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Leia nesta edição Editorial pg. 2 Tema de capa Enquete Para quem vai o seu voto? pg. 3 Entrevistas pg. 6 a 30 Francisco de Oliveira: Oliveira: « Vou votar nulo como protesto » José Arthur Giannotti: Giannotti: Uma política soft

Luiz Werneck Vianna: Vianna: A política está viva Luiz Alberto Gómez de Souza: Souza: Com Lula, onde ele estiver Francisco Weffort: Weffort: « A corrupção aumentou e a transparência diminuiu » Ricardo Gebrim: Gebrim: A força do conservadorismo

Destaques da semana Entrevista da Semana Adélia Prado: Prado: Uma poeta cristã na arena ideológica pg. 32 Teologia Pública José Oscar Beozzo: Beozzo: Um olhar sobre o ecumenismo pg. 36 Filme da Semana O que você faria? pg. 40 Neusa Barbosa: Barbosa: Uma crítica à modernidade pg. 40 Deu nos jornais pg. 41 Frases da Semana pg. 44 Destaques OnOn-line pg. 45

IHU em revista Eventos pg. 48 Sala de Leitura pg. 63 IHU Repórter pg. 64

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A política ainda é relevante? A eleição presidencial Voto nulo. Abstenção. Voto de protesto na Heloísa Helena. Lula, Alckmin... enfim as eleições de outubro, querendo ou não, estão na boca do povo. Mas a política ainda é relevante? Chico de Oliveira recentemente constatou que a política se tornara irrelevante. Nesta edição, ele concede uma longa entrevista, juntamente com mais cinco intelectuais brasileiros, Luiz Werneck Vianna, Luiz Alberto Gómez de Souza, Francisco Weffort, José Arthur Giannotti e Ricardo Gebrim, o último pertencente ao movimento Consulta Popular, refletindo sobre o significado político das eleições presidenciais deste ano. Uma enquete, ainda que muito rápida, feita no Câmpus da Unisinos, manifesta um pouco do que vai pelas mentes e corações de muitos brasileiros e muitas brasileiras a menos de dois meses das eleições.

Aproximando-nos da realização do Seminário Internacional A globalização e os jesuítas. Origens, história e impactos nos dias 25 a 26 de setembro, aqui na Unisinos, na Faculdade Jesuíta de Teologia e Filosofia (FAJE) e na PUC-Rio, a página eletrônica do Instituto Humanitas Unisinos - IHU - começou a publicar, nesta última semana, uma série de entrevistas e artigos sobre alguns aspectos da trajetória da Companhia de Jesus nestes seus mais de quatro séculos de existência. Nesta semana, foram abordados aspectos da gesta de duas personalidades: Francisco Xavier e Matteo Ricci. Por sua vez, como pré-evento do Seminário Internacional, a Prof.ª Dr.ª Eliane Cristina D. Fleck, do PPG em História da Unisinos, falará, na próxima quintafeira, no IHU Idéias sobre o tema Sentir, adoecer e morrer - sensibilidade e IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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devoção no discurso missionário jesuítico do século XVII. Sobre o tema, ela escreveu um breve texto que publicamos nesta edição. Ainda esta semana, dois filmes serão exibidos e debatidos no IHU. O Sétimo

Selo, de Ingmar Bergman, que faz parte do II Ciclo Idade Média e Cinema, que será reprisado no Cinema e Saúde Coletiva. Coletiva Neste número, o Prof. Dr. José D’Assunção Barros, da UFRJ, comenta as características das representações da Idade Média no Cinema. Também será exibido e debatido o premiado filme (já conquistou 16 prêmios internacionais) Cidade Baixa, de Sérgio Machado. O filme da semana é El Método (O que você faria? é o título brasileiro) do argentino Marcelo Piñeyro. A idéia mestra do filme são os processos de seleção de pessoal para postos executivos que realizam as empresas transnacionais, como metáfora das relações de poder que se constituem na sociedade contemporânea e a particularidade dos vínculos que estas relações produzem entre os indivíduos. Sem dúvida, um grande filme. Imperdível! A todas e todos uma ótima semana e uma excelente leitura!

Para quem vai seu voto? Há um mês e meio das eleições no Brasil, abordamos na presente edição as diversas opções de voto e diversos olhares sobre o Brasil, seus desafios e possibilidades. Em primeiro lugar, uma rápida enquete no Câmpus da Unisinos sondou em quem as pessoas vão votar. Em segundo lugar, seis intelectuais brasileiros respondem as mesmas perguntas sobre a conjuntura nacional e sobre suas opções eleitorais. São eles: Francisco de Oliveira, José Arthur Giannotti, Luiz Werneck Vianna, Luiz Alberto Gómez de Souza, Francisco Weffort e Ricardo Gebrim. Confira abaixo as opiniões de funcionários (as), professores (as) e estudantes da Universidade, seguidas pela apresentação dos entrevistados e suas respectivas respostas às perguntas formuladas pela IHU On-Line, concedidas por e-mail ou telefone. Diversos alunos (as), professores (as) e funcionários (as) não quiseram registrar suas opiniões.

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“Eu vou votar em branco, em razão dessa sujeira que aparece na televisão”. Henrique, 24 anos, vendedor de doces coloniais, brique da Unisinos. “Vou votar no Lula, porque eu acho que é o melhor que tem”. Luiz Fernando Santos, 40 anos, agente de viagens, Carlson Wagonlit, Unisinos. “Poderei mudar ainda, mas no primeiro turno creio que vou de Heloísa Helena! Talvez vote nulo ou justifique no segundo turno” Gilberto Antônio Faggion, 40 anos, Prof. da Unidade Acadêmica de Ciências Econômicas, Unisinos “Vou votar nulo porque nenhum dos candidatos está me satisfazendo”. Janaína Costa, 24 anos, aluna da graduação em Fisioterapia, Unisinos. “Vou olhar o horário político, porque eu acho que está muito superficial ainda a campanha dos candidatos. Não acredito numa grande mudança por parte de qualquer candidato. O eleitor tem que ser mais consciente e não acreditar em milagres. Temos que ver a melhor proposta e mais realista com a situação que vivemos hoje”. Flávio Leopoldo Lara, 34 anos, aluno da graduação em Direito, Unisinos. “Vou votar na Heloísa Helena, para uma mulher mudar o País, porque os homens não fazem isso”. Greice Mônaco, 19 anos, funcionária, Coffee Station, Unisinos. “Vou votar no Lula para dar continuidade aos projetos de esquerda do Brasil. Espero que, de fato, ele os realize, depois desse processo que teve nos primeiros quatro anos, a mudança para a classe mais miserável desse país, para dar dignidade e cidadania”. Júlio César Oliveira, 35 anos, câmera, TV Unisinos. “Vou votar no Alckmin, porque até agora ele está demonstrando que é o candidato mais justo, mais certo. Estou indo por ele”. Cristiana, 30 anos, promotora de vendas, Banco Santander, Unisinos. “Não sei em quem vou votar, porque eu não vejo nenhum que vá realmente mudar, que tem como proposta a estrutura da democracia que nós vivemos que eu acho que é uma grande mentira. Estou pensando em votar nulo, mas também estou analisando quais são as conseqüências disso”. Rodrigo Lentz, 22 anos, integrante do DCE, aluno da graduação em Direito, Unisinos. “Votarei em branco, pois não acredito nos candidatos à Presidência”. Andréia, 21 anos, promotora de eventos, Banco Santander, Unisinos. “Penso, com bastante reflexão, votar em Heloísa Helena. Motivo: valorização da mulher, ainda considerada por muitos somente dona-de-casa. Tenho notado em meu trabalho de Orientação Vocacional, o grande número de adolescentes femininas com grande capacidade administrativa e com interesses e valores humanos, de autenticidade, confiança, coragem e idealismo. Posso, portanto, confiar na atuação de Heloísa Helena IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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como líder nesses e em outros interesses e valores indispensáveis para o importante cargo de presidente do Brasil”. Prof. Dr. Armando Marocco, 84 anos, núcleo de orientação educacional, Unisinos. “Vou votar no Lula por ser a única opção que nós temos”. Elton, 40 anos, auxiliar de limpeza, Dalkia, Unisinos. “Ainda não tenho uma decisão formada, mas a princípio acho que vou votar no Alckmin, porque o Lula não dá mais”. Clara, 23 anos, promotora de vendas, Banco Santander “Hoje não tem um candidato que fale a verdade, que fale pela gente. Não dá para acreditar em nada do que eles dizem. Por isso, eu não tenho candidato. Estou desiludida com a política”. Jandira Margarete Schneider, 46 anos, proprietária da loja Unishop, Unisinos. “Penso em votar Alckmin, porque o Lula não fez um governo decente, foi um governo de ladrões. Ele agora está sem partido, está governando sozinho. Se ele se reeleger vai continuar esse governo de picaretas, um desastre. O PT já não é o PT, e o Lula não governa pelo PT. É melhor não deixar ele roubar mais”. Prof. Dr. Álvaro Luiz Montenegro Valls, 59 anos, professor da graduação e pós-graduação em Filosofia, Unisinos. “Não tenho nenhum candidato definido até agora. O que mais me agradou até o momento é a Heloísa Helena. Na última eleição, eu votei no PT, mas não vou votar de novo. Em razão dos acontecimentos nos quatro anos de governo. Corrupção, falcatruas, sem tomar nenhuma providência, e sim abafando. Fiquei desgostoso com o governo Lula. Tinha mais esperança”. Jacinto Schneider, 48 anos, gerente administrativo, Instituto Humanitas Unisinos.

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O debate eleitoral e a conjuntura nacional Conheça os seis intelectuais que participam na presente edição, debatendo o cenário político eleitoral.

Francisco de Oliveira: “Vou votar nulo como protesto” Para o sociólogo Francisco de Oliveira, o “voto nulo é um voto válido”, que expressa a discordância do eleitor com relação aos candidatos apresentados. Assim, Chico de Oliveira, como é mais conhecido e faz questão de ser chamado, declarou à IHU OnOn-Line que votará em Heloísa Helena no primeiro turno e, como sabe que ela não chegará ao segundo turno, nessa etapa votará nulo como forma de protesto. Outra de suas declarações na entrevista que

On--Line, foi que há um predomínio maléfico da concedeu por telefone à IHU On economia sobre a política. “Existe uma colonização da política pela economia”, sentencia. Outra inversão seria a submissão da política à mídia, inclusive nos tempos destinados à propaganda eleitoral: “Tudo é cronometrado e regulado por regras que são, originariamente, do mercado, e não da política”. E quem seriam os beneficiados pelo atual governo? Os banqueiros, sem dúvida, disse. Chico de Oliveira é professor titular da Universidade de São Paulo (USP) e autor de vários livros, entre eles, Crítica à razão dualista. O ornitorrinco. São Paulo: Boitempo, 2003 e de vários estudos. Foi um dos fundadores do PT, com o qual rompeu em 2003, por discordar dos rumos adotados pelo governo Lula. Em 2004, contribuiu com a formação do Partido Socialismo e Liberdade – PSOL. O sociólogo já concedeu

On--Line. A última delas, no dia 6 de abril deste ano, várias entrevistas à revista IHU On foi republicada na série Cadernos IHU em Formação - ano 2 – nº 9 - 2006 - Política

Econômica. É Possível mudá-la? Chico de Oliveira esteve na Unisinos em 17 de outubro de 2003, quando participou do Ciclo de Estudos sobre o Brasil.

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José José Arthur Giannotti: uma política soft “Houve uma mudança essencial no que diz respeito à política, não é mais a política clássica dos grandes embates, mas é uma política soft em que se trabalha na margem”. Essa opinião é do filósofo José Arthur Giannotti. Para ele o erro nesta política

soft ainda não foi suficientemente percebido. Giannotti, da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP) e membro fundador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). É livre docente pela USP, pós-doutor pela Universidade de Paris XI, França e doutor em Filosofia pela USP com a tese intitutulada John Stuart Mill: o psicologismo e a fundamentação lógica. Entre suas últimas obras, destacamos: Ma Marx rx vida & obra. Porto Alegre, RS: L&PM Editores, 2000; Certa herança marxista. São Paulo: Companhia das Letras, 2000 e O jogo do belo e do feio. São Paulo: Companhia das Letras, 2005. A breve entrevista que publicamos na presente edição, foi concedida pelo prof. Giannotti à IHU On On--Line por telefone.

Luiz Werneck Vianna: A política está viva A afirmação do cientista social Luiz Werneck Vianna, em entrevista exclusiva por telefone à IHU On On--Line, contradiz diversos intelectuais e movimentos brasileiros que decretam a morte da política. Em sua opinião, é preciso enfrentar as dificuldades do sistema democrático representativo e procurar “novas possibilidades de inscrição na esfera pública”. Ele salienta a importância dos intelectuais no papel de discussão da situação política, enfrentando o desafio e convidando a sociedade a recomeçar. “Temos que fazer política de um jeito inovador em relação ao jeito clássico de apenas nos determos na estrutura partidária, no voto e ponto final. Há outras formas de pensarmos a soberania, generalizando-a, tornando-a mais complexa, abrindo oportunidade para que a sociedade intervenha, participe, se mobilize”.

Werneck Vianna é professor pesquisador do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj). Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo, Werneck Vianna é autor de, entre outros, A Revolução Passiva: Iberismo e Americanismo no Brasil. Brasil Rio de Janeiro: Revan, 1997; A Judicialização da Política e

das Relações Sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Revan, 1999 e Democracia e os três On--Line poderes no Brasil. Belo Horizonte: UFMG, 2002. De Werneck Vianna, IHU On publicou uma entrevista na 44ª edição, de 25 de novembro de 2002. IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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Luiz Alberto Gómez de Souza: Com Lula, onde ele estiver O povo pobre saiu beneficiado do atual governo, garante o sociólogo Luiz Alberto Gómez de Souza em entrevista por e-mail à IHU On On--

Line. Gómez gostaria que os poderosos saíssem prejudicados do atual governo, "mas a falta de mudanças nas políticas econômicas o tem impedido”, completou. Gómez de Souza é doutor em Sociologia pela Universidade de Paris e mestre em Ciências Políticas pela Escola Latino-Americana de Ciência Política da Flacso, de Santiago do Chile. É autor de A JUC JUC:: os

estudantes católicos e a política. Petrópolis, Vozes, 1984 e A utopia surgindo no meio de nós. Rio de Janeiro: Mauad, 2003. Na edição 46, de 9 de dezembro de 2002, Gómez de Souza falou à IHU On On--Line sobre a pessoa e o pensamento de Ivan Illich sob o título Ele nos abriu grandes horizontes.

Francisco Weffort: “A corrupção aumentou e a transparência diminuiu” A constatação acima é de Francisco Weffort, em entrevista por e-mail à IHU On On--Line. Segundo ele, alguns partidos que se tinha como sérios, como PT, deixaram de sê-lo. Os debates de grande alcance nacional desapareceram do cenário. “Na ditadura tínhamos, pelo menos, o grande projeto de reconstruir a democracia, o que em alguma medida se conseguiu. Mas desapareceu do horizonte o debate econômico e social, ficando todos amarrados ao chamado superávit fiscal”. Os beneficiados com o governo Lula são os banqueiros, e os prejudicados constituem a maioria da população. Weffort é decano do Instituto de Estudos Políticos e Sociais (IEPES). É doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo e ex-ministro da Cultura do governo Fernando Henrique Cardoso. Escreveu Populismo y marginalidad em America

Latina. San José, Costa Rica: EDUCA, 1974; Por que democracia? 4. ed. São Paulo: Brasiliense, 1984 e Qual democracia. 4. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.

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Ricardo Gebrim: a força do conservadorismo Por e-mail, o advogado Ricardo Gebrim disse à IHU On On--Line que estamos vivendo anos de reação neoliberal “ainda que se percebam sinais de mudança no horizonte, a força do conservadorismo é imensa”, completa. Gebrim é coordenador nacional do Movimento Consulta Popular (MCP), que realizou recentemente a sua primeira Plenária Nacional, com a participação de representantes de vários estados. O movimento político, criado em 1997, tem como eixo central a construção de um Projeto Popular para o Brasil. Hoje presidente do Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo, Gebrim foi presidente do Diretório Central dos Estudantes (DCE Livre da PUC) em 1980 e militante da Solidariedade com a Revolução Nicaragüense. De 1988 a 1991, foi assessor jurídico da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Reproduzimos uma entrevista com Gebrim nas Notícias Diárias da página do IHU do dia 9-8-2006.

IHU On-Line – Alguns intelectuais descrevem a realidade como um esgotamento da política. Qual é sua opinião a respeito? A política foi colonizada pela economia Francisco de Oliveira – Não se trata propriamente de um esgotamento, mas neste ciclo histórico existe uma colonização da política pela economia. A economia está tomando o lugar da política. Empresas fazem política, criam institutos de ação cultural, a economia rege toda a política, quando deveria ser o contrário. À política os cidadãos têm acesso pelo voto nas eleições. O cidadão tem acesso à economia apenas como empregado ou consumidor. Há uma inversão e ela é devastadora para a democracia e sobretudo para um país como o Brasil, tão desigual, que precisa de políticas que não sigam as orientações do mercado. A política não é mais central. Quem é central é a economia. Essa é a tragédia. A economia é o domínio dos interesses privados, e a política deveria ser o domínio dos interesses públicos. À medida que a economia toma o lugar da política, há um curto-circuito e a cidadania não tem mais nada o que fazer. Você não pode intervir em uma empresa, mas na política você pode. Então, o grande trauma, e isso é geral no Ocidente e no Oriente, mas agora falamos especificamente do Brasil, para uma sociedade que depende tanto da política, é essa inversão. Se fôssemos seguir as orientações do mercado e o domínio da economia, a maior parte das grandes iniciativas modernizadoras do Brasil não teriam ocorrido, simplesmente porque o mercado não as sancionava. Hoje se

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comemora muito Juscelino1. Ele realizou coisas que, à época, faziam a imprensa chamá-lo de lunático. Hoje, todos glorificam Juscelino, até o presidente FHC e Lula “posam” de Juscelino. Se Juscelino tivesse bom-senso como Lula quer ter, não teria realizado nada. Foram decisões políticas que orientaram a economia, e não o contrário.

José Arthur Giannotti – Venho tentando um diálogo com o Chico Oliveira, que tem sido um dos grandes paladinos desta idéia. Em primeiro lugar, houve, sim, uma mudança essencial no que diz respeito à política, não é mais a política clássica dos grandes embates, mas é uma política soft em que se trabalha na margem. E a importância dela ainda é grande, é só perceber o que significa um erro nesta política soft. Veja o que tem acontecido no Oriente Médio ou em determinados estados brasileiros cujos resultados são pífios. Não é à toa, por exemplo, que até agora se tem errado sistematicamente na reforma universitária. Na verdade, transformaram-se as formas de fazer política.

Luiz Werneck Vianna – Não concordo. O que está havendo é uma crise do sistema de representação. Essa crise, como se constata, é universal, geral, não existe apenas no Brasil. Aqui ela está agravada por defeitos que têm esvaziado os partidos, que têm feito o homem comum desconfiar da vida política, da esfera pública. Isso qualifica a crise da representação no Brasil. Agora, a política está viva em toda a parte e assume feições particulares. No Oriente Médio, ela se manifesta nas questões identitária, religiosa, nacional, encontra pressões de resistência armada. Na África, a política tem outras conotações. Na América Latina, pode-se dizer que, depois da redemocratização do subcontinente, nós não temos sido capazes de encontrar formas mais generosas de inclusão do homem comum na vida pública, política. Tomemos o exemplo da Bolívia. Podemos dizer que, na Bolívia, se vive um esgotamento da política? A Bolívia está inteiramente mobilizada politicamente! A Venezuela, da mesma forma, e o Uruguai tem feito avanços na política. No Brasil, registram-se também avanços. Aqui, entretanto, não há dúvidas que houve uma desesperança muito grande porque da política saiu uma proposta de mudanças, reformas, que foi o Presidente Lula, em 2002, que culminou com a política fraca, de continuidade da administração da crise da burguesia brasileira. A estatização das ONGs Por sua vez, a vida associativa não tem feito outra coisa senão se expandir, inclusive no nosso país. As ONGs são testemunhas disso. Não adianta desqualificar as ONGs, elas são um fenômeno novo, que ainda precisa amadurecer, e amadurecerão melhor se tomarem distância do Estado. Está havendo uma estatização das ONGs, que é muito prejudicial. O fato de os partidos hoje não estarem colocados de forma a ouvir melhor, expressar melhor as demandas, as expectativas os anseios da vida popular, não quer dizer que isso não possa aparecer mais à frente. Veja o PSOL. Eu não guardo afinidade nenhuma com o programa do PSOL. É um partido que nasceu “ontem”. Sua candidata à presidente da República tem 15% dos votos, isso é sinal de que está

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Juscelino Kubitschek de Oliveira (1902-1976): médico e político brasileiro, conhecido como JK.Foi presidente do Brasil entre 1956 e 1961, sendo o responsável pela construção de Brasília, a nova capital federal. Sobre JK, confira a edição 166, de 28 de novembro de 2005, A imaginação no poder. JK, 50 anos depois, disponível para download na página do IHU, www.unisinos.br/ihu. (Nota da IHU On On--Line)

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aparecendo uma vivacidade, uma proposta viva, embora não muito consistente, mas que tem recebido audiência. Pensemos agora na União Européia. Ela é um fato político de expressão mundial. Ela é filha da situação dos mercados, mas não é pura expressão da vida mercantil européia. É um projeto político que, para se definir e avançar melhor, passa pela política, por uma constituição européia, por um parlamento europeu, por partidos europeus. Essa é uma operação que se torna complexa, porque o âmbito deixa de ser, puramente, o de estados-nação e passa a ser, crescentemente, ações visando à nova cena mundial. É onde os principais dramas da vida contemporânea estão situados. É só ver o que ocorre no Oriente Médio. Não é um problema referente apenas àquele umbigo do mundo. Essa é uma questão geral, que mexe com todos nós, com a vida de todos na sociedade. Acho, então, que temos que enfrentar a dificuldade de perceber a política apenas como filha do sistema da representação e encontrar outros pólos, que envolvam a vida associativa e descubram para ela novas possibilidades de inscrição na esfera pública. Novas arenas políticas Um mecanismo interessante para o qual não se chama muito a atenção é esse que o Direito e as instituições modernas do Direito têm criado no sentido de favorecer a criação e instituição de novas arenas para a deliberação e para a decisão do público. Pensemos, por exemplo, nas ações civis públicas, nos juizados especiais que podem se constituir perfeitamente em micro lugares de decisão e deliberação. Se só pensarmos a política referida ao tema imediato do poder, e, sobretudo se olharmos isso na chave de sua representação, aí não há como resistir à idéia de que algo vai muito mal. Se mudar a percepção, vê-se que há vida. Fala-se que chegamos ao fim da História, que o império americano estabeleceu já sua paz e que o mundo encontrou sua estabilização com base nesse vértice, escorado no poder político, diplomático, econômico e, sobretudo, militar, mas isso não corresponde com o que se viu agora no Líbano e no Iraque. A China não faz parte da cena política mundial? A China aponta para qual direção? Para uma intervenção política de uma potência emergente no mundo contemporâneo que está focada no sentido de se contrapor ao império. A União Européia, do seu jeito, também se contrapõe. O mundo do Oriente Médio, a América Latina, também. Mas é uma luta que assume uma sofisticação e uma complexidade inéditas.

A política deve ser integrada num contexto maior

Luiz Alberto Gómez de Souza – No meu livro A utopia surgindo no meio de nós (Mauad, 2003) indico que vivemos um tempo de crise de civilização e de profundas mutações sociais, numa transição de um período histórico a outro, no que Braudel2 chama de crise secular de transição. O centro do processo é a sociedade. O mito da transformação revolucionária de cima para baixo, a partir do estado, vem da revolução francesa e se esgotou quando Leningrado voltou a

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Fernand Braudel (1902 – 1985): historiador francês e um dos mais importantes representantes da Escola dos Annales. Em 1949 se torna professor do “Collège de France” e de diretor do Centro de Pesquisas Históricas da “École des Hautes Études”, uma organização não governamental ligada à pesquisa e desenvolvimento das Ciências Humanas. (Nota IHU On On--Line) IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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ser São Petersburgo. Com o Betinho3 fiz o que ele chamou de “opção pela sociedade” e ali estão os atores principais, especialmente nos movimentos sociais. Os Fóruns Sociais o demonstraram à saciedade. O que não quer dizer que a política, os partidos e as eleições não sejam necessários. Quem sofreu com a ditadura não tem direito de esquecer. No entanto, a política deve ser integrada num contexto maior.

Francisco Weffort – Eu não falaria de esgotamento, mas de enfraquecimento e de confusão. Isso resulta de condições gerais do mundo, por exemplo, a globalização financeira que debilita a capacidade de ação do Estado na economia. E resulta também de condições internas, por exemplo, o sistema proporcional que se adota no País e que enfraquece os partidos em geral e favorece a multiplicação dos partidos de aluguel. Este sistema proporcional nasceu depois da Revolução de 304 e dos escândalos das atas falsas da República Velha, de uma justa preocupação democrática em garantir a possibilidade de minorias. No Brasil de hoje, tipicamente uma sociedade de massas, o sistema se esgotou e precisa de reformas urgentes. A luta eleitoral converteu-se numa armadilha para grande parte da esquerda

Ricardo Gebrim – Não considero apropriado falar que toda a ação política se tornou irrelevante, e sim que a política institucional, blindada e desprovida de poderes, tornou-se impotente. Pode parecer o mesmo, mas é bem diferente. Estamos assistindo à crise estrutural das condições que possibilitaram, momentaneamente, o desenvolvimento do capitalismo num marco de democracia política. De um lado, as grandes decisões estratégicas da economia são retiradas do Estado, que cada vez decide menos no que importa; de outro lado, cresce a necessidade de fortalecer o aspecto repressivo. Gradativamente a função policial vai ocupando o centro do Estado brasileiro, impulsionada pelo terrorismo dos meios de comunicação. Nesta eleição, estaremos votando nos administradores de um Estado que cada vez menos pode decidir sobre o que importa realmente para o nosso povo, mas que tem o papel de administrar uma crescente máquina policial. Nossas eleições somente permitem a alternância 3

Herbert José de Souza (1935 – 1997): conhecido como Betinho, foi sociólogo e ativista dos direitos humanos brasileiro; concebeu e dedicou-se ao projeto Ação da Cidadania contra a Miséria e Pela Vida. Em 1986 Betinho descobriu ter contraído o vírus da aids em uma das transfusões de sangue a que era obrigado a se submeter periodicamente devido à hemofilia. Em sua vida pública esse fato repercutiu na criação de movimentos de defesa dos direitos dos portadores do vírus. Mas o projeto pelo qual se imortalizou foi, provavelmente, a Ação da Cidadania contra a Miséria e Pela Vida, movimento em favor dos pobres e excluídos. (Nota IHU On On--Line) 4

Revolução de 30: 30 movimento armado iniciado a 3 de outubro de 1930 que culminou com a deposição do presidente Washington Luís em 24 daquele mês. Em 1º de março de 1930 houve eleições para presidente da República que deram a vitória ao candidato governista Júlio Prestes, que não tomou posse e foi exilado.Getúlio Vargas assumiu a chefia do "governo provisório" em 3 de novembro de 1930, data que marca o fim da República Velha. (Nota IHU On On--Line)

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“democrática” entre líderes e partidos que se submetem às regras do projeto neoliberal. As margens de decisão política são cada vez mais estreitas e podem ser exercidas somente se não afetarem as bases determinantes da política e da economia. A monitoração externa dos atos de governo tornou-se rotina e os centros decisórios mais importantes têm sido colocados à margem de qualquer controle social. Nenhum contrato firmado nos marcos do neoliberalismo pode ser alterado. Isso é democracia? Estamos às vésperas de eleições gerais para os principais postos da República. Qual é a empolgação que vemos nas ruas? A percepção geral é que será apenas o momento de escolher quem vai fazer mais do mesmo. Nosso desafio é resgatar a possibilidade de ação política fora desta lógica da disputa eleitoral de governos. A luta eleitoral converteu-se numa armadilha para grande parte da esquerda. O que era um meio tornou-se um fim em si mesmo. A agenda de uma parte da esquerda se limitou à preparação das eleições. Essa é a lógica que queremos mudar. Queremos contribuir para formar uma geração disposta a enfrentar os desafios da transformação de nosso país, com tudo que isso implica, e não de pequenos “políticos” que enxergam cada jovem militante como um potencial cabo eleitoral para seu projeto pessoal. Nossa preocupação central deve estar direcionada para a construção de um ator coletivo, consciente dos limites do sistema representativo da democracia representativa formal, comprometido com a construção de um Projeto Popular para o Brasil.

IHU On-Line – Quem sai beneficiado e quem sai prejudicado do atual governo? Francisco de Oliveira – Sem dúvida nenhuma, beneficia-se a classe dos banqueiros. Basta ver o que se paga de juros da dívida interna. Neste mês, nesta semana inclusive, os jornais noticiaram o tamanho do lucro dos grandes bancos. O Banco do Brasil tem o maior lucro de todos, seguido do Bradesco e do Itaú. Se observarmos do que se compõe o lucro desses três grandes bancos, veremos que, na maior parte dos casos, é de juros da dívida pública. Pagam-se R$ 170 bilhões de juros da dívida pública, e o grande programa social do governo Lula, que é o Bolsa Família, não gasta R$ 10 bilhões. É a proporção de um para 17. Não há dúvida, portanto, de que quem se beneficia e quem se prejudica com essa política econômica.

José Arthur Giannotti – Ainda é muito difícil fazer uma avaliação sob este aspecto porque não creio que o atual governo tenha acabado. Há chances de Lula ser reeleito. Acho que há certa vantagem para todos nós. Temos uma política econômica, que é, mais ou menos, a mesma, há 14 anos. Mesmo que não estejamos de acordo com ela, desde o momento que o FHC assumiu o Ministério da Fazenda até agora, a linha econômica tem sido a mesma, o que tem dado à economia brasileira uma certa estabilidade. Ninguém está dizendo que essa política não tenha se esgotado, pelo contrário, acho que ela se esgotou há muito tempo, que são necessárias reformas profundas, mas o fato de haver esta estabilidade é importante para o Brasil. É verdade que nosso crescimento tem sido um dos piores do mundo, mas, em compensação, tem havido crescimento sem grandes traumas.

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Não há um projeto Brasil

Luiz Werneck Vianna – Os muito grandes e os muito pequenos se beneficiaram. O sistema financeiro vai muito bem. A política do Bolsa Família veio atender a uma parte da população que estava inteiramente à margem. Não há como recusar que muito em cima e muito embaixo há atendimento de expectativas, mas não há projeto de Brasil. Essa política vem configurando-se, tornando-se caso de um “suave fracasso” contra todos os sonhos e expectativas das gerações anteriores que pensaram em dar ao Brasil um dinamismo, uma energia, que foi a vaga da industrialização, a vaga do Oeste com Brasília e Juscelino, a modernização econômica. Esse grande impulso que sempre passou por um projeto estratégico de país, onde o Estado, a dimensão pública era central, hoje está desfocado. Temos atendimento do mercado de um lado, dos interesses da grande banca, a volúpia da estabilização a todo preço, e essa política neoliberal de assistencialismo para os excluídos, que não altera nada de sua posição no mundo. Não se dá a vara para que essas pessoas pesquem, e sim o peixe já pescado, o que me parece formar uma política de clientela romana, degradada, no pior sentido. Vejo que também se pensa o Brasil como se aqui tivéssemos atingindo o limiar do fim da História do País, estabilizamo-nos, chegamos a uma estabilidade na qual nada se mexe, tudo se conserva, e o potencial de energias que o país tem para mudar, pôr-se no mundo de um modo diverso, não vem sendo reverenciado, ouvido. Minha avaliação geral em relação a esse governo é de que ele não foi nenhuma tragédia, nem uma catástrofe, mas manteve o país desanimado, não ativou suas crenças, não foi capaz de mobilizar a população.

Luiz Alberto Gómez de Souza – O povo pobre sai beneficiado do atual governo com as políticas sociais, e ele sabe disso; a prova são as sondagens de opinião. O curioso é que as classes médias também compram mais e viajam mais, mas suas viseiras ideológicas e um certo moralismo “udenista5” impedem de ver isso. Gostaria que os poderosos estivessem saindo prejudicados, mas a falta de mudanças nas políticas econômicas o tem impedido.

Francisco Weffort – Os grandes beneficiários são os banqueiros. Os pequenos beneficiários, na verdade mínimos, são os mais pobres entre os pobres, os protegidos pelo assistencialismo do Estado. Os prejudicados são todos os demais, ou seja, a maioria da população.

Ricardo Gebrim – A característica principal do atual governo foi ter implementado o projeto liberal em ritmo mais lento, sem a voracidade do governo anterior. Isso é melhor para os interesses populares? Colocado nestes termos claro que sim. O trágico é o rebaixamento de nosso horizonte de transformação para aceitar isso como um mal menor. Preferimos ser estrangulados aos poucos que de uma vez. É essa opção política que devemos 5

Udenista: Udenista referente à UDN (União Democrática Nacional): foi um partido político brasileiro fundado em 7 de abril de 1945, frontalmente opositor às políticas e à figura de Getúlio Vargas e de orientação liberal. Seu principal rival nas urnas era o Partido Social Democrático. Até as eleições parlamentares de 1962 a UDN era a segunda maior bancada do Congresso Nacional, atrás apenas da bancada pessedista. Neste ano, o Partido Trabalhista Brasileiro roubou este segundo lugar da UDN. Como todos os demais partidos, a UDN foi extinta pelo governo militar que assumiu o poder em 1964. (Nota IHU On On--Line) IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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propagandear? esperanças?

Este é o caminho em que depositaremos novamente as

IHU On-Line – Mudaram as formas de fazer política? Quais são as diferenças com relação às últimas décadas? Tudo é cronometrado pelas regras do mercado

Francisco de Oliveira – As diferenças são enormes, basta ver a influência da mídia sobre a política, que é notável. Basta ver, ainda, a desigualdade com que entram os candidatos para concorrer ao voto dos cidadãos. Tudo é cronometrado e regulado por regras que são, originariamente, do mercado, e não da política. Partidos que têm vários deputados, têm mais tempo, e partidos que têm poucos deputados, têm esse tempo reduzido. Isso é uma regra da economia aplicada à política. Numa democracia, isso não poderia existir. Se o Tribunal Eleitoral acolheu as candidaturas, é porque ele julga que esses candidatos têm capacidade, estão aptos a disputar o voto da cidadania. Então, repartição de tempo da televisão, que é uma concessão pública, deveria ser de outra forma. Mas não. Até a repartição do tempo na televisão depende de critérios de mercado. É como se a política fosse um mercado. Esse é um dos exemplos de como mudaram as formas de se fazer política.

Luiz Werneck Vianna – Ainda não se encontrou, por mais que a democracia representativa esteja em crise, nada que a substitua. Devemos animar formas e fórmulas de democracia participativa, direta, algumas previstas na constituição, outras embutidas nesses novos institutos trazidos pelas inovações do mundo do Direito (ação popular, ação civil pública e outras) pela nova presença do Ministério Público e de sua articulação com as demandas sociais, como ocorre especialmente no meio ambiente. Outro tema importante está na saúde, na presença do Judiciário nessa questão, e muito substancialmente, como sabemos, no direito do consumidor. Por aí, há formas de ação contra as empresas e contra o Estado que também mobilizam a cidadania, além das formas que se assentam sobre uma ativação da cidadania nos orçamentos, na discussão do processo orçamentário em todos os níveis da federação. Temos que fazer política de um jeito inovador com relação ao jeito clássico de apenas nos determos na estrutura partidária, no voto e ponto final. Há outras formas de pensarmos a soberania, generalizando-a, tornando-a mais complexa, abrindo oportunidade para que a sociedade intervenha, participe, se mobilize. Para isso, evidentemente, a ativação de uma agenda pedagógica, cívica, se faz necessária. Aqui e no mundo todo.

Democracia participativa

Luiz Alberto Gómez de Souza – Voltando ao primeiro ponto, mudaram as formas de fazer política e experiências como o orçamento participativo são um exemplo. A corrupção que corroeu todos, e insisto, todos os partidos, vai obrigar a repensar o que é participação cidadã. Seremos capazes de fazer uma faxina cívica e levar a desaparecer pelo voto os corruptos, que estão gastando fortunas IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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em propagandas mentirosas? Há muito que inventar numa democracia participativa e não somente representativa.

Amarrados ao superávit fiscal

Francisco Weffort – Mudaram para pior. A corrupção aumentou, e a transparência diminuiu. Alguns partidos que se tinha como sérios, como PT, deixaram de sê-lo. Os debates de grande alcance nacional desapareceram do cenário. Na ditadura, tínhamos, pelo menos, o grande projeto de reconstruir a democracia, o que em alguma medida se conseguiu. Mas desapareceu do horizonte o debate econômico e social, ficando todos amarrados ao chamado superávit fiscal. Militantes especializados em gerir conflitos sociais

Ricardo Gebrim – O fim da experiência socialista soviética, gerando o chamado mundo unipolar e possibilitando essa fase neoliberal do capitalismo, tornou desnecessária para os Estados Unidos as ditaduras militares em nosso continente. O processo de dominação imperialista sobre os nossos países passou a dar-se em torno de três eixos centrais. No eixo político, político a afirmação das “democracias representativas” formais como única forma de governo legítima em nosso continente. No eixo econômico, econômico por meio da estratégia configurada pela proposta da ALCA, que envolve acordos bilaterais e sub-regionais e articulações na OMC. No eixo militar, militar pela ampliação substancial da presença por meio das bases militares e do controle das forças armadas de cada país. Diante desta correlação de forças, o processo eleitoral converteu-se numa prioridade para a esquerda em nosso continente. Essa centralidade na luta eleitoral determinou profundas mudanças entre as organizações de esquerda que apostaram nesta tática nos últimos 20 anos. Todas as tentativas de implementar uma estratégia combinada entre a ação institucional e as organizações populares não se consumaram e apenas cumpriram o papel de cooptação e aperfeiçoamento da eficiência do sistema. Formou-se uma geração militante especializada em técnicas de gerenciamento dos conflitos sociais, sem qualquer perspectiva transformadora que contemple rupturas ou alterações estruturais. No sistema político brasileiro, as regras eleitorais reforçam essa dinâmica com o voto em candidatos e não em partidos, dotando cada parlamentar de uma máquina administrativa - assessores, recursos e carro - que o fortalecem na estrutura interna do partido político, transformando gradativamente os projetos coletivos em pessoais. Como resultado deste ciclo político, pouco se acumulou na elevação do nível de consciência do povo e auto-organização popular, fortalecendo as concepções reformistas e o abandono da estratégia revolucionária. O que estamos assistindo é o esgotamento deste ciclo e a possibilidade de iniciarmos um novo período histórico das lutas populares.

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On-Line

– Quais são as reais conseqüências da globalização do capital sobre a forma de governar o Brasil? É possível não governar a partir do mercado e dos grandes interesses especulativos?

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O Brasil perdeu a autonomia e a soberania

Francisco de Oliveira – Para isso é preciso operar rupturas, porque o País está completamente submetido, não tem mais autonomia. Se mexer na moeda, no câmbio, o Fundo Monetário Internacional (FMI) “vem para cima”. Se mexer em subsídios para empresas nacionais, a Organização Mundial do Comércio (OMC), “vem para cima”. É tudo regrado, regulado e constrangido, e os países como o Brasil perdem a soberania e a autonomia. Essa é a conseqüência mais nefasta da globalização. A colonização da política é outra conseqüência da globalização. Tem que se obedecer aos constrangimentos do mercado. Então, os governantes são eleitos para não governarem. É um papel figurativo. Veja a entrevista que Olavo Setúbal, banqueiro, e portanto “insuspeito”, líder do terceiro maior banco brasileiro, o Itaú, deu à Folha de São Paulo6. Sobre os dois principais candidatos à Presidência, ele diz que são conservadores. Ele, um banqueiro, está dizendo que Alckmin e Lula são conservadores... Os grandes empresários estão “pouco se lixando”. Colocam dinheiro na campanha de um, de outro. Ganhe quem ganhar, eles sabem que será controlado, que terão apoio. Nada será ameaçado. E uma política que não ameaça a economia, que não faz balançar a economia, que não faz os empresários mudarem de decisões por causa dos resultados políticos, não vale nada, perdeu sua eficácia, seu papel na sociedade. É hora de os intelectuais olharem para o mundo

Luiz Werneck Vianna – Desobedecendo voluntariamente? Acho que não temos força para isso. O mundo é o mundo, e temos que nos curvar a processos que se impõem com a força de acontecimentos naturais à nossa vontade, o que não quer dizer que eles não sejam partilhas de intervenção do ator. O que eu penso é que o ator na vida republicana brasileira recuou. Ele parecia ser muito buliçoso com o PT, Lula, e isso se mostrou irreal, porque esse partido e seu governo se aquietaram, adaptaram-se às circunstâncias existentes em nosso país. Deixaram de resistir a elas. Creio que resistir de forma radical não era possível. Entre o que está aí e o que poderia fazer, há mil e uma possibilidades, oportunidades de intervenção. O que o mundo mostra é que a vontade das pessoas atua no sentido de mudar o curso dos acontecimentos. Não tenho nenhuma simpatia pelos sunitas do Iraque, mas não posso deixar de constatar que a vontade deles é que tem feito a dominação americana se tornar um desastre político e militar naquele país. O ator é sempre muito importante. E mais. Nessa hora, inclusive referindo-me à obra de um grande pensador contemporâneo, Habermas7, acho que essa é a hora que demanda a intervenção 6

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Olavo Setúbal: banqueiro brasileiro, dono do Itaú. As Notícias Diárias do sítio www.unisinos.br/ihu reproduziram em 13-08-06 a entrevista “Não tem diferença do ponto de vista do modelo econômico. Eu acho que a eleição do Lula ou do Alckmin é igual”, origialmente publicada pela Folha de São Paulo nessa mesma data. Jürgen Habermas (1929): filósofo alemão,, principal estudioso da segunda geração da Escola de Frankfurt. Herdando as discussões da Escola de Frankfurt, Habermas aponta a ação comunicativa como superação da razão iluminista transformada num novo mito que encobre a dominação burguesa (razão instrumental). Para ele, o logos deve contruir-se pela troca de idéias, opiniões e informações entre os sujeitos históricos estabelecendo o diálogo. Seus estudos voltam-se para o conhecimento e a ética. Sua tese para explicar a produção de saber humano recorre ao evolucionismo de Charles Darwin. Segundo Habermas, a fabilidade possibilita desenvolver capacidades mais complexas de conhecer a realidade. Evolui-se assim através dos

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da intelligentsia. Não é que os intelectuais devam se pôr no lugar dos partidos, assumir um papel de protagonistas. Mas, é hora de falar, de indicar o que está ruim, e com o risco de erro, de ser mal-interpretado. É uma hora em que não se pode ficar calado. Vemos que a resistência à ação americana no mundo encontra a oposição de personalidades intelectuais isoladas que fazem isso com muito vigor, basta pensar no caso de Chomsky8, por exemplo, entre outros. É a hora de os intelectuais olharem para o mundo, enfrentarem o desafio, e ao invés de dizer “acabou”, dizer “vamos recomeçar”.

Luiz Alberto Gómez de Souza – A globalização do capital é apenas uma parte, e a pior, de um grande processo de mundialização e de planetarização, possível pelas transformações tecnológicas, que produzem um mundo mais interligado, só que os setores dominantes querem dirigir o processo. Arrighi9 indicou muito bem como, no fim de um período, o capital especulativo tende a querer afirmar a hegemonia. Isso ficou pior com a concentração do poder num só país dominante e com um governo fundamentalista. Mas podem ocorrer surpresas e uma é o poder ascendente da China, a pressão dos países médios, entre eles o Brasil e a crispação do povo árabe ferido. O mercado, como lugar de trocas, sempre existiu nas civilizações, mas o capitalismo quis instalá-lo no centro, como um fetiche religioso e uma falsa vontade (“o mercado quer, o mercado pensa”), pior que a velha mão invisível. Os países pobres e os setores populares têm de opor-se de maneira criativa a uma política econômica que se convencionou chamar neoliberal e que é, na verdade, conservadora ou neoconservadora. Francisco Weffort – Não há como governar ignorando o mercado e a globalização, mas não deveríamos limitar-nos a simplesmente obedecer ao mercado e à globalização. Políticas sociais compensatórias, como as que se fazem desde FHC, agora também Lula, são necessárias, mas insuficientes. Temos uma agricultura forte e estamos, desde FHC e agora com Lula, realizando a reforma agrária. Há que complementá-la com uma política agrícola adequada, financiamentos e tecnologia. Além disso, devemos perseguir um objetivo que existe desde a época militar, a desconcentração industrial. Devemos estimular investimentos no interior e nos estados, para além do eixo Rio - São Paulo. Devemos estimular investimentos nas pequenas empresas, que são as que garantem a maior parte do emprego no país. E temos que erguer ao status de prioritários a educação, a segurança e a cultura. O Brasil precisa se tornar um país realmente democrático, seguro de sua identidade nacional, um país bem educado e culto, seguro também para se viver nele. erros. Habermas debateu com Ratzinger na edição da IHU On-Line 199, de 18 de outubro de 2004. (Nota da On--Line) IHU On Avram Noam Chomsky: Chomsky é professor de Linguística no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, das iniciais em inglês). Seu nome está associado à criação da gramática ge(ne)rativa transformacional, abordagem que revolucionou os estudos no domínio da linguística teórica. É também o autor de trabalhos fundamentais sobre as propriedades matemáticas das linguagens formais, sendo o seu nome associado à chamada Hierarquia de Chomsky. (Nota IHU On On--Line) Giovanni Arrighi: Arrighi Publicou o livro O Longo Século XX, em 1994, contribuição decisiva para o amadurecimento da tese de Immanuel Wallerstein, sobre a recorrência das “crises mundiais de hegemonia”, dentro do Modern World System1 , que nasceu no “longo século XVI”. Arrighi concedeu entrevista a IHU OnOn-Line, edição 144, de junho de 2004. (Nota IHU On On--Line) 8

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Ricardo Gebrim – Se um presidente eleito enfrentar realmente os interesses deste chamado mercado e dos grandes grupos especulativos, terá, inevitavelmente, que promover rupturas. Enfrentará todo um arcabouço legislativo, que inclui até mesmo diversas regras constitucionais, chantagens financeiras como a fuga de capitais e principalmente o boicote dos grandes grupos empresariais brasileiros. Como vêm demonstrando as experiências dos governos venezuelano e boliviano, isso só é possível com o apoio das massas. A questão é saber como um presidente, em nosso sistema eleitoral, em que cada ponto que avança nas pesquisas lhe vai obrigando a atenuar seu discurso e construir compromissos, poderá e se disporá a cumprir esse papel. Lembre-se, a liderança política de Hugo Chavez e Evo Morales não se construiu de uma bem sucedida carreira parlamentar. Nestes dois casos, a legitimidade perante as massas foi construída no exemplo pedagógico de ações insurrecionais. Foram nestes momentos que o povo teve claro que esses eram diferentes. Foi nestes momentos que eles romperam a banalização dos discursos e se constituíram em alternativas populares.

IHU On-Line – Qual foi a pior herança do governo FHC? E do governo Lula? Francisco de Oliveira – São essas às quais me referi anteriormente: submissão total aos interesses de mercado, de renúncia a um projeto nacional. Fernando Henrique justificava isso teoricamente, porque como ele foi, antigamente, o “príncipe dos sociólogos”, achava que tinha uma teoria na cabeça, e seu governo procurava seguir os fundamentos dessa teoria, que há 30 anos ele elaborou como Teoria da Dependência10. Lula não precisa dessa sofisticação teórica, mas faz a mesma coisa. Não há projeto nacional nenhum. Pensemos no caso da TV digital. O que os governos como o do Japão, de quem Lula vai comprar o pacote da TV digital, e o governo de Taiwan fizeram? Incentivaram a pesquisa científica e tecnológica para criar seu próprio padrão de televisão digital. Lula comprou o pacote pronto. Ao invés de tentar produzir, quis ir direto aos frutos, a exemplo do governo militar brasileiro quando trouxe para cá o sistema de televisão a cores. Não há um desenvolvimento nacional. Falta um projeto de nação. Isso para não falarmos nas políticas econômicas. Uma política que nos permite ficar sempre no mesmo lugar

Luiz Werneck Vianna – Nunca satanizei o governo FHC e também não satanizo o governo Lula. Acredito que são governos que se adaptaram às suas circunstâncias e não procuraram alterá-las, resistir a elas. Essa adaptação significa a opção pelo tema da estabilidade. Fizemos essa opção. Está bem que havia inflação, contra a qual se deveria lutar. Isso foi em 1994, passaram-se muitos anos e estamos mais aprisionados a uma política que visa apenas a nos permitir ficar no mesmo lugar. Não é atoa que somos, entre os países emergentes, o que cresce menos. As taxas econômicas de crescimento do Brasil

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Teoria da dependência: dependência Diz que o subdesenvolvimento é a contrapartida do desenvolvimento econômico. Ou seja, os desenvolvidos são desenvolvidos porque nós somos subdesenvolvidos. Existiria uma cadeia causal entre desenvolvimento e subdesenvolvimento, porque, inclusive, ela basicamente considerava inevitável a manutenção da situação desse subdesenvolvimento econômico. (Nota IHU On On--Line)

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são muito baixas, olhando os seus similares internacionais. Isso é uma prova clara de que estamos confortavelmente instalados na mesma situação.

Luiz Alberto Gómez de Souza – A pior herança de FHC foi o desmonte da nação e o escândalo das privatizações. O problema do governo Lula foi não ter conseguido ainda dar uma inflexão na política econômica. Não sejamos ingênuos, as pressões dos poderes reais nacionais e internacionais são fortíssimas sobre um governo. O paradoxo é que os que apostam na sociedade têm mais consciência dessas dificuldades e dos limites do possível e também mais paciência do que aqueles que acreditavam que chegar ao governo era ter o poder nas rédeas e, numa ação voluntarista, mudar tudo. Daí tantos desiludidos na velha esquerda. Francisco Weffort – No caso de FHC, haver estabelecido o instituto da reeleição. No caso de Lula, haver permitido (ou estimulado) a desmoralização dos partidos, especialmente o PT, e da Câmara Federal. Não sei se Lula rouba, mas ficou claro que ele deixa roubar. Na melhor das hipóteses, ignora o roubo que, contudo, se pratica nas vizinhanças do governo e no próprio governo.

Ricardo Gebrim – O governo FHC entrará para a história como um período criminoso em que conquistas históricas da nação foram subtraídas da forma mais escandalosa possível. Vejam o caso da Vale do Rio Doce. Com um patrimônio incalculável a companhia foi leiloada em 1997 pelo valor equivalente ao seu atual lucro trimestral. Basta dizer que, de todos, os presidentes latino-americanos que implementaram esses processos de privatização, FHC é o único, por enquanto, que não está preso nem respondendo processo penal. A herança deste período é a destruição das bases de sustentação que o Brasil havia construído nos 50 anos anteriores. Já o governo Lula tem como pior herança o maltrato da esperança de que era portador. Sua pior herança não foi a implementação de sua política econômica anti-social, embora sejam inegáveis seus efeitos trágicos, mas sua recusa sistemática em construir ou mesmo apontar qualquer sinalização para a construção de uma força social de mudança. Na verdade, desqualificou os setores sociais que partiram para o caminho da luta e desmoralizou a esquerda, permitindo que o inimigo tivesse elementos objetivos para vinculá-la a corrupção e a desonestidade.

IHU On-Line – Quais são as faces atuais do conservadorismo? Que setores apresentam conservadorismo?

resistência

hoje

a

esse

Quem não é conservador no Brasil, hoje?

Francisco de Oliveira – Olavo Setúbal definiu o conservadorismo muito bem. Ele disse que os dois principais candidatos à presidência são conservadores. Veja a pesquisa que a Folha publicou sobre como os brasileiros se consideram. Uma porcentagem altíssima, 47%, se definiu como de direita. Apenas 30% se consideraram de esquerda, e 23% de centro. É um conservadorismo espantoso para uma sociedade que precisa urgentemente de reformas. Por aí vemos a extensão do conservadorismo na sociedade brasileira. IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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É lastimável, porque essa sociedade precisa, urgentemente, de reformas, mas elas não encontram apoio nem sequer social. Os candidatos, de alguma maneira, recebem esse chão social sobre o qual pisam.

A esquerda foi abandonada

Luiz Werneck Vianna – Quem não é conservador hoje no Brasil? Hoje é uma corrida de todos ao centro político. A esquerda foi abandonada. Todos os gatos ficaram pardos. Os conflitos sociais são a seiva de uma sociedade, indicam a insatisfação, sinalizam que deve mudar. Como já firmei, cabe, nessa hora de mudança, de inovação, aos intelectuais, uma posição de coragem, de reflexão, diante da cena contemporânea, porque inclusive estamos ameaçados de que, por exemplo, o conflito no Oriente Médio gangrene, de que se perca seu controle. Vivemos num mundo sob risco. E viver esse mundo de risco creio que não é só procurar “surfar” nas ondas da crise, mas procurar impedir que elas se tornem ameaçadoras a ponto de porem em risco até a história da espécie. E por falar em espécie, uma das formas de resistência deve ser a resistência ambiental. Essa é uma luta que vem se dando no plano internacional. Há novas agendas que são internacionais – a da paz é uma, a do ambiente é outra, há também a luta contra as desigualdades. A política refluiu ou apenas ela está conhecendo outras arenas? Agora, arenas mais complexas... Não é fácil atuar no plano internacional. Mecanismos novos têm aparecido, como a Internet, por exemplo, que facilita a comunicação.

Luiz Alberto Gómez de Souza – O conservadorismo tem medo de mostrar sua verdadeira face e se disfarça de moderno. É curioso como o PFL, o PP e o PSDB não querem assumir a que interesses servem, nem o gelatinoso PMDB. Mas aos poucos irão encontrando resistências nos movimentos sociais. E o PT e Lula têm que redescobrir suas origens. Francisco Weffort – O conservadorismo no Brasil é um tema tão vasto que inclui até mesmo os que não se consideram conservadores. Uma pesquisa recente descobriu que perto de 50% dos brasileiros se consideram de direita. Suponho que estes sabem que são conservadores. Isso já é um avanço. O problema maior são os outros, os que pensam que são de esquerda, mas que, em sua grande maioria, também são conservadores. Desvendar as faces do conservadorismo, exigiria novas pesquisas e muita discussão. Creio que isso é indispensável para virmos a conhecer o Brasil atual.

Os movimentos sociais: pólos de resistência

Ricardo Gebrim – Estamos vivendo os anos de reação neoliberal. Ainda que se percebam sinais de mudança no horizonte, a força do conservadorismo é imensa. A atual configuração do capitalismo estimula a formação de gigantescas corporações multinacionais, que atropelam as fronteiras do Estado-nação conforme seus interesses imediatos, com isso enfraquecendo os instrumentos estatais de controle e regulação. A esfera pública torna-se um espaço impotente, desprovido de força e formas organizativas que possam confrontar estas IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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corporações. As políticas repressivas ou de “tolerância zero” são o novo caminho de legitimação ideológica. Esta nova configuração necessita fechar as portas para o potencial caráter político dos confrontos sociais, tratando toda luta popular como “desordem” social que se assemelha ao crime comum e exige os mesmos mecanismos de repressão. Em outras palavras, para as classes dominantes o Estado somente tem função como agente policial. O combate ao crime organizado é sempre tratado como uma prioridade que legitima leis e aparatos repressivos que serão usados para conter as lutas populares. O pólo principal da resistência encontra-se nos movimentos sociais. Sobrevivendo ideologicamente à grande crise do início dos anos 1990, converteram-se em principais referências de uma esquerda social desvinculada dos processos eleitorais. Uma referência de ousadia, radicalidade e valores. Ao se consolidarem como uma experiência que se fundamenta no trabalho de base, que desenvolve lutas de massa e forma novos quadros, os movimentos sociais se transformam numa referência para os setores mais conscientes que não aceitavam a lógica pragmática dos limites institucionais, em especial entre a juventude.

IHU On-Line – O que fazer com a dívida externa? Devemos seguir pagando ou há alternativas? O “suave fracasso”. A energia para mudar foi perdida

Luiz Werneck Vianna – Não pagar é impossível. Deve-se negociá-la com formas razoáveis. Mas não creio que essa seja a questão que está bloqueando o crescimento do País. O que está bloqueando o crescimento do País é o sistema de juros insuportável. É preciso dirigir o País de uma forma tal que mobilize as pessoas para as atividades produtivas, envolvendo empresários, trabalhadores, as chamadas forças vivas da nação, como se dizia antigamente. Esse jogo especulativo que a classe média entrou não produz mais riqueza, mas fá-la mudar de mão. Não têm faltado propostas dos nossos economistas no sentido de procurarmos um outro caminho. Claro que muito dessa discussão não se resolve no âmbito apenas da intenção, é preciso convocar especialistas para que alternativas sejam debatidas. Mas é só abrir os jornais que todos os dias eles estão lá apresentando, a meu ver, muito lucidamente, alternativas para o que está ocorrendo agora. A impressão que me inquieta é a do “suave fracasso”. Chegamos a um ponto de estabilização, o Brasil é isso mesmo, e a energia para crescer, mudar, foi perdida. Essa idéia me inquieta bastante.

Luiz Alberto Gómez de Souza – O grande problema hoje é a dívida interna enorme. A dívida externa não tem a gravidade de anos atrás e terá de ser negociada com criatividade e decisão. A Argentina, com uma crise profunda, soube fazê-lo melhor. Francisco Weffort – O grande problema não é a divida externa que caiu e vem caindo. O grande problema é a dívida interna, alimentada pelos gastos crescentes do Estado, em todos os âmbitos, federal, estadual e municipal, e em todas as esferas, executivos, parlamentos e judiciário. Alimentada também pela IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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má gestão e pela corrupção. Na sua maior parte, esta dívida interna tem como credores não apenas os grupos financeiros, nacionais e internacionais, mas também a grande massa nacional dos aplicadores e pequenos investidores. Num país em que o poder público não estimula o investimento produtivo, investir nos títulos públicos é muito mais rentável e seguro.

Ricardo Gebrim – O montante pagável de serviço da dívida externa ou interna pública é calculado em uma quantidade muito maior do que a dívida inicial. É um mecanismo de espoliação. Com o pagamento, os países endividados transferem, a preço muito alto, a dívida original. Chamam de dívida, mas é apenas um mecanismo de transferência de riquezas. Um verdadeiro estelionato. A Assembléia Popular11 que se reuniu em Brasília em outubro de 2005, com mais de 8 mil militantes de movimentos sociais apontou um caminho claro – não pagar a dívida externa.

IHU On-Line – Quais são os cinco elementos fundamentais para traçar um projeto de desenvolvimento para o Brasil nos próximos anos? FHC e Lula concentraram a renda

Francisco de Oliveira – Isso seria bem extenso para discutir-se nesse momento. Eu resumiria dizendo que o principal desafio brasileiro hoje consiste em um projeto radical de distribuição da renda. O problema brasileiro nunca foi a falta de crescimento, e sim que, obtendo a segunda maior taxa de crescimento econômico do mundo capitalista durante um século, conseguiu criar uma das sociedades mais desiguais do Planeta. O problema brasileiro, portanto, é de distribuição. Então, qualquer governo tem que encarar um programa radical de distribuição de renda, e não isso que está aí, essa “panacéia” que é, ao mesmo tempo, um insulto, um escárnio. Porque, enquanto se pagam R$ 170 bilhões de juros da dívida pública, o programa dito de redistribuição de renda, o Bolsa Família, gastou R$ 10 bilhões. Divida R$ 170 bilhões entre os que têm poupança no Brasil, e aplicam em títulos da dívida pública, e você achará o cociente de quem enriqueceu. Divida os R$ 10 bilhões pelos dez milhões de pessoas que recebem o Bolsa Família, e você terá o cociente da redistribuição de renda no Brasil. É ridículo. O que o governo FHC fez, e que o Lula continua a fazer, é concentrar renda. Eles têm programas de concentração da renda, e não redistribuição. Há estudos importantes, interessantes, que têm saído, e que não vêm de nenhum economista subversivo, cito o de um economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Guilherme Delgado12, que verificou que fatores propiciaram uma leve redistribuição de renda no Brasil. Não foi nenhum dos subsídios 11

Assembléia Popular: Popular fruto da união da 4ª Semana Social Brasileira, da CNBB e da Rede Jubileu Sul/Brasil e Campanha contra a Alca. Reuniu, em sua última edição, oito mil pessoas ligadas aos movimentos sindical, social e popular e à Igreja Católica, que definiram ações estratégicas para dar resposta aos desafios da atual conjuntura, resgatando a esperança do povo. (Nota IHU On On--Line)

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Guilherme Delgado: Delgado Economista do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), em Brasília, e membro da Comissão Brasileira de Justiça e Paz. Concedeu entrevista ao sítio do IHU, publicada nas Notícias Diárias do dia 14 de julho de 2006. (Nota IHU On On--Line)

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governamentais. Não foi nem o salário, via pela qual o Ocidente melhorou a condição dos trabalhadores. Foram os benefícios do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), aquele que os jornais combatem, que FHC atacou e que Lula continua atacando, aquilo que as pessoas recebem como direitos. Mesmo o Sistema Único de Saúde (SUS), que é um programa de saúde precário, que seja, não precisamos que nenhum deputado nos leve a nenhum hospital público. Nós vamos, somos recebidos e tratados. Não é nenhuma maravilha, mas é um direito. Isso, sim, redistribui renda. Agora Lula vem como a nova promessa de que, no seu segundo mandato, vai enfrentar a chamada crise das contas da Previdência radicalmente. Vai ser uma maravilha! Vou esperar para ver.

José Arthur Giannotti – Em primeiro lugar, sem que eu seja eleitor do Cristovam Buarque, a educação superior se transforma num ponto essencial para o desenvolvimento do País. E não é a educação superior porque ela é superior mas porque todo o ensino brasileiro hoje está inteiramente relacionado e sem este ensino não temos condições de ser um país desenvolvido. Houve já um enfoque importante no Ensino Fundamental, mas o grande problema hoje é o Ensino Médio, que deve ser repensado. Como muita gente sabe, sempre fui contra esta estupidez de ensinar à força sociologia e filosofia no segundo grau. Nós temos que reciclar os professores. E eles podem ser reciclados se também forem reciclados pelo Ensino Superior. Temos que dar à universidade uma tarefa de ponto para que o ensino seja reavaliado. Reforma política Um segundo ponto fundamental. Esse negócio de dizer que vai fazer a reforma no segundo mandato não funciona. Aos partidos cabe a responsabilidade de indicar os seus candidatos, e os partidos podem ou não aceitar conforme sua ideologia ou uma moralidade pública que se estabelece. O que estamos vendo é um escândalo total de deputados que foram cassados serem altamente valorizados como se nada tivesse acontecido. Isso depende de um bom funcionamento dos partidos. É necessária uma boa campanha para que todos os eleitores tenham a consciência de excluir todo esse pessoal do Congresso para provocar uma reforma. Pelo menos se não se tornar o Congresso de nossos sonhos que não seja o Congresso dos infernos.

Luiz Werneck Vianna – Ativar a cidadania, fazer uma reforma política que torne os partidos da esfera pública mais próximos do homem comum, inclusive no planejamento orçamentário das atividades do País. Criar lugares de deliberação pública, fortalecer a esfera pública e fazer um projeto educacional que seja capaz de elevar a maioria da população a um patamar novo em termos cognitivos, cívicos e morais. Cristovam Buarque tem toda razão: há uma revolução educacional a ser feita no Brasil.

Luiz Alberto Gómez de Souza – Os elementos são óbvios: a) um processo educativo de longo prazo, como países como a Coréia do Sul fizeram; b) desenvolver o mundo do trabalho e não só do emprego; c)uma ampla reforma agrária de verdade; d) melhorar as condições de saúde da população; e) redistribuição do ingresso num país campeão em desigualdades; f) uma política de segurança e de combate à violência, tudo num quadro de alianças internacionais e de uma política externa independente e latino-americanista. Para isso se exige também uma reforma política das instituições. IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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IHU On-Line – O que pode trazer ao País a eleição de Alckmin, Lula, Heloísa Helena? O senhor poderia comentar brevemente sobre cada um deles ou sobre outro candidato? Quarto mandato republicano que é a repetição do primeiro

Francisco de Oliveira – Entre o Alckmin e Lula, não vai haver diferença nenhuma. Veja os programas eleitorais na televisão. São iguais. Não têm diferença. O programa da Heloísa Helena sequer se materializou. Ela também está sendo muito insatisfatória nos programas políticos. O que se pode dizer, ainda, é que, de forma abstrata, Heloísa Helena tentaria operar algumas rupturas no quadro político e econômico, o que avalizaria sua candidatura. Mesmo assim, ela ainda não apresentou grande novidade. Lula e Alckmin não têm novidade nenhuma. Vai ser uma repetição. Entramos num ciclo. Teve o mandato do Fernando Collor, interrompedio pelo impeachment; Itamar tentou sobreviver. Vamos para um quarto mandato republicano, que é a repetição do primeiro. FHC teve dois mandatos e, provavelmente, haverá dois mandatos de Lula num país como o Brasil que necessita de reformas urgentemente. São todos iguais

José Arthur Giannotti – Eu não sei por que eles não contratam o mesmo marqueteiro. Eles poderiam economizar. Os programas são tão iguais. O marqueteiro poderia fazer um programa, algumas modificações como se fosse um copy desk e entregar a cada um dos candidatos. Todo mundo fala da segurança mas ninguém fala das medidas necessárias para que ela aumente. Todo mundo fala de crescimento, mas ninguém fala do tipo do crescimento. No discurso de Lula, passando pelo Alckmin e chegando à Heloísa Helena, nós temos ênfases psicológicas de cada um. Fazer uma análise de cada um é tão inócuo que não ousaria cometer tamanha insanidade. Luiz Werneck Vianna – Não me defini a respeito dos candidatos. Olho para essas candidaturas ainda com muita distância. Nenhuma delas conseguiu, até agora, ganhar minha adesão íntima.

Luiz Alberto Gómez de Souza – A última questão responderá melhor. Alckimin é a volta da tucanagem. Heloísa Helena é cair num voluntarismo declarativo e irado. Voto pela reeleição de Lula e justifico no final.

Francisco Weffort – Lula vai continuar o que aí está. Alckmin vai caracterizar seu governo pela melhoria da gestão e pela moralização. Espero que ele tome também a bandeira da reforma política, propondo o voto distrital misto. Heloísa Helena é o Lula de ontem, protesto justo, mas sem projeto de governo. Ricardo Gebrim – Alckmin é o retorno ao ritmo neoliberal de FHC. Privatizações, retomada da ALCA e repressão às lutas sociais. Cumprimento integral da agenda das grandes corporações e grupos financeiros. Lula sofrerá as mesmas pressões, mas cederá a conta-gotas, noutro ritmo. Heloísa Helena, na

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melhor das hipóteses, repetirá o desempenho de Lula em 1989. Só que desta vez, a tragédia provavelmente se repetiria em farsa.

IHU On-Line – Qual é o significado do voto nulo? E o da abstenção? O voto nulo não debilita a democracia Francisco de Oliveira – Penso que o voto nulo é um voto válido. O eleitor não considera que as alternativas à disposição satisfazem as urgências da sociedade brasileira e se recusa a legitimar o ganhador. Esse será meu voto no segundo turno. Votarei na Heloísa Helena no primeiro turno, e como sei que ela não chegará ao segundo turno, nessa etapa, entre Lula e Alckmin, votarei nulo. Os candidatos que estão aí não contemplam as perspectivas e as escolhas que eu gostaria de fazer. E que ninguém venha com o argumento que isso debilita a democracia. Debilita coisa nenhuma! O que debilita a democracia são essas candidaturas. A abstenção é da mesma natureza. A pessoa que se abstém de votar considera que as opções que lhe foram oferecidas não satisfazem e deixa de votar. Não acho isso nada reprovável. Se fossem campanhas que movessem os interesses, que apresentassem alguma perspectiva... mas nem as eleições americanas são assim! Existe tanta abstenção nos Estados Unidos, e não quer dizer que eles são mais ou menos politizados do que nós. É porque os americanos chegaram à conclusão de que a política, de fato, não afeta seu cotidiano. Votando, ou não, isso não afeta sua vida. Infelizmente, o Brasil pode estar se americanizando nesse pior sentido. A política não afeta, não muda essencialmente a vida das pessoas. O sujeito simplesmente se abstém. Mas eu não vou me abster. Vou votar nulo como forma de protesto. José Arthur Giannotti – Podem crescer. Mas acho que é uma irresponsabilidade política. Se pequenas mudanças podem acarretar conseqüências imensas, o voto nulo e a abstenção afastam o eleitor da responsabilidade de escolher bem seus candidatos. A questão maior é escolher os representantes das câmaras estaduais e municipais. Podemos ter com muito voto nulo e abstenção um Congresso pior que esse, e se tivermos um Congresso pior que esse, eu não saio mais de casa. Luiz Werneck Vianna – São duas coisas bem distintas. O voto nulo não deixa de ser uma forma de manifestação de opinião. A abstenção é pior ainda. A indiferença é terrível. Talvez o voto nulo e a abstenção sejam, nesta eleição, maiores do que nos pleitos anteriores. Essa sucessão de escândalos na vida parlamentar não ajuda, mas a Itália passou por isso e está por aí. A corrupção chegou à Alemanha, ao Japão. Os mecanismos de correção também estão presentes. Nossas instituições políticas estão bem desenhadas, demonstrando solidez. Particularmente, não recomendo nem o voto nulo, nem a abstenção. Penso que as pessoas devem escolher seu candidato, por mais difícil que isso possa ser, como é o meu caso no momento. Luiz Alberto Gómez de Souza – Voto nulo e abstenção são falta de consciência cidadã e a renúncia preguiçosa ou moralista às responsabilidades da participação. IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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Francisco Weffort – Voto nulo é uma forma aparente de protesto. Na verdade, é uma fuga da realidade. Abstenção é só fuga, nem protesto chega a ser. Ricardo Gebrim – A esquerda brasileira se apresenta nestas eleições com táticas diferenciadas. Não estará em jogo uma alternativa de poder popular ou apenas uma única forma de acumular forças. Durante os últimos 20 anos, a esquerda estava basicamente organizada num mesmo instrumento político, o PT, mas com projetos e programas diferentes. Agora teremos militantes de esquerda defendendo as candidaturas de Lula e Heloísa Helena. Mas também teremos uma parte da esquerda defendendo o voto nulo. A questão principal é que, neste momento histórico, não retomaremos a unidade da esquerda em torno de um projeto eleitoral. A unidade se construirá em lutas populares e não nas disputas eleitorais.

IHU On-Line – Quais são as principais orientações da Consulta Popular com relação às eleições? Ricardo Gebrim – Decidimos que nossa posição política, neste momento da história, não está centrada nas eleições, na opção de voto nem na indicação de candidatos, mas em um conjunto de propostas estratégicas que propomos ao debate na sociedade brasileira. Uma dessas propostas é exatamente a transformação profunda na organização do Estado Brasileiro, alterando o sistema representativo e constituindo diversos mecanismos de democracia direta e participação popular.

IHU On-Line – Uma pesquisa do Datafolha revela que 47% do eleitorado brasileiro se define como sendo de direita. Outros 23% se dizem de centro e apenas 30%, de esquerda. Geraldo Alckmin (PSDB) é o presidenciável com mais eleitores que se declaram de direita: 53%. Em seguida vêm Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com 47% e Heloísa Helena (PSOL), com 39%. O que revelam essas informações sobre o eleitor/a e sobre a política brasileira? Francisco de Oliveira – Além do conservadorismo, em geral, essa pesquisa revela um público pouco informado sobre as questões reais, o que é um defeito da política, e não dos eleitores. Os debates, candidaturas, matérias sobre política, não tratam sobre nenhuma questão relevante. Então, o eleitor não pode se informar. A pesquisa mencionada revela um público pouco informado, eu diria com pouco gosto pela política e com uma escassa capacidade de cobrar dos eleitos, dos mandatários de sua vontade, a responsabilidade pelos programas que divulgam. Em geral, é esse o perfil do eleitor brasileiro.

Luiz Werneck Vianna – Não acho que exista direita e esquerda no Brasil. O centro exerceu uma atração fatal sobre a sociedade brasileira de uma forma tal que todos correram para ele e lá perderam distinção. Assim, há centro-direita, centro-esquerda, centro-centro. Mas não há uma direita definida, como há na França, EUA, Inglaterra, não temos aqui, nem esquerda. Todos foram para o centro. Um fenômeno que me chama muito a atenção é que movimentos sociais IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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muito importantes, ao invés de estimularem a vida partidária, animarem a vida partidária (pensemos no MST, por exemplo, que poderia ser um sal da terra de um partido político) se mantêm à margem. Essa é uma opção ruim, manter os movimentos sociais à margem da esfera pública organizada. Essa energia que muitos movimentos têm ficaria melhor se fosse levada para o interior da esfera pública institucionalizada, por dentro dos partidos políticos.

Luiz Alberto Gómez de Souza – Os termos direita e esquerda não têm muito significado para a população, estão bastante gastos. Muita gente tem medo de mudar, num mundo de inseguranças. Norberto Bobbio13 classificou de direita aqueles que querem manter o que está aí e de esquerda, a luta pela justiça social. Teoricamente é certo, mas na prática as pessoas não sabem bem o que isso significa.

Francisco Weffort – Esta pesquisa, que considero valiosa, revela muito sobre a cultura política brasileira, mas quase nada sobre o conteúdo político das opções partidárias ou das opções presidenciais. A pesquisa revela opções sobre o que se considera desejável para a vida de cada um e para a sociedade em geral. No Brasil de hoje, há certamente pessoas de esquerda e de direita, mas é muito difícil caracterizar nestes termos os partidos políticos ou as opções políticas que os diversos candidatos pretendem representar.

Ricardo Gebrim – Essa pesquisa sobre a definição do eleitorado como de “direita” é bastante suspeita. Você viu os critérios que utilizaram? Há pouco tempo uma pesquisa também revelou que a maioria da população era a favor do socialismo. Como isso é possível? Na verdade, temos é que nos perguntar o que a Folha de São Paulo quer pautar com essa pesquisa? Existe um imenso esforço dos meios de comunicação em legitimar esse sistema, inclusive para ajudar na domesticação dos candidatos. É como se dissessem, para subir nas pesquisas sejam mais dóceis, não demonstrem radicalidade. Vejam como o eleitorado não gosta disso. O trágico é ver como isso funciona.

IHU On-Line – Para quem vai seu voto e por quê? José Arthur Giannotti – Para dizer francamente, não tenho. Vou esperar que aconteça alguma coisa para ver se algum candidato me abre alguma perspectiva. O candidato Lula, como ele não conhece nada, não viu nada e não tem nenhuma responsabilidade com a corrupção que foi instalada no País, aliás ele não conhece mais o PT, então eu também não o conheço. A Heloísa Helena, eu acho-a muito simpática, tem uma enorme vantagem de botar o dedo nas caras de pessoas, mas a forma como ela pensa o Brasil e o capitalismo nacional deixa a impressão de que ela não põe o dedo nas feridas. O candidato do PSDB não apresentou nada. Não vou anular, mas não sei em quem vou votar.

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Norberto Bobbio (1909 -2004): filósofo político, historiador do pensamento político e senador vitalício italiano. Foi um personagem importante no combate intelectual que conduziu ao confronto entre as três principais ideologias do século XX – o nazi-fascismo, o comunismo e a democracia liberal. Confronto que é responsável, em grande parte, pela arquitectura do sistema internacional e pela divisão do mundo em dois blocos políticos, militares e ideológicos que subsistiu até 1989. (Nota IHU On On--Line) IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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Luiz Alberto Gómez de Souza – Voto em Lula já no primeiro turno. As razões estão num manifesto do qual fui um dos iniciadores e que, em poucos dias, chegou a 100 assinaturas, de muitos profissionais, universitários, dirigentes religiosos e pensadores. Para ser conciso, retomo parte do mesmo, deixando de lado a introdução e o final, mais de conclamação: firme apoio à candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva para sua vitória no primeiro turno das eleições de outubro, somando-nos aos setores populares que já fizeram sua escolha pelo país afora, como indicam as pesquisas. Estes últimos sentem concretamente as melhorias em suas vidas e de suas famílias. Vivemos novo momento de um projeto político de transformações sociais que avançou no Brasil com a eleição de um operário migrante em 2002 e se fortalece na América Latina nas últimas eleições, com a emergência de candidatos, vários dos quais vitoriosos, ligados a esses mesmos setores populares ou deles provenientes. Lula é hoje referência internacional, especialmente na América Latina e nos países pobres. Constatamos também, no atual mandato presidencial, uma política externa independente, firme e criativa, que terá de continuar no futuro, num cenário internacional cada vez mais conturbado, dividido e absurdamente violento. No Brasil, recentes escândalos têm despertado perplexidades na sociedade. Condenamos com veemência todos os tipos de corrupção e de manipulação política. O processo vem de mais atrás, em muitos níveis da sociedade e do poder, mas agora atingiu fortemente setores da base de sustentação do governo. Isso não pode ser ignorado nem negado. O positivo é que todos os escândalos, velhos e novos, vêm sendo denunciados e divulgados, com destaque da Controladoria Geral, da Polícia Federal e do Ministério Público, o que pode favorecer a possibilidade de serem exemplarmente punidos, sem distinção de partidos ou entidades. Além disso, as próximas eleições, que não se reduzem à Presidência, poderão, pelo voto, afastar políticos corruptos, tarefa difícil, porém indispensável. Assim se fortalece a luta pela ética na política, que não se confunde com os moralismos oportunistas e eleitoreiros, como foram no passado o de Jânio da vassoura e o de Collor dos marajás e que podem sempre reaparecer com outros disfarces. (Há que) acelerar e ampliar políticas sociais, políticas educacionais e de segurança nacional, geração de emprego, reforma agrária, redução das desigualdades, com mudança na política econômica. Evidencia-se também a imperiosa necessidade de uma reforma política abrangente e profunda, com a participação não só dos partidos, mas também de setores amplos da sociedade. Falta muito por fazer. Esse projeto não se realiza num curto prazo e sofre pressões de um poder real dominante na sociedade nacional e internacional que o tem deixado bem aquém das expectativas criadas. Compete a todos nós, como sociedade civil organizada, seguir pressionando os poderes da República para o seu cumprimento. Isso será muito mais eficaz com a reeleição de Lula no primeiro turno: ele sairá fortalecido, para estar mais livre diante de pressões poderosas em contrário, capaz então de realizar e ampliar transformações que a sociedade exige.

Francisco Weffort – Votarei em Geraldo Alckmin. Minha decepção com Lula vem de muito antes de sua virada na política econômica, que ele criticou e depois seguiu. Vem de muito antes também do “mensalão" e dos sanguessugas. Estou profundamente decepcionado com os milagreiros que se pretendem carismáticos. Acho que o Brasil precisa de um governo sério, de bons administradores, e acho que o Alckmin se ajusta melhor a este padrão.

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Ricardo Gebrim – Não responderei a essa questão. Nesta entrevista, estou falando como um porta-voz de posições construídas coletivamente num movimento político. Meu voto pessoal é irrelevante e somente serviria para obscurecer a nossa posição de não se pautar pelo voto. O Movimento Consulta Popular está assumindo todas as conseqüências de falar claramente que o “rei está nu”. Estamos pagando um preço por ter a coragem de assumir essa posição. O povo percebe que esse manipulado jogo político não é claro nem acessível e não transformará a existência real de ninguém. Nosso desafio é contribuir para a construção desta alternativa.

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destaques da semana

Entrevistas da Semana pg. 32 Teologia Pública pg. 36 Filme da Semana pg. 40 Deu nos jornais pg. 41 Frases da Semana pg. 44 Destaques On-Line pg. 45

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Entrevista da semana Uma poeta cristã na arena ideológica Em seu recente livro Quero Minha Mãe (Record), a escritora mineira Adélia Prado cita, logo no começo, um dos primeiros filmes do russo Andrei Tarkovski, A Infância de Ivan, ao descrever Olímpia, personagem principal, como uma mulher dividida entre o que deveria ter feito e o que quer fazer. Olímpia inveja, enfim, a liberdade do pequeno Ivan, que, perdido entre trincheiras, tenta sobreviver numa guerra suja com a integridade de sua alma infantil, assumindo com força radical a ira e a virtude das crianças. Em entrevista ao jornal Estado de S. Paulo, 19-8-2006, a escritora mineira fala também desse sentimento. Longe do papel missionário de catequizadora que lhe querem impor, Adélia surge como voz insurgente, inconformada com a passividade do mundo diante da dominação hegemônica das grandes potências. Na entrevista a seguir, ela toma posição não como militante política, mas como escritora consciente do papel oracular da poesia e do caráter epifânico da arte. Segue, enfim, o principal ensinamento de São Paulo: "Agir contra a convicção é pecado." E enfrenta os leões na arena ideológica. Abaixo, a voz e as opiniões da poeta.

Você já teve alguma experiência mística por meio da arte? Toda arte é uma teofania. Li um ensaio de Jung14, Resposta a Jó, que me deixou perturbada. Fiquei com a impressão de estar diante de uma nova teologia. Esse 14

Carl Gustav Jung (1875 - 1961) foi um psiquiatra suíço. Para Jung, a psique humana é composta de vários estratos, ou instâncias, que interagem de forma variada no decorrer da vida. O ego, a sombra, a dupla animus-anima e o Si-mesmo são estratos que se expressam, interna ou externamente, para cada pessoa. Ao processo de integração desses estratos Jung chamou individuação. (Nota da IHU On On--Line)

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livro mexeu comigo de maneira violenta. Há filmes que me deixaram também perturbada, como os de Sokurov15, especialmente Moloch. Acho que, mais que a literatura, o cinema é que está falando das coisas. “Voto nulo” Apesar de não gostar de política, há muito tempo você não toca no assunto, embora tenha exercido

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Alexander Sokurov: cineasta russo. (Nota da IHU On--Line) On SÃO LEOPOLDO, 21 DE AGOSTO DE 2006


cargos públicos. Como vê o quadro atual? Só aceitei ser secretária de Cultura de Divinópolis por amizade ao então prefeito da cidade. Não conhecia nada da burocracia do cargo e sofri demais. Fiz o que pude, mas não é meu lugar. Quanto ao quadro atual, acho melhor a gente organizar uma romaria a Aparecida do Norte. Vou votar nulo. Nenhum dos candidatos me dá confiança para entregar meu voto, o meu desejo de felicidade para o Brasil. Nosso Congresso, digo, a qualidade do nosso Congresso, é um horror. Você votou em Lula? Votei, andei com botton dele no peito desde a primeira vez que ele disputou a eleição. Tinha um retrato dele, ainda de barba preta, grudado na geladeira. Ficou lá até quase a última eleição. Agora vou colocar dentro do freezer. Resultou em nada. Fiquei muito triste. Alguns escritores tentaram buscar uma definição para o caráter brasileiro, entre eles Mário de Andrade. Você arriscaria um palpite? Não. Esse caráter não existe porque nós não temos ainda consciência de povo ou de nação. Temos de crescer. Esse caráter ainda está por ser definido. Se isso acontecesse, o país inteiro poderia cair numa desobediência civil. O discurso político, o voto, tudo é próforma.

Transparência do Mal, que é uma falácia a União Européia tentar fazer desses países uma unidade, que nós precisamos mesmo é de alteridade, pois é a sua ausência que está gerando essa doença. A globalização é falsa. Os povos precisam da alteridade. Eu preciso da diferença para me afirmar. Há coisas boas na UE, como uma moeda comum, o mesmo passaporte. Mas onde vamos fazer piquenique? Sei que tem uma ameaça velada no meio dessas coisas, pois não se trata de uma tentativa de fraternidade real. Tem um outro objetivo que não é fraterno. Enquanto o interesse for só econômico, nós estamos literalmente desgraçados, porque é falso. Já que falamos de globalização, a crise energética levou grandes potências a invadir países, usando como argumento a bandeira da democracia. Não lhe parece falso? Falso demais. Está faltando exatamente uma coisa que provenha do fundo, dos afetos. Não dá para concordar com terroristas, mas é admirável que ainda existam. Eles representam uma fronteira, uma barreira que diz: "Não passa daqui não, que eu sou um homem-bomba." Está equivocado? Está, mas é admirável, ele é humano. O outro não é. É um mentiroso. Sabe que Tariq Ali falou exatamente isso aqui na Flip e foi vaiado? Ah, ele falou? Dou o maior apoio. Eu descobri a razão cíclica, interna, a

A globalização é falsa Vivemos hoje uma situação incômoda com a globalização. A criação da União Européia, por exemplo, trouxe com ela a destruição de culturas regionais, fazendo com que pessoas tenham até vergonha do dialeto que falam e aspirem ao status de cidadão europeu. Engraçado, porque estou justamente lendo Baudrillard16 e ele fala, em A 16

atualidade, é autor de vários livros entre os quais destacamos: A Troca Impossível. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2002; A Ilusão Vital: Civilização Brasileira, 2001 e A Sociedade do Consumo. Lisboa: Edições 70, 2000. De On--Line publicou o artigo A Baudrillard a IHU On máscara da guerra, na edição 51, de 17 de março de 2003. O Prof Juremir Machado da Silva apresentou o IHU Idéias de 11 de setembro de 2003, intitulado 11 de setembro: Ano III. Uma Baudrillard reflexão a partir de Jean Bau drillard. Sobre esse tema, Juremir concedeu uma entrevista na 74ª edição da IHU On On--Line, de 8 de setembro de 2003, sob o título 11 de setembro segundo Jean On--Line) Baudrillard. (Nota da IHU On

Jean Baudrillard: filósofo e sociólogo. Um dos importantes pensadores ocidentais da

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verdade da guerra. É um ato político real. O terrorista tem essa atitude real, verdadeira, não esse faz-de-conta dos grandes que se reúnem para decidir o destino do mundo. O terrorista é o limite. Talvez seja necessário mesmo esse padecimento universal para que o homem recupere alguns valores. Tem hora que não tem jeito não. Não é aquilo, por exemplo, que eu escutei de um intelectual lá em Cuba, uma coisa que me deixou sufocada de espanto: "Não tem revolução que se sustente sem paredão." Isso é outra coisa. Paredão é você acabar com o inimigo para ser o próprio. Não é disso que se trata, mas de outra coisa. É de ações originadas da convicção. Há uma tendência na literatura atual à intersecção entre a linguagem jornalística e a narrativa ficcional. Como você vê esse contágio? Existe bom e mau contágio. Jornalismo é uma categoria separada. Sua primeira obrigação é a de informar. O jornalismo enfeitado, literário, é muito ruim. Ficção é outra coisa. Não dá para chamar de jornalismo literário. Há ficções que nasceram de experiências jornalísticas, mas, como propósito, é desastroso. Nós estamos aqui ao lado de uma senhora que ganhou o Nobel de 1993, Toni Morrison, que começou a escrever justamente porque não via nem os jornais nem os escritores de ficção discutirem, nos idos de 1960, o papel da mulher negra na sociedade americana... Não conheço a obra da Toni Morrison17, mas se alguém escreve só para defender a causa negra, isso pode ser igualmente desastroso. Toda obra que você ideologiza, instrumentaliza, está muito perto do fracasso, porque a obra verdadeira não é criação sua. Nesse sentido, a pessoa pode ter um 17

discurso político, filosófico ou religioso muito bonito, mas artístico, não. A verdadeira arte não é sua. É como fazer música ou poesia religiosa. O resultado é insuportável, porque você vê o andaime da obra, a intenção. Memórias do Cárcere não é bom por ser um livro de prisão de Graciliano Ramos18. É bom porque é boa literatura. Na abertura surgiram muitos livros sobre os anos de chumbo da ditadura militar, que logo ficaram datados. A obra verdadeira não tem data. Você lê os pré-socráticos e o texto está fresquinho, parece ter sido feito de manhã. O que é um clássico para você? Um clássico é uma obra sem data e que tem interesse universal. A dorzinha daquele grego que viveu antes de Cristo é a minha, eu me reconheço nela. Quando Drummond recomendou a publicação de Bagagem, automaticamente apadrinhou você. Qual é a sua aposta entre os poetas jovens? Tenho muita dificuldade em ler todo mundo. Tem gente muito boa aparecendo, mas não dou conta nem de citar. Tem um poeta chamado Jorge Emil que eu recomendei para a Bom Texto (a editora carioca, que lançou O Dia Múltiplo, de autoria do poeta mineiro). Ele também é um ator excelente, um talento real. A poesia está viva, graças a Deus.

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Toni Morrison, Morrison nascida a 8 de Fevereiro de 1931, em Lorain, Ohio, Estados Unidos da América, escritora, ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 1993. (Nota da IHU On On--Line)

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Graciliano Graciliano Ramos (1892-1953): escritor alagoano, nascido em Quebrângulo. Autor de numerosas obras, várias delas adaptadas para o cinema, como Vidas Secas e Memórias do cárcere, em 1963 e 1983, respectivamente, por Nelson Pereira dos Santos. A obra Vidas Secas foi o objeto de estudo do Ciclo de Estudos sobre o Brasil, Brasil de 17 de junho de 2004. Quem conduziu o debate foi a Profª MS Célia Dóris Becker, das Ciências da Comunicação da Unisinos. Confira uma entrevista que a professora concedeu sobre o tema na 105ª edição da IHU On On--Line, de 14 de junho de 2005, disponível para download no sítio do IHU, www.unisinos.br/ihu. (Nota da IHU On On--Line)

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Dos poetas mais antigos, quem você lê com mais freqüência? Drummond. É bom demais. Tem uns poetas que eu não conhecia: Eliodoro Lombardi19, John Donne20, Gerard Manley Hopkins e me deu uma alegria profunda ler seus poemas. Descobri que o mundo está vivo, que existe uma palpitação vital nesses lugares da mística, da arte. Você encontra santos, pessoas que devotam sua vida ao transcendente, ao divino, ao amor, e vive esse heroísmo cotidiano.21 Pasolini também falava que só os santos e loucos - incluindo poetas nessa categoria - eram dignos de confiança, por serem os únicos com coragem para dizer não ao mundo. É verdade. Essas pessoas têm uma atração grande. São verdadeiras. Quando você conhece um santo na vida real, fica admirado com essa coragem cotidiana. Eu quero isso para mim.

esquizofrenia. Minha fé ainda é uma fé pequena. E essa integração com o divino, com o transcendente, muitas pessoas têm isso de maneira não doutrinária. Como é sua relação com autores que não se harmonizam com seus pontos de vista, digamos, o marquês de Sade? Mas o marquês de Sade22 é religioso (ri). Aldous Huxley23 me perturbou muito mais quando era adolescente. Lembro de ter lido, não sei se em Contraponto, que São Francisco beijava leprosos por não dar conta de beijar uma mulher. "O que é isso, onde já se viu?", pensei, espantada. Hoje vejo que essas provocações são muito boas, porque não deixam você virar fanático, radical. Você se transforma realmente num interlocutor, sem prejuízo de suas convicções. Acho isso muito bom.

Você já conheceu algum? Já. Tem uma pessoa que conheço que eu quero estar sempre perto, pegando aquela radiação gostosa. É uma pessoa admirável, que vive a experiência da fé e essa busca de forma radical. Qual é a função de um santo? O santo revela o amor de Deus. Ele confirma que somos criaturas feitas por alguém que nos ama. É aquele que fala: “Descansa, minha filha. Por que você está tão estressada?" São pessoas que vivem a fé de maneira radical, ou seja, têm confiança. O que causa o estresse é exatamente o susto: "Ai, e agora, Nossa Senhora, o que eu vou fazer?" Se você for realmente integrado, foge da

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Eliodoro Lombardi (1843-1894) poeta. (Nota da On--Line) IHU On John Donne (1572 –1631) foi um poeta inglês. (Nota da IHU On On--Line) A revista IHU On On--Line, recentemente, no número dedicado ao tema Jesuítas. Quem são? publicou uma longa entrevista sobre o poeta jesuíta inglês, Hopkins. A entrevista está disponível em www.unisinos.br/ihu. (Nota da IHU On On--Line)

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Donatien Alphonse François de Sade Sade, mais conhecido como Marquês de Sade (1740 - 1814) foi um aristocrata francês e escritor marcado pela pornografia violenta e pelo desprezo dos On-valores religiosos e morais. (Nota da IHU On Line) Aldous Leonard Huxley (1894-1963): romancista inglês. Viveu a maior parte dos anos 1920 na Itália fascista de Mussolini, que inspirou parte dos sistemas autoritários retratados em suas obras. Huxley produziu um total de 47 livros, dentre os quais a obra-prima Admirável Mundo Novo. 2. ed. São Paulo: Globo, 2002-2004, escrita em 1931. Os temas nela abordados remontam grande parte de suas preocupações ideológicas como a liberdade individual em detrimento do autoritarismo do Estado. (Nota da IHU On On--Line)

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Teologia Pública Um olhar sobre o ecumenismo Entrevista com José Oscar Beozzo José Oscar Beozzo é padre, teólogo e um dos maiores historiadores da Igreja na América Latina. Ele fala, na entrevista que segue, concedida por telefone à IHU On On--

Line, sobre as perspectivas para a Assembléia Geral do Celam, que acontece em Aparecida, no próximo ano, sobre a Igreja no Brasil e na América Latina, sobre o ecumenismo e sobre o governo Lula neste ano de eleições. Beozzo é coordenador-geral do Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (Cesep). É autor de inúmeros livros, entre os quais A Igreja do

Brasil. Petrópolis: Vozes, 1993. Faz parte do Centro de Estudos de História da Igreja na América Latina (CEHILA-Brasil), filiado à Comissão de Estudos de História da Igreja na América Latina e no Caribe (CEHILA). Publicamos aqui, trechos da entrevista concedida pelo Pe. Beozzo. A íntegra pode ser conferida nas Notícias Diárias, da página do IHU de 20-8-2006.

IHU On-Line - Quais as perspectivas do senhor para a Assembléia Geral do CELAM (Conselho Episcopal Latino-americano), que ocorrerá em Aparecida, no próximo ano? Oscar Beozzo - Eu diria que há uma série de votos de que se retome não só a tradição latino-americana, mas também as grandes intuições do Vaticano II, sobretudo a da Igreja, como povo de Deus, povo dos pobres, a da Igreja como espaço de participação e de comunhão, capaz de levar a sério a questão da mulher dentro da Igreja plenamente inserida nos diversos serviços e ministérios. Há muita gente trabalhando na perspectiva da 5° Conferência.: as CEBs prepararam um documento, a Pastoral Operária preparou outro, as pastorais sociais elaboraram também suas propostas e quase todas as dioceses se debruçaram sobre o documento de participação e encaminharam à CNBB suas IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

conclusões. Os jesuítas do ISI (Instituto Santo Inácio) de Belo Horizonte também propuseram um documento teológica e pastoralmente muito denso. Eu acredito que esse é um momento excepcional, pois começa a escutar-se a base da Igreja e verificar quais são as questões que deveriam estar na agenda da Igreja e na agenda da Conferência. A Igreja no século XXI Há também uma proposta do Conselho Nacional de Leigos de organizar-se um seminário no fim de semana seguinte à abertura da Conferência, para refletir sobre a Igreja no século XXI: quais são seus desafios e tarefas, sobretudo com relação a todos os batizados e não apenas do segmento clerical ou episcopal da Igreja; com base nos anseios das várias igrejas cristãs e não exclusivamente da Igreja Católica. A pastoral da juventude está pensando não só em participar da romaria, mas 36

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em fazer uma segunda romaria noutro dia, e levar as preocupações da juventude. A abertura do CELAM e a Igreja do Brasil O CELAM está convocando um seminário interdisciplinar, em novembro, para escutar as contribuições dos vários países e discuti-las e uma sessão de redação. em janeiro, para finalizar o documento de trabalho da Conferência. É claro que muita gente andou com o pé um pouco para trás, pensando se isso é para valer. Mas eu penso que há um clima positivo em relação à preparação da quinta Conferência e que se deveria aproveitálo como um momento de graça, como são todos os momentos colegiais, os concílios, os sínodos e as conferências na vida da Igreja. E o Brasil tem o privilégio de acolher a V Conferência. O CELAM foi fundado aqui, no Rio de Janeiro em 1955, na I Conferência do Episcopado Latino-Americano, realizada logo após o XXXIV Congresso Eucarístico Internacional. Agora em 2007, ela volta a acontecer no Brasil, desta vez em Aparecida. Isso facilita que a Igreja do Brasil fale com clareza, apresente sua perspectiva, partilhe a riqueza da sua caminhada com as outras igrejas do continente, e com o próprio Papa, que decidiu que virá para a abertura da Conferência.

IHU On-Line - Como se caracteriza a conjuntura atual do ecumenismo? Oscar Beozzo - No ecumenismo temos, de um lado, sinais muito positivos e, de outro, preocupações. A IX Assembléia do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), em Porto Alegre, RS, em fevereiro passado, foi um evento maravilhoso. Vimos representantes de 350 igrejas do mundo inteiro trabalhando juntos ao longo de dez dias. Além da participação da população local, havia cerca de 700 delegados e mais de 4 mil convidados participando em diferentes mesas IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

redondas e workshops, que abrangiam uma ampla gama de questões relevantes para a humanidade e para as igrejas e onde se pode constatar como avançou e se aprofundou a cooperação ecumênica, em todo o mundo. Os temas iam desde os cuidados com as crianças, com os aidéticos até a luta pela paz e pelo meio ambiente. Havia grupos trabalhando, apresentando e compartilhando uma caminhada ecumênica muito viva. O metodismo e a igreja ortodoxa Outro signo positivo nos chega do Concílio Metodista Mundial, que acaba de reunir-se em julho último, em Seul, na Coréia. Nesta 19ª. Conferência Metodista Mundial aconteceu a adesão do Concílio à Declaração Conjunta de 1998 da Igreja Católica Romana e da Igreja Evangélica Luterana sobre a “Doutrina da Justificação”. Ambas as igrejas superaram suas divergências sobre a graça e a justificação, ponto crucial da doutrina cristã e do dissenso católico-protestante, levantando as condenações mútuas, vindas desde a Reforma Protestante (1517) e o Concílio de Trento (1545-1563), no século XVI, convertendo-se, assim, num marco da caminhada ecumênica contemporânea. O fato de outras igrejas, como a Metodista, virem se somando a esse documento, é relevante porque toca o principal ponto do dissenso teológico entre a Reforma Protestante e a Igreja Católica. Ter alcançado, depois de 30 anos de discussão, uma compreensão comum, aceita pelas duas igrejas, reconhecendo que persistem diferenças, mas que as duas convergem no essencial, acolhendo como legítimas e ortodoxas as formulações doutrinais de uma e da outra igreja, é alentador. Igrejas ortodoxas É também extremamente positivo que se tenha saído do impasse entre as igrejas ortodoxas e o Conselho Mundial de Igrejas. Depois da VIII Assembléia do CMI em Harare, no Zimbawe (1998), momento em que várias igrejas 37

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ortodoxas deixaram o CMI, e outras manifestaram seu profundo desconforto, foi constituído um grupo de trabalho misto, para examinar as tensões e os conflitos existentes e propor caminhos de superação. A comissão, depois de trabalhar, ao longo dos últimos seis anos, delineou uma agenda e propostas concretas para regularem as mútuas relações, alcançando um consenso extremamente construtivo. Deve-se acrescentar também como sinal alentador a retomada do diálogo entre a Igreja Católica Romana e a Igreja Ortodoxa Russa. Com o retorno da liberdade religiosa na antiga União Soviética, após a Perestroika (1989) e o restabelecimento da Ucrânia como estado independente (1991), as duas Igrejas foram pegas de surpresa pelos conflitos religiosos desatados pela nova situação. Católicos ucranianos “uniatas”, retomaram mais de 3 mil igrejas que, com seu clero e seus fiéis, tinham sido anexadas, por ordem de Stalin em 1945, à igreja ortodoxa russa na Ucrânia, pondo fim à Igreja Católica oriental ucraniana que data de 1596. As muitas reuniões e resoluções tomadas entre as delegações das duas Igrejas não foram capazes de sustar os duros confrontos na base de suas comunidades. Quando o Papa João Paulo II restabeleceu a hierarquia eclesiástica da Igreja Católica Ucraniana em 1991, este gesto foi tomado como medida inamistosa pela ortodoxia em Moscou e Kiev. Felizmente, a situação de confronto e impasse foi superada e retomou-se o diálogo. Pentecostalização Temos dificuldades na caminhada ecumênica? Sim, e são muitas. Podemos citar o retorno a um certo isolamento e fechamento confessional, com maior insistência na legítima identidade própria de cada Igreja, mas com pouca ênfase na vastíssima zona de consenso, laços de efetiva comunhão e cooperação existentes entre as igrejas IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

cristãs. Há as dificuldades para se estabelecer aproximação, diálogo e cooperação com o vasto campo dos movimentos e igrejas pentecostais, tanto da parte dos ortodoxos, como dos protestantes e dos católicos. Surgiram também tensões no interior de muitas igrejas que vêm passando por um processo interno de pentecostalização. Há ainda impasses que persistem no campo doutrinal e, de modo particular, na esfera dos ministérios e dos sacramentos. Se cresceu o consenso sobre o mútuo reconhecimento do batismo praticado nas várias igrejas cristãs, não se avançou muito na questão eucarística, tendo mesmo havido retrocessos e enrijecimentos. Há pessoas que se assustam quando surgem conflitos e problemas na esfera do ecumenismo. Eu acho, porém, que é normal que isso aconteça na caminhada. O que seria anormal é nos acomodarmos e não enfrentarmos as antigas e novas dificuldades. Concilio Vaticano II e ecumenismo A Igreja Católica, desde o Concílio Vaticano II exprimiu uma sólida adesão ao ecumenismo e sua vontade de avançar por este caminho, vontade enfaticamente reafirmada por Bento XVI no seu discurso aos cardeais após a sua escolha: “Alimentados e sustentados pela Eucaristia, os católicos não podem deixar de sentir-se estimulados a tender para aquela unidade plena que Cristo desejou ardentemente no Cenáculo. Deste supremo anseio do Mestre divino, o Sucessor de Pedro deve ocupar-se de modo muito especial. De fato, a ele foi confiada a tarefa de confirmar os irmãos (cf. Lc 22, 32). Por conseguinte, com plena consciência, no início do seu ministério na Igreja de Roma, na qual Pedro derramou o seu sangue, o atual Sucessor assume como compromisso primário o de trabalhar sem poupar energias na reconstituição da plena e visível unidade de todos os seguidores de Cristo. Esta é a sua ambição, este é o seu dever. Ele está consciente de que, 38

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para isso, não são suficientes as manifestações de bons”. sentimentos. São necessários gestos concretos que entrem nos corações e despertem as consciências, enternecendo cada um àquela conversão interior que é o pressuposto de qualquer progresso pelo caminho do ecumenismo” (Bento XVI: Homilia na Santa Missa pela Igreja Universal – Capela Sixtina: 20-04-2005). Essa reiterada afirmação da Igreja Católica de seu compromisso ecumênico e as muitas iniciativas nesta direção não têm impedido manifestações e documentos como a Dominus Jesus que causaram perplexidade, desconforto e sofrimento nas demais igrejas cristãs, tornando-se um tropeço no caminho da unidade. A Igreja Metodista afasta-se do ecumenismo organizado Recentemente, no último mês de julho, a Igreja Metodista decidiu, no seu 19º. Concílio Geral, realizado em Aracruz, ES, afastar-se de todos os organismos ecumênicos em que estivessem presentes a Igreja Católica ou grupos não-cristãos24. Esse é um momento de exame de consciência, para todos nós, metodistas e católicos. Será que nos descuidamos uns dos outros, das dificuldades pastorais e doutrinais presentes em ambas as Igrejas? Será que nós, católicos, acompanhamos devidamente a Igreja Metodista? Demos com nossas atitudes, algum motivo para o afastamento? É um momento de profunda revisão. A busca da unidade é um mandato que Cristo nos deu. Não é uma alternativa deixarmos de ser ecumênicos, mas um caminho indicado por Cristo, portanto, obrigação para todos os cristãos e cristãs que assumiram o seguimento de Jesus em suas vidas.

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On-Line Quais suas expectativas para as eleições deste ano? Oscar Beozzo - É necessário, nas eleições, tomar em consideração tanto a escolha dos governadores, como a do Parlamento. Para bem governar e fazer avançar o País, é necessário que o voto dado para o executivo federal aproxime-se do voto dado aos governos estaduais e à Câmara e ao Senado, de tal modo que haja pelo menos o mesmo espectro político, que forme um arco de aliança suficientemente próximo, que permita estabelecer uma política geral com certa coerência e coesão. Não há nada que se possa fazer com os governos estaduais, puxando para um lado e o federal para outro; com o presidente buscando um rumo e o parlamento optando por outro. O que espero das eleições é que seja um momento de pensarmos, mais a fundo, o projeto de País que queremos, superando desigualdades e injustiças e estabelecermos o formato das instituições políticas que permitam fazer o País andar, trabalhar, e preocupar-se com o que é importante na vida do povo: educação, saúde, emprego, segurança e tudo o demais necessário para a vida das pessoas e das comunidades.

Sobre esse assunto, confira as Notícias Diárias do sítio do IHU, em 16-08-06, sob o título 24

Dirigentes metodistas deixam cargos no CONIC. (Nota da IHU On On--Line) IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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Filme da semana O que você faria? Ficha Técnica: Nome: O Que Você Faria? Nome original: El Método Cor filmagem: Colorida Origem: Argentina - Espanha Ano produção: 2005 Gênero: Drama Duração: 115 min Classificação: livre Direção: Marcelo Piñeyro Elenco: Eduardo Noriega, Pablo Echarri

Sinopse: Uma grande empresa convoca candidatos a um posto. Vários executivos comparecem. Fechados numa sala, eles são testados de maneira inusitada. A cada etapa, seus limites psicológicos e éticos são levados ao extremo.

Uma crítica à modernidade Reproduzimos a seguir a resenha de Neusa Barbosa, publicada no sítio www.cineweb.com.br em 14-8-2006.

Um dia, Madri amanhece com suas ruas tomadas por um enorme protesto antiglobalização. O manifesto ruidoso de milhares de pessoas contra uma reunião do FMI dificulta os transportes e as comunicações. Exatamente neste dia, um grupo de executivos dirige-se à sede de uma grande empresa, no centro da capital espanhola. Vão disputar uma vaga que foi anunciada. Não poderia haver maior contraste entre as ruas tomadas por barricadas, faixas e eventualmente explosões de bombas de efeito moral, e o ambiente impessoal e antisséptico da empresa. IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

Dentro de seus longos corredores refrigerados, numa sala high tech, sete executivos são colocados diante de computadores. Através deles, virão sucessivamente às mensagens para conduzir o teste, que é orientado pela última palavra neste campo, o método Grönholm. Não demora a que os candidatos revelem sua personalidade. O seguro Julio (Carmelo Gómez), a veterana Ana (Adriana Ozores), o cafajeste Enrique (Ernesto Alterio), o falador Ricardo (Pablo Echarri), o tímido Fernando (Eduard Fernández), o galante Carlos 40

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(Eduardo Noriega) e a glacial Nieves (Najwa Nimri, de Os Amantes do Círculo Polar). Todos são expostos a instruções aparentemente absurdas ou polêmicas, sempre ficando bem claro que estão sendo atentamente observados. Como ratos num laboratório. Se o computador se apaga, o candidato foi excluído. Baseado numa peça teatral, o hábil diretor argentino Marcelo Piñeyro (de Plata Quemada e Kamchatka), cria uma ágil reflexão sobre a modernidade e a ética – e não só nas relações de trabalho. Dentro de um ambiente mínimo e claustrofóbico, extrai alta tensão dos diálogos afiados e do desempenho de seu afinado grupo de atores, escolhidos entre a Argentina e a Espanha, co-produtores deste projeto. O diretor monta competentemente uma reflexão política sobre a época atual, jogando com os dados de uma situação muito comum na vida da maioria das

pessoas, a disputa por um (cada vez mais difícil) emprego. O melhor no tom escolhido por Piñeyro é não julgar, maniqueisticamente, ninguém, não elegendo mocinhos nem bandidos. O que não quer dizer que não permita também uma leitura moral, já que fornece sólidos elementos para pensar até que ponto uma competição com estas características pode tornar as pessoas sórdidas, já que, pelo desespero ou o desejo do sucesso a qualquer preço, são levadas a perder todo e qualquer limite. Nessa crítica a alguns dos mecanismos da modernidade, não é questão de menor importância a obediência cega, dentro de tantas empresas, a métodos marqueteiros, a que se atribuem características quase mágicas para selecionar seres humanos. Pensando nisto, os manifestantes antiglobalização que gritam do lado de fora têm uma inquietante e salutar razão de existir.

Deu nos jornais Diariamente a página do IHU (www.unisinos.br/ihu), editoria Notícias Diárias apresenta uma síntese das notícias com base nos principais jornais do País e do exterior. A elaboração das notícias diárias é feita em parceria com o Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores - CEPAT, com sede em Curitiba, PR. Abaixo algumas notícias selecionadas, extraídas do sítio do IHU.

Lucro dos Bancos O lucro líquido semestral dos cinco grandes bancos brasileiros (Banco do Brasil, Bradesco, Itaú, Unibanco e Banespa) cresceu 132,5% do início do governo Lula a junho deste ano. Veja a matéria nas Notícias Diárias do dia 15-8-2006. No mesmo dia, o sítio mostrou uma matéria com o diretor-presidente da Escola Ibmec São Paulo, Claudio Haddad. Haddad acredita que um dos principais vilões dos altos spreads - diferença entre o custo de captação do banco e o juro que cobra no empréstimo - no Brasil é a baixa concorrência do setor bancário. Ainda sobre o assunto as Notícias Diárias reproduziu um artigo do economista Paulo Nogueira Batista Jr no dia 17-8-2006. Olho na alta rentabilidade brasileira IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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Até os bancos suíços, conhecidos como os mais eficientes do mundo, querem ganhar dinheiro no Brasil. Um estudo do consultor Carlos Coradi, conforme matéria publicada nas Notícias Diárias da página do IHU mostra que os bancos brasileiros só perdem em rentabilidade para os suíços. Sobre o assunto, confira as Notícias diárias do dia 13-8-2006 e 16-8-2006. Sobre o lucro dos bancos as Notícias diárias da página do IHU no dia 17-8-2006 reproduziu um artigo do economista Paulo Nogueira Batista Jr. O ninho dos liberais Depois de dois anos de discrição, a Casa das Garças, como é conhecido o Instituto de Estudos de Política Econômica (Iepe) - funciona no Rio de Janeiro -, começou a ganhar notoriedade. Primeiro com a repercussão da visita, em fevereiro, do então pré-candidato à Presidência da República pelo PSDB Geraldo Alckmin. Em junho, chamou a atenção o lançamento de dois livros sobre mercado de capitais, dívida pública e crescimento econômico, com artigos de "notáveis" como Armínio Fraga e Pérsio Arida, ex-presidentes do Banco Central. Confira nas Notícias Diárias do dia 15-8-2006. O conservadorismo venceu? "Tendo servido à ditadura militar sempre que pôde e foi chamado, Setubal diz que tanto faz Lula como Alckmin porque os dois são conservadores. A lição implícita é: o conservadorismo venceu, a política já não tem nenhuma importância, é um espetáculo irrelevante", escreve Marcos Nobre, professor de filosofia política da Unicamp e pesquisador do Cebrap, em artigo reproduzido nas Notícias Diárias do dia 16-8-2006. Lula e Vargas As Notícias Diárias reproduziu no dia 17-8-2006 um artigo sobre o Lulismo. “Lula, embora se apresente como herdeiro de Vargas, mais se parece com seu avesso. Se o estancieiro dos pampas estruturou o nosso projeto de nação, o exartífice da metalurgia é partícipe ativo de seu desmoronamento", escreve Ricardo Antunes, professor titular de sociologia da Unicamp. Moniz Bandeira vê globalização política A troca de apoio político-eleitoral entre partidos e governos foi freqüente em boa parte da história política recente na América Latina. Em 1950, por exemplo, o presidente argentino Juan Domingo Perón deu amplo apoio a Getúlio Vargas, inclusive financeiro, diz o cientista político Luiz Alberto Moniz Bandeira, autor de mais de 20 obras sobre relações exteriores do Brasil. Confira a matéria publicada nas Notícias Diárias do dia 17-8-2006 América Latina Pingüins A lentidão demonstrada pelo conselho que se formou para reformar a lei educacional pinochetista no Chile está enchendo a paciência dos estudantes, que encabeçaram manifestações massivas nos meses de maio e junho. Na semana passada foram detidos 110 em Maipú. Confira a matéria publicada nas Notícias Diárias do dia 16-8-2006. Boicote à Veja IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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Uma entrevista com o jornaleiro Fábio Marinho que decidiu não vender mais a revista Veja foi reproduzida nas Notícias Diárias do dia 15-8-2006. Violência As Notícias Diárias do dia 17-8-2006 reproduziu um artigo do professor do Departamento de Sociologia da UFMG Cláudio Beato, sobre violência. As Notícias Diárias da página do IHU no dia 16-8-2006 publicou um artigo de Jorge Zaverucha sobre o crime organizado. Sobre o mesmo tema conferir a entrevista com Luiz Eduardo Soares no dia 18-8-2006. O II Congresso Latino-Americano de Gênero e Religião, que discutirá sexualidade e violência foi assunto das Notícias Diárias da página do IHU no dia 16-8-2006. Ecologia Organização calcula o quanto famílias e empresas poluem Nos próximos meses, o escritório de advocacia Pinheiro Neto deve iniciar o plantio de 64 mil espécies de árvores nativas da Mata Atlântica, equivalente a uma área de 40 hectares. Essas árvores vão retirar da atmosfera, ao longo de 30 anos, a poluição gerada pelo escritório e seus sócios durante cinco anos. Veja a matéria nas Notícias Diárias da página do IHU no dia 16-8-2006. Crise da água A crise de água, tradicionalmente vista como um problema dos países pobres torna-se algo cada vez mais preocupante também para países mais ricos como Austrália, Espanha, EUA, Japão e Reino Unido, diz o Fundo Mundial para a Natureza (WWF, na sigla em inglês) em relatório divulgado às vésperas da Semana Mundial da Água. Veja a matéria nas Notícias Diárias da página do IHU no dia 17-8-2006. Religião Bento XVI As Notícias Diárias da página do IHU repercutiu nos dias 14, 15 e 16-8-2006 a entrevista de Bento XVI concedida dia 13 de agosto, a três televisões alemãs. D. Aloísio Lorscheider e D. Luciano Mendes de Almeida Sobre o estado de saúde do arcebispo emérito de Aparecida (SP), dom Aloísio Lorscheider e do jesuíta D. Luciano, as Notícias Diárias da página do IHU acompanhou o quadro nos dias 16-8-2006 e 19-8-2006. Bispo é ameaçado no Xingu No ano passado mais de 800 mil pessoas estiveram envolvidas em conflitos no campo no Brasil. Os dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) demonstram a enorme precariedade com que trabalham entidades, trabalhadores rurais e movimentos sociais que atuam nas mais diversas regiões do país. Um exemplo disso é o caso do bispo austríaco naturalizado brasileiro Dom Erwin Kräutler, que sofre ameaças de morte desde o final de julho em razão de sua atuação no

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Xingu, no Norte brasileiro. Confira as Notícias Diárias da página do IHU no dia 16-8-2006.

O jesuíta que inventou o nome de Deus em chinês As Notícias Diárias do dia 19-8-2006 publicou duas matérias do jornal italiano Repubblica sobre Matteo Ricci. O título das matérias são respectivamente Matteo Ricci é o antianti-Marco Pólo e Cristo e Confúcio. Confúcio Semanalmente, até a realização do Seminário Internacional A Globalização e os Jesuítas. Jesuítas. Origens, desafios e impactos, impactos, entre os dias 25 e 28 de setembro, as notícias diárias publicarão entrevistas referentes ao Ano Jubilar Inaciano.

Frases da semana Programa eleitoral gratuito "Pior do que a dificuldade do PSOL por ter só um minuto para Heloísa Helena é o drama do PSDB, que precisa sustentar um programa de 12 minutos com o empolgante Geraldo Alckmin" - César Benjamin, vice na chapa de Heloísa Helena - Folha de S. Paulo, 16-8-2006. "Eleição no Brasil está mudando, deixando de ser novidade" - Fernando Mitre, diretor de jornalismo da Band, explicando que a baixa audiência do debate dos presidenciáveis não se deve somente à ausência do presidente Lula - Folha de S. Paulo, 16-8-2006. "É um dos programas mais chatos da TV mundial" - Rubens Figueiredo, cientista político - Rádio Jovem Pan - 16-8-2006. O PT e o lucro dos bancos "Se você encontrar um papel do PT assinado dizendo isso, eu terei o prazer de comê-lo com azeite e sal porque não existe isso" - Paulo Bernardo, ministro do Planejamento, afirmando que o PT nunca foi contra lucro de banco - Estado de S. Paulo, 17-8-2006. Roberto Jefferson vota em Heloísa "A princípio votaria em Geraldo Alckmin, mas votarei na Heloísa Helena. Ela rompe com o ciclo do rentismo paulista. Deixa no passado o jogo combinado do PSDB X PT" - Roberto Jefferson, ex-deputado federal, no seu blog - 15-8-2006 Prisão “Já vi coisas terríveis no mundo. Mas o trauma de entrar em uma penitenciária no Brasil eu nunca vou esquecer em minha vida" - Jean Ziegler, suíço, relator especial da ONU - Estado de S. Paulo, 15-8-2006. Um otimista bem informado

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“Como ser otimista quando se lê o jornal? O mundo é o lugar do inferno; milhões nascem para sofrer; eles não importam para nada e para ninguém. Não sou um pessimista. Sou um otimista bem informado” - José Saramago, prêmio Nobel de Literatura, ao concluir seu novo livro As pequenas memórias - 20-8-2006.

A depressão. Um preço indispensável “A depressão é um preço indispensável a pagar pela sociedade que as pessoas querem ter” - Michel Houellebecq, escritor francês, autor do livro A possibilidade de uma ilha onde faz a apologia do sexo como única forma de prazer - 20-8-2006. “É totalmente evidente que os seres humanos não são ligados uns aos outros” - Michel Houellebecq, escritor francês, autor do livro A possibilidade de uma ilha onde faz a apologia do sexo como única forma de prazer - 20-8-2006.

Destaques OnOn - Line

Entrevistas exclusivas produzidas pelo sitio do IHU Essa editoria veicula entrevistas exclusivas publicadas no sítio do IHU (www.unisinos.br/ihu), durante a última semana. Selecionamos algumas dessas entrevistas e apresentamos a lista completa de todas, que podem ser conferidas nas

Notícias Diárias do sítio, na data correspondente.

Título: Justiça social: expressão estratégica para o futuro imediato do Brasil Entrevistados: Sergio Pereira Leite Entrevista: "É preciso reconquistar a soberania nacional e a autonomia no sentido de regular algumas estratégias que dizem respeito ao futuro do País. Não podemos ficar à mercê da banca financeira internacional, que resolve especular contra a moeda, como foi no caso de 1999, quando houve uma sangria de dólares do País, em curtíssimo espaço de tempo", afirma o economista Sergio Pereira Leite na entrevista das Notícias Diárias do dia 15-8-2006. Título: A atualidade e a força dos estudos de gênero na academia e na sociedade Entrevistados: Joana Pedro e Mara Lago Entrevista: As professoras da Universidade Federal de Santa Catarina, Mara Coelho de Souza Lago e Joana Maria Pedro, apresentaram o tema Transversalidades de gênero em um simpósio realizado de 16 a 21 de julho de 2006, na UFSC, em Florianópolis. Confira nas Notícias Diárias do dia 16-8-2006 a entrevista sobre o tema. Título: Violência doméstica. "Agressores são predominantemente do sexo masculino" Entrevistados: Heloísa Zimmer Ribas Dias IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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Entrevista: O Sindicato dos Enfermeiros do Estado de São Paulo (SEESP-CUT) promoveu o seminário "Combater a Violência Doméstica é Garantir a Segurança e o Respeito Familiar" no último dia 5 de agosto. As Notícias Diárias da Página do IHU do dia 17-8-2006 entrevistou Heloísa Helena Zimmer Ribas Dias, especialista em violência doméstica sobre o tema. Título: Dom Aloísio. Entrevistado: tado: Ermanno Allegri, diretor executivo da Adital Entrevis Entrevista: O padre Ermanno Allegri, diretor executivo da Adital (Agência de Notícias da América Latina e do Caribe), quem conviveu por muito tempo com Dom Aloísio Lorscheider, em Fortaleza fala da contribuição do cardeal à Igreja e do convívio que teve com ele. Confira nas Notícias Diárias da página do IHU do dia 18-8-2006. Título: Francisco Xavier: o aventureiro de Deus. Entrevistado: do: Pedro Miguel Lamet, jornalista espanhol Entrevista Entrevista: Entrevista O jesuíta espanhol Pedro Miguel Lamet lançou em março deste ano o livro El aventurero de Dio Dios, que conta a história de São Francisco Xavier. A entrevista foi publicada nas Notícias Diárias da Página do IHU do dia 18-8-2006. Título: A política tornoutornou-se, o mais das vezes, um teatro Entrevistado: do: José Oscar Beozzo, Entrevista Beozzo, teólogo Entrevista: José Oscar Beozzo, um dos maiores historiadores da Igreja na América Latina, abordou as perspectivas para a V Assembléia Geral do Celam, que acontecerá em Aparecida, no próximo ano. Falou também sobre a Igreja no Brasil e na América Latina, sobre o ecumenismo e sobre o governo Lula neste ano de eleições. A íntegra da entrevista pode ser conferida nas Notícias Diárias da Página do IHU do dia 20-8-2006. Confira alguns trechos na presente edição, na editoria Teologia Pública.

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IHU em revista

Eventos Sala de Leitura IHU Repórter

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Eventos Filme O Sétimo Selo em exibição no IHU Idade Média e Cinema II Repensar a história medieval através do cinema é o objetivo do Idade Média e Cinema II, II evento promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos em parceria com o curso de História da Unisinos. O evento, que iniciou no dia, 12, com a palestra Introdução à linguagem cinematográfica e às representações da Idade

Média no Cinema, retoma suas atividades neste sábado, dia 26 de agosto, com a exibição do filme O Sétimo Selo. O clássico de Ingmar Bergman será debatido pelo professor do curso de História da Unisinos, José Alberto Baldissera. A exibição acontece na sala 1G119 e começa ás 8h30 min. O

Sétimo Selo também será debatido no evento Cinema e Saúde Coletiva que começa dia 29 de agosto.

Como se vê a Idade Média? Entrevista com José D'Assunção Barros Introdução Para contribuir com o tema abordado na semana passada Introduç ão à linguagem cinematográfica e às representações da Idade Média no Cinema a On--Line entrevistou por e-mail o historiador e professor de História com IHU On Doutorado pela Universidade Federal Fluminense, José D’Assunção Barros. Entre as obras mais recentes de Barros, destacam-se os livros O Campo da

História. Petrópolis: Vozes, 2004 e O Projeto de Pesquisa em História. Petrópolis:Vozes, 2005. Barros também possui formação em Música, e leciona História da Arte e História da Música nos cursos de Graduação em Música do Conservatório Brasileiro de Música. Coordena em sua Instituição de Ensino (USS) o Laboratório da Imagem do Som, que se dedica ao estudo e promoção de atividades relacionadas à integração entre História, Imagem e Som e, neste mesmo Laboratório desenvolve, conjuntamente com outros professores, um Projeto de Pesquisa sobre História e Cinema.

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IHU On-Line - Quais são as principais características nas representações da Idade Média no cinema? José D’Assunção Barros - A Idade Média, segundo penso, encontrou no Cinema diversos tipos de “representações”. Para entendê-las, em toda a sua riqueza e diversidade, devemos colocar duas ordens principais de questões: uma se refere ao Cinema como representação, de modo geral; outra se refere às representações mais específicas que as pessoas tendem a fazer da Idade Média, e que embora não se refiram apenas ao Cinema, tendem a contaminar também o Cinema quando a este se impõe a tarefa de representar a Idade Média. Ainda sem abordar o problema mais específico da Idade Média no Cinema, eu me perguntaria: o que as pessoas, de modo mais geral, esperam de um filme quando este se propõe a interagir com um fundo histórico qualquer, não importa de qual período? Respondo que as pessoas vão ao Cinema, neste caso, para uma destas três coisas: para fugir da realidade com a qual convivem no seu dia-a-dia; para ir ao encontro de uma realidade historicamente localizada, a qual desejam conhecer; e, por fim, para atingir uma outra realidade de modo indireto, por vezes a de sua própria época, de maneira cifrada. Para o caso da Idade Média, isso significa que o Cinema poderá tratá-la ou como uma “fantasia”, ou como uma “realidade” a ser conhecida; ou como forma de se referir a uma outra realidade para a qual a Idade Média será apenas uma “metáfora”. Iremos encontrar nos diversos filmes que se ambientaram na Idade Média não apenas estas três pretensões, como combinações delas. Representações mais específicas Já com relação à Idade Média propriamente dita, e conseqüentemente às suas representações no Cinema, eu proporia exatamente esta pergunta: como os historiadores e também as IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

pessoas mais comuns, vêem a Idade Média? Como elas a representam para si mesmas? Esta segunda ordem de questões é muito importante, porque o Cinema também é uma arte para as massas, para pessoas comuns, embora não seja apenas isso. Quero dizer com isso que o Cinema procura expressar por meio dos seus filmes históricos diversas representações da Idade Média (ou de qualquer outro período) que já estão disponíveis para as pessoas comuns nos livros de história e nos livros de estórias. Além disto, o Cinema procura dar a este público algo que se refere aos seus desejos e temores mais íntimos e mais intensos, algo que tenha um significado verdadeiro para as suas vidas. Eu identifico – entre outras – algumas “Idades Médias” que se acham perfeitamente representadas no Cinema por meio dos filmes já produzidos até hoje, e que atendem a este objetivo de ir ao encontro do público por meio de seus desejos, de suas esperanças, de seus temores. Apenas para citar algumas, lembrarei aqui a “Idade Média da fé”, A “Idade Média obscura”, a “Idade Média de luz”, a “Idade Média encantada”, a “Idade Média heróica”, a “Idade Media passional”. Estas dimensões, e muitas outras, pertencem à Idade Média como período histórico extremamente rico e complexo, mas muitas vezes o Cinema trabalha sobre uma delas (ou sobre uma combinação delas) exatamente como há historiadores que tendem a representar a Idade Média ora enfatizando um ou outro destes aspectos, ora combinandoos no sentido de realizar uma representação mais complexa.

IHU On-Line - Qual seria o filme precursor dessas representações? Que filmes o senhor citaria, como mais significativos dessa época? José D’Assunção Barros - Uma vez que lhe disse na resposta anterior que não há apenas uma única representação da Idade Média contemplada pelo Cinema, acho-me na obrigação de mencionar 49

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alguns exemplos sobre os vários casos. Não poderei esgotar todos os exemplos, pois, caso contrário, a resposta se alongaria demais. Mas vão aqui alguns. Para a primeira ordem de questões – a do Cinema que se aproxima da Idade Média como “fantasia”, “realidade” ou “metáfora” – eu começaria com um exemplo bem conhecido. O Feitiço de Áquila, um filme produzido em 1985 e que constitui um dos mais belos roteiros ambientados na Idade Média, faz-nos aproximar por um lado da Idade Média como “fantasia” e de, outro lado, colocanos em contacto com uma combinação de duas representações da Idade Média: a “Idade Média encantada” – isto é, aquela a que nos acostumamos desde crianças pelos contos de fadas – e a “Idade Média passional”, esta Idade Média onde os sentimentos são vividos de maneira radicalmente intensa, como é o caso do amor trovadoresco, o amor que deve enfrentar grandes desafios e obstáculos para que finalmente se concretize (ou mesmo para nunca se concretizar). Essa representação da Idade Média como um período que tem como uma de suas principais características a entrega a sentimentos vividos no seu limite de intensidade também tem o seu lugar na historiografia. Huizinga, por exemplo, desenvolveu em seu célebre livro O Declínio da Idade Média precisamente esta idéia de que uma das principais características da Idade Média é a tendência a explorar os sentimentos na maior intensidade possível.

IHU On-Line - E com relação aos filmes a que o senhor se referiu como um tratamento da Idade Média como “realidade” a ser conhecida? José D’Assunção Barros Relativamente a esta modalidade, alguns dos mais célebres filmes sobre personagens históricos – como por exemplo Joana D’Arc ou São Francisco de Assis – colocam-nos precisamente diante da intenção de trazer ao espectador algo do que realmente teria IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

acontecido em determinado período histórico. Nesses casos, o primeiro plano passa a ser ocupado pela intenção de permitir que o público entre em contato com uma realidade que realmente aconteceu nesta época que classificamos historicamente como Idade Média. Cada cineasta busca realizar esta aproximação “realista”, obviamente, à sua maneira. Há a possibilidade de romantizar e estetizar estes episódios históricos, mas conservando a preocupação, por exemplo, de assegurar um cuidadoso figurino, um cenário fidedigno para o período, uma estrutura que traga a estes filmes um efeito de realidade. A Joana D’Arc de Victor Fleming, um filme de 1948, ou de Otto Preminger, este datado de 1957, procuram assegurar a sua atmosfera de realismo por meio dos figurinos e cenários, tal como nos mostra Gerda Lerner em um ensaio Imperfeito incluído no livro Passado Imper feito; mas também o filme A paixão de Joana D’ Arc de Carl Dreyer, um filme de 1928 e que ainda era em preto e branco, busca atingir um intenso realismo por meio da recriação do ambiente psicológica que envolvia a tortura, e esta cena ocupa de fato um lugar privilegiado no filme. Assim, enquanto os dois primeiros filmes tendem à “Idade Média heróica”, poderíamos acrescentar, o terceiro tende a enfatizar a “Idade Média obscurantista”, dando especial ênfase a um dos temas que movimentam alguns dos mais profundos temores do homem moderno: a Inquisição (que não deixa de ser associada às terríveis formas de totalitarismo que o homem moderno conheceu tão bem por meio de processos como o desenvolvimento do Nazismo, que, por sinal, estava em gestação na Alemanha daquele mesmo período).

IHU On-Line - Poderia dar-nos mais algum exemplo sobre a maneira como os cineastas têm procurado retratar a realidade medieval,

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terminando por produzir representações distintas? José D’Assunção Barros - Também poderíamos contrastar filmes sobre São Francisco. Francisco, o Arauto de Deus, de Roberto Rossellini – um cineasta profundamente cristão – remete-nos, com seu realismo árido e despojado, muito mais à “Idade Média da fé” do que à “Idade Média da luz”. Já Irmão Sol, Irmã Lua, de Franco Zeffirelli, é um filme que parece colocar-nos diante de uma preocupação muito maior com o espetáculo, com a exuberância das cores. A Idade Média, aqui, afasta-se das sombras, embora tenhamos o mesmo tema histórico como objeto de representação. Podemos afirmar que cada uma destas representações traz uma faceta importante da Idade Média. Se este período ficou conhecido como “A Idade da fé”, por oposição à centralidade que o racionalismo e o pensamento científico ocuparam na Idade Moderna, a Idade Média também apresenta este lado do espetáculo, da exuberância de cores e das luzes encontraram a sua expressão mais bem acabada nas catedrais góticas. Ainda falando na intenção de um filme assegurar um certo realismo histórico, vale lembrar que também pode ser desenvolvida uma história fictícia, criada pelo autor, mas contra o pano de fundo de um ambiente que se busca reconstituir com o máximo de precisão, valendo-se da erudição histórica – e aqui será possível lembrar o filme O Nome da Rosa, dirigido em 1986 por Jean-Jacques Annaud, e que foi baseado no romance de mesmo nome de autoria de Umberto Eco.

fazem-nos aproximar na verdade de uma crítica social ou de um protesto relacionado com a nossa própria época. A Idade Média, então, é utilizada como “metáfora”. Este é o caso de Os Visitantes da Noite, um filme de Marcel Carné datado de 1942, que é, na verdade, uma parábola dirigida contra o totalitarismo nazista, produzida em uma França ocupada pelos alemães. Este filme, além de utilizar-se da Idade Média como parábola, também evoca uma combinação da “Idade Média obscura”, associável às sombrias forças nazistas com a metáfora da “Idade Média encantada”, que tem como um de seus personagens o próprio Diabo. Ao final da história, saíram vencedores o amor e a liberdade, o que se encaixa perfeitamente na metáfora antinazista, e o filme se encerra com a magistral cena em que dois amantes, transformados em estátuas de pedra, fazem ressoar alto as batidas de seus corações.

IHU On-Line - Quais as estéticas e os recursos mais característicos nos filmes da Idade Média? José D’Assunção Barros - As estéticas e recursos, naturalmente, vieram se transformando com o tempo, ao mesmo tempo em sintonia com as novas possibilidades tecnológicas que vieram surgindo e com as várias correntes cinematográficas que se desenvolveram. O filme Cruzada, de Ridley Scott (2005) – que acompanha a narrativa de uma cruzada medieval ocorrida em 1185 – pôde contar, por exemplo, com alta tecnologia e com um enorme investimento financeiro, em uma escala que não teria sido possível há algumas décadas atrás.

IHU On-Line - E com relação ao que o senhor mencionou inicialmente, a respeito da possibilidade de se utilizar a Idade Média como “metáfora”, poderia dar algum exemplo mais específico? José D’Assunção Barros - Para este caso, será importante lembrar os filmes que, por meio de um enredo medieval, IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

IHU On-Line - O que vem sendo discutido nos meios acadêmicos sobre Idade Média na ficção? Quais os principais debates e críticas? José D’Assunção Barros – São muitas as questões acadêmicas que se abrem diante do tema da representação fílmica da Idade Média, mas talvez a principal 51

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se refira ao fato de que um filme, mesmo que retrate um período anterior com recursos que busquem assegurar um efeito máximo de realidade, e mesmo que seja amparado por uma rigorosa pesquisa documental e bibliográfica, fala-nos muito mais de nossa própria época do que do período retratado. Devemos nos perguntar, como historiadores, o que nos revela o filme Cruzada acerca do impacto produzido em nossa própria época pela Guerra do Iraque e por outros confrontos contemporâneos, envolvendo nações ocidentais e o mundo islâmico. A escolha da temática de um filme não é obviamente gratuita: ela emerge de um fundo histórico específico. A maneira como um filme é contado, da mesma forma, também nos revela muito da época em que o filme foi produzido. Desse modo, discute-se muito nos meios acadêmicos essa relação dialética entre uma “representação”, que é produzida em uma determinada época (o século XX ou este princípio de século XXI que estamos vivendo) e aquilo que se pretende representar – no caso que presentemente discutimos, a Idade Média. Mais especificamente com relação a enredos fictícios ambientados na Idade Media, devo acrescentar que eles também são bastante úteis para o Ensino da História – tanto quanto os filmes que se propõem a desenvolver questões históricas que se referem a fatos e pessoas que estão documentados. Basta lembrar o já mencionado exemplo de O Nome da Rosa – um filme que permite aprender muito do que foi a Idade Média. Esta, aliás, é também uma questão que tem sido bem discutida nos meios acadêmicos: a possibilidade de utilizar didaticamente os filmes sobre a Idade Média, inclusive os de enredo fictício.

IHU On-Line - Quais são as principais riquezas culturais da Idade Média? José D’Assunção Barros - A Idade Média é, na verdade, um período complexo, multifacetado. Produziu IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

inúmeras realizações culturais – que vão das canções trovadorescas às catedrais góticas. Se, por um lado, a Idade Média foi a “Idade da fé”, sob o rigoroso controle da Igreja, por outro, os séculos XII e XIII foram os séculos das heresias. As novas possibilidades religiosas e a própria fragmentação da Igreja já se anunciam na Idade Média, da mesma forma como ali se gestam as monarquias centralizadas que logo se afirmaram no mundo moderno. Da mesma maneira, a Escolástica não deixa de trazer uma contribuição fundamental para o pensamento filosófico que se seguiu e a Alquimia, hoje se sabe, estendeu-se até Newton, que era um pensador extremamente complexo. Contudo, muitas vezes, a imensa contribuição cultural da Idade Média é esquecida. Como se discute muito hoje, os períodos que se seguiram historicamente à Idade Média produziram leituras diversificadas da Idade Média, e algumas delas não foram nada positivas, terminando por reduzir o período medieval a aspectos que, se existiram, são na verdade apenas uma pequena parte do que realmente foi a Idade Média. Assim, no início do chamado período moderno, sob o contexto do Renascimento, produziu-se naturalmente uma visão negativa da Idade Média: a visão da Idade Média como uma “idade de trevas”, que foi mais tarde reeditada pelo Iluminismo. Por sua vez, os artistas românticos tenderam a enfatizar em suas representações da Idade Média aquilo que melhor ia ao encontro de seus desejos, como, por exemplo, a intensidade dos sentimentos expressos pelo amor cortês, uma realização original e importante do período medieval. O momento em que vivemos, e o Cinema desempenha aqui um papel fundamental, permite que reconsideremos estas diversas facetas da Idade Média, que lidemos com as suas várias representações possíveis, que as coloquemos em contraste com a nossa 52

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própria época para melhor compreendêla. O interesse expressivo do Cinema pela Idade Média, segundo penso, referese ao fato de que as várias temáticas relacionadas a este período têm conseguido canalizar de maneira particularmente intensa alguns dos principais desejos e temores modernos. A Peste Negra prefigura a Aids; a Inquisição canaliza os receios diante dos regimes totalitários; a Alquimia, o Encantamento e o Trovadorismo

canalizam os desejos contemporâneos de ultrapassar o excessivo racionalismo e uma forma de vida exageradamente utilitarista, regida exclusivamente pelos mais frios interesses econômicos. O homem moderno, às vezes, vai buscar nos filmes ambientados na Idade Média a intensidade de sentimentos que ele nem sempre encontra na sua vida cotidiana, apesar de todos os perigos que a envolvem.

Adoecer: Morrer ou viver – reflexões sobre a cura e a não-cura nas reduções jesuítico-guaranis IHU Idéias Neste dia 24 de agosto, das 17h30min às 19h, acontece o IHU Idéias intitulado

Adoecer: Morrer ou Viver - reflexões sobre a cura e a não-cura nas reduções jesuítico-guaranis (Província Jesuítica do Paraguai, século XVII). A Prof.ª Dr.ª Eliane Cristina D. Fleck, docente do PPG em História da Unisinos, é a palestrante. O evento, aberto a toda a comunidade acadêmica, acontece na Sala 1G119 do IHU. No artigo a seguir, escrito especialmente por Fleck, a pedido da IHU On On--Line, são adiantados alguns aspectos do assunto. Graduada e mestre em História pela Unisinos, Eliane Fleck intitulou sua dissertação de mestrado O imaginário dos séculos XVI e XVII - suas manifestações e alterações

na prática missionária jesuítica. Obteve o doutorado em História pela PUCRS, tendo sua tese o título Sentir, adoecer e morrer - sensibilidade e devoção no discurso

missionário jesuítico do século XVII. Uma das contribuições mais recentes de Fleck à On--Line aconteceu na edição 171, de 13 de março de 2006, quando concedeu a IHU On entrevista Porque me ufano de meu país, de Affonso Celso, obra analisada no IV Ciclo de Estudos sobre o Brasil: Intérpretes do Brasil, em 16 de março deste ano.

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Saúde e doença nas Missões Por Eliane Cristina D. Fleck Segundo o historiador jesuíta Guillermo Furlong25 […] con anterioridad a la labor misionera entre los Guaraníes, y antes de la venida de los españoles, estos indios eran sanísimos, y como se expresaba un misionero al referirse a ellos, sólo conocían una enfermedad: la vejez” (Furlong, 1962, p.604). A introdução e a propagação de doenças desconhecidas como gripe, sarampo, varíola, tuberculose, disenteria, febre amarela, malária, pneumonia epidêmica, cólera, tifo, sífilis, lepra e doenças venéreas não só debilitaram como também desorganizaram as populações indígenas atingidas, facilitando o avanço da frente espanhola. As Cartas Ânuas registram que os missionários “con más buena voluntad que ciencia adecuada, acudían al alivio de los enfermos” (Furlong, 1962, p. 604)26, apesar de as Constituições da Ordem definirem que entre “las ocupaciones que no convienen a Guillermo Furlong (1889-1974): historiador jesuíta argetino. Escreveu mais de 80 livros e cerca de 1.500 publicações. Algunas de suas obras são Glorias santafesinas (1923), Los jesuitas y la cultura rioplatense (1930), El padre Quiroga (1930), La enciclopedia rioplatense de José José Sánchez Salvador (1930) e Cartografía jesuítica del On--Line) Río de la Plata (1936). (Nota da IHU On 26 Cabe ressaltar que, nos séculos XVI e XVII, os médicos formados nas universidades recebiam um ensino puramente acadêmico sobre os princípios de fisiologia dos humores. Aprendiam que a doença surgia de um desequilíbrio entre os quatro humores (o sangue, a fleuma, a bílis amarela e a bílis negra). O diagnóstico consistia em estabelecer que humor estava desequilibrado, e a terapia, em medidas para recompor o equilíbrio, fosse por sangrias – com cortes na veia, escarificação ou aplicação de sanguessugas – ou pela submissão do paciente a uma série de purgantes e vomitórios. Assim, o médico seguia uma monótona rotina de sangrias e purgas, prescrevendo ainda emplastros, ungüentos e poções. (Nota da autora) 25

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clérigos y religiosos se cuenta la medicina, y mucho más el comercio al parecer íntimamente ligado al sostén de boticas”. (Leonhardt, 1937, p.101) Estas proibições, contudo, podiam ser desconsideradas, quando o atendimento se fizesse necessário, “tratándose de la misericordia y caridad para con los pobres, cuando hace falta otro médico o cirujano” (Leonhardt, 1937, p. 103). Sabe-se que durante os séculos XVII e XVIII, os jesuítas puderam exercer a medicina “y expender a la gente las necesarias medicinas”, devido à inexistência de “Protomedicatos” que vieram a ser implantados nos diversos Vice-Reinos somente após a primeira metade do século XVIII. Já a 1ª Instrução do Pe. Diego de Torres Bollo (1609) deixava claras as condições a serem observadas pelos jesuítas no momento da instalação da redução e expressava a preocupação com o controle de doenças e com o eficiente abastecimento de alimentos. Desse modo, além de estarem autorizados a atuar como médicos nas situações de epidemias, deveriam evitar a debilitação dos indígenas pela fome ou pela instalação de determinadas enfermidades, usando medidas de prevenção. Considerando o imenso território que os Guarani ocupavam, as epidemias se propagaram facilmente, devido à sua grande população e à intensa comunicação que existia entre as aldeias, ligadas por uma rede de trilhas e caminhos abertos no interior das florestas ou pelos cursos d’água. Ivori Garlet observa que “os próprios missionários eram, em muitos casos, os agentes transmissores de doenças. Em algumas circunstâncias, o efeito das epidemias frustrava as suas expectativas, 54

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enquanto em outras, assinava o aval de seu ingresso nas aldeias, sendo tomados por grandes pajés que sabiam como tratar estas novas e estranhas doenças” (Garlet, 1997, p. 40). As doenças trazidas pelos espanhóis colocaram, inevitavelmente, os Guarani ante uma necessária reformulação de suas atitudes diante da doença e da morte. Isto pode ser observado tanto no Tesoro de la Lengua Guaraní, quanto no Bocabulário de la Lengua Guaraní (Montoya, 1876), organizados pelo Pe. Antônio Ruiz de Montoya e que registram, entre outras, as expressões ligadas às doenças, às epidemias e às reações dos Guarani diante de suas desastrosas conseqüências. As epidemias, então definidas como “peste” ou “enfermedad” pelos jesuítas, foram denominadas pelos Guarani como mbaba, taçi ai, maraa, mbae açi. Entre as doenças epidêmicas referidas: tepotí ugui ou tepoti pyta = “camaras de sangre/ desinteria”; mbirua = “ampollas/sarampo”; acanundu yrundi ara – naboguara = “quartãns/malária”. Como expressões reveladoras da percepção sobre os efeitos das epidemias, destacamos: nache mo amongueri taci = “a enfermidade levou minha gente”; chembotiabo mbar raci = “a enfermidade acabou com a minha gente”; y pichibi tabaa oupa hacipabamo = “está a aldeia espantada com tantos enfermos”; mbae aci oqui rucu ore rehe = “chove a enfermidade sobre nós”.

medio ambiente” como acreditavam “en el origen mágico y sobrenatural de la enfermedad”, apoiando suas práticas médicas “en recursos mágicos y religiosos y en alguna medida en remedios vegetales”. Enquanto “resultado de fuerzas extrañas y superiores al hombre, frente a las que solamente cabía el recurso a ofrendas y desagravios de tipo individual o colectivo, según la naturaleza del pecado cometido” (Téllez, 1993, p. 19), a enfermidade implicava um estado em que o indígena se encontrava “poseído o dominado por espíritus animales telúricos, que roban o destruyen al individuo, su alma, o su órgano enfermo” (Varah, 1984, p. 97).

A difusão – nas reduções jesuíticoguaranis da Província Jesuítica do Paraguai – da visão européia dos seiscentos sobre a doença – que explicava a perturbação da ordem natural por intervenções sobrenaturais, decorrentes de transgressão moral ou religiosa – foram em muito favorecidas pelas concepções de doença e de morte existentes entre os Guarani. Os indígenas americanos não só “mantenían un equilibrio sanitario entre las causas de enfermedad y su

Foram, sem dúvida, a mística envolvida nas curas e os rituais mágicos que garantiam a eficácia das mesmas, que causaram a oposição dos missionários. Daí ser possível perceber o confronto entre xamãs e missionários como uma disputa de saberes e poderes, pelo controle das doenças e pela manipulação das curas e não-curas. Este aspecto fica evidenciado, especialmente, nos registros que referem o uso de relíquias, a administração dos sacramentos do

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As Cartas Ânuas revelam que os missionários condenaram e resistiram ao emprego de ervas, resinas e bálsamos indígenas, limitando-se aos escassos remédios europeus e às práticas terapêuticas européias, sobretudo às práticas próprias de uma “medicina de tipo exorcista”, o que muito prejudicou o alívio dos enfermos em doenças que não puderam ser evitadas e para as quais não havia cura. Sonhos, visões, presságios, rezas, ervas, sopros e sucções – rotuladas como práticas diabólicas quando executadas pelos xamãs –, viriam a ser aplicadas, com uma justificativa religiosa cristã, pelos missionários que – assim como os xamãs – valiam-se da imaginação e do misticismo dos indígenas.

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batismo, da extrema-unção, do viático, o uso do licor de São Nicolau, das imagens de santos e da água benta. Empregada em doenças que abrangiam, desde picadas de cobras, dores musculares, disenteria, inchaço nos olhos, gripe e garganta inchada, peito inchado, febres, até reumatismo, surdez, hemorragias, coqueluche, lepra, varíola, sarampo e câncer, esta terapêutica esteve associada, invariavelmente, à cura ou à não-cura, ambas manipuladas pelos missionários com a intenção de converter os indígenas, acenando-lhes com a promessa da vida eterna. Em sua obra Os Reis Taumaturgos, Marc Bloch27 (1924) lembra que os ritos de cura não podem ser pensados e considerados fora das superstições que formam o “maravilhoso” de uma época e das “tendências gerais da consciência coletiva”. Por entendemos que as curas realizadas pelos missionários jesuítas nas reduções da Província do Paraguai, devam ser analisadas sob essa perspectiva, propomos algumas indagações: Os missionários realmente curavam? Se não curavam, como mantiveram a crença em seus poderes? Estes questionamentos foram, em grande medida, formulados com base na constatação do uso recorrente pelos missionários de expressões como “deixar-se morrer” e “bem morrer” e da percepção de que a cura era o “melhor meio de domesticar os indígenas”. Alguns missionários, no entanto, chegaram a afirmar que a “falta de comidas” ou o “bom estado da agricultura” condicionavam a conversão e definiam os “frutos do Evangelho”, o que os levava a admitir que as doenças não decorriam, exclusivamente, da justiça divina, e que fatores como Marc Léopold Benjamim Bloch (1886-1944): historiador francês. Junto com Lucien Febvre, é um dos criadores da Escola dos Annales e da Revista dos Annales, fundada em 1929. (Nota da On--Line) IHU On 27

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migrações e mudanças climáticas contribuíam para a debilitação dos indígenas. Isso não impediu que, de qualquer modo, os efeitos das doenças e das curas sobre os Guarani, com relação à conduta e às crenças, merecessem destaque na documentação. Cabe lembrar que as Ânuas referem essencialmente os casos de doentes que se disseram (e se mostraram) curados após a intercessão dos santos, da água benta, do batismo ou das relíquias sagradas. Não há qualquer referência aos insucessos nas tentativas de curas, ou então, menção a recidivas de doenças, o que atestaria que a terapêutica empregada não havia sido eficaz, levando o indígena a repetila, ou então, a desacreditá-la. Quando as doenças cediam ou pareciam ceder, dando a “ilusão da cura” se estabelecia uma relação entre fé e milagre, entre pecado e perdão, entre conversão e cura. Em relação aos registros de cura de indígenas que haviam sido dados como incuráveis ou até mortos, deve-se considerar a tendência natural do corpo humano de livrar-se de algumas doenças sem auxílio externo. Muitos dos achaques curados milagrosamente pertenciam àquela espécie que só o tempo podia curar, tais como as febres e as feridas abertas. Deve-se, ainda, considerar que as potencialidades dos medicamentos disponíveis eram muito restritas e que muitas das doenças e das curas estiveram, com certeza, associadas à fantasia e à imaginação. Na medida em que não propriamente os recursos medicinais sofreram contestação, mas sim sua eficácia ritual, as Ânuas referentes à segunda metade do século XVII revelam uma significativa e crescente absorção da farmacopéia e das práticas curativas indígenas, o que não só ampliou as possibilidades de manipulação estratégica das curas, como reduziu significativamente o caráter depreciativo a elas originalmente 56

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atribuído, o que fica atestado na admiração expressada por cronistas e historiadores do século XVIII em relação aos herbários e boticários das missões jesuíticas. Referências Bibliográficas FURLONG, Guillermo SJ. Misiones y sus Pueblos de Gauranies. Buenos Aires: Ediciones Theoria, 1962. LEONHARDT, Carlos SJ. Los Jesuítas y la medicina en el Rio de La Plata. Estudios 57, Buenos Aires, n. 57, p. 101118, 1937. GARLET, Ivori José. Mobilidade Mbyá: História e Significação. Porto Alegre,

1997. Dissertação (Mestrado em História). Programa de Pós-Graduação em História, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. TELLEZ, Carmen Sánchez. La medicina en las lenguas americanas y filipinas prehispanicas.[s.l.] Producciones de la Universidad de Alcalá de Henares, 1993. VARAH, Alfredo. La construcción guarani de la realidad - una interpretación psicoanalítica. Asunción: Centro de Estudios Antropológicos. Universidad Católica, 1984. BLOCH, Marc. Os Reis Taumaturgos. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.

“Memórias Ecônomo-políticas sobre a administração pública do Brasil”, de Antônio Gonçalves Chaves I Ciclo de Estudos sobre a Formação Social Sul-Rio-Grandense: a leitura de seus intérpretes

Dando prosseguimento ao I Ciclo de Estudos sobre a Formação Social SulSul-RioRioGrandense: a leitura leitura de seus intérpretes, a Prof.ª Dr.ª Ester Judite Gutierrez palestra, nesta quinta-feira, 24 de agosto, das 19h30min às 22h15min, na Sala 1G119 do IHU. Como tema, será examinado e discutido o livro de Antônio Gonçalves Chaves

Ecônomo--políticas so sobre Memórias Ecônomo bre a administração pública do Brasil. 4ª ed. São Leopoldo: Unisinos, 2004. Na entrevista a seguir, concedida por e-mail à IHU On On--

Line, a pesquisadora menciona que as idéias contidas nessa obra são atuais “mais pela permanência do que pela solução dos problemas apontados quase dois séculos atrás”. Graduada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Gutierrez é especialista em Fundamentos da Educação e em Gestão do Patrimônio Cultural Integrado ao Planejamento, ambos os cursos pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Cursou mestrado e doutorado em História na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), com a dissertação, posteriormente publicada, Negros, charqueadas & olarias. Um estudo sobre o eespaço spaço IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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pelotense. 2. ed. Pelotas: UFPel, 2001 e a tese Barro e sangue: urbanismo, arquitetura pelotense mão--de de--obra. Pelotas (1777 (1777--1888). Pelotas: UFPel, 2004. É autora também de e mão ítalo--gaúchos (1875 (1875--1914). Passo Fundo: Ed.UPF, 2000. Arquitetura e assentamento ítalo

Um escrito pioneiro Entrevista com Ester Judite Gutierrez

IHU

On-Line - Quais são os principais aspectos destacados pela obra de Gonçalves Chaves? Ester Judite Gutierrez – O pioneirismo de seus escritos, tanto no que se refere à data da publicação, 1822, como também, pelas críticas que fazia e pelas idéias que divulgava. Defendia o fim do regime escravista, confiava nos princípios do liberalismo econômico, recriminava as elites locais e a os representantes da coroa lusa, censurava o autoritarismo e a corrupção. O texto não mostrou a totalidade de seu pensamento. O autor propôs o que lhe pareceu possível ou viável. Falou da péssima e corrompida administração colonial lusitana e da necessidade de seguir um sistema liberal. Queria a República, mas indicou a Monarquia constitucional ou temperada como a forma de governo mais própria para a nossa união. Apontou as injustiças sociais e as dificuldades econômicas que decorreram da estrutura fundiária da campanha rio-grandense. Criticou o sistema de distribuição de grandes sesmarias e propôs repartições mais equilibradas das terras, acabando com o favoritismo e o nepotismo. Gonçalves Chaves queria a Abolição, propôs o fim do tráfico, porque entendia como a única proposta para a situação histórica daquele momento. Sabia que o fim do tráfico, que ocorreria em 1850, era a única bala certeira para a derrubada do regime escravista.

IHU On-Line - Qual é a atualidade dessa obra e como ela pode ajudarIHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

nos a compreender a realidade brasileira e, em específico, gaúcha? Ester Judite Gutierrez – O pensamento de Antônio José Gonçalves Chaves é atual mais pela permanência do que pela solução dos problemas apontados quase dois séculos atrás. A corrupção e a má distribuição de terras são exemplos irrefutáveis dessas questões que são nacionais e estaduais. Igualmente, a constatação: “o excessivo número de escravos faz que não os possamos tratar como temos obrigação”, pode ser transposta para a população carcerária do Brasil e do Rio Grande de hoje. O seqüestro de jornalistas, seguido da divulgação de vídeo com pedidos de mudanças nos presídios, recentemente ocorridos, são ilustrativos dessa situação.

IHU On-Line - De que modo a sociedade gaúcha, baseada na economia do charque, é retratada? Ester Judite Gutierrez – Gonçalves Chaves definiu a economia escravista, sobretudo a do charque, como uma economia do desperdício, porque, primeiro, implicava a reversão de um capital fixo na compra de escravos; cativos, independentemente da sazonalidade da produção saladeiril e das necessidades de mercado, que tinham de continuar sendo, alimentados, vestidos, alojados e vigiados; segundo, introduzia um corpo de trabalho parasitário, responsável pelo controle, pela manutenção da disciplina, continuação do próprio trabalho servil; terceiro, o prosseguimento das duras e cansativas 58

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tarefas dava-se pela violência e não pelo incentivo, o que resultava numa resistência passiva dos escravizados; quarto, os cativos consumiam muito e produziam pouco (sic.); quinto, a condição servil impedia a especialização técnica. Enfim, as condições de trabalho, o baixo preço pago para a aquisição de novas “peças”, impediam a reprodução natural da mão-de-obra necessária. Em conseqüência, apresentava pouca flexibilidade.

IHU On-Line - Qual é a abordagem do autor sobre a mão-de-obra escrava e seu papel na construção da economia de nosso estado e país? Ester Judite Gutierrez – Gonçalves Chaves fez uma crítica negativa ao modo de produção escravista, em especial, a salgadora. Propôs acabar com esse tipo de organização do trabalho. Literalmente, disse que ia fazer, e fez, uma análise econômica da produção escravista. Não apelou para a moral nem para o paternalismo, nem para questões humanitárias. Simplesmente, e inteligentemente, provou que era inviável economicamente. Diferente dos homens de seu tempo, Gonçalves Chaves percebeu as limitações estruturais impostas ao escravismo,

principalmente, carnes salgadas.

à

manufatura

das

IHU On-Line - Como se fundem "barro e sangue" nesse contexto? Ester Judite Gutierrez – Esse contexto está mais próximo de Negros, charqueadas & olarias, exatamente, porque o foco foi o Sítio Charqueador Pelotense. Nessa pesquisa, mostramos que, no inverno, quando a grama estava rala, o gado magro, não se matava, a mão-de-obra escravizada era aproveitada na produção de tijolos e telhas cozidos. Os cativos passavam os verões envoltos pela carne, pelo sangue e os dias frios e chuvosos cobertos pelo barro que extraíam e moldavam. Essa constatação respondeu à pergunta: O que faziam os trabalhadores servis na entressafra do charque? A cidade foi construída em alvenarias de tijolos e coberta com telhas cerâmicas, tema esse tratado em Barro e Sangue. Nas charqueadas, verificou-se a alternância entre a produção do charque e a produção nas olarias. Na cidade, constatou-se um coeficiente de correlação negativa entre a construção da área urbana e a produção saladeiril. Nos anos de muita produção e exportação de carne salgada, pouco se construiu. Nos anos de muita construção, pouco se produziu e exportou de charque. Talvez, essas observações expliquem o fôlego que teve o moribundo regime escravista.

IHU exibe filme Cidade Baixa Cinema BR em Movimento E o projeto Cinema BR em Movimento continua. Marque em sua agenda e venha conferir: a exibição acontece dia 23-8-2006, na Sala 1G119, às 19h30. Trata-se do longa Cidade Baixa, de Sérgio Machado, e do curta Desirella, de Carlos Eduardo Nogueira, a serem debatidos pelo Prof. MS. Fábio Alexandre Moraes, da Unisinos. A entrada e franca e toda comunidade acadêmica está convidada.

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On--Line, de 21-11-05, na editoria Cidade Baixa já foi discutido na edição 165 da IHU On Filme da Semana. Confira o comentário através do sítio do IHU, www.unisinos.br/ihu, onde você pode fazer download da edição mencionada. Em 18-02-06 a produção recebeu o Grand Prix do Festival Internacional dos Filmes de Amor, na Bélgica. No 58º Festival de Cannes, Cannes Cidade Baixa foi agraciada com o Prêmio da Juventude, que é concedido na mostra paralela Um Certain Regard. Regard Na Itália, Cidade Baixa ganhou dois prêmios este ano. O longa dividiu o prêmio de melhor filme com o francês

Douches Froids, no Festival de Cinema de Verona, Verona que tem como foco apenas filmes de amor. Alice Braga, protagonista do longa, também foi premiada. Com esses dois reconhecimentos, Cidade Baixa soma dezessete prêmios conquistados. E a programação não pára por aí. No dia 14-09-06, serão exibidos os filmes Vinícius, de Miguel Faria Jr., e Alma Carioca, de William Figueiredo. O debate ficará por conta da Prof.ª Dr.ª Simone Assumpção, docente na Unisinos.

Um filme para além dos clichês Por Francis Vogner dos Reis

Reproduzimos a seguir o artigo de autoria de Francis Vogner dos Reis e publicado originalmente na página www.cineimperfeito.com.br. Conforme o artigo, Cidade

Baixa é um filme que “não se escora em clichês brasilianísticos, em exotismo macumba-pra-turista e também não sofre de saudade crônica e impotente”. Cidade

Baixa é qualificado por Reis como “o mais belo filme de amor do ano e não exatamente um filme romântico”.

Quando os ares são de transformação sempre há um contrafluxo reacionário. Qualquer novidade no cinema brasileiro vem acompanhada de polêmicas que questionam, sempre, “se tal modo de filmar as pessoas, os lugares e os temas é realmente justo”, o parâmetro usado (quando se trata da “imagem do povo”), é o Cinema Novo, que infelizmente, na boca de muitos, virou cânone e receita pra entender “o povo”. Esse tipo de atitude dá a entender que os temas brasileiros sofrem de tanto IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

ressentimento que não é possível transgredir qualquer limite considerado “moral”. Se essas polêmicas não são destituídas de um mínimo de razão, elas se tornaram o coro da mediocridade e do complexo de inferioridade. Cidade Baixa é um recente caso que representa uma necessidade de “ver” as coisas de modo diferente, de sair da ditadura dos temas que “interessam”. Não se escora em clichês brasilianísticos, em exotismo macumba-pra-turista e

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também não sofre de saudade crônica e impotente. O filme de Sérgio Machado guarda semelhanças com Madame Satã de Karim Ainouz (co-roteirista aqui), pois em ambos a câmera reage com o corpo que filma. O filme se passa na Bahia. Não há Brasil profundo e noção abrangente de povo. Corpo é a palavra (e o objeto) chave em ambos os filmes. Cidade Baixa respira na batida desses corpos. Em uma cena Deco e Naldinho conversam com Karinna em um deck. Sem aviso prévio ela pula, desaparecendo do quadro. A altura só é percebida pelo som do seu encontro com a água. Naldinho a segue e salta também. Essa seqüência, que aparentemente não contribui em nada para o desenvolvimento dos personagens e até mesmo da dramaturgia (exigências que viraram camisa de força) consegue imprimir toda a força que Cidade Baixa tem de sobra, que vem do jeito muito particular que o cineasta filma a história de seus personagens. A atitude impulsiva, física, esse salto de Karinna e Naldinho é o tipo de ação que os dirige. Há uma liberdade que exaspera em cada plano, uma liberdade que não é condicionada pelo oposto “não liberdade”, mas liberdade como genuíno modo-de-ser. Deco, Karinna e Naldinho são filmados bem de perto, não só em questão de distância, mas também, e principalmente, em de um jeito que cria organicidade entre o

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ambiente e esses personagens. É como se tudo fosse uma coisa só. A fauna urbana com seu moradores, as ruas tortas, os puteiros, o cais, o comércio ambulante possui uma intensidade que compõe uma cartografia humana e geográfica da Cidade Baixa. O filme entende não só as vicissitudes de uma vida urbana, vê além do mero estudo de caso social: uma simbiose entre a cidade e seus personagens como um “todo” orgânico, assimétrico. O nome do filme não poderia ser outro que não “Cidade Baixa”, ela como esse “todo” é o personagem principal, Karinna Deco e Naldinho são suas partes. O que interessa na história de Deco e Naldinho é a inevitabilidade do triângulo amoroso vivido com Karinna. Da união dos dois amigos ao elo de ambos com Karinna que abala a amizade entre eles. Tudo é tão físico que a morte naturalmente espreita as relações, as ruas e os amores. Se a morte é uma constante entre esses personagens, o surgimento da vida também é um acontecimento natural (a gravidez de Karinna por exemplo), não um tipo de ruptura na vida miserável na possibilidade de família, ou qualquer outra coisa que idealize o que poderia ser melhor para os personagens. Eles estão longe da impotência, sabem escolher. O amor que vem acompanhado de morte, ciúmes e violência, mas também de tesão, amizade e paixão. Cidade Baixa é o mais belo filme de amor do ano e não exatamente um filme romântico.

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O decrescimento como condição de uma sociedade convivial Cadernos IHU Idéias “A sociedade do crescimento não é sustentável nem desejável", defende Serge Latouche, economista, professor de Ciências Econômicas na Universidade Paris-Sul, em artigo publicado nos Cadernos IHU Idéias, n.º 56, sob o título acima, que acaba de ser lançado pelo Instituto Humanitas Unisinos. No artigo, o autor expõe a organização de uma sociedade de "decrescimento" serena e convivial. Segundo Serge Latouche, "com o decrescimento, não se trata de voltar ao desenvolvimento (redensenvolvimento), tampouco entrar em subdesenvolvimento ou em des-desenvolvimento, mas simplesmente sair do desenvolvimento". Os Cadernos IHU Idéias podem ser adquiridos na Livraria Cultural, situada no andar térreo do prédio da Biblioteca, e/ou na Tabacaria Central, que fica no Centro Administrativo, ambas no campus da Unisinos. Também é possível fazer o pedido pelo e-mail humanitas@unisinos.br

Estudando as religiões Cadernos IHU A diversidade religiosa sempre é um tema instigante, por isso Estudando as

Religiões: Aspectos da história e da identidade religiosos é o título do Caderno IHU nº17, organizado por Adevanir Aparecida Pinheiro, Cleide Olsson Schneider e José Ivo Follmann. O material apresentado é rico em experiência. Está repleto de vivências de líderes religiosos em suas respectivas tradições, relatando aspectos de sua história e de sua identidade. Os Cadernos IHU podem ser adquiridos na Livraria Cultural, situada no andar térreo do prédio da Biblioteca, no Câmpus da Unisinos, ou pelo endereço livrariaculturalsle@terra.com.br Informações pelo fone 55 (51) 3590 8223. O Caderno IHU nº 17 já estará disponível no sítio do IHU para download, a partir do dia 7 de setembro.

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Sala de Leitura Criando Meninas, de Gisela Preuschoff (Fundamentos: 2003). O livro aborda o universo feminino desde a infância, assim como faz algumas relações sobre meninos e meninas em diferentes idades. É um suporte válido para quem, como eu, está iniciando-se nessa jornada de ser mãe, valendo também para os pais. Ainda dá tópicos sobre alguns assuntos que nos parecem supérfluos, porém são de suma importância serem trabalhados. Para as mães, é uma oportunidade de resgatarmos a nossa infância, e até perceber o porquê de algumas lacunas na nossa educação. O livro não ensina a educar, porém nos dá um grande alerta sobre o que já sabemos: pai e mãe presentes principalmente na primeira infância não tem substituição. Para quem tem filho vale a pena, visto que também há o livro criando meninos. Patrícia Cilene Sant’anna, Pro.fª MS da Unidade Acadêmica de Ciências da Saúde da Unisinos. Do Golpe ao Planalto, de Ricardo Kotscho (Cia. Das Letras). Com mais

de 30 anos de reportagem nos mais diversos veículos da imprensa brasileira, Ricardo Kotscho é um dos mais experientes jornalistas do Brasil. Trabalhou como repórter nos grandes jornais do centro do país. No ABC, no fim da década de 1960, conheceu o então sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva. Foi assessor de Lula nas campanhas presidenciais do PT. Neste livro, conta histórias curiosas e bastidores de grandes reportagens e experiências na política. Kotscho também é dono de um texto refinado e extremamente bem construído. Daniel Scola, Prof. MS da Unidade Acadêmica de Ciências da Comunicação. Estou lendo Crianças do Consumo: a infância roubada, de Susan Linn (tradução Cristina Tognelli. São Paulo: Instituto Alana, 2006, 322p.). A autora é professora de psiquiatria na Escola Médica de Harvard e diretora associada do Centro de Mídia Infantil Judge Baker (Boston). O livro denuncia as mazelas da sociedade do consumo e do consumismo, estimulado pelo marketing, em especial aquele dirigido às crianças. “As crianças são as queridinhas dos EUA corporativos”, afirma a autora, sendo alvos do marketing para tudo, “desde hambúrgueres até minivans”. A autora aborda a temática em doze capítulos, destacando a agressão invasiva das corporações, que visam a vender seus produtos, desde as maternidades (“Bebês de marca: do berço ao consumo”), passando pelos lares e atingindo as escolas (“Alunos à venda: quem lucra com o marketing nas escolas?”). É o marketing de alimentos, de bebidas, de brinquedos, de roupas, de games etc., indutor de hábitos e condutas vazios de valores humanos (a família é um valor defendido pelos “conservadores”), distanciando as crianças de brincadeiras e, conseqüentemente, da criatividade. A autora sinaliza as manifestações da sociedade civil na busca de alternativas transformadoras para libertar as crianças da exploração comercial.Recomenda-se a leitura do livro. Almiro Petry, Prof. MS da Unidade Acadêmica de Ciências Humanas da Unisinos.

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IHU Repórter Julie Reichert Um jeito de menina simples e sensível mistura-se com a segurança de quem parece caminhar na direção das metas traçadas. A webwritter da Unisinos, Julie Reichert, tem apenas 22 anos. Reservada, a estudante de Jornalismo da Unisinos valoriza a família, gosta de arte e sonha em conhecer o mundo. Nesta entrevista, Julie conta sua trajetória de vida, sua paixão pela criatividade e revela-se dona de fortes atitudes.

Origens – Eu nasci no dia 8 de janeiro de 1984, em São Leopoldo, mas moro em Novo Hamburgo. Meus pais sempre moraram lá, mas a minha mãe sempre trabalhou em São Leopoldo, no Hospital Centenário. Em função disso, acabei nascendo em São Leopoldo. Existe, na minha família, uma rixa entre São Leopoldo e Novo Hamburgo. Meu pai, por exemplo, esperou passar um tempo só para me registrar como tendo nascido em Novo Hamburgo. Tenho uma irmã três anos mais nova. Infância – Moro na mesma casa desde que eu nasci. Tive uma infância muito tranqüila, muito bacana. Tenho pais muito protetores. Aquela coisa de convívio de rua, de passar o dia correndo na vizinhança, eu nunca tive, mas meus amigos sempre iam à minha casa. Eu tenho um pátio enorme. Tem até galinha. Meu pai sempre quis que tivéssemos uma infância muito próxima da natureza, dos animais. No entanto, eu sempre detestei galinhas. Eu era muito de brincar de Barbie e adorava desenhar. Tive aquela infância normal, de muitas brincadeiras, diversão, amigos e primos... Família – Meu pai é gerente das lojas Colombo em Novo Hamburgo. Minha mãe é técnica de laboratório. Tive uma convivência muito forte com minha irmã e meus primos. Estudos – Estudei no colégio Pio XII em Novo Hamburgo. Fui presidente do Grêmio Estudantil. Era daquelas pessoas “triesforçadas”, muito dedicada, até me rotulavam como CDF de vez em quando. Com o Grêmio, acho que pude fazer mais amigos e até mostrar para todo mundo que eu não era só a Julie que estudava, que também era Julie que fazia amigos, que fazia festas, que era amiga. Carreira – Na época de escolher a profissão, estava em dúvida entre Arquitetura, Jornalismo, Engenharia Ambiental, História e Fisioterapia. Uma carreira em cada área. Decidi pelo Jornalismo porque adoro escrever e queria trabalhar em revista ou jornal. Fiz vestibular na Unisinos, na PUCRS e na UFRGS. Passei na Unisinos e na PUC, e IHU ONLINE • WWW.UNISINOS.BR WWW.UNISINOS.BR /IHU

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acabei ficando por aqui. Lembro que, quando vinha fazer as provas do vestibular na Unisinos, eu não me via estudando aqui. Eu achava tudo tão grande. E hoje, não consigo me imaginar estudando em outra instituição. Web – Quando entrei para a faculdade vi uma vaga de estágio e mandei meu currículo. Não fui chamada para essa vaga na Rádio Unisinos. Um dia me ligaram para tentar uma outra uma vaga de estágio no setor de Hipermídia, para trabalhar como webwriter. Fiz bem descompromissada as provas e as entrevistas, pois, como estava no início do curso, achava que não seria escolhida. No fim, estou aqui até hoje. Fiquei dois anos como estagiária e fui contratada. Agora já estou há dois anos como funcionária, trabalhando no Núcleo Internet da Gerência de Comunicação Institucional da Universidade. Quando comecei, não tinha nenhuma experiência profissional. Não pensava em Internet como um espaço onde eu pudesse atuar. Imaginava-me trabalhando em redação de jornal e de revista, ou de repente em produção de rádio. Mas, quando surgiu a oportunidade de trabalhar aqui, eu gostei. Não sabia quase nada de Internet, menos ainda de informática, mas era “triesforçada” e tinha um texto legal. Fui aprendendo aos poucos e hoje eu adoro. Trabalhar com a Web é muito interessante, pois envolve várias áreas do saber, vai do jornalismo, passa pelo marketing e atinge a informática. Horas livres – Saio com os meus amigos, vou a festas, cinema, academia e, claro, faço os trabalhos da Faculdade. Time – Sou gremista. Já fui bem fanática. Paixão – A família é tudo na minha vida. Quando eu tinha 13 anos, fiz uma cirurgia grande de coluna. Nestes momentos, descobrimos a real importância de uma família. Imagem – As pessoas me vêem como reservada, responsável e séria. Quem não me conhece pode até me achar um pouco fechada. Mas aí, quando a pessoa me conhece de verdade, ela vê que sou muito mais aberta e descontraída do que aparento. Livro – Memórias Póst Póstumas umas de Brás Cubas, do Machado de Assis. Gosto da narração. Acho criativa. A criatividade me atrai. Artes – Gosto bastante de pintura, aprecio as cores e as formas. Meu pintor favorito é o Kandisnky. A cadeira de História da Arte me influenciou muito. Kandisnky Filme – Forrest Gump, de Robert Zemeckis. Música – Qualquer uma dos Rolling Stones. Presentes - Sou difícil de dar presente. Gosto de ganhar coisas práticas e úteis. Férias - É descanso. É dormir até tarde, ficar mais em casa com a família, olhar mais TV, ler mais livros, ir para a praia... enfim, recarregar as energias. Sonho - Conhecer o mundo Eleições - Esse ano está difícil saber. Tenho minhas opiniões, minha posição, mas não sou muito de expô-la.

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Unisinos - A Unisinos é uma segunda casa. Eu passo muito mais tempo aqui do que em casa. Aqui está meu trabalho e minha faculdade. Eu adoro o câmpus. Eu nem me imaginava aqui dentro, hoje não vivo sem ele. Instituto Humanitas - O IHU eu vejo como um importante centro difusor do conhecimento. Alguns cursos e algumas áreas da Universidade estão tão relacionadas com a questão do mercado, de números. No IHU, tudo é mais reflexivo.

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