12 de junho de 2012 • Ano XXI • n.º 247 • QuInZenAL GRATuITo dIReToR cAmILo soLdAdo • edIToRes-eXecuTIVos Inês AmAdo dA sILVA e joão GAspAR
acabra joRnAL unIVeRsITÁRIo de coImBRA
Na fila dos centros de emprego RAFAELA CARVALHO
Histórias de quem procura por um trabalho em três distritos da região centro Págs. 16 e 17
enda
estudo da uc
Prioridades para o próximo ano letivo
Cafeína é benéfica para doentes neurológicos
nos próximo dias 15, 16 e 17, as académicas reúnem-se no último encontro nacional de Direções associativas (enDa) do ano letivo. no centro da discussão vai estar a ação, nomeadamente o novo regulamento de atribuição de bolsas que deve sair até à data do enDa, como creem os dirigentes associativos. a ação social, quer a direta quer a indireta, assim como o emprego jovem vão ser as prioridades reivindicativas do movimento associativo para o próximo ano letivo.
Desde 2009 que um grupo de investigadores da UC vem testando os possíveis benefícios da cafeína, quando consumida regular e moderadamente. e o que se prova depois de três anos de pesquisa é que a substância evidencia potencial de normalização dos circuitos neuronais - aplicando à doença psiquiátrica, confere uma proteção seletiva na disfunção do doente. em aberto está a hipótese de criação de fármacos com efeito semelhante.
Pág. 4
Pág. 11
álvaro domingues
Produção literária
Desenvolvimento regional
ainda há quem escreva na cidade
“Qualquer coisa que está entre o tejo e o Douro e que não se percebe muito bem o que é”, é desta forma que Álvaro Domingues caracteriza a região centro. O Geógrafo da Universidade do Porto, veio a Coimbra falar do seu recente livro “vida no Campo”. em entrevista ao Jornal a Cabra, mostrou um discurso crítico face à nova reforma de administração do poder local e olhou para as potencialidades e dificuldades da região centro.
Desde sempre que Coimbra foi albergue de grandes intelectuais, que entretanto se dispersaram. agora, o que resta da criação literária na cidade? a uma primeira vista, julgamo-la inexistente. Mas existem escritores em Coimbra, desconhecidos da maior parte da população devido a uma falta de divulgação mais forte.
Pág. 14
Págs. 12 e 13
@
Mais informação em
acabra.net
Golfe Clube da Quinta das Lágrimas
investe na formação de jovens e rejeita o estereótipo de que o golfe é para as elites entrevista
Pág.9
Volker Sommer Há poucas evidências de discriminação sexual entre animais
Págs. 2 e 3
2 | a cabra | 12 de junho de 2012 | terça-feira
destaque Inês amado da sIlva
Talv Deus
D
isse que “Deus criou Adão e Eva, mas não criou Adão e Steve” (“God created Adam and Eve, but he didn’t created Adam and Steve”). É uma afirmação recorrente no seu trabalho. Poderia explicar um pouco melhor esta frase? Cientificamente, sempre me interessei por comportamentos que não podem facilmente ser explicados pela teoria da evolução – como o infanticídio, a homossexualidade e como é que a evolução permitiu que esses comportamentos se desenvolvessem, uma vez que o objetivo da evolução é produzir descendência. Ou comportamentos como a religião – pessoas a acreditar em coisas irracionais – ou as artes – pessoas a fazer coisas que não são produtivas. O meu trabalho nas potenciais explicações para os comportamentos homossexuais é para ser visto nesse contexto. Claro que quando dou palestras tento torná-las interessantes e acessíveis. Isto é só uma face dessa linha divertida. Nos EUA, o lobby é a oposição ao casamento gay, ou que a homossexualidade não é mais do que uma doença, dizendo “Deus criou Adão e Eva, mas não criou Adão e Steve”.
Não é a minha opinião. Apenas uso isso como uma frase para ilustrar o puzzle da teoria da evolução. Depois digo: bem, talvez Deus tenha cometido um erro ou talvez Deus não se importe que exista um “Adão e Steve”. Tem vindo a investigar o comportamento homossexual em animais, que descreve como “bastante comum”. Isto surpreende muita gente? Estudar o comportamento sexual dos animais não é nada fácil, porque existem milhões de espécies animais e só sabemos como é que algumas se comportam. Tipicamente, as pessoas ficam surpreendidas ao saber que há algumas espécies animais em que a atração pelo mesmo sexo é comum. Há algumas em que é muito comum, e as pessoas perguntam-se naturalmente: são todos doidos? É porque estão em cativeiro? Ou só se enganam? O sexo pode também ser facilmente entendido como uma ferramenta social. É provavelmente agradável e os que têm relações sexuais ficarão melhores amigos, não importa se é entre um macho e uma fêmea ou entre duas fêmeas ou dois machos.
Socialmente falando, como funciona o comportamento homossexual nas sociedades animais? Há alguma semelhança entre os comportamentos humanos e animais quando se fala de discriminação? Em regra, qualquer coisa que os humanos façam também se encontra nos outros animais, seja canibalismo ou ser simpático para os vizinhos, comer, masturbar-se ou beber o sangue de outros, tendo de se atentar se tem ou não a mesma função que nas sociedades humanas. Quanto à discriminação sexual entre animais há muito poucas evidências, exceto que, por vezes, vemos alguns animais acabar com interações sexuais entre animais homossexuais, particularmente entre os macacos. No entanto, isto acontece também nas interações heterossexuais. Acredito que o tipo de discriminação que se vê nas sociedades humanas não se vê nas sociedades animais. Vê alguma causa para que isto aconteça? Curiosamente, quando os tempos são mais liberais, há mais homofobia. Porquê? Bem, se há uma ideia muito restrita do papel do homem e da mu-
lher e do que cada um é e faz, toda a gente sabe o que é certo e errado. Mas se os tempos se tornam mais liberais, temos um problema com a nossa identidade: quem somos nós? Nas sociedades ocidentais, particularmente nos últimos 20, 30 anos, quando toda a gente fazia o que queria, sem problemas, acredito que a homofobia cresceu, porque fomos forçados a dizer o que somos: a sociedade já não está a dizê-lo por ti. Isso foi também o que aconteceu com as pessoas que tinham interações homossexuais: foram forçadas a dizer o que eram. Há pressão sobre as pessoas para dizer “sou gay, não há nada de errado com isto”. Não se pode não dizer nada, tem que se confessar. Se a sociedade fosse mais conservadora a pergunta não seria feita e, por essa razão, não existiria também discriminação aberta. Pode dizer-se que os animais não julgam a orientação sexual? Eu acredito que sim, mas ainda não conseguimos perceber. A questão seria: será que os outos animais também têm conceitos sobre como deveriam ser? Acredito que nas sociedades dos primatas e de outros animais, como os elefantes, existem
12 de junho de 2012 | terça -feira | a
cabra | 3
destaque
vez s
não se importe que exista um “Adão e Steve” A homossexualidade animal é um dos objetos de estudo de Volker Sommer, professor de Antropologia Evolutiva na University College of London. Outros temas, como a integração dos chimpanzés no género Homo trouxeram o investigador ao colóquio “Anthropology in the 21st Century”, organizado pelo Núcleo de Estudantes de Antropologia. E quanto à homossexualidade, talvez Deus nem exista para se importar. Por Filipe Furtado e Inês Amado da Silva que todos estes exemplos são construções sociais muito específicas que a sociedade usa para construção de identidade. Se existisse uma solução única para como a sociedade devesse funcionar, tudo seria igual. Isto é sobretudo sobre criar uma identidade, para que os membros da sociedade tenham um sentimento de pertença. Acredito que a sexualidade é parte da nossa identidade social.
conceitos sobre como se comportar corretamente. Mas a nossa pesquisa ainda não está concluída e não sabemos se isso se estende ao comportamento sexual. O que sabemos é que se estende, por exemplo, ao que se deve comer. Quero fazer uma pesquisa exatamente sobre isso. Vimos que em algumas apresentações fala da Grécia Antiga, quando era bastante normal a ocorrência de comportamentos homossexuais. Como vê a mudança da aceitação social destes comportamentos? A palavra homossexualidade tem sido usada para interações muito diferentes e mentalidades diferentes. Será este o caso quando falamos de homens adultos que acariciavam os genitais de rapazes de 12 anos na Grécia, ritual que fazia parte do processo de educação? Isso é o mesmo que ter duas lésbicas em Nova Iorque a viver juntas, a ter uma relação e a adotar crianças? Há o famoso caso da população da Zâmbia, na Melanésia: quando os rapazes crescem, têm de realizar um ‘fellatio’ em homens adultos, o que significa beber o sémen – de outra forma, não se tornarão homens. Muitas pessoas dizem
Como é que essa identidade evoluiu através da História? Acredito que nós, nas nossas cabeças, gostamos de criar um sentimento de “eu” e de “tu”, de “nós” e de “eles”. Esta é uma classificação dicotómica do mundo e acredito que seguimos sempre isso, que gostamos de ter um ‘ingroup’ e um ‘outgroup’. Como isso se cria, está dependente de como o fazes. Existem as coisas mais estranhas. Podes ter um deus que sai da campa três dias depois, deuses com quatro braços sentados numa flor de lótus. É completamente arbitrário, e esse é o ponto principal. Falando do seu trabalho no The Gashaka Primate Project (projeto que mantém na Nigéria): já disse que podemos tentar manter tudo como está para os nossos netos, mas umas espécies morrem e outras emergem. Como alguém que estuda animais, plantas, a natureza, sofro ao ver isto. No entanto, se pensar melhor como biólogo da evolução, percebo que podemos não estar a tentar preservar, mas todos sabemos que em 10, 20 ou 100 mil anos, tudo vai mudar de qualquer forma. A evolução é sobre mudança e é muito difícil argumentar sobre o dever de proteger porque irá mudar de qualquer forma. Talvez o façamos para nosso prazer, mas é
tudo. Numa perspetiva mais alargada, não fará diferença. Também é preciso dizer que, agora, a destruição da natureza é trazida pelos humanos, como antes foi trazida pela natureza. Não está correto. E porque é que o nosso cérebro, que nos permite criar as máquinas e a tecnologia, não é parte da natureza? Também são parte dela. O que quero dizer é que a filosofia da conservação da natureza é difícil, porque, na verdade, não é lógica. É uma questão complicada. Nos seus estudos aborda o tema de os chimpanzés passarem ao género Homo. Porque defende isto? Como encara as críticas vindas de outros cientistas? Há classificações zoológicas das pessoas, dos animais, das plantas. É uma convenção. Mas acontece que o Homem é o único membro do género Homo, todos os outros estão extintos – Homo erectus, Homo neanderthalensis, por exemplo – e depois há dissidentes noutros géneros, como o Pongidae, o que inclui os chimpanzés, os bonobos. Com o aumento de conhecimento no campo da genética, torna-se claro que, na verdade, os chimpanzés e os bonobos estão mais próximos dos humanos do que estão dos gorilas. Quando Lineu fez a primeira classificação taxonómica incluiu todos estes tipos de criaturas no género Homo. Na altura, foi forçado a pôr os humanos à parte, não podendo, de facto, encontrar nenhuma razão fisiológica ou anatómica. Então disse: bem, os humanos são diferentes porque têm uma mente. A descrição dos humanos é “reconhecer-se a si próprio”, e isso é, na verdade, o que está no oráculo grego de Delphi. A descrição para os humanos é que estão aptos a reconhecer-se, enquanto outros animais não o conse-
guem fazer. Mas os chimpanzés conseguem… E agora questionamos isso. Eles também conseguem reconhecer-se ao espelho, podem ter um autoconceito, pensar sobre si próprios… começa a não ser lógico manter o nome separado. Então deviam todos chamar-se Homo, mesmo os gorilas, e depois existiriam subespécies. O que se faz politicamente é outra questão. É sobre estarmos a perder os nossos parentes mais próximos porque estamos a destruir o seu habitat. Aí voltamos à questão: isso importa? Isto é sobre adquirir uma consciência de que somos animais como os outros? Sim. Naturalmente, poderia ser a nossa identidade social: também sou um animal, estou ligado ao o resto do mundo, sinto-me ligado às outras criaturas. No entanto, por sermos estes pensadores binários, que gostam de pensar neste “nós” e “eles”, também gostamos de deixar claro que somos o que somos porque há outros que são animais. E esse é o motivo pelo qual o fosso entre animais e humanos é tão profundo. Gostamos disso, porque nos dá identidade. A ciência deveria pensar assim? Cientificamente, isto é non sense. Mas, psicologicamente, isto ajudanos. Deveríamos estar mais atentos ao nosso mundo mental, também como produto da evolução, para perceber como classificamos o mundo, porque o fazemos, como agrupamos as coisas. Acredito que é uma questão científica muito pertinente.
4 | a cabra | 12 de junho de 2012 | terça-feira
EnSino SuPErior
DG/AAC quer arrancar com as obras na fachada do edifício já no verão CArlotA rebelo
Substituição das janelas, reparação das fissuras e mosaicos e ordenação dos fios elétricos são as alterações. Também a sala de estudo pode sofrer uma requalificação para breve Inês Balreira A direção-geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC) pretende arrancar com as obras de requalificação na fachada do edifício já este verão. O projeto está aprovado desde 2009, contudo, as obras nunca chegaram a ser feitas. Quando o ex-presidente da DG/AAC, Miguel Portugal, terminou o mandato afirmou que as obras não tinham sido feitas porque houve outras prioridades mas, no entanto, o caderno de encargos já estava pronto e a obra adjudicada e podia arrancar quando a direção-geral assim o entendesse. Um ano depois, quando Eduardo Melo terminou o mandato explicou que não tinha havido disponibilidade financeira. O presidente da DG/AAC, Ricardo Morgado, afirma desconhecer as razões pelas quais as obras ainda não estão feitas, afirmando, no entanto, que “o projeto já está aprovado desde 2009 e já poderia estar feito”. O dirigente assevera também que “neste momento há prioridades superiores, nomeadamente a sustentabilidade financeira da AAC”. No entanto, “existe a vontade de prosseguir com as obras e é por isso que estamos a tratar do processo para que consigamos avançar no verão”.
O atual administrador da AAC, João Seixas, afirma que já se reuniu com a empresa a quem supostamente a obra estaria adjudicada, mas “não existe nenhum contrato assinado”. O dirigente revela que assim é possível abrir um novo concurso e “o que na altura foi adjudicado à obra pode agora ser menor”. No sentido de dar andamento à obra, João Seixas assegura que está já agendada uma reunião com a reitoria da Universidade de Coimbra e com o serviço de gestão do edificado, ambiente e segurança, saúde no trabalho “para analisar o caderno de encargos e abrir um novo concurso” para adjudicar a obra. O administrador revela que, com esta revisão do caderno de encargos, vai ser possível incluir outras reparações que não estavam contempladas. “Na altura não podíamos alterar as janelas e as que temos, em termos de eficiência energética, não valem muito nem pouco e já houve abertura para que possam ser mudadas”. Para além das janelas, João Seixas afirma que a intervenção vai passar pela ordenação dos cabos elétricos, reparação das fissuras e dos mosaicos e que não só a fachada da frente vai ser alvo de intervenção, mas também a fachada do lado dos jardins da AAC.
Sala de estudo remodelada no interior Para além das obras na fachada, o administrador revela que para breve estão também agendadas obras de requalificação da sala de estudo. “Já conseguimos um patrocinador para arranjar a sala de estudo e remodelar o material todo. Ainda não posso dizer o nome do patrocinador, mas o processo está a andar e será para breve também”, adianta.
Não só a fachada da frente vai ser alvo de intervenção, mas também a fachada do lado dos jardins da AAC É também intenção da DG/AAC fazer um levantamento sobre os espaços do edifício da AAC, nomeadamente “no que toca a salas”, revela Ricardo Morgado. “Temos alguns problemas de secções que têm espaço a menos e uma direção-geral que não faça este levantamento não sabe como é que está o edifício”, adianta o dirigente. Ricardo Morgado acrescenta que ainda “está em discussão fazer este levantamento e uma possível reorganização dos espaços”. Porém, o presidente da DG/AAC assevera que existem coisas que “não é possível fazer, porque para todos os efeitos o edifício é da reitoria e existe uma série de limitações processuais”.
Verbas para as obras congeladas há três anos o processo de requalificação da fachada da aac começou em 2009, no mandato do ex-presidente da dg/aac, Jorge serrote. nesse mesmo ano foram atribuídos, através dos projetos da Queima das Fitas (QF) de 2009, 34.794 euros à direção geral para a requalificação das fachadas do edifício, sendo que durante a execução da obra deve constar um painel com a inscrição “obra financiada pela Queima das Fitas de 2009”. todos os valores atribuídos aos projetos aprovados pela Queima das Fitas têm de ser levantados no mesmo ano que são atribuídos. contudo, o valor destinado às obras tem sido exceção. “a dg/aac tem vindo a fazer, ano após ano, desde a distribuição de verbas da QF de 2009, a requisição para que a verba se mantenha cativa e possa ser utilizada para a intervenção na fachada, quando necessário”, explica o secretário-geral da comissão organizadora da QF, andré gomes. o secretário-geral revela ainda que não há nenhum prazo limite para a verba estar congelada, mas sim “uma questão de bom senso”. “a obra arrancará, certamente, este mandato, pelo menos é o sinal que tenho da direção-geral e já nos foi perguntado se há disponibilidade de conceder a verba e isso é sinal de que vão arrancar com a obra dentro em breve”, acrescenta andré gomes.
IPC abre escola de verão em julho pela primeira vez d.r.
Promover a formação oferecida nas escolas da instituição, mas também ajudar os estudantes indecisos na escolha de um curso são os principais objetivos do projeto Inês Balreira Arte e design, saúde, engenharia, comunicação social e comunicação multimédia, música, teatro, desporto e lazer são algumas das áreas que a Escola de Verão Júnior do Instituto Politécnico de Coimbra (IPC) oferece. A pri-
meira edição desta iniciativa é vocacionada para estudantes do 5º ao 12º ano de escolaridade e decorre ao longo do próximo mês de julho De acordo com o coordenador adjunto do projeto, António Leal, o principal objetivo da criação deste projeto prende-se com a “promoção da formação que o IPC tem nas várias escolas”, mas também com o “fomento do gosto pela ciência e tecnologia junto dos jovens”. “Alguns [jovens] têm dificuldade em saber que curso escolher, principalmente os do 11º e 12º anos, e a melhor forma que podemos ajudar é permitir conhecer e experimentar várias áreas do saber através deste tipo
de atividades”, acrescenta o coordenador. Apesar de as inscrições ainda não terem encerrado, António Leal expecta entre 150 a 250 inscrições para a edição deste ano da escola de verão. O coordenador revela ainda que “tem havido uma grande procura por parte de alunos do 5º ao 7º ano, que não era esperado”, ressalvando o facto de, segundo o coordenador, o IPC ser a primeira instituição de ensino superior na área de Coimbra a oferecer um programa vocacionado para os alunos de este grau de escolaridade. Com o programa formativo, a escola de verão concilia ainda um programa recreativo no projeto.
Para além de aprenderem sobre as diversas áreas de saber oferecidas, os participantes vão ter oportunidade de participar em atividades culturais, como visitas a vários pontos da cidade, atividades desportivas e de exploração. Embora esta seja a primeira edição, António Leal assegura que “a partir de agora existirá todos os anos e abrangerá iniciativas das diferentes escolas do IPC”. Nesta primeira edição, as unidades do IPC com mais expressão na escola de verão são a Escola Superior de Engenharia, a Escola Superior de Educação e a Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra.
12 de junho de 2012 | terça-feira | a
cabra | 5
ENsiNo supErior
Dirigentes definem prioridades para o próximo ano letivo Novo regulamento de atribuição de bolsas e empregabilidade vão ser os temas em foco no ENDA desta semana. Ação social e emprego jovem vão ter primazia no ano que se avizinha Inês Balreira Nos próximos dias 15, 16 e 17 os dirigentes associativos reúnem-se no último encontro nacional de direções associativas (ENDA) do ano letivo, que vai ter lugar em Viseu. Em cima da mesa vão estar em discussão ação social, emprego: direito do trabalho e trabalhador estudante, qualidade e avaliação no ensino superior (ES): sistemas internos de qualidade e avaliação docente. A nível da ação social o assunto premente a discutir será o novo regulamento de atribuição de bolsas. “Pelas informações que tenho, o regulamento vai estar disponível antes do ENDA e a discussão vai centrarse muito nessa questão”, revela o presidente da direção-geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC), Ricardo Morgado. Também o presidente da Associação Académica da Universidade de Aveiro, Tiago Alves, considera que a discussão se vai centrar nessa questão. “Vamos fazer uma análise daquilo que foram os dados este ano, mas também discutir possíveis alterações ao novo regulamento, pois
existem associações que têm uma visão de alteração global e outras pensam que deve ser uma alteração mais pontual”. No seguimento das reuniões parlamentares que os dirigentes têm tido com a tutela, o presidente da Associação Académica de Lisboa (AAL), Carlos Veiga, acredita que o regulamento “não vai ser alterado na sua génese, mantendo-se como está, apenas com pequenas alterações”. Quanto à questão da empregabilidade, a discussão vai passar, de acordo com o presidente da DG/AAC, “por perceber se o código de trabalho deveria ser mais ou menos flexível, se é um entrave à entrada dos jovens no mercado de trabalho ou se poderia ser uma melhor ferramenta para a juventude”. Neste ponto vai ser ainda discutido o programa “Impulso Jovem”, recentemente apresentado pelo governo, que consiste num pacote de medidas no valor de 344 milhões de euros com o intuito de beneficiar cerca de 90 mil jovens através da criação de estágios profissionais, apoios à contratação e ao investimento. No que toca à qualidade e avaliação o debate vai centrar-se na “forma como é que a qualidade pode ser ou não medida e como é que pode ser tornada pública, de maneira a auxiliar as instituições a fazerem alterações à sua forma de funcionamento e aos seus cursos”, revela Morgado. O dirigente ressalva ainda que esta questão é também importante para os estudantes, uma vez que os auxilia na escolha de uma instituição. “O ponto da qualidade e avaliação é uma forma de ga-
Cedida pela dg/aaC
rantirmos a qualidade do ensino e das instituições, pois o sistema de avaliação de docentes tem estado no escuro e varia de instituição para instituição”, complementa Carlos Veiga. Hoje ao final da tarde os dirigentes associativos vão reunir com o conselho de reitores das universidades portuguesas para discutir principalmente ação social. d.r.
Prioridades para o novo ano letivo Segundo os dirigentes associativos, a prioridade para o ano letivo que começa em setembro vai continuar a ser a ação social. “A ação social nunca vai deixar de ser um tema e, num momento de crise, é uma temática que tem de ser ainda mais discutida”, considera Tiago Alves. A opinião de Carlos Veiga vai ao encontro da de Tiago Alves: “depois de o próximo regulamento de bolsas é necessário sabermos se é exequível e se é uma garantia para que os alunos não abandonem o ES, e sempre será uma das nossas prioridades”. Também o emprego jovem vai estar na ordem da discussão estudantil. “Perante o desemprego que se tem verificado, é importante que se debata esta problemática”, afirma o presidente da Associação de Estudantes da Universidade de Alto Douro e Trás-os-Montes, Sérgio Martinho. “Neste sentido, as académicas e as associações de estudantes têm feito esforços para se formar sobre o emprego jovem e em situações de emprego quer dentro do país, quer fora”, acrescenta. O presidente da AAL considera também que Bolonha não deve ser
esquecida, assim como a discussão sobre a rede. “Há uma série de discussões que são prementes de ter, mas são muitas vezes ofuscadas no trabalho que fazemos por dois setores tão importantes como a ação social e a empregabilidade”, considera.
Ricardo Morgado acrescenta que o intuito do movimento associativo é “manter uma postura reivindicativa e construtiva, através dos contributos que têm sido dados para tentar melhorar a situação do ES”. “É essa a postura que continuaremos a ter”, assevera.
Politécnicos da região centro reforçam partilha de recursos A criação deste protocolo é vista como uma maneira de contornar os cortes no financiamento das instituições e potencializar os recursos já existentes Inês Balreira Com vista a estreitar relações, oito institutos politécnicos da região centro do país – Instituto Politécnico de Coimbra, Castelo Branco, Guarda, Leiria, Portalegre, Santarém, Viseu e Tomar - assinaram no final do mês de maio um protocolo que permite a partilha de recursos humanos, como o intercâmbio de docentes, mas também de recursos materiais. Estes oito politécnicos constituem a
Associação Politécnica, com sede em Castelo Branco, fundada em 2000. O presidente do Instituto Politécnico de Coimbra (IPC), Rui Antunes, explica que o intuito do protocolo firmado é “rentabilizar os recursos existentes, nomeadamente os recursos humanos, tentando criar regras que permitam que seja mais fácil que um politécnico possa utilizar docentes de outro politécnico, mas também a níveis como a formação e investigação”. O presidente do Instituto Politécnico de Portalegre, Joaquim Mourato, clarifica a questão do intercâmbio dos docentes: “Uma parte tem que ver com situações pontuais, como a constituição de júris ou para concursos”. No entanto, o presidente acrescenta que esta mobilidade também pode acontecer por questões formativas. “Por vezes um docente não tem horário
completo num instituto e pode haver a necessidade desse recurso numa outra instituição e podemos, assim, completar esse horário”. Joaquim Mourato salvaguarda que esta cooperação ao nível dos docentes é concebida na “perspetiva de proteção do próprio docente, podendo desta forma ter trabalho a tempo inteiro”. Para além da mobilidade dos recursos humanos, Rui Antunes afirma que a intenção é também “aumentar a colaboração a nível de recursos materiais, como bibliotecas, laboratórios de investigação e determinados equipamentos que são caros de adquirir e não são de utilização intensiva”. O protocolo em questão foi também criado a pensar nos alunos dos oito institutos politécnicos em questão. “Este protocolo possibilita aos
estudantes ter acesso aos equipamentos sociais e académicos dos institutos associados nas mesmas condições que na sua instituição de origem, quando deslocados em atividades curriculares e académicas”, revela o presidente do Instituto Politécnico de Leiria e também presidente da Associação Politécnica, Nuno Mangas. Protocolos como este permitem ainda às instituições de ensino superior contornar a falta de financiamento em altura de crise. “Cada vez temos mais dificuldades e há menos recursos disponíveis e portanto, evitamos muitas vezes contratações que poderiam ser necessárias e, desta forma, com o mínimo de despesa e trabalho, podemos resolver alguns problemas e dificuldades orçamentais”, assevera o presidente do Instituto Politécnico da Guarda,
Constantino Rei. “As crises têm muitos aspetos negativos, mas podem também ter alguns positivos e um deles é, de facto, olharmos para a necessidade de poupar e gerar sinergias para conseguir fazer as coisas de forma mais sustentável, abrindo um caminho e uma disponibilidade do ponto de vista de atitude bastante grande em relação a esta necessidade de cooperar”, afirma o presidente do IPC. Além deste recente protocolo firmado, a Associação Politécnica colaborava já ao nível do Consórcio Erasmus Centro, um protocolo que inclui politécnicos, câmaras municipais e associações empresariais, com o objetivo de promover a realização de estágios de alunos portugueses na Europa e de alunos de instituições de ensino europeias em Portugal.
6 | a cabra | 12 de junho de 2012 | terça-feira
CUlTURA
Vamos brincar ao fim do mundo? cá
cultura por 12
JUNHO “AqUElE qUERIDO MêS DE AgOSTO” DE MIgUEl fOMES Cinema amSCv • 21H30 1€ (Com deSConto
para SóCioS)
13 JUNHO
“À CONVERSA COM…” RITA fERRO CaSa muniCipaL
13
CiCLo de enControS da CuLtura • 18H entrada Livre
JUNHO
“hISTóRIAS DE ÁgUA E MúSICA” ConCerto
pedaGóGiCo
reSponSabiLidade artíStiCa do
maeStro virGíLio CaSeiro
paviLHão Centro de portuGaL 10H30 • entrada Livre
14
JUNHO
“DIRT!” Cinema e debate CeS • 19H entrada Livre
15 JUNHO
PAUS + YOU CAN’T WIN ChARlIE bROWN múSiCa taGv • 21H30 10€ Com deSContoS
17 JUNHO
DONA ZEfINhA + DIAbO A SETE múSiCa taGv • 21H30 7,5€ Com deSContoS
20 JUNHO
“OS úlTIMOS DIAS DE EMMANUEl K ANT” teatro teatro-eStúdio da bonifrateS CaSa muniCipaL da CuLtura • 21H45 Sem informação de preço
21 a 24
JUNHO
“O AbAJUR lIlÁS” E “SANTíSSIMA APUNhAlADA” teatro • tCSb 21H30 (3ª a Sáb.) 16H (dom.) 5€ (SantíSSima apunHaLada
22
+ o abajur LiLáS: 12 € jantar + 1 eSpetáCuLo: 13 € jantar + 2 eSpetáCuLoS: 18 €)
JUNHO
reCitaL de piano taGv • 21H30 10€ Com deSContoS
João Gaspar Recebemos o aviso para o embarque. Descomprimidos, desinfetados, selecionados, vacinados, examinados – prontos para o “pósCisma”. O mundo vai acabar, e há humanóides que se perpetuam após o fim – os pós-humanos. Quatro híbridos, dentro da arca que se salva do fim, mostram o ambiente: sons metálicos, músculos retraídos de robot, ecos de um mundo que se foi, sintéticos, metais e luzes, posturas neutras e genéricas, televisões, microfones, vozes distantes. “É o público que vai criar o novo mundo”, afirma Nilce Carvalho, uma das atrizes da peça “Realpolitik”, em exibição até dia 15 na caixa negra do Círculo de Iniciação Teatral da Academia de Coimbra (CITAC). Há ambientes desconexos, falas que afinal são migalhas pertencentes ao antes, discursos sobrepostos, o Big Brother. “Realpolitik” é uma peça, ou um embarque, à volta do fim do mundo, no ano de profecias que já Hollywood prontamente abraçou. Realpolitik é também uma palavra alemã para a política baseada em realizações práticas despojadas de ideologia – uma política coerciva. Em tempos de alemães a darem uso à sua palavra, Rogério Nuno Costa, encenador da peça, agarra na proposta política e encontra na mesma uma “componente metafórica que tinha muito a ver com o que é que seria se soubéssemos que o mundo iria aca-
30
até JUNHO
“DUAS MANEIRAS DE VER A NATUREZA” DE ARMANDO MARTINEZ E EDUARDO J. ORTúN
expoSição CaSa muniCipaL da CuLtura 9H àS 19H30 entrada Livre
Por Ana Morais
“Realpolitik” é uma peça, ou um embarque, à volta do fim do mundo bar”. “No espetáculo é estilizada a condição do mundo pós-apocalipse, onde não se pode escolher rigorosamente nada”, expõe Rogério. O genérico passa a ser o real, ouve-se na peça. O espetáculo tem uma “densidade, um caos informativo para que o espetador saia zonzo de tanta informação que recebeu”, explica o encenador. Em “Realpolitik” surge uma atmosfera quase hipertextual que já estava idealizada pelo encenador. “Muitos suportes de imagem, de som, coisas que se parecem com televisão, outras com discurso político, ou científico, ou até a dimensão teatral pura de uma peça do [Samuel] Beckett” que surge já na reta final do espetáculo. Também nessa reta final, surge
uma nova língua – a Novilíngua, idioma fictício que não permite interpretações, presente na obra “1984” de George Orwell. Apesar da premissa de Orwell, Rogério Nuno Costa admite que o entusiasmo de “traduzir para uma língua que não existe levou-nos para uma posição quase oposta”. A ideia para a “Realpolitik” já é anterior ao convite do CITAC a Rogério Nuno Costa. Apesar de nunca ter encenado para o CITAC, ficou satisfeito com as pessoas que tinha à sua frente: “têm vontade, disponibilidade e interesse”. O processo, que durou dois meses e meio, pôs os atores de volta de séries de ficção científica, avança Nilce, que conta que os próprios nomes dos híbridos que representam são ba-
seados em personagens da série “Fringe”. Os textos foram escritos à alfaiate, à medida de cada um dos atores, com os mesmos a ajudarem a desenhar a peça com os improvisos que iam fazendo e com as ideias que iam lançando, explica Nilce Carvalho. Ao longo da peça surgem perguntas e somente perguntas. “Para as respostas têm que ir falar com outros”, assevera Rogério, que vinca o teatro como espaço de questionamento, “para transmitir dúvidas”, acrescenta Nilce. E há uma pergunta que é a base de todo o embarque: “se o mundo acabasse, o que é que acontecia?”. “Vamos brincar ao fim do mundo”, propõe Rogério.
Teatro de variedades em formato interventivo “Cahahahahabaret de Variedades” é a nova peça dos alunos de Teatro da ESEC. O objetivo é provocar uma reação interventiva no público. Estreia dia 13 Ana Duarte Ian Ezerin
CAO WEI
AnA MorAis
Com “Realpolitik”, o CITAC, numa encenação de Rogério Nuno Costa, abraça o apocalipse com a política coerciva. Um embarque no pós-fim e no que dele pode surgir
Um roteiro de cabaret, que se desconstrói em várias linguagens – sempre de maneira interventiva. Este foi o mote pelo qual os alunos do curso de Teatro da Escola Superior de Educação de Coimbra (ESEC), juntamente com o professor Clovis Levi, se guiaram para construir o espetáculo “Cahahahahabaret de Variedades”. Esta peça vai estar em exibição de 13
de junho a 30 do mesmo mês, na Tabacaria d’O Teatrão. O conceito de realizar um cabaret foi decidido quase instintivamente. “A primeira ideia que saiu é que nós queríamos fazer um cabaret/teatro de variedades”, afirma o professor e encenador da peça, Clovis Levi. E o que significa “teatro de variedades”? “É um cabaret que trabalha com muitas linguagens diferentes, que vão desde trabalhos coreográficos, de canto, de dança e trabalho com textos dramáticos”, esclarece o encenador. “Este espetáculo tem textos atuais, músicas, excertos do Eça de Queirós, textos dramáticos, ou seja, é uma miscelânea”, explica Mariana Sá, uma das alunas do curso e participante na peça. Relativamente ao pano sonoro, esse vai desde a música de intervenção, com artistas como
Zeca Afonso, José Mário Branco e Sérgio Godinho, passando pela música brasileira de Chico Buarque e Mamonas Assassinas. O repertório não esquece, também, a música atual de JP Simões ou Boss AC. “É um espetáculo que reúne várias cenas, vários números, que atravessam o século XIX até aos dias de hoje”, acrescenta Mariana Sá. A montagem do roteiro foi um processo que demorou cerca de um mês e meio. “As propostas partiram de nós, ou seja, fizemos uma recolha de material que nos interessava trabalhar, desde músicas, a números cómicos e outros tipos de textos dramáticos”, expõe a jovem atriz da ESEC. A partir daí, o processo de construção desenrolou-se naturalmente. Oriundo do Brasil, Clovis Levi rapidamente se tornou fã da música de intervenção portuguesa: “desde
que cheguei a Portugal, sou adepto da música portuguesa, então tenho muito material em casa e fiz também a minha pesquisa”. Quando a busca de informação para o espetáculo terminou, o professor reuniu tudo e concebeu o conceito desta peça. “Cahahahahabaret de Variedades” não pretende apenas fazer rir. Pretende também fazer com que o público reaja. “É um espetáculo com um clima sempre ‘para cima’, mas coloca a dimensão da necessidade de tomar uma atitude”, elucida o encenador. O objetivo principal será fazer com que “os portugueses não devam ficar se lamentando com a crise, precisam rir mas, ao mesmo tempo, rir não basta”, segundo Clovis Levi. “Temos que rir mas também temos que nos manifestar, temos de reagir. Então rir é reagir e essa é a ideia do espetáculo”, acrescenta, em jeito de provocação.
12 de junho de 2012 | terça-feira | a
cabra | 7
CuLtura
Um gajo esquisito a tocar blues no States O artista americano Bob Log III não é um espécime humano normal e decerto que o vai provar no concerto a realizar no States Clube, dia 13 de junho João Gaspar “Blues, rock e muita energia” é o que o público pode esperar do concerto de Bob Log III em Coimbra, dia 13, avança Eduardo Pinto, membro da ArtRites. O artista já passou por Coimbra noutras circunstâncias, tendo também marcado presença no festival Milhões de Festa em 2011. Para Eduardo Pinto, há, em Coimbra, “um público conhecedor da obra do Bob Log III e, de certo modo, pertencente ao “universo” no qual ele se movimenta”. Um capacete de motard, um fato de homem-bala e um micro ligado
a um telefone. Mãos e pernas livres para o que bem quiser. É assim que Bob Log III se apresenta em palco, envergando uma personagem atípica que faz dos concertos uma explosão tremenda de energia, entre o slide guitar blues e o rock. Não são raras as vezes em que pede para que dois membros do público se sentem nas suas pernas enquanto toca e os balanceia ao mesmo tempo. Personagem um tanto ou quanto bizarra, Bob Log III nasceu em Chicago, mas cresceu no Arizona. Em 1998 publicou o seu primeiro álbum de originais, “School Bus”, sendo que em 2003 lançou o longa duração que o catapultou –“ Lob Bomb”. Desse mesmo álbum, surge uma das músicas que mais chama à atenção quando tocada em palco – “Boob Scotch”. Basicamente, o artista norte-americano pede, por vezes, a alguém do público para molhar a mama no uísque do músico, que depois ele bebe.
Filme co-produzido pelo Citemor em Marselha cedida pelo citemor | SuSana paiva
Também à volta de mamas está outra performance que Bob Log III já chegou a ter nos seus concertos - duas mulheres pagas por ele para fazerem percussão com as suas mamas na música “Clap Your Tits”. A estranheza está sempre associada ao artista, sendo que Tom Waits, conhecido artista norteamericano, afirmou à Radical Wacko, que Bob Log III “é a coisa mais estranha e barulhenta que alguma vez se vai ouvir”. A ArtRites já organizou mais de 30 concertos em Coimbra, sendo o primeiro uma atuação dos Riding Pânico, em 2008. Eduardo Pinto conta que a promotora ArtRites surgiu por força de três amigos que queriam ver o melhor do underground português em Coimbra, “fartos de ter de ir a outras cidades”. “Fazemos isto por casmurrice”, adianta Eduardo, que se queixa de não haver, em Coimbra, “uma sala de pequena/média dimensão devidamente equipada para concertos”. d.r.
“Montemor”, de Ignasi Duarte, vai estar num festival de cinema em Marselha. O filme foi realizado em Montemor-o-Velho, em co-produção com o Citemor João Gaspar O filme “Montemor”, do catalão Ignasi Duarte, vai fazer parte da Seleção Oficial da Competição Internacional do Festival Internacional do Documentário de Marselha 2012, a decorrer entre 4 e 9 de julho. A película é uma co-produção do Citemor, Festival de Montemor-o-Velho, e conta com a participação de habitantes da vila do distrito de Coimbra. Ignasi Duarte já tinha passado pelo Citemor em 2005, a trabalhar para o encenador e dramaturgo Roger Bernat numa peça levada a esse festival. Nessa altura, Ignasi ficou cativado pelo ambiente da vila e do festival, ficando na cabeça a ideia de um documentário à volta da vila. Contudo, assim que voltou a Montemor, “apesar de haver a possibilidade de fazer um docu-
mentário, a ficção esteve sempre presente”, conta Vasco Neves, diretor do Citemor. A componente ficcional foi mais vincada, sendo que o argumento e as personagens são “pura ficção”. Personagens essas que, na sua maioria, são habitantes da vila sem qualquer experiência teatral, como explica Vasco Neves. Foram rodadas 80 horas de películas na vila e arredores, sendo que para além de habitantes da vila, a personagem principal é o ator Nuno Castilho. Esta é a primeira obra de cinema de Ignasi Duarte, assim como o primeiro projeto cinematográfico abraçado pelo próprio Citemor. “Houve uma grande aceitação das pessoas de Montemor, assim como uma grande participação de inúmeras pessoas e instituições”, conta Vasco Neves. O filme tem uma personagem central que vagueia por Montemor, encontrando pessoas e algumas aventuras. Vasco Neves afirma sentir-se “satisfeito”, com a inclusão do filme no festival de Marselha, sendo que considera tal participação como “um sinal de vitalidade do projeto Citemor”. Isto num momento crítico para o festival de Montemor-o-Velho, que esteve em risco de não se realizar devido a cortes no financiamento externo das suas atividades.
Jazz melodioso pela escadaria do Quebra até setembro Jazz@Quebra pretende dinamizar as escadas do Quebra Costas, através de 20 concertos de jazz de conjuntos nacionais, onde o palco é a própria escadaria João Gaspar “As bancadas são as escadas, o palco é o patamar da escadaria”, retrata Miguel Lima, da Quebra Produções, o cenário dos concertos de jazz que vão fazer de pano sonoro constante às escadas do Quebra Costas durante todo o verão. A proposta é 20 concertos,
dois por cada conjunto, em dez fins-de-semana, tendo começado a 1 de junho, com o Trio Paulo Bandeira. Miguel Lima, mentor do projeto, está convicto de que o Jazz@Quebra vai “ser uma boa oportunidade para promover a cidade e uma zona que vai em contra ciclo em relação a outras zonas de Coimbra. No Quebra, em vez de haver lojas a fechar, há lojas a abrir”, assegura. Todavia, esta iniciativa não é uma ideia nova. “Já tinha feito algumas iniciativas em 2009 e 2011. Este ano tentei fazer algo de outra envergadura”, afirma Miguel Lima, que lembra a importância da dinamização do Quebra Costas, seguindo a linha de pensamento do Mercado Quebra Costas, iniciado em 2006: “muito
voluntarismo e força de vontade de pôr vida nesta zona da cidade”. Os dois primeiros concertos do trio do baterista Paulo Bandeira, foram “fantásticos”, avança, Miguel Lima, lembrando que a escadaria estava completamente repleta de gente, havendo até pessoas à janela e à varanda a ver o concerto. “Será sempre um jazz muito melodioso, muito fácil de entrar nos ouvidos”, informa Miguel Lima, avançando que estes projetos afastam-se do free jazz e “querem que as pessoas gostem de ouvir jazz, quase num sentido pedagógico”. Os concertos, sendo no verão, têm como objetivo, segundo o seu organizador, procurar também o turista como público: “os turistas procuram
sempre música ao vivo nos centros históricos. Isso também é importante para que as pessoas saiam daqui a falar bem de Coimbra”. Apesar do evento já estar assegurado, Miguel Lima admite algumas dificuldades financeiras para pôr de pé o projeto, sendo que contou com a ajuda da Freguesia da Sé Velha e da Turismo do Centro, que financiam grande parte da iniciativa. No que toca à programação, Miguel Lima teve a preciosa ajuda de Paulo Bandeira, baterista de jazz no desenho da programação desta iniciativa: “o Paulo convive diariamente com grande parte dos músicos que cá vêm, então conseguiu estabelecer grande parte dos contactos e ajudar a or-
ganizar este evento”. O Jazz@Quebra vem também reforçar a ligação que este género musical sempre teve com o Bar Quebra, em que o jazz era uma presença assídua e vincada. Para Miguel Lima, para além da promoção da zona também quer que, com esta iniciativa, as pessoas “percebam que o jazz é uma coisa muito bonita, então ao vivo…”. O próximo fim-de-semana de jazz no Quebra Costas será de 29 a 30 de junho, tendo depois uma periodicidade semanal até setembro. Esse concerto duplo estará a cargo do Jeffery Davis Trio, liderado pelo luso-canadiano Jeffery Davis - “ um dos melhores músicos de vibrafone do mundo”, adianta Miguel Lima, expectante em relação a esse concerto.
8 | a cabra | 12 de junho de 2012 | terça-feira
ProlonGamento
F UT s a L
A equipa de Tó Coelho alcançou a manutenção na primeira divisão nacional. A duas jornadas do final do campeonato, os estudantes tinham uma oportunidade de ouro, uma vez que precisavam de apenas não perder com o Belenenses em casa, por mais do que dois golos, visto que na jornada seguinte teriam que ir a Braga, concorrente direto na luta pela sobrevivência no principal escalão. A Académica esteve praticamente toda a partida em desvantagem por duas bolas, mas acabaria por empatar por 6-6, marcando os dois golos da recuperação nos últimos cinco minutos. No ano de regresso à primeira liga, a Briosa parte para o último jogo do ‘play-out’ já descansada. Mantém-se, a par do Braga, enquanto Belenenses e AMSAC descem à segunda liga.
JUdo
Depois do quinto lugar, obtido na Taça do Mundo de Bucareste, a judoca Ana Sousa participou, no passado sábado, dia 10 de junho, na Taça de Tallin, na Estónia. A atleta da Académica, a única feminina a representar Portugal na prova, voltou a conquistar, uma semana depois, o quinto posto, depois de ter sido derrotada pela bielorussa Alesia Staraverava.
HÓ QUEI EM PaTINs
No passado dia 10 de Junho, sábado, a equipa de seniores masculinos recebeu e venceu por 2-1 o Nafarros, no Pavilhão número um, garantindo assim a permanência na segunda divisão nacional sul de Hóquei em Patins. Embora não dependessem apenas de si, os estudantes tinham de levar de vencido o lanterna vermelha do campeonato, faltando-lhe esperar que o Parede FC não ganhasse. A equipa do norte do país acabaria por ser derrotada, em casa, por 6-4, e desce, pela primeira vez na sua história, a terceira divisão. A festa fez-se em Coimbra.
Por Fernando Sá Pessoa
Carlos Gonçalves • Presidente da seCção de BasqueteBol da aaC
“Orlando Simões não continua como treinador principal” Eleito no passado dia 31 de Maio como novo presidente da Secção de Basquetebol de Coimbra, Carlos Gonçalves revela, entre os planos que tem para o clube, que Orlando Simões não vai continuar como treinador da equipa principal. Poderá continuar na estrutura da Briosa, mas com funções diferentes das que desempenhou na época passada. Com mandato de apenas um ano, o sucessor de Mário Castro explica ainda que pretende investir nas camadas jovens e devolver a Académica aos tempos de glória do passado. Fernando Sá Pessoa Daniel Silva Como começou a sua ligação pessoal ao basquetebol? Joguei basquetebol na Académica dos iniciados até aos juniores. Tive que me afastar devido a uma lesão, e fiquei alguns anos de fora. Quando a minha filha decidiu jogar, a Académica não tinha formação e foi para os Olivais. Acompanhei-a e cheguei a ser presidente do Olivais durante dois mandatos. Após a conclusão, saí, fiquei com saudades do terreno e escrevi durante 3 anos na página de basquete do Diário de Coimbra. Este ano, entendi que tinha condições para pegar na secção, que vivia um período muito complicado. Atualmente, sou também delegado dos clubes do distrito de Coimbra, eleito pela Assembleia Geral Portuguesa de Basquetebol. Disse que a secção está a passar por um momento difícil? Eu não gosto de falar do que está para trás, porque penso que cada um fez o que pôde. No entanto, a realidade é que a secção não está a atuar de uma forma coesa. Mas temos que trabalhar como uma família e recuperar a situação financeira, que é bastante complicada. É esse o grande problema? Sim. Em termos de projeto, a direção é constituída por pessoas que têm vontade de trabalhar e de pôr a Académica no sítio certo, principalmente no aspeto humano. Os próprios pais tentam ajudar, mas sim, a situação financeira é um problema e nunca podemos avançar muito sem resolver algumas situações que vêm de trás.
E em que situações se têm traduzido esses
problemas financeiros? Temos que resolver assuntos com a federação, junto ao grupo de atletas, a associação e alguns treinadores, para que possamos pôr em prática tudo aquilo que ambicionamos. Que é… Temos vários projetos. Primeiro, na formação, e agradecendo a todos os treinadores, penso que a Académica tem que voltar para um lugar meritório do mini basquete. Já foi das melhores mas, para o voltar a ser, temos que ter atenção à quantidade e, só depois, à qualidade. Temos potencial jovem e gostaríamos que a AAC disputasse todas as competições importantes do país. Este ano até fomos finalistas da Taça de Portugal. Que balanço faz da última época? Como já disse, não quero muito discutir o que está para trás mas, tendo em conta todos os problemas que houve, penso que foi uma época positiva. Em relação ao campeonato, aconteceram coisas que não podiam acontecer e nem quero individualizar. Nós já estudámos bem os erros para não os cometermos de novo. Quanto ao treinador, o Orlando veio no meio da última época. É para manter? Tenho uma boa relação com o Orlando Simões. Ele fez um bom trabalho durante o ano, apesar de ter chegado a meio, mas não vai ser treinador da Académica para o ano. Até terça-feira será divulgado o novo treinador. Quais são as razões da direção para essa decisão? Só posso explicar isso dizendo quem será o próximo treinador e isso não posso. Não é nada contra o Orlando, mas apenas uma decisão tomada a pensar no futuro do clube. Ainda não tivemos tempo para fechar todos os dossiês mas, em princípio, o Orlando terá um lugar dentro da equipa técnica.
Em que cargo? Não posso dizer. É óbvio que já tenho um compromisso com ele, já lhe fiz um convite para fazer parte da nossa estrutura. Mas isso também depende de algumas situações passadas que ainda não foram resolvidas.
muito dentro dos possíveis. É um apoio muito importante para a nossa equipa da Académica, mas sabemos que pode vir a ser mais complicado, devido à crise financeira que Portugal enfrenta. Temos de encontrar outras formas de apoio.
Em termos da direção, quais são os principais objetivos? O principal objetivo é pôr a Académica no topo da região centro, devido ao passado histórico que tem. A secção passou por períodos um pouco conturbados e estamos numa altura em que, quem quiser fazer parte, tem que compreender como funciona uma direção que foi eleita e que tem um mandato a cumprir. As pessoas que querem acompanhar a direção no seu projeto são todas bem-vindas. Depois, existe uma coisa em comum com os clubes de basquete da cidade, que é não terem pavilhão desportivo próprio. Somos capazes de passar uma época inteira sem poder ver os clubes de basquete da cidade a treinar e os adeptos nunca saberem onde os atletas vão treinar. Há cerca de três anos, estudou-se a questão de a secção ter um pavilhão próprio. Para a semana, vou pedir algumas audiências às altas entidades da cidade.
Em relação ao plantel, o clube irá investir? A Académica investe nos jogadores portugueses. Temos um grupo muito fechado que conseguiu bons resultados. Quanto às contratações, isso será estudado com o treinador. No entanto, a maior parte dos jogadores deve ficar para a próxima época. Será o treinador a decidir o que pretende, como quer jogar e terá inteira confiança na construção da equipa.
Como descreve a relação com a Câmara Municipal de Coimbra? A Câmara tem ajudado
E como descreve a relação com os estudantes universitários, no que concerne à captação de jogadores? Gostaríamos de ter mais estudantes universitários na nossa equipa sénior. Mas, infelizmente, a formação é complicada. É longa e não se faz em um, dois ou três anos. Os adeptos têm que ter paciência. Mas seria bom ter mais jogadores a virem de lá para a equipa sénior, como o Fernando Sousa e o Bruno Peixe. Já não acontece há alguns anos.
Sendo presidente da Académica e delegado de clubes pelo distrito de Coimbra, não teme que o considerem tendencioso, neste último cargo, em benefício da Académica? Não. Quando fui eleito delegado, já era diretor executivo da Secção de Basquetebol da Académica. E eu também sei honrar os meus compromissos.
Cedida por Carlos gonçalves
12 de junho de 2012 | terça-feira | a
cabra | 9
DEspOrTO
“As crianças são o futuro do golfe” O Golfe Clube da Quinta das Lágrimas tem atletas das mais variadas idades. Entramos no espaço verde. Há um campo de treinos para adultos, um para torneios e outro para crianças. Fernando Sá Pessoa “Tac”, e partem as bolas no “driving range”, primeiro para o ar, depois para perto das placas que medem a distância. Mas também há espaço para as crianças, de calção ao xadrez, e ouvem-se alguns burburinhos típicos dos jardins-deinfância. Há dias em que a academia parece isso mesmo. David Prieto, basco residente em Portugal, é sócio do Golfe Clube da Quinta das Lágrimas. Imigrou há cerca de dez anos, diz, e entrou na Quinta das Lágrimas para dar continuidade ao golfe, que pratica “desde pequenino”. E é assim que deve acontecer, “desde pequenino”. O golfe melhora a capacidade de a pessoa se submeter à pressão e, salienta Prieto, “desenvolve a precisão e o poder de concentração nas crianças, que é algo muito importante”. Isso e a capacidade de lidar com o fracasso. “Nos outros desportos podemos culpar a equipa, o campo, ou outras coisas. No golfe, a culpa do erro é só nosso. Não pode haver falhas”, reitera. A conversa é tida no bar que se na faz na divisória revestida de madeira, que separa o “driving range” - espaço para treino de tacadas de maior alcance – e o campo de minigolfe, destinado aos mais pequenos. Abre-se a porta que dá acesso a esse espaço, ouvem-se as crianças. Apesar de tudo, contêm-se nos seus polos e altercam momentos de silêncio e chilreios de pássaros com rasgos das vozes de infância. Poucas, ainda assim.
O estereótipo das elites no golfe O professor Nuno Barreto, que se dedica ao golfe de há dez anos para cá, “culpa de um inglês”, explica que este ambiente nada tem a ver com as elites e a ideia de que o golfe existe para elas. As crianças adquirem a capacidade de concentração e o estereótipo que há em redor da modalidade é errado. Na verdade, Nuno Barreto, que assume também funções na direção do clube, fala na importância da “desmistificação desse preconceito”. “Para jogar ténis podem ser precisos 200 euros para uma raquete”, lembra. “E há bicicletas de 1000 euros”. Marta Carvalho é, além de esposa de Nuno, membro da direção. Mas faz de tudo um pouco: “se for preciso também vou apanhar as bolas”. Contra o preconceito, afirma que um investimento de 200 euros em equipamento pode durar quase
uma década. Na opinião da dirigente-secretária-empregada do bar, “os campos estão fechados em si próprios, mas os valores não são proibitivos”. “Talvez o problema seja a ideia que as pessoas têm dos campos de golfe serem fechados”, afirma Nuno. A maioria deles são, lembra o diretor, comerciais, pelo que interessa “aumentar o número de jogadores para subir nas receitas”. Dá, por isso, o exemplo de Inglaterra, onde as pessoas praticam a modalidade por apenas quatro libras. Daí que a culpa, de certo modo, possa recair, para o dirigente, sobre os responsáveis dos campos de golfe: “a nossa academia está aberta à cidade e a toda a população, e há lugares onde, regra geral, se pagam 30 euros para se poder jogar.” Será importante, nesse sentido, olhar para a formação, grande res-
ponsável pela vida do clube da Quinta das Lágrimas. A verdade é que “não podemos continuar a viver do mercado externo” e, nisso, a crise poderá ser um mal que vem por bem. “O golfe não enfrenta uma boa altura em Portugal”, afirma, mas visto que ele estava “vocacionado para o turismo, poderá agora virar-se mais para os jogadores nacionais e para os nossos campos, pois só assim haverá sustentabilidade”. O plano do clube passa, nesse sentido, por trazer mais associados e não em fechar-se. “Entusiasmar as pessoas”, diz Nuno Barreto, um dos responsáveis pela academia, que conta com cerca de 150 associados.
O “pich and putt” Nesse sentido, surge a variante de “pitch e putt”, a principal no clube da Quinta das Lágrimas, que Nuno Barreto considera ser “a mais mo-
tivante”. Termina o torneio da Federação Portuguesa de Golfe, e logo se enche o bar de atletas. E vem barulho com eles. Acrescente-se o convívio próprio de um balneário masculino, junte-se-lhe a cerveja, e este é o bar. Ainda assim, Hugo Espírito Santo, o tricampeão nacional de “pitch and putt” dispõe-se a falar, entre os “olás” de camaradagem. “Esta é uma modalidade que se especializa no jogo curto, de finalização”, diz, explicando o fator motivacional. “Um pouco como o futsal está para o futebol”. Apesar de tudo, a questão inicial é de novo trazida à ribalta. Tanto Hugo como Mário Filipe, campeão europeu em pares da variante de golfe, admitem que teriam tido sucesso se tivessem começado a praticar quando eram novos. Mário admite que é amador e que continuará a ser sempre: “No golfe normal, sou mediano”. Fernando sá pessoa
o golfe Clube da Quinta das lágrimas foi o primeiro a ter um “drive range” em portugal
Secção de Andebol da AAC poderá deixar de competir Todas as equipas da secção de andebol poderão, na próxima temporada, deixar de estar em competição, embora esteja posta de parte a hipótese de encerramento Fernando Sá Pessoa Está em causa uma dívida de cerca de 8 mil e novecentos euros à Federação Portuguesa de Andebol que, garante o presidente da Secção de Andebol da AAC, Antó-
nio Sousa, “vem da direção anterior e se tem acumulado”. A juntar a este problema, há ainda 2 mil euros que a secção deve à Associação de Andebol de Leiria, uma vez que há escalões que, por não terem possibilidade de competir dentro de Coimbra, o têm de fazer fora de portas. Além disto, refere o dirigente associativo, “houve instituições que prometeram apoios e que até hoje ainda não chegaram”. A direção terá conseguido, ainda assim, renegociar a dívida com a federação no início da época. António Sousa aproveita ainda para deixar uma nota de agradecimento à Direção Geral da Associação Académica de Coimbra e ao Conselho Desportivo
que, afirma, “tudo têm feito para que esta situação se resolva”. Apesar de tudo, o encerramento é uma hipótese que não se coloca, sendo que o pior cenário passa pela não inscrição das equipas, que poderão continuar a treinar. Porém, a situação ganha, para o presidente da Secção, contornos mais negativos, se se tiver em conta o facto de, neste momento, haver 157 atletas inscritos na modalidade desportiva da academia. “Há dois anos, as pessoas perguntavam para que é que a secção queria o dinheiro, se não fazia nada nem tinha formação. Em dois anos, conseguimos pôr dez equipas a competir nos campeonatos nacionais”, adianta. A con-
cretizar-se o temor do dirigente, será o equivalente a “dar três passos atrás”. A intenção inicial era “ter mais jogadores de Coimbra nas equipas seniores”, que hoje contam apenas com dois, nos masculinos e três nos femininos. E recorda que, este ano, “tiveram de ser, muitas vezes, os atletas a pagar a resina para jogar e o combustível para as deslocações fora de casa”. No corrente ano, Nuno Sousa congratula-se com a performance geral de todos os escalões, masculinos e femininos, quando diz que “as expectativas foram superadas”, adiantando que, quando regressou à Académica, em 2010, “trouxe pessoas que já tinham estado na
estrutura do clube e que queriam devolver o clube ao que já se tinha feito no passado, pelo que o grande objetivo era conseguir ter todos os escalões em atividade”. Tal feito foi alcançado este ano. Em termos desportivos, António Sousa lamenta apenas a “falta de espírito de equipa” que a equipa sénior masculina revelou no decorrer da temporada e que lhe deixou “um amargo na boca”. Concretamente, o presidente refere-se à prestação na terceira divisão nacional, que começou com bastantes vitórias e que fez o clube pensar numa eventual promoção, mas que acabou por relegar a Académica para os lugares da manutenção.
10 | a cabra | 12 de junho de 2012 | terça-feira
CIêNCIA E TECNOlOgIA
A casca de ovo como aditivo de solos A investigação do DEQ quer avaliar as quantidades mais eficientes de casca de ovo no processo de compostagem para utilizar em solo agrícola Filipe Furtado Valorizar a casca de ovo é um dos principais objetivos de uma das investigações a decorrer no Departamento de Engenharia Química (DEQ) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC). E porquê valorizar a casca de ovo? “É um material que em termos legais não pode ser colocado em aterro sanitário, por ser um subproduto animal”, explica a enge-
nheira química que lidera a investigação, Margarida Quina. O trabalho daquele departamento concentra-se em arranjar um destino para os resíduos produzidos pela indústria de ovoprodutos, onde são utilizados milhares de ovos diariamente. Uma das soluções encontradas foi recorrer ao processo de compostagem para introduzir a casca de ovo no solo. “No fundo é um dois em um: resolve-se um problema industrial e reintroduz-se matéria orgânica novamente no solo”, que funciona como corretivo de solos. A compostagem é o processo biológico pelo qual se obtém um produto humificado, sem contaminação microbiológica relevante, alternativo à utilização de fertilizantes convencionais. Neste caso, os investigadores selecionaram, além da casca de ovo, casca de batata, relva e casca
de arroz para criar o corretivo de solos. A casca de ovo é eficaz contra metais pesados presentes no solo. A casca de batata, como vem da terra, não apresenta nenhum sinal de maior atenção na mistura, mas a relva é uma necessidade química, assim como a casca de arroz, que permite que a estrutura seja menos compacta, para fazer passar o ar. O trabalho passa por monitorizações laboratoriais ao longo de meses, de maneira a corrigir alguns problemas nos solos agrícolas. Neste momento, os investigadores estão a utilizar solo contaminado com chumbo, proveniente de uma zona de exploração mineira da região centro, e analisar se a casca de ovo tem uma contribuição positiva.
Analisar dosagens A investigadora refere que a
“área da compostagem não é um processo propriamente novo”. A compostagem funciona da mesma forma que a natureza, mas de uma forma otimizada. É uma técnica “muito versátil”, partindo de alguns elementos base. Tanto a nível industrial como a nível doméstico, a característica indispensável para a compostagem resultar é a existência de matéria orgânica biodegradável em quantidades suficientes. Os investigadores analisam as reações bioquímicas em reatores laboratoriais, através de variáveis como a temperatura, a concentração de oxigénio, humidade e a matéria orgânica, entre outras. Depois é avaliada a composição química, a estabilidade e fitotoxicidade dos compostos. Aqui reside a grande interrogação da pesquisa, isto é, perceber as quantidades máximas de ma-
teriais que se pode incorporar. Margarida Quina relata que até 30, 40 ou até 50 por cento de casca de ovo é possível integrar na mistura, mas depois disso “começam a surgir problemas colaterais”. A investigadora garante que a casca de ovo pode ser usada, pois as análises clínicas já o confirmam. Todavia, o que realmente interessa é a “maisvalia” no produto final. É necessário compreender se traz mais vantagens do que outras combinações já utilizadas, ou até quanto tempo resulta até o solo necessitar de novos corretivos. “Se o projeto tiver pernas para andar têm que se envolver outros parceiros”, como é o caso da Escola Superior Agrária, visto que depois dos testes em ambiente laboratorial é preciso testar a mistura em campos agrícolas que o DEG não possui, finaliza Margarida Quina. filipe furtado
FCTUC desenvolve manual de Matemática gratuito O projeto NIUaleph pretende dar alternativas aos formatos habituais de manuais escolares de Matemática, sem deixar de parte o ensino profissional Filipe Furtado Gratuito e acessível são as características que definem o “NIUaleph12”, manual de Matemática A para o 12º ano de escolaridade, desenvolvido por uma equipa do Departamento de Matemática da Universidade de Coimbra (DMUC). Os criadores do livro apresentam-no como uma alternativa aos formatos e intransigências das grandes editoras. O projeto NIUaleph pretende servir de linha orientadora do es-
tudo, ligando a teoria à prática, e engloba um caderno de exercícios, um manual do professor e o “KitTec 12”, manual de apoio ao uso calculadoras gráficas e ‘software’. Também serão disponibilizadas tarefas semanais online para os alunos resolverem. A equipa da FCTUC pretende desenvolver e disponibilizar da mesma forma um manual de raiz para a matemática de cursos profissionais, o “Aleph Pro”, uma área que tem sido negligenciada pelas editoras. “Não foram produzidos manuais quase nenhuns para o ensino profissional e os poucos que existem são francamente péssimos, porque as editoras fizeram o que era fácil: aproveitaram partes das coisas que já tinham e reciclaram novos manuais”, sublinha o docente da UC, Jaime Carvalho e Silva. A ideia de organizar manuais escolares não é nova para Jaime Carvalho e Silva, matemático que
coordena a equipa responsável pelo livro. Há três anos atrás, o objetivo era criar manuais para todo o período do ensino secundário, porém, “não foi possível chegar a acordo com nenhuma das editoras previstas”, explica o docente do DMUC. “Fui formando uma ideia muito má do funcionamento das editoras, porque também fui revisor científico em várias situações”, afirma Jaime Carvalho e Silva, que acusa algumas editoras de utilizarem o seu nome “apenas como elemento decorativo”, sem darem uso às observações sugeridas. “A editora achou que andava a perder dinheiro se fizesse a alteração dos ficheiros de impressão”, assevera. O docente também critica as tentativas de interferência na própria escrita do manual e a filosofia de transformar manuais num caderno de exercícios, quando na matemática os exercícios-tipo não resolvem todos os problemas. O mesmo argumenta que os alunos
precisam de ler antes de fazerem exercícios. Segundo Jaime Carvalho e Silva, os manuais constituem uma ferramenta na solução de um problema de estudo dos alunos portugueses: não conseguem prestar a devida atenção às explicações do professor e anotar o que este diz ou expõe nos acetatos, em simultâneo. O manual está disponível online, garantindo o acesso gratuito a todos os alunos portugueses “que queiram estudar e frequentemente não se entendem com o seu próprio manual”, aponta o investigador. Aprender matemática é difícil, dado que os alunos não estudam, alguns porque não gostam, outros porque acreditam serem incapazes de aprender a ciência dos números. “O mais grave é as pessoas escolherem carreiras para fugir à matemática”, enfatiza. Os alunos têm dificuldades com uma linguagem hermética, demasiado simbólica e condensada. “Se encurtam
frases que não se entendem, aquela escrita só confunde mais”, aponta Jaime Carvalho e Silva, que acrescenta que faltam textos legíveis aos manuais. Muitas vezes, os alunos esquecem a matéria e necessitam de uma ferramenta que permita revisões ou, para os alunos mais interessados, avançar na matéria e fazer o ensino secundário em menos tempo, como é recorrente nos Estados Unidos da América. A adoção do livro por um dos estados brasileiros surpreendeu a equipa, que de início não pensava neste vasto alcance de distribuição. O formato digital garante um fácil acesso ao espaço de língua portuguesa e evita os habituais problemas de distribuição de manuais portugueses no Brasil, a demora no transporte e a falta de competitividade no preço final. A impressão do manual pode ser feita a nível local, reduzindo o preço de compra.
12 de junho de 2012 | terça-feira | a
cabra | 11
CIêNCIA E TECNOlOgIA filipe furtado
o efeito da cafeína é diferente em pessoas com patologias de foro neurológico ou psiquiátrico, comparando a pessoas sem patologias
Cafeína pode vir a ajudar crianças com hiperatividade e défice de atenção Resultados obtidos por uma equipa de investigadores da UC, liderada por Rodrigo Cunha, evidenciam que a cafeína pode vir a retardar o aparecimento de sintomas ligados a determinadas doenças do foro psiquiátrico. Após estudos em modelos animais, é necessário passar à fase seguinte. Por Paulo Sérgio Santos
A
cafeína é um composto químico encontrado em inúmeras espécies vegetais, onde tem uma função diferente daquela que se começa agora a conhecer no organismo humano. Nos últimos anos, através do aumento da pesquisa em doenças neurodegenerativas como a doença de Alzheimer e a doença de Parkinson, uma equipa da Universidade de Coimbra (UC), liderada por Rodrigo Cunha, descobriu que o consumo crónico de doses moderadas da substância normaliza o funcionamento de circuitos neuronais. “Pareceu-nos pertinente estender este conceito de normalização funcional para o caso de doenças do foro psiquiátrico”, declara o investigador. O objectivo é normalizar os circuitos neuronais, ligados ao controlo da atenção, essenciais em situações de crianças com hiperatividade e défice de atenção. O grupo de investigação, inse-
rido no Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC), pretende agora iniciar os estudos clínicos em crianças, depois de uma fase de pesquisa em modelos animais, ao longo dos últimos três anos. “Em 2009 foi feito o primeiro pedido para lançar um estudo clínico em crianças com défice de atenção e hiperatividade”, esclarece Rodrigo Cunha. Pedido esse recusado, para que se aprofundassem os estudos em modelos animais, e que será novamente feito agora. Contudo, está dependente da obtenção de financiamento, uma vez que “a cafeína, por ser de livre acesso, é um fármaco muito pouco apetecível para ser patrocinado pela indústria farmacêutica”, demonstra o também docente da Faculdade de Medicina da UC (FMUC). Em termos químicos, o tratamento mais comum a nível mundial é a prescrição de estimulantes à base de metilfenidato, mais conhecidos como ritalina.
Historicamente, existe um estudo piloto feito no Canadá, em 1975, que sugeriu um benefício resultante do consumo de cafeína em 20 crianças. Contudo, “a utilização de uma estratégia terapêutica só é efectivamente segura se, para além de aferir que funciona, se defina como funciona”, refere Rodrigo Cunha. Para isso servem os estudos animais já efetuados e os estudos clínicos que se pretendem realizar, igualmente imprescindíveis “para avaliar a razão custo/benefício de qualquer proposta de intervenção”, salienta o investigador do CNC.
Investigações futuras e outros estudos As conclusões entretanto atingidas mostram que a cafeína não apresenta efeitos secundários em controlos, “mas antes previne selectivamente a disfunção no doente”, ou seja, “um estádio de doença leva a adaptações no fun-
cionamento do cérebro de um doente que acarretam um impacto distinto da cafeína”, afirma o docente. No fundo, o efeito da cafeína é diferente em pessoas com patologias do foro neurológico ou psiquiátrico, em relação a pessoas sem patologias. O grupo liderado pelo docente da FMUC está a desenvolver paralelamente estudos em doenças do foro neurológico, como as já referidas doença de Alzheimer e doença de Parkinson. Em 2011 concluiu-se a fase inicial, com o estabelecimento de uma prova de princípio. O principal objetivo desta outra linha de investigação é responder “à questão de como é que a cafeína confere neuroproteção”, avança o cientista, mas também “definir se é possível vir a desenhar fármacos semelhantes à cafeína que tenham maior potência, seletividade e perfil farmacocinético que maximizem o benefício pretendido”.
Para Rodrigo Cunha, a investigação em modelos animais, da utilização da cafeína para minimização do aparecimento de sintomas relacionados com o défice de atenção e hiperatividade, “já produziu resultados visíveis para o público em geral, visto que novo conhecimento foi gerado na forma de um artigo científico”. No entanto, a fase seguinte, de estudos clínicos, fará com que passem cinco a oito anos até que estes resultados tomem uma nova forma, percetível pelas pessoas. O investigador considera, todavia, que ainda existem muitas questões que necessitam de uma resposta. É importante saber “se a cafeína é igualmente eficiente em homens e mulheres, se o genótipo de cada indivíduo determina uma eficiência diferente da cafeína, se os efeitos da cafeína se desvanecem com o tempo e quando é importante e durante quanto tempo tomar que dose de cafeína”.
12 | a cabra | 12 de junho de 2012 | terça-feira
produção literária
O s escr existem
e merec
Coimbra é irremediavelmente associada à eterna geração de escritores de Miguel Torga, Joaquim Namorado, Aquilino Ribeiro, entre outros. Mesmo não sendo da cidade, eles passaram e deixaram uma marca que nos orgulha. Mas, hoje, como está a produção literária que em tempos foi tão profícua? Por Ana Duarte
C
Stephanie Sayuri paixão
oimbra, 1960. Cristóvão de Aguiar chega à cidade para ingressar no curso de Filologia Germânica. Vindo no meio de uma maralha de caloiros, mal sabia o que o esperava – e engane-se quem pensar que era a praxe, essa era secundária. A início, a integração custou, mas os tempos eram de “grande ebulição intelectual” e não demorou muito até Aguiar entrar nos meandros culturais de Coimbra, autênticas tertúlias onde se discutia de tudo. “Nós víamos um filme, discutíamo-lo durante três horas. Líamos um livro e, antes de emprestar a um amigo, falávamos dele durante uma tarde”, relembra o escritor, apontando a crítica à falta de discussão pública sobre os mais variados temas de hoje. Coimbra, 2012. Cristóvão de Aguiar está reformado, vive nos arredores da cidade. E é daí que consegue ter a perspetiva atual das coisas – porque a escrita precisa da distanciação. Fala de tudo, desde Coimbra do seu tempo à de agora, demorando-se na produção literária. “Não se pode comparar. Naquela altura, quando se publicava um livro, era um acontecimento”, conta Aguiar. Hoje, há um sem número de fatores que tornam a produção literária em Coimbra mais escassa, e, pior, mais irrelevante. O principal fator é o contexto temporal. Infelizmente, é o único contra o qual nada se pode fazer. “Não se pode comparar o nível da escrita de há 20, 30, 40 anos atrás com o que se verifica hoje”, adianta Adelino Castro, editor da Lápis de Memórias, pequeno projeto editorial sediado em Coimbra. Também não se pode comparar a
quantidade de escritores que havia com a que há hoje. Ainda assim, “existe mais do que parece”, afirma o poeta João Rasteiro, natural da cidade. A falta de incentivo e reconhecimento é outra das grandes problemáticas da produção literária por cá. Mas não é só. Para o professor de Teoria da Literatura da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC), José Carlos Seabra Pereira, também falta autocrítica e contacto com a boa literatura. “Alguns estudantes que estão a iniciar a sua prática de criação literária denunciam um convívio reduzido com a boa poesia e a boa ficção, portanto, não têm padrões de aferição daquilo que eles próprios fazem”, sustenta o professor, alertando também para o possível equívoco que possam ter em relação ao que querem fazer como criação literária. O sonho de “ser escritor como antigamente” foi mitigado. Antes, havia tempo. “A escrita não aparecia em sobressalto. A escrita podia olhar para o lado, fazer as grandes descrições da evolução do próprio tempo. Hoje, o tempo é uma coisa galopante, que quase não existe”, lamenta Adelino Castro. E é por isso que assistimos ao “boom” editorial, ao frenesim dos grandes grupos editoriais para conseguir um Lobo Antunes ou um Mário Zambujal. A verdadeira aposta em algo inédito, original, praticamente não existe e é nesse jogo empresarial que os jovens escritores ficam a perder. Contudo, Adelino Castro aponta quatro nomes que têm vingado no panorama literário nacional. “Temos o João Tordo, o Valter Hugo Mãe, Gonçalo M. Tavares e o José Luís
Peixoto. Não temos mais”. Mas a nível regional, qual é a situação?
Coimbra neorrealista vs. Lisboa modernista “Uma coisa que assombra a vida da criação é o pesar de Coimbra ter perdido a liderança, a condução da dinâmica do campo literário em Portugal”. O professor da FLUC aponta este aspeto como um dos principais a ter em conta quando se fala da literatura em Coimbra. Façamos uma retrospetiva às décadas de 40, 50 e 60: depois das ameaças que constituíram a primazia lisboeta do modernismo, Coimbra recuperou o destaque com o movimento neorrealista – a conjuntura era favorável. A Universidade era rainha na área do ensino e foi escolhida por muitos dos grandes autores como escola. Mas a própria cidade reunia em si encantos que deleitavam muitos intelectuais do passado. Desde Miguel Torga a Joaquim Namorado, o já referido Cristóvão de Aguiar, Mário Braga e até o filósofo Eduardo Lourenço são referências incontornáveis que associamos de imediato à “escola coimbrã”. “Foi uma geração de criadores que entendeu melhor o mundo do que esta geração está a entender”, ressalva o editor da Lápis de Memórias. Perante isto, e à primeira vista, pode-se entender que, a partir dos anos 70, Coimbra morreu literariamente. É errado ser-se tão catastrófico, porque a produção existe. Não em tanta quantidade, não com grandes nomes do panorama nacional, mas com pequenos escritores que, esporadicamente, tentam a sua sorte em
12 de junho de 2012 | terça-feira | a
cabra | 13
produção literária
critOres
ecem ser lidOs
editoras da cidade e têm visto o seu esforço ser compensado.
A produção literária hoje André Tomé encontra-se a tirar o doutoramento em Arqueologia do Próximo Oriente. Em ‘parttime’, como o próprio afirma, gosta de escrever. Essa vontade “surgiu como o recurso mais natural para tentar fazer sentido do mundo”, explica. No outono deste ano, vai lançar um livro de poesia - “Insula”. André é o exemplo de “esforço compensado” pela Lápis de Memórias, ainda que muito do que escreveu seja “literatura de gaveta”, isto é, ainda não foi dada a conhecer. Para um jovem conseguir mostrar esse trabalho, é preciso fazer “um exame autocrítico”, afirma. “Se depois desse exame ainda resistir uma voz que consegue antever algum acolhimento positivo, nesse caso, o aspirante deve procurar alguém que publique”. André é também exemplo de um jovem escritor, a começar a sua vida literária. Mas, e os outros? É invisível aos olhos da população de Coimbra a quantidade de escritores que existem e que tocam todas as áreas da escrita: poesia, conto, ficção e até literatura experimental. Tudo isto, aqui. E pode ser desde o vizinho do lado, o professor da universidade, o senhor que tem uma loja na Baixa, até ao jovem estudante ou ainda um médico. Jorge Seabra é médico ortopedista no Hospital Pediátrico de Coimbra, mas ao mesmo tempo é escritor. Primeiro, a sua atividade esteve ligada a publicações científicas. Depois, enveredou pela área da ficção, sempre com
um toque de realidade. “Eu atravessei e participei diretamente nas lutas estudantis de 1969. Essa experiência reflete-se muito no meu primeiro livro, que está muito ligado a Coimbra”, conta Jorge Seabra. Na poesia, temos João Rasteiro, nome indissociável da Casa da Escrita e da poesia coimbrã de hoje. Começou a escrever há cerca de uma década e nem sabia bem porquê. “Sabia que não estava a escrever nada de novo, por isso, só podia estar a escrever os poetas mortos e, eventualmente, dar-lhe um cunho meu”, explica João. Poeta premiado, João Rasteiro foi recentemente nomeado para o Prémio Portugal Telecom da Literatura, juntamente com nomes como Valter Hugo Mãe, António Cabrita e Gastão Cruz. Ainda assim, o seu nome, como o de outros, passa ao lado de muita gente. Será que Coimbra é uma cidade ingrata? “A cidade, de certa forma, olha com distanciamento para os seus escritores, como para outras atividades culturais”, responde Jorge Seabra. A culpa, essa , passa em parte pela comunicação social da região, que, na opinião de Seabra e Rasteiro, não faz a divulgação que algumas pessoas merecem.
O papel das editoras Coimbra é uma cidade pequena, por isso não é de estranhar que a rede editorial seja parca. Os objetivos dessas pequenas empresas é que fazem com que estas se diferenciem dos grandes grupos, sedentos de adquirir a próxima livraria. A Lápis de Memórias tem esses objetivos bem vincados. “Publicamos 10 livros por ano,
nada mais. Mas desses 10 livros, pelo menos nove são de autores da cidade”, explica Adelino Castro. Uma das bandeiras que defendem é a proximidade à região e a necessidade de ressuscitar Coimbra culturalmente. Para isso, fazem vários encontros com escritores reconhecidos, uma espécie de revivalismo das antigas tertúlias que Adelino frequentou na juventude. Porém, as editoras também têm algumas dificuldades em agirem sozinhas, especialmente quando se trata de dar um incentivo à produção literária. Elsa Ligeiro, da editora Alma Azul, diz que “não há qualquer apoio municipal ou universitário à formação na área literária”. Ainda assim, esta pequena editora subsiste em fazer, por exemplo, residências artísticas de leitura e escrita.
Que futuro? Em tom grave, Cristóvão de Aguiar lamenta não conseguir ver ninguém, neste momento, que possa ser elevado a um estatuto de escritor nacional. “Atualmente, junta-se meia dúzia de centenas de palavras e dá para a despesa da nova geração. Isso é muito pouco, principalmente numa época em que as pessoas deviam ser muito mais cultas do que no meu tempo”, acrescenta. Seabra Pereira concorda, afirmando mesmo que “Coimbra não vai recuperar a centralidade que tinha em tempos”. Em tom de reflexão, conclui: “talvez isso seja a ordem natural das coisas, dentro do que é hoje o sistema sóciocultural do país”. Será?
com Douglas Rabelo e Paulo Sérgio Santos
14 | a cabra | 12 de junho de 2012 | terça-feira
Cidade Álvaro Domingues • geógrafo
“Há pouca convicção na leitura regional e territorial de desenvolvimento” Num discurso crítico, o geógrafo Álvaro Domingues trouxe ao encontro mensal “Páginas Tantas”, do Teatro Académico de Gil Vicente, uma reflexão sobre a nova paisagem territorial portuguesa, patente no seu mais recente livro “Vida no Campo”. Em entrevista ao Jornal A Cabra, Álvaro Domingues vincou a ideia de união de municípios na reforma administrativa do poder local. Quanto à região centro, o geógrafo acredita ser “muito difícil de definir”, mas falou das suas potencialidades. Ana Morais Já recebeu o prémio pelo melhor trabalho sobre desenvolvimento regional (atribuído pela Associação Portuguesa de Desenvolvimento Regional). O que é para si este conceito? É uma coisa de que se fala pouco. Hoje fala-se em crescimento, em globalização e tem-se uma ideia de que as escalas - local e regional não contam, isto porque a economia se globalizou. Tem-se a ideia de que não há nada que seja pensado ao nível regional. Também se tinha a crença de que determinados processos podiam ser pensados regionalmente e territorialmente e hoje não se pensa assim. Por que é que acha que isso acontece? Porque as pressões e as tendências da globalização são tão fortes e o papel do Estado é tão fraco que o desenvolvimento regional, que tinha como grande motor a capacidade do Estado em promover, ativar e desenvolver dinâmicas ao nível regional, é hoje muito frágil. Por isso há tão pouca convicção numa leitura regional e territorial de desenvolvimento. Quais acha que são os parâmetros que podem combater isso e contribuir para um desenvolvimento regional equilibrado? É muito difícil dizer o que é equilibrado. O desenvolvimento regional nunca foi equilibrado, fala-se muito em assimetrias regionais, na dicotomia litoral e interior. Provavelmente foi sempre assim. Mas a questão maior de desenvolvimento regional não era pôr as regiões todas iguais, era puxar pelo potencial distinto de cada uma. Em Portugal, estamos confrontados com
um território muito assimétrico e isso faz com que, num clima de crise, ainda se note mais a dificuldade de encontrar qualquer coisa que seja motor do desenvolvimento. Olhando para a região centro: como a caracteriza? É uma região muito difícil de definir. É qualquer coisa que está entre o Tejo e o Douro, que não se percebe muito bem o que é. Porque entre a Ria de Aveiro, a Serra da Estrela, os Campos de Idanha, a Beira Alta ou Baixo Mondego – tudo -, quer do ponto de vista biofísico quer do ponto de vista demográfico e urbano, é completamente diferente. Porém, a região centro sempre me pareceu centrífuga. O que ela tem de centrípeta é esta cidade, Coimbra, devido ao potencial de duas funções: a universidade e os hospitais, e tudo aquilo que esses dois setores multiplicam a montante e a jusante. A saúde e a universidade são de escala regional e nalguns casos até nacional. Esse é o potencial de Coimbra. Todavia, é uma região com um défice no desenvolvimento industrial, na criação de emprego. Quando digo que é centrífuga é porque quando falo em região centro, Coimbra surge em primeiro mas, logo a seguir, nos ocorrem: Aveiro, Viseu, Guarda, Leiria… E isso é que dá esse ar centrífugo. Dizia que Coimbra parece ser a cidade mais demarcada da região centro. Acha que isso se mantém atualmente? Coimbra continua a ter uma fragilidade muito grande ao não criar emprego nas indústrias. Isso é problemático, porque a criação de emprego nos serviços pode ser rapidamente sugada por influência de Lisboa – este país é macrocéfalo desde o tempo de D. Afonso Henriques - ou do Porto. Mas a facilidade com que hoje se tecem contactos e relações origina que as pessoas altamente qualificadas fujam, se o meio, a nível local, não tiver instituições que retenham essa mão-de-obra qualificada. Creio que é esse o drama. Coimbra tem áreas de formação de excelência no seu ensino mas não tem instituições que sejam capazes de fixar a gente que aqui se forma. De maneira que é uma espécie de efeito centrípeto seguido de centrifugação. Acredita que uma das soluções para Coimbra
seria a criação de empregos no setor da indústria? Com certeza, embora isso não se decrete. Depende de uma economia que está desgovernada, cuja concorrência se tece ao nível global – portanto, não podemos ter demasiadas ilusões em pensar que basta criar parques empresarias ou industriais infraestruturados e esperar que as empresas venham… porque não vêm. Toda a gente usa a palavra mágica do empreendedorismo, e se estamos à espera que cada engenheiro eletrotécnico venha a criar o seu próprio negócio, devo dizer que não é um facto corrente na cultura portuguesa.
cerias entre o Estado e os privados, temos má memória de muitas delas. Agora, é certo que deve fazer-se alguma coisa em termos intrainstituições. Não temos muita tradição disso, pois com um Estado que é frágil, com um nível de decisão a nível regional que não
Falava da economia. Pensa que devem ser as entidades a intervir diretamente no impulsionamento do desenvolvimento regional? No tempo do Estado Social e do Estado Providência a resposta era muito simples: era o Estado que devia intervir. Agora, o que temos é um Estado de Providência em desconstrução. Há uns tempos acreditava-se que podiam aparecer par-
existe, com um poder local muito fragmentado dentro de municípios… Tocou na questão da fragmentação de municípios. Qual é o seu parecer face à nova reforma da administração local? A reforma da administração local está centrada na redução das freguesias. Isso não faz muito sentido porque se o objetivo é poupar dinheiro não é pelas freguesias que se poupa. Se a discussão fosse séria estaríamos a falar do nível intermunicipal e de formas de perceber o que é que pode ser a cooperação entre municíp i o s . Não é preciso q u e
“Se a discussão fosse séria estaríamos a falar do nível intermunicipal”
dois ou três municípios se fundam para se organizarem coisas ao nível intermunicipal, já existem experiências, desde a gestão de infraestruturas de saneamento à gestão de transportes escolares. Portanto, não se deve afunilar a questão – até porque a nível político isso é desastroso – para obrigar os municípios a juntar-se, para com isso se poupar fundos públicos. Diz que “a paisagem é o registo de uma sociedade que muda”. Considera que atualmente ambas estão a mudar a um ritmo rápido? O ritmo é tão rápido que quase não há tempo para entender o que se está a passar. É por isso que hoje se vive da nostalgia, da ideia de cidade enquanto centro histórico ou da ideia de rural enquanto aldeia típica. Isto, sem se perceber bem aquilo que se passou entretanto. São apenas estereótipos de realidades que representam muito pouco, e as pessoas não se dão conta do resto. Provavelmente, uma das razões é o ritmo a que as coisas mudam. E qual é o ritmo da região centro? Muito rápido. Na região centro e no país todo. Mudanças que tiveram que ver com a época de maior prosperidade e de maior crescimento até final dos anos 80 e agora por causa da crise… É difícil também não ver coisas fechadas, estradas sem ninguém. Para o bem e para o mal a mudança é, de facto, muito rápida e às vezes incompreensível. As pessoas têm uma visão bucólica de paisagem enquanto coisa apaziguadora, que se vê ao longe e que tem os carneirinhos em primeiro plano (risos).
ana duarte
12 de junho de 2012 | terça-feira | a
cabra | 15
Mundo Sociedade contemporânea
O terrorismo além do (pre)conceito os rótulos são vários, mas o conceito de terrorismo é abstrato e difícil de interpretar. Grupos ou indivíduos são denominados terroristas mas conta a História que alguns se tornam nobel da Paz. uma classificação adjetiva e volátil, que no dia de amanhã pode mudar. Por Maria Garrido e Catarine Martins
“H
d.r.
d.r.
á definições, basta ir ao dicionário”, começa por atirar o jornalista da Antena 1, Joaquim Reis, que entende as ações terroristas como “aquelas que produzem terror, que amedrontam. O terror é uma conjugação de medo, de pânico, de receio, algo que acaba por nos quartar nas decisões que poderíamos, ou não, tomar”, assevera. Uma abordagem que talvez resulte no entendimento perto do consensual sobre um conceito demasiado abstrato e complexo. Um ato de terror que pode ser cometido por qualquer pessoa: “se este senhor que aqui está ripar de uma pistola e de uma granada de mão, nos ameaçar e puser aqui no chão, ele está cometer um ato de terrorismo.” Por sua vez, concordante, o presidente da direção da Amnistia Internacional em Portugal, Vítor Nogueira, explica que este é “um dos problemas no que diz respeito ao direito internacional, pois os Estados chamam terrorista a toda a gente”.
A projeção do 11 de Setembro A palavra “terror”, bem como os atos de violência contra Estados, não são hoje uma novidade, tão pouco um apanágio do pós 11 de Setembro. “A primeira vez que surge na literatura a palavra ‘terror’ é dentro da revolução francesa”, lembra a professora do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa (ISCSP/UTL), Teresa de Almeida e Silva. Para a docente, foi o atentado contra as Torres Gémeas o acontecimento que “fez despertar a comunidade internacional para a questão do terrorismo. Apesar de este não ser nada de novo, talvez seja o expoente máximo”. Assumindo que a luta internacional contra o terrorismo se prende com os posicionamentos norteamericanos, nomeadamente na presidência de George Bush depois do 11 de Setembro, o jornalista, presença assídua em palcos de guerra, entende que “apesar de as definições serem muito úteis, é complicadíssimo arrumar os conceitos de terrorismo.” Ante isto, a dúvida que se coloca é se houve algum tipo de evolução do conceito ao longo do tempo. Vítor Nogueira responde: “penso que o conceito não está definido e vai continuar a não estar. É um termo que não está qualificado e é usado apenas como insulto, é utilizado de um ponto de vista adjetivo.” “Adjetivar como ‘terroristas’ hoje em dia passa muito por uma
nacional de afirmação de uma nova pátria. Aqui temos, isso sim, uma causa religiosa”, afirma. Vítor Nogueira acredita ser “injusto e incorreto” associar-se o terrorismo a uma religião em particular.
Vítimas ou inocentes?
questão ideológica pessoal. Os terroristas dos russos não são os terroristas dos americanos e muito menos dos chineses”, corrobora Joaquim Reis. “ A partir do momento em que eu disser que foi um atentado terrorista, já estou a adjetivar de uma forma que interessa a uma das partes”, remata.
“Nem o bem está todo de um lado, nem o mal está todo do outro” Recusando-se a classificar um grupo como terrorista dentro dos atuais conceitos, Joaquim Reis admite não o fazer pois “pode-se nunca saber quando é que as pessoas que fazem essa classificação de hoje para amanhã ficam amiguinhas umas das outras”. Para o jornalista, uma coisa é certa: “o mundo não é a preto e branco nem o bem está todo de um lado nem o mal está todo do outro.” Outro aspeto importante de referir passa pelas motivações dos cha-
mados grupos terroristas. Joaquim Reis distingue: ”esses grupos podem ter vários objetivos, como por exemplo o IRA e a ETA, que têm uma identificação com uma causa, uma causa que transcende o próprio grupo, completamente di-
“Há vítimas, há inocentes e há culpados dos dois lados”, diz Vítor Nogueira ferente do caso dos Baader-Meinhof na Alemanha ou das Brigadas Vermelhas em Itália”. Um fator emergente que considera interessante e com o qual estabelece o contraponto é o caso dos grupos ligados ao fundamentalismo islâmico. “Não há propriamente uma causa ideológica nem uma causa
“Há vítimas, há inocentes e há culpados dos dois lados”, defende o Presidente da direção da Amnistia Internacional. Teresa de Almeida e Silva aponta que quando se trata de terrorismo indiscriminado, há “sempre” vítimas e inocentes. “Há vitimas e há inocentes que foram [no 11 de Setembro e no 11 de Março] o alvo primordial do terrorismo e depois há também os que de uma forma ou outra são atingidos por este conflito.” Joaquim Reis recusa-se a falar em inocentes ou em culpados. Assume apenas existirem vítimas: “A única coisa que eu sei é que houve vítimas. E naquele momento, aquelas vítimas foram as pessoas que sofreram. Não digo sequer que as vítimas são inocentes ou são culpadas”.
Exército vs grupos terroristas Da mesma forma que um grupo é condenado pelas suas ações denominadas terroristas, também um exército o deve ser se encetar qualquer tipo de violação dos direitos humanos. Vítor Nogueira res-
guarda que “nem os exércitos nem os chefes de Estado beneficiam de impunidade e que quando cometerem atos criminosos, têm de ser igualmente punidos.” A docente do ISCSP estabelece uma distinção, lembrando que ao passo que “a ação de um exército está enquadrada num conflito regulado por regras internacionais que têm de ser cumpridas, o terrorismo é imprevisível, não cumpre leis.” “É um conflito assimétrico”, conclui. Joaquim Reis é mais assertivo: “um exército pode desencadear ações de terror, é óbvio que um exército pode cometer atos de terrorismo.”
Prémio Nobel da Paz Personalidades como Nélson Mandela ou Yasser Arafat ascenderam a Prémio Nobel da Paz. Figuras emblemáticas, curiosamente antes consideradas terroristas. Vítor Nogueira justifica esta inversão no sentido de, “em determinado momento, a perceção dominante ser aquela que os seus adversários conseguiam passar.” Pondo que “quando se entendeu que não era bem assim, a perceção mudou, alterou-se”. “O Yasser Arafat era terrorista? Era ao início. Acabou por ganhar o Prémio Nobel da Paz. O Kadafi não era, foi, deixou de ser, voltou a ser”, deixa no ar Joaquim Reis. com António Cardoso
16 | a cabra | 12 de junho de 2012 | terça-feira
País
A espera de tirar senh Viseu. Coimbra. aveiro. Três distritos que ajudam a descodificar o desemprego na região centro – que apesar de ter a taxa mais baixa do país, continua a ser representativa do flagelo nacional. são vozes que mostram a realidade de quem não desiste e ambiciona por dias melhores. À porta dos centros de emprego, encontrámos estas histórias. Por Liliana Cunha e ana Morais e Fotografia por ana Morais
“V
ou ali ao desemprego tirar a senha”, fala a voz pesada de rotina de um senhor de meia-idade para o telemóvel. À porta do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) de Viseu, pelas 11h30 da manhã, o tempo cinzento combina com as expressões de quem lá pára. Na fileira dos bancos poucos se encontram, o que contrasta com um grande número de ofertas de emprego expostas – “as ofertas encontram-se em inglês, uma vez que são necessários bons conhecimentos
desta língua”, podem ler apenas os que dominam a língua. São mais os que vão saindo, alguns cabisbaixos a alegar a pressa - a pressa de um emprego, a pressa de melhores dias. A esperança desvanece com a falta de uma resposta: “vim cá na semana passada duas vezes. Venho, vejo as ofertas, telefono e deixam-me pendurada”, revolta-se Ana Marques, de 21 anos. Veio do Algarve para se estabelecer com o marido, mas até agora as suas experiências foram más – “trataram-me abaixo de cão”, relata.
“Eu já tenho fome em casa”, admite Marisa que quer “lutar” pelo país
Região centRo tem a menoR taxa de desempRego atualmente, a percentagem de desempregados na região centro é de 11, 8. dentro dos números da população ativa (registados no primeiro trimestre deste ano), esta apresenta-se como a percentagem mais baixa de todo o país, incluindo ilhas. no universo de uma população ativa de mais de 5 milhões, segundo o instituto nacional de estatística (ine), torna-se interessante descodificar a evolução da região no panorama nacional. pelos quadros estatísticos mensais do ieFp, no final do ano de 2003, a região centro tinha mais de 62 mil desempregados inscritos. a recolha destes testemunhos reporta-se a três dos seis distritos da região, podendo observar-se dicotomias entre os dados que se reportam ao total de pessoas sem trabalho e as ofertas de emprego que foram disponibilizadas: aveiro, com 9 mil inscritos no centro, apenas tinha 165 ofertas de trabalho. Viseu, com mais de 8 mil inscritos, não registava mais de 250 propostas. a procura sempre excedeu a oferta nestas questões. Quase uma década depois, há um dado que se destaca: em abril de 2012, o número de inscritos em toda a região elevase para quase 90 mil pessoas. o paralelo entre ofertas e procura é que não sofre variação. em coimbra, por exemplo, são 11 900 desempregados, mais de 10 por cento da população residente na cidade, e as ofertas chegam num número incrivelmente baixo – 69. outro fator pertinente é a produtividade aparente do trabalho por regiões registada pelo ine. em 1995, a região centro produzia 13 milhões de escudos, aumentando em 2009 para 24 milhões de euros. Há, no entanto, uma comparação inter-regiões a valorizar: enquanto o centro remunerava 852,4 mil indivíduos, o algarve apenas remunerou 184 mil pessoas.
A procura constante por um trabalho que sustente a família é muitas vezes um desânimo. Desânimo esse patente no olhar de Paulo Rodrigues, com 29 anos, desempregado há meio ano. Mais um contrato que acabou. Como a grande maioria, já não se restringe à sua antiga profissão, vê em todas as áreas. Garante que ainda não encontrou nada, e com um filho de dois meses, não encara na saída do país uma solução, mas teme pelo fim do subsídio. E depois? “É esperar para ver…”, arrasta a voz. “Tenho andado a fazer uns bisca-
tes de pintura”, desabafa Sérgio Escalho, de 28 anos. Andava a vender telemóveis de porta em porta, mas foram as implicações contratuais de uma empresa de comunicação que lhe abriram a porta do desemprego há três anos e meio. Só tem o sétimo ano como formação e procura “por tudo”. Está a pensar rumar para a Suíça onde já esteve. Afinal, “está muito complicado no nosso país”. A viver numa instituição, João Santos, de 21 anos, está desempregado desde o ano passado. Esteve um mês em hotelaria, não ficou. Veio à procura de
“alguma coisa, algum curso”, tudo serve, mas, mais uma vez, é esperar, é “ver no que dá”.
“Estamos desempregadas a partir de hoje” Por Coimbra, a tarde soalheira notase na Avenida Fernão de Magalhães – o tráfego dos carros é consonante com o fluxo do vai e vem de gente no centro de emprego. José Marques, de capacete na mão, sai apressado de uma das portas do IEFP. “Tenho que ir buscar um cheque à segurança social”, conta ao mesmo tempo que sobe para a sua mota. Explica revoltado que um cheque que já devia ter recebido ainda não lhe chegou a casa. Mais a norte, em Aveiro, o relógio marca 10h45 e já há quem esteja privado de trabalho: “estamos desempregadas a partir de hoje”, admitem Carla Lopes e Sara Fonseca, de 38 e 37 anos respetivamente. Mais uma firma que entrou em processo de insolvência. Como eram as únicas empregadas, foram dispensadas. É tudo recente, porém “as perspetivas são muito más. Muito más”, vinca Carla Lopes. Entre um fumar de cigarro descontraído, surge a preocupação de Tiago Araújo, desempregado há um ano. Com 24 anos e o nono ano de escolaridade, já é a segunda vez que está sem trabalho. Acredita que o nível mais baixo de formação é um entrave que lhe dificulta a procura. “O governo não tem estado à altura. Está a cortar-nos as pernas”, protesta.
“Muitas vezes a crise é a desculpa” Estas estórias não se fazem sem a visão de quem está do outro lado. “Quem tem empregos, tem de lutar por mantê-los”, afirma a funcionária do refeitório do IEFP de Coimbra, Paula Pinheiro. Tem trabalho, contudo o medo de o perder está lá – “reduziram o meu horário mas é melhor que me reduzam uma hora do que ir para o desemprego”. Apesar de não tomar contacto direto, sabe que há dias em que a sala se enche de quem quer arregaçar as mangas. Paula Pinheiro considera que a crise muitas vezes é “a desculpa”. No entanto, o encerramento de muitas empresas
12 de junho de 2012 | terça-feira | a
cabra | 17
País
nha por um trabalho
em relação ao estímulo 2012, miguel alega “tu sozinho não te geres com 500 euros”
leva a que “os donos fiquem cheios de dinheiro”, lamenta. Com a mesma precisão com que diz o dia em que se viu sem trabalho (9 de fevereiro de 2012), Paulo Silva conta que os 150 euros do ordenado da sua esposa têm que dar para o sustento da casa, da filha, e deles. Mas no último mês não deu, e cortaramlhe a luz. É de Estarreja, fica-lhe longe vir ao IEFP de Aveiro, por isso procura mais na internet. Nesse mesmo dia, preencheu uma ficha num posto de abastecimento de gasolina. Em princípio, “o senhor diz que me vai tentar lá meter mas, com 40 anos, é-se velho demais para trabalhar”, fala a receio. Se conseguir ganhar 400 euros por mês, “já é uma ajuda”, garante com um olhar carre-
gado de esperança. “Mas como eu está muita gente”, afirma sem se sobrevalorizar.
“É preciso nosso país”
lutar
pelo
“Eu já tenho a fome em casa”, admite Marisa Lobo, num discurso crítico. Ao mesmo tempo que é crítica, apresenta um sorriso desenvencilhado. A mesma pessoa que diz ter a fome em sua casa mostra a vontade de “lutar pelo nosso país”. Sem papas na língua, quer falar e quer que a oiçam. “Viemos para a rua em agosto passado e nunca mais nos chamaram”. Não teve direito ao fundo de desemprego, por isso quer “lutar” pelo seu próprio trabalho. Está a tentar abrir um negócio juntamente com a colega, Branca Margarida, de 34 anos, também despedida na mesma altura. “Fomos ao departamento das finanças pedir ajuda para abrirmos um negócio nosso”, explica ao invocar a ajuda da sorte. O futuro de José Pedro, em Aveiro é pensado antecipadamente. Veio ao IEFP para se “informar”. Com 30 anos, está a pensar em abrir o seu negócio. Durante dez trabalhou numa empresa, e em março passado informaram-lhe, via internet, que em setembro a empresa mudaria de país – “os patrões nem tiveram a distinta lata de me dizer nada”, partilha indignado. Quanto à atitude do Estado assume que é radical e por isso “desligou das informações”. Considera que quando “o governo dá uma coisa,
tira outra”.
Estímulo 2012 Para estimular o emprego, o governo adotou, na semana passada, um conjunto de medidas que visa apoiar cerca de noventa mil jovens para o combate ao desemprego. Os estágios remunerados distribuem-se por entre a administração pública, pela agricultura e até por federações juvenis e desportivas. As bolsas são comparticipadas pelo Estado na sua totalidade e se o jovem ganhar um contrato, a contrapartida do apoio financeiro é assente. David Pereira, 23; Miguel Samarro, 23; e Sandra Vilar, 30, encaixam no perfil jovem. Em Viseu, “tem-se feito pouco nesse sentido”, garante David Pereira. Com uma licenciatura em Gestão, vai ter um estágio remunerado. Conseguiu-o em grande parte por que se bate “frente a frente” com quem possa ser o seu empregador. Miguel ainda está a frequentar o curso de Engenharia Mecânica, mas já busca um primeiro emprego. Queixa-se de que em Coimbra não tem oferta de emprego, e de que o tal Estímulo não lhe serve “não vai dar em nada, sozinho não te geres com 500 euros”, demonstra com dissabor. Para Sandra, estar em Aveiro à procura de emprego é uma constante. Professora de formação, confessa que todos os anos acaba
“por estar alguns meses no desemprego”. Relativamente às novas medidas do Ministério da Economia e do Emprego, acredita que representam uma incógnita – “não sei se vai resultar em alguma coisa”. Depois de trabalhar 12 anos na área da construção civil, Vasyl Koval está privado de trabalho pela primeira vez, há mais de um ano. Veio do seu país, Ucrânia, e pensou que era para ficar. No entanto, esse sentimento parece já não se manter – “se não arranjar cá em Coimbra vou para outro sítio”, garante ao mesmo tempo que lamenta as implicações que isso terá na vida da sua filha que quer continuar a estudar na cidade. “Se não encontrar emprego procuro no estrangeiro. Seja onde for”, afirma convicta Anna Cohr. A viver em Aveiro e com dupla nacionalidade só não parte de imediato para a Alemanha porque tem uma filha menor e encontra-se num processo de divórcio litigioso. Mas num futuro próximo, parece ser a solução. Aqueles que se encontram na faixa etária mais aproximada da reforma sentem na pele o travão da idade para obter trabalho. Já são muito velhos para trabalhar, mas são ainda muito novos para a reforma. “Isto são já problemas do país, não é só idade”, assevera João Soares, de 57 anos. Um dos problemas que proclama é o dos
jovens se sujeitarem a ganhar menos que o ordenado mínimo – “nós [os mais velhos] não nos vamos sujeitar, nem eles nos vão aceitar”. João vem ao centro todos os dias, mas não pensa ir embora. Dos sete irmãos que tem é o único que não emigrou. “Fomos a uma entrevista há pouco tempo, era para decidir quem ficava dos três, e ficou a mais nova”, lamenta Judite Nunes, de 56 anos. Se pudesse pedir ajuda ao governo, punha em primeiro lugar “os mais jovens” mas, ao mesmo tempo, não concebe um melhorar da conjuntura – “não há dinheiro, está tudo parado, não há obras, não há restaurantes… Onde vamos trabalhar?”. Embora seja a região com menor taxa de desemprego nacional [ver caixa], o centro faz-se de estórias como estas. Algumas pessoas vivem sem um trabalho, sem esperança, sem ânimo. Outras, já calejadas pela vida mostram a firmeza de quem não desiste do país. José Figueira, de 46 anos, desempregado há um, ironiza – “vivemos com o dia a sobrar para os dinheiros”. O Jornal A CABRA tentou contactar o secretário de estado do Ministério da Solidariedade e Segurança Social, Pedro Silva Martins. Depois de se mostrar disponível, não prestou declarações.
18 | a cabra | 12 de junho de 2012 | terça-feira
Cinema
Artes
“Cosmopolis ” De DAviD Cronenberg Com robert PAttinson PAul giAmAtti sArAh gADon 2011
Feito em cima do joelho
ver
CRítiCA De José sAntiAgo
A
história é a da monótona vida de marina (Ariane labed, premiada em veneza em 2010) numa pequena cidade no litoral grego, que divide o seu tempo entre a descoberta da sua sexualidade, o progressivo definhamento do pai e os documentários da vida natural de sir David Attenborough. É a melhor amiga de marina, a promíscua bella (evangelia randou), que inicia a jovem de 23 anos no sexo, partilhando momentos de alto erotismo com brincadeiras infantis como concursos de escarros ou passeios a imitar o famoso “ministry of silly Walks” dos monty Python. A atmosfera é permanentemente cinzenta, contrariando a imagem típica de panfleto turístico e de filmes com banda sonora dos
É
difícil falar de um filme como “Cosmopolis”. não por ser extremamente complexo ou abordar temas com particular densidade, mas exactamente pelo oposto e querer desesperadamente dar a entender uma maturidade inexistente. A adaptação do romance de Don Delillo, mostra-nos o dia mais difícil de um jovem milionário que só quer cortar o cabelo, desvalorizando todo e qualquer tipo de caos que o possa demover dessa finalidade. esse mesmo dia é pontuado pela ameaça eminente de um atentado à sua vida. O problema do filme não tem a ver com qualquer tipo de desleixo no trabalho de David Cronenberg como realizador, mas sim no seu trabalho como adaptador. não conhecendo a obra original, arriscome a dizer que muito pouco foi alterado na sua versão para o cinema, os diálogos parecem ter sido (dolorosamente) transcritos na íntegra e tudo o que não tinha
um travessão atrás foi empurrado para a construção de cenário. A visão redutora que dou ao produto final é justificada pelo trabalho prévio do realizador e por sabermos perfeitamente que aquilo não é marca de autor nenhuma, é pura e simplesmente um trabalho atabalhoado, desinspirado e absurdamente mal escolhido. As metáforas são mais do que óbvias e nem sou defensor de que elas se devam esconder, mas a proximidade dos temas retratados no filme com a nossa própria realidade torna tudo incrivelmente hilariante. encontramos até um momento em que se fala da morte de um rapper famoso (o artista favorito da personagem principal) e o grande pensamento que fica da cena é: morreu de causas naturais e não abatido num tiroteio… as voltas que a vida dá. Para ajudar à festa temos actores que insistem em desempenhar os seus papéis como se estivessem
num palco, em frente a centenas de pessoas, a exagerar uma actuação que no grande ecrã se vê apenas cómica. se a ideia era elaborar uma ponte entre o teatro e o cinema, aconselho que se olhe para o “Dogville” de lars von trier como exemplo bem sucedido. robert Pattinson está aqui igual a ele próprio, o que quer que isso seja. Apático, poupado na entrega e desconfortável, mesmo num filme de Cronenberg, onde se espera desconforto do bom. O restante elenco oferece-nos interpretações mornas, o que é uma pena já que inclui Paul giamatti e Juliette binoche. As palavras amargas que deposito na minha avaliação de “Cosmopolis” têm muito a ver com a admiração que tenho pelo realizador e a tremenda desilusão que é assistir a um filme que é fraco por qualquer padrão, não só o dele.
Attenberg Abba das ilhas gregas. Assim como a existência de marina e do seu pai, spyros (vangelis mourikis), um cínico arquitecto totalmente dependente da filha, com o espectro do complexo de electra sempre presente. O espectador pouco mais recebe do que pequenos fragmentos do dia-a-dia de marina, pausados, silenciosos, pouco dados a explicações. Poderá ser frustrante, para quem vê, o número de questões deixadas por responder, mas quem quer filmar a vida (e a morte) não o poderia fazer de outro modo. O filme de Athina tsangarai desenrola-se como a construção da morte de spyros. É o próprio que melhor o resume quando explica o que entende por construir: “é como se estivéssemos a desenhar ruínas. Como calcular o eventual
colapso delas com precisão matemática”. A morte do pai de marina é omnipresente e parece servir de metrónomo da acção. spyros planeia-a ao milímetro, como faria em relação a um qualquer edifício, cabendo à filha apenas executar e tratar dos pormenores, como se de um engenheiro se tratasse. A morte sempre exerceu uma atracção obscena sobre a arte e o cinema não é excepção. mas, ao retratá-la, os excessos e o mau gosto são perigos dir-se-ia que mortais. tsangarai consegue em “Attenberg” contorná-los pois não se deixa dominar por essa mesma atracção. A verdadeira história é a de marina, encarregada de cuidar de um morto adiado enquanto descobre uma nova vida. tudo ao som dos suicide. que ironia. João RibeiRo
filme
De AthinA tsAngArAi eDitora DvD AlAmbique 2010
A construção da morte
Artigo disponível na:
12 de junho de 2012 | terça-feira | a
cabra | 19
FeitAs oUvir
ler
Pão
D
esde a sua criação, em 2001, que a trem Azul Jazz store - espaço lisboeta situado na rua do Alecrim (a meio caminho entre o Cais do sodré e o largo Camões) - tem sido um espaço de encontro de melómanos, mas também de um contingente cada vez maior de músicos em busca de outros com quem partilhar explorações sonoras. se o cimento agregador é o jazz, as abordagens privilegiadas por esta cena emergente têm-se estendido a territórios muito mais vastos, abrangendo a electrónica, a música improvisada e a música contemporânea. nos PÃO, encontramos três De dos mais insignes representanPÃo tes desta efervescente cena musical. tiago sousa (esse mesmo, eDitoRA responsável pelo excelente shhPumA 02 disco que é Walden's Pond monk) pode encontrar-se aqui 2012 no harmónio e no órgão, travassos manipula uma parafernália electrónica (exclusivamente analógica) e Pedro sousa aparece com o seu saxofone tenor. embora a audição deste disco evoque paisagens, estas são, na maior parte, de um outro mundo, para o qual as nossas descrições de pouco servem. há uma noção clara do contributo de cada instrumento na construção das três peças presentes no disco. Construções onde os critérios espartanos reinam, crescem para se tornar algo massivo, como que se alimentando da matéria sonora reverberante. Prenhe de espiritualidade, mas sem mestres nem igreja, a música dos PÃO repete um mantra sujeito a ínfimas e infinitas mudanças, ora juntando um elemento, ora retirando outro. Depois da estreia com Felipe Felizardo e preparando agora o lançamento da mui aguardada colaboração de Carlos bica com norberto lobo, a shhpuma (espécie de subsidiária da Clean Feed) aponta novos rumos para a música criativa portuguesa. e, pelo caminho, alimenta a nossa alma!
Alimento para a alma
Destino: frankfurt
n
Páginas de nada
De AgAthA Christie eDitoRA eDições AsA 2012
uma única palavra, este livro é uma desilusão. talvez a expetativa fosse demasiado elevada. esperava da “rainha do crime” um policial envolvente e intrincado, que colocasse as rodas dentadas do raciocínio a funcionar à descoberta da solução dos complexos mistérios que se escondem por detrás de um crime “quase perfeito”. Agatha Christie não era mestre na arte de trazer a espionagem e intriga política para a literatura, e “Destino: Frankfurt” é a prova disso mesmo. O início promete. O diplomata sir strafford nye encontra no aeroporto uma estranha mulher que lhe faz uma proposta arriscada, alegando que corre perigo de vida. O leitor fica preso às primeiras páginas, à espera do que se seguirá. Porém, à medida que as lemos, pouco nos é dado. O diplomata volta então a encontrar-se com a jovem rapariga, mary Ann. Porém, esses encontros pouco nos esclarecem e tocam o ridículo. É altura de o leitor dar uma oportunidade à história, pensando que estas são as peças de um puzzle que no fim de encaixadas nos darão todo o sentido. uma ilusão que nos impede de desistir. seguem-se reuniões diplomáticas, que especulam quanto à origem dos recentes movimentos
anarquistas que causam sérios distúrbios em vários pontos do globo. então, voltam as teorias da conspiração hitleriana e eis o surgimento do neonazismo. Oferece à juventude uma nova religião, cujo deus é a imagem heroica do jovem siegfried. incentiva os estudantes à revolta e violência através da manipulação, difundindo uma crença na reconstrução de um novo mundo. sir stafford vê-se assim envolvido numa rede de espionagem, com a missão de descortinar o rosto que se esconde por detrás de tudo isto. As personagens nunca deixam de ser feitas de papel. não ganham vida porque não parecem reais, vazadas de profundidade. A inexistência de clímax é esgotante. O fim traz algum alívio ao leitor que não deixa de ser acompanhado pelo sabor da deceção. É rápido e insípido. não há uma descoberta inesperada ou um desfecho dramático que nos marque a memória. Diria que a previsibilidade é o inimigo deste livro, mas não estaria a avaliá-lo com correção. É impossível prever alguma coisa, porque não há indícios ou motivos que estimulem a imaginação do leitor. há apenas um grande vazio. não tenho dúvidas de que “Destino: Frankfurt” é uma nódoa na vasta obra de Agatha Christie. niCole ináCio
JoGar
max Payne 3 medium Payne
José miguel PeReiRA
GUerra DaS CaBraS A evitar Fraco Podia ser pior vale a pena A Cabra aconselha A Cabra d’Ouro PlAtAfoRmA Ps3, XboX, PC Artigos disponíveis na: eDitoRA roCkstAr gAmes 2011
J
ogar o tão aguardado terceiro capítulo da saga max Payne traz-nos uma revelação interessante: os videojogos, como meio de expressão, estão a atravessar uma mudança crucial que, a seguir o caminho actual, os levará cada vez mais próximos do género cinematográfico. e, se por um lado encontramos pontos positivos nesse facto (maiores valores de produção e, quem sabe, a afirmação dos jogos como a oitava arte), por outro perde-se muito do que tornava um jogo... um jogo - e que melhor definição que esta para a nova encarnação de max, desta vez sob a alçada da quase sempre irrepreensível rockstar. Contanto com o ambiente próprio da série e uma história com algum interesse (especialmente para os fãs da saga), uma curva de dificuldade acentuada (devido à boa inteligência artificial dos inimigos, que é um dos pontos fortes deste capítulo) e um grafismo aceitável ainda que genérico, max Payne 3 tenta contar uma história moderna e cheia de estilo (que sobrevive à custa de uma escrita bastante interessante), divertindo moderadamente embora sem grandes surpresas. no entanto há algo que se perde. O conformismo com as novas mecânicas
padrão do género (sistemas de cover, estilo narrativo, multiplayer à la uncharted - que, ironicamente, acaba por se revelar como o ponto forte do jogo) faz com que este novo capítulo, à excepção de meia dúzia de mecânicas próprias (como o bullet time característico da saga) -seja apenas mais um jogo genérico. longe vão os tempos de jogos criados pelo amor ao meio, pela criatividade e pelo risco: hoje é o dinheiro que manda e qualquer franchise que se preze deve ser, aparentemente, espremido até ao último dólar - max Payne 3, numa tendência (a meu ver negativa) da indústria, conta inclusivamente com uma loja integrada para a aquisição de futuros packs de dlc. este terceiro capítulo assume-se assim como um third person shooter tecnicamente competente, mas com uma profunda falta de algo novo, aplicando bem as mecânicas dos jogos anteriores da série e assimilando os novos paradigmas do género mas sem criar, verdadeiramente, nada de novo. O mais preocupante, ainda assim, é que, com todos os elementos com que conta, não podemos considerar que o todo seja maior que a soma das suas partes. PeDRo leitão
20 | a cabra | 12 de junho de 2012 | terça-feira
sOlTas
daniel alves da silva
uma ideia Para O eNsiNO suPeriOr CarlOs asCeNsO aNdré • direTOr da FaCuldade de leTras da uNiVersidade de COimbra
TOmai e COmei
Fazer do custo investimento
surPresas VeGeTariaNas
Procura-se refeição saudável. Numa época em que as cantinas são transformadas em salas de estudo e os universitários cedem à tentação de (sobre)viver à custa de sanduíches dos bares ou da fast food proveniente de restaurantes da Praça da República, dirijo-me às Amarelas e encaro o menu do dia. Ultimamente a minha alimentação não tem sido a mais adequada; sendo assim, opto pelo rolo vegetariano com arroz branco e, como bónus, satisfaço a minha curiosidade quanto à qualidade do sabor dos pratos vegetarianos, algo que sempre me intrigou. Deparo-me com uma fila inexistente e esqueço-me de pagar os dois euros e quarenta cêntimos. Corrigido o erro, regresso à mesa, pronto a deliciar-me. O arroz está no ponto, não se agarra ao prato nem está demasiado seco. O rolo aparenta ser bem recheado; só o confirmo quando o atravesso com a faca e o seu interior começa finalmente a ser revelado: há cenoura, milho e ervilhas, entre outros produtos que formam um recheio compacto com um sabor bastante agradável. A massa folhada que o envolve transporta-me às pastelarias da minha infância, como se aquele fosse o sabor de um pastel que a minha boca sentia pela primeira vez. Talvez a culpa fosse do perfume da canela que adorna o arroz doce e se misturava com o odor da massa. Delicio-me com a última porção do rolo vegetariano, já depois de ter finalizado o arroz e a salada (o mesmo que dizer: um pouco de alface e cenoura). Sigo com o caldo verde. Não está aguado, o que me agrada, mas falta uma rodela de chouriço para satisfazer em pleno a minha sensibilidade gourmet. Chega o momento da sobremesa. Do arroz doce, enfim, que continua com o mesmo sabor de sempre. Nunca o consigo terminar.
Por Daniel Alves da Silva
O repto que me é lançado – e que o título transcreve – é de resposta difícil e, paradoxalmente, de resposta fácil. Fácil, porque são muitas as ideias para um melhor ensino superior; difícil, porque escolher uma é tarefa de monta. Decidi fazer uma concessão a quem tem do sistema uma visão economicista e tomar por lema um velho cliché: os custos do ensino superior não são despesa, são investimento. Dirão que já estou a defender e a justificar o despesismo. Nada de mais errado. Quando falo de investimento, falo na aceção em que usam o conceito os economistas, os empresários, os “investidores”. O mesmo é dizer que falo de investimento estratégico, planificado e aplicado com rigor, orientado por finalidades e objetivos. Falo, afinal, de racionalizar. E racionalizar será outra das ideias que faz muita falta ao ensino superior. Racionalizar, por exemplo, a oferta. Acaba de ser divulgado um estudo que diz que em Portugal há 12 instituições de ensino superior por milhão de habitantes, número fantástico, comparado com os 2 ou 2,2 de boa parte dos países nossos parceiros. Racionalizar é pôr fim a essa proliferação “irracional”, alcançada à custa de pequenos favores em “capelas” partidárias. Racionalizar é impor às instituições a obrigação de organizarem malhas curriculares “racionais” e sustentáveis. Racionalizar é pôr cobro ao excesso de competitividade e concorrência desenfreada entre instituições pagas, todas elas, pelo erário
público. Fazer do custo investimento é apostar na formação, mas com rejeição do desperdício. É apostar na investigação científica, mas com metas e objetivos. Fazer do custo investimento é pôr um travão neste percurso suicida que o Ensino Superior está a trilhar e que consiste no envelhecimento da classe docente, impossibilitada, por força dos garrotes orçamentais, de se rejuvenescer. Dentro de poucos anos, mais de metade do corpo docente da Universidade de Coimbra, por exemplo, será constituída por pessoas com mais de 55 anos, quando não de 60. E os exemplos de novos docentes, na casa dos 30, será uma miragem. Quando dermos por isso, será tarde demais. E será precisa uma geração inteira para recuperar o tempo perdido. Fazer do custo investimento é gerir bem e exigir boa gestão, é verdade. Mas é, também, dar condições para gerir. Fazer do custo investimento é saber identificar áreas estratégicas e apostar nelas como qualquer empresário faria na sua empresa. Fazer do custo investimento é, afinal, saber identificar o que é, neste processo, o retorno. Porque não pode haver investimento se não houver previsão de retorno. E, iden-
tificado o retorno, assumir esse rumo. Sem vacilações. Se me perguntarem a quem cabe gerir esta(s) ideia(s), respondo: a todos os participantes do sistema, na proporção das respetivas responsabilidades. Aos governos e demais políticos, antes de mais, que parecem não ter, ainda, percebido esta realidade. Aos reitores e suas equipas, aos diretores e a quantos e quantas gerem o sistema, que devem dirigir em obediência a tais critérios. Aos professores e às professoras, que não podem assumir-se como destinatários do investimento, mas têm de considerar que são, também, parte dele e da sua execução; tal como não podem posicionar-se do lado reivindicativo, como se uma quota parte dos resultados lhes não coubesse. Aos e às estudantes, que têm de deixar de considerarse, apenas, a matéria prima, mas têm, antes, de assumir-se, corresponsavelmente, como parte de uma máquina onde cada componente é fundamental. É, apenas, uma ideia. Ou um somatório de pequenas ideias. Mas não foi isso mesmo que me foi pedido?
d.r.
“O NOssO ParaísO” • TaGV • 04 de juNhO
arTe.PONTO
o inatingível paraíso vermelho
D
e título original Notre Paradis, a mais recente obra do francês Gaël Morel narra a história de um casal de prostitutos, de idades consideravelmente distanciadas, juntos pelo acaso, quando Vassili encontra Angelo ferido nos bosques parisienses. O primeiro atravessa uma crise de meia-idade, pelo que se recusa a afirmar não ter mais de 30 anos e o segundo é um jovem que prefere manter a sua identidade desconhecida. Juntos embarcam numa história de sexo, paixão e crime. Os instintos assassinos de Vassili são inicialmente escondidos do amante, mas, a partir do momento que este toma conhecimento dos crimes em que se vê indiretamente envolvido, ambos passam a cooperar juntos. O plano é roubar e seguidamente matar os seus clientes, mas, a certa altura, algo corre mal e os dois são obrigados a abandonar Paris. Morel constrói um arranque poderoso e promissor. Há sentido estético e planos curiosos, o que
d.r.
funciona bem em termos visuais. O problema é que, a partir de certo momento, não passa muito disso. Tudo se desenrola a uma velocidade excessivamente acelerada. É difícil sentir a química e a intimidade que se pretende construir entre as duas personagens principais e sentimos necessidade em ver muita coisa explicada, inclusivamente, por que é que Angelo optou por seguir o mesmo destino do parceiro, quando nada aparentava que assim pudesse acontecer. O enredo é conduzido estranhamente e, como tal, cai na fatalidade de desmoronar cedo, talvez porque atinge uma altura em que tudo funciona de forma totalmente contrária àquilo que inicialmente prometia. Sabemos que nem sempre isso é necessariamente mau, o certo é que aqui funciona de forma errada. Há cenas inconvenientes de violência gratuita, que expõem mais do que é necessário e assistimos a momentos algo manipuladores, pretensiosos e até estereotipados, o que não fun-
ciona a seu favor, quando um dos pilares de “O Nosso Paraíso” se trata, precisamente, da homossexualidade. Porém, nem tudo aquilo em que Morel toca é incómodo. O realizador mostra-nos que há uma linha extremamente ténue, da qual nem sempre nos apercebemos, entre a inocência e o podre da sociedade, entre o desejo de uma criança de dez anos, cujo único objetivo primário é conseguir o animal de estimação que a mãe não permite ter e aqueles com quem convive, dispostos a fazer o indispensável para alcançar o seu paraíso. O “Nosso Paraíso” faz-se, sobretudo, de imagens com o intuito de chocar quem as vê. É obsessivo, caótico e mexe connosco, mas, infelizmente, nem sempre não o faz pelas melhores razões. Destacam-se as interpretações consistentes, sendo que Vassili de Stéphane Rideau está fenomenal e fica um potencial manifestamente desaproveitado com muito por explorar. Por Tiago Mota
12 de junho de 2012 | terça-feira | a
cabra | 21
sOlTas CarTãO de embarque
miCrO-CONTO
Por jacinto lucas Pires
A
cordo e estou num avião. A hospedeira perguntame se quero comer. Tem a boca vermelha e parece uma Kate Winslet desfocada, o que me faz pensar na minha mulher ou "ex-mulher". Título mais estranho para uma mulher tão séria e tão feliz. No sonho vou a caminho de Bruxelas para perguntar à presidente da União porque é que a Europa está a cair. "Deseja mais alguma coisa?" À quarta tentativa, consigo abrir a embalagem transparente, trinco o bolo. Um sabor a pomares de plástico sob longos céus parados. Acordo e estou num avião. A hospedeira per-
gunta-me se quero comer. Tem os dentes manchados de batom e isso traz-me à memória a minha namorada ou "amante". Se o termo não é muito antiquado, que a rapariga é assustadoramente jovem. Um grande plano fulminante, um flash na noite do quarto de hotel. A verdade é que, depois do divórcio, a nudez desta mulher quinze anos mais nova que eu perdeu todo o perigo. "Obrigado, muito obrigado." No sonho Lisboa é uma cidade arrasada por bombardeam e n t o s
aéreos e eu estou parado no que costumava ser uma rua ou uma praça a tentar perceber para que lado é o rio. Dentro do plástico transparente, o bolo castanho é um tumor. Quantas vidas estarão implicadas no facto disto estar aqui, à minha frente, em cima de um tabuleiro da cor do céu? Acordo e estou num avião. A hospedeira pergunta-me se quero comer. Quero comêla, agarrá-la pelo
rabo, morder-lhe o vermelho da boca, chupar-lhe a língua estrangeira até ela não ser mais do que um corpo, mas limito-me a fazer que sim com a cabeça. Pela janela, vejo os campos europeus, as casas, estradas, os rios, tudo diminuindo magnificamente. O raio de sol atravessa o avião como uma viga de ouro. Fecho os olhos. Não tenho ninguém a quem telefonar, ninguém no mundo inteiro, mas a Europa está salva e é uma União a caminho da felicidade. "Será que posso pedir um café?"
ilustração por ana beatriz rodrigues
mONumeNTais PaNadOs sOCiais
Jacinto Lucas Pires, 37 anos apesar de licenciado em Direito, a coisa das leis não era para ele. Voltou-se para a escrita, lançando em 1998 “azul-turquesa”, dois anos depois “abre para cá”, editando sempre pela cotovia. atirou-se para o teatro, enfiou-se na música e ainda experimentou o cinema. Gosta do conflito entre todas as linguagens, numa miscelânea que nem salada russa. Brinca mas também gosta de agitar. não pensa em carreira, apesar de já sentir o peso de ser pai. como o próprio processo de escrita – tanto é senhor de gabinete certinho, como um cego a divagar por imagens que sonha. Gosta do ridículo do real, que anda por aí ao nosso lado, no supermercado ou num café qualquer, ou até dos políticos de pronto-a-vestir que fazem questão de marcar presença na assembleia da república. observa com minúcia o que o rodeia, desde a senhora que pede o seu chá de tília à política nacional. Desagrada-lhe esta coisa de cada um no seu cantinho, com a sua vida espelhada num ecrã. Despretensioso, Jacinto Lucas Pires procura no real o seu absurdo..
João Gaspar
há FalTa de assuNTO.
Por doutorando Paulo Fernando • facebook.com/paulofernandophd
À
falta de assunto, podia dissertar sobre futebol, numa extensa análise do mercado de transferências da liga uzbeque, ou sobre basquetebol, discutindo os méritos das equipas que passaram às finais da NBA. Só que além de achar que isso não teria grande piada, também me parece que há quem o faça indubitavelmente melhor do que eu. À falta de assunto risível, trago assunto sério. Trago um tema rebatido aqui nos Panados Sociais – essa figura grotesca em que se renovou José Hermano Saraiva. Esta é talvez a maior traição da geração de 69 aos ideais de 69. Esta geração tem um carácter muito inspirado na numerologia, como o famoso número tanto vira para um lado como para o outro. O Professor enverga agora as insígnias (a Grã-Cruz) da Ordem do Infante D. Henrique que distingue indivíduos que tenham prestado serviços rele-
vantes a Portugal, no País ou no estrangeiro ou serviços na expansão da cultura portuguesa, da sua História e dos seus valores. Poderíamos começar por discutir o verdadeiro serviço de expansão da estória portuguesa que o Professor proporcionou, mas eu apenas sou versado nas letras da academia, não possuo credenciais para discutir a literatura de ficção. No entanto, há um dado que merece a nossa atenção. O Professor faz parte agora da mesma ordem que Cristiano Ronaldo, Murteira Nabo, Hosni Mubarak, Bill Gates ou…. A Associação Académica de Coimbra. Ora digam lá se a história não tem coisas levadas da breca! Faz-me lembrar os polacos que foram a Lvov torcer pela Alemanha! Devo acrescentar que não tenho por hábito acreditar em coincidências. Por estas bandas ninguém diz/faz nada. Vamos ali beber
d.r.
um caneco ao “estádio” dos jardins enquanto vemos o resumo do Euro comentado pelo Luís Freitas Lobo e pelo Pedro Henriques. Proponho que façamos a nossa própria homenagem ao Professor. A derradeira homenagem seria encimar a torre Cabra com o busto da velha gárgula, por onde o palavrório
poderia verter em torrentes emulgentes, reescrevendo a memória de todos os que ainda a retêm, e arrastando a aleivosia até às águas purificadoras do Mondego. Quando o Presidente da nossa arqueada República quiser condecorar aqui o doutorando, digo-lhe que troco a faixa por uma cerveja, como
cantavam os renegados de boliqueime, que sempre tem propriedades diuréticas para me aliviar de tanta cagança. Agora alguém que ponha aqui uma fotografia bonita para compor isto que eu já estou demasiado exaltado para continuar a escrever sem ser insultuoso para com as figuras de estado, o que, segundo me disse o quatro-olhos que está furiosamente a sublinhar um Código Penal, constitui um crime de acordo com o artigo 328. PS: Caro ex-dirigente associativo, está a começar a época dos festivais de Verão, levanta o teu passe geral junto do ex-SG da Queima mais próximo.
22 | a cabra | 12 de junho de 2012 | terça-feira
AtuAlidAde Breves Quebeque
Com apenas 21 anos, Gabriel Nadeau-Dubois, é o líder da Coalition Large de l'Association pour une Solidarité Syndicale Étudiante (CLASSE), considerada a mais radical das associações de estudantes. Os cerca de 70 por cento de estudantes, representados pela CLASSE, encontram-se em greve há mais de 100 dias. Este protesto prende-se com o aumento de 325 dólares canadianos no valor das propinas, o que equivale a 253 euros. Este valor seria pago, extraordinariamente, por ano, até 2016, em que a propinar anual chegaria ao valor de 3800 dólares canadianos. Ainda assim, Gabriel Nadeau-Dubois, afirma que esta não é só uma luta contra as propinas, mas sim uma “semente de revolta” contra a austeridade e as ideias neoliberais.
Chile Uma manifestação de homenagem ao ditador Augusto Pinochet em Santiago, na passada semana foi alvo de intervenção das forças policiais chilenas. “Obrigado, obrigado Pinochet, com as mãos e com os pés”, gritavam os
apoiantes do falecido ditador, pertencentes aos grupos Corporação 11 de setembro e da União de Oficiais Aposentados da Defesa Nacional, conhecidos por negarem a violação dos direitos humanos cometidos durante o regime. Por sua vez, centenas de manifestantes contra Pinochet reuniram-se numa praça próxima para chamar Augusto de "ditador, traidor, assassino e ladrão". O confronto foi inevitável e a polícia foi obrigada a intervir, o que originou mais de 20 feridos e 64 detenções.
Síria Depois de as Nações Uni-
Venezuela O embaixador de Portugal em Caracas, Mário Lino da Silva, estimulou os jovens luso-venezuelanos a se certificarem e a projetarem a imagem da comunidade de Portugal na Venezuela. Num discurso apelativo, proferido no encontro organizado pela Associação de Luso-descendentes da Venezuela, a fim de assinalar o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, o embaixador contestou: "esta gente [jovens], não sei se por pudor, se por vergonha ou modéstia excessiva, não consegue projetar devidamente a sua valia no seio da sociedade venezuelana e é preciso que isso se faça".
das terem alertado para o facto de a crise síria estar a um passo da guerra civil, os dirigentes do Conselho Nacional Sírio (CNS), principal coligação da oposição a Bashar al-Assad, reuniram-se para escolher um novo líder. O nome escolhido foi o do curdo Abdel Baset Saida, que apesar da inexperiência política é apelidado como um forte ativista independente. Depois da demissão do anterior líder da oposição - Burhan Ghalioun, o CNS acredita que o regime de Assad está a dar o “último fôlego”
Secretas O ex-diretor do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED), Jorge Silva Carvalho, arguido no polémico caso das secretas, para além de estar envolvido na espionagem relativa à vida privada de figuras públicas (políticos, jornalistas, empresários), sabe-se agora que guardou também a palavra-passe de acesso de um email privado, de um outro agente do SIED. Para além disso, apurou-se também, que Silva Carvalho depois de ser nomeado diretor do SIED passou a receber a lista de chamadas dos restantes agentes no seu próprio gabinete. Ana Morais
D.R.
A Cabra errou Na edição 246, no artigo “Fundo de Apoio Social da UC é reforçado em dez por cento”, pág.4, a fonte Bárbara Antunes é, erroneamente, várias vezes designada como Beatriz Antunes. Na página seguinte, no artigo intitulado “À semelhança de 1969, estudantes foram ao Jamor reivindicar”, o movimento Frente de Acção Estudantil (FAE) também aparece erroneamente designado como “Frente de AACção Estudantil”. Na mesma edição, a biografia do escritor do MicroConto foi atribuída a Ana Morais, quando na verdade é da autoria de João Gaspar. Pelos lapsos deixamos, aos visados, o nosso pedido de desculpa. Cartas ao diretor podem ser enviadas para
acabra@gmail.com
PUBLICIDADE
12 de junho de 2012 | terça-feira | a
cabra | 23
OpiniãO EditoriAl A mEmóriA D.R.
E
squecimento. Consiste na perda de memória, individual ou coletiva. Consequência da passagem do tempo, é por esquecimento, descuido ou simplesmente desprezo, que um ministro de um regime ditatorial recebe, este ano, uma condecoração da mais alta figura do Estado português. É por esquecimento, descuido ou simplesmente desprezo, que não é proferida (ou se é, não é audível) uma reação de condenação de quem quer que seja. Tão pouco de quem devia trazer a memória para o tempo presente: as académicas. Quando em 2009, por ocasião dos quarenta anos passados da Crise Académica de 1969, o Jornal Universitário de Coimbra – A CABRA realizou um inquérito sobre o conhecimento que os estudantes tinham sobre este acontecimento histórico, menos de 40 por cento sabiam que José Hermano Saraiva tinha tutelado a pasta da educação durante a crise. Volvidos três anos, não seria expectável que os resultados sofressem evoluções positivas, caso uma pergunta semelhante fosse colocada à comunidade estudantil da Universidade de Coimbra. É um dado que torna mais fácil a tarefa de explicar o porquê de a condecoração não suscitar reações. Mais uma vez, esquecimento. Memória. Entre muitas definições, é tomada de consciência do passado como tal. A prestação de serviços relevantes a Portugal, ou a prestação de serviços de expansão da cultura, história e valores portugueses, é distinguida com a Grã Cruz da Ordem do Infante D. Henrique. Este ano, o Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, condecora o ex-ministro da educação durante o período do Estado Novo, José Hermano Saraiva, com esta distinção.
“
É por esquecimento, descuido ou simplesmente desprezo, que um ministro de um regime ditatorial receba, este ano, uma condecoração da mais alta figura do Estado português”. A ironia do contraste histórico subsiste na mais elementar observação: o homem que não hesita em elogiar Salazar foi agraciado com a mesma ordem que a Associação Académica de Coimbra. A história tem por hábito ser maniqueísta no julgamento dos seus intervenientes. José Hermano Saraiva será lembrado como historiador, como aquele senhor dos programas de televisão e não como o ministro de um governo fascista. Porque nós deixámos. O facto de o Presidente da República (PR) e os membros do governo estarem constantemente a dividir o protagonismo em matéria de declarações públicas desadequas e gaffes, desvia a atenção destes “pequenos” pormenores como são a desvalorização da luta pela democracia. Pois é disso que se trata. Da falta de respeito e consideração para quem lutou contra um regime opressivo. Mas o PR é assim, sempre o foi. Torna-se redundante e exaustivo enumerar o conjunto de episódios com laivos fascizantes protagonizados por Cavaco. Em última análise, o castigo que recai sobre o eleitorado por escolher desacertadamente consiste nas erróneas tomadas de decisão do eleito.
Camilo Soldado
Secção de Jornalismo, Associação Académica de Coimbra, Rua Padre António Vieira, 3000 - Coimbra Tel. 239821554 Fax. 239821554 e-mail: acabra@gmail.com
Diretor Camilo Soldado Editores-Executivos Inês Amado da Silva, João Gaspar Editoras-Executivas Multimédia Ana Francisco, Catarina Gomes Editores Carlota Rebelo (Fotografia), Inês Balreira (Ensino Superior), Ana Duarte (Cultura), Fernando Sá Pessoa (Desporto), Ana Morais (Cidade), Filipe Furtado (Ciência & Tecnologia), Liliana Cunha (País), Maria Garrido (Mundo) Paginação Carlota Rebelo, Inês Amado da Silva Redação Andreia Gonçalves, Daniel Alves da Silva, João Valadão, Paulo Sérgio Santos Fotografia Ana Duarte, Ana Morais, Carlota Rebelo, Daniel Alves da Silva, Inês Amado da Silva, Fernando Sá Pessoa, Filipe Furtado Ilustração Ana Beatriz Marques, Tiago Dinis Colaborou nesta edição Catarine Martins, Daniel Silva, Douglas Rabelo, Ian Ezerin, Tiago Mota Colaboradores Permanentes Carlos Braz, João Miranda, João Ribeiro, João Terêncio, João Valadão, José Afonso Biscaia, José Miguel Pereira, José Santiago, Lígia Anjos, Luís Luzio, Nicole Inácio, Pedro Nunes, Pedro Leitão, Rui Craveirinha Publicidade Inês Amado da Silva 239410437 Impressão FIG – Indústrias Gráficas, S.A.; Telefone. 239 499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: fig@fig.pt Tiragem 4000 exemplares Produção Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra Propriedade Associação Académica de Coimbra Agradecimentos Reitoria da Universidade de Coimbra, Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra, Carlos André, Jacinto Lucas Pires
Mais informação disponível em
Redação: Secção de Jornalismo Associação Académica de Coimbra Rua Padre António Vieira 3000 Coimbra Telf: 239 41 04 37
acabra.net
e-mail: acabra@gmail.com Conceção e Produção: Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra
Jornal Universitário de Coimbra PUblIcIDaDe
PUblIcIDaDe PUblIcIDaDe
Associação Politécnica
A Associação Politécnica firmou um protocolo no sentido de cimentar sinergias entre os oito politécnicos que a constituem. Poder partilhar materiais e gerar um intercâmbio de docentes parece uma boa forma de tentar contornar a falta de financiamento que a rede de ensino superior sofre. Encontra-se, assim, uma forma de cobrir certas deficiências que possam existir com a falta de professores na área ou até a transposição de outras formas de ver um mesmo assunto. Os alunos também sairão beneficiados com esta partilha. A mobilidade de saberes e de outros recursos é fundamental para criar uma rede de interajuda entre instituições. L.C.
Secção de Andebol da AAC
A Secção de Andebol da Associação Académica de Coimbra acaba a época com um misto de sensações. À medida que encurtam os prazos para pagar as dívidas, que ascendem aos 10 mil, cresce a possibilidade de não haver viabilidade para inscrever as equipas nas competições. Dez equipas, no total. Um duro revés para esta direção, que tem na participação em todos os escalões competitivos a grande conquista do ano. Apesar disso, este é um feito que não pode ser rebatido, tendo havido, neste ano, 157 atletas federados inscritos pela Académica. A equipa sénior, recorde-se, manteve-se na terceira divisão. F.S.P.
Ministério da Solidariedade e Segurança Social
Vale a pena atentar nos testemunhos recolhidos nos três distritos centrais deste país. Por detrás da taxa de desemprego galopante, o ministério da Solidariedade Segurança Social mostrou uma abertura à qual, no entanto, não dá resposta. Embora a medida Estímulo 2012 possa ser uma resolução para a faixa etária que se estende até aos 30 anos, sobra a metade daqueles que ainda não têm idade para ter reforma. Serão estas medidas concretizáveis? Falta a ajuda para abrir o tal negócio, para desbloquear a burocracia e mudar a raiz do sistema que ignora os velhos. L.C.
Cuba, um retrato apaixonado por Maria Garrido
200 x 100
carlota rebelo
Havana é quente ao final da tarde. Nem o sol que se põe espalhando sombras pela cidade em ruinas oferece uma brisa. Uma única brisa.“Bienvenido a Cuba”. No aeroporto pesa o cheiro abafado do calor, uma mistura de terra e suor. Nas ruas bailam-se ritmos e cores. As meninas comemoram o seu décimo-sexto ou décimo-oitavo aniversário. Quais debutantes, invejáveis nos seus vestidos até aos pés, os cabelos desenhados, os rostos iluminados. Mercados. Artesanato, pintura. E de novo o movimento. De novo as vozes, a confusão. A beleza da arte. A oferta material do mais singular de uma cultura. Velhos correm atrás de turistas com uma caricatura feita nos três segundos em que os conseguiram perfilar. O cheiro a rum das caves. A agitação dos autocarros, furiosos pela cidade, entulhando gente. A Praça da Revolução... E são mais uma vez cores e danças.