Uma estória de amor

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Eternos uma est贸ria de amor e morte

Comunidade de Leitores, 9潞A, Escola EB 2,3 de Arrifana, Santa Maria da Feira ano lectivo 2008/2009


O dia estava a terminar e respirava-se calma naquele lugarejo sossegado que ainda não tinha sido engolido pela civilização desenfreada. Ali, havia tempo para muitas coisas. Os pais não tinham duplos empregos e as avós tricotavam e contavam estórias aos netos. No Verão, à sombra das árvores ou do alpendre. No Inverno, ao quentinho da lareira. Apesar de ser Janeiro, o dia não estava frio e o sol fez-se anunciar, embora timidamente, o que permitiu que as crianças saíssem para a rua e brincassem livremente. Inês chegou a pedalar esbaforida. Já tinha dado imensas voltas nas redondezas de sua casa, montada na bicicleta nova que recebera no Natal, e estava estafada. Quando entrou, encontrou a avó sentada a tricotar uma camisola para ela. Mostrava um ar sereno e, de vez em quando, parava as agulhas e fitava fixamente o seu trabalho, como se quisesse encontrar algum defeito, alguma malha caída ou, simplesmente, apenas admirá-lo pois parecia estar perfeito. - Avó, estou cansada. Posso ficar aqui, um bocadinho, à tua beira? - Claro, filha. Senta-te aqui, nesta cadeira. Queres ler um livro? - Não. Conta-me uma estória! - Uma estória? Agora? Não me ocorre nenhuma, de momento. - Não acredito! Sabes tantas! Conta-me uma estória de amor. - Está bem. Já que falas nisso e estamos no dia sete de Janeiro, lembrei-me de uma, verdadeira, que terminou em tragédia faz precisamente, hoje, 654 anos. - Mas essa é muito velha!... -Pois é, mas não passa de moda. Era a estória preferida da tua mãe quando tinha a tua idade. Tantas vezes lha contei que ela deu aos filhos o nome dos protagonistas. É por isso que tu te chamas Inês e o teu irmão Pedro. - Mas, então, quem foram esses? - Inês poderia ter sido nossa Rainha. Não foi porque o destino não o quis… - O destino?! - O destino, a má sorte, algum mau-olhado ou, simplesmente, o azar de se ter apaixonado pelo homem errado. - Começo a ficar interessada. - Então, vamos lá recuar no tempo e fazer uma longa viagem. Pronta para a partida e para emoções fortes? - Claro! Gosto das estórias que fazem chorar. - Então, vai seguindo esta com muita atenção.


Tudo se passou no século XIV. Uma estória trágica, na História de Portugal. Uma estória que acabou em sangue derramado…

Há muitos anos, um reino pequenino governado por D. Afonso IV, um rei valente na luta contra os mouros, assistiu a um trágico acontecimento.

Esse rei tinha um filho, D. Pedro. De natureza calma, os acontecimentos trágicos provocados por seu pai mudaram-lhe o carácter e ficou na História como D. Pedro, o Cruel.

Tudo começou quando, de Castela, veio D. Constança, uma princesa prometida em casamento a D. Pedro. Quando chegou a Portugal, trazia no seu séquito uma lindíssima dama de companhia, proveniente de uma nobre família espanhola, os Castro.

Imediatamente esta bela mulher despertou a atenção de D. Pedro. Inês vinha linda. O rosto esguio traçado por lábios finos, nariz delicado e olhos claros estava envolto em longos cabelos loiros. O decote mostrava uma pele de seda branca.


Apesar de estar casado com D. Constança, a paixão falou mais alto e os amantes encontravam-se secretamente numa quinta, em Coimbra. Amo-vos, Inês, e nada nos poderá separar! O que vai ser de nós, meu Pedro?

“Como as rosas selvagens que nascem em qualquer canto”, assim entrou o amor nas vidas de Pedro e Inês. Sem cerimónia. Sem pedir licença.

A resposta chegou rapidamente. Quando dava à luz, D. Constança faleceu. No entanto, este amor continuava proibido. A relação da família de Inês com D. Pedro não era bem vista. Portugal corria o risco de perder a independência, quando, um dia, ele subisse ao trono.

A maternidade faz-vos ainda mais bela! Como sois tão doce!

Porque nos perseguem desta maneira? Porque não podemos ser felizes se não queremos fazer mal a ninguém?

Então, secretamente, casaram.

Tão grande paixão deu frutos. A oposição ao casal fortaleceu a sua união e quatro filhos nasceram.


Nada os fazia separar. Nem a distância a que foram forçados, nem as más-línguas venenosas que tentavam contaminar tão puro amor. Quando não estavam juntos, unia-os os pensamentos e as cartas de amor que trocavam. Mas, a felicidade estava condenada. Os conselheiros do rei convenceram-no que a única solução para separar o casal seria a morte.

Custa-me mandar matar Inês mas, realmente, não vejo outra solução.

Estava a linda Inês em sossego, quando avistou três homens que se aproximavam com ar feroz, na companhia de el-rei D. Afonso IV. Inês imediatamente compreendeu. Iriam matá-la.

Poupai-me a vida, por compaixão a estes filhos, crianças inocentes, vossos netos. A minha culpa não é culpa deles. Não os deixeis órfãos!

Apesar da súplica, sem dó nem piedade, desumano, um punhal manchou o inocente níveo colo de Inês.


A quinta, refúgio de Pedro e Inês, e cúmplice do seu grande amor, foi a única testemunha deste crime terrível. O sangue de Inês ainda lá está, na fonte formada pelas imensas lágrimas de tristeza e saudade.

A vingança de D. Pedro foi terrível. Quando subiu ao trono, mandou retirar Inês do túmulo para a coroar rainha. Toda a corte foi obrigada a beijar-lhe a mão, numa cerimónia de grande pompa, como se Inês estivesse viva, feliz e linda como sempre, pronta para ser a rainha de Portugal.


Não contente, D. Pedro mandou construir dois túmulos que colocou no mosteiro de Alcobaça. Um para Inês e outro que ficaria a aguardar o dia em que se uniria, para sempre, à sua amada, sem mais oposição, sem sobressaltos.

Eternos, ambos dormem em paz!

FIM


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