Cartilha
I SEMINÁRIO DE FORMAÇÃO POLÍTICA FEMINISTA MISTO 30 de março de 13h as 18h Sede do PSOL Rio
SUMÁRIO
I. Introdução II. Identidade de Gênero III. Mulher e Direito à cidade IV. Mulher e Poder V. Mulher negra VI. A mulher Jovem na Universidade VII. Saúde da Mulher VIII. Educação não sexista
Cartilha construída coletivamente pelo Setorial de Mulheres da LSR-RJ Autoras: Isabela Leoni Karla Silva da Glória Lídia Maria de Souza Porto Lívia Cassemeiro Sampaio Mariana Cristina Moraes da Cunha Natália Coelho de Oliveira *Colaboração de Joubert Assunção, militante LGBT da LSR-RJ e Marcelle Leal, doutoranda em Teoria da Literatura UFRJ
I. INTRODUÇÃO Esta cartilha foi construída para que nós (organização e simpatizantes da LSR- tendência do PSOL - Liberdade, Socialismo e Revolução), possamos acumular sobre o debate de identidade de gênero, a situação das mulheres trabalhadoras nos serviços públicos, a particularidade da opressão às mulheres negras, às mulheres trabalhadoras e estudantes na universidade, o debate sobre a construção de uma educação não sexista e a participação das mulheres na cidade e nas instâncias de poder. Desta forma, para que haja maior entendimento sobre os assuntos discutidos na cartilha, cabem breves considerações sobre assuntos como a opressão patriarcal voltada às mulheres e a luta feminista. A opressão à mulher não é algo natural, ou mesmo foi criada por teóricos e estudiosos. É uma relação que faz parte de um processo histórico, em que o homem e a mulher estãoinseridos numa lógica de opressão, pois, nesta sociedade baseada na propriedade privada, obrigatoriamente tem que existir dominantes e dominados. E para que esta opressão aconteça e se perpetue alguns argumentos precisam
ser impostos e institucionalizados pela sociedade em geral, e algumas justificativas são dadas pela injustiça da exploração de um ser humano sobre o outro. Como por exemplo, que a mulher é um sexo frágil, associando-se à função biológica e reprodutiva do exercício da maternidade. (OLIVEIRA, N. C., 2011, p. 41) O capitalismo utiliza esse elemento para colocar em inferioridade a atividade produtiva da mulher e rebaixar seus salários em comparação com os do homem, numa mesma função. Portanto, suas características fisiológicas tornam-se fatores contrários a ela mesma, tornando-a marginalizada na ordem do capital. Qual mulher nunca sofreu preconceito no trabalho ou em outras instituições públicas e instâncias de poder, apenas pela sua condição feminina? Neste sentido, esta sociedade que as ordens hierárquicas (instituições sociais de reprodução do capital) exercem o poder sobre as mulheres revela uma relação de opressão de gênero. Portanto, a sociedade considera e naturaliza que: A mulher nasce e é educada para ser oprimida, para saber ‘o seu lugar’ no mundo, que é sempre, em qualquer âmbito, um lugar subalterno. É configurada para aceitar essa condição como se fosse algo natural, e ainda por cima, com um sorriso nos lábios; contido, claro. Essa idéia, que a
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imensa maioria das mulheres introjeta sem qualquer tipo de questionamento, assenta-se na função materna da mulher para justificar uma desigualdade entre os sexos e uma posição degradante que elas vêm suportando, com maior ou menor intensidade, desde o surgimento de formas mais ou menos estruturais de exploração entre os seres humanos. (TOLEDO, 2008: 23).
O feminismo, segundo Gregori (1993, apud LUZ, 2012), não é um movimento unificado, cuja definição se torna muito difícil em razão da grande quantidade de tendências e teorias aglutinadas em torno dele. De forma superficial, pode-se definir o feminismo como “um conjunto de noções que define a relação entre os sexos como uma relação de assimetria, construída social e culturalmente, e na qual o feminino é o lugar e o atributo da inferioridade”. Enquanto movimento político, o objetivo do feminismo seria “eliminar os dispositivos de poder e autoridade que imperam sobre a mulher”. A luta pelos direitos das mulheres existe pelo menos desde a Revolução Francesa, em 1789. No entanto, a organização das mulheres pela reivindicação dos próprios direitos somente ganhou força e notoriedade a partir do século XIX, com o movimento sufragista. As sufragistas acreditavam que poderiam superar as desigualdades de gênero se fossem inseridas na Página 4
política e no mercado de trabalho. Por isso, as principais bandeiras desta “primeira onda” do feminismo eram direitos políticos (votar e ser eleita), direito à educação com currículos iguais aos dos homens e direito ao trabalho remunerado com salário igual por trabalho igual. Já a “Segunda onda” denomina o movimento iniciado a partir de meados dos anos 1960 e que acrescenta reivindicações referentes à sexualidade (direito ao prazer), ao corpo (aborto e contracepção). O surgimento da pílula anticoncepcional, nos anos 60, impulsiona estas lutas que, marcadas pelo slogan “O pessoal é político”, passam a ideia de que a vida privada é fruto da organização da sociedade e reflete suas estruturas de poder (Lage & Nader, 2012). A história do movimento feminista e seu caráter plural implicam grandes responsabilidades para a esquerda revolucionária, incluindo pautar a luta das mulheres pela luta de classes. Atualmente o movimento feminista defende diversas lutas que se relacionam com a emancipação da mulher, a liberdade sexual, a divisão sexual do trabalho justa, a luta e denúncia contra a violência e assédio às mulheres e a luta pela ocupação e apropriação
das mulheres em espaços públicos e instâncias de poder. É importante que todos e todas tenhamos consciência de que a emancipação da mulher é uma condição para a construção de uma sociedade socialista e portanto, mais igualitária. Libertar a mulher de sua alienação é, ao mesmo tempo, libertar os homens de seus fetiches. (Saffioti)
II. IDENTIDADE DE GÊNERO É menino ou menina? Acredito que quase a totalidade dos pais brasileiros, e talvez do mundo, já ouviram esta pergunta. Antes mesmo de nascer, um médico já definiu se a criança é um menino ou uma menina pela visualização do órgão genital. Desde então, carregam o fardo de corresponder às perspectivas sociais correspondentes a tal nomenclatura. Quando designados meninos, ganham um quarto azul, uma roupa do time do pai e carrinhos e superheróis na decoração. Se nomeadas meninas, rapidamente são inundadas no mundo cor-de-rosa, onde princesas e seres encantados ganham
notoriedade. No entanto, pouco se reflete sobre o quão perversas podem ser estas “inocentes” atitudes ao longo do crescimento de um ser humano. Na infância, qualquer desvio de padrão é visto como engraçado ou como um comportamento natural de um indivíduo sem capacidade reflexiva. Isto é, uma criança do sexo masculino que veste as roupas da mãe e gosta de imitar os gestos femininos é minimamente aceitável, tendo em vista que está na infância. Contudo, quando se torna um adolescente ou um adulto, a mesma atitude é agressivamente repudiada, tanto em termos psicológicos quanto físicos. Se não seguimos o padrão sexo, gênero e desejo esperado pela maioria da população, somos excluídos ou até mesmo exterminados da sociedade. Portanto, é importante que entendamos um pouco sobre esta dinâmica para que não reproduzamos opressões que durante séculos se entranharam no discurso social. E não podemos pensar que a tirania está apenas no ataque claro e direto, Página 5
como fazem muitos homofóbicos e machistas. Aquela piadinha, brincadeirinha ou apelidinho podem ser tão agressivos quanto um canivete no rosto. É uma marca psicológica de uma cura muito mais difícil e demorada. Devemos nos questionar o que precisamos entender para não reproduzir estas opressões de gênero. O primeiro ponto a se destacar é a compreensão de que, apesar de sermos todos seres humanos, a primeira diferenciação que se estabelece é entre o sexo de um indivíduo. Logo, um bebê é do sexo feminino ou masculino. Esta distinção ocorre devido às características fisiológicas de nosso corpo. Assim sendo, o sexo feminino é composto de vagina e útero, por exemplo. Por sua vez, o masculino possui pênis e testículos. Os teóricos muitas vezes divergem se neste aspecto já temos uma diferenciação verdadeira, tendo em vista que há indivíduos que nascem intersexuais (hermafroditas) e abalam a estrutura binária (feminino x masculino) a que estamos acostumados. Página 6
E o que seria então aquele menino ou menina que é tão criticado no primeiro momento? Porque são tentativas de fazer com que um ser humano do sexo feminino e masculino correspondam, respectivamente, às categorias de mulher e homem. É uma tentativa de manter discursivamente uma ordem binária e manter um padrão da heterossexualidade. Todo aquele que adota uma postura diferente do que se espera do seu sexo é prontamente marginalizado. Partindo disso entramos numa lógica da “heterossexualidade compulsória”: quando nascemos, se temos determinado órgão genital, automaticamente nos designam um gênero, e de acordo com esse gênero, embutem o desejo pelo gênero oposto. Nasceu com pênis >> é homem >> gosta de mulher Nasceu com vagina >> é mulher >> gosta de homem Simone de Beauvoir foi um das primeiras feministas que para
além de questionar os papéis sociais que a mulher cumpria na sociedade capitalista, questionou o que é ser mulher nessa sociedade? E chegou a conclusão que “não se nasce mulher, torna-se”, desconstruindo justamente essa correspondência entre sexo biológico e gênero. Colocando gênero como uma construção cultural que coloca a mulher subalternizada, num lugar abaixo na relação de poder entre os gêneros. Partindo disso, ela abriu margem para discutirmos por exemplo a transexualidade. Travestis e Transexuais são pessoas que justamente não se adaptaram nesse perfil de gênero de acordo com o sexo biológico. Outra expectativa que se cria é em relação a nossa afetividade, por quem nós interessamos sexualmente, que é nossa orientação sexual. Se a pessoa possui o gênero feminino, vão direcionar seu desejo a alguém do gênero oposto, tudo baseado numa lógica heteronormativa, como se todos fossemos normalmente heterossexuais e iguais e outros possibilidades de afeto fossem desvios da normalidade. Porém
existem mulheres, que nasceram ou não do sexo biológico feminino, que direcionam seu afeto para pessoas do mesmo gênero. O que precisamos é nos embasarmos teoricamente em estudos sobre as pessoas trans e as mulheres lésbicas e ouvi-las, para que possamos compreender suas demandas enquanto pessoas de diretos e avançarmos para uma sociedade onde seja possível exercer com liberdade e direitos garantidos nossas desejos sobre nossos corpos. III. MULHERES E O DIREITO À CIDADE* Mulheres chefes de família é maioria na cidade do Rio de Janeiro. Elas estão em casa, cuidando dos filhos, netos, idosos, estão trabalhando na busca pela independência financeira e melhores condições de vida para os seus dependentes familiares, estão impulsionando diversas lutas e resistências ligadas ao avanço das políticas públicas. Estão mobilizadas, Página 7
principalmente, na luta pelos direitos humanos seja no asfalto, nas favelas, nas universidades, estão na luta pelo direito de ir e vir e pela liberdade de decidir sobre o próprio corpo. Neste sentido, desejam usufruir dos espaços públicos, sem que sejam desrespeitadas. Tais espaços que se conformam na cidade, são lugares que se constroem relações, compartilham-se pensamentos e elaboram-se política.
sendo uma luta diária para garantir o acesso aos serviços públicos. Mesmo com a opressão de gênero e repressão do Estado, notase um aumento da presença das mulheres nos espaços públicos, na tentativa de organização e fortalecimento da classe trabalhadora. As mulheres estão na frente de diversas lutas que enfrentamos nos últimos anos: greve da educação municipal, estadual e federal, a luta contra as remoções forçadas e deslocamentos involuntários, a luta pela moradia digna, a luta contra as organizações sociais na saúde, a luta contra o fechamento e melhoria das maternidades, a luta contra a intolerância religiosa, a luta pelo fim da violência contra as mulheres, a luta a favor dos direitos humanos dos moradores(as) residentes em favelas, a luta pela liberdade, a luta pela vida, isto tudo, porque sentimos a opressão e exploração cotidiana.
Isso mesmo, a saída do espaço privado para o espaço público tanto no trabalho, quanto nas universidades, instituições públicas, espaços de lazer, cultura e política é uma luta constante para garantir sua permanência e visibilidade. Existe uma necessidade clara de construir políticas públicas que viabilizem melhoria na qualidade de vida para os seus familiares, pois sabemos que as mulheres são as mais atingidas pelas péssimas condições da saúde, educação, transporte, serviços necessários à reprodução da Em pesquisa realizada pelo vida humana. São elas que, em sua Instituto Pereira Passos (IPP) sobre maioria, utiliza o serviço público, demografia e migração na cidade, Página 8
com base nos dados dos Censos de 2000 e 2010, constatou-se que na média brasileira, elas são chefes do domicílio em 38,7% das residências. Enquanto, no Brasil, as mulheres superam numericamente os homens numa relação de 51% a 49%, no Rio elas já são 53,2%. No Rio de Janeiro, as mulheres são 46,5% dos 2,14 milhões de chefes de família; mais que em São Paulo (44,1%), Vitória (43,9%) ou Belo Horizonte (43,6%). Olhando de outra maneira para o mesmo dado, 29,7% dos 3,3 milhões de mulheres do Rio são chefes do domicílio. E 21,1% dessas declararam no último censo não ter renda ou ganhar até um saláriomínimo. Segundo o mesmo instituto, é comum encontrar neste perfil, mulheres sozinhas, considerando o grande número de homens que as abandonam, deixando-as com a responsabilidade da casa. Além disso, é muito comum, a mulher incorporar os filhos de um casamento; os homens, não. Esta situação que impacta a vida das mulheres mais pauperizadas, não é coincidência, tendo em vista a orientação dos
Ministérios de Combate à Fome e à Pobreza e Ministério das Cidades para priorização da inclusão do nome das mulheres nos programas e projetos sociais de nível federal, estadual e municipal, principalmente nos programas “carros-chefe” do Governo Federal, como o Programa Bolsa Família e o Programa Minha Casa Minha Vida. Nesses programas, considera-se o processo da feminização da pobreza, pois essas mulheres são responsáveis pela unidade familiar, sendo assim zelam pela segurança alimentar, da educação, da saúde e da moradia dos familiares, atribuições historicamente instituídas. Muitas vezes a figura da avó é central na família, visto o benefício recebido por meio da seguridade social como aposentadoria e pensão. Tal Estabilidade adquirida através da Previdência Social, já não é a mesma entre as jovens mães da geração atual. Muitas possuem vínculo informal de trabalho, não pagam o INSS e ainda observase uma reforma da Previdência Página 9
Social que está na contramão dos direitos já conquistados pelos trabalhadores e trabalhadoras. Com isso, essas mulheres chefes de família, além de receber menos no seu trabalho precarizado, têm sido mais prejudicadas pela má qualidade nos serviços públicos prestados, pois não há incremento de investimentos nas políticas públicas. Há de se preocupar com a queda nos nascimentos e o consequente envelhecimento da população. E ainda, devem ser considerados, os casos de genocídio da população masculina, principalmente negra, nas favelas, que fazem aumentar, proporcionalmente, o número de mulheres chefes de família nas cidades. Temos uma população feminina em processo de envelhecimento, se afastando das atividades produtivas e o único benefício assegurado aos idosos, é o BPC, entretanto exige uma renda familiar, per capita de ¼ do salário mínimo, pois para se aposentar ele precisaria ter contribuído, no mínimo, 15 anos com carteira assinada. Página 10
A ocupação das mulheres nos espaços públicos não significa, imediatamente, emancipação feminina, pois o machismo persiste nas ruas e ele ainda é velado e abafado pela mídia, pois a sociedade ainda aceita este tipo de agressão, tanto física, quanto moral, verbal e psicológica. Por isso, a mulher tem que lutar para garantir o sustento da família, mas contra essas violações de direitos que ocorrem diariamente. Notamos, nos últimos tempos, um aumento do número de estupros, assédio sexual e moral que vem acontecendo com pessoas muito próximas e até com nossas companheiras de militância feminista. Segundo, o Fórum Estadual de Combate a Violência contras as Mulheres, os casos de estupro no Brasil aumentaram 18,17%, totalizando cerca de 50 mil. Nos últimos 3 anos, aumentou 150% das denúncias de estupros no Brasil. No Rio, são registrados 17 casos por dia. Contudo, as mulheres negras são as mais atingidas pela violência, sendo 55.7% das vítimas
de estupro e 54,2% de lesão corporal dolosa no Estado do Rio de Janeiro. Além da violência de gênero, temos a homofobia como um fator de agressão que também vêm impactando as mulheres lésbicas e bissexuais com o chamado “estupro corretivo”. Esta violência também atinge as transexuais que sofrem uma opressão cotidiana na defesa da sua identidade de gênero. Houve um aumento considerável do número de estupros em espaços públicos, nos transportes públicos e nas ruas, visto as últimas lutas travadas pelas feministas. Apesar disso, a violência doméstica persiste. No Estado do Rio de Janeiro, as mulheres são as maiores vítimas dos crimes de ameaça (66,7%), lesão corporal (64,5%) e estupro (82,8%), majoritariamente, praticados em âmbito doméstico. A cada 15 mulheres que são mortas no Brasil, sendo 29% dentro de casa e a maioria por parceiro íntimo ou por ex-companheiro. No estado do Rio de Janeiro 25 mulheres são mortas
a cada mês. Apesar de termos uma representante mulher, presidenta do país, tem sido frequente o corte de verbas da Secretaria de Política para Mulheres (SPM). A dotação orçamentária autorizada no ano de 2012 (R$ 109 milhões), apenas R$ 47,4 milhões foi desembolsada. O montante é inferior ao destinado para a pasta em 2011, de R$ 114,4 milhões. A diminuição de 6,3% é a primeira desde, pelo menos, 2008. Ainda, o número de casasabrigo é insuficiente frente ao aumento das denúncias de violência doméstica por parte das mulheres que necessitam de outro local de moradia. Sendo assim, as políticas públicas de gênero não atende a quantidade de mulheres que precisam sair do seu ambiente de conflito. Sabemos que a denúncia e publicização dos dados são importantes, mas não resolvem o problema do machismo na sociedade em que vivemos, onde a mulher é vista como posse, propriedade, sujeito indefeso, frágil e sem valor. Página 11
Precisamos romper com essa cultura imediatamente e construir, a partir de nossas ações coletivas, uma sociedade em que as mulheres sejam respeitadas, ouvidas e que assumam tarefas importantes na condução dos processos sociais. Queremos a emancipação feminina e que a mulher ocupe cada vez mais os espaços públicos, entretanto é necessário proporcionar meios e condições de vida para que elas usufruam do espaço da cidade. Outra questão importante é sobre a política de mobilidade urbana no estado do Rio de Janeiro que tem impactado a vida das mulheres. Temos um transporte público de péssima qualidade, além de ser um dos mais caros do mundo e torna a vida das mulheres trabalhadoras em um tormento. A ida para o trabalho e o retorno para a casa prolongam as horas de sua jornada de trabalho, pois essas mulheres perdem tempo no deslocamento e ainda quando chegam a casa, são responsáveis pelo trabalho doméstico. Devemos nos questionar Página 12
se esta política de transporte e mobilidade urbana atende às mulheres, pois elas não têm tempo para a vida social. Tempo este que é utilizado para compartilhar com seus filhos, família, lazer; e ainda, a mulher é responsabilidade pelo não cumprimento das tarefas domésticas e se sente eternamente culpada pelo “seu” “fracasso” que a sociedade impõe como individual. Considerase que o acesso ao trabalho não significou qualidade de vida para essas mulheres, pois quando essas mulheres chegam a casa, continuam trabalhando. Pesquisa sobre divisão sexual do trabalho revela que a mulher gasta 2,5 vezes mais tempo com atividades domésticas do que o homem (PNAD/IPEA, 2012). Enquanto as mulheres gastam 25 horas semanais, os homens gastam 10 horas. Esse acúmulo de tarefas sobrecarrega a saúde física e mental das mulheres, por isso devemos lutar contra a tripla jornada de trabalho e começarmos a rediscutir uma divisão sexual do trabalho material e do trabalho social mais justa.
Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD, 2012) sobre deslocamento para o trabalho nos revelam que, no ranking, o maior tempo gasto de casa ao trabalho é no Rio de Janeiro, com 47 minutos, seguido de São Paulo, com 45,6 minutos (IPEA, 25.10.2013), contudo esses números têm aumentado diariamente, principalmente na cidade do Rio, devido às intervenções urbanas em virtude dos jogos esportivos. De acordo com o estudo, nos últimos 20 anos, os tempos de viagem nas regiões metropolitanas tiveram crescimento três vezes maior do que os gastos em outras áreas, mostrando que problemas de deslocamento se agravaram com o tempo e que as obras de mobilidade urbana ainda não foram suficientes para sanar o problema. Além disso, existe um processo de periferização da população pobre, moradora dos centros urbanos que são impactadas pela valorização dessas regiões. O Estado tem remanejado esta população para regiões mais distantes dos serviços urbanos, necessários à
urbanidade. Este processo também se caracteriza como uma violação dos direitos humanos e tem atingido, principalmente, as mulheres que ficam na linha de frente do combate das ações de repressão. Percebe-se um protagonismo das mulheres nas lutas urbanas, constituindo-se maioria entre as lideranças desses movimentos sociais urbanos. A luta contra as remoções está sendo marcada por intensa resistência dessas mulheres que, no momento do enfrentamento com a polícia e na hora de passar o trator da remoção, sempre se colocam na linha de frente e se mostram guerreiras, na defesa da função social da moradia nas nossas cidades. IV. MULHER E O PODER Mulher e o Poder - formação de quadros femininos! Para além de discutirmos a origem da opressão, a sociedade capitalista patriarcal, delegou a mulher centralmente o papel de reprodução das relações sociais Página 13
de produção. Papel este que se concentra na esfera da vida privada: nos cuidados com a família e na elaboração e execução das tarefas domésticas. Mesmo com o desenvolvimento do capitalismo, das forças produtivas e mediante a necessidade de inserir as mulheres no mercado de trabalho, isso ocorreu de modo subalterno em relação ao homens. Pois o seu trabalho, passou a ser entendido como complemento da renda domestica, e sua tarefa duplicada, pois para além de trabalhar na produção, no espaço público, mantinha as tarefas domésticas responsáveis pela reprodução da própria sociedade capitalista. Acumulando a dupla e até tripla jornada de trabalha, as mulheres pobres continuam sendo excluídas do acesso a cidade, assistência a saúde, educação, moradia, são oprimidas enquanto mulher e exploradas,por serrem trabalhadoras. Apesar das conquistas realizadas pelos movimentos feministas, e diante da própria necessidade do capitalismo em inserir mulheres na produção, a Página 14
mulher ainda tem restrições para circular e atuar nos espaços públicos. Quando ela conquista esse direito, inicia-se um processo de coações, não por forma de leis, mais indiretas mas como normas sociais que se expressam pela violência que gera insegurança, ou mesmo pela condenação da sociedade que culpabiliza a vitima quando por conquistar o mercado de trabalho e tendo como preço o “abandono da família”. Essas pressões inibem as mulheres a circularem nas ruas, a participarem de espaços públicos, a ousar cruzar a fronteira do aceitável. Desde criança somos educados com uma educação machista, sexista e homofóbica. Na estrutura patriarcal está no topo da “pirâmide social de poder” o homem, branco, heterossexual. As meninas ganham panelinhas e brincam de casinha quando criança, pois estão sendo preparadas para cuidar da casa, enquanto os meninos são preparados para assumir este lugar de poder da pirâmide. Quando crescemos continuamos reproduzindo estas
relações de poder, nas quais as mulheres são cidadãs de segunda ordem, inferior. Quantas vezes escutamos: “vai perder para uma mulher?”, “vai deixar ela falar assim com você?”, “Tinha que ser mulher”, “mulher minha não faz essas coisas”! Não é a toa que até hoje as mulheres são a minoria na direção das organizações, que fazem menos inscrições em reuniões e falas públicas que os homens, mesmo quando são maioria no espaço. As mulheres são criadas para ouvir e obedecer os homens. Desta forma é mais difícil para as mulheres exporem as suas opiniões diante dos homens, pois é “normal” (produzido socialmente e interiorizado por todxs) que eles façam falas melhores. Isso não ocorre em espaços autoorganizados aonde todas as mulheres presentes partem do mesmo nível da pirâmide de poder nas relações sociais. Quando uma mulher faz uma fala pública ela está subvertendo o “normal” , então o desgaste e o esforço para ela será muito maior que para um homem, que está
fazendo a sua primeira fala. Pois ele está em um lugar que lhe é garantido, a mulher não, ela tem que conquistar o direito de estar naquele lugar. Quando os homens começam a militar eles se arriscam a fazer intervenções, mesmo que não tenham certeza, ou que errem, pois existe uma compreensão por parte do coletivo que eles estão se desenvolvendo politicamente. Já para as mulheres, como precisam conquistar este lugar de deliberação e formulação, não se permitem arriscar, errar, só se inscrevem quando tem certeza do que vão dizer. Pois subjetivamente e no imaginário social se errarem confirmam que os homens sabem fazer melhor. Homens e mulheres partem de largadas diferentes no processo de formação como um quadro político! As organizações de esquerda não escapam desta realidade. Mesmo quando tem a clareza e o discurso feminista os atos refletem a sociedade machista. Recriminam as companheiras elevando a voz; quando uma mulher participa de mesas, normalmente tem um papel Página 15
de secretária; os atributos físicos são usados para desqualificar as mulheres que atuam e lutam juntos com eles. Se isso acontece em organizações que tem a clareza da opressão do machismo, imaginem nas outras? A maioria das ações de opressão dentro da militância não é proposital, aonde o companheiro quer sacanear a companheira, mas sim por que é “ normal” na sociedade os homens estarem em uma relação de poder superior que as mulheres. Como quando em espaços de militância um companheiro homem faz elogios a atributos físicos de uma companheira que não possui intimidade. Ele não faria isso com um companheiro homem, pois não possui liberdade para comentar a sua aparência. Mas as mulheres devem exigir esta liberdade. Essas situações “lembram” a mulher que ela não está no mesmo “patamar de poder” que os homens, por tanto não tem as mesmas “condições” que eles. Isso se reflete em números. O Brasil está em 121º lugar* no ranking de igualdade entre homens e mulheres na política Página 16
• Câmara Federal*: dos 513 deputados federais, apenas 44 são mulheres (8,6% do total). • Senado*: dos 81 senadores, 13 são mulheres (16%). • Prefeituras: as mulheres são menos de 10% das prefeitas. • Câmaras Municipais: mulheres são cerca de 12% dos vereadores. (http://www12.senado.gov. br/senado/procuradoria/arquivos/ pesquisa-mais-mulher-na-politicado-instituto-ibope-e-patricia-galvao) Isso é contraditório dentro dos números aqui apresentados: • As mulheres brasileiras possuem nível de escolaridade maior do que o dos homens e também uma maior expectativa de vida. • No mercado laboral, as mulheres representam 44% da força de trabalho no país. • Com mais de 11 anos de estudo, as mulheres são maioria da População Economicamente Ativa (PEA). (http://www12.senado.gov. br/senado/procuradoria/arquivos/ pesquisa-mais-mulher-na-politicado-instituto-ibope-e-patricia-galvao, acessado em 13/02/2014) Reconhecer que o machismo ainda é predominante na sociedade,
ou seja, que existem relações de poder nas quais a mulher é inferior, não adianta nada se não transformamos tais relações na nossa militância cotidiana. É necessário que o conjunto da organização política assuma a tarefa de desconstruir as relações de opressão e force a construção de quadros femininos. Não temos mulheres assumindo papel mais protagonista na militância, pois as mesmas não arriscam a se formarem. Assim, legitimamos que terá mais homens na direção, por exemplo, por não tem mulher preparada. Vira um ciclo! A construção da paridade de gênero em todos os espaços e elaboração de tarefas deve ser uma prioridade de toda a esquerda! As companheiras só vão se formar na prática, se arriscarem a ocuparem esses espaços, mesmo que tenham um homem que o faça melhor, pois nunca vai se desenvolver se não experiência. Se as mulheres forem ocupar lugares protagonistas só quando estiverem “formadas politicamente como um quadro”, nunca irão se formar
como tal. Devemos sempre buscar a paridade de gênero em: mesas de atividades políticas, delegações, representações, formulação de documentos e artigos, direção.. Muitas vezes as mulheres militantes passam por situações de assédio e humilhação na militância e não sabem o que fazer, pois nunca se espera e prevê uma situação de opressão, anda mais entre militantes. São comuns frases como: “Você veio substituir o fulano?”, “passou no teste (referindo-se a completar uma tarefa de direção)”, “a fulana vai pegar essa tarefa?!! (como se ela não fosse capaz)”... Precisamos buscar saídas coletivas para tais situações de opressão, as quais remetem a mulher novamente para um lugar de cidadão de segunda categoria. Não deve ser um problema individual. Muitas vezes a mulher se sente culpada por não ter respondido na hora, mas uma vez a vítima é responsabilizada pela opressão. O setorial de mulheres deve também cumprir um papel de pensar tais situações. Para nós,socialistas revolucionarias, é claro que sem Página 17
o fim do capitalismo não teremos o fim do Machismo. Sabemos que este sistema econômico e social naturaliza a opressão contra a mulher e se aproveita daquela para se manter. Sabemos que não somente as políticas de ação afirmativa avançaram para uma sociedade sem machismo, por isso é um meio e não o fim. Sabemos que o machismo é tão naturalizado que as próprias oprimidas o reproduzem. Para isso é o papel de uma organização de Esquerda ter um Setorial de Mulheres forte, atuante e autoorganziado e espaços mistos de luta contra todas as formas de opressões. No entanto, sabemos também que no capitalismo não conquistaremos nossa emancipação, assim como da impossibilidade histórica de separar o feminismo e o socialismo, como sendo um única luta contra a exploração e opressão capitalista. V. MULHERES NEGRAS Mulheres Negras Por mais de quatro séculos Página 18
o Brasil se favoreceu do trabalho escravo. Mesmo após o período escravocrata o negro é marginalizado. A vida na miséria, sem trabalho e sem possibilidades de viver de maneira digna fazem parte de marcas que a história deixou à população negra. É importante lembrar que após esse período o governo brasileiro trabalhou em torno da imigração estrangeira na tentativa de extinguir o negro da sociedade brasileira. Ao fazermos a reflexão sobre a história da mulher negra a situação é ainda pior. Tal situação hoje se manifesta como um prolongamento, com poucas mudanças, da realidade vivida no período de escravidão. Essas mulheres continuam em último lugar na escala social sendo aquela que mais carrega as desvantagens do sistema injusto e racista do país. Muitas pesquisas demonstram que a mulher negra apresenta menor nível de escolaridade, trabalha mais, porém com rendimento menor. No período pós-escravatura, a maior parte das mulheres negras trabalhadoras que não trabalhavam
nos campos foram forçadas a tornarem-se criadas domésticas. De acordo com Angela Davis (1982), nos Estados Unidos “por quase um século elas foram incapazes de escapar ao trabalho doméstico em número significativo”. Tal realidade também se evidencia no Brasil.
empregada doméstica (que em sua maioria são negras). Outra criação desse imaginário são as mulatas, tidas como negras “tipo exportação”, vendidas internacionalmente através políticas de atração de turistas. Esta idéia é reafirmada em filmes, novelas, carnaval e etc. Segundo Angela Davis (1982), as vulneráveis condições Esta questão se perpetua das trabalhadoras domésticas até os dias de hoje. Um grande alimentavam continuadamente número de mulheres negras continua muitos dos retardados mitos sobre a a trabalhar como empregadas “imoralidade” das mulheres negras. domésticas, por diversos motivos: E ainda hoje existe um ideário de que baixa escolaridade; por estarem a mulheres negras são “promíscuas”. deslocadas do padrão de beleza “O que poderia ser considerado como história ou reminiscências do racista que lhes é imposto e etc. período colonial permanece, entretanto, Também não podemos deixar vivo no imaginário social e adquire novos contornos e funções em uma ordem social de considerar que o abuso sexual faz supostamente democrática, que mantém parte da história da mulher negra. intactas as relações de gênero segundo a cor ou a raça instituídas no período da Desde a época das senzalas até os escravidão. As mulheres negras tiveram dias de hoje a violência marca a vida uma experiência histórica diferenciada que o discurso clássico sobre a opressão dessas mulheres. da mulher não tem reconhecido, assim No período escravista o como não tem dado conta da diferença qualitativa que o efeito da opressão abuso às mulheres negras fazia parte sofrida teve e ainda tem na identidade da prática dos seus senhores, o que feminina das mulheres negras”. Sueli Carneiro (Fundadora e coordenadoraalimentou todo um imaginário que executiva do Geledés – Instituto da coloca a mulher negra como objeto Mulher Negra São Paulo SP) de desejo. Não é a toa que existe Um exemplo atual do o fetiche sexual com a mulher estereótipo criado em torno da Página 19
coisificação e da hiper sensualização da mulher negra foi a propaganda da cervejaria dona da marca Devassa. Esta propaganda trouxe a seguinte mensagem: “É pelo corpo que se reconhece a verdadeira negra”, além de exibir a imagem de uma mulher negra em pose e com roupas ditas sensuais. A propaganda foi classificada como publicidade abusiva, por equiparar a mulher negra a um objeto de consumo, por meio da comparação entre seu corpo e um produto. Nos autos do processo revelam sérios indícios de abusividade na peça publicitária, levando o Ministério da Justiça a instaurar um processo administrativo sancionatório. Outra questão que precisamos nos atentar e superar são apresentados pelo movimento feminista brasileiro no que diz respeito as lutas das mulheres negras. Dentre elas, a inclinação eurocentrista que universaliza os valores de uma cultura particular (a ocidental) para o conjunto das mulheres, sem mediálos na base da interação entre brancos e não brancos; além disso, muitas Página 20
vezes, revela um distanciamento da realidade vivida pela mulher negra ao negar “toda uma história feita de resistência e de lutas, em que essa mulher tem sido protagonista graças à dinâmica de uma memória cultural ancestral (que nada tem a ver com o eurocentrismo desse tipo de feminismo)”. De acordo com Sueli Carneiro, a unidade na luta das mulheres em nossas sociedades não depende apenas da nossa capacidade de superar as desigualdades geradas pela histórica hegemonia masculina, mas exige, também, a superação de ideologias complementares desse sistema de opressão, como é o caso do racismo. O racismo estabelece a inferioridade social dos segmentos negros da população em geral e das mulheres negras em particular, operando ademais como fator de divisão na luta das mulheres pelos privilégios que se instituem para as mulheres brancas. Enegrecer o movimento feminista brasileiro tem significado, concretamente, demarcar e instituir na agenda do movimento de
mulheres o peso que a questão racial tem na configuração: Das políticas demográficas, na caracterização da questão da violência contra a mulher pela introdução do conceito de violência racial como aspecto determinante das formas de violência sofridas por metade da população feminina do país que não é branca; Introduzir a discussão sobre as doenças étnicas/raciais ou as doenças com maior incidência sobre a população negra como questões fundamentais na formulação de políticas públicas na área de saúde; Instituir a crítica aos mecanismos de seleção no mercado de trabalho como a “boa aparência”, que mantém as desigualdades e os privilégios entre as mulheres brancas e negras.Sueli Carneiro
Para concluir trazemos algumas estatísticas para reflexão: A população negra, independente de sexo, recebe 50% menos que a não negra. Quando isso inclui o recorte de gênero a situação fica ainda mais alarmante. A remuneração de duas mulheres negras juntas correspondem ao valor de uma não negra, para exemplificar melhor isso o rendimento anual médio de uma mulher negra, na região metropolitana de São Paulo, em 2002, foi de R$ 412,00 já para uma não negra foi de R$ 765,00. Segundo fontes do IBGE da década de 90, 23% da população negra economicamente ativa, estão no emprego doméstico. Já na população branca este percentual é de 6,1%. As mulheres negras chefes de famílias com até um salário mínimo de rendimento são de 60%, revelando uma escolaridades mais baixas. Já as famílias chefiadas por mulheres que recebem três salários ou mais a presença das mulheres negras reduz para 29%.
Além disso, é necessário destacar que existem questões específicas da saúde da mulher negra. Elas são mais afetadas por diabetes e hipertensão e morrem mais de câncer cervical e de mama que as mulheres brancas. A luta por um sistema de saúde pública digno faz parte da luta Tais estatísticas nos fazem erguida pelas mulheres negras. refletir o tamanho das desigualdades Página 21
existentes. Sem dúvidas avançamos muito na luta feminista e na luta contra o preconceito racial, mas ainda temos muito a trilhar no avanço do debate e nas práticas. A luta e o combate as opressões devem ser feitas no cotidiano. Seguimos juntos pela construção de uma sociedade igualitária! Pela construção de uma sociedade multirracial e pluricultural, onde a diferença seja vivida como equivalência e não mais como inferioridade! VI. A MULHER JOVEM NA UNIVERSIDADE* A sociedade como um todo é contaminada pela ideologia machista que prega que o homem é superior à mulher. Podemos perceber o machismo encarnado em nossas vidas cotidianamente, começando em casa, depois na escola, no trabalho, na igreja e isso não é diferente nas universidades. Essas instituições que a princípio deveriam ser desprovidas de tal ideologia machista, pois são nelas que muitas ideias são construídas e desconstruídas, são Página 22
lugares repletos não apenas do machismo, mas também das outras opressões como racismo, homofobia (no caso das mulheres a lesbofobia) e a transfobia. A mulher já sofre machismo em seu primeiro contato com universidade: os trotes. Os trotes que deveriam ser um espaço para integração dos calourxs na calourada são “brincadeiras” que envolvem submissão dos mesmos em relação aos veteranos. Entretanto com as mulheres tal submissão é ainda pior porque os trotes são completamente abusivos e machistas na maioria das vezes, colocando a caloura como uma completa submissa do veterano. O veterano passa a acreditar que é dono do corpo da caloura, como se ela fosse um objeto e não um ser humano. “Brincadeiras” como simulação de sexo oral em frutas, campeonato de beleza em que as calouras devem mostrar seus seios, palavras como “pertenço ao meu veterano” ou “sou uma caloura vadia” são escritas em seus corpos. As meninas são praticamente
obrigadas a participar porque senão são excluídas na integração social com os colegas de faculdade. Defendemos o fim do trote machista nas universidades! Veterano não é dono de caloura! Com as mulheres, o trote faz a subjugação de quem já é subjugada pela sociedade! Chega!! Outro fato que as mulheres precisam lidar nas universidades é o risco de sofrerem violência, como abuso sexual, estupro e até assassinato. Nos Estados Unidos o governo Obama realizou um relatório sobre abusos sexuais e através de uma pesquisa constatou que uma em cada cinco mulheres sofrem algum tipo de abuso dentro das universidades. Muitas meninas diziam que “precisamos falar sobre isso”. Isso significa que casos de estupros e abusos sexuais costumam ser ignorados. Ninguém fala sobre eles. No Brasil não é diferente. Não sabemos ao certo o número de meninas que sofrem ou já sofreram algum tipo de abuso sexual. Não há dados sobre isso e nunca foi feito algum relatório sobre o assunto como
nos Estados Unidos. Na maioria das vezes os casos são abafados pelos reitores que, não querendo causar alarde, tentam tapar o sol com a peneira e muitas vezes deixam passar situações como essas. Recentemente, uma tentativa de estupro de uma aluna de engenharia de produção da USP foi largamente divulgada pela imprensa. A única atitude do reitor da Poli em relação a isso foi o anúncio de que o banheiro feminino mudaria de local no prédio (já que ele ficava num lugar remoto). Mais nada foi feito. Outro dois casos de estupro ocorreram nos entornos da Universidade Federal Fluminense em 2013. Recentemente, uma estudante que saía da sala de aula, por volta das 20:30 h, foi abordada e violentada por vários homens que estavam em uma Kombi. Nos últimos quatro anos os casos de violência sexual aumentaram em 250% na cidade de Niterói e isso reflete principalmente dentro da universidade. Na UFF, por exemplo a lógica de segurança implementada pela reitoria da UFF deixa clara a sua prioridade: o Página 23
patrimônio e não a vida das pessoas. A empresa terceirizada contratada pela reitoria é uma guarda puramente patrimonial, que está nos campi para proteger somente o patrimônio. Os guardas não são treinados para lidar com a segurança das pessoas, o que deveria ser prioridade para a reitoria. O clima de insegurança é forte entre os estudantes. As mulheres estão sujeitas a violência em todos os cantos da universidade, não apenas em festas ou choppadas. Elas podem sofrer violência nos corredores, nas salas de aula, nos espaços livres, nos banheiros e inclusive em seus alojamentos. Até quando elas não estão estudando e sim descansando em seus alojamentos universitários, estão propensas a abusos de qualquer tipo. Os abusos não são apenas físicos, são psicológicos também. Desde as “brincadeirinhas” dos trotes, piadas machistas dos colegas, professores que tentam se aproveitar de suas alunas, até violências piores como abusos sexuais, estupros e assassinatos são frutos da ideologia Página 24
machista que nos cerca. Uma outra demanda do movimento feminista para as mulheres das universidades são as creches para as estudantes que são mães. Segundo a pesquisa do INEP/MEC de 2010, as estudantes mulheres ocupam 57,5% das vagas nas universidades públicas, porém são as que mais possuem obstáculos para a conclusão de seus cursos, principalmente as estudantes mães que precisam se dividir entre estudar, trabalhar e cuidar de seus filhos. A maioria tranca o curso por um tempo ou simplesmente desiste dele. Uma pesquisa realizada pela ANDIFES em 2011 revela que 68% dos trancamentos de matrícula são por licença maternidade e que há um percentual elevado das estudantes com filhos que utilizam as creches universitárias (43,4%), nas 19 universidades que dispõem do serviço. O que ainda faltam são vagas nas creches e muitas mães não conseguem colocar seus filhos em creches por causa dessa falta de vagas. Defendemos a ampliação das
creches para um número bem maior de universidades já existentes e a ampliação dos números de vagas nas creches as quais já estão instaladas em universidades. As creches devem ser implementadas com qualidade, com um sistema pedagógico eficiente, dado que estas não são apenas depósitos de crianças. Elas devem dar todas as assistências as mães e as crianças, como materiais pedagógicos gratuitos para que as mães não tenham gastos ainda maiores por causa das creches. Pelo direito de trabalhar e estudar: creche universitária já! As universidades, como já dito anteriormente, não estão excluídas do resto da sociedade, logo se percebe o machismo em todos os seus âmbitos, inclusive o político. O Movimento Estudantil não está excluído de ser um âmbito machista. Observa-se isso claramente dentro dos diretórios e centros acadêmicos que têm suas cadeiras compostas majoritariamente por homens, assim como os DCEs. Devemos nos atentar principalmente para a esquerda,
que contem a ideologia contra as opressões na teoria, porém na prática isso não ocorre. Muitos camaradas da esquerda cometem atitudes machistas diariamente e secundarizam o movimento feminista. Lembremos que a revolução será feminina, negra, gay, lésbica e trans! Vamos construir uma sociedade livre de qualquer tipo de opressão, camaradas! VII. A SAÚDE DA MULHER A saúde da/para mulher está doente! As mulheres trabalhadoras compõe a parcela da população que mais são afetadas com o sucateamento da saúde, por serem a maioria entre os funcionários e usuários. Por ser um setor voltado para o cuidado e assistência do outro, características tidas como feminina nessa sociedade, as profissões desta área são majoritariamente femininas como enfermagem, psicologia, fisioterapia, etc. As mulheres são refém de um SUS - Sistema único de Saúde, que não funciona. Além disso, as mulheres também são a maioria entre aqueles que dependem do serviço público de saúde. Isso pois são as responsáveis pelo bem estar da família e por isso Página 25
precisam cuidar das crianças e idosos doentes, ficando horas em filas nos serviços de saúde e muitas vezes ainda voltam para casa sem serem atendidas, tendo que responder pelos doentes de sua família. Como vemos a sociedade patriarcal exime o estado de sua responsabilidade com a saúde da população culpabilizando as vítimas. A Saúde das mulheres não pode ser voltada exclusivamente para a reprodução!!
parto, mas sim se restringe a oferecer um enxoval para o bebe, clara política populista adotada pelo PT. Pelo direito de ser mãe! Brasil possui alto índice de mortalidade materna! Apesar de as políticas de saúde serem voltadas para a saúde reprodutiva da mulher/mãe a taxa de mortalidade materna ainda é muito alta. Isso evidência a falência do SUS, que apesar de ser uma conquista do movimento de saúde e possuir princípios como integralidade, equidade e universalidade, o desmonte da saúde e a constante políticas de privatização e a falta de verba real deixam as mulheres trabalhadoras desassistidas. 90% dos casos de morte materna poderiam ser evitados, se existe uma assistência real a saúde da mulher. No Brasil a mortalidade materna é entre 5 e 10 vezes maior que nos países ricos.
As políticas públicas voltadas para a saúde da mulher em geral nos coloca mais uma vez no lugar de reprodutoras. Isso pois são voltadas para o aparelho reprodutivo, negligenciando ostras necessidades que as mulheres possuem, enquanto sujeito social único. Na sociedade patriarcal a mulher ainda é vista como uma “mãe” em potencial, não é a toa que as pessoa se assustam quando escutam de uma jovem que ela não quer ter filho, automaticamente Legalização do aborto é pensam que ainda há tempo de uma questão de saúde pública! mudar de idéia. O governo Dilma focou na concepção de materno-infantil de saúde com o “Projeto Rede Cegonha”, que além de só conceber a mulher como mãe, ainda não garante efetivamente um acompanhamento decente da gestação, parto e pósPágina 26
No Brasil uma mulher morre a cada dois dias por causa de abortos mal feitos. A Meninas pobres, negras, que moram em comunidades são as maiores vítimas de abortos, reflexo da ausência de políticas de prevenção a gravidez. Muitas meninas quando descobrem que estão grávidas
ficam desesperadas com medo de retaliações da sociedade e da família, por saberem que terão que criar sozinhas o filho, pois o pai não irá assumir, etc, tentam as formas mais agressivas ao próprio corpo de aborto, por serem as mais baratas e viáveis. Como perfurar o útero introduzindo na vagina objeto pontiagudo, tomar chás abortivos, forçar quedas ou bater na barriga, tomar remédios controlados, ou recorrer a casas de aborto que são verdadeiros açougues. O problema é que em muitos casos tais métodos inseguros de aborto deixam seqüelas no corpo da mãe, ou a criança não morre e nasce com alguma má formação. Na maioria dos casos, quando o aborto ocorre de forma insegura, a mulher precisa ir ao hospital para fazer curetagem. Nesses casos a equipe de saúde trata as mulheres como criminosas. São deixadas em macas nos corredores sangrando, como um castigo, para que todos possam ver o que “ fizeram”. Mas a vez a vítima é culpabilizada. Segundo o Ministério da saúde, de acordo com a Norma Técnica de Atenção Humanizada ao Abortamento (2010) afirma que os abortos induzidos são mais de um milhão ao ano. Desses cerca de 200 mil precisam recorrer ao hospital devido a alguma complicação. Desta forma, vemos que o dinheiro
gasto para atender essas meninas no SUS, pós aborto inseguro e mal feito, poderia ser aplicado para a elaboração do aborto legal no SUS, pois esta é a terceira causa de ocupação de leitos nas maternidades. Por isso legalizar o aborto é uma questão de saúde pública para que as mulheres parem de morrer e sofrer. No entanto, compreendemos que também é necessário que existam reais políticas de prevenção e distribuição de contraceptivos, assim como um SUS que funcione, para que de fato as mulheres que não possuem plano de saúde possam ter acesso a abortos seguros. Pelo direito a atenção básica e políticas de prevenção. Exigimos que o governo invista na saúde e não na doença! De acordo com dados do Ministério da Saúde (DATASUS) as mulheres brasileiras de 10 a 49 anos adoecem e morrem das seguintes causas prioritariamente: cânceres, doenças cardiovasculares, doenças infecciosas e parasitárias, doenças causadas pela gestação e parto. Não existem políticas de prevenção efetivas. A política de saúde ainda foca mais a doença do que a saúde. Na prática o SUS atende a pessoa quando já adoeceu, quando deveria cuidar para que não chegasse a Página 27
adoecer. Exames preventivos possibilitariam que a doença fosse detectada rapidamente e tratada de forma adequada, antes de evoluir. Como exames de mamografia periódicos, ginecológicos, etc. Campanhas educativas de prevenção a doenças também são muito importantes. Não é a toa que o índice de mulheres infectadas com DST´s/HIV em crescido muito. Hoje a contaminação entre mulheres jovens é maior que entre homens, como era no passado, são 8 casos em homens com HIV para cada 10 mulheres. VIII. EDUCAÇÃO SEXISTA
NÃO
Há cinquenta anos um episódio lamentável mergulhou o Brasil no seu maior retrocesso político, social, e a partir de certa altura, econômico. O golpe civilmilitar que vaporizou as nossas instituições republicanas em abril de 1964 ensejou uma ditadura militar que endereçava a condução dos assuntos de Estado à uma matilha de tecnocratas com o selo de aprovação antissocialista em benefício de uma minoria milionária interessada sempre no pior que o capitalismo tem a oferecer ao povo. A nossa ditadura militar teve algumas singularidades fascinantes e vergonhosas do ponto Página 28
de vista institucional: tanto o golpe que a chocou do ovo da serpente como o regime que ela conduziu contaram com a ampla presença—e participação—de tudo que a sociedade civil nutria de menos democrático; ao mesmo tempo foram poucos os ditadores que durante o regime gozaram de poder absoluto sobre as forças nascidas da mesma Caixa de Pandora que lhes colocara no poder. Os cinco generais-presidentes que encabeçaram o condomínio de interesses macabros por 21 anos só puderam manusear o cetro real na medida em que se movimentavam a favor dos mecanismos de sustentação do golpe: a domesticação da sociedade civil, a abordagem antipopular dos problemas nacionais, o anticomunismo extremista como instrumento de controle cultural, a militarização da crise social que avassala o País há séculos, e inversão dos papéis institucionais do Estado. Esses mecanismos se combinaram de acordo com a convergência de interesses conservadores e reacionários que produziram o consórcio do golpe. Domesticar a sociedade civil atendia à ideologia autoritária daqueles militares que esperavam uma paz social decretada de cima pra baixo para a correta administração do País, e também do empresariado que, num audacioso golpe para vencer a luta de classes, preferia ver militares usurpando o Direito para neutralizar agitadores sociais e trabalhadores conscientes do que
aceitar a participação dos mesmos na condução dos destinos políticos. A abordagem antipopular dos problemas nacionais brotava do preconceito de décadas que os militares brasileiros nutriam contra o comunismo, identificado como gatilho de qualquer proposta de poder popular, e também da tendência essencialmente antidemocrática de um empresariado que pode alegar gostar de democracia num banquete de sócios, mas sabe em seu âmago que a maneira mais fácil de obter lucros é prestando o mínimo de contas possível à população. E o Brasil, nessa ótica, é pouco mais do que uma máquina de fazer lucros. O anticomunismo extremista como instrumento de controle social fazia as delícias de uma Igreja que associava comunismo com a subversão dos valores da família cristã, de uma corporação convencida de que qualquer ideia de vanguarda é produto do movimento comunista internacional, e de uma classe média moralista sem coragem de se opor às elites mais soberbas, porém, disposta a se consolar com o patético papel de vigilante dos bons costumes e de guarda pretoriana da mais retrógrada das morais cívicas. Feito do comunismo um rótulo capaz de abarcar tudo de culturalmente perigoso, verdadeiros tarados foram elevados às funções mais decisivas de produção intelectual e artística no País, sob o pretexto de que a voracidade destes era uma
arma indispensável no combate à subversão. A militarização da crise social que avassala o Brasil há séculos saciava aquela mínima porcentagem de milionários brasileiros temerosos da possibilidade da ralé se apropriar de qualquer medida de fatia do volumoso bolo da riqueza nacional, dos empresários estrangeiros localizados no Brasil que monopolizavam setores da economia, receosos de qualquer mudança de regras capaz de beneficiar a democracia em seu prejuízo, e daquela ascendente classe média que sonhava com a possibilidade de auxiliar as aves de rapina do capital estrangeiro a fincar suas bandeirinhas sobre nossa economia em troca de algumas migalhas. Nessa correlação de forças, botar o Exército para desmobilizar o povo faminto e explorado sairia sempre mais barato que negociar com o mais pelego dos representantes das classes trabalhadoras. A inversão dos papéis institucionais do Estado ia ao encontro das preocupações do Departamento de Estado norteamericano, dos pudores da classe média anticomunista e das necessidades práticas dos lobistas do poder na nova ordem. Os verdadeiros motivos de combate ao comunismo sempre foram egoístas para a coalizão conservadora, mas para ampliar o apelo de manobra tão delicada era Página 29
necessário lançar mão da retórica pró-democrática que compensava em histeria o que lhe faltava em propriedade e profundidade. Assim, para conservar a fachada de regime democrático, o Congresso brasileiro não foi fechado, a não ser em ocasiões específicas—mas foi plenamente esvaziado de suas funções públicas (praticamente incentivado, portanto, a inventar funções privadas). O multipartidarismo não deu lugar ao fascismo monopartidário, mas a um bipartidarismo cínico que reservava ao situacionista os louros da vitória e ao oposicionista os ônus das crises. Isso maquiou a real situação de criminalização da diversidade política da nação e facilitou o desencanto popular com os instrumentos partidários. O Judiciário manteve algumas prerrogativas de independência, mas elas foram tão vagas e tão inúteis no destino da sociedade que esse poder acabou se encastelando cada vez mais, tornando o acesso à Justiça no Brasil um dos mais bloqueados do mundo industrial. Tudo era permitido à sociedade civil e aos poderes da República contanto que beneficiasse os que estavam no poder, e tão logo que eles se mostrassem incômodos, como na vitória contra a cassação de Márcio Moreira Alves em 1968, ou na espetacular vitória do MDB nas eleições de 1974, em breve eram esvaziados de sentido, importância e possibilidades. A ditadura aniquilou tantas instituições que não conseguiu respeitar nem as que ela própria criou Página 30
—isso ficou visível em 1969, quando o próprio processo de escolha do Presidente que o regime criou foi atropelado e a própria Constituição criada havia menos de dois anos foi quase inteiramente revogada. Essa sórdida combinação de interesses diabólicos com suas aspirações particulares e que necessitava de uma horrível combinação química para atingir seus objetivos se explica pela própria formulação do golpe. Ele nasceu de várias cabeças e foi desempenhado a várias mãos. O IPES, Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais, teve a função de reunir os militares golpistas que desde 1954 perseguiam o pálido centro-esquerdismo de João Goulart com o empresariado que não poderia se lançar sozinho contra a República num golpe de mão. A intenção do IPES era assumir onde o IBAD havia parado. O Instituto Brasileiro de Ação Democrática fora criado em 1959 para arrecadar fundos estrangeiros e nacionais— mas sempre clandestinos—para derrotar a esquerda nas urnas, mas o seu sucesso limitado em 1962 levou seus sócios a buscarem vitórias no tapetão, reunindo empresários da mídia, golpistas profissionais, agentes estrangeiros, e militares reacionários. O fim de março e o começo de abril de 1964 registrou o maior nível de unidade da direita brasileira em qualquer ponto em sua História— talvez comparável apenas a outubro e novembro de 1989. O resultado
foi particularmente triunfante porque não só não se registrou unidade similar das esquerdas, como elas estavam particularmente desagregadas em virtude dos 464 anos de relativa semiclandestinidade que lhe espremeram o bom senso e a capacidade para trabalhos coletivos. A ditadura só foi embora após reverter a esquerda a estágio similar de precariedade política e até mesmo teórica. Não conquistamos muita coisa desde então, a não ser a possibilidade de superarmos essas limitações históricas com um acúmulo considerável de experiência que pode nos levar a um estágio mais avançado na luta de classes, conquanto nos mantivermos sagazes e maduros, a fim de que nossa diversidade não se degenere em divisionismo por conta das nossas inseguranças e pequenas questões particulares. Mas, mesmo a ditadura em si tendo um fim, até hoje permanecem muitos resquícios da mesma na política e no estado brasileiro. Além disso, paira uma sombra – ou uma censura – sob o período nos capítulos da história brasileira, pois não há condenação dos criminosos da época e mesmo a verdade sobre o período ainda é revelada a conta-gotas, com a comissão da verdade só tendo sido instituída recentemente e ainda com muitas limitações.
para combater as consequências e resquícios da ditadura militar, para eliminar este fantasma ainda bastante presente que até hoje cega e censura a consciência da classe trabalhadora. É preciso abrir todos os arquivos e desnudar o que ocorreu naquele período. Porém, é preciso também punir exemplarmente todos os políticos, policiais, militares, empresários e civis que contribuíram com o regime e seus crimes. A polícia militarizada, autoritária, racista, machista, homofóbica, repressora e assassina que temos hoje é também uma herança maldita deste período. A luta que cresce hoje pela desmilitarização da polícia é de extrema importância e tem o apoio do Coletivo Construção. É essencial reivindicarmos a democratização da mídia e quebrar esse modelo oligopolizados que nasce do monopólio da globo, que foi criada por investimento de uma empresa americana visando edificar um aparelho de dominação ideológica e apoio ao governo anticomunista que se instalava. Neste sentido é crucial que defendamos a luta pela democratização da mídia, quebrando com a dominação ideológica imposta pela burguesia e dando aos trabalhadores acesso aos veículos de comunicação de massa.
Ainda há muita luta a se fazer Página 31