Almanaque Brasil 151 - Novembro 2011

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Músicas para consertar a política

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u conheço a música que irrita os políticos desde os remotos tempos em que rodeávamos o velho rádio do avô Juca para ouvir as marotices de Nhô Totico e da dupla Alvarenga e Ranchinho. De política eu nada sabia. Por isso, para entender e rir das jocosas paródias, precisava da ajuda dos mais velhos. Muito mais tarde, já morando em São Paulo, lembro de ouvir Juca Chaves brincando com Juscelino Kubitschek. Confesso que não achava graça alguma naquela canção, pois o tal presidente e mesmo a bossa nova não faziam parte dos meus parcos conhecimentos. Só adentrei mesmo o mundo da política como aprendiz de operário. Como levava jeito para desenhar, fui incumbido de fazer charges no jornalzinho da fábrica. Orientado por operários mais velhos, desenhava reivindicações por melhores salários e mais segurança nas grandes e perigosas máquinas. Nessa mesma fábrica, o gosto pela música depois me promoveu a programador do som ambiente do refeitório da fábrica, que mais tarde passei a decorar com grandes painéis nos bailes de sábado. Quando deixei a fábrica para ser desenhista, tornei-me assistente de cenógrafo do programa de Luiz Vieira, a maior audiência da tevê brasileira na época. Lá aprendi que a música podia ser política sem deixar de ser bela e emocionante. Certo dia, o apresentador recitou versos sobre o sofrimento causado pela seca ao povo nordestino. Aqueles versos me fizeram esquecer pela primeira vez o meu próprio sofrimento. Guardo até hoje na memória a imagem das últimas palavras: agonizando, uma velha árvore estendia ao céu seus galhos secos, pedindo água a Jesus. Naquela noite descobri um Brasil maior e mais pobre do que o bairro onde eu vivia. Desde então, acho que me tornei um ser político e mais solidário. Nos anos 1970, fiz do meu ofício uma modesta contribuição contra o arbítrio do regime militar, que calou a imprensa e tentou calar a voz dos melhores cantores da minha geração. A todos emprestei solidariedade e desenhos para que, antes dos ouvidos, os olhos pudessem ver que mesmo amordaçada a voz ainda cantava o canto da liberdade. E a voz venceu, vencemos nós, venceu o Brasil. Graças a isso, hoje cantamos livres todos os cantos deste imenso país, que, infelizmente, ainda precisa da música para consertar a sua política.

ARMAZÉM DA M E MÓRIA NAC IONAL Diretor editorial Elifas Andreato Diretor executivo Bento Huzak Andreato Editor João Rocha Rodrigues Editor de arte Dennis Vecchione Editora de imagens Laura Huzak Andreato Editor contribuinte Mylton Severiano Redatores Bruno Hoffmann e Natália Pesciotta Revisora Liliane Benetti Designers Guilherme Resende, Rodrigo Terra Vargas, Soledad Cifuentes e Daniela Santiago (estagiária) Redatoras web Jaqueline Ogliari e Marisa Nascimento (estagiária) Gerente administrativa Fabiana Rocha Oliveira Assistentes administrativas Eliana Freitas, Viviane Silva e Geisa Lima Assessoria jurídica Cesnik, Quintino e Salinas Advogados Jornalista responsável João Rocha Rodrigues (MTb 45265/SP) Impressão Gráfica Oceano PUBLICIDADE Fernanda Santiago (11) 3873-9115 E-mail: publicidade@almanaquebrasil.com.br Distribuição em voos nacionais e internacionais

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Elifas Andreato

Onde a palavra falha, a música fala. Hans Christian Andersen, escritor dinamarquês

índice 5 carta enigmática 8 você sabia? 14 brasil na tv CANTOS E LETRAS 15 PAPO-CABEÇA Renato Teixera

20 ESPECIAL

26 JOGOS E BRINCADEIRAS 27 O Teco-teco 28 Viva o brasil Cunha

32 em se plantando, tudo dá

Laranja

34 bom humor

Anita Malfatti

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Música e política

24 IlUSTRES BRASILEIROS

Aumente seu nível de brasilidade e ganhe pontos para trocar por uma infinidade de prêmios Quem assina o Almanaque acumula pontos na rede Multiplus Fidelidade

capa Rodrigo Terra Vargas


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perceber que por aqui ninguém sabia o que fazer com uma bola como aquelas. O jeito foi reunir os ingleses que vieram trabalhar no Brasil e, em abril 1895, organizar a primeira partida de futebol que se tem notícia no País. O jogo, realizado na Várzea do Carmo, local onde hoje fica o Parque Dom Pedro, no centro de São Paulo, terminou em 4 a 2 para seu time. O brasileiro de nome inglês foi fundamental para a criação da Liga Paulista de Futebol, a primeira do País. Também marcava gols pelo São Paulo Athetic Club. Encerraria a carreira em 1910, mas não deixaria o futebol de lado. Tornou-se árbitro e envolveu-se em outras atividades relacionadas ao esporte. Hoje dá nome à praça onde fica o estádio mais charmoso de São Paulo. (BH)

Reconhece os cabeludos aí ao lado? Pois saiba que três deles certamente você sabe quem são. Ritchie, Lobão e Lulu Santos posam ao lado dos outros dois integrantes do Vímana, obscura banda que tiveram juntos nos anos 1970. Lulu Santos, que na época não desgrudava do pessoal dos Mutantes, conheceu na comunidade onde a banda morava o flautista inglês Ritchie. Lobão assumiu as baquetas por indicação de um amigo. A verdade é que o único compacto do grupo de rock progressivo com nome em sânscrito não entrou para a história. Mas seus integrantes, felizmente, sim.

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sua bagagem tinha roupas e itens pessoais. Mas outros objetos que colocou na mala para a viagem entre Inglaterra e Brasil mudariam a história do País: bolas, par de chuteiras, livros de regras, bomba de ar, uniformes. É considerado o responsável por trazer o futebol para estas terras. Tudo começou quando o paulistano nascido no bairro do Brás em 24 de novembro de 1874 mudou-se para a Inglaterra aos nove anos. Filho de escocês com brasileira de origem inglesa, apaixonou-se por rúgbi, críquete e, claro, por futebol. Aos 20 anos, já com um aristocrático bigode, resolveu voltar à terra natal para trabalhar numa estrada de ferro. E tratou de pôr os objetos de seu amor futebolístico na bagagem. O esporte era a coisa a que mais dava valor na vida. Mas espantou-se ao

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20/11/1695

Morre Zumbi dos Palmares, o último líder do Quilombo dos Palmares. Tempos depois, a data se torna o Dia Nacional da Consciência Negra.

22/11/1910

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João Cândido inicia a Revolta da Chibata, contra maus tratos a marinheiros de baixa patente, quase todos negros. Torna-se conhecido como o Almirante Negro.

Villa Kyrial livrou intelectuais da vida chã

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Kyrial. Tratava-se da chácara do senador Freitas Vale, um grande mecenas do período. No casarão, ele organizava salões de arte que não deviam nada à efervecência cultural da Belle Époque. Em saraus, banquetes e recepções, reuniam-se vários tipos da intelectualidade brasileira. “Desde o fútil Frequentadores da chácara: croquet, pingue-pongue e planos de revolucionar a arte brasileira. autômato da diplomacia do século 19, Sousa Dantas, até uma promissória de omingos de Morais, 555. Segundo gênio, o pianista Sousa Lima”, exemplificava Oswald Mário de Andrade, um oásis tinha esse de Andrade. Foi ali que ele e Mário, entre outros, endereço na São Paulo do começo do século 20: conceberam a Semana de Arte Moderna de 1922. “É o único salão organizado, único oásis a que Não havia artista em turnê pelo Brasil que a gente se recolha semanalmente, livrandonão passasse por lá. No gramado jogava-se se da vida chã”, dizia o poeta sobre a Villa

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croquet, jogo europeu parecido com o golfe, e na adega aconteciam concorridos campeonatos de pingue-pongue. Mas não pense que era bagunça. Apesar dos ares de vanguarda artística, tradições aristocráticas eram respeitadas. Os convites pessoais para banquetes esclareciam, além da programação cultural, o traje necessário: casaca ou smoking. Era necessário entender de vinhos e degustação de pratos exóticos. Para o crítico Antonio Candido, a Villa Kyrial foi “o mais completo exemplar que houve em São Paulo um traço característico da Belle Époque: a concepção de que o cotidiano deveria se tornar obra de arte”. Depois de demolida para dar lugar a prédios nos anos 1960, a chácara localizada na Vila Mariana sobrevive apenas nas fotos. (NP)

SAIBA MAIS Villa Kyrial – Crônica da Belle Époque brasileira, de Marcia Camargos (Senac, 2000).

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arizinho tem sete anos, é morena Além disso, a futura especialista em como jambo, gosta muito de pipoca Chopin seria a maior divulgadora da obra e já sabe fazer uns bolinhos de polvilho de Villa-Lobos. bem gostosos.” Você deve conhecer a Devido à Primeira Guerra, nas primeiras descrição, mas talvez não saiba que a décadas do século 20, Guiomar se revezou tal menina do narizinho arrebitado de entre Brasil e Estados Unidos, onde foi Monteiro Lobato tem inspiração na vida recebida como a melhor do mundo. Tocou real. Chamava Guiomar Novaes e era uma até na Semana de Arte Moderna, em 1922, dos 19 filhos dos vizinhos do escritor. O no Theatro Municipal de São Paulo. que ele não sabia na época é que a garota, No início da carreira, um dos membros que já dedilhava o piano, se tornaria uma da comissão julgadora do Conservatório de das maiores do mundo no instrumento. Paris havia reparado: “Ela não é bela, mas Aos 15 anos, em 1909, Guiomar recebeu tem os olhos ébrios da música e aquele Guiomar Novaes: elogios até do The New York Times. uma bolsa do estado de São Paulo para poder de isolar-se de tudo que a cerca”. Mais estudar música em Paris. Princesa Isabel, outra pianista que tarde o The New York Times iria além: “Se ela tivesse nascido vivia por lá, incentivou a jovem a tocar uma composição alguns anos atrás, certamente teria sido queimada viva como baseada no Hino Nacional que virou sua marca no exterior. feiticeira. Ela é jovem, bonita e toca como o diabo”. (NP) Reprodução

Menina do nariz arrebitado tocava “como o diabo”

Guiomar Novaes: Uma arrebatadora história de amor, de Maria Stella Orsini (C.I., 1992). No site do A lmanaque , ouça músicas tocadas por Guiomar. www.almanaquebrasil.com.br


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epois de sete anos ou, mais precisamente, 50 mil horas de trabalho, a construtora que terminou a maior hidrelétrica do mundo ainda trabalhou em um detalhe final: arquibancadas às margens do rio Paraná. Mais de cinco mil pessoas foram assistir à abertura das comportas da hidrelétrica de Itaipu, em 5 de novembro de 1982. Foram os presidentes do Brasil e do Paraguai, João Figueiredo e Alfredo Stroessner, que acionaram o mecanismo que levantou as comportas da obra binacional. Em meia hora, as águas represadas do rio formaram uma onda que encharcou o público. Figueiredo animou-se no discurso: “Esta obra é um exemplo do que é possível fazer em entendimento entre as nações quando existe respeito e amizade”. Mas poucos ouviram a comemoração do presidente. Uma forte chuva afugentou o público, já ensopado, no fim do evento. (NP)

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Antes de encher Itaipu, rio Paraná encharcou convidados

Joaquim Pedro de Andrade em ação: cineasta filmou de Mário de Andrade a Drummond.

Joaquim Pedro só se interessava pelo Brasil (e por livros) 22/11 “S

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ó sei fazer cinema no Brasil, só sei falar do Brasil, só me interessa o Brasil.” O cineasta Joaquim Pedro de Andrade poderia ter completado: “E, para falar do Brasil, só me interessa a literatura”. São poucos os filmes do carioca que não se baseiam na poesia ou na ficção nacional. No tempo em que o filho de intelectuais era recém-formado em Física, documentou Gilberto Freyre em O Mestre de Apipucos, e Manuel Bandeira, seu padrinho, em O Poeta do Castelo. Homem de esquerda, desagradou o Partido Comunista ao filmar O Poeta e a Moça, de Drummond. “É intelectualizado demais, não comunica”, acusou uma liderança no apartamento de Nara Leão. Deve ter se surpreendido com Macunaíma, o filme mais bem sucedido do Cinema Novo. O título premiado, estrelado por Grande Otelo e Paulo José, foi assistido por dois milhões de pessoas. O Modernismo de Mário de Andrade tinha tudo a ver com o Cinema Novo, e, nas palavras do jornalista Ruy Castro, levava para a telona a densidade da obra em “tropicalismo, circo, chanchada, pop art, pastelão, faroeste e até Cinema Novo”. Poemas dos antigos revolucionários mineiros também foram escolhidos a dedo para um longa de 1972. Em Os Inconfidentes, Joaquim Pedro denunciava a tortura da Ditadura Militar pelas falas de Tiradentes, deixando a censura sem ação. Entre trabalhos comerciais e publicitários, o cineasta filmou livros até o fim. Quando morreu, em 1988, preparava a ida às telas de Casa Grande e Senzala, baseada no clássico de Gilberto Freyre. (NP)

No site do A lmanaque , assista a um documentário sobre a construção da usina.

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SAIBA MAIS Joaquim Pedro de Andrade: A revolução intimista, de Ivana Bentes (Relume-Dumará, 1996).

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Figueiredo e Stroessner na inauguração de Itaipu.

10 de nov idades na pele de um repórter desconcertando políticos e personal f estava entre as vítimas Malu o de tevê meio atrapalhado. Paul soube desde o princípio explorar preferenciais. Entusiasta da internet, ia. Hoje, com cabeleira menos com inteligência os recursos multimíd ular e por vezes polêmico pop um vasta do que na foto, comanda programa de tevê.

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Prudente de Morais

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crime político está, enfim, implantado nos costumes brasileiros.” Assim noticiou o jornal Cidade do Rio, referindo-se ao atentado contra Prudente de Morais, ocorrido em 5 de novembro de 1897. Tudo começou quando o presidente recepcionava os militares que retornavam vitoriosos da Guerra de Canudos. Mas, entre sorrisos e afagos, o fato é que a guerra havia desgastado a relação entre o governo e o Exército. O símbolo desse descontentamento foi o jovem militar Marcelino Bispo de Melo, que durante a solenidade sacou um revólver e apontou para Prudente de Morais. A sorte do mandatário é que a arma falhou. Mas Marcelino não se deu por vencido. Puxou uma faca e partiu para cima do presidente, que foi defendido pelo coronel Mendes de Moraes e pelo ministro da Guerra, marechal Carlos Machado Bittencourt. O coronel saiu apenas ferido, mas Bittencourt “três minutos depois era cadáver”, como descreveu o Cidade do Rio. A Gazeta da Tarde estampou: “É geral o luto na cidade. As repartições públicas encerraram o expediente; as redações de todos os jornais içaram bandeiras a meio pau; deixaram de funcionar os teatros”. Marcelino foi preso e pouco dias depois encontrado morto na cela. A motivação do crime, apesar do descontentamento de parte dos militares com Canudos, nunca foi totalmente esclarecida. E o atentado deu força política a Prudente de Morais, que após o acontecimento decretou estado de sítio na capital do País, aumentando seu poder (BH) sobre os opositores. No site do Almanaque, confira notícias da época sobre o acontecimento. www.almanaquebrasil.com.br

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Parceiro de são Pedro, Takeshi criou técnica para fazer chover 4/11

dia mundial do inventor

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oi há mais de 30 anos. Takeshi Imai usava todo seu conhecimento em engenharia para criar equipamentos que ajudassem o homem do campo a produzir mais. Sua fábrica era famosa pelas motosserras capazes de jogar no chão uma árvore imensa em segundos. Ele mesmo testava as máquinas vez por outra. Até que numa tarde, com o ronco do motor gritando em seu ouvido, ele se preparava para derrubar um tronco quando quem caiu foi ele. O corpo não estava bem, faltavam forças e equilíbrio. Bastou aquela tarde. Nunca mais ele derrubou uma árvore sequer. A fábrica, que também não andava tão bem das pernas, foi fechada e os segredos da engenharia passaram a ser usados para outros fins. Takeshi aprendeu que para uma árvore crescer forte e sadia precisava de água. E ele resolveu agir. Estudou anos a fio para descobrir como a nuvem se forma, cresce, precipita e vira tempestade. Tornou-se um especialista em gotas, um “gotólogo”, como ele mesmo diz. Embarcou em um avião, transportou para os céus do interior de São Paulo nada menos que 300 litros de água potável. Gota a gota, borrifou o líquido nas nuvens. As gotas de tamanho controlado semeadas por Imai se grudaram à água da nuvem. Tempos depois a chuva correu forte e bem distribuída. Estava criado um método que acelera a precipitação sem usar produtos químicos. A técnica é uma mão na roda nos períodos de estiagem que assolam o sistema Cantareira/Alto Tietê, que abastece a capital paulista. Takeshi semeia água e colhe chuva de verdade. É um parceiro de são Pedro e faz de tudo, inclusive chover. (Laís Duarte) Divulgação

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SAIBA MAIS Conheça a técnica criada por Takeshi Imai em www.modclima.com.br.


Torcida do Bahia vaiou o próprio zagueiro por impedir gol de Pelé

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alvez o gol mais famoso da história do futebol seja o milésimo de Pelé, marcado contra o Vasco, no Maracanã. Mas pouca gente sabe que o tento número mil do Rei era aguardado para três dias antes, em 16 de novembro de 1969, num jogo entre Santos e Bahia. Era pelo menos no que apostavam os quase 50 mil torcedores que lotavam o estádio da Fonte Nova, em Salvador. A partida estava um a um até o fim do segundo tempo, quando Pelé driblou dois adversários e, com a meta vazia, deu um toque firme em direção ao gol. Ninguém no estádio ousou fazer sequer um movimento. Exceção feita ao zagueiro Nildo, conhecido como Birro

Doido, que esticou a perna de forma espetacular e salvou a bola em cima da risca. Em vez de aplausos, Nildo tomou da própria torcida uma das maiores vaias da história da Fonte Nova. Uma placa de ouro do governo da Bahia já estava até pronta: “Para Pelé, glória do esporte brasileiro e rei do futebol, em comemoração ao seu milésimo gol”. Mas aquela tarde de domingo (BH) não entrou para a história.

No site do Almanaque, veja o lance do quase milésimo gol de Pelé.

Por não ir ao Vietnã, carioca perdeu o título de Miss Mundo

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Lúcia Petterle: de miss mundo a médica pediatra.

sto é uma feira de carne humana, libertem nossas irmãs!”, bradavam militantes feministas em 11 de novembro de 1971, na porta de um teatro em Londres, enquanto trocavam sopapos com os policiais. Do lado de dentro ocorria a decisão do Miss Mundo. Ignorando os protestos, a carioca Lúcia Petterle, então com 22 anos, se emocionava ao ser eleita a vencedora do concurso, a única brasileira a alcançar o título até hoje. “Minha vitória é a contribuição que dou à juventude do meu país”, disse na ocasião. A estudante de Medicina havia se tornado miss por acaso – e a contragosto –, ao ser “forçada” por amigos a disputar um concurso de beleza. Seu carisma e medidas perfeitas a fizeram ganhar outras disputas, até ser eleita em Londres a mulher mais bonita do mundo. Porém, seu reinado não duraria muito. Convidada a passar o fim do ano no Vietnã para apresentar-se aos militares norte-americanos, Lúcia recusou. Foi proibida de usar o título de Miss Mundo a partir de então. Formou-se em Medicina e hoje é médica pediatra no Rio de Janeiro. (BH)

No site do Almanaque, assista a uma entrevista de Lúcia Petterle.

estação colheita O que se colhe em novembro Mamão, melancia, manga, melão, caju.

novembro t a mb é m t e m 1 Dia Internacional do Homem 2 Dia da Espera nça Cristã 3 Dia do Cabelei reiro e Artes Afins 4 Dia da União dos Escotei ros do Brasil 5 Dia Nacional da Língua Portuguesa 6 Dia Municipal do Voleibol (SP) 7 Dia Nacional dos Tribunais de Contas 8 Dia Mundia l do Urbanismo 9 Dia Nacional do Hotelei ro 10 Dia Nacional do Trigo 11 Dia Nacional do Supermercado 12 Dia Nacional do Diretor de Escola 13 Dia Nacional da Família na Escola 14 Dia Nacional da Alfabet ização 15 Dia do Joalheiro 16 Dia do Não Fumar (SP) 17 Dia da Sociedade Teosóf ica 18 Dia Nacional de Combate ao Racismo 19 Dia Internacional do Xadrez 20 Dia Nacional da Consciência Negra 21 Dia Mundia l da Televisão 22 Dia do Músico 23 Dia do Engenheiro Eletricista 24 Dia Mundia l do Vovô 25 Dia da Baiana do Acarajé 26 Dia do Ministério Público 27 Dia Nacional de Combate ao Câncer 28 Dia do Soldado Descon hecido 29 Dia do Café 30 Dia da Reforma Agrária

o baú do Barão

“Há carros de 90 cavalos, sem contar com o proprietário.” Nossa homenagem a Aparício Torelly, o Barão de Itararé.

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dia da música

Passinhos do funk misturaram passos Com “teflon para xingamentos”, de frevo com break Sakamoto denuncia 22/11

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m dos segredos da longa sobrevivência do funk carioca é sua incrível capacidade de constante reciclagem. A cultura funk é uma metamorfose ambulante movida por um turbilhão de modas, as ondas, que promovem a manutenção do interesse do público em assistir, viver e reproduzir este tipo de cultura. No começo do que hoje entendemos como baile funk, em meados dos anos 1980, o som que dominava as pistas vinha dos Estados Unidos. Hoje, a trilha sonora do baile é 100% nacional, produzida, em sua grande maioria, nas favelas e periferias cariocas. Nos anos 1990, o funk se fazia presente em todos os espaços físicos e midiáticos, e os MCs, em duplas, tornavam-se as figuras centrais da cena. Depois vieram os bondes, grupos que combinavam o ritmo forte com letras simples e direcionadas aos passos de dança, realizados em movimentos coreografados por quatro ou cinco dançarinos. Cada novo sucesso vinha acompanhado de sua “dancinha”, de seu “passinho”. Vistos primeiro em DVDs vendidos em camelôs, depois na internet, os passinhos se popularizaram. Duelos presenciais ganharam espaço, nos quais a dança é um modo de extravasar possíveis rivalidades entre comunidades, assim como ocorria no começo do hip-hop, nos subúrbios nova-iorquinos. Mais do que isso, é um modo de a molecada carioca explorar seu potencial criativo. Os passinhos englobam uma combinação interessante de passos clássicos de frevo, movimentos de break e do próprio funk carioca. Resultam, assim, numa dança nova, nascida no Rio de Janeiro, temperada com traços e sotaques de regiões distintas. O passinho é pop, é nordeste, é Brooklyn. É um encontro da raiz com a contemporaneidade e, por isso, mais tropicalista impossível. (João Xavi, de São João de Meriti-RJ - OVERMUNDO)

SAIBA MAIS Veja vídeos e leia artigos sobre o funk carioca em www.overmundo.com.br.

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eu blog é um dos mais ativos na luta pelos direitos humanos no Brasil. E um dos que mais recebem críticas e xingamentos. A página da internet do jornalista e doutor em Ciências Políticas Leonardo Sakamoto discute trabalho escravo, meio ambiente, violência contra mulheres. “Se eu te pegar na rua, você vai ver”, ameaçou um leitor anônimo. Com o tempo, Sakamoto aprendeu a lidar com as ameaças: “Jornalistas de Direitos Humanos no Brasil têm teflon para xingamentos”, brinca. A face mais importante da atuação do jornalista é a ONG Repórter Brasil, que fundou em São Paulo em 2001. A instituição, que atua em todo o País, denuncia trabalho escravo, invasão de terras indígenas, devastação de florestas. Mas esqueça os ativistas que fazem protestos com faixas e palavras de ordem. Uma das atuações mais comuns da ONG é mapear toda a rede de produção de determinado produto, da fazenda à casa do consumidor. O objetivo é descobrir se há trabalho escravo e devastação ilegal de florestas. Depois do levantamento das informações – que pode durar meses –, há a denúncia, reverberada pela mídia. Preocupados com sua imagem, muitos supermercados param de comprar produtos da empresa denunciada, atingindo os criminosos no bolso. Em suas andanças e pesquisas, Sakamoto constatou que o trabalho escravo no País não é tão incomum quanto se pensa. A escravidão contemporânea se baseia em condições degradantes de trabalho, cerceamento de liberdade e tortura. Com suas denúncias, fez muita gente que agia fora da lei perder dinheiro. E continua a colecionar (BH) inimigos em razão de seu trabalho. Divulgação

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SAIBA MAIS Blog do Sakamoto: blogdosakamoto.uol.com.br Repórter Brasil: www.reporterbrasil.org.br

Fases da Lua 1 . 2 . 3 . 4 . 5 . 6 . 7 . 8 . 9 . 10 . 11 . 12 . 13 . 14 . 15 . 16 . 17 . 18 . 19 . 20 . 21 . 22 . 23 . 24 . 25 . 26 . 27 . 28 . 29 . 30 . 31 crescente

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cheia

minguante

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rioa 21-12 Sagitá22-11 Entre todos os signos do Zodíaco, os nativos de Sagitário são os que mais sentem vontade de viajar pelo mundo. Costumam ser pessoas otimistas e acolhedoras, além de ter um forte senso de justiça. Os sagitarianos indignam-se sinceramente diante de qualquer tipo de opressão. No amor, atiram-se de cabeça, mas é difícil se prenderem a uma pessoa só por muito tempo. Seu modo de amar não cabe em convenções sociais.

Hélio muniu-se de botões para dialogar com o mundo 17/11

dia da criatividade

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Bruna Palazzo

Bruna Palazzo

ão há como passar pela banca de Hélio Leites na Feira do Largo da Ordem, em Curitiba, sem ouvir palavras de efeito. “Fazer o que você não gosta é o pior desemprego do mundo.” Entre tantas histórias, conselhos e ensinamentos, talvez essa seja a mais biográfica. O curitibano trabalhava em um banco “carimbando cheque de pessoas que não conhecia” quando resolveu fundar o Museu do Botão, em 1984: “Eu não penso, eu não imagino. Mas faço. O negócio é fazer”. Foi então que muniu-se de botões, caixinhas de fósforo, palitos de sorvetes e outras miudezas para “tentar consertar o jeito do mundo se enxergar e se aceitar”. O museu itinerante nada mais é que uma mala com rolhas, latas e papelões transformados em sutis e delicadas obras de arte interativas. Personagens históricos pendurados na aba do boné, por exemplo, narram episódios como o descobrimento do Brasil, sob o nome de Parangohélios, referência ao artista Hélio Oiticica e seus mais conhecidos trabalhos, os parangolés. “É uma das experiências mais criativas que tenho visto por aí, bem mais instigante e original do que muitas vernissages de artes plásticas”, observou Paulo Leminski no artigo O Significador de Insignificâncias, sobre o conterrâneo. Poucos

anos antes de morrer, o poeta se impressionava com o trabalho “moderníssimo, fundindo gesto e performance com o emprego de material reles (perdão, meus botões!)”. Hélio Leites reuniu outros artistas e intelectuais na Assintão, Associação Internacional de Colecionadores de Botão. Há ainda o Fiu-Fiuuu Sport Club, “um time de assobiadores”, e a Ex-Cola Unidos do Botão, a “menor escola de samba do mundo”. Com samba e enredo, desde 1991 ela desfila minicarros alegóricos no carnaval curitibano. Uma das últimas invenções de Leites remonta a torre de Julieta e traz uma miniatura de Romeu pendurado em um fio de cabelo. “Não é uma história de amor, é uma história sobre a intolerância. A felicidade por um fio”, analisa. Este ano a obra foi convidada para participar da Quadrienal de Praga, o maior evento da cenografia mundial. Como previa Leminski, “ontem o botão, hoje o assobio, amanhã o mundo”. O artista, todos os domingos na feira de antiguidades de Curitiba, não perde o foco: “O artesanato é um treino para o meu diálogo com a humanidade”. (NP)

1 terça Benigno 2 quarta Eustóquia 3 quinta Martinho de Lima 4 sexta Carlos Borromeu 5 sábado Isabel 6 domingo Leonardo de Noblac 7 segunda Engelberto 8 terça Deodato 9 quarta Teodoro 10 quinta Leão Magno 11 sexta Estevão 12 sábado Josafá 13 domingo Diogo 14 segunda Serapião 15 terça Alberto Magno 16 quarta Gertrudes 17 quinta Hilda 18 sexta Romão 19 sábado Narses I 20 domingo Bernardo 21 segunda Gelásio I 22 terça Cecília 23 quarta Felicidade 24 quinta Flora 25 sexta Mercúrio 26 sábado Silvestre Gozzoline 27 domingo Catarina Labouré 28 segunda Tiago de Marca 29 terça Saturnino 30 quarta André

Alberto Magno O alemão, nascido no século 13, é conhecido como Doutor Universal. Ele foi um dos mais importantes sábios da Igreja. Publicou trabalhos sobre física, química, astronomia, mineralogia, zoologia, navegação, agricultura. Era também um homem de muita fé. Tornou-se bispo, mas pediu dispensa para levar a vida como um humilde monge.

No site do Almanaque, assista a um documentário sobre Hélio Leites dirigido por André Saito e Cesar Nery. Veja também o vídeo de apresentação do artista na Quadrienal de Praga, dirigido por Denise Soares. Novembro 2011

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os! u não, uni-v o s o n a ic l b Brasil Repu grama Almanaque

República. E o pro da Proclamação da republicanas, Entramos no mês e País, sejam elas r histórias sobre est nta co de o bitadas ssã mi m se mantém na estas terras era ha lonial ou de quando co do río sil, o pe Bra do e s, ra monárquica o das TVs Cultu nas. Com transmissã íge ind s ada. E vo im po an r po forma somente itas nesta revista de ta as histórias descr Nunes, en on res bs ap Ro Almanaque s, personagem de stituível Almanaquia ub s do ins nto O . me so eci nis a nh põe animad r para testar os co fone e bom humo cro llo. mi Me de na o cia nid Lu mu de sai às ruas elegante comando ferido. Tudo sob o . pre ís pa rasil B sso no povo sobre vem por aí no Almanaque e se ligue no que Prepare a poltrona

Em se plantando, tudo dá - programa 17

• Elas atraem casamento, espantam mau-olhado e curam qualquer mal: as plantas brasileiras. • No Papo-Cabeça, diretamente de Pernambuco, o cordelista e xilogravurista J. Borges. • Afinal, como é que se faz um bom café? Esse é o assunto do Ciência Doméstica. • No Ilustres Brasileiros, as letras e as ideias da poetisa Cecília Meireles. TV Brasil: 18/11, 20h TV Cultura: 4/12, 15h

Árvores do Brasil - programa 15 Amor, sublime amor - programa 13

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• Histórias de amor, infidelidade e ciúme que fizeram Ilustres Brasileiros enlouquecerem. • Eugênio Scannavino e seu Projeto Saúde e Alegria: da Amazônia para o Papo-Cabeça. • Letra bonita e padronizada: o Como É que Se Faz? mostra a arte dos cartazes de supermercado. •N o Ciência Doméstica, verdades, truques e mitos da pescaria. TV Brasil: 21/10, 20h

TV Cultura: 6/11, 15h

Curiosidades no mapa - programa 14

• Entre milhares de municípios, encontramos os de peculiaridades e encantos pra lá de inusitados. • Sabia que nosso primeiro acidente de carro envolveu José do Patrocínio e Olavo Bilac? • Lô Borges traz ares mineiros ao Cantos do Brasil. • É do Baú: quem não se lembra da dancinha dos Menudos? TV Brasil: 28/10, 20h

TV Cultura: 13/11, 15h

• As árvores presentes nas bandeiras, em símbolos e na fé dos brasileiros. • Um Papo-Cabeça com o inventivo e inquieto Jorge Mautner. • No Como é Que se Faz?, aprenda a criar fantasias de maracatu. • Conheça Cabo Laurindo, o personagem que Wilson Baptista mandou para a guerra. TV Brasil: 4/11, 20h

TV Cultura: 20/11, 15h

Recordes tupiniquins - programa 16

• Em assuntos sérios e outros deliciosamente desimportantes, conheça recordes inusitados alcançados por brasileiros. • No Cantos do Brasil, o samba e a malemolência de Zeca Pagodinho. • Lembra como era gostoso brincar de pião? Então reaprenda a rodá-lo no Ciência Doméstica. • E ainda revirando a memória da infância, saiba de onde Chico Buarque tirou o inesquecível musical Os Saltimbancos. TV Brasil: 11/11, 20h

TV Cultura: 27/11, 15h

Nossa gente entre pontos e vírgulas - programa 18

• Chicó, Macunaíma, Policarpo Quaresma. Conheça personagens da literatura que ajudam a explicar o Brasil. • O bebê não para de chorar? Confira dicas populares para acalmá-lo no Ciência Doméstica. • Por causa de lagostas, Brasil e França quase entraram em guerra nos anos 1960. Você Sabia? • Sinônimo de dicionário: no Ilustres Brasileiros, a palavra é de Aurélio Buarque de Holanda. TV Brasil: 25/11, 20h

TV Cultura: 11/12,15h

Para se certificar dos horários de exibição, consulte o site das emissoras: www.tvbrasil.org.br e www.tvcultura.com.br.

Bebossa, Menescal e Wanda Sá - A Galeria do Menescal (Sala de Som Records). “É um barquinho

A Primavera do Dragão, de Nelson Motta (Objetiva).

Junio Barreto - Setembro (independente). Autor de músicas gravadas por Lenine, Maria Rita e Gal Costa, o pernambucano voltou aos estúdios sete anos após o lançamento de seu ótimo disco de estreia. No repertório, destacam-se sambas com clima e arranjos modernos, que flertam com outros gêneros. O disco conta com participações de Seu Jorge, Vítor Araújo, Céu e Marina de La Riva.

Crise Colonial e Independência, 1808-1830, organizado

que desliza mais suave.” Assim Roberto Menescal define a regravação de O Barquinho, que completa 50 anos em 2011. No disco, há ainda outras composições que remetem ao universo da bossa nova. Além de Menescal, participam do CD a cantora Wanda Sá e o grupo Bebossa.

www.almanaquebrasil.com.br

O jornalista narra a juventude do amigo Glauber Rocha (19391981) a partir de seu nascimento, na baiana Vitória da Conquista, até a consagração no Festival de Cannes, em 1964. Na biografia, entram discursos dos tempos de colégio e as aventuras do cineasta durante as filmagens de Barravento e Deus e o Diabo na Terra do Sol.

por Alberto da Costa e Silva (Objetiva). Em inédita reunião de olhares, grandes autores se debruçam sobre o surgimento do Brasil como nação independente. O livro abre coleção que resgatará nossa história em seis volumes. O projeto, coordenado pela antropóloga Lilia Moritz Schwarcz, faz parte de um amplo estudo sobre o papel da América Latina na contemporaneidade.


Por Bruno Hoffmann

R EN ATO T EI X EIR A

O folk não rasga, não quebra e não enferruja

GUSTAVO BOMFIM

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Ele nasceu em Santos, mas foi em Taubaté que passou boa parte da infância e adolescência. Na cidade do interior paulista, conheceu e aprendeu a respeitar a cultura caipira. Com pouco mais de 20 anos, mudou-se para São Paulo para iniciar a carreira como cantor e compositor. Não sabia ainda qual caminho musical seguir até que um samba de Paulinho da Viola lhe indicou a direção. Num show do compositor carioca, percebeu que deveria tocar apenas o que a sua sensibilidade pedisse. Fez então um pacto com a música: “Eu não te maltrato, você não me maltrata”. De lá para cá, deu a si a missão de repaginar a música da cultura caipira. E ajudou a abrasileirar um gênero musical que ainda não tinha adeptos: o folk, uma música que “não rasga, não quebra e não enferruja”, em sua definição. Passou a buscar a alma do povo para criar tantos sucessos, como Romaria e Tocando em Frente. Gravou mais de 20 discos e ainda hoje faz até 15 shows por mês. Nesta entrevista, Renato Teixeira explica o conceito de folk, lembra dos grandes nomes da música caipira e fala do atual momento das duplas sertanejas. Apesar das “letras banais” que se ouve nas rádios, profetiza: “Está para surgir um Chico Buarque da música sertaneja”. Novembro 2011


Desde o início, sua carreira é marcada por referências à cultura caipira. Foi uma escolha consciente? Eu tive sempre a proposta de repaginar a música da cultura caipira. Essa música sempre existiu, e de forma muito bonita. Basta ouvir João Pacífico para entender. Suas canções mexem muito com a emoção, parecem até compostas pelo Nelson Cavaquinho, mas de um jeito caipira. Resolvi fazer uma releitura dessa tradição, pois na época não havia muitas referências. E comecei a partir do conceito folk, o que era uma novidade no Brasil. Claro que sempre houve folk, mesmo que não consciente, como Luiz Vieira, João do Vale. Os afrosambas de Vinicius e Baden são folk puro. Mas como identificação direta, creio que fui o precursor. E dá um baita orgulho ter ajudado a criar algo num país com tantas opções musicais.

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Em música, o que exatamente é o folk? É observar o que o povo pensa e sente e transformar em música. É diferente de uma música introspectiva, que diz coisas mais individuais. O folk é eterno. É uma música que não rasga, não quebra e não enferruja. A palavra folclore derivou de folk. Na Alemanha, durante o século 17, um sujeito percebeu que as mulheres simples cantavam enquanto lavavam a roupa. Viu que o trabalhador do campo também cantarolava enquanto trabalhava. Ele decorou as músicas e pôs instrumentos. Quando perguntaram o que era aquilo, ele disse que era folk, e daí nasceu o termo. O estilo dá uma liberdade fantástica. Eu tenho uma música chamada Sina de Violeiro, que é uma tragédia, mas eu não vivi nada daquilo. Essa é e sempre foi a minha proposta, a de observar o povo e transformar em música. Pegar frases que escapam do povo, situações e criar a boa e velha balada, que é a música universal.

sonhava em ver meu nome nas portas de teatros, nas capas de revista. Mas, um ano depois, já estava com a minha cabeça em busca da realização artística, e esse era o grande barato. Fiz um pacto com a música: “Eu não te maltrato, você não me maltrata”. Quando eu maltratei a música, virei publicitário nos anos 1970, durante uns 10 anos. Mas mesmo como publicitário, criador de jingles, descobri um mundo maravilhoso. Apesar de fazer música sob encomenda, nunca deixei o racional tomar conta. A inspiração sempre vinha na frente. Quais jingles você fez? Muitos. Por exemplo: Roda, roda, roda, baleiro, atenção / Quando o baleiro parar, põe a mão / Pega a bala mais gostosa do planeta / Não deixe que a sorte se intrometa... É divertido, é uma brincadeira interessante. Quando fui compor o meu primeiro jingle, em 1973, perguntei a um companheiro mais experiente como era possível falar tantas coisas em apenas 30 segundos. Ele respondeu: “Cara, se você quiser, dá para fazer em 30 segundos uma bela sinopse da Bíblia”. E é isso mesmo. Jingle é uma espécie de haicai musical. Ganhei alguns prêmios, mas o que me animava mesmo era constatar que as vendas do produto anunciado tinham aumentado. Um dia, o Guaraná Antarctica teve de suspender o funcionamento das fábricas, porque não aguentou ter de produzir tanto guaraná após um jingle meu...

“Romaria não é uma canção para a santa, é uma canção para o romeiro. É um antropofagismo, respeitando a ética e os valores dos caipiras.”

E como surgiu esse desejo? Quando cheguei em São Paulo, no fim dos anos 1960, para começar a carreira, eu também fazia samba, marcharancho, música nordestina. Ainda estava à procura do meu estilo. Mas um dia mudou minha vida definitivamente. Eu estava na Galeria Metrópole assistindo a um show de Paulinho da Viola. Quando ele tocou Coisas do Mundo, Minha Nega, minha ficha caiu imediatamente. Ao ouvir a música, percebi que eu tinha de cantar quem eu sou. A música é um filme, uma maravilha que me fez trilhar meu caminho musical até hoje. Essa eu devo ao Paulinho.

O folk é uma música que caiu no gosto popular? Eu faço de 10 a 15 shows por mês, em todo o País. E sempre com ótimo público. Mas a mídia sempre esteve aquém de todas as artes no Brasil. A minha geração sofre de uma epidemia horrorosa, que é a falta de reconhecimento, o que gera frustração. Mas o verdadeiro reconhecimento para mim é a hora de pôr a cabeça no travesseiro e dizer: “Hoje fiz tudo certo”. Quando vim de Taubaté, www.almanaquebrasil.com.br

O que te move a compor? Como dizia antes, eu faço canção sobre pessoas. O que me impressiona quando vou para Aparecida do Norte, por exemplo, não são as igrejas, a estética, a parte arquitetônica. É a pureza dos romeiros. Se você olha nos olhos dos romeiros, é possível enxergar a alma. Romaria, talvez o meu maior sucesso, não é uma canção para a santa, é uma canção para o romeiro. E se tornou uma espécie de canção manifesto, como se eu dissesse: “A música caipira agora é assim, esse é o jeito mais viável”. É uma música caipira que poderia ser gravada pela Elis Regina, por exemplo. Foi um antropofagismo. Pegar a música caipira, pegar a MPB, misturar e extrair o que é importante, respeitando a ética e os valores dos caipiras. Como a música surgiu, em que se inspirou? Na época que compus, lá por 1973, eu estava muito ligado em poesia concreta. Estava apaixonado pela obra de Décio Pignatari, Augusto de Campos, todo aquele pessoal que desenhava com palavras. E comecei a compor a canção para usar um pouco a experiência que estava tendo. É de sonho e de pó / O destino de um só... Nunca imaginei que faria sucesso, justamente pela carga intelectual colocada, pela sofisticação. Embora ache que a poesia concreta seja a mais popular, não é fácil de entender. Uma coisa engraçada é


que, quando terminei a letra, não sabia o que colocar após o Como não sei rezar / Só queria mostrar / Meu olhar... E o que mais? Pensei em tudo para terminar a música: meu sentir, meu sofrer, meu pensar. E não vinham as palavras certas. Durante uns quatro meses cantei a música sem o fim. Até que percebi que o melhor era repetir o “meu olhar”: Meu olhar, meu olhar, meu olhar... No mesmo dia que terminei a música, um amigo perguntou se eu tinha algo novo, e toquei Romaria. Quando terminei, ele estava completamente aos prantos, me beijou a testa e perguntou: “Você tem noção do que você fez?”. Eu não tinha. A música ficou uns três anos na gaveta, até Elis gravar. Foi sucesso instantâneo. Um dia andava pela rua e ouvi alguém assobiar Romaria. Foi nessa hora que saquei que a música havia se tornado um sucesso. Durante muito tempo a música e a cultura caipira foram consideradas desimportantes, não? Achar que eram coisa menor é uma prova cabal da ignorância da classe dominante até o fim dos anos 1960, quando as coisas começaram a mudar. Era uma elite inspirada na Europa, que perdeu a oportunidade de conviver com gênios como João Pacífico e Tião Carreiro. Tião Carreiro fazia uma música única no Brasil, ninguém mais compunha no estilo dele. É uma riqueza cultural absurda, mas mesmo assim ele foi discriminado. Mas os caipiras não se entregaram e criaram um universo fantástico.

últimos tempos – e tem gente que quer me bater quando falo isso. E há outras coisas pelo País que podem ser consideradas bregas, mas são incríveis. Qual o lado bom e o lado ruim da atual explosão de músicos sertanejos? De Luan Santana a Rolando Boldrin, só há lado bom. Mas para fazer música, em qualquer estilo, tem de entender profundamente a música popular brasileira, de cabo a rabo. Eu encho a paciência de duplas novas, perguntando se já ouviram Vinicius de Moraes, se conhecem Tom Jobim. O problema é que as letras atuais do sertanejo estão muito banais. É tudo “eu te amo”, “cadê você?”. Eu gosto das letras de duplo sentido, com alguma sacanagem, mas essas já deram. A tendência é aparecer um letrista que dê conteúdo para esse fenômeno. Como Chico Buarque surgiu num contexto de MPB, está para surgir alguém do mesmo nível no contexto da cultura do interior. Eu acho que, daqui para frente, vai surgir uma música que se reencontre com o Brasil, mais “ary barrosiana”, aquelas grandes canções populares que não querem ensinar filosofia.

“A música caipira é de uma riqueza cultural absurda, mesmo assim foi discriminada. Mas os caipiras não se entregaram e criaram um universo fantástico.”

Qual foi o primeiro nome importante da música caipira? Tudo começou com Cornélio Pires, o primeiro sujeito a gravar música caipira no País. Ele é o grande gênio, o maior de todos. Ele criou tudo. Trouxe o chapéu de palha, o lenço no pescoço, a camisa xadrez. Também criou o conceito de dupla, porque percebeu que o violeiro, que usa um instrumento solo, precisava de um instrumento de base, e aí o cara do violão começou a fazer a segunda voz. Juntou todos esses elementos e trouxe para São Paulo. Ele é tão reconhecido que há, inclusive, uma cidade com seu nome. Aí começam a surgir Raul Torres, João Pacífico, Ted Vieira. Raul Torres, inclusive, além de música caipira, compunha marchinhas melhores do que se as que se fazia no Rio. Eram mais bem gravadas, mais bem tocadas e mais bem compostas. Um gênio.

O fato de os artistas não dependerem mais tanto de gravadoras ajuda a surgir manifestações interessantes hoje em dia? Muito, e em todos os estilos, até alguns considerados ruins. Mas não existe música feia, existe música que não agrada ao seu gosto. Música, só por ser música, já é bonita. É discutir entre o bom e o melhor. E toda vez que o subúrbio carioca se manifestar, fique atento que vem coisa boa. O movimento funk carioca é uma das melhores coisas que surgiram nos

Como surgiu Tocando em Frente, uma de suas músicas mais famosas? É uma parceria com Almir Sater. Um dia disse para ele que queria fazer uma música inspirada nas plaquinhas que há nas casas, como “Aqui mora um casal feliz”. Depois de pensarmos muito, começamos a inventar: “Ando devagar porque já tive pressa”... Pode perceber: se fracionar a letra, haverá um monte de frasezinhas. Isto é o Brasil. O sucesso da canção foi muito grande. Para minha surpresa, o The New York Times elegeu as 10 músicas brasileiras mais importantes de todos os tempos. Primeiro lugar, Tocando em Frente, segundo, Águas de Março, depois Aquarela do Brasil, e por aí vai. O jornal considerou Tocando em Frente a melhor música brasileira de todos os tempos! E não é... Há inclusive parcerias minhas com Almir mais bonitas.

Existe hoje uma geração jovem de folk? Existe, e muito. Já existe uma geração que está se organizando e se posicionando. Mas imagine que a música brasileira esteja à venda num supermercado – há a seção “axé”, a seção “sertanejo”, a seção “rock”. Onde ficaria o trabalho simbolizado por mim e por Almir Sater? Em lugar nenhum. Não é MPB o que fazemos. O que fazemos é folk. Mesmo assim, a rapaziada está chegando com força. A minha grande alegria pessoal é ser um dos caras que começou essa história, que ajudou a puxar o trem de muita gente. Hoje, as novas duplas reconhecem o meu trabalho, do Almir, do Sérgio Reis. Reverenciam o fato de Rolando Boldrin ter mostrado ao Brasil o que é a cultura caipira. Nós fomos importantes. Nós ajudamos a criar um caminho. Novembro 2011

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Política em verso e música Império, República Velha, Estado Novo, Anos JK. Não houve dirigente ou acontecimento político que não inspirassem os compositores nacionais. De bajulações escancaradas a críticas ferrenhas, a história política do Brasil ganhou nova forma ao som de notas musicais.

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go Terra Vargas Texto : bruno hoffmann Arte: Rodri

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s décadas de 1960 e 1970 são marcadas como um período em que músicos subiram aos palcos para mostrar seu descontentamento com a política do País. Mas saiba: a manifestação política no cancioneiro nacional é coisa bem mais antiga. Já na primeira fornada de discos gravados no Brasil, no comecinho do século passado, há canções que criticam (ou exaltam) o Império e a República Velha. Daí em diante, a junção de música e política tornou-se elemento constante na cultura nacional. Um dos momentos em que a música mais foi usada como bandeira ideológica – seja a favor ou contra os donos do poder – é o período do Estado Novo, entre 1937 e 1945. O nacionalismo, a exaltação do trabalho e a mão de ferro de Getúlio Vargas angariaram simpatizantes e inimigos. Getúlio usou as rádios e os vozeirões da época para propagar seus ideais. Houve até um notório sambista que, inspirado no presidente, deixou a malandragem de lado para pendurar uma gravata no pescoço. Mas também surgiram compositores críticos, que reclamavam, principalmente, da censura imposta pelo Estado Novo. E ainda os que ironizavam os bajuladores do presidente. Getúlio é o caso mais notório – talvez também por ter sido o presidente que por mais tempo comandou o País –, mas pouca gente escapou do espírito crítico dos compositores. De Hermes da Fonseca a Juscelino Kubitschek, de Arthur Bernardes a Jânio Quadros, os presidentes passaram por aborrecimentos disparados por violões e gogós famosos. Houve artista que pôs em xeque a idoneidade das eleições, quem usou jingles para provocar os adversários e até quem exigiu que o Brasil partisse para a guerra. Nas próximas páginas, conheça a música brasileira que deixou de lado dores e amores para se meter no mundo da política. www.almanaquebrasil.com.br


Arthur Bernardes mandou compositor para o xilindró

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candidato à presidência em 1922 era Arthur Bernardes, apelidado jocosamente de Seu Mé – uma referência a sua suposta passividade em relação às maquinações políticas. O compositor Freire Júnior, que, como boa parte dos cariocas, não nutria grandes simpatias pelo político mineiro, resolveu então compor Ai, Seu Mé, em que apostava que o candidato não ganharia as eleições: Embora se faça uma bernarda a cacete / Não vais ao Catete! / Não vais ao Catete! A música logo tornou-se sucesso, mas as previsões do compositor não se cumpriram. Apesar de assinar com o pseudônimo de Canalhas das Ruas (outra provocação a Bernardes, que dizia que as críticas a sua candidatura vinham de “canalhas das ruas”), Freire Júnior acabou no xilindró, depois que o candidato ofendido tornou-se presidente.

ta, Café paulisro leite minei

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República Velha se caracterizou pela Política do Café com Leite. Conchavos políticos garantiam que os ricos cafeicultores paulistas e os poderosos produtores de leite de Minas Gerais se revezassem no posto de presidente da República. Com apenas duas exceções – o gaúcho Hermes da Fonseca e o paraibano Epitácio Pessoa –, foi o que ocorreu de 1898 a 1930. Em 1926, ao compor Café com Leite, Freire Júnior usou a culinária para explicar a prática. A letra dizia que o “mestre cuca” – ou seja, o presidente do momento – convocava os “cozinheiros”, que seriam os representantes dos estados, para fazer uma “boia bem escolhida”. O resultado era sempre o mesmo: Café paulista / Leite mineiro / Nacionalista / Bem brasileiro.

Hino aos bajuladores

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ossa excelência, vossa eminência / Quanta reverência nos cordões eleitorais. Assim começa a canção que contém um verso que entrou para o imaginário popular: E o cordão dos puxa-sacos cada vez aumenta mais. Interpretada pelo conjunto vocal Anjos do Inferno, a marchinha foi um dos maiores sucessos de 1945, ano em que Getúlio Vargas – chamado de “doutor” na letra – saiu do poder. A canção lembra da infidelidade dos bajuladores, que logo viraram a casaca para agradar o próximo poderoso: Mas se o doutor cai do galho e vai ao chão / A turma toda evolui de opinião / E o cordão dos puxa-sacos cada vez aumenta mais.

João Cândido, um “marujo de opinião”

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duardo das Neves foi um dos mais importantes cronistas “político-musicais” do início do século passado. Entre tantas canções, em 1910 compôs Os Reclamantes, uma referência direta à Revolta da Chibata. Naquele ano, marinheiros liderados por João Cândido enfrentaram o presidente Hermes

da Fonseca ao colocar canhões de três navios voltados para o Rio de Janeiro. A principal exigência era o fim dos castigos físicos aos marinheiros, prática comum na época. Os Reclamantes retrata o clima que tomou conta da cidade, citando o comércio fechando as portas, a correria da população e o aspecto

de cemitério que invadiu as ruas. O compositor não se posicionou claramente na letra – apesar de, por vezes, puxar a sardinha para João Cândido, chamado-o de “marujo de opinião”. Mas, ao fim da letra, comemora o término da revolta e faz loas aos poderosos: Viva os chefes de armada / Viva o chefe da nação. Novembro 2011

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“Bota o retrato do velho”

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m 1950, não houve canto do Brasil que não tivesse ouvido a marchinha cantada magistralmente por Francisco Alves: Bota o retrato do velho outra vez / Bota no mesmo lugar / O sorriso do velhinho faz a gente trabalhar. A música referia-se a uma prática comum quando Getúlio era presidente: cada repartição pública ter uma foto dele na parede. Ele buscava voltar ao poder em 1950, agora por meios democráticos, e a canção de Haroldo Lobo e Marino Pinto foi usada como uma espécie de jingle político. Deu certo, e o gaúcho bateu o adversário Eduardo Gomes. Apesar do sucesso, Getúlio ouvia a canção a contragosto... É que ele detestava ser chamado de velho.

Luís Carlos Prestes (ou leite, carne e pão)

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taulfo Alves também tratou de homenagear Getúlio Vargas. No samba O Negócio é Casar, em parceria com Felisberto Martins, dizia: O Estado Novo veio para nos orientar / No Brasil não falta nada / Mas é preciso trabalhar. A lua de mel com Getúlio acabou em 1945, quando o presidente perigava sair do poder, fato que realmente aconteceu. Ataulfo gravou Isto É o Que Nós Queremos, em que criticava a censura do Estado

Novo, pedindo “liberdade de pensar e falar”. O verso final exigia: Nós queremos leite, carne e pão. Apesar de uma aparente inocência, o encerramento da música foi o que causou mais polêmica. Não demorou para associarem as primeiras letras de “leite, carne e pão” às de Luís Carlos Prestes, adversário de Getúlio e principal líder comunista do País. Criou-se até o boato de que Mário Lago – comunista ferrenho – seria parceiro na canção.

Saudosismo das cacetadas

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Caipiras cantaram os mandachuvas do mundo

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dupla Alvarenga e Ranchinho provou que falar de política não era exclusividade de quem vivia na cidade grande. Em ritmo de moda de viola, a dupla teceu opiniões sobre os líderes mundiais em Os Presidente (sem o “s” mesmo), composta em 1939. Para eles, Getúlio era um homem que “fez um novo Brasil pra gente”. Outro que merecia elogios era o presidente norte-americano

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Roosevelt, pois ele “cumpria o seu papel” – sem explicitar qual papel seria esse. “Hitler bigodinho”, no entanto, não merecia muitos louvores por “não gostar dos judeus”. Já o soviético Josef Stalin “mandava dar uns tirinhos” se descobrisse que alguém era criminoso. Por sua vez, Benito Mussolini foi descrito como um homem valentão, que não tinha medo de ninguém. E, claro, que não dispensava um prato de macarrão.

s eleições para a Câmara em 1840 foram das mais violentas da história do Brasil. Os liberais, que queriam ter maior poder sobre o imperador Pedro 2º, provocaram tumultos, espancamentos e até assassinatos para “convencer” os eleitores a votarem em seus candidatos. De tão violentos, os episódios entraram para a história como Eleições do Cacete. É o que retrata Capanga Eleitoral, de Barros, uma das primeiras canções gravadas no Brasil. A música conta a história de um idoso que, com saudosismo, lembra dos atos violentos que cometeu durante aquelas eleições: Na cabeçada derrubei mil caras / Numa rasteira muitos tombos dei. E ainda recorda como era temido e adulado: Cartas eu dava, bajulado eu era / Tinha excelências pruma eleição. De tanto aprontar, porém, o sujeito recebeu um castigo que hoje soa como uma premiação. Acabou degredado para Fernando de Noronha, local então reservado para criminosos políticos.


“Quem trabalha é que tem razão”

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u tenho orgulho em ser tão vadio, dizia Wilson Baptista no samba Lenço no Pescoço. Na mesma música ainda desdenhava dos trabalhadores: Eu vejo quem trabalha andar no miserê. Só que o Estado Novo de Vargas, instituído em 1937, passou a usar a música popular para propagar seus ideais – entre eles, o do trabalho. Não era incomum que sambistas que falassem de temas que desagradavam o governo fossem censurados. Com esperteza, Wilson resolveu adaptar seu repertório aos novos tempos. Assim surgiu Bonde São Januário, uma pérola da malandragem do sambista: Quem trabalha é que tem razão / Eu digo e não tenho medo de errar / O bonde São Januário / Leva mais um operário / Sou eu que vou trabalhar.

Presidente bossa-nova

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uscelino Kubitschek entrou para a história como um presidente carismático e sorridente. E como mostra a música Presidente Bossa-nova, de Juca Chaves, um político que sabia aproveitar as coisas boas da vida. Em tom irônico, o compositor desfilou os hábitos de Juscelino, como “mandar parente a jato pro dentista”, “almoçar com tenista campeã” (referindo-se a Maria Esther Bueno) e “tomar com Dilermando umas aulinhas de violão”. Dilermando era Dilermando Reis, um dos instrumentistas mais importantes da época e professor de música de JK. A contragosto dos assessores, o presidente resolveu receber o “menestrel” numa tarde. Juca tirou os sapatos (como costumava fazer em suas apresentações) e tocou a canção. Juscelino também arrancou os sapatos e ouviu a música com simpatia, mas com um “quê” de sorriso amarelo.

E a vassoura venceu a espada

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arre, varre, vassourinha / Varre, varre a roubalheira, dizia o empolgante jingle de Jânio Quadros durante a campanha eleitoral de 1960. A vassoura foi usada como um símbolo de que Jânio varreria a corrupção do País. O oponente de Jânio, marechal Lott, havia ganhado uma espada do presidente Juscelino Kubitschek por sua lealdade ao governo. E, num jingle-resposta, indicava

que a candidatura de Jânio estava alinhada com os interesses norte-americanos, enquanto a sua tinha caráter nacionalista: O povo sabe, sabe, sabe, não se engana/ Essa vassoura é de piaçava americana / Mas a espada do nosso Marechal / É fabricada com aço nacional. Apesar da espada parecer mais poderosa do que a vassoura, Jânio ganhou as eleições com folga.

Guerra, guerra, guerra!

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m 1942, as rádios brasileiras passaram a tocar a marchinha Guerra, de Max Bulhões e Nelson Trigueiro, na voz de Dircinha Batista. Mas não se tratava de nenhuma guerra conjugal, tema mais comum em seu repertório. A canção exortava o povo a lutar na Segunda Guerra Mundial. A inspiração dos compositores surgiu depois que submarinos alemães atacaram sistematicamente navios na costa brasileira. A população exigia que o País fosse ao combate. E a música também: Guerra, guerra, guerra / É o grito da nação / Em represália / À audaciosa agressão. A letra não se esquece de flertar com o Estado Novo de Vargas: Eu tenho orgulho da união do Estado Novo / Do presidente do Brasil, do grande povo / Da ofensiva fulminante brasileira / Contra o inimigo que enlutou nossa bandeira. A canção Anda, Nego, interpretada por Marilu, segue pelo mesmo caminho. Dessa vez, conta a história de uma mulher que apela ao coração para convencer o marido a ir lutar na guerra: Se você gosta de mim de verdade / Quero uma prova já do seu amor (...) / Deixa a escola de samba / Meta a farda no corpo e empunha o fuzil. E, mais adiante, se mantém na chantagem emocional: Deixa agora o pandeiro / Pra ser bom brasileiro / Honra a tua nação / Se quiser merecer meu coração.

SAIBA MAIS

• No site do Almanaque, ouça canções apresentadas neste especial. • Site do jornalista Franklin Martins, com histórias de mais de 100 canções sobre política: www.franklinmartins.com.br. Novembro 2011

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O Calculista das Arábias

ligue os pontos

Abdias do Nascimento

do País. Quando morto pelo governo, teve a cabeça exposta em praça pública para mostrar aos outros negros que não era imortal.

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b Ele lutou a vida toda contra o racismo. Fundou o Teatro Experimental do Negro e foi o primeiro deputado negro do Brasil. Morreu em 2011, aos 97 anos.

José do Patrocínio

c Apesar da escravidão ainda estar vigente, conseguiu tornar-se jornalista. Lutou pela causa abolicionista, fosse escrevendo em jornais ou apoiando a fuga de escravos.

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Castro Alves

d O baiano usava a poesia como sua principal arma contra a escravidão. Tanto que passou a ser chamado de O Poeta dos Escravos, principalmente após escrever Navio Negreiro.

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Zumbi

Na Grécia Antiga, um jovem que estudava com o filósofo Epicuro deixou para as outras civilizações um desafio formulado depois da morte de um grande orador de seu tempo, chamado Demócares. Como se fosse uma epígrafe cifrada sobre a idade do conterrâneo ateniense, Metrodoro dizia assim: “Demócares viveu um quarto de sua vida como menino. Depois disso, um quinto dela passou como rapaz, ainda um terço dela viveu como proprietário. Depois disso tudo, pôde desfrutar entre nós mais treze anos”. Saberia você, caro leitor, se encontrasse apenas essas antigas palavras na pedra do túmulo, desvendar a idade do grego?

acervo da família

a Ele foi o último líder do maior quilombo da história

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Nossa homenagem a Júlio César de Mello e Souza, o Malba Tahan

Adaptado de Matemática Divertida e Curiosa, de Malba Tahan (Record, 2009).

teste o nível de sua brasilidade

Palavras Cruzadas

País de origem do goleiro Andrada, que, em 19/11/1969, sofreu o milésimo gol de Pelé: (a) Bélgica (b) Argentina (c) Uruguai (d) França País que declarou guerra ao Brasil em 13/11/1864: (a) Argentina (b) Alemanha (c) Paraguai (d) Bolívia Escolhido O Mineiro do Século, em eleição realizada em 15/11/2000: (a) Tiradentes (b) Chico Xavier (c) Milton Nascimento (d) JK Zumbi foi assassinado em 20/11/1695 onde hoje é o estado de: (a) Alagoas (b) Pernambuco (c) Santa Catarina (d) Tocantins Em 7/11/1848, iniciou-se no Recife a Revolução: (a) Farroupilha (b ) Praieira (c) dos Cravos (d) de Beckman O goleiro Leão, nascido em 7/11/1949, não atuou por: (a) Palmeiras (b) Grêmio (c) Corinthians (d) São Paulo

Respostas O CALCULISTA DAS ARÁBIAS Demócares viveu 60 anos. O antigo problema pode ser resolvido com uma equação simples: (X - 13) = 1/4X + 1/5X + 1/3X.

Após o fim da Monarquia, Pedro 2º seguiu para qual país em 17/11/1889? (a) França (b) Itália (c) Espanha (d) Inglaterra

valiação

BRASILIÔMETRO 1a; 2b; 3c; 4b; 5a; 6b; 7d; 8a. SE LIGA NA HISTÓRIA 1b; 2c; 3d; 4a. ENIGMA FIGURADO Marcelo Tas. O QUE É O QUE É? Ré. CARTA ENIGMÁTICA Com 10 gols, foi artilheiro do primeiro campeonato paulista. (Charles Miller)

DE QUEM SÃO ESTES OLHOS?

Divulgação

Almir Sater

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Foi inaugurado em 6 de novembro 1892, no centro de São Paulo: (a) Viaduto do Chá (b) Masp (c) Pacaembu (d) Minhocão

1 0 Salvador Dali

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Conte um ponto por resposta certa

8 Candido Portinari


I L U S T R AÇÕ ES

CIA : LU

SSO N O TA

Villa-Lobos fez briga do cravo com a rosa durar para sempre

S

amba Lelê tá doente / Tá com a cabeça quebrada... Aposto que você conhece essa cantiga, não? E esta: O cravo brigou com a rosa / Debaixo de uma sacada / O cravo saiu ferido / E a rosa despedaçada? Deve ter sido uma das primeiras músicas que você aprendeu, assim como Caranguejo Peixe É, Escravos de Jó, Ciranda Cirandinha. Você e brasileiros de todos os cantos. Mas sabe quem fez todas essas músicas famosas por aqui? Ninguém. Ou melhor, todo mundo. Elas fazem parte da cultura popular brasileira e foram passando de boca em boca há muuuitas gerações. Porém, há quase 100 anos, um famoso maestro resolveu gravar essas cantigas para que elas ficassem guardadas para sempre: Heitor Villa-Lobos. Villa-Lobos era (e ainda é) o principal compositor de música erudita do Brasil. Mas gostava também de samba e de chorinho. O maestro percebeu que as músicas infantis populares podiam ser bem bonitas, além de importantes para o desenvolvimento musical das crianças. Na verdade foi um amigo dele, o escritor Mário de Andrade, quem pensou nisso. Só que Mário sabia que Villa-Lobos não aceitava ideias de ninguém. Então contou para o músico que um maestro chileno estava pesquisando e musicando todas as canções infantis do Chile. Na hora, Villa-Lobos ficou com uma baita inveja e quis fazer a mesma coisa no Brasil – sem saber que esse tal chileno nunca existiu.

JÁ PENSOU NISSO?

SOLUÇÃO NA P. 26

Como pão e água O pai de Villa-Lobos também gostava de música e era muito exigente quando o maestro era pequeno. O menino tinha que acertar a nota de todos os sons: a roda do bonde, o pio de um pássaro, o barulho de um objeto caindo. Aos seis anos já tocava violoncelo. Mais tarde aprendeu a tocar violão, mas escondido, pois o instrumento era considerado “coisa de desocupado”. Já adulto, foi mestre em colocar toques brasileiros na música erudita das salas de concerto. “É preciso fazer o mundo inteiro cantar. A música é tão útil quanto o pão e a água”.

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Para descobrir o nome, basta preencher o diagrama abaixo. O número de cada quadrinho indica uma letra escondida na linha correspondente do texto lá de cima. Por exemplo: primeiro quadrinho, linha 1:

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que nunca vai adiante?

TRA

A composição mais famosa de Villa-Lobos faz parte de uma obra chamada Bachianas Brasileiras. O conjunto chama-se assim pois o maestro fez músicas no estilo do alemão Johann Sebastian Bach, mas usando elementos típicos da música do Brasil. O trecho que ficou mais conhecido imita com os instrumentos de orquestra o som de um meio de transporte. Você sabe dizer qual é o nome dessa obra?

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Qual a nota musical

Z

Villa-Lobos realizou um sonho nos anos 1940: fez várias apresentações de canto orfeônico. Trata-se de um coral gigantesco, com tantas crianças que ocupa um estádio inteiro. O poeta Carlos Drummond de Andrade assistiu a um desses espetáculos e anotou: “Quem viu Villa-Lobos comandando o coro de 40 mil vozes no estádio do Vasco da Gama não pode esquecê-lo nunca. Era a fúria organizada em ritmo”. Imagina só o trabalhão que deu pra juntar essa molecada toda. Colocadas uma atrás da outra, essas crianças formariam uma fila de mais de 20 mil metros, ou 20 quilômetros!

VO E R EPE TIR EM

Vi o violão Ouvi o violoncelo

W W W. LU CI A N OTA SS O.B LO G

S P OT.CO M


CUNHA

História real A cidade paulista localizada na divisa com o Rio de Janeiro reúne o sabor do interior, com direito a pinhão, moda de viola e congada, além de histórias dos tempos do ouro e das batalhas da Revolução Constitucionalista.

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inda não era Cunha. Era uma passagem apenas. Ostentava o pomposo nome de Estrada Real, embora estivesse léguas distante de ser nobre ou realmente se constituir num caminho. Com muito grotão e biboca, passavam por ela tropeiros e mulas, emergindo e afundando nas vagas daquele montanhoso verde-mar. No lombo dos animais se empoleiravam montes de ouro extraídos das minas das Gerais. E o fim da picada era o porto de Paraty, onde a preciosa carga emprenhava os porões dos navios que seguiam para Portugal. A estrada tatuava as serras da Bocaina, do Mar e do Quebra Cangalha. Diante de tanto movimento, era preciso criar um pouso naquela marafunda de serra. Assim nasceu, em 1660, um lugarejo que batizaram com o triste nome de Povoação do Facão, melhorado em 1748 com o batismo de Freguesia de Nossa Senhora da

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Conceição do Facão. Em 1785, sumiram com o facão e colocaram Vila de Nossa Senhora da Conceição de Cunha, homenageando o então governador da província de São Paulo, capitão Francisco da Cunha Menezes. Em 1858 virou só Cunha, como é até hoje. Cunha é caipira boa da gema, e das muitas claras que entram no preparo dos suspirões recheados de doce de coco da Cidinha, doceira que herdou antigos sabores e saberes dos antepassados. Antepassados que sabiam das coisas. Dizem que aquelas comidas de sustança tipicamente mineiras – angu, couve picadinha, frango caipira, feijão tropeiro misturado com carne e farinha, doce de leite, frutas em calda, queijadinhas – só foram parar na mesa dos mineiros depois que os comerciantes da terra de Tiradentes começaram a circular pela Estrada Real.


Moda de viola é também prato que se serve sem miséria por essas bandas. E não falta exaltação à cidade, como nos versos de Antonio Nicolau: Nossa cidade de Cunha / Terra das malacachetas / Tem montanhas que brilham tanto / Como as estrelas cometa. Tomou gosto? Então ouça o repente de João Guilherme contando as batalhas travadas em solo cunhense durante a Revolução Constitucionalista: No ano de trinta e dois / Em Cunha a coisa ficou preta / Cariocas e Paulistas / Cruzaram as baionetas.

Outros solos e histórias Na zona rural de Cunha salpicavam artesãs como dona Benedita Olímpia, moldando o barro bom do Barreiro ou da Sororoca. As paneleiras faziam potes, boiões, cuscuzeiros, pichorras, em confecção que em tudo se assemelhava às vasilhas indígenas, utilizando o sabugo de milho raspado para alisar o barro. Depois de queimadas, as panelas precisavam ser curadas, untando-as com banha de porco por dentro e por fora. Moringas e potes não passavam pelo processo, por isso mantinham sempre a água fresquinha e com aquele sabor característico. Na boca do forno já havia gente aguardando para carregar o burro e vender em Paraty. O barro bom e a arte das paneleiras foram dando fama à cerâmica de Cunha. Atraídos pelas montanhas e serenidade do lugar, em 1975 chegou à cidade um pequeno grupo de ceramistas provenientes do Japão. O declive natural dos terrenos favorecia a construção dos fornos noborigama, técnica de origem chinesa, milenar e arcaica, que se baseia em fornos com quatro a cinco câmaras, construídos em rampa. As peças queimam durante 35 horas. Atingem temperaturas de até 1.400ºC e demoram três dias para esfriar. O resultado é uma cerâmica de grande qualidade, resistência e beleza. Já viu um lugar com tanta coisa boa? Tamo afiançando... Vá lá e confira, ara!

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Preste atenção Marca forte da cultura da cidade é a congada, manifestação que entremeia elementos católicos e africanos. Entoando melodiosos cantos em louvor de Nossa Senhora do Rosário, são Benedito e do Espírito Santo, os descendentes de escravos sacodem bastões e chocalhos amarrados às pernas ao som de sanfonas, tambores e violões, numa marcante coreografia. Novembro 2011


Haja coragem! A ponta do pé congela só de ensaiar, mas quando passa o efeito de agulhas pinicando a pele (vai ver que é por isso que a cachoeira se chama Pimenta), vira-se criança. Aos valentes, o prêmio de resplandecer corpo e alma.

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Cunha tem mais A mais alta das montanhas de Cunha tem1.840 metros de altura. De lá, em dias claros, pode-se avistar a baía e a cidade de Paraty, a Baía Grande e Angra dos Reis. A subida é íngreme, mas a vista lá de cima vale, e muito, todo o esforço.

O cultivo da uva, assim como o de laranjas, peras, ameixas e castanhas, aproveitando as características climáticas de Cunha, teve origem em 1878 e foi resgatado por João José Veloso com a produção de vinho artesanal nas variedades Isabela e Moscatel na Quinta do Manah.

Localizado em um casarão de 1780, possui no acervo quadros e peças em cerâmica, além de documentos e fotos que contam a história da Revolução Constitucionalista de 1932, que teve Cunha como palco de algumas batalhas.

A TAM possui voos diretos para São Paulo e Rio de Janeiro, saindo das principais cidades brasileiras. Confira em www.tam.com.br. Onde ficar Pousada Barra do Bié • O caminho para se chegar lá é prazeroso, ladeado de fazendas e de cercas que ganharam uma bela pátina do tempo. Além de interior aconchegante, a fumacinha saindo da chaminé da pousada anuncia comida boa feita com esmero por Ana Rosa. Fone: (12) 3111-1477. www.pousadabarradobie.com.br. Pousada da Mata • Nem bem o hóspede tira as malas do carro já vai provando as especialidades da Joana: um biscoitinho de nata, um pão de mel... É sinal do quanto a estadia por ali será saborosa. Fone: (12) 3111-1975. www.pousadamata.com.br. www.almanaquebrasil.com.br

Onde comer Quebra Cangalha • Bom local para se saborear uma truta com molho de pinhão e o cremoso purê de banana da terra. Fone: (12) 3111-2391. www.quebracangalha.com.br. Panela de Barro • Localizado no centro histórico, oferece as comidas de sustança típicas da roça: galinha caipira, feijão tropeiro, leitoa, farofas, abóbora, quiabo. Tudo feito em fogão a lenha e, claro, em panelas de barro. Rua João Manoel Rodrigues, 17.



LARANJA Citrus sinensis

Pomo perfeito Depois da banana, é a fruta mais procurada e apreciada – e a mais gostosa é nossa. Salvou marinheiros do escorbuto, soldados brasileiros da cólera, e hoje a ciência comprovou definitivamente: uma saborosa laranja todo dia nos mantém lépidos e fagueiros.

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discussão vem desde os gregos antigos: alimento que nos dá prazer coincide com o que nos nutre? Isto levou Sócrates (470-399 a. C.) a distinguir entre quem vive para comer e quem come para viver. E há os que levam tal antagonismo a extremos. Para nós, como para muita gente, é possível ao mesmo tempo obter prazer e valor nutritivo dos alimentos. A laranja é bom exemplo. Além de saborosa, suculenta, perfumosa, refrescante, tem grande valor nutritivo, e medicinal. Na escola aprendemos que, na era das navegações, marinheiros morriam às pencas nas viagens ultramarinas por falta de vitamina C, abundante nos cítricos. Quando abordamos o limão, em seção publicada em outubro de 2010, citamos Os Lusíadas, de Camões. O poeta narra que, ao chegar às Índias, os portugueses foram recebidos com limonadas, com o que “sarárão de escorbuto alguns doentes, que tinhamos comnosco”. No Brasil, houve outra heroína cítrica: a laranja. Em As Frutas na Medicina Doméstica, Alfons Balbach conta que na Guerra do Paraguai (1865-1870), durante a Retirada da Laguna, “foi a laranja que salvou o exército brasileiro que estava sendo dizimado pela cólera” e pelo escorbuto.

Depois da banana, ela é a fruta mais procurada e apreciada. Toda documentação encontrada afirma que tem origem na Ásia. Aqui sentiu-se em casa com as nossas. Câmara Cascudo, em História da Alimentação no Brasil, afiança: “A laranja da Bahia é produto made in Brazil. A indústria cítrica da Califórnia nasceu de laranjeiras enviadas da Bahia”. Certo é que já tínhamos nossas laranjeiras, celebradas por quem se gabava de ser “o primeiro filho do Brasil que publicou seus versos”, Manuel Botelho de Oliveira (1636-1711), no poema As Fruitas e os Legumes: As laranjas da terra / Poucas azedas são, antes se encerra / Tal doce nestes pomos / Que o tem clarificado nos seus gomos / Mas as de Portugal entre alamedas / São primas dos limões, todas azedas. Assim cantava o nacionalista Botelho. A da Bahia, de que fala Cascudo, resultou certamente de enxerto. Casaram uma espécie da terra com a Citrus sinensis, levada da China para a Europa e, no século 16, para cá trazida nas caravelas. Note que sinensis contém o radical sino – do grego Sínai: “da China”. De uma feliz união sino-brasileira, nasceu a laranja mais deliciosa do planeta.


Não engorda e faz crescer

A Iolanda Huzak

laranja previne e cura doenças. Pouco calórica, é rica em fibras – fundamentais, já vimos, para a saúde intestinal; e em sais minerais como fósforo (cérebro), cálcio (ossos), ferro (sangue). Tem vitaminas como A, do crescimento (e boa para pele, olhos, mucosas). A maior riqueza está na vitamina C, que abordaremos mais detidamente no mês que vem: você verá o que ela faz além de nos dar bem-estar e disposição. Pelas virtudes, e pela delícia que ela é, já foi chamada de pomo sagrado, ou pomo perfeito.

Faça um intestino feliz

Emre Nacigil

risão de ventre envenena o sangue, prejudica a pele, causa indolência, depressão; e mau humor – olha a expressão: Fulano vive enfezado. No intestino habitam microrganismos benfazejos que ajudam a digestão, atacam micróbios malfazejos e vivem à custa de celulose. E para o intestino se contrair nos movimentos peristálticos, que vão expulsar o bolo fecal, o canal intestinal precisa de volume, composto de celulose, e não só de alimentos que deixam pouco resíduo, como pão branco, leite, carne, ovo, o que levará a pessoa a sofrer de “intestino preso”. Alfons Balbach, autor de As Frutas na Medicina Doméstica, adverte para outra importante função da fruta: “Muita gente apenas chupa o suco da laranja e despreza o bagaço. Muito bom é ingerir tanto o suco como o bagaço, muito bem mastigado”. O bagaço é celulose, que, além de alimentar os microrganismos benfazejos, põe o intestino para funcionar. Se você comer uma ou duas laranjas por dia, seu intestino ficará agradecido. E você contente, de pele bonita e com mais disposição.

No Almanaque de dezembro: graças a Tio Sam, o mundo aderiu ao suco no café da manhã.

Iolanda Huzak

P

Dicas para tirar dela o que ela tem de melhor

C

om laranja se faz doce, compota, geleia, sorvete, creme, gelatina, bolo, pudim, até prato salgado. Algumas dicas: a casca seca ao sol aromatiza suflês e omeletes. Carnes gordas assadas no suco (pernil, presunto, aves) ficam mais macias e saborosas. A infusão da folha é ótima contra enxaqueca e febres. Não guarde o suco, a vitamina C logo evapora. Pela mesma razão, se for levar de lanche, descasque, mas não tire a pele.

SAIBA MAIS As Frutas na Medicina Doméstica, de Alfons Balbach (Edificação do Lar, s/d). História da Alimentação no Brasil, de Luis da Câmara Cascudo (Global, 2004).

Consultoria: nutricionista Aishá Zanella (aishazanella@hotmail.com)

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Mulher ciumenta

Uma mulher conversa com a amiga, que é muito ciumenta com o marido: – E aí, querida, está melhor com ele? – Mais ou menos... Hoje de manhã ele disse que eu era a oitava maravilha do mundo. – Que bom! E o que você respondeu? – Eu pedi pra ele se livrar já das outras sete!

Ele avisou 34

No acampamento na África, o líder do grupo, que era gago, disparou: – Hip, hip! E todos, sem pestanejar: – Hurra! O líder repetiu: – Hip, hip! Quando todos estavam prestes a soltar o “hurra” novamente, uma manada de hipopótamos passou e atropelou todo mundo.

Causos de

Rolando Boldrin

Reza para Cid Moreira Meu pai tinha uma danada duma dor na perna que mais tarde foi curada pelo meu amigo doutor Hungria. Toda vez que eu queria saber como era essa dor, para informar o médico, ele dizia: – Fala pro doutor Hungria que é uma dor efetiva! Ou seja, que não ia embora nunca. Falando no velho, devo dizer que era um herege, ateu, descrente de Deus. Diferente da minha mãe, que era uma rezadeira. Rezava para os filhos, que eram 12, para os netos, bisnetos, parentes, vizinhos, amigos e para quem mais achasse necessário. Teve uma época que começou a fazer as orações para gente que não era tão próxima do seu convívio. Se soubesse que o prefeito da cidade passava por alguma dificuldade, começavam as rezas. O mesmo se dava se algum amigo contasse algo triste de algum parente distante. Lá ia ela pedir a proteção dos céus. Só que um dia fui sabedor de algo inusitado. Minha mãe disse que estava rezando para o Cid Moreira, apresentador da Globo. Aí já foi demais para a minha curiosidade. Admirado, indaguei: – Ué, mãe. Por que a senhora reza para o Cid? A senhora nem o conhece pessoalmente. E ela emendou naquela bondade e compreensão filosófica que só quem é puro sabe: – Se ele trabaia na televisão, deve de precisá de muita reza. No que eu concordei, plenamente.

3 minutos

No consultório, o paciente recebe a notícia de que só tem três minutos de vida. – Pelo amor de Deus, doutor, e o que eu posso fazer? – Bom, dá tempo de fazer um macarrão instantâneo...

Outra de médico

– Doutor, o que eu tenho é grave? – Não se preocupe. Se houver alguma dúvida, vamos esclarecer na autópsia.

Na escola

Joãozinho pergunta: – Fessora, a senhora se casa comigo? – Me desculpe, Joãozinho, mas eu não gosto de crianças. – A gente evita, fessora!




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