Sentença sílvio barros

Page 1

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ - FORO CENTRAL DE MARINGÁ 2ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE MARINGÁ - PROJUDI Avenida Pedro Taques, 294 - Edifício Atrium Centro Empresarial - Zona 07 - Maringá/PR - CEP: 87.030-010 - Fone: (44) 3472-2300 Autos nº. 0029409-03.2010.8.16.0017 Processo: Classe Processual: Assunto Principal: Valor da Causa: Autor(s): Réu(s):

0029409-03.2010.8.16.0017 Ação Civil Pública Improbidade Administrativa R$280.884,56 Ministério Público do Estado do Paraná Márcia do Rocia Bittencourt Socreppa SILVIO MAGALHAES BARROS II

Vistos, etc.

1. RELATÓRIO

Cuida a espécie de Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ em face de SILVIO MAGALHÃES BARROS II e de MARCIA DO ROCIO BITTENCOURT SOCREPPA, todos qualificados na inicial, na qual alega o Parquet, em sua peça de impulso, que: a) no mês de setembro de 2009 o Município de Maringá iniciou processo de inexigibilidade de licitação nº 42596/2009, por iniciativa da então Secretária de Educação, Sra. Márcia do Rocio Bittencourt Socreppa, com a finalidade de adquirir 17.759 livros de literatura nacional, de edição e distribuição da Editora Globo S/A, para fins didáticos junto às Escolas Municipais de Ensino Fundamental; b) o argumento para a compra direta era que a Editora Globo seria a única titular dos direitos sobre publicação, distribuição e comercialização dos exemplares listados pela Câmara Brasileira do Livro; c) em novembro de 2009 a inexigibilidade foi firmada pela referida Secretária, sendo ratificada pelo Sr. Silvio Magalhães Barros II, Prefeito Municipal à época dos fatos, emitindo-se a nota de empenho nº 16273/2009, no valor de R$280.884,56 (duzentos e oitenta mil, oitocentos e oitenta e quatro reais e cinquenta e seis centavos), com pagamento realizado em junho de 2010; d) paralelamente ao processo de inexigibilidade, em razão do Relatório nº 004/2009, emitido pela Secretaria Municipal de Controle Interno, desencadeou-se o processo licitatório nº 84/2010 (pregão nº 026/2010-PMM) com mesmo objeto daquele processo de inexigibilidade, vez que apontada a existência de três outro possíveis fornecedores dos mencionados livros, com preços semelhantes aos da editora Globo; e) em fevereiro de 2010 realizou-se o pregão presencial, comparecendo apenas a empresa J. K. COMERCIO DE LIVROS LTDA, que ofertou proposta de

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


venda dos livros por R$215.650,00 (duzentos e quinze mil e seiscentos e cinquenta reais), homologando-se o resultado da empresa classificada, com a adjudicação do objeto do certame; f) em razão da frustração do certame, vez que a empresa licitante não entregou os livros ofertados, a Secretária de Educação dirigiu-se à Secretaria Municipal de Controle Interno, por meio do oficio nº 0293/2010-SEDUC, de abril de 2010, ao qual obteve a instrução de proceder aquisição do acervo bibliográfico por meio de novo processo licitatório; g) a Administração Pública Municipal retomou o processo de inexigibilidade nº 42596/2006 e utilizou a mesma nota de empenho (novembro de 2009) para pagar à Editora Globo S.A., em junho de 2010, a quantia de R$280.884,56; h) a compra direta não se mostrou justificada diante da possibilidade de concorrência com outros três fornecedores. Pugnou pela procedência da ação para o fim de ver declarado ilícito o processo de inexigibilidade de licitação nº 42596/2009 (nº 265/2009) e condenados os demandados pela prática de ato de improbidade administrativa, que causou dano ao erário do Município de Maringá (art. 10, caput e inciso VIII, da Lei nº 8.429/92) e violou o princípio da legalidade administrativa (art. 11, caput, da Lei 8.429/92), condenando-os, ainda às penas insculpidas no artigo 12, incisos II e III da Lei de Improbidade Administrativa. Juntou os documentos contidos nos eventos 1.1 a 1.27. Notificados, os demandados apresentaram manifestação (eventos 1.29, 1.30 e 1.32), tendo o Município de Maringá se manifestado no evento 1.34. Recebida a inicial, foi determinada a citação dos réus (evento1.35). A segunda demandada interpôs recurso de Agravo de Instrumento no evento 1.42, o qual foi parcialmente acolhido para o fim de anular a decisão que recebeu a inicial. Contestação do demandado Silvio Magalhães Barros II no evento 34.1, remissiva à fundamentação trazida na defesa do evento 1.29, na qual sustentou, preliminarmente, a incompetência absoluta do Juízo de Primeiro Grau para julgar ação civil pública contra a figura de agente político (ex-prefeito). Quanto ao mérito, alegou que não houve ilegalidade no procedimento de inexigibilidade de licitação e que o pregão somente se procedeu em virtude da insistência do Observatório Social e do Controle Interno. Ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos iniciais, vez que ausente qualquer conduta ímproba. A requerida Márcia do Rocio Bittencourt Socreppa contestou o feito no mov. 35.1, ocasião em que argumentou que em meados de 2009, exercia o cargo de Secretária da Educação e que naquela época, com justificativa de fls. 28/29 e pautado no parecer jurídico de fls. 86/88, iniciou-se o processo de compras para aquisição de livros literários para alunos do ensino público municipal para o ano letivo de 2010, por via de inexigibilidade de licitação, de obras cuja exclusividade foi comprovada em favor da Editora Globo. Contudo, aduziu que, a fim evitar eventual irregularidade, a Administração, juntamente com a requerida, resolveram promover licitação sugerida pelo Observatório e pelo Controle interno, na modalidade de pregão, que restou frustrada diante da ausência de entrega do material. Pontuou, ainda, que solicitou orientação, em

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


meados de abril de 2010, para adquirir os livros e que foi orientada a promover nova licitação, todavia, com base no parecer jurídico de fls. 201/204, deu continuidade ao procedimento licitatório inicial. Afirma, também, que não houve prejuízo financeiro ao erário, tampouco culpa ou dolo na forma de proceder diante do início do ano letivo. Pugnou, ainda, pela inclusão da Editora Globo S.A no polo passivo da lide. Requer, ao final, a improcedência do pleito, afastando-se qualquer penalidade. Juntou os documentos dos eventos 35.1 a 35.5. Sobreveio manifestação do órgão ministerial (evento 39.1), pugnando pela rejeição das preliminares e procedência dos pedidos. Dispensada pelas partes a produção de provas além das colacionadas nos autos (evento 46.1, 50.1), anunciou-se o julgamento do processo no evento 55.1. Com a conta de custas (evento 65.1), o feito veio concluso. É o essencial a relatar. Decido.

2. FUNDAMENTAÇÃO PRELIMINARES. 2.1. Incompetência do Juízo. A Lei de Improbidade Administrativa (LIA) preconiza que "os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei." (artigo 1º, caput). O artigo 2º daquele mesmo diploma legal não deixa dúvidas quanto à extensão do conceito de agente público, sendo "todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior." Portanto, no conceito estão incluídos os agentes políticos, inexistindo qualquer incompatibilidade entre os regimes de responsabilidade dos agentes políticos previstos no Decreto-Lei 201/67 e na Lei de Improbidade Administrativa.

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


O posicionamento pacífico do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que a Lei de Improbidade Administrativa é aplicável a agentes políticos municipais, tais como vereadores, prefeitos e ex-prefeitos, como no caso ora apresentado. Vejamos: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APLICABILIDADE DA LEI DE IMPROBIDADE A AGENTES POLÍTICOS. OMISSÃO. EXISTÊNCIA. 1. O acórdão embargado analisou tão somente a suposta violação do art. 535 do CPC, não se pronunciando sobre a aplicabilidade da Lei de Improbidade Administrativa a agentes políticos. 2. As Turmas da Primeira Seção do STJ firmaram entendimento no sentido da aplicabilidade da Lei 8.429/1992 aos agentes políticos. 3. Embargos de Declaração parcialmente providos, sem efeito modificativo. (EDcl no AgRg nos EDcl no AREsp 7.020/MS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2011, DJe 24/02/2012) grifei ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. PUBLICIDADE. PROMOÇÃO PESSOAL. LEI DE IMPROBIDADE. PREFEITO. APLICABILIDADE. DECRETO-LEI Nº 201/67. INCIDÊNCIA CONCOMITANTE COM A LEI Nº 8.429/92. REVISÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92) aplica-se a prefeito, máxime porque a Lei de Crimes de Responsabilidade (1.070/50) somente abrange as autoridades elencadas no seu art. 2º, quais sejam: o Presidente da República, os Ministros de Estado, os Ministros do Supremo Tribunal Federal e o Procurador Geral da República. Precedentes. 2. O Tribunal de origem, com fundamento nas provas colhidas, concluiu que as campanhas publicitárias realizadas pelo agravante foram "destinadas à promoção pessoal" (fl. 587). Alterar esse entendimento esbarra na Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 6.693/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/09/2011, DJe 27/09/2011) - grifei Mais que isso, especificamente o que se rebate na tese do primeiro demandado, no julgamento da Reclamação nº 2.138 do STF, restou afirmada a competência ordinária para processamento da respectiva ação, ao se consignar que caso “a competência para processar e julgar a ação de improbidade (CF, art. 37, § 4º) pudesse abranger também atos praticados pelos agentes políticos, submetidos a regime de responsabilidade especial, ter-se-ia uma interpretação ab-rogante do disposto no art. 102, I, "c", da Constituição” e que apenas os “Ministros de

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


Estado, por estarem regidos por normas especiais de responsabilidade (CF, art. 102, I, "c"; Lei n° 1.079/1950), não se submetem ao modelo de competência previsto no regime comum da Lei de Improbidade Administrativa (Lei n° 8.429/1992).” Diante de tais argumentos, não merece acolhida a pretensa tese de inaplicabilidade da LIA aos políticos, mantendo-se a competência deste Juízo para a análise e julgamento da presente lide. 2.2. Litisconsórcio Passivo – Inclusão da Editora Globo no polo passivo do presente feito. Da narrativa da inicial constata-se que os atos apontados como ímprobos não refletem na nulidade da aquisição realizada entra a Administração Pública e a Editora Globo. Com efeito, desnecessária a formação de litisconsórcio passivo necessário entre os demandados e a empresa que recebeu os valores trazidos na nota de empenho nº 16273/2009, na medida em que o escopo da presente ação civil pública é a responsabilização daqueles que praticaram condutas contrárias aos princípios da moralidade administrativa, não assim a quem efetivamente cumpriu com contraprestação pelo valor recebido. Ora, pelas provas carreadas aos autos, somente aos corréus imputou-se conduta ímproba, como a seguir se verificará. Não é direcionada à referida empresa qualquer responsabilidade quanto às irregularidades apontadas pela inicial, assim, não há que se falar em ocorrência de litisconsórcio passivo necessário, nos termos do art. 114, do Novo Código de Processo Civil, ou mesmo da legislação revogada (artigo 46 e seguintes). Ademais, repita-se, bem assim, pelo que se demonstrará do transcorrer da presente decisão, apenas e tão somente, caso demonstrado o efetivo prejuízo aos cofres públicos municipais, é que se justificaria a inclusão da empresa citada no polo passivo da lide, para, em assim sendo, ser o mesmo por ela, em conjunto com os demais réus, ressarcido. Diante tal fato, resta afastada a presente preliminar. 2.3. Mérito. O Ministério Público do Estado do Paraná pretende, com a presente ação civil pública, a condenação dos demandados, que à época dos fatos ocupavam, respectivamente, cargo de Prefeito Municipal e de Secretária de Educação do Município de Maringá, especificamente no exercício de 2009 e 2010, pela prática de atos de improbidade administrativa previstos no art. 10 e art. 11, da Lei nº 8.429/92, relativos à compra de material escolar (livros literários) para as escolas municipais sem prévio procedimento licitatório e em desacordo com o previsto no art. 37, XXI da Constituição Federal, e no art. 2º da Lei 8.666/93, o que violou princípios norteadores da administração pública (moralidade, legalidade, impessoalidade). A aquisição do material em questão, pelo montante global de R$280.884,56, sem o devido processo licitatório, está satisfatoriamente demonstrada, ausente, inclusive, controvérsia neste

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


ponto. Os demandados não negam as compras realizadas, apenas referem que não agiram com dolo, tampouco, com intenção de causar dano ao erário, tanto que promoveram o processo de inexigibilidade de licitação nº42.596/2006. Inicialmente, convém destacar que o termo improbidade: "do latim 'improbitas' (má qualidade, imoralidade, malicia), juridicamente, liga-se ao sentido de desonestidade, má-fama, incorreção, má conduta, má índole, mau caráter. (...). E ímprobo é o mau moralmente, é incorreto, o transgressor das regras da lei e da moral"[1]. Leciona o doutrinador Marçal Justen Filho[2]o seguinte: "(...) a improbidade administrativa consiste na conduta econômica eticamente reprovável praticada pelo agente estatal, consistente no exercício indevido de competências administrativas que acarrete prejuízo aos cofres públicos, com a frustração de valores constitucionais fundamentais, visando ou não a obtenção de vantagem pecuniária indevida para si ou para outrem, que sujeita o agente a punição complexa e unitária, de natureza penal, administrativa e civil, tal como definido em lei". Aliás, como obtempera Waldo Fazzio Júnior[3]: "atentar contra princípios jurídicos é mais grave do que violar regras; significa agredir todo o sistema. Justamente por isso, o texto do art. 4° da LIA, ao exigir que os agentes públicos cumpram e façam cumprir os princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, repercute o disposto no art. 37, caput, da Constituição Federal”. No presente feito imputa-se aos agentes a prática de ato de improbidade administrativa por terem transgredido, de forma dolosa e em total desrespeito à administração pública, as normas insertas nos artigos 10, caput, inciso VIII, e 11, caput, da Lei n° 8.429/92. A Constituição da República, em seu art. 37, caput, elenca os princípios que regem a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados e dos Municípios, sendo eles o da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência. Mais adiante, no § 4.° do mesmo dispositivo, o Constituinte proclama que os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação prevista em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. Este preceito não se aplica por si só, eis que para sua completa eficácia, atualmente, a Lei 8.429/92 cumpre essa função integrativa. Embora não haja um só conceito, improbidade significa falta de probidade, de honestidade ou de honradez. Pode ser traduzido em ato comissivo ou omissivo que desvelam a violação de princípios constitucionais da Administração Pública, com mais ênfase ao da legalidade e

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


moralidade, tendo em conta que se espera dos agentes públicos justamente o contrário, ou seja, a probidade e a observância de princípios éticos de boa-fé, retidão e lealdade. Como visto, a Lei 8.429/92 cumpre o mandamento constitucional, disciplinando os atos de improbidade administrativa com as respectivas sanções para seus responsáveis. A partir dela é que se busca a tipicidade legal para apuração da responsabilidade aqui denunciada. Os dispositivos invocados pelo Ministério Público na exordial seguem transcritos: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente; Art. 11.Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: A imputação ventilada na inicial diz respeito à violação de princípios da Administração Pública relacionados à legalidade e consiste na apuração de irregularidade na contratação com inexigibilidade de licitação, sem observar os respectivos dispositivos legais, com respectivo dano ao Erário. Questiona-se aqui a subsunção da conduta dos réus àquelas previstas nos artigos 10 e 11 da Lei de Improbidade Administrativa. Para tanto, cumpre tecer algumas considerações acerca do elemento subjetivo dos tipos que se pretende aplicar ao caso concreto. Nos termos da jurisprudência do STJ, já pacificada, a fim de que seja reconhecida a tipificação da conduta dos réus como subsumidas nas previsões da Lei de Improbidade Administrativa, faz-se necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9º e 11º e, ao menos, pela culpa nas hipóteses do artigo 10. Como bem delineia a doutrina[4], os ilícitos previstos nos arts. 9º e 11 não admitem culpa em razão de dois fatores. De acordo com o primeiro, a reprovabilidade da conduta somente pode ser imputada ‘aquele que praticou voluntariamente, almejando o resultado lesivo, enquanto que a punição do descuido ou da falta de atenção pressupõe expressa previsão legal, o que se encontra ausente na hipótese.

O Min. Teori Albino Zavascki, em julgamento realizado em 2011, junto ao STJ, proferiu voto nesse sentido, tendo tratado a questão com bastante clareza na própria ementa, razão pela qual transcrevo-a:

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


AÇÃO DE IMPROBIDADE ORIGINÁRIA CONTRA MEMBROS DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO. LEI 8.429/92. LEGITIMIDADE DO REGIME SANCIONATÓRIO. EDIÇÃO DE PORTARIA COM CONTEÚDO CORRECIONAL NÃO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. AUSÊNCIA DO ELEMENTO SUBJETIVO DA CONDUTA. INEXISTÊNCIA DE IMPROBIDADE. (...) 2. Não se pode confundir improbidade com simples ilegalidade. A improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente. Por isso mesmo, a jurisprudência do STJ considera indispensável, para a caracterização de improbidade, que a conduta do agente seja dolosa, para a tipificação das condutas descritas nos artigos 9º e 11 da Lei 8.429/92, ou pelo menos eivada de culpa grave, nas do artigo 10. (...) 4. Ação de improbidade rejeitada (art. 17, § 8º, da Lei 8.429/92). (AIA 30/AM, Corte Especial, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, Dje 28/9/11) – destaquei.

Especificamente quanto aos atos descritos no art. 11 da Lei 8.429/92, tem-se que dependem da presença de dolo, contudo dispensam demonstração de ocorrência de dano para a administração pública ou enriquecimento ilícito do agente. Sobre o tema, veja-se também recentes julgados do Superior Tribunal de Justiça:

ADMINSTRATIVO. IMPROBIDAE. CONTRATÇÃO SEM CONCURSO PÚBLICO. ELMENTO SUBJETIVO. DOLO GENÉRICO. REVISÃO DE PROVA. INVIABILDAE. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. A caracterização dos atos de improbidade previsto no art. 1 da Lei 8.429/2 está a depender da existência dolo genérico na conduta do agente. Precedentes. 2. A contratação irregular sem a realização de concurso público pode se caracterizar com ato de improbidade administrativa, mas, par tano, é imprescindível a demonstração de dolo, ao menos genérico, do agente .3. Par desconstituir a decisão do Tribunal de origem e acatar os argumentos do agravante seria necessário adentra no contexto fático-probatório, que não se mostra cabível no âmbito do recurso especial. 4. Agravo regimental não provido. (AgR no REsp 1274682/PB, Rel. Minstro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 6/12012, DJe 4/2013.) – Destaquei. PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ATO ÍMPROBO. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO NÃO CARACTERIZADO. PRECEDENTES. 1.Cinge-se a controvérsia dos autos a saber se a compra de uma unidade móvel de saúde tipo

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


médico/odontológica, em vez de ambulância simples, conforme convênio assinado pelo Município de Ouricuri e a União, e a prestação de contas com atraso, caracteriza improbidade administrativa. 2. As considerações feitas pelo Tribunal de origem afastam a prática do ato de improbidade administrativa por violação de princípios da administração pública, uma vez que não foi constatado o elemento subjetivo do dolo na conduta do agente, mesmo na modalidade genérica, o que não permite o reconhecimento de ato de improbidade previsto no art. 11 da Lei 8.429/92. 3. O Tribunal a quo decidiu de acordo com a jurisprudência desta Corte, no sentido de que "a caracterização do ato de improbidade por ofensa a princípios da administração pública exige a demonstração do dolo lato sensu ou genérico" (EREsp 772.241/MG, Rel. Min. Castro Meira, Primeira Seção, DJe 6/9/2011). Outros precedentes: AgRg nos EREsp 1.260.963/PR, Rel. Min. Humberto Martins, Primeira Seção, Dje 3/10/2012; e AgRg nos EAREsp 62.000/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 18/9/2012. Incidência da Súmula 83/STJ. Agravo regimental improvido.(AgRg no AREsp 526.507/PE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/08/2014, DJe 19/08/2014) – destaquei.

Dito isso, conclui-se que apenas nas hipóteses elencadas no artigo 10 daquela lei é que se admite punição do agente a título de culpa, já que o respectivo caput se reporta à ação ou omissão, dolosa ou culposa. O elemento subjetivo atinente ao dolo, no caso dos autos, estaria vinculado pela manifesta vontade do agente em realizar a conduta contrária ao princípio da legalidade e demais princípio que regem a Administração Pública, que aqui, especificamente, seriam os deveres de legalidade, lealdade às instituições, moralidade e impessoalidade. Pois bem. 2.3.1. Lesão ao Erário - Art. 10, inciso VIII da Lei 8.429/1992. Cumpre destacar, neste ponto, que não há controvérsia quanto aos fatos descritos na inicial pelo Ministério Público, de modo que a parte demandanda não se opôs à existência de contratação da Editora Globo com inexigibilidade de licitação. Conquanto seja suficiente a culpa para a tipificação da conduta descrita no dispositivo legal invocado, não se abre mão da prova de prejuízo ao erário, o que, in casu, não restou efetivamente demonstrado nos autos. Os demandados contrataram a compra de diversos exemplares de livros da literatura nacional,

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


conforme contido nos autos. Contudo, como também se observa do feito, não se apontou diferença entre o valor orçado em 2009 e aquele efetivamente pago em 2010, tampouco que a média de mercado fosse exageradamente inferior ao valor contratado. Não se está a afirmar a inexistência de variação de valores dos títulos adquiridos e daqueles disponíveis no mercado, mesmo porque o valor pago pelos Réus era e é tido como dinheiro público, que não admite, como se sabe, qualquer ato discricionário para seu gasto sem a devida e mais restrita observância legal. Contudo, impossível concluir que houve prejuízo de ordem material substancial. Explica-se tal posicionamento em virtude do que já fora dito acima, ou seja, de que se exige perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens. Como se observa dos autos, tem-se que, efetivamente, não se pode comprovar a existência material de prejuízo ao erário, eis que consta no documento de fls. 180/181 do evento 1.10 a informação de que a Editora Globo S.A. entregou todos os exemplares dentro do prazo inicialmente contratado, ou seja, em 01 de dezembro de 2009, mesmo sem a respectiva contraprestação pelo Município, o que só se efetivou meses depois, após frustrado o pregão posteriormente realizado, com a mesma nota de empenho, e por consequência, pelo mesmo valor da nota de empenho expedida anteriormente. Não se está aqui afirmando que não existiu algum prejuízo aos cofres públicos municipais. O que se está deixando bastante claro é que tal prejuízo, acaso existente, não restou demonstrado, comprovado pela parte Autora, a quem incumbia tal mister. Por conseguinte, ausente a comprovação quanto à efetiva lesão ao erário, incabível imputar aos demandados a prática da improbidade prevista no art. 10, inciso VIII, da LIA. 2.3.2. Lesão aos Princípios da Administração Pública - Art. 11, caput, da Lei 8.429/1992. Conforme decidido pela Segunda Turma do STJ (REsp 765.212/AC), o elemento subjetivo necessário à configuração de improbidade administrativa censurada pelo art. 11 da Lei 8.429/1992 é o dolo eventual ou genérico de realizar conduta que atente contra os princípios da Administração Pública, não se exigindo a presença de intenção específica. (REsp n.1.156.209/SP, rel. Min. Hermann Benjamin, 2ª Turma, DJe de 27.04.2011). A conjuntura dos fatos narrados e dos documentos apresentados pelas partes denotam deficiência estrutural dos mecanismos internos de controle da administração pública e carência de planejamento administrativo, diante da urgência na aquisição dos livros para o ano letivo que se iniciou sem o referido material, sendo que tais condutas resultam não apenas em má-gestão da coisa pública, mas também em ato de improbidade administrativa. Inegavelmente, a conduta dos demandados caracterizou o tipo do artigo 11 da LIA. O dolo demonstrado na espécie é genérico, suficiente, portanto, a vontade de realizar a conduta que

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


atenta contra os princípios da Administração Pública. Vale registrar, neste ponto, que os demandados não se opuseram ao fato de que iniciaram um processo de inexigibilidade de licitação, expediram nota de empenho para a compra do material, receberam o material e, antes de finalizar o procedimento, abriram novo procedimento de licitação na modalidade de pregão e que, em virtude do insucesso na entrega dos livros adquiridos pela empresa vencedora antes do início do ano letivo, deram continuidade ao primeiro procedimento de inexigibilidade de licitação, com o pagamento dos livros anteriormente recebidos. E não é só, eis que a sequência dada ao procedimento de inexigibilidade de licitação, com o pagamento dos livros já recebidos pela Editora Globo, ocorreu mesmo com orientação contrária emitida pelo Secretário Municipal de Controle Interno, consoante se infere as fls. 215 do evento 1.12 dos autos eletrônicos. É no mínimo contraditória – e ilegal - a justificativa de inexigibilidade apresentada para a contratação direta tal qual realizada. Ora, ou a Administração Pública estava convicta de suas razões para afastar procedimento licitatório ou, pairando dúvidas, deveria se cercar de todas as cautelas e certezas possíveis para, só então, contratar com o particular através do competente procedimento licitatório, eis que esta é a regra e aquela a exceção. Não é demais mencionar que a inexigibilidade em questão só se perfectibilizaria, na forma do art. 25, inciso I, da Lei 8.666/93, se houvesse absoluta certeza quanto à exclusividade do representante comercial escolhido, o que não lograram provar no feito. Em vez disso, deixaram clara a hesitação quanto ao modus operandi quando da abertura de novo certame licitatório, na modalidade de pregão, pelo que resta absolutamente demonstrado que os Réus sabiam que deveriam ter iniciado todo o procedimento de aquisição de livros escolares através do competente e devido procedimento licitatório, que, repita-se, é a regra constitucional que baliza todos os administradores públicos do país. Dentro desse contexto, tem-se que as irregularidades não se limitaram à forma de com todo o processo de aquisição dos livros escolares foi realizado, qual seja, amadora e sem qualquer respeito às suas normas regentes, mas, ainda, tem-se que tais irregularidades, sem qualquer sombra de dúvida, demonstrou a má-fé dos Réus, além de seu despreparo na gestão da coisa pública. Tais condutas não podem passar desapercebidas num controle acurado da legalidade e demais princípios que regem a administração pública, nem afastam a configuração da improbidade. O ato ímprobo em questão foi praticado mediante conduta dolosa, na medida em que os demandados agiram com total consciência de que violavam a legalidade administrativa. O princípio da legalidade, previsto no artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, aplica-se à Administração Púbica em geral, porém de forma mais rigorosa em casos como o ora analisado,

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


pois o administrador somente poderá fazer o que estiver expressamente autorizado em lei, inexistindo, pois, incidência de sua vontade subjetiva. Na administração pública só é permitido fazer o que a lei autoriza, diferentemente da esfera particular, onde será permitido a realização de tudo o que a lei não proíba.[5] No caso dos autos, infringiram os demandados o princípio da legalidade quando deixaram de realizar procedimento licitatório para a contratação de empresa para aquisição de livros escolares, pois não configurada a hipótese que autorizasse a inexigibilidade de licitação, prevista na Lei 8666/93. Aqui, uma vez mais cabe deixar bastante claro que os próprios Réus reconhecem tal premissa, pois, como visto, suas condutas são totalmente contraditórias, incompatíveis entre si, eis que, como poderiam iniciar um procedimento de inexigibilidade de licitação, para logo em seguida, o abandonar, justamente porque restou demonstrada a efetiva possibilidade de realização de licitação no caso concreto? Ora, ou era o caso de inexigibilidade de licitação, ou então, sua realização era obrigatória, como o é de regra, não podendo, por dedução lógica, um mesmo procedimento ser ao mesmo tempo passível de inexigibilidade de licitação e passível de disputa entre licitantes! Observe-se que a própria Administração exarou parecer orientando os Réus de que, como havia a possibilidade de licitação, indevida seria a continuidade do procedimento de inexigibilidade anteriormente realizada, justamente pela incompatibilidade entre ambas. Violaram também o princípio da impessoalidade, ao contratar empresa sem a realização de licitação, impedindo a concorrência, sem preservar o interesse público. Ainda, houve ofensa ao princípio da moralidade, pois não basta ao administrador a observância da estrita legalidade, devendo ele, no exercício de sua função pública, pautar-se por critérios éticos de razoabilidade. A inexigibilidade da licitação, fora dos casos expressos em lei, bem como a maneira como deram continuidade a um procedimento com expressa orientação de não fazê-lo, contraria qualquer padrão de probidade ou honestidade, aos bons costumes e às regras de boa administração. Além disso, a própria justificativa de que a pressa na aquisição do material se deu em virtude do ano letivo que já havia começado, contraria as normas do comportamento e zelo com aquilo que é público, especialmente no que tange à ao princípio da eficiência, eis que deveriam ter previsto que o ano letivo estava para começar, iniciando procedimento licitatório em tempo razoável para a aquisição dos livros escolares e não deixarem para o último momento, justamente, para tentar justificar uma inexigibilidade de licitação. A confusão gerada na ocasião, seja pela falta de organização da administração pública que deveria ter se programado melhor para o início das atividades escolares, seja pelo risco assumido com a escolha (equivocada) do procedimento adotado para aquisição dos livros em questão,

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


retardou visivelmente a distribuição dos exemplares para a rede pública de ensino e prejudicou todos os que dela se utilizam. Convém aqui reproduzir as lições de Maria Sylvia Zanella di Pietro acerca do tema: “Não é preciso penetrar na intenção do agente, porque do próprio objeto resulta a imoralidade. Isto ocorre quando o conteúdo de determinado ato contrariar o senso comum de honestidade, retidão, equilíbrio, justiça, respeito à dignidade do ser humano, à boa-fé, ao trabalho, à ética das instituições. A moralidade exige proporcionalidade entre os meios e os fins a atingir, entre os sacrifícios impostos à coletividade e os benefícios por ela auferidos; entre as vantagens usufruídas pelas autoridades públicas e os encargos impostos à maioria dos cidadãos. (...) Não é preciso, para invalidar despesas deste tipo, entrar na difícil análise dos fins que inspiraram a autoridade; o ato em si, o seu objeto, seu conteúdo, contraria a ética da instituição, afronta a norma de conduta aceita como legítima pela coletividade administrada... ”[6] Portanto, plenamente configurada a violação aos princípios da administração pública na conduta dolosas dos demandados, razão pela qual devem ser punidos com as sanções previstas para o caso de improbidade. 2.3.3. Das Penas Aplicáveis. Em virtude dos próprios cargos exercidos, inegável que os demandados possuíam conhecimento acerca de seus deveres e obrigações, relativamente aos atos por eles praticados, o que por si só configura a conduta dolosa, não podendo presumir, in casu, o desconhecimento. Amplamente demonstradas as irregularidades cometidas pelos gestores em questão, a caracterizar a improbidade dos atos por eles praticados, baseada na violação dolosa dos princípios norteadores da Administração Pública, com acima demonstrado. Assim, aplicáveis à espécie as sanções atinentes à prática ilegal dos atos constatados, previstas no artigo 12, inciso III, da Lei nº 8.429/92, in verbis: Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: (Redação dada pela Lei nº 12.120, de 2009). (...) III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente. Quanto à Silvio Magalhães de Barros II, sua responsabilidade exsurge a partir do momento em que ratificou o ato de inexigibilidade de licitação; assinou a nota de empenho nº 16273/2009 e autorizou seu pagamento, atestando a regularidade do processo de inexigibilidade de licitação, sem fiscalizar o procedimento enquanto gestor do patrimônio público municipal e dos interesses públicos. Aqui, cabe destacar que os próprios réus reconheceram que era indevida a inexigibilidade da licitação, eis que, na sequência, reconheceram que sua realização era cabível, tanto é assim que tal procedimento foi realizado, cujo fato demonstra a gravidade da infração perpetrada. Desse modo, plausível a aplicação de multa civil, no equivalente a 20 (vinte) salários vigentes à época do pagamento da nota de empenho (2010); a proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos; e, ainda, a suspensão dos direitos políticos por três anos. Em relação à Marcia do Rocio Bittencourt Socreppa, sua conduta teve a mesma gravidade do réu acima apenado, pelo que, inexoravelmente, deve receber a mesma reprimenda, qual seja, multa civil, no equivalente a 20 (vinte) salários vigente à época do pagamento da nota de empenho (2010); a proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária, pelo prazo de três anos; e, ainda, a suspensão dos direitos políticos por três anos. Cumpre ressaltar, ainda, que em razão da não comprovação de dano ao patrimônio público e da efetiva entrega dos livros adquiridos pelo preço inicialmente ofertado, sem atualização, tem-se como atenuada a gravidade dos atos praticados, motivo pelo qual as sanções adequaram-se ao mínimo legal, ressalvada a multa civil, diante de seu caráter pedagógico, além dos fatos já sopesados e descritos quando de sua fixação. 3. DISPOSITIVO Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES as pretensões formuladas pelo Ministério Público do Estado do Paraná na inicial, por entender que houve violação aos princípios da Administração Pública, conforme expresso no art. 11, caput da Lei 8.429/92 e, em razão disso, condeno os demandados SILVIO MAGALHÃES BARROS II e de MARCIA DO ROCIO BITTENCOURT SOCREPPA, nos termos do art. 12, inciso III, daquele diploma legal, às sanções descritas no item “2.3.3” da fundamentação retro, extinguindo o feito com seu julgamento de mérito.

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


Custas, pro rata, pelos réus. Sem honorários, por se tratar de legitimação conferida ao Ministério Público, sendo vedado aos seus membros receber honorários ou custas de qualquer espécie (art. 128, §5º, II, a, da Constituição Federal). Com a inclusão da presente sentença no sistema, dou-a por publicada. Registro conforme item 2.20.1.4, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná. Intimem-se. Oportunamente, arquive-se.

[1] GARCIA, Emerson e ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 1ª ed. Rio de

Janeiro: Lúmen Júris, 2002. p. 76 e 77 [2]JUSTEN FILHO, Marçal, Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 686 [3] FAZZIO Júnior, Waldo. Improbidade Administrativa e Crimes de Prefeitos. Atlas, 2003, pág. 173 [4] GARCIA, Émerson e Rogério Pacheco Alves. Improbidade Administrativa. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2 ed., 2008, p. 298. [5]MORAES, Alexandre de. Curso de Direito Constitucional.10.ed. São Paulo: 2002, p. 311. [6]DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionaiedade administrativa na Constituição de 1988. São

Paulo: 1998, p.119.

Maringá, 04 de Abril de 2016.

Nicola Frascati Junior Juiz de Direito

Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJXMU KPQXB HQ9QH BNY8A

PROJUDI - Processo: 0029409-03.2010.8.16.0017 - Ref. mov. 68.1 - Assinado digitalmente por Nicola Frascati Junior:10612, 04/04/2016: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: Sentença


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.