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TRIBUNAL DE JUSTIÇA

APELAÇÃO CRIME Nº 1.390.806-6, DO REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ - FORO REGIONAL DE SARANDI - 1ª VARA CRIMINAL APELANTES:

CONRADO BELLER FERRI E WELLERSON RÉGIS POIATTI

APELADOS:

MINISTÉRIO DO PUBLICO DO ESTADO DO PARANA E SEGURADORA LÍDER DOS CONSÓRCIOS DO SEGURO DPVAT S.A. (ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO)

RELATOR:

DES. JOSÉ CARLOS DALACQUA

APELAÇÃO CRIME – FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO (ARTIGO 297 DO CÓDIGO PENAL, POR TRÊS VEZES) – PRELIMINARES – PLEITO DE DESLOCAMENTO PARA A JUSTIÇA FEDERAL – INOCORRÊNCIA DE LESÃO AO INTERESSE DA UNIÃO – PEDIDO DE AFASTAMENTO DO ASSISTENTE AUSÊNCIA QUALIDADE

DE DE DE

PRELIMINARES

ACUSAÇÃO PREJUÍZO VÍTIMA

– –

REJEITADAS

IMPOSSIBILIDADE COMPROVAÇÃO

MATÉRIA –

PRECLUSA

MÉRITO

– DA –

PLEITO

ABSOLUTÓRIO – APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO

PRO REO – AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS – DOLO COMPROVADO EM PRATICAR O ILÍCITO PENAL – PLEITO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – DESÍGNIO AUTÔNOMO – DOSIMETRIA – CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DA CULPABILIDADE – PENA EXASPERADA FACE A MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA PRATICADA – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA – RECURSOS CONHECIDOS E NÃO PROVIDOS.

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VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Crime nº 1.390.806-6, do Região Metropolitana de Maringá - Foro Regional de Sarandi - 1ª Vara Criminal, em que são Apelantes CONRADO BELLER FERRI e WELLERSON RÉGIS POIATTI e Apelados MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ e SEGURADORA LÍDER DOS CONSÓRCIOS DO SEGURO DPVAT S.A. I – RELATÓRIO

O Ministério Público do Estado do Paraná, por seu digno Representante na 1ª Vara Criminal da Comarca de Sarandi, ofereceu denúncia de fls. 02/06 em face de CONRADO BELLER FERRI e WELLERSON RÉGIS POIATTI, devidamente qualificado nos autos, pela prática dos crimes previstos nos artigos 297, 299 e 304, todos do Código Penal, em razão dos seguintes fatos: “Em meados do ano de 2004, por volta do mês de agosto, nas dependências da empresa denominada Sarandi Cobranças de Convênios Ltda., localizada na Av. Dom Pedro I, n° 90, sobre loja, sala 01, Jardim Independência, neste Município e Comarca de Sarandi-PR, os denunciados CONRADO BELLER e WELLERSON RÉGIS POIATTI o primeiro agindo na condição de sócio da referida empresa (cf. contrato social de fls. 116 e ss.) e o segundo, como seu subordinado, empregado de tal empresa, dolosamente e conscientes da ilicitude de suas condutas, agindo em comunhão de desígnios, um aderindo à conduta do outro, deliberaram pela adulteração de documentos públicos (certidão de quitação de débitos da Justiça Eleitoral, extraídos via ‘internet’) com a finalidade de obter o pagamento, pela FENASEG – Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização, em favor da empresa Rede de Assistência à Saúde Metropolitana (Hospital Metropolitano), sediada nesta urbe, de despesas médicas que seriam cobertas por valores do chamado

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“seguro obrigatório DPVAT”, gerenciado por tal Federação. Isto porque a empresa Sarandi Convênios Ltda. havia sido contratada pela empresa Rede de Assistência à Saúde Metropolitana (Hospital Metropolitano), conforme documentos de fls. 119/120 dos inclusos autos, para proceder à montagem dos procedimentos e juntada dos documentos necessários para que os atendimentos médicos realizados no Hospital Metropolitano de Sarandi, a serem custeados pelo seguro obrigatório DPVAT, fossem posteriormente quitados pela FENASEG – Federação Nacional das Empresas de Seguro Privado. Neste sentido, na data de 26.08.2004, nas dependências de tal empresa, o denunciado WELLERSON RÉGIS POIATTI, com perfeita ciência e adesão de seu empregador, o também denunciado CONRADO BELLER FERRI, conseguiu, utilizando recursos eletrônicos digitais de um computador, e com base em uma certidão eletrônica obtida via ‘internet’ na página eletrônica do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), criar uma certidão de Quitação Eleitoral falsa em nome do paciente (do Hospital Metropolitano de Sarandi) Jefferson Antônio Danas, imprimindo-a posteriormente em formatação horizontal (formato de impressão conhecido como “paisagem”) e com a aposição de um suposto endereço residencial do referido paciente (fl. 131), quando é sabido que as certidões eletrônicas do Tribunal Superior Eleitoral somente são emitidas e impressas na formatação vertical (formato conhecido por “retrato”) e sem constar qualquer endereço de localização da pessoa a quem o documento se refere. Assim agiram os denunciados, de forma dolosa e consciente, visando suprir uma exigência da FENASEG – Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e Capitalização, para a efetivação do reembolso dos gastos tidos com os pacientes, que é a apresentação de comprovantes de endereços destes, sendo certo que, após produzir a certidão falsa acima mencionada, o denunciado WELLERSON RÉGIS POIATTI obteve, junto ao Cartório da Justiça Eleitoral de Maringá-PR, a aposição de um carimbo oficial no documento, afixado de forma negligente por funcionário público lotado no referido órgão, tudo com o fim de conferir uma aparência de legalidade aos atos e de regularidade à documentação para tentar evitar contestações e questionamentos futuros por quaisquer pessoas. No mesmo sentido e meses após tal fato, já na data de 15.12.2004, utilizando do mesmo expediente ilícito, imbuído de dolo e com a adesão igualmente dolosa e consciente de seu empregador CONRADO BELLER FERRI, o denunciado WELLERSON RÉGIS POIATTI novamente criou duas falsas Certidões de Quitação

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Eleitoral nos mesmos moldes (com as mesmas características de falsidade) em nome dos pacientes Sueli do Carmo Benedetti e Rafael Lourenço Batista, imprimindo-as em formato horizontal (“paisagem”) e com a inserção de endereços residenciais das referidas pessoas (fls. 134 e 135), tudo com o mesmo fim de suprir, com uma aparência de perfeita legalidade e regularidade, a exigência documental da FENASEG para ressarcir os gastos do Hospital Metropolitano de Sarandi com tais pacientes (comprovantes de endereço). De igual forma, e visando conferir maior aparência de regularidade aos documentos falsos, o denunciado WELLERSON RÉGIS POIATTI obteve na sequência, junto ao Cartório da Justiça Eleitoral de Maringá/PR, a aposição de carimbos oficiais nos referidos papéis, carimbos esses afixados de forma negligente por funcionários públicos lotados no referido órgão. ”

A inicial acusatória foi recebida à fl. 264, em 19 de novembro de 2010. Na continuidade, os réus foram regularmente citados, e, apresentaram resposta escrita à acusação (fls. 275/283 e 284/286). O juízo, por entender que não era o caso de absolvição sumária, determinou a continuidade do feito (fl. 293). À fl. 340 ocorreu o ingresso da Seguradora Líder dos Consórcios de Seguro DPVAT S.A. como assistente de acusação. Posteriormente, em sede de alegações finais, o Ministério Público do Estado do Paraná e a Seguradora Líder dos Consórcios de Seguro DPVAT S.A. manifestaram-se pela parcial procedência da denúncia a fim de condenar os réus nas sanções do artigo 297 c/c artigo 71, ambos do Código Penal (fls. 437/452 e 454/461). A defesa dos réus, ora recorrentes, por sua vez, sustentam que devem ser absolvidos (fls. 466/476 e 480/487).

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Finda a instrução, foi prolatada sentença às fls. 488/501 e os réus foram condenados pela prática do crime previsto no artigo 297 do Código Penal, por três vezes, em continuidade delitiva e foram absolvidos da prática dos crimes previstos nos artigos 299 e 304, ambos do Código Penal. No tocante a fixação da pena do réu CONRADO BELLER FERRI, foi-lhe aplicada à reprimenda de 02 (dois) anos, 06 (seis) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 14 (quatorze) dias-multa, à razão de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, iniciando-se o cumprimento da pena em regime aberto. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direito, consistentes na prestação de serviços à comunidade e na prestação pecuniária, no valor de 10 (dez) salários mínimos. Quanto ao réu WELLERSON RÉGIS POIATTI, foi-lhe aplicada à reprimenda de 02 (dois) anos, 05 (cinco) meses e 05 (cinco) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, iniciando-se o cumprimento da pena em regime aberto. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direito, consistentes na prestação de serviços à comunidade e na prestação pecuniária, no valor de 01 (um) salário mínimo. Inconformado

com

a

decisão,

o

recorrente

CONRADO BELLER FERRI interpôs recurso (fl. 505), sustentando, em síntese, que: a) possuía na época uma empresa de cobrança, a qual prestava serviços de recebimento de seguro DPVAT; b) desconhece qualquer tipo de falsificação e/ou utilização de documento falso em

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processos relativos a DPVAT; c) não agiu com dolo, pois todos os processos de DPVAT que passaram pela empresa eram realizados com dados fornecidos pelos pacientes quando da internação; d) há fragilidade probatória, motivo pelo qual deve ser aplicado o princípio do in dubio pro reo, absolvendo-se o apelante; e) subsidiariamente, pleiteia a desclassificação para o delito previsto no artigo 171 do Código Penal, haja vista que a falsificação foi o crime-meio para a prática do crime de estelionato; f) na dosimetria, afirma que deve ser fixada a pena no mínimo legal, afastando-se a circunstância judicial desfavorável (fls. 511/523). Igualmente irresignado, o recorrente WELLERSON RÉGIS POIATTI interpôs recurso (fl. 531), sustentando os mesmos argumentos apresentados pelo apelante CONRADO BELLER FERRI (fls. 541/549). Os recursos foram recebidos às fls. 506 e 535/536. Em contrarrazões, o Ministério Público sustentou pelo

conhecimento

dos

recursos

e

desprovimento,

com

a

consequente manutenção da sentença (fls. 526/530 e 556/561). A SEGURADORA LÍDER DOS CONSÓRCIOS DO SEGURO DPVAT S.A. apresentou contrarrazões somente quanto a WELLERSON RÉGIS POIATTI manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 571/572). A douta Procuradoria-Geral de Justiça, na pessoa de seu Eminente Procurador João Rodrigues de Almeida Sobrinho, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento dos apelos (fls. 583/590).

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Na tribuna, a defesa do acusado CONRADO BELLER FERRI arguiu como preliminares o pleito deslocamento do processo para a Justiça Federal e a ilegitimidade do assistente de acusação. Após, vieram conclusos. É o breve relatório. II – DO VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO

Presentes

os

pressupostos

processuais

de

admissibilidade, conheço dos recursos interpostos e passo à sua análise. Inicialmente, passa-se a análise das preliminares arguidas pela defesa do acusado CONRADO BELLER FERRI. A tese apresentada pela Ilustre defesa para o deslocamento da competência para processar e julgar da Justiça Comum Estatual para a Justiça Federal não merece acolhimento. Isso porque somente é possível o deslocamento de competência para a Justiça Federal quando houver interesse da União, nos termos do artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal. Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: (...) IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; (...)

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No caso em tela, o crime investigado nos presentes autos não ocorreu em detrimento de bens, serviços ou interesse da União. Corroborando

esse

entendimento,

o

Supremo

Tribunal Federal entende que inexistindo lesão direta a União não é possível o deslocamento da competência para a Justiça Federal. Quanto ao tema: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PENAL. PROCESSO PENAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA. CARTEIRA DE TRABALHO E PREVIDÊNCIA SOCIAL - CTPS. INEXISTÊNCIA DE LESÃO AO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. PRECEDENTE. ORDEM DENEGADA. I - No caso sob exame, o ora paciente foi condenado pela Justiça Estadual bandeirante por ter praticado o delito de falsidade ideológica, porque inseriu declaração falsa em documento público (CTPS), consistente em simulação de vínculo empregatício. II – Não havendo lesão ao INSS capaz de atrair a competência da Justiça Federal, o paciente deverá responder apenas pelo delito de anotação falsa na CTPS, cuja competência para o julgamento cabe à Justiça Estadual. Precedente. III – Ordem denegada. (STF - HC 102629, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 23/11/2010, DJe-020 DIVULG 3101-2011 PUBLIC 01-02-2011 EMENT VOL-02454-03 PP00621)

Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça em recentes julgados segue o mesmo entendimento do STF, de que a competência no caso de uso de documento falso é definida de acordo com a qualificação da entidade lesada com a conduta, sendo indiferente a natureza jurídica do órgão expedidor do documento. Nesse sentido:

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PROCESSUAL E PENAL. HABEAS CORPUS. PECULATO. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO E FALSIDADE IDEOLÓGICA. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CONHECIMENTO. INCOMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE ORIGEM. MATÉRIA NÃO SUSCITADA NO MOMENTO OPORTUNO. SUPRESSÃO. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS IMPRÓPRIAS. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DESÍGNIOS AUTÔNOMOS. 1. Tratando-se de habeas corpus substitutivo de recurso especial, inviável o seu conhecimento. 2. Matérias não decididas no acórdão impugnado não podem ser conhecidas, sob pena de supressão indevida de instância. Ademais, a jurisprudência deste Tribunal é pacífica no sentido de que a competência no caso de uso de documento falso é definida de acordo com a qualificação da entidade lesada com a conduta, sendo indiferente a natureza jurídica do órgão expedidor do documento. 3. Não são válidos para justificar o aumento de pena em razão de motivos e consequências elementos próprios do crime ou de natureza abstrata. 4. Não reconhecido pelo Tribunal de origem o nexo de dependência ou de subordinação entre as condutas relativas aos crimes de falsificação de documento público e de falsidade ideológica, inviável a aplicação do princípio da consunção. 5. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, para redimensionar as penas aplicadas na origem. (STJ - HC 308.749/AC, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Rel. p/ Acórdão Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 18/06/2015). PENAL E PROCESSUAL PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. ART. 90 DA LEI 8.666/93, ART. 297 E 304 DO CÓDIGO PENAL. PROCESSO LICITATÓRIO MUNICIPAL. FRAUDE. FALSIFICAÇÃO E USO DE DOCUMENTO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE LESÃO DIRETA À UNIÃO. COMPETÊNCIA ESTADUAL. 1. As certidões negativas falsas, ainda que provenientes de órgão federais (Receita e INSS), utilizadas em procedimento licitatório municipal, não trazem prejuízo direto a bens, serviços ou interesses da União, nem de qualquer de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, razão pela qual as infrações perpetradas não se amoldam às situações previstas no elenco taxativo do art. 109 da Constituição Federal, não se cuidando de crime afeto à justiça Federal. Precedentes desta Corte. 2. Conflito conhecido, para declarar competente o Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal de Pesqueira/PE, ora suscitado.

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(STJ - CC 136.937/PE, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/02/2015, DJe 23/02/2015)

E, ainda: PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. FORMULÁRIO DE AUTORIZAÇÃO DE VIAGEM PARA MENOR. EXPEDIÇÃO POR EMBAIXADA BRASILEIRA NO EXTERIOR. DOCUMENTO NÃO UTILIZADO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO PARA A UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 01. Conquanto o documento tido por falsificado - autorização de viagem para menor de idade - tenha supostamente emanado de Embaixada Brasileira, compete à Justiça Estadual processar e julgar a causa se a infração não foi praticada em "detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral" (CR, art. 109, IV; Terceira Seção, CC 107.584/PR, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 30/04/2010; CC 101.389/ES, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 27/02/2009). 02. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da Comarca de Guararema/SP, ora suscitado. (STJ - CC 118.363/SP, Rel. Ministro NEWTON TRISOTTO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SC), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 24/09/2014, DJe 09/10/2014)

Outrossim, em se tratando de fraude para o recebimento do seguro DPVAT, a competência é da Justiça Comum Estadual: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. ESTELIONATO. FRAUDE PARA O RECEBIMENTO DE INDENIZAÇÕES. SEGURO OBRIGATÓRIO DPVAT. PREJUÍZO. SOCIEDADES SEGURADORAS CONVENIADAS. COMPETÊNCIA JUSTIÇA COMUM ESTADUAL. 1. O interesse da União refere-se tãosomente ao pagamento do prêmio do Seguro Obrigatório, não possuindo vinculação com o sinistro e as respectivas indenizações seja por morte, invalidez permanente ou despesas de assistência médica e suplementares. 2. O

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suposto crime de estelionato para o recebimento de indenizações oriundas do Seguro Obrigatório - DPVAT prejudica as sociedades seguradoras conveniadas responsáveis pelo pagamento, nos termos da Lei n.º 6.194/74 e da Resolução n.º 109/2004, expedida pelo CNPS. 3. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Campina Grande/PB, ora suscitado. (STJ, Relator: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 09/03/2005, S3 - TERCEIRA SEÇÃO)

Destaca-se que a prática do ilícito penal, tinha como escopo falsificar Certidões de Quitação Eleitoral, para atender uma formalidade da FENASG (Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização) e, desta forma, inexiste qualquer lesão ao interesse da União. Portanto, há que se rejeitar a preliminar e manter a competência da Justiça Comum Estadual. Adiante,

quanto

a

preliminar

arguida

de

ilegitimidade da SEGURADORA LÍDER DOS CONSÓRCIOS DO SEGURO DPVAT S.A. para figurar como assistente de acusação, o pedido também não deve ser acolhido. Isso porque o rol previsto no artigo 268 do Código de Processo Penal prevê quem são os legitimados para figurar como assistente de acusação, in verbis: Art. 268. Em todos os termos da ação pública, poderá intervir, como assistente do Ministério Público, o ofendido ou seu representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas no Art. 31.

No caso em tela, a possibilidade de figurar como assistente de acusação é restrita àquelas hipóteses, no caso, seria a

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SEGURADORA LÍDER DOS CONSÓRCIOS DO SEGURO DPVAT S.A. a pretensa vítima de uso de documento falso. Conforme leitura dos fatos descritos na exordial acusatória, a seguradora é legítima para figurar como assistente de acusação, visto que o acusado foi denunciado por ter incorrido, supostamente nas condutas descritas no artigo 297, 299 e 304, todos do Código Penal, havendo, portanto, interesse e legitimidade em figurar como assistente do Ministério Público. Destaca-se trecho da denúncia: (...) os denunciados CONRADO BELLER e WELLERSON RÉGIS POIATTI o primeiro agindo na condição de sócio da referida empresa (cf. contrato social de fls. 116 e ss.) e o segundo, como seu subordinado, empregado de tal empresa, dolosamente e conscientes da ilicitude de suas condutas, agindo em comunhão de desígnios, um aderindo à conduta do outro, deliberaram pela adulteração de documentos públicos (certidão de quitação de débitos da Justiça Eleitoral, extraídos via ‘internet’) com a finalidade de obter o pagamento, pela FENASEG – Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização, em favor da empresa Rede de Assistência à Saúde Metropolitana (Hospital Metropolitano), sediada nesta urbe, de despesas médicas que seriam cobertas por valores do chamado “seguro obrigatório DPVAT”, gerenciado por tal Federação. Isto porque a empresa Sarandi Convênios Ltda. havia sido contratada pela empresa Rede de Assistência à Saúde Metropolitana (Hospital Metropolitano), conforme documentos de fls. 119/120 dos inclusos autos, para proceder à montagem dos procedimentos e juntada dos documentos necessários para que os atendimentos médicos realizados no Hospital Metropolitano de Sarandi, a serem custeados pelo seguro obrigatório DPVAT, fossem posteriormente quitados pela FENASEG – Federação Nacional das Empresas de Seguro Privado.(...) Assim agiram os denunciados, de forma dolosa e consciente, visando suprir uma exigência da FENASEG – Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e Capitalização, para a efetivação do reembolso dos gastos tidos com os pacientes”.

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Com efeito, havia indícios de que quando a seguradora ingressou como assistente de acusação, houve a utilização de documento público falso, visando obter proventos indevidos. Uma vez que a Seguradora figurou como assistente de acusação durante toda a instrução criminal e havendo prolação de sentença. Inclusive, o Ministério Público figura como dominus

litis, isto é, o titular da ação penal, tendo legitimidade para ajuizar o processo criminal, de modo que o assistente de acusação apenas irá auxiliá-lo. Vale lembrar que nesta fase recursal, o assistente de acusação apenas apresentou

contrarrazões

recursais,

não

visando a modificação da sentença, inexistindo qualquer prejuízo ao recorrente pela participação do assistente do Ministério Público. Ademais,

eventual

ocorrência

ilegitimidade

do

assistente de acusação constitui mera irregularidade, visto que a sua participação é facultativa, só devendo anular o processo mediante comprovação do efeito prejuízo e, no estado que se encontra o processo, não há subsídios a fim de demonstrar tal prejuízo. Quanto ao tema, Renato Brasileiro de Lima leciona que: “A existência e validade do processo penal independem da habilitação do ofendido como assistente da acusação. Com (ou sem) assistente, o processo penal terá existência normal, visto que sua presença não é necessária para a constituição válida da relação processual. De fato, enquanto sequer é possível cogitar da existência de um processo sem as partes principais – Ministério Público e acusado, na ação penal pública; querelante e querelado, na ação penal privada

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-, a habilitação do ofendido como assistente da acusação não é condição sine qua non para se conferir validade ao processo penal em crimes de ação penal pública, visto que sua intervenção é facultativa. Por isso, diversamente daqueles, que são considerados partes principais, necessárias, o assistente da acusação é tido como parte desnecessária, ou seja, contingente, chamado por alguns de parte adjunta ou parte adesiva.” (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. Salvador: Juspodivm, 2014. p. 1215-1216)

Além

disso,

a

arguição

de

ilegitimidade

do

assistente de acusação está preclusa, uma vez que o pedido foi deferido pelo juízo singular. Vale lembrar que o juízo a quo entendeu ser legítimo

o

interesse

da

vítima,

SEGURADORA

LÍDER

DOS

CONSÓRCIOS DO SEGURO DPVAT S.A., em figurar como assistente de acusação, tanto é que deferiu o pedido à fl. 340, seguindo rito previsto em Lei. Nesse sentido: “Apresentado por escrito ao juiz do feito o pedido de admissão do ofendido como assistente, prevê a lei a obrigatoriedade de prévia oitiva do órgão do Ministério Público (CPP, art. 272). O Ministério Público só pode se pronunciar contrariamente ao pedido de habilitação se constatar que o requerente não é o sujeito passivo da infração penal, seu representante legal, no caso de incapacidade, ou seus sucessores, no caso de ausência. Ao órgão ministerial, portanto, não é dado se opor ao requerimento com base em argumentos referentes ao mérito, oportunidade e conveniência da habilitação. Também incumbe ao Ministério Público verificar se o ofendido se fez representar por advogado regularmente inscrito nos quadros da OAB e se o requerente não figura como corréu no mesmo processo, visto que esta circunstância é causa impeditiva da habilitação como assistente (CPP, art. 270).” (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. Salvador: Juspodivm, 2014. p. 1218-1219)

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Portanto, há que ser rejeitada a preliminar arguida de ilegitimidade da assistente de acusação. As demais teses arguidas dizem respeito ao mérito recursal. Considerando

que

as

teses

suscitadas

pelos

recorrentes, versam basicamente sobre os mesmos tópicos, passase a análise conjunto dos recursos interpostos. Os

recorrentes

sustentam

a

ocorrência

de

fragilidade probatória, motivo pelo qual deve ser aplicado o princípio do in dubio pro reo, absolvendo-os. Inicialmente,

verifica-se

dos

autos

que

os

recorrentes foram processados e condenados pelo incurso na conduta capitulada no artigo 297, caput, do Código Penal, a qual possui seguinte redação: “Falsificação de documento público Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro: Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa. § 1º - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte. § 2º - Para os efeitos penais, equiparam-se a documento público o emanado de entidade paraestatal, o título ao portador ou transmissível por endosso, as ações de sociedade comercial, os livros mercantis e o testamento particular. (...)”

O delito em tela é classificado como de crime comum; formal; de forma livre; comissivo e, excepcionalmente, comissivo por omissão; instantâneo; unissubjetivo; plurissubsistente e admite tentativa; plurissubsistente e admite tentativa.

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A materialidade do delito restou consubstanciada por meio das Certidões de Quitação Eleitoral de fls. 16/18, bem como dos documentos que instruíram os autos de Sindicância nº 11/2005, originário da Corregedoria Regional Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná às fls. 13/86. A autoria foi cabalmente comprovada durante a instrução criminal conforme se extrai dos depoimentos prestados pelas testemunhas de acusação. Celso Saturnino afirmou em juízo que: “trabalhou no Cartório Eleitoral da Zona 137, no período de 1995 a 2007; o chefe do Cartório era Nilson Rodrigues de Carvalho; só teve conhecimento dos fatos quando foi intimado pelo Juiz; algumas pessoas iam até o Cartório, com certidões já preenchidas, para que fossem assinadas por Nilson; o depoente só carimbava; não tinham conhecimento de que as certidões eram falsas; soube que o pessoal da Receita Federal foi até o Cartório para conversar com Nilson; Nilson disse que de nada sabia e disse para levarem aos fatos ao Juiz; uma ou duas pessoas de Sarandi levavam as declarações para serem assinadas; nunca ganhou nada para carimbar os depoimentos; soube que as declarações eram utilizadas para dar golpes no DPVAT, dando entrada em seguros para pessoas que já estavam mortas; eles colocavam endereço nas certidões de quitação eleitoral; não sabe quanto rendia cada DPVAT; se fosse feita consulta, com certeza seria possível verificar que as pessoas estavam mortas; não sabe quanto tempo durou essa situação, mas acredita que dois meses; nem mesmo Nilson sabia que as certidões eram adulteradas; reafirma o que declarou durante as investigações; não conhece os réus; não pode afirmar que os réus eram as pessoas que levavam as certidões ao TRE; o procedimento de emissão de certidão era: a própria pessoa comparecia e apresentava documentos pessoais ou retirava pela internet a certidão que era autenticada pelo próprio sistema; não entendeu porque eram carimbadas e assinadas as certidões apresentadas por aquelas pessoas ao Nilson” (fl. 306)

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Luzia Eugênio da Costa declarou que: “trabalhou no Cartório Eleitoral da 66ª Zona Eleitoral; logo depois que o TSE expediu uma resolução admitindo expedição de certidões pela internet, pessoas começaram a levar certidões para carimbar; a maioria das certidões eram assinadas por Nilson, que era supervisor da central; começou a ver aquilo e pensar que as certidões pela internet já possuíam autenticação e não precisavam de carimbo e assinatura; depois de um tempo apareceram investigadores para conversar com Nilson a respeito do assunto; foi nesse momento que o Dr. Camacho começou a investigar e Nilson respondeu a um processo administrativo; Nilson confiava muito nas pessoas e por isso assinava; não saía endereço nas certidões emitidas pela internet; o Cartório de Registro Civil comunicava os óbitos todos os meses; não tem conhecimento de que Nilson tenha recebido alguma vantagem; acredita que Nilson tenha recebido uma advertência; os endereços não eram fornecidos sequer ao Ministério Público, salvo se estivesse com o processo em mãos; confirma o que declarou durante a fase investigativa; até hoje não consegue entender como as pessoas conseguiam obter certidões com endereço; as certidões emitidas e assinadas pela Central não saíam com numeração de autenticação (...)”(fl. 303).

Deolindo de Brito Barboza relatou que: “foi chamado para depor tendo em vista que algumas certidões de quitação eleitoral emitidas pela Central de Atendimento ao Eleitor eram levadas ao cartório da zona 137, coordenado por Nilson para serem assinadas e carimbadas; Nilson foi chamado para explicar porque assinava as certidões; a desconfiança era sobre o motivo de a pessoa ter ido pedir certidões em nome de terceiros; as certidões seriam utilizadas para dar entrada no pedido de DPVAT; todos os chefes de cartório foram intimados para tentar esclarecer o motivo das pessoas levarem certidões para assinar e carimbar; lembra que Nilson discutiu com alguém, mas não sabe o motivo; talvez Nilson tenha se chateado com a desconfiança da pessoa que fazia a investigação; os documentos, após o primeiro mês de óbito, deveriam estar cancelados no sistema; se tivesse cancelado

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o titulo, não sairia certidão de quitação eleitoral; não acredita que alguém tenha recebido pela emissão das certidões; o certo era que as certidões fossem entregues para a própria pessoa ou com procuração; pelo que se recorda apenas uma pessoa ia até o cartório levar as certidões para serem assinadas; depois do ocorrido foram tomadas providências para melhor identificar as pessoas antes de fornecer certidões; não sabe qual era a finalidade da certidão de quitação eleitoral para o golpe; foi ouvido pelo Dr. Camacho” (fl. 305).

Nilson Rodrigues de Carvalho, responsável pelo Cartório Eleitoral, relatou que: “o Cartório de Registro Civil comunica os óbitos; enquanto o Cartório não fazia a comunicação, as certidões eram fornecidas normalmente; em 2004 começava a sair a certidão on-line; as pessoas não entendiam bem e pediam para que o depoente carimbasse e assinasse; as certidões com endereço não poderiam ser fornecidas; o depoente só viu as certidões com endereço quando chegaram os auditores; ele tirava a certidão no escritório e levava para que fosse carimbada no Fórum a fim de conferir veracidade; não sabe o que eles faziam com as certidões; não lembra de discussão com o auditor; só ficou tranquilo depois que a Corregedoria do Tribunal compreendeu a falha do depoente; não sabe se era o pessoal do Hospital Metropolitano que articulava o golpe; confirma o que disse durante a investigação; só o depoente assinava as certidões, pois era chefe da Central; os funcionários conferiam apenas nomes, datas de nascimento, mas não notaram que havia endereço; é possível o fornecimento de endereços nas certidões, desde que solicitado pelo titular do título; depois do ocorrido foi até o Hospital Metropolitano para tentar identificar a pessoa e soube que ela trabalhava no escritório (...)”(fl. 304).

Perante os autos de sindicância, Nilson Rodrigues de Carvalho afirmou ainda que: “(...) certa vez uma pessoa esteve no cartório, disse que havia tirado uma certidão pela internet, mas precisava do

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carimbo da Justiça Eleitoral, porque o destinatário estava a exigir essa formalidade; pediu que ele deixasse as certidões que iria verificar e depois as carimbaria; não se deu conta que nelas constavam endereços; então, somente conferiu se tratava-se de eleitor e se estava quite com a Justiça Eleitoral; confirmando isso, as carimbou; a partir daí, essa pessoa diversas outras vezes trouxe certidões para a mesma finalidade, sempre conferia o nome a situação eleitoral, mas nunca conferia o endereço, porque não se dava conta de que ele constava do documento; certa vez, em janeiro último, recebeu a visita de dois auditores securitários, os quais apresentaram as certidões de fls. 7/9, dizendo que elas continham endereços falsos; o depoente, com o auxílio do colega Deolindo, conferiu e confirmou que o número da residência era falso, ou seja, diversos do constante dos cadastros eleitorais; na ocasião, por coincidência, referida pessoa, um senhor de aproximadamente 25 anos, estatura mediana, de compleição física “forte”, mestiço japonês, ali comparecia para que outas certidões fossem carimbadas, indicou-a aos fiscais como sendo quem lhe apresentara outras certidões para idêntico fim ; na ocasião, uma das certidões que ele trazia também foi checada e o endereço estava irregular (...)” (fls. 57/58).

Gilberto de Fraga Almeida, auditor da FENASEG, esclareceu que realizou por meses auditorias na cidade de Maringá e observou a utilização de documentos constatando endereços falsos dos beneficiados, inclusive declarou em juízo que: “o fato ocorreu há aproximadamente 8 anos; faz auditoria do Seguro Obrigatório e apuração de fraudes em seguros; ficou por vários meses em Maringá trabalhando em vários casos; no presente caso, havia falsificação dos comprovantes de endereço das vítimas para que elas não fossem localizadas ou fossem comunicadas pela Seguradora a respeito das cobranças de reembolsos que eles faziam em nome delas; quando a vítima entrava no Hospital, assinava um termo e o hospital se encarregava de fazer a cobrança do DPVAT; foi procurado, no TRE, por uma pessoa que administrava as cobranças dentro do hospital; era o próprio hospital que emitia as cobranças para as seguradoras; as cobranças eram superfaturadas; às vezes a pessoa tomava uma simples injeção e era inventado um procedimento complexo para resgatar o teto das despesas médicas do DPVAT, sempre

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superfaturando as cobranças; nesse caso eles falsificavam declarações do TRE e da Copel; o funcionário do TRE detectou que não eram verdadeiras as certidões; confirma o depoimento prestado na fase investigativa; não lembra especificamente do envolvimento dos réus” (fl. 404).

Vale lembrar que embora os réus neguem a prática do ilícito em juízo, é de ressaltar o interrogatório WELLERSON REGIS POIATTI:

“as certidões eram trazidas pelos próprios pacientes; como o

DPVAT exigia comprovante de residência, eram utilizadas as certidões do Cartório Eleitoral; as certidões eram expedidas pelo Cartório Eleitoral e que nunca as extraiu da internet; era funcionário de Conrado, fazia serviços de office-boy, pagamentos de contas e o auxiliava na montagem dos processos para o recebimento do DPVAT, Conrado que determinava sua função; somente tinha acesso as certidões, pois as levava para o Cartorário verificar se endereço realmente batia; quando a parte não trazia as certidões os processos ficavam parados, não possibilitando o recebimento dos valores; o interrogado nunca falsificou essas certidões; o interrogado, assim como outros funcionários, ajudava a montar os processos; as partes entregavam as certidões; uma única vez o depoente levou a certidão no cartório para verificar se estava tudo certo; nessa única vez foi afrontado por uma pessoa do DPVAT que estava lá; provavelmente as vítimas retiravam as certidões do Cartório Eleitoral de Maringá; foi até o Cartório porque o DPVAT exigia carimbo; não imagina como surgiu a desconfiança quanto às falsificações eis que foi até o Cartório Eleitoral de Maringá uma única vez; foi ouvido perante um juiz e assumiu certos fatos com medo de ser mandado embora, como por exemplo a digitação de documentos e ir ao Cartório carimbar documentos; não assumiu falsificar documentos; Conrado também não falsificou os documentos, pois a maioria deles era trazida pelas vítimas; no depoimento prestado perante o juiz, mentiu, pois estava com medo ser dispensado da empresa; não sabe quantos seguros foram feitos; não achou estranho que as certidões tivessem a mesma data e minuto de emissão; trabalhava com Conrado há pouco tempo, cerca de nove meses; salvo engano começou a trabalhar com Conrado em agosto de 2002; não tem conhecimento que as

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sindicâncias são feitas por amostragem e que não são todos os processos que passam por análise prévia; era Conrado quem colocava os processos no Correio; a empresa Sarandi Seguros não atuava dentro do Hospital; não sabe através de quem o processo chegava no escritório; não sabe se os pacientes tinham algum tipo de contrato com a empresa; quem fornecia os documentos era o Hospital; se faltasse algum documento, o interrogado ia até a casa do paciente buscar; quem delegava as funções na empresa era o Conrado; na cartilha do DPVAT constava que era necessário comprovante de residência; reafirma que nunca alterou ou inseriu informações em certidões”. (fl. 393).

Contudo, ao ser ouvido em juízo nos autos de sindicância, WELLERSON REGIS POIATTI confessou a prática delitiva. “(...) a função da empresa para a qual o declarante trabalha é montar os ‘processos’ com a documentação exigida pelo DPVAT, a fim de viabilizar o recebimento do ressarcimento correspondente; dentre os documentos exigidos, está o que comprove a residência ou endereço do paciente; nos casos referidos nesta Sindicância (11/2005), o depoente se valeu do site do TRE para obter certidão de quitação eleitoral; porém, como o modelo do site não ostenta o endereço da residência, dado que o declarante necessita, tratou de copiar o referido conteúdo e jogá-lo para um arquivo no formato “html”; a partir desse novo arquivo ou ambiente de trabalho, o modelo originário podia ser mexido, especialmente para nele se inserir o endereço que até então não apresentava; diz o declarante que foi ele e seu patrão, Conrado, quem, juntos, tiveram a ideia de acessar o site e proceder daquela maneira, o que se deu em alguns casos, menos de quinzes (...)” (fls. 64/67).

Neste mesmo sentido apontou corretamente à sentença ao afirmar que: “Embora, o acusado reafirme que não alterou ou inseriu qualquer informação nas mencionadas certidões, como bem salientou o representante do Ministério Público, duas das três certidões falsificadas foram retiradas do site do TSE no

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mesmo momento, não sendo crível que tais segurados, por mera coincidência, as tenham confeccionado no mesmo instante. Além do mais, em sede de sindicância, perante o Juízo Eleitoral, o réu apresentou versão que se coaduna com a realidade e narrou com clareza o meio utilizado para inserir os endereços dos segurados na certidão emitida via sítio do TSE e ainda que agiu em comunhão de esforços com Conrado (...).” (fls. 492-v/493).

Portanto, em que pesem os argumentos proferidos na sentença, a autoria foi comprovada nos autos, não havendo que se falar em aplicação do princípio do in dubio pro reo. Com relação ao valor probatório do depoimento dos policiais militares e guardas municipais, confira-se a jurisprudência desta Corte: “APELAÇÃO. CRIME DE PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. ARTIGO 14, CAPUT, DA LEI 10.826/03. PROCEDENTE. RECURSO. PLEITO ABSOLUTÓRIO POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. DEPOIMENTO DOS POLICIAIS. MEIO PROBATÓRIO VÁLIDO. PROVAS SUFICIENTES A ENSEJAR DECRETO CONDENATÓRIO. PEDIDO DE REDUÇÃO DA PENA PARA O MÍNIMO LEGAL. ACOLHIMENTO. AFASTADA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL. FIXAÇÃO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE COMO CONDIÇÃO ESPECIAL AO REGIME ABERTO. INVIABILIDADE. EXCLUSÃO, DE OFÍCIO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.” (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 1197636-8 - Francisco Beltrão Rel.: Laertes Ferreira Gomes - Unânime - - J. 16.10.2014) “APELAÇÃO CRIMINAL. (...) PROVAS INCONTESTES DA VIOLÊNCIA E AGRESSÃO CONTRA A VÍTIMA. CORROBORAÇÃO DO OCORRIDO PELOS TESTEMUNHO DOS POLICIAIS, ALIADOS AO RELATO DA VÍTIMA E À CONFISSÃO DO RÉU. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO. PARTE DA SENTENÇA REFORMADA. RECURSO DO RÉU DESPROVIDO E PROVIDO O RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO, PARA CONDENAR O ACUSADO QUANTO ÀS VIAS DE FATO. (...) 3. O depoimento testemunhal de servidores

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policiais reveste-se de eficácia probatória da materialidade e da autoria delitivas, sendo válido para fundamentar a condenação, mormente quando colhido em Juízo, com a observância do contraditório, e em harmonia com os demais elementos de prova.” (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 1168293-8 - Piraí do Sul - Rel.: José Mauricio Pinto de Almeida - Unânime - - J. 30.10.2014)”

Assim, a autoria do delito se mostra caracterizada diante dos depoimentos prestados pelas testemunhas de acusação, em sede de inquérito policial e em juízo, os quais são harmônicos, firmes, serenos e seguros no sentido de que os recorrentes falsificaram certidões do Tribunal Superior Eleitoral. Aliás, vale ressaltar excerto da manifestação da douta Procuradoria-Geral de Justiça às fls. 589/590. “Tendo em vista a prova produzida em Juízo, assim como os elementos informativos colhidos na fase investigatória, não resta dúvida de que os recorrentes inseriram dados em documentos públicos verdadeiros (certidões eleitorais), fazendo alterações materiais que ocasionaram a modificação de seu aspecto original. Ao assim proceder, os apelantes incorreram no crime tipificado no art. 297, caput, do Código Penal (falsificação de documento público), por três vezes, em continuidade delitiva, na forma do art. 71, caput, do Estatuto Repressivo. Impende averbar que,para a caracterização do delito capitulado no art. 297, caput, do Código Penal é desnecessário saber se os endereços apostos eram verdadeiros ou falsos, na medida em que a comprovação da adulteração, do caráter original do documento público, mediante a inserção de dados inexistentes, é suficiente para a caracterização da infração penal, Não obstante a negativa dos recorrentes, o material probatório coligido nos autos demonstra que as certidões originais fornecidas pelo Cartório Eleitoral não continham os endereços dos eleitores. Percebe-se que tal informação foi inserida pelo acusado Wellerson, sob o completo conhecimento e conivência de seu superior hierárquico, Conrado.

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Convém mencionar que o denunciado Conrado era o verdadeiro interessado e beneficiário do esquema criminosa, pois era o proprietário da empresa responsável pelas cobranças do seguro DPVAT e filho de um dos proprietários do Hospital Metropolitano, onde sua empresa funcionava, de maneira que não havia motivo para que o acusado Wellerson agisse por conta própria a fim de beneficiar a empresa da qual era um mero empregado. No que diz respeito à alegação de que não ocorreu a oitiva das supostas vítimas nos autos, compete anotar que, para a configuração do crime tipificado no art. 297, caput, do Código Penal, basta a falsificação do documento público, o que restou incontroverso nos autos.

No que tange ao pleito de desclassificação da conduta prevista no artigo 297 para a capitulada no artigo 171, ambos do Código Penal, aplicando-se o princípio da consunção, não merece acolhimento. No caso em tela, o crime de estelionato não foi comprovado, eis que sequer houve comprovação nos autos do recebimento de vantagem indevida e, como bem alerta NUCCI, a vantagem deve ser de natureza econômica para configurar o crime de estelionato. “Vantagem ilícita: diversamente do objeto material do crime de furto –que menciona coisa alheia –, neste caso basta que o agente obtenha vantagem, isto é, qualquer benefício, ganho ou lucro, de modo indevido, ou seja, ilícito. Logicamente, trata-se de vantagem de natureza econômica, uma vez que se cuida de crime patrimonial.” (In: NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 13. ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 866.)

Diante disso, a tutela penal é plenamente aplicável ao caso, e não há se falar em consunção, ante a autonomia da conduta típica da falsificação de documento público.

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Define-se o princípio da consunção, segundo Cezar Roberto Bitencourt: “Pelo princípio da consunção, ou absorção, a norma definidora de um crime constitui meio necessário ou fase normal de preparação ou execução de outro crime. Em termos bem esquemáticos, há consunção quando o fato previsto em determinada norma é compreendido em outra, mais abrangente, aplicando-se somente esta.” (In: BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal – parte geral, 1. São Paulo: Saraiva, 2011.)

Pelo conceito, têm-se que a consunção ocorre quando há o cometimento aparente de dois delitos, mas um constitui meio necessário de outro, mais abrangente que aquele. Desse modo, por se tratar de uma unidade de desígnios, o crimemeio é absorvido pelo crime-fim. No caso em tela, porém, o delito de falsificação de documento público não constituiu crime-meio para o delito de estelionato (o qual sequer ocorreu comprovação dos autos de sua existência). Desse modo, não há lógica na aplicação da consunção, quando inexiste o crime-fim. Do que se verificou dos autos o ilícito foi praticado como objetivo de atender uma formalidade da FENASG (Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização), como bem salientou o Ministério Público do Estado do Paraná em sede de contrarrazões às fls. 560/561 e a douta Procuradoria-Geral de Justiça à fl. 590. “No tocante ao pedido de desclassificação dos fatos para o art. 171, caput, do Código Penal (estelionato), é mister registrar que o pleito não merece ser acolhido, pois o crime

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de estelionato é cometido com o escopo de obter vantagem ilícita, o que não ficou comprovado nos autos. No caso em tela, restou demonstrada a falsificação documental para atender à formalidade da Fenaseg (Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização), com o intuito de obter reembolso com gastos tidos com pacientes atendidos pelo seguro DPVAT, de maneira que ficou comprovada a infração art. 297, caput, do Estatuto Repressivo.” (fl. 590).

Aliás,

a

Câmara

Criminal

desta

Corte

possui

precedentes quanto à impossibilidade de aplicação do princípio da consunção quando a potencialidade lesiva não é exaurida pelo crime de estelionato, nos termos da Súmula 17 do Superior Tribunal de Justiça: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais

potencialidade lesiva, e por este absorvido.”. Nesse sentido: “APELAÇÃO CRIME. ESTELIONATO, POR TRÊS VEZES, E FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO (ART. 171, CAPUT, C/C O ART. 71, E ART. 297, CAPUT, TODOS DO CÓDIGO PENAL). 1PLEITO ABSOLUTÓRIO. ALEGAÇÃO DE NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DO AFORISMO IN DUBIO PRO REO. INVIABILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE PATENTES. ALEGAÇÃO DE NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. POTENCIALIDADE LESIVA DO CRIME DE FALSO NÃO EXAURIDA PELOS ESTELIONATOS. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA Nº. 17 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ESCORREITA CONDENAÇÃO. 2- PLEITO DE REEXAME DA DOSIMETRIA DA PENA. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO CABIMENTO. PENA DEVIDAMENTE MOTIVADA. 3- PLEITO DE MODIFICAÇÃO DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA. IMPOSSIBILIDADE. REINCIDÊNCIA. DECISÃO FUNDAMENTADA. 4- PLEITO DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. INVIABILIDADE. ARGUMENTOS JÁ DISCUTIDOS EM SEDE DE HABEAS CORPUS, SEM ALTERAÇÃO FÁTICA. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PRESENÇA DOS REQUISITOS QUE A AUTORIZAM (ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL). RECURSO CONHECIDO E, NO MÉRITO, DESPROVIDO.”

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(TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 911813-2 - Santa Izabel do Ivaí Rel.: Lidia Maejima - Unânime - - J. 29.11.2012).

Portanto, desclassificação

para

a

não conduta

como

acolher

prevista

como

a o

tese

de

crime

de

estelionato. No que tange a dosimetria da pena, alegam os recorrentes que deve ser fixada a pena no mínimo legal, afastandose a circunstância judicial desfavorável. Sem razão. Na dosimetria da pena, o juízo sentenciante ao analisar as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, exasperou a pena base ao considerar a culpabilidade acentuada para os apelantes, nos seguintes termos: “(...) 3.1.1 – Do Réu Conrado Beller Ferri Da primeira fase: fixação da pena base – análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal: A culpabilidade, consistente no grau de reprovabilidade da conduta do agente, supera o previsto no tipo penal, eis que o réu de forma inescrupulosa além de contribuir e consentir com a inserção de dados inexistentes em documentos públicos, também fez uso de órgão público para dar aspecto de legalidade a sua conduta. (...) 3.1.2 – Do Réu Wellerson Régis Poiatti Da primeira fase: fixação da pena base – análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal A culpabilidade, consistente no grau de reprovabilidade da conduta do agente, supera o previsto no próprio tipo penal, eis que o réu de forma inescrupulosa além de inserir dados inexistentes em documentos públicos, também fez uso de órgão público para dar aspecto de legalidade a sua conduta. (...)”

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 27 de 29


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Pois bem, do contexto fático apresentado nos autos, revela-se que os apelantes devem realmente receber maior reprovabilidade em suas ações, pois agiram de forma muito além do que a própria conduta tipificada como delito. Em verdade, os apelantes falsificaram certidões de quitação eleitoral e, posteriormente, obtiveram junto ao Cartório da Justiça Eleitoral de Maringá, a aposição de um carimbo oficial no documento, afixado de forma negligente por funcionário público lotado no referido órgão, a fim de conferir uma aparência de legalidade aos atos e de regularidade à documentação para tentar evitar contestações e questionamentos futuros por quaisquer pessoas. Assim,

verifica-se

que

o

padrão

de

conduta

esperado superou o padrão descrito no tipo penal, exigindo maior reprovabilidade das ações desenvolvidos, motivo pelo qual deve ser mantida a sentença nesse tópico. Diante do exposto, voto no sentido de conhecer dos recursos interpostos e, no mérito, negar-lhes provimento, mantendo a sentença na sua integralidade. Ill – DISPOSITIVO

ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer dos recursos interpostos e, no mérito, negar-lhes provimento, nos termos do voto do relator.

Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br Página 28 de 29


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A Sessão foi presidida pelo Desembargador Laertes Ferreira Gomes. Participaram do julgamento e acompanharam o voto do Relator Excelentíssimos Senhores Desembargadores Laertes Ferreira Gomes e Luís Carlos Xavier. Curitiba, 22 de outubro de 2015 JOSÉ CARLOS DALACQUA Relator

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