DISTRICT 9 GAFANHOTOS NA TERRA
MÚSICA EDITORAS
PRAXE DOIS MUNDOS
Como sobrevivem as A primeira longa metragem de Neill Blomkamp rompe pequenas discográficas de com a estagnação da ficção científica, numa narrativa em que os extra-terrestres ficam presos em Joanesburgo Coimbra
Perspectivas diferentes que convivem na cidade dos estudantes
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a cabra
7 de Outubro de 2009 Ano XIX N.º 202 Quinzenal gratuito Director João Ribeiro Editores-executivos Vasco Batista Catarina Domingos
Jornal Universitário de Coimbra
Jorge Serrote admite levar AAC para manifestação Associações académicas favoráveis à acção conjunta reúnem em breve Após a reprovação da proposta para uma manifestação no último Encontro Nacional de Direcções Associativas (ENDA), o presidente da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC), Jorge Serrote, mantém a intenção de sair para a rua. Em breve, a AAC vai reunir com as associações aca-
démicas que se mostraram favoráveis à iniciativa de luta, a fim de planear uma acção concertada. Na impossibilidade de um entendimento, Serrote não afasta a hipótese da académica seguir sozinha. No entanto, este cenário será colocado em cima da mesa apenas numa futura Assembleia Magna.
Estudantes reúnem-se em Assembleia Magna na próxima semana
MARIA EDUARDA ELOY
A campanha de informação para Junho, decidida no ENDA de Maio, não foi realizada devido a “uma falta de acordo entre as académicas”, explica Serrote. Contudo, o dirigente adianta que as questões do financiamento e da acção social serão prioritárias nas próximas campanhas. 5
Últimos quatro anos Balanço no ensino superior Com o fim de mais uma legislatura, relembram-se os momentos de reforma no ensino superior, como a adopção do Processo de Bolonha e o nascimento de uma nova lei de autonomia. A acção social e o financiamento são igualmente analisados. Num ciclo de grandes mudanças, a efectividade da movimentação estudantil também é equacionada.
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José Miguel Araújo
“Queremos ser competitivos” A equipa sénior feminina do Olivais Coimbra teve este fim-desemana os seus primeiros jogos oficiais. O técnico José Miguel Araújo perspectiva a nova temporada, lembrando que as olivanenses estão a atravessar uma fase de reestruturação. O treinador está satisfeito com o plantel que tem à disposição e descarta a pressão de repetir a prestação europeia da época passada.
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Autárquicas
Independentes crescem
INDÚSTRIA EM COIMBRA De um passado próspero aos encerramentos e faltas de apoio 11
No próximo domingo, são 33 os movimentos independentes que se apresentam a eleições. A CABRA foi conhecer três dessas candidaturas, saber o que motiva os candidatos e quais os principais problemas que têm de enfrentar.
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acabra.net PUBLICIDADE
2 | a cabra | 7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira
DESTAQUE
O retrato de quatro reformas no ensino
Na altura em que se assinala o fim de mais uma legislatura e se perspectivam os anos que se seguem, A CABRA recupera as principais mudanças e políticas do ensino superior. Textos de Catarina Domingos e João Ribeiro e ilustração por Lídia Diniz
E
m Março de 2005, Mariano Gago assumia a pasta da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Pela frente estavam quatro anos de grandes reformas no panorama nacional. Aos desafios da acção social, das políticas de financiamento para as instituições de ensino superior, juntava-se o repto da adopção do Processo de Bolonha e da reforma das leis de autonomia. O presidente da direcção do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup), Gonçalo Xufre, destaca “a implementação de forma eficaz do Processo de Bolonha e a dinamização do ensino superior numa fase crítica em termos da procura por parte dos alunos que se candidatavam” como
os principais tópicos de preocupação. O ano lectivo de 2006/2007 começou com a aplicação de Bolonha a dois cursos da Universidade de Coimbra (UC): Psicologia e Engenharia Informática. A adopção estendeu-se a todos os cursos no ano seguinte. No entender do presidente da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC), Jorge Serrote, “não foi dado o devido tempo às instituições para fazer uma adaptação correcta do que tinha sido assinado, o que fez com que houvesse transformações muito bruscas em prejuízo dos estudantes”. Desde o início considerado o “processo da discórdia”, Bolonha tinha como principal pressuposto unifor-
mizar o sistema de ensino superior europeu. As alterações mais visíveis foram a redução generalizada da duração dos cursos, a contabilização das disciplinas pelo Sistema Europeu de Transferência e Acumulação de Créditos (ECTS, na sigla original) e um modelo de avaliação que pressupunha a participação activa do estudante. “Portugal conseguiu cumprir com três anos de antecipação o prazo legalmente estipulado”, começa por lembrar Gonçalo Xufre. No entanto, o responsável realça que “o processo ainda está longe dos seus objectivos mais nobres”. A impossibilidade de haver avaliação contínua, por falta de condições humanas e materiais, as
O ministro decidiu adoptar a ciência como ‘filha’ e o ensino superior como ‘enteado’” Gonçalo Xufre, presidente da direcção do SNESup
sobreposições de aulas e o desfasamento entre a valorização da antiga licenciatura e a obtenção do primeiro ciclo são as críticas mais apontadas. Neste sentido, para o vice-presidente do Comité Director do Ensino Superior e Investigação do Conselho da Europa, Virgílio Soares, “o Processo de Bolonha, que deveria estar concluído em 2010, só agora vai começar a ser realmente aplicado, apesar das declarações de auto-satisfação a nível europeu”.
Mudanças na lei da autonomia Outra das grandes reestruturações data de Junho de 2007, quando o governo aprovou o novo Regime Jurí-
dico para as Instituições de Ensino Superior (RJIES), que previa a existência de universidades fora da administração do Estado. Esta reforma na lei da autonomia prevê a possibilidade de as universidades passarem a fundações de direito privado, com a realização de contratos plurianuais, em oposição ao financiamento regular das instituições públicas. Para manter esses contratos-programa, as fundações comprometem-se a atingir metas orçamentais. Na opinião do presidente da direcção do SNESup, o RJIES constitui uma forma de o Estado aligeirar as responsabilidades financeiras. Gonçalo Xufre alerta ainda para a possibilidade de privatização. “Esse risco existe quando observa-
Não são aceitáveis políticas que coloquem as instituições à beira de ataques de nervos” Virgílio Soares, vice-presidente do Comité Director do Ensino Superior e Investigação do Conselho da Europa
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DESTAQUE A voz dos estudantes nos quatro anos da legislatura
o anos de o superior
CATARINA DOMINGOS
onde estavam representados, não lhes era tirada [representatividade] nesta proporção”, sublinha.
Financiamento como “problema crónico”
mos a forma como as fundações foram apresentadas e criadas”, explica. Para assegurar os objectivos orçamentais do regime fundacional, as universidades terão que canalizar fundos provenientes de propinas, serviços administrativos, projectos e outras receitas não consignadas, o que aumenta os custos dos estudantes. Quanto à propina, Xufre nota que o valor praticado “seria aceitável se estivesse efectivamente a ser utilizado para um reforço do investimento na qualidade pedagógica e não para pagar um pouco de tudo”. Ao nível do funcionamento dos órgãos de gestão, o novo regime trouxe a criação do Conselho Geral que substitui o Senado nas funções deliberativas. A composição deste novo órgão prevê a presença de dez elementos externos (pessoas de relevo na sociedade civil e com ligação à universidade e região), cinco estudantes, dois funcionários e 18 docentes. Uma das maiores críticas está ligada à perda de representatividade estudan-
til, que passou de 21 assentos no antigo Senado para cinco no novo órgão deliberativo. A participação dos estudantes “foi relegada para segundo plano o que representa um completo desrespeito”, critica Jorge Serrote. “Não posso compactuar quando elementos externos, especialmente num órgão deliberativo, têm o dobro de
A participação dos estudantes “foi relegada para segundo plano” presença dos estudantes”, acrescenta. O membro do Conselho Geral da UC, Luís Rodrigues, concorda com as críticas do presidente da DG/AAC, mas faz uma chamada de atenção para as responsabilidades dos estudantes. “Se os estudantes estivessem mesmo agarrados a todos os órgãos,
O RJIES foi um dos maiores ataques, foi retroceder décadas e décadas de história” Jorge Serrote, presidente da DG/AAC
No final de 2007 e início de 2008, cinco universidades públicas (Trásos-Montes e Alto Douro, Évora, Algarve, Açores e Madeira) eram dadas como estando em situação de falência técnica. “Este cenário foi provocado por uma política de desinvestimento no ensino superior e por uma estratégia de asfixia financeira por parte do ministério”, acusa Gonçalo Xufre. Já Virgílio Soares coloca a tónica no “problema crónico das regras de financiamento”. “Há situações em que uma maior racionalização é claramente possível, desde que o governo esteja aberto a colaborar nas soluções”, concretiza. No que diz respeito à acção social, Luís Rodrigues fala de falta de atribuição de verbas da parte da tutela para explicar os problemas que os serviços atravessam. “Enquanto houve um aumento de valências, não se registou um aumento de receitas da parte do Estado para as suportar”, sustenta o estudante de Farmácia. Em relação às bolsas de estudo, o presidente da Federação Académica do Porto, Ricardo Rocha, destaca o atraso nos pagamentos como o maior problema. Desde Outubro de 2007 que foi instituído o sistema de empréstimos bancários a estudantes para financiar os estudos, havendo um prazo de reembolso entre seis a dez anos após a conclusão do curso. “É um sistema que não deve crescer muito e não deve ser um substituto da acção social escolar”, entende Ricardo Rocha. Já o presidente da DG/AAC receia que esta seja uma modalidade que “vem dificultar a vida dos jovens mais tarde”. Recentemente, o Presidente da República promulgou o Estatuto da Carreira Docente Universitário, que
exige a obtenção do grau de doutor para aceder à carreira e que prevê um modelo de avaliação de professores. Este documento causou grande contestação, sobretudo junto dos docentes dos institutos politécnicos que fizeram greve aos exames no Verão deste ano. Para o presidente do Conselho Directivo e Científico da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UC, João Gabriel Silva, o texto é “claramente um passo positivo” e só peca por não ser mais “revolucionário”. O docente adianta que a sua faculdade já praticava algumas medidas de contratação, ainda antes da entrada em vigor do diploma.
Os próximos quatro anos Desde 2002, na altura do governo de Durão Barroso, as pastas da ciência e do ensino superior estão agrupadas no mesmo ministério. Quanto às vantagens desta agregação, João Gabriel Silva acredita que a junção “faz sentido, porque as universidades são por excelência o sítio onde mais investigação se faz”. No entanto, adverte que “este governo teve energia a favor da ciência, tirando meios às universidades e causando grandes dificuldades”. Para os próximos quatro anos, Gonçalo Xufre realça a necessidade de “recuperar Bolonha, que está a ser uma oportunidade perdida, e implementar um processo de avaliação de todo o sistema de ensino superior”. A reformulação do financiamento do ensino superior, a aposta na agência de avaliação e acreditação das universidades e a colaboração das entidades empregadoras são, para Virgílio Soares, as grandes metas a atingir. Contactado, o ministério remeteu todas as questões colocadas para o relatório “Ciência, Tecnologia, Sociedade da Informação e Ensino Superior - Principais medidas e resultados: 2005-2009”, sem prestar declarações. Com Diana Craveiro
Houve erros que confundiram o Processo de Bolonha” João Gabriel Silva, presidente do Conselho Directivo e Científico da FCTUC
O período do governo PS ficou marcado por momentos de contestação vinda dos vários quadrantes sociais. Professores, enfermeiros, polícias, militares, agricultores, entre outros não se fizeram de rogados na hora de sair à rua. Para o ensino superior, os estudantes foram abandonando a luta de rua para adoptar outras medidas para se fazer ouvir junto da tutela. No entender do presidente da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC), Jorge Serrote, “foram feitas algumas iniciativas”, acrescentando que “se poderia ter caminhado para algo mais nacional e esse caminho deveria ter sido uma aposta mais forte”. Para o dirigente associativo, essa aposta não aconteceu, “porque há diversas opiniões e visões de ensino superior”. O responsável defende que “as direcções-gerais foram cumprindo o seu papel”. “Há sempre questões que são próprias de época, momentos em que não é possível levar a cabo as iniciativas”, sustenta. Também o presidente da Federação Académica do Porto (FAP) recusa a ideia de que os estudantes não se fizeram ouvir nestes quatros anos, lembrando a tendência para a via dialogante. “O movimento associativo acabou por enveredar por uma via de diálogo contíguo, por uma via de entrega de proposta de alteração, discutindo directamente com os órgãos de gestão”, entende Ricardo Rocha. Sem as acções de protesto, o presidente da FAP acredita que “outras formas são igualmente eficazes”. Estas opiniões não são partilhadas pelo presidente da direcção do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup), Gonçalo Xufre, que classifica a movimentação estudantil como “apagada”. “Ao observar o que se passa noutros países, a forma como os nossos estudantes aceitaram a implementação de uma reforma tão profunda o Processo de Bolonha mostra que a acção estudantil está ‘anestesiada’”. No mesmo sentido, o estudante membro do Conselho Geral da Universidade de Coimbra, Luís Rodrigues, fala num movimento associativo “insuficiente”. No caso particular da AAC, o estudante de Farmácia defende que a acção estudantil em Coimbra foi a “menos má no aspecto nacional”.
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ENSINO SUPERIOR FÓRUM AAC 2009
Estudantes debatem ensino superior O futuro da academia e as formas de diálogo com o governo estiveram em análise no último fim-de-semana, em Aljubarrota
quando a nova legislatura começar, a solução vai passar por “falar com todos os partidos políticos e com o governo”. Contudo, Serrote não afasta a possibilidade de partir para uma manifestação. Quanto ao afastamento do as-
sociativismo, Jorge Serrote diz que falaram de novas formas de comunicar com as pessoas para as “cativar”. O kit do caloiro, entregue a cada novo aluno durante a matrícula, foi uma das medidas apontadas pelo presidente para SÓNIA FERNANDES
DIANA CRAVEIRO Na oitava edição do Fórum AAC (Associação Académica de Coimbra), a acção social, os programas de mobilidade estudantil, o afastamento do associativismo, o futuro da academia e os desafios do ensino superior para a nova legislatura foram os painéis debatidos. Dos três dias de análise, o presidente da Direcção-Geral da AAC (DG/AAC), Jorge Serrote, salienta a reflexão e o debate que envolveram dirigentes de núcleos de estudantes, direcção-geral, representantes de pedagógicos e directivos e ainda secções desportivas e culturais. Uma das questões discutidas que mais afecta directamente os estudantes foi a Acção Social Escolar. O presidente da DG/AAC conta que foram analisadas as propostas apresentadas na Assembleia da República: “quais seriam positivas, ou não, e quais seriam mais fáceis de implementar”. A conclusão é que a situação é negativa e que há “medidas que não resolvem o problema”. Com o sub-financiamento do ensino superior, o presidente da direcção-geral explica que,
contornar o afastamento dos estudantes e para “despertar uma consciência” mais activa pelo associativismo. No painel do futuro da academia, o presidente do Núcleo de Estudantes de Direito da AAC , André Costa, diz que foi pensada a existência, ou não, de “supernúcleos”, já que “há um grande número de núcleos, o que pode levar a que a informação se disperse muito”. A solução apontada passa pelo aumento da importância que é dada ao Conselho InterNúcleos, para “reforçar o seu papel e reunir mais vezes”, acrescenta André Costa. O presidente da direcção-geral revela que no Fórum AAC 2009 foram também equacionadas mudanças no funcionamento da Assembleia Magna (AM). A solução passa pela possibilidade de a AM se passar a realizar “ao fim da tarde, já que a hora parece ser uma questão negativa e esta poderia ser uma forma de tornar uma magna mais participativa”. Novo governo, novas medidas? Um dos pontos que também mereceu atenção no Fórum AAC, foram os desafios do ensino superior na próxima legislatura. O presidente da académica de Coimbra relembra a entrega de um caderno reinvindicativo ao primeiro-ministro e candidato pelo Partido Socialista às eleições legislativas, José Sócrates, e à cabeça de lista do Partido Social Democrata para as mesmas eleições, Manuela Ferreira Leite. O documento fala dos maiores problemas e desafios do
superior e apresenta algumas propostas. Jorge Serrote explica que consultaram “todos os programas eleitorais dos vários partidos políticos” e tentaram perceber de que forma é que as propostas do caderno foram “registadas”. O representante do estudantes no Conselho Geral da Universidade de Coimbra, João Oliveira, destaca neste ponto as formas encontradas para uma melhor abordagem ao poder político. Oliveira conta que havia várias opiniões mas que não se chegou a uma conclusão final. Em debate esteve “uma abordagem mais incisiva junto dos partidos e uma melhor forma de transmitir a mensagem estudantil a nível comunicacional”. Já a presidente do Núcleo de Estudantes de Economia da AAC, Mariana Pratas, destaca a análise das propostas apresentadas pelo Bloco de Esquerda nas legislativas, que incluíam “propostas de estágios de verão e alargamento do horário de funcionamento das faculdades, para um período nocturno”. O Fórum AAC ficou ainda marcado por alguns problemas que ditaram o seu final prematuro, o que impossibilitou a apresentação das conclusões finais. O presidente da direcção-geral revela que houve “algumas pessoas que causaram distúrbios no local onde foi realizado o fórum”, de que são exemplo “alguns danos em mobílias”. Embora os culpados ainda não tenham sido identificados, Jorge Serrote garantiu que “não foi ninguém ligado à DG/AAC” mas que os prejuízos vão ser pagos pelos responsáveis.
Nova comissão para analisar prescrições na UC SARA SÃO MIGUEL
Estudantes podem ver o seu caso solucionado através de um requerimento enviado ao reitor. “Casos mais graves” vão passar por novo grupo JOÃO MIRANDA Seis anos após a aplicação do regime de prescrições na Universidade de Coimbra (UC), ainda não existe uma solução definitiva para os estudantes que incorram na possibilidade de ter que abandonar os estudos. Este ano, tal como nos últimos dois, a hipótese colocada aos alunos passa por remeter um requerimento ao gabinete da Rei-
toria da UC, que analisará cada caso concreto e que deverá encontrar a solução que melhor se aplique - o que pode passar por inscrição em regime de tempo parcial, realização de cadeiras individualmente, entre outras. A novidade passa pela criação de uma comissão que junta o reitor da UC, o presidente da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC) e o novo Provedor do Estudante. “Este grupo vai apenas servir para analisar os casos mais graves”, explica o presidente da DG/AAC, Jorge Serrote, que admite que ainda não surgiu nenhum requerimento que exigisse a atenção da comissão. Segundo Serrote,cerca de 100 casos já foram solucionados pela reitoria, através do requerimento que pode ser levantado na secretaria da AAC.
Para o próximo ano, ainda não existe nenhum modelo de procedimento definido, mas a vice-reitora da UC, Cristina Robalo Cordeiro, admite que, “tal como neste ano, vai existir uma tentativa de cumprir a lei”. Por seu lado, Jorge Serrote avança que a DG/AAC vai interpelar o novo ministro do ensino superior “no sentido de demonstrar a posição dos estudantes relativamente às prescrições, que é a de estarem contra”. Em vigor desde 2004, ano de aprovação da lei, o regime impede um aluno que não obtenha um certo número de créditos concretizadas por ano, de se inscrever pelo período de dois semestres consecutivos. Embora contactado, não foi possível até ao fecho desta edição obter uma reacção por parte do reitor da UC, Seabra Santos.
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ENSINO SUPERIOR
AAC vai reunir com académicas para possível manifestação SÓNIA FERNANDES
Se do encontro agendado com as outras associações não sair uma proposta de luta, Jorge Serrote remete decisão para a Assembleia Magna JOÃO MIRANDA CLÁUDIA TEIXEIRA A acção conjunta entre académicas aprovada no penúltimo Encontro Nacional de Direcções Associativas (ENDA), em Maio, acabou reprovada no último encontro, nos passados dias 11, 12 e 13 de Setembro. A proposta de uma manifestação nacional, que partiu da Assembleia Magna da Associação Académica de Coimbra (AAC), conseguiu a aprovação na reunião geral das académicas no final do ano lectivo passado. Contudo, um ponto da moção, que se referia à necessidade de voltar a reflectir a acção num encontro posterior, foi, segundo Jorge Serrote, o “refúgio” das várias académicas que chumbaram a acção. Para o presidente da Direcção-Geral da AAC (DG/AAC), também a pouca adesão das académicas ao período de votação do encontro de direcções associativas serviu para que a proposta fosse reprovada. Independentemente da reprovação da proposta em ENDA, Serrote pondera ir avante com a acção de luta, junto das associa-
OS ESTUDANTES terão a última palavra em Assembleia Magna caso as restantes académicas rejeitem a manifestação ções favoráveis: “ estou a contactar as académicas e, provavelmente, a reunião será na próxima semana”. Sobre o cenário possível da AAC avançar sozinha para a iniciativa de luta, Jorge Serrote admite não ter uma opinião formada e remete toda a decisão para uma futura Assembleia Magna: “já fizemos muitas iniciativas sozinhos. Tudo depende da vontade dos estudantes da associação académica”. A decisão passa também, na opinião do presidente da DG/AAC, por concertar a inicia-
tiva com o “timing certo”. Em cima da mesa está a tomada de posse do novo governo. Campanha nacional de informação não se realizou Também no ENDA de Maio foi deliberada a realização de uma campanha de informação a nível nacional sobre questões como o financiamento do ensino superior, Acção Social Escolar ou o Processo de Bolonha, com início agendado para a época de exames de Junho e para o arranque do ano lectivo. Acção essa que não se
realizou. “Ficou tudo pendente do acordo entre todas as associações académicas e foi isso que entravou a campanha”, justifica o presidente da direcção-geral. Jorge Serrote explica que o futuro da acção de informação passará por desenvolver as principais preocupações da AAC, visto que no seu entender, “há questões como o financiamento e a Acção Social Escolar que são preocupações da académica de Coimbra, mas que não são de todas as associações”.
Assembleia Magna na próxima semana Os estudantes da Universidade de Coimbra reúnem-se em Assembleia Magna na próxima quarta-feira, 14. De acordo com o presidente da DG/AAC, Jorge Serrote, “vai haver duas magnas: uma para discutir os Estatutos da AAC e outra para a discussão do ensino superior”. “Ainda vamos decidir qual a ordem de trabalhos da magna da próxima semana”, conclui.
Programa Almeida Garrett promove a mobilidade interna Estudar em Coimbra e fazer um período de estudos numa das restantes 13 universidades portuguesas é agora uma realidade LÍDIA PARALTA GOMES Vá para fora, cá dentro. Graças ao Programa Almeida Garrett qualquer aluno do ensino superior público universitário pode trocar de estabelecimento de ensino por um semestre, numa iniciativa que abarca ainda estágios e trabalhos ou projectos de final de curso. Neste primeiro ano, a Universidade de Coimbra (UC) apenas vai receber e enviar estudantes ao
abrigo do programa no 2º semestre. “Este é o ano piloto, as decisões foram tomadas bastante tarde e não dava tempo para tudo funcionar bem”, explica Ana Isabel Ferreira, uma das responsáveis pelo projecto. “Se abríssemos logo as candidaturas, com certeza teríamos problemas”, justifica. Para efectuar a mobilidade exige-se que os alunos estejam matriculados pelo menos no 2º ano e já tenham efectuado um mínimo de 60 ECTS. O Programa Almeida Garrett permite uma mobilidade apenas com a duração de seis meses e não serão atribuídas bolsas. No entanto, Ana Isabel Ferreira sublinha que “os estudantes têm apoio dos Serviços de Acção Social da UC (SASUC) no alojamento”. A responsável pelo ‘outgoing’ da Divisão de Relações Internacionais, Imagem e Comu-
nicação (DRIIC) dá uma possível razão para a inexistência de bolsas. “Por exemplo, um aluno natural do Porto vem estudar para Coimbra e faz Almeida Garrett no Porto”, neste caso pressupõe-se que não haja custos de alojamento.
Um projecto ainda em construção Até ao momento apenas seis estudantes da UC se inscreveram para o programa. Em sentido contrário, a universidade vai receber três alunos. Como a iniciativa ainda está numa fase embrionária, a responsável pela entrada de alunos Almeida Garrett, da DRIIC, Teresa Silva, desdramatiza. “O programa foi lançado recentemente, portanto, sinceramente, não esperava mais candidaturas. Não me surpreende que neste momento só tenhamos três candidatos.”
O projecto parece interessar aos alunos, mas a informação peca por escassa: "ainda não ouvi falar do programa mas parece-me uma iniciativa interessante. Penso que falta divulgação", explica Carla Rosa, aluna do curso de Línguas Modernas da faculdade de Letras. A falta de bolsas também desmotiva os estudantes. “Se houvesse bolsa, seria muito mais apelativo para nós", é a opinião de Ana Pratas, de Bioquímica da faculdade de Ciências. As expectativas para o sucesso do programa são, portanto, olhadas a longo prazo. “Estou convencida que vai ser um tipo de mobilidade que vai ter bastante adesão”, afirma Teresa Silva, acrescentando que “até pelo aspecto económico será mais fácil para os estudantes movimentarem-se dentro do país do que even-
tualmente poderem concretizar períodos de mobilidade no estrangeiro”. A responsável acredita que a UC “vai receber muitos mais estudantes”. A data para as candidaturas terminou em Setembro, mas a DRIIC promete ser flexível e alargar os prazos, estando previstas sessões de esclarecimento para Outubro e Novembro. Para além de Coimbra, as universidades dos Açores, Aveiro, Algarve, Beira Interior, Évora, Lisboa, Nova de Lisboa, Técnica de Lisboa, Madeira, Porto, Trás-osMontes e Alto Douro, Minho e o ISCTE juntaram-se para a concretização deste projecto. O Almeida Garrett segue os mesmos moldes do Programa Erasmus, mas, num âmbito nacional, à semelhança do Programa SITUE, implementado em Espanha em 2000.
6 | a cabra | 7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira
CULTURA cultura por
cá
7 OUT
Por um punhado de discos Em tempos de crise na indústria discográfica mundial, três editoras de Coimbra lidam com inúmeros problemas, mas não cruzam os braços. Por Rafaela Carvalho LEANDRO ROLIM
“ADEUS, ATÉ AMANHÔ DE ANTÓNIO ESCUDEIRO FNAC • 21H Entrada Livre
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PRIMEIROS TRABALHOS de alguns dos mais conhecidos nomes do panorama musical português lançados pela Lux Records e pela Rewind Music
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VI EXPOSIÇÃO DE ESPANTALHOS Praça do Comércio 10H • 17H30
17 OUT
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Por Jonathan Costa
Longe dos grandes estúdios, artilhados com a última tecnologia da produção musical, sobrevivem as pequenas editoras. Realizando um trabalho quase artesanal e com meios reduzidos, estas empresas caseiras atravessam vários problemas, mas os projectos não param. Enfermeiro de profissão, Rui Ferreira juntou-se em 1996 a António Cunha e José Pinheiro, para dar forma à Lux Records. Começaram por editar a compilação “RUC: 10 Anos Sempre no Ar” e o álbum “Loudcloud” de António Olaio & João Taborda. Pouco tempo depois, António Cunha e José Pinheiro retiram-se da Lux, deixando-a a cargo de Rui Ferreira. As edições cessaram até 1998, altura em que foi lançado “FossaNova” dos Belle Chase Hotel em parceria com a NorteSul. Ao longo dos anos, muitos dos nomes mais conhecidos da música portuguesa receberam o carimbo Lux antes de se unirem às grandes editoras nacionais. Este abandono é algo que não preocupa Rui Ferreira que vê a Lux como “uma rampa de lançamento” para os artistas e por isso mesmo não assina contratos. Homem de ideias fortes, Rui Ferreira rejeita veementemente formatos de áudio como o MP3, por falta de qualidade e de valor histórico. “Acho que é uma falta de respeito completa pelos músicos”, assim como para com os técnicos envolvidos, critica. Rui Ferreira considera que actualmente não é difícil encontrar artistas para editar e que muitos lhe
mandam contactos e maquetas, no entanto não abdica dos concertos como forma de saber o que as bandas realmente valem. É da opinião que “os discos enganam muito” e alerta para os “truques” de edição: “é fácil melhorar CDs com software e, ao vivo, o artista pode acabar por ser muito mau”. Porém, nem todos são da mesma opinião. “Actualmente já ninguém vai assistir a concertos e a descoberta de outros músicos é fácil com a Internet”, assegura João Silva, fundador da Rewind Music, que admite usar o MySpace como forma de conhecimento de novos artistas. A Rewind apareceu, em 2007, como resposta à necessidade de algumas pequenas bandas editarem elas próprias os seus trabalhos. “Tínhamos que criar uma estrutura para sermos independentes”, justifica João Silva, que também integra o grupo conimbricense A Jigsaw. Contudo, nos últimos dois anos, a Rewind tem-se dedicado à divulgação de artistas internacionais em Portugal através da associação com editoras estrangeiras. A editora tem vindo a manter uma equipa de trabalho consistente que lhe permite ter a última palavra nas decisões tomadas. Um outro conceito, que começa a ganhar força, são as “netlabels”, editoras que operam exclusivamente na Internet. A Mimi Records de Fernando Ferreira é um exemplo de sucesso. Integrada na comunidade ClubOtaku, que promove o intercâmbio cultural entre o Japão e Portugal, a Mimi foi criada em 2003, precisamente para divulgar
a música destes dois países. Fernando Ferreira considera o intercâmbio como uma experiência engraçada que gera interessantes amizades culturais. O processo de edição é feito unicamente no computador portátil. Os artistas enviam maquetas que são seleccionadas por Fernando Ferreira, conforme o gosto e as opiniões de amigos, para depois remasterizar e disponibilizar online e gratuitamente. Apesar de controverso, este sistema de edição não preocupa os artistas. "Não vêem como música oferecida, mas sim como divulgação", esclarece o fundador da Mimi. Esporadicamente são editadas, em conjuntos de 100 CDs, compilações comemorativas que são postas à venda em concertos e eventos culturais. É o único lucro que a editora tem e não serve como sustento mas sim como uma forma de ganhar ânimo. A liberdade da Mimi passa também por não haver contratos, permitindo que um álbum seja editado por várias editoras em simultâneo. Altos e baixos Embora, como diz João Silva, "Coimbra tenha a vantagem de ter uma comunidade académica enorme", por norma “receptiva a eventos culturais", as três editoras concordam quanto aos problemas com que se deparam. A falta de espaços para concertos com boas condições técnicas, em zonas centrais da cidade é o principal problema. “As pessoas não se deslocam da Praça da República”,
lamenta Rui Ferreira. Queixas da falta de apoio da autarquia às empresas editoriais são também um tema comum. Rui Ferreira nota que “o teatro, o cinema, a música clássica e o jazz têm subsídios”, enquanto a música que comercializa é posta de lado. No entanto, o descontentamento não reside apenas em factores relacionados com a cidade. Uma das situações que mais lamentam é o desinteresse dos meios de comunicação, em especial a rádio, que rejeita à partida tudo o que não é comercial e da imprensa cultural, que não vai além de Lisboa e do Porto. Apesar de tudo, Rui Ferreira, João Silva e Fernando Ferreira acreditam que a produção cultural tem vindo a aumentar em quantidade e qualidade. Rui Ferreira chega a criticar o excesso, mostrando que Portugal não tem capacidade para editar mais de 260 discos por ano e acredita ser “preciso filtrar muito melhor esses projectos”. Ainda assim o futuro mostra-se risonho para as três editoras. A próxima aposta da Lux Records vai para o lançamento dos primeiros álbuns dos Tiguana Bibles e Madame Godard. A Rewind Music, por sua vez, pretende internacionalizar-se. Para a Mimi Records, o objectivo próximo é a associação da música a outras artes e a possível criação de um canal multimédia com videoclipes dos artistas que representam. Com Filipa Magalhães e Pedro Rodrigues
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CULTURA
Deuses procuram boas almas em tempos de crise PAULO ABRANTES
Teatrão e Brecht unem-se mais uma vez, dispostos a tirar o público dos assentos para a procura do melhor fim MARIA LASTRES PEDRO LEITÃO FILIPA MAGALHÃES É a segunda incursão da companhia do “Teatrão” pela obra de Bertolt Brecht. Até 18 de Outubro, estará em palco, na Oficina Municipal de Teatro (OMT), “A Boa Alma de Setzuan”, peça encenada pela holandesa Corrina Manara. A actriz Leonor Barata explica: “não queremos que o público venha para assistir confortavelmente a um espectáculo” e por isso Brecht – exímio aniquilador das falas vazias, da boca para fora, e respeitável coreógrafo dos silêncios e dos gestos – foi a escolha. Exige-se uma consciência pela parte de quem vem assistir pois, como diz outra das actrizes da companhia de teatro, Inês Mourão, “estamos a falar de realidade e com pessoas concretas”. Na Setzuan (espaço ficcional onde decorre o drama) da OMT, não há palco, na parede defronte da plateia está uma comprida cortina de plástico límpido, que atrás esconde ora o limbo, ora a fábrica dos operários. A peça principia com o vendedor de águas, Wang, que desliza por todo o espaço, de bicicleta, a anunciar a vinda dos deuses, “só eu sabia que vínheis”. Logo aparecem três entes divinos (a lembrar as três moiras da
“TRÊS MOIRAS da mitologia grega, figurantes do destino, deselegantes e adrajosas” mitologia grega, figurantes do destino) deselegantes e andrajosos, à procura de uma alma boa. Wang logo lhes explica que Setzuan encontrase em estado de penúria, não há dinheiro, e os que são bons, vestem pesadas carapaças de inveja; os deuses esclarecem que não se metem em assuntos económicos. A fuga de Shen-Té A boa alma de Setzuan revela-se, e é a modesta Shen-Té, uma prostituta que, por aceitar receber os deuses em
sua casa, é abonada por uma apetecível maquia de dinheiro. Shen-Té adquire então uma tabacaria, pronta a encaminhar a sua vida por trilhos mais humildes. No entanto, logo se vê rondada pelo ciúme dos próximos, desesperados aproveitadores, e toda a bonomia que lhe recheava a alma se vê fragilizada; instaura-se o conflito central da peça que subjuga a protagonista à dúvida maniqueísta, da aflita procura pelo terreno em que, como diz Brecht num dos seus poemas, seja possível “criar um estado de
coisas que torne possível a bondade; ou melhor: que a torne supérflua!”. A solução organizada por Shen-Té é então fazer nascer alguém novo, fragmentar-se num alter-ego, que é Shui-Tá, seu suposto primo, homem rígido e perspicaz, personagem-tipo correspondente ao novo homem do capital. É ele que salva a tabacaria dos credores e que, com a força que é a precisa para “construir impérios”, edifica em Setzuan uma fábrica capaz de empregar toda a população e terminar com a imoralidade imposta
pelos árduos tempos. Todo o dilema se adensa quando Shen-Té se apaixona pelo perspicaz aviador Yang Sun e a tabacaria finalmente fecha. A realidade que falava Inês Mourão é esta: um caótico mundo de homens transfigurados pelo medo e pela miséria. Pelos melhores ou piores caminhos, cabe ao público decidir o desfecho desta (e da sua) existência. O certo é que, como diz a protagonista “as boas almas são como os sinos, se lhes tocam, tocam, se não lhes tocam, não tocam”.
Centro, com um reportório de música tradicional do seu país de origem. No dia 17 há a projecção do filme “À beira do mar azul” do autor Boris Barnet e no dia 10 o padre Arsénio aborda o tema da religião no país transcontinental. Dia 16 é entregue à exibição de curtas-metragens de vários realizadores russos. O dia 31 fica reservado para o célebre escritor Nikolai Gogol, interpretado por Nina Guerra e Filipe Guerra. Outubro encerra-se pelas mãos do grupo “Aranhiças e Elefantes” que teatralizarão a literatura russa numa “Salada Rússia”. Para uma reprodução fiel da cultura nacional de cada mês, explica a co-organizadora do evento, “estabelecemos uma colaboração próxima com pessoas com quem iremos discutir sobre o genuíno do país”. No caso da Rússia foi o professor da Faculdade de Letras, Vladimir Pliassov,
além da colaboração permanente da Videolab, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e da própria Embaixada Russa. Graças a este projecto foram criadas aulas de conversação gratuitas. “A ideia resultou do contacto com os convidados dos vários países, propomos este projecto e eles aceitaram”, conta a co-organizadora do evento Não vão haver lições dos idiomas, mas diálogos entre os participantes. Inglês, persa, hindi e português (para estrangeiros) são as línguas que vão sendo faladas na Galeria Santa Clara desde do início deste mês. Segundo Olga Seco o balanço é positivo: “as pessoas que vêm ver o mês temático de um país acabam por vir ver os países seguintes”. O mês de Novembro será dedicado a São Tomé e Príncipe e para Dezembro, último mês temático, está programada uma selecção das melhores actividades de todo o ano.
“Um mês, um país”, a vez da Rússia Cultura, arte e gastronomia do país dos czares durante Outubro, nas Galerias de Santa Clara ANA MARIA COELHO FILIPA MAGALHÃES Desde o início do ano que o Galeria Bar de Santa Clara é mensalmente redecorado consoante as tradições dos diferentes países, programados pela iniciativa “Um mês, um país”. A co-organizadora deste périplo cultural e responsável pelas galerias, Olga Seco, confirma que Angola, Cabo Verde, Marrocos, Turquia, Cuba, Irão, Brasil, Iraque e Estónia foram países que por já lá passaram. A partir de 9 de Outubro começam as actividades dedicadas à Rússia. A ideia surge, segundo Olga Seco,
da crescente e sentida internacionalização das populações, bem patente na cidade de Coimbra: “a sociedade é cada vez mais internacional e acaba por ser natural pensar em termos multiculturais”. Acrescenta ainda a necessidade de integrar quem vem de fora: “ao fazer o mês do Irão acabámos por conhecer todos os iranianos de Coimbra”, valoriza. Todos os fins-de-semana, a partir da próxima sexta-feira, contarão com actividades que vão desde a leitura de contos, a conversas sobre temas correntes da contemporaneidade russa e sessões de cinema. O dia de estreia inicia com uma mostra da gastronomia típica, a chamada “Mesa Russa”, tendo a colaboração do único estabelecimento de produtos russos em Coimbra, o supermercado “Matriosca”. Actuam ainda no mesmo dia o duo Marina e Vladimir, pertencente à Orquestra Regional do
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DESPORTO 10 OUT
BASQUETEBOL Ginásio vs AAC 17h • Pavilhão Galamba Marques
Voleibol da AAC traça manutenção como objectivo
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FUTEBOL Académica vs Moinhos Estádio Universitário
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VOLEIBOL CV Lisboa vs Académica 17h • Pavilhão Escola Secundária Vergílio Ferreira
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ANDEBOL AAC vs Ass. 20km Almeirim 18h • Pavilhão 3 do Estádio Universitário
Máxima ambição para enfrentar a Divisão de Honra LEANDRO ROLIM
ANDRÉ FERREIRA A equipa de sénior masculina de voleibol da Associação Académica de Coimbra (AAC) inicia a participação no campeonato nacional A2 no próximo sábado, 10. A turma academista sofreu uma grande remodelação, tanto a nível técnico como a nível de jogadores. O técnico Carlos Marques, que o ano passado liderava a equipa masculina, passou este ano a treinar a turma feminina, assumindo assim um novo projecto. “Não tinha tempo para acompanhar os seniores masculinos devido aos horários de treinos que estavam programados e também porque foi o culminar de um ciclo”, refere o agora treinador da equipa feminina. Para o técnico, a sua equipa “ainda está em construção” e espera “receber mais algumas jogadoras” para conseguir “assegurar os objectivos que passam pela manutenção na liga A2”. Esta época o técnico das estudantes assume que vai ser “um campeonato difícil, pois houve equipas que se reforçaram em quantidade e qualidade”. No entender de Carlos Marques, Belenenses, Santo Tirso e Lusófona são os principais candidatos a vencer a Divisão A2. O campeonato tem início marcado para dia 18. A equipa feminina recebe o Belenenses, turma que se assume como a principal candidata ao título. A equipa sénior masculina da Académica também tem novo técnico. Miguel Margalho é agora o técnico da formação masculina, depois de, no ano passado, ter sido adjunto de Carlos Marques. Para Miguel Margalho, “o campeonato vai ser complicado, mas vai ser bem disputado e com muita competitividade”. O principal objectivo dos estudantes passa por “assegurar a manutenção”, o que significa que, de acordo com o técnico, “ficar nos oito primeiros seria o ideal”, reforçando a ideia que pretende intrometer-se na luta dos primeiros lugares. O técnico academista está satisfeito com o plantel que tem à disposição e que “dá garantias para fazer um bom campeonato”. A Académica recebeu alguns novos jogadores e também conseguiu o regresso de outros jogadores que no passado marcaram presença na equipa.
A ACADÉMICA TEM a sua estreia marcada para sábado, diante do Benfica.
O rugby da Académica entra em acção no campeonato este sábado, com a recepção ao Benfica. O objectivo é chegar à final-four MIGUEL CUSTÓDIO A equipa sénior da secção de rugby da Associação Académica de Coimbra (AAC) está de regresso ao grupo dos melhores da modalidade no plano nacional. Segundo o presidente da secção, Jaime Carvalho, esta subida de divisão “é colocar a secção no lugar de onde nunca devia ter saído e merece estar”. A ambição é grande e visível no discurso do treinador, Sérgio Franco. Segundo o técnico, “o objectivo para esta época passa por tentar ficar entre os quatro primeiros lugares e atingir a fase final com as melhores equipas que vão disputar o título”. Sérgio Franco está ciente das dificuldades que a equipa vai enfrentar, mas destaca a qualidade do plantel que “este ano está mais
equilibrado, dispõe de melhores alternativas e dá garantias de lutar pelos objectivos traçados”. A Académica conta nesta nova época com novos elementos que transitaram da formação sub-21 para o plantel principal, este facto aliado à contratação de jogadores estrangeiros que chegaram recentemente a Coimbra, torna o plantel mais alargado e com maior qualidade para enfrentar as novas exigências. O capitão de equipa, Gonçalo Neto, revela que o balneário está preparado para o desafio que se avizinha mencionando a “grande responsabilidade que é actuar a um nível completamente diferente e que exige melhores competências e maior dedicação”, assegurando que “os objectivos devem ser auspiciosos para que sejam atingidos”. Para o jogador, a Académica é um clube “hospitaleiro e que tudo faz para preparar os novos jogadores para darem cem por cento dentro de campo”, realça. Melhores condições de treino Nos últimos anos, as queixas acerca das condições de trabalho eram evidentes, mas nesta nova
época a secção de rugby conta com progressos. A equipa vai passar a ter a possibilidade de treinar e jogar no Estádio Sérgio Conceição em detrimento do campo do Estádio Universitário de Coimbra, o que, para o presidente da secção, representa “uma melhoria substancial” para a modalidade em Coimbra.
O orçamento deste ano aumentou para o dobro, adianta o presidente da secção A estrutura da secção está mais forte e Jaime Carvalho refere ainda que “o orçamento para esta época subiu para o dobro”, dando a oportunidade de contratar mais jogadores de maior qualidade. Neste momento, a equipa está numa fase avançada de pré-temporada. Para Sérgio Franco, o início de época “está a correr bem”, mostrando-se “confiante com a equipa que tem ao dispor”. O treinador academista revelou ainda que “vão chegar mais três refor-
ços, todos estrangeiros”. O técnico considera que é “importante ter estrangeiros na equipa para competir ao mais alto nível”. O desafio da equipa recém-promovida em vingar no campeonato nacional da modalidade é grande. A equipa orientada por Sérgio Franco vai ter como principal adversário o Grupo Desportivo de Direito, actual campeão nacional, que para o treinador “tem um plantel de grande categoria, com 22 jogadores internacionais, tendo alguns deles jogado nos principais campeonatos europeus no ano passado”. A prova é composta por oito equipas. A fase de apuramento joga-se a duas voltas ao longo de 14 jornadas. As formações que ficarem nos quatro primeiros lugares disputam a fase final, constituída por meias-finais e a final onde se vai apurar o campeão nacional. A última classificada da fase de apuramento é despromovida à Primeira Divisão Nacional. A Académica inicia a sua participação no campeonato este sábado, 10, ao receber o Sport Lisboa e Benfica, um jogo a disputar em Taveiro, no Estádio Sérgio Conceição.
7 de Outubro de 2009| Quarta-feira | a
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DESPORTO
JOSÉ MIGUEL ARAÚJO • TÉCNICO DA EQUIPA SÉNIOR FEMININA DE BASQUETEBOL DO OLIVAIS COIMBRA
Mais habituado a ganhar do que a perder O treinador levou a equipa feminina do Olivais à conquista do bicampeonato, da Taça de Portugal e da Supertaça. Num discurso cauteloso, José Araújo antevê dificuldades para 2009/2010 ANA MARIA COELHO
CATARINA DOMINGOS ANDRÉ FERREIRA O que pode fazer a equipa feminina do Olivais esta época, depois de ter alcançado o bicampeonato? Esta equipa está a entrar numa altura de reestruturação. Tem muitas jogadoras novas, não na equipa, mas jovens de idade. Para já o único objectivo é tornar a equipa competitiva. Se conseguirmos ser competitivos em todos os jogos estamos no caminho certo. Assume a candidatura ao título? Não. Ganhar os dois [títulos] foi muito difícil. Agora, foi assumido, por mim e pela direcção do clube, que estamos no momento de renovar a equipa. Depois de anos sem ganhar nada e depois dominar a liga durante duas épocas com quatro títulos, agora é a altura para repensar a equipa. Por isso, temos de trabalhar imenso com estas jovens jogadoras. Por um lado, queremos ser competitivos. Por outro lado, não podemos meter a responsabilidade num grupo tão jovem de fazer igual ou melhor que na época passada. Então descarta a ideia do tricampeonato? Não entramos dentro de campo para perder. Agora, é preciso estar muito claro que uma equipa tão jovem não vai ser tão consistente como o ano passado. Possivelmente, somos a equipa que maior reestruturação está a sofrer. Até ao final desta liga, o campeão é o Olivais, logo temos todo o direito de querer defender o título. Como tem corrido a preparação da equipa? Bem. O trabalho tem sido duro. As jogadoras mais jovens são as que têm sofrido mais. Foram as jogadoras que mais dificuldades tiveram para entrar nos nossos ritmos. Semana após semana estão a perceber a nossa filosofia atacante e defensiva. Estou contente com o trabalho realizado. Está satisfeito com as novas jogadoras? Na perspectiva de ir buscar jogadoras jovens que se comprometam com este projecto, de dois a quatro anos, estou contente. São jogadoras com muito potencial, embora ainda não tenham estatuto na liga, mas espero que em pouco tempo tenham esse estatuto. E as jogadoras norte-americanas? São muito jovens também. É a primeira experiência europeia. É pre-
ciso ter mais tempo para fazer uma real avaliação às jogadoras norteamericanas. As saídas da Ambrosia Anderson e Aja Parham deixam a equipa menos forte? Numa equipa portuguesa não podemos estar à espera que as jogadoras estrangeiras fiquem cá muito tempo. Que eu me lembre, na história do clube, a Aja foi a terceira jogadora que ficou cá dois anos. Normalmente, passam por cá e vão para campeonatos melhores. Ajudaramnos muito, mas chegamos a uma altura em que o nosso mercado é demasiado pequeno e as outras ligas são mais fortes. Por outro lado, acho que as duas mereciam jogar a um nível mais alto. Fico contente, porque as duas reconhecem que saíram daqui melhores jogadoras do que quando cá chegaram. Como treinador, como se sentiu quando viu a Aja Parham rumar aos EUA para jogar na liga profissional de basquetebol feminino? É sempre um motivo de orgulho. Quando ela acabou a universidade não conseguiu entrar no “draft”, foi um ano para a Alemanha e depois esteve dois anos aqui nos Olivais. É bom ver que o trabalho dela e o nosso é reconhecido. Depois de ter atingido os 16avos-de-final da Eurocup Women, como vai encarar este ano a participação europeia? Não gosto do pensamento pequenino de perder por muitos e ainda dizer que foi uma boa experiência. Perder não é bom e a perder por muitos não é boa experiência. O objectivo da participação é aproximar o nível das nossas equipas ao nível europeu. As pessoas têm de perceber que não é normal uma equipa portuguesa chegar à fase de grupos na Eurocup e ganhar três jogos, como fizemos o ano passado. Mais anormal é passar aos 16 avos. Por isso, o grande objectivo passa por ser competitivo nos jogos. Sentem a pressão de vencer os três jogos e passar à fase seguinte? Eu pessoalmente não sinto, porque estaria a pensar de forma errada. Depois estaria a condicionar a equipa para um nível de exigência que não tem obrigação nenhuma de ter, ainda para mais sendo uma equipa tão jovem. O que acha dos adversários que estão no caminho do Olivais? A equipa espanhola já participa nesta prova há muitos anos e ganhou-a há oito. Está mais do que ha-
“SOMOS A EQUIPA que maior restruturação está a sofrer”, diz José Araújo. bituada a isto. A equipa croata não conheço assim tão bem, porque a informação é menor, mas o basquete croata é muito superior ao nosso. A equipa belga foi a equipa que dominou a Eurocup, chegou aos oitavos e é uma equipa que há dois anos jogava na Euroleague, competição superior. Por isso, não vejo facilidades em lado nenhum no nosso grupo. Quem são as candidatas ao título? Ainda não vi as equipas. No grupo da frente penso que estão o CAB Madeira, o Boa Viagem, o Vagos, o Algés. Tenho de incluir também o Olivais e o Barcelos. Há alguma equipa que possa vir a surpreender? O Santo André tem um grupo de jovens interessante, mas não vi a maior parte das equipas. O que é que recorda como jogador de basquetebol e, depois, como animador de Minibasquete? [risos] Com pena minha, com 16 anos, percebi que nunca iria passar
de um jogador mediano e um treinador meu achou que eu tinha “queda” para treinar. Depois foi tudo muito confuso, porque ser um miúdo de 16 anos a dar treino a miúdos de 12 ou 13, que não é uma diferença de idades muito grande, é complicado. Com o extenso currículo como treinador, que balanço faz da sua carreira? [risos] Para já, tive oportunidade de trabalhar como adjunto com o professor Carlos Gonçalves, que foi meu treinador. Mais tarde fui adjunto do Norberto Alves, treinador da Académica, e adjunto no Lusitânia na liga profissional. Consegui trabalhar com treinadores com quem aprendi muito. Depois ao longo dos anos houve alguns títulos. É sempre bom ganhar. Penso que por onde tenho passado as equipas mostram qualidade. Sente-se um técnico ganhador? Nos últimos anos tenho sido [risos]. Estou mais habituado a ganhar do que a perder. No meio de uma carreira dedi-
cada ao basquetebol, que lugar ocupa o curso de Artes? [risos] É algo que deixa sempre as pessoas baralhadas. Havia três coisas que eu gostava de fazer: era o basquetebol, as artes plásticas e a música. Das três coisas a única que eu tive hipótese de começar a fazer foi o basquete. Porque aceitou continuar na equipa feminina do Olivais? Primeiro por uma questão de oportunidades. Dos convites que me foram propostos comparados com o desafio desta direcção, este foi o que achei mais interessante para mim. Mas recebeu convites? Sim, recebi alguns. Não aconteceram muitos, mas houve convites. Tem a ambição de treinar algum clube em Portugal ou no estrangeiro? Claro. Em Portugal, não fecho a porta a qualquer projecto que seja interessante. Gostaria muito de passar por uma experiência no estrangeiro, mas penso que qualquer treinador gostaria.
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DESPORTO PROLONGAMENTO BASQUETEBOL A equipa sénior de basquetebol da Académica teve este fim-de-semana o seu primeiro compromisso oficial. A AAC venceu o Angrabasket por 80-72, em jogo relativo à segunda jornada da zona centro/sul do Troféu António Pratas. Neste jogo, AJ Jackson esteve em destaque ao apontar 25 pontos no encontro. A estreia da turma de Norberto Alves na liga apenas acontece em Novembro.
HÓQUEI EM PATINS
Obras no pavilhão começam RAFAELA CARVALHO
VOLEIBOL A equipa sénior feminina da AAC disputou este fim-desemana um torneio de prétemporada na Lousã. Num torneio que se jogava à melhor de três “sets”, a Académica venceu o Lousã por 3-0, o Clube de Voleibol de Aveiro também por 3-0 e os juvenis da Tocha por 2-1. A estreia em jogos oficiais acontece no dia 18 de Outubro, em jogo da primeira jornada da Divisão A2.
A ASSOCIAÇÃO DE PATINAGEM de Coimbra chumbou a realização de jogos sem que o piso do Pavilhão 1 fosse reparado
O solo do pavilhão onde actuam as equipas de hóquei em patins da Académica vai ser melhorado para voltar a receber jogos CATARINA DOMINGOS
HÓQUEI EM PATINS A Académica estreou-se este fimde-semana no Campeonato Nacional da 2.ªDivisão. A turma de Miguel Vieira deslocou-se a Paços de Ferreira para jogar com a Juventude Pacense. O encontro terminou com uma vitória para a equipa caseira por 6-5. Na próxima jornada, a AAC desloca-se a Santa Maria da Feira, para defrontar o Clube Académico da Feira.
ANDEBOL Em jogo relativo à quarta jornada do Campeonato Nacional de 3.ªDivisão, a equipa sénior de andebol da Académica venceu em Viseu o Académico local por 3437. Com este resultado, a AAC soma nove pontos. Na próxima ronda, a turma de Ricardo Sousa recebe a Associação 20 km Almeirim. CATARINA DOMINGOS
As obras de requalificação do piso do Pavilhão 1 do Estádio Universitário de Coimbra já estão em marcha. Este parece ser o desfecho do problema com que se debateu a Secção de Patinagem da Associação Académica de Coimbra (AAC), depois de a Associação de Patinagem de Coimbra (APC) ter informado que os vários escalões não voltavam a jogar sem que o local sofresse reparações.
A primeira data para o início da intervenção era dia 28 de Setembro, mas houve um adiamento por razões burocráticas. “A obra ainda não tinha sido adjudicada”, explica a presidente da secção, Fátima Valente. A reabilitação do espaço tem a duração prevista de uma semana e meia e está a cargo da Fundação Cultural da Universidade de Coimbra, que gere o estádio universitário. Como solução, a secção procurou um novo terreno dentro da cidade, mas “nenhum tinha condições a nível do piso, nem tabelas”, como conta a dirigente. “Como o tempo das obras também não é muito, vamos fazer treino físico”, acrescenta Fátima Valente. No que diz respeito aos jogos, a presidente considera que está tudo “orientado”. “Trocámos as jornadas da equipa sénior masculina, que sá-
bado jogava em casa. Vamos primeiro a Santa Maria da Feira e, na segunda volta, o Clube Académico da Feira vem a Coimbra”, explica Fátima Valente. O Campeonato Nacional Feminino só tem início marcado para Novembro. Nos outros escalões, os jogos agendados acontecem fora de portas, pelo que está “tudo salvaguardado, nem que as obras se atrasem um pouco”. Estes foram os caminhos para evitar consequências mais graves como a notificação de falta de comparência, a eliminação das provas em que a Académica se encontra inscrita, as multas no valor de dois salários mínimos por jogo e a descida de divisão do escalão sénior. Este foi um início atribulado para a secção de patinagem, que agora encontra uma solução para a madeira degradada e para os buracos junto às balizas, que levaram ao chumbo da APC.
Objectivos desportivos mantêm-se “Com tudo a ser normalizado”, a secção de patinagem não mudou as metas que tem para a temporada 2009/2010. O Campeonato Nacional de 2.ª Divisão começou no passado fim-de-semana. A Académica, enquadrada na zona norte, teve o seu primeiro teste em Paços de Ferreira, diante da Juventude Pacense. No entender de Fátima Valente, os objectivos desportivos “não foram afectados pelo turbilhão das últimas semanas”. Nas provas regionais, os vários escalões “vão tentar alcançar o melhor lugar possível”. No que diz respeito à turma sénior, “o espírito é tentar vencer a maior parte dos jogos e conseguir a manutenção na segunda divisão”, como garante a dirigente. Este fim-de-semana, a AAC tem o segundo teste em Santa Maria da Feira.
Rogério Gonçalves passa por Coimbra sem vencer Rogério Gonçalves chegou a Coimbra com a exigente tarefa de suceder Domingos Paciência, sétimo classificado em 2008/2009 ANDRÉ FERREIRA A chegada a Coimbra de Rogério Gonçalves, a 18 de Junho, foi controversa desde início. O vice-presidente para o futebol profissional da Académica/Organismo Autónomo de Futebol (AAC/OAF), Jorge Alexandre, pediu a demissão por alegadamente não ter sido ouvido na
escolha do sucessor de Domingos Paciência, cabendo essa escolha ao presidente, José Eduardo Simões. O então novo técnico da Briosa, Rogério Gonçalves começou a preparar a equipa na Covilhã, local escolhido para a realização de estágio de pré-temporada. A (pré) época começou bem com a vitória no torneio da Covilhã, onde a Académica empatou com a equipa da casa e depois venceu o eterno rival, Naval 1º de Maio, por uma bola a zero. Depois os estudantes enfrentaram várias equipas, entre elas o Belenenses, tendo perdido apenas dentro de portas com o Santa Clara, por duas bolas a uma. No Torneio Cidade de Espinho, a Académica perdeu os dois jogos: primeiro com o Sporting local e de-
pois com o Rio Ave. Braga foi o primeiro adversário nas competições oficiais, num jogo em que a Briosa fez a melhor exibição, mas acabando por perder por uma bola. Nos dois jogos seguintes, Paços de Ferreira e Sporting deslocaram-se a Coimbra. Contra a equipa da capital do móvel, a Briosa empatou a uma bola e frente aos leoninos a derrota por duas bolas foi inevitável. Na jornada seguinte, a deslocação ao reduto do Olhanense marcou o início da grande manifestação. A Briosa perdeu com a recém-promovida equipa de Olhão, por duas bolas a uma e a jogar frente a nove jogadores. Rogério Gonçalves começava a ser alvo de grande contestação por parte
dos adeptos academistas que não viam êxitos na equipa. Com o empate em Vila do Conde, com o Rio Ave, o técnico não conseguia afastar a pressão em que estava mergulhado. A derrota pesada com o Marítimo não dava qualquer hipótese à direcção da Briosa que de imediato apresentou uma proposta para a rescisão do contrato. Rogério Gonçalves passou por Coimbra sem conseguir vencer em jogos oficiais e deixando a Académica no último lugar da classificação. Com estes resultados o técnico aumenta para dois anos e nove meses o tempo que está sem vencer para a liga portuguesa de futebol. O último triunfo foi a 4 de Fevereiro de 2007, quando treinava o Sporting de Braga.
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CIDADE
Mudanças no panorama industrial de Coimbra FOTOMONTAGEM POR LEANDRO ROLIM
A identidade da cidade está em transformação devido à perda de indústrias que a projectavam no país e no mundo. A Marcopolo e a Poceram são os exemplos mais recentes MARIA EDUARDA ELOY Coimbra perdeu, em 2009, mais duas das suas indústrias emblemáticas. Face à crise mundial, a Marcopolo – Indústria de Carroçarias, S.A. encerra a fábrica de Coimbra e a Poceram entra em processo de insolvência. O presidente da Câmara Municipal de Coimbra (CMC), Carlos Encarnação, afirma que “a câmara tem uma capacidade limitada de intervenção” para ajudar estas empresas, mas procura prestar apoio em situações críticas. Encarnação refere o exemplo da Marcopolo que já há oito anos pretendia encerrar a fábrica de Coimbra e que foi persuadida a não o fazer na altura. “A CMC foi um parceiro interessado na vida da Marcopolo, procurou facilitar-lhes a vida o mais possível, fez encomendas, comprou autocarros, carroçarias” e, portanto, a autarquia “ficou absolutamente surpreendida com a decisão da empresa de sair de Coimbra”, conclui. A CABRA procurou entrar em contacto com a Marcopolo, no entanto, até à data de fecho da edição não obteve resposta. Longe de serem fenómenos isolados no panorama da cidade, falências e encerramentos enquadram-se numa tendência que
SÃO CADA VEZ mais as indústrias tradicionais a desaparecer em Coimbra se prolonga há mais de 25 anos. O representante da Sociedade Central de Cervejas, Basílio Dinis, associa a extinção da Topázio, enquanto produto conimbricense, há já 17 anos, à falta de saneamento adequado às necessidades de produção. Mas admite que “não seria possível fazer o saneamento” para a fábrica, em detrimento de zonas urbanas carenciadas e que a autarquia de Manuel Machado, então presidente da CMC, se “portou extraordinariamente”. Contra as probabilidades que ditam o fim das indústrias mais tradicionais em Coimbra, há empresas que ainda persistem. A Fucoli – Somepal, S.A., a Dan Cake e a ressuscitada Ceres – Cerâmicas
Reunidas, S.A. são disso exemplos. O presidente do Conselho de Administração da Fucoli – Somepal, S.A., Álvaro Pereira, afirma que mantém a sua empresa de metalurgia em funcionamento com “apoio zero da autarquia”. Carlos Encarnação contrapõe que o melhor apoio que a autarquia pode dar à metalúrgica “é fazer as obras de saneamento”, para aumentar as vendas de produtos daquela indústria.
Novas apostas renovam a cidade O mediatismo industrial em Coimbra tem sido canalizado para o iParque, pólo de empresas ligadas às tecnologias e à saúde. São estes
os novos produtos que a cidade exporta e que vêm ao encontro do ideal do economista e docente da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC) José Reis que afirma que “o que importa é ter empresas que inovem, que possam criar emprego e que retribuam bem do ponto de vista salarial”. Contudo, para o Coordenador da União de Sindicatos de Coimbra, António Moreira, apesar de a criação de emprego ser positiva, as diferenças entre o tipo de mão-deobra da indústria tradicional e da nova indústria são tão marcadas que as novas empresas “para além de pequenas e para além de poucas não conseguem absorver a mão-deobra que está no desemprego”.
O investigador do Centro de Estudos Sociais (CES) Carlos Fortuna revela que as indústrias com mãode-obra pouco qualificada “estão a perder espaço face às empresas de serviços”, que “marcam o compasso das novas tendências da economia”. O director da Associação Comercial e Industrial de Coimbra, Paulo Mendes, confirma a opinião do investigador do CES ao afirmar que as indústrias voltadas para as novas tecnologias “são mais relevantes” e que “as outras são indústrias não competitivas no território europeu, que estão a ser desvalorizadas e localizadas em territórios onde a mão-de-obra intensiva é mais barata”. Apesar de a cidade ser conotada com comércio e serviços, fábricas como a Estaco, a Real Cerâmica, a Triunfo, as Confecções Ideal, a Fábrica da Cerveja (produtora da marca Topázio), contribuíram para definir a identidade de Coimbra. Nuns casos o encerramento e, noutros, a deslocação para regiões diferentes destas indústrias dos sectores metalúrgico, cerâmico, têxtil, de géneros alimentares, ditaram a perda de “empresas que marcaram um tempo e marcaram também uma referência da cidade no plano nacional e internacional”, como afirma o sindicalista António Moreira. Carlos Fortuna, acredita que a identidade da cidade “se está a perder”. Contudo, o sociólogo revela que “a longo prazo, o que vamos ver é uma mudança na natureza do emprego e da indústria económica”, em vez de uma lacuna, marcada por desemprego e problemas sociais. “Daqui a 25 anos”, a cidade estará a “refazer a sua identidade”, conclui. Com Alexandra Lacerda e Marta Pereira
SMTUC apostam na inovação Painéis sonoros concebidos para invisuais e horários de autocarros no telemóvel facilitam a mobilidade em Coimbra ANA MARIA COELHO Depois dos painéis informativos, que indicam o tempo de espera dos autocarros, agora os utentes invisuais vão ter painéis sonoros que disponibilizam a mesma informação. O administrador-delegado dos Serviços Municipalizados de Transportes Urbanos de Coimbra
(SMTUC), Manuel Oliveira, designa-os como uma “nova geração de painéis informativos”. É uma medida da empresa de transportes que pretende contribuir para a autonomia dos invisuais e das pessoas com acuidade visual reduzida. O sistema sonoro vai estar localizado em quatro paragens de grande movimento dentro da cidade. “Só com o funcionamento dos dispositivos é que poderemos saber se a medida é positiva”, revela a técnica de serviço social da Associação de Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO), Ana Eduarda Ribeiro. Será difícil prever os pontos fortes e fracos deste sistema de informação, dado que “nos primeiros tempos de utilização é que os utentes conseguem perceber as falhas”, acres-
centa. Segundo a técnica de serviço social, os SMTUC têm dado também formação aos motoristas, com o objectivo de os sensibilizar para as ne-
invisuais são positivas”, remata Ana Eduarda Ribeiro, considerando, contudo, que é “utópico” adaptar tudo numa sociedade de maiorias.
Painéis sonoros vão ser colocados em paragens de grande movimento
SMTUC com serviço para telemóvel Com o intuito de melhorar a vida dos utentes dos transportes públicos, foi criado o SMTUC Mobile. Através de uma aplicação instalada no telemóvel, os utilizadores podem consultar os horários dos autocarros da empresa e saber quantos minutos faltam para a linha em que pretendem viajar. O serviço está disponível para “download” gratuito no sítio dos SMTUC na Internet, desde Setembro. Até à data, tem conseguido
cessidades dos invisuais. Nas zonas de paragem, sempre que avistam uma pessoa invisual ou com limitação visual, os condutores procuram saber se ela pretende seguir naquela linha. “Todas as medidas que contribuam para a autonomia dos
“bastante adesão”, segundo o administrador-delegado dos SMTUC. Os utentes dos transportes urbanos de Coimbra, com acesso a esta aplicação, vão esperar menos tempo pelos autocarros. De futuro, os SMTUC querem implementar também uma nova forma de emissão de bilhetes, semelhante à utilizada no Porto e em Lisboa. Os novos títulos de transportes poderão ser carregados sempre que necessário, em vez dos actuais descartáveis. O processo encontra-se numa “fase de adjudicação” dependente do financiamento do Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, avança Manuel Oliveira, sem adiantar quando entrará em funcionamento. Com Maria Eduarda Eloy
12 | a cabra | 7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira
PRAXE
De capa e batina Vestem o traje académico e são unânimes quanto ao papel da praxe na integração dos caloiros. A praxe tem evoluído à luz das mutações da sociedade. Por Vasco Batista e Pedro Leitão
O
reatar do novo ano lectivo e a chegada dos novos alunos da Universidade de Coimbra (UC) resultam na intensificação do convívio entre caloiros e doutores e na própria intensificação da praxe. É altura de receber os novos estudantes e integrá-los na vida académica, em Coimbra, na faculdade, e, em última instância, numa nova realidade que se afigura irreverente. Quem vive em Coimbra não fica indiferente às manifestações de praxe que se perpetuam um pouco por toda a cidade. Uma passagem pelos jardins da Associação Académica de Coimbra (AAC) permite percepcionar de perto a forma como é vivida a praxe por uma tertúlia da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Naquele espaço, encontrámos “As Imperiais – Os Cowboys”. Um dos membros do grupo académico, João Henriques, adianta que a tertúlia “pretende integrar os caloiros na vida académica e em Coimbra através da praxe”. Além disso, revela que também se “discute política, a vida académica e o futuro da AAC” e que a tertúlia pretende ter um papel activo na integração dos caloiros que a ela pertencem. “Nota-se muito a diferença de um que é praxado e que está dentro da tertúlia para um que não está” revela Luís Amorim, outro dos elementos da tertúlia. No que concerne à função da praxe como elemento fundamental à adaptação na academia, os membros “d’As Imperiais – Os Cowboys” são unânimes e afirmam de forma decisiva que “é totalmente impossível viver-se Coimbra sem
se ser pela praxe”. “A praxe não se resume ao gozo com os caloiros. Estar de capa traçada a ouvir a serenata monumental da Queima das Fitas é praxe”, ressalvam. A integração numa nova vida é considerada o objectivo último da praxe e o que legitima a sua existência. “A praxe surgiu como um meio de integração do estudante na sua academia”, relembra o docente da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC), Amadeu Carvalho Homem. Na verdade, a integração é vista como algo subentendido quando se refere a praxe. “Não faz sentido falar em integração e praxe. A praxe é a própria integração dos caloiros”, afirma veementemente o Dux Veteranorum da UC João Luís Jesus.
Liberdade para decidir A maior parte dos alunos que ingressa na Universidade de Coimbra (UC) é proveniente de outras regiões do país. Neste âmbito, João Henriques metaforiza e considera que “os caloiros sentem a praxe como uma muleta”. “Eles olham para os mais velhos como guias que os introduzem na vida académica”. Por outro lado, os membros da tertúlia encaram a anti-praxe como uma opção que nunca é interpretada como motivo de exclusão. “Cada um tem a sua visão quanto à praxe e a solução passa por respeitar. Não é, de modo algum, uma forma de exclusão”, argumenta. No entender do Dux Veteranorum, “a maioria dos alunos que se declaram anti-praxe desconhecem a essência da praxe”. “A praxe é
muito mais do que as pessoas pensam e envolve a queima, a bênção das pastas, a latada”, relembra. Este ano, o conselho de veteranos tomou a iniciativa de oferecer a todos os caloiros um exemplar do código da praxe “para que Coimbra continue a ser o exemplo por excelência do que é tradição académica”, esclarece João Jesus.O termo praxe remonta ao ano de 1860 e pretendia reunir, no mesmo campo semântico, a panóplia dos comportamentos característicos do universo académico. Na altura, a expressão emergiu em virtude da concorrência entre a UC e as outras universidades que entretanto se fundiram em Lisboa e no Porto. Na verdade, a análise sócio-histórica denota que as tradições estudantis e, de uma forma mais abrangente, a universidade têm sido alvo de alterações nos seus conteúdos e nas suas práticas. “A universidade ao longo do tempo sofreu uma transformação bem evidente e isso também se sente no modo como a praxe tem sido entendida” destaca o docente da FLUC.
Evolução à luz da mudança Enquanto dinâmica social, a praxe tem acompanhado as mudanças da contemporaneidade, não se mantendo estanque. “Enquanto construção de uma certa identidade estudantil, a praxe
tem evoluído ao longo dos anos e tende a ser completamente alterada” antevê o investigador do Centro de Estudos Sociais (CES) da UC e especialista em movimentos estudantis, Rui Bebiano. “Cada vez menos podemos detectar um comportamento padrão entre os alunos universitários”. “A manutenção de uma certa ligação à hierarquização dos estudantes, ao predomínio de uma cultura masculina baseada numa determinada ideia de boémia é cada vez mais anacrónica”, considera Bebiano. Por outro lado, João Luís Jesus considera que a praxe tem evoluído “de acordo com a sociedade em que se insere”. “Em função dessa conexão, a evolução reflecte a falta de espírito crítico e iniciativa, de imaginação e inovação”, lamenta. Na mesma matriz de pensamento, Carvalho Homem acredita que a praxe pode também desencadear meios activos de reforçar componentes de superioridade individual. Nesse
sentido, alerta que o sentido da praxe pode ser distorcido e “em vez de se converter num meio positivo de integração, converte-se num meio negativo de opção”. As mutações verificadas podem resultar num alheamento dos estudantes à tradição e nos elementos básicos da praxe. “O próprio recurso à capa e batina tinha um significado bem diferente”. “Hoje os estudante só vestem o traje na altura das festas”, finaliza.
7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira | a
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PRAXE
Tradição sem código
RAFAELA CARVALHO
Recusam a praxe, não usam capa e batina, vivem Coimbra de uma forma que poucos conhecem. As repúblicas anti-praxe são ainda um mundo por explorar. Por João Ribeiro e Artur Romeu uem cruza a rua das Esteirinhas, na chamada “Baixa da Alta” de Coimbra, não fica indiferente a um edifício que lembra um navio. Construído no século XVI por um marinheiro, hoje alberga uma das mais antigas repúblicas de estudantes da cidade – a Prá-Kys-Tão. É hora de jantar e mais de dez pessoas, entre repúblicos (aqueles que habitam uma república) e comensais (os que apenas jantam e participam nas tertúlias), juntam-se num ambiente descontraído e animado. Nas paredes, convivem várias gerações de “prakystaneses” onde a originalidade e a irreverência deixaram a sua marca. Apesar de ser, desde 1969, uma república declaradamente anti-praxe, a memória dos tempos da capa e batina mantém-se presente em alguma decoração. Os actuais moradores da PráKys-Tão fazem parte de um grupo de estudantes que se demarca da maioria, pois rejeita tudo aquilo que a praxe pressupõe. “Como é que podes criar uma relação com alguém quando tens uma pessoa o dia todo a chamar-te besta e a não deixar que a olhem nos olhos?”, pergunta-se Ana Sofia Costa. Para quem discorda da praxe, esta não funciona como integração e aquilo que defendem é que se questione a razão de uma hierarquia baseada numa tradição que vêem como retrógrada. José Eduardo, no primeiro ano de Estudos Portugueses e Lusófonos, conta que a justificação dada por um “doutor” após uma qualquer ordem baseava-se no “respeito pelo código da praxe”. “Eu tenho personalidade; não é só porque alguém se lembrou de escrever estas coisas que eu me vou sujeitar”, defende. Muitas vezes o primeiro contacto dos novos estudantes com a vida académica passa pela praxe e esta acaba por ser uma oportunidade de se conhecerem. Catarina Alves compreende “o que é chegar sozinho a uma cidade e deixar-se socializar através da humilhação e da hierarquia, porque se tem necessidade de conhecer pessoas”. No en-
Q
tanto, “acho que as pessoas vão para a praxe sem sequer pensar no que ela simboliza”.
Uma questão de individualidade Uma crítica comum entre quem condena a praxe prende-se com o carácter normalizador da tradição. O perpetuar de ideias e atitudes identificadas com a praxe gera o receio de que a comunidade estudantil perca uma postura de crítica e de originalidade que lhe é associada. Catarina chama a atenção para “o problema de recriar continuamente os mesmos costumes, as mesmas tradições” e adverte que “o importante é que as pessoas não deixem de ser elas próprias para se tornarem uma ovelha vestida de preto”. O boneco de traje pendurado sobre a rua das Matemáticas deixa antever que não há lugar para caloiros e doutores. É aqui que se concentra um grande número de repúblicas anti-praxe, entre elas a República do Kuarenta. Sérgio Moutinho, um dos habitantes, realça aquele que, na sua opinião, é um dos grandes problemas da praxe: “uma pessoa chega aqui cheia de ideias, cheia de força, cheia de projectos, e acaba por fazer tudo que os outros fazem, a mentalidade fica bastante modelada”. A característica de arrasto da praxe reflectese no próprio movimento estudantil. “As magnas antes atraíam muito mais estudantes, o que hoje não se verifica. As pessoas não questionam as coisas”, nota Lia Antunes, também da Kuarenta. Para a maioria, a vida académica de Coimbra identifica-se com a cultura da praxe e sem ela essa vivência seria mais pobre. José Eduardo discorda: em poucas semanas, o estudante da faculdade de Letras já foi a ensaios do GEFAC (Grupo de Etnografia e Folclore da Academia de Coimbra), integrou reuniões do núcleo, assistiu a concertos e comícios. “É mais fácil perceber qual é o verdadeiro espírito académico, sentir que se faz parte da mudança, do que seguir doutores o dia todo”, conclui. O fim da praxe seria o ideal? Sér-
gio Moutinho acredita que “cada um deve ter a informação necessária para escolher”. Apesar de afastar a praxe não pretende impor a sua opção. Não muito longe da Kuarenta, há quem tenha posições mais incisivas. As habitantes da República das Marias do Loureiro orgulham-se da militância contra a praxe que praticam desde a fundação, em 1993. “Há alguns anos que distribuímos flyers, cartazes e damos informações aos novos estudantes sobre a praxe e a república”, conta uma das “Marias”. Em 2003, com o apoio da Antípodas, entretanto extinta, e da MATA (Movimento Anti-Tradição Académica), elaboraram o Manifesto Anti-Praxe que juntou cerca de 80 personalidades de diversos campos da sociedade civil. Em relação ao futuro do movimento anti-praxe, as Marias são cépticas. “Quando cheguei a Coimbra, em 1999, tinha esperanças que a praxe fosse desaparecer aos poucos; hoje só a vejo aumentar”.
CONTESTAÇÃO AO LONGO DO TEMPO Por diversas ocasiões, desde que existem registos da sua prática, a praxe (termo que na realidade só começou a ser utilizado na segunda metade do século XIX) sofreu fortes contestações que levaram mesmo à sua suspensão. O historiador Miguel Cardina refere que, no século XVIII, “D. João V suspendeu algumas práticas rituais após investidas mortais a novatos”, alvo de críticas de intelectuais. Já no século XX, por duas ocasiões, a praxe foi proibida na Universidade de Coimbra. Após a implantação da República, em 1910, estas práticas foram interrompidas durante nove anos. A crise académica de 1969 potenciou a última proibição da praxe resultante, segundo Cardina, da “renovação política, cultural e moral” da altura. Em 1979, a praxe volta a ser instituída.
A PRÁ-KYS-TÃO é uma das repúblicas mais antigas de Coimbra
14 | a cabra | 7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira
PAÍS & MUNDO ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS 2009
Os desafios de ser independente Nestas eleições autárquicas, são 33 os movimentos independentes que vão a votos no próximo domingo. Os candidatos queixam-se da desigualdade de meios disponíveis, mas sentem que a liberdade compensa. Por Bruno Monterroso FOTOMONTAGEM POR LEANDRO ROLIM
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om 46 anos, Horácio Pina Prata é candidato independente à Câmara Municipal de Coimbra (CMC). Com passado político no Partido Social-Democrata (PSD), o ex-vice-presidente da autarquia ressalva “não estar contra ninguém”, mas destaca “os problemas que têm surgido da natureza macrocéfala dos partidos políticos”. Nesse sentido, acrescenta que “muitas vezes as orientações nacionais são contra as questões locais”. “Coimbra tem sido maltratada”, critica. Nesse sentido, sublinha "a vantagem da liberdade”, proporcionada pela independência. Para o vereador, a sociedade em geral está cada vez mais consciente “que a mais-valia da participação e da cidadania é fundamental”, sendo uma questão de tempo até os partidos se verem forçados a alterar a legislação. Por isso, o candidato defende a criação de “círculos uninominais”, nos quais “pessoas que queiram candidatar-se a deputados para poderem ir defender a sua terra e a sua região o possam fazer”. Pina Prata entende ainda que “o caminho da defesa dos locais é um caminho que tem a ver acima de tudo com a liberdade da candidatura”. “Se nós queremos ter a verdadeira democracia participativa temos de lutar, mostrando que as candidaturas independentes são fundamentais e incontornáveis na defesa das regiões”, finaliza o candidato. “A forma liberta” de participação Filipe de Sousa é candidato ao município de Santa Cruz, na Madeira. O vereador foi eleito em 2005 pelo Partido Socialista, mas tal como outros candidatos independentes resolveu deixar o anterior partido, criando posteriormente o movimento Juntos Pelo Povo. Para o candidato, a vantagem fundamental é “acima de tudo, a forma liberta como as pessoas participam”, evitando assim quaisquer “interferências partidárias nas decisões que são importantes para a resolução dos problemas”. Por outro lado, como desvantagens face aos concorrentes, aponta a ausência de um “aparelhado”, bem como a relativa “inexperiência” de alguns membros do movimento, sublinhando que o trabalho para estas eleições dura “há já largos meses”. Lembrando que “outras pessoas não queriam que o símbolo estivesse explanado no boletim de voto”, uma exigência comum a outras candidaturas, afirma que “existem grandes obstáculos por parte
A PRESENÇA do símbolo das candidaturas independentes no boletim de voto é uma exigência comum dos partidos enquanto legisladores”, que “deveriam simplificar este tipo de projecto”. O madeirense lembra que “uma candidatura independente tira protagonismo e até receitas aos próprios partidos”, considerando que não vai haver “facilidades”. Apesar das dificuldades, o actual vereador acredita que “haver grupos de cidadãos a concorrer para autarquias locais, vai valorizar o verdadeiro sentido da democracia e do poder local”. Uma forma de democracia Teresa Serrenho é candidata independente à Junta de Freguesia de Nossa Sra. do Pópulo, em Caldas da Rainha. A professora, de 53 anos, constitui um caso raro nestas eleições autárquicas visto que é das poucas cabeças-de-lista sem anterior filiação partidária. Salientando que a sua postura na vida “sempre foi mais de intervir que criticar”, acrescenta que o cidadão, além do direito de ser crítico, “tem obrigação de fazer algo também”. A professora compara o problema do país ao de uma freguesia: “os cidadãos ao alhearem-se da política vão permitindo que as máqui-
nas no poder se instalem cada vez mais”. Teresa Serrenho acredita que “a maior parte das pessoas têm o sentimento de estarem fartos e saturados das máquinas partidárias, dos compadrios, dos conhecidos ou de gente amestrada que só faz o que o partido diz”. Como desvantagem principal, considera que não dispõe de “um aparelho partidário com dinheiro”, explicando que “não há qualquer apoio à cabeça”. “Para fazer uma campanha minimamente condigna gasta-se bastante dinheiro”, lamenta. Tal como outros candidatos, afirma ser injusto não poder exibir o símbolo do movimento no boletim de voto, criticando também o elevado número de assinaturas necessárias em zonas mais populosas. Para a candidata, é importante “mostrar que é possível uma democracia diferente”. E é peremptória: “acho que a candidatura independente é a forma perfeita de democracia”. A renovação que (não) há no poder Na análise aos aspectos acerca das candidaturas independentes, o in-
vestigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-UL) Manuel Villaverde Cabral sublinha que “no estado em que está o sistema partidário, tudo o que for manifestação dos interesses locais, das forças vivas e da sociedade civil é bem-vindo”. No entender de Manuel Villaverde Cabral, a sociedade civil “não é virtuosa por definição” e destaca a importância destes movimentos cívicos “sobretudo em Portugal, onde os partidos exercem um monopólio praticamente completo sobre a representação política”. Por outro lado, para o docente da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC) Fernando Ruivo um problema das candidaturas independentes é que, muitas vezes, consistem “num grupo de amigos ou numa clientela que dá o apoio a essa mesma candidatura”, quando deveriam ser “movimentos sociais ou de opinião fortes, emanados da sociedade civil com objectivos muito precisos”. Para estas autárquicas, o professor adianta que “só 29 presidentes de câmara é que não se recandidatam”. Na opinião do investigador, é evidente que daqui a quatro anos
serão outros, por lei, mas, por outro lado, já estão a ser preparados. “São os vice-presidentes, são os filhos de antigos presidentes. O sistema político fecha-se à população e o Estado está cristalizado”, ajuíza. Segundo Villaverde Cabral, “havendo vontade”, há espaço para candidaturas independentes, lembrando o caso do Helena Roseta, que há dois anos conseguiu dez por cento dos votos em Lisboa. Fernando Ruivo lembra também “o caso paradigmático” da candidatura de Manuel Alegre às presidenciais de 2006, obtendo “um milhão de votos contra um candidato do PS”. Apesar disso, mostra-se mais céptico em relação às possibilidades reais de sucesso dos independentes: “o poder é dos que lá estão e que se reproduzem”. “Entram aqueles que eles querem e que vão treinando, nas juventudes partidárias, fazendo a tarimba até conseguirem ocupar um cargo”, acusa. No seu entender, a solução passa pela criação de uma “sociedade civil portuguesa mais forte”, em que haja “debates, discussões, alternativas, participações da população e uma série de itens que não aparecem”.
7 de Outubro de 2009| Quarta-feira | a
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PAÍS & MUNDO
60.º ANIVERSÁRIO DA FUNDAÇÃO DA REPÚBLICA POPULAR DA CHINA
Tibete isolado D.R.
A poucos dias dos festejos da fundação da China, as fronteiras do Tibete foram encerradas aos turistas estrangeiros. As negociações entre as partes mostram-se difíceis
RELAÇÕES TIBETE - CHINA 1 9 1 2 – Tibete expulsa tropas chinesas e adquire independência até 1949, data da fundação da República Popular da China. 1 9 5 0 – Tibete é invadido por tropas comunistas chinesas que tomam de assalto a sede do governo. O governo tibetano reporta o caso à ONU que adiou o problema. 1 9 6 5 – China reconhece formalmente o Tibete como região autónoma. 2 0 0 7 – Governo chinês propõe reatar das conversações, caso o Tibete aceite a soberania chinesa
VASCO BATISTA BRUNO MONTERROSO A questão no Tibete voltou a ocupar destaque no debate político internacional. Poucos dias antes das comemorações do 60º aniversário da fundação da República Popular da China, o governo chinês decretou o encerramento das fronteiras tibetanas a turistas estrangeiros até amanhã, dia 8. O docente da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa Miguel Monjardino considera que o encerramento do Tibete aos estrangeiros “deve ser visto à luz das celebrações do 60º aniversário da China” e de modo a assegurar que os festejos não são “manchados com algum tipo de problema”. Para se compreender a questão no Tibete, torna-se imperativo recuar alguns séculos na história. A China trata-se de um país multinacional composto por 56 nacionalidades, cuja formação não se processou de forma alheia a conflitos entre as suas dinastias, classes e etnias. Neste sentido, a docente de Relações Internacionais na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC) Carmen Mendes considera que “a integridade territorial é o factor político, económico e social prioritário” da China. Na verdade, a ameaça de desfragmentação territorial ficou bem patente “aquando das manifes-
CONFLITO NO TIBETE já dura há meio século tações a favor da independência da província tibetana a poucos meses dos Jogos Olímpicos”, acrescenta. Além disso, para Monjardino, “a geografia política chinesa mostra que o acesso ao interior da China pelo sul é absolutamente vital para Pequim”. Os confrontos no Tibete são hoje uma realidade que “praticamente todo o mundo conhece”. “Nem todos os povos têm essa sorte”, analisa Monjardino. Neste aspecto, a comunidade internacional tem assumido um papel preponderante, “conseguindo manter o assunto na comunicação social”, completa. Na verdade, trata-se da única forma que a comunidade internacional encontrou para manter o assunto vivo, já que “ninguém vai sancionar a China, que é membro do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas)”. “A China fará tudo o que estiver ao seu alcance para man-
ter o Tibete no seu controlo, mas a comunidade internacional não está disposta a isso”. “É uma assimetria de forças”, examina Monjardino. Diálogos sem futuro As negociações entre a China e a comunidade internacional revelam-se complexas, em virtude da intransigência do governo de Ju Hintao que critica o mundo ocidental pela ingerência num assunto interno. “Para os líderes chineses, o Tibete, tal como Taiwan e Xinjiang, é um assunto interno e não pode ser transposto para o plano internacional”, expressa a docente da FEUC. A postura intransigente dos líderes chineses contrasta com a abertura e o apelo ao diálogo por parte do Dalai Lama, prémio Nobel da Paz, que, segundo Monjardino, constitui “uma importante alavanca neste tipo de combate”. Com efeito, a atribuição do Nobel da Paz a Dalai Lama foi
“muito mal recebido por Pequim, sobretudo quando a política de abertura da China ao exterior estava no auge” comenta Carmen Mendes. “A China percepcionou a pressão ocidental e o apoio ao povo tibetano como um incentivo ao exacerbar dos movimentos de oposição política emergentes”, desenvolve. O diálogo entre a União Europeia (UE) e a China já têm uma longa história e reveste-se de ambiguidades. Em matéria de direitos humanos e, sobretudo, na questão tibetana, as conversações têm-se mostrado contraproducentes. Deste modo, ainda que a UE respeite os princípios básicos de um estado de direito, enfrenta “o dilema de escolher entre os interesses económicos e a censura política”, tal como destaca a docente. Com efeito, “a União Europeia tem falhado redondamente na condução de uma política coerente de direitos humanos em relação à China, prin-
cipalmente devido aos interesses económicos individuais dos seus Estados membros”.
G-20
Noruega
No encerramento da cimeira do G20 em Pittsburgh, Gordon Brown destacou a criação de uma “nova ordem económica mundial para lidar com os problemas financeiros e económicos globais". Brown considera que os antigos sistemas de cooperação internacional foram ultrapassados. Além disso, o dirigente britânico explicou que os chefes de Estado dos países membros vão reunir regularmente e que a Coreia do Sul vai a assumir a presidência em 2010. Brown pretende que o G-20 assuma um papel mais importante do que o G-8 desempenhou no passado. O G-8 mantêm-se activo, mas passará a tratar de questões relacionadas, por exemplo, com a segurança. B.M.
A Noruega ocupa este ano o primeiro lugar do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da ONU (Organização das Nações Unidas), suplantando a Islândia na liderança. A queda do país insular para o terceiro lugar deveu-se à crise económica instalada. O IDH permite avaliar os níveis de riqueza e pobreza dos países e compará-los no que concerne à esperança média de vida e ao acesso à educação e à saúde. O relatório foi apresentado na segunda-feira na Tailândia e centra-se nos efeitos da imigração no desenvolvimento humano. Actualmente, o país com maior nível de pobreza é o Níger, logo seguido pelo Afeganistão. Portugal desceu um lugar e ocupa a 34ª posição. B.M.
Para além do Tibete Os conflitos no Tibete não são casos isolados. A China enfrenta também problemas com Taiwan e Xinjiang. Desde 1949, Taiwan é considerada pelas autoridades chinesas uma “província rebelde”, sendo que em 2005 foi promulgada a Lei Anti-Secessão, que legitima a utilização da força caso Taiwan declare unilateralmente independência. ”No entanto, os líderes chineses evitam uma ocupação por meios militares, temendo a retaliação dos EUA e o agravamento do relacionamento com o Japão”, defende a docente. Por sua vez, Xinjiang registou este ano graves motins na sua capital, Urumqi, das quais resultaram dezenas de mortes e um julgamento de mais de duzentos supostos manifestantes.
BREVES D.R.
Grécia O povo grego foi a votos no passado domingo para eleger o próximo governo. O resultado ditou a maioria absoluta do Pasok - Movimento Socialista Pahnlénico - encabeçado por George Papandreou. O desfecho eleitoral veio pôr fim à permanência de Kostas Karamanlis à frente dos destinos do país da Europa mediterrânica. O candidato pela Nova Democracia obteve o pior resultado desde a criação do partido. Assim, pagou pelos problemas que marcaram o seu mandato, como sejam os casos de corrupção, os avultados níveis de desemprego, e, por último, a resposta ineficiente dada aos incêndios que atingiram a Grécia nos dois últimos verões. Ao reconhecer
a derrota, Karamanlis abandonou a liderança do partido. Depois de cinco anos com políticas decretadas por um governo conservador, o novo presidente socialista promete retribuir a confiança que lhe foi atribuída. Durante a campanha eleitoral, Papandreou apresentou medidas inovadoras, como a promessa do investimento de três milhões num sistema sustentado numa lógica social da economia. O líder do Pasok pretende taxar os mais ricos para apoiar os desfavorecidos. O novo executivo terá de saber lidar com a crise económica instalada na Grécia e com o défice do PIB a roçar os seis por cento. V.B.
16 | a cabra | 7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira
CIÊNCIA & TECNOLOGIA As barreiras morais da ciência A investigação científica é limitada por princípios éticos e legais. Animais e humanos são submetidos a experiências para responder ao progresso SARA SÃO MIGUEL As evoluções da ciência permitem criar melhores condições de vida em vários campos. Na área da saúde, o vírus da gripe A tem sido dos mais comentados e mais temidos pela humanidade. No entanto, num curto espaço de tempo, desenvolveu-se uma vacina que está agora pronta para ser administrada. É a investigação científica que permite que tais soluções surjam, mas no que toca a ajudar o homem, até a ciência tem limites. Os medicamentos que surgem nos postos de saúde passam por várias etapas até serem comercializados. Uma das mais importantes é a fase experimental, onde desde logo surgem oposições em relação ao uso de animais por causar a morte a várias espécies. O membro da Associação Agir pelos Animais Myriam KanounBoulé condena estas práticas, afirmando que “o que é ilegal e punível fora de um laboratório, torna-se permitido dentro dele”. A activista declara que, nos locais de experimentação, “o animal já não é considerado como um ser vivo, mas sim como material descartável”. Por outro lado, o docente da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) Joaquim Norberto Pires considera que o uso destes seres vivos na fase experimental é “imprescindível” e que a sua morte é inevitável pois serve para “garantir resultados”. Apesar disso, os investigadores fazem com que “sejam bem tratados e que os procedimentos de morte sejam dignos e rápidos”. O docente considera “que não é possível chegar a uma lei que impeça a utilização de animais”, uma vez que o risco seria maior ao se “aplicar um medicamento numa pessoa sem nunca o ter testado”. No entanto, o recurso a métodos alternativos como cadáveres, células estaminais e simulações por com-
COLUNA DOS PORQUÊS Por que tenho “déjà vu”?
ILUSTRAÇÃO POR TATIANA SIMÕES
putador são uma forma de minimizar o número de animais sacrificados. Ensaios clínicos podem comprometer dignidade humana Após esta etapa, surgem os ensaios clínicos e as questões éticas que lhes estão associadas. Este
procedimento é um passo essencial na experimentação científica porque, como explica Joaquim Norberto Pires, “apesar de haver um grande grau de aproximação, os seres vivos são sempre diferentes” e é necessário testar as reacções no homem. Os ensaios clínicos são regulados pela IN-
FARMED (Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde), que remete para a legislação em vigor para esclarecer algumas questões. A lei limita estes ensaios clínicos de maneira a proteger a integridade física e moral dos participantes. De acordo com a lei
De certeza que todos já tiveram a estranha sensação de ter vivido antes uma determinada situação ou de ter estado num dado lugar, quando sabem que tal não aconteceu. A essa sensação chama-se “déjà vu”. Embora este fenómeno seja subjectivo e muitas vezes vago, sabe-se que ocorre com frequência (estima-se que em cerca de dois terços da população). Uma sensação de “déjà vu” pode durar entre uma fracção de segundo e alguns segundos e dissipar-se rapidamente da memória ou ser recor-
dada em detalhe muito tempo após ter tido lugar. Podemos mesmo ter a sensação que aquela situação ocorreu muitas vezes. Uma das hipóteses que explicam este fenómeno relaciona-se com a formação, armazenamento e evocação da memória, em que pode ocorrer um desvio ocasional e desacertado da informação do circuito da memória de curta duração, para o circuito de armazenamento da memória de longa duração. Nestas ocasiões, quando um facto novo tem lugar, a informação chega, er-
radamente, via circuitos da memória de longa duração e o indivíduo tem a percepção que tal informação já estava armazenada. Logo, o evento parece já ter ocorrido no passado. Outra explicação, também relacionada com a formação da memória, tem a ver com uma possível demora na percepção de determinada informação como sendo nova. Tal atraso no processamento da informação fará igualmente com que o cérebro interprete a situação como memória já anteriormente adquirida. Alguns estudos têm rev-
nº46 de 19 de Agosto de 2004, no artigo 6º, é exigido aos responsáveis que informem os direitos do participante, que obtenham o seu consentimento livre e esclarecido e lhe concedam todas as condições a que têm direito. O incumprimento da legislação constitui uma violação dos direitos humanos. A Amnistia Internacional é uma das organizações que “ se pauta pela dignidade humana, pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e por padrões internacionais desses mesmos direitos”, como esclarece o membro da direcção da instituição Ana Monteiro. Para ter um maior alcance, a organização tem uma rede de profissionais de saúde, a Amnesty International Health Professionals Network, e uma rede de “lobbying” orientada para a saúde mental, a Amnesty International Mental Health Lobbying Network. O que leva então algumas pessoas a participar em ensaios clínicos? Ana Monteiro destaca essencialmente três grupos. O primeiro refere-se aos que optam por entrar no ensaio “pela remuneração e falta de condições”. Os intuitos altruístas são o argumento do segundo grupo. “Aqui estamos a falar das pessoas que têm cancro ou doenças genéticas que sentem que poderão estar a ajudar outras pessoas na mesma condição”, explica. Por fim, surge o grupo que participa por ver nos ensaios “uma pequena possibilidade de sobrevivência”. Segundo o membro da Amnistia Internacional, “a organização não tem uma posição definida em relação aos ensaios clínicos”, mas “assume o compromisso de monitorizar situações em que a integridade humana esteja a ser comprometida” e desenvolve campanhas, como a “Exija Dignidade”, onde pretende sensibilizar a população para as questões dos direitos humanos. Com Andreia Polido
elado que a estimulação do cortéx entorrinal conduz à ocorrência de estados de “déjà vu”. Esta região do cérebro está situada no interior dos lobos temporais esquerdo e direito e sabe-se que é vital para o processamento da memória. À medida que o conhecimento sobre o cérebro progride será talvez possível estudar e compreender melhor o fenómeno neurológico de “déjà vu”.
TERESA GIRÃO, ESPECIALISTA DO CENTRO DE NEUROCIÊNCIAS E BIOLOGIA CELULAR
7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira | a
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ESTATUTO EDITORIAL DE ACORDO COM O ARTIGO 17º, ALÍNEA 3, DA LEI DE IMPRENSA, QUALQUER PUBLICAÇÃO DEVE DIVULGAR, ANUALMENTE, O SEU ESTATUTO EDITORIAL
Estatuto Editorial do Jornal Universitário de Coimbra A CABRA e do portal informativo ACABRA.NET De acordo com o Artigo 17º, alínea 3, da Lei de Imprensa, qualquer publicação deve divulgar, anualmente, o seu estatuto editorial 1. ACABRA e ACABRA.NET são dois órgãos de comunicação social académicos cujo objectivo é constituírem-se – numa simbiose capaz de aproveitar o formato e estilo diferente que cada um possui – enquanto Jornal Universitário de Coimbra. 2. ACABRA e ACABRA.NET têm como público-alvo a Academia de Coimbra e é sob este princípio que devem guiar as decisões editoriais. 3. ACABRA e ACABRA.NET orientam o seu conteúdo por critérios de rigor,
criatividade e independência política, económica, ideológica ou de qualquer outra espécie. 4. ACABRA e ACABRA.NET praticam um jornalismo que se quer universitário no sentido amplo do termo – desprovido de preconceitos, criativo, atento, incisivo, crítico e irreverente. 5. ACABRA e ACABRA.NET praticam um jornalismo de qualidade, que foge ao sensacionalismo e reconhece como limite a fronteira da vida privada. 6. ACABRA e ACABRA.NET são na sua essência constituídos por um conteúdo informativo, mas possuem espaço e abertura para conteúdos não informativos,
que se pautem por critérios de qualidade e criatividade. 7. ACABRA e ACABRA.NET integram-se na Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra, perante cuja Direcção são responsáveis; contudo, as decisões editoriais d’ ACABRA e d’ ACABRA.NET não estão subordinadas aos interesses ou a qualquer posição da Secção de Jornalismo, nem aquele facto interfere com a relação sempre honesta e transparente que ACABRA e ACABRA.NET se obrigam a ter perante os seus leitores. 8. A CABRA é um jornal quinzenal, cuja periodicidade acompanha os períodos de actividade lectiva. 9. ACABRA.NET é um site informativo, de actualização diária, cuja actividade acompanha os períodos de actividade lectiva.
Princípios e normas de conduta A isenção, imparcialidade e integridade que devem marcar o trabalho no Jornal Universitário de Coimbra implicam por parte dos seus jornalistas o conhecimento e aceitação de regras de conduta. Assim, o jornalista deve:
1. Recusar cargos e funções incompatíveis com a sua actividade de jornalista. Neste grupo incluem-se ligações à Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra, à Queima das Fitas, ao poder autárquico, bem como a actividade em gabinetes de imprensa, na área da publicidade e das relações públicas. Deste grupo estão excluídos, por respeito para com o direito do estudante de Coimbra de participar na gestão da Universidade de Coimbra, os cargos em órgãos de gestão das faculdades e da universidade. Cabe à Direcção do Jornal Universitário de Coimbra decidir quais os casos em que a actividade jornalística se encontra prejudicada por outras actividades e agir em conformidade. 2. Abdicar do uso de informações obtidas sob a identificação de “jornalista do Jornal Universitário de Coim-
bra” (ou similares) em trabalhos que não sejam realizados no âmbito do Jornal Universitário de Coimbra. Além disso, o jornalista comprometese ao sigilo das informações obtidas desta forma. Excepções a esta norma poderão ser autorizadas pela Direcção do Jornal Universitário de Coimbra.
3. Recorrer apenas a meios legais para a obtenção da informação, sendo norma a identificação como jornalista do Jornal Universitário de Coimbra. De forma alguma podem ser usadas informações obtidas através de conversas informais ou outras situações em que o jornalista não se identifica como tal e como estando em exercício de actividade. 4. Abdicar de se envolver em actividades ou tomadas de posição públicas que comprometam a imagem de isenção e independência do Jornal Universitário de Coimbra. Contudo, o Jornal Universitário de Coimbra reconhece o direito inalienável do jornalista universitário a assumir-se como cidadão. Assim, nunca um jornalista do Jornal Universitário de Coimbra será impedido de se mani-
festar em Reunião Geral de Alunos ou Assembleia Magna, desde que não esteja nessa altura em exercício da sua actividade jornalística, em cujo caso deverá prescindir do seu direito de expressão e voto. De igual forma, nunca será impedido de participar activamente em qualquer actividade pública. Cabe à Direcção do Jornal Universitário de Coimbra decidir quais os casos em que a actividade jornalística se encontra prejudicada por outras actividades e agir em conformidade.
5. Ter consciência do valor da informação e das suas eventuais consequências, particularmente no meio académico de Coimbra, no qual o Jornal Universitário de Coimbra é produzido e para o qual produz. Neste contexto particularmente sensível, o jornalista deve ter especial atenção à proveniência da informação e à eventual parcialidade ou interesses da fonte (não descurando o imprescindível processo de cruzamento de fontes), bem como garantir uma igualdade de representação em caso de informações contraditórias ou interesses antagónicos, evitando que o Jornal Universitário de Coim-
bra se torne meio de comunicação de qualquer instituição, grupo ou pessoa. Num meio em que o desenrolar de acontecimentos pode afectar, directa ou indirectamente, o Jornal Universitário de Coimbra, o jornalista tem também que saber manter o distanciamento necessário para a produção de uma informação rigorosa.
6. Garantir a originalidade do seu trabalho. O plágio é proibido. Nestes casos, a Direcção do Jornal Universitário de Coimbra deverá agir disciplinarmente e o jornal deverá retractar-se publicamente.
7. Recusar qualquer tipo de gratificação externa pela realização de um trabalho jornalístico. Estão excluídos deste grupo livros, cd’s, bilhetes para cinema, espectáculos ou outros eventos, bem como qualquer outro material que venha a ser alvo de tratamento crítico ou jornalístico; constituem também excepção convites de entidades para eventos que tenham um inegável interesse jornalístico (por exemplo, convites da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra para cobertura do Fórum AAC). Cabe à Direcção do Jornal Universitário de Coimbra resolver qualquer questão ambígua. PUBLICIDADE
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18 | a cabra | 7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira
CINEMA
ARTES FEITAS
“
District 9
O ”
DE NEILL BLOMKAMP COM SHARLTO COPLEY JASON COPE ROBERT HOBBS 2009
VAI PRÁ TUA TERRA!
JOGAR
CRÍTICA DE JOSÉ SANTIAGO
s extra-terrestes mudaram de agência de viagem, trocaram os tradicionais Estados Unidos por um destino mais alternativo, a África do Sul. District 9 é a primeira longa metragem de Neill Blomkamp, um dos protegidos de Peter Jackson, ele que também assina a obra no papel de produtor. Imaginem que um dia, depois de passearem o cão que certamente têm, reparam numa nave que paira sobre a cidade. É essa a premissa de District 9. Um objecto voador não identificado aparece do nada, a sobrevoar Joanesburgo, e nós, humanos, como bons hospitaleiros que somos, até aguentamos uns dias com aquilo lá em cima, mas, como paciência tem limites, é tomada a decisão de entrar furtivamente pela geringonça a dentro. Qual não é o espanto quando se descobre que em vez de criaturas hostis, afinal estamos perante seres que apenas
encalharam neste planeta e que se pudessem teriam muito gosto em ir embora. Nos meses que se seguem, e por problemas de integração é criado um gueto para os “gafanhotos”, que passam a viver em regime de exclusão. Ninguém se pode queixar da falta de originalidade. Numa altura em que a ficção-científica se encontrava em profunda estagnação eis que surge um título que quebra com todas as convenções, não só no conteúdo, mas também na estética. A primeira parte do filme, que nos dá a história de fundo, é feita com excertos de noticiário, vídeos de telemóvel e entrevistas, o que permite ao espectador uma maior proximidade a tudo o que a partir dali vai acontecer e convida-nos a moldar a nossa linha de pensamento para o formato: “Ó diabo, isto até é plausível”. Quando se entra na trama principal, o estilo não muda muito, passamos apenas do semi-documentário para um es-
tilo de filmagem de câmara ao ombro ao bom velho estilo do Resgate do Soldado Ryan ou de séries como The Shield. Onde realmente se sentem os 30 milhões de dólares da produção é nos efeitos especiais, ou não fosse a Weta Workshops, responsável pela saga Senhor dos Anéis, a força motriz por detrás desse trabalho. Não há actores reconhecíveis no elenco, mas isso não impede boas performances por parte de Sharlto Copley, o actor principal, e, por incrível que pareça, dos seres digitais, que conseguem ser mais expressivos que um Keanu Reaves dopado. Resumindo, esta é uma das melhores super-produções dos últimos anos. Não insulta a inteligência do espectador e consegue ser uma poderosa e intemporal metáfora das relações humanas. Combina a acção de Terminator, o coração de ET e a nojice d’ A Mosca.
Batman Arkham Asylum”
O
universo de adaptações de “franchises” ao meio vídeo-jogável é caracterizado por um encaixotamento primário e vazio de sentido do universo que define a obra original a um qualquer género interactivo estereotipado. De facto, “Arkham Asylum” passa esse requisito, com a equipa da Rocksteady Studios a fornecer uma envolvência que replica eficazmente o espaço narrativo e estético da banda desenhada. E nesse campo, é preciso relevar o trabalho de Mark Hammill (o velhinho Luke Skywalker) na voz de Joker, que consegue tornar o medíocre argumento numa deliciosa sucessão de gags
de humor negro. Mas o aspecto mais surpreendente deste “Batman” é exactamente o romper da lógica de encapsulamento típica das “franchises”. As suas mecânicas de jogo não são genéricas e ocas, mas sim um espelho adequado à acção do herói das “comics”: um misto de exploração, combate corpo-acorpo elegante (recordando “Assassin’s Creed”) e sequências furtivas. Há aqui uma caracterização minuciosa do “modus operandi” de Batman, desde o uso da sombra e da surpresa enquanto armas de eleição, ao recurso dos icónicos “gadgets”. Infelizmente, os diferentes estilos de jogo nunca são remisturados de forma orgânica, levando
a que a experiência se torne numa sequência linear e previsível de arenas de jogo enclausuradas, cada uma com o seu tipo de jogabilidade específico. Ocasionalmente encontram-se os bosses da praxe, mas nem esses conseguem servir de clímax a um ciclo de jogo levemente repetitivo, ao qual falta tensão e um ritmo em crescendo. “Arkham Asylum” é, por isso, um desses raros casos de uma transição bem sucedida ao meio lúdico. Imperfeita, é certo, mas muito acima do que é expectável.
RUI CRAVEIRINHA
PLATAFORMA XBOX360, PS3, PC-WINDOWS EDITORA EIDOS INTERACTIVE 2009
"Encarnar o Cavaleiro Negro"
Artigo disponível na:
7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira | a
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ARTES FEITAS
OUVIR
LER
Jewellery”
M
ica Levi é daquelas pessoas que dificilmente As jóias da coroa iria passar despercebida. Enganem-se os que pensavam que seria devido ao facto de esta rapariga de 21 anos, nascida, criada e residente no Reino Unido parecer um rapaz. É certo que o aspecto no mínimo invulgar de Micachu, como prefere dar-se a conhecer, dá desde logo a entender que há algo de muito especial com a pessoa em causa, mas cedo se percebeu que seria a música a área em que se iria destacar. Com apenas 21 anos já fez nessa área de tudo um pouco; vinda de uma educação musical profundamente clássica, fez formação de instrumento em violino e viola de DE arco. Foi mesmo convidada pela sua MICACHU AND THE SHAPES instituição de ensino a compor uma peça orquestral para a Orquestra FiEDITORA larmónica de Londres. Antes disso ROUGH TRADE experimentou o terreno do ‘grime’, tendo sido autora de algumas mix2009 tapes que lhe valeram o reconhecimento da comunidade ligada a esse género musical. Mas facilmente se percebe que o seu ecletismo é tal que muito provavelmente é apreciadora de música de todos os géneros que possam ser localizados entre, antes e para lá da música clássica e do ‘grime’. Jewellery é prova disso mesmo. Com tantas referências musicais à mistura, seria de esperar o elevado grau de desconstrução da ideia de género musical que se espelha ao longo dos curtíssimos 35 minutos que dura este Jewellery. Aliás, se há criticas a apontar a este disco, será por isso mesmo. A mescla de influências é tal que a sonoridade do álbum é tudo menos convencional, e por conseguinte não se tratará certamente de um trabalho fácil. O epicentro deste terramoto estilístico será a viola de baixa qualidade (e por sinal nada bem tratada) de Micachu. Percebe-se que a composição do disco passou muito por construir temas baseados nos curtos trechos desafinados e repetitivos da guitarra preparada (o som é tão diferente do habitual que se pode mesmo duvidar que se trate de uma guitarra) a que Mica Levi juntou linhas de voz, para posteriormente serem adicionadas as percussões nervosas de Marc Pell e os sintetizadores inocentes de Raisa Khan. Tudo isto conjugado de uma perspectiva sempre ‘lo-fi’, com pontas intencionalmente deixadas soltas e o aspirador de “Turn Me Well” a fazer o papel de cereja no topo do bolo. A ironia do destino faz com que as particularidades de Jewellery o tornem daqueles discos em que os mesmos pormenores podem fazer diferentes ouvintes amar ou odiar o disco. Para ficarem a saber de que lado da trincheira estão, o melhor mesmo será escutá-lo.
O Dom ”
A Russia de Vladimir Nabokov
DE VLADIMIR NABOKOV EDITORA ASSÍRIO E ALVIM 2004
T
cimento do pai de Fedor, um explorador que se dedica ao estudo das borboletas, que desaparece subitamente numa das viagens à Ásia Central marcando o caminho do personagem principal. Com o decorrer do texto a obsessiva busca, de Fedor, pela pureza e perfeição da sua escrita é completada por uma paixão que, por si só, é digna do “enredo de um romance notável”. Fedor é confrontado com dúvidas: ceder ao amor ou seguir obstinado através do processo criativo que lhe cobrava todo o “seu capital de trabalho”. Numa mistura de fantasia com a realidade, Vladimir Nabokov usa a vida de Tchernychevskii, um conhecido escritor russo precursor do realismo socialista, como ponto de viragem literário para Fedor Tcherdnytsev. Este critica a falta de sensibilidade de Tchernychevskii para a arte, que se encontra bem longe do seu ideal puchkiniano, mas admira a sua coragem como escritor. A fórmula de Nabokov para “O Dom” parece apontar para uma síntese final de inspiração hegeliana, um último capítulo, um retorno do espírito à ideia quando Fedor cumpre aquilo que imaginou previamente. Vladimir Nabokov, apesar das semelhanças com alguns traços presentes no livro, descarta desde logo, com preocupação, qualquer tentativa para identificar “o criador com a criatura”. RUI MIGUEL PEREIRA
VER
Sinais do Futuro” Apenas mais um filme apocalíptico...
EMANUEL BOTELHO
GUERRA DAS CABRAS A evitar Fraco Podia ser pior Vale a pena FILME
A Cabra aconselha A Cabra d’Ouro
EXTRAS
Artigos disponíveis na:
erminar um livro e achar que acabamos de levar com uma vida inteira. Cheia de muitas outras, este último livro de Nabokov escrito em russo é uma floresta de longos e velhos troncos da literatura russa, história recente de borboletas emigrantes onde cada personagem reclama uma vida. A complexidade da narrativa esconde a disputa constante, entre personagens, por verosimilhança e imortalidade, num ciclo muito para além do que é narrado. Fedor Godunov-Tcherdnytsev é um jovem escritor emigrado em Berlim, assim como foi Nabokov, que busca o aperfeiçoamento e reconhecimento da sua escrita. Vagueando fascinado primeiro por Puchkin e depois, mais tarde, por Gogol, Fedor é a personificação do intelectual emigrado que fugiu de uma Rússia em revolução. Uma primeira parte dedicada à poesia de Fedor que tarda em ser “espremida” pela crítica, segue-se um longo desabafo sobre lepidópteros, uma das grandes paixões do autor (curiosamente Nabokov desenha a lápis uma borboleta num livro, da primeira edição em inglês, que oferece à sua mulher no seu 43º aniversário). Este fascínio de Nabokov por lepidópteros (foi um dos maiores especialistas na área) é um dado bastante presente ao longo do livro, para alguns leitores possivelmente até à náusea, pelo desapare-
DE ALEX PROYAS EDITORA LUSOMUNDO 2009
“
S
inais do Futuro” é um “thriller” apocalíptico que se baseia numa previsão de uma rapariga enigmática. O filme começa nos optimísticos anos 50 americanos, aquando da abertura de uma escola. Os alunos são convidados a desenhar a sua imagem do futuro. Uma menina não desenha, limita-se a digitar números para a sua folha de papel. 50 anos mais tarde, os desenhos são desenterrados pelos alunos dessa escola e o pai de um dos alunos, o Professor John Koestler (Nicolas Cage), descobre que os números estavam relacionados com catástrofes que tinham assolado o mundo nos últimos 50 anos. John Koestler procura, então, desvendar os segredos daquele papel encriptado. Acaba por descobrir que faltam ainda três prenunciações, uma delas envolvendo a Humanidade por inteiro. Apesar de “Sinais do Futuro” ser considerado um “thriller”, tal aspecto é muitas vezes posto de parte durante o filme. Alex Proyas, realizador do conhecido “I, Robot”, apostou muito nos efeitos especiais (alguns mal conseguidos) e no desempenho de Nicolas Cage, descaracterizando um pouco o enigma e relegando o “sus-
pense” para um segundo plano. Acaba sendo um filme de acção com pouca força, a deixar uma sensação de insatisfação no espectador. Apesar de todos os defeitos, “Sinais do Futuro” é salvo pela ruptura de alguns clichés de filmes apocalípticos e pelas últimas imagens que aparecem antes de rodar o genérico, imagens essas que nos deixam a reflectir sobre a nossa existência e sobre a certeza das coisas. Um filme construído com recurso a alguns efeitos especiais dá sempre um bom “making of”. O interesse de ver a produção de certas cenas do filme faz com que valha a pena o DVD conter extras, visto que o comentário áudio do realizador acaba por se tornar algo fastidioso à medida que o vamos ouvindo. A voz de Proyas aborrece e a obrigação de ouvir os seus comentários enquanto vemos o filme mais uma vez, transforma o comentário num grande suplício para qualquer espectador.
JOÃO GASPAR
20| a cabra | 7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira
SOLTAS EU ESTUDO LÁ
UNIVERSIDADE DE COMENIUS • BRATISLAVA D.R.
ESTUDAR NO CENTRO DA
EUROPA
NA UNIVERSIDADE DE COMENIUS os novos estudantes não pagam propinas durante cinco anos
Coimbra recebe imensos estudantes estrangeiros com vidas diferentes no país natal. A CABRA falou com Kamila Friedlova e descobriu como é estudar em Bratislava Os caloiros estão todos no largo e usam uma espécie de coroa. Está a decorrer a primeira cerimónia de iniciação dos novos alunos na Uni-
versidade de Comenius, em Bratislava, a capital da República Eslovaca. Um por um, são chamados ao palco e juram ser bons alunos. No final, todos cantam a chamada “Canção do Estudante”, num ritual que acontece sempre na primeira semana do ano lectivo. O “Beánia” é a segunda cerimónia de entrada no Ensino Superior eslovaco. Um baile de gala que tem lugar durante o mês de Novembro e que conta com a presença dos antigos e novos alunos e também de alguns professores. Nesta altura os caloiros são baptizados. “Quando eu era caloira, durante o Beánia, uma aluna
VENENO NEGRO • POR RAFAELA CARVALHO
mais velha olha para mim e diz ‘abre a boca’. Eu abri e de repente vejo um disparo de pistola de água a ser projectado. Era vodka”, conta Kamila Friedlova. A partir daquele momento era oficialmente um membro da Faculdade de Gestão da Universidade de Comenius. O Ensino Superior não é obrigatório na Eslováquia mas estes novos alunos não pagam propinas durante cinco anos. O Governo financia o estudo desde que o curso seja completado no tempo previsto. A partir daí é fixado o pagamento de cerca de 800 euros anuais. Kamila diz que ficou encantada
com a Universidade de Coimbra porque há um projector em cada sala de aula. Na Faculdade de Gestão de Comenius são apenas dois. “Não temos nem giz de cores para escrever na ardósia”, acrescenta. “Quando há, é porque algum professor o financiou do próprio bolso”, o que é raro acontecer. Kamila lamenta que na Eslováquia os professores sejam uma das classes mais mal pagas. Quanto ao alojamento, a universidade tem residências especiais para estudantes mas a maioria não tem grandes condições e muitos alunos não são aceites por falta de es-
paço. A alternativa passa pela Mlynská Dolina, uma zona de Bratislava reservada a estudantes, com bares, cantinas e quartos que podem custar entre os 100 e os 300 euros. Mesmo assim, não há muitos alunos que possam pagar esse valor. Durante a noite, a agitação não é muito grande. As grandes festas e as idas à discoteca acontecem no máximo uma ou duas vezes por mês. Mas os finais de tarde são geralmente passados entre amigos, a passear pela cidade ou simplesmente a conversar na esplanada de um café. Por Cristiana Pereira
200 X 100 mundíce, lixo, sujidade e poluição. Pensar isto enquanto se contempla a fotografia é válido. Mas se a Alta de Coimbra fosse apenas sacos de lixo pretos bem arrumados a uma esquina e rabiscos políticos nas paredes de casas degradadas todos viveriam um pouco melhor. Em especial os gatos e cães vadios que agradecem a farta refeição. Infelizmente, a Alta de Coimbra é mais suja do que isto. Nesta tarde de Domingo não se viam os copos plásticos de cerveja nem as palhinhas negras das bebidas brancas que todas as noites enchem as ruas da Praça da República ao Quebra-Costas. Sorte a dos turistas que por ali andavam perdidos entre os flash’s das suas próprias máquinas fotográficas e o som da guitarra portuguesa que nunca se sabe muito bem de onde vem.
I
7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira | a
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O MUNDO AO CONTRÁRIO
SOLTAS
GRÃ-BRETANHA Um recluso de uma prisão da Grã-Bretanha ficou embriagado com o gel desinfectante usado para evitar o contágio de gripe A. O detido terá bebido o produto, que contém álcool, poucas horas depois de este ter sido disponibilizado pelos guardas prisionais. Também em Março, o hospital Royal Bournemouth tinha retirado da recepção os desinfectantes à base de álcool para evitar que os pacientes ingerissem o produto.
MAU TEMPO NO CHOUPAL Por Mestranda Maria Armanda
BOAS (RE)ENTRADAS
D
iz o calendário gregoriano que o ano começa em Janeiro. Doze badaladas, grande festa, malabarismos em cima de cadeiras e o Funchal bate o recorde de arremessamento de fogo-de-artifício. É assim desde o século XVII. Pois
caríssimos, deixem que vos diga, o calendário gregoriano é uma treta. Senão analisemos: assim à partida, o que é que realmente começa em Janeiro? A apanha da fruta? A época da caça? Nem isso. O Professor Marcelo atira-se ao rio? Não chega. O ano começa
CHINA As autoridades chinesas estão a usar manteiga para evitar o suicídio. Na região de Guangzhou, a estrutura metálica de uma ponte é untada com manteiga para evitar que os suicidas subam e se atirem. Depois de cartazes e até guardas nas extremidades da ponte, foi esta a solução encontrada pelo Governo chinês. O suicídio é tão comum na zona que até provoca embaraços no trânsito quando os condutores param para assistir. FRANÇA Uma deputada francesa quer obrigar revistas e sites a identificar as fotografias alteradas no Photoshop. O projecto de lei pretende assim acabar com as falsas imagens que transmitem uma beleza inalcançável no mundo real e que podem corromper as mentes dos leitores, em especial das jovens adolescentes. Cristiana Pereira
ILUSTRAÇÃO POR TATIANA SIMÕES
mesmo é em Setembro, o mês da rentrée, galicismo abraçado pela ocidental pátria lusa mas que não renega as suas origens: é uma palavra cheia de classe, de fino recorte, que fica bem em qualquer boca, em qualquer título de jornal. E, diz quem sabe, tem uma baguete enfiada no cesto da bicicleta e só toma banho aos fins-desemana. Confesso, uma das minhas grandes lutas – chamarlhe-ia até projecto de vida - é que os meses sejam renomados segundo as suas características: um Fevereiro transformar-se-ia num bem gráfico “Está um Frio dos Diabos” e o nosso querido mês de Agosto em “Aluguei um T1 na Quarteira e Meti Lá a Família Toda”. Setembro, claro, arrecadaria um bem requintado e conciso “La Rentrée”. Tudo para facilitar. E porque na verdade odeio mitologia romana. Ano novo, vida nova, portanto. Acabaram-se as reposições na televisão, o “homem nu com uma faca no bolso” dos diários. Coimbra enche-se de novos Erasmus muito loiros e muito cheios deste calor que não dá tréguas e caloirada neófita em busca da pedra filosofal, do Santo Graal da cidade, como quem diz, do bar com melhor traçadinho e minis mais baratas. Mas este ano, amigos, a tal rentrée foi em grande. E não um grande qualquer: foi “TGV” grande, “Jornal de 6ª” grande. A
rentrée desportiva já lá vai e com razões de sobra (normalmente à meia dúzia) para os efusivos festejos dos homens de família, taxistas em particular. Por sua vez, nem tanto para os CEO’s de empresas, cinquentões com dupla consoante no sobrenome em particular. A rentrée política trouxe eleições, os portugueses pegaram no método de Hondt, baralharam, partiram e voltaram a dar e agora, de repente, os tempos serão de negociação. E ainda faltam as autárquicas. A parte boa de ser uma mestranda rural é que este voto é significativamente mais fácil. Autarquicamente falando, os programas, as ideias, a boa vontade, tudo isso está sobrevalorizado: afinal de contas vamos acabar sempre por votar no tipo de bigode que ofereceu o maior e mais suculento porco no espeto ali no átrio da Junta de Freguesia. Vão por mim, o ano começa mesmo em Setembro. Parece-me que vamos todos sobreviver à rentrée. E o Professor Marcelo vai mudar o seu primeiro banho do ano para o primeiro dia do Outono.
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Todas as crónicas em
cabra net
COM PERSONALIDADE RAFAELA CARVALHO
NUNO ÁVILA • 39 ANOS • LOCUTOR DE RÁDIO
HÁ 15 ANOS A SER UM DOS “SANTOS DA CASA” Formei-me em jornalismo e trabalho no gabinete de comunicação da Câmara Municipal de Coimbra. Faço o “Santos da Casa” na RUC desde 1994 e, enquanto me der gozo fazer, enquanto achar que a música portuguesa e os seus artistas têm qualidade, acho que deve ser divulgada. Os dois programas não são tão distintos quanto isso porque eu às vezes no “Discos Perdidos” também passo música portuguesa, mesmo sendo um programa sobre música dos anos 70 e 80. Essa opção deve-se ao facto de eu ter crescido e começado a cimentar os meus gostos musicais no final dos anos 80, a partir de 1986 sensivelmente. Quando comecei com estas actividades, comecei a conhecer mais e a ir a concertos, a entrevistar bandas e funcionou tudo tipo bola de neve até chegar ao que chegou hoje. Continuo a achar que naquela altura se fazia muito boa música, se calhar muito melhor do que se faz agora. Nota-se isso porque a música daquela altura continua a passar e as pessoas continuam a ouvir, mesmo as camadas mais jovens. A partir daí ficou-me o gosto e pensei, “porque não fazer um programa?”. Neste momento, em Portugal, faz-se mais música de qualidade que não é tão ouvida do que alguma que não tem tanta qualidade mas passa. Há muita coisa que as rádios não passam. Especialmente naquelas rádios mais mainstream, de playlist mais formatada, há muita coisa que não passa. Além disso, as leis que se tentam criar para proteger os artistas portugueses, acabam por proteger sempre os mesmos ou seja, aqueles que não precisam de protecção. Por isso há muita coisa que fica ao lado. O “Santos da Casa” serve também para mostrar essas bandas que não chegam aos discos, gravam só maquetas, que não têm oportunidade de tocar nos grandes festivais mas que têm qualidade. Existe qualidade suficiente na música portuguesa para que ela seja divulgada e há bons projectos, basta as pessoas estarem um bocado mais atentas porque as bandas vão tocando aqui e acolá. Se as editoras estivessem um bocado mais atentas também eram capazes de descobrir mais alguns projectos interessantes. Quando comecei a ouvir música comprava mais aqueles Polystar e compilações do género que traziam os mega hits todos. Isso funcionou até eu começar a ouvir outro género de música e a grande paixão que eu tinha eram os Duran Duran. Falando de música portuguesa, o primeiro disco que comprei foi o primeiro álbum dos Táxi e o primeiro concerto de estádio que eu vi foi a primeira vez que o David Bowie veio a Portugal, no estádio de Alvalade. Para além da música também gosto muito de cinema e como tal vejo muitos filmes. Compro muitos CDs e muitos DVDs. Sou contra a pirataria porque também já fiz edição de discos e sei o que custa fazê-los e o que custa vendê-los e ficar com eles em casa e não vender. Entrevista por Camilo Soldado
22 | a cabra | 7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira
OPINIÃO
PROCESSO DE BOLONHA - UMA REALIDADE NA UNIVERSIDADE DE COIMBRA? INÊS MESQUITA*
A implementação real do Processo de Bolonha foi dolorosa, um choque sem preparação no modo de pensar e agir da comunidade universitária
A comemoração dos dez anos da assinatura do Tratado de Bolonha é mote para uma reflexão. Surgiu um novo modus operandis acerca do ensino, que de magistral passa à aquisição de aptidões, que com o conhecimento levam ao desenvolvimento de atitudes e competências. Surge a centralização do ensino no aluno, que apreende (e não apenas “aprende”) o conhecimento e desenvolve o “saber fazer”. A ideia em si é aliciante, porque finalmente se exige um papel activo dos alunos, acabando com a passividade. A tutoria e o ensino acompanhado e próximo são pilares deste desafio, existindo um compromisso docente/discente. Na Universidade de Coimbra a implementação deste Processo envolveu corpo docente, discente e funcionários. O primeiro documento sobre Bolonha surgiu “em bruto”, com aspectos completamente desadequados e longínquos da realidade da Universidade. Decorreram então adequações importantíssimas, em Senado da Universidade, em 2006, resultando em alterações de acordo com a especificidade de cada curso. No en-
tanto, por ter sido um projecto abraçado em pouco tempo, houve falta de planificação, sem avaliação das condições existentes para aplicação da avaliação contínua, com infra-estruturas e recursos humanos escassos até hoje. A implementação real do Processo de Bolonha foi dolorosa, um choque sem preparação no modo de pensar e agir da comunidade universitária. Mas existiam já caminhos traçados: a definição real do objectivos de cada curso – os “Descritores de Dublin” – que especificam a quantidade de aulas, de acordo com a importância dos temas e peso ao longo do curso e modo de avaliação dos conteúdos. No entanto, faltou a imprescindível reorganização de todo o processo de ensino-aprendizagem até aí vigente. Os ECTS sofreram uma distribuição errada pelas cadeiras, havendo em muitos cursos uma simples distribuição homogénea pelas Unidades Curriculares, sem ter em conta os conteúdos leccionados. A avaliação contínua tem que ser aperfeiçoada, já que não existem docentes suficientes para a rentabilizar, continuando a recorrer a tes-
tes que não avaliam competências. Nalguns casos cada semestre termina com avaliações finais, que na maioria dos casos substitui a avaliação contínua, por não haver recursos humanos nem estruturais para a realizar. Outro dos objectivos da Declaração de Bolonha é o aumento da mobilidade dentro da Área de Ensino Europeia. No entanto, para tal, é indispensável a uniformização e equiparação de graus e conteúdos leccionados e a criação de um sistema de comparação eficaz do trabalho realizado, além da criação de vagas reais para mobilidade. Existe outra questão frágil, em que os estudantes de Mestrados Não Integrados estão sujeitos a propinas de 2º ciclo aumentadas, o que significa que, para acederem a determinada área profissional, têm de completar os dois ciclos, com custos diferentes dos anteriores ao Processo. Após este balanço, surge a questão: trarão estas exigências do Tratado de Bolonha resultados realmente positivos? Na teoria sim, com a aquisição de competências, aptidões e atitudes, na construção do “saber fazer”. Mas diariamente
se desenha um longo caminho por percorrer, com tantas lacunas ainda existentes, nomeadamente nas condições de ensino e estratégias de formação. Para a sua concretização, urge mudar mentalidades, para que todos aceitem o Processo de Bolonha, trabalhando nele e não contra ele, construindo o futuro e não impedindo o progresso. Com o passar do tempo, algo impensável se revelou: o afastamento dos estudantes das funções associativas e de lazer da Academia, receosos das novas exigências. As competências sociais e humanas que se adquirem além dos livros são tão importantes como o conteúdo curricular…acreditem e trabalhem para o futuro, sem esquecer as tradições da nossa Academia, que deve a sua história a quem deu grande parte da vida em prol dos outros. Com organização, dedicação a Coimbra e vontade, viver o tempo de estudante com o Processo Bolonha é possível! *Membro do Conselho Geral da Universidade de Coimbra
D.R.
Cartas ao director podem ser enviadas para
acabra@gmail.com PUBLICIDADE
7 de Outubro de 2009 | Quarta-feira | a
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OPINIÃO 17º ANIVERSÁRIO DO ACORDO GERAL DE PAZ DE
MOÇAMBIQUE JAIR CHIULELE*
A 4 de Outubro de 1992 foi assinado em Roma uma convenção complexa, conjunto de mecanismos e garantias, fruto de discussões às vezes extenuantes. A convenção representava um conhecimento importante: A paz era possível. A paz é vida, é o fim de um pesadelo, é um nascimento. Por isso celebramos o Acordo Geral de paz. Moçambique emergiu de décadas de guerra para se tornar numa das economias africanas com melhor desempenho. O crescimento tem sido na ordem dos 8 por cento ao ano, impulsionado pelo bom desempenho dos sectores dos transportes, comunicações, indústria, construção e a recuperação na agricultura. A implementação consistente de reformas fundamentais conduziu a aumentos consideráveis de investimentos no País. Dados indicam que a pobreza registou um decréscimo de 15 por cento. Três milhões de pessoas saíram da pobreza absoluta, sobretudo nas áreas rurais, a mortalidade infantil baixou e as matrículas escolares aumentaram. Porque a psicologia profunda de uma pessoa não pode fazer-se sem a compreensão da sua própria história, quero lembrar a todos que Moçambique saiu de uma guerra armada mas entrou noutra guerra: “LUTA CONTRA A POBREZA ABSOLUTA”. O turismo em Moçambique revela um grande potencial para o crescimento do seu PIB com as praias de águas limpas, apropriadas para a prática do turismo, principalmente as que se encontram muito distantes dos centros
urbanos e ao longo da costa como as da província de Cabo Delgado, com destaque para as ilhas Quirimbas. O País tem ainda vários parques nacionais, onde sobressai o Parque Nacional de Gorongoza, com as suas infraestruturais reabilitadas e repovoadas com certos animais que estavam desaparecendo. Para atingir níveis que lhe são de direito, Moçambique tem apostado na diversificação do seu produto turístico que consiste no ecoturismo e no turismo de praia. Em termos de segurança, denota-se um aumento de condições que garantem e transmitem, não
Com grande satisfação tenho acompanhado o sucesso com que o País se tem desenvolvido só às populações como também ao turismo cada vez mais o bemestar e um sentimento de confiança. Com grande satisfação tenho acompanhado o sucesso com que o País se tem desenvolvido. A cada aniversário o País ganha um ritmo e cada cidadão tem a consciência de que sendo parte integrante da comunidade, ajuda a reinventar diariamente o ciclo de vida, cuidando melhor do seu bairro, da sua aldeia, da sua cidade, colaborando de modo intenso na erradicação da pobreza e no progresso do País. Envio o meu voto para que Moçambique continue buscando o seu desenvolvimento através das pequenas conquistas de cada dia. Parabéns nesta data tão auspiciosa!
Secção de Jornalismo, Associação Académica de Coimbra, Rua Padre António Vieira, 3000 - Coimbra Tel. 239821554 Fax. 239821554 e-mail: acabra@gmail.com
* Presidente da Mocimbra (Casa de Moçambique em Coimbra)
EDITORIAL O FIM DE UM CICLO, O ETERNIZAR DAS ATITUDES Em Março de 2005, a Associação Académica de Coimbra assinou, neste jornal, uma carta aberta dirigida ao recém-eleito primeiro-ministro português, José Sócrates. Nela se lançava o repto de “investir na educação por um país de futuro”; exigiam-se garantias de gratuitidade no ensino superior; recusava-se a utilização do Processo de Bolonha como “mais um instrumento de desresponsabilização do Estado pela educação”; demandava-se o reforço da acção social e defendia-se a autonomia universitária e o direito de representação dos estudantes. Quatro anos volvidos, os resultados são evidentes. Tivemos um ministro reformista, que quis mudar muita
“
mal afamado RJIES. Uma reforma autista, que não teve direito à discussão pública que uma medida de tão graves consequências deveria ter. Trata-se tão só de uma fuga do Estado às suas responsabilidades de promover um ensino gratuito, como prescreve a Constituição. É uma tentativa declarada de transformar as universidades em autênticas empresas, com uma lógica não pedagógica, mas económica. E quando o lucro é o objectivo, as pessoas são mais fáceis de sacrificar. Foi também esta reforma que afastou os estudantes dos órgãos de decisão das instituições de ensino superior, num claro atentado a todas as vitórias alcançadas contra quem os
Foram quatro anos de ataques ao núcleo duro dos direitos da comunidade estudantil
coisa, ouvindo muito pouco, à imagem do que fizeram alguns dos seus colegas nas respectivas pastas. Um ministro que apenas se preocupou com uma das áreas da sua governação, negligenciando outra e fazendo reformas contra as pessoas. Desde logo a aplicação do Tratado de Bolonha que, apesar de não ter sido assinado por Mariano Gago, foi por si posto em marcha com resultados negativos. Escudando-se em estatísticas e num provinciano “querer fazer ver” aos parceiros europeus, Bolonha foi aplicado sem olhar à realidade das universidades portuguesas. O ensino direccionado para o aluno, premissa que tanto fez sonhar os mais crédulos, depressa se mostrou uma miragem teórica, sem efeitos práticos, para além de sobrecarregar os estudantes e, consequentemente, afastá-los das actividades extra-curriculares. Seguiu-se o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior, o
tentou calar. E perante este cenário que, mais do que preocupante, é perigoso para a defesa dos direitos e garantias fundamentais de uma sociedade democrática, que fazem os estudantes? Se foram quatro anos de ataques ao núcleo duro dos direitos da comunidade estudantil, foram também quatro anos de imobilismo e acomodação de todos aqueles que deviam ser forças aglutinadoras da acção estudantil. O discurso, pré-definido e vulgar, perpetua-se e o medo de tomar uma posição, de adoptar acções realmente marcantes é maior. E, sem contestação, é mais fácil passar por cima dos interesses dos estudantes. Uma nova legislatura começa. Os problemas são os mesmos, agravados por quatro anos de erros. Pede-se que os estudantes parem para pensar em tudo aquilo que lhes tem sido tirado e reajam antes que haja mais para lamentar. João Ribeiro
Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA Depósito Legal nº183245/02 Registo ICS nº116759 Director João Ribeiro Editores-Executivos Vasco Batista, Catarina Domingos Editor-Executivo Multimédia: Maria João Fernandes Editores: Leandro Rolim (Fotografia), Diana Craveiro (Ensino Superior), Filipa Magalhães (Cultura), André Ferreira (Desporto), Maria Eduarda Eloy (Cidade), Bruno Monterroso (País & Mundo), Sara São Miguel (Ciência & Tecnologia) Secretária de Redacção Camilo Soldado Paginação Sara São Miguel, Sónia Fernandes Redacção Alice Alves, Ana Maria Coelho, Ana Rita Santos, Catarina Fonseca, Cláudia Teixeira, Filipa Faria, João Miranda, Luís Simões, Patrícia Gonçalves, Patrícia Neves, Pedro Nunes, Rui Miguel Pereira, Sónia Fernandes, Tiago Carvalho Fotografia Ana Maria Coelho, Camilo Soldado, Rafaela Carvalho Ilustração Lídia Dinis, Tatiana Simões Colaboraram nesta edição Alexandra Lacerda, Ana Maria Coelho, Artur Romeu, Cristiana Pereira, Jonathan Costa, Lídia Paralda Gomes, Maria Lastres, Marta Pereira, Miguel Custódio, Pedro Leitão Colaboradores permanentes André Costa, Camilo Soldado, Emanuel Botelho, Fernando Oliveira, João Gaspar, José Santiago, Mário Santos, Sofia Piçarra, Rui Craveirinha, Rui Miguel Pereira, Tânia Cardoso Publicidade Sónia Fernandes - 239821554; 914926850 Impressão FIG - Fotocomposição e Indústrias Gráficas, S.A.; Telefone. 239 499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: fig@fig.pt Tiragem 4000 exemplares Produção Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra Propriedade Associação Académica de Coimbra Agradecimentos Reitoria da Universidade de Coimbra, Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra
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TIRA MISSO :: Por André Costa
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Conselho de Adm. HUC
O muito aguardado silo-auto dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC) parece ter ganho finalmente pernas para andar. Após cerca de sete anos de deliberação, com muitas informações contraditórias de entremeio, foi anunciado pelo Conselho de Administração do hospital que o plano director dos HUC está a ser ultimado e contemplará a localização definitiva do silo-auto, que será construído até 2013. O projecto vai acrescentar inicialmente 900 lugares a uma zona que diariamente tem um movimento de 30 mil veículos. Resta saber se será desta vez que a obra avança. M.E.E.
Fórum AAC 2009
Após três dias de discussão, o Fórum AAC foi fraco de decisões. Numa altura em que é cada vez mais urgente discutir as problemáticas do ensino superior e em que a falta de financiamento põe em risco a continuidade de estudantes nas universidades, foram poucas as medidas palpáveis que saíram do fórum. Depois de um encontro que juntou todos os representantes dos alunos universitários era importante haver soluções. Impunha-se que três dias de reflexão fossem suficientes para que dirigentes e estudantes apresentassem mais do que discursos vazios. D.C.
Notas sobre arte...
Rogério Gonçalves
Rogério Gonçalves passou por Coimbra sem êxito. O técnico não conseguiu nenhuma vitória, em provas oficiais, enquanto treinador da Académica. Depois de ter sido alvo de muitas críticas e de forte contestação por parte dos adeptos e sócios da Briosa, o treinador acabou por rescindir o contrato que o ligava aos estudantes. Dois anos e nove meses é o tempo que Rogério Gonçalves não vence na liga portuguesa de futebol. Zé Nando, o treinador adjunto, foi quem assumiu a liderança da equipa, que esta semana deverá conhecer o novo treinador. A.F. PUBLICIDADE
SAUT DE L'ANGE • Willy Rizzo 1955 Nem ninguém lhes ligou coisa nenhuma. Dois corpos no ar a celebrar uma (in)sustentável leveza e ninguém lhes ligou patavina. Os habitantes do studium (R. Barthes) desta foto, em segundo plano, parecem estar de tal forma indiferentes aos “bailados”, que se transformam eles mesmos no punctum improvável (isto se este não o é sempre por natureza). Com uma atitude importunável, um lá-estão-eles-outravez-nisto, retiram todo o interesses e protagonismo ao salto épico da bailarina e do seu coreógrafo, que partilha com ela a levitação, Roland Petit. Repare-se na especial atitude do baterista que calmamente fuma o seu cigarro, desviou o olhar, rodou ligeiramente o pescoço, mas não muito. O interessante, para mim, é que ninguém parece realmente fazer caso do que se passa nesta espécie de bastidores do Opera de Paris. Por que estes dois
esforçaram-se, produzem pose (inevitável para quem sabe que vai ser fotografado diriam alguns). Willy Rizzo explica, em entrevista ao jornal The Guardian, que “fotografar a dança é como caçar”, exige rapidez. Para tirar esta foto Rizzo esteve bem atento aos sinais, primeiro os bailarinos ensaiaram uns breves e descontraídos passos como que adiantando o momento, enquanto isso Rizzo preparou a sua Rolleiflex. Com uma lente rápida e sem luzes de palco ou auxiliares, restou a luz suave e terna da janela. Em pequeno teve aulas de dança, o que talvez explique o brilhantismo dos seus vários trabalhos sobre o tema. No entanto, este fotografo de sucesso, não estudou a arte em lado nenhum, tendo-se tornado fotojornalista ao fotografar os julgamentos de Nuremberga. Por Rui Miguel Pereira