Edição 470 - A Evolução dos Bancos

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BRASIL

nº 470

www.brasilamericaeconomia.com.br

ENTREVISTA EXCLUSIVA A TRANSFORMAÇÃO DO BNDES O que mudou na gestão de Maria Silvia, uma das únicas mulheres do alto escalão do governo Temer

No 470 ABR/2017 R$ 20,00 ISSN 1414-2341

A EVOLUÇÃO DOS

BANCOS

O ESVAZIAMENTO DAS AGÊNCIAS, O INVESTIMENTO DAS INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS EM TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO, O FUTURO DAS TRANSAÇÕES E O PAPEL DAS FINTECHS NO MERCADO DE INVESTIMENTOS

LÍTIO A PRODUÇÃO E A COMPETITIVIDADE DA ARGENTINA, BOLÍVIA E CHILE














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Nesta edição

ENTREVISTA

18

Maria Silvia Bastos Marques Presidente do BNDES revitaliza modelo de gestão bancária ao introduzir novas políticas operacionais para garantir concessão de crédito

58

Michael Casey Conselheiro sênior na Iniciativa de Moeda Digital do MIT afirma que modelo digital traz transparência

AGROPECUÁRIA

44

A carne forte do Brasil Nova versão do regulamento para produtos de origem animal endurece regras para fortalecer segurança alimentar

EVENTOS

76

Gestão pública eficiente O prefeito de Santos, Paulo Alexandre Barbosa, foi o convidado do Conversando Com Quem Faz a Diferença, evento promovido pelo GCSM

CAPA

50

O futuro dos bancos Cifras dos investimentos do Brasil em TI estão equiparadas às de países como França, Alemanha e Índia. Realidade do fim das agências se aproxima 14 | AméricaEconomia

NEGÓCIOS

34

Lítio: a corrida pelo novo santo graal Chile, Bolívia e Argentina tentam aproveitar o boom mundial do lítio, a nova estrela da mineração por causa da eletromobilidade

64

Over the Top: tendência crescente Expansão do acesso à internet provoca guerra das plataformas OTT. Oferta de conteúdo próprio é alternativa à TV aberta

SEÇÕES 24 Movimentos 27 Opinião – Juan Jensen 28 Moderador 30 Tecnologia 32 Direito de Família – Ivone Zeger 42 Opinião – Mauro Miranda 48 Opinião – Marco Antonio Sabino 62 Opinião – Gilberto Caldart 70 Opinião – Ney Prado 72 Opinião – Jorge Pinheiro Machado 74 Opinião – José Renato Nalini 78 Opinião – Elmano Nigri



Editorial PUBLISHER E EDITOR Agostinho Turbian - publisher@editorai.com.br CONSELHO EDITORIAL Agostinho Turbian, presidente Antonio Carlos Romanoski, Elmano Nigri, Desembargador Henrique Nelson Calandra, Jorge Pinheiro Machado, Mario Garnero, Romeu Chap Chap, Toni Sando e Wilson Levorato CONTEÚDO Editora-chefe: Bruna Lencioni - bruna@editorai.com.br Repórteres: Beatriz Santos - beatriz@editorai.com.br Felix Ventura - felixventura@editorai.com.br Marcelo Almeida - marcelo@editorai.com.br Diretor de Arte: Rogério Macadura - arte@editorai.com.br Tradução: Marcelo Almeida - marcelo@editorai.com.br COLABORADORES Camilo Olarte, Elmano Nigri, Gilberto Caldart, Gwendolyn Ledger, Ivone Zeger, Jorge Pinheiro Machado, José Renato Nalini, Juan Jensen, Lino Solvis de Ovando, Marco Antonio Sabino, Mauro Miranda, Ney Prado e Redy Maldonaldo ASSINATURAS assinaturas@editorai.com.br AMÉRICAECONOMIA BRASIL DIGITAL www.brasilamericaeconomia.com.br Editores: Beatriz Santos - beatriz@editorai.com.br Marcelo Almeida - marcelo@editorai.com.br AMERICAECONOMÍA INTERNACIONAL Publisher e Editor: Elías Selman C. Editor-Geral: Fernando Chevarría León Editor Executivo: Rodrigo L. Serrano Editores: Bruna Lencioni (São Paulo), Jorge Cavagnaro (Guaiaquil), Lino Solís de Ovando (Santiago), Rery Maldonado (La Paz), Carolina Torres (Tegucigalpa). Editor-at-large: Samuel Silva Repórteres: Laura Villahermosa e Hugo Flores (Lima), Camilo Olarte (Cidade do México), Alejandro González (Bogotá), Hebe Schmidt (Madri) Colunistas fixos: John Edmunds, Jerry Haar, Susan Purcell Kaufman Designer: Sandra Florián AMÉRICAECONOMÍA INTELLIGENCE (Estudos e Projetos Especiais) Diretor: Andrés Almeida Pesquisadores Seniores: Fernando Valencia Analistas: Catherine Lacourt e Juan Francisco Echeverría Analista Peru: Carlos Alcántara AMÉRICAECONOMIA.COM Subdiretor de Mídias Digitais: Lino Solís De Ovando Repórteres: Héctor Cancino, Fernando Zúñiga, Juan Toro, Cristian Yánez e Matías Kohler

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Os textos assinados pelos articulistas não refletem, necessariamente, a opinião da revista AméricaEconomia

16 | AméricaEconomia

Bruna Lencioni Editora-chefe

Tenhamos fé O

acompanhamento do noticiário econômico traz um misto de sensações. Do lado racional, os relatórios trazem a percepção de que o país chegou ao fundo do poço e foi sugado por outro buraco, o famoso alçapão que vem depois do fim de tudo, ou seja, o próximo passo é ser sugado para cima. Do lado passional, é pura tristeza. O desemprego assola o país, com mais de 13 milhões de pessoas sem carteira assinada – uma parte está na informalidade e outra abriu o seu próprio negócio, mas é uma pequena parcela desses milhões todos nas ruas. São muitas histórias de mães, pais, avós e filhos sem trabalho. As pessoas estão mais sensíveis a doenças psíquicas, menos dispostas, com medo de serem vencidas pelo cansaço. Isso tudo pode causar certo comodismo, despertar aquela ideia de fazer um curso deixado para trás ou empreender, de fato. Quem se fixou no seu posto provavelmente encontra-se assoberbado (sem generalizar) – atua em várias frentes e precisa se reinventar diariamente para não ser alçado pelo desânimo. Não existem perspectivas ideais, na maior parte dos segmentos, para aquele plano de carreira prometido na empresa, aquela promoção ou o aumento de salário anualmente concedido por filosofia da companhia. Os tempos mudaram. A ideia é que a produtividade aumente, não no mesmo ritmo que os demais benefícios – aliás, benefícios estão cada vez mais escassos. Nesse sentido, a terceirização do trabalho, que passou no Congresso, pode trazer efeitos positivos. Basicamente, o governo regulamenta uma situação que hoje não existe, sob a égide da lei. Até quando? Não se sabe. É importante fomentar debates sobre o futuro das profissões, como a de jornalista, tão rebaixada com o passar do tempo e que ainda vive as transformações tecnológicas das mídias. O capital intelectual é necessário para a humanidade, mas em que momento da história recente se viu tanto silêncio em torno da importância intelectual e tanto barulho para os novos modelos, simples e eficazes da publicidade? Isto é para citar um exemplo básico, de um segmento que sangra. De modo quase geral, é possível dizer que o empresário luta muito. Com isso, o mesmo empresário castiga, necessariamente, quem está embaixo. A culpa é de quem? Afinal, é melhor estar empregado. O ciclo é vicioso e não há remédio. O tempo, a tolerância e a resiliência parecem as únicas armas. Resistir é preciso. A frase “o mercado está fechado e difícil” é a que mais ecoa por aí. É gente de todo tipo se apropriando desses termos para argumentar sobre qualquer tentativa de contraponto. É tudo isso, sim. Mas vai passar. Tenhamos fé. Oremos. ••• A AméricaEconomia dá boas-vindas ao especialista Jorge Pinheiro Machado, que inaugura a Página Verde, um espaço para opinião sobre sustentabilidade. Boa leitura. Siga a revista AméricaEconomia no twitter.com/brasil_ae, linkedin.com/company/brasil-americaeconomia e facebook.com/brasilamericaeconomia



DIVULGAÇÃO BNDES

Entrevista | Maria Silvia Bastos Marques, presidente do BNDES

18 | AméricaEconomia


Revolução no BNDES Gestão de Maria Silvia Bastos Marques, iniciada em junho do ano passado, inaugura um novo modelo de administrar no banco, que inclui novas políticas operacionais como realinhamento de taxas para empréstimos e mais agilidade na concessão de créditos Por Bruna Lencioni, de São Paulo

A

pós anúncios de mudanças em políticas de concessão de empréstimos, o foco se voltou para a presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Maria Silvia Bastos Marques. Nesta entrevista, ela faz um balanço de sua gestão, iniciada junto com o governo de Michel Temer (PMDB) em junho de 2016, após o impeachment de Dilma Rousseff (PT). A executiva inaugura um modelo moderno de gestão, com novas tecnologias e nova sistemática para operacionalizar os recursos do banco. As políticas operacionais englobam uma série de mudanças, que refletem o foco atual do BNDES – impulsionar a economia com rapidez e segurança. AméricaEconomia – O BNDES anunciou em janeiro suas novas políticas operacionais. O que mudou de mais relevante? Maria Silvia Bastos Marques – Em seu conjunto, a política define condições de financiamento e incentivos horizontais que substituem a lógica de apoio a setores pelo foco nos atributos dos projetos. A prioridade do BNDES são os projetos com forte impacto social, econômico e ambiental, capazes de gerar o máximo de benefícios para a sociedade, além daqueles apropriados pelo tomador de crédito. Os atributos dos projetos, que determinam a maior participação de financiamento pela Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), são: inovação, MPME, educação, saúde, infraestrutura, meio ambiente e exportação. Assim, as características de cada projeto definem suas condições de

financiamento no BNDES, independentemente de que setores econômicos eles se originem. As diretrizes resultarão em uma utilização mais seletiva e eficiente dos recursos financiados com a TJLP, que remunera o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e o Tesouro Nacional, principais fontes de financiamento do BNDES. Em relação às MPMEs, é importante ressaltar que a prioridade para esse grupo de empresas tornou-se estratégica, com um plano de trabalho até 2018, que envolveu a reclassificação de porte dessas companhias, que passou de R$ 90 milhões para R$ 300 milhões de faturamento anual, a ampliação do prazo de pagamento do BNDES Finame de cinco para dez anos, e a ampliação do limite do Cartão BNDES de R$ 1 milhão para R$ 2 milhões, entre outras medidas para simplificar, agilizar e ampliar o acesso ao crédito para o segmento. AE – Que outras iniciativas têm como foco o apoio às MPMEs? MS – Estamos trabalhando para aumentar de forma relevante nosso relacionamento digital com clientes, fornecedores e agentes financeiros. O que está em curso é uma mudança no paradigma de produtos e processos do BNDES, cujo marco principal será a entrada definitiva do banco no mundo digital, até o fim de 2018. Nesse cronograma de modernização e aproximação com as MPMEs, lançamos, em fevereiro deste ano, o aplicativo BNDES MPME para smartphones e tablets e, no fim do primeiro semestre, entrará em funcionamento um portal de

Prioridade do

BNDES são projetos com forte impacto social, econômico e ambiental

Abril | 19


Entrevista

relacionamento exclusivo para micro, pequenas e médias empresas, que será uma plataforma de acesso inteligente às linhas do BNDES. Além disso, recentemente firmamos um acordo de integração de sistemas com a B2W, maior plataforma digital do país, que passa a aceitar o Cartão BNDES como meio de pagamento. Até então, as transações do cartão só podiam ser realizadas, após negociação direta entre as partes interessadas, em um único portal específico na internet. A medida, que confere mais agilidade e automaticidade aos processos do Cartão BNDES, representa o início de uma revolução na forma do banco operar com as MPMEs, comparável ao lançamento do produto em 2003. O acordo com a B2W também cria espaço para que as plataformas de outros fornecedores e distribuidores sigam o mesmo caminho, ampliando a oferta de crédito para as mais de 700 mil MPMEs cadastradas no cartão. Abre-se um leque de oportunidades para a criação de outras soluções de financiamento para facilitar e ampliar o acesso aos demais produtos automáticos do BNDES.

Meta do banco é fechar 2017 com metade das operações não automáticas aprovadas em até

180 dias 20 | AméricaEconomia

AE – A atual diretoria pretende reduzir o tempo de aprovação dos projetos no BNDES? MS – Sim, essa é uma prioridade. Nossa meta é fechar 2017 com metade das operações não automáticas aprovadas em até 180 dias – hoje o prazo médio é de 315 dias. Para alcançar esse objetivo, o BNDES conduz desde o ano passado um estudo interno, já em fase final, que proporá mudanças no processo de aprovação de operações com o objetivo de diminuir os prazos de tramitação. Em paralelo, está em fase de contratação uma empresa de consultoria externa que fará a revisão e a ratificação do estudo feito internamente, incorporando as melhores práticas de processos no setor financeiro. O banco já adotou iniciativas para agilizar a tramitação das operações, como a possibilidade de protocolo dos pedidos de crédito por meio da internet. O banco também está promovendo uma completa revisão na sua forma de lidar com

seus produtos financeiros automáticos. Estamos desenvolvendo plataformas tecnológicas digitais, machine-to-machine (M2M), que permitirão uma maior simplificação de processos e uma significativa redução dos prazos de concessão do crédito: de 30 dias para dois dias úteis. AE – Qual é a percepção da senhora sobre o cenário ainda desfavorável para a atividade econômica? MS – Estamos saindo de dois anos de uma recessão profunda, que afetou todos os setores. Apenas a agricultura, o setor de óleo e gás e a infraestrutura não têm hoje capacidade ociosa. Por isso estamos olhando com atenção esses setores, e reorganizamos nossa política operacional para apoiar bons projetos e ajudar a viabilizar concessões em áreas como saneamento, no âmbito do Programa de Parcerias de Investimento (PPI). Como banco de desenvolvimento, estamos muito envolvidos na tarefa de impulsionar a retomada do crescimento, de forma sustentável. Ao mesmo tempo, estamos ampliando nossas ações para promover a transparência e o acesso às informações sobre todas nossas operações, uma exigência crescente aos setores público e privado. A economia já dá sinais de recuperação, com a queda da inflação e dos juros, e a retomada da confiança deve se refletir ao longo do ano no aumento da demanda por recursos do BNDES para investimentos. AE – Como o BNDES vai atuar no compartilhamento de garantias com outros financiadores? MS – O compartilhamento de garantias faz parte de um conjunto de iniciativas para agilizar e reduzir o custo na concessão de crédito, dando mais segurança aos demais financiadores dos projetos no período de pre-completion (antes da conclusão da obra). A possibilidade de compartilhamento será oferecida ao consórcio de bancos que financiar pelo menos 40% do empreendimento. É mais uma medida de estímulo à retomada dos projetos de infraestrutura, tor-


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nando-os mais atraentes para investidores brasileiros e internacionais. Nas próximas semanas vamos anunciar os detalhes sobre esse assunto. AE – A substituição da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) pela Taxa de Longo Prazo (TLP), que vai vigorar a partir de 1º de janeiro de 2018, pode afugentar investidores? MS – Não vemos motivo para que isso aconteça. A TLP vai dar muito mais previsibilidade aos contratos. A TJLP é uma taxa definida pelo Conselho Monetário Nacional de maneira quase discricionária, sem uma regra clara. Por isso, tem um alto grau de incerteza agregado a ela. Quando você converge para uma regra em que a taxa é definida por uma metodologia clara e a mercado, esse contrato tem uma segurança muito maior. É importante lembrar que o BNDES continuará contando com uma fonte diferenciada de recursos para financiar os investimentos no longo

prazo (recursos do FAT), a um custo de captação equivalente ao do Tesouro Nacional, que é o menor do país. Isso significa que o banco continuará oferecendo crédito a custo e prazos compatíveis com sua missão de fomentar o desenvolvimento sustentável da economia brasileira. Queremos reforçar, ainda, que todos os financiamentos em TJLP estão mantidos até o fim da vida dos respectivos contratos – e temos no BNDES contratos de até 30 anos. A TLP só entra em vigor em 1º de janeiro de 2018, e vai convergir para a NTN-B ao longo de cinco anos, em um processo com regras muito claramente estabelecidas. Essa segurança é algo essencial para qualquer investidor.

BNDES: atenção para os setores de óleo e gás e a infraestrutura

AE – A senhora é uma das poucas mulheres na equipe do atual governo. Qual a importância de termos, pela primeira vez, uma mulher como presidente do BNDES? MS – Eu me sinto honrada com esse cargo, e Abril | 21


Entrevista

por representar as mulheres na equipe do presidente Michel Temer, junto com a ministra Grace Mendonça, da Advocacia-Geral da União, e a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi. Considero isso muito positivo e importante, em um país no qual ainda existe discriminação de gênero no mercado de trabalho – uma realidade que vem mudando, embora em ritmo mais lento que o desejável. A meu ver, no entanto, mais do que a questão específica de gênero, a meritocracia e a diversidade são os fatores que devem ser levados em conta na formação de uma equipe. No BNDES, somos quatro mulheres e cinco homens em uma diretoria bem diversa, que mistura profissionais com diferentes backgrounds e experiências nas esferas pública e privada.

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AE – A senhora tem alguma aspiração política? Algum partido já a convidou para lançar algum tipo de candidatura? MS – Não, não tenho aspiração política.

“Meritocracia e diversidade são os fatores que devem ser levados em conta na

formação de uma equipe”

22 | AméricaEconomia

AE – Qual o balanço que faz de sua gestão à frente do BNDES até agora? MS – A nova diretoria tomou posse em junho de 2016, um momento de transição política e profunda crise econômica, que exigia ações de curto prazo para fomentar a recuperação do crescimento da economia e planejamento para continuar desempenhando seu papel central nos financiamentos de longo prazo. Desde então, rediscutimos praticamente tudo dentro do banco. Começamos por uma mudança na estrutura. Criamos as diretorias de Controladoria e Jurídica, muito alinhadas com nossa preocupação de trabalhar de forma transparente e segura. Em paralelo foi criado um Departamento de Monitoramento e Avaliação, fundamental para medir a efetividade e os resultados dos projetos financiados pelo BNDES. Além da reformulação das políticas e condições de financiamento do BNDES, sobre a qual já comentei, ao longo desses nove meses tivemos

“EM MAIO, VAMOS PROMOVER UM SEMINÁRIO COM BANCOS DE DESENVOLVIMENTO DE TODO O MUNDO PARA DISCUTIR O PAPEL DESSES BANCOS EM ECONOMIAS ESTÁVEIS E ENRIQUECER A DISCUSSÃO SOBRE O NOSSO PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO. QUEREMOS TRAÇAR UM PLANEJAMENTO PARA O BNDES COM METAS ATÉ 2030” avanços importantes. Criamos uma força-tarefa para equacionar a situação das concessões antigas e esperamos ter solução para algumas ainda neste semestre. Outra situação desafiadora que enfrentamos foram as operações contratadas de exportações de serviços de engenharia cujos desembolsos estavam suspensos desde maio. Nesse sentido, estabelecemos regras para a retomada desses desembolsos – já encaminhamos a solução para quatro contratos – e novas regras para os contratos futuros. Reforçamos o Progeren, linha de crédito do BNDES para financiamento de capital de giro que, nos últimos 12 meses, já desembolsou R$ 3,3 bilhões, sendo cerca de 70% para MPMEs. Temos trabalhado com afinco para que o banco apoie a retomada do crescimento econômico do país, ao mesmo tempo em que olhamos para o longo prazo. Em maio, vamos promover um seminário com bancos de desenvolvimento de todo o mundo para discutir o papel desses bancos em economias estáveis e enriquecer a discussão sobre o nosso planejamento estratégico. Queremos traçar um planejamento para o BNDES com metas até 2030.



Movimentos

SERGEY NIVENS / 123RF

2050, aí vamos nós Estudo da PwC mostra uma previsão otimista do desempenho dos países emergentes no longo prazo, mas pode ser um pouco otimista demais 10 principais PIBs da economia global 2016 - 2030 - 2050 (projeção) Em US$ TRI PPP a valores constantes 2016 2016

2030

6.7

6.1

5.3

9. Alemanha

10. Reino Unido

6.8 7. México

8. Japão

7.5

10. Reino Unido

7.1

3.6

9. México

10.5 4.4

3.6

8. Brasil

4.7 7. Alemanha

5.4

4.7 6. Rússia

5. Indonésia

10. França

5.6

2.7

2.7

9. Reino Unido

4. Japão

3.0 8. Indonésia

6. Rússia

23.4

19.5

34.1

38.0 3.7

3.1 7. Brasil

3.9 5. Alemanha

6. Rússia

4.9

10

4. Japão

8.7

18.5

20

21.2

40 30

44.1

50

2050

5. Brasil

60

58.4

Fonte: “O Mundo em 2050”, PwC / 2017

O

futuro, esse lugar inexistente que engorda as famílias dos políticos, dos apostadores e dos analistas de Wall Street, transformou-se em um vício: não podemos mais evitar antecipá-lo. A tentativa mais recente partiu da consultoria PwC, que realizou o estudo “O Mundo em 2050: Oportunidades e Desafios”. Nele, são traçados cenários possíveis de crescimento econômico para 2030 e 2050. As conclusões mais gerais apontam que “nas próximas quatro décadas, seguiremos em um mundo de duas velocidades em termos de crescimento. Por um lado, um grupo de países emergentes que vão crescer, pelo menos, uma média de 4% ao ano e, por outro, países desenvolvidos que vão crescer apenas 2% em média. Isso, além da crise financeira internacional, “está empurrando com maior velocidade o centro de gravidade da economia mundial para os países emergentes”. Desta forma, a “Índia irá se consolidar como a segunda potência mundial em 2050 (ver quadro); nesse mesmo ano, o Brasil irá superar o Japão na quarta posição; a Rússia irá se tornar a maior potência econômica da Europa, ultrapassando a Alemanha, e 24 | AméricaEconomia

4. Indonésia

3. Estados Unidos

2. Índia

1. China

3. Índia

2. Estados Unidos

1. China

3. Índia

2. Estados Unidos

1. China

0

países como o México e Indonésia podem superar potências como Reino Unido e França. Para o bem ou para o mal, o mais certo é que a PwC esteja errada. Por um lado, o aquecimento global e outras crises ambientais irão começar a destruir com mais força os recursos do planeta e é provável que causem prejuízos a economias que dependem de climas amenos para se desenvolver e ter mais recursos. Nesse sentido, ao adotar o critério nacionalista de “o meu país primeiro”, as economias emergentes que não têm (com exceção da China) recursos suficientes para manobrar sozinhas ficarão isoladas. Por outro lado, duas incógnitas econômicas vão persistir: o impacto da automatização das economias e o surgimento, ou não, de uma nova onda de inovação que impulsione o crescimento. Se isso ocorrer, deve primeiro envolver um grupo pequeno de nações. Até o momento não parece que o México ou a Rússia estejam preparados para promover uma revolução tecnológica. Ainda bem que existem a sorte e a inteligência: em 1900, se alguém dissesse que as então miseráveis Finlândia, Suécia, Dinamarca e Noruega iriam encabeçar a lista de países mais ricos, prósperos e bem-sucedidos, iria provocar muitas gargalhadas. AméricaEconomia Internacional


No meio da festa, mas com um olho na saída Quanto tempo vai W durar a festa? É ses países oscilem de forma brusca – acabam criando para se obter grandes lucros em pouco tempo (às vezes em horas) diante da tendência geral de alta do mercado. Uma pesquisa da The Market Mogul (ver quadro), no entanto, focada no setor, mostra que apenas 35% dos entrevistados acreditam que as medidas de desregulamentação e cortes de impostos terão mais efeitos positivos do que negativos das medidas imigratórias e comerciais. Já 30% dos consultados acreditam que deve ocorrer o inverso. O resto não tem uma visão clara e enxerga desdobramentos tanto positivos como negativos atuando de maneira independente. Quanto tempo vai durar a festa? É difícil dizer. Pode durar alguns anos, até que os desequilíbrios batam à porta.

difícil

dizer. Pode durar alguns anos, até que os desequilíbrios batam à porta

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all Street vive um carnaval de altas e lucros com a expectativa de desregulamentações massivas e cortes de impostos, mas um grupo numeroso também acredita que, no longo prazo, a farra deve acabar. Menos regulamentações nos setores bancário, farmacêutico, ambiental (com o subsequente aumento de custos para as companhias petrolíferas e petroquímicas), mais investimentos em infraestrutura rodoviária e aeroportuárias, mais oferta de empregos, são os fatores que muitos citam para explicar por que Wall Street chegou aos 20 mil pontos e os operadores vivem em festa. E isso apesar de o presidente Trump se comportar como um adolescente malcriado. Nenhuma delas são condições fundamentais para perturbar o delicado equilíbrio do mundo. Mas existe outra razão, mais vergonhosa, que também explica as altas: muitos operadores apostam nas oportunidades que as seguidas mini-crises – que afetam as empresas ou um país específico, fazendo com que os preços dessas empresas e dos fundos associados a esO dilema de Wall Street: Presidente Trump, Dr. Jekyll ou Mr. Hyde? Os cortes nos impostos e as medidas de desregulamentação vão pesar de forma mais positiva que o impacto das reformas comercial e migratória? Fonte: The Market Mogul. http://themarketmogul.com

Sim, os cortes de impostos e medidas de desregulação vão pesar mais positivamente

35%

Não, as reformas comerciais serão danosas demais

30%

Seus cortes de impostos e medidas de desregulamentação serão negativas em todos os sentidos

22%

Suas reformas comercial e migratória serão positivas em todos os sentidos

13%

Abril | 25


Outra crise? Não, obrigado

U “As marcas

locais

estão a ponto de se converterem em um sucesso mundial” 26 | AméricaEconomia

m sistema de alerta prévio criado por economistas da Universidade de Birmingham promete antecipar crises de dívida soberana levando em conta regiões e estruturas econômicas. Antigamente, na América Latina, um produto ou serviço estrangeiro tinha diversas vantagens competitivas em relação aos produtos locais. Hoje, de acordo com Kantar Worldpanel, – empresa que analisa padrões de consumo e tenta identificar tendências de consumo em geral – a tendência começa a mudar. “Os fabricantes locais agora ficam com um de cada dois dólares gastos em produtos de consumo em massa”, afirma um estudo sobre o tema. “Por terem conquistado maior sofisticação aplicando estratégias básicas de marketing e por se adaptarem às tendências mundiais, as marcas locais estão a ponto de se converterem em um sucesso mundial”, diz Kantar. Ocorre que o fato de ser local “permite estar mais perto das tendências locais e responder de forma mais rápida a elas, adaptar-se e conseguir gerar um processo de identificação entre o cliente e a marca”. Além disso, diz Kantar, “apesar de Brexit e Trump serem fenômenos complexos para

analisar, notamos uma conexão: uma parte importante da população está desafiando a globalização e está disposta a priorizar o sentimento nacionalista”. Em outras palavras, o global fomentaria o local. As empresas regionais usam seis estratégias básicas nesse sentido: adaptar as tendências globais às locais, promover a nacionalização, aproveitar o controle sobre a cadeia de valor, criar vínculos com diferentes targets, entrar no segmento natural e mostrar ter a capacidade de unir sustentabilidade com benefícios reais. Um caso de controle sobre a cadeia de valor é a marca de farinha peruana Anita Food, que desenvolveu e certificou sua própria semente de trigo, que foi eleita uma das seis melhores sementes peruanas. A empresa expandiu suas operações para outros países e setores, conseguindo que metade das famílias peruanas comprassem Anita pelo menos uma vez por mês. Como no futebol, se você tem uma torcida própria, jogar em casa cria uma grande vantagem. AméricaEconomia Internacional

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Movimentos


Olhando além do horizonte

A

economia brasileira tem enfim começado a esboçar alguma reação. Existe alguma divergência entre analistas sobre qual será o ritmo de retomada econômica. Nas projeções perto de zero, no qual a 4E se inclui com projeção de queda de 0,2% para o PIB deste ano, a retomada é lenta e gradual, mas o PIB apresenta crescimento em todos os trimestres deste ano, crescendo num ritmo anualizado de 2% já a partir do segundo trimestre. Nas projeções perto de 0,5%, que é a mediana do mercado, este ritmo de crescimento tem que começar mais cedo ou ser um pouco mais forte no segundo semestre do ano, alcançando 3%. Num contexto de recuperação econômica, a razão do PIB apresentar baixo ou

nenhum crescimento este ano diz mais respeito ao carregamento estatístico de 2016, que é negativo em 1,1 ponto percentual. Visto de outra forma, se a economia estagnar no nível do 4º trimestre de 2016, o crescimento em 2017 será negativo em 1,1%. Assim, mesmo para um número perto de zero, a economia tem que crescer algo como 2%, do início ao final de 2017. Para 2018, sem o efeito negativo do carrego estatístico, a maior parte das projeções indicam algo entre 2% e 3%. Mas, e na sequência? O que teremos? Num horizonte mais longo a divergência entre os economistas é maior. Crescemos pouco nos últimos anos. E tivemos retração econômica nos últimos oito trimestres. Com isso, as diferentes modelagens existentes apontam quadros bem divergentes. De um lado, filtros estatísticos apontam para um PIB potencial negativo, em torno 1,5% ao ano. Alguns poucos economistas têm se prendido a estes números sem fazer uma análise do real significado dos mesmos. De fato, a economia recuou significativamente

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Opinião | Economia

nos últimos anos. A média de crescimento em 2015 e 2016 é negativa em 3,7% ao ano. Nos últimos quatro anos, a média é negativa em 1% ao ano. Assim, se o desempenho tem sido recorrentemente negativo, o filtro apontará uma tendência também negativa. Outros economistas, neste caso em maior número, para não apontar um número ne-

trições estruturais da economia e fazer algumas premissas. Economistas que fazem esta abertura, decompondo a queda recente da atividade numa função de produção

NA VERDADE, PROJETAR A CAPACIDADE DE DESEMPENHO NO LONGO PRAZO REQUER UMA ANÁLISE MAIS ELABORADA DO QUE OLHAR NO RETROVISOR. REQUER ENTENDER O QUE CAUSOU A QUEDA RECENTE NA ATIVIDADE ECONÔMICA, ANALISAR AS RESTRIÇÕES ESTRUTURAIS DA ECONOMIA E FAZER ALGUMAS PREMISSAS

gativo, têm projetado PIB potencial na casa de 1% ou 1,5% ao ano. Estes números não são muito diferentes da média de crescimento dos últimos oito anos, que está em 1,2%. Desta forma, se este foi o desempenho dos últimos anos, parece natural que seja então nossa capacidade de crescimento. Na verdade, projetar a capacidade de desempenho no longo prazo requer uma análise mais elaborada do que olhar no retrovisor. Requer entender o que causou a queda recente na atividade econômica, analisar as res-

para o Brasil, encontram um menor uso dos fatores produtivos capital e trabalho, além de brutal queda de produtividade. Olhando a frente, restrições estruturais e um crescimento normal da produtividade (de 0,6% ao ano) apontam um PIB potencial na casa dos 3% ao ano, segundo estimativas da 4E. No médio prazo (2019–2022) o Brasil pode crescer mais que isso, justamente utilizando capacidade e mão de obra existentes e/ou tendo um crescimento maior da produtividade perdida.

Juan Jensen - Doutor em economia pela USP, sócio da 4E Consultoria e professor do Insper (jensen@4econsultoria.com.br) Abril | 27


Moderador

Royal Enfield abre 1ª loja no Brasil

FOTOS: DIVULGAÇÃO

O

Brasil ganha em abril a sua primeira concessionária da mais antiga fabricante de motos do mundo, a Royal Enfield, que nasceu no Reino Unido em 1891 com uma linha de produção de peças para máquinas de precisão. A marca, atualmente indiana, está em processo de internacionalização há dois anos, com presença em 50 países. O país deve receber os seguintes modelos para comercialização: Classic 500 (em todas as cores), Bullet 500 e Continental GT. A Royal Enfield atua no setor de média cilindrada (250cc a 750cc) e chega com a expectativa de oferecer um produto único ao brasileiro, em um mercado que tem potencial de crescimento. A loja fica na Avenida República do Líbano, nas proximidades do Parque Ibirapuera.

Indústria de investimentos vive encruzilhada ual é o olhar do investidor para o futuro? Não existem respostas concretas, mas tendências e advertências, conforme a pesquisa “Futuro Estado da Profissão de Investimento” do CFA Institute, que descreve a indústria em uma encruzilhada existencial. O relatório vem em tempos de megatendências, avanços tecnológicos, redefinição das preferências dos clientes, novas condições macroeconômicas e diferentes regimes regulatórios que refletem as mudanças geopolíticas e demográficas. E fornece um guia para os líderes da indústria de investimentos que procuram se adaptar. O trabalho vem com a campanha “Putting Investors First”, uma iniciativa anual do CFA Institute, que visa chamar a atenção da indústria sobre as necessidades dos investidores em todo o mundo. Os mais de mil entrevistados, todos profissionais de investimentos, apontam fatos que devem mudar nos próximos cinco a dez anos (ver quadro).

28 | AméricaEconomia

Mudando Tendências de Investimento • 73% esperam que fatores ambientais, sociais e de governança se tornem mais influentes • 70% esperam que os centros financeiros na região Ásia-Pacífico se tornem mais influentes Modelos de Negócios que Enfrentam a Pressão • 84% esperam a consolidação do setor • 70% esperam ver mais ativos entrando em veículos de investimento passivo • 63% esperam que as margens de lucro das empresas de gestão de ativos permaneçam • 57% esperam que os investidores institucionais procurem reduzir os custos ao in-sourcing de mais atividades de gerenciamento de investimentos

SHUTTERSTOCK

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Oferecimento:

Notas & Notinhas

Livro

Tancredo Neves, O Príncipe Civil Plínio Fraga Editora: Objetiva

O livro, que chega às livrarias em abril, é uma biografia de Tancredo Neves (1910-1985), traz em suas 648 páginas relatos e anotações sobre a trajetória do político que faleceu antes de iniciar o seu governo. O título é uma grande reportagem do jornalista Plínio Fraga, que não deixa de trazer o contexto da política brasileira e dos bastidores do poder entre as décadas de 1950 e 1980. O livro traz fatos relatados por familiares e documentos do Serviço Nacional de Informação, como atas de reuniões. Histórias sobre a amante de Tancredo Neves, Antônia Gonçalves de Araújo, também aparecem na obra. Tancredo Neves foi um dos políticos mais importantes da história brasileira do século XX. Foi ministro da Justiça de Getúlio Vargas em 1954, primeiro-ministro da experiência parlamentarista de João Goulart em 1961, líder do governo, senador e governador de Minas Gerais. Nos 21 anos de resistência pacífica ao regime militar, costurou a derrocada da ditadura em 1985 aceitando eleger-se presidente, ainda que sob as regras não democráticas. A posse, marcada para 15 de março, não aconteceu.

O volume 3 de FHC e os “Diários da Presidência” Fernando Henrique Cardoso Editora: Companhia Das Letras

O presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) lança o terceiro volume de “Diários da Presidência”, que traz histórias de seu mandato entre os anos de 1999 e 2000. Ele relata, nesta edição, de 748 páginas, uma visão pessoal sobre os principais episódios nesses dois anos de governo. FHC mostra como se deu na prática, entre as contingências da política e da economia, sua luta pela “terceira via” do desenvolvimento com justiça social. Uma leitura que esmiúça os bastidores da política brasileira a partir do olhar arguto do ex-presidente. O título tem trechos de gravações como este, do dia 26 de novembro de 2000: “Por mais que eu me esgoele, só vão dizer que eu sou mais neoliberal. Mas é melhor ser mais neoliberal do que neolítico. Eu não quero ser neoliberal, mas ser neolítico é pior, e aqui nosso problema é que estamos sob a ameaça de um ataque de ‘neoliticismo’ por parte dos chamados aliados, e mais ainda dos chamados adversários – aí, então, é ‘neoliticismo’ puro”.

Abril | 29


SHUTTERSTOCK

Tecnologia

Confiança que gera bilhões A

forma de monetização da Wecash, plataforma chinesa de avaliação de risco de crédito, pode ser diferente, mas não deixa de dar boas margens de lucro para a gigante asiática. Com mais de 63 milhões de usuários ativos e um valor de mercado próximo a R$ 1 bilhão, a empresa aposta na união entre ferramentas tecnológicas avançadas e um modelo disruptivo de negócios. A companhia fornece para instituições financeiras o Relatório Wecash, que avalia inúmeras dimensões do relacionamento de uma pessoa com sua renda e que fica pronto em 15 minutos. O diferencial: zero de custo para as instituições financeiras, o que torna a opção atraente e gera uma economia de bilhões de reais à receita dos contratantes. A Wecash só passa a 30 | AméricaEconomia

receber uma comissão dos bancos à medida que o tomador de crédito pague as prestações assumidas. O Chief Operating Officer (COO) da Wecash, Roger Madeira, explica que o processo de remuneração da empresa é uma demonstração de confiança na eficiência de seu sistema de avaliação de crédito. “A remuneração depende do sucesso mensal da operação”, diz. Recentemente, a empresa se instalou no Brasil com o intuito de atacar diretamente o modelo de análise de crédito praticado no país. “Esse custo encarece a concessão de crédito na medida em que ele é transferido para a taxa de juros do empréstimo”, explica o COO. Depois do Brasil, a Wecash projeta rápida expansão para Argentina, Uruguai, Chile e México. AméricaEconomia Brasil


Oferecimento:

Uma notícia falsa foi detectada

O

compartilhamento de notícias falsas se tornou um problema nas redes sociais – e não poderia ser diferente no Brasil. A fim de erradicar esta questão, a plataforma de comunicação corporativa interna Flock lançou a versão brasileira do Detector de Notícias Falsas (DNF). A plataforma permite que os usuários identifiquem informações falsas antes de as compartilharem. A ferramenta reconhece e sinaliza o conteúdo de mais de 600 fontes do mundo todo consideradas enganosas, não verificadas ou falsas quando os usuários compartilham as informações na plataforma Flock. A nova versão integra também as fontes enganosas brasileiras, que sinalizará links de qualquer um dos sites

listados. Ao compartilhar as URLs suspeitas nas caixas de mensagem da ferramenta, o recurso faz uma referência cruzada ao link em seu banco de dados. Quando o conteúdo de uma fonte de notícias não confiável é identificado, o DNF imediatamente o sinaliza e avisa aos usuários que ele é uma notícia falsa. “Infelizmente, desinformação gera desinformação e, através dos meios simples de compartilhamento no ecossistema digital de hoje, uma pequena notícia não confiável pode facilmente se espalhar como um incêndio em uma organização inteira”, afirma Bhavin Turakhia, CEO da Flock.

A ferramenta identifica e sinaliza o conteúdo de mais de

600

fontes do mundo todo consideradas enganosas

AméricaEconomia Brasil

Topa uma carona?

O

Waze vai lançar para os usuários brasileiros o Carpool, o serviço de carona entre usuários do aplicativo – a data oficial do lançamento ainda não está definida. Por meio de uma ferramenta separada do GPS, os motoristas poderão oferecer caronas para outras pessoas que farão uma rota parecida e dividir o combustível. Entretanto, o app deixa claro: a ideia não é lucrar e, sim, dividir custos. A primeira cidade a testar o novo sistema será São Paulo e os motoristas poderão utilizar a ferramenta apenas duas vezes por dia. AméricaEconomia Brasil

Abril | 31


Direito de Família

“Miscelânea” na família E como bem sabemos, esse tipo de formação familiar está se tornando cada vez mais comum. É, portanto, natural que surja uma série de dúvidas. Como fica a situação dessas famílias sob o ponto de vista da legislação? De que forma as relações entre seus membros são ordenadas juridicamente? Antes de mais nada, é preciso esclarecer uma coisa. O fim de um casamento ou de uma união estável não implica de forma alguma na extinção do poder familiar do genitor que não detiver a guarda dos filhos, ou seja, se você se divorciou e as crianças foram morar com sua ex-esposa, você continua detendo, juntamente com ela, o poder familiar sobre seus filhos. E se sua ex se casar ou contrair uma nova união, o poder familiar continua sendo seu – e não do padrasto. Isto significa que todas as decisões importantes relativas às crianças – como por exemplo, autorizações

SHUTTERSTOCK

F

amília Lego! Família mixed! Família mosaico! Família multifacetada...! Mas o que significa isso? Talvez você não as identifique pelo nome, mas com certeza conhece uma, ou várias, ou talvez até viva em uma delas. Todas essas novas denominações, na verdade, são as novas concepções populares de como estão sendo chamadas as famílias pluriparentais, ou, trocando em miúdos, aquelas que reúnem sob o mesmo teto pessoas oriundas de outros relacionamentos, os filhos que elas trouxeram dessas relações, seus atuais cônjuges ou companheiros, bem como a prole do novo casal. Deu para entender? Para simplificar, vou dar o seguinte exemplo: imagine uma mulher divorciada que tem dois filhos. Ela casa-se outra vez, tem um filho com o novo marido e os cinco passam a viver juntos. Isso é como popularmente estão sendo chamadas as tais famílias Lego, mixed ou mosaico.

32 | AméricaEconomia


para viagens e tratamentos médicos, escolha da escola e outras – continuam cabendo a você, em conjunto com sua ex-esposa. Contudo, um pouco de bom senso é fundamental. É normal que padrastos e madrastas colaborem de alguma forma com a criação de seus enteados, o que não deve ser visto como uma interferência, mas como uma simples questão de convivência. E já que falamos de direitos, vamos agora falar de deveres. Se você paga pensão alimentícia à sua ex-mulher e ela se casa com outro, a obrigação é extinta. Mas, se você paga pensão aos seus filhos, terá de continuar pagando mesmo que sua ex-esposa contraia novas núpcias. Afinal, a obrigação de prover as necessidades de seu filho é sua, e não do padrasto. E quanto ao enteado adotar o sobrenome do padrasto? Isto é possível? Diz a lei nº 11.924, de autoria do falecido deputado Clodovil Hernandez, que, havendo “motivos ponderáveis”, o enteado pode acrescentar a seu nome o sobrenome do padrasto ou da madrasta, desde que eles estejam de acordo, e desde que o sobrenome original não seja excluído. Por “motivos ponderáveis” pode-se entender, por exemplo, a existência de vínculos sócio-afetivos entre o enteado e seu padrasto ou madrasta e situações de abandono, de afastamento ou de negligência por parte do pai ou da mãe. Se o enteado for menor de 18 anos, ele deverá ser representado por seus pais. Caso um dos pais se oponha, cabe ao juiz decidir se os motivos são válidos. Porém, sendo ele maior de idade, a concordância dos pais não é necessária – basta que o padrasto ou a madrasta estejam de acordo. É importante frisar que o acréscimo do sobrenome não constitui uma adoção, não altera a filiação que consta na certidão de nascimento do enteado nem extingue o poder familiar do pai ou da mãe. Assim, muitos juristas entendem que tal alteração não seria “suficiente” para alçar o enteado ao rol dos herdeiros necessários. Isso significa que ainda existem controvérsias quanto à possibilidade jurídica de o enteado ou a ente-

ada vir a ter reconhecido o direito hereditário, quando da ocorrência do falecimento e abertura do inventário do padrasto ou madrasta, para fins de partilha de bens. Pela atual legislação, enteados não têm direito à herança deixada por seus padrastos e madrastas – exceto se eles decidirem beneficiar os filhos de seus cônjuges ou companheiros em seus testamentos. Por outro lado, os filhos continuam tendo direito à herança de seus pais mesmo que tenham adotado o sobrenome do padrasto ou da madrasta. Na linguagem jurídica, padrastos, madrastas e enteados são chamados de parentes afins. E, de acordo com a legislação, parentes afins não podem se casar nem constituir união estável uns com os outros. Em outras palavras: mesmo sendo viúvo, separado ou divorciado, o padrasto não pode casar-se ou constituir união estável com sua enteada, nem a madrasta com seu enteado. O país inteiro ainda se lembra, pois acompanhou o desfecho de um drama ocorrido no seio de uma “família mosaico”: o julgamento de Anna Carolina Jatobá e Alexandre Nardoni, acusados de matar a menina Isabella – filha dele e enteada dela. O episódio fez ressurgir a proposta, defendida por alguns juristas, de substituir os termos padrasto e madrasta, que já teriam uma certa conotação negativa desde os tempos de Branca de Neve, por “pai afim” e “mãe afim”. Contudo, a violência que atinge os menores em seu próprio lar não é perpetrada apenas por padrastos e madrastas, conforme se viu no caso de Isabella. Qualquer benefício concreto para as crianças só poderia advir de mudanças na legislação, na qualidade dos relacionamentos e na consciência dos adultos, e não na mera alteração das designações de parentesco.

Imagine uma mulher divorciada que tem dois filhos. Ela casa-se outra vez, tem um filho com o novo marido e os cinco passam a viver juntos. Popularmente, esta situação caracteriza as tais

famílias Lego, mixed ou mosaico

O fim de um casamento ou de uma união estável não implica de forma alguma na extinção do

poder

familiar do genitor que não detiver a guarda dos filhos

Ivone Zeger Advogada especialista em Direito de Família e Sucessão. Membro Efetivo da Comissão de Direito de Família da OAB-SP

Abril | 33


PATRICIO OTNIEL

Negócios | Minérios

A corrida pelo novo santo graal: o lítio Chile, Bolívia e Argentina tentam aproveitar o boom mundial do lítio, a nova estrela da mineração por causa da eletromobilidade. Uma disputa que revela estratégias distintas, desde um nacionalismo rígido até um pragmatismo empresarial

O 34 | AméricaEconomia

Por Gwendolyn Ledger, Rery Maldonaldo e Lino Solís de Ovando, em Santiago e La Paz

céu fica amarelo, azul, castanho, vermelho durante um dia de trabalho do engenheiro Hernán Cáceres sob o sol impiedoso do deserto do Atacama, no Chile, a 2.500 metros acima do nível do mar. Uma paisagem silenciosa que só é afetada pelas piadas de alguns dos 130 trabalhadores do

local ou por uma insolente música de tecnocumbia que sai das oficinas. Durante o dia, ele passeia pelas 15 piscinas das quais é responsável, cuidando dessa espécie de sorvete de baunilha levemente submergido, salmoura que foi exposta ao sol e submetida à


Lítio:

política do ex-presidente Obama, que apoiou a companhia Tesla na instalação de uma fábrica de baterias”, afirma Eduardo Bitran, vice-presidente executivo da Corporação de Fomento à Produção do Chile (Corfo). Esta confluência levou o mercado mundial a comportamentos inesperados. Para Chris Berry, presidente da consultoria House Mountain Partners, “o preço do lítio aumentou dramaticamente em 2016, até chegar a cifras de três dígitos. Mais do que qualquer outro metal, o lítio foi a estrela e 2017 será o ano em que a execução de projetos deve gerar mais receita no setor do que a simples exploração do lítio”.

vedete dos últimos anos por seu extraordinário potencial eletroquímico

Eletromobilidade Corfo levanta a bandeira da inovação no Chile e defende que o Estado aproveite uma “janela de 15 anos” do boom do lítio (prazo estimado para o surgimento de uma tecnologia substitutiProdução do lítio em Chile, Argentina e Bolívia Fonte: Informe Signum Box, janeiro de 2017

Produção (milhares de toneladas métricas)

País

Argentina Chile

Reservas (milhões de toneladas métricas)

2015

2016

3.600

5.700

2.000.000

10.500

12.000

7.500.000

0

10

0

Bolívia (*)

2017

(*) A Bolívia não registrou produção em 2015 e não tinha reservas em 2017

Uso do lítio em baterias de automóveis híbridos e elétricos Cenário de crescimento em milhares de toneladas LCE Fonte: Relatório Signum Box, janeiro de 2017

Médio

Alto

Baixo

500.000 450.000 400.000 350.000 300.000 250.000 200.000 150.000 100.000 50.000 2035

2033

2034

2031

2032

2030

2029

2027

2028

2025

2026

2023

2024

2021

2022

2019

2020

2017

2018

2015

0 2016

evaporação natural por 18 meses que faz parte do processo de extração do lítio. A exploração do minério acaba revelando as estratégias de cada país. Desde o nacionalismo da Bolívia, o pragmatismo neoliberal da Argentina, e o caso do Chile, o mais inovador do trio, que busca criar uma cadeia de valor que envolva o “cobre verde”, o potencial energético do deserto e a produção de um lítio com maior valor agregado. Os motores a diesel ressoam e extraem a salmoura. São 24 horas de sucção na fábrica Rockwood Lithium. Em breve, o sol vai fazer a sua parte ao longo de um ano e meio, quando a salmoura irá mudar seu tom de turquesa pálida para um amarelo profundo, tornando finalmente possível extrair o lítio: vedete dos últimos anos por seu extraordinário potencial eletroquímico, o componente preferido das baterias recarregáveis de alta densidade energética e o mais leve de todos os elementos sólidos. Estes atributos levaram ao crescimento da produção de compostos de lítio no mundo, passando de 97 mil toneladas de carbonato de lítio equivalente (LCE, na sigla em inglês) em 2005 para 178 mil toneladas em 2012, de acordo com a Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e o Caribe (Cepal); em 2014/2015, o valor chegou a 185 mil toneladas, de acordo com a consultoria Signum Box. Um aumento na produção que irá beneficiar grandes produtores de dispositivos tecnológicos, mas também as indústrias associadas, como as de cerâmica e vidro, que usam 20% das exportações totais de lítio; de gorduras e lubrificantes (13%); cimentos, adesivos, corantes e esmaltes (que somam 10%) e a metalúrgica (7%). Mas não é apenas uma questão de atributos e consumo em alta. O lítio se tornou uma estrela por fatores recentes e simultâneos. “Primeiro, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, em Paris (COP 21). Em segundo lugar, o grave problema da poluição na China e a

Abril | 35


Negócios

Uso do lítio por forma de aplicação Fonte: Relatório Signum Box, janeiro de 2017

2017

Projeção 2035

Baterias para veículos híbridos (HEV) e elétricos (EV)

Uso do lítio - % da produção

18%

52%

Baterias secundárias para dispositivos portáteis

16%

7%

Gorduras lubrificantes

13%

6%

Cerâmica

11%

6%

Baterias ESS (sistema de armazenamento de energia)

7%

2%

Ar condicionado

4%

2%

Baterias para veículos de duas rodas (2WEVs)

3%

8%

Áreas de fundição

3%

6%

Usos médicos

3%

1%

Alumínio

3%

1%

Polímeros

3%

2%

Vidro

3%

5%

Baterias primárias para dispositivos portáteis

2%

1%

Outros usos

11%

1%

Preço médio do carbonato e do hidróxido de lítio (US$/ton)

Fonte: Informe Signum Box, janeiro de 2017 Os preços correspondem à média entre níveis de qualidade em contratos de médio e longo prazo Carbonato de lítio

Hidróxido de lítio

12.000

8.000

2016 (e)

2015

2014

2013

2012

2011

2010

2009

2008

2007

2006

2005

2004

2003

2002

0

2001

4.000

va). O culpado por esse entusiasmo é Bitran, que apresentou um plano que ressignifica e reavalia o potencial do deserto chileno. “Alguém pode facilmente imaginar entre 20 milhões e 30 milhões de veículos elétricos em 2035, o que significa entre 1,5 e 2 milhões de toneladas a mais de cobre. Porque um veículo elétrico requer 65 kg adicionais de cobre – além dos 20 kg de base que possui; alguns falam de até 100 kg!”, destaca Bitran para justificar a importância fundamental de um “cobre verde”, produzido com baixas emissões. Diante desse requisito de sustentabilidade, as pupilas de Bitran se dilatam: “O Chile tem 36 | AméricaEconomia

30% das reservas mundiais de cobre e é o lugar do mundo com a maior radiação solar. Além disso, a maior parte do investimento em mineração está lá”, afirma. A estratégia do país, que envolve sol, cobre e lítio, foi apresentada pelo Chile a líderes mundiais que participaram da COP 22, em Marrakech. A presidente Michelle Bachellet e Bitran compartilharam os detalhes do plano com o ex-primeiro-ministro britânico David Cameron e, como recorda o vice-presidente executivo da Corfo, a primeira reação foi bastante eloquente: “brilhante”. Mas não seria tudo isso apenas um sonho? Não. Em 2016, o Estado chileno e a Rockwood Lithium firmaram um acordo que permitirá à filial chilena da empresa dos EUA Albermarle produzir 82 mil toneladas ao ano de sais de lítio (antes eram apenas 26 mil) com qualidade técnica e aptos a serem usados em baterias durante os próximos 27 anos. Com isso, o Chile poderá abastecer cerca de 30% da demanda mundial de lítio até 2020. Para concretizar essa expansão, a empresa irá investir cerca de US$ 600 milhões localmente e, em troca, o governo chileno vai receber US$ 2,7 bilhões até 2043. Não sonhar com esses desenvolvimentos custaria caro para o país, até porque a obtenção de lítio pelo Chile tem várias vantagens comparativas. Para Ignacio Moreno, ex-subsecretário de Mineração, “as salmouras do salar de Atacama se evaporam durante um período que vai de 14 a 18 meses, graças a uma grande radiação solar e pela total falta de chuvas, custando entre US$ 2.000 e US$ 5.000 a tonelada”. Nuvens no deserto Apesar das promissoras condições do lítio no Chile, do prédio onde trabalha Hernán Caceres é possível avistar nuvens negras. Três quartos do lítio do deserto do Atacama estão localizados em um território apache onde o governo chileno enfrenta um sério problema: uma disputa jurídica com a SQM, uma das quatro produtoras mais importantes do mundo, junto com a Albermarle,


a Talison e a FC. A empresa, cujo acionista majoritário é Julio Ponte Lerou, ex-genro do ditador Augusto Pinochet, é a maior dor de cabeça de Eduardo Bitran. Acusada pela Corfo de não cumprir os acordos econômicos de comércio de lítio estabelecidos desde os anos 1990 com o Estado do Chile, a situação da SQM se transformou em uma grande fonte de irritação para as autoridades, já que criou “incertezas nos mercados internacionais”, afirma Daniela Desormeaux, fundadora e CEO da consultoria Signum Box. E não sem motivo: a companhia mantém, ainda hoje, três processos arbitrais com o Estado. Daí a reação de alívio de empresas de baterias e companhias financeiras como Morgan Stanley diante do acordo com a Rockwood. “O mercado tinha um problema de estabilidade complicado”, diz Bitran. Apesar disso, a SQM segue consolidando sua posição. A empresa produziu até novembro de 2016 cerca de 50 mil toneladas de carbonato de lítio equivalente (LCE, na sigla em inglês) e projeta um aumento na capacidade de produção de hidróxido de lítio no Chile de 6.000 para 13.500 toneladas métricas anuais, crescimento que envolve, além disso, a construção de uma nova fábrica no salar de Carmen. A obra, que envolve um investimento de US$ 30 milhões, deve ser concluída até o final de 2017. Escândalo político O aperto de mãos entre Eduardo Bitran e John Mitchell, presidente da Unidade Global de Lítio da Abermarle – no Chile, no último dia 13 de janeiro – foi, “sem querer querendo”, uma ação terapêutica. O convênio entre Corfo e Rockwood, que assegura a venda de até 25% da produção nacional de lítio com preços preferenciais, representa uma lição de moral para um Estado passado para trás por muitos. Em oposição ao conflito com a SQM, nessa ocasião a Corfo soube incluir aspectos que podem permitir uma posição vantajosa para o Fisco.

As precauções do governo seguem a seguinte lógica: “A empresa (SQM) atuou sem ética. (Isso) obriga a rescindir o contrato porque os termos em que este foi firmado são leoninos”, diz o deputado Alberto Robles, presidente da comissão que revisou o ação de Corfo contra SQM. “Além disso, o caso do financiamento político [um dos maiores escândalos dos últimos tempos, quando foi descoberta a entrega de propina da empresa para candidatos de todo o espectro político] permite compreender por que a empresa não era fiscalizada”, afirma. O contrato com a Rockwood assegura receita ao Fisco até em casos de vendas menores ou prejuízos causados por oscilações de preços internacionais, obtendo uma receita não apenas pelo lítio, mas também pelo cloreto de bischofita, o cloreto de potássio e o cloreto de magnésio. Caso o sangue chegue ao rio (ou seja, se não for possível evitar confronto), o contrato estipula um processo de arbitragem, assim como situações que justificam a rescisão antecipada do convênio.

SQM: empresa produziu até novembro de 2016 cerca de

50 mil

toneladas de carbonato de lítio equivalente

Oferta de derivados de lítio por companhias e outros em 2016 Fonte: Relatório Signum Box, janeiro de 2017

Novos atores

Outros atores

FMC

7%

Tianqui (Talison)

4% 25%

9%

14%

25% China

16%

Albemarle

SQM Abril | 37


Negócios

O Chile concentra

52% das reservas mundiais de lítio

38 | AméricaEconomia

Futuros CEOL Ainda que o panorama com o vizinho SQM tenha sido motivo de inquietação, dentro e fora do Chile, o governo, além de desenvolver seu amplo acordo com a Rockwood Lithium, soube criar um plano B: instruiu a Corporação Nacional de Cobre (Codelco) para que explore o lítio nos salares de Maricunga e Pedernales, na região do Atacama. Uma decisão estratégica para aumentar sua quota de lítio sem ter que recorrer à SQM. Como o próprio governo reconhece, o objetivo é aumentar a oferta nacional e desenvolver produtos de maior valor agregado para aumentar a receita do Estado e gerar valor compartilhado com as comunidades. “O Chile concentra 52% das reservas mundiais de lítio. A isso se soma a nossa ampla experiência na mineração, a estabilidade institucional e macroeconômica do país”, opina a ministra de Mineração chilena, Aurora Williams. Mas o fato de não poderem ser feitas concessões neste setor gera críticas, entre eles o próprio SQM, porque resguarda apenas aqueles que têm propriedades inscritas ou em processo antes de 1979. “E todo aquele que tenha inscrito propriedades mineiras depois [...] o fez sabendo que não lhe garantia o direito de explorar o lítio”, diz Williams. Para o governo, se fossem permitidas concessões, teriam que ser criados acordos exclusivos, o que poderia infringir a atual legislação mineira. “Esse não é um obstáculo para o desenvolvimento da indústria”, diz Williams. Longe desse vai e vem, a Codelco tornou pública – em janeiro de 2017 – sua intenção de encontrar um sócio estratégico para explorar lítio em Maricunga e Pedernales. Por enquanto, o governo chileno trabalha na regulação do decreto que autorize a exploração e, junto com ele, regule futuros CEOLs (Contratos Especiais de Operações de Lítio) que tenham os incentivos

FOTOS: ROCKWOOD

A esperada salmoura, que ocorre sob o efeito do sol

e exigências para os sócios do Estado, aproveitando a expertise adquirida pela Corfo e pelo Ministério de Energia com os chamados CEOPs (Contratos Especiais de Operação Petrolífera). Concessível para hermanos Colocar a mão no bolso e sair para vender ao redor do mundo pode ser uma estratégia. O Voltu, empreendimento realizado pelos irmãos Guillermo Ivan e Gebhart, dois motoristas argentinos, foi uma grande ideia que combinou com o boom do lítio. A ideia partiu de Guillermo, hoje CEO da Voltu Motors Inc.: criar uma motocicleta que pode ser usada tanto na cidade como na estrada. Padrão para homens e mulheres e com um pacote de seis baterias montadas e processadas na Argentina, em sua fábrica no Paraná, cidade natal dos irmãos fundadores da empresa. Como todos os negócios, foi difícil no início, mas recentemente eles conseguiram o status de startup para buscar financiamento. Iván, o advogado, e Guillermo, o bioengenheiro, os sócios majoritários, sonham com a meta de lançar uma motocicleta em 2017 [com base nessas novas tecnologias], receber pedidos e começar a vender já em 2018. Eles já têm dez protótipos e em cada um colocaram um gadget adicional (o mais caro poderia custar US$ 16,5 mil).


Empreendimentos como a motocicleta dos Gerbhart são epifanias plausíveis no ecossistema argentino. Quando se fala de lítio, não se entra em território sagrado. A legislação argentina considera possível a concessão, ao contrário do que estabelece o Chile e a Bolívia em relação ao assunto. A isso se soma um momento de total abertura ao capital estrangeiro, que ficou evidente após o manifesto “Mini Davos” – oficialmente Fórum de Investimentos e Negócios – cuja última edição ocorreu em setembro do ano passado em Buenos Aires. O encontro, organizado pelo governo do presidente Mauricio Macri, atraiu oportunidades de investimentos nas áreas de bens, infraestrutura, serviços, indústria e tecnologia, e atraiu 1.688 empresas de 68 países. Assim, no curto prazo, – entre 2019 e 2020, mais ou menos – quando o Chile, liderando a corrida do lítio, for ultrapassado, será fácil explicar o porquê: a desmistificação do lítio e sua característica de ímã de investimentos, como ocorreu durante o “Mini Davos”, segundo Daniel Meilán, secretário de Mineração da Argentina: “de 30 projetos de mineração, 17 são de lítio”. “Aqui dizemos que a Argentina não é um país mineiro, mas um país com um setor de mineração. Não temos uma Corfo, mas temos lítio. As províncias têm o poder de fazer concessões. Estabelecemos uma natureza estratégica, mas aberta. A Argentina tem uma grande possibilidade de ser produtora de lítio [...] embora estejamos a alguns anos de alcançar a escala de produção que tem o Chile”, afirma. Apesar da modéstia de Meilán, as coisas vão mais do que bem para o lítio argentino. A própria SQM já apostou suas fichas na região de La Puna, zona de confluência das províncias de Jujuy, Salta e Catamarca. De acordo com executivos da empresa, a SQM está envolvida com o projeto do Salar de Caucharí, em Olaroz, cujo potencial de produção chega a 50 mil toneladas anuais de carbonato de lítio.

Anunciada no início do ano passado, será realizada por meio de uma joint venture que significou 50% da Minera Exar, com um investimento aproximado de US$ 500 milhões. “A Argentina oferece um cenário favorável para nosso projeto, em termos de apoio por parte das autoridades”, diz Daniel Jiménez, vice-presidente comercial de iodo, lítio e produtos químicos industriais da SQM. A Rockwood Lithium também consolida sua presença neste país. “Temos que continuar crescendo [...] Temos direitos exclusivos de exploração e aquisição do salar de Antofalla, na província de Catamarca”, dizem. E não se trata apenas de extrair o lítio sem maior processamento. Empresas como a FMC decidiram produzir hidróxido de lítio. Nada desprezível quando pensamos que, atualmente, o Salar do Homem Morto, que hoje representa 9,9% da salmoura mundial, anunciou que irá triplicar sua produção a 30 mil toneladas em 2018.

Salar de Atacama na região de Antofagasta, Chile

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CORFO

Negócios

Painéis fotovoltaicos com baterias de lítio da empresa Enel

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“O Chile não permite a entrada de novos players no mercado. É por isso que acho que as empresas preferem se estabelecer na Argentina”, diz o acadêmico argentino Daniel Barraco, que está à frente do projeto “Do salar para a bateria”, uma joint venture entre a Universidade de Córdoba, o Ministério de Ciência e Tecnologia (Conicet) e a estatal YPF. Além de lítio sob a forma de salmouras, em diversos depósitos de sal, a Argentina também tem o minério em forma rochosa ou espumosa, cujo custo de extração é bem mais elevado, entre US$ 5 mil e US$ 8 mil por tonelada, embora o aumento seja compensado pelo valor que o carbonato de lítio é vendido no mercado, que varia entre US$ 10 mil e US$ 12 mil a tonelada. No entanto, ao somar os projetos em obras ou aprovados, Desormeaux estima que em três anos a Argentina irá produzir 60 mil toneladas anuais, já que a demanda cresce à razão de 15 mil toneladas por ano. “Argentina, Austrália e Canadá são ameaças para o Chile”, diz a analista da Signum Box.

Meilán volta a citar a fórmula do sucesso: “O mercado (de lítio) é livre e se move por oferta e demanda. Se o mercado está sendo desregulado, as empresas estão se diversificando, os Estados não devem interferir nisso, apenas criar condições para os investimentos e permitir a criação de vagas de trabalho”, conclui. E a Argentina de fato as tem criado. Trata-se da nação que mais cresceu em relação ao número de explorações, depósitos e reservas nos últimos anos. “Todos os países [importantes] estão interessados ou começando a se interessar: China, Coreia do Sul, Japão, Estados Unidos, Alemanha e até Reino Unido”, diz Meilán. Dominar o preço mundial Dez toneladas. Sim, você leu certo. Dez toneladas de carbonato de lítio foram vendidas à China por US$ 70 mil em agosto de 2016. Trata-se da maior realização da Estratégia Nacional de Industrialização de Recursos Evaporáveis (Enire) da Bolívia, um dos pilares do modelo de desenvolvimento proposto pelo presidente Evo Morales. A Bolívia tem nove milhões de toneladas métricas de lítio no salar de Uyuni, o que a coloca em uma posição invejável. Por isso, o governo atual justificou a implementação do Enire como um programa de três fases (projeto-piloto em Uyuni, produção industrial e fabricação de baterias) que teve tantos atrasos na sua implementação como reajustes nos valores de investimento desde que foi promulgada em 2008. O acadêmico espanhol Iván Aranda Garoz, formado na Universidade de Quilmes, chegou à Bolívia em 2009 para supervisionar a execução das três fases. Ele não aceita que as conquistas sejam menosprezadas. “A Fase 3 já está em pleno andamento. É uma fábrica em escala experimental em La Palca, Potosí. Ali são feitas baterias de lítio com recursos humanos e materiais bolivianos. Trata-se de um estabelecimento no qual são montadas em média 100 baterias por dia (de 10 amperes para bicicletas e de 8 amperes para celulares)”, afirma.


No entanto, segundo estudo de especialistas, ainda não é suficiente. Chris Berry é taxativo: “Os investidores têm varrido a Bolívia do mapa. Essa nação deve ser capaz de demonstrar que é capaz de atrair e reter investimentos”, afirma. O excesso de ideologia não é todo o problema da nação. O clima em Uyuni dificulta a evaporação das salmouras, nas quais, além do lítio, existem outros 150 elementos. Isso foi resolvido com o processo de “branqueamento”, baseado na adição de cal, “mas que gera grande quantidade de iodo contaminante que a GNRE não sabe processar”, afirma Ricardo Calla, pesquisador do Centro de Estudos para o Desenvolvimento do Trabalho e da Agricultura. Após nove anos, os resultados ainda são escassos. “Há dúvidas sobre a qualidade do processo. E a isso se somam os atrasos e a falta de recursos humanos certificados em relação com os recursos investidos nele, mais de US$ 300 milhões”, destaca Juan Carlos Zuleta, especialista boliviano que já trabalhou com seu governo e com o chileno como assessor internacional da Comissão Nacional do Lítio. Uma perspectiva levantada pelos opositores ao discurso de Álvaro García Linera, em janeiro do ano passado, quando afirmou que graças à Enire a “Bolívia vai definir o preço do lítio no mundo”. Política comum? As últimas semanas não foram muito boas para o governo boliviano. Protestos intensos

“ANTES DO GOVERNO DE EVO MORALES, O PAÍS NÃO TINHA NENHUMA ESTRATÉGIA DE INDUSTRIALIZAR OS RECURSOS EVAPORATÓRIOS. A POLÍTICA ERA A ENTREGA DOS DEPÓSITOS ÀS EMPRESAS TRANS­ NACIONAIS”, AFIRMA ECHAZÚ

contra a Lei Geral da Coca acompanharam os primeiros dias em exercício do vice-ministro de Altas Tecnologias Energéticas, Luis Alberto Echazú. Levando tudo em conta, ele é otimista quando discorre sobre o lítio. “Dificuldades existem em qualquer projeto, sobretudo aqueles relacionados às comunicações e à formação profissional. No entanto, o país está avançando no sentido de superar essas dificuldades, mas ainda assim são projetos que nunca antes foram realizados na Bolívia”, reconhece à AméricaEconomia. Mas Echazú diz que os avanços do Plano de Industrialização do Lítio revelam que conquistaram uma grande vantagem: “soberania sobre nossos recursos naturais, formação de nossos profissionais, além da instalação de uma fábrica-piloto de baterias e de materiais catódicos”, afirma. Assegurar os recursos para todos os bolivianos é um valor que Echazú reitera com frequência. Está claro o desejo do ex-presidente Sánchez de Lozada para explorar o lítio de Uyuni com o setor privado. Hoje ele pode se orgulhar de ter enterrado o passado neoliberal do país. “Antes do governo de Evo Morales, o país não tinha nenhuma estratégia de industrializar os recursos evaporatórios. A política era a entrega dos depósitos às empresas transnacionais”, afirma. E quando é mencionada a aproximação da presidente chilena Bachelet para alcançar com Bolívia e Argentina políticas comuns em torno do lítio, Echazú não tem dúvidas ao afirmar que essa “proposta foi feita por Morales há mais de seis anos”. Uma Opep do lítio? Difícil imaginar algo dessa magnitude por enquanto. Não se trata de mera suposição, mas de sopesar os atomizados integrantes desta disputa sul-americana, competidores que correm pelo deserto defendendo estratégias opostas – nacionalismo, neoliberalismo e oligopólio inovador – atletas que tentam se apoderar do triângulo de ouro branco. Abril | 41


Opinião | Finanças

O

s fundos de pensão representam um setor de grande relevância econômica e social no Brasil. Segundo dados da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar, são 2,5 milhões de participantes ativos, 3,9 milhões de dependentes e mais de 730 mil assistidos, todos associados a um sistema que gere R$ 755 bilhões, o que equivale a 12,6% do PIB brasileiro. Historicamente, as altas taxas de juros vigentes no Brasil permitiram aos fundos de pensão atingir suas metas atuariais sem a necessidade de investimento em instrumentos financeiros mais complexos ou com perfil de risco mais elevado. Todavia, vivemos um momento macroeconômico de queda nas taxas de juros. Em tal ambiente, ficará mais evi-

dente para os gestores desses fundos a necessidade de se buscar ativos que ofereçam remuneração superior àquela determinada pela meta atuarial. Será necessário um alto nível de conhecimento e de capacidade técnica de análise dos mercados financeiros, dos produtos oferecidos e dos riscos envolvidos nas alocações de recursos. A regra atual da Previc, o regulador dos fundos de pensão, prevê que diretores e conselheiros dessas entidades, assim como funcionários envolvidos diretamente com a aplicação dos recursos garantidores dos planos, devam ser certificados e habilitados tecnicamente para exercer seus cargos e funções. Para demonstrar seu conhecimento, esses profissionais devem se submeter a um processo de certificação realizado por instituição autônoma. Porém, as certificações aceitas pela Previc (com a exceção da CGA – Certificação de Gestores Anbima) não têm foco nos processos de gestão de recursos por profissionais que analisem os objetivos de investimento em termos de risco e retorno, formem expectativas sobre os mercados

Mauro Miranda, CFA - Presidente da CFA Society Brazil 42 | AméricaEconomia

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Certificação e habilitação de gestores de fundos de pensão

de capitais e tenham uma sistemática de acompanhamento de resultados e gerenciamento de risco adequados ao segmento institucional. Além disso, certificações baseadas na mera análise de currículo ou cartas de recomendação não atendem a critérios básicos de verificação de efetivo conhecimento técnico e, portanto, não são minimamente suficientes para determinar a qualificação do profissional para a gestão de investimentos. Qualquer programa de certificação para os responsáveis por investimentos em fundos de pensão deve incluir temas específicos como alocação estratégica de recursos, teoria moderna de carteiras, análise de renda fixa, técnicas de imunização de carteiras, investimentos alternativos, estimação do prêmio de risco de ativos de renda variável, análise de múltiplos e precificação de ativos. Sem isso, não estaremos seguros de que a gestão da previdência complementar seja executada por

pessoas que dominam esses conhecimentos técnicos básicos e outros mais avançados. E sem essa segurança, como pode a sociedade confiar que o sistema de fundos de pensão gerará os valores necessários ao pagamento de aposentadorias no futuro? É preciso que a regulação determine regras mais rígidas e padrões mais elevados para a certificação das pessoas envolvidas com a gestão desse volume enorme de recursos. Quero acreditar que vivemos hoje no Brasil um momento de inflexão, em que estamos tomando o rumo de um futuro melhor, em todas as frentes. A alta qualificação dos profissionais de investimento responsáveis pela gestão dos recursos da aposentadoria de milhões de brasileiros será parte essencial dessa mudança de patamar qualitativo. As opiniões apresentadas nesta coluna não representam, necessariamente, a visão das entidades ao qual o autor está associado.



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Agropecuária | Consumo

A carne forte do Brasil

Governo federal lança nova versão do regulamento para produtos de origem animal e endurece regras para fortalecer segurança alimentar. Entenda por que a medida é importante ao consumidor

O 44 | AméricaEconomia

Por Bruna Lencioni, de Brasília

novo Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (Riispoa), assinado pelo presidente Michel Temer e pelo ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Blairo Maggi, em março, introduz mudanças na legislação e multas mais pesadas em caso de irregularidades. O consumidor deve entender que a atualização é relevante para a melhoria na qualidade dos produtos, ou seja, não se trata de uma medida punitiva, somente, aos produtores. “Além de garan-

tir à população a total sanidade e segurança dos produtos de origem animal, o novo regulamento coloca o país em linha com o padrão dos maiores produtores do mundo”, disse Maggi. O ministro contou, em entrevista à AméricaEconomia, na última edição, que a próxima agenda do ministério seria o lançamento da versão atualizada do Riispoa. A Operação Carne Fraca chegou antes, no entanto, provocou forte impacto à toda cadeia produtiva, e o que seria difícil parece ter se tornado providencial. O ministério encontrava resistência do


Na prática O conjunto de regras guia a fiscalização agropecuária em unidades industriais que fabricam alimentos de origem animal (carnes, lácteos, ovos, pescado e mel). Entre elas, a obrigatoriedade de se fazer atualização de rotulagem em um prazo de dez anos. Com isso, o ministério tem maior controle do que está sendo produzido no Brasil. Anualmente, de acordo com Moura, são registrados, em média, 40 mil novos produtos. Em relação aos fiscais, Andréa disse que o Riispoa torna obrigatória a realização de um checklist, o que, para o ministério, vai evitar interferências e influências políticas. “O objetivo nunca é multar, mas informar sobre as regras para que o produtor melhore o seu serviço”, disse. Entre as medidas previstas está a perda do selo do Serviço de Inspeção Federal (SIF) em caso de três irregularidades gravíssimas em um ano.

Produtores agora podem perder o selo do

SIF ,

em caso de irregularidades gravíssimas

WASHINGTON COSTA/MDIC

setor com o novo Riispoa em função de alterações como a sistematização de infrações, que inclui multa de até R$ 500 mil (antes o valor chegava no máximo a R$ 15 mil). No entanto, após a Carne Fraca, o Riispoa surgiu como uma ferramenta extra de sustentação para a segurança alimentar do país. O antigo Riispoa datava de 1952 e sofria alterações desde 2007, quando o ministério decidiu debater um novo modelo. O regulamento tinha 952 artigos e agora são 542. “O novo Riispoa faz parte do plano Agro+. É uma entrega importante do governo para toda a sociedade. Este regulamento dá segurança jurídica ao setor e garante a necessária padronização de processos, de Norte a Sul do Brasil”, afirmou o secretário-executivo do ministério, Eumar Novacki. De acordo com Andréa Figueiredo Procópio Moura, superintendente substituta da Superintendência Federal de Agricultura no Estado de São Paulo, 4.837 empresas estão submetidas ao documento.

Blairo Maggi, o presidente Michel Temer e o secretárioexecutivo Eumar Novacki, durante assinatura do decreto do novo Riispoa Abril | 45


Agropecuária

O novo documento em tópicos O Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (Riispoa) traz alterações significativas nos setores de carnes, lácteos, ovos, pescado e mel. Entenda por que a medida é importante ao consumidor por meio da análise dos principais tópicos do novo documento.

Fiscalização O consumidor de Norte a Sul passa a ter assegurada a mesma qualidade tecnológica e sanitária por consequência da padronização dos critérios de fiscalização em todo o país.

Segurança alimentar

Infrações

Garante ao consumidor que pequenas agroindústrias de produtos de origem animal também seguirão processos totalmente seguros. Exemplo: pequenas queijarias.

Estabelece critérios claros para aplicação de medidas cautelares e penalidades, classificando-as em leves, graves e gravíssimas. Por exemplo, quem tem três infrações gravíssimas perde o registro do SIF.

Autoriza estabelecimentos, antes limitados a produção de pouca variedade, a incorporar novas tecnologias para criação de outros produtos ao mercado.

Meio ambiente Possibilita o aproveitamento de resíduos industriais de produtos de origem animal na elaboração de produtos não comestíveis (graxaria e ossos para fazer materiais como artesanato). A medida preserva o meio ambiente do descarte desses resíduos.

Verifica excesso de água no frango, assim como as situações em que os produtos são considerados impróprios para o consumo. Inclui na rotina de fiscalização a realização de análises de biologia molecular e exames de DNA. Por exemplo, para identificação de espécies de peixes (panga/linguado), ou verificação da autenticidade do mel.

FOTO E ILUSTRAÇÕES: SHUTTERSTOCK

Alinha as normas brasileiras às regras vigentes nos países mais desenvolvidos do mundo. Deixa o país mais competitivo nos seus processos, o que permite maior agregação de valor e renda.

Fraudes econômicas

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Opinião | Gestão de crise

Soco no estômago

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anúncio da maior operação já deflagrada pela Polícia Federal no país foi feito numa sexta-feira. Naquele fim de semana, os churrascos pelo Brasil afora foram cancelados. Foi quase um Sábado de Aleluia antecipado. Mas nas ruas quem estava sendo malhado, vestido de Judas, era o produtor brasileiro de carne. “Foi um soco no estômago”, gemia o ministro da Agricultura, Blairo Maggi. E o mercado brasileiro produtor de proteína animal vergou logo no começo. Esfacelou-se como um boneco atingido a pauladas. O preço da arroba do boi despencou e os animais ficaram nos pastos. O abate foi drasticamente reduzido. Um negócio de US$ 3,5 bilhões em exportações havia sido atingido em pleno voo. Depois de exportar US$ 60 milhões ao dia, uma semana após o anúncio da Operação Carne Fraca esse número despencara drasticamente para US$ 74 mil ao dia.

China, o maior destino da nossa carne bovina, e Japão suspenderam a importação do produto brasileiro. Estados Unidos e União Europeia entortaram a boca com desconfiança. As acusações da Polícia Federal eram de tirar o apetite de qualquer um: comercialização de carne vencida, uso de substâncias cancerígenas para mudar o aspecto do produto, recheio de papelão nos embutidos, linguiças de carne de cabeça de porco. Mas nossa crise não era de qualidade. E sim de confiabilidade. Uma crise de credibilidade, de reputação. A Polícia Federal brasileira tinha dado um tiro no pé do Brasil ao enxovalhar nosso terceiro mais importante produto na pauta de exportações. Em uma entrevista coletiva desastrosa, a PF embalou todos os frigoríficos brasileiros no mesmo saco. Usou e abusou das exclamações e


de termos superlativos, apesar de ter investigado, por dois anos, apenas 27 dos cerca de 5 mil pontos de produção de carne no Brasil. E de ter cassado somente a licença de quatro, interditado três, ou seja, 0,4% dos frigoríficos em operação no Brasil. A probabilidade de se consumir algo fora do padrão era igual à de ganhar na loteria. Não que fosse tudo mentira. Realmente aqui e acolá havia abusos da indústria de carnes. Principalmente corrupção de fiscais do Ministério da Agricultura, que fecharam os olhos para irregularidades sanitárias em troca de dinheiro ou de... acreditem... picanha! Sim, peças de picanha. Só por esse fato a PF já poderia ter ocupado as manchetes que almejava. Não precisava ter carregado nas tintas. O que ocorreu foi uma baita barbeiragem de comunicação. Justo a Polícia Federal, que havia conquistado tanto crédito perante a opinião pública nos últimos tempos com as prisões espetaculosas de políticos e empresários corruptos. Aliás, não por coincidência, o espalhafatoso anúncio das irregularidades, que poderia ter ocorrido em qualquer dia, foi marcado para a data do terceiro aniversário da Operação Lava Jato. “A culpa é da imprensa”, disse o delegado responsável pelas investigações, Mauricio Moscardi Grillo, em uma tentativa de dividir responsabilidades, depois de ter percebido a repercussão das informações divulgadas por ele. Já seu colega Carlos Eduardo Sobral, presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal, preferiu falar em “falha de comunicação”. Corrigi-la era um trabalho dos gestores de reputação nas empresas ou nas agências fornecedoras de serviços de comunicação. Depois de um breve primeiro momento atordoados com tantas informações erráticas e tecnicamente imprecisas, as empresas reagiram, mostrando agilidade e competência dos seus profissionais. Jornalistas e influenciadores receberam explicações de especialistas gabaritados, que passaram a ser fontes de informação também da imprensa. Funcionários dos frigoríficos foram instados a testemunhar a

favor da nossa carne e houve até um churrasco organizado por operários de uma unidade no interior do Brasil. A polícia estava chamuscada. A reação das empresas, via imprensa e redes sociais, obrigou o governo a tomar uma posição. O ministro Maggi exigiu da PF uma nota desmentindo o “mau funcionamento generalizado do sistema”. E ela foi assinada por ninguém menos do que o diretor-geral da PF, Leandro Daiello, quase como uma confissão dos erros de divulgação cometidos por seus subordinados. A população, enojada em um primeiro momento com as denúncias, passou a entender que podia voltar a comer salsicha. Mas não bastavam os brasileiros. E o Ministério da Agricultura, também muito bem orientado por seus estrategistas de comunicação, passou a convocar a imprensa internacional para entrevistas exclusivas em que se corrigiam as notícias veiculadas. O ministro chegou a convidar a equipe de uma das mais importantes emissoras de TV chinesa para visitar aleatoriamente qualquer frigorífico brasileiro de surpresa. A ofensiva midiática deu resultado, e nossos principais importadores de carne passaram a, no mínimo, recuperar suas posições. Mas ficam os prejuízos. Em apenas dois dias, as ações dos principais frigoríficos chegaram a cair até 10%. Calculam-se perdas de até R$ 1 bilhão. E, se a sangria não fosse contida, especialistas acreditam que o impacto no PIB brasileiro poderia ter sido de redução de até 1% este ano. Felizmente, o fogo abaixou. Fica a lição: quando se fala em crises como essa, os especialistas em comunicação devem rapidamente entrar em cena; não se pode improvisar. Afinal, reputação é o maior patrimônio que uma empresa pode ter.

Em uma entrevista coletiva desastrosa, a PF embalou todos os

frigoríficos brasileiros no mesmo saco

O ministro Maggi exigiu da PF uma nota em que se

desmentia

o “mau funcionamento generalizado do sistema”. E ela foi assinada por ninguém menos do que o diretor-geral da PF, Leandro Daiello

Marco Antonio Sabino Sócio e presidente da S/A Llorente & Cuenca, agência especializada em gestão da reputação

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Negócios | Tecnologia bancária

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Por Beatriz Santos, de São Paulo

nvestimento em tecnologia da informação (TI) pode até ser uma nova questão a ser acrescida no budget de muitas empresas nos últimos anos – mas não para as instituições bancárias. Isso porque soluções e serviços inovadores já começavam a despontar em meados dos anos 1960, quando chegaram


O futuro

dos bancos Cifras dos investimentos do Brasil em TI estão equiparadas às de países como França, Alemanha e Índia. Realidade do fim das agências se aproxima

por aqui os primeiros computadores no setor financeiro. No entanto, agora há um boom de dinheiro no setor para atender o cliente digital. A novidade está nos números que os bancos trazem sobre o uso cada vez mais maciço dos smartphones para o acesso aos dados e transações.

A onda de dinheiro no segmento movimenta um mercado gigantesco de tecnologia. De acordo com os últimos dados da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), os investimentos mais as despesas com TI feitos pelos bancos brasileiros totalizaram R$ 19 bilhões em 2015. Segundo um levantamento da consultoria Gartner, de um total

Investimentos mais as despesas com TI totalizaram

R$ 19 bi em 2015

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Negócios

Investimentos do Brasil em TI estão alinhados com países como França, Alemanha e Índia

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de US$ 51 bilhões em investimentos e despesas em TI, o setor bancário é responsável por 13%, atrás apenas do governo, que investe 14%. A cifra deixa o país em 7º lugar em investimentos em tecnologia neste segmento, uma vez que se considera as dez maiores economias do mundo. Deste total, 44% foram aplicados em software, 35% em hardware (equipamentos) e 20% em telecomunicações. Além disso, tais dados fazem do Brasil o Bric que mais investe em TI na comparação com a proporção do Produto Interno Bruto (PIB). “É importante ressaltar que, quando se calcula os gastos em tecnologia da informação como proporção do PIB, os investimentos do Brasil estão alinhados com países como França, Alemanha e Índia”, afirma Gustavo Fosse, diretor setorial de tecnologia bancária da Febraban.

Canais digitais Em uma escala de evolução, as primeiras tecnologias implementadas foram os processos em tempo real, depois a expansão da rede de caixas eletrônicos, o desenvolvimento de soluções de biometria e, por fim, a criação dos canais de internet e mobile banking – atualmente, os mais utilizados pelos clientes bancários. “O cliente está cada vez mais conectado e busca cada vez mais os canais digitais para lidar com suas finanças”, afirma Fosse. Hoje, os canais digitais são responsáveis por 54% das transações bancárias, ante 38% em 2011. O número de contas habilitadas para o uso do mobile banking – via aplicativos – cresceu mais de 16 vezes entre 2011 e 2015, passando de 2 milhões para 33 milhões. Em 2015, os canais digitais foram responsáveis por 54 bilhões de


Mobile first Atuar como uma startup e lançar soluções inovadoras todos os meses – principalmente para os mobile banking. Esta é a intenção do banco Santander, que observou um aumento de clientes digitais nas plataformas da instituição. “De todas as transações financeiras feitas no banco, 75% foram em canais digitais. Isso é uma tendência do mercado e, nos últimos anos, empreendemos várias iniciativas a fim de digitalizar o cliente”, declara Alessandro Andrade, superintendente executivo de canais digitais do banco. Para Andrade, o cliente por si só é digital. “No dia a dia, ele está com o celular na mão, no ponto de ônibus, na rua, no trabalho. Então o que precisamos fazer é estar presentes nesses momentos”, declara. Para isso, eles utilizam o conceito de mobile first, que nada mais é do que pensar em novas soluções e priorizá-las para o mobile. A intenção é que seja possível realizar importantes transações com o menor número de cliques. “Hoje, quando o cliente abre o aplicativo, ele já tem pelo menos três informações importantes. Em um só clique ele já pode fazer uma transferência ou um pagamento e pode

visualizar o saldo. Abaixo, também com um só clique, a partir do quanto ele tem na conta, pode fazer um empréstimo ou contratar produtos de investimento. Simplicidade é o nome do jogo”, explica Andrade. Para que estas ferramentas sejam implementadas em um tempo hábil, o Santander mudou a forma de trabalhar e, hoje, são guiados pelo método ágil – basicamente o que fazem as companhias como Spotify e Netflix, por exemplo. “Estas empresas fazem todo mês melhorias nos aplicativos e é um processo rápido. Então nos inspiramos nelas”, conta o executivo. O que antes poderia demorar cerca de nove meses, agora pode ser feito em apenas um. O novo modelo é dividido em células de trabalho; alguns andares do prédio da instituição, que juntos contam com mais ou menos 600 colaboradores,

Gustavo Fosse, diretor setorial de tecnologia bancária da Febraban e diretor de tecnologia do Banco do Brasil

Em 2015, os canais digitais foram responsáveis por

54 bilhões de transações

DIVULGAÇÃO

transações, 70% a mais do que há quatro anos. “Isso mostra uma mudança relevante de comportamento do usuário”, declara o diretor. Um dos fatores que consolidaram os canais digitais por aqui está relacionado ao acesso à internet no Brasil – hoje, alcança 56% da população. O uso dos smartphones também contribui: se olharmos o cenário mundial, estamos acima da média, que é de 37%. Tais números que estes canais apresentam atraíram investimentos expressivos às instituições financeiras. “Estas plataformas se tornaram uma expressiva porta de entrada para a inclusão financeira de milhões de brasileiros pela possibilidade de carregar no bolso e acessar, a qualquer momento, serviços antes restritos a agências bancárias”, observa Gustavo Fosse.

Abril | 53


Negócios

trabalham em conjunto. “As pessoas trabalham juntas, em mesas de trabalho multidisciplinares. Têm um líder, o responsável pela tecnologia, o de design, o de segurança. Assim, ao final de algumas semanas de trabalho, conseguimos lançar uma ferramenta nova”, exemplifica Andrade. Curva acentuada de crescimento Do total de 26,8 milhões de correntistas do banco Bradesco, 13,8 milhões são clientes digitais – praticamente a metade. Hoje, 41% das transações são feitas pelo Bradesco Celular, alcançando um recorde diário de 20,3 milhões de transações – em 2008, esse percentual era de 1%. A internet representou 36% do total de transações, o Fone Fácil 2% e o autoatendimento 15%. “A maioria das transações do banco já é feita por canais digitais, como internet, mobile, ATM e contact center. O Bradesco Celular é o principal canal utilizado e, nos próximos anos, essa curva só vai aumentar”, afirma Luca Cavalcanti, diretor-executivo do Bradesco. Uma nova tecnologia que está em andamento para ser lançada nos próximos meses é o Bradesco Inteligência Artificial (BIA), que consiste em uma plataforma de tecnologia cognitiva já implantada internamente para dar suporte às agências, tirando dúvidas dos funcionários a qualquer hora e lugar. Outro projeto é a Biometria de Voz, que já está sendo implementado em maneira beta (versão de teste) e deve expandir durante 2017.

UM DOS FATORES QUE CONSOLIDARAM OS CANAIS DIGITAIS NO BRASIL ESTÁ RELACIONADO AO ACESSO À INTERNET – HOJE, ALCANÇA 56% DA POPULAÇÃO. O USO DOS SMARTPHONES TAMBÉM CONTRIBUEM: DIANTE DO CENÁRIO MUNDIAL, O PAÍS ESTÁ ACIMA DA MÉDIA, QUE É DE 37%

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O saque sem cartão, apenas aproximando um celular com tecnologia NFC, também já está disponível. “O cliente precisa apenas configurar o valor no aplicativo e, ao chegar no terminal de autoatendimento com o smartphone, realiza o saque na metade do tempo e sem a necessidade de utilizar o cartão”, explica Cavalcanti. Presença no polo mundial de tecnologia Nada de divisão sobre quem é digital ou não, o Banco do Brasil considera que todos os clientes são digitais. Claro, uns com mais intensidade, outros com menos. E é nesta intensidade que o banco enxerga um aumento expressivo. Em 2016, o canal que mais transacionou no banco foi o mobile, com 38,6%. A internet representou 26,4%, enquanto o atendimento presencial somente 3,5%. “Hoje são mais de 600 projetos em andamento. O que estamos trabalhando em termos de tecnologia é cada vez mais melhorar a experiência do cliente, fazer com que meu cliente digital faça um uso mais intensivo das soluções digitais”, afirma Gustavo Fosse, que também é diretor de tecnologia do Banco do Brasil. Segundo este conceito, o Banco do Brasil criou há cerca de oito meses um laboratório de tecnologia no Vale do Silício – o polo mundial de tecnologia na região na Califórnia, Estados Unidos (EUA). Existe uma equipe fixa por lá, e a cada três meses uma outra equipe sai do Brasil para o laboratório com o objetivo de trazer, ao final deste período, uma solução totalmente inovadora e diferente com base na experiência que vão ter na região em contato com as demais fintechs, startups e grandes empresas de tecnologia. “Paralelo a isso, nós também criamos um laboratório em Brasília em janeiro deste ano, onde trabalhamos com experimentações de novas tecnologias. Este grupo baseado aqui no Brasil atua em contato com fintechs, startups, universidades, aceleradoras, a fim de tentar trazer as melhores soluções para os nossos clientes”, afirma Fosse. Uma das soluções é o Conta Fácil: basta baixar o aplicativo e abrir uma conta de pagamento para


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quem ainda não possui conta no Banco do Brasil. Além disso, o correntista agora pode emitir uma senha de atendimento presencial pelo aplicativo, que dá uma estimativa de tempo para o atendimento. As senhas entram em uma fila virtual e o cliente efetua o check-in pelo aplicativo quando chegar à unidade do banco. A reestruturação anunciada pelo banco há alguns meses, além de ser uma estratégia de negócio, é uma avaliação do que o cliente quer, de acordo com o executivo. “Estamos em constante avaliação do que o cliente quer. A reestruturação é consequência das escolhas dos nossos clientes. Se ele quer ser atendido presencialmente, vai continuar sendo; se optar por um atendimento digital, que é o que tem se mostrado como o principal, ele vai ter esse atendimento da melhor maneira possível”, explica. Fintechs Ao pé da letra, uma fintech é a junção dos termos financial e technology. Ou seja, são startups que criam inovações na área de serviços financeiros, tornam o mercado de finanças mais eficientes. Hoje, são mais de 250 fintechs no Brasil, distribuídas num grande leque de categorias, entre elas pagamentos, crédito, investimento e até seguros.

“A crise de 2010 nos Estados Unidos juntou o desemprego em alta, a urgência de cortar gastos e muitos especialistas sem trabalho no mercado, principalmente bancários. Este grupo de pessoas com expertise no mercado financeiro criou um cenário onde a inovação disruptiva era a única chance de sobrevivência”, conta José Prado, cofundador e diretor-executivo da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs). Um exemplo é a Rico, uma corretora de valores 100% digital voltada para pessoa física, ou seja, para quem quer investir em um ambiente digital, sem a necessidade de ir a um lugar físico. “Nossos clientes são investidores que estão começando, querem sair do ambiente bancário e já estão familiarizados com a internet. Têm de 25 a 40 anos e quer fazer esse serviço por ele mesmo, diretamente, sem a intermediação de um gerente”, explica Mônica Saccarelli, sóciadiretora da Rico. Pela plataforma e aplicativo intuitivos, o investidor consegue fazer tudo sozinho. As opções

Fintech é a junção dos termos financial e technology

Abril | 55

TOCK


Negócios

de investimentos são em Tesouro Direto, Renda Fixa, que é CDB, LC, LCI e LCA, investimentos mais sofisticados, como fundos de investimentos e imobiliários, e também no mercado de ações. Hoje, são mais de 110 mil investidores na plataforma. “Nós tivemos um recorde de abertura de contas no mês de janeiro deste ano”, conta a diretora. Existem também as fintechs que atuam como ponte entre os investidores e empresas, que é o caso da Nexoos. Em atuação há cinco meses em São Paulo e há pouco mais de um ano no Paraguai, a plataforma conecta pequenas e médias empresas que precisam de empréstimos e investidores pessoa física que estão dispostos a fazer investimentos ao financiar estas empresas. “Ao invés de um investidor colocar o dinheiro na poupança e o banco fazer os empréstimos para outras empresas, é como se ele fizesse diretamente este processo, com um retorno muito maior”, explica Daniel Gomes, cofundador e CEO da Nexoos. Também inteiramente digital – inclusive as assinaturas –, a plataforma tem um rendimento superior aos seus concorrentes: um empréstimo pode render em média 23% ao ano sobre volume investido. “A gente consegue uma taxa mais

Hoje, são mais de

250

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fintechs no Brasil, distribuídas em um grande leque de categorias, entre elas pagamentos, crédito, investimento e até seguros

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barata para as empresas, principalmente porque não precisamos de uma garantia real, como um imóvel ou veículo, por exemplo”, declara Gomes. Pioneiro no segmento de bancos online, o Sofisa Direto tem como objetivo ser um banco diferente, contestador. Oferecem a mesma rentabilidade para investimentos de R$ 1 a R$ 1 milhão sem cobrança de taxas e tarifas. A opção tornou-se muito atrativa. “O mercado do qual fazemos parte está em franco crescimento. Ano passado, a poupança perdeu R$ 40,7 bilhões líquidos e, em 2015, foram R$ 53 bilhões. Este dinheiro está à procura não somente de melhores rendimentos, mas também de condições mais vantajosas”, afirma Leo Cherman, responsável pelo Sofisa Direto. Sobre a concorrência num momento que surgem muitas fintechs, Cherman é objetivo – não é um problema. Pelo contrário, é ótimo. “Somos 100% digital desde 2011, nascemos assim. São seis anos pensando em como evoluir e entregar a melhor experiência para os nossos clientes. Ser somente digital sem entregar valor não adianta nada. Nosso esforço está em trazer algo de valor ao cliente, que mude sua relação com o seu banco. O futuro não será somente digital, será também diferente em outras dimensões”, finaliza.



Entrevista | Michael Casey, conselheiro sênior da Iniciativa de Moeda Digital do MIT

Modelo digital traz transparência, diz especialista do MIT Por Marcelo Almeida, de São Paulo

E

DIVULGAÇÃO

m entrevista à AméricaEconomia durante o evento “Emerging Links”, que ocorreu nos dias 5 e 6 de abril em São Paulo e foi o primeiro no Brasil focado nas tecnologias que envolvem o blockchain – conceito que envolve bases de registros e dados compartilhados que têm a função de criar um índice global para as transações em um mercado, como uma espécie de livro-razão público, permitindo maior segurança e agilidade nas transações online – Michael Casey, jornalista por 18 anos no “Wall Street Journal” e agora conselheiro sênior da Iniciativa de Moeda Digital do MIT, destacou as principais mudanças que devem ocorrer na área financeira, sobretudo no modo como os bancos funcionam.

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AméricaEconomia – Você acha que o caso do blockchain/bitcoin é parecido com o do modelo de compartilhamento popularizado pelo Napster, que de início parecia uma tecnologia disruptiva, que deveria ser combatida, mas que agora começa a ser adotada por diversas companhias e instituições por ser uma necessidade devido a suas caraterísticas inovadoras? Michael Casey – A questão central é como vão reagir os grandes bancos, como o JP Morgan, o Citibank e empresas de seguros, que estão trabalhando dentro do sistema para otimizar seus processos, em relação a essas tecnologias. Então eu diria que sim, já existe uma compreensão de que eles não conseguem lutar contra essa tecnologia e que esse modelo lhes dá benefícios. Eu acho que eles sabem, no final do dia, que as inovações vão levar a um modelo peer-to-peer pleno [que remova qualquer intermediário]. E se nós vemos isso como o futuro do sistema financeiro, então eles [as insti-


AE – Porque, basicamente, esse novo modelo deve interferir nos lucros dos bancos na medida em que algumas transações se tornam realmente peer-to-peer. MC – Vai remover o intermediário, então as taxas que iriam para os bancos acabarão indo para a plataforma que realiza essa transação direta. AE – Mas algumas pessoas acabam radicalizando e chegando ao ponto de dizer que os bancos vão se tornar obsoletos. MC – Os bancos terão que mudar. A ideia do que significa um banco vai mudar radicalmente. Eu adoro a ideia de que os bancos saíssem do ramo de pagamentos e se tornassem apenas provedores de crédito. Eu espero que a ideia de que os bancos precisam exercer um papel em transações e movimentações de dinheiro entre indivíduos desapareça um dia e que eu e você possamos fazer transações de forma direta. AE – Mas isso já está acontecendo... MC – Há muita coisa acontecendo: finanças em modelo peer-to-peer, outros mercados privados, que permitem uma relação mais direta entre os acionistas e as corporações. Acho que os bancos ainda têm um papel. Eles agregam capital e são provedores de crédito. Nós ainda precisamos de empréstimos, uma economia globalizada depende deles. O crédito pode ter diferentes formas e não ser apenas resultado dessa intermediação. AE – Então o papel do banco ficaria restrito a prover crédito? MC – Nós não sabemos como será o futuro. Precisamos questionar: o que os bancos fazem

de bom para a sociedade? Para mim, é a expertise em relação à intermediação de crédito. AE – No debate, você disse que países que não são muito desenvolvidos ou não têm um sistema financeiro muito desenvolvido facilitariam a implementação desse tipo de nova tecnologia. Por quê? MC – Pode ser mais fácil e trazer mais benefícios. É muito difícil construir sistemas financeiros sofisticados se você não tem instituições em que pode confiar. Se você não tem acesso a um serviço de segurança durante as transações, se você não tem estruturas regulatórias confiáveis, enfim, se você usa o modelo padrão que envolve uma estrutura centralizada, torna-se bem difícil criar um mercado de capitais. Então, a falta de instituições (ou de instituições confiáveis) é o problema e o que o novo sistema diz é: esqueçam essas instituições, tentem criar garantias e melhorias por meio da tecnologia que permitam realizar transações confiáveis. Trata-se de uma forma de resolver vários problemas. Em alguns países que não têm um sistema judiciário eficiente, na hora de fazer uma transação eu posso precisar recorrer à justiça e processar alguém. Então, diante desse sistema pouco confiável, vou acabar não fechando o contrato. Não estou dizendo que você não precisa do judiciário, mas se você tem um sistema privado que te dá muito mais segurança em relação à informação que recebe e que tem executabilidade, ou seja, a capacidade de realizar transações, então eu posso não depender mais do judiciário e ter mais confiança em fechar negócios porque já não é tão importante um sistema judiciário eficiente. Esses são os tipos de ideias que devemos explorar. Creio que o mundo desenvolvido estará à frente dessas

“Existem muitas mudanças acontecendo, mas ao mesmo tempo existem muitas

barreiras”

“ESPERO QUE A IDEIA DE QUE OS BANCOS PRECISAM EXERCER UM PAPEL EM TRANSAÇÕES E MOVIMENTAÇÕES DE DINHEIRO ENTRE INDIVÍDUOS DESAPAREÇA UM DIA”

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tuições financeiras] irão administrar esse processo da melhor forma que conseguirem, protelando a implementação total desse modelo para continuar a fazer o que estão fazendo há décadas. Existem, então, muitas mudanças acontecendo, mas ao mesmo tempo existem muitas barreiras para introduzir essa tecnologia em um formato peer-to-peer pleno.

Abril | 59


Entrevista

“As melhores oportunidades estão nos países

emergentes”

Acho que há uma inter-relação entre bitcoins e inovação na Argentina. Na Venezuela eles têm outros problemas. Essas características podem ser aplicadas ao Brasil. Quando você tem uma crise e uma falta de confiança, você tem a oportunidade de construir algo em cima disso. Então acredito que em toda a América Latina existem grandes oportunidades nesse setor.

iniciativas, mas que as melhores oportunidades estão nos mercados emergentes porque eles não têm as instituições necessárias para realizar as transações que ocorrem em países desenvolvidos. AE – Aqui na América Latina nós temos diversos países que se enquadrariam nessa condição. MC – Eu conheço bem a América Latina, até porque vivi por seis anos na Argentina, visitei a Bolívia e conheço vários desses problemas. Na Argentina existem problemas fundamentais de confiança em relação à governança do dinheiro. Houve uma grande quebra de confiança entre as pessoas e quem comanda o sistema monetário do país e, por isso, o bitcoin se tornou bastante popular, assim como na Venezuela, porque essas instituições não funcionam nesses locais e acaba se tornando um mecanismo substituto para fazer transações.

AE – Mas no caso do Brasil os escândalos e crises ocorreram mais recentemente, isso não nos coloca em outra posição em relação a países na América Latina que já estão em crise há muito tempo? MC – Creio que sim, mas eu fiquei bastante surpreso positivamente. Realizamos o Blockchain Challenge e pedimos a startups brasileiras para apresentarem propostas de como usar o blockchain ou criarem um conceito de algo que usaria. Cinco empresas participaram, cada uma de um setor bem diferente das outras, e todas eram realmente interessantes, muito dinâmicas e foi extremamente encorajador.

AE – Esses dois países citados são os que mais usam moedas virtuais na América Latina? MC – Eu não tenho o número exato, mas a Argentina, sem dúvida, em nível per capita, é um dos países que mais usa bitcoins no mundo inteiro. E na Venezuela aparentemente está se tornando popular. Mas eu acredito que, na Argentina, ironicamente, o bitcoin dá uma oportunidade de desenvolver outras tecnologias relacionadas ao setor porque o país tem uma cultura de startups relativamente bem estabelecida e existem alguns inovadores por lá.

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AE – Então a crise facilitaria nesse processo? MC – Sim, crise gera oportunidade. E um dos benefícios fundamentais que essa tecnologia traz é a transparência. Um exemplo seria o caso de despesas do governo, já que agora podemos rastrear pagamentos de qualquer agência federal que você quiser para alguém que irá construir uma ponte e ver para onde foi o dinheiro, como foram feitos os pagamentos, se tudo foi feito de forma correta. Uma transparência que poderia permitir ao Brasil provar a si mesmo que é capaz de sustentar seu crescimento em práticas lícitas.

60 | AméricaEconomia

AE – Não é irônico que a moeda virtual que permitiu o surgimento do Silk Road e outros sites que vendiam materiais ilícitos agora seja vista como uma valiosa forma de garantir transparência? MC – Ironicamente, a maior preocupação atual com o bitcoin é que ele seria “transparente demais”.



Opinião | Meios de pagamentos

Pagamentos digitais na América Latina

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revolução digital na América Latina está impulsionando uma dramática transformação no comportamento do consumidor e na vida das pessoas. O digital está transformando a maneira como interagimos e fazemos negócios. De modo bastante significativo, a era digital representa a maior mudança nos meios de pagamento desde o advento do cartão de plástico, motivo pelo qual veremos mais mudanças no setor nos próximos cinco anos do que vimos nas últimas cinco décadas. No Fórum Econômico Mundial realizado na América Latina este ano, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) pediu que os governos utilizem seu poder de compra para apoiar e encorajar o desenvolvimento de serviços digitais de pagamento para o dia a dia de cidadãos e empresas. E eu concordo plenamente. A América Latina se destaca como o terreno ideal para novas tecnologias e serviços de pagamento, em grande parte devido a três fatores: 1. A América Latina possui uma das populações de usuários de smartphone que cresce mais rápido no mundo hoje. Em média, cada família possui três dispositivos conectados, sendo o smartphone o dispositivo mais desejado pelos usuários; 2. O Relatório de Mobilidade 2015 da Ericsson previu que haverá 850 milhões de assinaturas móveis (smartphones, PCs, tablets, roteadores móveis e telefones básicos) até 2021. Enquanto isso, a penetração de assinantes únicos na América Latina e no Caribe cresceu de 56% em 2010 para 68% em 2015, segundo um estudo da


DE MODO BASTANTE SIGNIFICATIVO, A ERA DIGITAL REPRESENTA A MAIOR MUDANÇA NOS MEIOS DE PAGAMENTO DESDE O ADVENTO DO CARTÃO DE PLÁSTICO, MOTIVO PELO QUAL VEREMOS MAIS MUDANÇAS NO SETOR NOS PRÓXIMOS CINCO ANOS DO QUE VIMOS NAS ÚLTIMAS CINCO DÉCADAS GSMA Intelligence, e a estimativa é que alcance 79% em 2020; 3. A América Latina registrou um crescimento gigantesco no e-commerce. Segundo a pesquisa de 2016 da Business Insider (BI) Intelligence, é a segunda região que cresce mais rápido, atrás somente de Ásia-Pacífico. Ao mesmo tempo, a América Latina e o Caribe caminham a passos largos para desenvolver seu sistema financeiro, segundo a última edição do Global Findex. Por exemplo, 51% dos adultos na região possuem agora uma conta bancária, comparado a 39% em 2011. Na Argentina, a titularidade de contas bancárias entre os 40% mais pobres dobrou para 44% de 2011 a 2014. Na região, 28% dos adultos fazem pagamentos diretamente pela sua conta, utilizando cartão de débito, comparado à média de 14% nos países em desenvolvimento. Enquanto os bancos continuam sendo vistos como o lugar “mais seguro” para as informações financeiras dos consumidores, vêm crescendo os números de uso móvel, novas vendas de aparelhos, serviços digitais e a da expansão do wi-fi, o que aponta para uma mudança cultural. Para que os consumidores da América Latina e do Caribe passem suas atividades bancárias e de pagamentos – baseada em grande

parte no contato e nas relações pessoais – para aplicativos móveis, os players de tecnologia e financeiros precisam ganhar sua confiança. Isto pode ser feito através da educação dos consumidores sobre como utilizar os aplicativos móveis e navegar em sites, assegurando a eles que seus dados e as informações de seus cartões estão em segurança. No entanto, para apoiar de verdade as pessoas e as companhias da base da pirâmide, é crucial trabalhar em conjunto com os governos locais para entender melhor os valores culturais e as necessidades de cada comunidade, ajudando a trazê-los para a economia dos pagamentos digitais. Pense nos milhões de pessoas que precisam se deslocar até seu local de trabalho todos os dias, ou se deslocar pela cidade, utilizando transporte público. Estamos trabalhando com bancos e companhias de transporte na América Latina para permitir que os cartões de banco dos passageiros sejam utilizados para pagar as tarifas, de maneira simples e segura – um modo excelente de gerar mobilidade para as pessoas e claramente demonstra os benefícios e vantagens dos pagamentos eletrônicos. Por exemplo, na Colômbia, os passageiros já acessam os sistemas de transporte de massa utilizando seus cartões de banco em Bogotá, Cali, Barranquilla e Medellín, enquanto no Brasil os consumidores já estão utilizando a mesma solução de transporte público em São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. As evidências são claras: as pessoas na América Latina querem uma vida mais conectada e, com isso, a revolução nos pagamentos é iminente em uma região onde o apetite por mudança digital é enorme.

A América Latina possui uma das populações de usuários de

smartphones que cresce mais rápido no mundo hoje

Gilberto Caldart Presidente da MasterCard para a região da América Latina e do Caribe

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Negócios | Entretenimento

A guerra das

OTT

Diante da crise da televisão aberta e a expansão do acesso à internet, as plataformas Over the Top (OTT) nos mostram o novo caminho a ser seguido neste negócio Por Camilo Olarte, Cidade do México

U 64 | AméricaEconomia

m homem olha para uma imagem estática em uma tela. Seu olhar perdido e triste pressagia uma tragédia. Sua esposa, sentada ao lado dele, tenta descobrir o motivo de sua aflição. Até que, entre soluços, ele responde que a Netflix havia cancelado a sua série favorita. “Stranger Things? Breaking Bad? Narcos?”, pergunta a esposa até que ele finalmente confessa: “Rebelde”. Sua esposa, com uma atitude condescendente e irônica, tenta consolá-lo. “É difícil dizer adeus, muitos sentirão sua falta, outros nem tanto”, conclui a peça publicitária. Foi dessa forma que a principal plataforma OTT (Over the Top) do mundo respondeu, em outubro de 2016, à decisão da Televisa de tirar o seu catálogo de conteúdo da Netflix.

O anúncio foi o primeiro de vários, de um embate que marca o início de uma forte disputa pela liderança em relação à nova maneira de assistir à televisão. Blim, da Televisa, Claro Vídeo ou Cinépolis Klic são apenas algumas das iniciativas de companhias mais tradicionais que estão lutando para manter uma parcela do mercado mexicano e avançar em vários países da América Latina. “Estamos diante de uma mudança de paradigma para a próxima década”, afirma Jorge Álvarez Hoth, ex-vice-presidente de televisão por assinatura da Televisa e ex-diretor da Sky e da Cablevisión. “Empresas como a Netflix rebaixaram a Televisa sem que ela tenha se dado conta”.


123RF

Um mercado Over the Top O mercado de plataformas OTT poderia chegar a um valor de US$ 62,3 bilhões em todo o mundo em 2020, de acordo com a Soonora, uma empresa mexicana dedicada à implementação deste tipo de plataforma. No México, o setor ainda representa apenas US$ 400 milhões, mas demonstra um crescimento em ritmo acelerado. Em 2016, a utilização de serviços OTT no México cresceu 25%, enquanto a TV por assinatura teve uma expansão de 14,7%, segundo o Instituto Federal de Telecomunicações (IFT). No entanto, mais da metade da população (51%) apenas tem acesso ao sinal da televisão aberta, de acordo com a Terceira Pesquisa de 2016 de Usuários em Serviços de Telecomunicações.

O aumento da penetração da banda larga móvel (o México tem o maior crescimento neste indicador entre as economias da OCDE) e o aumento da velocidade das conexões têm permitido que ocorra um maior desenvolvimento de tais plataformas. O México conseguiu passar de uma cifra de duas assinaturas de banda larga móvel por 100 habitantes, em 2010, para uma impressionante marca de 48 por 100 em 2016, um crescimento que representa 20 vezes mais a quantia registrada inicialmente. A expectativa é que a TV por assinatura continue crescendo em paralelo com o consumo de conteúdo por meio das plataformas OTT, mas em um ritmo mais lento. “A maior penetração da internet acaba fazendo com que ocorra um

O mercado de plataformas OTT pode alcançar um valor de

US$ 62,3 bi

no ano de 2020 em âmbito global, de acordo com Soonora, empresa mexicana dedicada à implementação deste tipo de plataforma. No México, representa US$ 400 milhões, mas cresce de forma acelerada

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Negócios

Os mexicanos e as OTTs Penetração e taxa de crescimento anual de TV por assinatura a serviços de vídeo OTT Fonte: Instituto Federal de Telecomunicações do México Penetração da TV por assinatura a cada 100 lares 120

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Mudança no segundo trimestre 2015 - segundo trimestre 2016 do total pagar assinaturas de TV

Mudança no segundo trimestre 2015 - segundo trimestre 2016 do total assinaturas de vídeo OTT 100

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Turquia Argentina

A Blim Televisa foi lançada em 2016, substituindo sua fracassada experiência anterior chamado VEO, focada na locação de filmes. A TV aberta representava até uns anos atrás quase 80% de sua receita, hoje representa apenas

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maior consumo de conteúdos audiovisuais por essa plataforma, o que causa um impacto direto no crescimento dos OTTs”, afirma Aldo Sánchez, coordenador-geral de Planejamento Estratégico do IFT. “Em relação aos serviços de TV por assinatura e os serviços OTT, alguns serão complementares e outros serão substitutos”, afirma. Apesar das mudanças, os conteúdos mais vistos na TV por assinatura e em menor proporção nas plataformas OTT ainda são aqueles que têm origem na TV aberta. Mas isso está mudando. “A presença da Netflix e a pirataria têm influenciado o consumidor, que hoje em dia é mais exigente, sobretudo a população mais jovem”, diz Pedro García, roteirista da série Dharma Beach. A Blim (Televisa) tinha 17,5% dos clientes das plataformas OTT no México no terceiro trimestre de 2016, de acordo com os últimos dados da empresa de consultoria The Competitive Intelligence Unit (CIU), bem acima dos 9,3% da Claro Video, que em 2012 se tornou a primeira plataforma OTT mexicana e chegou a ter mais de um quarto do mercado que tem perdido gradualmente. A Netflix chegou ao México em 2011 e lidera o setor com 5,6 milhões de assinantes (70% de participação de mercado) e um potencial de

crescimento anual de 44,5%, de acordo com um relatório da CIU. Outros serviços, como Mubi, Fox Play, HBO Go e YouTube Red representam apenas 1% do mercado cada uma. No dia 22 de fevereiro de 2016, a Televisa lançou o Blim, substituindo sua fracassada experiência anterior chamado VEO, que era mais focada no aluguel de filmes. A televisão aberta representava, há alguns anos, mais de 80% de sua receita, mas hoje representa apenas 33%. A forte crise que enfrentou a empresa de Emilio Azcárraga forçou o empresário a se concentrar no seu negócio de TV por assinatura (Izzi) e no Blim, que após um ano surpreendeu com seus resultados. A Blim fechou 2016 com um catálogo de mais de 20 mil horas (a Netflix tem 100 mil) após anunciar, em outubro, um acordo para transmitir com exclusividade na América Latina conteúdos da Telemundo e da NBC Universal. A plataforma segue em expansão e atualmente está disponível em 17 países. “Estamos confiantes de que no México e em breve no resto da América Latina seremos um player relevante”, disse Carlos Sandoval, CEO da Blim. Claro Video, sua concorrente mais próxima, é a plataforma OTT do bilionário Carlos Slim e representou a primeira incursão do México neste mercado. Diante da falta de conteúdos, a empresa firmou durante seus primeiros anos vários acordos para ampliar seu catálogo. Um dos acordos mais importantes foi realizado com a distribuidora de conteúdo DLA, uma subsidiária da Disney Media Distribution para a América Latina. A empresa sabe que a sua grande vantagem é aproveitar os seus assinantes de telefonia móvel e fixa para impulsionar o crescimento do número de clientes, além de oferecer preços de assinatura mais baixos. A plataforma cresce em número de assinantes, mas sua participação no mercado caiu com a chegada da empresa. Seu atraso, afirma um funcionário da Blim, ocorre porque não tem gerado produções originais suficientes, nem possui uma estratégia de marketing adequada. De qualquer forma, a Claro Video já está presente em 16 países.


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A Klic, da Cinépolis, a maior cadeia de cinema da América Latina, é uma das plataformas mais inovadoras e promissoras, de acordo com Fernando Baruch, consultor de plataformas OTT. Ao contrário de outras plataformas, a empresa tem a capacidade de oferecer versões e estreias muito recentes. Além disso, a companhia realizou recentemente o primeiro teste para a transmissão de um evento esportivo de alto impacto, um clássico do futebol mexicano. Klic fez um acordo com a equipe Chivas, de Guadalajara, para desenvolver e transmitir a Chivas TV. O canal oferece, além dos jogos, horas de conteúdo extra (treinamento, entrevistas, bastidores, jogos antigos). Algo semelhante ao que está fazendo, com muito sucesso, a National Basketball Association (NBA) mundialmente. “A plataforma OTT na América Latina se desenvolveu lentamente, mas ocorrerá um avanço graças à participação de novos players, sobretu-

A caça ao mercado Participação: 23.759 milhões de pesos estimados no quarto trimestre de 2016 Fonte: Soonora

TV por satélite

10,4% OTT

29,6%

60,0%

TV a cabo e outros Abril | 67


Negócios

Em 2020, o valor de mercado das plataformas vai superar os

do provedores de televisão locais e grupos de meios de comunicação regionais que investirão em serviços sob medida aos interesses dos consumidores de cada um dos países; ainda há muito por vir”, diz Baruch.

US$ 600 mi

O conteúdo é a chave O conteúdo é o que atrai os usuários, somado a outros fatores, como preço e qualidade, afirma Efrén Páez, analista da Mediatelecom, Policy & Law. “O sucesso do Blim explica, em parte, que tipo de conteúdo atrai os usuários. Portanto, o interesse de começar com conteúdo próprio, um conteúdo mais específico ao usuário a quem se dirige”. A Netflix se deparou com um grande obstáculo desde a sua criação: a autorização para transmitir conteúdos dentro de sua plataforma. A empresa, então, decidiu se tornar um grande criador de conteúdo. O sucesso de suas séries na América Latina e no mundo como Stranger Things, House of Cards ou Narcos incentivaram sua primeira produção em espanhol: Club de Cuervos, que já está em sua terceira temporada. Em poucos dias, irá estrear a sua segunda produção totalmente gravada no México: Ingovernável (Ingovernable), uma série política. “A

no México e deve superar a TV por assinatura

A vantagem é da Netflix Participação de um total de 6,32 milhões de assinantes no México 123RF

Fonte: Soonora

70,1%

17,5% 9,3% NETFLIX

BLIM

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CLARO VIDEO

1,0%

0,7%

0,7%

0,7%

MUBI

FOX PLAY

HBO GO

YOUTUBE RED

qualidade de produção e dos roteiros é muito superior ao que se fazia anteriormente”, afirma Pedro García. “Isso está levando as produtoras a abandonar velhos paradigmas do melodrama mexicano, que só chamam a atenção de um público de mais de 35 anos”, afirma. A reação das plataformas mexicanas a essa silenciosa invasão da Netflix tem sido, primeiro, tentar explorar suas vantagens: seu catálogo de conteúdo, no caso da Blim; sua base de clientes e sua tecnologia, no caso da Claro Vídeo; seu acesso a produções recentes, no caso da Klic. E, em segundo lugar, a produzir seu próprio conteúdo, mas com maior qualidade, aproximando-se de criadores como Carlos Bolado ou Gary Alasraki, que antes apenas tinham espaço no cinema para desenvolver seus projetos. “A Blim estreou cinco séries originais em 2016 e, embora ainda não pareça se aproximar do nível de sucesso da Netflix, estão andando na direção certa”, afirma Pedro García. Já a Claro Claro Video faz o mesmo e acaba de lançar a sua segunda produção original: A Irmandade. A nova forma de ver televisão tem promovido a criação de geradoras de conteúdo e pequenas produtoras. “A distribuição de conteúdo através de OTT não é exclusivo de grandes operadores, mas de todo aquele que gere algum tipo de conteúdo que seja relevante para algum setor da sociedade”, diz Fernando Baruch, especialista em implementação de plataformas OTT. “Algo já visto em outras partes do mundo e que muito provavelmente vamos ver por aqui é a criação de plataformas OTT que reúnam muitos desses atores pequenos debaixo de um mesmo teto”. Em 2020, o valor de mercado das plataformas vai superar os US$ 600 milhões no México e deve superar a TV por assinatura, prevê Soonora. “O ano de 2017 marca o momento em que as plataformas OTT se consolidaram no México. Aos poucos, os usuários estão mostrando às empresas que querem novas plataformas que estejam alinhadas com a tecnologia disponível, e, sobretudo, novos conteúdos”, diz Fernando Baruch.



Opinião | Direito do Trabalho

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ara os que estão preocupados com a criação de um moderno modelo trabalhista para o Brasil, torna-se irrelevante saber se, no passado, a legislação trabalhista atendeu de alguma forma os reclamos dos atores sociais e do governo. O fulcro da questão é saber se, atualmente, ela preenche, num contexto democrático, pluralista e globalizado, as suas verdadeiras finalidades. É nesse sentido que se torna importante estudar os vícios de origem, de forma e de conteúdo, ainda presentes em nosso atual modelo laboral, por meio de análise comparativa entre as condições objetivas e subjetivas existentes na era Vargas, e as condições presentes no atual momento da nossa história.

Hoje, no Brasil, quando se fala em flexibilizar e terceirizar o mercado de trabalho, parte-se do diagnóstico de que o excesso de regulamentação legal, o anacronismo e o alto custo da Justiça do Trabalho têm gerado uma série enorme de ineficiências no seu funcionamento. A rigor, todos perdem com esse sistema interventivo: sobre o total da massa trabalhadora pesam os custos do desemprego; sobre uma boa parte das empresas pesam os custos da sobrevivência; sobre os consumidores pesam os custos do aumento no preço dos produtos; sobre o Estado pesam os custos pela perda de receita; e sobre a economia do país pesam os custos pela impossibilidade de competir no mercado internacional globalizado. Por isso, frequentes e reiterados depoimentos de personalidades públicas e privadas, direta e indiretamente vinculadas à área trabalhista, nos dão conta de que chegou o momento de se reduzir os custos trabalhistas públicos e pri-

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A impostergável Reforma Trabalhista

vados que incidem sobre a produção de bens e serviços, com reflexos em toda a sociedade. Esse desiderato só pode ser alcançado com a desregulamentação e a flexibilização das relações de trabalho e com a adoção de formas alternativas e voluntárias de solução de conflitos. É a forma que mais se adapta à tendência

universal e a melhor maneira de atenuar os custos da nossa legislação trabalhista e facilitar a criação de novos empregos. É exigência impostergável, diante da perspectiva futura de limitar os empregos fixos e de tempo integral. Por isso são extremamente bem-vindas, ainda que tímidas, as iniciativas anunciadas recentemente pelo governo.

HOJE, NO BRASIL, QUANDO SE FALA EM FLEXIBILIZAR E TERCEIRIZAR O MERCADO DE TRABALHO, PARTE-SE DO DIAGNÓSTICO DE QUE O EXCESSO DE REGULAMENTAÇÃO LEGAL, O ANACRONISMO E O ALTO CUSTO DA JUSTIÇA DO TRABALHO TÊM GERADO UMA SÉRIE ENORME DE INEFICIÊNCIAS NO SEU FUNCIONAMENTO

Ney Prado - Desembargador Federal do Trabalho aposentado e Presidente da Academia Internacional de Direito e Economia 70 | AméricaEconomia



Opinião | Página verde

A única certeza é a sustentabilidade!

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ustentabilidade, uma palavra desgastada e arrisco dizer que pouca gente no nosso Brasil sabe o que é. Nos tempos de hoje em que imperam a volatilidade, a incerteza, a complexidade e a ambiguidade, talvez as únicas armas para a sobrevivência sejam a sustentabilidade e a inovação. As duas devem andar juntas para se obter, no mínimo, a permanência no mercado. Examinemos um pouco mais a fundo o significado de sustentabilidade. Entendo que a melhor definição, hoje, de negócio sustentável é aquele que leva em consideração a responsabilidade social e ambiental aliada à responsabilidade econômica. Na grande maioria das vezes, não se atinge a sustentabilidade da noite para o dia, como alguns desejam, mas através de um processo. Os tempos do ativismo, que de alguma forma contribuíram pioneiramente para o despertar da sustentabilidade, se foram e hoje mais e mais essa questão está sendo considerada estratégica.

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Atualmente, anuncia-se que dentro de cinco anos mais de US$ 5 trilhões investidos na economia fóssil vão migrar para da economia verde. Entretanto, onde estão os projetos sustentáveis para atrair esses investimentos? Quase não existem. A despeito de qualquer sentimento nacionalista ou mesmo de otimismo disfarçado, o Brasil poderia liderar a captação de investimentos para a nova economia. Basta preparar bem a sua base regulatória e estruturar os seus projetos, levando em consideração os três itens principais: responsabilidade social, ambiental e econômica. Se desejamos que o país do futuro se torne o país do presente, devemos ter um senso comum para que essas três áreas atuem com racionalidade em conjunto. Hoje, o que temos é o trabalhador que busca cada vez mais os seus direitos, assim como os empresários, que precisam de incentivos. Os ambientalistas ainda acham que são donos de 100% da razão. Claro que existem exceções em todas as categorias, mas são poucas ainda. Pensemos na agropecuária. Temos, sim, todas as condições para ser a excelência no suprimento de alimento para quem não tem como produzir. Entretanto, não dá para usar a tática do jeitinho. O Brasil é altamente dependente deste setor, portanto precisamos mais do que levá-lo a sério e, sim, destinar todo nosso foco na busca por excelência. Acredito que a Carne Fraca, apesar dos exageros, ajudou a mostrar um ponto fraco que precisa ser corrigido. O governo deveria terceirizar a fiscalização ao menos nesse momento. O ministro da Agricultura intitulou a agropecuária brasileira como a mais sustentável na COP 22. Logo em seguida, viu sua bravata cair por terra mostrando a insustentabilidade em seu próprio ministério. Temos ilhas de excelência neste setor. Agricultores perceberam que de nada adianta a exploração irracional do solo para uma, duas ou


EMPRESÁRIOS DEVEM ABRIR OS OLHOS ENQUANTO AINDA HÁ TEMPO. TOQUEM OS AVIÕES PARA BRASÍLIA EM BUSCA DE INCENTIVOS POR IMPLANTAÇÃO DE ESTRATÉGIAS SUSTENTÁVEIS. ALÉM DE OBTEREM UM RESULTADO MAIS PERENE, NÃO EMITIRÃO TANTO CARBONO

três colheitas, se depois sua terra estará exaurida. Pecuaristas que sabem que o caminho da produção de carne sustentável não passa só pela sanidade de seu rebanho, mas pelo aumento da produtividade por hectare, a fim de não precisar desmatar mais áreas. As recomposições da reserva legal das áreas de proteção permanente se fazem agora premissas legais. Com certeza, em breve as barreiras criadas não serão mais as sanitárias e, mas as ambientais. Para aqueles que seguirem as regras da sustentabilidade, sempre haverá apoio. A parte dessa classe que ainda tenta resistir, porque não percebeu que o mundo mudou e hoje está requerendo um método de produção diferente, precisa levar o social em consideração, assim como o ambiental e o econômico. Empresários devem abrir os olhos enquanto ainda há tempo. Toquem os aviões para Brasília em busca de incentivos por implantação de estratégias sustentáveis. Além de obterem um resultado mais perene, não emitirão tanto carbono. A McKinsey publicou um relatório informando que cada vez mais para entender os riscos e oportunidades de crescimento das empresas, os investidores/financiadores precisam entender a performance delas no que tange à sustentabilidade (responsabilidade social, ambiental e governança). Com isso, conclui-se que o empresário que focar no curto prazo estará fadado a ficar no esquecimento. Aos ativistas sociais e ambientais, precisamos que todos sentem a mesa com um único objetivo: sustentabilidade.

As ONGs que cuidam exclusivamente do social e do ambiental, e que vivem de doações, precisam se ajustar aos tempos modernos e obter um processo transparente de governança e métricas quantitativas e qualitativas a serem apresentadas aos seus doadores. Mecanismos para isso estão sendo difundidos como os Development Impact Bonds (DIBs). ONGs como o Instituto Verdescola estão em processo de uma governança transparente e o uso de indicadores para medir seu desempenho e apresentar os resultados bons e ruins para seus mantenedores. Os ativistas ambientais, sim, tiveram um papel preponderante no passado, entretanto, o momento agora é de se concentrar na busca e implementação das soluções. Um exemplo disso creio ser a parceria do frigorifico Marfrig com o Greenpeace. O Marfrig possui um satélite que monitora as propriedades de seus potenciais fornecedores de bovinos na Amazônia para se certificar de que os bois não estejam vindo de áreas de desmatamento ilegal. Na área governamental é que estamos engatinhando. Depois do papelão na COP 22 ,entenderam bem isso e foram obrigados a atuar em conjunto na COP da Biodiversidade em Cancún, onde o Brasil ratificou o compromisso de reflorestar 12 milhões de hectares. Pareceu bastante interessante que a Noruega deseje ajudar os agropecuaristas brasileiros que implantarem as regras da sustentabilidade. As iniciativas estaduais de ICMS verde já são um bom começo, mas é preciso mais. Penalizar os emissores de carbono é uma premência. Fica aqui o convite a todos: vamos trocar essa capa carcomida, corrupta e atrasada, feita para inglês ver, por um Brasil com uma alma verdadeiramente sustentável? Assim poderemos ser o país do presente.

Estima-se que, dentro de cinco anos, mais de

US$ 5 tri investidos na economia fóssil vão migrar para investimentos da economia verde

Jorge Pinheiro Machado Diretor America Latina – Regions of Climate Actions – R20

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Opinião | Justiça

Profunda reforma estrutural

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lgo de que o Brasil necessita e com urgência é de uma profunda reforma estrutural de sua política. A sensação que se tem é a de que ninguém mais acredita no sistema partidário. O Congresso, que deveria ser a função basilar, aquela que formula as regras do jogo, desprestigiou-se diante de denúncias consistentes aliadas a um denuncismo desenfreado. Não é saudável para a República uma situação em que o descrédito disseminado atinja a todos e não se consiga reabilitar a crença na política, realizada por partidos que não têm merecido respeito e consideração. Na escala da estima coletiva, todos os políticos e todos os partidos não figuram nos melhores rankings. Poucos acreditam que o Legislativo seja capaz de

oferecer ao Brasil a mutação imprescindível à reabilitação da política. Talvez o caminho seja a mobilização da sociedade, que aprendeu a reivindicar e se comunica instantaneamente valendo-se do cada vez mais facilitado acesso às redes sociais. Melhor seria que, apercebendo-se do nível de descontentamento, as lideranças lúcidas e as pessoas sérias cuidassem, elas mesmas, de oferecer um cardápio à população. O que poderia constar dele? Primeiro, a extinção do fundo partidário. Não faz sentido, num estágio de recessão, estagnação e queda crescente de arrecadação, numa crise muito mais grave do que aquela considerada a pior do século passado, eclodida em 1929, o país forneça bilhões para o sustento de partidos que, segundo a percepção generalizada, apenas têm servido para atender, prioritariamente, os interesses de seus integrantes. Os partidos deveriam funcionar com as contribuições de seus filiados e simpatizantes. Aí, sim, sobreviveriam aqueles cujo discurso atingisse o eleitorado capaz

de manter o aparato partidário. Em seguida, viria a drástica redução de partidos. Não é crível, mas é surreal que existam quase quarenta concepções de Estado e de exercício do poder para servir ao povo. A Democracia existe para permitir à maioria exercer os cargos públicos, não para forçar um convívio estranho entre inúmeras minorias. O chamado “governo de coalizão” obriga a uniões artificiais, que em nada condizem com a busca do bem comum. É preciso repensar a representação, pois a população mais desenvolvida é maltratada quando não se faz valer a regra “um homem, um voto”. O Sudeste é representado de forma falaciosa e prejudicial, quando se garante a Estados-membros com número reduzido de eleitores, deputados que valem muito mais do que os eleitos por outros mais populosos. Para a representação igualitária já existe o Senado Federal. Porém, o próprio bicameralismo precisaria ser repensado. A Câmara Federal, com

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a subtração de deputados em número correspondente à população dos maiores Estados, não significa observância da regra democrática. Há um déficit de representatividade exatamente nas áreas mais desenvolvidas. Por que não se permitir a disputa eleitoral sem partidos, abrindo-se a oportunidade à cidadania de concorrer a cargos eletivos sem a vinculação que a cada dia menos seduz a cidadania? Quem estiver atento não deixará de se aperceber do cansaço em relação à política. Campo fértil para o surgimento de outsiders, de aventureiros, de salvadores da pátria, de quem se dispuser a ouvir os anseios de um povo cansado de malfeitos e desejoso de retomada do desenvolvimento que permita a edificação da pátria justa, fraterna e solidária prometida pelo constituinte de 1988 e que trinta anos depois, ainda não foi entregue aos sofridos brasileiros.

José Renato Nalini - Desembargador aposentado, ex-presidente do TJ-SP e do extinto Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo 74 | AméricaEconomia

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GREGORY GRIGORAGI

GCSM | Conversando com Quem Faz a Diferença 2017

Gestão pública eficiente depende de tecnologia Novos modelos se estruturam e criam ambientes mais modernos com os novos softwares que o mercado apresenta; case de Santos é exemplo de cidade inteligente

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Da Redação, de São Paulo

administração pública consome um volume de papel muito grande e a quantidade de pastas de processos que vai e vem só dificulta a agilidade e a eficiência da gestão. Mas o mercado parece que está atento às necessidades do setor público. Na manhã do dia 15 de março, o prefeito de Santos, Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), mostrou como o município tem se modernizado com ferramentas desenvolvidas pela Eicon. Atualmente, do total de processos na prefeitura, 70% são digitais. O CEO da Eicon no Brasil, Luiz Alberto Rodrigues, explicou que a empresa está em mais de 150 prefeituras do país, de alguma forma, não com todos os seus recursos tecnológicos, mas com diversas soluções. “Controle de obras públicas, por exemplo, pode ser feito através de um sistema em que a prefeitura acompanha todo o detalhamento e execução para efetivar pagamentos”. Segundo o prefeito de Santos, a administração acelera os trâmites em um nível bastante satisfatório.

“Para licença prêmio, demorávamos uma média de 96 dias até concluir e isso está muito mais acelerado. Para cadastrar fornecedores, o desempenho melhorou e gastamos menos 78% do tempo agora”, contou. A cidade tem também um dispositivo que é um canal de comunicação direto da população com a prefeitura. Irregularidades podem ser denunciadas, assim como sugestões de melhorias, através de um aplicativo. O prefeito foi o convidado especial da primeira edição do Conversando Com Quem Faz a Diferença deste ano, promovido pelo Global Council of Sales Marketing (GCSM), com apoio da AméricaEconomia. O presidente da Desenvolve SP, Milton Luiz de Melo Santos, estava presente e afirmou que a gestão em Santos é inteligente, moderna e que o Brasil precisa de mais eficiência no setor público. “A Desenvolve SP é um órgão que pode ajudar as prefeituras e estamos dispostos a receber ideias de projetos que possam gerar melhorias para a população”.



Opinião | Recursos Humanos

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u estou muito cansado. Não está sendo fácil. Tenho acumulado funções. Estou sobrecarregado.” Tenho ouvido estas frases com muita frequência. Dos empresários e de seus colaboradores. É bem verdade que a situação econômica do Brasil exigiu que se fizessem ajustes bem contundentes nas empresas e que a consequência disso é um inevitável aumento de atribuições aos funcionários e empresários. Identifico, porém, que a tão propagada sobrecarga tem uma origem mais profunda do que o mero excesso de atividades. É uma questão ligada à competência. Competência é a soma de conhecimento e comportamento. Geralmente as empresas admitem um colaborador pelo seu conhe-

cimento e o demitem pelos seus comportamentos. A sobrecarga de trabalho geralmente é resultado da falta de: conhecimento, comportamento ou de ambos. A questão é: como lidar com funcionários que estão sobrecarregados? O empregador precisa responder às fundamentais perguntas a seguir: Os funcionários têm o conhecimento para fazer o que se espera de cada um deles? Os funcionários têm o comportamento necessário para desempenhar suas funções? A montagem das equipes está correta? Houve a verificação que cada um na equipe possui a competência necessária para um bom desempenho? O perfil dos diretores e gestores possui a indispensável característica que costumamos chamar de liderança? Como está o moral do time? Como fluem as comunicações dentro da minha empresa? Qual a quantidade de retrabalho que tenho na minha empresa? Qual o turnover da minha empresa e onde ele está mais localizado? Como a questão tem dois

Elmano Nigri - Presidente da consultoria Arquitetura Humana 78 | AméricaEconomia

lados, o colaborador deve ficar atento às seguintes indagações: Recebi as orientações e treinamento necessários para um bom desempenho? Como é executado o trabalho em equipe na minha empresa? Como são as comunicações que faço com meus pares/subordinados/líderes? Quantos dos meus valores estão alinhados com os valores da empresa em que trabalho? Como sou tratado na minha empresa? Estou feliz com meu emprego atual? Quanto contribuo para o sucesso e o resultado da empresa, onde passo a maior parte do meu dia?

SHUTTERSTOCK

Cansaço e alívio reconhecido pelo que faço”. “Se tenho as competências que o meu cargo demanda, a empresa irá crescer mesmo em situações de retração de mercado e de crise”. E o inverso também é verdadeiro. Pessoas que não são reconhecidas, que estão alocadas nos lugares errados, serão infelizes, pouco produtivas e se sentirão mais cansadas e desmotivadas. As dificuldades econômicas do nosso país podem trazer um sentimento de cansaço maior do que o normal, por isso, é sempre bom nos motivar com as esperançosas palavras da magistral

PESSOAS QUE NÃO SÃO RECONHECIDAS, QUE ESTÃO ALOCADAS NOS LUGARES ERRADOS, SERÃO INFELIZES, POUCO PRODUTIVAS E SE SENTIRÃO MAIS CANSADAS E DESMOTIVADAS

Se eu fosse demitido, voltaria a trabalhar novamente nessa empresa? Normalmente, após esses questionamentos, as conclusões são: “Se eu gosto da minha empresa e estou feliz, eu não me sinto sobrecarregado, pois sou

Cora Coralina: “É que tem mais chão nos meus olhos do que cansaço nas minhas pernas, mais esperança nos meus passos do que tristeza nos meus ombros, mais estrada no meu coração do que medo na minha cabeça.” Que assim seja!




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