4 DE OUTUBRO DE 2011 • ANO XXI • N.º 234 • QUINZENAL GRATUITO DIRETOR cAmILO sOLDADO • EDITOREs-EXEcUTIVOs INês AmADO DA sILVA E JOãO GAspAR
Microconto por Urbano Tavares Rodrigues
acabra
“Dou-lhe Amor”
JORNAL UNIVERsITáRIO DE cOImBRA
Pág. 21
RAFAELA CARVALHO
O teatrO nas palavras de quem O sente É considerado hoje em dia um dos mestres do teatro espanhol contemporâneo. Mas António Onetti é mais que isso: é uma testemunha do teatro, um observador com voz ativa no ato da sua produção artística Pág. 12 e 13
nOvO diretOr dO taGv
Fernando Matos de Oliveira “O TAGV deve ser uma estação no trajeto da universidade para as artes e das artes para a universidade” Pág. 2 e 3
FóRUM AAC
TURisMO de COiMbRA
Algumas conclusões ainda por concretizar
Empresa municipal em risco de extinção
O fórum AAC, que acontece anualmente, é um dos espaços privilegiados de concertação dentro da Academia. O de 2011 teve já lugar no passado mês de maio. Contudo, faltam ainda materializar algumas das conclusões referentes ao fórum de 2010. Dos quatros painéis desenvolvidos durante este espaço de discussão o painel de ação social é o que mais ilações tem por concretizar. Falta de divulgação do Fundo de Apoio Social da Universidade de Coimbra (UC) e da ação social indirecta são apenas alguns dos problemas. Também o Observatório Cultural da UC carece de nomeação para que o estatuto do estudante cultural possa entrar em vigor.
O não cumprimento dos orçamentos previstos para a Turismo de Coimbra, nos anos 2007 e 2008, levou a que a oposição se começasse a manifestar e a pôr em causa a continuidade da empresa municipal. Depois da demissão da anterior administração, no mês de julho, a empresa está a cargo de Luís Providência, vereador responsável pelo turismo. Ainda não se sabe qual o futuro que a TC pode tomar, mas a extinção é uma das possibilidades. Contudo a aposta na reestruturação da empresa é uma das alternativas apontadas.
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Mais informação em
acabra.net
2 | a cabra | 4 de outubro de 2011 | terça-feira
destaque
Fernando Matos de oliveira• diretor do tagv
“Não basta dizer que estam aqui e que isto é alta cultura
“Se não vêm até nós vamos ter que lhes entrar no ‘facebook’, no ‘twitter’, ou na ‘homepage’. O que é claro para nós é que a porta aberta não garante casa cheia”, assevera Fernando Mato
João Gaspar Inês Amado da Silva
É desta que a montanha russa pára?
No final de maio, A CABRA lançava a imagem de um TAGV descaraterizado, entregue a produções itinerantes. Entretanto, a direção mudou e as relações com a fundação parecem agilizadas. Fernando Matos de Oliveira, o novo diretor, lança como desafio a restituição da imagem perdida, apostando no espaço do teatro como uma plataforma de ligação e diálogo entre universidade, cidade e agentes culturais. Parceria e colaboração parecem ser as palavras a repetir vezes sem conta quando se fala da futura programação do TAGV.
É professor da Faculdade de Letras, formou-se em Literatura Portuguesa, é coordenador do curso de Estudos Artísticos e agora diretor do TAGV. Como descreve a sua relação com as artes? É uma relação bastante diversificada porque me interesso por várias artes, e isso até carateriza o nosso tempo. E até o curso de Estudos Artísticos exemplifica isso: o curso tem um nome plural, significa que o mesmo propõe uma relação diversificada com as artes. Quando nós nos confrontamos com os criadores, reparamos que as fronteiras são muito difusas e isso tem muito que ver com o modo como nos relacionamos com as artes, como se cria, e até como se
programa um espaço de artes como o Teatro Académico Gil Vicente (TAGV). O Professor Osvaldo Silvestre, colega de Manuel Portela, afirmava que este tinha uma atividade intensa enquanto diretor, quase desumana, para conseguir pôr de pé uma programação consistente. Estando envolvido no curso de Estudos Artísticos e na direção do TAGV, acredita que possa ser complicado gerir as duas tarefas? Eu e a reitoria concordámos em termos um novo diretor-adjunto que é o Mickael de Oliveira, que fez o curso e o mestrado em Estudos Artísticos, foi para Lisboa, criou um projeto artístico chamado Coletivo 84, está a fazer um doutoramento na área dos
Estudos Teatrais e acumulou uma série de experiências que garantem que a equipa de direção atual esteja, à partida, mais confortável para responder às mudanças que queremos implementar. Não estou sozinho até porque qualquer trabalho deste tipo tem de se fazer de forma colaborativa. Já não há espaço para diretores únicos ou projetos personalistas. Se nas artes o regime de colaboração é um fator que está presente na criação, então na programação também tem que estar. Enquanto espectador sente algum tipo de dificuldade em encontrar programação do seu agrado em Coimbra? Já tive mais. Porque agora temos projetos em Coimbra como a Escola da Noite, o Teatrão, a Marionet e outros elementos e agentes. Estamos
muito melhor do que estávamos há 10 anos atrás. O que acho que falta em Coimbra é coser algumas partes soltas que temos na cidade. É encontrarmos formas de chegar às pessoas e de lhes mostrar o que é que estas várias partes estão a fazer. O TAGV pode ser a agulha? Nós gostávamos muito de ser essa plataforma. O que vamos fazer agora é propor periodicamente reuniões de coordenação com todas as pessoas, entidades e grupos que fazem programação cultural na cidade e juntar esforços em programas de divulgação. E isso permite maximizar o nosso esforço de chegar às pessoas. Por exemplo, a reitoria está a desenvolver uma agenda integrada das atividades de todas as unidades da Universidade de Coimbra (UC). Não havia nada que as unisse. E agora há
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destaque AnA FilipA SilvA
tam responsáveis por ele. Não é pelo facto de que o TAGV organize um evento que não passe a ser nossa responsabilidade exclusiva de arranjar formas de o manter. Todos nós somos responsáveis. Se somos responsáveis pelo espaço público, também somos corresponsáveis por aquilo que são os bens imateriais como a memória ou os acontecimentos. Como é que classifica a ligação existente entre o TAGV e a universidade nos últimos anos? Tem tido oscilações. Mas acho que ainda há muito por fazer. Antes, o ensino das artes, em relação à universidade, estava focado na História da Arte, depois apareceu Estudos Artísticos, depois Design e Multimédia, depois o colégio das Artes. Então o que aconteceu foi que atingimos um ponto em que a UC nunca teve uma relação com as artes tão diversificada e tão intensa como agora. Cabe-nos registar essa mudança no diálogo da universidade com as artes e incorporá-la nas atividades do TAGV e este não ser apenas um lugar onde programadores externos põem cá coisas, mas ser uma estação nesse trajeto da universidade para as artes e das artes para a universidade.
mos ra”
Matos de Oliveira. a possibilidade de unir a programação da UC mas também de colocar nessa agenda a programação dos grupos profissionais e da Câmara Municipal de Coimbra (CMC). É muito importante centralizar a comunicação. Algo que me choca particularmente, é Coimbra ter tido eventos que já tinham um capital simbólico que acabaram como os Encontros de Fotografia ou a bienal de teatro universitário. A cidade de Coimbra deve perceber a importância da continuidade dos projetos porque quando eles morrem é um capital humano e material que morre. É preciso acarinhar muito melhor estes eventos. Então como é que se pode manter a continuidade de um projeto desses? É fazer com que as entidades se sin-
Quais os exemplos que pode apontar para reforçar o elo entre esse dois pólos? Vamos propor regularmente workshops para os alunos. A nossa ideia é a de que cada criador que venha a Coimbra, e em particular ao TAGV, e possa realizar um workshop. Isso multiplica tremendamente aquilo que podemos oferecer em termos de projeto educativo - os espectadores e os interessados podem simultaneamente ver e fazer. Esta proposta é parte da missão que queremos que o TAGV desempenhe - ser um parceiro na formação e na qualificação dos cursos e dos estudantes. Queremos que os alunos nas artes também coprogramem, que nos desafiem com projetos. Também podemos eventos em coprogramação, ou sermos uma entidade de parceria em trabalhos de investigação e em estágios. A ideia é pluralizar ao máximo as possibilidades de colaboração entre o TAGV e a UC. E que espaço é que as secções culturais e organismos autónomos da Associação Académica de Coimbra (AAC) vão ter dentro do TAGV? Nós queríamos que a relação que o TAGV tem com a AAC não fosse uma relação puramente passiva. Vocês querem um espaço para apresentar um evento ao público e ponto final. Isso não é muito interessante. Nós queríamos participar em projetos de interesse comum, queríamos envolver os grupos de teatro universitário, com eles a programar ou a contribuir para a programação deste espaço. Queríamos também que alguns eventos que acontecem, como o Caminhos, pudessem ser mais conservados e dialogados connosco. No fundo o que queríamos era criar um
envolvimento com a programação sem sermos um mero espaço de aluguer. Entrando num campo mais económico, qual o financiamento atribuído ao TAGV pela Fundação Cultural da UC? Nos últimos dois anos, o TAGV não teve uma verba identificada para programar e isso é difícil para uma casa como esta. O que conseguimos foi uma verba para este período de setembro a dezembro que tem uma componente de programação e outra de equipamento, e que anda à volta dos 80 mil euros. Para o ano queremos uma verba mais confortável que permita que, em termos de gestão de programação, possamos agir a tempo. Porque programar sem uma verba identificada não permite trazer os projetos no tempo devido ou sequer ter uma capacidade de compromisso. O desafio que temos pela frente, no âmbito da Fundação Cultural da UC, é a capacidade de encontrar fontes alternativas de financiamento. E esses financiamentos alternativos vão ser suficientes para uma programação de qualidade? Não vão ser os ideais mas acreditamos que nos sobra margem para fazer mais e melhor. Há um aspeto importante de frisar: nem tudo o que se pode fazer de programação no TAGV exige, necessariamente, grandes recursos. Temos tido uma experiência surpreendente de quanto podemos fazer com pouco dinheiro. E isso exige da nossa parte grande capacidade de negociação e persuasão de produtores, agentes e criadores, que percebem o lugar especial que o TAGV ocupa. E tem sido, por vezes, inacreditável a disponibilidade e recetividade que encontramos. Algumas pessoas apontam críticas à fundação. Por exemplo, Abílio Hernandez, antigo diretor do TAGV, acredita que a Fundação Cultural desvaloriza o teatro e que não contribui em nada para o financiamento do mesmo. Consegue encontrar vantagens no sistema fundacional? A fundação é um quadro institucional mas também um instrumento. E pode ser bem usado ou mal usado. Nós queremos é que aquilo que a fundação permite em termos de autonomia seja aproveitado da melhor forma. Houve alguma tensão entre a fundação e o TAGV. Isso é verdade. Mas também é verdade que a nova direção deseja que esta relação seja de cooperação e, até agora, tem nos permitido fazer algumas coisas em termos de programação que, de outra forma, não teríamos possibilidade de fazer. Já frisou a vontade do TAGV voltar a ter uma programação própria. Vamos deixar de ver Rucas e Cinderelas em Patins no palco do teatro universitário?
O TAGV não pode dispensar uma política de programação com capacidade de gerar receitas. Mas não tem necessariamente de ser feito como tem sido até agora. O Ruca já tem uma máquina de publicidade por trás, que nem é nossa, porque é que nós vamos estar a consumir os nossos recursos nisso? Se o TAGV tem dias sem ocupação, esses dias podem ser usados para esse tipo de espetáculos ou para atividades de escolas, ou no âmbito do aluguer da sala para congressos. Isso praticamente não chega à nossa programação, não está visível, alimenta de algum modo o teatro e é importante para dar mais receita ao teatro. O que queremos é valorizar os nossos critérios. O problema foi que, nos últimos dois anos, produtos bastante comerciais e de itinerância nacional tomaram muito do espaço que o teatro tinha. O que falhou para essa descaracterização do TAGV? Acho que foi o tal ruído entre o teatro e a fundação cultural. Não havia uma autonomia de gestão da programação tão grande como aquela que temos e isso condiciona as possibilidades de programar. E com isso o teatro académico perdeu alguma da imagem que tinha. Com esta nova linha de direção do TAGV, pretendem também apostar na criação contemporânea internacional? Há duas formas privilegiadas para termos a presença de criadores internacionais. À partida, quando são criadores com um trajeto reconhecido têm um cachet elevado, então tentamos trazer esses artistas por via dos programas QREN, em rede com outros teatros. Outra via, que não tem sido muito explorada, são criadores que estão a aparecer, de grande qualidade, jovens, e que aceitam o desafio de vir para cá. Isso exige de nós uma extrema atenção do que se está a fazer no estrangeiro e usar a nossa capacidade de persuasão e mobilização desses criadores. E faz sentido esta via, visto sermos um teatro universitário. Vai haver a possibilidade de residências artísticas? Gostávamos muito de avançar com dois aspetos. Um deles é o dramaturgo residente. Um deles será o Tiago Rodrigues no 1º semestre de 2012. Queremos que o teatro seja conhecido por ter um dramaturgo residente, algo nada frequente a nível mundial. A residência seria por seis meses, porém não significa que o dramaturgo viva em Coimbra durante seis meses, mas que fica em diálogo especial connosco durante esse tempo. Depois, queríamos também que o TAGV pudesse ter uma residência associada ao teatro, o que permitia que pessoas que convidássemos para espetáculos tivessem um lugar onde estar. Tal, permitia-nos fazer mais com menos. Se a universidade tem espaços, se tem cantinas, se tem teatro, se pusermos isto tudo a dialogar, de repente podemos fazer três vezes mais com o mesmo di-
nheiro. Isso permite realmente multiplicar os eventos e multiplicar o orçamento. Falou em como potenciar a relação entre o TAGV e a UC. E com a cidade? Com o público da cidade? Das coisas mais difíceis para nós é construirmos um projeto de comunicação e um público. Porque o teatro tem vivido alguma oscilação, às vezes com um fim abrupto em termos de direção, e a continuidade de projetos de comunicação com a cidade tornase um problema. Temos que tentar usar a nossa relação de privilégio com a CMC e a UC para chegar às pessoas. Qual a dificuldade? Enquanto que a Escola da Noite ou o Teatrão estão continuamente a trabalhar e vão criando rotinas, mecanismos de habituação, o teatro vive num para-arranca que é muito problemático. E é uma das missões mais difíceis que têm pela frente? Temos de conseguir dizer aos estudantes que estão no Cartola que vale a pena vir aqui. E isso implica chegar às pessoas doutra forma. Mostrarlhes que estão a perder qualquer coisa. E não apenas dizer o habitual do estamos aqui e isto é alta cultura. Temos que entender que as atividades culturais que se descuram na comunicação não têm sucesso. Eventualmente, nos anos 60 só tinha que abrir as portas, antes da internet, da ‘playstation’, antes de uma série de competidores no espaço público e do entretenimento. Como é que gerimos esse espaço, onde os desejos, as insatisfações, a imaginação e a provocação ocorrem? Já não é só nas artes tradicionais, é também nos videojogos, é no ‘home cinema’, é na ‘meobox’. Porque é que uma pessoa se vai dar ao trabalho de sair do sofá, de chinelos e pijama, para vir ao teatro? Não podemos pôr a cabeça na areia e dizer que eles vêm de certeza. Parece o menos, mas farto-me de pensar nisso. E como demonstrar ao público o que estão a perder? Temos que ser mais ousados e mais diretos na relação com o público. Se não vêm até nós temos que lhes entrar no ‘facebook’, ou no ‘twitter’, ou na ‘homepage’. Eventualmente, usar mais videoclips de espetáculos, ter uma ‘mailing-list’ mais personalizada em que os e-mails dos estudantes possam estar indexados. O que é claro para nós é que a porta aberta não garante casa cheia. As formas tradicionais de cultura têm uma concorrência muito forte das experiências individuais, pessoais ou virtuais. E três anos chegam para fazer esse trabalho? Pelo menos nós gostávamos de o fazer bem e de um modo sustentado nesses três anos. Eu acho que em três anos, apesar de tudo, pode-se fazer muita coisa. E se as coisas forem feitas em crescendo, de forma contínua e consistente, isso já é um motivo de satisfação.
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EnsinO supEriOr
Ação Social marcará de novo o ano letivo Movimentos estudantis consideram negativo e insuficiente o novo regulamento de atribuição de bolsas. Manifestação ainda este semestre é uma possibilidade Inês Balreira A publicação do novo regulamento de atribuição de bolsas no passado dia 21 de setembro veio marcar o início deste novo ano letivo. Apesar de algumas mudanças em relação ao anterior regulamento, o novo documento é criticado pelos estudantes. Hugo Ferreira, do movimento AACção, destaca como negativo o atraso da publicação do novo regulamento. “Na melhor das hipóteses os processos só vão começar a ser analisados no final do ano e as primeiras bolsas atribuídas em janeiro”, refere
Sílvia Franklim, da Frente de Acção Estudantil (FAE), e considera que este regulamento não está ao nível do que eram as exigências dos estudantes. “Estamos muito longe do que eram as nossas reivindicações e ainda estamos muito agarrados àquilo que era o decreto-lei 70/2010”, afirma. André Martelo, do movimento A Alternativa És Tu, vê este novo regulamento com o “objetivo de diminuir o número de alunos abrangidos pelas bolsas”, sendo que “promove os empréstimos, como forma dos estudantes pagarem os estudos”. No arranque do novo ano letivo, para além das preocupações a nível da ação social, os estudantes destacam outras prioridades que marcarão o ano letivo a nível reivindicativo. Hugo Ferreira salienta a importância “de se voltar a discutir e fazer um balanço crítico da introdução e implementação do Processo de Bolonha na Universidade de Coimbra”. O representante da AcÇão alerta ainda para o “silencioso aumento do valor das propinas, que começam assumir valores
impagáveis aos bolsos da maioria dos estudantes”. Por sua vez, o presidente da direção-geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC), Eduardo Melo, chama à atenção para as consequências que a redução do investimento nas instituições de ensino superior (menos 8,5 por cento no orçamento de estado) pode vir a ter na qualidade do ensino.
Moção aprovada na última AM Na última Assembleia Magna (AM) a DG/AAC ficou veiculada a convocar uma manifestação de caráter nacional caso o Ministério da Educação e Ciência (MEC) não cumprisse os objetivos do caderno reivindicativo proposto pela AAC no dia 24 de março, dia do estudante. Eduardo Melo afirma que “neste momento é difícil perceber se vale a pena ir para a rua ou não”, uma vez que “o ministério ainda não se pronunciou sobre nada”. Por sua vez, André Martelo assegura que faz sentido “avançar com a manifestação e todas as formas rei-
vindicativas que os estudantes encontrem para alertar para os seus problemas”. Hugo Ferreira partilha da mesma opinião, uma vez que “a atividade de contestação é uma condição necessária para a resistência neste contexto de corte e de agressividade social que o novo governo tem evidenciado”. A representante da FAE considera a manifestação necessária, no entanto, “ela só por si não chega”. “Não se pode levar as pessoas para Lisboa, levar as mãos cheias de nada e regressar com as mãos cheias de nada e dizer que foi uma vitória histórica”, afirma Sílvia Franklim. Ontem decorreu o Encontro Nacional de Direções Associativas extraordinário, no Porto, convocado para a análise do regulamento de atribuição de bolsas de estudo. Ainda ontem, quatro meses depois, os estudantes de Coimbra reuniram em AM para discutir o financiamento do ensino superior e o novo regulamento de atribuição de bolsas. Até ao fecho da edição estes eventos ainda não tinham decorrido.
“A contestação é necessária para a resistência no contexto de corte e agressividade social que o novo governo tem evidenciado”, afirma Hugo Ferreira
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cabra net
Acompanhamento da AM
Arquivo
Para além da ação social, o movimento estudantil destaca o corte no financiamento para o ensino superior como preocupação para este ano letivo
Observatório de Bolonha da AAC passa a Fórum Pedagógico O espaço de debate recém-revitalizado pretende ser um local de discussão em torno de questões pedagógicas que extrapolem a problemática de Bolonha Inês Balreira Em 2007, a Associação Académica de Coimbra (AAC) criou o Observatório de Bolonha com a função de refletir sobre os proble-
mas subjacentes à implementação do Processo de Bolonha na Universidade de Coimbra (UC). Inativo desde a direção-geral da AAC (DG/AAC) de Miguel Portugal, o observatório passou nos últimos tempos por um processo de revitalização. Em junho passado, o coordenador geral do pelouro da Pedagogia da DG/AAC, Rafael Duarte, anunciou que a intenção seria transformar o observatório para um fórum de discussão de âmbito pedagógico. “Mais que debater Bolonha, temos que debater todas as questões pedagógicas que se suscitam na UC”, revela a vice-presidente da
DG/AAC, Maria Inês Correia. Assim, no início do mês passado, a DG/AAC concretizou a revitalização do observatório, passando para um “modelo mais dinâmico e proveitoso de trabalhar”, como afirma o presidente da direçãogeral, Eduardo Melo. A base de trabalho deste novo fórum pedagógico assenta em conferências de esclarecimento periódicas, abertas a toda a comunidade académica, que contam com vários oradores convidados. Posteriormente, como esclarece Rafael Duarte, existe, à parte, “um programa calendarizado com sessões de discussão in-
terna”, exclusivo para dirigentes estudantis, onde se vão retirar conclusões acerca do tema debatido e se vai tentar encontrar soluções para os problemas pedagógicos. O fórum, cuja primeira sessão decorreu a 21 de setembro no auditório da Faculdade de Economia da UC, sob o tema “Ensino Centrado no Estudante”, tem conferências calendarizadas até 21 de novembro. Depois desta data, a continuidade do novo espaço de debate “dependerá de quem vier a seguir, mas acima de tudo do reconhecimento que as pessoas tenham das valias ou não do fórum”,
afirma Eduardo Melo, referindose à DG que vai tomar posse no início de 2012. O dirigente expressa ainda que “estas valias podem ser boas marcas a deixar para o futuro da AAC”, no entanto, “vamos ver qual é o entendimento dos nossos sucessores”. Maria Inês Correia revela também que o objetivo desta direçãogeral é, no final do mandato, deixar um “documento de trabalho, que por um lado seja regulamentador de todas as boas práticas deste semestre mas também um documento que a próxima DG possa utilizar”, para redirecionar o fórum pedagógico.
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EnsinO supEriOr
Um ano e um Fórum depois, conclusões não aplicadas
CAmilo SoldAdo - Arquivo
A maioria das conclusões não aplicadas prendem-se com órgãos que não estão criados ou divulgação que não foi feita. Dirigentes dizem que as conclusões são meramente indicativas. por inês Balreira
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ma vez por ano, geralmente em setembro, representantes dos núcleos, do senado universitário, conselho geral, conselho fiscal e direção-geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC) reúnem-se num espaço de discussão, o Fórum AAC. Este espaço, criado em 2001, é um local onde se fomenta o debate e discussão em torno de assuntos que vão desde a pedagogia à ação social e que funciona como forma de os dirigentes definirem as diretrizes para cada ano letivo. O Fórum AAC 2011 realizou-se, contrariamente ao habitual, no mês de maio. O presidente da DG/AAC, Eduardo Melo, explica que desta forma “existe mais espaço para a DG refletir sobre as conclusões que são tiradas e poder implementá-las no seu trabalho”. Contudo, apesar de o fórum deste ano já ter ocorrido existem conclusões provenientes do Fórum AAC 2010 que ainda não foram postas em prática. Confrontado com este facto, o atual vice-presidente da DG/AAC e coordenador geral do pelouro dos núcleos no mandato anterior, Phillip Santos, explica que o fórum apenas serve para “definir algumas linhas orientadoras” e que as conclusões retiradas não são vinculativas.
Que conclusões restam aplicar? Dos quatro painéis trabalhados durante o fórum (Qualidade e Financiamento no Ensino Superior (ES), Ação Social, Cultura e Desporto na UC e Formas de Intervenção Política) o de Ação Social é o que mais conclusões tem por aplicar. Uma das conclusões é relativa ao Fundo de Apoio Social aos Estudantes da UC, onde se concluiu a existência de um decréscimo do número de estudantes incluídos neste fundo. Uma das razões apresentadas para este facto é o possível desconhecimento por parte da comunidade estudantil. A solução
passaria por uma maior divulgação por parte dos Serviços de Ação Social da UC (SASUC) e junto dos núcleos. O vice-presidente da DG/AAC afirma que a difusão está para breve. “Iremos aproveitar a Festa da Latas para passar uma mensagem política e informativa junto dos estudantes, através de ecrãs gigantes. É uma fase em que os estudantes estão aglomerados e se passa melhor a mensagem”, explica. Também se concluiu que a ação social indireta (que engloba serviços de alimentação, alojamento, serviços médicos universitários, lavandaria e gabinete de aconselhamento psicopedagógico) não estava a ser divulgada da melhor forma. Em maio passado, Phillip Santos assegurou ao Jornal A Cabra que estava “para breve uma campanha informativa” relativa a este tema. O presidente da DG/AAC, Eduardo Melo, responde que esta divulgação foi feita durante a semana de matrículas dos novos estudantes. O dirigente acrescenta que ainda neste mandato avançará uma “divulgação através da internet, nomeadamente através da página do Facebook e do site da AAC”. A verdade é que o site está já há algum tempo com problemas técnicos, que no entanto, Eduardo Melo garante estarem a ser resolvidos. Contudo, o presidente da DG/AAC alerta para o facto de o “maior problema neste momento não ser a falta de divulgação da ação social indireta, mas sim a sustentabilidade destes serviços”, que é posta em causa com a “diminuição da verba para o funcionamento dos serviços”. Por sua vez, Phillip Santos acrescenta que o gabinete de apoio psicopedagógico é um projeto que está a ser trabalhado com estudantes de Psicologia e que “está para arrancar”, sendo um projeto que a DG/AAC quer lançar antes do final do mandato. As deficiências das residências universitárias, sendo uma forma de ação social indireta, foram também alvo de discussão. O vice-pre-
Antes do final do mandato, a atual dG/AAC pretende realizar outro arraial social para equipar as residências sidente afirma que ultimamente a DG/AAC tem estado em contacto direto com os residentes para saber dos seus problemas. Como forma de colmatar a falta de meios nas habitações Phillip Santos relembra o arraial social organizado no ano letivo transato. “Fizemos na altura o arraial social para conseguir receitas, que acabou por dar mais dinheiro do que esperávamos”, afirma. O dirigente acrescenta ainda que é intenção da DG/AAC “organizar outro até ao final do mandato para equipar as residências”. Do painel de ação social saiu ainda a conclusão de que os certificados de habitabilidade emitidos pela AAC eram pouco detalhados e a proposta de criação de um gabinete, “cujo funcionamento se regesse sob a forma de voluntariado”, para informar e colmatar as falhas dos certificados. “ Isso tem que ser criado de raiz e logo no início de uma DG”, avança Eduardo Melo, confirmando a não criação do referido gabinete. A explicação do presidente da DG/AAC prende-se com o facto de sendo um gabinete em regime de
voluntariado ser “complicado motivar”.
Conclusões dos restantes painéis Das conclusões retiradas em torno do painel “Qualidade e Financiamento no ES”destaca-se a proposta de criação de um novo órgão na UC, de caráter consultivo, que teria como principal missão “o fomento das trocas de experiências pedagógicas entre as faculdades da UC”, como descreve o documento de conclusões do fórum. Contudo, este órgão não foi criado. Eduardo Melo explica que a criação deste órgão teria que ser feita em conjunto com a reitoria e que “este tipo de alteração de fundo para já não avançará”, uma vez que “a grande preocupação da reitoria neste momento é apresentação do plano de desenvolvimento a médio/longo prazo da UC”. Relativo a este painel ficou ainda documentado o incentivo à concertação entre estudantes eleitos para os conselhos pedagógicos, núcleos e DG/AAC, de forma a criar um debate mais produtivo. O vice-presidente da DG/AAC diz
que para concretizar este ponto “está prevista a criação de um espaço de discussão”, em ambiente informal. Phillip Santos avança que os moldes deste “local de debate” serão os de uma Assembleia Magna, e que o espaço será provavelmente a cantina dos grelhados. Do Fórum AAC 2010 saiu também a ideia da criação do estatuto do estudante cultural, para os estudantes que participem nas secções culturais no âmbito da AAC. O referido estatuto foi elaborado e aprovado em senado universitário em dezembro do ano passado, mas ainda não está em vigor. Para que possa vigorar o estatuto carece da criação e nomeação do Observatório da Cultura da UC (OCUC). O reitor da UC, João Gabriel Silva, disse em junho ao Jornal A Cabra que a nomeação do OCUC seria feita ainda antes do início das férias de verão. Porém, Eduardo Melo afirma que o reitor ainda não nomeou o observatório. O dirigente acrescenta que a implementação deste novo estatuto “tem sido uma prioridade até agora, mas não o tem sido para a reitoria da UC”.
6 | a cabra | 4 de outubro de 2011 | terça-feira
ensino sUperior Jorge gouveia monteiro• AdministrAdor dos serviços de Ação sociAl dA UniversidAde de coimbrA
“Este regulamento é feito para a contenção da despesa” Camilo Soldado No início do ano letivo, o administrador dos Serviços de Ação Social da Universidade de Coimbra (SASUC) comenta o novo regulamento de atribuição de bolsas e os problemas orçamentais dos serviços de ação social Em entrevista ao Jornal A Cabra em 2010, dizia que o modelo de escalões estava desadequado e propunha um grau contínuo ou linear. Este regulamento de atribuição de bolsas é mais justo que o anterior? Considero que ganhámos a batalha de acabar com os escalões mas o que acaba de sair é um regulamento para a contenção da despesa. Baixa o valor da bolsa de referência quando as despesas de manutenção no ensino superior (ES) não baixaram. Não há explicação para que a bolsa de referência fosse de 6017,52 euros e tenha baixado para 5611,19. O diploma não a dá, as declarações do senhor ministro também não e quatrocentos euros num ano é uma descida considerável. É verdade que este regulamento resolve algumas coisas. A forma iníqua de empolar os rendimentos das famílias por redução do divisor de membros do agregado familiar está resolvida. Na simulação que fizemos, com cento e dois processos, detetámos que em vez de 212 508 euros, o estado
gasta 200 264, ou seja, poupa 12 mil euros. Não falei daqueles alunos que beneficiaram da bolsa de transição no ano passado porque muitos vão ficar sem bolsa. Fizemos uma seleção aleatória para esta amostra e há um número significativo de casos de perda de bolsa. Para além da descida da bolsa máxima, que falhas vê no novo regulamento? Começava pelos pontos positivos porque também os há. Este regulamento denotou uma postura mais séria do governo relativamente à questão do aproveitamento escolar. Há uma maior exigência de 60 por cento dos créditos em vez dos 50 por cento do ano passado. Mas preocupava-me sobretudo o caso dos alunos que tinham ‘part-times’ e que foram confrontados no ano passado com a subida brusca do critério de aproveitamento. Pelo menos desta vez foi-lhes dado um ano para se adaptarem. Há questões que este regulamento não resolve: os lucros das ações tributáveis em sede de IRC não entram para as quotas. Acho isto negativo porque naturalmente o pai ou a mãe podem não ser gestores da empresa mas sendo acionistas, têm rendimentos muito significativ o s p o r e s s a via.
Também não é claro, em termos de regulamento como é que o aluno comunica uma alteração que acontece a meio do ano na sua situação económica, como a morte do pai ou uma situação brusca. O benefício de transporte continua a ser restrito a alunos das regiões autónomas, portanto continua a trabalhar-se numa ficção em que ser de Coimbra ou de Vila Real de Santo António é o mesmo em termos de despesa.
centenas de estudantes a concorrer ao fundo de apoio da universidade. Além das candidaturas a bolsas, temos um número importante de candidaturas ao fundo de apoio que são apreciadas pelos mesmos técnicos. No ano passado tivemos 500 reclamações, a imensa maioria eram reclamações políticas. Isso dá um trabalho imenso a analisar, à procura de que, eventualmente, tivesse havido alguma falha.
Em que ponto está o processo de atribuição em Coimbra? Está a zero.
Em 2010 dizia que o principal problema dos SASUC era o financiamento. Quais são os principais problemas neste momento? Vejo-me obrigado à coerência de manter a afirmação. O problema agravou-se. No ano passado fomos confrontados com um corte abusivo na ordem dos trezentos mil euros e este ano há um corte proporcional ao da UC, de 8,54 por cento, o que se traduz em menos quatrocentos e oitenta mil euros de financiamento aos SASUC. O financiamento do orçamento de estado mantinha-se em 5,5 milhões há quatro anos seguidos. O valor caiu para quatro milhões oitocentos e quarenta mil euros. Isso significa que os SASUC estão privados de reabilitar e conservar as suas instalações. Neste momento estamos com muita dificuldade em resolver alguns problemas nos restaurantes mais antigos e em algumas residências estamos com dificuldade em cumprir as nossas obrigações de senhorio.
O secretário de estado do ES, João Queiró, disse que as bolsas deviam ficar pagas até ao fim de outubro. Isso é possível? Não vejo que o seja. As universidades foram compelidas a aderir à plataforma eletrónica do ministério. Coimbra acreditou no despacho mas a plataforma não está afinada ao novo regulamento. Há muitos alunos do primeiro ano que não perceberam que podiam concorrer quando fizeram a candidatura ao ensino superior. Não me parece razoável avançar com uma declaração pública com o prazo de outubro e estarei muito atento a qualquer tentativa de crucificar os serviços de ação social pelos atrasos. Já vimos a tentativa de pôr os estudantes à porta dos Serviços de Ação Social. Mesmo que eu queira atribuir uma bolsa hoje, não posso. Disse também na entrevista de há um ano e meio que a plataforma eletrónica iria acelerar mais o processo… Ela tem essa fama. Se estivéssemos a trabalhar com a nossa ferramenta própria, já teríamos alguns processos francamente avançados, designadamente as candidaturas de renovação de bolsa, que serão quatro mil. Nem essas conseguimos atribuir enquanto a plataforma não estiver a funcionar. No ano passado os processos de atribuição de bolsa foram concluídos em abril. Que data apontaria para este ano? Neste momento é impossível avançar com uma previsão. Temos tido uma sobrecarga m u i t o grande de trabalho porque quando as bolsas baixam ou demoram, há algumas
Rafaela CaRvalho - aRquivo
O contrato do InTocha com a Associação Académica de Coimbra (AAC) cessa este ano. Os SASUC estão interessados na concessão do bar? É um rumor. Não escondo o desagrado pela maneira como o bar dos jardins funciona, que tem sérias consequências para os SASUC. Estamos a suportar todo o consumo de eletricidade e estamos à espera que no-lo paguem mas também estamos insatisfeitos pela falta de cumprimento de alguns elementos do contrato com a AAC, como a limpeza e a licença das casas de banho tardia. Toda a manutenção tem consequências muito graves para nós e para o Teatro Académico Gil Vicente (TAGV). Isso já foi discutido com o InTocha. Também é conhecido que tenho a opinião que os SASUC deviam ter uma linha autónoma mais virada para os bares. Tenho uma proposta de criação de uma empresa filha dos SASUC que pudesse concorrer a essas situações, como o bar do TAGV, a nova cafetaria da unidade central do Pólo III, bares das faculdades, etc. Se o contrato realmente findar e a DG/AAC quiser discutir isso seriamente com os SASUC, nós estamos nisso.
Mestrados da FLUC com prazo de entrega especial Camilo Soldado Os prazos para a entrega de dissertações, projetos e relatórios de estágio dos cursos do segundo ciclo da Universidade de Coimbra (UC) foram estipulados para 29 junho, com as provas públicas a decorrer de 2 a 25 de julho. Esta medida veio alterar as datas de algumas faculdades que tinham como prazo limite de entrega 15 de Outubro, de modo a uniformizar os prazos de todas as faculdades. Tal diretriz da reitoria veio “clarificar os procedimentos que não estavam a ser praticados em todas as unidades orgânicas da UC, com casos de manutenção dos prazos pré-Bolonha”, explica a vice-reitora para a Pedagogia do 1º e 2º ciclo, Madalena Alarcão. O coordenador do mestrado em Comunicação e Jornalismo, Carlos Camponez, refere que a “decisão não foi completamente aceite pela Faculdade de Letras da UC (FLUC)”. O docente refere que os novos prazos “não têm em conta os alunos que já foram para estágio” e lembra que “alguns cursos têm condições particulares”. No entanto, apesar de o diretor da FLUC, Carlos André, concordar com a decisão de se acabar o ano letivo ao mesmo tempo em todas as unidades orgânicas da UC, “era necessário adiar o prazo devido às especificidades da Faculdade de Letras”. O que acabou por acontecer e a data para a entrega é agora a 28 de setembro, sendo esta alterada no futuro, naquilo que Madalena Alarcão classifica de “período de transição”, até que se “atinja uma harmonia de procedimentos”. A membro do conselho científico da FLUC, Ana Teresa Peixinho, refere que o Jornalismo seria “uma das áreas a ser afetada por este calendário”. No entanto, a docente realça “o papel importante do diretor da FLUC” ao “tentar negociar e ao ter conseguido esta exceção”. Para o docente Carlos Camponez, “o interessante do relatório de estágio é o confrontar da base teórica adquirida na faculdade com a experiência adquirida”, o que seria impossível com o novo prazo estabelecido pela reitoria. A manterse a data estabelecida a início, o docente tinha dúvidas se iria “baixar o nível de exigência dos trabalhos”. Apesar de Ana Teresa Peixinho considerar que seria impossível “ler, arguir e presidir a júris de teses de mestrado” todos os dias em julho, a docente entende que “a diminuição de qualidade dos trabalhos não decorre deste calendário mas da aplicação de Bolonha, naquilo que ela teve de pior”.
Com Inês Amado da Silva e João Gaspar
4 de outubro de 2011 | terça-feira | a
cabra | 7
cUltUrA
As interioridades abrem a temporada do CCDD
cultura por
cá
inêS amaDo Da Silva
“interioridades” não é só o mote artístico da exposição de pintura – marca também a posição do centro cultural dom dinis no seu papel como agente cultural
4 OUT
“De ombro na ombreira”, De alexanDre o’neill arTeS cénicaS cenTro culTural Dom DiniS 21h30 • enTraDa livre
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mão mortA múSica TaGv 21h30 • 12 euroS
Inês Amado da Silva Arménio Diniz Santos, nascido em 1957, em Belmonte, arrecada já quase tantas exposições como anos de vida. Artista plástico e professor primário, entretanto retirado, mostra a fotografia do neto e gaba o elogio lido e gravado pelos filhos, que ecoa na galeria do Centro Cultural Dom Dinis (CCDD) enquanto a exposição decorre. “De cada vez que exponho”, confessa, “é como se fosse a primeira vez. Quando a exposição termina há também um certo vazio”, reconhecendo que “ainda tem dificuldade em se considerar artista”. Apesar disso diz-se “satisfeito” com o que faz: “quem vê uma tela destas, identifica-se, essa é a minha satisfação”. Arménio Diniz Santos admite, também, que tem deixado de vender algumas telas “se disserem que ficam bem com os cortinados”. “A pintura, por norma, é tudo menos o que se tem visto por aí”, assevera. Para o artista, a pintura revela-se “uma forma de regresso às origens”. “Uma tela nunca tem preço; serão sempre minhas”, afirma, explicando ainda acreditar que o conteúdo de uma tela está sempre dentro do artista, precisando apenas do momento certo para ser exteriorizado. É o seu interior que Arménio Diniz
6
OUT
“três vidAs e UmA só
há 15 anos, em Paris, arménio Diniz Santos selecionou nove cores - aquelas com que ainda hoje pinta Santos expõe, assim, desde 19 de setembro e até 15 de outubro. As suas “Interioridades”, literalmente.
Uma obra peculiar Um dos grandes impulsos para o trabalho de Arménio Diniz Santos foi o elogio que, em tempos, lhe fez Sommer Ribeiro, arquiteto português e diretor do Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian entre 1983 e 1994, dizendo que a sua obra não se assemelhava a nenhuma outra que conhecesse. O artista afirma não se identificar com nenhuma corrente artística específica, e o conteúdo da sua obra é peculiar. “Já sentiste a solidão?”, interroga. Embora ela seja um dos maiores autocolantes no estereótipo do artista, Arménio quebra, de alguma forma, com a conceção, diferenciando também a sua obra com a abordagem de temas como a maternidade, um dos que lhe é “mais caro”. Outra das suas obras em exposição foi pintada aquando do nascimento do neto, na
qual colocou um envelope, por detrás do quadro, “com o que toda a gente [da família] estava a sentir naquele momento, para ele ler aos sete anos”. “Interioridades” é um conjunto de sensações estéticas suaves, aprazíveis, semelhantes entre si, de conteúdos harmoniosos e histórias. Há uma aura comum às suas obras, transmitida essencialmente pelos roxos, azuis e amarelos dourados que, maioritariamente, Arménio utiliza. “Já pinto com as mesmas cores há 15 anos” - as nove cores que selecionou enquanto viveu em Paris. Sentindo necessidade de mudar algo na sua vida, Arménio Diniz Santos partiu para a capital francesa por um período de quatro anos, algo que marcou também a sua obra. Da convivência com a cultura árabe que naquela cidade manteve, resultam influências na sua obra, nomeadamente as formas mais ondulantes que aponta no seu autorretrato, a primeira obra na galeria. “Paris é
uma cidade fantástica”, assegura o artista - “tudo passa por lá, e ou absorvemos ou estagnamos. Eu preferi viver mesmo”.
Liliana Cunha Ana Duarte Que esperar de um jovem de 24 anos com um desgosto amoroso? Das duas uma: um estado permanente de inércia ou um grito de agonia. No século XIX, respondia-se às vicissitudes da vida com arte. E foi o que fez Alfred de Musset, dramaturgo francês. Este vivia em perfeita comunhão amorosa com a escritora George Sand, uma autêntica “Vénus de Milo” das Letras – era o mito da mulher ideal. Fazendo a transposição para a realidade, Sand revelou-se “dema-
siado letrada” para Musset – entenda-se libertina - , desatando-se com facilidade do sentimento. Pelas terras do Renascimento, Musset adoece e George Sand troca-o pelo médico do dramaturgo. Deste infortúnio, o artista francês retira um ensinamento importante: ‘on ne badine pas avec l’amour’, que, mais tarde, se tornaria num dos maiores sucessos do teatro romântico. Mas não se ficou por aí; o desgosto despoletara um processo de catarse tal, que Musset imprimiu nas palavras a sua dor: escreve duas peças (“Não Se Brinca Com O Amor”, traduzida, e “Lorenzaccio”) e uma obra autobiográfica - “A Confissão Do Filho Do Século”. Jorge Silva Melo é o responsável pela revitalização do clássico para a contemporaneidade. Diretor da companhia de teatro “Artistas Unidos”, Silva Melo fala desta obra como “a marca de uma busca inquieta de si mesmo e dos outros”. Interroga-se
cinema Fnac coimbra 21h30 • enTraDa livre
6 27 a
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ciclo “mestres do cinemA”: michelAngelo Antonioni
Nome da exposição é mote para o CCDD Tendo sido professor do ensino básico, Arménio Diniz Santos critica “uma má gestão até da sensibilidade [cultural]” em Portugal. Também para a responsável pela programação cultural do CCDD, Rosa Maria Marques, “estamos num interior que infelizmente não é muito bafejado pelo Estado na cultura”, admitindo assim que “o nome da exposição reflete a perspetiva” da própria instituição – “estamos no interior da Universidade de Coimbra, rodeados por todos os lados, no interior do país”. A programadora confirma assim uma linha de continuidade no trabalho do CCDD, pretendendo “deixar esta intimidade e abrir as suas portas ao exterior”, numa perspetiva de “trazer o público” até ao CCDD.
TeaTro Sala GranDe omT 21h30 • 4 a 12 euroS
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a NOV
OUT
“We love 77” de sArdine & tobleroni PinTura e cinema caSa DaS arTeS aTé 10 euroS
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mercAdo QUebrA costAs Feira eScaDaS Do Quebra coSTaS 11h • enTraDa livre
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Uma lição de vida teatralizada conferindo nova vida ao clássico romântico “não se brinca com o Amor”, de musset, os Artistas Unidos contam a morte por amor de um jovem
morte” de rAúl rUiz
“o bArbeiro de sevilhA”
sobre o que se passa com as paixões, com os sentimentos, com a liberdade, com a verdade e a mentira; “como é que chegámos a este ponto?”, pergunta. A ideia da produção da peça surgiu de uma conversa com um dos atores da companhia, em 2009, Elmano Sancho: “perguntei-lhe, ele que D.R.
tem formação francesa e estudou em Paris, se nunca tinha feito o Perdican [personagem principal] de «Não se Brinca com o Amor»”. Projetaram o plano. Só um pormenor logístico impediu a apresentação imediata do clássico: não havia sala. O elenco escolhido conta com a participação de um “jovem grupo de atores de 25 anos, uma renovação”, nas palavras do também encenador. António Simão, um dos interpretantes, vê o espetáculo construído de forma “inovadora e surpreendente, misturando comédia com tragédia, parecendo simples mas complexificando-se”. “Não Se Brinca Com O Amor” já passou por Viseu e Almada e vai ser exibida em Coimbra, dias 6 e 7, na Oficina Municipal de Teatro. Na opinião de Silva Melo e António Simão, a peça tem sido bem recebida pelo público e o encenador acrescenta ainda que os atores só têm a ganhar com isso: “é bom vê-los descobrir novas salas, novas soluções”.
ÓPera TaGv 21h30 • 25
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euroS
12 26 e OUT
“órgão de coimbrA” viSiTa GuiaDa Seminário maior De coimbra 14h30 • 2 euroS
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OUT
“40º11’n 8º24’W” bAndo à pArte
TeaTro
Sala GranDe omT 21h30 • 4 a 12 euroS Até
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NOV
os ArQUivos de bergmAn FoToGraFiaS De roDaGem Fnac coimbra ToDo o Dia • enTraDa livre
Por Rafaela Carvalho
8 | a cabra | 4 de outubro de 2011 | Terça-feira
CUlTURA
Contemporaneidade aliada à tradição A cor e a criatividade do artesanato urbano dão vida à baixa conimbricense no dia 5 de outubro, numa feira que promete atrair visitantes de todo o país Ana Francisco Diana Lima Do feltro ao ferro, do vidro ao papel, o artesanato urbano aposta em novos conceitos criativos, ao explorar a diferença, a originalidade e a inovação. Imprimindo traços de modernidade e um caráter mais contemporâneo às manufaturas, é uma atividade em expansão a nível nacional e internacional. É com o objetivo de promover esta nova conceção artística que acontece, no dia 5 de outubro, a Feira de Artesanato Urbano, organizada pelo município, a decorrer nas ruas Visconde da Luz e Ferreira Borges, das 10h00 às 19h00.
Pelas preocupações ecológicas e pedagógicas, esta arte distingue-se do artesanato tradicional por utilizar materiais do quotidiano que podem ser reciclados. “São linhas estéticas e orientações diferentes”, explica a artesã Elisabete Balhau. É a simplicidade que caracteriza o processo de elaboração de conceitos e escolha de matérias-primas em que se desenvolve a técnica destes artistas. Elisabete acredita que, apesar de estar bastante desenvolvido em Portugal, o artesanato tem, em outros países, “uma aceitação completamente diferente”, sendo mais valorizado. “Cá ainda se confundem muito os conceitos”, afirma, lamentando que os seus produtos sejam comparados a outros vendidos em “lojas chinesas”, esquecendo-se que “por detrás desse artigo há muitas horas de trabalho e investimento, não só ao nível da conceção, mas também ao nível da idealização”.
Promoção das artes “O negócio não é muito rentável”, co-
Concerto duplo lança grelha da RUC d.r.
menta a artesã Filomena Cabral Antunes, aposentada. Apesar disso, garante: “não me posso queixar. Sinto-me bem a fazer este trabalho”. Para os participantes da feira, o lucro é algo que vem por acréscimo, resultado de uma atividade que acaba por ser “uma espécie de terapia ocupacional, uma forma de relaxar”, como descreve Elisabete Balhau. “Trabalho com paixão e sou uma pessoa privilegiada por isso mesmo”, concorda Sílvia Jácome, também artífice. Contando com a colaboração de “largas dezenas” de artesãos, a vereadora da cultura, Maria José Azevedo, espera que esta feira de “amplitude nacional”, seja uma “fonte de receita para os participantes” e um pretexto para “animar a baixa”. Todos os interessados podem participar, apresentando os seus trabalhos nesta “feira franca”, que, nas palavras da vereadora da cultura, aspira a “promover as artes e, ao mesmo tempo, a colorir a cidade”. d.r.
volta Meia volta reutiliza meias para criar peças coloridas, que cativam crianças e adultos
No próximo dia 8 de Outubro, Eleanor Friedberg e Euros Childs vão ao Museu Nacional Machado de Castro para a apresentação da grelha de inverno da RUC Camilo Soldado A iniciativa parte de uma co-produção da Lugar Comum com a Rádio Universidade de Coimbra (RUC) e, para além de assinalar a apresentação da grelha de inverno de 2011/2012, está inserida nas comemorações dos 25 anos da RUC. A vice-presidente da RUC, Mariana Roque, explica a escolha de Eleanor Friedberger: “era dos Fiery Furnaces, que é uma das bandas que significava muito para a malta que entrou há uns dez anos aqui”. Eleanor Friedberger, que se afastou do irmão (com quem trabalhava nos Fiery Furnaces) para editar Last Summer, vem a Coimbra, para um dos raros concertos. “Eleanor vai andar a fazer ações de promoção pela Europa, mas pouquíssimas com concertos e conseguimos trazê-la para dar um espetáculo”, destaca a vice-
presidente. Mariana Roque justifica ainda opção de Euros Childs (um dos fundadores dos Gorky’s Zygotic Mynci) como sendo “uma das bandas fetiches” da rádio dos estudantes, e destaca a apresentação do artista galês pela primeira vez a solo com piano. Relativamente à elaboração da grelha, o presidente da RUC, José Santiago, explica que o facto de “não haver uma estratégia definida” faz parte da orgânica. “É consoante aquilo que vai surgindo e só estando atentos à grelha é que poderão ter a certeza daquilo que mudou”. Mariana Roque afirma que o conteúdo vai ser, à semelhança dos anos anteriores, composto por programas “propostos, tanto por sócios da rádio como pelos novos sócios que estiveram a fazer estágio no verão”. A principal diferença em relação à grelha de verão é a maior presença de conteúdos de informação. “Vamos ter programas melhor definidos, com as arestas mais limadas do que na grelha de verão e uma maior diversidade derivada dos cursos”, completa o presidente. José Santiago realça a continuação da existência de “um programa mais informativo às 9h00 da noite”. Tal como no ano transato, os programas a transmitir nesse horário serão à volta de temáticas variadas como “Coimbra ou desporto”.
Secção de gastronomia inativa devido à falta de eleições A falta de eleições deixou a secção de gastronomia sem atividade. O problema, que é apontado como sendo de simples resolução, arrasta-se desde março Ana Francisco Diana Lima A secção de gastronomia permanece inativa devido à não-marcação de eleições, após o fim do mandato do ex-presidente, André Malho, em março do passado ano letivo. O erro, segundo o mesmo, deveu-se a “uma falha de comunicação com a presidente da mesa do plenário”. Defende
ainda que comunicou pessoalmente o problema à direção-geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC) e à coordenadora-geral da cultura da DG/AAC, Jessica Barandas. Apresentada a situação, o expresidente constatou que nada foi feito. André Malho assevera que, no ano do seu mandato, “a secção estava a evoluir” e seria simples marcar as eleições para quem quisesse apresentar novas listas, até porque “havia e há muita gente a querer continuar com a atividade da secção”. Tal não aconteceu, segundo o mesmo, “porque ninguém da DG/AAC quis tratar do assunto”. Malho ressalva que “há um pouco de descredibilização da secção” e lamenta que “um problema tão simples de resolver” se mantenha. A coordenadora-geral da cultura
rafaela Carvalho
assegura que, na altura, falou com dois dos nomes que o ex-presidente indicou como estando interessados em formar uma lista, mas que, após os confrontar, “não conseguiu que ninguém se candidatasse”. Jessica Barandas lamenta este transtorno, que afirma estar a tentar resolver. “Se a secção estiver inativa durante 12 meses poderá ser extinta pelo conselho cultural da AAC (CC/AAC)”, alerta Jessica Barandas. Há ainda a opção de ser proposta uma comissão administrativa, ideia que defende: “com uma nova eleição é possível reorganizar a secção”. “Os estudantes da Universidade de Coimbra não têm tido especial carinho pela secção de gastronomia”. Quem o diz é o coordenador da comissão executiva do CC/AAC, António Miguel Arnaut, que justifica desta
forma a estagnação em que se encontra a secção. Critica “a mania especial dos dirigentes julgarem que a divulgação tem de ser feita de determinada forma”, acreditando que a solução passa pela difusão exaustiva da mesma em todas as faculdades. Jessica Barandas contrapõe, dizendo que há procedimentos que fazem desta uma “situação complicada”. Admite, porém, a falha relativamente à divulgação, assegurando que irá expor o problema em CC/AAC. “Não está apenas a minha opinião em causa, não posso tomar qualquer decisão”, salienta. Apesar disso, assegura ser “contra qualquer secção se extinguir”, por se tratar de “uma perda cultural para a AAC”. A coordenadora-geral exprime o desejo de que a secção esteja “completmente funcional” dentro de alguns meses.
4 de outubro de 2011 | Terça-feira | a
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dESpORTO a
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futSAl AAC/oAf x SC braga 17h • Pavilhão engenheiro Jorge Anjinho
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V Ól e I AAC x fiães 17h • Pavilhão universitário nº 2
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f u t e b ol Arganil x Académica Sf 16h • Campo de Jogos de futebol de 11
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b A S q u et e fC Porto ferpinta x Académica Coimbra - IV Campeonato da lPb 16h • Pavilhão Rosa Mota
João NuNo AtAíde • Ex-SElECiONAdOR dE RâgUEbi dA ESlOvéNiA
“Acho que é daquelas histórias que ficam para contar aos netos” Fernando Sá Pessoa Fábio Santos Jogador de râguebi da Associação Académica de Coimbra, João Nuno Ataíde foi para Ljubljana, cidade eslovena, cumprir um ano de Erasmus enquanto aluno de Direito. Não passava pela cabeça de ninguém que, nove meses depois, trouxesse na bagagem o cargo de selecionador daquele país. O jovem conimbricense explica o episódio caricato que lhe pode valer o nome no livro do Guinness e que confessa terse revelado, sobretudo, como uma forma de “enriquecimento pessoal”. Qual é a sensação de defender as cores de um país como selecionador, logo de um país que não é o teu? Para começar, esta experiência foi marcante e fantástica. No fundo, foi mais defender a modalidade e dar o que tinha para fazer com que evoluíssem, porque o râguebi, não sendo muito evoluído em Portugal, é muito mais famoso do que na Eslovénia. E sabia que podia dar o meu contributo. Depois, há o facto de ser tão novo. No início, e l e s pensavam que e u
tinha 28, 30 anos [risos], mas quando disse que tinha 23 ficaram um bocado espantados. Mas, à medida que ia dando os treinos, eles iam entendendo que eu tinha algo de novo e de positivo para lhes dar. Por isso, foram gostando e deixaram-se cativar. Disseram que eu era como um balão de oxigénio novo, porque já estavam saturados de velhas coisas. A adaptação foi fácil? Foi. Inicialmente treinei quinze dias como atleta de um clube, e só depois é que perguntaram se eu queria planear duas semanas de treino. Planeei, gostaram muito e fui-me integrando. Fiquei como treinador da equipa até ao final da estadia enquanto estudante de Erasmus naquele país. E a certa altura disseram que estavam sem selecionador e que em Março ia haver
dois jogos. É aí que me perguntam se estou interessado em ajudá-los como selecionador nacional, porque disseram que eu tinha capacidade para isso. E eu aceitei. Sentias-te preparado? Inicialmente foi uma excitação, confesso. Mas depois, como tinha percebido como funcionava o râguebi na Eslovénia, com um grande nível de amadorismo, achei que facilmente lhes podia incutir novas ideias e novos métodos. Acabou por ser fácil. Mas inesperado... Foi, claro! Eu não fiz nada, diretamente, para chegar a isso. O m e u objetivo era continuar ligado à modalidade, apesar de não estar em Portugal durante e s s e ano, por
estar em Erasmus. Comecei a treinar como jogador e dei por mim como selecionador de um país durante dois meses! Achas que esta experiência pode servir como rampa de lançamento para uma qualquer careira desportiva? Sinceramente, não. Para fins curriculares, acho que é uma coisa que me valoriza imenso. Como treinador acho que não, porque este ano não vou estar a treinar qualquer equipa das camadas jovens da Secção de Râguebi da Associação Académica de Coimbra, por incompatibilização de horários. Futuramente, posso ser treinador, mas apenas como ‘hobbie’ e nunca como profissão. É pena, mas em Portugal é assim. A que distância está o râguebi esloveno do nosso? O râguebi na Eslovénia está para o râguebi português, como o português está para o neozelandês. Lá, é uma modalidade totalmente amadora, em que eles tanto vão para os treinos, como a seguir vão para noitadas. Cá, isso não acontece. Todos os jogadores têm a sua profissão, para além de jogador de râguebi. E nós temos 50 ou 60 clubes, eles têm quatro em todo o país. Sentes que evoluíste mais como jogador, treinador ou como pessoa? Como jogador não, até porque fiz apenas dois jogos com eles, só por brincadeira. Como treinador, talvez um bocado, mas principalmente como pessoa. Porque, para além de treinar os outros, estava inserido num país diferente, com uma cultura diferente, a conviver com pessoas que eu não conhecia, o que fez com que tivesse de crescer um bocado. Pensaste em ficar mais tempo na Eslovénia? Não. Já estava tudo na minha cabeça. Já sabia que ia estar um ano na Eslovénia. Quando me convidaram para ser selecionador foi só de março a abril, e depois continuei ligado ao Rugby Klub Ljubljana, o clube onde já treinava. Não pensei em ficar mais tempo, mas confesso que me custou mais sair de lá por ter criado laços
rafaela Carvalho
com as pessoas do râguebi esloveno, que no fim acabaram por ser as minhas amigas. Tens algum momento nessa curta carreira de treinador que queiras realçar? Melhor ou pior... Tenho um estranho, mas ao mesmo tempo muito engraçado. Foi quando eles estavam a cantar o hino e eu estava de fora. Como é óbvio, eu não o cantava porque não o entendo e porque não é o meu. E senti que era eu que estava a orientar aquela equipa, aquela seleção, naquela modalidade, naqueles 80 minutos de jogo. Isso foi uma coisa que senti que era estranha mas, ao mesmo tempo, boa. O pior foi quando perdemos com a Suíça. É verdade que entraste para o livro de recordes do guiness? Falou-se nisso, sim [risos]. Mas acabei por não entrar. Ainda hoje, se me empenhar nisso, é uma questão de ir à internet e de me candidatar. Até porque fui ver e o recorde estava em 24 anos e eu na altura tinha 23. Chegaste a ser remunerado pelo cargo? Fui. Apesar de os treinadores que estavam antes de mim [eslovenos] o fazerem sem receber. Então já chegaste com um certo estatuto... Não foi estatuto. Eu não puxei o assunto, eles é que propuseram os valores e eu aceitei. Qual é o balanço global que fazes desta experiência? Muito positivo. Acho que é daquelas histórias que ficam para contar aos netos. Ninguém acredita, é muito gratificante e, acima de tudo, é muito enriquecedor. É o que me fica. A importância não é eu dizer que fui selecionador. É eu sentir que me enriqueci pessoalmente com isso e que eles também ficaram marcados. Em relação ao râguebi português, o que é que pode ser feito para melhorar? Isso é um tema um bocado complicado porque é uma questão estrutural. O râguebi está montado de maneira centralizadora, está todo em Lisboa. Na primeira divisão, seis clubes são de lá, só dois é que não. Os treinos da seleção são todos em Lisboa, os jogos também. É uma pena.
10 | a cabra | 4 de outubro de 2011 | Terça-feira
DeSPorTo Prolongamento
Ambição, mas não demasiada
FUTSAL
RAfAelA CARvAlhO
A Académica/OAF deu um pontapé no mau momento que assolava a equipa e venceu o Loures, no passado sábado, no terreno do adversário. Os estudantes, recém-promovidos à primeira divisão nacional, responderam assim às preocupações do seu vice-presidente, Carlos Clemente, após as derrotas nas últimas duas jornadas, frente ao Belenenses e ao Operário dos Açores. Vitor Coelho, treinador da Briosa, volta a ter razões para sorrir. BASQUET EBOL
A época teve arranque com o troféu António Pratas, antes do início do campeonato. E apesar de a Académica ter começado com uma vitória frente ao Casino Ginásio por 66-61, foi eliminada no último sábado. No jogo que valia a passagem da fase de grupos, nem os 16 pontos marcados por Richard Ochure foram suficientes. Os pupilos de Luís Santarino não conseguiram fazer frente ao S.C. Lusitânia e saíram da competição, após a derrota por 51-77. DESPO RTOS NÁ UTICOS
Decorreu, no passado dia 24 de setembro, em Viana do Castelo, o campeonato nacional de sprint shell. No quadro dos seniores masculinos, a equipa de 4X alcançou o terceiro lugar da tabela classificativa. Destaca-se, no entanto, a prestação individual de Helen Figueira, na secção feminina, que alcançou o único primeiro lugar da Associação Académica de Coimbra em toda a prova. FUTEBOL
A equipa de futebol da AAC voltou a ganhar no campeonato, ao levar de vencida a equipa do Tabuense por 2-0. Em jogo a contar para a segunda jornada da divisão de honra da Associação de Futebol de Coimbra, os estudantes conquistaram a vitória em casa. Seis pontos em dois jogos que garantem, para já, o terceiro lugar na tabela classificativa.
Por Fernando Sá Pessoa
A claque da Académica esteve presente, apesar da derrota frente ao Operário dos Açores
“Temos equipa para lutar pelos lugares cimeiros”, afirma Carlos Clemente. No futsal existe entusiasmo, mas as recentes derrotas arrefeceram os ânimos Fernando Sá Pessoa Fábio Santos À entrada do pavilhão Engenheiro Jorge Anjinho, nota-se que é dia de jogo. A chama do futsal reacendeu-se com a subida da Académica/Organismo Autónomo de Futebol (AAC/OAF) ao principal escalão nacional da modalidade. Algumas dezenas de pessoas concentram-se à volta do recinto enquanto cresce a expectativa para ver os estudantes de novo em ação, isto após um prometedor início de época, em casa, onde venceram o Belenenses. É bom recordar que a Académica esteve 14 anos afastada
dos principais palcos do futsal. Trata-se, portanto, de um regresso há muito ambicionado por todos os que fazem parte do clube. “Coimbra merece ter uma equipa de futsal na 1ª divisão”, explica Carlos Clemente, vice-presidente da equipa de futsal, que sublinha que a intenção era “alcançar a subida durante os três anos de mandato, o que foi conseguido”. No entanto, na terceira jornada, o resultado acabou em deceção, com a vitória do Operário dos Açores, por 3-1, em Coimbra. Mas nem por isso a Mancha Negra abrandou os cânticos. Nessa toada de otimismo, o treinador Vitor Coelho afirma que ainda é muito cedo para alarmismos, pedindo para não serem feitas “futurologias”. Prova disso foi a vitória na jornada seguinte, a última, frente ao Loures, também por 3-1. A “falta de concentração” de que o técnico se queixara parece ter desaparecido e a equipa conseguiu, fora de casa, dar uma resposta positiva às duas derrotas consecutivas. Esta fase, que o vice-presidente considera “não ser
a melhor”, deve-se ao facto, por juízo do mesmo, às muitas lesões. “Toda a direção anda preocupada porque, de facto, num grupo de trabalho com quinze jogadores, ter cinco lesionados é muito complicado”, justifica. E, embora esteja atenta à situação atual, a direção não põe em causa o lugar do treinador. O dirigente mostra-se satisfeito com o trabalho de Vitor Coelho e assegura que “não está, de maneira nenhuma, nos planos, alguma solução que passe por ele”.
“Manutenção é objetivo principal” No regresso à primeira divisão, a expectativa dos adeptos é grande, a julgar pela concentração no pavilhão da Briosa, ainda para mais numa fase em que o futsal ganha destaque no panorama desportivo nacional. Todavia, o treinador dos estudantes, no cargo desde a época passada, mostra-se cauteloso e distante de euforias: “o nosso objetivo principal é a manutenção na primeira divisão”. Foi nesse sentido que a equipa se reforçou com joga-
dores que, na perspetiva de Vitor Coelho, “conferem a experiência de que o grupo precisava para esta competição”. Para Carlos Clemente, a Académica pode sonhar mais. O dirigente, que esteve presente na época de subida do clube ao primeiro escalão, afirma que “a meta são os oito primeiros lugares, para se poderem alcançar os playoff’s”. E lembra ainda que “há equipas com orçamentos que, para a Académica, seriam insuportáveis”. Os estudantes ocupam, no final da quarta jornada, o sétimo lugar da tabela classificativa.
Mudança de Pavilhão Em relação à qualidade do Pavilhão Engenheiro Jorge Anjinho, Carlos Clemente afiança que tem condições para a competição, mas reclama a utilização do Multiusos de Coimbra para determinadas ocasiões: “continuamos a aguardar que o vereador do desporto marque reunião com a direção da Académica para utilizarmos o Pavilhão, nomeadamente nos jogos grandes”.
Muito desporto com pouco dinheiro Se, por um lado, o último ano foi positivo para várias modalidades, no setor financeiro todas têm um problema. Por vezes, aponta-se o dedo Fernando Sá Pessoa As secções de desporto da Associação Académica de Coimbra, cada uma com a sua especificidade, deba-
tem-se com dificuldades financeiras. Rui Fonseca, presidente da secção de Judo, continua a reclamar 63 mil euros à Câmara Municipal de Coimbra (CMC), verbas acordadas com essa entidade para um projeto de alta competição. “Desde 2009 que não recebemos dinheiro nenhum da Câmara”, adianta. Porém, olhando para os resultados desportivos, a postura do dirigente muda, e expressões de lamento como “grande esforço” dão lugar a regozijos: “somos o único clube em Portugal que tem campeões nacionais em todos os escalões e ganhámos a Taça de Portugal, tanto em
masculinos como em femininos”. Vítor Graveto, presidente da secção de Voleibol da AAC, aponta para os “atrasos da CMC na distribuição de fundos” como o grande culpado da falta de dinheiro na secção. E avança que, quando eles são desbloqueados, “também a Associação se atrasa na redistribuição de verbas”. Não obstante as dificuldades, Vítor Graveto congratula-se com os resultados das várias equipas. “Somos uma equipa amadora, que concorre na segunda divisão com equipas profissionais”, diz, sobre os seniores masculinos.
“Dívidas da anterior direção” Na secção académica de Basquetebol, repete-se a contenda, mas com uma novidade. A recente direção fala, na voz do presidente Mário Castro, de “uma dívida de 100 mil euros” que herdou do último executivo, muito embora já estejam liquidados, afiança o mesmo, “cerca de 20 mil”. A confirmar a regra, o saldo é, no campo desportivo, favorável, a ponto de Castro considerar a equipa de Coimbra como uma das três melhores do país.
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CiDADe
Turismo de Coimbra: extinção ou reestruturação? Ainda sem um futuro definido, a empresa municipal Turismo de Coimbra corre o risco de vir a ser extinta – a alternativa passa por uma reestruturação profunda. Ainda com uma imagem anexada à UC, o turismo na cidade exige uma aposta em alternativas inovadoras e mais abrangentes. Por Ana Morais
D
esde o início do ano que a Turismo de Coimbra (TC), empresa municipal responsável pela promoção e animação turística do município desde 2007, tem estado no centro das atenções. O incumprimento do orçamento previsto nos anos de 2008 e 2010 contribuiu para que a oposição se manifestasse contra a continuidade da empresa. Também no passado mês de julho, a administração da TC, liderada por Luís Alcoforado, apresentou demissão conjunta. Antes, a 2 de março de 2011, o deputado socialista André Oliveira entregou em Assembleia Municipal (AM) uma moção que sugeria a extinção da TC até ao final do corrente ano. No entanto, a recomendação feita ao executivo camarário não surtiu efeito, uma vez que só a Câmara Municipal de Coimbra (CMC), como órgão executivo, pode tomar uma decisão. Estes acontecimentos têm tornado vulnerável e cada vez mais incerta a situação da TC.
RAfAelA CARvAlhO
Situação atual da TC Neste momento, a TC está a cargo de Luís Providência, também vereador responsável pelo turismo, e nas últimas semanas voltou a discutir-se a possibilidade da extinção. Contudo, na última AM, a 29 de setembro, não foi transmitida nenhuma recomendação à CMC. Luís Providência revela o desejo de continuidade da empresa mas, sobretudo, a necessidade de repensar a sua estrutura, e adianta que uma decisão definitiva só será tomada aquando da saída da resolução do conselho de ministros. Esta resolução prevê a elaboração de um “Livro Branco do setor empresarial local”, do qual constará um levantamento e avaliação das empresas locais de todo o país, bem como a criação de uma comissão de acompanhamento. Segundo o ex-administrador da TC, o orçamento previsto para os anos de 2008 e 2010 não foi cumprido devido a uma transferência de capital da CMC para a TC, que estava prevista e não aconteceu. Essa transferência seria o resultado de proveitos da cedência de alguns espaços na cidade (Parque de Campismo, por exemplo). Os ganhos seriam contabilizados no orçamento da TC, mas como não existia uma via de transferência da CMC para a empresa originava-se um défice nas contas. Sendo a CMC a única acionista da empresa de turismo, a câmara viu-se forçada a suportar esse défice. Todavia, Luís Alcoforado assegura que a CMC “acompanhava a execução orçamen-
“Coimbra é património mas também é história”, diz Pedro Machado, diretor da Turismo Centro de Portugal
comerciantes criticam turismo de coimbra a tc surgiu após um estudo na área do turismo realizado nos anos 2000, pelo presidente da cmc de então, manuel machado. uma das principais conclusões do estudo evidenciava que coimbra, pelo seu peso enquanto destino turístico, justificava a criação de uma entidade própria que tratasse exclusivamente da promoção da cidade e da organização do turismo. a tc só entrou em funcionamento em 2007, com Luís alcoforado a encabeçar o conselho de administração, com o objetivo de promover, de forma sustentada, atividades com vista ao aumento da procura turística da cidade. todavia, os comerciantes de lojas de recordações espalhados por coimbra não se inibem de críticas: “a tc devia apostar mais na promoção e divulgação do comércio tradicional”, afirma Hélder Gonçalves, proprietário da “coisas e sabores”. a professora catedrática Fernanda cravidão vai mais longe e refere que há potencialidades que não estão a ser aproveitadas – “os alunos de turismo, Lazer e Património são recursos humanos competentes, uma mais-valia”. também a cooperação entre os países da cPLP é uma ideia com futuro, saída do congresso internacional de turismo. Por ana morais tal da empresa e sabia o que se estava a passar”. Já Luís Providência revela que “estavam a ser suscitadas dúvidas relativamente à viabilidade financeira da empresa”, o que o levou a solicitar uma revisão das contas: “foi por minha iniciativa que pela primeira vez os contratos-programa foram sujeitos a visto prévio do Tribunal de Contas”. Em discordância com esta revelação está Luís Alcoforado, que assevera que “quem pediu uma cer-
tificação de contas ao final do primeiro semestre foi a anterior administração”. E em resposta a Providência a propósito da viabilidade financeira da TC, Alcoforado assegura que “tudo na empresa municipal era transparente e regular, todas as contas da TC foram certificadas e aprovadas em sessões de câmara”. Quanto às dúvidas sobre a demissão da administração da TC, Luís Alcoforado assegura que a administração “acreditou que, ao fim
de três anos, era o tempo ideal para sair”.
Propostas para o futuro da TC Providência atesta que o orçamento previsto para 2011 vai ser cumprido, apesar de apenas um contrato-programa referente à promoção turística do concelho ter passado pelo Revisor Oficial de Contas, procedimentos que, segundo o vereador, se tivessem sido iniciados antes de o ano começar, poderiam já estar encerrados. Os dois contratos-programa que representam o investimento nas atividades da TC perfazem um total de um milhão de euros (1% do orçamento camarário), o que, segundo o vereador, representa “uma percentagem baixa”. Sendo a empresa totalmente financiada pela CMC, Providência manifesta o desejo de reconsiderar a sua organização e propõe a integração de privados, para que a TC “possa ganhar autonomia”. Luís Alcoforado explica que esta abertura ao setor privado sempre esteve prevista, mas adianta que “é necessário haver projetos empresariais que possam ter retorno para quem investe”. Para além desta possibilidade, Providência mostra a ne-
cessidade de cortar na despesa e apostar na renegociação com alguns dos fornecedores da empresa.
Turismo em Coimbra para além da UC Várias são as personalidades que apresentam novas apostas para a cidade. A geógrafa e responsável pelo Congresso Internacional de Turismo (realizado em Coimbra nos passados 27,28 e 29 de Setembro), Fernanda Cravidão, afirma a necessidade de se apostar em novos nichos e a existência de “várias coimbras dentro de Coimbra”. Da mesma opinião é o diretor da Turismo Centro de Portugal (TCP), Pedro Machado: “Coimbra é património mas também é história, saúde, educação; é Baixo Mondego, Serra de Sicó, é a romanização”, demonstrando as várias vertentes por explorar no turismo em Coimbra, nos quais a TCP pretende apostar. Outra valência por explorar, segundo Providência, é o turismo de congressos que, aliado ao facto de Coimbra ser a cidade do conhecimento, “pode atrair muitos eventos à cidade”, após a conclusão das obras no Convento de S. Francisco. “Essa aposta será mais forte”, garante o vereador.
12 | a cabra | 4 de Outubro de 2011 | Terça-feira
PErfil
A testemunha do Te
Onetti apresenta-se um escritor simples que privilegia o reconhecimen opressão do regime, trocou o Direito pelo teatro, arriscou e vingou. Ho Por Ana Duarte, Catarina Gomes e Ana Morais rafaela carvalho
começou a ver teatro “a preto e branco” na televisão, com a sua mãe.
E
spanha, 1962. Francisco Franco era a figura de estado há 23 anos. Como em qualquer regime totalitário, a censura não dava azo à criação nem oportunidade à cultura, entre outras áreas. O país atravessava um impasse sem final à vista e a criação artística estava estagnada. Neste mesmo ano, em Sevilha, nasce António Onetti, dramaturgo espanhol contemporâneo. Apesar de não ter sentido a opressão do regime – tinha apenas 14 anos quando o franquismo acabou -, sentiu mais tarde o peso da responsabilidade, como herdeiro da revolução. O regime caiu, a censura acabou. “O que escrevemos agora?”, perguntavam os dramaturgos espanhóis em debate constante. O objetivo principal seria reunir os entusiastas do teatro num espírito comum, numa mesma ação pela dramaturgia. Mas como o fazer? António Onetti acentua a inquietação que viveu junto dos seus cole-
gas, uma vez que pertenceu à primeira vaga de escritores a criar em democracia. A resposta a este “como” é complicada. “Ou nós nos agarrávamos aos clássicos, como Shakespeare, ou tentávamos responder com algo próprio”, conta Onetti. A equação de como escrever “aqui e agora” perturbava esta geração de aspirantes a dramaturgos e encenadores. Mas associar António Onetti ao teatro e à dramaturgia não surge do acaso. Apesar de ter nascido no seio de uma família de advogados e, naturalmente, sentir a pressão de enveredar pela mesma carreira, destacava-se um elemento familiar com uma paixão alienada do resto. A mãe, o tal elemento, via “teatro a preto e branco” na televisão. A ela se juntava o pequeno Onetti, que lhe foi tomando o gosto. “Aí aprendi muito”, revela. Mas nem por isso a insistência da família se desvaneceu: António ingressou na faculdade de Direito. Este é um dos muitos casos em que aplicar a
expressão “quando não se gosta, não vale a pena insistir” é quase um dogma. O então aluno de direito reprova no primeiro ano e desiste no segundo. Acrescenta mesmo que era um “péssimo estudante”. Pode-se culpar o teatro amador por este desvio de percurso. Para a família, continuava a frequentar o curso de direito, mas foi junto das companhias de teatro amador que encontrou o que realmente o estimulava. “Apetecia-me fazer aquilo e achava que podia. Tinha uma componente de aventura e instabilidade, porque ninguém pensa que vai facilmente fazer vida do teatro”.
Cada um é o que conta Ficar em segundo lugar no Prémio Marqués de Brandomín, com o seu primeiro trabalho, deu-lhe a oportunidade de ser apresentado a muita gente conhecida do mundo da dramaturgia. Outra oportunidade que definiu o seu trajeto foi o facto de ter conhecido Fermín
“Escrever é solitário, ao contrário de dirigir um trabalho que envolve muita gente. É bom para alternar, mas também não seria só diretor”
Cabal, dramaturgo e, na altura dos 23 anos de Onetti, professor na Real Escola Superior de Arte Dramática, que leu o seu primeiro trabalho numa só noite. O professor “formou um grupo de sete ou oito pessoas, que hoje são escritores e diretores dessa geração, para que começássemos a escrever”, explica. Sendo a escrita, segundo o mesmo, “algo pessoal e solitário”, este grupo deu-lhe a resposta a um conflito que o assolava: “com quem partilhas o que escreves?”. Depois da discussão de ideias no grupo, impunha-se a pergunta: “o que fazer a seguir?”. Foi na obra de Brecht, “o melhor sintetizador do teatro”, que o jovem Onetti foi encontrar resposta à equação partilhada com os colegas. Quando começa a escrever não sabe para onde vai. “Todos somos o que queremos contar. Necessitamos de uma pequena verdade. O resto é prática”. Quando se escreve, quando se conta, vivem-se todos os personagens. Confessa
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PErfil
Teatro
mento à fama. Enquanto adolescente num país que se recompunha da Hoje é considerado um mestre do teatro contemporâneo espanhol.
rafaela carvalho
“
Todos somos o que queremos contar. Necessitamos de uma pequena verdade, o resto é prático.” que entre ser ator, realizador e dramaturgo, é o último que lhe dá mais prazer. No entanto, é mais cansativo: “é bom poder dirigir um filme. Escrever é solitário, realizar é um trabalho que envolve muita gente. É bom para alternar, mas também não gostava de ser apenas diretor”. Quanto ao trabalho de ator, é comunicação pura e dura, de outro modo não tem sentido. “Para se ser ator é necessário ser ator e nada mais. Mas para ser diretor é necessário saber o que é ser ator”, assevera.
A falta de reconhecimento
antónio onetti mostrou-se um comunicador nato, com uma expressividade verdadeiramente teatral
A criação da expectativa no público e o cumprimento dessa é decisivo. O escritor está comprometido socialmente. É no seguimento desta explicação que Onetti se revela como um “especialista de casos reais”. Quando questionado sobre as preocupações atuais do estigma mercado-audiência, o artista defende uma maior atenção ao público; e o escritor que não o faz e, contrariamente, “escreve para si próprio“, não deveria escrever. “É como pagar a um massagista para o ver a massajar-se a ele próprio”. É um hábito seu procurar em Espanha espetáculos clássicos de grandes diretores espanhóis. Em tom mais sério, revela a tristeza que sente em relação à falta de reconhecimento por alguns atores, dramaturgos e até realizadores. O cinema espanhol é muito desprestigiado em Espanha por questões políticas. Quem gosta de filmes de Pedro Almodóvar, por exemplo, é visto como revolucionário, segundo Onetti. Mas “não somos todos Bardem e Penélope” – isto é, nem todos têm o reconhecimento devido. Se porventura tivesse escolhido o cinema inicialmente, como era seu desejo enquanto jovem, talvez não tivesse tido a oportunidade de conhecer a sua primeira mulher, que colaborou consigo muitas vezes na produção dos seus textos e de quem teve dois filhos. Tal como os pais, ambos seguiram cursos relacionados com as artes. Do
seu segundo casamento, também com uma atriz de teatro – desta vez, de nacionalidade brasileira - , teve mais dois filhos. O dramaturgo revela-se um homem atento à família e faz questão de separar a vida familiar da profissional: “prefiro viver em Sevilha, onde passo mais tempo com a minha família, apesar de mesmo assim ser escasso. A Barcelona, vou apenas por trabalho e depois regresso”.
Um observador ativo Mas Onetti não é só teatro. O seu tempo é repartido de uma forma desigual por várias atividades, admite com pesar. ”Vejo e faço tudo o que posso, agora posso é menos. A minha última filha é ainda muito nova, tem apenas dois meses e prefiro passar mais tempo com ela, passear com ela no parque”. Referentemente aos seus gostos, confessa a sua paixão pelo cinema independente dos Estados Unidos e pelos romances clássicos sul-americanos, de autores como Carlos Fuentes. Aprecia música do mundo. À memória surgem-lhe de imediato os nomes de Cesária Évora, Madredeus e a sonoridade única da guitarra de Coimbra. Ao ‘habitué’ jornalístico “como se define numa palavra”, responde que se vê como uma testemunha, um observador constante e ativo, não só no âmbito do seu trabalho, mas da vida em geral. Todavia, por vezes, observar, só, não basta. O processo de criação requer pesquisas exaustivas. “Pedem-me coisas históricas em que sou considerado um especialista”. Mesmo assim, trabalha no mundo subjetivo, em que a escolha das personagens é essencial e em que avalia quais contarão melhor a história. Pode à primeira vista parecer que António Onetti é um homem reservado e taciturno, um pouco intimidador até. Mas aos poucos mostra-se um comunicador nato, com uma expressividade verdadeiramente teatral que contrasta com uma simplicidade de quem ama aquilo que faz. Uns veem o teatro como uma arte, outros como um trabalho – Onetti vive-o.
14 | a cabra | 4 de outubro de 2010 | Terça-feira
CIÊNCIA & TECNologIA
O sexo está no meio das pernas, o género na cabeça
Ilustração por ana granado
No passado mês de setembro, uma equipa de 15 especialistas dos HUC realizou as primeiras cirurgias de mudança de sexo alguma vez feitas naquele hospital. Este é um processo longo e delicado que permite a consonância entre sexo e género. Por Joana de Castro, Filipe Furtado e Paulo Sérgio Santos
A
ntes do nome, a criança nasce com um sexo que não escolhe, que pode negar com o passar dos anos. Falamos daquilo que é designado, do ponto de vista clínico, como uma perturbação de identidade de género. Segundo o sexólogo Jorge Cardoso, “há um desalinhamento entre o sexo biológico que não é escolhido e o género, com que não nascemos mas que vamos construindo”, o qual “possui uma componente psicossocial, aprendendo a desempenhar um papel masculino ou feminino”. “O sexo está no meio das pernas e o género na cabeça”, simplifica o urologista dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC), Henrique Dinis. Nos doentes com perturbação de identidade de género, o alinhamento entre género e sexo está ausente. Para Jorge Cardoso, “há um conjunto de aspetos que têm de ser avaliados, que começam na história pessoal, infantil e juvenil do sujeito onde, com grande frequência, começam a aparecer indicadores, quer em termos do tipo de brincadeiras ou de interações com o outro sexo”. Outro ponto importante da avaliação psicológica é o diagnóstico da existência de outra possível psicopatologia, que não indica uma perturbação de identidade de género, onde a cirurgia de reatribuição de sexo não é o tratamento. As avaliações psicológicas são in-
dependentes e, em alguns casos, existe um pedido de uma segunda consulta noutro centro de especialidade para garantir que “se trata de uma perturbação de identidade de género”, enfatiza Jorge Cardoso. O segundo passo é a terapia hormonal, que visa introduzir algumas características femininas ou masculinas que provocam alterações da pilosidade e mudança de voz. Jorge Cardoso explica que “a feminização ou masculinização dos doentes permite ajustes da vida quotidiana ao novo papel: ir à casa de banho do sexo para que está a mudar, relacionar-se, vestir-se ou dar-se às outras pessoas nessa condição”.
O processo cirúrgico Até esta fase o processo é reversível. Posteriormente, decorrem dois anos até que se possa iniciar a fase da cirurgia. Se for de homem para mulher, “é uma cirurgia única e longa, na parte dos genitais. Depois há outras coisas que podem ser feitas como colocar próteses mamárias, sendo que ainda há pacientes que pretendem também alterar ligeiramente o rosto”, descreve Henrique Dinis. O urologista salienta também que, “no caso de mulher para homem, são necessárias múltiplas cirurgias, algumas das quais com durações que podem atingir 12 horas no bloco”. Em termos cirúrgicos são dois pro-
cessos distintos: “num, é um doente que tem um pénis que não pretende e deseja ter uma vagina, existindo a amputação de um órgão e a criação do outro. No caso da transformação de uma mulher num homem, há que criar um órgão que é um apêndice saliente. Faz-se um retalho, utilizando o grande dorsal ou um falo do músculo do antebraço para formar o pénis”, explica o urologista. Já quando se trata da criação de uma vagina, há duas técnicas principais: “o revestimento interior da vagina pode ser feito com pele do pénis ou do escroto ou, em alternativa, mucosa intestinal. O que está em causa é a lubrificação, inexistente no primeiro caso e possível no segundo”, adianta Henrique Dinis. Na transformação de homem para mulher o processo de adaptação pode ser rápido, havendo, a necessidade de se ter relações sexuais para que a nova vagina não atrofie. No caso de mulher para homem há uma probabilidade muito maior de complicações ao nível da vascularização do novo órgão, podendo comprometer a sua utilização futura. O finalizar de todo o processo não exige, para a maior parte dos sujeitos, do ponto de vista psicológico, grande acompanhamento. É o concretizar de um desejo - o corpo estar em consonância com a forma de pensar e com o género do indivíduo.
Um TEDx Coimbra à volta de ideias positivas A segunda edição do TEDx Coimbra traz o tema “e se os pensamentos voassem?”. A organização pretende criar uma comunidade TED na cidade e dá especial atenção ao voluntariado Filipe Furtado Na edição de 2010 do TEDx Coimbra, o tema era a ligação entre ideias e conhecimento como forma de mudar o futuro. Este ano, a 15 de outubro, a organização pretende ser
“um pouco mais sintética”, comenta Frederico Dinis, um dos organizadores, propondo “deixar fluir as ideias, os pensamentos e a imaginação” e ver “o que é que podemos conseguir”. Foi pelo contributo de um dos elementos da equipa organizadora, Ana Dinis, que surgiu o tema “e se os pensamentos voassem?”. O mote do evento é uma resposta à falta de “qualquer tipo de mensagem positiva em tudo o que seja media”, conta o organizador do evento. “Mais do que as desgraças que vemos todos os dias, são as boas práticas e os exemplos positivos que nos motivam para ir em frente”, salienta Frederico Dinis. O TED (Tecnologia, Entretenimento e Design), fundado em 1984 na Califórnia, Estados Unidos da
América, é um evento internacional anual que junta várias personalidades para contar histórias ou lançar ideias que vão desde a tecnologia, entretenimento, design, ciência, negócios, desenvolvimento e humanidades. Este evento procura melhorar o mundo e a vida das pessoas através da partilha de experiências de sucesso. O TEDx Coimbra reproduz o modelo, normas, características e orientações do TED, porém é organizado em moldes independentes. O evento ocorre no Conservatório de Música de Coimbra, que tem “tudo a ver com o TED”, justifica Frederico Dinis. No dia 8 de outubro , será divulgado o programa do evento na Galeria Bar Santa Clara, acompanhado de um coletivo de ‘disc
jockeys’. As 18 intervenções do TEDx Coimbra serão feitas por um painel de oradores renovado. Frederico Dinis refere que, após “um brainstorming da equipa” e da elaboração de uma lista prévia de oradores, foi necessário focar a “parte menos conhecida deles”. Uma das caras deste ano é Fernanda Freitas, conhecida por apresentar o programa “Sociedade Civil”, na RTP2. O organizador justifica a escolha: ”tem um percurso no jornalismo que é inverso ao corrente. Tinha um ‘talk show’ à tarde, numa televisão, e decidiu abandonar isso para fazer um programa de nicho, para se focar nas pessoas. É este tipo de perfil de oradores que teremos”. A organização pretende, para além
do evento, criar uma comunidade TED em Coimbra. Frederico Dinis afirma que “essa comunidade não poderá reunir-se apenas uma vez por ano para ter um evento durante um dia, das nove da manhã até às sete da tarde e esgotar-se aí”. “Este ano trabalhámos de forma diferente e começámos a alargar o âmbito daquilo que é o evento”, acrescenta. Os ‘coffee breaks’ terão lugar numa área que vai contar com uma feira de voluntariado, onde será dado a conhecer aos participantes o trabalho comunitário de algumas instituições como o Banco Alimentar contra a Fome ou a Federação Portuguesa de Desporto. No final realizar-se-á uma ‘after party’ na Galeria Bar Santa Clara.
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PAíS rafaela Carvalho
Estado perde a providência As instituições sociais recebem cada vez mais pedidos de ajuda, o país continua em maré de cortes orçamentais e a população tem cada vez menos mecanismos de apoio. A imposição das políticas neoliberais revela-se perversa para os estratos mais baixos da sociedade. Por liliana Cunha e Nicole Inácio
U
m estado social neoliberal em vez de um para o bem-estar social. São meras designações, contudo, explicam muitas das mudanças sociais a que vimos assistindo. “Reduzir o papel do Estado na economia e na área social”, esclarece a investigadora no domínio das políticas de combate à exclusão social no Observatório Político da Universidade Nova de Lisboa, Camila Rodrigues, é um dos efeitos da atual conjuntura económica que, por défice de capital, delega na iniciativa privada a responsabilidade para gerir o mercado. Deixa, assim, de estar assegurada a proteção dos direitos sociais da população - cortes na saúde, educação e segurança social são medidas implementadas desde o início do ano e reforçadas pela intervenção da ‘troika’. Na opinião de Camila Rodrigues, é preciso saber se “o Estado vai re-
duzir os direitos sociais dos cidadãos de uma forma sistemática pode ser uma fase ou uma intenção que pode nem ser realizada”. A socióloga acentua que, se tal acontecer, será algo sem precedentes. No panorama nacional denotam-se ainda as assimetrias de um Portugal ruralizado e de um Portugal metropolitano. “No interior, as respostas são mais escassas e as dificuldades são maiores por variadas razões”, refere o vice-presidente da Federação Nacional de Cooperativas de Solidariedade Social, Rogério Cação. Interior ou litoral, em todo o país se verifica um aumento exponencial dos pedidos de ajuda por parte dos portugueses às instituições de trabalho social.
As IPSS e as autarquias “Em julho deste ano já tínhamos apoiado tantas famílias como apoiámos durante o ano transato”, sus-
tenta Susana Maria, responsável pela Associação de Defesa e Apoio à Vida, uma instituição social de Coimbra vocacionada para o apoio à família e proteção da vida humana. Como suporte para estes pedidos existem as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), sem finalidade lucrativa, e que se propõem a dar forma ao dever moral de solidariedade e de justiça para com os mais frágeis. A Legião da Boa-Vontade, IPSS incrementada a nível nacional, “necessita e precisa do auxílio das pessoas, porque é disso que ela vive”, sublinha o responsável pelo departamento de comunicação da instituição, Jorge Teixeira. Contribuir com donativos monetários, de vestuário, bens alimentares ou participando em ações de voluntariado são vias pelas quais o cidadão pode auxiliar estas associações. Intervêm no mesmo campo as au-
tarquias, que funcionam como intermediárias entre a administração interna e as entidades de apoio social. A mediação funciona através de “candidaturas apresentadas pelas instituições sociais” motivadas para a “construção e implementação de equipamento e projetos”, explica o membro da divisão de Ação Social e Família da Câmara Municipal de Coimbra, Jorge Ferreira.
Diminuição de apoios e PES Contrariamente ao desejado, o número de contribuintes tem sofrido um decréscimo impulsionado pelo atual agravamento do desemprego, como lamenta Paulo Pereira, diretor técnico do centro Porta Amiga, estendido a todo o país sob a alçada da Assistência Médica Internacional. Camila Rodrigues alerta que “há menos pessoas a fazer contribuições para o Estado e, em contra-
partida, há mais a precisar de apoio”. Por conseguinte, obtém-se “um desequilíbrio que vai aumentar com o envelhecimento da população”. Os 400 milhões de euros que o governo vai investir no Plano de Emergência Social (PES) pretendem atenuar os efeitos nefastos da exclusão social. “O governo quer permitir que mais instituições possam distribuir refeições a pessoas ou famílias mais carenciadas”, informa o documento que inclui também medidas como o descongelamento das pensões mais baixas, e a garantia de que “o apoio dos fundos comunitários às instituições sociais passe de 75 para 85%”. O incentivo à empregabilidade com a criação de uma rede de microcrédito e a inserção de desempregados com mais de 45 anos no mercado são também outras apostas do plano. puBlICIdade
16 | a cabra | 4 de outubro de 2011 | Terça-feira
Mundo
Apesar do otimismo, a Primavera Árabe é passível de subversão Em torno de expectativas de democratização, a sombra do radicalismo paira sobre os países da Primavera Árabe, um termo otimista que pode, na verdade, ser um pouco mais complexo e dúbio do que parece. Aproveitamento da religião também pode ser condicionante. Por Joana de Castro e Maria Garrido
“A
radicalização, a violência e a guerra são sempre uma possibilidade nos processos de transição e de democratização, no Médio Oriente ou em qualquer outra região”. Quem o diz é o doutorando em Ciências Políticas e Relações Internacionais, Carlos Gaspar, referindo-se à possibilidade de uma radicalização nos países da apelidada Primavera Árabe, por parte das forças de libertação. Contudo, esta própria designação é questionada por Carlos Gaspar: “forças de libertação é um termo equívoco”, considerando que a Primavera Árabe “não é um movimento violento”. Também José Goulão, especialista em política internacional e questões do Médio Oriente, sublinha que “as radicalizações são sempre possíveis quando não se resolvem os problemas sociais”. O mesmo acredita que se levantam ainda “muitas expectativas em relação à Primavera Árabe”, uma vez que “não há qualquer relação, a não ser de génese” entre os vários países. A radicalização depende, em parte, dos processos eleitorais, na forma como se irão processar, no resultado e na aceitação dos mesmos, explica a especialista em geopolítica do Médio Oriente, Ana Santos Pinto. A mesma afirma que não se pode “falar em movimentos de transição política e muito menos em democracias”. No entanto, sublinha que “não significa que não exista uma maior participação das populações nos atos eleitorais, e que estes não cumpram aquilo que são as exigências mínimas de atos participados”. Assim, entende também que “as democracias não são feitas de eleições, mas de muito mais que isso”.
O dúbio conceito de democracia “Não é claro que todas as forças que se opõem e que querem derrubar o poder instalado mais ou menos ditatorial queiram uma democracia do tipo daquela que veio a ser reivindicada mais tarde pelos europeus de leste”, comenta o investigador do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI), Bernardo Pires de Lima. O mesmo
refere que o conceito de Primavera Árabe não será aplicável, pois é “demasiado otimista para refletir a complexidade das realidades internas desta região”, face ao sucedido na Europa de Leste, onde o conceito de democracia “vingou”. Pires de Lima chama no e n -
tigador acredita que “há certamente muitas intenções democráticas e princípios que são princípios universais e não exclusivos do ocidente. Mas há outros movimentos que não têm uma conceção das democracias como nós a temos”.
Corroborando estas afirmações, José Goulão remete para o erróneo facto de se considerar que movimentos contra um regime ditatorial “são movimentos democráticos, de acordo com os nossos parâmetros”. “Haverá, no entanto, movimentos dentro destes países que têm conceções e valorizam aquilo que nós valorizamos e
h a verá outros que não, que se aproveitam da convulsão para chegar ao poder”, acrescenta. Tendo em conta a importância do fator religioso como base destas sociedades, não será difícil entender o Corão como a “forma como cada um dos indivíduos vivem e se organizam, sejam eles moderados, sejam eles radicais”, refere Ana Santos Pinto. A especialista lembra ainda com isto, que o Corão “faz parte da ordem política”,
tanto a atenção para o facto de o conceito de democracia como o ocidente o concebe, poder não ser compreendido da mesma forma pelo oriente ou, pelo menos, não em todos os países: “eu acredito que haja movimentos seculares, ou não, que queiram instituir um estado de direito pluralista com liberdades extensas e eleições livres”. Nesse sentido, o inves-
iilustração por tiago Dinis
não significando tal facto “uma inevitabilidade na radicalização”.
Fator religião Carlos Gaspar menciona que a religião “é decisiva em todos os países onde as religiões monoteístas são dominantes” e entende ser “importante definir primeiro quais são as questões que podem separar as correntes mais reacionárias”. Para tal, o também investigador do IPRI distingue as que defendem a sharia (código de leis do islamismo) e a submissão das mulheres, das correntes modernizadoras “que defendem uma ordem política e jurídica secular, a igualdade de direitos cívicos e políticos entre homens e mulheres, a proteção das minorias, nomeadamente as minorias religiosas, como os coptas (comunidade cristã) no Egito, e uma abertura económica”. Como modelo a seguir, Bernardo Pires de Lima aponta para o modelo turco, uma vez “que este é uma espécie de democratização islâmica, com respeito pelas tradições mas assente no estado de direito”. “Há quem queira aproveitar-se do fator religioso para tirar os seus benefícios, através de sociedades onde ainda há muito obscurantismo associado à religião”, assevera José Goulão. Considerando que a religião “tem um peso”, o especialista defende que “grandes potências mundiais usam a religião e a sua força para atingir os seus objetivos”. Como exemplo, dá o caso do Kosovo e da Bósnia-Hersegórvina, que “não foi mais do que uma aliança entre a Organização do Tratado Atlântico Norte (NATO) e grupos islâmicos que noutras situações são considerados terroristas”. Afirmando ser preciso “estranhar as simplificações” do conceito de Primavera Árabe, uma vez que estas “não ajudam a explicar a complexidade das coisas”, Bernardo Pires de Lima remata: “em vez de termos uma Primavera Árabe, podemos ter um inferno árabe - ter movimentos absolutamente radicais e permeáveis ao radicalismo islâmico, a redes terroristas, ao crime organizado, a uma espécie de medievalismo”.
Com João Paulo Ferreira
4 de outubro de 2011 | Terça-feira | a
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EsTATuTo EdITorIAL de acordo com o Artigo 17º, alínea 3, da Lei de Imprensa, qualquer publicação deve divulgar, anualmente, o seu estatuto editorial
Estatuto Editorial do Jornal Universitário de Coimbra A CABRA e do portal informativo ACABRA.NET
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ção, sendo norma a identificação como jornalista do Jornal Universitário de Coimbra. De forma alguma podem ser usadas informações obtidas através de conversas informais ou outras situações em que o jornalista não se identifica como tal e como estando em exercício de atividade. 4. Abdicar de se envolver em atividades ou tomadas de posição públicas que comprometam a imagem de isenção e independência do Jornal Universitário de Coimbra. Contudo, o Jornal Universitário de Coimbra reconhece o direito inalienável do jornalista universitário a assumir-se como cidadão. Assim, nunca um jornalista do Jornal Universitário de Coimbra será impedido de se manifestar em Reunião Geral de Alunos ou Assembleia Magna, desde que não esteja nessa altura em exercício da sua atividade jornalística, em cujo caso deverá prescindir do seu direito de expressão e voto. De igual forma, nunca será impedido de participar ativamente em qualquer atividade pública. Cabe à Direção do Jornal Universitário de Coimbra decidir quais os casos em que a atividade jornalística se encontra prejudicada por outras atividades e agir em con- formidade. 5. Ter consciência do valor da in- formação e das suas eventuais consequências, particularmente no meio académico de Coimbra, no qual o Jornal Universitário de Coimbra é produzido e para o qual produz. Neste contexto particularmente sensível, o jornalista deve ter especial atenção à prove-
niência da informação e à eventual parcialidade ou interesses da fonte (não descurando o imprescindível processo de cruzamento de fontes), bem como garantir uma igualdade de representação em caso de informações contraditórias ou interesses antagónicos, evitando que o Jornal Universitário de Coimbra se torne meio de comunicação de qualquer instituição, grupo ou pessoa. Num meio em que o desenrolar de acontecimentos pode afetar, direta ou indiretamente, o Jornal Universitário de Coimbra, o jornalista tem também que saber manter o distanciamento necessário para a produção de uma informação rigorosa. 6. Garantir a originalidade do seu trabalho. O plágio é proibido. Nestes casos, a Direção do Jornal Universitário de Coimbra deverá agir disciplinarmente e o jornal deverá retratar-se publicamente. 7. Recusar qualquer tipo de gratificação externa pela realização de um trabalho jornalístico. Estão excluídos deste grupo livros, cd’s, bilhetes para cinema, espetáculos ou outros eventos, bem como qualquer outro material que venha a ser alvo de tratamento crítico ou jornalístico; constituem também exceção convites de entidades para eventos que tenham um inegável interesse jornalístico (por exemplo, convites da Direção-Geral da Associação Académica de Coimbra para cobertura do Fórum AAC). Cabe à Direção do Jornal Universitário de Coimbra resolver qualquer questão ambígua.
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A CABRA é um jornal quinzenal, cuja periodicidade acompanha os períodos de atividade letiva.
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18 | a cabra | 4 de outubro de 2011 | terça-feira
Cinema
ARtes
Meia-noite em “Paris ”
W
de Woody Allen Com oWen Wilson, RAchel McAdAMs, K Athy BAtes 2011
diz olá ao trotsky!
ver
CrítiCa de josé santiago
oody allen sofre de um problema - não consegue parar de trabalhar. tal não seria um defeito se a qualidade dos lançamentos se mantivesse constante, mas à excepção de alguns, muito poucos títulos, a primeira década do século xxI não foi simpática para o nova-iorquino. Se pensarmos numa carreira cinematográfica como um bolo às camadas em que a cobertura é o melhor trabalho, Meianoite em Paris é a base. não a última camada, mas o suporte, decorado com naperon de papel. É em Paris que somos apresentados a Gil, um escritor de argumentos para cinema, descontente com a indústria e que decide experimentar o formato literário como uma tentativa de escape. Durante a estadia na cidade da luz faz-se acompanhar da noiva, Inez, dos futuros sogros e de um pretensioso casal amigo da futura esposa. numa noite em que decide
passear sozinho, é convidado por um grupo de foliões a entrar num carro que o transporta até aos loucos anos 20, onde conhece personagens como F. Scott Fitzgerald, ernest hemingway e Salvador Dali. acaba por ser um trabalho menor, desinspirado e inundado de clichés sofríveis que insistem em acompanhar-nos até ao último minuto. todas as conversas que Gil tem com os artistas não passam de meras exposições históricas, com diálogos secos, humoristicamente mal sucedidos e muito longe da escrita a que o realizador nos habituou nos anos 70 e 80. É a história clássica do escritor desiludido com a vida e que ganha um novo fôlego depois de encontrar os seus heróis. owen Wilson foi o actor escolhido por Woody allen para interpretar o personagem principal. É uma das interpretações mais competentes, mas não deixa de ser isso mesmo, aliás, todo o elenco
parece sofrer de uma falta de motivação compulsiva. Mas com um argumento indiscutivelmente fraco, também me parece que não podiam ter feito muito mais. a conclusão do filme fez-me contorcer de agonia, apenas aliviada por uma gargalhada provocada pelo ridículo a que tinha acabado de assistir. É claro que há filmes bem piores, mas nunca pensei ver Woody allen num trabalho que parece ter sido encomendado pelo gabinete de turismo da cidade de Paris. Meramente expositivo, atabalhoadamente rematado e completamente desprovido de alma. o empolamento de que o realizador tem vindo a ser alvo pode estar na origem do desastre que é Meia-noite em Paris. apesar da degradação óbvia, na qualidade das mais recentes produções, é incrível a quantidade de críticas positivas que recebem. Quer-me parecer que a nostalgia é inimiga da objectividade.
127 Horas”
“
127 horas” mostra uma história baseada na autobiografia de aron ralston, um alpinista norteamericano que sofre um acidente num desfiladeiro, no utah, e fica com o braço bloqueado por uma rocha. o filme passa-se quase na sua totalidade na fenda onde aron ralston (James Franco) fica preso. Mas, o que à primeira vista pode parecer uma película entediante, tem, na verdade, um ritmo muito enérgico que capta a atenção do espectador. a realização é de Danny Boyle, um cineasta experiente que no passado já nos trouxe filmes aclamados como “28 Dias Depois” ou “Quem Quer Ser Bilionário”. e aqui, a estrela é, sem dúvida, James Franco. o actor californiano consegue, no que será o seu melhor trabalho até
hoje, transmitir toda a violenta experiência física e psicológica sofrida por ralston. a película vai-se tornando cada vez mais claustrofóbica, focando-se essencialmente nas expressões faciais da personagem, dada a sua quase nula mobilidade e o reduzido espaço em que se insere. a interpretação de Franco enche-se de realismo, tanto nas situações cómicas do filme como naquelas de maior desespero. Durante o tempo que passa isolado, ralston tem constantes recordações da sua vida que o levam a reflectir sobre os acontecimentos que o levaram até ali e a decisão que irá tomar quanto à sua situação. estes retrocessos permitem ao espectador conhecer o interior da mente da personagem e
assistir a uma interacção entre personagens, que de outra forma seria escassa. o filme termina com uma cena que arrepia, certamente, o espectador comum. a personagem, que antes se caracterizava por um ser solitário, apercebe-se da importância das relações sociais e dos erros que cometeu no passado. acompanhado por uma incrível banda sonora do compositor indiano allah rakha rahman, o filme é uma viagem pelas emoções mais recônditas do ser humano e um relato de alguém que não sucumbe às adversidades e luta desumanamente para viver. o DVD tem 20 minutos de cenas eliminadas e o comentário áudio do realizador Danny Boyle e do produtor Christian Colson. joão Valadão
filme
De Danny Boyle eDitora 20th Century Fox 2011
Um encontro ao extremo da resistência humana
artigo disponível na:
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feitAs oUvir
ler
Uniko ” Avalanche flutuante de cordas e manipulação electrónica
o
último álbum (rainbow) permanece na memória de muitos. a popularidade é indiscutível. há quase 30 anos a criar interpretações únicas, os californianos Kronos Quartet elevam, neste último trabalho, a emotividade da música e conseguem falar-nos através dela. Para criar uniko, um reflexo de 18 meses de construção, juntam-se à dupla finlandesa Kimmo Pohjonen e Samuli Kosminen. uma colaboração única onde a exploração de novas matérias sonoras expande a imaginação a um nível impossível de antecipar. uniko é uma composição em sete movimentos contrastantes e simultaneamente envolvidos, ligados tede maticamente ao conceito de sonhos, KRonos QUARtet através dos quais somos musicalmente hipnotizados por narrativas editora que nos transportam para outros ondine universos. este álbum não representa um 2011 conjunto de música de câmara, nem os Kronos o pretendem fazer. aqui, o quarteto é alargado por acordeão e por manipulação electrónica. nos seus mais recentes trabalhos, encontramos uma forte presença de elementos minimalistas. em uniko esses elementos não repousam na repetição de compassos. os ritmos resultam como passagem de uma forma para concretizar marcos estruturais; momentos líricos, pizzicatos amplificados ou vozes distorcidas nunca antes exploradas com este rigor. uma obra repleta de progressividade, rica em variações e impulsos que nos conduzem a melodias folk evidenciadas pelo acordeão. “Kalma” ou “Plasma” são desencontros inesperados onde vigoram as emoções acompanhadas por cores sonoras. aristóteles dizia que os olhos são os órgãos da tentação e os ouvidos os órgãos da instrução; o ouvido não só capta o som como, ao enviá-lo directamente para o cérebro, desencadeia um processo criativo de pensamento; os processos físicos e cognitivos da audição não são, de modo algum, passivos. uniko é uma das melhores surpresas de 2011, uma síntese de composições inesperadas que definem, de uma forma clara, a música que se faz no século xxI, onde a secundarização do ouvido acentua o empobrecimento do nosso sentido da audição. lígia C. anjos
s.o.s. angola – os dias da Ponte aérea”
Memórias Retornadas
de RitA GARciA editora oficinA do livRo 2011
a
través de vozes como as de Fernando teles, Marques leandro ou Maria laura, somos levados para uma viagem no tempo. Sentimentos de revolta, medo e raiva, mas também de tristeza, angústia e desamparo dominam os relatos de testemunhas que, no ano de 1975, tiveram de deixar angola, a única terra que conheciam e que sabiam adorar. rita Garcia, repórter, mostra-nos como foi difícil a vinda para Portugal. o estado português parecia desinteressado em ajudar quem do outro continente clamava por ajuda. a repórter enfatiza a persistência do tenente-coronel antónio Gonçalves ribeiro, graças à qual a ponte aérea existiu. assim, a aparente utopia de transportar quase 200 000 portugueses tornou-se parte da realidade. entre julho e outubro de 1975, milhares de famílias viveram momentos de medo, receando ser mortas pelos movimentos de libertação angolanos. Famílias inteiras fugiam com a única roupa que traziam no corpo. o desespero para conseguir um voo causava agitação nos aeroportos lotados. os aviões de várias companhias faziam viagens ininterruptas, nas quais o espaço dos aviões era aproveitado ao máximo. o drama dos assistentes de bordo não foi esquecido pela autora. apesar do cansaço, tinham de manter uma postura rígida e fria para não su-
cumbir perante os rostos de quem já nada esperava, e que tudo tinha perdido. em “S. o. S. angola” encontramos um excelente trabalho de investigação, proveniente da face jornalística que sempre acompanhou rita Garcia. Para além da informação que nos apresenta, enquanto lemos as suas linhas é impossível não sentir compaixão por estes “portugueses-angolanos”, que deixavam para trás toda uma vida, e partiam para um país que nada lhes dizia, para um futuro desconhecido. ao longo da obra, o leitor encontrará algum vocabulário específico que é esclarecido pela autora numa divisória intitulada de “notas”. a linguagem da obra acaba por ser muito acessível ao público geral. o que poderá ser pesado em algumas passagens do livro é a grande quantidade de números que, na minha opinião, apenas acentuam a exatidão dos dados que a autora recolheu. trata-se essencialmente de um livro de memórias, mas não se dirige apenas àqueles que viveram neste tempo e precisam de recordar. também é importante para as gerações que se seguiram, que devem conhecer o lado mais negro e humano desta odisseia. É por essa mesma razão que saliento a qualidade desta obra: não deixa que estas vozes sejam silenciadas, e que nomes de verdadeiros heróis não sejam esquecidos. niCole ináCio
JoGar
Xenoblade Chronicles” Pequena epopeia
GUerra DaS CaBraS a evitar Fraco Podia ser pior Vale a pena a Cabra aconselha a Cabra d’ouro Plataforma Wii artigos disponíveis na: editora Monolith softWARe 2011
D
iscípulo de lucas e da mitologia Campbelliana, tetsuya takahashi (autor do incontornável “xenogears”) sempre procurou recuperar, dentro do seu meio, alguma dessa sensação de magia e de espectacularidade faustosa. Contador de histórias inato, esta sua nova obra é mais uma fantasia barroca, ornamentada por arabescos de enredo imprevisíveis, fundamentados numa mescla de referências intelectuais e populares. Infelizmente, nesse domínio, esta sua produção é mais talhada para o grande público, ofuscando a predominância de sisudos dilemas filosóficos em prol de acessibilidade formal às suas temáticas, com um desgostoso enquadramento estético de animação japonesa, roubando toda a carga dramática das suas encenações. Mesmo assim, é no domínio videolúdico que “xenoblade” mais suscita críticas e elogios. resultado de uma colectânea de mecânicas de grandes sucessos dos últimos anos, o seu pastiche acaba por seguir demasiado afincadamente as modas, apropriando o bom e o mau em igual medida. Cita com terrível infelicidade a parafernália ludo-maníaca de “Monster hunter”, “World of Warcraft” e “Dragon Quest Ix”, num jogomundo obcecado por excessos de horas, de costumização, de mecânicas, de de-
mandas, de troféus e de todo o lixo que insiste ser ‘zeitgeist’ do meio. Mas é com grande virtude que foi buscar as dinâmicas temporais e de interacção social do injustamente esquecido “Majora’s Mask”, que ficou com o combate táctico semi-naturalista de “Final Fantasy xII”, e que aspira à grandeza espacial de “Shadow of the Colossus”. e é nesse jogo de inspiração geo-arquitectural que “xenoblade” mais frequentemente atinge o sublime, na vastíssima exploração de ambientes esteticamente atractivos, do naturalismo cénico ao simbolismo onírico de ueda, do futurismo à fantasia delicodoce, com uma companhia sonora profusa e eclética de compositores de género (aCe+, Shimomura, Kiyota e Mitsuda). Com toda a confluência de prazer e angústia que nos traz, “xenoblade” acaba num limbo agridoce. Mas numa geração descaradamente pobre no rPG como noutros domínios - basta recordar o patético “Final Fantasy xIII” ou as ditas referências norte-americanas-, essa ambivalência emocional é mais do que suficiente para permitir afirmar que se trata da única oferta digna do género em muito tempo.
rUi CraVeirinHa
20 | a cabra | 4 de outubro de 2011 | terça-feira
SoltaS
Camilo Soldado
uma ideia Para...
tomai e Comei
rui antuneS • PreSidente do inStituto PolitÉCniCo de CoimBra a reorganização da rede de enSino Superior
CantinaS monumentaiS menu PraXe • “a BaSe É tudo”
Na minha memória estava ainda bem vívida a massa, que embora um pouco colada se revelou aceitável para aqueles almoços mais rápidos, em que não há tempo para se ser esquisito e se quer muito um prato de massa ou simplesmente uma refeição que não ultrapasse um euro e 80. Desta vez com mais tempo em mãos, pedi o menu praxe que me pareceu bastante razoável no que toca ao preço. Consistia numa pizza individual com um ingrediente à escolha, no meu caso fiambre, sumo e sobremesa – fruta ou doce. A fila movia-se vagarosamente e não se devia apenas à novidade do sítio. Existe apenas um forno e as portas estão constantemente a ser abertas para introduzir novas pizzas, não dando descanso às primeiras para que cozam. Seria talvez um pouco bruto dizer que a massa da pizza é dura de mais. A massa da pizza é dura de mais. Optando por uma abordagem mais leve, podemos antes dizer que os talheres não são os mais apropriados. Apesar da moça aparência, porta-se como se tivesse o dobro do tamanho, já que demora o dobro do tempo a comer. A base exige algum esforço para ser cortada. É comida que pede faca com serrilha. Assim, a refeição assemelha-se a correr uma grande distância. Pensamos “está quase, está quase” e, de vez em quando, bufamos e agitamos as mãos em frente à cara, já coradita. Pelo fim da refeição, em vez de satisfeitos ficamos simplesmente contentes por termos acabado. Mas que isto não desencoraje ninguém. A pizza é aceitável. Enalteço a boa distribuição do fiambre e o molho saboroso. Serve este apenas para precaver aqueles que gostam de comidas que se deixam cortar fácil. Em última análise, é uma boa alternativa a um Pasta Café ou Pizza Hut mais caro. Aconselho apenas que evitem as laranjas. Regra geral são secas por causa do calor que vem do forno.
Por Catarina Gomes
Parece inquestionável a necessidade de reorganizar a rede do ensino superior. Fazê-lo só é racional, no entanto, se for para obter outra mais adequada ao que se precisa. Ou seja, temos que nos entender primeiro sobre o que se pretende do ensino superior. Durante séculos a universidade serviu para formar dignitários da igreja e uma única instituição foi suficiente. Com a implantação da República foi necessário formar as novas elites intelectuais e dirigentes. Eram precisas mais universidades e a transformação das escolas politécnicas de Lisboa e Porto em universidades serviu esse objectivo. Foi a primeira reorganização da rede. Depois do 25 de Abril passou a ser importante que o número de portugueses com formação superior se aproximasse da média da OCDE. Para além da formação de elites, era importante formar todos os que tivessem capacidade para concluir um curso superior. Para o atingir fizeram-se duas alterações: (1) condicionou-se o exercício profissional de actividades que até aí não requeriam formação superior à obtenção de um curso superior; e (2) criou-se uma rede de instituições que permitisse concretizar esse alargamento das necessidades de
ConCerto integrado no CiClo Beethoven (1770 - 1827) • tagv • 01 de outuBro
SinfoniaS de um Sonho
“
Por entre os sons da música, ao ouvido/ como a uma porta que ficou entreaberta”. Acatámos as palavras de Vergílio Ferreira e invadimos o espaço. Para comemorar o Dia Mundial da Música, o Teatro Académico Gil Vicente escolheu o compositor romântico Ludwig Van Beethoven, pela Orquestra Filarmónica das Beiras. A obra de um dos grandes vultos da música erudita foi condensada no concerto para piano e orquestra nº3, pela oitava sinfonia e pela funesta abertura de Coriolano opus 62. Faltou a chama da quinta sinfonia, símbolo de uma volúpia que faz lembrar o paraíso onde a Divina Comédia de Dante findou. Copo meio vazio ou meio cheio? A aparente viagem pela qual todos ingressaram durante cerca de duas horas leva a acreditar que a bagagem estava perto do excesso. Pedia-se mais à acústica, já que o soar dos instrumentos começou por ser diminuto. Os sopros dão o toque de partida, mas foi falso
formação. Esta rede já cumpriu os seus objectivos. O número de jovens com formação superior é hoje aquele que se espera de um país desenvolvido. Também os pressupostos académicos, económicos e de mobilidade que estiveram na origem do sistema binário, com universidades e politécnicos em todos os distritos, estão ultrapassados. Hoje já não é suficiente formar elites e garantir que todos tenham formação superior. Exige-se do ensino superior um contributo para o desenvolvimento de uma economia baseada no conhecimento. Precisamos de instituições de investigação de prestígio mundial e que atraiam os melhores estudantes e investigadores internacionais, o que só
se conseguirá com recursos substancialmente superiores. Os condicionalismos económicos actuais determinam que apenas algumas, poucas, instituições poderão vir a ter essas condições. As outras deverão concentrar-se naquilo que fizeram bem até agora, ou seja, a formação de profissionais altamente especializados. Estes factores, aliados às condições académicas e de mobilidade que caracterizam as actuais instituições de ensino superior e o país, são determinantes para a nova rede de ensino superior que deverá basearse em duas ideias: (1) divisão entre instituições que têm por objectivo manter a actividade de qualificação para o exercício profissional e instituições vocacionadas para atingir a excelência na investigação com impacto significativo na economia. Uma nova dicotomia entre instituições de ensino e instituições de investigação deve substituir a velha e gasta dicotomia entre universidades e politécnicos; (2) definição de critérios de qualidade e de número mínimo de alunos que limitem os cursos existentes e os ajustem à procura, sem prejuízo da redundância necessária aos sistemas d.r. confiáveis.”
arte.Ponto d.r.
alarme. Numa tentativa de ensaio, as cordas juntam-se num alternado complô para perceber quem alcança primeiro a meta. Mas é Ernst Schelle, o maestro convidado, quem abre a tempestade. O conflito da abertura de Coriolano é carregado com pausas estratégicas, para confundir o mais amante dos filmes de Hitchcock. Endossando o holofote para o pianista Jorge Moyano, a orquestra subjugou-se aos desígnios das cordas percutidas e às duas mãos subdivididas, que se faziam soar a uma velocidade orgânica, despertando cobiça entre os comuns. Sentiu-se a emotividade, exultada na face do homem que pulsou o pedal. Desta forma, é quase inegável a dicotomia entre ódio/amor. Pois sente-se a presença do elemento que determina a relação – o piano de cauda. Respira-se a harmonia, e a tormenta vivida dá lugar a um passeio pelo jardim, transposto no último andamento da mais curta sinfonia.
Calma. A história não acaba sem melancolia. Obriga a cerrar as pálpebras e sentir os recantos duma vida sofrida a quem só o dom salvou. O torpor dos lugares mais taciturnos é o que resta. Urgiu a necessidade do brilho duma “eroica” que se ausentou. Marcaria a passagem para a segunda fase do seu legado. Vislumbre dela só lá mais para o fim com o “Allegro Vivace” da oitava sinfonia. Ou de uma ode à alegria, inscrita na nona e a mais conhecida para os pouco entendidos do género. Soergueuse uma ponte entre a seleção de reportório e a vida do compositor. Por que também o seu fim foi premonitório devido à falta de acuidade auditiva que se dilatou ao longo do tempo. O termo esteve relacionado com o começo. De novo, as cordas variavam sem causar melodia, numa espécie de intermitência. Só se sentiu o remate quando o maestro fez vénia ao grupo de instrumentistas. Brava! Por Liliana Cunha
4 de outubro de 2011 | terça-feira | a
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SoltaS dou-lhe amor
miCro-Conto
Por urbano tavares rodrigues
E
ra então membro do júri do Prémio Casa de Las Americas, onde me tornei amigo de Mário Benedetti e de Lincoln Silva, poeta paraguaio, que mais tarde traduzi para português. Mas sentava-se ao meu lado, manifestando uma grande simpatia, uma rapariga de meia estatura, sempre pólo e jeans, que parecia cigana. Só os olhos, muito rasgados, diziam que ela era índia. Chamava-se Marília Hurtado. Houve uma manhã em que, acometido de uma enxaqueca, com vómitos e horríveis dores de cabeça, sem que os meus medicamentos me minorassem a dor, fui nadar para a piscina de água gelada, confiando no efeito da vasoconstrição. Marília seguiu-me sem eu dar por isso. Nadou também, secou-se e quis acompanhar-me ao meu quarto. Curei-me nos braços dela, amando-a, primeiro, com muito esforço, depois em triunfo, banhado de luz e felicidade. Enquanto permaneci em La Havana nunca mais nos largámos de mão na mão, de olhos nos olhos. Até à dor da separação. *Por escolha do autor este texto não segue as regras do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
UrBANO TAVArES rOdrIGUES • 87 ANOS Foi em Lisboa que nasceu, em 1923, mas foi o Alentejo que reteve o seu olhar. Urbano Tavares rodrigues recorda “anos de encantamento” com uma voz que se lembra e que se arrasta pelos chaparros, pelas amendoeiras e pelas estrelas. Alentejo, a sua terra do nunca, com Urbano a fazer parte de tudo, com olhos mirabolantes que se exaltam em memórias. Foi lá, à volta dos campos, que compreendeu a miséria dos levantados do chão, levando-o, depois do 25 de Abril, a entregar as terras que tinha aos camponeses. Já antes, Urbano chegara ao partido comunista, pelo coração e não pela cabeça, como lhe chegou a dizer Cunhal. Um herói sem causa que coleccionou algumas lutas. A sua posição contra o Estado Novo levou-o até França, onde se cruzou com Camus e Malraux, do qual encontra a linha condutora para a sua obra: “dei-me pouco com Malraux mas foi como se me tivesse dado sempre”. Tem na mulher o motor, no envelhecimento a sua grande dor e na resistência palavra de ordem. Urbano Tavares rodrigues não é uma estante de prémios e obras. Urbano é um humanista, um eterno brigante.
A partir desta edição e até ao fim do ano de 2011/2012, os leitores do Jornal Universitário de Coimbra A CABrA poderão contar com colaborações inéditas de autores portugueses ou de expressão portuguesa. Escritores (reconhecidos ou que busquem o reconhecimento), jornalistas e outras personalidades marcarão presença neste espaço.
monumentaiS PanadoS SoCiaiS Por doutorando Paulo fernando • facebook.com/paulofernandophd
S
e já conhece esta crónica passe imediatamente para o Opção 2. Se é a primeira vez que pega no Jornal Universitário de Coimbra por favor leia a Opção 1.
Opção 1 Sejam então muito bem-vindos os que vêm por bem e os que de Coimbra apenas conhecem ainda o espaço compreendido entre a torre e aquelas escadas com as bolas ao topo. Bem-aventurados também os que vêm alimentar a especulação do mercado imobiliário, e os pais que confiam a guarda dos petizes a velhinhas que os põem a viver em sótãos e vãos de escada na primeira oportunidade! Eu sou Paulo Fernando e por vezes falo na terceira pessoa como os jogadores de futebol. Estou aqui para vos apresentar o lado negro da força. Ante vós, todo um mundo de possibilidades! Uma miríade de carreiras de autocarro, faculdades e departamentos, nomes impronunciáveis de estabelecimentos de diver-
João Gaspar
iiluStração por ana Beatriz marqueS
são nocturna, tascas e restaurantes com vinho que varia entre o mau e o pior, desafios intelectuais apenas ao alcance de mentes iluminadas, inteligências superiores que se apressam a partilhar o conhecimento numa lógica vertida sobre os pobres de espírito - na cadeira da vida universitária não há sebenta, não há consulta, não há cábula e não se pode levar o exame feito de casa – há educação pelos pares! Estimem os que convosco partilham tal sapiência, estimem os doutores que de forma tão desapegada se acercam da fila das matrículas gritando pelos caloiros de Direito como os instrutores da recruta no antigamente. Ante vós a praxe! Os pega-montros nas janelas das cantinas, o inquérito sobre a vossa proveniência, que revela as parafilias bestiais das psiques doutorais, os subtis ‘innuendos’ de natureza sexual, só possíveis dado o profundo romantismo que, do Choupal até à Lapa, desperta Coimbra nos
no CafÉ Com… Paulo fernando inÊS amado da Silva
seus amores. Festas do pijama na principal praça da cidade, ‘pillowfights’, criativas feveradas e festas da “porca e do parafuso”, cantorias e marchas de mão dada como nos escuteiros. Tudo mediante uma pequena contribuição. No próximo mês de No-
vembro vão ter a oportunidade de retribuir com amor todo o carinho que os vossos padrinhos e madrinhas vos dedicam – mediante o depósito de um papelinho numa urna, com duas linhas rectas a intersectarem-se no centro de um quadrado pré-determinado à entrada da faculdade.
Opção 2 Gosto em revê-los. Já sabem quem está com quem, quem traiu quem e quem se vendeu por não sei quanto? E votar? Este ano quem vai ter o cartaz com mais caras? Quem vai dar as esferográficas mais catitas? Ou será que nos vamos deparar com uma inovação no marketing caciqueiro, pago a troco de obséquios futuros? E dos blogues – qual é o que preferem? Com as eleições à vista, os departamentos de ‘scouting’ andam na estrada. Há muito jovem promovido à categoria sénior do moscambilheiro. Anda por aí muito voto sem senhorio, muito café para ser tomado, muito diamante em bruto para ser lapidado – ovelhas que correm o risco de se tresmalhar - e tu, jovem caciqueiro, podes ser o seu pastor! Para tal, quantos cafés já tomaste hoje? E comigo? Quem quer tomar café? *Por escolha do autor este texto não segue as regras do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
22 | a cabra | 4 de outubro de 2011 | Terça-feira
opinião UM DiA qUE AinDA vALE A pEnA cELEbRAR EDUARDO MELO*
“neste momento teremos um Sistema de Acção Social que dificultará ainda mais a garantia de oportunidades e o preconizado Ensino Superior para todos”, assevera Eduardo Melo.
O ano lectivo transacto foi marcado por uma forte contestação ao Decreto-Lei 70/2010 e ao Regulamento de Atribuição de Bolsas, como às Normas Técnicas Nacionais. Durante todo o ano, a Associação Académica de Coimbra liderou o descontentamento, fazendo valer a sua opinião junto dos decisores políticos, exigindo que se cumprisse um Sistema de Acção Social Escolar que permitisse a igualdade de oportunidades no acesso ao Ensino Superior e, desta forma, a também igualdade de oportunidades na mobilidade social. À data, todos os partidos políticos com assento parlamentar, exceptuando-se o Partido Socialista, à época o partido do Governo, votaram a retirada das Bolsas de Estudo do âmbito do DL 70/2010 e criticaram veementemente quer o atraso no processo de atribuição que se verificou, quer os efeitos da reestruturação do Sistema de Acção Social, de onde se destacaram particularmente os dois partidos que constituem a actual coligação governativa. No entanto, e como já vem sendo hábito, o Regulamento de Atribuição de Bolsas de Estudo a
Estudantes do Ensino Superior, saiu tardiamente e já iniciado o ano lectivo. Se por um lado foram correspondidas algumas alterações exigidas pelo movimento associativo aquando da retirada das bolsas de estudo do Decreto-lei 70/2010 isto é, o apuramento do rendimento per capita por divisão do rendimento do agregado familiar pelo número de pessoas e a não contabilização das bolsas de estudo enquanto rendimento do agregado -, por outro, várias foram as alterações problemáticas a relevar. Desde a baixa em 406.39 € do valor anual da bolsa de referência; à fixação de um limite mais exigente de aproveitamento escolar - 60% dos ECTS a que o estudante se encontrar inscrito, para a atribuição de bolsa a partir do ano lectivo 2012/2013; passando pela aplicação de deduções no valor de bolsa atribuído, três escalões para a determinação do valor patrimonial mobiliário, com aplicação por método sucessivo, quando abrangido mais que um escalão; sendo ainda instituídas variantes da fórmula de cálculo padrão, traduzidas em regimes especiais de determinação de
rendimentos dos agregados constituídos por apenas uma ou duas pessoas. Numa primeira avaliação, podemos dizer que este Regulamento é claramente insuficiente. Em primeiro lugar porque, ainda que o limiar de elegibilidade possa, por efeito da retirada da ponderação no cálculo da capitação do agregado familiar, elevar-se ligeiramente, a abrangência do Sistema de Acção Social ficará bastante aquém da abrangência incluída no Regulamento de Atribuição de Bolsas do ano de 2007, em aplicação até ao ano lectivo anterior – e este deve ser o termo de comparação, e não o Regulamento que tantos problemas causou recentemente. Por outro lado, prevê-se um efeito de abaixamento do valor médio de bolsa, o que se torna especialmente grave num momento de grandes dificuldades económicas, como as que atravessam o país. Estes factos fazem-nos prever que, neste momento, teremos um Sistema de Acção Social que dificultará ainda mais a garantia de oportunidades e o preconizado Ensino Superior para todos. Depois do ano lectivo de 2010/2011, em que
este sector de formação, especialmente ao nível dos incentivos ao estudo, sofreu o maior ataque na história da República Portuguesa, exigia-se uma postura mais responsável e a construção de medidas políticas que, não só corrigissem os erros do passado, mas que acima de tudo garantissem o futuro de uma geração predisposta a assumir os destinos do país e a contribuir para o seu desenvolvimento através de uma economia sustentada no conhecimento avançado. É um erro, no actual cenário económico, continuar a não aceitar o Ensino Superior como uma preocupação fundamental para o Estado. Para este novo ano, exige-se que a postura séria e reivindicativa, alicerçada em contributos construtivos, se mantenha. É fundamental que os Estudantes consigam passar, na opinião pública e junto do Executivo, uma mensagem fundamental: adiar o Ensino Superior como prioridade é adiar o país. *Por escolha do autor este texto não segue as regras do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. *Presidente da Direção Geral da Associação Académica de Coimbra
Carlota rebelo - arquivo
Cartas ao diretor podem ser enviadas para
acabra@gmail.com PubliCiDaDe
4 de outubro de 2011 | Terça-feira | a
cabra | 23
opinião rafaela Carvalho
EDitORiAL UM OUtRO REgULAMEntO DE bOLSAS
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ais um ano, mais um regulamento de atribuição de bolsas. No atual contexto torna-se já expectável que, de regulamento para regulamento, mais estudantes sejam privados das bolsas que sustentam a sua manutenção no ensino superior. Depois de fazer uma simulação da análise de 102 processos à luz do novo regulamento de atribuição de bolsas, o administrador dos Serviços de Ação Social da Universidade de Coimbra, Jorge Gouveia Monteiro, admitiu que se verificou um “número significativo de casos de perda de bolsa”. Já para não referir aqueles que receberam a bolsa de transição no ano transato e que pouca esperança têm de voltar a re-
ferência quando a eletricidade, o gás, os transportes, a habitação, a alimentação, tudo o que é essencial para o sustento de um estudante no ensino superior, aumentaram de preço. Quando a insensibilidade social do Ministério da Educação e Ciência encontra massas de estudantes conformados, dá azo a que haja cada vez mais cortes no que à ação social concerne, foi assim até agora e, devido a um passado histórico muito recente (lembrar os anos que a contestação estudantil esteve imobilizada, enquanto eram aprovados o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior (RJIES), lei das prescrições e outros que tais), não existem sinais que vá mudar. Neste cenário de austeridade con-
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quando a insensibilidade social do MEc encontra massas de estudantes conformados, dá azo a que haja cada vez mais cortes no que à ação social concerne cebê-la. Se no ano letivo passado assistimos a uma hecatombe anestesiada pela vitória que nunca chegou a ser, arriscamo-nos a observar semelhantes números se nada for feito pelos representantes dos estudantes. Não basta mostrar descontentamento. Manifestamente, o pouco que tem sido feito até agora não é suficiente e vai continuar a não ser quando, em janeiro, forem divulgados os números daqueles que anularam a matrícula na Universidade de Coimbra por não terem meios para pagar as contas. A cúpula associativa nacional mostra-se preocupada mas nada faz de eficaz em termos de reação (para não falar do trabalho proactivo que se desejaria há muito feito) para alterar a conjuntura. É inadmissível o corte de quatrocentos euros anuais na bolsa de re-
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tínua, em que já foi anunciado um corte de 8,5 por cento no orçamento do estado para o ensino superior, as próprias IES são empurradas para uma situação periclitante em que irão procurar outros meios de se financiarem e outros modelos arriscados, como é o fundacional. Neste modelo, em caso mais que provável de escasso financiamento, a instituição irá buscá-lo à família do estudante através da propina. Este é um cenário que importa evitar. Não é preciso muito mais para perceber o caminho ruinoso que se está a seguir no ensino superior e, consequentemente, no país. É então importante uma maior ligação dos estudantes com a restante sociedade civil, que é tão ou mais afetada que os estudantes com estas medidas e confere o peso reivindicativo necessário para se fazer ouvir. Camilo Soldado
Diretor Camilo Soldado Editores-Executivos: Inês Amado da Silva, João Gaspar Editoras-Executivas Multimédia: Ana Francisco, Catarina Gomes Editores: Inês Balreira (Ensino Superior), Ana Duarte (Cultura), Fernando Sá Pessoa (Desporto), Ana Morais (Cidade), Liliana Cunha (País), Marília Garrido (Mundo) Secretária de Redação Nicole Inácio Paginação Inês Amado da Silva, Rafaela Carvalho Redação Diana Lima, Joana de Castro Fotografia Ana Filipa Silva, Camilo Soldado, Inês Amado da Silva, Rafaela Carvalho Ilustração Ana Granado, Ana Beatriz Marques, Tiago Dinis Colaborou nesta edição Fábio Santos, João Paulo Ferreira, Paulo Sérgio Santos, Urbano Tavares Rodrigues Colaboradores Permanentes Carlos Braz, João Miranda, João Ribeiro, João Terêncio, João Valadão, José Afonso Biscaia, José Miguel Pereira, José Santiago, Lígia Anjos, Luís Luzio, Pedro Madureira, Pedro Nunes, Rafael Pinto, Rui Craveirinha Publicidade João Gaspar 239821554; 917011120 Impressão FIG – Indústrias Gráficas, S.A.; Telefone. 239 499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: fig@fig.pt Tiragem 4000 exemplares Produção Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra Propriedade Associação Académica de Coimbra Agradecimentos Reitoria da Universidade de Coimbra, Rui Antunes, Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra, Urbano Tavares Rodrigues
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Jornal Universitário de Coimbra
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MEC
À semelhança do ano letivo anterior, o ano académico iniciou-se sem um regulamento de atribuição de bolsas. No final de agosto o ministro Nuno Crato prometeu-o “para breve”, brevidade que demorou um mês. À custa deste impasse, o secretário de estado do ensino superior, João Queiró, terá motivos para “ficar triste”, uma vez que estão reunidas as condições para que a situação do ano passado se repita. Dejá-vu? Esperemos que não e que as bolsas sejam atribuídas antes de janeiro. Esperemos também que o ensino superior não caia no esquecimento durante mais quatro anos. I.B.
Fernando Matos de Oliveira
O TAGV, nos últimos anos, não teve qualquer tipo de linha de programação definida. Uma espécie de tudo o que vem à rede é peixe. A nova direção de Fernando Matos de Oliveira, com uma maior autonomia de gestão do espaço, tem como objetivo voltar a trazer o barco a bom porto. O novo diretor lança-se com determinação para a restituição do termo académico ao teatro, propondo iniciativas que visam melhorar a ligação entre a universidade, a cidade e o teatro. Um discurso ambicioso e com pernas para andar. Rezemos para que não manque. J.G.
Turismo de Coimbra
A empresa municipal responsável pela dinamização do turismo em Coimbra ainda não sabe o rumo que há de tomar. Enquanto se espera para saber se será extinta ou reestruturada, o que se sabe é que os orçamentos previstos para 2008 e 2010 não foram cumpridos. Quanto às justificações destes incumprimentos Luís Providência e Luís Alcoforado trocam galhardetes camarários. Mas no que toca ao cerne da questão - a necessidade de novas apostas para o turismo da cidade - todas as vozes se levantam para propor as melhores alternativas. Passarão estas novas opções por desamarrar a imagem de Coimbra à Universidade? A.M.
Cadeados do amor… por Carlos Costa
200 x 100 Por vários países da Europa renasce a tradição de colocar cadeados nas pontes como símbolo de amor eterno. Esta ideia, já antiga, consiste num casal de apaixonados trancar um cadeado com os seus nomes numa ponte, e lançar a chave ao rio. Junto das pontes e monumentos históricos surge uma nova profissão: os vendedores de cadeados. Esta é mais uma oportunidade de negócio para explorar turistas apaixonados. O que é certo é que na Ponte Vecchio, em Florença, já se passam multas a quem for apanhado a colocar cadeados na ponte. Esta prova de amor pode custar 50 euros de multa. Parece que por aqui a moda ainda não pegou, mas se tal acotecer, da forma como está a estabilidade entre os casais portugueses, é melhor que guardem uma chave suplente.