ANO 3 N.8 - EDIÇÃO DE CHANUKÁ 5781 - DEZEMBRO 2020

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Sefarad Universo

ANO 3 N.8 - EDIÇÃO DE CHANUKÁ 5781 - DEZEMBRO 2020

Shaar Hashamaim:

ANOS DE UMA FÉ 80 INABALÁVEL 1


CATÁLOGO EDITORIAL

2021

Apresentamos ao público leitor e livreiro, o Catálogo Editorial da Talu Cultural para o ano de 2021. Nele encontrarão as publicações de nossos 5 selos editoriais: Talu Cultural Postagens Sagazes Amazônia Judaica Universo Sefarad E a nossa nova”menina dos olhos”, o selo CriosLivros por Demanda


A Talu Cultural e o IBI - Instituto Brasil Israel, lançarão no Brasil, em Israel e em Portugal, No 1º. semestre de 2021”, o novo livro do mais premiado correspondente internacional para o Oriente Médio da atualidade.

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Diretor/Editor Executivo Elias Salgado Editora Executiva Regina Igel Diretor de Arte e Design Eddy Zlotnitzki Correspondente Internacional Henrique Cymerman Benarroch Literatura Cristina Konder Conselho Editorial HOMENAGEM ESPECIAL: Prof. Samuel Isaac Benchimol z”l Andre de Lemos Freixo Fernando Lattman-Weltman Heliete Vaitsman Henrique Cymerman Benarroch Ilana Feldman Isaac Dahan Jeffrey Lesser Michel Gherman Monica Grin Monique Sochaczewski Goldfeld Regina Igel Renato Athias Wagner Bentes Lins Editor Elias Salgado Projeto gráfico e arte diagramação Eddy Zlotnitzki Revisão Regina Igel Colaboram neste número Anne Benzecry Benchimol Mônica Grin Esther de Goldberg Paloma Díaz-Mas Isaac Dahan Incluí o Suplemento Amazônia Judaica

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EDITORIAL

Regina Igel, Editora Executiva

Nesta edição, vamos encontrar uma história (ainda que muito breve), sobre judeus que, para defenderem sua fé, tiveram que se comportar como espiões contra os portugueses, a favor dos holandeses. Tal narrativa vem dos tempos em que Pernambuco fez parte do reino dos flamengos, quando os judeus se sentiram livres para prosseguir com seus rituais religiosos, no território conquistado por Nassau, o conde holandês. Como estivessem sob proteção holandesa, os judeus se sentiram a salvo dos portugueses inquisidores, seus calabouços e suas fogueiras. No entanto, os lusitanos chegaram ao nordeste... e foi quando os judeus não hesitaram em se tornar espiões a favor dos seus protetores. É possível que cada um de nós faria o mesmo, se fosse para proteger quem nos protegeu. Leiam o artigo “Soldados judeus sefarditas’, para se informarem um pouco mais sobre essa guerra que terminou com a liberdade de culto, que não fosse católico, na colônia portuguesa. E os judeus durante o Holocausto? Não só liberdade de culto lhes foi proibida, mas liberdade de serem vistos e percebidos como seres humanos. Os nazistas retiraram seus nomes e lhes deram números gravados nos seus braços esquerdos, antes de lhes trazerem miséria, torturas, assassinatos e covas coletivas... Assim foi por toda a Europa, mas pouco se sabe sobre os sacrificados entre os judeus portugueses. O ensaio de Paulo Valadares nesta edição, intitulado “Os Ribeiros de Penamacor: Parentela ‘portuguesa’ assassinada na Shoah”, recorda o que aconteceu aos judeus de Portugal na fatal Aktie Portuguesia, que consta de seu artigo elucidativo sobre o Holocausto na Península Ibérica. Daquele passado sombrio em terras lusitanas, entramos no presente, agora iluminado pela sigla MAR, significando Museu de Arte do Rio. O jogo de palavras, MAR e “mar” o caminho percorrido pelos nossos antepassados, converge para ‘Judaica no MAR’, exposição permanente da nossa presença no estaqueamento da sociedade brasileira. Leiam o artigo “Um convite para navegar”, de Eliane Piczol, coordenadora da parte judaica, que nos orienta quanto ao seu acervo que está, desde 2019, informando e instruindo seus visitantes (naquele ano, o Museu recebeu meio milhão de pessoas). Vamos aceitar o convite e navegar pelo ensaio? Claro que sim! E ainda há mais um museu para visitar, ainda no Rio, assim que for possível. Tratase do Museu Judaico do Rio de Janeiro, fundado por três famílias em 1977, segundo Márcio A. Sukman, seu diretor e autor do ensaio que descreve sua história e parte de seu acervo, nesta edição. Leiam o artigo para saberem mais do que se pode resumir nesta apresentação. Sua história e seu conteúdo não são nada menos do que empolgantes! Saindo do Rio, vamos ler a descrição do Museu Judaico de São Paulo, por Adriana Bialski, voluntária e profunda conhecedora da história do Museu, instalado nas nobres dependências de antigo Templo, hoje adaptado às exigências de um museu moderno e prático, com paredes de vidro, cúpulas que lembram solidéus, com um acervo invejável! Há um razoável número de museus dedicados à memória judaica no Brasil e, por enquanto, apresentamos três deles aos nossos leitores, dois no Rio de Janeiro e um em São Paulo, acima indicados. Mas também há um ‘museu’ de papel, como a obra literária impressa, do sefardita chileno Hernán Rodríguez Fisse, cujo romance Sefardíes en el exilio é resenhado por Regina Igel, para o Universo Sefarad. Assim, alcançamos comunidades sefarditas na América do Sul, em espanhol (a resenha está em português). Outros escritores serão apresentados em futuras edições. Nossa edição de agora convida para a Festa das Luzes, a Chanukáh (leia-se Ranucá), celebrando o extraordinário ‘feito’ de uma lamparina descoberta nos escombros do Templo dizimado pelos romanos. A candeia continha óleo para um só dia mas, milagrosamente, iluminou o recinto e os heroicos judeus por oito dias e noites, que se livraram das ruínas e festejaram a reconstrução da casa de orações! Por isto, acendemos oito velinhas, uma por noite, na Festa das Luzes que, neste ano 2020, é celebrada entre os dias 10 e 18 de dezembro. Acreditemos e esperemos que elas iluminem o Novo Ano 2021! Assim seja!


ÍNDICE

34

SHAAR HASHAMAIM: 80 anos de fé

06

MEMÓRIA Uma parentela portuguesa na Shoah

14

HISTÓRIA Sefarditas e ashkenazitas no Pernambuco Holandês

16

DOSSIÊ: ACERVOS: JUDAICA Judeus em 3 museus brasileiros

40

ZEJÚT ABOT Festival em Haquitia

30

NOSSO LEITOR

31

SUPLEMENTO ESPECIAL 80 ANOS DA SHAAR HASHAMAIM

44

CRÔNICA Um Shabat Em Haquitia

28

RESENHA: Hernán Rodríguez Fisse. Sefardíes en el exilio

43

PÁGINA OURO

49

FUTURO: 2021: Um ano de novidades no Amazônia Judaica

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MEMÓRIA

OS RIBEIROS DE PENAMACOR:

PARENTELA “PORTUGUESA” ASSASSINADA NO SHOAH Para minha irmã Sara Ribeiro.

Paulo Valadares*

O genocídio dos judeus na Europa, cometido pelos nazistas alemães na primeira metade do século XX, conhecido na história judaica como “Shoah” (Holocausto), deixou seis milhões de mortos num universo de nove milhões que viviam no Continente

Por razões geográficas, não se percebe que ele tenha atingido também os sefarditas (judeus de origem ibérica) que, naquele momento, concentravam-se no Oriente. Mas pequenos grupos deles viviam na América e também na Europa, sendo igualmente atingidos pela catástrofe. Liliana Picciotto Fargion (1947-) tem um trabalho pioneiro sobre o tema (1991): Il libro della memoria. Gli Ebrei deportati dall’Italia (1943-1945), onde relaciona os judeus italianos vítimas do Shoah, a maioria deles de origem espanhola e portuguesa. Em abril de 1998, conheci o historiador russo Rashid Muradovich Kaplanov (1949-2007), especialista em Ribeiro Sanches, que fez algumas palestras em São 6 | USf | ANO 3 - Nº8 | CHANUKÁ 2020

Paulo e chamou minha atenção para a difusão dos Ribeiros de Penamacor pelo mundo, nosso ramo paterno. Isto estimulou-me a juntar processos inquisitoriais, literatura sobre eles e, a partir disto, escrevi um ensaio genealógico que mostra a sua dispersão geográfica, gerando desde rústicos fazendeiros no sertão brasileiro, como o nosso avô paterno Joaquim Ribeiro (1896-1971) em Campos (hoje Tobias Barreto), Sergipe, a requintados baronetes ingleses (do 8º ao 11º baronetes de Beaumont of Stoughton Grange). Como a parentela espalhou-se pela diáspora sefardita eles vivem no Reino Unido, nos EUA e na Holanda.


Fiquei curioso se algum parente sofrera o Shoah. Como os alemães não atravessaram o Atlântico e nem chegaram aos EUA, só nos restou rastrear a Holanda em procura destes Ribeiros, tanto pelo ramo masculino quanto feminino, já com o nome da nova varonia. Este artigo contém os quatro “ícones do holocausto», elencados pelo historiador Oren Baruch Stier: 1) Anne Frank; 2) os trens que conduziam as vítimas para o extermínio; 3) a inscrição no portão de Auschwitz: Arbeit Macht Frei (O trabalho liberta) e 4) seis milhões de vítimas. Não é um trabalho sobre o Holocausto no seu todo, é apenas a história das vítimas de uma parentela portuguesa que sobrevivera às fogueiras da Inquisição: os Ribeiros de Penamacor e arredores da Cova da Beira.

OS RIBEIROS DE PENAMACOR São descendentes de judeus convertidos no séc. XV em Portugal. Muitos deles se dedicaram à saúde, como boticários, cirurgiões e médicos, por séculos. Produziram uma figura extraordinária como o Dr. Ribeiro Sanches (1699-1783), médico na França e na Rússia, de conhecimento enciclopédico. Enfrentaram a Inquisição com algum sucesso - sei apenas de um queimado ou garroteado: o boticário João Henriques (1720-1742), natural de S. Vicente da Beira e preso no Brasil (Inquisição de Lisboa, Processo nº 8378). O restante “deu no pé”. A experiência inquisitorial fê-los migrar para lugares mais tolerantes, como a Inglaterra e dali para a América e Holanda. A saída para a Inglaterra foi por conta-gotas. Lá, eles buscavam a comunidade judaica agregada na sinagoga de Bevis Marks, em Londres. Eram pobres, mas tinham algum conhecimento religioso: uma senhora da família fazia pão ázimo para vender na comunidade (Ribca Nunes Sanches), Isaac de Paiba (Rodrigo Carrião de Paiva?) e o filho Abraham de Paiba foram mohelim (circuncisadores) em Londres entre 1715 e 1775. A filha de Isaac, Ribca, foi casada com o Rabino Isaac de David Nieto (1702-1774). O ramo mais visível surgiu de uma dessas fugas: o Dr. Diogo Nunes Ribeiro (1668-1741), que foi médico em Lisboa; denunciado à Inquisição, fugiu com a família

para Londres. Naquela cidade, entrou num programa de recolocação de judeus pobres e migrou para Savannah, América, já com o nome de “Dr. Samuel Nunez”. A sua descendência é conhecida na literatura judaica americana como parte dos Grandees (sefarditas de alta projeção econômica, social, intelectual e também política), tal a importância social conquistada por eles: Mordecai Manuel Noah (1785-1851), considerado o judeu mais influente do seu tempo; N. Moses Taylor Phillips (1868-1955), historiador; Benjamin Nathan Cardozo (1870-1938), o segundo judeu na Suprema Corte, o Comodoro Uriah Phillips Levy (1792-1862), etc. O ramo holandês vem de vários troncos, porém o que nos interessa começou com Manoel Nunes Ribeiro, nascido em 1710, em Lisboa. Ele chegou à Holanda num grupo familiar, do qual há registro até de um neto que foi renomeado “David” e que teria nascido na mesma Lisboa (1742) e por quem prossegue a descendência. Viveu entre judeus portugueses, casando-se, rezando juntos e fazendo negócios entre eles.

O SHOAH NA HOLANDA O processo de extermínio dos judeus holandeses foi bem planejado. Em 9 de outubro de 1940, os alemães invadiram a Holanda. Enquanto o governo fugiu, eles criaram a estrutura para deportar os judeus aos locais de extermínio nos confins poloneses. Definiram quem era “judeu” - aquele que tivesse dois avós judeus. Em 10 de janeiro de 1941 registraram os judeus locais: 159.806, sendo 19.561 provindos de casamentos mistos. Os nazistas organizaram o campo de Westerbork como um hub ferroviário: servia de ponto de aprisionamento, seleção e distribuição para enviar os prisioneiros aos campos de extermínio no interior polonês, através de trens que partiam todas as terças-feiras, quando os nomes eram lidos em voz alta e embarcados para a viagem de três dias. Ele funcionou entre 1942 a 1945, foram 65 comboios para Auschwitz e 19 para Sobibor (97.776 judeus e destes, 1266 eram crianças). Para evitar rebeliões, dissimulavam o propósito com certa deferência e diziam que eles iam a trabalho. As famílias 7


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MEMÓRIA

Cattela Jessurun, o 2º (Amsterdã, 18 de julho de 1888 - Auschwitz, 11 de fevereiro de 1944), filho de David Spinosa-Cattela Jessurun e a sua prima Ester Spinosa-Cattela Jessurun, neto paterno de Abraham Spinosa-Cattela Jessurun (o 1º) e Ester Mendes da Costa; neto materno de Josua Spinosa-Cattela Jessurun e Ester de Lima. Saltando gerações, era descendente do Licenciado João Rodrigues Espinosa (*Vila Real, 1558), filho do advogado Manuel Dias Catella e Esmeralda Rodrigues. Médico, cobrador de impostos e importador de açúcar brasileiro - um de seus filhos foi preso em Salvador pelo Visitador Marcos Teixeira. João Rodrigues foi preso pela Inquisição de Coimbra em 1618 (Processo nº 1328). Abraham (o 2º) era funcionário numa empresa de seguros mas tinha, na parentela, gente como o filósofo Baruch de Spinosa (1632-1677). Era casado com Clara Rebecca (Lopes Suasso) Spier (sobrinha do Cav. Francisco Lopes Suasso, mencionado anteriormente), ambos assassinados no campo de extermínio construído para isto na Polônia. Encontrei na documentação brasileira a entrada do comerciante holandês Josua Spinosa-Cattela Jessurun (*Amsterdã, 1879), vindo da Argentina neste período conturbado, abril de 1939 e que desapareceu em Santos (estado de São Paulo), conforme a documentação policial. Era uma comunidade endógama e culturalmente semelhante. Basta ver o reflexo disto em sua onomástica: dos 100 Lopes Cardoso que sofreram nos campos de extermínio, nove se chamavam Abraham (nascidos entre 1866 e 1935), oito, Jacobs (nascidos entre 1874 e 1933) e cinco, Isaacs (nascidos entre 1884 e 1922). Como eles não usavam middle name e nome materno, só se individualizavam pela data de nascimento e fazer a genealogia destes homônimos, aparentados entre si, é difícil e muitas vezes sujeita a equívocos.

11/02/1944 – UM DIA... Todo escrito começa no silêncio do espaço pedido pelo § (parágrafo), mas não se sabe os sítios que serão visitados adiante. Escrevi sobre Westerbork lá em cima e nem imaginei chegar aqui. O confinamento 8 | USf | ANO 3 - Nº8 | CHANUKÁ 2020

dos familiares juntos permitiu aos nazistas planejar os destinos dos aprisionados a partir da utilidade para si: eliminação sumária de velhos & crianças e trabalho escravo para os aptos fisicamente. Como soube que Abraham Spinosa-Cattela Jessurun (o 2º) foi assassinado em 11 de fevereiro de 1944, na chegada a Auschwitz? Era um velho, 56 anos. Por dever do oficio procurei data da morte de sua esposa Clara, que foi na mesma data do marido. Ela tinha 50 anos. Procurei outros assassinados neste dia e encontrei o artista gráfico Samuel Jessurun de Mesquita, 76 anos, primo dos anteriores – ele não se escondera, pois acreditava que respeitariam a sua nobreza. Vejo a foto de duas menininhas (elas não são exceção): Leana, 6 anos e sua irmã, Eva Munzer, 8 anos. É a afirmação que velhos e crianças eram assassinados ao chegar ali. Se a morte é obscena, que dirá destas?

OS “RIBEIROS” Ninguém da família escreveu diários ou memórias, era gente comum que só tinha a ausência notada quando faltava ao trabalho: pedras não lapidadas, máquinas não-vendidas, recantos não varridos. As mágoas e as alegrias ficaram restritas às suas paredes. Sara Ribeira (1838-1914) foi uma dona de casa como tantas outras, daquelas que são medidas pelo sucesso da descendência, quando cria gente trabalhadora e decente. Viveu em Londres e Amsterdã. É uma vida que não serve para os romancistas, apenas para os genealogistas. Ela tinha dois irmãos, que foram identificados: David Emanuel e Michael Nunes Ribeiro. O David Emanoel casou-se com Rachel Elias de Vos e os seus descendentes vivem no Reino Unido, em Oldham, Stroud e em Whitechapel. Apesar de casar com ashkenazim de Poznan e Varsóvia, os netos se casaram entre si. Olhando além dos discretos Ribeiros: a matriarca Sara Ribeira descendia de dois personagens periféricos mas relevantes na história judaica: vinha do senhor de engenho Duarte Saraiva, conhecido também como David Senior Coronel (Amarante, 1572-Recife, 1650?), o homem mais rico de Pernambuco e a quem foi dedicado o livro “Conciliador” (1640) do Rabino


Menasseh Ben-Israel, que o liga ao último Rabino-mor de Castela. Descendia também de Antonio de Montezinos, aquele viajante pela América que defendeu, para o rabino mencionado, que a ascendência indígena vinha dos judeus. Sara casou-se com um “português” como já tinham feito os ancestrais. Tiveram filhos, dos quais identificamos dois: Rachel e Michael, ambos casados com “portugueses”. São dez descendentes da “portuguesa” Sara Ribeira (não coloquei genros e noras) distribuídos pelos campos de extermínio em Auschwitz, Sobibor e Birkenau: Isaac Querido, 56 anos; Abigail Querido, 28 anos; Rebeca Sofia Salzedo, menos de um ano; Juliette Sluijs, 5 anos; Rebecca Acoen, 34 anos; Ana Querido, 48 anos; Sonja Ray Blom von Amerogen, 21 anos; Clara Sippora Blom, menos de um ano; Isaac de Valença, 47 anos e Rebeca de Valencia, 43 anos. Das crianças, salvou-se apenas Rose Querido, que foi registrada como filha de mãe solteira, cristã e renomeada “Marianne”. Os padrinhos Theodorus e Vroowtje Bijlsma, foram reconhecidos pelo Museu Yad

Vashem, em 1993, como Righteous among the Nations. Eis a genealogia dessa gente: 1) Primeiro, os ancestrais da matriarca: 1 - SARA NUNES RIBEIRO / SARA RIBEIRA, 1838-1914; PAIS: 2 - MICHAEL EMANOEL NUNES RIBEIRO, 1814-1897; 3 - MIRJAN HANNAH HENRIQUES COELHO, 1807-1882; AVÓS: 4 - EMANOEL NUNES RIBEIRO; 5 - SARA MICHAEL ACOEN; 6 - SAMUEL de MOSES HENRIQUES COELHO; 7 - RACHEL de JACOB BARUCH BUENO; BISAVÓS: 8 - “DAVID” (devia ter sido anteriormente Diogo,

nome repetido na parentela; pois nasceu em Lisboa. É neto do Manoel Nunes Ribeiro); 9 - SARA SEMACH de BARRIOS; 9


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MEMÓRIA

10 - MICHAEL ACOEN; 11 - JUDITH de ARON SENIOR CORONEL (trineta do magnata Duarte Saraiva - da família do último Rabino-mor de Castela; hexaneta do aventureiro Antonio de Montesinos); 12 - SAMUEL COELHO HENRIQUES; 13 - HANNAH de ISAAC TREVES; 14 – JACOB de DANIEL BARUCH BUENO; 15 - ESTER de ISAAC RODRIGUES PEREIRA. 2) Agora, a sua descendência: I - SARA NUNES RIBEIRO (Amsterdã, 31 de dezembro de 1838 - ibid, 1914) casou-se com Isaac de Valencia (Amsterdã, 15 de setembro de 1839 - ibid, 07 de agosto de 1914), filho de Emanuel de Valencia e Rachel Jessurum Cardoso, neto paterno de Jacob Emanoel de Valencia e Rebeca de Valencia; neto materno de Isaac Cardoso e Rachel Melhado. São os pais de: 1 (II) - Rachel de Valencia, que segue. 2 (II) - Michael de Valencia, que segue. II - RACHEL de VALENCIA (Londres, 15 de junho de 1865-10 de janeiro de 1933). Casou-se com Abraham Israel Querido, filho de Isaac Querido e Rebecca de Valença; neto paterno de Emanoel Abraham Querido e Lea Nunes Nabarro; neto materno de Emanoel de Valença e Rachel Jessurun Cardoso. São os pais de: 1 (III) - Isaac Querido (Amsterdã, 4 de maio de 1888 - Auschwitz, 18 de janeiro de 1944). Assassinado pelos nazistas. Casou-se com Marianne Pollak (5 de março de 1891 - Brussel, 3 de julho de 1976), filha de Charles Polak e Branca Snoek; neta paterna de Jacob Eliaser Polak e Leentje Mechanicus; neta materna de Asser Snoek e Marianne Zak. Com geração. 2 (III) Rebecca Querido (4 de maio de 1889 - 28 de março de 1938). Casou-se com Juda Querido (20 de julho de 1883 - Sobibor, 5 de março de 1943), filho de Abraham Querido e Abigail Pesaro, contador. Pais de: a) Abigail (7 de maio de 1915 Sobibor, 9 de abril de 1943), casada com Samuel Salzedo (4 de dezembro de 1913 - Sobibor, 9 de abril de 1943). Este casal teve uma filha, Rebecca 10 | USf | ANO 3 - Nº8 | CHANUKÁ 2020

Sofia Salzedo (Haia, 10 de setembro de 1942 Sobibor, 9 de abril de 1943). 3 (III) - Sara Querido (1890 -1892). 4 (III) - Jael (Judith) Querido (17 de julho de 1891-1939), casada com Abraham Acoen (25 de outubro se 1876 - 10 de setembro de 1942), filho de Rafael Acoen e Sara Rodrigues de Miranda, vendedor de máquinas de escritório. Pais de: a) Sara Acoen (1906 - ?) x Marcus Sluijs, filho de Nathan Sluijs e Klaartje Zwaaf. Estes, pais de: a) Juliette (29 de março de 1938 - Sobibor, 16 de abril de 1943); b) Rebeca Acoen (6 de dezembro de 1908 - Auschwitz, 30 de setembro de 1942) x Bernard Gans (2 de novembro de 1910 - Auschwitz, 30 de setembro de 1942); Foram assassinados no mesmo dia – o que presume a morte juntos; c) Rafael Acoen (27 de maio de 1911 - 23 de novembro de 1979), gerente de armazém, x Josina van Itallie (1916 -1959). 5) Emanuel Querido (5 de janeiro de 1893 - 1953?) casou-se duas vezes, com as filhas de Nathan Kalf e Maria Benavente; Ester (1895-1919) e Mitje (1892-1968). Lapidador de diamantes. 6 - Lea Querido (14 de outubro de 1894 - 7 de agosto de 1972) casada com Maurits Querido (10 de junho de 1895 - Auschwitz, 28 de fevereiro de 1943), filho de Abraham Querido e Dina Cohen. Caixeiro viajante. A filha do casal, Rose Marie, que nasceu em outubro de 1942. Como mencionado antes, foi salva pelos amigos Theodorus e Vroowtje Bijlsma, ao ser registrada como filha de uma mãe solteira católica, sob o nome de Marianne. O casal foi reconhecido como Righteous among the Nations pelo Museu Yad Vashem, em 1993. 7 - Ana Querido (3 de setembro de 1895 Auschwitz, 3 de setembro de 1943), casada com Levie von Amerogen (16 de dezembro de 1894 - Auschwitz, 30 de abril de 1944), vendedor de charutos. Pais de: Sonja Ray Blom v. Amerogen (Amsterdã, 12 de janeiro de de 1923 - Birkenau, 7 de abril de 1944), empregada doméstica; casada com Simon Blom, filho de Benjamin Blom e Sippora


Krevelf; por sua vez pais de Clara Sippora Blom (20 de julho de 1943 - Auschwitz, 8 de abril de 1944). 8 - Jacob Querido morreu na infância. 9 - Rachel Querido (1 de dezembro de 1900 - 10 de maio de 1989), casada com Maurits Henri Rodrigues (28 de setembro de 1901 - 25 de junho de 1960), filho de Isaac Rodrigues e Rachel de Miranda, agente têxtil. II - MICHAEL de VALENCIA (Londres, 28 de setembro de 1872 - Amsterdã, 8 de janeiro de 1906), casou-se com Lea Farro (Amsterdã, 24 junho de 1875 - 11 de janeiro de 1940), filha de David Farro e Rebeca Pach; neta paterna de Samuel Cohen Farro e Rachel Alexander; neta materna de David Levie Pach e Esperànce Moze. São os pais de: 1 (III) - SARA CAMILLE de VALENCIA nasceu em Amsterdã, 19 de maio de 1896 - ?), c.c. (casada com) J. C. Bonkoffsky. 2 (III) - ISAAC de VALENCIA (Amsterdã, 11 de outubro de 1897 - Auschwitz, 28 de janeiro de 1944), c.c. Mietje Park (1896 - Auschwitz, 28 de janeiro de 1944), filha de Meijer Hartog Park e Sara de Abraham de Leon; neta paterna de Hartog Emanuel Park e Sara Robart; neta materna de Abraham Jacob de Leon e Rachel Wolf de Groot. Foram assassinados no mesmo dia – o que presume a morte juntos. 3 (III) - REBECA de VALENCIA (Amsterdã, 15 de fevereiro de 1900 - Sobibor, 9 de julho de 1943), c.c. Maurits Wolff, filho de Meijer Wolff e Mietje Van der Kar. Assassinada pelos nazistas. 4 (III) - DAVID de VALENCIA (Amsterdã, 29 de agosto de 1904 - 12 de maio de 1991), c.c. Judith Cohen, filha de Wolf Cohen e Frederike Ensel.

PERTO DO FIM O campo de Westerbork serviu como um hub ferroviário, distribuindo os presos entre os campos de extermínio construídos na Polônia ocupada: Auschwitz, Sobibor e Birkenau, conforme os interesses nazistas. Localização baseada numa “lógica” enganosa, dissimulando a responsabilidade nacional, assim

como escondiam o objetivo dos campos aos recémchegados: Arbeit Macht Frei (O trabalho liberta), enquanto assassinavam crianças e velhos na chegada, prolongando os sofrimentos dos sobreviventes. Os dirigentes dos campos eram jovens ambiciosos que pretendiam ascender na hierarquia social nazista. O Obersturmführer (primeiro-tenente) Franz Paul Stangl (1908-1971), nascido numa pequena cidade da Áustria, filho de modesto soldado do Império Austro-húngaro, trabalhou na indústria têxtil, teve uma experiência como carrasco no programa nazista de eutanásia (Aktion T4). O seu trabalho em Sobibor foi bem avaliado pelos superiores, tanto que foi levado a outros campos para a organização. Perto da derrocada nazista, foi mandado para a frente de batalha, uma tentativa de “queima de arquivo”. Preso pelos americanos, conseguiu passar incólume. Ele e o antigo auxiliar, o Oberscharfürhrer (sargento) Gustav Franz Wagner (1911-1980), recorreram ao bispo austríaco D. Alois Hulda (1885-1963), que lhes deu fuga. As fugas eram feitas através dos ratlines (rotas de escape escondidas e protegidas) que levavam os criminosos de guerra a locais seguros, notadamente onde já houvesse empresas alemãs e anticomunistas. Os Stangls, marido, esposa e três filhas foram para Damasco, onde viveram alguns anos, de onde partiram para o Brasil em 1951. No país, ele e a esposa encontraram trabalho em empresas alemãs, como a Volkswagen (1959-1967), onde continuaria o trabalho repressor, como chefe do serviço de segurança, espionando e denunciando operários para a repressão política. A empresa era dirigida pelo arquiteto alemão Friedrich Wilhelm Schultz-Wenk (1914-1969), que fora membro do Partido Nazista. O esconderijo de Franz Paul Stangl foi denunciado por alguém próximo à família, ao arquiteto Simon Wiesenthal (1908-2005), o Caçador de Nazistas, em troca de “um centavo por cada prisioneiro”, ou seja, sete mil dólares. Depois de um processo legal, ele foi extraditado pelo Supremo Tribunal Federal brasileiro e morreu de ataque cardíaco quando começou a cumprir a pena de prisão perpétua na Alemanha. O 11


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seu adjunto, Wagner, não foi extraditado mas morreu após golpes de arma branca, em circunstâncias desconhecidas.

CONCLUSÃO A investida nazista aos judeus holandeses causou uma tragédia que atingiu os dois grupos, tanto os judeus asquenazitas quanto os sefarditas. Dos 4300 “portugueses”, sobreviveram 800 deles - incluso os Ribeiros. Encontrei judeus holandeses que sobreviveram ao Shoah, com relações no Brasil: Nanette Blitz Konig, que esteve por lá quando tinha quinze anos. Ela é autora de Eu sobrevivi ao Holocausto. O comovente relato de uma das últimas amigas vivas de Anne Frank (2015) sobre esta experiência. O outro é Louis Frankenberg, que tinha sete anos quando foi trocado por prisioneiros alemães. Rachele Zippel (née Awerbach), avó materna do R. Toive Weitman, coordenador geral do Memorial da Imigração Judaica e do Holocausto em S. Paulo, esteve neste campo e dali dois irmãos foram à morte nos campos de extermínio. Ela sobreviveu. Dois fatores foram responsáveis por isto: a geografia sem pontos de fuga e também a falta de “anticorpos” sociais dos judeus locais, que não sofriam o antissemitismo agressivo do Leste europeu e acreditavam nos gestos dissimulados dos agressores. Apenas a vinculação genética e cultural com Portugal não foi suficiente para salvá-los da morte porém, tempos depois, já por outras circunstâncias, a Pátriamãe ofereceu-lhes a oportunidade de recuperarem a antiga nacionalidade. O advogado lisboeta José Ribeiro e Castro, deputado do CDS/PP, depois de um encontro com sefarditas europeus, consultou o Ministério da Justiça português sobre a questão da nacionalidade através do requerimento “Assunto: Retorno de judeus expulsos. O problema da requisição da nacionalidade portuguesa pelos judeus sefarditas” (10/05/2010), respondida pelo ministro Alberto Martins em 9 de junho do mesmo ano. A partir disto construiu-se o decreto-lei nº 30-A/2015 que lhes concede a “nacionalidade por naturalização” como reparação ao tratamento dado nos tempos inquisitoriais, se pedido. A legislação portuguesa atingiu um alvo não considerado na feitura da lei, os brasileiros descendentes de cristãos-novos. Num momento de 12 | USf | ANO 3 - Nº8 | CHANUKÁ 2020

crise econômica e política, muitos se interessaram por esta saída inesperada, o passaporte português, para entrar no mercado europeu. Processo que envolve a feitura de um documento genealógico ligando o pleiteante a um ancestral judeu português, que terá de ser ratificado pela Comunidade Israelita de Lisboa, do Porto ou de Belmonte, gerando trabalho para genealogistas, advogados e pareceristas. Assim, personagens marginais que só eram conhecidos academicamente como judeus ou cristãos-novos, tornaram-se protagonistas nestes processos de naturalização, como: o ex-rabino Abraham Sênior (Fernán Peréz Coronel), Agostinho de Paredes, Antônio Simões Colaço, Antônio Bicudo Carneiro (tenho dúvida se cristão-novo), Antonio da Fonseca Rego, Antonio Fernandes (da Praça), “o Pé de Açúcar”; o médico Antonio Paulo, Diogo Fernandes e sua esposa, Branca Dias (os personagens mais evocados como ancestrais legitimadores nestes processos); Brites Mendes de Vasconcelos, “a Velha”; Bartolomeu Ledo (tenho dúvida se cristão-novo), Beatriz Marques (tia de Águeda Moniz, cristã-nova), Belchior da Rosa, os Calaças, Domingos (“Pinta Diabos”) Gonçalves Pinto, Francisco Mendes Leão, Fernão Lopes e sua esposa, Branca Rodrigues; Abade Francisco de Sousa (os Rebouças da Bahia), Gaspar Dias (os Barretos de Cabeço de Vide); Josefa Maria Valcácer (esposa de Antonio de Azevedo Maia), Junca Montezinho e sua esposa Micol; Leonor Henriques, Leonor Ribeira, Manoel da Costa Farrapo, IV; Manoel Lourenço Andrade, Manoel Preto de Morais, Mateus Lopes Franco, Maria da Costa, Maria de Heredia, os Mendes de Sousel, Miguel Gomes Bravo, o médico Moussem Boyno (Moshe b. Abraham HaLevy), Pedro Vaz de Barros, Pantaleão Monteiro, “o Velho”; Pedro Álvares, “o Galego”; os Ramalhos de Elvas, Santo Fidalgo (Shemtov b. Abraham) e sua esposa, Orovida; Sebastião de Freitas e Vasco Fernandes de Lucena. Tornaram-se contemporaneamente motivo de orgulho e esperança para os seus descendentes. PAULO VALADARES, Mestre em História Social (USP), autor de artigos e livros sobre História Judaica. Premiado com o The AJL Judaica Reference Award (2003). Membro do Conselho Curador do Memorial da Imigração Judaica e do Holocausto, S. Paulo, Brasil.


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Sefarad Universo

HISTÓRIA

Soldados judeus sefarditas e asquenazes na invasão holandesa de Pernambuco

Fonte: Judeus no Brasil:Estudos e Notas Por Thana Mara de Souza

Os fatos sobre a conquista holandesa são conhecidos e os historiadores são unânimes em afirmar o quanto os cristãos novos portugueses estavam ansiosos para que o estabelecimento dos holandeses fosse bem sucedido, pois desse modo poderiam voltar a sua verdade fé, o judaísmo

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O principal espião dos holandeses no Brasil era o senhor de engenho João Brabantino, cristao novo que residia em Pernambuco desde 1618 ou 1620, e que forneceu informações valiosas aos invasores que ocuparam a vila de Olinda em fevereiro de 1630. Segundo o cronista Duarte de Albuquerque Coelho, o Judeu Antonio Dias Paparrobalos, serviu de guia central para as tropas que desembarcaram. A expedicao militar organizada em 1629, composta de mercenarios de varias nacionalidades, incluia uma unidade composta em sua maioria por judeus portugueses, chamada na epoca de “Companhia dos Judeus”. Sua existencia é confirmada pelo historiador Hermann Kellenbenz que descobriu nos documentos da inquisição espanhola em madri, uma lista de 41 nomes de judeus serfaditas e 20 asquenazes da Alemanha que se alistaram como soldados da frota do almirante Hendrick Lonck que tomou Pernambuco em 1630. A lista foi relatada pelo Capitão português Estevan de Ares de Fonseca, um cristao novo de coimbra que se converteu ao judaísmo em Amesterdão. Capturado pelos espanhóis nas guerras contra os protestantes nos países baixos, Fonseca confessou aos inquisidores a participação ativa de judeus portugueses no

exército da república holandesa e na invasão do Brasil. Entre os soldados judeus que mais se destacaram no Brasil Holandes foi o Capitão Moisés Navarro, que veio a Pernambuco como soldado naval, e em 1635 se tornou um senhor de engenho, comerciante de açúcar e tabaco, se tornando um dos homens mais ricos do Brasil Holandes. Foi Moisés Navarro que serviu de intérprete para Sigismund von Schkopp com os portugueses após a derrota na Batalha dos Guararapes em 1649, e convenceu o comandante Francisco Barreto de Menezes a permitir os holandeses enterrarem seus mortos em Guararapes. Após o fim do Brasil Holandes em 1654 Navarro e seus irmãos Aaron e Jacob se mudaram para a Ilha de Barbados. Segundo relatos de Johan Nieuhof, muitos Judeus de Recife preferiram morrer em combate contra a insurreição pernambucana a serem forçados a se converter ao catolicismo novamente. Em 1655 Frei Manoel Calado relatou que dois Soldados Judeus capturados em Recife, Jacques Franco, e Isaac Navarro foram rebatizados a fé católica a acabaram ficando no Brasil mesmo após o fim da presença holandesa.

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Sefarad Universo

RESENHA

Hernán Rodríguez Fisse. Sefardíes en el exilio. Santiago de Chile: Ediciones Zéjel 2019, 146 pp. – Por Regina Igel

Os sefarditas são de origem ibérica, já sabemos. E muitos também não ignoram que, depois que escaparam da Espanha e de Portugal, a partir dos séculos XV (da Espanha) e XVI (de Portugal), os judeus espanhóis e portugueses se espalharam pela Europa e pela Ásia. Alguns se estabeleceram nas antigas colônias ibéricas como ‘cristãos-novos’, mas sobre estes sefarditas contaremos outro dia...

A família do escritor chileno Hernán Rodríguez Fisse foi uma daqueles grupos de expatriados que, partindo da Espanha, chegando e partindo de Portugal, encontrou refúgio e vida nova na Turquia. 28 | USf | ANO 3 - Nº8 | CHANUKÁ 2020

Isto foi há séculos e o que é muito interessante neste livro em que o escritor conta a trajetória da família desde então, é que até hoje os seus descendentes se comunicam em ladino, um dos nomes de ‘judeoespañol’, além de outros. (Não vamos entrar em pormenores sobre os distintos significados deste idioma secular, quase desaparecendo atualmente, mas o ‘judeo-español’ ainda liga famílias sefarditas pelo mundo afora.) O livro acima indicado, Sefardíes en el exilio, está em espanhol, mas apresenta muitos textos (de cartas, cartões postais e reprodução de conversas) em ladino. O autor tem a delicadeza de colocar em espanhol atual o que está na linguagem excêntrica e linda, derivada do castelhano e do português. Hernán Rodriguez Fisse é neto de Ezequiel Fisse e Rachel Cohen. Seus avós viveram na Turquia, onde constituíram uma família com cinco filhas e um filho. O autor é filho de Fortunée, a terceira filha de Ezequiel e Rachel, que se casou com o igualmente sefardita David Rodríguez, com quem passou a morar no Chile. Foi onde nasceu o escritor, em 1950. E ele conta, pelos relatos da sua mãe, das tias, do tio, em encontros pessoais, também por cartas e, depois, por telefone, como foi a vida da família Fisse na Turquia. Seu avô tinha uma loja de temperos, num grande mercado em Istambul. Vendia muito bem, era admirado por todos, sua família vivia das vendas no mercado. As filhas e o filho estudavam nos bons colégios da cidade, frequentavam festas entre amigos, eram todos benquistos na comunidade judaica sefardita em Istambul. Frequentavam a sinagoga e mantinham, por iniciativa e vigilância da Dona Rachel, os rituais judaicos em casa. Até que um dia aconteceu algo totalmente inesperado e é neste episódio que o narrador começa a contar a história. O que houve foi que a melhor escola na cidade era dirigida pela Igreja Católica, e duas das filhas do casal foram lá matriculadas. Isto foi no tempo em que o presidente


Atartuk abriu a Turquia para ares libertadores: a república passou a ser laica, isto é, religião não era empecilho para ninguém, uma escola católica podia admitir crianças de outras religiões e assim as meninas de Ezequiel e Rachel foram estudar na Notre Dame local. Uma delas, a Esther (nascida em 1915), resolveu converter-se ao Catolicismo e tornar-se freira. Foi esta a comunicação que o Sr. Ezequiel e sua esposa receberam de parte da diretora da escola. Ficaram espantados, para dizer o mínimo. A D. Rachel foi até a escola e quis ver a filha. Foi impedida. Disseram que, como ela tivesse manifestado o desejo de ser freira, ela tinha de ficar recolhida, sem contato nenhum com a família. No entanto, a mãe conseguiu retirar da escola a outra filha (Fortunée, cinco anos mais jovem do que Esther e que seria a futura mãe do autor). Ficaram sem ver, por muito tempo, a que seria noviça. Ela também mudou de nome, em vez de Esther, escolheu ser Teresa. Só que não se tornou freira, saiu da Turquia, estudou na França, se casou com um diplomata americano, cuja família era polonesa e católica, estabelecida nos Estados Unidos. A mãe da EstherTeresa nunca mais falou com ela. Com o pai, ela ainda conseguiu conversar (ele sempre foi o mais liberal na família). Mas, adiantando um pouco mais no livro: Todas as moças se casaram, o único filho se mudou para Israel e a família do Sr. Ezequiel e da D. Rachel foi se espraiando pelo mundo, com seus cônjuges e filhos. Mantinham-se em contato por cartas e, mais pela frente no tempo, também por telefone. Uma vez e outra se encontravam em algum ponto da Europa ou dos Estados Unidos, conforme a conveniência das famílias. E o maior de todos os encontros foi em Istambul. A alegria de rever-se, de se abraçarem, de rirem juntos, de contarem de suas vidas, descreverem os lugares onde viviam ultrapassa as páginas do livro, nos agarra, nos inclui nas reuniões, nos casos contados, nas alegrias e também nas

tristezas. Houve outro casamento fora das esferas judaicas, de parte de uma das filhas. Houve a morte precoce de uma criança. Houve casamentos arranjados pelas famílias e também os espontâneos, quando o casal se conhece e passa a namorar e casar. Quase todas as moças foram felizes com seus maridos, mas houve traição de parte de um deles, enquanto um outro entrou em crise e mudou seu comportamento depois de perder seu posto (história do diplomata americano). E a história de Fortunée e David, os pais do narrador, que foram para o Chile porque um irmão de David lá se encontrava e os convidou para lá morarem. Como já falavam ladino, foi fácil para o casal entrosar-se na comunidade chilena, onde prosperaram e criaram sua família. Mas a Turquia permanecia viva na memória deles, no espírito de quase tudo o que faziam. Pouco se conhece da história sefardita na América do Sul (e em outras partes do mundo, para se ter uma boa medida). Este livro vem preencher uma das lacunas: ficamos conhecendo as tradições sefarditas na Turquia, o idioma ladino, os altos e baixos de expatriados como espelhados nos Fisse e nos seus descendentes. Um romance repleto de emoções, das mais variadas, além de percorrermos com os personagens lindas paisagens urbanas e rurais em várias partes do mundo. E tudo tendo como pano de fundo a história da Turquia, as duas guerras que arrebentaram em solo europeu, as mudanças na família Fisse e tantos outros acontecimentos que ora perturbavam, ora alegravam os membros daquela família. De suas páginas emana uma corrente invisível, mas bem percebida, de alta espiritualidade, com uma força mística não baseada em religião, mas numa crença no poder da união familiar. O autor soube manter um equilíbrio feliz entre emoções pessoais, pesquisas históricas, relatos de terceiros e sua própria observação sobre o desenvolvimento do seu clã.

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Sefarad Universo

DO NOSSO LEITOR

Caro Elias, Acabo de ler a edição de Rosh Hashaná da Universo Sefarad. Parabéns pelo belo projeto gráfico e os temas abordados.

Vocês se superam a cada publicação. Mazal Tov!

Yom Tov Aflalo

Adriana Buzaglo

Querido Elias, Que bela revista e que leitura agradável. Parabéns!

A edição de Rosh Hashaná lemos num fôlego só. Já estamos ansiosos pela próxima. Sucesso sempre, Elias.

Josá Kliger

Sol Bentolila

Eli, Qué bello tu trabajo. Besos desde Santiago. Miriam Caro

Parabéns pelos 10 anos de criação do Portal Amazônia Judaica. Alexandre Berneman


Suplemento

Ano 3 – No. 8 -Edição Especial 80 anos da Shaar Hashamaim –Dezembro 2020

Shaar Hashamaim:

UMA PORTA PARA O CÉU ZEJÚT ABOT

Festival inédito de Haquitia


Congratula-se com o Kahal Kadosh da Sinagoga Shaar Hashamaim pelo transcurso dos 80 anos da .inauguração do seu majestoso Templo Castanha-do-Brasil Semente de Cumarú Guaraná em Grão Bálsamo de Copaíba Óleo de Castanha-do-Brasil Bálsamo de Andiroba

Rua Justo Chermont, 194 - Centro – Óbidos – Pará – Cep. 68250-000 Tel. (91) 99177-8807 – Whats App – (91) 99221-6496 Rua Gaspar Viana, 354 – Campina – Belém – Pará – Cep. 66010-060 contato@caiba.com.br – www.caiba.com.br


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LEGADO

I ZEJÚT ABOT:

FESTIVAL INÉDITO DE HAQUITIA Por Dr. Sergio Benchimol

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PÁGINA OURO

Agradecemos às empresas, instituições, famílias e pessoas que apoiam nossa idéia e incentivam nosso evento*

(POR ORDEM ALFABÉTICA)

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FAMÍLIAS E PESSOAS

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EMPRESAS

(POR ORDEM ALFABÉTICA)

Amazônia Judaica Benoptica Ciam Cip Clínica de Olhos Benchimol Centro de Microcirurgia Benchimol Grupo Bemol Laor Vision

INSTITUIÇÕES

(POR ORDEM ALFABÁTICA)

Sinagoga Beth Yaacov – Rebi Meyr - Manaus Sinagoga Eshel Avraham - Belém Sinagoga Isaac Bennesby – Porto Velho Sinagoga Shel Guemilut Hassadim – Rio

Abraham Bohadana Abraham Serrulha Dra. Adriana e Kaluf Duek Anne e Jaime Benchimol e família Amanda e Gerson Eissen Celeste Pinto Serruya e família Eddy Zlotnitzki Dra. Eliana e Dr. Michel Ghelman Dr. Eliezer e Lia Benchimol Família Elmaleh-Salgado Dr. Gabriel L. Benchimol Dr. Isaac Dahan Eng. Jacques Rubim Benchimol Karine Sarraf Keyla e Mauro Marzochi Dr. Luiz Bennyosef Eng. Marcelo Rubim Benchimol Messody Salgado Bennesby e família Dra. Mirelle e Dado Castro Neves Dra. Nina Benchimol Nora Benchimol Minev Dr. Raphael L. Benchimol Raquelita e Dr. Fortunato Athias Profa. Dra. Regina Igel Dr. Yehuda Benguigui * Estas são empresas, famílias e pessoas que até o momento do fechamento desta Edição Histórica, conseguimos contatar e listar. Porém já sabemos que muitos outras se unirão a nós.


CRÓNICA

Um Shabat em Haquitia Elias Salgado

Dedicado a Moisés Salgado, nosso querido Moshitinho

“Mais do que Israel cuidou do Shabat, o Shabat cuidou do Povo de Israel”

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FUTURO

COMO SERÁ 2021?

Para nós será um ano de novidades!

Alguns poderão dizer que nós, na Redação, temos um quê de arrogantes. Não, não temos. É que possuímos, como uma de nossas facetas, pensar sempre pra frente. E pensar grande, ah, isso sim!

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MENSAGENS

Dr. Sergio Benchimol e família

congratulam-se pelos 80 anos do magnífico Templo da

ESNOGA SHAAR HASHAMAIM e convidam todos a participar do

ZEJÚT ABOT FESTIVAL DE HAQUITIA,

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em homenagem a seus amados pais, Raphael e Donna Benchimol z”l 50 | Edição Especial 80 anos da Shaar Hashamaim – Dezembro 2020


Uma das mais belas esnogas do Brasil chega aos 80 anos. Muita luta, resiliência, abnegação e fé foi necessário para que nossos antepassados pudessem torná-la uma realidade. A eles devemos a celebração de hoje. ZEJÚT ABOT – El Zejút de muestros padres se paró conosotros. Chanuká Sameach a todos em nome de: Eliezer e Sime Z”l; seus 9 filhos e filhas, suas noras e genros, netas e netos; bisnetas, bisnetos; tataranetas e tataranetos. 5 gerações e mais de 150 anos de presença na Amazônia Chag HaOrot Sameach FAMILIA ELMALEH – SALGADO

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MENSAGENS

Um Chanuká com muita paz, saúde e que D-us abençoe cada família. Que as luzes de Chanuká, iluminem nossos caminhos com liberdade de expressão, diversidade e pluralismo, tão importantes em nossa sociedade. Congratulações pela comemoração dos 80 anos do majestoso Templo da Esnoga Shaar Hashamaim. É o que desejam, David Mendel e Shimon Ely, orgulhos da família Rodrigues Pinto. Chag Chanuká Sameach.

Sinagoga Shaar Hashamaim

Símbolo de um judaísmo vivo e atuante, que, segue através de gerações, reunindo pessoas, famílias e fortalecendo nossas tradições.

Com alegria, a família de Raquelita e Fortunato Athias se congratula com a comunidade judaica do Pará, no 80º aniversário da sinagoga, construída por seu tio, o saudoso engenheiro Judah Eliezer Levy z”l. 52 | Edição Especial 80 anos da Shaar Hashamaim – Dezembro 2020


Jaime e Anne Benchimol e família, parabenizam a Esnoga Shaar Hashamaim pelos 80 anos de construção do seu explendoroso Templo Chanuká Sameach a todos

Jaime Benchimol

Com imenso júbilo pelos 80 anos da nossa querida Esnoga Shaar Hashamaim, parabenizamos toda nossa kehilá e desejamos a todos Chag Chanuká Sameach Abraham Kabacznik e Família

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MENSAGENS

O CIP – CENTRO ISRAELITA DO PARÁ, COM ORGULHO IMENSO, E EM NOME DE TODA A KEHILÁ DE BELÉM, VEM PARABENIZAR O KAHAL KADOSH DA ESNOGA SHAAR HASHAMAIM PELOS 80 DE CONSTRUÇÃO DE SEU GRANDIOSO TEMPLO

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O Comitê Israelita do Amazonas parabeniza a

Esnoga Shaar Hashamaim

pela passagem dos 80 anos de fundação do seu grandioso Templo. 55


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