Procuradora dá parecer favorável para que doses sejam distribuídas conforme situação epidemiológica

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PR-AM-MANIFESTAÇÃO-1842/2021

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO AMAZONAS 1º OFÍCIO Rua Sírio Libanês, 5, Chapada – Manaus/AM, CEP 69050-020 Fone: 92 2129-4700. Correio eletrônico:pram-ofício1@mpf.mp.br

AO JUÍZO DA 1ª VARA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO AMAZONAS

AUTOS N. JF-AM-1001975-43.2021.4.01.3200-ACP REQUERENTE: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO E OUTROS. REQUERIDO: UNIÃO FEDERAL E OUTROS.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela Procuradora da República signatária, vem, perante V. Exa., no uso de suas atribuições legais e constitucionais, manifestar-se nos termos seguintes quanto à tutela pretendida pelo autor.

I - SÍNTESE DOS FATOS

Trata-se de ação civil pública ajuizada pela DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO e a DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO AMAZONAS em face da UNIÃO FEDERAL, na qual requer que União seja obrigada, no prazo de 30 (trinta) dias, a adquirir novas doses de vacinas contra a enfermidade COVID-19 e destiná-las ao município de Manaus e ao subconjunto prioritário de municípios do interior (Manacapuru, Tefé, Iranduba, Itacoatiara, Parintins, Coari e Tabatinga), em quantidade suficiente para imunizar pelo menos 70% (setenta por cento) da população elegível, sem qualquer prejuízo às prioridades já definidas para o país, no Plano Nacional de Imunização. Subsidiariamente, propõe a sugestão ao órgão de gestão do Plano Nacional de Imunização - PNI, que se determine a avaliação e a deliberação, considerando o perfil epidemiológico das regiões mais críticas, dos seguintes pontos: Página 1 de 6


1) a vacinação, em caráter de urgência, nas condições normais, com duas doses, às pessoas com residência em Manaus, Manacapuru, Tefé, Iranduba, Itacoatiara, Parintins, Coari e Tabatinga, acima dos 50 (cinquenta) anos de idade; 2) a vacinação, em caráter de urgência, com duas doses, postergando-se os intervalos entre as doses, às pessoas com residência em Manaus, Manacapuru, Tefé, Iranduba, Itacoatiara, Parintins, Coari e Tabatinga, e que estejam acima dos 50 (cinquenta) anos de idade; 3) a vacinação, com apenas 1 (uma) dose, dos indivíduos menores de 50 (cinquenta) anos e maiores de 17 (dezessete) anos de idade, com histórico de infecção pelo novo coronavírus ou adoecimento pela enfermidade COVID-19, devidamente documentado, residentes em Manaus, Manacapuru, Tefé, Iranduba, Itacoatiara, Parintins, Coari e Tabatinga. Por meio do despacho de ID n. 441084365, o juízo decidiu por apreciar a tutela de urgência após a manifestação da ré e do MPF em até 48 horas. A União, por intermédio da Advocacia-Geral da União (id 443595352), se manifestou pela denegação do pedido de concessão de tutela antecipada de urgência e pela suspensão do processo até o julgamento das ADPFs 754, 756 e 785 pelo Supremo Tribunal Federal, que têm por objeto demandas mais amplas acerca do plano de vacinação para grupos prioritários, com a constante atualização do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19. Também aduziu que o pedido da inicial interfere no sistema constitucional dos poderes, ao invadir a atribuição do Poder Executivo de regular discricionariamente a conveniência e oportunidade na forma e operacionalização de assunto relativo à política de atenção à saúde no país. Instruiu os autos com a 1ª edição do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação Contra a COVID-19, de 16 de dezembro de 2020.

É o breve relatório.

II - DO DIREITO À SAÚDE E DA VACINAÇÃO NO ESTADO DO AMAZONAS

A Constituição Federal impõe ao Estado o dever de promover, proteger e recuperar a saúde da população, por meio de políticas públicas (art. 196 da CRFB). Neste sentido, o diploma normativo regulador do SUS (Lei n. 8.080/90) preceitua ser a saúde direito fundamental do ser humano, devendo o sistema mencionado cumprir diversos objetivos. Entre tais objetivos, incluem-se prezar pela “integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso (...)”. Todavia, as taxas de mortalidade no Página 2 de 6


Amazonas continuam em rápida ascensão, conforme se depreende em comparação dos dados disponibilizados no painel da FVS, entre a taxa de mortalidade do dia 04/02/2021 (que subsidiou a inicial, id Num. 440131881 - Pág. 5), e os dados de 22/02/2021, que indicam o aumento de 210,3 para 253,9 óbitos por 100 mil habitantes em apenas 18 dias de intervalo.

Acesso em 23/02/2021. Disponível em http://www.saude.am.gov.br/painel/corona/

Impende destacar que esse salto na taxa de mortalidade em 18 dias ocorreu mesmo com a legislação estadual (Decretos Estaduais nº 43.234, de 23 de dezembro de 2020, nº 43.282, de 14 de janeiro de 2021, e nº 43.303, de 23 de janeiro de 2021) que vigorava no período, proibindo a abertura de qualquer atividade não considerada essencial, e ainda restringia a circulação de pessoas durante o dia e a noite, com medidas severas como a autorização de apenas um membro por família para ir ao supermercado ou à farmácia. A partir de 22/02/2021, os decretos do Governo do Amazonas nº 43.449 e nº 43.450, de 19 de fevereiro de 2021 (DOE em anexo), promoveram a flexibilização de circulação de pessoas e reabertura de comércios e outros serviços não essenciais, o que nos permite inferir que a curva de contágio e disseminação do vírus voltará a crescer, pois, segundo os dados disponibilizados no site do Governo do Estado, por ora, apenas 8,9% da Página 3 de 6


população programada para ser vacinada tomou a primeira e a segunda dose do imunizante (http://www.fvs.am.gov.br/indicadorSalaSituacao_view/75/2). Acrescente-se a isso que a adequada resposta imune, com presença de de anticorpos neutralizantes, ocorre em média no 14º dia após a segunda dose, nos termos dos dados apresentados no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação Contra a COVID19. Repisa-se, o aumento da circulação de pessoas onde apenas uma parcela ínfima da população se encontra imunizada é ambiente propício à difusão e mutação do vírus, o que pode agravar a crise de saúde vivenciada pelo Amazonas e pelos estados vizinhos - alguns já em estado de calamidade pública, como o Acre. A 2ª edição do PNI (em anexo), elaborada em 25/01/2021, informa que a logística de distribuição das vacinas está especificada no Item 6.3.4 “Logística para a Distribuição de Vacinas”, e que a grade do total de doses por UF serão atualizadas nos Informes Técnicos. Consultando o Informe Técnico mais recente da Coordenação-Geral do Programa Nacional de Imunizações, publicado no dia 19/01/2021 (id 440192873 - Pág. 34), verifica-se que a distribuição das doses ocorre de acordo com o critério populacional. Contudo, o próprio Ministério da Saúde admite a necessidade de vacinar a população do Estado do Amazonas de maneira prioritária, conforme se confirma em matéria veiculada no site do MS em 15/02/2021[1], in verbis:

O Amazonas deve ser o primeiro estado brasileiro a ter vacinação plena contra a Covid-19, informou nesta segunda-feira (15/02) o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, em reunião com os 13 prefeitos da Região Metropolitana de Manaus. Eles começarão a vacinar, a partir de 22 de fevereiro, o público-alvo a partir de 50 anos de idade. A reunião foi realizada no Centro Integrado de Comando e Controle (CICC), onde funciona o comitê de crise instalado pelo Ministério da Saúde (MS) em Manaus. A aceleração do Plano Nacional de Imunização envolve uma forçatarefa com a participação do Governo Federal, por meio do MS e Ministério da Defesa, do Governo do Amazonas e das prefeituras municipais, além de outros parceiros que estão sendo agregados. A meta é vacinar, em 10 dias, todas as pessoas desse grupo, nos 13 municípios. Somente Manaus deverá vacinar 267 mil pessoas, de acordo com dados divulgados pela Prefeitura. (...) O ministro anunciou que a aceleração será possível porque até o dia 22 de fevereiro o Ministério da Saúde terá recebido dois lotes dos dois laboratórios que já estão produzindo vacinas, o Butantan (Coronavac/Sinovac) e a Fundação Osvaldo Cruz (AstraZêneca/Oxford). Logo no início de março, outros dois lotes serão entregues. Além das vacinas que são encaminhadas aos estados por partilha proporcional, o MS vai destinar os 5% do Fundo de Imunização para o Amazonas. Página 4 de 6


(...) Os municípios que fazem parte da Região Metropolitana de Manaus são Itapiranga, Careiro da Várzea, Careiro, Autazes, Rio Preto da Eva, Silves, Presidente Figueiredo, Novo Airão, Manacapuru, Iranduba, Itacoatiara e Manaquiri. (grifos ausentes no original)

Apesar disso, ainda não foi iniciada a vacinação de pessoas com idade inferior a 70 (setenta) anos que não vivam em instituições de saúde, nem estejam acamadas. Ressaltese, mais uma vez, que a vacinação é o único meio possível para diminuir a taxa de contágio e, consequentemente, de novas variantes do vírus, cujos estudos apontam para uma maior transmissibilidade e letalidade. Nesse sentido, a distribuição das vacinas considerando apenas o quantitativo populacional dos estados não é a medida mais eficiente a ser adotada, notadamente porque o ritmo de transmissão e contágio muda de acordo com a situação epidemiológica em cada município. Mais eficaz, portanto, a distribuição de vacinas pelo país considerando a situação epidemiológica de cada estado, conforme acenado pelo Ministério da Saúde ao decidir priorizar o Amazonas, o que em nada conflita com o PNI existente, que tem como objetivo principal a redução da morbimortalidade causada pela COVID-19. Acrescente-se que a ANVISA [2] publicou em 23/02/2021 que a agência concedeu registro definitivo da vacina da Pfizer, aumentando, portanto, as opções de vacinas que podem ser adquiridas pelo governo para aprimorar o cumprimento do PNI.

III - CONCLUSÃO

Dessa forma, em consideração às razões elencadas neste parecer, e, consequentemente, em respeito às determinações impostas pelo conjunto normativo do ordenamento jurídico pátrio, pugna o Ministério Público Federal pelo seguimento do feito, determinando-se que o Programa Nacional de Imunização - PNI adote o critério epidemiológico para distribuição de vacinas e atenda às prioridades atinentes aos municípios mais afetados do Brasil, notadamente cidades no Estado do Amazonas.

Manaus/AM, 23 de fevereiro de 2021.

MICHELE DIZ Y GIL CORBI PROCURADORA DA REPÚBLICA -Em substituiçãoPágina 5 de 6


Notas 1. ^ https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/amazonas-deve-ser-primeiro-a-vacinar-toda-a-populacao 2. ^ https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/noticias-anvisa/2021/aviso-de-pauta-2013-coletiva-de-imprensa-1

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