SCS - Intervenção da Imagem

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CADERNO DE ANÁLISE

INTERVENÇÃO NA IMAGEM

SETOR COMERCIAL SUL


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Universidade de Brasília Faculdade de Arquitetura e Urbanismo

CADERNO DE ANÁLISE

INTERVENÇÃO NA IMAGEM

SETOR COMERCIAL SUL Amanda Brasil Cavalcante Orientadora: Gabriela Tenorio 2016 3


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Sumário 01.

7 o que queremos com ele ? por que o scs?

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Segregação e exclusão social Policiamento e a violência ADJETOS e degenação Percepção do espaço urbano

16 18 19 22

como ele é? características gerais Análise de mapas do setor ESTUDO DE CASO diagnóstico do objeto de estudo A Pesquisa da Imagem mapeamento de problemas mapeamento de potencialidades

28 33 37 64 69 59 76 77

02.

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03.

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ANEXo Setor Comercial Sul e a experiência noturna um relato pessoal Pesquisa da imagem

Referências Bibliográficas

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79 80 82

87


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01. 01. 7


o que queremos com ele 8

O objeto deste projeto é o Setor Comercial Sul em Brasília - DF, localizado próximo à Rodoviária do Plano Piloto, na Escala Gregária, entre os Setores Hospitalar Sul (Hospital de Base e Hospital Sarah Kubitschek), Hoteleiro Sul (com prédios marcantes, como o Hotel Nacional) e de Diversões Sul (Conic). Ele se estende do Eixo Rodoviário até a via W4 sul e se caracteriza como centro das mais variadas atividades comerciais e prestação de serviços. Ao todo, reúne 106 edifícios, onde se concentram empresas, escritórios e serviços públicos com diferentes especialidades. É um lugar que atrai milhares de pessoas diariamente. O setor é dividido em duas partes: A e B. O estudo terá como foco a parte B, mais próxima à plataforma rodoviária. Holanda (2010, p. 59) afirma que a cidade de Brasília possui três centros: o centro funcional, ponto em torno do qual se concentra a maioria dos empregos e serviços; o centro demográfico, ponto que minimiza a distância per capita média para os habitantes da metrópole, considerado o local de moradia; e o centro morfológico, ponto mais acessível fisicamente, em média, a todos os demais pontos da cidade, considerando o sistema viário. Brasília é uma cidade tricéfala, em que os três centros separam-se por grandes distâncias. O seu centro funcional localiza-se no cruzamento dos dois elementos estruturadores do Plano – Eixo Monumental e Eixo Rodoviário – onde se encontra o Setor Comercial Sul; o centro demográfico fica no Guará1, e o centro morfológico, na Estrada Parque Indústria e Abastecimento, a sudoeste do Plano.


Feira da Torre de TV

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Setor de Diversões Norte

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Rodoviária “do Goiás” Museu Nacional

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Parque da cidade

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SQS 302

SQS 102

Setor de Autarquias Sul

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Sobre o centro funcional de Brasília, Lucio Costa disse: “Esse foco urbano de congestão foi deliberadamente concebido para fazer contraponto aos desafogados e serenos espaços das superquadras comerciais” (COSTA, 1995). A partir dessa frase, percebe-se que esse centro é o local de encontro, o locus da urbanidade do Plano Piloto. O setor em questão congrega não só atividades de caráter local, mas de caráter regional, já que abriga vários órgãos que servem a todo Distrito Federal. Funciona como elemento articulador dos diversos setores do centro de Brasília – no caso, o centro funcional, onde estão localizados 82% dos empregos formais da RIDE (Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno).

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A falta de manutenção e o foco no espaço fechado em detrimento do espaço público colaboraram por transformá-lo em uma área bastante degradada e abandonada. Esses fatores acabaram por levar ao enfraquecimento de sua identidade e à alteração de características importantes, como o esvaziamento das praças, que não oferecem o mínimo de conforto, e a complicada circulação de pedestres, com passeios destruídos, desnivelados e tomados por carros (MORAES, 2009). A proposta é fazer uma ressignificação do Setor, por meio de uma intervenção urbana que traga ao lugar urbanidade e per-

Figura 1 -Praça sem nome, em um ponto central no setor, em frente a um posto policial.

manência de pessoas, levando em consideração os períodos diurno e noturno. Será preciso articular atividades e desenho urbano que possam assegurar um uso e ocupação adequados para o setor. Dessa maneira, busca-se consolidar a ideia de centro, lembrando, em função, os centros de cidades tradicionais, com a intensa ocupação prevista por Lucio Costa. O setor deve se transformar num lugar que supra as necessidades e demandas de comércio, serviços e lazer, no centro da cidade, dentro e fora do período comercial. O SCS (Setor Comercial Sul) é um lugar muito usado no período diurno, enquanto, no período noturno, as atividades do térreo fecham, deixando este nível sem vida comercial e com poucas pessoas. Ele acaba sendo ocupado pelas camadas marginais da sociedade, como prostitutas, travestis, moradores de ruas – “mendigos” - e viciados em drogas – “craquentos”. Essas pessoas são as excluídas da nossa sociedade e infelizmente são vistas, por uma grande parcela população, como o mal do mundo contemporâneo que precisa ser erradicado, usando meios agressivos e preconceituosos. O projeto deve considerar a questão da degeneração que assombra os possíveis frequentadores do lugar, que carregam na memória uma imagem estigmatizada do setor. Para se chegar a uma nova imagem do setor, não podemos negar a

Figura 2 - Foto de encontro de food trucks, no Setor Comercial Sul, programado para ocorrer durante todo o mês de abril deste ano. É um evento com um recorte de classe social, que atende a só um nível de consumo – perfil de intervenção que não se deve buscar ao se ter como objetivo um ambiente verdadeiramente plural, integrador e democrático.

existência dos agentes marginalizados da sociedade; deve-se considerá-los como parte integrante do espaço, sem criar um lugar hostil a essas pessoas ou que faça releituras do que chamamos de arquitetura hostil. A cultura atua como elemento integrador de diversas classes sociais e é partir dela que as classes marginalizadas podem empoderar-se e sair de uma situação vulnerável, fazendo conexões diversas com outros lados da sociedade, que podem ajudá-los a melhorar suas condições de vida. Assim, o projeto deve englobar espaços onde a atividade cultural faça parte da ressignificação do espaço e que a arquitetura forneça espaços que facilitem e estimulem esse tipo de atividade, como o trabalho voluntário retratado no Anexo I, deste plano de trabalho. Nos capítulos seguintes será relacionada a vida boêmia e noturna com a produção cultural e de ideias, que fomentará o uso diversificado do setor. Com essa requalificação do Setor, pretende-se gerar uma maior diversidade social no lugar, de modo a atrair e fixar pessoas de várias partes do Distrito Federal. A diversidade social permite que pessoas de diferentes realidades se encontrem no espaço público e isso transforma as pessoas, deixando-as mais tolerantes e, por consequência, a sociedade mais pacífica. As fronteiras sociais devem ser quebradas, para que o espaço possa ser ocupado por desde o estigmatizado “mendigo” até um funcionário público. Elas serão quebradas a partir do momento em que o espaço for convidativo e livre de cobranças monetárias. Para o espaço do Setor Comercial, deve-se pensar em um ambiente público onde se possa apenas estar, passar e permanecer, ou seja, apenas existir. Não se pode ter um espaço público plural quando, para se estar ali, deve-se consumir. A manutenção do espaço público não acontece de maneira satisfatória, pois deixa qualquer tipo de usuário – o comerciante, o ambulante, ou o prestador de serviço – sem conforto, seja para andar por entre as quadras ou para se sentar em uma praça. O trabalho deve favorecer a vida pública, valorizar seus habitantes e oferecer espaços públicos de qualidade, nos quais a


urbanidade prevaleça. Busca-se, assim, melhorar a qualidade desses espaços do Setor Comercial Sul para que, das atividades necessárias (aquelas que as pessoas realizam porque precisam, por fazerem parte da sua rotina diária e obrigações na cidade, ainda que o espaço público não lhes ofereça um mínimo de suporte), surjam, cada vez mais, as atividades opcionais, que são aquelas que as pessoas escolhem fazer e praticamente só ocorrem quando o espaço público possui algum atrativo ou alguma qualidade que as seduza e as faça permanecerem mais tempo no lugar (GEHL, 2006, p. 9-11). Assim, essa proposta pretende mostrar um potencial de ocupação da cidade e de empoderamento para o cidadão, frente a um espaço tão importante, tirando o véu de coerção que aquele lugar coloca sobre nós, no momento em que a sua configuração não nos deixa seguros e quando o policiamento extensivo é a única solução para essa insegurança. Para se chegar a esse resultado, os espaços públicos devem ser convidativos e atraentes e possuir elementos que lhes tragam significado, o que faz surgir sentimentos de identificação e pertencimento, favorecendo a sua apropriação. Eles devem ser criados como destinos e não apenas locais de passagem. No atual SCS, ao contrário, os lugares são apenas de passa-

Figura 3 - Praça sem nome, em um ponto central no setor, em frente a um posto policial.

gem sem que as pessoas tenham interesse de permanecer. Vale também para esse projeto a reflexão sobre a quantidade desproporcional de espaço viário destinado ao carro, seja ela em vias ou em estacionamentos. Na atualidade, os projetos urbanísticos de qualidade, pelo mundo, voltam-se para o pedestre, deixando o carro em segundo plano. O Brasil vai contra essa mudança mundial e ainda apresenta desenhos e propostas de “melhorias” e intervenções que privilegiam e estimulam o deslocamento por carro particular. Para trazer a cidade para esse novo patamar, deve-se desencorajar o uso do automóvel, reduzindo a velocidade e a capacidade das vias, reduzindo áreas de estacionamento, sejam elas subterrâneas ou de superfície e deve-se repensar o sistema de conexões com o entorno de modo a facilitar a chegada e saída no SCS. Esse projeto também vai reconsiderar o uso do solo no Setor, repensando a exclusão do uso habitacional nele, uso que pode trazer um novo dinamismo para as atividades em diferentes horários. Esse projeto deve considerar as Leis de Tombamento do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e decretos e deve focar em não perder a imagem do lugar.

Figura 4- Foto do amontoado de carros nas ruas internas, realidade diária do setor

• Melhorar a conexão do Setor Comercial Sul com os setores adjacentes, fazendo a costura entre eles; • Mudança de paradigma no trato das vias urbanas, de forma a ampliar o espaço de pedestre em detrimento do espaço do automóvel, tirando o automóvel do topo da hierarquia no espaço; • Espaços públicos atraentes e bem configurados, com praças e galerias atrativas, transformando-os em espaços de permanência; • Trabalhar de forma que o subsolo possa voltar a ser um espaço utilizável pelos edifícios e agregar um novo uso a ele, que atraia novos usuários para atividades opcionais; • Incluir o uso habitacional para o espaço; • Distribuir melhor as atividades no tempo por meio da implantação de atividades culturais, de comércio e serviços que funcionem durante a noite e durante os fins de semana e feriados; • Incentivar a cultura boêmia dentro do setor; • Dar um novo significado que o afaste da visão degenerada e estigmatizada atual; • Transformá-lo em um espaço livre, plural e democrático.

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por que o scs Figura 6. - As fotos apresentadas mostram espaços vazios configurados pelos edifícios, da quadra 1, que é uma que apresenta as melhores configurações de espaço público, com uma manutenção mais presente. Mesmo assim, esses espaços nem sempre geram espaços de qualidade, como a fotoa a esquerda. Podem formar espaços que são, como na foto a direita, grandes vazios perdidos sem equipamento urbano transformados em bolsões de estacionamento.

O Setor Comercial Sul é o lugar do centro de Brasília que mais se aproxima a um centro urbano de uma cidade “tradicional”, seja pela diversidade de pessoas que vêm aqui para vários fins, ou pelo tipo de apropriação dos espaços daí resultantes. 12

Esse espaço é uma paisagem de lugares, pois são os espaços públicos e espaços de vivência coletiva que são importantes para sua morfologia urbana, e a não a forma dos prédios. Assim como todo o Plano Piloto, o vazio do setor é o que une a paisagem de diferentes lugares na cidade; é este vazio, nesse espaço, que forma a paisagem (AZEVÊDO, NEVES E LIRA, 2014). Dessa maneira, é necessária uma requalificação desse elemento para que o SCS converse melhor com Brasília e possa ser um centro agregador e de permanência, onde atividades tenham um espaço plural e de qualidade. Mesmo com grandes áreas de estacionamento, os usuários do Setor Comercial Sul demonstram uma grande insatisfação em relação à segurança dos seus automóveis e à própria quantidade de estacionamentos. O déficit de estacionamento faz os motoristas estacionarem seus automóveis indevidamente ao longo de meios-fios, em filas duplas, sobre as calçadas ou em áreas livres públicas. A qualidade do transporte público brasiliense desencoraja pessoas a utilizá-lo, mesmo o setor estando inserido em uma malha extremamente bem servida de opções de transporte coletivo: estação de metrô,

Rodoviária do Plano Piloto e a via W3, por onde passa um grande fluxo e variedade de linhas de ônibus. A ideia apresentada pelo governo para solucionar o problema dos usuários de automóveis foi a de criar de 15 a 20 mil vagas, no Setor Comercial Sul, que seriam construídas por meio de parcerias público-privadas. Essa proposta gerou uma polêmica muito grande em torno do valor que seria cobrado por hora, e por isso a proposta foi posta de lado e nunca voltou ao debate (TENORIO, 2012). No entanto, o problema não é a falta de vagas, mas o excesso de carros. Essa mudança de visão sobre qual é o problema muda completamente a busca por soluções: em vez de se preocupar em criar mais vagas, todos os esforços devem se concentrar em diminuir o número de carros na cidade no período comercial. Atualmente, o Setor Comercial Sul encontra-se em uma situação que envolve duas realidades. Uma acontece no período comercial, na qual o térreo do setor tem um grande fluxo de pessoas, os estacionamentos ficam lotados, os guardadores de carro (flanelinhas) estão presentes e os quiosques, lojas e cafés estão abertos; e o outro acontece no período noturno, no qual o lugar fica sem atividades no solo, as lojas fecham, os trabalhadores vão embora, deixando o lugar mais vazio, porém ocupado por uma parcela da população marginalizada: os moradores de rua, prostitutas, traficantes e viciados em drogas. Essa população, na verdade, também está lá duran-

te o dia, mas em conjunto com o funcionamento cotidiano. Vale ressaltar que muitos edifícios ficam abertos até as 20 horas, com alguns até 22 horas, no entanto as pessoas que trabalham neles não movimentam uma troca de atividades no térreo (que daria continuidade na vivência diurna), já que esse já se encontra fechado e vazio e já passa uma sensação de insegurança. A parcela marginalizada da sociedade deve, também, ter suas necessidades em relação a um espaço urbano digno asseguradas, uma vez que são essas camadas vulneráveis que mais precisam da atuação do estado e que, ainda sendo marginais, são cidadãos. O momento noturno do setor deve passar por uma intervenção, para que seja ocupado dando olhos a um lugar que hoje apenas se situa no imaginário de muitas pessoas como um lugar a ser evitado. Essa ocupação é necessária, já que assim que os usuários cotidianos, funcionários dos prédios, comerciantes e prestadores de serviços deixam o setor, as camadas marginais se veem em uma disputa por espaço entre as diversas camadas marginais, que para ter o controle utilizam de violência, sem que haja “olhos” para ver tais ações. A Polícia Militar e as pessoas da “sociedade”1 também as agridem com intuito de afugentá-las ou por vê-las meramente como um problema, aproveitando-se da condição de esvaziamento do lugar.


Figura 7 - Foto de umas das galerias para pedestres, foto feita por voltas das 20h, de uma quinta-feira. As atividades no período noturno são mais pontuais e com isso não geram fluxo grandes de pessoas, apesar da boa iluminação.

Figura 8 - Praça do Povo completamente abandonada, com muitos obstáculos para o usuário, e com um mobiliário não convidativo.

Figura 9 - A quantidade de pessoas que transitam nesse lugar deveria ser um sinal para o Governo de Brasília pensar em medidas mais eficientes de intervenção para atender as necessidades desses cidadãos

Hoje, vemos algumas iniciativas privadas de ocupação de espaços públicos, como encontro de food trucks, restaurantes com mesas em calçadas, feiras em parques, entre outros. São eventos que ocupam de maneira interessante o espaço da cidade, mas que junto com isso atrelam a noção de consumo para se estar ali. Eles restringem o espaço urbano para apenas uma camada social, para aqueles que podem consumir o que está sendo vendido – quem não faz parte dessa camada se sente excluído social e economicamente do espaço.

tribuição de atividades e pessoas no território continua sendo desigual e os espaços públicos, em geral, continuam vazios e desinteressantes, assim como os lugares de permanência encontrados no SCS.

pode gerar um forte dinamismo de atividades e de pessoas por lá.

A realidade do setor é um espaço deteriorado, sem qualidade ou manutenção. As praças, que poderiam agregar usuários, estão depredadas e sem uso; os passeios, com piso quebrado; grandes áreas para estacionamento; precária conectividade com os setores adjacentes, entre outros problemas que precisam ser superados para se atingir os objetivos de qualidade urbana. Intervenções que favoreçam a vida pública ainda não foram contempladas em Brasília, uma vez que elas costumam ser pontuais e excludentes, como por exemplo a proposta de estacionamentos no Setor estudado, quando o mais democrático a se fazer seria repensar a lógica do transporte público para lá, o que agrava essa situação de descaso e falta de manutenção do lugar. As iniciativas voltadas para o pedestre não contemplam a experiência de deslocar-se a pé com segurança e prazer. A dis-

A ideia de repensar a exclusão da habitação no setor decorre do problema social e econômico do Brasil que é a falta de moradia para grande parte da população. Segundo o CENSO IBGE, em 2012, no Brasil havia cerca de 192 milhões de habitantes, desses milhões, entre 0,6% a 1% se encontravam em situação de rua. Em números, isso corresponde a 1,8 milhões de moradores de rua em todo o território brasileiro. São Paulo, em 2015, tinha mais de 15 mil moradores de rua, 10% mais do que há 4 anos. O ritmo de crescimento dessa população é superior ao dos demais habitantes. Em Brasília, um levantamento feito a partir de abordagens nas ruas, o SEAS (Serviço Especializado de Abordagem Social) da SEDHS (Secretaria de Estado de Desenvolvimento Humano e Social), identificou cerca de 4 mil pessoas em situação de rua no Distrito Federal no primeiro semestre de 2015. Devido à imensa crise habitacional em todo o mundo, esta questão não pode mais ser ignorada. O uso habitacional voltado para um perfil de morador que fuja da família tradicionalmente formada por pai, mãe e filhos e que se interesse por apartamentos menores e por um estilo de vida que se assemelhe ao oferecido por centros urbanos,

O Setor Comercial Sul pode ser visto como um grande desperdício de “gente”. É um espaço público com grande potencial: já possui um grande fluxo de pessoas, grande variedade social e grande oferta de emprego (mesmo que apenas durante uma parte do dia). Apesar de desinteressantes e malcuidados, acredita-se que os espaços públicos do Setor Comercial Sul possuam um potencial inestimável para dar suporte a uma vida pública muito mais intensa, variada e atraente, inclusive durante os períodos noturnos e durante os finais de semana. No entanto, esse espaço menospreza seu usuário, uma vez que não se preocupa em oferecer nenhuma qualidade espacial, seja ela na manutenção das calçadas ou no desenho das praças . Frente a esses problemas, percebe-se a urgência em se requalificar esse espaço para dar lugar a um centro digno de seus usuários e que possa agregar mais pessoas em diferentes períodos e de diferentes classes, sem com isso negar todos os atuais ocupantes de lá (Figura 13). Com isso, o estigma do Setor Comercial Sul deve ser mudado para a consolidação da sua verdadeira vocação: ser um centro agregador. É essencial para a dinâmica de uma cidade que exista um espaço que abrigue e represente a pluralidade social e econômica, trazendo urbanidade para o lugar.

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02. 02. 15


QUEM PENSA IGUAL Segregação e exclusão social 16

Brasília foi construída a partir de 1956, inaugurada em 1960 como nova capital do Brasil, com um projeto de Lucio Costa fortemente influenciado pelos manifestos do CIAM, numa tentativa de se trazer a modernidade, retirando o estigma de colônia portuguesa. As premissas modernistas concluíam que, a partir de intervenções arquitetônicas e urbanísticas, seria possível criar novas formas de associação coletiva, de hábito pessoais e de vida coletiva (HOLSTON, 1993, p. 37) e que, portanto, a arquitetura e urbanismo modernos seriam os instrumentos de transformação social. Os agentes políticos da época também viam isso como a possibilidade de ilustrar um novo Brasil, abrindo as portas para o interior do país. Brasília seria planejada para ser uma cidade sem contrastes sociais. As classes antagônicas se misturariam e conviveriam no espaço coletivo público. Não existiriam favelas ou cortiços e todos teriam a sua cidadania garantida com habitações decentes, condições econômicas confortáveis e emprego certo (PERREIRA, 2008, p. 64). Segundo James Holston (1993), ao se retratar esse futuro imaginado para Brasília, negaram-se as condições existentes da realidade brasileira. A tentativa de apagamento da história e da realidade presente do País era um projeto já fracassado, que implicava uma negação da própria realidade social, sendo apenas um reforçador do passado colonialista do Brasil. Em 1950, o Brasil ainda era um país rural, entretanto, imerso em uma pobreza total, desamparada pelo Governo e não atingida pelas políticas sociais da época. A população rural brasileira sofreu, em meados dos anos 1960, com a indus-

trialização da agricultura, que intensificou a desigualdade social do campo, mantendo intacto o direito de propriedade dos grandes fazendeiros e produtores rurais. O desemprego em massa foi uma realidade que culminou no êxodo rural para a cidade, e em 1960 cerca de 37% da população rural, 14 milhões de pessoas foram para as cidades brasileiras. As cidades não puderam acompanhar o crescimento demográfico e, assim, as primeiras favelas eram formadas, o chamado “mundo rural na cidade” (VALLADARES, 2005, p. 22). A partir desse contexto social de segregação, a formação de Brasília acompanhou essa realidade. Aldo Paviani afirma que a população passou de 12.700 em 1957, para 64.314 em 1959 e chegou a 127.000 em 1960 (PAVIANI apud GONÇALVES, 1998, p.72). Os trabalhadores que vieram para a construção da capital ou imigrantes que vinham espontaneamente a procura de empregos, oriundos principalmente da região Nordeste, não podiam habitar o Plano Piloto planejado, já que não era interesse dos governantes esse tipo de população ocupando o centro político brasileiro. Alguns começaram a formar as primeiras favelas brasilienses (as chamadas invasões), como a Vila Sarah Kubitscheck, que logo foi dissolvida pelo governo, e como solução criaram-se as cidades satélites. Uma das primeiras executadas com essa finalidade foi a Cidade Livre, atual Núcleo Bandeirante, que inicialmente abrigou cerca de 4 mil flagelados da seca nordestina (GONÇALVES, 1998). A imigração para Brasília não parou, tendo sempre o Nordeste como principal origem dessas pessoas. A oferta de empregos e de habitação da capital não conseguiu, e até hoje não con-


segue, suprir a demanda dos imigrantes, fatores que explicam em parte a origem da população de rua. Desde a inauguração da nova Capital, a população de baixa renda que chegava à capital foi alvo de medidas sociais que visavam controlar as ocupações desordenadas do solo urbano (PERREIRA, 2008, p. 67).

Figura 10 - Morador de rua e a invisibilidade no dia-a-dia das pessoas.

Figura 11 - Calçada do Pontão. A qualidade da manutenção é evidente, diferentemente da pluralidade social.

maior contingente de necessitados, o que continua excluindo os mais pobres e mais vulneráveis (PERREIRA, 2008, p. 67).

Dentro da exclusão, a condição de ser um sem-teto é a de maior grau de marginalização que pode ocorrer dentro de uma metrópole. As razões que levam à situação limite de exclusão, que implica viver e dormir na rua, trazendo sobre as costas o pouco que se tem, são diversas, mas, geralmente, estão ligadas à falta de trabalho e de recursos em decorrência de perda de laços familiares e sociais que lhe permitiam dispor de um lar, ainda que provisório, obrigando o sem-teto a habitar em qualquer recanto da cidade (...) Ninguém está a salvo de uma série de fatalidades. (MONTANER, 2011, p. 187).

Junto com a segregação social, a ocupação de Brasília favorece uma segregação sócio-espacial. Zonas mal conectadas com a malha viária de espaço coletivos restringem o uso de quem não tem carro, por exemplo, delimitando a classe econômica da pessoa que vai ter acesso a ela. A Praça dos Cristais, no Setor Militar, que é um ponto turístico da cidade que não recebe outro tipo de visitante que não o motorizado, exemplifica bem esse tipo de área central que não é aberta para todos, mesmo sendo pública. Até mesmo a falta de acessibilidade é um forte segregador do espaço, que exclui cadeirantes, idosos e pessoas com dificuldade de locomoção. Temos o exemplo do recente Calçadão da Asa Norte que não tem um caminho que possibilite uma travessia segura de quem vem da L2 sul.

Existem várias políticas públicas de assistência social que atendem a essa população no DF. Elas procuram dar conta das necessidades de saúde, alimentação, educação, esporte, cultura e emprego. Todavia, há uma ênfase na solidariedade entre o Estado e o pobre. Não há políticas que dão autonomia para essas pessoas, que busquem deixar o pobre como verdadeiros titulares da sua cidadania. São programas que focam e fragmentam em categorias de atendimentos essa população. Tais categorias são regidas por rigorosos critérios de elegibilidade, como ser um idoso, um deficiente físico ou estar inscrito em instituições filantrópicas com parcerias com o governo. Essas medidas segregadoras não atendem ao

No Setor Comercial Sul, vemos o início de uma intervenção que também parece se aplicar apenas a parte da população, deixando de lado outra grande parte que não consome. Um festival de food trucks está sendo organizado periodicamente em frente ao museu dos correios. Mais uma vez vemos uma intervenção que preconiza o consumo e não o simples “estar” no espaço público, que exclui parte da população que não consome esse tipo (e preço) de produto. Tem de seressaltar que é importantenão se contentar a “parar por aí” em iniciativas desse tipo - elas devem ser encarada como uma faísca que pode impulsionar outras iniciativas mais inclusivas e mais plurais.

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Policiamento e a violência

A ideia de cidade planejada consolida a construção de uma cidade com grande controle governamental, modelo de cidade que se iniciara na Europa Ocidental pós-Revolução Industrial, com força no século XIX. As cidades pós-industrialização permitiram o aparecimento dos cortiços e uma série de epidemias provocadas pelas condições insalubres dos centros urbanos. Essa realidade resultou no estabelecimento do urbanismo moderno (HOROUEL apud PEREIRA 1998, p.114). O urbanista surge, neste contexto, juntamente com sanitaristas e inspetores, como o especialista capaz de sanar os males da cidade insalubre, em parceria com a administração pública. O mesmo conjunto de transformações associadas aos processos de industrialização e urbanização, principalmente na Inglaterra e na França, que iniciou o urbanismo moderno leva à incorporação de atribuições governamentais que são da esfera da saúde coletiva e individuais, implicando interferências diretas sobre questões como a reprodução, a higiene pública, a velhice e a própria sexualidade (FOUCAULT apud MACOWELL, 2002). Nesse panorama, a relação entre propriedade privada e bem público sofre um processo de reconfiguração, que faz o poder da administração pública – muitas vezes representada pela figura do urbanista – intervir diretamente sobre a propriedade privada, o corpo e a habitação dos cidadãos (MACOWELL, 2010, p. 45).

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Figura 12 - No subsolo, que funciona como uma galeria, a sujeira é constante e os lojistas, com medo de arrombamentos ou assaltos, não abrem as portas ali. Usam o subsolo como depósito, quando usam.

O Plano Piloto de maneira geral [...] é um território que permanece largamente imaculado de maiores tensões sociais, isto não quer dizer que elas não existam. Sugere, pelo contrário, que a repressão a elas ocorre com uma eficiência e truculência como não se vê em outros centros urbanos do Brasil. A história da cidade é marcada por uma grande repressão às interferências que foram ocorrendo ao ideal de uma capital planejada e controlada. Se a ocupação vasta e rarefeita de Brasília sugere um montante extraordinário de recursos para mantê-la - para manter suas áreas verdes incólumes, seus percursos rodoviários amplos e desimpedidos, suas infraestruturas subterrâneas, seus edifícios permeáveis ao nível do solo, sua tranquilidade e segurança, seu perfil classe-média – deve-se somar aí os custos de

seu policiamento, ao fabricar espaços difíceis de serem transportados e que vêm acompanhados da ineficiência e alto custodos seus transportes públicos. Este poder de policiamento é o ponto fundamental para a manutenção do status de que goza o Plano Piloto. Repressão é a parte do custo de se sustentar Brasília. (CASTELLO apud MACOWELL, 2008, p. 81) A superexposição à violência, seja ela proveniente de outros moradores de rua, de pessoas da sociedade civil ou do próprio Estado, é uma das facetas mais difíceis da vida da população de rua. Por serem vistos como “invasores”, estão à mercê do controle repressivo do governo. A qualquer momento eles podem ter seus pertences confiscados. Além disso, existe a lógica na sociedade de que, quanto mais pobres, mais perigosos, por isso eles frequentemente são ameaçados, revistados e presos. Mesmo com muitos conflitos entre eles, principalmente ligados a roubos e brigas, a violência mais temida é a praticada pela sociedade. A violência contra essa população é a concretização do preconceito, da discriminação, da ignorância e da intolerância de grandes parcelas da sociedade; preconceito que repercute na não implementação de políticas sociais, pelo Estado, que possam dar autonomia a essas pessoas. As autoridades também exercem controle por meio do uso do território. A administração local detém grande parte das terras do Distrito Federal, assim como os principais cargos administrativos estão na posse de grandes proprietários de terra e empresário do mercado imobiliário, conferindo um caráter de domínio do Estado sobre o espaço da cidade. A manipulação de argumentos, ora em defesa da necessidade de manutenção do “plano original” de construção de Brasília (muitas vezes utilizando o tombamento como justificativa), ora apontando para a inadequação do mesmo plano às condições atuais de desenvolvimento da cidade, se presta a justificar quase qualquer intervenção do Governo de Brasília, frequentemente associada ao uso do “poder de policiamento” e à “repressão às interferências”.


ADJETOS e degenação Figura 13 - O morador de rua Davi dos Santos recebe os exemplares e os locais determinados para a venda da revista Traços. A revista será comercializada por 5 reais, o morador fica com 4 reais e usa o 1 real que sobra para comprar novos exemplares

1.Que se acrescenta; adjunto, juntado. “nota a.” 2.Indivíduo que representa um credor em contratos ou obrigações jurídicas, recebendo, por este quantia, pagamento etc. do devedor. O policiamento que incide sobre o espaço, por meio do uso de violência física ou por medidas autoritárias, acontece sobretudo sobre quem o ocupa esse espaço. Nas cidades brasileiras, esse processo mobiliza signos relacionados à racialidade, à sexualidade, ao gênero e à classe social. Assim em um espaço temos dois tipos de pessoas: as que importam para o funcionamento do espaço e aquelas que estão à margem da sociedade, isto é, aquelas que não são vistas como importantes no processo de cidadania. “Elas acabam por sair desses espaços a que não pertencem, ocupando os restos dos espaços públicos.[...]Corpos que não importam são corpos ‘adjetos’. Tais corpos não são inteligíveis [...] e não têm uma existência legítima.” (Prins e Meijer, 2002). Corpos adjetos, portanto, são da ordem do “inóspito” e do “inabitável”, enquanto os corpos que pesam, em sua existência material, ocupam os espaços legítimos, os espaços que importam (MACOWELL, 2010, p. 47). Esses corpos ocupam os lugares que lhes foi deixado pelos corpos que pesam. Os espaços onde a urbanidade não existe, onde a vida pujante da cidade não se estabeleceu, são dei-

xados para os adjetos. O Setor Comercial Sul, de noite, é um exemplo de espaço que representa a posse dos adjetos sobre o território. Uma área com infraestrutura precária, sem a presença do Estado, sem segurança física e sem olhos para eles. Muitas vezes os adjetos, por serem uma camada da população vulnerável, acabam sofrendo opressões de corpos mais fortes, que controlam seu estilo de vida e usam da violência para controlar os corpos daqueles que ocupam o lugar indesejável. A questão da invisibilidade dessa camada já é algo natural para a sociedade com um todo. Indo contra essa apatia, algumas iniciativas em Brasília começam a abordar essa questão do marginalizado, como o grupo no Facebook Brasília Invisível, que relata a história de moradores de rua, e a revista TRAÇOS, que é vendida por moradores de rua que ficam com 80% do lucro obtido com as vendas dos exemplares. Essas iniciativas tentam mudar uma realidade que é esmagadoramente triste e excludente. A ideia é transformar essas pessoas em cidadãos sem chocar, mas buscando a integração com toda a população. Os adjetos em situação de rua perderam o direito à sua vida privada e à intimidade. Sua vida cotidiana realiza-se no espaço público, onde, além disso, são suscetíveis a serem expulsos, mutilados, roubados, humilhados ou agredidos. Isso os transforma em marginais, degrada-os humanamente e os

torna totalmente frágeis e vulneráveis. “O privado desapareceu, diluído no público” (MONTANER, 2014, p.188). A “geografia dos sem-teto” é definida pelos recantos mais protetores da cidade: pontes, pórticos, recuos ou vãos de vitrines. Para dormir, procuram lugares específicos perto de centros de assistência e redes de transporte urbano, facilitando o acesso a lugares onde recebem ajuda, comida, roupa. Também procuram lugares com boa localização, em recantos muito transitados, evitando serem alvo de violência verbal e física (MONTANER, 2014, p.189). O cartesianismo de Brasília espelha-se em um ideal de estado neutro e asséptico. O desenho geométrico da cidade, a distribuição rigorosamente ordenada das funções e dos equipamentos urbanos, as ruas e avenidas largas, os amplos espaços vazios e a amplitude do alcance da visibilidade, entre outras características, dão a Brasília uma transparência e um controle, supostamente características da entidade estatal. Os espaços de Brasília, em sua forma projetada, diferente de qualquer outra cidade, não se distribuem em uma estrutura labiríntica, em que a infinidade de trajetos e caminhos possíveis se evidencia a qualquer caminhante de forma análoga à das infinitas possibilidades dos enredos da vida. Essa estrutura labiríntica também funciona como uma proteção, uma esquiva ou um esconderijo (CASTELO, 2008, p. 27). A pesquisadora Camila Potyara Pereira, em sua pesquisa so-

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das calçadas e acessos; o acesso às garagens subterrâneas é ocupado por moradores de ruas e viciados em drogas; a qualidade do espaço público é ruim e sem manutenção (Figura29), o que entre outros fatores negativizam a visão das pessoas sobre o lugar. De noite essas caraterísticas se intensificam e, junto a isso, ocorre um esvaziamento da área, ressaltando a imagem de lugar dos marginalizados e do tráfico de drogas.

Figura 14 - Lixo entulhado em um poste, imagem que se repete ao longo das quadras.

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Hoje a ocupação do SCS é sobretudo feita por serviços essenciais. O comércio atende principalmente ao público interno de trabalhadores do próprio setor e de usuários dos serviços ali oferecidos. A falta de cuidado com a estética dos prédios, com os caminhos dos pedestres, ou com as praças é visível. Reformas foram feitas de maneira pontual e isolada. Esses fatores contribuem para que a maioria das pessoas veja o espaço do SCS como feio, caótico e poluído.

bre a população de rua de Brasília, detectou que ela, diferentemente da do resto do país, prefere se esconder para não ser expulsa em direção às cidades satélites e ao entorno do DF. Aqui, essas pessoas vivem em um dilema: ao mesmo tempo em que, ao ficarem expostas, elas podem ser alvo de violência e repressão, é justamente esta exposição que lhes poderia permitir obter maiores benefícios por parte das pessoas mais abastadas, que se sensibilizariam pela sua condição. Vemos que dessa forma o Setor Comercial Sul parece atender a essas duas necessidades: de dia é bastante movimentado, dando chance para esses moradores conseguirem alguma ajuda, e de noite ele se torna um lugar mais isolado. Ainda que fiquem à mercê de grupos opressores e da atuação da polícia, parece que lá elas encontram espaço para se esconder.

na cidade, onde a ideia de pertencimento a um lugar digno

O traçado moderno das cidades, com áreas multifuncionais, avenidas amplas, edifícios isolados e espaços amorfos, não favorece a “habitação” dos desabrigados. Eles vivem melhor nas estruturas das cidades tradicionais, com espaços delimitados, com recantos, curvas e diversidade, que permitem que sejam habitados e ocupados. Provavelmente, por se parecer com um centro de cidade tradicional, o SCS abriga tantos moradores de rua.

A configuração assumida pelo Setor Comercial Sul ao longo das últimas décadas contribuiu para que fosse feita a associação, no imaginário de grande parte da população do DF, entre o Setor e a ideia de degeneração.

Juntamente a essa degeneração do espaço, os seres adjetos tomam para si esse espaço marginal e se tornam soberanos da sua exclusão, constituindo para si as regras de seu ordenamento territorial próprio, que só pode existir simultâneo à norma, onde os seus corpos estão presentes.

De dia o cheiro e a quantidade de lixo são perceptíveis e incomodam quem passa e trabalha por lá; os espaços para estacionamento de carros já não são suficientes para a demanda; com essa superlotação de veículos, a paisagem se torna poluída e congestionada; com intenso comércio informal – hoje controlado com o uso da coerção policial – ocupava as galerias térreas e algumas marquises, dificultando o trânsito de pedestres, que já é complicado por conta da precariedade

Na cidade estatal, o contraditório processo da vida, com suas incertezas e imprecisões, dificilmente se materializa na forma das fendas, fissuras, labirintos, galerias e vielas que moldam a essência dos espaços urbanos desde que a humanidade inventou a cidade (MACOWELL, 2010, p. 45). Brasília, e principalmente o Setor Comercial Sul, tentam acomodar a complexidade da vida na cidade em um espaço tão idealizado que se esqueceu do lado incerto do homem e da mulher.

Trazer à luz as necessidades e desejos dessas pessoas é dar espaço para que eles também sejam protagonistas do espaço urbano e, a partir disso, iniciar um processo de ruptura com a marginalização, exclusão e violência que sofrem diariamente

pode promover melhorias na vida de todos. A cultura é uma ferramenta essencial nessa ruptura – estimulá-la dentro do setor é possibilitar que as pessoas vulneráveis criem novos vínculos interpessoais e que se aumente a possibilidade de superação da situação de risco em que vivem. Quando é excludente, uma cidade não cumpre sua função essencial de acolhimento e termina se transformando em uma aberração, em uma monstruosidadeque avança contra seus indigentes, suas minorias e seus “perdedores”, e até os maltrata e os assassina, de modo a transformá-los na imagem de um fracasso e de uma angústia condenada por parte da sociedade privilegiada. (MONTANER, 2014, p.191).

As duas esferas da degeneração, a arquitetônica e a social, são absolutamente interligadas e interdependentes, e existe uma relação de causalidade unidirecional. Os fenômenos que levam à degeneração de um espaço só são explicados ao se considerar o contexto, que envolve aspectos históricos, econômicos, políticos, sociais, geográficos, entre outros. A presença dos adjetos está vinculada a lugares impróprios para a vida do sujeito “de bem” da sociedade. Assim, é muito claro que a combinação de espaço descuidado e grupos marginalizados componham a ideia da degeneração do espaço.


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Percepção do espaço urbano

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Figura 16 - Praça Millennium square, em Chicago, um exemplo de como um espaço público pode ser o ponto de encontro para diversas pessoas. O mobiliário promove a interação entre as pessoas, sendo um atrativo de entretenimento.

Figura 17 - Gráfico representando a relação entre a qualidade dos espaços públicos e a ocorrência de atividades externas.

A paisagem do Setor Comercial Sul é uma paisagem de lugares. Como exemplificou Holanda (2013), o oco, o vão, os vazios entre os dois cheios, por onde nos movemos, são a finalidade última da arquitetura. Os elementos-fim da arquitetura apresentam atributos deles próprios, como dimensões horizontais e verticais, absolutas e relativas, luz e sombra, temperatura, umidade e movimento do ar, aromas, ruído e silêncio; e atributos das relações com outros vazios, como direta

aprendizagem social. Quando este compartilhamento se dá com pessoas de grupos (sociais, culturais, econômicos, religiosos) diferentes dos que pertencemos, a aprendizagem é ainda mais significativa e benéfica para a sociedade. Quanto mais intensamente apropriado um lugar, mais a população se identifica afetivamente com ele e melhor o preserva (HOLANDA, 2013, p. 130).

ou indireta acessibilidade, continuidade ou descontinuidade, proximidade ou distância, integração ou segregação, envolvimento, hierarquia, etc. Para se alcançar a urbanidade pretendida, esses atributos devem ser levados em consideração para formar espaços públicos mais saudáveis e de qualidade.

A cidade, ao reunir mais gente em maior contato, permite maior participação e melhor compreensão das relações sociais, assim como o acesso a diferentes maneiras de viver. E essa interação faz classes, estilos de vida e até mesmo as pessoas diferentes deixarem de ser estigmatizadas e o medo ao estranho desaparecer.

Em cidades internacionais, trabalhar pela urbanidade passou a ser uma meta de governo e uma preocupação da sociedade civil. De uma forma geral, isso envolve pensar e desenhar a cidade para diferentes pessoas, unindo-as pela sua forma mais básica de locomoção: o andar. Dessa forma, busca-se uma cidade que abraça diferentes estilos de vida, mas que oferece um modo de vida urbano comum a todos.

Gehl (2006, p. 15) defende que o espaço público suaviza a fronteira entre se estar sozinho e se estar acompanhado, por oferecer uma forma descomprometida de se estar entre outras pessoas. Além disso, um espaço público de boa qualidade é aquele que favorece todos os tipos de atividades, classificadas por ele em necessárias, opcionais e sociais.

Assim, as cidades estão aprendendo a ver espaços públicos subutilizados como desperdício social, cultural, financeiro e ambiental. Os espaços públicos têm que convidar e acolher o maior número de pessoas e as mais diversas, pelo maior período de tempo possível, de maneira confortável, digna e atraente. Dessa forma, neles poderá florescer a vida pública: o conjunto de ações, programadas ou não, protagonizadas pelos indivíduos nos espaços públicos, ou seja, florescer a urbanidade. (TENORIO, 2012). Na urbanidade, está pressuposta a interação presencial, que só pode ocorrer entre indivíduos que compartilham um mesmo espaço. Compartilhar o mesmo espaço com outras pessoas – ainda que com elas não interajam – favorece a

Consequentemente, em um bom espaço público as atividades necessárias continuam ocorrendo, mas duram mais tempo; as atividades opcionais começam a surgir porque o lugar convida as pessoas a permanecer, sentar, comer, jogar, e então há mais pessoas, permanecendo mais tempo no espaço público. A partir daí surgem atividades sociais, como conversar, cumprimentar-se, que não precisam acontecer efetivamente, pois apenas o observar e escutar o cotidiano do espaço público já acrescenta urbanidade ao lugar. A esfera pública permite ou força o contato entre pessoas que dificilmente se encontrariam se dependessem apenas de eventos privados. As pessoas devem ter interesse em ir para esses espaços públicos, e esses devem oferecer atividades e serem localizados


Figura 18 - Em 2006, a prefeitura começou um processo de pedestrealização de ruas importantes da cidade. A permeabilidade da malha para o pedestre ficou muito mais fluida, a retirada dos carros possibilitou uma integração visual e física com a Catedral, e o caminhar ficou muito mais interessante e livre. Os níveis de poluição caíram muito e as vendas do comércio subiram. Com a retirada das barreiras ao pedestre foi possível a implantação de um veículo leve sobre trilhos, cuja rota corta o centro histórico da cidade e leva as pessoas para os principais pontos turísticos.

Figura 19 - A Avenida de la Constituición (1977), até o ano de 2006, era uma via para carros, com calçadas generosas e arborizadas. Na época, a pedra que constitui a fachada da Catedral sofria com a poluição emitida pelos carros. Por causa da rua não era possível ter uma visão mais ampla do todo do monumento

a distâncias curtas de outros pontos importantes na cidade e de outros espaços coletivos. Um ótimo lugar deve oferecer muitas atividades que sejam atrativas para mulheres, pois elas tendem a ser mais seletivas com os lugares e são indicadoras de segurança; deve servir para todas as faixas etárias, e incluir as pessoas que representam a comunidade onde o espaço se localiza. As pessoas têm que ter motivos para conhecer e para frequentar um espaço, e essa descoberta acaba por expandir-se nos arredores, espalhando essa sensação de bem-estar coletivos (PROJECT FOR PUBLIC SPACES, 2005). Essas atividades devem ser realizadas durante o dia e a noite, impedindo que o espaço fique estagnado ou perigoso em um dos períodos. Gehl (2006) afirma que há diferentes maneiras de promover ou impedir o contato pessoal, visual e auditivo por meio de arranjos físicos, e para favorecer a vida pública é preciso eliminar (ou não criar) barreiras (Figuras 34 e 35). Frederico Holanda traduz a definição de urbanidade para uma forma física: [...] “propus que urbanidade fisicamente caracteriza: a) minimizar espaços abertos em prol de ocupados; b) menores unidades de espaços abertos (ruas, praças); c) maior número de portas abrindo para o espaço público (jamais paredes cegas); d) minimizar espaços segregados, guetizados, becos sem saída e condomínios fechados (HOLANDA, 2003).

Jane Jacobs (2007), crítica do urbanismo modernista e destaca dois fatores fundamentais para a vida pública que podem ser alcançados pelo desenho da cidade: segurança e diversidade. O primeiro, como pré-requisito para o uso das ruas pelas pessoas; o segundo, como garantia de que a cidade não será um agrupamento de comunidades homogêneas e intolerantes umas com as outras. Seu objetivo é que haja vida urbana diversa e vibrante em todas as ruas da cidade. “É uma coisa que todos já sabem: uma rua movimentada consegue garantir a segurança; uma rua deserta, não” (JACOBS, 2007, p. 35). Espaços públicos movimentados que abrigam tanto frequentadores antigos e assíduos (conhecidos) quanto novos e eventuais (desconhecidos) são bons e seguros para ambos. Jacobs afirma que a melhor maneira de lidar com os indesejáveis nos espaços públicos é tornar o lugar atraente para todo mundo. Quanto mais frequentado um lugar, mais seguro ele se torna. Isso porque duas coisas notáveis ocorrem num espaço público muito utilizado: há mais vigilância informal, e assim aqueles que praticam atos ilícitos tendem a ter menos lugar e há maior sensação de segurança. Você se sentirá muito mais segura perto de um morador de rua em meio a muita gente do que estando a sós com ele, uma vez que ele é um corpo estigmatizado.

A jornalista (2007) chama de “erosão” o processo de dar cada vez mais espaço para os automóveis (mais faixas, mais pistas, viadutos, estacionamentos). Esse processo ocorre com inevitável ônus para os pedestres e usuários de transporte público, que perdem espaço e comodidades, tendo que subordinar seus trajetos ao que lhe foi designado depois que o automóvel foi atendido. Para reverter esse processo, a autora diz que seria interessante exercer pressão sobre os automóveis, criando condições menos favoráveis a eles, tornando-os cada vez menos necessários. Os automóveis não são causa: eles são sintoma. Quando as nossas cidades passarem a desestimular o uso do automóvel, surgirão cada vez mais ruas interessantes e atraentes, que possam favorecer a vida pública. De fato, as cidades cujos governantes estão aprendendo a valorizar o pedestre e a colocar o automóvel em um patamar de menor importância na hierarquia da mobilidade vivem um momento de revitalização de seus espaços coletivos. No livro A cidade como um jogo de cartas, de Carlos Nelson F. dos Santos (1988), a importância da imagem da cidade aparece como uma forma de conhecimento dos seus padrões e estrutura, formando uma imagem coletiva dela. Com isso, haverá uma referência básica de marco para quem for dali, e qualquer novo espaço agregado ou alterações na ocupação de uma área existente não irão gerar conflitos ou desvinculações notáveis dos usuários com o lugar.

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Figura 20 - Mapa feito por uma comerciante entrevistada durante a pesquisa de campo feita sobre a imagem do setor, que será relatada posteriormente neste plano de trabalho . Essa pessoa não foi capaz de assimilar os elementos arquitetônicos do lugar, ela se lembra apenas das suas funções. O SCS não apresenta uma imagem forte para o usuário.

Kevin Lynch, em seu livro A Imagem da Cidade (2006), descreve como a imagem coletiva da cidade deveria ser construída de modo que as pessoas pudessem ter uma leitura clara dela, assim a cidade deveria ser legível na sua configuração. Uma cidade legível seria aquela cujos bairros, marcos ou vias fossem facilmente reconhecíveis e agrupados num modelo geral, por exemplo. É algo que se reveste de uma importância especial quando consideramos os ambientes na escala urbana de dimensão, tempo e complexidade, e para compreender isso, devemos levar em consideração não apenas a cidade como uma coisa em si, mas a cidade do modo como a percebem seus habitantes.

Em uma intervenção urbana, a transformação física de um lugar resulta em mudanças de apropriação do espaço público. Mas vale observar que, nem a arquitetura determina nosso comportamento, como se fôssemos desprovidos de vontade ou iniciativa, nem ela é neutra. Lucio Costa coloca a “Bastilha” brasiliense (1985), como a substituição das elites pelos trabalhadores manuais, que tomaram conta do espaço da Rodoviária, das plataformas às conexões dos Setores de Diversão. O caso serve como exemplo para exemplificar essa relação tênue entre o usuário do espaço público que conversa, contrapõe e modifica o próprio espaço que ocupa.

A orientação em um espaço é importante para a nossa sensação de equilíbrio e bem-estar. A desorientação causa angústia e até mesmo medo. O espaço do Setor Comercial Sul é em si o símbolo poderoso da cidade de Brasília, que por sua vez é o símbolo e resultado de uma sociedade complexa, e, se bem organizado em termos visuais, pode ter um forte significado expressivo.

O arquiteto Marcelo Galo (2012, p. 2), em seu artigo A cidade boêmia: circulando ideias e formando corpos, começa a indagar se o modernismo teria sido feito para atender a demanda noturna de atividades em uma cidade: “Como Le Corbusier ao pregar uma cidade que privilegiasse quatro funções: habitação, circulação, lazer e trabalho, dentro da cartilha de zoneamento, separação e circulação. Seria uma cidade para o dia?”.

A cidade também deveria evocar uma imagem forte em qualquer observador, originando a imaginabilidade da cidade. Um espaço altamente “imaginável”, nesse sentido de evidente ou legível, é mais bem formado e distinto dentro da malha urbana. A clareza da estrutura e a expressividade da identidade são os primeiros passos para o desenvolvimento de símbolos fortes.

O autor dá ênfase à necessidade da experiência boêmia para a dinâmica da cidade, uma vez que a experiência noturna é a que faz circular ideias desde o século XVII, na França, tendo a boêmia como estilo de vida de jovens artistas à margem da sociedade burguesa. Esses jovens existiam de forma marginal baseada na recusa ou na incapacidade de aceitar uma identidade social estável e limitada (MONGIN apud GALO, 2012, p. 3). As vanguardas artísticas não teriam existido sem

a boêmia, já que ambas surgiram juntas (Paris, século XVIII), sendo resultado da Modernidade e da urbanidade. Os boêmios se caracterizam por explorar novas formas estéticas e formas de viver. Viviam em bairros com oferta de moradias acessíveis e com variedade de estabelecimentos notívagos. Eles foram capazes de participar ativamente na produção e a redefiniçao da cidade. Os ambientes urbanos mais diversificados proporcionam experiências criativas e facilitam a circulação de ideias. “Subversão política, desapego material, contestação estética e dissidência sexual seriam ingredientes para uma constante marginalização da boêmia” (GALO, 2012, p. 7). Assim como muitos segmentos da sociedade, o capitalismo assimilou e valorizou o boêmio, trazendo ele para a lógica do consumo, dessa forma ele sai da margem se desloca para o centro, fazendo com que empresas e cidades se tornem mais tolerantes com a boêmia, facilitando uma inserção dela no cotidiano noturno do SCS. Cidades com ruas e bairros que permitem a residência, convivência com cafés, boates, galerias e teatros são mais benéficas para a circulação de ideias do que aquelas onde a cidade é zoneada, com as funções separadas, com rodovias privilegiadas em detrimento dascalçadas. Estas são cidades onde a troca de informações é comprometida. A necessidade de contatos interpessoais na produção de ideias é, no entanto, primordial. Sem esse contato de pessoas, não existe a noite e não existe cidade.

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como ele é? Figura 21 - A rodoviária do Plano Piloto retratando a pluralidade que o centro de uma cidade deve ter

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A construção da nova capital foi o símbolo da maior modernização de um país. Ela deveria unir o desenvolvimento tecnológico e econômico pelo qual o país estava passando com a necessidade da ocupação da área central do Brasil e a construção de uma identidade nacional, que quebrasse com uma visão colonial, fundada no discurso renovador dos valores culturais trazidos pelos ventos da modernidade. Em 1956, foi lançado o concurso para a Nova Capital, no qual 26 projetos participaram, e o vencedor, o projeto de Lucio Costa, era o único que sintetizava a ideia da capital moderna. Inúmeros projetos apresentados poderiam ser descritos como demasiadamente desenvolvidos; o de nº 22, ao contrário, parece sumário. Na realidade, porém, explica tudo o que é preciso saber nesta fase; e omite tudo o que é sem propósito” (Apreciação do Júri, Relatório do Plano Piloto de Brasília, 1991). Assim como em todas as propostas apresentadas, Lucio Costa mostrou um projeto que firmava a divisão da cidade pelas

funções consideradas básicas pelos modernistas – trabalhar, habitar e recrear-se. Fez vias exclusivas para automóveis, a partir de um sistema de transporte hierarquizado, com vias expressas para evitar ao máximo cruzamentos, e muitos vazios urbano, junto com uma baixa densidade construtiva. O Plano Piloto “nasceu do gesto primário de quem assinala um lugar ou dele toma posse: dois eixos cruzando-se em ângulo reto, ou seja, o próprio sinal da cruz” (COSTA, 1956). Ao longo do eixo arqueado, o Eixo Rodoviário, dispuseram--se os setores residenciais. Os centros cívico e administrativo, o setor cultural, o centro de diversões, o centro esportivo, o setor administrativo municipal, os quartéis, as zonas destinadas a armazenagem, ao abastecimento e às pequenas indústrias locais e, por fim, a estação ferroviária, foram naturalmente ordenados e dispostos ao longo do eixo transversal, que passou a ser o Eixo Monumental do sistema. Nas palavras do próprio urbanista: Lateralmente a esse setor central de diversões, e articulados a ele, encontram-se dois grandes núcleos des-

tinados exclusivamente ao comércio — lojas e ‘magasins’, e dois setores distintos, o bancário-comercial, e o dos escritórios para profissões liberais, representações e empresas, onde foram localizados, respectivamente, o Banco do Brasil e a sede dos Correios e Telégrafos. Estes núcleos e setores são acessíveis aos automóveis diretamente das respectivas pistas, e aos pedestres por calçadas sem cruzamento, e dispõem de auto portos para estacionamento em dois níveis, e de acesso de serviço pelo subsolo correspondente ao piso inferior da plataforma central. No setor de bancos, tal como no dos escritórios, previram-se três blocos altos e quatro de menor altura, ligados entre si por extensa ala térrea com sobreloja de modo a permitir intercomunicação coberta e amplo espaço para instalação de agências bancárias, agências de empresas, cafés, restaurantes, etc. Em cada núcleo comercial, propõe-se uma sequência ordenada de blocos baixos e alongados e um maior, de igual altura dos anteriores, todos interligados por um amplo corpo térreo com lojas, sobrelojas e galerias. Dois braços


Figura 22 - Ligação do Setor Comercial Sul com o Setor Hoteleiro Sul. Não é um lugar feito para a comodidade do pedestre, a barreira da via quebra a continuidade, até mesmo visualmente.

elevados da pista de contorno permitem, também aqui, acesso franco aos pedestres” (Relatório do Plano Piloto de Brasília. COSTA, 1956). O zoneamento da cidade veio a partir das diferenças de interação humana com o espaço proposto. Assim, ela se divide em uma zona de lazer e comércio, de moradia e de centro cívico-administrativo do país. A noção de escala e de interação entre essas zonas, a estrutura viária e a paisagem são essenciais para o entendimento da cidade, e com isso surgiram as quatro escalas de Brasília: a Escala Monumental, a Escala Gregária, a Escala Residencial e a Escala Bucólica. O foco desse trabalho se encontra na Escala Gregária que é formada pela interseção dos eixos monumental e rodoviário e tem como principal elemento a plataforma da Rodoviária. Ela é composta das áreas do Setores de Diversões, Comerciais, Bancários, Culturais, Hoteleiros, Médico-Hospitalares, de Autarquias e de Rádio e Televisão Sul e Norte e pela área adjacente à Rodoviária do Plano Piloto, que é o ponto de intersecção entre os eixos Monumental e Rodoviário, que liga

o Plano Piloto às outras Regiões Administrativas (RA’s). Na parte superior do setor se encontram os Setores Comerciais, de Diversões, de Rádio e TV e Médico-Hospitalar, na parte inferior se encontram os Setores Bancários e de Autarquias. Esta escala foi gerada para abrigar as áreas de convívio social e cultural da cidade, sendo que no seu núcleo, nos prédios adjacentes à Rodoviária, estariam os polos culturais e de diversão, com a presença de teatros, cafés, restaurantes, cinemas, lojas, casas de chá e a Ópera, com acessos pelo Setor Cultural e de Diversões. Eles deveriam possuir uma vista livre para a Esplanada dos Ministérios da sua plataforma superior. Trinta anos decorridos desde a apresentação do Plano Piloto ao júri internacional que escolheria a proposta a ser implantada, Lucio Costa, no documento intitulado Brasília Revisitada, disse: Reexaminar os projetos dos setores centrais, sobretudo os ainda pouco edificados, no sentido de propiciar a efetiva existência da escala gregária — além da Rodoviária

e dos dois Setores de Diversões — prevendo percursos contínuos e animados para pedestres e circulação de veículos dentro dos vários quarteirões, cuja ocupação deve, em princípio, voltar-se mais para as vias internas do que para as periféricas [...] Neste mesmo sentido, não insistir na excessiva setorização de usos no centro urbano — aliás, de um modo geral, nas áreas não residenciais da cidade, excetuando o centro cívico. O que o plano propôs foi apenas a predominância de certos usos, como ocorre naturalmente nas cidades espontâneas (COSTA, 1987). Em carta destinada ao Secretário José Carlos de Mello, em 1983, ele acrescenta: Embora tardiamente, acho importante esclarecer que ao definir os vários setores da área central da cidade – bancário, comercial, hoteleiro, etc. – pretendi simplesmente acentuar a prevalência em certas áreas de determinado tipo de atividades, sem com isso excluir a instalação ali

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Figura 23 - Ligação entre o SCS com o Setor Hospitalar Sul, feita com bolsões de estacionamentos, a travessia para o pedestre é perigosa e conta com apenas uma faixa de pedestre. Note que o caminho para pedestres, na primeira foto, não tem nenhuma árvore, tornando-o árido, já o bolsão de estacionamento, na segunda foto, tem muitas árvores para garantir o bem-estar do carro.

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de atividades de outra natureza necessárias ao conforto dos usuários e à animação da vida local (Carta ao Secretário José Carlos de Mello, COSTA, 1983). O que se pode perceber é uma preocupação de Lúcio Costa com o acesso não só de veículos, mas também de pedestres, a todas as partes do centro urbano, de forma que todos os setores estivessem interligados entre si arquitetônica e urbanisticamente. No entanto, a área do centro, onde melhor se deveria reproduzir a urbanidade das cidades tradicionais, consiste numa de partes mais segregadas no que diz respeito às suas relações com o entorno. O pedestre encontra diversas dificuldades e barreiras para se locomover de um setor ao outro. O Setor Comercial Sul é talvez a parte do centro da cidade que mais se parece com a urbanidade das cidades tradicionais pela variedade de atividades que nela se localizam e pelas muitas e diversas pessoas que vão diariamente ao lugar. Entretanto, esse fluxo de usuários desaparece rapidamente nas primeiras horas da noite devido à ausência de atividades de

lazer e à extrema setorização. Além disso, o setor é separado dos seus vizinhos por vias arteriais (algumas delas semienterradas) e parques de estacionamentos que “emolduram” o conjunto de seus edifícios. Tudo isso contribui ainda mais para o isolamento desse setor das outras partes do centro, fortalecendo as marcantes descontinuidades que encontramos na área central do Plano Piloto e prejudicando a urbanidade. O setor encontra-se em na área tombada de Brasília. A Portaria nº 314, de 08 de outubro de 1992 expedida pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), assegura um caráter morfológico ao espaço que se destaca na escala de Brasília. “Artigo 7º - (...) III - Nos demais setores referidos no artigo anterior (em qual o Setor Comercial Sul se encontra) o gabarito não será uniforme, sendo que 10 nenhuma edificação poderá ultrapassar a cota máxima de 65.00m (sessenta e

cinco metros), sendo permitidos os usos indicados pela denominação dos setores de forma diversificada, ainda que se mantenham as atividades predominantes preconizadas, pelo Memorial do Plano Piloto” (IPHAN, portaria nº 314/1992, p. 3).


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Eixo Monumental Setor de diversão sul cONIC

Setor Hoteleiro Sul

Rodoviária “do Goiás”

Setor Hoteleiro Sul

hotel nacional

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pátio brasil

Quadra 6

Quadra 5

Quadra 4

Quadra 3

Setor de rádio e TV Sul hospital SArah kubitschek

s3 sul hospital de base

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300

N

Quadra 1

eixo L

Quadra 2

W3 sul

brasíla park

prédio do bradesco

eixão - Eixo Rodoviário

venâncio 2000

S2 sul

eixo W

W4 sul

te b r a p l u S l ia c r e m o Setor C

Setor bancário Sul


características gerais O Setor Comercial Sul possui aproximadamente 42 hectares e pode ser dividido em duas partes: a parte A, situado entre a via W3 e a via W4 sul, e a parte B, entre o Eixo Rodoviário e a via W3 sul. O objeto de estudo deste trabalho é apenas a parte B do setor, a qual é dividida em seis quadras comerciais, separadas por vias transversais. Esta parte é muito bem servida de equipamentos públicos, estando a 778 metros da Rodoviária do Plano Piloto, por exemplo. Não se trata de um setor apenas comercial, mas sim de um lugar onde um número variado de categorias da divisão técnica do trabalho se estabelece, complementares entre si, complementares ao trabalho doméstico e complementares, inclusive, ao trabalho político-administrativo. São serviços pincipalmente demandados pela população, que independem do caráter da cidade e que não são oferecidos diretamente pelo Estado (HOLANDA, 1985, p.46). A natureza utilitária das áreas centrais influencia a ocupação do espaço, as pessoas que nele se encontram, quase exclusivamente, encontram-se na faixa de idade economicamente ativa. Ainda assim – com exceção do período noturno – há muita vitalidade no setor.

Figura 24 - Totem criado para auxiliar na localiação do pedestre, este localizado na quadra 1. Note, em linhas tracejadas verde e laranja, os dois caminhos reformados para atender a pessoas com dificuldades de locomoção.

O setor apresenta gabaritos e densidade de usos ocupação superiores ao restante do Plano Piloto. Essa densidade, entretanto, acontece de forma verticalizada e não compacta. Apesar da alta densidade, o setor possui grandes áreas livres (cerca de 72,5% da fração total), principalmente nas laterais das quadras, formando grandes bolsões de estacionamento. São aproximadamente 38.592m² destinados a estacionamentos e 1.424 vagas, mas que não atendem à crescente de-

manda de usuários (para efeito de cálculo, consideraram-se apenas as vagas formais). O setor é configurado por quadras com blocos altos e de altura menor, conectados entre si por meio de galerias e caminhos no térreo (Figura 44), o que permite a instalação de comércios visando atender a demanda da população que lá circula, como agências bancárias, restaurantes, cafés, agências de empresas, entre outros. Os prédios foram concebidos para agrupar distintos tipos de comércio: nos andares dos seus prédios, abrigaria representações comerciais e escritórios para profissionais liberais. Já no térreo, seria composto de diversas lojas de distintos portes, com uma ampla gama de oferta de produtos, oferecendo os mais variados serviços para a população que lá circulasse, sendo esta gerada pelos escritórios localizados no setor, bem como a oriunda da plataforma central, dos setores adjacentes e da população no geral. O comércio, de maneira geral, especializou-se em atender apenas os trabalhadores do setor, o que não gera dinamismo nas atividades do térreo e não atrai novos usos opcionais, como encontros sociais ou eventos culturais. Os existentes são poucos e pouco difundidos, o que não gera um grande fluxo de pessoas para eles, como o Museu dos Correios. O funcionamento do térreo, após o horário comercial, tende a zero. Vários restaurantes funcionam apenas no horário do almoço, período com maior volume de pessoas, e fecham às 15h, os bancos enceram seus atendimentos às 16he os órgãos públicos finalizam suas atividades de atenção ao ci-

33


Setor Hoteleiro Sul

34

A primeira quadra a ser edificada na área foi à Quadra 1, com 15 andares (contando térreo e sobrelojas). Na parte térrea e sobreloja dos edifícios do setor, observamos uma grande variedade de comércio: lanchonetes, bares e até locais que fornecem empréstimos para aposentados e pensionistas. Essa quadra possui espaços amplos no nível térreo dos seus edifícios, que não ficam próximos uns dos outros - cenário que já se encontra na quadra 2, 4 e 6. As quadras de número par, como a quadra 2, apresentam prédios geminados, formando um retângulo na quadra, com os prédios do lado de fora formando uma fachada conjunta que só difere pelo estilo arquitetônico deles e apresentam um vão no meio para promover uma melhor circulação de ar e iluminação (Figuras 57 e 58). O nível térreo destas quadras promove um acesso fácil para os pedestres que lá circulam, pois apesar de algumas diferenças topográficas, estas quadras foram pensadas para promover um acesso relativamente fácil para os pedestres, com calçadas ao redor do prédio e acessos no meio das quadras, as galerias.

10.

01.

11.

Q6

S2 sul

Q5

05.

09.

03.

Q3

Q4

07.

Q2 02.

08. 06.

Q1

04.

Eixo Rodoviário

Há alguns anos os ambulantes eram figuras marcantes do lugar e estavam presentes em todas as quadras, pincipalmente nas galerias. Isso ocorria devido à grande quantidade de pessoas ali presentes, o que também favorece a ocorrência de mercado informal nos espaços abertos. No entanto, o Governo do Distrito Federal, com ações conjuntas com a Polícia Militar, retirou esse tipo de atividade de lá. Hoje, alguns “camelôs” se arriscam em meio à fiscalização para conseguir vender seus produtos.

Conic

N

W3 sul

dadão às 18h. No entanto, verificou-se que muitos edifícios particulares encerram suas atividades às 20h, podendo chegar até às 22h – a unidade do SESC gastronomia tem cursos que terminam às 22h30, por exemplo. Esses edifícios contam com seguranças particulares, para a proteção dos seus funcionários que saem de noite, com medo do vazio e das garagens subterrâneas, que inibem e desincentivam o caminho pelo térreo. Assim, é necessário fazer o resgate da vida noturna no setor para que os usuários tenham mais conforto e para que o potencial de ocupação dele seja plenamente usado.

Setor Hoteleiro Sul

12.

S 3 sul

A quadra 3 possui prédios de três andares (mais o térreo) e, na sua lateral, um espaço livre, a “Praça do Povo”, em péssimo estado de conservação, e sua ligação com a quadra é descontínua, uma vez que a praça é rebaixada em relação ao nível dos prédios. Existem várias lojas de grande porte vazias nesta quadra. A quadra 4 possui prédios de seis andares (mais o térreo) com variados usos e com as mesmas passagens no nível térreo para facilitar o acesso dos pedestres, nesta quadra ela possui várias lojas abertas voltadas para ela. Já a quadra 5 possui uma configuração ímpar, com blocos separados entre si e com apenas dois andares: loja e sobreloja. Os mesmos se conectam por passagens abertas, que se tornaram vias para pedestres, com predominância de lojas de artigos pessoais. Na beira da via que faz a divisa entre esta quadra e a 04, se encontra uma praça com um posto policial.

Os blocos B e C da quadra 05 apresentam uma divisão no meio deles, que é um espaço aberto onde se pode observar claramente as vias de acesso veiculares que Lucio Costa propôs que estivessem em um nível abaixo do nível predominantemente dos pedestres . A quadra 6 apresenta a mesma configuração da quadra 4: blocos geminados com a mesma configuração, diferenciando apenas a fachada entre cada edifício e cortados no nível do térreo por galerias para pedestres. Esta quadra se relaciona com a W3 sul, e essa relação se dá por um grande estacionamento e alguns quiosques. A parada de ônibus é um equipamento que reúne muitas pessoas e vendedores ambulantes


01.

Figura 25 - Via local que separa a quadra 1 e a quadra 2.

05.

02.

Figura 26 - Atual situação da galeria da quadra 6, sem abertura de lojas e alguns camêlos ocupam o espaço de passagem.

06.

03.

Figura 27 - Fachada dos prédios da quadra 2.

07.

04.

Figura 28 - Acesso do eixo W e Estação Galeria a Quadra 1.

08.

35

Figura 29 - Passagens entre os edifícios, com comércio no térreo.

09.

Figura 33 - Entre os prédios da quadra, muito comércio, voltado para a passagem central.

Figura 30- Relação da praça com o prédio da quadra.

10.

Figura 35 - Passagem entre Setor Comercial Sul e Setor Hoteleiro Sul, Via S2.

Figura 31- Galeria do bloco da quadra 4, uma das mais vivas, com comércio aberto para ela.

11. 07.

Figura 34 - Visual das diferentes fachadas da quadra, sem nenhuma relação entre si.

Figura 32 - Relação do nível térreo com o subsolo, ausência de proteção para o pedestre.

12.

Figura 36 - Passagem na Quadra 04.


36


Anรกlise de mapas do setor 37


Barreiras

N

38

0

50 100

200

300

400

500

Barreiras

10

2

00

3

00

40 50

0m

0m

e tr

0m s etro

m et

me

ro s

t ro s

e t ro

Cheios e vazios

s

os

N N Local Central Regional

0

50 100

200

300

Mapa de AbrangĂŞncia

N

400

500


gabarito N

1-2 pavimentos 3-6 pavimentos 7-10 pavimentos

0

11-14 pavimentos 15-20 pavimentos 46 pavimentos (Torre de TV)

200

300

400

500

Mapa de Gabarito

39

N

400

50

10

1-2 pavimentos 3-6 pavimentos 7-10 pavimentos

11-14 pavimentos 15-20 pavimentos 46 pavimentos (Torre de TV)

00

2

AbrangĂŞncia

50 100

3

00

40 50

0m

0m

e tr

0m s etro

m et

me

0

50 100

200

300

Mapa de Gabarito

ro s

t ro s

e t ro

s

os

10

2

00

3

00

40 Local Central Regional

50

0m

0m

e tr

0m s etro

m et

me

t ro s

e t ro

os

ro s

s

0

50 100

Mapa de A


uso noturno O térreo do setor funciona durante o horário comercial, uma vez que grande parte do fluxo de pessoas que passam por ele é neste período. Os prédios de escritórios e clinicas ficam abertos até às 20h, com alguns chegando até às 22h, a unidade do SESC Gastronomia mantém cursos até às 22:30, e a unidade do Ministério da Saúde que abriga pessoas com transtornos psicológicos e viciados, fica aberta até às 21h. As atividades noturnas que acontecem, com exceção das citadas acima, funcionam em dias específicos, principalmente nas quintas e sextas-feiras.

uso do solo

40

NDe maneira geral, o setor é caracterizado pelo uso comercial

10

0m se de serviços, como lanchonetes, lojas de artigos pessoas, e t r o bancos e escrítorios.

2

00

Instituição de ensino Hospitais Templos e igreja

Rodoviária Hóteis

0

50 100

00

3

Shopping Estação de mêtro Parque

200

300 m e

Mapa de Uso4Noturno 0

50

Local Central Regional

Residencial Comercial e Serviços Turismo

0m

0m

e tr

m et

r o s Dentro dessa grande setorização existem prédios institucio-

400

t ro s

e t ro

s

os

Instucional Institucional Hospitalar Institucional de Ensino

500

nais (SEGETH, INFRAERO e Ministério do Trabalho e da Saúde), culturais (Museu dos Correios e Fundação Cultura Palmares) e educacionais (SENAC, SESC e a Casa da Cultura da América Latina.

Residencial Instucional Comercial e Serviços Institucional Hospitalar Turismo Institucional de Ensino Espaços de Permanência Sistema viário 0

50 400 0 100 50 100200 200300 300 Mapa de cheios e vazios

Mapa de Abrangência

N N

Espaços de Permanência Sistema viário

500 400

500


41

Festa na garagem da quadra 3.


hierarquia viária

Figura 40 - Via W3 sul.

Figura 41 - Via S2

Figura 42 - Via S3.

42

Figura 37 - Via Local 1.

Figura 38 - Via Local 2.

Figura 39 - Via Local 3.

Figura 43 - Via Local 4.

A oeste, encontra-se a Avenida W3, via arterial importante para deslocamento norte-sul no Plano Piloto, com um grande volume de ônibus. A leste, encontra-se o início do Eixo W, via de trânsito rápido que atravessa toda a Asa Sul. Essas duas vias delimitam a parte B do setor. As vias de fluxo secundário S2 e S3 delimitam o Setor Comercial Sul ao norte e ao sul, espectivamente, e o separam do Setor Hoteleiro e do Setor Hospitalar. São vias largas que funcionam como limites visuais e físicas para o pedestres, pois precisam contornar e passar ou por bolsões de estacionamento ou por taludes para continuar a travessia entre os esses setores, que acontece em apenas alguns pontos. Internamente, as vias locais dividem o setor em quadras e dão acesso aos bolsões de estacionamento internos e às vagas os longo das vias no interior, em ambos os casos os carros mais uma vez são barreiras para o caminhar.

Figura 44 - Via Local 5.


27 8

22 0 m

Eixo R

281m

via W

3

odo viár io

Eixo L

335m 243m

242m

238 m

352m

356 m

683 m

53 2 m

Eixo W

225 m

24 8m

43

681m

30 4m

43 0m

41 0m

Rodovia Via arterial Via coletora

Via local Linha de mêtro

31 1m

0

50 100

200

Mapa Sistema Viário

300

400

500

N


Análise de Fluxos Escala Gregária

44 É possível identificar claramente um eixo de fluxos de pedestres intenso que atravessa todo o setor no sentido Leste-Oeste. A Leste, os principais pontos de origem e destino são a Rodoviária e a Estação de Metrô e, em menor grau, o Setor Bancário e Setor de Diversões Sul (Conic). A Oeste, percebe-se que o fluxo se dá em direção ao shopping Pátio Brasil e às paradas de ônibus da W3, mas dali também se pode ir para o Setor de Rádio e Televisão e Parque da Cidade. O fluxo é menos intenso, ou pelo menos mais disperso, na direção dos setores Hospitalar e Hoteleiro. A própria morfologia do setor contribui para canalizá-lo em um eixo nítido, graças às galerias internas para pedestres. O setor está bem conectado em relação aos modais quando se compara com outros pontos da cidade. Com apenas uma caminhada de 300 metros se chega ao Eixo L ou a W3. A proximidade com as duas rodoviárias do plano aumenta o fluxo de pessoas que apenas passam por ele.

As vias locais, internas tiveram seus sentidos alterados recentemente, o que favoreceu a conexão de carro entre os setores adjacentes, principalemente com o Setor Hoteleiro e as travessias de pedestres em vias locais, internas do setor receberam semáforos. Essas medidas transformaram o SCS em uma rota alternativa para se chegar a via S2 e ao Eixo Monumental. Como resultado as vias locais passaram a ter um maior fluxo de carros, que que deve ser analisado, com o decorrer do tempo de implementação, para vereficar se a rua continua com caráter local mesmo com essas modificações. A via que separa o Setor Comercial do Setor Hoteleira Sul não tem nenhum ponto de ônibus, o que pode ter contribuído para que esse lado do SCS tenha mais fachadas cegas (analisadas mais a frente) e um menor fluxo de pessoas. Nesta via, o caminhar pode ser mais perigoso devido a vários cruzamentos entre as vias e entradas de garagem.


45

Trajeto de linhas de ônibus Sentido das vias Fluxo de pedestres

Linha de mêtro Semáforo

Ponto de Bicicleta Itaú Ponto de ônibus Estação de mêtro

Conjunto Nacional CONIC Pátio Brasil

Rodoviária do Goiás Rodoviária do Plano Piloto

0

50 100

200

300

Mapa de trajetos de ônibus

400

500

N


01.

02.

Praça dos Artistas: localizada na quadra 5, é delimitada por vias, bolsão de estacionamento e pelos blocos da quadra 5 que são os únicos edifícios que possuem uma relação direta e cujas lojas abrem-se diretamente para ela; apresenta um canteiro que é um bloqueio visual para quem passa pela calçada. Praça do Postinho Policial: localizada na quadra 5, apresenta várias fachadas ativas em seu entorno, com várias unidades comerciais voltadas para seu espaço, no entanto, não estabelece uma relação direta com essas lojas, pois está em um nível mais baixo do terreno; em um de seus limites, é delimitada pelo edifício do BRB, cujas fachadas cegas não proporcionam uma boa interação.

03.

Praça do Povo: localizada na quadra 3, tem um grande bolsã ode stacionamento como um dos seu limites e está a 2 metros rebaixada em elação a galeria dos edificios da quadra e a 1 metro em comparação com a calaçada externa, o que cria uma barreira ao pedestre.

04.

Praça da quadra 1: delimitada a norte e sul pelos dois prédios do Lelé Figueiras Lima, o Edifício Morro Vermelho e o Carmago Corrêa. O oeste e leste, ela não está delimitada, o paisagismo e mobiliário que sugerem sua marcação, ela passa grande parte do dia sobreada pelos edifícios lateriais e é bem ventilada e fresca, e é longe de bolsões de carro, o que faz com que seja mais atrativa visualmente e mais confortável.

1

Praça Roberto Marinho: passa desapercebida ao pedestre, já que não apresenta nenhum limite ou mobiliário adequado que a caracterize como espaço de permanência; seus limites são bolsões de estacionamentos que dificultam a percepção do ambiente e geral uma poluição visual.

Espaço de permanência

46

2

1

05.

4

2 3

4 3

1 Praça dos Artistas 2 Praça do Posto Policial

3 Praça do Povo 4 Praça da quadra 1

As praças não constituem locais de destino. Além de não possuírem elementos que as tornem memoráveis, oferecem suporte a poucas atividades e o mobiliário urbano existente encontra-se bastante degradado. Seus limites não são bem definidos nem contíguos e, geralmente, não possuem uma relação direta com ela. De maneira geral estão todas sem manutenção adequada e não são espaços acessíveis a todos os possiveis usuários. 0 10

Praças

50

100

200

N


01. 02. 03. 04. 05.

47


Uso do Solo Lojas térreo 48

Há diferentes tipos de lojas no setor, que atendem as necessidades do dia a dia dos trabalhadores e público que o frequenta. A maioria dessas lojas funcionam somente durante o dia, de 08 às 18h, sendo que várias fecham mais cedo, como agências bancárias, que encerram às 16h e restaurantes, que só abrem para o almoço às 11h e fecham por volta das 15h. Cinemas e teatros são atividades ausentes, os edifícios culturais como, o Museu dos Correios, Fundação Zumbi dos Palmares e Casa da Cultura da América Latina, encerram às 18h e não apresentam uma interface interessante com o térreo.


49

Lojas financeiras (bancos, lotéricas, crédito pessoal) Lojas alimentação (restaurantes, lanchonetes, mercado) Lojas de saúde (clínica, famárica, laboartório) Lojas de suporte para escritórios (livrarias, papelarias, gráficas Lojas de artigo pessoal (roupas, joalherias, óticas, sapatarias) Outros (imobiliárias, turismo, elétricas, auto escola, sindicatos

Instituições (SENAC, SESC, SEGETH) Instituições culturias Cursos Boates Entradas edifícios Lojas vazias

0 10

50

100

200

Lojas do térreo

N


Bordas ativas (fachadas com transparência)

Bordas passivas (fachadas sem transparência)

Com transparências, sem barreiras visuais, o que permite as pessoas verem o que está acontecendo do lado de dentro e também o contrário. As pessoas naturalmente se reúnem ao longo dessas bordas, param para ver as vitrines e o movimento dos funcionários dentro das lojas.

Uma borda passiva, fachada cega impede trocas de informações com o térreo que vão além da informação do revestimento. Esse tipo de tratamento de fachada, geralmente, torna o caminhar monótono e pouco atraente, fazendo com que os pedestres procurarem outras rotas. Ao escurecer, lugares que não possuem portas ou janelas abrindo para ele tendem a provocar medo.

Fachadas e aberturas

50

Figura 45 - Livraria localizada na quadra 1.

Figura 46 - Livraria localizada na quadra 1.

Figura 47 - Cafés e restaurantes da quadra 1.

Figura 48 - Cafés e restaurantes da quadra 1.

A qualidade das fachadas do térreo é um fator extremamente importante na qualidade de uma área urbana. Fachadas térreas de boa qualidade são aquelas ricas em detalhes, com várias aberturas para a calçada e com transparência para que haja uma troca visual entre o exterior e interior. O caminho dos pedestres alo longo dessas fachadas é interessante, com vários estímulos e trocas de informação, as atividades dentro e fora das lojas se enriquecem e mais pessoas se interessam em passar por esses espaços. Paredes cegas, ao contrário, não geram nenhum atrativo que faça com que transeuntes se sintam instigados a caminhar por elas, já que não há troca de informações interessantes. Para se conceber uma cidade viva e atraente, uma parte importante das fachadas do piso térreo devem ser abertas, transparentes e convidativas.


51

Partes sem transparência Partes transpaêntes, permitem visualização do interior

Portas Fachadas cegas

0

50 100

200

Fachadas piso térreo

300

400

500

N


avaliação fachadas

A maior parte das fachadas tem baixa qualidade (quando analisamos os atrativos delas) dando uma sensação de pobreza visual por quase todo setor. As várias unidades superdimensionadas, e em muitas quadras, juntas, criam um ambiente monótono para o pedestre que passa em frente a elas. Muitas lojas utilizam grades e portas metálicas, que fecham por completo a fechada quando encerradas as atividades, deixando o ambiente menos atraente no período noturno. Várias fachadas sofrem com a falta de manutenção: pinturas descascadas, vidros quebrados e sinalização descuidada adicionam uma impressão de um ambiente urbano deteriorado. As fachadas cegas formam um anel na periferia do setor e contribuem ainda mais para o isolamento do SCS, em relação aos seus vizinhos, o que fortalece as marcantes descontinuidades do lugar.

52 Figura 49 - Passagem na quadra 5. Fonte: Ingrid Araújo.

Figura 53 - Livraria na quadra 1. Fonte: Ingrid Araújo.

Figura 54 - Galeria de lojas de artigo pessoal na quadra 5. Fonte: Ingrid Araújo.

Figura 50 - Fachada da quadra 4. Fonte: Ingrid Araújo.

Figura 51 - Mercado na quadra 5. Fonte: Ingrid Araújo.

Figura 52 - Loja na quadra 5. Fonte: Ingrid Araújo.

Fachada sem atratividade

Fachada com média atratividade

Fachada com alta atratividade

• Pouca ou nenhuma vida

• Poucas unidade passivas ou fechadas

• Atraente

• Grandes unidades com pouca ou nenhuma porta

• Desenho das fachadas pouco interessante

• Muitas portas

• Várias unidades fechadas e passivas

• Detalhes pobres

• Sem unidades passivas ou fechadas

• Predominância de fachadas sem atração, monótonas

• Grades

• Fronteiras suaves

• Pouco ou nenhum detalhe

• Atividades estendem-se pela calçada


53

Fachada com alta atratividade Fachada com mĂŠdia atratividade Fachada sem atratividade

0

50 100

200

300

400

Qualidade das fachadas do tĂŠrreo

500

N


300

ios

barreiras para pedestres 54

N Legenda Travessia descontínua Travessia contínua

Calçada estreita

0 10

50

100

Travessias e calçadas

Taludes

N

400

0 10

As travessias internas ao setor são feitas por faixas de pedestres com ou sem semáforos. As vias locais são tomadas por carros o que dificultam a travessia em outros pontos que não sejam os “formais”. As travessias laterais são com semáforo, poucas não apresentam algum tipo de interrupção (bolsões de estacionamento ou via), nota-se que o posicionamento delas, não levou em consideração o deslocamento do pedestre, e sim, os cruzamentos e retornos das vias. Vários passeio estão danificados e são estreitos, dificultando o livre caminhar.

N 50

100

500 Travessias e calçadas

200

200


55

N 0 10

50

100

Bolsões de estacionamento

200

Bolsões de estacionamento

Taludes e arrimos

Há grandes bolsões, principalmente nas laterais, o que contribui para segregar ainda mais o SCS em relação aos demais setores. Não importa o tamanho da área destinada para carro (vias e estacionamentos), ela nunca será suficiente, quanto mais espaço damos aos carros mais carros vêm ocupar esse espaço, gerando uma demanda infinita. Assim, faz-se necessário repensar a destinação de grandes áreas centrais para automóveis particulares, que ao reduzir-se esse espaço, teremos melhoras no microclima do lugar, nos espaços para pedestres e na dinâmica das atividades como um todo.

Estão localizados em sua maioria nas bordas, o que evidencia a desconexão, para pedestre, existente entre os setores do centro. Também existem como forma de resolver o desnível do terreno nas entradas para o subsolo. No interior do SCS, existem muitos desníveis que são resolvidos com escadas e rampas.

0 10

50

100

Taludes, arrimos e desníveis

N

2


Análise de Fluxos Escala do pedestre 56 O fluxo Leste-Oeste é muito forte, o que é reforçado pela configuração das galerias internas das quadras, que proporcionam um caminhar, em sua maior parte, protegido do sol e chuva. Esse eixo de deslocamento une fluxos vindos, principalmente, da estação galeria, rodoviária, eixo L e via W3 sul, servem de conexão para várias partes centrais da cidade. Ele distribui e recebe as pessoas que vem transversalmente pelos caminhos do setor, entre as quadras e as pessoas vindas dos setores laterais, como as vindas do Setor Hospitalar. A Estação Galeria e a Rodoviária (que está a aproximadamente 700 metros) são os pontos de origem e fim de deslocamentos. Por ser um lugar com muita porcentagem de área livre sem construção, permite variadas possibilidades de deslocamento. Essa liberdade de escolha de caminhos aparece quando percebemos em mapas a quantidade de espaço destinado para o deslocamento do pedestre, mas, quando vamos ao setor, vemos que esses espaços em diversos obstáculos, como a qualidade dos passeios e a falta de medidas que os tornem

acessíveis, os taludes que impedem a passagem em vários pontos e a quantidade de carros parados em lugares impróprios, os bolsões de estacionamento, e, o ápice, carros parados nas calçadas. Essa tomada do setor pelos carros impede a travessia continua e direta, mostrando que na realidade esse espaço é dos carros e não dos pedestres. Os caminhos internos costumam ser sombreados pelos edifícios, mas mesmo assim a sensação de calor é muito grande, devido a porcentagem de área pavimentada e a quantidade grande de carros. Os pontos de ônibus são importantes pontos de atração e dispersão de pessoas que chegam e vão embora dessa parte central do Plano Piloto. Por esse motivo e junto a outros fatores (taludes, fachadas cegas) o lado do Setor Hoteleiro não tem um fluxo muito grande de pessoas em comparação com a outra via que delimita o SCS. Os novos pontos de bicicleta do Itaú também contribuem para um novo fluxo de pessoas.


57

Ponto de Bicicleta do Itaú

Pontos de ônibus

Estação Galeria: mêtro e ponto de ônibus

Fluxo de Pedestres 0 10

50

Fluxo de pedestres

100

200

N


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A Pesquisa da Imagem Algumas questões foram levantadas no início desta pesquisa referentes a leitura do usuário e observador com o espaço de Setor Comercial Sul. Entre elas a preocupação maior se situou na imagem do setor, o que ele transmite para seus usuários, e a imaginabilidade e a legibilidade de lá. É importante para o projeto aferir o que as pessoas assimilam desse ambiente. Uma vez que o desenvolvimento da imagem é um processo interativo entre observador e coisa observada, é possível reforçar a imagem tanto através de artifícios simbólicos e do reaprendizado de quem a percebe como através de reformulação. (LYNCH, 2006, p.12) Na vivência da autora deste estudo, viu-se que o setor carecia de uma identidade única e marcante, que pudesse dar uma identidade ao lugar e a legibilidade parecia muito falha, era difícil o reconhecimento do espaço e o deslocamento dentro dele. Apesar da experiência como técnica, era preciso averiguar se os usuários do espaço concordavam ou discordavam com as impressões já assimiladas. Para isso foi proposta uma entrevista com base na pesquisa feita por Kevin Lynch em seu livro “A Imagem Da Cidade”. Essas entrevistas foram no próprio setor, com trabalhadores das quadras de 1 a 6 em dois dias distintos, quarta e quinta pela tarde (dois entrevistados eram conhecidos meus e pude entrevista-los em outro horário). Ela teve um caráter exploratório, para, como foi dito, averiguar as minhas impressões quanto a imagem e da legibilidade. As perguntas e os mapas resultantes dela estão no final deste plano, no Anexo II. Ao todo 13 pessoas participaram, a maioria tem o segundo grau completo e ganha até 2 mil reais, já a faixa etária variou bastante, de 21 até 67 anos, com 4 pessoas no intervalo de 25 a 30 anos, nenhum dos entrevistados mora no Plano Piloto, e sim nas Regiões Administrativas (4 moram no Guará) e duas em cidades do estado de Goiás, Girassol e Valparaíso. De maneira geral todos os entrevistados foram bem receptivos às perguntas, buscou-se aqueles que trabalhavam em áreas mais interessantes do ponto de vista da localização dentro do setor, por exemplo, uma comerciante que trabalha na quadra 1, a quadra mais bem configurada e mais conservada de lá e uma comerciante, dentro de uma galeria em um prédio na q uadra 5, cuja frente se abre para um prédio com fachada cega. Primeiro levantou-se o perfil do entrevistado, grau de escolaridade, idade, renda, naturalidade e local de moradia, em seguida, as perguntas, como esta: o que vem à mente quando você escuta Setor Comercial Sul. Com essa pergunta interessava saber o que as pessoas guardavam no seu imaginário sobre o Setor. Infelizmente, mas já esperado, as pessoas citavam coisas ruins, como muita sujeira, perigo, medo, bagunça e feio; algumas iam para um lado mais prático e falavam palavra como trabalho; poucas disseram prédios e um "lugar que se resolve tudo".

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Outra pergunta era se o setor poderia ser considerado o centro de Brasília. Parecia que as pessoas nunca tinham pensado a respeito, como se esse conceito de centro aqui em Brasília fosse difícil de se imaginar. A maioria considerava que sim, ou pelo fato de reunir muitas atividades em um mesmo lugar, ou por ser seu lugar de trabalho, ou pelo histórico do setor, que no passado já foi um convergente de todos os bancos da cidade, de órgãos do governo e de um comercio mais variado. Algumas respostas consideravam o centro como sendo a Escala Monumental, com a Esplanada dos Ministérios, o Congresso Nacional, a Catedral e os Palácios. Essa resposta foi uma que mais chamou atenção, porque coloca o centro da cidade como algo contemplativo em vez de se aproximar do conceito de centro de uma cidade tradicional.

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Metade dos entrevistados vão ao setor de carro, porque de ônibus leva mais do que o dobro de tempo para chegar em seu trabalho. Os que vão de transporte público relataram que tinham muitas opções de caminham e que escolhiam a que lhes era mais rápida, muitas vezes essa opção era parando mais longe do setor e ir caminhando, como, por exemplo, descer na Rodoviária ou no Banco Central no Eixinho. Todos comentam sobre a quantidade de estacionamento no Setor, mas nenhuma vez alguém mencionou sobre a possibilidade de se retirar alguns para que o ambiente ficasse melhor para os pedestres, todos vêm a necessidade de se criar mais estacionamentos para resolver o problema da falta de vagas que causa barulho e até brigas no local. Parte da entrevista consistia em desenhar um mapa do Setor com todas as características que eles lembrassem, aquilo que eles julgassem necessário para se locomover por lá. A grande maioria dos desenhos não conseguir mostrar desenhar todas as quadras, só mostravam as mais próximas ao trabalho ou que costumam ir para tomar um café, por exemplo. Apenas uma das pessoas desenhou todas as quadras, mas sem levar em consideração a forma dos edifícios. Quase todos os entrevistados fizeram uso das vias como limites para o setor, inclusive a maioria começou o mapa a partir das vias (a W3 Sul foi a mais desenhada). Notou-se que as pessoas que apenas usavam o carro para se locomover para

lá não desenharam as proximidades e os setores ou prédios adjacentes, já as que se locomoviam de ônibus tinham uma visão muito mais ampla e incluíam o Setor Hospitalar, o Conic e a estação do metrô. Outra questão observada foi a que os prédios foram associados ao tipo de serviço que ele oferece, por exemplo: o prédio das Lojas Americanas, o prédio do SENAC ou do Banco Bradesco. Comum a quase todos os desenhos foram o ordenamento e ritmo dado aos edifícios do SCS, todos seguiam a ordem das quadras e se posicionavam dessa forma; um caminho linear representando o trajeto que vai desde a parada de ônibus W3 sul, passando pelas galerias centrais até o ponto do metrô no final da quadra 1; a estrutura viária delimitando as quadras; e a ordem com que os desenhos eram feitos, primeiro as vias e posteriormente as quadras desenhadas em ordem crescente ou decrescente. Dois mapas foram mais distintos do resto. Uma das entrevistadas colocou em seu desenho pessoas e ao desenhá-las separou os “mendigos” e “craquentos” dos outros transeuntes, desenhou muitas árvores e muito lixo. Nenhum dos entrevistados reclamou de calor excessivo ou frio. Um dos entrevistados mencionou que gostava de onde trabalhava, um quiosque na quadra 1, pois lá ele podia ver o céu. Nos desenhos apenas duas pessoas se preocuparam em desenhar árvores, uma delas citou que o som das galerias lhe era agradável agora que estavam sem os camelos. Muitos reclamaram do cheiro de lixo e do barulho constante de carros. A insegurança era um dos itens mais falados. Todos concordaram que o Setor Comercial Sul era perigoso inclusive no período diurno, e consideravam que a insegurança vinha da quantidade de moradores de rua e viciados em droga que lá existem. A quadra 5, que abriga o chamado “buraco do rato” é considerado um dos piores lugares, por abrigar muitos moradores de rua, viciados e ser um depósito de lixo. O caminho até a rodoviária, por exemplo, também foi apontado como um lugar de extrema vulnerabilidade.


Todos consideravam que seu deslocamento no setor era razoável, não achavam que caminhavam muito e sabiam se localizar. Tudo o que precisam ao longo do dia, como um restaurante ou papelaria podia ser encontrada em sua própria quadra, e com a experiência do dia-a-dia já sabiam encontrar endereços e serviços por lá. No entanto, admitiam que é muito difícil localizar-se, os endereços são confusos e não existem muitas placas que direcionam o transeunte, os comércios acabem virando pontos de informação.

Figura 56 - Visual de quem chega ao início da W3 sul, a esquerda o Pátio Brasil e a direita a quadra 6. Fonte: adaptado do Google Maps.

Pode-se dizer que as referências do Setor, principalmente na área B analisada, na questão de imagem e de marco, são externas a ele, como o prédio do Banco BRB (Setor Bancário Norte) e o Pátio Brasil (faz parte do Setor, mas não da área analisada). Mesmo assim, parecia que as pessoas não tinham noção do que era o Setor, nem quais eram os seus limites e elementos. Duas moças que foram entrevistadas cse destacaram por terem uma visão mais amena do setor. Uma que conseguiu construir uma sensação afetiva por sempre passear por lá a procura de alguma loja específico e por isso quando foi trabalhar por lá conseguiu ver o “lado bom” do lugar e outra que nunca tinha ido ao Setor antes de começar seu trabalho e não carregava um estigma, por isso para ela tudo parecia bom, em termos de segurança por sempre estar acompanhada por amigos, ficando por lá até por voltar de 20h e às vezes participa do "pagode" que acontece em um bar às sextas de noite. Um entrevistado foi um sargento da Policia Militar do posto segurança na quadra 4, é um dos poucos lugares com uma pouco mais de cuidado com a manutenção do espaço ao redor. O policial comentou que antigamente tinham no local algo em torno de 70 ocorrências de delitos por mês, hoje esse número gira em torne de 20, devido a ronda rotineira e ininterrupta da força militar (apesar de vários comerciantes comentarem que nunca veem os policiais fazendo a ronda).

Figura 55 - Mapa representando apenas a quadra 5, local onde a entrevistada trabalha.

Figura 57 - Mapa que inclui elementos externos, caminho longitudinal e ritmo dos prédios

Para a corporação policial, o trabalho de ronda extensiva no lugar é essencial, uma vez que o setor, segundo ele, é perigoso em todos os seus aspectos e as galerias subterrâneas são um grande problema, marginalizadas até no período diurno.

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A entrevista seguiu para as galerias subterrâneas, até o “buraco do rato”, onde no período noturno, visualizou-se a decadência, a sujeira, o fedor e a falta de manutenção (descrição mais completa no Anexo I). Durante o dia essas características ficaram mais evidentes. Mesmo de tarde já havia alguns usuários de drogas sentados pelo caminho e muito lixo, de latinhas usadas par consumo de crack até fezes humanas. Barras metálicas foram colocadas lá para dar segurança contra arrombamentos às lojas do subsolo e impedir que pessoas sentem ou deitam na calçada. Lá existem uma distribuidora de bebidas que funciona pela noite, que segundo ele é um chamariz para os moradores de rua e os viciados, alguns restaurantes e uma sauna gay que funciona de noite com um acesso restrito.

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Para a entrevista, tirei fotos das áreas próximas ao “buraco do rato” e não percebi que ao fundo de onde as tirava tinha um grupo de moradores de ruas, alguns já havia encontrado pela noite (Anexo I), que se sentiram incomodados com o fato de eu estar tirando fotos deles. O policial percebeu o incomodo e os chamou para explicar o proposito das fotos. Um deles explicou estavam se sentindo humilhados, que mesmo sendo “mendigos” não podia tirar fotos deles assim, feito “bicho”. É importante mostrar que esse grupo da sociedade também é gente, também tem um sendo de identidade que muitas vezes foi tirado pela sociedade que os marginaliza e os generaliza, como algo a ser evitado e até mesmo exterminado.

Figura 58 - Observe a quantida de informação no desenho, pessoas, lixo, “craquentos, “mendigos”, praças e árvores

É válido acrescentar que a minha sensação de segurança só foi abalada quando me vi andando do lado de um policial, que representa para muitos daquele setor uma instituição opressora e inimiga. Ao lado dele me senti notada por todos e de certa forma marcada.

Figura 60 - Entrada do “Buraco do rato”.

Figura 59 - Vista até o prédio do Bradesco.

Figura 61- Corredor do “buraco do rato”, tomada por grafite.


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alq uiv ir ua d Ri oG

ESTUDO DE CASO

Bairro Macarena

Sevilha

64 Figura 62- Localização do casco histórico, note a diferença de desenho entre a parte medieval e a outra, mais contemporânea. Em amarelo a Alameda de Hércules e em rosa estão marcados os espaços públicos, sejam eles praças ou pontos turísticos. Fonte: adaptado do Google Maps.

O estudo de caso escolhido também passou por um processo de decadência só conseguiu vencer essa fase com um consistente projeto de intervenção urbana com forte interesse municipal e participação da comunidade. O processo de decadência se assemelha muito com a atual situação do Setor Comercial Sul, que ao invés de se investir em uma proposta profunda de reestruturação do espaço, ainda nos preocupamos com a quantidade de vagas para carros particulares. Devemos aprender com esses exemplos semelhantes, que tiveram um resultado positivo de urbanidade após muitos anos de projetos e uma serie de intervenções sem consistência.

Metropol Parasol

Figura 63 - Proximidade dos espaços comuns. Fonte: adaptado do Google Maps.


Alameda de Hércules É uma importante praça pública situada no centro histórico de Sevilha, com 37 mil metros quadrados. Sua formação data do ano de 1574 e é considerada a primeira praça pública da Europa. No centro antigo, é o espaço público mais antigo e se encontra no extremo norte da antiga cidade murada, cerca do rio Guadalquivir e próximo ao bairro Macarena. Sevilla, como grande parte das cidades do mundo que margeiam grandes rios, sofreu durante muitos anos com problemas de enchentes. A Alameda foi profundamente mudada para resolver essa questão e para atender as necessidades da população residente. As origens do lugar remontam a existência de um braço do rio, absorvido paulatinamente pelo crescimento da cidade e que estava em processo de secamento. Esse rio cortava grande parte da área da cidade e que, hoje, essa área representa importantes ruas e bairros do casco histórico. Até 1574, a Alameda era uma lagoa. O terreno, depois do desaparecimento da lagoa, ficou muito pantanoso. Demorou anos para que o completo saneamento do bairro fosse feito, as obras consistiram em valas de drenagens que levavam a água de volta para o rio. Uma vez terminadas, o rei da Espanha contratou um arquiteto para que fosse construída a Alameda. Logo o lugar se configurou como um ponto de encontro e passagem para os sevilhanos. Mesmo com essas obras o lugar continuou a alagar até o século XX, quando obras mais profundas de infraestrutura foram realizadas. Em um dos extremos da praça foram colocadas duas colunas romanas com capitéis coríntios, uma delas sustenta Hércules (fundador místico da cidade) e Júlio César (fechou as muralhas da cidade por considera-la importante). As duas esculturas se assentam sobre os capitéis, que as dá um caráter monumental de grande esbeltes. Figura 64- Braço de rio que foi secando até dá lugar a cidade que hoje apresenta o desenho da imagem. Fonte: livro La Alameda de Hércules y el centro urbano de Sevilla: hacia um riequilibrio del Centro Antiguo, de José León Vela.

Em 1864, viu-se a necessidade de se embelezar a já consolidada alameda, colocando novas fontes, bancos e melhorando o ajardinamento. Outras duas outras colunas foram colocadas na extremidade oposta as já existentes, estas elevam leões, marcando uma linearidade do caminho e servindo como reforçadores dos marcos visuais. Até o século XX, a praça foi o ponto de desenvolvimento do social, onde se podia beber, jogar, correr de touros, celebras festas religiosas e uma das atividades que mais marcaram a praça: cantar e danças as sevilhanas. Os anos de ouro da praça foram as décadas de 1920 e 30, onde lá reunia o todas as assembleias, todo o movimento assalariado operário anarquista, que giravam em torno de uma classe mais popular. Lá era o reduto da frente popular da cidade (SALAS, 2012). A vida diurna da Alameda era familiar, comércio e restaurantes funcionando, pessoas transitando, convício social acontecendo. A noite era alegre, com muitas atividades, que abraçavam qualquer gosto, era tudo muito plural, com muitos bares e quiosques. Durante anos foi considerado o lugar do flamenco sevilhano, onde muitos interpretes saíram dali. Com certeza, era o sitio mais boêmio da cidade, lugar que reunia artistas (SALAS, 2012).

Figura 65- Os alagamentos da Alameda foram constantes durantes muitos anos, esta em 1849. Fonte: adaptado do vídeo Un paseo por la Alameda

Junto com essa efervescência urbana, a prostituição fazia parte do cotidiano das casas lindeiras a praça. Vários apartamentos eram alugados para essa atividade. A prefeitura com a intenção de tolher essas atividades noturnas, derrubou os quiosques

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de bebidas, em 1947 e 1948, quando entãodeu-se o início a decadência. Junto a isso, novos pontos de encontro e novos espaços públicos foram construídos da cidade, deixando a Alameda em segundo plano sem um público frequente. O comercio, que antes era variado, caiu e a área começou a se deteriorar, ocorreu a perda do controle social O lugar passou a ser ocupados pelos adjetos, travestis, prostitutas e o tráfico de drogas tomaram conta do espaço. Os moradores se mudaram dali fugindo da decadência e do entorno social agressivo. O ponto alto dessa fase foi a década de 1980, com mais de 70 prostíbulos, pontos de drogas e muito estigma. Os habitantes restantes eram de classes muito baixas e ocupavam casas sem manutenção, muitas estavam vazias (DÍAZ, 2012). Fisicamente, o lugar passou por enumeras reformas: em 1936,

Figura 66 - Praça em 1935. Fonte: Blog ABC de Sevilla

Figura 67 - 1965. Fonte: Ayuntamiento de Sevilla.

abriram novas vias laterais para carros e passeios transversais que dividiam o lugar em três setores; em 2001, se instalaram quiosques de bebidas em estilo neorromântico. Mas o resultado dessas intervenções parciais e desconexas o ponto turístico perdeu seu caráter unitário e seu esplendor inicial. Ao final, o ambiente estava em desuso, e a fragmentação do espaço gerava confusão nos usos e deixava a ocupação caótica, com bares e carros ocupando o espaço de maneira desordenada.

tria cultural. Várias camadas da população foram retiradas de lá, para dar lugar a zona de ócio da cidade de Sevilla. A maioria dos investimentos são restaurante, bares e boates, que agradam a qualquer gosto. Os lugares mais tradicionais se mantem com apoio governamental,

A intervenção do Estado foi fundamental para a busca de um lugar seguro e atrativo. Em 1992, iniciou-se a desmantelação dos prostibulos e os pontos de drogas, o policiamento passou a ser mais presente, com um ponto de atendimento à comunidade. Várias políticas de incentivo aos proprietários de comércio e de habitações foram lançadas, junto com fomento para os empresários de pequenos negócios e à indús-

A grande obra veio, em 2008, com o lema “La alameda que te gusta”, levou em consideração as demandas dos cidadãos a respeito do espaço público e com uma grande obra de infraestrutura. A intervenção teve diretrizes como o replantio de árvores originárias da Andaluzia, acostumadas com o rigoroso verão, com o respeito as árvores mais velhas que já estavam lá; a pavimentação foi feita com um desenho de bloquetes únicos, com a mesma coloração da terra batida antiga, seu desenho facilitou o acomodamento a topografia da praça; a maior parte do espaço é peatonal, deixando os caros restritos apenas a duas vias laterais de mão única e sem estacio-


namentos, a pavimentação é única, tanto para os pedestres quanto para os carros; novos quiosques foram construídos juntamente com grandes pérgulas de concreto em forma de T com painéis de alumínios pintado, abaixo delas e perto dos quiosques um espaço de permanência foi configurado com parquinhos para crianças e bancos de concreto pré-fabricado. A intervenção que mais chama atenção são as três fontes, configuradas por aspersores no chão, localizadas nos extremos e no centro da alameda. Elas receberam um tratamento de piso diferenciado com bloquetes azuis antiderrapantes, que reproduzem no plano do solo desenhos que marcam a presença de água. Elas são o grande atrativo diurno que criam um microclima fresco e servem de brincadeira para crianças e adultos. Além disso, remetem a história do lugar, que sempre teve uma relação com a água, seja com inundações ou com fontes mais tradicionais.

Figura 69 - Os desenhos no piso que marcam as fontes trazem expressividadde e unidade para a Alameda. Fonte: Site Public Space, Alameda de Hércules.

Figura 68 - No desenho da fonte central forma dois números: 1574, o ano de criação da praça, e 2007, ano que se iniciou a última remodelação do espaço. Fonte: Site Public Space, Alameda de Hércules.

Figura 70 - A boemia sevilhana se reune na Alameda de Hércules para passar a noite entre cervejas e tapas. Fonte: Blog Ciao for now.

Figura 71 - Performance artística na alameda pela noite, o lugar passou a ser sinônimo da diversidade de ideias e de artistas. Fonte: alamedeando2010. wordpress.com

Com essa última intervenção, a Alameda de Hércules pode recuperar a urbanidade de tempos passados, sem renunciar o uso da linguagem contemporânea, ou da história do lugar. Problemas intrínsecos da região como o forte sol e calor, foram combatidos com sombras de árvores de grande porte, aspersores e pérgulas. Os novos quiosques conversam quase que de forma irônica com os neorromânticos do passado, integrando e diluindo a presença forte deles. A volta da unidade do espaço foi dada com o uso do mesmo tipo de bloquete e de cor para toda a área incluindo as vias para carros, e liberou-se o passeio das barreiras arquitetônicas e de obstáculos, dando continuidade para o todo. Por fim, graças a expressividade dos desenhos azuis e brancos que marcam as fontes contemporâneas, o espaço ganhou unidade e convertendo-se em um espaço fluido e novo.

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diagnóstico do objeto de estudo Programa de necessidades Cada reflexão sobre o espaço existe uma dimensão ou aspecto de análise, pelas quais podemos descrever e avaliar o espaço. Não se pode simplesmente avaliar um lugar como bom ou ruim sem se especificar a que dimensão se refere.

Considerou-se o Setor Comercial Sul em todas as suas dimensões. A partir dos dados obtidos na pesquisa de campo e, juntamente com a pesquisa da imagem, cada dimensão foi analisada e a partir disso uma diretriz foi proposta de acordo com as dimensões investigadas no diagnóstico do objeto. Estas serão usadas como norte nas tomadas de decisão para se atingir os objetivos do projeto.

Dimensão Bioclimática: o lugar implica condições adequadas de iluminação, acústica, temperatura, umidade, velocidade do vento e qualidade do ar?

Dimensão econômica: os custos de implantação, manutenção e uso dos lugares são compatíveis com poder aquisitivo das pessoas implicadas? Dimensão Funcional: o lugar satisfaz as exigências práticas da vida cotidiana em termos de tipo e quantidade de espaços para as atividades e seus relacionamentos? Dimensão sociológica: a configuração arquitetônica (vazio e cheios) implica em maneiras desejáveis de indivíduos e grupos de localizarem-se nos lugares, de moverem-se por eles e consequentemente ter condições desejadas para encontros e esquivanças interpessoais e para visibilidade do outro? O tipo, a quantidade e a localização relativa das atividades implicam desejáveis padrões de utilização dos lugares no espaço e no tempo? Dimensão topoceptiva: como se dá a percepção do lugar mediante estímulos visuais que dele advém? Sua identidade permite a formação de uma imagem clara, facilmente memorável? Como é a orientação? Encontramos o caminho sem dificuldades? Dimensão simbólica: o lugar é rico em elementos arquitetônicos que remetem a outros elementos, maiores que o lugar, ou a elementos de natureza diversa – valores, ideias, história? Dimensão afetiva: o lugar tem uma personalidade afetiva desejável? Ele é abandonado ou bem cuidado, seguro ou perigoso, interessante ou desinteressante, claro ou confuso, estático ou dinâmico, frio ou aconchegante, banal ou especial? Dimensão estética: o lugar é belo, há características de um todo estruturado e qualidades de simplicidade ou complexidade, igualdade ou dominância , similaridade ou diferença? O lugar é uma obra de arte por veicular uma visão de mundo? Sua configuração implica uma filosofia? (HOLANDA, 2010, p. 27 e 28).

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Bioclimática A existência de grandes superfícies impermeáveis reduz a umidade relativa do ar e eleva as temperaturas devido à absorção de calor pelas áreas asfaltadas e edificadas. Os materiais predominantes, o asfalto e concreto, prejudicam a absorção de ruídos e aumenta a absorção e liberação de calor durante o dia, o que resulta em um desconforto térmico para os pedestres que ali passam. A lataria de carros tem uma grande refletância, isso gera um incômodo muito grande para o pedestre, as fachadas de edifícios com superfícies espelhadas também contribuem para esse desconforto. Apesar da diversidade de alturas dos edifícios do setor, o local possui baixo índice de rugosidade, pois os edifícios de mesma altura estão dispostos de forma concentrada. Isso contribui para temperaturas mais elevadas, pois minimiza o potencial das trocas térmicas com o ar. Ao mesmo tempo, essa grande massa de prédios altos contribui para a sombra de grandes áreas, que muitas vezes não são aproveitadas lugares de permanência. Vários caminhos protegidos de chuva e sol são possíveis.

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Área asfaltada

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Mapa de Gabarito 1-2 pavimentos 3-6 pavimentos 7-10 pavimentos

11-14 pavimentos 15-20 pavimentos 46 pavimentos (Torre de TV)

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Áreas verdes

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1-2 pavimentos 3-6 pavimentos 7-10 pavimentos 1-2 pavimentos 3-6 pavimentos 7-10 pavimentos

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Áreas asfaltadas

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11-14 pavimentos 15-20 pavimentos 46 pavimentos (Torre de TV) 300

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Mapa de Gabarito 0

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Mapa de Gabarito

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Econômica A predominância de áreas livres e sistema viário sobre áreas privadas gera um maior custo de implantação e manutenção. Há uma desvalorização imobiliária na área devido degeneração e ao estigma que o Setor Comercial Sul carrega na atualidade, e devido a conjuntura econômica do país. Várias lojas estão fechadas, principalmente as de maior área, e os altos alugueis não contribuem para a ocupação dessas lojas.

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Fachadas térreo Partes sem transparência Partes sem transparência Partes transpaêntes, permitem visualização do interior Partes transpaêntes, permitem visualização do interior

1-2 pavimentos 3-6 pavimentos 7-10 pavimentos

Partes sem transparência Partes transpaêntes, permitem visualização do interior

Portas Fachadas cegas

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Fachadas piso térreo

Fachadas piso térreo

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11-14 pavimentos 15-20 pavimentos 46 pavimentos (Torre de TV)

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Portas Fachadas cegas

Partes sem transparência Partes transpaêntes, permitem visualização do interior Portas N Fachadas cegas 0 50 100 200 300 400 500

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Mapa de Gabarito

Estética

Para muitas pessoas o conceito de belo está ligado com as noções de boa manutenção, de algo novo e limpo. O Setor Comercial Sul é o oposto desse conceito, sua arquitetura e espaços públicos estão malcuidados e poluídos, com calçadas e mobiliário quebrados e praças também em péssimo estado de conservação. Comparativamente com outros setores de Brasília, este deve ser com a melhor configuração e estruturação, que são simples e tentam colocar em igualdade os espaços. Mesmo assim o espaço peca, ao não cuidar do espaço protegendo o pedestre e colocando o carro como principal presença, relação analisada pela quantidade de área asfaltada em detrimento de áreas de permanência para as pessoas. Figura 72 - Praça quadra 3, falta de manutençõ na fachada do edifício e na praça.

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Fachadas piso térreo

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Funcional Observa-se grandes descontinuidades entre o Setor Comercial Sul e os setores adjacentes, o pedestre tem que atravessar grandes barreiras para chegar a outros pontos próximos. A via W3 é uma barreira de carros com um curto tempo de travessia controlado pelo semáforo, e possui cruzamentos desconfortáveis e apressados, que termina no Pátio Brasil com uma barreira de ônibus parados al longo da faixa. O caminho para a rodoviária é razoável, existem calçadas ao longo de todo percurso, mas é desinteressante e não acompanha o desenha natural dos pedestres, os caminhos de desejo marcados no solo. A via S2, semienterrada, que divide o Setor Comercial Sul e o Setor Hoteleiro, também constitui uma grande barreira, com taludes muito íngremes, com poucas escadas para vencê-los. A ligação com Setor Hospitalar não é melhor, há uma extensa e larga faixa de estacionamento entre os setores, com duas vias que só permitem travessias com segurança aos pedestres, em dois pontos em meio a bolsões de estacionamento. O sistema viário é superdimensionado, há grandes bolsões de estacionamento, os quais segregam os espaços e dificultam a mobilidade do pedestre. Apesar de grandes áreas destinadas a estacionamento, estas não são suficientes para suprir a crescente demanda por vaga, com isso, os carros param de forma irregular ao longo das vias e ocupam espaços que deveriam ser dos pedestres. As calçadas, em sua maioria, não são acessíveis: são estreitas e danificadas, apenas duas rotas foram feitas atendendo às normas de acessibilidade: a longitudinal que passa pelas galerias e uma lateral que liga ao Setor Hospitalar. 72

Figura 73 - Um espaço cego entre as quadras 1 e 2, na periferia das quadras.

As quadras, de maneira geral, são permeáveis ao pedestre, os edifícios possuem galerias transversais internas que criam um caminho que cruza o setor no sentido longitudinal. As fachadas cegas, encontradas nas bordas do setor, contribuem para um isolamento, que fortalece as marcantes descontinuidades que encontramos na área central. O tratamento das calçadas nas bordas do setor também é muito ruim, com calçadas estreitas e interrompidas por constantes entrada e saída de carros, sem algum tipo de sinalização que proteja o pedestre. A interface entre as quadras é muito ruim e precária. Os degraus existentes para vencer os desníveis entre uma quadra e outra deixam de ser uma zona de transição e passam a constituir uma barreira, devido a qualidade do passeio, segregando os espaços. As calçadas de dentro do setor também não são muito confortáveis aos pedestres, estão em ruim estado de conservação e não atendem as normas de acessibilidade. As praças apresentam desníveis e escadas e não tem mobiliário adequado ou com alguma manutenção.

Figura 74 - Cruzamento da S2 sul com a W3 sul, a direita se encontra o SCS. Fonte: adaptado Google Maps.

No subsolo, as lojas fecharam as aberturas para ele, e muitas vezes cercaram com grades a calçada em frente as entradas. A manutenção desse espaço é quase nula e é ocupado por carros estacionados de maneira desordenada e moradores de rua, não há um grande fluxo de pedestres.

Figura 75 - Setor Hospitalar Sul, a esquerda, e a quadra 3, a direita. Em frente do prédio da INFRAERO (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária) outro bolsão de estacionamentos, que não oferece nenhum diálogo que concte esses dois setores. Fonte: adaptado do Google Maps.


Sociológica As ruas que unem os setores adjacentes, não foram projetadas como uma unidade. A experiência ao se andar pela calçada do Setor Hoteleiro, ou Setor Hospitalar, é uma, enquanto a do Setor Comercial Sul é outra, mesmo se tratando da mesma rua. Assim, o pedestre não visualiza uma conexão entre eles e a isso se adiciona o fato que a travessia estre eles é uma disputa por espaço com carros, e, de maneira geral, andar por essas calçadas e travessias não é confortável ou atrativo. O caminho até a Rodoviária, como já foi dito, é muito desinteressante e centenas de pessoas o utilizam diariamente . O fluxo de pessoas, durante o horário comercial, é sempre constante. No entanto, esse fluxo está apenas de passagem pelo lugar, não usufruindo dos lugares de permanência. As praças constituem locais de passagem e não de destino, poucas pessoas as utilizam, sendo um uso restrito a quem trabalha lá. Os quiosques de comida são o serviço que mais agrega pessoas em seu entorno e mesmo estando perto de praças, não é o bastante para que os clientes dos quiosques as utilizem devido ao seu péssimo estado de conservação e a sua configuração e desenho, como verificado no estudo de APO das alunas Caroline Nogueira e Jéssica de Morais. Duas das três praças do setor, a Praça dos Artistas e a Praça do Povo, possuem desníveis que dificultam o acesso e até mesmo visualizar que ali se encontra uma praça. Crianças e idosos não fazem parte do público e é raro ver mulheres desacompanhadas permanecendo nos lugares abertos, devido aos poucos olhos que se voltam aos espaços abertos. Existem vários espaços no setor com fachadas cegas e comércio que não se abre para o térreo. As áreas livres, muitas vezes por não estarem bem delimitadas e não exerceram uma função bem definida, acabam por formar espaços abandonados ou bolsões informais de estacionamento. O uso noturno do térreo é quase nulo, restrito às entradas dos edifícios, alguns bares e a unidade de SENAC que oferece cursos noturnos. O lugar se torna deserto e a utilização do espaço se torna nula, deixando o setor estigmatizado. As paradas de ônibus são abandonadas de qualquer equipamento que lhes dê algum tipo de vida e que torne mais agradável e que favoreça a permanência desses usuários dessa atividade necessária.

Figura 78 - Espaço que tentou se configurar como uma praça com um pouco mais de "verde", no entanto é sempre vazio e sem atrativos.

Figura 76 - Pela noite esses espaços viram grandes vazios subutilizados.

Figura 77 - Toda área de estacionamento é asfaltada, resultando em grandes áreas impermeáveis.

73


Topoceptiva É possível entender a divisão das diversas quadras que compõem o setor, por meio das vias locais que as delimitam, a cada rua uma quadra diferente. A diferença de gabarito em algumas quadras contribui para uma melhor distinção delas, e as galerias internas dos edifícios formam um caminho que atravessa todo o setor, facilitando um pouco a orientação. Apesar disso, localizar-se no setor é uma tarefa muito difícil, a arquitetura dos prédios, com exceção a alguns elementos na quadra 1, é muito semelhante, não criando marcos na paisagem, o que dificulta a localização. A quantidade de estacionamentos indistintos, também prejudica muito as referências nas quadras. Vários entrevistados disseram fazer uso de elementos externos como referências de direções, como por exemplo o prédio do BRB, no Setor Bancário. O comércio acaba servindo de ponto de informação para um novo transeunte do setor, já que não há nenhum tipo de placa que poderia auxiliar as pessoas a encontrar endereços. As ruas lotadas por carros não oferecem um caminho amigável. Como já foi concluído a partir da pesquisa de imagem, a identidade do local é muito fraca e não tem uma boa legibilidade .

Figura 79 - Fachadas da quadra 6.

74

Figura 80 - Fachadas da quadra 4

N Quadras e edifícios 1-2 pavimentos 3-6 pavimentos 7-10 pavimentos

11-14 pavimentos 15-20 pavimentos 46 pavimentos (Torre de TV)

0

50 100

200

Mapa de Gabarito

300

400

500

N


Simbólica O setor não possui uma forma impactante, nem de elementos que simbolizem a sua história. Aqueles que frequentam o lugar se sentem incomodados com a poluição e barulho do setor e a imagem de espaço degenerado é a que eles atribuem ao espaço. A imagem degenerada se dá pela união da ruim manutenção do espaço físico e pela presença das pessoas marginalizadas da sociedade, que moram principalmente no subsolo. A arquitetura modernista do setor não se destaca, os edificios são similares e sem uma atrativo visual. Os elementos que poderiam surgir em meio a paisagem, como os dois edifícios do Lelé na quadra 1, que não têm o devido peso na paisagem, já que o entorno não os valoriza, por isso não se destacam ao longo dos caminhos, e as pessoas não tem conhecimento da suas existência. Muitos entrevistados classificaram o lugar apenas como ponto de trabalho, não agregando ao lugar nenhum outro uso que possa ser estimulado, ou “salvo”.

75

Figura 81 - Os dois edifícios Camargo Correa e Morro Vermelho. Fonte: http:// www.archdaily.com.br/br/603479/obras-do-lele-por-joana-franca

Afetiva No geral, as pessoas não se sentem acolhidas no espaço do setor comercial, elas sentem medo e repulsa pelo lugar, consideram o lugar sujo, fedido e bagunçado. O espaço público é degradado e sem manutenção, e o lixo, o barulho e a sujeira são constantes, na dinâmica. Juntamente com a questão urbana, a presença dos moradores de rua e usuários de droga e o ostensivo policiamento geram medo e inseguran. Com isso, o Setor Comercial Sul mantém seu estigma de lugar perigoso, sem que as pessoas sintam prazer em conhecer e ocupar o espaço.

Figura 82 - A pluraridade do lugar precisa ser reforçada pelo desenho urbano, para que momentos como o da imagem sejam lembrados pelos usuários.

Ao mesmo tempo, que o setor gera esses sentimentos negativos nos usuários, vemos que a pluralidade faz parte da dinâmica diurna, que faz com que todos os grupos sociais estejam representados e, mesmo que em um espaço não apropriado, acontecem muitas trocas sociais e diversidade de atividades, principalmente quando comparamos com o mesmo setor, mas na asa norte.


mapeamento de problemas 76

Travessia de pedestre interrompidas Calçadas interrompidas Taludes Bolsão de estacionametos Praças para intervenção S3 sul - via sem identidade S2 sul - via sem identidade Marco aquitetônico sem visibilidade


mapeamento de potencialidades 77

Área com potencial de permanência Fluxos para reforçar Taludes Conexão com Setor Hospitalar e super quadras Conexão com Pátio Brasil Conexão com Setor Hoteleiro Conexão com Conic e Rodoviária S2 sul - com nova identidade S3 sul - com nova identidade Áreas com potencial para novas projeções

N


78


ANEXos

79


ANEXo i

Setor Comercial Sul e a experiência noturna um relato pessoal 80

Quando comecei a pensar em fazer esse projeto de diplomação, percebi que precisava incluir de alguma forma todos os usuários do Setor Comercial Sul. Friso a palavra todos, porque isso, para mim, implica incluir as camadas marginalizadas da sociedade, que no caso são moradores de rua, prostitutas, travestis e viciados em drogas. Escolhida essa diretriz, me vi com a dificuldade em entender o funcionamento desse espaço para essas pessoas, às quais eu não tinha nenhum acesso ou possibilidade de interação, por estarem em uma situação de extrema vulnerabilidade e opressão.

panelas. Algumas coisas tiveram que ficar no chão, por falta de espaço. A roupa ficava exposta no chão mesmo, do outro lado da galeria, deixando um espaço de passagem. O lixo produzido era reunido em um saco que foi descartado posteriormente em um lugar não tão próximo da galeria, pois próximo a ela não tinha nenhum lugar apropriado para isso.

Conversando com amigos e contando sobre meu trabalho, recebi o convite para participar de uma ação voluntária para entregar roupas e comida para moradores do SCS no sábado de noite. Aceitei e fui cheia de expectativas e imagens já formadas. Minha amiga comentava que lá era realmente muito perigoso e o trabalho de caridade só era feito porque os traficantes de droga “tinham liberado” e a polícia aceitava também.

Logo, algumas travestis e mulheres mais idosas chegaram para escolher roupas e pegar um prato de macarrão. Poucos homens apareceram. Todos pareciam sóbrios com exceção de uma mulher muito magra que usava roupas rasgadas. O que me chamou atenção para essa situação foi como as mulheres opinavam na escolha das roupas, queriam modelos e cores específicas. Não faziam isso de maneira “esnobe” ou ingrata, mas sim com a mesma naturalidade com que escolhemos nossas roupas nas lojas no shopping. Isso me fez ver a necessidade de deixar claro que essa camada da sociedade também tem seus desejos e necessidades que devem ser contemplados e percebidos.

Cheguei ao setor por volta das 20h e encontrei o grupo na galeria térrea da quadra 5. Lá, o grupo se reuniu, para organizar as roupas e o jantar. Para organizar as mesas e para servir a comida, o prédio vizinho, que ainda estava aberto (faz parte do Ministério da Saúde), cedeu duas mesas para apoiar as

Um pequeno grupo se formou para que se iniciasse uma ronda para chamar os moradores de rua para a galeria, onde receberiam as doações. Precisava ser pequeno para não os assustar. Era preciso também levar comida para que eles tivessem certeza que as intenções de nosso grupo eram boas

(me relataram que há algum tempo um grupo de pessoas usando essa “desculpa” da doação de comida, atraía-os para uma emboscada, na qual apanhavam). Já estava observando que o SCS estava deserto, poucas pessoas ainda passavam pelo caminho retilíneo que começa na parada da W3 Sul, voltada para o Pátio Brasil e passa pelas galerias térreas e termina na Estação Galera do metrô. Certamente essas pessoas estavam no fim de seus expedientes, pegando o caminho para casa. A maioria era formada por homens, casais ou grupo de homens, nenhuma mulher desacompanhada. Começamos o caminho indo até a praça onde fica o Posto Policial da PM. Todo o Setor parecia ter iluminação, não adequada ao pedestre, pois os postes são muito altos, mas dava claridade ao lugar. Essa praça em especial estava muito bem iluminada. No posto havia quatro PMs e duas viaturas. Até chegar lá, encontramos algumas pessoas dormindo no chão debaixo das marquises em alguns pontos mais escuros. Toda vez que encontrávamos alguém oferecíamos comida e avisávamos da oferta de roupas e mais comida na galeria. Muitos não pareciam interessados. Próximo a esta praça, para minha surpresa, há um órgão do Ministério da Saúde que recebe pessoas que têm interesse


em abandonar o vício às drogas ou ao álcool ou que são doentes mentais. Eles se internam lá por no máximo 14 dias e recebem comida e cuidados neste período. Lá também é possível agendar consultas sem necessariamente estar internado. Na frente dele, vários moradores de rua estavam reunidos conversando entre si e com os seguranças e agentes do Ministério. Havia um clima amigável ali e muitos conversaram com nosso grupo.

continuar, pois uma equipe da PM estava revistando e fazendo uma operação de coerção em alguns homens. Decidimos descer no próximo subsolo para esperar que a ação dos policias terminasse. Lá não havia ninguém, havia uma ou duas luzes acesas, o mau cheiro e a sujeira chegavam ao ponto de incomodar mesmo alguém que já estava esperando por um ambiente assim. A falta de manutenção era evidente, mesmo com a luz difusa vinda das aberturas da galeria.

de fumo. Hoje com a pouca iluminação, e talvez com a ação mais visível da polícia, o número de pessoas que ali moram caiu muito. Consegui observar que havia barras metálicas colocadas obliquamente à parede, de maneira que impedissem uma pessoa de sentar ou deitar no chão próximo à parede, uma clara alusão à cidade hostil. O forro do teto estava pendurado em algumas partes, quase caindo, e a maioria das luminárias, mesmo protegidas por grades, já estava quebrada.

Seguimos caminhando até a frente do banco SAFRA, na quadra1, onde muitos transeuntes estavam na parada de ônibus e alguns prédios ainda estavam abertos com seguranças na porta. Tudo era muito bem iluminado, com alguns flanelinhas por ali e moradores de rua que se organizavam para dormir. O vazio nessa parte do espaço era predominante – sem os carros era possível ter noção da quantidade de espaço que eles ocupavam na quadra.

Continuamos a caminhada até o térreo da quadra 1, que parecia ser o lugar mais bem iluminado. Acredito que por isso não havia tantas pessoas morando ali. Também não havia nenhuma pessoa transitando no local.

Por fim, voltamos à galeria por volta das 21h40, onde havia dois moradores de rua que se divertiam com o grupo que cantava algumas músicas. Ao todo pude observar trinta ou mais pessoas que vivem ou trabalham ali, à margem da sociedade. Vi duas viaturas da polícia que faziam rondas motorizadas entre as quadras. Algumas vezes fizeram barulho com os pneus para nós, como se fosse uma hostilidade. A noite terminou com uma oração e abraços.

O caminho continuou pela lateral do conjunto de prédios, ao lado da via S2, onde, como já se esperava, havia algumas prostitutas e travestis. Aquela lateral estava iluminada, novamente, apenas com postes para a rua e não para pedestres, o que gerava uma certa penumbra, que contribui para a atividade das mulheres que passam a noite lá. Tentamos descer ao primeiro subsolo, mas preferimos não

Descemos para o primeiro subsolo (descobri posteriormente que ali era o lugar conhecido como “buraco do rato”, um dos lugares mais perigosos do SCS), então sem a polícia. Vimos vários moradores de rua, visivelmente alterados pelo uso de drogas ilícitas e álcool.Eles pareciam mais hostis à nossa presença, devido ao efeito das drogas ou à recente presença da polícia ali. Muitos não aceitaram o convite para subir até as galerias e contentaram-se com a comida oferecida na hora. Comentaram comigo que, antes, no buraco, não havia nenhum tipo de iluminação, o que possibilitava a moradia de inúmeras pessoas nas ruas sujas e fedidas e a existência de uma boca

81


ANEXo ii Pesquisa da imagem

82

• Escolaridade: Analfabeto/ Semianalfabeto/ 1º grau completo/ 1º grau incompleto / 2º grau completo/ 2º grau incompleto/ Superior completo/ Superior incompleto

desenho perfeito, mas apenas um esboço de mapa. (Tomar nota da sequência em que o mapa é desenhado)

c. Quanto aos cheiros e sons do local?

7. Quais elementos do SCS de Brasília você considera mais diferentes e que te marcam mais e que são mais fáceis de identificar e lembrar.

• Idade:

ir.

• Sexo:

4. Como você chega ao SCS, com qual meio de transporte?

• Naturalidade:

a. Qual linha? Caso venha de ônibus

• Onde mora e há quanto tempo mora?

b. Quanto tempo demora?

• Em quais outras localidades do DF já morou? Por quanto tempo?

5. Qual caminho você toma ao chegar no SCS. Me conte como se você estivesse me explicando as direções exatas, as direções completas e explícitas do trajeto que você normalmente faz quando vai da sua casa ao trabalho. Não faz mal que você não se lembre de nomes de ruas e lugares (durante o relato do trajeto, o entrevistador deve pedir, se achar necessário, que o entrevistado acrescente mais detalhes às suas descrições).

b. Se você fosse levado para lá de olhos vendados, ao ser tirada a venda você saberia onde está e saberia ir para o trabalho?

• Local de trabalho: •  Renda: Salário Mínimo – R$880,00 em 2016: Até 1000 reais / Mais de 1000 a 2000/ Mais de 2000 a 5000/ Mais de 5000 a 10000 / Mais de 10000 Perguntas específicas: 1. O que vem à mente quando você escuta Setor Comercial Sul? 2. O que você considera como sendo o Centro de Brasília? Por quê? Caso o setor comercial não faça parte, pergunte: o que é o Setor Comercial para você na cidade? 3. Você poderia fazer um mapa esquemático do SCS? Desenhe-o exatamente como se estivesse fazendo um esboço para um estranho, incluindo todas as características principais e explicando as partes. Não esperamos que nos apresente um

a. Mostre onde fica seu trabalho ou onde você costuma

a. Poderia descrever .............. para mim?

c. Você sente alguma emoção específica ao passar por ..............? d. Poderia mostrar, no seu mapa, onde fica ..................? (E, se for o caso) onde ficam os limites de ...................? 8. Perguntas livres:

a. O que você acha do SCS?

a. Desenhe no mapa esse caminho.

b. O que você modificaria aqui?

b. Quanto tempo você demorar para fazê-lo?

c. O que vale a pena ser mantido aqui?

c. Desenhe no mapa anterior quais caminhos você costuma fazer no SCS, onde você come ?

d. Em sua opinião, o SCS é um lugar fácil para encontrar caminhos ou identificar partes?

6.Você sente alguma emoção específica ao passar pelas diferentes partes deste trajeto?

e. Dos lugares de Brasília que você conhece, tem algum que seja fácil de se localizar chegando lá pela primeira vez?

a. Existem partes dele em que você se sente inseguro quanto ao lugar onde está?

b. Alguma parte que você ache bonita?


Homem, 48 anos, natural de Goiânia, morador do Guará. Considera o setor como centro de Brasília pelo seu passado, que anterior-

Homem, 42 anos, natural de Tocantins, morador de São Sebastião, com

Mulher, 51 anos, natural de Brasília, moradora do Guará e trabalha em

renda entre mil até dois mil reais. Considera o setor como centro de Bra-

uma loja de artigos elétricos na quadra 1. Pela sua visão, o setor é um

mente já foi um lugar de forte atração e concentração de atividade que

sília e um lugar onde se resolve tudo. Se locomove até o SCS às vezes

lugar de muitos prédios, o centro seria a Rodoviária e o Conjunto Nacio-

só lá se encontrava, como bancos e clínicas diversas. Hoje não o vê da

de ônibus e às vezes de carro, de transporte público demora cerca de 45

nal, o SCS é um espaço de lojas e, principalmente, escritórios. Ela faz uso

mesma forma, mesmo sendo um lugar com muitas atividades atrativas,

minutos a 1 hora e com o automóvel particular 25 minutos. Tudo os servi-

do carro particular e demora cerca de 20 minutos para chegar ao local de

o fluxo e a qualidade do espaço não são mais os mesmos. Se locomove

ços que precisa durante um dia de trabalho, cafeteria, restaurante, banco,

trabalho. Até as 18h não se sente insegura ao caminhar por lá. Não acha

até o SCS por carro particular e demora 15 min, considera que ali é bem

encontra na própria quadra onde trabalhar, quadra 1. Durante o dia não se

que nenhum elemento da paisagem se destaque esteticamente, os edifí-

servido de transporte público. Sente muita tristeza por ver que o espaço

sente inseguro, pois muitas pessoas transitam no lugar, apenas no final

cios se destacam por suas funções e para ela os mais marcantes seriam o

foi abandonado, ficando sujo e sem manutenção, de noite, na sua opinião,

do dia, com o esvaziamento do térreo, a sensação de insegurança apare-

das Lojas Americanas e os dos bancos Santander, Itaú e Banco do Brasil.

é o espaço para os indigentes e tráfico de drogas. O tipo de comércio

ce, em todos os lugares do setor. Nada no setor lhe chama atenção, para

Em sua fala, comparou o SCS com o Setor Bancário Norte que, em sua

também mudou muito ao longo dos 12 anos que trabalha na quadra 4:

ele tudo é igual e nada se destaca, ao seu ver ele passa uma péssima im-

opinião, é mais bonito. Se pudesse mudar seu local de trabalho, colocaria

várias empresas grandes, bancos e lojas mais tradicionais saíram de lá e

pressão para alguém que percorre seu espaço. Para melhorar a imagem, é

mais árvores, mais iluminação, mas gostaria de demolir tudo e fazer o se-

deram lugar a costureiras e salões de beleza. Considera as galerias para

necessária uma reforma para arrumar calçadas, cuidar do lixo e da segu-

tor do zero, também colocaria mais placas para ajudar quem não conhece

pedestres como o lugar mais interessante, as utiliza para se localizar e

rança, e colocar mais placas para sinalizar melhor os endereços.

o setor a achar endereços.

acha interessante o som do caminhar das pessoas que ela propaga.

83


Homem, 67 anos, natural do Maranhão, morador de São Sebastião, com

Mulher, 32 anos, natural de Rondônia, moradora de Girassol, no município de Cocalzinha, Goiás. Pela sua visão, o setor é um lugar de muita sujeira, de

renda entre mil até dois mil reais. Considera o setor como centro de Bra-

“craquentos” e prostitutas e não apresenta características de centro, que para ela seria a Esplanada dos Ministérios e os monumentos, o SCS é apenas

sília e está ligado fortemente ao seu trabalho, em um quiosque na quadra

um conjunto de lojas, que poderia ser mais limpo e sem camelôs, que atrapalham as vendas das lojas. Ela faz uso do transporte público para chegar

1. Se locomove até o SCS por carro particular e demora 15 minutos, usar o

ao local de trabalho, quadra 5, e demora por volta de 2 horas, desce perto do Hospital de Base e, na volta, pega o ônibus na via W3. Em seu caminho,

de transporte público é inviável, porque transporta mercadorias que utiliza

considera perigosos os espaços perto da W3, por causa dos flanelinhas e mendigos, e a calçada perto dos Correios (quadra 6), porque lá é vazio. Onde

em seu trabalho. Nos últimos anos percebeu que muitas lojas fecharam e

trabalha hámuitas árvores e considera isso positivo, mas ressalva que o lixo e a quantidade de ratos nas praças é algo incômodo. Acha positiva a quan-

acredita que a crise econômica do país seja o motivo da queda das ven-

tidade de pessoas que utilizam o espaço e vê isso como um potencial e para ela a quadra 1 tem prédios bonitos e espaços mais arrumados. Se pudesse

das e consequentemente dos estabelecimentos vazios. Se sente seguro

melhorar o setor, tiraria os mendigos e arrumaria as praças e as calçadas, mantendo a quantidade de comércio.

até as 18h, por causa do movimento de pessoas, e analisa que o número de moradores de rua diminuiu com a presença mais constante da polícia militar. O senhor ressaltou que o setor é exclusivamente seu local de trabalho, por isso não tem tempo para passear ou admirar a paisagem ao seu redor, mas acha agradável ver o céu e presenciar a passagem do tempo por meio dele. Gostaria de trazer mais segurança, estacionamentos e retirar algumas árvores.

84


Mulher, 21 anos, natural de Brasília, moradora do Guará, com renda de mil

Mulher, 26 anos, natural de Brasília, moradora da Estrutural, com renda de

Mulher, 28 anos, natural de Brasília, moradora do Guará, com renda de

a dois mil reais. Considera o setor um lugar onde se resolve tudo, acha-o

até mil reais. Considera o setor como um grande comércio, com alta cri-

até mil reais. Considera o setor apenas como seu local de trabalho e não

bem organizado e o centro da cidade por ser perto de tudo. Se locomove

minalidade, acha-o feio e com péssima estrutura. O centro da cidade seria

consegue enxergar um centro para a cidade. Se locomove até o SCS de

até o SCS de ônibus e demora cerca de meia hora. Prefere passar nos

a Esplanada dos Ministérios e a Praça dos Três Poderes. Se locomove até

ônibus e demora cerca de 1 hora. Gosta de sentar-se na praça da quadra

lugares onde tem mais pessoas e se sente muito insegura ao longo do ca-

o SCS de carro e demora cerca de 15 minutos, se fosse de ônibus poderia

1 após o expediente para esperar os amigos e conversar até de noite, e

minho até a rodoviária e no estacionamento da livraria Saraiva, na quadra

levar mais de 1 hora. Se sente muito insegura ao passar perto do sobsolo

não se sente insegura em nenhum lugar, pois sempre está acompanhada.

1. Considera a vista que o Setor Bancário parte mais bonita do espaço e

da quadra 5, o “buraco do rato”. Considera o Pátio Brasil o marco visual

Acha ruim a quantidade de traficantes e moradores de rua. Não se localiza

internamente, o marco visual é o Pátio Brasil. Reclamou da manutenção

e a parte mais bonita do setor. Segunda a entrevistada era necessário

muito bem no setor, porque trabalha há pouco tempo no lugar. O Setor

das calçadas e da quantidade de barulho gerada pelos carros.

melhorar a infraestrutura, como calçadas e estacionamentos, e reformar

Bancário promove a melhor vista e as melhores referências. Acha que o

os prédios.

setor precisa de mais árvores e menos comércio.

85


86


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87


Amanda Brasil Cavalcante bramandac@gmail.com 88


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