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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1495076-0 - DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ – 1ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA. Apelante 01:

RICARDO JOSÉ MAGALHÃES BARROS E OUTROS

Apelante 02:

WALTER ALEXANDRINO

Apelados:

OS MESMOS

Relator:

DES. LUIZ MATEUS DE LIMA

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO POPULAR. AÇÃO POPULAR. AGRAVO RETIDO. AUSÊNCIA DE REITERAÇÃO.

NÃO

CONHECIMENTO.

CONTRATO

DE PRESTAÇÃO

REFERENTE

À

DE SERVIÇOS

ELABORAÇÃO

DE

PROJETO

ARQUITETÔNICO PARA A CONSTRUÇÃO DE HOSPITAL.

SUPERFATURAMENTO.

COMPROVAÇÃO. INSUFICIENTE.

PROVA

MÉTODOS

NÃO PERICIAL

UTILIZADOS

QUE

NÃO CONFEREM CREDIBILIDADE AO LAUDO. AUSÊNCIA AGENTES

DE

ELEMENTO

PÚBLICOS.

SUBJETIVO

IMPOSSIBILIDADE

DOS DE

CONDENAÇÃO À REPARAÇÃO DO PREJUÍZO CAUSADO

AO

REFORMADA.

AÇÃO

IMPROCEDENTE. SUCUMBÊNCIA. AUTOR.

ERÁRIO.

SENTENÇA

POPULAR

JULGADA

INVERSÃO AUSÊNCIA

ISENÇÃO

DE

DAS

DA

MÁ-FÉ

DO

DESPESAS

PROCESSUAIS. 1. A comparação com os projetos elaborados para outros hospitais não se presta para a Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 1 de 23


Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 2

configuração do ato lesivo ao patrimônio público, a ser protegido na via da ação popular, já que o laudo técnico não distingue entre obras de construção e reforma, nem aponta os critérios de semelhança com o projeto idealizado para o Hospital Regional de Maringá. 2. A ausência de elementos essenciais impede que se atribua credibilidade ao laudo pericial, pois as situações econômicas vividas pelo país na época de cada uma dessas obras, de grande variação inflacionária, não permitem que a apuração do valor do projeto do Hospital Regional de Maringá se dê por simples comparação e não permitem apurar o excesso no valor contratado pelo consórcio com a empresa Bross. 3. Inexiste prova do agir doloso ou culposo dos agentes públicos ou que evidencie o conluio entre estes e a empresa contratada com o intuito de lesar os cofres públicos, que enseje o dever de reparar. 4. Admitir o manejo da ação popular, nesses casos, submeteria o Administrador Público à mudança na opinião pública e da conjuntura política,

o

que

certamente

geraria

insegurança jurídica aos ocupantes de cargos públicos. 5. A integral improcedência

dos pedidos

formulados na ação popular torna prejudicada Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 2 de 23


Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 3

a apelação interposta pelo autor popular, mas não lhe impõe o dever de arcar com o ônus da sucumbência, diante da ausência de má-fé na propositura da ação, nos termos do art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO. APELAÇÃO 1 PROVIDA. APELAÇÃO 2 PREJUDICADA.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Cível nº 1495076-0, do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Maringá – 1ª Vara da Fazenda Pública, em que são apelantes RICARDO JOSÉ MAGALHÃES BARROS E OUTROS e WALTER ALEXANDRINO e apelados OS MESMOS. RELATÓRIO Gelson Nery Nascimento ajuizou ação popular em face de Ricardo José Magalhães Barros, Antônio Santo Mamprim, João Celso Sordi, Metroplan – Consórcio Intermunicipal para o Desenvolvimento Metropolitano da Região de Maringá, Marialva, Sarandi e Paiçandu, Município de Maringá e BROSS – Consultoria e Arquitetura S/C Ltda.

Alegou que durante a execução do convênio relativo ao Hospital Regional Metropolitano, dentre elas o superfaturamento na contratação e pagamento do projeto à ré BROSS. Registrou que de acordo com o Convênio n. 151/1991-

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Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 4

ACV, os recursos repassados pelo INSS para a execução da obra não poderiam ser utilizados para pagamento do projeto. Arguiu que o contrato para a execução do projeto com o réu Metroplan se deu sem licitação. Ainda, o consórcio METROPLAN é formado pelos Municípios de Maringá, Sarandi, Marialva e Paiçandu e o encargo assumido não poderia ser repassado o encargo financeiro exclusivamente ao Município de Maringá. Sustentou que houve excesso no preço pago pelo projeto em questão se comparado com outros hospitais, além de prejuízos financeiros e à moralidade administrativa. Destacou que o pagamento foi realizado à custa dos recursos repassados para a efetiva construção do hospital e não para cobertura do projeto.

Requereu a procedência da ação popular, com a declaração de nulidade do contrato firmado com a empresa BROSS

Consultoria

e

Serviços

S/C

Ltda.

e

consórcio

Intermunicipal para o Desenvolvimento Metropolitano da Região de Maringá, Sarandi, Marialva e Paiçandu – Metroplan e, por consequência, de todos os atos subsequentes ao contrato e a condenação dos responsáveis às perdas e danos sofridos pela Municipalidade.

Citados, os réus apresentaram contestação (f. 101/284; 288/291; 321/332).

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Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 5

Gelson Nery Nascimento desistiu da ação, sendo sucedido por Hermogenes Botti, que, posteriormente, também desistiu. Assumiu o polo ativo Walter Alexandrino. Sobreveio a r. sentença de procedência da ação popular (fls. 636/643). A sentença foi anulada, por cerceamento de defesa, ante o julgamento antecipado da lide, em decorrência da necessidade de dilação probatória 910/957. Após regular instrução, sobreveio r. sentença que de procedência da demanda para “(...) declarar a nulidade do contrato de prestação de serviços firmado entre Metroplan e BROSS, bem como dos atos dele decorrentes, e ainda condenar os réus solidariamente ao pagamento das perdas e danos sofridos pelo Município de Maringá. Saliente-se que o valor devido será apurado em execução de sentença, e deverá ser corrigido monetariamente pela média INPC/IGP-DI desde o efetivo desembolso pelo Município, e sobre ele incidirão juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação. (...) Os réus restaram vencidos. Logo a eles caberá o pagamento das custas e das despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios à parte autora (art. 12 da lei n. 4.717/65), os quais arbitro em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) (...) a ser repartido de forma equitativa entre os autores.” (1962/1995).

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Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 6

Inconformados,

Ricardo

José

Magalhães

Barros, BROSS – Consultoria e Serviços S/C Ltda., Antonio Santo Mamprim e João Celso Sordi interpõem apelação.

Sustentam a ofensa à coisa julgada, pois a regularidade da forma de contratação e a impossibilidade de restituição integral do valor pago, já foram decididas nos presentes autos pelo Eg. TJ/PR por ocasião do julgamento da Apelação Cível n. 107324-5). Aduz que os valores pagos estavam em consonância com os praticados no mercado à época da contratação. Registra que, conforme o laudo pericial, ficou comprovada a regularidade do valor pago, inclusive abaixo do valor tabelado pelo IAB (vigente à época de 1991), que previa o correspondente de 3,6% do valor do projeto em relação ao custo da obra, e o presente projeto atingiu o valor correspondente a 3,2%. Afirma que o critério da média de mercado é desprovido de elementos para a devida comparação e que não é possível comparar o projeto executado em Maringá com aqueles mencionados pela r. sentença para justificar o hipotético excesso de preço. Alegam que os detalhes de cada projeto e a tecnologia empregada não são os mesmos, tampouco são conhecidos os contratos que deram origem a pactuação e ao

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Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 7

menos são conhecidos os projetos incluídos nesses contratos. Destacam que algumas das obras citadas pelo Sr. Perito foram meras reformas.

Registram,

ainda,

que

no

caso,

não

foi

contratado apenas o projeto arquitetônico, mas também projeto conceitual, projeto básico e projeto executivo e que não há provas de excesso de preço na contratação do projeto. Por fim, a comparação a ser feita é em relação ao custo da obra (conforme tabela do IAB) e não em relação ao valor até então liberado no orçamento e repassado para o Município para a realização da obra (fls. 1998/2009).

Walter Alexandrino, por sua vez, também interpõe

apelação,

pleiteando

a

fixação

dos

honorários

advocatícios no percentual de 10% sobre o valor da condenação, corrigida monetariamente e acrescida dos juros de mora, devendo o pagamento ser feito ao atual autor da ação popular, vez que atua em causa própria (fls. 2012/2020).

Foram

apresentadas

contrarrazões

(fls.

2026/2029). A Douta Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo conhecimento e parcial provimento da apelação 1, “(...) para que a sentença seja reformada tão somente no que tange à condenação ao ressarcimento integral dos valores recebidos, a fim de que o numerário a ser devolvido seja limitado pela

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Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 8

diferença entre a quantia superfaturada e o valor médio praticado

no

mercado,

sob

pena

de

restar

caracterizado

locupletamento indevido da administração pública. (...)”. Por fim, deixou de se manifestar sobre o apelo 2 (fls. 2044/2061). VOTO Cuidam-se de apelações cíveis interpostas por Ricardo José Magalhães Barros e Outros e Walter Alexandrino contra r. sentença que, nos autos de ação popular ajuizada por Gelson Nery Nascimento contra Ricardo José Magalhães Barros, Antônio Santo Mamprim, João Celso Sordi, Metroplan, Município de Maringá e Bross – Consultoria e Arquitetura S/C Ltda., julgou procedentes os pedidos iniciais para “declarar a nulidade do contrato de prestação de serviços firmado METROPLAN e BROSS, bem como os atos decorrentes,

e

ainda

condenar

os

réus

solidariamente

ao

pagamento das perdas e danos sofridos pelo Município de Maringá” (f. 1.962/1.995). A ação popular é instrumento posto à disposição de todo cidadão com o objetivo de anular ato lesivo ao patrimônio público, assim compreendido os valores econômicos, artísticos, estéticos, históricos ou turísticos, nos termos do art. 1º, §1º, da Lei n. 4.717/1965: “Art. 1º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de entidades

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Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 9

autárquicas,

de

sociedades

de

economia

mista (Constituição, art. 141, § 38), de sociedades mútuas de seguro nas quais a União represente os segurados ausentes, de empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de instituições ou fundações para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas pelos cofres públicos. § 1º - Consideram-se patrimônio público para os fins referidos neste artigo, os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico. (Redação dada pela Lei nº 6.513, de 1977)” Sobre a ação popular e o conceito de ato lesivo, ensina Hely Lopes Meirelles: “Ato lesivo, portanto, é toda manifestação de vontade da Administração danosa aos bens e interesses da comunidade. Esse dano pode ser potencial ou efetivo. (...) Em última análise, a finalidade da ação popular é a obtenção da correção nos atos administrativos ou nas atividades delegadas ou subvencionadas pelo Poder Público. Se, antes, só se competia aos órgãos estatais superiores controlar a atividade governamental, hoje, pela ação popular, cabe também ao povo intervir na Administração, para invalidar os atos que lesarem ao Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 9 de 23


Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 10

patrimônio

econômico,

administrativo, artístico,

ambiental

ou

histórico da comunidade. Reconhece-se, assim, que todo cidadão tem direito subjetivo ao governo honesto.” (MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança. São Paulo: Malheiros, 31ª ed. 2009. p. 134/135).

No presente caso, a ação popular tem como causa de pedir “os prejuízos financeiros sofridos pelo patrimônio público municipal (...) primeiro, pela pelo Município de Maringá de uma obrigação adstrita ao consórcio intermunicipal, METROPLAN, e segundo, pela excessividade do valor pago à empresa Bross, cujo ressarcimento pretende o INSS perante o Município de Maringá” (f. 06). O pedido, por sua vez, visa a “declaração de nulidade do contrato firmado com a empresa Bross – Consultoria e Serviços

S/C

Ltda.

e

consórcio

intermunicipal

para

o

Desenvolvimento Metropolitano da Região de Maringá, Sarandi, Marialva e Paiçandu – Metroplan, e, por consequência, todos os atos subsequentes ao referido contrato” (f. 08). O consórcio METROPLAN firmou, em julho de 1991 com a empresa Bross, contrato para a elaboração de projeto arquitetônico para a construção do Hospital Regional de Maringá, com capacidade para 162 (cento e sessenta e dois leitos) e área construída

de

15.900m²

(quinze

mil

e

novecentos

metros

quadrados), ao custo de Cr$ 208.987.300,00 (f. 142 e 149/167). De acordo com os dados existentes à época, a obra estava estimada em Cr$ 6.530.853.125,00 (f. 149). Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 10 de 23


Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 11

O valor do projeto estava dentro dos parâmetros estabelecidos pelo Instituto de Arquitetos do Brasil – IAB, para projetos de igual natureza, já que representava menos de 3,6% do custo total da obra.

Nesse sentido, inclusive, registrou o Expert, em resposta a um dos quesitos formulados pela defesa dos réus:

“Em

julho

de

1991

o

valor

dos

projetos

contratados, Cr$ 208.987.300,00, representa 3,2% do valor global da construção contratada pelo contrato 43/92, Cr$ 6.506.626.000,00, portanto está de acordo com os 3,6% tabelados pelo IAB.” (f. 1.763)

Esse contrato foi cedido ao Município de Maringá. Ainda, como houve o repasse de valores pelo antigo INAMPS para a construção do Hospital Regional de Maringá, a Municipalidade foi condenada pelo Tribunal de Contas da União a ressarcir os cofres da União (f. 482/487). Posteriormente,

a

Administração

Municipal

subsequente optou por não realizar a obra, por entender que o projeto era superior ao que seria exigido para atender à demanda da região de Maringá. Da leitura da decisão do TCU extrai-se que a Municipalidade não foi condenada por causa do valor do projeto, mas da impossibilidade de utilização dos recursos transferidos pela União, através do extinto INAMPS, para a elaboração do projeto. Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 11 de 23


Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 12

Vale dizer: o projeto deveria ser custeado com recursos da própria Municipalidade:

“Nesse aspecto, acompanho a posição esboçada pelos pareceres exarados nos autos, no sentido de que a devolução cabe ao Município, uma vez que os projetos e os

gastos

efetuados

foram

atestados

pela

própria

administração posterior, a qual afirmou estar de posse dos documentos relativos aos projetos encomendados. Ademais, a desistência da construção foi tomada pelo Município,

não

podendo

esse

alegar

prejuízo,

pois

conforme afirmado pelo ex-Prefeito, os projetos poderão ser levado a cabo a qualquer momento pela Prefeitura, não configurando responsabilidade pessoal do Prefeito anterior”. (f. 488). O

TCU

também

reconheceu

que

não

ficou

“comprovado locupletamento ou vantagem pessoal na aplicação dos recursos” (f. 492). Por igual, o Tribunal de Contas do Estado do Paraná, consultado pelo próprio Município de Maringá, reconheceu a legalidade técnica do procedimento adotado (f. 1.497).

Tais elementos seriam suficientes para, por si só, afastar a lesividade aos cofres públicos decorrentes da contratação do projeto. Todavia, são oportunos outros esclarecimentos.

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Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 13

Em meados de 1998, o Município de Maringá retomou a iniciativa de construir o Hospital Regional de Maringá.

A gestão à

época utilizou-se

do projeto do

contratado em 1991, mas modificou-o significativamente, inclusive com alterações na área de construção, metragem, etc. Por causa da ausência de licitação, indícios de superfaturamento e outras ilegalidades, a execução da obra foi objeto de inúmeras ações judiciais perante à Justiça Federal, dado o interesse da União. Esse quadro fático trouxe significativa confusão para a presente demanda, pois a obra executada em 1998 passou a ser adotada como parâmetro, em muitos momentos, para apurar o indício de superfaturamento no contrato firmado em 1991.

A própria prova pericial, em inúmeros aspectos, releva-se carente de credibilidade para esclarecer o quadro fático apurado, já que se utiliza da obra executava (reprise-se, diversa da projetada) como comparativo. Nesse aspecto, ao esclarecer a remuneração proposta pelo IAB, disse o Expert: “Através da portaria 562 de 05 de novembro de 1997 a Anvisa considerava que o custo para construir um hospital no Paraná em novembro de 1997 era de R$ 863,93/m², (...), como o CUB do Paraná no mesmo mês de novembro de 1997 era de R$ 477,25/m², conclui-se que

no mês de novembro de 1997 para construir um hospital custava 1,81 CUB por metro quadrado. Portanto, o custo Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 13 de 23


Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 14

para construir um hospital em julho de 1991 era em Cr$ 148.243,65/m² = 1,81x Cr$ 81.902,57/m² (CUB 07/91) (...)” (f. 1.280/1.281). Ou seja, a prova técnica calcula o valor estimado para obra de 1991 com parâmetros de 1997. Ainda, o laudo pericial esclarece que os valores apurados para 1991 foram atualizados pela média do INPC do IBGE e IPC da FIPE (f. 1.283). Desconsidera,

contudo,

a

conjuntura

socioeconômica vivida pelo país e pelo Município de Maringá em ambos os períodos.

Em 1991, o país iniciava a reabertura para o mercado internacional e vivia período de grande instabilidade econômica, após mais de vinte anos de regime militar enquanto Maringá, cidade-polo da região noroeste do Estado ainda não possuía um hospital apto a atender o iminente aumento na demanda de atendimentos. Já em 1998, ano da construção do Hospital Regional, o Brasil já vivia período de maior estabilidade econômica, com os primeiros anos do Plano Real. Por sua vez, Maringá já emergia como uma das cidades de melhor qualidade de vida do Estado e do país e contava com o aumento da capacidade do Hospital Universitário, por exemplo.

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Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 15

Nesse sentido, oportuna a lição do Juiz Federal Dr. Marcos Cesar Romeira Moraes, por ocasião da sentença proferida na Ação Penal n. 2001.70.03.002294-6/PR, que apurou a prática de crimes praticados na execução da obra do Hospital Regional em 1998:

“A economia oscilou substancialmente entre 1992 e 1998, com hiperinflação (84,32% a.m., março/1992, p. ex.) e deflação em alguns períodos do Plano Real. A atualização monetária segundo índices oficiais não era apropriada para determinar a variação do preço de produtos ou serviços nesse período, que se sujeitou à lógica Lei da Oferta e da Demanda. Sofreu valorização positiva e negativa. Muitos produtos não se sujeitavam e ainda não se sujeitam à regra inflacionária, pois seus custos baseiam-se no mercado internacional e à variação cambial. Em obras hospitalares a situação é acentuada. Essas variações desautorizam a mera atualização monetária de orçamentos de obras privadas ou públicas, e disso

resulta

na

possibilidade

de

super

ou

subfaturamento. Disso pode decorrer prejuízos ao ente público que contrate nessa situação, seja por desvio de verba pública no primeiro caso, seja pela interrupção das obras no segundo pela insuficiência de recursos. Em outras

palavras,

índices

inflacionários

não

medem

adequadamente o valor de uma obra, ainda que índices como o INCC.” Por

igual,

a

comparação

com

os

projetos

elaborados para outros hospitais não se presta, nesse caso, para a Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 15 de 23


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configuração do ato lesivo ao patrimônio público, a ser protegido na via da ação popular.

Isto porque, o quadro comparativo elaborado pelo Sr. Perito não faz distinção entre obras de ampliação e reforma e obras de construção de hospitais (f. 1.284). Veja-se, por exemplo, as comparações com o custo do projeto de outros hospitais, especialmente da região de Londrina e Maringá: [a] Hospital Evangélico de Londrina: R$ 25,15m²; [b] Hospital Universitário de Maringá: R$ 45,84m²; [c] Hospital Maternidade de Londrina: R$ 34,75m²

O Expert não observa, contudo, que o Hospital Evangélico de Londrina foi inaugurado há mais de 60 (sessenta) anos, o HU de Maringá foi inaugurado em outubro de 1988 e o Hospital Maternidade de Londrina em dezembro de 1992. Ainda, o Expert não demonstra de onde foram extraídos os custos de cada uma das obras, tampouco aponta a forma de atualização do montante apurado para chegar ao valor indicado no laudo. A falta desses elementos impede que se atribua credibilidade ao laudo pericial, pois as situações econômicas vividas pelo país na época de cada uma dessas obras, de grande variação inflacionária, não permitem que a apuração do valor do projeto do Hospital Regional de Maringá se dê por simples comparação. Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 16 de 23


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Por

oportuno,

a

resposta

ofertada

pela

Administração do Hospital Paraná ao Ofício encaminhado pelo Expert esclarece que “o projeto arquitetônico original deste Hospital foi elaborado nos idos de 1970, passando por simples atualização em razão de ampliações posteriormente executadas” (f. 1.343). Ainda, o contrato firmado em 1991 previa, além do projeto do hospital, a realização de estudos técnicos, definição da área, anteprojeto arquitetônico, projetos básicos, entre outras atribuições que, certamente, encarecem o custo do projeto. Das outras obras comparadas, por outro lado, não é possível aferir com precisão qual o objeto contratado, o que impede sua utilização como parâmetro de comparação com o contrato firmado. Cabe ressaltar, ainda, que a obra é descrita como “faraônica” pela gestão do Prefeito Said Ferreira, subsequente à do réu Ricardo José Magalhães Barros, o que pode conduzir à conclusão de que poderiam ocorrer certos exageros no projeto elaborado, mas não de que tenha ocorrido superfaturamento.

Nessa

perspectiva,

os

elementos

de

prova

produzidos não são capazes de demonstrar o excesso no valor contratado pelo consórcio com a empresa Bross. Também não existe nada que indique a existência de agir doloso ou culposo dos agentes públicos ou que evidencie o Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 17 de 23


Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 18

conluio entre estes e a empresa contratada com o intuito de lesar os cofres públicos, que enseje o dever de reparar.

O

reconhecimento

do

ato

lesivo

exige

a

comprovação, no mínimo, da culpa do agente responsável pela sua prática, nos termos do art. 11 da Lei n. 4.717/1965: “Art. 11. A sentença que, julgando procedente a ação

popular,

decretar

a

invalidade

do

ato

impugnado, condenará ao pagamento de perdas e danos os responsáveis pela sua prática e os beneficiários dele, ressalvada a ação regressiva contra

os

funcionários

causadores

de

dano,

quando incorrerem em culpa.”

Ainda

que o

ato

pudesse

ser

anulado,

sua

lesividade não acarreta a automática condenação dos responsáveis à reparação das perdas e danos causados ao ente público, quando ausente o elemento subjetivo na prática do ato. Da mesma forma, é inequívoco que o projeto foi elaborado, ou seja, que o serviço contratado foi efetivamente prestado.

Disso decorre que condenar os réus a restituírem à Municipalidade os valores despendidos configuraria enriquecimento ilícito do ente público, que se beneficiou do projeto (ainda que não executado na forma inicialmente idealizada), em detrimento da contratada.

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Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 19

Por derradeiro, também não é possível apurar a afronta ao princípio da moralidade, mencionado na petição inicial.

Leciona Teori Zavascki: "(...) o enunciado do princípio da moralidade administrativa – que, repita-se, tem natureza essencialmente jurídica - está associado à gama de virtudes e valores de natureza moral e ética: honestidade, lealdade, boa-fé, bons costumes, eqüidade, justiça. São valores e virtudes que dizem respeito à pessoa do agente administrativo. Conseqüentemente, os vícios do ato administrativo por ofensa à moralidade são derivados de causas subjetivas, relacionadas com a intimidade de quem o edita: as suas intenções, os seus interesses, a sua vontade. Estará atendido o princípio da moralidade administrativa quando a força interior e subjetiva que impulsiona o agente à prática do ato guardar adequada relação de compatibilidade com os interesses públicos a que deve visar a atividade administrativa. Se, entretanto, essa relação de compatibilidade for rompida – por exemplo, quando o agente, ao contrário do que se deve razoavelmente esperar do bom administrador, for desonesto em suas intenções, for desleal para com

a

administração

pública,

agir

de

má-fé

para

com

o

administrado, substituir os interesses da sociedade pelos seus interesses pessoais – estará concretizada ofensa à moralidade administrativa, causa suficiente de nulidade do ato. A quebra da moralidade caracteriza-se, portanto, pela desarmonia entre a expressão formal (= a aparência) do ato e a sua expressão real (= a sua substância), criada e derivada de impulsos subjetivos viciados quanto aos motivos, ou à causa ou à finalidade da atuação administrativa. É por isso que o desvio de finalidade e o abuso de Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 19 de 23


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poder (vícios originados da estrutura subjetiva do agente) são considerados defeitos tipicamente relacionados com a violação à moralidade" ((Processo Coletivo, Ed. Revista dos Tribunais, 2006. p.93/94). No caso, pode-se até questionar os mais diversos aspectos da obra, como a dimensão, localização, necessidade de heliporto, entre outros constantes do projeto idealizado pelo então Prefeito Municipal. Pode-se, inclusive, questionar se existia a necessidade de um hospital regional em Maringá ou a possibilidade de se adequarem os existentes.

Todavia, essas questões inserem-se no âmbito de discricionariedade do administrador público, que não se sujeitam à análise pelo Poder Judiciário quando não está evidenciada a ilegalidade do ato praticado. Admitir o manejo da ação popular, nesses casos, submeteria o Administrador Público à mudança na opinião pública e da conjuntura política, o que certamente geraria insegurança jurídica aos ocupantes de cargos públicos, como esclarece Hely Lopes Meirelles:

“Admitir que qualquer cidadão conteste a validade de um ato administrativo praticado por agente competente, de acordo com a lei e os regulamentos aprovados pelos Poderes Constitucionais legítimos, apenas com base no conceito vago de imoralidade, é deixar a sorte da Administração ao sabor variável e influenciável da opinião pública e dos humores políticos, Se a

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Administração age dentro da lei, sem desvio de finalidade, não há como aceitar a intervenção do Poder Judiciário através da ação popular.” (op. cit. p. 133).

Dessa forma, evidenciado que a ação popular foi utilizada com intuito eminentemente eleitoral, aliada à ausência de provas do superfaturamento na elaboração do projeto contratado, não é possível anular o ato impugnado.

Por consequência, ante o provimento da apelação interposta pelos réus e a integral improcedência dos pedidos formulados na inicial, fica prejudicada a apelação interposta pelo autor popular. Ainda, ausente a má-fé na propositura da ação, fica o autor isento do pagamento das custas processuais e ônus de sucumbência, nos termos do art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal:

Art. 5º. (...) LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;”

Por derradeiro, não se conhece do agravo retido interposto pelo autor popular (f. 1.036/.1039), por causa da sua não

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Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 22

reiteração por ocasião das razões de apelação interposta, nos termos do art. 523 do CPC/1973, vigente à época.

Do exposto, voto no sentido de não conhecer do agravo

retido

interposto

por

WALTER

ALEXANDRINO;

dar

provimento à apelação interposta por RICARDO JOSÉ MAGALHÃES BARROS E OUTROS para, nos termos do art. 487, I, do CPC/2015, julgar improcedentes os pedidos formulados na ação popular, sem condenar o autor popular ao pagamento das despesas processuais diante da ausência de má-fé e; julgar prejudicado a apelação interposta por WALTER ALEXANDRINO.

ACORDAM

os

Senhores

Desembargadores

integrantes da Quinta Câmara Cível com quórum estendido do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por maioria de votos, em: a)

não

conhecer

do

agravo

retido

interposto

por

WALTER

ALEXANDRINO; b) dar provimento à apelação interposta por RICARDO JOSÉ MAGALHÃES BARROS E OUTROS para, nos termos do art. 487, I, do

CPC/2015, julgar

improcedentes os pedidos

formulados na ação popular, sem condenar o autor popular ao pagamento das despesas processuais diante da ausência de má-fé e; c) julgar prejudicado a apelação interposta por WALTER ALEXANDRINO. Vencidos o Senhor Desembargador LUIZ MATEUS DE LIMA (Relator Originário) e o Senhor Juiz Substituto em Segundo Grau Dr. ROGÉRIO RIBAS, que dão parcial provimento aos recursos de apelação, com declaração de voto em separado do Senhor Desembargador LUIZ MATEUS DE LIMA.

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Apelação Cível nº 1495076-0 fl. 23

A Sessão foi presidida pelo Senhor Desembargador LUIZ MATEUS DE LIMA, com voto, e participaram do julgamento o Senhor Desembargador CARLOS MANSUR ARIDA e os Senhores Juízes Substitutos em Segundo Grau EDISON DE OLIVEIRA MACEDO FILHO e ROGÉRIO RIBAS.

Curitiba, 12 de julho de 2016.

NILSON MIZUTA Relator Designado

LUIZ MATEUS DE LIMA Voto Vencido

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