Sentença

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Maringá Foro Central

Vistos e examinados os autos de Processo Crime nº 2012.3907-6 (SNU 15903-86.2012.8.16.0017), em que são partes, como autor, o MINISTÉRIO PÚBLICO e, como réus VALTER VIANA, brasileiro, casado, funcionário público, nascido aos 08/02/1967, filho de João Viana e de Nair Rodrigues Viana, residente e domiciliado na Rua Pioneiro José Téo, nº 1124, Jardim Guaporé, nesta cidade e Comarca; MARIO JOSÉ ALEXANDRE, brasileiro, divorciado, funcionário público, nascido aos 20/11/1969, filho de Francisco Alexandre e de Dirce Poli Alexandre, residente e domiciliado na Rua Mussio Leão, nº 88, nesta cidade e Comarca de Maringá/Pr e APARECIDO SANTI, brasileiro, casado, vendedor, filho de Santo Santi e de Maria Biazotti Santi, residente e domiciliado na Rua Avenida Tiradentes, nº 254, nesta Cidade e Comarca.

I – RELATÓRIO O Ministério Público, no uso de suas atribuições legais, ofereceu denúncia em face dos acusados VALTER VIANA e MARIO JOSÉ ALEXANDRE, como incurso nas sanções do artigo 317, § 1º, combinado com o artigo 29, caput, ambos do Código Penal e do acusado APARECIDO SANTI, como incurso nas sanções do artigo 333, parágrafo único, do Código Penal. Arrolou 06 (seis) testemunhas. Pelo r. decisão de fl. 874, datada de 15/06/2012, foi recebida a denúncia em face do acusado Aparecido Santi. Na mesma ocasião, foi determinada a notificação dos acusados Valter Viana e Mario José Alexandre, para fins do disposto no artigo 514, do Código de Processo Penal. Os denunciados Valter Viana e Mario José Alexandre foram notificados em 06/07/2012, consoante certidão de fl. 904. Por sua vez, o denunciado Aparecido Santi foi citado em 02/07/2012, conforme certidão de fl. 906. A Defesa do acusado Aparecido Santi apresentou resposta à acusação às fls. 908/912, arrolando uma testemunha. As Defesas dos denunciados Mario José Alexandre e Valter Viana apresentaram resposta preliminar às fls. 924/941 e 942/964, respectivamente. Instado a se manifestar sobre o conteúdo das defesas dos réus, o Ministério Público, em parecer lançado às fls. 967/1003, pugnou pelo recebimento da denúncia em face dos acusados Valter Viana e Mario José Alexandre, bem como pelo prosseguimento do feito.

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A denúncia contra os acusados Valter Viana e Mario José Alexandre foi recebida em 17/10/2012 (fls. 1013/1014), sendo rejeitadas as preliminares ventiladas pelas Defesas dos réus. Seguindo o rito ordinário, os acusados Mario José Alexandre e Valter Viana foram citados em 05/11/2012, consoante certidão fl. 1023. O réu Valter Viana, por meio de Defensor constituído, apresentou resposta à acusação às fls. 1028/1030, arrolando as mesmas testemunhas arroladas na denúncia. Por sua vez, o denunciado Mario José Alexandre, igualmente por meio de Defensor, apresentou resposta à acusação às fls. 1034/1058, sem arrolar testemunhas. Novamente o Ministério Público se manifestou acerca dos argumentos expostos nas respostas à acusação dos réus, ocasião em que requereu o prosseguimento do feito (fls. 1077/1084). Por meio do despacho de fl. 1086, o Juiz Titular da 1ª Vara Criminal declarou-se suspeito para atuar no processo. Em decisão de fls. 1087/1088, frente e verso, datada de 08/03/2013, as preliminares aventadas pelas defesas foram afastadas, determinando-se o prosseguimento do feito. A legalidade da prova emprestada foi reconhecida pela decisão de fls. 1122/1123, havendo a designação de data para audiência de instrução e julgamento. Respeitados os princípios do contraditório e da ampla defesa, foram inquiridas 06 (seis) testemunhas arroladas pela acusação/Defesa (fls. 1141/1145 e 1187). Os acusados foram interrogados conforme fls. 1210/1212, tudo mediante mídia digital, acostada aos autos. Como diligências finais, as Defesas dos acusados pugnaram pela oitiva do dono do terreno, o que foi deferido pelo Juízo (fl. 1213). A testemunha foi ouvida conforme fl. 1226, igualmente mediante sistema audiovisual (mídia digital arquivada em Cartório). Em manifestação de fls. 1227/1257, o Ministério Público apresentou alegações finais, pugnando pela procedência da denúncia e a consequente condenação dos acusados Mario José Alexandre e Valter Viana, nas sanções do artigo 317, § 1º, combinado com o artigo 29, caput, do Código Penal, bem como a condenação do réu Aparecido Santi, nas sanções do artigo 333, parágrafo único, do Código Penal. A Defesa do acusado Aparecido Santi apresentou alegações finais às fls. 1263/1266, argumentando que não existem provas nos autos a comprovar a existência do crime narrado na denúncia, não havendo dolo por parte do réu, razão pela qual deve ser absolvido. Subsidiariamente, requereu a exclusão da causa de aumento de pena prevista no parágrafo único do artigo 333 do Código Penal, bem como que a pena seja fixada no mínimo legal. Já a Defesa do acusado Mario José Alexandre apresentou suas derradeiras alegações às fls. 1267/1297 e 1299/1329 (cópia), ponderando que a propriedade descrita na denúncia era particular, razão pela qual seria impossível preencher os requisitos do tipo penal definido no artigo 317, caput, do Código Penal. Assim, diante da fragilidade das provas produzidas nos autos, pleiteiou a absolvição do denunciado. 2 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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Por derradeiro, a Defesa do acusado Valter Viana apresentou alegações finais às fls. 1330/1347, alegando não haverem provas suficientes nos autos para sustentar um decreto condenatório, razão pela qual pede sua absolvição. Antecedentes criminais dos denunciados em anexo. É o relatório. Decido.

II - FUNDAMENTAÇÃO Havendo o processo transcorrido normalmente, inexistem nulidades ou irregularidades a serem sanadas, daí porque, havendo sido observado o devido processo legal em seu aspecto formal, passo desde logo à análise do mérito. Considerando que foram denunciados três réus, por diferentes crimes, por questões didáticas e para evitar a repetição desnecessária dos depoimentos, faço por bem primeiramente consignar o resumo da prova oral colhida em Juízo. Interrogado em Juízo, o acusado MÁRIO JOSÉ ALEXANDRE disse que a acusação não é verdadeira. Explicou que na época dos fatos exercia a função de Chefe de gabinete do Prefeito, cargo que ocupa até hoje. Esclareceu que, pelo fato de trabalhar no gabinete do Prefeito, várias pessoas procuravam-no para obter informações, dentre elas sobre o programa PRODEM. Argumentou que, com relação ao programa PRODEM, somente acompanhou sua formatação no ano de 2005, negando que tenha feito qualquer intermediação para que empresas conseguissem terrenos através desse programa, afirmando que encaminhava os pedidos à Secretaria de Indústria e Comércio, sendo que na época dos fatos o Secretário era o corréu Valter Viana. Disse que não conhece Osvaldo, não sabendo se essa pessoa intermediava negociações na Prefeitura. Confirmou que várias vezes foi procurado por Mario Moura, gerente da empresa GERMANYA. Detalhou que no local em que atualmente está localizada a rotatória do contorno norte, havia um terreno da Prefeitura, explicando que havia o projeto do contorno norte desde 1990, só que em razão da demora, no ano de 2006, o terreno foi cedido à empresa GERMANYA. Narrou que, com a reestruturação do projeto do contorno norte, a Prefeitura requereu esse terreno de volta, havendo assumido o compromisso de arrumar outro lugar adequado para a empresa, sendo o lugar que eles se encontram hoje. Falou que o local em que a empresa está instalada atualmente foi anteriormente vendido pelo Município a uma empresa, cujo nome não sabe, aludindo que poderia ser a empresa Arilu Alimentos, sabendo que o proprietário dessa empresa não cumpriu os requisitos exigidos pelo PRODEM – prazo, número de empregados –, razão pela qual foi feita a reversão do terreno pela Prefeitura, asseverando que o terreno foi tomado em razão do não cumprimento dos requisitos pela empresa Arilu Alimentos. Asseverou que a negociação da empresa GERMANYA com a Prefeitura foi feita por meio da Secretária de Indústria e Comércio, que possui pessoal especializado para analisar o contrato, sendo ainda necessário passar pela aprovação da Câmara de Vereadores. Falou que não se recorda de ter sido procurado por Mauro Menegon ou Magno dos Santos Rodrigues, afirmando que foi procurado por Devanir Almenara. Contou que foi procurado várias vezes por Devanir Almenara, pois ele queria um barracão da Prefeitura, desses em que funcionam microempresas, sendo que ele insistia em um barracão que estava vago. Afirmou que esses barracões são cedidos de forma temporária pela Prefeitura, contando que Devanir Almenara conseguiu instalar seu projeto em um desses barracões no ano de 2012. Revelou que conheceu 3 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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Aparecido Santi através de Mario Moura, da GERMANYA, afirmando que ele, Aparecido Santi, trabalha para Ingá Veículos, concessionária da Mercedes. Contou que Aparecido Santi ligou para o depoente, afirmando que teria sido indicado por Mario Moura, perguntando se havia algum modo de conseguir um terreno como a GERMANYA tinha conseguido. Afirmou que conversou algumas vezes com ele e o encaminhou à Secretaria de Indústria e Comércio, afirmando que não tinha conhecimento se a Prefeitura possuía algum terreno para eles. Disse que não houve qualquer reunião com Aparecido Santi e Valter Viana, afirmando que agendou uma reunião entre eles, da qual não participou. Alegou que tomou conhecimento do terreno particular depois da tratativa de Aparecido Santi com Valter Viana. Sobre a conversa gravada no dia 24/06/2010, disse que Aparecido Santi tinha interesse em um terreno particular, relatando que intermediou o negócio somente para o bem da cidade, relatando que, como não havia terreno pelo PRODEM, encaminhou Aparecido Santi para falar com o Secretário de Indústria e Comércio. Explicou que, anteriormente, o dono desse terreno – do terreno particular que fica ao lado da empresa GERMANYA – entrou em contato com a Prefeitura, com o fim de vendê-lo, porém a Prefeitura não tinha interesse na compra, sabendo dessa situação em razão de conversas com Valter Viana. Com relação à expressão “vamos ganhar alguma coisa aí”, disse que acredita que Aparecido Santi, por ser o responsável em encontrar um local para a instalação da empresa, tinha interesse em uma corretagem, acreditando que ele também queria prometer alguma vantagem para agilizar o negócio. Sobre o diálogo transcrito na denúncia à fl. 13, explicou que nunca pediu nada para ninguém, sendo que também tem conhecimento de que Valter Viana não pediu nada para ninguém, acreditando que Aparecido Santi estaria oferecendo alguma vantagem para agilizar a compra do terreno. Afirmou que não tinham condições de intermediar o negócio, pois o terreno era particular, razão pela qual encaminhou Aparecido para falar com o dono do terreno. Asseverou que em nenhum momento solicitou ou aceitou qualquer coisa, relatando que falou “é complicado falar essas coisas pelo telefone”, porque queria encerrar logo a conversa. Argumentou que sempre faz a ponte entre as pessoas e as diversas Secretarias. Explicou que a Prefeitura subsidia parte do metro quadrado do terreno, sendo que as porcentagens variam de acordo com o seguimento da empresa, explicando que essa conversa estaria relacionada ao quanto de subsídio que a Prefeitura daria à empresa. Sobre o diálogo de fl. 15, esclareceu que Mário estava preocupado que os donos da empresa em que trabalha teriam conhecimento de que ele, Mario, estava interferindo na empresa concorrente (Ingá Veículos). Declarou que, após encaminhar Aparecido Santi e o seu pessoal à Secretaria de Industria e Comércio, não teve mais contato com eles. Confirmou que atendeu Aparecido Santi normalmente, sendo que em nenhum momento objetivou ganhar qualquer vantagem. Disse que Valentin entrou na fila para obter algum benefício do PRODEM, mas ele não conseguiu, posto que não havia terreno para o seguimento dele. Afirmou que o terreno objeto do presente processo é particular, razão pela qual não tem poder de gerência sobre ele, alegando que foi ostensivamente desrespeitado no GAECO. Acredita que foi o primeiro a ser contatado por Aparecido Santi dentro da Prefeitura, sendo que nesse momento não tinham conhecimento desse terreno, ocasião em que encaminhou Aparecido Santi à Secretaria de Indústria e Comércio, sendo que lá foi constatado que havia um proprietário que estava disposto a vender um terreno, afirmando que não tomou conhecimento de quem era esse terceiro. Contou que não conheceu os diretores da empresa Ingá Veículos, asseverando que não sabia se Aparecido Santi seria remunerado se o negócio fosse feito, 4 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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desconhecendo também se o proprietário do terreno era amigo de Valer Viana. Afirmou que o terreno da empresa GERMANYA foi adquirido pelo PRODEM, sendo que o terreno do particular fica ao lado do local em que a empresa GERMANYA está instalada. Disse que Valter Viana não participou dos diálogos iniciais com Aparecido Santi, alegando que não participou da reunião com Valter Viana. Por fim, disse que não ofereceu qualquer vantagem para Valter Viana, bem como nunca recebeu qualquer pedido dele. O acusado APARECIDO SANTI, ouvido em Juízo, negou a acusação narrada na denúncia. Contou que na época dos fatos era gerente de vendas da empresa Ingá Veículos - revenda da Mercedes-Benz – sendo que também conhecia Mario Moura, funcionário da empresa GERMANYA – revenda da Volkswagen –, aludindo que eventualmente conversavam. Explicou que visitou o estande da empresa GERMANYA na Expoingá, quando comentou com Mario Moura que havia visto a placa onde a empresa iria se instalar e que a empresa em que trabalhava, Ingá Veículos, também queria comprar um terreno naquela região, momento em que Mario Moura passou o contato de Mario Alexandre. Disse que só contatou o acusado Mario Alexandre por telefone, quando falou da intenção da empresa em que trabalhava de adquirir um terreno nas mesmas condições da GERMANYA. Alegou que esperava receber alguma comissão se a empresa em que trabalhava comprasse um terreno indicado pelo depoente. Informou que Mário disse que a Prefeitura talvez não teria o terreno, mas que eles poderiam conversar com o Secretário de Indústria e Comércio, para ver se conseguiam algo, razão pela qual foram falar com Viana. Contou que marcaram a reunião na Prefeitura, sendo encaminhados por Mario Alexandre ao gabinete de Valter Viana, quando foi dito que a Prefeitura não tinha um terreno nas condições da empresa GERMANYA, mas que havia um terreno ao lado da referida empresa, de um particular que já teria oferecido o imóvel à Prefeitura. Detalhou que, nessa ocasião, o seu patrão manifestou interesse em comprar o terreno particular, ao passo que o acusado Valter Viana ficou de ver com o proprietário do imóvel se ele ainda estava interessado em vender. Descreveu que, no dia seguinte, o seu patrão e mais um dos sócios da empresa se dirigiram, por conta própria, ao imóvel mencionado, ocasião em que conversaram diretamente com o dono do terreno. Falou que o proprietário estava interessado em vender todo o imóvel, ao passo que seu patrão queria comprar somente a parte da rodovia. Disse que avisou Mário Alexandre que a empresa não mais estava interessada na aquisição do terreno. Relatou que não se recorda se antes da reunião já tinha a informação de que o imóvel localizado ao da GERMANYA era particular, acreditando que Mario Moura poderia ter mencionado esse fato quando da conversa inicial. Afirmou que o diálogo constante na denúncia (fl. 13) é referente ao terreno particular, sendo que intencionava, se tudo desse certo com a compra, ganhar uma comissão. Relatou que Mário Alexandre era a pessoa que fazia a ligação com Valter Viana. Contou que, por conta de Mário Alexandre e Valter terem a informação de quem era o proprietário do imóvel particular, julgou que a negociata estava nas mãos deles, pois os viu como intermediadores do negócio, acreditando que, por conta disso, aventou a necessidade de dar alguma coisa a eles. Disse que o contato com Mário Alexandre foi feito por telefone e que houve comentário sobre o valor que o proprietário estaria querendo receber pela venda do imóvel. Afirmou, mais uma vez, que esperava uma gratificação do patrão por conta da compra do terreno, pois ele havia pedido para que os funcionários procurassem um local para as novas instalações da empresa, relatando que esperava também uma gratificação do vendedor, mesmo 5 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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que não soubesse quem era o dono do imóvel. Descreveu que a empresa Ingá Veículos tinha intenção de sair do local em que estava instalada, pois o imóvel era antigo e pequeno. Confirmou que a empresa tinha intenção de adquirir um terreno na saída para Astorga, eis que o Grupo G10 estava instalado lá, não sabendo se a empresa GERMANYA tinha um terreno nessa região. Alegou que o Diretor da empresa em que trabalhava falou que o nome do proprietário do imóvel era Orlando. Explicou que falou para Mário Alexandre amarrar o negócio simplesmente porque queria ganhar uma remuneração com a compra do terreno pela empresa, asseverando que eram Mário Alexandre e Valter que tinham todas as informações sobre o terreno, bem como o contato com o proprietário. Alegou que foi demitido por conta da incompatibilidade com o outro gerente, bem como por incompatibilidade salarial. Negou que Mário Alexandre tenha participado da conversa com os diretores da empresa e Valter Viana, sendo que o teor da conversa foi o interesse da empresa em adquirir do Município um terreno nos moldes do imóvel da GERMANYA, quando ficaram sabendo que não havia, ocasião em que Valter Viana ficou de entrar em contato com o proprietário do terreno. Contou que Valter Viana disse que o proprietário já havia oferecido esse terreno para a Prefeitura, bem como que na reunião com os diretores Valter Viana não pediu qualquer vantagem, sendo que também não ofereceu qualquer vantagem aos corréus. Disse que Valter não participou das conversas que teve com Mario Alexandre. Por fim disse que Valter Viana nunca entrou em contato com o depoente depois da reunião. Já o acusado VALTER VIANA, em Juízo, disse que a acusação não é verdadeira. Explicou que o PRODEM é um programa de desenvolvimento econômico, em que a Prefeitura oferece condições para que o empresário instale sua empresa no município ou aumente a capacidade de produção da empresa já instalada. Asseverou que não há terrenos gratuitos, mas sim incentivos fiscais para aquisição de terrenos. Esclareceu que os empresários são atendidos pessoalmente pelo depoente ou por outros diretores, sendo comum as pessoas tirarem as dúvidas na Secretaria. Detalhou que, no período em que assumiu a Secretaria, o processo para instalação da empresa GERMANYA já estava em andamento, explicando que foi na sua gestão que a empresa GERMANYA conseguiu o imóvel que atualmente está instalada, sendo que as tratativas foram feitas com Mario Moura. Disse que não sabe o motivo pelo qual o município requereu esse imóvel do antigo proprietário, afirmando que, quando realizou o procedimento para a GERMANYA, o terreno era de propriedade da Prefeitura. Confirmou que conhece Magno dos Santos, explicando que ele procurou a Prefeitura para instalar uma empresa, mas não conseguiu, pois naquela época não havia disponibilidade de terrenos. Disse que Devanir Almenara queria um barracão, sendo que não atendeu à solicitação dele porque a documentação não atendia ao que a lei exigia. Alegou que não se recorda da reunião com Aparecido Santi, pois atende muita gente, contudo, não vê problema em ter atendido Aparecido. Afirmou que se recorda da existência de um terreno particular localizado ao lado da GERMANYA, sendo que não intermediou qualquer negociação desse imóvel. Lembra que o proprietário desse imóvel procurou a Prefeitura para vendê-lo, mas a compra não foi viabilizada. Asseverou que não houve qualquer oferecimento ou requerimento de benefício. Quanto ao diálogo que teve com Mário Alexandre, enquanto estava em Curitiba, explicou que não se recorda de haverem abordado a questão de valores, aventando a possibilidade de que isso pode ter acontecido. Por fim, disse

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que conhece Orlando e um dos herdeiros do terreno particular, asseverando que não procurou o dono do imóvel. A testemunha DEVANIR ALMENARA, inquirida em juízo, disse que tinha uma empresa de brindes e que, em 2005, protocolou junto à Prefeitura um pedido de ampliação do negócio, pedido esse que ficou paralisado. Contou que, em conversa com uma pessoa em Curitiba, foi informado de que o seu procedimento só andaria se “corresse dinheiro”, razão pela qual decidiu investigar por conta o assunto. Revelou que gravou conversas com o empresário Margo, sendo que ele também era um dos requerentes do programa PRODEM. Disse que não sabe se Valter Viana recebeu ou pediu propina. Informou que ficou sabendo dos fatos da denúncia por blogs na internet. Alegou que não tem conhecimento sobre o envolvimento de Mario Alexandre nos fatos narrados na denúncia. Por sua vez, a testemunha MAGNO DOS SANTOS RODRIGUES nada soube relatar sobre os fatos narrados na denúncia. Afirmou que não conhece o acusado Aparecido Santi, sendo que também não conhece Mário José Alexandre. Disse, ainda, que conhece o acusado Valter Viana em razão do pedido que realizou na prefeitura para aquisição de um terreno, explicando que passou toda a documentação ao Secretário, sendo que até o momento está aguardando. Por fim, declarou não pagou e não foi solicitado qualquer valor extraoficialmente. A testemunha ARIOVALDO COSTA PAULO, em Juízo, disse que protocolou o requerimento de um imóvel pelo programa PRODEM, sendo que a compra foi concretizada com o subsídio do referido programa. Alegou que o projeto de sua empresa foi barrado na Prefeitura em razão da proximidade com o aeroporto, ficando parado por mais de 08 (oito) anos. Explicou que foram feitas exigências absurdas, tais como a necessidade de vidros duplos e isolamento acústico (“obra faraônica”). Contou que no final da segunda gestão do Prefeito Silvio Barros, recebeu uma proposta da Prefeitura, para entregar o terreno em troca do valor que havia pago pelo imóvel. Disse que devolveu o imóvel e recebeu o valor da Prefeitura. Pontuou que, depois de um ano, a empresa GERMANYA logo construiu no lugar, não sabendo como, desconhecendo as qualidades da construção. Por fim, relatou que não tratou com o acusado Mario Alexandre quando da devolução do terreno, sendo que nessa época o Secretário da Secretaria de Indústria e Comércio era Shinji Gohara. A testemunha MARIO DE MOURA JUNIOR, inquirido em Juízo, disse que é funcionário da empresa GERMANYA, concorrente da empresa Ingá Veículos. Contou que a GERMANYA conseguiu o terreno pelo programa PRODEM, sabendo que a empresa Ingá Veículos estava comprando terrenos na época. Explicou que o acusado Aparecido Santi, em determinada ocasião, perguntou ao depoente se sabia de algum lote nas imediações da GERMANYA. Disse que sabia que o terreno do lado da GERMANYA estava à venda, pois havia uma placa de “vende-se” no local. Disse que indicou o acusado Mario Alexandre ao acusado Aparecido Santi, simplesmente porque foi por ele que a empresa em que trabalha conseguiu o encaminhamento do projeto. Negou que tenha indicado o acusado Mario Alexandre com o intuito de que ele poderia facilitar as coisas. Por fim, disse que não houve indicação de qualquer tipo de vantagem ou qualquer insinuação de que alguém precisaria de uma vantagem para o programa “andar”.

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A testemunha SHINJI GOHARA, inquirida em Juízo, disse que foi Secretário da Secretaria de Indústria e Comércio entre março de 1998 e dezembro de 2008. Falou que a pasta foi ocupada depois de sua saída pelo atual Secretário Valter Viana. Confirmou que foi procurado por Devanir Almenara, quando este lhe fez algumas perguntas e disse que estava havendo pagamento de suborno na Prefeitura, quando afirmou que levasse as denúncias ao Prefeito. Falou que não tomou conhecimento de fraudes envolvendo terrenos na cidade, esclarecendo que conhece o empresário que era proprietário do terreno onde atualmente está instalada a empresa GERMANYA, explicando que realizou a retomada do imóvel em razão do empresário não cumprir com o contrato, pois não preencheu os requisitos para construção. Sabe que o terreno foi posteriormente cedido para a empresa GERMANYA. Disse que nunca foi procurado pela empresa Ingá Veículos ou o pelo réu Aparecido Santi para tratar da aquisição de terrenos, bem como não foi mencionado por Devanir Almenara o nome do acusado Mario José Alexandre. Informou que era comum que os empresários procurassem a Secretaria para saber de informação acerca dos procedimentos protocolados, explicando que havia uma comissão nomeada pelo Prefeito para analisar esses procedimentos. Afirmou que não atendia empresários interessados em terrenos particulares, pois não havia como interferir na negociação. Revelou que as conversas formais ficavam registrada em documentos, pois estes empresários tinham o protocolo do pedido, sendo que as conversas informais eram para pedir informações, quando não havia ainda um requerimento protocolado. A testemunha ORLANDO DOS SANTOS, indagada em Juízo, disse que é o proprietário do terreno que fica ao lado da empresa GERMANYA. Explicou que, em determinada época, a Prefeitura estava atrás de alguns terrenos para construção de um parque industrial, sendo que foi à Prefeitura para oferecer o terreno, mas a negociação não foi aprovada. Corrigiu que, naquela época, foi o Advogado contratado que procurou a Prefeitura para oferecer o terreno. Disse que não foi procurado pela empresa Ingá Veículos para vender o terreno. Afirmou que os acusados não pediram qualquer valor para negociarem o terreno, bem com que não recebeu ligações de Mário José Alexandre, não sabendo quem é tal pessoa. Esclareceu que é o proprietário do terreno com mais nove irmãos, sendo que toma a maioria das decisões para tratar da venda do imóvel. Disse que conhece o acusado Valter Viana desde quando ele era vereador. Falou que não sabe informar se o seu irmão Osvaldo foi procurado por outras pessoas para tratar da venda do terreno. Negou que tenha sido procurado pelos acusados para vender o terreno. Asseverou que não foi procurado pela empresa Ingá Veículos, não sabendo se seu irmão Osvaldo atendeu algum representante dessa empresa. A testemunha ALBERTO JOSÉ GIARETTA, inquirida em Juízo, disse é o proprietário da empresa Ingá Veículos, sendo que em determinada ocasião se dirigiu à Prefeitura de Maringá/PR, acompanhado do acusado Aparecido Santi. Disse que sua empresa ficava na Avenida Colombo, em Maringá, quando foi noticiado que não passaria mais caminhão naquele local. Esclareceu que conversou com o Secretário da Indústria e Comércio, pois o acusado Santi o conhecia. Pontuou que, nessa ocasião, foi verificar com o Secretário a possibilidade de aquisição de uma área como aquela que a GERMANYA havia conseguido. Contou que o Secretário disse que não havia terreno, bem como que ele, o Secretário, indicou um proprietário que estava vendendo uma área próxima ao local em que GERMANYA estava instalada. Afirmou que, depois disso, conheceu o proprietário do terreno particular, mas não 8 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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saiu negócio, pois ele queria vender a área toda. Revelou que, depois disso, recebeu uma ligação de um Promotor de Justiça de Maringá, que alegava que o funcionário da empresa (Aparecido Santi), havia tentado ganhar dinheiro em cima da eventual compra da área, juntamente com mais alguém. Por fim, disse que demitiu o funcionário por este e por outros motivos. II. 1 – Do crime de corrupção passiva imputado aos denunciados Valer Viana e Mario José Alexandre. A denúncia imputa aos acusados Valter Viana e Mario Alexandre a prática do crime tipificado no artigo 317, § 1º, combinado com o artigo 29, caput, ambos do Código Penal. O crime é assim descrito no Código Penal: Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. § 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.

Consoante doutrina de GUILHERME DE SOUZA NUCCI1, “solicitar significa pedir ou requerer; receber quer dizer aceitar em pagamento ou simplesmente aceitar algo. A segunda parte do tipo penal prevê a conduta de aceitar promessa, isto é, em consentir em receber dádiva futura”. O objeto da tutela jurídica é o funcionamento normal da Administração Pública, no que diz respeito à preservação dos princípios de probidade e moralidade no exercício da função. Segundo doutrina e jurisprudência majoritária, o crime de corrupção passiva é formal, ou seja, a consumação ocorre no momento em que o funcionário público solicita, recebe ou aceita receber promessa de vantagem indevida, sendo desnecessário para o fim de consumação que o agente obtenha, de fato, a vantagem almejada. Analisando detidamente os autos, verifico que denúncia deve ser julgada parcialmente procedente neste ponto. O cerne da denúncia reside no fato de saber se os acusados aceitaram receber futura vantagem indevida em razão da negociação de um terreno particular pela empresa Ingá Veículos, vantagem essa proposta pelo corréu Aparecido Santi que, na qualidade de gerente da referida empresa, estava procurando um novo local para instalação do empreendimento. Com efeito, do conjunto probatório dos autos é possível concluir, com a segurança necessária, que somente o acusado Mario José Alexandre incidiu na conduta típica do artigo 317, caput, do Código Penal, eis que aceitou receber futura vantagem indevida 1

NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado, 13ª edição, rev., atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 1182. 9 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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proposta pelo corréu Aparecido Santi, consistente em receber uma comissão em dinheiro, oriunda da possível compra/venda de um terreno particular. Extrai-se da prova oral colhida em Juízo que, inicialmente, a empresa Ingá Veículos pretendia adquirir um terreno nas mesmas condições da empresa Germanya, ou seja, pelo programa PRODEM, fato esse comprovado pela testemunha Alberto José Giaretta (dono da empresa Ingá Veículos). Por conta disso, segundo restou esclarecido nos autos, por indicação de Mario Moura (da Germanya), o corréu Aparecido Santi entrou em contato com o corréu Mario Alexandre, ocasião em que marcaram uma reunião com o Secretário Valter Viana, igualmente corréu. Nessa ocasião, restou esclarecido que não havia terreno disponível para o segmento da empresa Ingá Veículos, ou seja, a empresa devia procurar um terreno particular para comprar. Consigne-se que a conduta inicial do acusado Mario José Alexandre, de encaminhar o corréu Aparecido Santi e o proprietário da empresa Ingá Veículos à Secretaria de Indústria e Comércio, não constitui ilícito, mas simples obrigação/dever funcional. Porém, naquela mesma reunião, foi confirmado que o imóvel que fica ao lado da empresa Germanya era particular, bem como que Valter Viana passaria o contato do proprietário. Foi deste ponto em diante que a conduta do acusado Mário José Alexandre rumou para a consumação do ilícito descrito na denúncia. Veja-se que o acusado Aparecido Santi, motivado pela probabilidade de obter uma comissão oriunda da compra do imóvel particular por seu empregador (Empresa Ingá Veículos), ofereceu ao acusado Mario José Alexandre, que detinha informações sobre o nome do proprietário do terreno, alguma vantagem caso a compra fosse realizada. É o que se depreende do diálogo transcrito à fl. 13, da denúncia: Índice nº. 34106357 (alvo: 44-9102-0266 – dia 25/06/2010): [...] Santi: (...) eu preciso conversar com você o seguinte, os homens ai tem dinheiro, precisamos ganhar dinheiro, vamos dizer assim, porque não vai ficar assim... o que que tem que fazer? Qual que vai ser o esquema? Que que tem que... sempre tem negócio político né! Vai ter patrocínio, já falei assim pra ele. Outra coisa, se precisa me falar mais ou menos o que que... todo mundo tem que ganhar alguma coisa aí né. Não sei qual é a jogada aí. Eu queria preparar você o seguinte...de repente você quer alguma coisa, o secretário quer alguma coisa né. Eu não sei como que funciona a coisa, queria conversar com você. Mario: vamos fazer o seguinte, por telefone é complicado falar essas coisas. Vamos conversar pessoalmente. Eu ligo para você a tarde, e ele gostou lá ou não? Santi: não, ele gostou, achou bom o terreno e hoje vem o resto da diretoria aqui. Aquele senhor que foi comigo ontem (24/06/2010), o senhor Alberto, ele é o dono do grupo. Parece não ser forte, mas o cara é muito forte. Então vamos conversar. Precisamos ganhar alguma coisa. Mario: então tá bom, vamos conversar. Santi: vamos ganhar o jogo.

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Foi exatamente neste momento que o crime se consumou, pois o acusado Aparecido Santi, de forma livre e consciente, sabendo do cargo que o acusado Mario José Alexandre ocupava dentro da Prefeitura, ofereceu vantagem indevida, com o fim de agilizar as negociações do terreno particular. Por outro lado, o acusado Mário José Alexandre, ciente do oferecimento da vantagem, aceitou levar a conversa adiante, demonstrando inequívoca concordância no recebimento da benesse proposta por Aparecido Santi. Ora, como não configurar sua inequívoca concordância, ao dizer “então tá bom, vamos conversar”, bem como ao alegar que esse tipo de conversa não deveria ocorrer por telefone? Saliente-se que em relação ao tipo penal descrito no caput do artigo 317, do Código Penal, delito de natureza formal, a sua consumação se dá com a mera solicitação, expressa ou velada, de benesse indevida, ou mesmo na aceitação de tal promessa. Nesse sentido: PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ART. 317, DO CÓDIGO PENAL. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. INÉPCIA. DENÚNCIA QUE OBEDECE O DISPOSTO NO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DECISÃO REFORMADA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO PROVIDO. 1. Para a configuração do delito tipificado no artigo 317, do Código Penal, não se apresenta como imprescindível a indicação do que consistiu a vantagem indevida solicitada, mas sim a solicitação, ou, se for o caso, o eventual recebimento ou a aceitação da promessa de vantagem indevida, em face do que, para a consumação do referido delito, pouco importa que o ato seja efetivamente realizado. 2. Importa ressaltar, ainda, que para a realização do art. 317, do Código Penal, que a prática do ato tenha relação com a função do sujeito ativo, o que restou demonstrado de maneira satisfatória na denúncia de fls. 02-A/02-G. 3. Assim, verifica-se, na hipótese dos autos, que a denúncia de fls. 02-A/02-G preenche os requisitos do art. 41, do Código de Processo Penal, não se vislumbrando, ainda, na espécie, a presença de qualquer dos requisitos enumerados no art. 395, do Código de Processo Penal, que estariam a autorizar a sua rejeição. 4. Decisão reformada. 5. Recurso em sentido estrito provido. (TRF-1 - RSE: 14653 DF 0014653-12.2009.4.01.3400, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL I'TALO FIORAVANTI SABO MENDES, Data de Julgamento: 02/10/2012, QUARTA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.181 de 23/10/2012). Sem grifo no original

Com efeito, o conjunto probatório dos autos demonstra que o acusado Mario José Alexandre, utilizando-se do poder de coação que a função pública exercida lhe conferia, pretendia, com a intermediação de negócio particular, obter de algum modo a venda do imóvel e auferir a vantagem indevida prometida por Aparecido Santi. Note-se que o crime de corrupção passiva caracteriza-se com a utilização do cargo público a fim de obter vantagem indevida. No caso dos autos, o acusado Mario José Alexandre estava intermediando a compra de imóvel particular, notadamente motivado pela promessa da vantagem oferecida por Aparecido Santi, e assim o fez aproveitando-se da função que exercia e dos contatos que possuía por ocupar posição pública. O elemento anímico resta configurado pela atuação deliberada do acusado Mário José Alexandre em continuar as tratativas com o acusado Aparecido Santi, fazendo-se de intermediário na negociação de um terreno particular, conduta essa estranha ao 11 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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cargo público que exercia, porém, praticada em razão da função que ele exercia na Prefeitura Municipal de Maringá (Chefe de Gabinete), utilizando-se, assim, da qualidade de Chefe de Gabinete, com contato inclusive com o corréu Valter Viana, a fim de obter os dados do proprietário do referido imóvel. Além do mais, não obstante o objeto da negociação tenha sido um terreno particular, tal circunstância, por si só, não afasta a possibilidade da prática do ilícito penal pelo acusado Mário José Alexandre. O crime de corrupção passiva caracteriza-se com a utilização de cargo público a fim de obter vantagem indevida, bastando que esta obtenção seja possível ao funcionário em troca de uma conduta que esteja incluída nos poderes que seu cargo lhe confere. Ora, o cargo exercido por Mario Alexandre não lhe conferia poder para negociar terreno particular, porém a conduta por ele praticada assim o foi em razão da função por ele exercida dentro da Prefeitura. Afinal, Aparecido Santi só chegou até Mario Alexandre em razão de prévio contato com Mario Moura, da Germanya. Neste contato, Santi questionou Mario Moura acerca de como teriam conseguido um terreno daqueles com a Prefeitura, pois estavam interessados em algo do mesmo gênero, quando então Mário Moura lhe deu o contato de Mario Alexandre, Chefe de Gabinete, ocasião em que as tratativas se iniciaram. Assim, resta claro que Mario Alexandre aceitou promessa de vantagem indevida e futura, proveniente do corréu Aparecido Santi e, para tanto, em razão da função exercida dentro da Prefeitura Municipal de Maringá, tentou intermediar negociação de terreno privado, entre particulares, ato este, conforme já salientado, estranho à sua função, porém exercido em razão dela, o que configura o crime descrito no caput do artigo 317, do Código Penal. Entretanto, o Ministério Público, tanto na denúncia quanto nas alegações finais, pugna pela condenação do acusado Mario Alexandre nas sanções do mencionado dispositivo legal, porém com o aumento de pena previsto no §1º do mesmo artigo. Porém, em momento algum o Ministério Público logrou mencionar e, muito menos, comprovar, qual seria o ato de ofício que o servidor Mario Alexandre teria retardado ou deixado de praticar. Neste ponto, veja-se que a denúncia é genérica, apenas mencionando: “(...) 9. Por conseguinte (...), vislumbra-se claramente que o denunciado APARECIDO SANTI, com vontade livre e consciente, ofereceu e prometeu vantagem indevida, apesar de incerta e futura, aos funcionários públicos denunciados MÁRIO JOSÉ ALEXANDRE e VALTER VIANA para determiná-los a praticarem atos de ofício, no exercício de suas funções públicas e em razão dessas respectivas funções ou cargos, violando dever funcional e agindo em desacordo com as prescrições legais, em detrimento da moralidade para com a Administração Pública municipal, ao passo que os referidos servidores públicos municipais, conscientes da reprovação e ilicitude de suas condutas, mediante esforços conjugados e em comunhão de desígnios, em razão de suas funções e no exercício das respectivas funções ou cargos públicos, aceitaram malsinada oferta incerta e futura, pertinente a uma ilícita promessa de vantagem indevida para praticarem atos de ofício infringindo seus deveres funcionais, em detrimento da honorabilidade da Administração Pública, porque oficialmente não é desse modo que deveriam atuar” (páginas 24/25, sem grifo no original).

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Ora, a intermediação de compra e venda de terreno particular, efetiva e logicamente, não se encontra dentro das atribuições do cargo exercido pelo acusado Mario Alexandre, não se podendo dizer que, com isso, ele retardou ou deixou de praticar ato de ofício, razão pela qual deve ser condenado pela prática da conduta tipificada no caput, do artigo 317, do Código Penal. Não obstante a responsabilidade penal do acusado Mario José Alexandre pela prática do crime de corrupção passiva, entendo desnecessária a aplicação do disposto no artigo 92, inciso I, alínea “a”, do Código Penal – perda de cargo, função pública ou mandado eletivo – uma vez que não houve prejuízo ao erário, bem como não houve o pagamento da vantagem indevida oferecida pelo acusado Aparecido Santi. Ademais, trata-se de conduta reprovável, mas não a tal grau, a ponto de justificar a perda do cargo público, no entendimento deste Juízo. Quanto ao acusado Valter Viana, por sua vez, embora seu nome tenha sido mencionado na denúncia e nos diálogos interceptados por diversas oportunidades, inexiste qualquer elemento de prova nos autos que possa caracterizar a prática do crime de corrupção passiva. Veja-se que realmente o nome do acusado Valter Viana é citado nas conversas telefônicas interceptadas. Contudo, embora o acusado Mário José Alexandre tenha mencionado nos diálogos que conversaria com Valter Viana, dando a entender que precisaria da anuência dele, fato é que não consta dos autos a prova de que o acusado Valter Viana tenha solicitado, recebido ou aceitado receber a vantagem indevida proposta por Aparecido Santi. Note-se que os autos carecem de provas concretas no sentido de indicar que o acusado Valter Viana efetivamente teria integrado o “esquema” de intermediação de compra e venda do terreno particular. Em suas derradeiras alegações, o Ministério Público menciona que o acusado Valter Viana teria negado a participação na reunião com Aparecido Santi e Alberto José Giaretta – dono da empresa Ingá Veículos –, afirmando esse encontro foi realizado a portas fechadas, com o objetivo de angariar alguma vantagem indevida. Porém, analisando os autos, sobretudo as provas produzidas em Juízo, constata-se que o acusado Valter Viana alegou não se recordar dessa reunião, afirmando, logo em seguida, que não haveria problema se ela tivesse ocorrido. Ademais, ainda que nessa reunião o acusado Valter Viana tivesse indicado o dono do terreno particular ao proprietário da empresa Ingá Veículos (Alberto Jose Giaretta), tal circunstância, por si só, não configura a prática do crime tipificado no artigo 317, caput, do Código Penal. O crime de corrupção passiva consiste na conduta do funcionário público em solicitar, receber ou aceitar receber vantagem indevida. Ao contrário do que restou demonstrado no tocante à conduta do acusado Mario José Alexandre, não há provas nos autos de que o acusado Valter Viana tenha, de fato, aceitado receber a vantagem proposta por Aparecido Santi. Veja-se que não há qualquer prova de que nessa reunião o acusado Valter Viana tenha solicitado, recebido ou aceitado receber qualquer espécie de vantagem. 13 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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Trata-se de presunção do Ministério Público que não encontra respaldo no conjunto probatório dos autos. Caso isso tenha ocorrido, não restou demonstrado, o que já é suficiente para suscitar a dúvida e afastar condenação do acusado por falta de provas. Para que haja a condenação criminal, necessária se faz a existência de provas certas e inequívocas que confirmem a materialidade e a autoria delitivas, sendo impossível condenar alguém com base em meros indícios e suposições. Nesse viés, o Ministério Público deixou de comprovar a conduta do acusado Valter Viana, pois não há comprovação de que ele tenha recebido, solicitado ou aceitado receber futura vantagem indevida em razão da negociação do terreno particular. Assim, a responsabilidade penal do acusado se mostra duvidosa, o que recomenda a aplicação do princípio do “in dubio pro reo”. Deste modo, quanto ao denunciado Valter Viana, encerrada a instrução criminal, a prova coligida não se mostra suficiente para sua condenação, pois, persistindo a dúvida sobre a autoria tem lugar a aplicação do princípio “in dubio pro reo”, assim consagrado na lição do mestre Malatesta: “O direito da sociedade só se afirma racionalmente como direito de punir o verdadeiro réu; e para o espírito humano só é verdadeiro o que é certo; por isso, absolvendo em caso de dúvida razoável, presta-se homenagem ao direito do acusado e não se oprime o da sociedade. A pena que atingisse um inocente perturbaria a tranquilidade social, mais do que teria abalado o crime particular que se pretendesse punir; porquanto todos se sentiriam na possibilidade de serem, por sua vez, vítimas de erro judiciário. Lançai na consciência social a dúvida, por pequena que seja, da aberração da pena, e esta não será mais a segurança dos honestos, mas a grande perturbadora daquela mesma tranquilidade; não será mais a defensora do direito, e sim a força imane que pode, por sua vez esmagar o direito indébil.” (A Lógica das Provas em Matéria Criminal, Saraiva, p. 14/15). II. 2 – Do crime de corrupção ativa imputado ao denunciado Aparecido Santi A denúncia imputa ao acusado Aparecido Santi a prática do crime tipificado no artigo 333, parágrafo único, do Código Penal. O crime é assim descrito: Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.

Consoante doutrina de GUILHERME DE SOUZA NUCCI2, “oferecer (propor ou apresentar para que seja aceito) ou prometer (obrigar-se a dar algo a alguém) cujo objeto é a vantagem, conjuga-se com determinar (prescrever ou estabelecer) a praticar (executar ou levar a efeito), omitir (não fazer) ou retardar (atrasar), cujo objeto é ato

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NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado, 13ª edição, rev., atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 1221. 14 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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de ofício (...). A consumação se dá por ocasião do oferecimento ou da promessa, independendo da efetiva entrega”. Igualmente, segundo doutrina e jurisprudência majoritárias, o crime de corrupção ativa é formal, ou seja, não exige resultado naturalístico, consistente no efetivo recebimento da vantagem. Desta forma, o recebimento da vantagem indevida pelo funcionário público pode até existir, mas se afigura desnecessário para fins de consumação do delito. Analisando detidamente os autos, verifico que não existem provas suficientes para sustentar uma condenação penal em face do acusado. O acusado Aparecido Santi, em seu interrogatório judicial, afirmou que o negócio da compra do terreno particular por seu empregador – Ingá Veículos – estava nas mãos dos corréus Mario José Alexandre e Valter Viana, que detinham as informações sobre o vendedor do terreno, afirmando que, por conta disso, todos deveriam receber alguma vantagem. Foi nessas condições que o acusado Aparecido Santi ofereceu a vantagem ao corréu Mario José Alexandre, conforme diálogo entabulado entre eles no dia 25/06/2010) e, diante da aceitação do acusado Mário, conforme fundamentação supra, ocorreu a consumação do crime tipificado no artigo 317, caput, do Código Penal, em relação ao funcionário público (Mario Alexandre). Confira-se: Índice nº. 34106357 (alvo: 44-9102-0266 – dia 25/06/2010): [...] Santi: (...) eu preciso conversar com você o seguinte, os homens ai tem dinheiro, precisamos ganhar dinheiro, vamos dizer assim, porque não vai ficar assim...o que que tem que fazer? Qual que vai ser o esquema? Que que tem que... sempre tem negócio político né! Vai ter patrocínio, já falei assim pra ele. Outra coisa, se precisa me falar mais ou menos o que que... todo mundo tem que ganhar alguma coisa aí né. Não sei qual é a jogada aí. Eu queria preparar você o seguinte...de repente você quer alguma coisa, o secretário quer alguma coisa né. Eu não sei como que funciona a coisa, queria conversar com você. Mario: vamos fazer o seguinte, por telefone é complicado falar essas coisas. Vamos conversar pessoalmente. Eu ligo para você a tarde, e ele gostou lá ou não? Santi: não, ele gostou, achou bom o terreno e hoje vem o resto da diretoria aqui. Aquele senhor que foi comigo ontem (24/06/2010), o senhor Alberto, ele é o dono do grupo. Parece não ser forte, mas o cara é muito forte. Então vamos conversar. Precisamos ganhar alguma coisa. Mario: então tá bom, vamos conversar. Santi: vamos ganhar o jogo.

Veja-se claramente que o acusado Aparecido Santi, motivado pela obtenção de uma comissão/corretagem oriunda de uma eventual compra do terreno particular por seu empregador – Ingá Veículos –, prometeu ao corréu Mario José Alexandre alguma vantagem. Embora tal conduta possa ter sido suficiente para consumar o crime de corrupção passiva, no qual incorreu o acusado Mário José Alexandre, não se presta para configurar o crime previsto no artigo 333, caput, do Código Penal, em relação ao acusado Aparecido Santi. 15 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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É de se ver que “o delito de corrupção ativa caracteriza-se com o oferecimento ou promessa de vantagem a funcionário público, cujo dolo consiste na intenção de realizar alguma dessas condutas, com o fim específico de o funcionário praticar, omitir-se ou retardar ato de ofício, sendo esse o elemento subjetivo do tipo” (TRF-4 - ENUL: 63282720064047003 PR 0006328-27.2006.404.7003, Relator: ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Data de Julgamento: 17/02/2011, QUARTA SEÇÃO, Data de Publicação: D.E. 11/03/2011) A acusação relativa ao crime de corrupção ativa deve, para atender às exigências dos princípios do direito penal - contraditório e ampla defesa – descrever, concretamente, a conduta imputada ao agente na primeira parte do dispositivo incriminador ("oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público") e a finalidade vinculada a esta conduta prevista na segunda parte dele ("para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício"). Segundo se verifica da inicial acusatória, o acusado Aparecido Santi realmente ofereceu a vantagem indevida ao funcionário público Mário José Alexandre, preenchendo, com isso, a primeira parte do tipo penal. Contudo, conforme se depreende da inicial acusatória, no trecho em que descreve a conduta imputada ao acusado Aparecido Santi (fl. 24), nenhuma delas permite a efetiva delimitação de conduta exigida pelo acusado ao funcionário público Mario Alexandre. Note-se que não há qualquer indicação de que o acusado Aparecido Santi, naquela oportunidade em que prometeu a vantagem indevida ao acusado Mário José Alexandre, tenha determinado que o funcionário praticasse, omitisse ou retardasse ato de ofício. Saliente-se que, embora a corrupção ativa – assim como a corrupção passiva – possa se consumar com o simples oferecimento ou promessa de vantagem indevida ao funcionário público, sendo irrelevante que o ato funcional venha a ser praticado ou não em decorrência da propina, o fato é que, para a corrupção ativa, deve haver um ato de ofício a ser praticado pelo funcionário, sem o qual não há crime. Não é possível extrair do conjunto probatório aportado ao feito a indicação do ato de ofício que seria praticado, omitido ou retardado pelos funcionários Mário José Alexandre e Valter Viana, de modo que não há provas suficientes nos autos a indicar a efetiva prática do delito tipificado no artigo 333, caput, do Código Penal, pelo denunciado Aparecido Santi. Desta feita, quanto ao denunciado Aparecido Santi, encerrada a instrução criminal, a prova coligida não se mostra suficiente para a condenação do acusado, pois, persistindo a dúvida sobre a autoria tem lugar a aplicação do princípio “in dubio pro reo”. Por fim, consigne-se que o crime de corrupção ativa é autônomo ao crime de corrupção passiva, de modo que um pode coexistir sem o outro. Esse é o entendimento sedimentado no Superior Tribunal de Justiça: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. QUADRILHA, CORRUPÇÃO PASSIVA, ADVOCACIA ADMINISTRATIVA E LAVAGEM DE DINHEIRO. EXCLUSÃO DOS ACUSADOS DE CORRUPÇÃO ATIVA DO PÓLO PASSIVO DA AÇÃO PENAL. FATO INSUFICIENTE PARA QUE O PROCESSO SEJA TRANCADO COM 16 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Maringá Foro Central RELAÇÃO AO RECORRENTE. UNILATERALIDADE DOS ILÍCITOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 317 E 333 DO CÓDIGO PENAL. RECONHECIMENTO DA INÉPCIA DA INICIAL QUANTO A ALGUNS DOS DENUNCIADOS POR CORRUPÇÃO ATIVA. DECISÃO QUE NÃO FAZ COISA JULGADA MATERIAL. POSSIBILIDADE DE OFERECIMENTO DE NOVA PEÇA VESTIBULAR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CARACTERIZADO. 1. Conquanto exista divergência doutrinária acerca do assunto, prevalece o entendimento de que, via de regra, os crimes de corrupção passiva e ativa, por estarem previstos em tipos penais distintos e autônomos, são independentes, de modo que a comprovação de um deles não pressupõe a do outro. Doutrina. Jurisprudência do STJ e do STF. 2. [...]. (STJ - RHC: 48238 PE 2014/0125580-2, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 20/11/2014, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/11/2014) – sem grifo no original

Assim, a absolvição do acusado Aparecido Santi não influencia na condenação do acusado Mário José Alexandre, uma vez que os delitos são autônomos e independentes entre si.

III – DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido deduzido na inicial acusatória para o fim de: A) CONDENAR o réu MARIO JOSÉ ALEXANDRE, qualificado no preâmbulo, como incurso nas sanções do artigo 317, caput, do Código Penal; B) ABSOLVER o réu VALTER VIANA, qualificado no preâmbulo, das imputações a ele feita na denúncia, referente ao crime tipificado no artigo 317, § 1º, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal; C) ABSOLVER o réu APARECIDO SANTI, qualificado no preâmbulo, das imputações a ele feita na denúncia, referente ao crime tipificado no artigo 333, parágrafo único, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Outrossim, deixo de fixar o valor mínimo de reparação dos danos causados pela infração, uma vez não há indicação de prejuízo causado. Passo agora à fixação da pena, em conformidade com o critério trifásico, preconizado por Nélson Hungria e previsto no artigo 68 do Código Penal, em relação ao réu Mario José Alexandre: A) CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. O acusado não agiu com dolo que ultrapasse os limites da norma penal, o que torna sua conduta inserida no próprio tipo. Quanto aos seus antecedentes, filio-me à posição jurisprudencial que atesta ser possuidor de maus antecedentes o agente que possui contra si uma sentença penal condenatória transitada em julgado, face ao princípio constitucional da presunção de inocência (artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal). Com isso, sentença penal condenatória pendente do trânsito em julgado não serve para configuração de maus antecedentes (Superior Tribunal de Justiça, HC 49253/DF, Rel. Min. Paulo Medina, 6ª Turma, j. em 30.05.06, DJ de 01.08.06, p. 554). De igual forma, inquérito policial e processo criminal em andamento também não configuram maus antecedentes (Superior Tribunal de 17 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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Justiça, REsp 770685/PR, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma, j. em 12.06.06, DJ de 01.08.06, p. 530). Cite-se, por oportuno, o Enunciado da Súmula 444, do Superior Tribunal de Justiça: “É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base.” Face ao exposto, diante da certidão de antecedentes criminais em anexo, verifico que o réu não possui maus antecedentes. A conduta social do réu e a sua personalidade não foram analisadas, haja vista os elementos constantes dos autos. O motivo do crime se constitui pela obtenção de lucro fácil, o que já é punido pela estrutura do tipo penal, não havendo fatos extrapenais a serem valorados nesta moduladora. As circunstâncias do crime se encontram relatadas nos autos, nada tendo a se valorar. O crime não produziu consequências extrapenais a serem valoradas, não tendo havido efetiva entrega da vantagem prometida. Comportamento da vítima: não existe vítima individualizada, posto tratar-se de crime contra a administração pública. Assim sendo, com fulcro no artigo 59 do Código Penal, fixo a pena base em seu mínimo legal, ou seja, 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias multa. B) CIRCUNSTÂNCIAS LEGAIS – AGRAVANTES E ATENUANTES. Não concorrem circunstâncias agravantes e/ou atenuantes, de modo que a pena fica estabelecida nesta fase em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias multa. C) CAUSAS DE AUMENTO OU DIMINUIÇÃO DE PENA. Não concorrem causas de aumento de pena ou diminuição de pena. D) PENA DEFINITIVA. Face à inexistência de outros elementos modificativos, fixo a pena definitiva em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias multa. O valor do dia multa é fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato delituoso, devidamente atualizado, observado o disposto pelo artigo 60, caput, do Código Penal, por não existirem elementos para se aferir a real situação econômica do réu. E) DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA. Considerando o disposto no artigo 33, caput e § 2º, alínea “c”, do Código Penal, o regime inicial para o cumprimento da pena ora imposta é o ABERTO. F) DA POSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. Compulsando os autos, verifico que o acusado preenche os requisitos constantes no artigo 44 do Código Penal, razão pela qual é cabível a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, por ser a melhor medida a ser aplicada no caso concreto, de forma a resgatar o sentimento humanitário do agente.

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Assim sendo, observado o disposto no artigo 44, §2º, e na forma do artigo 46, ambos do Código Penal, SUBSTITUO a pena privativa de liberdade aplicada por uma pena restritiva de direito, consistente em prestação de serviços comunitários e prestação pecuniária, por se configurar medida suficiente à repreensão do delito. A prestação de serviços à comunidade deverá ser realizada mediante a atribuição de tarefas gratuitas, conforme as suas aptidões, devendo ser cumpridas à razão de 01 (uma) hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho; em entidade a ser designada pelo Conselho de Execução Penal deste Município em audiência admonitória. Por outro lado, a prestação pecuniária é arbitrada no valor de 04 (quatro) salários mínimo nacional vigente3, que deverá ser revertido em favor de entidade a ser designada pelo Juízo da Execução Penal, sem prejuízo da pena de multa imposta. G) DA IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA. Como a pena privativa de liberdade foi convertida em pena restritiva de direito, a concessão do sursis processual afigura-se descabida, em face do disposto no inciso III do artigo 77 do Código Penal. H) DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE. Concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade, uma vez que permaneceu solto por quase todo o período de apuração dos fatos, não havendo qualquer motivo ponderoso a justificar, por ora, a prisão cautelar do réu, eis que ausentes os requisitos da prisão preventiva.

IV – PROVIDÊNCIAS FINAIS Condeno o acusado Mario José Alexandre, nos termos do artigo 804 do Código de Processo Penal, ao pagamento das custas processuais, em proporção, calculadas ex lege. APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO: a) remetam-se os autos ao cartório contador para o cálculo das custas processuais e multa; b) lance-se o nome do réu na coluna “Rol dos Culpados” do Livro de Registro de Processos Criminais; c) expeça-se guia para a execução da pena, com as observâncias das disposições legais, remetendo-se à Vara de Execuções Penais (VEPMA); d) em cumprimento ao disposto pelo artigo 72, §2º, do Código Eleitoral, bem como pelo artigo 15, inciso III, da Constituição Federal, oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, comunicando a condenação do réu, com a sua devida identificação, acompanhada de fotocópia da presente decisão; 3

Prestação pecuniária arbitrada em razão das condições econômicas do réu, notadamente por informar em Juízo que recebe mensalmente a quantia aproximada de R$ 6.000,00 (seis mil reais). 19 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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e) cumpra-se no que for aplicável o Código de Normas, inclusive quanto à remessa de cópia da parte dispositiva desta sentença à vítima do crime ou familiares, em sendo o caso; f) intime-se o réu para no prazo de 10 (dez) dias, efetuar o pagamento da multa e custas processuais (artigo 50 do Código Penal). Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Ciência ao Ministério Público. Cumpram-se as demais disposições do Código de Normas da Corregedoria Geral de Justiça do Paraná. Maringá, 11 de fevereiro de 2015 (quarta-feira).

SUZIE CAPRONI FERREIRA FORTES JUÍZA DE DIREITO SUBSTITUTA

20 Suzie Caproni Ferreira Fortes – Juíza de Direito Substituta (wr)


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