Manifesto do Partido Comunista Anônimo de Souza 1 – Burguesia e Proletário O mundo inteiro se assombra Com o tal do comunismo. O papa e os poderes Querem fazer exorcismo: Dizem que é coisa do cão Querer o socialismo Quem fala mal do governo De comunista é chamado Porque o comunismo vive Até contra a lei do Estado, Por que só o comunismo Nos pode dar resultado. Toda história deste mundo Foi rico matando pobre, Foi plebeu escravizado Por toda família nobre: Nossa vida vale menos Que uma moeda de cobre. Aqueles servos feudais Se fizeram burguesia, Navegaram nas Américas N’África e n’Oceania, Tomaram o lugar dos reis, Mas mantendo a tirania. Luta de classe não é Uma invenção de ninguém: É o motor da história Movendo a vida que vem, Do jeito que o vento sopra Por mim, você e alguém. O vapor e a maquinaria, Tomaram o lugar da mão Do homem que trabalhava Para ganhar o seu pão. E a máquina vale mais Do que meu amigo João.
Daí veio a nova praga: A conquista do mercado. Foi assim que eles mataram O negro escravizado; Foi assim que construíram Seu “mundo civilizado”. A burguesia criou O mercado mundial. Isso que hoje se chama “Civilização Global” É cria da burguesia Que se fez industrial. A vida que hoje vivemos Vem de processo bem lento. Os reis caíram do trono Quando soprou novo vento. E o sol da burguesia Tomou todo o firmamento. Foi mesmo revolução Que fez a nova classe. Mas é eterna verdade Que morre tudo que nasce – Morrerá a burguesia Chegando quem a ultrapasse. Naquelas águas geladas Onde vive o egoísmo A burguesia afogou Toda beleza e lirismo, E tudo virou comércio Medido por algarismo. A própria religião Nunca mais teve profeta, Até mesmo a medicina Só tem a moeda por meta. Dinheiro tudo compra E corrompe até poeta. Adeus luares de maio, Adeus tranças de Maria, Nunca mais a inocência, Nunca mais a alegria, Adeus a vida do campo Que hoje é só nostalgia.
Acabou-se o que era doce, Foi-se o mundo camponês. Desgraçou-se tudo aquilo, Afundou-se duma vez: Homem perante a maquina E como gado, só rês. A burguesia só vive Ampliando a produção. Assim vai determinando Aquilo que os homens são. As relações sociais São contadas em cifrão. Tudo aquilo que foi sólido É hoje fumaça no ar. Aquilo que foi sagrado Hoje está no lupanar. Por isso que precisamos Garantir nosso lugar. A burguesia que veio Fez acabar as nações. Não há espaço pros homens, Não batem seus corações. Tudo que existe é mercado Guardado por legiões. Foi assim que a burguesia Centralizou a política. Toda relação humana Tornou-se fraca e raquítica, E a nossa classe aleijada Se arrasta paralítica. A burguesia derruba Qualquer país atrasado, Até a muralha da China Tem o alicerce abalado. Saquear, depois vender, E a lei do seu mercado. Todo aquele que já fez Ou macumba ou bruxaria +sabe que tudo o que faz Volta-se contra outro dia: Assim se prepara a corda Da forca da burguesia.
Quem leva o burguês pra forca E o novo trabalhador, Seja ele da mecânica Ou do tal computador. A burguesia bem sabe: Servo vence o senhor. Preço do teu trabalho Também é mercadoria: Seu trabalho vale merda, Só enriquece a burguesia. Seu filho morre de fome, Você não tem garantia. A oficina pequena Onde um mestre ensinava Seu ofício ao aprendiz Que com ele praticava Já perdeu toda a função: A mão de obra é escrava. Quem labuta por salário, Vai lambendo sal azedo. Não vende nem seu trabalho, Porque este causa medo. Vende a força do trabalho, Que se transforma em degredo. O produto fabricado Vale mais que o ser humano Que sofreu para fazê-lo Passando por todo engano Daquele patrão que o explora Porque este é o seu plano. O pobre trabalhador Sofre na mão do patrão E continua sofrendo Se faz compra a prestação. E ainda paga aluguel Bem caro ao senhor ladrão. Por isso o trabalhador Ao nascer já vai pra luta. Enfrenta a fera burguesa, Faz azedar sua fruta. Pra quem vive do trabalho, Burguês é filho da puta.
No começo é um por um, E depois somos milhões. Trabalhador consciente Se liberta dos patrões, Em busca da nova ordem, Nós formamos multidões. Aquele que era só um Naquela fábrica medonha, São muitos do mesmo ramo, O que um pensa, o outro sonha. Assim luta quem trabalha E não quer passar vergonha. Toda essa massa de gente Como cabrito na serra Não se uniu por acaso, Mas por estar numa guerra. Resistindo à burguesia Nos unimos nesta terra.. A burguesia querendo Derrotar seus inimigos, Já nos manda ir pra guerra Como todos os seus perigos. Morremos levando chumbo E eles se tornam amigos. Mesmo assim vamos crescendo, Mesmo assim a classe aumenta. Nós somos o sal da terra, Somos feijão com pimenta, Somos o saber da vida E o sabor que alimenta. Todos nós somos iguais No salário tão mesquinho. Vivemos a pão e água, Mas produzimos bom vinho. Os burgueses passarão – Nós, um dia, passarinho’. Nosso triunfo é pequeno E não dura quase nada. Mas se ainda não venci, Vou formando um camarada, Que continua a batalha E vai seguindo na estrada.
Nossa união como classe, Ou seja, como partido, Nós mesmo prejudicamos Quando eu brigo contigo. Por isso, lutemos juntos, Eu e você, meu amigo. Aquelas brigas estúpidas Da velha sociedade Nos fazem tomar consciência De toda sua maldade: Burguês mata aristocrata, Nós queremos igualdade. Toda vez que um burguês Pretende alguém derrotar, Nos chama como soldados E manda nos ensinar. Nós, sabidos, aprendemos A arte de nosso lutar. Hoje são trabalhadores, Alguns que foram patrões Ou têm medo de se ver Na miséria dos peões. E nossa classe se educa Vendo tais contradições. E quando na luta de classes Vai chegando o “agá” de hora, A velha sociedade Se caga, se mija e implora. Vem puxar o nosso saco, Porque nossa classe vigora. A chamada classe média Nunca fez revolução. Tem bronca da burguesia, Mas tem medo do patrão, Falando em linguagem clara: O classe média é bundão. Aquele pobre perdido, Que se vê feito farrapo, Não serve para muita coisa, Mesmo por que virou trapo. Lambe os pés da burguesia, Come até cocô de gato.
Por isso que não podemos Contar com nenhum dos dois: Nem com o pobre corrompido Nem com aqueles que depois Vai querendo nos mastigar Como quem mastiga arroz. O trabalhador que pensa Não obedece ao patrão. Sua mente não aceita Essa tal situação: Não aceitas os burgueses Lei, moral ou religião. Os trabalhadores podem Fazer o mundo mudar. Aquilo que é de um só Para todos tem que dar. Propriedade privada No mundo tem que acabar. Por isso devemos ter Nossa mente sempre alerta. Nós devemos destruir A garantia tão certa Do edifício burguês E deixar a porta aberta. Somente assim nós teremos Justiça e paz pela terra. Não como a justiça deles Nem sua paz, que é guerra. Teremos vida de gente Cujo sonho não se enterra. Não travemos mais luta De país contra país, Embora seja preciso Afirmarmos a raiz, E lutar pela nação, Por um tempo mais feliz. É mesmo guerra civil No seio do nosso mundo. Guerra suja, escondida, Pedra que desce ao fundo. Mas nós nascemos sem medo, Sem medo estamos no mundo.
O servo entrou na comuna. Mesmo sob a servidão E o pequeno burguês Se fez burguês, fez nação. Mesmo sob o feudalismo Que o mantinha na opressão. Já o trabalhador de hoje Tem cada vez mais miséria. Mas o burguês que o explora Não acha que a coisa é séria. “O mais fraco que se quebre” – O mais forte faz pilhéria. Até hoje na história Sé venceu a minoria: Todo meio de produção Servindo a classe vadia. Mas só os trabalhadores Representam a maioria. A burguesia brincando Dominou o mundo inteiro. Pra ela quem só trabalha Deve estar no cativeiro. - Somos nós a nova classe, Da velha somos coveiros. 2 – Proletários e comunistas. Sempre está o comunismo Unido ao trabalhador; A toda gente operária Nós damos maior valor. Para nós, o proletário Nunca dirá “por favor”. Queremos tudo o que quer Todo partido operário: Vida melhor para todos, Do peão ao bancário. Derrube-se a burguesia, Erguendo-se o seu contrário. O ideal comunista Não foi nascido do nada: É fruto das condições Da nossa classe explorada Que precisa dar um fim À propriedade privada.
O trabalho por salário Não garante nossa vida: O burguês fica mais rico E seu capital se estica. Não temos nada de nosso E a situação se complica. Mas é do nosso trabalho Que nasceu o capital. O nosso salário mínimo Representa nosso mal. Quanto mais nós trabalhamos Menos vemos o metal. Do nosso trabalho o fruto Mal chega para comer, Levar vida miserável, Sem direito de querer, Obedecendo até quando Eles nos mandam morrer. O nosso trabalho vivo Assim vai se acumulando. Quando houver o comunismo Teremos voz de comando: De todo nosso trabalho Vamos estar aproveitando. Os burgueses falam muito Nessa tal liberdade, Que para eles consiste Em manter a propriedade. Assim mandam em nossa vida, Dominam nossa vontade. A liberdade para eles É só comprar e vender. Só eles que são pessoas, Só eles podem querer. Eles se enganam, coitados: Um dia vamos poder. O comunismo não quer Roubar o trabalho alheio. Quer evitar o contrário Deste quadro que é tão feio. “abaixo o trabalho escravo!” - Nós gritamos sem receio.
Eles dizem que sem eles Morrerá toda cultura; Que sem haver capital A vida não é segura. Eles mentem, por que sabem Que nós somos o futuro. Quando eles falam cultura Dizem só “adestramento”, Homens que se tornam máquinas, Sofrendo todo tormento. Pra eles não somos gente, Somos simples instrumentos. Eles dizem que à família Nós queremos destruir: Outra mentira que contam Porque queremos unir Crianças que não trabalhem, Pais e filhos a sorrir. Foi em nome de tal família Que veio a prostituição. As mulheres, para eles, Só servem à produção. Entre si são todos cornos, É assim que eles são. Dizem que o comunismo À pátria não tem respeito. É verdade: nossa pátria Não é a lei de um sujeito. Nossa pátria é para sempre O homem livre, não sujeito. Nós não somos de atacar Ou matar um companheiro Só porque ele nasceu No território estrangeiro. Nossa pátria, a liberdade, Não se compra por dinheiro. A história desse mundo São as classes em combate. Revolução sempre houve: O novo ao velho abate. Só se acabarmos as classes Tudo será igualdade.
Como á vida é desigual, E desiguais os Estados, Não vale o mesmo critério Entre ricos e atrasados: Vigorando a mesma lei Fracassam os resultados. Assim diremos, são dez Itens do nosso programa Que podemos praticar Seguindo esse panorama Adaptando os casos Conforme for cada drama: -O latifúndio é crime. -Quem paga imposto é o rico. -Ninguém herda o que não fez. -Quem não presta diz não fico. -Todo dinheiro é do povo. -Motorista não faz bico. -Terra e fábrica para todos. -Quem puder, vai trabalhar. -Cidade e campo se ajuntam. -Crianças vão estudar. Assim dizemos pra sempre Assim vamos vigorar. O que chamam poder público Nunca mais será político. Nunca mais haverá classes Nem o seu ranço raquítico. O velho poder dos velhos Morrerá de sifilítico. Nova vida social Tira o lugar do burguês. A velha sociedade Já perdeu a sua vez. – Quando um se desenvolve Um mais um já são três.
3 – Literatura Socialista e Comunista 1 – O socialismo reacionário a) o socialismo feudal
Também reacionário O socialismo já foi, No tempo do carrancismo Quando o homem era boi, Na velha idade média Naquele tempos de oi. Lá na frança e na Inglaterra A doente aristocracia Porque derrotada lança Gritos contra a burguesia. A história não se finda Porque sempre principia. No ano dezoito-trinta França fez revolução, Na mesma época o inglês Passava decepção. (Isto se refere aos nobres, Porque o pobre era cão). Os nobres perdendo o trono Foram atrás do proletário. Falavam mal do burguês Em todo jornal diário. Assim levaram a luta Para o campo literário. Já não podendo lutar Contra a brava burguesia Limitavam-se a escrever Contra ela todo dia. Assim buscavam do pobre Conquistar a simpatia. Aquilo que resta da obra Deles, agora é caduco. Já riram muito, gozaram, Só fazendo vuco-vuco. Assim o mundo ficou Mais uma vez mais maluco.
A grande bronca que tinham Dos burgueses inimigos Era ter criado a classe Que traz maiores perigos: Brava classe proletária Pra todos eles um risco. Assim, na luta política, Ajudaram a repressão. E na vida do dia a dia Fazem discurso cristão. E o padre, com água benta Lava e limpa a opressão.
b) O socialismo pequeno burguês Não foi só a aristocracia Que perdeu para burguesia. Também o pequeno burguês Perdeu toda garantia: Pode virar proletário No espaço de um dia. Foi assim que a classe média Fez discurso social. Foi assim que analisou A contradição final Das forças de produção Daquela era fatal. Os sábios da economia Diziam ser coisa pra frente A exploração do trabalho, Maquina matando gente, Camponeses na miséria, Quantidade de indigentes. Mas esse socialismo Ainda não é bastante: Quer voltar ao passado. Quer tudo como foi antes. Não avança um milímetro, Não dá um passo adiante.
c) O socialismo alemão ou o “verdadeiro socialismo”
No velho século dezoito, Filósofos da Alemanha, Imitaram os franceses Sem porém a mesma sanha: Deixaram a fala macia Como teia de aranha. A burguesia alemã Contra o feudo e a realeza, Se chamava liberal, Quase teve a grandeza: Gritou socialismo Nos ouvidos da nobreza. Então os governos tiranos Assustaram a burguesia. Aqueles socialistas A tudo destruiria. Aqueles socialistas Eram praga ou epidemia. Esses pequenos burgueses, Recuaram para sempre, Daquilo que quer a gente. Eles não querem igualdade, Querem cargos de gerente. 2 – O socialismo conservador ou burguês
A burguesia querendo O seu poder conservar Apela para caridade E diz que vai melhorar A vida de todo pobre, A qualidade do ar. Tudo aquilo que eles fazem É miséria filosófica. Fazem museus e escolas Da ciência ecológica Enquanto derrubam as matas Com sua fúria catastrófica.
3 – O socialismo e o comunismo crítico- utópico
Esses sistemas fundados Ainda naquele momento Já compreendiam bem A ação dos elementos, O antagonismo de classes E seu desenvolvimento. Foram quase evangelistas Pregando que toda ação Fosse mansa e pacífica Sem qualquer arma na mão. Por isso, tudo findou Em sonho e divagação. 4 – Posição dos comunistas diante dos diferentes partidos de oposição
O comunismo combate Por todo trabalhador Seja em França ou Alemanha, Pólo Norte ou Equador. O comunismo é o futuro Do mundo que despertou. O comunismo se orgulha: Fala tudo, nunca mente. Na luta vai derrubar Essa ordem existente. O proletário só tem A perder suas correntes.
Por isso fica esse grito: -Se ajunte, minha gente.
Notas: Escrito por Marx e Engels entre dezembro de 1847 e janeiro de 1848, o Manifesto do partido comunista é o grande “eco épico” da humanidade, desde a segunda metade do distante século XIX. Estranho épico, n/ao vazado em poesia (como a Ilíada), nem em prosa de ficção (como Grandes Sertões: Veredas), nem em prosa jornalística (Como Os Sertões), mas na letra de manifesto político, didaticamente propagandeiro da revolução. E é o chamamento à revolução que dá ao Manifesto de Marx e Engels esse vibrante “eco épico” que repercute para sempre. Graciliano Ramos, diz a anedota, reclamava que o comunismo “não pegava” no Brasil por causa das traduções empoladas no Manifesto. Dizia que, em vez de “Proletários do mundo inteiro, uni-vos!”, devia ser: “Minha gente, se ajunte!”. Nesta versão anônima – composta em sextilhas de sete sílaba (redondilha maior), o metro mais utilizado na poesia popular do Nordeste ( também chamada “cordel”) - , teve-se em conta a lição de Graciliano. Apesar da quase impossibilidade de transmutação de prosa e poesia, espera o autor ter cometido simples tentativa, longe do hediondo atentado. Consultou-se basicamente a 5ª edição, da Editorial Vitória ( Rio de janeiro – GB, 1963), tradução anônima, “cotejada com a última edição em espanhol da Obras Escolhidas de Marx e Engels (Moscou, 1962) que foi traduzida da edição russa preparada pelo Instituto de Marxismo Leninismo anexo AP Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética”.
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