Revista do Conselho Curador - 2ª edição

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Dezembro de 2013 Edição nº 2

Reportagem

PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA EBC:

Fábio Pozzebom/ABr, editada de acordo com a licença CC

O QUE VOCÊ TEM A VER COM ISSO?

Conselheira

Trabalhadores

Retrospectiva

Rita Freire: “Conversar é a essência de uma empresa como a EBC”

Empregados falam sobre equidade de raça e empresa pública no Canadá

Confira as atividades do Conselho Curador no 2ª semestre de 2013


Revista do

Conselho

editorial

Curador

Editora-executiva Priscila Crispi Editores Mariana Martins e Guilherme Strozi Reportagens e artigos Aida Feitosa Daphne Dias Isabela Vieira Marcus Vinícius Leite Fraga Mariana Martins Nélia Del Bianco Priscila Crispi Regina Lima Rita Freire Fotografia Agência Brasil (Fábio Rodrigues Pozzebom e Marcello Casal), Coletivo Mídia NINJA, Instituto Voz, Rede Comunitária de Comunicação, Divulgação, Shutterstock, Ana Migliari (TV Brasil), Instituto Voz (Guilherme Marin), Arquivo Pessoal Projeto gráfico e diagramação Cid Machado Vieira CONSELHO CURADOR | EBC Ana Luiza Fleck Saibro (Presidente) Heloisa Maria Murgel Starling (Vice-Presidente) Aloizio Mercadante Ana Maria da Conceição Veloso Cláudio Salvador Lembo Daniel Aarão Reis Filho Eliane Gonçalves Helena Chagas Ima Célia Guimarães Vieira João Jorge Santos Rodrigues José Antônio Fernandes Martins Marco Antonio Raupp Maria da Penha Maia Fernandes Mário Augusto Jakobskind Marta Suplicy Murilo César Oliveira Ramos Paulo Ramos Derengovski Rita Freire Rosane Bertotti Sueli Navarro Takashi Tome Wagner Tiso Secretaria Executiva do Conselho Curador Guilherme Strozi Mariana Martins Priscila Crispi Raquel Fiquene Ramos DIRETORIA-EXECUTIVA | EBC Diretor-Presidente Nelson Breve Diretor Vice-Presidente de Gestão e Relacionamento Josimar de Gusmão Lopes Diretor-Geral Eduardo Castro Procurador-Geral Marco Antônio Fioravante Diretora de Jornalismo Nereide Beirão Diretor de Produção Rogério Brandão Diretor de Conteúdo e Programação Ricardo Soares Diretor de Administração e Finanças Alexandre Assumpção Ribeiro Diretor de Negócios e Serviços Antonio Carlos Gonçalves Ouvidora-Geral Regina Lima Secretária-Executiva Sílvia Sardinha

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Empresa brasil de comunicação

A EBC é sua Num ano em que o Brasil vivenciou enormes manifestações populares na luta por diversas demandas, a 2ª edição da Revista do Conselho Curador não poderia ficar à margem de debater a necessidade de uma maior participação social nas decisões do país. E, por que não, da EBC? O esforço do Conselho Curador tem sido o de assegurar que a Empresa Brasil de Comunicação cumpra seu papel de construir conteúdos que promovam a reflexão crítica à partir de uma programação e de um jornalismo que tenham sempre o cidadão como prioridade. E claro, também como ator principal na construção dos programas e das notícias dentro da empresa. Nesta edição, tentamos explorar quais são os mecanismos de participação social, além da Ouvidoria, existentes nos canais de mídia da EBC, prioritariamente a TV Brasil, as Rádios EBC e o Portal EBC. E responder se a EBC estimula de fato esta participação social, qual a razão para uma empresa pública de comunicação fazer isso e, se o público está se sentindo contemplado. Dando continuidade à concepção da Revista, nesta edição você também vai encontrar um resumo das atividades do Conselho Curador em 2013, um texto feito por uma funcionária da EBC para a coluna “Trabalhadores e Trabalhadoras”, um espaço destinado para artigos dos membros do Conselho Curador e uma análise da Ouvidoria sobre conselhos editoriais ao redor do mundo. Seja bem-vindo, participe e boa leitura! Ana Luiza Fleck, presidenta do Conselho Curador da EBC

Facebook: www.facebook.com/conselhocuradorebc Twitter: http://www.twitter.com/ConselhoCurador YouTube www.youtube.com/conselhocuradorebc


Índice

Dia a dia do Conselho

Trabalhadores e Trabalhadoras

Matéria de capa

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Notas do Conselho Curador

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Espaço Público

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Cartas dos leitores “O projeto da Rede Nacional de Comunicação Pública da EBC deveria seguir os preceitos da comunicação pública e do § 3º do inciso IX do Artigo 8º da Lei que a rege. Assim, melhor seria exigir, como condição à cessão de programas ou à abertura de espaço na sua programação para as TVs estaduais, que os respectivos governos tornassem “suas” emissoras efetivamente públicas. Do contrário, a EBC estará fortalecendo, com o dinheiro público que a mantém, emissoras estatais afastadas do interesse público.” Alberto Perdigão Coordenador do Grupo de Estudo em TV Pública da Universidade de Fortaleza- UNIFOR

Programação em debate

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Coluna acadêmica

Palavra da Ouvidoria

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Fala, conselheira!

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“Gostaria de parabenizar o trabalho de todo o Conselho Curador da EBC. Acompanhei algumas reuniões e vi que o trabalho é sério, porém gostaria de fazer uma cobrança: a empresa não pode estar vinculada à Secom, do Governo Federal. Em que medida se é possível construir uma programação e jornalismo isentos com tais ligações? Deixo um apelo para que o Conselho trabalhe para separar a EBC desta Secretaria. Encarecidamente, abraço” Paulo Canhoto Professor do Centro Universitário do Distrito Federal e mestre em Ciência Política pela Universidade de Brasília


Shutterstock

Trabalhadores e Trabalhadoras

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Empresa brasil de comunicação


Para combater a desigualdade:

ações afirmativas na EBC

Por Aida Feitosa, jornalista Cojira-DF e Isabela Vieira, jornalista da EBC e Cojira-RJ

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m diálogo constante com a sociedade brasileira, a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) encontra-se frente ao desafio de incorporar a diversidade brasileira à sua estrutura organizacional. No momento em que o governo federal propõe a reserva de vagas em concursos públicos para pretos e pardos (negros), empregadas e empregados da EBC vão além: querem todos os cargos de chefia e direção preenchidos de acordo com critérios de gênero e raça, proporcional ao verificado no país. A proposta – rejeitada pela diretoria da empresa - constava da pauta de reivindicações do Acordo Coletivo de Trabalho 2013/2014 e foi tema de debates nos piquetes de greve, com apoio de representantes do movimento negro. A EBC aguarda a tramitação do Projeto de Lei 6738 que reserva a pretos e pardos (negros) 20% das vagas oferecidas nos concursos do executivo federal, e enquanto o projeto tramita, a diretoria se comprometeu a implementar o Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça, da Secretaria de Políticas para as Mulheres. A adesão – defendida nas duas últimas pautas de reivindicações do acordo coletivo – ocorreu em setembro deste ano. No momento, a atual estrutura da empresa é excludente. A EBC tem apenas uma mulher entre os seus oito cargos de diretoria. A presidência, ocupada nos primeiros anos pela jornalista Tereza Cruvinel agora está sob a responsabilidade do jornalista Nelson Breve. Os seis superintendententes, vinculados à Diretoria-geral, são homens, assim como os principais gestores da vice-presidência. No Rio, levantamento feito com dados do Portal da Transparência, mostra que dos 57 cargos de chefia, somente 15 são ocupados por mulheres (sendo três do quadro funcional). Em São Paulo, de 20 cargos de gestão

na TV Brasil, 16 estão preenchidos por homens. O problema na estrutura organizacional das empresas de comunicação e no jornalismo não é exclusividade da EBC. Levantamento da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) mostrou que, embora a maioria dos jornalistas seja mulheres, brancas e jovens (64%), elas ocupam posições hierárquicas mais baixas e recebem salários menores que os homens. Já os negros e negras jornalistas somam 23% desses profissionais, o que não corresponde nem de perto ao percentual de 50,74% de pretos e pardos (negros) na sociedade brasileira, segundo o IBGE. No bojo da criação da EBC, em 2008, o pesquisador PHD em Comunicação e cineasta Joel Zito Araújo já alertava para o problema. Estudo coordenado por ele constatou que apenas 8,6% dos apresentadores das emissoras públicas de televisão eram negros/negras. Do total de repórteres de vídeo desses mesmos canais, somente 5,5% eram considerados pretos ou pardos. O racismo institucional deve ser enfrentado desde os processos seletivos aos programas de progressão de carreira, passando pelas regras de acesso à empresa, que ainda proíbe a entrada de empregados ou entrevistados trajando chinelo ou bermuda. Pesquisas censitárias sobre a composição do quadro de funcionários e campanhas de esclarecimentos devem acompanhar as práticas de combate ao racismo e valorização da diversidade. Dessa forma, a EBC cumprirá sua função constitucional de produzir conteúdos que promovam os direitos humanos, desconstruam estereótipos e garantam a pluralidade. Aida Feitosa jornalista integrante da Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial (Cojira-DF) e Isabela Vieira jornalista da EBC e integrante da Cojira-RJ.

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Dia a dia do Conselho

Conselho Curador:

segundo semestre em retrospectiva Texto: Mariana Martins

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Ana Migliari (TV Brasil)

inalizando os seis anos de existência, o Conselho Curador iniciou suas atividades do segundo semestre de 2013 com a participação da presidenta do Conselho, Ana Fleck Saibro e do diretor presidente da EBC, Nelson Breve na reunião do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional (CCS). A reunião debateu o planejamento e o panorama atual da EBC e gerou também uma série de pedidos de informação, elogios e sugestões por parte dos integrantes do CCS. Tanto o Conselho Curador quanto à Diretoria

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Empresa brasil de comunicação

da EBC apresentaram um registro das atividades realizadas nos últimos anos, bem como das perspectivas para os próximos períodos.Vale lembrar que o Conselho Curador tem, dentre suas responsabilidades legais, o dever de encaminhar todas as resoluções tomadas pelo pleno para o CCS. Em agosto, foi a vez do Conse-


lho Curador participar do IV Fórum Internacional de Mídias Públicas na América Latina, que foi realizado na sede da EBC, em Brasília, entre os dias 29 e 30 de agosto. Na ocasião, a presidenta do Conselho falou sobre o papel da participação social no fortalecimento da comunicação pública. O fórum contou ainda com a participação de mais de 30 especialistas em comunicação latinoamericanos e iberoamericano. Durante o fórum, foram discutidos os modelos de financiamento da televisão pública, a participação cidadã na gestão da mídia pública, os desafios da criação e compartilhamento de conteúdos regionais, além das vantagens e desvantagens da regulamentação do setor. Mais profunda neste semetre foi, contudo, a contribuição do Conselho no processo de construção das Diretrizes de Conteúdo e Programação para o biênio 2014/2015. Os debates foram feitos no mês de setembro durante um seminário interno da empresa que contou com a participação dos conselheiros, da direto-

ria, das superintendências e das gerências. O processo contou ainda com a contribuição dos empregados que se manifestaram por meio do canal interno de comunicação da empresa. Estas contribuições foram analisadas e incorporadas ao documento final, aprovado durante a 47ª Reunião Ordinária do Conselho, realizada no dia 15 de outubro no Rio de Janeiro. Foi também no Rio de Janeiro que o Conselho realizou a sua audiência pública semestral, no dia 14 de outubro. A audiência teve como objetivo estimular o debate em torno da contribuição que a sociedade civil pode dar para o modelo de consulta pública que o conselho deve fazer para a eleição dos seus membros. Uma consulta prévia, que teve início no dia 25 de setembro e foi até o dia 02 de dezembro, foi feita para receber por Correios e por e-mail, sugestões para a realização da segunda consulta que será realizada no início de 2014, aí sim para eleger cinco novos membros da sociedade civil. Alguns pontos foram consenso durante a audiência pública e, de alguma forma deverão estar presentes no próximo edital, são eles: a necessidade de se garantir, entre os conselheiros, representação regional, de pessoas com deficiência, jovens e indígenas, além de alcançar a equidade de gênero e praticar uma política afirmativa para afrodescendentes. Além disso, concordou-se que não se deve haver restrições para definição de quais entidades podem participar da indicação de nomes, a não ser as já descritas na Lei de criação da EBC (Lei nº 11.652). Em novembro, o Conselho reconduziu a conselhei-

Audiência Pública no Rio de Janeiro debateu o modelo de escolha dos novos conselheiros

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Dia a dia do Conselho

religiosos diversos. Durante o semestre foi criado um edital público para que empresas pudessem sugerir formatos e modelos de programas com os respectivos objetivos. As propostas habilitadas no pitching foram publicadas no Diário Oficial da União (DOU) nos dias 13 e 19 de novembro. Para o programa “Diversidade Religiosa: Panorama”, de cunho jornalístico, foram recebidas 14 inscrições, sendo 7 habilitadas para a participação. Para o programa “Diversidade Religiosa: Retratos”, de cunho mais cultural-artístico, foram recebidas 15 inscrições, sendo 6 habilitadas para a participação. Os resultados finais das seleções serão divulgados no DOU nos dias 09 e 11 de dezembro. Ainda em dezembro, os participantes classificados defenderão seus projetos na EBC para posterior início das produções.

Marcello Casal Jr. (ABr)

ra Ana Luiza Fleck Saibro ao cargo de presidenta do colegiado. Na reunião extraordinária realizada no dia 13, o mandato de Ana Fleck, que se encerraria em dezembro desse ano, foi renovado por mais dois anos. Esta reunião foi realizada no mesmo período em que os trabalhadores da empresa estavam em greve. Alguns conselheiros e conselheiras participaram de uma atividade promovida pelo comando de greve para ouvir as principais demandas do movimento e tentar contribuir com um possível acordo entre trabalhadores e EBC. Ao final do processo de negociação, que ocorreu no dia 21 de novembro, o Conselho em nota parabenizou as partes pela aprovação do acordo coletivo e reafirmou a sua crença nas relações de trabalho como fator essencial na construção de conteúdos e neste movimento como construtivo para toda Empresa. Este semestre foi ainda marcado pela cobrança do Conselho para a criação da Faixa de Diversidade Religiosa, fruto de discussões iniciadas pelo órgão ainda no ano de 2011. A faixa contará com um programa jornalístico semanal, com duração de uma hora, que tratará de temas filosóficos e culturais que abordarão o tema “religiosidade”. Também contará com um programa semanal de 30 minutos com a apresentação de mensagens de grupos

Conselheiros aprovaram Diretrizes de Conteúdos, que vão valer para o biênio 2014/2015 na EBC

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Notas do Conselho Curador

Texto: Mariana Martins

Jornalismo e coberturas das manifestações públicas em debate O jornalismo da EBC foi tema de mais uma edição do Roteiro de Debates do Conselho Curador em agosto. A pauta surgiu na Câmara Temática de Jornalismo e Esportes e, para além do jornalismo da empresa de uma forma geral, incorporou o tema das manifestações que estavam acontecendo no país. Logo, a cobertura que os veículos da empresa fizeram das manifestações de junho e julho passou a ser também objeto do debate que contou com a participação de Luiz Felipe Marques, do Coletivo Midia Ninja e Iluska Coutinho, professora da Universidade Federal de Juiz de Fora. O debate rendeu propostas e diretrizes para serem tomadas pela empresa, como a definição de um prazo para criação do Comitê Editorial e para elaboração dos planos editoriais dos veículos da Empresa, previstos no Manual de Jornalismo, bem como projetos continuados de formação dos funcionários, como um programa de pósgraduação em comunicação pública.

Ouvidoria e Conselho fazem parcerias para melhorar fluxo de informações O Conselho Curador e a Ouvidoria da EBC passou a trabalhar de forma mais colaborativa no levantamento das demandas vindas da sociedade. O acordo, que surgiu após reuniões entre as equipes das duas instâncias, resultou em um novo modelo de aproveitamento e exposição do Relatório da Ouvidoria. Reuniões mensais estão sendo realizadas entre as equipes dos dois órgãos com vistas a garantir que as Câmaras Temáticas do colegiado estudem previamente o documento da Ouvidoria, a partir de filtros que selecionarão as demandas dos cidadãos segundo os eixos de discussão de cada grupo.

Roteiro de Debates movimenta sede da EBC no Rio de Janeiro Em setembro foi a vez do Rio de Janeiro entrar no circuito dos roteiros de debates. Aproveitando a ida do Conselho Curador à cidade para realização da audiência pública, que iniciou os debates sobre o modelo de consulta pública para renovação dos membros da sociedade civil no Conselho, a Câmara temática de cinema e dramaturgia pautou o roteiro com o tema: dramaturgia e a ficção nos

conteúdos da EBC. O debate contou com a participação da professora da Universidade Federal Fluminense Heloísa Toledo Machado e com o realizador audiovisual André Pellenz, diretor de Natália, minissérie produzida em parceria com a EBC. O debate contou com a participação dos funcionários da empresa que lotaram o Espaço Cultural da EBC Rio e contribuíram para eleboração dos encaminhamentos tirados do encontro. Como resultado do roteiro de debate, algumas ações concretas foram propostas, como a criação de um núcleo de dramaturgia, o estabelecimento de parcerias com escolas de teatro e cinema, além da adaptação de obras literárias para a televisão. O debate, porém, abarcou questões como estética, mercado audiovisual e o papel da TV pública, contribuindo para o desenho de diretrizes para essa programação. Todos os roteiros de debates podem ser vistos na íntegra na página do Conselho Curador no Youtube (www.youtube.com/user/conselhocuradorebc).

CC cobra à Anatel liberação daContribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública O Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação enviou no dia 29 de outubro, um ofício solicitando informações sobre a Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública para o Presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), João Batista de Rezende. No documento, o colegiado posiciona-se pela liberação dos recursos que compõe a Contribuição pagos pela empresa Tim ao Fundo de Fiscalização das Telecomunicações.O envio do ofício foi aprovado pelo pleno em sua 47ª Reunião Ordinária, realizada em 15 de outubro de 2013. Segundo a Anatel, esse assunto é de responsabilidade da Advocacia Geral da União.

Conselho Curador se posiciona sobre Marco Civil da Internet O Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação enviou no dia 25 outubro uma moção de apoio a aprovação do projeto de Lei do Marco Civil da Internet (PL 2126/11) para o presidente da Câmara dos Deputados, o relator do PL e outros parlamentares. O envio do documento foi aprovado pelo pleno em sua 47ª Reunião Ordinária, realizada em 15 de outubro de 2013.

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Diego Bresani

matéria de capa

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Gestão participativa: o público na EBC Texto: Priscila Crispi

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participação social voltou a andar de mãos dadas com o conceito de democracia nos noticiários, discursos parlamentares e conversas de mesa de bar. Isso porque as manifestações que varreram o Brasil em junho desse ano trouxeram para a pauta do dia a crescente insatisfação não só com os serviços prestados pelo Estado, mas, especialmente, com sua falta de diálogo na execução orçamentária e de políticas públicas. O resultado da pressão popular pode ser observado no anúncio de programas que pretendem resolver não só problemas na saúde, educação e transportes, mas o histórico abismo entre a esfera pública e a intervenção social no país. Se as medidas para dar retorno aos protestos são recentes, a discussão sobre a participação cidadã por aqui já é bem antiga e ganhou força com a promulgação da Constituição Federal de 1988, conhecida justamente como “Constituição Cidadã”. A Carta Magna recebe esse apelido porque, dentre outras importantes contribuições para a redemocratização do país, criou mecanismos de participação e controle social. A participação cidadã foi, então, considerada condição obrigatória para a construção de um Estado Democrático de Direito. Para a doutora em Sociologia pela Universidade de Brasília, Sayonara Leal, a participação está totalmente ligada a uma democracia plena. “Ser cidadão é participar para além do voto. Esse é um direito e um dever”, diz. Na outra ponta, ela afirma que uma

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O Conselho Curador é o ente institucionalizado para ser a representação da sociedade na EBC. Ele é formado de 22 membros, dos quais 15 são representantes do povo, eleitos por um processo de indicação por parte de entidades da sociedade civil. “Na minha opinião, a EBC só é realmente pública porque garante a participação da sociedade em sua gestão por meio do Conselho”, define a conselheira Rosane Bertotti. A militante explica que sua participação no colegiado é referenciada pelos movimentos sindicais, feministas, de luta pela democratização da comunicação e da agricultura familiar. Rosane faz relatorias das reuniões do colegiado para esses movimentos e realiza reuniões preparatórias antes de discussões específicas. “Acredito que nosso Conselho é amplo, mas tem uma parte da sociedade civil que ainda não está representada. Ao mesmo tempo, estamos preocupados em atender essa demanda, o que se reflete nas programações que fazemos”, diz. Para além da atuação dos conselheiros, o colegiado realiza atividades, em várias cidades do país,

Mídia Ninja

das características principais de uma instância pública são os mecanismos que garantam que a sociedade possa intervir em sua gestão. Esse é, justamente, um dos princípios que determina a prestação dos serviços de radiodifusão pública, descrito na legislação que cria a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), Lei Nº 11.652, de 7 de abril de 2008. Segundo o texto, a comunicação pública deve se valer da “participação da sociedade civil no controle da aplicação dos princípios do sistema público de radiodifusão, respeitando-se a pluralidade da sociedade brasileira”. Duas instâncias foram previstas na Lei para garantir a execução desse princípio: o Conselho Curador e a Ouvidoria.

Manifestações em junho deste ano – como esta em SP estimularam as discussões sobre participação social

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Ana Migliari (TV Brasil)

Mídia Ninja

Público participa de Roteiro de Debates promovido pelo Conselho Curador no Rio de Janeiro

como audiências públicas, debates e reuniões com setores específicos para estimular o diálogo com a sociedade (ver box na página 18). Já a Ouvidoria da EBC tem papel duplo: acolher e estimular a opinião do público e também analisar criticamente a produção, funcionando como uma espécie de Ombudsman. Para Regina Lima, ouvidora-geral da EBC, mais importante do que abrir canais para participação, é gerar mudanças a partir da opinião do cidadão. “Abrir espaço até os veículos privados faziam com as cartas dos leitores, há muitos anos. O problema é o que fazemos com isso. A comunicação pública precisa respeitar as pessoas e ela faz isso quando a programação reflete as demandas vindas da sociedade”, defende. “Gosto muito de receber a opinião que vem da Ouvidoria, primamos por responder. Existe um diálogo sobre ela, mas a opinião do público ainda não tem força pra mudar uma programação”, diz Rogério Brandão, diretor de Produção da EBC. Segundo ele, pela vocação da Empresa, os canais de participação deveriam

ser ampliados e isso, naturalmente, geraria mudanças nos produtos. “Quanto mais os produtores, nós, formos expostos às críticas e sugestões, mais respostas teremos que dar”, afirma. Regina acredita que a presença de estruturas de participação, em si, não garante que o interesse público seja priorizado, mas que sempre vai agregar algo novo ao conteúdo. A pesquisadora Sayonara concorda: “esses são espaços obrigatórios em qualquer empresa pública. Se eles funcionam, é questão de pesquisa, mas com certeza eles legitimam a visão de comunicação pública que a empresa quer fazer”. Os três, porém, concordam em um aspecto: é preciso fazer com

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Cristina Saliby, telespectadora da TV Brasil, participou de audiência pública promovida pela EBC

que a sociedade abrace o projeto da comunicação pública. E isso pode ser uma tarefa muito difícil. Sayonara explica que mobilizar as pessoas em torno da EBC é um desafio, pois a sociedade brasileira é muito voltada para a vida privada e está acostumada com uma comunicação predominantemente comercial. “Tudo que é público só funciona se as pessoas se sentem parte. Por isso, vale o esforço da EBC de deixar claro esse conceito, mostrar que aquilo pertence a todo mundo, ir buscar a participação”, afirma. Rogério acrescenta que a divulgação da Empresa deve gerar nas pessoas o sentimento de pertencimento. “O cidadão precisa achar que isso aqui é dele e não do governo. Isso ainda não acontece”, admite. Cristina Saliby é engenheira e telespectadora da TV Brasil, além de ser ouvinte das rádios MEC AM e FM do Rio de Janeiro há muitos anos. Ela comprova a tese de que o conceito de coisa pública desperta o interesse dos cidadãos. “Sempre soube que esses eram veículos públicos e gosto disso. Não acompanho só porque gosto da programação. Na verdade, eu acho que gosto da programação justamente porque ela é pública, plural, de interesse coletivo, independente dos interesses do governo”, explica. Cristina entrou em contato com a Ouvidoria da EBC neste ano para reclamar de um problema técnico – alterações no áudio da programação. A resposta chegou, mas o problema não foi resolvido. Mesmo assim, mais tarde, ela aceitou um convite do Conselho Curador para participar de uma audiência pública sobre o modelo de escolha de novos conselheiros. “Me senti honrada por ter sido convidada e participante da EBC. Eu gosto de dar minha contribuição, e quando algo é público, sinto

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que tem um pedacinho meu ali”, afirma. A engenheira conta que nem sempre consegue promover em amigos e familiares o mesmo entusiasmo que tem com a TV pública. “A Empresa fazer mais divulgação de si mesma não vai resolver tudo, porque acredito que é um problema cultural também. Se nossa educação fosse melhor, as pessoas veriam mais a TV Brasil. Agora, entre quem já vê, se houvesse uma divulgação sobre o que é a empresa, sua totalidade e seus canais de interação, com certeza, as pessoas participariam mais”. Sayonara endossa a opinião da telespectadora sobre a importância da educa-

Não acompanho só porque gosto da programação. Na verdade, eu acho que gosto da programação justamente porque ela é pública.

ção para uma cultura participativa. Mas alerta que uma formação crítica não é o único fator que leva as pessoas a intervirem socialmente. “Isso não é determinante porque países que são modelo de democracia também tem um deficit de participação popular. Está provado que capacidade para intervir não tem a ver com diploma e sim com interesse. Temos níveis de engajamento porque as pessoas têm motivações distintas”.


Espaços de Participação O Manual de Jornalismo da EBC diz que a produção jornalística da Empresa se submete ao interesse público por meio da interação com o cidadão. Segundo o texto, os canais de comunicação da sociedade com a empresa devem alimentar sua pauta jornalística, seu planejamento e suas ações estruturadas. Dentre esses canais estão o Conselho Curador, a Ouvidoria, e-mails, telefonemas, redes sociais, contato direto dos profissionais com a população, pesquisas de opinião, o jornalismo participativo e as pautas colaborativas. O sistema de pautas colaborativas ainda não foi totalmente implantado nas redações da EBC, estando restrito ao perfil do Repórter Brasil, jornal de veiculação nacional da TV Brasil, no Facebook. Sobre o jornalismo participativo, o Manual define que “entende-se como a participação do cidadão o acolhimento de sugestões de pauta, críticas, dados e informações e produção de conteúdos”. A produção vinda da sociedade precisa se amoldar a parâmetros também estabelecidos na norma.

tânea, são também estimuladas. Não existe, porém, uma agenda de publicação sistemática. “Algumas estratégias poderiam aumentar a participação na editoria colaborativa como abrir a plataforma do Portal, o que já está sendo trabalhado, fechar parcerias específicas com entidades que produzam comunicação e ter uma equipe que cuide exclusivamente disso”, defende Lauro. Outro tipo de interação gerenciada pela Sucom são aquelas recebidas pelo Portal na área de comentários e também pelas redes sociais. Os diálogos possuem perfis diversos – narração paralela de eventos esportivos, informações complementares sobre coberturas de políticas públicas e programas de governo, pedidos de serviços, críticas às matérias, entre outros. O retorno da audiência nesses canais influencia a cobertura e gera correções constantes no que foi publicado, segundo o gerente.

A definição de jornalismo participativo, porém, não está fechada – nem para definição de conteúdos da Empresa, nem para a academia. O consenso reside na ideia que a prática do jornalismo participativo constitui uma interação que vai além de intervenções superficiais, como o envio de sugestões e pautas, possibilitando aos destinatários colaborarem com a produção dos conteúdos, em suas várias etapas. Nesse sentido, dois espaços correspondem ao jornalismo participativo na casa: o quadro “Outro Olhar”, também no Repórter Brasil, e a editoria “Colaborativo”, no Portal EBC. Lauro Mesquita, gerente de conteúdos da Superintendência de Comunicação Multimídia (Sucom), área responsável pelo Portal da Empresa, acredita que a internet viabilizou uma nova forma de se produzir conteúdos, superando o tradicional esquema emissor-receptor de informações, o que fez florescer o jornalismo participativo. “O conteúdo, na web, não morre na publicação, ele gera novos conteúdos. É um trabalho permanente de reconstrução a partir do leitor”, explica. Para ele, garantir transmissões ao vivo, sejam elas produzidas por entidades da sociedade civil, ou por cidadãos não-organizados, são a forma mais relevante de produção direta do público, pois as demais publicações passam por edição, ainda que consentida.

Redação da Superintendência de Multimídia, em Brasília, responsável pelo Portal EBC

As colaborações não chegam apenas de maneira espon-

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O “Outro Olhar” é um quadro do telejornal Repórter Brasil que existe desde a criação da TV Brasil, em 2007. Apesar de ter em média dois minutos durante o jornal, Patrícia Leite, coordenadora do quadro, acredita que o projeto está consolidado. “Ele teria que ser é ampliado, invadir a grade, ocupar outros veículos da Empresa”, afirma. Patrícia defende que o espaço é o olhar de quem vive a notícia, uma espécie de antropologia visual sem a interferência do olhar técnico. “As pessoas são as verdadeiras produtoras, nós somos apenas pautados pelo que elas vivem”, afirma.

Instituto Voz

Uma das entidades que já participaram do quadro é o Coletivo Catarse, de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Segundo André Oliveira, repórter do coletivo, o tipo de interação mais efetiva entre entidades da sociedade civil e a EBC passa sempre pela autonomia da produção. “Se os coletivos tiverem a liberdade de escolherem suas pautas, criarem os próprios temas, isso vai gerar mais interesse dos jornalistas em participar. Eles saberão que ali podem emplacar os seus pro-

Público pode participar do quadro Outro Olhar enviando seus próprios vídeos

Para a coordenadora, as pessoas estão cada vez mais interessadas em participar da produção de conteúdos, mas não existe uma cultura propícia para que a demanda seja espontânea. Segundo ela é porque a técnica da comunicação não é fácil e grande parte da população ainda não tem acesso às ferramentas de produção. Porém, na visão de Patrícia, o esforço de qualificar a população para essa participação ofereceria um salto de qualidade para o jornalismo da EBC, em relação aos veículos comerciais. “Empresas comerciais têm dinheiro para renovar equipamentos e estar em todos os lugares. Emissoras públicas têm pouco dinheiro e equipe e só conseguiremos fazer isso porque não seremos nós, mas sim as pessoas que estarão em todos os lugares para contar os fatos”, define. “O trabalho que fazemos aqui é muito efetivo, o mundo está copiando, mas sinto que a Empresa deveria valorizar mais este espaço”. A jornalista acredita que algumas medidas pontuais valorizariam o quadro e a participação da sociedade na Empresa como o aumento do número de funcionários na equipe, a disponibilização de verbas para realização de oficinas, uma maior divulgação dos espaços de intervenção, a horizontalização dos conteúdos em todos os veículos da empresa e uma comunicação interna mais efetiva que estimulasse os trabalhadores a abraçar o projeto.

Rede Comunitária de Comunicação

Outro Olhar

jetos e reportagens e isso, sim, é um sistema colaborativo”. Os vídeos que vão ao ar chegam tanto de maneira espontânea quanto de maneira estimulada – por meio de parcerias com ONGs, coletivos de comunicação, produtores independentes e movimentos sociais. Segundo Patrícia, um trabalho cuidadoso de estabelecer confiança e treinar os colaboradores é feito por ela e Andréa Araújo, outra profissional que integra a equipe. Além disso, elas captam material em mostras de cinema, em redes sociais, oficinas e palestras universitárias que realizam pelo país. “As pessoas têm a falsa impressão de que os vídeos veiculados são produtos de baixa qualidade, mas eles apenas inovam na estética, que não é a tradicional da mídia”, diz.

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Empresa brasil de comunicação

Coordenadora do Outro Olhar, Patrícia Leite, realiza oficinas de jornalismo participativo em Unaí, MG


Estética do público Para além do jornalismo, o diretor de Produção da EBC, Rogério Brandão, explica que as grades da TV Brasil se abrem para o público principalmente em três momentos: nos programas transmitidos ao vivo, no programa da Ouvidoria, o “Público na TV”, e através do Banco de Projetos, endereço eletrônico (www.ebc.com.br/producao), aravés do qual pessoas físicas e jurídicas podem cadastrar propostas de licenciamento, produção de conteúdos audiovisuais, radiofônicos, multimídia, entre outras.

A voz e o rádio O rádio costuma ser tratado como um veículo de proximidade e participação. Essa, com certeza, é a vivência de Mara Régia di Perna, radialista há mais de 30 anos e idealizadora do programa “Viva Maria”, que vai ao ar pela Rádio Nacional da Amazônia. O programa foi responsável por mobilizar movimentos em torno dos direitos da mulher na década de 80 e é, até hoje, uma referência para a população feminina, especialmente, do Norte e Nordeste do país. As cartas que lotam a mesa

A socióloga Sayonara Leal lembra que uma empresa pública de comunicação deve tratar o gosto do público com humildade. “O Brasil está firmado no padrão Globo. Se você quer emplacar algo, tem que levar em conta o padrão estético. É pretensioso dizer que a sociedade não sabe o que é bom. A EBC tem que sair do pedestal e ir ver o que o usuário quer. Ele é quem decide!”, pontua.

É mais cômodo fazer programas de dentro do estúdio, mas não tem temperatura.

Arquivo Pessoal

“Nossa interlocução com os produtores independentes é um bom começo para trazermos para nossa tela a diversidade estética da sociedade”, acredita Rogério. Ele acredita que é preciso equilibrar o padrão de qualidade compatível com o que as pessoas já estão acostumadas a ver, com a inovação vinda da produção colaborativa. “Não se trata de dirigismo estético, mas é importante darmos elementos novos para formação de uma nova opinião”, afirma.

Mara Régia coordena o programa “Viva Maria”, responsável pela participação feminina na luta por direitos

de Mara comprovam a intimidade dos ouvintes com a apresentadora e a influência em suas vidas pessoais. “Eu sinto falta da participação que tinha nos primeiros tempos. Perdi a interação no ar, porque hoje o Viva Maria tem só cinco minutos, virou um programete. Nossa comunicação, na Rádio AM da EBC, ficou mais fria”, lamenta. Mara, que também apresenta semanalmente, por duas horas, o programa Natureza Viva, na mesma emissora, se considera uma comunicadora popular. “Você só entra na

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matéria de capa

sintonia certa quando ouve quem está do outro lado. As coisas mais bonitas que já escrevi vieram dessa interação com o povo. É mais cômodo fazer programas de dentro do estúdio, mas não tem temperatura”. Ela acredita que as tecnologias de transmissão deveriam ser melhor aproveitadas pela Empresa para levar o rádio para a rua. “Não acho que é papel da EBC ser um instrumento mobilizador, mas nossa programação tem que refletir as necessidades de políticas públicas que não encontram espaço nas mídias tradicionais. Esse tipo de cobertura é inspiradora e, por si só, mobiliza”.

Como entrar em contato com o Conselho Curador da EBC Página na Internet: www.conselhocurador.ebc.com.br Telefone: (61) 3799-5636 / 3799-5554 Email: conselho.curador@ebc.com.br Carta (Correio) Conselho Curador da EBC Setor Comercial SUL - SCS - Quadra 08 Bloco B-60 1º Piso Inferior - Edifício Venâncio 2000 - Asa Sul – Brasília/DF CEP – 70333-900 Consultas Públicas - quando abertas, as consultas públicas são publicadas no Diário Oficial da União, na página do Conselho Curador na Internet e publicizada em toda

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as contas do Conselho nas redes sociais. Para participar, você pode enviar contribuições pelos correios ou por e-mail. Audiências Públicas – toda audiência pública é aberta aos cidadãos. Elas acontecem semestralmente em diferentes cidades e estados do país. Caso vocês não possa ir, também pode enviar suas contribuições pelos correios ou por e-mal. Redes Sociais Facebook: www.facebook.com/conselhocuradorebc Twitter: @ConselhoCurador YouTube : www.youtube.com/conselhocuradorebc


Espaço Público

Trabalhadores da EBC criam núcleo de estudo da comunicação pública Texto: Mariana Martins de produção e divulgação de trabalhos e de debate permanente sobre o tema, agregando também outros atores sociais. Com pouco tempo de vida, o Espaço Público já realizou em 2013 debates com os empregados sobre o novo Manual de Jornalismo da EBC e pretende realizar em 2014 um seminário em São Paulo para discutir comunicação pública, reunindo funcionários, movimentos e entidades sociais. Também está prevista a realização de oficinas dadas pelos próprios funcionários, como aula de fotografia e de edição de vídeo. Uma página na Internet foi criada para facilitar o diálogo e publicar documentos produzidos pelo grupo. Nesta página, além do manifesto de criação do Espaço Público, estão disponíveis os contatos e a agenda de atividades do núcleo de estudos (www.espaçopublico.net). No Facebook, o link é www.facebook.com/NucleoEspacoPublico Arquivo Pessoal

N

o final de junho, trabalhadoras e trabalhadores da Empresa Brasil de Comunicação criaram um grupo de discussões chamado Espaço Público (Núcleo de Estudos e Reflexão de Trabalhadores da Comunicação Pública). A motivação para criação do grupo, segundo o seu manifesto, surgiu da preocupação com o debate político sobre o modelo de comunicação pública no Brasil. A avaliação do grupo é que a criação da EBC foi uma iniciativa importante dentro de um país que historicamente privilegiou a radiodifusão privada, mas que ainda existem poucos canais institucionais na empresa para a participação dos trabalhadores e trabalhadoras que produzem seus conteúdos. Inicialmente formado por trabalhadores da EBC em São Paulo, a organização deixa claro que a intenção é ampliar para todas as praças em que a empresa tem sede (Brasília, Rio de janeiro e Maranhão). O núcleo de estudos e reflexão pretende ser um espaço de formação desses profissionais da comunicação, mas também de interlocução com a sociedade, de análise da programação da EBC,

Trabalhadores da EBC em São Paulo se reúnem para debater temas ligados a programação da empresa

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Programação em debate

do espetáculo:

Shutterstock

esporte e cidadania na cobertura paralimpíadas na TV Brasil

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Arquivo Pessoal

Muito além

Nélia Del Bianco pesquisadora e Daphne Dias orientanda


O

conceito de espetáculo, segundo o pensador francês Guy Debord (1997), está intimamente relacionado à vida humana. É uma tendência natural da sociedade transformar o que é peculiar na atitude pessoal em show espetacular. A cobertura esportiva não escapa à essa tendência. É destaque no noticiário o que impressiona pela grandiosidade, o sensacional, o feito heróico dos atletas. Cada vez mais na mídia tradicional, o jornalismo esportivo se diferencia dos demais pela ludicidade, entretenimento, por lidar com paixões, emoções, valores, por perpassar interesses cotidianos, sentimentos, anseios e expectativas de vários campos sociais. Por essa lógica, trata-se, com freqüência, atletas como celebridades. Teria a TV pública condições de romper com essa lógica dominante de cobertura? Ao fazer uma análise comparativa da cobertura dos Jogos Paralímpicos de Londres de 2012 entre a TV Globo e a TV Brasil, Daphne Arvellos1, sob orientação de Nelia Del Bianco2, mostra que a diferenciação é a marca distintiva3. Sob a ótica da complementaridade dos sistemas de radiodifusão prevista na Constituição de 1988, pode-se observar que cada emissora desempenhou um papel a partir de seus objetivos. Guiada pela lógica da manutenção de atrações e de grandes patrocinadores, a TV Globo associou o evento ao entretenimento, aos feitos heróicos, às histórias de superação de atletas com limitações. A TV Brasil seguiu os princípios que caracterizam a radiodifusão pública: agregou à cobertura a questão da cidadania, ou seja, esporte relacionado à qualidade de vida, ao bem-estar e à saúde. A diferenciação foi percebida a partir da análise dos valores notícia utilizados para guiar a escolha dos fatos e o enquadramento da narrativa nas duas emissoras, tais como atualidade,

abrangência, impacto, relevância, qualidade da história, entre outros. A pesquisa demonstra que há alguns pontos semelhantes na cobertura entre as duas emissoras como enfocar, em parte das matérias, os resultados das partidas, os atletas que se destacaram, aspectos inusitados e a emoção da vitória. Enquanto a TV Globo detinha-se em informar sobre o acontecimento, a TV Brasil procurou contextualizar as paralimpíadas, fazendo matérias sempre com pontos de vistas múltiplos e abordagens diferenciadas. Ao dar maior espaço à cobertura na programação, a TV Brasil criou matérias de maior duração, contextualizadas no ambiente dos atletas como cidadãos portadores de necessidades especiais. A história de superação dos atletas era sempre mostrada no contexto das comunidades em que vivem. O cidadão, como pertencente a um lugar, a uma família, podia dizer muito mais do que simplesmente retratar sua vitória no esporte como resultado exclusivo do esforço individual. Incluir esse aspecto na abordagem humanizou a cobertura porque aproximou os atletas à realidade dos espectadores para os quais se dirige o conteúdo veiculado. Construir uma abordagem distinta é o maior desafio a considerar os atrativos que a emissora comercial oferece como transmissões exclusivas, excelente qualidade de imagem e recursos tecnológicos para captar ângulos inusitados. À TV pública cabe o papel da diferenciação, produzindo programação de qualidade com a qual o público seja capaz de se identificar. Não se limita a produzir programas para audiências negligenciadas por outra mídia ou a abordar assuntos ignorados pela mídia tradicional de informação. Trata-se simplesmente de um modo de organizar e produzir diferente, sem exclusão de qualquer gênero, plural, diversa e significativa do ponto de vista do interesse humano.

Teria a TV pública condições de romper com essa lógica dominante de cobertura?

1 Jornalista formada pela UnB. Foi bolsista do Observatório de Radiodifusão Pública na América Latina. Há mais de dois anos trabalha no Núcleo de Contas Corporativas do escritório do Grupo Máquina PR em Brasília. 2 Professora da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), Brasil. Doutora em Comunicação pela ECA-USP e estágio de pós-doutorado na Universidade de Sevilha, Espanha. Cofundadora do Observatório de Radiodifusão Pública na América Latina (www.observatorioradiodifusao.net.br) 3 Foram analisados 37 matérias produzidas pela TV Brasil veiculadas nos programas SporTvisão, Stadium, +Visão. Caminhos da Reportagem, Repórter Brasil, Jornal Visual e Opção Saúde. Pela TV Globo foram avaliadas 47 matérias veiculadas nos programas Globo Esporte,Boletim Paralímpico e Esporte Espetacular. Todas foram ao ar em julho de 2012. A cobertura da TV Brasil foi disponibilizada na seção Londres 2012 do portal da EBC. Além de ser disponibilizado no site, todo conteúdo ganhava teasers na página da rede social Facebook, com incidência de ações “curtir” e “compartilhar”, com a possibilidade também de receber comentários.

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Coluna acadêmica

Marcus Vinícius Fraga Jornalista da EBC

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Lições do Canadá N

o Canadá, o sistema de comunicação pública é resultado do pacto federativo de uma nação multicultural. Dessa forma, a mais antiga rede de comunicação broadcast no país é pública, a CBC/Radio-Canada, em funcionamento desde 1936. Metade da empresa é inglesa (a Canadian Broadcasting Corporation) e metade é francesa (a Société RadioCanada). Ambas são uma corporação de comunicação nos moldes da EBC – televisão, rádio e internet. O orçamento se aproxima dessa lógica de separação entre anglófonos/ francófonos, apesar da parte inglesa receber maior dotação, resultado também de uma maior população que tem o inglês como língua materna. A CBC/Radio-Canada foi criada com o intuito de evitar que a cultura canadense fosse sufocada pelas transmissões americanas. Em setembro de 1952, as primeiras emissões de televisão começaram simultaneamente em Montreal (bilíngue) e Toronto (apenas em inglês). Dentro do planejamento estratégico da empresa para 2012, está a busca por ampliar a cobertura de assuntos canadenses, ampliar seus serviços regionais, e fortalecer as plataformas online e digital. A cabeça de rede da CBC fica em Toronto e da RadioCanada fica em Montreal (as principais cidades do país). A sede administrativa está localizada na capital Ottawa. Além da capital federal, todas as dez capitais provinciais e dos três territórios no norte gelado, outras importantes cidades possuem escritórios próprios de produção de conteúdo para ambos os braços da empresa. Assim, temos um quadro de ao menos 14 escritórios bem estruturados e montados para produção e divulgação de conteúdos de interesse local, na-

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cional e internacional. A Corporação possui um presidente geral e dois vice-presidentes (um para o braço francês e outro para o inglês). Em junho de 2011, CBC/Radio-Canada empregava cerca de 8.660 funcionários e operava 82 estações de rádio e 27 emissoras de televisão de todo o país. Dentro do Canadá, são 48 escritórios próprios e oito afiliados em cidades de menor importância. Internacionalmente, CBC/Radio-Canada tem seis escritórios no exterior (Londres, Jerusalém, Pequim, Los Angeles, Washington e Nova Iorque).

A CBC/Radio-Canada foi criada com o intuito de evitar que a cultura canadensefossesufocada pelas transmissões americanas.

Receitas A CBC/Radio-Canada conta com quatro fontes de financiamento: verbas do governo, receitas de publicidade, receitas de serviços de especialidade e outras receitas. A dotação do governo (responsável por aproximadamente 70% do orçamento geral da empresa) gira atualmente em torno de um bilhão de dólares ao ano. A publicidade é também uma fonte importante de receita, compondo aproximadamente 20% do orçamento. Esse financiamento, porém, é alvo de questionamentos, sendo responsabilizado por gerar um modelo de comunicação parecido com o desempenhado pelas mídias privadas. Dessa forma, uma das grandes diferenciações da CBC/Radio-Canadá em relação aos veículos comerciais é a produção de conteúdos 100% canadenses – mesmo que, muitas vezes, eles tenham o formato espetaculoso das mídias privadas. Isso porque, no Canadá, pela facilidade de proximidade geográfica, política e linguística, os veículos privados sofrem concorrência direta de empresas dos Estados Unidos. A Corporação investe na programação canadense (e não apenas em programas jornalísticos) o mesmo tanto que todas as emissoras privadas convencionais do Canadá juntas. CBC/Radio-Canada também gera receitas de assinatura e publicidade de

Em todo o território canadense, a CBC/Radio-Canada possui: - dois canais abertos de televisão de entretenimento e notícias nos moldes da TV Brasil (um em inglês e outro em francês); - dois canais de rádio FM de notícias 24h (um em inglês e outro em francês); - dois canais de rádio FM dedicado à produção musical (um em francês e outro em inglês); - dois portais de internet que fazem o trabalho de sinergia de tudo que é produzido pela empresa (um em fran-

seus serviços informativos em inglês e francês – CBC News Network, documentários, e Réseau de l’informações da Radio-Canada (RDI). Também são geradas receitas de forma mais heterodoxa: venda de programas, aluguel de instalações e de prédios de sua propriedade, taxas de estacionamento e licenciamento de produtos com a marca CBC/Radio-Canada. Hoje, os serviços de rádio, televisão e internet têm sido a principal fonte de negócios da CBC/Radio-Canada. A grade de programação oferece conteúdos de produção canadenses de notícias, artes, entretenimento, programação infantil e esportes. Nos últimos anos do governo conservador do primeiro ministro Stephen Harper, a empresa vem sofrendo com cortes de repasses do governo federal, o que a levou a demitir funcionários e a fechar escritórios, levantando questionamentos sobre a viabilidade de um modelo de comunicação pública tão dependente do orçamento federal. A CBC/Radio-Canada comprou o direito de transmissão da Copa do Mundo de 2014 e também da cobertura dos Jogos Olímpicos de Inverno na Rússia, em 2014, e de Verão do Rio, em 2016 – vale lembrar que os jogos Olímpicos de Inverno são muito importantes para o Canadá, sendo o país, inclusive, campeão da última edição dos jogos, realizada em Vancouver, em 2012.

cês e outro em inglês). Em ambos, encontram-se também transmissões em streaming e de podcasts; - dois canais internacionais a cabo integrados com seus respectivos portais que produzem conteúdos de abrangência global e buscam atingir tanto a comunidade canadense que mora no exterior como os imigrantes no interior do país (por isso, há conteúdos em francês, inglês, espanhol, mandarim e árabe); - nos três territórios do norte, há também a produção de conteúdos nas oito línguas aborígenes;

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Conselhos Curadores :

Agência Brasil

Palavra da Ouvidoria

Regina Lima ouvidora-geral

exemplos de representação pelo mundo

É Shutterstock

louvável a iniciativa do Conselho Curador, através de uma Audiência Pública e uma Consulta Pública, envolver a sociedade civil na escolha dos novos cinco integrantes. Esta não é a primeira vez que consultas desta natureza se realizam. Em 2010 e 2012 entidades ligadas à comunicação pública e outros setores foram convocadas a indicar nomes para compor a lista submetida ao Pleno do Conselho e à Presidência da República. Esta sequencia de iniciativas revela uma consciência crescente da importância de fortalecer os laços entre a sociedade civil e o Conselho Curador da EBC, instân-

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cia mais representativa na estrutura organizacional da Empresa. a prestar contas à Assembleia da República. Uma comparação dos critérios e processos de Existe também um Conselho de Opinião, seleção adotados em outros países pode ser instrutivo. Nos Escomposto de 29 integrantes, 12 dos quais tados Unidos, o Conselho Diretor (Board of Diretors) do PBS é escolhidos por órgãos legislativos e 15 por composto de 27 integrantes, dos quais 14 são gerentes de emisassociações, conselhos consultivos e confissoras locais afiliadas, eleitos pelo público associado ao sistema sões religiosas, além de 2 membros de repelo pagamento facultativo de uma taxa anual. Os demais inteconhecido mérito, cooptados pelos restantes grantes são o presidente da empresa, nomeado pelo Conselho, membros do conselho. e 12 diretores, eleitos pelo Conselho, que representam o público No caso da EBC, a escolha efetiva dos em geral. A composição atual do Conselho inclui diretores e conselheiros por entidades representativas, ex-diretores de bancos, fundações, empresas e organizações da mesmo que o procedimento formal do Consociedade civil, tais como o Conselho Americano de Educação, selho Curador não seja alterado, é uma opum lobby que representa aproximadamente 1.800 instituições ção que já foi exercida em pequena escala. de ensino superior. As controvérsias que quase inevitavelmente Na Grã-Bretanha, o BBC Trust é composto de 12 surgiriam, tais como a definição de quais segmembros, nomeados pela Rainha, aconselhada pelo primeiro mentos deveriam ser representados e quais ministro e pelos três ministros da Cultura, Mídia e Esporte. Alguns conselheiros são escolhidos pelos conhecimentos especializados que possuem em assuntos financeiros ou editoriais. Quatro conselheiros são representantes das quatro nações que No caso da EBC, a escolha formam o país: Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte. O Trust traefetiva dos conselheiros por balha em estreita colaboração com os quaentidades representativas, tro Conselhos de Audiência, um em cada nação, presidido pelo integrante do Trust mesmo que o procedimento que representa a respectiva nação. formal do Conselho Curador não A título de contraste, na Itália, que, como o Brasil, pertence à cateseja alterado, é uma opção que já goria de vínculo governamental, a RAI foi exercida em pequena escala. é governada por um Conselho Administrativo composto de nove integrantes, sete dos quais eleitos por uma comissão do Parlamento Italiano. Os outros dois, um dos quais presidente do Conselho, são nomeados pelo maior acionista, o Ministério de Desenvolvimento Econômico. Na Espanha, o Conselho de Administração da RTVE é composto entidades deveriam ser autorizadas a partide 9 integrantes, escolhidos pelas duas Casas do Parlamento. cipar da escolha, poderiam ser contornadas A representação dos interesses da sociedade civil nestes casos pela adoção de sorteios e rodízios, instrumenpassa pelo crivo dos partidos que formam a base do governo. tos desenhados a igualar as chances nestas A RTP de Portugal, que também pertence a esta situações. Os ganhos em termos da formação categoria, oferece uma variante interessante que se assemelha de vínculos orgânicos com a sociedade civil ao Conselho Curador da EBC. O poder decisório da empresa não seriam desprezíveis. Os mecanismos compete ao Conselho de Administração, composto de 5 intede representação das audiências regionais e grantes, indicados pelos membros do governo responsáveis locais utilizados na BBC e no PBS também pelas áreas de comunicação social e de finanças e obrigados merecem consideração.

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Agência Brasil

Fala, conselheira!

EBC e sociedade:

é preciso que se conheçam

A

Rita Freire Conselheira

Shutterstock

sede da EBC no Edifício Venâncio em Brasília é organizada ao longo de um largo corredor central, que vai de uma avenida à outra conduzindo às redações, estúdios, salas de trabalho e reuniões, e por onde as pessoas se encontram porque querem ou por acaso, quando chegam ou saem, vão ao banheiro, a um restaurante, querem esticar as pernas ou simplesmente conversar. Ali está a sala onde se reúne o pleno do Conselho Curador, e nos dias de encontro as rodas que se fazem e desfazem dentro desse pequeno auditório, nos intervalos, também escapam porta afora. A vida e a alma da empresa passam um pouco por essas conversas livres da burocracia. O acesso do “Venâncio” à rua se dá por uma escadaria que no dia 13 de novembro foi transformada por trabalhadoras(es) da empresa em lugar de assembleia. Outras conversas transcorriam em São Paulo, no Rio de Janeiro, em um dos momentos mais tensos de uma greve de quinze dias, quando havia incerteza sobre as negociações. Mas aquele colorido de gente na escadaria falava mesmo é de coisas a melhorar na atividade da empresa – a comunicação pública – mais do que da pauta salarial. Havia uma excitação em conversar sobre o projeto EBC e um desespero

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pela simples ideia de que a empresa não quisesse prosseguir negociando. Pelo corredor, também era evidente a preocupação da empresa ao ver o que considerava sua melhor proposta recusada pelas bases que não aceitavam o fim das negociações. No final, antes de um dissídio, prevaleceu a conversa e a EBC retomou suas atividades com um sentimento maior de apropriação coletiva do seu futuro. Conversar amplamente é a essência de uma empresa como a EBC, que tem a missão de viabilizar a comunicação pública e as lições de casa são sempre um laboratório. Mas vamos dar a essa missão o alcance que ela realmente tem: viabilizar a comunicação pública de todo o país, com uma negociação que não envolve apenas dirigentes e trabalhadores, mas também a sociedade. A participação social na programação e decisões da EBC é uma necessidade e razão de ser da empresa pública, a menos que ela deixe de existir como tal. Mas isso ainda não acontece razoavelmente e é preciso entender o porquê. A EBC ainda não tem um modelo para se espelhar que não venha de experiências menores, comerciais ou de fora do país. E nenhuma dessas dá conta da missão de uma mídia pública brasileira, de abrangência e compromisso nacional, porque a experiência ainda não existe, está apenas em construção. Não é possível cobrar da sociedade a percepção de que essa empresa e a sua gestão lhe pertencem, para que compareça, ocupe os corredores e os canais de comunicação da empresa, e converse sobre o seu projeto. Com maior ou menor tensão, isso acontecerá por necessidade democrática. Quem pode se antecipar em promover esse diálogo e abrir os corredores é a própria EBC. Mas isto também é um aprendizado sem modelos prontos. As pessoas conhecem os postos de saúde e os bancos escolares e sabem de seus problemas a partir da experiência. Quando vão às ruas brigar pelo SUS, ou

pela qualidade de escolas públicas, existe o sentimento de apropriação da política pública. Mas quando o assunto é comunicação, a experiência vem do mercado, onde a mídia é a fábrica de celebridades e detentora da decisão sobre o que é notícia e interesse nacional. É um distanciamento que abrange vários aspectos da comunicação. Usuários navegam na internet mais como um fenômeno da tecnologia que da política, e nas redes sociais como uma oferta do mercado e não da possibilidade da apropriação

A vida e a alma da empresa passam um pouco por essas conversas livres da burocracia.

tecnológica. Até por isso, não cercaram o Congresso quando o movimento social pedia a votação do marco civil da internet, nem antes pressionaram o bastante por um padrão brasileiro de TV digital, nem o fazem hoje pelo padrão mais interessante para o ambiente digital do rádio. O Brasil é apaixonado por rádio e televisão aberta, mas é uma paixão interceptada pelo botão que liga o aparelho e despeja a programação dos grandes meios. Esse amor não tem ajuda da política para nos permitir mergulhar no universo da radiodifusão como uma outorga que a sociedade faz a uma empresa, e não o produto dessa empresa distribuído em forma de notícias, novelas, receitas e futebol. Para convencer o Congresso a votar um projeto para a mídia democrática está sendo preciso antes colher, uma a uma, 1,5 milhão de assinaturas, o que significa ter

de convencer uma multidão, boca a boca, sobre a importância da democracia na comunicação. E essa é uma conversa que a EBC precisa ajudar a fazer, como empresa que deve ter autonomia para ouvir e dar voz a todos os lados da sociedade, e colocar em pauta tanto a mídia pública quanto o ambiente da comunicação em que ela se insere. O Conselho Curador tem grande responsabilidade. Nos seus assentos estão 15 representantes da sociedade civil, de um total de 22 membros, e 5 deles terão substituição em breve. Essas cadeiras são canais de conversa da empresa com a sociedade e por isso cabe ao Conselho, antes de um processo de sucessão, ajudar a mobilizar para a escolha democrática e diversificada de seus ocupantes. Com maior representação das mulheres do que no passado, ainda não há paridade de gênero nas cadeiras da sociedade civil. Ampliar a representação afro-brasileira e indígena é urgente, seja para qualquer segmento social ou regional que também esteja em falta no Conselho. Os meios de participação social na EBC não se esgotam na política: contam com o trabalho da Ouvidoria, que vem se consolidando como espaço real de interlocução direta. Tem a possibilidade de abertura para os coletivos das mídias sociais, veículos e agências de interesse público e com as emissoras parceiras de sua rede. São canais o licenciamento de obras, co-produções, banco de projetos. Mas esses canais não terão a ocupação devida sem que a sociedade os conheça, sem a mediação da política para que sejam valorizados e democratizados, e também ampliados, por exemplo com a criação dos Comitês de Usuários. Não terão a ocupação devida, ainda, sem o empenho da empresa para que sejam visibilizados, com ampla difusão dos critérios e as etapas de participação. Para o projeto de comunicação pública se consolidar, a EBC precisa se dar a conhecer.

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