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Jogando Para Ganhar
VOLO PER VERITAS
Juliana Torchetti Coppick jutorchetti@yahoo.com.br
A contratação de pilotos na aviação agrícola geralmente se dá de maneira simples.... Um bate papo entre o dono e o piloto para que se tenha uma noção da experiência do aviador, um acerto em relação a comissão, um voo para testar a máquina, e claro, as habilidades do piloto e pronto! Está feito o acordo. Felizmente, esse processo tem começado a mudar, graças a iniciativa de alguns operadores.
Recentemente, ao ir em busca de uma vaga para a próxima safra, eu tive uma dessas experiências que se tornam marcantes, inesquecíveis e enriquecedoras.
Ao conversar com Dominique Youakim dono de uma empresa aeroagricola (a Aerinova Aerial,LLC.) logo de cara percebi um diferencial na maneira como ele conduz o processo de contratação. Fizemos uma vídeo conferência e a primeira pergunta dele foi: “onde você está agora e onde você se vê no futuro?”. Uma pergunta bem fora do usual “quantas safras você já voou?”. A surpresa não parou por aí. Depois do nosso bate papo, ele me enviou um e-mail para que eu respondesse a algumas perguntas. Não era um teste.
Ao invés de avaliar respostas como certas ou erradas, as perguntas eram para identificar a minha personalidade. A ideia é que o dono da empresa possa entender que tipo de personalidade está entrando para sua equipe e o quão compatível aquela pessoa será com os demais. Dominante, Influenciador, Apoiador e Cauteloso são os quatro resultados possíveis.
Esses quatro tipos de personalidade podem (e provavelmente vão) interagir no ambiente de trabalho de maneiras diferentes. Nossa personalidade e a maneira como lidamos com os demais, terão impacto direto na maneira como encaramos o sucesso, os conflitos, problemas, vitórias e derrotas no ambiente profissional. E no dia a dia, a comunicação, (que é primordial em qualquer função) será diretamente afetada também pela personalidade das pessoas envolvidas no processo.
Achei interessantíssimo descobrir e entender porque eu gosto muito mais de voar solo do que em um avião com uma grande tripulação e passageiros. Isso não quer dizer que eu não goste de trabalhar em equipe. Ao contrário! Acho incrível estar em uma empresa e me sentir parte de um time com um objetivo comum. E autoconhecimento vai além de saber quem você é ou que lhe agrada. Se conhecer também vai lhe ajudar a entender o porquê de você não gostar de certas coisas também. Para mim, por exemplo, ter que disputar áreas e mapas com um colega de empresa, não faz sentido nenhum, mas se a competitividade se apresentar no sentido de: “vamos competir com a concorrência, e não entre nós”; aí sim é o tipo de desafio que me interessa.
Nossa personalidade também é, muitas vezes, a chave para entender o gatilho de certos conflitos, como quando a maneira como alguém fala conosco nos parece correta ou não. Pessoas com personalidade em “Dominância” podem muitas vezes ser interpretadas como intimidadoras, já os que tendem mais à “Cautela” podem ser vistos como inflexíveis ou arrogantes. Os de personalidade “Influenciadora” têm dificuldade em manter o foco e serão indiretos na hora de se comunicar. Já a turma de personalidade com ênfase no “Suporte”, terá dificuldade em se adaptar às mudanças. Então imaginem alguém da turma dos Dominantes (que gostam das coisas ditas diretamente e sem rodeios), tentando se comunicar com a turma da Influência, (que geralmente não se comunicam de forma muito direta e dão voltas e mais voltas até dizerem o que precisam dizer). É faísca na certa!
Claro que todos têm aspectos positivos também! O Dominante tende a ser extremamente responsável, o Influenciador tende a ser bastante eloquente, o de personalidade Apoiadora tem grande capacidade de planejamento e os Cautelosos, estão sempre em busca da excelência. A arte de gerenciar uma equipe está em saber onde e como usar as qualidades de seus integrantes.
Ser um bom chefe requer tato na hora de escolher seu time e depois montar o quebra-cabeça do “quem trabalha com quem”. Acredito que muitos de vocês já viveram ou presenciaram a incompatibilidade entre ajudante e piloto. Por outro lado, a sinergia entre esses dois profissionais pode fazer a diferença na segurança e na produtividade de uma safra. A diversidade pode ser enriquecedora ou desastrosa... dependendo da combinação que se faz.
Toda empresa deve investir tempo (e por que não, dinheiro?), para criar uma cultura corporativa e se certificar de que sua equipe entende essa cultura e a pratica diariamente. E não estou falando apenas de um banner na recepção com dizeres relacionados à Missão, Visão e Valores. O investimento de uma empresa aeroagrícola é sempre alto, então por que hesitar em dar atenção à qualidade de sua equipe? Contratar um “corpo” só funciona para manequim de loja. Ou seja, não adianta colocar qualquer pessoa na sua equipe e acreditar que o problema está resolvido. Assim como em uma orquestra ou nos esportes, é importante se certificar de que aquela pessoa se encaixa na função.
Uma frase da qual jamais vou me esquecer, dita por Peter Schutz: “Contrate o caráter. Treine as habilidades”.
Não é raro que ao indagarmos pessoas em uma função idêntica, sobre o que elas fazem; as respostas sejam tão diversas. Como naquela história do homem que chega a uma construção e pergunta para três funcionários o que eles estão fazendo. Um diz que está “ganhando o pão de cada dia”, o outro responde que está “ apenas quebrando pedras” e o terceiro diz que está ”construindo uma catedral”. Na verdade, os três estavam desempenhando a mesma atividade, com as mesmas ferramentas; porém com ideias totalmente distintas sobre o propósito de estarem ali.
De volta à minha visita a esse operador aeroagricola, tive ainda a grata surpresa de ser convidada para uma espécie de “clube do livro” que ele promove entre os funcionários. Todas as quartas-feiras, na hora do almoço, eles se reúnem para discutir sobre certos capítulos de um determinado livro. O que estamos lendo agora chama-se “Great Teams”, do escritor Don Yaeger. Ainda não encontrei a versão em português, mas o livro fala basicamente das 16 coisas que todas as grandes equipes (no mundo dos esportes e no mundo dos negócios) têm em comum.
Eu me apaixonei pelo conteúdo logo de cara. E a razão pela qual me encantei pelo livro é que ele não é um daqueles materiais enfadonhos e cansativos. Pelo contrário, fala de paixão pelo que se faz, fala de superação e de colocarmos verdade naquilo que nos dispomos a fazer. O autor enfatiza a importância de a empresa ter claramente definido o seu propósito, da necessidade de se criar uma cultura e praticá-la diariamente, dos desafios de desenvolver a camaradagem no ambiente de trabalho e do valor de práticas como a mentoria, por exemplo.
Um dos grandes erros que vemos hoje em dia é que muitas empresas não se comunicam adequadamente e também não preparam seus funcionários para as mudanças. Certos empresários detêm e retêm todo o conhecimento da dinâmica de suas empresas. Claro que certas estratégias devem se manter no nível da confidencialidade; mas é importante entender que um time forte e coeso sabe se comunicar e navegar, mesmo que em águas turbulentas.
Eu acompanho a equipe do SINDAG pelas redes sociais e recentemente notei que eles lançaram um programa de mentoria. E é de atitudes assim que estamos falando aqui! De inovar, lançar mão da tecnologia e de recursos que possam conduzir nossa atividade para um patamar ainda mais próximo da excelência.
Em meio a toda essa crise e diante de tantas perguntas ainda sem respostas, uma coisa se mostrou certa: a aviação agrícola é atividade essencial!
Não é incrível que no meio dessa pandemia, possamos fazer da nossa atividade uma ferramenta de superação e de sobrevivência?
Estamos no caminho certo, estou certa disso. E por mais competitivos que possamos ser, é preciso entender que ganhar nem sempre requer que o outro perca.
Hoje eu sei que a maior prova de que uma empresa está ganhando o jogo é quando as pessoas têm orgulho em fazer parte daquele time. Se quem está dentro não quer sair e quem está fora quer entrar, pode ter certeza de que o placar está positivo!