Igreja

Page 1

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1403792-4 DE MARINGÁ – 7ª VARA CÍVEL Apelante:

IGREJA EVANGÉLICA MISSIONÁRIA SÓ O SENHOR É DEUS

Apelado:

BELCHIOR SOARES DA SILVA

R. Adesivo: BELCHIOR SOARES DA SILVA Recorrido:

IGREJA EVANGÉLICA MISSIONÁRIA SÓ O SENHOR É DEUS

Relator:

JUIZ SERGIO LUIZ PATITUCCI

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR FALTA DE INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – PRELIMINAR AFASTADA – PARTES E OBJETO DA LIDE NÃO ELENCADOS NO ARTIGO 82 E INCISOS DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – INTERESSE EXCLUSIVAMENTE PATRIMONIAL – DESNECESSIDADE DE INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO COMO “CUSTOS LEGIS” – PRESCRIÇÃO – PREJUDICIAL DE MÉRITO JÁ ANALISADA EM SEDE DE DESPACHO SANEADOR – AUSÊNCIA DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO CABÍVEL EM MOMENTO OPORTUNO – OCORRÊNCIA DE PRECLUSÃO – MÉRITO – OFENSA À HONRA DO MAGISTRADO – EMPREGO DE EXPRESSÕES INJURIOSAS E DIFAMATÓRIAS EM PEÇA ESCRITA DEFLAGRADORA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO CONTRA O MAGISTRADO – ABUSO DE DIREITO CARACTERIZADO – OFENSA À REPUTAÇÃO, HONRA E BOM NOME DO JUIZ DE DIREITO – DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO – MAJORAÇÃO – VALOR NÃO CONDIZENTE COM AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO E COM O CARÁTER PEDAGÓGICO E COMPENSATÓRIO – CORREÇÃO

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 1 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

MONETÁRIA – TERMO INICIAL – DATA DO JULGAMENTO – SÚMULA Nº 362 DO STJ - VERBA HONORÁRIA – MANUTENÇÃO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSOS – APELAÇÃO 1 – CONHECE PARCIALMENTE E, NA PARTE CONHECIDA, NEGA PROVIMENTO – APELAÇÃO 2 – PARCIAL PROVIMENTO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1403792-4, da 7ª Vara Cível da Região Metropolitana de Maringá do Foro Central de Maringá, em que é apelante Igreja Evangélica Missionária Só o Senhor é Deus, recorrente adesivo Belchior Soares da Silva e apelados Os mesmos.

I – RELATÓRIO

Trata-se de ação de indenização por dano moral, ajuizada por Belchior Soares da Silva, em face da Igreja Evangélica Missionária “Só o Senhor é Deus”. Por brevidade, adota-se o relatório da sentença, assim redigido: “(a) o autor é Juiz de Direito, titular da 6ª Vara Cível local; (b) por essa unidade judiciária tramitaram demandas de interesse da parte ré (“Declaratória” n. 101/00 e “Cautelar Inominada” n. 43/00, ambas em face de ALÉCIO MIRANDA LEAL e SALINE ATIE RAMOS, e que visavam pretensa apropriação de recursos deles e da RÁDIO DIFUSORA DE LONDRINA LTDA, da Igreja ré; (c) o autor, no seu múnus público, exarou decisões desfavoráveis aos interesses desta, que opôs exceções de suspeição (ns. 121.084-4 e 327.446-6), que, depois, foram rejeitadas, e “Protesto Judicial”, autos n. 860/10, na 4ª Vara Cível local, arquivados de plano; (d) insatisfeita, a parte passiva aforou reclamação disciplinar em desfavor da parte ativa (autos n. 2010.0338680-6), neste Estado, dizendo

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 2 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4 que ele recebera propina (em R$ 300.000,00) a fim de exarar essas decisões, desfavoráveis à parte passiva (e favoráveis a ALÉCIO MIRANDA LEAL e SALINE ATIE RAMOS), com várias críticas à personalidade do juiz, como a de (d1) manter atuação reprovável e agir duvidoso nesse múnus, de (d2) ser pessoa rancorosa, vil, nutrida por ânsia, ódio, de (d3) ser perseguidor, (d4) parcial e procrastinador; (e) essa reclamação foi arquivada definitivamente, pela ausência de provas da acusação, mesmo com ele facultando a quebra de sue sigilo fiscal e bancário; (f) a parte passiva, ademais, promoveu passeata no dia 21.9.01, denegrindo e constrangendo a honra da parte ativa, sua reputação e bom nome; (g) a conduta da parte ré gerou grande abalo à honra objetiva e subjetiva daquela, causando danos extrapatrimoniais, que devem ser compensados, para o que sugere o valor de R$ 300.000,00; (h) vindica condenação da parte passiva à compensação pelos danos extrapatrimoniais, bem como pela sucumbência” (fl. 2.283).

Após as manifestações das partes e instrução do feito, adveio a sentença (mov. 293,1 – fls. 2283/2296), que julgou procedente a pretensão inicial, para o fim de condenar a requerida ao pagamento de indenização por danos morais, estes fixados em R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), corrigidos monetariamente pela média INPCIBGE/IGP-DI, desde a data da publicação da sentença e acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês. Por fim, condenou a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação. Inconformada, a requerida apela

(mov. 299.1 – fls. 2359/2490)

arguindo, preliminarmente, a nulidade da sentença, ante a necessidade de intervenção do Ministério Público no presente feito. Aduz que a ação estaria prescrita, na medida em que transcorrido mais de três anos entre a data dos fatos atribuídos por ofensivos e o ajuizamento da presente demanda. No mérito, defende que a ação seria totalmente improcedente, ao argumento de que o apelante, ao ajuizar as medidas judiciais em desfavor do apelado,

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 3 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

apenas o fez no exercício regular de direito e sem a intenção de denegrir ou macular a imagem do autor, tanto é que se manteve o caso sob sigilo. Quanto a afirmação do recebimento de propina pelo magistrado, mencionado na reclamação disciplinar, aduz que esta informação foi retirada das gravações de conversas telefônicas constantes nos autos de ação penal que tramita perante a 1ª Vara Criminal de Maringá e da ação cominatória c/c reparação de danos. Já quanto a manifestação pública realizada pelos membros da Igreja, sustenta que esta se deu na forma de passeata pacífica e ordeira, não trazendo qualquer faixas ou cartazes denegrindo a imagem ou reputação do autor, ora apelado. Afirma, ainda, a inexistência de provas a demonstrar o dano moral indenizável suportado pelo autor, ou, ainda, a intenção da ré em ofender a honra do requerente. Alternativamente,

pugna

pela

redução

do

quantum

indenizatório, em atenção aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade e, em especial, à condição da apelante, que se trata de uma instituição religiosa sem fins lucrativos. Por fim, requer a redução do valor arbitrado à título de honorários advocatícios, para 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. Por sua vez, o autor também recorre adesivamente (mov. 310.1 – fls. 2511/2533),

pretendendo a majoração do valor arbitrado a título de indenização por dano

moral para R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), considerando que o autor foi acusado e caluniado de ter recebido este montante à título de propina. Insurge-se, também, contra o montante da verba honorária, pretendendo, para tanto, a sua majoração, tendo em vista o grau de zelo do procurador do requerente, a natureza e a importância da causa, assim como o trabalho prestado e o tempo

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 4 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

exigido para tanto. Contrarrazões apresentadas tanto por uma, como por outra parte

(mov. 310.2 – fls. 2521/2534 e mov. 319.1 – fls. 2564/2592)

pugnando pelo desprovimento do

recurso alheio. É o relatório.

II – O VOTO E SEUS FUNDAMENTOS

Trata-se de recurso de apelação interposto em face da sentença que julgou procedente a ação de indenização, condenando a requerida ao pagamento de indenização por dano moral, no importe de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), assim como ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação. Da Intervenção do Ministério Público Preliminarmente, defende a requerida, ora primeira apelante, que a sentença deveria ser anulada, ante a necessidade de intervenção do Ministério Público no presente feito. Contudo, razão não lhe assiste. Isso porque, consoante disposto no artigo 82 e incisos do Código de Processo Civil, "compete ao Ministério Público intervir: I - nas causas em que há interesses de incapazes; II - nas causas concernentes ao estado da pessoa, pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamento, declaração de ausência e disposições de última vontade; III - nas ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e nas demais causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte."

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 5 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

In casu, verifica-se não haver necessidade de intervenção do Ministério Público, haja vista não estarem as partes litigantes e muito menos o objeto da presente ação elencados no rol acima transcrito. Com efeito, na espécie, trata-se de ação de indenização em face de ter a requerida, em suma, atribuído ao requerente a prática de condutas ilícitas no exercício das funções judicantes. Portanto, como se percebe, a demanda encerra o tema da responsabilidade, de modo que não se exige a atuação do “custos legis”. Neste sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: “RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS AJUIZADA CONTRA PROMOTOR DE JUSTIÇA. MINISTÉRIO PÚBLICO. INTERVENÇÃO. DESNECESSIDADE. LEGITIMIDADE PARA RECORRER. AUSÊNCIA. 1. Somente a parte sucumbente, o terceiro prejudicado e o Ministério Público, enquanto parte ou fiscal da lei, podem recorrer (Código de Processo Civil, artigo 499). 2. Em se cuidando de ação indenizatória por dano moral, proposta contra promotor de justiça, não há falar na intervenção do Ministério Público Estadual como custos legis, faltandolhe, assim, legitimidade para recorrer, eis que também não ostenta a qualidade de parte. 3. Recurso especial não conhecido”. (STJ – 1ª T., REsp 880049/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 15.02.2011 – grifo nosso).

Destarte, não se há falar em nulidade da sentença por ausência de intervenção do Ministério Público. Da prescrição Sustenta a ré, ora primeira recorrente, que deveria ser reconhecida a ocorrência de prescrição do direito de ação, ao argumento de que transcorreram-se mais de três anos entre a data dos fatos e o ajuizamento da presente demanda. Contudo, em análise dos autos, observa-se que a questão relativa a prescrição foi analisada e decidida em sede de despacho saneador

(mov. 44.1 – fls.

1411/1414).

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 6 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

Da referida decisão, verifica-se que a requerida foi devidamente intimada (mov. 50.0 – fl. 1421), mas ela não interpôs, na ocasião, qualquer recurso. Assim sendo, a alegação de prescrição não merece sequer ser conhecida, uma vez que, embora devidamente intimada, a requerida não se insurgiu, com o recurso cabível e em momento oportuno, contra o referido despacho decisório. Logo, não se pode, nesse momento, questionar a respeito da prescrição, porquanto incidente à espécie, a preclusão temporal. Sobre a preclusão temporal, ensina Fredie Didier Junior: “A preclusão temporal consiste na perda do poder processual em razão do seu não exercício no momento oportuno; a perda do prazo é inércia que implica preclusão (art. 1863, do CPC). Para a doutrina majoritária, é reconhecido como fenômeno decorrente do desrespeito pelas partes dos prazos próprios e preclusivos. Ocorre, por exemplo, quando a parte não oferece contestação ou recurso no prazo legal”1.

Assim sendo, precluiu para a requerida, ora primeira apelante, a faculdade de questionar em grau recursal a ocorrência de prescrição, sendo forçoso reconhecer que as alegações apresentadas neste recurso não são passíveis de discussão por estar atingida pela preclusão. Desta feita, considerando a ocorrência de preclusão temporal para se recorrer da decisão que afastou a prejudicial de mérito da prescrição, o apelo não está a merecer conhecimento, neste tópico. Do dever de indenizar No mérito, defende a requerida que não estariam presentes os requisitos configuradores do dever de indenizar, ao argumento de que agiu no exercício regular do direito.

1

DIDIER Jr, Fredie. Curso de Direito Processo Civil. Vol. 1. 11. ed. Salvador: Juspodivm, 2009, p. 281.

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 7 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

O autor alega que sofreu agressões à sua honra de magistrado, devido a utilização de expressões depreciativas nas exceções de suspeições e reclamação disciplinar, aforadas pela parte requerida, após o autor ter exarado decisões desfavoráveis aos interesses daquela. Afirma que foi acusado de recebimento de propina para exarar as decisões contrárias e a parte requerida promoveu a realização de passeata, denegrindo e constrangendo a sua honra. Por essas razões, ajuizou a presente ação, pretendendo o recebimento de indenização por dano moral. Inicialmente, necessário consignar que a oposição de exceção de suspeição e de reclamação perante o órgão de classe, a princípio, caracteriza o exercício regular de um direito, pois está amparada no direito de petição, previsto no artigo 5º, XXXIV, da Constituição Federal, capaz de gerar responsabilidade somente em casos extremos, ou seja, naqueles em que restar comprovada, de forma inequívoca, o cometimento de excesso por parte do interessado. Sobre o direito de petição, transcrevo os ensinamentos de José dos Santos Carvalho Filho2: Consiste esse direito, de longínqua tradição inglesa, na faculdade que tem os indivíduos de formular aos órgãos públicos qualquer tipo de postulação, tudo como decorrência da própria cidadania. (...) Como é lógico, o direito de petição não pode mascarar qualquer forma de abuso por parte do interessado. A Constituição protege o uso do direito, e não o abuso. Por isso, as petições devem ser, como regra, escritas e não devem conter expressões ofensivas e difamatórias. Não são consideradas lícitas as petições clandestinas ou anônimas (...). Fora isso, podem conter pedidos revisionais, queixas, súplicas, sugestões, e correções de erros e abusos.

No que diz respeito, especificamente, à representação aos órgãos de classe, efetivada por advogado ou qualquer outro interessado, com a finalidade 2

Carvalho Filho, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 23. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2010, p. 1030/1031.

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 8 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

de comunicar a ocorrência de determinados atos, supostamente irregulares, praticados por Magistrados e demais funcionários do Poder Público, conforme já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça: “se trata de medida necessária e salutar para a administração da Justiça” (Superior Tribunal de Justiça, REsp 1065397 / MT, Rel. Massami Uyeda, Julg. 04/11/2010, Pub. DJe 16/02/2011).

O ministro Humberto Gomes de Barros, em voto-vista proferido no julgamento do REsp 531335/MT, destaca que: “valer-se dos instrumentos legais, no escopo de resgatar a imparcialidade na condução de processos judiciais, não constitui abuso no exercício do direito. Ao contrário, pior seria ao Estado de Direito se as partes não dispusessem de meios legítimos para questionar a imparcialidade dos magistrados” .

E, neste contexto, eventual responsabilidade daquele que formaliza a representação somente restará configurada se restar comprovado que este agiu de forma injusta, maliciosa e despropositada, com o intuito de denegrir a imagem ou a honra do representado. Portanto, inobstante a parte goze do direito de petição, tal direito não pode ser usado de forma abusiva, de maneira a invadir a esfera do direito de outrem. Assim, na análise da conduta da ré, para se definir se esta ou não com excesso, deve-se tomar como parâmetro o instituto do abuso de direito. O abuso de direito, na teoria geral, encontra-se relacionado à “noção de excesso; ao aproveitamento de uma situação contra pessoa ou coisa, de maneira geral. Juridicamente, abuso de direito pode ser entendido como o fato de usar de um poder, de uma faculdade, de um direito ou mesmo de uma coisa, além do que razoavelmente o Direito e a sociedade permitem”3.

3

Venosa, Sílvio de Salvo. Direito Civil: parte geral. 9. ed. São Paulo: Atlas. 2009, p. 533 v. 1.

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 9 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

Transportado tal conceito para a esfera das relações jurídicas em geral, tem-se que o abuso do direito de peticionar e de manifestar o pensamento ocorre quando a parte age de forma incompatível com a causa e a defesa de seu interesse, violando os direitos e garantias constitucionais conferidos a todo ser humano. Ainda, de acordo com a jurisprudência, para a caracterização dos atos ilícitos cometidos contra a honra (calúnia, injúria e difamação), é imprescindível que fique evidenciada a intenção de ofender, a ponto de refletir consideravelmente na vida pessoal do ofendido, causando-lhe aborrecimentos acima dos corriqueiros, e dano factível em suas relações profissionais, familiares ou sociais, bem como que tais expressões sejam incompatíveis com a narrativa dos fatos discutidos no processo. Com efeito, na espécie, analisando, em especial, a reclamação disciplinar formulada pela primeira apelante junto à Corregedoria, verifica-se que a mesma extrapolou os limites da razoabilidade. Isso porque, ao invés de simplesmente se limitar a relatar os fatos, passou a fazer acusações criminosas contra o magistrado (autor), ofendendo a honra pessoal e profissional do mesmo, incorrendo, por conseguinte, em abuso do direito. Da aludida peça, cumpre-se destacar: “Mas, de forma surpreendente no dia 10.09.2001 o então advogado e procurador de ALÉCIO MIRANDA LEAL Dr. Fuad Esper Chaida, veio novamente provocar a manifestação do Juiz Belchior, numa peça que supostamente foi denominada de ‘agravo retido’ (doc nº 18, fls. 2506/2515). E pelo que pode observar, essa manifestação surtiu pleno resultado. E vale dizer, de forma muito rápida, o que não é proceder comum e normal do Juiz BELCHIOR na entrega de qualquer postulação que lhe é endereçada. Tanto é que, de forma ágil e muito estranha (com apenas 06 (seis) dias, a contar do protocolo da citação petição) o Juiz BELCHIOR, de forma sucinta e sem qualquer embasamento legal, veio considerar por inepta a petição inicial prolatando decisão em que extinguiu parcialmente a ação (ação ordinária, autos nº 101/2000), cassando os efeitos da liminar (doc nº 16 - fls. 2516/2520) com a imediata expedição de ofício aos órgãos (Juta Comercial, Anatel, Detran, Copel e Tabelionato de Notas) – (doc. Nº 16 – fls. 2523/2529), assim como devolveu aos ex-diretores (ALECIO e SALINE) a posse e a administração da Rádio Difusora de Londrina Ltda., além de um imóvel (apartamento 1903, Edifício Porto Fino, Rio de Janeiro) e de um veículo (Mercedes

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 10 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4 Bens/S-500, importado, cor prata, ano 1999, placa LWC – 8272) aos réus Alécio Miranda Leal e Saline Atie Ramos. Mas, pasme. O que causou maior espanto é que o juiz BELCHIOR, após ter já lançado sua assinatura em todos os expedientes acima e entregar os expediente aos advogados e procuradores dos ex-diretores e réus (ALÉCIO e SALINE), determinou a uma das serventuárias que informasse ‘por telefone’ ao advogado e procurador da Igreja/Reclamante da decisão supra mencionada (doc. Nº 18 – fls. 2516/2520). Como se vê, a decisão judicial prolatada na ação principal (ação ordinária, autos n 101/2000), tinha por escopo retribuir a vultuosa “propina” recebida pelo juiz BELCHIOR, mormente no que se refere ao total esvaziamento da garantia processual (emissora de rádio, imóvel e veículo) e a impossibilidade de se obter qualquer êxito na fase de execução de sentença condenatória, posto que devolveu ao corruptor ALÉCIO e sua mulher SALIEN não somente a posse e a administração da Rádio Difusora de Londrina Ltda., como também os únicos bens que se encontram sequestrados: o imóvel (apartamento 1903, Edifício Porto Fino, Rio de Janeiro) e o veículo (Mercedes Bens/S-500, importado, ano 1999, placa LWC-8272. (...) Aliás, a decisão que suspendeu os efeitos dos atos praticados pelo juiz BELCHIOR não agradou em nada o ex-diretor e réu ALÉCIO MIRANDA LEAL, posto que segundo ficou sabendo os ATUAIS Diretores da Igreja Reclamante, após uma inflamada discussão, que ocorreu no dia 24.09.2001 (passados 07 (sete) dias passados da prolação da referida decisão pelo juiz BELCHIOR), veio este (ALECIO) a destituir o advogado e procurador Fuad Esper Cheida (doc. Nº 16 - fls. 2850/2853), posto que segundo se ouviu dizer por ALECIO “o advogado não havia cumprido o combinado e que se não desse jeito ele iria exigir a devolução do valor da propina”. (...) a partir da data da revogação de mandato do advogado Fuad Esper Cheida, a Igreja passou a receber informações e telefonemas de uma terceiro (que não se identificou_ de que a referida decisão (doc. Nº 16 – fls. 2516/2519) “havia custado a ALÉCIO MIRANDA LEAL o valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), sedo que R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) foi destinado como propina, ao juiz BELCHIOR e que o saldo de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) ficou em poder do então advogado e procurador Fuad Esper Cheida” (mov. 1.3 – fls. 31/33 – grifo nosso).

Ora, se a requerida entendia que o magistrado tinha agido de forma abusiva e imparcial na condução dos processos que lhe diziam respeito, cumpria-lhe dirigir às autoridades competentes uma reclamação que trouxesse um relato dos fatos, não tecer considerações ofensivas à pessoa da mesma, inclusive, imputando-lhe a prática de ato criminoso (corrução passiva), que, conforme se denota, não restou comprovado, ensejando o arquivamento da reclamação, pela Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná.

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 11 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

Conforme bem ponderou o magistrado singular: “E se essa é a ‘prova’ de que a parte ativa teria recebido ‘propina’, pode-se dizer que não há o mínimo de comprovação suficiente sobre tal cogitação. Isso não passa de simples ilação, que proveio ou foi (convenientemente) difundida por litigante descontente, que, por decerto, quis acreditar que os resultados judiciais desfavoráveis seriam fruto de perseguições do Juiz. Afinal, a opção de atribuir a culpa aos outros, ou de procurar culpados, tem sido a forma mais comum – e rasteira – de justificar a (s) derrota (s). Para alguns, não é fácil admitir que a carência ou a falta de razão (do direito) foi causa eficiente para a derrota (sucumbência), porque mais fácil e cômodo é imaginar que isso ocorreu porque o julgamento foi tendencioso, parcial. Mas se isso fica no íntimo do vencido, ou no seio mais reservado de sua esfera jurídica, até que se toleraria a insurgência como simples inconformismo, inato às pessoas. Todavia, quando embala ações de efetivo ataque à pessoa do julgador, à idoneidade deste, obviamente, a atitude não pode ser deixada sob o mantido da impunidade (sob a pena de se estimular a irresponsabilidade, a ofensa a direito supremo das pessoas)” (fl. 2.290).

Com efeito, deveria a requerida ter tido mais cuidado ao acusar, por escrito, o magistrado de prática de crime, ao invés de sujeitar o Juiz a graves constrangimentos perante a Corregedoria-Geral da Justiça, obrigando-o a enfrentar uma correição em que sua honra pessoal é atacada de maneira deselegante. É certo, conforme já salientado, que a representação à Corregedoria-Geral de Justiça é o instrumento próprio para a apuração de irregularidades, não merecendo censura aquele que relata fatos, que entende serem inadequados, à autoridade competente, com cuidado e moderação, sob pena de se deixar aquele que age contrariamente à normalidade e moralidade, sem a devida sanção. Não foi, entretanto, o que se deu no caso dos autos, em que a ré, de forma odiosa, atacou frontal e gravemente a pessoa do autor, tecendo considerações inverídicas e levianas sobre o mesmo, atingindo diretamente a sua integridade psíquica, sua honra e reputação. Denota-se que a ré não se limitou, nem se contentou a tecer considerações e críticas ao ato jurisdicional que reputava ilegal. Foi muito além, violando a integridade moral do magistrado e lesionando a sua conduta profissional, pondo-a em dúvida com assertivas desprovidas de suporte probatório.

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 12 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

Tal se infere, sem dúvida, dos trechos em que a ré faz alusão a suposto recebimento de propina pelo magistrado, ora requerente. Destarte, a demanda não se limitou a noticiar, objetivamente, fatos à Corregedoria-Geral de Justiça, recaindo para o campo dos qualificativos depreciativos e ofensivos à honra e à reputação do demandante, construída ao longo de extensa carreira como Juiz de Direito. Vale dizer, ainda, que o arquivamento da reclamação disciplinar não elide ou afasta a responsabilidade civil da demandada pelas expressões injuriosas e caluniosas lançadas na reclamação que encaminhou à Corregedoria-Geral de Justiça, pois as ofensas ali irrogadas chegaram ao domínio público e certamente chegou ao conhecimento dos operadores do direito que atuam na Comarca de Maringá, onde o autor presta jurisdição. É evidente que a inconformidade com a decisão proferida pelo autor deveria desafiar o recurso cabível, e não a manifestação junto à Corregedoria Geral do Estado, em que foi imputada ao autor o cometimento de prática criminosa (recebimento de propina). Não há ato jurisdicional infenso ao controle judicial. E diversos são os meios de impugnação às decisões judiciais de que se podem socorrer as partes prejudicados e mesmo terceiros, desde que afetados pela eficácia de atos jurisdicionais eventualmente lesivos a interesses legítimos ou reputados ilegais ou abusivos. O que não se concebe e não se pode admitir, na atuação da parte, na defesa de seus direitos, é de que deixe de utilizar meios processuais e recursos idôneos e lícitos ao seu alcance para impugnar as decisões judiciais e descambe para o campo da ilicitude, do ataque pessoal à honorabilidade e integridade pessoal e profissional do magistrado, tal como se verifica na espécie, da conduta praticada pela ré.

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 13 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

De se esclarecer que são livres os direitos de livre opinião, de resposta, de expressão, de manifestação do pensamento, e de petição. No entanto, tais prerrogativas não podem ser exercidas de forma excessiva, agressiva, destinando a outrem impropérios, acusações e considerações de ordem pessoal. A veemência da postulação, evidentemente, precisa cingir-se aos limites da polidez. O direito de petição da parte não lhe confere imunidade para ofender a outrem, muito menos ao julgador da causa, nem legitima ou autoriza eventuais excessos. Com efeito, a ilicitude da conduta adotada pela requerida, ante o flagrante conteúdo ofensivo, injurioso e difamatório que contém a peça destinada à Corregedoria-Geral de Justiça, enseja à ré, o pagamento de indenização por danos morais. Enfim, tendo a requerida extrapolado, em muito, os limites de sua atuação, atribuindo ao requerente a prática de ato criminoso deverá responder por seu ato, vez que a malsinada reclamação, de teor severamente agressivo e desabonador, ofendeu a honra pessoal do magistrado, ora segundo apelante, que, ressalte-se, tem não só o dever, mas o direito de manter íntegro o seu nome pessoal. Quanto à alegação de inocorrência de danos morais, ante a inexistência de provas, melhor sorte também não socorre a requerida, ora primeira apelante, haja vista ser desnecessária a prova do dano, bastando a comprovação do ato ilícito, que atingiu a honra do ofendido. No mesmo sentido: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. OFENSA A HONRA DE MAGISTRADO. COMPROVAÇÃO DO ATO ILÍCITO E NEXO DE CAUSALIDADE. DESNECESSÁRIO A COMPROVAÇÃO DO DANO MORAL. ARTS. 535 E 458 DO CPC. OFENSA. INEXISTENTE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO. - O Art. 535 do CPC não é maltratado, quando o acórdão decide com clareza, precisão e fundamentadamente as questões

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 14 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4 pertinentes. - Inexistindo defeito de fundamentação capaz de tornar nulo o julgado, inexiste ofensa ao Art. 458 do CPC. - A prova do dano moral resulta da simples comprovação do fato que acarretou a dor, o sofrimento, a lesão aos sentimentos íntimos. - Nega-se seguimento a recurso especial interposto pela alínea "c", em que não se demonstra a divergência nos moldes exigidos pelo Art. 255 do RISTJ. - Em recurso especial somente é possível revisar a indenização por danos morais quando o valor fixado nas instâncias locais for exageradamente alto, ou baixo, a ponto de maltratar o Art. 159 do Código Beviláqua. Fora desses casos, incide a Súmula 7, a impedir o conhecimento do recurso. - A indenização deve ter conteúdo didático, de modo a coibir reincidência do causador do dano sem enriquecer injustamente a vítima”. (STJ – 3ª T., REsp nº 968019/PI, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 16.08.2007).

Por tudo isso, é de ser mantida a sentença que reconheceu restar caracterizado o dano moral suportado pela parte autora. Do quantum indenizatório No que diz respeito ao valor fixado a título de indenização por danos morais, ambos os recursos serão analisados conjuntamente, pois enquanto a requerida pugna pela redução do quantum indenizatório, o autor requer a sua majoração. Com efeito, o valor da condenação a título de danos morais deve ser majorado, levando-se em conta os princípios norteadores para sua fixação, consistente na repercussão da ofensa, qualidade do atingido e capacidade financeira do ofensor, de molde a inibi-lo a futuras incidências sem, no entanto, ocasionar insuportável gravame patrimonial para o mesmo e proporcionar enriquecimento ilícito ao lesado, dentro da chamada "Teoria do Desestímulo". O ilustre mestre Caio Mário da Silva Pereira, assim destaca: "A vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho patrimonial efetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em certos casos pode ser mesmo mais valioso do que os integrantes do seu patrimônio, deve receber uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo as circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva." (Responsabilidade Civil, nº45, pg. 67, RJ, 1989).

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 15 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

Nestes termos, a reparação de danos morais deve ter relação com o fato, como assim, ser em importância suficiente para atingir o fim preventivo, em cifra que não corresponda a valores muito elevados, mas que também não tão irrisório que se cinjam a ínfimo decréscimo do patrimônio do lesante. Consoante o colendo Superior Tribunal de Justiça, é recomendável que, "na fixação da indenização a esse título, o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico da parte autora e, ainda, ao porte econômico da ré, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos na doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso" (STJ - REsp 259816/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª T).

Na espécie, é de se considerar intensa a reprovabilidade da conduta da requerida. A despeito disso, insiste em continuar atacando a integridade moral e profissional do magistrado, utilizando-se de expressões depreciativas e desonrosas. As reiteradas manifestações escritas nos presentes autos revelam que não há a mínima autocensura, policiamento próprio ou fator inibitório, bem ainda o acentuado dolo de ofender e o “animus injuriandi” com que agiu a requerida. Denota-se que tais ofensas vêm sendo atacadas contra o Juiz de Direito, de modo reiterado, não se limitando, ao que se infere dos autos, àquela peça que motivou o ajuizamento da presente ação reparatória. Veja que a requerida, ora primeira apelante, tanto na contestação, como nas presentes razões recursais, continua a imputar ao autor o recebimento de propina. Há que se colocar um freio nesse proceder, e aí a indenização assume nítido cunho pedagógico.

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 16 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

Sobre o tema da honra profissional anota Aparecida Amarante4: “A honra profissional diz respeito a certas qualidades que não são gerais e sim especiais em relação ao exercício de determinadas profissões. Em cada profissão existe um conjunto de normas que obrigam a determinada conduta e, se esta conduta não for observada, por não-cumprimento do dever, pela omissão, pela comissão de fatos proibidos, configura-se conduta desonrosa. Se toda pessoa tem a sua própria honra, cada classe ou profissão poderá também ter a sua; o direito não só deve proteger o homem intuitu personae, mas igualmente o seu grupo social. Os homens ligam-se pela profissão e pelo trabalho, que os unem na incessante luta pela vida. Devemos considerar, neste campo, tanto as relações internas como as externas. No âmbito interno, o comportamento desonroso é analisado pelo próprio grupo social, que poderá excluir de seu seio o componente desonroso. E, no campo externo, a proteção da honra se dá por meio de normas jurídicas.”

Logo adiante, acrescenta a mesma doutrinadora5: “Dessa forma, em diversas profissões como a do médico, a do juiz, do advogado, do comerciante, existem determinadas qualidades fundamentais, sobre as quais se constrói a reputação profissional do indivíduo. Diz Santos Cifuentes que ‘por la mayor altura obtenida con el esfuerzo y el estudio, se hace más sensible el honor y debe ser más refinada la vara para medirlo’. Exemplifica afirmando que dizer a um ‘joão-ninguém que este não tem conhecimento nem sentido ético não é o mesmo que dizê-lo a um Prêmio Nobel de Química’. Tanto mais se amplia o campo de proteção à honra, ou seja, mais ela se eleva, quanto mais forem os méritos da pessoa reconhecidos pelo meio social, em premiação aos esforços por ela despendidos. Além do título profissional, que distingue o indivíduo, como premiação de seu esforço, destaca-se, na sua vida profissional, a conduta ética. Na atividade profissional ganha a ética especial destaque, impondo determinada linha de conduta, traçada ou pela lei, costumes, cultura, hábitos àquela classe de pessoas preparadas para o exercício de determinada atividade. Ainda subsidiados em Santos Cifuentes, destacamos: qualquer imputação de inexecução daqueles deveres específicos, próprios da profissão, por intolerável, desmedida ou falsa, fere a honra profissional.”

Com efeito, considerando a gravidade da conduta ilícita e a extensão dos prejuízos causados ao demandante (abertura de procedimentos disciplinares e quebra do sigilo bancário e fiscal), entendo que a indenização fixada na sentença, encontra4 5

Amarante, Aparecida. Responsabilidade Civil por Dano à Honra. 5. ed. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2001, p. 81/82. Ob. Cit., p. 82/83.

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 17 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

se em desconformidade com as circunstâncias fáticas, razão pela qual deve ser majorado para R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), quantia esta que se mostra justa e equilibrada e em estrita observância ao princípio da razoabilidade. E, em tendo sido majorado o valor arbitrado a título de indenização por danos morais, a correção monetária deve incidir a partir da data deste julgamento, nos termos da Súmula nº 362 do STJ, in verbis: "A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento".

Da verba honorária Por fim, em relação aos honorários advocatícios arbitrados, novamente entendo que não merece qualquer reparo a sentença hostilizada. Na espécie, se verifica que o magistrado estabeleceu como valor devido ao pagamento dos honorários advocatícios, o percentual de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação. Em razão de o procurador da parte autora ter demonstrado zelo profissional, ao apresentar as peças processuais indispensáveis ao deslinde da causa, bem como ter prestado o seu serviço de forma adequada, apresentando o seu trabalho no momento oportuno, o percentual concedido na sentença se considera proporcional e adequado à realidade dos autos, de acordo com os ditames do art. 20, § 3º, do Código de Processo Civil. Por outro lado, não é demais lembrar que somente cabe à segunda instância a modificação da verba de sucumbência quando essa se mostrar irrisória ou exagerada, situações que não se configuram no caso em apreço. Assim, deve ser mantida, também, a verba honorária fixada em sentença. Ante o exposto, é de se conhecer parcialmente do primeiro apelo e, na parte conhecida, negar-lhe provimento, bem como é de se dar parcial provimento ao segundo recurso de apelação, para o fim de majorar o quantum

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 18 de 19


Apelação Cível nº 1403792-4

indenizatório para R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), corrigidos monetariamente a partir da data deste julgamento, mantendo-se, no mais, a sentença por seus próprios fundamentos.

III – DISPOSITIVO

ACORDAM os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer parcialmente do primeiro apelo e, na parte conhecida, negar-lhe provimento e dar parcial provimento ao segundo recurso de apelação, nos termos do voto do relator. Participaram da sessão de julgamento os Excelentíssimos Desembargadores José Augusto Gomes Aniceto – Presidente sem voto, Domingos José Perfetto e Luiz Osório Moraes Panza Curitiba, 17 de setembro de 2.015.

SERGIO LUIZ PATITUCCI Relator

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 19 de 19


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.