Abril 2016

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por Mariana Diniz Lion - Editora-Chefe

Fórum da Liberdade na presença da amiga Adriana Teixeira

“Aconteceu neste mês o chamado Superbowl do Libertarianismo. O 29º Fórum da Liberdade foi realizado na PUC, em Porto Alegre, nos dias 11 e 12 de abril. Por isso, inclusive, a revista saiu com algum atraso – mea culpa! O Fórum pra mim foi uma novidade – e apesar de ter trabalhado muito durante o evento, as palestras, conteúdo e ensinamentos serão divulgados pelos organizadores muito em breve.

Outros eventos especiais aconteceram nesse mês – diversas Conferências Estaduais dos Estudantes Pela Liberdade e a Conferência Atlantos – que contaram com a presença de Yaron Brook, CEO do Ayn Rand Institute. Eu, particularmente, aproveitarei tudo o que aprendi para trazer mais firmeza para o meu trabalho na revista. Deixo aqui meu agradecimento especial a todos os que me ajudaram a vivenciar momentos únicos nos últimos dias: se realizar um sonho não tem preço, os passos que damos em direção à sua concretização tem valor ainda mais inestimável. Muito obrigada!”

Yaron Brook, CEO do Ayn Rand Institute 2


Sumรกrio

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A simbiose entre

ESTADO

e

GRANDES EMPRESAS no Brasil

Um dos aspectos mais marcantes da atual crise brasileira é a relação espúria entre Estado e grandes empresas. Porém, para além das ilegalidades, há também a repetição de um tipo de orientação de política econômica que já ocorreu em outros momentos históricos. Na República Velha, onde o café era a principal fonte de “riqueza nacional”, as oligarquias cafeeiras se articularam para, através do governo central, controlar os preços internacionais do produto, alegando que o café era um “monopólio natural” do Brasil e deveria ser “defendido e valorizado”. A Era Vargas, procurando romper com a economia agroexportadora, inaugurou um período de industrialização nacional, com forte tutela estatal. A mesma receita foi aplicada durante a ditadura militar, culminando com a “década perdida” e a inflação totalmente fora de controle. A política econômica brasileira sempre foi marcada, com algumas exceções, pelo “capitalismo politicamente orientado”, em que o Estado procurou tutelar a atividade econômica, numa simbiose entre esta e o poder político, em que não há uma diferença clara 4


entre o público e o privado nas relações sociais. De maneira geral, o principal argumento para justificar esse tipo de orientação é o de que o Brasil, como um país “novo”, com uma economia “dependente”, precisa ser “protegido” da concorrência internacional para alcançar o “desenvolvimento”. No entanto, a consequência destas políticas foi o crescimento em “vôos de galinha” em que, após um momento de bonança econômica, estimulado pelas artificialidades e planejamentos estatais, segue-se um período de crise e estagnação. Estas relações, no entanto, não partem somente da iniciativa estatal, mas das próprias empresas, que pressionam os governos para obterem privilégios, dando margem, além da corrupção, a um sistema econômico pouco calculável, em que as regras econômicas não são claras e o ambiente de investimentos é inseguro. Com isso, somente as grandes empresas conseguem alcançar o crescimento, beneficiando-se de privilégios legislativos e também de auxílios como o crédito público direcionado. Enquanto isso, as pequenas e médias empresas não conseguem prosperar e o fechamento em relação aos mercados internacionais obriga os consumidores a arcarem com os altos custos dos bens e serviços fornecidos por empresas pouco produtivas. Assim, mais uma vez, no momento atual, nos vemos diante de relações patrimonialistas, não só repetidas, mas também reforçadas e redimensionadas na Era Petista. Max Weber coloca que, no patrimonialismo, homens isolados puderam vir a ocupar, por meio de relações pessoais, posições privilegiadas que possibilitaram “oportunidades de aquisição quase ilimitadas”. No entanto, evidentemente para o autor, estas condições dificultam a constituição de um 5 A Agorista - Abril 2016


sistema econômico capitalista, uma vez que o condicionamento político da economia gera insegurança de base jurídica, em função da “duração sempre incerta dos monopólios” e do surgimento constante de novos privilégios, de forma que “o caráter arbitrário da forma de dominação patrimonial” opõe-se ao desenvolvimento do capitalismo industrial privado. Assim, o “espírito” da administração patrimonial, cujo interesse repousa na tranqüilidade e no contentamento dos súditos, “opõe-se com repulsa e desconfiança” ao desenvolvimento capitalista, que “revoluciona” as condições de vida existentes. Raymundo Faoro ressalta que “no curso dos anos sem conta”, o patrimonialismo estatal incentivou o setor especulativo da economia, “voltado ao lucro como jogo e aventura”, ao mesmo tempo em que tentou promover o desenvolvimento econômico sob o comando político. Também adotou “o mercantilismo como técnica de operação da economia”, gerando um capitalismo politicamente orientado, “não calculável nas suas operações”. Este tipo de relação social, política e econômica, porém, mesmo sendo uma constante e uma condicionante das sociedades patrimoniais, não é totalmente incontornável. Um exemplo disso são outros países da América Latina, como os da Aliança do Pacífico. Ricardo Velez Rodríguez coloca que países como Chile, Peru, Colômbia e México, nos últimos dez anos, sanearam suas economias, conseguiram manter taxas sustentadas de crescimento, diminuíram o desemprego e melhoraram os indicadores sociais a partir da colocação de suas empresas no circuito do mercado internacional, através de tratados de livrecomércio, inclusive com os EUA e Europa. 6 A Agorista - Abril 2016


Enquanto isso, o Brasil - juntamente com Argentina, Venezuela, Bolívia - fechou cada vez mais sua economia, alimentando o discurso “antiimperialista” e nacionalista. No entanto, ficou evidente que os projetos de “desenvolvimento” trataram-se na verdade de uma simbiose entre o Estado e as grandes empresas, a fim de evitarem mutuamente a concorrência econômica e política. Dessa maneira, percebemos que mais grave do que a corrupção – podemos ousar dizer – é a condução irresponsável do governo em relação à economia e às contas públicas, o que não só privilegia de maneira “passiva” as grandes empresas, como também é resultado direito das pressões e das articulações políticas feitas por elas. No entanto, mais do que um problema atual, esta é uma característica “estrutural” do Estado no Brasil, de longa duração, mas que, conforme exemplos de países próximos, pode vir superada ou, ao menos, mitigada.

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Cinelogia por Lucas Oleiro

HACHIKO – uma história de devoção

Poucas histórias da ficção superam as da vida real. É por isso que cinebiografias emocionam, cativam e ainda nos levam a pensar sobre o tema durante dias. Um dos filmes com este efeito é o Sempre Ao Seu Lado (Hachiko: A Dog´s Story, 2009, EUA) com Richard Gere, Joan Allen, Jason Alexander, Cary-Hiroyuki Tagawa e outros. O filme conta uma história que aconteceu no Japão no início do século XX. Hachiko é o nome do cão da raça akita, famoso no país e depois fora dele, que ficou conhecido através de reportagens em jornais. Nos artigos que narravam a história de lealdade ao dono, professor da Universidade de Tóquio, Hachiko acompanhava seu amigo todos os dias até a estação de trem e sempre estava lá quando o professor retornava. Imagens da Internet

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A história dos dois virou uma lenda no Japão e foi usada nas escolas para ensinar às crianças a importância lealdade entre amigos. Despertou uma onda de criações de akitas no país, que até então restavam apenas 30. Hoje é possível encontrar na estação de Shibuya uma estátua de Hachiko, no lugar onde ele ficava esperando seu dono voltar. No filme, Hachiko continua sendo um akita. Ele é achado ainda filhote em uma estação na periferia de Nova York pelo professor universitário Parker Wilson (Richard Gere), que o leva para casa. No início, sua esposa (Joan Allen) se recusa a adotar o pequeno, mas fica comovida com a relação dos dois. Um colega de Parker, o também professor universitário Ken (Cary-Hiroyuki Tagawa), é responsável por explicar os ritos e crenças japonesas. Ele diz que por uma "conexão espiritual", talvez não tenha sido o professor que achou Hachiko, mas o cão que o escolheu como dono. "Hachi" é o numeral japonês para oito, especial, que simboliza a ligação entre os planos terrenos e transcendentes.

Imagens da Internet

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Este belo romance pode nos levar a reflexão, mas não a atribuir características unicamente humanas aos animais como conclusão. Animais, como Hachiko, agem por instinto de sobrevivência. Eles não são capazes de pensar num futuro maior do que alguns minutos ou se lembrar com detalhes do passado, suas ações são direcionadas ao aqui e agora. Cães não são podem refletir sobre a consequência de atitudes que ainda não tomaram ou sobre o remorso de uma decisão que os levou a agir de forma errada.

Animais domésticos como cães e gatos, vivem entre humanos há aproximadamente 30 mil anos, por melhor se adaptarem as nossas rotinas e relações sociais. Mas com a evolução, outros mais inteligentes e próximos ao homem como macacos, golfinhos e elefantes podem eventualmente entender o sofrimento de outros a ponto de oferecer ajuda. As manifestações destas percepções, que chamamos de empatia, podem variar da mímica corporal, quando o animal imita o movimento do outro (coçar, bocejar, sorrir, cruzar as pernas, mostrar os dentes) até a percepção emocional, que são captadas no convívio e passam a ficar em sintonia (medo, alegria e raiva). Imagens da Internet

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O cão, com seu instinto natural, pode proteger a família de uma agressão, perceber as mudanças de humor, realizar tarefas domésticas e circenses e até ser considerado o melhor amigo do homem por manifestações de lealdade e fidelidade. Ainda que bastante distante dos seus antepassados, os lobos, um cão se reconhece em uma matilha que tem uma estrutura funcional e principalmente, um líder. Em 2004, na Califórnia, um labrador chamado Jet se sacrificou ficando na frente de seu companheiro, um pequeno garoto que estava prestes a ser atacado por uma cascavel, recebendo a mordida e o veneno. Se tornou um herói. Não pensou na própria sobrevivência, como um altruísta autêntico. Este comportamento instintivo do animal pode parecer ético em algumas circunstâncias, mas não passa de um fenômeno ligado a ação e reação. Jet agiu desta maneira por considerar o menino um membro do seu grupo (matilha), aplicando o impulso biológico e primitivo de sobrevivência familiar. Compartilhando da preocupação de Cesar Millan, o Encantador de Cães - que colaborou muito com a relação do autor desta coluna e sua bulldog dourada, a Dilma - entendo que os cachorros da nossa sociedade desejam ter o que a maioria dos cães que vivem soltos tem: a possibilidade de simplesmente ser cães, de viver em uma matilha estável e equilibrada. Nossos cães lidam com um problema desconhecido para muitos cachorros soltos pelo mundo: a necessidade de "desaprender" os esforços bemintencionados, mas destrutivos, de seus donos para transformá-los em pessoas com quatro patas e pelos. E Hachiko, apesar da beleza da história do filme, mostra o que é um cão autêntico, um companheiro diligente, através de seus atributos e limitações naturais. Na história, o animal não foi capaz de perceber o motivo da ausência do seu dono, pois lhe faltou a capacidade cognitiva necessária, as noções de direitos, deveres e responsabilidades éticas e morais. A Agorista - Abril 2016

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É muito estranho que tantos de nossos amigos libertários e anarquistas se oponham e até mesmo ridicularizem os direitos dos animais com tanta intensidade. Por um motivo: o direito animal é perfeitamente libertário por ser justamente um direito negativo. Diferente dos tão incoerentes direitos positivos, como o “direito à educação” e “direito à saúde”, o direito animal é, acima de tudo, o direito de ser deixado em paz. Ele não necessariamente convoca o governo a cobrar tributos apenas para oferecer a estes animais comida, abrigo e cuidados veterinários. Ele apenas requer que nós paremos de matá-los e de fazê-los sofrer. Não consigo pensar em nenhuma outra situação em que um libertário não esteja apenas reclamando para si direitos positivos – “o direito de submeter os animais a qualquer uso que deseje” – enquanto o oposto é pregar um direito negativo! O princípio da não-agressão (PNA) determina que é moralmente errado iniciar o uso de força contra outras pessoas (e sua propriedade), exceto em casos de legítima defesa. A questão, de modo geral, é: este princípio se aplica aos animais? Um ensaio traduzido e adaptado do original de David Graham, por Mariana Diniz Lion

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Seriam os animais parte da “comunidade moral” que é protegida pelo PNA? Muitas pessoas costumam responder que não. Usaremos, aqui, a expressão “direitos dos animais” como uma expressão para indicar a reinvindicação de que animais possuem um único direito: O direito de não serem mortos ou submetidos a sofrimento por humanos, exceto em legítima defesa. Se você tem implicância com o termo “direito”, também pode pensar nessa expressão como equivalente à seguinte proposta: É moralmente errado mata animais ou fazê-los sofrer, exceto para legítima defesa. O argumento mais poderoso para nos levar até esta conclusão é o Argumento dos Casos Marginais. São chamados Casos Marginais os que se referem a humanos em que falta a habilidade de racionalizar ou há a impossibilidade de responsabilizarem-se por suas ações, mas ainda são considerados parte da comunidade moral e possuem o direito de não serem mortos ou submetidos a sofrimentos, exceto em casos de legítima defesa (os filósofos também chamam estas pessoas de ‘pacientes morais’). Esse argumento é tão crucial para os direitos dos animais que o filósofo Daniel Dombrowski escreveu um livro inteiro sobre o assunto, chamado Babies and Beasts: The Argument from Marginal Cases. Ainda não se conhece nenhuma resposta satisfatória a este argumento. Este me convenceu, de forma racional, que é moralmente errado matar animais ou fazê-los sofrer se não for para legítima defesa. O Argumento dos Casos Marginais vale-se de pura lógica Aristotélica. Assim seria o Argumento aplicado no curso de um debate casual. Opositor dos direitos dos animais: Como você pode dizer que animais possuem direitos? É impossível. Defensor dos direitos dos animais: Por quê? Opositor: Por uma razão – animais não são racionais. Eles não podem ser responsabilizados por suas ações. Para possuir direitos, é necessário ter essa capacidade. 13


Defensor: Mas peraí – crianças também não podem ser responsabilizadas por suas ações. Significa que podemos caçar bebês? Opositor: Claro que não. Crianças serão capazes de ponderar, algum dia. Devemos tratá-las como potenciais detentoras de direitos. Defensor: Mas e se a criança estiver terminalmente doente e só possuir seis meses de expectativa de vida? E uma pessoa que nasceu sem uma parte do cérebro e tem a capacidade mental de um porco? E uma pessoa senil? Estaria tudo bem matar, comer e usar essas pessoas para seus próprios interesses, assim como de fato fazemos com os porcos hoje em dia? Opositor: Bem... Deixe-me pensar sobre isso. Bem-vindo ao Argumento dos Casos Marginais. Dada a importância revolucionária deste argumento, ainda me choca o número de libertários que ignoram e ridicularizam os direitos dos animais. O autor deste artigo chegou, inclusive, a mandar e-mails para conhecidos opositores, questionando qual sua posição frente ao argumento. Alguns deles responderam que ser humano é o suficiente para se ter direitos – e ponto. Alguns se esquivaram da questão. Um ou dois admitiram que não poderiam contraargumentar, mas que não iriam tão longe a ponto de concordar que animais possuem os mesmos direitos que ‘humanos marginais’. E vale ressaltar que por ‘humanos marginais’ não há referência somente àqueles que perderam temporariamente sua capacidade, mas a pessoas que a perderam de forma permanente. Um dos argumentos que contrapõe parte da aplicação dos Casos Marginais na argumentação é o da Normalidade das Espécies. Diz-se, portanto, que ainda que você faça o recall de cadeiras por elas não poderem suportar pessoas sentadas, elas não se tornam macacos ou palmeiras. 14


Por analogia, diz-se que ‘humanos marginais’ ainda pertencem à categoria ‘humanos’. Expõe-se que, porque ‘humanos marginais’ pertencem a uma espécie que normalmente raciocina, sente culpa, assume responsabilidades sobre seus atos (condição previamente estabelecida, pelos opositores, para que se possuam direitos), os ‘marginais’ também merecem proteções morais como o PNA – o status moral de um indivíduo dependeria do que é normal para a espe´cie daquele indivíduo. No entanto, este contra argumento é falho. A ideia possui apelo, já que é óbvio que não devemos tratar uma outra pessoa de um mode pior meramente porque é um desafortunado – como diria-se, por exemplo, de alguém com dano cerebral grave. No entanto, suponha que um chimpanzé aprenda a ler e escrever em português. Suponha, ainda, que ele eventualmente se torna capaz de conversar sobre ciência, literatura e moral. Suponhamos que um dia ele queira ingressar em uma universidade. Claro que haveriam diversos argumentos sobre permiti-lo, mas imagine que alguém diga “Somente humanos podem frequentar a universidade. Humanos podem ler, falar e compreender a ciência. Chimpanzés não.” Mas este chimpanzé pode fazer estas coisas. “Sim, mas chimpanzés normalmente não podem, e é isso que importa”, responderia este alguém.

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Esse é um bom argumento? Embora outros argumentos possam eventualmente refutar o Argumento dos Casos Marginais, este é fraco. Ele assume que nós deveríamos determinar como um indivíduo deve ser tratado, não com base em suas próprias qualidades, mas com base nas qualidades de outros indivíduos. Este chimpanzé não seria autorizado a fazer algo que requer leitura, embora seja capaz de fazê-lo, porque outros chimpanzés não o são. Isso não parece apenas injusto – é irracional. Claro que o direito de um chimpanzé “ir à faculdade” é irreal, mas sua lógica se aplica a qualquer tipo de direito. Ele nos leva ao reductio ad absurdum. A negação de concessão de direitos de nosso chimpanzé superdotado segue a premissa de que devemos tratar os indivíduos de acordo com o que é normal à sua espécie. Se você acha tal determinação inaceitável ou minimamente irracional, também deve rejeitar o argumento de os ‘humanos marginais’ devem ser tratados conforme a normalidade humana. E por que parar em direitos? Se o status moral de um indivíduo depende do que é normal para sua espécie, porque não impor as mesmas obrigações morais nos casos marginais? Segundo os opositores, uma parte essencial de ser moralmente habilitado é assumir responsabilidades pelos seus atos. Por outro lado, nós não atribuímos responsabilidades aos que não são capazes, uma vez que eles não sabem o que estão fazendo. Sendo assim, se concordarmos com o argumento da Normalidade das Espécies, deveríamos punir todos os ‘humanos marginais’ por suas más ações. Se, por exemplo, um homem em estágio avançado de Alzheimer foge de sua clínica, rouba um veículo e atropela uma criança, devemos acusá-lo de homicídio culposo e jogá-lo em um presídio. A maioria das pessoas diria “Claro que não se deve punir um homem claramente incapaz por estas ações. Você deve levar em consideração seus aspectos individuais, não se pode tratálo como a qualquer pessoa normal”. Exatamente. E é por isso que o argumento da Normalidade das Espécies é falho. Inclusive, se você pensar bem, este argumento é bastante anti-libertário. Requer o julgamento de alguém não 16


pela sua individualidade, mas como membro de um coletivo – neste caso, sua espécie. Não é diferente dos coletivismos que ouvimos constantemente da esquerda. Se não faz sentido definir o valor moral de um indivíduo somente com base na sua raça, é igualmente sem sentido fazê-lo com base na sua espécie. As diferentes espécies, por si só, não são moralmente relevantes. O que importa é a natureza individual sob as luzes dos princípios morais objetivos. É fácil apreender este fato quando fazemos uma introspecção e nos perguntamos: Por que é moralmente errado infligir sofrimento a humano que não pode raciocinar? Por que é imoral torturar uma pequena criança? Será que é porque esta tem potencial para se tornar um agente moral no futuro? Seja honesto. Não seria realmente porque a criança sofreria, apesar de possuir interesse em não estar sofrendo? Não seria porque forçar a criança a sofrer, contra sua vontade, violaria o PNA? Por que é imoral usar um doente de Alzheimer como tiro ao alvo? É porque este é membro de uma espécie que normalmente é formada por aqueles que podem ser responsabilizados por seus atos? Com certeza não. É porque considerar a possibilidade de sofrimento, quando há interesse em não sofrer, e tratá-lo de modo contrário à sua vontade, vai diretamente de encontro ao princípio da não-agressão. E tudo isso ainda é verdade quando se fala do macaco. Como um ‘humano marginal’, o macaco pode sofrer. E não é de seu interesse sofrer. Forçá-lo a sofrer ou mesmo morrer, exceto para legítima defesa, é violar o PNA.

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Ok. Mas se os animais têm o direito de não sofrer, não caberia a nós policiar seus instintos e impedir predadores de atacar suas presas? Não. Animais devem defender a si próprios além de, claro, não possuírem o direito positivo de serem protegidos, tanto quanto os humanos não o teriam de acordo com a lógica libertária. O que o argumento dos Casos Marginais prova, é que é imoral para agentes morais tratar aos animais de maneiras que não trataríamos ‘humanos marginais’, exceto para legítima defesa. Porque os animais não são agentes morais, o que eles fazem está fora do alcance da ética. Alguns diriam que então a zebra tem o “direito” de não ser esmagada por uma rocha caindo. Como agentes morais, nós só podemos nos preocupar com aquilo que nós deveríamos ou não fazer. Animais selvagens estão por sua conta. Ao menos, o animal predado na natureza tem uma chance de luta. Mas não a possui quando trancado numa jaula. Outra objeção popular é:”Mas animais se matam e se comem na natureza, então por que nós não podemos fazer o mesmo?” Em outras palavras: “Se outros animais podem, nós podemos.” Certamente seria bobo basear nossos princípios morais nas ações de animais que sequer podem ponderar sobre o que fazem! Alguns animais comem seus descendentes. Isso significa que estou moralmente apto a comer os meus? Uma questão válida de um anarquista é, “Como os direitos dos animais seria protegidos numa sociedade anarcocapitalista? Diferente de uma pessoa, um animal não poderia pagar uma agência privada de proteção para evitar a agressão”. Talvez tais especulações sejam mais apropriadas para um momento diferente – primeiro, devemo determinar a questão filosófica da existência desse direito. Embora eu tenha dito, no começo do artigo, que muitos libertários ignoram o argumento dos Casos Marginais para ridicularizar os direitos dos animais, nem todos procedem da mesma maneira. Na convenção de 2002 da FEE (Foundation for Economic Education), o autor do trabalho que baseou este artigo, David Graham, conversava com o psicólogo libertário Nathaniel Branden. Durante a sessão de 18


perguntas e respostas, um rapaz disse que mantinha um site objetivista, e que nele havia postado um artigo ridicularizando os direitos dos animais. Uma mulher o contatou por e-mail, o desafiando com o argumento dos Casos Marginais. Ele confessou que não conseguiu pensar em uma boa refutação. Dr. Branden então, o interrompeu: “Receio não poder ajudá-lo nessa”. E então explicou como ele mesmo havia se debatido com a questão do status moral dos animais. Ele disse que mesmo Ayn Rand (uma catlover confessa, por sinal) sentia que deveria existir algo moralmente errado em maltratar animais, mas que, incapaz de ajustar o pensamento à sua filosofia objetivista, deixou o problema de lado. Quanto ele, afirmou não ser capaz de negar a pura lógica Aristotélica do argumento dos Casos Marginais. Ele ficou preso ali. Outros libertários deveriam seguir o exemplo de Dr. Branden e encarar os méritos de uma posição racional a favor dos direitos dos animais. Direitos dos animais não são ridículos. Direitos dos animais não são uma pauta inerente da esquerda. Somente porque os movimentos pelos direitos dos animais têm sido associados à esquerda há anos que é um assunto inerentemente esquerdista, como segurança social ou medicina socializada. Esquerdistas também são contra a Guerra às Drogas. Isso significa que libertários não podem tomar partido sem sucumbir às ideologias esquerdistas? Claro que não. Ser a favor dos direitos dos animais não o colocará utomaticamente na mesma categoria dos ativistas escandalosos. Nós, libertários, devemos ter princípios e prezar pela consistência lógica. É hora de colocar de lado ad hominems e marionetes. Vamos assumir o desafio de desenvolver o tema com coerência e, acima de tudo, honestidade.

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Muito tem sido falado, no meio libertário, sobre feminismo, segregação racial e manifestações culturais estigmatizadas. É, de fato, uma quebra de tabus. Quando o assunto é a garantia das liberdades negativas aos animais, porém, instala-se um silêncio peculiar. Há quem permaneça com as arcaicas convicções rothbardianas que garantem, baseadas em mitos da biologia e solipsismos ímpares, que esses seres tão morfologicamente diferente de nós não devem gozar de direitos sobre suas próprias vidas, posicionamento que se afasta cada vez mais dos avanços daquele liberalismo inovador que não significa apenas pacto da não-agressão e livre mercado.

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O liberalismo, principalmente em sua face libertária, tem sim tudo a ver com o movimento pela ampliação dos direitos aos não humanos. Primeiramente, é necessário entender que lutar pela libertação animal implica ser adepto do veganismo, filosofia de não crueldade que prega a abstenção do consumo de todos os alimentos de origem animal (além da carne, leite, ovos e afins) e o boicote às empresas que promovem testes nos mesmos; respeitando, assim, todos os seres dotados de senciência – a “capacidade de sofrer ou sentir prazer ou felicidade” –, característica que une animais humanos e não humanos, com uma diferença apenas de grau (e não de gênero), como já afirmava Charles Darwin. Além dos veganos se basearem na premissa de que a exploração animal é errada (assim como a escravidão o era), outro motivo forte para se opor às indústrias do leite e de ovos é o sadismo que envolve o sistema de obtenção dessas secreções. Vale ressaltar que a dieta vegana é comprovadamente viável do ponto de vista nutritivo. Segundo o Conselho Regional de Nutricionistas: “As dietas vegetarianas [incluindo a vegana], quando atendem as necessidades nutricionais individuais, podem promover o crescimento, desenvolvimento e manutenção adequados e podem ser adotadas em qualquer ciclo de vida.” Por último, faz-se fundamental quebrar a ideia de que veganos (ou mesmo vegetarianos, veja bem!) só comem mato, inver A Agorista - Abril 2016

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dade muito repetida pelos opositores do estilo de vida cruelty free, a esses recomendo darem uma olhada na página no Facebook do Chubby Vegan. Explanações feitas, vamos à parte do babado, da confusão e da gritaria. Alega-se, com frequência, a fim de justificar o consumo de carne, que estamos no topo da cadeia alimentar. A dieta onívora nos é natural. Natural. A pobreza é o estado natural do homem, dizem proeminentes liberais. Inclusive o conservador Rodrigo Constantino (proeminente – e liberal – dependendo do ponto de vista), que já criticou os veganos diversas vezes, de acordo com ele foi o nada natural “advento capitalista” que trouxe o progresso. Se um novo conceito busca o bem geral, trazendo benefícios a todos, por que não subverter “valores” antigos? É disso que o libertarianismo, que se contrapõe às contradições de conservadores, trata. Os únicos seres racionais dessa situação têm a responsabilidade moral de entender que a partir do momento em que torturas e mortes se tornam totalmente dispensáveis é de uma importância vital que elas cessem. Filtrar as vidas que importam por sua inteligência é perigoso até para os humanos: Einstein teria direitos sobre um garoto que nunca teve oportunidade de estudo? Quantas pessoas ele não poderia subjugar? Se o contra-argumento, porém, é realmente a ideia de que os humanos, no geral, seriam intelectualmente superiores aos animais, devo alertar que galinhas tendem a ser mais inteligentes do que crianças pequenas. É seguro dizer que toda sublevação provém de sentimentos incômodos, que desencadeiam a disposição de lutar pela causa. As sufragistas estavam descontentes com a exclusão que sofriam, os abolicionistas viam a infelicidade proveniente da exploração e das humilhações frequentes – muitas promovidas por agressões físicas, rotineiras nos ambientes de criação de animais –, os homossexuais também eram e são alvo de espancamento e A Agorista - Abril 2016

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desrespeito, o que fez com que fossem criados inúmeros grupos de defesa LGBT. Esses sentimentos fortes, que acometem os mais diferentes tipos de vidas, também estavam presentes no boi cujos órgãos foram devorados ontem numa churrascaria ou na vaca, dona das tetas machucadas que forneceram o leite cheio de pus (células somáticas) que faz o milkshake de chocolate. É isso que deve ser levado em conta. Há muita desonestidade no pensamento de que um bebê órfão deve ter sua vida preservada mesmo sem ser capaz de dizer isso ao passo que não se questiona o sofrimento infligido a um bezerro enquanto é afastado da mãe, mesmo sendo tão óbvio o horror de ambos – mãe e filho. Um princípio da nãoagressão que admite agressões arbitrárias baseado em divisões de espécie precisa ter sua lógica repensada. “E quanto às plantas? Você não tem dó delas?” As plantas não têm sistema nervoso, portanto são incapazes de sentir dor, medo ou felicidade – pelo menos como conhecemos hoje. Elas respondem a estímulos, como já demonstraram pesquisas, mas seu grau de consciência é nulo, um indivíduo não está causando sofrimento a um vegetal ao comê-lo. É risível comparar essa situação ao consumo de um porco. Além disso, grande parte do plantio de vegetais é destinada à alimentação de “animais de criação”. Quem ama as plantas não deve, definitivamente, comer animais. Mas e a afinidade efetiva entre liberalismo e veganismo? Ela começa pelas inovações no mercado. Uma mudança de hábitos requer outros alimentos, outros produtos não testados e sem componentes de origem animal, novos ares. E há espaço pra eles. Qualquer um que conviva num ambiente de adeptos do movimento em prol da libertação animal percebe que a demanda não é pequena. A Agorista - Abril 2016

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O crescimento do mercado “livre de crueldade” facilita a vida e a expansão dos veganos, interesse que propicia também o sucesso do empreendimento. É só através do consumidor que a situação degradante dos animais pode ter fim. Ele é soberano e manda um recado para outras marcas no momento em que opta por aquela que não promove testes abusivos. Um dos principais tópicos do liberalismo é o Estado mínimo. A importância do poder reduzido é ponto pacífico entre conservadores e libertários. A maioria esmagadora dos testes científicos realizados em animais é financiada pelo poder público. E mais: muitas delas têm objetivos esdrúxulos, servindo apenas como fonte de lucro para universidade e estabelecimentos de pesquisa. Num mundo em que pesquisas sádicas obviamente inúteis não têm incentivos financeiros, torna-se inviável continuar com elas. Tendo em vista que atualmente a literatura científica está recheada desses exemplos por causa do intervencionismo, conclui-se facilmente que tais experimentos, no mínimo, diminuiriam de modo vertiginoso e natural numa conjuntura em que dinheiro não é desperdiçado sem propósito. Harry F. Harlow, um psicólogo famoso, realizador de vários testes em macacos (que incluíam um tipo de indução ao estresse em que as macacas esmagavam o crânio de seus filhotes), foi, durante 25 anos, editor do Journal of Comparative and Physiological Psychology, que publicava experiências tão macabras quanto as suas. Ele mesmo admitiu, numa nota de despedida, ter chegado à conclusão de que, depois de analisar cerca de 2500 manuscritos para publicação, “a maior parte das experiências não era digna de realização e os dados obtidos não são dignos de publicação”. Declaração surpreendente se observarmos que o principal intuito do seu próprio trabalho foi demonstrar que a privação prolongada de cuidados maternos pode trazer efeitos A Agorista - Abril 2016

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nocivos a crianças pequenas – e que pra isso se utilizou de racks de estupro e métodos torturantes que não valem a pena detalhar. O filósofo canadense Michael Allen Fox lançou, em 1986, um livro que pretendia justificar eticamente os testes realizados em animais, The Case For Animal Experimentation. A publicação veio em boa hora para os cientistas, que já sofriam um bombardeio de críticas. Mas o curioso é que após uma recensão negativa sobre sua obra, ele respondeu que os argumentos do livro realmente eram equivocados e que tinha concluído não ser possível justificar os testes. Episódio depois do qual virou vegetariano e lançou Deep Vegetarianism, em que faz uma análise profunda do vegetarianismo e defende tal estilo de vida. Se você não é vegetariana(o) provavelmente os fatos citados no texto nunca tinham chegado ao seu conhecimento. Talvez você sequer tenha entrado realmente em contato com as ideias pró-libertação animal. E esse é o maior argumento contra os direitos dos animais: o costume de não os respeitar. Ainda que não seja verbalizado. Com sua Teoria Social Cognitiva, o psicólogo Albert Bandura provou a força que o exemplo tem sobre um indivíduo. Três grupos de crianças assistiram a filmes curtos, de finais diferentes, em que um homem batia num João-Bobo. O grupo que viu o tal agressor ganhar uma recompensa pelo ato tende a repetir aquele comportamento com o boneco. A Agorista - Abril 2016

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Aquilo que alguém pensa sobre suas próprias ações é, muitas vezes, determinado por conceitos estabelecidos previamente. Ao saírem do teste de persuasão, essas crianças conviverão com outro: a sociedade carnista. E ele não dura três horas ou um dia, mas a vida toda.

Em 2009, no programa No Limite, da Globo, pessoas foram induzidas a ingerir ovos cujo feto já estava praticamente todo formado, o que gerou em mim, como em milhares de outros telespectadores, um profundo nojo – à época seguidora de uma dieta onívora, nem me questionei sobre os entraves éticos da situação. Mas tomada por um sentimento de repugnância àquela cena, perguntei à então professora de biologia se comer aquilo (um feto) poderia trazer malefícios à saúde, ela respondeu negativamente com uma leve surpresa cômica pela minha inocência. Eu simplesmente não enxergava a semelhança entre esse ovo e a carne do dia-a-dia. A semelhança absurda. A Agorista - Abril 2016

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Os hábitos de um indivíduo tornam mais compreensíveis a dificuldade que ele tem de aceitar novos pensamentos, ainda que estes busquem livrar cada vez mais seres de injustiças e padecimentos provocados por uma ideologia intrínseca de segregação. Não é a toa que conservadores como Rodrigo Constantino e Reinaldo Azevedo se opõem veementemente ao movimento pela libertação animal. A partir do momento em que não se veem determinadas ações sendo postas em xeque, de modo palpável, elas tendem a ser aceitas sem pestanejo. Mas como disse o destacado dramaturgo e escritor vegetariano George Bernard Shaw, “todas as grandes verdades começam por ser blasfêmias”.

As referências mencionadas no texto e sua publicação original encontram-se na Ficha Técnica.

A Agorista - Abril 2016

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por Nathalia Motta

A Desigualdade é mesmo um problema? Os intelectuais e formadores de opinião brasileiros no que tange a economia tem a tendência quase que cultural de resumir todos os problemas do país em uma palavra: desigualdade. Não é difícil no Brasil encontrar, principalmente em grandes metrópoles, exemplos óbvios dessa disparidade, tornando assim impossível fugirmos dessa questão mesmo que a realidade seja um tanto quanto diferente dos que cismam em usa-la como bode expiatório. Mas, será que a diferença de renda entre os indivíduos é mesmo o problema? Ou será que as condições que as pessoas vivem são muito mais importantes que isso? Thomas Pikkety em seu livro O Capital no Século XXI defende que seja criado imposto e regulação sobre o capital afim de que seja reduzida a desigualdade de renda entre as famílias. Mas, taxar os ricos realmente ajuda os pobres? A Agorista - Abril 2016

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O Estado pegar dinheiro dos ricos e usa-lo para supostamente ajudar os pobres aos olhos de muitos parece ser a solução ideal para se resolver o problema da pobreza, mas quem pensa assim provavelmente nunca ouviu falar da “Curva de Laffer”.

Note que ao atingir o ponto máximo da carga tributária, a arrecadação começa a cair.

A curva de Laffer calcula a relação entre a carga tributária e o total arrecadado pelo governo: quanto mais impostos forem cobrados sobre determinado bem, nesse caso o capital, menor será o incentivo para produzi-lo. Com isso, as pessoas terão mais incentivo para sonegar, criar paraísos fiscais ou até mesmo para não produzir riqueza, o que consequentemente faz com que a arrecadação caia. Sendo assim, isso incentivaria as pessoas a venderem seus bens, e a “empobrecer” já que ser rico implicaria em ter menos dinheiro para si. Medidas desse tipo não enriquecem os pobres, mas empobrecem as pessoas com o capital necessário para investimentos e criação de empregos, esses sim responsáveis por acabar com a miséria. 29 A Agorista - Abril 2016


Qual o problema em João ganhar X e José ganhar X+1 desde que ambos estejam em condições de vida satisfatórias? José provavelmente vive com mais luxo e conforto que João, mas isso não necessariamente significa que João seja miserável. O problema é aqueles que não ganham ao menos X, ou seja, o real problema é a miséria. A falta de acesso à alimentação, a água potável, moradia, educação e emprego, condições básicas de vida. Então, como resolver esse problema? Como garantir que os pobres tenham acesso a esses bens de consumo? Pensemos então em como fazer com que João passe a ganhar também X+1, e não em “redistribuir” o que é de José. Como garantir que pobres tenham acesso a bens e serviços? Só há duas alternativas: ou elevamos a renda das pessoas, ou diminuímos o custo desses bens e serviços. Um estudo realizado pela FIESP (Federação de Indústrias no Estado de São Paulo) realizado em 2014, intitulado “A Carga Tributária no Brasil: Repercussões na Indústria de Transformação” mostra que famílias que ganham até dois salários mínimos, ou seja, 72% dos brasileiros (segundo censo demográfico do IBGE realizado em 2010) gastam até 46% de sua renda em impostos embutidos nas despesas de consumo. Ou seja, quase 50% de todo dinheiro que essas pessoas poderiam usar para ter acesso a mais bens e serviços ou até mesmo para investir em poupança (que aliás no Brasil está em completo declínio, segundo o Banco Central em janeiro de 2016 os saques superaram os depósitos em R$ 12,03 bilhões, a maior retirada de valores registrada desde 1995), cai diretamente nas mãos de políticos e burocratas. O que supostamente deveria voltar ao contribuinte em forma de políticas públicas, serviços sociais e coisas do tipo, é usado para 30 A Agorista - Abril 2016


pagar centenas de benefícios a deputados, senadores, alimentar corrupção e manter um estado extremamente inflado, como o brasileiro que consome R$ 214 bilhões por ano, isso tudo apenas para manter seus servidores. Mesmo nas mais ricas nações haverá desigualdade, e como já foi dito, ela não é em si um problema, o maior desafio é lidar com a miséria e garantir que a população carente tenha acesso a bens de consumo. Redistribuir renda através de impostos progressivos só desestimula os indivíduos a enriquecerem e a pouparem, dinheiro esse que poderia ser utilizado em investimentos, ampliação e criação de indústrias e empresas, geração de trabalho e renda, que cai nas mãos do governo e é utilizado com irresponsabilidade e total falta de inteligência econômica, pagando salários altíssimos, mantendo centenas de cargos “apadrinhados” e regalias à políticos. Impostos sobre indústrias são repassados aos consumidores finais, esses que chegam a comprometer quase metade de sua renda apenas com produtos básicos, o que também os impede de poupar para consumir produtos duráveis. Conceder direitos de propriedades em favelas transformando ativos em capital, já seria um passo grandioso para ascensão dos moradores dessas comunidades. Reduzir drasticamente impostos, conceder direitos de propriedades, garantir um ambiente de negócios e investimentos seguro, aniquilar a burocracia, administrar recursos públicos de forma inteligente e cortar gastos governamentais com extinção de ministérios, cargos comissionados e desnecessários. Essas medidas sim garantem uma sociedade mais rica e empreendedora, e uma consequente ascensão das camadas sociais. 31 A Agorista - Abril 2016


Ritmo de Liberdade

Por Julia Moioli

ACADÊMICOS DE MILTON FRIEDMAN Os Acadêmicos de Milton Friedman são uma das bandas mais interessantes que já surgiram dentro do meio liberal. Com o lema “Samba, Capitalismo e Liberdade”, desde o final de 2013 o grupo vem deixando sua marca com um som de primeiríssima qualidade e letras muito bem elaboradas, que fazem indivíduos de visões variadas, de anarquistas à progressistas, refletirem sobre ideias liberais e contextos políticos. Cerca de dois anos e meio atrás, os músicos João Nogueira e Jopa Velozo publicaram no YouTube sua primeira música, o “Samba do Torreão”, dedicado à um amigo dos dois que defendia o socialismo. “Torreão, garoto bem intencionado/Queria fazer pelo proletariado/Na universidade brasileira/Onde todo mundo paga a brincadeira”, diz um trecho da letra. Esta primeira música foi gravada na casa onde moravam enquanto estudavam na Berklee College of Music, em Boston, uma das faculdades de música mais prestigiadas do mundo inteiro. 32


João Nogueira e Jopa Velozo são unidos por afinidades políticas, musicais e também culinárias, e junto com outros amigos músicos, gravaram além do Samba de Torreão, hits como San Bastiat e Bigodagem Bolivariana. As músicas dos Acadêmicos de Milton Friedman se destacam por vários motivos. A mistura do clima informal da casa onde gravaram boa parte das músicas, o talento notável dos músicos, as letras nada clichê, totalmente inovadoras, contribuem para que representem algo muito especial dentro do meio liberal. Em julho de 2015 a banda gravou seu primeiro material oficial, sendo um deles “Privada Presidencial”, lançado alguns meses depois com grande repercussão do público. Absolutamente tudo no vídeo foi feito pelos próprios Acadêmicos: composição, letras, arranjos, storyboard, figurino, cenário e até mesmo parte da direção. A essência é a mesma, mas a gravação profissional proporciona ao ouvinte uma experiência diferente dos vídeos anteriores, que eram informais e com uma captação de áudio bem mais simplista. O segundo videoclipe foi lançado durante a apresentação que o grupo fez no evento Fórum Liberdade e Democracia, do Instituto para Formação de Líderes em São Paulo-SP. A música, intitulada “Good Intentions”, conta com a participação do cantor americano Chris Kazarian. Conversei um pouco com a dupla Jopa Velozo e João Nogueira para entender mais sobre a origem da banda, os planos para o futuro e o que eles pensam sobre os rumos da política e do movimento liberal no Brasil e nos Estados Unidos.

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A Agorista: Como foi o processo de formação política de vocês? Quais as principais influências que os levaram a se tornar libertários? Já foram esquerdistas um dia? Jopa: Nunca fui esquerdista. Fui criado com uma visão mais de direita, pois meu pai é do exército e fui me identificando mais como liberal com o tempo. Meu primeiro guru era o meu amigo de colégio Felipe Svaluto, que foi quem me indicou ler alguns autores como Mises e Hayek. Na época, o acesso era complicado e tive que ir até o Instituto Liberal que ficava em Botafogo no Rio de Janeiro para adquirir os livros. E por aí fui seguindo.

João: Eu comecei a vida sendo esquerdista por influência do meu pai e dos meus professores de colégio. Eu nunca tinha conhecido um direitista de verdade, até que um dia, num jantar na casa de uma ex-namorada, eu estava vomitando esquerdismos sobre a pobreza na África e um senhor conservador me pegou no flagra na mentira. Esse foi meu primeiro “wake up call” que me fez buscar o que estaria do outro lado, e conhecendo este outro lado, fui compreendendo melhor o que significava ser de esquerda e me aprofundando acerca das ideias da liberdade. Minhas influências foram o filosofo inglês Roger Scruton e o economista Mises. AA: De onde surgiu a ideia de homenagear Milton Friedman no nome do grupo? Jopa: Na verdade, não foi algo planejado. O nome surgiu espontaneamente, através de uma interação com nosso muso inspirador, Pedro Torreão. A Agorista - Abril 2016 34


A gente tinha acabado de fazer nosso primeiro samba, o Samba do Torreão, e o João anunciou no Facebook, informando ao Torreão que ele seria homenageado com o primeiro samba libertário da história. O Torreão, então, nos perguntou se o nome da escola de samba era Acadêmicos de Milton Friedman. É um exemplo de conhecimento disperso na sociedade, que só foi unificado através de interações voluntárias. Nós demos o samba, ele nos batizou. AA: Sabemos que o grupo está finalizando seu primeiro EP. Como andam estes preparativos? Jopa: Tem sido uma loucura. Estamos costurando acordos com gente que acredita no nosso trabalho, pois a nossa grana está lá embaixo. Crowdfunding já foi algo que pensamos em fazer, organizamos muita coisa, mas é impossível cuidar da logística daqui de longe. Pra você enviar um CD do Rio de Janeiro para qualquer lugar do Brasil é caríssimo. A gente ia fazer a campanha pra gravar, mixar, masterizar, prensar, fazer camisetas e os correios ficariam com 1/3 de tudo que arrecadássemos. A parte mais idiota seria a mais cara. É uma coisa ridícula. Mas a boa notícia é que as pessoas interessadas em ajudar têm aparecido e que o nosso plano é lançar não apenas um EP, mas sim gravar dois EPs numa sequência rápida. E o segundo, se tudo der certo, será gravado num estúdio muito conceituado perto de NY, mas isso é tudo que dá pra falar por agora, pra depois não melar e termos falado demais. AA: O que acharam da experiência de tocar no Fórum Liberdade e Democracia, em São Paulo? Vocês têm interesse em participar de outros eventos liberais no Brasil? João: Foi uma experiência gratificante. Fomos muito bem recebidos e bem tratados por todos os envolvidos. A Agorista - Abril 2016

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Ficamos surpresos de ver nossas canções tão informais e espontâneas atingindo um grande público. Não é todo dia que uma banda pode abrir um evento com a participação do próprio filho do Milton, David Friedman. Temos bastante vontade de tocar nos eventos dos Estudantes Pela Liberdade, bem como estabelecer o primeiro bloco de carnaval realmente anárquico deste país. AA: Falando agora de uma análise externa, o movimento liberal/libertário tem crescido significativamente nos últimos anos. Apesar do cenário caótico em que se encontra o Brasil atualmente, vocês enxergam algumas perspectivas mais otimistas para o país conforme o liberalismo ganha mais espaço? João: Não, a coisa vai feder por muito tempo ainda (risos). Brincadeiras à parte, liberdade não é algo que simplesmente cai do céu. É necessário fomentar uma cultura de liberdade, que ainda está muito embrionária no Brasil. As pessoas estão insatisfeitas, mas ainda não sabem separar muito bem o que é acidental e o que é proposital. Além disso, costumam se relacionar com símbolos e ideias vagas, como a tal da meritocracia, que é uma ideia que não contribui em nada para a liberdade. Jopa: Essa mudança cultural passa pela percepção de que pensar sobre política vai além de discutir os personagens e bandeiras da política brasileira, pois, embora esta seja uma realidade cotidiana, também é importante buscar uma posição que anteceda a tudo isto. Caso contrário, nos vemos perdidos entre políticos, burocratas e símbolos, esperando que um deles possa ser nosso salvador. Ficamos buscando aquele que não seja corrupto, sem entender que resolver problemas sociais e econômicos também vai além da honestidade e da boa intenção. A Agorista - Abril 2016

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A corrupção é uma desgraça tão grande no Brasil, que o brasileiro tem dificuldade de se dedicar a pensar em outras questões sérias a serem debatidas. AA: Já os Estados Unidos, onde vocês moram, enfrentarão eleições difíceis em breve. Em uma provável disputa entre Hilary Clinton e Donald Trump, quais são as expectativas de vocês em relação aos rumos do país e o clima de ideias? João: Péssimas. Os Estados Unidos estão pouco a pouco se tornando como um Brasil, só que ainda está cheio de dinheiro. Se nas últimas eleições tivemos Ron Paul trazendo luz para as ideias da liberdade, Donald Trump veio para destruir o pouco que restava do partido republicano, afastando-se de suas raízes, e o americano ficou tão bobo que passou a acreditar em bons velhinhos, dentre os quais o mais perigoso é o Bernie Sanders.

/academicosdemiltonfriedman Acadêmicos de Milton Friedman

academicosdemiltonfriedman.com

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Ruiz Eleutério (Who is Eleutério?) – Acadêmicos de Milton Friedman Eleutério, nascido em um berço nada esplendido Já desde pequeno queria empreender Sentia que a escola do bairro era um atraso Pulava o muro para poder aprender Olhava os mercantes na feira trocando entre si Percebeu que o valor se encontrava logo ali Chegou a conclusão que no ato de vender A satisfação do outro é o que faz acontecer Juntou alguns vinténs Comprou alguns limões Fez uma bela limonada e foi vender em mil portões Mas Maria do Rosário ficou indignada Chamou logo a poliícia que desceu a cacetada e disse "e ai, vagabundo, porque não tá na escola?" Eleuterio perguntou "que faz você na minha cola?" O policial riu, disse que era proibido trabalhar com aquela idade E que, então, precisava confiscar a propriedade E o pobre Eleuterio perdeu sua limonada mas não a dignidade Eleutério! Eleutério! Eleutério! Eleutério! Conseguiu trabalhar de porteiro E guardar um dinheiro Que ele deu de entrada num kombão maneiro Fazia trechos ousados, em sua comunidade E logo já dirigia por toda a cidade Mas aí a companhia de transporte Sentiu no bolso e preparou o seu bote Ligou para o prefeito, que era seu amigão A polícia chegou, cade a licitação? Eleutério então disse, que te importa mermão? Pelo seu desacato parou no camburão Tentou ser camelô: "Atrapalha a passagem!" Foi vender salsichão: "Sai daqui chinelagem!" E Eleutério teimava em engolir a lição De que pra prosperar tem que ter arma na mão Fez inúmeros bicos Comprou um barracão Mas perdeu para um shopping, que ganhou num leilão Morreu pobre mas deixou o enterro pago E na lápide entalhou o seu recado: "Se nessa vida há algum ditado que valha É o que diz que muito ajuda quem não atrapalha." Eleutério! Eleutério! Eleutério! Eleutério!

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Nesta coluna vamos responder a todos os tipos de perguntas complexas que são feitas sobre situações práticas em que a iniciativa privada pode substituir o estado. Tem alguma dúvida sobre “Como seria no Ancapistão”? Entre em contato conosco através do e-mail aagorista@outlook.com e nos mande sua pergunta – nossos especialistas podem respondê-la aqui!

Caio Vioto: Esta pergunta, assim como muitas outras que vão no mesmo sentido, pode ser respondida a partir da ideia de custo de oportunidade. Os recursos são escassos, enquanto os desejos humanos são dos mais variados tipos, assim, quando se escolhe alocar recursos visando um determinado fim, renuncia-se a várias outras possibilidades de alocação dos mesmos recursos. Dessa forma, Estado e mercado alocam recursos de maneira diferente. A Agorista - Abril 2016

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O aparato estatal se organiza de maneira mais centralizada, a partir da vontade e da razão articulada de burocratas e governantes, sendo assim, suas possibilidades são mais limitadas, uma vez que os recursos estão concentrados nas mãos de um menor número de pessoas e seguem uma lógica política, que muitas vezes contraria a racionalidade econômica. Numa sociedade economicamente livre, os recursos são alocados de maneira descentralizada, uma vez que o mercado é um processo de tentativa e erro, que fornece informações sobre possibilidades de alocação dos recursos. Diante disso, numa sociedade sem Estado ou predominantemente livre do ponto de vista econômico, teríamos mais possibilidades de alocação de recursos, inclusive para pesquisas científicas. No entanto, é impossível afirmar se pesquisas semelhantes às da NASA continuariam recebendo investimentos, já que isso dependeria das decisões descentralizadas dos indivíduos no mercado. Pode-se imaginar, porém, que uma sociedade mais livre seria uma sociedade mais próspera e, dessa maneira, pesquisas científicas poderiam estar ainda mais desenvolvidas do que estão atualmente, já que haveria maiores possibilidades de alocação de recursos, que não dependeriam de decisões políticas.

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Referência Cultural ►► Por Mariana Diniz Lion

Welfare State: a Human Tragedy As duas interpretações de 29h59’59’ Como mencionado no editorial desta revista, importante evento para a liberdade em nosso país foi o 29º Fórum da Liberdade, em Porto Alegre. O IEE – Instituto de Estudos Empresariais levou a obra acima fotografada para compor a face cultural do acontecimento. Originalmente batizada “29h59’59” por seu criador, Liu Qiang, a obra, que mostra uma enorme massa humana se degladiando pelo acesso às tetas da vaca, retratava não apenas o conceito simplista de que nós, humanos, somos os únicos animais que consomem leite animal após o desmame – retrata também uma percepção da comunidade científica quanto aos ciclos solares. Muitos argumentam que a diferença de segundos a cada ano nos levaria, no futuro, a ter um dia de quase 30 horas. Neste ponto, a população seria tão volumosa que a terra não suportaria. No entanto, a obra foi acertadamente rebatizada como “Welfare State – a Human Tragedy”, referindo-se aos governos assistencialistas e a doentia relação de dependência que perpetua com seus cidadãos.

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Por Michelle Fransan

O que vou escrever aqui é um assunto velho, mas que abarcarei de uma forma suave, pois tenho certeza que a minha percepção é a mesma de todos, mas, colocando em miúdos, também tenho certeza que agregarei ao debate íntimo. Sim, estou mais profunda hoje, talvez mais intimista, meditando sobre a forma como temos encarado a vida e nossos relacionamentos interpessoais. A ideia do bens de consumo mudou com os anos. Antigamente, devido as crises, as guerras e as condições financeiras, os bens eram feitos para ser duráveis. A moda não ditava o consumo da sua geladeira, nem o designer dos aparelhos, tudo tinha durabilidade e conserto. Assim eram os relacionamentos entre as pessoas, duráveis, perenes, tinham conserto. A teoria de Aristóteles funcionava muito bem para as realizações de amor pelos objetos e interpessoais. “Comprazo-me com que eu tenho”. Hoje em dia, nada foi feito para durar. Do celular à máquina de lavar roupa, para tudo há prazo de validade, moda, tendência. Tudo estaria “ok” se não tivéssemos transferido a ideia do bem de consumo também para o homem sem que haja código de direito do consumidor para nos proteger de nós mesmos. Há o consumo do homem pelo homem. As pessoas consomem as outras até esgota-las. A relação que as pessoas têm com os objetos é exatamente a mesma que elas têm com as pessoas, estamos coisificando o ser humano. O espírito do consumo é extremamente forte, e o espírito do descarte é tão forte quanto. Nada que o amor platônico não explique “Amar é desejar” e os budistas não desenhem com Sansara (O ciclo vicioso dos desejos). Transferimos este desejo às pessoas as reduzindo para a esfera da satisfação gerando todos os transtornos de ansiedade, compulsividade, angústia que acometem a sociedade atual; nos sentimos absolutamente descartáveis. Isso é a volta do Hedonismo, não diria do Hedonismo Grego - epicurista, mas do Hedonismo Romano derivado da baixeza, da corrupção, de jogos mordazes que, no vil, sobrevivia sob o julgo dos desejos. Voltamos ao subjetivismo extremo, ao egoísmo rasteiro, onde o subjetivismo do outro inexiste. Onde o solipsismo toma conta da visão, excluindo todo o universalismo do nosso ponto de vista. Lamentavelmente, o virtualismo cria um registro solipsista onde o contato com o outro só irá existir se houver uma perspectiva de consumo. Passamos a ser um bem fungível, consumido e descartável. E é neste meio onde surgem pessoas desequilibradas que acreditam que o mundo é do jeito que elas querem que seja. Há, assim, a perpetuação da Fase Anal descrita muito bem por Freud, esquecendo que, o que faz existir relações e amadurecimento são os confrontos, o contato íntimo, o olho no olho que nos leva a conhecermos a nós mesmos através do outro. Portanto, a internet se transformou num refúgio contra o autoconhecimento, uma espécie de autodefesa frente a maturidade e o desenvolvimento humano.

Cheers!

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por Cauê Bocchi

“As Aventuras Revolucionárias de Marquinhos, o Comunista Camarada” Capítulo II Adam, um dos garotos, respondeu: -

Mas a gente quer sair da favela doutor. Queremos ganhar dinheiro para podermos comprar carro, roupas, poder viajar...

-

Mas vocês não percebem que isso significará a opressão de seus próprios irmãos? Vocês, que nasceram nessa linda comunidade, que possuem uma linda cultura, vão se deixar seduzir pelo sistema burguês? Não veem todo o esforço que fazemos por vocês? Doamos cestas básicas para quase todas as famílias, promovemos rodas de capoeira, aulas de street dance, criamos uma escola de samba. Além disso, tem o nosso governo, que sempre faz de tudo pela comunidade, e inclusive dá o ValeFamília para os pais de todos vocês.

-

A gente é muito agradecido pela ONG, doutor. Mas queremos trabalhar e ganhar o nosso dinheiro, sabe? Gostamos muito da cesta básica, mas a gente queria mesmo é comer os lanches que você e o professor Sakamula comem quando saem aqui da comunidade. A gente gosta da capoeira, das aulas de dança e do carnaval, mas queríamos mesmo era ter dinheiro para comprar ingresso para shows de outras músicas que a gente também gosta, e praticar outros esportes que não existem aqui na comunidade.

... Fui pesquisar e disseram que é um -negócio Fui pesquisar e chamado inflação, que mas é não um consegui entender. negócio Você sabe o que é inflação, doutor?

-

Mas e o dinheiro do governo que vocês recebem?

-

Não adiantou muito não, doutor. A maioria dos nossos pais parou de trabalhar, porque agora o governo ajuda. Aí não sobra nada. Tem essa coisa também que minha mãe fala, que o preço dos produtos está ficando mais caro...

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Sakamula levantou os olhos do seu celular, e respondeu de maneira magistralmente precisa: - Esse negócio de inflação faz parte do fetichismo pelos números das hard sciences burguesas. Isso não serve para nada, e você não tem que prestar atenção nessas conversas. Esse pessoal da inflação fica o dia inteiro olhando planilha em seus escritórios com ar-condicionado, e se esquece da realidade do Brasil, que eu conheço muito bem porque visito as comunidades. Adam não entendeu nada, mas ficou com vergonha de perguntar. Pelo que ele já tinha ouvido dizer, esse negócio de fetiche sempre tinha a ver com uma boa putaria. De qualquer modo, respondeu a Marquinhos (Sakamula já estava ao celular mais uma vez): - Mas então, gostamos muito da ONG e do governo, mas vamos abrir a banquinha para ganhar o nosso dinheiro também. - E o que vocês me dizem sobre a mais-valia? Como vocês vão se sentir se souberem que tudo isso que vocês querem só poderá ser conquistado se outras pessoas ficarem na miséria por isso? E a consciência social de vocês? - Mas doutor, vamos nos revezar na banquinha, ninguém vai trabalhar para a gente. Nem temos dinheiro para isso. Fred, outro dos garotos presentes, complementou: - A gente queria ter alguém para trabalhar na banca, doutor. Mas aí a gente viu que tem que pagar muitos direitos para o trabalhador e muito imposto para o governo, aí fica muito caro. Meu irmão está desempregado, e eu queria oferecer esse emprego para ele, mas não vai dar. Marquinhos já estava perdendo a paciência.

Continua na próxima edição...

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1) Palavra de editor – Fotos de acervo pessoal 2) Capa e índice – edição de imagens de Mariana Diniz Lion 3) A simbiose entre Estado e Grandes Empresas no Brasil: Imagem da Internet adaptada por Mariana Diniz Lion. Referências: FAORO, Raymundo. Os donos do poder. Rio de Janeiro: Editora Globo, 2001. VELEZ RODRIGUEZ, Ricardo. A grande mentira: Lula e o patrimonialismo petista. Campinas: Vide Editorial, 2015. WEBER, Max. Economia e sociedade. Vol. II. Brasília: Ed. da UnB, 2004. 4) LIBERDADE ANIMAL: Artigo original: http://www.strike-the-root.com/4/graham/graham1.html Imagens – WeheartIt.com Livro: http://www.amazon.com/exec/obidos/tg/detail//0252023420?v=glance&st=* 5) Libertação Animal e Livre Mercado: Publicação original em mercadopopular.org.br. Referências: http://www.mises.org.br/EbookChapter.aspx?id=25; http://ecocheervegan.com/nutricao-vegetariana/165-ovos-de-granja-aindustrializacao-da-crueldade; https://www.facebook.com/chubbyvegan?fref=ts; https://www.facebook.com/chubbyvegan?fref=ts; http://www.nydailynews.com/opinion/chickens-smarter-four-year-old-article1.1428277; http://www.nupel.uem.br/pos-ppz/Mastite.pdf; https://pt.wikipedia.org/wiki/Princ%C3%ADpio_da_n%C3%A3o_agress%C3%A3o; http://www.humanesociety.org/animals/pigs/pigs_more.html; http://www.agricultura.gov.br/vegetal/culturas/milho; http://economia.terra.com.br/vida-de-empresario/empresas-veganas-ganhamforca-e-vao-alem-do-ramoalimenticio,32e0139c73e36410VgnVCM3000009af154d0RCRD.html; http://www.pea.org.br/crueldade/testes/naotestam.htm; http://www.temple.edu/tempress/titles/1399_reg.html; http://www.carnism.org/; 6) Ritmo de Liberdade: Fotos – acervo pessoal ADMF; Letra: créditos na matéria. 7) Desigualdade – Imagens retiradas da internet, atribuída a Sponholtz (http://www.s1noticias.com/charge-do-dia-brasil-tem-162-milhoes-na-pobrezaextrema.html#axzz4725Wv3zU) 8) Call – Questão retirada do grupo “Anarcocapitalismo”, no Facebook, conforme imagem. 9) Referência Cultural: “Walfare State ou 29h59’59’” http://epl.org.br/2016/04/22/nos-fomos-no-29o-forum-da-liberdade/ http://blogs.ubc.ca/clayeung/2012/12/03/798/ http://iee.com.br/ Foto: Maria Teresinha Mendes no 29º Fórum da Liberdade 10) Fanfic Libertária de Cauê Bocchi (parte 2). 45


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