"Viagem ao Oriente" | Catálogo de exposição

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no século XIX

[Em]COMUM

Projeto

ARQUIVO MUSEU DIOCESE LAMEGO

Uma cidade. Dois museus

One city. Two museums



th

19 century

no sĂŠculo XIX

Arquivo - Museu Diocesano de Lamego 8 de junho - 14 de setembro de 2014


FICHA TÉCNICA EXPOSIÇÃO

CATÁLOGO

Direção Luís Sebastian

Textos José Pessoa Georgina Pinto Pessoa Manuela Vaquero

Comissariado José Pessoa (coordenação) Georgina Pinto Pessoa Manuela Vaquero Conservação Georgina Pinto Pessoa Ampliações digitais Alexandra Pessoa José Pessoa Design, produção e montagem Museu de Lamego Publiserv, Lda.

Fotografia José Pessoa Alexandra Pessoa Paula Pinto Inventário e Catalogação Georgina Pinto Pessoa Manuela Vaquero Conceção e composição gráfica Luís Sebastian Paula Pinto

Coleção Família Mascarenhas Gaivão

Imagem da capa Goa Velha - Ruínas do Convento de S. Paulo (Índia), atribuída a Souza and Paul, 1884-1894.

Comunicação Patrícia Brás

Edição Museu de Lamego | DRCN

Agradecimentos Aurobindo Xavier Giordano Bruno Paulo Feytor Pinto Paulo Varela Gomes Centro Português de Fotografia

Data de Edição Setembro 2014 ISBN 978-989-98657-5-4 O conteúdo dos textos, direitos de imagem e opção ortográfica são da responsabilidade dos autores.


no século XIX

ÍNDICE Apresentação 5 7 9 12

20 42 54 70 86 90 98 104 112 138

António Ponte (Diretor Regional de Cultura Norte) Luís Sebastian (Diretor do Museu de Lamego) João Carlos Morgado, Pe. (Diretor do Arquivo-Museu Diocesano de Lamego) Janelas no Tempo Oriental: Colecção de Fotografias do século XIX José Pessoa Notas de Viagem Egipto Ceilão / SriLanka Timor-Leste Java: Batávia / Jayakarta Georgina Pinto Pessoa Índia Praganã Nagar-Avely Damão Caminho-de-ferro dos Gates Goa Bombaim Manuela Vaquero

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Dossier Museográfico

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Bibliografia



no século XIX

O estabelecimento de parcerias tem-se afigurado como um dos meios mais eficazes de promoção da cultura e da salvaguarda do património cultural. O relacionamento entre instituições culturais de diferentes tipos e de diferentes tutelas, de instituições de cariz diferenciado e, cada vez mais, com particulares tem permitido realizar eventos culturais de grande interesse, permitindo que um público cada vez mais diversificado possa contactar com bens patrimoniais e com narrativas mais estruturadas e qualificadas. A Direção Regional de Cultura através dos seus museus tem procurado promover iniciativas que vão de encontro aos diferentes públicos, qualificando a oferta cultural e potenciando a salvaguarda do património. Não posso deixar de felicitar esta parceria que o Museu de Lamego corporiza com a Diocese de Lamego e com particulares, potenciando a promoção de iniciativas de grande relevância.

5 Uma palavra também para toda a equipe que organizou esta exposição que muito dignifica as instituições e particulares envolvidos. Setembro | 2014

ANTÓNIO PONTE Diretor Regional de Cultura do Norte


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A exposição “Viagem ao Oriente” é a segunda expressão pública do trabalho de identificação e inventário de espólios fotográficos familiares com referência ao Douro, que tem vindo a ser levado a cabo pelo Museu de Lamego desde 2012. Iniciado com o espólio particular da família Mascarenhas Gaivão, já em 2013 permitiu a realização de duas exposições: “Uma viagem no tempo, do outro lado do espelho” e ”Caminhos do Ferro e da Prata”. Debruçando-se a primeira sobre o retrato e a segunda sobre a construção da linha férrea do Douro e Minho, esta última contou ainda com a publicação do respetivo catálogo em suporte de papel. Continuando a intenção de anualmente dar expressão pública ao trabalho de inventário de espólios fotográficos familiares, optou-se neste ano de 2014 por isolar um conjunto fotográfico subordinado ao tema do Oriente, ainda retirado do espólio particular da família Mascarenhas Gaivão, dando forma a uma exposição temporária e publicação do respetivo catálogo, desta feita em formato digital, privilegiando a sua disponibilização gratuita e universal on-line a partir do site do Museu de Lamego (www.museudelamego.pt). Ao contrário das duas exposições realizadas no Museu de Lamego em 2013, nesta nova iniciativa optou-se pela sua realização no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. Esta opção compreende-se dentro do Projeto Em[Comum], protocolado em 2014 entre o Museu de Lamego e a Diocese de Lamego, tendo por objetivo dinamizar os espaços do Arquivo-Museu Diocesano de Lamego através de iniciativas conjuntas. Assim, dentro do Projeto Em[Comum], o Museu de Lamego realizou entre 16 de março e 30 de abril de 2014 a exposição “A Sé de Lamego no Museu”, patente na sala de exposições temporárias do Arquivo-Museu Diocesano de Lamego e contando igualmente com catálogo digital on-line, à qual se junta agora, dentro deste dinamismo de colaboração, a exposição “Viagem ao LUÍS SEBASTIAN Diretor do Museu de Lamego

Oriente”.

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Novamente, cabe aqui agradecer toda a disponibilidade e cooperação da família Mascarenhas Gaivão, sem cuja abertura ao seu precioso espólio fotográfico particular nenhuma destas três exposições teria sido possível. Dentro das habituais parcerias em que o Museu de Lamego se tem apoiado na realização das suas atividades, voltamos nesta iniciativa a contar com o apoio do Teatro Ribeiro Conceição, a quem agradecemos a cumplicidade de sempre. Igualmente vital no desenvolvimento das atividades do Museu de Lamego, o apoio mecenático das empresas da região tem sido um dos principais sustentáculos do dinamismo que se tem querido imprimir à ação do museu enquanto principal agente cultural do território em que se insere. Às mais de uma dezena de empresas que compõem já o quadro de mecenas do Museu de Lamego junta-se agora a GeoDouro (www.geodouro.pt), sem o apoio financeiro da qual esta nova iniciativa não teria sido possível, cabendo neste ponto um especial agradecimento ao Eng. José Alves.

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Por fim, o agradecimento incontornável às equipas do Museu de Lamego e do Arquivo-Museu Diocesano de Lamego envolvidos nesta iniciativa, cujo esforço e dedicação permite sempre ir mais longe e para lá dos meios materiais disponíveis.


no século XIX

O Museu Diocesano de Lamego alegra-se de receber nas suas instalações a exposição “Viagem ao Oriente no século XIX”. Esta é uma mostra fotográfica, espólio da família Mascarenhas Gaivão, que nos permite viajar no espaço e no tempo pelo Oriente do Século XIX. A presente mostra foi inaugurada no dia 8 de Junho do corrente ano de 2014, no mesmo dia e na mesma hora em que nos Jardins do Vaticano, o Papa Francisco se reunia com os dirigentes de Israel e da Palestina para rezarem em conjunto pela paz no Oriente Médio. Uma coincidência feliz que neste mundo globalizado nos aproximou duma forma tão expressiva dos problemas que hoje afligem o Oriente Médio e o Oriente em geral. A exposição foi oportunidade de (re)visitar o marcante encontro de culturas entre o Ocidente e o Oriente, com um fascínio manifestamente recíproco. As influências foram mútuas e o resultado final uma mundivisão diferente e novos estilos de produção artística que são património novo e comum.

9 As igrejas cristãs, seminários e outros edifícios religiosos (ou o que resta deles), que podemos observar nas fotografias expostas, são testemunho eloquente da passagem de tantos missionários generosos que daqui partiram para essas terras longínquas anunciar o Evangelho, promover a cultura e praticar a caridade. É grato recordar, registar e convidar a conhecer o nome e a obra de dois missionários jesuítas, oriundos da nossa Diocese de Lamego: os padres João Rodrigues e Sebastião Vieira, naturais de Sernancelhe e Castro Daire, respectivamente, que partindo para as Terras do Sol Nascente, deixaram um eco de heroísmo que ressoou por todo o Oriente. João Rodrigues imortalizou-se pela tinta da sua pena, Sebastião Vieira pelo sangue das suas veias que derramou como mártir. Também estas vidas são património imaterial que é alicerce e muralha de tanto património material. JOÃO CARLOS MORGADO, PE. Diretor do Arquivo-Museu Diocesano de Lamego


“Viagem ao Oriente no século XIX” é mais um feliz resultado do “Projecto [Em]Comum” que irmana os dois museus da cidade no objectivo idêntico de servir a região, partilhar sinergias e promover a Cultura. Manifesto pois a minha profunda gratidão ao Museu de Lamego, à família Mascarenhas Gaivão, ao comissariado científico e a todos os que em serviços menos visíveis, mas não menos importantes, tornaram possível esta exposição.

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JANELAS NO TEMPO ORIENTAL: COLECÇÃO DE FOTOGRAFIAS DO SÉCULO XIX JOSÉ PESSOA

Em busca dos bens culturais ainda desconhecidos Da Colecção Fotográfica da Família Mascarenhas Gaivão, que o Museu de Lamego vem trabalhando, graças à generosidade dos seus proprietários, existe um terceiro núcleo que, em nosso entender, justifica e impõe uma divulgação imediata. Sessenta e três imagens, coladas em cartões de formato médio de 25 x 18 cm, quase todas legendadas e datadas, algumas assinadas ou carimbadas pelos autores, outras cuja autoria é facilmente identificável, com numerações diversas e sem continuidade. Na sua maioria terão pertencido a álbuns destinados à promoção de encomendas de provas soltas. Paisagens, ambientes urbanos, arquitecturas civis e religiosas, grandes obras de engenharia, tipos humanos e profissionais, o passado, o então presente e a construção do futuro desfilam diante dos nossos olhos. O que existe de comum nestas imagens que as juntam num núcleo? A viagem que nos proporcionam do Cairo a Jacarta, do Egipto das pirâmides e do deserto aos príncipes de Java, passando através do Canal do Suez, Port Said e as suas gentes, a Índia e as colónias portuguesas, Bombaim e Ceilão, Timor, Java e as Índias Holandesas. É uma viagem pelo Oriente, entre 1880 e 1895, no auge da descoberta e do fascínio orientalista que possuiu os intelectuais e cientistas europeus, bem como proporcionou um extraordinário desenvolvimento comercial e económico das potências ocidentais, e permitiu a constituição do império vitoriano, o maior domínio mundial da História da Humanidade. Este núcleo de provas positivas, feitas a partir de negativos de vidro pelo processo de colódio húmido e impressas em albuminas, chegou até nós num maço, sem qualquer embalagem especial, sem qualquer informação adicional a não ser, felizmente, as legendas originais e as assinaturas ou carimbos das casas fotográficas que as produziram. Registe-se também que quase todas se encontram em bom ou razoável estado de conservação, apesar das colas que as fixam aos suportes de cartão. Estavam guardadas numa caixa chinesa de charão.

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Para uma correcta avaliação da importância e do interesse deste núcleo, há que recordar as mais significativas exposições fotográficas orientalistas, com imagens de autor do séc. XIX, expostas e publicadas recentemente; os fotógrafos nele representados; a qualidade das imagens preservadas. Há que salientar a exposição “Na Índia dos Vice-Reis, Imagens da Saudade Antecipada”, fotografias de Souza e Paul e Adolpho Moniz, com textos de Maria do Carmo Serén e Teresa Galvão Veloso, integrada nos Encontros de Fotografia de Coimbra, em 1992. 1

O respectivo catálogo oferece-nos vinte e sete imagens que estariam inseridas nos álbuns “Índia Portuguesa” Souza e Paul, Photographos da Casa Real, ca. 1890 (20) e “Damão e Nagar Avely”, Adolpho Moniz, amateur photographe, ca. 1890 (7). Tratase também neste caso de uma colecção de família, pertencente a D. Teresa Galvão Veloso e Arq. José Forjaz, parentes dos proprietários da Colecção Mascarenhas Gaivão, Dr.ª Ana Maria de Moraes Sarmento Moniz Mascarenhas Gaivão e Dr. Manuel Mouzinho de Albuquerque Mascarenhas Gaivão, o que nos levou a procurar a origem comum destes dois espólios!

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Cipriano Forjaz de Sampaio, que foi Governador de Timor e era irmão de uma bisavó comum de D. Teresa Galvão Veloso e Dr. Manuel Mouzinho de Albuquerque Mascarenhas Gaivão, poderá ter sido a origem das fotografias orientalistas da Colecção Mascarenhas Gaivão, tendo falecido sem deixar descendência. Sua sobrinha Maria de Gusmão, para casa de quem se retirou, em Coimbra, era viúva de Manuel de Mascarenhas Gaivão, que por sua vez teria recebido também imagens de Eulália Pimentel, viúva de Jayme Forjaz de Serpa Pimentel, capitão tenente da marinha de guerra, que desempenhou funções na Índia, e posteriormente em Angola e Moçambique, de que há notícia de ter coleccionado os álbuns da Índia. Tanto quanto conseguimos apurar, vindas de duas fontes diferentes juntaram-se para posteriormente novamente se dividirem. Cinco imagens, duas de Nagar Avely e três de Goa, figuram nos dois conjuntos, o que nos parece indiciar dois diferentes coleccionadores. 2

No respectivo catálogo , Maria do Carmo Serén, com a qualidade literária que a caracteriza, contextualiza historicamente a Índia Portuguesa e a sua situação nos finais do séc. XIX, e afirma: “Estas fotografias falam da Índia Portuguesa, de Goa e Damão; uma

1 Serén, Maria do Carmo; Veloso, Teresa Galvão - “Na Índia dos Vice-Reis, Imagens da Saudade Antecipada”, fotografias de Souza e Paul e Adolpho Moniz - Encontros de Fotografia de Coimbra, em 1992. 2 Ibidem


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Índia de final do séc. XIX, vista pelos olhos que se formaram nas “artes e naturezas” deste período. Isolam paisagens na distância, compõem grupos, fazem o catálogo do património;(…)”. Podemos aqui ver 20 imagens de Souza e Paul e 7 de Adolpho Moniz, todas referentes a Goa, Damão e Nagar Avely, quase todas em bom estado de conservação e várias de grande qualidade documental. Em Julho de 2008, no Museu Nacional de Arqueologia, abriu a exposição “Impressões do Oriente: de Eça de Queiroz a Leite de Vasconcelos”. Coube-nos a selecção de imagens e guião científico da parte fotográfica. Apresentavam-se 42 albuminas, datadas 3

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entre 1850 a 1890 , e 24 provas actuais feitas a partir de estereoscopias em vidro, provenientes de negativos de colódio húmido . Aí a viagem passou pelo Cairo, Alexandria, Jerusalém, Belém, Beirute e Tripoli. No respectivo catálogo pode-se ler “As imagens que nos mostram monumentos e sítios arqueológicos são bem representativas do estado em que estes se encontravam quando a 5

arqueologia dava os primeiros passos, e a consciência da necessidade de preservação do património cultural era ainda futuro” . Entre outras anónimas, podemos encontrar os seguintes autores: - Félix Bonfils (10 imagens, das quais três são atribuídas); - Ferrier & Soulier : J.Levy Suc (23 imagens); - Constantine e Georges Zangaki (8 imagens); - Hyppolite Arnoux (7 imagens, das quais uma é atribuída); - Tancrède Dumas (1 imagem); - Sociétè Photographique du Canal de Suez (1 imagem). Estão aqui representados quase todos os mais importantes fotógrafos que se estabeleceram nesta zona do crescente fértil, e que 3

Adquiridas pelo Estado e de origem desconhecida. 4 Espólio da Casa-Estúdio de Carlos Relvas, Câmara Municipal da Golegã. 5 Pessoa, José - Impressões de Viagem: A grande Aventura fotográfica do século XIX in “Impressões do Oriente: de Eça de Queiroz a Leite de Vasconcelos”, Museu de Arqueologia, I.P.M., Julho, Lisboa 2008.

enviaram para a Europa as primeiras imagens das antigas civilizações e o testemunho dos povos que ao longo dos tempos ali se fixaram, sobre as cinzas e as pedras do passado. O mundo árabe, exótico aos nossos olhos, ao mesmo tempo fascinante e

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decadente. São estas, tanto quanto sabemos, as exposições recentes que se relacionam em temas e autores, e que antecedem a que agora vos propomos. Caracterizam-se por darem a conhecer provas de autor e de época, memórias das vidas portuguesas em viagem pelo Médio Oriente. A nossa viagem, porém, não se fica pelo Índico, atravessa o canal do Suez e o Mar Vermelho, vai bem longe nos mares e nas gentes do Oceano Pacífico. Viajemos então. Fotógrafos europeus orientalistas na Colecção Mascarenhas Gaivão Hyppolyte Arnoux, sob cujas origens pouco ou nada se sabe, fotógrafo francês que se fixou no Egipto a partir de 1860, tal como

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muitos outros fixou monumentos, tipos humanos e profissões, ambientes urbanos e curiosidades locais, mas o seu tema principal, e que constitui mérito inegável, foi o da construção do Canal do Suez, de que foi a principal testemunha fotográfica. A sua capacidade de iniciativa e visão comercial leva-o a associar-se com os também famosos irmãos Constantine e Georges Zangaki e após 1862 com António Beato. Vem a criar um estúdio em Port Said, na praça principal Ferdinand de Lesseps, em cuja fachada se lia: “Fotografia do Canal”. A mesma inscrição se podia ler numa embarcação equipada com câmara escura, que Figura 1 - Assinatura prova Cat. 010

circulava na nova estrada, entre dois mares, entre dois mundos. Está representado nesta colecção por dez provas de grande qualidade, algumas delas muito conhecidas internacionalmente6. António Beato (que por vezes assinava “Antoine”, certamente para satisfazer a clientela francesa, então a mais representada) chegou ao Cairo em 1860, vindo a estabelecer-se em Luxor, em 1862, onde ficou até à morte (1906). Nasceu provavelmente em Veneza, vindo a naturalizar-se súbdito britânico. Nos anos 50 trabalhou na Índia com o seu irmão Felice Beato, também fotógrafo

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Principais dados recolhidos de: Hippolyte Arnoux, Le Canal vers 1880. Photographe de l'union des deux mers, Catalogue d'exposition. Centre Historique des Archives Nationales. Hôtel de Soubise. 6 nov. 1996 - 3 fév.1997. Paris 1996.


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e grande precursor do fotojornalismo de guerra, com quem frequentemente assinou conjuntamente (Felice Antoine Beato). Foi também, como já referimos e durante algum tempo, associado a Hyppolyte Arnoux. Dedicou-se especialmente aos monumentos faraónicos e aos motivos característicos dos povos que viajavam pelo deserto, satisfazendo a clientela turística, então em franco crescimento. Embora as quatro provas que lhe atribuímos não estejam assinadas, (não temos acesso ao reverso, colado em cartão grosso, onde provavelmente estará o seu carimbo), não existem dúvidas na atribuição, dado o estudo comparativo com imagens muito semelhantes existentes em colecções internacionais. A coloração e os enquadramentos são inconfundíveis. De Adolpho Moniz nada sabemos, vindo citado por vezes como “amateur photographe”. Está representado por seis albuminas coloridas manualmente, de Nagar Avely e Damão. Figura 2 - Assinatura prova Cat. 016

Souza and Paul é uma firma que se estabeleceu em Goa no ano de 1864, fotógrafos da Casa Real, e… continua a existir no seguinte endereço: Opposite Govt Printing Press, Panaji, Mahatma Gandhi Rd, Goa, GA 403005, Índia - Telemóvel:+91 832 222 3968. Dele reproduzimos cinco provas assinadas e dez que, com segurança, podemos atribuir. Esta assinatura, JSá Vianna, que não se pode ver com luz normal, é incisa e só se distingue com luz espelhante. Trata-se de um

Figura 3 - Assinatura prova Cat. 026

autor timorense, ou aí residente temporariamente, com duas provas assinadas (pelo método já referido) e quatro atribuídas, indiscutivelmente semelhantes e fazendo parte do mesmo conjunto e com o mesmo tema. Fomos posteriormente informados pelo Doutor Paulo Feytor Pinto, de que Jayme Henrique de Sá Vianna, (seu trisavô) nasceu em Lisboa, a 7 de setembro de 1858, e morreu a 12 de março de 1895, em Macau, onde está sepultado. Esteve em Timor, intermitentemente, entre 1879 e 1893, onde chegou como alferes - morreu major. Comandou as "campanhas de pacificação" de Lamaquitos, Liquiçá, Matibiam, Quelecai e Maubara. Foi condecorado com a Ordem de Torre e Espada, em 1890, e com o colar da Sociedade de Geografia, em data

Figura 4

desconhecida. Teve três filhas de D. Francisca da Costa, filha do liurai D. Manuel da Costa, da região de Batugadé (ou Baucau). As duas filhas mais velhas vieram para Portugal e tiveram descendência e a mais nova ficou em Timor, com a mãe. Embora não

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tenhamos obtido até agora a confirmação plena de que se trata do autor das fotografias marcadas com “JSá Vianna”, parece-nos altamente provável de que se trate da mesma pessoa. Ou então as imagens foram marcadas para assinalar o proprietário, o que não foi prática comum. Em sessenta e três provas, existem somente vinte sem qualquer identificação de autor, o que nos parece francamente uma excelente média. Este conjunto de fotografias do séc. XIX, da Colecção da Família Mascarenhas Gaivão é o maior núcleo de provas de autor desta época exposto recentemente, o que mais se estende na diversidade dos locais, das distâncias, das diversas culturas sobre os quais nos abre algumas janelas no tempo e no espaço. Do Mar Vermelho, atravessando o Índico, até às profundezas do Oceano Pacífico. Mostra-nos ainda exemplos de fotógrafos estrangeiros de grande importância na história da fotografia orientalista, como são Hippolyte Arnoux e António Beato, bem como de fotógrafos portugueses no oriente, pouco conhecidos como Adolfo

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Moniz e um desconhecido JSá Vianna. É um espólio complementar do que foi publicado nos Encontro de Fotografia de Coimbra, em 1992, e é uma continuação do que constou da Exposição “Impressões do Oriente: de Eça de Queiroz a Leite de Vasconcelos”. Cabe ainda salientar a qualidade e o excelente estado de conservação com que estas provas chegaram aos nossos dias. Por estas diversas razões, é com grande satisfação que as expomos e publicamos, estando a partir de agora disponíveis para os investigadores. Quantos espólios deste tipo aguardam, esquecidos em múltiplos armários e arcas, que urge recuperar e estabilizar, para que não se percam, para que se ganhem para o Património Cultural do presente e do futuro.


no século XIX JANELAS NO TEMPO ORIENTAL: COLECÇÃO DE FOTOGRAFIAS DO SÉCULO XIX JOSÉ PESSOA

Critérios de uma exposição - Dado que uma parte das espécies se encontram colados nos dois lados do mesmo cartão, e não sendo fácil criar estruturas que nos permitissem mostrá-las simultaneamente, optámos por reproduzir uma de cada e expor uma prova actual da mesma (devidamente assinalada), procurando manter as densidade e tonalidades do estado actual de cada original, tanto quanto o processo digital nos permite. - Os títulos das legendas transcrevem, sempre que existem, as legendas originais (mesmo se verificamos que estão erradas e aqui são complementarmente corrigidas) escritas sobre os cartões. Quando não existem optámos pela identificação do local ou do tema. - A sequência das provas expostas e de catálogo procurou reconstituir a viagem possível de ocidente para oriente.

19 Mais uma vez queremos salientar a nossa gratidão para com a Dr.ª Ana Maria de Moraes Sarmento Moniz Mascarenhas Gaivão e Dr. Manuel Mouzinho de Albuquerque Mascarenhas Gaivão, proprietários da Colecção Mascarenhas Gaivão, pela sua generosidade e colaboração com o Museu de Lamego, num processo exemplar de partilha de capacidades entre uma instituição e um património familiar. E como é fascinante percorrer estas imagens, criadas acerca de 125 anos, que continuam a encantar-nos com o seu carácter exótico e a testemunhar as pegadas históricas da nossa caminhada pelo Mundo. E são também património dos povos e culturas que os portugueses visitaram e onde viveram.



no século XIX

EGIPTO GEORGINA PINTO PESSOA

“Maré Nostrum” ponte entre velhas e novas culturas. Na outra margem, espraia-se o delta do Nilo - Itéru . Corre do interior profundo de África no Burundi, em sinuoso percurso pelo 1

Ruanda, Uganda, Sudão e Egipto, entre lagos e quedas de água, promessa de vida cumprida em cada cheia. Integra essa espécie de lua que configura o Crescente Fértil, imagem obrigatória nos manuais escolares, gravada na memória de todos entre a curiosidade e o espanto. Região de perpétua passagem onde paradoxalmente sempre se permaneceu. De oriente para ocidente, de sul para norte o tráfego sempre foi intenso. Culturas, raças e credos aqui coabitam, conferindo um aroma, uma luz, uma atmosfera e um cosmopolitismo muito peculiar a esta região, particularmente presentes em Alexandria e no Cairo. Se a geografia lhe impôs uma sobrevivência árdua, atribuiu-lhe, também, os meios de sustentabilidade necessários, que os homens sempre souberam exponenciar na sua relação com o rio Nilo, na sábia mestria com que construíram as suas urbes e as suas habitações, na riqueza cultural que foram dando corpo ao surpreendente património material e imaterial, legado impar para a humanidade. Aspectos que com maior ênfase na cultura e na arqueologia, nos recursos da região ou na sua posição estratégica, fizeram deste país um ponto de referência, um local apelativo e recorrente da estratégia política dos países ocidentais, como outrora o tinha 1

Itéru - “grande rio”.

Nome atribuído pelos egípcios ao rio Nilo.

sido pelos grandes impérios persa, grego, romano e otomano.

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No século XIX, foram as grandes potencias ocidentais, em plena fase de industrialização, como a Alemanha, a França e a Inglaterra, a afirmar os seus interesses imperialistas e colonialistas, movendo influências, exercendo pressões, procurando aceder e controlar áreas consideradas fulcrais para a sua expansão e crescimento, dos quais dependia o alargamento dos mercados, quer no acesso às matérias primas quer no escoamento da sua produção. Aproveitando o processo de decadência dos turcos, o domínio do Médio Oriente tornou-se exequível, num período que antecedeu a presença de um novo elemento mobilizador de grandes disputas nesta zona, já no século XX - o petróleo. Porém, e ainda no contexto do século XIX, urgia a abertura de uma via rápida e segura de acesso ao Índico via Pacífico, que desse cumprimento aos objectivos desta economia industrial e capitalista das grandes potências europeias, particularmente da 2

Inglaterra. Aqui assumiu grande relevância a construção do canal de Suez, acontecendo esta entre 1859-1869 , ideia repescada do velho império romano traduzida na construção de canais ligando o sul até ao delta do Nilo.

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Estendendo-se da cidade de Suez, ao sul, até Port Said , ao norte, o Canal de Suez ("Qanat as-Suways") liga o Mar Mediterrâneo ao Golfo de Suez e ao Mar Vermelho, permitindo uma via navegável até o Oceano Índico. O Egipto das pirâmides, dos faraós e das múmias, do deserto, de beduínos e tuaregues, dos camelos e das rotas caravaneiras, era também um marco obrigatório na política internacional, um itinerário de referência de intelectuais, de aventureiros, de quem empreendia a “profética” viagem à Palestina, ou simplesmente do formativo “grand tour” de jovens aristocratas e burgueses. Majestosos templos cheios de colunas e baixos-relevos onde habitavam estranhos e implacáveis deuses, com corpo de “gente” e cabeça de falcão. Obeliscos que desafiam o céu e intrigantes túmulos em forma de pirâmide que pareciam querer tocar-lhes. Outros escavados nas rochas, penetravam “indefinidamente” no seu interior deixando à entrada eternos colossos.

2 Obra executada pela Companhia Geral do canal de Suez de Ferdinand de Lesseps. Cerca de 1,5 milhão de egípcios trabalharam em sua construção, desses, aproximadamente 125.000 morreram, sobretudo de cólera. 3 Fundada em 1859 aquando da construção do canal. A atribuição do nome Por Said deveu-se à intenção de homenagear o então Quediva do Egipto, Said Paxá.


no século XIX EGIPTO GEORGINA PINTO PESSOA

A expedição ao Egipto de Napoleão Bonaparte (1798) e o impacto provocado pelas imagens e pelas informações recolhidas e publicadas na Description de l'Égypte (1809-1822), primeira obra sistemática consagrada ao Egipto, tinha sido enorme. O seu carácter descritivo e abrangente, contemplando a Geografia, a Etnografia e a Arte, permitiu a sua descoberta e estimulou a curiosidade sobre esse berço maravilhoso e longínquo. Fascínio e entusiasmo tão caro quer ao espírito romântico quer ao positivismo do século XIX, que assim viu intensificar o interesse por esta civilização, pelos seus vestígios arqueológicos e pelo coleccionismo dos mesmos. Em 1822 Jean-François Champollion elabora os princípios de decifração da escrita hieroglífica egípcia, que conclui em 1824 no seu "Précís Du système hiéroglyphique des anciens égyptiens”. A aura de riqueza e mistério mobilizou para estas paragens estudiosos e aventureiros de todo o tipo, distante ainda do espírito da arqueologia, onde a convivência da ciência e do conhecimento se misturaram com o da aventura e do saque. Aliás, com a participação não só de particulares, mas também de instituições oficiais, para quem os fins justificaram os meios, fazendo chegar aos grandes museus europeus as suas extraordinárias Colecções de Arte Egípcia, e a anuência e até incentivo do governo de Mohamed Ali (1769-1849). Cerca de 1875, os antiquários de Luxor vendiam aos turistas, em excelente estado de conservação, os mais belos papiros, chauabti e objectos de mobiliário funerário e até de múmias. E esta prática havia de prosseguir até praticamente finais do século XIX, apesar do esforço e do importante papel de alguns como François-Auguste-Ferdinand Mariette (1821-1881). Funcionário do Museu do Louvre, Mariette partiu para o Egipto em 1850 com a missão de adquirir para o museu antigos manuscritos coptas e siríacos que pudessem ombrear com as colecções de Londres e do Vaticano. Mariette operava, naturalmente, com o acordo tácito das autoridades egípcias. Amante do risco e influenciado por Nestor L'Hôte, desenhador de Champollion, ainda seu parente afastado, continuará a

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aventura da arqueologia. Em 1850-51, descobre o Serapeum de Sakara, uma das grandes descobertas da arqueologia egípcia, como os achados de Deir el-Bahari (Gaston Maspero, 1881), o túmulo de Tutankhamon (Howard Carter, 1922) ou dos túmulos reais de Tânis (Pierre Montet, 1939). A Marinette se deve o tesouro da rainha Aahotep, na região tebana, a limpeza do templo funerário de Hatchepsut, em Deir elBahari, e do templo de Amon, em Karnak, entre outros. Curiosamente, o homem que teria ido ao Egipto para levar mais uma parte do seu património, revoltado com o impune e continuado saque de tantos monumentos e documentos egípcios, havia de se constituir num dos seus principais e maiores defensores, sendo nomeado por Mohamed Said, em 1858, maamur, isto é, «director» dos trabalhos do antigo Egipto4, cabendolhe a autoria dos primeiros textos legislativos fundadores da salvaguarda do património.

24 Em Portugal cria-se em 1850, a Sociedade Archeológica Portuguesa. Nomes como Leite de Vasconcelos, Possidónio Silva, Santos Rocha, Estácio da Veiga ou Martins Sarmento são referência obrigatória da arqueologia portuguesa. Em 1880 realiza-se o Congresso Internacional de Antropologia e Arqueologia Pré-Históricas e em 1893 Leite de Vasconcelos funda o Museu 4

Etnográfico. Enquanto os conceitos da moderna arqueologia evoluíam e se estruturavam, em parte sob os auspícios de G. Maspero5, por 6

William Matthew Flinders Petrie (1853-1942), George Andrew Reisner (1867-1942), entre outros, fazendo das últimas décadas de oitocentos e primeira de novecentos, a “idade de ouro” da Egiptologia, e a acção imperialista das grandes potências ocidentais se digladiava, pela afirmação da supremacia política, institucional e cultural sob uma área tão crucial quanto o Médio Oriente (que em parte conduziria ao grande conflito armado de 1914), uma literatura de viagens7, descritiva ou poética, espécie de etnoliteratura radicada nos discursos antropológicos e etnográficos, mas também uma literatura esotérica e alquímica cumpririam

Mariette recusando vários cargos em França: Direcção da Biblioteca Nacional de França, Senado de França, conservador do Museu do Louvre, cátedra no Collège de France. O vice-rei conceder-lhe-ia, como reconhecimento da sua dedicação os títulos de bey e, mais tarde, paxá, o mais alto grau honorífico da administração turca. 5 Deu continuidade ao trabalho de Marinette e à frente do Serviço de Antiguidades Egípcias, G. Maspero desenvolveu um apreciável trabalho na organização das escavações. Iniciou a publicação dos Annales du Service des Antiquités de l'Égypte (ASAE), que ainda hoje se publicam. Iniciou a impressão dos Catalogue Général du Musée du Caire; publicou: Études de Mythologie et d'Archéologie (1893) e Histoire ancienne des peuples de l'Orient classique (1895-1899). 6 Rigoroso nos seus métodos e técnicas, Petrie publicou os resultado dos seus trabalhos, como os efectuados em Nagada, Abidos ou Amarna. De grande importância a sua obra: Methods and aims in archaeology (1903) 7 Chateaubriand (1806); Lamartine (1832-33); Nerval (1842; Victor Hugo (Les Orientales -1829); William Beckford; Lord Byron (Turkish Tales -1813-1816)


no século XIX EGIPTO GEORGINA PINTO PESSOA

essa mentalidade romântica que alimentou o pensamento e estimulou a criatividade dos intelectuais, dos artistas e das elites 8

em geral, convidando à viagem e ao seu registo . Eça de Queirós (1845-1900) cumprirá este mito, na viagem (1869)que realizou ao Egipto, aquando da abertura do canal do Suez, consubstanciada na obra O Egipto (obra póstuma). Servir-lhe-ia ainda como fonte de inspiração e ponto de partida para outras viagens mais além, também tão ao gosto da época, como a Relíquia ou o Mandarim, onde o imaginário de uma religiosidade mais ou menos caricaturada ou do gosto por um oriente requintado e

exotismo se evidenciam. A tradução e adaptação de narrativas orientais como O Livro das Mil e Uma Noites, tradução do orientalista Antoine Galland, publicada entre 1704 - 1717, com várias traduções e publicações9 posteriores, ajudaram a construir essa imagem icónica profundamente sedutora e exponencialmente recriada e reconstruída a partir do fabulado imaginário oriental e de óbvios recalcamentos das mentalidades ocidentais. O Médio ou próximo Oriente surgia, assim como um espaço redescoberto, a fruir, estudar e explorar. Via de acesso a um oriente mais profundo e distante, agora disponível, para reerguer os esteios de velhas e novas potências, abrir fronteiras às ciências e ao conhecimento ocidental nessa transversalidade com os saberes ancestrais dessas áreas geográficas, um mundo que sendo já velho se abria repleto de novidade, aos olhos deslumbrados do ocidente. A viagem permitia o contacto e observação fundamentais à construção do conhecimento experimental, sistemático, científico. À literatura de viagens, onde a narrativa se cruza com a Geografia, a História, a Antropologia e a Etnografia, associa-se a informação da viagem do investigador e do erudito. 8 Delacroix - Marrocos 1832; Flaubert ao Egito e Médio Oriente entre 1849 e 1852 (…) 9 John Paine (Londres, 1839-41), Edward Lane (1882-84) e finalmente Richard Francis Burton (Londres, 1885). 10 François Arago, em 1839, na sessão de anúncio mundial do processo fotográfico, conjecturando sobre as possibilidades de aplicação do novo processo, propôs que de imediato se constituísse um grupo de trabalho para o inventário dos monumentos franceses, bem como "copiar os milhões e milhões de hieróglifos que cobriam totalmente os grandes monumentos de Tebas, Memphis e Carnac.

A Fotografia10 surge neste contexto encontrando terreno fértil para explorar e um mercado de potencialidades extraordinárias. Esforçando-se por captar as imagens desse exotismo que correspondia às expectativas da nostálgica visão da clientela ocidental “compondo para a fotografia” esse quadro “fabulado”, tantas vezes traído pela sensibilidade e pela consciência do fotógrafo,

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que a lente da câmara tão bem sabia captar, “desnudando” o objecto fotografado e apresentando uma realidade bem diferente, despojada dessa aura idílica e romântica. Essa capacidade mimética dos processos fotográficos, rigorosa e fiável na captação da realidade, característica tão cara ao positivismo da época, e a exactidão técnica da sua reprodutibilidade, permitiu, de certa forma, a apreensão do tempo e do espaço, e a portabilidade das vivência do lugar através das imagens. Percurso, onde se retiveram e materializaram milhares de anos de história, dos seus vestígios, das suas gentes, dos seus costumes, do seu património, alternativa impar às litografias, desenhos e aguarelas dos vários artistas plásticos que os tinham antecedido. A coincidência entre a prática fotográfica e esta cultura da viagem marcada pelo desejo expansionista e colonialista europeu, pelas solicitações das ciências, em particular da Arqueologia e a demanda de uma sociedade (europeia) aristocrático-burguesa 11

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sedenta de sensações e de imagens que preenchessem os cânones de um sentimentalismo bucólico, levará inúmeros fotógrafos a viajar para estas regiões.

Com frequência, aí se fixaram e aí abriram os seus estúdios, documentando e registando, elaborando e disponibilizando extraordinários álbuns de vistas, como A. Beato e Hippolyte Arnoux, autores destas imagens. Carregaram o seu “laboratório portátil”, gravaram na chapa de vidro a eternidade pétra de Luxor, da imensidão dos seus hieróglifos e baixos-relevos. Na árida paisagem do deserto, definiu-se o horizonte em filas de camelos, de tuaregues ou beduínos, companheiros na jornada de sempre, surpreendeu-se a pausa da caminhada, registou-se o acontecimento histórico na abertura do canal de Suez às portas de Port Said. Os lugares e as gentes. A peculiaridade do mashrabiyyah12 de uma medieva casa árabe no Cairo, as actividades do quotidiano, a vitalidade da água, a suave volumetria das ânforas de barro sustentadas por raparigas de olhos profundos e penetrantes,

11 Muitos outros como Francis Frith; Maximine du Camp; August Salzmann; Joseph Philibert Girault de Prangey; A. Beato, Bonfils, Lekegian, Sebah, Zangaki; Rudolf Lehnert e Ernst Landrock. 12 Imagem do Takhtabush e mashrabiyyah da casa árabe. Tipo da galeria. Área coberta ao ar livre, localizada entre dois pátios: um é sempre ensolarado e pavimentado e o outro é o jardim. O takhtabush tem uma abertura lateral de acesso ao pátio pavimentado, acedendo-se ao jardim através do mashrabiyyah.


no século XIX EGIPTO GEORGINA PINTO PESSOA

envoltas em “panos”, túnicas e xailes que testemunham a condição social, a cultura, a religião, as técnicas …a “pose” das duas egípcias, ostentando sedas ornadas de laços e colares, emanando uma androginia enigmática, relegando para segundo plano uma terceira rapariga de olhar distante…a cena de harém (?) num sui generis contraponto entre a observação do privado e do mundano, de uma intimidade escondida sob a sombra da burca e a jovial provocação de um olhar frontal, um sorriso ténue resvalado na velada nudez do peito e dos braços de uma jovem. A vida, nesse pulsar plural de universos num Cairo onde diferentes etnias, culturas, percursos e memórias, contribuem para a construção da imagem de um Egipto antigo, sempre surpreendente e misterioso, pleno de contrastes e contradições.

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Canal de Suez EGIPTO Autor Hippolyte Arnoux Técnica Albumina Inventário Cat. 001 Datação 1886


no século XIX

Caravana EGIPTO Autor António (Antoine) Beato Técnica Albumina Inventário Cat. 002 Datação 1886


no século XIX

Camelos EGIPTO Autor António (Antoine) Beato Técnica Albumina Inventário Cat. 003 Datação 1886


no século XIX

Templo de Luxor EGIPTO Autor António (Antoine) Beato Técnica Albumina Inventário Cat. 004 Datação 1884-1894


no século XIX

Templo de Luxor EGIPTO Autor António (Antoine) Beato Técnica Albumina Inventário Cat. 005 Datação 1884-1894


no século XIX

Tipos e Costumes - Aguadeiro EGIPTO

Autor Hippolyte Arnoux Técnica Albumina Inventário Cat. 006 Datação 1886


no século XIX

1886 - Cairo - Casa Árabe EGIPTO

Autor Hippolyte Arnoux Técnica Albumina Inventário Cat. 007 Datação 1886


no século XIX

1886 - Vendedor de limonada - Port Said EGIPTO

Autor Hippolyte Arnoux Técnica Albumina Inventário Cat. 008 Datação 1886


no século XIX

1886 - Port-Saide - Mouro EGIPTO

Autor Hippolyte Arnoux Técnica Albumina Inventário Cat. 009 Datação 1886


no século XIX

1886 - Port-Said - Georgeana EGIPTO

Autor Hippolyte Arnoux Técnica Albumina Inventário Cat. 010 Datação 1886


no século XIX

1886 - Port-Said - Mulher Arabe EGIPTO

Autor Hippolyte Arnoux Técnica Albumina Inventário Cat. 011 Datação 1886


no século XIX

1886 - Port-Said - Mulheres Arabes EGIPTO

Autor Hippolyte Arnoux Técnica Albumina Inventário Cat. 012 Datação 1886


no século XIX

1886 - Port-Said - Mulheres Egípcias EGIPTO

Autor Hippolyte Arnoux Técnica Albumina Inventário Cat. 013 Datação 1886


no século XIX

1886 - Port-Said - Mulher Arabe EGIPTO

Autor Hippolyte Arnoux Técnica Albumina Inventário Cat. 014 Datação 1886



no século XIX

CEILÃO / SRI LANKA GEORGINA PINTO PESSOA

A ilha de Ceilão já era conhecida no ocidente desde a civilização grega, cujas histórias idealizadas, os generais de Alexandre Magno ali fizeram chegar, a partir das incursões expansionistas até às margens do Indo. Estrabão chamou-lhe Taprobana, epíteto adoptado por Luís de Camões. Sri lank A nobre ilha também de taprobana, Já pelo nome antigo tão famosa, Quando agora soberba e soberana Pela cortiça calida, cheirosa, Dela dará tributo à Lusitana Bandeira, quando, excelsa e gloriosa, Vencendo, se erguerá na torre erguida Em Columbo, dos próprios tão temida.

(Lusíadas, canto X, est:51) Área: 65.610 km² População: 21.128.773

Plínio refere a presença de embaixadores de Ceilão, longínqua terra da utopia, lugar entre a lenda e a realidade, que aqui faziam

Capital: Kotte (126.872)

chegar a aromática canela e as pedras preciosas, transportadas até às margens do Mediterrâneo por mercadores orientais que

Língua: Cingalês e Tamil Religião: Budismo e Hinduísmo

atravessavam o Oceano Índico, o Mar Vermelho ou a Pérsia. Os primeiros contactos com os portugueses deram-se em 1506 com a chegada de Dom Lourenço de Almeida1 a Colombo. Local

1 Chamavam "Diabo Louro", era filho do vice-rei da Índia D. Francisco de Almeida.

estratégico para o império português, terra promissora para o comércio, ponto de paragem na rota da seda e das especiarias,

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importante na política diplomática e propagandística do império português. Como afirmou Manuel Flores, «a ideia da mítica 2

Taprobana subjugada por um rei do Ocidente cristão trar-lhe-ia seguramente um enorme prestígio» à sua chegada enviou um embaixador ao rei de Kotte. A receptividade do rei de Kotte, face aos portugueses, foi inicialmente muito positiva. «O imperador, que se chamava Aboenagao Pandar, era benigno e não lhe era oculto que pela fama conseguíamos o que queríamos, com alegre rosto veio em uma e outra coisa que lhe pedimos, concedendo tudo, apesar dos Mouros que ali assistiam, os quais nos eram 3

suspeitosos, porque da nossa entrada lhes resultava perderem aquele negócio (em que não se enganaram)» .

Provavelmente, vendo nestes um estímulo ao seu comércio e um potencial aliado de poderosa capacidade militar, importante 4

contra outros reinos rivais . Se Portugal não se queria envolver nas questões internas da ilha, uma feitoria teria sido o objectivo, a história interna desta e a

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ambição de controlar as suas riquezas ditou outro destino aos portugueses, muito para além das suas intenções iniciais. O rei de Kotte dividiu o reino pelos seus três filhos. O herdeiro do reino de Citavaca, opondo-se ao irmão que herdara Kotte, chamou em seu auxílio o samorim de Calecute, a mais forte potência hindu da costa do Malabar, principal rival do poderio português no Índico. Por sua vez, o rei cingalês de Kotte, recorreu ao auxílio militar português para combater o seu irmão. A rivalidade e as brechas nos reinos orientais, abria, assim, as portas à entrada dos portugueses no oriente. 5

As relações amistosas com o rei de Kotte, Dharma Parakramabahu IX (r. 1489-1513), conduziram ao pedido Vijayabahu VI (15132

21) para o estabelecimento de uma fortaleza portuguesa que veio a ser construída em 1518, em Colombo, por ordem de D. Manuel.

Flores,Jorge Manuel, Os Portugueses no Mar de Ceilão- Trato, Diplomacia e Guerra (1498-1543), Ed. Cosmos, Lisboa, 1998, p. 116. 3 Ribeiro, João; Fatalidade Histórica da Ilha de Ceilão, Publicações Alfa, 1989, p. 14. 4 Quando D. Lourenço de Almeida chega ao atual Sri Lanka, o território encontrava-se dividido em sete reinos, em estado de conflito entre si. 5 Rei Kotte que sucedeu a Dharma Parakramabahu IX.


no século XIX CEILÃO / SRI LANKA GEORGINA PINTO PESSOA

Todavia, a confiança e a estabilidade nestas relações foram efémeras, conduzidas, quer por instigação de terceiros, quer por 6

conflitos de interesse, que obrigaram o rei cingalês à submissão face à coroa portuguesa e ao pagamento de páreas anuais de canela num regime tributário formalizado. Entre 1520 e 1530, os contactos diplomáticos foram apenas pontuais, havendo, no entanto a registar a fixação de uma pequena comunidade de portugueses no reino de Kotte. A pressão e os conflitos com os reinos vizinhos acabariam por proporcionar uma nova aproximação, com a abertura à missionação e ao estabelecimento de um tratado que traria a Portugal uma embaixada do rei de Kotte, Bhuvaneka Ibahu, que pretendia deixar no trono o seu neto Dharmapala em detrimento do seu irmão. Esta foi liderada por Sri Radaksa Pandita estando em Portugal entre 1542-1543. «No cais esperavam-no os moradores da Casa Real, entre eles os condes de Vimioso e da Castanheira. Talvez até o irmão do rei, o Infante D. Luís, de quem o Pandita dirá maravilhas no regresso a Kotte. Com o marquês de Vila Real, viajou até ao Paço para uma audiência com D. João III. Entregou então ao monarca português o presente que trouxera da ilha de Ceilão: um cofre cujas placas de marfim tinham esculpidas as figuras do próprio D. João III; de Bhuvaneka Ibahu; dele mesmo, embaixador, e da recepção que lhe seria feita em Lisboa, tal como a imaginaram em Kotte; do príncipe Dharmapala; do momento da coroação. D. João III, estamos certos, não desiludiu o Pandita: para o juramento de Dharmapala como herdeiro do trono de Kotte, reuniu na Sé de Lisboa os notáveis do Reino, “mandando que se fizessem grandes festas e se corressem touros”7.

O interesse português alargou-se, agora a outros reinos, esboçando-se então os primeiros planos para a conquista e a missionação da ilha como um todo, muitas vezes com o apoio de soberanos ou dos seus opositores, aos tronos locais. Em 1551, o vice-rei Afonso de Noronha estabeleceu uma nova guarnição em Colombo, que se manteria até 1656. Alguma falta de visão e de 6

Imposto pago por um Estado a outro em sinal de dependência. Flores, Jorge Manuel; Os Portugueses no Mar de Ceilão: Trato, Diplomacia e Guerra; p. 191. 8 Relíquia do Buda no principal templo budista de Kotte, o Templo do Dente de Buda. 7

sensibilidade face às questões religiosas8 causaram alguns reveses nesta aproximação. Todavia, a conversão do rei Dharmapala (1551-97) pelos franciscanos em 1557, tomando por nome Dom João, resultou na doação mortis causa do reino de Kotte à coroa

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portuguesa, em1580. Além da fortaleza de Colombo, D. Constantino de Bragança construiu a fortaleza de Mannar, em 1560, com o fim de controlar a navegação no Estreito de Palk e proteger a comunidade de cristãos locais. Na década de 1590, deu-se início a uma conquista efectiva do Ceilão por ordens explícitas de Lisboa e Madrid. Apesar de alguns contratempos, como a morte do rei converso ou a derrota de Danture, construíram-se várias fortalezas, alargou-se a missionação a Jesuítas, Agostinhos e Dominicanos e integrou-se o reino de Kotte na Monarquia Católica de Filipe II. Em 1617 faz-se um tratado com o rei de Kandy, ficando este vassalo da coroa portuguesa, ainda que em conformidade com as práticas cingalesas se tenha salvaguardado a sua independência.

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A chegada de Holandeses e Dinamarqueses à ilha representou um novo desafio para os portugueses, mas um novo aliado para os reinos autóctones, mobilizando os portugueses para o reforço das suas fortificações e para a construção de novas cidades fortificadas. Esforço inglório, porém, já que o avanço português sobre o reino de Uva, nas montanhas a Sul de Kandy, redundou em pesadas derrotas (Randeniwela, Gannoruwa), no cerco de 16 meses a Colombo e na transferência de várias fortalezas para a posse dos holandeses. Entre tréguas incertas e infrutíferas negociações, o prelúdio da saída anunciada surge em 1655, com a aliança, desta feita, entre Holandeses e Kandy Rajasinha II (1635-87), da qual resultou a perda de Colombo (1656), Mannar e Jaffna (1658) marcando o fim da presença portuguesa na ilha. A supremacia Holandesa manter-se-á até ao embate com os ingleses então em plena expansão e


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afirmação, passando a controlar toda a ilha com a conquista do reino de Kandy em 1815. De salientar, neste período a produção de obras portuguesas sobre a história de Ceilão (Fernão de Queiroz, João Ribeiro) e a acção de missionários como o Padre José Vaz, Oratoriano goês (1687). Em 1833, a ilha é incorporada no Império Britânico, mantendo o nome de Ceilão. Quase um século depois, em 1931, o Reino Unido concede autonomia limitada à colónia, tornando-se independente em 1948. 9

O sonho de permanência nunca se dissipou, sobrevivendo no português crioulo que se reforçou na ilha enquanto língua de comunidades cristãs luso-descendentes ou portuguesas (Portuguese Burghers), nomeadamente em Colombo, no litoral do Sudoeste da ilha e em Batticaloa, onde hoje se mantém. Outro aspecto significativo destas permanências expressa-se na presença de muitos apelidos portugueses, que ultrapassam o âmbito das relações matrimoniais e familiares e se estendem à penetração do próprio Cristianismo e da acção de catequização missionária. 10

Designado por muitos viajantes como a Pérola do Atlântico, o Ceilão antigo a “Ilha leão”, assim baptizada pelos portugueses, possui duas capitais: a administrativa Sri Jayawardenapura Kotte e Colombo, a capital comercial. A natureza moldou-o em forma de lágrima sob o “vértice” da Índia. Ilha de plurais e exuberantes paisagens, puzzle de planícies, praias brancas e jardins de corais, de suaves colinas e íngremes montanhas, povoada de densas florestas, rios e cataratas. Dos arrozais e das plantações de chá, dos elefantes e dos tigres … Ombreiam com lendárias cidades, de templos sagrados, de requintados palácios e imponentes fortalezas. 9 Ver: Tomás, Maria Isabel (2008) "A viagem das Palavras", in Matos, A. T. de & Lages, M. F. (coords.), Portugal: percursos de interculturalidade, vol. III (Matrizes e Configurações), pp. 431-458. 10 Singhala ou “Ilha do Leão”.

A complexa grandeza das ruínas da cidade sagrada de Anuradhapura, de Polonaruwa os seus templos hindus e budistas, os seus

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11

simbólicos stupa , elementos arquitectónicos fundamentais do culto, relicários onde se guardam as relíquias do Buda, são a melhor demonstração do requinte que atingiu a arquitectura budista cingalesa entre os séculos VII e XII. 12

O altaneiro mosteiro de rocha de Dambulla , as pinturas feitas nas reentrâncias da Grande Rocha do leão, representando as Apsaras, simultaneamente ninfas celestiais e mulheres da corte. Sigiriya, o palácio-fortaleza, centro geométrico e espiritual de uma complexa composição arquitectónica concebida à escala de um território imenso. A cidade de Candy, com vários monumentos entre os quais se destaca o Templo do Dente de Buda. O Pico de Adão, a mais de 2 mil metros de altitude. Conta a lenda que aqui se refugiaram Adão e Eva após a expulsão do Paraíso, nessa ponte com o cristianismo, local onde acorrem peregrinos de diferentes credos.

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A Robustez do Forte de Galle exibe a epigrafe “ANNO MDCL XIX" e o brasão de armas neerlandês com o ubíquo emblema do galo e a sigla da Companhia - "VOC” - inscrita ao centro, erguido sobre a velha estrutura portuguesa. 13

Sri Lanka “Ilha Sagrada” , de cultura milenar, grandiosa e intemporal no seu património e no seu misticismo. As etnias que constituem os seus elementos gentílicos: a veda de origem malaia, a cingalesa provavelmente proveniente do norte da Índia e a tamil do sul, caldearam-se ao longo dos séculos com a portuguesa, holandesa e britânica, resultante dos efeitos da colonização, para além das influências vindas dos mercadores árabes, indonésios, abissínios e chineses, numa espantosa e agregadora miscigenação. Nessa extraordinária aventura que a fotografia enceta no século XIX, afirmando-se da segunda metade em diante numa caminhada imparável de sucessivos progressos e surpreendestes conquistas, tão profundas que haviam de transformar o nosso

11 Representação simbólica de Buddha, construção arquitectónica de forma cónica onde se alojam as cinzas do Buda. A Casa das Relíquias circular de Pollonaruwa é a melhor demonstração do requinte que atingiu a arquitectura budista cingalesa entre os séculos VII e XII. 12 O mosteiro foi construído sobre uma rocha de 160 metros de altura com vista para a planície. 13 Nome autóctone, designação assumida a partir da sua independência em 1948.


no século XIX CEILÃO / SRI LANKA GEORGINA PINTO PESSOA

olhar sobre nós, as coisas e o universo, coube a muitos fotógrafos a importante tarefa de registar e recolher em imagens os longínquos, míticos e exóticos locais, as suas paisagens, as suas gentes e os seus costumes, nesse apelo em sintonia com a política, a ciência, a cultura e a mentalidade da época. Muitos assinavam e datavam as suas imagens, chegando, assim, até nós o seu nome e o seu percurso. Outros por qualquer razão, não o fizeram, mantiveram o seu anonimato. Seguimos-lhe as pegadas através da sua obra, fotografias como as quatro que se apresentam neste núcleo. Testemunho e memória de gente, com histórias, com sonhos, com batalhas, com derrotas, com conquistas. Gente com vidas reais construídas de lágrimas, de sorrisos, de afectos, de expectativas, de projectos... Gente real com vidas reais retidas no breve instante da pose pelo clic da câmara, sob o gesto atento do fotógrafo, partilhadas e perpetuadas nos olhares que aqui se cruzam.

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no século XIX

Colombe - 1894 - Singhaler SRI LANKA

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 045 Datação 1894


no século XIX

Colombe - 1894 - Singaleza SRI LANKA

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 046 Datação 1894


no século XIX

Colombe - 1894 - Indeo SRI LANKA

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 047 Datação 1894


no século XIX

Colombe - 1894 - Singaleza SRI LANKA

Autor Atribuída Souza & Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 048 Datação 1894



no século XIX

TIMOR-LESTE GEORGINA PINTO PESSOA

Núcleo de Timor - 1885 /1889 Notas de uma viagem encetada na aventura do mergulho deslumbrado. Deixamo-nos conduzir pelas imagens retidas pela câmara de Sá Vianna, fotógrafo amador (?), viagem sua de outrora, registada com o olhar atento, a sensibilidade e o saber, timidamente assumido na incisa assinatura que marca delével o suporte de uma albumina. Embarcamos aqui, nesta outra margem, num tempo emancipado pela história e pela vontade. Entramos no veleiro, norteados pelo pavilhão português rumo a terras longínquas de além-mar onde o sol se esconde e se ergue. Lançamos âncora na praia entre a espuma branca e a areia, ao lado de juncos e sampanas e de gente que banha o suor nas águas mornas que bordejam o velho crocodilo feito ilha nesse mar salpicado. Na sua história mais antiga encontramos os Vedo-Australóides, os Melanésios por volta dos 3.000 a.C., em 2.500 a.C “os protomalaios” - povos oriundos do Sul da China e da Indochina do Norte. A natureza montanhosa e particularmente inóspita do interior da ilha teria sido condição favorável à permanência da sua diversidade linguística. Timor - Timur - “Leste” nome atribuído pelos Malaios nessa alusão à sua geografia. Timor, ilha maior, integra a pequena Sunda, conjunto parcial do grande arquipélago indonésio, parte da Insulíndia Oriental, zona de transição entre a Ásia e a Oceânia.

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Cartografada e desenhada por Francisco Rodrigues, geógrafo e navegador português do século XVI (1512 e 1513), esclarecendo 1

cuidadosamente que aquela era «a ilha de timor onde nasce o sândalo» . Como a pena do épico Luís de Camões havia também de registar: “Alli também Timor, que o lenho manda Sandalo salutifero , e cheiroso, Olha a Sunda tão larga, que huma banda Esconda para o sul difficultoso: A gente do sertão, que as terras anda, Hum rio diz que tem miraculoso, Que por onde elle só sem outro vae, 2

Converte em pedra o pão que nelle cahe”

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Já no século VII, os chineses tinham sido atraídos pela madeira preciosa não descurando o interesse pelo mel e pela cera. Comunidade que, no presente, continua a ser das comunidades de maior expressão em Timor-Leste, ligadas ao comércio. No século XIV pagavam tributo ao Reino de Java, marcas de uma terra por diversas razões disputada, a quem a heterogeneidade interna e as fortes pressões externas, tantas vezes obrigaram a brava e estóica resistência. Os portugueses chegaram a Timor entre 1512 e 1520, também eles interessados principalmente no sândalo, madeira nobre que cobria praticamente toda a ilha, utilizada na perfumaria, farmacopeia e no fabrico de móveis de luxo. Mais tarde seria substituído pelo café. Em 1652, estes exploradores fixaram-se em Oecusse, no oeste da ilha. Timor encontrava-se então dividido em dois reinos, Samby, na parte oeste da ilha, e Behale, no leste, hoje ocupada por Timor Lorosae. Nesta zona habitava o povo maubere, dividido em duas confederações: os Serviãos e os Belos.

1

José Manuel Garcia - O livro de Francisco Rodrigues: O primeiro atlas do mundo moderno. Editora da Universidade do Porto, 2008. O navegador e geógrafo Francisco Rodrigues é autor de um Livro de Geografia Oriental, de cerca de 1512, com Regimentos, Roteiros, CartasEsboço e Desenhos Panorâmicos dos litorais do Sueste asiático e da Ásia Oriental. As suas cartas do litoral da China, desde o golfo de Tonquim até ao litoral da Coreia, são as primeiras dessas regiões traçadas por um europeu. Francisco Rodrigues é também o primeiro europeu a escrever um Roteiro sobre a navegação nos mares da China, "Caminho da China", de Malaca a Cantão. O livro encontra-se agora em Paris. 2 Camões, Luís - Os Lusíadas. Cant. X; est. CXXXIV, p.367.


no século XIX TIMOR-LESTE GEORGINA PINTO PESSOA

A ausência de fontes torna difícil a definição das fronteiras que separavam os reinos situados na orla fronteiriça entre ambas as confederações. Estes terão sido dominados por uma aristocracia guerreira constituída pelos datos belos, sendo a palavra datu um vocábulo que tanto designa o chefe de um conjunto de aldeias, hierarquicamente inferior ao rei ou liuriai, ou simplesmente chefe de aldeia. Esta aristocracia tinha o seu centro político em Behale, onde se falava a língua tétum. A sua utilização, já no século XVII, pelos missionários parece ser um indicador de que esta correspondia, então, à língua mais falada na parte centrooriental da ilha, como continua a ser na actualidade. Desde o final do século XVI os confrontos com os Holandeses que disputavam a posse das ilhas viriam a consagrar a sua divisão e o estabelecimento de uma a área ocidental de influência holandesa e uma área oriental de influência portuguesa assinando-se um tratado no ano de 1661. Os portugueses fixaram-se na costa noroeste de Timor estabelecendo a capital em Linfau. Em 1769 construiu-se Díli para substituir a anterior capital, muito susceptível aos ataques holandeses. Pequeno aglomerado de frágeis e expostos edifícios, particularmente aos incêndios, aspectos que motivaram a sua urbanização em 1834. Díli foi então elevada à categoria de cidade em 1864. A definição das fronteiras seria, aliás, uma questão difícil que passaria por episódios de conflitualidade mais ou menos aberta e pelo estabelecimento de vários tratados - 1859; 1904; 1914, contando este último já com a intervenção do Tribunal Internacional de Haia. O processo de colonização portuguesa fundamentar-se-ia na exploração económica, no comércio e na missionação, não passando por um efectivo domínio do território. A presença portuguesa era marcada pela acção e autoridade das ordens religiosas, dominicanas em primeiro lugar. “[…] Em frente a Timor, numa pequena ilha, Solor, os dominicanos-soldados haveriam de erguer uma fortaleza que, durante décadas, mais não foi do que uma paliçada em madeira, logo depois, nos finais da centúria, batida em pedra, conquanto se mostrasse cada vez mais indefesa perante as ofensivas múltiplas das

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populações locais, das populações regionais islamizadas e desses outros europeus, também comerciantes-soldados, que, navegando acompanhados pelos sólidos investimentos da Companhia Holandesa das Índias Orientais, alargariam os espaços das concorrências e, naturalmente, das influências [...]3.

Mais do que pelas políticas administrativas, marcadas pela condicionante transitoriedade dos cargos: “[…]Os governadores de solor e de Timor não tinham outro objectivo mais do que fazer resultar em seu beneficio todo o comercio interior das ilhas impedindo e embaraçando a existência de pessoas ricas. A dificuldade dos transportes dava lugar a que da Índia não passassem a Timor, já nessa época (sécs. XVII e XVIII), senão degredados por culpas graves, homens faltos de educação, e de sentimentos de honra, atingindo pois a dissolução dos costumes o seu maior auge, atendendo a que tais 4

indivíduos eram investidos nos principais cargos” .

O exercício da função eclesiástica e o seu relacionamento com os poderes politico-administrativos estavam longe do normal

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cumprimento das respectivas atribuições e da cordialidade exigível. “[…] A falta de apoio pecuniário por parte do govêrno, deu logar a que os missionário Dominicanos perdessem muito do seu fervor religioso, obrigando-os a baixar à terra os olhos que mística e fervorosamente fixavam, de ordinário, no firmamento. Tinha o geral da ordem motivos para defender a sua congregação, sobretudo na parte respeitante aos fundos do cofre das missões, sobre o qual sacavam a cada passo os governadores de Timor, sem mais se preocuparem com saldar as dívidas. Era tal a força do hábito, que os próprios Viso-Reis, para quem os Dominicanos apelavam, faziam orelha 5

surda a tudo quanto se relacionava com esta espécie de empréstimos forçados[…]” . 3

Todavia, para o estado português de então (séc. XVIII), de princípios absolutistas e laicos, tornou-se clara a necessidade de alterar o rumo desta perniciosa actuação. A acção eclesiástica, importante na cristianização e instrução, devia estar ao serviço

Sousa, Ivo Carneiro - A História de Timor e a presença Portuguesa na Insulindia. (Exposição) Porto, 1977. 4 Morais, A. Faria de - Subsídios para a História de Timor. P. 40 in MARQUES, A. H. de Oliveira (Dir.) - História dos Portugueses no Extremo Oriente. Vol. 3º, Ed. Fundação Oriente, Lisboa, 2000. ISBN 972-785-017-0 5 Idem, Ibidem.


no século XIX TIMOR-LESTE GEORGINA PINTO PESSOA

do Estado, a quem competia colonizar e civilizar. Tarefa difícil, porquanto Timor (bem como Macau) integrava o estado da Índia, administrativamente dependente de Goa, área dispersa, sujeita a grandes pressões e envolvida em guerrilhas e conflitos locais ancestrais, longínqua e exposta parte do império. Por outro lado a Igreja, com forte influência no terreno, não foi um adversário fácil. Aspectos que se extremam ao longo século com a burocratização do Estado e a afirmação do absolutismo. Em 1702 é nomeado o 1º governador de Timor, António Coelho 6

Guerreiro , mas que administrativamente dependia de Goa. Em 1844 Timor e Macau, anteriormente estados dependentes da Índia, autonomizam-se, porém Timor manteve-se subordinado a Macau até 1896. 7

Assim, em quatro séculos de domínio português, pese embora os esforços do Estado centralizador no século XVIII , muitas eram as zonas onde não havia comandos militares nem órgãos de soberania, nem de policiamento nem de fiscalização. A concretização dos princípios orientadores das políticas coloniais decorrentes da Conferência de Berlim ocorrida entre 18841885, onde se procurou regulamentar a competição das potências europeias em termos de “ocupação efectiva” como critério de reconhecimento internacional de um dado território, só serão efectivados por Portugal em 94 com a tomada de posse do governador Celestino da Silva. 6

Referência de André Coelho Vieira em 1698 como governador de Timor, cargo não confirmado. 7 Sugere-se a consulta dos docs. «Instrucção» dada ao governador Vieira Godinho 1784; «Regimento da Alfandiga do Porto de Dilli» 1785; «Regimento da Intêndencia-Geral da Marinha e fazenda Real» 1785; «Instrucções» para o governador Cunha Gusmão («Documento de Sarzedas») - 1811; cit. FIGUEIREDO, Fernando - TIMOR. Da subordinação Directa a Goa à União com Macau (1770-1844) in MORAIS, A. Faria de Subsídios para a História deTimor. P. 40 in MARQUES, A. H. de Oliveira (Dir.)História dos Portugueses no Extremo Oriente. Vol. 3º, Ed. Fundação Oriente, Lisboa, 2000, p.699-705.

O esforço de neutralização das hostilidades dos autóctones, o desbravamento e a ocupação de novas áreas, direcionaram a acção deste dirigente, mobilizando campanhas militares da pacificação e de afirmação da soberania portuguesa, indispensáveis também à exploração dos seus recursos.

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Particularmente aguerridos e contestatários face ao domínio português, os Manufahi foram um reino difícil de submeter. Bem armados e contando com elevado número de aliados, só em 1896 se submeteriam à jurisdição portuguesa. A primeira medida tomada nessa direcção foi o condicionamento do comércio do território aos estrangeiros, embora esta medida visasse, objectivamente, a comunidade chinesa, tendo-se estabelecido que:“[...]. É expressamente prohibido desde 1 de janeiro de 1895 o estabelecimento de commerciantes chinezes quer com residencia fixa quer ambulantes fora das seguintes localidades: Dilly, Liquiçá, Aipello, Maubara, Cotubaba, Batugadé, Okusse, Manatuto, Baucau, Lautém e Viqueque. [...]. Os commerciantes a que se refere o numero antecedente poderão estabelecer [se] tambem em qualquer outras 8

localidades, onde de futuro sejam estabelecidos postos fiscaes.”.

Regulada esta questão, Celestino da Silva envolve-se então, a fundo, em campanhas de “ocupação” efectiva e de “pacificação” do território sob jurisdição portuguesa.

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Na viagem que temos vindo a percorrer com as imagens de Vianna, privamos com ele a partilha do testemunho de um relacionamento e simultaneamente de uma estratégia de domínio da acção governativa, na fotografia datada -1885 e legendada “Timor - Dilly, Régulo, principaes e ordenanças de Baucau” pelo autor, seguida por Celestino da Silva e já utilizada pelo seu antecessor. “O Governador é para os indígenas o grande justiceiro, o general, o único representante de Sua Majestade, o pai, os oficiais são os seus delegados, os seus braços, o governador fala-lhes pela boca deles, o que eles 9

dizem e preceituam é o que diz e preceitua o governador” .

Recorrendo à integração de autóctones nos mecanismos de governação colonial, delegando e constituindo-os porta-vozes do governador português. Obviamente partindo e utilizando a cultura e as tradições locais, a sua hierarquia e a suas normas, com base no costume e no grupo, nos elos de uma sociedade ancestral profundamente ritualizada.“[…] a história de Timor não apenas já existia antes, como havia acumulado séculos de especializações, desde a forma de apropriar, dividir e organizar os espaços até de reunir pessoas e grupos, convocar tradições e culturas consuetudinárias e, mesmo, de

8 Figueiredo, Fernando, Augusto de - TIMOR NA VIRAGEM DO SÉCULO XIX PARA O SÉCULO XX:TIPO DE COLONIZAÇÃO E SEUS AGENTES. Colóquio Timor: Missões Científicas e Antropologia Colonial. AHU, 24-25de Maio de 2011, p.2. 9 Roque, Ricardo - A voz dos bandos: colectivos de justiça e ritos da palavra p o r t u g u e s a e m T i m o r- L e s t e c o l o n i a l , 2 0 1 2 . http://dx.doi.org/10.1590/S0104-93132012000300006.


no século XIX TIMOR-LESTE GEORGINA PINTO PESSOA 10

«fazer história» … […]” .

Todavia, Celestino da Silva, auxiliado pelo lendário “arbiru”, o alferes Francisco Duarte, exerceu a sua acção e dedicou 12 anos da sua governação à pacificação e integração da população gentílica. “[…] Com as campanhas, recorrendo a processos mais ou menos discutíveis, mas com grande determinação, este governador conseguiu a ocupação total da parte oriental da 11

ilha e a submissão dos reinos à soberania portuguesa. Ou seja: impusera-se a pax celestiniana.[…]” A acção de

Celestino traduz também os traços de uma personalidade carismática e integrada no seu tempo, determinada e empenhada na concretização de uma missão difícil. “A Província de Timor, situada nos confins do mundo teve sempre vida particularmente árdua. O século XIX não lhe trouxe sensível alteração do que fora: região profundamente afectada pela personalidade do seu governador […] bem ou mal escolhido era quem talhava os destinos da província durante o seu período governamental. […]

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61 Foi este Timor longínquo que o nosso fotógrafo viajante, do qual desconhecemos o percurso e as motivações da viagem, vivenciou nos finais de oitocentos. Talvez aqui se tenha cruzado com Cypriano Forjaz entre meados das décadas de 1880 e de 1890, que aqui desempenhou o cargo de Secretário - Geral de Governador de Timor, cujo nome está ligado à grande Exposição Insulare Colonial Portugueza realizada no Palácio de Cristal, no Porto, em 1894.

Terra das monções, das plantações de café, do Tatamailau, dos tais, das uma lulik (casas sagradas), das lee teinu (casas com pernas) da região de Fataluku. 10

Sousa, Ivo Carneiro - A História de Timor e a presença Portuguesa na Insulindia. (Exposição) Porto, 1977. 11 Figueiredo, Fernando Augusto - Timor na Viragem do Século XIX para o Século XX: Tipos de Colonização e seus Agentes. Colóquio Timor: Missões Científicas e Antropologia Colonial. AHU, Maio, 2011. 12 Rego, Silva - O Ultramar Português no século XIX. Timor 1850-1910. Trigésima palestra. 1965.

Terra do povo Maubere, dos Régulos e catuas, que nas suas vestes tradicionais de guerreiro (espada, penas de galos na cabeça, peles de cabrito nos tornozelos, luas de ouro e prata no peito e testa) foram travando obstinadas lutas, contra todos os invasores.


Antes da libertação quantas vezes mais tiveram que erguer a espada… O século XX reservava-lhe pesado fardo. Acompanhamos a viagem. Com o início da II Guerra Mundial, australianos e holandeses, conscientes da importância de Timor, aterraram em Díli, apesar dos protestos portugueses. Em Fevereiro de 1942, o Japão usou a presença dos australianos como pretexto para invadir Timor, onde permaneceu até Setembro de 1945. Neste contexto, e apesar de Portugal se ter mantido neutral, após o ataque a Pearl Harbor, em Dezembro de 1941, Timor-Leste foi ocupado por tropas australianas e holandesas, a pretexto de impedir uma invasão japonesa. No final da guerra, Timor estava em ruínas. Cerca de 50.000 timorenses teriam perdido a vida. Quer pela ocupação japonesa, quer pelos esforços na resistência aos invasores ou pelo auxílio à Austrália. Após a rendição dos japoneses, miséria e devastação ensombravam Timor. Em 1974, a revolução de Abril em Portugal trouxe a libertação de Timor, sopro efémero de esperança, caído aos pés do invasor.

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Brutal a ocupação Indonésia, materializada no inqualificável 'Massacre de Santa Cruz', ponto de viragem do olhar chocado do mundo que agora se mobiliza em sua defesa. Para que em 2001 Timor-Leste, livre pudesse dizer com Xanana Gusmão: Timor Lorosai - Mar Meu.


Timor - Dilly; Régulo, principais e ordenanças de Báucau - 1885 TIMOR no século XIX

Autor Atribuída a J. Sá Vianna Técnica Albumina Inventário Cat. 057 Datação 1885


Barcos e botes com mercadorias e grupos de homens, junto da praia TIMOR no século XIX

Autor Atribuída a J. Sá Vianna Técnica Albumina Inventário Cat. 058 Datação 1889


Barcos (Sampanas) ancorados na praia TIMOR no século XIX

Autor Atribuída a J. Sá Vianna Técnica Albumina Inventário Cat. 059 Datação 1889


no século XIX

Barco junto da costa TIMOR Autor Atribuída a J. Sá Vianna Técnica Albumina Inventário Cat. 060 Datação 1889


Barco a vapor TIMOR no século XIX

Autor J. Sá Vianna Técnica Albumina Inventário Cat. 061 Datação 1889


Timor - Dilly - 1889 TIMOR no século XIX

Autor J. Sá Vianna Técnica Albumina Inventário Cat. 062 Datação 1889




no século XIX

JAVA: BATÁVIA / JAYAKARTA GEORGINA PINTO PESSOA

Neste percurso por terras de Oriente, aportamos em Java - rainha do oriente - ilha maior do vasto arquipélago que constitui a Indonésia, situada entre o sudeste do continente asiático e o continente insular da Austrália, entre o Índico e o Pacífico, pincelando os mares de múltiplas formas, qual tela de um artista, também maior - ao qual não faltou nem a criatividade nem o simbolismo, a que a história e a lenda deram vida. A sua origem revela-se nos inúmeros vulcões em actividade, que atravessam a cadeia montanhosa que se desenvolve de Oeste para Leste. A fértil planície litoral e o alinhamento de planaltos calcários contextualizam um clima de monção e um solo sulcado de rios e densas florestas onde abundam a teca, o ébano, o sândalo e o bambu espelhados na imensidão dos arrozais. Remota e misteriosa, viu florescer a civilização de Dong Son (neolítico), abraçou a cultura indiana (século IV), ergueu majestosos templos hindus (século VII), construiu o império Majapahit (1293), assistiu à destruição pelos muçulmanos no início de quinhentos, ao domínio e à imposição da sua cultura e credo. Situada na encruzilhada das principais rotas marítimas, foi desde cedo percorrida por aventureiros e mercadores da Índia, China e Arábia, posteriormente haviam de chegar os ocidentais, portugueses, holandeses e ingleses. A partir do séc. XV, no porto de kalapa, pequeno povoado junto ao rio Ciliung, o mais significativo do reino de Sunda, desenvolverse-á a cidade de Jacarta. Vindos de todas as partes chegavam navios mercantes (da Europa, China, Índia e de todo o arquipélago indonésio) carregados de noz-moscada, pimenta, cravinho, canela, chá, café, cerâmica, tecidos finos e outros produtos exóticos.

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A primeira frota europeia a tocar a sua costa foi a portuguesa, em 1513. Quatro navios procedentes de Malaca procuravam a almejada rota para as "Ilhas das Especiarias". O rei de Sonda encontrou na ajuda dos portugueses o apoio necessário contra a cobiça do sultanato de Demak, assinando com eles o tratado de Sunda kalapa (1522), com o compromisso de aí construírem uma fortaleza. Teria sido assinalado com um Padrão Luso Sundanês, curiosamente visto pelos autóctones como um símbolo de fertilidade, e cuja réplica se encontra hoje no Museu Nacional da Indonésia em Jacarta, instalado em edifício outrora sede administrativa da Companhia Holandesa das Índias Orientais e do governo holandês, mandado construir em 1710 pelo governador-geral Van Riebeeck. Os portugueses só regressariam ao mar de Java em 1526. No mesmo ano, o príncipe Fatahillah de Banten invadiu a ilha e apropriou-se do porto de Sunda Kelapa. Em 1527 chamou ao burgo - Jayakarta - (vitorioso). Os Holandeses chegam em finais do século XVI. Em 1619 as suas forças dirigidas por Jan Pieterszoon Coen invadem, destroem e

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conquistam a cidade, mudando-lhe o nome para Batávia, o anterior só será reposto em 1949. A companhia das Índias Orientais holandesa (VOC), fundada em 1602, estabeleceu o seu primeiro posto avançado em Banten (Java), em 1604. A VOC expandiu-se criando uma série de estruturas que iam de Galle, no Siri Lanka, até ao sul da Índia, Bengala, Malaca, Taiwab, além de Nagasaki, no Japão todas controladas a partir de Batávia. O declínio do comércio com o Japão a partir dos meados do séc. XVII, o aumento dos custos com a defesa deste império, associados ao aumento da já tão experimentada e prejudicial corrupção1, tornaram incomportáveis a sua manutenção, deixando espaço para que os emergentes ingleses ocupassem os territórios da VOC, com sua própria Companhia das Índias. Em meados do séc. XVIII, a VOC era uma mera sombra do que havia sido. Também os ingleses tinham fundado a sua Companhia das Índias Orientais em 1600. A partir de 1615, a base da companhia em Bengala deu-lhe acesso a maiores recursos e possibilitou a criação de outras bases em Bombaim (1668) e em Calcutá (1690), na Índia. Em 1694, a companhia obteve o monopólio do comércio com a Índia, o que a fortaleceu e lhe deu grande prestígio e poder político. 1 Aspectos presentes nos problemas de manutenção do império português, que levariam à decadência deste e à prática efectiva de uma mera política de transporte.


no século XIX JAVA: BATÁVIA / JAYAKARTA GEORGINA PINTO PESSOA

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No século XIX, por um breve período, entre 1811 e 1814, impor-se-á a presença inglesa . O fim da ocupação dos Países Baixos pela 3

França, logo após a queda de Napoleão, conduziu à assinatura de um tratado entre ingleses e holandeses, onde se acordou que as possessões holandesas deveriam regressar à posse destes, facto que veio a ocorrer no ano seguinte em 1815. A Holanda procurou, então, intensificar a sua autoridade colonial e, como em períodos anteriores, novas revoltas surgem entre a população autóctone com o ensejo, sempre presente, de recuperar a liberdade perdida, porém foram sufocadas uma a uma. Este imperialismo moderno (século XIX) decorrente natural do enorme crescimento capitalista e da afirmação de uma poderosa aristocracia/burguesia mercantil e financeira, não pouparia esforços no sentido de concretizar os seus projectos hegemónicos, ainda que à custa da dominação imposta a povos de todo o mundo. Este imperialismo era também consequência do crescente 2

Nos meados do século XVIII a Companhia das Índias Orientais britânica entra em declínio, causado pelos altos custos das aventuras militares e pela pesada carga de corrupção que a dominou - os mesmos problemas que haviam acabado com sua rival holandesa e anteriormente com a supremacia portuguesa e espanhola. O grande império vitoriano - o maior entre os grandes de sempre - veria também chegar o seu fim de forma lenta e fragmentada. 3 13 de Agosto de 1814. 4 Decorrente dos avanços tecnológicos, de novas formas de obtenção de energia, o aperfeiçoamento das técnicas de produção, dos avanços científicos, do desenvolvimento dos transportes e das comunicações, a baixa dos preços dos produtos industrializados, a ampliação do consumo, o desenvolvimento de medicina, a introdução de novos medicamentos, o consequente aumento demográfico e obviamente de consumo e de oferta de mão-de-obra. 5 Friedrich Ratzel (1844-1904): “O Ser e o Devir no Mundo Orgânico”, (1868); “Quadros da Guerra com a França”; “Quadros das cidades e da civilização norte-americanas” (1874); “Os Estados Unidos do Norte da América” (1878-80); “Antropogeografia” (1882); “Politische Geographie” (1897). Ratzel justifica o conceito de "espaço vital", no qual este representa uma parte do equilíbrio entre a população e os recursos no sentido de suprir as suas necessidades. Possível relação entre o projecto imperial alemão e as formulações de Ratzel, sustentando o imperialismo bismarckiano. 6 Herbert Spencer (1820-1903): Estática Social; Sistema de Filosofia Sintética; O Indivíduo Contra o Estado (1884); A Educação Intelectual, Moral e física (1863); Os Princípios da Sociologia (1874-1896)

processo da industrialização. As áreas dominadas tornaram-se as fontes fornecedoras das matérias-primas e os trabalhadores nativos a mão-de-obra barata dos empresários e das companhias monopolistas. As consequências da Segunda Revolução Industrial4 e o aparecimento de novas potências no mundo capitalista, levariam as de maior poder a uma “agressiva” disputa das áreas coloniais, onde cada uma procurava assegurar áreas que se consideravam estratégicas para o controle geopolítico de vastas regiões a serem colonizadas. No século XIX as ideologias fervilhavam de teorias justificativas, civilizacionais e religiosas, qual recrudescência dos ideais de cruzada medieval ou da missionação quinhentista. Invocava-se a necessidade imposta por Deus aos homens brancos e civilizados, a salvação das “almas impuras” dos povos “bárbaros”, que viviam uma vida primitiva nos recantos mais inóspitos dos continentes africano e asiático. Na teoria do espaço vital (Lebensraum), Ratzel5 afirmava que a acção das nações industrializadas nas regiões “não civilizadas” do planeta era a única alternativa para a promoção do desenvolvimento. O Darwinismo Social de Spencer (1820-1903)6 e a

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"sobrevivência do mais apto", estabelecendo uma paralelismo entre a sobrevivência e evolução dos organismos vivos, os mais aptos e as sociedades, justificando desta forma a submissão das “raças inferiores” às “superiores”. As nefastas consequências deste colonialismo, pese embora o desenvolvimento das nações industrializadas (mas também à sua custa), conduziriam em boa medida à desestruturação dos sistemas produtivos locais e à fome; à submissão, ao agravamento dos conflitos regionais e ao crispar das disputas imperialistas. Em 1876, a conferência de Bruxelas, seguida da conferência de Berlim, em 1884, promoveram a partilha do continente africano, justificando “era preciso abrir a África para a civilização” e abriram caminho a fricções e conflitos que ainda hoje permanecem. Cada palmo de terra ou de mar era ferozmente disputado. 7

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A África ficará marcada pela segregacionista guerra dos Bôeres (1899-1902), enquanto na Ásia, a Guerra dos Cipaios (18578

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1859); a Guerra do Ópio (1839-1842); a revolta dos Taiping (1851-1864) ou a Revolução Meiji (1867-1912), no Japão, foram marcos de um século que irreversivelmente comprometeram e determinaram os trilhos do século XX. No palco europeu 11

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conduziriam à I Guerra Mundial e haviam de conduzir à II Guerra Mundial . Regressamos ainda à ilha de Java, à Batávia Holandesa, para deixar de o ser neste contexto da Segunda Guerra. Após o ataque de Pearl Harbor (Havai), forças japonesas deslocaram-se para o sul, a fim de conquistar alguns países do sudeste asiático. Depois da queda de Singapura, invadiram as Índias Holandesas Orientais, as forças coloniais renderam-se em Marco de 1942, deixando este território nas mãos dos japoneses até à rendição destes no final da guerra, em 1945. A República da Indonésia “nasce” a 17 de Agosto de 1945, dia em que sua independência foi proclamada e Batávia voltou a ser Jacarta - Jayakarka - a vitoriosa. Posteriormente havia de assumir o papel do invasor, porque são assim as sombras dos impérios perdidos e as quimeras das

7 Os cipaios, soldados indianos que trabalhavam como mercenários, revoltaram-se em 1857 contra a dominação britânica pelo péssimo tratamento dado pelas autoridade inglesas e pela destruição da produção local, particularmente de tecidos. A revolta foi reprimida pelas tropas inglesas. Mais tarde, Mahatma Gandhi propôs uma luta sem armas e sem sangue derramado através do boicote aos vários produtos ingleses. 8 Conflito provocado pela destruição de avultado carregamento de ópio pelas autoridade chinesas, que terminaria com o Tratado de Nanquim, do qual resultou a abertura de cinco portos chineses a comerciantes ocidentais e entregou a ilha de Hong Kong à administração britânica. 9 Nacionalistas chineses revoltam-se contra as potências estrangeiras. 10 Oposição dos nacionalistas ao governo do xogunato (família Tokugawa). 11 1914-1918. 12 1939-1945.


no século XIX JAVA: BATÁVIA / JAYAKARTA GEORGINA PINTO PESSOA

grandezas almejadas. Caminhos de ontem sempre remanescentes na história de cada lugar e da sua gente, independentes do imaginário idílico que se possa urdir, seja porque razão for. 13

Como se percebe na alusão de Edward Said , «O Oriente como invenção do Ocidente» reportando-se à visão que o ocidente tinha do Oriente em geral e do Médio Oriente em particular “como uma ideia que tem uma história e uma tradição de pensamento, de imagens e um vocabulário que lhe deram uma realidade e uma presença no e para o ocidente. O 14

ocidente sentiu sempre um fascínio pelo oriente que adquiria maior peso quando passava uma crise de identidade”.

Na verdade, o fascínio que este Oriente exercia vinha de longe e tinha traços ora místicos ora científicos, aos quais não eram estranhos nem o gosto de um certo bucolismo romântico, nem o fascínio pelos ideais medievos, quase cavaleirescos, materializados na demanda dos lugares santos - Ex Oriente lux, essa luz que vinha do oriente, nem a exigência da observação e da experiência/experimentação. Mas esta ideia do oriente construída no ocidente “mostra como ela mistura demasiados espaços geograficamente dispersos (desde o Líbano à China…) e como representa uma categoria cultural politizada, já que está ao serviço do projecto colonial europeu ocidental. Numa espécie de dialéctica do eu e do outro, o Ocidente precisa de se demarcar do Oriente para ser ele próprio. E essa miragem do orientalismo ter-se-ia prolongado pelo 15

menos até ao fim do Império Otomano no início da Primeira Guerra Mundial (1914-1918)” .

Num Oriente mais além, pedaço de chão situado entre a Tailândia e a Austrália, viajamos com o olhar do fotógrafo, seguimos-lhe as pegadas nesse ano de 1886 - Batavia - canal e ruas; … como nos testemunham as legendas das suas fotografias. Não deixamos de nos interrogar sobre a pessoa e o percurso deste anónimo, as motivações desta itinerância por terras tão 14

Said, Edward - Orientalismo. Representações ocidentais do oriente. Ed. Livros Cotovia, Lisboa, 2004. Moita, Luís - Ocidente contra Oriente?, 2009. (www.janusonline.pt).

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longínquas … que fascínio seria o seu? Em 1890, o fotógrafo alemão Gusrav Fritsch captou nas suas chapas de vidro a doce

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nudez da mulher javanesa. A leitura que estas imagens nos proporcionam é de grande riqueza documental e estética, permitindo-nos apreender essa pluralidade de universos e de intenções que se cruzavam no mundo de então e que aqui se retiveram. As reminiscências da Jayakarka ancestral, da sua relação estreita entre as gentes e o meio, a sobrevivência arreigada à terra, o arroz limpo pela

brisa sobre o baloiçar cadenciado das mulheres de braços desnudos, os corpos envolvidos no kaine lavrado pelas geométricas formas conferidas pela ancestral técnica do batik. O olhar provocador do rapaz que vai preparando os cocos com a lentidão de quem tem o tempo dos coqueirais, a intimidade feminina partilhada nas transparências das águas do rio, os olhares distantes, que se voltam na sua timidez, denunciando a surpresa dos intrusos. Como extraordinárias são as imagens do príncipe guerreiro javanês, nas suas poses hieráticas, no seu belíssimo sarong estampado transportando-nos sob as asas de Garuda para essa Java antiga do lendário reino de Panji e de kirana, para as estórias do Ramayana e do Mahabharat, que alimentaram fértil literatura, animada pelas marionetas e pelo teatro de sombras, pelas danças e pelo gamelão.

76 Lembramos que três anos antes da passagem do fotógrafo e da captação destas imagens, em 27 de Agosto de 1883, tinha ocorrido a explosão do vulcão de Krakatoa. Cerca de 36 417 pessoas teriam morrido. Os horrores da catástrofe ficariam 16

registados no diário de Willem Beyrinck . Batávia, a capital, sobreviveu por pura sorte, graças à protecção natural contra ondas oferecida pelas barreiras de coral e pequenas ilhas que a circundam. Mesmo assim, as centenas de canais que, bem ao gosto holandês, faziam parte da arquitectura da cidade, transbordaram rapidamente, inundando as ruas. É também esta Batávia colonizada que se nos desvenda num sui generis paradoxismo. O largo canal que irrompe na sua verticalidade moderna, mas onde as nuvens se espelham e as margens coram a roupa. O caçador de tigres, que na clareira do cafezal posa para a câmara a sua viril superioridade sustentada pela espingarda, sobre os olhares e as bocas fechadas dos gentios e a indiferença dos fiéis amigos. Para que o ciclo se feche na plantação de café, na casa de madeira e juncos, construída sobre estacaria, que a plêiade de operários ladeia sobre o olhar altivo do colonizador. É uma realidade com dois rostos que emerge nas imagens de Batávia.

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Krakatoa - The Day the World Exploded (“Krakatoa - O Dia em que o Mundo Explodiu”), do geógrafo britânico Simon Winchester.


no século XIX JAVA: BATÁVIA / JAYAKARTA GEORGINA PINTO PESSOA

As marcas da apropriação do colonialismo de uma época, exercício do domínio intrínseco aos povos em todas as épocas e a memória de uma ancestralidade grandiosa e heróica, que como o último moicano teimara em resistir.

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Java - Caçadores de Tigres INDONÉSIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 049 Datação 1886


Java - casa agrícola, numa plantação de café INDONÉSIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 050 Datação 1886


no século XIX

1886 - Índias Holandesas - Malaias limpando arroz INDONÉSIA

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 051 Datação 1886


no século XIX

1886 - Batavia - vendedores de coco verde INDONÉSIA

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 052 Datação 1886


no século XIX

1886 - Batavia - Príncipe Javanês -Ttraje de Gala INDONÉSIA

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 053 Datação 1884-1894


no século XIX

1886 - Batavia - Príncipe Javanês -Traje de Gala INDONÉSIA

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 054 Datação 1884-1894


1886 - Batavia - Canal e ruas INDONÉSIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 055 Datação 1886


1886 - Batavia - No banho INDONÉSIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 056 Datação 1886



no século XIX

ÍNDIA MANUELA VAQUERO

Índia, um sonho português cumprido com a chegada de Vasco da Gama àquelas paragens pela rota do Cabo da Boa Esperança, em 1498, um novo caminho para as especiarias alcançado por mar - o ouro das Índias como as designavam - o gengibre, o cravo, o açafrão, a noz-moscada, a canela e a pimenta, produtos difíceis de obter, porque eram trazidos para o Ocidente pelos mercadores árabes, que os transportavam até à zona do Suez, em enormes caravanas no dorso de camelos, para serem depois embarcadas para os portos italianos de Veneza e Génova. Ao longo do século XV e primeira metade do XVI, o transporte de mercadorias era feito através do Mar Vermelho e do Golfo Pérsico, tradicionais vias de ligação entre a Europa e a Ásia que faziam de Adem e Ormuz as portas de entrada para o Oceano Índico. Os preços praticados eram elevadíssimos, o que tornava a mercadoria preciosa. Quando foi possível ir e voltar de Lisboa às lendárias Índias de barco, em pouco mais de 365 dias, quando as histórias da Arábia, Pérsia e Índia foram confirmadas… começaram a aparecer ilusórias descrições das mulheres do Oriente - afáveis e de olhos amendoados, de pele morena e sorriso doce - Camões não deixa de as descrever na sua Ilha dos Amores e os marinheiros partiam nas caravelas imbuídos nestes sonhos. Da Índia chegavam relatos a respeito dos habitantes do Malabar, de sua relação com o clima e da diversidade da fauna e flora harmoniosos jardins com lagos repletos de flores de lótus, densa vegetação de palmares e uma enorme variedade de arbustos e frondosas árvores tropicais rodeavam magníficos pagodes (templos hindus), com os seus rendilhados minuciosos e geométricos nos beirais, no pátio a presença da água era imprescindível, então como agora elemento com de poderes de purificação. As árvores da pimenta e da canela eram repetidamente descritas, assim como as múltiplas formas de aproveitar as palmeiras e o coco. Também a dança, acompanhada pelo som de flautas e oboés, tambores e gonzos, proporcionava o ambiente ideal para serem narradas histórias de míticos deuses e heróis, pelas ruas os encantadores de serpentes seduziam as cobras, não só pela música das flautas, mas pela sua forma e movimentos.

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A literatura de viagens, que se inicia com a necessidade de registar rotas, condições atmosféricas, pormenores costeiros, diários de bordo, registava já apontamentos pitorescos com descrições de itinerários e percursos, relatando visões inéditas sobre as terras incógnitas da tão almejada Índia. O relato verídico da descoberta apenas vai acontecer a partir do momento em que a consciência transformar em pensamento e em palavra o que foi visto e, considerar importante examinar quais os aspectos naturais e humanos a ter em conta, sejam eles a educação espiritual, a instrução, a defesa do território ou a submissão dos povos à nossa cultura. A Índia era uma sociedade de castas onde nasceu o hinduísmo, o bramanismo e muitas outras religiões e crenças, país de muitas línguas e idiomas, muitos povos e costumes, com uma cultura milenar e um misticismo surpreendente, uma sociedade de contrastes que se revelava sofisticada e deslumbrante para o Ocidente. Esta era a Índia que os portugueses procuravam e encontraram, e esta relação luso-indiana veio a durar cerca de 500 conturbados anos. Trouxemos as especiarias e muitos outros saberes, mas também levámos conhecimentos, ciência, religião, construímos igrejas, conventos, casas e fortalezas com uma

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simbologia e arquitectura correspondente à europeia, num desejo constante de convertermos a exótica Índia num espaço familiar.




no século XIX

PRAGANÃ1 NAGAR-AVELY MANUELA VAQUERO

A Oriente, para lá do Mediterrâneo, da Ásia Menor, da Arábia, da Pérsia, do Afeganistão, na margem do rio Damanganga que vai confluir no Mar da Arábia, fica Praganã Nagar-Avely um pequeno território português que, conjuntamente com Dadrá, fez parte da Índia Portuguesa desde o ano de 1783 até 1954. Estes dois torrões eram enclaves, sem acesso ao mar, administrados pelo Governador Português do distrito de Damão com a capital situada em Silvassá. As primeiras referências à região de Dadrá e Nagar-Aveli datam da época medieval, quando os invasores Rajput, em 1262, se tornaram soberanos da terra, formando um pequeno estado chamado Ramnagar. Toda esta área se manteve sob o seu controle até meados do século XVIII, quando foi conquistada pelos Marathas. São várias as versões relativas à tomada destes territórios pelos portugueses. Segundo uns no ano de 1783, a marinha Maratha, para indemnizar os portugueses do afundamento de um navio, fez a cedência do território de Nagar-Avely à coroa de Portugal que a inseriu no Estado da Índia Portuguesa. Outros historiadores afirmam que, pelo tratado de 1780, Portugal receberia 72 aldeias, outrora por eles perdidas, e com essas povoações se formaram os enclaves de Dadrá e Nagar-Aveli. Existe ainda uma terceira versão… As relações entre colonizadores e nativos foram sempre pacíficas, no entanto, há muito poucos vestígios da cultura portuguesa 1

Praganã - Subdivisão administrativa, espécie de província ou distrito, na Índia portuguesa. 2 “O sr. Jayme Pereira de Sampaio Forjaz de Serpa Pimentel, official da armada e ex-governador de Damão, fidalgo cavalleiro da Casa Real, cavalleiro de N. S. da Conceição, sócio da Sociedade de Geographia de Lisboa, publicou, em um volume de mais de 300 paginas, O Distrícto de Damão, apontamentos de uma administração colonial. Comprehende muitos e interessantes dados históricos e estatísticos, e a defeza e justificação do esclarecido auctor durante o tempo que governou aquelle districto. É livro que terá grande numero de leitores. Foi impresso pela livraria Ferin e saiu dos prelos, muito nitido, da typographia Castro Irmão. ” in Diário de Notícias, 11 de Agosto de 1892.

no território, sendo praticamente impossível encontrar alguém que fale português. As referências que encontrámos relativas ao ano de 1892 de Praganã Nagar-Avely não são as mais abonatórias, embora a sua população fosse numerosa, não tinha uma única estrada, uma única ponte ou um caminho viável… não existiam vestígios de obras. O ex-governador do Distrito de Damão2, sobre o assunto deixou escrito: « (…) tristes logarejos, immundas choupanas, imagens da penúria e da miséria attestam quanto a dominação portugueza de ha um século nada benéfica tem sido aos seus

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rudes e selvagens habitantes, onde entes nús, esfomeados, tristes, pallidos, anemicos, dão tristíssimo exemplo e vergonhoso 3

testemunho do nosso imperdoável desleixo e abandono.» E continua as suas descrições afirmando que nos territórios das possessões inglesas, todos os anos, se abrem milhas e milhas de estradas, se constroem pontes e aquedutos mas: «Na nossa Praganã não há o mais pequeno vestígio de obras deste género, podendo dizer-se que até hoje nada há feito, e portanto que tudo resta a fazer! O estado actual é deplorável, forçoso é confessá-lo.» Praganã Nagar-Avely deixou de ser uma possessão portuguesa no ano de 1954.

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3 Jaime Pereira de Sampaio Forjaz de Serpa Pimentel, na sua obra: “O Districto de Damão, apontamentos de uma administração colonial”.

Lisboa: Livraria Ferin.1892, p. 222.


Praganã Nagar-Avely Uma das casas de Silvassá ÍNDIA no século XIX

Autor Adolfo Moniz Técnica Albumina colorida manualmente Inventário Cat. 015 Datação 1884 - 1894


Praganã Nagar-Avely Ferreiro, Alfaiate, Barbeiro Oleiro e respectivas mulheres ÍNDIA no século XIX

Autor Adolfo Moniz Técnica Albumina colorida manualmente Inventário Cat. 016 Datação 1884 - 1894


Praganã Nagar-Avely Parabú; Parse; Carpinteiro Batelá e respectivas mulheres ÍNDIA no século XIX

Autor Adolfo Moniz Técnica Albumina colorida manualmente Inventário Cat. 017 Datação 1884 - 1894


Praganã Nagar-Avely Dança de Roda ÍNDIA no século XIX

Autor Adolfo Moniz Técnica Albumina colorida manualmente Inventário Cat. 018 Datação 1884 - 1894




no século XIX

DAMÃO MANUELA VAQUERO

Damão foi possessão portuguesa a partir do ano de 1559, quando o vice-rei D. Constantino de Bragança a conquistou ao Rei mouro de Cambaia, embora o primeiro contacto tido com o território se tivesse dado no ano de 1523. Nascida na foz do rio Damanganga, que divide a cidade - a norte Damão Pequeno, do lado sul Damão Grande - foi um grande entreposto comercial durante os séculos XVI e XVII. Nesses tempos o distrito de Damão fabricava grande quantidade de estofos de algodão que exportava para África, mas as suas principais fontes de receita eram: a cultura de cajuris, dos quais se extraia a seiva para fazer vinho, o cultivo do arroz e as indústrias do sal e da pesca. No entanto, a sua importância desvaneceu-se com o declínio do poder marítimo de Portugal e, passados 333 anos, a situação neste cantão português, por terras da Índia, era bem diferente e encontrava-se bastante negligenciado a nível da salubridade pública, segundo nos narra o capitão-tenente Forjaz Serpa Pimentel: “Rara a casa que não tivesse porcos ou vaccas. Curraes nenhuns. Damão de cidade só tinha o nome. Abundavam as esterqueiras, a começar na extensa horta do palácio e a acabar no quintal do hospital militar. Os porcos divagavam á vontade pelos logares públicos. Os baixos do palácio repletos de entulho, lixo e escrementos. Os poços faltos de limpeza desde annos, filtrando constantemente as aguas sujas e pútridas que se lhes accumulavam em redor. As ruas verdadeiros chiqueiros. As viellas deposito de immundicies accumuladas de annos.” Referindo a fortaleza de Damão acrescenta: “No lastimoso estado em que se encontra este material, sem reparos, a não ser 21 canhões de ferro destinados a salvas, as peças de bronze e os dois obuzes, só serve para attestar aos estrangeiros que visitam Damão o abandono a que desde muito votamos aquella praça de guerra.”1 1

Jaime Pereira de Sampaio Forjaz de Serpa Pimentel “O Districto de Lisboa: Livraria Ferin,1892. Damão, apontamentos de uma administração colonial”.

Não poderemos deixar de acrescentar, segundo estatísticas, que a colónia de Damão, por essa época, tinha cerca de 67 mil

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habitantes distribuídos por 388 Km2, que se encontravam divididos em dois concelhos, com uma cidade, uma vila e noventa e oito aldeias e onde apenas existiam doze europeus. O seu governador, o Sr. Jaime Forjaz de Serpa Pimentel, alerta para a grande necessidade de se enviarem portugueses para a Índia, para que possam dirigir os serviços e defenderem devidamente o país e salienta: “Como era differente no tempo de Affonso d' Albuquerque e D. João de Castro”. Esta cidade marítima da Índia, situada no golfo de Cambaia, foi praça-forte e possessão portuguesa até 18 de Dezembro de 1961. Torrinha do Palácio do Governador O Palácio do Governador em Damão é uma construção com fachada tripartida de inspiração clássica - o alçado desenha-se a partir de três corpos ligados por uma varanda alpendrada, evidenciando-se uma torre central mais elevada. Embora o requinte estético seja de salientar e corresponda à função de aparato urbano a que se destinava, teremos que ter em conta as descrições que

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fomos encontrar alusivas ao seu interior, nesta data, que são absolutamente surpreendentes: “Dentro do palácio a immundicie é quasi geral, e a par da immundicie visivel desleixo em tudo o que pertence á fazenda nacional. Com quanto bem situada a secretaria do governo no edificio denominado Torrinha, afigura-se a quem n'ella entra pela porta principal mais uma espelunca suja e sórdida do que a primeira repartição do districto. Escadas Íngremes, corroídas com o tempo. Pavimentos gemendo sob os nossos passos. Armários quasi coevos de D. Constantino de Bragança, vergando sob o peso de infolios, semi-corroidos pela humidade e pela traça. Mesas aleijadas, corcomidas, de pannos esfarrapados, dançando desordenadamente ao perpassar de empregados. Cadeiras desmantelladas, gemendo ao menor conctato. Uma verdadeira miséria franciscana!” Fomos encontrar este interessante relato alusivo à Torrinha do Palácio do Governador, situado na rua central, repleta de sombras,


no século XIX DAMÃO MANUELA VAQUERO

no Livro “O Districto de Damão, apontamentos de uma administração colonial”, escrito no ano de 1892, pelo exgovernador do Distrito de Damão e oficial da armada, Jaime Pereira de Sampaio Forjaz de Serpa Pimentel.

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Torrinha do palácio do Exmo. Governador DAMÃO ÍNDIA no século XIX

Autor Adolfo Moniz Técnica Albumina colorida manualmente Inventário Cat. 019 Datação 1884 - 1894


A casa do Comissariado e a rua principal de Damão-pequeno DAMÃO ÍNDIA no século XIX

Autor Adolfo Moniz Técnica Albumina colorida manualmente Inventário Cat. 020 Datação 1884 - 1894



no século XIX

CAMINHO-DE-FERRO DOS GATES MANUELA VAQUERO

Os Gates Ocidentais, essa imensa cordilheira situada no oeste da Índia, mais velha que os Himalaias, acompanham o Mar Arábico ao longo de 1600 vastos quilómetros, limitando as planícies da Costa de Malabar. Foram perfurados, penetrados, contornados para vencerem as encostas em morosas curvas, viadutos e profundos túneis, atravessados por carris, ao longo do século XIX, tornando possível o acesso ao interior do continente indiano, facilitando assim o intercâmbio comercial. Foram considerados recentemente Património Mundial, pela Unesco. A paisagem é avassaladora, composta por montanhas e desfiladeiros, onde os cursos de água se multiplicam rasgando a rocha e dando origem a admiráveis quedas de água. É uma zona de encostas íngremes povoadas por vegetação frondosa, influenciada pelas fortes chuvas das monções, que proporciona paisagens de cortar a respiração. De permeio a mão do homem reconhece-se no horizonte, pois as grandes escarpas aparecem cortadas por túneis, pontes e aquedutos, por trilhos de ferro paralelos - as chamadas Estradas de Ferro - que serpenteiam as encostas por aquelas inóspitas paragens, para as transporem, tornando a comunicação com o interior do continente indiano mais fácil e o principal meio de transporte das gentes que aí habitam e labutam. Continuando com as estradas de ferro não poderemos deixar de referir a linha pelos portugueses construída, no ano de 1878, para se poder realizar a ligação entre o porto de Mormugão e as linhas férreas do território inglês. Este empreendimento teve 1

por base o famoso tratado assinado com a Inglaterra que tinha como finalidade estreitar as relações comerciais entre a índia 1

O Tratado de 1878, assinado entre Portugal e Inglaterra, tinha por finalidade fazer com que os ingleses acabassem com o contrabando de sal e de sura (álcool de palmeira) que inundavam o mercado de Bombaim, prejudicando assim os seus comerciantes. O produção de sal de Goa era feita em grande escala e chegava a Bombaim, muito mais barato que o manufacturado pelos ingleses, também a sura goesa era muito apreciada pelos britânicos do lado de lá do Gates. Com o Tratado os ingleses tomavam de arrendamento as salinas e podiam utilizá-las, ou deixá-las ao abandono, quando quisessem. A economia de Goa ficou, em parte, subordinada à da Índia Inglesa, no que respeitava ao fabrico, produção e consumo de vários produtos.

portuguesa e a índia inglesa, abolindo barreiras e abrindo aos britânicos os mercados portugueses e principalmente ao importante porto de Mormugão. Apenas oitenta e dois quilómetros de caminhos-de-ferro, que ligavam Mormugão e a estação de Castle Rock, mas que atingiam a altitude de novecentos metros e levaram dez anos para serem executados. Na realidade a

construção da ferrovia foi uma tentativa derradeira para tentar tirar a Índia, a nossa Índia, da crise sem precedentes em que se encontrava submersa mas revelou-se uma operação inglória e dispendiosa para o Estado Português.

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Goa - C. de ferro, nos Gates ÍNDIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 038 Datação 1884-1894


Goa - Caminhos. de ferro, nos Gates ÍNDIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 039 Datação 1884-1894


Goa - Caminho. de ferro, dos Gates ÍNDIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 040 (prova actual de original colado no reverso) Datação 1884-1894


Goa - Caminho de ferro, dos Gattes ÍNDIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 041 Datação 1884-1894


no século XIX

Goa - A queda d'agua, nos Gates ÍNDIA

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 042 Datação 1884-1894




no século XIX

GOA MANUELA VAQUERO

“Goa bela! Olha os Gates em chama! Olha a crista revolta Que se inflama! Andam tigres à solta Nos bosques de Bengala! É a Índia que te fala! É a Índia que te chama!” 1

Adeodato Barreto

113 A cidade de Velha Goa, nas margens do rio Mandovi, sustentáculo para a circulação de toda a cidade, é um lugar particularmente fascinante e revelador das memórias de tempos passados, com um património arquitectónico riquíssimo mas seriamente degradado; fundada no século XV pelos muçulmanos foi, no ano de 1510, conquistada por Afonso de Albuquerque então Governador da Índia, permanecendo sob domínio português até meados do século XX2. Numa carta ao rei escrita em Outubro de 1 Adeodato Barreto - poeta e escritor luso-goês, nas suas obras vamos encontrar importantes paradigmas da cultura hindu. Natural de Margão, a cultura indiana influenciou-o profundamente e tal torna-se perceptível nos seus poemas, repletos de concepções da doutrina filosófica indiana, relativos à transmigração. 2 No ano de 1954 Portugal perdeu os primeiros territórios na Índia, em Dezembro de 1961, a União Indiana invadiu Goa, Damão e Diu que só viriam a ser formalmente considerados independentes depois da Revolução do 25 de Abril em1974. 3 Encontraram-se indícios de relações comerciais, respeitantes à exportação de especiarias, desde o tempo dos Sumérios. Não terá sido por acaso que os portugueses ali montaram as suas feitorias.

1510, Afonso de Albuquerque descreve Goa como sendo uma “ilha cercada dagua, de muita Remda, e muito proveitosa.” Os portugueses procuravam na Índia o que a Europa ambicionava - a pimenta acima de tudo, e outras especiarias, que até então lhes eram fornecidas pelos mercadores árabes que a visitavam desde tempos bem remotos3. Goa ficou a ser, a partir do século XVI, a capital do império português na Índia e, em simultâneo, um centro de divulgação do catolicismo. Missionários jesuítas, franciscanos, dominicanos, agostinhos, bem como outras ordens religiosas, aí se estabeleceram, sendo inicialmente bastante


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condescendentes com as religiões locais - das quais se destaca o hinduísmo , facilitando um processo de conversão e de aculturação. O papel dos missionários foi fundamental não podendo, no entanto, deixar de ter em conta que o processo de adopção de valores culturais compreendeu avanços e recuos, rejeições recíprocas, quer dos modelos europeus quer dos asiáticos. Neste ambiente ideológico, marcado pelo espírito da Contra-Reforma e pelas determinações do Concílio de Trento (1545-1563), a política de tolerância religiosa, seguida por Afonso de Albuquerque cedeu lugar à intransigência. Os templos hindus e as mesquitas foram destruídos, procurando-se favorecer os convertidos e dificultar a vida aos hindus e muçulmanos. Com o estabelecimento do Tribunal do Santo Ofício em Goa, no ano de 1560, cujo propósito fundamental seria impedir as 5

influências gentílicas nas práticas culturais cristãs, influências essas desenvolvidas a partir da segunda metade do séc. XVI e ao longo do séc. XVII - o termo gentilismo encontra-se em muitos documentos inquisitoriais - denúncias, confissões, tratados teológicos e jesuíticos, cartas e crónicas. Em geral, refere-se a práticas que envolvem venerações desenvolvidas por populações

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que eram convertidas ao cristianismo, no decurso da expansão marítima portuguesa, e que acabavam por estabelecer misturas de elementos da religião local com os do cristianismo. Provocou também que muitos milhares de goeses partissem para outras paragens. Este tribunal, que tinha sob sua jurisdição todo o império do Oriente, desde a costa oriental africana até Macau e Nagasaki, alterou a situação completamente e a religião católica passou a prevalecer, tendo um papel importantíssimo no seu 6

desenvolvimento. Foi definitivamente abolido no ano de 1812 , embora a sua acção abrandasse com as reformas pombalinas (1755-1777) que tiveram um grande alcance social. A partir do ano de 1843, a velha cidade de Goa, começou a perder prestígio para Pagim ou Nova Goa, para tal facto muito contribuiu a mudança de residência dos governadores, pois desde o ano de 1759 passou a ser o espaço escolhido para morada dos vice-reis, que transformaram a notável a fortaleza do Idalcão em palácio e Goa, a bela cidade situada na ilha de Tissuary, inicia o seu processo de envelhecimento, entregue a si própria e às monções começa a ser invadida pelo musgo e pelo matagal numa degradação iminente, onde as casas e os edifícios abandonados vão caindo gradualmente. Diz-nos o Professor Silva Rego,

4 Religião principal da Índia - “uma federação de credos e de bem ordenadas maneiras de vida, uma cultura religiosa pluralista, uma agregado de tradições étnicas, oferecendo uma vasta gama de alternativas.” 5 As autoridades não consentiam a realização pública das cerimónias gentílicas, pretendendo com isso evitar o escândalo em terras cristãs e a contaminação religiosa dos fiéis, assim era permitido aos cristãos prestar culto público a Deus, mas os hindus e os muçulmanos teriam que praticar o seu culto em privado. 6 As ruínas do edifício do Tribunal do Santo Ofício, próximo da sé catedral, ainda em razoável estado no ano de 1833, eram uma das atracções históricas de Velha Goa, especialmente para os visitantes estrangeiros.


no século XIX GOA MANUELA VAQUERO

numa conferência, proferida no ano de 1965, sobre A Índia-Portuguesa 1850-1910: “Em 1880, o ministro da Marinha e Ultramar, Visconde de S. Januário, ex-governador-geral da Índia, tomando em atenção a urgente necessidade em que se debatia o Estado da Índia, mandou vender pràticamente tudo quanto pertencia às igrejas, confrarias, juntas, câmaras municipais, seminários, colegiadas, bens da Fazenda, etc. Observou-se isto não só em Goa, mas também em Damão e em Dio. (…) Abundavam as revoltas, provocadas por motivos aparentemente fúteis, mas sempre pejados de consequências.” Era o princípio do fim… o estado da Índia Portuguesa encontrava-se em agonia… sem indústria, sem agricultura, sem estradas condignas, sem infra-estruturas capazes para se sustentar, acaba por assinar, sob a orientação de Andrade Corvo com a Índia Inglesa, o “Tratado de 1878”, do qual nunca se viria a libertar, padecendo as consequências da supremacia Inglesa. Velha Goa ou Velha Cidade - no ano de 1548 possuía já 14 igrejas, pois foi nos dois primeiros séculos da nossa presença na Índia, que se edificaram quase todas as edifícios religiosos que povoavam aquela paragens, mas que não resistiriam à impiedosa passagem do tempo e ao desleixo dos homens. Eram construções imponentes, quer pela sua volumetria, quer pela qualidade arquitectónica, que ainda nos dias de hoje espantam e atestam, não só as ambições evangelizadoras dos portugueses mas também a importância da cidade e das suas riquezas. No ano de 1891, não passavam de ruínas, apenas visíveis as suas frontarias destroçadas em irremediável estado de degradação. Paredes e muros encontravam-se envolvidos pelo mato, num total abandono, embora majestosos na sua decadência. A profusão de igrejas, nos seus tempos de intenso apogeu, a sua importância enquanto local de peregrinação e devoção católica, levaram a que Goa ficasse conhecida como “Roma do Oriente”. Ruínas do Convento de Santo Agostinho e do Convento de São Paulo A história da arquitectura indo-portuguesa teve o seu início no reinado de D. Manuel (1495/1521), período de grandes

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transformações no domínio da arte, quando Portugal adquire um poderio económico considerável. Os monumentos edificados nas novas terras conquistadas vão reflectir as preocupações dominantes dos seus governadores e o espírito evangelizador que imperava e, se em África são notáveis algumas grandiosas fortalezas, na Índia salienta-se sobretudo a arquitectura religiosa. Nos inícios do século XVI as construções eram de dimensões modestas e frágeis, mas a partir dos meados deste século, com a colaboração da mão-de-obra local, as igrejas e conventos tornaram-se sumptuosos e multiplicaram-se pelas várias regiões da Índia, principalmente na costa do Malabar, onde as possessões portuguesas se situavam. Das inevitáveis influências recíprocas resultou a originalidade da arte indo-portuguesa. Para podermos fazer uma ideia do que teria sido, nos seus tempos áureos, o Convento de Santo Agostinho, do qual apenas subsistem ruínas, evoco a obra de Pedro Dias, De Goa a Pangim, Memórias tangíveis da Capital do estado Português da Índia que sobre o assunto nos diz: "O que resta hoje da igreja do Convento de Santo Agostinho é uma impressionante e

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vastíssima ruína, mas pode através dela perceber-se a grandiosidade que teve o complexo monástico e as dimensões excepcionais da sua formidável igreja da invocação de Nossa Senhora da Graça. (...) A fundação desta casa remonta ao ano de 1572, quando 12 religiosos, sob a direcção de frei António da Paixão levantaram as paredes de um primeiro mosteiro. Anos volvidos, em 1597, foi iniciado o definitivo, sob a invocação de Nossa Senhora da Graça, padroeira dos eremitas calçados de Santo Agostinho.(...) Temos também a informação de que as paredes estavam parcialmente forradas com azulejos, cujas marcas são aliás bem visíveis em muitos pontos das ruínas, tendo sido aproveitados alguns para outras construções, podendo ver-se nomeadamente no frontal de altar da sacristia da Casa Professa do Bom Jesus. São claramente identificáveis como lisboetas, de tapete e rica policromia, feitos em meados do século XVIII. (...) O Convento de Santo Agostinho tinha também uma zona comum, com amplos dormitórios, refeitório, hospedaria, enfermaria, etc., completando-se esta zona habitacional de vários andares com quatro capelas: a dos provinciais, a dos priores, a de Nossa Senhora do Rosário e a de Nossa Senhora da Assunção." Eram assim imponentes estas construções monásticas.


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Também do colégio de São Paulo e de sua Igreja apenas restam ruínas. Com a expulsão dos jesuítas, o antigo colégio foi abandonado, encontrando-se, no ano de 1827, em estado de completa ruína, sendo dois anos depois, demolido pelo Governo, subsistindo apenas a fachada da igreja. O material da demolição foi utilizado em novas construções erguidas em Pangim, que, no século XIX, dando prosseguimento a um processo iniciado há décadas, passando a substituir a velha urbe, conduzindo Velha Goa à decadência, perdendo a extraordinária posição que ocupara nos três séculos anteriores a favor desta Nova Goa. Para podermos aquilatar bem da sua importância, recordamos que no ano de 1556 a imprensa foi introduzida nestes domínios pela Companhia de Jesus, saindo dos prelos do Colégio de S. Paulo a primeira obra impressa - Conclusões ou Teses - . Alcançou tal fama no Oriente, que chegou a ser intitulado “Universidade de Goa”. Os portugueses na sua missão evangelizadora quiseram também espalhar muitos dos conhecimentos que possuíam, relativos à fé e à ciência, dos quais o estabelecimento da imprensa é um bom exemplo, se tivermos em conta que em Calcutá a arte de impressão apenas foi implementada duzentos anos depois. Diz-nos o Conde de Ficalho, na sua obra Garcia da Orta e o seu Tempo, que quando os navegadores portugueses chegaram ao continente asiático não encontraram um “país de selvagens”, mas uma “civilização diversa da sua, inferior em muitos traços e superior em alguns”. Túmulo de S. Francisco Xavier O Túmulo de S. Francisco Xavier, o apóstolo do Oriente, assim designado pelo seu trabalho de doutrinação na Ásia, encontra-se na Basílica do Bom Jesus em Velha Goa. Sendo um dos fundadores da Companhia de Jesus, no ano de 1534, ordem religiosa destinada ao ensino, à conversão e à caridade, foi enviado pelo rei D. João III, para o Oriente com a finalidade de espalhar a fé católica por aquelas paragens. Foi o primeiro missionário jesuíta na Índia e, na ânsia de converter as populações locais, nem sempre fez uma transição gradual entre a religião hindu e a católica o que o iria levar, posteriormente, a pedir a D. João III a

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instauração de um Tribunal da Inquisição em Goa, que se viria a concretizar apenas após a sua morte. A Companhia de Jesus chegou a Goa em 1542 e aí fundou um centro educativo e religioso, o Colégio de São Paulo ou de São Roque, 7

que contava naqueles longínquos tempos com uma enorme biblioteca e tipografia , que sobreviveram até 1830 como já atrás foi dito, no entanto, a Basílica do Bom Jesus, principiada no ano de 1594 perdurou através dos tempos e, ainda hoje, nela abriga o túmulo relicário de S. Francisco Xavier. Facto que devemos relevar é o de ser considerada um dos melhores monumentos da arquitectura barroca da Índia e uma das Sete Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo, fazendo parte Património da Humanidade pela Unesco. Escolhendo o modelo das igrejas jesuítas portuguesas, o templo do Bom Jesus tem uma nave única, revestida a madeira e não possuindo capelas laterais, salvo duas situadas na área do transepto. Na fachada da igreja existe um enorme frontão decorado com as armas da Companhia de Jesus e ladeado por volutas. Segundo Bernardo do Valle de Castro: “O maior tesouro do interior da igreja é a capela do transepto onde se encontram, desde 1655, os restos de Francisco Xavier, numa

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urna de prata finamente trabalhada por artistas locais. A urna está localizada num mausoléu executado pelo artista florentino Giovanni Battista Foggini em 1697. Estes monumentos, em mármore italiano, foram oferecidos pelo Grão-Duque da Toscana, Cosimo III Médici, e armado no local por um artista especialmente enviado, Placido Francesco Ramponi, chegado a Goa em 1698 com esse objectivo. A capela-mor possui um retábulo dourado, datado de c.1699, dedicado ao Menino Jesus, com uma imagem de Inácio de Loiola, o fundador da Ordem. Em 1946, tornou-se a primeira basílica da Índia. Nos dias actuais, ainda há peregrinações ao local, para visitas ao túmulo d' O Apóstolo do Oriente. Este túmulo relicário do Apóstolo do Oriente é exposto de dez em dez anos, na Sé Catedral de Goa. O dia de S. Francisco Xavier comemora-se a 3 de Dezembro, pretendendo evocar o dia da morte, que ocorreu na China no ano de 1552. O corpo do santo encontra-se surpreendentemente bem conservado, faltando-lhe contudo o braço direito, sendo que o osso do úmero se encontra

7 A documentação existente dá-nos a indicação de ter saído dos prelos do Colégio de S. Paulo, da Companhia de Jesus, a sua primeira obra, Conclusões ou Teses, provavelmente em Setembro-Outubro de 1556.


no século XIX GOA MANUELA VAQUERO

num relicário de prata em Macau. A festa em honra de S. Francisco Xavier reúne tão grande número de pessoas, que faz deste santo o padroeiro espiritual da Índia. Lorenzo Ortiz no seu livro San Francisco Javier, Príncipe del Mar, escreve: “Todos os casos da sua prodigiosa vida são raros, todos ternos, todos admiráveis os que lhe sucederam no mar navegando, ou para o bem ou alívio dos que de ele dependiam. Fora do mar, raras são as suas profecias, assim como os seus milagres, as suas conversões, o seu poder e os efeitos da sua caridade.” Seminário de Rachol e Seminário de Chorão Portugal foi o primeiro país europeu a pretender exercer uma autoridade religiosa, política e comercial sobre os lugares do Oriente, o que originou um contacto civilizacional mais alargado e conduziu à edificação de um poderio religioso ainda hoje patente nas inúmeras igrejas e conventos espalhados pelo território. Muitos deles mais não são que deploráveis ruínas, majestosas na sua decrepitude e reveladoras de um passado multissecular repleto de cultura e transmissão de saberes. O Seminário de Rachol, situado nas margens do rio Zuari, no distrito de Salcete em Goa, foi mandado construir pelo rei D. Sebastião e foi o primeiro seminário edificado na Ásia, datado de 1580 e apostolado pela Companhia de Jesus até esta ter sido expulsa de Goa em 1762. O seminário alcançou um enorme desenvolvimento cultural e, em simultâneo com o Colégio de São Paulo de Velha Goa, foi considerado uma das mais influentes instituições da cristandade no Oriente - na sua escola de Teologia formaram-se alguns dos mais brilhantes sacerdotes da Índia. Durante o governo da arquidiocese de Goa, por D. António 8

Sebastião Valente , reuniu-se em Goa um notável concílio provincial que benfeitorizou de tal forma o Seminário de Rachol, que a Santa Sé concedeu, a esta instituição de ensino, a permissão de conferir o grau de Bacharelato em Teologia, aos alunos que 8

O arcebispo D. António Sebastião Valente dirigiu a diocese de Goa desde Maio de 1892 até Janeiro de1908, data da sua morte. Lente da Faculdade de Teologia da Universidade de Coimbra, foi considerado enérgico e virtuoso, sabendo enfrentar com talento difíceis situações. A concordata de 1886 foi por ele superiormente orientada.

terminassem o curso com distinção. O seminário, que usufruía já de enorme notoriedade, atingiu então lugar de destaque a nível mundial. A igreja deste seminário foi dedicada a Santo Inácio de Loiola- fundador da ordem jesuíta.

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Uma das primeiras tipografais da Ásia foi aqui instituída, imprimindo algumas das valiosas obras, relativas ao cristianismo, publicadas neste continente na época. No ano de 1616 foi publicado o primeiro livro - Krista Purana “Discurso sobre a Vinda 9

de Jesus Cristo Nosso Salvador ao Mundo” a tradução do Evangelho para língua marata - idioma falado na costa ocidental da

Índia, por uma enorme parte da população, pertencente ao grupo de línguas indo-arianas - não poderemos deixar de salientar que o Seminário de Rachol foi pioneiro no estudo das línguas indianas - sendo em Goa e nos enclaves do Malabar que os Jesuítas atingiram maior relevo na divulgação da sua erudição. Na margem direita do rio Mandovi, acerca de duas léguas de Velha Goa, situava-se o Seminário de Chorão, do qual apenas subsistiam ruínas nos finais do século XIX. Era aí, nesse espaço, pelos anos de 1559, que se ensinava a ler, escrever e a doutrina 10

de Cristo a quatrocentos meninos, bem como a língua concani . Mais tarde teve a designação de Real Colégio de Educação de Chorão, no ano de 1565, os Jesuítas aí instalaram o Noviciado de São Paulo, assim funcionando até á abolição da Companhia

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de Jesus em Goa; segundo documentos coevos, o edifício era de enormes proporções em forma de quadrilátero com as suas 11

sessenta e cinco celas construídas para os noviços da Companhia de Jesus . Fernão Mendes Pinto, o chamado andarilho de Quinhentos, passou mais de duas ousadas décadas no Oriente. Esteve na costa oriental de África, na Índia, em Samatra, no Sião, na China, no Japão… e propôs-se narrar os episódios do que viajou e viu na sua original obra Peregrinação. Naufragou e esteve preso diversas vezes, tendo chegado a ser vendido como escravo, sendo rico e pobre… aqui, nestas remotas paragens conviveu com S. Francisco Xavier, que muito admirava e por quem se deixou influenciar, o que o levou a professar, tornando-se noviço no Seminário de Chorão. 9

Este livro foi escrito na língua falada em Goa, em forma poética, e era cantado pelo povo ao som do tamborim. O último livro a ser publicado em Rachol foi Regras da Companhia de Jesus em 1674. A imprensa permaneceu em Rachol até 1674. 10 O concani ou concanim, que os portugueses designavam por canarim, é uma língua indo-ariana falada na Índia. Foi o goês André Vaz de Carambolim que escreveu a primeira gramática de Concani no século XVI. 11 Cf. Abade Dinis L. Cotinaeu de Kloguen: Bosquejo Histórico de Goa, pp. 77 -125.


Goa Velha - Ruínas do Convento de S. Agostinho ÍNDIA no século XIX

Autor Atribuída a Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 021 Datação 1884 - 1894


Goa Velha - Ruínas do Seminário do Chorão ÍNDIA no século XIX

Autor Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 022 Datação 1891


no século XIX

Goa Velha - Ruínas do Arco da Conceição ÍNDIA

Autor Atribuída a Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 023 Datação 1891


Goa Velha - Ruínas do Convento do Carmo ÍNDIA no século XIX

Autor Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 024 Datação 1891


Goa Velha - Ruínas do Convento de S. Paulo ÍNDIA no século XIX

Autor Atribuída a Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 025 Datação 1884-1894


Goa Velha - Seminário de Rachol ÍNDIA no século XIX

Autor Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 026 Datação 1891


Goa Velha - Seminário de Rachol ÍNDIA (localização errada no original: Igreja do Convento de S. Francisco de Assis) no século XIX

Autor Atribuída a Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 027 Datação 1884-1894


Goa Velha - Convento de Jesus - Interior ÍNDIA (localização errada no original: Interior da Igreja do Convento de S. Francisco de Assis) no século XIX

Autor Atribuída a Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 028 Datação 1884-1894


no século XIX

Goa Velha - Túmulo de S. Francisco Xavier ÍNDIA

Autor Atribuída a Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 029 Datação 1884-1894


no século XIX

Goa Velha - Convento de Jesus - Túmulo de S. Francisco Xavier ÍNDIA

Autor Atribuída a Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 030 Datação 1884-1894


Goa Velha - P. Goa. Festa Gentilica ÍNDIA (localização errada no original: A festa decorre no templo de Manguesh, Mardol) no século XIX

Autor Atribuída a Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 031 Datação 1884-1894


Goa - Pagode de Noguen de S. Mardal ÍNDIA (localização errada no original: A festa decorre no templo de Manguesh, Mardol) no século XIX

Autor Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 032 Datação 1884-1894


Goa - Jardim do Radjah Sauntavalle ÍNDIA (O nome correcto do Rajá, de acordo com informação de Paulo Varela Gomes, será de Sawantwadi; de acordo com Aurobindo Xavier, trata-se de Soundekar Rajá, em português Rei de Sundem) no século XIX

Autor Atribuída a Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 033 Datação 1884-1894


Goa - Radjah de Sudem e suas Esposas ÍNDIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 034 Datação 1884-1894


Goa - Bicholim ÍNDIA no século XIX

Autor Souza & Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 035 Datação 1884-1894


Goa - Mormungão ÍNDIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 036 Datação 1884-1894


Goa - Porto Vasco da Gama - Mormungão ÍNDIA no século XIX

Autor Atribuída a Souza and Paul Técnica Albumina Inventário Cat. 037 Datação 1884-1894



no século XIX

BOMBAIM Manuela Vaquero

Quando no ano de 1509 os portugueses tiveram o primeiro contacto com Bombaim, este pedaço de terra, então um arquipélago formado por sete ilhas, com vestígios de civilização desde a Idade da Pedra, mais não era que um terreno pantanoso. As primeiras referências que temos relativas à ilha aparecem relacionadas com a história dos descobrimentos e conquistas remontando ao tempo do Vice-Rei D. Francisco de Almeida. Nos dias de hoje, é uma das maiores e mais importantes cidades da Índia, tendo-se desenvolvido muito com a colonização inglesa e principalmente a partir de 1869, com a abertura do Canal de Suez, que transformou Bombaim num dos maiores portos marítimos do Mar da Arábia. Ao contrário das outras colónias portuguesas na Índia, Bombaim não foi terra subjugada ou perdida para outros impérios, mas sim entregue aos ingleses no ano de 1665. Ao assinar-se, em 1661, o tratado entre Portugal e Inglaterra, para a celebração do casamento da princesa D. Catarina de Bragança, filha do rei D. João IV, com Carlos II de Inglaterra, Bombaim com todos os seus senhorios e pertenças fez parte do dote da princesa. A Índia era então governada por D. António de Melo e Castro, que discordou da cedência deste território e retardou a entrega que só se viria a efectuar no início de 1665. Embora esta parcela de solo nacional fosse exíguo na altura, mais tarde, veio a transformar-se na “Jóia da Coroa Britânica”. Situa-se na cidade de Bombaim o Mercado de Crawford, mandado construir no ano de 1868, por iniciativa de Artur Travers Crawford, e era, até há poucos anos, um dos mais movimentados de Bombaim. São de salientar várias curiosidades relativas a este mercado- todo o seu pavimento é feito em pedra Caithness de proveniência escocesa que, dadas as suas propriedades, lhe confere grande frescura; foi o primeiro edifício do país a ter luz eléctrica e são famosos os frisos que adornam as suas portas 1

Os frisos foram projectados por Lockwood Kipling, pai do célebre poeta Rudyard Kipling, nascido em Bombaim no ano de 1865, autor do “Livro da Selva” e prémio Nobel da literatura no ano de 1907.

principais1. Logo à entrada um aviso “é proibido cuspir ou fumar” e “é obrigatório entrar acompanhado por alguém credenciado”. Lá dentro vendem-se frutas, variadas, colorias e magnificamente expostas… vegetais, carnes, pássaros, frutos secos e as

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famosas especiarias. Esta amĂĄlgama de cores e odores atordoa os sentidos. “I'm in love with this country. I find heat and smells and oils and spices, and puffs of temple incense, and sweat and darkness, and dirt and cruelty, and above all, things wonderful and fascinating innumerable.â€? Rudyard Kipling

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1891 - Bonbay - 1891 - Vista Geral das Repartições Publicas ÍNDIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 043 Datação 1891


1891 - Bombaim - Mercado Crawford ÍNDIA no século XIX

Autor Não identificado Técnica Albumina Inventário Cat. 044 Datação 1891




no século XIX

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Figura 5 - Montagem da Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Fotografia: Paula Pinto | Museu de Lamego.


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Figura 6 - Montagem da Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Fotografia: Paula Pinto | Museu de Lamego.


no século XIX

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Figura 7 - Montagem da Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Fotografia: Paula Pinto | Museu de Lamego.


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Figura 8 - Montagem da Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Fotografia: Paula Pinto | Museu de Lamego.


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Figura 9 - Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Fotografia: José Pessoa | Museu de Lamego.


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Figura 10 - Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Fotografia: José Pessoa | Museu de Lamego.


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Figura 11 - Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Fotografia: José Pessoa | Museu de Lamego.


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Figura 12 - Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Fotografia: José Pessoa | Museu de Lamego.


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Figura 13 - Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Fotografia: José Pessoa | Museu de Lamego.


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Figuras 14 e 15 - Material de divulgação da Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Conceção: Luís Sebastian | Museu de Lamego.


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Figuras 16 e 17 - Material de divulgação da Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Conceção: Luís Sebastian | Museu de Lamego.


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Figura 18 - Material de divulgação da Exposição Viagem ao Oriente no Século XIX, no Arquivo-Museu Diocesano de Lamego. © Conceção: Luís Sebastian | Museu de Lamego.




no século XIX

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[Em]COMUM

Projeto

ARQUIVO MUSEU DIOCESE LAMEGO

Uma cidade. Dois museus

One city. Two museums


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