Lixo decisão

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ - FORO CENTRAL DE MARINGÁ 1ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE MARINGÁ - PROJUDI Avenida Pedro Taques, 294 - 18ª Andar - Torre Sul - Ed. Átrium Empresarial Zona 07 - Maringá/PR - CEP: 87.030-010 - Fone: (44) 34722795 Autos nº. 0005433-20.2016.8.16.0190 Processo: Classe Processual: Assunto Principal: Valor da Causa: Autor(s): Réu(s):

0005433-20.2016.8.16.0190 Ação Civil Pública Edital R$10.000,00 Ministério Público do Estado do Paraná CONSTROESTE CONTRUTORA E PARTICIPAÇÕES LTDA Município de Maringá/PR

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, por seu órgão de execução, ajuizou ação civil pública com pedido de tutela de urgência em caráter incidental em face do MUNICÍPIO DE MARINGÁ e CONSTROESTE CONSTRUTORA E PARTICIPAÇÕES LTDA., todos qualificados (movimento 1.1), e argumentou, em apertada síntese, que o ente municipal deflagrou processo licitatório n. 731/2016 (concorrência n. 016-16) para contratação de empresa especializada para a prestação de serviços de coleta regular manual, transporte e destinação final de resíduos domiciliares e comerciais pelo período de doze meses, prorrogáveis por iguais e sucessivos períodos até o limite de sessenta meses. Segundo o MP, o Município de Maringá fixou o preço máximo da licitação em R$ 30.426.159,12 para o período de doze meses de contratação, todavia, apurou-se que o serviço poderia ser prestado nas mesmas condições previstas no edital pelo valor de R$ 13.974.391,55, vale dizer, 117% (cento e dezessete por cento) inferior. Salientou, ainda, que o Observatório Social de Maringá impugnou o edital pelos motivos elencados na inicial, todavia, a impugnação não restou acolhida. Relatou, também, que treze dos quinze Vereadores da cidade enviaram recomendação ao Prefeito Municipal solicitando a suspensão da concorrência, sugestão também não acolhida. Narrou todo o iter que levou a empresa ré Constroeste ao êxito da licitação, pontuando, inclusive, que a requerida não fez a coleta seletiva de resíduos sólidos. Teceu outros argumentos que serão analisados em momento oportuno. Requereu em sede de tutela de evidência a suspensão da contratação da ré Constroeste, e, na hipótese de o acordo já ter sido celebrado, a suspensão dos seus efeitos. Acostou documentação às sequências 1.2 a 1.17. Determinou-se a intimação dos réus para oitiva prévia (evento 7.1). Posteriormente, atendendo pedido do parquet, decidiu-se apenas pela manifestação do ente municipal (movimento 23.1). O Município de Maringá apresentou suas razões no evento 34.1 e argumentou que a concessão da liminar poderá acarretar dano à população maringaense. Teceu comentários sobre as impugnações formuladas pelo Observatório Social e pelo Vereador Humberto Henrique e narrou que a coleta seletiva não era objeto da licitação, bem como eventual Parceira Público Privada. Especificou todos os fundamentos levantados pelo autor. Documentos às sequências 34.2 a 34.36 e 35.2. O Ministério Público manifestou-se nos eventos 32, oportunidade em que juntou nova documentação. Eis o relato do essencial. Decido.

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJT7T 2JHLC GCBYQ WJMXB

PROJUDI - Processo: 0005433-20.2016.8.16.0190 - Ref. mov. 41.1 - Assinado digitalmente por Fabiano Rodrigo de Souza:10635, 26/08/2016: CONCEDIDA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. Arq: Decisão


Trata-se de ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Estado do Paraná onde se questiona a legalidade do procedimento administrativo n. 731/2016 decorrente da licitação n. 016/2016. De início, importa salientar que se admite a concessão de provimento de urgência de cunho satisfativo contra a Fazenda Pública, bem como a imposição de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer (nesse sentido: STJ - REsp 1184194 RS 2010/0039195-5 – Rel. Min. Eliana Calmon). A presente ação originou-se de inquérito civil instaurado pelo MP após representação de vereador municipal, que, através de cálculos, informou que o objeto da contratação representava valor 117% maior do que a prestação realizada diretamente pelo Poder Público. Ao compulsar os documentos juntados pelas partes autora e ré alguns dados causam estranheza: a) ausência de estudos técnicos que assegurem a viabilidade e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento; b) ausência de demonstração da viabilidade e conveniência da delegação do serviço; c) inexistência de um estudo concreto para estimar o valor máximo do objeto contratado; d) ausência de disposição sobre a destinação final dos resíduos sólidos; e) ausência de previsão contratual referente a coleta seletiva. Todavia, mister salientar que os números relativos ao valor da contratação, por si só, demostram, em cognição inicial, uma flagrante desproporcionalidade na contraprestação pelos serviços que serão executados. Conforme se verifica no evento 34.21, O Município de Maringá possui 23 (vinte e três) veículos de coleta de lixo, todos lotados na gerência de coleta e tratamento de resíduos. O quadro total de coletores municipais varia entre 180 e 212 – movimentos 34.30, 34.31 e 35.2 – dados esses fornecidos pelo próprio réu. A homologação final da concorrência n. 16/2016 (fls. 1763 do auto de procedimento administrativo n. 731/2016), datada de 04/08/2016, fixou o preço anual do contrato em R$ 28.294.800,00 (vinte e oito milhões duzentos e noventa e quatro mil e oitocentos reais), e preço mensal em R$ 2.357.900,00 (dois milhões trezentos e cinquenta e sete mil e novecentos reais). Já a lavagem e desinfecção de feiras livres teve o valor mensal homologado em R$ 137.794,00 (cento e trinta e sete mil setecentos e noventa e quatro reais) e custo total anual estimado em R$ 1.653.528,00 (um milhão seiscentos e cinquenta e três mil e quinhentos e vinte e oito reais) – cf. CD-ROM arquivados nos autos e disponível para consulta (movimento 17.1). Por sua vez, a ré Constroeste conta com 15 (quinze) caminhões, sendo que cada um deles terá um motorista e três coletores (cf. informação do Município de Maringá – movimento 34.1). Assim, em números absolutos, constata-se que a frota e o número de trabalhares da Constroeste são significativamente inferiores aos números atuais existentes no Poder Público Municipal. Em pesquisa na rede internet de computadores (internet) vê-se, a título de argumentação, que no último trimestre do ano de 2013 o Governo do Estado de São Paulo assinou com convênio no valor de R$ 43.456.079,40 (quarenta e três milhões quatrocentos e cinquenta e seis mil setecenta e nove reais e quarenta centavos) para aquisição de caminhões coletores e compactadores de lixo, dentre outros, para 170 cidades, tendo um caminhão coletor e compactador de lixo que custava cerca de R$ 270

mil

sido

comprado

por

R$

194

mil.

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJT7T 2JHLC GCBYQ WJMXB

PROJUDI - Processo: 0005433-20.2016.8.16.0190 - Ref. mov. 41.1 - Assinado digitalmente por Fabiano Rodrigo de Souza:10635, 26/08/2016: CONCEDIDA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. Arq: Decisão


PROJUDI - Processo: 0005433-20.2016.8.16.0190 - Ref. mov. 41.1 - Assinado digitalmente por Fabiano Rodrigo de Souza:10635, 26/08/2016: CONCEDIDA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. Arq: Decisão

Ora causa estranheza que o valor de um ano e meio de contrato seja o valor utilizado para aquisição de equipamentos para atender 170 municípios do Estado de São Paulo, com equipamentos, é lógico que nessa comparação não está incluído as despesas com pessoal , manuteção de equipamentos e destinação do lixo, mas por exemplo daria em um ano de contrato para o município adquirir mais de 100 caminhões compactadores de lixo novos, ao preço de R$270.000,00 cada caminhão Uma das duas contas não bate: ou o Governo do Estado de São Paulo economizou – e muito para melhorar a gestão ambiental em 170 cidades; ou o Município de Maringá firmou um contrato exorbitantemente desproporcional. Parece-me, em sede de cognição sumária, que a segunda hipótese é mais plausível. Desde já deve ser destacado que o fato de o acordo do Estado de São Paulo ter sido celebrado em 2013 não tem o condão de refutar a desproporcionalidade do valor homologado na licitação n. 016/2016, já que em três anos a diferença da quantia contratada não seria tão gritante.

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJT7T 2JHLC GCBYQ WJMXB

270 mil sido comprado por R$ 194 mil. http://www.ambiente.sp.gov.br/2013/09/19/governo-de-sao-paulo-assina-convenio-com-170-prefeituras-para-melh

Ainda a título de exemplo, observa-se que em 16 de junho 2016 a Prefeitura de General Carneiro, no Estado do Paraná, realizou licitação para aquisição de um caminhão coletor compactador de lixo pelo valor de R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais), conforme notícia lançada no site http://geraldenoticias.com.br/prefeitura-de-general-carneiro-realiza-licitacao-para-compra-de-caminhao-compact , o que daria para aduiquir 117 caminhões novos durante apenas um ano de contrato É de fácil assertiva constatar que o valor mensal do contrato firmado entre os réus poderia ser convertido na compra cerca de nove caminhões coletores para a frota de Maringá. Em um trimestre o ente municipal poderia renovar totalmente seus caminhões coletores. Assim, prima facie, vislumbra-se , em princípio , há vício no processo licitatório com flagrantes indícios de superfaturamento na licitação, causa mais estranheza, ainda o fato da empresa atuar com apenas 15 caminhões e um total de apenas 60 funcionários, correspondente a quase 1/3 do total de servidores municípais que realizam a função, não havendo que se falar em aumento na qualidade e periodicidade na coleta do lixo, havendo indícios de extremada estimativa de gastos mensais pela contraprestação a ser realizada, sem que sequer esteja sendo feita a coleta seletiva do lixo e destinação ambiental adequada. A Lei n. 8.666/93, em seu art. 3º, prevê que a licitação se destina a garantir a seleção da proposta mais vantajosa para a administração. Pelo exame dos números acima lançados parece ser evidente que o art. 3° não foi observado, já que o valor mensal do contrato poderia ser revertido em maquinário e manutenção dos servidores públicos municipais especializados na coleta de lixo a um preço bem menor,conforme demonstrado na petição inicial e na denuncia feita. Além disso, como também já mencionado, vê-se que o número de caminhões e de coletores da empresa Constroeste é inferior aos números do Poder Público – o que evidência, liminarmente, a ausência de vantagem do contrato. Em situações como a posta em análise não há violação ao Princípio da Separação dos Poderes, já que a lei não subtrairá à apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça de lesão a direito (art. 5º, XXXV, CF). Não se pode falar, ainda, em invasão ao mérito do ato administrativo, já que cabe ao Judiciário examinar a proporcionalidade e a razoabilidade de tais atos. Comprovados estão, portanto, elementos que evidenciem a probabilidade do direito. A alegação do município de que levou em conta preços cotados em outros municípios, por si só, não tem o condão de afastar a aparente desproporcionalidade na contraprestação, já que não é possível


dimensionar quais foram as obrigações assumidas nos contratos noticiados, para chegar aos referidos valores, em especial, por ex: se haverá também coleta seletiva , forma de destinação ambiental final do lixo, etc. Assim havendo probabilidade de flagrante desequilibrio contratual, motivo suficiente para suspender os efeitos do contrato, para que não haja, em princípio, enriquecimento sem justa contraprestaçção, resta prejudicada, nesta fase, a análise dos demais teses de ilegalidades ocorridadas no processo licitatório, que deverão ser objeto de julgamento de mérito. De outra banda, entendo que também se encontra presente o perigo de dano e/ou o risco ao resultado útil do processo, uma vez que a manutenção do contrato acarretará enormes prejuízos ao erário, o que atinge toda a população maringaense. Deve ser pontuado, todavia, que a concessão do pedido antecipatório não acarretará lesão aos cidadãos, já que o Município de Maringá possui frota e servidores em número superior do que a ré Constroeste, e poderá regularmente efetuar a coleta de lixo. Argumenta-se, nessa seara, que antes de aberta a licitação guerreada, o serviço de coleta de lixo era realizado pela própria municipalidade, de modo que não haverá prejuízos para a população. Presentes, então, os requisitos do art. 300, do Código de Processo Civil, de modo que o deferimento do pedido se impõe. Ante o exposto, restando demonstrados os requisitos ensejadores para a concessão de tutela provisória de urgência em caráter incidental, DEFIRO o pleito do Ministério Público, pelos fundamentos acima apontados, para o fim de SUSPENDER TODOS OS EFEITOS DO CONTRATO FIRMADO ENTRE OS RÉUS RELATIVO À LICITAÇÃO – CONCORRÊNCIA n. 016/2016, bem como a execução dos serviços contratados e quaisquer pagamentos deles decorrentes, salvo os pagamentos de serviços já efetuados até a data da primeira intimação desta decisão por um dos réus. Intime-se o Município de Maringá e a empresa contratada, para que no prazo de 02 (dois) dias úteis cumpra integralmente a decisão, devendo, inclusive, retomar o Município a coleta dos resíduos sólidos. Para cada dia de atraso no cumprimento desse decisium fixo multa diária de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), sendo vedado novos pagamentos a empresa contratada, ainda que tenha descumprido esta decisão e não tenha interrompido a execução do serviço após a intimação desta decisão pelo primeiro réu que for intimado, nos moldes do art. 536, do Código de Processo Civil. No mais, determino a citação da parte ré para, querendo, oferecer contestação. Saliento que em razão de constar no polo passivo pessoa jurídica de Direito Público, que ordinariamente não realiza autocomposição, com fundamento no art. 334, § 4º, II do CPC/2015, deixo de designar audiência de conciliação. Apresentada a defesa, se na contestação houver alegação sobre ilegitimidade ou ausência de responsabilidade pelo prejuízo invocado (art. 338), bem como de qualquer das matérias enumeradas no art. 337 do CPC (art. 351, do CPC), intime-se a parte autora para, no prazo de 15 (quinze dias), proceder na forma do art. 338 do CPC/2015, ou para, no mesmo prazo, apresentar impugnação ou requerer a produção de provas (art. 351, do CPC/2015). CUMPRA-SE URGENTE ESTA DECISÃO . Ciência ao Ministério Público. Intimações e diligências necessárias.

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJT7T 2JHLC GCBYQ WJMXB

PROJUDI - Processo: 0005433-20.2016.8.16.0190 - Ref. mov. 41.1 - Assinado digitalmente por Fabiano Rodrigo de Souza:10635, 26/08/2016: CONCEDIDA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. Arq: Decisão


Maringá, 26 de agosto de 2016.

FABIANO RODRIGO DE SOUZA JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJT7T 2JHLC GCBYQ WJMXB

PROJUDI - Processo: 0005433-20.2016.8.16.0190 - Ref. mov. 41.1 - Assinado digitalmente por Fabiano Rodrigo de Souza:10635, 26/08/2016: CONCEDIDA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. Arq: Decisão


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