Barreiro Contemporâneo Volume III parte 2

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MISCBLANEA



 R MA N D O

D Â S ILVA PÀIS

MISCELANEA (FIGURASE FACTOSDO BARREIRO

DEvÁRrASÉpocast

x

EDIÇÃO DA

CÂMÂRÂ MUNICIPALDO BARREIRO 7971



BREVE NOTA DE INTRODUCÃO As cróruícas e nótulas aúricts, aqti reunid,as, tr)ertencenx,ncL s'utr maior parte, rL,oque podemos clrtmur a pequena história rJo Barreiro. São esboçosde figuras e narcatiucrs rJe acontecimentos (alguns deles eiaad,osde pitoresco e getruíno sabor populclr), em que pesso(Lsd,e todns as categorias sociais são, no entonto, citarÌas, enfim, minud,ências d,o passad,o, que também fazem parte da Históri,a (com H grand,e) da própria terra, ontle utnas e outros surgiram e d,ecorreram,- mas já, numa escakt de esbatÌd,a'importâ,ncia ou projecçCto,na d,eci,sõ,o d,os sans d,estinos ou no rurno d,os acontecimentos locaìs. A g ora seleccionatlas,r et:ístas e actual,izoias, r ecotutitufuJas, mesmo, algumas d,elas, estas crónicas e uó..rias notas ligeiras, caleid,oscópicas, airam a luz d,a publiciclar)e atraaés clas nossa ,penl,, enL aários iornnis barreirenses, no rlecurso dos tiltimos trìnta e cinco anos, mais precísamente: & partir d,e 1931r. A sua reu,n'íão em uolume, resst+scitorl,asila rida ef émera, que tì,aerarn, correspond.e,finalmente, a um d,esejo que ao Autor mani,festaram, tanto purticular como pàblicamente, muitos rlos seus ant'igos luito,res, a,os quaÌs, tr)or isso, aqui deina erpressos os seus agra,rTecimentos,pelo apreço que llt es dispensara.m. .RsúaMiscelânia de Figuras e Factos do Barreiro de várias Épocas, constitu'ind,o, em com,plementorl.a MONOGRAFIA DO BARREIRO, uma obra integmda no presente aolume, teni, - estamos üsso com;encidosum sabor próprio tle leí,tm.a amerut s d,espretenciosa,atraués os rneandros cLead,ria <cenogrnfia>, que ao mais enigente dos sans apreci,ad.ores nã,o d,eíreará,de agratlar. Que assim sucetla, sã,o, naturaLmente, os nossos uotos. Armando da SiÌva Pais


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COCHIM. 1524 O GRANDE ALMIRANTE MORREU NA NOITE DE NATAL... A trasladnção dos ossos de Vasco d,a Gamn em 1880

SUA PASSAGEM PELO BARREIRO

D. Vasco da Gama, nascido em Sines, provàvelmenteem 1469 (â data é controversa), 1." Conde da Vidigueira e Almirante do Mar, o glorioso descobridoa:, em 1498,do caminhomarítimo para a Índia, eterna glória de Portugal e brilhante feito histórico, que abriu novas perspec: tivas à 'Civiìização,tornou-sg sem dúvida, pela maravilha dos seusfeitos de navegadore militar, uma das nossasmais destacadasfiguras. Como se sabe, foi autor do DiÁ,rio dessatriunfal viagem do grande Almirante, o modestomarinheiro barreirense Álvaro Velho. (') Em 1521 subiu ao trono de Portugal o rei D, João III. Os negócios da Índia corriâm mal e o governo de D. Duar"te de Menesesnão se

(') -V. uO SARREIRO ANTIGO E MODERNOI--I Alguns antigos rultos bú/n'eírerÂesrlotâleis,

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Parte- Cap. XLIV -


DO BARREIRO DE VÁRÌ-{S ÉPOCAS

D. VASCO DA GAMA 1." Cotrle rla VìciigtLeira ()iilosiavurâ

de HeÌnnni

Lo!ès)

mostrava à aÌtura duma boa administïação. Foi entáo que o sucesso-r de D. Manuel I chamou à corte Vasco da G:rma, que dela vivia retirado há perto de dez anos, e o nomeou vice-rei da Índia (o 2." deste título e o 6.'na escala dos governadoles), com pÌenos poderes sobre todas as terras portuguesas do Oriente, confiando nà suas râlas quàlid:ìdes de energia e prudência. Nomeado em 9 de Abril de 1524, o famoso Almirante saiu de Lisboa comandandoumà luzidâ armada de 14 velas (duas das quais se perderiam na viagem). No Oceano Índico, um estranho fenómeno, porém, ia dizimando a armada inteila: as terras asiáticas já estavam próximas, quando o mal se embraveceu,erguendo oÌÌdas a grânde aÌtuïa, sem que, todavia, fortes sopros de vento se fizessem sentirl... Perante o lisco de todos desapaleceremcom os barcos nas entranhas misteriosas do oceano, os tripulantes gritavam, apavorados, colrendo às peças,agarrando-seaos barris e às tábuas, resvalando peÌas amuradas,ao passoque outros acudiam às bombas,entre clamoresangustiosos e apitos de manobra. A confusão era já tremenda na própria nau capitânia, forte e formosa, quando o destemido AÌmirante, com a mão esquerda forte10


FIGURAS E FACTOS mente apoiada junto à amarraçáo das escoteiras da gávea, estendendo o braço direito, impõe, a custo, silêncio. E como se fizesse surgir, com o seu gesto, uma possibilidade de esperança à aterrorizada equipagem, exclama : - Sossegai!.. . E um silêncio súbito abafou a grita, logo interrompida, de novo, pela forte voz do arrojado Ìobo do mar, exclamando num riso aberto: - Nãn haljais medo! Alegraí-aos untes, portugueses! ri r,t mar que treme debaíro de nós! O fenómeno, afinal, tivera origem num tremor de terra subrnarino, como zÌsseverârâao conde da Vídigueira o mestre físico, de bordo. E, sem mais qualquer novidade, a armada aportou a ChaúÌ, a 5 de Setemblo daquele ano, e, no fim do mês, a Goa, onde D. Vasco da Gama tomou posse do governo, com toda a solenidade. A sua simples presençâ no Oriente, naqueles poucos meses até ao fim desse ano de 1524, foi o suficiente para se modificarem desonestos prôcessos de governo e se refrearern certos propósitos menos dignos. Em Dezembro, porém, o grande Almirante falecia em Cochim, a primeira das cidades da Índia que acolhera favoràvelmente os portugueses. O seu passamento deu-se na noite de Natal (de 2,4 pàrà 25, às 3 horas da madrugada), após uma curta enfermidade. Escreveu Gaspar Cor:reia (em <LeniLascla Íncl'ia>): <O corpo, vestido em roupas de seda, e em cima o manto da Ordem de Cristo, e espada e cinta dourada, e esporas douradas, calçadas sobre borzeguins pretos, e na cabeça barrete preto redondo, foi posto na sala na tumba da Misericórdia, descoberto, e o Ìevaram os fidalgos vestidos nos mantos da Ordem, e o levaram nos ombros com muitas tochas e todo o povo. Foi Ìevado ao Mosteiro de Santo António e enterrado na capeÌa-mór, e sobte a cova sua grade em quadra da altura de um palmo, forrada de veludo preto, com franja de branco e preto, posta sobre um pano de veludo que cotrria toda a cova; onde, ao outÌo dia, lhe fizeram grande ofício, onde estiveram todos os fidalgos, e os filhos metidos com e5 frades, que de noite se foram meter no mosteiro, fazendo seus prantos, como era razão, perdendo tão honrado pai, de tão grande merecimento ao reino de PortuEal>.


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

Em 1538, os restos mortais de D. Vasco da Gama foram tlazidos para Portugal, peìo seu filho D. Pedro da SiÌva, sendo depositados na capela-mor da igr:eja do convento de Nossa Senhora das Relíquias, de frades carmelitas, próximo da Vidìgueira, com a seguinte inscrição:

AQUI JAZ O GRANDE ARGONAUTA DOM VASCO DA GAMA PR." 'CONDE DA VIDIGUEIRA ALMIRANTE DAS ÍNDIAS ORIENTAES E SEU FAMOSO DESCOBRIDOR

Foi em 1 de Abril de 1880 que a, então, Academia Real das Ciências, de Lìsboa, rounida em assernbleia geraÌ, aprovou um requerimento de Latino Coelho, em que se pedia que a douta agremiação solicitasse do Governo, por ocasião do Centenário de Camões (10 de Junho de 1880), a trasladação dos ossos do g:rande poeta épico e dos ossos de Vasco da Gama, conjuntamente, para o mâgnífico templo dos Jerónimos. Deferido o requerimento, a Academia nomeou depois duas comissões, uma parâ tïatar da trasladação dos ossos de Camões, procurados na Igreja de Santana, à Mouraria, e outra para dirigir a trasladação da ossada do grande AÌmirante do Mar das Índias, da igreja do convento carmeÌita da Vidigueira. Desta segunda tarefa se encarregou especiaìmente o sócio da Academia, prof. dr. Teixeira de Aragão (1823-1903), ao quaÌ serviu de secretário o dr. Sousa Viterbo ( 1845(46 ?)-1910), auxiliado por mais dois ilustres âcâdémicos, o oficial da Marinha e astrónomo Frederico Augusto Oom (1830-1890), e o escritor Manuel Pinheiro Chagas (1842-1895).

A cerimónia da abertura do túmuÌo do grande navegador teve lugar no dia 7 de Junho, encontrando-se dentro dele um montão, confuso. de 12


FIGURAS E FACTOS ossos, pertencentes, evidentemente, segundo referiu Pinheiro Chagas, a diversos indivíduos, o que reveÌava ter sido a sepultula já violada, como outras próximas, por mãos sacríÌegas. Misturados com terra, viam-se dentro dela, dois ou três crâneos, diversos fémures e tíbias... <l{as estaria dentro da sepultura, peÌo menos, o crâneo de Vasco da Gama? Isso estava.Qual delesseria?>- perguntava Pinheiro Chagas. Era o maior deÌes, ir.rcontestàveÌmente,o crâneo de um velho, pois que os outros seriam de crianças ou adolescentes. A distinta comissáo académica não duvidou um momento de que tinha na sua frente esse resto calcinado, r'elíquia do cadáver do imortaÌ herói, que ia finaìmente entrar, no Mosteiro dos Jerónimos. Alguns anos depois desta impressionante cerimónia, ao fazer para à velhà llustraçd.o Portuguesa o seu curioso telato, escreveu Pinheiro CÌragas estas interessantes pâlâvïas, cuja transcrição tomámos como nosso dever, poï constituirêm, sem dúvida, um esplêndido trecho literário, diglo da mais âpurâdâ seÌectâ: <... Estávamcs em presenqado crâneo de Yasco da Gama. Dizer as impressões que nos saltearam logo que penetrou no nosso espírito a convicção de que era o crâneo do famoso descobridor da Índia, que tínhamos na máo, é impossível. Só o génio de Shakespeare pode encontrar a expressáo verdadeira para esse mundo de pensamentos, que nos tumultuavam no cérebro. Se HamÌet pudesse ter numa das máos o crâneo de Vasco da Gama, e na outra o crâneo de Yorick, se pudessesopesá-lose ver equiparadosnessa tremenda igualdade do nada, o cérebro que foi iÌuminado peÌa chama interior do génio, e o que abrlgou simplesmente o facho trémulo d,a razáo de um Ìoucol... Que ensinamentos nessa 1ição1... Que versos sublimes não acrescentaria o poeta do Avon a esse diálogo Ímortal de Hamlet e de Horácio, no cemitério de Elsenor ! Qual era o motivo dessa impressão estranha ? Por que é que sentiamos todos o calafrio das grandes comoções, ao sentirmos na mào o crâneo que fora quase quatro séculos antes agitado por táo levantados pensamentos? Quem poderá dizêlol Era tão compÌexa a causa! Mas o pensamento predominante era o seguinte talvez: O quê?! Pois um homem concebe o âltivo pensamento de ir atravez do desconhecido


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS procurar as regiões da aurola ! Esse pensamento executa-o com toda a energia de uma corageÌn ìndomável ! Afronta, sem desanimar, as borrascas infrenes do cabo Tormentoso I Domina com o prestígio da sua energia os Ìobos do mâr que o acompanham,que bastam, um a um, para infundir pavor às mais bárbaras gentesl Entra, sereno e frio, nessas cortes orientais, pala ele desconhecidas,e cheias, como as flor.estas da Índia, de traições e venenos! Volta cercado da auréola dos serni-deuses,e é acoÌhido na sua pátria com um imenso canto de triunfo ! Vê o seu nome repetido pol iodos os ecos do mundo civilizado! Na corte desÌumbrante do Papa Leão X, e nas cor.tessemi-bárbaras dos povos eslavos, o seu feito e a sua glória encontram a admiração e o aplauso! Vê erguer-se em Belém, em honra das suas facanhas, esse maraviÌhoso templo, onde fica pelpetuada a sua fama nos rendilhados do portal e nas altas abóbadas sombrias, e no lagedo sonoro, onde os passos do visitante parecem despertar todos os ecos da nossa gìória antiga I Morre, enfim, ele, o grande almirante e o grande vice-rei, na terra dos prodígios, que a sua audácia entregou ao domínio da sua pátria, cercado do respeito supersticiosodessespovos, que a sua energia assombrara! Como se lhe não bastasseo templo, tem ainda a epopeia! Como se os esguios coÌuneìos não fossem suficientes para levantar ô seu nome às regiões siderais, vêm ainda as estrofes aÌadas de Camões embalálo no ambiente Ìuminoso, onde pairam etername rte sobre as ruínas da pátria I O seu nome glorioso é, como o nome do seu cantor, o único nome português que se salvou do esquecimento ingrato do universo ! E toda essa glória, e todo esse prestígio, e toda essa energia, e todo esse poder, e toda essâ forqa estáo aqui reunidos nesse envóluclo ósseo insensíveÌ, que um de nós segura nas mãos, no recinto pobre e modesto de uma igreja de campo, deserta a essa hora ou quase deserta, e cujas desornadasjanelas deixam passar um raio de sol, que vai iluminar â campa, onde se lêem estas palavras: Aqui, jaz o grarule &rgonauta D- Vasco da Gama! Grande ! É então que nos lembra o magnífico exórdio do sermão das exéquias de Luís XIV. Com o crâneo de Vasco da Gama nas mãos, como o famoso pregador francês perante â essa que encerrava os restos mortais do rei quase omnipotente, ouviríamos também essa brevíssima frase, que ele soltou dos lábios apenas subiu ao púlpito, e que vale só por si um longo discurso: - Só DEUS É GRANDE !>

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DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

Encerradas numâ pequena urna as respeitáveis reÌíquias desseegrégio português de antanho, preparou-se entáo a sua condução, no dia imediato, num comboio que, peÌas oito horas da manhã as transportaria ao Barreiro, com destino ao Mosteiro de Belém.

II No dia 3 de Junho viera ao Barreiro, Pimentel Montes. encarregado de armar em salão o vagão que havia de conduzir da Vidigueira até esta vila os ossosde Vasco da Gama. Colgaduras Ìlegras, adorrradas de coroas de louros forravam-no interiolmente. Às 13.horas do dia 8, chegou o comboio especiaÌà estação do Barreiro, que era ainda o actuaì edifício das Oficinas Gerais dos C. F. S. S., à frente dò qual se estendia uma longa ponte de madeira, assente em, estacaria, até ao nível de água que permitia, no canal, a atracção dos vapores de pâssageiros. Meia ,hóïa anies, rancorará já, ao largo da pc'nta clo Mexilhoeiro, a corveta de g]|.etra Mirulelo, vinda de Lisboa, com o vapor Operário, rebocando uÌn escâìer arrnado em câmara ardente, quê tomou imediatamente o rumo do Barreiro, ladeado de mais de uma dezena de embarcações, que conduziâm o ministro da Marinha e Lriltramar e numerosos convidados à recepção dos restos mortais do Grande Almirante do Mar das Índias, de novo à beira das águas do Tejo. . -A ponte de embarque regorgitava de gente, esperando a chegada do comboìo â Marquesa de Niza e seus f,iÌhos, descendentes do ggande navegad.or, numerosâ oficialidade da Marinha, académicos, sócios da p.geiedadede Geog:rafia, membros da comissão da imprensa, promotora das festas. etc. Ao topo- da ponte formava a guarda de honra uma forçâ de Câçâdorps:1, junto da quaÌ alinhava a. banda da Sociedade Marcial Capricho Barreirense (<Franceses>), de que era mestre Car:los Augusto Abreu, e a cuja direcçáo presidia, nesseano, Joaquim do Rosário Costa.


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS Às numelosasembalcaçõesvindas de Lisboa juntavam-se,entretanto, muitos botes do B:rrreiro, do Seixal e de CaciÌhas, apinhados de gente. O espectácuÌoera formosíssimo.

Igrelja clos Jet'ónimos, em BeIém. - Túmulo de Vasco rla GaÌ|LrL, trabaLllo decalcado sabre o nLatuelino, d.& autoria do escuLtor Costtu Ìlota, tio (1862-19J0)

A urna contendo os ossos de Vasco da Gama foi então conduzida com toda a so enidade, para o escaler, acompanhadade um capeláo da armada, com sobrepeliz e estoÌa pretâ. Largando, em seguida, da ponte, o escaÌer e todas as outras embarcâções, formando cortejo, desÌocaram-se em direcção à corveta Mì.rulelo, para onde foi transferida a uïnâ, recebida ao portaló por altas patentes da Armada, comandante e oficiais do navio e g'uarda de honra. A Miúelo, embandeirada em arco, com a guarnição ras vergas, levantou ferro pouco depois, para fundear em frente do antigo Arsenal da Marinh:r, em Lisboa. LO

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IIGURAS E FACTOS <O dia estava espìêndido, formosíssimo dia de Junho> - recordava Pinheiro Chagas em 1886. <O espectáculo dessa esquadra, vinda do Barreiro e atravessando o Tejo em toda a sua imensa Ìargura, dizem-nos os que o puderam ver de Lisboa, era um panorama verdadeiramente maravilhoso>.

Entretanto, era recebido também com elevada solenidade, à porta daquele Arsenal, o cofre contendo os restos mortais de Luís de Camões. A meio da tarde desse dia, um g:rande cortejo fluvial, conduzindg despojos daqueles dois Grandes Portugueses, largou rio abaixo para os Belém, ao ruído de salvas, de músieas e de foguetes, por entre aÌas de embarcações mercantes e de transportes fluviais e marítimos, embandeirados e repletos de gente. Desde então, ficaram lado a lado os despojos gloriosos do descobridor do caminho marítimo para a Índia e do grande poetâ que cantou esse feito maraviÌhoso - os dois ligados peÌo eterno víncuÌo dos LusiarJas.

Dois dias depois, em 10 de Junho, 300." aniversário da morte de Camões, Lisboa realizou a sua festa esplendorosa, em memória dq famoso épico. A Comissão Executiva da Imprensa de Lisboa - sua organizadora ---1 traduzira nestas paÌavras o seu alto pensamento: - <O povo portuguêg na comunhão fraterna de todas as suas actividades e de todas as suaq instituiqões sociais, na plena consciência da sua vitalidade nacionaÌ e da sua solidariedade histórica: - Saúda a memória do extraordinârio pensaclor e artista, que reâlizou nos Lusíatlas a eterna e decisiva afir' mação do génio deste povo e da sua característica e gloriosa concorrência na civilizaçáo moder"na>. E Latino Coelho dizia na Academia Real das Ciências, ao fazer nm extraordinário Panegíri,co,do Poeta: <-Onde nasceu Camões? É duvidoso. E ainda bem, porque fica sendo todo o Portugal o berço do grande épicol> 1 ry


DO BARREÌRODE VÁRIAS ÉPOCAS O cortejo cívico e triunÍal, nesse dia realizado, excedera em imponência todas as expectativas. Os grantles carros triunfais, que nele tomaram parte, alguns dos quais cÌeìineadospor artistas como Silva Porto, Columbano, Simões de Almeida, Tomazini, arquitecto José Luís Monteiro e outros estiveram expostos três dias no Terreiro do Paço. Mais cìe 150 mil pessoas enchiam, por essa ocasião, as ruas de Lisboa, da pitoresca Lisboa do último quaúel do Século XIX...

C ITA Ç Ã O N A S OB R A S

DE DE

B A RRE iRO V I CE NT E GIL

Mestre GiÌ, autor dos famosos autos, com cuja representação concorreu, decididamente, para fundar um teatro português e que, aÌér4 disso, teria sido um habilíssimo ourives-lavrante, exetcendo também as funções de mestre da balança da Casa da Moeda de Lisboa - no que,. em tudo isso foi protegido diÌecto da <Raínha Velha> (a viúva do rei D, João II e fundadora das Misericórdias) - deixou nas suâs peças larga citaçáo de povoações portuguesas, em especial da Estremadura (com primazia para Lisboa), da Beira e do Alentejo. Gil Vicente, segundo estudo de um dos seus mais minuciosos biógra' fos, que foi Anselmo Braamcamp Freire (1849-1921), teria nascido algtns anos antes de 14?0, e falecido <plôvàveÌmente> nos fins de 1536' princípios de 153?>. O que se sabe, ao certo, é que, em Abril de 1540,, o autor do Auto da Àlma era já falecido. Por essa altura, o Barreiro era já uma ui.la, mas há pouco menos de vinte anos. (A carta de vila do Barreiro é datada de 16 de Janeirq de 1521). (1) Embora com alguns dos habitantes dedicados à agricultura, a acti; vidade da sua mâioria exercia-se na pesc&, no rio e na barra de Lisboa'

(') -V.

(O BARREIRO ANTIGO E MODERNO)' págs. XV a XIX 18


FÌGURAS E FACTOS

Era já, naturalmente, a profissão mais rendosa, se bem que mais rude e violenta. Tripulantes das embarcações, gente do mar, forte e sâdiâ, era, errì, geral, de gestos decididos, de poucas brincadeiras. A primeira referência ao Barreiro, que registamos, é a que consta de um dos mais interessantes e conhecidos autos de Mestre Gil, o Auto ila Barca clo [nf erno. Fzla o Onzeneiro (o usurário) : Hou kí hou clemo barqueiro, Sobeìs oós no que me lunclo? Quero la tornar ao mundo, E trazer o meu d,inhe'iro, Qu'aquel'outro mar'ínheiro, Porque me tê tir sem tw,rla, Dá,-me tanta borcegarla (') Como arrüs ld, do. Bayteiro. GÌL VICENTE

(')

Pancâda.

No Pranto tle Mo,rÌa Pardo' na fala da encomendaçãoda alma (Testamento)- diz ela: V enha tod,o sacerdote A este meu enterramento, Que ti.üer tõ,o bom alento Como eu ti,ue cú de cote. Os de Abrantes e Ptrnhete (") D' Arruda e d' Alcouchete, D' Alhos-V etlros e Barreiro, Me renhã,o cú sem d,inheiro, Até cento e uinte e sete. (')

Era â antiga designação da vila de Constancia, no Ribatejo.

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DO BARRE]RO DE VÁR]AS ÉPOCAS

Uma terceira citaçáo se encontra na tragicomédia Ternplo de Apolo, na seguinte fala do Vilão:

Querei,s conhecer o mnrn, Dai,lhe ofício a sem;i,r, Poi,s nrtn fuí cosa,na Londeìra, Nem. em tod,o o Ri,bateio, Em qu'eu nõ,o emtt'esenxpeio; E jâ esti,uena Peilemeira; E não ai 6' qts aqui uejo. Vão aqui, pôr por porte'iro Hum d.emopastel de pêgo, E tem cenreíra (s) conlego: Poix n'egreja do Barreiro Entrei sem este trosfego. (')

Cenreira

é teìlÌnú, bi'rra.

Na mesma peça, no diálogo do ViIõ'o com Apolo, diz aquele: Nanca uos eu dwei bolos; Porque como ü noz he noz, Deus nnsceo em Estremoz E sun mÃ'e em Ama'i'olos: E esta he rwinha ttoz. E San Ped'ro n'o Baweito, E San Paalo em Alcouchete, San Fro,nci'sco em Atregrete, E SontisPríto em Pornbeiro, E San Funand,o em Put'hete. Nos seus espirituosos versos, MestÍe Gil Vicentê tigo Sào Pedro Barreiro... Por acaso, por conveniência de metrificação do verso?

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FIGURAS E FACTOS

O que náo deixa de ser interessante anotar ó que houve uma Irmandade de S, Pedro, composta do pescadores, do Barreiro que, desde tempos bem recuados, estava da posse da ermida de S. Roque, que existia no local da actual Igreja de N.' Senhora do Rosário. A época da fundação dessa irmandade é, porém, completamente desconhecida.

Por fim, mais duas citações do Barreiro, se acham no Auto tla Festa. Um vilão, de nome lonafonso, reproduz, sem âlterâções muito sensíveis, as suas faÌas no Tem.plo d,e Apolo. As referências ao Barreiro são, portanto, seis, nas obras de Mestre Gil, que casado foi com Branca Bezerra...

V EL I{OS

MA N U S C R ITO S ... I

. . . e a Misericórd,ia f oi intlemnizada por D." Brites pdrd, <<d.esenccffregcL'r>> d cLlnlado defunto mnrido... Estas coisas são de todos os tempos e sucedem em muito boas instituições... Pertencem ao rol das misérias sociais, que tanto podem tocar aos grandes como âos pequenos. Em 1?89 (unr ano célebre na história da humanidade: 14 de Julho Tomada da Bastilha - Início da RevoÌução Francesa), a Mesa da Mise' ricórdia do Barre,iro estava desfalcada pelo seu antigo tesoureiro, que se havia locupletado corn dinheiros da instituição, e numa quantia muito importanter para aqueÌe tempo: 107614 réis ! Mas o infiel servidor morreÍâ, e de como a questão foi arrumada, sem prejuízo para a Santa Casa, teza o termo da Mesa, que a seguir reproduzimos: Aos nwe üas do mês de Agosto, d,e mi'\, e setecentos, a oitenta, e noL)eúnos, na Caza d,o Despacho d'esta Santo, Ca'zo'dtt' Miserícórclia d'esta q1


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS ailla d,o Barreiro nú f)rezença tlo lrmãn Proteclor, muis lrmãns ad,juntos abaro assignarlos, juntos rt." se detreminarenL cuuzas pertencentes a esto'mesma St." Caza entre ellas foì. oua'ido o requeri,mento de Brites Mwia d,osSwttos, oÌ,uaa tle Antónío tlos Santos, Teaoureiro q. foì. d,esta, St." Caz1,,a qunl c.;md,o-secitad,a a requerimento clesta mesrma St." Caza p.a conl effeito satüfazer a quantia de Cento e sette mi| sei,s centos, e quo,to,rz,e réis, q. tanto se achou ffuar elle üto seu vnaridn d,eaendaa estú mesn'Il, Caza d.os awLos enx q. foi. Tezou,re'írod,ella; e porq. ell'a se &chaa& nLt.o akonsod,a, e sem mei,os ytara pud.er satisfaaer huma tã,o encessi,aaquantia, e dezejond,o d,e algum modo desencams,gur a al'ma d,e seu d,efunto marid,o, e não'prel'uücar ü estü St." Caza, de sua' 6po'tltanea, e Liare aonta.da of f ereci,a pl,r(L pa.gún'Lentotlct tlita quantì'l" humas Caaas, que possue nesta ViIIu,, no Ci,ti.o d,as Obras, us quaes sdo swas po,t' compro' q. dello* fizera seu defunto ma,r'ído, e nesta certeza dezejond,o a Meza d,ealgum nxod,oÍavorecel,kL,eTtõ,opreiudicar a esta mesmo, Caza, hou,aerão por bem aceitar-l'he a afÍerto, por elkt fe'ita', d,e que se esti,pulani E scriptura para título desta mesm,a St.' Cazo, com as comüçoens, e clausulas p.o muior segura,nçaprecizas, a qunl feita e assignad,a e entregando ella o titulo po,rq. llze pertencem, ú hõ'o por tlezobriga.tla d,a quantia Liquklarla, e de qualquer outrú q. pello tempo ad,eantese kqutúar, e constar ficar o seu d,i,to marido d,euendo d,os annos ent" q. foi' Tezoureíro desta mesma St.' Cttza; e, por a'ssim estarem conaidos e ajustad,os mand,arõ,ofaaer este termo, q. conz"a d'itu offeTente assì.gnarã,o. E eu o Vigó,rio Antóüo Justino d,e Matos, Escríuõ,o da Meza, o escreui e ass'ignei,. O Provedor, Francisco Aluarez Cazal. - O Vig.", António Justi,no de Matos. - Francisco TheoiLoro Alaes Cazq'l- Mam,el (Ileghtel) Jaci,nto José Borges - Al,ermd.re Alberto tlos Santos - Joaquím (IIegíael) - Brites Mariq, clos Santos. NOTA - Não deixa de ser interessante anotar, ,em face deste documento, quanto é antiga a denominação do Ci,ti,o (sic) das Obras, pois não deverá ser outïo senão aquele loca1 do Barreiro, no início da já extinta estrada para o Lavradio, conhecido por As Obras, ainda hoje vulgarmente designado por Largo clas Obro's, que, desde 15 de Dezembro de 1910, por deìiberação da Câmara Municipal do Barreiro, tomou o nome de Largo Alenand,re Herculono, Que obras fossem essas que já


FIGÜRÀS E FACTOS em 1789(!) eram sinalizadoras daqueÌe local, não o sabemos nós, até porque nem delas (das obras rnateriais às obras espirituais...) aÌguma vez encontrámos por ali vestígios de já táo recuada época...

II o.uisddos,o andc[dor tocaaa o síno, Eram <<bocalmente>> n'L(rsos irmã,os não andreciam... Compulsando alguns terrnos da Mesa da Misericórdia do Barreiro dos fins do Século XVIII e dos princípios do Século XIX, nota-se que uma grave crise de gente capaz de a administrar, afligia por esses tempos a veneranda instituição. Ontem, como hojg em quase toda a par"te, mas com uma diferença: é que, antigamente, não abundariam, por certo, pessoasà altura de desempenharem capazmente as funções qu,e eram convidadas a exercer; hoje, elas não faltam, o que não revelam é disposição para aceitá-las. Não estão para se ralar... Isto - quando os cargos sáo gratuitos, porque se eles passassem a ser remunerados, a entidade que os tivesse de nomear ou sancionar, via-se e d-csejava-se com a muÌtidão dos pretendentes e dos empenhos à sua volta... Daqui o observar-se este curioso aspecto: contra a facilidade coÍÌì que se demitem dos cargos gratuitos ou os abandonam, surje a dificuldade de correr airosamente com eles dos cargos remunerados. Ai não... Pois em Janeiro de 1804, a crise era manifesta entre os hmãos da Misericórdia, para eleger a nova Mesa. É o que se revela neste terrno, recheadinho de tantos erros que <<chumbariam>hoje um menino da 2.' classe da instrugão primária, e no qual se chegou a apelar para o Desembargo do Paço, no sentido de solucionar o caso: <Aos aínto, e noue üas d,o mes tle Janetro de míl outo centos, e qucltro o.rLlxosna Mi,zeri,cord,ía desta Vi,la d,o Barrei,ro se ajuntou o Proae' d,or offi,cios, a lrmaoms po,t'a ef e,ito de se fazer noaa. Elei.çõ,o na fo,rma d,o nosso Compromisso por serenl para, ."ssoaaizados a muior ytarte d,eles nã,o só bocal,mente,co1no tã.o berrnao toquo tle sino, que IJ." esse ef ei,to tocou, pa,ra se ajuntatrenz, e coma se tti,o ctiuntarão, nã,o só os lrmaons


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS do Meza, como tão bem os mnis lrmaons, apmas d'a Meza o lrmãn c\a Meza Antínio d,e.Medeiros, e f ora da Meza unícumente o Doutor António Firmo d,eFegueired,oMore,íra, e o Alferes Alerand,re Alberto d,osSarttos, com os qtnì,s senÃ,oltoutle p,roced.erd dita Eleição cuia falta iá' prati.cad'a por outras algumos rezes, corno consta'por ternzos lattrados neste liaro, d,ó,uma eaid,ente proua d,e falto, d,e respeito e obedüncia ao Prouedor, e Meza, et Tlor consequência o que recomenda, o nosso Compromisso, e fal,ta, d,e conüçoens impostas no termo d,assua* aseitaçoens, cuias desord,ensach,ãoeles Proaed,o,r,e muis Irmaons sobre,ütos porlerião ser raft1€üó,aeì,spor d,eternuínaçõ,o Regia d,eSua Alteza. Eeal', para, cujo ef ei.to, não sendo d,a inúenssõ,od.e elles (ilegivel) Mezar'i,os,ete,rrrizassemsse,e conti' nuz,renl nos enwregos que actualmente estCt'oseraindo comtra o espír'íto d,o mesmo Compromísso,- acordarã,o 'por no,'prezensa tlo mesmo Soberano Senhor todo o erposto, pello competente Tribunal rlo Dezembargo d,o Passo, afim cle úi.gnw-se prouidencÌnr d,e renúd.io cometendo a algutn d,osMeüstros, a quem f or semído o, f actura cla noua Elei,çã,odestu,Santa' Caao,; e palla d,ito, falta dos sobreütos lrmaons senã.o d'eternuinarã,o aá,rias cowzas pnro, utilirLad,e da mesma Santa Caza, e só *im d.eterrninarã,o que se dessem algumas esmollas aos pobres desta Vill'a, o que se enecutou, e por não se pod.er tleter"minar cou.zaalguma, os sobreütos que se o,charõ,oprezentes mand,ar'ãofazer o prezente termo, que assignarão, e Eu Manuel Pi,nheiro Borges E scriaão da d." Imnand,ade, que o fiz, e ass'ignei. Manael, Pi,nh.."Borges - O Provedor, Alawez Cctzalrle Med,ei,ros- Antóni.o Fi.rmo de Fìgueireclo Moreyro, be,rto tlos 5t,."'>.

Pình." - Ant." Aletand,re Al-

A crise deve ter sido demorada, dado que o termo de Mesa que se segue a este, tem a data de 26 der Dezembro (de 1804). Francisco Aìvarez Casal continuava à frente da Misericórdia. mas seria já por pouco tempo.

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FIGURAS E FACTOS

III

Em 1810, a Misericórdia d,oBarreiro zela pela regularÌdnd,e das suas contas, e despach,aalgr.ms assuntos interessuntes O documento que a seguir reproduzimos é datado de JuÌho do ano de 1810, que não foi um ano qualquer... O nosso País, ainda perturbado pelas duas recentes invasões francesas, iria suportar, nesse ano - em Setembro - a terceira incursão das tropas do doido genial que foi Napoleão Bonaparte... Não deviam ser, então, pequenas as preocupações de todos os barreirenses, que tinham visto por aqui os desatinos dos francesesde Junot em 1807. Desta vez, porém, os novos invasores não passariam das Linhas de Torres... Mas estes pobres documentos são impenetráveis a tudo quanto diga respeito à grave situação do País, por essa época: nem indirectamente, sequer, dizem algo que tivesse sido uma consequência desses acontecimentos. E não sabemosde outros nos arquivos da instituição... (Arquivos?!-Uns tantos papéis, um veìho livro...)

Revertamos agora ao objecto da crónica: O novo Provedor da Misericórdia do Barueiro, Fonseca Morgado, sabedor das repreensões de Sua Reaì Alteza quanto à forma pouco cuidada como decorriam os assuntos da Santa Casa, torna deliberações várias para não tornar a acontecer <<oque com vergonha da Corporação tem sucedido repetidas vezes>, e chega a responsabilizar (no assunto dos frades do Convento da Verderena) o próprio Tesoureiro, <que pagará por seus bens>, se não cumprir o que ficava resolvido. Mas o rneihor é transcrever: <Acordão em Mesa o Provedor e mais Mesarios abaixo assignados, qúe examinando as Contas do anno próximo passado, se demore a sua Aprovação até que se liquide o pagamento dos foros e se saiba o estado actual da Santa Casa.


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS Que ilegiáo o procurador actuaÌ da Mesa o Irmão Joaquim José Machado, e the fizerão Procuração GeraÌ assignada por toda a Mesa para proceder à effectiva liquidação de foros e rendas, fazendo-se'Ìhe as despesas à custa da Santa Casa, e cobrando judicial ou amigàvelmente, e para dar contas de tudo a esta Mesa, com o mâppa coÌnpetente do estado da Santa Casa e das suas dividas. Que o Thesoureiro actual o Irmão Manoel GÌiz Lobato não desse aos Reìigiosos do Convento da Verderena dinheiro algum, senão os doze mil réis que a Instituidora da Capelìa manda dar, mas sim se Ìhes dê todas as causas em espece, como cumpr€ fazer a Administradores com pena de que fazendo o contrario, se lhe não levará em conta e o pagará por seus bens. Que o sobredito Thesoureiro fará huma exacta e diária conta de receita e despesa, corn divizáo do que he da Capella e do que he da Irmandade, e com documentos competentes, pâra que esta Santa Casa mostre sempre a probidade, honra e desinteresse dos seus Officiaes, para que se observem os Provimentos dos Provedores da Comarca, e para que em fim não sejão reprehendidos de Sua ReaÌ Alteza, o que com vergonha da Corporação tem sucedido repetidas vezes. Que deffirindo ao Requerimento de Manoel Pinheiro casado com Maria Joaquina dotada desta Santa Casa em que pede o pagamento do seu dote, visto estar nas circunstâncias de ser pago, mandarão que o Thesoureiro faça o effectivo pagamento logo que haja dinheiro. Que deffirindo também ao Requerimento de Altónio Gliz preso na Cadeia desta Villa por ter commettido desobediencia contra o Comandante das Ordenanças, e ao mesmo tempo compÌicado com crimes, e embargado por eÌles na Cadea desta Villa, a Mesa intendendo não dever ser embargado por outros crimes, por ser Preso MiÌitar e por ser pobre, o descrevem nos Livros da Santa Casa, mandão que o Irrnão dos Pobres lhe assista diàriamente em quanto estiver preso com hum pào, que o Thesoureiro satisfará, e que o Escrivão da Mesa escreva âo Dr. Juiz de Fora huma Carta rogando-Ìhe em nome da Mesa todo o favor e es:molÌa, e que no caso de não ser attendida esta Carta que deve ser revestida dos termos os mais atenciosos, então se represente ao Ex.'o Sr. General e enfim, se cuide em seu livÌamento.

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FIGURAS E FACTOS

E por não haver mais que determinar, mandarão lavrar este Accordão que todos assignârão aos outo dias do mês de Julho de Mil outo centos e dés, e eu Marcos Pinto Soares Escrivão da Mesa o fiz e assignei. José Mi.guel Saruíaa d.aFonseco,Morgad,o (Provedor - Mrlrcos Pi,nto Socr.res(Escrivão) - Manoel GLi,zLobato (Thesoureiro) - Joõ.o Pi,nlteí,ro Borges-O. P." Jo'sé Antóni,o Soares - Joaqu'int J. Mnnhatlo (Procurador) - Vi,toríno Marques - (seguem-semais cinco assinaturas ilegíveis).

Desde 1760 que a Misericórdia do Barreiro continuava na administração dos bens do vínculo instituído pela fundadora do Convento da Verderena, D. Francisca de Azambuja, isto é, a partir da época em que faleceu, sem deixar descendênciadirecta o último sucessor do sohrinho da testadora, Fernão Rodrigues, que eÌa fizera seu herdeiro. (1) A Misericórdia, entre muitas outras obrigações, tinhâ ã de prover à sustentação dos frades do convento. PeÌo que se verifica pelo documento transcrito (que não está muito cÌaro a tal respeito), os franciscânos estavam a receber pensão em dinheiro, indevidamente, mas que esta instituição entendia dever passar a entregar em géneros alimentícios, para sustento dos mesmos religiosos, como âliás, lhe competia. De qualquer forma, estariam os frades aÌiviados da necessidadede esmolar para não morrerem de fome, embora isso fosse contra as regras da Ordem. - A entrega de dotes pela Santa Casa da Misericórdia (por conta das rendas dos bens deixados pela testadora) era também outra das obrigações que lhe assistia. - A protecção dos presos pobres e desprotegidos era uma das missões das Misericórdias - do seu Compromisso. O acordão que se transcreve re ere um câso desses. Nem tudo era mau, antigamente...

(O BARREIRO (') -V. ANTÌGO E MODERNO)) A Sa,nt& Cdsa d.a Mise,ì"icórdí.r, do Bartefuo e e) suo, Capehr.

I

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FIGURAS E FACTOS

IV Em 1818, o guardião do Cotu-entoda V erd'erena informaaa a Misericórüa do Barreiro <<quettdo .. . tinha Padres que lhe comesserntodcLa carne>> Eis mais outro interessanteacordão da Santa Casa da Misericórdia do Barreiro que se refere aos fr:rdes tlo antigo Convento da Madre de Deus da Verderena: <<Aosnove dias do Mes de Agosto de mil oito centos e desoito n'esta ViÌla do Barreiro e Casas do Despacho cle Santa Casa da Misericórdia da ditta Villa, estancÌo em Mesa o Provedor e mais Irmãos da Mesa abaixo assignados parâ o fim de deliberarem cousas relativas ao Serviço de Deos e desta Irmandade, foi proposto pelo Irmão Provedor: Que tendo-selevantado os Sequestrosdos bens da Capela de Do ra Francisca d'.{zambuja, e entrando a Irmandade na Administração da dita Capella, por Despacho do Dr. Provedor da Comarca de trez de Agosto do corrente anno, mandara approntar pelo Irmão Thesoureiro actuaì toda a Ordinaria de carne e pão, que em cada semana se deve tlar à Comunidade da Verderena, e tendo sido notificados o Síndico e os Padres, para teceber a dita Ordinaria em espece com pena de se perder por sua conta, âppareceo o actual Guardião do dito Convento, Fr. António de Jesus Crucificado, dizendo que não tinha Padres que lhe comessem toda a carne, que a Instituidora deixou em seu Testame rto, e que por tanto só queria receber meia arroba cada Semana e o pão amassado,a cuja pïoposta respondeoo Provedor que nada podia decidir a este respeito sem convocâr Mesa, à quaÌ devia requerer aÌegando suas razões, ao que se comprometteo, assentando-se as sete horas da manhã tlo presente dia, p." se apresentar o dito requerimento, e sendo nove horas e meia sem apparecer pessoa alguma, Requerimento, nem Officio do dito Guardiáo, o Provedor fazendo ìer as verbas dos Testamentos e Codicilos, a Provisão Regia de Sua Majestade de quatro de Maio de mil oito centos e hum, e o Mandato do D." Provedor da Comarca de tres tle Agosto corrente, pôs a votos da Mesa, se se devia dar aos 28


FIGÜRÀS E FACTOS

Padres as Ordinárias em espece como a Instituidora ordenara e o Instituto dos Padres o exigia, ou se lhes devia dar em especea carne qrieo Guardião pedisse, e o resto em dinheiro pâra as suas outïas necessidades,o que sendo bem ouvido de todos os lrmáos, responderão tratìA íur odo ;rtP r;orntorto) O 0 ? th o .d ;l;r ' io fi á' nuìl o que rto P .ra"n uniformemente, da B i rr"ìto' .li Sa n ltr Co sa Ja l l ìscthórJìa tÕ dP níto'sc tsl t d? dato Vr r z. A .i '.' ,i *'sà i,ã ito l oto ;;;;"elÌes não tinhão outra i 'l sti tu:"i o ,l a tot,n,l ouro ') ,;; - ' r :, "'rP r"tl cl o P o P rJ',rLei senão as Verbas p ve ' .,ío r i o A utor dasl as ?Á nìros) as Iarl rs fa/rè't's n e ìr o AL le lin o do. C unha. À osquctdo. as Testamentarias, q rP sl nt!rodr c ronsaP radn 1 1 e C( 1 p e ln , ì,osl P r;orüP nt' quaes confirmadas por S drl l o A ntónío Regia, Authoridade mandavão dar a carne em especee não em dinheiro, de cuja determinação não podião affastar-se sem manifesta infracção do cumprimento exacto das obrigações do seu cargÕ de Administradores' que sendo Representantes da i".tndo.u, não podem nem devem alterar o que foi por ella disposto' dessem e que por tanto querião que em cada hum sabado do anno se pão aos tlitos Padres trinta e dous arrateis de vaca e hum alqueire de náo amassatÌo, e em todas as terças-feil:as, oito arrateis de caÏneiro' se sendo no tempo que decorre do Natal ao Entrudo, em cuJo tempo e vaca de arrateis vinte Testamento, lhes dará na forma do referido que Magestade Suâ vinte cle porco; e que ïequeressem emediatamente â só Elle potleria annuÌaï humâ verba testamentaria tão clara e manifesta, no que totlos convieïão' e que o Escrivão partecipasse ao Guardião esta mesma decisão para seu governo' Outro sim Acco :tlaráo que se remetesse à Mesa da Definição da Provincia de Santa Maria d'Arrábida huma Representação descrita no Livro do Registo a f. 11 pedintlo à dita Provincia as Providencias necessárias sobre ô estado actual da Comunidade da Verderena' E por não haver mais nâda que decidir mandarão findar este Termo que todos assignâïão e eu Marcos Pinto Soares,Escrivão da Santa Casa 29


DO BARREÌRODE VÁRÌAS ÉPOCAS o escÌ'evi e assinei. (a) Marcos Pi,nto Soares, Aboím, Pinheiro, Soares, Crtrlos António, (de cruz). Deste acordáo da Mesa da Santa Casa se verifica que os franciscanos da Verderena teimavam em receber uma parte pelo menos, da Ordinária, em dinheiro, pois só em espécie se tornava demasiada para eles. Com efeito, a comunidade não passaria de uma dezena, ou menos. de indivíduos, por essa êpoca,- z poucos anos, já, da sua extinção (1834). Parecia rnoáL\el, portânto, o pedido dos franciscanos paÍa que lhes fossem diminuídas as quantidades de carne que, normaÌmente, a Misericórdia Ìhes entregava. Mas esta respondeu que não tinha mais que cumprir o testamento da instituidora. Essas obrigações só podiam ser aÌteradas por despacho régio. Poúanto, em numerário - nada... Se a questão acabou por ser resolvida de outra forma, não sabemos, pois desconhecemosa existência de outros documentos que se lhe refiram. O apeÌo, registado na parte final do documento, da Misericórdia do Barreiro à Junta de Definição da Província da Arrábida, deve ter sido no sentido de mandar executar obras de reparação no convento, as quais se fizeram em 1819, administradas pela Santa Casa. Por essa altura era Provedor um senhor chamado António Correia Manuel de Carvalho e Aboím, e o escrivão era o prior de AÌhos Vedros, Marcos Pinto Soares.

Uma <Notícia>> do Passado. .. AS FESTAS A NOSSA S.A DO ROSÁRIODO BARREIRO, EM 1825 Intitula-se Notíci,a (hoje chamaríamos programa) o amarelado mas ainda bem conseÌvâdo papel meiolinho em que a <Regia Typografia Silviana>, de Listroa, publicou no ano de 1825, o relato da tradicional festividade do Barreiro, a Nossa Senhora do Rosário. (') (O BARREIRO ANTIGO E MODERNO>-I Parte- Cap. XIIÌ(')-V. Da,t.t d.e 1736 q, Fastì1,ìdnrle (L Nossa Serú1.o,Ì'(x do Rosó,t'i.od.o Barreìro.

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FIGURAS E FACTOS

0X!n,"R?o SíCarlÍ Patiar"ha concedeí00 di"" d" ltuma lnàulq! a todae di, pêisoaa f. rczarem Saloe .B.a-diante dêsta lmage'

(Da Colecção dè Resistos

de Santos, do Àuto!)


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS Hoje raro (e quem sabe se único?) é este documento, saído com a necessária licença da Mesa do Desembargo do Paço, há nada menos de 145 anos... Já reveÌa suâ antiguidade e infunde respeito, porque este papeÌ de que, por oferta de dedicado amigo, somos possuídores, vem <sobrevivendo>a um bom número de gerações... Há quantos anos se desfizeram já, no seio da terra mãe, todos os olhos que o leram?!... Perdoados estarão já, também, ìrá muito tempo, os erros ortográficos de que o recheou quem o escreveu... Mas vamos à N otíci,a, que será interessante cotejar com um pïograma moderno da festividade. Naquele ano de 1825, as festas reaìizaram-sede 13 a 17 de Agosto. No primeiro dia efectuava-se o <Transito de Nossa Senhora, com uma devota Procissão, que sâhirá da Igreja de S. Domingos desta cidade (Lisboa\ pelas 8 horas da manhã>.

CONDUçÃO DA IMAGEM

AO BARREIRO

Na Procissão se conduzirá huma Imagem da Senhora até ao Caes da Pedra, para dahi ser transportada ao Barreiro em hum EscaÌer, que irá acompanhadode vâïías Faluas, e outras Embarcações,as quâes sendo pagas pela Irmandade, estarão naqueÌÌe mesmo sitio, para ìevarem gratuitamente aos Irmãos e a todas as mais pessoas, que em obsequio e devoqão à Mãe Santissima, quizerem acompânhar sua Santa Imagem, concorrendo deste modo para a maior plausibilidade de semeÌhante acção.

ENTRADA DA IMAGEM NA IGREJA Logo que a dita Imagem chegue ao Barreirq irá em Procissão para a lgreja, onde se cantará a Ladainha por Música, s à noite o Terço também cantado por Música, no fim do qual haverá Sermão de que será orador o M. R. P. M. Fr. José de Almeida Drack, ReÌigioso da terceìra Ordem da Penitencia, e Pregador Regio. No dia 14 haverá Missa cantada com o Santissimo exposto, e Sermáo, sendo Orador o mesmo R. P. M. Esta Festividade he Acção


FIGURAS E FACTOS de Graças à Senhora peìos immensos beneficios, quê tem feito, e continuamente está fazendo a este Reino; e à noite haverão Matinas por Música. O DIA DÁ, PROCISSÃO No dia 15 em que a Igreja celebra a Gloriosa Assumpção, e Coroação de Nossa Senhora, igualmente haverá Missa cantada, com acompanhamento de grande instrumental, Santíssimo Sacramento exposto, e Sermão de que ha de ser orador M. R. P. M. Fr. Pedro da Purificação Alves Pretto, Religioso da Ordem dos Pregadores; e Pregador Regio: de tarde haverá huma Procissão, que constará de varias lrmandades com Andores de diversas Imagens de Santos, e ultimamente a Imagem de Nossa Senhora do Rosario, que se venera na ViÌla do Barreiro, mediante os prodigios, e milagres com que um immenso concurso de Fieis devotos a acclamáo, e appelìidão especial, e efficaz Protectora em todos os seus trabalhos e afflicções, Depois de recolhida a Procissão haverá Sermão de que será Orador o mesrno, depois do qual se cantará a Ladainha por Musica, com alguns Motetos; rematando tudo à noite com hum grande Fogo de vistas, e do ar.

FESTA A S. ROQUE No dia 16 que he dedicado ao Senhor S. Roque, haverá também Missa cantada com o Santissimo Sacramento exposto, e Sermão, sendo Orador o mesmo R. P. M. Fr. José de Almeida Drack, Religioso da Terceira Ordem da Penitencìa, e Pregador Regio; e à noite o Terço cantado por Musica. REGRESSO DA IMAGEM A LISBOA No dia 17 pelas 6 horas da manhã será reconduzida a mencionada Imagem com a mesma formalidade, e ordem para esta Cidade, onde na forma do costume a esperão as Communidades de Religiosos para a acompanharem do Caes até à Igreja de S. Domingos, a fim de que esta Procissão infunda o respeito, e tenha a grandeza que lhe he proprio'


I DO BARREIRO DE VÁRÌÀS ÉPOCAS

FEIRA FRANCA Duïante os três dias das Festividades ha Feira Franca no Ìargo, e citio contíguo à Igreja da Senhora do Barreiro, a qual Sua Magestade houve por bem conceder a esta Real Innandade, sendo o seu rendimento appÌicado para as obras da mesma Igreja.

PRE\,'ENCÃO AOS FIEIS Previne-se aos Fieis Devotos, que quem visitar a Igreja de Nossa Senhora, com a devida disposição, ganha todas as Indulgencias, e remissões de peccados, concedidos à Igreja de S. João de Laterão em Roma, que segundo as sagradas BuIIas, passadas a favor da Igreja da Senhora, são infinitas. FESTA DA IGREJA EM OUTUBRO No dia 2 de Outubro do presente ânno, em que se celebra a Festa do Santissimo Rosario,, haverá igualmente Missa cantada, com o Santissimo Sacramento exposto, e Sermão, e à noite se cantará o Terço por Musica: na Segunda feira seguinte se fará na mesma Igreja hum Officio pelas Almas dos Irmãos defuntos.

DISPOSIÇÕES FINAIS Participa-se finalmeute que o actual Thesoureiro da Irmandade he MeÌitão José Pedro de Aguiar morador na Rua de S. José, onde se podem dirigir quâesquêr esmollas, ou donativos, que se offertem a Nossa Senhora do Rosario do Barreiro. Adver-te-se que na VilÌa do Barreiro se achão estabelecidas Hospedarias à custa da lrmandade para accommdar os devotos Romeiros, que concorrem a vesitar a miìagrosa Imagem de N. Senhora, e nos dias das Festevidades ha barracas para os devotos que concorrem às mesmas Festas.


FIGURAS E FACTOS

E aqui terminava o relato das festas litúrgicas no Batreiro, em honra da Mãe de Cristo- sob invocação da Senhora do Rosário - nesse já tão recuado ano de 1825, reinando em Portugal o Senhor D. João VI.

COMO SE COMEMOROUNO BARREIRO A ACLAMAÇÃO DO REI D. PEDRO V ( 1855) Ia terminar a regência de D. Fernando, iniciada em 1853, por morte de sua mulher, D. Maria II, que se finara apenas com 34 anos de idade e fora mãe de 11 fiÌhos ! Esplêndido exemplo de maternidade, dado peÌa primeira muÌher portuguesa, por direito hierárquico, e que soubera ser boa Mãe, virtuosa Esposa e exceÌente Rainha. O príncipe D. Pêdro, herdeiro do trono, não pudera ser então acÌamado rei, pois contava apenas 16 anos. Atingida a maioridade em 1855, a sua aclamaçãosolene,em sessão real extraordinária das Cortes Gerais da Nação, ia finalmente ter lugar em 16 de Setembro daquele ano, dia do seu 18.' aniveÍsário. D. Fernando de Saxe Coburgo Gotha, o príncipe alemão que tão simpático se tornara à gente portuguesa, merecendo até do combativo e insatisfeito José Estêvão, palavras de franco louvor à sua nobreza de carácter e à prudência e zeÌo que sempre revelata, apresentaria nesse acto o filho que subia ao trono com o título de D. Pedro V ('). O nosso povo pôr-lhe-ia dois cognomes, qual deles o mais belamente sugestivo: o Esperonçoso, pela fé que nele depositava o Pâís, farto de lutas internas, que o desgastavam sem cessar, trazendo corno consequência o desassossegoe a ruína da maior parte das famílias e o desolador atraso

(1) De seu nome coÌnpleto: D. Pedro de Alcântara Maria Fernando MigueÌ Rafael Gabriel Gonzaga Xavier João António Leopoldo VictoÌ Francisco de Assis Júlio Amélio,


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS material que por toda a parte se manifestava (já nos encontrávamos muito à retaguarda dos outros povos, cujos caminhos de progtesso e expansão havíamos indicado...), e o Bem Amodo, depoisque ele vira o seu jovem monarca debruçar-se, carinhoso, à cabeceira dos coléricos, nos catres dos hospitais povoados de vítimas, indiferente ao seu perigoso contágio e interessando-se contìnuamente peÌa sorte desses infelizes. A gratidão do povo não se impõe ou decreta; o amor do povo conquista-sê e poucos chefes de Estado portugueses soubetam conquistarlhe o coração, como o primogénito de D. Maria II. Mas D. Pedro V não nascera decididamente pala reinar. Erâ são e bom de mais pârâ essa altíssima função, e abominava a política. Relata Júlío de Sousa e Costa, no seu interessantíssimo ìivro <O segredo de D. Pedro Vu ('): u... detestava a tirania dos políticos, a quem ele não poupava, tendo algumas vezes sido bastante rude com eÌes, na ocasião da assinatura régia, apesar de ser uma pessoa correcta e delicada. Odiava os processosque usavam e havia tazã"opara issol... Não se conformava com a regedoria baixa de que ele tinha perfeito conhecimento. A fórmula que Ìhe Ìembravam amiúde: o Rei é o Guarda Augusto e Soberano da Constituição, fazia-o sorrir como, sem dúvida, toda a gente que sabe apreciar os factos. Os manipanços poÌíticos à frente dos caciquese por aí fora até aos legedores das par'óquias, talhavam, comiam, distribuiam as fatias... E o jovem monarca viu isso, e viu com entendimento>. E mais adiante: <E como havia D. Pedro V de confiar nos políticos, quando se lembrava das convulsõesque eleshaviam provocadonos últimos vinte anos?... Aos marechais dos partidos chamava chefes de barulo, com grande aplauso de Alexandre Helculano (seu amigo intimo). E este úìtimo, que terçara armas por um ideal que mais tarde vira desbaratado, dissera um dia: -_Oh! Que tropa táo manhosa!l!... E andei eu aos tiros parâ vel' isto ! I !... Era o desiludido a manifestar-se, enojado com os processos de corrupção... e de incompetência>.

(r)

Edicáo Romano Torres. Lisboa, sem data.

36


FIGURAS

E

FACTOS

O dia da aclamaçáo do 31." rei de Portugal era festivo em todo o País. Lisboa envergava as suas meÌhores galas e a modesta população bârrèirense, defronte da Capital do reino, não podia deixar de corresponder,

Ta'mbérn o Bco'reiro, eltl 16 de Setelnbro d.e 1855, comelro,rolr festi,rdmente a subìú.d,d,e D. Pedro V ao trono: nesse d,ìa, u,m,altLzìd,asessão solene se realizou no clntigo edilícío d.a Cô,mara MunícipaL a legenda da letra

capitular -

Era

esta

um I grande -

que

Américo Marinho desenhou para a crónica do nosso <Barreiro

Histórico> (Jornal O Búrreiro -

que fazia pâÌte

a nartativâ

191+l+),de

reproduzida. Gravou-a

em madeirâ de buxo o xilógrafo

Mânuel

Cabanâs.

em solenesàctos oficiais, à grande cerimónia desse dia. Visionava-se o início de uma época diferente e respirava-se confiadamente, corno se se âcâbasse de deixar um ambiente pesado, provocado por um período de constantes agitações. No sábado, 15, véspera do dia da aclamação, foi inaugurado solenemente nesta viÌa o Asilo D. Pedro V, parâ â infância desvaÌida do Barreiro. <Todo o día granl,e tem ,Ì)ésper&sr>, escreveu a <Revolução de Setembro> (3), noticiando esseacto. <A uésperado dia 16 d,eSeternbrod,e1855 fo'í solemnisada no Barre'[ro, por uma forma mni grút& úo bontloso e magnãnimo coracão d,e S. M. o sr. D. Pedro 5.o>. Era a abertura do asiìo, sob a égide do novo monarca (a).

(3) N.o 4031, de 20 dê Setembro de 1855. (1) V. (O BARREÌRO ANTIGO E MODERNO))-I PaÌte - Câp. XXÌÌ-O Asilo d.e D. Petl,ro V-Cem anos de eyistência d,o,modeBtq, nws pqestimosa caaa de cat'ìdad,e-


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

Mas pròpriamente os actos oficiais comemorativos de tão festiva data seriam, no Barreiro, a sessãosoÌene no saÌão nobre da Câmara Municipal e o Te Deum que se seguiria na igreja matriz (Santa Cruz). Às duas cerimónias se refere o livro n." 2 (a pp. 23-v e 24) das actas da C. M. 8., peÌa forma que vamos transcïever: <Anno tlo Nctscimento d,e Nosso Senltor Jesus Cristo de nuil e oi'to sentos e sincctenta e sinco aos dezaseisdias do Mez de Septembro do ditto únno, n6ta Vi\tct,tlct Bameíro e Passosd.o Concellrc, a onrle ueio a Cãmara Municipo.l corqostt d,o Prezidente João António Gomes, e os Verio'd'ores Manoel d,os Santos Costa, Ricardo António Pança e Manuel Vicente Alues, faltund,o por doença Antório Marfu, Bandeba: Bem como ao mesnlo acto concorrerão ct Rea.o Parocho desta Freguezia: o Ad,ministra'd'or dn Concelho - c,tJui.z Ord,índ,rÌo: e mais authorido'des, emprega'd'os,e pessoas abtiro assignal,as. Reunül,a ctss'im a' Assembleia, representand'o o Municiitio, declarou o Prezitl,ente que era hoje o di'a Solemne e legal em 4ze Sua Magestade EÌ-Rei o Senhor Dom Pêdro 5." tomarú cls redeas do gotet'no da Nassão Portugueza: E por isso leuantaua ú sxLúaoz entuando os ttiuas do costume à mesma Augusta pessoa; que por todos fordo corcespond,idoscom aerdad,eiro enthaziasmo e alegria; protestuulo a muis s'incera e corrlial orlhizãc e reaerente respeito ao nouo Reinado toclo cheì.ode esperanças pelas no' torì,as Virtud,es rl,o nosso Jrnem Monarcha. Em seguida passou a Camara, acompo'nhaia de tod,a a Assembleia, à Igreja Matriz, a ond,eassistìrõ,o ao Tetleum im'ploraruIo as bençãos do Alti.sstmo sobre o nosso adora'do Rei' o Senhor Dom Ped'ro 5.o, enL beneficio tl,a Nassã,ocLwe nos honramos pertencer e tudo i'sto acompanhado d,e nãn equi,oocasdemonstrações d'e iubilo e satisfação. E para constar se fez a prezente acta que toclosassi'gnardo.E eu Jodo Maria d,'Abreu Moreira, escrinã.oda Camara, ú escreDi>. Seguem-se depois entre algumas ilegíveis, as seguintes assinaturas: Jr,tséda Cunha Bwreto, administrador do conceÌho; José V'icente Feneira, prior da freguesia de Santa Craz; José Ped'ro tLa Costa, Jluiz Ordinário; Raf ael ldé.zio Sebastì'õ,oMari,a Pímenta, administrador substituto; .losá 38


FIGURAS E FACTOS dos Santos Costa, Juiz de Paz; Joã,oAntónio tle Almeid.tt, escrivão da Câmara; Joaquim António Galuã,o, escrivão do Juizo Ordinário; Laureano José Coelho, regedor; António Manael da Cunha, facuÌtativo municipal; José António Raìmundo, escrivão da Fazenda; João de Brito e Mello, âdvogado; José António de Cttraalho Júnior, oficial da Administração; António Sérgio Gomas, seminarista; tr-rancisco Teotloro Brauo; J oaquim Gerardn tr-irnuino; José Osório tla Fonseca, escrivão do Juiz eleito; ./oaquim António Nunes, cheïe da estação dos Colreios; Froncì,sco Maria Soei,ro, continao da Câmara; José. Carlos Braao, Francisco Alaes Li,ma, José d,o E spírito Santo, António José Nunes, etc.

A VINDA AO BARREIRO DE D. PEDRO V E FAMÍLIA REAL. EM 1859. DE VISITA AO CAMINHO DE FERRO DO SUL, EM C ONS TR U Ç Ã O, E O U TR A S NO T Í CI A S D A É P OCA , já prontaa linha "Em princípiosde 1859,encontrava-se até Vendas Novas, tendo-a o rei D. Pedro V percorrido, a 2 de Fevereiro desse ano, acompanhadoda rainha D. Estefânia,de seu pai D. Fernando,e de numeroso e brilhanteséquito,num comboioaprontadoparao efeito." De "O BARREIFO ANTicOE L,IODERNO" - I Partê Cap. XXllÌ-Os

Caminhosdê FeÍro do Sul e Sueste,

p. 184.

Numa quarta-feira, 2 de Fevereiro de 1859, visitou D. Pedro V o caminho de ferro do suì, em construção. Pouco mais de dois anos antes, exactamente a 2g de Outubro de 1856, já havia sido aberto ao púbÌico o primeiro troço de camlnho de ferro do nosso Pãís, estendendo-seentão a linha apenas de Lisboa (Santa Apolónia) ao Carregado. 39


DO BARREIRODE VÁRÌAS ÉPOCAS Os trabalhos pârâ â construção de uma linha férrea ao sul do Tejo começaram também por essa época. O jovem monarca português mosttava-se muito entusiasmado com o futuro desenvolvimento da nossa viação acelerada, tendo, sem dúvida, em Fontes Pereira de Melo o estadistâ que, nuncâ desanimando, mais afincadamente lutou pelo pïogresso das novas vias de comunicação. Desejando visitar a Ìinha férrea do sul, que, dentro de pouco tempo, seria aberta à exploração púbìica, resolveu D. Pedro V fazer uma digressão nesta linha, acompanhado de sua augusta família. Apressaram-se Ìogo os directores da empresa - a Companhia Nacioa preparar uma condigna nal dos Cãminhos de Ferro do Sul do Tejopela primeira vez iam ali, tendo recepção a tão altas personâgens que, comunicado imediatamente a sua visita à Câmara Municipal do Bar"reiro, em cuja presidência estava Francisco Alves Casal, tendo como vereadores Domingos Quintino de Andrade, José dos Santos Costa, António Maria Bandeira e Josó Caetano de SaÌles Godinho. Descrevendo a real visita, referiu o redactor Vieira da Silva, da.Beuoluçd,ode Setembro, que <a ponte em frente da estaçáo principal (actual edifíci,o das Oficinas Gerais) transformou-se numâ bela rua ajardinada. Na entrada da Ìinha levantou-se, como por encanto, um Ìindo pavilhão. A gare q:uese está construindo, donde muitas saÌas já se encontram ornadas com briìho, os armazéns que ficam laterais à mesmà gare, e todas as vastas oficinas desta via férrea, achavam-sevistosamente enfloradas e embandeiradas>. <Bem assim o estavam as estaçõesda mesma linha, pendendo das janelas de algumas, colchas e cobertoresn.

Tendo embarcado em Lisboa, no vâpor <Camões>,da Companhia de Navegação do Tejo, D. Pedro Y chegou âo Baueiro pelas 10 horas da manhã, acompanhado da rainha D. Estefânia, sua esposa,de D. Fernando, seu pai e ex-regente do reino, e de luzidíssima comitiva, da quai faziam parte o Ministro das Obras Públicas, CarÌos Bento, o camarista de serviço, Conde de PenafieÌ, os Duques de Saldanha e da Terceira e suas esposâs, lr0


FIGURAS E FACTOS os MaÌqueses de Ficalho e de tr'ronteira, o Visconde da Ltz, o Conde da Ponte de Santa Malia, Joaquim António de Aguiar, António Maria Fontes Pereira de Mello, o Governador Civil de Lisboa, Alberto Morais de Carvalho, MeÌlo Archer, Paulo Centurino, etc. À entrada da linha férrea, junto do pavilhão, encontravam-se o presidente e vereâdores da Câmara Municipal do Barreiro, o âdministmdor do conceìho, Francisco de Salles da Siìveira, o juiz ordinário António ManueÌ da Cunha, o pároco de Santa Cruz, José Vicente FerreÍra, acompanhados das pessoas de maior representâçáo dâ Ìocalidade, do director do caminho de ferro, Francisco da Silva Mello Soares de Freitas ('), de empregados da mesma empresa e muito povo. Ao darem enhada no paviÌhão os reais visitantes, a filarmónica do Barreiro (,), postada naquele local, tocou o Hino Real, a cuja execução se seguiu â de outlas peças de música, com especial satìsfação não só do fundador e protector da mesma, o vereador da Câmara Municipal do Barreiro, António Maria Bandeira, antigo tesoureiro municipal e depois comerciante estabelecido nesta vila, com Ìoj'a de mercearias, como também do povo que aÌi concorreu, para demonstrar com a sua presença e a do conjunto musicaÌ da terra, quanto Ìhe era simpático o sucessor de D. Maria II. Francisco AÌves Casal dirigiu, então, a D. Pedro v a seguinte âìocução: Senltor, A Câ,mara Mun:í,cfuio,L cLoConcelho clo Barrei,ro d,esempenhahoje u,rn derer e uma, honrosa m,issãct,apresentand,oa Vossa Magestarl,e,Ttor s.i e em nome d,os habitantes d'elle, os ytrotestos cla sua felicidad,e e dn sua ded,icaçõn à Pessoa Augusta de Vossa Mu,gestade. Est,e poao, d quem os Senhores Dom Joã.o 9." e DorL Joõ,o 6." honrarõ,o d,esembwcandonestus Pruias, não pod,ìn, por occasid.ode receber de

(1) Mais tarde agraciâdo com o títuÌo rfe Visconrl.e ilo Barreiro. V. (O BARREIRO ANTIGO E MODERNO)) - I Parte - Cap. XXV - O BdrÌ'eiro nos t|tlllos de nobrez&. (r) Era a Socied,ad,eFi\armónica Ban eirense, da qual sairia, em 18?0, a Sociedade MarciaÌ Câpricho BarÌeirense ((FrancesesD).


DO BARREIRO DE VÁRIÀS ÉPOCAS

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FIGURAS tr FACTOS Vossa Magestade a mesma honra, tLe,irar tle manífestar o seu regosíjo os smtimentos que as eleuaclasuirtudes e a soltci,tud,ecle Vossa Magestad,e pelo bem estur cleste paiz llte inspirayfi.o - s o seu reconhecimento pelos benefíci,osdeaidos aos melhora.mentos emprehenclil,osno reìnad,o de Vossa Magestad,e, benefícios jó importantes, e que mais o hão-de ser pela contintLação dos meìos de aiação publica. A Camaru e os habÌtantes cl'este Concelho conftã,o em que Vossa Magesiad,e se dignnrá de acollter benignamente a ingenua manijestaçãn que e\euão à presença de Vossa Magestaclee os aotos que todos fazem pela prosperülade de Vossa Magestaie, de Sua Magestarl,e a Rainha, d,e Seu Augusto Pu| e da sua Dinastia> Seguiu-se a alocução de Soares de Freitas que, também em breves palavlas, exprìmiu a satisfação que à companhia do caminho de ferro causava a visita reaÌ, pedindo depois a graça de Sua i\{ajestade aceitar a carluagem para seu serviço particuÌar, que à empresa tinha mandado construir. Pouco depois, D. Pedro V e a sua comitiva tomaram Ìugar no comboio especial, composto de 12 carruagens, que os devia conduzir â Vendãs Novas, térmi.nas da linha, para onde já seguira um outro comboio conduzindo a guarda de honra (uma forca d.e Infantaria ?) e aìguns empregados da linha. A recepção em Vendas Novas foi maglífica: no largo fronteiro ao palácio real (") fora levantâdo um luxuoso pavilhão, erguendo-se também à saída da linha para a estrada da malaposta do Alentejo um majestoso arco de louro. Naquela povoaçáo, numerosas individuaÌìdades aguardavam o comboio vindo do Barreiro, demorando-se ali D. Pedro Y até à tarde, após o que regressou a esta vila, no mesmo comboio, embarcando para Lisboa.

(3) RefeÌimo-nos ao pâlácio mandado edificaÌ poÌ D. João V, para aÌi ser aÌojada a comitiva teal, çm iluas único,s noites, a caminho do Caia, por ocasião dâs ?rasBagens, islo é, parâ levaÌ a infanta D. BáÌbara que iâ casar com o rei Fernando VI, do Espanha, e receber a infânta D, Mariana Vitória, noiva do príncipe D. José, de Portugal, que depois foi rei. Este palácio fez-se em 9 meses e custou apÌoximâdamente 1 milhão de cruzados.


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DO BARREIRODE VÁRIAS É?OCAS Enfim, náo ficou constando que, durante esta real digressão, de pitoresco sabor parz a época, se registasse o menor acidente (')'

Pouco feliz época para o nosso País foi aquela em que reinou D. Pedro V. Ao aplacarem-se as lutas revoÌucionárias, comprazia-se o destino em lançar sobre Fortugal terríveis fÌagelos - doeng,asque dizimavam homens e males que destruíam plantas. As forças indomáveis da Natureza e as enfermidades humanas confrariavam os nâturâis sonh.osde um reinado feliz. O aparecimento do cólera-mórbus, primeiro (em Outubro de 1855 havia um mês que o novo rei governava), e, depois, da fekrre amareìa, em 1857, constituirâm uma gzande desgraça para o País' O Governo circulou imedialamente a todos os governadores civis, ordem para que se abrissem hospituís proaisórios para os contaminados' Tomado nesta viÌa conhecimento da determinação pela autoridade adminìstrativa, logo esta se reuniu com a Câmara Municipal para se deliberarem as providências adequadas nesta ìocalidade, onde, infelizmente, o asseio nos seus modestos arruamentos era um míto e onde se verificava, em gr:ande núrnero, a população miserável. Em cumprimento das ordens recebidas, tratava-se de arranjar com urgência uma casa apropriada para enfermaria.

({) O mesmo, todavia, nãe foi registado com a viagem do comboio real que inâugrìrou, em 1856, o troço de caminho de ferrâ de Lisloa ao Carregado. Leiam-se, por exemplo, as interessantíssimas <Memórias da Marquêza de Rio Maior>r (Parceria A. M. PereiÍa, Lisboâ, 1980), nas quais â ihÌstre dama de D. Ma.ria Piâ refeÌe que (p&reciú 11'1ttewqme garrúÍão), <<am6qui,na, escusolo serí üzer, das mnis ptinLìtbas todo,ê aa carructge|La que lhe o'h"elatranu, e fôraas nã,o tinhn. fôrça para wcher Iac'gand,o pelo carníttho. Algutnas ile conoid,oÃos, nos Oliaai*, O tagã'o do Ca'rdiul P&tri.o,rc& e ilo Cobido, Íicou ern Sacaoém I m&is urn, techead'o de d'i'gnatá'ri'os, fìcou ao ilesanlpq,ro na PóDoú, Creio que se o CarregarJo lôsse müs longe, e a mdnter-se lLma túl p,roporçõ,o,chegaaa Ló,a máquino lòsinha, ou p@rte de[Q'...>, A.s npo,gáoeis peÌipécias ã que estes acidentes deram origem, são fáceis de imaginaÌ... <Até andou getute conl archotes pel"o,linha - cottcltti aquela bondosa fidalga em procura dos ná,uïragos d,o Progresso.,,> /+l+


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FIGURAS E FACTOS Verificou-se Ìogo que â única casâ existente nesta vila e que melhores condigõespossuía para esse efeito, era o chamado Salão das Hospedarfas, pertencente à Irmandade de N." S.' do Rosário, à quaÌ foi requisitado, pedindo-se também, ao mesmo tempo, â cedência de umas casas de Jorge Abrahão Whulouse, eri.stentes ao fundo do areal rlo Rosdrí.o (") . Igualmente se mandou fazer certo número de càmas, mas, feÌizmente, todas estas medidas eram, até aí, de ordem preventiva. Por mo'tivos que já agora são difíceis de apurar, os proprietários puserâm obstácuÌos à cedência e, de taÌ ordem foram, que a Câmara teve de recorrer à Comissão Administrativa da Santa Casa da Misericórdia desta viÌa, pedindoJhe as dependências da mesma, que foram imediatamente postas à ordem. l|{as o cólera-mórbzs só apareceu no Barreiro em Março de 1856. Foi o que verificámos, consultandoa acta da Câmara Municipal desta vila, de 12 daqueÌe mês e ano. Aí se tefere que pelo presidente do Município, Joáo António Gomes, foi dito que <tendo-se dezenvolvido á poucos dias nesta Villa alguns cazos de Colera e tornando-se de abeceluta e imediata nessecidadea pïezençâ de um novo Facultativo que possa de prompto ocurrer a qualquer precizão e auceÌiar aqueìe que aqui existe, tinha para o fim convidado para esta sessãoo Facuìtativo lezidente no Lavradio, Matheus José Baptista... >. O cirurgião do Barreiro era, por esse tempo, António Manuei da Cunha, com o qual, todavia, não pôde trabaìhar o cirurgião Mateus Baptista, em virtude de já se haver comprometido a prestar serviço numa associaçãode Lisboa. Então a Câmara solicitou da autoridade administrativa a requisicão ao Conselhode Saúde Pública de um facultativo <erperiente e práticct no trcLctdrnentode tal mollestia, para ser pago pellos coffres d,o Municipio>. Logo em 16 do mesmo mês, se apresentou no Barreiro o cirulgiáo-médico Manuel Luís Machado, SubdeÌegadoTécnico do Conselho de Saúde do Reino, para ministrar imediatos socorros aos coléricos, enquanto pelas vias legais não fosse nomeado o facultativo pedido para este Município. Mas certamente por já haver mostrado a gua competência no Barreiro, onde estivera entre 1842 e 1846, quando aqui se declararam outras

(5) No locaÌ da actual propriedade da Sociedade Nacional de Cortiças (Casa Reynolds),


DO BARREIRO DD VÁRIAS ÉPOCAS graves epidemiàs,pediu imediatamente a Câmara Municipal do Barreiro a conservação nesta tella do referìdo cirurgião, já notável <pelos relevantes servìçospor eÌle platicados em identicâs cilcunstâncias nas terras do AÌgarve>. Do facuÌtativo António Manueì da Cunha (',) solicitou a Câmarâ a maiol cooperação,<... esperandodo seu zello, inteligencia e actividadc hovessede reunil os seus esforços aos do seu collega afim de se obtel a prompta extinção do orliveÌ ferageÌlo de que estamos acometidos, pol quanto a Camara se náo popará a pÕr impÌáticâ quanto estiver a seu alcance e porque por ambos os Facultativos Íoi requizitado um EnfermerÕ parzì os quâdejuvar, a Camara deixou a sua dispoziçáoa nomiaçãodo dito Enfermero, a quem desde já Ìhe arbitra trezentos reis por dia aÌém de uma gratificação que afinàl se lhe dará conforme o serviço que fizer> (r).

Aqui, como em muitas outras legiões do País, especialmenteno Ribatejo, o medo e o teuor apossaram-seda povoação. Muito especialmente,impunham-se,no Barreiro, rápidas medidas de salubridade,destruindo os iugares infectos - montuleilas, regueiras, etc. - que existiam dentro da vila, mandandopurificar as águas,promovendo visitas sanitárias ao mercado,aÕsaçougues,às hospedariase às tabernas. Mas verificou-se que isso não bastava. A populaçãopobre, a mor parte pescadoles,pâssâvafome, debilitando-se de tal forma que fácil era o organismo não poder resistir ao ataque do cólera, que mais uma vez atingira a Europa, vindo da Índia, seu foco de infec@o permanente. É isso que nos reveÌa mais um documentooficiaÌ, a acta da C. M.8., de 23-III-1856, na parte que pâssâmosa tÌ'anscrever: <... e logo ponderandoa Camara o estado epidemico em que se acha esta Villa e sendo ponderado pelos ditos FacuÌtativos aqui existentes que

(ô) Este facultativo municipal parece que tinha fama d,e grande copol Sobre eÌe escteveram num jornâl de Lisboa (O Pot'túguei, âno de 1856) q\re, kpor um copo de (N6s 7)inlú é c(L,pai de tlrdo; em e.9t&1Ldo embri.agad.o,nã,o é capalë de cousa @Ig?Lmat>. não chegamos a perceber bem isto, e o leitoÌ lambém não, com certezâ...). (7) Actâ da C. M. 8., de 16-3-1856.


FIGURAS E FACTOS não achão meio de estinguir a mulestia sem combater a fome que em grande escalÌa tem definhado uma grande parte destas familias, requerendo por isso fossem sucorridas de pronto ao menos em ârroes, êm vista do que determinou a Camala que pondo-seem combinaçãocom a Comissão de Socorros a quem restam ainda alguns meios, cumessacedesde amanham a serem sucorridâs as familias pobres,offeciando-sedesdejá ao Governo poï intrevenção do Governo CiviÌ, requezitandoarroes para mantimento destes desgraçados... o Aqui se revela bem a miseráveÌ vìda de quase toda a população do Barreiro, que seïiâ habitado, nessa época, por cerca de 2800 almas ("). Era preciso màtâr â fome a muitos desgraçados,principalmente às crianças, mas tal medida não evitava que aquele mês de Março de 1856 se tornasse de trágicas lecordaqõespara este povo. Registando-se nesta vila uma média de oito falecimentos por mês, naqueÌe Março de 1856 morreram no Barreiro 51 pessoas,das quais 41 em consequência do ataque d.o cóIera-mórbus. O prior da freguesia de Santa Cruz, José Vicente Ferreira, não descansavano seu dolorosodever de sâcrâmentar as vítimas. Nos registos de óbito, escreveu,várias vezes,estaspaÌavras: <<...o grand,eataque de colera que o accornetlleu com tom.itos contì"nua.d,os, nã.o deu lugar a rJar-lhe o sagratlo ui(ttì,co>. Naquele referido mês, no dia 27, morreu nesta vila, atacada pelo cólerü, a própria mãe do prior, D. Joaquina Ferreira dos Santos, viúva de José Ferreira dos Santos Escudeiro, ambos naturais de Alcanena. Tinha 88 anos, a pobre velhinha. Em Abril, decresceua epidemia, registando-se, entre 16 faÌecimentos, sete casos fatais provocados pelo cóleru. No íim dessemês o perigo estava debelado.

(3) Relativa aos anos de 1855-56 não conhecemos nem paÌece que deve haver qualquer estatística populâcionâl do concelho do Barreiro, mas, segundo o <<Dicionário abreviado de Portugal ê suas possessõesultrâmaÌinasD (1.. vol.), do padÌe Fiâncisco dos Prazeres Mâranhão, publicado no Porto, em 1852, o Baneiro tinha nesse tempo 706 fogos, o Lavradio 153, Palhais 111 e Coina 45. CaÌculando, aproximadâmente, que, em PortugaÌ, cadtL fogo tem .4 habi,t\ntes ou elmas (V, <<Dìcionário abreviado da choÌographia, topogrâphia (...)>, de J, Â. Almeida, de Valença), segue-seclue as populações daqueÌas localidades seriam, respectivamente, de 2824, 672, 444 e 180 hâbitantes. ft7


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

Em 4 de Maio, a Câmara gratificava com 36 000 réis o facuÌtativo António Manuel da Cunha, pelo esforço que desenvolveu para debeìar a epidemia nesta vila. Em Palhais, também pela mesma terríveì causa se registaram algumas mortes; no Lavradio, nada consta a esse respeito no registo de óbitos da freguesia. No ano de 1857, a febre amareÌa não provocou, felizmente, fatalidades no Balreiro.

'lambém para a agricultura aqueÌa época náo foi feÌiz. Num meio de medíocres agricultores, o mal dos pomâres, das vinhas, das batatas, o pouco desenvolvimento das sementeiras nesta região e por quase toda a parte, tudo parecia concorrer para o viver miserável do povo. O bondoso coração de D. Pedro V doía-se do infortúnio sofrido por todo o País. Também com ele próprio náo trouxera a feìicidade, pois a morte levara-o cedo, em plena juventude, com 24 anos de idade e seis de reinado, em 11 de Novembro de 1861. Ao passar o féretro do desventurado monârcâ pelas ruas da capitaÌ, numa tarde triste e húmida, excìamou uma mulher do povo: -

Mandou Deus esta chuva para até as pedras se vestirem de luto!...

Em 14 de Novembro, três dias depois do falecimento do rei, reservava o caprichoso destino que fosse ainda João António Gomes, que seis aÍros ântes havia mandado celebrar, com tanto regozíjo, a subida ao trono do muito amado primogénito de D. Maria II, aquele que devia agora anunciar à Câmara Municipal do Barreiro, na qualidade de seu presidente, <a ì,nfausta e sentüIissì,mamorte d,eELreí o Senlnr D. Perl'ro 5.", cle muí saud,ozamemóri,o>, acrescentando que <.. . hera d'opinião que a Câmara deveria dar um sinal de perfundo reconhecimento à memória daquelle bondozo Rei, fazendo-seum officio funebre sufragando a sua alma...>. Sic [ransií gLoria munl i...

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FIGURAS E FACTOS

JOÃ O

A N TA N IO

GOMES

ESCORÇOBIOGRÁFICODE UM BARREIRENSE D E R IJA TÊ MP E R A , A N TIG O P RE S I DE NT E DO MUNICÍPIO LOCAL Terá o leitor referenciado já o nome de Joáo António Gomes (mencionado na acta camarâtia transcrita) na I Parte de <O BARREIRO ANTIGO E MODERNO>) ('), sem que, porém, pela breve alusão que então Ìhe fizemos, tal cidadão lhe pudesse merecer atenção de maior, apesar de ter sido, durante anos e por vários períodos, presidente do Município barreirense. Mas não há dúvida de que João António Gomes foi um dos barreirenses de quem algumas folhas lisboetas mâis faÌarâm, em especial em conturbados períodos de agitação política, e os testemunhos versados em letra de forma, que sobre ele possuímos, levam-nos a concluir ter sido tão estimado por uns, quanto malquerido por outros seus contemporâneos. João Gomes foi o presidente da Câmara Municipal do Barreiro por vários períodos, como já dissemos, dois dos quais marcados pelas seguintes datas: 2 de Janeiro de 1852 a igual data de 1858 e, depois, de 2 de Janeiro de 1860 a 31 de Janeiro de 1862. FiÌho de António Josó Bolacha ('), naturaÌ da Aldeia de Paio PÌres, e de D. Ana Joaquina, do Barreiro, João António Gomes veio à luz nesta vila (assim consta do seu legisto de óbito) em 1807, o terrível ano da primeira invasão do nosso Pais pelas tropas de Napoleão I, imperador dos franceses.

O conhecimento que temos deste nosso ascendente(3) é um tanto incompÌeto e, sobre alguns aspectos, impreciso e perturbado, aqui e ali, por

-

(1) O Asilo (,) (3)

No Cap. XI}iA dntig& IÌrdia e a úd{r lrìscatóri@, p.732, e no Câp. XXII de D. Pedro V, p. 76tr. Fal€cido no Barreiro, a 31-V-1831. Erâ bisavô do Àutor, pelo Ìado materno.

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DO BARREÌRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

Rept"aduçõ.o de 1rm,retr&to deste üLtig(, Tnesidanf,e da

provas ambivalentes... Náo se nos tornou possível, por isso, aprofundá-lo; no entanto, sobre eÌe possuímos algumas curiosas notíciâs de nalureza políticâ, que Ììão seïíamoscâpâzes de obter se não tivéssemos tido a sotte de nos virem parar às mãos, por oferta, entre outros, de alguns elementos sobre interessantes aspectosda vida local (n) nos úÌtimos anos do reinado de D. Maria II e na regência de D. Fernando IL Sem necessidadede darmos rédeas largas à imaginação, começamos por dizer que João Antónlo Gomes foi aÌfaiate, ofício que, durante anos, exerceu, païece que com pouco apràzrmento. Na sua mocidade, as lutas civis começavam â estaÌar por todo o País. As reformas políticas iam constituir a preocupação máxima de algumas gerações de portUgUeses,

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originando ódios, préìios-desgraças sem

JoÃo ANTóNI6 cot{Es (1807-1876)

Cãmara XlzLnicioal do Bar-

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contà -, como só eles sabem produzir' Por altura das Ìutas entre miguelistas Marjnho; cÌavuradeManuer cabanas) e liberais (1828-1833), João Gomes tomou partido peìos primeiros, que acabaram vencidos. Afastado uns tempos das lutas políticâs, esse facto não teria evitado que chegasse â ser presô, r'ecolhendo à cadeia do Limoeiro. Aí, segundo ouvira dizer uma sua neta ("), ele escreveuum reÌato de suas actividades poÌíticas num volumoso cadetno, que, infelizmente, se perdeu, e travou conhecimento com alguns nobïes que, mais tarcìe, já fora do cácere, Ìhe dispensaram muita estima e consideração, como, por exempÌo, (Desenho do Dintor

Amórico

(a) Devemos boa parte deles ao erudito investigador miÌitar, sr, coroneÌ Belisário dâ Silvâ Pimentâ, filho de ilustre baueirense, que os possuía no seu arquivo de famíliâ. (5) A Mãe do Autor, Ana Isaura Rodrigues da Silva Pais (fâlecida a 25-V-1955), filha de Ernília Gomes RodÌ'igues da Silva (faÌ. a,2\-V-1920, com 73 anos) e de Luís Rodrigues da Silva (fal. a 1E-V-1916, com 71 anos), aquelas natuÌais do Barreiro e este nascido no Lavradio.


FIGURAS E FACTOS i

D. Cristóvão Manuel de Viìhena, moço fidalgo com exercício na casa real e oficial de cavalaria, morgado de Pancas (u), que, depois; apadrinhou um dos seus filhos, de nome Cristóvão Maria Gomes (r). Tendo-se consorciado coÌn uma senhora barreirense, D. Mariana Rosa, dela teve João Gomes 11 filhos, um dos quais, António Sérgio Gomes, clérigo de Ordens Menores do Seminário Fatriarcal de Santarém, faleceu no Barreiro, em 28 de Junho de 1858, a poucas semânasde dizer missa noua na tradicional festividade reÌigiosa de 15 de Agosto, dedicada a N.' S.' do Rosário, desta vila, como desejaria seu pai que, para esse efeito, solicitara um breve a Roma, em virtude da menoridade do futu.ro sacerdote. . Tão grande, porém, foi o desgosto sofrido por D. Mariana Rosa, pela perda deste filho que, definhando-se ante a impotência de reputados cirurgiões da época, â pobre senhora faleceu a 22 de Fevereiro de 1860, sendo este o motivo por que se podia ler no plinto do seu jazigo, no cemitério do Barreiro ("), a seguinte legenda:

FALLECEU VICTIMA DO SEU AMOR MATER,NAL.

João António Gomes não se atemorizava, contudo, ante a infelicidade da sua famíÌia, reagindo sempre aos golpes que o destino lhe vibrava,

(6) Faleceu em Lisboa, a 29-VI]I-1876. (?) Nâscido a 2 de Agosto de 1848, foi baptiza.do em 15 do mesmo mês e ano Igreja Matriz de Santa Cruz do Baneiro. ((Foi pâ- Assunção de N." S.^-na drinho-aêfere o ãssênto de baptismo a fls. 129 do Liçr'o 1?.' (1838-1850) da freguesia de Santa Cruz - o Excelentíssimo D. Chdstovão Manoel de Vilhena, e tocou poÌ Nossâ Senhora da Conceição a nxcelentíssima D. Maïia Benedicta Manoel de Vilhena, filha do PadrinhoD. Faleceu solteirq com 33 anos de idade, em 5-IV-1882. (3) É actuaÌmente o CemitéÌio de Vila Chã, para onde este jazigo (subterrâneo) foi trasladado em Agosto de 1969, por ocasião da transferência, pâra ali, dos iazigos ê mausoléus do cemitério da antiga. Estrada do Lawadio, efectuados no decurso daqueÌe ano e no seguinte. Este e outros jazigos Ìeconstruídos eÌn Vila Chã, já sofreram, com esta, a segundâ trasladâção em menos de meio século. Por ocasião destâ fúnebre taÌefa, observou-se que alguns caixões de chumbo, com mais de sessenta anos, continham ainda, poa cêrbo, dâdo o peso que acusâvam os despojos neles elcerrados, os corpos Ìessequidos, rnumificados, jâ nes6e estado tÌansportados (pdmeira trasladação) do antigo cemitéÌio do Largo Luís de Camões, desta vila. Um deles estí no jazigo a que nos referimos.


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS o maior dos quâis fÕi ver morrer qttâse todos os filhos na pujança da vida, meses havendo em que lhe faÌeclam dois. A política e os negócios â que se dedicou distraíam-no dos desgostos íntimos e o Bolacln, como lhe chamavâm, por influência do apelido paterno, casou depois com outra senhora, D. Maria do Rosário, da quaÌ não teve fiÌhos. ExpÌorou ainda a indústria de pesca, tornando-se proprietário de uma bateira com 14 homens de tripulação, que razoáveÌ rendimento lhe deu. Resìdia João António Gomes na actual Travessa da Figueira, onde possuía, do lado nascente, uma série de moradias, provindo daí o motivo de aqueÌa modesta artéria púbÌica ser conhecida ainda de alguns velhos barreirenses por Trauessa (ou Beco) clo Bolaclta.

Em 1840, João António Gomes era Juiz Ordinário do Barreiro, ocupando também, por essa época, o cargo de Provedor da Santa Casa da Misericórdia desta viÌa. Em vários documentos oficiais se encontra o nome de João António Gomes com a profissáo de arltogad'o. Ele, todavia, não possuía quaisquer graus académicos, mas exercia aqueÌas funções no tribunal da comarca, com autorização do desembargo do Paço, por lhe reconhecetem conhecimentos bastantes e idoneidade moral para esse fim' E de como as coisas se passavâm, por vezes, naquelâ época, vamos dar um pitoresco exempÌo, pelo qual podemos avaliar o erpecliente de um defensor... Fortuitamente, chegou-nos às máos uma crónica de um diário do Poúo, o J ornal cle Notícias, na qual, sob o título <Águas Furtadas> (uma secção semanaÌ, salvo erro, que <Sete Sílabas> assinava), se referia um caso passado com João António Gomes. Não cita o cronista o nome do antigo presidente da Câmara desta vila. mas sabe o autor, por via de memórias transmitidas na família, que o caso o teve por protagonisúa. Relatava o autor da local que, sendo esse indivíduo adaogo'clo,foi incumbido, uma vez, de defender um sujeito acusado do crime de homicÍdio. Entre as testemunhas, aÌgumas declararam ter reconhecido perfeitamente o réu, à luz do Ìuar, na ocasião em que apunhalava a sua vítima.


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FÌGURAS E FACTOS Iniciaram-se os debates,e todas as provas eram contrárias ao âcusado. Nos rostos dos juízes notava-se a convicção de que eÌe fora o criminoso. O caso estava sério. Quando ao at|uogorl,ode defesa foi dada a paÌavra, este levantou-se e disse apenas o seguinte: - Tod,as ds prolcrs e toda a acusação, que se fundam em que as testemunhas uiram e reconheceram o réu à luz do luar, caem pela base.Nessa noite nd,o ltouue luur ! E sacou de um repertório - 6 4Bs1fla de Água> - que confírnava a sua asserção... Uma testemunha confirmou imediatamente o prognóstico do popuÌar aÌmãnaque. Estava ganha a causâ. Na dúvida, os juízes absoÌveïam o réu. Mais tarde o verdadeiro cuìpado foi entregue à justiqa. Comentário do cronista: <Nesse tempo, se não fosse a letra do repertório, o inocente era enforcado>.

Já com 61 anos de idade, foi João António Gomesnomeado,em 19 de Janeiro de 1868, escrivão da Câmara Municipal do Barreiro, cargo que exerceuaté 1870 ("). Ao abalar deste mundo, em 24 de Agosto de 1876, quase compÌetamente cego, João António Gomes, dos onze filhos que tivera, deixava sòmente três (10). Náo poucos desgostos o atingiram, alguns dos quais de natureza política, em especial quando aderiu à causa do conde de Tomar, o que Ìhe valeu ser duramente atacado por panfletos anónimos e até com versos de <pé quebrado> e um soneto <Declicatlo ao Elleitor do Concelho clo Barreiro Joã,o Antónío Gomes pella occaz'iã,ode se ter aeúüln ao Mi-

(,) Ào pedir a confirmação régia das suas funções, a Câmara Municipal do Barreiro informou nq requerimento apresentado por J. A. Gonres, que este havia sido chamado pâra aquele cârgo <<çtoc'selhe teconlncer capací.úarÌee inteligencia suJfi,ci,entes, cortuod,ttestã,oos seÌriçog fei,tos por eLIe à mti,s d,e trintú cLnnosenl este Múnici:piorr. (Acta dâ C. M. 8., de 8-III-1868). (rc) Por curiosa coincidência, seu velho amigo D. Cristóvão de Vilhena, MoÌgâdo de Pâncãs, seguiu-o cinco dias depois, na viagem da qual se não volta mais.


DO BARREIRO DE VÁRIÀS ÉPOCAS

ni,stro d,o Reino António Bernard,o dtt Costa Cabral>, deplorando ter-se alistado <zo bando co.Sralíno,do Barreiro um alto empregado>, etc. Nada disto era, então, de admirar. O que se pubìicava através de panfletos e em certas folhas da imprensa política atingia, não raras vezes, as raias do mais despejado palavreado e os ataques pessoais chegavam à maior violência! Segundouma correspondênciade 1856 para um jornal de Lisboa, da autoria de um administlador do concelho do Barreiro, que o foi, depois, de Almada, de nome José da Cunha Barreto ("), João António Gomes era o mandáo-mor político do Barreiro. Todos aqui eram por ele dominados: comerciantes, industriais (moleiros) e proprìetários (vereadores ou não), facultativos municipais e Õutros servidores, todos etam seus caporos (sic)... O relato é de estarrecer e arrasâï: A mais baixa poÌítica aomnarvo

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Ao Ìado dos antigos processos de gârantia ( ?) das Ìiberdades individuais (que não excÌuiam o emprego do trabuco e do punhal, 1á para as terras do interior do País), exercidos peÌos grão-mestres da corrupçáo, aquilo de que actuaÌmente alguns indìvíduos se lamentam sobre matéria de direitos cívicos (respeito à libeldade do sufrágio, de expressáo escrita, de reunião, etc.), é, no entanto, o mais ro"diosadas cLuroro,s...- comparadâ com o trágico negrume dessa época do nosso liberaÌismo. Leia-se, investigue-see, depois, conclua-se...

João António Gomes foi homem, porém, de uma rigÍssima têmperâ. Mais de trinta anos, pelo menos, d,eucartas na suú tema, talvez nem sempre Limpas, mas deu-as, até aos próprios inimigos. Instruíu-se por si próprio, mostrando sempre uma indómita vontade de ampliar os seus conhecimentos, de aprender bem mais do que lhe tinham ensinado.Ar)uogou... sem ser advogâdo. Alinhou na rudeza da época. Foi atacado, mas também atacou, trabalhou muito para o comum (que é, como se diz, trabaÌhar para nenhum...) e, tanto quanto sabemos,náo deixou fortuna que fizesse engalfinhar os herdeiros na divisão do espóÌio...

(n) V. (O BARREIRO ANTIGO E MODERNO)) I Parte-Câp. O Asìlo de D. Ped,Ì'oV,, p!, 162 e 163. 5lr

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FIGURAS E FACTOS

POR ALGUNS NÃO PAGAM TODOS... A POPULAÇÃODO BARREIRO GRAVEMENTE OFENDIDA NO DIA DE ANO BOM DE 1871 Ia-se tornando um caso muito sério... Tal a concÌusão a que chegámos, quando lemos a acta da reuniáo da Câm:rra Municipal do Barreiro, de 7 de Janeiro de 1871' Era presidente da Câmara, Francisco Alves Casal, barreirense da gema, probo e austero. Consta dessa acta o seguinte: <Na mesma Veriaçõ,oforam presentes aar'i'osci'dadãose proprietarios deste Concelho, mostrarul,o-segrauemente ofendidos na sua honra e reputação pelo Reu,' Pwocho encomeruJadodesta mesma Freguesi'a J oaquim Pereira cla Sì.lau,não só pellas mús expressõesinfammtes por elle proferi,cl,asà Missa Conuentual no di,a primeiro do corren'te, mas também repetirlas no jornal d,anoite n.o 3 d'elt d'o corcente e Diarin tle Noticias n'" 1801 d,o mesmo di,a. Ped,ìnd,opor consequenciaà Cannra que pol'ú desagrat:o rla pouoação ultrajada, a Camara representasse aeementenxenteao Er.mo Vì,gario Capitular do Patriarchaclo pura que se d,igne relno'Der quanto antes o ituJicaio Pdrocho ai,sto que em aista tle tã.oinsoli,to como (ileglel) proced,imento nõ.o pode nem deue demoro'r-se nesta Freguesia fazend,o-se substituit por um E clesiastico d.a escolha,de S. E:r.". O que sentlo ouuid,o pela Camara e anui,nd,oaos d,eseiostÌos seus aclministradores, resolueu que nesta conformidad,e se representasse, fi,cantlo encarcegatln o seu Presid,ente de apresentar a mìn:tún da mesma representação. . . >> , etc. Estava um confÌito aberto entre os representantes do poder temporaÌ e o do poder espiritual da estremenha e ribeirinha vila do Barreiro. Com efeito, o protesto foÌ elaborado pela Câmara Municipal, seguindo o documento para o Vigário CapituÌar da Diocese, não só assinado pelo presidente da edilidade e todos os vereadores, mas também firmado com as assinaturas de muitas dezenas dos mais considerados habitantes e naturais do Barreiro. Estavam todos de acordo, pois, de facto, não constituiam qualquer assembleiainternacionaÌ...


DO BARREÌRODE VÁRIAS ÉPOCAS Qual o motivo desse grave escândaìo? Eis o que conseguimosaveriguar; Pelas duas horas da madrugada da noite de Natal de 1870, uns indivíduos acercaram-seda residêncìa do reverendo Pereira da Silva e, mexendo na porta dâ câsa, empul'taram-na, parecendo tental arrombá-la, mas foram pressentidos por aquele sacerdote, que deu o alarme. Os tais indivíduos fugirâm imediatamente. Seria uma brincadeira, aliás uma partidâ de mau gosto? O sacerdote afirmava que se tratava de ladrões, e com empenho pediu às autoridades que investigassem, indicando um gïupo de indivíduos que .fizia serem seus inimigos, capazes de tudo e procurando o seu descrédito. As autoridades, pcrém, nada conseguiram apurar de concreto, e os dias iam passando. Até que no 1." de Janeiro daquele ano de 1871, o padre Peïeira da Silva, à hora da missa, com o templo cheio, decidiu püblicamenteapïesentar as suas razões, mas fêlo de taÌ forma insultuosa, tanto para o povo do Barreiro, como indirectamente para as autoridades do concelho, que rebentou enorme escândalo. Acusando as autoridades de pusiÌânimes e acusandotambém o Barreiro de criar e albergar gente má e desordeira, o prior excedeu os Ìimites normais da compostura e do bom senso. O Jornal tla Noite (') do dia 4 daquele mês de Janeiro, a propósito do incidente da madrugada do Natal, dizia: <As authoridades procedem a investigações, e é de crer que se descubram os authores d'este condemnar'eÌattentado. Houvc uma epocâ em que a villa do Barreiro, onde estes casos eïam frequentes, mudou completamente, conservando sempre o socego e a boa ordem; foi quando o actuaì administrador do concelho de Belém, o sr. Jayme da Veiga ("), authoridade energica e inteligente, teve a seu cargo aqueÌla administragão, acabando com muitos abusos.

(1) EÌa diÌector deste jornaÌ António Augusto Teìxeira de Vasconcelos. Ao corpo rêdactoÌiâl pertenciâm, entÌe outros, Rangel de Lima e Gervásio Lobato. (r) Jaime CorioÌano llenriques Leça da Veigâ, bâchaÌ'el forrnado em Direito. Foi nomêado administÌador do concelho do Barreiro em 1 de Agosto de 1366, tomando posse no dia 7 do mesmo mês e ano. Deixou o cargo em FevereiÌo de 1868.

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FIGURAS E FACTOS

Esperamos que se tomem providências contra os cïiminosos, parâ com o mâu exemplo da impunidade, se não repetirem scenasque podem tel sérias e graves ç615cquêneias.Por sua vez, o Dúít"io de N otící.us,sem fazer quâisquer comentários, dizia que <alguns maÌfeitores tentaram entrar em casa do reverendo parocho do Barreiro, mas sendo pressentidos :r tempo, evadiram-se.> Estas notícias câusaïam certa sensação,divergindo as opiniões sobre as verdadeiras causas do incidente e lamentando-se que ele levâsse o prior a abri,r guerra contra toda a pôpulàção barreirense. Daí lesultou formar-se a comissão de pessoas a que nos referimos, ofendidas peÌas objurgatórias do sacerdote.Este, com a inserção no./ornal da Noíte da notÍcia que transcrevemos,ficava também em posiçáo muito deÌicada perante as autoridades directamente visadas ('), o que as levou a secundar o pedido apresentado. Mas o assunto pâïecià não se resolver depressa,o que levou a Câmara Municipaì do Barreiro a dirigir em 1 de Fevereiro duas representações, uma ao Governo de S. Majestade o rei D. Luís I e outra ao Governador Civil do Distrito de Lisboa, solicitando breves providências, dado o lamentável acidente do dia de Ano Bom, que a gente de vergonha do Barreiro não esquecia. As queixas da Câmara e do povo foram então ouvidas e o reverendo Pereira da SiÌva foi finaÌmente mandado sair do Barreiro, sendo substituído pelo seu colega AÌexandre Antonio Duarte. Encontrámos um documento dizendo que este chegou ao Barreiro nos primeiros dias de M:rrqo seguinte, e a ele se refele uma acta da Câmara Municipal desta vila, de Feveleiro de 1872, dizendo que <era de grande zelo pello culto, gé.neoconc'iliad'ore caritatitto>. Parece que erâ, portanto, o sacerdote que convinha. A população fora, pois, desagravada.

(3) O âdministÌador do concelho do BarÌeiro eÌa, desde Setembto de 18?0, João Maria de Andrade tr'erreira. Nâo conseguimos descobrir qual foi verdadeiramente a sua interferência neste conflito com a autor.idade eclesiástica. Todavia, um decfeto de 3 de Janeiro de 1871 nomeava novo administrador do concelho do Barreiro: António César de Lima Leitão, que tomou posse no dia 18 de FeveÌeiÌo seg1rlnte.


DO BARREIRODE VÁRIÀS ÉPOCAS Exigira-o um punhado cle tledicados barreirenses que ordeira, mas firmemente, soubera impor as suas razões. Mas isto era no tempo em que eles - poucos, mas bons - se sentiam verdadeiramente na sua terra e ìhe dedicavam mais interesse e carinho...

QUANDO UM BARREIRENSE SOLICITOU E O B TE V E , N O B R AS I L , DO NA T I V O S PARA O CULTO DE N.A S." DO ROSÁRIO ( 187.0-187 5) Nossa Senhora tlo Rosário, que se venera na sua igreja da viÌa do Barreiro, teve, desde há muito, grande veneração em terras lrrasileiras' Seguntlo uma nota que J. A. Pimenta deixou na sua M em'órin H'ístórica, ua veneração por esta imagem tornou-se verdadeiramente extraordinária, existindo (...) aincla actuaÌmente (1886) na cidade do Maranhão' império do Brasil, uma egreja em que todos os anos se festeja a imagem de N. S. do Rosario do Barreiro>. Naturalmente, cortenclo fama a veneração que Ìhe trib'utavam os próprios reis da Casa de Bragança, principalmente desde D' Maria I' muitos portugueses - humildes e poderosos- que partiam paÏâ terras da América do Sul, ìevavam com âs esperanças em novos e felizes rumos da sua vida, uma partícula de fé no poder milagroso daquela imagem' E assim foram Ìançando a boa semente' para ajuda do culto e beneQue de lá vieram por vezes boas esmolas ficiações no templo dedicailo à Virgem do Rosário é certo e digno de registo, sendo o objecto desta crónica revelar aos lêitores os pormenores ãu urna d"s"as colheitas de donativos obtidos por subscrição naquela grande nação, dilecta filha de Portugal.

João GonçaÌves de Assunção, uO' Mangagá>, era um barreirense de famílias humílimas, verdadeiro homem de trabalho que, principiando aqui 58


FÌGURAS E FACTOS a vida nas duras lides marítimas, Iabutou depois no Brasil, conseguindo mais tarde voÌtaÌ a PortugâÌ com aÌguns bons contos de réis. Em 1874, a Real Irmandade dos Escravos de N.'S." do Rosário atravessava uma grave ctise financeira, que já vinha afectando profundamente o esplendor com que sempre fizera decorrer, em épocas normais, as festas à sua Padroeira. Acrescia o facto de o templo necessitar de muitas reparações. Não bastava a boa vontade dos que trabaÌhavam abnegada e graciosamente na Irmandade - era preciso dìnheiro. E foi então lembrado que João Gonçalves de Assunção erâ â pessoa indicada para desta vez pedir no Brasil, onde possuía amigos e influências, uma esmola, com a qual se pudesse reavivar Õ cuÌto e restauïàï o que estava arruinado. Aceite a incumbência, foi-Ìhe passado o seguinte documento, cópia fiel do nos foi cedido: originaÌ que obsequiosamenie Jll.nose En.ú6 srs.. O Jui,z e maì,s mezatios da Real lrmand,ad,e rlos Escrauos d,e Nossa Senhora rJoRozario dd, ViLlcL(lo Barreiro, tem solicítar a aalioscr,protecção d,e tôrJas cLsILl.^"" e En."'o" pessoq,sresid,entesno Impéri,o do Brazò|, tanto Portuguezas como Bra,zileiras, pürü os coadjuuar no piedoso Ìntento de conserl)ur, e nlesmo engrandecer, se tanto for possituel, o esplendor do culto rla, mesma prorÌ,'ígiosaSenhora, uenerad,an'aquella Vi,lla, desd,etemp6 'tnui,remotos. A base iLeste seu appelo fwula-se nos saluta:res eíenlplos que todos os tlias presenceì.ão; porque nã,o ha empreza ou commettimento algum, que tenlta por fim a, creução de um estabeleci,mentotle ca.ri.tl0,cle, ou de que se não uma c&sa cle instracção, ou tle uma reedificação de tem.plo, a rejatn a'inculados oa nomea d,os subdi,tos d,o Império do Brazi.l, cLoa/pello d,os de Portugal. Longo seri.a, Senhores, fazer a história ilesta ReaI lrmand,od,e,tlescreaer o seu primitÌx)o esplendor, e enplicar a causctda decarlêncìaa que lzoj e estír,r ecluziíIú. Bastard tli,zer que por arig ens diaersas, os rend,imentos da.Irmantlo.d.e, totlos euentuaes,não bastam para as despezasortlÌnd.rias do culto, quanto mnis para o,sf esti.aklatlesde 15 de Agosto e 1." DornÌngo ile Outubro, determinarlas pelo seu respectiao Compromisso! Totktui,ct,lutando a Meza com grondes d.ificuldarles mas empregando ,;ncri,ueisesïorços, tem conseguttlof azer a sua costumad.af esti,uüade, conserua.ttdono Templo a decenc'Ìad,euid,aa tã,o alta Mo,gestarle. 59


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DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS ConÍi.am pois os abuíro ass'ignadctsque rossas lll.'^ e EÍ."'"' pessoüs uireis em seu aurilì.o, para, por meio cl'elle, 'potler-seobter, tanto os iltdispensá,aeisrecursos em faaor do culto rJa Nossa Senhora do Rozarìo da V'iLla tlo Barreiro, cortLopairú a repantção tLo T emplo da Santissima Vir' gem, bastante deteríorado, e sua tlecoração, o que mu'i'to ctgrad'ecem' desd,eid.. Para a entrega finalmente, de qurtesquer esmolas ou donatíuos, que hajam de se ofertar a Nossa Senhora, poderão ser entregues úo nosso constítuido procurad,or o ILl.''" Snr. Joã'o Gonçalues d'Assumpçã,o,que d,a tnilhot uonto.d,ese promptÌficou para medianeiro desta' pettçào Barreiro em Meza e Casa de Despacho da Real lrmand,a.d,ed6 Escrcruos ile Nossa Senhora. do Rozario cr'os16 de Agosto de 187/t.: O Juiz, António José Teìreira de MeLIo. O assistente, Domingos Quíntino d,e Andrade. O Procurador geral, Fructuoso José Pereira. O Thezourefuo, José Olympio de Campos. O procurador da Irmandade, Faustino Duarte Feneíru O Deputado à Meza, José Maria tla Silra. O procurador da lrmandade, Antótio Cmd,i,d,oRosendo. O procurador da Meza, Ni'colao Canüdo da Luz lgreja. O mordomo da CapeìÌa, Francisco Antoüo da Si,Iaa(?) Mattoso. O deputado à Meza, Feli.c'ianoJosé Barboza. O 2." Secretário, Miguel Augusto luens. O 1.' Secretário, Miguel I gnacio de Med,eiros.

O apelo da Irmandade dos Escravos de N." S.' do Rosário da Vila do Barreiro foi correspondido, pois a subscrição rendeu, entre sessentae cinco contribuintes, aÌgumas centenas de mil réis brasileiros, destacando-seas dádivas do Visconde de S. Salvador de Matosinhos (100$00), da Dilecção do Banco Industrial (100$00), do Visconde do Souto (20$00), de B. Leite Veìho (20$00), de ManueÌ Marques da Costa Bragâ (20$00), do próprÍo João Gonçalves de Assunção (20$00), de Francisco Lobato Carolla (20$00), de João António Guimarães (20$00), de Manueì GonçalvesDias (20$00), de António GomesTeixeira (20$00), de Diogo de Sousa Araújo (20$00), etc. De um documento apenso ao originaì do pedido de auxílio da lrmandade, consta o seguinte asseÌ'Ìto:


FIGURAS E FACTOS <<Recebina qualidade de thesoureiro da Mesa administrativa da Real Irmandade de N.' S.' do Rozario da ViÌla do Barreiro, por mão do IÌ1.-' Snr. João GonçaÌvesde Assumpção, uma letra de réis 316$580, moeda forte, sacada no Rio de Janeiro sobre o Banco de Portugal, em íavor do Ill.'" Snr. Antonio José Têixeira de Mello, Juiz da referida Irmandade, soma esta que Ìiquidada corresponde ao totaÌ da subscripçáo acima mencionada.>> O total da subscliçáo - 651$00'- produzira, em léis fortes, os referidos 316$580.alrecadadosfinalmente pelo tesoureiro da lrmandade, José Olímpio de Campos, ouriaes do ouro com loja no seu anaümento n'o'.. (aqui termina a anotaçãopor que nos estamos guiando).

No ano seguinte (1875), as festas em honra de N." S." do Rosário cìo Barreiro revestiram maior aparato e grandeza. A cerimónia principaÌ consistiu, como de costume, na saída da pequena Imagem processionaÌmente, da Igreja da Madalena, em Lisboa, no sábado, 14 de Agosto, acompanhada de um eclesiástico, membros da Irrnandade e muito povo, embarcando, no Cais das Colunas, numa galeota da Casa Real, tripulada por remadores particulares do serviço do Paço, envergando os seus trajos característicos de dia de gala. A galeota, depois de aitavessar o Tejo, seguida de várias embarcações, entre o estreÌejar dos foguetes e o cÌamor dos clarins e das hombetas ressoando hinos sem descanso, aproou depois ao veÌho e já desaparecido Cais de Nossa Senhora, na Quinta Braancamp, seguindo-seas soÌenidades habituais, com procissão no dia seguinte, etc. No J ornal do Comércio, actual e gÌorioso decano dos diários portugueses, escrevia-se no dia 17 daquele mês e ano: <Esteue muito concorc'ído,e oi'stosaa f esta n'aquela ailla (Barreiro) celebratla hontem a Nossa Senhora do Rozari'o. A's 10 horas da man'hd,d'ì'stribuiu-se um bodo o, 50 pobres, o quc'l constaua rle 1 Kg. de arcoz, 1 põ'o e 100 réi,s em di,nhebo. Fez a distribuição e assisttu a todas as scllemnidao!


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS des que se celebrwam n'aquella uilla, o respecti.aoadtnànistroior clo concelho (') . A's 11 horas (de 15 de Agosto) celebrou-se m,issa solemne porinstru,mental prèga,nLo o reo. Duarte d,o Rosó,rio, A's 6 d,a tard,e suíu a proci,ssã,oque leaaaa 7 and,ores. A egreia estllL,a ürmad,a ricamente e com esmerad,ogosto e rnereceu os mcónuíos de todas as pessoas que de Lisboa foram, assístir às festas. Era Juiz da f esta o sr. Domingos Quintino de Andrad,e>.

Quintino de Andrade e Cândido Rosendo tinham sido as principais vontades, das quais resultara o novo ìuzimento da parte religiosa da festividade. Comentando o aspecto interior da igreja, escrevia por essa ocasião um esclarecido visitante, no Did,rio llustrad,o : <Se as paredes do tempÌo já náo vergam ao pezo dos velÌudos, se nos altares se não ostentam já as riquíssimas j arras da China e do Japão, se não vai tão pouco êxecutar aìi as cÌássicas partituras de fr. José Marques (') e de Marcos PortugaÌ (3), a música da Patriarchal, ainda assim, a egrejâ apresenta-se ornâda com primor, entrelaçam-se com âs mais finâs flores os fios de ouro de milhares de lumes e entoa os hymnos Ìyturgicos uma música se não menos numerosâ e menos estrondosa, não menos rica de inspiradoras e devotadasharmonias>.

(1) Em 1875 ela administrador do concelho do BarÌeiÌo o magistrado D. João PeaeiÌa Coutinho, nomeâdo para esse caÌgo por decreto de 30 de MâÌço daquele ano. Tomou posse em 3 de Maio seguinte. (2\ Fr. José Mo/rques. Vi'rei no tempo do rei D. José. Foi câpêlão do colo e mestro de música da lgreja do LoÌetq em Lisboa. Dedicou-se também à lexicografia. (3) Md,rcos Po'rtug&I, Notâvel músico português e compositor de elevado merecimento, Nasceu em Lisboa, em 24 dê MaÌço d,e 7762, e faÌe€eu no Rio de Janeiro a 7 de Fevereiro dê 1830.

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FTGURAS E FACTOS

A

DA

H IS T ÓR IA

< PEÇA>

(6-r-1877) Um certo,menLusicdl que deu brado

Corria o ano de 1876 do remansoso reinado de D. Luís. Lisboa possuía desde 6 de Novembro do ano anterior um esplêndido estabeìecimento da divertimentos populares, devido à feliz iniciativa de um cidadão britânico, Henry Whittoyne. Denominada Recreios Wltíttoyne' essa casa de espectáculos, com esplanada, recintos de jogos, palco para teatro, pista para circo, etc., constituiu desde ìogo um dos principais lugares de diversões da capital portuguesa. As iniciativas do seu fundador, promovendo concettos musicais, contratando companhias de zarzueìa e organizando várias verbenas atingiram muitas vezes elevado êxito, tornando Ìrastante conhecida e estimada a sua casa. Uma das mais curiosas iniciativas populares daqueles Recreios foi, em Setembro de 18?6, a realizaçáo de uma grande festa musical de filarmónicas de fora de Lisboa, à qual sete deram o seu concurso. Foram elas as seguintes: A Euterpe, de Benfica, a União Seixalense, do Seixal, a 1." de Dezembro, de Aldegalega, A Fabril, de Arrentela, a Lavradiense, do Lavradio, â tr'abrìI, de Chelas, e a SociedadeMarciaÌ Capricho, do Barreiro. A audição de todas estas bandas de música efectuou-se no dia 16 daquele mês e ano, um sábado, no meio de grande concorrência de público, tocando também a banda privativa daquela casa de especíáculos um variado reportório. Havia então um prémio e um diploma para a que mais agradasse a um determinado júri de entendidos, prémio esse constituído por um valioso quadro artístico. Por fim, foi considerada vencedora a briosa Sociedade Filarmónica 1,' de Dezembro, de Aldegalega.

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DO BARREIRO DE VÁRIÀS ÉPOCAS

Ora a atribuição deste prémio, dada certa rivaÌidade já existente entre algumas bandas concorrentes, deu Ìugar a rigorosas discussões e a certa polémica, que saltou até para a Imprensa, em especiaÌ entre os adeptos da SociedadeLavradiense e da SociedadeCapricho, do Barreiro, ambas preteridas a favor de Aldegalega. Daqui resultou, depois, que aquelas duas sociedades se desafiassem, pata executarem em público, perante um júri escolhido de comum acordo, a mesma peça de música, que, com a devida antecipação, tivesse sido ensaiada. Estava-se já no fim do àno, em Dezembro. Desafio aceite, a mesma peça de música foi entregue a cada uma das filarmónicas. Essa partitura (que ainda existe, bem conservada, no arquivo da actual SociedadeDemocrática l-Inião Barreirense, <Franceses>) tinha apenas a indicaçáo de <Fantasia para banda miÌitar>, e era originaÌ de José Fernandes Escazena, que foi mestre da banda de Infantaria 14 e um categorizado executante e composltor. A organização desta partitura não ela, porém, muito complicada, incluindo apenasrequinta, flautim, cìarinetes (três), cornetins (dois), trompas (duas), trombones (dois), bombardinos (dois), contra-baixo e bateria. Os ensaios começaram logo no meio do maior sigiÌo e com as máximas cautelas... Mas, desconfiadade que a rival pusesseem prática algum sistema de espionagem sobre uma ou outra particularidade da execução, a banda do Lavradio começou a ensaiar numa dependência do antigo solar da Quinta de Barra-a-Barra. Por sua vez, a dos <Franceses>pôs de alerta, perto da sede e no per' curso da praia, até próximo do Lawadio, alguns fiéis amigos da Sociedade, para que nenhum espia daqueles lados pudesse obter ou ouvir qualquer potmenor que interessasse à interpretação da música. O júrí que havia de apreciar, finalmente, â execução da peça, num certame que a todos os títulos se tornaria recomendável, resolveu então que a audição das duas bandas se realizasse no dia 6 de Janeiro çle 1877, no circo dos Recreios Wfuíttoyne. 6rt

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FIGURAS E FACTOS Constituíam o júri, além do autor da peça, os seguintes professores: -João Emílio Arroyo, chefe de música miÌitar, que pertenceu à Orquestra de S. Carlos, como flautista e foi professor do Conservatório Reaì de Lisboa; - Manuel Martins Soromenho, que foi também professor do Conservató:io de Lisboa ; - Carlos Augusto Campos, exímio cÌarinetista e regente de banda militar ; e - Joaquim T"homaz del Negro, igualmente professor do Conserwatório, trompetista primoroso e regente de categoria. A expectativa era grande e muitas foram as famílias do Barreiro e do Lavradio que, âpesâr do mau tempo, nesse dia de Janeiro, acompanharam a Lisboa as suas filarmónicas favoritas.

Executada que foi a peça, logo pairou sobre a grande maioria dos assistentes a dúvida sobre qual delas havia tocado melhor, visto ambas se terem aprimorado ao máximo, recebendo fartos aplausos. Entretanto, o júri reunira, mas da sua deliberação nada transpirou ao púbÌico nessa noite, talvez por um motivo de segurança bem compreensível: ó que ambas as filarmónicas e respectivos admiradores voltariam de Lisboa no mesmo barco, e do caso de se saber logo qual delas ficara vencedora, poderiam muito bem resultar cenas desâgrâdáveis entre os passageiros... porque as rivalidades musicais já nessa altura geravam fàciÌmente conflitos, Mas houve -dizia-seapenas uma pessoa sabedora, ao certo, de que o júri distinguira a banda do Lawadio, <pela sua mais feliz execução>. Foi o presidente da direcção, Cândido Manuel Pereira, quq no entanto, ficou muito caladinho, para não levantar maiores ondas do que as do Tejo, nessa noite de invernia... No domingo seguinte, no Lavradio, era dia de festa... ao passo que, no Bar"reiro, os adeptos da SociedadeCapricho Ìançavam aos quatro ventos as suas dúvidas sobre a Ìegitimidade da distin@o conferida à rìval, As 6õ


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS versões sobïe os termos em que se pronunciaïa o júri erâm âs mais diveÌ:sas, e é então, nessà âÌtura, que a dirêcção da Sociedade Lavradiense Íaz um comunicado ao público, dando também a conhecer os precìsos termos em que fora redigida a acta pelos ptofessores. São essesos documentos que vamos em seguida transcrever, por cópia autêntica, âos quâis se seguirá a resposta de um uFrancês> que, embora bastante correctâ. fez arder Tró'ia...

II Eis o comunicado: <AO PúBLICO. -Tendo a sociedadephilarmonica Lavradiense sido convidada pela sociedade Capricho Barreirense para n'um desafio musical experimentarem as suas forças, executando uma pega de música feita expressamentepara essefim, reaÌizou-seo desafio ajustado no dia 6 de Janeiro de 1877. E sendo a execução da peça de música subrnetida à apreciação dos digníssimos professotes abaixo nomeados, foi por elles deliberado, unânimemente, que a execução da sociedade musical Lavradiense se avantajou à da sociedadeCapricho Barreirense. Publicando o par:ecer do respeitavel jury, que apreciou tão imparcialmente o merecimento d'esta sociedade, approveitamos a occasião para agradecer por este meio aos exm"s professores, que compozeram o jury, as expresões de elogio, que nos são dispensadas, e de que nos confessaremos sempre agradecidos. Não agradecemos a preferencia que por ss. ex's. nos foi conferida, porque estamos plenamente convencidos da justiça que os moveu para tal resoluqão: mas consignamosum voto de Ìouvor pela rectidão e imparciaìidade, com que julgaram. Lavradio, sala dâs sessões da sociedade philarmonica Lavradiense, 9 de Janeiro de 1877. O PresÌ.d,ente- a) Candido Manuel Pereira O Secretario - a) Antonio Rodrigues dos Santos e Silva.> Segue-sea <Cópia da citada sessão e deliberagão do jury constituido a dar o seu parecer àcerca do merecimento das sociedadesphilarmonicas Barreirense e Lavradiense>: 66


FIGURAS E FACTOS <Aos se'isd,eJaneiro de 1877, 6tand,o prese'ìLtesno circo tlos Recreìos Marcíal Capricho Bclrce,ireTlse e Latural.'íense Whi.tthoEne, as soc'ieclo,cJes para entre ellas se procecler a um certamen artistì,co musical, erecutarul,o aLternadamente uma phantasia original escripta erpressamente parü esse fim pelo Ill.no sr. José Fernand,es Escazena, e sendo tarnbem presentes, rli,go presente, o jut-y composto tlos srs. Joã.oEmíLio Amoyo, MwrueI Martins Seromenho, Carlos Augusto Campos e Joaquim Thomaz del Negro, foi este unrLnime em rLeclarar que, em rìsta da dif ficul.d,od,ed,apeça e d,o li,witttdo tmtTto enl que ü estutlarctm sõ.oambas o,ssociedarlesdignns do mníor elogi,o; mas, apesar da boa erecuçã.o e ÌncontestaDel merecimento d,a socied.oie Mwcì,al Caprich.o Batreirense, a d,o Latra.d:io teue uma eïecução muis c\aru, e se auantújou à primeira: embora não f osse mui,to grande a superi,orid.oie, serin i,niquo rleì.rar de reconhecer que a teue. O que o resu\tatlo g era,Lprora é a mu'ita applicaçõ,oe merecÌntento d,e ambas e que a, sociedadeLa,ara,díensefoi mais felìz rm. erecução. E para que conste, foi, laurad,o o presente ternlo, que nos, os membros ilo jury, assi,ruímos. Lisboa, sala dos Recreins Whi.tto'ltne, seì,s tle Janetro de 1877. (aa) José Fernandes Escazena, João Emílio Arroyo, ManueÌ Martins Soromenho, Carlos Augusto Campos, Joaquim Thomaz deÌ Negro. Esttí conforme o origÌnal. Sala das sessõesda socÌedacleLaurad,íense, 9 cle Janeiro cle 1877. O S ecretá.rio,Antónìo Rodrigues dos Santos e Silva.> Eis, portanto, aqui reproduzido, um muito honroso documento do longo historiaÌ da SciedadeFilarmónica Agrícola Lavradiense,a S. F. A. L. ou a <Vèlhinha>, como carinhosa e popularmente é designada pelos antigos habitantes do Lawadio. Mas não o é menos - deve acrescentar-senara a conceituadaSociedadedos <Franceses>.

De Cândido Manuel Pereira já, em lugar competente (') traçámos as suas principais notas biográficas. Uma, nova, todavia, acrescentâmos

(') V. <O BARREIRO ANTIGO E MODERNOD Ì Parte- Cap.XVIII ',-inhosilo concelhoe o bttstardbtlto do.rcgiiio LloLn)rad.io.

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DO BARRIIRO DE VÁRIÀS ÉPOCAS àgorà. J^ com 42 ânos, Cândido Pereira casou-se,nesse ano de 1877 - a 17 de Maio - com D. Brígida Maria, senhora de 26 risonhas primaveras, sua prima e conterrânea, o que nos leva a supor que a alegria e a satisfação do sucessoalcançadopela filarmónica da sua colectividadeforam tais e tão profundas, que o levaram a encarar, desde logo, os preparativos do casamento,com vista à felicidade totaÌ... Quanto a António Rodrigues dos Santos e Siìva: era também iavradiense, filho de Ì\fanuel Rodrigues dos Santos e Siìva, grande influente migueìista do Lavradio, conhecido por O Patacas, por seus negócios com o Brasil. (Era nada menos que o trisavô de quem escreveestas crónicas.) Seu mencionado filho António foi casado com D. Maria Josó Eugénio Militão e eÍa pessoade fino trato. Fora aluno laureado do Colégio de Campolide, dos padres da Companhia de Jesus.Após a morte (repentina) do pai, que foi, como ele, proprietário no Lavradio (era dele a Quinta do Meloal, em Barra-a-Barra), dedícouparte das suas ocupaçõesà administração dos bens que herdara. Foi também professor do ensino primário eÌementar naquela antiga viÌa ("), de cujas funções já estava aposentâdo, ao falecer, com 67 anos de idade, a 6 de Fevereìro de 1890. pubÌicaremos A seguir, e para conclusão da história da <<Peqa>, a carta-comentário de um adepto da Sociedade Marcial Capricho Barreirense, que - em nossa opinião - teria constituído o fuÌcro à volta do quaÌ se originarâm acesas discussões,emitindo-se pareceres que, seguidos, logo depois, de manifestações mais destinadas a acirrar a rivalidade, do que a chamar à boa compreensão os discordantes, acabaram por pïovocar o corte de reÌações,longo tempo mantido, entre as duas antigas sociedades lecreativas do nosso conceìho.

III No dia 19 de Janeiro de 18?7, pubÌicava o jotnal Di.ár'io Popular, de Lisboa, o seguinte, sob o título <Barreiro e Lavradio>:

(') Um único dos seus aìunos é ainda vivo (em 19?0) José Pereira, estimado iaç'radiense (nascido a 18-IX-1879), residente desde há anos no Baueiao, filho, precisamente, de Cândido ManueÌ Pereira, amigo íntimo deste antigo mestre-escoÌa, que ensinava não só o ABC e a Aritmética, mas também Lâvores..

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FiGURAS E FACTOS <Rea|i.zc,tu-se no cl'icr, 6 do comente um certamen musi,cal, entre as phi.larmonicas Capriclto Bameirense e Laaratliense, cujo resultatlo, segund,o a opiüd.o do jury, foÌ serem ambas as sociedad,esmu[,to dignas d,e elogio, proa(r/r-se a m:u,ì.taapplicação e merecimento de ambas e que apesar d,a boa e*ecuçã,oe incontestauel merec'imento da socíed,a.de Bameirense, a Lauratliense foì, a muis feliz na erecuçã,o.Tal foi a opiniíío clo jury, como se d,essa uê da acta publi,cada no rJüt.11 neste jornal. tí fac'il rleprehetzd,er-se d,ecisãoque a uictorüt fo'i alcançada pela grossura d,eum cabelo. Se ambas se egualaram em tudo, se mostraram eguaes merecimentos em, tutlo e a mesma appli.caçã,o,se, como di,z o iuru, a superlorüI,ade cle uma sc,,bre a outra nã,o foí mui.to grande, e apenas d,ea'idaa uma feliz erecução, é força conf essar que e$e nouo merecimento, que se denom'tna felicidade, tanto podi,u pender para um laio como tr)&rao outro, e se hoje coube ò soci.ed,ad,e do Laarad,,io,em outro d.ia poderi,a caber à do Barreiro. Nas meIhores orchestras dos theatros mai,s af amados, a entratla tle um i,nstrumento fora do tempo, ou ü sua d,esafinaçãomotnentamea,pode prejudicar a erecução, e nem por zsso as boas orchestras perd,em os seus cred,itos, quanrlo os tenham sol'itlatnente estabelecülos,ou quando um jury competente tenha, reconhecÌrlo a sua boa erecuçõ,oe incontestáveÌ merecimento. Sem termos a competenci,a ofi,cial d,o jury, com os nossos ouo'[tlos quase profanos, aprec'iá.mosa et:ecuçd,od,as d,uasphilarmonicas, e parece-%os que sem ì.njusti,ça, as op'ituiõesse poderi.am d,it;i.cl,iregualmente, pois que foÌ, excellente a erecuçíto cle a,rnbasel,las,e que nenhuma fi,caric. meIind,rada se se clei:rassede contúr a fauor rla outra o merecí.mentode feÌìcidad.e,que desde os tempos da harpa do rei, Datuid até. ao certamen das duas ythilarmoniccts appatece pela primeira 'L)ezcomo circunstanc'ia rJectsi,aa da 'Ltictori,a.> D.

Não nos foi possível identificar - tantos anos passaÍam já sobre os acontecimentos! - o autor deste interessante comentário, mas Ì'Ìão nos restam dúvidas sobre o se:: carácter oficioso, digamos assim, reproduzindo o critério dos homens da Sociedade Capricho, a cuja direcção presidia, por essa altura, Caetano José Ferreira. O que se sâbe, com folos de veracidade, é que a sua úÌtima paúe levantou fortes discussõese tocou a sensibilidade dos adeptos da sociedade do Lavradio. Daí, as relações entre uns e outros ficârem mais tensas ainda. 69


l DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS O caso chegou até a interessar os vultos poìíticos mais Ìigados à nossa região, um dos quais, o deputadoEduardo Tavares, escrevia,nessaocasião, no seu jornal O Circulo 79.' <.Seja-nospermitido dizer duas palavras a respeito deste assunto, a nós que já tivemos a honra de ser obsequiadospor ambas as sociedades. O documento que deixamos transcrito (a acta do júri) honra egualmente as duas, poïque o que eÌle prova é que um jury composto de ptofessores tão distintos, lhes presta a homenagem da sua consideração. O jury tinha fataÌmente de se pronunciar por uma dellas, mas fel-o por forma que muito deve Ìisongear aqueÌles Ìaboriosos artistas das duas localidades, que com tanto esmero cuÌtivam â ârte musical.>> Não se podia ser mais diplomático... e, efectivamente,ïaras vezes, como neste caso, a diplomacia do político não escondeu nem desvirtuou a verdade: a acta dos Mestles honrou sobremaneira as duas fiìarmónicas. Todavia, foram, depois, certas exteriorizações púbÌicas de regozijo dos adeptos da sociedade Lavradiense que melindraram profundamente os homens da Capricho Barreirense, e levaram ao cotte de relações. Recordamos, por exempÌo, que, certa vez, num dos aniversários do certame musical, Ìlercorreu as ruas do Lavradio um cortejo de que fazia parte um carro, conduzindo tJmà peçu formada por muitos morteiros e foguetes, tudo puxado por grosso e comprido cabo (aÌusão à afirmacão da <victoria alcançada pela grossura de um cabelo>), e a cujo carro fora atreÌado um aÌentado cão... E, ainda muitos anos depois,era o <6 de Janeiro> celebrado no Lavradio com o estrondear e o estralejar de numerosos morteiros e foguetes, ìançadospara o espaçona direcção do Barreiro (3).

O reatamento das reÌações de amizade entre as duas simpáticas colectividades veio finalmente a verificar-se em 1932, nada menos de cinquenta e cinco anos depois do certame dos RecreiosWhittoynel Para tal facto - sucedido a 7 de Setembro desse ano, no 2.o aniver- concorreram decisisário da inauguraçáo da nova sede dos <<Franceses>

(3) Também no Lâ\.Ìâdio existê uma Rua 6 de Janeìc'o, pot: Ìesolução de 16-I-1916 (!), da. sua Junta de tr'reguesia, então presidida por Inácio João dos Santos.

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FIGURAS E FACTOS vamente âs boâs diligências, por parte da sociedade do Barreiro, por Aní. baÌ Pereira Fêr"nandese José Soares, e peÌa do Lar,r'adio, por Bento Rodrigues Amaro, Martiniano Pereira e Álvaro de OÌiveira.

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Na sede da S. F. A. L. apenas existia, há anos, a recordar o famoso certame, uma saudaçáo,em verso, manuscritâ (vimola em 1953), da autoria de J. V. Pesca (trata-se de J oã,oYaz Pesca, antigo dirigente e dedicado amigo daquela colectividade), com a data de 6 de Janeiro de 1897. Estava encaixilhada, em moldura simpìes, resguardada com vidro, no então gabinete da Direcção. Esta recordação enferrnava, contudo, de um erro grave, talvez consequência da jâ enfraquecida memória do autor, o qual, ao pretender rimar com <o dia de Reis>, diz depois que <Em Lisboa foram coroados de louros em 6 de Janeiro de 1876>! A necessidadede rima traíra-o, fazendo-o recuar um ano... Bom seria, pois, que a rectificação fosse feita à margem daquela singela ìemb,rança dos tempos idos, para não induzir em erro os vindouros.

O DR. MAGALHÃES LIMA VEIO AO BARREIRO, PELA PRIMEIRA VEZ, EM 1885, PARA TESTEM UN H A R O R E G IS TO D O F I L HO DE UM OPERÁRIO Muitos anos antes da implantação da República, em 1910, e ainda anteríormente à revoluçáo de 1891, no Porto - movimento este chamado dos <precursores da República> - já no Barreiro existiam acérrimos idealistas do novo regime. Um dos indivíduos que mais se distinguiram pelas suas arraigadas convicções anti-monárquicas e também anti-reÌigiosas foi João Baptista Firmino, carpinteiro, nascido no Barreiro, a 16 de Março de 1856. Tinha este operário algumas amizades em certos l.ultos do meio intelectual republicano, dispensandolhe muita simpatia o dr. Sebastião de


DO BARREÌRODE VÁRÌAS ÉPOCÁS Magalhães Lima ('), vigoroso jornalista que ocupava então o Ìugar de redactor-principaÌ do jornal O Século. Pois num domingo de JuÌho de 1885, o dr. Magalhães Lima veio ao Barreiro testemunhar o registo civil de um filho de João Bâptista Firmino, revelando com este acto a consÍderaçãoque lhe merecia aquele seu humiÌde correligionário. É o que consta do 8." assento exarado (nos termos do reguìamento de 28 de Novembro de 1878) no Livro de Nascimentos daqueÌe ano, página 4, donde respigamos as seguintes passâgens: <... às onze horas e um quarto da manhã tlo dia cinco ilo mez de Julho d,o onno d,e mil oi,to centos e o'itento e cinco laarei o s,ssentod'o nnscimento d,e lnna pessoa do sexo masculino, nascüIa às seì'shoras e me'ía da m,anltã, do di,a 10 de Junho do comente u'no e se Intle chamar Dartuin, Íì.lho Legítimo d,eJoõ,oBaptista Fi'rmíno, co,satlo,cle prof issd'ocarpinteiro, natural d,o Barreiro e d.omiciliarlo nesta ailla, e de Marin da Glória Marques, nesta uilla...> casaÃ,a,natural do Barreiro e rl'om.i'c'iliatla

<(.,.) foram testemunlns o ll|.ilo Er.mÒSr. Dr. Sebasti.ãoMagalhães Lima, iotnalista, natu,ral do Rio de J aneiro e clomicil:iadoem Li'sboa, e Ventnra EIoy d,a Fonseca Caeìro (') , solteiro, proprietó'rio, n'atwal rLeLisboa e d,omici,lìadono Barreiro..->> OficiaÌizou o registo o administrador do conceÌho, Ernesto Augusto da SiÌva Cordeiro.

Os sete registos anteriores tinham sido os seguintes: 1." - Em 24-VIII-1881, Ermelinda, filha de André Camps Rimbaus, roÌheiro, e de Maria Leonoi' dos Santos;

(1) O dr. Sebastião de Magalhães Lima, que foi o primeiro director de O Sáczrlo e o 32.' Grão-Mestre da Maçonaria Portugtesa, nasceu no Brâsil (na cidade do Rio de Janeiro), em 30 de Maio de 1850. Veio pâra Portugal aos 5 anos de idade, tendo falecido em Lisboa, na Casa de Saúde das Amoreiras, em 7 de DezembÌo de 1928. (r) Xra comissionista nesta vila, onde viveu durante muitos anos. Foi sepultado no cemitério locaÌ.

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FiGURAS E FACTOS 2." - Em 23-XII-1884, Belmira, filha de Alfredo José Azoiano, proprietário, e de Amélia Maria; 3.'- Em 26-I-1885,José Augusto, fiÌho de José Braga e de Amélia Maria ; 4.. e 5." - Em 29-I-1885,Sara e Dalwin, gémeos,nascidosem Santo António da Charneca, filhos de Miguel Tavares e de Mariana de Jesus (o pequenoDar"win faleceu em 1886, na referida povoaçáo); 6.'- Em 26-III-1885, Gertrudes,filha de João Teixeira, rolheiro, e de Maria SaÌomé; ?.,'- Em 5-V-1885,Teófilo Braga, filho de António Avelino, rolheiro, e de Narcisa Clímaco. (Cerca de 1916, Teófilo Braga AveÌino foi um dos mais apreciados guitarristas do Barreiro. Era corticeiro, como o pâi, tendo falecido, com 63 anos de idade, nesta vila, â 7-V-1948.

Mas prossigamos a evocaçãodo caso: Em 7 daquele mês, em correspondência desta vila, publicava O Século a seguinte notícia, na secgâo<OcoruênciasDìttersas>: <Realizou-seno domingo, na administração do concelhodo Barreiro, o oitavo registo civil de nascimento. Foi o de uma criança do sexo masculino, fiÌho do nosso correligionário e amigo João Baptista Firmino, que recebeu o nome de Darwin, e foram testemunhas os srs. dr. Sebastião de Magalhães Lima e Ventura EÌoy da Fonseca Caeiro. Foi a primeira vez que Magalhães Lima foi à villa do Barreiro. Receberam-no ali, além da família do sr. Firmino, os srs. Ventura Eloy da Fonseca Caeiro, José Silvestre, Alfredo José Azoiano, José Elias Ligorne e Josá António Rodrigues. O sr. administrador do conceÌho cedeu os seus emoìumentos ao pobre mais necessitado, o que é deveras louvável.> A esta notícia, acrescentavao mesmo jornal em nota da redacção: <<Emnome do nosso coÌlega, agradecemosaos nossos dedicados amigos do Barreiro a recepção affectuosíssima que lhe foi feita aìi,


DO BARRETRODE VÁRIAS ÉPOCAS Um grupo de homensdedicadose honestos,que muito honram os princípios que defendemos,e que são, a todos os títulos, muito dignos da nossa > estima e consideragáo.

Agora, uma nota interessante: Tão apaixonado eïa João Baptista Firmino pelas ideias republicanas e descobertas científicas que vinham revoÌucionar certas instituições e diversos convencionalismos do seu tempo, que, a cinco dos seus sete filhos, deu o nome de vultos que mais admirava. Assim, além do nome de Dalr'win ("), o do céÌebre naturalista e fisiologista inglês, dado ao fiÌho que o dr. Magalhães Lima apadrinhou no registo civil, a outro seu fiÌho, nascido a 15 de Fevereiro de 1887, pôs o nome de Franklin, o notável estadista e homem de ciência norte-americano. A um outro fiÌho, nascido a 2 de Junho de 1889, deu o nome de.Eobespierre (n), o sanguinário e, por fim, guilhotinado terroristú da Revolução Francesa. A um quarto fiÌho, nascido a 10 de Outubro de 1891, deu o nome de Murat, olt,-o não menos céìebre revolucionário e famoso demagogofrancês. Sòmente a uma sua filha, nascida a 27 de Abril de 1888, deu o nome de uma figura ficticia: Jessa Helfmrmn ('). Assim se chamava, peìo que nos informaram, a principaÌ protagonista de um Lomance eslavo (o segundo nome é, quanto a nós, de pura origem germânica), obra cujo entrecho, de costumes sociais, entusiasmara aquele republicano barreirense. Forte sensaçãoproduziram alguns destesnomes,de que João Baptista Firmino se orgulhava, mas de lastimar é que não houvesseainda naqueÌa época, disposição legal que vedassea liberdade de se dispor de certos nomes próprios e apelidos estrangeiros, em detrimento dos que o uso corrente já (3) de 1885. (') Março de (5)

DaÌ'win Marquês Firmino faleceu, com 4 meses de idade, em 9 de Setembro

Robespierre Marques Firmino faleceu, com 9 meses de idade, em 18 de 1890. Jessa HeÌfmann Marques Firmino faleceu solteira, com 34 anos, em 16 de Outubro de 1922, Às outras duas Íilhâs de Joáo Baptista, D. Gertrudes e D. Glória Maxques FiÌmino. natuÌais do Bar-reiro. foram casadas e são já fâÌecidas, bem como fâlecidos são já também os seus outros irmáos, Frâ klin e Mâtât, destâcâdos repubÌicanos locais.


FIGURAS E FACTOS adoptarâ como nacionais, âpesar de, em Portugaì, se notar - como ainda há anos observou, com muito acerto, o falecido professor doutor Agostinho de Campos- <a falta de um catálogo de nomes próprios pessoâis, fora do qual nem os pâis podem escolher os nomes, nem os párocos ou oficiais do Registo admiti-los, para baptizar: ou reg'istar crianças> (o).

O grupo repubÌicano a que pertenciam João Baptista Firmino, Ventura Caeiro, José António Rodrigues, José Elias Ligorne e poucos mais, seguia com â maior dedicâção a política de Magalhães Lima. Em todas as eleições em que este se apresentava como candidato a deputado, neÌe votavam invariàvelmente. Nos anos de 1885 e 86 publicava O Século,assinadascom o pseudónimo de Fient, porta-voz desse grupo ('), violentas crónicas escritas do Barreiro, nas quais se atacavam furiosamente os monárquicos desta viìa. Chegoua pubìicar-seisto (") : <... eristem nesta oila homens que se ri'em d,e nós, que nos úpontam alaraemente como republiqueiros, que receiam o no$o contacto, que nos a\cunham d,e cono,Ihas,tolos ou malucos!

(0) A pÌopósito, observamos que os nomes próprios que podem ser escoÌhidos actualmente, sõ,o os que constlvm dos ali,Íerentes calendó'ríos (disposição do decreto n.' 22 018, dê 22 de Dezembr.o de 1932, que deixa ainda caminho aberto para muitos gostos exóticos...). No entântq uma útil ÌestÌição se fez no referido diploma: podendo ser dados às crianças nomes de peÌsonagens aonhecidâs na História, não devem eles, contudo, envolver referência política. Se tal fosse hoje peÌriitido, aonde chegaria o gosto de certos progenitores e padrinhos? (') Ela Josê António Rodrigues (Josê d,a"Quinta-Gr6rul,e). Rêla'tivamer,te iíÊtruído, escÌevia algumâs vezes nas gâzetas da época. Foi o pÌimeiro coÌrespondente de O Século rto Bârreiro. As suas crónicas, como, por exemplo, aquelâ que, em parte, aqui tÌanscÌevemos, eram muito combâtivas, atacando intrèpidamente os adveÌsários. Essa atitude originou-lhe seÌ uma vez foltemente agredido à bengalada pelo dr. José Joaquim FeÌnândes Costa, subdelegado de Saúde deste concelho, monárquico convicto, filiado no padido regenerâdor. (3) Do citado joÌnal, n." 1539, de 19 de Janeiro de 1886. Ano 6.".


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS Quem serã,oos canalhas? Aquelles que leuantam erguìda a fronte, que nõ,o receialtu inclinar-se para o latlo dos oppri'm"idos,ou os que nos quere'ìn subjugar, prol)ocúr e insultar, dìzenrí'o-sedefensores de tod'osos goaernos? Quem serão os tolos e malucos? Aquelles que sabem sentir os males da nútri,a ou os oue sõ.oconiuentes na sua decadência?

A Luta tem que fatalmente feri'r-se; pois seia o muts breae possíael, unomo-n(B na rlefeza tia pútria, façamos sentar no banco dos réus os nossos tutores, sejamos 'inerordreis. . .>>. Lançava-se já por todo o país a semente que havia de fazer brotar o novo regime, derrubando as instituições monárquicas. Até que ponto teriam, entïetanto, as realidades correspondido aos sonhos dos idealistas?

*

Voltando a João Baptista Fiïmino: Foi deveras trágico o fim que estava resetvado a este convicto lepublicano barreirense. Mlnado de desgosto e vergonha, João Baptista faìeceu a 18 de Maio de 1902, na cadeia do Limoeiro, em Lisboa, onde se enconttavâ pïeso por suspeita de ter praticado no Barreiro um duplo e horroroso crime de homicídio - o célebre Crime d,osV elhos (2! para 22 de Setembro de 1900) -, do qual jurou sempre a sua inocência, acreditada, aliás, pela esmagâdora maioria da população desta vila. A viúva daquele que - segundo inscrigão gravada no jazigo que recolheu os seus restos mortais - foi <aítimo, cle um eno iucliciário por in' fluência potítica> (não chegou, porém, a ser julgado), faleceu, nesta vila, a 18-XII-1917, com 53 anos de idade.

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FIGURAS E FACTOS

1890-O

(ULTIMATUM> INGLÊS

As manifestaçõespatrióticas da populaçã.odo Barreiro A 11 de Janeiro de 1890 - ia fazer três meses,àpenas,que ao tror'Ìo de PortugaÌ subila o rei D. CarÌos (') - sucederao caso do <ultimatum> inglês, dirigido ao governo de Lisboa, em face do conflito levantado pela nossa velha aliada, originado na viagem de exploração do major Serpa Pinto através da região dos Makololos. Pol aqueÌe acto de força Ìevava-se o nosso País ao reconhecimento do protectorado britânico na Mashona' lândia e regiões do Chire e do Niassa. PortugaÌ, o povo português, recebeu a atitude britânica como uma afronta - palavïa que, com todo o seu poder significativo, faz parte dos fotmosos versos de A Portuguesa, o hino patriótico então surgido, para alentar e eÌevar as almas amarfanhadas pela atitude da nação, que ainda era, por essetempo, â senhora dos mares e de náo pequena parte da Terra... Uma recente referência num jor"naÌ local ('), a esse hino patriótico que a vitoriosa RevoÌução de 5 de Outubro de 1910 havia de eÌevar à categoria de Hino Nacional, levou-nos, por assocìaçãode ideias, a fazet: veconstituir a forma como o povo do Barreiro vibrou, nesse ano de 1890, ante a humilhação sofrida, Possuindo aÌguns apontamentos da época, sobre o assunto, vamos então recordar os acontecimentos sucedidos nesta vila.

O primeiro gesto público patriótico, neste concelho, partiu da Câmara Municipal. Em sua sessáo de 20 de Janeiro, a Câmara, resolvendo,unânimemente, aderir ao movimento nacional de protesto contra a atitude do governo ìnglês, deliberou:

(1) Por moÌte do pai, o rei D. Luís, ocouida a 19 de Outubro do ano anteÌior, em Cascais. (2) Jornql rlo Baneito, n." 422, de 25-IX-1958.

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DO BARREÌRODE VÁRIAS ÉPOCAS 1." - Dat o nome d,eSerpa Pinto a uma do's ruus tlesta uila (3) ; 2.' - Conuülar toclosos comerciantes e munícipes deste concelhoa nõ'o cornprclrenl g éneros d'e proa eniêncì.aÌnglesa; 3." ..._,So?r,d'entro d,e ili,as, em bando precatório, e abrir subscri'ção parü ú coTnpra d'e materlal de guerra.

A primeirà manifestação pública de protesto, realizou-seno dia 25 de Janeiro, um sábado, peÌas dez horas da noite, promovida pela Câmara Municipal, que era acompanhadada banclade música da SociedadeMarcial Capricho Barreirense (<Os Franceses>) e de muito povo, dando-senumerosÕs <<vivas>a Serpa Pinto e à nação portuguesa, e invectivando-seos ingleses. Como consequênciada reacçáo do povo contra os britânicos, no dia 7 de Fevereiro foi entregue ao director dos Caminhos de Ferro do Suì e Suesteuma replesentaqáo,pedindoque fossedespedidodas oficinas desta vila o súbdito ingÌês James, ,,contra cuja permanência aqui todo o pessoal das oficinas está descontente>. E o pintor James foi despedido " facto que encheu de júbiÌo todo aqueÌe pessoaÌ, que rendeu louvores ao seu director. Entretanto, pala a data de 11 de Fevereiro (em que fazia um mês o <Ultimatum>, que a maioria da Imprensa designava por <A pata'da d'e parâ John ButL>), todo o PortugaÌ e, em especial,Lisboa, se preparava levar a cabo ruidosas manìfestações, nas quais os elementos repubÌicanos púiriam ter parte preponderante. Receando vastas alterações de ordem presigoverno regeneradores, dos bÌica, fortes ataques ao regime, etc., o peÌos dido por Serpa Pimentel (que sucedera, em face da crise provocada acontecimentos do <11 tle Janeiro>, ao gabinete de José Luciano de Castlo), p:roibiu todas as manifestações' Na província, no entanto, algumas manifestações patrióticas se efectuaram e nas localitlades onde os elementos republicanos avultavam, foram estes que encâbeçâïâm os cortejos e mais ruidosamente marcâram a suâ presenla.TaÌ sucedeuno Barreit'o. É uma das mais antigâs ruas do Barreiro, sendo anterioÌmente denorninadâ IÌ1td de S. Francisco, (3)

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FIGURAS E FACTOS Aqui, a manifestação foi plomovida peÌa SociedadeFilarmónica Barreirense (<Os Penicheiros>) Eram cerca das 8 horas e meia da noite quando a sua filarmónica, acompanhada da direcção e de celca de um miIhar cÌepessoas,se dirigiu à residênciado presidenteda Câmara, onde fez entrega de um protesto, percorrendo em seguida todas as ruas da vila' Constantementea muÌtidão levantava vivas à união da raça Ìatina, a Serpa Pinto. a Paiva de Andrade, ao partido republic:rnoportuguês,a Magalhães Lima, a TeófiÌo Bràga, a Latino Coelho,a Manuel de Arriaga, a Jacinto Nunes, ao jolnal republicano O Século, etc., ouvindo-setambém abaixos à Inglâterra, aos Braganças e à Mônarquia. o grande cortejo, dentre o quaÌ Aos acordesdo Hino da Restaur:ação, avuÌtava uma enorme bandeira nacionaÌ, só dispersou cerca da meia-noite, não sem que um eÌemento repubìicano, João Baptista Firmino, tivesse usado da palavra, verberando a acção da IngÌaterra. Eis o documento entáo entregue ao presidente da Câmara Municipal do Barreiro: <Faz hoje um mez que a nossa briosa nacionalidadefoi infamemente ultrajada pelo governo britânico, peÌo governo d'essanaqáo pirata que se chama Inglaterra, pelo governo da nação que se dizia nossa fìeÌ aliada' A SociedadePhilarmonica Balreirense, como intérprete dos sentimentos patriótìcos d'uma grande parte dos habitantes da vilÌa do Barreiro, protesta contra o ignobil procedimento ingÌês e adhere a todas as manifestações promovidas peìo paí2. É necessário que nem um só portuguez deixe tle protestar contra a brutaÌidade britannica, e que em coro gritemos : Abaixo a Inglaterra I Abaixo os traidores à Pátria I Viva Serpa Pinto I Viva PortugaÌ I Viva o povo do Barreiro ! Barreiro, 11 de Fevereiro de 1890.> ( Segu iam-se /ìÌtwProsasossinaturas)

No dia 16 de Fevereiro (um domingo) teve Ìugar nesta viÌa outra manifestaçáo patriótica, desta feita no teatro da SociedadeMarciaÌ Capricho Barreirense (<Franceses>), ao terminar a representaçãode uma peça dr:rmática intituÌada O Padrão cL'El-Rei. 79


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS No fim do espectáculo,o actor SantosJúnior, empunhandoa bandeira nacional, leu um discurso patriótico, no fim do qual a assisténciase manifestou com <vivas> à Pátria, a Serpa Pinto e ao Povo Português, enquanto a olquestra tocava o Hino da Restaura@.o.

!l pÌonto. Os tempos rodaram, as paixões acâlmârâm e tudo se foi modificando. 26 anos depois - em 1916- já portuguesese ingÌeseslutavam, Ìado a lado, contra um inimigo comum...

RECORDA.SEO trNG,OTAVARES TRIGUEIROS, ANTIGO DIRECTORDOS CAMINHOSDE FERRO DO SUL E SUESTE, ALTAMENTE ESTIMADO PELA CLASSE FERROVIÁRIA DO BARREIRO A distinta e honesta figura que soube timbÌâr, sempre, por uma exemplar vida pública e que vamos aqui lembrar, voÌvidos setenta ânos após a sua morte, foi recordada com carinho no Barreiro, por veÌhos ferroviários, que receberam dela bastantes provas de interesse e consideração, aÌguns dos quais lhe ficaram devendo,mesmo,o trabaÌho com que se iniciaram na vida prestante e laboriosa. Essa figura de esclarecida inteligência e bom critério, à qual muito ficou a dever, na sua época, o progresso materiaÌ do País, no aspecto do desenvoÌvimento ferroviário, foi o prestigioso militar e técnico João Pêdro Tavares Trigueiros, que, depois de exercer âs funcões de chefe da secção de exploração das linhas do Sul e Sueste, foi seu director, no dilatado período de 22 anos, de 1876 a 1898, deixando proÍunda saudadenesta vila, quando se retirou do seu elevado cargo. Tavares Tligueiros, de ilustïe sangue beiráo, nasceu em Lisboa, a 5 de Outubro de 1831, tendo, cedo, perdido o pai, o que o forçou a pro-


FIGURAS E FACTOS cu1'â1',êm face de precáriàs condições económicas da famÍÌia, um rumo de vida susceptível de Ìhe garantir os indlspensáveis meios de subsistência. Matriculando-sena EscoÌa do Exército, após tirar os prepalatórios, com tal força de vontade se Ìançou ao estudo,que, com 21 anos apenas,concluía o curso do Estado Maior e Engenharia Civiì. Foi esta carleita que o seduziu, pelo que, obtido o indispensáveÌ tirocínio militar, em 1855, logo procurou colocaçãono Ministério das Obras Públicas, criado três anos antes. Serviu, então, em várias direcçõesde obras públicas distritais, nos estudos da linha do Leste, na fiscalização dos primeiros lamais dos caminhos de ferro do Sul e Sueste, na construção das linhas entregues à companhia do Sueste e, mais tarde, na exploração técnica das linhas do Norte e Leste. Todas estas funcões, que exerceu com proficiência, deram, em breve, a Tavares Trigueiros um entendimento profundo dos serviços ferroviários, uma taÌ prática e soma de conhecimentos que, tendo sido, em Outubro de 1869, chamado a assumir o cargo de chefe da expÌoraçãodo Suì e Sueste,não constituiu suïpïesâ o ter-se conhecimento,após a morte, em 1876, do eng.' NuÌÌo de Brito Taborda, director das referidas linhas, que fosse o eng.. Tavares Trigueiros quem o vinha substituir, tornando-se efectiva a sua nomeaçáo em 20 de Novemblo daqueÌe ano. Era então ministro das Obras Públicas o eng." Louïenço António de Carvalho (1837-1891), uma provada competênciasobre assuntos ferroviár'ios, que, por duas vezes, foi colaborador de Fontes Pereira de MeÌo, como titular daquela pasta, em ministérios presididos por este grande estadista. Árdua e ingrata, tantas vezes, foi a acção que a Tavares Trigueiros coube, então, desenvolver, diante dos fracos recursos de que o Estado podia dispor, para meÌhorar e desenvolvel as suas linhas férreas. Sempre, porém, partidário da sua administração por parte do Poder CentraÌ, o âbâlizado engenheiro sentia quebrar-se-lhe o ânimo, receando, porventura, que todos os seus esforços não evitassem um dia a entrega das linhas a companhias arrendatárias. Contudo, até deixar o seu alto cargo de director, Tavares TYigueiros foi poupado a verificar esseextremo recurso. No entanto, aÌgumas vezes revelou com desassombro a sua discordância perante ordens e sugestões de origem governamental, atentatórias da sua Ìiberdade e que iriam comprometer as directrizes âdministrativas, chegando, de uma vez, a depor o seu caïgo, se certas imposições se concretizassem,no que revelou dignidade, firmeza moral e completa ausência de interesse materiaÌ no desempenho das suas funções. Se essas atitudes eram, então, pouco vul81.


DO BARREÌRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

gares, hoje são râras, se veÌificarmos a tendência de muitos dirigentes para disfrutarem, o mais diÌatâdo tempo possíveÌ das vantagens das posições a que foram alcândôrados, quando ìrelâs há muito se tornâïam pouco desejáveis. Instado a continuar no seu posto, o eng." Tavares Trigueiros, que ascendera ao generalato em 1890, pôde, no entanto, em Abril de 1898, obter do ministro a exonerâção, como seu favor pessoal, para poder, enfim, lransmitir a um mais novu dirigente, s.s funções que exercia há um já longo período. O eng." Pedro Inácio CO NSE L H E IR OJ OÃ O P ED R O Lopes veio substituí-lo, a este entregando a direcçáo em 2 de Maio de 1898. TÀVARES TRÌGUEIROS Tavares Trigueiros foi, então, con(1 8 3 1 -1 9 0 2 ) vidado a ocupãr um lugar de membro do Genera[ d.e Dìt:isão can, o atrso Conselho Superior de Obras Púbìicas e do Estarlo Maioc' e Engenheiro Minas. Pouco depois,ao ser criado o Con(Desenho e crâvurà êú mâdeira de Cândido liDes seÌho de Administração dos Caminhos de Ferro do Estado,, pela lei de 14 de Julho geral aplauso, vogal do referido ConseÌho, de 1899, ele era nomeado, com falecendo no desempenho destas funções. No período em que Tavares Trigueiros dirigiu os C. F. S' S.: *

Construíu-see completou-sea gare marítima do Barreiro; - Dotou-se a estação desta vila com uma doca de reparação de vapoles, rebocadolese ìanchões; - Mandou-se aÌargar, com novas Ìinhas e armazéns, a área da estação, o que, aliás, náo viria prejudicar o projectado prolongamentoda linha até Cacilhas; - Adquiriram-se doÌs novos vâpores, 24 locomotivas e uma quantidade razoável de outro mâterial circulante; - p61xvp abertos à exploração os caminhos de ferro de Serpa a Pias; de Casévelâ Amoreiras e, à sêguir, o de Amoreiras a Faro, renovando-se grande extensão da via e ampliando-semuitas estações;

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FIGURAS E FACTOS - Instituiu-se no Barreiro um cLÌtso de desenho de máquinas nara aprendizes e operários; ..._Foi criada a Associação rle Soconos dos Empregad,os dos Camì,nlrcs de Feno clo S'ttI e Sueste, que dele obteve o mais desveÌadocarinho, zelando peìa sua sólida situaçáo financeira; - Foram criados os Armazéns de Víaeres, que asseguravam ao pessoaÌ os benefíciosdos fornecimentos a crédito; - E, já como membro do ConseÌhode Administração dos C. F. 8., pôde, em 1901, Tavares Trigueiros tomar parte âctivâ e importante na criação da Caina de Aposentações e Soconos do pessoal das linhas do Estado, sendo nela encorporadaaquela associação,cujo capitaÌ era já cerca de 100 contos de réis.

O generaÌ engenheiro Tavares Trigueiros faÌeceu na sua residência, na Rua Câmara Pestana, em Lisboa, a 27 de Fevereiro de 1902, sendo sepultado no Cemitério dos Prazeres. Cercâ de quatro anos ântes, ao despedir-sede director dos C. F. S. S., quis também fazer as suas despedidasa todo o pessoal ferroviário do Barreiro, vindo então a esta vila, no dia 4 de Maio daquele ano de 1898, onde foi alvo de imponente manifestação de todos os seus subordinâdos. Percorrendo todas as repartições e oficinas, despediu-sepessoalmentede todos os engenheiros, chefes de divisáo e de serviço, âmânuenses,contramestres e mais empregados. Depois, todo o pessoal o acompanhou até ao vapor, junto do qual o chefe do depósito principal de máquinas, Zacarias Ferreira, o saudou vivamente, em nome do pessoal operário, soltando <<vivas>> âo fundador da associação de socorros dos empregados e ao protector da jovem Associação dos Bombeiros Voluntários dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste, no que foi frenèticamente correspondido. Invocando a alta estima que os fenoviários do Barreiro dedicavam ao seu antigo director e a manifestação que, na sua despedida,lhe fizeram, pronunciou o dr. José Joaquim Fernandes Costa, chefe da Secção Médica principaÌ do Serviço de Saúdedos C. F. S. S., naturaÌ do Barreiro, sentidas palavras de homenagem à memória de Tãvares Trigueiros, no dia do seu funeral, em 1 de Março de 1902. Delas destacamosestg período de fino

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DO BARREÏRODE VÁRIAS ÉPOCAS recorte: <Eïa uma formosa tarde de Junho de 1898 ('). Estamos ainda a vêlo à pïoâ, no extremo do vapor D. Afonso, que recuava, espadanando as águas do canaÌ com as suâs rodas potentes. De figura erecta e firme; religiosamente descoberto; páÌido de grata comoção; os olhos marejados cle lágrimas, a custo sustidas pelos neglos cílios; semicercado pelos engenheiros subalterrros, que o deixavam saliente no primeiro pÌano; a mão esquerda crispada sobre o peito, como que a conter as desordenadaspalpitalvez no início da morbidez que o havia de arrebatar; tações do cot:àçã,o, fortemente emocionado por uma tão espontânea demonstração de uma grande saudade, aintla incipiente, ele agradecia a custo, com profundas inclinações da sua bela cabeça. E quando o vapor, depois da sua voÌta em frente da Azinheira, singrava já em demanda de Lisboa, ainda vimos ao longe o seu busto esbatido no horizonte, reduzído muito pela distância, a enviar-nos num distinto aceno, o seu último adeus de director.u NOTA - Em homenagem à rnemória do eng." Tâvares Trigueiros, foi dado o seu nome a um vapor-rebocador, para serviço da direcção do Sul e Sueste, cujâ compra fora efectuâda à firma inglesa Thomas F. Works. O refeÌido barco, com matrículâ na N. C,N. (Navegação Costeirâ Nacional), esteve ao serviço durante mais de cinquentâ anos, entre as duas margens do Tejo.

UM CORTEJODO 1.'DE MAIO, NO BARREIRO, HÁ MAIS DE ?OANOS... O Congresso Internacional dos Operários, reâlizàdo em Paris, em 1889, hâvia deÌibelado que, a partir do ano seguinte, o dia 1." de Maio fosse festejado com uma folga geral e com manifestações de reivindicação do dia normal de trabalho reduzido â 8 horas. Dentro das aspiragões mais legítimas do operariado estava, de facto, a triìogia dos oito: 8 horas de trabalho, 8 horas de descansoe 8 horas de recreio ou cultura mental, Iema ambicionado e defendido por todos.

(r) Ti'âta-se oe um lapso de memóriâ. A despedida efectuou-se, como dissemos, no dia 4 de Maio.

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FIGURAS E FACTOS De ano para ano, em Portugal (e com dupla razão nos países lbrtemente industriaÌizados) as manifestações pelo 1.' de Maio foram aumentando de grandeza, estendendo-se,em bteve, de Lisboa ao Porto e a outros centros operários mais importantes. A chamada Festa do Trabalho tinha todo o apoio do Pãrtido Socialista Português, e naqueÌe ano de 1898, a que nos vamos reportar, a palavra de ordem continuava a serl. 8 horas de tra' balho. Prelendia-se acabar, assim, com o que até então era uso: duração do trabalho, do nascer do Soì ao pôr do Sol. De Verão, com uma hora para o aÌmoço e duas para jantar; de Inverno, meia hora parâ âlmoço e uma hora para jantar, aqueÌa alterada depois, para uma hora também, destinada a almoço. A Inglaterra já havia adoptado oficialmente o novo horário; na Bélgica, na França, na Alemanha ia já ele entrando na prática, e entre nós as comissões operárias pediam simplesmente que se seguisse o exemplo dos nossosvelhos aliados... Tudo isto já pertence, há muito, à histór'ia das reivindicações do proletariado, que, só ao cabo de largos anos, viu satisfeita a sua aspiração, não fácil de conseguir, com efeito, porque Capìtal e Trabalho náo se entendiam com leaìdade,e a economia liberal nem sempre esteve à altura de estabelecer entre ambos uma justa concórdia, uma perfeita harmonia que os levasse à mútua compreensão de direitos e deveres e impusesse, enfim, uma estreita cooperação entre eles.

Decorria o ano de 1898 e o operariado de Lisboa preparou para o dia do Jubileu do Trabalho a devida comemotação, com um gtande cortejo aÌegórico. E no Barreíro também o operâriado preparou a sua festa... Vivia-se a fase romântica do seu movimento, que Ììunca ficará mal invocar. O dia 1." de Maio desse ano foi um domingo, dia magnífico, cheio de sol, dando assim o tempo óptima contribuição para o brilhantismo do cortejo com que o elemento operário desta vila ia celebrar a passâgem dessa data. Segundo notas que tomámos há anos, respeitantes a essa época, e da sua recordação, ainda viva, em velhos amigos nossos, já então passantes dos setenta... foi iniciador dessafesta Caetano FraÌ'Ìciscoda Silva (186685


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS -1955), carpinteiro das Oficinas Geraìs dos Caminhos de Ferro,, o qual teve na Associação dos Operários Corticeiros o organismo coordenador e impulsionador da maniÍestaçáo,o que não admirava, pois esta classeoperária era a que então exibia mais poder de iniciativa e espírito de reivindicação, como já recordámos em outrc lugar. À comissão organizadora pertenciam, entre outlos, os corticeiros Ricardo e Jerónimo da Costa e os operários dos C. F. S. S., Manuel Tavares dos Santos,ferreiro,, António Lindim, pintor, e Flancisco António Maria e José Maria Madeira, carpinteiros. Às 8 horas da manhã estoiraram na vììa foguetes e moÌteiros, ende cìassee de recreio A fim bandeirandoas sedesde todas as associaqões de garantirem a ordem, que felizmente não foi perturbada, tinham vindo para o Barreiro quatenta praças de Câçâdores1. A concentração dos manifestantes e dos carros alegóricos fora feita na Rua Miguel Pais, em frente da fábrica de coltiça de Victor Garrelon (que foi, por último, de R. Carvalho & C.'), num espâçosoterreno aÌi existente, há muito ocupado já por vários prédios. Às 10 horas, a concentraçãoestava concluída e o cortejo pôs-seem marcha peÌas ruas e travessas da vila, abrindo com um numeÏoso grupo de pescadoresÌocais, que conduziam, sobre potente cârro, um barco de pesca, com todos os pertences, revestido de buxo e fìores, e Ìe'vandoà frente coroas de flores artificiais dedicadas a dois ÍaÌecidos pescadores:João Gonçalves e Augusto dos Santos. Vinha, depois,a Troupe Recreativa Barreirense,tocando o Hino 1." de Maio, seguida da direcçáo da Associação dos Operários Corticeiros e seus associados,que desfiÌavam com um carro aÌegórico do feitio de uma pirâmide quadrangular, vendo-se do Ìado da frente um grande retrato do poeta e pedagogoJoão de Deus (falecido dois anos antes - em 1896), e da parte de baixo a reproduçãode uma página da <CartiÌha MaternaÌ'. O conjunto ela enfeltado com veldura, floles e peças de ferramenta dos corticeiros' Desfilavam a seguir mais dois cârros: o de um Grupo Social e outro cle uma Sociedacle FraternaÌ, este úÌtimo executado por corticeiros da Casa GarreÌon, bem enfeitado e conduzindo um quadro com os retratos dos operários dessa fábrica. Prosseguia depois o cortejo com â representãção de uma antiga Coopelativa Operária Barreirense, constituída peÌos seus directores e numcrosos sócios, conduzindo e ladeando Õutro cârro alegórico do feitio de um caramancháo artìsticamente enfeitado com festões e coroa de flores, 86


FIGURAS E FACTOS oÍertas de Joaquim dos Santos da Faustina, José Gregório e António Sobral, este último natural de Cercal do Alentejo (concelho de Santiago de Cacém) e que foi o primeilo desta família a fixar-se no Barreiro, aqui deixando descendentes. Logo após, desfilava o carro da AssociacáoRecreativa dos C. F. S. S., envolvido em flores e verdura e ostentando o retlato de José Fontana (1841-1876),o paladino das primeiras organizaçõesoperárias. Fechavâ finaÌmente o cortejo a Sociedade de Instrução e Recreio Bar"reirense (Penich,eiros), representada pelos seus directores, banda de música, tocando igualmente o Hilo 1." de Maio, e carro aÌegórico, este também em forma de pirâmide, de cuja parte superior surgia um musculosobraço empunhandopotente martelo. Quem ideaÌizouesLecarro (ou, pelo menos, o braço e o martelo, que ia sempre osciÌando com o andamento pelas primitivas e muito pouco reguÌares calçadas da vìla) foi Manueì Henrique Faninho, natural de Setúbal. hábil carpinteilo de moldes dos Caminhos de Ferro. Dele voltaremos a falar mais adiante. Depois de ter percolrido as principais altérias da vila, o cortejo chegou ao primitivo cemitério local (que ocupava â maior parte do actuaÌ Jardim PúbÌico do Largo Luís de Camões,hoje Ìigada ao topo norte do Campo D. ManueÌ de MelÌo, do Barreirense), encaminhando-seos maniÍestantes para as sepuÌturas do corticeiro Francisco dos Santos, do ferroviário José Pereira e do pescador Augusto dos Santos, que haviam trabalhado com dedicaçãoem benefício das aspiraçõesoperárias, cerimónia que se encerrou com alguns dìscursos à beira das suas campas.

À noite, na Associaçãodos Corticeiros, na Plaça de Santa Cruz, reaÌizou-se uma sessão solene, na qual falaram sobre o significado da Festa dos Trabalhadores,Ricardo Meireles, cortìceiro, que ânos depois foi para o Brasil, José Barreto Couceiro que, segundo nos ìnformaram, foi operário chapeleironesta vila, Emídio Martins e o indispensávelpropagandista corticeiro (entáo operário e, mais tarde, industrial) Miguel António Lopes, o homem que erà capaz de falar em toda a parte. E assim terminou para o operariado barreirense o festivo dia 1." de Maio de 1898, com esperançasem melhores dias para todos os trabalhadores... 87


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

(Jma ach'egapara a História d,oMouimento Socíaltstaem Portugal

OS CINCO CENTROSSOCIALISTAS BARREIRENSES O BARREIRO I'OI O PRIMEIRO CONCELHO DO PAÍS QUE ELEGEU UMA CÂMARA COMMAIORIA SOCIALISTA ( 1ee0-22 ) Porque a maioria deìes teve curta existência e modesta actividade' já hoje sáo raramente lecordadosos centros sociaìistasque houve no Barqn* foram nada menos de cinco, e não pequeno tÏabâlho nos deu " ""i.o, o leferenciálos com base em dados absoÌutamenlecerlos'

O 1.' CENTRO Íundou Foi no ano de 1890 que o 1." Centro SociaÌistado Barreilo se Aguiar' de António Joaquim no 1.'andar cÌoprédio n." 196 c1aRua do Cons' que foi maquinista residência do seu próprio funcÌador, Joaquim Marques, (1841-1876)'pridos vapores tlo SuÌ e Sueste e amigo de José Fontana Azedo meiro propagandista do movimento operário em Portugal, e de Português' Partido SociaÌista antigo do Cn".o ifa+g-fgrl), um cÌoschefes Este Centro teve efémera duração, poÏ causas que pâssamos a expÌicar. certa Se bem que em Lisboa o movimento socialista começassea crrar peÌas efewescência, aqui a polítlca era quase totalmente influenciada progressistas, colectividades de recreio musicais, uma artegimentando o facto de circunstância esta e outra regeneradores. Acrescia ail-da a socialistas) a classe coúiceira (onde havia certo número de simpatizantes que lhe se encontrar ainda pouco desenvolvitla no Barreiro, e ser a única podia dar algum alento. Já' porém, nessa aÌtura, ela começava a sel mldesacreditar nada pelos eÌementos anarco-sindicalistas, âpostâdos em para o desalento que concorreu tudo e destruir o incipiente movimento, o dos poucos que acompanhavamJoaquim Marques' 88


FiGURAS E FACTOS

O 2.' CENTRO Em 1897 -esta dâta foi-nos indicada, de memória, por um antigo militante socialista local - surge a fundaqão do 2.' Centro Socialista do Barreiro, cuja sede funcionou na Rua da Amoreira, n." 4-1.". ContagiadospeÌa propaganda de alguns novos apóstoìosdo ideal, que muito se esforçaram por fazet difundir e engrandeceressesnovos principios sociais, foram fundadores do novo Centro: MìgueÌ António Lopes, Vicente Morais, Manuel Tiago e João Ferreira, todos,por essaâltura, operários corticeiros, e, ainda, Joaquim Ferreira Aìves ('), de Azaruja, comerciante locaÌ, aÌém de outros mâis. O último a abandonaï o roÌ dos vivos (dentre os citados) seria João Fereira, em 1966. A existência deste Centro também não foi longa, mercê da guerr:r acesaque lhe moviam os militantes da extrema-esquerdae, por outro lado, o próprio Partido RepublicanoPortuguês não perdia ocasiãode combater doutrinàriamente os jovens sociaÌistas,temendo que o movimento associativo operário, por que eles pugnâvam, viesse enfraquecer a sua popuÌaridade e, portanto, os alicercesem que pretendiam assentar a sua política. AÌém disso, o Partido SociaÌista Português sofreta, por essa época,uma forte propaganda hostil, pela falênciâ de uma cooperativa de viação, <A Lusitânia>, de Lisboa, que havia sido fundada sob seus auspicios. O pequeno núcìeo Ìocal também sofreu todas estas infÌuências e, tal como sucedera com o plimeilo Centro, iguaÌmente o seu imediato sucessor fechou as portas pouco tempo após ter surgido. Mas os seus criadores, fiéis aos princípios que defendiam, não haviam desistÌdo de fundar nova agremiaçáo, em época mâis propíciâ, já com mais amplos fins, além dos pròpriamente polÍticos. (Em Julho de 1900 houve uma tentativa païa se fundar outro Centro Socialista, que não teve, porém, concretização). O 3." CENTRO E essa ocasiãosurgiu, mas só aÌguns bons anos depois: na primeira década deste século, precisamente em 1909, com a rasgada ajuda de um (') ?ai de Horácio Ferreira Alves, que foi industrial corticeira e cometciante nesta vila e âinda escÌitor e jornalista, nat. de S. Bento do Mato (Azaruja). Dirigiu ne Barreiro, em 1922/23, o jornal O nIwrIo Co,rticeiro, tendo falecido em Lisboa, â 20-XÌ-195?, com 66 anos de idade.

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ântigo companheiro de Azedo Gneco e de outros caudilhos do ideário socialista. Já anos antes dessa data viera viver para o Barreiro, para a Quinta das Palmeiras, na já extinta estradâ pâra o Lavradio, propriedade onde costumava passar uma temporada, em especiaÌno Yerão, o considerado militante socialistaLadislau Estevam da Silva Batalha, nascidoem Lisboa, em 1856, professor de línguas (com dipÌoma ofìcial), escritor, jornalista, conferencista,pedagogoe economista,homem de ascendênciabem modesta e com uma larga experiênciada vida prática, que, apaixonadopelas ideias sociaÌistas,vinha fazendo deÌas,há muito, a maior propaganda. Afeiçoando-se muito ao Barreiro, em breve LadisÌau Batalha contactcn, nesta viÌa, com diversos elementosdas camadas operárias, junto dos quais Ìogo adquiriu o maior prestígio, prontificando-se, em breve, o popuÌar mentor socialista a ajudáìos a fundar um nÕvo centro social, com mais sólidas bases que os anteriores. Quando Batalha se lixou pròpriamente na vila do Barreiro (vindo moraï parà o 1.o andal, esquerdo,do prédio com o n.o 301 de poÌícia da Rua do Cons. Aguiar (sempre està ruâ...), ìogo iniciou os seus trabalhos nessesentido e, assim, no dia 1." de Maio de 1909, em sessáorealizada na antiga Associaçãode CÌassedos Operários da Indústria Corticeira, foram Ìidos e aprovados os Estatutos do novo centro político, que eÌe elaborara e nos quais decÌarava tratar-se de <uma agremiação política, económica, instrutiva e de lecreio, destinada a cooperar para a realizagã'o do progr:ama do partido socialista e de todas as reformas e melhorias tendentes a levantar a situação económica,poÌítica e sociaÌ das cÌassesprodutoras>. A quota dos sóciosera de 20 réis semanais,o mínimo, e a sededeste 3." Centro foi instalada na Rua Serpa Plnto, n." 5-1." andar, prédio hoje com a fachada modificada e pertencente ao comerciante Luís Lopes dos Santos. Como fundadores do Centro, com Ladislau BataÌha e sua esposa, D. Ernestina Costa (senhora com quem sê câsarâ em segundasnúpcias, que possuÍafamiÌiales no Barreiro, e foi a sua desveladacompanheiraaté ao Íim da vida), citam-se,além dos que criaram e dirigiram o antecessor Centro, Francisco RamaÌho e Francisco Martins, que foram presidentes da direcção e sens comltanheü'os (et:a este o tratamento entre os filiados) José de Moura, Manueì Coutinho, Tomás Camps, João Ferreira Filipe (naturaì de Azaruja e falecido em Lisboa, em 1930) e CamiÌo Pereira, estes os mais activos elementos, todos da cÌasse corticeira. 90


FIGURAS E FACTOS Posta em actividade :l nova agremiaqáo,sob a égide da Comissáo Central do Partido, instalada em Lisboa, promoveu LadisÌau Batalha a criação de um jornzrl do Centro SociaÌistado Barreiro, iniciativa a que, como jornalista já experimentadoem vários órgãos da Imprensa lisboeta, se lançou cÕm prazer e segurança. E assim, a 5 de Dezembro de 1909, saía à publicidadeo primeiro número do Auante, qlinzenário <Defensor das Classes Trabalhadoras e dos interessesloc-.ris>,tendo como director e proprietário Ladislau Batalha, e como administrador OÌiveira Pombo. A redacção e a administração funcionavam na sededo centro poìítico e o jornal era compostoem Lisboa. O novo ór'gão barleirense tinha uma apresentação agradável para a época,era cuidadosamenteredigido e teve, como único jornal do concetho, nessetempo, uma expansãomuito reguÌar, devida à popularidadee ao plestÍgio do seu director. No 1." número, no artigo A nossa otitu.de,que se leconheceda autoria de BataÌha, lê-seo seguinteperíodo: <O Auante>,,pubìicadocom o apoio do Centro Socialista do Barreiro, náo tem outra política que não seja àqueÌa que melhor possa ir conduzindoà defesa das cÌassesoprimidas. Inspirando-se, pois, nos prÕcessosmodernos adoptados pelos g:randes partidos democráticosdas naçõesmais adeantâdas,como sejâm AÌlemanha, IngÌaterra, França, Estados Unidos e outras, o Aaante, ào mesmo tempo que serve os interessesmoraes e materiaes da circumnscripçáo do Barreiro, não deixa de dÌspensarquanto possíveÌ:rmelhol orientacãoàs hostesproÌetarias de toda a regiáo portugueza do suì>. Em Janeiro de 1910, promoveu-sea inauguração oficiaÌ deste novo centro socialista,realizando-separa o efeito, no dia 23, uma grande sessão pública, a que assistiram delegadosdo P. S. P. de Lisboa e vários jornaÌistas, entre os quais Antónìo Pedro Muralha (1878-1946),que tâmbém escreveuno Auante. Relatos da época dizem-nosque pronunciaram então entusiásticosdisculsostrabalhadoresde r'árias artes e ofícios: umâ costureira, um cânâlizador de gás, um padeiro, um tipógrafo, um apontador, um jornaìisla e oulros de Ídónticaspt'ofissões. Quão longe se estava ainda, por essetempo, do tom enfático e pretensamente solenede muitos discursosde hojel Nem frases altamente empoladas, nem Ìongas estiradas louvaminheiras. Os oradores implovisavam geraÌmente os seus discursose ató um deÌes,por essa ocasião,cativou as atençõesdo auditório, em estiÌo humorÍstico, com citações curiosâs, que espalharam pela sala ondas de sàdiâ âlegria e boa disposiçào... 91


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FÌGURAS E FACTOS Era essaépocamelhor ou piol que a actuaÌ? Diremos só que era dilerente, pelo que temos estudadosobre ela, já pela consuìta de documentos escritos, já por testemunhaspessoais,que temos escutado.Não deixamos, porém, de reconhecel que os tempos modernos se caracterizam, em todo o mundo, por muita vaidade balofa, muito pretensionismoirritante, muito cinismo maÌdoso.E quem não souber vivel assim -ai de nósl- não se governa... Foi ainda pol iniciativa de Lndislau Bataìha que se criou, na sededo Centïo, uma bibìioteca denominada depotsLiurat'ia Pública, qte f:rcuÌtava o levantamento de livros para leitura em casa, contra o pagamento de 20 réis por livro e por semâna; e a eÌe mais se ficou devendoa instalação, lìa mesma sede, de um culso de desenhoindustrial e de francès. O activo propagandistaque era,:rfinal, a alma do 3.'centlo sociaÌista desta vila, homem que conheciaas sete pzrrtidasdo mundo, desdea Amética aos países do Oriente, tendo tlabalhado certo tempo em Inglaterra, onde se aperfeiçoarà no conhecimentode Ìínguâs, dâva também, na sua casa palticular, lições de francês e inglês prático e teórico, tendo ministrado os seus ensinamentosa vários ÍnCivíduosdesta vilzr ou aqui lesidentes, dos quais citamos: José Francisco da Costa Neves,actual provedor da Misericórdia do Barleiro, Joaquim José Fernandes, antigo presidente da Câmara Municipal desta viÌa, dr. António Clementeda SiÌva, advogado em Lisboa e antigo subchefedo Serviço do Movimento dos C. F. S. S., Horácio Ferreira Alves, já aqui citado, AÌfredo Azoiano Júnior, proprietárÌo, etc. Por sua vez, D. Ernestina Costa,na qual Ladislau Batalha tinha uma entusiástica colaboradora das suas iniciativas. fundara nesta vìla a Uníão Fraterno"I das Mulheres do Bt,rreiro, cuja primeira missão era trabaìhal para a criação de uma crechepara os Íilhos dos operálios. Houve um peditório púbÌico para obtençáode receitas, mas a iniciativa, ligada como estava às contingências poÌíticas do centlo socialista, não vingou, polque a vida daquela âgremiaqãose tornou difícil, à medida que tudo se preparava, da parte dos republicanos, para o derrubamento do regime monár'quico. Em Agosto de 1910 dizia-se: nO Centro está compÌetamentemorto e vai acabarl>. Por sua vez, Batalha respondia no jornal: <A todos os nossos companheirostecomendamoso mâior dó e compaixão para com os detractores da generosa obra de defeza e protecqão que estamos preparando aos trabalhadores do Barreilo. Yá o público vendo por'ém e plevina-se contra aquellesque só teem paìavras e nada maisl>. 93


DO B.A.RREÌRO DE VÁRIÀS ÉPOCAS Mas o cÌestinoestava traçado... A propaganda dos repubìicanos,pelo volume e extensáo,abafava a dos outlos sectorespoÌíticos e sociais.Nisto, há eleiçõespara deputados.No Centro Socialista do Barreìro sulgem desentendimentos:uns optam peÌa abstençãode voto; outros, pelo cumprìmento de directivas superiores,que os convidam a votàr nas listas republicanas, e assim, para prÕvârem que acima de tudo eram sociaÌistas,vão às ui:nas, de lista aberta, contla a lei, o que motivou áspera censura por parte dos monárquicos.Esta crise provoca, então, a demissãode aÌguns sóciosfundadoles do Centlo, que, todavia, declaram mantel a firmeza dos seus princípios ideaÌistas. Com a fundaçáo do novo legime em Outubro, o Centro Republicano Estevam de Vasconcelos,do Barreiro, vivia a sua hora de triunfo, àbsorvia todas as atengões,aÕ passo que o enfraquecido centro socialista maÌ podia reunir os seus fiéis companheiros.Era a maré alta das adesõesem massa ao P. R. P. por parte dos de .,viva quem vencel>, fauna que é, aÌiás, de todos os tempos, mas de que raros se previnem. Com o n." 25, saído a 10 de Novembro de 1910, o Auante motreu, repousando,em breve esquecido,na campa do passado.Ladislau Batalha, para se entreter, âgorâ que o Centro tinha os seus dias contados, montou na Rua Serpa Pinto, na esquina para a Travessa Luís de Camões,uma <Livraria e Papelaria Internacional>.Mas cedo se aborreceu do fraco negócio que montara, fecha o estabelecimentoe pâssa, pouco depois, a sua residência para a Rua do Telhal, em I"isboa. tr'oi nessa casa que, alguns anos depois, em 1919, Ladislau Batalha recolheu o glorioso autor das <ClaÌidadesdo SuÌo, o grande poeta Gomes Leal (1848-1921), <salvando-oda fome, da vermina, das dormidas nos portais, das vaias e da chacotada dos garotos, e salvando-nos a nós todos - escreveu Albino Forjaz de Sampaio- da ignomínia de ter deixado morrer faminto e tiritante, nojento e grotesco, o maior poeta português do seu tempo>. O 3." Centro SociaÌistado Barreiro encerrou em 1911.

Ladislau Batalha, homem sempre sincero e generoso, ainda por muianos continuaria a ser recordado no Barreiro, especialmenteentre os tos seus correÌigionários, que muito o estimaram. Em Arruda dos Vinhos, ot.


FÌGURAS E FACTOS pâïa onde fora residir no último quartel da vida, veio a falecer esse verdadeiro autodidact^ à 26 de Fevereiro de 1938, com a idade de 77 anos. <Ainda parece que o estou a ver - dizia-nos há tempo um antigo barreitense-. Tinha uma figura pouco vuÌgar: baixo, forte, quase atarracado, de olhar vivo e insinuante. Aìegre e despretensioso,costumâva usar sempre calças e casaco largos, talvez por hábito adquirido no estrangeiro, e, por boa boquilha de cerejeira, fumava invariàvelmente os seus charutos,..>,

O I+." CENTRO Foi fundado este novo Centro cerca de dois anos depois de ter encerraclo o anterior, isto é, em 1913, com aÌguns elementos daqueÌe. Não teve, tambéir, vida longa. Como nos disse, um dia, um dos seus fundadores,os republicanos,de posse do ambicionado poder, <negavâm o direito de existência a outros que não bebessemo licor do seu cáìice>. Por outras palavras: toda a Ìiberdade para eles, excepto para os adversários... As intrigas e as campanhas de descrédito surgiram sobre os elementos socialistas, cujo Centro, situâdo na Rua do Cons.J. A. Aguiar, n"" 218-1.",foi, em breve, apelidadode Ceztro Socialista Burguês..., visto os republicanos negarem a alguns dos seus filiados, tais como a Miguel António Lopes, Joáo Ferreira Filipe, João Ferreira, Vicente da Fonseca Morais e seu irmão, João da Fonseca Morais, todos, ao tempo, pequenos industriais corticeiros, e â Joâquim Ferreira Alves. comerciante.o direito de se afirmarem socialistas... Estes, aborrecidos com tanta falta de lealdade dos seus adversários poÌíticos e também pela incompreensão de muitos operários (que se voÌtavam para os sindicalistas,em especialos dos Caminhos de Ferro), resoÌveràm, em ocasião propícia, o que não foi muito além de dois anos, en'rregar a chave da casa ao senhorio.

O 5." CENTRO É ainda na Rua do Cons. J. A. Aguiar que suïge o 5." Centro Socialista do Barreiro, fundado em 1920, o qual funcionou no 1.o andar do prédio com o n. 25 de oolícia. 95


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS Por essa altura, boa parte do operariado barleirense já andava despeitada com os processos da governação repubÌicana, e, ao preparaï-se a fundação deste Centro, muitos elementos novos acoïleÌ'am a darlhe a sua filiação. A essa data, recorda-se que, dos fundadores dos primeiros centros, apenasmarcaram a suâ presençâ (simples coÌaboração,aliás, porque toda a actividade deste novo organismo se ficou devendo, com justiçâ, a rapazes cheios de vida e boa vontade em trabalhar) os citados João Ferreira, já então intlustrial de sapataria, dotado de oualidades de inteligência' muita actividade e eneïgia, e MigueÌ António Lopes, agente comerciaÌ da indústria coiticeira ('). Teve este último Centro político da Rua do ConseÌheiroAguiar uma inesperada e eÌevada importância, surgida pouco depois de uma mudança de governo, em que este resoÌveu fazer consulta às urnas para as eÌeições camarárias, as quais deram, no Barreiro, com extraordinário espanto dos democráticos, as maiorias ao Pãrtido Socialista, quando fora intenção dos seus filiados vencer na Câmara apenas as minorias. Assim se registou o facfu curioso d,e ter sklo o Barceiro o primeìro concelho do Pats que elegeu uma Cãmara com muíori'a sociali'sto, ficando nas minorias dois evoÌucionistase um democrático. Recordam-se os nomes de alguns elementos que mais ficaram Ìigados à existência deste Centro: Joaquim Figueiredo, Júlio Caetano Veríssimo, Manuel José Bravo, Teodoro Caria, CelestinoBaptista, João Ferreira 2'o, António Viegas e Josó Augusto dos Santos ( Alcomaz) , todos ferroviários; AÌberto Tomé Vieira, naturaÌ de Leiria, então empregado do comércio nesta vila e que, depois, abraçaria a carreira do jornalismo, tornando-se clistinto profissionaÌ (foi redactor de O Século e, anos depois, chefe da redacção do Did'rìo d'e Notícitts), Augusto António Penedo, ajudante de farmâcia, natural de AÌcácer do Sal; Leonel António Cardeira, industriaÌ de barbearia, natural de Sines, e António José da Silva, comerciante no Barreiro e, nessa época, eÌemento preponderante na cÌasse dos caixeiros de Lisboa. (,) A João Feüeira (18?5-1966) nos Ìeferimos já em <O BARREIRO CON19) e II (Ì Pâxte- Cap. III-P.42)' ( I Par t e- Cap. I-P. TEMPO RÂNEO D- I (<<PenicheirosD), enconMigueÌ Àntónio Lopes (186?-1931), benemérito da S.I.R.B. IL(I PãÌte (O já CONTEMPORÂNEO BARREIRO por em nós citado tÌa-se Ca n. IV - P. 65) .

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F1GURASE FACTOS Por essaaltula saiu a folha regional Acçïto (") , cuja redacçáoe administraçáo, a princípio na Tïavessa do Rosário, n'' 20, em breve se mudou também para a Rua do Cons. J. A. Aguiar, n" 25' Nela pontificaram dique versos eÌementossocialistas do Centro, mas há que acentuar, âqur' jornaÌ mais nos se baseou a propagandadesseselementosatravés do cìtado interessesdo Barreiro, âté então muito abandonados,do que pròpriamente quem no puro objectivo de propaganda socialista. Isto verifica fàcilmente jornal, pretendeu também se onde purler compuÌsara colecçãodesseantigo àesen,rolve" a cultura literária, não tendo sido mesmo implofícuo o resuÌpal'ecedevel tado do seu esforço nessesentido. Esta é a verdade,que nos parcÌaÌidades' ser dita, pois não nos movem nem jamais nos influenciaráo quais nos depassado, os sobre do factos tenhamos de expor ""-pt"'qr" isentos de paixões. O contrário seria falsear a história e engabruçamos narmo-nos a nós pïóPrios. Continuanclo ainda. Enquanto os assuntos municipais iam decorrendo bem, num certo período- e não foi fácil, a princípio, â taÏefa dos novos camaristas, a braços com alguns serviços mal organizados o uma Câmara Ìutando com ínfimas receitas e baixo crédito - este Centro Socialista da Rua Aguiar viveu o apogeu da sua existência, mas em breve os democráticos (reduzidos às minorias) tais ataques desferiram aos adversários, explorando os seus deslizes,que levaram os mais sinceros clelesa abanclonar os lugares da Câmara, começando a maioria sociaÌista a enfraquecer, o povo a fazer comentários desfavoráveis ao partido, e a minoria a empalmar os lugares vagos... E se ainda um ou outro elemento socialista ficou, esse representava apenas a sua personalidade,ou já o sofismado propósito de enfiloirar, a breve trecho, nos partidos republicanos que <pesavâm> mais. Outros, ainda, preferiram afastâr-se, tornando-se ì,ntlepend'entes,entrando, mais tarde, na situação criada pelo <28 de Maio>. E foi assim, há perto de cinquenta anos, que motreu também o 5." Centro Socialista do Barreiro, deixando, até hoje, a porta fechada a nretenso sucessor,

( ' ) V . ( O BA R R EIR O AN T IG O E M O D E R N O> -I Jornais e Reristas Bd'rreíTenaes.

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I FIGURAS E T'ACTOS

MANUEL GUALDINO, O HÁBIL OPERÁRIOBARREI: RENSE QUE CONSTRUIU UMA LOCOMOTIVA ( 1906) O Barreiro tem sido bergo de habilidosos operários de todas as artes e ofícios. A fixação, nesta vila, das importantes oficinas gerais dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste, nos princípios da segunda metade do Século XIX, e mais recentemente (já no actual século), a construção nesta ÌocaÌidade das vastas fábricas da Companhia União Fabril ('), deram aqui origem ao desenvolvimento de elevado número de hábeis artífices, que ficaram possuindo todas as condições para dignificar, em qualquer lugar ou ocasião, o trabalho nacionaÌ. Mas cabem, incontestàveÌmente, as honras da preparação dos meÌhores operários do Barreiro aos serviços ferroviários que nesta viÌa se instalaram, trazendo para aqui as oficinas gerais daquela indústria de transportes, que congrega artífices das mais variadas especiaÌidades. Eles sentem, com a consciência do que são capazes d,efazer:, a dignidade da profissão. E estimam-se e aperfeiçoam-se. Um ilustre médico português recordou, um dia, numa conferência proferida nesta vila, que eÌe imperfeitamente conhecia, mas de que ouvira várias vezes falar a seu pai, que este, certa vez, lhe dissera estas palavras: - Encontrei, em muitas torras do País, operários, mas no Barreiro encontrei senhoq'es opertirios!

Comecemos,então, por relatar, neste aspecto da actividade da população barreirense, a vida de um habilíssimo operário, naturaÌ do Barreiro, cuja fama correu o País, tornando-ss merecidamente notado devido ao seu extraordinário gosto peÌa mecânica e génio inventivo. Referimo-nos a Manuel Gualdino dâ Silva (').

(r) XXIII e (') rura da

V. (O BARREIRO ANTIGO E MODERNO) - respectivâmenteCâIítulos XXXVÌI - 1 Parte. Já citado em (O BARREIRO ANTIGO E MODERNO)),nâ iegendada grap. 88.

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DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

B, a Letra in.ir:ittl cLc Batreiro, na sinÍa1tiú do Trabtllto: os ruidos própr'ios das gratudes aÏici'tÌtLs,onde os rÌLaquìnis'mos e os eslorços lísicos da| llom.ens transÍarlrom,

amold&11| e subiugant

sã'o T)redomi|LüLtes na terra b&'rreirense. (LetL*ã c^piL\7làt deserLlLQdapor A'mérico Marbtho e gra'u. etu'mcLdeilra,po'r ManrLel Cdh(LcL matéria,

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r|f)La cróLict7 do Alrtor,

cmtigo iornal

O Ba

pubuça d no

eìro).

Traçando a história da sua vida, apïoveitamos, em seguidâ, a oportunidade pàï^ fàzer desfilar perante os leitores, uma honÏosa citaçãc cìe algumas dezenas, taÌvez perto de uma centena de nomes de outros distintos operários, uns naturais deste conceÌho,outros náo, mas paÏa todos os quàis o Barreiro deu oportunidade de se evidenciarem nas suas profissões ou especiaÌidades,tÕdos desenvolve;ndoe aplicando as suâs mâis fortes energias em prestígio do trabaÌho Ìocal e dando o meìhor do seu esforqo por um PoÍtugal Maior' Tanto para os que de há muito não p€Ìtencem ao número dos vivos, como pâra os que, felizmente, ainda existem, mas já retirados das suas actividades (só a estes e àqueles nos ref eri'remos) seja a citação dos seus nomes nesta crónica, uma homenagemsincera, embora singeÌa, de apreço e admiraqào do Autor.

Filho de modesta gente do campo, Manuel Gualdino da SiÌva nasceu no Barreiro, a 25 tle Agosto de 1865, tendo sido seus pais Manuel Gualdino da Siìva Sénior, moleiro, natural de Palhais, falecido em 1906, no Barreiïo, e Mâïiâ de Jesus Marinho, nascidâ em ArrenteÌa (concelho de Seixal). Em 1882, com 17 anos, sentindo-sefortemente atraído pelos trabalhos mecânicos,entrou para as oficinas dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste,como aprendiz de serralheiro. 100


FTGURAS E FACTOS

Pouco tempo depois saìu de lá, e até 14 de Outubro de 1887, data em que voÌtou outra v€z para aquelasoficinas, esteve empregâdo, já como oficial, na fábrica Barboré, na Avenida 24 de Julho, em Lisboa, antiga fábrica Tejo; na oficina Garcia, perto do Caneiro de Alcârrtara; na Empresa AgrícoÌa, também na Avenida 24 de Julho, perto da antiga fábrica tseÌÌo & Formigaes, e ainda no ArsenaÌ da Marinha, para onde havia entrado em 25 de Setembro de 1886. Quando voÌtou para os Caminhos de Ferro do Sul e Sueste,começouali a trabalhlr cumo empreiteiro de reparagòrs em locomotivas, sob as ordens de Carlos Albers, muito estimado e distinto engenheiro do servigo de tracção, e de Augusto Rodrigues, mestre-geral das oficinas.

M.{NUEL DA

GUÁLDINO SÌLVA

(1865-1914) (Reprodtrçã,odÌtm rotrato, I eito, por geÌL 1Leto, o püLtor e ,prafessor do etú.i1Lotécnìco, Amégrarìca da SiINa llarìnlto; L-tlrd le lleürc| Cab&nas)

Foi no período de 1887 a 1891 que Manueì Gualdino se dedicou, com afinco, ao estudo d:r mecânica,surgindoìhe então a ideia de, logo que se the tornasse possíveÌ,construir uma locomotiva em tamanho reduzido, que rodasse com algumas c:ìïruâgens. Seria um verdadeiro comboio em miniatura. Náo tendo obtido, nessa ocasião,algumas facilidades com que contava, saiu novamente dos Caminhos de Ferro (para onde já não voÌtaria) e estabeÌeceu-se, em 4 de Maio de 1891, com Ìoja de mercearra no Largo clas Oóras, desta vila. Mas a sua vocação, forçadamente desviada do próprio rumo, não lhe permitiu estar muito tempo ao baÌcão do estabelecimento.Era para eÌe um supìício encontrar-se afastado de máquinas e de ferramentas... Em breve ManueÌ Gualdino deixava a gerência da Ìoja a seus pais e, no ano seguinte, entrava como serralheiro para a fábrica de cortiqa instalada na Quinta Braancamp, sob o título de Companhia Poúugal. Tendo voltado a trabalhar em Lisboa, agorâ na fábrica de Júlio & Ftanco, no Largo das Fontaínhas, em Alcântara, Manuel Gualdino só 101


DO BARRIIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS em 189ã conseguiu realizaï um legítimo sonho: possuir uma serralhari:r que mecânica. Mas era pobre, como sempre foi, e para a reaÌização do que emprestasse Ìhe alguém ambicionava tornava-se necessário haver capital ou lhe obtivesse directamente as ferramentas precrsas' Sabendo deste seu desejo, seu primo António Maria César Júnior prontificou-se a adquirirJhe o materiaÌ para a instalação da oÍicina, que' naquele ano, abriu finalmente no Largo do Moinho Pequeno, com fÍente para a Rua MigueÌ Pais. Começando a trabalhar com redobrado gosto na sua of,icina, a sorte ainda tlesta vez não se Ìhe mostrara propícia: quando o produto dos seus para esforços lhe estava criando as condições de desafogo financeiro mal aconpug"i o vaÌor das ferramentas, António Maria César Júnior, selhado por invejosos, pois o seu íntimo contrariava processos desta natureza, promoveu-lhe um aresto do qual pouco escapou' E eis Manuel Gualdino novamente sem trabaÌho, nas mais difíceis condições de vida' Já casado e com filhos, a situaçáo que deparava nada tinha de invejável, até que a suâ admissão, em 1902, na fábrica da Sociedade Nacional de Cortiças, veio pôr termo às preocupações que o afligiam' Dirigia esta empresa o súbdito britânico RafaeÌ Reynolds, no qual uma natural possuído não distinção e desenvoÌvidas faculdatles intelectuais de que era poÏ isso muito impetliam um agratlável contacto com os operários, que o estrmavam. Tendo oportunidade de conhecer de perto Manuel Gualdino da Silva' breve o distinguiu com a sua amizade, incitando-o a Ìevar por diante os projectos em quo há muÍto Pensava. o ajudaria no que fosse - Que trabalhasse e ele - ReynoÌds preciso. Sentindo-se geralmente estimado na fábrica, Manuel Gualdino comeprojectar a construção de uma nova máquina de fazer roÌhas' por çou E tão bem se houve, que esse engenho, do qual nos faÌtam hoje pormenores, mereceu os mais rasgados eÌogios dos patrões. Depois, em casa, começoua construir, peça poÌ peçâ, um fonógrafo, aparelho que, aí por volta de 1905, no nosso paÍs, em câsâ onde aparecesse a funcionar, atraia todas as atenções.Era a <máquina falante> que constituía motivo da maior atracção.. 102


FIGURAS E FACTOS

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I DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS E com o seu fonógrafo deu ManueÌ Gualdino algumas interessantes sessõesparticulares no Barreiro (3)' Ainda estudou os planos duma engenhosa bicicleta, assim como dum veÌocípele para deslizar sobre a água, mas a locomotiva continuava a ocupa? o primeiro Ìugar no seu peÍìsamento.

Tendo adquirido um exempìar da revista britânica <Railway Engineer>, de Julho tle 1905, com uma estâmpa e descrição da máquina tipo <<Atlantic>, cla companhia inglesa <Great Northern>, deìiberou executar aquele modelo, com algumas modificações, principalmente nos fiches' A máquina seria reduzicla à sexta-parte, ficando com o comprimento de 2,10 m., a altura de' 0,90m. e a Ìargura de 0,60' O <<tender>teria de comprimento 1,35.; o diâmetro das rodas motoras 0,3?m. e finaìmente o <bogie>0,18 m. Com o auxílio financeiro de D. Rafael Reynolds e a ajuda de dois bons amigos e hábeis operários das oficinas dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste, Manuel Henrique Paninho e António Joaquim Praça, aos quais nos referimos mais adiante, Manuei Guald-ino começou a construção da locomotiva. A caldeira foi tocla construída de aço, tendo a chapa na parte ciÌíndrica ? mm de espessura e na frente a da fornalha 10 mm' Com 29 tubos de aço, atarrachados e dilatados, escorada por 200 escoras, também de aço, a caltleira foi depois experimentada à pressão de 11,5 quilogramas por centímetro quadratlo, a á'gua, e a 12 quilogramas a vapor' tendo revelado resisténcja e solidez precisas.

(3) Vem a propósito citar que não foi ManueÌ Gualdino o único operário que por essn épo"" constÌúiu um ÍenógtaÍo. Possuímos um velho apontamento dizendo que n an oit ede26deM ar ç ode1905, J oãoM a r i a R e s e n d e , m a t c e n e i r o , n a s c i d o e m O v a Ì ' e seus filhos Joáo e AÌtuÌ Resende, todos moladores no Barreiro, apresentaLâm em público um gÌamofone, po1. eles inteiÌâmentê construído nesta vila, e fizeram executaÌ" ,ru aono"u maquineta, vârias pe.çâs de música no anìigo teatro dos <Ftanceseg), onde' na4uela noite, com a. repÌesentação dâ comédia ((Moços e Velhos')' se realizava uma festâ altística

do actor Dupont de Sousâ.

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FIGURAS E FACTOS A aÌimentação desta caldeira era feita por meio de um aparelho <Giffard> que-segundo uma descrição por que nos estâmos guiando, feita na época- foi colocadapor baixo da caixa de fogo, do lado esquerdo, por uma bomba a vapor coÌocadano interior da cabina e poï uma bomba de mão, de sistema inventado por Manuel Gualdino. - sistema <<StrondÌey>,e o Tinha regulador - válvula <,Jacareu>> espertador, colocadono interior da caixa de fumo, era também invenção deste inteÌigente serralheiro, verificando-se que imprimia uma fortíssima tiragem. Guardadas as diferenças de dimensões,os espertadores das grandes locomotivasnão tinham mais força do que este. A fundição do bronze e do latão foi feita no Seixal, por um operário de nome FiÌipe, que a obteve com esmero e perfeiçáo. Quanto às rodas e cilindros, a sua fundiçáo foi entregue à fábrica Vulcano, de Lisboa, que também se esmerou no trabaìho. O torneiro António Joaquim Praça, sem a mínìma remuneraçáo,mrs tão sómente movido pela amizade que tributava a ManueÌ Gualdino, prestou-se a tornear toda a obra necessáriapara a máquina, ao pâsso que o carpinteiro Manuel Henrique Paninho, também sem qualquer remuneração,se encaïïegou de executar todos os moldes,um dos quaiso das rodas - for-rnadopor mais de 60 bocadinhos,pacientementegrudados e Ìigados,de tal forma que se toïnâva difícil descobrirlhes as juntas, era duma perfeição notável. A máquina dentro em pouco aparecia compÌeta, nos seus minimos detaÌhes:torneiras, manómetros,níveÌ de água, faróis, etc., etc. e quando ela esteve em exposiçáo,na própria oficinâ, causou sensâçàocomo num velho e pequeno torno, de macha simples, se puderam tornear todas as peças, excepto as rodas e os ciÌindros. <Se não tivéssemosa certeza do que afirmamos - escrevera-seentãoduvidaríamos da possibilidade de, com um torno semelhante,se poder fazer obra tão perfeita>. Era a vez de caberem as felicitações a António Praça, que era de Estremoz. (Faleceria no Bareiro, com menos de quarenta anos de idade, a 10-IX-1916).

A experiência oficial da locomotiva efectuou-senum Domingo, dia 1 de JuÌho daqueÌeano de 1906, ao longo dum caminho junto da Fábrica Nacional de Cortiças, conhecido por DebuÌro ilos Pinheiros. 105


DO BARRE]RO DE VÁRIAS ÉPOCAS

No aLtì,go areal tlo eï-Larga de Nossat Senhora clo Rosóti,o (actual Praça Dr. Caeiro da Mata), €Ìlt 7g0ti: & màquíno Precutoda po'' Il[at' t.l

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Aí se verificou satisfatòriamente que a C. T. C. n'" 1 - tal a marca cla máquina - dispunha de força e desenvolviaboa velocidade' D. Rafael ReynoÌtls gastara cerca de 1 conto e 500 mil Ïéis, que Manuel GuaÌdino iâ pagâr com a receita que obteria âpresentando a sua obra ao púbìico, como meio de divertimento' Logo se mandaram fazer seis vagonetas pequenâs, cada uma das quâis possuia assentospara quâtro passageÌros' E o pequeno comboio funcionou pela primeirâ vez' por ocasiáo das festas de Nossa Senhora do Rosário que naquele já referido aÌÌo se realizaram nos dias 14, 15, 16 e 17 de Agosto, improvisando-seuma <estação> ao norte do Largo do Rosário. Os rails cobriam um percuÏso de 175 metros, circundando o espaçouma rede de arame e postes de madeira' Escreveu-se em O Sécu\o, por essã acâsião: <Esta máquina é um trabalho industrial e de arte, talvez o melhor que se tenha produzido em Portugal. atendendo às condições em que foi feita, sem as ferramentas própriâs necessárias e numa pequena oficina, atendendo que o seu autor não frequentou escola alguma, não é engenheiro, e apeÌìas um operário muito modesto e muito inteligente, que muito mais faria, se tivesse estudatlo e pudesse frequentar os grandes centros fabris do estrangeiro>' E acrescentava,a propósito; <Na classe dos metalúrgicos nesta locaìì106


FIGURAS

E

FACTOS

dade (Barei.ro ) há-os de grande valor, de muita inteligência, faltando-lhes apenas a protecção oficial e um certo conforto nas condições económicas da vida, para poderem expandir-se, para poderem produzir>. A pretexto de anotar a apresentaçáo do valioso trabalho de Manuel Gualdino, citava-se uma incontestáveÌ verdade, que ainda havia de perdurar por muito temno.

A máquina miniatura constituiu a maior atracção das tradicionais festas barreirenses, naquele ano, despeúando a môntagem do comboio grande curiosidade(') . Cada viagem custava um vintém, por passageiro, e as minúsculas carruagens andavam sempre cheias. O comboio esteve depois na Moita do Ribatejo, na Atalâia e no Porto, onde foi montado nos jardins do antigo Palácio de Cristaì, fazendo grande sucesso.Foi depois vendido, tendo transitado por vários donos, um dos quais director da SociedadeEstoril.

(") Permitâ-se-nos um pequeno desvio na narrativa, para, na pÌesente nota, focarmos um caso pitoresco, que introduz um pouco de poesia nestâ aridez prosódica... NaqueÌe ano de 1906, visitou o Barreiro, â 12, de Ágosto, dias antes do início dâs festas em honra de Nossa Senhora do Rosáriq a Tuna Comerciâl de Lisboa. Centenas de pessoas vieram a esta vila, sendo entusiàsticamente acolhidas. Couberam as honras da recepção a patrões e empregados da finna O. Herold & C.", que os esperavam com um aglupamento musicaÌ e a corporação de bomìreiros daquele antigo estallelecimento de indústria corticeira. Muitos visitantes yiaâm, por essa ocasião, os preparativos da montagem do caminho de ferro em miniatura, que Mânuel GuaÌdirÌo diÌigia, com dedicaQão e entusiasmo. À noite, em honra da Tuna, realizou-se um espectáculo no Teatro Independente. Possuímos, por cópia, uma curiosa poesia, assinada por S. Gamâ, que no dia da excursão. os empregados do comércio da capital distribuíram, em (plaquetto no Baneiro. DenominaÌâm-na (BEM HAJA)) e aqui a ranscrevemos: Nós aìmos ile Lisboa em romo,'rüt, A ltisitd,t'um pooo nosso ìrmão, De qlem só nos sepúrú a múnsidão D'este formoso Teio que eÍtasia!

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DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS A máquina encontrava-se em 1944 no conceìho de Oeiras, tendo ainda por essa época funcionado numa festâ tealizada em Paço de Arcos, em benefício duma corporação de bombeiros daquela viÌa' Depois, perdemos-Ìheo rasto.

Manueì GuaÌtlino tla Silva, ao terminar a execução do seu trabalho, dissera que ele havia sido muito custoso e o flzerà envelhecer bastante' Não ad,mira que assim fosse, mas tudo agravado peÌa sua vida, de certo modo atribulada. Era um inconformista, possuído duma maneira de ser que pouco se coadunava com uma longa permanência em determinado local de trabalho, porque o espírito de ctriosidade despertava-Ìhe o desejo de conhecer métotlos de Ìaboraçáo em diferentes oficinas mecânicas' o que, sendo recomendável no sentido de atlquii:ir maior soma de conhecimentos, Ìhe foi, contudo, prejudicial para a saúde, para o descanso do corpo, complexo sempre sensível às preocupações do espírito' puÌJá enfraquecido por diabetes, a tuberculose,que o atacou nos 1 de Abril mões, escolhera-o para mais uma das suas vítimas e, em de de 1914, Manuel Gualdino da Silva falecla no Barreiro, com 48 anos

E tã'o bem n'os recebem neste di(L InoLl)ìdá'ret gTato' clrcio il'unção' Qüe "ó' n"s fíco Preso o 'orocão' Enb'elaçaclo em LaSos il'hannonia! Beln lla'il poì's o poao do Ba'"reiro, Bem hÚia a 3110'tetr&, os 8e1raÌY'nnotea' E tu/lo quú'nto encanta o lor\steiro ! Bem h'aja d sìru índít'sttio,, os seus Laaoc'es, Da íe't"t'a o sentimell'to tettlaàei't'0, A graça angeli'cal ilos seus Amores ! Se não se pode considerar um primor de ate poética, não se deve negaÌ ao soneto uma vincaala expressão de gentileza e cavalheirismo' meninas dessa época com o Quanto teriam rejubilado âs gentis senhotas e gâlante finâl da poesia?! ..

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FIGURAS E FACTOS

idade. Quase no fim da sua curta existência, foi ainda maquinista do primeiro animatógrafo que funcionou no Barreiro, no Teatro Independente(').

ANTIGOS E HABILIDOSOS OPERÁRIOS QUE HONRARAM O BARREIRO (ONDE NASCERAM OU ONDE SE ESPECIALIZARAM) E O TRABALHO NACIONAL Segue-sea citação de alguns dos primeiros e bons operários barreirenses e de outros mais que, não sendo naturais desta vila, aqui vieram fixar-se e aqui se destacaram por seus próprios méritos. Deve observar-se que, na sua grande maioria, desenvoÌveramas aptidões sem o ampaïo de bases técnicas, mas procurando aperfeiçoar-segradualmente nos seus ofícios, guiados por competentesmestles e acabando pol vencer e criâr prestígio, impelidos pela vocaçãoe peÌa força de vontade, que em quase todos se observava. Ceïtamente que é mais naturâl umâ reÌâcão desta natuïezâ pecaï por diferenqa,que não por excesso.Reconhece-se essamaior possibilidade e para eÌa se pede a devida compreensão.Sen'imo-nos de numerosos apontamentosde diversas origens e de depoimentosverbais de já velhos operários Ìocais, que na nossa mocidade conhecemos(quase todos já há muito desaparecidosdo rol dos vivos), controlando depois as suas informaçõese juízos críticos. Alguns desseshomens conheceramainda, directa ou indirectamente, vários eÌementos d.essaprimeira camada de operários que se formou no Barreiro, depois de 1861, quando, com â abertura à expÌoraçáo d,o Cominho tle Feno ao Sul do Zeio, se começou â pïocessar o desenvoìvimento industriaÌ do Barreiro. António José (da Loura) e João da Luz foram os que- desfiando Ìongo rosário de recordações- nos falaram dos tempos mais recuados, seguindo-se-lhesEduardo Rodrigues dà Silva. Augusto dos Santos e,

(') Sobre este antigo teatÌo baÌÌeirense leia-se <O BARREIRO MODERNO)) - I Parte - Cap. XXXII Os pri'meiros teatros,

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ANTIGO

E


DO BARREÏRODE VÁRIAS ÉPOCAS mais modernamente,Joaquim José (este último ainda, felizmente, vivo e há anos residente em Lisboa), todos, por coincidência, naturais do Barreiro, - aos quais ficámos a dever estes eÌementos que são bem da h.i.stóríudo pouo, d.o povo que, zfinal, faz a História.

Quando foram aqui inaugurados os caminhos de ferro e as suas primeiras oficinas começaram a funcionar no Barreiro, não havia nesta nesta vila pessoal com habilitações necessárias para bem desempenhar os serviços, com excepção dos que competiam a ajudantes, serventes, limpadores, etc. O primeiro pessoal operário veio portanto de fora. No entanto, já em 1878 ali havia operários que tinham entrado como aprendizes, notando-se alguns com conhecimentos bastantes para o bom desempenhodo ìugar. Foi por essa época que um notório desenvoìvimento se começou a operar naquelas oficinas, Era director dos Caminhos de Ferro o engenheiro João Pedro Tavares Trigueiros. O engenheiro Miguel Carlos Correia Pais dirigia o serviço de exploração, desempenhandoas funções de chefe de tracção Patrício Makene, ingìês contratado. A chefia das ofícinas estava entregue a outro inglês, John Makene, também na situação de contratado. Estes súbditos britânicos e outros tinham vindo montar as oficinas dos Caminhos de Ferro desta viÌa, ficando aqui alguns deles, a seu pedido, depois de a empïesa ter sido adquirida peÌo Estado, em 1869. Um dos primeir6s - 96 1fls o primeiro - dos grandes operários que se reveìaram naquelas oficinas, foi José Francisco dos Reis. Tinha vindo do Brasil e os mais difíceis trabaÌhos de forja era ele quem os executava. Foi o primeiro mestre-geraì das oÍicinas dos Caminhos de Ferro do Sul. Dos Caminhos de Ferro do Norte viera outro bom operário: Joáo Zzcarias Ferreira. Era de Lisboa, do bairuo de Alfama, onde nascera em 1843. Tinha vindo para maquinista, tendo sido nomeado depois contramestre da oficina de máquinas úteis, fundição e caldeireiros de cobre. Mais tarcle foi chefe de maquinistas. Era muito estudioso e desempenhou, sempre conscienciosamente,o seu lugar, o que Ìhe grangeou eÌevada estima. 110


FIGURAS E FACTOS Outro espÌêndido operário que veio dos Caminhos de Ferro do Norte foi Augusto Rodrigues- mestre Augusto. Era naturaÌ de Lisboa. Tendo sido, em breve período, nomeado contramestre da oficina de serralheiros e encartegado do serviço de máquinas, subiu mais tarde a mestre-geral das oficinas, das quais foi o segundo. Ainda dois contramestres daquela época são dignos de referência: o da oficina de carpinteiros, José António Ribeiro, de Vila Nova de Gaia, que erâ de facto um artista no ofício, e o da oficina de pintura, James Hencliff, outro ingÌês contratado. Outros bons operários: José Esteves Ramos ("Iosá Bonito), do Lavradio. Era um competente pürtor e foi nomeado contramestre quando acabou o contrato de J. Hencliff. Joaquim António Rodrigtes (Boch,ecln), naturaì do Barreiro, que entrou como ajudante de pintor, sucedendodepois a José Esteves Ramos, no lugar de contramestre. Outro bom pintor foi João Rodrigues Lindim, também do Barreiro, que, começandopor ajudante, sucedeu,pol sua vez, em contramestre, â Joaquim António Rodrigues. Ainda na profissão de pintores, devemos destacar Nuno Pereira, Jcão GuiÌherme (João Grande), faìecido em 1950, e Manueì Inácio, todos do Barreiro, os quais, admitidos ao servico, o primeiro como aprencliz e os dois últimos na quaÌidade de pintores auxiliares, se tornaram bons artistas. Jorge Ricardo Woodman, de origem inglesa, admitido como ajudante, foi igualmente outïo bom pintor, assim como, mâis modernamente, Ângeio da Cruz Santareno (1887-1951) de Lisboa que, tendo sido também admitido como ajudante de pintor, reveÌou muita competência, chegando a mestre da oficina de pintura.

Recordemosaìguns competentesoperários torneiros mecánicos: Luís Rodrigues da Silva (Luís Patuas). nasciclono Lavradio, em 1844. Substituiu Joáo Zacarias Ferreira no lugar de contramestre. Era 111


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS muito engenhoso e desempenhou com reconhecida competênciâ o seu oficio. Mestre Luís - como geraÌmente o chamavam - (e permita-se-nos a honra de recordar que este ântigo opeÌário era avô materno de quem escreve estas crónicas) superintendia também nas oficinas de caÌdeiraria de cobre e fundição. ManueÌ dos Santos Oliveira' Foi outro bom torneiro' Este artífice saiu depois das oficinas e dedicou-se à arte dramática, na qual chegou (') a evidenciar-se, tornando-se conhecido pelo actor Olittei'ra José Augusto dos Santos, do Barreiro Este torneiro foi admitido como aprendiz e tornou-se um operário muito competente' Sucedeu a Luís Rodrigues da Silva, no ìugar de conl ramestre' Manuel Pinho Costa, barreirense, foi também hábiÌ operário torneiro' sucedendo,como contramestre, a José Augusto dos Santos' Outros bons âïtistas torneiros: Eduardo José da Costa, do Barreiro'; Eduardo José do Couto, do Lavradio, que foi em comissão de serviço à Alemanha e chegou a conmestre, tendo sido também um dos mais distintos músicos nascidos neste concelho('); Manuel Joaquim Lopes, de Palmela; e Francisco Fernandes, natural de Beja, que montou depois uma oficina metalúrgica no Barreiro, situada na Rua Vasco da Gama, sob a designaçãode uFrancisco Fernandes & Filhos, Lda.n, da qual foi, iniciaÌmente, em 1928' o único proprietário, associando, depois, seus filhos (esta serraÌharia encerrou já há anos). Todos estes operários haviam entrado como aprendizes, nas oficinas ferroviárias desta vila' António Joaquim Prâça, natural do Barreiro, foi outro habilíssimo operário torneiro, que se desenvolveunas oficinas dos Caminhos de Ferro' já referimos' onde foi atlmitido como aprendiz supranumerário Como foi um tlos melhores cooperadores de Manuel Gualdino, na construção da Ìocomotiva que este executou.

V. (O BARREIRO ANTIGO E MODERNO))-I Parte-Câp' xxXIIOs Itrimeú'os teatros -P. 254 P arte-C ap' X Ií ' ) V. (O B AR R E IR O AN T IG O E MOD E R N OI-ÌI l+1/' P' laúqãien'se de recc'eio colectìt:idatl,e A nnis antigo (')

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FIGURAS E FACTOS Casimiro de Jesus Júnior, António Luís dos Santos Costa e José Frutuoso da Silva, os dois primeiros do Barreiro e o último do Lavradio, foram também bons torneiros. Um outro contramestre de torneiros, sabedor e aplicado, foi Alfredo António BoÌina, do Barreiro, que entrou ao serviço como aprendiz auxiliar, em 1893 ("). Ainda um antigo e bom torneiro foi António Maria Pereira de Vasconcelos, natural de Palhais, que passou depois para o serviço fluvial, como maquinista dos vapores, onde, durante cerca de 30 anos, provou muita competênciae dedicação ao serviço. Como aprendiz de torneiro, foi também admitido nas oficinas ferroviárias do Barreiro, um outro bom operário desta vila, Augusto António dos Santos, que passou em seguida para o serviço de máquinas e chegou a chefe de depósito. Mais modernamente, citamos ainda como torneiro, um outro muito hábil ferroviário barreirense: Ângelo Augusto Cordeiro (1892-1970)' que foi chefe de cantão tlas antigas Obras Metálicas (Zona Sul).

No ofício de carpinteiro mencionaremos: Tomás António Ribeiro, nortenho. Era perfeito em todos os seus trabalhos e foi quem primeiro construiu carïuagens nas oficinas e também um salão especial para a direcção dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste, trabalho este muito elogiado peÌo seu perfeito acabamento. Outro bom carpinteiro foi Manuel Cristo, natural do Barreiro, que executou importantes trabalhos nas carruagens de 1.' cÌasse. Cristóvão Duarte e Eduardo Ribeiro, este último admitido como aprendiz, tornatam-se também competentes operários carpinteiïos, assim como João Inácio Nunes e Manuel Ribeiro (este igualmente bom tanoeiro), ambos barreirenses, e Arsénio José, de Évora.

(t) É dos raros operários desse tempo ainda, feÌizmente, vivos. V. referência no vol. <<O BARREIRO CONTEMPORÂNEO> - II - PP. ?9 e 80.

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DO BÀRREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS José Vicente, do Barreiro, foi outro hábil carpinteiro que acompanhou sempre os trabalhos da nova esta@o dos Caminhos de Ferro desta vila (gare marítima). Passou depois às oficinas e sucedeua José António Ribeiro no lugaï de contramestre. Outro bom contramestre de carpinteiros foi Caetano Francisco da Silva, naturaÌ de Beja, mais tarde reformado em gerente dos Armazéns de Víveres. (FaÌecido em 1955, foi um destacado vulto republicano locaÌ e presidente da direcção do ex-Asilo de D. Pedro V) ({). Francisco António Maria, como Manuel Cristo, especializou-se também na construção de carruagens, tornando-se bom artista. Mencionemosainda: Manuel Henrique Paninho, naturaÌ de SetúbaÌ, que foi outro dos bons colaboradores de Manuel Gualdino, na construção da pequena locomotiva tipo <AtÌantic>. Executou importantes trabalhos nas caïïuâgens do Minho e Douro e chegou a contramestre. Francisco Assis, seixalense, foi outro habilidoso carpinteiro de moldes, que se tevelou nas oficinas dos Caminhos de Ferro do Barreiro, assim como João de Deus MagaÌhães, que fora admitido ao serviço em 1909, na quaÌidade de carpinteiro, por conta de empreiteiros. Também, neste ofício, se destâcou José Joaquim Fernandes de Carvalho, de Alcácer do Sal, que foi mestre. (Já aposentado, foi vogal duma Comissão Administrativa da C. M. B. nos anos 30, sob a presidênciâ do ten. B. S. Fernandes).

E ferreiros? Bons artistas também se fizeram nesta viÌa. Esplêndido operário foi, por exemplo, António Pereira (Carumba), natural do Barreiro. Tendo sido admitido ao serviço na qualidade de malhador, passou depois a ajudante de ferreiro, em seguida a ferreiro e por fim a mestre. Foi, depois, à AÌemanha, em serviço oficial.

(") V. (O BARREIRO ANTIGO E MOD'ERNO))- I Parte - Cap. XXII que impla$to1L.j O Asilo tle D. Ped.roV e Cap. XXXIX - O Ba"n'eiro tuú re1)oluçã.o nenública.


FIGURAS E FACTOS Outro hábil ferreiro foi João José, também nascido no Barreiro, que entrou para as oficinas como servente. Especializou-seem molas de suspensãode cattuagens e vagons. Mais outro contramestre, grande operário, que ensinou muitos operários barreirenses: Joaquim Guerreiro, natural das Minas de S. Domingos. Era duma competência que não receava confrontos. Manuel Tavares dos Santos foi outrc mestre de ferreiros muito habilidoso, assim como João Bravo, do Barreiro. Também se distinguiram no mesmo ofício José Pedro dos Santos (Ped,ro Seaero,), de Palhais, proprietário duma oficina metaÌúrgica no Barreiro (5), e Francisco Alves Torrão, Pedro Nunes Jerónimo e Carlos Augusto Ribeiro, todos do Barreiro. Esteve este úÌtimo, que foi um grande mestre de Ferraria, em serviço profissional na Alemanha. Foïa admitido como servente auxiliar, nestas Oficinas, em 1896, sendo já Íalecido. (Foi pai de um excepcionaì técnico barreirense, das mesmas oficinas, que é Joaquim Ribeiro). Como ferreiros também se especializaram no Barreiro, durante quâse um sécuÌo, vários membros duma muito estimada família, cujo chefe, Francisco Marinho (o) era espanhol, naturaÌ da GaÌiza, da povoação de Santa Maria de Pareiios. Seguindo a profissão do pai, seus filhos, Domingos e Herculano Marinho, nascidos no conceÌho do Seixal, e MânÌleÌ Marinho, natural do Barreiro (todos já há muito faÌecidos) continuaram a laborar na oficina que o seu progenitor montou na ex-Rua da Praia, com frente para a Rua Marquês de Pombal, no taÌhão de prédios onde se encontra o actual Cl.tl:e 22 de Novembro. DeÌa derivaram, mais tarde duas, ficando uma a funcionãr no Largo do Moinho Pequeno e outra na Rua Miguel pais. Na posse dos netos de Francisco Marinho conservou-se em actividade, ainda por muitos anos, a oficina da Rua Miguel Pais, que foi transferida, por fim, para a Avenida Alfredo da Silva, no seu troço inicial, perto da referida rua, tendo tido em Artur Marinho o seu derradeiro proprietârio, até ser encerrada, nos úÌtimos anos da década

(") Estâ oficina é actualmente (19?0) continrÌada por um fiÌho e um neto deste já falecido opeÌário. (") Francisco Maxinho que, primeirâmente, veio residir para o concelho do Seixal, veio depois para o Barreiro, ondê fâleceu com ?6 ânos de idade, a 15-II-18?9. Foi casâdo com Henriquetâ Marinho, dâ quaÌ deixou sete fjÌhos.


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS de 50. No local que esta velha oficina do Barreiro ocupava na Rua Miguel Pais foi depois erguido um prédio de rendimento, em cujo rés-do-chão está instaÌada uma estância de madeiras (Silva & Farto). A do Largo do Moinho Pequeno jt+ acabara há muito tempo.

Mas prossigamos na citação de outros hábeis operários do Barreiro, passando agota a fazer referência a caldeireiros e fundidores: Marcelino Ferreira (Fuste) nascido no Barreiro, foi um muito competente caldeireiro. Admitido ao servlço das Oficinas dos C. F. S. S'' em 1875, como ajudante de caldeireiro, chegou, por fim, a contramestre. Era muito inteÌigente e instruído, tendo deixado apreciável biblioteca, que passou à posse de seus herdeiros. Foi um dos operários do Barreiro indicados para irem à Alemanha, em serviço profissionaÌ. Dois irmãos deste operário, Arsénio Ferreira e Joaquim António Ferreira (Fuste), ambos também do Barreiro, foram igualmente bons operários caldeireiros de ferro. Ainda dentro deste ofício, mais dois bons operários barreirenses, admitidos como aprendizes naquelas oficinas: Vitorino Lobato (1867-1948) que chegou a mestre de caldeireiros de ferro, e Joaquim José que, começando por aprendiz de caldeireiro de cobre, chegou a mestre da oÍicina de fundição de bronze e ferro, de soldadura elóctrica e oxiacetiìene. Esteve na Inglaterra e na Alemanha, em serviço oficial. Também José Maria da Silva, de Lisboa, Manuel Neves Salgado Júnìor e Bernardino da Silva se destacaram como caldeireiros, especiaìizando-se o último em aparelhos hidráuìicos. Entre os operários fundidores, merecem-nos referência: João Gonçalves, Zacarias de Sousa Miranda ('), de Lisboa, João Luís David,

(') Zacqt:i,as de Sousa Mirândâ foi pai de Manuel António Miranda, empÌeiteiro de obras públicas, tâmbém de Lisboa, que deu o seu apelido a uma série de casas de habitação que construiu no Barreiro, junto dâ actuâl Estação do Bâ:rreiro-Á, o denominado Bairro Miranda, e avô de Armando de CarvaÌho Mirândâ, proprietáÌio e antigo empresário do Teatro Cine Barreirense.

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FIGUAAS E TÂCTOS também lisbonense, e Mariano Francisco Borralho, alentejano, de Cuba, que chegou a mestre.

É maior a Ìegião dos bons operários serralheiros que se revelaram no Barreiro, tendo como <casd-rnãe>as oficinas feroviárias desta viÌa. Citemos alguns deÌes, nossos conhecidos directa ou indirectamente, sem a pretensão, que seriâ estuÌtícia da nossa parte, de esgotar substancialmente o extenso rol de todos aqueles que mereceriam mais destaque. Caetano José Ferreira, natural de Évora, e Gabriel José Ferreira Neves, foram ambos bons serralheiros. O primeiro destes também executava perfeito trabaÌho de Ìatoeiro. Joaquim da Costa, do Barreiro: entrou como âprendiz e chegou a contramestre da montagem. Passou depois a fazer serviço no depósito de máquinas, pela sua provada competência. José Maria de Paiva, outÌo bom serraÌheiro, natural do Barreiro. Entrou como aprendiz, chegando a contramestre da oficina de material circulante. A seu pedìdo, passou depois a maquinista dos vapores. António José (da Loura) , nascidolo Barreiro, em 1864: entrou para as oficinas ferroviárias do Barreiro, como aprendiz de serralheiro, em 1878 (com 14 anos incompletos), tendo atingido a categoria de clzefe d.as of i,cinas. (V. a -crónica <Um mestre de operiírios barceirenses.- No Centenó,rio tle Antóüo José ( tla Loura) - 196+ - integrada no presente voÌume). José Rodrigues foi outro operário que entrou como aprendiz de serralheiro em 1876. Muito habilidoso. Manueì Martins Júnior (Norti.sta), também do Barreiro. Tendo entrado como aprendiz de serraìheiro para as oficinas, passou mais tarde, já operário, para as máquinas. Nomeado maquinista, passou em seguida a chefe de maquinistas e finalmente a chefe de depósito. Manuel António Júnior (Bolina).' nascido no Barreiro, em 1869, entrou, ainda com 12 anos, para as oficinas ferroviárias, como aprendiz (auxiliar). Foi um bom serralheiro e desenhador,chegando a mestre. Esteve na Alemanha, em missão profissional. António Germano BoÌina. irmão do antecedente. nascido no Barreiro em 1873: admitido nas oficinas ferroviárias como aorendiz de 717


DO BÀRREIRODE VÁRÏAS ÉPOCAS serraÌheiro, tornou-se igualmente um bom operáïio. Passou depois ao serviço de revisor de balanças. Fal. nesta viÌa em 1952 e foi, no seu tempo, um distinto amador de música, componenteda banda da S. D. U. B. (<Franceses>), a qual, durante muitos anos, o teve como competente director). José Torcato Fragoso, do Barreiro, Inácio João dos Santos, FeÌisberto da Costa Soares, José Baptista (Lanclzínha), (que foi em ser-viço, à Alemanha) e AÌfredo da Costa Soares, todos estes últimos nâturais do Lavradio, foram também bons operários serralheiros, iniciando o seu ofício como aprendizes nas oficinas desta vila. José Lanchinha e AlÍredo Soares que hâviam sido admitidos ao serviço, respectivamente em 1890 e 1893, foram mestres. João Fernandes, de Beja, foi também um excelente serraÌheiro. Passando a maquinista e depoìs, a chefe de maquinistas, em Faïo, chegôu, mais târde, a inspector principaÌ de tracção. João Femandes (Maneca), (1887-1955) natural do Barreiro, foi outro competente serralheiro, que entrou, em 1909, pãra âs oficinas, como aprendiz. Foi, mais tarde, contramestre da oficina de pequena reparação, contramestre para o depósito de máquinas e, depois, inspector do pequeno material (3). José Vicente Ferreira, natural do Barreiro, foi também um dos mâis competentes operários serÌalheiÍos desta viÌa. Tendo saído voluntàriamente dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste, entrou depois para ã fá\bvicà O. HeroÌd & C.', onde continuou pïovando a sua muita competência. Faleceu a 15-IV-1931, nesta vila. Outro excelente sêrrâlheiro, igualmente do Baneiro, foi João Maria Pireza, nascido em 1869. Náo tinha dificuldades no seu ofício e foram de destaque os seus tlabâlhos em diversas tarefas que lhe confiaram,

(') João da Mo,necú falece[ na sua residência da Avenida da República, 34, desta vila, na casa que mais tarde ampliou e que seu pai, Manuel Fernandes, também barreitense, ali mandara construiÌ, nos últimos anos do Séc. XÍX, paro, d ÍeLm1Uú(q,re então morava na Ruâ Seïpa Piíío\ poder gozaï oB e/res do campo.,. Imagine-se o era, ainda por essa época, a faixâ do Barreiro compreendida entre âquelâ Avenida e a de AÌfredo da Silva... Na pequenâ horta da. propriedade havia um poço com belíssima água, de que muitos hâbitantes das redondezas se serl'rarn grâciosamente.

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FÌGURAS E FACTOS especiâìmente nos vapores fluviais. Foi também maquinista-chefe da Central Eléctricâ dos Caminhos de Ferro. Francisco José Pireza, irnão deste últímo, foi outro excelente operário que entrou como aprendiz de serralheiro parâ as oficinas dos Caminhos de Ferro. Era também barreirense (nascido em 1867) e, muito hábil, chegou a mestre de serralheiros. Esteve em serviço na Alemanha e foi ele, com Alexandre de Almeida, Vitorino Lobato e José Caetano, então ajudante de caldeireiro, natural do Barreiro, quem procedeu à reconstrução, sob âs ordens do engenheiro Luís d'Orey, no ano de 1900 do Titan do molhe norte do porto de Leixões, que havia tombado sob vioÌento temporal, e de outro engenho daquele tipo, no mesmo porto, trabaÌhos que lhes vaÌeram elogiosasreferências. José Maria Coelho Fénica, natural de SetúbaÌ, foi outro bom operário, que trabalhava tanto de serralheirc como de torneiro. Era revisor de balanças, possuÍndo um espírito muito cur:ioso e inventivo. Outro bom operáïio, que entrou como aprendiz para o desenho e Íez escaÌa por serraÌheiro, frezador e niquelador, foi Eduardo Rodrigues da Silva (Patacas), do Barreiro. Tendo sido destacadopara os serviços eÌéctricos, nos quais se especializou,chegou a inspector. Tomou parte na montagem da CentraÌ Eléctrica dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste, que funcionou em edifício próprio, fronteiro ao das Oficinas Gerais, já há anos transformado e onde estão actualmente as instalações da Região Sul da C. P. Ouiro bom serralheiro mecânico e electricista (era o único operário electricista das oficinas ferroviárias do Barreiro, em 1911, de que o anterior era ajudante), foi Francisco Xavier GonçaÌves (1858-1944), natural do Barreiro e habilitado com o cuïso da Escola Industrial de Machado de Castro. Foi o operário montador principaÌ daquela antiga Central Eléctrica, sob as ordens do eng." Luís d'Orey. Prossigamos a citação: Alexandre de Almeida, do Barreiro. Entrou para os C. F. S. S. como aprendiz de serralheiro, e passou depois ao desenho onde mostrou grandes aptidões. Quando esteve nos Caminhos de Ferro do Minho e Douro, organizou ali a colecçãode desenhosque serviu para, em Hanôver, se fazerem as máquinas tlpo BeEer Peacock, empregadas naquelas linhas. Depois de haver permanecido na AÌemanha em missáo de serviço, foi encarregado de dirigir o escritório de desenho dos C. F. S. S., onde exe119


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

cutou e diÌigiu importantes projectos de novo materiaÌ circuÌante (as carruagens de 7 m. de 1.', 2.' e 3." classes,païa as linhas do SuÌ e Sueste e outro material para via reduzida) e diversa aparelhagem. Foi o 4.' cltefe d,asoficintts (') destes caminhos de ferro, por ter sucedido a António Josê (da Loura), quand,o este se reformou. Alexandre de AÌmeida passou depois a inspector das oficinas com a categoria de agente-técnìco principai, prestando serviço em Lisboa. De fino trato e um ar de austera mas agradáveÌ presençâ, Alexandr-e de Almeida (cujos três filhos foram todos homens de desporto e dois deles, António e Bento, grandes jogadores de futeboÌ do F. C. Barreirense), foi o úÌtimo dos prestigiosos chefes daquelasoficinas, saídos do elemento operário, isto é, dos práticos, que tanto soubetam dignificar o trabaìho que Ìhes era confiado. Faleceu nesta viÌa, com 73 anos de idade, a 24-III-1951. Outro bom operário, também admitido como aprendiz de serralheiro. em 1890, foi Eduardo Rodrigues Cavaco (1878-1963),natural do Lavradio. Já operário serralheiro, passou para o depósito de máquinas, em 1903, tendo estado no ano seguinte, em serviço profissional, na AÌemanha e, mais tarde, no mesmo país e na Bélgica, em 1922 e 1926, como chefe de missão. Aposentou-se em inspector-chefe de tracção. AbíÌio Alves Amorim, nascido em Castanheira de Pera, foi também bom serralheiro e, passando, mais tarde, para o serviço de tracçáo, chegou a chefe de depósito de máquinas. Esteve também na Alemanha, em serviço oficial. Mais dois outros bons operários serralheiros, ambos barreirenses que foram aqui aprendizes: João Francisco Marques e MarceÌino Mare ques Lobo. O primeiro, nascido em 1878, foi ferramenteiro e passou depoís para os serviços eléctricos, onde foi muito competente. O segundo trabalhou como serralheiro de máquinas fixas e frezador. Nascido em 18?6, faÌeceu em 1965 (e foi um dos maiores entusiastas locais da tr'esúo Braua que temos conhecido...). Como serraÌheiros reveìaram também muita competência José António de Almeida, do Seixaì, que, admitido como aprendiz auxiliar, che-

(") Esta categoria foi aboiida em 1927, pela Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, quando ela tomou posse, por arrendamento, das Ìinhas férreas do Estado.

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FÏGURAS E FACTOS gou a mestre da oficina do depósito de máquinas do Barreiro, e Artur da SiÌva Vieira, de Lísboa, o qual, passando de serralheiro a maquinista dos vapores, permutou depois o Ìugar com o mestre José Maria de Paiva. Foi contramestre e aiudante do chefe das Oficinas dos Caminhos de Ferro. Naturais do Barreiro, citamos ainda outros bons serralheiros: os irmãos João, José, Luís e António da Luz que entraram como aprendizes nas oficinas ferroviárias desta vila. O primeiro, que esteve na Bélgica e na AÌemanha em missão de serviço, passou ao materiaÌ circulante e foi mestre de serraÌheiros; o segundo, que foi também para o material circulante e esteve na Alemanha, fez, por empreitada, importantes reparações e construções, chegando a inspector: daquele material; o terceiro chegou a mestre de serralheiros do depósito de máquinas, e o último desempenhou também o seu ofício com muito acerto. Miguel dos Santos, nascido no Lavradio, em 1892, que foi aprendiz de serralheiro, tornou-se iguaìmente um competente operário, subindo a chefe de depósito de máquinas. Foi oficial de milícia da Legião Portuguesa do Barreiro. Por questões de servìço, um tresloucado ferroviário feriu-o mortalmente, a tiro, a 19-III-1940, no escritório daqueÌedepósito. (Era filho de um outro grande ferroviário, Joaquim José dos Santos (Joaquirn Bi,cho), nat.ural de PaÌmela, que foi inspector de tracqão dos C. F. S. S.), faìecido no Barreiro, com a provecta idade de g4 anos, em 1958). Ainda mais alguns nomes: João de Santa Rita Marques (João Allúnho), João Januário Correia (O Americano), Joáo dos Santos Júnior, Francisco Moreira e João Fernandes Jordão, todos do Barreiro, tornaram-se bons artífices serralheiros, assim como Joaquim de Jesus, natural de Lisboa, que se revelou espÌêndido serralheiro da montagem, e António José da Rosa, portuense, que foi mestre da oficina do depósito de máquinas do Barreiro. Outro grande operário barreirense, de craveira excepcional, foi Vicente dos Santos Bolina (1881-1964). Admitido como aprendiz de serralheiro, supranumerário, em 1893, foi apÌainador, atingiu a categoria de chefe de maquinistas e chegou, por fim, a inspector-principal dos Serviços Eléctricos dâ C. P. Competentíssimo em trabaìhos mecânicos, esteve na Alemanha, no estudo e recepção de vário material para os Caminhos de Ferro do Suì e Sueste, chegando ìá a ser-Ìhe perguntado 121


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DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS <<seele conhecia os ofícios todos!> Ainda mestre de serraÌharia, foi Vicente Bolina quem executou, no Barreiro, as coroas de bronze que estão no túmulo de Teófilo Braga, no Panteão de Santa Engrácia, e do Soìdado Desconhecido, no Mosteiro de Santa Maria da Vitória, na Batalha. Como aplainador, ofício em que chegorÌ a mestre, destacou-seJanuário Vicente Ferreira, naturâl de Lisboa e faÌecido no Barreiro (onde viveu desde crìança) em 1966, com 90 anos de ldade.

Entre os operários estofadores, destacou-se, primeiramente, João António do Carmo (1860-1935),natural de Chaves.Já com conhecimento do ofício, veio, ainda muito novo, para Lisboa e, pouco mais tarde, para o Barreiro, esmerando-se nos seus trabalhos, na oficina de estofadores dos C. F, S. S., que ele próprio montou, da qual foi mestre e onde deixou também bons discípulos. Laureano José, ManueÌ Gil e AbeÌard da Silva Ferreira, todos do Barreiro, que naquelas oficinas entraram como aprendizes, foram iguaÌmente bons operários estofâdores, assim como João Rodrigues Lindim (1896-1970), também naturaì do Barreiro, que chegou a contramestre da oficina, e ainda Tomás Jorge da Trindade (pai do maestro barreirense Ferrer Trindade), outro categorizado artífice nesse ofício, igualmente nascido nesta viÌa (em 1890), e já na situação de aposentado desde 1950.

Longa seria a Ìista, como já dissemos, de todos os elementos opeÌários que se destacaram nas oficinas ferroviárias locais, aerd,ad'e'í'ra escokt, d,e mtrítas úrteE e ofícios. Mas é necesúrio fínaÌizáJa, restando-nos a citação de alguns mais, das últimas décadas, já aposentados (e um ou outro já falecido). Os operários serraÌheiros constituem a maioria... Pois recordemos mais um dos antigos, Júlio Caetano Veríssimo, que, nascido em Silves,


FIGURAS E FACTOS a 3-X-1887, veio païâ o Barreiïo com 14 ânos e 2000 réis no bolso e, admitido como aprendìz Ìlas Oficinas Gerais dos C. F. S. S., nelas chegou a contramestre principaÌ, categoria em que se reformou. Esteve por duas vezes,em serviço profissional, em Kassel (Alemanha) e foi, no início da década de 20, presidente da ComissãoExecutiva da C. M. B. Manuel Ferreira Querido, contramestre de serralharia, foi outro esplêndidoprofissional e com o quaÌ aprenderâm e se aperfeiçoaram no ofício muitos operários. Raúl Alexandre Baptista, Afonso Fernandes Morgado (actualmente na Alemanhâ) e António Espada Cachola, todos bons serraÌheiros, com muitos conhecimentosdo ofício. Leonel Guiomar de Almeida Santos, que mais de perto conhecemos,foi também um bom artista, um técnico compÌeto,em Seïralhãria. Era natural de Lisboa, donde viera, ainda criança, para o Barreiro. aquÍ falecendo em 1964. Teodoro da SiÌva Caria, nascido no Montijo em 1889, foi um muito competente contramestre da montagem, bem como outro bom contramestre de serralharia foi ManueÌ Ferreira da SiÌva (Carapau), natural de Setúbal, falecido no Barreiro, em 1955. Luís GuiÌherme, outro nascido em Lisbo:r (em 1893), mas filho e neto de barreirenses (descendentede piloto da Barra, para cuja corporação eram <<recrutados> muitos mâïítimos do Baïïeiro): foi um muito competente serralheiro de máquinas a vâpoï, estando aposentado desde 1954. Outro barreirense (antigo vereador local), que deixou justa fama de bom mecânico: António Gomes Júnior, mestre de oficina cerca de dez anos. Esteve também em serviço profissional na Alemanha, encontrando-se aposentadodesde 1958. Nas oficinas de fundição, outro contrarnestre, barreirense, se destacou em vários trabalhos dessa especialidade: Gilberto Tavares dos Santos,também antiso vereador da C. M. B. e actuaÌmente aposentado. Um pequeno parêntese para citarmos um muito competente contramestre de carpintaria (Moldes), que foi Jacinto Ernesto Sanches, do Barreiro, jâ aposentado. Joâquim José Guilherme (um dos antigos campeões de basquetebol do F. C. Barreirense), nascido em 1906, filho do já aqui citado João Guiìherme, foi também um bom serralheiro e baìanceiro das Oficinas da C. P. atingindo â categoria de contramestre de 1.'. Dedicando-seaos serviços motorizados, foi à Holanda para estudar as automotoras <<Allan>,


DO BARREÌRODE VÁRIAS ÉPOCAS das quais haviam sido encomendadâsalgumas para o nosso País. Está aposentadodesde há anos. E, entre aÌguns dos mais recentes reformados, náo deixamos ainda de referir: Abílio Pereira Baltazar, nascido em Santo António da CharÌreca, em 1907. Serralheiro, torneiro, balanceiro e ftezad.ot:,especializou-se em sinaìizaçãoe mecânica de precisão. Fez a maqueta das Oficinas Gerais da C. P., no Barreiro, iniciativa dos engenheirosJosé Alfredo Garcia e Costa Macedo, trabaÌho que Ìhe mereceu eÌogios.Esteve na BéÌgica, no estudo das actuais máquinas de bilhetes, mecânicas e eléctricas, tendo-se aposentadoem 1967. Manuel Pascoal (antigo futebolista - guarda-redes- do F. C. Barreirense), nascido no Barreiro, a 19-IX-1905, foi também um profissional muito competente na reparação de bogies, rodas e caixas de automotoras e reboques. Foi contramestre de 1.", categoria em que se aposentou em 1966. Também Francisco Mira Barreiros, nascido em Mora (veio aos 12 anos para o Barreiro), foi um abalizado técnico em motores <Diesel>. Esteve em serviço profissionaÌ nos E. U.4., por conta da C. P., atingindo a categoria de contramestre principal, na qual se reformou. (Já depois de aposentados,tanto Mira Barreiros como Manuel Pascoal foram convidados,pela C. P., o primeiro para instrutor de operários em assuntos da sua especialidade,e o segundo païa preparaï tècnicamenteoperários para o trabalho especializadoque requer a oficina de ïepâïação de locomotivas, na fase de substituição das antigas máquinas a vâpor pelas <Diesel>). E chegámos ao fim, Mas, antes, faremos âqui umâ excepção para citarmos um eÌemento ferroviário, não das Oficinas, mas dos Serviços de Via e Obras, dos quais foi um abalizado técnico: o eng.' auxiÌiar Luís Francisco Cavaleiro, portuense de nascimento.Muito estimado na classe ferroviária, teve relevante interferência na construção das Novas Oficinas locais, nos trabaÌhos da sua especialidade, tendo-se aposentado a 17-XII-1970, por atingir, nessa data, o limite de idade, como Adjunto do Sector de Via e Obras do Barreiro. Terminando âqui os nossos apontamentos, esperâmos que outros, talvez, um dia, concluam a lista, coìmatando faltas e juntando, a estes, novos nomes da Nobreza do Trabalho, a única eÍn que vâle a pena acreditarmos.

12rt


FIGURAS E FACTOS

UM MESTRE DE OPERÁRIOS BARREIRENSE NO CENTENÁRIODE ANTÓNIO JOSÉ (DA LOURA) (') ( 1e64) Estiveram expostos, em Março de 1964, na BibÌioteca MunicipaÌ desta vila vários pratos decorativosfeitos por António José (da Loura), com pequeninos pedaços de porcelana fina, dispostos segundo composições de desenhopor eìe próprio concebidas.Trabalhos de muita habilidade, paciência e gosto, que se admiraram com prazer. Particularmente nos pediram os âtenciosos funcionários da referida BibÌioteca que escrevêssemosumâ linhâs sobre o autor daqueles trabalhos, porquanto passavâentão o centenário do seu nascimento.Aqui lhes agradecemosa lembrança e âtendemos o pedido formulado.

No dia 13 de Março de 1864 (um Domingo em que pelas ruas do Barreiro desfilava a Procissão do Senhor dos Passos). nasceu nesta viÌa um menino que receberia na pia baptismaÌ o simpÌes e económico nome de António José... Era seu pai Domingos Bernardo e sua mãe uma airosa e desenxovalhada râpariga aÌourada de nome Joana Baptista. Marido e muÌher estremeciam o pequerrucho. A vizinhança daquele lar de gente pobre, mas honrada e feliz, começou daí a pouco a distlnguir de António José o rapâzote dos outros da sua idade pelo <<soubriquet> (d,a,Loura) . E António José (da Loura) ficou ele até ao fim da vida, que foi dilatada. Tornou-se um exemplo de self mad,e man, clos muitos que se forjaram nesta vila e lhe deram-e dáo ainda-fama de possuir opedos mais habilidosos do País. rários Que saibamos,ele só sabia Ìer, escreque ver e contar, e o <<curso)> frequentou.., foi a tropa-mas chegou a Mestre-Geral das Oficinas dos Caminhos de Ferro do Estado, do Barreiro. Quanta ciência <empacotada> seria hoje necessário âcumular parâ isso'..-para, depois, atirar 90'Vo dela parâ desperdícios?1...

() de 19 64 .

Primitivamenle pubÌicado no Joraal do Bartp;ro. n." 696, de 26 de MâÌqo


DO BARREÏRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

António José entrou aos 13 anos para aprendiz de serralheiro das Oficinas. A sua muita habiìidade para o desenho (de máquinas e ferramentas) deu ensejo a destacar-see passaÌ para a Secçãode Desenho, da quaÌ foi nomeado contramestre em 1889. Finalmente, em 1905, substituiu mestïe Augusto Rodrigues no lugar de Chefe das Ofocinas dos Caminhos de Ferro do Barreiro. Esteve em missáo de serviço na Escócia, onde fiscalizou a construção de várias máquinas para os C. F. S. S. Á NT óNI O J OS É D A L OU R A

Entre outros importantes trabalhos desenhados e executados sob a direcção de António José,fìguraram as primeiras balançascentesimaisusadasnos Caminhos de Ferro do Sul, e algumas báscuìas para grandes pesagens' recebencÌo,cremos que por essâ aÌtura, a medaÌha de <Bons Serviços e Exemplar Comportamento>,por Decreto de 25 de Maio de 1912. Em 1913, este operário, mestre de operários, pediu a reforma' Tinha 36 anos de serviço, e iria viver ainda outros 36 anos, como aposentado, pois faleceu em 1949. FoÌa o 3." mestre-geral das Oficinas dos C. F. do Sul e Sueste. A eÌe sucedeu Alexandre de Almeida, outro velho ferroviário que ainda bem conhecemos,e que foi o último dos prestigiosos chefes dessasOficinas que ascendeuàquela categoria. (') Quando mais de perto conhecemos António José, andava e1e já na casa dos sessentaanos. Várias vezes subimos ao 1.'andar da sua residência,na ex-Rua Almirante Reis (actuaÌ Rua do Cons. Serra e Moura), esquinando para a Rua Dr. Eusébio Leão, e, por nossas largas convetsas' muitas indicações preciosas do Barreiro do Séc XIX Ìhe ficámos devendo. Era ainda um homem bem conservado, e raro lhe falhava a memória, mas quando lhe escapava uma indicação, embora secundária, Ìogo a mulher, D. Gertrudes Maria Marques, também do Barreiro e já falecida,

(') V. â crónica anteÌ'ioÌ o Bdrreì,ìo (.,.)t>

<<ArLtigos e HabìIidosos OperóIías

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q1rc honror&m


FTGURASE FÀCTOS vinha completaï a referência que ele considerava incompÌeta. Era um casal muito unido. Viviam um para o outro. Não tiveram filhos. Aos 7 anos de idade, António José tornou-se componenteda banda de música da SocieàadeMarcial Capricho Barreirense (<Franceses>), tocando ferrinhos. Nos fins do ano de 1821, Ìá. foi ele, encorporaclona banda, tocar a Lisboa, ao Paço das Necessidadesna presenca do rei D. Luís I. Como era muito miúdo, Íoi autorìzado a subir para um banco, para ser visto pelo Mestre... Quando faleceu, era ele o último dos compo_ nentes da banda dos <<Frânceses>> do tempo de João GazuÌ, músico da Real Câmara. Depois de reformado, reÌativamente novo aincla, António José da Loura dirigiu muitos trabalhos de decoração para as salas da sua dilecta Colectividade, ern grandes ocasiões festivas. E das suas máos saíam ainda interessantes trabalhos executados em cartão e papéis colo_ ridos: figuras, fÌores, calendários, etc. etc. que distribuia pelos moqos e pelas meninas das suas relações.Na época clasfolias carnavalescas,na Páscoae pelos santos populares era então solicitado pela mocidadealegre para exibir as suas paciências. Quando, pelos anos de trinta, as bandas dos <penicheìros)> e <<t.ïân_ ceses> acabaram e a emoÌução terminou, António José repartiu também peÌos <Penicheiros>a sua colaboraçãonas festas que essa coìectividade organizava. Para mais, era seu bem próximo vizinho... Quando este velho ferroviário faleceu - a 14 cle Setembro de 1949- não havia imprensa regionalista no Barreiro. O seu passamento não foi, por isso, assinaladocomo devia. O centenário do seu nascrmento deu-nos, pois, o ensejo de recordar alguns tragos dessa figura de genuíno barreirense, de cujas mãos saíram muitos prodígios de bom gosto. Que grande professor de Desenho e Trabalhos Manuais ele noderia ter sido !

UM PEDAÇO DO ANTIGO BARREIRO QUE FO I O <MIN I-RO S S I O ) L O CA L O P O P U LA R (LA R G O DO CA S A L > Se aÌguém perguntar a habitantes do Barreiro onde é a praça Gago Coutinh,o e Sacailura Cabral,, a maior parte deÌes hesitará e náo respon_ derá com muita certeza... Outros desconhecerãomesmo onde fica.


DO BARREIRODE VÁRIÀS ÉPOCÀS Mas se for citado o La.rgo do Casal, a maioria dos batrreirenses logo o Ìocaliza. E quantos have,rá, ainda, que se lembrem do anterior nome desta minúscuìa praça? Certamente poucas são já as pessoas que se recordam de que, antes de eÌa tomar o nome dos gloriosos portugueses que, em 1922 (Março-Junho) praticaram à proeza do <raid> Lìsboa-Rio de Janeiro, se denominava entáo Largo da Alegria... Já em outro lugar (') nos referimos à família CasaÌ que, desde a 2." metade tlo Século XVIII, habitando a casa da veÌha Rua rJe Palltai's (actual Rua do Cons. Joaquim António de Aguiar), com os actuais n." 154 â 162, â tornejar, a Nascente, para o pequeno largo com os n.'" 1 a 3, veio a designáJo,popularmente, pelo seu apeÌido.Era o chefe da família, ainda nos princípios da terceira década do Século XIX' o já octogenário sargento-mor de ordenanças (oficial de ordenanças) Francisco AÌvarez Casal (') .

J. A. Pimenta deixou-nos, na sua <Memória Histórica> ( 1886)' aÌguns interessantes traços biográficos de Alvarez Casal, que não Ìhe foi difícil investigar, pois se consorciâra com uma suâ bisneta (")' Este Alvarez CasaÌ, que foi provedor da Misericórdia do Barreiro (nascido nesta vila, segundo escreveuaquele autor) fora nomeado capitáo cìe ordenanças da vila do Lavradio, em 7176; recebeu, anos mais tarcÌe, o grau d,e cavaleiro da Ordem de Santiago e foi ainda comandante da cavalaria das cinco vilas, Molta e aÌìexas (Barreiro, Lavradio, Alhos Vedros e Coina). Já passantedos oitenta anos, faleceu e foi sepultado (a 7 de Maio de 1835), na Igreja Matriz de Santa Cruz, desta vila, após ter recebido todos os Sacramentos (Foi nesse ano que se enterÌaram na dita igreja os últimos corpos).

Parte- Cap' xXI(') V. (O BARREIRO ANTIGO E MODERNO'-I I. Dd Rua. (Ie Paltruis à Ruc!' D. Ma'aueL (') Anotamos o seguinte: em vários asseDtos pâroquiais (de baptismo e óbitos) mencionando o norne tlo sargento-moÌ, poÌ nós atentamente lidos, nenhum lhe registâ os apeÌidos Altarez Cazal (sic), mas sj;rn A\ttes Cdzal (slc), e num deles é até mena vila de S, Lourenço de AÌhos Vedros, como suâ terra natal "ionada (3) V. nota ('). Idem, idem.

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FIGURAS E FACTOS Seu fiÌho Francisco Aìves Casal (1805-1881) foi também pessoa de muito prestígio no Barreiro, aqui desempenhando como o pai, vários cargos administrativos. Foi capitão de ordenanças desta viÌa, nomeado por decreto de D. Miguel, datado de 28 de Setembro de 1832, e refere ainda J. A. Pimenta, que, por ocasião de uma visita de D. João VI a esta viÌa, quando o referido monarca se encontrava na Quinta Real do Alfeite, fora Francisco Alves Casal nomeado reposteiro da Casa ReaÌ.

Pois a um e a outto, pai e fìlho, se referem os interessantes factos sucedidosnesta viÌa, em 21 e 22 de Julho de 1833, vésperas da queda de Lisboa em poder das tropas liberais e da consequente fuga dos partidários do rei D. MigueÌ, que veio encerrâr un lamentoso período de guerra civiÌ sofrido pelo nosso País. Recordemos, então, este episódio, tal como Pimenta o deixou relatado: <Quando constou no Barreiro que havia passado próximo do rio Judeu, o conde de Villa FÌor, depois duque da Terceira, com as ttopas liberais victoriosas, e que se dirigia sobre AÌmada, todo o povo se ïevolucionou imediatamente,dando vivas a D. Pedro e mortas a D. Miguel ; e, depois de grande alarme, sempre dirigidos especialmente peÌo capitão de miÌícias d'esta vilÌa António José Pereira e peÌo médico d'esta vilÌa António Cânclido Lobato, (chegada a noite) colÌocaram pela praia grande número de sacos de pinhas e barricas d'alcatrão accesas' em signal de regosijo; produziu grande pânico em Lisboa esta mânifestaqão; e os realistas, ignorando que o conde de Villa Flor se achava tão próximo, tomaram-n'a como uma pequena revolução isolada, facil de suffocar, e affirma-se que o governo chegara até a mandar preparar um navio de gueïra para canhonear o Baneiro, caso os ânimos se não acalmassem. <O que é facto, porém, é que no dia seguinte, 22 de Julho, logo de manhã, aportou à praia um escaler do arsenal da marinha, tripulado por grande número de marujos, conduzindo um official d'armada, encarregado pelo governo de syndicar acerca dos factos succedidos no dia anterlôr. <Depois do escaìer andar por muito tempo bordejando pela praia, para um e outro lado, a fim de se certificar se a povoação estâvâ em socego, desembarcou por uÌtimo o officiaÌ e dirigiu-se, acto continuo, 129


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

a casâ do capitão de ordenanças, Francisco AÌves Cazal e, depois de prolongada e áspera conversação, preguntou-lhe quâes as medidas que havia posto em prática para reprimir os desatinos populares; como elle the respondesse que nada havia podido fazer, em consequência da enérgica attitude do povo, recebeu Ìogo ordem de prisão. <Precisamente n'este momento, entrava na saÌeta, onde isto sg passava, o velho octogenário de rija têmpera, Francisco Alvarez Cazal, que trémulo pelo peso dos annos e da indìgnação, depois de haver dado ordem para que fechassem todas as portas da sua casa, bradou ao officiaÌ: - preso está o senhor, à minha ordem como comandante da cavallaria d'estas viìlas, por ter aqui vindo exercer arrthoridade sem me pedír vénia, chegando a prender meu filho e em minha própria casa,-e, acompanhando a palavra com a acção, intimou-o a que depozessea espada, a qual o officiaÌ immediâtamente the entregou. Este official foi tratado com todas as attenções, conservando-se preso na câsa da CamaÌã; com o intuito de que a notícia não passasse a Lisboa, o povo metteu todos os marinheiros na enxovia, encalhando o escaÌer na praia; outros dizem que este fôra queimado pelos mais enthusiastâs. <Difficilmente se pode descïever a alegria de toda esta gente quando, no dia seguinte, ouvindo alguns tiros para os lados da Cova da Piedade, seguidos de grandes descargas já mais próximo d'Almada e de alguns tiros de peça, d'ahi a pouco, poderam veï arrear, no castello d'esta villa, a bandeira azul e encarnada; eïa chegado o dia 23 de Julho de 1833, e precisamente n'este momento, emquanto o povo despedaçava pelas ruas d'Almada o corpo de Telles Jordão, tomava o duque da Terceira posse d'este castello, içando a symphatica e triumphante bandeira constitucional. E terminarra desta forma a inteïessante narrativa: <A estes factos, memoráveis nos annaes da nossa liberdade, e às continuas e sucessivasderrotas das tropas de D. MigueÌ, que terminaram peÌo exílio d'este príncipe, deveram muitos barre,irenses o conservarem ainda por alguns annos a cabeçasobte os hombros.,

A casa de residência desta família era, primitivamente, de um só piso, sendo,depois,ampÌiada com o 1." andar, o que fàcilmente se observa 190


F]GURAS N FACTOS pela sua traca muito diferente da do piso térreo. A propriedade, que tinha horta e jardim, ocupava, outrora, quâse todo o quarteiráo entre o largo a que nos referimos e a actual Travessa da Figueira (a que os antigos chamavam o Beco do Boktcha). Pelo anos 20 deste sécuÌo,uma pequeÌÌa e derradeira parte do logradouro, voltada a suÌ e poente da

Um aspecto do KLa'rgo tÌo Casal>, erÌL7912, coln tluas placas aietdinacltTs. (Airula o rés-do-cltão do primeiro prédio clo íado esquertTo era umtt modest& casa de lL&b'itoqõ,o,ond.e abr'íria ertu 7975, a jâ <<antiga>> Leitariu Chic...) (l'oto de Mário da Costâ Mâno)

casa, foi vendida por Josó Augusto Pimenta e sua mulheÌ: ao industriaÌ de alfaiataria José Félix Ferreira, que ali mandou construir, em 1928, o que é ainda o mais moderno prédio do Largo clo Casal, constituído por 2 pisos, no rés-do-chão do qual instaìou o seu estabelecimento, reservando o 1." andar para habitação da família. Encerrada alguns anos depois a aìfaiataria, já" entáo dirigida por um filho do proprietário, dado o falecimento deste (a 5-XII-1954), instalou-se lá, anos mais tarde, a sede do Cine-Clubedo Barreiro. A Praça Gago Coutinho e Sâcadurâ Cabral foi das mais concorridas desta viÌa, quando o Barreiro tinha quasetoda a vida comerciaÌe associativa concentrada ao longo dos vários quarteirões das três ruas paralelas 131


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS à sua antiga praia-norte. Era, então, o mi'nì-Rossio local-.- Do Ìado sul, a sededa Sociedadedos .,Penicheiros>,que ainda Ìá está e onde decorriam os ensaios da sua já extinta filarmónica, enchendo de boa música todo o Ìargo e suas vizinhanças; do lado norte, a sempre concorrida e já hoje cinquentenária <Leitaria Chic>; do lado ocidental, o prédio de 1'' andâï, construído em 1876, por João Gonçalvesde Assunção,que foi depois pertença do industrial Joaquim Lopes Quintino e é hoje propriedade dos herdeiros do fotógrafo Joáo Resende. A grande animação que, em muitos domingos (e sábados) decorria no pequeno largo se devia ao facto de, nesse 1." andar comprido, embora estreito (com entrada pela Rua J. A. Aguiar, n." 150), ter funcionado, durante anos, a sede do FuteboÌ Clube Barreirense ('), época essa que se pode considerar de apogeu do clube <<aÌvi-rubro>. Por úÌtimo, aÌi, muito perto, à iÌharga, no edifício do ex-Teatro Repúbtica e ex-Cinema-Teatro (actual Ci'nema F emoai,ár'ios, de seu 3.' registo...) estava também o Sindicato dos Ferroviários do Sul e Sueste, com uma vida social activa, cheia de problemas. AÌi não residia a estagïação... Aonde já vai isso tudo ! ái, que soi'clades,como se suspiïava na velha revista... Mas não se deva pensar que a vida se apartou dalil Nada disso! Apenas que o Largo rl,o Casal passou de centro cívico do Barreiro a centro cívico de um bairro ou sector da vila, isto é, da totaÌidade à parcialidade, neste aspecto. AIém da iâ citad'a Leitaria Chic (que o seu actual proprietário, José Ribeiro, mantém, dotando-a com torrefacqáo de café, para robustecer o seu negócio), possui ainda aqueÌe popuÌar local o Café Casalense, 1á instalado há perto de 40 anos e, desde há 18, explorado por António Luís Bucha, nat. de Vendas Novas. Por cima deste café era precisamente o saláo de bilhar (um só, que mais não cabia nele...) cìo Futebol Clube Barreirense. No mesmo edifício, na esquina oposta (para a Rua do Cons. Aguiar), era a barbearia de Joaquim Silveira (que foi jogador do F. C. Barreirense); mais tarde, mas durante pouco tempo, foi também aÌi o Café Sport, de Jorge Sobral. Era o ano de 1924. Tempos depois, encertado este café, ao qual se seguìu uma loja de panos, abriu ali, em 1929, uma drogaria especializada em artigos

(') V. (O BARREÌRO CONTEMPORÂNEO)- ÌI - IÌ Parte-A Vidâ Destlo Bar'ì'eiro poriiva .._ Cap. IX-As sedessociais dos ttês muioras c[ubesdesPort'í1)os ç seusparquesde iollos. (PP.230 e 232),

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FÌGURAS E I.ACTOS de pesca-passe o recÌame...- gerida por Heitor Mário Antunes da Costa, um dos proprietários deste quase centenário prédio, onde posteriormente, mais outro estabelecimento, em anexo, esteve instalado. E é nas noites de Verão-mas sem vento...-que o ttellr-.o Larç1o do Casal nos dá, ainda, um certo ar da sua graça... de outros tempos, com a freguesia das vizinhanças <cavaqueando>às mesas dos seus cafés, à volta das <bicas> ou das uimperiais>... Positivamente mais socegado e menos ruidoso... até porque a pïópria presençeque lhe davam alguns tipos populares da vila é já uma outra saudâde: o espanholdo amendoim torrado e o <<Camaraducha>, sapateiïo, que passava horas seguidas de pé e com uma perna a cavaleiro do espaldar do banco de madeira implantado na já extinta placa central do lurgo, em frente da <<Chic>,a olhar com uma vista para a direita, na direcção d.o Largo das Obro,s, e com a outra virada para cima... Parece que ali havia um mistério, que ele nunca deixou descobrir... Mas voltemos um pouco atrás, parâ referir ainda algo mais que vaÌerá a pena deixar püà à luístória deste pequeno pedaço do antigo Barreiro...

Ainda nos primeiros anos deste século, havià no largo pròpriamente dito, quando eÌe possuia a pìaca central e â tada a Ìargura desta, com Írente para a Rua do Cons. Aguiar, tm mturete revestido de cantaria na pãrte superior, onde se sentavam os que se dispunham a passar ali uns momentos de folga. Outros, encostados ao pequeno muro que servia de banco corrido, entretinham-se ali largo tempo, em âmena cauaqueirü, e não poucos concertos à guitarra e a bandoÌim, efectuaram naquele local, muitos barreirenses, por noites cálidas e luarentas... -Onde estiveste ontern à noite? A esta pergunta feita a um amigo e companheiro de alegres momentos, podia eÌe responder âlgumâs vezes: - Entretive-me no muïo d,o Largo rJo Casal... Esse murete, possíveÌ reminescência dos bttoreus oa boto:reu,s (E) de muitas vilas e aldeias do País, foi destruído quando a placa centraÌ

(") São na província conhecidos por este nome certos muros que se constroem para efeito cÌe retenção de terrenos declivosos ou areias,

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DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS do largo (na qual havia duas palmeiras, uma notte e outra a sul) passou a ser calcetada e recebeu canteiros, pelo que acabaram, por aÌi, a partir dessa aÌtura, os jogos do berÌinde e do pião da rapaziada miúda' Uma bomba manual coÌocada a meio do topo sul (em frente da sede dos <Penicheiros>),que puxava água vinda poï umâ tubagem, do vizinho

A Ttob'reza(l,e aspecto (mas não tanto',para aquele tempo.. ) do lada do Casal>, em 7912, mostr@ndo po/rfu qt) qlint&L ot'íental do <<Lago -anesas à caáa de habitnção cIú' conceituatla Íamiílì'a e rl,epenrlêncìas d&qua\e aqelid,o, hoie e,.tinta (Folo dê Mário

dâ Costa Mano)

Poço d,os Dezassei,s,funcionou mais tarde naquele local, que ainda os candieiros de petróleo aÌumiavam, projectando païà o meio do largo as sombïas das acácias lá depois plantadas.

Foi em 1922, a 8 de Mâio, que a Comissão Executiva da Câmara Municipal do Bareiro tomou a resolução de dar ao Largo da Alegria o nome de La'rgo Gago Couti'nlrc e Sacadn+raCabra| sob proposta do 13rt


FIGURAS E FACTOS seu vice-presìdente Henrique José Bravo (o), que, nessa altura, informou os seus colegas de que estava a ser constituída uma grande comissão de deÌegados de todas as colectividades locais, para a organização de festas e um bodo aos pobres, comemorando a conclusão do céÌebre <raid>. Já, contudo, no Ìivro de actas n.. 4, fls, 71, daquela Câmara (sessão de 70-4-22), se encontra a primeira referôncia ao que se projectava fazer nesta vila, em sinal de regozijo pelo intrépido feito dos nossos aviadores, e que havia de culminar pela coÌocaçãode uma lápide, dando os seus nomes àquele largo. Por nos parecerem curiosos os seus termos, â seguir tïanscrevemos essa referência: <Disse e.m seguida (o presi,rlente) (') que, estando a concluir-se o <<raid> de Lisboa ao Rlo de Janeiro, intentado peÌos aviadores portugueses Gago Coutinho e Sacadura CabraÌ, cuja importância e aÌto vàlor científico é desnecessárioencârecer, e propondo-se todo o País a festejar condignamente o complemento desta gloriosa empresa, parece-lhe que esta Câmara se deve associar, peÌa for:ma mais consentâneâ com as suâs forças, às manifestações de regozijo que por tal facto se façam em todo o País, e, por isso, lembrava que se iÌuminasse nessa noite a fachada do edifício dos Paços do Concelho e se exteriorizasse por todas as formas o nosso regozijo. Associam-se às palavras do presidente o vice-presidente, sr. Henrique José Bravo e os vogais António Germano Bolina e Evaristo José da Costa, tendo reprovâdo o vogâl José Augusto dos Santos, que verbera o procedimento do governo em fzzer uma despesa de três mil contos com este empreendimento que de nada serve ao País. Estranha que todos se preocupem com este assunto e que se esqueçamque nâs cadeias se encontram centenas de chefes de família presos, sem culpa formada, e cujas famílias se debatem na mâior miséria. Assim, condena e reprova em absoluto a proposta do presidente, devendo oficiar-se à Direcção da SociedadeDemocrática União Barreirense, pedindo a cedêncìa de uma porção de tigeÌinhas de vidro>. O vereador discordante de toda e qualquer festa de regozijo pela famosa travessia aêrez do Atlântico-Sul, assombrosa ousadia de dois

(') Nascido no Barreiro a 12-II-1887, foi subchefe de ÌepâÌtição da C, P. Já aposentado, faleceu. Ìesta vila, a 12-I-1964. (') Júlio Caetano Veríssimo.

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DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS portuguesesque iam Ìevar às terras de Vera-Cruz a primeira aeronave europeia, no meio da admiraqão universaÌ, era operário pedreiro das Oficinas Gerais dos C. F. S. S. Mais conhecido por Alcomaa, foi um <Penicheiro>,que muito trabaÌhou pela sua dilecta colectividade.O motivo expressodo seu desacordoé que não deixa de ser significativo, em 1922, em plena RepúbÌica Democrática! E também não deixa de ser lamentável que até na apreciaçáo duma proposta justificada peÌo vaÌor e oportunidade dum feito tão transcendente,a unanimidade entre meia dúzia de portugueses fosse uma irrisão1...

O Largo do CasaÌ, está, desde há anos, reduzido quase à sua expressão mais simpÌes. O maior movimento rodoviário que, por toda a viÌa, se comeqoua processar, obrigou, ali, também, a sensível transformação.Destruída a sua pÌaca empedrada central, com as acácias que a ornâmentâvâm, e bem assim as suas estreitas faixas de rodagem ìaterais, passou aquela a ser ocupada por Ìarga faixa de betuminoso, destinada ao trânsito de veículos, construindo-se, depois, pàsseÌos a nascente e :r poente, onde quatro -(J,mú1)ìst& bancos (dois de cada TnrcìoL do pequeno <<Lat'go (lo Cd:jabt, tal o ptëdio'maìs camo ertl etn tgfi, Do Lad.oesqtte't'tLo, Ìado) foram coÌocados, antigo .kL f,racetú, co'ú, o lrente Ttri:rtr:ipaL(as d'epetLtlôncìas tla habitação) pant a RtLa do Cons. Joaqtitt à sombra de novas árAntótio AglLiol' e que erú pro[)rieddda da f am:í.íiaCasal. vores. Não faìando já (A porta ldrgtt sert:itt, tlu,ranúe arLos,& um6 caTroíl'f7a)' no maÌcÕ do coneio... Do larlo direito e ct esta ligarla, rê-se ptvte do prédio tnaìs no:lerno, e'm cuio 7.' pisL, esturo então insta[adat & alïaìataúa d,e José FéIit Ferreira

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Também, por isso, houve de remodelar, se


Ã0 P O U O DO

B A RR EI R O

Dá-seconhecirlen[o a todoo Povo ordeiloe tlriraìhadoldo Colcelhodo BnrreiroqueoautordoÍançamento da bombl que explodirrrranoitetìeISpara 19 tio colren[e,no LaÌgo SacaduraCabrale Grgo Coütìnho, felindo6 operaì'ios, gravemenie, moITEs, aÌgunsrleles eorihr.cldo foio corliceiloJOnai Íãnrbem parr J(,.ilD I'ALDEf lf AIlt(|, de conivecia com o corticeiro GOIìçÁLVf,S, coühecldo por ÁBll,l0 ll'Bll,f0 GÁRltÁIl-lS, os clurtisanLlarn Íugidos. 0 criminosoé natulaltle Silves,filltode Domingosllontes terl 40 anos deidade,aproxinia danerte, é baixo, fc,rte.tem cabelopietojá conraìguns brarrcos,usacariìrapada,teLnrostoredondo, olhuscastânhos vestedoiscasaescuros, cosjâ muitousatìos, urrrde col.imalvadioacastanhatlo e oul.rodefazenda escula, calçade cotirnescrlo às r iscas,camisaescurade riscaclo, aìpercatas e boinaclara. Trabaìhar,a de seuoficio,ha portcas senranas, na ÍablicirChavesülorales, não tendotrabalhadono dia do atentacÌo nemnosdiasseguintes. tr-otÌiatlo atentado recoÌherr a casadepoisda suà faç:rnha, conServaudo-se rli ateao dia seguinte às í5,30 horas,depoisd0 quedesapareceu. lJstiìosenLlotornadasas maislapidase enetgicasproviderrcias, dentloe fora íìo Currcalho r frmdo climinososel caDtrrlarlo. A Adrnilistraçâodo Concelho oleróceunrpréiniurle I 000d00a quemirrtìicaro 1';r13ipi1u do bontbiStiì. .A,rutoridadeadrninistlativa tolna e corrsidera responsaveÌ iodo aquele que,tìequalquer'Íbrnae poÌ qualquermodo,encubrao pàrarÌeilodo cliniôoso, ou ìÌreforneçarneiosde fuga,auxiliornollÌ ou matelial,abligo,el,c.,resporrdendo pe|anteostr ibunais comoco0ivelteno cnme. O Balreilonãodeve,no ententlerdosseushabitantes oltìeirose trabalhadorgs.lical como labórtrìe terla LÌebornbistas,felo crirnede un deslailadoe alcoolico.

0 Ãdministrador doConcelho Benlo da õilva Fernandes Il|ado pclâ Cotrri.rôo de Cenr||ra Tipogistii Cono.crÂl-Àrr EusebioLoÃo- DÀBREIRO UM DOCUMENTO: - Comunicado d,e Admúústração dct Concelho aÌo Barleba sobre o caso aLoatentado bombista ocorrìdo pm jg7! ío <Largo,Ìo Cosobr,c1lìt)Lome oÍicial soitt n1túto cleturp(Ldo, A esse grane itucidellte n(,s referintos en <<OBARREIRO CONTEXIPOÈÂN86, - III-


FÌGURAS E FACTOS ali, o sistema de iluminação eÌéctrica, desaparecendo do centro da pequena praça um candeeiro de três fortes lâmpadas de incandescência,para dar lugar à iluminação com ìuz fluorescente, montada em suportes colocados nos edifícios fronteiros. Uma única e deslustrosa ocorïência se ïegistou, âté âgora, nesta tão antiga quanto popular praça do Barreiro: o rebentamento de uma bomba de dinamite, nela lançada numa noite de Janeiro de 1934. Mas a histórla desse atentado, cujas lamêntáveis consequências acompanhámos de perto, já a deixámos traçada em outro lugar. O Largo do Casal, esse, quedara inocente, pela sua honesta tradição baìrrista, dum crime estranho. (V. reprodução do Comunicado <<AoPovo do Barreiro) (3).

DA PASSADA VIDA BOÉMIA E FADISTA DO BARREIRO I-O

GINGUINHA-ÍDOLO

DO FADO

<Boémio i,meuerente. Tão f àcilmente írnproui.saaa urnu, pând.ega conlo uola ccLntiga; sempre rclr)az, sempre ìoüem, rlesafiando os <lranganol es> (la épocct,,... O povo do Barreiro é dos que mais apreciam o Fado. Essa canção popular teve e tem sempre, aqui numeroso público a ouvi-la, quando em certos <retiros> ou nas sociedadesde recreio e teatros a vêm interpretar alguns dos seus mais conhecidos ídolos, e, hâ cerca de mei6 século, era ainda vulgar um grupo de fadistas amadores, uns, barreirenses, outros de fora, mas aqui residentes, organizarem longos certames de fado e serenâtâs que âtrâíam numerosos ouvintes. Mas o tempo, hoje, é outro... e agora resta a saudade no peito desses <antigos rapazes>, que cultivâvam com briÌho e arte essa sentimental

Da Colecção do Autor.


DO BARRE]RODE VÁRIAS ÉPOCAS canção, e improvisavam versos que reflectiam uma singular veia poética, ora no aspecto sentimentaÌ, ora no humorístico. Da guitarra - esse melódico instrumento arrancavam os boémios as suas notas de veludo, que embalavam as muÌtidões, e o Barreiro dessa época estimava essas verdadeiràs troupes, esses músicos, esses poetas do fado, esses cantadores, entusiastas e ruidosos, que espaìhavam vida e alegria, mandando <<àsmalvas> todas as tristezas ! Recordaremos, 4 seguir, muitos dos rapazes desse tempo, alguns, infeÌizmente já faÌecidos. Nesta crónica, porém, vamos apenas falar de um cantador da <<velhaguarda>, que viveu muitos anos no Barreiro, onde popularizou a simpática canção e conquistou boas amizades e dedicações.Foi ele António dos Santos Ginguinha.

I

António Ginguinha era ribatejano, natural de Samora Correia, vila onde nasceu a 27 de Dezembro de 1865. Em Samora se conservou até aos 12 anos, quando o pai lhe morreu, deixando-o com mais sete irmãos, todos menores. Aprendeu então a trabaÌhar a bordo de fragatas em Vila Franca de Xira e, pouco tempo decorrido, já, cantzva, com voz bem timbrada, nas tabernas do cais daquela vila. Cantava... e compunha os versos para as suas cantigas I O rapaz, porém, nunca soube ler nem escrever... Mas apesar da sua rudeza de conhecimentos,dava-sea improvisar quadras e cantigas que despertavam legítimo entusiasmo nos ouvintes, A sua vida de poeta popular mais se robusteceu, quando, homem já e sempre que ele aparecia, nas regiões ribeirinhas, acabado de desernbarcar da tragata, se via atrâído pâra as tabêr"nas e os <retiros>, onde se dava a cantar e a improvisar até alta madrugada. Começando então a frequentar, amiúde, o Barreiro, onde tinha dedicados amigos em Francisco de OÌiveira (1), João AÌves, Augusto

(') Francisco de OÌiveira, natural de Manhouoe (S. Pedro do Sul), era comissário de caÌgâs e descâÌgâs na Estação do Barreiro, tendo sido aqui proplietário. Faleceu, com 48 anos de idade, na sua casa da Rua da Recosta, a 1?-X-1916.

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FIGURAS E FACTOS Duarte e outros, Ginguinha acabou por se estabeÌecernesta vila, por volta do ano de 1900, com uma casa de vinhos e comidas, na Ruâ MigueÌ Pais, num prédio com o actual n." 17, onde ao pïesente existe um àrmazém de sucatas e em cujo 1." andar funcionou a já extinta Associaçáo de Classedos Carregadorese Descarregadoresde Terra e Mar desta vila. O estabelecimento de Ginguinha torÌ'Ìou-se então um autêntico soìar do fado. Citamos, a propósito, esta curiosa referência de Júlio Guimarães, nos seus uSubsídios para a história do Fado>, em Guitarru de <...sua casa de pasto (no Bameiro) era âo mesmo Portugal-7946: tempo um verdadeiro cenáculo da poesia popular, pois aÌi, em alegre estúrdia, se juntava a fina flor da fidalguia e dos cantores da época, não sendo raro darem-se no seu estabeÌecimentc sessõesde fado que duravam dois a três dias sendo Ginguinha um dos cultores mais predilectos, não só peÌo seu carácter e generosidade, como também pelos seus improvisos, modaÌidades,em que poucos o excediam, e que seriam perfeitas se a sua cuÌtura não fosse rudimentar., Ainda em Guitama d"e Portugal ( 1932), aÌguém lembrava o antigo troveiro nestes termos: <Era delicioso o Ginguinha. Vocé não caìcula a jovialidade exuberante que trazia sempre consigo. Sempre uma anedota na ponta da língua, sempre uma quadra a propósito de quaÌquer assunto. Estou a vê-lo suíças primorosamente tratadas, a calva enorme, franco nos gestos, meigo no olhar, afectuoso no trato. E que improvisador! Tinha Liararia pzra duas semanas seguidas. Poucos ou nenhuns lhe levaram a paÌma. Eram de oiro as suas composições, porque com elas o Ginguinha conseguia atirar oiro, às mãos cheias, para o coÌo dos necessitados.Abandonava os seus negócios,a sua própria vida, para, de Vila Franca e, mais tarde, do Barreiro, ir para toda a parte Ìevar o seu estro a festas de caridade.u Com efeito, nesta vila e por várias vezes, cantou Ginguinha, com de caridade, nos Bombeiros sua voz potente e clara, em <<verbenas>> Herold, no Teatro Independente, etc., onde alardeava suas possibìÌidades vocals e seu estro poético, com o maior êxito, a"olado de Júlio <Janota>, Guilherme Coração, os Vianinhas e outros. (Mas como improvisador, com possibilidadesreconhecidas,diz-se que só Miguel Caleiro, morador nos Brejos de Azeitão, et:à càpàz de lhe pedir meças...). EÌe próprio compunha e cantava: 11t0


DO BARREIRODE VÁRiÀS ÉPOCAS Hó, quem d.iga que o Gi'Wuinha tí o reÌ tlos cantad'ores; n mentira, não é tal, Inda há outros sup'rtores !

Em 1917, Ginguinha, minado, ao que se disse, por desgostoscausados por intrigas de alguns que se consideravam seus rivais, saiu do Barreiro, e voltou para Sarnora Correia, onde montou outra tabernâ. O grande cantador do fado não fora feliz na sua vida privada: casara duas vezes e enviuvara outras tantas, tendo ficado do seu segundo matrimónio uma fiÌha, que era o seu enÌevo. Quando deixou o Barreiro, foi também na sua companhia um filho que the nasceu aqui ('). Depois' encerïou â casa em Samora e seguiu, por último, para Vila Franca de Xira, ondo se empregou na Cooperativa PaìhabÌanco. Lá faleceu com 56 anos incompletos,a 19 de Agosto de 1921, e no seu funeral se Ìncorporaram alguns milhares de pessoas. NOTAS DIVERSAS - i) Um dos mais populares fados cantados por António Ginguinha, tinha este mote da sua autoria, alusivo à implantação da República em Portugal (1910): Nas úguas clo nosso Tejo, Ví nascer uma clonzela; Hd, quem a quei,ra mtLtar, Mtts há, ouem rLoma por ela! Certa vez, no antigo Teatro Independente, desta vila '), um cantador de fama e poeta popular pediu à assistência que Ìhe desse motes, que eÌe

(') Trata-se de Francisco dos Santos Ginguinha. Foi sua mãe CÌaudina Rosa, e nasceu Ì1o BaÌreiro, a 1de Dezembro de 1910, É operário, aposentado, das fábricas da C. U, F. nesta vila e foi bombeiro da, corporaqão privatiYa daqueÌa empresa. (3) V. (O BARREIRO ANTIGO E MODERNOT-I Palte-Cap. XXXIIOs 'ÌrrinLeìros teatros.


FIGURÀS E FACTOS se encarregâria de gÌosar imediatamente. O homem saiu-se bem. de início. até que Ginguinha, que também q:uis tttì,rur mote, se saiu com este: Se d,i,scorcernã,o lhe cust(r, Diga-me, faça fator, Quem seria o inaentor Do P-d-nd,: - Santa Justa!

E com este mote é que parece que o tal fadista e versejador se viu atrapaÌhado... II) - No mês de Março do ano em que faleceu, Ginguinha promoveu em Vila Franca, em benefício da Misericórdia local, um cortejo alusivo ao <Enterro do Bacalhau> que, peìa perfeita organização e magnífico aparato de que se revestiu, com a coÌaboração da banda de música do Grémio Artístico Vilafranquense, constituiu, no seu género, um êxito até então não ultrapassado naquela região. III) -No antigo Salão Mondego, na Rua da Barroca, em Lisboâ, foi há anos, e na presença de seu fiÌho natural do Barreiro, (que naquela ocasião recebeu cumprimentos e saudações de numerosos cultivadores do fado) descerrado um busto de António Ginguinha, esculpido em mármore como homenagem ao grande cultivador e improvisador da popuÌar canção, que -que como então se recordou - foi um <coração de oiro, alma límpida, nobre exemplo de virtudes, que fazem a sua memória respeÍtada e tornâm a sua vida um símbolo de hondade e honradez>.

II-O

<ARMANDINHO> - MAGO DA

GUITARRA

Depois da crónica em que recordámos Ginguinha, o antigo cantador de fado, cujâ vida, como referimos, tão ìntimamente ficou ligada ao Barreiro, vamos agorâ recordar uma outra figura que foi a de um grande servidor, consciente e abnegado, da causa fadista: Armando Augusto Freire, o <Armandinho>, nascido em Lisboa, em 1893. Guitarrista-conceúista de excepcionaÌ valor, foi homem que nasceu pârâ ârrancar, com aìma e coração, os mais maviosos acordes que esse

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DO BARREIRODE VÁRIÀS ÉPOCAS instrumento musicaÌ é susceptível de produzir e que tanto falam corn terlura ao sentimento. E que filigranas de sons pode o verdadeiro artista arrâncâr à alma duma guitârra?!... Já o talentoso poeta Fernando Caldeira (1841-1894) dizia: Em ouaind,o umú guitürd, Paro, tirand,a o chapéu; Não me im,porto d,e mower, Se houter guitarcas no Céu! Digno continuador de outros antigos e notáveis guitarristas, como por exemplo esse inolvidável João Maria dos Anjos, que foi sapateiro em Alfama e mestre de guitarra do rei D. Carlos (então príncipe real), de Reinaldo Varela, de António Maia, de MagioÌly e de Luís Carlos da Silva, Luís <PetroÌino>('), a fama do <Armandinho> ultrapassou as fronteiras de Portugal, conhecendoverdadeiras horas de triunfo em Espanha, nas Áfricas e em vários países dâ América do Sul. Uma das primeiras casas do Barreiro -se não a primeira - onde Armando Freire tocou guitâïrâ, foi no restaurante da Rua da Recosta, pertencente a Francisco de Oliveira, empreiteiro de cargas e descargas ra Estação Barreiro-Mar, e elemento assíduo nas antigas troupes boémias desta vila.

(') Luís <Petrolino> (autor dum fado com o seu nome), farnoso guitarrista que percotÌeu as principais cidades da Europa e se exibiu também na Rússia, tendo cegado duma vista quando uma cordâ da g:rÌitarÌ'a, que ele tocava, se pâúiu e lhe saltou para os olhos, tâmbém frequentou muito o Barreiro, pertencendo à trozLpe tadistà que mais cetiames da popular cangão fazia nos habitÌìâis retiros destâ vila, em várias quintas dos arr,edores, no (Primo-da-Primà), em Santo Àntónio da ChâÌneca, etc. Nesta povoação da freguesia de Palhais, o local onde se cultivava o fado era na bem provida taberna de Valeniim da Rosa Limpo (1856-1937). Músicos, cantadores e assistentes iam paÌa lá de trem e, eÌn contacto com os capitosos vinhos do velho Valentim, às tantas da madrugada a etilizaçáo ia muito avançada, mas o cocheiro do caÌto era o único que não tinha ordem pâra se a.diantâÌ... À volta (isto tâmbém se repetia, com ponto de oÌigem noutros sítios) os boémios faziam â viagem deitados no estÌado do cârro, mistuÌados uns com os outros e dormindo que era um regalo!,.. Depois, já noite alta, no Barreiro mal alumiado a petÌóteo, o cocheiro ia passaÌÌdo com o carro pela residência onde sâbia morar cada um dos fr"egueses, e ia dizendo às donas da casa, com malicioso sorriso: -Minha senhora, venha cá indicar o seu mârido...

llrs


]IIGURAS E FACTOS O grande concertista de guitarra era de tipo franzino, baixo, pouco ostentoso e quem o observassefora do seu verdadeiro ambiente, náo poderia calcular que fibra possuíae de que talento dispunha aqueÌafigura simples e modesta,que havia de ser o maior instrumentista do seu género. A sua reveÌação no meio boémio do Barueiro não se fez demorar e àqueÌerestaurante, à taberna e casa de pasto de Ginguinha, na Rua Miguel Pais, e a outros locais onde ele vinha muitas vezes,com vários cantadores de Lisboa, o Júlio Leopoldo de CarvaÌho (Júlio <Janota>), Guilherme Simões e outros), acorriam numeÌosâs pessoâs,que enchiam as casas,proporcionando bom negócio aos proprietários, nessas ocasiões,e a todos, horas de agradáveÌ convír'io e alegria. O futuro ídoÌo da música do Fado criou então, aqui, aÌgumas amizades,uma das quais foi, sem dúvida, a que lhe dispensouAugusto Ferreira, antigo empregadodos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste e depois empregado do comércio, nascido no Barreiro, a 16 de Junho de 1879 Augusto Ferreirzl era fiÌho do abastado proprietário local José Ferreira (1832-1913)(") e fez durante aÌguns anos, mercê da boa situação cle que a casa pâterna disfrutava, uma vida bastante larga, <queimando> boa parte da sua mocidade na boémia despreocupadae feliz, p;15 - f2nf2s vezesl- traiçoeira. No lar que constitui, ele seguia o generosoexempÌo de seu progenitor: mesâ senìpre farta para os amigos e para os amigos de seus amigos! Armando Freire conquistara a sua amizade e durante três anos, com breves intervaÌos de tempo, o exímio guitarrista viveu em suâ câsa, na Rua MigueÌ Pais desta vila. Nesse período, o .,Armandinho> ensinou entáo a tocar guitarra o filho maìs velho do seu anfitrião, Augusto Lopes Ferreira, que ïevelava notáveÌ gosto para dedilhar o mavioso instrumento de música. Seu aÌuno, porém, em plena mocidatìe, aos 20 alÌos, foi colhido peÌa morte, falecendo a 23 de Junho de 1918. O desaparecimento do infeìiz moço lançou a sua família no maior desgosto,que mais aumentou ainda, quando a 3 de Julho - dez dias depois da morte do filho - uma febre tifóicÌe vitimou Augusto Ferreira, que deixou viúva e seus outros quatro fiÌhos em circunstâncias entáo difíceis.

(') p. 113.

V. (O IÌ-{RREIRO ANTÌGO E MODERNOD- IPârte - Cap. XVII -

1t4

--J-


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS Mas Armando Freire, jamais olvidou a casa de seus amigos, onde sempre encontrou sinceras amizades e for"tes estímulos para a sua vida, como nunca esqueceu a vila do Barreiro e as noites de Fado aqui passadas e nas quintas dos arredores, que foram para ele das mais gratas recordações dos seus tempos da mocidade. Mais tarde, tornado verdadeiro profissionaÌ, aqui voÌtou váïias vezes, aos palcos dos teatros. Eìe tocou para todos os púbÌicos, como alguém lembrou, desde o da taberna de mesas toscas, ao dos salões paÌacianos, e nâ sua companhia andaram homens, desde os de fato de ganga aos de casaca. Os seus solos de guitarra (muitos dos quais, gravados em disco, correm mundo) foram aplaudidíssimos. Armando Freire ganhou muito dinheiro, mas não soube amealhaï. Boémio impenitente, mas de fraca compleição física, a tuberculoseescoÌheu-opzrra mais uma das suas vítimas. A 21 de Dezembro de 1946, falecia o <<Armandinho>em Lisboa, na Trav. das Flores, 8, 1.", dt.". Viveu pôuco mâis de meio sécuÌo aquele que <tinha a guitarra por sua alma e confidente>.Casado com D. Crisálida dos Santos Freire, deixou um único fiìho, Armando dos Santos Freire.

IÌI_AMADORES DE FADOS E DE SERENATAS QUE O BARREIRO CONHECEU Aí pelos anos de 1918 e 1919, época de convulsões económicas, sociais e políticas, que davam que fazer e que pensâr ao <Zé Povinho>, havia no Barreiro um numeroso grupo de gente nova que não estava disposta a implessionar-se em demasia com as contingências e contrariedades da vida, e, pensando que o preferíveÌ era esquecêJas,pïoculrava então, em inofensivas diversões ou em episódios sentiment4is, uns bons momentos de prazer e alegria e romantismo, que todos afinal desejam. MelancóÌicas paixões assaltavam alguns, e os que mais geito possuíam para versejar, exprimiam em Ìíricas estrofes os seus inflamados estadosde alma, ora declamandopoesias,ora cantando-as,com entusiasmo sincero, ao som de guitarra e de viola, que outros companheiros tocavam. O Fado era então, como é hoje, uma cantiga popular que atingia, nessa época, grande aura, e quase sempr:e,no remate das serenatas por ÌÌoites serenas, batia-se o fadinho até aÌta madrugada, muitas vezes diante de abundantee aoetitosaceia.

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FIGURÀS E FACTOS O habituaÌ ponto de reunião da trou:pe pãrà as suas foÌganças era :r Leitaria <Chic>, na Rua do ConselheiroAguiar, rnas, outras ocasiões, partiam da sede do Grupo Dramático (depois CÌube) 22 de Novembro, à Rua Marquês de Pombal. Dos rapazes novos desse tempo são ainda bem recordados, entre mâis um ou outro cuja citação pode faìhar na lista que deles possuímos, Frederico Costa, que então residia no Barreiro e que, na carreira miÌitar, atingiria o generalato (faleceu a 21-VIII-1969), David Miranda, empregado de escritório, da Carris de Ferro, em Lisboa, já faÌecido, e seu irmão JúÌio Miranda, capitão de engenharia,há muitos anos domiciÌiado em Odemira, onde é industrial; Antero Cerqueira de Sousa Pereira, que foi escriturário da Secqão de Tecidos da Cuf e era neto de Honorato de Sousa, antigo chefe do Movimento dos C. F. S. S.; João de Azevedo do Carrno, empregado de esclitório dos Caminhos de Ferro e um inspirado poeta, que versejava com sâber e sentimento, isto é, com cabeça e coraqáo... ; Viliato Joaquim de Almeida, amador dramático barreirense, também ferroviário, estes, feÌizmente, ainda vivos, e Domingos dos Santos Marujo, um espírito sempre alegre e uma voz melodiosa e sentimentaÌ especialistano fado-serenata,Otelo Pereira, que foi empregado camarário nesta vila, Augusto RebeÌo,Fiìipe Pantoja, escliturálio da C. U. F. e Luís António Leitão, todos estes úìtimos já faÌecidos. A todos eles se juÌ1tavâ também António Joaquim Lopes Quintino ('), um barreirense de espírito divertido e alegria comunicativa, imprescìndível no grupo e cujo pai era proprietário durna quinta no lugar da Telha, deste concelho, onde, algumas vezes, se punha termo às cantorias com opíparas ceias e a presença de fadistas de Lisboa. Os acompanhamentosÍnusicais eram geralmente feitos à guitaïrà, por Manueì José Bravo, empregado feruoviário, natulal do Barreiro, e à viola por António Limão Reis, aÌgarvio de Siìves, que a morte arrebatou, ainda novo, com 48 anos, em 1953. Outras vezesera também Alberto Teixeira Bravo, outro ferroviário, desta vila, quem tocava vioÌa.

(') António Quintino (irmão de Alexandre Lopes Quintino, que foi vereador da Câmâaa Municipal di BârreiÌo e que morreu com 34 anog de idade, em 1932), também já faÌeceu. Nascido nesta vila, a 15-XI-1899, fixâra já há muitos anos a sua residência em Aveiro, onde erâ proprielário, no lugal da Barra, tendo âí falecido a 19-IV-19?0.


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS Os trovadores tinham sempre um ceïto grupo de acompanhantes, cuja presenca a troupe já quase considerava indispensável, e entre eles destacavam-seEduardo Rodrigues da SiÌva, nosso tio materno, que foi inspector dos C. F. S. S., Guilherrne Henrique Ryder Costa, industrial, José Maria da Costa Mano Júnior, comerciantetodos do Barreiro, e ainda Herculano Marinho, consagradoamador dÍâmático barreirense e Miguel de Lemos Pantoja, empregado de escritório da Cuf, todos eles também iá desviados da estrada da vida terrena. Nesse após-guerra de 1914-1918,muitas e lindas cançõesandâvam em voga, que os cantadores incluíam ÌÌo seu reportório, com êxito antecipadamente garantido... Eis os nomes de algumas delas:-nO cigarro do Soldado>,o <Fado das Mãos Criminosas>, da opereta <Miss Diabo>, a <Guitarra de Portugal>, o <Fado Paiva e Pbna>, o <Fãdo da Saudade>,a <Espingarda de Pau>, <Constelações>, <Ciúme>,a célebre <Cançãode Maria>, a <<Canção da Madrugada> e até o... <Pistotira>. Nas serenatas glosavam-se, por exemplo, estes motes: Aqui tens meu coração, Mata-o se queres, meu bem. Mas aê que estó,s dentro dele: Se o matas, morces também. Foge-me a aida em ped.ctços, Minh,'alma desfaz-se em luz ! Qu'r,i morrer em teus braços, T orrú,-los a minha cruz ! Quanto aos fados, muitas e bonitas eram as letras que com eles se cantavam, pelo que apenas algumas quadras (umas glosadas em oitavas, outras em décimas), aqui recordamos, para concluir, poì: hoje estas Ì'Ìotas (as duas primeiras são da época da guerra de 1914-1918): Quando cr,batalha f indou, Eulúlia ao compo clesceu. Por entre os mortos procura Um fi.Iho que fora seu.


FIGUR.dS E FACTOS . Cüncin, mdn do Progresso, Dai a,o muntlo ed'ucaçã'o, Para que acabem os guerras Da naçã,o contra nação'. Nu.m oníma,ila amuial, A tlescuil,od'a ald'e'ã', Quandn parou d,e d,ançar, Jú despontaua a man'hõ'. O Fad,o, conção bendita' De Portugal ori"und,o, ttr a conção mnis bomi'ta Que se canta em tod'o o mand'o. Se um dia morresse o Fod'o, Este céu de Portugal' Nunca mais serín azul, Nem o Tejo cle cri,stal. Camões nasceu p'rü poeta, E Marle para guerretro; Cup'id'o, para o amor, E Boca.gep'ro, breieiro...

Também um inspirado fado era cantado com versos de g:énerohumorista, feitos por Azevedo do Carmo, cujo mote era este: Com certo ar de fadi'sta, Até jrí d,izem os rnortos: ìsto é da' minhn ústa, -Ou Ou os borrotes estõ'o tortos!

E até à crónica seguinte, em que focaremos mais gente da antiga boémia do Barreiro, músicos do fado, etc,, gente dum perÍodo ainda recérn-passado, é certo, mas 'bem diferente já do actual..,

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DO BARREÌRO DE VÁRiAS ÉPOCAS

IV-MAIS ALGUNS AMADORES DE FADOS E SERENATAS QUE O BARREIRO CONHECEU E OS INSTRUMENTISTAS Ainda no período imediato à 1.' Grande Guerra Mundial, havia um outro grupo de fadistas amadores, que visitava, com muita frequência, a vila do Barreiro: era essà troupe constitlida pol aÌguns sargentos da Armada, em serviço na EscoÌa de Torpedos de Yale de Zebro. Aqui se lhes juntavam, depois, outros râpâzes. Fados e serenatas eram então entoados até horas adiantadas da madrugada e quase sempre Domingos dos Santos Marujo (') -um animador de primeira água... - eïa quem garganteava as meÌhores selenatâs, umas com versos dos cancioneiros populares,outras com quadras do g'randepoeta Augusto Gil (1873-1929). Os acompanhamentos eram feitos à vioÌa pelo então 1.' sârgentÕ Cândido Augusto Lopes, natural de Izeda (Bragança), que ainda bem conhecemos e é já falecido, tâmbém. Com alguns destes cantadores da simpática boémia dessa época e, mais ainda, com o Ììumeroso grupo de outros rapazes, já por nós citado anteriormente, se iuntava, âinda, o barreirense António de Oliveira, então empregado de escritório dos Caminhos de Felro, nesta vila, que cultivava iguaÌmente as seïenâtas e, competente apreciador do fado e dos seus cuÌtivadores, era outro companheiro ideal das troupes. Fot:z sea pai o estimado Francisco de Oliveira, já referido em crónicas anteriores, pode.ÌÌdoportanto concluir-se,nâturalmente, que <fiÌho de peixer... Os cantadores de fama - sempre amadores...- também náo faltavam por essa época e um pouco mais tarde. Um deles, poï exemplo, era Domingos da Luz, então ferroviário, natural do Barreiro, e outro era Francisco António Bexiga, outïo ferroviário, natural de Alvito e então residente no Lavradio, mas desde há muito um barreirense por adopção. Francisco Bexiga chegou, mesmo, a sel considerado como um amador de muito boa categoria, entre os profissionais do fado, que o elegiavam amiúde. Algumas vezes cantou em Lisboa, uma das quais no antigo <Saláo Artístico>, do Parque Mayer, acompanhado por <Armandinho> e Georgino de Sousa, ao ìado de fadistas de nomeâda, como FiÌipe Pinto

(')

Falecido no Barreiro, a 26-VI-1968. 7 LO


FIGURAS E FACTOS

loi emytegaão d.e escritório clos C. F, S.5., clepois fiscal d.e ìrnpostos d.a C. M. B. e, pot fbn' esc,ritut ó,t io da Jtmta cle F'regue.sitt do Bo"rDomì,ngos Mat'ujo

,reiro,largos

(Catapirra)

onos, ãté aLoseu Íalecimento.

Nos oì1os d,e 3a, secì"etaTiou d Comissão Concel,hia d,a U. N, ilo BarreiÍl, d.a pTesidência do d,t'. Luís

dos S&ntog,

António

consencltlor do Registo Ciril local. Era unt bat"reirense ge,ralmente estrmulo, (Llegre e comxúúcatü)o (nas lnras

boas, como nos

horas mó's da sua titla) e 1mL anedotìst& da ,ra,r& c&tegori&. Cert6 aez, d1,por 1931?, n mo, noìte de denso netoeiÌo e no regresso de uma grawle

mãnif esfugão poLítica em

Lìsbo&, tete o bcnco da carreitrú de lançor ferro, apinh,odo de manìÍestúntes, perto iÌos 2 horas

aIcL maclrugtLtla por

não podeÌ'

aTronca/r o;s, su ool(ondo a tlouPgot' cis 7 horaa, qüanÍla o neroeiro

letantalt,

D OMIN GOS D OS S A N TOS MARUJO (1900-1968) (Yisto

Dor

Américo

Marinho,

em

Estação do Ba'rc'eiro. Pois du't'dn'te essos 5 11o1"a8,Dorúingos Mo,mtio, a' nosso Lado, cleu-se d. entreter d'ezen&a de passageitros (inclui,n<lo algu.rnos senho, as) co'ttu constdntes hìstórías lzumorístíc(B, entrem,eado,stle pó'rias imitações e ütos ile espírita' & tal pont! que nínguim di,recçõ,o à

ali, d.eu po,t'mal empregada essu madrugatTa pasaad& sobte os âguas do Teio' E nã,o Ío,rarro poúcds da pesso&s de clest&qle do nosso Dist'r'íío, entra os presentes, qLLe lhe testernunlLaramt clesde essú &Ltur&, um'a eslteciaL con' sidel'açãn. Jó, depoi,s d.os 50 Qnos, Damìngos Maruio esT)eritou a sua teia poétic(r', adorm.eci,ilad.esdeo tempo dú sua mocidarle boómìa e irrete. ente, tendo 'pub^ca(lo lìtumeroscLagazeti.IlTas,a nosso I)ed.ido, no iorna| O Barreüense e colaborado' poéticos, no JorrÌal do Battefua. DeixolL, a'ind&, d,epoi,s,com outras co'tìLpos7ções aLguns inéclì.tos, que nos confiou alguìÌL tempo aütes de loleceÌ^.

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DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCÂS e Gabriel Infante. Também, noutïa ocâsião, cantou com muito êxito em Faro, com Joaquim de Campos e Rosa Maria. MáscuÌa figura, de voz potente e bem timbrada, Francisco Bexiga, quando uma vez cantou no antigo Teatro-Cine Barreirense (então um grande salão de madeira...) com o popular cantador João Maria dos Anjos, numa festa em benefício de Joaquim <Pau Louro>, ouviu daquele consagÌado <astro> fadista pâlavras da maior admiração, que eram um incitamento para ele entrar no grupo dos profissionais cultivadores da popular canção.Mas Francisco Bexiga combatenteda 1.'Grande Guerra, nunca se desÌumbrou... não deixando de seguir apenas a sua vida de ferroviário, em que se aposentou, nã categoïia de chefe de depósito de máouinas. eÌn 1944.

Um competente guitarrista que, durante alguns anos, acompanhou muitos barreirenses cantadores do fado, foi Alberto Gualdino da Silva. Nascido no Barreiro, a 17-VIÌ-1894, fiÌho de Manuel Gualdino da Silva e de Maria da Luz, seguiu, como o pai (que foi um habilíssimo serralheiro das Oficinas Gelais dos C. F. S. S.) a vida ferroviária, também como operário, tendo chegado a torneiro de 1.' classe. Com muita vocaçãopara tocar instrumentos de corda, AÌberto Gualdino esmerou-seno bandolim (!), tocando, muito novo ainda, em baiÌes e retiros populares. E, apesar de não saber música, ele reproduzia, nesse instrumento, qualquer canção ou fado em r/oga, com extraordinária facilidade. Um dia, já aborrecido do bandoÌim, experimentou tocâï guitaïra e, com espÌêndidaadaptação, toraou-se em breve, um bom guitarrista. De feitio muito populaï, Alberto Gualdino ia a toda a parts aonde o chamavam, para acompanhar jovens cantadoresdo fado. Era seu companheiro, quâse sempre, urn competente violista, igualmente ferroviário e seu grande amigo, Manuel da Costa Mano, também do Barreiro, e recentementefalecido (a 21-I-1971).

(') O bandoÌim, ainda há uns quarellta anos, ela muito tocâdJ no BarÌeiÌo, não só por homens como tâmbém por senholâs, havendo quem ministrasse curso de licões desse instrumento. em casa. tÒ r


FIGURAS E FACTOS José da Siìva (José Estola), também outro ferroviário barreirense, foi mais um bom tocador de viola e de bandoÌim, que, com GuaÌdino, deu apreciadas sessõesde música de fado, nesta vila. AÌberto Gualdino morreu relativamente ïìovo, como o pai, vítima duma grave doença. Ainda outros músicos do fado, que nos cumpte igualmente citâr, embora mais ântigos, foram: Francìsco Blavo, caÌafate, e seu iÌmào João Bravo (CaldÌnhas), corticeiro, filhos do veÌho e há muito falecido gente do Barreiro, já de Joáo Bravo, que foi carpinteiro navaì-tudo outros tempos... O primeiro ela exímio em bândolim, e o segundo era um bom violista. Faziam parte, com outros, de umâ <estudantina>, que ensâiava numa modest:r câsa da Ruà do ConseÌheiroJoaquim Antónío de Aguiar. Nesse grupo ingressou, depois, João da Silva Júnior, (João Chitas), naturaÌ de Lisboa, mas barreirense de adopção que foi bandoÌinistamuito perfeito e que faÌeceria com 78 anos de idade em 1961, nesta viÌa (onde era proprietário) na categoria de contramestre, reformado, da C. P., depois de ter sido, durante anos, veleador municipaÌ.

Depois da saídà de António dos Santos Ginguinha, do Barleiro, e já muito dimiruída a intensa vida fadista que animava o restaurante da Recosta, de Francisco de OÌiveira - que foi o generoso protector da grande maioria dos cantadores e instlumentistas do Fado, que por esta vila pàssaram- ainda nas tabernas e casasde pasto da Rua MigueÌ Pais, até já depoìs de 1930, como também em mais outras casas da Rua do ConselheiroAguiar, da Rua Marquês de PombaÌ e do popular Largo das Obras, se continuou a entoar a cançáo, com certa flequência, por parte de diversos amadores, alguns dos quais autênticos estreantes que, em contacto com os capitosos sumos da uva, davam largas à sua aÌegria, experimentando as <habilidades>vocais>... Da maioria deies não ressumou, todâviâ, fama que ficasse perdurando... e com lazào. Houve, porém, na Rua Màïquês de PombaÌ n." 36, um fadista amador de categoria, Ricardo António Correia, falecido a 23-VII-1948, dono que foi duma afamada casa de vinhos, que ainda existe, mas já pertença de outros comerciantes.Ricardo Correia era também um verdadeiro apai152


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS xonado pelo Fado e pela guitârra, entoando a cânção com profundo sentimento. É curioso notar-se que o seu cuÌto pelo Fado se reproduziu em seü filho Fernando Correia, ferroviário, natural do Barreiro, como o pai, e que é actualmente um valoroso fadista, detentor de <carteira profissionaì> (").

Ainda da paÍte dos vultos populares, que se entretinham tangendo a guitarra e a viola, quase sempre ao gosto e a pedido dos cantadores, com uma interessante vocação musicaÌ que, se estimulada fosse, numa vida menos agitada do que aquela que vivam, seria susceptível de os elevar na categoria dos bons instrumentístas, houve dois irmãos, ambos motadores nz jâ citada Rua Miguel Pais, que não só deixaram no Barteiro e suas redondezas fama de homens capazes de medir suas forgas físicas com qualquer outro que os pretendesse enfrentar movido de propósitos menos cordiais... como âinda de apreciadosguitarrista, um deles, a n nrrtrn

v i n l i e fq

O primeiro foi João dos Santos Painço, e o segundo, mais velho do que ele, chamou-se Francisco Painço. João Painço, nascido no Barreiro, a 3 de Maio de 1901, foi carregâdor e fragateiro, trabaÌhando nos câis do Caminho de Fêrro e particulares desta vÌÌa, e quem o obser-vassebem, fora do ambiente fadista, não previa, por certo, que os seus dedos fortes e bem calejados, pareciam de cera, quando dedilhavam, maviosamente, as cordas da sua guitarra ! Tinha esse homem uma força muscular fora do vuÌgar, que, às vezes, exibia com orgulho, no que erâ quase sempre imitado pelo irmão'Chico. Que nos perdoem a derivação, por momentos, mas não resistimos a contar, a propósito, este episódio que nos foi narrado por pessoas que o presenciaram. Uma tez, João Painço prestou-se a esta <<simples>demonstração: agarrou num saco de trigo, com 75 quilogramas de cereal e pôìo às costas; depois, pegou a jeito em mais dois sacos, cada um com o mesmo peso, entalando-os, â b aço, à direita e à esquerda, contra o

( r ) V . ( O BA R R EIR O

C ON T EMP O R Â N E O-II> -C ap.

V II-p.

143.


FIGURÀSE FACTOS corpo. E aguentandoâssim, nâdâ menos de 225 quilogrâmâs, seguiu com eles, a <pranchear>,firme, até deitá-los para dentro duma fragata ! E não tomava fortificantes ! Francisco Painço, que tarn:bémse ocupavâ nos serviços de câis e marítimos, nascido no Barreilo, em 1898, era, como executante de instrumentos de corda, mais hábii a tocar vioÌa, embora tangessemenos mal, a guitari'a. Os dois irmáos completavam-sedeste modo, no tradicionaì aeompanhamentomusicàl do Fado, fazendo-se ouvìr, muitas horas da noite, nas taberlas e casas de comidzrsda Rua Miguel Pars. Francisco e João Painço morïêram ambos muito novos ainda. O primeiro faÌeceu nestâ vila, com 36 anos de idade, a 22 de Dezembro de 1934. Seu irmão João, já falecera seis anos antes: a 28 de Agosto de 1928, finara-se em Lisboa, contando apenas 27 anos, sendo sepultado no Cemitério do AÌto de S. João.

Um outro instrumentista do fado, que viveu alguns anos no Barreiro e se tornou um portento a tocrìr guitârra, foi RauÌ Gil. prodígio>, do céÌebreLuís <PeFora discípulo, considerado<<menino trolino>. Nascera em Lisboa, segundo nos informaram, e era, por parte de seu pai, que foi ensaiador da antiga Estudantina do Largo das Obras ('), aparentado com Ricardo Correia. Não só tocava maraviÌhosameïÌte,como também compunha fados, um dos quais o <Fado Vitória>, que concebeuem Setúbal, na sede do clube desportivo daquele nome, e que foi depois registado por outro autor. O <viola> que o acompanhoumuito tempo, cerca de doze anos, era o barreirense António José Cordeiro (António Filipe), popular amador dramático local, em cujo dÕmicíÌio aquele guitarrista viveu três anos.

(') Esta Estudântina, grupo musical e recteativo, funcionava no prédio de Àntónio Maria César (Antónìo Matrìo das Obras). Nos baixos do edifício estavâ instalada uma espaçosaadega (é actúâlmente uma casa de vinhos e poucos petiscos...), onde também se cantou o Fado. Ali perto do populâr L{Lrga d(Ls Oórds, nã. então (actuâl Rua CâmiÌo CâsteÌo Branco), também se caDtava denominada Rua. FeüeÌ o Fâdo nâ T(LbenLa,do Sat'agaço.

15 tr.


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS RaúÌ Gil era muito conhecido e apreciado em Lisboa e em todo o Ribatejo, mas confessava possuir uma afeição especial pelo Barreiro, onde, uma vez, na câsa de Jod,o da tr/iola, interpretou as <Czardas> de Monti, mantendo um copo de vinho em equiìíbrio, na escala da guitarra ! A 21 de Agosto de 1927, um domingo, uma comissão de amigos do Barreiro, promoveuìhe uma festa de homenagem - <GrancÌiosoConcílio Poético>, dizia o program.r, nem mais nem menos!... - que deconeu no n." 48 da Rua Miguel Pais, um armazém que era então de Manueì Joaquim Barreiros Galé, onde se ouviram canções de Filipe Pinto, Joaquim Viegas, Carlos Freire, Artur Azevedo e anuel da Fonseca. O abuso do álcool acabou por arruinar Raul Gil, que levava uma intensa vida de boémia, chegando, por fim, a pedir dinheiro, a bem dizer de porta em porta, para se poder sustentar, até que um dia, há já anos, âpaïeceu morto, por doença, numa rua do Montijo.

Propositadamente não deixámos seleccio'nadosnesta longa citação os muitos indivíduos que no Barreiro cultivaram as serenatas e outros que tânto gosto revelaram pela causa fadista (cantadoïes, poetas, instrunrentistas e seus companheiros mais assíduos), os quâis ficaram indissolü-zelmente Ìigados à passada vida boémia da nossa vila, embora, como é natural, os grupos que constituíam, tivessem afinidades próprias. Entendemos que, apesar de muitos dos seus componenres f,erem aÌcançado, com o decorrer da existência, notória diferenciação sociaÌ, esta não nos otrrigava â tâÌ destïinça que, de certa forma afectaria a sua invocação em conjunto. Dada esta voìuntária explicação, vâmos prosseguir as presentes notas, citando mais aÌguns nomes de músicos do fado, estes mais modernos, mais do nosso tempo: José Fernandes Bravo, nascido no Barreito, â 22-I-1914, um notável <vioÌa>, concertista, cujos pl.ogressos se foïam acentuando de ano para ano; Ftancisco Ferreira (mais conhecido por <Oliveira>, por ter sido aíilhado de Francisco de Oliveira), que foi um bom tocador, tanto de guitarra, como de viola (faleceu em 11-X-1965, em Lisboa) e Giì Ferreira, um comperenre bandolinista, antigo basquetebolista do Futebol Clube Barreirense campeão de Lisboa da modalidade.


E FACTOS FIGUR.A.S A estes dois últimos, irmáos, juntamos um terceiro, Rui Fêrreirâ, todos eles barreirenses e filhos de Augusto Ferreira, que foi, como já dissémos, o grande amigo e o anfitrião do <Almandinho>, quando ele frequentou o Barreiro. Rui Feneira, ferroviário, já aposentado, e cornerciante, foi outra figura principal dos grupos de cantadores de serenatas da nossa viÌa, pois era possuidor de uma melodìosa voz que, no entanto, nunca pretendeu cuÌtivar, a qual, mesmo assim, tão apreciada era quando cantava o <Bailado das Horâs>, da <Giconda>, uma <Romanza>, da <.Toscâ>ou a <<Cavatina>, do Barbeiro de SeviÌla>, de volta dos baiÌes campestres... Nos anos 30, o Fado experimentou mais uma assinalada expansão no Barreiro.

V-MAIS RECENTEMENTE... - O{JTROS FADISTAS E POETAS DO FADO. - CITAM-SE VÁRIOS LOCAIS ONDE SE CULTIVOU A POPULAR CANÇÃO (E SE PRATICOU TAMBÉM O JOGO DO PAU...) -E TERMINA-SE COM <OS MARIALVAS> No próprio ano de 1930, a 4 de Setembro, recordamos que, na então Praça da RepúbÌica (actuaÌ Praça de Santa Cïuz), o comercianteMário Rodrigues Solano, o <Lá-Vai>, de quem faÌamos noutro luga-r, inaugurava a sua E splctnada Paris, corr. um um certame de fados ao âr livre, cantados, entre outros por José Rocha e Fernando Santos. Na Rua MigueÌ Bombarda (actual Rua D. Manuel I), onde actualmente se encontra um estabelecimentode artigos de vime (cestaria), com o n.o 81, esteve instalado, de 1930 a 1933, um Café de fados, montado por José João Nunes Gândar (Joã,o do Restatnante), e por um seu familiar, onde, aos sábâdos, domingos e quartas-feiras, se trinâva a guitarra, sobre um pequeno estrado (algumâs vezes tocadâ por RauÌ GiÌ), acompanhando amadores e profissionais da Canção Nacional. Lâ cantaram, entre outros, Domingos Silva (1), futuro .<encartado>,e um filho

-I

(') Já especialmente ciiado em <O BARREIRO CONTEMPORÂNEO - IL Parte-Cap. \I-Factas e F'ígtLt,as .la Vida Artística e Recreatilttl alo Bar-

too


DO BARREÌRODE VÁRIAS ÉPOCAS do dono da casa, José Gândar, há uma vintena de anos ausente no Brasil. J oet"oiLo Restaurante, comerciante e proprietário no Barreiro e pai de numerosa prole, era espanhoÌ, natural de Pontevedra (GaÌiza), mas sua mulher ela portuguesa, de Santiago do Cacém, tendo sido tamtÉm o dono de uma afreguesâdacasa de vinhos e comidas junto à passagem de nível do primitivo Barreiro-A, que ele mandou ampliar para 1.' andar' (para sua habitaçáo) e àguas fuúadas. (O estabeÌecimentocomerciaÌ já pertence a outtos donos, sendo hoje ainda uma casa de vinhos a retalho). João d,o Restauralxte, homem muito activo e popuÌar, em especial no meio ferroviário, em que tinha vasta cÌienteÌa,faleceu nesta vila, com 60 anos de idade, a 6-V-1933. O seu Café de fados acabou Ìrol essa aÌtura.

Em 1931, na noite de 1de Agosto, o <SoÌal dos Pacatos>,na Rua da Recosta, próximo do Quarteì dos Bombeiros YoÌuntários do Sul e Sueste, quebravà a sua pacatez (muito teórica...), organizando uma grande Fesútr,do Fctdo, dedicada ao poeta popular António Augusto Santos, o qual era então ena.Ìtecido <pela brilhante carreira que vinha marcando no meio fadista>. António Augusto Santos, que vive em Faro desde 1944 e que tem sido um barreirense consta-nte enaltecedor da sua terra, a qual visita amiúde, merece-nos,peÌâ sua operosidadeno jornaÌismo, peìos seus trabatem lhos tócnicos e literários (ele que-com orgulho o pode dizerl-só a 4.' classe da veÌha Escoìa Conde de Ferreira, do Barreiro) uma teferência mais alongada nestas notas evocativas. Nascido nesta vila, a 2-IV-1905, na Rua Serpa Pinto, n.' 17, entïou para o serviço dos C. F. do Sul e Sueste a 26-II-1919, aposentando-se em 1965, com quarenta e seis anos e três meses de profícua actividade profissionaÌ. Começou a escïever aos 25 anos, aÌtura em que se descobriu como versejador... Para Domingos SiÌva e outros vários cantadores e canta-


FIGURÀS E FACTOS deiras do Barreiro e de Lisboa, escreveu nada menos de 73 letras I Em 1932 fundou, como já referimos noutro lugar, (') o jornal O Btneiro. Lança-se, entretanto, noutras modalidades de poesia,.Escreve poesia infantil (1.' menção honrosa da Emissora Nacional, em 1938); poesia Ìírica (menção honrosa no Ateneu ComerciaÌ de Lisboa, em 1943); poesia heróica; quâdra (menção honrosa do D,[drì,o tle Lisboo,, na <Canqão da Uva e do Vinho>); e pratica a modaìidade de soneto (menção honrosa de dìstìnção nos <Jogos Acelistas>, de Lisboa), etc. Em 1937/38, era um dos pfimeiros autores representadosem teatro radiofónico, na Rádio Peninsular, quando este posto foi inaugurado. Colabora também na imprensa do Algarve, sendo há já anos colaborad.ot: d.o Jorna\ do Barreiro. Vem, ainda, pubÌicando obras, não só de carâcter profissional, mas também de índoìe desportiva, bem como peças de teatro. (') Pois grande festa foi essa,no <Solar dos Pacatos>,que o já falecido Luís Costa, outro barreirense (e um caçador entusiasta) que também escreveu letras para o Fado, dirigiu com muito acerto. Nela tomaram parte cerca de vinte cantadores, entre os quais Artur Caselas,um ás do fado corrido, que passou por rival do grande Ginguinha. A festança em honra de António Augusto Santos teve, depois, como ponto culminante, um Conctuso d,e Fado Comüo, apreciado por um júri de que Manuel dos Santos César, João Azevedo do Carmo e AníbaÌ Pereira Fernandes eïam os componentes.

(') V. (O BARREIRO CONTEMPORÂNEO -II)-ÌV Patte-A Impretsa do Be.rrei'ro (7921 -1967\. (') Anotâm0s as 5eguintes publicações de .A.ntónio Augusto Santosi (Rede Geral)), (Matedal e Tracçáo>, (Pontos de Exame)), (A Locomotivâ a Va,por>, <Curso Diesel de EÌectricidader, (Dicionário de Problemas> (assunto de instrução profissional); ((Regras de Futebol pelâ Imâgemn (âs pÌimeirâs pubÌicadas em Portugal, em O Not'te Desportho, em 32 números, com desenhos do arquitecto Sâmpaio e que mereceram paÌavras de louvor de Otto GlóÌiâ, de Joaquim Alves Teixeira e do malogrado dr, Tavares da Silva); <<Benfica-Sporting>>,<<Vilhenasr>,<<A Casa dos Rapazes de Faror, (RoteiÌo de laro)r; (Portugal FerroviárioD, mapa dos Caminhos de Fearo (1953). Parâ teatro escreveu ainda: (Porto-Benfica>, (1047)), (Um caso sér'ior>,<<Filhos>, ((Mercado NegroD, <Ninon>, <Um génioD, (D. Juan>, <<Milionários>>, <Cornódia Íntima>, <<Comédiada Vidâ)), (SoÌ de Inverno)) e (Drâmâ Antigo)), êstês dois últimos em verso aÌexandrino. Em 1969 tinha paÌâ pubÌicação ((Mâpã FerÌoviário de Angola e MiçambiqrÌel).

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DO BARREIRO DE VÁRÌAS ÉPOCAS

A:inda por essa época,os serõesfadistas em que Francisco Ferreira (OÌiveira) e José Grave, guitarristas, e José Bravo e GiÌ Ferreira, violistas, repetidamente se exibiam - marcando já excelente presença o caltador Domingos Silva - iam conquistando novos locais de exibição, que eram quase sempre saÌas cheiâs, até espÌanadase simples <retiros> em que se transformavam aÌguns quintais... Recordamos que até no vasto saìão dos Adueilos (Grupo 41) da Rua MigueÌ Pais se cantou o fado em 1932; no Café Recreio Moderno, mais conhecidopor Café do Daniel (O Rei rkt Cerceja) - o já falecido Daniel IgÌésias- , estabeÌecimento situado na Rua Dr Eusétrio Leão, onde hoje existe o Café Central, se reâlizaram (desde os anos 20) festas de fados, uma das quais de maior audiência, como foi a que decorreu, na esplanada, em 7 de Maio de 1933, dedicadaao cantador Alfredo dos Santos (Correeiro) Outros certames de fados, peÌos anos de 1934 a 1938, a,proximadamente, decorreram no quintal de Pedro Seaero (') â sul dâ antiga Rua Miguel Bombarda, sendo, algumas vezes, intervaladas as audições de fados com sessõesde Jogo de Pau, dirigidas peÌos Domingos Miguel, de AÌmada, e João Lavrador, com António Caçador, GuiÌherme Tanganho e outros. AÌi cantaram, entre muitos outros fadistas, o setubalenseLeontino Bonacho, José Rocha, Eugénio Maurício, a cantadeira Maria do Carmo Torres, bem como tangeu a guitarra, com virtuosismos, o muito apreciado Militão Hilário. Citamos ainda outros locais em que, por essa época, se cuÌtivava aqui a populalOanção Nacional: o quintal de José Chora-hoje um páteo, com várias habitações-12 fty2 1.. de Maio (Bairrs das Palmeiras), onde uma comissão de amigos da Troaa .Lzsa organizou concorridas sessõesde Fado c Poesia. Ainda noutr.o local, ali bem perto, na casa de vinhos de Joã.oda Violo,,na Trav. das Palmeiras, com frente para a Rua 31 de Janeiro, se organizaram muitas sessõesfadistas e se (') José Pedro dos Santos (Pedra Serero), que entrarâ, aos 1? anos, pâra servente dâs Oficinas Gerais dos C. F. S. S. no Barreiro, eÌa natuÌâl da freguesia de Pâlhâis, deste concelho. Foi um hábil operário e, mais tarde, industÌial metalúrgico, fundadoÌ dumâ importânte oficina, nesta vila, que dirigiu quase até ao fim da sua diÌatada vìda e é hoje continuada poÌ seus filhos. Nascido a 14-I-IBI7, Pedro Severo falecsu, com 89 anos de idade, no BarreiÌo. a 5-IÌ-I96b.

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FIGURAS E Í'ACTOS

apresentâ1'am,até, novos fados, com larga assistência de apleciadores desta canção. Ainda no quintaÌ de António Serrano (do seu estabelecimentodenominado tr'lor d.o Alto dos Silt:ei,ros, no bairro do mesmo nome) se organizaram muitas tardes de Fado, aí por 1936-38. Tanto neste Ìocal como no pátio de José Chora, também se efectuavam demonstrações de Jogo de Pau. Outro quintal onde se cantou o Fado e se exibiram amadores e mestres daquele jogo, foi o de Luís Pinto Brandão, industrial corticeiro, situado na Rua José EÌias Garcia, de que recordamos o <Grande Certamen> (de Fado e Jogo de Pau) ali organizado em 9 de Maio de 1937. E assim se entretinham os ócios de domingo... Hoje, abala-se de automóvel para fora da terra, e ainda se diz mal...

Quanto a novos fadistas barreirenses, eles iam sempre aparecendo, em quase todos estes locais. Além dos já citados, recordamos Sebastião Pires (nascido nesta vila, a 3-VI-1921) que se estreou num <retiro> da Rua 1.' de Maio, em 1933, sendo possuidor de carteira profissionaÌ desde 1938 ('); José Luís da Costa, ferroviário, filho do já citado Luís da Costa; Armando Baptista, outro felroviário; Manuel Joaquim Lopes, já falecido; e EstanisÌau Domingos, corticeilo, já reformado, resìdente no Lavradio. Com quase todos estes fadistas se exibiu, em muitas fesias, um duo <guitarra-viola> que era constituído, respectivamente, por MiÌitão Hilário e José Jacinto (Pa"starelo), ambos residentes nesta vila. Eram sempre sucesso. Um outro fadista barreirense, de reais qualidatles, mas amador (com uma interpretação muito parecida com a de Fêrnando Farinha), foi Fernando Macedo, nascido a 30-VI-1930. Em festas de beneficência locaìs e em Lisboa, em colectividades de recreio, foi ouvido sempre com muito agrado. f empregado de restaurante e chegou a actuâr na antiga Casa Típica <Fiesta> (actual Café-Restaurante<FaroÌ>), na Rua D. Manuel I, desta vila. (')

É actualnente empregado da C. M. B.

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DO BARREiRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

Em Outubro de 1945 - para concluirmos estas já largas referênfundaram alguns ailmiradores do Fado, no logradouro do précias...dio com os n."' 36 a 38-A da Rua Júlio Dinis (Bairro da Quinta Grande) o Grupo <Os Marialvas>. A casa era (e é ainda) um estabelecimento de vìnhos e petiscos, propriedade de Bernardo Martins, ferroviário aposentado, natural de Freixo, freguesia de Serralves (S' Pedro do SuÌ), o qual se tornou, desde logo, destacado protector do grupo, que teve, entÌe outros fundadores mais entusiastas (o núcleo iniciaÌ foi de 25), António José Teixeira, condutor dos C. F. e Carlos Francisco Ribeiro da Siìva, mestre de obras da C. M. 8., ambos já aposentados das suas actividàdes, bem como ainda: Arnaldo Romano, Cãrlos Correia, António Miranda' João Gonçalves e Joaquim Gonçalves, Manuel Vieira, Mário Rocha, Joaquim Domingos, António Machado, Manuel Rosa, António Barradas, Alfredo Matias, António Vinhais e José Pessoa. Foram tamMm dedicados <mariaÌvas> (eìenco artístico do grupo): Militão Hiìário e seu filho Armando Hilário, instrumentistas e os cantadores Ìocais Domingos SiÌva, Ramos Prog?esso, José Pires, Fernando Coneia e Sebastião Pires. De Lisboa, também algumas cantadeiras actuaram aìi em várias festas, fazendo <Os Marialvas> revertet, todos os anos, o produto líquido das suas organizações (rifas, etc.) para vestir e caÌçar, pelo Natal, dez crianças pobres, e para donativos às instituições de beneficência locais e aos jotnais Diirio d,eNotício^s, O Século e Jornnl d,o Barreiro com destino aos pobres seus protegidos' O grupo chegou a ser visitado e felicitado pelos antigos presidentes da C' M. B. Joaquim Josó Fernandes e Manuel da Costa Figueira' Foi já em 196? que <Os MariaÌvas> se extinguiram, sendo arrendatário da casa Manuel Francisco, natural do conceÌho de Arganil, com o qual, aliás, ainda eles 1á estiveram instaÌados cerca seis anos. os sócios do gtupo usavam emblema próprio: uma guitaïra de prata.

Náo temos a pretenção de considerar esgotado tudo quanto seria interessante registar sobre este assunto e que diz respeito a uma dìstracção tão atraente ao povo trabalhador - como ó cantar ou ouvir o 161


FIGURAS E FACTOS Fado - num meio opelário, como o do Barreiro. Observa-se,contudo, nestes últimos anos, que os modernos meios mecânicos de música, espalhados hoje, desde os lugares públicos às casas palticuÌares, têm contribuído imenso para irem enÍraquecendo e dispersando os grupos de <caroÌas> que organizavam as sessõesfadistas e outras reuniões desse género. Esses meios, sem mâis macadas, Ihes proporcionam os passatempos â seu gosto... e menos tentações de outros gastos a que o mais intenso convívio sociaÌ costuma conduziï... Os antigos <retiros> já acabaram; algum mais moderno que, porventura, exista neste imenso Barreiro, co,claaez mais subúrbio de Lisboa, ainda não tem história bastante... Fiquemos enlão pot aqui.

BARREIRO EM MARCHA... A VILA-INDUSTRIAL CANTADA EM VERSO Principalmente entre os anos de 1940 e 1950, a mocidade do Barreiro (elementos das cÌasses operárias e das profissões Ìiberais) orgânizou âqui diversas <<marchas>>, tanto por bairros, como por colectividades, na esteira e sob a influência das <marchas> integradas nas festas de Lisboa, por ocasião dos Santos Fopulares. Entre nós, a moda pegou, até, nos grupos excursionistas ! A música era escolhida entre âs mais popuÌarizadas da época, mas com a letra feita a catacter, para ela. Um dos grupos excursionistas mais activos, por esse tempo, foi o que teve a sua sede no Largo das Obras, n." 7. A 27 de Julho de 1941, no passeio organizado à região de Alcobaça e ao Ribatejo, estreia a sua <<mârchâ>,com a música do filme Marim Papoi,la, sendo a Ìetra de José Rosa Figueiredo (1), então com 19 anos de idade, o qual não podia deixar

(') José Rosa Figueiredo nasceu no Barreiro, a 26-Xï-7922, Tendo trabalhado, algìrÌIs anos, na C. U. F., é actuaÌmente operário metalo-mecânico da Siderurgiâ Nacional, residindo na Baixa da Banheira, onde foi director da Delegação locaÌ do F. C. Barreirense. DiligeÌlte e estudioso, tem colaboratìo (em pÌosa e verso) em vários jornãis regionais e publicou os n.o' 1 e 2 do jornal A B.Li$a d.a Bamh,eira.

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DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS de imprimir aos seus versos as características que mais especiâlizam esta vila industrial. Alguns anos mais tarde, na excursão desse grupo organizada em 1955, ao Douro e ao Minho, Rosa Figueiredo é convidado â escrever a letra para a <<marchâ>que seria cantada peìos seus amigos através do País, com a música da sempre linda <marcha> Ld, uai Lìsboa, de Raul Ferrão (1890.1953). Retomando o tema daqueles seus pïimeiros versos, escreveu ele nova Ìetra que voltou a ser impressa num folheto de 4 págs. e distribuída por onde o grupo passava de autocarro. E assim se fazia, no decurso de a.gradáveis momentos a propaganda desta desta nossa terra, que recebe francamente todas as pessoas que entram no seu seio, em breve gratas pelos meios de vida que nela encontraram e seduzidas peÌa simpática convivência social ( entre pessoas, famílias e colectividades) que é timbre da sua popuÌação. Eis a letra cantada com a popuÌar música: O BarreÌro nossa tema muito amad,a, É modestc, mas é li,rula, Pelo Tejo pregui,çoso elo, é banllotla, Que a tomo mais bela ainda; Na "-erd,ad,e rtã,o é um centro turísta, Mas é qua,seum d,esafì,o, A tud,o o que d,e belo eni,sta, O que hd desde a Bela Vista À prcúa clo Laararlio. Refrain Este Barreiro Modesto corlL certeza Seotrabalhoérí.queza Estd at o seu aalor;

Dedicado colectivista, foi o criador das bibliotecas do Clube União BânheiÌense e do Ginásio Atlético Clube da Baixa da Banheira, devendo-se-lhe meÌitória âctuâção nos grupos cénicos da localidade c,nde reside, cuja (marchâ> popular é também cantada com versos seus.

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FIGURAS E FACTOS

E ste Barre'iro Ndn se pod,e igualar, É uma tema sem, pa,r Porque é um híno ao labor. Tem por museus oficinos rna'gestoscLs, Fumegantes chaminés São,nesta terxL 0.s está'tuas portentosas Que a enchem de Iés ct Iés. E a sinfonin lí o' martelar Que d,uromte Soa e faz ilo A CAPITAL

rleste mundo obreiro d,o mo,Iho, o tl,ia i,nteiro Ba,rceiro DO TRABALHO!

MAIS OUTRA CANÇÃO QUE NÃO FOGE AO TEMA CARACTERÍSTICODO BARREIRO Conção <Alfredo d'a Si.lna> (1939) O exemplar da folha impressa, que possuímos, tem a data, manuscrita, de 19-fV-1939. A seguir ao título acima lê-se: <Música e L€tra de José de Araújo>. Versos e música eram destinados a ser ouvidos no acto inaugural do busto de Alfredo da Silva, mas ainda em vida deste, o que, como já descrevemos('), não foi possível promover. - O auton, natural de Guimarães, era entãq operário d.a Zona Têxtil (Fiação de Juta) da C. U. F., te,ndo sido filarmónico da banda de música da ex-Liga de Instrução e Recreio CUF.

(') V. (O BARREIRO CONTEMPORÂNEO)) -II-II Pgs. 260 e 261. ro4

Parte- Cap. ÌX-


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

Eis os versos: I Braço uno, ind,i'ai,síuel, Bra,ço forte, jurewil, Saída o 'ínesquecíuel Patrã,o d,o, UniÃ,o Fabril.

VI

ÌI

O üa por nós escolhüo Para o,qui uos uir sau.d,ar, De nós nã..oseró, esquecitlo, Nãn o porÌe'is oloülar.

Do esfo,rgo e boa aontal,e Com que nos guia e conduz Eis u 'prota rlo" aercla.d,e, Por nós posta à plena luz.

VII

III Dos eremplos que nos d,ú De honrarlez e rect'íd,õ,o O ftuto pcttente está,: ELe,nóseaUniã,o.

Sua oid,a comeu f rigo Num períoclo srmguinálio, Por ì,sso tem um ami4o Si,ncero em cada operó,rio.

IV

VIII

Com a nossa gratil,ão Potle, pois, sempre contar; Se sabe ser bom patrã,o, Nós sabemos trabalhar.

Vòaerá eternam.ercte Fara a nossa gratil,ã,o, Quem é rico, inteli,gente, E sabe ser bom patrã,o. IX

Disposto a ob'decer De alma f orte e coraçõ,o, Cumpre sempre o seu deoer, Segue o eremplo do, Patrão.

Quem exemplos rÌestes chí, Tem o respeito deuido', Por quem a saurlá-lo está Após o tleuer cumprid,o.. -

Embora desconhecendo a música da canção, queremos crer que o seus âutor terá sìdo melhor executante que poeta. Mas salva-se dos seus vêrsos a singela intenção que os ditou, inspirada n6 conceito geral - lo t


ì

FIGURAS E FACTOS em que Alfredo da Silva era tido pelos seus servidores - dos mais categorizados aos mais humildes - e esse é o que desejamos recordar através deste eiemplo de homenagem popular.

A MARCHA DOS BALÕES (2z-VIII-1946) (últì,mo d,i,adas f esttts d.e N.^ Senhortt d'o Rosdrio, desse ano) Foi esta marcha oferecida por Jerónimo M. S. Paiva, otganizada peÌo proprietário da uCasa Azuì>, do Barreiro e abrilhantada pelo Conjunto Musical do Grupo 31 de Janeiro. Era composta de 15 meninas e outros tantos rapazes, tendo sido premiados os pares que conduziam os mais bonitos baiões. Era cantada eom os seguintes versos: Salaé oi,Ia do Bamei'ro,' Grand,e e nobre no lnbor; Beija-te o Tejo fagueiro, Tudo em tí é paa e amor. T ens os f a,rlo,se os canções, Os bailes e gütarrol'as; Tens o, marchn dos balões De gentes entusilsnwl'as ! .. .

Ma,rcha d,os balões, Alegre e taful, Vem dos corações Vem d,a Cs,sa AzuL!

E lú aaÌ. a Casa AzuI, A dnr oid,a à, rornaria, Num brilltantismo taful' Dumn tet"ra d,'al,egria.

É tud,o alegrin À luz d.os bqlões! Ronda d,e f oli,a, Sol, d,os corações! Barreiro ! Barreiro ! Bri,Lha conzo orualho! Barre'íro ! Ba,mei.ro! ALMA DO TRABALHO!

Por tós! Por nós! Amo,r! Vig or ! 166


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS flma referência sobre o autor destes versos: Jerónimo Marciano da Silveira Paiva, antigo sargento do Exército, natural de EÌvas (N. a 20-V-1879). Em período negro da sua vidà (1912-13), foi secretário da Câmala MunicipaÌ do Barreiro. Admitido âo serviço dos Caminhos de Ferro do Estado, foi empregado principaÌ do Serviço de Via e Obras (Direcção do Sul e Sueste), tlansitando, mais tarde, païa a C. P. Em 1932 aposentou-se.CuÌtivando os âssuntos literários, Jerónimo Paiva chegou a publicar vários livros de prosa e uma peqâ de teatro, interessando-setambém peÌa poesia. Dirigiu vários jornais locais (V. <O BARREIRO ANTIGO E MODERNO> - I Parte - Cap. XLI), tendo sido, nos primeiros anos do regime republicâno, o correspondente, no Barreiro, do jornal RepúbLìca, fundado pelo dr. António José de Almeida. Em 1912 foi ele quem saudou, em nomes dos habitantes desta vila, o fundador da República, Machado Santos, quando este visitou aqui, o Centro Escolar Republicano dr. Estêvão de Vasconcelos. Jerónimo Paiva passou uma vida sociaì difícil na época da maior agitação sindical dos ferroviários do SuÌ e Sueste.Mais tarde, na vigência do Estado Novo, trabaÌhou na sede do S. N. dos Ferroviários do Sul de Portugal (Pesso:rl do Movimento, Tracção, Via e Oblas e Serviços Regionais), onde dirigiu a respectivâ Secretaria. Faleceu no Barreiro, a 22 de Setembro de 1950, tendo sido sepultado no Cemitério do Lavradio, em cujo mausoléu se gravou Ìegenda (da autoria do seu amigo e probo ìnvestigador histórico Júlio de Sousa e Costa, também já falecido), donde consta que foi: <(...) E scritor, Republí.camo,um perseguír).oque sòmente pela morte foi uenci,clo>. NOTA - Jerónimo Paiva, que foi assíduo colaborador da Gazeta do SuL, do Montijo, deixou as seguintes obras publicadas: Ca'tas Crué'ts (Crítica político-sociaÌ ) , 1925; Do ALto Alentejo (Regionâlismo), 1927; Garra Ertremisúa (Patologia SociaÌ), 1933; Do Meu Alentejo (Novela, 1.' prémio em Concutso Literário Regional), 1938; Aí rem a Guema,! (Crítica Geral), 1939; Em plena Aldeia (RegionaÌismo), L940; Caminhct Noao? (Peça TeatraÌ, em 1 âcto), 1942.

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FIGURAS E FACTOS

MÁRIO RODRIGUES SOLANO, O <I,Á.VAI> UMA FIGURA POPULAR DO COMÉRCIO LOCAL plograma da Era este o proprietário cla u'Casa Azul>, citado no generis> uma cita<sui <<Marchados Balões>. Merece-nos a sua figura çáo mais dilatada. de Mário Solano era naturaÌ de Alegrete, freguesia do concelho já passante Foi 11-XII-1890' a mundo ao Portalegre, tendo vindo ali de 1915' rlos vinte ânos que veio para o Barreiro' A 27 de Setembro <Chic> na l'eitaria mesa começou aqui a trabalhar, como empregado de a Casal) (já po" ,tãs mencionada no capítulo dedicado ao Largo do ' tlata, abria ao público, ocupando o lugar- duma casa de habiio"t'n"..r anos se contaçáo que anteriormente ali havia' Apenas cerca de dols de juta' na fábrica F', para a U 'C' .".,rou ìli, indo em 1918, trabaÌhar Mundial) período I Guerra da Mas a juta um dia faltou (estava-seno <prega> com Companhia' daquela encarregacÌo-geral o e João SiÌva, que o seu corpo Mário Solano nos adubos, a cârÍegâr sacos, irabalho Ìogo a seguir emMas E despediu-se' franzino náo aguentou, é claro. mol'Ìtâïa Matias que Luís Correia prêgou-se como caixeiro na metcearia já <ChapeÌaria antiga hoje ond-u, uno. clepois, se havia de instalar a Aguiar' Entretanto Rua na por Gaspar, Manuel Gaspar>, fundada pouco tempo' poÏque em tudo Isto famílit eie casara e constituíra Solano o sez logo em 1919, na mesma rua' no n'" 214' abria Mário primeiro deste o de Ouro>' pr'imeiro estabelecimento de café: o <Chave um ali reunir-se iome, portanto, na viÌa do Barreiro' Começoudepois a poesia grupo de rapâzes com vincadas tendências literárias, cultivando a animava ã a-nov"Ìa, ciiscutintlolivros e autores e Mário Solano também tendo bagaceira' de e copinhos os diáÌogos literários, por entre cafés <Lá Vai>' de aìcunha sido aqúÌe ambiente que lhe provocaria a julgado' por Esse epíteto não lhe foi aplicado, porém, como se terá mais apressados Ìhe ser hábito dirigir tal expressão aos seus fregueses' Mário Solano' que origem' outra teve em serem atendidos... O caso palco' numa festâ ao recitar dia, apreciava a tlecÌamaçáo, foi aqui, um que quer fosse ") onde (ãt" aliás, duma totaÌ descontracção a falar que era umâ ".", poesia A rLançad'o Vento, de Afonso Lopes Vieira' a linda de glória tlo ínolvidável actor Augusto Rosa' Ora é dessa das prof+ "o"áa. poesia a expressáo <E ld rai'.. , Ló' aai""> que, repetidas vezes 168


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS ïida pelo declamador, com gestos largos e românticos (amadorìsticamente exagerados...), caiu no <gôto> da assìstência,e daí o ter ficado conhecido pelo <Lá Vai>, aÌcunha que não mais o Ìargaria até ao fim da vida e que ele próprio adoptou, mencionando-adepois nos pÌospectos de propaganda das suas iniciativas e nos reclames das suas casas comerciais. Encerrando o Café <Chave de Ouro> (casa onde surgiu a ideia e foi preparada a publicação do mensário literário Gente Moça (1923), (') com Jorge Teixeira, Jorge Soares e outros), Mário Soìano abriu, depois, uma outra casa, do mesmo ramo, na Praça de Santa Cruz, n." 28, o Paris>), que abriu a 1 de Janeiro de Café <Paris> (mais tarde <<Casa 1930. A seguir, conservando ainda esta casâ, abriu em 1 de Setembro de 1939 (dia em que tiveram início as hostiìidadesque haviam de conduzir à II Guerra Mundial) a <Casa Azul), na Rua dr. Eusébio Leáo, esquinando, a Nascente, para a Rua dr. Câmara Pestana. Ern Junho de 1962, trespassouesta casa e abria <A Mascote>,no n." 131-A da Rua D. ManueÌ I, em edifício de esquina para a Rua João de Deus. Em 1968, trespassou também este estabeÌecimento, voÌtando para o da Praça de Santa Cruz, cuja casa havia passado,em 1943, para a propriedade de sua irmã, D. MatiÌde Ramalhete Solano, em cuja companhia ele vivia ültimamente, aí falecendo a 27 de Janeiro de 1970, quando descansava da sua labuta da parte da manhã, pelas ruas do Barreiro, na venda dos bolos de seu fabrico e também (como distracção...) de lotaria (ostentando uma boneca-a sua <Chica>-que lhe dava sorte, como ele pregada dizia, do lado esquerdo do casaco). Conforme as disposições que deixou escritas, Mário Solano foi sepuÌtado em Portalegre.

Foi este comerciante Ìocal um incansável trabalhador. Numa época em que, para o comércio de boÌos e outros plodutos de confeitaria, tudo era preciso vir de Lisboa (até o geìo, para refrescar as bebidas!) era

(') V. (O BARREIRO ANTIGO E MODERNO))- Ì PaÌtê 'rOs lornais e Rea^istasBarreirenses,

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YÌ Ì -


FÌGURAS E FACTOS ele que quâse tudo Ìá ia buscar, vendendo aqui os produtos dos melhores fabricantes da capitaÌ. Depois... tudo foi mudando. Apareceu a concorrência da produção Ìocal (na doçaria), que Mário SoÌano não podia acompanhat. Começou então a fabricar ele próprio certos bolos, que considerava especialidadesda casa (dentre os quais os seus ,<moreninhos> eram bastante apreciados...). Todos os estabeÌecìmentosque eÌe possuru (com excepçáo do <Chave de Ouro>) tinham, contudo, uma clientela própria, mais assídua do que em qualquer outra parte: eram os jovens, buliçosos, barulhentos pôr vezes, chegando a irritar o dono da casa que, em certas ocasiões, quando excediam os limites da compostura, tinha de gritar mais do que eÌes para os pôr na rua... Armários e montras dos seus estabelecimentos eram um tazoâyel amontoado dos mais variados produtos do seu comércio, por entre uma colorida floresta de etiquetas, rótulos, reclames e prospectos, e onde também náo faÌtavam rifas (baratas...) para sorteios de objectos de arte ou garraÍâs de vinho ou Ìivros, a favot da assistência.E, aqui, uma outra faceta do popuìar <Iá Vaì>: o seu desejo de auxiÌiar todas as obras câritativas, de bem fazer. Lembram-se ainda os mais velhos barreirenque ele Ìançou e fez triunfar, para a compra de uma ses d.a cam.ytanhr:. carreta funer:ária, para a Casa da Misericórdia do Barreiro (por esse tempo estava amputada a santid,ad.eâo título da instituição... ), quando era provedor Augusto César de Vasconcelos, por cuja memória Mário SoÌano dedicava um verdadeiro cuÌto. Sorteios vários, subscrições e ainda um espectáculo de beneficência, para obter fundos com esse objectivo, tudo eÌe promoveu, e a cârretâ (de tracçáo braçal) foi finalmente comprada. Era o ano de 1925. Custara cerca de 600 escudos... e esteve ao serviço da Santa Casa até meados da década de 40, tendo sido nós, por sinal, quem a mandou reduzir a lenha, de apodrecida que estava, quando dirigimos aquela Instituição. Depois, mas já antes de 1955, foi o Asílo de D. Pedro V (actual Externato do mesmo nome), que mais tornou alvo dos seus desvelos- recordando-se. certamente. de que também ele fora educado num asilo (de Portalegre), após ter perdido o pai, modesto agricultor, aos nove anos de idade. Tornou-se-lhe, então, uma preocupação absoÍvente a administração dâquela casa de caridade do Baïreiro, a taÌ ponto que provocou conflitos com os seus directores, por chegar a levantar observações sobte casos que se verificavam inconsistentes, o que o levou a sofrer a irradiação de subscritor. 170


DO BARREIRODE VÁÈIAS ÉPOCAS Entretanto, Mário Solano dava o seu modesto contributo para algumas festas locais (a do Parque Municipal, por exemplo, a favor do referido Asilo de D. Pedro V). ao Concurso dos Yestidos de Chita (1945) e âos aïràiâis popuÌares, em que nem sempre se saía com felicidade, em virtude de as suas iniciativas serem desde logo apoucadas pelos irreverentes... Por tudo isto, junto com a suâ actividade comercial, ele viveu uma vidâ sem der;canso e, ainda pol cima foi mais de uma vez roubado I Mas foi honesto, trabalhou como poucos, e nunca a riqueza lhe sorriu, e foi vítima de alguns desentendimentos, sempre, porém derivados ou ligados a iniciativas de carácter beneficente. Mas <era sobretudo o seu sentido de Bem Fazer - como aÌguém escreveu- que sempre o dominâva, superior, ao fim e ao cabo, às desconsideraçõesdos outros>. Nos seus últimos anos de vida, deu-se a organizar excursôes,em autocarro, à capitaÌ do seu distrito, tendo sido o mâis populâr propagandista do Barreiro na cidade de Portalegre (por ocasião das suas Festas d,os Auentais), onde, aos excursionistas barreirenses ali recebidos com eÌe, eram sempre prodigalizadas carinhosas recepções. O <Lá Vai> era único...

UMA PITORESCA SÉRIE DE FiGURAS POPULARES DO BARREIRO DOS TEMPOS PASSADOS ( E uMA, APENAS, DA ACTUALIDADE...) O <CHICO ALMINHAS>

E O <MANEL> PEDRO

A 19 de Novembro de 1892, no avô dos jornais baneirenses, O Szl do Tejo, começou o actor, autor e ensaiador Josó Maria Dupont de casâra casara e constituíra família. Isto tudo em pouco tempo, porque Sousa a pubìicar um romànce original que intituÌou O Alminhas ou o T esouro clo Laararlio (a conjunção adversâtiva estava então na moda, nos títu.los dos romances...). A acçáo da obra era encetadano Barreiro, pelas duas horas da madrugada duma noite de temporal: <<...entretanto, apesar dos horrores da tempestade, um indivíduo cuidadosamente embuçado n'umâ ampla capa à espanhoÌa, caminhava n'esse momento peÌa 171


TÌGURAS E FACTOS rua de Palhàes (actu{Ll Rua do Conselheiro Joaqui.m Antówio tle Aguiar) em direcção à estrada do Lavradio>. O tal embuçado era nem mais nem menos que um fidaÌgo, que seguia para o Alto de Santa Bárbara, onde nessa noìte se desenrolaria uma cena supinamente dramática ! Brrr l. . . Ora esse romance, em virtude de o jornal só ter chegado a viver seis meses,suspendeuao 14." folhetim, exactamentequando o seu imaginoso autor ia começâr a descrevel o principaÌ protagonista, o tal A\m'inhls, que neÌe emparceitava com um outro tâÌ Manel Pedt:o. Que dois que ele juntou!... Tanto um como outro, foram os mais populares tipos do Barreiro do úÌtimo qualtel do sécuÌo passado, e o segundo ainda no princípio da actual centúria, ambos com uma história miseràveÌmente desgraçadae infinitamente triste. Esse tal Alminhas, também conhecido por Francisqu,inho e ainda por Chico Alminlrus, era lavradiense. Um tanto ou quanto espertâlhote, mas sem modo de vida definido, deu-lhe um dia pai'a afirmar que, <inspirado por visões beatificas> havia descoberto o sítio onde estava enterrado um tesouro no Lavradio, e com tal convicção o afirmou, que Ievou alguns indivíduos a fazetem escavaçõesnaqueì:r antiga. vila, acabando por deixarem a terra revolvida e do tesouro... nem d,gutt.Desconfiando depois que estavâm a ser gozad,os e vítimas duma vigarice, pediram a detençãodo tlampoÌineiro, que foi conduzido à cadeia, sendo condenado a prisão cotreccional.(1). Mas as suas aventuras, segundo informações que reconhemos, haviam começado alguns anos antes em Sines, onde ele um dia se fez passal por celto indivíduo que, há muito tempo desapareceradaquela localidade e era filho de um rico pïoprietárÍo dessa vila, que tiver:r notícia de o rapaz ter morrido em África,

(') O caso do tesouro do Laoratlio, que foi já há cem anos, fez fâlâr a imprensa de Ì-isboa. Quando, um dia, procul'ávamos, em antigas folhas da capital, referênciâs sobre as coÌectividades recreativas do Barreiro, à voÌta do ano de 18?0, eis que deparámos, inesperâdamente, na 1.' página, do Diá'rio de Notícitts de 4 de Janeiro de 1812, com a seguinte local, que vai tÌa.nscÌita nã oÌiografia da época: <O Thesouro do Laara.di,a-DpíIogo.-NAo apparecerL o tlLesorúo e cai,xLo, "renda (ros il[.uã.id,os-A justiça e,b,Ì'iu or ollús e fallotr., O pai da alhinhâ, o ,t icasso ínagiÌLíLi.io, o inspifddo dlls 1)isões beatílicas, foi qualificado de ,mêto espertalllõ,o e conclenad.oa seis meses de prísão corteccional, por enganar as o,uthorid@d,es,e seu pae a tÌ'ez mez6,> Fi.r.]àta, a comédia...

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DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS mâs o povinho é que não acreditavâ no seu falecimento, festejando o impostor, amimando-o e tratando-o por <rico menino>. A princípio tudo correu menos mâl (ele dava grandes parecenças com o desaparecido) e ninguém dera ainda peÌo Ìogro, mas bem depressa se viu que o AÌminhas se limitava, apenas, a organizar grandes pândegas, dando cabo em pouco tempo de boa soma de dinheiro. Até que, um dia, um advogado e proprietário em Santiago de Cacém, dr. Manuel da Costa e que já o conhecia daqui, onde o vira a mendigar, desvendou a verdade àquela gente, e o Clti,co Alminhas deu às de Vila Diogo o mais depressa que pôde... Esse pobre diabo, de nome Francisco Rodrigues, faleceu soÌteiro, com 50 anos de idade, a 14 de Maio de 1897, numa casita da Santa Casa da Misericórdia desta vila, sita na calçada do mesmo nome, onde eram recolhidos os <<semeira nem beira>. Habitual frequentador da antiga Adega de José Mendes, na Trav." de Santa Cruz, com esquina para a Rua do Conselheiro J. A. Aguiar (casa que, mais tarde, foi demolida, para o alargamento da mesma via pública), a sua vida foi tm romance que Dupont de Sousa deve ter chegado a escrever, reforçando-o com os dotes da sua imaginaçáo de autor dramático - mas que o destino quis para sempre deixar, em parte, inédito. TaÌvez fosse melhor... Quando, num domingo de Setembro de 1961, fizemos uma das nossas visitas ao Lavradio, observámos, por acaso, que estava a ser demolida a casita onde residira o Almi'nhas, no antigo Alto da lgreja, para alargamento das instalações do Grupo Sport Chinquilho 9 de Abril Lavradiense. O Tesouro, é clarc, jâ há muito passara à histriria...

Manuel Pedro fora antigo marÍtimo, tendo andado alguns anos embarcado em navios da rnarinha mercante. Por aqui apareceu um dia e fez-se trapeiro. Fora um homem forte, de elevada estatura e largo arcaboiço, que fatalidades da vida transtornaram de forma taÌ, que eram frequentes os seus desbragamentos de linguagem pelas ruas do Barreiro, com escândalo da gente séria. Vivia o pobre de Cristo sòzinho, num moinho abandonado para as bandas de Barrâ-a-Bâïïa, - e gaÌinhas e outros animais doentes que encontrasse, alguns deÌes devolvidos pela 173


FÌGURAS E FACTOS maré, ao longo da praia, preparava-os à sua moda e chamava-Ìhes... um figo. Mascava e comia pedagos de charutos fortes, de picar, que lhe davam, como se saboreasseuma barra de chocolate...Era tão extraordinária a natureza dos aÌimentos que, algumas vezes, constituírâm a suâ refeicão e a quantidade de álcool que ele ela capaz d.e ingerir, que o falecido dr. Fernandes Costa afirmava ter o maior empenho em lhe fazeL um dia a autópsia, parâ ver como era aquele estômago lá por dentro... ittrão sabemos se aoueÌe médico barreirense a chegou a fazer ou não, poÌs juÌgamos que o popular Manel Ped,ro, eminente borracháo que, païâ cúmuÌo da sua desgraça, foi certo dia (em 1908) vítima de grave acidente na Estação dos Caminhos de Ferro do Barreiro, do qual lhe resuìtou a amputação de uma perna e a quase inutiÌização da outra (o que lhe valeu fazerem-Ìhe uma festa de benefício no antigo Teatro Independente), veio a falecer, já de avançada idade, num hospital de Lisboa. E Iá se foi o homem que andava sempre com um saco de linhagem às costas...

O ALEXANDRE Alexandre de Almeida eïâ o seu nome, tendo sido seus pais José de Almeida, trabalhador, e Maria Amélia, doméstica; arnbosdo Barreiro, onde também Ìhes nasceu este fiÌho que, segundo nos parece, logo desde os primeiros meses de idade, foi talhado para a infelicidade. Nascido a 8-VIII-1893, foi <baptizado em perigo tle utd,a pela parteira Francisca Rosa,viúva, no dia um de Janeiro de 1894>-assim rezà o seu registo de nascimento. geria caso para desejar que a morte o tivesse levado nessa aÌtura? Talvez. Ainda em criança, um ataque de meningite perturbouJhe as faculdades mentais. O pai, daí a pouco tempo, falecia, e ia ficar neste mundo o Alerandre Maluco, amparado à pobre mãe Maria Amélia, e a seu irmão, António José de Almeida operári6 das Oficinas Gerais dos C. F. S. S. e distinto <<caixa>que foi da filarmónica da S. D. U. B. (<Franceses>). O Alexandre - já o conhecemos[srns6-1fl6 se metia com ninguém, mas o pior é que se metiam com ele... Ensinavam-lhe palavrões, <pârtes gagas>, o diabo a quatro... Depois, incitavam-no, acusavâm-no de coisas tremendas, crimes horríveis, que o seu cérebro, embora pertur-


DO BÁRREIRODE VÁRÌAS ÉPOCAS bado, tendia a repudiar. Quando, por exemplo, Ìhe chamavam <<assassino da Maria Alves> (famoso crime praticado em Lisboa peÌos anos de 20), o pobre do Alexandre até esboçava gestos agressivos, acabando por se lançar para o chão, a morder-se e â rasgar-se. Fora isso, gostava de ensaiar uns pregões, umâs cabriolas e uns assobios de que só ele tinha â palenf,e... Faleceu com 48 anos de idade na casinha da Travessa do Loureiro, n." 6, onde vivia com a mãe e o irmão, soÌteiro. Uma cirrose do fígado dos muitos <copinhos> que lhe pagavam... - Ìevou-o desta vida, a 20 de Junho de 1942. Por essa ocasião, no n." 491 do antigo jornal O Barreiro, de 2-VII-!942, J oáo Azevedo do Carmo, com aquele sentimento tão humano e generoso que Ìhe conhecemos,dedicoìr ao AÌexandre um emotivo artigo, de que não resistimos a reproduzir aqui alguns trechos: <Foi há d,ias a mtet'rar o pobre do nosso Alenalìxdre,a figura muis popular dos últim.os qua,renta anos d,a nossa terra! Jamuis ouo,iremos ü sua uoz naqueles célebres pregões cünto,ntes, que outrora. enchinm d.e alegrìa as ??ossos ruazinhus, tle lés-a-lé.s...Jamnis ouairemos o.quelesassobios à cachapi,m, jamuis o 1)erenlos naquekrc graciosíssimas partes à inglesa e jamais o terenLosna nosso,frente em rí,sos,dlÌ.anted,uma si,mplesmoed,cr, de cobre... (...) O Alet:andre foi, em busca d,e seus irmã,os tle ìnfortúnio... Foí-se and,arulo lâ para Santa Bdrbara, a l,eaar-nos saud,a.desaos tr'istes que o preced,eram... Fo,í aclÌante tla mãe, e airula" bem que o Íoi! Que serin d,o Alena'vulre sem a mõ,e, sem a Senhora AméLin? Pobre Senhara Amélia! Estamos a uê-la, a, f echar-lh,e os olhos e a ci,ci,a,r-lhe: - Füho da minha almm, uai círulúnd.o.A mÃ,enõ,o se denlorú, a m,ã,enão se d,emot'a,filho!>

A ESPANHOLA

DAS

GULOSEIMAS

O nome deÌa nunca o soubemos. Só sabíamos qte fazia uns doces, à base de <ponto de rebuçado>, coloridos, de diversos feitios, alguns imitando flores e passarinhos, que eram uma tentação para a petizàda. A espanhola, que vivia com o marido (português), habitou numa barraca, que também erã a Íá,bríca, dos doces e que esteve, uma porção de tempo, implantada no Largo Luís de Camões, na faixa do passeio em frente da qual se ergueu, depois, o edifício da Sociedade dos <Franceses>,


FIGURASE FACTOS Quando ela saía a vender as suas guìoseimasàs crianças (sua quase excÌusiva clienteÌa), costumava dizet:: - Chom,, <m'inino>, chora, c'a espanlnla tai-se embort... Chupa, cachupa! E, um dia, desapareceudali a barlaca mais os seus moladores, não sabemospara onde...

O <PÊRA OU MOSCA> Era corticeiro, quadrador. Homem alto, espigado - ainda nos lembramos muito bem da sua figura - passeava munido dum bengaìão, onde se via, junto ao castão, uma porção de tachas amarelas. emérito beberrão e, certo fs12 11111 Este homem -diziam-nos...dia, jurou que náo havia de beber mais vinho, fazendo a promessa de que, por cada âÌÌo que passassesem o beber, pregâva uma tacha na bengala. Pelo que víamos - e se o caso era verídico - o homem emendara-se. Mas, não havia dúvida de que tinha uma tara quâlquer. Quando um indivíduo o interpelava, perguntando-lhe '. <- Pêrü ou logo ele, irresistìaelmente, respondia: <L'ísboa ou Porto!> Mosca?>gaiatos que lhe descobriram o <fraco>, perseguiam-nona rua, Os gritandoJhe: <Pêra ou Mosca>?! <Pêra ou Mosca,?! E sls, muito sério, agitsndo com eÌegância a bengala, lespondia sempte: <<Lisboaou Portol>. Nunca se zàngava, nunca foi malcriado para alguém. E seguia, imperturbável, o seu caminho...

O <CADÁVER> O nome dele era Francisco dos Santos. Natural do Barreiro, foi, muito tempo, aguadeiro e também moço de recados. De forte físico, aguentava os trabalhos mais violentos e mais os que requedam... uma boa disposição a toda a prova, como o de cozer os corpos, após as autópsias no cemitério local, o que lhe valeu a alcunha de <O Cadáver>. Mas, é claro, depois de uma tarefa destas, tinha Ìugar uma forte libação e daí o seu uso frequente das bebidas. Nadava regularmeÌÌte e certâ vez entrou numâ prova, na praia do Barreiro, nâ qual seguia em último. Francisco Paulino (do F. C. B.) que, naquela ocasião, com outros, acompânhava numâ canoa, os concoïrentes,vai ao encontro dele e (<malandricer...) 176


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS passâlhe com o barco por cima da cabeça, com gesto de desprezo" ' Mas ã uCarláver, ressurgiu à tona de âg'ta e 7â continuou"' chegando, por fim, à meta. No outro dia, na antiga Leitaria <Chic>, foi Ï'rancisco dos

francisco dos Santos 6adaYer AGUADEIRO ELECTRICO

Cartã.a d,e ú.s;,to' d'o <<Cailá,uen, (Por obseqüiosâ ofêÌta

de J. Â. Marques)

Santosalvo de uma festa, durante a qual recebeuuma medalhade cortiça, para recordaçãoda sua resistência à superfície do elemento líquido... Morte insotita o aguardava. Falecel, por sufocação,na já desaparecida Adega do Mercado (na Rua Eça de Queiroz,em frente do Mercado MunicipaÌ 1." de Maio, desta vila), no dia 16 de Novembro de L942, quando comia um pedaço de toucinho cru, que se lhe atravessara na gàrganta.Passaraa cadáver,de facto, com 55 anos de idade.

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FIGURAS E FACT'OS

O ESPANHOL

DOS AMENDOINS

Veio para o Barreiro nos princípios da década de 20 e era de nacionalidade espanhola.Seu nome: Fernando Barbosa e-segundo decÌarou a Tomé Vieira, em 1929 (') -nascera em Ayamonte (província de Huelva), em 1849, contando, portanto, naquela aìtura, 80 anos de idade. Tinha uma Ìarga história este homem, que bem conhecemos ainda, já bastante cur"vado, de alcofa segura por um pau, ao ombro, a vender amendoins, que ele apregoava no seu idioma de origem: <arbillana> I - acrescentando, de vez em quando, a tradução: amend'oim tomado ! À noite transportava, na outra mão, um banquito de armar, onde se sentava, junto dos cinemas ou dos cafés, passando de ambulante a iugar de venda provisório... Pois tinha ele uma larga história, como dizíamos, a quaÌ resumia, recordando que, ainda criança, viera para Portugal, para criado da casa da famíÌia Centeno. Depois voltara a Espanha, a fim de cumprir o servìço militar, após o que havia regressado ao nosso País em 1871, empregando-se como cocheiro na casa dos condes de Azambuja, em Palhavã, donde passara para â casâ do 2." marquês de FicaÌho que, ao tempo, desempenhava funções no Paço, pelo que ficou trabaÌhando nas cocheiras reais. Como guarda de malas, acompânhou, algumas vezes, o rei D. Luís nas suas viagens.Em 1902, foi aposentadocom uma pensão, mas com a queda da Casa Real, peÌa implantagáo do regime repubÌicano deixou de receber a pensão e, já com sessenta anos, teve, novamente de agenciar a vida. Em Lisboa, vendeu sotvetes durante aìgum tempo, até que veio para o Barreiro, onde o conhecemos a residir no n.. 17 um pequeno rés-do-chão dum prédÌo de dois pisos, da Rua da Amoreira, cujas traseiras, deitavam para o Patio Morgado (antigo e popular Prítio tlos Bühos). (AÌi perto, na Rua Aguiar, numa casâ há muito demolida para dar luga.r ao prédio da Alfaiataria Macedo, vendia bolos um simpática velhota, a ti Hilária, que todo o Barreiro desse ternpo conhecia.. . ) Mas continuando. Fernando Barbosa não tinha aqui pessoa alguma de família. EÌe próprio tratava da comida e do seu negócio, a venda do amendoim torrado (a que a rapaziada também chamava alcagóitas)

(')

Em Eco do Bclrrearo n." 136, de 1-V-1929.

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DO BARREIRO DX VÁRIAS ÉPOCAS

e um gato, que o ia esperar à volta da venda, era o seu fiel companheiro. (Durante algum tempo, partilhou da sua casa.um corticeiro que erâ um <<furioso>da Tauromaquia. Conhecido pela alcunha de <Bigodinho>, era indispensável nas <vacadas>que se organizavam nestâ vila, ehegando a ser também uma figura populâr local, embora não fosse natural do Barreiro). Uma <curiosidade> mais: o cabelo do velho espanhol dos arnendoins era branco de jaspe e daqueles que os cabeleireiros classificam de 1.' qualidade, própïio para o fabrico de chinós. Pois o popular velhote viu <<negócio> no caso e, de três em três meses, ia à capital cortar e vender o cabelo... para o fornecer aos calvos. Fernando Barbosâ viveu uns dezassete enos no Barreiro e foi morrer a um hospital de Lisboa.

O <CAMARADUCHO> Foi outro tipo popular do Barreiro. Era aÌentejano, natural da freguesia de Santo Amador, do concelho.de Moura. Veio, ainda homem novo, para o Barreiro, tendo trabalhado, muitos anos, na oficina da antiga Sapataria Coelho, desta vila, de que era, proprietário José Coelho (') (esta sapataria foi, por último, a antecessora da de Calixto Augusto Mendes, na Rua da Cons. Joaquim António de Aguiar). O <Camaraducho>-João, de norne próprio - era tratado, geraÌmente, por João Santo Amador, mas com o hábito, que ele tinha de se dirìgir aos colegas de ofício e a outros amigos por <ó camaraducho>, ficou ele próprio por ser conhecido pelo vocativo que usava, com o que, aÌiás, nunca se importou. Teve, mais tarde, uma oficina de sapateiro (numa casa que era também sua residência) na já referida rua, onde, em alguns fins de tarde (no Verão) ele se entretinha a tocar um harmónio, de fraca categoïia... Era solteiro, segundo julgamos saber, e dava-se ares de galanteador (barato...) do sexo fraco, mas sem escândaIo. Eram

(') José Coelho foi um conceituado comerciante locâl, estabêlecido, nesta vila., durante 3? anos. Era natural de Fátimâ (concelho de Vila Nova de Ourém), tendo falecido no Bârreiro, com ?1 anos de ldade, a l2-ll-7942,

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FIGURAS E FACTOS

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DO BARREIRODE VÁRÌAS ÉPOCAS mais os modos de admiração do que as falas... Certa vez, em 1931, o efémero Ri,so d,o Barretro dedicoulhe versalhada a card,cter, ilustrada com a figura deste popular <<bate-soÌa>,traçada pelo pintor Américo Marinho e de que damos aqui a reprodução. O <Camaraducho> era proprietário dumas casitas no Alto do SeixaÌinho. Já doente, envelhecido e cansado, païece que umas sobrinhas o conseguiram <<arrancar>da pobre casa em que vivia, levanclo-opara Lisboa, onde faìeceu. Isto há uns vinte e tal anos.

Propositadamente, deixámos para o fim talvez a maì,s çtopuktr das figuras populares do Barreiro dos últimos tempos: O <BARBEIRO DAS OBRAS> O nome dele era José Rodrigues Marques, - n61ne completo, o que raríssimas pessoas devem ter sabido, com excepção, naturaÌmente, das de família que por cá deixou. Mas para o povo do Barreiro ele era apenas o Eabeiro das Obras ou, quando muito, o Marques d,asObras, o que, aliâs, se podia prestar a equívoco com uma outra pessoa, do mesmo apelido, residente no mesmo largo, popuÌarmente designado <das Obras>, e que fora, aìi, também, industrial de barbearia. Mas, por <Barbeiro das Obrasu é que já não havia possibiÌidade de qualquer confusão. Era ele, só ele, autor das mais estapafúïdias excentricidades. José Marques era naturaÌ de SangaÌhos, concelho de Anadia, tendo sido seus progenitores José Rodrigues Marques e Matilde da Conceiçáo ambos nascidos na vila dos capitosos espumantes. Veio, ele, um dia para o Barreiro, não directamente de Sangalhos, mas sim de Vendas Novas, onde era já barbeiro e já casado, dados estes que recolhemos de Manuel dos Santos César (1892-1968) que bem o conheceu, porque foi seu senhorio e vizinho, largos anos. Num prédio do dito Largo das Obras (oficialmente Largo Aleranclre Herculano), onde está presentemente instaÌada uma casa de vinhos e comidas, denominada <Adega Bragança>, montou esse impagável Ftgaro 787


FiGURAS E FACTOS a sua barbeaÌia, que chegou â seï muito afreguesada, principalmente por pessoaìda C. U. F., que por ali fazia seu caminho para o trabalho. Conhecemos José Marques quando ele já rondava de perto os 50 anos de idade: era um homem de estatura média, entroncado,de grenha eriçada (parecendoalérgico 4o uso dos pentes neÌe próprio...), cabeludo, usando farto bigode que terminava numâs guias descidas ao canto dos lábios, enfim, am precursor de muitos que vemos, hoje, por aí... Tinha olhos negros, de <vivaço> e também umâ linguinha sempre pronta a ripostar a uma obser-vação ou a Ìargar uma maliciosa piada... Nunca o vimos de colarinho; a indumentária era já bastante desleixada,constituída, normalmente, por um casaco e calças mais ou menos brancos. VíamoJo caminhar já com dificuldade, pesadão,parecendo-nosque por inchaço das pernas. Era um devoto admirador de Ba.co,sempre pronto a honrálo com uns bons copáziosdo tinto... Mas nem sempre o <Barbeiro das Obrasu fora a criatura que nós já assim conhecemos. Embora sempre boémio e brincalhão, amigo de cantarolar e tocar a sua guitârra, ele apresentava-se antigamente com desenvoltura e natural decência,no seu Íato do ofício, de brancura impecável e sem que a sua vida, simples, desse aso a disfrutes. Como todo o <completo> barbeiro da província, o <<Barbeirodas Obras> arrancava dentes, e arrancava-os sem dor ou com dor, conforme a pessoa de que se tratasse e também a disposição em que ele se encontrava... Se andava arreliado da vida, ai do <cliente> que reclamasseos serviços de <dentista>... Se estava satisfeito e bem disposto, tudo ele fazia para que a <operação>)corresse da melhor maneira, bezuntando então âs gengivas do padecente com um líquidozinho de que só eÌe possuíao segredo.Aquilo era <milagroso>...E a questãoé que eÌe chegou a fazer uma <<desgraçada>concorrência aos verdadeiros dentistas. Por esse tempo funcionava no Barreiro um competente consuÌtório dentário, que era o do dr. Júlio Velez Caroço, montado numa parte do rés-do-cháo da residência dessefaÌecido médico, na Trav. Luís de Camôes. Pois certa vez, o <Barbeiro das Obras>, quando passou pelo dr. Velez Caroço, afivelou o semblante mais série deste mundo, e disparouJhe: - Boa tarde, <<colega> ! Claro que o referido médico nunca Ìhe deu qualquer espécie de confiança, mas sabemos que chegou a embirÌ:àr com a desfaçatez do barbeiro, mandando-lhedizer que tivesse juízo, senão um dia... 182


DO BARREÌRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

As excentricidades, aventuras e brincadeiras do <Barbeiro das Obras>, de que temos conhecimento, são tão numerosâs, que vamos, por isso, joeirá-las, de forma a aproveitar as que melhor o possam caracierizar e ser aqui recordadas. No período da vereação socialista do Barreiro (1920-1922), o ideário era muito discutido nos habituais centros de ucavaqueÍra> da vila, insistindo os seus s mpatizantes na defesa de miríficas ideias igualitárias. O <Barbeiro das Obras> já estava farto de aturar, no seu estabetreci mento, as discussões a esse respeito. Certo dia, um dos tais fregueses <socializantes>>senta-se-lhe na cadeira, para ele the rapar a barba. Mestre barbeiro começâ o serviço e, sem que o freguês se desse conta da marcha do trabalhinho, rapâ-lhe muito bem metade da cara, escanhoa-a, desinfecta-a e, quando o cliente esperâva que ele se mudasse para 9 outro lado da cadeira, a concluir a tarefa, retiralhe a toalha do peito, faz-lhe sinaÌ para se levantar, e dizlhe assim: - Também gosto do socialismo. Vá agora ao outro barbeiro aqui perto, para rapar a metade que falta, que ele também precisa de ganhar a vida... E o tal freguês não teve outro remédio senão sujeitar-se às condições impostas pelo impagável José Marques...

Doutra vez, pelo Carnaval, o <Barbeiro das Obras> seguiu para Lisboa levando com eÌe duas muletas. Acomodou-se no barco e, à saída dos passageiros (ainda na estação velha do Sul e Sueste, com as suas escadas de madeira), José Marques pôs uma muleta por baixo de cada sovaco, e fingiu.se coxo, revelando a maior dificuldade em sair da prancha e subir âs escadas. De Ìá de cima da ponte, o mestre do barco reparou naquele <inváÌido> e gïitou para os marinheiros junto ao pottaló: -

Aiudem aí esse homem ! 133


FIGURAS E FACTOS Prontamente eìes acorreram a ampará-lo, com todo o cuidado, na subida da escada. Depois de se v€Ì nà pônte, o <Barbeiro das Obras> endireitou o corpo, juntou numa das mãos as duas muletas, caminhou Ìesto na direcção da cabine donde o mestre o tinha mandado auxiliar e, cuïvando-se, de chapéu na mão, cumprimentou-o: - Muito boa tarde ! E muito obrigado a V. Ex.. I (Como o mestre do barco comentou a <partidinha>, não sabemos bem, mas não é difícil imaginar... ) E o <Barbeiro das Obras> lá seguiu para a cidade, a repetir a <graça> por outros sítios... Era Carnaval...

Era este impagável Fígaro dono dumâ guitarra em que fazia soar aÌguns maus acordes... Tinha-a, ali, a um canto do seu estabelecimento, como companheira de suas pândegas e passeâtâsnocturnas, ela, a guitârïa, e também uma cadeìa que tanto mais se lhe afeiçoava quanto mais ele se ia afundando numa vida desregrada... Mais de uma vez lhe deu para ir altas horas da noite, para junto do portão do cemitério do Barreiro, iá na estrada do Lavradio, dar um concertoem voz câveïnosae vinhática, que acompanhavaà guitarra... Aquele sítio er:a então um verdadeiro ermo, donde pouco se avizinhâvam as i-abricâsda C. U. F. E esse vulto de branco (o seu vestuário habitual) de encontro ao portão nêgro da mansão da morte, emitindo sons ïoucos e saturnos que a fiel cadeÌa secundava com os seus latidos, fez arrepiar muito boa gente que por ali tinha de fazer seu caminho, chegando várias pessoas,menos animosas,a darem <às de ViÌa Diogo>. Duma vez, peÌo menos, sâbemos que o macabro concetto daquele <fantasma> junto do cemitério, fez dispersar, como por encanto, um grupo de rapazotes que vinha dum baiIarico do Lavradio, muito satisfeitos, pela estrada fora... <Pernas p,ra que vos quero?>> Por último, já the tinham partído a guitarÌ:a. Mas eÌe, saudoso da companheira mutilada, ainda muito tempo depois the empunhava o braço decepado,e simulava fazerlhe vibrar as cordas ausentes..18t*


DO BARRÈTRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

Em certas ocasiões,davalhe para fazer tïavessuras e pirraças desconcertantes...E sempïe que podìa, tinha a maior satisfaçãoem sofismar uma ordem ou disposiçãolegaÌ... Naquele período dos primeiros anos da República, assinalado por constantesrevoluções,desordens,greves e boataria desenfreada,o Barteiro estava, de vez em quando, ocupado, umas vezes por forqas do Exército outras por reforços da Guarda Republicana.Certa ocasião,em que estavâm as garantias suspensas e se previam graves acontecimentos, a popuìação foi avisada para recoìher â suas casas, devendo os estabelecimentos fechar até determinada hora. Mestre <Barbeiro das Obras> lembrou-seentão de, a essahora, abrir de par em par a porta e as janelas da sua casa e vir sentar-seno poial da porta, a tomar fresco... Vem uma patrulha, intimâ-o a recolher-see a fechar a casa. Protesta, esboça uma justificação e em resposta apanha âlguÌls sopapos.Em face disso, achou por bem obedeceràs ordens, fecha a casa, e a força segue o seu caminho. Mais para a noite, imaginando a meìhor forma de não o proibirem de ter a casa escancarada,vai à porta e à janela. retira-as do seu lugar, e recolhe-sea descansâr...

Certa ocasião,as filhas do José Marques- eÌam duas- que andavam há muito tempo de volta do pai, para as levar ao campo, pela 2.. feíra de sestas, obtiveram dele, finalmente, a promessâ de que, naquele ano thes faria a vontade. Aproximou-se a data e, de véspera, já as raparigas estavam a prepârâr um bom e apetitoso farnel, que concluíram pela manhã do dia ansiosamente esperado, ficando tudo o necessário parà se regalârem com uma beÌa refeiçáo ao ar livre, diante de largos e saudáveis horizontes, bem acomodado em dois cabazes,não esquecendo,claro está, umas garïafas daquele vinho que o pai muito apreciava. Cheias de alegria, envergaram os seus mais bonitos vestìdos de veÌão, alindarâm-se e avisaram o pai de que estavam prontas para sair com ele. 185


FÌGURAS E FACTOS - Vamos 1á embora para o campo I - excÌamou o <Barbeiro das Obras>. Pegaram nos cabazese sairam todos de casa. Atravessaram o passeio mais a faixa de rodagem da rua em frente. E em pÌeno Largo das Obras - que possuía, ao centro, duas árvores ornâmentais de grande porte e Ìargas ramagens, circundadas por uns manhosos canteiïos relvados - o impagável Fígaro pâra à sombra das árvores, e diz paras as raparigas: Vocês desejavam ir para o campo? Pois. isto aqui é um -Prontol cantinho do campo muito agradáveÌ. Toca a estendeï a toaìha e vâmos comer já alguma coisa... Ficou por ali, apenas a umas dezenas de metros de casa, o ansiado <passeio>da família âo campo, na 2.' feira de sestas... E era de ver as caÍas das duas moças, diante daqueleexcêntrico pai...

Os últimos oito ou dez anos da vida do uBarbeiro das Obras> foramlhe da mais penosa amargurâ. Alguns anos depois de enviuvar de Rosa Maria Antunes, as filhas haviam seguido cada qual a sua vida. Ficou sòzinho. Depois veio uma veìhota tratarlhe da casa e cuidarlhe das roupas. A doença minara-o pelo uso imoderado da bebida e, como .iá não podia trabalhar, deixou o ofício. Com pena do infeÌiz, o senhorio perdoavalhe a renda da casa, onde, por último, já se arrastava, nela vindo a falecer, de congestão cerebral, a 23 de Maio de 1938. Tinha 60 anos de idade, acabando na compÌeta indigência aquele que foi um dos mais excêntricos habitantes do Barreiro.

Outras figuras mais ou menos populares houve ainda no Barreiro, na 1.' metade deste século, quando esta nossa vilâ era muito mais pequena e habitada por uma terça parte (se tanto...) da populaçãoque hoje conta, peìo que, naquela época, totlos os dias, a bem üzer, as oíatncts Jâ nã,o aconteceria o mêsmo agoïâ... Eram os âguadeiros, os moços de recados, os pregoeiros, etc. Estão, ainda, na lembrança de muitos, o <Machinho>, 186


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS o <<Câgica>, o <<Besouïo> e o Nicolau... O que nã6 víamos era os guedelhudos, porque, desde novos, todos tinham por costume ir ao barbeiro, e quem usava barba e bigode eram os velhcs. Outros usos, outros costumes...

Uma úÌtima figura, esta bem contemporânea e estimada no meio desportivo local (mais precisamente: do Futebol CÌube Barreirense), entre o quaÌ tem sido arvorada em <<mascote>>: António Joaquim Barbudo, o nosso <Anão>, cauteleiro que foi e ainda é às vezes, e que em 14 de Outubro de 1945, bandarilhou, como um valente, uma bezerra de quatro meses, numa <vâcada> no antigo Largo de N.' Senhora do Rosário. Nascido em Lagoa (Algarve), z 2-Y-L920, veio para o Barreiro com dez anos de idade e trabalha actuaÌmente nas oficinas dos Serviços MunicipaÌizados da C. M. B. Que se conserve muitos anos, ainda, entre nós.

AS SENHAS (QUE FORAM (DINHEIRO,) EMITIDAS NO BARREIRO,EM 1920E 1921 (QUANDO AS TIPOGRAFIAS SUBSTITUÍRAM A CASA DA MOEDA) Como curiosidade, absolutamente desconhecidada gente Ìrova, reproduzimos, a seguir, senhas q.ue circularam no concelho do Barïeiro, nos anos de 1920 e 1921. Foram ünheiro, foram <moeda conenre>, enf,re compradores e vendedores, no conceÌho a que se destinavam. Vamos, porém, a uma breve explicação preliminar sobre moedas, cédulas e senhas. São consideradas cédulas os títulos emitidos em representação das moedus metúlicas üaisiond,rias e de trocos. Estas moedas rnetálicas, em cuja cunhagem se empregam metais inferiores, tais corno o cobre e o níquel ou ligas destes metais, têm sempre 187


FIGURAS E FACTOS rtm D(Llornom'ínal superior ào ralor real ou intlínseúo, considerândo-se, por isso, moedas fracas. Como, porém, subira demasiadamente o custo desses metais (e foi que o aconteceudurante e depois da Guerra MundiaÌ de 1914-18), a fim de se evitarem ìargas despesascom a cunhagem de tais moedas, recorreu-se, para substituí-las, à emissão de cédulas, às quais a lei conferia curso Ìegal. A Tipografia substituía-se, assim, à Casa da Moeda. Não foi, todavia, na Primeira República (1910-1926) que, pela primeira vez, se emitiram cédulas em território nacionaÌ. Por portaria de 14-V-1830, a Regência da Ilha Terceira (Açores) mandara imprimir cédulas de 500, 250 e 100 réis; e, em 1893, foram emitidas no Continente cédulas de 50 e 100 réis, que estiveram em circulaçãoaté 1900,ano em que foram substituídaspor moedasde níquel. (') As últimas emissões de cédulas feitas peÌa Casa da Moeda, em substituiçáo das moedas de bronze dos valores de $05, $10 e 920, criadas peÌo Decreto com força de Lei n." 9718 de 23-V-1914, foram autorizadas, respectivamentepelos Decretos n." 3196, de 15-VIII-1917 e n." 4120, de 5-IV-1918 e pela Lei n..7297 de 4-VIII-1922. Posteriormente, o Decreto n." 10687, de 11-IV-1925, em face de se verificarem numerosas falsificações das céduÌas de $20, cuja circulação fora mandada suspenderpor portaria de 4 do mesmo mês e ano, criou novo tipo de cédula deste mesmo vaÌor, que se manteve com as outras (de $05 e $10) em circulação até à cunhagem das moedas de bronze atingir a produção necessária para os pagamentos.

De tal modo se acentuara, contudo, nâquela já citada época, a faìta de metais para a cunhagem das moedas (divisionárias) e a aÌta do seu custo e, por isso, as dificuÌdades do comércio e do público nas transacções do dia-a-dia, que, parâ não faìtarem os meios próprios para os pequenos

(') Segundo apontamento que recolhemog do distinto tesserologistâ José António Gonçaìves, de Lisboa, por intermédio do nosso conteuâneo José António Marques (também coÌeccionador de cédulas), e do qual reproduzimos ainda outros elemenios sobre este assunto.

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qtu foratn dinlleiro: 1,2 e i Da C. M- B.-Senlns centdros (Anos cle 1920-1921) ( Da C ol ec รง รฃo de J . A. M ar ques )


FIGURAS E FACTOS pagaJnentos e trocos, se âutorizaïam as Câmarâs Municipais, nos anos de 1919, 1920, 1921 e 1922- os de maior crise - a emitirem cédulas de L, 2, 3, 4, 5, 10 e 20 centavos, com aceitaçã,oobri,gatória nns d,reas d,os respectirtos concel,hos.EraJhes dada a designaçáo de senhas. Também houve, ainda, emissõesautorizadas de senhas daqueles valores, feitas por Misericórdias, Hospitais Civis, AssociaçõesComerciais e

Do AsìIo de D. Ped.ro V d.a V'iIa do Bat"ceü'0. - Senhas que ÍoranL dinlxebo: 7 e 2 centctaos (sabemos que tarabém lúure d.e /+ centqluos). Ano de 1921 ( D a C ol ec ç Ào de J . A. M àr q!€s )

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DO BARREIRODE VÁR]AS ÉPOCAS Industriais, Albergues, AsiÌos (corzo por eremel,o, a ernissão feita pelo AsíIo (acï'tal Patronato) de D. Ped,ro V d,o Bame,iro), Colégios, Bancos, Celeiros Municipais, Creches e Juntas de Freguesia.

A crise financeira de 1920 foi de tal ordem que a moeda corrente chegou a ser substituída, por iniciatíva de alguns comerciantes retalhistas, por chapas de zinco, folha e pedaços de papel ou de cartão (em que se escrevia a paÌavra <Vale>), e até os seÌos se utilizaram também como moeda corrente. Como, neste caso, se tratava de frágeis pedaços de papel, preservava-se-Ìhesa fragilidade colocando-os,geralmente, sobre placa redonda de estanho, que lhes servia de moldura, fixandoìhe uma folha de mica, em subs.tituição de vidro.

UM FEIXE DE RETALI{OS DO PASSADÕ E MAIS ALGUMAS RECORDAÇÕES... (POR ORDEM CRONOLÓGICA) 1862-DO

CóDIGO DE POSTURAS MUNICIPAL

Das disposições sobre nLarchantes e cortad,ores que faziâm parte do Código Municipal do Barreiro de 1862 (sendo presidente da C. M. B. José Luís da Costa) destacamos, por âcharmos curiosas, as seguintes: <O marchante será obrigado a vender a todas as pessoas deste conceÌho, carne de vaca, carneiro ou capado, e porco, nas épocas e pela forma designada nos, $ê seguintes: 1.'- Venderá carne de vaca e de porco na época que decorre desde a Conceiçãoao Entrudo; 2." - Venderá carne de vaca e de carneiro ou capado desde sábado de Aleluia inclusivé até ao dia da Conceição; 191


FIGURAS E FACTOS 3." - SeÌão dias de obrìgação de vender vaca todos os sábados, domingos e terças-feiras de cada semana; 4." - Serão dias de obrigação de vender carne de poïco e carneiro ou capado (nas suas respectivasépocasdesignadasnos $$ 1.'e 2.") todos os dias da semana, excepto as sextas-feiras; poderá vender nas segundas, quartas e quintas-feirâs de 5.'-Só cada semàna â vaca que Ìhes sobrar dos dias antecedentes pelo preço do carneiro, se desta carne não houver a necessáriapara se vender a todas âs pessoâs que a procurarem, porque, havendo-a, a poderá vender pelo seu verdadeiro preço.> Dada taÌ complicaçãode dias e de épocas,é cÌaro que o marchante quantas andavâ... era igualmente obrigado a saber-e muito bem-a 1871-O

EMPEDRAMENTO DUM ANTIGO TROÇO DA ESTRADA REAL (RUA MIGUEL PAIS)

Conforme se Ìê numa acta da Câmarâ MunicipaÌ do Barreiro, foi em 18 de Outubro de 1871 que se mândou empedrar a estrrtda real q,te <<uuida E stação prìncipal d,o Ca.minho de Femo, em direitura a esta ai.lla a term'inar no Largo do Rozarío, (a actual Rua Miguel Pais). Para este melhoramento se esforçou o então deputado por este círculo, Eduardo Tavares, ao quaÌ a Câmara manifestou a sua muitâ gratidáo, <ficando certú que jamais se risca,rá, da lembrcLnçacla Cô,mara e pouo do Barceìro seraì.ço cle tamanha estimação, esperando firmemente pela ocasião oportuna para mostrar a sua gratìd,ã.o e reconhecimento>. Não sabemos se tal manifestação de gratidão e reconhecimento se chegou a fazer, mas o que sabemos é que Eduardo Tavares (1831-1885) foi um almadense de muita categoria, como político e como jornalista, um grande colaborador de importantes homens de Estado, tendo sido deputado, e cremos que por mais de uma vez, pelos concelhos do Barreiro e de Almada que, com outros, faziâm parte do Círculo EÌeitoral n.' 73. 7877-

PROVIDÊNCIAS CONTRA UMA EPIDEMIA

A Câmara Municipal do Barueiro tomou providências sobre a limpeza da vila, a pedido do sr. Sub-Delegado de Saúde, com vista a atenuar a gravidade çl.ocóLerarntorbus,se porventura aparecesse neste concelho. 192


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS Assim, aprovou, por unanimidâde, as m€didas necessárias para compelir os habitantes da viia a varïerem duas vezes por semana as testad'as d,as suas casas d,e habitação, até ao mei'o d,a rua' ficando responsáveis pela limpeza de quaisquer imundícies (fosse qual fosse a sua natureza), que se enconttassem no mesmo sítio. PenaÌidades para os desìeixados: à primerra faÌta, repreensão; à segunda,multa; e à terceira, cadeial Pois erâ óptimo que âs mesmas medidas se tomassem agora (cem anos depois os porcalhões continuam...) parâ os que atiram o lixo das janelas para a rua, câ pelos nossosbairros periféricos...

1872 -Ul|[

<FRACO> FAROL...

Em 11 de Dezembro, compareceu perânte a Câmara Municipal do Barreiro, Manuel Jaques, cabo de mar nesta vila, e em nome do capitão clo porto de Lisboa, pediu que se lhe desse um candeeiro para colocar em sítio (?) a poente tlo MexiÌhoeiro, païa servir de farol, <a fim de evitar quaÌquer desgraça que possâ acontecer nos barcos que por ali navegam>. A Câmara deferiu o pedido, mandando entregar um candeeiro ao requisitante. Fraco farol seria esse, mas, mesmo assim, talvez bons serviços tivesse prestado...

1 889-1S9O-I'ELICIDADES

PERPI1TUAS...

... que a pobre humanidade se esfalfa, em vão, por alcançar, são enganadoras miragens, necessàriamente transitórias, como tudo na vida terrena, pois jamais passaram de nomes... Assim revela o L'iuro d'e óbitos de 1889, a fls. 25, da freguesia de Santa Cruz, deste conceÌho, informando para a posteridade que Felicidade Perpétua (moradora que foi na antiga Rua do Rosário, actuaÌ Rua do Cons. Sena e Moura), entregou a alma ao Criador peÌas duas horas da tarde do dia de NataÌ daquele ano, no estado de solteira' com a bonita idade de 70 anos; 193


FIGURAS E FACTOS

... e que outra Feìicidade Perpétua, a qual, por essa altura, também vivia no Barreiro, com a idade de 67 anos, casada com José da Costa, vinte e seis dias depois da morte da sua homónima (ou seja, a 20 de Janeiro de 1890), ìhe seguiu o rumo para aquelas paragens donde nunca mais se voÌta, tudo isto deixando registado o prior da freguesia, padre Francisco António Quintão, que era frei,*enísta, isto é, de Freixo-de-Espada-à-Cinta. Pois, ao que sabemos, tais Íelicid,ad,es perpétuas extinguiram-se desde então, nesta nossa terra barreirense...

1894-

FORTE DISTRACÇÃO I

Em 18 de Fevereiro, dizia o jornal O Sul d,o Tejo ('): <Devido não sabemos a que circunstância, o maquinista do combóio n.o 4, em um dos dias da semana finda, veio desde a Moita até Alhos-Vedros, apenas com dois vagons engatados à máquina, d,ei"rand,ona pri.meì,ra estaçã,oas currzulgens que conduz'inm os passageíros. Reparando mais tarde nesta faÌta, teve de retroceder a buscar aquellas carruagens, chegando ao Barreiro com t hora de atrazo, Tem graça mas dispensamos a repetição.> Quem teria sido o brincalhd,o do maquinista?

19OO-O

CRIME DOS VELHOS

Naquele tempo (séc.XIX já nas últimas despedidas...),o crimg que, com tal designação ficou conhecido entre a popuÌação do Barreiro, foi dos que mais trouxeram a opinião pública interessada, dos que mais faÌados foram em todo o País, mais ainda do que ânos antes, o crime de AÌhandra, de que foi útima o Fand,ango e o do Casal do Faustino, perto de Mafra, em que foram vítimas três infelizes velhos.

(') V. (O BARREIRO ANTIGO E MODERNOT Ì Parte - Cap. XLI - O,s Jornaig e Reristas B ct'n'eirerLses.

194


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

Acedendo ao pedido de alguns no'uos (barreirenses), que dele ouviram falar a pais e avós, e já que o trágico acontecimento pertence aos anais do Barreiro, aqui fica, pois, um breve resumo do que foi o Crimp dos V elltos. Numa casa com o n.o 14 (de um único pavimento, fachada com uma porta e duas janelas e uns cinco ou seis metros de frente (') da Rua do Cons. Joaquim António de Aguiar - sempre esta ruâ, que era então a principal do Barreiro -, apareceram assassinados, rtà càmz- do quarbo onde dormiam, José do Espírito Santo, conhecido por José d,o Andador, itre 68 anos de idade, nascido no Barre ro, a 30-XII-1832, e Maria do Rosário, sua mulher, de 71 anos de idade, também natural desta vila e que com ele se casara em segundas núpcias, depois de ter enviuvado de João de Jesus,,o Quntro e Cinno, O duplo assassínio foi descoberto na manhã de sétbzdo,Z2 de Setembro de 1900 e fora perpetrado na noite anterior (de 21 para 22), com evidentes requintes de ferocidade, tais os golpes de arma branca (navalha ou punhal) que lhes tinham sido vibrados no pescoço e na cabeça. Móbil do crime? Certamente o roubo, por:que gavetas de móveis, baús, roupas, etc. tudo estava aberto e revoÌvido. Ora os velhos, de cujo matrimónio não havia filhos, tinham fama de possuir contos de réis em libras de ouro! Eram económicos- sabia-se - e possuíam seu <pé de meia> acumulado, não só proveniente de rendas de casas (o velho tinha no Barr"eiro mais de uma dezena de casas de rendimento, embora todas pequenas propriedades), mas também de empréstimos de dinheiro sobre penhores e ainda do aluguer de ca.mas para pernoitar na casinha que possuíam na Trav." do Rosário n." 18 ('), para a qual deitavam as traseiras da sua casa de habitação, onde ficavam geralmente trabalhdores e vendedores ambulantes, e até no sótão da própria casa (quando na outra já não havia vaga), alugavam esteiras para pernoita. Preço: 1 vintém por dormida.

(') A casa, onde foi per?etrado o duplo cÌime, tinhã sido constÌuída em 1863 e já não existe há muitos anos. A sua área está jnìegr.ada na do actual prédio, de 1,o andar, com os n.o' 13 â 17. (Verifica-se, assim, que a antigâ nuÌneraçào por. passou a Lm4>ar e vice-versâ). (") É a actual TÌav." Novâ do Rosário, O prédio ainda existe (um r/c) e tem actualmente o n.' 1?.

1e5


FIGURAS E FACTOS Logo após a descoberta do crime, não se encontrou, à simples busca, quaÌquer porção de dinheiro, mas após o arrolamento, veio a descobrir-se, escondidas por vários cantos da casa, jóias, dinheiro em notas, moedas diversas e algumas Ìibras, mas, sem dúvida que o <grosso> do pecúìío dos velhos ìevara sumiço. Nas portas da casa não havia vestígios de arrombamento, as manchas de sangue eram numerosas e uma delas afirmava-se desenhar nìtidamente a larga mão do presumível assassino. A investigação policial começou imediatamente, (") e nela em breve trabaÌhavam vários agentes de Lisboa. Foram, então, detidos, no decurso dos restantes dias de Setembro e no mês seguinte, numerosos ìndivíduos, alguns deles parentes dos velhos. As prisões sucediam-se aqui, outras em Almâda, no SeixaÌ, até em Setúbal e não sabemos se em mais localidades ainda. Mas tudo em vão. Em 1901, o novo âdministrador do concelho do Barreiro (.), depois de estudar demoradamente o processo, faz, de surpresa, no dia 14 de Agosto (pleno período da festividade local a N." Senìora do Rosário), a prisão de dois suspeitos, (moradores na Rua Marquês de PombaÌ), pessoas do Barreiro e muito conhecidas na vila. EstaÌam, então, as intrigas, as discussões tornam-se mais apaixonadas ainda, vjsionam-se delatores encobertos, movidos por ódios pessoais. <O ódio é muito ! A vingança é muita!dizia-se. O futuro dirá estas coisas todasl>

Das duâs prisões então efectuadas, uma apenas foi mantida, a do carpinteiro João Baptista Firmino, sobrinho do veÌho assassinado que, dos caÌabouços da Judiciária, em LÍsboa, deu entrada na Cadeia do Limoeiro a 13 de Setembro desse ano, depois de ter sido pronunciado

(') EÌa administÌador do concelho do Barreiro o 4.. conde de MesquiteÌa, D. Luís Maria ÁÌvaro da Costa de Sousa de Macedo (que no aÌÌo seguinte sairia do Bârrêiao, para exercer iguais funções em SintÌa), e José Luís dÍr Costâ, naturãl do Barrêiro, administÌâdor subsiituto. (") Era novo administrador deste concelho (desde 1-2-1901) Joaquim Alfredo GaÌlis, jornalista e escritor.

1.96


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS no Tribunâl da Comarca do Seixal (a cuja área então pertencia o concelho do Barreiro) como suposto autor do crime. (Casado com Maria da Glória Marques Firmino, sua parente, tinha então sete filhos, o mais velho com 14 aìros e o mais novo com 3 meses). Firmino nunca cessou, porém de proclamar a sua inocência e asseverou-se que nem a mais leve contradição lhe foi notada na instrução do processo. O seu olhar duro, seu génio irascível e fogoso tinham contribuído - também se dizia - para o prejudlcar aos oìhos dos investigadores. Entrou o ano de 1902 e, entretanto, o seu julgamento devia ter Ìugar nas audiências de Junho, daqueie tribunal. O recÌuso, porém, transtorrrado pelo sofrimento, adoece gravemente em Maio, recolhe à enfermaria da cadeia e aí sucumbe a uma cérebro-encefaÌite, no dia 18 desse môs. A Justiça náo o chegara a juÌgar, mas a opinião pública já procÌamara o seu <veredictum>: inocente. E assim terminara a existência do operário republicano, barreirense, que, em 1885, convidara Magalhães Lima a testemunhar o regìsto de nascimento de um dos seus filhos. - (Y. crónica incluÁiLaneste uolume).

Que a inocência de João Baptista Firnino parecia não oferecer dúvidas, está o facto de, muito tempo depois da sua morte, continuarem a ser procurados os autores (ou o autor) do nefando Crtme d,os Velhos. É o que consta de uma outra nota, que possuimos, que nos diz da prisão, ern Setúbal, no dia 15 de Setembro de 1905, de outros dois indivíduos, vendedores ambulantes de tecidos. Rernovidos para o Barreiro, no dia 30 daqueìe mês, nenhumas pÍovas ou mesmo indícios de culpabiÌidade se apuraram contra eles. Aindâ em 1906 se efectuaram diligências, algumas através do Tribunal do Seixal, para Tocalizar e prender mais suspeitos, cujo ro1 não erâ pequeno. Tudo, porém, em vão. O crime ficaria sem castigo. Mas, de um modo geral, era convicção do povo que o ou os assassinos estariam entre os habituais hóspedes das vítimas (bufarinheiros, bricheiros, ferros-velhos - ambulantes - e malteses), que melhor conheciam a casa e os costumes dos seus DroDrietários. 197


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

O procedimento judicial já há muito pïescreveu (5). As paixões e as anlmadversões que o críme provocou dentro do Barreiro já também se extinguiram, como todos aqueles que as agitaram e já findaram a exis;tência. O mistério subsistirá para os humanos. e só Deus o conhece.

J9O5-

AQUELA RUA MIGUEL PAiS...

A Rua Miguel Pais era ântigamente uma artéria muìto pouco sossegada, chegando um jornal de Lisboa a publicar, em 8 de Março dg 1905, esta edificante noticia: <Esta noite houae a tradicional p&ncad.ari,aentre os <ltabitués> da Rm, Mìguel Pais, encetando-se a rlesordem na taberna corlL o n.o 38. Na Ad,minìstração rlo Concelho nã,6 foi, apresentad,a quaL quer queiãú, porque os contend.orescostumam ajustar contas na ríLesma moed,a.Portanto, qualquer noite, teremos o desforço enl nol)a butalha>. Safa !

1905 -EM QUE SE RECORDAM UMA EFÉMERA COLECTIVI. DADE RECREATIVA DO BARREIRO E UMA INSPIRADA POESIA A 14 de Março de 1905, subira à cena no antigo Teatro dos <Franceses>,à Rua Marquês de Pombal, desta vila, a peça de grande intensidade dramática A Torre da Bustilha, de SaÌvaCor Marques, desempenhada pelo Grupo Dramático Barreirense. Tratava-se de espectáculs em benefício da novel S. I. R. dos Empregados dos C. F. S. S., a cuja direcção presidia Joaquim José Fernandes, falecido em presidente da Câmara Municipal do Barreiro, a 7-XII-1950, e que era então escriturário de 3.' classe dos Serviços Centrais (Pessoal Adminìstrativo) dos Caminhos

C) V. CóDIGO PENAL m.in&L (arl." 125."- S 2.).

Cap. VI-

198

Do

evtixLçõ,orla rcsponsabi|idtLd,e cri-


FIGURAS E FACTOS de Ferro do Sul e Sueste. (Deixando o Exército, com o posto de 1." sargento de Infantaria, J. J. Fernandes ingressara nos caminhos de ferro, como factor de 2.', em 20-VII-1904, iniciando então uma carreira que seria rápida e brilhante, até Chefe do Serviço do Movimento, devido às suas incontestáveis qualidades de trabaÌho e aos elevados conhecimentos profissionais que ràpidamente adquiriu). Foi esta sociedade de recreio uma tentativa interessante de um grupo de ferroviários do Barreiro, para criarem um centro de diversão, sem as características mais ou menos poÌíticas das duas principais colectividades recreativas locais: a dos <Penicheiros) e a dos <<Franceses>, respectivamente enfeudadas à facgáo progressista e à regeneradora da poÌítica nacional dessa época. Náo durou, porém, a S. L R. dos Empregados dos C. F. S. S. mais que três anos, pois, era difícil viver nas condições originàriamente imaginadas, tendo a sua última sede (depois de estar instalada num prédio da Rua J. A. Aguiar) sido na Rua Seipa Pinto, n." 6, 1.' andar, por cima da antiga retrozaria de José (e, depois de seu filho, Álvaro) Tavares Veloso. Foi a Tomada d.u,Basti,lha representada, então, naquela data, com enorrne assistência, estando a beÌa sala do teatro profusamente ornamentada de flores e hera, aplicadas juntamente com vários utensílios dos caminhos de ferro, abrilhantando o espectáculo um grupo musical da sociedadebeneficiada. Não se dispensou Joaquim José Fernandes de tomar, também, parte no espectáculo (recoÌhemos dele próprio uma boa parte destes apontamentos), tendo recitado, num dos interva.los, a poesia intitulada Na passagem do Regi,mento (e outra melhor não podia escolher quem saíra há pouco tempo da tropa...) Como é natural que muitos dos nossos leitores (mais jovens...) não conheçam (nem dela tenham ouvido falar) esta inspirada e linda poesia do dr. Bernardo Lucas, que tanta nomeada teve por essa já distante época, recitada em numerosos palcos e salas, não resistimos ao desejo de a reproduzir: Com garbo superior, che'ío d,e luzimento, Por entre a poaoaçã,omarchaaa o regimento, Paru, um campo ond,eiría o uelln general Passar à gu,atni.çãoa reaista gera| 199


DO BARREIRODE VÁRÌAS ÉPOCAS Como era num Domìngo, e ìa na üantei,rc, A m ,síca tocanrJo uma marclt a guerreira, Às portas ainha o poao, abria,m-se as janelns Ond.e assomaaam logo as cabeci,tas bekts De cri.anças gentü e os rostcts del:icatlos De mulheres por quem cLrüenl os sold,o,tIos. E enquanto o regimento ia assim deslumbrante, De súbito, enìbindo utnü cena raüante, Numa casita humikle abr[u-se u,nla l)idraço, E uma Ltnd,amulher, co,rn a mais fina graça E o mais belo sorriso e o muis artlente olho,r, Atirou tla janela um beijo o. um militar. Entã,o ia tocündo o sonoro clarim, E o cotneta pensou: <O beijo é pcLra mim!> Porém, cadct so\d,cL{Jo olhou agradecitlo Para a Lind,amttlh,er, rísonho e conuencitlo Que o bei,jo lhe ero, dado ao seu garbo famoso. Logo catla ofi,cial se julgou donaíroso, Capaz d,a por sì.só ,inspòrar o desejo Que teue essúrrLlllher tle llte atirar o,tmbeíjo, E a um deles mtnca f o'í, como entõ,o, Lisongeira A sun obrigação de le'uw a band,eiru. O coronel sorria. Braao em mui.tcts batalhas, Cobr'ira ìnteiramente o f)eito d.e medalhas, Olhand,oas quuìs, pensou: <Fo'i a minlza brauura Que entusiasmou ass'im aquela, críúturú!> E o beijo que inflamou a, todos corLo um rastilho, Sòmente o comereend,euo oelho ci,rurgiã.o, Que à formosa mulher ti,nln sah:ailo um filho Que ela estat;a a apertar d'encontro ao coração.

1906-<UMA

ARTÉRIA

(DO BARREIRO) MUITO SOI-ITÁRIA>...

Em 1906, na Rua Albers (actual Rua D. Manuel I e ex-Rua Mìguel Bombarda), estava ainda o edifício da C.M.B. em construçã"oe,76t perto do antigo Apeadeir6 do BARREIRO (que erâ junto da passa-A 200


FIGURAS E FACTOS gem de nível de via única), havia já algumas casas, entre as quais a pensão do sr. Joaquim da Rosa, mais conhecido por Joaquirn d,e Étora, (onde agora estão localizados, um estâbeÌecimento de comércio e indústria - café e pastelaria (com fabrico próprio) -e mais três casas comerciais, sendo uma delas de roupas de criança e as outras lojas de bijutarias). Na pensáo hospedavam-se,gerâlmente, ferroviários, solteiros, coÌocados na Estação do Barreiro, empregados de despachantes, negociantes do Alentej o e outros viajantes ( estes surpreendidos, por vezes, com os nevoeiros que faziam guspender as carreiras dos barcos para Lisboa). E mais um estabelecimento de taberna havia perto. <... é. artéría mtr,i,to sol;itó,ria- escrevia-se. então, para um joÍnaÌ lisboeta - send..oa horas mortas urn retrdÃ,aleiro ermo, 'tnesnlo próni,m,o d,o <chalet> clo eW." Carlos Al,bers>. -. O <chalet> ainda lá está e estará, atestando um arrepiante exemplo de conservantismo dos seus abastados proprietários, como se de um <Prémio Valmor> se tratasse. Quanto ao ermo, muito ele mudou, feìizmente.

1908-O

COMBOIO REAL DO DIA 1.. DE FEVEREIRO

O condutor do comboio real que trouxe de Vila Viçosa à gare marítima do Barreiro o rei D. Carlos e o príncipe herdeiro D. Luís FiÌipe, no seu regresso a Lisboa, no trágico dia 1 de Fevereiro de 1908, era João Anacleto da Silva (30-XI-1860/15-III-1946 ), natural de Castro Verde e que foi um dos mais convictos, ardorosos e indefectíveis republicanos que viveram no Barreiro, onde teve forte preponderância política, tendo sido aqui presidente da Direcção do antigo Centro Escolar Republicano Dr, Es.têvão de Vasconcelos e administrador do concelho. Já aposentado, montou nesta vila uma fábrica de refrigerantes, que seus herdeiros continuam.

Naquela viagem, o dur"turtilou em Casa Branca, mas casual"o-noio mente, o que não deixou, todavia, de causar algum aìarme, tendo o forgão e a máquina (a n.. 90, tripuÌada pelo maquinista de 2.' classe Manuel Nunes (Raposo) e pelo fogueiro de 1." classe Manuel Baptista) ficado com várias avadas. 201


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

O referido comboio real foi depois trazido pela máquina n.. 17, conduzidâ pelo maquinista de 2." classe Higino António dos Santos, tendo como fogueiro (de 1.' classe) Francisco da Costa Mechas. Era guarda-freio José da SiÌva Claudino.

,790e-UMA

REPRESENTAÇÃO... SEM FUTURO

Em 21 de Janeiro de 1909, a Câmara MunicipaÌ do Barreiro promoveu uma reunião, na sua sala das sessões,das pessoas mais representativas da terra, para apreciarem o pìano duma companhia alemã, que pretendia construir o futuro Arsenal da Marinha junto desta viÌa. O Presidente apresentou, nessa altura, um projecto de representação ao Governo, no qual se dizia que <o ri,o era naaegá,uelpara qualquer cruzador até ao Barreiro>, contra o que se insurgiu Õ €ng.. Fernando Borges de Sousa (um dos assistentes), que fez ver que tal afirmação só ser-viria para nem ao menos eÌa (a representação) ser lida até ao fim pelos altos poderes, generalizando-se depois a troca de impressões sobre a altura das águas das marés, etc. Tudo ficaria, aÍinal, em <d,guas d,e bacalhau>>,ísto é, navegáveis peÌos Ìugres bacalhoeiros, quê continuam a ir até defronte da Azinheira...

1917-O

<BARREIRO> METRALHADO

E AFUNDADO

O primeiro dos navios de carga que presumimos ter havido com o nome de <BARREIRO> foi o antigo barco alemão <Lubeck>, apresado no Tejo, com outros barcos tomados à Alemanha, após a sua declaração de guerra a Portugal, em Março de 1916. Barco de 3 000 toneladas, com 35 homens de tripulação, só fizera duas viagens com o pavilhão gerrnânico, tornando-se pertença d,osTransportes Marítimos tlo Estado, A 27 de Abril de 1917, o <Barreiro>>, consignado à fir:na Viúva Macieira e C.", largara do cais da Rocha do Conde de óbidos, em Lisboa, com destino a Rouen, com 4 000 pipas de vinho branco e centenas de sacos de cacau, produtos estes destinados a diversas firmas francesas.


FIGURAS E FACTOS

O tapor

<<Bo,rreírot> no mornel4to erL que desa.po,l'eci& nas águas do Cultá,bri,co

No sábado, 28, ao largo da costa norte da Espanha (no Golfo da Biscaia), o vapor, que era comandâdo peÌo câboverdiano José Gomes de Pina, da ilha do Fogo, Íoi metralhado a tiros de canhão, acabando por se afundar, não sem que, antes, marinheiros alemães fossem a bordo, donde levaram o que lhes pareceu útil, mostrando-se satisf,eitos quando souberam que o <Barreiro> era um dos barcos tomados pelo Governo Português aos alemães... O incidente originou apenas a morte do criado de bordo Inácio Martins, quase decapitado por uma granada do submarino, e que foi para o fundo corn o navio, aportando os restantes tripulantes, horas depois, em baleeiras, alguns deÌes muito feridos, à costa espanhola, donde vieram para Poltugâl. 1921-O

BARREIRENSE DESAFIA! CINQUENTA ANOS..,)

(E

ERA

ASSIM

Para que o Desporto também aqui fique representado, reproduzimos a seguir duas notícias publicadas no antigo jornaÌ Os SporÍs, bem reveladoras de outros usos, outros costumes... ,203


DO BARREIRO DE VÁRIAS ÉPOCAS

De 1 9 1 1ú 1 9 5 6 . . . SEDES DO F. C. BARREIRENSE (Numa fotomontagem dê Augusto Câbrita)

Demorad.a foi, a peregrinação do Futebol CLtr,beBam'eirense, por clí1)e'rsasdisas !7Iudos nté ;nala,[ar lodos os s"4s Seruiços c Secções no Ginâsìolgede (que âvultâ ao âlto da foto). N&.do mpnoa d? qtorPnto ? ?;n?o únos - qTte nuncú coruluzi,raqL à deseEJe,ramç&.,.- decorreram d,egde que os seus furld(Ldores (do Sport Recreõ.tí o Operá,rio Barreirense, n(L su{L granàe maíoria) que se reulLiraTrl n4 cd.sinha, hd, anos abarul.o1Ld(l,a e aÚuinadtu,

da et':-Rtta Aímirante

Reís, no cinto de cuja ún'íca porta se colocou, enL 791t5, u.,ttLa lú,pü)e, assìMLlaaúIo a e,femé.ricle(a meio da foto, do lado direito), encet@r\rn a eristência do C|ube <<alti-rubrut>, ãnte,Ìrend,o utna aJí.,rmaçõ,o d,e g,randeza desporti,úa, eltL represent(Lçã.oilo BaÍrei,ro. Foi, ú seile d,a <<Lango do Casal> (todo o 1.' andar do pÌédio que se Ìecorta na paúe inferior dâ mesma IoLo) qüe, até 1956, no;s nonênlos dp pnlusídsttlop ":braçã,o aiaeu, As outÌ'as tü)eram }risL'lria meno|

especütculat

e, a,lgu:ìnns, bastarte

singel&. XIúB todc!,sforanL marcos oÂsinúlo.dos dxnna, honestq, e peq'sistente dctiaìdade iled,icarlct à Ctuus(t clo Desporto. (V. <O BARIìEIRO -II-II

20rr

Parte-A

CONTEMPORÂNEO" Vida

Desportiva).


DO BARREIRODE VÁRÌAS ÉPOCAS De 13-II-1921 - ,.Pelos Clubes - Foot-Ball Clu,b Barreìrense - O Foot-Bnll Club Bc,meirense üceíta, d,esafios com todos os Clubs que conL ele quei,rúm,jogar e para muis facilÌd,ad,edar aos teams que ao Barceiro se rlesloquem, fcr,cilita as p(rssúgensaos jogadores>. E a outra: De 30-VI-1921- <PelosAmedores- No Bameiro - Promoaido pela Federação SociaÌista de Desportos AtÌéticos, efectuou-se no rlomingo, 12 rlo corrente, uma festn. tlesportiaa que tere início por um desafio de foot-ball entre os 1.o' grupos d.o Cintra Foot-ball e o Foot-ball Club Barre'irense, que terminou pel,o,ai.tória do Barreírense, por 10 . goals a 0. O grupo rle Cintra estó, pouco acostumad,o a perd,er, pois que úo aerem as suas rerles furarlas, foram abandonando o cam,po à Íormi.ga. A arbitro,geln f oi razoó,rel, embora nã,o agratlasse a toclos.- PeIa comissã,o, >. f oram of ereciclas medal,llas üo s'1,enced,ores

1929-

AS PANCADAS DOS <ESPÍRiTOS>..,

Este engraçado <mistório> passou-se na Primavera do referido ano, na Rua MigueÌ Pais, num prédio de rés-do-cháoe 1.oandar com o n.' 72, de José Marinho (1), benquisto cidadão barreirense, casado, e proprietário local, que ainda bem conhecemosna nossa mocidade. Aquilo era umas pancadas fortes - diziam que nós não as ouvimos, credo1...- capazesde estremecertoda a casal José Marinho julgara, a princípio, que fossem brincadeiras de mau gosto dos vizinhos do andar de cima e pediulhes explicações. Ora as criaturas jurarâm estar tão inocentesdo insóÌito caso como quando foram deitadasao mundo; todavia, as pancadâs não deixavam de soar, todos os dias, ató com arreliadora pontuâìidadel Além de insólitas, toÌ"navam-se incomodativas e não havia já dúvida de que deviam provir do próprio rés-do-chão! O caso acabou por sair dos domínios familiares para o domínio público e logo se lhe deu foros de sobrenatural. Era o espírito da antiga

(') Falecido na sua ditâ residência, a 20-Ì-1950, com 84 anos de idade. já no estado de viúvo de Maria. Leonor Esteves Mârinho.

205


DO BARREIRODE VÁRIAS ÉPOCAS dona da casa, diziam uns; era uma outra <<almado outro mundo>, afirmavam outros, A casa passou, então, a ser visitada por inúmeras pessoas do Barreiro, perante as quais: o tâl <espírito> respondia com pancadas ao que lhe perguntavam, como ìhe era indicado ! E até acompanhava com pancadas na parede, que sepârâva a cozinha de outro compartimento da casa, as cantigas duma rapariguita de 13 anos, de lome Judite, criadita da casa, quando eÌa cantarolava a canção da <<Vassourinha> ! Mas a jovem, naquela ocasião, nunca estava presente! O <espírito> só com ela é que parecia gnfsndgl-ss- s1a a <medium>...- e, para isso, precisava que a deixassem só, no tal compaúimento ao lado da cozinha. Jornais de Lìsboa tomaram conta do <caso>,isto iá em Junho desse ano, depois de decorridos perto de três meses após o aparecimento do <fenómeno>,e em 24 horas tudo se pôs a Ìimpo! Era o dia 5 daquele mês. A taÌ Judite, que não sabia ler nem escrever, mas era espertalhota e ladina, só depois de se assegurar que as outras pessoasestavam €m sítio de onde não a podiam ver, é que conseguia fazer <faÌar a parede> através das pancadasmisteriosas..., vindo, então, a descobrir-seque era eìa própria quem as provocava, batendo com as nádegas contra certo locaÌ da parede que ressoava com faciÌidade. Um simples fenómeno físico, provocou os maiores disfrutes e também afinal. Claro que a <<descobertâ> alguns desmaios das pessoasmais nervosas... com o que tudo, porém, acabou, passândo-se,depois, a perguntar o motivo de toda aqueÌa <fita>, que até passou por ser recÌamo de uma sociedade de espíritas, em formação, por essa época, no Barreiro... Enfim, nunca se soube ao certo. Mas que o caso foi <<notícia> para os jornais, 1á isso foi... Para que havia de dar à Judite, hein? E que será hoje feito ctrela?

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206


FIGURAS E FACTOS

BARREIRO ANTIGO-BAIRRO

DE

S. FRANCISCO

(Foto de José Joaquin)

Unü trecho dct Bairro d,e S. Francisco, coÌtL seus neIlLoBpré(Jios de beirul à portugue'a (à.e$cepçã,o e).eum ou oütro cuia reco;strução Íugi1a à trag6 cúro,cterística d.o local)- To'Q,ta-sede uma ri.st& pa,rcíaL da Rut José Rell)ús, que, neste troço, é um pequeno largo ou praceta. por:ularmente d,esi.gnaal.o ftor Largo do Rompana, por Ia ter sído estabelecklo o p't'o'l/r'ietá,rio e comercàante local Francisco d,os Sair,tos Roonpana (que abotoT.ìxL& ìd,quetú corlt 6 dltmlaaes de ouro, quando os outros os p!tuíün dp Itrdla.,.), oli leulo falerìdo pn J83J. (Foi ouô dp um distìilissimo 1Ì1.éücobú,Ì'r'eiÌ'ense,d,o mesmo no1ne, tarnbéL\ j(í ía,Iecíd.o-V, <<O BARREIRO ANTIGO E MODERNO>, - I Po,rte-Cúp. XLIV-pp. s61). tÌltimamente (1968-1969), ÍoÌ.a1rLco\ocad&s na.s esqu,ínas d,os ariuaraentos deste bai?ro, pl(Lcas toponímicas em paináis d,e azuLejo (Louça de Saca!é1tL) ,) ,i'ÌtLitand,o o atnho @nügo, e aintla uma Eérie d,e 19 canilieiros, d,e ontì-go d,esenho,de cobre e latã,o, cont consolas de ferro ftudil.o, eEipaã.os d,e luz mista.

207


DO BARREIRO DN VÁRIAS ÉPOCAS

UM VELHO ASPECTO DA RUA DO CONSELHEIRO JOAQUIM ANTÓNIO DE AGUIAR

O mais ir,regular

tr e-

clLo destd ttiltiga

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clo Barreirc.

No 1." plana, clo lado esqTLer(Lo, quase ìnteiramellte Íor& do dlinl&nento da rLta, ,-ê-se c prédìo com. os n.'" 228 a 231+

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de palicìl1, culjo larlo poelrte d,eìtcL par& a Tc'antessaclo Lottreiro, rL.' 5, o qu{LI pertenceïL a. Joã,oM&ri& de Abretl llorebt

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(1826-190ï) e

em cLljo 1.' andar ele resìdia, se|Ldo actualmente dè seu,sdescend"erlte,s,residentes

em

-:".'

M atttentor -o-N orto ( | a-

:P-; A^ 1.6_

nLíIia Moreird. de Campos). A sua lerga jí1r&la de peito, roltado

à d.ita tr&,-essa., encontt'&1)cí-seno petfeìto enÍia Leúto daquela rua, e é tradìção que a$ihr licou para que eqrLeíeantigo barreìrense pxulessadeld. obserua,r. cómo(la e satisÏatü'ian ente inst&\l7d.o, a m&rclLa d,a Ttrocissão de Nossa Senhor& d,o Easó,rìo, d,esclea sua lgrejd, Iú no lund,o, (t uns borrs 70a metros... Este Itrédio sofretr grand,e benef iciação em 19ti9. Ao futulo, um dos préd.ios (co,m.os Ì1." 5 e 7 da Rua da Amoreira) que estrcotglrleÌÌL 6 Ru& ilo ConsellLeil'o AgtLìar e que têm resístülo, até hoie, (to cama.rtelo municipa,I.

208


18-Vr-1933 - RECORDAçÃO DUMA YISITA AO BARRE IRO, P RE CURS OR A DA

MINISTERIAL

PRESIDENCIAL

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O U EN T ES Cfoqueresde gaÌinho com queiJopalmeÀao Cêixinhôsfolh6oascom recheiP Rìssoesde camarao Dequenosbifes F F IOS

giletes de lombo com ôgrióes giambre com ôspic Sônduíchesvariôdês iÌú

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I G UARI AS gfutóô 60 c616me10 60lo 'lnqÌeõ e Pão de eó Petilô fours á 9ronceta. Oôce de ovcs á PoÍtuguesa Rebuçôdos de ovos e de ffuta ôcÌeres de cafè e Jonoiaxe PolrÌ)ieres de mil folhas Án:nás com vinho do Polto Oonbons, omendoos, eÌc, Neve de morongo

vtNHoa ah^h6^ónÂ

e Café

Ì r G À c ^ s ^ Fth Es ^ J T A V A R ES 5t, nu ir hlnr. 6!- llsmt

NOTA:

ôÁFiÃ-<

f\^r r ^

do <tL nclL>t oíerecido ao Ministro Interior, d.os Reis D't'. Albino (actüt ['ìnente o deput(Ldo rnuis &nügo da X Legisldíu,r& (1969-1973) rl,a Assembteìa Ndnionq,\ po,t' ocod.as siã,o dú incúrgul'eçd..o (oficial) obras de construçã,o cJ,tuMu'alha Norte d.a. ri.La. (V, O Barreiro Contemporâneo - I - I Pdrte Coa. VII) EsBe <<lunch>, set'aid.o & dnas centenas de conrido.Cos, no antigo Salã,o de BibLíoteca d.a C, M. B. (clctu&btle'ÌLte b8to,la4ões da Reparüção Técni,ca), ïoi. o muís pela qualidade d.as requinto.do, 'iguat'iÚ,s e respectiro serlJiço, de quantos, até oÁ, tìnha. d, Pastelaria T atares I onlecídn para lo calidad.es à tolta d,e Lìsbo.t,- Fícou na memória de tod,osos cotwiaas (incluind.o a do Autot, que tanlbém Iâ estere...) (Da Colecçáo dó Autor)


5-XI-1933-RECORDAÇÃODA VISITA DOS DOIS PRESIDENTES À VILA

DO BARREIRO

Un artí:ttico eremplar ilo, ement& do <<Potto de Honrat> oferecitlo peta C. XI. B, e serïiiLo no Mercdclo ÌI1t1tícípoí (no tlia d& ìntuuguração da sua coberturo metiilica), a centena,s tla conridtLtlos, sob d, ?re'idêtuci(L do então galJernadot cútil tle Setúbaí, Dr. Mítrio Cais Este"ras, otu regozijo pela t:isita de Cat'mona e de SalrLzar cLoBa,r,ì'eiro (benL), bebett-se (melhor ) e, c ìna1.Lg7rÏaçíLo de tíu"ios,mellLorconevto:..-Com.eu-se d,epois,clunçorLse (mal...) pela noite adi\nte... (Da Colecção do Autor)


ÍN nr cps



ÍNDICE

DOS

AS S UNT O S Pá"s.

Brevê Nota de Introdução

7

A trasÌadação dos ossos de Vasco da Gama em 1880-Sua pelo BaÌÌeiro Citação do Barreiro

VELIIOS

breve passagem

I

nas obras de Gil Vicente

18

MANUSCRITOS:

1-...e a Misericórdia foi indemnizada por D. Brites, parâ (desencârr€gaÌ)) a, alma do defunto marido II -

Erâ.m (boca-Ìmente)) avisados, o andadoÌ tocava o sino, mas os irmãos nãs apareciam

III-Em 1810, a Misericórdia do Barreiro zela pela regularidâde contâs e despacha alguns assuntos interessantes

27 Zl

das suas 25

IV-En 1818, o Guardião do Convento da VerdeÌena informava a Misericórdia do Barreiro (que não tinhâ Pâdres que lhe comêssem toda a carne>l

28

Uma <<Notíciar>do Passado...-As Barreiro, em 1825

g0

Como se comemorou no BarÌêiÌo

Festas a Nossa Senhora do RosâÌio do a aclamà4ã.o do rei D. Pedro V (1855)

35

A vinda ao Barreiro de D. Pedro V e Família Real, em 1859, de visita ao Caminho de FerÌo do Sul, em construção, e outras notícias da época

39

João António Gomes - EscoÌco biográfico de um barreirense de rija ãntigo pÌesidente do Município local

49

têmpera,

Por algun5 não pagam todos... - À população, do Sarreiro grâvem€nte ofendida no dia de Ano Bom de 1871

213


Pás. Quando um ba.rreirense solicitou e obteve, no Brâsil, donativos para o cuÌto de Nossa. Senhorâ do Rosário (1874-76) À História

da ((Peçâ)) (6-I-18?7) -Um

ceÌtame musicaÌ que deu brado

O dr. Magalhães Lima veio ao Barreiro, peÌa primeira testemunhaÌ o registo do fiÌho de um operário 1890 - O (Ultimatum>> do Barreiro

63

vez, em 1885, pârâ 17 da populâçáo

A5 maniÍestações patrióticas

inglês

58

'i7

Recorda-se o €ng.o Tavâïes Trigueiros, antigo directoÌ dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste, altamente estimado pela cÌasse ferroyiáriâ do Barreiro

80

Um coÌtejo do 1." de Maio, no BaÌreiÌo,

84

há mais de 70 anos

Uma achega para a história do movimento socialista em Portugal centaos socialistâs barreirenses Manuel Guâldino, o hábil operário barreitense que construiu

Os cinco 88

uma locomotivâ

(1906)

-q9

Àntigos e habilidosos operários que honrâaam o Barreiro onde se especializarâm) e o Trabaìho Nacional Um mestÌe de operários barreirense. Loura) - 1964 Um pedaço do antigo Baneiro, do Casal),

DA PASSADA VÌDA I-O II -

Ginguinha -

(onde nascerâm ou 109 José (da

No Centenário de António

725

que foi o (mini-RossilD locaÌ: o popuÌar <Largo

BOÉMIA

127

E FADISTA

DO BARREIRO:

Ídolo do Fado

O ((Armândinho)) -

138 742

Mago da GuitarÍa

Amadorcs do Fado e de Serenatas, que o Barreiro

.

745

conheceu e ,

149

V-Mais Ìecentemente...- OutÌos fâdistas e poetas do Fado. - Citam-se vâÌios locais onde se cultivou a popular canção (e se pÌaticou tambóm o Jogo do Pau). -E termina-se com (Os MariaÌvasr . . , . . . .

156

III -

conheceu

Mais alguns âmadores de Fados e Serenatas que o BaueiÌo os insi;rumentistas

Barreiro em Marcha.,.-A

Vila IndustÌiâÌ

.

cantadâ em verso .

Mais outra canção que náo foge ao tema caracteaístico do Bârreiro. <Aìfredo da SilvD (1939)

162 Canção

A Marcha dos BaÌões (22-VIII-1946) Mário

164 166

Rodrigues Solâno, o "Lá-Vâi)), umâ figura

211+

popuÌar do comér:cio locaÌ

168


Uma pitoresea série de figuras populares do Barreiro dos tempos passados (e uma, apenas, da actualidade...): o <Chico> Alminhas e o (Maneb) Pedro; o Alexandre; a espanhola da5 guloseimasl o <Pêra ou Mosca>, o (CadáveD); o espânhol dos amendoins; o (CâmaraduchoD; o (Barbeiro das ObÌas)), etc.

771

As senhas (que folam <<dinheirot) emitidas no Barreiro, em 1920 e 1921 (Quândo as Tipografias substitúírâm a Casa da Moeda)

187

UM FEIXE DE RETALHOS DO PASSADO E MAIS ALGUMAS RECORCódigo de Posturas MuDAÇõES... (Poa oÌdem cronológica): 1862-Do nicipâl; 18?1-0 empedïamento dum antigo troço da Estradâ Real (Rua MigueÌ Pais); 1871- Providências contÌâ uma epidemia; 1872-Um <frâcor farol...; 1889-1890- Felicidades Perpétuas...; 1894-For|te Distracçáo!; 1900-O Crime dos Velhosi 1905- Aquela Ruâ Migu€l Pais,..; 1905 - Em que se Ìecordâm umâ €fémera colectiúdade recÌeativâ do Baraúériâ (do BaueiÌo) muito reiro e uma inspirada poesia; 1906-(Uma solitáriaD...; 1908-O Comloio Rcal do dia 1.' de Fevereiro; 1909(BARREIRO)) metralhado Uma repÌesentação... sem futuÌoj 191?-O Barreirense desafia! (E já era assim há cine afundado; 1921-O qrenta anos,..) I 1923-As pancadas dos ((espíritos)) Barreiro

Antiso -

O mâis irreg!ìar 18-VÌ-1933 5-XI-1933 -

Bairro

trecho da Rua do ConseÌheiro Joaquim António

RecoÌda4ão duma visita Recordação da visita

ministerial

208

de Aguiar

209

ao Barreiro

dos dois Presidentes ao Barreiro

215

1 207

de S. FÌâncisco

.

,

.

.

270



DA S

ÍNDICE

GRA V URA S

P6c.

10

D, Vasco da Gama, 1.' Conde da Vidigueira Túmulo de Vasco da Gama, na Ìgìeja

16

dos Jerónimos

19

Gil Vicente Edifício dâ Santa Casa. da Misericórdia

do Barreiro

(1946)

29 31

Nossã Senhora do RosáÌio da Vila do BaÌreiro J-Letrâ

Capitular

(Alusiva

37

à aclamaçáo de D. Pedro V)

Aspecto da Estação dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste (edifício antigo) João António

50

Gomes (1807-1876)

Cons. João Pedro TavaÌes Trigreiros

(1831-1902)

82

A cabeça do 1.' númeÌo do quinzenário baÌTeirense (<ÁvanteD (1909) B-

LetÌa, Capitular

(Alusiva ao Baareiro como impor.tante centro de trabalho)

92 100 101

Manuel Gualdino da Silva (1865-1914\ Barreiro - Antigas instala4ões da fábrica (gravura de 1898) Uma locomotivâ (em miniâtura),

42

de codiça

da Quinta

Braamcamp

no Largo de N.' SenhoÌâ do Rosário, em 1906

103 106

José da Louaa (1864-1949)

726

Um aspecto do ((Largo do Casab>, em 1912

131

OutÌo âspêcto do (LaÌgo do Casab> (lâdo or.iental) €m 1912 ,

134

Umâ vista parcial do (Largo

136

António

Domingos dos Santos MaÌujo

do Casal> em 1943 . (1900-1968) .

217

150


Pás.

. Um cartão de visita de Francisco dos Santos

771

Tipos Populares .- o (CamaÌaducho,

180

(Desenho de Américo MâÌinho)

Cédulas emitidas pela Cârnara MunicipaÌ do BarreiÌo

em 1920-21

Cédules emitidas pelo antigo Asilo de D, Pedro V do Barreiro

em 1927

189 190

O vapor <<Barreiro> nò Ìnomento de desaparecer nas águas do Cantáltico

203

De 1911 a 1956...-Sedes

204

do Futebol Clube Barreirense

Um aspecto do chamado (LâÌgo

Um velho aspecto da Rua do Cons. Joaquim António de AguiâÌ Cardápio das igualiâs

2o7

do RompanD) .

208 209

de um lanche

Cardápio das iguarias de um (Porto de Honrar

21,0

I

218



Cor p.

e im p. na Gr éflca Bôa Nova, L da -

B!,â Al v es T or s o, 2A- Li s boa



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