Carlos Camponez “Repensar a ideia de Autonomia” PÁG. 16
18 de junho 2013 • ANO XXII • N.º 262 • QUINZENAL GRATUITO DIRETORa ana duarte • EDITORa-EXECUTIVa ana morais
acabra jornal universitário de coimbra
Academias manifestam-se em setembro se Governo não ceder A decisão foi unânime. As associações de estudantes presentes no último Encontro Nacional de Direções Associativas (ENDA) do ano letivo, em Vila Real, dizem que se “esgotou a paciência”. Por isso, prometem levar a cabo uma manifestação nacional já em setembro, se a tutela não ouvir as reivindicações dos estudantes do ensino superior. PÁG. 5
A Secção Experimental de Yoga da AAC celebra 30 anos PÁG. 6
I Mostra Gastronómica Para dinamizar o Mercado D. Pedro V, a Associação de Mercados promoveu uma mostra de sabores PÁG. 8
candidatura UNESCO
“Museus no Centro”
Direcção Regional de Cultura do Centro cria rede de intercâmbio em sete museus, entre a Guarda e as Caldas da Rainha. Projeto pretende dinamizar as instituições e atrair públicos mais variados. PÁG. 10 e 11
Manifestação
Alta e Sofia a caminho Protestos dos do património professores na capital Entre os dias 17 e 26 de junho, o Comité do Património Mundial da UNESCO vai reunir no Camboja para decidir sobre a classificação da Universidade de Coimbra, da Alta e da Rua da Sofia como Património da Humanidade. As expectativas já são muitas e sempre positivas, naquela que é uma das consagrações mais reconhecidas internacionalmente. Desde o início que a cidade se juntou em torno desta candidatura, por meio de parcerias entre várias entidades. PÁG. 2 e 3
No sábado, milhares de professores marcharam em Lisboa pela defesa da Escola Pública e pelo direito ao trabalho. Questões como a mobilidade especial, aumento do horário laboral na função pública e anúncios de despedimentos são algumas da contestações desta classe. Os vários casos de greve ao exame de ontem, 17, representam este descontentamento.
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Mais informações em
acabra.net
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CANDIDATURA DE COIMBRA A PATRIMÓNIO MUNDIAL DA UNESCO
A ideia de uma história à espera da consagração
A dias de se conhecer a decisão do Comité do Património Mundial da UNESCO, Coimbra já se prepara para ser classificada como património da Humanidade. Entre atividades de promoção e divulgação, já tudo foi feito para mostrar a cidade ao mundo. Por Ana Duarte e João Martins camilo soldado
d.r.
Para Fernanda Cravidão, deverá haver um “interface” entre a Alta e a Baixa no que toca a requalificações
A
reunião do Comité do Património Mundial no Camboja, a decorrer desde o dia 17 até ao dia 26, vai ditar a decisão da candidatura da Universidade de Coimbra (UC), Alta e Rua da Sofia a Património Mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura - UNESCO. As expectativas são altas para aquela que é a consagração de edifícios e espaços como toda a Alta universitária, os antigos colégios
da Rua da Sofia, a Associação Académica de Coimbra, o Jardim Botânico, o Mosteiro de Santa Cruz, entre outros. Depois da oficialização da candidatura pelo Estado português, em janeiro de 2012, já foram realizadas inúmeras iniciativas de promoção e divulgação da candidatura, que contou com a parceria e apoio de várias entidades da cidade. A Agência de Promoção da Baixa de Coimbra (APBC) foi uma das estruturas que contri-
buiu em termos de promoção e divulgação nesta ação. “Colaborámos com algumas iniciativas e esperamos continuar, é essa nossa vontade, e o que nos parece é que esta candidatura é muito importante para a Baixa de Coimbra, a par da Alta. É uma mais-valia, sem dúvida”, explica o presidente da APBC, Armindo Gaspar. Também já aconteceram as visitas das entidades oficiais de avaliação, como o Conselho In-
ternacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS). Dessa visita, realizada entre os dias 17 e 23 de setembro do ano passado, saiu uma avaliação já muito positiva sobre o “Bem” (património candidato). O curador da candidatura e ex-pró reitor da UC, Raimundo Mendes da Silva, explica que, no parecer que a ICOMOS deixou depois da visita, se ressaltam “três coisas muito importantes: reconhecimento pelo valor excecional universal; a candidatura e
o “Bem” têm todas as condições intrísecas para ser património mundial; e reconhecimento de todas as medidas de proteção que foram propostas no dossier de candidatura, isto é, todas as condições oficiais para que a classificação como património mundial da Humanidade seja positiva”. Para além da área candidata, existe um perímetro alargado a toda a zona envolvente – a zona de proteção – que abrange, principalmente, a parte histórica de
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Coimbra. Aí, a candidatura tem de cumprir determinados parâmetros, nomeadamente no que toca às medidas de proteção e o Plano Diretor Municipal (PDM), que tem de sofrer alterações. A maioria deste trabalho já está feito, no entanto, Raimundo Mendes da Silva reconhece que há medidas de proteção que não se implementam de um dia para o outro. Contudo, neste momento, a UNESCO e a ICOMOS já concordaram com aquelas que foram apresentadas. “O PDM está a ser revisto, vai ser criada uma comissão de peritos para avaliar as questões do impacto visual e isso demora tempo a fazer. A UNESCO pode, por uma questão de precaução, dizer para se esperar mais um ano”, esclarece o curador.
Requalificação e financimento
Vários edificíos que estão patentes na candidatura encontram-se, neste momento, em estados um tanto degradados. A docente de Património Cultural e Turismo da Faculdade de Letras da UC (FLUC), Fernanda Cravidão, aponta a área da Rua da Sofia como uma das principais a recuperar. Para além disso, afirma que a recuperação do património não pode ser apenas nestes lugares [zona candidata], “tem de ser todo o conjunto”. Dá o exemplo da recuperação da Alta como forma de interface com a Baixa – unir esforços para a requalificação dos dois sítios, mesmo que um deles não esteja na candidatura. Esta “tem de ser uma política não de caráter tão municipal mas uma política geral do país, para a recuperação dos centros históricos”, acrescenta ainda. O investigador do Centro de Estudos Sociais (CES) e docente da Faculdade de Economia da UC, Carlos Fortuna, corrobora a opinião de Fernanda Cravidão, acrescentando que a zona “do Mondego é um dos recursos mais escandalosamente desaproveitados da cidade”. Atrair fundos estruturais e investidores é fulcral na parte da requalificação do património. O impacto que esta candidatura pretende ter, em primeiro lugar, “é uma atenção sobre o ‘Bem’”, diz Mendes da Silva. O curador espera que, consequentemente, isso atraia fundos “quer oficiais, quer nacionais”, bem como “receitas próprias ou de investidores privados”. “A candidatura foi muito importante para definir este plano e é muito importante para dar entusiasmo aos investidores e às entidades públicas”, remata.
Impactos na cidade
“O reconhecimento de Coimbra como património UNESCO poderá servir de estímulo para a restauração, a hotelaria ou o comércio e o artesanato, por um lado, mas também para museus, espaços verdes, equipamentos
Mapa da área candidata juntamente com o área de proteção (área envolvente) culturais e desportivos indica Carlos Fortuna. Estes poderão ser os principais impactos que a cidade pode vir a sofrer. Para além disso, a chegada de mais e mais turistas, bem como novos estudantes estrangeiros pode também vir a acontecer. “Mais atividade económica” e “mais prestígio” são, segundo Raimundo Mendes da Silva, algumas consequêncais que podem advir daí. A uma primeira vista, Coimbra apresenta-se como uma ci-
“Para além da área candidata, existe um perímetro alargado a toda a zona envolvente” dade relativamente pequena, e pode julgar-se que não tem as condições necessárias à receção de muitos turistas. No entanto, Fernanda Cravidão afirma que “[a cidade] já tem uma oferta de equipamentos e infraestruturas hoteleiras que permitem acolher um número considerável de turistas” e que deve considera-se toda a zona envolvente da cidade – como, por exemplo, a Figueira
da Foz ou Montemor-o-Velho -, e não apenas o seu núcleo. Para contrariar o mito das “cidades pequenas”, Carlos Fortuna considera que “são aquelas em que é maior o impacto de uma ação deste género”. “São essas as cidades que se ‘engrandecem’ de forma mais sensível com a valorização internacional dos seus patrimónios”, adita. Por ser pequena, Raimundo Mendes da Silva vê Coimbra como uma cidade repleta de elementos que a possam congregar e que sejam motivadores, especialmente na altura da decisão a ser tomada no Camboja. E isso é um fator importante para unir a cidade em torno de uma causa. “Não se trata de uma candidatura que vai classificar a universidade. É uma candidatura congregadora. Esta mais-valia de ser um projeto congregador pode ter efeitos benéficos em todas as áreas da cidade e na própria qualidade de vida das pessoas”, acrescenta o curador.
Alterações na vida urbana
Não são só os edifícios que podem vir a solfrer alterações. Também a vida quotidiana da cidade vai ser moldada à imagem de
uma cidade considerada património mundial da Humanidade - benefício que, antes de tudo, é, nas palavras do professor da FEUC, “de natureza simbólica e representacional dos lugares”. A classificação, segundo a professora da FLUC, pode vir a melhorar a qualidade de vida das populações. Para além disso, as requalificações que vão ser feitas “levam progressivamente a novos comércios, por um lado,e à recuperação de algum comércio tradicional, com uma outra
“O presidente da CMC vê esta candidatura como um “selo mundial de qualidade” roupagem, por outro”, explana Fernanda Cravidão. Ademais, as modificações estruturais podem ainda trazer mais população, “que dá mais vida à cidade”. “Isso pode melhorar a auto-estima [de Coimbra] e em termos ambientais, estéticos e económicos, naturalmente que é uma questão sempre positiva”, adianda ainda a docente de Património Cultural e Turismo.
O investigador do CES vê este reconhecimento como um “’texto’ sobre a história, a memória e a cultura desta cidade”. “Texto” que “deve ser lido como “pretexto” para um ativo envolvimento da cidade – quer dizer, de todos nós – consigo mesma”, reitera Carlos Fortuna. Desta forma, os desafios à criatividade das entidades que se envolvem nesta candidatura são postos à prova, para tentarem captar mais atenção, tanto a nível nacional como internacional. No entanto, Carlos Fortuna alerta: “[a consagração] não será uma solução redentora para as dificuldades que Coimbra revela. Não o é em nenhuma das cidades património. Essa solução não existe. Constrói-se. Criativa e democraticamente”. Até ao fecho da edição, o Jornal A CABRA não conseguiu contactar o presidente da Câmara Municipal de Coimbra, João Paulo Barbosa de Melo. No entanto, em declarações dadas à UCV, em janeiro de 2012, o presidente vê esta candidatura como um “selo mundial de qualidade”. “Não são só os edifícios e ruas [a candidatarem-se]. É, sobretudo, uma ideia de Portugal que passou por Coimbra e daqui para o mundo”, acresenta, na mesma entrevista.
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ENSINO SUPERIOR
O que leva os alunos a cometer fraude? rafaela carvalho
Estudar os vários tipos de fraude no ensino superior é a premissa para um estudo inovador saído da UC. Apostar na prevenção torna-se mais importante que defender medidas punitivas Liliana Cunha Ana Morais Pagar por trabalhos. Colocar o nome de um colega num trabalho onde não participou. Levar cábulas para frequências e exames. Usar as novas tecnologias para passar à cadeira. São exemplos de práticas resultantes de um estudo em curso intitulado “A ética dos alunos e a tolerância de professores e instituições perante a fraude académica no ensino superior” promovido pelo Centro de Estudos Sociais (CES). Com uma amostra representativa de oito mil alunos portugueses, o estudo estende-se a Espanha e ao Brasil com números experimentais. Os dados recolhidos no país constituem uma amostra inédita. “Não há estudos com essa abrangência em Portugal, inquirimos mais alunos nas maiores universidades e nas áreas científicas em que há mais inscritos”, explica o investigador e professor da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC), Paulo Peixoto. Entre os três países, Portugal é o que aparenta ser o menos fraudulento. Para além dos inquéritos, realizaram-se painéis com os alunos de forma a ouvi-los e recolher informação qualitativa. Depois, entraram as respostas dos docentes e instituições. Inquiriram-se professores para apurar o que pensavam sobre as fraudes cometidas pelos alunos e foram analisados os regulamentos disciplinares ou códigos de ética para ver que medidas as instituições aplicam. “O primeiro nível para evitar a fraude académica é conhecer as diferentes práticas de fraude e como elas são percecionadas pelos alunos”, frisa o coordenador do projeto, Filipe Almeida. Com uma equipa de investigação multidisciplinar nascida na FEUC, e numa conversa entre colegas, o projeto ganhou forma em março de 2010 motivado pela falta de uma análise científica do tema. A apresentação dos resultados finais está já agendada para 23 e 24 de janeiro do próximo ano, num seminário de conclusão no sítio onde surgiu a ideia. As áreas que se cruzam, entre outras, são a da sociologia, economia e ciências da educação. A investigadora Ana Seixas juntou-se ao projeto, já que havia desenvolvido uma tese de doutoramento sobre o ensino superior, mais pro-
Investigar o que motiva os estudantes do Ensino Superior a cometer fraude académica foi o mote de um estudo promovido pelo CES rece Filipe Almeida.
Dados intermédios
Situações em que há mais predisposição para a fraude: - Alunos que já têm essas práticas nos ensinos secundário e básico - Estudantes-trabalhadores ou com um elevado número de atividades extracurriculares - Alunos repetentes ou com acumulados insucessos - Unidades curriculares com altos níveis de reprovação - Homens (comparativamente com as mulheres)
Situações em que há menos predisposição para a fraude: - Contextos em que há grande interação entre alunos e professores - Alunos com bom aproveitamento escolar
Tipos de fraude mais comuns: - Colocar nome de um colega num trabalho sem a sua participação - Comprar trabalhos - Apresentar o mesmo trabalho em várias unidades curriculares priamente no estudo das práticas pedagógicas e do insucesso escolar.
Extensão a outras realidades
A decisão de alargar o estudo a outros países partiu da vontade das instituições e da acessibilidade a colegas que lá lecionavam. “A dada altura, se quiséssemos continuar, podíamos aumentar a rede, mas isso prejudicaria o tempo de conclusão do estudo. Havia muita gente que estava interessada que este estudo fosse aplicado nas suas ins-
tituições”, explana Paulo Peixoto. Há práticas que os alunos não reconhecem como fraude. “Perguntámos também aos alunos quais os instrumentos mais adequados para evitar os níveis de fraude e, curiosamente, os alunos tendem a apontar medidas mais punitivas”, ressalva o investigador. Contudo, o objetivo do estudo é pensar a fraude a priori, numa perspetiva de prevenção antes da punição. “O lado didático do projeto é prioritário em relação à punição. Estamos mais centrados nas questões da prevenção”, escla-
Envolvimento da comunidade académica
“As formas de fraude que mais se praticam são as que, de alguma maneira, os alunos veem cometer pelos professores, faz parte de uma cultura de pares. As pessoas fazem aquilo que veem fazer”, confessa Paulo Peixoto. Recorde-se os dois casos de ministros alemães que perderam o diploma por plágio, um dos tipos de fraude académica. Ainda assim, esta pode ser uma tendência que vem de outros graus de ensino e que tende a perpetuar-se na vida profissional. “Muitos alunos dizem que cometem fraude no ensino superior porque já era uma prática que traziam do secundário”, explica o sociólogo. “As pessoas cometem fraude na vida e nas profissões porque foi assim que se safaram”, partilha Paulo Peixoto, usando o conhecido exemplo do “chico esperto”.
Punições previstas
A adaptação dos regulamentos internos das universidades portuguesas a medidas que punam a fraude e outros advêm do Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior, de 2007. “A UC tem um regulamento disciplinar dirigido
aos alunos que não é completo”, acusa Paulo Peixoto. O investigador acredita que os regulamentos deveriam abranger casos de fraude de professores e da própria instituição, alargando a prevenção a toda a comunidade. De alguns exemplos consultados nos regulamentos disciplinares da UC, Universidade do Porto, Universidade de Lisboa, Universidade de Aveiro, Universidade de Évora, entre outros, verifica-se uma uniformização das sanções previstas para o caso de fraude. Nestes casos não se encontra prevista a expulsão. Por sua vez, exemplos como a Universidade Católica Portuguesa ou a Universidade Lusíada preveem a expulsão do aluno que cometa infração disciplinares. As semelhanças de todos os exemplos enunciados encontram-se na inexistência do mesmo tipo de regras aplicadas a professores e a instituições. A aplicabilidade do estudo reside na possibilidade de mapear as respostas institucionais à fraude académica em Portugal. E, a par da prevenção, avaliar “até que ponto essas respostas estão alinhadas com os motivos e os inibidores que os alunos reconhecem como sendo os mais importantes na fraude”, remata o coordenador do estudo, Filipe Almeida.
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ENSINO SUPERIOR enda
Direções associativas avançam com manifestação se não forem ouvidas O movimento associativo nacional tomou uma decisão unânime em ENDA. Se a resposta nula da tutela persistir, há manifestação nacional marcada para setembro Liliana Cunha “O sistema de ensino está na situação em que está e o movimento associativo decidiu por unanimidade entrar em protesto”, anuncia o presidente da Direção-geral da Associação Académica de Coimbra (DG/ AAC), Ricardo Morgado. Reunido em Encontro Nacional de Direções Associativas (ENDA) no último fim-de-semana em Vila Real, o movimento associativo nacional decidiu passar à ação, já que se queixam de que as suas propostas e políticas não têm sido aplicadas. O protesto decidido avança em setembro a nível nacional, se as reivindicações não forem escutadas. Em comunicado conjunto publicado após o fim do encontro, as associações dizem não ter encontrado “eco num Secretário de Estado mudo, cego e insensível para com o movimento associativo e, mais gravemente, para com os estudantes e demasiadas vezes para com todo o setor que é suposto tutelar”. Os dirigentes de algumas das maiores associações do país partilham o mesmo sentimento: está “esgotada a paciência”. “Os estudantes apresentam
propostas mas que vêm a esbarrar numa falta de diálogo, de interlocutores que fazem com que o nosso trabalho tenha sido dificultado”, explica o presidente da Associação Académica da Universidade do Minho, Carlos Videira. Da parte da Federação Académica do Porto, Rúben Alves afirma que não houve “porta aberta para verdadeiramente ouvirem as nossas soluções na secretaria de estado do ensino superior e por outros membros do governo”. Rúben Alves lembra ainda que Passos Coe-
lho havia prometido ao movimento associativo uma reunião em período pré-eleitoral que “nunca se chegou a realizar”.
Evolução de um ano
Todos concordaram na deliberação de levar a cabo uma manifestação nacional, decisão um tanto inédita, já que as últimas ações decididas passaram por uma petição contra o regulamento de atribuição de bolsas no primeiro ENDA do ano letivo; uma declaração de princípios sobre o
desemprego no ENDA de dezembro e um comunicado para comemorar o Dia do Estudante em março, numa altura em que já se haviam discutido os cortes do Orçamento do Estado 2013. “É importante rever e redirecionar outro caminho no sentido das nossas propostas serem tidas em conta. Se isso não acontecer estas associações terão uma palavra a dizer nessa manifestação que poderá acontecer”, frisa o dirigente da Associação Académica da Universidade de Trás-osd.r.
O último ENDA do ano lectivo realizou-se na UTAD nos dias 14, 15 e 16 de Junho
-Montes e Alto Douro (AAUTAD), Sérgio Martinho. O “ponto a salientar” de Sérgio Martinho relaciona-se com o agrado de Ricardo Morgado por parte da AAC, já que “há muitos anos que não saía uma posição conjunta reivindicativa desta forma pelo movimento associativo”, ressalva.
Atualização da propina
Em Vila Real houve ainda tempo para a discussão sobre a atualização da propina nas diversas Instituições de Ensino Superior (IES). A Universidade do Minho (UM) tomará a decisão a 1 de julho, mas Coimbra, Évora, Algarve, Porto e Vila Real já decidiram o que fazer. A Universidade de Coimbra foi a única que atualizou o valor da propina. “Na UTAD foi conseguido isso de forma muito trabalhosa, mas com o comprometimento de conseguir juntar esforços na contenção de custos e alternativas de receita própria”, aclara Sérgio Martinho. “Tudo indica que a proposta do reitor da UM será o aumento para os 1066 euros”, lamenta Carlos Videira. No entanto, os alunos têm organizado um calendário reivindicativo que conta já com um abaixo-assinado. “Em Coimbra a propina subiu e isto acaba por debilitar as IES e a entrada de estudantes nas mesmas”, frisa o dirigente da AAUTAD. “É um ENDA que marca um outro ciclo que vai começar agora a ser trabalhado e em discordância completa com este governo”, finaliza o presidente da DG/AAC. Já está criada uma comissão para definir os moldes desta manifestação nacional. com Ana Morais
Ruído da Latada é causa da queda do brasão no mosteiro catarina carvalho
Depois do pedido de dois estudos independentes em novembro, confirma-se a relação do ruído da Festa das Latas com a queda do brasão no Mosteiro de Santa-Clara-a-Velha Liliana Cunha As conclusões dos estudos pedidos pela Direção Regional da Cultura do Centro (DRCC) foram enviadas na última sexta-feira, 14, ao presidente da Câmara Municipal de Coimbra (CMC), João Paulo Barbosa de Melo, e ao presidente da Direção-geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC), Ricardo Morgado. Em causa está a prova de que o ruído provocado nas noites da Festa das Latas em 2012 fez cair um
brasão de pedra no topo do Mosteiro de Santa-Clara-a-Velha. Alicerçada por cimento e ferros depois da sua última restauração em 1940, a pedra caiu três dias depois do final das noites do Parque no dia 20 de outubro. A presidente da DRCC, Celeste Amaro, em declarações, na altura, ao jornal Público, estava segura de que os espetáculos que se dão no Parque da Canção têm “vindo a provocar danos no monumento” e prometia levar “o caso até às últimas consequências”. Sete meses depois a confirmação está dada e os dispositivos instalados no local, bem como os testes de monitorização mostraram que os sons exteriores danificam a estrutura com mais de 400 anos. “Falei com um dos professores que fez o relatório e ele estava também abismado com a conclusão porque pensava que só o som não fazia mal nenhum”, explica Celeste Amaro. O professor em causa esteve
dentro do mosteiro na noite de oito para nove de maio deste ano, noite essa em que atuou o Dj Hardwell na Queima das Fitas 2013 e afirmou a Celeste Amaro que “o medidor de som e o ponteiro saltavam” com as vibrações. Sem ter ainda nenhuma reação por parte da DG/AAC e da CMC, a diretora diz ter a “certeza que nenhum deles vai responder, mas neste momento estão aferidos os decibéis possíveis para não degradar o mosteiro e não afetar inclusivamente as pessoas que lá estão a ouvir”. Questionado face às conclusões, Ricardo Morgado acredita que, mesmo “não entendendo nada de pedras, de monumentos, o ruído pode ter contribuído e não terá sido o único fator para que tenha caído a pedra”.
Continuidade da não está em causa
festa
“Temos limitadores desde há dois anos e foram colocados pela CMC.
As autoridades estão a monitorizar tudo isso”, assegura o presidente da DG/AAC. No entanto, os limitadores não impediram a queda do brasão. “Sei que tenho de ter uma reunião com a AAC antes da Latada. Ninguém quer que deixe de haver Queima das Fitas, é a maior festa que Coimbra tem, mas, agora só desde que cumpram aquelas regras”, aponta Celeste Amaro. O excesso de decibéis terá novamente de ser controlado na Festa das Latas. Por parte da DG/AAC, Ricardo Morgado predispõe-se a “entrar em diálogo e arranjar soluções que permitam não interferir com a população vizinha, nem com os monumentos” - porém, sem “pôr em causa a Festa das Latas e a Queima das Fitas”, que afirma serem as festas mais “marcantes de Coimbra e da academia”, e que em dias de festa, é normal “para os estudantes, para a cidade e para o país haver ruído”.
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CULTURA daniel alves da silva
Yoga: 30 anos a promover o bem-estar Os 30 anos da Secção Experimental de Yoga da AAC comemoram-se sem esquecer “a filosofia de bondade e descoberta pessoal”. A evolução tem sido crescente e os participantes também. Por Ana Morais
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Ao lado das antigas Cantinas Verdes é a sala de meditação da SEY
o lado das antigas Cantinas Verdes, uma porta abraçada por um arco-íris pintado na parede, e uma tímida placa onde pode ler-se “yoga” convidam-nos a entrar. Entramos e deixamos os sapatos à porta - na sala de meditação só está de pés descalços. Uma sala estreita e despojada, em que as paredes brancas são interrompidas pelas várias janelas que deixam espreitar a natureza, é preenchida pelos colchões de quem aceitou o convite. Em posição de Lótus, tem início a meditação. Sentir o corpo e valorizar todas as sensações é o mote de começo, já de olhos fechados e boca entreaberta com um ligeiro sorriso nos lábios. As posições evoluem a vários ritmos, mas sempre interiorizando a necessidade de sentir o nosso corpo. Testando o equilíbrio e a flexibilidade, o que mais interessa é a atitude com que se encaram os exercícios. Desde há 30 anos que este é o espírito da Secção Experimental de Yoga (SEY) da Associação Académica de Coimbra (AAC). Um grupo de amigos que tinha em comum a paixão pelas artes orientais, ia-se encontrando nos jardins e nos corredores da AAC ou por salas emprestadas para praticar yoga. Luís Trindade, um dos fundadores ainda hoje ligados à SEY, conta que apesar de na altura “ser estranho algumas artes e práticas orientais, havia uma vontade instituída, foi a ‘new age’, uma época interessante pela descoberta dos estudantes”. Margarida Lima, outra das fundadoras e a orientadora da sessão descrita, explica a vontade que havia de “fazer uma coisa diferente, um yoga aberto, em que se pudesse experimentar todas as correntes e escolas que apareciam”. Ainda assim, a também professora univer-
sitária explica que havia uma grande vontade de “promover o bem-estar e o desenvolvimento pessoal”. A SEY conta hoje com 60 inscrições oficiais. Contudo, como as práticas são de entrada livre, “qualquer pessoa pode chegar e experimentar naquele dia e continuar ou não”, explica Luís Trindade. “É um local de prática aberto”, é assim que Luís carateriza a secção. Quanto ao aniversário simbólico, o membro-fundador brinca para desvalorizar o número: “30 anos, para nós, pequeninos humanos, é muito tempo, mas para a idade do cosmos é um cisco ou um micro cisco”. Todavia essas três décadas permitiram já uma evolução. Margarida Lima explica que a SEY “tem crescido mas mantendo a filosofia original de bondade, descoberta pessoal, e também de abertura e de aceitação da diferença”, e isso é notório pela diversidade de praticantes que chegam à secção. “É um trabalho mais interior e pessoal, e nesse sentido a secção nunca se expôs muito”, admite Luís Trindade, apesar de reforçar o convite a todos os interessados para os horários das sessões: segundas, terças, quartas e quintas, das 18h30 às 20h, sessões de yoga; e às terças das 20h15 às 21h, sessões zen.
Entre a meditação
O ano passado em época de exames, Diego Costa apercebeu-se da existência da SEY e desde então tem marcado presença nas sessões. Hoje admite as mais-valias que esta secção lhe trouxe: “o conhecimento do próprio corpo, o equilíbrio, a postura, a respiração. E tem aumentado muito a minha concentração, o que é ótimo nos exames”. Já Rita Coimbra, outra das praticantes, vem à SEY há
cerca de dez anos e confessa: “tenho aprendido muito, os professores são muito diferentes e aprendemos um bocadinho de cada um deles”. A presidente cessante, Viviane Carrico, na SEY desde 2006, atualmente fora do país, confessa a forte ligação que ainda detém. “ A secção proporciona à academia e à cidade o conhecimento e prática desta arte milenar”, atesta.
Comemorações de aniversário
Já com atividades realizadas no equinócio da Primavera, chega o solstício de verão, a 21 de junho, celebrado com uma tertúlia com antigos praticantes de yoga, com a presença de Pedro Choy, outro dos fundadores e hoje reconhecido pela prática de acupuntura, na Cafetaria do Museu, às 21h30. “Uma conversa entre pessoas em que o yoga tenha deixado a marca no seu trabalho do dia-a-dia”, explana Luís. No dia seguinte, 22, haverá oficinas de meditação, na sala de práticas, e ainda um concerto chamado de “tantra mântrico”, com a banda Guerreiros da Luz. Quase duas horas depois dos exercícios práticos de yoga, os últimos minutos são guardados para o relaxamento. Deitados no chão e de olhos fechados somos invadidos pelo poderoso som de uma taça tibetana. A voz suave e agradável de Margarida transporta-nos. E somos levados para o centro das nossas sensações. Depois de sentirmos cada parte do nosso corpo, o despertar é mais agradável. Aos poucos voltamos e somos desafiados a encarar as coisas como se fosse a primeira vez, sem ideias feitas. A sessão termina, mas a calma incutida pela meditação continua. É assim com a SEY há 30 anos. com Daniel Alves da Silva
Mostra de Teatro Universitário regressa com novidades A 24 de junho inicia-se a II Mostra de Teatro Universitário que este ano acontece em dois palcos e traz à cidade uma companhia estrangeira Maria João Gomes Daniel Alves da Silva O Teatro Académico de Gil Vicente (TAGV) organiza novamente a Mostra de Teatro Universitário, que decorre entre os dias 24 e 28 de junho. Pelo segundo ano consecutivo,
o TAGV promove o teatro feito pelos estudantes, num evento que reúne os grupos de teatro universitário conimbricenses, e que conta também com a presença de um grupo de teatro universitário espanhol. A iniciativa alarga-se este ano ao palco do Teatro da Cerca de São Bernardo (TCSB), que irá também acolher alguns espetáculos da presente edição. “O TAGV contactou-nos porque sabia que dois dos espectáculos da Mostra estrearam aqui [no TCSB]”, explica o responsável pela administração do TCSB, Pedro Rodrigues. Referindo-se ao “projecto H”, do Teatro dos Estudantes da Universidade de Coimbra
(TEUC) e à “Manhã”, do Grupo de Etnografia e Folclore da Academia de Coimbra (GEFAC), pensados e “construídos neste teatro”, tendo sido estreados por lá, acrescenta Pedro Rodrigues. Mostra-se, ainda, agradado por haver mais uma edição e considerando esta “uma boa iniciativa para a cidade”. A Mostra tem também a participação do Thíasos (Grupo de Teatro do Instituto de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra), que traz à sala principal do TAGV a comédia “Lísistrata”, de Aristófanes. O Círculo de Iniciação Teatral da Academia de Coimbra (CITAC) apresenta o seu
exercício final de curso, “Aquário”, uma criação colectiva dos formandos com a coordenação de Catarina Lacerda. A novidade deste ano é a inclusão da Compañia de Teatro Noite Bohemia, do Instituto Ramon Menéndez Pidal (Zalaeta), da Corunha, que interpreta “Una tragedia de Eurípides”. A vinda do grupo espanhol justifica-se pela aposta no crescimento da Mostra, que se pretende um evento de referência no teatro universitário em Portugal. Relativamente aos preços serão inferiores ao ano passado e vão ter o preço único de 3 euros por espetáculo. Decorrem também dois deba-
tes no café-teatro, “Mulheres em Cena”, sobre o papel da mulher na cultura tradicional e “Como dar forma ao Caos”, que se foca no teatro universitário. O diretor do TAGV, Fernando Matos de Oliveira, explica, quanto ao teatro universitário, que o seu estudo “contribuiu para o desenvolvimento do teatro em Portugal, mais do que noutros países europeus”. A existência do teatro universitário mantém-se apesar da adversidade económica enfrentada pelas companhias. Contudo, o diretor do TAGV reconhece que o mesmo conseguiu estabelecer-se graças a “abertura de cursos de artes na universidade”.
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desporto
Espadas estão de volta a Coimbra Com tradição em Coimbra, a esgrima volta a atrair. Depois de uma tentativa infértil de trazer a atividade à AAC, o grupo reconstituiu-se numa outra associação da cidade Ana Morais Há menos de 100 anos acontecia o último duelo no país entre um republicano e um monárquico, ambos da capital, por motivos de honra. Desde então que as espadas apenas se gladiam no desporto, sem qualquer intuito de resolver conflitos. É assim na esgrima. Espada, florete e sabre, três objetos agora usados apenas na desportiva, deixam para trás as histórias de honra resolvidas a sangue. “Quando se pensa em esgrima pensa-se na antiga aristocracia, mas a esgrima democratizou-se muitíssimo. E hoje encontramos pessoas de todas as classes sociais e proveniências”. Quem o diz é o coordenador da mais recente Secção de Esgrima, formada em Coimbra, da Associação Cristã da Mocidade (ACM), Pedro Bingre, para apresentar um grupo heterogéneo de esgrimistas. “A esgrima em Coimbra tem uma larga história”, conta Pedro, apesar de ressalvar que esta secção não herdou nenhum desses antigos participantes. Desde outubro de 2012 que um conjunto de amigos, integrado por Pedro Bingre, começou a idealizar esta secção, mas só em março deste ano é que se formalizou enquanto
Secção de Esgrima. Depois de haver uma tentativa de recuperar esta secção na Associação Académica de Coimbra (AAC), o cenário mais acessível foi recuperar a sala de armas (termo da gíria) da ACM. Problemas orçamentais com a antiga Secção de Esgrima da AAC parecem ter sido o impedimento, apesar de Pedro Bingre explicar que não conseguiram apurar mais detalhes relativos a esta situação. Também o presidente do Conselho Desportivo, Miguel Franco, reconhece: “é um processo antigo, surgem muitos e não me consigo recordar”. Ainda assim, Pedro explica que após a tentativa de recuperar a secção na AAC foi pedido o pagamento de “uma dívida bastante avultada” à Federação Portuguesa de Esgrima, o que constituiu um impedimento, devido à falta de meios financeiros. Por outro lado, Miguel Franco explica que o projeto apresentado ao Conselho Desportivo para a recuperação desta secção era “vago” e “não tinha a viabilidade financeira devidamente comprovada”. Contudo, o presidente do Conselho Desportivo reconhece a lacuna de uma secção de esgrima numa “AAC tão eclética”.
Um grupo heterogéneo
No entanto, o grupo que ansiava a formação da Secção de Esgrima encontrou uma alternativa, a ACM. Desde então que em quarta-feira de treino, o tilintar do choque das espadas é o som mais presente num dos pavilhões da associação. Depois dos treinos de aquecimento, os esgrimistas realizam uma ‘pull’ (um minicampeonato), em que todos combatem contra todos e num ambiente de diversão. O que interessa não são os pontos, mas sim
a evolução e a precisão dos movimentos. Estudantes dos três ciclos, profissionais, atletas de várias nacionalidades e idades distintas constituem o ainda pequeno grupo da secção. Em português e inglês, o coordenador dá as indicações para o decorrer do treino. A mais recente atleta é Alice Torres. Teve conhecimento deste grupo através do Facebook e desde a última quarta-feira que é presença no treino, depois de uma viagem de Aveiro até Coimbra. “Estão todos muito empenhados em que isto funcione, é um grupo bastante engraçado, daí ter aderido”, explica Alice, que já tinha praticado florete há cerca de 15 anos. Entre uma pausa de um combate, José Fernandes e Bárbara Ormonde, ambos estudantes, contam com orgulho o evoluir da secção, uma vez que acompanham o processo desde início. José praticou esgrima na infância e agora reconhece que “gostava de continuar e até entrar nas competições”. Já Bárbara, a mais nova do grupo, tinha vontade de experimentar este desporto e andou em busca de um local para o fazer, até que chegou a Pedro. Hoje reconhece que a “heterogeneidade do grupo contribuiu” para a sua evolução. Sem financiamento externo, a gestão é feita a partir das próprias quotas. Já federados e com convites para participar em campeonatos, Pedro Bingre explica que no final do corrente ano esta será já uma possibilidade, “não tanto para ganhar prémios mas sim para ganhar experiência”. Mas o objetivo é trazer mais pessoas para a secção já que, afinal de contas, como confessa Pedro, “este não é um desporto para elites”.
ANA MORAIS
ANA MORAIS
A sala de armas recuperada na ACM é a mais recente Secção de Esgrima
Um ‘hobby’ de custos e dedicação elevados rafaela carvalho
A celebrar os 20 anos do seu primeiro campeonato europeu, o Radiomodelismo da AAC apresenta, apesar das perspetivas preocupantes, uma situação regular João Valadão Fundada em abril de 1991, a Secção de Radiomodelismo da Associação Académica de Coimbra (SRAAC) apresenta-se como um polo quase único na dinamização e prática do radiomodelismo na cidade. Com um historial de vinte e dois anos, muitos são os registos da participação em provas de competição europeias e mundiais. O atual tesoureiro da SRAAC, Carlos Lobo, contextualiza o surgimento da secção com o “arranque do radiomodelismo em Portugal”
e a importância da realização do campeonato europeu de radiomodelismo em 1993, em Coimbra. “Numa pontuação de zero a 10, tivemos 9.8 na organização, foi o melhor resultado de sempre”, adianta. Situado no Estádio Universitário, o local da pista de radiomodelismo é o mesmo desde a sua fundação. Da pista todo o terreno, que apenas permite a prática de modalidades nessa área, houve a passagem para o asfalto, que passou a acomodar pilotos das cinco áreas em que a secção atualmente se inscreve. “Fizemos uma primeira pista, que não foi muito bem conseguida a nível de traçado, entretanto fizemos a atual”, esclarece Carlos Lobo. É assim que, no ano 2000, é construído o miniautódromo de velocidade, que permite a prática de modalidades como 1:8 pista, 1:10/200 e também a realização de provas com carros elétrico, na categoria 1:10 elétrico pista. O tesoureiro da SRAAC valoriza a passagem de diversos atletas pelo clube, com
destaque para as participações de Miguel Matias e Carlos Durães em provas de âmbito nacional e internacional. Como sócia-fundadora, a SRAAC é um dos 27 clubes membros da Fundação Portuguesa de Radiomodelismo Automóvel. Com cerca de cinquenta sócios, dos quais menos de cinco são estudantes, são muitos os que permanecem por dedicação. Carlos Lobo explica que alguns membros da direção do passado, inclusive da primeira equipa de 1991, tiveram que regressar para assumir cargos diretivos. O tesoureiro da SRAAC lamenta a falta de interesse dos mais jovens, particularmente do público universitário, e sublinha a necessidade de atrair mais sócios para a sobrevivência da secção. “Há a necessidade que uma direção se mantenha durante algum tempo, para que haja estabilidade, aqui isso não se consegue”, acrescenta. Desprovida dos patrocínios que desde a sua fundação a financia-
vamn, a SRAAC sustenta-se através de uma rigorosa gestão dos fundos acumulados ao longo dos anos. “Temos uma ‘almofada’ muito grande que vamos gastando, mas quando acabar não temos outra alternativa senão fechar a porta”, alerta o Carlos Lobo. Com um financiamento do Conselho Desportivo da Associação Académica de Coimbra, que atinge pouco mais de mil euros por ano, o dirigente desportivo queixa-se também das limitações que são impostas na área do autofinanciamento. “Como estamos agarrados à ‘camisola’ não podemos fazer publicidade, a lei não o permite”, acresce. Realizado no passado sábado, 16, o Campeonato Nacional de Escala 1/5 não trouxe um feliz resultado aos atletas da AAC. Gonçalo Almeida não pôde comparecer e Jaime Almeida, o único piloto a participar terminou em 12º lugar, num conjunto de treze atletas que se incontravam inscritos.
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cidade
I mostra de gastronomia de coimbra Rafaela Carvalho
rafaela carvalho
rafaela carvalho
rafaela carvalho
Pão caseiro, crepes de beldroegas, queijadas de Pereira e vinhos regionais foram alguns dos produtos que preencheram as bancas do Mercado D.Pedro V
Do vinho à urtiga, se enche a barriga
Dinamizar o mercado D. Pedro V, atrair novos públicos e proporcionar aos visitantes uma nova visão do mercado, foram alguns dos objetivos da I Mostra de Gastronomia. De Coimbra e arredores, vários expositores trouxeram algumas das iguarias que caraterizam a sua riqueza gastronómica. Por João Valadão
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ealizada no passado sábado, dia 15, a I Mostra de Gastronomia de Coimbra trouxe ao mercado D. Pedro V um conjunto de dezoito expositores, com uma diversa gama de sabores de vários locais da região centro. Organizada pela Associação de Mercados de Coimbra, o evento inclui-se num conjunto de atividades que tem vindo a ser realizado no último ano, no âmbito de um esforço de dinamização do comércio tradicional da cidade. A representante da Associação de Mercados de Coimbra, Ana Simões, comenta que a feira resulta “de um esforço de três meses” e que contou com o apoio fundamental da Confraria dos Sabores de Coimbra, que também colaborou na realização
de contactos com outras confrarias de renome. Em dia de santos populares, a I Mostra de Gastronomia tornou-se um local privilegiado para provar algumas especialidades da cozinha portuguesa e outros produtos menos presentes nas refeições. O cozinheiro dos Serviços de Ação Social do Instituto Politécnico de Coimbra, António Neves, é um dos expositores que se destaca pela novidade dos seus produtos. Bolos e outras doçarias preenchem a sua banca, rodeadas por um conjunto de diversas flores comestíveis. A exposição consiste em produtos de urtiga e beldroega, que António confeciona no âmbito de projetos paralelos nos quais participa. “As pessoas não estão habitua-
das a este tipo de produtos silvestres, mas aos poucos vou-lhes incutindo o gosto”, explica o cozinheiro. Os benefícios para a saúde, a riqueza biológica do produto e a facilidade em arranjá-lo em terrenos baldios são algumas das vantagens que a bancada de António Neves oferece. Também presente na mostra, e provador das diversas iguarias oferecidas pelas bancas, esteve o presidente da Câmara Municipal de Coimbra (CMC), João Paulo Barbosa de Melo. O autarca explana a relevância deste tipo de eventos para a divulgação do comércio tradicional
junto dos cidadãos: “os comerciantes organizaram-se e isso é muito importante”. O presidente da CMC acrescenta que é preciso que “o mercado seja um sítio onde nos sintamos bem, assim ficamos satisfeitos e voltamos”. Contudo, o autarca apresenta-se reticente quanto à realização deste tipo de eventos como solução para a crise que aflige o comércio tradicional na cidade. “Estas iniciativas têm um ato simbólico, ajudam as pessoas a virem cá, mas não se pode esperar que a salvação vá ser organizar eventos destes todos os dias”, conclui. rafaela carvalho
A mostra contou com a presença de dezoito expositores
Uma cidade pouco aderente
Maria Preciosa Vale, presidente da Confraria dos Sabores, conta que o objetivo principal é “divulgar a cozinha tradicional e conventual, da forma mais genuína possível”. Movido pelo lema de “promover, defender e divulgar”, o grupo conimbricense, constituído unicamente por mulheres, participa regularmente em eventos de dinamização da gastronomia conventual. A opinião de que Coimbra é uma cidade com pouca aptidão para a realização de eventos dinamizadores da gastronomia conventual e do mercado tradicional parece gerar consenso entre os vários participantes da mostra. Maria Preciosa Vale mostra-se surpreendida pelo número de pessoas que afluiu ao mercado: “para Coimbra, que não é muito aderente, até veio um número significativo”. Também Ana Simões valoriza a realização da I Mostra de Gastronomia, num contexto que proporciona poucas oportunidades para a promoção do comércio tradicional. Sobre uma futura realização da feira, a representante dos comerciantes espera que o evento se posso repetir, de forma a garantir também a dinamização do próprio espaço. Para além do grupo de dezoito expositores que estiveram presentes, a mostra contou com a participação de grupos de artesanato e musicais, que preencheram o dia com diversas atuações. Entre o variado número de expositores que estiveram presentes contam-se a Confraria dos Sabores de Coimbra, a Confraria Gastronómica “As Sainhas”, a Confraria de Vinho de Lamas, a Confraria da Doçaria Conventual de Tentúgal ou a Confraria Enogastronómica Sabores Do Botaréu.
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ciência & tecnologia
Maior longevidade requer mudança de paradigma
O enquadramento demográfico português conhece, hoje, novos contornos. A esperança média de vida aumenta, a taxa de natalidade não assegura renovação e a taxa de mortalidade diminui. O país está envelhecido e é preciso adequar as políticas às novas realidades. Por Rita Abreu e Carolina Varela
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arquivo - rafaela carvalho
om o passar dos anos, um leque de fatores tem sido responsável pelo aumento da esperança média de vida. A melhoria das condições de bem-estar, acompanhada dos progressos da medicina e da assistência médica está na origem do aumento da longevidade da sociedade portuguesa. Os dados do Instituto Nacional de Estatística apontam para uma esperança média de vida em torno dos 82,43 anos para as mulheres e 76,47 anos para os homens – valores referentes ao triénio 2009-2011. A realidade atual contrasta em larga medida com o panorama dos anos de 1960, altura em que “a esperança média de vida era de apenas 61 anos para os homens e 67 anos para as mulheres”, lembra o presidente do Centro Hospitalar da Universidade de Coimbra (CHUC), José Martins Nunes. A esperança média de vida à nascença tem conhecido um caminho crescente nos últimos anos, sendo sempre superior nas mulheres. “A evolução da medicina e a possibilidade de tratar doenças existentes, bem como a possibilidade de prevenção de aparecimento de doenças graves tem permitido às pessoas viverem mais tempo e com maior qualidade de vida”, ressalta a especialista em genética médica do Centro Genética Clínica (CGC), Purificação Tavares. A especialista salienta que o aumento da esperança média de vida “não tem sido acompanhado por um aumento da população, contrariamente ao que seria de esperar. Apesar de se viver mais tempo, a natalidade tem decrescido, facto que resulta numa população envelhecida”.
Determinação genética
Novas demografias
O aumento da proporção de idosos – pessoas de 65 ou mais anos de idade – e a diminuição da percentagem de jovens – pessoas com idade inferior a 15 anos – no conjunto da população, traçam a estrutura atual do país. O índice sintético de fecundidade e os saldos migratórios são, também, variáveis determinantes na definição da sociedade. Em 2009 registou-se uma média de 1,32 filhos por mulher, sendo que o valor necessário à substituição de gerações é de 2,1. Também nos saldos migratórios os valores de saída têm superado os de entrada, deixando o país com um saldo negativo. O investigador do Centro de Estudos Sociais (CES), André Brito Correia, alerta para a alteração das realidades demográficas que “têm colocado uma série de questões para as quais a sociedade portuguesa não parece preparada”. Num contexto
que ao longo dos próximos 40 anos, podendo em 2050 ser superior a 32 por cento do total da população residente em Portugal, e a população jovem registar menos de 13 por cento. Com vista à atenuação dos problemas decorrentes do envelhecimento demográfico, o presidente do conselho de administração do CHUC aponta a “criação de condições de incentivo a políticas de preservação de boa saúde, estilos de vida saudáveis e de apoio às organizações que se dedicam ao apoio de idosos”. Quanto à importância do crescimento da natalidade, acredita que “pode ser incentivado através do aumento do abono de família, da licença de parto, dos subsídios de nascimentos e aleitação, de um maior apoio da legislação laboral às futuras mães e até penalização fiscal dos celibatários e casais sem filhos”.
Estima-se que em 2050 haja cerca de 2,5 idosos por cada jovem demográfico muito diferente do que marcava a sociedade de há meio século atrás, torna-se imperativo “equacionar formas diferentes de ver a relação entre formação, trabalho, tempo de lazer e o modo como as gerações se relacionam entre si”, não hesita o investigador do CES. O aumento de pessoas idosas, que caracteriza atualmente o país, resulta numa redução da população ativa e crescente procura de cuidados de saúde. Purificação Tavares observa que estes fatores “têm grande impacto nas contas públicas, principalmente na saúde, uma vez que a
tónica continua a ser o tratamento e não a prevenção”. André Brito Correia frisa, também, a necessidade de colmatar o que considera que tem sido “um grande desfasamento entre as dinâmicas demográficas dos últimos anos e aquilo que se verifica a nível económico, social e político”.
Novos paradigmas
O cenário social e demográfico do país reconhece no envelhecimento demográfico um processo contínuo, que apesar de poder conhecer algumas atenuantes e uma certa desace-
leração, nunca pode ser extinto. José Martins Nunes cita o relatório anual do Conselho da Europa sobre a “Evolução demográfica recente na Europa”: “a população portuguesa irá diminuir nas próximas duas décadas, dado que, embora aumente a esperança de vida, o número de nascimentos está a cair a uma velocidade superior à europeia. Os portugueses serão menos um milhão em 2050 e a população estará ainda mais envelhecida, havendo perto de 2,5 idosos por cada jovem”. Segundo o mesmo relatório, prevê-se que a população idosa dupli-
O tempo de vida dos indivíduos relaciona-se, entre outros fatores, com condições genéticas. “Existe uma relação entre o comprimento dos telómeros (regiões terminais dos nossos cromossomas) e a longevidade. Foram também descritos outros genes que parecem influenciar a longevidade”, determina a geneticista do CGC. O fator genético pode ter um papel neutro, protetor ou ser um fator de risco acrescido. “A presença de determinadas alterações genéticas aumenta o risco de se desenvolver uma doença. Já se fazem testes genéticos para atuar especificamente sobre o risco de doenças para cada um”, avança Purificação Tavares. O meio ambiente assume um peso preponderante na temática da longevidade. A especialista do CGC acrescenta que “a interação do meio ambiente com hábitos que as pessoas têm e com os fatores genéticos são determinantes”. A manipulação genética do tempo de vida tem sido alvo de múltiplas pesquisas. “O aumento da longevidade celular não é sinónimo de saúde. Os mecanismos de proteção de erros, que evitam, por exemplo, o aparecimento de cancros não são mantidos”, acusa a geneticista. Conclui que “as tentativas de manipulação genética deveriam ter em conta a prevenção de doenças e o aumento da qualidade de vida e não apenas a longevidade”. Ter conhecimento antecipado de doenças que se podem manifestar mais tarde na vida de cada um e a possibilidade de atuar com antecedência sobre o seu aparecimento são duas das conquistas basilares da história da humanidade.
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museus no centro
Património museológico em intercâmbio A Direção Regional de Cultura do Centro transporta o modelo do Mosteiro de Santa Clara-a-Velha para a rede “Museus no Centro” criada no início deste ano. Cinema, música, teatro, oficinas pedagógicas e exposições itinerantes unem agora sete museus da região centro de Portugal, da Guarda às Caldas da Rainha, de forma a tornar estes espaços mais apelativos, com um aumento de público e de receitas. Por Rafaela Carvalho e Sónia Mendes
U
ma nova rede, “Museus no Centro”, integra agora os museus de Aveiro, Guarda, Dr. Joaquim Manso (Nazaré), José Malhoa, Cerâmica (Caldas da Rainha), Francisco Tavares Proença Júnior (Castelo Branco) e Santa Clara-a-Velha (Coimbra). Após terem sido entregues à sua tutela, a Direção Regional de Cultura do Centro (DRCC) desenvolveu um projecto de agregação que pretende “criar novas dinâmicas quer através da atração de públicos quer através do cumprimento da função social e cultural dos próprios museus”, explica o diretor de serviços de Bens Culturais, Artur Côrte-Real. O objetivo é transportar para todos os museus um modelo que o Mosteiro de Santa Clara-a-Velha (MSCAV) tem vindo a desenvolver ao longo dos últimos anos. Organizar sessões de cinema, teatro, música, e muitas outras atividades pedagógicas e culturais com o intuito de criar uma programação mais jovem e atrativa. Celeste Amaro, diretora da DRCC, é perentória: “uma exposição vê-se uma vez, se não houver esta dinâmica as pessoas não voltam”. Também a coordenadora do MSCAV, Lígia Gambini, compreende esta necessidade de dinamizar os espaços históricos e quebrar um paradigma instituído. “Os museus já não são aqueles espaços sombrios dedicados apenas a eruditos, mas sim abertos à maioria da população”, confessa. Também por essa razão, a
DRCC pretende desenvolver um maior trabalho de divulgação em plataformas online e integrar neste novo projeto a criação de lojas e cafetarias, bem como alargar os horários de visita. “Esta é uma tentativa de reaproximar os museus das pessoas, de os tornar espaços de lazer, de fazer fruir as cafetarias, os relvados, os edifícios e os monumentos”, afirma Lígia Gambini.
Intercâmbio de experiências
A rede “Museus no Centro” revela-se então uma oportunidade de união de esforços entre as diversas entidades nela englobadas. “A ideia é captar aquilo que cada museu sabe fazer melhor e levar esse conhecimento aos outros para que esta dinâmica cultural se torne mais rica, abrangente e concertada - onde a experiência específica de cada espaço enriqueça também os outros”, reitera a coordenadora do MSCAV. Assim, técnicos arqueológicos do MSCAV ou técnicos de pintura do Museu José Malhoa poderão dirigir oficinas pedagógicas em qualquer um dos outros museus. A DRCC pretende ainda que as exposições sejam itinerantes rentabilizando os recursos económicos disponíveis. Foi também criado um passaporte para o público de forma a que a visita a cada um dos museus seja registada, permitindo descontos e garantindo uma prenda surpresa no final. “São visitas que se complementam e que no fundo espelham a riqueza da nossa cul-
tura”, reitera Lígia Gambini. Segundo Celeste Amaro, um dos principais objetivos é tornar os museus “cada vez mais autosustentáveis”, o que implica um aumento do público. E, de acordo com os dados estatísticos da DRCC, este projeto que é agora divulgado, mas que tem estado em fase de experimentação desde janeiro, permitiu aos museus integrados um aumento de visitantes. De um total de 16 908 visitantes anuais em maio de 2012, o conjunto dos museus teve um acréscimo para 26 508 em maio de 2013, um aumento de cerca de dez mil visitantes. Artur Côrte-Real explica: “estes projetos são medíveis e, portanto, não há nada abstrato. Daqui a um ano já fizemos uma primeira apreciação de aumento de públicos e de aumento de receita.” No entanto, os responsáveis da DRCC acreditam que o projeto ainda tem um longo caminho a percorrer. Deste acréscimo de visitantes ficam excluídos o Museu Joaquim Manso na Nazaré e o Museu da Guarda cujas condições atuais são, na opinião de Celeste Amaro, o principal entrave ao desenvolvimento. “Pretendemos encerrar o museu da Nazaré, que está sem condições de abertura ao público e nada apelativo, e refazê-lo no promontório”, confirma a diretora.
Cultura como um produto vendível
Num momento marcado pela crise económica, onde os cortes na
cultura são cada vez mais acentuados, é necessário, na opinião de Celeste Amaro, descobrir novas formas de angariar receitas. “Promover a cultura hoje tem que ser como vender um produto, vender um museu tem a mesma ciência e o mesmo ‘marketing’ que vender outro produto”, confessa a diretora. Os três responsáveis deixam ainda bem claro que um museu não é apenas as atividades e exposições que este alberga. “O museu vive também com o trabalho de investigação e com o trabalho de conservação”, declara Artur
“Uma
exposição vê-se uma vez, se não houver
dinâmica
as pessoas não voltam” Lígia Gambini
Côrte-Real. Por isso mesmo, o diretor de serviços de Bens Culturais defende a necessidade de “inverter a ideia de que quando se vai a um museu não se paga”. No seu ponto de vista “contribui-se para a manutenção de uma memória”. Lígia Gambini reforça: “é evidente que a cultura deve ser acessível, mas a gratuitidade completa leva a que também muitas vezes não se valorize os espaços”. com Juliana Pereira
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museus no centro
fotomontagem por catarina carvalho
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país
Os exames do nosso descontentamento
Milhares de docentes manifestaram-se em Lisboa este sábado, 15, pelo direito à “estabilidade no emprego”, contra a mobilidade especial e contra o aumento da carga horária. Reivindicações da classe que marchou do Marquês aos Restauradores. Por Camilo Soldado, em Lisboa
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Júlio Ferreira é professor há 13 anos. Acompanhado pela filha, veio de Faro pelo que diz ser “um imperativo ético”. Está a contrato há tantos anos quantos exerce a profissão e está em Lisboa para “lutar pela escola pública de qualidade” mas também pela “estabilidade no emprego”. No dia 15 de junho os professores voltaram à rua, desta feita como interlúdio de uma jornada maior. Depois da greve às avaliações segue-se
a greve ao exame de Português. Em causa está a mobilidade especial, controversa medida que o Ministério da Educação e Ciência quer aplicar. Se o nome estiver no mapa, saiu de lá um autocarro em direção a Lisboa com mais ou menos antecedência, conforme a distância. De norte a sul do país, para percorrer a Avenida da Liberdade, juntam-se cerca de 50 mil professores, alegam os sindicatos. “Só da região
O que é a mobilidade especial? Até agora os professores beneficiavam de um estatuto na função pública que os isentava do regime de mobilidade especial. A transição sugere-se numa situação em que os trabalhadores, na sequência da reestruturação de serviços, não são necessários. Ainda há os que optem voluntariamente por esta transição em certos períodos temporais. Atualmente, aqueles que desejem passar para o grupo apenas mantêm o salário inteiro nos primeiros dois meses. Nos dez meses seguintes passam a receber apenas 66,7 por cento da remuneração, e depois ficam reduzidos a metade do salário. No entanto, a lei não prevê um limite para que os funcionários fiquem na mobilidade especial. Para os professores a situação nunca antes prevista faz com que, se não ficarem colocados em nenhuma escola ou se não tiverem horário letivo suficiente, se vejam forçados a entrar nesta transição por via da falta de trabalho. A reivindicação cresce porque a alteração da lei querida pela tutela tem de estar pronta até ao final deste mês. Tiram-se os professores de um regime próprio onde, caso não lhes seja atribuído um horário zero (seis tempos letivos), terá de concorrer a uma escola no mesmo concelho e se mesmo assim não conseguir, acaba por ficar na escola em funções de substituição temporária ou exercer outros trabalhos de apoio. Neste momento, e segundo a Fenprof, estão cerca de 14 mil professores em risco. Por Liliana Cunha
do Porto vieram 11 autocarros”, afirma José Machado, professor de Filosofia e Psicologia em Gaia, na Escola Secundária António Sérgio. Docente há 32 anos, José Machado viu serem investidos 12 milhões de euros na modernização da escola para agora “mandarem os professores para a rua, fecharem os cursos e aumentarem os horários de trabalho”. Na última deslocação da classe profissional a Lisboa, um despiste de um transporte de animais vivos na autoestrada fez com que quem viesse do centro e norte do país se atrasasse. Este sábado, pelo caminho, houve quem gracejasse e indagasse o que é que o ministro Crato poderia mandar desta vez. Os primeiros autocarros a chegar ao Marquês fizeram-no por volta do meio-dia. Ali ao lado, o Parque Eduardo VII fazia lembrar o Jamor em questões de farnel, houvesse razões para festejar. Bombos, apitos, buzinas, cânticos e a inevitável “Grândola”: tudo é válido na altura de demonstrar o descontentamento. Marcada para as 15 horas, urgia começar a marcha. Os 27 graus à sombra com outros tantos ao sol faziam o alcatrão queimar nos pés. Então, do Marquês aos Restaura-
dores, passaram 30 minutos – isto à cabeça da manifestação. Quanto à cauda, eram já 16 horas e ainda haviam bandeiras a abandonar o Marquês.
“Vou fazer as greves todas”
Professora de Educação Física há 25 anos, Bela Afonso vem de Braga pois “há razões mais do que suficientes” para se manifestar. A mobilidade especial e o aumento de 35 para 40 horas laborais são apenas dois dos motivos que a levaram à capital e que a levaram também a fazer greve ontem, 17, à vigilância do exame de Português. E acrescenta: “vou fazer as greves todas”. Os Restauradores não encheram na totalidade, sobejavam espaços ao sol e a sombra da avenida mostrava-se mais convidativa. Lá à frente, ao pé do palco, o mar de bandeiras teve que ser afastado para deixar que as televisões fizessem o seu trabalho. Também de Braga vem Manuel Silva, professor de Mecanotecnia. Com 36 anos de serviço e no quadro há 33, esta não é a primeira presença em manifestações da classe. “Estou em vias de ir para o desemprego, como todos”, motivo que o leva a ir para rua.
P. prefere não ser identificada. Professora na Brandoa, efetiva há duas décadas, faz questão de ir a todas as manifestações. O marido, que está ao lado, “é solidário, apesar de não ser professor, também vem a todas”. Quanto às revindicações, P. exemplifica que por cada turma de testes são lhe ocupadas cinco a seis horas na correção. Da sua escola vieram poucos professores, afirma, “mas também vieram pessoas já reformadas”.
Ministério com falta de ética
José Machado acredita que o aumento do horário de trabalho vai prejudicar a qualidade do ensino público. “Vai prejudicar os jovens e os desempregados, porque os contratados vão para a rua e os efetivos irão para a mobilidade”, antevê. Contra o Ministério que acusa de falta de ética, o professor de Filosofia garante que de 81 conselhos de turma agendados desde do dia sete, nenhum se realizou. Cinco e meia e a multidão começa a dispersar. Mário Nogueira já discursou e é hora de arrumar as bandeiras. A grande maioria dirige-se para a beira-rio, onde os aguardam os autocarros para os levar de volta. D.R.
Professores de norte a sul do país rumaram a Lisboa para se manifestar contra as medidas do Governo e os ataques à educação pública
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mundo
Estratégias energéticas europeias precisam-se
Falta de investimentos, fraco desenvolvimento dos recursos renováveis e concorrência norte-americana são alguns dos problemas que assombram as políticas energéticas da União Europeia. O isolamento da Europa neste combate tem-se revelado prejudicial no contexto internacional. Por António Cardoso
O
Conselho Europeu reuniu-se em Cimeira no dia 22 de maio e convergiu as suas temáticas na urgência de serem feitos progressos nos domínios da energia. As empresas do setor apontam como falhas nas estratégias europeias: a diminuição drástica dos investimentos em grandes projetos de infraestruturas capazes de dar resposta a picos de consumo, a ausência de um quadro regulamentar preciso, e o peso muito relativo da política energética comum. Situações que na ótica das empresas podem por em causa a segurança de abastecimento energético da Europa. Desde 2008 que a União Europeia (UE) tem uma política comum integrada de energia e alterações climáticas. Em 2007, a Comissão propôs uma estratégia designada “Pacote energia-
“A falha de abastecimento é uma questão grave que põe em causa dinâmicas económicas” -clima: três vintes até 2020”, que foi aprovada em 2008 pelo Conselho e Parlamento Europeu. Esta estratégia europeia definiu objetivos para 2020, como a redução de CO2 em 20 por cento e aproveitar 20 por cento do total de energia para consumo da UE, de proveniência renovável. Apesar destes objetivos serem obrigatórios, a estratégia define um terceiro objetivo facultativo: o aumento da eficiência energética em 20 por cento. “A falha de abastecimento é uma questão extremamente grave e que pode por em causa dinâmicas económicas”, prenuncia-se a deputada do Partido Ecologista “Os Verdes”, Heloísa Apolónia,
defendendo que o investimento deveria descentralizar-se dos gigantes do setor, sendo a aposta uma produção mais localizada. Porém, a eurodeputada do Partido Social Democrata, Maria da Graça Carvalho, defende que “não há uma falta visão europeia”. “O que se passa é que começa a ser preciso definir o pós 2020”, esclarece relativamente às queixas das empresas do setor. A deputada com assento no Parlamento Europeu, considera que “os elevados investimentos exigidos pela construção de uma qualquer central ou linha energética requerem tempo”, e é portanto urgente “definir o rumo a seguir, para dar também uma segurança ao setor empresarial e ao setor industrial”. Nesse sentido, Maria da Graça Carvalho acredita que é necessário preparar “não só o 2030 mas também o 2050”. Na mensagem transmitida na semana que antecedeu a Cimeira, e segundo o jornal francês “Le Fígaro”, as empresas desejam ainda que o mercado do carbono seja mais compreensível, menos dispendioso e mais eficaz, em especial no confere às licenças de emissão. As indústrias que mais consomem energia e que mais emitem, enfrentam então as apertadas medidas da UE, obrigando a enveredar pela deslocalização das centrais de produção, que vão abrir noutros locais, sem essas restrições. Trata-se muita das vezes de centrais de gás de ciclo combinado (CGG), que são também vítimas do desenvolvimento do Gás de Xisto na América do Norte.
Gás de Xisto
mite aos Estados Unidos exportarem quantidades enormes de carvão. Estas servem para alimentar as centrais de produção de eletricidade da Europa, a preços muito mais competitivos do que os do gás para as CGG. Contudo, quando questionada a hipótese de exploração deste gás no contexto europeu, a presidente do Conselho Diretivo do Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), Teresa Ponce de Leão, assevera: “o que é possível nos EUA pode não ser possível na Europa. Temos que apostar em soluções em locais onde existem recursos que possam ser aproveitados”. O elemento que, nas palavras da eurodeputada social-democrata, vem “baralhar o cenário internacional” fez os EUA deixarem de consumir carvão, tornando o seu preço nos mercados mais baixo, e obrigan-
“O que é possível nos EUA pode não ser possível na Europa”, declara Teresa Ponce de Leão do a Europa a consumir muito mais carvão do que antes.
Ilhas de energia
A diminuição drástica dos investimentos em grandes projetos inviabiliza, no imediato, as ambições de ter uma Europa coberta de uma rede elétrica, por exemplo. “Existem ilhas do ponto de vista energético, a Península Ibérica tem uma ligação muito ténue com a França”, confirma
Maria Graça de Carvalho. Na questão da diversificação de fontes ou “’mix’ energético”, como vem definido na estratégia do “pacote clima-ambiente”, as diretivas em relação ao gás e a gasodutos prendem-se com a não dependência de nenhum país fornecedor ou país de trânsito. Apesar da grande diversidade de fontes da Península Ibérica, como o gasoduto da Argélia e os oito portos de gás liquefeito, a não ligação por gasoduto à França não é favorável aos restantes estados membros, sobretudo os do norte europeu (dependentes do abastecimento russo). Outra das situações que tem prejudicado a UE em termos de política energética é a não concretização de um acordo internacional com as restantes potências mundiais. “A Europa tem estado sozinha nesta luta”, confirma Maria de Carvalho. “Reduzir o nuclear, apostar forte nas energias renováveis e um acordo internacional verdadeiramente eficaz” - são alguns dos ponto definidos por Heloísa Apolónia como fundamentais em termos futuros. Opinião partilhada pela eurodeputada e pela presidente do LNEG.
O gás, quatro vezes mais barato do outro lado do Atlântico do que na Europa, perpublicidade
14 | a cabra | 18 de junho de 2013 | Terça-feira
cinema
artes
“Esquecido” De Joseph Kosinski Com Tom Cruise Morgan Freeman Olga Kurylenko 2013
Oblívio
ver
crítica de MANUEL RoBIM
M
iranda July já se havia sagrado, no passado ano de 2005, um caso de estudo auspicioso com “Eu, Tu e Todos os que Conhecemos”. Pois bem, “O Futuro” veio agora mostrar que esta é, seguramente, uma das mais talentosas senhoras da escrita e realização do cinema independente. Sophie (July) e Jason (Hamish Linklater), na casa dos 30, decidem adotar Paw-Paw, um gato com uma esperança de vida de seis meses, que, se se adaptar ao casal, pode ainda prolongar-se por mais cinco anos. O hospital veterinário exige, contudo, uma espera de um mês, até que o felino res-
N
o que à relação entre profundidade e proximidade diz respeito, um filme pode e deve obter o máximo dessa equação, tanto quanto o argumento o permitir. No caso de “Oblivion”, a conta é efectuada de uma forma copiosamente oca, uma vez que no final o sentimento que fica, apesar de verdadeiro e lógico, peca pela indiferença. Joseph Kosinski, realizador de “Tron:Legacy” (2010), em parceria com os produtores de “Rise of The Planet of the Apes” (2011), traz-nos um ‘sci-fi thriller’ carregado de visuais fortes e destemidos, cenários apocalípticos originais e noções de desertificação aprumadas. No meio de tudo isto, encontramos Jack Harper (Tom Cruise), um dos últimos seres humanos que habitam a face da Terra, anos depois de um surto alienígena ter destruído a Lua e ocupado o planeta. O trabalho de Jack é simples: um pouco como Wall-E, ele está encarregado
gatado recupere totalmente da sua pata esquerda e possa ser levado para casa. July empurra-nos, assim, para uma estranha forma de introspeção pela vida do casal, quando estes se apercebem de que Paw-Paw pode condicionar as suas vidas para sempre e só têm um mês para ser livres e descobrir o sentido das suas vidas. Sophie desiste de ensinar dança a crianças e aventura-se no desafio do YouTube “30 Days, 30 Dances”. Por sua vez, Jason larga o trabalho de técnico informático a partir de casa e torna-se ativista ambiental, por impulso. Este mês de autodescoberta só vem, porém, intensificar o
sentimento de que, enquanto casal, o seu relacionamento persiste apenas por mera e ingénua comodidade. Afinal, contrariamente ao que diz a sabedoria popular, antes mal acompanhado do que só. “O Futuro” é uma espécie de murro no estômago; um retrato de uma sociedade pré-niilista que não sabe nem tem muito por que viver. Prima pela sua estranheza, consegue ser bizarro, até, e é altamente imprevisível. Mas desafia o espetador e a sua sensibilidade de uma forma rara, como já poucos o fazem. É isso que o torna especial. tiago mota
de limpar destroços deixados pelos drones, assim como de os reparar caso avariem, ou sejam atacados pelos Scavs, essa malta extra-terrestre, agora mais terrestre do que os próprios humanos. Com a companhia da sua parceira de trabalho Vica (Andrea Riseborough), ambos executam as tarefas perante inquestionável liderança de uma senhora conhecida como Sally (Melissa Leo), que apenas vêem através de intercomunicador. Mas Jack lembra-se de coisas, memórias assolam a sua gaveta cerebral, deixando-o irrequieto. Imagens de uma rapariga que conheceu em tempos, não sabe de onde nem compreende quando, mas lembra-se dela. Tudo atinge um pico quando Jack, numa das suas pequenas missões, resgata uma rapariga identica à dessa mesma memória (Olga Kurylenko), correndo o risco de alterar o rumo da própria subsistência da espécie humana. O ponto forte deste filme é sem
filme
dúvida a sua premissa, a sua ideia, mas de facto tudo isto nunca chega a ser suficiente para suportar o prato principal. As possíveis influências para o realizador – “Blade Runner”, “Star Wars”, “Moon”, entre outros – são facilmente identificáveis. E isso não seria mau, se não tivessem sido tão levianamente adaptadas. Apesar de cenários e sequências interessantes, a ideia nunca chega a amadurecer o suficiente, desta forma desperdiçando actores com personagens de enorme potencial, como é também o caso de Morgan Freeman, que nunca chega a ter a preponderância necessária – ou então tem-na de uma forma ironicamente robótica. Apesar de deixar ideias interessantes no ar, esta experiência científica de Kosinski cai em seco e não faz eco. Fica na retina uma abordagem demasiado complicada e com fios soltos, que se puxados irão originar um nó ainda maior.
“
O Futuro”
De Miranda July editora
Dvd colecção fnac/ leopardo
2011 Artigo disponível na:
“O Futuro” que não o é
18 de junho de 2013 | Terça-feira | a
cabra | 15
feitas
ouvir
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Q
ler
Gancho”
uer lhe chamemos Regula, Bellini ou Tiago, existe, neste MC oriundo do Fala aí Patrão! Catujal, uma característica que disparou deliciosamente desde 2002, até aos dias de hoje: o Ego. “Gancho” não é mais do que o ego de Regula a olear a narrativa do dia a dia de um barbeiro, que cresceu a fazer ‘rap’, com a ambição de quem usa as lâminas para talhar barras de ouro. Regula já não é novo no movimento Hip-Hop: estreou-se na sua “1ª Jornada” em 2002 e foram precisos 3 anos para o “Tira-Teimas”; aproveitou para lançar os MC’s da sua zona nas mixtapes Kara Davis vol. 1 (2007) e Vol.2 (2009), tendo deixado os fãs de De ‘rap’ “tuga” a salivar por um terRegula ceiro álbum que reflectisse toda a evolução registada nas mixtapes. Editora “Gancho” é um disco de exalSuperbad Records tação do ego (egotrip), de um Regula de ‘flow’ maduro a relatar 2013 o seu quotidiano que incluem os negócios ilegais, as festas, as desilusões amorosas e as suas rivalidades. O estilo não é novo e se olhamos para o disco de 2012 de NGA como referência mais fresca da abordagem egotrip, constatamos que em “Gancho”, Don Gula vai mais longe, não se limitando a fazer colagens de “punchlines”. Tanto nos álbuns, como nas mixtapes, estivemos sempre na presença de um MC bem acompanhado. A ‘crew’ Show No Love apadrinhada em Kara Davis, Xeg ou mesmo o inevitável Sam The Kid, mantêm a sua residência neste disco, revelando a importância dos amigos para Regula, como é exemplo “Rosas”, numa homenagem aos malogrados Mascarenhas, GQ e Snake. A produção mostra um pouco da viragem de Regula na sua sonoridade. Os instrumentais são quase na sua totalidade electrónicos, minimalistas e com notória influência do “Dirty South” americano, embora e curiosamente, o único instrumental produzido por um americano (Andrew Dalton) para o tema “Casanova”, tenha um estilo vincadamente Dancehall. Conta também com Sam The Kid, DJ Ride no ‘scratch’ e a revelação Holly-Hood a confirmar o seu talento também nos instrumentais. “Gancho” é a cara de Regula, é tudo o que tínhamos ouvido anteriormente com mais agressividade, mais confiança e a ocupar um espaço no ‘rap’ “tuga” que só tinha um gerente. Fala aí patrão! carlos brAz
A evocação da essência
De Agustina Bessa-Luís Editora Guimarães (Babel) 2012
jogar
N O triunfo do banal
guerra das cabras A evitar Fraco Podia ser pior Vale a pena A Cabra aconselha A Cabra d’Ouro
Artigos disponíveis na:
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e Agustina Bessa-Luís, uns dizem ser uma autora séria e difícil. Outros dizem que a sua escrita soa como algo de barroco, complicado. Cividade é um exemplo condensado e representativo das características singulares do tempo, espaço e personagens na obra de Agustina, categorias estas que se unem para a criação de um imaginário único que remonta à realidade rural portuguesa no início do século XX, na qual a obra da autora está absolutamente radicada. Por isto, Cividade é também um bom princípio para se iniciar a leitura de Agustina e contrariar preconceitos fáceis. Esta pequena novela de 76 páginas remonta ao início da carreira da maior escritora portuguesa viva. Cividade – que quer dizer «cidade» ou «citânia» - data de 1951, sendo uma das suas primeiras obras, caracterizada por essa evocação embrionária das origens da própria autora. No entanto, a publicação aconteceu apenas no final de 2012. O título da obra refere-se a um monumento localizado nos arredores de Vila do Conde, perto de onde Agustina terá passado os seus verões enquanto criança. A acção decorre maioritariamente na aldeia de Corvos, tomando a quinta abandonada que a escritora lembra da infância o nome de Solar dos Cavaleiros. Este é também o espaço em que cresce a protagonista, Rita, de onde sai para estudar mas ao qual retorna por falta
Plataforma Disponíveis Xbox360 e PS3 Editora Warner Bros 2013
“
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Cividade”
de talento. O sítio que abandona para casar mas ao qual, velha e viúva, regressa, nunca deixando de sonhar e efabular aquilo que havia deixado na aldeia de Corvos, que representa, para uma mulher a quem nunca foi permitido ter nada, aquilo que é verdadeiramente seu: a terra e a infância. Com a morte do marido opressor, Rita visita a velha tia Braselisa. A caminho de casa da tia, Rita lembra a infância passada no mosto da pobreza dura da qual foge, no Portugal rural representado pela agricultura e, no imaginário de Agustina, pelas mulheres fortes que marcam as suas histórias. O ponto forte de Cividade é, como na restante obra de Agustina, a tradução em palavras do mais singular pensamento de cada personagem, do mais pequeno traço de personalidade, da intenção unicamente retratada, com a mestria incomparável da autora. Num certo sentido, evocar a Cividade é também trazer à lembrança a fundação da cidade e da civilização; e fazê-lo - na literatura, em especial – é sempre evocar também o seu maior feito, a língua, e o que há de mais embrionário no Homem. Só que, para Agustina, evocar o mais embrionário parece ser evocar esse mundo brutal e maravilhoso, nostalgicamente quase perdido, da ruralidade portuguesa, com todo o manancial de interpretação humana que ele pode oferecer – e que mais nenhum pode. Inês Amado da Silva
Injustice: Gods Among Us - Xbox 360”
ão se trata de reacender a velha discussão entre a devoção à DC Comics e o amor pela Marvel (até porque, convenhamos, um milionário vestido de morcego ou um extraterrestre com uns ‘colants’ azuis estão a anos luz dos recursos meta-narrativos de Deadpool ou da construção das personagens de X-Men). Mas é isto que “Injustice: Gods Among Us” deixa bem claro, a incapacidade da Warner Bros superar ou até mesmo acompanhar o passo da inovação dos diferentes títulos da Marvel. Obra dos NetherRealm Studios, os criadores da recente saga de “Mortal Kombat”, “Injustice: GAU” é o que promete ser: um jogo de luta. Nem mais, nem menos. Um verdadeiro produto pronto a figurar em qualquer arcada de salão de jogos. A perpetuação do velho modelo do frente, murro, murro, pontapé e, de quando em quando, um ou outro bloqueio (que, refira-se, se tornou bem mais complicado neste esquema de jogabilidade). Pelo meio, qualquer derivação ou acção original – o velho hadouken, portanto – continua legada a combinações complexas de teclas, que mais que se patentear como um grande perigo à integridade física do nosso adversário, representam um teste à nossa capacidade de memorização e reacção. A grande premissa do modo ‘single-
player’, a história que pretende colar todos os momentos de luta e gerar uma componente diegética no jogo resulta numa narrativa tosca e inconsistente, onde, perante o assassínio de Lois Lane, o Super-Homem tenta criar uma nova ordem mundial para combater o mal. Encontra resistência num grupo insurgente, criado pelo Batman. Algo completamente diferente dos episódios da “Guerra Civil”, da Marvel (...). É, de resto, desta variedade de capítulos que vão surgindo os diferentes personagens jogáveis – que ainda são bastantes –, onde, para lá das personagens óbvias, figuram um Nightwing, uma Harley Quinn ou até mesmo um Sinestro. É, porém (admirem-se!) Aquaman que mais surpreende na possibilidade de jogabilidade e na fluidez de movimentos. Os cenários também estão lá todos, a entrada do Daily Planet, os vários pisos da Batcave ou uma Atlantis pronta a ruir, e onde a interacção com os objectos garante possibilidades de exponenciar a experiência de jogo, a impolidez de detalhas mal acabados está lá sempre para nos recordar a evidência da bidimensionalidade do jogo. Resumindo, “Injustice: GAU” é mais um jogo de luta, mas um sucesso em todas as festas... joão miranda
16 | a cabra |
18 de junho de 2013 | Terça-feira
soltas Fluxo controlado
critic’arte
uma ideia para o ensino superior
pelo ideal
O Teatro da Cerca de São Bernardo recebe a Circolando, na sua última apresentação - para já - da peça “Areia”. A companhia que comummente atua com um alargado circuito de colaboradores, traz-nos uma interpretação quase singular. O intérprete e diretor artístico, André Braga, vive num areal. Ele é consumido e consome a areia que o rodeia. Numa área que se pode coordenar através de cinco pontos fulcrais, distinguidos em três: pelas construções de areia, similares a miniaturas de rochas sedimentares de zonas áridas como o Grand Canyon, outro por uma cadeira com pouco de pernas e outro pela posição do músico Tó Trips (do grupo musical Dead Combo), com uma caixa quadrada a seus pés. Da guitarra parte o andamento, da cadeira parte o movimento. O espaço pertence a uma consciência na qual a palavra é nula tanto quanto a apatia. O seu senhor é a ideia e a areia. Repartida em três capítulos finalizados por um epílogo, que estabelece (a)normalidade. O capítulo principia-se com o auxílio do vídeo, um nevoeiro noturno que estabelece a libertação dessa consciência própria. O ator debate-se com a areia, tanto quanto a quer, como exaspera tanto quanto o tem. Há uma sequência de explosões emocionais, que vão dar lugar à nova. A semente da ideia é a luz desareada in vitro. Entre o apegar e desapegar da formulada, sem ela, pelo balançar do pêndulo, se vê que o homem sem ideia não é mais do que a sua própria sombra. Ao reemergir apropriado pelas suas mãos revestidas em vermelho, o êxtase da novidade rapidamente se perde, quebrando o cerne e devolvendo-o à areia, mostrando a ciclicidade. A sonoridade criada por Trips, que controla as emoções do criador-escravo, ajuda a perpetuar as da audiência. Por Maria João Gomes
Carlos Camponez • Professor da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra Repensar a ideia de autonomia
R
d.r.
ecordo, sentado na minha secretária do Diário de Lisboa, um editor e um jornalista que se digladiavam, entre argumentos a roçarem as vias de facto, porque o primeiro pedira ao segundo para lhe «vender melhor» a sua proposta de reportagem. O jornalista sentiu-se chocado, adiantando que não tinha de vender coisa nenhuma e que o único juízo editorial aceitável era aferir do interesse público da sua proposta. Na altura, os empresários começavam a fazer passar nas redações a ideia que os meios de comunicação social eram um negócio e, como tal, teriam de ser geridos como as outras empresas. Quando olho para trás, não posso deixar de ver a altercação entre aqueles dois jornalistas, ocorrida nos finais dos anos 80, como um prenúncio do que viria a transformar-se na autonomia dos jornalistas e, por consequência, do que se está a passar hoje nas Universidades. Entre o estatuto social dos jornalistas e dos professores universitários não deixo de encontrar alguns paralelismos. Ambos partilham de um espaço de liberdade, de
d.r.
19 29 a
JUN
“Cândido – ou o optimismo” OMT •
Teatro
vários horários
18
4€
JUN
“Palombella Rossa” Cinema AMSCaV • 21h30 1€ C/ Descontos
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22
JUN
JUN
Noite de Fados Música MSCaV • 17h00 10€
Monodeer Aqui
Música
• 23h30 Entrada Livre
base tango
investigação e de pensamento, assente em valores de responsabilidade e função social de referência para as sociedades contemporâneas. Jornalistas e professores fundam nesses valores a sua autonomia profissional e, por isso, veem-se, cada um à sua maneira, como uma elite, muito embora sejam assalariados como o comum dos trabalhadores. Porém, basta olhar para o encurtamento do espaço de investigação, para a submissão dessa investigação a uma racionalidade instrumental, para a sobrevalorização da sua ligação às empresas e a objetivos de utilidade e operacionalidade; basta olhar para os ‘rankings’ e para os critérios que os determinam, para as crescentes tarefas de gestão a desempenhar pelos docentes, para a necessidade de construir currículos talhados para responder às solicitações de formação profissional e de empregabilidade; talvez isto baste para percebermos o quanto as Universidades não só têm vindo a estar submetidas aos ditames do mercado como se estão a transformar nisso mesmo: mercado. Sempre considerei que as análises sobre o Novo Capitalismo, o Capitalismo Imaterial e o capital do conhecimento descuraram os efeitos sobre a autonomia daquelas profissões que, supostamente, deveriam estar mais protegidas, nomeadamente as ligadas ao conhecimento à comunicação e à informação. O que se está a passar hoje no jornalismo e nas Universidades parece dar-me razão. Por certo que a defesa da autonomia e da liberdade dos jornalistas, como também agora dos docentes universitários, foi invocada muitas vezes em nome de corporativismos ultrapassa-
24 28 a
JUN
“Workshop de Férias - Expressão Dramática”
1
JUL
JUN
Música FNAC • 17h00 Entrada Livre
cultura por
Workshop OMT Vários horários • 30€
30 Ultraleve
dos e de interesses serôdios que nada tinham a ver com os valores sociais de referência que lhe davam sentido. Mas não é menos verdade que as críticas a esses corporativismos escondem interesses que mais não visam do que desarticular algumas das instituições que mais contribuíram para a construção das sociedades contemporâneas. Não vale a pena retomar a discussão sobre as implicações que esta mercadorização do saber e do conhecimento terá para as Universidades e, em particular, para as Letras e as Ciências Sociais e Humanas. Mas, talvez, mais do que lamentarmos a liberdade e a autonomia perdidas, nos tenhamos de concentrar em repensar nos fundamentos dessa autonomia e nas razões dessa perda. Este parece-me ser o debate mais urgente e, paradoxalmente, ausente da Universidade. Não vale a pena pensar em autonomia enquanto deixarmos que sejam apenas outros a dizer quem somos e a definir o que seremos; enquanto não dissermos o quanto estamos dispostos a bater-nos por ela, pela Universidade e pela ideia de sociedade a que aspiramos. E ainda, a universidade deveria promover a realização de seminários/ workshops direcionados para estes investigadores, que permitem desenvolver e alargar as suas competências e competitividade: escrita de projetos de investigação ganhadores, apresentações orais de sucesso, comunicação com o público e com os ‘media’, oportunidades e desenvolvimento de ‘networking’, propriedade intelectual, inovação, etc. Em conclusão, uma maior integração e participação destes dois elementos da comunidade universitária contribuirá para uma Universidade mais eficaz, mais jovem, e melhor.
“Os Nossos Filhos” Cinema TAGV • 21h30 4€ C/Descontos
3 6 a
JUL
“Arruinados I” Teatro Colégio da Trindade 20h00 • Entrada Livre
cá
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“As Férias de Sr.Hulot” Cinema AMSCaV • 21h30 1€ C/Descontos
8 JUL
“Noutro País” Cinema TAGV • 21h30 4€ C/Descontos
Por Joana Guimarães e Daniel Alves da Silva
18 de junho de 2013 | Terça-feira | a
cabra | 17
soltas
Sem pensar
micro-conto
Por Luiz Ruffato Para M.R.
B
atiam à porta? Padre Manuel acordou assustado, consultou o despertador, uma e meia da manhã. Apurou os ouvidos e do fundo do corredor vieram novas pancadas, pum-pum-pum. Então, levantou-se, ainda zonzo, vestiu a calça jeans, colocou a camisa amassada jogada sobre a cadeira e, não encontrando os chinelos de dedo, caminhou os pés descalços pelo cimento grosso. Havia dois anos instalara-se naquela comunidade pobre em Cariacica, na periferia da Grande Vitória. Formara-se no seminário redentorista da Igreja da Glória, em Juiz de Fora, e em seguida fez o mestrado em Teologia, em Petrópolis, escrevendo uma dissertação, bastante elogiada, sobre práticas evangélicas no mundo contemporâneo. Mas estava insatisfeito. Queria mergulhar na vida, ajudar o próximo. Queria compartilhar suas vivências de caçula de uma família enorme, criado solto feito bicho, mas salvo pela fé em uma sociedade mais justa, alicerçada em sólidos valores cristãos. No percurso, alguns passos apenas entre a cama desconfortável, que ocupava metade do minúsculo quarto da casa paroquial, e a porta da frente, padre Manuel tentou adivinhar quem estaria buscando sua assistência àquela hora da madrugada. Provavelmente alguém que necessitava de uma extrema-unção, embora raras as demandas por esse sacramento, agora os doentes morriam em hospitais, longe dos parentes. Cada vez mais as pessoas, escravas do egoísmo, renunciavam à experiência da dor provocada pela
ausência do ente querido, como se, agindo assim, livrassem-se do luto, momento reservado à reflexão sobre nossa própria finitude. Deschaveou a porta e a brisa fresca roçou seu rosto exausto, serpenteando pelo cômodo abafado e quente, constituído por poltrona e sofá de três lugares, napa amarela exibindo enormes rasgos. No lado de fora entreviu dois homens, protegidos pela semiescuridão da rua, as lâmpadas dos postes destroçadas por mãos vândalas. Pensou em acender a luz da sala, mas a voz fina do mais baixo, Padre Manuel?, ateou um arrepio que perpassando todo seu corpo imobilizou-lhe o braço, Sim, em que posso ajudá-lo?, a respiração sôfrega. Vou direto ao ponto, disse, enquanto o colega permanecia ao seu lado estático, longínquo, qua-
Luiz Ruffato 52 anos Natural de Minas Gerais, Luiz Fernando Ruffato é um escritor de referência na literatura contemporânea brasileira. Nasceu em 1961. Formou-se em Jornalismo, mas antes de exercer o ofício de jornalista e assessor de imprensa, trabalhou como vendedor de pipocas, operário têxtil e torneiro mecânico. Em 1998, “Histórias de Remorsos e Rancores”, primeiro livro do autor, lançou-o no mundo da literatura. A sua obra é composta por romances, ensaios, contos e poesia. Luiz Ruffato considera que atingiu o ponto mais alto da sua carreira aquando a edição de “Eles eram muitos cavalos”, em 2001. O romance foi premiado pela APCAAssociação Paulista de Críticos de Arte –e pela Fundação Biblioteca Nacional, com o prémio Machado de Assis. Contou com oito edições “standard” e duas edições “de bolso”. Foi ainda traduzido para francês, italiano, espanhol e português (de Portugal). O autor de “Estive em Lisboa e lembrei de você” (2009), garante que adora Portugal e que tem grandes amigos no país. Daniela Gonçalves
Por Bacharel Jorge Gabriel
M
matei um padre, fiquei chateado de ter de pegar esse serviço, mas devo uns favores aí... Então, de coração, com a maior boa vontade, queria pedir uma coisa... Pega umas mudas de roupa, a gente espera, leva o senhor pra rodoviária em Vitória, põe num ônibus pra bem longe, e acabou... Eu perco a empreitada, mas fico em paz com minha consciência... O padre mirou o mais alto, que mantinha-se calado, olhos mergulhados na treva. O outro retomou, Ele não concorda não, mas é meu parceiro, já quebrei muito galho dele, então chegamos a um acerto. Mas não temos muito tempo. Se o senhor não fizer o que estou falando, infelizmente fico sem escolha. Então, padre Manuel, afastando-se da porta, deixou o corpo arriar sobre o sofá estragado. ilustração por joão pedro fonseca
entre a arregaça e o calhabé uitos há que em Coimbra encontrarão a pessoa que se tornará cônjuge, até que a morte nos separe, ouvir-se-á nos votos, também não exageremos, dir-se-á em surdina, acrescentado-se, num sussurro, não é preciso tanto dramatismo. Pelos declives acidentados da Lusa Atenas florescerão sentimentos, a maior parte deles, contudo, não tão etéreos como os que descritos pela bem-intecionada perenidade das juras. Serão os tais mais efémeros, decerto, coisas da espuma dos dias, da espuma das noites, amores intensos e fugazes, adubados por outras espumas e pelo próximo ‘kalash’. Por outro lado, há quem veja em Coimbra um espécie de lugar mágico, de aura romântica adensada, sob a égide da capa negra e dos acordes chorosos do fado. Ainda há nela quem veja o local de amores de perdição, baptizados pelas lágrimas que dariam o
se alheio. Nós fomos contratados para matar o senhor. Padre Manuel sentiu as pernas bambearem e a cabeça zonzeou. Me matar?, indagou, tentando não demonstrar pânico. O senhor está incomodando com esse negócio de denunciar traficante, delatar policial... Faço apenas meu trabalho, gaguejou, e o suor começou a minar em seu sovaco, sua testa, seus pés. Sinceramente, não me interessa a opinião do senhor. Eu não penso, me pagam, eu executo. Padre Manuel levou a mão ao bolso da camisa procurando o maço de cigarros, gesto inconsciente pois abandonara o vicio há mais de cinco anos. O homem continuou: Me mandaram matar o senhor, aqui estou. Mas veja o meu lado. Minha mãe é católica, de ir à missa todo domingo, põe aqueles véus na cabeça, confessa, comunga... Nunca
seu nome a quintas, serão tais sortudos os afilhados de Pedro e Inês. Não é como se Coimbra, rica como só ela nessas mariquices, não tenha espaço para tais episódios de paixão assolapada. Mas existem por estas mesmas ruelas episódios mais vistosos do que a discreta rotina de dois mais-que-tudos. Os meandros do amor supérfluo, ou de engate, dir-se-ia, em linguagem corrente e de decoro duvidoso, são por demais berrantes e complexos. Talvez porque o terreno onde tal modalidade se pratica é pantanoso e acidentado, no qual os cumes da vitória vivem lado a lado com os buracos da humilhação. Entre nós, meros mortais, vivem mestres na arte de gerir tão sensíveis topografias, homens e mulheres dotados da mais profunda sapiência relativa à doutrina do olha-desolha-olha-fixa-desolha-olha-o-resto-fica-à-imaginação-do-caro-leitor. Por esta cidade, como todas as
Desculpem lá, mas este fim-de-semana vi “O Amor Acontece” d.r.
outras, mestres e aprendizes vão tentando a sua sorte, aperfeiçoando a sua técnica, pincelando de base as bochechas, respirando nuvens de pó de arroz. Salpicando-se com a sua melhor água de colónia, disparando aerossóis para as axilas, quando não para outras partes. Enquanto isso, as
pedras continuam vermelhas, tingidas pelo sangue de Inês, e a fonte dos amores ainda brota, conta a lenda, pelas lágrimas que chorou. Enquanto isso, também a voz do Zeca ainda ecoa pelas ruas infestadas de patchóli, oh Coimbra do Mondego, dos amores que ele cá teve, e que outros
tiveram e terão. Talvez Coimbra seja uma moeda de inspiração cardio-metafórica e por aqui convivam estas duas facetas, uma polida e brilhante, a outra enferrujada e obscura. Talvez por aqui andemos, atirando moedas ao ar, sem saber o que encontraremos na próxima esquina, se nos quedaremos inebriados de patchóli ou encadeados pelo reflexo das águas da fonte. Talvez estas coisas do coração não sejam assim tão simples, possivelmente não serão, uma moeda nunca foi boa metáfora para nada, quanto mais para coisas tão complexas. Talvez seja tudo diferente e não tenhamos de escolher entre o cinismo da obscuridade e a fé absurda no cliché. E quiçá as moedas tenham mais de dois lados, vá-se lá saber. Quiçá, quiçá, quiçá. *Por escolha do autor este texto não segue as regras do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
18 | a cabra | 18 de junho de 2013 | Terça-feira
opinião
Cartas à Diretora Da obrigação de respondere SARA ROCHA*
“
Fico espantada com a ligeireza com que são feitas tais declarações, tão desprovidas de interesse genuíno em conhecer as verdadeiras causas dos problemas dos estudantes
Peço a palavra. Permitam-me a solenidade de evocar palavras quentes da história de Coimbra, os dias de hoje assim o pedem, e porque urge reabilitar o valor do acto de respondere. Lidas as declarações feitas acerca da qualidade da alimentação dos Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra (SASUC) na edição passada d’A Cabra, fui interpelada, não pela necessidade de reagir, mas pela obrigação de responder. Fiquei a saber que os representantes dos estudantes fizeram um grande esforço de diagnóstico: apalpação do pulso estudantil via Facebook. Não conheço a amostra, mas a conclusão é rematada por “motivos pessoais” dos estudantes. Já para a administração dos SASUC, as filas são, afinal, imputáveis à fraca memória dos “fula-
nos”. Falei no inquérito a outros: ninguém ouviu falar em tal consulta, mas toda a gente tinha uma palavra a dizer sobre o assunto. Tratam-nos como bichos, alguém me disse. Bichos. Entretanto lá batutei umas interjeições com os braços, seguidas da gravidade de quem dá conta que o que leu é para ser levado a sério. Perguntam-me como ainda me surpreendo. Não posso habituar-me, tenho de prevenir-me contra a amargura do cinismo e a dormência do “vai-se andando”. Fico honestamente espantada com a ligeireza com que são feitas tais declarações, tão desprovidas de interesse genuíno em conhecer as verdadeiras causas dos problemas quotidianos dos estudantes que mais directamente dependem do trabalho dos SASUC.
Gradualmente têm fechado cantinas, aumentaram os preços das refeições e residências, e foi-se naturalizando o uso da resposta “sabe como é, as coisas não estão fáceis, não nos deixam facilitar”. Sei, sei como é. Por isso mesmo, não aceito essa resposta. E ainda gostava que me explicassem como é isso de “facilitar” um direito. Desconheço. Mais que a privação material e as provações que daí decorrem, o que dói é a dimensão da ausência do reconhecimento humano, a experiência dilacerante da igualdade traída. Retomo a solenidade: a nossa dignidade obriga-nos a proclamar bem alto uma alternativa de solidariedade: ou há universidade para todos ou não há para ninguém. Ou somos todos gente ou então, a cada um de nós, resta-nos aceitar sermos
bichos. Aí, remanesce o atestado de invalidez precoce para a felicidade, pois que decidimos, afinal, aspirar apenas à manutenção do escorrer dos dias, aceitando em sofrimentos mudos perder, a cada dia, um pouco mais de dignidade, coisa que é, simplesmente, fazer uso da nossa capacidade em responder, da nossa liberdade.
*Por escolha do autor este texto não segue as regras do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. *estudante não bolseira da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra e habitante numa residência dos Serviços de Accção Social da UC
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18 de junho de 2013 | Terça-feira | a
cabra | 19
opinião
José Saramago: “tudo isto pode ser contado doutra maneira” Ana Paula Arnaut*
Em Manual de Pintura e Caligrafia, 1977, lemos que “Escrever não é outra tentativa de destruição mas antes a tentativa de reconstruir tudo pelo lado de dentro, medindo e pesando todas as engrenagens, as rodas dentadas, aferindo os eixos milimetricamente, examinando o oscilar silencioso das molas e a vibração rítmica das moléculas no interior dos aços”. É, justamente, nesta tentativa de reconstruir tudo pelo lado de dentro que José Saramago manifesta o seu génio literário. Abandonando o registo sintático canónico e usando uma linguagem e um ritmo próprios da narração oral, acompanhados de constantes exercícios metaficcionais, o escritor não desvenda apenas o modo como (se) constrói o romance. A grande preocupação é, também e essencialmente, (tentar) descobrir “o que é isto de ser-se um ser humano”, como confessa em entrevista à Revista Bravo, em 1999. Não se estranha, por conseguinte, que toda a ficção saramaguiana se paute por uma ideologia intensa, já notória nas crónicas e em alguns poemas. Não raro, pois, de modo diverso mas sempre fascinante, José Saramago conduz o leitor a reflexões sobre a parcialidade do modo como o passado histórico (laico e religioso) tem vindo a ser transmitido ou sobre a forma como os mais elementares direitos humanos são constantemente violados. Através do diálogo entre diversas fontes, José Saramago constrói esse outro diálogo,
entre História e ficção, porque, afinal, como escreve em Levantado do Chão, “tudo isto pode ser contado doutra maneira” (p. 14). Nesta outra maneira, o poder do Homem supera hereticamente o poder divino e o valor do herói anónimo supera o valor daqueles a quem a História concedeu honras de primeiro plano. Assim, nos universos saramaguianos, os credores da admiração e do respeito do narrador são sempre as figuras marginais à História, ou, em termos mais gerais, os pobres e os desfavorecidos. Em última instância, o que autor e narrador nunca esquecem é que “faltando os homens, o mundo pára”, porque, afinal, é a sua vontade que “segura as estrelas” (Memorial do Convento, pp. 66, 124).
*Por escolha do autor este texto não segue as regras do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. *Centro de Literatura Portuguesa/Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
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Nesta tentativa de reconstruir tudo pelo lado de dentro que José Saramago manifesta o seu génio literário
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Editorial Mais vale tarde do que nunca E eis que chega o final do ano letivo – época de exames à parte. É a “época baixa” do movimento associativo, fecha-se a loja mais cedo e começa-se já a fazer o balanço. Mas o ano não acaba sem antes se realizar mais um Encontro Nacional de Direções Associativas (ENDA). Neste último fim-de-semana, destaca-se da discussão, que teve lugar em Vila Real, a marcação de uma manifestação de cariz nacional, em resposta a um silêncio constante da parte da tutela. Houve ainda espaço para o assunto da atualização da propina, que está já decidido na Universidade de Coimbra. Olhando para o que foram as ações reivindicativas deste ano por Coimbra – e talvez um pouco por todo o país – chegou-se à conclusão de que a tentativa de agendamento
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àquilo que era o chamado Estado-providência e, mais diretamente, ao bolso dos nossos pais. Para além disso, fecharam-se cantinas e negaram-se bolsas. Porque é que as direções associativas do país só se aperceberam agora que a paciência esgotou? É que a nossa já acabou há algum tempo. Mas ainda bem que a epifania aconteceu, porque assim podem começar a planear o calendário reivindicativo do próximo ano letivo. Em setembro teremos manifestação nacional (finalmente), onde os estudantes de todo o país estarão reunidos. Já se viu que a política dos comunicados e das petições não leva a lado nenhum (as últimas ações saídas de reunião em ENDA), ainda por cima, quase todas levadas a cabo
Porque é que as direções associativas do país só se aperceberam agora que a paciência esgotou? É que a nossa já acabou há algum tempo
de reuniões, vulgo “ações de gabinete”, são ineficazes. Os dirigentes associativos dizem ter encontrado “eco num Secretário de Estado mudo, cego e insensível para com o movimento associativo”. É verdade, na medida em que este governo iniciou o mandato, pouco ou nada se destacou ou apareceu, para responder perante aqueles de direito – os estudantes, representados pelas suas associações (bem ou mal). Outra das conclusões tardias foi a de uma paciência extenuada. Já há muito tempo que a comunidade estudantil alerta os dirigentes associativos para esse facto. Em 2012/2013 presenciou-se o agravamendo das desistências no ensino superior, acompanhado de um ataque brutal
numa altura em que o Orçamento do Estado de 2013 já fazia aplicar profundos cortes nas Instituições de Ensino Superior. Depois de uma uma petição contra o regulamento de atribuição de bolsas, uma parca comemoração de uma data como o Dia do Estudante, a 24 de março, leitura de (mais) um comunicado -, e uma declaração de princípios sobre o desemprego, eis que se fez luz e se pensou em agir de forma a que a tutela ouça as vontades dos estudantes. Tentou-se chegar à fala pelos meios mais cordiais e burocráticos. Não deu resultado. O passo que se deveria ter tomado logo de seguida era o de uma ação reivindicativa forte, consistente e que reunisse em si o movimento estudantil nacional. Por Ana Duarte
Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA Depósito Legal nº183245/02 Registo ICS nº116759 Diretora Ana Duarte Editora-Executiva Ana Morais Editores Rafaela Carvalho (Fotografia), Liliana Cunha (Ensino Superior), Daniel Alves da Silva (Cultura), João Valadão (Cidade), Carolina Varela (Ciência & Tecnologia), António Cardoso (País & Mundo) Paginação Catarina Carvalho, Rafaela Carvalho Redação Ana Francisco, Daniela Proença, Ian Ezerin, João Martins, Joel Saraiva, Pedro Martins Colaborou nesta edição Daniela Gonçalves, Joana Guimarães, Juliana Pereira, Maria João Gomes, Rita Abreu, Sónia Mendes Fotografia Ana Morais, Camilo Soldado, Catarina Carvalho, Daniel Alves da Silva, Rafaela Carvalho Ilustração Andreia Prata, Carolina Campos, João Pedro Fonseca Colaboradores permanentes António Matos Silva, Bruno Cabral, Camila Borges, Camilo Soldado, Carlos Braz, Catarina Gomes, Fábio Rodrigues, Filipe Furtado, Inês Amado da Silva, Inês Balreira, João Gaspar, João Miranda, João Ribeiro, João Terêncio, José Miguel Pereira, José Miguel Silva, Luís Luzio, Manuel Robim, Rui Craveirinha, Tiago Mota Publicidade Ana Duarte - 239828096/239410437 Impressão FIG - Indústrias Gráficas, S.A.; Telefone. 239 499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: fig@fig.pt Tiragem 4000 exemplares Produção Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra Propriedade Associação Académica de Coimbra Agradecimentos Reitoria da Universidade de Coimbra, Carlos Camponez, Luiz Ruffato
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Secção Experimental de Yoga (SEY)
Promover a filosofia do bem-estar e desenvolvimento pessoal aceitando a diferença, através do envolvimento do trabalho do corpo e do espírito, é o mote da SEY. Atualmente com 60 inscritos, a evolução tem-se notado pelo número de presenças nas sessões de meditação. Há 30 anos no seio da Associação Académica de Coimbra (AAC), a secção tem promovido o enraizamento desta prática milenar na cidade e na academia. Numa AAC que se prima pela tradição, a SEY inova pelo seu cariz filosófico e que muitos julgam esotérico, através da oferta a toda a comunidade de uns minutos de relaxamento e meditação, em dias cada vez mais agitados. A.M. PÁG. 6
DG/AAC
Por muito que a DG/AAC afirme que os limitadores de som no Parque da Canção foram colocados pela Câmara Municipal de Coimbra e tenha havido monitorização dos mesmos, a queda do brasão não é indiferente a ninguém. Celeste Amaro estava certa quando atribuiu a causa ao som excessivo da Latada. Sete meses depois prova-se que o exagero dos sintetizadores dos DJ faz mossa no monumento e na “saúde pública” de quem reside à volta. Ricardo Morgado diz que não percebe do assunto, nem “de pedras nem de monumentos”. Só quer que as Festas académicas continuem. Se não cair mais nada entretanto ficam todos bem. L.C. PÁG. 5
Nuno Crato
Anunciar as medidas mais gravosas na pasta da Educação, no final do ano letivo, foi sem sombra de dúvida uma estratégia “quase” inteligente definida pelo Ministério. Os anúncios de despedimentos e o aumento da carga horária, a esta altura do campeonato remetiam para um impedimento reativo, por parte dos docentes, condicionado pelas avaliações e pelos exames, que os atiravam contra os pais e os estudantes. Felizmente, os tribunais deram direito a quem o devia, e os professores puderam vir para a rua lutar contra um dos maiores ataques dos últimos anos à Escola Pública. Enfim, sucessivos “erros cratos”. A.C. PÁG. 12
Uma eternidade de ouro por Claudia Carvalho Silva
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Dos céus cinzentos, destaca-se o ouro. Destaca-se a garra, a luta persistente. E é no cenário escuro que sobressai o poder de sonhar. Não há como desistir dos sonhos quando o panorama enegrece e quando daí surge o antídoto para os nocivos dias que correm. Já diziam que “um sonho sonhado junto é realidade” e é quando os sonhos de mudança se tornam partilhados que deixam de ser meras dimensões inatingíveis, feitos de matéria suave, frágeis linhas douradas de pensamento, delicados fragmentos da nossa imaginação para se tornarem em algo capaz de bradar aos céus e fazer as nuvens tempestuosas dispersarem. Mas o silêncio é de ouro. Áureo, tal como a estátua que vive silenciosamente o seu destino imortalizado. E a escolha é de cada um de nós: agarrar-se ao pesadelo ou deixar o sonho brilhar alto.