O guardião de nossa brasilidade
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ste Almanaque nasceu em 1999, o mesmo ano da comemoração do centenário de Câmara Cascudo. Quem acompanha a nossa trajetória sabe que ele é o nosso inspirador e patrono. Em julho de 2004 recebi de sua filha, Anna Maria Cascudo Barreto, o livro O Colecionador de Crepúsculos, uma fotobiografia do pai, acompanhada de uma carinhosa dedicatória. Nela, me cumprimentava pela insistência na divulgação da cultura popular. Seu livro é admirável porque, como ela mesmo avisa, tratou o garimpeiro do imaginário popular apenas por “pai”, seu primeiro amor. Tudo é narrado sob a ótica filial, com a autenticidade de quem foi testemunha constante das alegrias e tristezas daquele homem que é sinônimo de brasilidade. Esteve sempre ao seu lado, desde o nascimento até a sua “última viagem”. A publicação é um emocionante relato sobre a vida e a obra do mais importante pesquisador da nossa cultura popular. Nos revela um extraordinário ser humano, que jamais aceitou os inúmeros convites para concorrer a uma vaga na Academia Brasileira de Letras. Não queria competir com amigos que admirava. Câmara Cascudo escreveu sobre os mais variados temas em cerca de 150 livros. Mas foi no entendimento da alma popular, na expressão do nosso imaginário, que se tornou um dos maiores pensadores do Brasil. Ele nos ensinou a ser ainda mais “nós mesmos”. Definia-se como “um provinciano universal”. Seu legado intelectual das raízes populares fez dele um estudioso dos nossos costumes, reconhecido no País e fora dele. Ele explicava que “a cultura popular é básica, de uma sabedoria ilimitada porque vem de uma sedimentação de conhecimentos. Nada tem de escolaridade. É uma mistura de constatações no tempo e no espaço, repetidas oralmente e sempre com uma pitada do sentimento pessoal do momento. Todas as outras culturas são acessórias, ela é a principal”. Por essas e outras é que adotamos uma frase sua para representar nossa admiração por ele: O melhor do Brasil ainda é o brasileiro. Se pudesse nos ouvir agora, ouvir nossos elogios à sua magnífica obra, certamente responderia com sua costumeira modéstia: “É mentira, mas é gostoso.”
Elifas Andreato O escritor Osvaldo Lamartine, ao saber da morte de Câmara Cascudo, questionou desolado ao acadêmico Diógenes da Cunha Lima: – A quem, agora, nós vamos perguntar as coisas?
A R M A Z É M DA M E M Ó R I A N AC I O N A L Diretor editorial Elifas Andreato Diretor executivo Bento Huzak Andreato Editor João Rocha Rodrigues Editor de arte Dennis Vecchione Editora de imagens Laura Huzak Andreato Editor contribuinte Mylton Severiano Redatores Bruno Hoffmann, Clara Caldeira,
Nara Soares e Natália Pesciotta Revisor Lucas Carrasco Assistentes de arte Guilherme Resende e Paula Chiuratto Assistente administrativa Eliana Freitas Assessoria jurídica Cesnik, Quintino e Salinas Advogados Jornalista responsável João Rocha Rodrigues (MTb 45265/SP) Impressão Posigraf
Presidente Cmte. David Barioni Neto Diretora de Marketing Manoela Amaro Mugnaini Diretor de Assuntos Corporativos Marcelo Xavier de
Mendonça
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Correspondências
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Capa: São Jorge em barro, de Mestre Gerard. Foto de Valfrido Lima
Aumente seu nível de brasilidade E ainda ganhe pontos para viajar Quem assina o Almanaque acumula pontos no Programa TAM Fidelidade. Pagamento por cartão de crédito ou boleto bancário. Central de atendimento ao assinante: (11) 3512-9481 • (21) 4063-4320 • (51) 4063-6058 • (61) 4063-8823 Ou pela internet: www.almanaquebrasil.com.br
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Irmã de Chico Buarque
Luís da Câmara Cascudo Solução na p. 32
Janeiro 2009
20/1/1985
20/1/1977
INAUGURAÇÃO DO AEROPORTO INTERNACIONAL DE SÃO PAULO/GUARULHOS, MAIS CONHECIDO COMO CUMBICA
INAUGURAÇÃO DO TERMINAL DE PASSAGEIROS DO AEROPORTO INTERNACIONAL DO RIO DE JANEIRO, MAIS CONHECIDO COMO GALEÃO.
Olhos que pertencem a uma figurinha carimbada do cinema brasileiro. Nascido em São Paulo no dia 3 de janeiro de 1969, chegou a cursar a faculdade de Belas Artes antes de subir aos palcos. Na tevê, estourou como o Cintura Fina de Hilda Furacão e não parou mais. Seu currículo, além das novelas e minisséries, conta com mais de 20 filmes, dentre os quais os aclamados Central do Brasil e Cidade de Deus. (CC) Confira a resposta na página 32.
FESTA ESTRANHA
TARDES EM ITAPUÃ
Batuque afro-brasileiro inspirou Mick Jagger?
Oswald e Pagu casaram no Cemitério da Consolação
reprodução/Ab
reprodução/Ab
mick jagger na bahia, em 1968.
pagu e oswald (ao centro) depois da cerimônia.
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m 1929, nas palavras de Raul Bopp, “a arca antropofágica encalhou”. E se as coisas não caminhavam bem para o Modernismo, também entre o casal Tarsila do Amaral e Oswald de Andrade a vida começava a desabar. Patrícia Galvão, a polêmica Pagu, na época com 18 anos, era presença constante no dia-a-dia do casal. Cercada de mimos, acompanhava-os em bailes, teatros e reuniões. Deste convívio nasceu um romance entre Pagu e Oswald, que abandonou Tarsila e escandalizou a todos, casando-se com a jovem. A cerimônia aconteceu em 15 de janeiro de 1930 no Cemitério da Consolação, em São Paulo. O próprio Oswald registrou: “Nesta data contrataram casamento a jovem amorosa Patrícia Galvão e o Crápula forte Oswald de Andrade”. A façanha realizou-se em frente ao túmulo da família do noivo, na rua 17, número 17 do cemitério, mas foi apenas simbólica. Mais tarde a união foi confirmada na (CC) igreja da Penha, na zona leste paulistana. Saiba Mais Paixão Pagu: A autobiografia precoce de Patrícia Galvão (Agir, 2005).
“Até a morte, tudo é vida.”
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de janeiro de 1968. Mick Jagger e Marianne Faithfull desembarcam no aeroporto do Galeão, no Rio. Logo a notícia de que um Rolling Stone estava no País se espalha e o casal decide partir para a Bahia. Chegam à cidade no dia da lavagem da escadaria da Igreja do Bonfim. Mick alugou uma casa em Itapuã e, bem à vontade no novo lar, tocava violão, brincava com as crianças e participava de rodas de samba. Foram 19 dias de férias. “Todas as noites ficávamos até o nascer do sol tocando música brasileira, principalmente com tambores”, relembra. “Acho que foi aquela experiência que levou Mick a usar um samba como base para a música Sympathy for the Devil”, diz Marianne. O casal voltou ao Brasil em dezembro daquele mesmo ano, acompanhado do guitarrista Keith Richards e de sua mulher. Dessa vez as férias seriam em Matão, interior de São Paulo. Mas esta já é uma (NS) outra história de almanaque. Saiba mais Sexo, Drogas e Rolling Stones, de José Emilio Rondeau e Nélio Rodrigues (Agir, 2008).
Miguel de Cer vantes
Rolls Royce e camélias
Rendeiras de Mariana vestem primeira-dama e ganham fama internacional Ricardo Stuckert/PR
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LULA, MARISA E CAMÉlias.
m 2003, na bicentenária comunidade de Ilha Grande, no interior do Piauí, foi formada a Associação das Rendeiras dos Morros de Mariana. Era uma forma de garantir maior visibilidade ao trabalho. E deu certo: desde então as vendas não pararam de crescer. Mas o momento de maior notoriedade ocorreu em 1º de janeiro de 2007, na posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A primeira-dama, Marisa Letícia, trajava um vestido amarelo, criado pelo estilista Walter Rodrigues, adornado por 1.200 camélias produzidas pelas bordadeiras. A união da alta costura com o artesanato têxtil ganhou lugar de destaque no noticiário brasileiro e internacional. E esse casamento entrou definitivamente no mundo da moda. Estilistas consagrados, como Lino Villaventura, Carlos Miele, Fause Haten e Ronaldo Fraga, já utilizaram a técnica do artesanato têxtil em suas coleções. (MF)
Saiba mais Site do Museu do Objeto Brasileiro: www.acasa.org.br
VOLUNTÁRIOS, PERO NO MUCHO
Brasileiros deram jeitinho para escapar da Guerra do Paraguai
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revista ilustrada 12/03/1865
m 1864, Brasil, Argentina e Urudos, outros tramavam para que inimigos políguai se uniram para combater ticos fossem no seu lugar. Havia até quem ofeum inimigo comum, o Paraguai, recesse familiares: sobrinhos, irmãos, filhos... então a nação mais desenvolvida da América A prática mais comum, no entanto, era a do Sul. A justificativa era que os paraguaios aquisição de escravos para substituir o conpretendiam invadir o Sul do Brasil e parte vocado. Até o governo passou a comprar nedos outros dois países para expandir o terrigros para as batalhas. “Forças e mais forças despedida dos primeiros voluntários. tório até o Oceano Atlântico. a Caxias. Apresse a medida de compra de esA guerra eclode, mas as primeiras batalhas são um fiasco para os bracravos e todos os que possam aumentar o nosso Exército”, escreveu sileiros. Logo percebe-se a necessidade de mais combatentes no front. dom Pedro II ao ministro da Guerra. Em 7 de janeiro de 1865 são criados os Corpos de Voluntários da Estima-se que mais de 20 mil escravos tenham lutado na GuerPátria, que pretendiam incentivar o alistamento de civis por ideais para do Paraguai. O número representa cerca de 16% dos soldados trióticos. No começo até que dá certo, mas logo a empolgação passa, e brasileiros. Como é de se imaginar, eram tratados como inferiores o trabalho de persuasão se torna cada dia mais complicado. “Os brapelos companheiros. Muitos trabalhavam como criAdos dos solsileiros não se alistam voluntariamente por acreditarem que só pobres dados brancos. A Ordem do Dia para a Batalha de Tuiuti, uma das lutam”, explicou à época o escritor Joaquim Manoel de Macedo. mais importantes da guerra, determinava: todos os batalhões deOs “voluntários” começam então a ser recrutados na marra. Cada qual veriam estar a postos, inclusive “os bagageiros e camaradas [criadava seu jeito para escapar da guerra. Uns doavam dinheiro e empregados] dos senhores oficiais”. (BH) Saiba mais A Guerra do Paraguai, de Joaci Pereira Furtado (Saraiva, 2000).
O r i g e m da e x p r e s s ão
Imprensa marrom Derivada do termo yellow press, a expressão foi utilizada pela primeira vez no Brasil pelo jornalista Alberto Dines, que resolveu dar o título “Imprensa Amarela” a uma matéria sobre uma revista sensacionalista. O chefe de redação do Diário da Noite, Calazans Fernandes, sugeriu a mudança de cor, pois considerava o amarelo suave demais. Acabou pegando.
Janeiro 2009
J an e i R O 6 dia dos santos reis magos Gambá, cuca, boi-bumbá...
Figureiras fazem versão tupiniquim do presépio
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Julio Moraes
Bíblia diz que uma estrela lheres são a maioria) e as peças são brilhante orientou os Reis produzidas até hoje. As figureiras têm Magos até Belém, ao enconaté símbolo: uma escultura de pavão tro de Jesus recém-nascido. Mas pacriada pela artesã Cândida Vieira dos ra Taubaté, no interior de São Paulo, Santos, que passou a ser consideraforam os franciscanos os responsáda referência do artesanato paulista. veis por levá-los pela primeira vez, “Minha família já faz as figuras há peem forma de imagens para montar lo menos 150 anos”, diz Cândida. Ao o presépio. Os religiosos mal sabiam lado da irmã Maria Luiza, é a figureique, pouco tempo depois, os magos ra mais antiga da rua Imaculada, que presépio produzido pelas figureiras de taubaté. receberiam companheiros inusitaconcentra boa parte das artistas. dos, como o gambá, a cuca e o boi-bumbá. Se antes saíam de lá para vender as peças no Mercado Municipal, agoTudo começou quando o Mosteiro de Santa Clara foi instalado no Vale ra são os compradores que procuram o local, transformado em ponto do Paraíba no século 17, e lá passaram a ser produzidos os presépios turístico. Encontram as casas facilmente, pintadas em cores vivas. que enfeitavam as casas da região. Com o tempo, os artistas não deram A Casa do Figureiro, espécie de cooperativa, nasceu em 1993 para mais conta do alto número de encomendas. Passaram a reproduzir manter a tradição. Com aproximadamente 40 membros fixos e forno somente a Sagrada Família – Cristo, Nossa Senhora e são José. elétrico, a argila usada não é mais retirada do Rio Itaim, com o intuito O povo sentiu falta dos Reis Magos e dos outros adornos, como anide preservar a reserva natural. A matéria-prima agora vem certificada mais, anjos e camponeses. Daí surgiu um grupo de artesãs responsáde São Paulo. vel pelas peças de segundo plano. Ficaram conhecidas como “figureiPelo menos 600 Reis Magos saem por ano da Casa do Figureiro, com ras”, palavra que ainda não consta no dicionário, em contraposição destino a vários cantos do Brasil e do mundo. Um trio para cada releiaos “santeiroS”. tura da cena natalina. “Um traz nas mãos o incenso, outro, o ouro e o Primeiro elas apenas repetiam as figuras tradicionais, mas depois coúltimo, a mirra”, explica Cândida. meçaram a também moldar na argila seres de seu próprio imagináNo Brasil, a data que representa a chegada dos Santos Reis ao estáburio. Ao lado de Jesus, surgiram aves locais, raposas, além do gambá, lo significa que os enfeites natalinos já podem ser tirados. Melchior, cuca, boi-bumbá... Baltazar, Gaspar: já para a caixa! É hora de as figureiras se ocuparem A tradição passou de pai para filho (ou de mãe para filha, já que as mucom as imagens pagãs e de são Francisco. (NP)
Saiba Mais www.figureirasdetaubate.com.br
janeiro também tem 1 Dia da Paz Mundial 2 Dia do Bonde 3 Dia do Juiz de Menores 4 Dia do Hemofílico 5 Dia da Saudade no Futebol 6 Dia da Gratidão 7 Dia da Liberdade de Culto 8 Dia do Repórter Fotográfico 9 Dia do Fico 10 Dia do Astronauta
11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
Dia dos Fabricantes de Baralhos Dia da Fundação de Belém (PA) Dia do Leonismo Internacional Dia do Treinador de Futebol Dia Mundial do Compositor Dia do Cortador de Cana-de-Açúcar Dia dos Tribunais de Contas do Brasil Dia do Ensino Médio no Brasil Dia do Terapeuta Ocupacional Dia de São Sebastião
21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31
Dia Mundial das Religiões Dia da Vila Brasileira Dia do Senado Dia Nacional do Aposentado Dia do Carteiro Dia do Comediante Dia do Orador Dia do Portuário Dia da Hospitalidade Dia Nacional dos Quadrinhos Dia Mundial do Mágico
7 dia do leitor
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dia da saudade NEM TOM JOBIM ESCAPOU
Machado de Assis integrou uma sociedade de mentirosos
Roniquito distribuía sinceridade e impropérios pelo Rio
reprodução/AB
armando rozário
CASCATA, LOROTA, POTOCA
machado de assis
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a segunda metade do século 19, a Tipografia Paula Brito era um fervilhante ponto de encontro dos intelectuais cariocas. O estabelecimento levava o nome de seu dono, Francisco de Paula Brito, considerado por muitos o primeiro editor do País. E foi por sugestão do influente livreiro que, em 1840, reuniu-se pela primeira vez a Sociedade Petalógica do Rossio Grande. Aos impressionados com o nome pomposo, um esclarecimento: “peta” significa mentira, cascata, lorota, potoca. A Sociedade era uma espécie de clube lítero-humorístico que tinha como propósito exercitar a imaginação e difundir mentiras para desmoralizar quem as passasse adiante. Foram muitas as personalidades que contaram por ali suas histórias. O mais célebre certamente foi Machado de Assis, que integrou a sociedade aos 16 anos. “Lá se conversava de tudo, desde a retirada de um ministro até a pirueta da dançarina da moda”, descreveu mais tarde. A maior marca do grupo, segundo o escritor, era o pluralismo. “Era um verdadeiro campo neutro, onde o estreante das letras se encontrava com o conselheiro.” Assim, políticos, poetas, dramaturgos, artistas, viajantes, simples amadores, amigos e curiosos se juntavam ao grupo, que teve uma intensa produção poética e musical. Castro Alves, Casimiro de Abreu, Artur Azevedo, o próprio Machado e também Paula Brito deram letras a vários lundus e modinhas, fazendo da Sociedade Petalógica reduto criativo e um dos berços da música (MA) popular brasileira. Saiba Mais Tese “Doces Modinhas para Iaiá”, de Jonas Alves da Silva Júnior, disponível em www.teses.usp.br
falava inglês, francês e o que bem entendesse.
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ma ameaça rondava os bares de Ipanema nos anos 1960 e 1970 na figura de um rapaz baixinho, franzino e com nome inusitado: Ronald Wallace Carlyle de Chevalier. Economista respeitado, bem-nascido, Roniquito falava inglês, francês e, depois de umas boas doses de uísque, o que bem entendesse. Em bares como o Antônio’s e o Veloso, rondava as mesas iniciando discussões que iam da música clássica à literatura. E às vezes passava dos limites. A Tom Jobim, que sóbrio admirava, disse que sua música não passava de imitação de VillaLobos. Antonio Callado teve que ouvir: “Você já leu Faulkner? Então deve saber que perto dele você é um bosta”. Em um de seus momentos mais sem cerimônia, ao perceber que estava sem isqueiro, foi pedir fogo ao primeiro que entrou no restaurante em que almoçava. Como se tratava do geNeral Costa e Silva, acabou detido. Data da época em que trabalhava na TV Globo, como auxiliar de Walter Clark, a invenção de uma palavra hoje incorporada ao dicionário. Quando questionado o que fazia na emissora, teria respondido: “Sou aspone: assessor de porra nenhuma!”. Roniquito – que durante o velório de um amigo entrou na capela ao lado e exclamou: “Esse defunto de vocês é uma merda. O nosso é muito mais bonito!” – teve morte prematura, aos 45 anos, vítima de complicações decorrentes de um atropelamento. Detalhe: na porta do Antônio’s. Sobre ele, o cartunista Jaguar comentou: “É um mistério. Morremos de saudade de um sujeito (MA) que vivia nos esculhambando”. Saiba Mais Dr. Roni e Mr. Quito, de Scarlet Moon de Chevalier (Ediouro, 2006). Janeiro 2009
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dia do farmacêutico SABEDORIA POPULAR
Projeto no Amapá transforma quintais em farmácias
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divulgação
or que sempre apelar para os medita e as indicações de uso das plantas. camentos convencionais quando O Farmácia da Terra exige uma equipe temos uma verdadeira farmácia básica, composta de dois farmacêuticos, à disposição no quintal? Pensando nisso, um enfermeiro, um nutricionista e um pesquisadores do Instituto de Pesquisas técnico agrícola. O grupo tem a responsaCientíficas e Tecnológicas do Amapá criabilidade de estabelecer o projeto, desde ram o projeto Farmácia da Terra, que se o primeiro contato com as comunidades baseia na tradição local para desenvolaté a execução das oficinas, passando ver medicamentos naturais contra dOenpor treinamentos de plantio, manejo, coformação de coletores ças simples. leta, secagem e armazenagem além da Além de terem um custo mais baixo, os chamados fitoterápicos produção de remédios caseiros. preservam e difundem a sabedoria popular e têm a capacidade de O projeto é dirigido às zonas rurais, mas pode ser implantado até melhorar a qualidade de vida da população, que em muitos casos mesmo em condomínios fechados nas cidades, diz Terezinha de Jenão tem acesso aos medicamentos convencionais. No projeto, sus dos Santos, coordenadora do Farmácia da Terra. “O mais imagentes de saúde, parteiras, estudantes, professores e líderes coportante é saber usar as plantas de forma eficaz e segura.” Hoje o munitários aprendem a montar hortas, a extrair espécies da floresprojeto está em 21 comunidades de 12 municípios do Amapá. (CC) Saiba Mais Site do Iepa: www.iepa.ap.gov.br
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dia do fusca COM DINHEIRO PÚBLICO
Maluf comemora o tri dando mais de meio milhão em Fuscas
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pós conquistar a Copa de 1970 no México, lesiva à cidade. A história estendeu-se até 2006, sagrando-se tricampeã mundial, a seleção quando Maluf foi inocentado pelo STF sob o arbrasileira recebeu diversas homenagens gumento de que a Câmara de Vereadores havia pelo País. Uma, porém, causa polêmica até hopermitido a doação. je. Com dinheiro público, o então prefeito de São O autor decidiu não recorrer, pois já se sentia saPaulo, Paulo Maluf, presenteou cada jogador com tisfeito com a repercussão do caso. Já o ex-preum Fusca, coqueluche da indústria automobilístifeito comemorou a decisão com uma declaração ca nacional da época. Foram 25 veículos que, em singular: “Dei um fusquinha para o Pelé, para o valores atuais, custariam cerca de 600 mil reais. Rivellino, para o Tostão e até para o Leão. E o proA medida perdulária recebeu críticas de diversas cessado fui eu, e não quem recebeu os carros”, maluf e os tricampeões entidades. No mesmo ano, o advogado Virgílio disse. Esta foi uma das primeiras ações judiciais Egydio Lopes Enei entrou com ação popular que exigia a devolucontra Maluf, que já respondeu a outros 150 processos criminais, ção do dinheiro aos cofres públicos. O Supremo Tribunal Federal boa parte por má gestão do dinheiro público. Atualmente, são sete (BH) acolheu a ação, entendendo que a atitude realmente havia sido – quatro no STF e três no Tribunal de Justiça de São Paulo. Saiba Mais O Malufismo, de Mauricio Puls (Publifolha, 2000).
Henfil
O humor foi sua arma Por Clara Caldeira
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udo começou em Ribeirão das Neves, região metropolitana de Belo Horizonte. Lá nasceu e cresceu na década de 1940 o menino que entraria para a história como um dos mais importantes desenhistas brasileiros. Henrique de Souza Filho, o Henfil, frequentou o colégio Arnaldo da Ordem do Verbo Divino, um curso supletivo e a faculdade de Ciências Sociais, que abandonou dois meses depois. Foi embalador de queijos, boy de agência de publicidade e revisor de textos, até especializar-se, no início da década de 1960, em ilustrações e quadrinhos. Estreou em 1964 na revista Alterosa, a convite
Cartunista, jornalista, escritor. Mas, acima de tudo, um crítico. Destacou-se pelo engajamento na luta contra a ditadura e a aids. Conviveu com o vírus contraído numa transfusão de sangue, e nunca se deu por vencido. Revolucionou a história dos quadrinhos e renovou o desenho nacional com seus personagens tipicamente brasileiros, fazendo do humor uma arma de resistência. do editor Roberto Drummond. Lá nasceram os famosos Fradinhos e o apelido que carregou pela vida afora – contração de Henrique e Filho. Logo estaria publicando desenhos em O Diário de Minas, no carioca Jornal dos Sports e nas revistas Realidade, Visão, Placar e O Cruzeiro. Ainda em meados dos anos 1960 foi para o Rio de Janeiro, levando debaixo do braço seu livro Hiroxima meu Humor. O objetivo era conseguir que Millôr Fernandes – o grande nome do desenho e do humor na época – assinasse o prefácio da obra. Sem êxito.Voltaria ao Rio anos depois, agora não mais de passagem. Começou a trabalhar para o Jornal do Brasil e O Pasquim, tornando-se um nome conhecido por todo o País.
divulgação
“ Tenho um instrumento universal nas mãos que é o humor. Quero ser um espinho contra o estado das coisas. ”
Guerrilheiro do cartum Uma das características mais marcantes de Henfil foi o envolvimento com os movimentos sociais e políticos contra a ditadura militar (1964-1985). “Tenho um instrumento universal nas mãos que é o humor. Nasci no berço da luta de classes. Eu quero ser famoso como um cara que é mais um espinho contra o estado das coisas. Essa fama eu quero para mim”, dizia. O engajamento político era traço de família. Irmão do sociólogo Betinho e do compositor Chico Mário, Henfil era, como eles, hemofílico. E também contraiu o vírus HIV numa transfusão de sangue.“Por causa da hemofilia, Henfil vivia sempre com a espada na cabeça”, lembra Ziraldo.“Ele sentia que podia morrer a qualquer momento. E se defendia do mundo através do humor.” Para muitos dos que o conheceram, o desenhista era uma mistura dos dois fradinhos que levou para O Pasquim quando a meca do jornalismo bem-humorado de esquerda o convocou para suas frentes. A personalidade dos dois era uma convocação para a tomada de consciência da situação em que se encontrava o Brasil. Falava da acomodação e da hipocrisia incorporadas ao fradinho Cumprido, e da iconoclastia presente no fradinho Baixim. Outro personagem de destaque foi a esperançosa Graúna que, ao lado do cangaceiro Zeferino e de Bode Orelana, denunciava, em pleno milagre econômico, as disparidades entre o Norte e o Sul do País.Também povoaram suas páginas Pó de Arroz, Orelhão, Cabôco Mamadô, Urubú, Bacalhau e Ubaldo Paranóico – figuras que exerceram um papel vital na renovação do desenho humorístico brasileiro. Apoiavam-se
na descolonização numa época em que os quadrinhos nacionais tinham seu desenvolvimeno sufocado por publicações estrangeiras. Após uma década de trabalho no Rio, Henfil mudou para Nova Iorque para fugir da censura e tratar da saúde. Publicou Os Fradinhos, rebatizados de Mad Monks, em cerca de 200 jornais. Mas o público começou a reclamar do humor pesado, e o acordo com o distribuidor acabou. Assim, dois anos depois, Henfil estava de volta ao Brasil. Sua estadia na terra do Tio Sam rendeu o livro Diário de um Cucaracha, que fala do preconceito dos norte-americanos contra estrangeiros, especialmente os latinos.
NOS PALCOS E TELAS Em 1977, Henfil começou a colaborar com a revista IstoÉ. Cartas da Mãe era o nome da coluna em que críticas e desabafos do cartunista vinham à tona sob o pretexto de serem endereçadas a dona Maria da Conceição. Nas cartas, burlava a censura e tratava de temas como exílio político e anistia. No início da década de 1980, publicou os livros Henfil na China e Antes da Coca-Cola. Envolveu-se também com teatro e cinema. Realizou a peça A Revista do Henfil, e em 1984 escreveu e dirigiu o filme Tanga – Deu no New York Times. Nas telinhas, foi redator da TV Mulher, da Globo. Publicou ainda os livros Diretas Já, Fradim de Libertação e Como se Faz Humor Político. Ciente de que o tempo não jogava a seu favor, produziu até o fim da vida. Morreu em 4 de janeiro de 1988, vítima de complicações da aids. Seus personagens, entretanto, vivem até hoje em livros escolares, revistas e em qualquer iniciativa de retratar o tempo em que viveu. A obra de Henfil é um registro de seu tempo. SAIBA MAIS Procure no YouTube (www.youtube.com) por “Henfil” e assista ao documentário Henfil – Profissão Cartunista.
O M elhor Produto do Brasil é o Brasileiro CÂMARA CASCUDO
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Lino viLlaventura, amir slama e valdemar iódice RONALDO FRAGA
Há uma moda nacional? Existe uma moda brasileira de alto nível ou nos limitamos a imitar o que é feito em países mais desenvolvidos no tema? Essa questão é debatida há tempos, sem conclusões definitivas. E é ainda mais pulsante nesta época de São Paulo Fashion Week, evento que há 13 anos põe o País no cenário mundial da alta-costura. Os convites são disputados, a imprensa se aglomera e as imagens são assistidas em todo o mundo. O Almanaque, então, resolveu entrevistar três importantes estilistas que participam ou participaram da SPFW para falar sobre brasilidade: Lino Villaventura, Amir Slama e Valdemar Iódice. As perguntas – todas com a palavra “Brasil” ou derivados – são idênticas. É o momento de descobrir: afinal, há uma moda nacional?
Lino Villaventura
forte identidade possuem as influências culturais do local onde se vive ou viveu parte da vida. Se sou brasileiro e faço um trabalho autoral, é claro que as minhas raízes culturais estarão presentes no resultado do meu trabalho.
Desde 1982, quando abriu sua primeira loja em Fortaleza, o estilista constrói uma sedimentada carreira no campo da moda. Foi escolhido pelo Itamaraty para representar o País na World Trade Fashion Faire em 1989. Também recebeu diversos prêmios pela importância cultural da sua obra. Atualmente, exporta suas peças para sete países.
divulgação
Os profissionais de moda brasileiros têm destaque em âmbito mundial ou ainda procuram seu espaço? Nós trabalhamos pra isso. O objetivo da Abest [Associação Brasileira de Estilistas] é justamente divulgar a moda brasileira como um produto de qualidade e criatividade. Estamos tendo um ótimo resultado. O índice de venda é sempre crescente e o retorno de mídia, excelente. Mas precisamos ter paciência e trabalhar cada vez melhor. O espaço e destaque que conquistamos têm proporcionado um crescimento significativo a cada coleção apresentada.
O que aprendeu sobre moda nas viagens pelo Brasil? Muitas coisas. Aprendi e aprendo sempre. Este País, com sua diversidade cultural, é muito inspirador.
A cultura popular brasileira influencia seu trabalho de alguma forma? Evidentemente, todo o trabalho original e com uma
Este País, com sua diversidade cultural, é muito inspirador.
É possível criar obras de alto nível inspirando-se em temas nacionais? E não poderia ser diferente. Nosso País é fonte não apenas aos brasileiros, mas a todos que conhecem nossas Cores, a natureza esplendorosa, nossa culinária, nossas frutas, nossa gente colorida. Enfim, o Brasil é um país que contagia e emociona a todos por ser um imenso celeiro de inspirações. A moda está distante do dia-a-dia do brasileiro comum? De maneira nenhuma. Moda não é apenas a roupa que está na passarela, mas tudo que essa passarela influencia e determina.
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Amir Slama
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Ele começou a carreira como professor de história. Após formar-se na faculdade, passou a dar aulas numa escola de classe média de São Paulo. Pouco tempo depois decidiu dar uma reviravolta na vida: tornou-se barman de uma famosa casa noturna da cidade. Hoje, após nova guinada, é estilista e sócio da Rosa Chá, marca que fundou e tornou mundialmente conhecida. Os profissionais de moda brasileiros têm destaque em âmbito mundial ou ainda procuram seu espaço? Alguns estilistas conquistaram destaque mundial, como Alexandre Herchcovitch, Carlos Miele, Isabela Capeto, eu próprio, entre outros. Seja com lojas próprias, com vendas em butiques sofisticadas e em editoriais de grandes revistas, desenvolvemos há alguns anos trabalhos no mercado externo com grande sucesso. A cultura popular brasileira influencia seu trabalho de alguma forma? Ela está sempre Presente nos meus trabalhos. Seja de modo direto, como em coleções em que trabalhei com as lendas brasileiras ou sobre o universo do cangaço, seja de forma indireta. Também fiz trabalhos em parceria com artistas plásticos e compositores contemporâneos, como o Gonçalo Ivo e a Rita Lee.
A cultura popular brasileira está sempre presente nos meus trabalhos.
O papel da moda é o de surpreender, traduzir desejos ainda não despertados.
O que aprendeu sobre moda nas viagens pelo Brasil? Reforcei bastante a minha ideia de diversidade, que, em suma, é a tradução da moda brasileira. Por exemplo, lugares como Santa Cruz do Capibaribe [em Pernambuco] e Blumenau [Santa Catarina], tão distantes e diversos, congregam cursos de moda que estimulam a pensar sobre a produção nacional. É possível criar obras de alto nível inspirando-se em temas nacionais? Sim, é possível. Na moda, uma ideia e uma referência são transformadas em algo concreto, com a possibilidade de ser vestido. O papel da moda é o de surpreender, traduzir desejos ainda não despertados. A moda está distante do dia-a-dia do brasileiro comum? Sim e não. Antes o assunto era restrito a pequenas e escondidas colunas especializadas na imprensa nacional. Atualmente, a alta divulgação que a moda conquistou na mídia a tornou um assunto geral. Mas, ao mesmo tempo, a moda autoral é cara e, devido ao preço, acaba definindo seu público consumidor. E esse mesmo trabalho se torna mais barato na próxima estação, o que a faz chegar mais próxima do brasileiro comum.
divulgação
Valdemar Iódice O interesse pela moda começou cedo, ao observar a mãe criando roupas na confecção da família. Envolveu-se rapidamente com o negócio. Em 1987, lançou sua própria marca, a Iodice, em que produz roupas que se tornaram notórias pela sensualidade e leveza. “Busco refletir o alegre estilo de vida do brasileiro”, costuma definir. Os profissionais de moda brasileiros têm destaque em âmbito mundial ou ainda procuram seu espaço? Esses profissionais têm destaque internacional, sim. A começar pelas modelos. Além do fenômeno Gisele, há várias tops de destaque. E, por exemplo, todos os estilistas que participam da Semana de Moda de Nova Iorque têm seu espaço no exterior. Claro que há muito ainda o que fazer, mas já se fala de moda brasileira nos outros países. A cultura popular brasileira influencia seu trabalho de alguma forma? Vivo no Brasil, tenho contato direto com a músi-
A mulher brasileira influencia meu trabalho. Sua feminilidade e sensualidade são referências para minhas criações.
ca, as artes plásticas, o comportamento do meu País. É claro que isso influencia no que faço. Mas sem ser caricato, sem ter referência direta. E, mais que tudo, a mulher brasileira influencia meu trabalho. Sua feminilidade e sensualidade são referências para minhas criações. O que aprendeu sobre moda nas viagens pelo Brasil? Que o brasileiro tem seu jeito, seu modo de se vestir. E que nossa cultura é muito forte, com trabalhos que permeiam nosso comportamento e, consequentemente, nosso estilo. É possível criar obras de alto nível inspirando-se em temas nacionais? Para citar um exemplo de design, temos o trabalho de Francesca Romana Diana, com quem farei parceria no próximo SPFW. Ela faz suas joias apenas com pedras e temas brasileiros e é sucesso em todo mundo. A moda está distante do dia-a-dia do brasileiro comum? Não. A moda faz parte do cotidiano de todos.
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ESPECIAL
artesanato
Texto: Bruno Hoffmann Arte: Paula Chiuratto
Fotos: Beth Lima e Valfrido Lima
As refinadas mãos brasileiras Por anseio artístico, tradição ou para garantir uma vida mais digna, artesãos brasileiros mantêm-se criando elaboradas peças de arte por todo o País.
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s primeiras expressões culturais da humanidade foram moldadas à mão. O artesanato surgiu em 6 mil a.C., quando o homem aprendeu a polir pedra, a fabricar cerâmica e a tecer a partir de fibra animal. Inclusive por estas terras. Desse período há indícios de arte produzida por etnias que viviam onde hoje está o sudeste do Piauí. Séculos e mais séculos depois, o Brasil foi descoberto pelos portugueses. E com eles chegaram novas formas de arte manual, que aos poucos foram incorporadas à já sedimentada criação indígena. Mais um século adiante e foi a vez de os negros trazerem (na marra) o que conheciam da época em que viviam na África. Depois, chegaram os imigrantes europeus e asiáticos. Criou-se um artesanato híbrido, com influência de tudo e de todos que formaram este País. Neste Especial, o Almanaque apresenta a arte popular produzida do Oiapoque ao Chuí ou, mais propriamente, da Ilha de Marajó a São Borja. Todos foram pinçados do
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recém-lançado livro Em Nome do Autor (Proposta Editorial, 2008). É uma das mais completas obras sobre o artesanato brasileiro. Nas 458 páginas, os autores Beth Lima e Valfrido Lima mostram o resultado dos 110 mil quilômetros percorridos em quatro anos de pesquisa. Ao total, foram 320 artesãos entrevistados. Eles afirmam que a grande maioria vive em condições muito pobres, e que o artesanato é uma forma de garantir uma vida que beire a dignidade. “Mesmo em situações de penúria e isolamento, criam peças de extrema beleza e emoção”, conta Valfrido. Em diversas ocasiões ambos eram confundidos com “pessoas importantes”, como políticos ou gente da televisão. “Eles ficavam com um olhar de ‘agora pode ser que as coisas melhorem’.” Nem sempre melhoraram, e esse tipo de arte ainda é subvalorizada por boa parTe da população. Mas os artistas continuam a produzi-las, seja para manter a tradição, para dar vazão aos anseios artísticos ou para garantir, por meio de suas mãos simples, uma vida digna.
1. Oxóssi em barro, mestre Gerard. 2. Velho Gaúcho em barro, Rossini Rodrigues. 3. Carranca em madeira pintada, esculpida por Zefinha Paulino. 4. Oxum e Oxóssi em barro, mestre Gerard. 5. Boi em barro cru, Severino Pereira dos Santos. 6. Bumba-meu-boi em barro, João das Alagoas. 7. Caminho para roça em barro, Severino Pereira dos Santos. 8. Galo em lata reciclada e verniz, Joca dos Galos. 9. Pássaro com asas abraçadas, feito com raiz encontrada na mata, Gesileu Salvatore.
O marajoara que vive só da arte le é um dos poucos artesãos da Ilha de Marajó que vive exclusivamente da sua obra artística. Trata-se de Anaías dos Santos Freitas, que aprendeu o ofício nos anos 1960, quando uma Freira e um oleiro lhe ensinaram os princípios da atividade. “Também aprendi com um bispo, que me mostrou um livro estrangeiro com mais de mil peças dos índios daqui e comecei a reproduzi-las”, conta. Trabalha num galpão nos fundos de casa, e vende parte dos objetos na capital Belém. “Mas volto logo pra cá!” Uma das poucas lamentações é sobre o fato de muita gente de talento deixar o artesanato de lado. “Precisamos sobreviver. Quando se encontra um emprego fixo, há quem não pense duas vezes: o barro e a madeira ficam de lado, empilhados...”
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Ponta de Pedras – Ilha de Marajó, Pará
1. Releitura de vaso em estilo Marajoara 2. Defumador em barro, cópia de original Marajoara com algumas modificações
Pela liberdade artística esde pequeno, João das Alagoas produzia pequenas figuras em barro, inspiradas em temas que via a sua volta. Ele foi aos poucos deixando a atividade e passou a trabalhar no comércio da cidade. Um certo dia viu-se desempregado. A solução? Retomar a arte Capela, Alagoas
Bumba-meu-boi em barro cru
esquecida na infância. “Me apeguei trabalhando nos folguedos, nas histórias contadas e nos brinquedos”, resume. Ele demora semanas para fazer um boi tal qual o da imagem ao lado. São sempre peças únicas. “Existem as que são mais comerciais, como os santos e presépios. Mas uma coisa eu aprendi: não quero fazer quantidade, me escravizar. Quero fazer qualidade e mostrar isso a quem valoriza a nossa arte.”
“A semente fala o que quer ser” udo o que está à disposição na floresta pode ser material para Gesileu Salvatore. Troncos, cipós, sementes, musgos, cascas de inseto e até vértebras de cobra são recolhidos pelo artista, que passa semanas na mata para escolher a matéria-prima, para depois “bater um papo” com elas. “Quando olho o material, sei imediatamente o que vou esculpir, montar ou entalhar. Os pedaços de pau e as sementes conversam com a gente e falam o que querem ser.” E qual a razão do sobrenome inusitado? “Salvatore vem de Salvador Dali, um artista por quem tenho verdadeira paixão.” 1.
Rio Branco, Acre
1. Espiral da Vida, com tronco de pama 2. Dançarina, raiz encontrada na floresta
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A sagrada obra de Mestre Gerard le já produzia louças e brinquedos quando, aos 12 anos, sonhou com Bom Jesus da Lapa. Acordou com vontade de modelar a imagem. E nunca mais deixou as figuras sacras de lado. Hoje, é conhecido internacionalmente por suas peças delicadas em estilo barroco. O sincretismo religioso está presente na obra: os mantos de Nossa Senhora misturam-se às saias e panos de Iansã, Iemanjá e outros orixás. Hoje atua em um amplo espaço, ricamente ornamentado com santos católicos e africanos, onde ensina os jovens da região. 3.
Barra, Bahia
1. Oxum em barro 2. Nossa Senhora da Conceição em barro 3. São Jorge em barro
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Nascido em berço de barro le é filho de Mestre Vitalino – um dos artesãos mais importantes da história do Brasil. E Severino Vitalino mantém a arte herdada do pai, produzindo surpreendentes peças de barro. “Eu nasci em berço de barro. Éramos em seis irmãos, e desde os 7 anos ajudava meu pai a fazeR as pecinhas. Hoje sou continuador de sua obra”, explica, orgulhoso. Desde 1948 a família vive em Caruaru, mais precisamente no distrito de Alto do Moura. Foi montado na cidade um museu em memória de Mestre Vitalino, e seu filho é o responsável por cuidar do local. “Caruaru é o que é hoje por causa do meu pai e de outros mestres que aqui se formaram”, finaliza.
1.
Caruaru, Pernambuco
1. Banda de Pífanos Mestre Vitalino em barro 2. Caçador de gatomaracajá em barro 3. Morte do ladrão em barro
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A grande família de bordadeiras inda moça, Antônia Diniz Dumont aprendeu a bordar, e rapidamente se tornou craque em criar imagens em tecidos. Além das encomendas, ela bordou o enxoval de todos os filhos. E, depois, fez o mesmo com os netos. Como “retribuição”, filhas e netas aprenderam a técnica. Todas passaram a criar de forma coletiva. Uma riscava o desenho no pano e, juntas, começavam a bordar. Caso uma se cansasse, passava pra outra, e pra outra... Depois, enviavam pelos Correios para que Antônia acertasse detalhes, e enviasse de volta. O sucesso se tornou tão grande que suas imagens ilustram livros infantis (de escritores como Jorge Amado) e cobrem galerias de arte em todo o Brasil.
Pirapora, Minas gerais
Árvore da vida e detalhes de outros bordados
Trocou a engenharia pelo artesanato
Belo Horizonte, Minas gerais
Peça aberta e fechada (esquerda), em madeira pintada
le se formou em engenharia civil. Mas, desde que aprendeu a esculpir madeiras com um dos tios, a inquietude artística nunca o largou. Humberto Araújo, então, decidiu largar a profissão em 1996 para se dedicar exclusivamente às esculturas. “Às vezes, sentia que não tinha a genialidade suficiente, mas tinha a necessidade de estudar, criar.” Entre as obras, destacam-se as esculturas articuladas. “Em 1999, eu procurava toras para comprar e não encontrava. Só via madeira beneficiada. Então comecei a juntar os pedaços para conseguir volume.” Ele gostou do resultado: “Acredito que essas peças tenham um lado lúdico”. O maior incentivador para que largasse a engenharia foi o próprio tio que o havia ensinado décadas atrás. “Ele disse: ‘Vá em frente!’. Eu acreditei e gosto cada vez mais do que faço.”
Como é possível? lhe para a imagem ao lado. Sua primeira impressão, provavelmente, é de que a garrafa é pintada. Nada disso. O artista Edgar Andrade de Freitas usa areias coloridas para montar imagens tão ou mais impressionantes que esta. Com precisão absoluta, coloca finas camadas
de areia e, com agulhas, puxa traços grossos ou finíssimos, que cria o claro-escuro e os tons e semitons. Aprendeu a atividade com 14 anos, quando começou a acompanhar outra famosa artista da região, Joana de Andrade. “Eu não sei muito bem a origem dessa arte. Para mim, é a arte da areia colorida”, simplifica. Majorlândia, Ceará
São Jorge – garrafa com areias coloridas Janeiro 2009
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364 dias por ano
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Só paro na Sexta-Feira Santa.” É esse o ritmo de trabalho de Adelina Medeiros, que aprendeu o ofício com o pai. Ele fundou no município a primeira escola de Oleiros do Brasil, em 1944. Suas peças se destacam pela perfeição do acabamento, sendo considerada uma espécie de Mestre Vitalino do Sul. Ela costuma retratar as festas catarinenses, com personagens do Boi-de-Mamão - como a Maricota, o vaqueiro e a bernunça -, ricamente decorados. Tal qual a mulher açoriana, que traz no vestido a renda de bilro.
São José, Santa Catarina
1. Mulher Açoriana em barro pintado 2. Bernunça em barro pintado 3. Maricota em barro pintado 4. Vaqueiro em barro pintado 1.
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Penas de lata oca dos Galos não carrega o apelido à toa. Desde jovem dedica-se a figuras de aves, como galos e pavões, produzidas a partir de latas. Para trabalhar durante dois meses, precisa de mil latas. Recebe doações, mas a maioria compra do lixão da cidade. “E não pode ser qualquer uma. Uso três tipos de latas grandes. Recorto tudo, soldo com ferro quente e depois pinto, que é para não enferrujar”, explica. Tentou ensinar aos mais jovens, mas nem todos se interessaram. “De dez, apenas três passaram a trabalhar com isso”, lamenta-se. Mas ele se mantém firme. “É minha vida e o sustento da minha família.”
Araçagi, Paraíba
1. Pavão em lata reciclada e pintura acrílica 2. Galo em lata reciclada e pintura acrílica
3.
Os santos de madeira pernambucano Pedro Ferreira de Souza aprendeu a fazer santos de madeira com a mulher, Zefinha Paulino, figura notória de Ibimirim. Ela morreu com apenas 38 anos, mas Pedro manteve a arte viva. Suas imagens chamam a atenção principalmente pelas linhas barrocas. O filho do casal, Gilberto, tenta erguer o museu Zefinha Paulino. A ideia é dificil de ser posta em prática, já que o município perdeu a importância econômica do passado e o artesanato está pouco estruturado como em outras regiões do País. Ibimirim, Pernambuco
1.
1. Profeta em imburana 2. Nossa Senhora da Conceição em imburana pintada
2.
As caretas maranhenses ão caia no erro de perguntar se Abel Teixeira faz máscaras. “Faço careta”, explica taxativamente. Tudo começou ainda criança, para se divertir durante o Bumba-meu-Boi. “As caretas eram só de pano. A roupa era feita de pano velho, estopa ou de palha. Qualquer coisa servia, porque o mais importante para o Cazumba [seu personagem nas festividades] é brincar. Nós somos os verdadeiros artistas de nós mesmos.” De lá para cá, já perdeu as contas de quantas produziu. Utiliza diversos materiais e temáticas na produção das caretas. E sente saudade das festas mais antigas. “Hoje, os bois são chamados para brincar em vários lugares num dia, e aí fica muito cansativo”, lamenta-se.
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São Luís, Maranhão
Caretas Cazumba em tecidos e diversos materiais
A terra dos presidentes – e do artesanato ão Borja, de pampas e da fronteira com a Argentina, é a cidade de dois ex-presidentes da República: Getúlio Vargas e João Goulart. É também a terra de Rossini Rodrigues, um autodidata na arte de modelar barro. Começou aos 6 anos, criando seus próprios brinquedos. “Não tive professor. Fui olhando e fazendo. Me orgulho de ter ficado entre os dez primeiros colocados para representar o Brasil no Prêmio Unesco de Artesanato Popular”, comemora. Suas obras também receberam outras condecorações no estado e na Argentina. Agora, pretende criar grandes murais em cimento. São Borja, Rio Grande do Sul
Bolicho do Gaúcho em barro
Janeiro 2009
Enigma Figurado
ligue os pontos
autor da obra ao lado deixou um importante legado à cultura pernambucana quando morreu, em 20 de janeiro de 1963. Começou como brincadeira: a mãe o distraía com rebarbas da argila enquanto trabalhava peças utilitárias. Ele fazia bonequinhos e levava Junto para vender numa feira de Caruaru. Assim surgiu o bonequeiro, a crônica no barro. Hoje, esse tipo de arte é consagrado no Alto do Moura, graças ao mestre precur(NP) sor. Qual o nome dele?
R.:
(segundo nome)
reprodução/ab
O
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a Típica do cerrado, é possível vê-la nos grandes centros urbanos em revoadas que produzem uma verdadeira algazarra.
2
b O bico grande, colorido e oco é sua característica mais marcante. Nos anos 1980 tornou-se símbolo de um partido político.
3
c O Brasil possui a maior diversidade desses animaizinhos leves e rápidos, capazes de bater as asas de 70 a 80 vezes por segundo.
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d Capaz de emitir sons, imitar vozes e assoviar, é sinônimo de exotismo tropical com suas penas coloridas e vibrantes.
O Calculista das Arábias
acervo da família
Nossa homenagem a Júlio César de Mello e Souza, o Malba Tahan
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Em uma de suas constantes viagens pelas Arábias, o sábio Beremiz Samir presenteou o rei Iadava com um tabuleiro de xadrez. Agradecido, o soberano propôs ao calculista que pedisse em troca o que quisesse. Beremiz disse não querer ouro nem prata, mas grãos de trigo. Diante da perplexidade do rei e de sua corte, explicou: “Dar-me-eis 1 grão de trigo para a 1ª casa do tabuleiro de xadrez, 2 pela 2ª, 4 pela 3ª, 8 pela 4ª e assim por diante, dobrando sucessivamente até a 64ª e última casa do tabuleiro”. O rei não conseguiu pagar ao calculista a quantia solicitada e a dívida foi perdoada, pois Beremiz só queria ensinar a todos uma lição algébrica. Você saberia dizer qual?
BRASILIÔMETRO teste o nível de sua brasilidade 1 Tradicional escola de samba do Bixiga, fundada em 1/1/1930: (a) X-9 (b) Vai-Vai (c) Camisa (d) Rosas de Ouro 2 Cidade em que circulou o primeiro trem urbano da América Latina, a partir de 5/1/1867: (a) Rio (b) São Paulo (c) Caracas (d) Recife
Palavras Cruzadas
3 Célebre programa de rádio criado em 3/1/1934: (a) Balança mas Não Cai (b) Hora do Brasil (c) Balancê (d) A Hora do Ronco 4 Lei que, em 9/1/1881, instituiu eleições diretas: (a) Eusébio de Queiróz (a) Pedro I (c) Maria da Penha (d) Saraiva 5 Carioca que, em 28/1/1981, tornou-se a primeira bailarina do Teatro Municipal do Rio: (a) Ana Botafogo (b) Márcia Haydée (c) Lia Rodrigues (d) Cláudia Müller 6 Mercado de Salvador, incendiado em 10/1/1984: (a) Mercado Municipal (b) Paes Mendonça (c) Mercado Modelo (d) Mercado das Pulgas 7 Estrada que liga o Rio a São Paulo, inaugurada em 19/1/1951: (a) BR-101 (b) Castelo Branco (c) Ayrton Senna (d) Presidente Dutra 8 Filme de Walter Salles, ganhador do Urso de Ouro em Berlim em 22/1/1998: (a) Diários de Motocicleta (b) Central do Brasil (c) Abril Despedaçado (d) Cidade de Deus Respostas na p. 32 AVALIAÇÃO – Conte um ponto por resposta certa: 0 a 2 – Brasilidade na reserva 3 a 4 – Meio tanque 5 a 8 – Tanque cheio
“Tolo é aquele que naufragou seus navios duas vezes e continua culpando o mar.”
Publilus Syrus
Diversão para pequenos
i l u s t r ac õ es
c : Lu
iano
Ta s s o
e grandalhões
Temos praias do Oiapoque ao Chuí A
h, o verão chegou. Você, como uma criança esperta, já deve ter separado o filtro solar, os óculos escuros e o boné para passar ao menos alguns dias na praia. E praia é o que não falta. O Brasil possui um dos litorais mais extensos do mundo. São cerca de nove mil quilômetros de areias, conchinhas e o imenso Oceano Atlântico à frente. Desde a praia do Arroio Chuí, no Rio Grande do Sul, até a foz do Oiapoque, no Amapá, é uma ao lado da outra. Você já deve ter ouvido falar “do Oiapoque ao Chuí” quando alguém quer se referir ao Brasil inteiro – o Oiapoque é o pedaço do nosso território mais ao norte; o Chuí é o mais ao sul. Feliz de quem vive numa cidade litorânea. Ter um marzão perto de casa é um privilégio. Mas sorte mesmo tem quem mora em ilhas. Você sabia que três capitais brasileiras estão cercadas pelo mar? Então saiba: Florianópolis, Vitória e São Luís. Ô vidão... O mar tem grande influência no modo de vida do brasileiro. Por isso é tão exaltado em canções. Foi pelo litoral, por exemplo, que se iniciou a colonização. Ao longo dele foram erguidas as nossas primeiras cidades e muitas das capitais dos estados. Já reparou? Pode fazer a conta. Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Maceió, Belo Horizonte... Ops, Belo Horizonte?
Diversão na areia
JÁ PENSOU NISSO?
Na praia – além de pegar sol e uns jacarés – dá para praticar esportes e outras atividades bacanas. O frisbee, por exemplo, é baratinho e bem fácil de brincar (mas cuidado pra não acertar a cabeça de ninguém!). Futebol na areia também é bem legal. Basta colocar uns cHinelos como trave e correr atrás da bola. Vôlei de praia, então, nem se fale. O Brasil é tão bom no esporte que já conquistou nove medalhas olímpicas. Além, é claro, do brasileiríssimo frescobol, inventado em 1945 na praia de Copacabana.
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l
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Cada número no diagrama abaixo corresponde a uma página do Almanaque. Descubra a letrinha colorida na página indicada e vá preenchendo os quadrinhos até completar a mensagem cifrada que escrevemos para você.
O mar esta bravo. O que falar para acalma-lo?
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O lugar do Brasil mais perto da África é a Praia do Cabo Branco, que fica em João Pessoa, capital da Paraíba. Está a 2.850 quilômetros do território africano. Perto, mas nem tanto. Se alguém decidir ir ao outro continente de jet ski, que anda em média a 50 quilômetros por hora, chegará em 57 horas, ou seja: mais de dois dias (isso sem parar nenhum segundo sequer...). Num navio que viaje a 30 quilômetros por hora, a viagem durará quatro dias. Já se o maluco for remando num caiaque, chegará à África em 570 horas, ou quase 24 dias. Isso se nenhum tubarão almoçá-lo pelo caminho...
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A placa de palha da praia preta.
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Artesanato
Um garimpo chamado Brasil Nas andanças pelo País, Heitor e Silvia Reali se depararam com inúmeras obras de arte feitas pela mão popular. Selecionamos algumas que merecem ser vistas mais uma vez nesta edição especial. Texto, fotos e ilustrações de Heitor e Silvia Reali
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H
á cinco anos, Heitor e Sil-
mais de 700 panelas de barro por mês. E
via Reali percorrem o País
ainda as tecelãs de uma pequena cidade
em busca de boas histórias de al-
gaúcha, que exportam seus cobertore-
manaque. Nessas viagens encon-
zinhos feitos em teares manuais para
traram cidades interessantes, per-
as mais chiques butiques europeias e
sonagens marcantes e arte de alto
norte-americanas.
nível, produzida por delicadas mãos
É gente que usa as mãos para criar
populares. Como esta edição é dedi-
obras de alto refinamento. Que se or-
cada ao artesanato, resolvemos sele-
ganiza em associações em busca de
cionar alguns casos encontrados pela
representatividade. Que faz questão de
dupla de aventureiros em todas as re-
manter as tradições passadas de geração
giões brasileiras.
em geração, mesmo com a eterna pouca
E bons casos não faltam. Como o sergi-
valorização da arte popular, espontânea.
pano que recebeu uma bronca numa de
Na última página ainda há um pequeno ro-
suas primeiras manifestações artísticas, e hoje é um respei-
teiro, para servir de ponto de partida para a busca da cul-
tado ilustrador de cerâmicas. Ou do capixaba que vende
tura produzida em cada canto do Brasil.
1
Aracaju - Sergipe
A arte de ver o belo onde ninguém vê E
m Sergipe, artistas põem em suas obras imagens poéticas e imprimem traços autorais. Seus ateliês ajudam a entender como se forma e se manifesta a gigantesca cultura de nosso povo. Ismael Pereira e José Alves Siqueira, o Zeus, são autodidatas. “Esse menino vai longe”, diziam de Ismael.“Uma vez, adolescente, fiz uma grande arte, pintei toda a lateral de uma fábrica. Enquanto de longe admirava meu trabalho, vi o proprietário se aproximar e exclamar: ‘Ah-ah, muito bonito, hein?!’ E mandou que eu deixasse o muro branco como era antes.” Hoje, Ismael é admirado pelas figuras de cerâmica que retratam guerreiros, bois, cavalos, galinhas, corujas, recobertas de um acabamento individualizado. Zeus começou aos 15 anos lixando ex-votos para seu irmão. Ele reafirma sua cultura artística nas santas, cujos mantos têm movimentos solenes e detalhes que evocam elaborados pontos de renda, ou ainda nas figuras que expressam melhor a região, como o cangaceiro, o Conselheiro e o Padre Cícero.
ISMAEL APRENDEU A TÉCNICA DE FORMA AUTODIDATA.
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Cunha - São Paulo
Encantos do antigo Caminho do Ouro
ARTESÃOS FAZEM DA CIDADE REFERÊNCIA NACIONAL.
A
vila nasce no século 17, como pouso de tropeiros do ciclo do ouro. Depois, vem o ciclo do café. Agora, a cerâmica. E Cunha segue fiel à vocação. A argila sedimentada ao redor da cidade, sempre foi apreciada pelas paneleiras, que moldavam todo tipo de utensílio. À maneira dos índios, alisavam as peças com pedra de
rio e sabugo de milho. Em 1975, chega um pequeno grupo de ceramistas do Japão. O declive natural, que favorece a construção dos fornos noborigama, incentivou-os. Noborigama, técnica de origem chinesa, milenar, baseia-se em fornos com quatro a cinco câmaras, construídos em rampa, que submetem o barro a temperaturas de até 1.350°C. A lguns ajudantes dos primeiros ceramistas se transfor mar a m em hábeis artesãos. Cunha tornou-se referência da cerâmica de alta temperatura. Dessa forma, atraiu outros ceramistas e compradores chinesa. de origem de vários Estados. trabalha técnica kimiko
Janeiro 2009
Vitória - Espírito Santo
Arte que une água, terra, fogo e ar P
or exigir delicadeza, a cerâmica utilitária foi sempre trabalho feminino. Em Vitória não era diferente. Gerações de ceramistas mulheres produziam suas cobiçadas panelas de barro – sobretudo na Quaresma, época de maior consumo de peixes – para deleite dos mais exigentes paladares. Mas como cultura popular não se congela, a tradição se reinventou. Hoje há produção o ano todo. E os homens, que se limitavam a retirar a preciosa argila do Vale do Mulembá, também põem a mão na massa. Instalados em galpões, os ceramistas trabalham em tornos manuais. Para alisar o barro, usam
uma pedra de rio. Secas, as peças vão para o forno a lenha. Todo o processo é artesanal. Serve de pincel um raminho de ervas do campo que, molhado no tanino, dá tonalidade escura à peça. Ofício arcaico e simples, que une água, terra, fogo e ar. Para a cozinheira Mara Fernandez Soares, da praia de Ubu, em Anchieta, um segredo do especial sabor da moqueca capixaba é que a panela de barro permite ao caldo engrossar naturalmente. Ela enumera ainda outras vantagens: a panela vai direto do fogo para a mesa, mantém a comida quente por mais de 30 minutos, não deixa resíduos de alumínio e é mais fácil de lavar. Já provou? moqueca capixaba.
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Mostardas - Rio Grande do Sul
Nossas cores aquecem gente de outras cores N
uma cidade escondida nos contecidos e cobertas dessa lã tosca eram fins do Brasil, gente simples seconsiderados de má qualidade. Hoje gue antiga tradição tecendo panos de esse fazer ancestral é sinônimo de valã que fazem sucesso além-mar. lorização de nossas artes e tradições, Mostardas, cidade congelada no temda competência na tecedura da lã e po, fica entre os areais e os mais antide entrelaçar fios, obtendo ricas texgos faróis do Rio Grande do Sul. Suas turas.As cores harmoniosas são quase artesã ao tear, que já é uma obra de arte. mulheres eram habilidosas em tecer sempre sóbrias e remetem panos coloridos para saias e xales, ponchos e bombachas. aos pampas secos do inverno gaú“Nesse tempo existia aí uma raça especial de ovelhas que cho. O cobertorzinho de Mostardas produzia lã, tão aquecedora como nunca mais vi outra. faz sucesso pra lá do mar, represenA gente que trabalhava com tal lã suava em barba e ficata nosso desenho tão puro quanto va com as mãos vermelhas, quentes, fumegando, como se primitivo, vendido nas mais sofistiestivesse lidando com água esperta”, retrata Simões Lopes cadas lojas dos Estados Unidos, Itália, Neto em seu livro Casos do Romualdo. Originalmente, os França e Alemanha.
Piranhas - Alagoas
Pontos para exclamação Z
iguezagueando pelo São FranOs bordados de Alagoas ou de Sercisco a bordo de um barco a gipe, assim como outros artesamotor, chega-se em 15 minutos à natos de qualidade do Brasil, moIlha do Ferro. A poucos passos da vimentam 2,8% de nosso Produto borda do rio fica a sede da Artilha, Interno Bruto. Esses dados seriam uma associação com 45 artesãs. suficientes para entusiasmar mais O bordado dali bebe de uma única parceiros para os projetos, a exemfonte, uma flor amarela denomiplo do estilista Ronaldo Fraga, nada boa-noite. Flor e bordado se que usou rendas e bordados em fundem no nome, assim como as suas coleções. A brasileira Angélica o ponto de bordado boa-noite se inspira numa flor. técnicas de sua execução. O tecido Mueller realizou duas exposições é desfiado e torcido como na renda labirinto, mas se une na Alemanha com rendas e bordados de Alagoas, com granaos pontos do rendendê. Esse raro bordado, único no Brade sucesso de vendas. O sonho é que tais figuras de proa se sil, apresenta quatro diferentes composições, o boa-noite multipliquem pelo País, dinamizando o artesanato brasileisimples, o boa-noite de flor, o cheio e o cheio com variação. ro e, por consequência, o trabalho das bordadeiras.
Onde encontrar Aracaju – SE Engenho da Terra Só o melhor do artesanato, garimpado em todas as regiões do Estado. Imagens de santos em madeira esculpida, redes, mantas, tapetes, móveis, bordados e o tradicional “mandrião”, vestidinho longo para batizado em cambraia de linho e aplicações de renda Renascença. Belém do Pará – PA Espaço São José Liberto Em funcionamento numa antiga cadeia pública, abriga o Pólo Joalheiro, a Casa do Artesão, um museu dedicado às gemas paraenses, cerâmicas marajoaras e tapajônicas e artefatos indígenas. Curitiba – PR Feira do Lago da Ordem No entorno do Lago da Ordem e da Praça da Memória, abrangendo seis ruas, cerca de 1.300 artistas e artesãos expõem seus produtos nas manhãs de domingo. Quadros, esculturas, marchetarias, bordados e tolhas de renda têm um ponto em comum: o capricho.
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Salvador – BA Feira de São Joaquim Na maior feira livre permanente da Bahia, com mais de 4 mil barraquinhas e boxes, se encontram de cerâmica e cestaria a pimentas e frutas, além de brinquedos artesanais em lata ou madeira e todos os utensílios próprios para o candomblé. São Luís – MA Centro de Comercialização de Produtos Artesanais do Maranhão – Ceprama O local abriga o melhor do rico artesanato do Estado: bolsas e tapetes feitos de fibra do buriti, uma árvore bem comum na região; rendas de bilro aplicadas em toalhas de mesa; além de diversos tipos de máscaras.
SAIBA MAIS • Ismael Pereira: (79) 3217-4067 • Zeus: (79) 3361-1043 • Centro de Arte e Cultura de Sergipe: (79) 3255-1413
• Turismo em Cunha: www.cunhatur.com.br • Cia. do Bordado de Entremontes: (82) 3686-6023 • Cooperativa dos Artesãos da Ilha do Ferro – Artilha: (82) 3624-8013
Janeiro 2009
FEIJÃO Phaseolus vulgaris
Unificador da Nação A verdadeira preferência nacional. Seu caldo figura entre os primeiros alimentos salgados do bebê. Somos o maior produtor e maior consumidor mundial. Podemos dizer que o brasileiro é dependente físico do feijão. Tem gente que não passa um dia sem ele. Por Mylton Severiano
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o fim de 2006, preparava-me para visitar a filha caçula em Rouen, perto de Paris. Fazia seis meses que ela estudava numa universidade da antiga capital da Normandia. E o que pediu para lhe levar? Feijão. “Quanto puder trazer, pai.” Queria preparar uma feijoada para amigos da França e de outros países, e aplacar o banzo. Antes de Colombo aportar na América, incas, maias e astecas já conheciam essa fabácea, prima da lentilha, ervilha, soja. Também na velha Europa a cultivavam. Greco-romanos usavam feijões inclusive para votar: branco significava sim, preto significava não. No Brasil, tornou-se parte da identidade nacional. Feijão com arroz, mais uma “mistura”, é o prato nosso de cada dia. Em nosso falar cotidiano, ele surge em saborosas expressões, como quando se diz de alguém: não vale o feijão que come. Equivale para nós ao arroz dos orientais. Na Tailândia, “pegar um arroz” é almoçar. Aqui, dizemos “vou pegar um feijão”. E tem as variações sobre ele: a nacional feijoada, o gaúcho feijão tropeiro, virado à paulista, tutu à mineira. Mocotó e dobradinha com feijão branco. Acarajé, fritura de massa de
feijão-fradinho. Abará, outro bolinho, este cozido no vapor. E vai na salada, seja o grão cozido, ou o broto. Até doce se faz! Das centenas de variedades, os feijões mais comuns no Brasil são: preto, branco, mulatinho, rosado, vermelho, jalo – grão grande, vermelho rajado de branco. Cada lugar tem seu predileto. No Nordeste e na Amazônia, é o feijão-decorda, de outra espécie, Vigna unguiculata. Em Salvador, o mulatinho ou carioquinha – usam até na feijoada! Em Florianópolis, o vermelho. Em Porto Alegre e no Rio de Janeiro, o preto.Tão arraigada cada preferência, que uma vez, lá por 1980, faltou feijão preto no Rio. Meu amigo João Antônio, o premiado escritor de Malagueta, Perus e Bacanaço, mandou-me um aerograma desesperado. Pedia, “por caridade”, procurar em São Paulo, onde se come todo tipo de feijão, o seu pretinho, que não via a cor havia semanas. O despacho saiu mais caro que o feijão, mas era questão de compatriotismo. Não à toa, em Sobrados e Mucambos Gilberto Freyre se inclui entre os estudiosos que consideram o feijão “fator de unificação brasileira”.
O que a laranja tem a ver com a feijoada?
equipe/ab
iolanda huzak
Um, dois, feijão com arroz
O
s dois são ricos em proteínas, carboidratos, ferro, sais minerais, vitaminas, fibras. O amido do arroz, além de energético, facilita a absorção da proteína do feijão. Alguns aminoácidos, essenciais ao crescimento da criança, se faltam em um, você encontra em outro: arroz é pobre em lisina, abundante no feijão, pobre em metionina, que o arroz tem de sobra. A dupla ainda previne câncer, bom funcionamento intestinal, protege o coração, combate a anemia. Um casamento perfeito que nosso povo intuiu.
S
ábado, dia de feijoada em milhares de restaurantes de várias regiões. Invenção dos negros, que transformaram em prato nobre cortes do porco que a casa-grande desprezava. Acompanha arroz branco, couve refogada, farinha de mandioca, molho de pimenta. E laranja: mais uma genial intuição popular. Sua vitamina C eleva de 10% para até 40% a absorção de ferro do feijão. E ajuda na digestão de um prato de sustança. O humorista Stanislaw Ponte Preta dizia que a boa feijoada é aquela que inclui uma ambulância na porta. 31
E dá samba E
iolanda huzak
m Saco de Feijão, o portelense Chico Santana critica a inflação do tempo em que acabou o mil-réis: Eu ia no armazém do seu Manuel com um tostão/ Trazia um quilo de feijão/ Depois que inventaram o tal cruzeiro/ Eu trago um embrulhinho na mão/ E deixo um saco de dinheiro. Em Feijão da Dona Neném, de Zeca Pagodinho e Arlindo Cruz, a personagem convida para seu famoso pitéu no fogão de lenha, mas põe todos a cobrir sua casa. Diz o verso: Primeiro a laje, depois o feijão. Paulinho da Viola celebra “o feijão da Vicen-
vicentina, a do famoso feijão.
tina”. Mas é Chico Buarque quem dá a receita em Feijoada Completa. Avisa a mulher que leva amigos. E instrui: Prepare as linguiças pro tira-gosto. Uca, açúcar, cumbuca de gelo, limão. Mulher, você vai fritar um montão de torresmo pra acompanhar. Arroz branco, farofa e a malagueta. A laranja-bahia ou da seleta. Joga o paio, carne seca, toucinho no caldeirão. Depois de salgar, faça um bom refogado, que é pra engrossar. Aproveite a gordura da frigideira pra melhor temperar a couve mineira. E vamos botar água no feijão.
Saiba mais Feijão, texto de Danusia Barbara, fotos de Sergio Pagano (Senac, 2005). Farinha, Feijão e Carne Seca – Um tripé culinário no Brasil colonial, de Paula Pinto e Silva (Senac, 2005).
Mylton Severiano é jornalista.
quinta
Martinho
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Marcelino
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Genoveva*
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Caio
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Eduardo
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terça
Melânio
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Reinaldo
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Vidal
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sexta
Juliano
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sábado
Petrônio
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Honorata
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Taciana
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Leôncio
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Dácio
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Isidoro
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Marcelo
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Mariano
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domingo
Liberata
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segunda
Marta
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terça
Fabiano
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quarta
Frutuoso
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quinta
Gaudêncio
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sexta
Áquila
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sábado
Artêmio
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Ananias
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Tito
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terça
Mauro
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quarta
Cirilo
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quinta
Báculo
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sexta
Hipólito
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sábado
Luísa
Mariquinha teimosa N
ão tinha cumádi mais teimosa do que a Mariquinha. Era dia de são João no arraiá, e na hora de estourar os foguetes em homenagem ao santo sucedeu esse causo. Todo mundo sabe que o jeito de soltar foguete é chegar o fogo na pólvora e, quando acende, a gente solta logo. Assim o dito-cujo voa pelos ares para dali a alguns segundos explodir. Pois bem: aí é que entra a teimosia da Mariquinha. Quando todos esperavam que ela soltasse a vareta, ela não fez isso. Aí o povaréu se apavorou: Todos (gritando) – Sorta, Mariquinha! Sorta a vareta! Sorta logo que o rojão vai explodir! Mariquinha – Num sorto coisa nenhuma! A festa é aqui embaixo! Como é que o foguete vai estourar lá em riba??!! E o foguete: chiiiiiiii...
Todos (apavorados) – Sorta logo, muié teimosa! Essa coisa vai explodir! Mariquinha – Ah, mas num sorto mêmo. Quero vê ele arrebentá é aqui embaixo! E não deu outra: foi aquela explosão. Morreu a Mariquinha teimosa. Lá vai de tardinha o enterro rua abaixo, pro rumo do cemitério perto do córrego. Ao passar em cima da ponte, não é que o Malaquias tropeça e derruba o caixão na água?! Foi aquele deus-nos-acuda. Todo mundo correu córrego abaixo pra resgatar a Mariquinha teimosa. Menos o cumpádi Malaquias, que, para espanto de todos, garrou a subir rio acima. Todos – Êh, cumpádi, o rio corre é para baixo! Cumé que ocê tá procurando rio acima?! Malaquias (na sua lógica) – Disso eu sei, ué! Mas do jeito que a cumádi era teimosa...
Adaptado de Contando Causos, de Rolando Boldrin (Nova Alexandria, 2001).
AQUARIO
(22/1 a 19/2) O aquariano tem sintonia com tudo o que é diferente, novo e moderno. Costuma entender o mundo como um conjunto. Adora investigar e descobrir a razão das coisas. Bondoso e tranquilo, desafia o sistema e aquilo que possa representar opressão. Tem verdadeiro horror ao comodismo e às ideias cristalizadas. Em qualquer tipo de relacionamento, detesta cobranças.
* Santa Genoveva Em 451, aos 28 anos, Genoveva convenceu os habitantes de Paris a não entregar a cidade aos hunos e aplacou a ira de Átila com suas preces. Especula-se que teria informado ao invasor sobre uma epidemia de cólera, dissuadindo-o de sitiar a cidade. Viveu até os 89 anos. É a santa padroeira de Paris.
lenise pinheiro/folha imagem
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DE QUEM SÃO ESTES OLHOS? Matheus Nachtergaele
Estação Colheita O que se colhe em JANEIRO Uva, maçã, quiabo, maracujá, banana, tomate, laranja-pêra
Crescente: 4/1 às 9h56 Cheia: 11/1 às 1h27
Minguante: 17/1 às 0h46 Nova: 26/1 às 5h55
CARTA ENIGMÁTICA – “A felicidade, como a fortuna, faz-se de pequenas parcelas, valorizadas pela emoção. Mobilize suas rápidas alegrias cotidianas, e some... Junte em ramalhetes suas felicidades miúdas.” ENIGMA FIGURADO – Mestre Vitalino. SE LIGA NA HISTÓRIA – 1d (arara); 2c (beija-flor); 3d (maritaca); 4b (tucano). BRASILIÔMETRO – 1b; 2d; 3b; 4d; 5a; 6c; 7d; 8b. O QUE É O QUE É? – Deixa de onda. O CALCULISTA DAS ARÁBIAS – Para obter o total de grãos de trigo devemos elevar o número 2 ao expoente 64 e do total tirar uma unidade. Trata-se de um número verdadeiramente astronômico, de 20 algarismos, muito famoso na matemática: 18.446.744.073.709.551.615.
“As crianças encontram tudo em nada. Os homens encontram nada em tudo.”
Giacomo Leopardi
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Tom Zé junta os seus para botar a bossa em pratos limpos Depois de estudar o samba e o pagode em discos de 1976 e 2005, Tom Zé aproveita os 50 anos da bossa nova para lançar seu olhar particular sobre o gênero musical que, segundo suas palavras, “inventou o Brasil”. Mas não espere de Estudando a Bossa clássicos como Chega de Saudade ou a participação de artistas que flutuaram no barquinho dos desafinados. Tom Zé junta os seus pares para fazer uma reconstrução da bossa bem a seu modo. E alcança algo que diz ter sempre cobiçado: fazer músicas para cantar
enquanto se lavam os pratos. Em quase todo o disco, o baiano divide microfones com cantoras como Fernanda Takai, Mônica Salmaso e Zélia Duncan, numa seleção de vozes feita pela jornalista Patrícia Palumbo. Outra participação é a de David Byrne, a quem Tom Zé credita seu renascimento, com a descoberta nos anos 1990 de Estudando o Samba. E pra completar a reunião de não-bossanovistas, Arnaldo Antunes assina quatro canções. Que venha agora um Estudando o Roque, ou o Choro... Ou será o Funk? (BH)
Especial MTV Luiz Melodia Uma reunião de sambas históricos, principalmente das décadas de 1930 a 1960. No repertório, canções de Geraldo Pereira, Wilson Batista e Cartola. Mameluco Afro Brasileiro O cantor e compositor Wesley Nóog lança seu primeiro álbum solo. A temática é a formação do povo brasileiro, cantado em forma de soul, samba e muito funk. Dez Canções Em seu quarto CD, a brasiliense Adriana Maciel apresenta músicas inéditas de Vitor Ramil, Celso Fonseca, George Israel e regravações de Gilberto Gil e David Bowie. 33
A saga da Família Manchete Os irmãos Bóris, Arnaldo e Adolfo Bloch foram donos de um império que começou com a extinta revista Manchete e contou com emissoras de rádio e tevê. Os Irmãos Karamabloch – apelido dado pelo escritor Otto Lara Resende, em referência aos Karamázov, de Dostoiévski – remonta a trajetória desta numerosa família de imigrantes judeus que chegou ao Rio em 1922. Dando continuidade ao ofício do patriarca Joseph, que tinha sido tipógrafo na Ucrânia, constituíram aos poucos uma potência das comunicações. Catástrofes pessoais e coletivas, reviravoltas
espetaculares, empreendimentos ambiciosos. Tudo é relatado pelo neto e homônimo de um dos Karamabloch. Arnaldo Bloch é escritor e jornalista, autor de biografias como Fernando Sabino: Reencontro e dos romances Amanhã a Loucura e Talk Show. Assumiu a missão de recordar a epopeia familiar num tom romanceado em que paixão, aventura, erotismo, ambição e humor dividem espaço com momentos imperdíveis da história do jornalismo brasileiro. (CC) Companhia das Letras, 344 p., R$ 48.
Mitos Brasileiros em Cordel Cesar Obeid
Nossos mitos em rimas acompanhadas de xilogravuras de Ernesto Bonato. Entram na roda histórias como as do Saci, da Iara e muitas outras. Salesiana, 64 p., R$ 32. Estórias do Trem
Victor José Ferreira
O presidente do Movimento de Preservação Ferroviária apresenta 75 causos reais das estradas de ferro. Na apresentação, textos de Arnaldo Niskier e Ivan Lins. Pandion, 168 p., R$ 20. Berço da Vida Dante Buzzetti e Silvestre Silva
Com mais de 270 fotos e textos sobre nossas aves, o livro aborda desde o comportamento de acasalamento até os diferentes tipos de ninho. Terceiro Nome, 248 p., R$ 120. Janeiro 2009
Extrema-unção O velhinho está nas últimas. O padre é convocado: – Antes de morrer, o senhor deve reafirmar a sua fé em Jesus Cristo e renegar o demônio. O velhinho faz que não ouviu. O padre insiste: – Vamos lá, meu senhor. Quando se deixa este mundo, é preciso renegar o mal para poder juntar-se ao Senhor... E nada... Já perdendo a paciência, o padre apela: – Por que diabos o senhor não renega logo o demônio? E o velhinho: – E eu sou louco? Enquanto não souber para onde vou, não quero ficar mal com ninguém!
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Água na boca O bêbado chegava todo dia no boteco, pedia uma pinga, tapava o nariz e tomava tudo num só gole. Um dia o balconista não se conteve: – Escuta aqui, ô cara! Por que você tapa o nariz enquanto bebe? E o bêbado: – É que o cheiro da pinga me dá água na boca... E eu gosto dela é pura!
“Este mundo é redondo, mas tá ficando chato.” A Lua já foi habitada A Lua já foi habitada. Os selenitas viviam felizes, até que um espírito de porco, bastante lunático, começou a fomentar discórdias, tornando a vida insuportável. Os selenitas, então, muito descontentes, começaram a emigrar para outros planetas. Alguns vieram para a Terra, onde ainda vivem, sem se terem adaptado perfeitamente. É por isso que ainda se encontra por aí muita gente que parece que vive no mundo da lua. Nossa homenagem a Aparício Torelly, o Barão de Itararé.
Clarividência A mulher, extremamente ciumenta, vai a uma cartomante: – Tenho duas notícias ruins, minha senhora – diz a cartomante. – O seu marido tem uma amante e a senhora vai ficar viúva muito em breve... – Então, vê aí se eu vou ser absolvida!
Jesus está te olhando A casa ficou silenciosa, e o ladrão começou a andar. – Jesus está te olhando! – uma voz falou. Apavorado, o ladrão notou num canto escuro da sala uma gaiola com um papagaio. – Foi você que disse que Jesus está me olhando? – Fui eu mesmo – respondeu o papagaio. – Ufa! Já estava imaginando coisas... E qual é o seu nome? – Judas. – Judas? Onde já se viu um papagaio chamado Judas? – E um rottweiler chamado Jesus? Já tinha visto?
Ponto Final
“Os anos ensinam muitas coisas que os dias jamais chegam a conhecer.”
Paulo Car uso
Ralph Waldo Emerson