Memórias

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Mem贸rias

Alessandra Sumitani Kamimura

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Ficha Catalográfica Elaborada pelo Sistema de Bibliotecas e Informação - SBI - PUC-Campinas

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Kamimura, Alessandra Sumitani. Memórias / Alessandra Sumitani Kamimura. - Campinas: PUC-Campinas, 2013. 100p. Orientador: Helder Manuel da Silva de Oliveira. Monografia (conclusão de curso) - Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Centro de Linguagem e Comunicação, Faculdade de Artes Visuais. Inclui bibliografia. 1. Fotografia. 2. Memória. 3. Fotomontagem. I. Oliveira, Helder Manuel da Silva de Oliveira. II. Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Centro de Linguagem e Comunicação. Faculdade de Artes Visuais. III. Título. 22.ed. CDD – m770

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Ă€ todos aqueles que procuram construir em seu presente, o passado da qual poderĂŁo se lembrar com orgulho depois.

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“O melhor álbum de fotografia é a nossa memória, nela ficam gravadas fotos reais de momentos bons e ruins de nossa vida.” - Márcia Reis

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AGRADECIMENTOS Em especial, agradeço primeiramente aos meus pais, que me deram a base sobre onde construí tudo aquilo que sou hoje. Agradeço também à minha irmã, que me ensinou a ver os desafios de forma diferente e a me soltar mais para o mundo. Além deles agradeço também à minha prima Carol e às minhas amigas Elaine, Juliana, Alani, Laiz e Larissa, com quem vivenciei muitos momentos e gravei muitas memórias que ficarão para sempre, mesmo quando a distância ou o tempo não nos permitir uma rotina de conversas e encontros. À todos os amigos com quem não tenho tantas memórias físicas, mas com quem passei muitas horas conversando, mesmo que somente na internet. Aos meus professores e grandes mestres, com quem aprendi não somente a teoria de diversas matérias, mas muito mais do que poderia aprender sozinha sobre a vida e tudo que a cerca. E enfim, mas não menos importante, meus agradecimentos vão a todos aqueles que compartilharam momentos e memórias comigo, sejam elas boas ou ruins. Porque mesmo que nem todas as memórias sejam um sonho passado, elas contribuíram diretamente para que eu me tornasse quem sou hoje.

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RESUMO Neste trabalho, abordo os principais pontos em comum da fotografia e da memória, questionando a relação entre ambas e as consequências (boas ou ruins) que ela traz para todos os que vivem neste mundo moderno, onde a fotografia é uma parte constante do cotidiano. Tento abordar a importância da fotografia para a memória, assim como a importância da memória para compreender plenamente aquilo que é fotografado. Palavras chave: Fotografia, Memória, Fotomontagem.

ABSTRACT In this work I discuss the main points in common of photography and memory, questioning the relationship between them and the consequences (good or bad) that they brings to all who live in this modern world, where photography is a constant part of everyday life. I try to address the importance of the picture to memory as well as the importance of memory to fully understand what is photographed. Keywords: Photography, Memory, Photomontage.

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SUMÁRIO

Dedicatória...............................................................................03 C it a ç ã o. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 0 5 Agradecimentos...........................................................................................07 Resumo / Abstract.........................................................................................................09 Introdução......................................................................................................................................13

A luz e a fotografia..................................................................................................18

Revivendo Memórias..................................................................................................21 Construindo Memórias.............................................................................................31 Referências Artísticas.................................................................................................57

Steve Mccurry..........................................................................................................60

Sara K. Byrne..........................................................................................................64

Jerry Uelsmann.......................................................................................................68

John Clang...............................................................................................................72

Chuck Close.............................................................................................................76

Daniel Escobar.........................................................................................................78

Jamie Poole.............................................................................................................82

Vik Muniz................................................................................................................86

Considerações Finais..................................................................................................91 Referências Bibliográficas..........................................................................................97 11


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INTRODUÇÃO

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o dicionário da língua portuguesa, a palavra memória está definida como a “faculdade de reter as ideias adquiridas anteriormente; lembrança; reminiscência”. Para a ciência, trata-se da capacidade de adquirir, armazenar e recuperar posteriormente informações tornando possível o seu uso na geração de novas ideias ou conhecimentos. A fotografia, com a sua capacidade de gravar momentos, trouxe às pessoas a possibilidade de armazenar imagens e tornou-se um dos modos mais usados para trazer eventos do passado à memória. Com ela, podemos trazer à tona momentos ou pessoas importantes de nossas vidas e recordar a partir daquelas imagens aquilo que sentimos ou pensamos em um determinado momento da vida. Neste ponto, podemos comparar a memória a um álbum de fotografias, em que podemos acessar os mais diversos dados de eventos já ocorridos ou pessoas conhecidas. É através deste ‘álbum de fotografias da memória’ que podemos rever ações ou momentos de nossas vidas e tirar deles o conhecimento que formará o ‘eu’ do presente ou do futuro. Nós, seres vivos, 15


somos formados por nossas ações e conhecimentos específicos. Em um grande emaranhado de características, o nosso ‘eu’ vai sendo formado e modificado assim como um álbum de fotografia vai sendo preenchido com o passar dos anos. O número de memórias que carregamos aumenta gradativamente conforme vivemos, e são armazenadas com mais ou menos importância dentro de nossa mente. Graças a esse armazenamento contínuo, as memórias vão se tornando cada vez mais numerosas e difíceis de acessar conforme os anos passam, e em alguns momentos, perdem-se em meio a todos os acontecimentos vividos por nós, indivíduos. Com a invenção da fotografia, podemos regis16

trar os mais diversos momentos de nossa vida para que, posteriormente, possamos trazer a superfície uma memória há muito enterrada dentro de nossa mente mesmo após muitos anos. É através da fotografia que conseguimos trazer à tona muitas memórias e a sua presença torna mais fácil o compartilhamento de um passado com outro indivíduo. Desde a invenção da fotografia, tornou-se possível ter acesso a momentos vividos por nós ou por outras pessoas, desde que estes tenham sido gravados e guardados para posterior apreciação. Com ela, podemos também conhecer pessoas que não conhecemos pessoalmente, ou vivenciar momentos de terceiros mesmo que não tenhamos feito parte daquele momento


específico. Esta técnica tornou-se um método comumente utilizado pelas pessoas para armazenar momentos importantes de suas vidas e tornou-se também um modo de ilustração do passado que antes só era possível através da própria memória, daverbalização dos momentos vividos ou de sua representação artística a partir de diversas técnicas de ilustração manual. A obra ‘Memórias’ tem como objetivo o ‘fazer pensar’ desses aspectos e pontos em comum da fotografia e da memória, e tem como meio de criação a própria fotografia em sua forma digital que é posteriormente impressa em grande escala. Utilizando fotografias digitais da vida de uma pessoa de modo a preencher o vazio de um retrato, a obra cria imagens de pesso-

as preenchidas por suas memórias, sejam elas numerosas ou não. Essa retratação torna possível ver e analisar a vida que aquela determinada pessoa teve até ali, tornando possível até mesmo acessar momentos de sua vida e conhecê-la através de suas memórias. Além disso, ao observar as fotos que compõem o ser, pode-se perceber o número de memórias que aquele indivíduo acumulou até ali, e quais foram os momentos mais importantes de sua vida que este selecionou para fotografar e guardar.

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A Luz e a Fotografia

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ara que possamos compreender plenamente o ato fotográfico, precisamos primeiro entender a luz, pois é a partir dela que as imagens fotográficas se formam. A luz é uma forma de energia eletromagnética que é captada por nossos olhos e se propaga em linha reta e velocidade constante. Algo importante a se entender da luz é que ela pode se refletida, absorvida e transmitida. Quando refletida, a luz deixa de ser um único raio e propaga-se para todos os lados, e é a partir dessas reflexões que a fotografia é feita. Passando pelo orifício da câmara escura, a

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imagem é projetada de forma invertida e de cabeça para baixo, uma forma semelhante àquela que é captada pelos olhos dos seres humanos. E, utilizando um material capaz de absorver a luz e posteriormente fixar as informações obtidas por essa reflexão, passa-se a obter a fotografia. A fotografia teve seu início a partir da observação da luz e das suas propriedades e, ao contrário do que muitos pensam, ela teve diversos inventores, que desenvolveram seus estudos ao mesmo tempo chegando às conclusões necessárias para o desenvolvimento da técnica. Muitos anos antes de Cristo, Aristóteles já havia iniciado seus estudos sobre a luz, ao observar a luz proveniente de uma eclipse ser refletida no chão ao passar por entre as folhas de uma árvore. No início do século XI, surgiu as primeiras descrições da câmara escura e no século XIV ela já era utilizada no auxílio para o desenho. Nesta época, a câmara escura ainda possuía proporções muito grandes, sendo composta de uma sala onde em uma das paredes era realizado o orifício de entrada de luz e na parede oposta a imagem era refletida no branco pintado. A partir disso, a câmara escura foi sendo adaptada às necessidades de maior nitidez ou tamanho menor. Com a inclusão de uma


lente biconvexa em 1550, sugerida pelo físico Girolamo Cardano, conseguiu-se melhorar a nitidez da imagem sem perder a luminosidade (um problema encontrado nas primeiras câmaras escuras). A partir disso, e unindo a câmara escura à descoberta de Angelo Sala, em 1604, do escurecimento de um composto de prata em contato com a luz, que a fotografia passou a ser desenvolvida. Durante todo o século XIX, a fotografia foi sendo aos poucos pesquisada e aperfeiçoada por diversos cientistas e artistas, criando cada vez mais a possibilidade de gravação dos momentos a partir da luz. No início, o principal problema encontrado foi quanto à fixação da imagem, pois antes da descoberta do elemento fixador, as imagens se perdiam após pouco tempo graças à ação contínua da luz sobre o composto de prata. Graças a isso, diversas pesquisas foram feitas, e foi somente após a descoberta do elemento fixador que a fotografia finalmente pôde ser eternizada (dentro dos limites do material utilizado), e com elas as memórias de cada um. Em seus primeiros anos, a fotografia era um tipo de representação muito caro, somente possível àqueles com melhores condições financeiras. Foi somente em torno do ano de 1888

que a Kodak iniciou a produção de câmeras mais simplificadas e passou a pesquisar meios de tornar a fotografia mais popular e de fácil acesso ao público. A partir disto, as câmeras fotográficas passaram a ser vendidas, e não era mais necessário o estudo da fotografia para se fotografar. A grande propaganda da empresa na época era justamente que qualquer um poderia apertar o botão e a companhia do Sr. Eastman faria o resto. Após o lançamento de sucesso de suas primeiras câmeras, a empresa passou a pesquisar formas de tornar a fotografia ainda mais simples, criando os rolos de filme e posteriormente realizando pesquisas para a fotografia em cores. A partir daí, a fotografia decolou, e o acesso a ela vêm se tornando cada vez mais fácil com a invenção da fotografia digital e da alta tecnologia distribuída em diversos equipamentos. Atualmente, a fotografia tornou-se algo comum a todos, e qualquer um pode preservar os momentos de suas vidas com um simples clicar. O fácil acesso à tecnologia acoplada em celulares, tablets ou câmeras digitais vem tornando o ato de fotografar em algo sempre presente no dia a dia das pessoas e a fotografia vem se tornando cada vez mais algo quase obrigatório em eventos ou momentos de cada um.

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REVIVENDO MEMÓRIAS

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s memórias sempre foram importantes para mim. Lembrar daquela pessoa especial, daquele momento importante que aconteceu há tantos anos atrás - mas que ainda posso reviver tão claramente que é como se estivesse ali - ou até mesmo, quem sabe, lembrar daquele momento recente que quero guardar para sempre na minha memória sempre foi uma das minhas atividades preferidas para os momentos de ócio. Algumas memórias, porém, perdem-se em meio a tantas lembranças e, em meio a todas estas recordações que carrego comigo, perco algum momento importante que trago dentro deste grande emaranhado dentro de mim. No meio de tantas memórias, algumas delas escondem-se e só tornam a aparecer quando algo as provoca e as chama de volta à superfície. Uma palavra, um som ou um cheiro podem trazer de volta uma memória que eu nem mesmo sabia que ainda carregava e possibilita que eu reviva aquele momento passado mais uma vez. Mas, na maior parte das vezes, aquilo que traz de volta uma memória é aquela imagem guardada com tanto carinho, feita especialmente para ter 23


Afghan Girl, Pakistan (Steve Mccurry)

a certeza de que aquele momento não seria mais esquecido enquanto a imagem durar: a foto. A fotografia sempre esteve presente na minha vida, mesmo antes que eu soubesse do que se tratava aquela caixinha preta que emitia uma luz que cegava e que era colocada entre mim e minha mãe quando eu era bebê. Foi só por volta dos seis anos que tive o primeiro contato com o trabalho fotográfico profissional, quando vi pela primeira vez o retrato ‘Afghan Girl, Pakistan’ de Steve Mccurry em que uma garota de olhos verdes olha para a câmera com uma expressão séria na capa de uma das revistas National Geographic que minha mãe costumava assinar. Lembro-me de que naquela época, não dei tanta importância para o fotógrafo em si, que conseguiu captar aquela imagem que chamou tanto a minha atenção, mas sim para o questio24

namento de ‘quem seria aquela garota?’. Eu me perguntava quem ela era, onde vivia, quem conhecia e como seria a sua vida. Mesmo que ainda fosse pequena para grandes questionamentos, lembro-me que me perguntei sobre ela por alguns instantes antes de abrir a revista e mergulhar naquele mundo de imagens que a revista trazia para uma criança que ainda mal sabia ler. Depois daquele dia, a fotografia foi se tornando cada vez mais importante para mim, seja para simplesmente observar ou para criar, como aconteceu posteriormente. Reviver momentos através da fotografia faz com que seja possível que nos lembremos de pessoas ou momentos importantes da nossa vida. Além disso, ao fotografar determinado momento, impomos certa importância a este momento em específico, categorizando-o como um momento que


gravamos porque não queremos nos esquecer dele no futuro. Susan Sontag, em seu livro “Sobre Fotografia”, comenta sobre essa visão fotográfica do mundo e dos momentos: “Ao nos ensinar um novo código visual, as fotos modificam e ampliam nossas ideias sobre o que vale a pena olhar e sobre o que temos o direito de observar. Constituem uma gramática e, mais importante ainda, uma ética do ver. Por fim, o resultado mais extraordinário da atividade fotográfica é nos dar a sensação de que podemos reter o mundo inteiro em nossa cabeça – como uma antologia de imagens.” SONTAG, 2004. Pag. 13.

Ao fotografar um momento, retemos aquele instante de modo permanente, tornando possível que tenhamos um contato quase direto com ele no futuro. A fotografia possibilita armazenar um momento tal como ele aconteceu, sem impor ou alterar nada da realidade que é gravada pela câmera. Fotografar momentos tornou-se praticamente uma obrigatoriedade nos dias de hoje. No primeiro dia de aula de uma criança, na celebração de um aniversário ou em uma reunião de família e amigos, não importa qual seja o evento, se o momento for julgado importante por aqueles que fazem parte dele, uma câmera fotográfica é um acessório quase indispensável. Com a facilidade do acesso aos recursos fotográficos, o número de fotos armazenadas torna-se cada vez maior e, com a facilidade de armazenamento desde a invenção da fotografia digital,

a quantia de fotos tiradas também aumenta. Estas fotos tornam eternos momentos que vivemos e nos fazem lembrar aquele dia especial ou daquela pessoa importante com a qual não podemos mais conviver diariamente. Olhar uma foto tirada no passado possibilita que nossa mente resgate a memória que gravamos daquele dia e comprova muitas vezes que essas memórias são reais, que realmente aconteceram. Com isso, a fotografia torna-se cada vez mais uma extensão da memória, tornando possível que armazenemos uma quantia maior de eventos e relembremos desses momentos passados através dessas fotos tiradas e armazenadas nos mais diversos meios que existem hoje. Sempre que tiramos uma foto, guardamos aquele momento ou aquela pessoa para que possamos relembrar dele depois. Essa posse física é uma extensão de nossa memória, pois, com ela, não precisamos necessariamente lembrar todos os detalhes de um rosto ou de um evento já poderemos consultá-lo na fotografia depois. Essa posse também é discutida por Susan Sontag em seu livro, quando ela fala que: “A fotografia é, de várias maneiras, uma aquisição. Em sua forma mais simples, temos numa foto uma posse vicária de uma pessoa ou de uma coisa querida, uma posse que dá às fotos um pouco do caráter próprio dos objetos únicos. SONTAG, 2004. Pág. 172

E essa posse não pertence somente àqueles que fizeram parte daquele momento ou 25


que conheceram pessoalmente quem é retratado, mas também pode pertencer a todos os outros que tiverem contato com a fotografia, como Susan Sontag aborda logo depois:

é discutido no livro ‘História e Memória’ de Le Goff, mesmo que ele esteja abordando este esquecimento através da escrita, e não da fotografia:

“(...) mediante máquinas que criam imagens e duplicam imagens, podemos adquirir algo como informação (e não como experiência).” SONTAG, 2004. Pág. 172

“Por outro lado, Platão, no Fedro [274c 275b], coloca na boca de Sócrates a lenda do deus egípcio Thot, patrono dos escribas e dos funcionários letrados inventor dos números, (...) e do alfabeto. E sublinha que, fazendo isso, o deus transformou a memória, mas contribuiu sem dúvida mais para enfraquecê-la do que para desenvolvê-la: o alfabeto “engendrará esquecimento nas almas de quem o aprender: estas cessarão de exercitar a memória porque, confiando no que está escrito, chamarão as coisas à mente não já do seu próprio interior, mas do exterior, através de sinais estranhos.” LE GOFF, 2008. Pág. 438

Esse foi o meu caso quando vi a foto de Steven Mccurry que tanto me impressionou. Eu não conhecia a garota, mas podia vê-la ali, na minha frente. A fotografia nos possibilita isso. Conhecer pessoas que não conhecemos ou até mesmo aprofundar conhecimentos sobre o passado daqueles que conhecemos. Elas carregam consigo uma história e uma lembrança que nos é transmitida através das imagens ou daquilo que a acompanha. É quase impossível que uma foto nos seja mostrada sem uma história por trás dela. Como foi tirada, onde foi tirada, por quem foi tirada... Sejam estes detalhes expostos ou não, cada foto possui a sua própria história e carrega as suas próprias memórias. Quase como um ser vivo, a fotografia carrega consigo as lembranças de sua imagem mesmo que, para que estas memórias apareçam, a foto ainda dependa de seu observador. Mas assim como a fotografia pode auxiliar a memória, ela também pode fazer com que nós a exercitemos menos, confiando na fotografia para nos lembrar dos momentos passados ao invés de os armazenarmos em nossa mente. Isso 26

Ao confiarmos nas fotografias para lembrarmos do passado, deixamos muitas vezes que as memórias sejam postas de lado, para armazenarmos novas informações. Mas este não é um fato de todo ruim, já que esse esquecimento é essencial para que a nossa memória continue funcionando. Se não selecionássemos aquilo que devemos esquecer, as memórias se acumulariam de tal forma que tornaria muito difícil o acesso de qualquer elemento específico dentro dos milhões de imagens que gravaríamos. Nossa memória seria quase como um cartão de memória lotado, onde tantas fotografias são acumuladas que é quase impossível encontrar alguma em especifico para observá-la em meio a todas as outras. Em um grupo grande demais de fotografias, o reconhecimento de suas imagens torna-se confuso, e a seleção torna-se um


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elemento indispensável para que tudo volte a ter sentido. Conforme o número de fotografias aumenta e seu arquivamento vai se tornando cada vez maior, a possibilidade de perder um momento dentre tantos também se assemelha à memória humana. Conforme gravamos os diversos momentos de nossas vidas em nossa memória, alguns deles se esvaem para que possam dar lugar a outros mais recentes ou mais importantes. Com isso, nossa memória vai aos poucos selecionando aquilo que é ou não importante de lembrar e, assim como selecionamos um momento específico para tirar ou não fotos dele, vai deixando para trás momentos julgados como neutros. Na obra ‘Memórias’, esse acúmulo de 28

informações é representado através do grande número de fotografias utilizadas para criar o retrato como um todo. Como a quantia de memórias (representadas pelas fotografias) é muito grande, a visibilidade de cada uma delas torna-se menor e, dependendo da distância do observador, não podem nem mesmo ser vistas. As fotos que formam o todo do retrato perdem sua forma quando observadas de longe, passando a ser parte de um todo, criando as impressões de luz e sombra na grande fotografia. Além disso, a obra traz também as memórias daqueles que são representados nos retratos que a compõem, através da construção de sua forma através de fotografias de sua vida. Isso possibilita àqueles que observam a obra um primeiro contato não somente com uma pessoa


desconhecida, mas também o contato com as suas memórias e acontecimentos de sua vida que o levaram até ali. Para que o observador tenha contato com estas memórias, basta que ele se interesse, dê um passo adiante e se aproxime para observar de perto todos os detalhes daquele que é representado por suas memórias. Barthes, em seu livro “A câmara clara”, discute essa relação entre fotografia e observador durante todo o decorrer de seu livro e específica seus sentimentos quando diz: “Se gosto de uma foto, demoro-me a contemplá-la. Que faço eu durante todo o tempo que fico ali, diante dela? Olho-a, perscruto-a, como se quisesse saber mais sobre a coisa ou a pessoa que ela representa.” BARTHES, 2008. Pág. 110

Neste ponto, Barthes se assemelha a muitos outros observadores que, ao entrarem em contato com uma fotografia, se perguntam quem é aquela pessoa; curioso por conhecê-lo, entendê-lo e talvez até mesmo sentindo a vontade de entrar em contato com a sua vida e as suas memórias assim como o fiz quando vi pela primeira vez o retrato da garota de Steve Mccurry. A obra ‘Memórias’ torna possível esse conhecimento, trazendo partes da vida de uma pessoa para o observador e instigando-o a conhecer aquele à quem observa, mostrando-lhe suas memórias e tudo aquilo que o formou até o momento em que o retrato foi tirado.

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CONSTRUINDO MEMÓRIAS

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ideia geral da obra Memórias surgiu a partir da importância da fotografia na minha vida e nas lembranças de meu passado. Com o costume de guardar as fotografias e usá-las posteriormente para relembrar momentos passados, percebi o quanto essas memórias são importantes para mim, e como a fotografia é importante para preservá-las. A partir dessa necessidade de lembrar (e de ser lembrada) pelas fotografias, senti a necessidade de abordar essa ligação em uma obra, representando a memória através da fotografia. A ideia inicial de desenvolvimento do trabalho foi no uso da fotografia analógica, utilizando negativos na técnica de fotograma (sobreposição do negativo no papel fotográfico e exposição à luz de modo que o objeto seja representado através do contato). A ideia era de criar fotografias com os negativos, representando com eles as memórias que esta pessoa carrega dentro de si. Refletindo sobre a ideia e questionando seu processo, procurei uma forma mais simples de torná-la real e realizar testes antes de iniciar o processo. Passei então a realizar testes com o 33


Teste 1 Fotomontagem com negativos escaneados. 34


scanner, utilizando a fotomontagem digital para obter os resultados que procurava na ideia inicial. Ao realizar este teste e ter contato com as fotografias da vida de uma pessoa, me deparei com o primeiro problema: algumas das fotografias já entravam na era digital, e quase ninguém possuía um arquivo com os negativos das fotografias de seu passado. Este impasse me fez pensar pela primeira vez sobre a fotografia digital, e a sua inclusão no processo criativo. Pensei em algumas possibilidades de fixação da imagem no papel fotográfico através de projetores, mas decidi que a qualidade final não ficaria boa, além da demora do processo de produção. Com isso e com o teste que já havia realizado, decidi me voltar de vez ao meio digital, e iniciei o desenvolvimento de meu trabalho tentando criar um autorretrato através de diversas fotografias de minha vida. Utilizando um scanner para digitalizar as fotos velhas (tiradas em uma época em que a fotografia digital ainda não existia) e um programa de edição de imagens (Photoshop), passei a construir uma montagem usando como base um retrato recente meu. Esse primeiro trabalho resultou em um refinamento das ideias gerais da obra e fez com que eu me deparasse pela primeira vez com algumas questões: a luz e sombra do retrato e a conexão com as fotografias que o formam. Após este primeiro teste, realizei outros utilizando fotos minhas, de parentes ou amigos próximos. Percebi, neste momento de criação, 35


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que para que a montagem se tornasse satisfatória, eu deveria conhecer ao menos um pouco da vida e da realidade da pessoa retratada. Isto me fez refletir pela primeira vez sobre a importância da fotografia para que nos aproximemos das pessoas, pois com elas podemos ter contato com momentos que ela viveu e pessoas que conheceu. Além disso, ao trabalhar com a fotografia digital, me deparei com um elemento que enquanto trabalhava com os negativos, eu não precisava lidar: a cor. Após a montagem de alguns trabalhos iniciais, senti a necessidade de testar as cores de diversas formas, procurando a que melhor se adaptava ao trabalho e que melhor representava o conceito de memórias e sua ligação com a fotografia. Utilizando o programa de edição de imagens para criar diferentes tonalidades e níveis de saturação das fotografias, fui aos poucos testando e percebendo os resultados que se adaptava melhor ao trabalho. Sempre que produzia um trabalho diferente, criava nele diversos testes de cores, de modo a observar como as toNas páginas anteriores: Teste 2 Auto Retrato (Cor e Sépia) 40


nalidades diferentes criavam diferentes aspectos de apreciação. E foi através destes testes que percebi que a opção em cores com a saturação aumentada era a que mais me agradava, pois parecia trazer mais memórias à tona, além de trazer sentimentos que as outras opções não me traziam. Após encontrar o resultado que mais me agradava visualmente, voltei mais uma vez ao enfoque da forma. Ao criar um teste com a foto de um bebê, percebi que o número de memórias que uma criança acumulou é bastante diferente da de uma pessoa adulta, e que isto pode ser visto claramente no número de fotografias acumuladas até então. Além disso, percebi também a relação direta entre os elementos de fundo e de detalhes das roupas que o retratado utiliza, e a sua influência direta na visibilidade das outras fotografias. Quanto mais detalhes a fotografia possuísse em questões de detalhes de roupas ou elementos externos, pior se tornava a visibilidade das fotografias utilizadas para representar as suas meTeste 3 Eirik (Cor e P&B) 41


Teste 4 Eirik e Carol

(Representação de relação entre mãe e filho)

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mórias. E, ao recortar o fundo da fotografia do bebê (pois esta estava muito poluída), percebi também que este recorte afetava diretamente na qualidade final do trabalho, deixando-o mais bruto e com uma aparência inacabada. Outra coisa que percebi ao realizar a montagem do bebê, foi suas ‘foto-memórias’ eram limitadas quase somente a ele ou à ele e seus parentes mais próximos pois esta é a realidade em que ele vive em seus primeiros anos de vida. A partir desta observação, passei a criar fotografias que representassem estes vínculos também, criando fotomontagens com mais de um elemento e representando as memórias de cada um e as memórias que compartilhavam. Para isso, posicionei as fotografias das memórias individuais de cada elemento nas laterais, enquanto aquelas que representavam momentos e memórias compartilhadas eram posicionadas na junção dos corpos. Através destes diversos testes, fui aos poucos entendendo e aprimorando o posicionamento das fotos dentro do retrato, de modo a respeitar as áreas claras e escuras do mesmo e criando assim resultados cada vez mais naturais e inteiriços. Realizando testes com fotografias de amigos, parentes e conhecidos, passei a criar uma série de trabalhos procurando aperfeiçoar cada vez mais as composições finais e os aspectos gerais dos retratos grandes. Através destes testes, percebi que os retratos ficavam com um resultado cada vez melhor conforme o número de fotos utilizadas aumentava, e o resultado fi-

nal do trabalho tornava-se mais nítido quando observado de longe e menos nítido conforme se aproximava. Com uma grande quantidade de fotografias usadas para formar o retrato final, este se tornava cada vez mais nítido em questão de luz e sombra enquanto as fotografias que o formavam tornavam-se cada vez menos visíveis. Os detalhes de cada fotografia que formava o retrato tornavam-se cada vez mais confusos observados no retrato como um todo, e só podiam ser identificadas se observadas de perto, com uma aproximação através do zoom no retrato criado. Com todos os testes realizados e resultados obtidos, passei a pensar na forma de impressão do trabalho, e percebi que uma impressão em grande escala traria um melhor resultado não só visualmente, mas também transmitiria melhor o conceito do trabalho. Em grande escala, o trabalho mostraria o retratado de longe, como uma fotografia geral formada por diversos elementos. Mas para que os observadores pudessem ver os detalhes (ou no caso, as memórias representadas pelas fotos menores), eles precisariam aproximar-se, assim como precisamos nos aproximar das pessoas para conhecê-

Nas próximas páginas: Teste 5 Amizade (Cor, P&B e Alta Saturação) 43


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Teste 5 Processo de criação 47


-las na vida real. Outro detalhe importante, foi a questão do fundo. Em meus testes, percebi que a presença de um fundo preenchido, sem espaços vazios, tornava a experiência de observação mais interessante. Comparando os testes 5 com o restante dos retratos criados, percebi que o preenchimento total do espaço tornava a fotografia mais equilibrada, além de possibilitar o uso de um número muito maior de fotografias. Essa percepção fez com que eu me questionasse pela primeira vez sobre o ambiente da fotografia, e passei a refletir sobre a sua representação. Percebi, através desta reflexão, que assim como as pessoas e momentos são importantes para a memória, os ambientes onde estas memórias se formaram também são importantes e influenciam diretamente no resultado final daquilo que nos lembraremos depois. Pensando nisso, passei a criar testes utilizando o ambiente do retrato, algo que havia ignorado nos testes anteriores. Para preenchê-lo, optei por utilizar fotografias de ambientes que influenciaram na vida da pessoa retratada, colocando-os de modo a criar um fundo preenchido pelos ambientes que se tornaram memórias para o indivíduo. Retirando as fotografias de ambientes antes utilizadas nos retratos, eu as substitui por fotografias de momentos (com pessoas) e as utilizei para preencher o fundo da fotografia principal. Após testar o preenchimento com dimensões variadas, encontrei na organização de 48

acordo com tons o melhor resultado (utilizando fotografias de paisagens escuras em contato com as areas claras da fotografia e vice versa, criando assim a sensação de negativo-positivo no retrato principal). Depois disso, passei a testar diferentes formas de cor, utilizando níveis de saturações, nitidez ou tonalidades diferentes. Com estes testes, encontrei no fundo colorido o melhor resultado, pelo mesmo motivo já citado anteriormente: as cores representavam melhor as memórias das fotografias representadas. Além disso, o uso de fotografias em uma escala menor mas que ainda fossem maiores que as fotografias utilizadas no corpo traziam um melhor resultado, pois as fotos em escalas muito grandes tornavam a competição de imagens grande demais. Encontrei, nesta forma, uma representação em que mesmo que o ambiente se torne presente e colorido assim como o corpo, o retratado ainda se destaca, separando assim as duas partes representadas e não deixando que elas competissem tão intimamente entre si.

Teste 6 Auto Retrato II

(Representação de ambiente)


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Na pรกgina anterior: Teste 6-1 Auto retrato II Ao lado: Teste 6-2 Auto retrato II

(Ambiente colorido)

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Teste 6-3 Auto retrato II

(ambiente P&B)

Na pr贸xima p谩gina: Teste 6-4 (Final) Auto retrato II 53


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REFERÊNCIAS ARTÍSTICAS

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ara a criação do trabalho, procurei artistas que pudessem me dar apoio na produção do trabalho, e encontrei alguns que realizavam trabalhos semelhantes àquilo que eu estava criando, possibilitanto assim que eu estudasse suas obras de modo a conhecer diferentes obras e adaptar os conhecimentos tirados delas para produzir a minha própria obra. Já antes do início do trabalho, havia me deparado com as fotografias de Steve Mccurry, como já citei anteriormente. Após o início da produção, encontrei diversos outros fotógrafos que auxiliaram no embasamento teórico de minha obra e além disso muitos outros artistas que, trabalhando em diversas técnicas, produziam trabalhos parecidos com aquilo que eu estava criandoe possibilitaram um refinamento de ideias gerais para a criação. Encontrei tanto artistas que trabalhavam na mesma base que eu (a fotografia) quanto outros que trabalhavam em diversas outras bases, como a colagem, desenho ou pintura. Neste capítulo, falarei um pouco sobre cada um deles e o modo como influenciaram em minha obra final. 59


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Steve Mccurry

Yanesha,Peru Já citado anteriormente, Steve Mccurry e seus retratos foram a primeira referência que tive de fotografia. Além disso, foio através de seu retrato ‘Afghan Girl’ (à esquerda) que refleti pela primeira vez sobre a vida e as memórias daqueles que eram fotografados por ele, e como seria a vida de cada um.

Gosto dos trabalhos de Mccurry pois carregam um certo mistério, apesar das cores nítidas e ângulos que nos mostram todos os detalhes do fotografado. A fotogafia nos leva a um mundo novo e nos faz deparar com diferentes realidades, fazendo-nos refletir sobre a vida e as memórias. 61


Steve Mccurry Peshawar, Pakistan 62


Steve Mccurry Tibetan Girl 63


Sara K. Byrne

Através de uma pesquisa de artistas que pudessem auxiliar em minha criação, encontrei o trabalho de Sara K Byrne, que realiza retratos através da dupla exposição que a câmera Canon SD Mark III possibilita. Utilizando imagens da natureza para a composição de retratos, as fotografias de Sara tornavam-se uma mistura das pessoas retratadas com os locais onde estavam ou outros ambientes naturais fazendo com que, em alguns momentos, os detalhes do retrato até mesmo se perdessem, tornando-se somente uma silhueta preenchida pela natureza. 64

O que achei interessante no trabalho de Sara foi não somente o trabalho com a dupla exposição, mas a harmonia com que ela conseguia criar seus trabalhos fazendo com que os detalhes da natureza ficassem evidentes, mas sem encobrir completamente todos os detalhes da pessoa retratada, deixando-a evidente, mesmo que somente na silhueta. Além disso, essa mistura de mulheres com a natureza trazia uma delicadeza maior aos retratos, além de torná-los únicos e diferentes dos demais trabalhos de dupla exposição que encontrei.


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Jerry Uelsmann

Encontrei o trabalho de Jerry Uelsmann quando ainda estava focada no trabalho com a fotografia analógica. Achei muito interessante as edições de fotografia que Uelsmann criou antes mesmo da invenção de programas de edição como o photoshop. Uelsmann trabalhava utilizando negativos e criando sobreposições de imagem através de um processo de revelação onde a luz gravava no papel fotográfico elementos de diferentes

negativos criando assim uma imagem única no final. Suas obras parecem possuir um pouco do surreal e da fantasia, criando realidades fantásticas e diferentes de tudo aquilo que podemos ver na vida real. Apesar de não ter utilizado sua técnica no final, os trabalhos de Uelsmann serviram de inspiração inicial para o meu trabalho, e por isso considero-o como uma das minhas principais referências. 69


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John Clang

John Clang e seu irmão

Os trabalhos de John Clang ressaltam a importância das relações entre as pessoas. Utilizando o Skype para unir famílias separadas pela distância para criar através desta conferência de vídeo uma fotografia de família, o artista cria a ilusão de que todos estão juntos em um único espaço. A sobreposição de imagens (da conferência e daqueles que estavam presentes no espaço da fotografia) foi feito através de uma retroprojeção em tamanho real e de alta quali72

dade, criando assim a ilusão de presença física no espaço. O que achei interessante no trabalho deste artista foi não somente a união das pessoas e reforço dos laços que eles possuem, mas também da mistura de imagens projetadas e reais em uma fotografia. Encontrei no trabalho do artista a base para a criação dos retratos com mais de um elemento, e dos vínculos que estas pessoas possuíam entre si.


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Chuck Close

Outro artista que encontrei e que chamou a minha atenção foi Chuck Close, em sua série ‘fingerprints’ (ou ‘digitais’), que cria retratos realistas através da sobreposição de impressões digitais. Com pequenas marcas criadas pelas impressões de seu polegar, o artista criava diversos retratos que tinham sua composição basicamente pelo claro e escuro das digitais que os formavam.

Observando este trabalho, percebi as questões de claro e escuro que precisaria criar em meus retratos, e pude perceber mais claramente os aspecto de luz e sombra, que poderiam ser criados através da escolha de fotos mais claras ou mais escuras para ocupar áreas da imagem a ser composta.

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Daniel Escobar

Encontrei os trabalhos de Daniel Escobar quando passei a pensar na impressão em grande escala. Ao pesquisar sobre artistas que realizassem trabalhos em grande escala, me deparei com a série de trabalhos dele intitulada ‘Permeáveis’ que, utilizando sobras de impressões para outdoor, criou “pinturas” com este material, fazendo diversos furos nos cartazes publicitários para que a imagem de baixo pudesse ser vista. 78

A sobreposição destas imagens e dos furos realizados por ele com um furador de papel, criava uma nova imagem, como em uma colagem mais elaborada. O que achei interessante no trabalho deste artista foi não somente a sobreposição de imagens, mas também a qualidade de seus trabalhos mesmo utilizando sobras de outdoors (que não possuem uma qualidade gráfica tão boa quando vistas de perto).


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Jamie Poole

Os trabalhos de Jamie Poole mituram poesia e retratos. Utilizando fragmentos de poesia e dispondo-os na tela, o artista cria retratos realistas que, vistos de perto, podem ser lidos. As frases de poesia utilizadas pelo artista foram impressas em diversos tons de branco, preto e cinza, de modo a a criar a ilusão de luz e sombra nos retratos. Colando-os em diversos ângulos, Jamie Poole criou retratos interessantes, fazendo com que os observadores tivessem

contato com a poesia ao se aproximar da obra. Suas obras se parecem muito com o resultado que eu gostaria de obter em meu trabalho final, e foi inspirada nestas obras que passei a criar retratos com um número cada vez maior de fotografias, visando uma impressão em grande escala que trouxesse esta necessidade de aproximação do observador para ver e entender aquelas ‘memórias’ que formavam a pessoa retratada. 83


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Vik Muniz

A série “The Best of Life” de Vik Muniz apresenta diversos desenhos de fotografias apresentadas pela revista Life feitos somente a partir da memória. Ao representar as fotografias observadas utilizando somente a sua memória como fonte, o artista depara-se com uma grande diferença de formas, como ele mesmo comentou em entrevista: “Nesses trabalhos eu tentei encontrar como a fotografia se parece em nossa cabeça quando não estamos olhando para

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ela. Elas trazem as estruturas das famosas fotos, mas, na verdade, são muito diferentes.”

Trabalhando com a memória e o desenho das fotografias, o trabalho de Vik Muniz se assemelha à obra Memórias pela representação da memória a partir de imagens. Utilizei este trabalho como embasamento para relacionar a fotografia e a memória, além de encontrar nele uma representação diferente da fotografia a partir da memória.


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Consideraçþes finais

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Através da elaboração da obra ‘Memórias’, percebi que a fotografia vem se tornando cada vez mais importante para as pessoas, seja para guardar os momentos importantes ou para relembrá-los depois. Além disso, a fotografia torna-se muito próxima à própria memória humana quando desmembrada, tanto em seu esquema de armazenamento e organização, quanto em seus significados para aqueles que a observam. A memória também está amplamente ligada à fotografia, pois, sem ela, a maior parte das fotografias tornam-se apenas imagens belas, sem significado algum. Lembrar-se do lugar, do momento, das sensações e das pessoas que estavam à sua volta no momento de uma fotografia é dar vida àquela imagem, tornando-a muito mais que um elemento de ilustração ou decoração. A fotografia vem se tornando cada vez mais indispensável às pessoas, mas com a facilidade de acesso vem se tornando cada vez menos valorizada. Com a evolução das tecnologias e a facilidade de acesso a equipamentos cada vez melhores, as pessoas vem tomando o hábito 93


de fotografar momentos indiscriminadamente, querendo guardar aquele momento para si, mas muitas vezes esquecendo-os depois. Ao invés de utilizar a fotografia como meio de suporte para se lembrar de momentos importantes, as pessoas vêm fotografando tudo e deixando-se esquecer de vivencias importantes. Dessa forma, ao olhar para uma fotografia depois, elas não con94

seguem mais lembrar daquele momento específico, ou do motivo que as fez fotografar aquilo. As pessoas são formadas por memórias, assim como a fotografia depende dela para ser entendida. Mesmo em imagens gerais, como paisagens ou objetos bonitos, a memória é usada para interpretar aquela imagem e dar significado a ela. As pessoas utilizam de suas expe-


riências para julgar ou dar significado àquilo que veem. E estas experiências são diretamente ligadas às suas memórias, já que nossos conhecimentos são criados a partir de tudo aquilo que vivemos e lembramos em nossas vidas. Desta forma, percebi que a fotografia é importante não somente para mim, mas para as pessoas em geral, e vem se tornando cada vez

mais uma extensão da memória auxiliando a lembrar de momentos passados através de sua observação ou fotografando algum momento importante para ter a certeza de que lembraremos dele depois de forma mais real o possível.

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ReferĂŞncias bibliograficas

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BARTHES, Roland. A Câmara Clara: nota sobre a fotografia. Lisboa: Edições 70, 2009. BORIS, Kossoy. Realidades e ficções na trama fotográfica. São Paulo: Atelie Editorial, 2000. BUENO, Silveira. Mini Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: FTD, 2000. DUBOIS, Philippe. O ato fotográfico e outros ensaios. São Paulo: Papirus, 2008. LE GOFF, Jacques. História e Memória. São Paulo: Editora da UNICAMP, 2003. PIOLINO, Pascale; DESGRANGES, Beatrice; EUSTACHE, Francis. Lembrar é viver. In Revista Mente e Cérebro, Edição Especial nº 27. Scientific American. SONTAG, Susan. Sobre Fotografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

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