Edição 288 Jornal Universitário de Coimbra - A Cabra

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7 DE MARÇO DE 2018 ANO XXVIII Nº288 GRATUITO PERIÓDICO DIRETOR CARLOS ALMEIDA EDITORES EXECUTIVOS ANA FRANCISCA NUNES E PEDRO DINIS SILVA

acabra JORNAL UNIVERSITÁRIO DE COIMBRA

Secção de Fado ameaça boicotar Queima das Fitas

Serenata Monumental e outras atuações estão em jogo. Discrepâncias entre relatórios de contas motivam atraso na distribuição de verbas. PÁG. 3

ENSINO - PÁG. 4 -

Eric Jorge, atual presidente do Conselho Fiscal, faz o balanço do seu mandato e pede “seriedade, celeridade, rigor e transparência” aos seus sucessores

CULTURA - PÁG. 7 -

Rui Vieira Nery, Prémio UC 2018, viaja pelas suas memórias e partilha o seu percurso de vida até aos dias de hoje

DESPORTO - PÁG. 8 -

Mancha Negra completa 33 anos de existência. Possível subida da Académica para a Primeira Liga anima a claque, que considera serse adepto uma “forma de viver”

CIÊNCIA - PÁG. 9 -

Algoritmo desenvolvido identifica imagens ao recriar processos biológicos. Recursos limitados superam resultados de empresa multinacional

CIDADE - PÁG. 11 -

Município de Coimbra aderiu ao Orçamento Participativo pela primeira vez. Cidadãos vão apresentar ideias para o Centro Histórico da cidade HUGO GUÍMARO


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SECÇÕES E CONSELHOS DA AAC EM ADAPTAÇÃO AOS NOVOS ESTATUTOS

Principal obstáculo é a resistência à mudança. Processo “não é fácil e o sucesso depende da boa vontade dos dirigentes” - POR ANA RUA E PEDRO EMAUZ SILVA -

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m maio de 2017, a Associação Académica de Coimbra (AAC) renovou os seus Estatutos. Como consequência, os conselhos, tanto Cultural como Desportivo, e as secções vão ter de adaptar os seus regulamentos internos. Além disso, trouxe ou­tras alterações que visam melhorar o funciona­ mento da AAC. O presidente do Conselho Desportivo da AAC (CD/AAC), Miguel Franco, refere que a passagem deste órgão para deliberativo “foi a principal alte­ ração no regulamento”. Acrescenta ainda que colo­ caram “no papel o que já era feito na prática”. No que refere à fiscalização do estado financeiro das secções, Miguel Franco questiona-se acerca da sobreposição de poderes com o Conselho Fiscal da AAC (CF/AAC), dada a alteração do CD/AAC para órgão deliberativo. Caso a sobreposição não acon­ teça, “o CD/AAC está disponível para fazer esse trabalho”, clarifica. Em relação às secções, salienta também que existem “poucas alterações”. No entan­ to, informa que a uniformização das eleições para o mesmo período do ano é “uma luta antiga, mas que

já foi ultrapassada”. “Para já, o mais importante é a distribuição de verbas”, considera o presidente do Conselho Cultu­ ral da AAC (CC/AAC), Paulo Abrantes. Neste mo­ mento, a distribuição de verbas estabelece que 69 por cento atribui-se aos movimentos e despesas, 29 por cento para projetos e dois por cento para o CC/ AAC. Foi proposto pelo Conselho que 70 por cento fosse dedicado aos projetos e 30 por cento destina­ do aos movimentos de caixa, pois existe uma grande disparidade entre o dinheiro distribuído por cada secção. “Existem secções que recebem 30 mil e ou­ tras que recebem cerca de 100 euros”, esclarece. Em termos de estrutura do regulamento, Paulo Abrantes considera que “poucas alterações devem ser feitas”. Ambos os presidentes concordam que a uni­ formização do período de eleições é um ponto forte. Segundo o presidente do CF/AAC, Eric Jorge, os conselhos são eleitos em fevereiro e tomam posse em março. Por sua vez, as secções elegem durante o mês de abril e tomam posse em maio, de acordo com o artigo 170º dos Estatutos da AAC.

Neste processo de alteração de regulamentos, o papel do CF/AAC é “explicar às várias secções o funcionamento da casa imposto pelos novos esta­ tutos”. Eric Jorge, ao fazer um balanço da ada­ptação por parte das secções, refere que o principal obstá­ culo é “a resistência à mudança”, pois existem “di­ rigentes dos 18 aos 80 anos, o que dificulta a con­ ciliação dos vários pontos de vista”. Acrescenta a burocratização das normas como desvantagem no início, mas acredita que “a longo prazo se vai tornar uma vantagem”. A criação da Comissão Disciplinar, para Eric Jorge, é um “benefício, pois apoia o CF/ AAC”. Termina o seu balanço ao dizer que “Roma e Pavia não se fizeram num dia” e reconhece que a adaptação “não é fácil e o sucesso depende da boa vontade dos dirigentes”. Nos novos estatutos destaca-se a criação da Comissão Disciplinar, as alterações no modo de eleição do CF/AAC e no aumento do número de membros deste órgão. Além disso, de acordo com o artigo 198º, a organização da Queima das Fitas está sujeita a mais controlo.

ESTUDANTES DE DIREITO CONTESTAM PROLONGAMENTO DE EXAMES Provas de primeiro semestre ainda a decorrer. Discentes mostram a sua insatisfação face ao avanço do problema - POR ANA LAGE E MÓNICA REGO -

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alargamento da época de avaliações finais na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC), na Licenciatura em Direito, prolonga-se até, pelo menos, dois meses após o estipulado pelo mapa de exames. Neste momento, existem estudantes cujas provas orais de passagem ainda não foram marcadas. Os universitários qu­ei­ xam-se da contínua falta de docentes, que atrasa a correção das provas. No dia 20 de fevereiro realizou-se um plenário na FDUC que permitiu aos alunos apresentarem as suas queixas perante o atraso da marcação de exa­ mes. “A grande adesão estudantil comprova o d­es­ contentamento generalizado”, afirma o presidente do Núcleo de Estudantes de Direito da Associação Académica de Coimbra (NED/AAC), Fernando Marques. Em comparação com anos anteriores, este evento foi dos mais concorridos, ao contar com a presença de cerca de 150 estudantes. A FDUC apresenta um sistema de avaliação di­ vergente de outras faculdades porque opta na sua grande maioria pela avaliação final. Esta metodolo­ gia é incompatível com o mapa de exames, pois as marcações ficam próximas umas das outras. “Isto obriga a que o aluno divida a época de exames na normal e na de recurso”, explica o presidente do NED/AAC. “Qualquer aluno que pretenda ser bem-sucedido não consegue realizar tudo numa só época”, acrescenta. Maria Raquel Ferreira, membro do Conselho Pedagógico da FDUC, acredita que a origem do problema prevalece na “insuficiência de docentes para a quantidade de alunos inscritos nas unidades

curriculares”. Aponta a “falta de substituição” de professores que, entretanto, se retiraram da facul­ dade, assim como o aumento dos alunos que dão entrada na mesma. “Existem cadeiras com novecen­ tos inscritos”, exemplifica. Perante a proposta da avaliação repartida, o presidente do NED/AAC aponta algumas advertên­ cias quanto a turmas maiores. “Em vez de existirem quinhentos exames para corrigir, existem mil fre­ quências”, ilustra. Foram propostas algumas medidas em prol da resolução deste problema que, no entanto, não o solucionaram por completo. Os “monitores” eram estudantes de quarto ano, que, na passagem para o mestrado e através de um processo de seleção,

auxiliavam os professores nas provas orais. Esses mesmos monitores “vieram tentar responder às necessidades que os estudantes e professores têm”, afirma Fernando Marques. Com o objetivo de reunir as preocupações dos universitários, o NED/AAC, em consonância com os estudantes, está a elaborar um documento úni­ co. Este é “bastante detalhado e contém problemas e propostas para a resolução dos mesmos”, declara Maria Raquel Ferreira. Pela primeira vez, estas questões são levantadas entre a comunidade estu­ dantil através de um questionário específico. Até ao fecho desta edição, não foi possível entrar em contacto com o diretor da FDUC, Rui Marcos. JÉSSICA GONÇALVES


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SECÇÃO DE FADO RECUSA ATUAR NA QF SEM AS CONDIÇÕES EXIGIDAS

Última distribuição dos lucros do evento foi referente à edição de 2015. Problema considerado como possível “ponta do icebergue” - POR VITTORIO ALVES, GABRIELA MOORE E ANA SOFIA NETO PEDRO DINIS SILVA

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om várias atividades já planeadas e a contar com a verba referente à Queima das Fitas (QF), a Secção de Fado da Associação Académica de Coim­ bra (SF/AAC) teve de readaptar-se de forma rápida para equilibrar as contas. Segundo o vice-presidente da SF/AAC, Emanuel Nogueira, foi necessário um grande esforço para aumentarem a venda de discos, o número de atuações e procurarem financiamentos exteriores à AAC. A escola de música da secção, cujo objetivo não é gerar lucro, viu os seus preços aumen­ tados, uma vez que a SF/AAC possui colaboradores remunerados. O apoio da Reitoria da Universidade de Coimbra em troca de serviços também foi importante para não se cair em défice. Emanuel Nogueira afirma que “todas as secções estão descontentes com a situação”. Todavia, e mui­ to devido à situação precária pela qual passaram há pouco tempo, apenas a SF/AAC se manifesta. Não só a atribuição das verbas é motivo de insatisfação. Tam­ bém as condições oferecidas aos grupos no palco da QF são, segundo revela, “péssimas”. O tesoureiro da secção, Miguel Luís, acrescenta a “falta de valor” que lhes é dada. Diante deste cenário, a SF/AAC anunciou na última Assembleia Magna que não vai participar na edição deste ano da QF. O anúncio foi feito já numa “situação de desespero”, como refere o vice-presidente da SF/AAC. Isto implica que os grupos da secção não participem na Serena­ ta Monumental, no Sarau Académico e nas atuações no Parque da Canção. A intenção do ultimato é forçar a celeridade do processo de análise e aprovação dos Relatórios e Contas das Queimas das Fitas de 2016 e 2017, bem como a distribuição de verbas relativas a ambas as edições. Além disto, para voltar à QF, a secção exige não só a distribuição das verbas como também a melhoria das condições do ‘backstage’, um “processo disciplinar interno” sobre as pessoas envolvidas e que “este caso seja entregue ao Ministério Público”. Irregularidades levam a congelamento de contas A QF, cujo lucro é a principal fonte de rendimen­ to da AAC, é um protocolo entre a Direção-Geral da

AAC (DG/AAC) e o Conselho de Veteranos. Contu­ do, não é por completo subordinada à associação. A Comissão Organizadora da Queima das Fitas (COQF) é constituída por quatro entidades: Conselho Geral, Comissão Central, secretário-geral e secretariados. O Conselho Geral é um órgão permanente e é constituí­ do por cinco elementos: o presidente da DG/AAC e o tesoureiro da DG/AAC ou os seus representantes, um membro das secções culturais e outro das secções desportivas e o Dux Veteranorum. A meio do ano de 2016, após a QF, o CF/AAC vi­ gente apresentou a demissão. Desta forma, os relatóri­ os da edição, que deveriam ter sido entregues em ou­ tubro, não o foram. O novo CF/AAC começou o seu mandato em janeiro de 2017, mas, de acordo com o atual presidente, Eric Jorge, o relatório só foi entre­ gue no final de março. Foram evidenciadas diferenças entre o relatório entregue pela COQF’16 e o relatório feito pela Contabilidade, Tesouraria e Pessoal da AAC (CTP/AAC). Ao reunir com o então secretário-geral, Luís Lobo, percebeu-se que o relatório elaborado pela CTP/AAC, que servia de base de verificação para o CF/AAC, era feito consoante o ano civil e não o ano da edição, como acontecia com o da QF. Além disso, foi alegado pela COQF’16 que, até ao ano da edição, não se apresentavam documentos que justificassem os números apresentados. Eric Jorge considera “impos­ sível fazer qualquer tipo de verificação sem haver um documento que a sustente”. Revela a existência de in­ dícios de violações estatutárias e sublinha a delicadeza do assunto como uma possível “ponta do icebergue”. O CF/AAC pediu à contabilidade que refizesse o seu relatório com base na edição. No entanto, as dis­ crepâncias permaneceram. Ao comprovar isto, o CF/ AAC pressionou a COQF’16 e, a 12 de dezembro, emi­ tiu o seu parecer final desfavorável. O CF/AAC e­xi­ giu então que fosse feito um plano de distribuição de verbas de acordo com o valor apurado pela CTP/AAC no prazo de 15 dias. Este prazo não foi cumprido pelo Conselho Geral, o que fez com que o CF/AAC con­ gelasse as contas bancárias da QF. Eric Jorge lamenta que a situação tenha chegado a este ponto e definiu-a

como uma “faca de dois gumes”. Segundo ele, o CF/ AAC tem como principal função salvaguardar o bom funcionamento da casa. Porém, com o congelamento das contas, acontece o contrário, já que as secções pre­ cisam do dinheiro para funcionar. O Relatório e Contas da última edição encontra-se “preso no Conselho Geral” e não foi entregue ao CF/ AAC, como conta Eric Jorge. O presidente do Con­ selho Cultural, Paulo Abrantes, também membro do Conselho Geral, relatou que já foram apresentados seis relatórios ao Conselho Geral, mas os próprios membros encontram irregularidades e não permitem que avance para o CF/AAC. Serenata Monumental com a SF/AAC? Como frisou o presidente da DG/AAC, Alexandre Amado, a COQF’18 é uma “estrutura humana renova­ da e merece a oportunidade de funcionar”. A SF/AAC percebe que o boicote anunciado pode prejudicar a edição deste ano, apesar de a comissão atual não ser a culpada da situação. Sente, no entanto, ser importante esta “afirmação para se obter uma mudança”. Devido ao congelamento das contas bancárias da QF, foi aberta uma nova conta apenas para esta edição. Logo, a atual COQF não conta com os ha­ bituais cinco por cento do lucro da edição anterior definidos pelo regulamento interno do evento. O a­ tual­­ secretário-geral da QF’18, Manuel Lourenço, conta que, até ao momento, não têm feito gastos financeiros. Revela que estão a “procurar melhores propostas e a baixar o orçamento onde podem”. O secretário-geral da QF’18 ressalva que, apesar de estar a fazer tudo para garantir a presença da SF/ AAC, a Serenata Monumental, como atividade pre­ sente no Regulamento Interno da QF, vai realizar-se “quaisquer que sejam os moldes”. Emanuel Nogueira considera uma ofensa tirar um lugar que, segundo ele, lhes pertence. “Foi graças à SF/AAC que se recuperou a Canção de Coimbra no seio da AAC”, sublinha. O vice-presidente da secção afirma a importância de o problema ser resolvido, “de uma vez por todas”, antes da próxima edição.


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ERIC JORGE FAZ BALANÇO DO MANDATO DO CONSELHO FISCAL Com sentimento de dever cumprido, o atual presidente do Conselho Fiscal da Associação Académica de Coim­ bra (CF/AAC), Eric Jorge encerra um mandato “cansativo e bastante longo”. O antigo presidente do Núcleo de Estudantes de Engenharia Civil da AAC (NEEC/UC) espera do próximo CF/AAC “seriedade, celeridade, rigor e transparência” - POR JÉSSICA GONÇALVES E MARGARIDA MANETA -

GABRIELA MOORE

Entrevista disponível na íntegra em acabra.pt


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O que te motivou a candidatares-te há um ano? Depois de terminar o mandato no NEEC/ AAC, surgiu a oportunidade de ingressar numa lista no CF/AAC. Confesso que já tinha tido a ideia de representar um órgão da AAC. O que eu mais queria era elevar o bom nome da as­ sociação e participar em toda a história que a mesma produz. Que balanço fazes do mandato? Foi um mandato longo, não foi o período ha­ bitual de um ano. Teve cerca de um ano e cerca de três meses. Foi muito cansativo, exaustivo até. Houve alturas em que parecia que estava tudo a correr mal, que as coisas não estavam a aparecer como tínhamos projetado. No en­ tanto, conseguimos ultrapassar isso e resolver quase todos os processos e todas as atividades que o CF/AAC tinha de desenvolver e a que nos tínhamos proposto. Portanto, faço um ba­ lanço positivo. Alguma vez pensaste em desistir? Desistir nunca foi uma opção. Sempre tive uma equipa que me ajudou e acompanhou desde o início e conseguimos ultrapassar tudo. Nem sempre estamos no melhor das nossas capacidades, nem sempre estamos a cem por cento. No entanto, o facto de termos entrado todos da mesma lista no órgão fez com que conseguíssemos puxar uns pelos outros e levar os trabalhos a bom porto. O que realças do mandato? Não consigo arranjar um ponto mais impor­ tante do mandato. Foi muito complicado, so­ bretudo devido ao processo demissionário do CF/AAC do ano anterior. Esse processo trouxe muitas consequências e mazelas. Para nós, foi prioritário colmatá-las. Deparámo-nos com uma casa bastante desarrumada. Foi difícil e um choque muito grande para todos. Até eu, enquanto presidente do CF/AAC, não estava mesmo nada à espera que fosse assim, que as coisas estivessem naquelas condições, mas tí­ nhamos de honrar o compromisso e foi o que fizemos. Tínhamos o parecer do Relatório Anual e Contas da Direção-Geral da AAC (DG/AAC) do ano de 2016 para lançar. Não devia ser nossa competência, mas sim do CF/AAC que estava em funções nesse ano. Mesmo assim tivemos que o fazer. Aproveitámos essa oportunidade para pormos em prática a nossa visão en­ quanto órgão fiscalizador, não só das secções e dos núcleos de estudantes, mas também da DG/AAC. Só tínhamos de avaliar, achámos que tínha­mos as condições suficientes para fa­ zer esse trabalho e fizemo-lo de forma exímia. Tivemos de lançar também o parecer sobre o Relatório Anual e Contas da Queima das Fi­ tas (QF) de 2016 em meados de abril. Foi um processo longo e bastante cansativo por falhas de comunicação. Na nossa base de dados tínha­ mos um endereço de ‘e-mail’ da QF que viemos

a saber, da pior forma, que não correspondia ao que estava ativo. Emitimos o parecer sobre o relatório da QF de 2016, que saiu negativo devido às discrepâncias que encontrámos entre o relatório apresentado pela própria comissão organizadora e os dados que tínhamos e rece­ bíamos do serviço de contabilidade e tesoura­ ria da AAC. A QF defendeu-se, como é do seu direito, expôs o seu lado, os seus argumentos. Entretanto, revimos o relatório por eles entre­ gue, fizemos uma segunda análise e ainda pe­ dimos um parecer à chefe da contabilidade e ao técnico oficial de contas. Verificámos que exis­ tia essa discrepância. O Relatório de Contas da QF de 2017 ainda não chegou, continua preso no Conselho Geral da QF (CGQF), mas ainda temos esperança que chegue até acabarmos as nossas funções.

“O Conselho Fiscal não é um órgão que reúne para depois não se fazer nada. O presidente do CF/AAC não é uma figura que só aparece quando existe uma assembleia ou entrevista. Necessita de ponderação e rigor” Tivemos a entrada em vigor do ex-libris do nosso mandato, os Estatutos da AAC. Duran­ te o verão, tentámos perceber o que podíamos pôr em prática e aplicar ou não na revolução estatutária. Passámos de um documento que tinha cem artigos para um que tem cerca de 216. É uma carga grande inteirarmo-nos desse dossiê e perceber qual é que ia ser a dinâmica que esses estatutos iam imprimir na casa. Acho que essa transição foi bem aplicada. Consegui­ mos aplicar quase tudo o que era pedido pe­ los estatutos naquilo que eram as disposições finais e transitórias destes. Conseguimos criar uma base de dados geral da Académica dos associados seccionistas, algo que foi feito de raiz por este CF/AAC. Afixámos os cadernos eleitorais para estas eleições do CF/AAC, mas elas vão ter impacto em toda a vida das secções porque os cadernos eleitorais serão também utilizados para as eleições dos conselhos cul­ turais, desportivos e internúcleos. Acabo o CF/ AAC ao fixar os cadernos eleitorais para os cor­ pos gerentes das secções associativas. O nosso mandato não acaba no dia das eleições para o CF/AAC, acaba no dia em que a lista vencedora tomar posse e iniciar as suas funções. Portanto, até esse dia ficamos à espera

e vamos trabalhar no que temos de trabalhar. Esperamos receber o Relatório Anual e Con­ tas da DG/AAC 2017, também o da QF 2017, que esse sim era o que nos competia avaliar en­ quanto CF/AAC 2017 e era aí que queríamos pôr em prática tudo o que aprendemos durante o ano todo. O CF/AAC provou estar à altura e ser um órgão que merece o destaque que teve nesta revisão estatutária com as competências que nos dão muito mais peso a nível de tra­ balho. Fomos o CF/AAC do ano 2016, de 2017 e um bocado de 2018, portanto, sentimos que cumprimos a nossa missão e conseguimos ele­ var o bom nome da AAC. Dado que estás a liderar a mudança na casa, porque não te recandidataste? Não me recandidato porque entendo que exis­te muito cansaço neste ponto do mandato. Foi um termo mais longo do que aquilo que é habitual nos órgãos centrais da AAC. Foram mais três meses de trabalho constante que já vinha no seguimento de um ano de trabalho redo­brado para conseguirmos voltar a trazer o CF/AAC que se tinha perdido com o processo demissionário do ano anterior. Encontrámos um CF/AAC que existia, mas que se estava a afundar. Os meus colegas não se recandida­ tam por motivos deles, ao contrário da Beatriz Martins que ingressa uma das listas candidatas. Sempre achei que seria profícuo haver alguém deste CF/AAC para o ano seguinte, de forma a dar seguimento a processos que ficam pen­ dentes. Não estão reunidas as minhas condições pe­ssoais para me recandidatar por ter sido um ano em que me absorvi e me deixei absorver muito pela AAC. Tenho um curso para ter­ minar que não se tornou mais fácil estando a desempenhar funções na AAC. Ser presidente exigiu muito de mim e isso refletiu-se no meu percurso académico. Sinto necessidade de me afastar por agora. Não digo para sempre, uma vez que continuarei interessado na vida da AAC. Em que estado passa a casa para o próximo CF/AAC? Deixamos uma casa mais arrumada, mais respeitadora. Senti muito que, ao longo do ano, o contacto com as secções e o respeito foi aumentando. Conseguimos fazer com que o serviço de contabilidade, a tesouraria pessoal da AAC e a própria administração da DG/AAC evoluíssem. O que esperas do próximo CF/AAC? Seriedade. O CF/AAC não é um órgão que reúne para depois não se fazer nada. O presi­ dente do CF/AAC não é uma figura que só apa­ rece quando existe uma assembleia ou entre­ vista. Necessita de ponderação e rigor. Devem evitar-se extensões de prazos e começar-se o trabalho mais cedo. É importante ser célere. A transparência também deve pautar e é impor­ tante ter orgulho na Académica e nos estatutos que foram elaborados com seriedade.


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CELEBRAÇÃO DO MÊS DO FADO VAI ALÉM DAS SERENATAS Iniciativa “impulsiona a atividade e a presença das novas gerações”. Manuel Alegre, Rui Pato, Manuel Portugal e Jorge Gomes vão participar nas celebrações - POR CATARINA MAGALHÃES E FILIPA VIEIRA CATARINA MAGALHÃES

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Mês do Fado regressa a Coimbra, cinco anos depois, e prolonga-se durante o mês de março. A organização está a cargo da Secção de Fado da Associação Académica de Coimbra (SF/ AAC). “Não, o Fado de Coimbra não pode morrer” é o mote da iniciativa. Serenatas, noite de guitarradas, conferências, debates, convívios e um concerto de encerramento integram a programação. O evento vai ao encontro dos objetivos estabe­ lecidos pela organização, uma vez que a Canção de Coimbra “não atravessa um momento de luz”, reconhece Simão Mota, um dos membros da organi­ zação. A SF/AAC propõe-se a reavivar e impulsionar o Fado de Coimbra e assume o dever de “defender e preservar” a identidade da Canção de Coimbra, ex­ plica o mesmo.

A presença de “vultos de fado” como Manuel Alegre, Rui Pato, Jorge Gomes ou Manuel Portu­ gal representa uma tentativa de “libertar o Fado de Coimbra do clichê das serenatas”, estabelece o vice-presidente da SF/AAC, Emanuel Nogueira. A ligação ao romantismo é uma parte de um passado do qual os membros da organização ambicionam evoluir - “uma transição estética e lírica”. A canção de Coimbra “é indissociável do poema”, destaca Simão Mota. A organização enfatiza o debate das casas de Fado. É uma iniciativa “que gera discussão, tanto na secção, como nas casas de Fado”, afirma o também membro da SF/AAC, Simão Mota. No debate vão es­ tar presentes os representantes das várias casas de fado da cidade: Manuel Portugal do Fado Hilário,

Associação Cultural, Ricardo Dias da Casa de Fados Centro Cultural “àCapella”, João Farinha do Fado ao Centro - Associação Cultural e Artística do Centro e Jorge Cravo, que é cultor da Canção de Coimbra. Outro destaque do ciclo de eventos é o concerto de encerramento que vai decorrer no auditório da Reitoria da Universidade de Coimbra. Este vai con­ tar com a “participação de grandes nomes da canção de Coimbra”, acrescenta o vice-presidente da SF/ AAC. Na ótica da organização, o espetáculo vai ser o “culminar das celebrações”. A conferência “A Gui­ tarra de Coimbra e a sua raiz popular”, do mestre Jorge Gomes, também integra a programação. “Um dos objetivos estabelecidos é cruzar ge­ rações” e “provocar um intercâmbio de ideias”, acrescenta Emanuel Nogueira. Apesar de manter a sua raiz na vertente popular e académica, o Fado de Coimbra “aliou-se àquilo que eram as ansiedades das pessoas e dos estudantes”. O mesmo sublinha a ligação às necessidades políticas do país e da aca­ demia, o que alude ao período do Estado Novo. “Consciencializar as pessoas daquilo que é o Fado de Coimbra e o papel que tem na história da cidade” é o que a SF/AAC pretende, esclarece o vice-presi­ dente da secção. Neste contexto, toda a programação está organizada “segundo um percurso histórico, desde os finais do século XIX até à atualidade”, frisa Simão Mota. As celebrações impulsionam a atividade e a pre­ sença das novas gerações na Canção de Coimbra. Numa secção que teve a sua génese na década de 80, um dos propósitos é “cativar os mais jovens para apreciarem e darem continuidade a este género”, conclui Emanuel Nogueira. Trata-se de um even­ to que “pode vir a resgatar o lugar de destaque da secção no património cultural muito importante”, que é o Fado de Coimbra.

“A CASA DAS VANGUARDAS” REFLETE 60 ANOS DO CAPC Exposição sobre a história do CAPC cria uma coligação com o Colégio das Artes. “A vanguarda está em Coimbra, a vanguarda está em ti” é o mote do evento

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ste ano o Círculo de Artes Plásticas de Coim­ bra (CAPC) faz 60 anos. É um lugar “associa­ do às vanguardas artísticas em Portugal, pelo menos desde os anos 60 e 70” do século XX, é assim que o diretor do CAPC, Carlos Antunes, começa por justi­ ficar a importância desta exposição. A apresentação tem como intuito invocar momentos importantes da história do CAPC. “O círculo, embora discreto, teve sempre uma ligação muito forte às vanguardas artísticas”, refere Carlos Antunes. “A Casa das Vanguardas” é o nome provisório da exposição. O evento conta com a parceria do La­ boratório de Curadoria do Colégio das Artes. A or­ ganização está a cargo de um grupo de alunos do Mestrado de Estudos Curatoriais da Universidade de Coimbra (UC). Esta iniciativa está integrada na 20ª Semana Cultural da UC e vai ser inaugurada no dia 17 de março.

- POR EDUARDA MENDES E ANA SANTOS -

“A vanguarda está em Coimbra, a vanguarda está em ti” é o título de um texto de Ernesto de Sousa, crítico português do século XX, que já colaborou com o CAPC. O título serviu de mote para a esco­ lha do nome temporário da exibição. “Os últimos 60 anos foram a altura em que a arte passou por um processo das denominadas segundas vanguardas”, explica o coordenador do Mestrado em Estudos Cu­ ratoriais do Colégio das Artes da UC, Delfim Sardo. O mesmo menciona que as segundas vanguardas se refletiram na utilização intensiva da fotografia e do vídeo, que vieram substituir os processos canónicos da pintura e escultura. A coletânea de obras conta com 12 peças que marcam os últimos 60 anos da arte contemporânea portuguesa. “A exposição vai modelar os diferentes picos da arte”, refere o diretor do CAPC. Na perspe­ tiva de Carlos Antunes, “a arte não evolui, ao con­

trário da ciência”, mas “traduz o estado do mundo”. O mesmo acrescenta que “os artistas antecipam o seu tempo, pois a arte é o espelho da época em que se inscreve”. Assim, esta exposição vai contar o con­ tributo do CAPC à arte contemporânea portuguesa nas últimas seis décadas. A peça central da coleção é da autoria de Wolf Vostell, um artista alemão que trabalhou no CAPC e tinha uma relação próxima com Ernesto Sousa. Nas palavras de Delfim Sardo, “a obra serviu de mote para ir ao encontro de outras obras que com ela dia­ logassem”. Segundo o coordenador também vai ha­ ver uma interação com o cinema. A exposição tem como tema “a ideia de camadas, ou seja, projetos artísticos que têm várias dimensões e interpretações possíveis”, aponta Delfim Sardo. Este conceito foi escolhido pelos alunos do Mestrado em Estudos Curatoriais da UC.


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“NÃO COMPRAMOS ROUPA SÓ PORQUE TEMOS FRIO”: PELA LENTE DE RUI VIEIRA NERY Professor da FCSH-UNL recebeu, dia 1 de março, o Prémio UC de 2018. “É uma recompensa de 40 anos de carreira” - POR LAUREN BENTO, INÊS GAMA E MIGUEL MESQUITA MONTES -

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evê-se na Amália como se vê ao espelho. A sua música favorita é sempre a última de que gostou muito. Embora lisboeta, é filho de Coimbra e sente-se em casa nos Estados Unidos e no Brasil. E ainda é o mais recente vencedor do Prémio Universidade de Coimbra (UC). Rui Vieira Nery respirou música toda a sua vida. Filho de “um músico prático” e de uma historiado­ ra de arte, foi fruto do cruzamento entre a preferência musical do pai e o gosto da mãe pela história. “A pre­ sença da música não foi uma opção, ela estava sempre presente”, confessa Rui Vieira Nery. E a prova disso foi ter aprendido a tocar piano desde muito cedo. Mais tarde, licenciou-se em História na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, mas a sua for­ mação na área da música levou-o a “pensar na mes­ ma como um fenómeno temporal”. Como em terras lusas “a história não se interessava pela música, nem vice-versa”, Rui Vieira Nery partiu em busca de um espaço interdisciplinar no outro lado do Atlântico. Assim, durante oito anos, estudou e investigou na Universidade do Texas, nos Estados Unidos da Améri­ ca. “Viver no campus de uma universidade americana é como viver numa espécie de torre de marfim”, des­ creve. “Existe uma grande sensação de liberdade, apesar de se trabalhar um bocado à margem dos problemas reais que se passam fora das muralhas da universidade”. Da sua experiência norte-americana recorda amigos e namoros, e ainda uma formação científica e profissional muito sólida. Ao definir este período como um marco importante, Rui Vieira Nery comenta que “amadureceu como homem, intelectual e cidadão”. De regresso a Portugal, exerceu vários papéis de destaque, entre os quais o de Secretário de Estado da Cultura no primeiro governo de António Guterres. “Não há nem desenvolvimento, nem verdadeira de­ mocracia se não houver um incentivo à cultura efi­ caz”, comenta. Enquanto estudioso da música, Rui Vieira Nery defende que a formação dos jovens “devia ser muito mais generalizada e fazer parte do seu cur­ rículo geral”. Ainda assim, admite que a criação da música portuguesa “está num período muito interes­ sante, pelo simples motivo de que o número de alunos com este tipo de formação aumentou de forma expo­ nencial”, comenta. “É evidente que o talento desses estudantes é muitas vezes frustrado pela inexistência de oportunidades”, aponta ainda o musicólogo. Num país em que “o go­ verno gasta cerca de 0,22% do Orçamento de Estado na área cultural, que representa cerca de 4,5% do PIB, o incentivo a esta pasta deve ser maior”, ao ter em con­ ta o seu peso na economia nacional. Como um dos principais responsáveis pela ins­ crição do Fado na lista de Património Cultural Imate­ rial da Humanidade pela UNESCO, Rui Vieira Nery tem Amália Rodrigues como uma figura de referên­ cia. “Foi uma personalidade extraordinária, que re­ presenta a identidade portuguesa em todos os seus aspetos”, expõe. Também se revê em Jordi Savall, ar­ tista espanhol que “mudou as regras do jogo da músi­ ca antiga”, explica. Este compositor ibérico lutou pela raiz mediterrânica, ao comprovar que países como Itália, Espanha e Portugal davam umw contributo tão grande para a Europa quanto outros reconhecidos pela tradição.

É professor associado do Departamento de Ciências Musicais na Faculdade de Ciências Sociais e Hu­ manas da Universidade Nova de Lisboa. Enquanto académico, mantém uma relação forte com o Brasil, produto do intercâmbio cultural existente entre os dois países. Visita este país, que considera uma segun­ da casa, de forma constante para participar em colóquios e eventos, ou “apenas encontrar amigos, passear e tomar um copinho na praia”, confidencia. Alguns destes laços partiram dos tempos na América do Norte. “Quando estava no Texas, tinha pontos em comum com colegas brasileiros, o que con­ tribuiu para estabalecer ligações”, conta Rui Vieira Nery. Ao observar o leque vasto daquilo que são os seus trabalhos, confessa ser difícil selecionar uma só obra. Apesar de “Para uma História do Fado” ser o seu livro mais vendido, o autor destaca as suas obras “Fado para a República” e “Os Sons da República”. Enquanto a primeira é uma antologia de letras do fado republicano, operário e anarquista, a segunda debruça-se na ge­ ração de 70 de Eça de Queirós e Antero de Quental. Embora tenha exercido a sua carrei­ ra como estudioso em Lisboa, a Uni­ versidade de Coimbra foi essencial para as suas pesquisas no mundo musical, so­ bretudo através do espólio disponível na Biblioteca Geral da UC. Rui Vieira Nery considera-a mesmo “um dos fundos mais ricos da história da música portuguesa”. O musicólogo vê a UC como pioneira no reconhe­ cimento do papel das artes na academia. “É significa­ tivo que o Prémio UC esteja a ser dado cada vez mais a gente ligada à criação artística”, reflete.

“Não há nem desenvolvimento, nem verdadeira democracia se não houver um incentivo à cultura eficaz” A música foi o veículo que conduziu Rui Vieira Nery ao prémio UC. Apesar de esta estar intrínseca na sua vida, não consegue se­ lecionar uma em particular com a qual se identifique. A sua músi­ ca favorita é sempre a última de que gostou. Já na cerimónia que se ­r­­ealizou no dia 1 de março foi feita uma reflexão acerca do seu percurso, alicerçada num conjunto de memórias pessoais. Rui Vieira Nery aparenta ver poesia em tudo. “Não compramos rou­ pa porque temos frio, compramos roupa porque gostamos dela, compramos roupa porque nos desperta afetos e emoções”. O mesmo acrescenta que “muito desse ‘design’, muita dessa conceção inovadora nos produtos vem de uma sensibi­ lidade cultural e artística, da criatividade e da capaci­ dade de inovação”, conclui. São visões únicas como esta que desenham este artista. Uma aparência cuidada e pensada ao pormenor. Um ar um tanto levitante, que respira música em todas as direções. Rui Vieira Nery pensa na conferência de aceitação do Prémio UC, que vai acontecer em breve. “Memórias de um fim andante” é como se denomina a re­ trospetiva proferida na Sala dos Capelos, cheia de caras jovens que visiona através das suas lentes. ANA SOFIA NETO


7 DE MARÇO DE 2018 DESPORTO -8-

HUGO GUÍMARO

PROGRAMA COMUNITÁRIO PRETENDE QUEBRAR A BARREIRA ENTRE ESTUDOS E ALTA COMPETIÇÃO Dificuldades na conciliação da carreira dual motivam criação de plataforma de apoio aos pais. Projeto europeu pretende alargar-se a nível mundial - POR ANA RITA TELES -

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MANCHA NEGRA: 33 ANOS DE “UMA FORMA DE VIVER” Melhor organização financeira e participação dos jovens dá “novo sangue” à claque. Possível subida de liga anima adeptos da AAC/OAF - POR FRANCISCO MADAÍL, DANIEL PASCOAL E SAMUEL SANTOS -

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m 1985 nasce a claque oficial da Associação Académica de Coimbra/Orga­ nismo Autónomo de Futebol (AAC/OAF), à qual se atribui o nome Mancha Negra. O grupo festejou, no passado dia 3 de março, 33 anos de existência. A Mancha Negra surge “numa altura em que as claques organizadas começam a aparecer em Portugal”, como explica Rui Mário Oliveira, um dos fundadores do grupo. Para esclarecer a criação do nome, revela que, “pelo facto de a Académica ser a única equipa a vestir preto no país”, o grupo considerou que o nome deveria estar relacionado com a ideia de “uma grande mancha negra”, sem deixar de referir a inspiração na personagem homónima da Disney. Acerca do estado atual do grupo, o presidente, João Paulo Fernandes, afirma que este tem contado com o aumento do número de membros ao longo dos anos, “graças ao seu processo de legalização e ao momento vivido pela equipa apoiada”, a pos­ sível subida de divisão. Apesar de “situações complicadas, como a descida de liga em 2016” da Académica, Rui Mário Oliveira considera que “a evolução da claque é impressionante”. Não deixa de acrescentar que, ainda que o grupo tenha crescido a nível financeiro e mudado a nível organizacional, “o amor ao clube permanece”. Rui Mário Oliveira admite que “o projeto da Mancha Negra superou todas as ex­ pectativas” e deseja que a claque “cresça até ao seu centenário”. Por sua vez, o presi­ dente evidencia a importância dos jovens para o futuro da mesma e, apesar “das ge­ rações mais velhas não estarem tão presentes”, confia que os valores vão permanecer. Nos últimos anos, a AAC/OAF vivenciou episódios marcantes da sua história. Francisco Sobral, sócio da Mancha Negra, presenciou alguns deles. Este afirma que o dia mais feliz da sua vida foi a 20 de maio de 2012, quando a equipa venceu a Taça de Portugal, frente ao Sporting Clube de Portugal. Em consonância com a opinião do fundador e do atual presidente, salienta que a conquista deste troféu e consequente qualificação para a Liga Europa foram os melhores momentos vividos pelo clube. Em busca de novos anos de glórias, a AAC/OAF luta pela subida de divisão para a Primeira Liga. Francisco Sobral acredita que não vai ser fácil, devido à “alta com­ petitividade” da Segunda Liga, em que a disputa pelos primeiros lugares é intensa. Apesar da performance das equipas “ser feita de altos e baixos”, o sócio da claque acredita que a Académica tem “o melhor plantel do campeonato” e possui capaci­ dades de voltar ao topo do futebol português. Apesar de “não ser possível viver apenas de futebol”, João Paulo Fernandes e Fran­ cisco Sobral consideram fazer o máximo para estarem sempre presentes. “É uma forma de estar, uma maneira de viver”, conclui o presidente da Mancha Negra. João Paulo Fernandes não deixa de referir que “qualquer pessoa é livre de entrar” no gru­ po e que o “ambiente vivido” durante os jogos é o principal fator de atração.

om o objetivo de apoiar os pais em relação à carreira dos filhos estu­ dantes-atletas, nasce o projeto EMPATIA a nível de União Europeia. Com início no passado mês de janeiro, tem duração prevista até dezembro de 2020. Liderado pela Universidade de Liubliana, na Eslovénia, e financiado pela Comissão Europeia, o projeto EMPATIA, acrónimo para Education Model for Parents of Athletes In Academics, decorre da parceria entre universi­ dades e instituições desportivas de diferentes países europeus. Como parte integrante desta lista, encontra-se a Universidade de Coimbra (UC), o Foro Itálico da Universidade de Roma, a Universidade de Limerick, na Irlanda, e o Instituto Nacional do Desporto, Perícia e Performance, em França. No caso de Portugal, além da UC, o projeto encontra-se associado ao Giná­ sio Clube Figueirense (GCF) e, a nível europeu, a entidades como a EUSA (­European University Sports Association), o Comité Olímpico Nacional Italiano e o Instituto Irlandês do Desporto. De acordo com a presidente do GCF, Ana Lúcia Rolo, a sua criação desen­ volveu-se em resposta à “falta de acompanhamento por parte dos pais e de uma boa ligação entre a escola e o desporto, de modo a conciliar os horári­ os dos estudantes”. Para o diretor da Faculdade de Ciências do Desporto e ­E­­­­­d­­u­­­­cação Física da UC (FCDEFUC), António Figueiredo, os pais co­ns­ tituem “um agente fundamental que tem sido negligenciado”, pelo poder que detêm nos momentos de decisão dos jovens atletas. Como descreve Ana Lúcia Rolo, o programa consiste na “criação de uma plataforma ‘online’ para que os pais obtenham mais informações e apoio”. António Figueiredo acres­ centa ainda a intenção de “maximizar a atividade escolar e desportiva e a articulação entre as duas dimensões”. Nestes moldes, o diretor da FCDEFUC reitera que a decisão de a UC par­ ticipar, baseia-se no facto de a instituição “reclamar, há cerca de três anos, um novo espaço de centralidade para o desporto universitário em Portugal e no estrangeiro”. Acrescenta ainda como apoio para a implementação do projeto o facto de se realizarem os Jogos Europeus Universitários, este ano, na cidade de Coimbra. No que diz respeito ao GCF, Ana Lúcia Rolo explica que o convite a este se justifica por corresponder a “um clube multidespor­ tivo”, que conta com 13 modalidades e com a participação de jovens a partir dos 14 anos. António Figueiredo realça o facto de o projeto se focar em jovens adultos, mas sem descurar o reconhecimento de “franjas da população que podem carecer de intervenção similar, como o caso da carreira dual ligada aos jo­ vens paralíticos”. Não deixa de acrescentar que, num futuro próximo, o pro­ jeto tenciona, com os estudos realizados, “criar algum tipo de plataformas de apoio aos pais em amostras de faixas etárias ainda mais baixas”. Para o diretor da FCDEFUC, é natural que um jovem ao longo da sua car­ reira dual se depare com situações de maior complexidade, como o caso de “estar sujeito a ambientes sociais mais restritos”. Refere ainda que a prática desportiva costuma “entrar em conflito com alguns hábitos socais típicos dos jovens adultos”. Apesar da fase embrionária de recolha de dados em que se encontra, António Figueiredo admite que “há a possibilidade de se con­ seguir, no futuro, desenvolver uma ‘network’ internacional”. Com Raquel Medeiros


7 DE MARÇO DE 2018 CIÊNCIA E TECNOLOGIA -9-

SIMULAÇÃO DE PROCESSOS BIOLÓGICOS PARA A CRIAÇÃO DE UMA INTELIGÊNCIA DIGITAL DESENVOLVIDA NA UC Projeto consegue resultados superiores à Google. Investigador afirma que é a altura certa para se discutir sobre as implicações da inteligência artificial - POR ANDRÉ CRUJO E MARINA FERREIRA -

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uatro investigadores da Faculdade de Ciên­ cias e Tecnologia da Universidade de Coimbra ­(FCTUC) desenvolveram o Deep Evolutionary Network Structured Representation (DENSER). O projeto desen­ volvido pela equipa da UC constitui um novo algoritmo que permite a identificação de imagens através de redes neuronais profundas (RNP) artificiais. “Replicar processos evolucionários” é a base o processo de categorização do algoritmo, explica Penousal Macha­ do, integrante da equipa e professor auxiliar do Depar­ tamento de Engenharia Informática (DEI) da F ­ CTUC. Filipe Assunção, aluno de doutoramento do DEI e tam­ bém membro da equipa, defende que o que diferencia o DENSER da tecnologia prévia é a sua autonomia. O doutorando em Ciências e Tecnologias da Informação na FCTUC explica que a aprendizagem computacional é feita “de uma forma independente”.

O conceito de RNP surge da aplicação de teo­ remas matemáticos. “Uma RNP é um modelo computacional simplificado de uma rede neuro­ nal biológica” que, neste caso específico, conse­ gue identificar imagens através de uma abrangen­ te base de dados, explica o professor. O mesmo acrescenta que assim se “permite simular proces­ sos evolucionários que ocorrem a nível biológico”. O novo ‘hardware’ disponível, “computadores e pla­cas gráficas mais potentes”, possibilita o desen­ volvimento do algoritmo, elucida o professor. A limitação de recursos não constituiu um ­o­­bs­­táculo na obtenção de resultados competitivos por parte da equipa da UC. Em contraste com as duzentas placas gráficas utilizadas pelo ‘Google Brain’, desenvolvido pela empresa Google, as cinco usadas pelo DENSER são suficientes para que os

resultados do mesmo sejam superiores às da empresa internacional. “Tudo o que leva à obtenção de resulta­ dos semelhantes com menores recursos acaba por ser uma vitória”, refere Filipe Assunção. Apesar do DENSER apenas ter a capacidade de identificar imagens, este está integrado numa secção da tecnologia que levanta questões éticas. O desen­ volvimento deste algoritmo coloca a equipa em con­ tacto com os perigos e as vantagens proporcionadas pelo avanço da inteligência artificial. “Será que se deseja que seja um algoritmo a decidir se uma bom­ ba deve ser largada?”, questiona Penousal Machado. O mesmo conclui que “está na altura certa de ter uma discussão séria sobre os perigos e as oportunidades da inteligência artificial”, visto que é uma área cada vez mais presente no quotidiano de muitos.

SEMENTES, ANIMAIS, ECOSSISTEMAS: INVESTIGADORES DA UC PUBLICAM ESTUDO SOBRE MOÇAMBIQUE Local de trabalho foi “um verdadeiro campo de batalha”. Investigador estabelece ponte com regeneração das florestas portuguesas afetadas pelos incêndios - POR MARIA FRANCISCA ROMÃO E MICAELA SANTOS -

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urante um ano, uma equipa de cinco investi­ gadores do Centro de Ecologia Funcional da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) lançou-se à aventura de estu­ dar a dispersão de sementes por animais em ecossiste­ mas complexos no Parque Nacional da Gorongosa, em Moçambique. O resultado foi publicado este ano na revista Nature Communications. “Até há pouco tempo, não havia métodos de análise para conciliar diferentes informações, o que fazia com que se tratasse cada habitat de forma isolada e não como um todo”, afirma o inves­ tigador, Sérgio Timóteo. Deste modo, a equipa de tra­ balho desenvolveu um método que simboliza “um passo em frente” e que permite observar diferentes habitats de forma interligada. Um ecossistema complexo, que é composto por diver­ sos habitats e espécies, assemelha-se a “uma manta de re­ talhos”, isto é, uma unidade com muita variação interna, como elucida o investigador. A estratégia de escolher o ILUSTRAÇÃO GENTILMENTE CEDIDA POR SÉRGIO TIMÓTEO

Parque Nacional da Gorongosa, localizado numa antiga colónia portuguesa, prendeu-se com “as suas paisagens heterogéneas, condições químicas, variações meteorológicas e com a diversidade ao nível da fauna e da flora”, explica. Sérgio Timóteo aponta “a importância de dife­ rentes grupos de animais transportarem sementes de um habitat para outro” como uma das princi­ pais conclusões do estudo. Macacos, babuínos e elefantes destacam-se como as espécies mais re­ levantes neste processo, daí que os investigadores pretendam conservá-las e protegê-las, assegura. Antes de ser o pano de fundo desta inves­ tigação, o Parque Nacional da Gorongosa foi “um verdadeiro campo de batalha”, recorda o investigador. Com a Guerra da Independência de Moçambique e a Guerra Civil, “o parque foi devastado, as po­pulações diminuíram e muitos animais morreram”, esclarece. Numa tentativa

de recuperar o parque, o governo moçambicano e a fundação americana Greg Carr Foundation uniram forças com a criação de um projeto científico, ao qual a UC se associou. Estudar a dispersão de sementes é estudar o contributo dos animais que as transportam para restaurarem “a paisagem original do parque”, frisa Sérgio Timóteo. De Moçambique a Portugal, o investigador reitera que a dispersão de sementes através dos animais pode contribuir para a reflorestação das zonas afetadas pe­ los incêndios. “Este processo vai ser importante para a regeneração da floresta e para a recuperação da va­ riedade que nela existia”, esclarece o investigador. “Conhecer pessoas, estabelecer parcerias e criar novos pontos de contacto” são mais-valias da partic­ ipação da comunidade académica neste projeto in­ ternacional, assim como a possibilidade de discutir opiniões, ideias e conhecimentos, salienta, por fim, Sérgio Timóteo.


7 DE MARÇO DE 2018 CIDADE - 10 -

ABRIR FRONTEIRAS A NOVAS COMUNIDADES EM COIMBRA

Cidade recebe diversos imigrantes, muitas vezes em situações delicadas. Associações sem fins lucrativos e autarquia ajudam estes novos cidadãos na etapa de introdução à vida em Portugal - POR MARIA FERNANDES E ANA LAURA SIMON -

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espetro de dificuldades que podem surgir a um indivíduo ou uma família imigrante é alargado e inclui problemáticas culturais e sociais. A faixa etária varia e envolve tanto adultos e idosos como crianças e estudantes universitários de diversas nacionalidades, oriundos de ex-colónias portuguesas, países de leste, entre outros. Segundo Henrique Gar­ cia, presidente do Centro de Acolhimento João Paulo II (CAJPII), esses obstáculos vão desde “necessidades básicas ao que é preciso numa casa” até “à reinserção da pessoa na sociedade”, afirma. Entre os projetos de

apoio da associação, está o “Lado a Lado” que, em parceria com a Associação Académica de Coimbra, insere estudantes universitários em lares com ido­ sos. Estes precisam de ajuda não apenas em relação à mobilidade, como também na socialização e outras tarefas diárias, e a cedência de espaço ao estudante permite uma ajuda mútua. O Centro Integrado de Apoio Familiar de Coim­ bra (CEIFAC) é uma organização que apoia famílias com dificuldades internas e de integração social, quer sejam estas portuguesas ou estrangeiras. Segundo Maria João Vieira, desenvolvem uma série de proje­ tos e atividades de forma alargada que permitem, por exemplo, haver um “acompanhamento de famílias no âmbito da terapia sistémica”, fortalecer laços en­ tre os seus membros e promover ainda a “formação para públicos em risco de exclusão social”, declara a diretora executiva da instituição. Acres­ centa que “são famílias fragilizadas por estarem num país diferente e por muitas vezes não terem emprego”, fator que afeta também os próprios portugueses. Algumas famílias chegam ao CEIFAC a pedido do tribunal de família e menores e outras recorrem “em momentos de di­

ficuldade no sentido de os ultrapassarem”. Maria João Vieira reflete ainda que “é importante tratar todos da mesma maneira”, quer sejam portugueses quer sejam imigrantes. “Aquilo que eu faço a uma das famílias que acolhemos é precisamente aquilo que eu faço no dia a dia com um conhecido, um amigo ou um fami­ liar”, declara. O mercado de trabalho pode mostrar ser, também, um desafio a um imigrante. Com a crise e a falta de vagas de ofícios para todos, o CAPJII oferece cursos de língua portuguesa para os imigrantes conseguirem empregos, por exemplo, na construção civil, mes­ mo com Ensino Superior completo. Isso demonstra como a adaptação pode requerer ajustes, e adequar-se à rede institucional portuguesa é primordial nesse processo. Entidades como o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras são responsáveis pelos procedimentos burocráticos na chegada dos imigrantes que incluem a legalização dos indivíduos e a atribuição de docu­ mentos de identificação. O processo de adaptação a um novo país, com cultura e língua diferente, pode ser complicado para muitas dessas pessoas. De acordo com o presidente da CAPJII, “a dificuldade reside na diferença de cos­ tumes e das leis no país de origem”.

HUGO GUÍMARO

BAIRRO DA RELVINHA VAI TER UMA NOVA IMAGEM Conclusão da sede e urbanização do exterior são a prioridade. Moradores do bairro aguardam apoio municipal anunciado por Manuel Machado - POR SOFIA MOREIRA E MADALENA PORTUGAL -

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s estudantes universitários locais e interna­ cionais vão estar envolvidos em ‘workshops’, a cargo do arquiteto José Bandeirinha, que preten­ dem urbanizar o Bairro da Relvinha. O projeto está inserido no programa ‘Reuse of Modern Buildings’ e vai começar entre os dias 6 e 12 de abril. Vários estudantes de escolas de arquitetura europeias vêm para Coimbra com o objetivo de melhorar os espaços exteriores do Bairro da Relvinha. “Urbanizar, ou seja, fazer passeios, calçadas, jar­ dins, drenar as águas, organizar os espaços e plantar árvores” é o objetivo do projeto de acordo com José António Bandeirinha, docente do Departamento de Arquitetura da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. Para isso, considera es­ sencial que os estudantes “falem com os habitantes e ouçam as suas ideias”, conclui.

A reconstrução de um antigo fontenário está nos planos do arquiteto. O local onde “eram feitas foguei­ ras, se brincava à cabacinha e se viviam os amores e desamores”. Tem um valor sentimental para os habitantes, explica o presidente da Cooperativa de Habitação Económica Semearrelvinhas, Jorge Vilas. “Foram vivências que ficaram sempre na memória e que todos recordam com saudade”, aponta. Outro projeto que desejam ver concluído é o ­edifício que funciona como sede e espaço recreati­ vo. O processo, promovido em Coimbra enquanto Capital Nacional da Cultura em 2003, é a prioridade dos moradores, esclarece Jorge Vilas. Iniciado há 15 anos, o projeto foi interrompido por falta de financia­ mento. Em vista, está a construção de dois ­edifícios anexos à sede. Um destes vai funcionar como sala de informática e o outro como sala de reuniões.

No dia em que se comemoraram os 43 anos da Semearrelvinhas, o presidente da Câmara Munici­ pal de Coimbra, Manuel Machado, mostrou-se em­ penhado em “contribuir para fazer o que falta fazer”. José António Bandeirinha está “convencido de que a câmara estará empenhada” em passar da fase de pro­ jeto à prática. De lixeira a bairro constituído por barracas de madeira e, por fim, a bairro com condições de habi­ tação, a Relvinha contou com o apoio de muitas pes­ soas, o que pode ser explicado pela “simpatia com que os moradores recebem toda a gente”, acredita Jorge Vilas. José António Bandeirinha acrescenta que os moradores “sempre estiveram na frente de reivindicação, da luta” e aponta este como um dos fatores que justifica as suas conquistas. “O louvor é todo deles”, conclui o mesmo. SOFIA MOREIRA


7 DE MARÇO DE 2018 CIDADE - 11 -

ORÇAMENTO PARTICIPATIVO AO ENCONTRO DA INTERVENÇÃO CÍVICA

Município convida população a eleger ideias para o Centro Histórico da cidade. A iniciativa tem como objetivo “contribuir para o exercício de uma participação informada” dos cidadãos - POR JOSÉ MIGUEL COUCEIRO, JOSÉ GOMES DUARTE E BERNARDO ALMEIDA HENRIQUES -

HUGO GUÍMARO

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a sequência da aprovação, a 19 de fevereiro, das Normas de Participação e do Crono­ grama de Execução do primeiro Orçamento Par­ ticipativo (OP) da Câmara Municipal de Coimbra (CMC), designado por Coimbra Participa (CP), a Assembleia Municipal, no passado dia 1 de março, aprovou, por larga maioria, as propostas do executi­ vo camarário. A primeira edição do OP de Coimbra tem como foco a “dinamização do Centro Histórico”. Regina Bento, vereadora do executivo, informa que a esco­ lha da temática resultou do facto desta ser objeto de interesse de “todos os quadrantes políticos”. Acres­ centa que foi uma questão “muito discutida na cam­ panha eleitoral por todos os partidos”. A iniciativa compreende várias etapas que se estendem desde a apresentação de propostas, de 12 de março a 30 de abril, até à fase de votação dos projetos, de 1 de junho a 30 de junho. A apresentação dos programas vence­ dores realiza-se no início de julho. Para a execução do programa, vai ser criada uma Comissão Técnica (CT), composta por três elementos designados pelo presidente da câmara e por outros cinco eleitos pela Assembleia Municipal (AM). Re­ gina Bento considera que se trata de “uma comissão técnico-política mista”. A CT, informa a vereadora, tem como função “avaliar as propostas e convertê-las em projetos em colaboração com os proponentes”. Contudo, “a comissão técnica não escolhe propostas, são os cidadãos”, reitera. Segundo o ‘site’ da CMC, o OP pretende “pro­ mover e contribuir para o exercício de uma parti­ cipação informada, ativa e responsável dos cidadãos nos processos de governação local”. Em simultâneo, é acrescentado que a iniciativa deve fomentar “a in­ tervenção dos mesmos na decisão de afetação dos recursos existentes às políticas públicas municipais”. A primeira edição do Orçamento Participati­ vo de Coimbra suscitou vários pareceres e algumas preocupações por parte das forças políticas com as­

sento na Assembleia Municipal: Centro Democráti­ co e Social - Partido Popular (CDS-PP), Partido Social-Democrata (PSD), Partido Socialista (PS), Coligação Democrática Unitária (CDU), Cidadãos por Coimbra (CpC) e Somos C­oim­bra (SC). Apesar dos diferentes posicionamentos dos partidos, ex­ istem elementos de unanimidade entre eles. Por um lado, considera-se positiva a contribuição que iniciativas desta natureza podem vir a trazer no âmbito da participação dos cidadãos na esfera políti­ ca. Noutra perspetiva, o montante disponibilizado para a execução do programa CP é encarado como insuficiente, um fator que pode boicotar a própria aproximação dos cidadãos à vida pública. As verbas alocadas para o OP de Coimbra estão cifradas nos 150.000 euros. Destes, 100.000 euros destinam-se a cidadãos com 30 ou mais anos de idade e os restantes 50.000 euros estão reservados para cidadãos jovens com idades compreendidas entre os 14 e os 30 anos, inseridos no programa Coimbra Jovem Participa. Em relação ao financiamento, o executivo encara a questão do valor como “não significativa”, uma vez que “estas iniciativas devem ser progressivas”, expli­ ca Regina Bento. “Além disso, esta edição não prevêm obras e projetos que se constituem mais onerosos”, acrescenta a vereadora. Graça Simões, do CpC, o movimento político que já tinha feito uma proposta de OP em 2014, refere que esta iniciativa é útil para “aproximar os cidadãos da governação municipal e contrariar a falta de trans­ parência”, apesar da questão do financiamento. Numa linha idêntica, Ferreira da Silva, líder da ban­ cada do PS, realça também que o CP pode “aumen­ tar a transparência da atividade de uma autarquia”. A claridade e o acesso a informação também são salientados como fatores importantes por Filomena Girão, do SC. “Só se pode participar se se souber o que está a acontecer”, acrescenta. Lúcia Santos, dep­ utada do CDS-PP, aponta que “é de louvar iniciativas que promovam a democracia participativa e o en­

volvimento das pessoas na tomada de decisão”. No entanto, a mesma relembra que foram apresentadas noutras autarquias propostas com valores de orça­ mentos participativos muito superiores, algo que ao acontecer em Coimbra iria permitir executar projetos de maior envergadura. O líder de bancada do PSD, Nuno Freitas, embo­ ra admita que “a iniciativa é válida e interessante do ponto de vista democrático, político e colaborativo”, considera que este projeto surgiu “muito mais de uma cedência do que de um entusiasmo genuíno”. Do mesmo modo, Graça Simões também o vê como resultado de uma “cedência à pressão que tem sido feita e não de uma convicção política”. Por sua vez, Manuel Pires da Rocha, representante da CDU, de­ fende a ideia de criação de um orçamento para a par­ ticipação. Todavia, o representante alerta que “criar orçamento para a participação não é, de certo modo, um orçamento participativo”. De uma forma geral, todos os quadrantes políticos entendem que o raio de atuação do CP é limitado. Lúcia Santos (CDS-PP) sustenta que a temática “aca­ ba por ser uma medida que torna curta a iniciativa”. A posição merece a concordância de Filomena Girão (SC), que considera o “passo pequeno e que tem de se ser mais audaz”. O facto de o regulamento não permitir a candidatura de associações sem fins lu­ crativos merece o reparo de Graça Simões do CpC. O âmbito do OP está confinado ao Centro Históri­ co, Para Manuel Rocha (CDU) faria mais sentido a atribuição das verbas “a instituições que já existem e que promovem a participação dos cidadãos”. O líder da bancada do PS, Ferreira da Silva, atual maioria do executivo, também “espera que a iniciativa possa vir a ser alargada a outros locais no futuro”. Nuno Frei­ tas (PSD) sugere a possibilidade do programa “vir a ter segmentos dentro do próprio OP e que vale a pena alinhá-los com objetivos sociais, económicos e cul­ turais”. Apesar das divergências, o OP foi aprovado por larga maioria na AM de 1 de março.


7 DE MARÇO DE 2018

SOLTAS - 12 -

RACISMO - POR SECÇÃO DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS DA ASSOCIAÇÃO ACADÉMICA DE COIMBRA -

fotografia por paulo abrantes - secção de fotografia da associação académica de coimbra

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um bicho papão esta palavra. E muitas ve­ zes a ouvimos em discursos fogosos - “És um racista!” – como um simples insulto leve. Não tarda a resposta: “Eu não sou racista! Até te­ nho um amigo que é negro!” – que, juro, ser uma transcrição ipsis verbis de uma conversa de fim de tarde não faz mais que duas semanas. Passaram mais de 20 anos desde a aplicação da Lei contra a Discriminação Racial. E ainda o cenário é pouco positivo: recentemente o Comité Europeu contra a Tortura do Conselho da Euro­ pa colocou Portugal no topo dos países da Euro­ pa Ocidental com o maior número de casos de violência policial, onde os riscos de abusos são maiores para afrodescendentes portugueses e es­ trangeiros. Um cenário longe da igualdade e respeito pelos direitos humanos.

Ainda em notícias desta temática há uma dis­ cussão em ascensão: de racismo inverso. Existe racismo inverso? E só de preto contra branco? Tem um significado amplo? Há aqui necessidade de procurar conceitos an­ tes de respostas: O primeiro será o de «preconceito», que é uma ideia, um pré-conceito, de algo ou alguém que concebemos sem contactarmos com esses ante­ riormente. Sobre a «discriminação», que é o acto de ex­ por através de discursos (…) todo o nosso pre­ conceito com doses, muitas vezes absurdas, de ­ignorância e ódio. Finalmente, o «racismo» é uma opressão histórica, uma violência sistémica, uma relação de poder e de profunda desigualdade.

No mesmo jornal é possível encontrar um ar­ tigo intitulado “A falácia do “racismo inverso””, que infere a inexistência do racismo inverso. A continuar esta pesquisa, outros autores dizem que acreditar em racismo inverso é o mesmo que acreditar em unicórnios. Não é possível, porque o homem branco é sistemática e historicamente o mais poderoso em qualquer relação de poder. Noutro espectro, autores descrevem actos de dis­ criminação de negros versus brancos como prova deste racismo inverso. Outros ainda não acredi­ tam em racismo inverso, apenas em racismo, na discriminação racial que se manifesta pelo sim­ ples mau carácter do homem médio. Racismo sabemos que existe. O estudo acima mencionado é mais uma prova, infelizmente. Fica a questão do fenómeno de “racismo inverso” que convidamos a refletir: unicórnio ou realidade?


7 DE MARÇO DE 2018 SOLTAS - 13 -

CANTIGAS DE MÉ-MÉ - POR CABRA TROVADORA -

Sentes que o fado acabou, Primavera de verbas adormecidas. Qualquer coisa que não bate certo E o Fiscal chumbou, Que foi um mar de notas desaparecidas. E levam nos bolsos guardados A ausência de uma balada. E entre os embriagados, Lá no alto, chora a Cabra.

Vejam bem, Que só há revoltas na AAC Quando a DG se põe a pensar. Quem lá vem Dorme à noite ao relento no Sereia E as propinas precisa de pagar. E se houver Uma Praça de gente à fartura, E o governo, e o governo nao quiser ceder, Anda alguém, Vestido de breu à procura Daquilo que não quer saber.

OBITUÁRIO - POR CABRA COVEIRA -

E PARA A QUEIMA NÃO VAI NADA, NADA, NADA? UNTZ!

E

ste ano, a Sé Velha estará mais vazia do que nunca. Isto 40 anos após o regresso da Serenata Monumental. Foi para isto que andou Alberto Martins a pedir a palavra? O único som que se vai ouvir na cidade são as gotinhas da chuva a cair na calçada. Pode não ha­ ver Serenata para ninguém, mas passes gerais para os amigos haverá com certe­ za. E barris, especialmente barris. Não queremos saber de Fado, nem de traje, nem de fitas. Só queremos álcool e um belo sonoro. Este ano andamos todos de tanga. Untz.

ÉÉÉÉÉÉ, TOURO!

C

om que então a Garraiada vai a re­ ferendo? Posso votar? Como é que isso se faz? Eu não quero ver o bicho so­ frer, mas, por outro lado, gosto de uma viagem à borla para a Figueira. E agora o que é que eu faço? Viro vegan? Eu nem gosto de salada, nunca fui de comer bró­ colos... Vendo bem, o touro morre de qualquer maneira, mais vale ser agora, enquanto ainda estou bêbado. Eu gosto de flores. Dêem-me um raminho. Rami­ nho. Raminhos. Raminhos? Coentros. Orégãos. Bife. Hmmmmm. Estava a fa­ lar de quê mesmo?


7 DE MARÇO DE 2018 ARTES FEITAS - 14 -

CINEMA Da mestria do detalhe à falha do fulcral - POR VASCO SAMPAIO -

Linha Fantasma De Paul Thomas Anderson Com Daniel Day-Lewis, Les­ ley Manville, Vicky Krieps 2017

A

preciemos os primeiros minutos de Linha Fantasma. A descrição da casa Woodstock, um dos mais prestigiados ‘ateliers’ de Londres nos anos 50, é feita com a chegada de dezenas de costurei­ ras, que rápida mas delicadamente sobem uma lon­ ga escadaria até às salas onde trabalham. À entrada, cumprimentam Cyril (Lesley Manville), braço direito do chefe da casa, que mantém a postura impecável in­ dependentemente da aspereza das palavras que saem da sua boca; já ao cimo dos degraus, saúdam, uma a uma, Reynolds Woodstock (Daniel Day-Lewis), o res­ peitado chefe do atelier. Entre um momento e o outro, a leveza e a destreza com que Paul Thomas Anderson capta os acenos e as palavras trocadas entre persona­ gens, o delicado pisar da madeira com os sapatos de cada uma das empregadas e o suave rodopiar das suas

saias em volta da escadaria, são uma ótima amostra da já conhecida perícia do realizador. Depois, a caraterização das personagens: Woodstock é obsessivamente metódico. Penteia-se ­ com duas escovas idênticas, operadas simétrica e si­ multaneamente para garantir que não escapa um fio de cabelo. Começa a trabalhar à mesa de pequeno-al­ moço, onde até o insignificante som da faca a barrar manteiga nas torradas lhe perturba a concentração e o impede de desenhar nas condições perfeitas. É acompanhado pela sempre austera Cyril, que relem­ bra constantemente os restantes elementos da casa das regras impostas por Woodstock, e que reserva os escassos sorrisos para as clientes. E eis que chega Alma (Vicky Krieps), uma empre­ gada de mesa que irrompe pela vida de Woodstock

– o homem e a casa – e obriga a repensar a forma de trabalhar, de servir os clientes e até de tomar o pe­ queno-almoço. Alma traz consigo a tensão, esse ins­ trumento central dos filmes de Thomas Anderson, mas não preenche a tela como Day-Lewis, Manville, a impecável cenarização, o magistral guarda-roupa e a irrepreensível banda-sonora de Jonny Greenwood. Nesta que é uma das mais simples e acessíveis pelí­ culas do realizador, é lamentável que aquela que de­ veria ser a personagem nuclear do filme não consiga sobressair por entre tanta mestria.

Razoável

JOGO

Into The Breach - POR ALEXANDRE SILVA -

N

um futuro pós-apocalíptico, a Terra é invadida pelos terríveis alienígenas insectóides conhe­ cidos como Vek. Numa última tentativa de salvar a Humanidade, um esquadrão de pilotos é enviado jun­ tamente com os seus robots gigantes para o passado, esperando alterar o curso da história... Mais uma vez. Produzido pela Subset Games, que nos trouxe an­ teriormente o aclamado FTL: Faster Than Light, este jogo lançado a 27 de Janeiro é um simulador de es­ tratégia por turnos. Ao longo de vários mapas vamos combater os Vek, controlando os nossos robots cha­ mados “Mechs” em mapas gerados aleatoriamente. Ao longo do desenrolar da narrativa vamos melhorando tanto os nossos pilotos como os Mechs, por via das recompensas fruto de terminarmos as missões que nos são propostas. Embora a maioria das mecânicas do jogo parecerem bastante simples, o jogo é extrema­ mente complexo, sendo que cada turno de cada missão é como um enigma que temos de resolver, com inúme­ ras respostas certas, mas um número ainda maior de respostas erradas. A simplicidade é já uma imagem de marca da ­Subset Games. Tanto em FTL como em Into the Breach, os gráficos bem retro de 8-bits servem o propósito de

manter a estética de retrogaming bem como a de per­ mitirem que o jogo esteja acessível a um maior número de pessoas que não possuam placas gráficas de última geração. Ainda assim existem vários ambientes, como neve, deserto ou ilhas vulcânicas que, além de ajuda­ rem na estética, nos presenteiam com mais desafios e oportunidades durante as batalhas. No entanto, a longevidade deste jogo é imensa, pois embora comecemos com os 3 Mechs básicos, existem vários sets de Mechs e de pilotos para desbloquear à medida que vamos jogando. Isto proporciona também maneiras inovadoras de lidar com os inimigos, pois todos eles têm armamento e maneiras de jogar dife­ rentes. Infelizmente, este jogo encontra-se apenas disponí­ vel para PC, na plataforma Steam por apenas 14.99€. Contudo, a produtora já fez saber que estão em nego­ ciações para lançá-lo também para consola, mas sem data anunciada. Este título vai com certeza proporcio­ nar horas de diversão a todos, especialmente aos vete­ ranos de jogos de estratégia por turnos.

Into The Breach De Subset Games Para Microsoft Windows 2018

A Cabra aconselha


7 DE MARÇO DE 2018 - 15 -

MÚSICA

GUERRA DAS CABRAS A evitar Fraco Podia ser melhor

Abraçar Roberto

Razoável A Cabra aconselha

- POR FILIPE FURTADO -

A Cabra d’Ouro

O

último ano foi muito profícuo no reencontro entre a musicalidade portuguesa e brasileira. Se neste mesmo espaço de crítica passaram os traba­ lhos de António Zambujo a navegar o repertório de Chico Buarque, Carminho a percorrer o eterno Jo­ bim, encontramos, por sua vez, “Roberto Carlos por Raquel Tavares”. Quando se interpretam ídolos de toda uma vida, canções que viraram banda sonora de infância, num vasto mundo de novas roupagens possíveis, a sim­ plicidade e a honestidade são o que prevalecem no trabalho final. É assim o resultado destes 14 temas, nessa nova pele chamada fado. “Roberto Carlos por Raquel Tavares” veste a sim­ plicidade própria do fado, canções espaçadas entre a poesia, o andamento da guitarra clássica e os con­ selhos sábios da guitarra de Lisboa. As palavras do cantor “romântico” descrevem em perfeição esse es­ tado de alma elevado a património imaterial da hu­ manidade: “sou fera ferida no corpo, na alma e no coração”. A simplicidade chega também pela voz de Raquel Tavares. Nunca deixamos de escutá-la como fadista, todavia, mais leve, livre de muitos tiques e clichés da tradição fadista, fazendo o uso do contra­

Roberto Carlos por Raquel Tavares De Raquel Tavares Editora Sony Music Entertainment Género Fado Ano 2017

ponto que o sotaque português permite. As peque­ nas orquestrações de cordas e sopros soltam-nos para um imaginário dos grandes romances, quase um filme. “Como é grande o meu amor por você” ou “Emoções” são exemplos de arranjos de refina­ da elegância. O quinto disco de estúdio de Raquel Tavares conta também com convidados de peso. Caetano Veloso marca presença na interpretação de “De­ baixo dos caracóis dos seus cabelos”. Em “De Tanto Amor” é já Ana Carolina que dá forma ao dueto. “Roberto Carlos por Raquel Tavares” será um disco competente para os entusiastas do fado, uma releitura obrigatória para os seguidores da longa carreira do compositor de 76 anos, uma magnífica desculpa para regressar aos tempos das paixões e amores de outras gerações. É, acima de tudo, uma honesta e digna homenagem, um abraço sentido de Raquel para uma das suas paixões musicais.

Razoável

LIVRO Afinal era de Cuba, mas da vila Alentejana

I

- POR RITA FLORES -

taliano ou português, nobre fidalgo ou ilustre artesão. A identidade de Cristóvão Colombo é o grande mistério narrado n’O Codex 632. Em­ bora “nuestros hermanos” acolham com grandeza a descoberta da América por tal navegador, Tomás Noronha, personagem principal do romance de José Rodrigues dos Santos, investiga a verdadeira razão de tamanho apoio concedido pelo rei por­ tuguês, D. João II, na organização da navegação e no regresso a Castela. Tomás Noronha, perito em criptoanálise e lín­ guas antigas, em todos os romances da coleção deixa-se inquietar pelo perfume de mulher. Desta vez uma aluna sueca, Lena, que graças a um iróni­ co atraso do programa Erasmus, solicitou ajuda para rever a matéria das aulas perdidas. Noronha, porém, deixou-se perder pelas suas curvas tão bem desenhadas desta que se revelou uma rosa amarela (símbolo de infidelidade). Do pormenor dos relatos das viagens ao mais cuidado detalhe histórico desta navegação, o au­ tor tem a capacidade de ensinar um momento da história cruzada entre Portugal e Espanha na épo­ ca dos descobrimentos. Através da aventura que leva Noronha a compreender todos os estratage­

mas montados pela monarquia Portuguesa, ainda em pleno século XV, o autor desvenda o mistério que levou D. João II a esquecer a tentativa de assas­ sinato praticada por um grupo de nobres, do qual Colombo fazia parte e ainda a entregar dinheiro e mapas portugueses para uma navegação que havia recusado e pertencia agora a Castela. O Codex 632 é na verdade uma crónica escrita por Ruy de Pina após a morte de D. João II onde se relatam as vivências da corte na altura em que se negociava o Tratado de Tordesilhas. Este mo­ mento não foi mais do que um exercício de ne­ gociação com uma desconhecida vantagem dada a preocupação do Príncipe Perfeito em organizar expedições secretas, contínuas e “por mares nun­ ca antes navegados”. Afinal os portugueses nunca foram ingénuos, apenas se deixaram levar pelo habitual sentimento de ganância e riqueza de um património, deixaram-se ficar, ficar apenas nos livros de história.

A Cabra aconselha

O Codex 632 De José Rodrigues dos Santos Editora Gradiva 2005


Mais informação disponível em

cabra.pt JORNAL UNIVERSITÁRIO DE COIMBRA

EDITORIAL - POR CARLOS ALMEIDA -

Panis et circences

N

o meio de um céu de nuvens densas, relâmpagos e trovoadas eternas que são as distribuições de verbas da Queima das Fi­ tas pelas secções da Associação Académica de Coimbra (AAC), eis um sinal de chuva: a Sec­ ção de Fado da AAC ameaça não tocar na festa dos estudantes. Eis então a secção que toma a medida mais drástica no seio da academia, sec­ ção essa que afirma estar de “tanga, a Queima não paga” e que pelos vistos, este maio, pode vir a cantar o silêncio. É pois um triste reflexo de a casa estar tão desarrumada, que já nem nas gavetas mais recônditas se consegue encontrar a motivação para continuar. Quem se segue? Qual será a próxima estrutura dentro da AAC a sacudir a paz podre instalada? Já se perdeu a conta das temporadas da série “Distribuição de Verbas” e esta não é a última. Está no ar apenas e infelizmente mais um episódio dra­ mático. Muitas secções culturais dependem exclusivamente do dinheiro da Queima das Fitas e muitas secções desportivas precisam de melhores condições. Espera-se celeridade nas análises dos relatórios de contas das duas últi­ mas edições do evento, o que, mais um vez, era para ontem. Pôr a AAC e o Estádio Universi­ tário bonitos para os Jogos Europeus Universi­ tários não chega. Num ano em que a cidade se prepara para o frenesim de visitas em grande número, esperemos para ver como a casa-mãe se vai sentir. Maquilhagem não chega, é preciso cuidar da saúde interna o mais breve possível.

Pôr a AAC e o Estádio Universitário bonitos para os Jogos Europeus Universitários não chega”.

ERRATA Na página 11 da edição 287 do Jornal Universitário de Coimbra - A Cabra, no artigo que tem como título “Risco de cheias no Mondego aumenta após incêndios”, onde se lê “Iniciativa distingue UC de outras universidades. DG/AAC também manifesta preocupação com comportamentos de risco durante a semana da Queima das Fitas” deve ler-se “Especialistas responsabilizam a tutela pela ordenamento do território. “Verões mais quentes e regimes de precipi­ tação menos previsíveis” são consequências das alterações climáticas”. Aos visados, as nossas desculpas.

Ficha Técnica

Diretor Carlos Almeida

Jornal Universitário de Coimbra – A CABRA Depósito Legal nº183245702 Registo ICS nº116759 Propriedade Associação Académica de Coimbra

Editores Executivos Ana Francisca Nunes e Pedro Dinis Silva Equipa Editorial Luís Almeida e Pedro Dinis Silva (Ensino Supe­ rior), Daniela Pinto (Cultura), Margarida Mota (Desporto), Ana Francisca Nunes (Ciência & Tecnologia), Isabel Simões (Cidade), Hugo Guímaro (Fotografia) Colaboraram nesta edição Vittorio Alves, Lauren Bento, José Mi­ guel Couceiro, André Crujo, José Gomes Duarte, Maria Fernandes, Marina Ferreira, Inês Gama, Jéssica Gonçalves, Bernardo Almeida Henriques, Ana Lage, Francisco Madaíl, Catarina Magalhães, Margarida Maneta, Raquel Medeiros, Eduarda Mendes, Miguel Mesquita Montes, Gabriela Moore, Sofia Moreira, Ana Sofia Neto, Daniel Pascoal, Madalena Portugal, Mónica Rego, Maria Francis­ ca Romão, Ana Rua, Ana Santos, Micaela Santos, Samuel Santos, Alexandre Silva, Pedro Emauz Silva, Ana Laura Simon, Ana Rita Teles, Filipa Vieira

JORNAL UNIVERSITÁRIO DE COIMBRA

Colaboradores Permanentes Inês Duarte, Rita Flores, Filipe Fur­ tado, João Pimentel, Vasco Sampaio, Paulo Sérgio Santos Paginação Luís Almeida, Ana Francisca Nunes, Pedro Dinis Silva Fotografia Jéssica Gonçalves, Hugo Guímaro, Catarina Magalhães, Gabriela Moore, Sofia Moreira, Ana Sofia Neto, Pedro Dinis Silva

Impressão FIG – Indústrias Gráficas, S.A. Telf. 239499922, Fax: 239499981, e-mail: fig@fig.pt Produção Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra Agradecimentos Reitoria da Universidade de Coimbra Tiragem 2000 exemplares


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