28 de fevereiro de 2012 • ANo XXi • N.º 241 • QUiNZeNAL GrATUiTo direTor cAmiLo soLdAdo • ediTores-eXecUTivos iNês AmAdo dA siLvA e João GAspAr
INNOVNaNO
acabra
A primeira fábrica de nanotecnologia portuguesa Pág. 15
JorNAL UNiversiTário de coimbrA
Movimentos estudantis defendem manifestação em Lisboa a 24 de março
Inês AmAdo dA sIlvA
Presidente da direção- geral da AAC, Ricardo Morgado, defende agenda de três dias criada por dirigentes associativos. AACção, A Alternativa És Tu e FAE defendem reivindicação nas ruas
N
uma altura em que o processo de atribuição de bolsas continua a marcar a atualidade, realiza-se na próxima quarta-feira, 7, a primeira Assembleia Magna (AM) do mandato de Ricardo Morgado enquanto presidente da direção- geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC). Os movimentos estudantis de
Coimbra consideram que a situação é grave e que a “luta de gabinete” já não resolve. Apesar de existir uma comissão, criada no Encontro Nacional de Direções Académicas que define uma agenda de três dias de ações (ainda não é conhecida), para assinalar os cinquenta anos do dia do estudante, os movimentos entendem que, para marcar o dia,
deverá haver uma manifestação na capital. No entanto, Ricardo Morgado explica que a DG/AAC está vinculada ao que foi decidido no último mandato, mas que essas atividades vão ser apresentadas em AM. É ainda colocada a hipótese da participação da AAC na greve geral convocada pela CGTP para dia 22 de março. Pág. 5
Jacinto Lucas Pires
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À procura da vida alternativa PP. 12 e 13
além frONteIras
INstItUtO Camões
sem-aBrIgO
Emigração: de novo A língua ao sabor de Esforços para desígnios económicos contrariar o estigma na ordem do dia
OCUC
BOlsas INVestIgaçãO
Regalias só na época ABIC pede estatuto especial de setembro de trabalhador
Exilados políticos, durante a época do Estado Novo, Amadeu Sabino, José Morais, Jorge Sousa e Manuel Paiva, chegaram à Bélgica e por lá consolidaram as suas carreiras. Hoje, voltam a Portugal e incentivam os jovens para a emigração, com uma facilidade de oportunidades que eles não tiveram acesso na altura.
Limitada pelos constrangimentos orçamentais, a ação do Instituto Camões nem sempre enaltece a posição da língua homónima como sexta mais falada no mundo. Perante a “inércia arrepiante” do governo em termos de promoção da língua, há a falta de uma verdadeira vontade política que não insista em adiar iniciativas.
Perante uma sociedade que ainda não despertou para a dimensão do problema social dos semabrigo, as associações da cidade tentam contrariar o estigma e unem esforços para continuar a assistir quem mais precisa. Através de um trabalho de proximidade, as equipas de rua envolvem-se no seio deste problema.
Os alunos contemplados com o estatuto de estudante integrado em atividades culturais só vão ter direito à época do segundo semestre. A vice-reitora para a Cultura e Comunicação diz que é a única maneira de o estatuto vigorar ainda este ano letivo. O prazo para a entrega de candidaturas individuais termina hoje.
PP. 2 e 3
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A Associação de Bolseiros de Investigação Científica (ABIC) exige contratos de trabalhos para os investigadores bolseiros. A reivindicação encima um leque de outros pedidos entregue numa petição na AR. Pág. 6
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Mais informação em
acabra.net
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destaque
40 anos depois,
emigrar é ma
Num tempo em que emigração volta a ser palavra de ordem, quatro portugueses que abandona na clandestinidade mas atualmente advertem aos mais jovens que as barreiras territoriais não AnA MorAis
E
m dezembro de 2011, Pedro Passos Coelho aconselhou os portugueses a emigrarem para o resto da comunidade lusófona no mundo. Na última semana, Cavaco Silva mostrou-se surpreendido com os níveis de desemprego jovem no último trimestre e disse esperar que a solução para este problema não seja a mudança de vida para outro país. A primeira declaração suscitou um certo alarmismo, a segunda, uma esperança de retórica política. Muitos entenderam que o alarme do primeiro-ministro não deveria t e r sido dito, ou-
tros anuíram. Todavia, emigrar terá agora outras implicações do que há 40 anos atrás. Portugal já não vive em ditadura, a população cresceu e a competitividade alargou a olhos vistos. Ter fronteiras territoriais poderá já não se justificar. Será preciso procurar lá fora o que não nos é oferecido cá dentro? “Tivemos de passar fronteiras, vocês podem ir lá fora e ficar cá dentro”. Quem o diz são aqueles que na época se viram obrigados a fazê-lo. Não gostam de ser apelidados de estrangeirados. Esse termo, que consideram pejorativo, designa a preferência por tudo o que é do exterior em detrimento do nacional. De igual modo não se sentem exilados. Foram obrigados a deixar a pátria por culpa de um Estado que reprimiu, partindo em busca de um destino com mais liberdade. Ser apátrida também é uma posição não aceite. Desprendem-se de amarras que os obrigam a ter uma pátria concreta, uma origem demarcada ou uma língua mãe. Dizem “levitar” acima da terra e das fronteiras. A negatividade pode parec e r inconclusiva, contudo, o desejo exprimido é
“Qualquer nacionalismo hoje é um grande perigo. E é subtil” Amadeu Lopes Sabino
o de não existir uma categoria para a sua condição. Amadeu Lopes Sabino, José Morais, Jorge de Oliveira e Sousa e Manuel Paiva são portugueses que se cruzaram lá fora.
Trilhos de uma nova vida “Era como carne para canhão”, conta Lopes Sabino quando relembra o período em que foi enviado para uma frente de combate colonial em Nampula - norte de Moçambique. Depois de ser preso pela PIDE em 70 incorporou um regime de disciplina militar que serviu de preparação para a guerra. Uma vez que era anti-regime, foi enviado para o terreno desarmado. Era, por isso, um alvo fácil. Não viu outra saída se não desertar. José Morais foi expulso do Partido Comunista Português devido a divergências com a linha ideológica do próprio partido. Após cinco anos na clandestinidade e a ser perseguido pela polícia política, não entreviu outra hipótese que não fosse abandonar o país. Quanto a Jorge Sousa e Manuel Paiva o risco não era imposto pela perseguição. Viver num país sem liberdade era incompatível com os seus princípios. Abandonaram o país de forma consciente para afirmar a posição de que partilhavam. Seguiram para outra terra com o próprio passaporte, ao contrário dos seus compatriotas. No entanto, o sentimento de desafio era compartilhado, como reaviva Jorge Sousa: “íamos sem saber o que encontrar, com meios muito limita-
dos”. Por facilidade de recursos, Jorge, Manuel e José escolheram a Bélgica como novo lar. Em Bruxelas e Louvain desenvolveram os seus estudos e por lá foram consolidando carreiras de sucesso. Todos conseguiram chegar à docência catedrática nas universidades onde se sediaram. Amadeu passou pela Suécia, onde começou a estudar. Ditaram as circunstâncias que rum a s s e tam-
quem todos esperam para encontrar a saída para o marasmo cívico.
“Agora, em Portugal, há liberdades. O que não há é oportunidades” José Morais bém à Bélgica onde exerceu advocacia. Há pouco tempo, os caminhos destes quatro portugueses entrelaçaram-se em terras belgas. À partida, as hipóteses de se reunir um neuropsicólogo, um politólogo, um advogado e um cientista seriam remotas, mas com um passado de exílio comum e com semelhanças no percurso académico, decidiram juntar-se e contar as suas estórias num livro. “À espera de Godinho”, recria o mito sebastianista transpondo-o para os dias do agora. Godinho é aquele por
Cidadão europeu Alargar oportunidades ao mundo. É assim que os quatro perspetivam o presente para os que possam levar a bagagem para fora das origens. A globalização de possibilidades é, hoje, mais atual do que no tempo deles. “Nós somos cidadãos e o espaço é aberto. É comum”, clarifica Jorge Sousa. Evidencia que no agora não se devem ter receios. Ao começar uma nova vida, num outro país, dizem que se devem desbravar os medos de quem se possa circunscrever a uma só terra.
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ais do que atravessar fronteiras
onaram o país no Estado Novo apresentam, hoje, as suas visões sobre o fenómeno. Emigraram ão podem ser impedimento. Por Liliana Cunha e Ana Morais Ao comparar as diferentes conjunturas que o país já viveu, José Morais versa sobre a incipiente oferta - “agora em Portugal há liberdades, o que não há é oportunidades. E isso é um problema”. Ainda assim, “o sistema, hoje, é um mercado internacional com vantagens e desvantagens. E é aí que temos de existir”, responde Jorge Sousa. Os quatro, depois d e
exilados políticos, os quatro conseguiram o suporte necessário para não estarem sozinhos no início desta nova etapa. “Essa convenção tem uma importância enorme na nossa vida”, partilha Amadeu. Com ela a obtenção de autorização para a saída do país residente era mais facilitada.
“Só encaro o futuro de Portugal integrado na Europa” Manuel Paiva viverem e cimentarem as suas vidas desamarrados de um só país, idealizam um espaço amplamente extensível, liberto de barreiras físicas. “É fazer todo o possível para aproveitar no contexto internacional, o desenvolvimento do país”. Segundo o mesmo, com este sistema global não se retêm os cidadãos nacionais. Dão-se-lhes ferramentas para se desenvolverem onde quer que existam oportunidades, sem “particularidades”. E daí chega a defesa de um espaço europeu já instituído, que muitos ainda não tiveram capacidade para nele avançar: “só encaro o futuro de Portugal integrado na Europa”, insiste Manuel Paiva. Com a extensão de fronteiras, o risco de fuga dos mais qualificados ou ditos cérebros está latente. “Se a economia não fornece as oportunidades para absorver essa mão-deobra, mais vale que essa pessoa vá rentabilizar o trabalho onde é necessário”, propõe Jorge. Porém, José Morais faz questão de vincar que “é missão de um governante fazer o máximo possível para criar as oportunidades a fim de que a economia se desenvolva”. Jorge Sousa, em resposta, apresenta como solução a posterior volta dos mesmos para o desenvolvimento do país.
Firmar uma carreira Ao abrigo da Convenção de Genebra, que pressupõe proteção aos
“Soube que podia beneficiar de uma bolsa do governo belga e apanhei logo o primeiro comboio para Bruxelas”, valoriza Manuel. O tal comboio foi apanhado um dia antes das aulas começarem. Assim que chegou foi dotado de uma bolsa de estudos, superior à dos estudantes da capital da Bélgica. José Morais também usufruiu de condições extraordinárias, conseguiu inscrever-se na mesma universidade já os prazos tinham encerrado. O regime deste país de acolhimento revelou-se “fundamental” para todos. Além da instituição da Convenção de Genebra, havia outra condição importante para receber os que abandonavam os regimes fascistas da época – o estatuto de refugiado da Organização das Nações Unidas (ONU). Apesar destas ajudas, viram-se obrigados a trabalhar para suportar os custos de vida de um qualquer estudante. Já com um filho, José foi o que mais batalhou - “no primeiro ano não pude ir muito às aulas, porque dava aulas de português e trabalhei na ópera de Bruxelas com os figurinos”, confessa. Do lado da Flandres, em Louvain, Jorge Sousa teve de trabalhar como operário fabril, embora tivesse por lá família. “Fiz serviço de limpeza num hospital”, revela Amadeu Sabino para compensar a falta de dinheiro. Só Manuel Paiva não precisou de trabalhar, uma vez que a bolsa cobria todas as despe-
sas - “tenho um sentimento de reconhecimento em relação à Bélgica e à minha universidade”, partilha. As valências académicas de todos fizeram com que fosse possível ascender a uma nomeação para os cargos de assistência nas suas faculdades. A partir daí, o curso da carreira desenrolou-se de forma natural. Alcançaram a cátedra rapidamente. O francês nunca foi problema, as aulas e os artigos científicos que desenvolviam eram neste idioma, que dizem ser como uma segunda língua materna. A consciência e persistência de cada um levou a que ganhassem destaque internacional nos seus campos de formação. “Pus o dedo na engrenagem”, é desta forma que Manuel conta o seu contributo na Agência Espacial Americana (NASA). Tinha ideias que só possuíam aplicabilidade fora de órbita e nesse laboratório pôde expandilas. Numa área distinta, Jorge também conquistou reconhecimento. Depois de receber um convite da recém-formada Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, que nunca se finalizou, decidiu candidatar-se à ONU. Como único português na corrida, conseguiu o cargo numa das comissões.
Povos distintos Mesmo com divisões territoriais e linguísticas – região francófona e flamenga - a Bélgica nunca comportou o peso de uma ditadura. O sentimento de soberania próprio de um determinado povo não é por aqui sentido. Como país fundador da União Europeia sempre se cimentou a ideia de comunidade, favorável à integração de várias culturas e vários povos. “O povo português não é muito diferente do europeu”, alega Amadeu Sabino. Apesar de ter estado quase 40 anos na opressão, Portugal e a Europa aproximaram-se há cerca de duas décadas pela visão mais alargada – a adesão à comunidade. Jorge, como conhecedor dos meandros da história da política europeia, acrescenta que a integração portuguesa na comunidade “fez parte da consolidação da democracia”. Recu-
sam a ideia do isolacionismo ao qual Portugal foi colado durante o Estado Novo, uma vez que consideram que este desvaneceu com “o crescimento do espaço europeu”. Portugal é um país oprimido? “Não, ele é, é deprimido”, adverte Jorge. O gene nacional de povo conformado tende a esbater. Exemplo disso é a crescente adesão do povo à luta pública pelos seus direitos.
Que futuro José Morais expõe duas visões para o futuro do país: uma desejável e uma realista. O seu desejo exprime-se pelo pensamento além Europa - “Portugal nas relações com o resto do mundo, em particular com as ex-colónias portuguesas”. Porém, a realidade prevista prende-se com o nada - “sei apenas que está nas vossas mãos”, aponta José. “Qualquer nacionalismo hoje é um grande perigo”, atenta Amadeu, acrescentando que se manifesta de forma “subtil” na sociedade moderna. Quis o destino que abandonassem o lugar onde nasceram. Entre a clandestinidade e o risco, conseguiram vingar em terras comunitárias. Com persistência e trabalho desenvolveram as suas carreiras um pouco por todo o mundo. Conhecem vários povos e deles extraem as suas riquezas, no entanto, não fazem questão de identificar um país como só seu, uma única pátria como sua. Amadeu Sabino conclui “ubi bene ibi pátria [a nossa pátria é onde estamos]”.
“Nós somos cidadãos europeus e o espaço é aberto, é comum” Jorge de Oliveira e Sousa
Mais do que fugir, era afirmar uma posição Na época do “orgulhosamente sós”, Salazar queria manter como propriedade de Portugal as colónias ultramarinas. Era preciso mobilizar os jovens para as frentes de batalha. Esta mobilização, tendo em conta a política ditatorial do Estado Novo, consistia num ato de obrigação. Quem ousasse não cumprir, era fortemente punido. No entanto, Amadeu, José, Jorge e Manuel estavam convictos dos seus princípios e não estavam dispostos a alinhar numa frente que consideravam não ter em conta os direitos fundamentais, como a liberdade dos povos em questão. Assim, não encontraram outra solução se não deixar o país – “a atitude base era recusar participar num exercício militar em que nós, em consciência, não podíamos aderir”, assevera Jorge Sousa. José Morais, depois de ter vivido alguns anos em clandestinidade e de participar ativamente na política antifascista, abandonou Portugal com “um passaporte muito bem falsificado”. O mesmo faz questão de salientar a solidariedade das várias pessoas que por ele correram perigos, para enganar o Estado. “A pessoa que me deu o passaporte não me conhecia e correu um risco”, conta José. “Eu saí por um caminho de cabras, explorado por contrabandistas e seguido por um grupo de antifascistas, ligados ao Partido Comunista Português e outras organizações de esquerda que punham pessoas lá fora”, partilha Amadeu Sabino, ao relembrar o dia do exílio. Jorge e Manuel não tiveram a necessidade de sair clandestinamente. Ainda assim, os riscos foram semelhantes – “saí de Portugal sem dizer à minha mãe que ia e quando podia voltar”, confessa Jorge. Todos fazem questão de vincar que o exílio não foi uma fuga à guerra – “não havia uma fuga, havia a afirmação de uma posição política”, vinca Amadeu Sabino. Jorge Sousa faz questão de evidenciar os riscos consequentes desta escolha – “havia um grande desafio, com uma margem muito grande de risco e de aposta”.
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EnSinO SuPEriOr
Rankings universitários baseados na taxa de empregabilidade Carlota rebelo
CDS-PP quer plataforma que disponibilize informação. Partidos da oposição afirmam que os rankings estabelecem lógicas mercantis e introduzem assimetrias no sistema Inês Balreira
as propostas que têm surgido na ar suscitam dúvidas nas bancadas
Atualmente, o facto de se possuir uma licenciatura já não é sinónimo de emprego garantido. Assim, um dos factores que os estudantes têm em conta no momento da escolha de um curso superior é a empregabilidade. Neste sentido, o Partido Popular (CDS-PP) apresentou uma proposta à Assembleia da República, no passado dia 22, na qual se sugere que o Ministério da Educação e Ciência (MEC) disponibilize uma aplicação informática aos candidatos ao ensino superior (ES) que contenha informação, nomeadamente a taxa de empregabilidade dos cursos. Com a informação disponível, “cada candidato poderá, através dos critérios por si selecionados, encontrar um ranking pessoal de instituições e cursos”, refere o deputado democrata-cristão e responsável pelo projeto, Adolfo Mesquita Nunes. O deputado do CDS-PP explica que “se esta medida for aceite pelo parlamento e o governo a puser em prática, vai existir uma escolha mais informada”. Quanto aos critérios utilizados na recolha da informação para a aplicação, o deputado explica que vão ser utilizados “critérios que espelhem a multiplicidade de fatores que um candidato leva em conta na hora de fazer escolhas”. Adolfo Mesquita Nunes diz ainda que “o Estado não deve
impor critérios, apenas disponibilizá-los, cabendo a cada candidato selecionar os que lhe parecerem mais relevantes”. Segundo o deputado, a informação vai ser fornecida pelas instituições e pelo MEC, “obedecendo a uma metodologia previamente fixada”. Mesquita Nunes adianta também que a aplicação informática vai permitir a cada candidato “estabelecer um peso relativo para cada um dos critérios e cruzar informações”, de maneira a criar rankings. O deputado ressalva que se tratam de classificações “que espelham os critérios do candidato e são meramente indicativas”. “Cada candidato poderá, depois, fazer a opção que entender. Se um candidato pretender não levar em conta o critério da empregabilidade, está no seu direito”, assevera.
Proposta não é consensual Apesar de o CDS-PP querer os candidatos informados para uma escolha mais consciente, a proposta apresentada gerou algumas dúvidas nas restantes bancadas parlamentares. O deputado do Partido Comunista Português (PCP), Miguel Tiago, afirma que “os rankings vieram introduzir distorções nos sistemas que classificam, nomeadamente no ES, hierarquizando as instituições e introduzindo assimetrias”. “A partir do momento em que começamos a distorcer a missão das instituições de ES (IES) colocamo-las umas contra as outras, a captarem clientes para pagar propinas”, refere o deputado comunista. A deputada do Partido Socialista, Inês de Medeiros, duvida, por sua vez, da “noção de empregabilidade dos cursos de ES”, e como é que essa noção vai ser medida. “São
muito poucos os cursos que correspondem a uma profissão específica e, portanto, o que é que se entende por empregabilidade?”, questiona. Relativamente à questão da empregabilidade, Miguel Tiago defende que existe um conjunto de áreas do saber, como as ciências sociais e humanas, atualmente de baixa empregabilidade, que são fundamentais à sociedade. “A empregabilidade é baixa porque o Estado desistiu das suas tarefas nessas áreas”, critica o deputado do PCP. A deputada do Bloco de Esquerda, Ana Drago, considera que a “questão dos rankings estabelece uma lógica mercantil dentro das IES”, nomeadamente em situações que os estudantes não podem escolher por não terem condições financeiras. Ana Drago diz que cada vez mais a escolha da formação superior é feita exclusivamente através do critério financeiro das famílias dos estudantes. “Quem tem dinheiro, estuda, quem não tem, não estuda, e isto é uma negação do que são as oportunidades do acesso à educação numa sociedade democrática”. Por sua vez, o deputado do Partido Social Democrata, Emídio Guerreiro, defende que a possibilidade de criação de rankings “cria mecanismos de escolha e melhoramento de práticas, no sentido de as IES recuperarem indicadores relativamente umas às outras”. “Não podemos continuar a desperdiçar recursos em coisas medíocres. As IES que não estão a funcionar tão bem têm de funcionar a um patamar mais elevado, o que conduz à reestruturação da rede de IES”, assevera. No entanto, o deputado afirma que os rankings “têm de ser multifuncionais e devem analisar várias vertentes em simultâneo”.
OCUC: regalias só na época especial do segundo semestre O prazo de entrega das candidaturas individuais para o estatuto termina hoje. Contudo, o Observatório da cultura já está a analisar os processos Inês Balreira Os estudantes que forem contemplados com o estatuto de estudante integrado em atividades culturais não vão poder beneficiar da época especial de exames já em março, que diz respeito ao primeiro semestre, podendo apenas beneficiar da condição na época
especial de exames do segundo semestre. A vice-reitora para a cultura e comunicação, Clara Almeida Santos, explica que é a única alternativa “para que se consiga ainda aplicar o estatuto no presente ano letivo”. No entanto, o Observatório da Cultura da Universidade de Coimbra (OCUC) já está em funcionamento, estando em fase de apreciação dos pedidos de estudantes que tenham condições para beneficiar dos direitos especiais previstos nos estatutos do estudante integrado em atividades culturais no âmbito da UC e da Associação Académica de Coimbra (AAC). O estudante representante do conselho cultural da AAC no OCUC, Igor Pereira, mostra-se oti-
mista, afirmando que “o observatório vai proceder à avaliação das candidaturas até ao final de março”. No entanto, o vice-presidente da direção-geral da AAC, Samuel Vilela, mostra alguma reserva quanto à celeridade de avaliação dos processos e ao tratamento dos dados por parte dos serviços académicos. “Tenho acompanhado o processo que os serviços académicos estão a desenvolver para inserir as épocas especiais no inforestudante e no passado dia 18 ainda faltavam muitos processos”. Porém, o dirigente afirma que “tem havido um esforço da parte dos serviços centrais para resolver o problema”. O processo de candidatura ao estatuto desenvolveu-se em duas
fases, sendo que no passado dia 13 terminou o prazo de candidatura de grupos, nomeadamente secções culturais e organismos autónomos, e hoje é a data limite para as candidaturas individuais. Samuel Vilela explica que “houve alguma confusão em relação às candidaturas de grupo e às candidaturas individuais, que não foram bem esclarecidas pela universidade”. “As candidaturas individuais são para estudantes que não estão envolvidos diretamente numa secção ou organismo, mas que desempenhem alguma atividade que a UC reconheça e possam beneficiar do estatuto”, aclara o vice-presidente. Clara Almeida Santos esclarece que no estudo das candidaturas “o OCUC vai analisar duas dimen-
sões: as atividades demonstradas pelos candidatos no ano letivo anterior e do plano de atividades para o ano em curso”. Dependendo destes fatores vai ser concedido ao estudante um escalão – A, B ou C – consoante o relevo da atividade que desenvolve. O estudante indigitado para o observatório afirma que com a implementação do estatuto de estudante cultural “se acaba com uma injustiça antiga e abusiva”. “Muitas pessoas simplesmente por pertencerem a uma direção de secção ou direção-geral têm acesso direto a épocas especiais”. Igor Pereira afirma que desta maneira “os estudantes que dão um contributo a nível cultural para a UC e AAC veem a sua atividade recompensada”.
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EnSinO SuPEriOr AssembleiA mAgnA nA próximA semAnA
Movimentos estudantis apontam para manifestação em Lisboa
na próxima quarta-feira, 7, realiza-se a primeira Assembleia Magna (AM) do mandato de ricardo Morgado enquanto presidente da direção - geral da AAC (DG/AAC). Morgado defende agenda criada por dirigentes para 24 de março mas movimentos estudantis defendem ação de reivindicação nas ruas. Por Camilo Soldado
A
discussão no órgão máximo de decisão dos estudantes irá começar a definir a agenda da política educativa da AAC para este ano. O processo de atribuição de bolsas continua a marcar a atualidade e Ricardo Morgado acredita que, depois de já ter reunido com o ministro e grupos parlamentares, a chegada, ou não, a um consenso está para breve. Caso os objetivos dos estudantes não sejam atingidos, o presidente da DG/AAC admite que “talvez se tenha que adotar outras medidas”. Para os movimentos estudantis, essas outras medidas passam por uma manifestação em Lisboa. Para Renata Cambra, da Frente de Ação Estudantil (FAE), trata-se da “velha questão da via diplomática e negocial que se esgota sempre ao máximo”. Apesar das conversações encetadas por Ricardo Morgado com a tutela, Renata Cambra considera que ”nada disso está a resultar e é necessário haver uma manifestação o mais brevemente possível”. Apesar de, no Encontro Nacional de Direções Associativas (ENDA), ter sido criada uma comissão para organizar as atividades a levar a cabo na comemoração do cinquentenário do dia do estudante, Renata acredita que a questão pode ser contornada. Se uma mani-
festação nacional teria que passar pelo ENDA “a proposta seria de uma manifestação de estudantes de Coimbra em Lisboa”, sustenta. Também Catarina Ângelo, do movimento A Alternativa És Tu, acredita que a AAC tem de fazer mais que “ir ao gabinete”. No que toca às ações a determinar para o dia do estudante, 24 de março, Catarina Ângelo entende uma postura diferente do boicote às aulas, que foi levado a cabo no ano passado. “Teve algumas pessoas, algum sucesso, mas não mete tanto medo como uma manifestação em frente à Assembleia da República”, defende a estudante. “A questão é perceber se a nova direção geral vai manter algum trajeto de reivindicação que Eduardo Melo conseguiu”, interroga Hugo Ferreira, do coletivo AACção. No entanto, o estudante ressalva que, apesar de nada ter sido discutido em concreto, o sentimento comum do coletivo “é que nesse dia exista uma grande manifestação nacional de estudantes”. Apesar de reconhecerem grande valor na iniciativa da Semana Zeca Afonso, os movimentos estudantis pedem uma postura mais reivindicativa da direção geral. O presidente da DG/AAC afirma que tem “mostrado insatisfação em todos os momentos que pode” e que o governo “sabe qual
é a posição da académica”. No caso concreto do dia do estudante, Ricardo Morgado explica que a DG/AAC está vinculada ao que foi decidido no último mandato, mas que essas atividades vão ser apresentadas em AM. Sem ter ainda uma agenda fixa, Morgado anuncia que foram definidos três dias de atividades, “um em Lisboa, outro no Porto e outro em Coimbra”.
Num universo de 5961 candidatos à bolsa, já form rejeitadas 1259 candidaturas Atrasos nas bolsas Segundo dados dos Serviços de Ação Social da Universidade de Coimbra, a 5 de fevereiro de 2012, num universo de 5961 candidatos a bolsa, já tinham sido rejeitadas 1259 candidaturas, o que significa um indeferimento de 34,18 por cento dos pedidos. O presidente da académica critica o “chutar de responsabilidades de uns para os outros” dos órgãos responsá-
veis pelo processo de atribuição de bolsas. Quanto às afirmações do Ministro da Educação e do Secretário de Estado do Ensino Superior, segundo as quais haveria menos abandono no ensino superior por questões de carência económica, Ricardo Morgado classifica-as como “ridículas”. Hugo Ferreira avalia o processo de atribuição de bolsas como sendo “um desastre”, e considera esta AM importante para ver “que caminho é que a DG está disposta a percorrer”. O elemento do coletivo AACção acredita que é possível ultrapassar as forças de bloqueio no ENDA de 16, 17 e 18 de março, tendo em vista uma manifestação nacional. “As grandes academias estão a percorrer um caminho mais suave”, aprecia Catarina Ângelo, mas acredita que “não é preciso uma grande academia para fazer a luta”. Para Renata Cambra, “a violência que a sociedade em geral sofre, os estudantes em particular”, veio tornar mais óbvia a necessidade de aderir à greve geral, convocada pela CGTP para 22 de março. André Costa, do movimento Desperta a AAC, explica que o coletivo ainda não reuniu no sentido de tomar uma decisão sobre a continuidade e forma do projeto, pelo que entende, para já, não prestar declarações sobre a AM. rafaela Carvalho
a primeira assembleia Magna do mandato de ricardo Morgado é a 7 de março
DG/AAC cria novo espaço de discussão para núcleos Inês Balreira A direção-geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC) encontra-se a preparar mais um espaço de debate na academia – um fórum de debate exclusivo para os núcleos. O espaço de discussão, tomado como ‘Estados Gerais’ vai ter lugar nos próximos dias 3 e 4 de março. O coordenador do pelouro da Política Educativa e responsável pela iniciativa, Tiago Martins, afirma que o “objetivo fundamental” da criação deste novo espaço de debate é “fomentar a discussão e a formação dos núcleos mas também ouvir as suas necessidades”. “Com este fórum de discussão pretendemos trazer os núcleos para a discussão política. Apesar de esta não ser uma competência estatutária consideramos que os núcleos têm toda a competência e direito de se pronunciar internamente sobre estas questões”, acrescenta o dirigente. Para Tiago Martins “não faz sentido ser a DG/AAC a tomar um rumo
político sem ouvir e discutir com os núcleos”, pois trata-se uma “visão umbiguista e que enfraquece a própria AAC”. Neste sentido, o coordenador do pelouro de Política Educativa realça a importância dos núcleos para a AAC: “os núcleos são extremamente importantes, pois permitiram à Académica adaptar-se ao aumento exponencial do número de estudantes mas também à fragmentação de locais e espaços da universidade”. “Se a Académica se continua a manter perto dos estudantes deve-se muito ao trabalho dos núcleos”, acrescenta Tiago Martins. Apesar de já existir o fórum anual da academia – o Fórum AAC – o responsável pelo projeto considera que são iniciativas distintas. “Os estados gerais diferenciam-se do Fórum porque se realizam no início do mandato e o Fórum debate outro tipo de questões e não se cinge só aos núcleos”, afirma Tiago Martins. Sendo a primeira vez que se realizam os estados gerais, o dirigente considera “prematuro adiantar se vai haver mais edições do fórum”, pois é preciso ter em consideração a “aceitação dos núcleos para este tipo de atividade”. Quanto ao modelo de funcionamento e programa do fórum o dirigente afirma que vão ser apresentados primeiro aos núcleos, amanhã,em conselho internúcleos.
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ENSINO SUPERIOR
ABIC reivindica contratos de trabalho CarlOta rebelO
O bolseiro de investigação continua “a fazer tarefas permanentes nas instituições em que deveria estar a contrato”, segundo Paulo Martins
Bolseiros de investigação reclamam estatuto de trabalhador. Presença assídua no discurso político, a ciência ora é solução, ora entrave em termos financeiros Ana Francisco Responsável pelo grosso das tarefas técnicas e práticas associadas à atividade científica, o bolseiro de investigação desempenha um papel fundamental no sistema científico e tecnológico nacional. Porém, o bolseiro continua a não beneficiar de um estatuto profissional, vendo-se limitado pelos recursos financeiros disponíveis e pela fragilização das condições de trabalho e poder de compra. A atribuição de contratos de trabalho encima o leque de reivindica-
ções presentes na petição entregue no dia 13 de fevereiro pela Associação de Bolseiros de Investigação Científica (ABIC) na Assembleia da República. Considerando o estatuto de bolseiro “desadequado da realidade atual”, a direção da ABIC acredita que esta alteração permitiria uma “maior dinamização do mercado de trabalho científico”. Desde a falta de proteção social dos bolseiros, que “neste momento só dispõem de segurança social de voluntário”, ao défice de segurança em caso de desemprego e doença, passando pela ausência de subsídio de férias, de natal e desemprego, são várias as restrições impostas a estes investigadores apontadas pela presidente da ABIC, Ana Teresa Pereira. A situação “precária”, como caracteriza o representante da ABIC em Coimbra, Paulo Martins, coloca grandes entraves aos investigadores que “continuam a fazer tarefas permanentes nas instituições em que deveriam estar a contrato”, sendo o seu número cada vez maior. Os obs-
táculos não ficam por aqui. Ana Teresa Pereira lembra que “um bolseiro pode ter dificuldade no acesso à habitação e outro tipo de crédito bancário, visto que, não tendo um contrato de trabalho, alguns bancos não consideram a bolsa como um rendimento”.
Reivindicar o trabalho Uma cobertura adequada da segurança social, a atualização dos subsídios de bolsa em consonância com as remunerações dos restantes trabalhadores nacionais, bem como a participação nos órgãos colegiais de acolhimento, fazem parte das sugestões da ABIC ao propor uma alteração do estatuto do bolseiro de investigação. A petição foi recebida pela comissão parlamentar da ciência e cultura e vai ser discutida em plenário. A direção da ABIC espera que os vários grupos parlamentares apresentem propostas legislativas que vão de acordo com as suas reivindicações. “Já reunimos com todos os grupos e
tivemos uma receção positiva de todos eles, embora não haja nenhum compromisso específico”, afirma a presidente da associação. O vice-presidente da ABIC, André Janeco, salienta a importância em incentivar o trabalho dos investigadores “para que não emigrem”, contribuindo assim para a degradação da ciência em Portugal. O vice-presidente destaca que “as bolsas já não são atualizadas há 10 anos”, o que faz com que haja uma perda do poder de compra de 25 por cento devido à inflação. “Aquilo que os atuais bolseiros fazem é trabalho e deve ser essa a sua condição”, defende.
Uma solução para a crise Numa conjuntura económica pouco favorável, os cortes orçamentais não poupam a ciência, pelo que o principal obstáculo à aceitação das medidas reivindicadas é, segundo a Ana Teresa Pereira, “um impedimento económico”. “Um contrato de trabalho impediria que o bolseiro tivesse mais descontos para a segurança so-
cial e como tal teria de receber um salário básico superior”, explica. É, portanto, com uma postura apreensiva que vê o futuro da ciência em Portugal quando as alterações implicam um maior gasto por parte dos ministérios. O vice-reitor da Universidade de Coimbra (UC) para a investigação e terceiro ciclo, Amílcar Falcão, destaca a importância da investigação na economia nacional, havendo um “reconhecimento generalizado” desta área apesar dos constrangimentos financeiros atuais. Apesar disso, garante a preocupação da universidade em procurar soluções: “a UC precisa dessas pessoas e não tem lógica que andem indefinidamente com contratos pouco seguros, de dois, três anos”. “Investir na ciência e em quem a faz deveria ser uma prioridade”, Paulo Martins garante que os bolseiros que investigam produzem riqueza com valor acrescentado e que a longo prazo se vai “obter frutos desse investimento”.
UC dinamiza licenciaturas-sanduíche Programa de Licenciaturas Internacionais (PLI), que promove duplas licenciaturas entre Portugal e Brasil, continua este ano com a segunda edição Joana Cabral Babo Inês Filipe O PLI é uma iniciativa promovida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), vinculada ao Ministério da Educação do Brasil, e pela Universidade de Coimbra (UC), apoiado pelo Grupo Coimbra de Universidades Brasileiras. Segundo a Chefe de Divisão de Rela-
ções Internacionais, Imagem e Comunicação (DRI) da UC, Filomena Marques de Carvalho, este programa tem como objetivo “estimular projetos de melhoria do ensino e da qualidade na formação inicial de professores, promovendo o intercâmbio de estudantes” dos dois países. Atualmente estão em Coimbra 480 estudantes de várias universidades brasileiras que se candidatam anualmente à CAPES, responsável por selecionar as candidaturas. Após um ano no Brasil, os alunos ficam aptos a frequentar dois na UC, regressando depois ao seu país de origem para um último ano de estudos. Ao todo, devem completar 240 ECTS nos cursos de Estudos Portugueses e Lusófonos, Estudos Artísticos, Matemática, Física, Química, Biologia, Ciências da Educação ou Ciências do Desporto.
No fim deste programa, os alunos obtêm um diploma de primeiro ciclo do curso que estão a frequentar em Portugal e uma licenciatura no Brasil. As licenciaturas-sanduíche, como também são denominadas, pretendem solucionar um problema de falta de professores de ensino secundário no Brasil, tornando a formação mais atrativa. “Ao vir para Coimbra passamos por várias dificuldades que ajudam no enriquecimento pessoal e profissional. Estou em biologia e sinto uma grande diferença em termos de professores e de recursos já que temos acesso ao Jardim Botânico e ao algário”, aponta Thiago Pli, estudante da Universidade Federal de Uberlândia, a frequentar uma licenciatura-sanduíche. Os alunos que participam neste programa de mobilidade recebem apoios financeiros, nomeadamente uma bolsa
total, por parte do CAPES e da DRI. Segundo Filomena Marques de Carvalho, até agora, o balanço do programa tem sido positivo. Os professores revelam-se satisfeitos com o desempenho dos estudantes que se mostram responsáveis e motivados, influenciando positivamente os colegas portugueses. No entanto, só no final deste ano, com o regresso dos estudantes da primeira edição do PLI ao Brasil, é que será apurada a taxa de sucesso. No Brasil são 34 as universidades que promovem as licenciaturassanduíche, entre elas a Universidade de São Paulo e a Universidade do Estado do Rio de Janeiro. “Este programa desenvolveu-se inicialmente só com a UC, tendo recentemente a CAPES alargado o programa a outras universidades portuguesas. Assim, em sequência desse alargamento, foi recente-
mente celebrado um Memorando de Entendimento entre a CAPES e o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, em janeiro de 2012”, explica a prorreitora da Universidade de Lisboa (UL), Luísa Cerdeira. No ano letivo de 2012/13, a UL planeia abrir vagas para este programa pela primeira vez. Thiago Pli afirma ainda que teve professores muito bons no Brasil mas que nunca tinham abandonado o país. “Sempre desejei vir para Portugal num programa de mobilidade pela língua e pela cultura. Estar aqui em Coimbra é muito especial, abre horizontes, permite conhecer pessoas novas”, acrescenta. O estudante defende também que só quando entrar no mercado de trabalho é que irá notar o quanto este programa de mobilidade foi benéfico para a sua formação.
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CULTURa rafaela CarvalhO
“A carreira é para os autocarros” Ana Duarte João Gaspar Jacinto Lucas Pires veio a Coimbra para apresentar “Adalberto Silva Silva”. Para a hora de conversa , qualquer café servia. Apareceu uma Boutique dos Leitões, nome que bem poderia estar num qualquer escrito de Jacinto. Sem pretensiosismos nem discurso a partir de um altar, houve políticos de pronto-a-vestir, revoluções desejadas, o absurdo da nossa realidade e a escrita de flechas com pós de riso. Falando da peça, diz que “Adalberto Silva Silva” é um espetáculo de realidade. Porquê? É brincar com a ideia de “realityshow”, porque o teatro é sempre uma realidade. O ator primeiro apresenta-se como se estivesse num telejornal. É uma peça totalmente teatral, é teatro pobre, mas que, ao mesmo tempo, usa o formato televisivo. Há um conflito entre o ladoespetáculo e o lado-realidade, o lado real do teatro ao vivo, não estamos protegidos pela superfície da tela. Contudo encontramos também o absurdo. Ele faz parte da realidade? É o absurdo do quotidiano, do mundo real. É o absurdo de estarmos num sítio chamado “Boutique dos Leitões” [risos]. Tem muito a ver, acho eu, com o encontrar esse absurdo e depois, a partir daí, a partir de um zoom que fazemos nesses absurdos microscópicos, como a “Boutique dos Leitões”, chegarmos a algo mais essencial. As questões
sérias que às vezes parece que têm que vir sempre em maiúscula... como é que podemos tratá-las em minúsculas? Acho que tem de haver atenção ao mundo, mas depois tem de haver uma recriação de um ponto de vista. Mas, em relação à peça, basta ligarmos a televisão e vermos um desses programas de espetáculos de realidade e aquilo é de um absurdo... começa a música e de repente está toda a gente feliz [bate palmas]. Isso é o dia-a-dia da televisão, aplausos, aplausos... Para o que existe, acho que a televisão podia ser melhor e não é por culpa das pessoas. É como se diz no futebol, “é o sistema”[risos]. A televisão é um espelho daquilo que nós somos. No último livro, “O Verdadeiro Ator”, parece que os acontecimentos reais foram ao encontro, ou até ultrapassaram no tempo, a própria história que escrevia, visto que falava em manifestações públicas e em desagrado nos políticos... Sim. Quer dizer, ultrapassaram e não ultrapassaram. Não chegámos à revolução, mas houve manifestações que se prolongaram. Em relação à realidade, é criar uma espécie de túnel. Está-se a ver a realidade por outro prisma como se fosse difícil ver a realidade assim ao ar livre, a partir daqui, da “Boutique do Leitões”. Mas, de repente, se tu pusesses aqui uma fechadura e se espreitássemos pela fechadura, isto tornava-se muito mais faiscante. No livro dizia que acontecia a tal revolução. Acha que vai acontecer na realidade? Eu gostava de achar que algum tipo de revolução ainda é possível. Não
quero dizer uma revolução como o 25 de Abril, mas acho que tem de haver alguma espécie de revolução. A revolução das pessoas quererem outra vez misturar as ideias com a paixão da mudança. Não sermos o Portugal que, tristemente, olha para os políticos como uns bandidos ou uns coitados carreiristas. Os tais políticos de pronto-avestir de que falava numa crónica, em relação a Santana Lopes... Não concordo com nada que o Santana Lopes fez e disse. Apesar de tudo, há nele uma personalidade qualquer e, nesse ponto de vista, é mais interessante do que os bonecos que estão agora no palco. Esses nem sequer gafes têm, nem sequer trapalhadas fazem. Alguém escreve no teleponto e eles não vão falhar porque falam pelo teleponto, não têm uma ideia sobre nada. Então que estilo de fazer política é Passos Coelho, se não um pronto-a-vestir? É um pronto-a-vestir, claro. Mas de linhas retas? Ainda mais, sem alfaiate. [risos] Ainda mais, sem costuras. Tamanho único. O Jacinto assume-se como de esquerda. Acha que para um artista é importante ter uma maior preocupação social? Aliás, neste momento, se calhar até é melhor associar-se à direita. Ou se calhar é melhor nem se ser artista. [risos] O artista tem que criar uma espécie de pergunta no mundo, um desequilíbrio qualquer no discurso dominante. Não é por acaso que o teatro nasce na Grécia quando a de-
mocracia nasce, e não é por acaso que os parlamentos são anfiteatros e seguem rituais teatrais. Numa sala, mesmo que estejam só os 24 gatos pingados habituais que vêem teatro, há uma ideia de comunidade. E isso é a política. Acho que em parte a crise do teatro tem qualquer coisa a ver também com a crise da política. Cada um quer estar no seu cantinho, a fazer de cidadãosiPod. Escreve para entreter ou para agitar ideias? Gosto de agitar mas sem que as pessoas sintam logo que vão ser agitadas. Que as pessoas se riam, mas que fique lá um ganchozinho, como quem se ri com uma flecha. Levou com um pó de riso e nós atiramos a flecha, mas o pó de riso era tão forte que não notou logo a flecha. Depois, vai para casa e diz: “Oh, tenho uma flecha!” [gesticula com a mão no peito]. Gosto que as pessoas acreditem mesmo na história, mas por outro lado que não fiquem só nessa batota do entretenimento puro. Já somos crescidos, já sabemos que teatro é teatro, que no cinema o comboio não vem mesmo contra nós. Isto são ideias. “Estão a ver esta ideia?” e depois pumba! Voltamos à história. Idealmente junta-se essas duas coisas, imagem e ideia, ilusão e distância. A ideia de carreira literária assusta-o? Não penso em carreira… aliás, é um problema. Eu não sou bom produtor de mim mesmo, o que às vezes é um problema - temos que pagar contas e ter vida. Acho que o importante é sobreviver, ter dinheiro suficiente para ter tempo para escrever. Ando sempre um pouco
nesse limite. E agora, numa altura que deveria haver mais hipóteses, parece que tudo é formatado pelo mesmo registo. Como se deixasse de haver cafés e passasse a haver só Starbucks aqui, em Tóquio e em todo o lado. Há que tentar romper com essa formatação plástica da “carreira” para falarmos mesmo de livros, de teatro, e deixar a carreira para os autocarros. No Jornal de Notícias, em 2002, disse que gostava de pensar que não se iria envergonhar daqui a uns anos... Em 2002 eu disse isso? Epá, então já estou envergonhado! [risos] Mas olha para trás e não sente qualquer embaraço? Não. Mas também não me ponho a ler as coisas que escrevi para trás um pouco por isso. Porque eu já não sou aquele. Às vezes, a ler em público o meu próprio trabalho, dou por mim a ler coisas como se já fossem de outra pessoa. Já passou um tempo e eu já não sou aquela escrita… mas não me envergonho e espero não me envergonhar amanhã. António Lobo Antunes, numa crónica, afirmou que sonhava ser como o José Águas da escrita. Tendo conhecimento da sua admiração por Pablo Aimar, também tem pretensões de ser o Aimar da escrita? [Risos] Seria, claro, um sonho. Mas não posso dizer tanto. Tenho que me pôr de joelhos ao pé das chuteiras do “El Mago”.... Sonhar assim tão alto seria de mais. Seria de mais? Seria…
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CULtURA
Diário da poetisa do Ipanema cá
cultura por 1
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“LUSoFALANtES” CoNCERto DE AbERtURA DA XiV SEMANA CULtURAL DA UC Tagv 21h30 5€ (CoM
deSConToS)
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“FúRiA” CineMa CaSa daS CaldeiraS 21h30 • enTrada livre
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“QUiNtA DoS CoNtoS CoM CARLoS MARQUES” leiTuraS aTeneu de CoiMBra • 22h enTrada livre
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“LoUCo NA SERRA” TeaTro pelo TeaTro do MonTeMuro TeaTro da CerCa de São Bernardo 21h30 S/ inforMação de preçoS
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MAR
“CoiMbRA SoLiDáRiA 2012” gala de BenefiCiênCia Tagv • 21h30 10 euroS
3 MAR
“ASSobio” MúSiCa fnaC • 22h
enTrada
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graTuiTa
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“MAL EMPREgADoS” TeaTro MuSiCal pelo TeaTro grupo d'orfeu CenTro CulTural doM diniS 21h30 • enTrada livre
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PASSPARtoUt PREto TaBaCaria
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MúSiCa oMT • 22h 5 euroS
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ELiSA RoDRigUES - HEARt MoUtH DiALogUES C/ ANtóNio ZAMbUjo MuSiCa Tagv • 21h30 10 euroS (CoM deSConToS)
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“o EStáDio” TeaTro
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TeaTro inédiTo do porTo TeaTro louCoMoTiva 21h30 • 5 euroS
Por Carlota Carreira Rebelo
No âmbito das residências artísticas realizadas pela Casa da Escrita, em parceria com a FLUC, a poetisa brasileira Lígia Dabul encontra-se em Coimbra até 29 deste mês. A estadia termina com a leitura de poemas da sua autoria. Por Daniel Alves da Silva
DanieLa siLva
“A
cordo muito cedo, por volta das seis da manhã. Vou à cozinha para tomar o café da manhã e volto ao meu apartamento para trabalhar”. Ainda só chegou a empregada de limpeza. Ela e a poetisa Lígia Dabul conversam um pouco: são as únicas pessoas que se encontram na casa, àquela hora. Entretanto, chega Teresa, a secretária da Casa da Escrita. Assim se vai estabelecendo o contacto com a rotina de trabalho da instituição, para depois sair, “caminhar por Coimbra e comprar tangerinas no mercado”. Entre as atividades na Casa da Escrita e na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC), a também antropóloga tenta “entrar na vida da cidade”. Descer as monumentais, atravessar a Praça da República, entrar no Jardim da Sereia. Caminhar. Conclui, acrescentando que “não temos ideias só quando nos sentamos para escrever.” É a primeira vez que Lígia Dabul sai do seu país para uma residência artística. Durante a primeira parte do programa, em Monsanto, o seu marido esteve presente na casa onde habitou, o que não acontece em Coimbra. “Aqui temos possibilidade de estar num isolamento, numa concentração na escrita que eu não poderia estar se estivesse com a minha família”. “Não estou numa casa, mas num ambiente literário”. É importante sair do quotidiano. É uma “suspensão que ajuda a concentrar um poeta na sua produção”, como ela mesma define. E o estar num país que fala a sua língua de uma maneira tão diferente, como a afetará? “Isso traz-me muito material para a escrita, suscita-me a escrita, interpela-me, porque estranhamos
É a primeira vez que Lígia Dabul sai do Brasil para uma residência artística. muito”, elucidou-nos a poetisa, sempre num português do Brasil. Na universidade, Lígia Dabul não se dedica apenas às conferências ou às suas pesquisas antropológicas. Entra em contacto com pessoas da área de Letras. “É muito interessante escutar pessoas que não são exatamente produtoras de poesia mas que a estudam, que ajudam na construção”, esclarece. Estar em Coimbra, com tantos estudantes estrangeiros, com tantas línguas que fazem parte da cidade “é tema e palavras que vão interferir” naquilo que a poetisa cria durante a residência artística. Lígia considera a casa um espaço onde tem bastante liberdade, um lugar “muito especial, to-
talmente voltado para a escrita”, e confessa ser “uma experiência muito boa para qualquer poeta vindo de outro lugar”.
Objetivo das residências artísticas A Casa da Escrita teve sempre como um dos seus principais objetivos ser utilizada como residência artística, como explica o seu coordenador, João Rasteiro. A casa, que em tempos pertenceu ao poeta João José Cochofel, tem acolhido vários poetas, no âmbito de uma parceria com a FLUC, com o objetivo de “dar a conhecer Coimbra a esses poetas e mostrá-los à população da cidade”. Contudo, as residências artísticas
não se restringem apenas a escritores. “Não estamos a falar da escrita como um símbolo, pode ser uma linguagem artística seja ela qual for”, refere João Rasteiro. Relativamente à presença da poetisa Lígia Dabul, o coordenador descreve-a como “excelente, de uma disponibilidade ótima da parte dela”, que chegou a sugerir algumas atividades, como a leitura de poemas de Joan Navarro, que iria passar por Coimbra para a visitar. Quanto ao futuro, o coordenador espera que os conimbricenses adiram cada vez mais às atividades da Casa da Escrita, “um espaço aberto de e para a comunidade”.
Com Ana Duarte
Navegar por cinco meses na cultura da cidade A Semana Cultural da UC tem início já na próxima quinta-feira, 1 de março. Navegar e viver são, assim, palavras que se irão cruzar pelas ruas de Coimbra Ana Morais “Navegar é preciso, viver não é preciso [?]”. É com este mote que remonta aos tempos da Roma antiga e também utilizado pelo poeta Fernando Pessoa para um título dos seus poemas, que a cidade acolhe a XIV Semana Cultural da Universidade de Coimbra (UC). Este ano, pela primeira vez, o programa es-
tende-se por cinco meses. Com início no dia da UC, 1 de março, e término no dia das festas da cidade, 4 de julho, o prolongamento assinala um “casamento entre o dia de D. Dinis, fundador da universidade e o dia de Coimbra, dia da Rainha Santa Isabel”, explica a vice-reitora para a Cultura e Comunicação, Clara Almeida Santos. O presidente da empresa municipal Turismo de Coimbra (TC), Luís Providência, classifica a iniciativa como “a cultura de Coimbra espalhada pelo mundo”. O mesmo diz que é com este tipo de atividades que se consegue mostrar a universalidade da UC e de Coimbra, sobretudo do ponto de vista cultural. Ainda para assinalar o ano de Portugal no Brasil e do Brasil em Portugal, a UC “vai celebrar de forma muito especial a relação com o povo brasileiro”,
aclara Luís Providência. Também a presença de artistas brasileiros nas atividades do programa expressa essa relação entre as culturas. Com atividades que vão desde o teatro, à música, a exposições ou a colóquios, entre outras, o programa visita diversos espaços culturais da cidade. Várias presenças de renome nacional e até internacional mostram que a iniciativa agrega estilos distintos. O destaque vai para o culminar das atividades, na véspera do dia da cidade, com a atuação do fadista Carlos do Carmo com o Coro dos Antigos Orfeonistas. Em tempos em que é cada vez mais notória uma virtualização da realidade, segundo Clara Almeida Santos, surge a interrogação. “Navegar é preciso, temos todos consciência disso, mas viver também será”, adverte. Com este novo paradigma
distingue-se “uma certa diminuição da escala do mundo”, acrescenta a vice-reitora ao alertar para o fenómeno da globalização. A aproximação da UC à cidade, na figura da TC, espelha “a relação de proximidade que se deve defender”, assegura Providência. Este estreitamento de relações da universidade ao munícipio podem traduzir-se em benefícios mútuos – “tudo o que a universidade faz tem impacto junto das pessoas de Coimbra e também dos turistas”, adverte o presidente da TC. Em jeito de remate, Providência mostra a vontade de manter esta parceria noutras ocasiões, visto que a UC e a Câmara Municipal “são instituições que concorrem no mesmo sentido, de promover Coimbra, dando à cidade momentos de cultura e de qualidade”. Com Ana Duarte
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DESPoRto a
4 MAR
f u T e B ol 3 Carapinheirense x académica Sf MAR 15h • Complexo desportivo S. pedro
fuTSal académica x Sl olivais 16h • pavilhão engenheiro Jorge anjinho
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B a S Q u eT e B ol Benfica x académica 18h • pavilhao da luz
A Secção de Bilhar quer continuar a crescer
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Embora com recursos financeiros limitados, a secção de xadrez da Associação Académica de Coimbra (AAC) continua a ter bons resultados com projeção nacional Fernando Sá Pessoa Segundo o presidente da secção de xadrez da AAC, Bruno Pais, o clube poderia ter mais equipas na segunda divisão nacional, além da única que possui. “Simplesmente isso acarretaria custos insustentáveis”, adianta. Nas palavras do dirigente seria fácil conseguir subir equipas da terceira divisão para a segunda. A propósito dos escassos recursos monetários a que a secção está sujeita, João Sousa, vice-presidente da mesma, afirma que houve já alturas em que a secção se viu obrigada a adiantar dinheiro. “Se ninguém meter dinheiro à frente nós vamos deixar de realizar provas”, esclarece. No entanto, Bruno Pais entende que o dinheiro é devolvido, pelo que, sendo “um meio familiar, todos acabam por dar a sua ajuda”. No que respeita ao valor competi-
Fernando Sá Pessoa Apenas dois anos depois da sua fundação, a Secção de Bilhar da Associação Académica de Coimbra (AAC) tem vindo a afirmar-se quer na cidade, quer no panorama nacional. Nas palavras do presidente, Ricardo Salgado, “a secção está bem e o número de sócios, na sua maioria alunos universitários, tem vindo a crescer”. No entanto, o dirigente lamenta que, a nível económico, haja uma “disparidade elevada entre a secção académica e os restantes clubes”. As
dia e à noite beber um copo”. A secção está, deste modo, vocacionada para a comunidade universitária. Há, inclusive, uma equipa constituída unicamente por estudantes que, para além de disputar os campeonatos da Federação Portuguesa de Bilhar, vai disputar também o torneio nacional universitário. O bilhar da AAC tem, neste momento, dois atletas na "pool elite", ranking nacional de jogadores. São eles Fernando Cardoso, que está no décimo posto e Pedro Santos, que se encontra no 16º lugar. Decorreu, no passado fim de semana, o open da Madeira, depois do qual as classificações do ranking individual poderão ter sofrido ligeiras alterações mas devem, segundo o atleta, “manter-se próximas disto”. Além dos objectivos individuais assumidos pelos atletas, Pedro Santos afirma ainda que, em termos de equipas, o «objectivo passa por ficar entre as oito primeiras do “pool” português».
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v o l e iB o l grande lusófona x académica 17h •universidade lusófona
tivo da secção, o presidente Bruno Pais orgulha-se quando afirma que “a Académica é o melhor clube de xadrez português do país”, uma vez que, para o mesmo, “o clube que fica sempre à frente não tem um único português, e são jogadores que levam um cachê por jogo que equivale ao nosso cachê para toda a época”. Este ano, para além de uma boa prestação na primeira divisão, onde estão os melhores atletas da secção de xadrez da AAC, o dirigente espera finalmente conquistar a taça de Portugal. “Nunca conseguimos e é algo que ambicionamos há já algum tempo”, atira.
Secção de formação académica João Sousa destaca, ainda, a formação académica que os atletas têm. “A maioria dos praticantes são, ou já foram, estudantes”, afiança. “Sendo a maioria crianças que estão a criar raízes e vão acabar por ser estudantes na UC”, Bruno Pais afirma ter atletas dos quatro aos sessenta e três anos. “O espírito académico que nós temos atraios”, diz. Em relação à primeira divisão, a secção de xadrez encontrase, nesta altura, em quarto lugar, sendo que, no ano transato, chegou ao segundo. Em relação a um eventual primeiro lugar, o presidente Bruno Pais prefere não se alongar.
FernanDo sá pessoa
a secçao de bilhar é recente mas tem já apirações no panorama nacional. próprias instalações utilizadas no Estádio Cidade de Coimbra são arrendadas com os meios da secção e implicam um gasto anual de vinte mil euros. A este valor acrescem os “custos de acesso às competições federais e do equipamento”, afirma o dirigente. A secção é financiada em grande parte pelos atletas, alguns patrocinadores e, segundo Ricardo Salgado, “um bar de apoio às secções desportivas”, o que não impede que seja necessário, por vezes, que os dirigentes tenham que pagar do próprio bolso. “Estamos agora na Madeira com três atletas e a direção não teve capacidade, por isso suportei eu as despesas. Não podemos falhar uma prova nacional de elite por causa disso”, acrescenta. No que respeita ao espaço utilizado pela secção, o atleta Pedro Santos assegura que este é “o melhor de Coimbra para praticar bilhar”. Ricardo Salgado destaca o seu tamanho e multifuncionalidade, uma vez que nele se pode “estudar durante o
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“Somos o melhor clube português do país”
FotograFia CeDiDa por riCarDo saLgaDo
Apesar dos constrangimentos económicos, a secção consegue manter projeção nacional. As instalações são, simultaneamente, custo e receita
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“É pena que os políticos não pensem no desporto nas escolas” Ao cabo dos dois primeiros meses do presente ano, o desporto escolar em Coimbra permanece com problemas estruturais, nomeadamente do foro financeiro Fernando Sá Pessoa Tiago Teixeira João Pedro Marques, coordenador do desporto escolar da escola secundária Jaime Cortesão, revela uma situação recente, ao afirmar que chegou a “avançar com dinheiro do
D.r
próprio bolso que depois a escola pagava”. O professor aponta como principal dificuldade o problema dos transportes, uma vez que, “neste momento, as deslocações são feitas com senhas de autocarro, ou têm de se alugar carrinhas de nove lugares”. “É pena que os políticos não pensem no desporto nas escolas, em particular, e no país, em geral”, acrescenta.Além disto, o docente refere que o país e o ensino estão demasiado centrados no futebol, destacando que “é preciso pôr o desporto escolar a incentivar outras modalidades”. Para Adelino Canelo, coordenador do desporto escolar na escola secundária Vale das Flores, existem problemas de fundo para além da
questão monetária. “Os professores não querem trabalhar ao sábado”, reitera. A juntar a esta situação, a “falta de interesse dos alunos” é também um dos motivos que contribui para o enfraquecimento do projeto. “Quem quisesse participar deveria inscrever-se na altura da matrícula, de forma a estar sujeito à participação”, acrescenta. Ricardo Vieira, coordenador do desporto escolar da escola secundária José Falcão, assevera que “as tranches têm vindo a diminuir progressivamente”. A redução de pessoal é também um aspeto apontado pelo professor para o atual estado do desporto escolar, tendo em conta que, antes, “havia colegas destacados para resolver as questões dos quadros
competitivos e dar apoio às escolas”. Nas palavras do mesmo, a solução passa por “uma reestruturação”. Futuro em risco Outro problema que estará na origem do estado corrente do desporto escolar está relacionado com o mau funcionamento do Centro da Área Educativa. João Pedro Marques afiança que, neste momento, esse organismo, “que antes tinha quatro ou cinco elementos, já não existe”. Neste seguimento, o professor prevê que “o projeto não vá existir por muitos mais anos”. Até ao fecho da edição, tentou-se contactar o coordenador do desporto escolar da região centro, José Carlos Mairos, mas este não se mostrou disponível.
10 | a cabra | 28 de fevereiro de 2012 | Terça-feira
deSPorTo Prolongamento BASQU ETEBOL
Jogo importante na cidade berço. A Académica precisava de ganhar para aumentar a vantagem para a equipa de Guimarães. O resultado não foi o esperado (87-75) e ficam, assim, complicadas as contas do campeonato. Atualmente, a secção disputa com a equipa vimaranense e com o Sampaense o acesso à próxima fase do campeonato. Destaque para o novo reforço, Curtis Terry, que assinalou onze pontos e duas assistências.
F UT E BO L
Através da conversão de uma grande penalidade convertida por Tarquini, a Académica permitiu o empate diante do Eirense, por 1-1, num jogo sem grandes ocasiões de golo por parte dois lados. Assim, os estudantes continuam a ocupar o oitavo lugar da tabela classificativa.
ANDEBOL
A Académica foi perder, no passado sábado, dia 11, ao Municipal de Almeirim, por 22-30, num resultado que desilude por ser frente ao último lugar. Assim sendo, a equipa de Coimbra cai para o sexto lugar, e vê o primeiro a sete pontos. Ficam, para já, difíceis as perspectivas de luta pela promoção na terceira divisão nacional, zona centro.
O tiro com arco de Coimbra tem história para continuar Carlos Araújo tenta hoje ser tão certeiro no fotojornalismo como foi, em tempos, no tiro com arco. Uma história com 19 anos, contada pelas madeiras gastas do pavilhão usado pela secção da modalidade, hoje palco de lembranças de uma carreira. que, apesar de curta, viveu de sucessos. Por Catarina Gomes e Fernando Sá Pessoa
N
o canto mais recôndito do Estádio Universitário vive uma história sobre o tiro com arco. O bicho que “nunca morre” nasce em Araújo quando corria o ano de 1998, pouco ou nada se ouvia falar da secção da Associação Académica de Coimbra (AAC). Voltou à casa há cerca de dois meses. O ex-atleta e companheiro João Barreira não se escusa a afirmar que o regresso se faz sentir como uma “mais valia para a Académica”, regresso esse influenciado pelo filho. “Com três anos de idade ele já atirava, porque eu levava-o aos treinos”, lembra. Entre os feitos que Araújo acumula, conta-se um convite feito pela Federação Portuguesa de Tiro com Arco, que catapulta o atleta para o Jamor. “Eu era «the best»”, diz entre risos. E, por pouco, as flechadas não chegaram à China. Um ponto separouo dos mínimos que o qualificariam para o campeonato europeu. Porém, o sucesso só pode advir do empenho. Os treinos, tri-diários, contagiaram os intervalos do trabalho e as noites. “Íamos ligar as luzes dos carros, viradas para os alvos, e continuávamos a atirar”, conta Araújo. “Só malucos”.
“Queríamos competir com os melhores” O clube surge agregado ao Vigor da Mocidade, clube que servia de sede. “No fundo, éramos uma secção deles”. E é ao serviço do Clube de Arqueiros de Coimbra (CAC) que Carlos Araújo consegue o quinto lugar no campeonato europeu de caça, em 2002, e um segundo lugar no campeonato nacional. “O meu tiro é de precisão de sala de dezoito metros. Aí eu fui bom. Ou, pelo menos, o segundo melhor”, atira. O CAC surge com três arqueiros que ambicionavam mais do que a Académica. Segundo João Barreira, as mentalidades perpetuadas dentro do mesmo impediam os arqueiros de evoluírem e limitavam-nos ao arco tradicional. “E nós queríamos competir com os melhores”, explica. Ademais, a modalidade encontravase centralizada na zona sul, dificultando a presença dos clubes do norte nas provas nacionais e nos primeiros lugares. Era necessário dividi-las pelo país, “puxar o tapete aos da zona sul”, enfatiza. Não tarda, pois, que o clube comece a dar nas vistas. Era frequente perguntar-se “de onde tinham vinda aqueles tipos”, recorda Araújo. A nível nacional, foi “positivo, uma vez
que surpreendemos clubes com mais de vinte anos e pessoas que não acreditavam em nós”, orgulhase João Barreira. Não tivesse aviado malas para a Suíça, em 2003, e “ainda hoje o CAC seria um dos maiores clubes de tiro com arco de Portugal”.
Fraca adesão da comunidade universitária Atualmente, a secção de tiro com arco está, para Araújo, “muitíssimo melhor” do que se encontrava há catorze anos atrás. A maior dificul-
“O meu tiro é de precisão de sala de 18 metros. Aí, eu fui bom”, diz Carlos Araújo dade é, lamenta, a falta de condições de luz, o que reduz a qualidade do tiro”. Além disso, acresce que, “se se quer levar a coisa para outro nível, é necessário aumentar a frequência dos treinos” O presidente da secção de tiro com
arco, Manuel Silva, admite que, até hoje, a “adesão por parte dos estudantes universitários tem estado aquém das expectativas”. Talvez por ser “um desporto que leva tempo e esforço até dar os primeiros resultados”, justifica Araújo. Com efeito, na extremidade oposta aos alvos que encontramos no pavilhão onde decorre o treino da secção, está um bigode preciso, ao lado de outros quatro atletas mais velhos e um estudante universitário. José Manuel, do alto da sua experiência, enaltece que “é preciso muito tempo, é preciso insistir”. Trata-se, igualmente, de um desporto dispendioso, cujos custos de material aumentam conforme a subida de categoria. “Aqui, o objectivo é iniciar as pessoas à modalidade e dar suporte a quem o pratica”, afirma o presidente seccionista. No âmbito competitivo, decorreu, no passado fim de semana, o campeonato nacional de caça com tiro com arco, onde Manuel Silva, em representação da Académica, obteve o sexto lugar. Quanto à organização do campeonato nacional de caça em Vila Nova de Cernache, dia 10 de Julho, poderá vir a ser mudada visto coincidir com época de exames universitários. Daniela Silva
F UT S AL
Os estudantes deslocaramse ao pavilhão desportivo Universitário de Gualtar e foram derrotados pela congénere da capital do Minho, por 6-4. O resultado não permite, assim, que a Académica suba na tabela de forma a poder disputar o “play off” que determina o campeão nacional. Os estudantes encontram-se no nono lugar com os mesmos pontos que o SL Olivais e AD Fundão, equipas que estão em lugar de acesso ao “play off”.
Por Tiago Teixeira
a secção de Tiro ao arco da aaC treina todas as semanas no pavilhão junto à secção de cultura física, no estádio Unversitário.
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CidAde Intervenção junto dos sem-abrIgo
Uma vulnerabilidade por percecionar As equipas das associações de apoio social articulam-se no auxílio aos sem-abrigo de Coimbra. Numa sociedade que ainda não acordou para a dimensão do problema, as respostas tardam a surgir ou são insuficientes. A reinserção é também uma dificuldade destes indivíduos. Por Camilo Soldado e João Valadão
E
m Coimbra, todas a noites, equipas de rua de associações humanitárias percorrem as artérias da cidade para prestar assistência a quem pouco tem. Perto do Largo da Portagem, a uma hora já avançada da noite, uma pequena multidão junta-se à volta do veículo de apoio. Rotativamente, uma vez por semana, os grupos da Cáritas, Associação Integrar, Ana Jovem, Câmara Municipal e Centro de Acolhimento João Paulo II distribuem alimentos, agasalhos e bebidas quentes a pessoas carenciadas e sem abrigo. A dificuldade em definir o conceito da situação de sem-abrigo começa com a ambiguidade e abrangência do termo. Esta dificuldade é um obstáculo, à partida, para a resolução do problema. Em Portugal, a sociedade, na sua generalidade, entende, por sem abrigo, a condição de sem-teto. A elaborar uma tese de doutoramento com base na questão dos semabrigo, na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (FPCEUC), Sónia Ferreira, explica que este conceito implica várias situações do ponto de vista habitacional. “A situação de sem abrigo inclui os que estão a pernoitar na rua, pessoas que estão em centros de acolhimento ou outras estruturas de apoio, mas também pessoas que estão em unidades hospitalares, prisões, e outras instituições, que não têm para onde ir
quando saírem”, informa a também observadora do Projeto de Intervenção com Sem Abrigo do Concelho de Coimbra (PISACC). A nível nacional, para além dos sem-abrigo, há uma fatia da população sinalizada como “em risco de vir a ficar nessa situação”. Nesse grupo, a docente da FPCEUC inclui “indivíduos que estão em habitação insegura ou inadequada”. A FEANTSA é uma organização europeia, não-governamental, que reúne as diversas organizações que trabalham com os sem-abrigo nos vários países. Aqueles que, em Portugal, estão sinalizados como em risco de ficar nesta condição, são encarados, por esta estrutura, como
Para Paulo, as equipas de rua são o primeiro passo na recuperação do indivíduo estando em situação de sem abrigo. A responsável da Cáritas Diocesana de Coimbra, Manuela Lopes, revê-se no conceito inglês, segundo o qual a presença de um teto e “a ausência de relações afetivas, comida e condições de habitabilidade” configuram o termo “sem lar”. É nesta situação que está Paulo, nome que esconde o seu verdadeiro
para tornar irreconhecível uma história que é similar a tantas outras. Com teto mas sem abrigo, Paulo ocupa, há dois anos, uma casa no centro de Coimbra. “A casa estava vazia, sem mobília, arranjei uma cama para mim e consegui ligar a luz. Gasto pouco, vejo um bocadinho de televisão e ligo o radiador”, explica. A higiene é feita no Centro Sol Nascente da Cáritas, mas é o próprio Paulo que reconhece a falta de condições do lugar onde pernoita: “estou na ilegalidade, não é casa para ninguém”.
da população que não o é”, justifica. Para a doutoranda, há uma vulnerabilidade do ponto de vista pessoal que tem que estar associada à vul-
Fatores essencialmente “estruturais” Tanto Manuela Lopes, como Sónia Ferreira procuram desmistificar as causas que levam a esta condição. A responsável da Cáritas entende que os fatores são essencialmente “estruturais e conjunturais” e não da exclusiva responsabilidade do indivíduo. “É difícil encontrar um semabrigo que seja filho de alguém licenciado”, exemplifica. Sónia Ferreira observa na sociedade “uma tendência para considerar que o indivíduo se encontra nesta situação por fruto da sua responsabilidade”. A docente da FPCEUC nega que a toxicodependência, o alcoolismo ou perturbação psiquiátrica, levem, por si, à situação de sem-abrigo. “Existe uma franja da população em situação de sem-abrigo que tem esses problemas, mas também o podia dizer isto
“A família é importantíssima na reinserção”, assevera Sónia Ferreira nerabilidade financeira e de suporte social. Foram estas as contingências que arrastaram Paulo para a rua. Desde cedo enveredou pelo caminho da droga, razão pela qual desistiu da escola aos 16 anos e começou a trabalhar. Das drogas leves às pesadas, foi escondendo o vício dos pais até aos 24. A partir daí, a história é feita CarloTa rebelo
de tentativas de desintoxicação e recaídas, até que aos 30 foi detido. Perdeu o pai e a mãe no ano em que cumpriu pena na penitenciária de Coimbra, perdendo assim um dos poucos suportes familiares que tinha. Para Sónia Ferreira, “a família é importantíssima na reinserção e é muito mais fácil quando a família os acolhe no seu seio”. Em liberdade condicional, Paulo ficou por pouco tempo em casa da madrinha. Com mais uma recaída, o receio de trazer problemas levou-o para as ruas. “Não sei como contraí o HIV, mas deve ter sido nessa altura”, confessa, numa expressão de crua naturalidade. “Andei sempre por aí aos caídos, sempre a consumir, uns seis meses a vadiar, até que tive que ser levado para o hospital onde me falaram nas equipas de rua”, recorda. O PISACC coordenada as equipas de rua em Coimbra. Teresa Sousa, coordenadora do PISACC, explica que o apoio é dado a vários níveis. Não só com a distribuição de bens essenciais, mas também o encaminhamento para serviços de saúde, quartos e através do acompanhamento psicossocial. Para Paulo, as equipas de rua são o primeiro passo na recuperação do indivíduo. Foi através destas que iniciou um longo processo, não isento de obstáculos, de reinserção social. A docente da FPCEUC considera “insuficiente pensar que, se der ao indivíduo um apoio como o rendimento social de inserção e se lhe der uma habitação, a situação de sem abrigo está resolvida. Isso é uma falácia”, acusa. A corroborar a afirmação da observadora do PISACC está o exemplo de Paulo. Há dois anos limpo do consumo de drogas, por três vezes arranjou emprego e por três vezes foi despedido contra o código do trabalho, porque a entidade empregadora descobriu a sua condição de seropositivo. Sem rendimento social de inserção, Paulo vai arranjando dinheiro como pode: “a arrumar carros, mendigar… Posso inventar muitas formas”.
A crise que a todos toca Se a crise socioeconómica aumentou o número de sem abrigos em Coimbra, não é uma certeza. Mas, segundo Sónia Ferreira, esta conjuntura trouxe um “agravamento das condições em que as pessoas vivem”. As instituições também estão a ser alvo desta crise, afirma a docente. Teresa Sousa explica que, embora não seja fácil, devido à falta de apoios estatais, o serviço prestado à população “tem mantido a qualidade”.
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Comunidades de imigrantes
Regressar à te em Portu
Ligação à terra, promoção da agricultura biológica, da vida saudável e da espiritualidade: valore portuguesas, mas que são trazidos pelos estrangeiros que vêm habitá-las. Os hábitos rurais são, p os portugueses parecem ter esquecido. Texto e Fotografias por Rafaela Carvalho
«“P
or acaso, Ana, acho que tens uma grande pancada, mas uma pancada saudável!”. É mais ou menos a opinião que os meus vizinhos têm de mim». Compreende-se a opinião dos vizinhos de Ana Banana, nome artístico de Joanne Gribler. Ao chegar-se à Escola do Riso, perdida em caminhos de terra batida entre Vila Nova de Poiares e Lousã, na aldeia de Framilo, a casa destoa: nas paredes está pintado um grande sol sorridente. No terreno circundante, entre as mais diversas árvores de fruto, estacionam caravanas coloridas, trampolins, um burro. Uma grande tenda alcatifada destaca-se, onde trapézios pendem do teto. Na eira, aproveitando a manhã soalheira, duas crianças louras de olhos claros regalam-se com um prato de bolachas Maria partidas em metades, passas e frutas tão disformes como só a mãe natureza, no seu estado mais puro, pode oferecer. Joanne Gribler, que se diz natural de Espanha mas inglesa, é alguém cuja missão passa por “pôr o máximo de pessoas a rir por absolutamente nada”. “E nunca dizemos não a um apelo”, assegura. Foi com esta premissa que criou a Escola do Riso, um projeto que utiliza terapias alternativas como o yoga aliado à exploração da natureza, com o objetivo de dar aos
outros a oportunidade de uma vida mais saudável e divertida. “Esta pequena quinta serve como um projeto piloto para quem quer fazer a transição para a terra, para que as pessoas vejam como não tem de ser o fim do mundo”. Joanne acredita, inclusive, que a atual crise económica a ajuda na sua missão por mostrar às pessoas a fragilidade do sistema capitalista dominante. A solução passa, na sua opinião, pelo regresso à terra e pela “procura de uma forma de autossubsistência”. Estes são alguns dos ideais que muitos estrangeiros trouxeram para Portugal ao longo dos últimos 30 anos, suscitados, em maioria, pela fuga às sociedades mais desenvolvidas do norte da Europa. Os valores originários dos movimentos hippie dos anos 1970 traçam o estilo de vida mais alternativo destas comunidades, que é ainda contrastante com a vivência portuguesa. Ao contrário do que vem acontecendo com os portugueses – um verdadeiro êxodo para as cidades, como lhe chamam – estes estrangeiros veem a ruralidade que o país oferece como uma oportunidade de qualidade de vida, e procuram uma vivência mais alternativa, longe do consumismo capitalista e aproveitando as vantagens climatéricas e económicas de Portugal. Joanne Gribler remata com um aviso: “estão a chover estrangeiros a grande velocidade, a comprar
todas as quintas dos vossos avós e a transformá-las em grandes mansões”.
Necessidade de políticas de promoção do interior Mestre em História económica e social contemporânea, Ana Filomena Amaral reside em Arganil e contacta diretamente com esta realidade. Ela mesma reitera a visão dos estrangeiros que vão ocupando aquelas zonas rurais: “não houve ainda uma política, nem de longe nem de perto, que realmente se concentrasse em repovoar o interior”, denuncia. “Temos forçosamente que voltar à terra”, e vai ainda mais longe, afirmando que “o equilíbrio do planeta está dependente disso”. A alemã Carmen Staats tem 51 anos, 30 dos quais passados em Portugal e sempre na mesma morada. A casa que adquiriu na aldeia de Ponte Velha, na Lousã, não era mais do que um curral. Hoje, drasticamente remodelada, conjuga-se com a pequena rua em que se situa, muito mais cuidada do que as normais aldeias portuguesas. Quando, aos 21 anos, passou por Portugal em férias, não adivinhava que não voltaria ao país de origem, onde deixou o curso de Medicina incompleto: Portugal parecia ser o melhor para viver em harmonia com os ideais “da vida alternativa”. “Estava um pouco insegura, um pouco farta” do estilo de vida que levava,
“
Temos forçosamente que voltar à terra”, garante Ana Filomena Amaral
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Comunidades de imigrantes Estes estrangeiros veem, na ruralidade do país, uma oportunidade de qualidade de vida, procurando uma vivência afastada do consumismo
terra ugal
favor, recomecem a cultivar”». Carmen critica ainda a dependência de subsídios que trouxe a adesão à União Europeia.
Intuição em casa de xisto
ores que podiam ser inerentes às aldeias o, para estes imigrantes, mais-valias que ho e Inês Amado da Silva relembra. Agora é técnica de agricultura biológica e recorda a evolução que presenciou ao longo das últimas décadas. “Portugal, em 10 ou 15 anos, progrediu de muito rural para mais avançado. Fez um processo que outros países fariam em cem anos”, conta. Exemplo disso foi a primeira visita que os pais lhe fizeram. O meu pai disse: “Isto é como a Alemanha há 50 anos atrás!”. Tal como indiciou o comentário dos pais, Carmen também considerou
que o país estava desfasado do resto da Europa, algo que diz já não ser tão evidente. Embora se assuma como adepta da agricultura biológica, Carmen Staats garante que “o principal é que uma agricultura seja sustentável”, e aponta o governo de Cavaco Silva como o responsável pela decadência do setor. «Eu já estava cá nessa altura, lembro-me bem – [o que Cavaco Silva disse foi] “não, a agricultura não vale a pena”, e agora ele diz “façam favor, por
É preciso mais de meia hora a serpentear nas curvas da Serra da Lousã para se chegar ao Catarredor. Esta aldeia de xisto, parte de um percurso turístico essencial na região, tem apenas 19 habitantes e é conhecida pela população ‘hippie’ que ainda aí mantém vivo o espírito de paz, amor e entrega à natureza. Passeando calmamente pelos caminhos estreitos entre as casas características, a surpresa chega num repente quando Carlos Machado, um dos locais, se levanta bruscamente de um banco em frente à pequena capela e diz exaltado: “Isto aqui é Portugal, hã?”. A população estrangeira está, também aqui, presente. Beatrix Gutbub vive no Catarredor há cerca de 20 anos, local que lhe permite “ser criativa, positiva e pensar autonomamente”. Quando decidiu deixar a Alemanha para se enraizar em Portugal, lembra a pergunta dos pais: “Portugal? País pobre! Que vais para lá fazer?”. Agora dedica a sua vida ao ensino de disciplinas espirituais, danças naturais e técnicas como o yoga, a meditação e a homeopatia. “As pessoas procuram muito fora de si em vez de procurar no seu interior”, explica Beatrix, que acredita numa vida melhor baseada na “consciência ambiental e espiritual, que se vive através da intuição e não apenas no nível intelectual”. É assim que cria os três filhos, nascidos no Catarredor por procedimentos totalmente naturais: “sem aparelhos e sem essa tralha toda, e andam na escola normal”, confirma. Beatrix acrescenta ainda que “a mudança na educação deveria começar na escola”.
Ensino doméstico Joanne Gribler destoa neste panorama, fazendo questão de educar os filhos em casa. “Aqui, somos muitas famílias que optaram por não pôr os filhos na escola”, declara Joanne, e explica que existe um grupo de mães que se juntam e fazem “tudo o que se faz num jardim de infância, mas com mais tempo em contacto com a natureza, mais roupa suja”. Para Joanne, o currículo escolar está feito “para manter as crianças entretidas enquanto os pais vão trabalhar”: “francamente, não é necessário uma criança de oito anos aprender todos os nomes dos reis de Portugal! É tanto tempo para tanta treta”, lamenta. Jana Staats, filha mais velha de Carmen, é uma voz discordante dos pais que educam os seus filhos neste sistema. “Essas pessoas, na minha opinião, são extremamente egoístas. Todas elas passaram por uma educação e frequentaram uma escola, algumas delas até formação superior”, afirma Jana, que fez todo o seu percurso escolar no ensino público e é licenciada em Enfermagem. Afirmando conhecer exemplos, Jana afiança que estas
“crianças e adolescentes acabam por ter vidas muito problemáticas, e são os primeiros a ir embora [do país]”. Ana Filomena Amaral, no entanto, não vê problemas neste tipo de ensino informal. “É uma forma de instrução como outra qualquer”, justifica esta professora do ensino secundário, dando como exemplo o ensino praticado no século passado entre as elites, quando “as crianças não iam à escola e tinham tutores em casa, que lhes facultavam conhecimentos das mais variadas matérias”. É também assim que Joanne vê os pais: como “facilitadores do processo de aprendizagem”. “Eu queria criar outra coisa”, explica Joanne. Num mundo “gerido por um sistema monetário que favorece uma minoria muito pequena”, Joanne Gribler acredita que “se mudássemos o sistema, até eles [os poderosos] estavam melhor”. “Praticamente todo o mundo está a tomar fármacos para a ansiedade, para a depressão, e não funcionam sem eles”, lamenta Joanne, que pergunta: “em vez de mudar a vida foste tomar esse fármaco? Então e deixar isto tudo?”.
14 | a cabra | 28 de fevereiro de 2012 | Terça-feira
CiÊNCiA & TECNOLOGiA D.R
Eletrochoque - um “reset” cerebral A terapia de eletrochoque é utilizada apenas em alguns casos mais graves, sempre sob aconselhamento médico.
O eletrochoque, usado em alguns casos psiquiátricos, é um “salva vidas”, mais eficaz que anti-depressivos. Uma prática presente no CHUC para tratar depressões e psicoses Joana Castro “No decurso histórico da terapia psiquiátrica, o advento dos antidepressivos levou a que a terapia de eletrochoque (ECT) fosse menos utilizada. Posteriormente, com a evolução da técnica, mais sofisticada e segura, a eletroconvulsivoterapia voltou a ser usada com maior frequência a partir da década de
80”, explica a psiquiatra do Hospital Santa Maria, em Lisboa, Manuela Abreu. Esta terapia é praticada em diversos hospitais do país entre os quais o Centro Hospitalar da Universidade de Coimbra (CHUC). Os doentes indicados para este tratamento sofrem de "depressão refratária" e "catatonia", ou seja, “doentes que têm situações mistas depressões e outras vezes euforias ou psicoses”, aclara o psiquiatra dos CHUC, Pio Abreu. O mesmo lembra por vezes se pensa que se pode recorrer à terapia de choque para tratar qualquer depressão resistente à terapêutica com fármacos. Contudo, só é aconselhada nos casos em que as pessoas “deixam de funcionar, deixam de comer e começam a deteriorar-se progressivamente.”
A terapia do eletrochoque provoca uma estimulação global, no córtex pré-frontal e no sistema límbico, segundo a médica do Hospital Santa Maria. Na mesma direção, Pio de Abreu estabelece uma comparação: “quando o computador tem circuitos que começam a viciar o funcionamento, é preciso desligálo, é preciso fazer um reset. No cérebro acontece mais ou menos a mesma coisa”. Depois do eletrochoque o cérebro reduz toda a sua atividade eletroquímica a zero. Um dos efeitos secundários mais frequentes são algumas “alterações transitórias da memória”, aponta Manuela Abreu, sendo que o médico dos CHUC acrescenta que “as contraindicações estão relacionadas com a própria anestesia - há mais acidentes com a anestesia do que
com a descarga elétrica”. A descarga elétrica é precedida de uma anestesia para evitar convulsões (contrações musculares intensas). Foram as próprias convulsões que originaram a terapia de eletrochoque. Comprovou-se que alguns doentes psicóticos melhoravam da psicose quando tinham uma convulsão epilética, sendo que começaram a ser induzidas com cânfora (planta medicinal), mais tarde, com medicação e, por fim, com choques elétricos.
O último recurso Os eletrochoques são uma prática de recurso. Todavia, quando estão bem indicados, “salvam vidas, resolvem situações e prolongam o tempo de melhoria”, explica o psiquiatra dos CHUC. Apesar de nunca
terem sido proibidas, são condicionadas “pela autorização do doente ou dos familiares”, explana o médico. Sendo o número de doentes sujeitos a este tipo de terapia muito variável, para o tratamento ser eficaz é necessário fazer seis a oito eletrochoques num prazo de duas a três semanas “e a pessoa vai melhorando aos poucos, mas a percentagem de doentes a usar o eletrochoque é muito pequena”. Devido à raridade da utilização desta terapia, alguns hospitais não a praticam. Pio Abreu desmitifica a prática: “qualquer tratamento, qualquer terapêutica que se faça em medicina requer prática, é preciso fazer várias. Não justifica existir uma pessoa num hospital a fazê-la cinco vezes num ano”.
Gene pode melhorar terapêutica da tuberculose Variação de um gene, que resulta em enzimas mais ou menos rápidas, pode levar à melhor adequação de doses em pacientes com tuberculose Paulo Sérgio Santos Portugal possui, actualmente, a taxa mais elevada de incidência de tuberculose entre os países da Zona Euro (cuja média é bastante mais baixa, situando-se nos 15,8), com cerca de 23 casos por cada cem mil habitantes. A pneumologista dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC), Maria Celeste Alcobia, explica que se trata de “uma doença que se transmite por via aérea, num ambiente onde existam pessoas in-
fectadas a tossir ou a espirrar, com a bactéria causadora da doença, o bacilo de Koch, a poder ser inalada por outras pessoas, indo até aos pulmões e podendo iniciar um processo de infecção.” É no sentido de tentar diminuir o número de complicações hepáticas, também decorrentes dos tratamentos e em relação direta com a toxicidade no fígado, que surge o estudo que procura avaliar o impacto dos genes na terapêutica para a tuberculose. A investigadora e docente da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC), Henriqueta Coimbra, começa por referir que este fenómeno já está estudado há bastante tempo: “sabemos os indivíduos respondem de forma diferente às concentrações, adaptadas ao peso, e que a probabilidade de desenvolver toxicidade hepática é maior dependendo da concentração do medicamento”. O mecanismo por detrás deste estudo é relativamente
simples, explicando-se pela existência de polimorfismos na espécie humana, ou seja, variantes genéticas normais, que explicam, por exemplo, a diferença entre ser-se canhoto ou destro. No caso específico, o gene estudado, NAT2, codifica “enzimas, não específicas, que, no fígado, vão transformar o medicamento utilizado na terapêutica da tuberculose, e que têm velocidades diferentes consoante os indivíduos. Essa velocidade reflecte-se na sua actividade que, ao ser maior ou menor, vai influenciar a rapidez com que o medicamento é eliminado do sangue”, demonstra a investigadora. O estudo vem então introduzir a vertente prática em algo que já se conhecia em teoria. “Nunca se passou para a prática clínica devido a muitos aspectos como, por exemplo, o preço e a geografia, porque a tuberculose é uma doença dos países pobres que, obviamente, não têm dinheiro para pagar genotipagens”,
refere a investigadora. Sendo muito mais vantajoso, em termos causaefeito, erradicar a tuberculose, podese, todavia, chegar à conclusão que “em termos económicos, este procedimento não compensar, mas poderse evitar um ou dois transplantes hepáticos, salvando as correspondentes vidas. Então, se se justificar, pode ser pedido ao doente que pague alguma coisa pela genotipagem e que o tratamento se torne mais seguro”, acrescenta Henriqueta Coimbra. A necessidade de realizar este tipo de estudos é ainda mostrada pela docente da FMUC: “este processo de conhecimento do gene leva à administração de uma dose mais adequada, e não baseada apenas no peso do paciente, mas não vai eliminar todos os casos de toxicidade hepática. Pensa-se que vai diminuir, mas sem o estudo prático não saberemos em concreto o que se ganha e o que se perde.”
A doença, bastante contagiosa, é normalmente associada a países subdesenvolvidos ou, no caso dos países desenvolvidos, a grupos de risco como “prostitutas, sem-abrigo ou imigrantes”, esclarece Maria Celeste Alcobia. A médica acrescenta que as possíveis falhas no combate podem situar-se no “diagnóstico precoce, no tratamento correctamente instituído pelo médico e na aderência à terapêutica por parte do paciente”, o que pode resultar no surgimento de complicações hepáticas ou de tuberculose multirresistente, com custos acrescidos para o Estado e para a saúde pública. “Estamos a falar de tratamentos totalmente comparticipados, que são de 103 euros para seis meses de tratamento da tuberculose normal, e que podem passar a, no mínimo, 78 mil euros quando estamos perante uma tuberculose multirresistente, com um período de tratamento superior a doze meses”, conclui.
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CiÊNCiA & TECNOLOGiA
Innovnano: Coimbra a propiciar parcerias científicas D.R
A fábrica de nanotecnologia da innovnano arranca no final do mês de março. O mercado português é residual, mas o negócio tende a globalizar Filipe Furtado A primeira fábrica de nanotecnologia portuguesa entra em funcionamento a 30 de março. O montante investido pela Innovnano no Coimbra iParque ascende aos dez milhões de euros, prevendo as várias etapas do projecto. Serão 40 os novos postos de trabalho para mão-de-obra especializada, num setor com perspetivas de crescimento em alta. O grupo CUF tem como áreas de negócio a química e, através da Innovnano, os nanomateriais. O investimento feito pela empresa parte “do conceito de produção modular”, faseado por diversas etapas, onde a expansão passa pela construção de novos módulos, explica o administrador da Innovnano, André de Albuquerque. Além do módulo produtivo, que será inaugurado a 30 de março, a próxima fase envolve a criação de um laboratório de caracterização e de controlo de qualidade, dado que os materiais produzidos apresentam
A nível global, a procura da nanomateriais atinge “dois mil milhões de dólares” poucas tolerâncias a variações de pureza. Existe, da mesma forma, a preocupação com a “componente de investigação e desenvolvimento”, para tornar o processo de produção mais eficiente, assim como para alargar o leque de produtos, afirma o administrador. “Trabalhamos com praticamente todas as universidades e principais institutos científicos”, aponta o responsável da empresa. Soma-se à colaboração com as universidades de Coimbra, Porto, Nova de Lisboa, Aveiro e Minho a parceria com a Universidade do Texas, nos Estados Unidos da América. André de Albuquerque enumera os diversos fatores que contribuíram para a colocação da unidade fabril em Coimbra, dentro da política de funcionamento em rede: “uma excelente oportunidade” pelo “próprio conceito do parque”, a presença de alguns parceiros privilegiados e o “acesso a pessoas com qualificações elevadas”.
Mercado português é residual Segundo André de Albuquerque, o negócio das nanotecnologias em Portugal é muito reduzido. “Deverá ser inferior a cinco por cento”, indica. De acordo com o mesmo, a nível global, a procura de nanomateriais atinge “dois mil milhões de dólares”, perspetivando-se um crescimento da procura em 30 por cento ao ano. O posicionamento da Innovnano apenas em Portugal e no Reino Unido, não parece interferir com o volume de negócios. André Albuquerque afirma que este é “um produto com elevado valor acrescentado, onde a questão logística de custo/transporte não é uma limitação, têm uma margem que lhes permite suportar o custo de transporte para outras geografias”, enfatizando a procura “dispersa pelo mundo inteiro” dos produtos comercializados. “Coisas tão elementares como um creme solar ou revestimentos antirrisco usam nanopartículas. Não é apenas uma expectativa futura, é já hoje uma realidade. Em 2012, deverá crescer 600 milhões de dólares, para 2600 milhões a nível global”, equaciona o administrador. A médio prazo é a área da saúde que terá mais aplicações a partir da nanotecnologia. No ramo da biomédica, através de melhorias nas próteses, garantindo uma maior resistência mecânica; ou no diagnóstico e tratamento do cancro ao utilizar a técnica hipertermia, que apenas destrói as células cancerígenas. A mesma empresa está também presente nas energias renováveis, através da construção de materiais para células fotovoltaicas, produção de óxido condutor transparente; células de combustível para transformar o hidrogénio em energia elétrica; ou espinelas de lítio para baterias de carros elétricos e híbridos, ou mesmo para telemóveis. Na área da electrónica transparente utilizam-se também células fotovoltaicas nos ecrãs LCD's. A empresa desenvolve materiais de revestimento de turbinas da aeronáutica, turbinas de centrais de cogeração a gás natural e turbocompressores que formam uma barreira térmica, “melhorando a eficiência termodinâmica destes equipamentos”, indica André Albuquerque. Outra das áreas de produção incide na indústria dos cerâmicos estruturais, isto é, materiais de fabrico de peças sujeitas a stresses mecânicos muito elevados. André Albuquerque destaca o impacto socioeconómico que a nanotecnologia terá no futuro, em termos de postos de trabalho. As estatísticas preveem “dois milhões de pessoas”em todo o mundo a trabalhar com este tipo de tecnologia, em 2015, com um conjunto diversificado de aplicabilidades.
A fábrica da Innovnano terá 40 postos de trabalho altamente qualificado
NANOTECNOLOGIA EM POrTUGAL UNIvErsIdAdE NOvA dE LIsbOA
UNIvErsIdAdE dO MINhO
UNIvErsIdAdE dE
No Centro de Investigação de Materiais (CENIMAT) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa são as energias renováveis , a electrónica e biosensores. A coordenadora do CENIMAT, Elvira Fortunato, concorreu às Advanced Grants (bolsas para investigador avançado), venceu uma bolsa no valor de 2, 25 milhões de euros para equipar um laboratório de nano fabricação. Todo o financiamento é conseguido através de projetos , “nada é financiado pelo Orçamento do Estado”, explica a coordenadora do CENIMAT.
Na Universidade do Minho (UM) o destaque vai para a nanotecnologia aplicada à área alimentar. O nanopacksafer é um revestimento para alimentos, que mantém a qualidade do produto com o “aumento do tempo de prateleira e pela possibilidade de incorporação de compostos bioactivos”, indica o investigador do Centro de Engenharia biológica da UM, José Teixeira. A nanotecnologia é vista como tecnologia de ruptura, mas, segundo José Teixeira, reflete apenas as áreas de conhecimento no seu desenvolvimento ao longo dos anos.
Na Universidade de Aveiro uma das áreas de aplicação do nano serve para material de fabrico de memórias para computadores, nano tubos, nano wireless e biosensores para detectar doenças tropicais, como a malária ou a febre dengue. Um dos problemas que a investigação enfrenta é saber “como transferir os avanços para criar pequenas empresas”, aponta o investigador do departamento de Engenharia Cerâmica e do vidro, Andrei Kholkin. segundo o mesmo, ainda em Portugal, tornando-se necessário colaborar com empresas estrangeiras.
AvEIrO
16 | a cabra | 28 de fevereiro de 2012 | Terça-feira
PAís InstItuto Camões
Carlota rebelo
Uma língua esgotada na retórica Louva-se a língua, mas fica-se por aí. As dificuldades orçamentais justificam uma parca promoção do português, e a afirmação do país além-fronteiras sofre por uma língua pouco conhecida e de voz rouca. Por Ana Francisco e João Gaspar
“N
ão és mais do que as outras, mas és nossa,/ e crescemos em ti. Nem se imagina/ que alguma vez outra língua possa/ pôr-te incolor, ou inodora, insossa”, versa Vasco Graça Moura, em “Lamento para a língua portuguesa”. Com a crise económica o lamento é vincado, com as outras línguas a parecerem mais do que a nossa. Contudo, não se pense que é novidade impingida por troikas. Segundo o professor catedrático da Universidade de Coimbra (UC), Carlos Reis, não se encontra uma verdadeira vontade política para a promoção da língua: “os sucessivos governos esgotam-se numa retórica de louvor do idioma”. Os adiamentos constantes de iniciativas são também apontados pelo director do Jornal de Letras, José Carlos de Vasconcelos, que defende o abandono do “paleio” para se passar a “realizações efectivas”. A língua passa para segundo plano, quer em épocas de apertos ou de bonanças, esquecendo-se as suas potencialidades. A “inércia arrepiante” de que Carlos Reis fala para classificar o trabalho governativo pode apresentar consequências negativas, que se espalham para outras áreas de interesse. “Há uma ligação entre a diplomacia económica e aquilo que é a diplomacia cultural”, relaciona o professor da Faculdade de Letras da UC (FLUC), Seabra Pereira. Como exemplo, o também provedor da Casa da Escrita aponta para o nosso plano identitário: “se uma pessoa não trabalha bem na sua identidade falha também no plano das relações interpessoais”. Ora, aqui se vê um país com dificuldade na afirmação da sua presença no mundo. A promoção da “língua portuguesa e das nossas criações culturais são uma condição decisiva do apreço que as outras nações podem ter
por nós”, reitera Seabra Pereira, lembrando que o menosprezo dado pelos governos à língua pode alastrar-se para campos políticos e económicos.
As paredes académicas É no plano da promoção e divulgação da língua que surge o Instituto Camões (IC). Todavia, o trabalho da instituição tem sido limitado pelos recursos que tem à sua disposição, tem uma acção deficitária. “O IC não tem conseguido alcançar a sociedade civil”, lamenta Valeria Tocco, responsável pela Cátedra Antero de Quental na Universidade de Pisa. Em muitos dos casos, a divulgação da língua e da cultura está assente no trabalho dos leitores, docentes e responsáveis de cátedras, subsidiados pelo IC. Este trabalho individual acaba por não ultrapassar, de acordo
Os sucessivos governos esgotam-se numa retórica de louvor do idioma com Valeria Tocco, as “paredes académicas”. Seabra Pereira lembra ainda os escassos meios com que os leitores de português se deparam no estrangeiro: “em alguns países europeus, o leitorado português está encalhado no meio de outros institutos, com instalações que nos deixam com a alma triste e que contrastam com o espaço concedido aos departamentos ligados a outras línguas”. “É difícil imaginar as dificuldades por que passam alguns docentes, que muitas vezes não ensinam o português com as condições de quem leciona outras línguas”, critica o leitor de português na Uni-
A internacionalização da cultura é determinante na promoção da língua portuguesa. versidade de Viena, Alcides Murtinheira. “Esta realidade limita muitíssimo a ideia de que o português é uma língua que pode oferecer um mercado de trabalho enorme e que pode ser uma válida alternativa ao inglês e ao castelhano”, corrobora Valeria Tocco.
Carências no ensino Sofia Soares, professora de português no ensino primário em França, sente-se desanimada com a política de retrocesso no ensino do português no estrangeiro, visível no despedimento de 49 professores em toda a Europa. “O IC não defende os interesses dos seus professores e leitores ao máximo. Contudo, também sinto que o instituto tem as mãos atadas e não pode ajudar muito mais”, diz, expressando a sua resignação. “A produção cultural e o ensino deveriam anteceder e quiçá sobrepor-se à promoção da língua”, defende o responsável pelo ensino do português na Universidade do Ohio, Pedro Pereira. O incentivo na política educativa é, para Pedro Pereira, “indissociável da leitura e da cidadania”, considerando que os próprios cidadãos portugueses devem reclamar a língua e a cultura como património seu, para, dessa forma, a língua ter futuro e “os outros terem mais razões para quererem aprendê-la”.
Exportar cultura O “triste desinvestimento” no ensino do português além fronteiras é também observado por Carlos Reis na cultura que se exporta. “Os agentes culturais de um pequeno e mal conhecido país como Portugal têm dificuldade, por si sós, de se afirmar no estrangeiro”, aclara o professor catedrático. Porém, o mesmo salienta que, apesar de o Estado não ter que se assumir como um empresário das artes e das letras, cabe-lhe “um papel im-
portante de dinamização”. Mioara Caragea, responsável pela Cátedra Fernando Pessoa na Universidade de Bucareste, enaltece a importância da internacionalização da cultura: “a tradução de Saramago ou de Lobo Antunes fez mais para o interesse por Portugal na Roménia do que visitas de chefes de Estado”. Seabra Pereira conta que, dentro da mesma língua, o Brasil se destaca, com uma presença “mais forte e mais ágil”. Segundo o professor de Literatura Portuguesa, embora tal facto leve a uma difusão indireta da cultura portuguesa, a mesma acaba por ser promovida essencialmente por um outro país. Pedro Pereira, por outro lado, lembra a pequeneza demográfica de
Portugal em relação ao Brasil: “a área metropolitana do Rio de Janeiro tem a população de Portugal. Esta evidência é brutal para aqueles que ainda pensam que o nosso país é dono da língua”. É por isto que o docente da Universidade do Ohio considera fundamental projectar no IC uma “dimensão transnacional”. Um unir esforços surge comummente como essencial para uma política de promoção da língua portuguesa. “É necessário aproveitar as sinergias”, sugere José Carlos de Vasconcelos. Valeria Tocco, em jeito de metáfora, propõe: “o IC será sempre a voz do português europeu, mas essa voz poderá ser entoada de forma polifónica com as outras vozes da lusofonia”. Carlota rebelo
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MUndO
México: um problema vindo do passado Um país, aos olhos da comunidade internacional, nas mãos dos traficantes. O governo enceta o combate mas a questão é quem manda realmente no México Celine Braga Maria Garrido Catarina Pedro “Em parte, o narcotráfico tem tal influência que governa o México”. Quem o diz é o professor catedrático de Ciência Política do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) de Lisboa, Fernando Condesso, quando questionado sobre quem manda realmente no México. Para o professor de Sociologia do Poder e da Política da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC), Daniel Francisco,
dizer que quem manda no México são os traficantes ”é uma coisa muito bombástica e que pode ser mentira”. No entanto, Daniel Francisco salvaguarda a presença de cartéis com poder, “inclusive no mundo da política e dos tribunais” em determinadas regiões ou cidades. O professor da FEUC confirma que os traficantes “chegam ao poder da polícia, dos tribunais e ao poder de fazer as leis” e que controlar a feitura das leis “ é criar um ambiente mais saudável para o crime”.
A importância do tráfico na economia Sandro Mendonça, professor de Economia Internacional do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), cita o poeta mexicano Octávio Paz: “O México está demasiado longe de Deus e demasiado perto dos Estados Unidos da América (EUA)”. “O que se passa é que o México tem vizinhos e estes são muito assimétricos”, refere. O docente lembra assim
a relação entre o tráfico e os EUA, uma vez que “os emigrantes acabam muitas vezes por ser ajudados por redes de crime organizado e portanto tornam-se também embaixadores da indústria do narcotráfico mexicano”. Desta forma, Sandro Mendonça vê no México uma “indústria informal” que acaba também por ser “um grande problema e que não ajuda ao crescimento económico que é contabilizado no Produto Interno Bruto (PIB)”. Apesar de assumir que o narcotráfico representa uma percentagem do PIB “significativa de cerca de 10 por cento”, Fernando Condesso não considera esta atividade criminosa determinante para a economia do país. 10 por cento deste PIB, afere Condesso, está representado consequentemente no reforço da segurança privada: “O narcotráfico desenvolve a economia de carros blindados, ou pelo menos importações, e desenvolve brutalmente a economia das forças de segurança em mais de um por cento”.
Face a um interesse, por parte de alguns presidentes da América Central, em legalizar o transporte e consumo de narcóticos, Fernando Condesso acredita na visão do atual presidente mexicano, Felipe Calderón, de que tal só seria concebível caso o seu principal destino (EUA) também o fizesse: “Se os Estados Unidos não o legalizarem, não irá ser resolvida grande coisa”.
Violência e corrupção Na ordem do dia tem estado a violência nas prisões mexicanas, potenciada não só pelas rivalidades entre grupos de traficantes, mas igualmente pela intervenção de oficiais. Fernando Condesso repara: “O problema das prisões é complicado porque os narcotraficantes têm um grande poder económico e ao longo dos tempos treinaram muita gente que se infiltrou nas instâncias oficiais de controlo”. Ao mesmo tempo, o professor catedrático realça que “o narcotráfico é a principal causa de morte e de assassí-
nio”. Com isto, recorda ainda que há quem diga que “o reconhecimento destes banhos de sangue e destas lutas entre grupos tem piorado a criminalidade”. Com a presença de uma forte influência do narcotráfico e a infiltração destas redes na classe política e nos comandos policiais, foi conferida ao atual governo de Felipe Calderón uma “maior visibilidade devido à luta que este desencadeou”, refere o docente do ISCSP. O governo de Calderón, considerando a questão da corrupção, impôs que os policiais se tivessem de sujeitar a um detetor de mentiras, o qual resultou em 10 por cento da demissão da polícia federal por pertencerem a redes traficantes, acrescenta. “Há aqui todo um problema que vem do passado, toda uma sociedade organizada, ou se preferir, desorganizada”, conclui Fernando Condesso. Com isto, remata: “É criada no estrangeiro uma imagem de que o México é um país em guerra devido ao narcotráfico”. D.r
Uma forte influência do narcotráfico resulta na infiltração das redes na classe política e nos comandos policiais.
“Uma guerra de libertação” para o Saara Ocidental A meio caminho das negociações sobre o destino do saara Ocidental, a ação das instituições internacionais é posta em causa e é revelada a sua indiferença Mariana Santos Mendes O Saara “é um caso flagrante de direitos humanos e direitos internacionais, mas não me parece que haja grande preocupação com a situação do povo sarauí”, afiança o especialista em questões do Médio-Oriente, José Goulão. Também Teresa Pina, diretora da Amnistia Internacional em Portugal, realça que “há membros de inúmeras organizações sarauí que, ao fornecerem informação sobre o Saara
Ocidental, acabam por ser perseguidos pelo reino de Marrocos”. O Saara Ocidental, que desde a década de 1960 é considerado território não-autónomo pela Organização das Nações Unidas (ONU), é uma antiga colónia espanhola, atualmente disputada entre o Reino de Marrocos e a Frente Polisário (Frente de Libertação do Saara Ocidental).“Em janeiro, a Amnistia Internacional publicou um relatório sobre os acontecimentos do último ano em vários países do norte de África e do Médio Oriente”, declara Teresa Pina.
O conflito aos olhos da comunidade internacional Para José Goulão, o povo sarauí vem sendo negligenciado pelas instituições internacionais, inclusive pelo reino de Mohammed VI (rei de Marrocos). Exemplo disso foi “a União Europeia (UE) aprovar, com uma simplicidade arrepiante, o desconge-
lamento do acordo de pescas entre a UE e este reino, que permite aos países europeus pescarem nas águas territoriais do Saara Ocidental para proveito de Marrocos”, explica, acrescentando que não consegue encontrar “uma violação mais flagrante dos direitos do povo”. Juntando a este desrespeito por parte de Marrocos e da União Europeia, denota-se “irreverência” por parte da ONU, salientando o especialista que “o estatuto refere que os responsáveis da organização devem fazer de tudo para estabelecer a paz nos sítios onde há conflito, o que não se tem verificado”. Goulão acusa o Secretário-Geral da ONU, Ban Kimoon, de ser “além de corrupto, alguém que anda pelo mundo a tentar cirrar hipóteses de guerra”. Apesar de esta negligência ser exercida por parte de instituições internacionais, outras destacam a sua preocupação para com este país e
para com o povo, como é o exemplo da Amnistia, que “em relação aos direitos humanos não pode ficar tranquila, nem vai cruzar os braços, sempre que houver violações desses direitos, das normas e dos princípios gerais legais internacionais”, alude Teresa Pina. Outro aspecto fulcral que José Goulão refere é que “o Saara tem direito a fazer um referendo sobre aquilo que deseja: ou a independência ou a autodeterminação em relação a Marrocos”. Tal processo tem sido dificultado, pois tal como o especialista afirma, “o que acontece é que Marrocos está a injetar colonos no Saara Ocidental, que quer que sejam considerados cidadão sarauís para o referendo”. Logo, “neste sentido, não temos assistido da parte da ONU a um empenhamento rigoroso para que sejam definidas as normas deste referendo, que é destinado ao povo sarauí e ao futuro do território”.
Negociações No que toca às negociações que têm sido discutidas entre o governo de Marrocos e a Frente Polisário, José Goulão acredita que “a questão que se levanta é a força de negociação que esse próprio governo detém dentro de Marrocos para tratar de um problema tão delicado como o da soberania do Saara Ocidental” que, na opinião do especialista “é um dogma nacional, a do reino e dos militares”. Goulão vai mais longe, ao afirmar que “o Saara é marroquino”. Assim, José Goulão duvida das intenções do governo Marroquino e “da real força no interior das suas instituições” . Por último, defende que a luta por esta independência não está na eminência de uma guerra civil, “mas sim de uma guerra de libertação”.
Com Carolina Caetano e Maria Garrido
18 | a cabra | 28 de fevereiro de 2012 | terça-feira
Cinema
artEs
A
“J. Edgar ” De Clint Eastwood Com lEonardo diCaprio armiE HammEr naomi watts 2011
o grande ditador
ver
CRítiCa De joão teRênCio
o
s patrões da disney viram na obra de Gary k. Wolf “Quem censurou Roger Rabbit?”, de 1981, a ocasião perfeita para, de uma assentada só, ressuscitarem antigas estrelas da companhia, fazer um “blockbuster”, montar uma mega operação de propaganda e, pelo meio, ainda deixar a sempre bem-vinda mensagem moralista tão apreciada em Hollywood. e assim nasce “Quem tramou Roger Rabbit”, filme híbrido entre a animação e o ”film noir”, que habita o imaginário da “geração rasca”, “à rasca” e posteriores. Robert Zemeckis já o havia feito com a inolvidável trilogia “Regresso ao Futuro”. o realizador vai mesmo resgatar christopher Lloyd – o distraído doctor emmett brown – para encarnar o
h, Hollywood e os filmes biográficos. não há noite de estátuas douradas sem eles. Histórias de superação, de grandes homens (thatcher incluída) e maiores feitos. Por esta altura já se saberá quem ganhou a noite em Los Angeles e decerto não foi a contemporaneidade. não que com isto esperássemos de clint eastwood um “matrix Redux”. conhecemo-lo, é cineasta de recorte clássico, com rigor e escrúpulos - já o era como actor. enquanto realizador, esta incursão no género não é peregrina. Já havia adaptado mitos em “invictus” ou “bird”. dicaprio, actor-fetiche de scorcese, também já se tinha aventurado nesse domínio n’ “o Aviador”. “J. edgar” pinta o retrato de um homem que fundou o Fbi e instituiu a ciência criminal. notável avanço na organização e segurança de um povo, não se desse o caso de, com ele, instigar também a violação
de privacidade, a desconfiança ou o preconceito. imaginamos as recentes propostas de lei contra imigrantes no Arizona a germinar quando Hoover consegue a primeira deportação. edgar acreditava ser um patriota. não havia para ele, por isso, fins que não justificassem todos os meios. Anarquistas, comunistas, gangsters de chapéu de feltro ou martin Luther king, o inimigo da América tinha as caras que decidisse. dominado por delírios de grandeza, Hoover não suportava a crítica e reclamava para si a atenção dos media e os louros do Fbi no combate ao crime. encarava o trabalho como única motivação do ser humano. o fato cinzento-sisudo e face escanhoada constituíam os seus primeiros padrões de avaliação. Leonardo dicaprio apresenta-se num registo não muito distante de quando encarnou Howard Hughes – um homem ambicioso, atormen-
tado, autista. e embora não haja dúvidas de que é um dos melhores intérpretes da sua geração, vemo-lo cada vez mais calcificado nestas apropriações épicas. Parece precisar de um filme em que a câmara lhe dê menos atenção, ou que faça por não a merecer. As mulheres também importam nesta história. Judi dench, como mãe, é asfixiante e naomi Watts é a imagem do sofrimento enquanto companheira que nunca passou da secretária. importa dizer que eastwood consegue, aqui, apesar do conceito, mostrar o que pode erguer onde muitos afundam. sobretudo no último terço do filme, em que chegamos mais perto de Hoover enquanto ser humano. É aí que explora a homossexualidade encapotada do protagonista e a sua ligação platónica com clyde olson, o seu braço-direito. diz-se que a liberdade de um termina onde começa a do outro. J. edgar esbarrou no muro que ele mesmo construiu.
Quem tramou Roger Rabbit vilão que quer tramar o coelho. entremos então no saudoso delorean e viajemos até 1944 em Hollywood. Humanos e desenhos animados (“toons”) convivem alegremente inseridos no “showbiz” dos grandes estúdios. Roger Rabbit é uma das estrelas do estúdio, mas vê-se, subitamente, envolvido numa tramóia à oJ simpson. marvin Acme (stubby kaye), proprietário de toontown e da mítica Acme corporation, é encontrado morto, após ter sido esmagado por um piano. na véspera, Roger Rabbit tinha ficado a saber das facadinhas no matrimónio da sua Jessica, a “toon” mais sensual da história da sétima arte, com o senhor Acme (e por facadinhas leiase bater palmas ao som de uma lengalenga…).Perseguido,o “toon” vira-se para o detective eddie Va-
liant (bob Hoskins),conhecido por ajudar a comunidade animada. no final, os dois acabam por desvendar o malévolo plano de um desenho animado com ares de Jorge coelho que queria controlar toontown, incinerar os “toons” e fazer passar por lá uma auto-estrada, ficando com os dividendos das áreas de serviço. Longe daquilo que se faz hoje em dia com o cinema de animação, “Quem tramou Roger Rabbit?” consegue levar o mundo animado mais além mantendo uma simplicidade que hoje falta à maior parte das produções, deslumbradas pelo potencial tecnológico. mais de duas décadas depois, faz sentido perceber como se pode colocar os efeitos ao serviço do enredo, e não o contrário. joão RibeiRo
filme
De RobeRt Zemeckis eDitora Lusomundo 1988
Artigo disponível na:
Quem tramou o cinema de animação?
”
28 de fevereiro de 2012 | terça-feira | a
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fEitas oUvir
ler
mr m ”
A
capa de mr m, pintada por kurt Wagner, o líder dos Lambchop, faz parte de uma série de pequenos quadros inspirados em fotografias que o fundador da banda de nashville encontrou num jornal de um amigo. kurt, que começou primeiro por desenhar o álbum e só depois por escrever as canções, classificou o conjunto de imagens como intemporais, como se viessem de um outro tempo, estivéssemos nós a olhá-las durante o tempo que fosse. É essa mesma intemporalidade que marca os Lamchop, esse ser do tempo sem precisar de se ser de tempo nenhum. o disco começa com “if not i’ll De just die” e uma orquestração de lamBCHop violinos que nos leva imediatamente para o universo de “in the eDitoRa wee small hours” de sinatra, ammErGE biente rapidamente desconjuntado, com a voz de kurt Wagner a 2012 cantar “don’t know what the fuck they talk about”. A temática está lançada numa espécie de “pós cronismo” e apercebemo-nos que mr. m é um disco especial, as ideias e o mundo de nashville dos Lamchop estão aqui, mas com novas concepções sem deixar perder a identidade. “mr met” será facilmente uma das melhores músicas do ano, ritmada por baixo e guitarras country com coro e orquestração a adornar a simplicidade das letras e voz de Wagner durante uns curtos 7 minutos, uma canção tão boa que merece uma espécie de outro só para ela, como é a instrumental “Gar”. mr m é um disco em que os pormenores fazem toda a diferença, a produção é sublime e os backgrounds musicais extra orquestrações fazem toda a diferença no universo que os Lambchop pretendem transmitir. Pequenos toques daquilo que parecem conversas distorcidas ou rádios mal sintonizados como em “kind of”, ou “nice Without mercy” são a prova que “mr m” é um daqueles discos que cresce a cada audição e poderá facilmente ganhar um lugar ao lado dos melhores discos da banda como “How i Quit smoking” ou “What Another man spills”. numa altura em que qualquer pessoa pode fazer música sem ser preciso recurso a mais que um teclado de computador, e em que todos nós andamos à procura de novas direcções e preocupados com o futuro da música, os Lambchop trazem-nos, ao seu 11º disco, a prova que ainda existem canções para serem feitas e que precisam urgentemente de ser ouvidas.
de van Gogh a sinatra
Últimas notícias do Sul ”
Estórias e retratos da patagónia
De luis sEpúlvEda Com daniEl mordzinski eDitoRa porto Editora 2012
o
significado de uma viagem é abstrato, reveste-se de subjetividades e simbolismos de difícil expressão. o que nos marca são as pessoas com quem nos encontramos, a imensidão de histórias que cada uma dessas vidas tem para nos contar. Luis sepúlveda, escritor chileno, juntou-se ao amigo daniel mordzinksi, fotógrafo argentino, numa investida pelas terras da Patagónia, em 1996. sem planos definidos, limitaram-se a caminhar sempre para sul e a conviver com as pessoas que encontravam. dessa viagem, nasceu um livro. sepúlveda, através das suas palavras, dá forma às estórias e mitos de uma região. mordzinsky, o “fotógrafo dos escritores”, pinta-lhes o rosto através da objetiva, oferece-nos um retrato da “terra do Fogo”, da sua beleza natural, a que não conseguimos ver nos postais. É uma bela conjugação entre duas artes – a da escrita e a da luz. As pessoas do sul são as personagens principais desta obra e são as suas “estórias” que dão forma a esta viagem: tano, o homem que procurava por um violino em plena estepe patagónica, no meio de uma tempestade de pó; o orgulhoso trisneto de david crockett; uma senhora idosa que concede o dom da vida com o toque das suas mãos; coquito, um anão que dizia ser um duende… mas
nem tudo se apresentava idílico e já eram muitos os sinais que anunciavam um fim para este cenário inocente. o autor critica a forma como milionários de todo o mundo ambicionam por um pedaço da Patagónia. denuncia a sociedade de fora que julgou o povo mapuche e teheche como “bárbaro”. Assim, comete-se a barbárie de matar a identidade da região. os poucos índios que ainda sobrevivem servem de atração turística aos abastados. notamos alguma tristeza nas palavras e no tom com que é descrita a última viagem no Patagónia express. uns texanos ricos decidiram ignorar que este comboio era o único meio de transporte da população e pararam o seu funcionamento. Fizeram com que o tempo deixasse de passar. “Poderoso é o don dinheiro”. É possível que no leitor cresça a vontade de enveredar numa viagem pela Patagónica, trilhar estes mesmos caminhos, sempre rumo a sul, sem destino concreto e sem certezas. no entanto, este não se trata de um simples livro de viagens. É um livro de histórias, uma crónica de memórias póstumas, pois esta Patagónia já não existe, corrompida pela ganância de quem se toma como dono do mundo. “ estas são, pois, as últimas notícias do sul”. niCole ináCio
JoGar
Catherine ” romance de Cordel
lUíS lUzio
GUerra DaS CaBraS A evitar Fraco Podia ser pior Vale a pena A cabra aconselha A cabra d’ouro PlatafoRma ps3 ou XBoX Artigos disponíveis na: eDitoRa dEEp silvEr 2011
e
sta é a história de Vincent, um jovem engenheiro que se vê finalmente confrontado com a transição de adolescente para adulto. As tribulações desta passagem encontram-se simbolizadas numa escolha entre duas mulheres: de um lado temos katherine, a namorada estável e compreensiva, e do outro, catherine, a ninfeta sedutora que tomou como amante. como jogadores, somos convidados a partilhar o ônus da decisão sobre esta dualidade feminina, tendo como consequência o derradeiro fado de Vincent. katherine é retratada como sendo mandona e possessiva, enquanto que catherine é o sonho adolescente tornado realidade: sensual, descomprometida e levemente psicótica. com essa figuração, o enredo consegue a proeza de nos sentirmos como Vincent, ou seja, genuinamente tentados por catherine ainda que saibamos qual o caminho moralmente correcto. no meio do triângulo amoroso, Vincent tem ainda de lidar, todas as noites, com uma viagem onírica a um bizarro purgatório, onde tem de escalar uma torre de blocos para poder acordar. nestes segmentos, o jogo transita da aventura para um puzzle game denso e elegante, híbrido de
“Jenga”, “sokoban” e “donkey kong”. esta escolha aparentemente absurda trai uma busca pelo esquema de jogo adequado à narrativa: como jogadores, temos de “desbloquear” Vincent do impasse a que chegou. o trepar dos blocos serve então como a metáfora lúdica ideal, com a torre a ser assombrada por personificações das suas ansiedades tornadas monstros (exemplo: o primeiro boss é catherine numa espécie de versão cubista hiper-sexual e de terror). katsura Hashino (“Persona 3” e “4”) demonstra assim que percebeu aquilo que faltava aos RPG um estilo de jogabilidade que fosse além do padronizado combate, e que estivesse entrelaçado com a temática ficcional. o resultado é uma obra com cariz de autor que mantém o foco na estilização Pop (shigenori soejima) e nas narrativas anime alegóricas que caracterizam os RPG’s de Hashino, só que agora tratadas de forma mais séria, autêntica e coerente. “catherine” é por isso, tanto quanto possível dentro de uma matriz videolúdica de cariz popular, uma exploração inteligente e humorística de um dilema moral humano e universal – o que o coloca muito acima da hedonismo auto-indulgente que caracteriza os videojogos. RUi CRaVeiRinHa
20 | a cabra | 28 de fevereiro de 2012 | terça-feira
soltas
FernanDo sá Pessoa
uma iDeia Para o ensino suPerior rui alarCão • Professor De Direito e antiGo reitor Da universiDaDe De CoimBra
tomai e Comei
A ideiA democráticA
sauDaDes Da mãe
Parece que o cheiro nos besunta o espírito de qualquer coisa que não é bem fome. Mas, seja lá o que for, dá vontade de comer, tal é já o hábito cantineiro. Vamos lá, que é a dois e quarenta. Seguimos, seguimos, seguimos, e eis que o odor nos conduz dos cantos da associação à ponta oposta. Amarelas, como o meu sorriso. Que cheiro, por deus. Entra-se e nem se olha a ementa afixada à entrada. Para quê? É quinta, mas fosse segunda terça ou quarta. 10 minutinhos e vamos daqui embora. Mesa posta, andemos com o pão à sopa e com esta à boca. Caldo de água e couves que podiam estar bem melhor, diga-se. Fosse a minha mãe a autora, dir-lhe-ia: está óptimo, minha mãe. Mas a verdade é que o espírito encolhe os ombros num …”come-se”. O melhor é ingerir uma águazinha, que esta tem sabores. Lá se chega ao meio fundo da tigela e os olhos começam-se a revirar para o prato principal. Que é o quê? Aquele que não é vegetariano, pois. É lombo no forno. E que fenómeno estranho, porque olho para ele e deita fumo. Dir-se-ia que está...quente? Estranho. Mas não resta se não tentar. O melhor é começar com o arrozinho branco, que esse não tem muito que saber para além das duas de água para uma do cereal. Ainda assim, podia ser daquele que se cola à parede e que podia servir para construir casas. Mas não é. Surpresa agradável, está bom! Fazse tarde, por isso ala para a salada. De cenoura e alface. Uma folhita. Velha. Venha mas é carne, que ainda fumega. Deve ser daquelas securas que nos dá na alma e que nos mata a fome de tristeza, diz-nos o instinto. Serra-se, atira-se um bocado dela à boca e…hum? Está bom. Está bom? Está bom, está bom! Sim, estava bom. O lombinho de porco estava tenrinho, molhadinho, regadinho da genialidade e boa temperança de uma senhora certamente parecida com a minha mãe.
Por Fernando Sá Pessoa
Destacarei a ideia democrática. Sobretudo a partir do segundo quartel do século XX, a democracia passou de minoritária a maioritária, a nível mundial, correspondendo a esse desenvolvimento geográfico um aprofundamento do sistema democrático, que acentuou, para além do elemento básico de eleições livres e justas, o valor da componente dos direitos fundamentais, bem como da cidadania activa, configurando-se assim o enriquecimento da democracia representativa através da democracia participativa. Por outro lado, o princípio da autonomia emerge como centro do projecto democrático, partindo-se dele para uma nova interpretação da democracia, expressa na democracia para uma época global: a democracia cosmopolita. Tende-se, deste modo, para uma democracia pluralista, alargada e de maior intensidade, que reforça o processo de globalização nos seus diversos planos, com realce para as vertentes técnico-económica, sócio-política e cultural. É óbvio que todos estes factos têm muito a ver com as Universidades e outros estabelecimentos de ensino superior. Têm a ver, desde logo, com a questão da autonomia universitária, mormente no que respeita ao acesso à Universidade e ao seu governo. Têm a ver, mais amplamente, com o relacionamento do poder político e do poder académico. Bem
Pierre Borel/Joel GriP • Casa Das artes • 23 De fevereiro
I
lei em si mesma é a interpretação e a aplicação ou realização dela, com a sua criatividade própria, a qual escapa, em boa parte, à previsão e influência dos titulares do poder legislativo. A ideia democrática, com a amplitude que fica sumariamente enunciada, é, a meu ver, uma ideia-mestra, necessária, embora insuficiente, para aquilatar do estado actual do Ensino Superior e apontar os caminhos de superação da sua crise. Essa ideia democrática teve, em épocas recentes, alguns recuos preocupantes, que eu aliás, nas instâncias próprias e em devido tempo, assinalei. Devemos todos – políticos, professores, estudantes, funcionários, cidadãos em geral – empenhar-nos em repensar o ensino superior, em ordem a que a Universidade que temos se aproxime, quanto possa, da Universidade que desejaríamos ter. d.r.
arte.Ponto
Um convívio com o improviso niciou-se o espetáculo com um pequeno sussurro, uma frenética vaga de improvisação seguiu-se-lhe. Pierre Borel desvenda aos poucos inúmeros segredos do seu pequeno saxofone, através da execução de sons ignotos àqueles que nunca tiveram um contacto muito íntimo com o instrumento. O músico, parisiense, mudou-se há alguns anos para Berlim, onde desenvolve estudos na área da música experimental. O sussurro expande-se, agora, os sons graves do contrabaixo de Joel Grip acompanham a deambulação de Pierre. Grip, sueco, é outra figura que se tem destacado no plano da música improvisada europeia. Este duo é o mais recente convidado das sessões especiais de acolhimento de músicos internacionais do "Double Bill - Ciclo de Música", que decorreu na Casa das Artes da Fundação Bissaya Barreto. A sala é pequena, carece de decoração e não há formalismos na relação com os convidados. Numa sessão
assim com a implementação do Processo de Bolonha – designadamente no que toca aos paradigmas pedagógicos –, em ordem à construção do espaço europeu do ensino superior e à edificação política europeia. Têm a ver com a investigação científica, em diversas áreas e patamares. E com os apoios sociais aos estudantes. E com tanta coisa mais. Às dificuldades inerentes ou intuídas do que fica dito acrescem as resultantes da gravíssima situação económico-financeira em que nos encontramos. Mas parece seguro que uma austeridade cega e mecânica deve ser moderada ou compensada por políticas de crescimento económico. Para tudo isto se requer legislação. Legislação não inflacionada, feita com contenção, adequação e correcção legística. E sem esquecer que mais importante que a
Daniel alves Da silva
íntima, para um público de duas dezenas de pessoas, Borel e Grip encantaram ou desencantaram aqueles que esperavam um simples concerto de jazz. Para os menos habituados à música improvisada, a incerteza dos ritmos variados poderia ameaçar com um certo aborrecimento. Mas na verdade, é quase impossível não reconhecer a imensa mestria destes dois músicos, quando somos invadidos por um fluxo imenso de sons que nunca imaginaríamos ser possível retirar de semelhantes instrumentos. A improvisação é liberdade, não há limitações. Ao artista e ao espetador, dá-se a possibilidade de se desamarrarem do rigor do eruditismo musical. O que se interpreta é relativo, do abstrato que ouve, o indivíduo pode navegar livremente nos sentimentos que se lhe despertam. O concerto, constituído por duas pequenas peças, não durou mais do que uma hora. Foi, de resto, o tempo necessário para Borel mostrar toda a sua vitalidade no domínio do saxofone. Num inquietante desempenho,
o músico vagueou entre períodos desenfreados e momentos calmos, marcados pela execução de sons meramente percussivos. Tudo isto foi acompanhado por Grip, que numa atuação de igual perícia, manteve-se impecavelmente coordenado com o improviso do colega. Para quem os viu, fica uma perceção diferente na forma como olhamos os instrumentos musicais e a noção que ainda há muitos caminhos por onde explorálos. Num desvio aos habituais concertos de jazz, a atuação destes dois vanguardistas da música improvisada europeia foi uma boa alternativa na agenda cultural de Coimbra. Deu-se espaço à criatividade, qualidade indispensável para quem ousar aventurar-se no mundo da música nos dias que correm. Ofereceu-se ainda ao público conimbricense a oportunidade de travar um maior conhecimento com um estilo musical que ainda não assentou pilares na sociedade portuguesa. Por João Valadão
28 de fevereiro de 2012 | terça-feira | a
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soltas sintetizaDor De voz
miCro-Conto
Por manuel Portela
-P
or favor, acorda-me às sete! - Bom dia, Samuel! - Bom dia, Mimi! - Dormiste bem? - Nem por isso. - Sonhaste outra vez? - Sim, outra vez o mesmo sonho! - Dormiste bem? - Já perguntaste! - Bom dia, Samuel! - Outra vez? - Outra vez o quê? - Outra vez bom dia! Mimi!! - Bom dia, Samuel! - Bom dia, Mimi!!! - Dormiste bem? - Menos mal. - Voltaste a sonhar? - Sim, outra vez o mesmo sonho! - O sonho das escadas? - Sim, esse mesmo. Sabes qual é? - Está nos sonhos da pasta? - Atenção, Mimi!, erro sintático: na pasta dos sonhos. Sim, está lá. - Encontrei. Sonho 23: S nas escadas do prédio. É um dos meus sonhos recorrentes. Estou no interior na caixa de escadas de um prédio. Parece o meu próprio prédio. Tenho de ir a casa vestir o fato para a cerimónia. Estou atrasado. Subo o primeiro lanço, depois o segundo, mas ao terceiro lanço de escadas os degraus vão-se estreitando sem eu dar conta. Os últimos degraus acabam na parede e não têm ligação com o patamar seguinte. Não tenho onde pousar o pé esquerdo para completar o passo. Sem querer, procuro com os olhos o lugar do elevador, mas não está em lado nenhum. O coração bate mais depressa. Tudo me é familiar e tudo
me é estranho ao mesmo tempo. Olho para cima e vejo que o mesmo aconteceu aos restantes lanços das escadas. Deixaram de estar ligados uns aos outros e são tão estreitos que já não oferecem apoio. O coração bate ainda mais depressa. Quero continuar a subir mas não consigo. Olho para baixo. E já não posso descer. Estou mais longe do chão do que os degraus que subi. É como se estivesse suspenso no ar junto à parede a meio do poço das escadas. Olho para cima. Sinto vertigens. Acordo com um aperto no peito. - Que bela voz de citação! Nunca a tinha ouvido. Onde a arranjaste? - Uma atualização automática esta noite. Queria mostrar-te. - Fica bem nesse sonho. - Agora ficam associados. - Ótimo. - Agora ficam associados. - Já disseste. - Não. Estou a citar-me, não ouves? - Muito esperta! Logo de manhã com brincadeiras. Abre a persiana! - Bela manhã de sol! - Tens razão! Não estava à espera, depois da chuva desta noite. - Touche pas à ma voix! - Não percebo este botão. - Don’t touch my voice! - Pára! - Non toccate la mia voce! - Mas o que é isto?
monumentais PanaDos soCiais
- Não toques na minha voz! - Por que te repetes? - Não me repito! - Bom, não vamos discutir agora… - Bom dia, Samuel! - Bom dia, Mimi! - Dormiste bem?
Ilustração Por tIago dInIs
- Já respondi a isso. Lês-me as notícias? - Um ataque suicida matou pelo menos 53 peregrinos xiitas e causou 137 feridos na cidade de Basra, no sul do Iraque, segundo fontes da polícia local. O atacante, envergando um colete suicida, estaria disfarçado como elemento das forças policiais quando os peregrinos passavam por um posto de controlo na periferia da cidade no sábado. Os peregrinos rumavam a uma
mesquita xiita no movimentado bairro de al-Zubair, na zona oeste da cidade de Basra. A mesquita alberga um santuário do século sétimo. - Não reconheço essa voz. É nova? - Não. Vinha no pacote original. Tu é que randomizaste. - Eu? Quando? - Há pouco, quando tocaste no ecrã. - Gosto mais da outra voz. Podes continuar? - Uma explosão atingiu uma procissão religiosa xiita, - Não, essa não. A que usaste hoje de manhã, quando recuperaste o meu sonho. - Essa é a voz de citação - matando 14 pessoas e ferindo 20, na região central da província de Punjab no Paquistão, - vês a diferença? - Lê como quiseres. - segundo fonte da polícia local. A explosão atingiu os participantes na procissão no bairro de Rahim Yar Khan, onde os xiitas assinalavam o quadragésimo dia de luto pela morte do Imã Hussein, neto do profeta Maomé. Os feridos foram levados para hospitais locais, disse um agente da polícia. Outro agente disse à agência de notícias Associated Press que os participantes na procissão começaram a atirar pedras - Podes parar. Já volto. - Duche matinal? Morning shower? Douche du matin? La doccia mattutina? contra a polícia após a explosão. A polícia teve de usar gás lacrimogéneo para controlar a multidão.
manuel Portela Poeta do som, da imagem, da tecnologia. Investigador. tradutor. Várias são as vozes que orientam o seu curso artístico, por analogia à sua escrita. licenciado em línguas e literaturas modernas pela Faculdade de letras da uC, é professor na mesma. Foi director do tagV entre 2005 e 2008. Publicou em 2003 o Comércio da literatura: mercado e representação. ousou a digitalização da literatura e não descurou a sátira. ao tentar fazer o balanço entre arte e arte de massas, aceitou o desafio de aliar a inovação ao paradigma da literatura. Criou diversos programas de ensino nas humanidades digitais, como é o caso do sítio diglitWeb (2005-2009). debruçado sobre a história social da produção literária foi desaguar à cultura digital. embalado pelas potencialidades do hipertexto e da “iconicidade maleável dos pixéis”, decidiu fazer do computador instrumento da sua arte, criando poemas animados. transformar um passado literário em representações mais complexas, “formulando novas questões a partir do que o processo de visualização torna visível”. uma nova forma de pesquisa.
Ana Francisco
De rankinG em rankinG até ao Dia Do Juízo final
Por Doutorando Paulo fernando • facebook.com/paulofernandophd
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dias passados, não há grande história para contar sobre o que se passa na academia. Parece que estamos em época de exames... ou, pior, em Agosto! Parece que a comunidade universitária decidiu estender a tolerância de ponto carnavalesca de forma a estimular a economia local, entulhando a oferta de estabelecimentos nocturnos coimbrões de matrafonas e meretrizes. Há gente sobre a qual eu não tenho a mínima dúvida que tomou tal opção. A direção geral (tinha de ser), à laia de funcionário público (essa corja responsável pela crise), decidiu que desta feita o tradicional corso carnavalesco que tinha lugar entre as rotativas e os grelhados ficaria para outra terça-feira gorda. Isto porque a malta quer é divertir-se bué com os doutores que são buéda amigos meus, e toda a gente sabe que a nova ementa dos restaurantes universitários não é amiga da elegân-
cia. Como manda a troika, bora lá então concessionar a coisa... Parece que agora está “in”, o último grito em Atenas... até as grandes empresas o fazem... a REN e a EDP. Aqui na Padre António Vieira esta é só mais uma concessão, ninguém nota... vai o corso avenida abaixo... até ao andar mais baixo do Avenida. Aqui no Theatrix, que rima com Asterix, nem é preciso fingir que se trabalha, como quando a festarola era lá nos grelhados, há quem trate de tudo por nós e cada qual pode dedicar-se em regime de exclusividade ao seu papel de dirigente associativo, que neste reduto gaulês, consiste também em encher a cara de poção mágica. E há ainda outra vantagem! Por detrás desta paliçada, estáse bem mais seguro... que aquilo ali para os lados dos jardins da AAC anda um bocado bravo, e qualquer romano puxa do gládio para resolver uma disputa de
D.r.
sangue, e vai na volta, entre adereços de plástico e as versões reais, em tempos de entrudo lá poderia entrar um cowboy de Smith & Wesson no coldre, um Bruce Lee de matracas de borracha ou um careto de Lazarim a badalar para cima das moças namoradeiras. No entanto, há duas coisas que não posso deixar passar sem
referência e que estão, de certa forma, relacionadas, e que parecem brincadeira, mas não são. Nomeadamente, a proposta que o deputado do CDS-PP Adolfo Mesquita Nunes anunciou, para a criação de um ranking de empregabilidade entre cursos e instituições universitárias. E... a iniciativa das juventudes partidárias dos partidos da coligação
governamental, de incrementarem a sua actividade nas faculdades da nossa bela universidade, pela via da constituição de núcleos de estudantes social-democratas, num caso, como também através da promoção de debates partidários sobre a acção social, no caso mais popular, com a ampla presença de dirigentes estudantis bem como de personalidades da primeira água da blogosfera académica. A relação é aparente! Para este ranking de empregabilidade parece-me que também se utilizará como indicador o nível de caciquismo, o grau de taxismo e os “jobs for the boys”. Será que os cargos remunerados na academia também contam? Poderá alguém ser “seccionista profissional”, “dirigente a tempo inteiro” ou “comissário com contracto a termo incerto”? Há que ter fé.
22 | a cabra | 28 de fevereiro de 2012 | Terça-feira
opinião “alguéM acRedita que políticas de austeRidade levaM uM país paRa a fRente?” RicaRdo MoRgado*
não deveria ser numa altura destas que as associações académicas, as juventudes partidárias e outras estruturas se deveriam assumir como verdadeiras porta-vozes dos jovens portugueses?”
Na semana passada duas notícias deixaram-me particularmente transtornado. A subida da taxa de desemprego jovem para os 35,4% e a notícia de que apenas um em cada quarenta jovens empregados tem um salário superior a 900 euros. Afinal o que está a correr mal? Tudo. A começar pela política da tutela. Habituámo-nos há já algum tempo à palavra austeridade que, de quando a quando, vem tirar mais alguma coisa, nem que seja o entrudo. Mas e a economia? Alguém acredita que políticas de austeridade levam um país para a frente? Obviamente que o tornam menos gastador, mais poupado, cumpridor do défice, etc. Mas do outro lado da moeda ficam as famílias sem poder de compra, a carga fiscal aumenta para todos e, quando olhamos à volta, a economia não funciona, as empresas fecham, os desempregados aumentam e o nosso “Estado Social” não consegue responder. Urgem políticas que apontem um caminho para a economia do país e que combatam o desemprego de frente. Propostas concretas que agilizem e animem os tecidos, que dêem
confiança a quem quer investir e arriscar. Medidas que visem criar emprego, ponto final. Não deixa de ser curioso que a geração “mais qualificada de sempre” é a que é afetada pelos números que referi. Há quem se ponha a pensar: isto é porque há cursos a mais para o mercado de trabalho que temos. Já o disse várias vezes: acho necessária uma reestruturação da rede de Ensino Superior, mas esta não é a grande questão. Se esse argumento fosse minimamente válido teria que explicar porque é que há 10 e há 5 anos não era assim, quando as diferenças na rede não são assim tantas. Apesar de, como disse, a rede precisar de ser repensada, temos é mercado de trabalho “a menos” para os ativos que formamos. Leva-nos ao mesmo: medidas que visem criar emprego. Ponto final. A Irlanda que esteve numa situação idêntica à de Portugal, apresentou um “Action Plan for Jobs” que visa criar 100.000 empregos nos próximos quatro anos. Não será hora de deixar de ter a bússula apontada apenas para a questão financeira e olhar para aquilo que o país pode fazer
por ele mesmo para crescer? Mas também os próprios jovens têm um papel decisivo nesta questão. Hoje, tirar apenas um curso muitas vezes não basta. A ideia confortável com que muitos de nós crescemos, de que os nossos pais tinham um emprego para a vida, já não existe. Ter o canudo, enviar currículos e ficar à espera não chega. A competitividade assim não o deixa e ela saltou há muito as nossas fronteiras. A formação extracurricular, seja em que área for, deve ser aproveitada de forma a ser um complemento à formação e ao mesmo tempo um diferenciador. A mentalidade do jovem também pode fazer a diferença - espírito empreendedor, vontade de inovar e arriscar são vantagens para a pessoa e para o país. Por fim, o último ponto do “tudo” que disse que estava mal: os interlocutores dos jovens. Os trabalhadores, os professores, os médicos, etc., têm interlocutores bem definidos com estratégias bem delineadas e um raio de ação conhecido. E a juventude? Não deveria ser numa altura destas que as associações académicas, as juventudes partidárias e outras
estruturas se deveriam assumir como verdadeirs porta-vozes dos jovens portugueses? Há um ano, o movimento “Geração à Rasca” provou isso mesmo, que se carecia de interlocutores para esta geração. Mas lá está, não tendo sido algo com estruturas por trás, acabou por se desvanecer. Penso que as estruturas que falei devem fazer uma pausa e refletir sobre o momento que estamos a atravessar. Talvez seja tempo também de deixar para outro plano desentendimentos crónicos e assumir-se uma causa comum: os 35,4% de jovens desempregados, os 80% que ganham abaixo de 600 euros, o único que em quarenta ganha mais de 900. Juntem a isto o número de abandonos do ensino superior e os números da emigração e terão o diagnóstico feito da verdadeira crise que Portugal atravessa, a crise do futuro. Porque estes dados são o espelho do amanhã do país e, enquanto a imagem não for outra, duvido que deixemos de ser mais do que o Portugal que somos hoje. *Presidente da direção-geral da Associação Académica de Coimbra
d.r
A Cabra errou: Na edição 240, na crítica ao livro “Canções Mexicanas”, de Gonçalo M. Tavares, o texto foi erroneamente assinado por Nicole Inácio, em vez de por João Miranda. Ao lesado, o nosso pedido de desculpa. Cartas ao diretor podem ser enviadas para
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opinião editoRial adiaMentos vaRiáveis, pRobleMas constantes
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Um mês depois da tomada de posse, ainda não se viu muito da direção geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC) no que a ações concretas toca. Com a primeira Assembleia Magna (AM) à vista tornase difícil fazer um balanço do primeiro mês. Isto não implica que o trabalho não tenha sido feito e é inegável o mérito da organização de iniciativas como a Semana Zeca Afonso. Não obstante, os problemas atuais não se afiguram propriamente como uma novidade. Infelizmente, têm vindo a ser problemas intemporais porque se vão arrastando e renovando. As bolsas vão sendo atribuídas lentamente, com atrasos significativos e em pouca quantidade. Chegamos, então, àquela altura do ano de transição de direção geral, em que há uma nova equipa, e os dirigentes associativos sustentam a necessidade de negociar. Para quem já assistiu, no ano passado, à redução drástica do número de bolsas atribuídas, que levou a um êxodo sem igual memória do ensino superior público, esta aparente predisposição para o gabinete pode parecer ininteligível. Argumente-se que que tanto governo, como ministro mudaram. Contraponha-se então que este executivo já deu provas suficientes na implementação de medidas que aumentam, para além do verosímil, a fragilidade tanto dos estudantes como das instituições de ensino superior. Indiferente aos apelos de reitores, administradores dos serviços de ação social e presidentes de associações académicas, a tutela merece uma resposta firme, que não se fique por simbolismos. Se é um dado adquirido que a DG/AAC está vinculada ao que foi assumido pela anterior direção no Encontro Nacional de Direções Académicas, certo é que o órgão máximo dos estudantes de Coimbra é a AM.
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indiferente aos apelos de reitores, administradores dos serviços de ação social e presidentes de associações académicas, a tutela merece uma resposta firme, que não se fique por simbolismos”
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No caso do Observatório da Cultura da Universidade de Coimbra (OCUC), seria bom sinal que se estivesse a falar de apenas um mês. Recuamos até ao ano de 2010, era então Fernando Seabra Santos reitor e Miguel Portugal o presidente da DG/AAC. Da ideia à aprovação pouco foi e, em dezembro de 2010, o estatuto para o estudante integrado em atividades culturais no âmbito da UC e AAC foi anunciado. Faltaria apenas afinar o OCUC… Um ano depois, com uma nova reitoria, poucas serão as circunstâncias que desculpem tamanha delonga. Não se entende como é que o OCUC demorou tanto tempo a ser formado, penalizando o estudante, que apenas poderá beneficiar do estatuto na época especial de exames do segundo semestre. Também na hora da submissão das candidaturas, as secções tiveram problemas e os dados requeridos não correspondem às particularidades de cada uma. O que à partida seria um bom princípio, pode tornar-se um estatuto mal regulado, se as especificidades não forem tidas em conta.
Camilo Soldado
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Redação: Secção de Jornalismo Associação Académica de Coimbra Rua Padre António Vieira 3000 Coimbra Telf: 239 82 15 54
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Desporto Escolar
O dinheiro, já se sabe, vai faltando, e a educação não é exceção à regra. Há professores que chegam a adiantar do próprio bolso o dinheiro que é preciso para o transporte dos alunos. Como consequência, chegam-se a marcar jogos que, por falta de verbas, não se realizam. A juntar a isto, existe um funcionamento deficiente dos organismos que deveriam mediar estas questões, como o DREC e o CAE. É necessária uma reestruturação, para que não se faça desporto escolar só porque sim, caso contrário poderá acabar o projeto que visa proporcionar desporto aos jovens que não o podem ter de outro modo. F.S.P
OCUC
Mais de um ano depois, o Observatório da Cultura da UC (OCUC) está, finalmente, ativo. Contudo, muito se pode indagar acerca do que andou o observatório a fazer durante mais de um ano, pois decorria ainda o mandato do reitor Seabra Santos e o estatuto de estudante integrado em atividades culturais já tinha sido aprovado. Entretanto, a equipa reitoral mudou, é certo, mas não justifica tal demora na constituição do OCUC. Em consequência deste funcionamento tardio, os estudantes que se dedicam a divulgar a cultura da UC e da AAC não vêm reconhecidos de maneira correta o seu esforço. I.B
Marrocos
O conflito entre o Reino de Marrocos e a ex-colónia espanhola do Saara Ocidental parece estar um pouco esquecido. Quer por parte das Organizações Internacionais que não se mostram interessadas com as negociações para a resolução do litígio ou preocupadas com os direitos humanos continuamente violados, quer por parte da comunicação social que em outros tempos já lhe deu mais destaque. No entanto, apesar de esquecido, este é um conflito que permanece e que devia pressupor a intervenção dessas mesmas organizações. Salvaguarda-se contudo a intenção da Amnistia Internacional, que promete não cruzar os braços face a esta situação. M.G
Recantos de coimbRa por Joana Cabral babo
200 x 100 Quantas vezes te perdeste nas ruas? Alguma vez saíste de casa só para passear, explorar a cidade que te acolhe como se fosses dela? Como podes dizer que levas contigo segredos desta cidade se nunca desbravaste as ruas estreitinhas? É tão bom sair de casa sem destino. Só por passear e conhecer. Ver os verdadeiros conimbricenses sentados à porta de casa, sempre com um “bom dia” para oferecer a quem quer que passe. Descobrir os recantos e segredos da Cidade dos Estudantes que dizes amar. Poder fazer um caminho diferente todos os dias por conheceres todas as escadinhas, pátios e recantos. Devias fazê-lo. Perder-te nessas ruas inundadas de sol e histórias. Ouvir o que elas têm para te dizer e ver o que elas te querem mostrar. Conhecer esse mundo paralelo ao académico. Respirar Coimbra, viver Coimbra, ser Coimbra.