Revista Decisum

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blicação singular e inédita no Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Veiculando decisões, pareceres e consultas mais significativas prolatadas pelo conselheiro no decorrer do segundo semestre de 2006, a revista reúne também artigos de autoria de integrantes do corpo técnico do gabinete e seleciona fatos sociais e institucionais relevantes. Decisium reserva, ainda, o espaço “Mineiranças” para a divulgação artística e cultural mineira. O principal escopo da iniciativa com o lançamento da revista é contribuir para o aprofundamento das discussões de temas relacionados ao controle dos atos da Administração Pública, especialmente aqueles que foram ou estão sendo objeto de análise pelo Tribunal de Contas. A publicação de artigos, com abordagens mais amplas e variadas, busca estimular o esforço pelo aperfeiçoamento e o interesse pela pesquisa, ampliando a temática abordada pela revista, com matérias de interesse jurídico de forma geral. Ademais, a revista Decisium colabora com a divulgação institucional do Tribunal de Contas, não obstante estar focada apenas nas atividades do gabinete do conselheiro Andrada e de seu corpo técnico. E tal iniciativa vai ao encontro do esforço comum pelo fortalecimento do Estado de Direito Democrático, onde transparência e informação são requisitos indispensáveis ao exercício pleno da cidadania. É, assim, singela, mas significativa ação contributiva para o alargamento dos canais dialógicos que devem sempre existir entre os órgãos de controle do Estado e a sociedade. Na medida em que a maturidade democrática avança sobre a sociedade brasileira, cresce a importância do papel desenvolvido pelos órgãos de controle, pois quanto mais a democracia se consolida entre nós, maior é a exigência de fiscalização e de transparência dos atos públicos. O Tribunal de Contas assume, assim, cada vez mais, ao lado de outras Instituições afins, função primordial no Estado Contemporâneo. Nesse contexto, a revista Decisium representa gesto salutar, e surge para transitar em espaço bastante amplo que ainda precisa ser melhor explorado não só pelos cidadãos e a sociedade como um todo, mas pelas próprias instituições estatais.

>> EDITORIAL

A revista Decisium, do gabinete do conselheiro Antonio Carlos Doorgal de Andrada, é pu-



>> ÍNDICE

Notícias

07

Andrada é eleito conselheiro do TCE

07

Andrada faz abertura de seminário em Juiz de Fora

15

Conselheiro participa de seminário nacional em São Paulo

16

21 Julgados 22

CONSULTA Nº 711.005

25

PROCESSO Nº 711021

32

PROCESSO Nº 709.101

36

RECURSO DE REVISÃO: Nº 666.571

45

PARECER DA LAVRA DO CONSELHEIRO ANTÔNIO ANDRADA

Mineiranças

51 57 Artigos 58

O Parlamento e o controle político da Administração Pública

72

O pós-positivismo e o papel do juiz em um Estado Democrático de Direito

87

O vice-prefeito no processo eleitoral: uma visão atual

91

A natureza jurídica do parecer prévio emitido pelos Tribunais de Contas estaduais e admissibilidade de recurso


6


>> NOTÍCIAS

Andrada é eleito conselheiro do TCE Antônio Carlos Andrada, deputado e líder do PSDB na Assembléia mineira, foi eleito com 41 votos para ocupar a vaga de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado

>>

Em disputa acirrada, a Assembléia Legislativa de

do ex-deputado José Ferraz, no ano de 2004, e pas-

Minas elegeu, no dia 9 de março de 2005, o depu-

sa a ser o conselheiro mais novo da história do TCE.

tado estadual Antônio Carlos Andrada (PSDB) para

O cargo é vitalício, tendo o conselheiro as prerro-

o cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do

gativas de desembargador. Aos 44 anos, deputado

Estado (TCE). Embora a votação tenha sido aperta-

estadual no segundo mandato, diz não temer dis-

da, Andrada foi eleito por 41 votos contra 35 ob-

putas políticas, pois foi nascido e criado entre elas

tidos pelo deputado Sebastião Helvécio (PDT) e um

em Barbacena. “Vou levar toda essa experiência

pelo funcionário da Assembléia Alexandre Bossi.

para o Tribunal.”

Os ventos sopravam a favor de Antônio Carlos An-

Relator da Comissão Especial criada pela Assem-

drada. A falta de um candidato natural – como foi

bléia Legislativa em 2003 para analisar a situação

na eleição de Wanderley Ávila no ano passado -, a

do Tribunal de Contas, Andrada fez sua campanha

condição de líder do PSDB e do bloco Parlamentar

de conselheiro com propostas de modernização do

Social Progressista (PSDB/PDT/PTB/PPS e PSB) e,

TCE, reafirmadas tão logo foi anunciado o resulta-

principalmente, seu ótimo trâmite com os colegas,

do de sua eleição. “Entendo que o Estado brasileiro,

tanto do governo quanto da oposição, sinalizavam

e aí com atenção especial aos tribunais de contas,

para sua aceitação. “De uma certa maneira, a po-

precisa se aparelhar melhor, se modernizar, para

sição de líder me dá mais oportunidades e maior

combater os que agem à margem da lei, cada vez

visibilidade, mas acredito que neste embate os de-

mais aparelhados com equipamentos de alta tec-

putados levaram em conta o relacionamento entre

nologia em informática e que mobilizam e movi-

colegas”, afirma Andrada.

mentam dinheiro público”, explica.

Andrada ocupa a vaga que foi aberta com a morte

<<

Fonte: jornal O Tempo - Simara - 10/3/2005

>> O Conselheiro Antônio Carlos Andrada ladeado pela sua esposa Paula, sua mãe Amália, seus filhos e irmãos.

7


Pronunciamento do conselheiro Antônio Carlos Andrada Pronunciamento do conselheiro Antônio Carlos Doorgal de Andrada por ocasião de homenagem da Corte de Contas de Minas Gerais pela sua investidura no cargo em 22 de março de 2006.

22/3/06

8

Constitui para mim grande honra integrar esta

ciente e imparcial que contribua para uma boa ad-

Egrégia Corte de Contas como seu conselheiro. Esta

ministração, promotora de ações que reduzam as

Casa é produto da evolução pública e cívica, pre-

desigualdades sociais, ofertando a todos educação

sentes, sobretudo, entre nós mineiros, amantes da

e saúde de qualidade, serviços públicos eficientes e

Democracia e da Liberdade.

crescimento econômico que se traduza em aumen-

Embora a história do controle no Brasil remonte ao

to da renda da população.

período colonial, a idéia de um Tribunal de Contas

Minhas senhoras, meus senhores, e meus eminen-

data de 1826, quando Caldeira Brandt, Visconde

tes companheiros de trabalho no Tribunal de Con-

de Barbacena, e José Inácio Borges propõem sua

tas do Estado de Minas Gerais:

criação no Senado do Império. Mas é com a ini-

Perdoem-me se inicio minha alocução sobre tema

ciativa de Rui Barbosa, então ministro da Fazenda,

tão bem conhecido por todos. Mas nunca é demais

que o Tribunal de Contas da União é criado através

revisar conceitos sobre controle externo da Admi-

do Decreto 966-A, em 1890, para ser acolhido no

nistração Pública, sobretudo agora que o requisito

ano seguinte pela primeira Constituição Federal da

da “transparência” é lembrado à exaustão por to-

República. A partir daí, a história do controle da

dos os setores da vida nacional.

Administração Pública no Brasil percorre longa tra-

Fiel às minhas raízes familiares, era natural que me

jetória, repleta de percalços, avanços e recuos, até

voltasse, ao me formar como Bacharel em Direito,

os dias atuais.

para a Administração Pública e para as lides políti-

Criado pela Constituição Mineira de 1935 e extinto

cas. Assim, elegi-me vereador à Câmara Municipal

em 1939 pelo Estado Novo, o Tribunal de Contas

de Barbacena, em 1989. Ali forjei as primeiras lições

de Minas Gerais ressurge como produto da rede-

e compreensões acerca das atividades públicas, e

mocratização de 1946, para ser disciplinado pela

aprendi que a representação local é extremamente

Constituição Mineira de 1947. Desde então, o nos-

autêntica e rica em ensinamentos. Meu passo se-

so Tribunal de Contas vem mantendo presença

guinte foi o Executivo Municipal, quando à frente

marcante na vida pública mineira, para alcançar,

da Prefeitura de Barbacena pude promover ampla

com a Constituição Federal de 1988 e a Mineira

reforma administrativa e dinâmica gestão gover-

de 1987, patamar ainda mais elevado face às suas

namental. Pude conhecer as agruras dos dirigentes

novas atribuições.

municipais brasileiros, sempre diante de problemas

O papel a ser desempenhado pelos Tribunais de

sociais maiores que os instrumentos e os recursos

Contas, em face desta situação, se agiganta dian-

disponíveis, numa luta diária para decidir e priori-

te do clamor popular por um controle efetivo, efi-

zar questões, muitas vezes em detrimento de ou-


tros encaminhamentos não menos importantes.

na Assembléia Legislativa, tive oportunidade de

No biênio 1997/98, atuei como assessor especial

atuar como relator da Comissão Especial instituída

do então governador Eduardo Azeredo, desenvol-

para analisar a atuação deste Egrégio Tribunal. Pro-

vendo diversos trabalhos, dos quais destaco os que

movemos, à época, um trabalho construtivo, que

promovi junto ao Fundo Penitenciário do Estado e

produziu efeitos positivos na instrumentação jurí-

na implantação, em nossos municípios, do Código

dica e administrativa desta Casa, como a aprovação

Brasileiro de Trânsito. O ano de 1999 assinala meu

da Emenda à Constituição do Estado n. 69/2004,

ingresso no Parlamento Mineiro. Naquela legislatu-

que criou o Ministério Público Especial, conforme

ra, ocupei a vice-presidência da Comissão de Edu-

decisão do Supremo Tribunal Federal, e a que fi-

cação, Cultura, Ciência e Tecnologia e tive a honra

xou o número de auditores a serem nomeados após

de ser escolhido líder da bancada do meu partido e

aprovação em concurso público. Foram momen-

da oposição. Em 2002, reeleito deputado estadual,

tos em que pude debruçar-me sobre a questão do

fui honrado novamente com a escolha para lide-

controle da Administração Pública, sedimentando

rar a bancada, função que acumulei com a de líder

a visão que já tinha dos órgãos estatais no setor.

do Bloco Parlamentar de sustentação do governo.

Tudo isso me serve de subsídio para o balizamen-

Membro da Comissão de Fiscalização Financeira e

to do trabalho que aqui inicio. É claro, ao lado da

Orçamentária, fui relator-geral do Orçamento do

rica experiência diária que terei na convivência

Estado para o exercício de 2005, quando Minas Ge-

com meus colegas conselheiros, com o qualifica-

rais atingiu o equilíbrio de suas contas, o chamado

do quadro técnico de servidores da Casa e o in-

“déficit zero”. No dia 9 de março de 2005, fui es-

dispensável aprendizado das salas de aula – é que,

colhido pelo plenário do Parlamento Mineiro para

recentemente, retomei os bancos universitários de

integrar este Tribunal de Contas, na vaga aberta

pós-graduação na área da Administração Pública e

com o falecimento do sau-

das Instituições Políticas.

doso Conselheiro José Ferraz.

A Constituição Federal de 1988

Dou começo a esta jornada em

concedeu aos Tribunais de

posição de humildade, aquela

Contas dos estados um status

humildade que não é sinôni-

privilegiado como órgão autô-

mo de subserviência, mas do

nomo e auxiliar do Poder Le-

desejo de aprender mais para

gislativo, na importantíssima

poder ajudar mais. Esta tem

missão de controlar e fiscalizar

sido, aliás, a postura por mim

as contas dos administradores

adotada em todas as etapas da

públicos. De fato, o artigo 71

minha vida pública.

da nossa Carta Política dá ao

Durante minha permanência

Poder Legislativo a titularidade 9


do controle externo e nomeia as Cortes de Con-

paração dos poderes”, a sua finalidade e “o motivo

tas como auxiliares necessárias a essa atividade.

pela qual ela existe é a liberdade. Ela existe para

Foi ainda mais longe a nossa Constituição Federal

assegurar a liberdade”. E um dos desdobramentos

ao tratar dos Tribunais de Contas, discorrendo, em

da liberdade na vida democrática, como evolução

seu texto, uma série de atribuições outras como a

do direito político nos séculos XIX e XX, é o plura-

de “julgar as contas dos administradores e demais

lismo, que também alterou a fisionomia dos esta-

responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos

dos. Nessa linha de raciocínio, o Estado, que na sua

da administração direta e indireta”. Assim, além

origem era o centro absoluto da vida pública, deixa

do auxílio ao Poder Legislativo, têm os Tribunais

de sê-lo com o passar dos tempos para assumir a

de Contas vasta competência exclusiva por força

posição de referência, num mundo cada vez mais

de normas constitucionais. Os Tribunais de Contas

complexo, compartimentalizado e globalizado. Um

são, assim, a primeira e a última palavra – ao mes-

mundo novo, onde a economia ultrapassa as fron-

mo tempo – para todas

teiras estatais com um

essas contas que não se-

“... além do auxílio ao Poder

capitalismo voraz, tecno-

jam apresentadas como

Legislativo, têm os Tribunais

lógico e informático de

próprias dos chefes dos

de Contas vasta competência

dimensões planetárias e

Poderes Executivos nas

exclusiva por força de normas

a sociedade ocupa papel

esferas federal, estadual

constitucionais.”

de crescente poder atra-

e municipal. O poder ju-

10

vés de movimentos civis

dicante aí se estende de forma ampla sobre milha-

e populares de massa, da mídia e de organizações

res de administradores públicos pelo Brasil afora.

não-governamentais, nacionais e internacionais,

Não sendo poder constituído, são os Tribunais de

diluindo sobremaneira o poder antes concentrado

Contas órgãos autônomos inseridos no âmbito do

nos estados. É nesse contexto, nos ensina o profes-

Poder Legislativo, por vinculação. Estão os Tribu-

sor Diogo de Figueiredo, que surge o Estado plura-

nais de Contas para o Legislativo, como os Minis-

lista, com vários “centros de poder difusos”, para a

térios Públicos federal e estaduais estão para o Po-

“afirmação do pluralismo político como resposta ao

der Judiciário. São órgãos vinculados, mas não por

pluralismo social”.

subordinação. Aliás, o eminente jurista e professor

Esse pluralismo sociopolítico que vivenciamos ex-

Diogo de Figueiredo Moreira Neto destaca “a ex-

prime um direito fundamental que precisa ser ga-

trema modernidade com que se apresenta o fenô-

rantido pelo Estado. Dessa forma, impõe-se ao Es-

meno dos órgãos constitucionalmente autônomos”

tado Contemporâneo reorganizar-se para além da

no ordenamento jurídico brasileiro. Ele remonta às

concepção clássica da Separação dos Poderes, bus-

lições de Montesquieu para quem a concentração

cando avançar e evoluir com a adoção de meca-

do poder é perigosa ao lembrar que “o telos da se-

nismos novos que auxiliem os poderes tradicionais


a cumprirem suas funções. É nesse contexto que

poder governativo, de iniciativa e de gestão. Paro-

surgem os órgãos constitucionalmente autônomos,

diando o eminente ministro Carlos Ayres de Brito,

que resultam da necessidade de maior distribuição

do Supremo Tribunal Federal, em recente palestra,

de poder na Administração Pública para fazer face

cabe afirmar que o Judiciário, o Ministério Público

às novas demandas do Estado, diante dos novos

e os Tribunais de Contas têm algo em comum: eles

imperativos da sociedade atual, onde a preocupa-

podem impedir o desgoverno, mas eles não gover-

ção com a liberdade e os direitos fundamentais não

nam, propriamente.

pode ser esquecida.

Observa-se de forma incontestável que os Tribunais

Mas com o amadurecimento da sociedade, também

de Contas encontram-se em posição de destaque

o conceito de Democracia evoluiu, passando a exi-

no ordenamento jurídico brasileiro, com funções

gir dos estados instrumentos mais bem elaborados

constitucionalmente bem delineadas. Recorro no-

e eficientes para a participação popular, não apenas

vamente aos ensinamentos do ministro Carlos

de escolha eleitoral, mas também as de influência

Ayres de Brito. São palavras dele: “A Constituição

nas ações governamentais

avocou normativamente

e execução das políticas

“Essa visão atualíssima de Democracia dá

a matéria, chamou para

públicas e, principalmen-

aos Tribunais de Contas, ao lado de outras

si o encargo de traçar o

te, no seu controle. O re-

instituições afins, papel fundamental...”

perfil praticamente aca-

nomado professor francês

bado dos Tribunais de

Jean Rivero, ao abordar o assunto, oportunamente,

Contas (...)”. Conclui ele, daí, que os Tribunais de

sentenciou: “a Democracia consiste não somente

Contas não precisam da lei para existir. A norma

em escolher quem nos deve governar, mas escolher

constitucional, ao tratar dos Tribunais de Contas,

como queremos ser governados”. Essa visão atua-

tem eficácia plena, aplicabilidade imediata. No di-

líssima de Democracia dá aos Tribunais de Contas,

zer do referido ministro, “não há hiato, não há abis-

ao lado de outras instituições afins, papel funda-

mo, não há espaço vago passível de preenchimento

mental, porque como órgão técnico de controle

por lei” quando se trata da sua existência. No pla-

externo é importante e indispensável instrumento

no federal, o paradigma do Tribunal de Contas da

de que deve se valer a sociedade na obtenção de

União é o Superior Tribunal de Justiça e no plano

dados, parâmetros e indicadores para uma avalia-

estadual são os Tribunais de Justiça dos Estados. Os

ção isenta dos governos e a formação madura, com

Tribunais de Contas têm competências para baixar

informação segura, de uma opinião pública côns-

regimentos internos e dispor sobre as atribuições

cia de seus direitos e apta a participar de todo o

de seus órgãos, observadas as garantias processuais

processo público-administrativo. Mas é igualmente

das partes.

importante destacar que não se deve confundir a

Verificamos, portanto, que aos Tribunais de Contas

função de controle externo, de fiscalização, com o

são dadas amplas garantias constitucionais para o 11


desempenho de função cada vez mais necessária ao

Aécio Neves, minha saudação respeitosa e minha

Estado Contemporâneo e valorizada de forma cres-

reafirmação de estima e admiração. Ao povo mi-

cente pela sociedade. É imperativo, por isso, que os

neiro, que por diversas vezes confiou-me manda-

Tribunais busquem o aperfeiçoamento constante

tos de representação popular, a gratidão de quem

de suas ações – tanto no plano organizacional in-

se afasta das lides partidárias e políticas, mas que

terno, de aprimoramento material, técnico e ope-

permanece na vida pública, servindo ao público. Ao

racional dos seus órgãos, quanto da qualidade das

Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais – na

suas decisões como desdobramento de sua finali-

pessoa de seu presidente, conselheiros e funcioná-

dade maior, o controle, em todas as suas modali-

rios – o meu muito obrigado pela simpática acolhi-

dades – para que ele cumpra à altura as suas fun-

da. Ao conselheiro Wanderley Ávila, orador que me

ções e corresponda às expectativas da sociedade na

antecedeu, meus agradecimentos pelas palavras

ânsia legítima por maior transparência do Estado

carinhosas que sei serem fruto da nossa amizade,

e de seus respectivos atos. Ao lado do Ministério

construída sobretudo nos ambientes parlamentares.

Público, especialmente,

Tenho plena convicção

os Tribunais de Contas

“É imperativo, por isso, que os Tribunais

de que aqui, como ocor-

cumprem funções espe-

busquem o aperfeiçoamento constante

reu na Assembléia Mi-

cíficas e fundamentais à

de suas ações.”

neira, seus passos serão

existência do Estado de

sempre boas referências

Direito Democrático, representando a vertente téc-

para os meus. Aos meus pais – Amália e Bonifácio

nico-estatal – mas autônoma – do controle exter-

Andrada -, a meus irmãos, tios, cunhadas, sobri-

no da Administração Pública, que tem em primeira

nhos e demais familiares, minha manifestação de

instância a sua titularidade no cidadão brasileiro, a

afeto imorredouro. A minha esposa Paula e a meus

quem devemos sempre prestar as contas das coisas

filhos, Maria Carolina, Bonifácio José, Antônio Car-

públicas, e perante o qual devemos reiterar nossos

los, Martim Francisco e José Bonifácio, meu carinho

respeitos aos direitos e prerrogativas que lhe ga-

e desvelo, nesta hora em que compartilham comigo

rante a Lei Maior.

o início de nova caminhada. Agradeço a Deus pe-

Bem, senhoras e senhores, vou terminar meu pro-

las oportunidades que me vem proporcionando, e

nunciamento – que receio já se alonga além da pa-

peço que suas bênçãos continuem a iluminar todos

ciência dos que me ouvem – com algumas palavras

quantos labutam na área pública, na hercúlea ta-

de agradecimentos.

refa de conduzir as cidadãs e os cidadãos na edifi-

Em primeiro lugar, deixo aqui minha manifestação

cação do bem comum e da paz social.

de reconhecimento à Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais e a meus companheiros deputados, pela frutuosa convivência e pela indicação para esta Corte de Contas. Ao eminente governador 12

Muito obrigado.


>> O conselheiro Ant么nio Carlos Andrada discursa em sua posse

13

>> O conselheiro empossado Ant么nio Carlos Andrada e o presidente do TCE, Eduardo Carone Costa


Toma posse a nova conselheira do TCE >> No dia 10 de novem bro, Adr ien e Bar bosa t om ou pos s e com o a nova c on selh eir a do Tribuna l de Conta s do E stado de M in as Gera is (TCE ). Prim eira m u lh er a in tegr ar a corte s uperior do TCE , a bac h ar el em D ireito, ex-prefeita de T r ês Pon tas, n o 10/11/06

sul de Minas, e ex-presidente da Associação M i n e i r a dos Municípios ( A M M ) , en tr e 2 001 e 2004, ocupa a va g a aber ta c om a apos enta doria do cons elh eir o Sy lo Costa. Em s eu dis curs o de pos s e, qu e c on tou c om

>> Primeira mulher a integrar a corte superior do TCE, Adriene toma posse como nova conselheira

a pres ença do pres idente do T CE, Edu ar d o Ca rone, e d o s a t u a i s c o n s e l h e i r o s ,

gr an de d e s a f i o q u e i r e i e n f r e n t a r c o m

dentre eles, Antônio Ca rlos A n dr ada disse

responsabilidade e muita vontade de

q u e a s s um ia a s nova s fun ç ões c om o “u m

acertar”.

<<

A ndrada participa do I Seminário de Controle da Gestão dos Recursos Públicos >> No segundo dia do I Seminário de Controle da Gestão dos Recursos Públicos, às 14 horas, o conselheiro Antônio Carlos Andrada proferiu palestra acerca do Parlamento e do Controle 10/11/06

Político da Administração Pública. Em comemoração a o an iv er sári o d e u ma déc ada da Escola de Contas e Capacitação Professor Pedro Aleixo, o Seminário ocorreu nos dias 9 e 10 de novembro, durante todo o dia, no Auditório Vivaldi Moreira do Tribunal

14

>> Cons. Antônio Andrada discursa para auditório cheio

de Contas do Estado de Minas Gerais (TCEMG).

<<


Andrada vai à reunião no Gabinete da Presidência >> Na quarta-feira, dia 8 de novembro, às 16 horas,

presentes o Dr. Wilson Nélio Brumer, Secretário

o conselheiro Andrada compareceu ao Gabinete

de Estado de Desenvolvimento Econômico, a Dra.

da Presidência para uma reunião onde estiveram

Maria Celeste Morais Guimarães, auditora-geral do Estado, o conselheiro-presidente Eduardo Carone Costa e demais conselheiros do TCEMG. Nesta reunião, esclareceu-se a criação de um fundo de subsídio oferecido pelo Estado para instalação

08/11/06

de telefonia celular nas cidades de baixa demanda. Esse fundo visa a incentivar as companhias telefônicas a implantar seus serviços nessas localidades, onde, normalmente, não se dispõem a entrar com

>> Cons. Antônio Andrada vai ao Gabinete da Presidência no TCE/

recursos próprios pela baixa lucratividade.

<<

MG para discutir sobre um fundo de subsídio para a telefonia celular

Andrada faz abertura de seminário em Juiz de Fora >> Proferindo

palestra sobre “Universidade e

Mercado de Trabalho” para dois mil alunos e professores da Universidade Presidente Antônio Carlos - Unipac - em Juiz de Fora, o conselheiro Antônio Carlos Andrada fez a abertura oficial da IV 23/10/06

Mostra de Produções Científicas da Instituição, no dia 23 de outubro. Durante os dias de duração do evento, mais de 400 trabalhos foram apresentados e discutidos em seminários, painéis e mesasredondas, sobre temas relacionados às áreas das ciências humanas, sociais, exatas, tecnológicas, agrárias e de saúde. A abertura da Mostra de Ciências foi coordenada pelo pró-reitor de Pesquisa e Extensão da Unipac, prof° José da Paz e pela pró-reitora de Ensino e Assuntos Acadêmicos, profª Floripes de Souza Veiga.

<<

>> Cons. Antônio Andrada faz abertura de seminário para alunos e professores na Unipac de Juiz de Fora

15


Conselheiro participa de seminário nacional em São Paulo

18/10/06

16

>> No período de 16 a 18 de outubro, o conselhei-

manhã, teve como orador o Doutor Antô-

ro Antônio Carlos Andrada participou do Semi-

nio Carlos Caruso, presidente do Tribunal de

nário Nacional Ajustes Entre os Setores Público

Contas do Município de São Paulo. Terminada

e Privado, no Auditório do Plenário do Tribunal

a solenidade, o ministro Gilmar Mendes, vice-

de Contas do Município de São Paulo, na capital

presidente do Supremo Tribunal Federal (STF),

paulista. O evento foi promovido pelo Instituto

deu início à Conferência Inaugural.

Brasileiro de Estudos Especializados (Ibrae), mas

O evento contou com a participação de profissionais

contou com o apoio de outras instituições.

da estirpe de: Prof. Antônio Carlos Cintra do Amaral,

O professor Toshio Mukai, considerado um dos

Dr. Jessé Torres Pereira Júnior, Ivan Barbosa Rigolin,

maiores especialistas brasileiros em Direito Público,

Profª Lúcia Valle Figueiredo, Carlos Pinto Coelho

coordenou o Seminário que teve a participação de

Motta, José Crettela Neto, Profª Maria Sylvia

200 pessoas, durante esses três dias. Foi também

Zanella Di Pietro, Diógenes Gasparini, Prof.

um dos conferencistas no último dia.

Diogo de Figueiredo Moreira Neto, dentre ou-

A sessão de abertura, na segunda-feira pela

tros.

<<

>> Cons. Antônio Andrada é um dos 200 presentes no Seminário em São Paulo


Medalha do Mérito da Corte de Contas Ministro José Maria de Alkmim

11/9/06

>> Durante a tarde da última segunda-feira, dia 11 de

de Oliveira Prado, o deputado estadual Sebastião

setembro, o conselheiro Antônio Carlos Andrada

Costa e o presidente do Banco de Desenvolvimento

participou da cerimônia de entrega da Medalha do

de Minas Gerais, Romeu Scarioli, aos quais o conse-

Mérito da Corte de Contas Ministro José Maria de

lheiro agraciou com o Colar do Mérito.

Alkmim. Entre as personalidades homenageadas,

À noite, a partir das 20h, o conselheiro esteve pre-

estava o jornalista Aristóteles Luiz Menezes Vascon-

sente no jantar de confraternização organizado pelo

celos Drummond, o assessor especial da Assembléia

TCEMG, no Restaurante Vecchio Sogno, no bairro

Legislativa do Estado de Minas Gerais, José Geraldo

Santo Agostinho.

<<

>> Conselheiro Antônio Carlos Andrada entrega a Medalha ao jorna- >> Conselheiro Andrada entrega a Medalha ao deputado Sebastião lista Aristóteles Drummond

Costa

>> Conselheiro Andrada entrega a Medalha ao assessor da ALMG, >> Conselheiro Andrada entrega a Medalha ao presidente do BDMG, José Geraldo

Romeu Scarioli

17


Quarta Câmara do Tribunal de Contas tem novo presidente >> Por proposta do presidente do Tribunal de Contas, conselheiro Eduardo Carone, de acordo com critérios regimentais, e aprovado pelo plenário da Corte de Contas, o conselheiro Antônio Carlos Andrada assumiu a presidência da Quarta Câmara, a partir da Sessão Plenária do dia 7 de junho. A Quarta Câmara tem por função tratar das 07/6/06

matérias relacionadas com aposentadorias, reformas, pensões, convênios, prestação de contas de convênios, contratos, que não envolvem matérias licitatórias.

<<

>> Conselheiro Antônio Carlos Andrada assume a presidência da Quarta Câmara

Andrada participa da abertura de seminários da REAP/MG

26/5/06

18

>> O conselheiro Antônio Carlos Andrada, repre-

de Justiça do Estado, e a abertura foi realizada

sentando o presidente do Tribunal de Contas de

por Palestra Magna, proferida pelo desembarga-

Minas Gerais, Eduardo Carone Costa, participou

dor Caetano Levi Lopes, do Tribunal de Justiça do

da abertura do Seminário As Reformas do Pro-

Estado de Minas Gerais. Durante os dias 25 e 26

cesso Civil Brasileiro promovido pela Rede de

de maio, o Seminário debateu as principais modi-

Escolas de Formação de Agentes Públicos de

ficações decorrentes da Emenda Constitucional 45

Minas Gerais – REAP/MG. O evento foi presidi-

que tem por objetivo dar maior celeridade aos

do pelo desembargador Nilson Reis, do Tribunal

processos judiciais.

>> Antônio Carlos Andrada participa da abertura de seminários da REAP/MG

<<


“Pantheon dos Andrada” é reaberto ao público >> Em solenidade presidida pelo prefeito municipal de Santos/SP, João Paulo Papa, e com as presenças do presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo, do conselheiro Antônio Carlos Andrada, do Tribunal 17/3/06

de Contas de Minas Gerais, de diversos parlamentares federais e estaduais paulistas e autoridades acadêmicas, civis e militares, foi reaberto ao público o “Pantheon dos Andrada” no dia17 de abril. A banda dos Fusileiros Navais, da Marinha brasileira, entoou o Hino Nacional. No local estão depositados os restos mortais do Patriarca da Independência Nacional, José Bonifácio de Andrada e Silva, e de seus irmãos, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Martim Francisco Ribeiro de Andrada.

<<

>> Conselheiro Andrada discursa em nome dos descendentes dos três irmãos Andrada cujos restos mortais estão no Pantheon

Tribunal de Contas acompanha PPP Estadual 26/4/06

>> No dia 26 de abril, o presidente do Tribunal de

ta afirmou que o Tribunal de Contas terá atuação

Contas de Minas Gerais, Eduardo Carone Costa,

colaborativa, sem abdicar de suas atribuições, pro-

acompanhado dos demais conselheiros que inte-

movendo acompanhamento simultâneo de todos

gram a Corte de Contas, Antônio Carlos Andrada,

os atos a serem praticados através de auditoria

Elmo Brás, Wanderley Ávila, Moura e Castro, Simão

operacional especial.

<<

Pedro e Sylo Costa, recebeu a visita dos secretários de Estado Wilson Brumer, do Desenvolvimento Econômico, e Paulo Paiva, de Obras Públicas, que entregaram o edital para a licitação da primeira Parceria Público Privada – PPP - do Estado, sendo iniciativa pioneira no País. De acordo com o edital, a PPP pretende recuperar a Rodovia MG-050 cujo contrato tem estimativas de investimentos da ordem de R$ 30 milhões por ano. Na ocasião, o conselheiro Eduardo Carone Cos-

>> Conselheiros do Tribunal de Contas de Minas Gerais em reunião com os secretários estaduais

19



Trata-se de consulta formulada pelo

>> JULGADOS

CONSULTA Nº 711.005

22

presidente da Câmara Municipal de Ibiraci, Rubens Felipe dos Santos, na qual faz indagação acerca de gastos com publicidade...

25

PROCESSO Nº 711.021 Legalidade do Legislativo Municipal em depositar e movimentar suas disponibilidades financeiras na Cooperativa de Crédito do Vale do Rio Doce Ltda. – Sicoop - Crediriodoce

PROCESSO Nº 709.101 Representação - Polícia Civil do Estado de

32

Minas Gerais

36

Parecer da lavra do conselheiro Antônio Andrada sobre a questão da aplicabilidade do Instituto da Decadência nos atos sujeitos a registro no âmbito dos Tribunais de Contas

45

RECURSO DE REVISÃO: Nº 666.571

Pedido de Vista


CONSULTA Nº 711.005

dante”, “esvaída”, dada a fluidez do mundo contemporâneo,

CONSULENTE: RUBENS FELIPE DOS SANTOS - PRESIDENTE

em oposição ao conceito de “sólido” enquanto duradouro

DA CÂMARA MUNICIPAL

– tal qual a sociedade estática do mundo antigo. Completa

PROCEDÊNCIA: CÂMARA MUNICIPAL DE IBIRACI

o autor aduzindo localizar-se na Revolução Industrial e na formação do Estado-Nação o processo de desconstrução da

Trata-se de consulta formulada pelo Presidente da Câmara

idéia de comunidade espaço-temporalmente situada .

Municipal de Ibiraci, Rubens Felipe dos Santos, na qual faz

Ora, da mesma forma, o século XX representou uma “se-

indagação acerca de gastos com publicidade, a teor do § 1º

gunda revolução”, marcada principalmente pelo avanço da

do art. 37 da CR/88.

técnica e da tecnologia, de sorte que o advento da globa-

A douta Auditoria manifestou-se à fl. 58 dos autos.

lização catapultou as relações sociais para um plano supraestatal, de cunho mundial, em que as barreiras e fronteiras

CONSULTA Nº 711.005

Preliminarmente, em que pese a maneira utilizada para for-

passam a carrear um viés quase que meramente virtual. Vi-

mulação da consulta não se apresentar como a mais ade-

vemos, pois, em tempos da chamada modernidade tardia,

quada, conheço da consulta formulada, em razão da rele-

alta modernidade ou modernidade pós-industrial, como

vância da matéria, da legitimidade da parte e da pertinência

assim denominam Anthony Giddens2 e os estudiosos ra-

temática, nos termos do art. 7o, X da Resolução n. 10/96.

cionalistas de matriz habermasiana ou pós-modernidade,

Acolhida a preliminar, passo a analisar, em tese, o questio-

nos dizeres dos desconstrutivistas como Derrida, Lyotard, dentre outros.

namento proposto. Não é sem tempo recuperar que o advento da modernidade, parametrizado por fatores como a reforma protestante, a consolidação do capitalismo, a revolução científica e o racionalismo filosófico, representou a ruptura de um modelo de sociedade estamental-comunitária dos antigos, para a chamada sociedade dos modernos, esta sedimentada pelo surgimento dos Estados-Nacionais e regulada pelo direito

Controvérsias filosóficas à parte, não se pode olvidar que essa nova configuração é marcada pelo surgimento dos grandes blocos econômicos (União Européia, Alca, Mercosul, Nafta, etc.) e pela intensa evolução dos meios de comunicação e do trânsito de informações em grande escala, fenômeno tão bem estudado pela primeira geração da Escola de Frankfurt, capitaneada por Adorno, Marcuse e Horkheimer. Portanto, o que se observa no alvorecer deste novo século,

positivo ou codificado.

é o apogeu da chamada sociedade da informação, informa1

Sobre esse fenômeno, Daniel Soczek recorre a Zygmunt

ção esta cujo domínio passa a representar, como os bens de

Bauman, explicando que este cunhou o termo “moderni-

produção de outrora, o cerne da preocupação e cobiça das

dade líquida” – idéia que Bauman utiliza para expressar sua

economias mundiais.

concepção de modernidade em uma perspectiva “transborNesse cenário, dominado pela extrema fluidez e velocidade 1 SOCZEK, Daniel. Comunidade, utopia e realidade: uma reflexão a

22

partir do pensamento de Zygmunt Bauman. Rev. Sociol. Polit., Nov.

2 GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade. São Paulo:

2004, no.23, p.175-177. ISSN 0104-4478.

UNESP. 2001


de transformações, em que passamos a compartilhar meios

contexto, nesse novo mundo, exsurge, até como corolário

tradicionais de comunicação – tais como jornais, revistas

do dever de prestar contas aos administrados - o que tam-

e a televisão, com a mídia eletrônica – Celular, Internet,

bém pode ser entendido como um vetor de promoção do

constata-se um fluxo contínuo de sons, imagens, dados que

controle social – a necessidade de que se diferencie, em

invadem nossas vidas e incorporam-se inexoravelmente ao

cada caso específico, os limites de utilização da propaganda

nosso cotidiano.

estatal.

Toda essa reconstrução teórica tem uma razão de ser, haja

Nessa linha, pelo mandamento constitucional supra-referi-

vista a extensa polêmica que se apresenta, mormente com o

do, infere-se que a utilização de recurso público para reali-

advento da Carta Magna de 1988, envolvendo a questão da

zação de publicidade institucional é possível desde que te-

propaganda estatal e, mais especificamente as limitações

nha caráter educativo, informativo ou de orientação social,

jurídicas a ela impostas, à luz do disposto no § 1o do art. 37

dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que

da Constituição da República, que agora deve ser analisado

caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servido-

à luz de um futuro que já chegou e não de um passado que

res públicos.

não mais subsiste.

Como se observa, é necessário que a publicidade se desti-

Nesse sentido, e em tempos da obrigatoriedade de gerir a

ne a fins específicos: educativos, que servem à educação,

coisa pública em consonância com os ideais de uma demo-

formação ou aprimoramento da consciência comunitária,

cracia participativa que se subsume, sem prejuízo de outros,

v.g, que visam esclarecer sobre perigo de doenças, impor-

na necessidade de transparência das ações estatais e go-

tância do aleitamento materno, benefícios da doação de

vernamentais, observamos, não sem tempo, o surgimento

sangue e órgãos, exercício do direito de voto, etc.; infor-

de segmentos de mídia especializados como a TV Câmara,

mativos, que têm a finalidade de informar a população de

TV Senado, TV do Judiciário, TV Assembléia, Voz do Brasil,

algo a ser revertido em seu benefício, como a publicidade

dentre outros.

sobre o potencial turístico da região, festas típicas, feiras,

Não resta dúvida, que esse novo nicho de mídia estatal afigura-se como uma demanda legítima - até por que reflexo desse contexto global que acabamos de traçar - e inadiável de uma sociedade vigilante e ávida por acompanhar o desempenho daqueles que têm a responsabilidade de conduzir os destinos jurídico-políticos do país. Nessa linha, quase que como um “big-brother” institucional pode-se acompanhar

etc. Ademais, a hipótese também está a se configurar no caso da veiculação de noticiários que se caracterizam por prestações de contas das ações administrativas bem como a divulgação de providências de reconhecida relevância para o interesse público; e por fim, orientação social que visa à conscientização da população acerca de ações vinculadas à cidadania, liberdades públicas, etc.

o dia-dia dos deputados, senadores, ministros etc. Será,

Definido o escopo de validade da propaganda estatal, resta

pois, que essas aparições constantes poderiam ser carac-

ainda o esclarecimento acerca da parte final do dispositivo,

terizadas como promoção pessoal a desafiar imputação de

que impede a veiculação de nomes, símbolos ou imagens de

penalidade?

autoridades ou servidores públicos, desde que caracterizem

A pergunta não é sem sentido, à medida que, nesse novo

promoção pessoal.

23


Quando do meu ingresso no Tribunal de Contas, pude infe-

alusão ao seu nome no diário oficial do município, já car-

rir, que não raro esta Corte se pauta por uma interpretação

reia um condão de reprovabilidade prévio que importará

bastante rigorosa do dispositivo aludido, não admitindo

irregularidade insanável e passível de sanção. Dois pesos ou

qualquer inserção de nomes, símbolos, fotografias ou ima-

duas medidas?

gens nas propagandas, por entender que este fato, por si só, já estaria a caracterizar a violação do preceito constitucional em comento e ao princípio da moralidade, em flagrante desvio de finalidade.

ção normativa não pressupõe a simples presença de nomes, símbolos ou imagens, mas sim a ocorrência de vício insanável na publicidade estatal que venha caracterizar que o

Entretanto, em face de todo o exposto, entendo que a ques-

administrador ou servidor público dela se utilizou para se

tão merece um tratamento um pouco diferente. Em minha

autopromover às custas do erário.

avaliação, até por que assim dispõe a parte final do § 1o do art. 37 da CR/88, o ilícito só estaria caracterizado se fosse efetivamente constatado, a partir de um juízo de adequabilidade de cada caso concreto, o caráter de promoção pessoal da autoridade ou servidor público.

Cabe, pois, como já aludido, questionar o propósito da publicidade. É fundamental que se fique comprovado, em cada caso concreto, o intuito de alardear ou elevar os méritos e atributos pessoais, enaltecer virtudes do administrador, enfim a busca de promoção indevida às custas da publicidade

Sendo assim, não é a mera inserção de nome, símbolo ou

veiculada. Isto, obviamente, na intenção de se obter um bô-

mesmo imagem na publicidade estatal, condição, por si,

nus de natureza político-pessoal que lhe confira uma posi-

suficiente para que se possa caracterizar o desvio de finali-

ção de vantagem em relação aos demais, em decorrência da

dade do administrador. Não é sustentável, até como coro-

utilização da propaganda estatal, violando, assim, de forma

lário do princípio da publicidade e transparência dos atos

clara, o princípio constitucional da isonomia. Neste caso,

estatais, parâmetros basilares da Administração Pública e

aí sim, estaremos diante de uma atitude infensa à norma

garantia dos cidadãos, que a Administração se mantives-

a caracterizar o desvio de finalidade. Obviamente, o que se

se silente sobre a publicidade de determinado ato, a título

quer evitar é o mero apontamento de possíveis irregula-

ilustrativo, sobre a inauguração de determinado posto de

ridades com base em uma interpretação automática, para

saúde, unicamente, pelo fato do administrador ter sido fo-

não dizer subjetiva ou discricionária, sem atentar para as

tografado juntamente com os demais presentes.

particularidades de cada caso concreto, fruto de uma visão

Note-se, pois, que esse simples exemplo conduz a uma problemática mais complexa para não dizer paradoxal. De um

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Não é isto que o preceito constitucional visa coibir. A veda-

de mundo não associada com o dinamismo que deve pautar a concretização do direito pelo intérprete.

lado, observamos constantemente, no Órgão Oficial do Es-

Não nos cabe, pois, o silêncio ou passividade na interpre-

tado, a veiculação de imagens e reportagens do Governa-

tação de um direito que deve apresentar-se como vetor

dor, dos Secretários de Estado de Deputados, etc. sem que

de integração social e promoção de justiça. Esperar que o

haja qualquer questionamento acerca de sua licitude ou

legislativo resolva os problemas sociais com reformas ou

ilicitude. Do contrário, a simples veiculação de fotografia

mudanças da legislação é desconhecer a máxima “EX FAC-

de um agente político municipal ou mesmo uma pequena

TO ORITOR JUS”, ou seja, com a permissão de uma tradu-

P


ção não literal, olvidar que a vida em muito transcende a

A douta Auditoria manifestou-se por meio de parecer cir-

limitada capacidade humana de produzir suas normas de

cunstanciado acostado às fls. 07 a 16.

conduta.

É o relatório em síntese.

É, pois, como respondo ao questionamento formulado. Conselheiro Antônio Carlos Andrada

___________________

II - PRELIMINAR

A parte é legítima ex vi do disposto no art. 7º, inciso X, alínea “a” da Resolução TC 10/96 – RITCMG.

PROCESSO Nº 711.021 NATUREZA: CONSULTA CONSULENTE: ORESTE ALFREDO DE SOUZA – Presidente da Câmara Municipal de Capitão Andrade

Quanto à pertinência da matéria versada, verifica-se tratar de assunto afeto à função deste eg. Tribunal de Contas, com fundo constitucional e evidente repercussão financeira e operacional, nobre ao interesse das municipalidades.

ASSUNTO: LEGALIDADE DO LEGISLATIVO MUNICIPAL EM

Isto posto, conheço da consulta em face da legitimidade

DEPOSITAR E MOVIMENTAR SUAS DISPONIBILIDADES

da parte e da pertinência da matéria, para respondê-la em

FINANCEIRAS NA COOPERATIVA DE CRÉDITO DO VALE DO

tese, consoante o preceituado no artigo retroexposto do

RIO DOCE LTDA. – SICOOP - CREDIRIODOCE.

RITCMG.

I - RELATÓRIO PROCESSO Nº 711.021

III – FUNDAMENTAÇÃO

Versam os autos sobre consulta encaminhada a este Tribu-

Antes de adentrar no mérito, informo, na oportunidade, que

nal pelo Sr. Oreste Alfredo de Souza, Presidente da Câmara

o objeto da presente Consulta difere do objeto da Consul-

Municipal de Capitão Andrade, que em síntese, questiona

ta nº 701526, formulada por um terço dos edis da Câmara

sobre:

Municipal de Ponte Nova, tendo como Relator o Conselhei-

1) Possibilidade do Poder Legislativo Municipal receber seus recursos orçamentários mediante depósito em conta corrente através de entidade cooperativa conveniada. 2) Possibilidade do Poder Legislativo Municipal depositar suas disponibilidades em entidade cooperativa conveniada.

ro Elmo Brás, e que se encontra com vista ao Conselheiro Simão Pedro Toledo. Ressalto que aquela consulta indaga, pontuando perifericamente, a respeito da possiblidade do município poder firmar convênio ou contrato de prestação de serviço com instituição financeira privada, para o pagamento de ven-

Requer, o consulente, que se conheça do mérito da presente

cimentos de servidores; sobre a possibilidade de adotar no

consulta.

processo licitatório, visando a contratação de serviços ban-

25


cários, a modalidade concorrência com tipo “maior oferta”,

Ainda, impende assinalar o entendimento da Ministra Ellen

e, por fim, acerca da possibilidade de movimentação das

Gracie proferido no voto da ADIN 2600-MC, citado no jul-

disponibilidades de caixa do município, mesmo na existên-

gamento em tela, in verbis:

cia de bancos oficiais.

Vejo, também, que essa regra salutar de depósito em ban-

Como se vê, a matéria acima colacionada não guarda iden-

cos oficiais imposta pela Constituição, vai ao encontro

tidade com a matéria da presente consulta que passarei a

do princípio da moralidade previsto no art. 37, ‘caput’

fundamentar a seguir:

do seu texto, ao qual deve obediência a Administração

II.1) Obrigatoriedade do depósito das disponibilidades de caixa em instituições financeiras oficiais.

Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. (...) ‘o fato de obrigar o depósito em instituições

Primeiramente, imprescindível se faz informar que a regra em vigência, art. 164, §3º da CR/88, determina que os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e os órgãos ou entidades do Poder Público e das empresas por ele controladas

financeiras oficiais é medida saneadora, pois evita que o Prefeito faça como seu o saldo médio com o depósito da Prefeitura para obter empréstimos pessoais. (negritos no original e grifo meu).

deverão depositar as disponibilidades de caixa em institui-

II.2) Exceção à obrigatoriedade do depósito das disponibili-

ções financeiras oficiais de qualquer esfera, estaduais ou

dades de caixa em instituições financeiras oficiais e o dever

federais.

de licitar.

Nesse sentido é a orientação reiterada desta Colenda Corte nas respostas às Consultas nºs 616661, 677160, 657310, 658264, 616661, 682192 e 694568.

Todavia, encampa exceção essa interpretação quando no município não existir instituição financeira oficial. Esse é o entendimento do Exmo. Sr. Conselheiro Eduardo Caro-

Importa acrescentar que a Lei de Responsabilidade Fiscal, LC

ne em resposta à consulta n.º 616661, em Sessão do dia

n.º 101/2000, em seu art. 43, apenas se limitou a preceituar

15/03/2000, acompanhando a resposta proferida pelo

que as disponibilidades de caixa dos entes da Federação

Exmo. Sr. Conselheiro Murta Lages à consulta n.º 53198-7,

serão depositadas conforme estabelece o § 3º do art. 164

em Sessão do dia 03/02/94, que versava sobre a possibilida-

da Constituição.

de de movimentação de contas-correntes em bancos parti-

Assevera-se, contudo, que não existe lei federal que discipline as

26

culares, a qual transcrevo:

exceções aludidas na parte final da norma constitucional supra,

(...) é de se responder ao consulente que, ‘a priori’, tanto a

não obstante o estabelecido na Medida Provisória n.º 2192-70,

movimentação bancária e a aplicação financeira das dispo-

reeditada pela última vez em 24/08/2001, e suspensa a eficá-

nibilidades hão de se efetivar em agências locais de institui-

cia de seu §1 º do art. 4º, com efeitos ex nunc, pelo Supremo

ções financeiras oficiais. Em não existindo essas no muni-

Tribunal Federal que em sede da ADIN 3578/DF deferiu em par-

cípio, entenderíamos que é de se lhe facultar, mediante

te o pedido da medida cautelar, em decisão prolatada no dia

autorização específica em Norma Municipal, dentro de

14/09/2005 e publicada o no Diário Oficial em 24/02/2006.

sua competência concorrente, proceder à movimenta-


ção bancária com instituições financeiras privadas, bem

nização da produção e do trabalho em bases associativas e

com ali efetuar aplicações financeiras, desde que uni-

cooperativas, opções legitimadas pelo atual ordenamento

camente com base em títulos e papéis com lastro oficial

jurídico, no intuito de contribuir para o desenvolvimento

(...). (grifo no original e negrito meu).

sócio-econômico no contexto globalizado.

Cabe, entrementes, observar que a contratação de insti-

Com essas considerações e em simetria com o raciocínio já

tuição financeira privada é objeto perfeitamente licitável,

extravasado, há de se indagar, em face da inexistência de

nos termos previstos no art. 37, inciso XXI da Lei Maior.

instituição financeira oficial no município, sobre a possi-

Assim, ressalvadas as hipóteses de dispensa e inexigibilida-

bilidade do depósito e movimentação das disponibilidades

de, o dever de licitar impõe-se de forma cogente. A Admi-

financeiras municipais em cooperativa de crédito.

nistração tem o dever de proceder ao certame licitatório, considerando que o objeto pode ser oferecido por mais de um interessado. Existem, no mercado financeiro brasileiro, várias instituições habilitadas a oferecer o mesmo produto e serviços bancários à Administração Pública, com qualidade e segurança. Desse modo, nos termos fixados no edital de convocação será contratada a instituição bancária de melhor solidez econômica e financeira, que por conseqü-

Nesse momento cumpre trazer à baila alguns posicionamentos deste Tribunal de Contas no sentido de que as cooperativas estão impossibilitadas de figurar como licitantes ao argumento de que tal participação infringe o princípio da igualdade, dada a inviabilidade de competição, em razão dos possíveis incentivos que as permeiam. A matéria foi objeto de decisões desta Corte quando das respostas às consultas nºs 249384, 439155, 459267 e 656094.

ência trará maior segurança à Administração, assim como oferecerá o pagamento de menores tarifas e os melhores

Entretanto, esses posicionamentos merecem algumas con-

serviços.

siderações. Primeiramente, o que se visa coibir é o cooperativismo de fachada, adotado por algumas empresas para

II.3) Possibilidade de participação de cooperativas em procedimento licitatório.

ocultar o vínculo empregatício com seus trabalhadores (caracterizado pela relação de subordinação, pessoalidade, renumeração e não-eventualidade) como acontece amiú-

Na oportunidade, registro, inicialmente, que no mundo globalizado - configurado nas transformações de ordem social, política e econômica mundial, surgidas nas últimas décadas - as mudanças no mercado de trabalho e nas relações comerciais ficam evidenciadas, mormente no que concer-

de no setor de intermediação de mão-de-obra, conferindo aos pseudos cooperados uma fictícia autonomia de trabalho – traço fundamental nas cooperativas – esquivando-se, sobretudo, dos encargos previdenciários e laborais, como o FGTS.

ne aos avanços tecnológicos. Todavia, tais transformações, paradoxalmente à temática da globalização do capitalismo

Lado outro, faz-se mister registrar a resposta à consulta n.º

contemporâneo, contribuem para o agravamento da desi-

682676, proferida pelo Exmo. Sr. Conselheiro José Ferraz,

gualdade social, caracterizada pela falta de oportunidade

em 16/06/2004, que ao firmar a convicção sobre a viabi-

de trabalho e emprego.

lidade da contratação de cooperativa de táxi pela Administração, legitimou exceção aos entendimentos aventados

É nesse liame que emergem as formas alternativas de orga-

nos precedentes desta Casa, no sentido de possibilitar a

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participação de cooperativas em certames licitatórios. A decisão referenciada fundamenta-se no entendimento de que a cooperativa de táxi estará colocando à disposição da Administração Pública, não a mão-de-obra de seus coope-

Acrescente-se a esse dispositivo o incentivo ao cooperativismo revelado no art. 174 da Carta Magna: Art. 174 (...)

rados, mas o serviço público de transporte de passageiro via táxi, por intermédio de cooperados verdadeiramente

§2º A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras

autônomos no exercício da respectiva atividade, ou seja,

formas de associativismo. (Lei 5.764 de 16/12/71 que define

não há a presença do vínculo empregatício na relação

a Política Nacional de Cooperativismo)

contratual. Acrescente-se a isso que a tarifa que se cobra é a tarifa fixada pelo Poder Público diferentemente da coo-

Além disso, o comando inserto no art. 17 da Lei Estadual n.º 15075 de 05/04/2004 preceitua:

perativa de mão-de-obra. A sociedade cooperativa poderá habilitar-se em procesPortanto, o posicionamento desta Casa acerca da vedação da participação de cooperativas em processos licitatórios não é absoluta. Registre-se, sobretudo, que o entendimento consignou, com propriedade, o dever do exame acerca da natureza jurídica de cada cooperativa. Insta assinalar que a Lei Maior autoriza a participação de cooperativas nos procedimentos licitatórios, conforme se infere da inteligência do disposto no art. 37, inciso XXI, à medida que as restrições de participação em licitações resumem-se apenas àquelas previstas no comando normativo, que, assim, dispõe: Art. 37 (...)

so licitatório promovido por órgão ou entidade da Administração direta ou indireta do Estado em igualdade de condições com os demais licitantes, desde que apresente certificado de registro na OCEMG ou em outra organização de cooperativas estadual, conforme previsto na Lei Federal n.º 5.764 de 16/12/71. (negritei) Faz-se coerente pontuar, ainda, que o Tribunal de Contas da União entende que as cooperativas podem participar de procedimento licitatório - julgado TC-012.485/2002-9 de 22/01/2003, Relator Ministro Benjamim Zymler que dispõe em seu voto: Não há vedação legal, portanto, para que possam celebrar avenças com o Poder Público. Como frisado anteriormente, a licitação concretiza o princípio constitucional da impes-

XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as

soalidade e da igualdade, portanto, as restrições a terceiros contratar com a Administração somente podem ser aquelas previstas em lei e desde que limitadas à qualificação técnica e econômica indispensáveis à execução do contrato.

condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual

28

somente permitirá as exigências de qualificação técnica

(... ) o professor Marçal Justen Filho afirma,’in verbis’, que

e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento

‘essas considerações permitem afirmar que é possível e viá-

das obrigações. (negritei).

vel a participação de cooperativa em licitação quando o


objeto licitado se enquadra na atividade direta e específica para a qual a cooperativa foi constituída. Se porém, a execução do objeto contratual escapar à dimensão do objeto social da cooperativa ou caracterizar atividade especulativa, haverá atuação irregular da cooperativa. Será hipótese de sua inabilitação. (in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 7ª ed. Dialética, São Paulo, 2000, p. 316)

casos a legislação vigente. Assim, comungo, lastreado por todo o raciocínio exposto, pela imposssibilidade de participação de cooperativas de mão-de-obra - cujos trabalhadores desempenham funções sob regime de subordinação - em processos licitatórios, sob pena de infrigência dos princípios albergados no sistema positivo pátrio. Observados os apontamentos acima colacionados, concluo

(...) a Constituição Federal estimulou a atividade cooperativista, consoante se depreende do §2º do art. 174, ao estipular que a lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo. Evidente que o Estatuto de Licitações e Contratos não é a Lei requerida pelo cons-

pela viabilidade da participação de cooperativas de crédito nos procedimentos licitatórios, cerne da presente questão, devendo-se levar em consideração, entretanto, quais os serviços que podem ser ofertados aos associados e aos nãoassociados.

tituinte para concretizar o comando constitucional supra. Não traz ações positivas do Estado no sentido de fomentar

II.4) Impossibilidade de depósito e movimentação das dis-

o desenvolvimento das cooperativas. Todavia, não pode

ponibilidades financeiras municipais em cooperativa de

acarretar atitude negativa do Poder Público. Contraria

crédito.

o direito admitir que o mesmo Estado que tem por dever constitucional editar lei para incentivar o cooperativis-

Não obstante minha posição em agasalhar a possibilidade

mo venha, por meio de interpretação de normas legais,

de participação de cooperativas de crédito em licitações, é

restringir o desenvolvimento de cooperativas.

essencial a análise acerca dos tipos de serviços que podem ser oferecidos aos não-associados, nos termos da lei. Sob

(...). (grifei e negritei).

este aspecto mostra-se elucidativo o parecer do Auditor

Não há como desconhecer que a questão jurídica envolvi-

Gilberto Diniz, que passo a transcrever com as vênias de

da é complexa. Todavia, acompanho o entendimento que

estilo:

ampara a possibilidade de participação de cooperativas em licitações, somente permitindo-se no procedimento as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações, observada, entretanto, a natureza jurídica da cooperativa e desde que respeitados os princípios constitucionais - em especial o da impessoalidade e o da igualdade, bem como verificado que

A seu turno, as cooperativas de crédito são consideradas instituições financeiras não-bancárias e integram o Sistema Financeiro Nacional, consoante prescrevem o art. 192 da Constituição da República e o § 1º do art. 18 da Lei Federal 4.595 de 31/12/1964, que dispõe sobre a política e as instituições monetárias, bancárias e creditícias, cria o Conselho Monetário Nacional e dá outras providências.

o objeto da licitação encontra-se enquadrado ao objeto social da cooperativa e, ainda, absolutamente descaracte-

Nessa esteira, as cooperativas de crédito, pelo fato de in-

rizado o cooperativismo de fachada, observada em todos os

tegrarem o Sistema Financeiro Nacional, têm o funciona-

29


mento definido pelo Conselho monetário Nacional e suas

Nesse particular, a Resolução CMN/BACEN de n.º 3.321/2005

operações fiscalizadas pelo Banco Central do Brasil, à luz

de 30/09/2005, estabelece que as cooperativas de crédito

do que estatui a citada Lei 4.595/64, art. 4º, incisos VI e VIII,

somente podem captar depósitos de seus associados, como

9º e 55.

também que a realização de empréstimos se restringe a

Por essa razão, além das aludidas Leis 5.764/71 e 4.595/64, as cooperativas de crédito se regem pelo disposto na Lei

seus associados, como estatui o art. 27 desse ato normativo, com a seguinte redação:

10.406 de 10/01/2002 (Código Civil Brasileiro), e nos atos

Art. 27. A cooperativa de crédito pode realizar as seguintes

normativos baixados pelo Conselho Monetário Nacional e

operações, além de outras estabelecidas em regulamenta-

pelo Banco Central do Brasil e pelo respectivo estatuto so-

ção específica:

cial.

I - captar, somente de associados, depósitos sem emissão

As cooperativas de crédito, em princípio, conforme dispõe o

de certificado; obter empréstimos ou repasses de institui-

‘caput’ do art. 4º da Lei 5.764/71, estão impedidas de reali-

ções financeiras nacionais ou estrangeiras, inclusive por

zar negócios jurídicos com pessoas não-associadas.

meio de Depósitos Interfinanceiros de Microcrédito (DIM);

Mas o art. 86 do indigitado diploma legal contempla exceção a essa regra, ao dispor que as cooperativas poderão fornecer bens e serviços a não-associados, desde que atendidos os objetivos sociais. E, no caso específico das cooperativas de crédito, essas sociedades somente poderão fornecer bens e serviços a nãoassociados com fulcro em regras específicas de órgão normativo, na exata dicção desse dispositivo legal, in verbis: Art. 86. As cooperativas poderão fornecer bens e serviços a não associados, desde que tal faculdade atenda aos objetivos sociais e esteja de conformidade com a presente lei.

receber recursos oriundos de fundos oficiais e, em caráter eventual, recursos isentos de remuneração ou a taxas favorecidas, de qualquer entidade, na forma de doações, empréstimos ou repasses; II - conceder créditos e prestar garantias, somente a associados, inclusive em operações realizadas ao amparo da regulamentação do crédito rural em favor de associados produtores rurais. (grifei e negritei) Vê-se, portanto, que a reproduzida normatização do CMN e do BACEN é clara no sentido de que as cooperativas de crédito somente podem captar depósitos e conceder créditos e prestar garantias a seus associados.

Parágrafo único. No caso de cooperativas de crédito e das seções de crédito das cooperativas agrícolas mistas, o disposto neste artigo só se aplicará com base em regras a serem estabelecidas pelo órgão normativo. (negritei)

(...) A jurisprudência do eg. Superior Tribunal de Justiça também é no sentido de que as cooperativas de crédito somente podem captar depósitos e realizar empréstimos com as-

30

Dessa forma, e com fundamento nas disposições do parágrafo único do dis-

sociados, v. g., entendimento consubstanciado nos Recursos

positivo legal reproduzido, as cooperativas de crédito, para poderem fornecer

Especiais 784378 (Min, José Delgado), 591298 (Min. Teori

bens e serviços a não-associados, estão sujeitas às normas editadas pelo Con-

Zavascki). 529391 (Min. José Noronha) e 543828 (Min. Cas-

selho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil.

tro Meira (grifei)


De outra sorte, entretanto, à cooperativa de crédito é fa-

Inicialmente informo que o Banco Postal é um serviço dos

cultada a prestação de serviços a terceiros (recebimentos

Correios e caracteriza-se pela utilização de sua rede de

de tarifas, tributos, pagamentos de salários a empregados,

atendimento para a prestação dos serviços bancários bási-

cobrança, seguros, cartão de crédito e outros), tão-só essa

cos em todo o território nacional, objetivando, primordial-

atividade em relação a não-associados, a teor do disposto

mente, oferecer estes serviços à população de baixa renda,

no inciso IV do art. 27 da citada Resolução CMN/BACEN

o que tem sido um desafio em todos os países.

3.321/2005, verbis:

Para isso, os Correios atuam como correspondente ban-

Art. 27. a cooperativa de crédito pode realizar as seguintes

cário do banco privado parceiro, em sintonia com as orien-

operações, além de outras estabelecidas em regulamenta-

tações do Banco Central do Brasil, nos termos da Resolução

ção específica:

3110/2003 do Conselho Monetário Nacional e da Portaria

(...) IV- prestar serviços de cobrança, de custódia, de recebimentos e pagamentos por conta de terceiros mediante contrato com entidades públicas e privadas e de correspondente no País, nos termos da regulamentação em vigor, por conta ou em benefício de associados e de usuários, observadas, no atendimento a não associados, as restrições estabelecidas nos incisos I e II. (negritei) (...)

n.º 588/2000 do Ministérios das Comunicações. Isto posto, invergo ao debate a possibilidade da utilização de Banco Postal pelos municípios que não possuem instituição financeira oficial. Nesse sentido, é o entendimento, o qual acompanho, do Tribunal de Contas do Paraná, inserto no Acórdão 78/06, sessão do dia 09/02/2006, ao responder consulta formulada pela Assembléia Legislativa daquele estado, advertindo-se, entretanto, que: Antes de se iniciarem as operações entre o Município e o Banco Postal, o Prefeito Municipal deve promover chama-

Conclui-se, assim, pela impossibilidade de depósito e mo-

mento público de agências ou postos bancários, preferen-

vimentação das disponiblidades financeiras municipais em

cialmente oficiais. Constatando-se a instalação de estabe-

cooperativas de créditos. Estas somente poderão prestar aos

lecimento bancário oficial no Município, com este devem

municípios, nos termos do disposto na Resolução 3.321/05,

ser realizadas as operações. Não existindo banco oficial no

serviços de cobrança, de custódia, de recebimentos e paga-

Município, este poderá efetuar suas operações junto a ban-

mentos por conta de terceiros.

co privado, observando a exigência de procedimento lici-

II.5) Possibilidade da utilização de Banco Postal pelos municípios que não possuem instituição financeira oficial.

tatório, caso haja mais de um banco privado no município. Não havendo possibilidade às alternativas acima, poderá o Município utilizar-se do Banco Postal. (grifei)

O município, restando frustadas as posssibilidades de pro-

IV - CONCLUSÃO

ceder às operações bancárias em instituições financeiras oficiais ou privadas (neste caso observado o procedimento

Ex positis, concluo que:

licitatório como observado alhures) poderá utilizar-se de Banco Postal.

1º) As disponibilidades de caixa dos Estados, Distrito Fede-

31


ral, Municípios e dos órgãos ou entidades do poder Público

de seus associados, nos termos da Resolução CMN/BACEN

e das empresas por ele controladas devem ser depositadas

3.321/2005, art. 86, parágrafo único c/c com art. 27, incisos

em instituições financeiras oficiais, de quaisquer esferas, es-

I e II .

taduais ou federais.

7º) A jurisprudência do eg. Superior Tribunal de Justiça

- Esta é a orientação reiterada desta Colenda Corte nas res-

também é no sentido de que as cooperativas de crédito so-

postas às Consultas nºs 616661, 677160, 657310, 658264,

mente podem captar depósitos e realizar empréstimos com

616661, 682192 e 694568;

associados;

2º) Inexistindo instituição financeira em funcionamento no

8º) Facultada à cooperativa de crédito somente a presta-

município, este deverá, no limite de sua autonomia legis-

ção dos seguintes serviços a não-associados: serviços de

lativa concorrente, editar lei que autorize o depósito e a

cobrança, de custódia, de recebimentos e pagamentos por

movimentação de seus recursos financeiros em instituição

conta de terceiros, a teor do art. 27, inciso IV da Resolução

financeira privada, incluída as aplicações financeiras, desde

supracitada. Concluindo-se, portanto, que a cooperativa de

que essas tenham por lastro títulos ou papéis públicos, não

crédito não pode movimentar disponibilidade de caixa do

prescindindo de realização de procedimento licitatório, nos

município.

termos do art. 37, inciso XXI da CR/88;

9º) Possibilidade da utilização de Banco Postal pelos muni-

3º) Esta Corte de Contas não obstante entender em algumas

cípios que não possuem instituição financeira oficial, desde

consultas que as cooperativas não podem figurar como li-

que ultrapassados alguns procedimentos que não tenham

citantes, já adotou posicionamento divergente na consulta

logrado êxito.

nº 682676, quando possibilitou a participação em licitação

Tribunal de Contas, 10 de outubro de 2006.

de cooperativa de táxi; Conselheiro Antônio Carlos Andrada

4º) Possibilidade de participação de cooperativas em lici-

Relator

tações, desde que respeitados os princípios constitucionais - em especial o da impessoalidade e o da igualdade - bem

___________________

como verificado que o objeto da licitação encontra-se enquadrado ao objeto social da cooperativa e, ainda, absolutamente descaracterizada a atividade de fachada, observada em todos os casos a legislação vigente;

PROCESSO Nº 709.101 NATUREZA: REPRESENTAÇÃO ÓRGÃO: POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE MINAS GERAIS Tratam os presentes autos de representação, com pedido

5º) Viabilidade de participação de cooperativas de crédito nos procedimentos licitatórios, cumpridos os apontamentos acima registrados, verificando-se essencialmente os serviços que podem ser ofertados aos associados e aos não-associados nos termos da lei; 6º) A cooperativa de crédito somente pode captar depósitos

32

de liminar, formulada pela empresa PANFLOR EMPREENDIMENTOS LTDA, sediada na cidade do Rio de Janeiro/RJ, em face da decisão do Chefe de Polícia Civil do Estado de Minas Gerais que desclassificou a representante e classificou a empresa ISABEL CRISTINA CAMARGOS COIMBRA-ME em primeiro lugar na licitação modalidade Pregão Presen-

PROCESSO Nº 709.101


cial n.º 319/2005 - promovida pelo órgão em epígrafe, cujo

falta de amparo legal e intempestividade do recurso inter-

objeto é a contratação do fornecimento de alimentação a

posto, improcedência do pedido, cerceamento de defesa e

presos condenados e/ou provisórios aguardando julgamen-

impossibilidade de revisão da decisão exarada pelo Chefe

to e policiais na Unidade de Polícia Civil CERESP/Gameleira,

de Polícia Civil.

conforme especificações dos anexos do edital.

Inferiu-se, do exame inicial da representação, que não fora

Consoante a ata do pregão presencial, acostada às fls. 70

comprovado, de plano, o prejuízo na demora da concessão

a 73, foram classificadas as propostas de ISABEL CRISTINA

da tutela pretendida (periculum in mora).

CAMARGOS COIMBRA-ME; HELIO MENDES MAGALHÃES E PANFLOR EMPREENDIMENTOS LTDA, na ordem crescente de preços. Posteriormente, na fase de habilitação, foram desclassificadas as duas primeiras empresas pela pregoeira, res-

Nesse sentido, ad cautelum, os autos foram encaminhados ao órgão técnico, que apontou a necessidade de se verificar a atual situação da prestação do serviço licitado junto à Polícia Civil, a fim de subsidiar o posicionamento desta Corte.

tando a empresa PANFLOR EMPREENDIMENTOS LTDA como única classificada no certame.

Diante do exposto, foram os autos convertidos em diligência, intimando-se, por meio de Oficial Instrutivo, o Chefe de

Em ata, consignou a empresa ISABEL CRISTINA CAMARGOS COIMBRA-ME seu desejo de apresentar recurso contra sua desclassificação, interposto tempestivamente, conforme documentos de fls.75 a 86. A representante juntou con-

Polícia Civil e o Diretor de Divisão de Material e Patrimônio, para que fornecessem informações acerca do estado em que se encontrava o fornecimento de alimentação ao CERESP.

tra-razões recursais, fls. 105 a 117. O recurso foi julgado improcedente pela pregoeira, fl. 119, decisão ratificada pelo

Cumprida a diligência e verificada a ausência dos pressu-

diretor de material e patrimônio, fls. 124 a 131.

postos que autorizariam a concessão da medida, em sessão da Segunda Câmara, de 02/05/2006, foi indeferida a liminar

Inconformada com essa decisão, a empresa ISABEL CRISTINA CAMARGOS COIMBRA-ME, interpôs RECURSO de RECONSI-

requerida, sendo os autos encaminhados ao órgão técnico para que procedesse ao exame da documentação juntada.

DERAÇÃO, protocolizado em 13/02/2006, diretamente ao Chefe de Polícia, que deu provimento ao recurso, desclassi-

Não satisfeita com a decisão proferida pela Segunda Câma-

ficando a representante e classificando a referida empresa

ra, que negou provimento à concessão da liminar requerida,

em primeiro lugar no certame em comento – publicação no

a empresa Panflor Empreendimentos Ltda interpôs Pedido

“Minas Gerais” em 18/03/2006, fl. 133.

de Reconsideração, em 16/05/2006, protocolizado sob nº 146869-2.

A partir desse quadro, insurge-se a representante contra suposta

1

ilegalidade do ato do Chefe de Polícia, que poderia ter desbordado

Inicialmente, cabe esclarecer que, a meu juízo, o instrumen-

de suas competências ao reformar a decisão da Pregoeira, decisão

to tecnicamente adequado para hostilizar a decisão que in-

esta ratificada pelo Diretor de Material e Patrimônio – autoridade

deferiu a medida liminar requerida pela representante não

responsável pelo edital e pela homologação do certame.

se trata de Pedido de Reconsideração, e sim de Agravo.

Em sua argumentação, em síntese, alegou a representante,

O agravo, diferentemente do recurso de reconsideração,

33


será interposto contra despacho interlocutório, ordinário

Ora, neste caso, percebe-se que o interesse que a represen-

do Presidente ou do Relator, ou contra decisões não defini-

tante traz à tona no pedido formulado em sua exordial é in-

tivas do Tribunal Pleno ou das Câmaras, nos termos do art.

dividual, descabendo ao TCMG decidir que a Administração

250 do referido Regimento.

contrate consigo. A esta Corte caberia sustar os efeitos do

Neste sentido, consoante os ensinamentos de Antônio Cláudio da Costa Machado, em “Código de Processo Civil Interpretado”, fl. 748, o agravo pode ter por objeto uma provisão

ato do Chefe da Polícia Civil, desde que o contrato não houvesse sido assinado, determinando as correções adequadas no procedimento.

jurisdicional de urgência, constituindo-se uma medida limi-

Portanto, o escopo de abrangência da atuação das Cortes

nar cautelar concedida ou denegada, uma antecipação de

de Contas situa-se no plano da eficácia e não da validade.

tutela, também concedida ou denegada, ou medida liminar

A conseqüência prática disto é que, caso o agente público

puramente antecipatória.

insista em continuar executando ato cuja prática foi susta-

No caso em tela, o indeferimento da concessão da liminar requerida não constitui decisão de mérito, cabendo, pois, contra ela a interposição de agravo.

da pelos Tribunais de Contas, o fará por sua conta e risco, respondendo objetivamente pelas suas conseqüências, inclusive eventual necessidade de ressarcimento de valores ao erário, após a apuração de responsabilidade em processo

Diante do exposto, nos termos da certidão expedida pela

próprio.

Secretaria Geral e pelo princípio da fungibilidade, recebo a documentação em exame como agravo por tempestivo.

Dessa forma, a posição a ser adotada pelo Tribunal de Contas de Minas Gerais é binária, vale dizer, o pronunciamento

A questão da concessão da liminar ora pretendida para além

é no sentido da regularidade ou da irregularidade do

da argumentação aduzida pela representante, diz respeito

procedimento.

à própria competência do TCMG, em matéria de licitação e contratos administrativos.

Também se deve registrar que ao Tribunal de Contas de Minas Gerais não compete declarar a validade ou invalidade

É que, embora possa parecer que o TCMG atue nessa seara,

dos atos da Administração, competência esta que cabe à

tutelando o interesse individual do representante (licitan-

própria Administração (no exercício do poder de auto tute-

te), isto, de fato, não acontece, porquanto o interesse do

la) ou ao Poder Judiciário, se for provocado para tanto.

controle externo é o interesse da sociedade. O que se quer dizer é que, em outros termos, a teor do Nesse diapasão, quando o TCMG verifica a regularidade dos

disposto no art. 71, IX e X e § I da Constituição, ao TCMG

certames licitatórios não o faz para determinar que a Admi-

compete sustar a eficácia de atos administrativos ilegais

nistração contrate ou não contrate com eventual licitante,

quando isto efetivamente for possível, mas não declarar sua

mas sim para declarar se o certame atende ou não atende

invalidade ou sua validade.

ao que dispõe o ordenamento jurídico. Eventual interesse individual que se pretenda ver tutelado deve ser objeto de

34

Por demais, vale dizer que a competência de sustação do TCMG

ação no âmbito do Poder Judiciário, órgão a que está afeta a com-

antes da assinatura do contrato pressupõe o caso das licitações

petência para solver conflitos e tutelar interesses individuais.

que ainda não tenham dado azo à contratação, pois se o con-


trato está firmado, a competência sustatória é do Poder

42.416/02 que regulamenta a lei), a este deverá ser dirigi-

Legislativo.

do o recurso, que caso não provido deverá encaminhá-lo

Neste sentido, ao compulsar os autos e a documentação acostada, verifica-se que o contrato já foi firmado, de sorte que a competência para sustá-lo é do Poder Legislativo, conforme já aludido.

para autoridade competente. Esta deve ser entendida como aquela responsável pela licitação, ou em outros termos, aquela que homologa o certame, para que, em sede final e definitiva, decida sobre a procedência ou não do recurso. Encerra-se, aí, pois, o processamento do recurso hierárquico

Logo, não é possível que o TCMG, em sede da liminar, sus-

cabível à espécie.

penda licitação, como, aliás, deveria ter requerido a repre-

No caso sub exame, verifica-se que a autoridade responsá-

sentante, posto que já findada.

vel pela licitação – Ata de Realização do Pregão Presencial

Entretanto, não obstante toda essa reconstrução teórica aqui desenvolvida, em que resta clara a impossibilidade do Tribunal de Contas conceder a tutela nos termos propostos pela recorrente, não poderia deixar de tecer algumas considerações afetas ao caso que ora se apresenta a esta Corte. Em uma primeira análise, não se pode olvidar de mencionar uma série de indícios de irregularidades que carreiam, per si, o condão de macular todo o procedimento licitatório e conseqüentemente a execução dos contratos e a realização das despesas dele decorrentes.

de fls 119 a 122 - foi o Diretor da Divisão de Material e Patrimônio, sendo este o responsável pela última palavra recursal no certame em comento. Ressalta-se ainda, que não cabe a esta Corte discutir tal fato, pois não cabe a ela imiscuir-se na esfera de distribuição de competência interna da Polícia Civil para processamento de licitações e ordenamento de despesas. Entretanto, em função da aplicação subsidiária da Lei 8666/93 à modalidade pregão, poder-se-ia considerar a hipótese do cabimento de recurso interposto diretamente à autoridade máxima da Polícia Civil, como representação,

Aspecto essencial, sem prejuízo de um maior aprofunda-

a teor do art. 109, inciso II, da Lei 8666/93, ainda que com

mento posterior em questões de ordem técnica do proce-

reservas, ou mesmo como direito de petição, em função do

dimento - referentes, por exemplo, a cláusulas editalícias

mandamento constitucional insculpido no art. 5º, XXXIV, a

- e do processamento dos contratos, diz respeito ao próprio

da CR/88, e não como pedido de reconsideração, pois não

ato do Chefe de Polícia que desclassificou a representante

há como alguém reconsiderar algo que não decidiu.

e adjudicou o objeto à empresa Isabel Cristina Camargos Coimbra-ME- que aliás encontra-se impedida de fornecer a alimentação, em função de sua interdição pela vigilância sanitária.

Não obstante a consideração de tais possibilidades, necessário ainda é que se observasse a questão da tempestividade da interposição dos mesmos. Ora, a se aceitar que quaisquer manifestações de irresignação quanto a decisões da

Ora, ab initio, cabe aqui fazer uma breve digressão sobre

Administração possam se dar a qualquer tempo, sem limi-

o processamento dos recursos na modalidade Pregão. Nes-

tes, parâmetros ou balizas, estaria-se a subverter de forma

te, como a decisão de inabilitar o licitante é do pregoeiro

até irresponsável a segurança jurídica que devemos tute-

(vide art 9º da Lei Estadual 14.167/02 e art 7º do Decreto

lar. Nesse sentido, como se observa dos autos, o “recurso”

35


foi interposto quase que 30 dias após a manifestação da

do contrato de fornecimento já estar em execução - e à

autoridade competente (Diretor da Divisão de Material e

Promotoria do Patrimônio Público para as providências que

Patrimônio), portanto nem mesmo pelo princípio da fungi-

entender cabíveis.

bilidade poder-se-ia conhecê-lo como tempestivo. Por fim e por demais, ainda que do recurso fosse dado conhecimento, caberia ao Chefe de Polícia tão somente dar provimento ao mesmo, determinando que os autos fossem baixados a quem de direito para dar cumprimento à sua

Dê-se ciência do inteiro teor desta decisão à empresa Panflor Empreendimentos LTDA. Em seguida, encaminhem-se os autos à Secretaria da Segunda Câmara para que proceda à juntada da documentação referente ao agravo interposto.

decisão, e não, ele próprio inabilitar quem quer que seja e adjudicar o objeto a um terceiro.

É como voto. Conselheiro Antônio Carlos Andrada

Entendi necessárias essas considerações no intuito de aler-

Relator

tar ao Sr. Chefe de Polícia de que, quando da análise do

___________________

mérito, em virtude dos veementes indícios de irregularidades, poderá e deverá o TCMG sindicar a licitude da licitação

RECURSO DE REVISÃO: Nº 666.571

como um todo e do contrato para, se for o caso, imputar

PEDIDO DE VISTA

ao responsável pelo prosseguimento da licitação as pena-

RECORRENTE: SR. MAURO SANTOS FERREIRA

lidades previstas na LC 33/94 e no RITCMG, sem prejuízo

ENTIDADE: SECRETARIA DE ESTADO DE RECURSOS HUMA-

da imputação de ressarcimento, se verificado após o devido

NOS E ADMINISTRAÇÃO.

processo legal, dano ao erário na contratação. VOTO Pelo exposto, nego provimento ao agravo por perda de seu objeto, haja vista o exaurimento da competência desta Corte de Contas na concessão da tutela nos termos pretendidos.

Em Sessão Plenária do dia 22/03/2006, pedi vista dos presentes autos para inteirar-me da matéria em votação. Versam os autos sobre Recurso de Revisão interposto pelo ex-Secretário de Estado de Recursos Humanos e Administração, Sr. Mauro Santos Ferreira, com fundamento no art.

Entretanto, à vista dos indícios de graves irregularidades re-

84 da Lei Complementar nº 33/94, objetivando a revisão

lacionadas ao processamento do certame licitatório, solicito

da decisão prolatada pela Terceira Câmara, na Sessão do

ao Exmo Conselheiro Presidente a realização de inspeção

dia 18/12/2001, no Processo de Aposentadoria nº 493.050,

extraordinária em regime de urgência para apuração do

de Rosa Maria Duretti, concedida por ato publicado em

procedimento ora em comento e da execução dos contratos

03/08/1996.

dele decorrentes, não sem antes recomendar, desde logo, ao Chefe de Polícia que adote medidas saneadoras do procedimento, sem prejuízo da ciência dos fatos à Assembléia Legislativa, nos termos do art. 76, § 1º da CE/89 - em virtude

36

Relatório

A decisão em comento denegou o registro do ato de aposentadoria, tendo em vista o não cumprimento da diligência determinada em 01/08/2000, para juntada aos autos de certidão de tempo para fins de concessão da Gratificação

RECURSO Nº 666.571


de Incentivo à Docência, computando-se os afastamentos

cancelando, ou não a decisão anterior, com fundamento

da regência de classe por laudo médico e, se implementado

na decisão da Quarta Câmara prolatada na sessão do dia

o requisito de tempo, a servidora teria direito à inclusão do

05/09/2002, processo nº 657.559.

2º biênio aos proventos.

A decisão constante do processo supracitado foi no sentido

O Recorrente aduz em razões recursais, em síntese, que no

de que os documentos autuados como recurso de revisão

universo de processos de aposentadoria encaminhados a

e assim recebidos pelo Conselheiro Presidente, na verdade

este Tribunal, “apenas aqueles distribuídos em data próxima

cuidariam de cumprimento de diligência ou justificativas

à Terceira Câmara, retornaram a esta Casa para concessão

por parte de autoridade competente.

da Gratificação de Incentivo à Docência computando-se todos os períodos de licença para tratamento de saúde, deter-

A douta Procuradoria é acorde com a douta Auditoria, fls. 52 e 53.

minação essa, que contraria formalmente a legislação que institui a referida gratificação e o posicionamento firmado

Em seguida, o Conselheiro Sylo Costa submeteu o relatório

no decorrer dos anos por essa Colenda Corte, já que até

ao Conselheiro Revisor Elmo Braz.

então, não havia negado registro a nenhum ato de aposentadoria sob tais argumentos.”

O Processo foi incluído na pauta da Sessão Plenária do dia 15/10/2003, ocasião em que ficou decidida a suspensão do

Alega, ainda que, se os afastamentos da regência para tra-

julgamento até que houvesse deliberação sobre a matéria

tamento de saúde forem computados para a concessão de

trazida anteriormente pelo Conselheiro Moura e Castro.

biênios, na atual situação e naquelas análogas, significa rever a situação de milhares de professores, colocando em risco a estabilidade da relação entre Administração e administrado e os princípios da igualdade e estrita legalidade a que estão vinculados os atos administrativos.

Assim, em Sessão Plenária do dia 22/03/06 o Conselheiro Sylo Costa, após o sobrestamento do presente processo na Secretaria do Pleno - aguardando a decisão acerca da proposta referente à interposição e tramitação de recursos em processo de aposentadoria - retorna à apreciação do Pleno

O despacho de admissibilidade do recurso encontra-se à fl. 31 e,

o respectivo Recurso de Revisão e entende que a matéria

à fl. 30, Certidão expedida pela Secretaria - Geral desta Casa.

deve ser examinada no Recurso de Revisão nº 660.828 de sua relatoria.

O Conselheiro Sylo Costa, nos termos do despacho de fl. 33, determinou a remessa dos autos à Diretoria Técnica -

Ainda, quanto ao mérito, esclarece que a matéria já foi ob-

DAARP / DEARP, cuja informação encontra-se às fls. 35 a

jeto do Incidente de Uniformização de Jurisprudência, pro-

38. Ato contínuo concedeu vista do processo ao Recorren-

tocolado sob o nº 674.348, apreciado na Sessão Plenária do

te, pelo prazo regimental e, a seguir, às doutas Auditoria e

dia 23/04/2003.

Procuradoria.

A seguir votam de acordo com o Conselheiro Relator, o

Em parecer de fls. 50 e 51, a douta Auditoria opina pela

Conselheiro Elmo Braz, Conselheiro Moura e Castro, e Con-

remessa dos autos ao Sr. Conselheiro Relator de origem, vi-

selheiro Simão Pedro.

sando novo exame da legalidade do ato de aposentadoria,

O Conselheiro Wanderley Ávila nega provimento ao recur-

37


so, quando, na seqüência, pedi vista dos autos. É o relatório.

agasalhado o reconhecimento de que, em um Estado que se autodefine como democrático, é de todos a Constituição, tendo em vista que a legitimidade do direito e do pró-

Fundamentação

prio Estado provém de sua origem democrática, isto é, na perspectiva de Jürgen Habermas1 na sua conceituada obra

Primeiramente, registro que a presente questão relativa ao cômputo dos períodos de afastamento por motivo de tratamento de saúde para fins de concessão da Gratificação de Incentivo à Docência, foi objeto do Incidente de Unifor-

Direito e Democracia: entre a faticidade e a validade, na exata medida da participação dos cidadãos na construção dos direitos e deveres que eles próprios definem para regular a vida em comum.

mização de Jurisprudência, protocolado sob o nº 674.348,

Nessa linha, Marcelo Cattoni2, em sua obra “Devido Proces-

apreciado na Sessão Plenária do dia 23/04/2003. Ocasião

so Legislativo” resgata Jiménez Redonho, que ao discorrer

em que esta Corte de Contas, por maioria dos votos, re-

acerca do princípio democrático como uma densificação do

conheceu a vigência e aplicabilidade da regra estabelecida

princípio do discurso ensina: sólo son legítimas aquellas

no art. 2º, §4º, da Lei nº 8.517/84, segundo a qual é veda-

normas de acción que pudierem ser aceptadas por todos

do o cômputo dos períodos de afastamento e licenças para

los possibles afectados por ellas como participantes em

concessão da Gratificação de Incentivo à Docência, tendo

discursos racionales3.

tal regra sido recepcionada pela Constituição da República de 1988 em todo o seu alcance, não configurando ofensa ao princípio da moralidade. Ao contrário, entendeu-se que a restrição legal guarda consonância com a aposentadoria especial do professor, conforme art. 40, §1º, inciso III, alínea “a”, combinado com o §5º, da Constituição da República, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98. Porém, a decisão não pôde ser sumulada, uma vez que não foi alcançado quorum especial de cinco votos previsto no Regimento Interno deste Tribunal.

Com efeito, como desdobramento da produção legítima de normas deflui a necessidade de participação ativa de toda a sociedade organizada - cidadãos e órgãos que se encontram sob sua égide - no processo de interpretação constitucional, não obstante a competência para o exercício do controle de constitucionalidade, na acepção técnica e estrita – ser alcançada somente pelos órgãos do Poder Judiciário em face do modelo jurisdicional de controle adotado no direito brasileiro. Nessa perspectiva é que resulta a necessidade de se assegurar a sociedade aberta de intérpretes da Constituição

Saliento, na oportunidade, que a controvérsia trazida à dis-

apresentada por Peter Häberle.

cussão constitui polêmica de dimensão legítima, haja vista entendimentos divergentes esposados por conselheiros des-

1 HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade.

ta Corte.

Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro Vols. I e II, 1997.

Desde já, informo que, com a devida vênia, discordo do decisum em realce e passo a fundamentar o meu entendimento.

2 CATONI, Marcelo. Devido processo legislativo, Belo Horizonte: Mandamentos, 2000, p 15. 3 Tradução livre: só são legítimas aquelas normas de ação que puderem ser aceitas por todos os possíveis afetados por elas como participantes de

Ao intentar solver a questão cumpre assinalar que deve ser

38

discursos racionais.


Na esteira deste enfoque é que se cristaliza o poder / dever dos Tribunais de Contas, órgãos de controle primazes, cuja existência e efetiva atuação são imprescindíveis em um re-

das disposições constitucionais5. Registro, desse modo, o teor da Súmula 347, do Excelso Pretório:

gime democrático, até como forma de garantia e respeito às normas insculpidas na Lei Maior. Não pode, contudo, de-

O Tribunal de Contas no exercício de suas atribuições pode

clarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do

apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do poder

Poder público, nos moldes do Poder Judiciário, mas deve

público.

negar-se à aplicação de leis manifestadamente inconstitucionais, no desempenho de suas funções.

Encampando o fundamento acima esposado e a questão prefacial, verifica-se que compete ao Tribunal de Contas,

A Mestra Elke Andrade Soares de Moura e Silva ao abordar

nos termos do art. 71, III c/c art.75 da CR/88, apreciar, para

o assunto cita o ensinamento de Hemístodes Cavalcanti:

fins de registro, a legalidade das concessões de aposentado-

A declaração de constitucionalidade é, entretanto, prerrogativa do Poder Judiciário, de que não se pode utilizar o Tribunal de Contas sem invadir a esfera daquele Poder, mas, ao apurar a sua própria competência em face da

rias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento do ato concessório, além de outras atribuições previstas nas Constituições Federal e Estadual e nas leis infraconstitucionais.

Constituição e das leis e ao apreciar os atos sujeitos ao seu

Com efeito, o Conselheiro Eduardo Carone ao relatar o

julgamento, nada impede que o Tribunal de Contas exami-

exame contido no seu voto em sede de Incidente de Uni-

ne a validade e a eficácia das leis e dos atos administrati-

formização de Jurisprudência, processo nº 674348, assim

vos perante a Constituição, deixe de aplicá-los e reconheça

entendeu:

o seu vigor quando manifesta a inconstitucionalidade4. Ainda, entende a Professora referenciada, verbis: É certo, porém, que ao Tribunal de Contas não é permitido declarar a inconstitucionalidade da norma, posto que referida função está reservada exclusivamente ao Supre-

O exame da legalidade dos atos concessórios de aposentadorias, reformas e pensões deve ser entendido como via de mão dupla, para não se cingir, apenas, à verificação da compatibilidade do ato concessório com a legislação que o rege em observância ao princípio: “tempus regit actum”.

mo Tribunal Federal e aos Tribunais de Justiça Estaduais

Verifica-se, pois, que o nobre Conselheiro já sinaliza para

(quando em conflito norma municipal ou estadual e dispo-

essa mudança na forma de se compreender e aplicar o direi-

sitivo da Constituição do respectivo Estado), na realização

to. Nesses termos, sob o paradigma do Estado Democrático

do controle direto (abstrato) de constitucionalidade. Deve,

do Direito, em que a legitimidade das decisões adquire um

no entanto, negar-lhe aplicação, se constatar que discrepa

caráter procedimental e participativo, não mais se sustenta o modelo positivista de Kelsen segundo o qual a validade do ordenamento jurídico se resumia a um silogismo des-

4 SILVA, Elke Andrade Soares de Moura e, Os Tribunais de Contas e o

provido de conteúdo que deveria encerrar toda a lógica do

Controle de Constitucionalidade as Leis, Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, Ano XXII, nº3, p 90.

5 Moura e Silva, ob. cit. p 89.

39


“dever-ser”. Do contrário, a nova modelagem, denominada pós-positivista, traz à baila a aquisição de normatividade por parte dos princípios que agora, a exemplo das regras, passam também a incorporar o ordenamento jurídico e, portanto, adquirem coercitividade.

cularidades do caso concreto. (...)8 (Negrito meu). Faz-se, então, necessário trazer ao debate a confirmação da eficácia normativa dos direitos fundamentais e dos princípios que se transformaram numa espécie de bússola da Constituição orientando e governando todo o ordenamento

Isto posto, verifica-se que a Administração Pública não

jurídico. São os direitos fundamentais a Constituição mes-

está apenas atrelada ao princípio da legalidade. No orde-

ma em seu máximo teor de materialidade, que após o pe-

namento jurídico, outros princípios concorrem para reger

culiar rompimento com o positivismo, libertou-se de ser um

as situações de aplicação, de sorte que a norma adequa-

sistema de normas na representação clássica, para se trans-

da apresenta-se como deslinde de um juízo ou senso de

formar num sistema de princípios. Reconhece-se, a partir de

adequabilidade imprescindível para o resultado do processo

então, a inteira juridicidade dos princípios9.

interpretativo. Na construção da norma adequada, como explica Rodolfo Viana Pereira6, apoiado na obra de Klaus Günther7, exige-se que todo discurso de aplicação das normas – regras ou princípios – pelo intérprete, deve pautar-se

A própria CR/88, nos §§ 1º e 2º do art. 5º, também consagra tal entendimento ao dispor sobre a aplicabilidade imediata dos direitos e garantias fundamentais e a recepção de princípios outros daqueles já expressos em seu texto.

pela motivação e fundamentação, na qual devem ser consideradas todas as circunstâncias fáticas envolvidas no exa-

Como se observa, nesse novo contexto, e aqui faço menção a

me do caso concreto.

Rodolfo Viana Pereira, a Constituição é locus hermenêutico do Direito. É o lugar a partir do qual se define a amplitude

Portanto, árdua é a tarefa do intérprete que não pode mais se ancorar no porto seguro de uma modelagem unicamente positivista. Elucidativos, neste sentido, são os ensinamentos do Professor Menelick de Carvalho Netto: Desse modo, no paradigma do estado do Direito, é de se requerer do Judiciário que tome decisões que, ao retrabalharem construtivamente os princípios e regras constitutivos do Direito vigente, satisfaçam, a um só tempo, a exigência de dar curso e reforçar a crença tanto na

dos significados possíveis dos preceitos jurídicos infraconstitucionais. A afirmação do constitucionalismo moderno como modo de regulamentação da convivência política, e a consagração do princípio da supremacia constitucional não poderiam permitir compreensão diversa. Portanto, é essencial a função do operador do Direito para investigar frente à lei infraconstitucional, fonte normativa, sua correta adequação à conjugação das regras e princípios (normas) constitucionais, no intuito de fazê-la aliada aos

legalidade, entendida como segurança jurídica, como certeza do Direito, quanto ao sentimento de justiça realizada, que deflui da adequabilidade da decisão às parti-

8 CARVALHO NETTO, Menelick de.Requisitos pragmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do estado democrático de direito. Revista de Direito Comparado. BeLo Horizonte: Faculdade de Direito da UFMG, v.3, p 486, 1999

40

6 V.P. Rodolfo, ob. cit. p 161

9 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constituciona, 7ª edição, Malhei-

7 GÜNTHER, Klaus. Teoria da Argumentação no direito e na moral.

ros, São Paulo, p 585.


fins que norteiam o modelo ideal de comunidade política e,

Compreendida a noção da indissociabilidade dos direitos

assim, realizar justiça no caso concreto10.

fundamentais à vida e à saúde, têm-se o substrato do prin-

A Constituição constitui-se, no caso, a fonte de toda legitimidade por demonstrar o limite do trabalho hermenêutico. O que afasta a aceitação plena de que os métodos clássicos de interpretação (literal, teleológica, etc.) são suficientes para trazer a verdade genuína constante no seio da norma. Nesse diapasão, na monumental obra “Verdade e Método”, do Mestre Gadamer, precursor da chamada hermenêutica filosófica, encontramos as cristalinas palavras de Richard

cípio da dignidade da pessoa humana. Ou seja, a ausência da efetividade na concretização destes direitos fundamentais constitui, também, uma violação ao princípio constitucional, podendo-se, inclusive, exigir judicialmente a prestação correspondente. Por demais, sem adentrar aqui na profícua discussão acerca da fundamentalidade dos direitos prestacionais, ou seja, aqueles que demandam uma ação positiva do Estado, cabe frisar que a saúde integra o chamado “mínimo existencial”

Palmer:

indispensável à manutenção da integridade física e em últi-

A verdade não se alcança metodicamente, mas dialeticamente (...). Rigorosamente falando, o método é incapaz de revelar uma nova verdade; apenas explicita o tipo de verdade já implícita no método11.

ma ratio, da própria vida. Não obstante adotar uma linha doutrinária diferenciada no que diz respeito ao presente tema, o Professor Ricardo Lobo Torres entende também, que as prestações que fazem

Toda essa reconstrução teórica se mostra importante, pois

parte do “mínimo existencial”, sem o qual restará violado o

à luz do método clássico de interpretação literal do art. 2º,

núcleo da dignidade da pessoa humana, compromisso fun-

§4º, da lei 8.517/84, não deve ser computado o período de

damental do Estado brasileiro, são oponíveis e exigíveis dos

afastamento do servidor da atividade específica de profes-

poderes públicos constituídos. E, ainda, o “mínimo existen-

sor ou regente de ensino, por motivo de licença para trata-

cial” representa um conjunto de condições iniciais para o

mento de saúde, para fins de percepção da Gratificação do

exercício da liberdade, que assim traduz:

Incentivo à Docência. Entretanto, acredito que no caso em tela esse entendimen-

Os direitos à alimentação, saúde e educação, embora

to não pode prosperar. Para justificar meu entendimento,

não sejam originariamente fundamentais, adquirem o

passo à análise do dispositivo em comento face à Consti-

status daqueles no que concerne à parcela mínima sem o

tuição de 1988, que em seu Título II – Direitos e Garantias

qual não sobrevive12. (Negritei)

Fundamentais – art. 6º, assegura a saúde como direito social fundamental, até mesmo por se apresentar como corolário ao direito à vida.

Depreende-se da interpretação do raciocínio transcrito que o direito à saúde não é tratado como um direito individual fundamental a priori, devendo adquirir este status, pois constitui em sua essência o standart mínimo de existência

10 PEREIRA, Rodolfo Viana. Hermenêutica filosófica e Constitucional.Del Rey, Belo Horizonte, 2001,

p 141.

11 PALMER, Richard E. Hermenêutica Lisboa, edição 70,1997, p 169.

12 TORRES, Ricardo Lobo, Os direitos humanos e a tributação – imunidades e isonomia, 1995, p133.

41


indispensável ao princípio da dignidade da pessoa humana.

sustento e de sua família.

E, nesta sociedade contemporânea focada no ponto de vista

Toda essa construção que permite a liberação das amarras

jusfilosófico, na credibilidade dos postulados humanistas e

de uma legalidade estrita encontra acolhida também na Ju-

na democracia, a dignidade da pessoa humana (considerado

risprudência Pátria. Nessa perspectiva, decidiu o Superior

seu aspecto material) adquire relevância ímpar.

Tribunal de Justiça ao julgar o Recurso Especial 249026/PR,

Portanto, no caso sub examine a normatização dos princípios permite que possamos continuar no modelo de juridi-

FGTS. LEVANTAMENTO, TRATAMENTO DE FAMILIAR POR-

cidade sem permitirmos distorção que reduza a regulamen-

TADOR DO VÍRUS HIV, POSSIBILIDADE, RECURSO ESPECIAL

tação à hipótese restrita da regra contida no art.2º, §4º, da

DESPROVIDO.

lei estadual 8.517/84.

1. É possível o levantamento do FGTS para fins de trata-

Esposado meu entendimento, gostaria ainda de mencionar

mento de portador do vírus HIV, ainda que tal moléstia não

que na construção da norma adequada ao caso em comen-

se encontre elencada no artigo 20, XI, da Lei 8036/90, pois

to, relevante é o excerto extraído do acurado entendimento

não se pode apegar, de forma rígida, à letra fria da lei, e

promanado do voto do nobre Conselheiro Eduardo Carone:

sim considera-la com temperamentos, tendo-se em vista a

O intérprete deve atentar para a questão pontual no exame do cômputo, ou não, do período de licença para tratamento de saúde para fim de concessão da gratificação sob comento, e que está relacionada ao aspecto da voluntariedade do afastamento, ou seja, a doença independe de ato volitivo do servidor, sendo sempre involuntária, inesperada e indesejada. (Negritei) Portanto, a partir dos argumentos por mim apresentados e valendo-me desse posicionamento do Conselheiro Eduardo Carone em assentada já referida, e considerando o direitos fundamentais à vida e a saúde, cernes do princípio da dignidade da pessoa humana retratados na Constituição da República de 1988, infere-se que a norma jurídica infraconstitucional em comento não pode desferir reflexos

42

Relator Min. José Delgado, assim ementado:

intenção do legislador, mormente perante o preceito maior insculpido na Constituição Federal garantidor do direito à saúde, à vida e a dignidade da pessoa humana e, levandose em conta o caráter social do Fundo que é, justamente, assegurar ao trabalhador o atendimento de suas necessidades básicas e de seus familiares. 2. Recurso Especial Desprovido O Ministro José Delgado, neste voto, ao relatar, ratificou as palavras do ilustre prolator da sentença de 1º grau, in verbis: Prefiro, quando as circunstâncias assim o exigem, navegar ao largo da legalidade, sem rotular-me alternativo, contudo, sentindo prazer incomensurável de decidir de forma a albergar os anseios dos mais necessitados.

danosos para a vida funcional e para o patrimônio da servi-

Caminha-se, desse modo, para a conclusão que o art.2º, §4º,

dora. A saúde é um direito garantido constitucionalmente,

da lei estadual nº 8.517/84 não deve ser aplicado in casu,

sendo-lhe assegurado o afastamento do serviço para trata-

pois a sua aplicação constituirá afronta à Constituição Fe-

mento médico necessário, e por sua vez, o pagamento de

deral de 1988 e à Carta Mineira de 1989, quando, senão

sua remuneração, para que possa continuar mantendo seu

vejamos também, a exemplo disso, o art. 37 da Constitui-


ção Mineira dispondo que após a cessação dos motivos que

dignidade da pessoa humana. E continua o Mestre Paulo

causaram a aposentadoria por invalidez, o servidor público

Bonavides:

que retornar à atividade terá direito, para todos os fins, salvo para o de promoção, à contagem do tempo relativo ao período de afastamento. Conclui-se que se considerarmos que o caso em tela não trata de promoção do servidor e que a aposentadoria por invalidez é ocasionada por problemas de saúde, o mesmo tratamento deve ser atribuído ao servidor que esteve afastado para tratamento de saúde, ou seja, trata-se de afastamentos de mesma natureza. Extrai-se de todo o exposto, que a regra epigrafada, em face do óbice do cômputo do afastamento para tratamento de saúde para fim de percepção da Gratificação de Incentivo à Docência, não pode ser aplicada no presente caso por revelar-se uma violação à nova ordem jurídica trazida com o advento das Constituições da República de 1988 e Estadual de 1989; por via de conseqüência o art. 8º do Decreto

A pior das inconstitucionalidades não deriva, porém, da inconstitucionalidade formal, mas da inconstitucionalidade material, deveras contumaz nos países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos, onde as estruturas constitucionais, habitualmente instáveis e movediças, são vulneráveis aos reflexos que os fatores econômicos, políticos e financeiros sobre elas projetam. (...) Cabe, por conseguinte, reiterar: quem governa com grandes omissões constitucionais de natureza material menospreza os direitos fundamentais e os interpreta a favor dos fortes contra os fracos. Governa, assim, fora da legítima ordem econômica, social e cultural e se arreda da tridimensionalidade emancipativa contida nos direitos fundamentais da segunda, terceira e quarta gerações. (Negritei)

Estadual nº 23559/84 deve receber o mesmo tratamento. Nesse caso, a regra em destaque cede espaço em face do

Cumpre acrescentar, ainda, que a Lei Maior contempla, em

direito fundamental à vida e à saúde, materializados no

seu art. 3º, como um dos objetivos fundamentais da Repú-

princípio da dignidade da pessoa humana, que se apre-

blica Federativa do Brasil “construir uma sociedade livre,

senta como norma adequada ao caso concreto.

justa e solidária”. Objetivo este que tem pertinência com o respeito à redução das desigualdades sociais, que é ao

Portanto, não considerar os princípios como normas tende-se a corromper o próprio valor segurança jurídica que se pretende assegurar. À vista desse sentido, acrescento o entendimento de que a inconstitucionalidade material é o satélite da ilegitimidade, como ensina Paulo Bonavides13 que apoiado na obra de Juarez Freitas sobre a intrísica e substancial inconstitucionalidade da lei injusta, afirma que o conceito de inconstitucionalidade material, em outros termos, está diretamente vinculado aos princípios superiores de justiça, igualdade e

mesmo tempo um princípio da ordem econômica, art. 170, VII da CR/88, e também um dos objetivos fundamentais do nosso ordenamento jurídico. Não obstante já ter discorrido sobre meus fundamentos e marcado minha posição, não poderia de deixar de trazer à colação novamente o entendimento do nobre Conselheiro Eduardo Carone, que embora com fundamento diverso, em que faz referência ao atendimento do princípio da moralidade, também esposa a tese da possibilidade do cômputo do período de afastamento para tratamento de saúde na concessão de Gratificação de Ensino a Docência, senão ve-

13 BONAVIDES, São Paulo, p 553 e 554.

jamos:

43


Nesse diapasão, o diploma legal sob exame ao permitir

mente o disposto no §4º, do art. 2º, da lei nº 8.517/84 estará

que se faça o cômputo de período de afastamento de fé-

descumprindo o princípio da moralidade insculpido no art.

rias regulamentares e férias-prêmio, por exemplo, licenças

37 da Carta Magna.

eminentemente voluntárias, e não permitir que se faça o cômputo do tempo relativo à licença para tratamento de saúde, afastamento totalmente involuntário, atende ao princípio da moralidade administrativa (art. 37, “caput”, CF/88)?

Por todo o exposto, entendo que este eg. Tribunal Pleno deve afastar a aplicação do §4º, do art. 2º, da Lei Estadual 8.517/84, no caso vertente, por entender que o dispositivo ofende os direitos fundamentais à vida e à saúde, substratos do princípio da dignidade da pessoa humana. Sob pena

De pronto, entendo que a resposta é negativa, pois não

deste Órgão de Contas não cumprir com fidelidade a com-

é ético e moral apenar o servidor, já castigado com a

petência atribuída pela Constituição Mineira e pela Cons-

doença indesejada, com a impossibilidade de cômpu-

tituição da República.

to, para fim de concessão da gratificação de incentivo à docência, de período de afastamento, comprova-

Faço constar por fim, como fator de reflexão, a lição do Professor Doutor Menelick de Carvalho Netto:

do por laudo médico oficial, involuntário do exercício das atribuições específicas de seu cargo, para cuidar de

Assim podemos concluir que, sob as exigências da herme-

sua saúde, direito constitucional que decorre do direito

nêutica constitucional ínsita ao paradigma do Estado De-

fundamental e inaliável à vida, cuja inviolabilidade é

mocrático de Direito, requer-se do aplicador do Direito

garantida na Lei maior (art.5º, “caput”, e art. 196- CF/88)

que tenha claro a complexidade de sua tarefa de in-

(Negrito meu)

térprete de textos e equivalentes a texto, que jamais a veja como algo mecânico, sob pena de dar curso a uma

No mesmo sentido cabe trazer à discussão os ensinamentos da Mestra Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

insensibilidade, uma cegueira, já não mais compatível com a Constituição que temos e com a doutrina e ju-

Em resumo, sempre que em matéria administrativa se

risprudência constitucionais que a história nos incumbe

verificar que o comportamento da Administração ou do

hoje de produzir15. (Negritei)

administrado que com ela se relaciona juridicamente, embora em consonância com a lei, ofende a moral, os bons costumes, as regras de boa administração, os princípios de justiça e de eqüidade, a idéia comum de honestidade, estará havendo ofensa ao princípio da moralidade administrativa14.

VOTO: A PARTIR DE UMA INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO POR NÃO RECONHECER, IN CASU, A APLICABILIDADE DA REGRA ESTABELECIDA NO ART. 2º, §4º, DA LEI Nº 8.517/84, SEGUNDO A QUAL É VEDADO O CÔMPUTO DOS PERÍODOS DE LICENÇAS E AFASTAMENTOS DE QUALQUER NATUREZA - INCLU-

Ora, pelo ensinamento expendido e pelos motivos exarados na presente análise, o administrador que cumprir literal-

15 CARVALHO NETTO, Menelick de.Requisitos pragmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do estado democrático de direito. Revista

44

14 DI PIETRO.Maria Sylvia Zanella,. Direito Administrativo. 19ª, Atlas, São

de Direito Comparado. BeLo Horizonte: Faculdade de Direito da UFMG,

Paulo, 2005, p 91.

v.3, p 170 e 171, 1999


SIVE PARA TRATAMENTO DE SAÚDE - PARA CONCESSÃO

Por óbvio, não cabe aqui refazer todo o arcabouço teórico

DA GRATIFICAÇÃO DE INCENTIVO À DOCÊNCIA, POR CON-

construído na peça ora em comento. Entretanto, não po-

FIGURAR OFENSA AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS À VIDA E

deria me furtar de fazer o registro do que me parece ser o

À SAÚDE, SUBSTRATOS DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA

ponto central da tese desenvolvida e que reflete a justeza

PESSOA HUMANA.

do raciocínio ali esposado, no que tange à aplicação do pra-

NESTES TERMOS, DENEGO O REGISTRO DO ATO DE APO-

zo decadencial às Cortes de Contas. Nele, resta configurada de forma racionalmente fundamentada, a complexa inter-

SENTADORIA.

relação do complexo de atos que envolvem, por um lado a ___________________

concessão e por outro, o registro das aposentadorias e que confluem para a adoção do prazo decadencial pelas Cortes

PARECER DA LAVRA DO CONSELHEIRO ANTÔNIO ANDRA-

de Contas.

DA SOBRE A QUESTÃO DA APLICABILIDADE DO INSTITUTO DA DECADÊNCIA NOS ATOS SUJEITOS A REGISTRO NO

Nesse sentido, do parecer sub exame, às fls. 20 e 21, trans-

ÂMBITO DOS TRIBUNAIS DE CONTAS

crevemos o seguinte excerto, verbis: Ademais disso, é preciso não perder de vista que, no que

PARECER

Veio a este Gabinete através do Exp. 074/MPTC/2006, pro-

tange ao controle de legalidade exercido pelos Tribunais de

moção da lavra da Procuradora Luísa Cristina Pinho e Netto,

Contas, para fins de registro, sobre os atos de aposentadoria,

e também encaminhado a essa Presidência em 24/03/2006,

é razoável sustentar que o Tribunal não tem competência

que trata de aspectos jurídicos, nuances e desdobramentos

para determinar o comportamento da Administração, aqui,

envolvendo o registro dos atos de aposentadoria concedi-

trata-se de um competência típica do controle. O Tribunal

dos há mais de cinco anos.

verifica a legalidade do ato e o registra, ou, verificando sua ilegalidade, nega o registro, não lhe cabendo determinar a

Em apertada síntese, o bem elaborado e fundamentado parecer, forjado em uma sólida base doutrinária e jurisprudencial, trata de questões que envolvem: o poder de autotutela da administração para rever seus atos, a concorrência ou colisão de princípios, ser ou não o ato de aposentadoria complexo, a discussão acerca da aplicação das leis de processo administrativo no âmbito dos Tribunais de

conduta da Administração. Esta, considerando aceitável o entendimento do Tribunal(e não tendo se consumado a decadência) deverá, respeitando o devido processo legal, rever o ato, tornando-o legal e apto para registro. Neste caso, a Administração não está cumprindo ordem ou determinação do Tribunal, está exercendo competência própria, colocando em movimento sua autotutela.

Contas, a necessidade da boa-fé do beneficiário do ato, o devido processo legal envolvendo o registro do ato. Nesse

Tanto é assim que, se a Administração não concorda com

contexto desenvolvido e trabalhado, erigiu a douta Pro-

a interpretação dada pelo Tribunal de Contas que leva a

curadora, um raciocínio no qual entende ser cabível a esta

entender o ato como ilegal, pode recorrer no âmbito do

Corte, tão somente registrar os atos de aposentadoria, sem

próprio Tribunal de Contas, bem como pode levar a questão ao

análise de mérito, quando decorridos cinco ou mais anos de

Judiciário, que deverá, então, fixar o direito aplicável ao caso con-

sua concessão.

creto, precisando os termos em que o ato deverá ser registrado.

45


A aceitar o entendimento defendido no trecho transcrito,

mada a decadência nos termos da Lei de processo Admi-

estar-se-ia diante de uma situação ímpar: o prazo deca-

nistrativo.

dencial não se aplica ao tribunal de Contas – que se nega a registar o ato - , mas se aplica à Administração – que teria que rever o ato originário para obter seu registro. Tratando deste impasse, esclarecedores os argumentos colacionados pelo Conselheiro do TCDF Ávila e Silva (pesquisados no site do Conselheiro do mesmo Tribunal, Dr. Jorge Ulisses Jacoby Fernandes: www.jacoby.pro.br): “De fato, o estado de pendência eterna é incompatível com o objetivo do ordenamento jurídico que reclama estabilidade.

invalidar ato ilegal por manifestação unilateral de vontade, resta a via judicial para buscar por provimento jurisdicional a anulação da aposentadoria concedida com vício de legalidade estrita. È de reconhecer a incidência do prazo de 5 anos, como defende Celso Antônio Bandeira de Mello (Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 971-972). Conforme bem exposto, fica claro que essa situação coloca a Administração em uma situação paradoxal e

Certo, também, que à Administração estaria vedada a anu-

absurda: Se por um lado, encontra-se compelida pela

lação de atos de que decorreram efeitos favoráveis para os

determinação da Corte de Contas a rever o ato eivado

destinatários, se passados cinco anos da data em que foram

de vício, por outro vê-se impedida a fazê-lo pela ocor-

praticados, salvo comprovada má-fé.

rência do prazo decadencial.

O descompasso no prazo de ação praticado pelo Tribunal,

Nesses termos, Sr. Presidente, resta claro, a meu ver, que

caso não jungido aos cinco anos demarcados pela Lei n.º

não cabe outra posição desta Corte, a não ser determinar

9.784/99, levaria a Administração a um dilema. O Tribunal

o registro do ato de aposentadoria nessas condições, o que

pronuncia a ilegalidade a Administração decaiu do direito

ratifica, portanto, a tese trazida à colação pela douta Pro-

de anular o ato. E a prática do ato é da esfera administrati-

curadora.

va, que estaria impedida de cometê-lo.

Explico melhor: o Tribunal de Contas ao adotar o insti-

O Poder Judiciário já assenta a jurisprudência no sentido

tuto da decadência não abdica de qualquer competên-

de que ‘após decorridos cinco anos não pode mais a Admi-

cia que lhe é atribuída pela Carta Magna, à medida que

nistração Pública anular o ato administrativo gerados de

estará a exercer o seu múnus na exata medida em que

efeitos no campo de interesses individuais, por isso que se

determina o registro do ato, que se encontra aperfeiço-

opera a decadência’ (STJ Mandado de Segurança n. 6.566/

ado e conforme à lei exatamente pelo decurso de tem-

DF DJU de 15/5/00).”

po, ou seja, do prazo decadencial. Nesse sentido, apenas

De fato, a aceitar que o prazo de 5 anos não se aplica aos Tribunais, mas se aplica à Administração, chega-se à situação absurda de que o Tribunal não registra o ato por con-

46

E nem se argumente que à Administração, que não pode

gostaria de reforçar que o próprio CPC, em seu art. 269, IV afirma textualmente que a decadência é causa de extinção do processo com resolução de mérito.

siderá-lo ilegal e a Administração não pode anulá-lo para

Entretanto, ainda que clarificado meu entendimento, ne-

conformá-lo ao entendimento do Tribunal já que consu-

cessário ainda fazer menção a duas observações, para mim,


extremamente relevantes e pertinentes ao assunto aborda-

• TJMG

do.

1)

A primeira, diz respeito ao fato da necessidade da boa-fé , ou melhor, da não comprovação de má-fé do beneficiário como condicionante da operação da decadência no prazo aventado de cinco anos.

APELAÇÃO

CÍVEL/REEXAME

NECESSÁRIO

.0024.02.833379-7/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): JD DA 1ª V FAZ COMARCA DE BELO HORIZONTE, ESTADO DE MINAS GERAIS - APELADO(A)(S): MARIA JOSÉ CARIDADE CARNEIRO - RELATOR: EXMO. SR. DES. WANDER MAROTTA

Ora, para manter a coerência com as determinações nor-

EMENTA: CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA ¿ DECURSO DO

matizadas nas ordens de serviço ns. 01 / 04; 03 /04 e 06 /04

PRAZO DECADENCIAL. Decorridos 5 (cinco) anos do ato con-

que vieram racionalizar a análise dos atos de aposentadoria,

cessivo da aposentadoria, prazo durante o qual quedou- se

perfilo do entendimento de que a decadência somente não

inerte a Administração, opera-se a decadência, posto que o

se caracterizaria quando o Tribunal for informado da ocor-

ato administrativo, aqui, gera efeitos no campo de interes-

rência de má-fé ou quando os indícios da mesma forem

ses individuais, não sendo absoluto o poder de autotutela

explícitos e aferíveis de plano quando da análise dos autos.

da Administração. Mesmo antes da edição da Lei Estadual

Nesse sentido, elucidativas são as palavras do ex-Conselhei-

nº 14.184, de 1º de fevereiro de 2002 (art. 65), o direito de

ro do TCDF e doutrinador Jorge Ulisses Jacoby Fernandes ,

a Administração invalidar os atos por ela praticados, esta-

citado às fls. 26 do parecer, verbis:

va sujeito ao prazo decadencial por força do princípio da

Note-se que o Tribunal deve ser cientificado ou estar con-

igualdade entre os sujeitos da relação jurídica.

vencido da ocorrência de má-fé, para só então apreciar o ato, pois, se a Corte fosse verificar a ocorrência de má-fé em todos os processos que são aplicáveis os preceitos do art. 54 da lei n. 9784/99 para, posteriormente, em caso de sobrevir a pérfida, praticar os atos correspondentes, não estaria sendo eficaz. [...]

2) APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.00.341715-1/000 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): 1º) JD 3 V. FAZ COMARCA BELO HORIZONTE, 2º) MARLENE MACHADO PORTO, 3º) ESTADO MINAS GERAIS - APELADO(A)(S): MARLENE MACHADO PORTO, ESTADO MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. HYPARCO IMMESI EMENTA: SERVIDOR PÚBLICO - PROVENTOS DE APOSENTADORIA - REDUÇÃO SUMÁRIA - OMISSÃO ADMINISTRATIVA

Haja vista a grande dificuldade em se aferir a existência de má-fé, penso que esta Corte só deveria se pronunciar quando houver indícios suficientes para fazer cessar a presunção de boa-fé ou o Tribunal for informado a respeito.

- DECURSO DO PRAZO LEGAL - DECADÊNCIA CONSUMADA - LEIS 9.774/99 E 14.184/2002 - NULIDADE DO ATO REDUTÓRIO IMPUGNADO - “MANDAMUS” - SUA CONCESSÃO. Nada impede que a Administração proceda à revisão do aro

Na esfera do Poder Judiciário, seja nos Tribunais de Justiça

de aposentadoria do servidor, desde que o faça com obser-

Estaduais ou nos Tribunais Superiores, não obstante a au-

vância do devido processo legal, a ele (servidor) assegurado

sência de um entendimento assente e pacificado acerca do

o exercício do direito à ampla defesa. Todavia, se a Admi-

tema, já se pode destacar um sem número de arestos que

nistração se omite e só adota as medidas conducentes à re-

adotam a tese da decadência, senão vejamos:

visão (e, mesmo assim, unilateralmente) após o decurso do

47


prazo de cinco anos, consuma-se, inexoravelmente, a decadência. E consuma-se, porque o direito do Poder Público de nulificar os atos administrativos dos quais resultem efeitos favoráveis aos respectivos benefícios, sujeita-se à decadência, ou seja, decai, irremediavelmente, em cinco anos, contados da data em que tiverem sido praticados, salvo a

inerentes. 2. “O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.” (artigo 54 da Lei nº 9.784/99).

ocorrência de má-fé comprovada “salienter tantum”, a teor do art. 54 da Lei 9.784/1999 e do art. 65 da Lei (estadual)

3. “Após decorridos 5 (cinco) anos não pode mais a Adminis-

14.184/2002.

tração Pública anular ato administrativo gerador de efeitos no campo de interesses individuais, por isso que se opera a

• STJ MANDADO DE SEGURANÇA Nº 7.978 - DF (2001/0132898-3) RELATOR : MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO IMPETRANTE : MARIA REGINA DE CASTRO SANTOS RODRI-

decadência.” (MS nº 6.566/DF, Relator p/ acórdão Ministro Francisco Peçanha Martins, in DJ 15/5/2000). Precedente da 3ª Seção. 4. Ordem concedida.

GUES

Portanto, e a partir dessa premissa, entendo ser possível a

ADVOGADO : ULISSES BORGES DE RESENDE E OUTROS IM-

adoção de critério que possibilite o registro em bloco das

PETRADO : MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA IMPETRADO :

aposentadorias ainda não analisadas e que se encontrem na

SUPERINTENDENTE NACIONAL DE GESTÃO ADMINISTRATI-

situação ora descrita, compatibizando-se inclusive a ques-

VA DO INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA

tão da análise da ocorrência de prejuízo ao beneficiário do

AGRÁRIA – INCRA.

ato. Para tanto, a título de contribuição, sugiro que seja

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA,

baixada, pela Presidência, ouvidos os demais Conselheiros,

SERVIDOR PÚBLICO. REVISÃO DO ATO. AUSÊNCIA DE INS-

ordem de serviço visando normatizar tal situação, até mes-

TAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.

mo para ir no encontro às diretrizes esposadas nas instru-

VIOLAÇÃO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA AMPLA DE-

ções que vieram racionalizar a análise das aposentadorias.

FESA CONFIGURADA.

48

IMPOSSIBILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO REVISAR O ATO.

A segunda observação, não obstante estar explicitamente

DECADÊNCIA. ARTIGO 54 DA LEI Nº 9.784/99.

apontada na conclusão do parecer de fl. 35, que assim dis-

1. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, seguin-

põe: “Nesta esteira, a Administração deve enviar os atos

do orientação do Pretório Excelso, firmou entendimento no

para a análise e registro no Tribunal em tempo razoável,

sentido de que a desconstituição da eficácia de qualquer

impondo-se ao Tribunal, a seu turno, tomar as medidas

ato administrativo, que repercuta no âmbito dos interes-

necessárias no sentido de otimizar a análise das aposen-

ses individuais dos servidores ou administrados, deve ser

tadorias em tempo hábil.”, apresenta-se como corolário de

precedido de instauração de processo administrativo, em

toda uma nova sistemática que se quer ver aqui implantada

obediência aos princípios constitucionais do devido proces-

no que tange à análise dos processos de aposentadoria. Ora,

so legal e da ampla defesa, com todos os recursos a ela

para que esta competência constitucional atribuída aos


Tribunais de Contas não se torne letra morta, necessário

quaisquer esclarecimentos adicionais, reiterando meus ele-

é que se crie mecanismos para que o envio das referidas

vados votos de estima e respeito.

aposentadorias a esta Corte se processe em tempo hábil, dentro de critérios adequados à realidade do Tribunal e dos jurisdicionados, mas de tal sorte que o descumprimento do

Conselheiro Antônio Carlos Andrada

prazo limite, enseje aplicação de sanção ao responsáveis de conformidade com o permissivo da LC 33/94 e do RITCMG. Nesse sentido, entendo ser pertinente a adequação das instruções normativas que regulam a matéria para abarcar

___________________

essas sugestões, principalmente no que diz respeito à sistemática dos prazos para envio. Por fim, quanto à alegada necessidade de se observar o contraditório quando da alteração do ato original que importe prejuízo ao beneficiário do ato, sugiro a formação de um grupo de estudo ou comissão para firmar um posicionamento sobre o tema, que é complexo e envolve tanto questões como direito/violação de direitos e garantias fundamentais, quanto a própria natureza da atividade desenvolvida pelos Tribunais de Contas quanto à espécie. A partir da ciência de que o referido parecer já passa a integrar a informação de diversos processos que tramitam nesta Casa, e não obstante já ter externado que este entendimento será adotado nos processos de minha relatoria, entendo ser pertinente tratar a matéria com prioridade, considerando-se o elevado estoque de processos desta natureza que superpovoam as coordenadorias, diretorias e gabinetes desta Casa. É sabido que dentre os vários estudos que se realizam sobre os Tribunais de Contas, interna e externa corporis, quase a totalidade deles aponta para a análise de aposentadorias como um gargalo quase que insolúvel, gerando um profundo descompasso entre a atuação do Tribunal e os anseios da sociedade de um controle efetivo, eficaz e eficiente. Feitas essas considerações, coloco-me à disposição para

49


Tiradentes >> A Cidade de Tiradentes foi fundada por volta de 1702, quando os paulistas descobriram ouro nas encostas da Serra de São José, dando origem a um arraial batizado com o nome de Santo Antônio do Rio das Mortes. O arraial, posteriormente, passou a ser conhecido como Arraial Velho, para diferenciá-lo do Arraial Novo do Rio das Mortes, a atual São João del Rei.

50

<<


>> MINEIRANÇAS


História de Tiradentes Em 1718, o arraial foi elevado à vila, com o nome de

quitetura civil do século XVIII, como o Sobrado Rama-

São José, em homenagem ao príncipe D. José, Futuro

lho, nos quatro cantos: o Sobrado do Aimorés Futebol

rei de Portugal, passando, em 1860, à categoria de ci-

Clube, na Rua Direita; o prédio da Prefeitura com suas

dade. Durante todo o século XVIII, a Vila de São José

sacadas de ferro batido e sótão; a casa nº 114 da Rua

viveu da exploração de ouro e foi um dos importantes

Padre Toledo, com forros pintados, representando os

centros produtores de Minas Gerais.

cinco sentidos; a casa do Largo do Ó nº 1, com forros pintados; e três casas com antigas janelas de rótula,

No fim do século XIX, os republicanos redescobrem a

na Rua Direita.

esquecida terra de Joaquim José da Silva Xavier, o “Tiradentes”, fazem uma visita cívica à casa do vigário

Como chegar

Toledo, onde se tramou a Inconfidência Mineira. Mas foi o inflamado Silva Jardim que, de passagem por São

De Belo Horizonte, o caminho mais prático para che-

José, sugere em seu discurso que o nome da cidade

gar em Tiradentes é seguir pela BR040 até o Trevo

fosse trocado para o do herói, em lugar de um rei por-

para Murtinho (5 quilômetros após passar por Congo-

tuguês. Com a proclamação da república, por decreto

nhas). Você vai passar por Entre Rios de Minas e Lagoa

de número 3 do governo provisório do Estado, datado

Dourada. De São João del Rei até Tiradentes são 12

de 6 de dezembro de 1889, recebe a cidade o atual

quilômetros.

nome “Cidade e Município de Tiradentes”. Após longos anos de esquecimento, o conjunto arquitetônico da

Para quem sai de São Paulo, o caminho mais prático é

cidade foi tombado pelo então Serviço do Patrimô-

pela BR381 (Rodovia Fernão Dias) até a entrada para a

nio Histórico e Artístico Nacional (Sphan), em 20 de

cidade de Lavras (380 quilômetros). Seguir então pela

abril de 1938, tendo sido, por isso, conservado quase

BR265 até a entrada para Tiradentes (110 quilôme-

intacto.

tros).

Ainda existem na cidade excelentes exemplares de ar-

Do Rio de Janeiro, seguir pela BR040 até Barbacena (270 quilômetros), passando por Petrópolis e Juiz de Fora. Em Barbacena, pegar a BR265 até a entrada de Tiradentes (53 quilômetros).

52

Fonte: www.tiradentes.net


Calendário de Eventos Janeiro - Mostra de Cinema Brasileiro - 2ª quinzena. - Aniversário da cidade - dia 19. Fevereiro - Carnaval (de acordo com o calendário nacional). Durante o carnaval, os blocos da cidade revivem os antigos carnavais de época das “marchinhas”.

Roteiro Turístico Monumentos Cíveis

Abril - Semana Santa (festa móvel).

Maria-fumaça Chafariz de São José

- Semana da Inconfidência (festa móvel).

Casa da Câmara Junho

Cadeia Pública Centro Cultural Yves Alves Casa Padre Toledo Largo da Forras Ponte de Pedra Igreja da Santíssima Trindade

- Jubileu da Santíssima Trindade - missas, novenas e procissões. O Jubileu conta com barracas de roupas, bebidas e salgados. - Encontro de Motos Antigas - último fim de semana do mês.

Matriz de Santo Antônio Igreja do Rosário Igreja de São João Evangelista Igreja Nossa Senhora das Mercês Capela de São Francisco de Paula

Julho - Inverno Cultural - festival de inverno que ocorre paralelo com o festival de São João del Rei. 2ª quinzena.

Capela de Santo Antônio do Canjica Agosto

Passeios ecológicos Mãe D’Água

- Festival Internacional de Cultura e Gastronomia. - 2ª quinzena.

Cachoeira do Bom Despacho Mangue Cachoeira do Carteiro

Outubro - Festival de Cavalo Campolina - 2ª quinzena.

Poço da Matriz Balneário de Àguas Santas Distrito de Vitoriano Veloso (Bichinho)

Dezembro - Réveillon - melhor réveillon da região. Dia 31. 53


Conheça os roteiros turísticos - Maria-fumaça

- Largo da Forras

Construída em 1881, atualmente liga as cidades de

Local de lazer da comunidade. Neste largo, temos além

Tiradentes e São João del Rei, num belo passeio mar-

do casario antigo, o prédio da Prefeitura de 1720 e a

geando o Rio das Mortes, e com vista para a serra de

Igreja do Senhor Bom Jesus da Pobreza de 1771. Neste

São José.

Largo também podemos encontrar o passinho da paixão de Cristo (ao todo são sete espalhados pelo Cen-

- Casa da Câmara

tro Histórico contendo as passagens de Cristo), onde

Construção de 1717, neste casarão se reunia o Sena-

se realiza parte dos festejos da Semana Santa, alguns

do da Câmara desde 1718 e onde o pai do Alferes,

decorados com grandes obras de arte. Encontramos

Domingos da Silva Santos, exerceu o cargo de verea-

também um monumento dedicado ao Alferes Tiraden-

dor. O prédio servia para recepcionar os imperadores

tes, construído em 1892 para celebração do centená-

e pessoas ilustres que visitavam a cidade de São José

rio da morte do mesmo.

del Rei (Tiradentes). - Ponte de Pedra - Cadeia Pública

Construída no século XVIII, em 1703, para dar acesso

Construída em 1833, no local da velha cadeia incen-

ao lugar denominado Santo Antônio do Canjica, onde

diada, é um prédio sólido e austero e com grades pe-

havia uma mina de ouro.

sadas em suas janelas de pedra. - Igreja da Santíssima Trindade - Centro Cultural Yves Alves

Começamos nosso roteiro por este monumento, não

Aproveitando a fachada existente, seu interior foi

pelo seu valor arquitetônico, pois esta igreja é de

construído nos moldes da arquitetura colonial. Foi

1810, nova em relação à cidade, mas pelo seu valor

construído com o objetivo de receber os diversos

cultural, pois foi neste local em outra capela primi-

eventos da cultura local.

tiva que o Alferes Tiradentes, devoto de Santíssima Trindade, exigiu que na bandeira da Nova República,

- Casa Padre Toledo

idealizada pelos Inconfidentes, tivesse o triângulo da

Este casarão tem seu valor arquitetônico, pois é a

Trindade. E fracassada a Inconfidência, o símbolo foi

construção em que mais se concentram pinturas de

usado na bandeira do Estado de Minas Gerais. Nesta

tetos em um mesmo prédio em Minas Gerais. Também

igreja, encontra-se uma importante imagem de Deus

possui um grande valor cultural para o Brasil, pois

em tamanho natural, única no Brasil, vestida a ma-

aqui, em 1788, ocorreu a primeira reunião da Incon-

neira de papa da idade média, de autor desconhecido.

fidência Mineira, onde se tramou os primeiros ideais

Certamente, o Alferes por várias vezes rezou em frente

de libertar o Brasil de Portugal, tendo este movimento

a esta imagem.

partido para Ouro Preto, Capital do Estado. Esta casa

54

era de propriedade do inconfidente Padre Toledo. Hoje

- Matriz de Santo Antônio

é um museu com rico mobiliário e obras de arte.

Construção de 1710 considerada a 2ª igreja mais rica


- Chafariz de São José Construído em 1749 pela Câmara Municipal de São José del Rei (Tiradentes), é considerado o mais belo chafariz do Brasil. Foi construído com três funções: na parte da frente, abastecer com água potável a população; à direita, servir como suporte para as lavadeiras locais e, à esquerda, servir de bebedouro aos animais, sua fachada Barroca guarda uma rara imagem de São José e um brasão de armas do Reino de Portugal. E como diz a lenda, basta você beber um gole desta em ouro do Brasil. Seus altares foram revestidos de ouro em 1752. É um dos mais belos templos barro-

água cristalina e novamente você retornará à bela Tiradentes.

co do Brasil, também existe em seu interior um belo órgão de 1779 considerado um dos quinze mais importantes do mundo. No seu adro, também pode ser visto o relógio do sol de 1785, feito pelo português Leandro Gonçalves Chaves. Sua fachada foi projetada

- Igreja Nossa Senhora das Mercês Construída no final do século XVIII pela irmandade dos pretos crioulos nascidos no Brasil. O seu interior é decorado com raríssimas pinturas de Manuel Vitor de Jesus.

pelo mestre Aleijadinho. - Capela de São Francisco de Paula - Igreja do Rosário Construída em pedra, em 1708, possui três altares com talhas de meados do século XVIII. As imagens que compõem seus altares são todas de cor negra, com exceção da imagem de Nossa Senhora do Rosário, pa-

Construção do séc. XVIII. À sua frente, amplo gramado onde se ergue um cruzeiro, instalado em 1718, quando da elevação à Vila de São José del-Rei. Ainda desta colina, descortina-se também uma bela vista da cidade e da serra de São José.

droeira da igreja. Esta, foi construída pelos escravos vindos da África, que trabalhavam durante a noite e levavam em suas unhas e cabelos o ouro roubado de seus senhores, com o qual decoraram esta igreja.

- Capela de Santo Antônio do Canjica Construída em 1702 pelo fundador da cidade, o bandeirante João de Siqueira Afonso. Sua fachada e interior são simples. Localizada no Bairro do Canjica, seu

- Igreja de São João Evangelista Igreja construída pelos homens mulatos. Seu interior apre-

nome é devido aos grandes bagos de ouro, encontrados na época neste local.

senta estilo rococó e o que chama atenção são as imagens de um mesmo santeiro em tamanho natural. E no altarmor desta igreja está enterrado o ilustre tiradentino, compositor de músicas sacras, Manoel Dias de Oliveira.

Fonte: www.guiatiradentes.com.br Fotos: Cláudio Campos - Tiradentes - (32) 9958-4344

55



>> ARTIGOS O Parlamento e o controle político da Administração Pública

58

72

O vice-prefeito no processo eleitoral: uma visão atual

O pós-positivismo e o papel do juiz em um Estado Democrático de Direito

87

91

A natureza jurídica do parecer prévio emitido pelos Tribunais de Contas estaduais e admissibilidade de recurso


O PARLAMENTO E O CONTROLE POLÍTICO DA

dos governos pelo Parlamento. John Locke (1632-1704),

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA *

precursor das idéias democráticas liberais, defendia um governo de autoridade limitada pelo consentimento do povo

Antônio Carlos Doorgal de Andrada **

e pelo direito natural...

1. Breve Histórico

“...somente o consentimento, e não a conquista, é que jus-

1.1 – Separação de Poderes e constitucionalismo

tifica um governo legítimo (para Locke). O governo absoluto não seria legítimo, porque seria inconcebível a anuência

O tema “O Parlamento e o controle político da Administra-

ao governo com esta característica, haja vista que o ho-

ção Pública” nos remete à formação do Estado Moderno

mem seria colocado em situação pior que a do seu estado

com o “movimento constitucional” do século XVIII, impul-

natural.

sionado pelas revoluções americana e francesa, e também

O fato de reconhecer, no poder legislativo, uma superio-

pelo constitucionalismo britânico, “uma espécie de pré-his-

ridade sobre os demais, não significa que Locke tenha lhe

tória constitucional” que tem suas raízes na Magna Carta

transferido o poder absoluto que tanto condenava; é que

de 1.215 imposta ao rei da Inglaterra (CANOTILHO, 1995,

o poder legislativo tem por limite a vontade do povo, de

p.61). O constitucionalismo traduz o esforço das idéias libe-

modo que, quando desrespeitada esta, é apeado e substi-

rais para a contenção do poder até então concentrado nas

tuído, porque o poder retorna à população. Se o legislativo

mãos de monarcas absolutos que tiveram em Luiz XIV a sua

é a representação do povo, que, por sua vez, confere-lhe

personificação paradigmática: ”L’Etat c’est moi”. O Estado

poderes, por certo não pode ter mais poderes que o próprio

liberal que surgia, embora trouxesse na sua essência apenas

povo. Ou, ainda, se individualmente qualquer do povo não

os chamados direitos de primeira geração – individuais e

tem poderes absolutos, e é este que elege o parlamento,

políticos – e tivesse estrutura eminentemente formal, impôs

então a criatura não pode ter mais poderes que o criador”

a limitação do poder político pela divisão das funções do

(ALVES, 2004, p.50).

Estado – executiva, legislativa e judiciária – e discriminação constitucional de suas respectivas competências. Esclarece

Três momentos, neste período, traduzem a afirmação do

Paulo Bonavides que Constituição“é o conjunto de normas

Parlamento como instituição de controle político, concreti-

pertinentes à organização do poder, à distribuição da com-

zado com a separação dos poderes e a necessidade de con-

petência, ao exercício da autoridade, à forma de governo,

trole mútuo. Primeiro, pelos pensamentos de John Locke,

aos direitos da pessoa humana, tanto individuais como so-

mas, depois, através do desenvolvimento destas idéias por

ciais” (BONAVIDES, 1998, p.63).

Montesquieu (1689-1755), expresso em seu livro “O Espírito das Leis” (1748), é que a teoria da separação dos poderes

58

Karl Loewestein, em livro clássico, afirma que “a finalidade

ganha o status de “dogma da ciência constitucional” (AL-

da constituição escrita é limitar a concentração do poder

VES, 2004, p.55):

absoluto nas mãos de um único detentor” (PEIXINHO,

1- o “Bill of Rights” (1689), pelo qual diversas competências

GUANABARA, 2005, p. 18). Pode-se afirmar que data desta

reais são transferidas para o Parlamento inglês – como a

fase histórica do Estado, o surgimento do controle político

criação de impostos;


2- Declaração de Independência Norte-Americana (1776),

O fato é que desde os primórdios do Estado liberal, passan-

quando afirmou-se que os poderes (dos governos) “ema-

do pelo Estado Social, pelo Estado Providência, pelo Estado

nam do consentimento dos governados” representados no

do Bem-Estar, pelo Estado mínimo, pelo Estado neoliberal

Parlamento (MALUF, 1990, p. 124); e,

e pelo Estado gerencial, o Estado Contemporâneo - de Di-

3- Revolução Francesa (1789), que declarou a Assembléia

reito Democrático – requer formas e modelos eficientes de

Nacional como representante da vontade geral, que seria

controle das coisas públicas. Verifica-se que um dos des-

expressa pelas leis.

dobramentos da liberdade na vida democrática como evo-

“Aqui observamos um enfoque diferente em relação à

lução do direito político é o pluralismo. O Estado, que no

questão do poder. Confrontando o pensamento de Mon-

nascedouro “era o centro absoluto da vida pública, deixa

tesquieu com o de Locke observa-se, como bem ressalta

de sê-lo com o passar dos tempos para assumir a posição

Pierre Manent, uma preocupação daquele com a origem

de referência num mundo cada vez mais complexo, com-

do poder, enquanto Montesquieu volta suas atenções para

partimentalizado em sistemas e globalizado. Um mundo

os seus efeitos, enxergando, na oposição entre o poder e a

novo, onde a economia ultrapassa as fronteiras estatais

liberdade, o cerne de um problema político a ser resolvido.

com um capitalismo voraz, tecnológico e informático de

Concentrando-se no objetivo da liberdade dos cidadãos,

dimensões planetárias e a sociedade ocupa papel de cres-

Montesquieu enxerga na separação dos poderes uma con-

cente poder através de movimentos civis e populares de

dição sine qua non de tal objetivo (...). Ainda no século de

massa, da mídia e de organizações não-governamentais,

Montesquieu, o tema da separação de poderes seria re-

nacionais e internacionais, diluindo sobremaneira o poder

tomado e implementado como estratégia política na for-

antes concentrado nos estados... neste contexto... surge o

mação de uma nova nação. Com efeito, o tema ocupou

Estado pluralista, com vários ‘centros de poder difusos’,

lugar central entre os escritos federalistas dos americanos

para a ‘afirmação do pluralismo político como resposta ao

Madison, Hamilton e Jay Madison, publicados na impren-

pluralismo social’. Esse pluralismo sociopolítico... exprime

sa de Nova Iorque em 1788 (...)” (PEIXINHO, GUANABARA,

um direito fundamental que precisa ser garantido pelo Es-

2005, p. 5 e 9).

tado... passando a exigir (dos estados) instrumentos mais bem elaborados e eficientes para a participação popular,

Importante ressaltar que o controle político dos governos

não apenas de escolha eleitoral, mas também de influência

exercido pelos Parlamentos ao longo dos tempos está dire-

nas ações governamentais e execução das políticas públi-

tamente ligado à evolução do Estado de Direito Democráti-

cas e, principalmente, no seu controle” (ANDRADA, 2006,

co. E nessa esteira nascem os chamados direitos de segunda

p. 175).

e terceira geração, de conteúdo social, econômico e cultural, e os difusos e coletivos, relativos à paz, à solidariedade

Essa pluralidade política e social inerente aos Estados de

e à preservação ambiental. É que, na trajetória estatal, va-

Direito Democrático trará reflexos no papel a ser desempe-

mos encontrar também as formas autoritárias – fascistas ou

nhado pelos Parlamentos no controle político da Adminis-

marxistas – nas quais o controle político dos governantes é

tração Pública, que igualmente era quase absoluto e exclu-

praticamente inexistente, e o Parlamento, quando presente,

sivo na sua origem, para, nos dias atuais, representar mais

não passa de peça decorativa ou formal.

uma forma de controle, dentre outras tantas.

59


1.2 – O controle e suas vertentes

mica, mas englobando, também, outros impassíveis de ser valorados como tal, mas que merecem a mesma proteção,

Da Constituição da República de 1988 pode-se extrair duas

e às vezes até maior, da sociedade e dos agentes públicos,

grandes vertentes acerca do controle da Administração Pú-

como o meio ambiente e o patrimônio artístico, arquitetô-

blica (SIRAQUE, 2005, p.94): 1 - o controle institucional (a)

nico, histórico e cultural” (SIRAQUE, 2005, p.97).

interno e (b) externo; e, 2 - o controle social. Sobre a matéria, José Afonso da Silva assim explana: Resumidamente, podemos conceber o controle institucional interno (art. 70 e 74 da CR/88) como “autofiscalização”

“A submissão da Administração à legalidade fica subordi-

e a “alma do plano de organização da Administração Pú-

nada a três sistemas de controle: o administrativo, o legis-

blica” (SIRAQUE, 2005, p.95). De natureza administrativa,

lativo e o jurisdicional. Qualquer desses controles objetiva

decorre do poder de autotutela (Súmulas 346 e 473 – STF)

verificar a conformação da atividade e do ato às normas

que permite à Administração Pública rever os próprios atos

legais” (SILVA, 1990, p.371).

quando ilegais, inoportunos ou inconvenientes (DI PIETRO, 2005, p.639): “Sem ele não é possível garantir transparência

Para ele, o controle jurisdicional exercido pelo Poder Ju-

da atividade administrativa e os objetivos constitucionais

diciário “é o mais importante” e se realiza “com base na

da República. Podemos afirmar que o controle institucional

garantia de acesso ao judiciário” (art. 5º, XXXV CF), o que

interno é a viga mestra do controle institucional externo e

a doutrina denomina princípio da inafastabilidade da juris-

do controle social dos atos da Administração Pública... As

dição ou direito público subjetivo à jurisdição. Em auxílio

falhas de controle institucional interno, certamente, vão

ao Poder Judiciário, atua o Ministério Público no controle

gerar deficiência na atividade administrativa do Estado, na

jurisdicional da Administração Pública, como fiscal da lei e

prestação de contas, na legalidade dos atos administrati-

da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses

vos, na prestação dos serviços públicos, na preservação do

sociais e individuais indisponíveis (art. 127 e 129 CF):

patrimônio público...” (SIRAQUE, 2005, p.95 e 96). “Dentre as medidas judiciais intentáveis para correção da

60

O controle institucional externo, como informa a própria

conduta administrativa, afora as comuns ao Direito Priva-

nomenclatura, está organizado fora do âmbito de atuação

do, como, exempli gratia, as de defesa ou reintegração de

do responsável pelo ato a ser controlado, e pode ser de na-

posse ou as ações ordinárias de indenização e as cautela-

tureza jurisdicional, administrativa e política: “...a fiscaliza-

res em geral, existem algumas específicas para enfrentar

ção não depende da vontade político-administrativa das

atos ou omissões de ‘autoridade pública’. São elas o habeas

autoridades a serem fiscalizadas. As autoridades fiscaliza-

corpus (art 5º LXVIII CF e arts. 647 a 667 do CPP), o manda-

doras, ante denúncia, representação ou notícia de eventual

do de segurança, individual ou coletivo (art. 5º LXIX e LXX

irregularidade, não podem deixar de fazer a fiscalização,

CF e Lei 1533, de 31.12.51), o habeas data (art. 5º, LXXII CF

sob pena de incorrerem em prevaricação, uma vez que têm

e Lei 9.507, de 12.11.97), o mandado de injunção (art. 5º,

o poder-dever de zelar pelo patrimônio público, entendido

LXXI CF), a ação popular (art. 5º, LXXIII CF e Lei 4.717, de

este não-somente os bens passíveis de valoração econô-

29.06.65), a ação civil pública (art. 129, III CF e Lei 7.347,


de 24.07.85) e a ação direta de inconstitucionalidade, por

cionais. Assim, o controle social poderá existir no sentido

ação ou omissão (arts. 102, I, “a” e 103 CF e Lei 9.868,

de verificação do mérito (conveniência e oportunidade) de

de 10.11.99)” – sem legislação citada (MELLO, 2005, p.883 a

uma decisão estatal ou da sua legalidade” (SIRAQUE, 2005,

887).

p.100 e 101).

O controle institucional externo é de natureza administra-

Considerado pelos doutrinadores como direito fundamen-

tiva quando a Administração Pública Direta faz o controle

tal de primeira geração, o controle social da função admi-

da Administração Pública Indireta – autarquias, fundações,

nistrativa do Estado expressa-se no exercício da cidadania

empresas públicas, consórcios, etc. (art. 37, § 8º, II CF) – e

para a proteção dos direitos individuais, coletivos e difusos.

quando os Tribunais de Contas exercem a função adminis-

Como direito público subjetivo, o controle social difere da

trativa de controle da Administração Pública (art. 71, I, III,

participação popular:

IV, V, VI, VII, VIII, IX, X, XI CF). “A participação popular ocorre antes ou durante o proQuando exercido pelo Poder Legislativo, o controle institucional externo é de natureza política. A Constituição de 1988 dá competência exclusiva ao Poder Legislativo para “fiscalizar e controlar” os atos do “Poder Executivo, incluídos os da administração indireta” (art. 49, X CF). Com o auxílio do Tribunal de Contas (art. 71 CF) ou diretamente, o Poder Legislativo faz o controle da atividade administrativa do Estado com o escopo de verificar se os atos inerentes às respectivas funções são oportunos e convenientes e se estão conforme os requisitos e as finalidades da lei.

O controle social é aquele realizado por pessoa física ou

cesso de decisão da Administração Pública, e o controle social, após a concretização desse processo, com o intuito de verificar se a norma jurídica foi concretizada pela Administração na forma estabelecida. A diferença fundamental entre participação popular e controle social é a seguinte: participação popular é a partilha de poder político entre as autoridades constituídas e as pessoas estranhas ao ente estatal e controle social é direito subjetivo de o particular, individual ou coletivamente, submeter o poder político estatal à fiscalização”. “Enquanto no controle institucional os agentes públicos têm o poder e o dever legal de fiscalizar, controlar os atos

jurídica estranha ao Estado, e também por entidades de

das atividades estatais, sob pena de responsabilidade po-

caráter público, cujos membros e dirigentes, ou parte de-

lítica e criminal, no controle social o cidadão não possui

les, sejam originários da sociedade civil, que os indica ou

nenhuma obrigação legal de fiscalizar ou controlar, mas

os escolhe (OAB, CRM, Conselhos de Saúde, da Infância e

tem a faculdade garantida pela Constituição de adentrar

do Adolescente, Tutelares, etc.). É o controle realizado por

na intimidade da Administração Pública para fiscalizá-la,

alguém que não seja agente público no exercício de função

com animus sindicandi, e submetê-la à soberania popular”

ou órgão do Estado (arts. 1º, parágrafo único e 74, § 2º CF): “O controle social tem a finalidade de verificar se as deci-

(SIRAQUE, 2005, p.112 e 104).

sões tomadas, no âmbito estatal, estão sendo executadas conforme o que foi decidido e se as atividades estatais es-

2. O Poder Legislativo na Constituição de 88

tão sendo realizadas de acordo com os parâmetros esta-

O advento do Estado Moderno, liberal em substituição ao

belecidos pela Constituição e pelas normas infraconstitu-

absolutismo monárquico da época, consagrou-se na sepa-

61


ração dos Poderes dos Estado com a aplicação da doutrina

1. Legislativa – é a função típica, principal: legislar as maté-

de Montesquieu e a garantia de direitos individuais, pila-

rias de sua competência (art. 48 CF);

res que “estão ligados à própria origem do direito cons-

2. Fiscalizadora/Controle – fiscalizar e controlar os atos do

titucional” (PINHO, 2006, p.51). Assim, a representação

Poder Executivo (art. 49, V e X CF);

dos poderes estatais está relacionada às suas três funções

3. Julgadora – julgamento de crimes de responsabilidade do

básicas – legislativa, executiva e judiciária – para as quais

Presidente da República e de altas autoridades da República

correspondem, independentes e especializados, os Poderes

(arts. 51, I e 52, I e II CF), e de parlamentar por quebra do

Legislativo, Executivo e Judiciário. Entretanto, “A separação

decoro (art. 55, II, § 2º CF);

de Poderes não é rígida, pois existe um sistema de inter-

4. Deliberativa – atribuições de competência exclusiva exer-

ferências recíprocas, em que cada Poder exerce suas com-

cidas por atos deliberativos próprios, resoluções e decretos

petências e também controla o exercício dos outros. Esse

legislativos (arts. 49, 51 e 52 CF); e,

sistema é denominado pelos norte-americanos checks and

5. Constituinte – poder constituinte derivado para alterar

balances. A separação de Poderes não é absoluta. Nenhum

o texto constitucional através de emenda à Constituição

Poder exercita apenas suas funções típicas” (PINHO, 2006,

(art. 60 CF).

p.51).

6. Administrativa – a Câmara dos Deputados e o Senado Federal têm competências exclusivas, respectivamente, para

O Poder Legislativo tem como função típica a elaboração de

a auto-organização, dispondo sobre seu “funcionamento,

leis – normas gerais e abstratas (art. 48 CF). O nosso modelo,

polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, em-

disposto na Constituição da República, é bicameral, sendo

pregos e funções de seus serviços ...” (arts. 51, IV e 52, XIII

“exercido pelo Congresso Nacional, que se compõe da Câ-

CF).

mara dos Deputados e do Senado Federal” (art. 44 CF). Em razão do tema proposto para a presente exposição, A Câmara Federal (arts. 45 e 51 CF) é composta de represen-

iremos nos ater às atribuições fiscalizatórias e de controle

tantes do povo eleitos pelo sistema proporcional para um

do Parlamento. Preliminarmente, cabe ressaltar a diferen-

mandato de quatro anos, sendo sua composição baseada

ça específica entre controle e julgamento, já que ambos

nas representações estaduais as quais respeitarão a propor-

são exercidos pelo Poder Legislativo e não raro é comum

cionalidade populacional dos respectivos Estados-membros

confundi-los, senão misturá-los, sem levar em conta que

face a Federação.

são institutos jurídicos diferentes, embora próximos ou até

O Senado da República (arts. 46 e 52 CF) compõe-se de

mesmo sobrepostos, às vezes. A característica primordial do

representantes dos Estados-membros, em número de três,

julgamento é a imparcialidade, a impessoalidade e a obje-

eleitos pelo sistema majoritário para um mandato de oito

tividade de quem julga, respeitado o devido processo legal,

anos.

a ampla defesa e o contraditório (art. 5º, LIII, LIV e LV CF). Já na atividade de controle estão presentes a parcialidade,

62

Conforme se extrai do texto constitucional, as atribuições

a pessoalidade e a subjetividade de quem controla, e quem

do Poder Legislativo podem ser elencadas e classificadas,

realiza o controle não aplica sanção alguma: a modificação

didaticamente, em seis grandes áreas:

do “ato não é realizada por quem faz o controle, mas pela


autoridade à qual a lei atribuiu o poder político-adminis-

A realidade, porém, é que a função de controle está con-

trativo para tanto” (SIRAQUE, 2005, p.92).

solidada em nossos dias, encontrável em todas as nações onde vigora o Estado de Direito (Democrático) – que tem

3. O controle político do Parlamento

por primazia o homem e os ideais de justiça – , além de

3.1 – Antecedentes

consagrada na grande maioria das constituições nacionais, independente da forma de Estado ou de governo,

“A exigência de prestação de contas, permitindo à popu-

mesmo porque uma das finalidades da constituição escrita

lação fiscalizar a aplicação de recursos públicos, surgiu

é exatamente estabelecer a divisão de funções e diversas

há milhares de anos, como se constata nas ordenações de

formas de controle” (ALVES, 2004, p.80).

Drácon, editadas por volta de 621 a.C., no arcondato de Aristecmo. Do mesmo modo, aparece nas ordenações de

O controle é exercido quanto à abrangência e quanto ao

Sólon, editadas em 594-593 a.C., nas quais era reconhe-

mérito. Citando Habermas, José W. Bezerra Alves, abor-

cido o direito de o povo cobrar prestação de contas dos

dando o controle político do Parlamento e o judicial, ob-

funcionários eleitos. Políbios noticia que, em Roma, entre

serva que ele é feito sob dois aspectos: quanto “ao caráter

os séculos III e II a.C., os cônsules, ao deixarem seus cargos,

profissional da execução da lei” e quanto à “observância

eram obrigados a prestar contas de sua atuação ao povo”

das atribuições normativas que a legalidade da execução

(ALVES, 2004, p.79).

e, com isso, a reserva da lei, garantem para intervenções administrativas” (ALVES, 2004, p. 81).

O Senado Romano tinha toda a autoridade sobre o tesou-

“... o que é preciso ressaltar é que o que hoje denominamos

ro público, ficando as receitas e despesas sob seu controle.

Estado de Direito (Democrático) não significa a busca ou

Qualquer desembolso dependia de sua autorização, inclusi-

a luta por um Estado com normas, mas a busca de escoi-

ve para obras públicas.

mar o direito posto das marcas da arbitrariedade, da autocracia, da discriminação, da punição inconseqüente, da

Quando da formação do Estado Moderno, o Legislativo atu-

facilitação da concentração da renda e da propriedade, da

ava como simples corpo consultivo dos monarcas absolutos.

igualdade, etc., aspectos em grande parte já tratados des-

Posteriormente, passou a ter funções de natureza orçamen-

de os tempos da Carta de João Sem Terra, culminando com

tária. Montesquieu, na elaboração da sua teoria da divisão

a declaração burguesa de direitos de 1789 e da atual carta

de poderes, defendia a possibilidade do Poder Legislativo

de direitos humanos de 1948” (AGUIAR, 1990, p.147).

examinar a maneira como as leis por ele promulgadas estavam sendo executadas.

3.2 – O controle parlamentar na Constituição de 88

“A função de controle, através do Parlamento, é a que mais evoluiu no último século e tem experimentado notáveis

Adotando, em parte, o entendimento de Celso Antonio

transformações, sendo certo que, atualmente, em muitos

Bandeira de Mello, as atribuições fiscalizatórias e de con-

Parlamentos, aparece como a de maior destaque, suplan-

trole das funções administrativas do Estado pelo Parlamen-

tando as atividades de legislação, no momento presente,

to podem ser exercidas de forma direta (MELLO, 2005, p.870

em grande parcela, exercida pelo Poder Executivo.

a 876) ou dependente.

63


3.2.1 - É controle parlamentar direto aquele exercido pelo

públicas” (art. 58, § 2º, IV CF), poderão “solicitar depoimento

Poder Legislativo, diretamente, sem intermediários, no ple-

de qualquer autoridade ou cidadão” (art. 58, V CF).

no exercício de suas prerrogativas constitucionais. De acordo com o art. 49, X da Constituição Federal, entre os atos de

3. Comissões Parlamentares de Inquérito – CPIs

competência exclusiva do Congresso Nacional incluem-se os de “fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer

O art. 58, § 3º, da Constituição Federal, permite a criação de

de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da

“comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes

Administração indireta” (Lei 7.295, de 19.12.84). São os se-

de investigação próprios das autoridades judiciais, além

guintes os instrumentos utilizados pelo Parlamento para o

de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas,

exercício do controle político:

serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante reque-

1. Sustação de atos do Poder Executivo

rimento de um terço de seus membros, para apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclu-

Ao Congresso Nacional compete “sustar os atos normativos

sões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público,

do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar

para que promova a responsabilidade civil e criminal dos

ou dos limites de delegação legislativa” (art. 49, V CF).

infratores”.

2. Convocação de Ministros de Estado e Requerimento de

“...para que a atribuição de fiscalizar possa ser regular-

Informações

mente exercida, é indispensável que o órgão encarregado possa ‘investigar’ os fatos, valendo-se de meios e instru-

64

“A Câmara dos Deputados e o Senado Federal, ou qualquer

mentos que se mostrem adequados à consecução dos fins

de suas Comissões, poderá convocar ministros de Estado ou

apontados. Daí conclui Paulo Brossard que ‘o poder de in-

quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à

vestigar é inerente ao poder de legislar e de fiscalizar’. Em

Presidência da República para prestarem, pessoalmente,

suma: o Congresso Nacional e as suas Casas têm poderes

informações sobre assunto previamente determinado, im-

investigatórios, aos quais devem corresponder mecanis-

portando crime de responsabilidade a ausência sem justifi-

mos para o seu exercício eficaz. O mais importante desses

cativa adequada” (art. 50 CF). Também “as Mesas da Câmara

mecanismos, como a história recente tem se encarregado

dos Deputados e do Senado Federal poderão encaminhar

de demonstrar, é a CPI, tal como prevista “ no texto cons-

pedidos escritos de informação a ministros de Estado...

titucional” (FARIA, 2002, p.12).

importando crime de responsabilidade a recusa, ou o não

“...convém lembrar que a Constituição Federal atribui às

atendimento no prazo de trinta dias, bem como a presta-

CPIs poderes de investigação próprios das autoridades

ção de informação falsa” (art. 50, § 2º CF). As comissões

judiciárias e não os de jurisdição. Investigar é necessário

permanentes de qualquer das Casas Legislativas, em fun-

para instruir um processo. Poderes de investigação, visam,

ção da matéria de suas respectivas competências, além de

portanto, à instrução processual e jamais a qualquer jul-

“receber petições, reclamações, representações ou queixas

gamento, que somente pode resultar de atribuições juris-

de qualquer pessoa contra atos ou omissões das entidades

dicionais que são conferidas aos juízes.


Mesmo na instrução existe a chamada ‘reserva jurisdicio-

“Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacio-

nal constitucional’, prevendo que determinados atos so-

nal: (EC n. 19/98 CF)

mente podem ser praticados por decisão judicial, dentre eles: a quebra da inviolabilidade do domicílio (art. 5º, XII), a

I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou

quebra da inviolabilidade da escuta telefônica (art. 5º, XII)

atos internacionais que acarretem encargos ou compro-

e a prisão, ressalvado o caso de flagrante delito (art. 5º,

missos gravosos ao patrimônio nacional;

LXI)... A CPI, se entender oportunas tais providências, pode

II – autorizar o Presidente da República a declarar guerra,

requerê-las ao Judiciário.

a celebrar a paz, a permitir que forças estrangeiras transi-

Para que haja possibilidade de uma investigação completa

tem pelo território nacional ou nele permaneçam tempo-

pelo Legislativo, o mesmo deve estar investido plenamente

rariamente, ressalvados os casos previstos em lei comple-

da autoridade que lhe é atribuída pelo legislador consti-

mentar;

tuinte. A Lei 1.579/52, estabelece que:

III – autorizar o Presidente e o Vice-Presidente da Repúbli-

‘Art. 2º - No exercício de suas atribuições, poderão as Co-

ca a se ausentarem do país, quando a ausência exceder a

missões Parlamentares de Inquérito determinar as diligên-

quinze dias;

cias que reputarem necessárias e requerer a convocação

IV – aprovar o estado de defesa e a intervenção federal,

de ministros de Estado, tomar depoimento de quaisquer

autorizar o estado de sítio, ou suspender qualquer uma

autoridades federais, estaduais ou municipais, ouvir os in-

dessas medidas;

diciados, inquirir testemunhas sob compromisso, requisitar

........................

de repartições públicas e autárquicas informações e docu-

........................

mentos, e transportar-se aos lugares onde se fizer mister a

XII - apreciar os atos de concessão e renovação de conces-

sua presença’ (KLEIN, 1999, p. 39 e 40).

são de emissoras de rádio e televisão;

Por decisão fundamentada e com a observância das devidas

XIII – escolher dois terços dos membros do Tribunal de

formalidades legais, pode a Comissão Parlamentar de In-

Contas da União;

quérito, por autoridade própria, sem a intervenção judicial,

XIV – aprovar iniciativas do Poder Executivo referentes a

determinar a quebra do sigilo bancário, fiscal e telefônico

atividades nucleares;

(dados referentes aos registros de ligações), conforme en-

.......................

tendimento do Supremo Tribunal Federal” (MS 23.452, Rel.

XVI – autorizar, em terras indígenas, a exploração e o apro-

Min. Celso de Mello, DJU 19.10.1999, p.39).

veitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais;

4. Autorização / aprovação do Congresso Nacional para

XVII – aprovar, previamente, a alienação ou concessão de

atos concretos do Poder Executivo

terras públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares”.

Há inúmeros casos previstos na Constituição Federal em que

5. Poderes controladores privativos do Senado Federal

o Poder Legislativo interfere, necessariamente, para controlar a atividade administrativa. São competências exclusivas

Alguns poderes controladores são privativos do Senado Fe-

do Congresso Nacional:

deral:

65


“Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: (EC

exoneração, de ofício, do procurador-geral da República

n.19/98, EC n. 23/99, EC n. 42/2003 e EC n. 45/2004 CF)

antes do término de seu mandato;

.......................

.......................

III – aprovar previamente, por voto secreto, após argüição

XIV – eleger membros do Conselho da República, nos ter-

pública, a escolha de:

mos do art. 89, VII;

a) magistrados, nos casos estabelecidos nesta Constitui-

XV – avaliar periodicamente a funcionalidade do Sistema

ção;

Tributário Nacional, em sua estrutura e seus componentes,

b) ministros do Tribunal de Contas da União indicados pelo

e o desempenho das administrações tributárias da União,

Presidente da República;

dos estados, do Distrito Federal e dos municípios;

c) governador de território;

......................”.

d) presidente e diretores do Banco Central;

6. Impeachment do Presidente da República e dos Minis-

e) procurador-geral da República;

tros

f) titulares de outros cargos que a lei determinar; IV – aprovar previamente, por voto secreto, após argüição

Se o Presidente da República for denunciado por prática

em sessão secreta, a escolha dos chefes de missão diplo-

de crime de responsabilidade, por qualquer cidadão, au-

mática de caráter permanente;

toridade ou parlamentar, e a Câmara dos Deputados, por

V – autorizar operações externas de natureza financeira,

dois terços de seus membros, acolher tal acusação, o Se-

de interesse da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos

nado Federal irá julgá-lo e suspendê-lo de suas funções

territórios e dos municípios;

tão logo instaure o processo. Se for condenado, o Presi-

VI – fixar, por proposta do Presidente da República, limites

dente será destituído do cargo, ocorrendo o denominado

globais para o montante da dívida consolidada da União,

impeachment. (art. 86 CF). São considerados crimes de

dos estados, do Distrito Federal e dos municípios;

responsabilidade os atos do Presidente da República que

VII – dispor sobre limites globais e condições para as ope-

atentem contra (I) a Constituição; (II) o livre exercício dos

rações de crédito externo e interno da União, dos Estados,

Poderes Legislativo e Judiciário, do Ministério Público e

do Distrito Federal e dos municípios, de suas autarquias e

dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;

demais entidades controladas pelo poder público federal;

(III) o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;

VIII – dispor sobre limites e condições para a concessão

(IV) a segurança interna do país; (V) a probidade na admi-

de garantia da União em operações de crédito externo e

nistração; (VI) a lei orçamentária; e (VII) o cumprimento

interno;

das leis e das decisões judiciais (art 85 CF). Estes crimes es-

IX – estabelecer limites globais e condições para o mon-

tão definidos em lei especial que regulamenta o processo

tante da dívida mobiliária dos Estados, do Distrito Federal

e o julgamento (Lei 1.079, de 10.04.50).

e dos municípios; X – suspender a execução, no todo ou em parte, de lei de-

7. Fiscalização Orçamentária

clarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo

66

Tribunal Federal;

Uma Comissão Mista do Congresso Nacional, formada por

XI – aprovar, por maioria absoluta e por voto secreto, a

deputados e senadores, tem atribuição específica para exa-


minar e dar parecer sobre projetos relativos a plano plu-

Cabe ao Congresso Nacional sustar os contratos do Exe-

rianual, diretrizes orçamentárias, orçamento anual, créditos

cutivo padecentes de ilegalidade, a pedido do Tribunal de

adicionais, planos e programas (nacionais, regionais e seto-

Contas (art. 71, X e § 1º CF).

riais) e exercer o acompanhamento e a fiscalização orçamentária (art. 166, § 1º CF).

4. Despesas irregulares

3.2.2 – O controle parlamentar dependente é aquele exer-

A Comissão Mista do Congresso Nacional destinada à fis-

cido pelo Poder Legislativo com o auxílio do Tribunal de

calização e acompanhamento orçamentário, dentre outras

Contas. O Parlamento, de certa forma, depende de manifes-

atribuições (art. 166, § 1º CF), diante de indícios de despesas

tação daquele órgão para agir:

não autorizadas, poderá solicitar esclarecimentos à autoridade responsável, que terá cinco dias para fazê-lo. Caso não

1. Julgamento da contas do Executivo

sejam os esclarecimentos prestados ou se os mesmos forem considerados insuficientes, a Comissão Mista solicitará

É da alçada do Congresso Nacional “julgar anualmente as

ao Tribunal de Contas pronunciamento conclusivo sobre a

contas prestadas pelo Presidente da República e apreciar

matéria. Entendendo o Tribunal irregular a despesa, a Co-

os relatórios sobre a execução dos planos de governo” (art.

missão poderá propor ao Congresso nacional a sua sustação

49, IX CF). Se as contas não forem apresentadas dentro de

(art. 72 CF).

sessenta dias após a abertura da sessão legislativa – 15 de fevereiro de cada ano -, a Câmara dos Deputados procederlhe-á à tomada (art. 51, II). O julgamento das contas presta-

5. Inspeções e Auditorias

das pelo Presidente da República, pelo Congresso Nacional, será realizado mediante “parecer prévio” emitido pelo Tri-

A Câmara dos Deputados, o Senado Federal e suas respec-

bunal de Contas que as apreciará no prazo de sessenta dias

tivas comissões, poderão solicitar que o Tribunal de Contas

a contar do seu recebimento (art. 71, I CF).

realize inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial nas unidades

2. Informações ao Tribunal de Contas

administrativas dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e demais entidades referidas no inciso II do art. 71 (art.

O Congresso Nacional, por qualquer de suas Casas, ou de

71, IV CF).

suas comissões, poderá solicitar informações ao Tribunal de Contas sobre a fiscalização contábil, financeira, orçamentá-

4. Conclusão

ria, operacional e patrimonial, e sobre resultados de auditorias e inspeções realizadas (art. 71, VII CF). Por sua vez, o

1. A evolução democrática do Estado consolidou o contro-

Tribunal de Contas, trimestralmente e anualmente, enviará

le de suas funções administrativas, ampliando-as conside-

ao Congresso Nacional relatório de suas atividades (art.71,

ravelmente. O pluralismo político e social, a complexida-

§ 4º CF).

de da vida moderna e o desenvolvimento de técnicas de

3. Sustação de contratos

comunicação e informação possibilitaram e favoreceram

67


a organização de sistemas variados de controle. De certa

neira o resultado das votações. Manipulado pelo Executivo,

forma, o controle político do Parlamento, que na origem

o Poder Legislativo não demonstra aptidão para o exercício

era praticamente único e quase absoluto, vai aos poucos

do controle das funções administrativas do Estado.

cedendo espaço a outros, mais especializados e eficazes. A Constituição de 1988 proporcionou significativo avanço

5. A desorganização do quadro político – sistemas partidário

nos sistemas de controle, especialmente o chamado con-

e eleitoral deficientes – produz uma classe política instável,

trole social, e na ampliação das competências dos Tribunais

individualista, de pouca representatividade e inconsistente,

de Contas, que exerce o controle institucional externo de

dificultando o desenvolvimento do processo legislativo e o

natureza administrativa.

exercício, pelo Parlamento, de suas competências e atribuições. Os intermináveis confrontos e desarranjos políticos,

2. A morosidade do processo legislativo típica do Parlamen-

geralmente decorrentes da fragilidade dos partidos que

to e o “burocratismo político” concorrem para enfraque-

pouco ou nada representam, favorecem a atuação isolada

cer o controle político exercido pelo Parlamento no Brasil.

de parlamentares que procuram satisfazer demandas paro-

Outras formas de controle exercidas por outros órgãos ou

quiais em detrimento de uma agenda nacional (NETO, SAN-

entidades revelam-se mais ágeis e de resultados mais ime-

TOS, 2003, p. 91 a 139).

diatos, colocando a atuação do Parlamento em segundo plano, de sentido mais formal que material.

6. A judicialização da política e das relações sociais tem aumentado no Brasil. Impotentes diante da intromissão do

3. O desaparelhamento técnico-funcional do Parlamento

Poder Executivo no ambiente parlamentar, as minorias re-

dificulta o exercício do controle da Administração Pública,

correm ao Poder Judiciário para fazer valer seus direitos e

que possui quadros técnicos e gerenciais nitidamente mais

posições. Também setores da sociedade descrentes da atu-

preparados e competentes. O despreparo do Parlamento

ação do Parlamento buscam no Judiciário o que não con-

para o exercício de suas funções de controle tem sido em-

quistaram através do processo político-parlamentar. O que

pecilho para que suas prerrogativas constitucionais sejam

se verifica é o esvaziamento do espaço político-dialógico

levadas a termo.

para a superação dos problemas sociais e políticos, e a assunção paulatina do Poder Judiciário como uma espécie de

4. A hipertrofia do Poder Executivo tem relação direta com

“conselho gerencial da República” (VIANNA, 1999, p. 15 a

o esvaziamento do Poder Legislativo. A evolução político-

44), o que representará enorme déficit e distorção do sis-

administrativa brasileira tem revelado um Poder Executivo

tema democrático.

cada vez mais articulado e com mais poderes, dirigindo a

68

atuação do Poder Legislativo, através da formação das cha-

______________________________________________

madas “maiorias parlamentares”. Não raro, as pautas dis-

* Palestra proferida em 10.11.2006, no “I Seminário de Con-

cutidas no ambiente parlamentar são as determinadas pelo

trole da Gestão dos Recursos Públicos”, promovido pela Es-

Executivo que, através de instrumentos políticos, adminis-

cola de Contas e Capacitação Prof. Pedro Aleixo, do Tribu-

trativos e orçamentários – emendas parlamentares, verbas

nal de Contas do Estado de Minas Gerais, em comemoração

ministeriais, medidas provisórias, etc - influencia sobrema-

aos dez anos da referida Escola.


** Antonio Carlos Doorgal de Andrada é Conselheiro do Tri-

DAHL, Robert A. Sobre a Democracia. UnB, 2001.

bunal de Contas do Estado de Minas Gerais, bacharel em Direito, professor universitário e especialista em Direito Pú-

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo.

blico (PUC-MG) e Controle da Administração Pública (CAD-

Atlas, SP, 2005. 18ª edição.

Gama Filho/RJ), e mestrando em Direito e Instituições Políticas (FUMEC). Foi vereador, prefeito municipal e deputado

DUSO, Giuseppe; Org. O Poder – História da Filosofia Polí-

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70


71

5. Anexo


O PÓS-POSITIVISMO E O PAPEL DO JUIZ EM UM

ordenamento jurídico capaz de refletir os anseios de justiça

ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

e certeza, exsurge um realinhamento dos princípios, que de simples entidades abstratas ou etéreas de um remoto pas-

Leonardo de Araújo Ferraz*

sado jusnaturalista, passam a adquirir grau de normatividade e coercitividade plenas. Portanto, para um ordenamento jurídico se mostrar válido, é necessário que seu “conteúdo” seja gerado na exata medida da participação dos afetados por essas normas, entendidas agora como princípios e regras.

I Introdução Isto, sem dúvida, envolve um giro cognoscitivo que perpassa a questão do fundamento de validade do direito para Um dos grandes dilemas que se apresenta para a sociedade

abarcar os desafios que envolvem sua aplicação e princi-

moderna, cada vez mais complexa e plural, englobando dis-

palmente a postura adequada daqueles que têm por ofício

tintos projetos individuais de vida boa1, é o de como ajustar

aplicá-lo.

e conformar o papel do direito no sentido de que o mesmo se preste não só a estabilizar expectativas de comporta-

Para CARVALHO NETTO,

mento, tal qual já dizia Luhmann, mas também servir como

... no paradigma de Estado Democrático de Direito é de se

fator de integração social.

requerer do judiciário que tome decisões que, ao retrabalharem construtivamente os princípios e regras constitu-

Neste novo cenário, verifica-se o colapso de um modelo de

tivos do direito vigente, satisfaçam a um só tempo, a exi-

ordenamento de ordenamento jurídico fundado e legitima-

gência de dar curso e reforçar a crença tanto na legalidade

do apenas em um sistema de regras, sistema este incapaz de

entendida como segurança jurídica, como certeza do direi-

assegurar os ideais de correção normativa e em última aná-

to, quanto ao sentimento de justiça realizada, que deflui

lise de justiça, principalmente nos chamados “hard cases”,

da adequabilidade da decisão às particularidades do caso

na concepção de DWORKIN (1999). Neste sentido, explica

concreto.(2001:23)

Tércio Sampaio Ferraz Júnior, prefaciando Écio Oto Ramos, que “ a validez normativa, ...., não pode ser a validez formal,

Écio Oto Ramos Duarte completa aduzindo que “ contem-

típica do Estado liberal e legalista que se estabelece pri-

poraneamente, a perspectiva de superação no campo do

mariamente na relação entre normas, por que regimes au-

positivismo envolve a consideração de uma tensão ineren-

toritários também se adequam a esta validez ...“ (2004:23)

te ao fenômeno jurídico entre sua certeza (racionalidade) e a sua legitimidade (justiça).”(204:35)

Desta forma, no sentido de comprovar a completude de um Como pode se inferir das palavras do renomado jusfilóso-

72

1 Nesses termos, a sociedade para se configurar democrática deve asse-

fo e constitucionalista mineiro e do filósofo piauiense, é

gurar que sejamos iguais por sermos livres para sermos diferentes.

grande o dilema que se apresenta ao aplicador do direito,


principalmente nestes tempos de alta modernidade, como

concreto conjuntamente com as demais partes, em respeito

apregoa CHAMON JR (2005).

aos princípios constitucionais da isonomia, contraditório e ampla defesa, que garantem aos afetados igual possibili-

Sob a ótica do aplicador, a partir desta nova e complexa

dade de participação e exposição de todos os argumentos

configuração jurídico-normativa e social, demonstra-se

possíveis, assegurando que essas decisões se revistam de

inconcebível, como se observa freqüentemente, a tomada

aceitabilidade racional.

de decisões a partir de preferências pessoais ou pretensos valores próprios de um julgador super-herói ou de uma so-

Para tanto, será traçada, em breves linhas, a reconstrução

ciedade hegemônica, visto que em uma sociedade plural e

do modelo positivista a partir do modelo desenvolvido pelo

que aceita a diferença, não há como criar “standards” valo-

grande cientista do direito, Hans Kelsen, apontando seus

rativos seja do ponto de vista pessoal ou coletivo. Ademais,

limites e sua incapacidade de eliminar o decisionismo e a

muitas vezes verificamos um judiciário totalmente afinado

discricionariedade na aplicação do direito.

com o executivo, do qual se torna um mero fantoche manipulável ao talante das variantes políticas.

Como tentativa de superação do “colapso” positivista, sucede-se uma abordagem dita pós-positivista que eleva os

Por isso, se observarmos os Tribunais Constitucionais da Eu-

princípios ao “status” de norma jurídica dotado de coerciti-

ropa e também o Supremo Tribunal Federal, restará clara a

vidade plena e que será tratada a partir da análise dos prin-

constatação de que a postura dos membros na sua quase

cipais pontos da obra de dois renomados autores: Ronald

totalidade é esta que acabamos de denunciar. Sob a pre-

Dworkin e Robert Alexy.

tensa tutela de uma sociedade carente, órfã de proteção e justiça, como já expunha Ingbord Maus, o Judiciário, a par-

Em relação ao primeiro, será discutida a questão do direi-

tir de uma postura claramente ativista, e dita salvacionista,

to como integridade e a figura do chamado juiz Hércules,

exercendo papel de um verdadeiro legislador, decide ques-

para na última parte do trabalho ser enfeixada uma série

tões jurídicas a partir de argumentos meramente políticos,

de críticas a esta postura quase mítica do julgador expli-

pragmáticos ou fundados em uma eticidade padronizada de

citando, em conformidade com o Estado democrático de

acordo com os valores dominantes no seio social (sic) ou da

direito através do médium institucionalizado de um pro-

própria clarividência pessoal do julgador.

cesso constitucional, como reduzir o árduo fardo que lhe seria conferido.

Como alternativa a esta “práxis”, apresenta-se um modelo de aplicação do direito centrado no juízo de adequabilidade

Em relação ao jurista alemão, Robert Alexy, se buscará de-

tal qual proposto por Klaus Günther e retrabalhado por Jur-

monstrar como sua teoria da argumentação falha ao tentar

gen Habermas, que busca garantir um sentido de correção

superar os problemas do positivismo, pois embora tente as-

normativa das decisões judiciais a partir do respeito a con-

segurar um caráter de racionalidade das decisões judiciais,

dições procedimentais do discurso de aplicação. Para tanto,

Alexy cai na sua própria armadilha, pois trata os princípios

devem estar centradas na imparcialidade do juiz, que deve

jurídicos como valores, bens ou comandos otimizáveis, que

construir a decisão e aplicar a norma adequada ao caso

em última análise representam preferências em maior ou

73


menor grau, rompendo com o código binário do direito lei-

válida. A premissa menor é um ato de X, que, v.g. “ordena

to, perpetuando, portanto os problemas da discricionarie-

algo” sendo, assim, dotado de sentido subjetivo. Se a pre-

dade, do decisionismo, do utilitarismo e do agir político no

missa maior (norma objetivamente válida) pudermos alcan-

fundamento das decisões.

çar que se deve obedecer à ordem de X (premissa menor), então a conclusão é que a ordem de é, também, objetiva-

II Desenvolvimento

mente válida para o ordenamento jurídico. (2003:2)

II.1 O positivismo de Hans Kelsen Desta forma, o Direito contém normas que se encontram Considerado um dos maiores teóricos do direito do séc. XX,

escalonadas dentro de uma pirâmide hierárquica. Portan-

Hans Kelsen2 deixou um legado bastante significativo, do

to, uma norma de escalão superior dá origem à norma de

qual se destaca a obra intitulada Teoria Pura do Direito.

escalão imediatamente inferior e assim sucessivamente, de forma que, como já apresentado, uma norma somente só

Na sua teoria que se denomina pura, Kelsen procura fazer

será juridicamente válida se puder ser fundamentada em

com que o estudo do Direito (ordem normativa) se afaste de

uma norma hierarquicamente superior.

quaisquer interferências estranhas aos conteúdos jurídicos, tais quais a moral e a ética3. Sendo assim, o estudo do Di-

Apesar de toda a pretensa coerência teórica, Kelsen sofreu

reito deve ater-se tão somente ao sistema normativo e dele

uma série de questionamentos em função de incongruências

extrair seu fundamento de validade. Em outras palavras,

internas insanáveis do modelo, ou como coloca CATTONI DE

como explica CHAMON JÚNIOR, “ ... podemos entender que

OLIVEIRA(2001:55), insustentabilidade dos pressupostos

o fundamento de uma norma positiva só pode ser outra

teóricos, que culminaram com um colapso da Teoria Kelse-

norma.”(2003:2)

nia em um paradigma de Estado Democrático de Direito.

Neste sentido, para validar a norma e portanto o próprio Direito,

Um dos grandes reveses que se apresentam em relação à sua

Kelsen lança mão de um silogismo. Segundo CHAMON JÚNIOR,

teoria é acerca do fundamento da norma que se encontra no

a premissa maior é uma norma considerada objetivamente

topo do ordenamento jurídico (Constituição). Como poderia ela própria ser validada dentro do modelo? Neste ponto,

74

2 Kelsen é na verdade, um neo-positivista, à medida que sofistica e

Kelsen lança mão da chamada norma fundamental que se

supera o legalismo (positivismo) liberal. Para ele, Direito positivo é Direito

diferencia das demais não por ser posta, mas sim pressuposta.

válido, e não aquilo que está escrito, expresso em lei.

Para que os mandamentos legais possam ser considerados

3 Em verdade, para Kelsen, a pureza não se encontra no Direito em si,

obrigatórios é indispensável supor a existência de uma norma

mas sim na sua teoria. Ele não descarta que questões morais, éticas,

fundamental, que admite legitimidade do poder e o dever de

práticas sociais, etc., entram na construção do Direito (conteúdo).

obediência da comunidade. Aí reside uma grande contra-

Entretanto, estas questões não devem influenciar o estudo do Direito, já

dição ou mesmo paradoxo da sua teoria pura, visto que a

que ao isolar o objeto (Direito) para descrevê-lo, Kelsen afasta qualquer

“completude” e o fechamento da mesma só pode ser justi-

influência externa de modo que sua área de investigação se restrinja ao

ficada a partir de algo transcendental, filosófico, totalmente

próprio objeto do seu estudo.

fora do padrão lógico-normativo definido em sua teoria.


Outro questionamento diz respeito ao fato de Kelsen con-

Nesse contexto, o papel da ciência do Direito não é criar

siderar uma norma válida sem prescindir de um outro ele-

normas, mas sim realizar as descrições, ou seja, as interpre-

mento para além do modelo silogístico apresentado. Nes-

tações possíveis das normas jurídicas, ou em outras palavras

tes termos, a norma será válida quando fundamentada em

revelar o quadro de leituras possíveis da norma, cabendo ao

outra superior (fundamento) e se for minimamente eficaz

intérprete autêntico escolher aquela que entender correta,

(pelo cumprimento da norma e aplicação). Trata-se pois de

dentro das várias interpretações fechadas numa moldura.

uma condição resolutiva4 cuja constatação se dá a partir de

Todo ato dentro desta moldura estaria conforme a norma e

um viés sociológico, o que representa sobremaneira uma

portanto seria considerado válido. Neste caso, a aplicação

contradição para seu modelo.

passa a ser uma questão de política do direito, ou seja, a escolha do aplicador se baseia em questões para além do

Entretanto, o maior gargalo de sua teoria relaciona-se com

direito positivo, a saber: normas de moral, de justiça, de

a questão da interpretação, que foi abordada em destaque

valor, etc. Trata-se, em resumo, do decisionismo da Teoria

nos textos originais de 1934, Zur Theorie der Interpretation;

Kelseniana já que, no que se refere a esse ato de vontade,

de 1953, a versão francesa Théorie pure du Droit e a edição

de escolha, o julgador é livre para agir de acordo com o seu

de sua Reine Rechtslehre de 19605.

entendimento e convicções” (CHAMON JÙNIOR, 2003:6). Isso, sem dúvida, pode gerar sérios problemas de insegu-

Nos dizeres de Kelsen, a própria norma seria um “esquema

rança jurídica, pois não existe apenas uma resposta correta

de interpretação”, de modo que “o juízo em que se enuncia

para cada caso concreto, mas sim várias, sendo que aquela

que um ato de conduta humana constitui um ato jurídico

que for escolhida dentro da moldura, seja ela qual e de que

(ou antijurídico) é o resultado de uma interpretação espe-

forma for, estará validada pelo direito.

cífica, a saber, uma interpretação normativa”. (1987:4) Na evolução da Teoria Pura do Direto, a partir de 1960 , KelPortanto, interpretação para Kelsen vai significar duas coi-

sen passa a defender que a autoridade que aplica o Direito

sas: ou é ato de aplicação – de vontade – e aí estamos fa-

possui liberdade não apenas para escolher algumas das in-

lando de uma interpretação autêntica (feitas pelo legislador

terpretações possíveis dentro da moldura, como também

ou pelo juiz), aquela que cria norma jurídica6 ou é ato de

possui a faculdade de, por sua autoridade, criar direito novo

conhecimento e aí estamos falando de uma interpretação

fora do quadro – é o chamado “giro decisionista”. Trata-se,

não-autêntica ou cognoscitiva (feita pela dogmática e pe-

no caso, da discricionariedade que é conferida ao juiz, que

los destinatários da norma).

ao interpretar para além do quadro das descrições possíveis, estaria criando direito novo, fora do escopo de validade pensado inicialmente na sua teoria. Trata-se na verdade

4 Neste sentido, a norma é inicialmente válida.

da ampliação de seus “poderes”, já que agora, a partir de

5 É importante frisar que a interpretação será abordada como um todo,

suas convicções, poderá escolher não somente dentre as

sem distinção de períodos.

leituras possíveis dentro de quadro, mas também para

6 No sentido de que interpretação como ato de vontade, faz com que a

além dele, potencializando a questão da insegurança

autoridade crie uma norma individual para o caso concreto.

75


jurídica, conforme já discutido7.

Evidentemente trata-se de uma postura insustentável em um Paradigma de um Estado Democrático de Direito, cujas

Neste caso, a sentença passada em julgado faria com que

relações sociais envolvem um elevado grau de complexi-

uma norma do escalão inferior obtivesse validade em fun-

dade, em que as diferenças entre os membros desta co-

ção da interpretação autêntica realizada pelo aplicador,

munidade devem ser respeitadas. Como admitir um direito

não mais, neste caso, em função de uma norma superior

legítimo como algo construído à mercê de um poder dis-

determinante do dever-ser. A questão acerca da validade

cricionário conferido aos julgadores? Onde estaria a segu-

das decisões estaria reduzida somente à questões rela-

rança das nossas relações? Seria admissível aceitar que os

tivas ao poder conferido à autoridade e a eficácia do

valores por eles defendidos (com certeza reflexo de uma

Direito.

ideologia dominante) possam representar os valores de uma sociedade tão líquida e rarefeita como um todo?

Outrossim, a aplicação do Direito quando compreendido como exercício de um poder discricionário, entrega o Di-

Confundir a atividade legislativa com a atividade jurisdicio-

reito nas mãos do órgão aplicador, uma vez que prevalece

nal é postura incompatível num sistema democrático, onde

sua vontade como válida, desde que transitada em julgado,

as decisões devem se pautar no Direito como sistema de

trazendo ainda mais incerteza às relações jurídicas.

garantias. Qualquer decisão tem que se apresentar como forma a impedir os abusos e as arbitrariedades a que as

Para resumir esta inconcebível postura positivista, Olivier

autoridades poderiam ser levadas.

Jouajan assim se manifesta: Em uma sociedade democrática a hermenêutica jurisdicioCette incapacité à assumer plus avant du point du vue ju-

nal não se pode adotar um caráter discricionário. A “trans-

ridique le processus de la application doit être dés lors ren-

ferência” de competência legislativa para os Tribunais tira

voyé non pás a ume errreur d’ aiguillage en cours de route

dos cidadãos o controle de suas instituições. Devem os Tri-

de la théorie pure du droit, mais a ses presupposés théori-

bunais traduzir um equilíbrio de poderes entre os numero-

ques fondamentaux. Parce que la morme este identifié au

sos grupos, dos quais nenhum seria dominante. Os Tribunais

texte de norme, qu’elle este déconnectée de la real´té elle

não podem usurpar o poder, à medida que devem respeitar

doit s’appliquer, que dans le mouvement de l’application, le

o direito construído e reconstruído a partir da efetivação

texte, dans l’indetérminité de ses significants multiples, doit

dos preceitos constitucionais que sirvam como base de uma

demeurer isolé des élements qui pourrait lui faire de sens, la

comunidde princípios.

théorie pure du droit ne peut que s’arreter sur une théorie vide de l’interpretation: et elle s’arrête lá parce que elle est

II.2 0 pós- positivismo

est en panne8. jurisdiconal no paradigma do estado democrático de direito: para uma

76

7 O aplicador, no caso, passa fazer as vezes do próprio legislador.

análise crítica da “jurisprudência dos valores”, de Alexandre de Castro

8 JOUJAN, Olivier. Apresentação in MÜLLER, Friedch. Discours de la

Coura, in Jurisdição e hermenêutica constitucional. Coordenação: Marce-

méthode juridique. Extraído do texto: Limites e possibilidades da tutela

lo Cattoni, p. 419.


II.2.1 Ronald Dworkin, o direito como integridade e o juiz

prever aprioristicamente todas as situações de aplicação da

Hércules

norma), caso o juiz tivesse que solucionar um caso que não se amoldasse às possíveis interpretações daquela norma, es-

Ronald Dworkin, catedrático em Oxford e crítico literário,

taria o juiz criando um direito “novo” e portanto a exercer

apresenta, a partir de suas obras Levando os Direitos a Sé-

sua discricionariedade12. E mais, se este direito criado não é

rio e O Império do Direito, uma crítica contumaz e incisiva

fundamentado dentro do modelo (e portanto afastando a

ao positivismo9. Dworkin, cioso do colapso do modelo po-

existência de um dever/direito preexistente) por que have-

sitivista, direciona sua abordagem principalmente no que

ria o dever de obedecer àquela decisão se ela em verdade

tange a três aspectos centrais: os fundamentos de legiti-

não é direito (validamente entendido), à medida que não há

midade10 do direito; a problemática da discricionariedade

como justificar a decisão?

do juiz ao solucionar um caso concreto e a justificativa do cumprimento de uma decisão oriunda do agir discricioná-

Realmente os teóricos positivistas não enfrentaram a con-

rio do juiz, pelo fato de que a mesma, por não se validar

tento estas questões à medida que as mesmas comprome-

segundo a lógica do modelo, não se prestaria a criar nem

tiam toda a fundamentação da modelagem positivista. No

obrigação nem direito11.

intuito de perpassar esses obstáculos, Dworkin apresenta um giro cognitivo ao propor um novo viés compreensivo

A partir desta constatação, quais seriam então estas defi-

do direito, no sentido de validá-lo e legitimá-lo a partir de

ciências do modelo positivista por ele detectadas? Em ou-

uma teoria despida das incongruências e incompletudes do

tras palavras, quais seriam as inconsistências internas dessa

positivismo, em uma corrente que se denomina pós-positi-

abordagem que deveriam ser supridas ou superadas? Ora,

vismo. Para isto, introduz no debate conceitos tais quais di-

primeiramente é pertinente o questionamento acerca da le-

reito como integridade, comunidade fraternal de princípios,

gitimidade do direito. Como se sabe, o positivismo não pres-

Hércules, que serão melhor apresentados e interconectados

supõe qualquer vinculação da validade da norma (Direito)

no decorrer do trabalho.

com o seu conteúdo. O que interessa, in casu, é somente a sua origem (se fundada em uma norma hierarquicamente

Neste sentido, Dworkin, em sua obra, apresenta-se desde o

superior) e a forma pela qual ela é verificada ou aplicada

início preocupado com a questão da legitimidade do direito.

(se minimamente eficaz na sociedade). A questão funda-

Para ele, “uma concepção de direito deve explicar de que

mental que deve ser discutida é esta: se são estas noções

modo aquilo que chama de direito oferece uma justificati-

que esgotam a validade do direito (e como não é possível

va geral para o exercício do poder coercitivo pelo Estado”. (1999:231). Ainda neste sentido, coloca que um “Estado é

9 Aqui entendido como uma postura filosófica e científica, que teve

legítimo se sua estrutura e suas práticas constitucionais

como principais expoentes John Austin, Hans Kelsen, Haart entre outros.

forem tais que seus cidadãos tenham uma obrigação geral

10 Ou validade como é tratado por Kelsen na sua teoria pura do Direito.

de obedecer às decisões políticas que pretendem impor-

11 Obviamente os aspectos pontuados por Dworkin são interrelacionados e conexos, de sorte que no desenvolvimento de seu raciocínio as questões

12 A validade de uma decisão discricionária se fundaria no poder geral de

aventadas serão abordadas a seu tempo.

autoridade conferido ao juiz e no princípio da coisa julgada (efetividade).

77


lhe deveres.” (1999:232). Exsurge pois o cerne da questão.

em benefício do bem-estar dos outros membros do grupo,

De que forma pois, poder-se-ia conceber o direito como

decorrentes de uma responsabilidade mais geral (3) e, por

legítimo de forma a legitimar o próprio Estado? Ora, nes-

fim, exigem que as práticas do grupo se mostrem no igual

te momento, introduz-se o conceito de integridade. Para

interesse de todos, no sentido de que as comunidades fra-

Dworkin, isto só pode ser obtido a partir da reconhecimento

ternas sejam conceitualmente igualitárias (4).(1999:242).

do direito como integridade, de sorte que “um Estado que aceita a integridade como ideal político tem um argumen-

Ademais, as pessoas aceitam que são membros desse tipo

to melhor em favor da legitimidade do que um Estado que

de comunidade, aceitam que são governadas por princípios

não a aceite.”(1999:232).

comuns e não apenas por regras explícitas criadas por um acordo político14. Neste caso, segundo Dworkin, a política

Para a compreensão do como se pode pensar o direito como

tem uma natureza diferente. É uma arena de debates sobre

integridade, necessário é que se compreenda a noção tra-

quais princípios a comunidade deve adotar, que concepção

balhada por Dworkin do que se seja uma comunidade fra-

deve Ter de justiça, equidade e justo processo legal e não

ternal de princípios, no sentido de prover a forma pela qual

a imagem diferente, apropriada a outros modelos, na qual

as obrigações (coerção autorizada pelo direito) aos seus

cada pessoa tenta fazer valer suas convicções no mais vas-

membros imposta possam ser consideradas como legítimas,

to território de poder ou de regras possível. Os membros

no sentido da manutenção de uma ordem coerente de prin-

de uma sociedade de princípio admitem que seus direitos e

cípios somente nela (comunidade fraternal) viabilizado13.

deveres políticos não se esgotam nas decisões particulares tomadas por suas instituições políticas, mas dependem, em

Em primeiro lugar, as pessoas que pertencem a este tipo de

termos mais gerais, do sistema de princípios que essas deci-

comunidade devem possuir quatro características particu-

sões pressupõem e endossam.(1999:254-255)

lares em relação às responsabilidades que cada membro do grupo deve para com todo o grupo e outros membros iso-

14 Na teoria de Dworkin, as normas jurídicas (ordenamento jurídico)

ladamente: devem considerar as obrigações como especiais,

decompõem-se em regras e princípios. A distinção entre ambas é que as

que se prestam a um caráter distintivo em relação a pessoas

regras seguem a lógica do tudo ou nada ( in-an all or nothing fashion),

que não pertençam ao grupo. (ex.: respeitam os princípios

ou seja, se estão caracterizados os fatos que determinam sua aplicação

de sentimento de equidade e justiça da organização políti-

(subsunção), a regra é aplicada; caso contrário, não. Já os princípios

ca vigente em sua comunidade particular, que podem ser

seguem a lógica da ponderação(balance), no sentido que princípios

diferentes daqueles de outras comunidades) (1); fazem com

concorrentes podem conviver validamente na ordem jurídico-política,

que as responsabilidades de cada sejam pessoais, vinculan-

transferindo para a análise argumentativa do caso concreto a hipótese

do diretamente um membro a outro (2). Envidam esforços

de incidência de um ou de outro, segundo um juízo concreto, em que a decisão adequada se traduz do ponto de equilíbrio obtido do ajuste dos

78

13 O motivo pelo qual uma comunidade de fato e uma comunidade de

princípios ao caso concreto e do caso concreto aos princípios. Obviamen-

regras não sustentarem um ideal de integridade pode ser entendido pela

te esta abordagem, que sustenta o caráter binário do direito, se afasta

leitura da obra O império do Direito, de Ronald Dworkin, em suas pgs.

por completo do modelo Alexyano, que interpreta este “balanceamento”

251 e ss.

como se fosse uma questão de preferência, atratividade ou importância.


Em resumo, cria-se um vínculo entre os membros da comu-

Portanto, com ênfase, pode-se afirmar que não há mais es-

nidade, não por questões de afinidade, afetividade ou pa-

paço para a chamada discricionariedade do juiz tão critica-

rentesco, mas pelo estabelecimento de uma rede de respon-

da na Teoria Kelseniana. Aqui, não se sustenta a discussão

sabilidades recíprocas conectadas pelos princípios comuns,

acerca de várias possibilidades de interpretação da norma

assim entendidos como aqueles intersubjetivamente (entre

ou mesmo decisão fora do quadro destas interpretações

os membros da comunidade) compartilhados e construídos

possíveis. No modelo defendido por Dworkin, a legitimi-

e reconstruídos histórica (cotidianamente) e organicamen-

dade conferida ao direito em razão dos princípios, que se

te, segundo as expressões coerentes das concepções que

reflete em um sistema de normas principiologicamente co-

aquela sociedade tem de justiça, equidade e devido pro-

erente, “leva a uma vinculação e nega justamente a noção

cesso legal15.

de “liberdade” do juiz por uma questão de legitimidade. Disto conclui-se que os princípios têm força normativa”.

Destarte, pode-se inferir que o fundamento de legitimidade

(CHAMON JÚNIOR, 2003:16)(g.n) Como se observa, o mo-

do direito só se sustenta em uma comunidade de princípios,

delo defendido por Dworkin afasta-se completamente do

de forma que o direito como integridade, entendido exa-

ideal positivista, à medida que, para cada caso concreto re-

tamente como o conjunto de normas coerentes com os

construído argumentativamente, não existe uma resposta

princípios comuns adotados, deve buscar a resposta para

qualquer, mas sim uma resposta correta (que inclusive leve

o caso concreto no sentido de preservar esta ordem coe-

em consideração o processo concretamente desenrolado)

rente de princípios. Aqui, demonstra-se que a abordagem

(2001:19), exatamente aquela que mantém o ideal de inte-

de Dworkin refoge totalmente da lógica positivista de ten-

gridade do sistema.

tar definir, em abstrato, todas as condições de aplicação de uma norma16. Na teoria de Dworkin, ao contrário, não

Ora, o comprometimento do juiz com a manutenção do ideal

existe espaço para várias respostas aceitáveis. Para ele, por

de integridade do sistema impõe-lhe que ao solucionar um

levar em consideração o caso concreto, considerado como

caso concreto, cujas características não encontram acolhida

único e irrepetível e dotado de especificidades próprias, na

nos standards normativos preexistentes, não crie direito,

construção da resposta, para aquele caso, haverá apenas

ou seja, uma norma particular de moldes positivistas (dis-

uma resposta correta, exatamente aquela que irá refletir a

cricionária) que carece de qualquer pretensão de validade.

integridade do sistema.

Na verdade ele deve não inventar um novo direito, mas sim desvelá-lo, descobri-lo, reconstrui-lo argumentativamente à luz do caso concreto, buscando uma decisão que seja co-

15 Apesar de não fazer menção explícita a GADAMER em sua obra, pode-

erente com todo o ordenamento jurídico (as leis, a Consti-

mos perceber uma certa similitude de pensamento quanto à questão da

tuição e inclusive a conjugação com as decisões passadas,

“formatação” dos princípios comuns da comunidade fraternal. Para uma

os precedentes) que se assenta no modelo de princípios

visão mais completa da obra de GADAMER, sugerimos a leitura do livro

adotado por aquela comunidade (mantendo a integridade

Hermenêutica filosófica e constitucional, de Rodrigo Viana Pereira.

do sistema)17. Por isso, conforme explica CHAMON JÚNIOR

16 De tal sorte que haveria assim várias possibilidades de interpretação de uma norma, todas elas válidas.

17 Como explica Dworkin “ Os juízes que aceitam o ideal interpretativo

79


(2003:19) é mediante essa forma de interpretação que se

nada. Para os princípios, diferentemente, subsiste a lógica

“descobre” o direito, e não o cria: reconstrói-se, então, o

da ponderação, cuja aplicação consiste na determinação de

direito, e não um direito para o caso concreto”, de forma

uma relação de prioridade, na qual os princípios são apli-

que, em relação à decisão (a correta) principiologicamente

cados mediante uma “pesagem”. Para Alexy, diante do caso

sustentável, não subsista qualquer déficit de legitimidade.

concreto, a pesagem dos princípios se dá por critérios de preferência, importância ou atratividade de uns fren-

II.2.2 Robert Alexy, princípios e valores

te aos outros, o que em verdade quer significar que Alexy considera a lógica dos princípios igual a lógica dos valores

A Teoria da Argumentação Jurídica de Robert Alexy preten-

do ponto de vista de sua aplicabilidade.

de construir um modelo de sistema do direito que possa ser considerado racional. Em verdade, procura conjugar dois

Sendo assim, Alexy reduz a aplicação do direito não a um

modelos: o modelo segundo o qual o direito é visto como

conceito de adequabilidade18, mas sim a uma ponderabili-

um sistema de normas e outro modelo segundo o qual ele é

dade material de comandos otimizáveis, compreendendo-se

visto como um sistema de procedimentos.

os princípios como algo que deve ser realizado na maior medida possível, ou seja, algo que deve ser aplicados

Alexy procura recuperar a idéia de razão prática, através de

no seu grau ótimo. Entretanto esta postura leva a sérios

uma teoria do discurso (vista como uma teoria de procedi-

problemas de aceitabilidade ou mesmo sustentabilidade de

mentos), em que uma norma vai ser considerada exata na

sua teoria sob o paradigma de um Estado Democrático de

medida em que resultar de um determinado procedimento,

Direito.

daquele discurso prático. Esta teoria do discurso tem como característica a possibilidade das convicções e dos interes-

Primeiramente, entender os princípios como comandos de

ses dos indivíduos modificarem-se ante os argumentos que

otimização leva ao estabelecimento de um modelo hierár-

são colocados ao longo do procedimento.

quico destes princípios, ou seja, de uma “ordem concreta de valores” com vista a determinados fins, fins estes que

Como sistema de normas, o direito pode ser concebido ape-

representam valores compartilhados apenas por determi-

nas como um sistema que concilia os níveis das regras e

nados grupos. Neste sentido, tratar princípios como valores

dos princípios. Os princípios são obrigações de otimização

faz com que se busque o que é bom, melhor ou preferível,

enquanto as regras têm uma natureza de obrigação defi-

condicionado a determinadas concepções de “vida boa”.

nitiva.

Isto não é sustentável em uma sociedade moderna, plural,

Para as normas, aplica-se o conceito de subsunção. As re-

complexa, multicultural e democrática, uma vez que valores

gras ou são ou não são aplicadas, em uma lógica do tudo ou

são sempre pessoais ou de determinado grupo e, portanto, insuscetíveis de representarem algo que é efetivamente

da integridade decidem casos difíceis tentando encontrar, em algum

compartilhado

pela

sociedade

conjunto coerente de princípios sobre os direitos e deveres das pessoas, a melhor interpretação da estrutura política e da doutrina jurídica da

80

comunidade.”(1999:305).

18 Conforme trabalhado em Dworkin.

como

um

todo.


Ademais, compreender a aplicação dos princípios como

“eles”19. A vinculação da legitimidade das decisões jurídicas

algo gradual faz com que a suposta “exatidão” da decisão

à participação e ao reconhecimento de todos como co-au-

de um determinado caso concreto seja em verdade algo

tores da construção e reconstrução do direito leva à supe-

aproximado, em virtude de que uma decisão será tão mais

ração do modelo eticizante a que a teoria de Alexy impõe à

correta quanto mais se aproximar das condições ideais do

sociedade. Neste contexto, para que a aplicação do direito,

discurso. Ao desenvolver sua teoria nestes moldes, Alexy

no sentido de que se possa impor uma obrigação daquilo

subverte a ordem binária do direito no sentido de se buscar

que é devido, seja legítima, é necessário que a decisão ade-

o que é devido, e mergulha na armadilha decisionista do

quada para o caso concreto exsurja a partir de um critério

positivismo, ao permitir que se tenha em verdade diver-

de racionalidade argumentativa, em que todas as posições

sas decisões que seriam “válidas”, à medida que caberia

dos afetados pela decisão sejam “levadas a sério”, e contri-

somente à pessoa do julgador a determinação de quais

buam para a construção do provimento final.

e em que medida uns princípios (valores) seriam prefe-

Para concluir, neste sentido, CHAMON JÚNIOR resume a

ríveis a outros.

discussão posta: “...Tertium non datur. Afinal, interpretar o direito legitimamente não implica transformar-nos nem

Sobre o que foi exposto, CATTONI DE OLIVEIRA se posiciona

em pregadores de nossa concepção ética, muito menos

de forma incisiva:

servos de valores alheios.” (2003:36)

“Ao final, ao se reduzir o Direito a valores que, por sua natureza, não são homogêneos numa mesma sociedade,

II.3 O papel constitucionalmente adequado do juiz em um

aumenta-se o risco da irracionalidade do processo juris-

paradigma de Estado Democrático de Direito

dicional de controle, transformando-o em uma instância político-legislativa que se sobressairia ao próprio legislador

Uma das mais contundentes críticas feitas à teoria de

democrático. Instaurar-se-ia, desse modo, uma ditadura de

Dworkin é aquela em relação ao papel desempenhado pelo

“boas intenções éticas e políticas”, que desrespeitaria a ci-

juiz na busca da melhor interpretação (a adequada) para a

dadania e o legislativo, à medida que os reduziria a meros

solução do caso concreto. Para o autor, no árduo trabalho

tutelados do Tribunal de cúpula, no caso do Supremo Tri-

de busca solitária da adequação, historicamente compreen-

bunal Federal, ou no caso alemão, da Corte Constitucional

dida, que conforme o direito a ser aplicado, o juiz deve ser

Federal.(2002:174)” 19 O grande problema da Teoria de Alexy é que ele, quando da aplicação

Em resumo, na argumentação jurídica, os princípios devem

do direito, leva em consideração argumentos pragmáticos, morais e

ser compreendidos dentro de uma visão deontológica, no

éticos, parecendo desconhecer a distinção entre discursos de justificação

sentido do que deve ou não ser aplicado, e não como algo

e discursos de aplicação. A busca da adequabilidade do direito a ser apli-

que deve ser preferido ou que é mais atrativo em relação

cado em função do caso concreto deve referir-se somente a argumentos

a outro. Não se permite dentro do paradigma do Estado

jurídicos, com base no conjunto de normas validadas pelos discursos

Democrático de Direito que, em nome do “bem comum”, se

de justificação. (Para maior aprofundamento sobre o tema: GUNTHER,

estabeleça para os “outros” aquilo que se julga bom para

KLAUS. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação)

81


dotado de atributos quase sobre-humanos para que, base-

de contemporânea para explicar como direitos e princípios

ado no ideal de integridade, interprete todo o sistema de

constitucionais devem ser concebidos e implementados

princípios à luz da prática das instituições da comunidade

para que cumpram naquele dado contexto as funções nor-

(CHAMON JÚNIOR, 2003:18). A carga de responsabilidade

mativamente atribuídas a eles.”

atribuída ao juiz é tamanha que Neuenschwander Magalhães resume o assunto ao dizer que a busca da respos-

E completa:

ta correta “.... é tarefa de um juiz dotado de qualidades quase que impossíveis de coexistirem em uma só pessoa,

O que quer dizer que as compreensões jurídicas paradigmá-

razão pela qual chama este juiz ‘ideal’ de HÉRCULES.”

ticas de uma época, refletidas por ordens jurídicas concre-

(1999:438).

tas, referem-se a imagens implícitas que se tem de própria sociedade; um conhecimento de fundo, um bakground, que

Dentro desse quadro, este agir quase mítico do herói HÉR-

confere às práticas de fazer e de aplicar o Direito uma pers-

CULES pode ser minimizado a partir da noção do que seja

pectiva, orientando o projeto de realização de uma comu-

paradigma. CATTONI DE OLIVEIRA recorre a HABERMAS20

nidade jurídica.(2002:54)

(1996:194-195) para estabelecer o conceito de paradigma21 para o campo das ciências sociais e, no âmbito dessa, para

A partir destas noções, pode-se dizer que, ao imergir nes-

as reflexões acerca do Direito.

tes paradigmas, que são construídos e reconstruídos pela comunidade jurídica, HÉRCULES tem sua jornada aliviada,

“Por esse último (paradigmas de Direito), entendo as visões

visto que a tarefa de estabelecer o escopo significativo de

exemplares de uma comunidade jurídica que considera

coerência da norma é sobremaneira reduzida por essa com-

como o mesmo sistema de direitos e princípios constitu-

preensão paradigmática do direito. Para CHAMON JÚNIOR,

cionais pode ser realizado no contexto percebido de uma

HÉRCULES fica muito mais aliviado da complexidade de sua

dada sociedade.

atividade, pois ao invés de, em todos os caos, ter que siste-

“Um paradigma de Direito delineia um modelo de socieda-

matizar, na formação de sua teoria, “toda” a malha principiológica e de regras com os casos anteriores, ele já toma

20 HABERMAS, Jurgen. Between facts and norms, 1996.

contato com uma “certa” ordem, que serve de pano de fun-

21 Segundo CATTONI DE OLIVEIRA (2002:52), o termo “paradigmas” foi

do para o seu ofício.(2003:33)

introduzido na discussão epistemológica contemporânea, com o sentido,

82

por exemplo, utilizado por Gomes Canotilho, ou seja, como “ ‘Consenso

Mas será que esta postura de isolamento de HÉRCULES, de-

científico’ enraizado quanto às teorias, modelos e métodos de compre-

fendida por Dworkin, é sustentável em um paradigma de

ensão do mundo”, a partir do conceito concebido por Thomas Kuhn:

Estado Democrático de Direito? Seguindo os ensinamentos

“..... paradigmas são realizações científicas universalmente reconhecidas

de Habermas, o próprio sentido de integridade deve ser re-

que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares

definido, abarcando agora “uma comunidade de indivíduos

para uma comunidade de praticamente de uma ciência.”. Para um maior

integrados e que assumem uma postura realizativa de to-

aprofundamento do assunto, sugerimos a leitura de Marcelo Andrade

dos os demais.” (CHAMON JUNIOR, 2003:34).

Cattoni de Oliveira e Menelick de Carvalho Netto.

Nesta linha, a argumentação racional que efetivamente le-


gitime a solução dos conflitos só pode ser obtida a partir

agora compreendido a partir de uma perspectiva de prin-

de uma compreensão procedimental da democracia (e do

cípios constitucionais que se apresentam como garantia

direito), a partir da constatação de que todos os indivíduos

fundamental de todos os cidadãos. Através deles, o provi-

que estão sob o império do direito participam de sua cons-

mento jurisdicional se consolida e se reveste de legitimida-

trução e reconstrução, dentro de uma rede que permita que

de a partir da participação de todos os afetados pela deci-

os fluxos comunicativos desses participantes (tomadas de

são. Entretanto, não se trata de uma participação qualquer.

posições e opiniões) estejam orientados para o entendimen-

Em verdade, devem ser garantidos a todos aqueles em cuja

to, o que só pode ser sustentado e efetivado a partir da

esfera jurídica o ato final está destinado a produzir efeitos,

Constituição, entendida como a base de uma comunidade

iguais possibilidades de participação no processo, ou em

que compartilha princípios intersubjetivamente construídos

outras palavras, uma simétrica participação no processo de

e reconstruídos.

construção desta decisão. Trata-se, pois, da efetivação do princípio constitucional do contraditório23.

Por tudo isso, demonstra-se impossível e até mesmo im-

Além disto, aos legítimos participantes, deve ser provido a

plausível que HÉRCULES se mantenha como o guardião

possibilidade de se utilizar de todos os argumentos licita-

único de todas as virtudes que lhe permitam, sozinho,

mente constituídos, o que apresenta-se como corolário do

garantir a adequação da decisão a ser tomada. Ora, se o

princípio constitucional da ampla defesa24. Esta nova ótica

juízo de adequabilidade22 obtido através da compreensão

de abordagem sedimenta a superação do modelo de pro-

paradigmática (que é intersubjetivamente compartilhada

cesso como relação jurídica, tal qual difundido no Brasil por

por todos) deve ser extraído a partir de uma prática rea-

Liebman25 e demonstra a prevalência da Constituição como

lizativa, tem-se que sua decisão deve ser entendida como

locus indispensável à operacionalização do modelo.

um empreendimento comum suportado pelos pressupostos

Neste sentido, a insubsistência desta corrente processualis-

comunicativos de todos. 23 Para Aroldo Plínio Gonçalves, citado por FERNANDES (2002:47), a

Esta noção procedimental de democracia e direito, em que

idéia que está na base do princípio do contraditório é a da evolução da

as decisões legítimas (adequadas) só podem ser tomadas

prática da democracia e da liberdade, em que os interesses divergentes

com base em contextos discursivos publicamente assen-

ou em oposição encontram espaço garantido para sua manifestação na

tados, só vem reforçar a obrigatoriedade de se enxergar

busca da decisão participada.

o processo tal qual o modelo idealizado pelo italiano Elio

24 CATTONI de OLIVEIRA coloca que, além do contraditório e da ampla

Fazzallari, compreendendo-se agora o procedimento como

defesa, outros princípios também possuem relevância neste modelo

gênero, do qual o processo é espécie, ou seja, o processo

constitucional de processo, tais como o devido processo legal, do direito

é o procedimento realizado em contraditório, devendo ser

à prova, do juiz natural, independente e imparcial, da fundamentação racional das decisões judiciais, da publicidade, da instrumentalidade

22 Conforme já mencionado, para uma exata compreensão do sentido e

técnica do processo, da efetividade e da inafastabilidade da tutela jurisdi-

alcance do chamado senso ou juízo de adequabilidade, recomenda-se a

conal, etc. (2002:98).

leitura do livro GUNTHER, KLAUS. Teoria da argumentação no direito e na

25 Os grandes expoentes desta corrente são Cândido Rangel Dinamarco,

moral: justificação e aplicação.

Ada Pellegrini, dentre outros.

83


ta (corrente paulista ou instrumentalista) está exatamente

expectativas de comportamento e de ser uma das formas de

no fato que sua construção se consolida e se sustenta ape-

integração social. (FERNANDES, 2002:47).

nas nos termos de um paradigma já não mais sustentável de um Estado Social. Para esta corrente, conforme prescreve

Esta nova modelagem abre, inclusive, novas perspectivas,

Dinamarco, citado por FERNANDES (2002:44), “a jurisdição

à medida que a abordagem apresentada em função deste

e o processo devem ser compreendidos como instrumen-

modelo constitucional de processo possa ser estendida para

tos que têm por finalidade realizar “os valores sociais e

além da esfera judicial, abarcando também os procedimen-

políticos da nação”. E a liberdade e igualdade, enquanto

tos legislativos e administrativos, pois os mesmos po-

valores a serem realizados pela jurisdição, encontram seu

dem também ser interpretados como processo, na justa

sentido tão somente à luz das suas identidades culturais e

medida em que se abre o contraditório para todos os

tradicionais de cada nação, a partir da definição prévia de

legítimos participantes.

quais seriam os valores mais atrativos para aquela Nação. Assim, os juízes se apresentam como os guardiões de um virtuosismo ético-político representando “um canal de co-

III Conclusão

municação entre a carga axiológica da sociedade em que vive e os textos legais.” (FERNANDES, 2002:45).

1 – Em sociedades pós-industriais, ou inseridas em um contexto da denominada alta modernidade, é instigante e

Como se observa, esta postura é incompatível com os dita-

premente a necessidade de se compatibilizar e tolerar a

mes de um Estado de Direito Democrático, que conforme

existência de uma grande diversidade de projetos de vida

demonstrado, exatamente desloca o papel-missão do juiz

individuais.

para a garantia das partes, enquanto atores da construção das sentenças das quais elas são destinatárias. Em função

2 – Neste contexto, é fundamental conformar o papel a

disto, conforme explica CATTONI DE OLIVEIRA (2002:98),

ser exercido pelo direito nessas sociedades para que ele se

a importância deste modelo constitucional do proces-

revista de legitimidade que garanta sua coercitividade não

so pode ser apreendida na garantia “ .... de uma devida

apenas pelo atributo da autoridade.

racionalidade procedimental e a reflexidade que cobra o Estado Democrático de Direito”, compatível com o conceito

3 – Essa nova configuração traduz-se na superação de uma

processual de cidadania, nos termos de uma “comunidade

modelagem positivista do direito, reduzido a um modelo de

aberta de intérpretes da Constituição”, segundo preceitua

regras distanciado da realidade, para uma modelagem que

Peter Haberle. Assim, esta sociedade de intérpretes não se

assume a normatividade plena também dos princípios.

refere somente ao Supremo Tribunal Federal e a um gru-

84

po de experts, representantes divinos da carga axiológica

4 – Exsurge pois o realce do papel a ser desempenhado pelo

da nação, mas é pressuposto de autonomia dos cidadãos,

aplicador do direito que, diante dessa nova configuração

devendo ser exercitada cotidianamente através da interpre-

normativa, deve realinhar sua postura para se afastar de

tação constitucional, nos moldes de uma soberania difusa,

um viés decisionista e discricionário, baseado em suas pre-

que garanta que o direito alcance sua tarefa de estabilizar

ferências pessoais ou pretensos valores homogeneizantes


da sociedade.

adotados, que deve buscar a resposta para o caso concreto no sentido de preservar a ordem coerente de princípios da

5 – Nesta linha, o colapso do modelo positivista, cuja le-

comunidade. Nesta modelagem, que perpassa a noção do

gitimidade se assentava nos aspectos formais da produção

direito como um sistema estático de regras, não há que se

do direito, deu-se pela incapacidade de superar a questão

falar em lacunas interpretativas que, conforme discutido no

central de indeterminação estrutural do direito, que além

positivismo, se apresentam como terreno fecundo para o

de não poder ser confinado a um modelo fechado de regras,

exercício da discricionariedade do juiz. Surge então a fi-

apresenta-se como texto e, portanto, admite múltiplas lei-

gura do juiz Hércules, que no desempenho da sua função

turas. Entretanto, nem por isso a aplicação do direito se

jurisdicional deverá desvelar, a partir de uma reconstrução

resume à escolha de qualquer das possibilidades encerradas

argumentativa, o direito a ser aplicado ao caso concreto,

em uma moldura ou mesmo fora dela, pois até mesmo a

buscando uma decisão, a resposta correta, que seja coeren-

moldura é historicamente datada em função do pano de

te com todo o ordenamento jurídico (as leis, a Constituição

fundo intersubjetivamente compartilhado. Sendo assim,

e, inclusive, a conjugação com as decisões passadas, os pre-

o ponto de partida dos seguidores da corrente positivista

cedentes) que se assente no modelo de princípios adotado

passa pelo ganho de normatividade dos princípios e pela

por aquela comunidade, no sentido de manter a integridade

consciência da necessidade de se retrabalhar a questão da

do sistema.

indeterminação estrutural do direito, a partir da necessidade da conjugação do binômio certeza/ segurança jurídica.

7 – Robert Alexy, não obstante incorporar também a construção do direito em bases principiológicas e de querer incor-

6 - Ronald Dworkin rejeita uma concepção meramente me-

porar a componente racional na argumentação dos discursos

canicista e formalista do direito, criticando de forma incisi-

jurídicos como forma de superar o colapso positivista, con-

va a questão da legitimidade do direito estar desvinculada

tradiz a si mesmo quando informa que colisão de direitos so-

do seu conteúdo, a possibilidade do agir discricionário do

mente pode ser resolvida a partir da ponderação de valores,

juiz e a obrigatoriedade do cumprimento de decisões, como

que em última análise impõe para uma das partes envolvidas

aquelas exaradas discricionariamente, fundamentadas fora

restrições ou sacrifícios. A partir desta técnica de decisão, em

do modelo positivista. Para tanto, Dworkin propõe um giro

que a maior realização de um princípio envolve a restrição de

cognoscitivo que associa a legitimidade do direito e do pró-

outros em maior ou menor grau, subverte-se a lógica deôn-

prio Estado ao ideal de integridade. Sendo assim, trabalha a

tica do direito ao tratar os princípios como bens, ou valores,

concepção de uma comunidade de princípios, em torno da

como mandados de otimização. O grande problema dessa

qual cria-se um vínculo dos seus membros, não por ques-

abordagem, em uma sociedade plural que vise a assegurar a

tões de afinidade, afetividade ou parentesco, mas pelo es-

coexistência de distintos projetos de vida individuais, é uma

tabelecimento de uma rede de responsabilidades recíprocas

hierarquização prévia desses valores (princípios), que em úl-

conectadas pelos princípios comuns. Assim exsurge a noção

tima ratio não se afasta das preferências pessoais do julgador

de direito como integridade, entendido exatamente como o

ou de uma pretensa e insustentável homogeneidade valora-

conjunto de normas coerentes com os princípios comuns

tiva imposta por uma elite dominante.

85


8 – Por fim, procura-se apresentar uma alternativa a este

sual Jurisdicional dos Direitos Fundamentais. In: Revista

status quo, aqui tratado em termos de uma crítica tanto à

Brasileira de Estudos Políticos n° 88, dezembro de 2003.

visão alexiana, como já debatida, quanto à postura solip-

Programa de Pós-graduação da Faculdade de Direito da

cista e deveras sobre-humana do juiz Hércules de Dworkin,

UFMG. Imprensa Universitária da UFMG, p. 109-147.

a partir de uma abordagem paradigmática que atua como

CHAMON JÚNIOR, Lúcio Antônio. Tertium non datur: Pre-

grade seletiva contextualizada pelo véu da historicidade

tensões de coercibilidade e validade face a uma teoria da

que se presta a moldar o entendimento das concepções que

argumentação jurídica no marco de uma compreensão pro-

envolvem a praxis jurídica e realização dos direitos funda-

cedimental do estado democrático de direito. Dissertação

mentais. Neste contexto, a tarefa do aplicador do direito

de mestrado. 2003.

deve se pautar como um juízo de adequabilidade normativa que envolve a consideração de todas as normas, princípios

CHAMON JÚNIOR, Lúcio Antônio. Paradigma e aplicação

ou regras, prima facie aplicáveis ao caso concreto, bem

do direito: por uma compreensão constitucionalmente

como o levantamento das circunstâncias específicas e re-

adequada do direito penal sob a perspectiva de um caso

levantes para sua solução. Neste caso, não existe princípio

concreto. In: Revista de informação legislativa. Brasília: Se-

melhor ou preferível para solução do caso, mas simplesmen-

nado Federal, n. 155, julho/set. 2002.

te a norma adequada. Ademais, a pretensão de legitimidade das decisões é garantida através do medium institucionali-

_________. A filosofia do direito na alta modernidade. Lú-

zado do processo constitucional, que se caracteriza como

men Júris: Rio de Janeiro, 2005.

o locus adequado para a tomada das melhores decisões em respeito aos princípios constitucionais da ampla defesa e

COURA, Alexandre de Castro. Limites e possibilidades da

contraditório.

tutela jurisdicional no paradigma do estado democrático de direito: para uma análise crítica da “jurisprudência

*Advogado. Especialista em Controle Externo e Processo

de valores”. In: Jurisdição e Hermenêutica Constitucional.

Constitucional. Mestrando em Direito Público pela PUC/

CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade (Coord). Belo Ho-

MG.

rizonte: Mandamentos, 2004.

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CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. Direito Constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002.

DUARTE, Écio Oto Ramos. Teoria do discurso e correção normativa do direito: aproximação à metodologia discur-

CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. Direito Processual

siva do direito. 2.ed. ver – São Paulo: Landy Editora, 2004.

Constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2001. FERNANDES, Bernardo Gonçalves. A teoria geral do processo e a CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. Teoria Discursiva

86

da Argumentação Jurídica de Aplicação e Garantia Proces-

teoria da constituição no Estado Democrático de Direito. 2002.


KELSEN, Hans. Teoria Pura do direito. São Paulo: Martins

Os Poderes Legislativo e Executivo municipais passam a efetiva-

Fontes, 1987.

mente ter representação relevante e não apenas periférico, residual; tanto que a eles é atribuída a competência para fixar os

MAGALHÃES, Juliana Neuenschwander. Sobre a interpretação ju-

subsídios do prefeito, do vice-prefeito, dos secretários municipais

rídica. In: Revista de Direito Comparado. Programa de Pós-gradu-

e dos vereadores, conforme a normas de seus arts. 29, V e VI; 37,

ação da Faculdade de Direito da UFMG e Mandamentos, 1999.

X e XI, dentre outras, em observância de limites, dentre eles, o da disponibilidade orçamentária do município.

-----------------------------

Toda essa evolução força novas abordagens acerca de velhos temas, pois que as inovações introduzidas pela CR/88 exprimem a O VICE-PREFEITO NO PROCESSO ELEITORAL: UMA VISÃO

vontade do Legislador Constituinte de ver o município aprimorar-

ATUAL

se administrativamente de modo a justificar sua criação e manutenção. Se não fosse assim não haveria a necessidade de reconhe-

José Eduardo Lewer de Amorim *

cê-lo, de forma clara, como ente da Federação. Seria mais fácil mantê-lo atrelado à vontade do Estado a que pertence.

A Constituição da República de 1988 – CR/88 – reconheceu, acertadamente, o município, como ente da Federação, status que não

E tais novas abordagens, a nosso sentir, são bastante oportunas em

usufruía expressamente ao tempo da Constituição da República

época de eleição, por ser esta a época apropriada para renovação,

de 69 – CR/69. Esse novo posicionamento fez com que o texto

para promoção e adoção de atitudes tendentes a produzir evolu-

constitucional de 88 fosse mais abrangente ao tratar da organiza-

ção do sistema e atender ao desejo do Legislador Constituinte de

ção e dos representantes legais do Município.

fazer o Estado avançar e se aperfeiçoar. Em especial, tanto sob o enfoque político quanto sob o enfoque social, parece importante

Em um estudo comparativo, vê-se que a CR/69 tratava do mu-

se pensar na figura do vice-prefeito.

nicípio em seu capítulo III e em conjunto com o Estado. O que se previa, em verdade, eram as normas de como os estados criariam

A sociedade está muito decepcionada com a classe política e, ao

e organizariam os seus municípios. No caso de Minas Gerais, a

mesmo tempo, muito empenhada em criar barreiras que impe-

Lei Complementar nº. 3, de 28/12/72, era o texto legal que dis-

çam ou dificultem a atuação danosa dos agentes políticos, a dila-

ciplinava a matéria referente à organização administrativa dos

pidação do dinheiro público, a malversação do dinheiro público.

municípios.

Seja porque é ilegal por natureza, seja porque a sociedade vive tempos difíceis diante da ausência de ajuda eficaz por parte do

A CR/88, por sua vez, dedica ao município, expressamente, a sua

Poder Público, que se diz justificar pela adoção de políticas so-

atenção em diversos artigos, além de tratar dele, exclusivamente,

ciais tendentes a ajudar toda a população, indiscriminadamente,

em seu Capítulo IV. O município passa a ter o poder de se auto-or-

políticas estas que só ao Estado caberia adotar, posto que muito

ganizar por meio de Lei Orgânica, de criar cargos e estabelecer os

caras. E, assim, o Estado vai sobrevivendo, se agigantando, apesar

vencimentos e subsídios de seus funcionários, servidores e agentes

de passar para a sociedade a nítida impressão de que ele é inefi-

políticos.

caz, inoperante. Mas continua existindo, continua se auto-orga-

87


nizando numa simbiose de participação das pessoas do povo, num

de validade de sua candidatura a qualquer cargo, mesmo para

primeiro momento (na eleição) e, depois, dos agentes políticos (os

fins de reeleição.

eleitos). Em qualquer situação, ele recebe salário, por meio de subsídio, por E o vice-prefeito? Que figura é essa? Como ele atua nesse sistema?

ser agente político. O desequilíbrio no processo, a isonomia entre

Para que ele é eleito? Para que ele recebe remuneração por meio

os candidatos fica comprometida na medida em que ele tem o

de subsídio?

status de agente político acrescido do dinheiro público para fazer sua campanha, enquanto o cidadão comum, às vezes, sequer tem

Com o advento da CR/88, o vice-prefeito tornou-se mais expressi-

emprego. Não é esse desequilíbrio, não é essa quebra de isonomia,

vo ainda, tendo assegurado, sem restrição, remuneração por meio

não é essa involução que o Legislador Constituinte tentou cons-

de subsídio nos termos do art. 39, §4º. E com a reforma constitu-

truir com a CR/88.

cional, pode mesmo o vice-prefeito ser candidato a reeleição. Por-

Quando o vice-prefeito tem função na administração, esse dese-

tanto, parece que não se tem dedicado a atenção que essa figura

quilíbrio de forças, essa quebra da isonomia entre os candidatos

merece. O vice-prefeito é um agente político, segundo decorre

fica ainda mais evidente e o processo eleitoral, ainda mais ame-

das normas da CR/88, e sua participação no processo eleitoral pas-

açado em sua legitimidade. É incomensurável a distância entre

sa quase que despercebida.

um candidato que ostenta a condição de agente político, por ser vice-prefeito, que tem função na administração e que rece-

E isso se infere do fato de as candidaturas de vice-prefeito, salvo

be subsídio, de um possível oponente seu que simplesmente tem

raras exceções óbvias, decorrentes de fatos públicos e notórios,

um emprego. Só o fato de ser agente político, vice-prefeito, já

não serem objeto de impugnação ou de pesquisa acerca da con-

transfere ao povo, principalmente àquela pessoa mais humilde, a

dição de elegibilidade do possível candidato. Todos quanto atuam

idéia de poder, de grandeza, de detentor de ferramentas capazes

no processo eleitoral, desde os Tribunais até os Partidos Políticos,

de influir em seu destino, pois pode, na condição de vice-prefeito,

voltam suas atenções para os candidatos a prefeito esquecen-

mandar a Administração fazer ou não fazer. Mandar a Adminis-

do-se do vice, como se ele pudesse ser qualquer um, e não pode.

tração fazer alguma coisa a favor ou contra alguém. É amigo do

Como se ele pudesse agir de qualquer maneira durante a campa-

prefeito, tanto que compõe a mesma chapa, então por que não

nha eleitoral, como se as normas eleitorais só fossem válidas para

tem esse poder?

os prefeitos, os vereadores, os servidores e funcionários públicos, não para o candidato a vice. E isso não é verdade.

A Lei Complementar 64/1990 prevê a necessidade de o simples funcionário público municipal responsável ou que tenha interesse

88

Muita das vezes, o vice-prefeito não tem função apesar de ocupar

no lançamento, na arrecadação ou na fiscalização de impostos,

o cargo eletivo e assim ser agente político. Mas em diversos mu-

taxas e contribuições de caráter obrigatório se desincompatibi-

nicípios, seja por questões de real necessidade seja para satisfação

lizar em relação ao cargo no prazo de 6 (seis) meses. Ora, com

do princípio da moralidade, o vice-prefeito tem função e a exerce

certeza que o vice-prefeito tem mais interesse no lançamento, na

na administração. E a Justiça Eleitoral raras vezes tem sua aten-

arrecadação e na fiscalização de impostos do que qualquer ou-

ção voltada para tal fato. Se o agente político vice-prefeito ocupa

tro funcionário municipal. E, no entanto, a Justiça eleitoral não

cargo, é necessário verificar sua desincompatibilização para fins

se preocupa com tal situação, não se importando em saber se ele


deveria ou não, conforme o caso, também se desincompatibilizar

da Carta Política, efetivamente deu novo status à figura do vice-

para fins eleitorais.

prefeito, que passou então a ser considerado agente político com direito a remuneração fixada por lei específica. Passou assim a ter

De igual forma, o mais simples secretário municipal do mais sim-

efetiva representatividade e a ser reconhecido como agente do

ples município, se o cargo for de livre nomeação, tem que ser exo-

Poder, mesmo presente o prefeito, o que não acontecia antes da

nerado para ver sua pretensa candidatura ser considerada legal.

Emenda, quando o vice-prefeito só era alçado a agente do Poder

E o contra-senso é que esse simples secretário tem menos poder,

na ausência do prefeito.

menos recurso e menos influência do que o agente político, Vice-

Daí a necessidade de ter também novo, específico e diferencia-

Prefeito do município do qual é servidor. O desequilíbrio de forças

do tratamento diante dessa realidade, notadamente por parte da

é inquestionável e, sem dúvida, que macula o resultado final do

Justiça Eleitoral. Não há como ignorar que um agente político,

processo eleitoral.

reconhecidamente membro do Poder, possa disputar eleição sem pelo menos licenciar-se. Afinal ele recebe salário por ser vice-pre-

A figura do vice-prefeito passa tão despercebida numa campanha

feito e, em alguns municípios, exerce cargos na administração. A

política que, em determinados casos, nem mesmo o fato de ter

Justiça Eleitoral, quando requerido por um vice-prefeito o registro

ou não assumido o cargo de prefeito em substituição ao titular

de sua candidatura a cargo diverso, deveria verificar se ele recebe

é verificado.

salário, se exerce cargo na administração para, então, conforme o caso, determinar que ele ou renuncie ou se licencie.

A questão é que existem diversas situações que influenciam na condição de elegibilidade do agente político vice-prefeito que de-

Essa nova situação mereceu até mesmo a atenção do eg. Tribunal

veriam ser analisadas pela Justiça Eleitoral e não são, tais como: Se

de Contas do Estado de Minas Gerais, que reconhecendo o novo

substituiu o prefeito, pode ser candidato a outro cargo que não o

status desse agente político, firmou entendimento de o vice-pre-

de prefeito? Se não se desincompatibilizou de seu cargo e função

feito, ao assumir outro cargo na administração, dever optar pela

na administração, pode ser candidato? Na qualidade de agente

remuneração do cargo ou pela sua remuneração de vice-prefeito.

político, com poder institucional a si conferido pela CR/88, seu não

Disse o eg. Tribunal de Contas em sessão plenária:

afastamento do cargo gera ou não gera desequilíbrio no processo eleitoral, quebra ou não a isonomia entre os candidatos, que tanto

SESSÃO DO DIA 27.2.02

prega a legislação eleitoral? A Lei Orgânica do município do qual

ASSUNTO: CONSULTA Nº 654852, FORMULADA PELO SR. JOSÉ

é vice-prefeito lhe atribui que cargo ou função pública? Ele se de-

BENEDITO DE PAULA, PREFEITO MUNICIPAL DE PIRANGUÇU, SO-

sincompatibilizou ou não no período de 6 (seis) meses anteriores,

BRE A POSSIBILIDADE DE O VICE-PREFEITO RECEBER, TANTO PELO

a exemplo de todo servidor ou funcionário público? Em qualquer

CARGO DE VICE-PREFEITO QUANTO PELO CARGO COMISSIONA-

caso, o desequilíbrio de forças no processo eleitoral e a quebra

DO DE DIRETOR DE OBRAS E TRANSPORTES.

da isonomia em função de sua condição de agente político e de receber subsídio é causa ou não de inelegibilidade, exigindo, no

RELATOR: CONSELHEIRO SYLO COSTA

mínimo, o afastamento do cargo no período eleitoral?

CONSELHEIRO SYLO COSTA:

A Emenda Constitucional 19/98, ao acrescentar o §4º ao art. 39

89


“Cuidam os presentes autos de consulta formulada pelo prefeito

Por ocasião de resposta à consulta nº. 699969, o eg. Tribunal de

municipal de Piranguçu, Sr. José Benedito de Paula, solicitando

Contas de Minas Gerais, também pela relatoria do em. conselheiro

deste Tribunal um parecer acerca da possibilidade de o vice-pre-

Sylo Costa, assim se manifestou:

feito receber, tanto por este cargo quanto pelo comissionado de diretor de obras e transportes. (...)

PLENO – SESSÃO: 8/3/06 RELATOR: CONSELHEIRO SYLO COSTA CONSULTA Nº 699969

No mérito, respondo a consulta nos termos do parecer, que adoto,

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

da douta Auditoria desta Casa: “Dispõe o § 4º do art. 39 da Cons-

CONSELHEIRO SYLO COSTA:

tituição Federal que:

Tratam os autos de consulta formulada pelo Sr. Prefeito Municipal de Paineiras acerca da possibilidade legal de acumulação de

§ 4º — O membro do Poder, o detentor de mandato eletivo, os

remuneração de vice-prefeito e que está vazada nos seguintes

ministros de estado e os secretários estaduais serão remunera-

termos:

dos exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado

(...)

o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio,

Mérito

verba de representação ou outra espécie remuneratória, obede-

A dúvida suscitada pelo consulente já foi objeto de exame por

cido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI.

parte deste Tribunal, tendo prevalecido no processo de consulta nº 654.852/2002 da Prefeitura Municipal de Piranguçu, por mim

Verifica-se, portanto, que com o advento da Emenda Constitucio-

relatado, o entendimento de que o vice-prefeito, ao assumir cargo

nal 19/98, que acrescentou o parágrafo acima citado ao artigo

na Administração Pública, deve fazer a opção por uma das duas

39, a remuneração, em nível municipal, do detentor de mandato

remunerações em face da restrição contida no artigo 37, inciso

eletivo e dos secretários, corresponde, exclusivamente, a subsídio

XVI, da Constituição Federal, que veda a acumulação remunerada

fixado em parcela única, sendo vedado o acréscimo de qualquer

de cargos, empregos e funções públicas.

gratificação.

(...) Quero alertar também que, a partir da Constituição de 1988, a

Note-se que, tanto o inciso V como o VI do art. 29 da Carta Fe-

função de vice-prefeito passou a ser cargo e não expectativa de

deral, com a redação dada pela EC 19/98, estabeleceram que os

cargo. Daí ele ser remunerado e tomar posse junto com o prefeito,

subsídios do prefeito, vice-prefeito, secretários municipais e ve-

o titular. Antes era uma expectativa de cargo: era uma função

readores serão fixados com observância do que dispõe o aqui

esdrúxula, já falei isso aqui. Tinha de ficar torcendo para o prefeito

citado artigo 39, parágrafo 4º.

quebrar uma perna, morrer, sei lá o quê. Agora não, é cargo e ele ganha para isso.

Além disso, deve o vice-prefeito, ao assumir cargo na Adminis-

90

tração Pública, fazer a opção por uma das duas remunerações,

Sendo certo que com o advento da Emenda Constitucional 19/98

em face do art. 37, inciso XVI, da Constituição Federal, que veda

o vice-prefeito passou a ter o status de agente político, tendo

a acumulação remunerada de cargos, empregos e funções públi-

sido, inclusive, lhe assegurado o recebimento de salário, já que

cas.”

passou a ser cargo, conforme entendimento firmado pelo Con-


selho Pleno do eg. Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (Consulta nº 699969 anteriormente transcrita e em cópia anexa),

* José Eduardo Lewer de Amorim é bacharel em Direito com graduação

e em consonância da EC 19/98, concluímos que:

em 1986 pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora – MG. Advogado autônomo militante na capital e no Estado de Mi-

1 - Para candidatar a cargo diverso, deve o vice-prefeito afastar-

nas Gerais em todas as áreas do Direito, com interesse e dedicação maior

se de seu cargo (vice-prefeito – cf. se infere da EC 19/98 e da Con-

pelo ramo do Direito Público. Membro do IBDAFM – Instituto Brasileiro

sulta do TCEMG 699969), como outro servidor qualquer, uma vez

de Direito de Família, integrante da Comissão de Expansão, eleito cola-

que tal afastamento é determinação legal além de que no cargo o

borador para a Regional da cidade de Juiz de Fora. Desde 1988, no que

desequilíbrio do processo eleitoral será evidente.

se refere às atividades de Direito Público, teve a oportunidade de prestar assessoria jurídica a diversas câmaras de vereadores, municípios, vereado-

2 - Se exerce função na Administração, seja por ato de nomeação

res e prefeitos do Estado de Minas Gerais. No ano de 1994 foi nomeado

do Executivo seja por previsão na Lei Orgânica do município, deve

procurador geral do município de Ribeirão das Neves. Exerceu o cargo de

ser exonerado do cargo no prazo da Lei e como outro servidor

superintentende administrativo do IMAG – Instituto Mineiro de Apoio

qualquer.

aos Governos Municipais. É membro fundador da Associação Brasileira de Estudos de Contabilidade e de Direito Público – ABEP. Atualmente ocupa

3 - Ainda que se considere que o vice-prefeito não tem cargo, o

o cargo de chefe de gabinete do conselheiro do Tribunal de Contas do

que contraria o entendimento do eg. Tribunal de Contas do Esta-

Estado de Minas Gerais, Dr. Antônio Carlos Andrada.

do e a determinação da EC. 19/98, deve então deixar de receber salário, pois que além de imoral o recebimento de salário sem ocu-

-----------------------------

par cargo ou desenvolver função, o dinheiro público recebido pelo

A NATUREZA JURÍDICA DO PARECER PRÉVIO

vice-prefeito não pode ser utilizado em sua campanha eleitoral, o

EMITIDO PELOS TRIBUNAIS DE CONTAS ESTADUAIS

que seria flagrantemente imoral.

E ADMISSIBILIDADE DE RECURSO 1

Acreditamos que o processo eleitoral, dada a sua importância para

Antônio Carlos Doorgal de Andrada2

o destino da cidade, do Estado e do País, deveria dar mais atenção à figura do candidato a vice, notadamente ao vice-prefeito,

RESUMO: O parecer prévio emitido pelos Tribunais de Con-

pois não são raros os casos em que o prefeito não passa de uma

tas estaduais tem natureza decisória ou é instrumento

fachada e a formação de chapas, com a escolha do “vice certo”,

meramente opinativo para o julgamento das contas do

não passa de uma artimanha engendrada para conduzir pessoas nem tão bem intencionadas assim ao comando dos destinos de

1 Artigo baseado em parecer emitido no processo administrativo TC-

centenas e milhares de pessoas. Deve se verificar a Lei Orgânica do

652.562, apresentado em Plenário.

município para se saber se há previsão expressa de o vice-prefeito

2 Mestrando em Direito e Instituições Políticas na Faculdade de Ciências

ocupar cargo. Deve se verificar se o vice-prefeito está nomeado

Humanas da FUMEC. Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de

para outro cargo, enfim, o vice-prefeito deve ter um tratamento

Minas Gerais. Bacharel em Direito. Especialista em Direito Público (PUC-

diferenciado diante das novidades trazidas pela EC 19/98.

MG) e em Controle da Administração Pública (CAD-Gama Filho/RJ). Foi vereador e prefeito de Barbacena e deputado estadual.

91


chefe do Executivo, pelos Poderes Legislativos? Para além

recer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a

do que preconiza a doutrina tradicional do Direito Admi-

Administração ou os particulares à sua motivação ou con-

nistrativo brasileiro, o parecer prévio deve ser considerado

clusões, salvo se aprovado por ato subseqüente. Já, então,

uma modalidade jurídica especial e autônoma, sobretudo

o que subsiste como ato administrativo não é o parecer,

pelo seu viés vinculante e por integrar etapa instrutória do

mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a

julgamento legislativo.

modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva. O

PALAVRAS-CHAVE: parecer prévio, Tribunais de Contas, jul-

parecer, embora contenha um enunciado opinativo, pode

gamento legislativo, ampla defesa e recurso.

ser de existência obrigatória no procedimento administrativo e dar ensejo à nulidade do ato final se não constar do

ABSTRACT: Previous seeming emitted by the Courts of sta-

processo respectivo, como ocorre, p.ex., nos casos em que a

te Accounts they have power to decide nature or is mere

lei exige a prévia audiência. Nesta hipótese, a presença do

opinativo instrument for the judgment of the accounts of

parecer é necessária, embora seu conteúdo não seja vin-

the Head of the Executive, for Legislative them? For beyond

culante para a Administração, salvo se a legitimidade do

the one that praises the traditional doctrine of the Bra-

ato final, caso em que o parecer se torna impositivo para a

zilian Administrative law, previous seeming a special and

Administração. (MEIRELES, 2006, p.176).

independent legal modality must be considered, over all for its binding bias and integrating instrutória stage of the

Como se infere das lições extraídas dos mestres supracita-

legislative judgment.

dos, a natureza do parecer, no sentido em que foi explica-

KEYWORDS: To seem administrative, to seem previous,

do, encerra conteúdo por essência opinativo, desenvolvido,

Courts of Accounts, judgment of the public accounts, con-

pela sua natureza, sem princípios e garantias proces-

tradictory and legal defense petition and right.

suais, e ademais carente de qualquer atributo de decisão propriamente dita, o que afasta de plano qualquer possibi-

1. O Parecer no Direito Administrativo

lidade de insurgir-se contra seu conteúdo por via recursal.

Ponto de fundamental importância é o critério para uma

Nesta linha, bem explica o professor Diógenes Gasparini

correta caracterização do que realmente seja o parecer

(2006) que:

prévio emitido pelo Tribunal de Contas. Doutrinariamente, vários autores pátrios militantes na área do Direito Admi-

O parecer não pode ser atacado por recursos administrativo

nistrativo abordam o conceito de parecer, de maneira am-

ou judicial, pois não se dispõe a declarar, a certificar, criar,

pla e genérica. O Mestre Celso Antônio Bandeira de Melo,

alterar, transferir ou extinguir direitos e obrigações. Com

bastante econômico, afirma que parecer “é a manifestação

efeito, decidiu o então TFR que “Descabe mandado de se-

opinativa de um órgão consultivo expendendo sua apre-

gurança quando não há ato administrativo do qual emane

ciação técnica sobre o que lhe é submetido”. Hely Lopes

suposta coação ou ilegalidade. Parecer, por não ter força

Meireles (2006), a seu turno explica:

vinculante, dado seu caráter meramente opinativo, não é ato administrativo” (RDA, 149:257) decisório.

Pareceres administrativos são manifestações de órgãos téc-

92

nicos sobre assuntos submetidos à sua consideração. O pa-

Entretanto, o nosso trabalho fundamental é reintroduzir a


discussão acerca da natureza jurídica do parecer prévio da

crivo. É a partir desta constatação que emerge a impor-

lavra do Tribunal de Contas no intuito de se verificar se o

tância do Tribunal de Contas ao emitir seu parecer sobre as

mesmo se amolda aos tipos de pareceres “tradicionais” do

contas do chefe do Executivo, objetivando, com a isenção e

direito administrativo ou se carreia, per si, características

a imparcialidade típicas destes órgãos colegiados, dar ao indiví-

próprias, particulares, que o distingue dos demais e lhe exi-

duo (prestador) e à sociedade a garantia da escorreita interpretação

ge tratamento de instituto jurídico apartado e autônomo.

da Constituição e da Lei. (grifo nosso) (FERRAZ, 2001, p.154).

2. O parecer prévio e o seu poder vinculante

3. O processo de julgamento das contas do Chefe do Executivo

Entendemos que a terminologia parecer prévio utilizada para a manifestação dos Tribunais de Contas é tecnicamen-

Delineando o raciocínio, faz-se mister, agora, a exata com-

te incorreta, à medida que dada a singularidade do processo

preensão do sui generis processo de julgamento de contas

de julgamento das contas globais do chefe do Executivo -

do chefe do Executivo por parte do Parlamento. Em verda-

assentada na forma como se desenvolvem os atos que cul-

de, trata-se de um todo único, mas de natureza complexa, à

minam com a emissão do parecer prévio e posterior decisão

medida que desenvolvido em momentos e esferas distintas:

final do Parlamento – quer significar que o parecer prévio

um, anterior, no âmbito do Tribunal de Contas, cuja ma-

emitido representa muito mais que um mero instrumento

nifestação preparatória é a exaração do parecer prévio e

técnico-opinativo que se presta unicamente a subsidiar o

outro, subseqüente, no âmbito do Legislativo, da qual deflui

julgamento político por parte do Poder Legislativo.

o julgamento propriamente dito.

Por isso, particularmente, defendemos que não faz sentido

Como se observa, trata-se de um procedimento administra-

tentar classificar o parecer prévio dos Tribunais de Contas

tivo de natureza especial, não se confundindo com o pro-

em função de qualquer dos diversos critérios tradicionais

cedimento administrativo comum ou ordinário ou mesmo

existentes. Na verdade, como já introduzido, possui carac-

com ato administrativo complexo (1), uma vez que, in casu,

terísticas próprias e singulares que o afastam destes mode-

os atos emanados por cada esfera no curso do procedimen-

los. Nesse viés, a evolução de paradigma sobre a questão

to têm existência autônoma conquanto não absoluta, uma

partiu de um novo olhar que alguns estudiosos passaram

vez que o decidido no Tribunal de Contas pode ser ratifi-

a lançar. Nessa direção, aos Legislativos, no momento de

cado ou contraposto no Parlamento, e neste caso, a exigir

finalizar o processo de julgamento das contas globais do

motivação e quorum qualificado.

Executivo, não é dado simplesmente ignorar o parecer

Com efeito, não obstante o ato final pertencer à exclusiva

prévio, omitindo-se de julgá-lo ou desprezar seu conte-

competência do Legislativo, o parecer prévio do Tribunal

údo sem expressar, motivada e tecnicamente, as razões

de Contas cumpre função preparatória, devendo o proces-

pelas quais o fazem. Em qualquer dessas duas hipóteses,

so administrativo de julgamento de contas ser enquadrado

a conduta do Parlamento será ilícita.

na espécie que o publicista italiano Mário Bracci intitula

Na prática, não se deve olvidar que os Parlamentos são ór-

“procedimento expressivo de manifestação complexa”,

gãos políticos por excelência, que não raro se apegam às

entendido como tal a “... sucessão de atos distintos prove-

paixões partidárias para apreciar os fatos colocados a seu

nientes de órgãos distintos para chegar-se ao ato final...”

93


(FERRAZ, 2001, p.6).

de parecer afetas ao Direito Administrativo, conforme já

É fundamental explicar que tanto no âmbito das Cortes

exposto. Ademais, é pacífico na jurisprudência brasileira o

de Contas como no Poder Legislativo, o procedimento,

entendimento de que os Tribunais de Contas devem, nos

propriamente dito, desenvolve-se sob a chancela dos

processos de sua competência, franquear aos interessados

princípios constitucionais do contraditório e ampla de-

a possibilidade do exercício da ampla defesa e do contra-

fesa, sendo facultado e franqueado ao agente político

ditório (2). Ademais, a reforçar os aspectos peculiares que

a utilização de qualquer meio lícito para fundamentar

encerram o parecer prévio, e que lhe alçam a uma condição

sua defesa, apresentar alegações ou fazer apontamen-

para além de simples instrumento opinativo, estão a) a ne-

tos que entender necessários.

cessidade de quorum ultraqualificado para sua desconsti-

Ora, no caso específico do denominado parecer emitido pe-

tuição e b) as razões a serem expendidas para que ele deixe

los Tribunais de Contas, verifica-se, em verdade, a existência

de prevalecer: assim, em relação ao chefe do Executivo mu-

de um verdadeiro processo cognitivo exauriente, destinado

nicipal, o parecer do Tribunal só deixará de prevalecer com

a formar a convicção daqueles que têm o múnus de pro-

a expressa manifestação contrária de dois terços do Poder

ferir um provimento ao final deste. Portanto, como já nos

Legislativo, conforme disposto no art. 31, § 2º. da CF/88, qu-

ensinava o mestre processualista Elio Fazzalari, o processo

orum este superior ao necessário para, por exemplo, apro-

é o procedimento desenvolvido em contraditório. Assim,

vação de emendas constitucionais, exigindo-se ainda que a

ao permitir que os interessados apresentem suas alegações

recusa do acatamento da manifestação do Órgão de Con-

no curso do iter do julgamento das contas desenvolvido no

trole seja devidamente motivada, sob pena de nulidade.

âmbito desta Corte, configurar-se-ia a presença do proces-

Doutra parte, a ratificação do posicionamento exarado pelo

so e conseqüentemente seus desdobramentos, incluindo a

Parlamento tem como motivação do ato o próprio parecer

manifestação final, ou melhor, dizendo, o decisum e, por

prévio da lavra da Corte de Contas. Sobre essa necessida-

conseguinte, o direito constitucional de ele recorrer. Isso,

de de motivação para desconstituição do parecer prévio,

aliás, coaduna com sentido do mandamento constitucional

cristalinas são as palavras do professor Dutra de Araújo

que atribui o viés amplo à defesa a ser franqueada aos inte-

(1992):

ressados. Portanto, ampla defesa quer significar que ela poderá e deverá ser desenvolvida com todos os meios possíveis

É claro que, se dada questão técnica é controversa, não se

e disponíveis, e indubitavelmente não há como prescindir

há de exigir que o administrador – comumente um leigo

da via recursal.

no assunto – vá necessariamente ter como descobrir qual a melhor postura, mas ao tomar a decisão terá que, na moti-

4. O parecer prévio como etapa processual

vação do ato administrativo, explicar como e sob que critérios chegou à conclusão de ser este ou aquele o melhor

94

Para, além disso, o respeito ao princípio constitucional do

comportamento. Certamente o fará invocando os subsídios

contraditório, observado no curso da emissão do “parecer

de parecer técnico elaborado por especialistas. Se não pro-

prévio” na esfera dos Tribunais de Contas, não é um mero

var, pela motivação que buscou a melhor opção técnica,

detalhe, mas por si só condição suficiente para diferenciar,

inválido será o ato (ARAÚJO, 1992, p. 78).

de plano, esta figura daquelas modalidades tradicionais


Nesse sentido, em farta jurisprudência do Tribunal Superior

processo n.º 4958-02.00/00-3 - assim transcrito:

Eleitoral - TSE, verifica-se que as contas municipais julgadas irregulares pela Câmara Municipal, cujo fundamento con-

Com efeito, se, como reiteradamente se repete neste soda-

substanciou-se no parecer prévio, exige propositura de

lício, a verdadeira atipicidade do parecer... decorre do fato

ação no âmbito daquele Tribunal - e agora concessão

de o mesmo “nascer com força de decisão”, .... , reconheça-

de liminar – para desconstituir a manifestação das Cortes

se no particular, seu alcance decisório para os fins de se

de Contas e permitir ao interessado concorrer ao cargo ele-

sujeitar à apelação (nos exatos termos do art. 157, ... , do

tivo pretendido (3).

diploma regimental).

Esse é o entendimento que se deflui do RECURSO ESPE-

Destarte, este é inclusive o entendimento assente em diver-

CIAL ELEITORAL nº 16.625 – PARAÍBA (Decisão prolatada

sos Tribunais de Contas estaduais do país, tais como os de

em 12/9/2001), relator ministro Waldemar Zveiter, da qual

Sergipe, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Espírito Santo,

transcrevemos a ementa:

Pernambuco e Tribunal de Contas dos municípios da Bahia, dentre outras. Nestes, seja implícita ou explicitamente, já se

RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEI-

admite interposição de recurso em sede de parecer prévio.

TO. CONTAS. REJEIÇÃO. INELEGIBILIDADE. 1. A tempestiva propositura da competente ação judicial, visando a des-

Por derradeiro, para maior visualização do tema, deve-se

constituir parecer prévio emitido pelo tribunal de con-

destacar algumas considerações sobre os principais motivos

tas, que serviu de fundamento para rejeição de contas

alegados para o não conhecimento de recurso em parecer

pela Câmara Legislativa, enquadra-se na ressalva preconi-

prévio pelos defensores de tese contrária ao aqui defen-

zada na LC n. 64/90, art. 1º, I, g.

dido: a) não-recebimento do recurso pelo fato da não ca-

2. Precedentes

racterização de cerceamento de defesa, haja vista que as

3. Recurso não conhecido. (sem destaque no original)

Cortes de Contas, em geral, franquearam aos interessados, previamente, a oportunidade de se manifestar sobre as irregularidades verificadas; e, b) falta de interesse de agir,

5. O condão decisório do parecer prévio e seus efeitos

caracterizado pela ausência de prejuízo ou gravame, sofrido

legais e políticos

pela parte ou interessado. Em relação ao primeiro ponto, cabe frisar, de início, que se deve franquear ao interessado

Seria o caso da seguinte indagação: se a desconstituição do

o respeito às garantias ao contraditório e ampla defesa, e,

parecer não prescinde de ação judicial, como sustentar que

portanto, sob esse prisma, a manifestação prévia do inte-

possui natureza meramente opinativa? Ora, a resposta passa

ressado estaria ajustada aos ditames constitucionais a não

obrigatoriamente pela consideração de que o parecer prévio

caracterizar a violação ao direito de defesa.

emitido pelo Tribunal de Contas reveste-se de condão eminentemente decisório, aqui considerado em sentido amplo.

Entretanto, a abordagem pode e deve se dar sob outro enfo-

O mesmo entendimento externou o Ministério Público jun-

que. A questão passa pela diferença entre as naturezas das

to ao Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul,

alegações apresentadas previamente e aquelas apresentadas

com o seguinte posicionamento - Parecer n.º 0669/2001,

em sede recursal. Ora, a primeira manifestação, geralmente,

95


diz respeito tão somente aos apontamentos listados pela

de trazer as palavras de Luiz Carlos Gambogi, que em seu

unidade técnica dos Tribunais de Contas, sem ter passado

artigo “O parecer prévio nas contas do executivo munici-

ainda pelo crivo das respectivas Auditorias, do Ministério

pal e os recursos a ele inerentes”, publicado na revista do

Público Especial junto aos Tribunais e do próprio Plenário,

TCMG nº 04, edição 01, de 2000, ao tratar da repercussão

este detentor da última palavra. Portanto, no curso do iter

da emissão do parecer prévio na esfera do prestador, senão

processual esta manifestação pode ainda não refletir tudo

vejamos:

que será consolidado no curso da instrução. Nesse meio tempo, poderão surgir fatos, elementos ou documentos

Não se pode esquecer que o parecer prévio emana de uma

novos que poderão compor as justificativas do interessado.

instituição que goza de crédito e de prestígio. A publicação,

Qual então o momento de apresentá-los? Exatamente na

ainda que sob o rótulo de parecer prévio, no Diário Ofi-

via recursal, até como forma de assegurar de forma eficaz

cial, de deliberação pela rejeição das contas afeta interesses

os princípios da ampla defesa e do contraditório.

substanciais em importantes direções. Se, por exemplo, a egrégia Corte emite parecer prévio desfavorável ao presta-

Ademais, o recurso presta-se a hostilizar especificamen-

dor (prefeito ou ex-prefeito), haverá a inversão do ônus do

te a parte dispositiva da manifestação final das Cortes de

quorum. Isto é, o prestador ficará obrigado a mobilizar e a

Contas, oriunda, agora sim, de uma cognição exaustiva e

convencer dois terços dos membros da Câmara Municipal

com os fundamentos à disposição do interessado, inclusive

para que suas contas não permaneçam rejeitadas e, ele, su-

material probante não disponível quando da apresentação

jeito à ira da LC N. 64/90 (inelegível). Por outro lado, se a

das alegações prévias. Sendo assim, a manifestação prévia

egrégia Corte emite parecer prévio favorável ao prestador,

não exclui o recurso. São institutos diferentes e com obje-

o ônus do quorum recairá sobre aqueles que vêem razões

tivos diferentes. Até porque é fundamental que o parecer

para que sejam rejeitadas as contas apresentadas. Em suma:

prévio exarado pelas Cortes de Contas reflita de forma mais

o prejuízo do prestador, quando o parecer prévio lhe é des-

fidedigna possível o resultado do processamento das contas

favorável, é flagrante, incontroverso, indiscutível. Ademais,

globais do chefe do Executivo e isso passa por um esgo-

é de se lembrar que nos termos do parecer prévio sempre

tamento cognitivo que não prescinde da utilização da via

estará estampado um juízo sobre a honra e a dignidade do

recursal, por todos os motivos alegados anteriormente.

prestador. Ora, um parecer recomendando à Câmara Mu-

Obviamente a apuração do viés protelatório do recurso deve

nicipal à rejeição das contas do prefeito, emitido pela mais

ser processada caso a caso, em sede de admissibilidade. Se

alta Corte de Contas do Estado, é um instrumento que con-

constatada a ausência de qualquer elemento novo que pos-

tém, em si mesmo, um fortíssimo conteúdo moral e jurídico.

sa levar à reforma da manifestação dos Tribunais de Contas,

Não à toa as correntes adversárias de um homem público,

poderá e deverá ser o recurso indeferido de plano.

ao recortarem do Diário Oficial uma decisão desfavorável ao prestador, fazem dela milhares de cópias e as espalham

96

Sobre o segundo ponto, não obstante a construção ante-

pela cidade. Sabem os adversários que naquele pequeno re-

riormente explicitada caracterizar o parecer prévio como

corte do Diário Oficial está uma ferina, senão mortal, arma

uma decisão em sentido lato – o que por si só já permite

política. Todos os Conselheiros que passaram pela vida pú-

vislumbrar a repercussão na esfera do interessado - gostaria

blica sabem que tal fato acontece. Não enxergá-lo é tentar


esconder o sol com a peneira. É negar o óbvio, o evidente, o

Considerando que a Constituição Federal consagra em seu

que não exige demonstração.

art. 5º, inciso LV, os princípios da ampla defesa e do contraditório, assegurando aos litigantes em processo judicial

6. Desnecessidade de previsão regimental para cabimento

ou administrativo e aos acusados em geral os meios e os

de recurso

recursos a ela inerentes.

Cabe, ainda, mencionar que o entendimento aqui esposado

Considerando que o recurso de rescisão, previsto na Lei

tem como base a natureza do instituto, fato este que per-

Complementar n. 33/94, foi inspirado e guarda semelhança

passa considerações de cunho meramente formal ou basea-

com a ação rescisória do CPC que, em seu art. 487, dispõe

das em interpretação literal, principalmente em face de este

quem tem legitimidade para propor ação desta natureza.

ser um dos argumentos utilizados por alguns doutrinadores

Considerando, ainda, que o recurso de rescisão deve caber

e mesmo Cortes de Contas para não conhecer do recurso,

também contra as decisões definitivas, uma vez que em de-

qual seja, da ausência de previsão expressa no Regimen-

cisão terminativa não se examina o mérito, entendo que

to Interno. Nessa linha, inclusive, não há como se olvidar

a Lei Complementar 33/94, na parte que dispõe sobre o

a possibilidade de se admitir o recurso em parecer prévio

Recurso de Rescisão não guarda consonância com as dis-

como corolário do direito de petição, constitucionalmen-

posições do CPC, relativas à ação rescisória e, sobretudo,

te previsto. Nesse contexto, assim expõe Odete Medauar

restringe o direito de recorrer dos jurisdicionados previsto

(1993), verbis:

no art. 5º, inciso LV da Lei Magna Federal. Destarte, em face da supremacia das disposições constitu-

O direito de interpor recurso administrativo independe de

cionais que consagram a ampla defesa e o contraditório,

previsão expressa em lei ou demais normas, visto ter respal-

recebo a petição protocolizada sob o n.º 180758-01, uma

do no direito de petição, que no ordenamento pátrio vem

vez demonstradas a legitimidade da parte e a tempestivi-

consignado pela Constituição Federal, art. 5º XXXIV, “a”, in-

dade do recurso, nos termos do art. 279 da Resolução TC

tegrante do rol dos direitos e garantias fundamentais (ME-

nº 10/96. (RECURSO DE DECISÃO n. 708641 – www.tce.

DAUAR, 1993, p. 14 e 15).

mg.gov.br).

Raciocínio análogo foi desenvolvido pelo conselheiro Edu-

7. Conclusão

ardo Carone Costa, presidente do Tribunal de Contas de Minas Gerais, no seu juízo de admissibilidade do “recurso

Por todo o exposto, a tese do cabimento de recurso contra

de rescisão” n. 708641 e que demonstra uma postura que

manifestação dos Tribunais de Contas em sede de parecer

transcende a simples disposição textual do Regimento In-

prévio deve prevalecer por estar plenamente de acordo com

terno. Neste, não obstante o recorrente buscar hostilizar

os princípios constitucionais vigentes, especialmente os que

decisão definitiva e não terminativa como prevê textual-

se referem ao contraditório e ampla defesa, sobretudo pela

mente aquele diploma normativo, proferiu a Presidência

sua natureza decisória – mesmo que em sentido amplo

posicionamento pela admissibilidade do recurso nos se-

– como aqui amplamente demonstrado.

guintes termos:

97


Citações

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Câmara dos Deputados. Brasília: Centro de Documentação e

(1) A exata diferenciação do porquê do julgamento das

Informação/Coordenação de Publicações, 2005.

contas globais configurar um procedimento administrativo e não um ato complexo, pode ser depreendida de Luciano

FERNANDES, . Tribunais de Contas

Ferraz (2001), a partir dos ensinamentos por ele trazidos de

do Brasil. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2005.

Mário Bracci e Celso Antônio Bandeira de Melo. (2). E parece ser este o posicionamento da Corte de Contas

FERRAZ, Luciano. Controle da Administração Pública: ele-

de Minas Gerais materializado no disposto no art. 184 do

mentos para compreensão dos Tribunais de Contas. Belo

seu Regimento Interno, ao referir-se especificamente à fi-

Horizonte: Mandamentos, 1999.

gura do processo e sua instrução e ainda votação em sessão da Câmara, órgão de deliberação e decisão daquela Casa,

_______. Due process of law e parecer prévio das Cor-

senão vejamos, verbis: “Art. 184 – Verificada a correta ins-

tes de Contas. In. Diálogo Jurídico. Ano I. n. 9. Salvador,

trução do processo, o relator, em sessão, oferecerá rela-

dez./2001.

tório e voto”. (sem grifo no original) GAMBOGI, Luis Carlos. O parecer prévio nas contas do Exe(3) Cabe menção à recentíssima decisão do TSE, prolatada

cutivo Municipal e os recursos inerentes. In.: Revista do

em 24/8/2006. Nesta, o Colendo Tribunal alterou o posicio-

Tribunal de Contas de Minas Gerais. n. 04. 1. ed. Belo Ho-

namento acerca da interpretação da Lei de Inelegibilidade

rizonte, 2000.

(LC 64/ 1990), consolidada na súmula TSE 01/1992, que permitia que o candidato que tivesse suas contas rejeitadas pe-

GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 11. ed. São

los Tribunais de Contas pudesse concorrer ao mandato ape-

Paulo: Saraiva, 2006.

nas com ingresso de ação no Poder Judiciário. Agora, com o novo entendimento, é necessário, para além da ação, que

MEDAUAR, Odete. A processualidade no Direito Adminis-

o interessado consiga sentença – ainda que liminar – que

trativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993.

fundamente o motivo pelo qual o seu direito de disputar a eleição pode ser assegurado.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

Referências

TRIBUNAL DE CONTAS DE MINAS GERAIS. Recurso de Rescisão n. 708641. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa.

ARAÚJO, Dutra de. Motivação e controle dos atos adminis-

Disponível em <www.tce.mg.gov.br>.

trativos. Belo Horizonte: Del Rey, 1992. TRIBUNAL DE CONTAS DE MINAS GERAIS. Resolução n.

98

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Ad-

10/96. Regimento Interno do Tribunal de Contas de Minas

ministrativo. 19 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2005.

Gerais. Disponível em <www.tce.mg.gov.br>.


TRIBUNAL DE CONTAS DO RIO GRANDE DO SUL. Parecer n. 0669/2001 do Ministério Público do Rio Grande do Sul no Processo n. 4958-02.00/00-3. Disponível em <www.tce.rgs. gov.br>. TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Recurso Especial Eleitoral n. 16.625/PB. Rel. Min. Waldemar Zveiter. Decisão prolatada em 12/9/2001. Disponível em <www.tse.gov.br>.




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