Edição 263 - Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA

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16 de julho 2013 • ANO XXII • N.º 263 • QUINZENAL GRATUITO DIRETORa ana duarte • EDITORa-EXECUTIVa ana morais

acabra jornal universitário de coimbra

Uma Ideia para o ensino superior por João gabriel silva “reorganizar para desenvolver”

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Autárquicas 2013

As atualizações da proprina de norte a sul do país Apenas quatro iES aumentam a propina

Coimbra já se prepara para a campanha dos seis candidatos

PÁGS. 2 E 3

PÁGS. 4 E 5

Perfil: Amolador de tesouras

Limitações ao Graffiti e à arte urbana

A persistência de uma profissão esquecida no tempo

‘Writers’ insurgem-se com nova lei PÁG. 15

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Propinas

De norte a sul, as voltas que a propina dá Em todo o país, apenas quatro Instituições de Ensino Superior (IES) vão efetuar a atualização da propina no próximo ano letivo. O novo ano vai trazer um aumento de cerca de 35 euros para a comunidade estudantil. Aqui se comparam as decisões levadas a cabo pelos Conselhos Gerais de algumas IES. Por Liliana Cunha e Ana Duarte

Aumenta: UC

Outras:

Da reunião realizada a 27 de maio apenas saiu a seguinte declaração: “o Conselho Geral (CG) da Universidade de Coimbra decidiu não alterar a regra anterior”. A regra de que se fala é a inscrita na Lei do Financiamento do Ensino Superior 62/2007 na sua atualização. “As propinas e demais encargos devidos pelos estudantes pela frequência do estabelecimento de ensino são fixados pela entidade instituidora, ouvidos os órgãos de direção do estabelecimento, tendo de ser conhecidas e adequadamente publicitadas em todos os seus aspetos antes da inscrição dos estudantes”. Incide no aumento da propina de 1037 euros para 1065,72. O reitor da Universidade de Coimbra (UC), João Ga-

briel Silva, ainda não se pronunciou sobre a decisão. A reunião do CG ficou marcada pela falta de quórum, dada a não comparência de membros ou pela saída antecipada de alguns elementos - tal fez com que a votação fosse de maioria relativa. Os estudantes conselheiros no CG tentaram apelar a uma votação favorável à manutenção do valor – 1037 euros. Este é já o segundo aumento de propinas que a UC implementa. O primeiro, dado no ano letivo anterior, deveu-se à criação de um Fundo de Apoio Social. O segundo dar-se-á pelo subfinanciamento do ensino superior. Os protestos por parte da Direção-geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC) fizeram-se sentir no

final da manhã anterior à reunião. O presidente da DG/AAC, Ricardo Morgado, ainda acreditava no congelamento da propina. No entanto, e nas palavras do estudante conselheiro, Luís Rodrigues, em entrevista ao Jornal A CABRA, em maio deste ano, os estudantes “sofreram uma derrota”. A Universidade de Coimbra vem a sofrer consecutivamente cortes no seu orçamento. Segundo declarações do reitor à rádio TSF, a UC está com um orçamento 13 por cento abaixo daquilo que existia em 2005. Em 2013 o corte é de 8,5 por cento e coloca a UC “em grandes dificuldades” já estávamos com um funcionamento muito complicado e agora ficámos com um funcionamen-

to mesmo no limite para abrir a porta com dignidade”, lamenta João Gabriel Silva. Na altura (novembro de 2012), o reitor ameaçava fechar as portas da universidade. Mas tal não aconteceu. Para o próximo ano letivo, a UC praticará a propina máxima. Porém, os estudantes bolseiros não sofrerão do aumento, dado que o valor da bolsa é sempre indexado à inflação e ao valor que a universidade pratica. “A UC não esteve à altura. É um momento difícil para os estudantes”, declarou o presidente da DG/AAC, Ricardo Morgado, em entrevista ao Jornal A CABRA, em maio deste ano. O presidente afirma que a situação financeira volátil que a UC atravessa “não é desculpa”.

As restantes IES a proceder à atualização da propina encontram-se na Grande Lisboa: Universidade de Lisboa (UL), Universidade Técnica de Lisboa (UTL) e Instituto Politécnico de Lisboa

(IPL). No que respeita à UL e à UTL, ainda não foram adiantados muitos dados relativamente à atualização visto, que estas universidades encontram-se, neste momento,

em processo de fusão. A isto junta-se, ainda, um processo eleitoral para a escolha de um novo reitor. A presidente do CG da UL, Leonor Beleza, foi contactada, no entanto, o Jornal A CABRA não obteve

qualquer resposta. O Jornal A CABRA também contactou o presidente do IPL, Luís Vicente, porém, até ao fecho da edição, não recebeu declarações sobre este aumento. carolina varela


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propinas

Não Aumenta: UP

O reitor da Universidade do Porto (UP), José Marques dos Santos, apresentou em CG a proposta de aumento da propina (de 999 euros para 1037,20 euros), que foi rejeitada por unanimidade. Marques dos Santos ainda não tomou uma posição sobre a decisão à imprensa. O estudante conselheiro, Pedro Bragança, afirma que “o bom senso falou acima de tudo e foi tomada uma decisão pela defesa dos estudantes”. Quanto à rejeição da proposta do reitor, o estudante explica que não

se “tratou de uma votação contra uma proposta do reitor, mas sim uma posição contra a forma como as universidades públicas têm sido asfixiadas”. Do ponto de vista imediato, o impacto nas contas da UP está na ordem dos 1,6 milhões de euros nos últimos dois anos. No entanto, Pedro Bragança acredita que “está demonstrado nos relatórios de contas que a boa gestão financeira tem capacidade de suportar estes impactos”. O movimento estudantil mobilizou-se e entregou uma carta que foi Na região norte, a par da UP, a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), aplica o mesmo valor. Perspetivando a possibilidade de um aumento por parte do governo, o reitor da UTAD, Carlos Sequeira, propôs os 1037 euros. Contudo, a proposta foi recusada. A propina mantém-se mas vão passar a cobrar e taxar a título de exemplo, os estacionamentos no campus universitário e emolumentos. “Vamos penalizar de outro modo, já que os carros usufruem sem pagar nada do

UTAD

estacionamento”, explica o reitor. Os motivos para a recusa incidiram na grande percentagem de alunos deslocados e na situação económico-financeira das famílias que “têm que suportar os alojamentos, a estadia, e as deslocações dos estudantes”. Outro dos motivos é a competição com o preço praticado na UP. Carlos Sequeira acredita que o aumento da propina em outras instituições não leva à perda de novos alunos. “Não é fator de discriminação ou de escolha. Não acredito nisso”, remata.

UAlg No Algarve, a atualização da propina revertia para a criação de um Fundo de Apoio Social (FAS). O CG não aprovou a atualização e as propinas mantiveram-se nos 965 euros. O reitor da UAlg, João Pinto Guerreiro, explica que o impacto da decisão não será no orçamento da universidade mas “no que seria um benefício para os estudantes em dificuldades”. O reitor partilha da opinião de Carlos Sequeira e não crê que a propina

condicione as opções das famílias na escolha da universidade. “As diferenças entre propinas nas universidades são relativamente pequenas. O que condiciona as opções das famílias ou é a qualidade ou a proximidade do ensino”, frisa. Quanto ao aumento em quatro IES, Pinto Guerreiro não considera relevante, já que “tem de haver um esforço das famílias no sentido da educação dos seus filhos”.

MINHO

UBI

O reitor da Universidade da Beira Interior (UBI), António Fidalgo, não prestou declarações dado que a proposta ainda vai ser levada a votação na próxima reunião do Conselho Geral. António Fidalgo é também a favor da não atualização da propina na UBI.

A 1 de julho, o Conselho Geral (CG) da Universidade do Minho (UM) reuniu para decidir sobre o valor da propina a aplicar no ano letivo de 2013/2014. A proposta do reitor, António Cunha, foi no sentido de manter o valor aplicado no ano anterior – 1037,20 euros. No entanto, segundo o presidente do CG, Álvaro Laborinho Lúcio, o debate teve em conta “não só o impacto financeiro da medida, como o seu efeito social interno”. A votação não foi consen-

sual, já que os quatro estudantes presentes votaram a favor de uma redução e não de uma manutenção do valor da propina. Por altura do último Encontro Nacional de Direções Associativas (ENDA), o presidente da Associação Académica da UM, Carlos Videira, acreditava que a proposta do reitor iria ser do aumento para os 1066 euros. Os estudantes haviam organizado um calendário reivindicativo e uma petição para levar ao reitor.


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eleições

Autárquicas em Verão quente “Há muita coisa que tem de ser alterada” Cláudio Trindade, Partido pelos Animais e pela Natureza (PAN) “Pelo bem de tudo e de todos”

D.R.

“Somos um partido pela transição e há muita coisa que tem de ser alterada”. É desta forma que Cláudio Trindade, candidato pelo PAN à presidência da Câmara Municipal de Coimbra (CMC), justifica a motivação desta candidatura. A vontade de mudar as políticas para algo “mais sustentável” é notória no discurso do candidato. Seguindo as linhas do próprio partido, quer o ambiente quer os animais merecem especial destaque. Assim, melhorar a legislação no que toca aos animais ou apostar em ideias que promovam a sustentabilidade ambiental integram o projeto do PAN para a autarquia de

Coimbra. O partido, fundado em 2009, apresenta pela primeira vez a sua candidatura à CMC. Quando se perguntam as expetativas para resultados eleitorais, a resposta é clara: “não alimentamos grandes esperanças”. Contudo, a ressalva é feita: “as pessoas chegaram a um ponto em que não podem continuar como estão, elas querem algo diferente”. Nessa oferta, contam-se, entre outras, as propostas de aumento de número de hortas urbanas, diminuição da quantidade de edifícios abandonados, sobretudo no centro da cidade, melhoramento do sistema de transportes ou alargamento

da área do Choupal. No que concerne a problemas atuais da autarquia, como é o exemplo da ameaça de privatização da água, o Partido pelos Animais e pela Natureza é “absolutamente contra a privatização”, justificando esta postura com o argumento de que “a água é um bem fundamental”. O candidato de 40 anos dá a cara a um projeto que não se pretende centrar numa só pessoa mas sim no conjunto. Dessa forma, assume que podem haver “surpresas”: “podemos atingir o público que quer algo diferente”, adianta Cláudio Trindade.

“Defendemos que os serviços públicos sejam valorizados” Francisco Queirós, Coligação Democrática Unitária (CDU) “Coimbra em luta por uma vida melhor” Uma coligação entre o Partido Comunista e o Partido Ecologista Os Verdes constitui a Coligação Democrática Unitária, mais uma vez candidata à autarquia de Coimbra com Francisco Queirós a cabeça de lista. Francisco Queirós recandidata-se depois de em 2009 o ter feito e ter conseguido ser eleito como vereador, assumindo a área da Habitação. Assim, este apresenta-se como um projeto de sequência. “Continuar o projeto de participação de decisões do concelho. Participação na proposta, na crítica e evolução em muitas lutas fundamentais para a cidade”, avança o candida-

to pela CDU. Atualmente a CDU lidera cinco freguesias do concelho e é nesse trabalho, bem como no trabalho feito na Assembleia Municipal e na CMC, que o candidato encontra a valorização dessa política de combate. “Temos provas dadas na denúncia, na crítica e na proposta nestes anos todos”, sublinha. “É possível que um concelho de Coimbra em luta ofereça uma vida melhor aos cidadãos”: é com esta premissa que Francisco Queirós esmiuça algumas linhas gerais desta candidatura. “Melhoria da qualidade de vida

das pessoas, valorização dos serviços públicos da cidade, como os transportes públicos, a água, a higiene e a limpeza” são alguns dos pontos fulcrais da candidatura da CDU à autarquia. Em suma, Queirós ressalva: “defendemos que os serviços públicos sejam valorizados em Coimbra”. Fazendo um balanço “extremamente positivo” quanto a trabalho desenvolvido na sua vereação, bem como nas várias juntas de freguesia CDU, o candidato não se aventura em previsões eleitorais, mas assume: “aquilo que nos propomos é dar qualidade de vida” aos cidadãos de Coimbra.

D.R.

“Dar continuidade a um projeto” João Paulo Barbosa de Melo, Por Coimbra “Juntos por Coimbra”

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A junção do Partido Social Democrata, do Partido Popular Monárquico e do Movimento Partido da Terra dá origem à coligação Por Coimbra, já participante em processos eleitorais autárquicos anteriores, com algumas alterações. Desta feita não há junção do Partido Popular e este lugar é ocupado pelo Movimento Partido da Terra. Quem dá a cara pela coligação é o atual presidente da autarquia, João Paulo Barbosa de Melo. A motivação é “dar continuidade a um projeto no qual já tinha vindo a trabalhar e dar-lhe continuidade num tempo em que os desafios são diferentes e quando se abriram um

conjunto de janelas novas na cidade”, assume o candidato, acrescentando a necessidade de estes desafios “exigirem conhecimento dos dossiês e uma ideia de fundo sobre a cidade”. No que diz respeito aos grandes objetivos deste projeto para autarquia, o grande enfoque vai para a vontade de “tornar a cidade mais competitiva e economicamente mais forte e mais robusta”, pois, só assim, segundo Barbosa de Melo, é que uma cidade consegue a sua independência. O atual presidente conta ainda que “Coimbra tem um problema de base económico”, e para esta coligação o objetivo é “tra-

balhar afincadamente para renovar a barra económica de Coimbra”. Quanto ao balanço do mandato, Barbosa de Melo assume que “a esmagadora maioria dos projetos foram conseguidos”. E ressalva que houve projetos mais demorados e que podiam já estar concluídos, contudo alguns procedimentos “impostos” a uma autarquia tornaram isso “completamente impossível”. Quanto a ausência do Partido Popular, Barbosa de Melo é sucinto: “tudo fizemos para que a coligação com o CDS pudesse ser de novo reeditada. Fizemos o possível mas não aconteceu”. com João Valadão


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eleições Numa altura em que o país se debate ora com reformas do governo ora com intervenções presidenciais a pedir compromissos partidários, as autarquias preparam-se para acolher as eleições a 29 de setembro. Na autarquia de Coimbra são seis os candidatos que se apresentam a votos. Já com programas definidos ou ainda com programas por definir, as propostas para o concelho já se desenham. Por Ana Morais

“Dar resposta ao anseio dos cidadãos do concelho”

José Ferreira da Silva, Cidadãos por Coimbra “Coimbra é a nossa causa” “Queremos uma democracia participativa que complemente a democracia representativa”. É desta forma que José Ferreira da Silva, o candidato à autarquia pelo recém-criado movimento Cidadãos Por Coimbra, apresenta este projeto. O formato inovador na cidade conta, para além de alguns nomes bem conhecidos da comunidade académica, com inúmeros cidadãos conimbricenses que aos poucos se foram associando ao movimento. Ainda sem nomes definidos para a liderança da autarquia, foram feitos vários encontros/ reuniões para se discutir várias

D.R.

temáticas da cidade. “Dar resposta ao anseio dos cidadãos do concelho”, dar-lhes voz e espaço para participarem “nos destinos da autarquia” é o grande objetivo deste movimento. Como o projeto é novo, torna-se mais difícil prever qualquer resultado. Ainda assim, Ferreira da Silva arrisca: “temos uma expetativa francamente positiva” e acrescenta que um bom resultado eleitoral “é um resultado que permita participar ativamente na governação da autarquia”. Transparência na gestão da câmara, promoção no investimento e criação de condições quer no

incentivo à habitação quer no que toca ao impulso de emprego “para que os jovens formados na Universidade de Coimbra cá permaneçam”, e a estimulação e acolhimento dos produtores locais são algumas das ideias integrantes do projeto do movimento para o concelho. No que toca à gestão autárquica, o candidato clarifica: “os cidadãos não sabem que gestão é feita”. E nesse sentido, dá o exemplo do Convento de São Francisco, ainda em fase de construção: “estamos a pouco tempo da inauguração e ninguém sabe o que vai lá ser feito”.

“Ser uma opção para os eleitores de Coimbra” Luís Providência, Centro Democrático e Social – Partido Popular (CDS-PP) “Viva Coimbra” O atual vereador para o Desporto e Lazer, Luís Providência, é o candidato pelo CDS-PP à autarquia de Coimbra. Desde 1997 que o Partido Popular não apresentava uma candidatura isolada à autarquia de Coimbra. Ainda assim, Luís Providência explica que “não há regra nenhuma em o CDS ir coligado ou não” e acrescenta que esta decisão foi tomada entre as duas comissões políticas concelhias dos partidos, que “não chegaram a um entendimento”. “O que motiva a candidatura é o CDS apresentar-se a votos e ser uma opção para os eleitores de Coimbra”, justifica o candidato.

Também o contributo do CDS-PP nesta câmara serve de motivação, pois Providência considera que o seu partido contribui para “o enriquecimento da cidade em variadíssimos pontos e para o desenvolvimento das freguesias periféricas do concelho de Coimbra”. Ainda sem apresentar o seu projeto, sublinhando que esta apresentação será feita de igual forma para toda a comunicação social, Luís Providência adianta que o programa está a ser escrito com o contributo de pessoas de várias áreas desde a cultura ao desporto, passando pelo urbanismo. Porém, o projeto do CDS-PP para a

autarquia vai apostar em todas as áreas, visto que a “CMC interfere na vida dos cidadãos em variadíssimas áreas, é muito abrangente essa atividade municipal”. Quanto ao balanço do trabalho feito pela autarquia, a resposta é inequívoca: “não tenho falhas a apontar”. Já no que toca a perspetivas de resultados eleitorais, Providência afirma: “queremos ter um resultado melhor possível”. Ainda assim, ressalva que este resultado seria melhor do que aquele que o CDS na última vez que concorreu à CMC em 1997.

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com António Cardoso e Carolina Varela

“Ajudar a valorizar Coimbra e vencer esta vida amorfa” Manuel Machado, Partido Socialista (PS) “Valorizar Coimbra”

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Depois de dois mandatos a assumir a presidência da autarquia de Coimbra, entre 1990 e 2001, Manuel Machado regressa à vida política da cidade com “a vontade de ajudar a valorizar Coimbra e vencer esta vida amorfa, desinteressada, com falta de espírito crítico”. Assim, o objetivo é “que a instituição municipal seja uma parte para empreender a mudança que resolve os problemas”. Nesse sentido, Manuel Machado apresenta algumas propostas para vencer essa crise, nacional e local, com a criação de empregas, estimulação de empresas, incentivo de indústrias ‘high-tech’

e “i-ferrugem”, potencializar as entidades e associações da cidade, entre outras. Só assim, no entender do candidato socialista, “Coimbra tem todas as condições para ser uma cidade melhor”. Todavia, ressalva a necessidade de existir “um catalisador”. “Queremos que as pessoas que escolhem aqui viver o possam fazer com dignidade e para isso é preciso haver emprego, estabilidade e ter motivação para empreender em coisas novas”, clarifica Manuel Machado. Não se poupando a críticas ao último executivo, o candidato socialista reconhece que há na ci-

dade “muitos problemas pendentes”. “Por falta de articulação a nível da instância municipal existem iniciativas notáveis que não são conhecidas”, critica Manuel Machado, ao acrescentar que um dos objetivos para a autarquia é “desafiar as pessoas a participar no projeto e conhecer a opinião, a vontade e a motivação de todos”. Quanto a perspetivas de resultados eleitorais, o candidato não arrisca; ainda assim, clarifica: «a vontade é tudo fazer para fazer renascer a esperança nesta “encantada e fantástica Coimbra”, como dizia Antero de Quental». com João Valadão


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Graffitis CALAR AS PAREDES PELA FORÇA DA INCOMPREENSÃO Aprovada no passado dia 5 de julho, a nova lei do Governo restringe a execução de ‘graffitis’ e outras formas de arte urbana a autores licenciados, mediante autorização da autarquia local. Um pouco por todo o país, vários são os ‘writers’ que questionam a falta de conhecimento dos legisladores em distinguir os diversos estilos. Por João Valadão

“T

udo começou com o ‘tag’, com uma assinatura”, conta o ‘writer’ do Porto, Nuno Palhas, mais conhecido pelo seu nome artístico, Third. É nos comboios urbanos de Nova-Iorque que o ‘graffiti’ toma a sua primeira forma, numa história que se caminha lado a lado com a cultura hip-hop. A partir de estilos simples e de execução rápida, como a ‘tag’ ou o ‘bombing’, o ‘graffiti’ desenvolve-se e deriva para obras mais complexas. Third explica que esse é o lado mais “ilegal”, mas que essa é a raiz da ‘street-art’ que hoje encontramos nas ruas de muitas cidades. Como uma técnica que recorre ao ‘spray’ para exprimir uma arte, o ‘graffiti’ divide-se em “duas grandes nuances: o lado legal e o ilegal”, adianta o ‘writer’ de Mangualde, Zela. Para o artista, o lado legal permite a exploração artística do autor, ao mesmo tempo que dá vida ao local público intervencionado. Para a comunidade artística, a indefinição do ‘graffiti’ e de outras formas de expressão artística na rua é uma questão fundamental

necessária para perceber os limites legais da execução da própria arte. Em Ponta Delgada, nos Açores, o Festival Walk & Talk apresenta, anualmente, trabalhos de ‘street-art’, caracterizado por uma multiplicidade de estilos. O fundador do festival, Jesse Moniz, alerta para uma “fronteira muito ténue” entre aquilo que é considerado arte pública e vandalismo. “A ‘street-art’ pode ser bem aceite pelas pessoas, pela abrangência, o ‘graffiti’ é, na maior parte, um código para quem sabe o que isso é”, comenta o ‘writer’ de Lisboa, Pedro Campiche, ou Akacorleone, como é conhecido nas ruas. “O ‘graffiti’ começa por ser uma técnica com atos, mas ultrapassa isso, é uma comunidade”, adianta.

“Uma lei castradora”

Aprovada no quinto dia do presente mês, a nova proposta de lei do Governo estipula que a execução de ‘graffitis’, picotagem e outras formas de expressão artísticas de rua sejam feitas exclusivamente mediante uma licença do autor e respetiva apresentação do projeto

à autarquia local. As coimas (já existentes) atingem agora valores entre os 100 e os 25 mil euros. Segundo o ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, em conferência de imprensa sobre as conclusões do Conselho de Ministros, a então aprovada e apresentada proposta de lei à Assembleia da República é “a instituição de um regime contraordenacional”. Apesar do reforço das leis que limitam a liberdade artística dos ‘writers’, o ministro diz que o Governo não prende confundir “esse tipo de atividades com arte que se realiza também em espaço público”. A comunidade artística critica, no entanto, os conhecimentos daqueles que irão ser os aprovadores dos projetos apresentados às autarquias. “As pessoas responsáveis não têm formação para isso e vai depender do seu gosto pessoal, é subjetivo”, adianta Pedro Campiche. O ‘writer’ de Lisboa acredita que a aplicação da lei vai ter o efeito contrário: “o ‘graffiti’ ilegal e cru vai ficar mais forte, porque se não há legalização, a reação óbvia é o vandalismo”. Tam-

bém Jesse Moniz aponta defeitos à nova legislação: “é uma lei castradora”. Para o jovem açoriano, as pessoas já se habituaram a ter “expressões presentes na rua” e a “validar a sua presença”.

Insegurança ou conforto?

Sentimentos de insegurança causados pelos ‘graffiti’ no seio das populações é uma das principais razões evocados pelo Governo. O também ‘writer’ de Lisboa, Hélio Bray, confessa que “esse sentimento pode existir”, mas que não é “menos verdade” que com isso o executivo pense “ser mais fácil controlar [a população] ”. A associação da execução de ‘graffitis’ e outras expressões em locais públicos a sentimentos ne-

gativos está diretamente relacionada com a dinâmica e objetivo do ato. Jesse Moniz ressalva, porém, que “não se pode ter a pretensão que tudo o que é espaço público é de todos, há que haver normas, consentimentos”. Pedro Campiche garante que a noção de que o ‘graffiti’ está associado ao crime é “retrógrada”. “As formas de expressão de arte urbana trazem cor, vida e pessoas às cidades”, completa o ‘writer’ lisboeta. Desassociado de uma componente legal, o ‘graffiti’ pode voltar à simplicidade e multiplicação da prática do ‘tag’ e ficar desprovido da crítica política e cívica que o tem caraterizado. “A lei é apenas uma barreira mental, e a mente pode ser livre”, conclui Hélio Bray. catarina carvalho


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fusing

Fusão a 4 Neste verão a Figueira da Foz não é apenas destino balnear. Acolhe também um festival multidisciplinar impulsionado por jovens figueirenses, capaz de projetar a cidade no panorama festivaleiro nacional - sem esquecer o que de melhor a cidade tem para oferecer. Por António Cardoso e Daniel Alves da Silva

M

úsica, arte urbana, desporto e gastronomia unem-se para o FUSING Culture Experience. Entre 1 e 4 de agosto, a Figueira da Foz funde-se em experiências que transcendem os limites da própria cidade. O FUSING é tudo isto. O conceito apresenta-se como uma fusão, não só dessas quatro áreas, mas também “uma fusão muito grande com a cidade”, como afirma um dos membros da organização do festival, Carlos Martins. O evento surge da necessidade de colocar a zona centro no panorama cultural nacional, de “querer fazer alguma coisa” e mostrar o que de melhor anda a ser feito, acrescenta Carlos Martins, não só a nível local, mas também nacional. A organização, constituída por um núcleo duro de jovens da Figueira da Foz, criou a associação cultural DoisTrêsTrês para que o festival fosse possível. Núcleo esse constituido por amigos, ligados à

música, às artes visuais, à gastronomia e ao desporto. Em colaboração com diversas entidades nacionais, detentoras do ‘know how’ nas várias áreas, a equipa gere e articula as atividades e programação do festival. O projeto iniciou-se em setembro de 2012, já com reuniões preliminares a decorrer. “No início, o projeto não tinha esta dimensão”, confessa Carlos Martins. Contudo, à medida que os contactos foram sendo gerados, e o tempo avançava, a organização percebeu que poderia fazer “uma experiência única em Portugal”, congregando as diferentes vertentes do cartaz. Ainda em 2012, numa altura em que o projeto “já estava a ser falado”, decorreu o Criativa (Encontro de Criadores da Figueira da Foz), importante para compreender que “tipo de organizadores e agentes” culturais na Figueira poderiam ser contactados, acrescenta ainda o membro da organização.

Projetar a Figueira

“Sempre defendi que a Figueira necessita de ter um evento que a projete para fora”. Quem o afirma é o vereador da Cultura da Câmara Municipal da Figueira da Foz, António Joaquim Tavares, que alude à dinâmica cultural do município, “muito forte, mas muito virada para si própria”. O FUSING, pelas dimensões que está a ter, “começa já a parecer” ter alguma dimensão para o exterior, o que, refere ainda o vereador, é “muito importante”. A projeção que o festival obteve nos media nacionais – “é muito difícil passar essa barreira”, garante o autarca – foi fruto de um “grande trabalho”. Carlos Martins assim o explica: “muitos contactos, muitas reuniões, muitos nãos, muitos sins, muitos talvez”. Acima de tudo não desistir e acreditar: “o lema sempre foi esse”, resume. Contudo, a inexistência de um histórico da parte da organização do festival foi um dos grandes obs-

táculos à obtenção de patrocínios. “A grande dificuldade foi conseguir passar a certeza de que o FUSING ia avançar”, revela o organizador figueirense. O evento ia acontecer e era tal e qual como tinham projetado, adita. Outra dificuldade com que os iniciantes se deparam foi a falta de uma equipa bem definida: “as pessoas certas para as atividades certas”, já que o primeiro ano é “fulcral para o sucesso ou não do projeto”, remata.

Um festival local

O festival teve em toda a sua elaboração uma preocupação de âmbito local ao integrar as suas atividades com a dinâmica e as atividades da própria cidade. Há patrocínios de empresas e estruturas culturais locais, as atividades do próprio festival foram concebidas em simbiose com a cidade. As intervenções dos artistas de rua, criadas num clima de proximidade, onde o artista está a pintar sob olhar do públi-

co, ficarão depois patentes nas paredes da urbe; as aulas de surf, gratuitas, aproximam o público do evento, numa fusão que também acontece através de ‘showcookings’ ou ‘workshops’. A Figueira da Foz, enquanto cidade de média dimensão, e pela suas características topográficas, potencia a utilização de meios de transporte sustentáveis. Aproveitando esta particularidade urbana, a organização do FUSING pretende “um evento que prime também pelo uso da bicicleta”, afiança Carlos Martins que espera que quem visite a cidade aproveite para “andar, passear, conhecer e ver o que a Figueira tem de melhor”. catarina carvalho


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balanço desportivo

AAC

BALANÇO DESPORTIVO

ANDEBOL

Embora sem títulos, o vice-presidente da Secção de Andebol, Marcos Alves, ressalva o trabalho da equipa de iniciadas femininas e dos seus técnicos, sobretudo na vertente formação. Quanto ao balanço propriamente dito, o vice-presidente assume que “correu como se esperava desportivamente”. Contudo, ressalva: “entre algumas lesões e outros fatores, foi uma época satisfatória, com a exceção de alguns resultados por parte da equipa sénior masculina”. Com uma direção “muito reduzida” nesta época que termina, Marcos Alves explica que em breve uma nova direção irá tomar posse. Ainda assim, os problemas persistem e “são recorrentes”, como classifica o vice-presidente. Entre esses problemas destacam-se a falta de apoio financeiro, a exigência de mais horários de treino e ainda a necessidade de mais técnicos.

ATLETISMO O panorama não é o melhor para a Secção de Atletismo. E quem o diz é o presidente da secção, Mário Rui: “a época desportiva que ainda não terminou não está nada famosa”. Face aos problemas económicos, a secção ficou sem vários atletas de renome, que se viram obrigados a sair, e que se traduziu numa ausência das competições nacionais coletivas, o que “não era normal”, explica Mário Rui. “Foi uma época um pouco desastrosa face ao que vínhamos a fazer nos últimos anos”, confessa o presidente, apesar de ressalvar o trabalho feito no setor feminino. A justificação reside na falta de financiamento e assume-se o risco de a secção poder não continuar. “A secção está muito limitada. Não há dinheiro e alguns atletas e treinadores é que suportaram alguns encargos feitos pela secção nesta época desportiva”, lamenta Mário Rui.

BADMINTON “Foi a melhorar época que tivemos nos últimos 30 anos”, orgulha-se o presidente da Secção de Badminton, Celso Baía, ao enumerar os vários títulos, com destaque para Nuno Santos, com o primeiro lugar conquistado no campeonato nacional. Com cada vez mais atletas e menos espaços para treinar, a próxima

época já se desenha e há a vontade de conquistar o título nacional coletivo, que nesta época “fugiu por pouco”, segundo Celso Baía. Apenas com atletas formadas na Associação Académica de Coimbra, ou “prata da casa”, como lhe chama Celso Baía, os resultados conseguiram-se. A falta de espaços para treinar as várias modalidades é recorrente e, por vezes, a conjugação de horários torna-se complexa e os seniores são obrigados a treinar “em horários impróprios, quando os pavilhões estão livres”.

BASEBOL O ano da secção de Basebol e Softball começa com o reativar da atividade. O presidente, Patrick Gomes, salienta que houve alguns problemas durante a época, nomeadamente a nível financeiro. No entanto, já conseguiram “diminuir a dívida e obter bastantes jogadores, cerca de 15”, explica o presidente. Até agora, a secção já conseguiu ganhar dois torneios e ficar em segundo numa taça. Há jogo no próximo dia 27. Para o ano, a secção quer “organizar um torneio em nome da AAC e trazer ainda mais gente para ter uma equipa masculina e feminina”, sublinha o presidente. Persiste a contrariedade da Federação “ter perdido o estatuto de entidade pública, não responder e não auxiliar as outras equipas. É esse o grande problema do basebol em Portugal”, lamenta Patrick Gomes.

BASQUETEBOL Tendo em conta as dificuldades no início da época, ninguém esperava, segundo o presidente, Carlos Gonçalves, que a época corresse “muito bem”. Contudo, as comemorações do 85º aniversário possibilitaram que muitas pessoas se juntassem à secção e assim “recuperar o prestígio desportivo e o da instituição”, explica o presidente. Quanto aos principais objetivos cumpridos, o presidente destaca o facto da equipa sénior masculina ter sido vice-campeã nacional, bem como o facto de três atletas seniores terem sido selecionados em sub-18 para a seleção nacional. No que toca ao setor feminino, as atletas sub-

16 foram campeãs distritais e conquistaram ainda duas taças. Quanto aos problemas, Carlos Gonçalves explica que “a falta de espaços para treinar e para jogar foi a maior dificuldade”.

BILHAR No bilhar, a AAC foi a única a chegar a todas as fases finais por equipas individuais das modalidades em que estava inscrita: ‘pool’, ‘pool português’, ‘american pool’ e ‘snooker’. “Ninguém conseguiu fazê-lo até agora, conseguiu a Académica”, orgulha-se o presidente da secção de bilhar, Fernando Salgado. O sentimento de final de época é positivo. Há a destacar resultados individuais “importantes, como a manutenção na divisão de elite de um atleta apesar de um corte de metade de divisão” e o reforço da equipa universitária para a próxima época – “de modo a que subam de divisão”, refere o presidente. Fernando Salgado acredita que na próxima época, a Secção de Bilhar, também recente, chegue aos 50 atletas.

BOXE O balanço da época no boxe é também positivo, mas com a circunstância de ser a vertente de kickboxing que assegura os títulos. “No boxe estamos com um grande problema a nível de organização. Houve situações de demissões de direções e problemas entre regiões e federações”, explica o presidente, Miguel Silva. Têm havido “boicotes de associações nas provas nacionais”, conta o presidente. Têm um atleta na seleção nacional de ‘kickboxing’ e outras provas que venceram. Contudo, a próxima época baseia-se “numa situação igual ou pior”, lamenta o presidente. Em causa está de novo a proposta de utilizador-pagador no Estádio Universitário de Coimbra (EUC). “Se calhar os treinadores vão-se embora. Se avançarem com isso, muitas secções vão começar a ser fantasma”, remata Miguel Silva.

CULTURA FÍSICA A Cultura Física foi “campeã nacional no torneio de ‘powerlifting’ e recordista mundial”,


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balanço desportivo

O desporto é, desde há muito, um pilar fundamental das atividades da Associação Académica de Coimbra (AAC) e da cidade. Apesar da conjuntura financeira adversa às práticas desportivas e ao dirigismo e os recentes incidentes de penhoras, a AAC continua a arrecadar títulos e a trazer reconhecimento para a academia. Por Liliana Cunha, Ana Morais e Carolina Varela assinala o presidente, Fernando Reis. Nos campeonatos europeus bateram dois recordes mundiais e quatro nacionais. Para a próxima época o destaque vai para o campeonato do mundo na República Checa. Mas, antes disso, ainda há campeonatos nacionais. Esta não é uma secção com dívidas, garante o presidente. O problema de sangue novo também existe nesta secção: os “estudantes são como as ondas do mar. Vão e vêm. Não podemos ter uma média dos estudantes que temos aqui”, afirma Fernando Reis. “Somos vaidosos e queremos estar no topo”, atesta o dirigente.

DESPORTOS MOTORIZADOS “O nosso problema é que quando sairmos de lá não sabemos se temos alguém para nos substituir”, sublinha a presidente, Cátia Morais. A falta de pessoas a integrarem a secção de Desportos Motorizados é o problema mais evidente. A época ainda só vai a meio - termina no final do ano civil. Até agora contam-se dois campeões nacionais e as atividades que realizaram – ‘track day’ e o ‘rally paper’, que “tiveram bastante adesão”. Para o próximo meio ano esperam-se o resultado dos campeonatos de pilotos, que acabam em novembro, e, em setembro, já está programada uma corrida de ‘karts’ em resistência. “Não somos uma secção que consegue angariar patrocínios, e estamos dependentes financeiramente da AAC”, finaliza Cátia Morais.

DESPORTOS NAÚTICOS Na semana passada a Secção de Desportos Náuticos foi alvo de mais uma penhora. Desta vez, a dívida correspondia à Secção de Basquetebol. O presidente da secção, Ricardo Reis, está preocupado: “este fim-de-semana temos o campeonato de juvenis e simplesmente a secção tem zero no saldo disponível. Tem de ser o meu dinheiro e dos treinadores a pagar o gasóleo, os transportes e a alimentação”. O dirigente diz que a situação não é novidade e revela que já se encontra agendada uma reunião com a Direção-geral da Associação Académica de Coimbra (AAC), com o intuito de que lhes devolvam os 1600 euros que faltam na conta da secção. Quanto a perspetivas futuras, prevê-se para a próxima época, que a concretização da intenção de contratar um treinador profissional pode instituir-se como um caminho inglório: “não sei se vamos conseguir. Temos um treinador em tempo parcial, e não podemos ir a certas provas internacionais, nem investir em barcos”, conclui. O panorama atual da secção não é nada favorável ao seu bom funcionamento e urge alterá-lo.

FUTEBOL A Secção de Futebol atravessou uma época positiva. O presidente, Rui Pita, conta que “os seniores se mantiveram na divisão de honra, a secção chegou à meia-final da Taça

e algumas equipas das camadas jovens chegaram às fases finais, apesar de não terem subido ao nacional”. Por alcançar ficou apenas a Taça da Associação de Futebol de Coimbra. Os problemas sentidos prendem-se, essencialmente, com a logística relativa às condições do EUC. Num ano que ficou marcado pela estabilidade financeira, projeta-se, agora, a próxima época. Fica o objetivo de “assegurar mais rapidamente a manutenção nos seniores, pôr uma ou duas equipas das camadas jovens a disputar os nacionais e vencer a Taça da Associação de Futebol”.

GINÁSTICA Uma época com um “saldo muito positivo”, em que as 90 vagas iniciais foram totalmente preenchidas e com resultados “fantásticos a nível distrital, nacional e internacional”, clarifica a presidente da Secção de Ginástica, Ana Bastos. Já em preparação para a nova época, os títulos conquistados são recordados e servem de motivação: oito na totalidade (cinco nacionais e três internacionais), bem como os vários prémios que distinguiram atletas da secção ou até apuramentos para campeonatos internacionais como o World Games. Com uma grande procura, o espaço da secção mostra-se “manifestamente insuficiente” para o decurso normal dos treinos. Ana Bastos explica: “embora a secção procure fazer pequenas melhorias nas instalações, a degradação das mesmas é evidente”.

HALTEROFILISMO O presidente da Secção de Halterofilismo, Bruno Almeida, faz um balanço bastante positivo da época. Obtiveram vários títulos de campeões nacionais, masculinos e femini-

nos, um campeão do mundo e um terceiro lugar no campeonato nacional de equipas, realizado no ano passado. A secção atravessa uma situação financeira complicada. A falta de apoios é o que justifica a necessidade do “esforço da secção e, por vezes, também da parte dos atletas para dar a volta a algumas questões”, observa o presidente. Bruno Almeida aponta, ainda, o principal problema sentido: “a possibilidade do estabelecimento do estatuto de pagador-utilizador do pavilhão onde treinamos será uma dificuldade”. Para a próxima época fica o desejo de fazer melhor.

JUDO A revalidação do título nacional de equipas seniores é o destaque feito pelo presidente da Secção de Judo, Rui Fonseca, para o balanço do trabalho desenvolvido pela secção. A conquista de resultados significativos em equipa a nível nacional e a participação a nível individual em competições estrangeiras são motivos de orgulho para as equipas técnicas da secção.

“Continuamos a ter campeões nacionais e atletas em todos os escalões, com participações no campeonato da Europa e mundiais”, lembra Rui Fonseca. Ainda assim, os esforços vão já para a próxima época em que se nota a vontade de “tentar arrecadar resultados de excelência”. Apesar dos problemas “transversais a todas as secções”, como explica o presidente, a Secção de Judo encontra-se a preparar “o maior evento de judo a nível nacional”, a acontecer em outubro: o estágio de judo da Académica.

KARATÉ Segundo o treinador José Lemos, as várias atividades da secção de Karaté permitiram que esta época fosse vantajosa. Alcançaram o primeiro lugar na liga de ‘karaté-shotokan’ e um vice-campeão na Federação Nacional de Karaté. José Lemos acredita que os objetivos foram alcançados – “são os melhores resultados que, a nível nacional, era possível atingir”. Destaque para o sexto lugar de um atleta nos campeonatos europeus em Bel-


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balanço desportivo grado, Sérvia, e ainda para o torneio organizado na Queima das Fitas que trouxe cerca de 250 atletas nacionais e estrangeiros. “A época encerra em grande”, analisa o treinador. Ainda com alguns problemas financeiros por resolver, a secção já tem dinheiro depois de dois anos sem receber e o número de praticantes mantém-se.

LUTAS AMADORAS O presidente da secção, Adilson Brito, explica que a época, que só termina em janeiro, não está a ser tão produtiva como o habitual. “Não só pelos poucos fundos de que neste momento dispomos para competição, mas também pelo facto de a modalidade estar muito concentrar em Lisboa, Algarve e Braga, o que torna os custos de competição altíssimos”, ressalta. A necessidade de um investimento nas infraestruturas, no que toca ao EUC, a par da diminuição do número de atletas a integrar a secção, são dois dos problemas que, de momento, mais afetam a secção. “Enaltecer o bom nome da Associação Académica de Coimbra e honrar a camisola” são os objetivos que Adilson Brito deixa.

NATAÇÃO Ainda vai haver mais duas competições nacionais para esta secção até ao final da época. O ano começou com o receio de que a crise pudesse refrear as inscrições na formação de atletas, mas o presidente, Miguel Abrantes, considera que se excederam “as expetativas”. Houve vários pódios a nível nacional e, inclusive, nos campeonatos nacionais de massas, onde a Académica foi campeã de clubes. Desde chamadas à seleção de atletas e um décimo lugar no campeonato do mundo de triatlo, a

natação teve mais gente este ano. A próxima época já está alinhavada e nos moldes desta. “Alguns técnicos vão sair, mas temos massa humana para colmatar eventuais saídas e estamos organizados”, assegura Miguel Abrantes. Resta ver como é que as “pessoas vão reagir nas inscrições em setembro”, conclui.

PATINAGEM Com uma média de cem atletas distribuídos por dez escalões, a Secção de Patinagem, na voz do diretor desportivo, Rui Freire, teve “uma época satisfatória”. Com a participação em todos os escalões existentes na modalidade, admite que os resultados alcançados “foram satisfatórios”. Os juniores venceram o campeonato regional e a equipa sénior feminina conseguiu o melhor lugar de sempre da história da secção. São estes os resultados destacados. Entretanto, haverá uma nova direção a tomar posse. Quanto a queixas, a falta de espaço é a mais notada, numa altura em que a secção tem uma grande procura. Ao que acresce a falta de condições, como o facto de chover no pavilhão em que são realizados os treinos. E como conta Rui Freire, houve mesmo momentos em que se tiveram de interromper os treinos.

PESCA DESPORTIVA A época da Secção de Pesca Desportiva vai agora a meio, com perspetivas de subida aos nacionais. O presidente, Humberto Marques, conta que a época está a ser positiva: “tivemos algumas provas que não nos correram muito bem, mas, em contrapartida, outras que correram otimamente”. Ainda que este seja um desporto um pouco caro, o ano está a ser marcado pela entrada

de atletas de toda a cidade. Com o objetivo de voltar a colocar a Associação Académica de Coimbra nos nacionais, o presidente não deixa de falar do estado financeiro que afeta a secção. “A associação tem-nos ajudado, mas não tem chegado para as despesas, temos metido dinheiro do nosso bolso, enquanto esperamos por verbas que ainda não chegaram”, relata.

RADIOMODELISMO A meio da época, a Secção de Radiomodelismo conta já com uma Taça de Portugal em todo o terreno e com dois pilotos no campeonato da Europa. “Os objetivos desta época estão a ser cumpridos, mas podiam ser melhores se tivéssemos mais praticantes”, lamenta o tesoureiro, Carlos Lobo. Os praticantes diminuíram, esta época, em cerca de 50 por cento. Os elevados encargos com a manutenção do autódromo, as novas regras do EUC, o desaparecimento de antigos patrocínios e a diminuição das verbas do Conselho Desportivo são entraves com que a secção se tem deparado. O ano ficou, ainda, marcado pela criação do estatuto de sócio-patrocinador que não pratica mas colabora com uma quota de 10 euros, “que vai suportando as despesas diárias”, observa Carlos Lobo.

RUGBY A Secção de Rugby arrecadou o título de campeã nacional com as equipas femininas e masculinas, no campeonato nacional universitário. Em declarações ao Jornal A CABRA no ano passado, o presidente da Secção de Rugby, Jaime Caravalho, determinava os objetivos que moviam a secção para a época deste ano e que parecem ter sido assegurados: “o aumento do número de atletas e a colocação de alguns deles nas seleções”. Dois jogadores foram convocados para o último estágio da Seleção Nacional. A equipa feminina sagrou-se tetracampeã de rugby de sete sem nenhum ensaio sofrido em todas as provas realizadas nos Campeonatos Nacionais Universitários.

TAEKWONDO A Secção de Taekwondo tem desenvolvido o trabalho, nos últimos anos, na senda de melhores resultados, com uma forte aposta na formação de técnicos. A formação dos treinadores foi o ponto mais relevante do trabalho desenvolvido no seio da secção no ano passado. Em entrevista ao Jornal A CABRA, no ano passado, a presidente da secção, Ana Lopes, assegura que este tipo de formações teve um impacto muito positivo “numa excelente época”.

TÉNIS DE CAMPO A Secção de Ténis de Campo encontra-se a disputar o campeonato nacional de sub-14, no qual o membro da direção da secção, Eduardo Cabrita, acredita que “a equipa feminina poderá ser vencedora”. A nível regional acumulam-se as vitórias; em competição nacional contam-se duas atletas e, numa abrangência mais internacional, destaca-se a realização de dois torneios internacionais. Setembro, outubro e novembro são o ponto alto de toda a competição, altura em que se disputam os campeonatos nacionais de seniores. Face aos parcos recursos financeiros, o dirigente determina: “os balões de oxigénio vêm dos empréstimos e de pessoas que vão competir e recebem apenas quando o dinheiro chega”. A aposta da época recai no campeonato de sub-14 feminino e no campeonato nacional, de masculinos e femininos.

TIRO COM ARCO A atravessar uma das épocas mais paradas do tiro com arco dos últimos tempos, a secção contou este ano com menos uma prova do que o habitual. “Costumávamos fazer a prova para o Campeonato Nacional de Caça e o terreno onde fazíamos a prova foi alterado pela construção de um novo troço de estrada”, conta o presidente, Manuel António Silva, sobre o que costumava ser o principal evento da secção. A atividade com mais visibilidade do ano foi uma demonstração na Escola Secundária José Falcão. O presidente faz um balanço positivo do ano e destaca a entrada de novos participantes. Para o ano, fica o objetivo de voltar a organizar a prova nacional para o Campeonato de Caça, mais demonstrações e uma atividade centrada no plano das atividades desportivas da Queima das Fitas.

VOLEIBOL “Temos a dimensão que conseguimos ter, não podemos crescer mais porque não temos para onde”, explana o presidente da Secção de Voleibol, Manuel leal. Sem problemas “de maior”, a grande preocupação reside na incerteza da próxima época, no que concerne à utilização do EUC. Segundo Manuel Leal, o próximo ano será “uma incógnita”. No que toca ao balanço, o tom é mais positivo, visto que os objetivos propostos para esta época foram atingidos: a manutenção das equipas seniores masculinas e femininas na segunda divisão e a conquista do vice campeonato universitário masculino e feminino.

XADREZ Com vitórias a nível nacional e internacional, a época que termina em setembro conta com um aumento no número de atletas (cerca de 250), todos os títulos distritais e uma participação nas Olimpíadas. A Super Taça fica por alcançar – único objetivo não atingido. Pela frente ainda estão duas provas e os campeonatos nacionais. “Todos os anos conseguimos pódios em vários escalões, este ano vamos levar 13 participantes e espero vir com bastantes prémios para casa”, conta o presidente, Bruno Pais. O presidente aponta como problemas principais questões financeiras, dificuldades em manter os estudantes universitários focados num clube com mais de 200 atletas e em organizar todas as provas em várias partes do país, em simultâneo.


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PERFIL

fernando marques • o fotógrafo “formidável”

A formidável história do mundo contada por uma lente

“A Vida É Formidável” é a exposição patente na Galeria de Santa Clara até setembro, com o espólio do conhecido fotógrafo da cidade, Fernando Marques – “Formidável”, se faz favor. Faz-se a evocação de uma das “personagens” da Baixa, que captou mais de meio século de história no país e no mundo. Por Ana Duarte

P

elas ruas da Baixa, Fernando Marques deambulava, cauteleiro de profissão. Durante muitos anos, era o conhecido vendedor de lotarias que, aqui e ali, parava para dois dedos de conversa com quem o quisesse. Mas por debaixo do casaco qe habitualmente vestia, trazia sempre a sua companheira do quotidiano: a máquina fotográfica. É através da sua lente que hoje se pode revisitar a Coimbra do passado, desde as festas académicas, a famosa Crise Académica de 1969, passando por algumas tragédias como incêndios e até jogos da Briosa. Nascido por cá, em setembro de 1911, Fernando Marques era uma referência – e ainda o é. A fotografia era um passatempo que lhe valeu o reconhecimento e o respeito com que é retratado hoje, assim como a sua personalidade. “Não era fácil. Ouvia mal, era desconfiado... mas era uma pessoa adorável”, conta Mário Martins, que o conheceu aquando da sua entrada para o Diário de Coimbra (DC), por volta de 1979. Na altura (e até antes), Fernando Marques, para além da venda das cautelas, colaborava com diversos jornais da cidade como fotógrafo. Nas redações de jornais como o DC, Jornal de Coimbra (extinto em 2004), e até o jornal A Bola e o Record, fez amizades duradouras que olham para trás com saudosismo e respeito para com aquele que se autodominava de “Formidável”. “Fernando Marques ofereceu a sorte grande a Coimbra, ele que era vendedor de lotarias”. É assim que Jorge Castilho, jornalista e fundador do Jornal de Coimbra, olha para a importância do trabalho d’O Formidável para a cidade. Mas Fernando Marques não imortalizou apenas Coimbra pela sua objetiva; “fotografou Coimbra, a região centro, o país e o mundo”, explica Jorge Castilho.

A paixão pelo desporto e o espetáculo

“O futebol e o espetáculo foi um pretexto para trabalhar muito de perto e ter afinidades profissionais com o Fernando”, relembra Sansão Coelho, jornalista. Também caminhou ao lado d’O Formidável, em várias reportagens e entrevistas – onde era semper captado pela lente de Fernando Marques. E essa captação, que na altura era “permitida”, era vista por Sansão Coelho como um “miminho” que o fotógrafo oferecia ao repórter. Amália Rodrigues, Marisol, Sylvie Vartan foram alguns dos nomes entrevistados por

D.R.

A famosa fotografia d’ O Formidável abraçado a Eusébio, no Mundial de Futebol de 1966 Coelho e captados por Fernando Marques. E numa época em que a nomenclatura de “fotojornalista” ainda não era conhecida, o Formidável já se autodominava como um. “Chegou a dizer-me que era um fotojornalista. Tinha sentido de oportundidade e de atualidade”. No panorama nacional, era conhecido por acompanhar sempre a seleção nacional nos campeonatos do mundo e o Benfica. Os episódios dessa altura são muitos e bem sabidos pelos seus amigos: Mário Martins relembra “aquela vez em que o Formidável foi com a seleção a Itália e não tinha dinheiro para regressar”. “Acabaram por ser os jogadores a cotizarem-se para lhe pagar o bilhete de regresso de comboio”, acrescenta. Foi nessas andanças que Fernando Marques reuniu trabalhos únicos na área da fotografia e onde rivalizou amigavelmente – sempre – com fotógrafos conhecidos como Nuno Ferrari, do jornal Record, e Varela Pécurto. Foi aí, também, que, na opinião de Jorge Castilho, o Formi-

dável fez o seu melhor trabalho: “no Campeonato do Mundo de 1966, em Inglaterra, quando podia ter feito a fotografia da sua vida [ter fotografado o Eusébio em lágrimas a sair do estádio], ele preteriu a tal fotografia para ir acarinhar o Eusébio”. Portanto, “o mais notável trabalho que ele fez foi o que ele não fez”, graceja Castilho. Nas palavras de Mário Martins, “é a fotografia que melhor mostra o que era o Formidável”.

Fernando “Omnipresente” Marques O facto de não ter um horário a cumprir proporcionou-lhe a hipótese de fotografar livremente e de poder estar (quase) sempre em todo o lado. “Era um bocado omnipresente, estava sempre em tudo e em todas as situações”, caracteriza Sansão Coelho. Também foi graças ao despudor que tinha, qualidade irrevogável que lhe é sempre reconhecida, que conseguia grandes oportunidades de recolha de imagens mas que, por vezes, poderia levar a alguma insegurança, como foi caso

vivido com Jorge Castilho: “ficámos num incêndio, nos inícios dos anos 70, cercados pelas chamas. Era ainda um jovem repórter, ele já era um fotógrafo calejado, e aí tivemos que nos apoiar um ao outro para nos acalmar”. Para além da omnipresença que lhe era característica, também era multifacetado. “O Formidável entrava nos cafés, sentava-se, punha o seu ‘papillon’ quando era necessário e desdobrava-se. Adaptava-se facilmente e tinha o despudor de entrar em todos os sítios e lugares”, explica Sansão Coelho. Não há registo de se ter dado mal por isso, mas, quiçá? A verdade é que hoje a Imagoteca da Câmara Municipal de Coimbra é composta por um enorme acervo fotográfico da sua autoria, onde, segundo Jorge Castilho, “é possível reconstituir a história da cidade e dos seus cidadãos”. Isto tudo pela lente de Fernando Marques. “Podemos considerar de alguma maneira que ele é um historiador que faz história através das imagens”, diz o ex-diretor do Jornal de Coimbra.

Mais reconhecimento merecido

Apesar disso, Sansão Coelho lamenta que a cidade não tivesse retribuído mais: “foi uma pessoa que devia ter sido mais acarinhada em vida pelo seu talento e pelo seu mérito”. No entanto, quando se fala n’O Formidável, quem fala, fá-lo com respeito e reconhecimento – pela pessoa e pelo profissional que foi. Fica a dúvida da origem do nome “Formidável”. “Muitas vezes o que acontecia é que a foto é que era formidável, e vinham com esse carimbo”, tenta explicar Sansão Coelho, ainda na incerteza. E que, sem qualquer presunção, Fernando Marques falava assim de si próprio. Em homenagem (entre as muitas que lhe foram feitas desde a sua morte, em 1996), o poeta e político Manuel Alegre evoca-o como “o fotógrafo de Coimbra”, com uma visão única: “Há uma cidade que só ele vê/e é mais certo que só ele capta/o insondável(...)”. Assim era o Formidável.


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fotorreportagem ANA MORAIS

CANDEEIROS HÁ MUITOS P

resentes em quase todas as ruas, avenidas ou ruelas; integrados na paisagem urbana ou demasiado rústicos perante os contextos citadinos, iluminam um pouco tudo por toda a cidade. A verdade é que candeeiros há muitos. Para dar luz a qualquer recanto da urbe, desde as ruas principais aos becos mais refundidos, quer-se que deem luz a quem passa e ao que por lá permanece. Guardiões e permanentes testemunhas do que

se passam em Coimbra, de dia apreciam as histórias e à noite contam-nas, emanando a luz que há em si para quem deambula. Para quem não conhece a cidade, os candeeiros podem ser um excelente guia, conduzindo-nos por um percurso certo e previamente determinado. Dum ponto de vista mais metafórico, as luminárias presentes de norte a sul do país bem como do litoral ao interior, podem ser uma espécie de amuleto. Perante a atual situação

política portuguesa, pedem-se candeeiros que nos guiem e que nos conduzam a uma política desprovida do obscurantismo financeiro e marcada pela luz de dias melhores e sem pensamentos puramente economicistas. Voltando de novo a Coimbra, também a cidade precisa dessa iluminação, já que as autárquicas estão aí à porta. E agora que se é Património Mundial da Humanidade há que conservar essas luzes. A.M.

INÊS MARTINS

ANA MORAIS

INÊS MARTINS

ANA MORAIS

INÊS MARTINS


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fotorreportagem DANIEL ALVES DA SILVA

INÊS MARTINS

INÊS MARTINS

INÊS MARTINS

rafaela carvalho

INÊS MARTINS

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rafaela carvalho


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unesco

Estatuto diferenciador

precisa-se

O recente reconhecimento da Alta como Património da Humanidade levanta questões económicas que poderão afetar aqueles que por lá vivem. As repúblicas, a braços com o Novo Regime de Arrendamento Urbano, assumem um lugar de destaque na discussão. Por António Cardoso e Carolina Varela

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or entre becos e ruelas, cruzam-se as linhas escorreitas que dão volumetria à Alta coimbrã. Erguem-se edifícios que perpetuam a memória de vultos incontornavelmente enraizados na história do país. Sobressaem nomes como Eça de Queiroz, José Afonso, Manuel Alegre, entre muitos outros. Apontam-se vestígios da tradição e da história que hoje classificam a Alta como Património Mundial da Humanidade. O passado funde-se com o presente, não apenas nos edifícios que resistem, mas nos rostos envelhecidos de quem reside lado a lado com a sagacidade da juventude. O retrato que conquistou o galardão da UNESCO não revela a degradação e o desleixo que mancham a imagem difundida. Fruto deste reconhecimento, podem emergir riscos relativos ao aumento do valor de mercado dos imóveis que constituem a Alta. O diretor comercial do setor imobiliário da cidade, Nuno Quitério, determina que “pode existir a tendência dos proprietários terem uma atitude de especulação relativamente ao real valor do imóvel e aumentarem os preços”. Ainda que o risco de especulação seja uma realidade, a conjuntura atual do país pode vir a contrariar esta situação. “O trajeto normal em Portugal é uma redução do património edificado, que poderá amortecer este efeito de aumento do valor das propriedades”, ressalva o vereador para a Administração e Gestão Urbanística da Câmara Municipal de Coimbra, Paulo Leitão. O curador da candidatura da Universidade de Coimbra, Alta e Rua da Sofia a Património da Humanidade, Raimundo Mendes da Silva declara que, “face aos níveis atuais de ocupação da Alta e da Baixa, o fenómeno da eventual especulação não será plausível a curto prazo”. Atribui à Câmara a necessidade de acompanhar a evolução do mercado e desenvolver

mecanismos para controlar estes fenómenos. Com a classificação da UNESCO, Coimbra vê a sua visibilidade exponenciada a nível mundial, em termos turísticos. Torna-se, assim, expectável que, do ponto de vista económico, haja um aumento do interesse de investidores. “O reconhecimento é, ‘à priori’, uma mais-valia económica, mas não basta desenvolver a atividade turística como atividade económica”, assevera Paulo Leitão. “Se o território não for habitado, não vale de nada este reconhecimento”, determina. “Interessa mostrar uma cidade para turista ver, mas do ponto de vista das condições das pessoas que vivem na Alta, vejo pouco ou nada a ser feito”, afirma o residente da república dos Galifões, Mário Gomes. Trata-se de uma zona da cidade que abriga “repúblicas e idosos, com contratos bastante antigos e que neste momento correm o risco de ser despejados”, alerta.

Pedaços de história

É em algumas das ruas mais características da cidade que se edificam as repúblicas como apontamentos de tempos idos. Ao longo dos anos, as marcas de centenas de estudantes constroem as paredes das casas que atualmente possibilitam uma alternativa de habitação mais económica. São o ponto de encon-

tro do tempo. São registos vivos de uma história que corre o risco de ser perdida. “Estamos a patrimonializar uma cidade, em particular a área da Alta, mas ao mesmo tempo está-se a deixar que morram [as repúblicas] ”, acusa Mário Gomes. Apesar da sua importância em termos histórico-culturais, a generalidade das casas apresenta um elevado grau de degradação, potenciado por um alheamento, quer da parte dos senhorios, quer das entidades responsáveis, de que se queixam os repúblicos. “É uma hipocrisia gigantesca. Tanto a reitoria como a Câmara Municipal de Coimbra já mostraram uma posição de descargo com as repúblicas e não há nenhum cartaz da candidatura que não tenha uma fotografia para mostrar que as repúblicas são muito bonitas”, não hesita o repúblico dos Solar Residência dos Estudantes Açorianos, Igor Constantino. As repúblicas abrangidas na candidatura enfrentam várias adversidades, que condicionam a sua sobrevivência. As repúblicas que povoam as ruas

da Alta podem defrontar-se com as possíveis implicações especulativas advindas da patrimonialização. Mário Gomes acredita que, “com a especulação imobiliária, o valor das casas será acrescido, o que recai nas rendas, que grande parte das repúblicas já viram aumentadas”. O aumento das rendas insere-se no Novo Regime de Arrendamento Urbano (NRAU), que permite, num período transitório de cinco anos, um aumento de 1/15 avos do valor patrimonial da casa, sendo que passados dois anos do período de transição, a renda pode ser submetida a valores de mercado. Grande parte das repúblicas já atingiu valores de renda quase impraticáveis. O repúblico dos Galifões chama a atenção para a situação da república 5 de Outubro. “Tiveram um aumento brutal de renda, na medida em que pagavam menos de 100€ e neste momento a renda vai passar para quase 800€”, pormenoriza.

Hipocrisias à parte

Na opinião de Igor Constantino, cabe à Câmara Municipal e à Universidade um papel de salvaguarda das repúblicas. “Estamos em posição para denunciar e não deixar que haja uma cerimónia em que não digamos que eles são uns hipócritas”, assegura. O residente no Solar dos Açorianos assume que da parte dos repúblicos pode também existir alguma falta de abertura. Acrescenta que “a maioria são estudantes pobres que até agora têm sido mal representados por um Conselho de Repúblicas que é uma ditadura da minoria”. A criação de uma lei capaz de proteger as repúblicas e o novo contexto da Alta, do NRAU, é a solução apontada por Igor Constantino e partilhada por Raimundo Mendes da Silva. “O facto de as repúblicas estarem como património imaterial na candidatura dá-lhes outra força, a elas e às entidades públicas, para reclamarem um estatuto algo diferenciador”, conclui o curador. rafaela carvalho


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amolador de tesouras antónio loureiro • amolador de tesouras

rafaela carvalho

Um homem atravessa Portugal na sua querida bicicleta... e assobia!

A sua pedra de amolar tudo afia. Alicates, facas, tesouras de costura ou de podar. António Loureiro, amolador há mais de trinta anos, faz de todo o objeto de corte o seu ganha pão. Isto enquanto percorre o país de norte a sul a “dar música” aos clientes que começam a rarear. Por Rafaela Carvalho

C

orre o boato de que vem de Leiria, mas há quem diga que é de Pombal. Alguns acreditam que foi Viseu a cidade que o viu nascer e outros que juram a pés juntos que é mesmo de Coimbra. A verdade é ninguém sabe ao certo de onde vem. Nasci em Montemor-o-Novo. O meu pai também é alentejano e a minha mãe é de Grândola. Vivi aqui em Coimbra uns tempos, com o meu pai, quando era miúdo, mas sou alentejano. De uma coisa todos têm a certeza: António Loureiro, o amolador de tesouras, traz a chuva. Assim que as pesadas nuvens cinzentas tapam o sol e as pequenas gotas se precipitam sob o solo, é certo vê-lo atravessar ruas e ruelas na sua bicicleta. O som do seu assobio, tão característico, estende-se como o vento sobre a cidade chamando os clientes para amolar tesouras e alicates ou afiar facas e outros objetos de corte, bem como arranjar varetas de guarda chuvas ou até panelas. Antes, o meu pai e o meu avô só andavam nesta profissão de inverno. Aparecia muito mais material, principalmente chapéus-de-chuva. De verão iam para a apanha do

tomate, à ceifa do trigo ou para a vindima. Lá ganhava-se mais dinheiro do que nisto. E depois no inverno regressavam. É o que ele me conta a mim e o que eu sei. É por essa razão que as pessoas dizem: “lá vem o manda chuva!”. Hoje em dia eu faço isto o ano inteiro. Trabalho todos os dias e nem todos os dias chove. [liberta uma gargalhada sonora e pergunta]. Há alguém que mande vir chuva? Há alguém que mande no tempo? António Loureiro tem hoje cinquenta anos. Desde os catorze que faz da arte de afiar tesouras a sua vida e da pedra de amolar a sua fonte de rendimento. À sua conta são mais de trinta anos a pedalar e a assobiar, mas esta é uma tradição que já vem de família. Comecei atrás do meu avô. É profissão de família. Antes era apenas uma rodinha com um pedal. Depois como o meu pai também era amolador passei a acompanhá-lo. Agora com cinquenta anos também já não tenho hipótese de mudar. Não sei fazer mais nada, e a bem dizer ler e escrever também não sei. Quem é que quer dar trabalho a um velho? Só se fosse para uma fábrica de amolar tesouras. Mas se não há

trabalho para os jovens, imagine-se agora para um homem de 50 anos sem a escolaridade mínima, sem nada. Nunca tive hipótese de estudar. Também gostava de saber ler e escrever, mas naquela altura os pais queriam que andássemos com eles. Não tínhamos morada certa, parávamos num sítio sete ou oito dias, e noutro mais uns tantos. Somos sete irmãos e nenhum é da mesma cidade. A vida itinerante ainda hoje se mantém e António Loureiro passa longos períodos sem conviver com a família. Atravessa Portugal de norte e sul e não raras vezes passa os fins-de-semana, ou até as principais festividades, longe de casa. Tenho uma carrinha onde meto a bicicleta e durmo lá dentro. Faço tudo, de aldeias a cidades. O Alentejo está deserto e uma pessoa lá não ganha para comer, nem para as despesas. Vou de Coimbra a Aveiro, Espinho, Póvoa de Varzim, Viana do Castelo, Valência e volto por trás direito a Chaves, Vila Real e finalmente volto a casa. Dependendo do trabalho fico até dois dias numa cidade. Como isto já é tão rotineiro, já temos zonas definidas. A parte mais difícil é andar sempre a

assobiar e não aparecer nada. Nem se imagina as horas que por vezes ando por aí sem aparecer uma peça para eu trabalhar. Uma pessoa começa a ficar esmorecida. Ando eu a dar música a estas pessoas, e elas não me dizem nada! Mas nem sempre é assim… Esta Páscoa não a passei com a minha família, passei-a em Lamego a trabalhar. E uma senhora chamou-me. Estava a chover muito no dia de Páscoa e ela diz-me: “então é dia de Páscoa e você anda a trabalhar?” Eu disse-lhe: “claro, tenho de ganhar para comer.” Ao que ela me responde: “tem que ganhar para comer, então venha cá”. Levou-me para casa dela e obrigou-me a estar ali a comer com a família no dia de Páscoa. Tive lá umas duas horitas com ela. Deu-me um casaco e uma camisa, tudo maravilhoso. São coisas assim que guardamos na memória. Em Portugal os amoladores de tesouras são uma profissão em vias de extinção. Os clientes começam a escassear e os poucos que ainda aproveitam os seus serviços são idosos. Os jovens agora compram coisas para mandar fora e a maioria não cozinha. Ainda há alguns que

têm curiosidade, mas a maioria dos clientes são as senhoras idosas com as suas tesouras. Todas gostam de ter uma tesourinha afiada e as alentejanas são de mais, se não tiver uma caixinha da costura... Uma tesoura bem afiada, se for cuidada, dá para três ou quatro anos. Porém, tão grave quanto a falta de clientes é a diminuição destes vendedores ambulantes. António Loureiro não conhece mais que oito. Um deles, seu irmão. Como o próprio afirma, é uma profissão que dá para comer e beber, mas mal chega para as despesas. Tenho filhos mas eles não querem seguir com isto. O mais velho, que é informático, ainda me acompanhou duas vezes, mas diz que não quer. Ele tem razão, mas aprender não custa. O mais novo não que ainda é pequenito, mas o mais velho devia saber fazer isto. Um dia pode a vida voltar-se ao contrário. Até porque as pessoas em ganhando fome são obrigadas a fazer coisas que não querem fazer. E era uma coisa que ele podia orgulhar-se. Eu gosto desta profissão. Quando trato de uma faca, de um chapéu ou de qualquer outra coisa é com todo o carinho.


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mata nacional

Por onde a foca se esconde O maior eucalipto da Europa, uma espécie única de salamandra na Península Ibérica e uma foca lendária, com segundas intenções. A pouco mais de cinco quilómetro do centro de Coimbra estende-se a Mata Nacional de Vale de Canas, que começa agora a ver o resultado dos esforços de recuperação após o incêndio de 2005. Por João Martins. Fotografias de Rafaela Carvalho

A

pouco mais de cinco quilómetros do centro de Coimbra, no seguimento da estrada do Tovim, chegamos a uma das matas nacionais localizadas na cidade. A Mata Nacional de Vale de Canas, com cerca de 16 hectares, está inserida nas freguesias de Santo António dos Olivais e Torres do Mondego. Quase em anexo, a povoação do Picoto dos Barbados partilha a sua área por dois espaços: um, mais nobre e ajardinado, e outro que é caracterizado pela cobertura verde das várias espécies de árvores que atualmente compõem a mata. De início, a mata desempenhava uma tapada de caça para a coroa portuguesa, sendo ainda hoje possível ver as fundações do que seria o “pavilhão de apoio” à caça, e era composta essencialmente por vegetação espontânea. A necessidade de obras nas margens do Mondego, a fim de evitar as cheias do rio, levou a que o estado português no século XVII a adquirisse. A mata, “que tinha aqui bons pinheiros”, revelava-se como um local ideal para a exploração de madeira para as ditas obras, relata António Ribeiro, o vigilante da

natureza responsável. Nessa altura “era um terreno limpo, porque se aproveitaram os pinheiros, e não havia a preocupação que hoje temos com a conservação da natureza”, explica. Ainda nessa época, os interesses da universidade não ficaram alheios às potencialidades de Vale de Canas. O espaço começou a desempenhar papel importante como local de investigação científica. No terreno, “foram semeadas plantas exóticas (como o eucalipto e cedros) e também algumas sequóias, que eram árvores que praticamente não existiam em Portugal”, revela António Ribeiro. “Foram essas espécies que durante quase um século fizeram a Mata Nacional de Vale de Canas”, conclui o vigilante. Já em meados do século XX, o espaço foi ampliado. Foram adquiridos os terrenos circundantes, acrescentando mais dez hectares aos seis já existentes. “A mata foi transformada, fizeram-se muitos trilhos e foram colocadas mesas em vários pontos. Era uma mata quase monumental porque eram árvores gigantes que estavam aqui”, lembra o vigilante. A Mata Nacional de Vale de Ca-

nas foi mudando sucessivamente de entidades gestoras, sendo atualmente gerida pelo Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF). Hoje, assume uma função educativa junto das escolas. “O serviço [ICNF] criou aqui instalações que ao longo destes vinte anos receberam milhares e milhares de alunos, principalmente do primeiro e segundo ciclos”, diz António Ribeiro. Na sua opinião, essa função educativa “foi uma ajuda muito grande para a juventude da cidade, pelo menos na parte do primeiro contacto com a natureza e o conhecer algumas espécies”, refere o vigilante, dando como exemplo o caso da salamandra-lusitana. Esta espécie, única na Península Ibérica, pode ser encontrada junto aos cursos de água da parte mais remota da mata.

Incêndio de 2005

Composta essencialmente por várias espécies de eucaliptos, “a mata era estrondosa e tinha grandes exemplares desta espécie”, explica o vigilante. Aquando do incêndio de 2005, que devastou a área envolvente da cidade, este es-


16 de julho de 2013 | Terça-feira | a

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vale de canas paço verde também foi, em grande parte, afetado. “O fogo deixou a mata de rastos e mesmo o jardim, que é a zona mais nobre, ficou completamente devastado”, recorda António Ribeiro. Apesar da destruição alguns, exemplares sobreviveram ao incêndio e exemplo disso é um dos eucaliptos, considerado o mais alto da Europa, que está classificado como Arvoredo de Interesse Público na base de dados do ICNF. O panorama da flora foi alterado após 2005 e, segundo o vigilante, optou-se por reflorestar a área com variadíssimas espécies. “O ICNF entendeu que iríamos tentar plantar espécies que eram da nossa flora autóctone, essencialmente castanheiros, carvalhos e muitas cerejeiras”. A recuperação da área florestal mostrou-se lenta, não só pelas características físicas do terreno mas também pelo processo de limpeza e retirada das árvores queimadas. “Felizmente conseguimos plantar toda a área, temos já sítios onde se nota um bom serviço e que requerem agora muito trabalho, já que essas plantas não têm um crescimento tão rápido”, adita António Ribeiro.

Devolver a foca à mata

Com uma nova mata, surge agora o desafio de recuperar o interesse junto da população da cidade. E os estudantes, que no passado eram parte ativa na vida da mata, são um dos públicos alvo. António Ribeiro recorda os tempos em que esse contacto era mais frequente. “Vamos lá para Vale de Canas, vou lá mostrar-te a foca” era uma forma de os estudantes, num ato de brincadeira, dizerem que iam a mata. “Traziam a namorada”, conta o vigilante, referindo que este “era um sítio engraçado”. “Na verdade, não há nenhuma foca, mas quem vinha de fora da cidade não sabia: a foca era outra”, conclui. A estória da foca chegou mesmo a ser recriada com a elaboração de um mapa do espaço, onde o animal marinho com um capa e uma borla na cabeça surge como o ícone principal. De forma a justificar o afastamento atual da comunidade estudantil da mata, o vigilante aponta alguns “desafios” que a cidade oferece, tal como centros comerciais e bares. Ainda assim, após o incêndio, houve uma certa aproximação de certos grupos de estudantes “que fizeram um projeto e mostraram a sua disponibilidade em ajudar na recuperação da mata”, admite António Ribeiro. O vigilante ressalva a intenção, pois “tudo isso ajudou a chamar à atenção das pessoas que era necessário intervir na altura”. Para além de ser um espaço verde perto da cidade com funções, não só recreativas, mas também desportivas, a Mata Nacional de Vale de Canas dispõe de ligações através da rede de autocarros da cidade e é, António Ribeiro garante, “um local aprazível e um sítio muito bom para estudar”. com Rafaela Carvalho

Para além de ser um espaço verde perto da cidade com funções, não só recreativas, mas também desportivas, a Mata Nacional de Vale de Canas dispõe de ligações através da rede de autocarros da cidade e é, António Ribeiro garante, “um local aprazível e um sítio muito bom para estudar”.


18 | a cabra | 16 de julho de 2013 | Terça-feira

cinema

artes

Bling Ring: o gangue de Hollywood”

De Sofia Coppola Com Emma Watson Katie Chang Israel Broussard Estreia: 8 de Agosto de 2013

Oh não, outro filme de adolescentes criminosos!

“O

Profundo Mar Azul” é um dos lançamentos de DVD deste verão que foge à leveza e banalidade de muitos filmes da época, o que talvez possa ser justificado por chegar a estas bandas com dois anos de atraso, quem sabe pela estação errada. Estaremos perante uma Inglaterra ressacada no pós-guerra, por 1950, espelhada nas interpretações de Rachel Weisz (Hester), Tom Hiddelston (Freddie) e Simon Russell

OUTRAS SUGESTÕES

ver

João Ribeiro

A

s gerações mais novas representam, invariavelmente, o falhanço da educação e dos valores que guiaram as suas predecessoras. A geração que viveu a Segunda Guerra pôs as mãos à cabeça quando viu os seus filhos a abandonar tudo por mais uma passa em Woodstock; mais tarde, os outrora defensores do amor livre desesperaram com a indolência e passividade da Geração X. Hoje, clama-se contra uma geração mimada, educada pelas celebridades e que vive à procura de excessos. “The Bling Ring”, “uma história que não poderia ter acontecido há 10 anos”, aparece precisamente como esse alerta. As palavras são da realizadora Sofia Coppola, que se baseou na história verídica de um grupo de cinco adolescentes de Los Angeles que assaltou várias mansões de algumas das maiores estrelas de Hollywood. Entre as vítimas estão Lindsay Lohan, Megan Fox e Paris Hilton. Esta última tem até uma pequena participação no filme e esteve presente na

Beale (Sir William) que compõem um triângulo amoroso despoletado por um casamento afectuoso porém frígido entre Hester e o seu marido juiz. A protagonista busca colmatar as suas necessidades num romance erótico com um jovem piloto cravado de marcas deixadas pela segunda grande guerra. Marcas essas que são um território comum dos esporádicos filmes do inglês Terrence Davies, que já não realizava desde 2000, e aqui volta a apostar no espaço em que melhor se

sua apresentação em Cannes. Os comportamentos rebeldes e iconoclastas da geração Facebook têm despertado a atenção do mundo dos adultos. Séries como “Skins” ou o filme “Spring Breakers” vêm reescrever a forma como são representados os adolescentes nas décadas do novo milénio. Longe vão os tempos das narrativas típicas do highschool, pontuadas pelas divisões entre nerds e populares e que culminavam na noite do baile de finalistas, uma espécie de Juízo Final para menores de 17. Os adolescentes são representados hoje de uma forma muito mais cínica, amoral e perigosa. Se antes já eram apresentados como mimados e caprichosos, movidos pela sociedade de consumo, agora isso parece já não chegar. Há uma atracção inexorável pela quebra das regras pelo simples prazer de transgredir. O que nos vale é que, em poucos anos, estes mesmos miúdos hão-de estar a realizar filmes sobre os perigosíssimos comportamentos dos jovens dessa época.

move. Sem extras (o que pode encurtar o interesse), este DVD dará todo o seu espaço à história baseada na peça escrita em 1952 por Terrence Rattingan e leva-nos a crer que estaremos perante grandes interpretações, sobretudo a de Weisz ou não tivesse sido ela nomeada para os Globos de Ouro deste ano pela sua interpretação como Hester Collyer. Um mar que não se adivinha calmo, só falta mesmo saber de que tamanho serão as ondas.

Terra Prometida

OUTRAS SUGESTÕES Só Deus Perdoa De Nicolas Winding Refn Com Ryan Gosling Kristin Scott Thomas Yayaying Rhatha Phongam Estreia: 25 de Julho de 2013

The Iceman De Ariel Vromen Com James Franco Chris Evans Michael Shannon, Estreia: 1 de Agosto de 2013

De Terrence Davies

O Profundo Mar Azul”

Com Rachel Weisz Tom Hiddelston Simon Russell Beale 2013

Um mar que não lembra o verão camila fizarreta

Homem de Ferro 3

Sete Psicopatas

De Gus Van Sant

De Martin McDonagh

De Shane Black

Com Matt Damon Frances McDormand

Com Sam Rockwell Colin Farrell

Com Robert Downey Jr. Gwyneth Paltrow

2013

2013

2013


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feitas

D

ler

Repave”

epois de um excelente disco, a outra banda de Justin Vernon (o famoso falsete melancólico de Bon Iver) parte à aventura de um novo disco. Aqui, o paradigma muda. Depois de vários anos a compor música à distância, culminando com o lancamento de “Unmap”, em 2009, os Volcano Choir assumem-se agora como uma “entidade viva”, compondo da forma tradicional e mais orgânica, em vez de pensar a composição tendo como objecto final a visão de algo construído em estúdio. Com o tema “Byegone” como aperitivo, é possível verificar que existe uma maior preocupação na estrutura e concepção da música, que augura De uma direcção oposta à exploVolcano Choir ração de texturas e conjugação harmónica dos instrumentos, Editora apostando mais no apelo direcJagjaguwar. to que a canção, guiada prin2013 cipalmente pela voz (ditada em simples linhas melódicas), transmite. Com um nome que aponta para uma certa renovação (sendo “Repave” a repavimentação da sua estética), pode esperar-se deste disco uma intensa jornada, liderada por uma voz harmonicamente inquieta, abrilhantada por uma banda super maturada que parece estar cada vez mais segura do caminho que toma. “Repave” é editado a 2 de Setembro, com o selo da editora Jagjaguwar. JOSÉ MIGUEL SILVA

OUTRAS SUGESTÕES Blurred Lines De Robin Thicke

V

A Fascinante Construção do Eu”

erão é praia, sol, mulheres lindas em biquini, mulheres lindas sem biquini. Verão é tempo também de boas literaturas de areia, tempo de encher o espírito, não basta encher a vista. “A Fascinante Construção do Eu”, de Augusto Cury, é a proposta certa para colocar no ‘tabelier’ durante a vigem, na estante da casa-de-banho ou na pochete. Augusto Jorge Cury, para os mais desatentos, é médico, psiquiatra, psicoterapeuta e escritor. Na súmula de todas estas disciplinas, traz mais um ‘best-seller’ garantido para o escritor brasileiro mais lido da década . O seu trabalho na Teoria da Inteligência Multifocal sobre a construção de pensamentos, qualidade de vida e devolvimento da inteligência. “A Fascinante Construção do Eu” não é novidade para o público brasileiro, com a primeira edição em 2010, mas só agora chega às livrarias em Portugal pela

De Augusto Cury Editora Lua de Papel 2013

OUTRAS SUGESTÕES

ouvir

Lua de Papel. Cury sabe o que o “Eu” comanda a vida e quer mostrar como mantê-la sob controlo, treinar a mente para enfrentar as dificuldades. “Quantas vezes entra numa espiral que não conseguiu controlar?” é uma das muitas questões que Cury responde nestas maravilhosas páginas de introspecção e procura do ‘carpe diem’. Para pais e filhos, divorciadas ou estudantes, esta é a peça que faltava na estante e numa vida com final feliz. Se os exames não lhe correm bem, se a sua vida amorosa está em baixo, se descobriu que vai ser pai, se descobriu que só tem mais cinco dias úteis de vida (neste caso não compre, pois não terá tempo de o acabar), se o problema de quem procura este livro é sono, Ausgusto Cury deixa a nota: “você pode brigar com o mundo, mas se você brigar com a sua cama, você vai perder”. Filipe Furtado

Lobo vermelho

A Felicidade em Albert Camus De Marcello Duarte Mathias

De Liza Marklund

Editora Dom Quixote

Editora Porto Editora

2013

2013

Jogar

2013

WHERE YOU STAND De Travis 2013

AM De Arctic Monkeys 2013

Paracosm De Washed Out 2013

D

epois de uma sucessão de infelizes falhanços, parece que Suda51 vai finalmente retomar a linha virtuosa que inaugurou com “Killer7”. A singular repetição do tema do Assassino, aqui interpretado como um bizarro James Bond cibernético, parece indicar o retorno a esse espaço estéti“Killer7 está co mais sóbrio, negro morto?” e (esperamos) menos populista. Nada deKiller is Dead monstra esta viragem tão distintamente como (Xbox360, PS30) o estilo visual adoptado: uma espécie de ‘neonscuro’ hiperbolizado até ao infinito em cores garridas e deliciosamente digitais. Hélas, esta nova obra não rejeita elos de continuidade com patetices recentes: mantém-se a sexualização barata do pior ‘anime’ e o banal ‘hack-and-slash’. Questionamo-nos então: será “Killer is Dead” obra do autor de “Killer7”, ou temos de engolir mais um devaneio do puto reguila que fez “No More Heroes”, esse estandarte do pornoludismo “cool” nos videojogos? RUI CRAVEIRINHA

A

nunciar ‘GTA V’ como um jogo sobre o qual pairam as grandes expectativas deste verão seria um pouco redundante. A crer em todos ‘trailers’, antecipações e mais diversos anúncios, ‘GTA V’ é o jogo do ano. É como se a Rockstar tivesse ouvido atentamente as “Saudades de los preces de todos os fãs e tivesse enfiado tudo santos” o que o que a série teve de bom num só jogo. Grand theft auto 5 Estão lá a expansão e os meta-cenários do (Xbox360, PS30) ‘San Andreas’, ou a jogabilidade do ‘IV’. E há novidades, como um sistema de jogo multi-personagem, ou um modo online capaz de concretizar o desejo mais caótico de Talia al Ghul. A crer em tudo o que a Rockstar vem anunciando, ‘GTA V’ é mais que merecedor de uma pré-encomenda com todos os requintes. Perante tudo isto, é bom que a Rockstar saiba cumprir a sua promessa, sob pena de apresentar mais um fracasso para a colecção. Perdoar duas vezes seguidas não é fácil, e os fãs de ‘GTA’ são tudo menos bons João Miranda cristãos.


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16 de julho de 2013 | Terça-feira

soltas entre a arregaça e o calhabé

Como um dedal de ferro, saltitando num mundo de papel

Por Bacharel Jorge Gabriel

D

urante a vida, vamos passando em várias casas, quais peças num tabuleiro gigante de Monópolio, seremos o carrinho ou o dedal, talvez a bota perdida e desemparelhada, decerto não o simpático canídeo. Os dados rolam e lá vamos nós, um, dois, três, quatro, cinco, tentando alicerçar os hotéis da nossa vontade numa qualquer rua Augusta, procurando evitar a companhia das águas. Pelo meio, virando as

cartas da sorte, ou do azar, que alguns vão até directamente para a cadeia, sem passar na casa de partida e sem receber os tão desejados dois contos. Serve esta portentosa e inusitada alegoria para dizer que o acaso nos vai levando de porta em porta e nós lá o seguimos, a maior parte das vezes, às cabeçadas nas paredes dos corredores. De certos passadiços fugimos a catorze pés, outros há onde semeamos as raí-

zes do gosto. Sempre a viver entre o fugir e o ficar, nesse fio onde balança a frágil existência, compassada ao toque de um par de dados, sem que, durante a maior parte do tempo, nos apercebamos sequer do ritmo. Às vezes, quando envoltos nas sombras do vale das mantas, quando revemos o chorrilho de coincidências que nos levou até onde estamos, nessas alturas ganhamos perspectiva, e apenas aí

sussurramos, a vida tem coisas do camandro. Somos mesmo pequenos, pensamos, um pretensioso grão de areia em rumos voláteis, em fugas e permanências, em voltas infinitas de ampulheta, e sussurramos, realmente, a vida tem coisas que vai lá vai. Tudo isto porque há casas e casas, e poucas há que tratemos por esse nome. Normalmente, são até essas as que mais nos dizem, suprema ironia que através de tão

parcas sílabas. Porém, também as outras nos vão marcando, em salas grandes e pequenas, reza a máxima intemporal, aqui transladada de outros âmbitos, que o tamanho não interessa. Maior ou menor o espaço entre as paredes, o que nos marca é o que tais paredes guardam, e mais nem se deveria dizer sobre o assunto, sob pena do discurso entrar no campo romântico-diabético-parolo. Tudo isto porque nos vamos juntando no espaço entre as paredes. Onde conhecemos outros com os mesmos gostos, com as mesmas ambições. Onde partilhamos objectivos comuns, e sempre se partilha mais do que um solitário objectivo se cabeças pensam em conjunto, duas serão melhores do que uma, e se mãos trabalham em conjunto, também quatro serão melhores que duas, vinte melhor que dez, quarenta melhor que vinte. Entre paredes, muito se passa. Cada casa diferente e irrepetível. Por vezes, há ‘performances’, Tourette e Photoshop. Noutras ocasiões, há gritos estridentes, auscultadores no máximo e o sol a espreitar por trás do vidro. Também há cigarros a fumegar, copos de plástico branco e telefones a tocar de manhã. E há paredes, muito já se falou delas, forradas a papel. E há um papel que se respira, uma ideia em celulose que nunca nos deixará.

*Por escolha do autor este texto não segue as regras do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

16 JUL

“The Red Army/PFLP: Declaration Of World War” Cinema Ateneu • 22h00 Entrada livre

16 JUL

“La Valse/A Sagração da Primavera” Cinema/Dança TAGV• 21H30 12€ C/ Descontos

18 JUL

“Nó Cego” Música Salão Brazil 22h30 • 5€

16 17 e

JUL

“Sr. Ibrahim e as Flores do Corão” Teatro TCSB • 21h30 10€ C/ Descontos

18 19 e

JUL

“Silêncio Insurrecto” Recital de Poesia Casa da Escrita • 21H30 Entrada livre (limitado a 35 lugares)

cultura

23

por

JUL

“Cordis & Cuca Roseta” Música Anfiteatro Colina de Camões 21h00 • 15€ C/ Descontos

25 JUL

“O Rei no Exílio - Remake” Teatro TAGV • 21h30 7€ C/ Descontos

25 26 e

JUL

“1325” Teatro TCSB • 21h30 10€ C/Descontos

29 JUL

“O Desprezo” Cinema Quebra-Costas • 22h15 Entrada Livre

27 JUL

“Jeffery Davis Trio” Música TAGV • 21h30 4€ C/ Descontos


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soltas

O último a chegar

micro-conto

Por Manuel Jorge Marmelo A Edgardo Apolónio sucedeu-lhe, certa vez, aborrecer-se de ser injustamente considerado um contista obscuro e sem talento nenhum. Convidou por isso um selecto grupo de intelectuais para jantar em sua casa, esperando que o convívio mais íntimo com outros autores pudesse melhorar a sua reputação. Pôs a mesa com os pratos melhores, os menos esmoucados, os únicos talheres que possui, guardanapos de papel e os copos que conseguiu

tomar de empréstimo entre os vizinhos, ainda assim lamentáveis e pouco adequados à importância da reunião. O primeiro convidado a chegar foi o escritor mais ou menos consagrado e muito folgazão, ao qual Apolónio secretamente confiara uma parte considerável do sucesso do convívio. Era famoso por contar anedotas picantes e dirigir elegantes galaneios a senhoras e meninas de qualquer idade, podendo ser de

grande serventia para a animação da conversa e para a descontracção geral — desde que não bebesse para além da conta e não acabasse por se tornar inconveniente. Chegou encharcado e anunciando que iniciara um programa rigoroso de controlo do peso, que o impedia de tocar em bebidas alcoólicas. Aliviado, Apolónio tomou-lhe das mãos o sobretudo e o chapéu de chuva, disse-lhe que ficasse à vontade e correu a abrir a ILUSTRAÇÃO POR ANDREIA PRATA

porta aos outros convidados, que vinham igualmente molhados e apressados pela inclemente borrasca. Ao fim de algum tempo os convivas estavam quase todos reunidos na acanhada sala de Apolónio. Conversavam animadamente em volta da mesa, servindo-se com parcimónia da única garrafa de vinho, mas não se atreviam a sentar-se sem que chegasse aquele que tardava. O escritor que devia contar anedotas discorria sobre finanças, mas, em compensação, a mulher do ensaísta austero sorria excessivamente, namoricando o dono da casa, o escritor mais ou menos consagrando, o tradutor taciturno que recusara o aperitivo e bebericava um copo de sais de frutos e até mesmo a poetisa vaporosa que tinha fama de ambivalente e lírica. No exterior a chuva continuava e ouviam-se ocasionais relâmpagos: A mulher do ensaísta começou a ficar um pouco ébria logo ao fim do primeiro copo, tendo apalpado discretamente, pelo menos uma vez, a nádega direita do tradutor com problemas digestivos precoces. Quando, por fim, se ouviu a campainha, o anfitrião pediu licença aos demais e foi abrir a porta ao último convidado, o que ainda faltava. Os outros receberam-no festivamente, erguendo os copos quase vazios e dizendo que já não era sem tempo. A poetisa ambivalente sugeriu até que o jantar devia estar frio e seco como o cadáver de uma velha de noventa anos. Quando o retardatário entrou na sala, todos repararam que não trazia guarda-chuva nem gabardina, e que vinha, ainda assim, completamente enxuto — mas não disseram nada. Compreendram que o último convidado era apenas um personagem da ficção e que, ainda por cima, tinham sido convocados para um conto tão pobre que talvez nem tivesse orçamento para lhes pagar o jantar.

Manuel Jorge Marmelo 42 anos Em dezembro de 2012, Manuel Jorge Marmelo sentiu-se assomado pela melancolia e escreveu no seu blog “Teatro Anatómico” que “seria capaz de passar a vida inteira a escrever, sem necessidade de fazer outra coisa para além deste matraquear dos dedos nas teclas do computador, desta espécie de música que se mistura com o remoinho do vento nos braços nus das árvores, com o rumor da chuva e com as sirenes das ambulâncias passando ao longe”. Na realidade, a vida de Manuel Jorge Marmelo foi desde cedo dedicada ao “matraquear” dos dedos num teclado. Nascido em 1971, na cidade do Porto, é jornalista desde os 18 anos e escritor publicado desde os 25. Entre as suas principais obras contam-se “As mulheres deviam vir com livro de instruções” (1999) que se encontra na décima edição; “O Silêncio de um Homem Só” (2004) galardoado com o Grande Prémio do Conto Camilo Castelo Branco; e “Uma Mentira Mil Vezes Repetida”(2011), um dos seus mais aclamados romances. “Somos Todos Um Bocado Ciganos” (2012) é o seu mais recente livro. No texto acima referido, Marmelo diz-nos ainda: “seria feliz se pudesse viver de escrever e fotografar. Mas não posso. Não dá. Ocorre-me que devia, ao menos, ter nascido rico ou com talento”. A verdade é que a vida de Manuel Jorge Marmelo tem sido mesmo passada à volta das palavras. Rafaela Carvalho


22 | a cabra | 16 de julho de 2013 | Terça-feira

opinião uma ideia para o ensino superior João Gabriel Silva • Reitor da Universidade de Coimbra

Reorganizar para desenvolver

A

necessidade de uma reorganização da rede do ensino superior é um tema recorrente em Portugal. Em regra gira à volta da afirmação da existência de demasiada oferta pública, do desperdício de recursos com cursos sem alunos, e a necessidade de concentrar esses mesmos recursos num conjunto restrito de escolas, para que possa existir em Portugal ensino e investigação ao nível dos melhores do mundo. A estas observações respondem os que se sentem visados, em regra escolas do interior do país onde há de facto poucos alunos, dizendo que a saída dessas escolas de regiões demograficamente frágeis levaria essas regiões a um declínio terminal. Está subjacente a ideia de que as escolas procuradas por mais alunos são melhores do que as procuradas por menos alunos. Se os estudantes procurassem, acima de tudo, a melhor escola para obter a sua formação superior, essa escolha se-

ria uma excelente indicação para se saber quais as escolas de maior qualidade. Sabemos no entanto que assim não é. A qualidade da escola tem seguramente um papel importante na escolha dos candidatos ao ensino superior, mas não é a razão principal. A proximidade à área de residência é o fator decisivo. Basta ver que, por exemplo, a percentagem de estudantes de Lisboa na Universidade do Porto é residual, e o mesmo se verifica nas Universidades de Lisboa em relação a estudantes vindos do Porto. As razões disso são óbvias: o grande custo de frequentar o ensino superior não são as propinas, que aliás não variam de forma relevante entre as várias escolas, mas sim os custos de alojamento e alimentação, caso tenham de sair de casa para ir para a Universidade. Ficando em casa dos pais os custos são muito inferiores, pelo que a universidade mais próxima, mesmo que esteja longe de ser a

melhor, é em regra a escolhida. Outra razão menos óbvia é de raiz cultural mais profunda. Em alguns países, o momento da independência em relação aos pais é a entrada na universidade. Muitas vezes, mesmo que entrem numa universidade na mesma cidade onde moram com os pais, os estudantes saem de casa e passam a viver numa residencial estudantil, num quarto ou até em apartamento próprio. É o caso de países como a Alemanha, a Noruega ou os Estados Unidos. Países mais ricos que Portugal, poder-se-á dizer. Mas em Portugal, mesmo os estudantes com condição económica para o fazer raramente o fazem. Há menos espírito de aventura, menos vontade de independência a não ser para sair à noite, e a sociedade genericamente só espera esse momento de independência com o primeiro emprego. Não vale por isso a pena olhar para as preferências dos estudantes portugueses para determinar quais são as melhores universida-

des, pois apenas conseguiremos identificar quais as universidades que têm mais população nas redondezas. Fechar os cursos que atraem menos alunos não significa, por isso, preferir as melhores escolas. Significa beneficiar os grandes centros populacionais e dar mais um passo no processo de desertificação do interior do país. Reconheço, no entanto, que o país não pode ignorar que manter cursos sem alunos é desperdiçar recursos que são escassos. Se há oferta excedentária, ela tem de ser encurtada. A questão que se levanta é, no entanto, a de decidir quais cursos fechar. Os dos grandes centros, ou os dos outros locais? Em alguns casos dever-se-ia fechar os dos grandes centros, não os do interior. Uma verdadeira opção pelo desenvolvimento do país seria definir que a oferta pública de qualidade em algumas áreas do conhecimento deveria estar fora de Lisboa e do Porto. Colocar

no interior escolas de qualidade teria um efetivo efeito de promoção de desenvolvimento do país. Reconheço que a grande maioria das escolas do interior, por muitas razões, não têm qualidade internacional. As regras para estas novas escolas teriam de ser muito mais exigentes; não poderiam ser meras agências de emprego para os caciques locais. É possível criar essas escolas de grande qualidade fora das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto. Algumas já existem. Quer Portugal aceitar este desafio, de desenvolver todo o seu território e inverter o processo concentracionário em duas grandes áreas metropolitanas? O mínimo que podemos dizer é que esse processo de concentração, que tem vindo a concretizar-se há tantos anos, não trouxe ao país o desenvolvimento desejado. Penso que Portugal é demasiado pequeno para prescindir da grande maioria do seu território.

Arquivo - Felipe grespan


18 de junho de 2013 | Terça-feira | a

cabra | 23

opinião

Editorial O amargo sabor do fim

A Cabra errou: Na edição 262, na rúbrica Uma Ideia para o Ensino Superior foi erradamente atribuído o último parágrafo a Carlos Camponez. Na verdade, o final do texto era da autoria de José Torres Farinha.

É fecho da edição. O artigo já devia ter entrado há muito, tem 50 caracteres a mais e falta um título. A paginadora grita, nós ouvimos e voltamo-nos para o computador. Já são 7h25, o café pouco efeito faz, quanto mais as bebidas energéticas. As faculdades falham-nos, mas ala que isto tem de seguir para a gráfica cedo. É preciso concentração, é preciso condensar muito em pouco. Assim se passou mais um ano de trabalho na Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra (AAC). Quinzenalmente, a equipa do Jornal Universitário de Coimbra – A CABRA -esforçava-se por apresentar uma publicação abrangente, completa e irreverente – como se tem feito de há 22 anos para cá. Nem sempre foi fácil, é certo. Os erros foram muitos, prontamente reconhecidos perante todos, sem entrar nas banalidades de se poder errar porque se é humano. O ano não foi fácil para nós nem para nenhuma secção desta casa. Durante todo este tempo – pelo menos aquele que compreendeu setembro de 2012 ao mês presente -, assistimos a um desinteresse geracional dos estudantes pelas atividades que lhes são oferecidas (!) logo no início do ano. A ânsia dos “doutores” pelo medo dos caloiros, a correria aos bares da Sá da Bandeira ou, simplificando, a vontade de, como se diz por aí, não fazer nenhum porque “ah e tal, o primeiro ano é dado” não é compatível com o trabalho que, ao mesmo tempo, se começa a desenvolver nas secções da AAC (e que às vezes começa ainda no verão). Mas compreende-se. A vida universitária começa a deslumbrar-nos cedo, a malta quer é aproveitar porque o curso só tem três anos. É Bolonha, a culpa é de Bolonha!

Condensaram-nos a aprendizagem, só temos aquele tempo e pronto. Antes desse malfadado processo de harmonização das estruturas de ensino superior europeias, havia alguns que relaxavam: “com calma vamos lá, se ficar mais um ano, não há crise”. O problema é que agora há. E essa crise tem vindo a castrar orçamentos e a asfixiar as (pobres) universidades. A indexação do valor da propina à taxa de inflação também tem que se lhe diga. A educação não é um bem transacionável, não deve aumentar consoante a inflação. Já vamos para os 1066

A educação não é um bem transacionável, não deve aumentar consoante a inflação”

euros e nem os Serviços de Ação Social nos acodem, porque “o seu processo foi indeferido” são as novas palavras de ordem. Para quem se viram os estudantes? Para os dirigentes associativos. São os seus representantes, são eles que podem levar a voz dos estudantes às mais altas instâncias e bater o pé. Deviam fazê-lo. Porém, nem sempre acontece e as razões são várias: falta capacidade de mobilizar, faltam ações concretas, falta, acima de tudo, alguém que nunca desista. E foi faltando isso pela academia mais antiga do país. A discussão perdeu-se, e, aí, voltamos à tal situação da malta não querer fazer nenhum e viver apenas na sua zona

de conforto (como quem diz a Praça da República). Como já foi referido ao longo deste ano letivo no Jornal A CABRA, a AAC é apenas um microcosmos do que se vive no país. Portanto, se o desinteresse generalizado pelas coisas que estão ao nosso lado já tem as proporções e consequências que tem, o que dizer, então, do efeito que terá no quotidiano nacional? Fica no ar, em jeito de reflexão – para quem ainda se dá ao trabalho. E voltamos ao início. É um círculo vicioso que, dia após dia, consome as secções e as deixa dormentes. As dificuldades financeiras, especialmente naquelas que praticam desporto e que os nossos dirigentes se orgulham de “levar o nome da Académica além-fronteiras”, agravam ainda mais o problema, obrigando ou a cessarem funções por períodos de tempo indeterminados ou a reinventarem-se, cortarem aqui e ali e a ter de pôr dinheiro do próprio bolso – quando não têm de o fazer. Numa cidade relativamente pequena como Coimbra, a AAC é das poucas associações que oferece e premeia a população com uma oferta cultural e desportiva vasta: há teatro, há rádio, há yoga, por exemplo; pratica-se tiro com arco, pesca desportiva e radiomodelismo, entre outros. É disso que nos orgulhamos e é isso que apregoamos por aí. Se há tanto orgulho, se há tanta vontade de espalhar a mensagem, porque é que a deixam morrer lentamente? Vocês, estudantes. Os momentos passam, as saudades ficam, como se dizia em maio de há três anos. Mas é só isso que fica. E um canudo para dizer que são “doutores”. Valha-nos agora que somos Património Mundial da Humanidade. Por Ana Duarte

Aos visados e leitores, as nossas desculpas. A Direção Cartas à diretora podem ser enviadas para

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Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA Depósito Legal nº183245/02 Registo ICS nº116759 Diretora Ana Duarte Editora-Executiva Ana Morais Editores Rafaela Carvalho (Fotografia), Liliana Cunha (Ensino Superior), Daniel Alves da Silva (Cultura), João Valadão (Cidade), Carolina Varela (Ciência & Tecnologia), António Cardoso (País & Mundo) Paginação António Cardoso, Carolina Varela, Catarina Carvalho, Rafaela Carvalho Redação João Martins, Joel Saraiva, Pedro Martins Fotografia Ana Morais, Carolina Varela, Catarina Carvalho, Daniel Alves da Silva, Rafaela Carvalho, Inês Martins Ilustração Andreia Prata Colaboradores permanentes António Matos Silva, Bruno Cabral, Camila Borges, Camilo Soldado, Carlos Braz, Catarina Gomes, Fábio Rodrigues, Filipe Furtado, Inês Amado da Silva, Inês Balreira, João Gaspar, João Miranda, João Ribeiro, João Terêncio, José Miguel Pereira, José Miguel Silva, Luís Luzio, Manuel Robim, Rui Craveirinha, Tiago Mota Publicidade Ana Duarte - 239828096/239410437 Impressão FIG - Indústrias Gráficas, S.A.; Telefone. 239 499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: fig@fig.pt Tiragem 4000 exemplares Produção Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra Propriedade Associação Académica de Coimbra Agradecimentos João Gabriel Silva, Manuel Jorge Marmelo


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FUSING: Um conceito diferente de festival

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Perfil: Fernando marques, o fotógafo da cidade

Balanço desportivo da época das secções da académica

Fotorreportagem: os candeeiros perdidos por coimbra

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as adversidades da classificação da alta coimbrã

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Mata nacional de vale de canas: a recuperação da fauna e da flora depois do incêndio de 2005

acabra.net PÁG. 16 E 17


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