P o P 07 R$ 8,00
vembro 20 nº 02 . No
rock br os sons
as bandas
a década
jrcomunicações
especial
anos 80
............................... CAPA Philippe vocalista e guitarrista da Plebe Rude em show realizado em São Paulo
FOTO: FLÁVIO COLKER
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.............................. 80´s A década perdida. A década que todos preferem esquecer.
A década trash. O que não destrói a memória da década de 80, a fortalece. E nada é capaz de apagar tanta atitude. Era o fim a didatura, e o começo da atividade. Da rrrrrádio atividade de Evandro Mesquita e dos exageros do Cazuza nas noites no Madame Satã, ou na tenda do Circo Voador. A vida era leve e urgente. Parte dessa leveza se perdeu na sombra da AIDS, mas a juventude nunca morre. Ela muta e resiste à própria morte como Cazuza, Júlio Barroso e Renato Russo fizeram. Uma geração inteira se deu conta de que todos os dias quando acordava, não tinha mais o tempo que havia passado. O encontro do espaço criativo com o existencial possibilitou o nascimento de movimentos musicais influenciados pelo planeta inteiro, agora mais próximo e mais acessível.
Tudo era possível, tudo era permitido. Do Golpe Militar, só ficou a lembrança de que era proibido proibir. A criação foi tamanha que é impossível citar todo mundo. Falamos com Luiz Calanca, da Baratos Afins e com Cadão Volpato, do Fellini. Recebemos textos exclusivos de gente que ajudou a pavimentar a cultura musical perdida em paradas globais fabricadas e falamos com muita gente. Os verdadeiros filhos da revolução são aqueles que fizeram parte dela. Tanta gente que não cabe apenas um hino, mas muitas vozes perguntando em coro:
Que país é esse? Elaine Gomes
5 drops
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11 o barato de calanca
conheça a
15 inventando moda renatta de lucca abre
H2SO4
o baú da
21 nos porões noturnos relatos esclaredores
das noites paulistas
25 ro ck br as bandas,
os estilos, a década
37 falamos com cadão o teatro é mágico! a febre dos musicais nos palcos e
41 guia
MOJO BOOKS!
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...... ............ ....wonder ........claudia Rio 85: PoP
o ano do rock no Brasil
fellini zero
DROPS página 8
FOTO: DIVULGAÇÃO
Kid Abelha: visual no começo da carreira
Seus olhos no retrato por elaine gomes Leoni amava Paula, que amava Herbert. Os três estudavam na PUC do Rio, e eram amigos. Paula Toller namorou Leoni até conhecer Herbert Vianna e virarem um novo casal. A troca de recados entre os dois, nas canções, fazia a alegria dos fãs. Paula pedia que ele tirasse a bermuda, avisando que os solos de guitarra eram inúteis no campo das conquistas em Como eu quero, e Herbert respondia mais tarde que não havia nascido de óculos em Óculos.
Paula flertava com as bandas universitárias, mas recusava convites para fazer parte delas por ser muito tímida. Até o dia em que ela resolveu aceitar e as coisas caminharam para a banda Kid Abelha e os Abóboras Selvagens (homenagem à banda pop norte americana Kid Creole and the Coconuts), com a chegada de George Israel e Bruno Fortunato. Pouco tempo depois, Leoni acabou se desentendendo com os integrantes do Kid (mais especificamente Paula e Herbert – que não fazia parte da banda, mas estava sempre presente) e saiu para formar seu Heróis da Resistência, sem muito êxito. No Rio de janeiro, na época, uma rádio chamada Fluminense FM, pedia no ar que os jovens enviassem fitas demo que eles selecionavam e executavam. Onze entre Dez bandas cariocas foram apresentadas ao
grande público pela Fluminense FM. Distração foi ao ar pela Fluminense em 82 e dois anos mais tarde, a WEA lançava Seu Espião, primeiro disco de ouro daquela geração. Com letras simples e músicas bem compostas, aliadas aos solos de sax incomuns no repertório geral das demais formações; o Kid em Seu Espião, falava de amor, de ciúmes e de sentimentos colegiais ainda presentes na maioria dos jovens que compravam seus discos com a avidez de quem estava cansado de esperar um representante digno. Quando Paula, afinadíssima, cantava o dia a dia no colégio: “as minhas notas todas vermelhas na mesa do diretor, me dá nos nervos, eu só consigo fugir pro corredor”, ou a insegurança juvenil do amor: “não que eu seja ciumento, é apenas precaução. Deixa eu ler
seus pensamentos, deixa eu ser seu espião...” arrebatava uma multidão de jovens, cheios de sonhos e conflitos, recém saídos do colegial. Chico Buarque de Hollanda adora Paula Toller, que adora surf music. Na quadrilha musical brasileira, Paula conduz o Kid Abelha (hoje sem as Abóboras Selvagens) como uma das bandas mais estáveis, com a formação de sempre, independente das carreiras solo que ela e George Israel desenvolvem.
Faixas: Nada tanto assim/ Alice/ Hoje eu não vou/ Fixação/ Como eu quero/ Ele quer me conquistar/ Por que não eu?/ Homem com uma missão/ Pintura íntima.
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............................... s p o r d zraio
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FOTOS: ACERVO PESSOAL
Quando se fala de rock nos anos 80, as big bands tupiniquins “Legião Urbana” e “Titãs” vêm a mente. A POP pesquisou, e foi atrás dos “indies” da época.
jardim das delicias
fellini
Banda paulista que atuou nas colunas das revistas entre 84 e 90. Lançando álbuns que muito se falou e pouco se ouviu, Fellini tem um som “estranho” com uma mistura de estilos, pop rock, samba, MPB... uma mistura que a gravadora Baratos Afins apostou na época. O som da banda deu base a pessoas como Chico Science e Fred 04.
Wonder woman no Jardim das Delícias por elaine gomes
A cena do Rock nacional parecia estar preparada para o im-
pensável; até aparecer Claudia Wonder em dezembro de 1985. Mesmo para uma geração que cresceu sob os ensinamentos demolidores do punk, mesmo para a garotada que se abrigava sob os efeitos estéticos da new wave, mesmo para os hardcores que não estavam nem aí pra nada, a presença de um transformer nos palcos roqueiros era algo inusitado, estranho e terrivelmente instigante. Claro que, a essa altura, já rolavam as provocações sexuais de alguns grupos europeus, mas por aqui o povo gay não se misturava às turmas mais avançadas. O explícito permanecia difuso, distante, diluído. Ou restrito a atitudes raras como as meninas das Mercenárias, ao glam nostálgico dos shows de Patrício Bisso e a raros vocalistas de opção sexual declarada. Afinal, a Aids ainda espalhava terror no mundo. E ninguém parecia se importar com nada além de diversão, vodka, pó, porões, rock, idéias e ressacas. O show que lançou Claudia Wonder nesse redemoinho se chamava “O Vômito do Mito” com a banda “Jardim das Delícias” e estreou no Madame Satã, o epicentro de experimentações da noite paulistana. Era uma proposta performática: acompanhada por cinco músicos e dirigida por Beto Ronchenzel, La Wonder entrava em trajes de samurai (“para provocar o machismo nipônico”, diz ela) e, zás-trás, arrancava tudo e virava uma mulher-morcego com visual meio punk. No final do show, o choque: numa banheira cheia de água vermelha tingida com groselha, ela se despia lentamente. Mulher com pau, menina veneno, bat-girl poderosa, transformer purificando o sangue do preconceito da ligação do sexo gay à contaminação do vírus da Aids. Matava a cobra e mostrava o pau.
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“eu_adoro_Beatles,mas_com doze_anos_eu_ainda ouvia_muita_trilhadenovela, muito_EltonJohn, JacksonFive,StevieWonder...“
violeta de outono Banda de rock psicodélico paulista que, em 84, grava uma fita demo e começa a tocar nas rádios alternativas das cidade de S.Paulo e Rio de Janeiro. Em 86 gravam um compacto com três faixas e no ano seguinte, 87, assinam com a RCA (atual Sony-BMG) o primeiro LP da banda. Em 91 o vocalista e guitarrista, Fabio Golfetti, se afasta da
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Tudo começa em 83 quando lançam o compacto com “heróis” e “100-paixão”. Depois disso veio “passos no escuro” que ganhou disco de ouro vendendo mais de 200 mil cópias. Abriram o show da Tina Turner no RJ e em SP e... pararam. Voltaram em 2000 com “eletro acústico” (independente) que vende 10 mil cópias, mediante a esse fato a EMI fez a coletânea de toda a sua obra.
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o som das ruas Música em todo lugar Rock em Brasília, São Paulo, Rio e nas ruas? Culpe o walkman O walkman nasceu em 1979, quando um dos sócios da Sony, o engenheiro Masaru Ibuka disse ao outro sócio, o físico Akio Morita, que gostaria de ouvir música o tempo todo, mas não havia como carregar o equipamento. Morita pensou, então, que muitos jovens tinham esse mesmo problema e pediu a seus funcionários que desenvolvessem um aparelho portátil e leve, com fones de ouvido confortáveis. Assim, em primeiro de Julho de 1979, chega às lojas o primeiro Walkman. Em dois anos, o aparelho vendeu cerca de 1,5 milhões de unidades, e, na década de 80, se tornou uma febre entre os jovens que se fascinaram com a possibilidade de escutar suas músicas favoritas a qualquer hora e em qualquer lugar. CLAUDIA URBANISKI
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sando es av tr a a d a éc d a d e d a a met gando-se fo a a d n gu se a e , to er o des num oásis dinho ouro pre
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sobre os anos 80
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pato fu
vila mariana 08.06
guilherme isnard
vocalista da banda zero
POP seleciona e recomenda as 6 melhores do rock oitentista
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que país é este? Legião Urbana - Críticas ao governo, som pesado e um pouco de esperança ao povo. Tudo o que uma boa música de rock brasileiro precisa ter.
2 ideologia 3 ska
Paralamas do Sucesso - Ritmo marcante com ótimos arranjos. Contava ainda com instrumetos de sopro, arrumadinho como os Paralamas.
Cazuza - Eu quero um a pra viver. Cazuza enxerga o fut uro, fazia músicas na década de 80 que poderiam
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Titãs - Uma história triste, porém, bem tocada. Saber o destino de Marvin já vale para esperar a música chegar ao final.
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rádio pirata
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pintura íntima
vios, marinha RPM - Reis, guerras, na s. Mistura ata mercante e rádios pir o de cópias lhã mi 1 de is perfeita e ma mais? vendidas. Precisa falar
Kid Abelha - Quem é que nunca completou o refrão de ssa música cantando em cima da cama e embaixo da escada. Um bom ref rão não é tudo, mas é 90%.
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.............................. PoP + bandas k Rio 85: a cidade do rock Azul 29
FOTOS: ARQUIVO FOLHA ILUSTRADA
Cenas de um dia apoteótico: milhões se espremem em função do rock
O tecnopop do Azul 29 surgiu na capital paulista no início da década de 80. Influenciados pela new wave, que estava em alta naquele momento, a banda lança, em 83, seu primeiro compacto pela WEA. Em 84 veio o segundo. No mesmo ano, participou da trilha do filme “Bete Balanço”. De curta duração,
não gravou LP.
Absyntho
A influência da new wave esteve presente, também, na banda carioca Absyntho. Com estilo pop-rock, a banda, formada em 82, fez sucesso, no ano seguinte, com a música “Meu Ursinho Blau Blau”, que vendeu 350 mil cópias. Lançou, ainda, um compacto com a música “Palavra Mágica” e um único LP, com o hit “Balanço do Trem”. Para alegria de todos, a banda acabou em 87.
Metrô
O dia em que o Rio virou Woodstock por vinicius gonçalves 1.600.000 litros de bebidas, 4 mi-
lhões copos, 9000.000 sanduíches, 7.500 quilos de macarrão, 500.000 pedaços de pizza, 800 quilos de gel para cabelo e um recorde mundial para o Mc Donald’s, que vendeu 58 mil hambúrgueres em um único dia!Esses são grandes números para um grande evento. E esse evento começou em uma sexta-feira, dia 11 de janeiro de 1985.
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Os portões se abriram, já começou! O maior evento já realizado até aquele dia. Equivalente a cinco Woodstocks. 10 dias de shows, 90 horas de musica, 5400 minutos de emoções e de recordes. Tudo isso localizado na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, em um terreno com 250 mil metros quadrados, 5mil só para os palcos, que foram divididos 80 para o principal e mais 3 palcos móveis. Alem de dois hospitality center (camarotes especiais), dois fast foods gigantescos, dois Beer Gardens e shopping centers. Alem de 50 lojas e dois Helipontos. Consumiu a mesma quantidade de energia elétrica de uma cidade de 189 mil habitantes. Mas isso não chega aos pés da grandiosidade que o evento teve e das bandas que lá se apresentaram. Bandas como: ACDC, Ozzy Osbourne, Rod Stuwart, Scorpions, White Snake, Yes, Queen, Iron Maiden… alem das nacionais: Barão Vermelho, Blitz, Elba Ramalho, Kid Abe-
lha, Lulu Santos, Ney Matogrosso, Paralamas do Sucesso, Gilberto Gil, Rita Lee, Ivan Lins, Moraes Moreira... enfim uma trupe de grandes músicos. Grandes bandas, que fizeram um grande espetáculo que mudou os olhares, tanto do Brasil quanto do Mundo, sobre os eventos tupiniquins. Esse evento consagrou o Brasil como um dos grandes pólos para receber shows internacionais.Deu tão certo que foi repetido mais duas vezes no Brasil, 1991 (Maracanã) e em 2001 numa nova “Cidade do Rock” no mesmo local onde foi construída a primeira. Não contente com isso o Rock in Rio virou um festival itinerante que atravessou o Oceano Atlântico e chegou na “terrinha” (Portugal) e hoje já existe a proposta de se organizar um Rock in Rio nos arredores de Madri, mais precisamente na comunidade de Arganda del Rey. Essa “brincadeira” vai custar a bagatela de 30 milhões de euros! Alem de ter o seu palco principal telões que usaram a luz do sol como base energética do evento, pois o evento agora é adepto ao programa “carbono zero”.
Um festival de música estudantil, em 79, apresentou ao público a banda Gota Suspensa. Um estilo meio rock progressivo, umas letras em francês. Em 83 gravam o primeiro LP. Passam a tocar rock romântico e decidem trocar seu nome para Metrô. Em 84 gravam o compacto “Beat Acelerado”, que rodou o Brasil e, por conta do enorme sucesso, garante à banda a gravação de um LP, o “Olhar”. Com o excesso de shows, o cansaço e a pressão de todos os lados, a banda se desestrutura com a saída de Virginie, a ‘mocinha-vocalista’, em 86, bem no auge da fama. Numa tentativa de continuar, contratam um novo vocalista, Pedro Parq, mas fracassam e, em 87, a banda termina. CLAUDIA URBANISKI
Vamos cantar, em uma só voz, para nossos irmãos hispânicos. “E agora....nós vamos invadir sua praia!...”
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.............................. PoP k kk baratos afins
O motor das bandas independentes. Misto de gravadora, produtora e loja, a baratos afins acolhia e distribuía a produção musical “indie” da época.
ENTREVIST FOTOS: VINICIUS GONÇALVES
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TA luís calanca Dipit utem nullam quismod magna consendip
LUIZ ERA UM ADOLESCENTE
normal da sua geração. Gostava de sair e ouvir música com os amigos, como todos. “Era comum irmos à casa de alguém, cada um levava um disco e ouvíamos. Uma ação em grupo, o som tocava e conversávamos sobre as músicas”. Além disso, se divertia tocando em festinhas. Tempos depois, Calanca, perto do nascimento de sua filha, cogitou abrir uma loja de vinis para “pagar o enxoval da menina”. “Eu tinha uns dois mil vinis, e um dia fui vender um. Quando cheguei à loja e vendi o disco tive a idéia. Vou abrir uma loja de discos!” Então, pegou todo o seu acervo de discos e álbuns, falou com o cunhado, que já havia tido uma loja. “Ele me deu mais uns dois mil. Aí fui até a Galeria do Rock e falei com o dono de um ponto. Acabou que o cara trocou o ponto por uma coletânea do Roberto Carlos”. Mas isso não bastava para Calanca. A loja era diferente de todas as outras. Tinha discos de pop eletrônico no chão, como carpete, “sei que foi uma coisa feia, mas fazia parte do movimento da época” – diz Calanca, rindo. A loja ainda não tinha nome. “Pensei assim, a idéia era comercializar discos comuns a um valor acessível, e os que eu achava bom cobrar o valor justo por eles. Daí veio o nome Baratos Afins, eram palavras que tinham tudo a ver com a época, e que também falavam sobre a idéia da loja”, mas a história guardava outro rumo para a vida deste comerciante.
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Enquanto abria a loja, continuou com a sua discotecagem em festas. E assim
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organizou um show do Mutante Arnaldo Baptista. “Fiz de tudo. Colei cartazes, panfletei, vendi ingressos, bilheteria, produção...” O show deu certo, mas algo terrível aconteceu pouco tempo depois. Após ser internado em um Hospital de São Paulo, Arnaldo, cai do terceiro andar e sofre um traumatismo craniano que o deixaria com seqüelas permanentes do prédio da clínica. Sua mulher procurou Calanca: “ela me chamou para terminar o novo disco do Arnaldo, e eu fiz, porque eu adorava o cara. Estava realizando um sonho”. O disco saiu e com ele veio uma nova idéia: produzir músicas. E foi que ele passou a fazer, foi garimpando, garimpando, procurou aqui e ali e achou. Descobriu e produziu algumas das melhores bandas dos anos 80. Bandas como Voluntários da Pátria, Smack, Ratos de Porão, Mercenárias, Kafta, Fellini, Coke Luxe, Vultos, Akira S. e as Garotas que Erraram, Gueto e 3 Hombres, entre outras. O tempo passa e traz a mídia digital. Mas isso não desanima Luis que logo faz uma campanha pró vinil “eles estavam falando que o vinil não servia para nada. E eu me questionava, como assim não serve para nada? Então todo o meu trabalho, até hoje, não serve de nada? Acho que não viu.” E começou uma campanha pró LP. Embasado em vários argumentos, incluindo a sonoridade, amplificação,
Dipit utem nullam quismod magna consendip essequat lorerae
“Quando eu comecei, achava sei que não sabia e ainda n
“Eu sempre produzi o que gostava. Não é um estilo único. Esse fato fez com que a Baratos Afins tivesse o rótulo de não ter rótulos”
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............................... qualidade e durabilidade, Luis começa a defender que o LP é melhor que as mídias novas em alguns aspectos. “Hoje, se você for pegar qualquer mídia: o CD, MP3, MP4 e outras, e amplificá-las, para tocar em uma festa é visível a queda na qualidade do som; enquanto com o vinil essa qualidade quase não se perde. A mesma coisa pode se aplicar entre o vinil e os rolos de fita. A qualidade do rolo é superior. Mas é pouco viável levá-lo para cima e pra baixo.”
que entendia de música. Hoje não sei nada sobre música.”
Quando questionado sobre o processo que usa para encontrar as bandas, Calanca diz que “Eu sempre produzi o que gostava. Não é um estilo único. Esse fato fez com que a Baratos Afins tivesse o rótulo de não ter rótulos” e emenda “por esse motivo tive a sorte de lançar estilos de música que nem existiam aqui na época e só descobrimos isso depois.” Ele se refere à 1ª banda de Rockabilly nacional, o 1º CD de blues e à primeira banda de Heavy Metal nacional a Arpta e ao Ratos de Porão, que depois descobrimos ser uma banda Crossover “não sabíamos fazer nem heavy nem punk daí saiu aquilo lá” brinca Calanca. E hoje, com mais de 167 álbuns editados, a filha formada em Radio e TV, uma loja conceituada no 2º andar da Galeria do Rock e uma gravadora, Calanca diz:
“Quando eu comecei, achava que “Hoje, se você for pegar qualquer mídia: o CD, entendia de música. Hoje sei que MP3, e amplificá-las, para tocar em uma festa é não sabia e ainda não sei nada sobre música.” VINICIUS GONÇALVES visível a queda na qualidade do som”
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INVENTANDO
AMODA nos porões
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música ditava a moda e o comportamento da juventude com uma força nunca vista. Todos queriam usar os óculos do Devo, os Creepers feitos à mão da Dr. Phibes e as ombreiras dos Davids Bowie e Byrne fotos: renata de lucca
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S just my luck ĂŠ o segundo disco da banda
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Um Creeper era um sapato de bico fino feito sob um soladão de borracha confortável e disputado a tapas, já que era caro e feito à mão pelos meninos da Dr. Phibes. Demorava muito pra aparecer uma leva nova, e quando aparecia já estava vendida (consegui com muito custo, comprar dois pares e um deles tenho e uso até hoje – para desgosto de minha filha adolescente). As ombreiras eram lei, vinham tanto nos paletós que a gente comprava nos brechós quanto nas peças caras das lojas bacanas da Rua Augusta. Até sutiã vinha com ombreira. Fazia parte da desconstrução da farda militar e de todo o simbolismo que ela trazia. Até hoje a meninada Punk e Skinhead usa coturno e vestes militares em diferentes alusões aos militares. Os homens tinham duas opções de estilo, o brechó chic retrô ou o bom e velho jeans com camiseta que dependendo dos acessórios virava Rock a Billy ou Punk.
David Bowie era (e ainda é) uma referência na vanguarda da moda. O cara não erra nunca (desconsideremos a fase Ziggy Stardust, que isso fez parte de um passado que até ele quer esquecer). Sempre elegante, sempre bem. Os góticos se vestiam como ainda hoje: sobretudo preto e aquela cara de quem não sente calor com aquela roupa toda... Mas o bom mesmo era ser diferente daquilo que se esperava. A ordem era a desordem e a desconstrução. Conversei com Renata de Lucca, dona da grife HSO4, objeto de desejo dos descolados da época:
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O fato é que realmente queríamos ser diferentes. Quanto
mais melhor. Quem começou a usar saias foram esses dois das fotos, o Marco e o Rodrigues, hoje mais conhecido como Jeová Rodrigues. Eu e o Marco inventávamos e cortávamos as roupas, algumas vezes a gente se inspirava na ID, que era uma revista de vanguarda Inglesa que eu assinava. Mas a maioria das peças era criação nossa.
Essas estampas de rosas sobre tecido preto, nas blusas, foram criação minha, eram pintadas no tecido já cortado, antes de montar as blusas e fizeram muito sucesso. Estampávamos também sobre tecidos já estampados, você pode ver blusas listadas com estampas de cavalos marinhos feitas à mão. Também usávamos tecidos e costuras do avesso. Fazíamos vestidos com as laterais abertas e presos por tiras...
Colocávamos ferragens em algumas roupas e muitos zíperes. Rendas também, eu adorava misturar rendas, ficava uma coisa gótica romântica. Ficava bonito mesmo. Bom, vendíamos bem e o que mais gostavam é que a HSO4 fazia roupas exclusivas, não havia duas peças iguais, nem as camisas eram iguais, pois a estampa sempre diferia. Fizemos coleções inusitadas: No War, Bebês de Cubatão... Coisas bem malucas.
Fizemos muita roupa com tecido para estofamento de sofás e vestimos muitos músicos e artistas na época, saímos na mídia, inclusive no programa da Hebe com desfile da HSO4. Tudo da nossa grife naquele ano foi pra mídia. Saímos em muitas matérias de revistas e jornais: Folha de SP, Folha da Tarde, Jornal da Tarde, Estadão e Revista Cláudia. O legal, o mais importante, acima de tudo era ser totalmente diferente.
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no madame satã...
QUEM éDIFERENTE é diferente!
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Não sei bem como fui parar no Madame Satã pela primeira vez, ainda que hoje pareça o caminho natural migratório de todos os jovens esquisitos da década. O Satã era um misto de portal com outro lado do espelho, onde você se encontrava e se perdia. Onde qualquer excesso era natural e as pessoas eram parecidas de tão diferentes. elaine gomes
”
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A Pista do Sat達: misto de euforia e subvers達o
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UMA NOITE eu passava horas com uma Dinamarquesa riquíssima, esposa de um banqueiro que sustentava a amante do Presidente João Figueiredo. Duas músicas depois rachava um Martini (eca, a gente adorava essa porcaria encefalizante) com o Heitor Werneck e fumava um maço de Benson&Hedges com o Caio Fernando de Abreu. O porão (pista de dança) enchia e esvaziava numa velocidade tamanha, que os DJs Marquinhos e Magal sabiam na hora se estavam agradando. Pra encher, era só ouvirmos aquela bateria maravilhosa na introdução de Inbetween Days do The Cure, ou Incertain Smile do The The ou Smiths e One Thousand Violins, e pra esvaziar bastava que o Paulo Ricardo subisse no palco. Era senso comum odiar o RPM e adorar o Ira!. A música não precisava ser dançante, bastava ser boa que descíamos todos para a pista e ficávamos ouvindo maravilhados, assim era com o Durutti Column e Cocteau Twins (que tocou no meu casamento no final da década!). O Satã era estranho, desconfortável e descabido. Exatamente como nos sentíamos com 18 anos. Era perfeito.
Tudo fervia junto naquele caldeirão. Descer a Conselheiro Ramalho depois das 11 da noite era uma festa. Ali se encontravam, de terça a sábado, componentes de bandas, grupos de teatro, gente da noite e quem importava na cidade. Era vanguarda? Tava no Satã. Dividir a pista com o Renato Russo não era nenhuma novidade (e era quase uma temeridade dançar com ele), nem com o Cazuza, Rita Lee, e todos os componentes das bandas da época. Como alunos de uma mesma escola, nos indentificávamos como fulano “do Satã”, e era a senha pra entrar de graça em shows e nas outras casas
felizmente insuportável. Aos sábados era a noite mais fraca, as festas geralmente eram em dias de semana, e com a fila na porta cheia de “desavisados”, nossa diversão era barrar os curiosos implicando com os figurinos “papai-é-rico-eeu-sou-bestinha”. Aparecer muito colorido ou muito arrumadinho era pedir pra ficar do lado de fora. Quando o Kiko Zambianchi fez sua festa de aniversário no Rose, fomos especialmente escalados (e pagos, o que era raro) pra ficar na porta barrando as pessoas! Eu me sentia a própria Rainha de Copas do filme Alice no País das Maravilhas, bradando: cortem a cabeça! As coisas eram assim, exclusivas. A sensação é que a
Cultural Madame Satã. O nome foi uma homenagem ao famoso malandro carioca, por estar sempre à frente de seu tempo. O que começou como um restaurante virou o antro sujo (já dizia Arrigo Barnabé) de onde saiu boa parte da criação cultural de uma década. Ninguém sabe ao certo como toda aquela gente foi parar no Satã, mas eu sempre achei que era porque, uma vez do lado de dentro, éramos iguais, invisíveis e especiais. Ninguém se chocava nem reparava muito em nada. Cada um fazia o que bem entendia, desde passar a noite olhando pro teto, até cheirar metros de cocaína. Ninguém te incomodava, nem ligava pro teu modo de dançar (até porque não dava pra enxergar muito na pista). O Satã ainda existe como a juventude da década de 80. Resiste ao envelhecimento, sapateia, inventa e produz, mas sente que o tempo passou noite começava assim que a e que nada mais chegará perto noturnas. Era raro, mas havia as noites de festa no Rose ou gente chegava, e não poderia de uma única noite vivida naquelas temperaturas. no Napalm, Anny 44, Carbono ser melhor. 14 ou Val improviso que valiam uma escapada, mas Receita da Fervura ninguém voltava pra casa sem O Satã foi uma idéia de dois casais de irmãos: Wilson e passar no Satã. Elaine de As turmas eram diferentes, o Williams Santos, e Márcia e Almeida Gomes tem povo mais engomadinho ia Miriam Dutra. O local, na Rua 42 anos, é ao Radar Tantã, Radio Clube, Conselheiro Ramalho, bairro editora e Aeroanta ou no Dancing. do Bexiga, era um antigo estudante Nos domínios satânicos, só show room de uma fábrica de de jornalismo. Assídua freq balanças industriais que, com uentadora dos porões entravam convidados. Éramos satânicos. uma panelinha hermética e a reforma, virou o Restaurante
“Numa noite eu passava horas com uma Dinamarquesa riquíssima e fumava com o Caio Fernando de Abreu”
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De todo libertin amarra a dĂŠcad
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De norte a sul do país, surge o Rock Brazuca
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om o desalento do regime militar e da censura, roqueiros soltam o verbo e dão início à febre do rock brasileiro O inicio dos anos 80 marcou o começo da maioria das bandas consideradas ícones do rock até os dias de hoje. Rock e política, rock e protesto, rock e poesia, rock puro e ingênuo, às vezes careta e quase sempre incorreto. Rock e política, rock e protesto, rock e poesia, rock puro e ingênuo, às vezes careta e quase sempre incorreto. O que eles queriam mesmo era soltar o grito que estava preso na garganta, reprimido por mais de duas décadas de censura imposta pelo regime militar. Cada um tinha uma forma diferente de expressar sua indignação com o autoritarismo e de tentar aproveitar sua liberdade. Seja o rock paulista, o carioca ou o de Brasília o importante é que eles acertaram os acordes e fizeram sorrir uma nação inteira, agora livre, chamada Brasil. Dependendo da região em que viviam, cada banda tinha um
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motivo diferente para ancorar as letras de suas músicas em algum tipo de movimento de protesto. É claro que todos eles fizeram letras mostrando sua insatisfação com o governo, mas dentre os paulistas, por exemplo, a tendência era criticar as diferenças raciais, a conduta da polícia e a desigualdade social, como fizeram os Titãs em Televisão e o Ira em Núcleo Base, ambos em 1985. Enquanto os paulistas criticavam o governo de forma mais esquiva, a abertura política proporcionou ao pessoal de Brasília total liberdade de expressão, e eles iam com o dedo direto na ferida, aberta pelo golpe militar, criticando não só o sistema de governo como também os governantes.
Atitudes improváveis até alguns poucos anos atrás. O principal exemplo dessa indignação é Que país é este? que, apesar de ter feito sucesso com a Legião Urbana apenas em 1987, havia sido escrita por Renato Russo e vinha sendo executada pelo Aborto Elétrico desde o final da década de 70. A música deixa clara a podridão do sistema político e judiciário em Brasília e, diante de tudo o que vemos nos noticiários atualmente, parece até que a letra foi feita para retratar os tempos atuais. No Rio de Janeiro a conversa era diferente, a classe média carioca, salvo raras excHeções, estava mais preocupada com poesia e literatura. Tinham mais estudo e melhor condição financeira que a maioria das bandas do Brasil mas, nem por isso deixaram
passar em branco a oportunidade de se posicionar diante dos acontecimentos políticos e sociais da época. Os Paralamas do Sucesso gravaram Patrulha Noturna (1983) onde criticavam a polícia e Alagados (1986) sobre a condição social do país. Cazuza, que na maior parte dos anos 80 teve uma preocupação maior com a poesia de suas letras, deixou para protestar apenas no final da década com Ideologia e Brasil (1988). O Rock brazuca ainda deve muito de sua fama a algumas figuras excêntricas como Lobão, Marcelo Nova e Roger, que não se enquadram nos padrões das bandas da época, criando rimas malucas e hipóteses improváveis como em Eu não matei Joana D’Arc (Camisa de Vênus - 1984)e Nós vamos invadir sua praia (Ultraje a rigor – 1985).
“O que eles queriam mesmo era soltar o grito que estava preso na garganta, reprimido por mais de duas décadas de censura imposta pelo regime militar”
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............... PoP
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a capital tamb
urante os anos 80, Brasília dividiu a atenção da juventude que gostava de rock com outras duas capitais, Rio e São Paulo. Mas o pessoal de Brasília tinha duas grandes diferenças em relação aos grupos dos outros estados. A primeira é a proximidade física com toda a estrutura do governo federal, o que os fazia estar mais ligados a tudo o que acontecia na vida política e econômica da nação. Várias músicas fazem questão de retratar essa situação.
A segunda é que a cidade ainda não era muito grande e todo mundo se conhecia. Foi daí que surgiu o Aborto Elétrico, grupo que, junto com a Plebe Rude de Philippe Seabra, André Mueller e André X, acabou gerando as outras duas bandas que resumem o que foi o Rock de Brasília nos anos 80: Capital Inicial e Legião Urbana. O AE foi fundado em 1980 por Renato Russo, Fê Lemos e André Pretórios e, principalmente sob influencia de The Clash e The Police, bandas ingleses de punk rock, passou a agitar a noite dos
“com o cenário político efervescendo e a chance de falar o que queriam, essa tinha mesmo que ser a pegada do Rock da capital brasileira, música de protesto”
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principais barzinhos da capital do país. André foi o primeiro a deixar a banda. Viajou à África do Sul para servir ao exército na época do Apartheid. Em seu lugar entrou o irmão de Fê, Flavio Lemos. A partir daí, AE e Plebe Rude, passaram a dividir o palco inúmeras vezes nos principais shows de Brasília. Em 1981, em um show histórico em Patos de Minas, Plebe Rude e Legião Urbana dividiriam o espaço novamente. Só que desta vem no xilindró. Neste show, ainda sob a vigilância do
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bém era rock regime militar, a Plebe cantou “Vote em Branco” e a Legião “Música Urbana 2”, consideradas subversivas na época. O Aborto Elétrico terminou em 1982, depois de uma briga entre Fê Lemos e Renato Russo. Com a saída de Renato, a alma da turma, o final do Aborto Elétrico era inevitável. A partir daí, os irmãos convidaram Dinho Ouro Preto, que além de ser um fã incondicional do Aborto, era namorado de Helena, irmã de Fê e Flávio, e juntos fundaram o Capital Inicial. Renato Russo, após uma curta
carreira como ‘trovador solitário’ conheceu Dado Villa Lobos que tocava guitarra e fundaram a Legião Urbana. A Legião já começou com um repertório incrível de sucessos escritos na época do Aborto Elétrico e da temporada solo de Renato. Músicas como Que país é este?, Música Urbana, Química e Faroeste Caboclo já faziam sucesso no começo da década de 80, apesar de só terem sido lançadas no final dela. O Capital inicial também aproveitou muito bem pelo menos duas das músicas da
época do Aborto, Veraneio Vascaína, que fazia duras críticas à ação da polícia e Fátima sobre a criminalidade e o capitalismo. Em 1985 mudaram-se para São Paulo, mas os tempos de Brasília ficaram marcados para sempre nos trabalhos da banda. E não tinha outro jeito, com o cenário político efervescendo e a chance de falar o que queriam, essa tinha mesmo que ser a pegada do Rock da capital brasileira, música de protesto, com boas letras e som no último volume. Foi assim com Que país é este?,
Índios e Geração Coca-Cola da Legião, Até Quando Esperar e Minha Renda da Plebe Rude e Veraneio Vascaína e Ficção Científica, para citar alguns exemplos, mas, se olharmos o material produzido pelas três bandas de Brasília, entenderemos facilmente o que eles tentavam nos dizer. Só para completar, um dado importante, em 1999 o álbum Que país é este? da Legião Urbana, atingiu a marca de 1 milhão de cópias vendidas, sendo o único álbum de rock dos anos 80 a receber o disco de Platina Tripla.
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............... a alegria carioca
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contaminou o Brasil
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as três principais regiões consideradas berço do rock brazuca dos anos 80 (São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro), o Rio era o lugar onde as bandas tinham menos preocupação com economia, política e outros assuntos chatos, relacionadas à nova realidade pós AI-5. Das quatro maiores bandas de rock nacional de todos os tempos: Titãs, Legião Urbana, Barão Vermelho e Paralamas do Sucesso, as duas últimas são cariocas. Além disso, o Rio tinha dois grandes centros da cultura rock’n roll dos anos 80: o Circo Voador e o Noites Cariocas, que viviam lotados, revelando ou confirmando talentos como e Kid Abelha e Lulu Santos Explicar o sucesso do rock carioca é fácil. Na antiga capital do país, a vida já era demasiadamente séria e a liberdade recém conquistada gerou um tipo de reação específica nos jovens. Eles queriam esquecer os problemas e dificuldades da vida e não tinham tempo a perder 3 com coisas complicadas.
d z O rock era uma forma de b libertação, inspiração que vinha m principalmente da poesia, da
literatura e da maconha, sem 30 falar que grande parte das bandas
cariocas sofreu forte influência do reggae e do ska, gêneros mais animados e descontraídos do que o rock, principalmente o rock inglês. Partindo desse pressuposto, a Blitz, de Evandro Mesquita, Fernanda Abreu e, ao menos no início, Lobão, foi a precursora do movimento. Criada exatamente no ano de 1980, o primeiro álbum da banda, Você Não Soube Me Amar (1982), fez um estrondoso sucesso, anunciando que um novo ritmo chegava ao Brasil. Não era exatamente o rock pesado com que estamos acostumados, a Blitz apostava muito na performance de seus integrantes e nas letras mais despreocupadas, sucesso que lhes rendeu uma vaga no palco do primeiro Rock In Rio em 1985, um ano depois, a banda já anunciava seu final, voltando a se reunir ocasionalmente.
chegar. Cinema Mudo vendeu 90 mil cópias (quantia considerável para a época) e emplacou pelo menos três grandes sucessos, Vital e sua moto, Cinema Mudo e Patrulha Noturna. Mas o meteoro Paralamas estava apenas começando a subir, o grupo lançou, no ano seguinte, O Passo do Lui e atingiu de vez o
“o Rio era o lugar nham menos preocu mia, política e outro
FOTO: DIVULGAÇÃO
Outra banda que participou daquele Rock In Rio foram os Paralamas do Sucesso. Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone (formação que dura até hoje) jamais imaginavam o tremendo sucesso que seriam os Paralamas. A banda lançou seu primeiro disco, Cinema Mudo, em 1983 e a partir daí já dava para imaginar até onde podiam
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................ em 1986 veio o terceiro disco, Selvagem? E a marca de 750 mil cópias vendidas, disco de Platina triplo e mais uma porção de hits tocados nas principais rádios do país. Até o final da década de 80 a banda ainda lançaria mais quatro discos.
FOTO: DIVULGAÇÃO
O sucesso dos Paralamas foi tão grande que, de forma direta ou indireta, foram responsáveis pelo surgimento e influência de outra grandes bandas da época como os Engenheiros do Hawaii e o Biquíni Cavadão. Barão Vermelho: euforia carioca plena
onde as bandas ticupação com econoos assuntos chatos”
estrelato. Elogiado pelos críticos e aclamado pelo público do Rock In Rio, onde tocou ao menos cinco das dez músicas do disco, o álbum vendeu mais de 250 mil cópias e emplacou Óculos, Meu Erro, e Ska, entre outras. Mas o sucesso dos Paralamas não estava apenas no nome,
Cazuza em ensaio fotográfico para o disco Exagerado
Para se ter uma idéia completa do que foi o rock carioca dos anos 80, precisamos lembrar outra banda poderosa da época, o Barão Vermelho. Fundada em 1981, por Guto Goffi, Maurício Barros, Frejat e Dé, a banda misturava blues com um rock despojado, estilo Rolling Stones e Deep Purple. Como não tinha um vocalista fixo, de vez em quando, Léo Jaime assumia o microfone, mas, convidado para fazer parte da banda, recusou, indicando para o lugar aquele que seria responsável pela boca, o cérebro e o coração da banda... Cazuza! Um dos maiores letristas que o mundo já viu, dono de uma mente brilhante, e na maioria das vezes perturbada, Cazuza criou para o Barão a maior parte dos sucessos do grupo. Sucesso esse que não veio logo de cara, o primeiro disco, Barão Vermelho, foi um desastre de crítica e público. Só no segundo LP, Barão Vermelho II, após um empurrãozinho de Caetano Veloso, que incluiu a música “Todo amor que houver nessa vida” em seu show e reconheceu Cazuza como um grande poeta é que a atenção da crítica voltou seus olhos ao grupo. Logo depois a banda foi convidada a compor a trilha sonora do filme Bete Balanço, de Leal Rodrigues
Herbert Vianna com o Paralamas era o lado engajado do rock carioca
e espalhou sua música por todo o Brasil. Na onda do sucesso de Bete Balanço, o Barão lançou em 1984 seu terceiro disco, Maior Abandonado vendendo 100 mil cópias em apenas seis meses. Em 1985 a banda foi convidada a abrir os shows no Rock in Rio, talvez o melhor momento do Barão, que logo em seguida perderia seu astro maior, Cazuza, que cansado de fazer ‘aquele tipo de som’ decidiu se dedicar à carreira solo. Frejat assumiu o vocal, mas a banda não conseguiu mais ser a mesma, voltando a ter grande sucesso apenas no começo da década de 90, após a morte de Cazuza. O rock carioca dos anos 80, com as letras de Cazuza, a irreverência da Blitz e a eterna busca dos Paralamas pelo ‘som perfeito’, jamais será esquecido por quem viveu aquela época em que a alegria carioca contaminou o Brasil.
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urante o início dos anos 80, aconteceu no Brasil uma verdadeira explosão rock. A juventude da época encontrou no estilo musical uma forma de cantar suas histórias. E de todos os centros brasileiros onde o rock surgia, São Paulo foi, sem dúvida, o mais eclético. Por aqui surgiu todo tipo de banda que se pode imaginar. Em 1980, a cidade de São Paulo tinha pouco menos de 8,5 milhões de pessoas, sem contar o ABC, que crescia com o apoio da indústria, principalmente automobilística, instalada na região. No final dos anos 70, inicio dos 80, o ABC paulista foi palco de inúmeras greves, que mostravam o descontentamento da população com as condições impostas pelo regime militar. Nesse cenário surgiram grandes bandas brasileiras de rock como os Titãs, o Ira, RPM e o Ultraje A Rigor, que venderam centenas de milhares de disco em todo o Brasil. Os Titãs surgem no final dos anos 70 da aproximação de uma turma que gostava do estilo musical. Marcelo Fromer, Tony Belotto e Branco Mello eram o Trio Mamão; Nando Reis e Paulo Miklos faziam parte do Sossega Leão; Arnaldo Antunes fazia parte da Aguilar e Banda Performática; Ciro Pessoa e Charles Gavin 3 eram Os Jetsons e Sérgio Britto d não tocava com ninguém.
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As primeiras apresentações do grupo aconteceram em 1981, em palcos de colégios da capital, como o Equipe, que apresentava também artistas renomados como Caetano Veloso e Gilberto Gil..
sampa
A estréia oficial dos Titãs do IêIê (e não Iê-Iê-Iê) aconteceu em outubro de 1982 no Sesc Pompéia, já com Branco Mello e André Jung, que depois tocaria no Ira. Misturavam MPB com reggae e rock. Essa mistura, somada a letras de protesto contra o governo e as condições de vida da população foi, com certeza, o que gerou o sucesso dos Titãs. Até 1984, os Titãs do Iê-Iê tocaram no circuito underground paulista, até o lançamento do primeiro LP, ‘Titãs’, que trazia o sucesso “Sonífera Ilha”, uma das faixas mais executadas naquele ano. A música levou o grupo a fazer sucesso em outros estados do Brasil, através da apresentação em programas como Chacrinha e Bolinha, entre outros. Daí em diante os Titãs lançaram mais cinco discos durante a década de 80, emplacando músicas como Polícia, Família e Comida, e o LP Cabeça de Dinossauro, marco da luta contra a censura que vendeu mais de 300 mil cópias. O Titãs é reconhecido até hoje como uma das grandes bandas de rock brasileiro, fruto da qualidade de sua música e da quantidade de ‘hits’ que o grupo emplacou. Mas o maior fenômeno do rock brasileiro de todos os tempos tinha outro
marvin!
Capital Inicial: punks bem vestidos
as células
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a
“Capital Inicial, RPM, Ira!, Titãs eram os representantes do rock paulista” nome... RPM Compondo músicas desde o final dos anos 70 e após muitas tentativas frustradas de deslanchar, Paulo Ricardo e Luiz Schiavon acertaram a mão apenas em 1985. Até então, o grupo se apresentava apenas em shows em danceterias e colégios paulistas, vestidos com roupas de couro e calças jeans, numa mistura de anos 60 com a roupa usada por motoqueiros.
mesma época de Titãs e RPM foi o Ira (ainda sem exclamação). A principal formação do grupo tinhas os amigos Nasi e Edgard Scandurra (que já havia tocado no Ultraje a Rigor), Dino e André Jung (ex-Titãs).
O que não tinha como dar certo acabou mudando de vez a história do rock brazuca. Com o lançamento de “Revoluções por Minuto” o meteoro RPM mostrava sua cara. O disco vendeu 600 mil cópias e a banda fez 260 shows no ano de 1985. No ano seguinte, o RPM lançou “Ao vivo”, com algumas músicas inéditas e regravações como ‘London London’, o disco vendeu de cara 250 mil cópias, chegando a 2.200.000 cópias vendidas, recorde absoluto no Brasil.
Em 1983, lançaram o primeiro compacto, que continha “Gritos na multidão” e “Pobre paulista” já mostrava o tipo de som que a banda se propunha a fazer: Rock pesado com letras de protesto e Scandurra, considerado um dos melhores guitarristas do país na época.
O sucesso que surgiu como um meteoro, acabou da mesma forma. Era difícil de administrar a fama, assim como o consumo de drogas de seus integrantes, o RPM chegou ao fim em 1987 mas, pressionado pela gravadora, ainda lançou mais um disco em 1988, chamado “RPM” mas que também ficou conhecido como “Quatro Coiotes”.
s do rock
O LP foi um fracasso, os shows não tinham a mesma graça e o grupo acabou de vez em 1989. Outra banda que começou na
Em 1981 Nasi convidou Scandurra para tocar num show na PUC e assim começava a nascer a banda.
Mas foi em 1986, em seu segundo LP, que o Ira colocaria de vez seu nome na história do rock brasileiro,com o lançamento de “Vivendo e não aprendendo” que emplacou Flores em você e o maior sucesso da banda, “Dias de Luta”. São Paulo teve ainda o rock escrachado de Roger e seu Ultraje à Rigor, que invadiu as rádios com “Nós Vamos invadir sua Praia”, “Marilou” e “Dinheiro”, entre outras. A banda fez muito sucesso, apesar de não seguir os ‘padrões’ do rock da época. Teve também os ‘Garotos Podres’, pessoal do ABC que cantava temas como política, sociedade, violência, capitalismo e revolta e os Inocentes, banda punk da periferia da cidade, ou seja, rock para todos os gostos.
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..rock............. fora do eixo
A banda emplacou algumas músicas de muito sucesso como Refrão de Bolero e Infinita Highway, só para citar as mais conhecidas.
N
A verdade é que os Engenheiros nunca foram unanimidade. Adorados pelo RS e odiados por grande parte dos fãs de rock, a cada disco novo vinham os elogios e críticas quase que em igual proporção.
Fundado em 1984, graças a uma greve na faculdade de arquitetura, Humberto Gessinger resolveu reunir alguns conhecidos, dentre eles Carlos Stein que logo depois iria para o Nenhum de Nós, e montar uma banda.
Outro fenômeno do Rock aconteceu na Bahia. O Camisa de Vênus, liderado por Marcelo Nova e com fortes influências do rei Raul Seixas, a banda fez sua primeira apresentação na capital Salvador em maio de 1982. No ano seguinte, o Camisa gravava seu primeiro LP pela Som Livre. O disco, que levava o mesmo nome da banda, ainda lhes traria problemas no futuro.
ão só as três principais capitais do país (Rio, São Paulo e Brasília) formaram as melhores bandas brasileiras dos anos 80. Fora do eixo também era possível encontrar Rock’n Roll da melhor qualidade. No Rio Grande do Sul, por exemplo, quem melhor se enquadra nesse perfil são os Engenheiros do Hawaii.
A primeira apresentação foi apenas em janeiro de 1985 num barzinho em Porto Alegre
e coincidiu com a abertura do Rock in Rio. A partir daí a carreira da banda deslanchou, os Engenheiros eram cada vez mais procurados para tocar em bares de todo o Rio Grande do Sul. Desde o principio é possível notar a forte influência do Ska e de bandas como o Police e os Paralamas, que já faziam muito sucesso em todo o Brasil.
Logo depois da gravação do primeiro disco a gravadora exigiu que o Camisa trocasse de
nome, por acreditar que era de díficl divulgação. Como o pedido não foi atendido, o Camisa ficou sem gravadora até 1985, quando lançou Batalhão de Estranhos, com o sucesso Eu não matei Joana D’Arc. O Camisa de Vênus correu o Brasil, quase sempre lotando seus shows. Até o final da década a banda ainda lançaria mais quatro discos e grandes sucessos como Simca Chambord, Bete Morreu, Silvia e Só o fim.
“Engenheiros e Camisa de Vênus eram as bandas-sensação fora do eixo Rio-SP-Brasília” FOTO: DIVULGAÇÃO
Engenheiros correm na Infinita Highway
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................ 365 Absyntho A Cor do Som Afrodite Se Quiser A Gota Suspensa Agentss Akira S & As Garotas Que Erraram Alta Tensão Arrigo Barnabé Arte no Escuro Anjo Caído Asdrubal Trouxe O Trombone As Mercenárias Azul 29 Banda 69 Barão Vermelho Biquini Cavadão Black Future Blitz Blindagem Brylho Buana 4 Cabine C Cambio Negro Camisa de Vênus Capital Inicial Celso Blues Boy Cheque Especial Civil Clínica Cólera Coke-Luxe Claudio Zoli Dalto
DeFalla Detrito Federal Dr. Silvana & Cia Ed Motta Edgard Scandurra Eduardo Dusek Egotrip Escola de Escândalos Ethiopia Expresso (Expresso Rural) Fausto Fawcett & Os Robôs Efêmeros Fellini Finis Africae Gang 90 Golpe de Estado Gueto Grupo Engenho Hanoi Hanoi Harry Heróis da Resistência Herva Doce Hojerizah Inimigos do Rei Ira! Itamar Assumpção João Penca & Seus Miquinhos Amestrados Joe Euthanázia Kaes Vadius
Kafka Kid Abelha & Os Abóboras Selvagens Kid Vinil Kiko Zambianchi Kongo Legião Urbana Léo Jaime Lobão Lúcia Turnbull Lulu Santos Luni Magazine Maria Angélica Não Mora Mais Aqui Marcelo May East Metrô Mixto Quente Muzak Não Religião Nau Nenhum de Nós Ness Neuzinha Brizola Obina Shok O Espirito da Coisa Okotô Os Eles Os Melhores Os Paralamas do Sucesso O Terço O Último Número Paulo Ricardo
consuma Patife Band Picassos Falsos Plebe Rude Rádio Taxi Ritchie Rosa Púrpura Roupa Nova RPM Salário Mínimo Sempre Livre Sexo Explícito Sossega Leão Skowa e A Máfia Smack Soviet American Republic Sylvia Patricia Sylvinho Titãs Tokyo Tutti-Frutti Ultraje A Rigor Uns e Outros Varsóvia Vid & Sangue azul Violeta de Outono Virginie & Fruto Proibido Voluntários da Pátria Vôo Livre Vultos Vzyadoq Moe
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................ FOTOS: CLAUDIA URBANISKI
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Cadão
olá fellini! T
arde de terça-feira, hora do rush, trânsito lento, clima instável. Chego atrasada e esbaforida. Meu entrevistado me espera calmo, tomando um chá. O local? Uma livraria daquelas tão grandes que nos deixam desnorteados. O reconheço graças a um código, como nos filmes: “Eu vou estar com uma camisa listrada”, me disse ele, por telefone. Sentome, desdobro-me em desculpas por conta do atraso e logo percebo que a conversa vai ser boa. É muito simpático esse rapaz... por cláudia urbaniski
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POP – Na década de 80 vocês também enfrentavam problemas como trânsito lento? (risos) Cadão Volpato – Não! (risos)
Íamos a pé a quase todos os lugares... Não era esse caos. POP – Vocês é que eram felizes... (risos) Cadão – Eu tive a sorte de
POP – Conta como foi esse nascimento do rock brasileiro na década de 80. Cadão – O nosso rock nasceu do movimento punk, que chegou por aqui com grande atraso. Na Europa já se vivia o punk desde 1976. No Brasil esse movimento chegou em 1981, 82 e trouxe consigo a máxima do “faça você mesmo”, que pregava que qualquer um podia tocar, mesmo sem saber, que qualquer um podia fazer o seu estilo de música. Esse espírito germinou
na USP, entre os estudantes e eu era um deles. POP – O Fellini nasceu assim? Cadão – Pois é. Um dia o Thomas [Pappon] chegou pra mim e disse: “Eu quero formar uma banda, quero tocar baixo e quero que você escreva todas as letras e cante”. Nisso há que se ressaltar que eu nunca tinha cantado na vida e tocava violão muito mal. Além de que o Thomas era baterista e não baixista. Tomado pelo entusiasmo do “faça você mesmo” eu disse ‘sim’ e a banda surgiu em 1984. POP – E como vocês se viravam, já que nem sabiam exatamente o que estavam fazendo? Cadão – No início tudo era cópia das bandas inglesas, o jeito de tocar, de cantar e até a
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morar perto de tudo, de todos os points da época. O rock brasileiro estava nascendo, e eu pude ver bastante coisa bem de perto. Ia caminhando pro Madame Satã, pros bares onde rolavam os shows, abrigava os colegas [gente como Renato Russo] na minha casa... Era muito bom.
................ sonoridade. Mas com o tempo, e não era preciso muito, cada um foi criando seu próprio estilo, sua identidade. Com a maioria das bandas da época acontecia isso. A gente começou a valorizar a new wave, que era o pós-punk, e se inspirar nela. O resultado era até que bom. POP – “Até que bom”? Cadão – Ah, a gente tem que considerar que mais de 80% do que se produziu naquela época era inaudível. (risos) Mas a molecada se esforçava, criava desde letras inspiradíssimas, até as composições mais malucas que se pode imaginar. POP – Uma coisa que me chamou atenção foi o fato de que os músicos tocavam em várias bandas ao mesmo tempo. Como era isso? Cadão – Era tão difícil ter um cara com a pegada certa que acabávamos fazendo um rodízio de músicos. O mesmo cara que tocava no bar da esquina saia correndo do show pra ir tocar com a outra banda do outro lado da cidade. POP – Que loucura... Mas a produção foi intensa e o movimento parecia enorme. Cadão – Só parecia (risos) Era sempre o mesmo grupo de pessoas, indo de show em show, tocar com essa ou aquela banda. Não passava de 30 caras que se misturavam e formavam 50 bandas diferentes... POP – Isso era geral, acontecia no Brasil todo? Cadão – Tô me concentrando mais em São Paulo. Em Brasília, por exemplo, a coisa era bem diferente. Aqui a gente precisava juntar grana e unir esforços pra importar um disco. Lá o movimento era formado por filhos de diplomatas que não precisavam se esforçar muito
pra conseguir ouvir o som que rolava lá fora. Ou eles compravam os discos, ou os pais traziam do exterior. E isso se imprimia também no comportamento deles. Eles eram mais punks, calças mais rasgadas, um som mais pesado, as letras mais politizadas. Eles conseguiam gravar discos, tinham grana pra isso. A gente ralava a vida toda pra gravar por um selo independente, e olhe lá. Não que isso seja ruim. POP – Quem gravava de forma independente tinha mais autonomia, não é? Cadão – Claro! A gente falava o que quisesse, não devia satisfações...
POP – Mas pagavam o preço... Cadão – É... éramos ‘marginais’. (risos) POP – Onde se concentravam as grandes gravadoras? Cadão – No Rio de Janeiro. Engraçado é que as bandas saíam de Brasília, passavam por São Paulo e depois iam gravar no Rio. Foi assim que eu conheci, e abriguei (risos) o Renato Russo. Foi numa dessas ‘escalas’, antes de chegar ao Rio.
mas depois, passada a raiva (risos) muita gente foi buscar inspiração na bossa nova, por exemplo.
POP – A produção musical da década de 80 entrou para a história. É uma década que não morre. Os anos 2000 têm alguma chance, musicalmente falando? Cadão – É com infelicidade que eu acredito que não. Não se fez nada de significativo nos últimos anos. O que vemos é uma explosão de bandas, de sucessos instantâneos, de cantoras com a mesma voz, de letras que não dizem nada, de sons que na causam nada... A música tem sofrido com essa mediocridade. POP – Os anos 80 lhe causam nostalgia, saudade? Cadão – Não. Eu vivi, e muito bem, o que tinha pra ser vivido na época. Lembro com felicidade daqueles anos, mas estou longe de ser saudosista. Acho que a gente tem que andar pra frente. Ficar preso ao
passado não leva a nada.
Agradeço e desligo o gravador, a entrevista terminou. Uma volta pela imensa livraria, uma aula sobre punk rock diante da prateleira de CD’s. Cadão me ensinou muito sobre a década de 80. Saí dali feliz: aprendi muito e bati um papo super agradável com esse cara pra lá de especial.
Cadão Volpato é jornalista, escritor e músico. Foi repórter na área de cinema da Veja, editor do caderno de Turismo da Folha de S. Paulo, editor da SET, editor da Interview, redator-chefe da Capricho, editor de Cultura da revista Época e apresentador de TV. Atualmente, além de ministrar cursos sobre Rock e trabalhar na TV Cultura, ele prepara um programa de rádio.
POP – Falando no Rio de Janeiro, como era o movimento lá? Cadão – Aquela coisa de carioca (risos). Eles tinham uma onda meio reggae embutida no rock deles. POP – E a relação do rock dessa época com a MPB? Cadão – Era a MPB quem ditava as regras, eles estavam no comando. E não era uma música alegre, era deprê, baixo astral. No início a gente queria era fazer oposição, manifestar nosso repúdio à supremacia da MPB,
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o ano da
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A alegria da Blitz: rock descompromissado
1982. Regina Casé,
Luis Fernando Guimarães, Perfeito Fortuna e Evandro Mesquita faziam parte do grupo “Asdrúbal trouxe o Trombone” junto a outros amigos. O grupo trazia uma proposta de desconstrução da dramaturgia habitual, com interpretações despojadas e textos baseados na criação coletiva. As peças do grupo eram todas muito musicais, e as pessoas começaram a chamar as apresentações do Asdrúbal de “shows”. Daí em diante, o grupo foi sendo chamado para abrir shows de rock. Numa dessas aberturas, eles cantavam na passagem de som da banda da cantora Marina Lima. O ensaio foi tão bom, que começou a juntar gente e assim nasceu a Blitz (ainda sem nome). A leveza e o astral da bossa nova. A truculência infantil da Jovem Guarda. O apelo estético do tropicalismo. O impacto cênico dos Secos & Molhados. O senso pop dos Mutantes. E muito mais. Quando “Você Não Soube Me Amar” pegou um Brasil recém-saído da ditadura de surpresa, a Blitz inaugurava a mais divertida e espontânea aventura do pop nacional. Na formação inicial Evandro Mesquita dividia o palco e os vocais com Marcia Bulcão e Fernanda Abreu. Lobão comandava a bateria e Billy Forghieri, o baixo. Como toda boa banda de rock, a Blitz teve várias formações, mas Evandro, Marcia e Fernanda sempre estiveram presentes. Naquele ano, o grupo inglês The Police veio ao Brasil e só se ouvia falar em “Police”, e numa associação de idéias, Blitz foi o nome escolhido e ficou.
Resgatando a felicidade perdida em algum ponto entre o golpe de 64 e o AI-5, a Blitz era alegre e sorridente, e fez tanto sucesso com suas letras engraçadas e cheias de detalhes, encaixadas em melodias pobres, mas vibrantes e contagiantes, que foi capa da revista Isto É com o título “Ok você venceu” (frase de Você não soube me amar). Entre o lançamento e a consagração popular, Lobão caiu fora. Antes de a banda assinar o contrato com a EMI, o baterista percebeu que toda agitação em torno do grupo poderia dar espaço para sua carreira solo. Posou para a capa da revista Istoé de 27 de outubro de 1982 como integrante da banda, mas, antes do contrato, foi procurar outra gravadora com uma demo e a revista debaixo do braço. Foi contratado pela RCA-Victor que, sem pensar, lançou a própria demo como o primeiro disco do grande lobo, Cena de Cinema, de 82. Na Blitz, quem assumia as baquetas agora era Roberto Gurgel, o Juba. Era uma época em que se podia ousar em alguns detalhes: a banda lançou um compacto com uma música de um lado e no ou-
tro só se ouvia a voz de Evandro Mesquita dizendo “nada nada nada nada nada...” (outra parte de Você não soube me amar). A Blitz gravou um vídeo clipe (assim eram chamados) para a Globo e aquele rock diferente, alegre e sem postura política aparente enlouqueceu o país. O Compacto Você não soube me amar vendeu mais de um milhão de cópias. No LP seguinte, “As aventuras da Blitz” a censura vetou duas faixas (prova de que em outros assuntos, qualquer ousadia era mal vista), mas o disco já estava prensado e pronto para ser distribuído. A saída foi inutilizar as faixas censuradas Ela quer morar comigo e Cruel Cruel Esquisofrenético Blues. A consagração final da banda acontece no primeiro Rock in Rio, quando, nos domingos 13 e 20 de janeiro de 1985, o grupo mostrou toda a desenvoltura de palco adquirida nos últimos dois anos. Mais uma temporada no Canecão, em junho de 85, uma turnê russa (!!) no mês seguinte e Ricardo Barreto anuncia sua saída, levando a namorada Márcia
aBlitz_ inaugurou a_mais divertida_e_ espontAnea aventura_do pop_ nacional. Bulcão, no começo de 86. A banda, pensando em gravar o quarto disco (batizado de O Último da Blitz), ainda tenta sobreviver, mas se desintegra oficialmente no dia 7 de março de 1986. Triste fim para a banda mais divertida do pop nacional até então. Outras viriam, mas nenhuma com tanto sabor. ELAINE GOMES
seja
POP
.............................. PoP
guia
Cazuza
RPM vange leonel
blitz
páginas 41-45
DIVULGAÇÃO
LANÇADO apenas em 1987 mas com a maior parte de suas músicas escritas no final da década de 70, antes mesmo do lançamento do primeiro LP da banda, Que país é este? é o disco que melhor retrata o que foi a Legião Urbana, um dos maiores grupos de rock brasileiro que já existiu.
Legião Urbana Que País é Este? por luiz gerardi
Talvez pressionado pela gravadora que pedia mais um LP após o tremendo sucesso de Dois, do ano anterior, Renato Russo não teve tempo para compor as faixas que vão neste disco, apenas Angra dos Reis e Mais do Mesmo foram compostas exclusivamente para ele, coube então a Renato Russo, a tarefa de escolher o que mais lhe agradava de tudo o que ainda não havia sido gravado. O vocalista apelou então às músicas que fizeram sucesso na época do
Aborto Elétrico, grupo que originou a Legião Urbana e o Capital Inicial, e montou o disco com as músicas que os fãs já conheciam dos shows da antiga banda. A receita estava pronta e não tinha como dar errado, uma mescla de rock pesado e de protesto com acordes simples e umas das vozes mais potentes do Rock. Que país é este? reúne três dos maiores sucessos da Legião Urbana, a primeira faixa, que entitula o disco, Eu sei e Faroeste Caboclo, que segundo o próprio Renato Russo era o seu “Hurricane”, grande sucesso de Bob Dylan que contava a história de um boxeador negro que é preso por um crime que não cometeu. Um fato trágico e que viria a marcar a vida de Renato Russo aconteceu durante a turnê de Que país é
este? A banda estava ansiosa por tocar ‘em casa’, todos os ingressos estavam vendidos para o show no estádio Mané Garrincha, que teve superlotação. Muita gente foi pisoteada e levada aos hospitais e a Legião teve que encerrar o show na metade, causando a revolta dos fãs. Esta experiência fez com que Renato Russo perdesse de vez o gosto pelos palcos, passando a gostar menos das turnês, raras na carreira da banda.
Faixas: Que País é Este? / Conexão Amazônia / Tédio (Com um T bem grande pra você) / Depois do Começo / Química / Eu Sei / Faroeste Caboclo / Angra dos Reis / Mais do Mesmo
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.............................. a holandesa Alice Gwendolyn (Alice Pink Punk, namorada de Júlio). Sua primeira apresentação foi no Paulicéia Desvairada de Nelson Motta, que era uma tentaviva de casa POP com o “padrão globo de qualidade” que afundou pouco tempo depois. O LP “Essa tal de Gang 90 & as Absurdettes” saiu pela RCA em 83.
PoP k Pop! kkkkExcelente kkkBom kkRegular kRuim
Faixas: Louco amor/Românticos a gô-gô/ Telefone/Eusei,masnãosei/Conviteaoprazer/ Spaced out in paradise/ Perdidos na Selva/ Noite e dia/ Mayacongo/ Jack Kerouak.
Gang 90
Essa tal de Gang 90 & As Absurdettes kkk
Faixas: Rádio Pirata/Olhar 43/ A Cruz e a Espada/ Estação no Inferno/ A fúria do sexo frágil contra o dragão da maldade/Loiras Geladas/Liberdade/ Guerra/Sob a luz do sol/Juvenilha/ Pr’esse vício/ Revoluções por Minuto.
RCA
Cabeça Dinossauro Atlantic
k
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As bandas nacionais de Punk Rock eram todas muito parecidas; a rebeldia emergente compunha na mesma garagem. Então vieram as cabeças dos Titãs com uma fúria além da habitual e arrombaram a festa com o LP Cabeça Dinossauro. Um disco raivoso e pulsante, que soube aproximar a ira e o Pop, atropelando as trilhas titânicas de até então. Produzido por Liminha, Vitor Farias e Pena Schmidt, o disco é de 86 e foi mixado e gravado em apenas um mês. Foi a primeira participação de Charles Gavin (vindo do Ira!), que assumiu a bateria no lugar de André Jung (que foi para o Ira!)... A primeira leva de cópias, cerca de 30 mil, foi encartada num papel fosco de custo quatro vezes maior que o habitual para que a baixa resolução da cópia do esboço de Da Vinci fosse compensada. Mais tarde, Sérgio Britto conseguiu uma cópia melhor vinda diretamente do Museu do Louvre e as capas dos discos saíram com o papel normal. Arnaldo Antunes havia sido preso por tráfico de heroína ( Belloto por porte) e as músicas Polícia e Estado Violência embalam a memórias dos 26 dias que Antunes passou na prisão. Bichos Escrotos teve sua execução proibida pela censura federal. No mais, o disco é uma paulada, a obra prima dos Titãs.
RPM
Revoluções por Minuto
ELAINE GOMES
J. MONDINO
Titãs
Júlio Barroso era um homem genial. Aquela criatura alta e magra atrás de um par de óculos de lentes muito grossas não era exatamente a imagem de homem moderno e músico antenado, mas ele era um gênio da modernidade musical. Quando ainda morava em Nova York em 1980, ele já havia composto Perdidos na Selva. Assim que terminou, mostrou para o amigo (pasmem) Guilherme Arantes, que imediatamente musicou o refrão que faltava. A partir daí nascia a Gang 90 & as Absurdettes. A formação inicial era Júlio nos vocais, Guilherme nos teclados, Gigante Brasil na bateria, Lee Marcucci no baixo e Wander Taffo na guitarra. As Absurdettes eram Luíza Maria, Denise Barroso (irmã de Júlio) Maria Elisa Capparelli Pinheiro (a May East, figura onipresente no universo rock ‘n roll paulista, e namorada de Nelson Motta na época) e
convenhamos...). Antes de decidir passar o resto da vida distribuindo seu olhar 43, Paulo Ricardo foi crítico musical da Som Três, onde mandava bem o suficiente pra ter feito uma tremenda bobagem mudando de posto. O disco RPM foi lançado em 1985 pela EPIC/ CBS e os sinais de vida puderam ser ouvidos não apenas no país, mas no planeta vizinho. Um disco rápido e distraído cantado por um Mauricinho mal acabado de nome Paulo Ricardo. Mal acabado, mas bom de marketing, sejamos justos. As faixas emplacaram todas. Uma a uma elas martelaram nossas cabeças nas rádios no maior fenômeno de vendas do mercado fonográfico nacional. Destaque para a tentativa politizada de Juvenilha.
Epic/CBS
k Furacões são assim: devastadores. Mas passam. Neste momento, queridos leitores, ergam os olhos para o céu e agradeçam a quem de direito tiver feito essa bobagem acabar. Não que eles desistam fácil, os meninos do RPM (hoje não mais tão meninos, mas igualmente insistentes e desavisados) ainda sobem ao palco para cantar versões das mesmas coisas de 20 anos atrás (e que já não eram grandes coisas
Faixas: Cabeça Dinossauro/ AAUU/ Igreja/ Polícia/Estado Violência/Igreja/Polícia/ Estado Violência/ A face do destruidor/ Porrada/ Tô cansado/ Bichos Escrotos/ Família/ Homem Primata/ Dívida/ O quê? ELAINE GOMES
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Vange Leonel Nau EMI
“Muita gente não conseguia direito classificar o estilo do NAU. Alguns achavam que a gente fazia heavy metal, por causa do meu vocal e da guitarra pesada do Zique. No final, o nosso som acabou identificado como um gótico pesadão. Os shows do NAU eram bem intensos porque eu cantava de maneira bem dramática e a massa sonora da banda era estarrecedora.”Vange Leonel A partir desse depoimento da Vange, enviado por email para a redação da POP, dá pra construir uma imagem (sonora) mental do que foi a NAU. Vange tem uma voz poderosa, e a guitarra distorcida e com acordes esticados parecia mesmo com o som dos góticos. A verve teatral era constante nas apresentações, e seus amores passionais, presentes em cada letra. Destaque para os versos poderosos de Corpo Vadio: “me diga que eu te excito, que eu morro por você”. O único disco da NAU saiu em 1986 pela CBS. ELAINE GOMES
Ultraje a Rigor
Nós Vamos Invadir sua Praia kkk Warner O ano era 85. A banda, Ultraje a Rigor. E o álbum?...Sim, “Nos Vamos Invadir
a sua Praia!” Ele vem com 11 musicas, das quais, 9 são sucessos absolutos da banda. O disco tem uma levada meio rock dançante e, quando lançado, foi um dos mais tocados do ano. Começa com a faixa titulo do álbum, nós vamos invadir a sua praia, musica que despensa comentários. Daí segue para uma seqüência indo desde Rebelde sem Causa, Mim quer Tocar, Zoraide, chegando na pop das pops Ciúme. Do amor à critica política que começou com uma frase do rei Pelé “agente não sabemos escolher presidente...”, eis que a mente de Roger cria Inútil, para não ficar serio de mais a banda manda a hilariante Marylou, vai para a morta, Jesse Go, Eu me Amo e por ultimo, a musica inspirada no bordão da mãe do vocalista, Independente Futebol Clube. VINICIUS GONÇALVES
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Cólera
Tente Mudar o Amanhã CSB
O Cólera, a despeito do nome furioso e da pegada Punk, era uma banda melódica. Auto denominada “libertária” e conhecida por mandar mensagens discando direto. A banda nasceu em 79 com Redson no baixo e vocais, Helinho na guitarra e vocais e Pierre na bateria e vocais. Antes da gravação do primeiro disco, Helinho foi substituído por Val e Redson assumiu as guitarras além da primeira voz. A banda sempre teve uma preocupação com a sobrevivência do planeta. Isso , em plena década de 80, era uma verdadeira raridade. Gravaram algumas coletâneas internacionais, a primeira foi O Grito Suburbano, com Olho Seco e Inocentes, em 82. Tente Mudar o amanhã era o nome do LP lançado em 1984. Destaque para o fato do vinil do disco ser vermelho e para a letra (ainda tão atual) de Cidade dos Meus Pesadelos C.D.M.P:. “Sem futuro/Dia e noite pode escutar/Tiros e gritos/E no asfalto você vai olhar”
Faixas: 1.9.9.2./ Marcha/ Nabro3/ São Paulo/ C.D.M.P./Agir/ Palpebrite/ Duas Ogivas/ Amnésia/ Passeata/ Amanhã/ Eu Não Sou Você/ Rasgando no Ar/ Burgo-alienação/ Sargeta/Distúrbios/ Violar Sua Leis/ Condenados/ Não Existe Mais/ Em Você ELAINE GOMES
CLASSICOS
comentados DAVID LACHAPELLE
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É tudo ou nunca mais Cazuza Exagerado Warner
Cazuza era um cara abusado. Todo mundo que convivia com ele sabia disso. O Barão Vermelho era uma banca sólida no cenário nacional. Os shows lotavam e os discos vendiam muito bem. Um belo dia ele cansou daquela agitação Rock’n Roll do Barão Vermelho, com determinadas obrigações criativas e compromissos, além dos conflitos crescentes com Frejat e Maurício (companheiros do Barão)que também queriam cantar. Agenor de Miranda Araújo Neto queria mais poesia. Queria gravar Noel Rosa e Lupicínio Rodrigues entremeados com rocks cheios de palavrões cantados por ele e mais ninguém. Sobre sua saída da banda, há o seguinte depoimento registrado no livro Preciso dizer que te amo (uma compilação feita por sua mãe, Lucinha Araújo): “Caí fora da banda antes que ficássemos inimigos para sempre. O show em Curitiba foi o Grand finale. Começamos a bater boca no palco, e platéia assistindo tudo parada. Todo mundo vendo o Cazuza brigando aos palavrões com o Barão e vice-versa. O grupo já não se entendia mais. Mesmo assim fomos até o final do show. Ou eu caía fora, ou seria eternamente o vocalista do Barão. Sem dúvida foi um bonito período da minha carreira. Eu tenho um ego muito grande, não conseguiria dividir um palco ou um disco”. Em 1985 Cazuza gravou Exagerado, seu primeiro disco solo, que foi um fenômeno de vendas. O poeta do abuso, um homem urgente. Faixas: Exagerado/ Medieval II/ Cúmplice/ Mal nenhum/ Balada de um vagabundo/ Codinome Beija-Flor/ Desastre Mental/ Boa Vida/Só as mães são felizes/ Rock da descerebração. ELAINE GOMES
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.............................. livros
NO ESCURINHO de ser inútil, a Realidade, aquele chicletinho do saquinho rosa e vermelho...enfim, com a idéia de colocar tudo isso em um livro divertido e envolvente os jornalistas, Luiz André Alzer e Mariana Claudino, escrevem o Almanaque dos anos 80 que coloca, de maneira divertida e leve, o leitor no mundo pós repressão nos deliciando com as maravilhas que lá existiam. VINICIUS GONÇALVES
BRock
Arthur Dapieve Editora 34 Com uma linguagem clara, concisa e uma narrativa pra lá de envolvente, Arthur Dapieve conta a história de um dos mais importantes movimentos musicais do Brasil: o Rock. Esclarecendo antecedentes, traçando prognósticos de futuro e acompanhando de perto esse movimento tão rico da década de 80, o autor nos insere no contexto e nos familiariza com a história do rock brasileiro. De Celly Campelo, cantando “Estúpido Cúpido”, nos anos 50, até a morte de Renato Russo, em 1996, deixando órfã uma verdadeira legião urbana, nada escapa à descrição. Grandes bandas de todo o Brasil, quem já foi e quem ainda é ícone do BRock, quem tentou e quem conseguiu sobreviver, as pequenas bandas e suas grandes contribuições... enfim, tudo o que foi, de alguma forma, significativo na produção musical da década, considerada “perdida” pelos economistas e sociólogos, mas que foi o marco do rock brasileiro, está descrito nas 224 páginas do delicioso “BRock – O Rock Brasileiro dos Anos 80”. CLÁUDIA URBANISKI
Almanaque dos Anos 80 Luiz Alzer & Mariana Claudino Ediouro
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O que existe entre a morte do “poetinha” Vinicius de Moraes e a queda do muro de Berlin?A fundação do PT e a eleição direta para presidente, depois de quase 30 anos de ditadura? Sim uma década! Uma década marcada pela diversão e pelo exagero. O mundo evoluía, os vídeo-games surgiram, a produção musical erupcionou, abertura política, nossa convicção
do cinema... DIVULGAÇÃO
consuma! ALZER, Luiz André & CLAUDINO, Mariana – Almanaque anos 80. São Paulo, Ediouro. ARAUJO, Lucinha. Cazuza – Preciso dizer que te amo. 1ª Edição. São Paulo, Editora Globo, 2001 ARAUJO, Lucinha Só as mães são felizes. 1ª Edição. Rio de Janeiro. Editora Globo, 1997. BRYAN, Guilherme. Quem tem um sonho não dança: Cultura jovem brasileira nos anos 80. Rio de janeiro. Record, 2004 DAPIEVE, Arthur. Brock – o rock Brasileiro dos anos 80. 3ª Edição. São Paulo. Editora 34, 1995. FRIEDLANDER, Paul. Rock and Roll: uma história social. Rio de Janeiro.Record, 2002.
LEITE, Marcelo. Madame Satã o Templo do Underground dos anos 80. 1ª Edição. São Paulo. Editora Lira. 2006
MARCHETTI, Paulo. Diário da Turma 1976 – 1986. A História do Rock de Brasília. São Paulo. Conrad, 2001
Viver é o melhor remédio Por Luiz Gerardi
Curtindo a Vida Adoidado Ferris Bueller day off Elenco: Matthew Broderick, Mia Sara e Alan Ruck. Comédia 1986 Paramount Pictures
Antes que eu comece a falar sobre Curtindo a vida adoidado é
preciso que vocês saibam que o filme não é uma superprodução, não teve um elenco recheado de atores famosos, o orçamento foi baixo e o enredo não era lá essas coisas. O filme apenas conta a história de um garoto que, entediado com o colégio, resolve matar aula. Ai surge a pergunta: então o que faz de Curtindo a vida adoidado um filme tão especial? É só a coreografia do sucesso dos Beatles Twist and Shout? A resposta é simples, não. O filme consegue reproduzir o que é o sonho de todo jovem estudante da década de 80. Enganar o diretor da escola (e ainda ver ele se da mal), curtir um lindo dia de sol com os amigos, ir ao jogo de baseball e... jogar uma Ferrari pela janela... A princípio, não há nada de mais em se fazer isso, hoje em dia vemos filmes onde se destroem prédios, aviões e até mesmo o próprio planeta. Mas naquela época era diferente. Em 1986, não se viam muitas Ferraris andando pelas ruas, o carro vermelho era o maior símbolo do capitalismo que caminhava a passos largos, jogar um carro desses pela janela era como dizer a toda a indústria cultural que não precisamos de suas invenções para viver. Então o filme tem um aspecto crítico? Eu responderia que sim, mas muito sutil. Ou você conhece algum estudante que mataria aula para ir ao Museu ver as obras de Picasso e Renoir? Difícil né? Mais uma crítica aos hábitos da juventude americana da época.
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.............................. saideira do avesso Desce regurgitando os poros, absorvendo a tensão, desinibindo. Olho para o quanto eu fiz, como estou e como toco as pessoas. Intimamente, a vontade extrema de causar comoção, euforia, brilhar. Faço-me entender com minha arte. Sangro os dedos e monto acordes. Agora. Nesta época onde os brilhos difusos são o chamariz à liberdade. Quando a mordaça foi arrancada e gritamos por aprisionamento dos antigos valores, eu sou único. A euforia lá embaixo, gritos em uníssono. Eu aqui, ela desce novamente. O pensar, o fazer e o agir trocam figurinhas. Marcadas? Raras? Eu quero...
Com uma única canção, determinar os gemidos do sexo sujo. Com algumas palavras, o ardor do ácido na língua. Tudo-agora-não-faz-sentido-
porque-o-hoje-é-agora-sem-mesmo-sedar... conta – que eles pagam.
A minha arte é a insatisfação: escrevo mal, falo mal e faço. Ontem foi dia de extremos. Hoje irei quebrá-los. No limite farei coisas improváveis. Beijar uma puta de esquina, tomar tubaína e trepar. Muito. Com tudo, Com todos. Mas agora...
Meu corpo emana uma energia estranha. Minha boca solta sopros harmônicos agradáveis. Lá embaixo eles são minha droga. Eu injeto até o ar da seringa. Pulo, faço acrobacias. Eles me adoram. Estou exposto e talvez eu entenda meu papel. Minha época. Minha juventude. Eu sou uma década. O tempo que insiste em se fazer notar até ontem. Assim, naquele olhar de um angulo privilegiado, eu espio minhas possibilidades. Nunca estive tão presente.
alex oliveira
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ATEMPORAL
............................... POP O V I S U EXL
meus anos 80 H
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avia mais de uma banda que eu gostava nos anos 80. A primeira que me chamou a atenção era a do “Lobão e os Ronaldos”. Eu gostava das letras e da atitude da banda. Depois eu comecei a prestar atenção nos Paralamas do Sucesso. Aquela coisa do “Eu uso óculos” me pareceu bacana. Tinha uma ingenuidade legal naquilo. Uma coisa relaxada, alegre, que eu gostava de ouvir. Eu também me divertia muito com o Ultraje a Rigor. É bom lembrar que no início dos anos 80 eu ainda morava em Porto Alegre e haviEu ouvi muita coisa nos anos 80, principalmente rock dos anos 70 – meu favorito até hoje. Mas nos anos 80 nós descobrimos que também poderíamos ter rock brazuca. Rita Lee foi demais. Raulzito então, nem se fale. Mas aquela avalanche de bandas, só mesmo nos anos 80. Ainda hoje, temos tanta coisa interessante acontecendo graças às bandas dos anos 80. Elas todas, em conjunto, foram nossos os Beatles. Tivemos Ursinho Blau Blau, Sempre Livre, OK. Mas também tivemos grandes Bandas nos anos 80, e algumas são grandes até hoje. Entre tanta gente boa, sempre preferi os Paralamas do Sucesso. Até o nome é diferente. O líder usava óculos, imagine, e tocava muito. A cozinha era das mais competentes, se não a mais competente do Rock Brasileiro. E eram três caras – só! Power trio, como o Rush e o Police – chique pacas. Foram os primeiros a misturar ritmos (Ska, Reggae), a buscar brasilidade (Alagados, Severino), e falar bobagem também (Eu não nasci de óculos). Quase ninguém se levava a sério, mas com tanto e tantos ritmos, com tanto swing, só eles. Puseram teclados, naipe de metais e fizeram todo mundo dançar e pular. Não tinha show melhor. Você saia de lá desidratado, mas leve e feliz. Paralamas, nos 80, hoje e sempre. a um encantamento especial em relação a essas bandas de fora da cidade. Elas eram produto de uma realidade diferente da minha.Eu tinha
impressão que eles eram mais livres, que sabiam ganhar dinheiro fazendo só o que gostavam, etc. Essas bandas todas me ajudaram na decisão de, em 1985, mudar para São Paulo. Eu queria viver o que eles viviam. Aliás, não posso deixar de fora a Blitz, com a maravilhosa “Você não soube me amar”.Kid Abelha era demais também. “Como eu quero” foi trilha sonora de muita fossa (fossa é anos 70, mas tudo bem)Outras bandas, como Titãs e Ira!, vieram somente no final de 80, pelo menospara mim. A primeira vez que ouvi Cabeça de Dinossauro eu chapei total.Do Ira! eu gostava mais ou menos.Pra ser bem sincero, eu dizia que gostava só porque era apaixonado por uma garçonete do Ritz que amava a banda. Daí eu tinha que fingir que amava também. Mas no fundo, no fundo do meu coração havia dois caras fundamentais para mim: Cazuza e Nei Lisboa.O Nei Lisboa eu acompanhei desde os anos 70 em Poá e para mim ele é “o cara”até hoje. Pena que pouca gente conhece. O Cazuza (e não estou falando de Barão vermelho, que achava um saco) é uma história a parte. Aliás, Cazuza e Nei Lisboa, cada um da sua forma, pintaram o melhor e mais poético quadro da minha geração.
Antonio Costa Neto é publicitário e Autor do livro Mãe na Zona.
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............................. INOCENTES, O ÁLBUM
“Mais conhecido como o disco dos pelados” O ano era 1989, nosso último ano na Warner e as relações andavam tensas, entre a banda e a gravadora. Entre os membros da banda, cada um tinha uma opinião sobre qual caminho a seguir e a gravadora queria que a gente fizesse um disco popular, que vendesse, ou degola! Todos nós vivíamos exclusivamente tocando, minha filha tinha dois anos e eu andava completamente duro, uma situação insuportável para um pai. Nos bastidores do Circo Voador, no Rio de Janeiro, encontramos Frejat, do Barão Vermelho, que se ofereceu para produzir o disco, a sintonia foi total, e achávamos que seria legal para quebrar o estigma que existia entre o rock de São Paulo e o do Rio. Gravamos uma pré (demo), com as músicas que fariam parte do álbum, no estúdio Vice-Versa, nos intervalos da gravação do “Panela do Diabo”, do Raul Seixas com o Marcelo Nova, encontrávamos Raul na sala de estar e dividíamos os lanches fornecidos pela gravadora. A aprovação de nossa demo-tape pela Warner foi um parto, senão fosse pela intervenção do Frejat acho que nunca gravaríamos aquele disco. Foi a primeira vez que entramos num estúdio sem um nome para o álbum, tamanho era o problema interno da banda, tanto é que ficou só “Inocentes”. A capa foi outra história engraçada, a gravadora queria os quatro na capa, nós não queríamos, então fizemos as fotos todos pelados e algemados, achando que a gravadora nunca aprovaria aquela capa, mas eles adoraram e o tiro saiu pela culatra, tivemos que engolir nossa própria idéia inoportuna. O disco todo é um pouco irregular, pois mistura várias tendências, tem o baião rock de “Promessas”, o rap rock de “A voz do Morro”, a balada sangrenta de “A Face de Deus”, acho que a melhor letra que já escrevi, e tinha as porradonas de sempre como “A Lei do Cão” e “Marcha das Máquinas”, mas era eclético demais e apontava direções demais para a época, estávamos um pouco adiantados... Como era de se esperar, ninguém entendeu nada, não agradamos nem a gregos e nem a moicanos, tomamos um pé na bunda da Warner, a banda se desmantelou e passamos três anos duros e sem gravar, três anos difíceis. Hoje ouvindo o álbum atentamente, vejo que ele é moderno, precursor de várias tendências que se tornariam realidade na década de 90, pois ele já trazia rudimentos de tudo que se faria depois, desde a mistura de música regional, até na levada funkeada, mas era pretensão demais para uma banda punk com toda a patrulha ideológica que a cercava.
t l b
Clemente é vocalista e guitarrista das bandas Inocentes e Plebe Rude, além de apresentador no Showlivre.com, falou com exclusividade à POP.
fale com a POP!
PoP
n°2
CONSELHO EDITORIAL: Eduardo Rocha, Tânia Sandroni, José Alves Trigo e Marco Moretti. Márcia Detoni, Mônica Mandaji EDITOR-CHEFE: Elaine Gomes EDITORES: Elaine Gomes e Alex Oliveira PRODUÇÃO EDITORIAL: Alex Oliveira REPÓRTERES: Vinicius Gonçalves Cláudia Urbaniski Luiz Gerardi
DIRETOR DE ARTE: Alex Oliveira DIRETOR COMERCIAL: Caio Cassinelli
jr comunicações POP
Uma publicação da JR Comunicações Ltda. Redação: Rua Dom Theodósio, 345 Vila Abertina
PARA ASSINAR Horário de atendimento: de segunda a sexta-feira, das 8 às 20h Contato: 55 11 7896-9806 E-mail: pop@teletarget.com.br Números atrasados poderão ser adquiridos diretamente com o seu jornaleiro, havendo estoque disponível, pelo preço da edição anterior
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na rede
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