NASCIDO DA ESCURIDÃO Um romance Legado dos Hunter A autora de best-sellers do New York Times, Lara Adrian, apresenta o primeiro romance de uma nova e emocionante série de romances de vampiros ambientada no sombriamente sedutor mundo da paranormalidade de Midnight Breed. Como um ex-assassino do programa Hunter, Asher é um membro do pequeno grupo de vampiros da Raça Gen One. Um que sobreviveu aos horrores do laboratório de um louco e a crueldade na formação que fez dele um dos seres mais letais que existem. Agora, vinte anos depois de sua fuga dessas origens infernais, Asher é um solitário, cujo coração é tão frio quanto suas habilidades são impiedosas. Mas quando ele frustra uma matança no meio do deserto próximo de Las Vegas, Asher encontra uma mulher bonita que o leva a um jogo mortal contra inimigos poderosos – o que testará suas habilidades e sua honra manchada. Naomi Fallon está acostumada a sair de situações arriscadas. Órfã desde criança após o assassinato de sua mãe, ela não sobreviveu 26 anos nas ruas sem gastar a maior parte das suas nove vidas. Mas quando sua última aventura a leva para o deserto de Mojave contra os capangas de um gângster de Vegas, ela tem certeza de que seu tempo acabou. Então, ele aparece – imenso, brutal e longe de ser humano. Naomi nunca precisou da ajuda de ninguém, muito menos de um Raça. Mas depois de um risco tão alto, apenas um homem com as habilidades de Asher pode mantê-la segura. No entanto, o solitário vampiro sedutor e bonito tem seus próprios inimigos, e um segredo que não só vai quebrar sua fé nele, mas seu coração, provando o que ela temia o tempo todo... que a confiança é apenas uma ilusão e o amor pode ser a arma mais afiada de todas.
Capítulo 1 O deserto de Mojave se estendia em infinitas direções sob o céu escuro da noite. Essa era a terra de ninguém, nada além de acres de terreno sombrio repleto de vegetação desagradável e todos os tipos de predadores noturnos de dentes afiados que rondavam a escuridão em busca de presas. Por mais perigosos que fossem os habitantes selvagens de Mojave, não havia caçador mais letal que o homem Raça que atualmente se apressava ao longo da faixa vazia de asfalto, atrás do volante de uma antiga picape Chevy. Hoje à noite, Asher não saiu para caçar para si mesmo. Deixou o velho rancho a uns trinta e tantos quilômetros no deserto, numa missão para pegar ração animal e suprimentos domésticos. Não era a coisa favorita dele, fazer a jornada para a civilização na fronteira do estado de Nevada, mas era uma obrigação que acabou assumindo como um favor ao idoso humano que o abrigara há uma década e meia. Ned Freeman o aceitou com poucas perguntas e nenhum medo aparente ou desdém por quem – e o que – Asher era, ou de onde veio antes de acabar na parte do deserto do velho homem. Desde o falecimento de Ned no ano passado, a modesta casa e sua variedade de animais não tinham mais ninguém para cuidar deles, então Asher ficou. E porque não? Não tinha nenhum lugar urgente para estar. Ninguém esperando por ele em outro lugar. Como um produto de laboratório,
nasceu e foi criado para uma vida solitária. Era tudo que conhecia ou queria, mesmo agora. Dirigindo o caminhão de Ned ao longo da estrada sinuosa e curva que cortava um caminho no meio da Reserva Mojave até onde os olhos podiam ver, Asher sentiu um indiferente conforto no vasto vazio da terra que se tornara sua casa. O trajeto de duas horas que começou por volta das oito da noite se transformou em cinco depois que o caminhão estourou um pneu na saída. O velho estepe que Ned guardava atrás dos assentos da cabine não estava em muito melhor forma, ele descobriu, o que significava levar sua bunda até o posto de gasolina 24 horas da rodovia, em busca de um remendo e um pouco de ar. Era um alívio estar voltando para a fazenda depois de horas entre a aglomeração e o barulho da humanidade. As pessoas o deixavam nervoso, e não apenas porque a visão dele deixava a maioria dos mortais no limite. Com um metro e noventa e seis, pesando 120 quilos num dia normal, e a maior parte de sua pele marcada com dermaglifos semelhantes a tatuagens que o anunciavam como um dos mais puros da Raça, ele não se misturava exatamente. Fazia vinte anos desde que a Raça foi exposta aos seres humanos compartilhando este planeta com eles, mas as relações ainda eram tênues na melhor das hipóteses. Felizmente, esses problemas pertenciam a outros de sua espécie. Asher estava feliz em deixar os combates políticos e heroicos para os guerreiros da Ordem e seus comandantes nas principais cidades do mundo. Quanto a si mesmo? Fez matanças o suficiente, e nunca foi nada perto de um herói. Recostado no banco do motorista com a janela aberta para deixar entrar o ar fresco da noite, ele olhou para frente, para o trecho estreito e cheio de buracos do asfalto iluminado pelos faróis dianteiros amarelos da picape estridente. Um coiote uivou ao longe, uma canção que foi rapidamente captada por outros que se juntaram num refrão assombroso. Asher respeitava esses caçadores. Teve que matar um quando várias tentativas de proteger as galinhas de Ned falharam, mas não teve nenhum prazer nisso. Não que matar fosse um prazer.
Faça seu dever, garoto. O comando baixo e ameaçador deslizou por sua mente. A voz do seu velho mestre, o louco da Raça que criou Asher e dezenas de outros como ele em seu laboratório. Com um grunhido, Asher apagou a lembrança de Dragos e seu infernal programa de Hunters. Alcançando o botão no velho rádio do caminhão, ele sintonizou na única estação sem estática até o volume máximo. Nenhum ponto em viajar pela estrada da memória. Não era nada além de um campo de minas terrestres esperando para explodir. Em vez disso, deixou o ruído de uma música country melancólica abafar o ruído igualmente desagradável em sua cabeça enquanto se concentrava na estrada à sua frente. Estava a apenas quinze minutos do rancho quando seus faróis provocaram um brilho na distância a cerca de um quilômetro e meio da estrada. Um elegante sedan preto de luxo saiu da pista a cerca de cinquenta metros pela areia compacta do deserto. As narinas de Asher queimaram quando uma sensação de inquietação rolou sobre ele. Poucas pessoas tinham negócios tão longe da I-15, e nada de bom tendia a resultar quando se aventuravam naquele cemitério de areia sufocante. Neste ponto do deserto escuro, e há esta hora tardia, você parava aqui deliberadamente ou sob coação. Com o tempo, ele viu o suficiente de ambos para saber. Seus pensamentos se voltaram para uma noite, cerca de doze anos atrás, quando se deparou com um homem da mesma Raça – um ex-Hunter, como ele – nessa parte remota do deserto. O nome do macho era Scythe, e ele se arrastou até o Mojave para morrer ao sol depois de perder uma mulher que amava e seu filho pequeno. Foi Ned quem insistiu em levar Scythe de volta ao rancho e ajudá-lo a se curar, se eles pudessem. Mas foi Asher quem finalmente se recusou a deixar o outro homem desistir. Ele chutou o traseiro de Scythe através de semanas de recuperação, até que seu irmão Hunter finalmente estava bem o suficiente para partir. Não que uma boa ação pudesse compensar todo o mal que Asher fez em sua vida. Não faria nem um arranhão, na verdade. Mas ele estava contente que Scythe vivesse, e embora não tivessem muito contato, Asher ouviu que o
macho tomou uma companheira de Raça e estava vivendo uma boa vida na Itália em algum lugar. Ele tinha a sensação de que o que estava acontecendo perto do sedan preto estacionado não terminaria tão bem. Não era da sua conta. Não era problema dele também. Asher fez uma careta e desligou a música, silenciando o cantor de voz rouca que estava lamentando sobre a mulher que não sabia o quanto queria até que ela foi embora. Quase contra sua vontade, o pé aliviou o pedal do acelerador enquanto ele estudava o carro grande à frente. Parecia vazio, embora por quanto tempo não pudesse ter certeza. Sem problemas de pneus visíveis, sem cheiro de fumaça ou outros sinais externos de problemas no veículo. O que significava que o problema real estava ocorrendo em algum lugar entre as árvores de Josué e os trechos de cactos no deserto à direita. Os faróis do caminhão velho eram fracos, mas Asher os apagou completamente e parou de forma silenciosa vários metros atrás do sedã. Desligou o motor e abriu a porta enferrujada. No instante que suas botas tocaram o chão, sabia com certeza absoluta que algo estava errado. Estava silencioso. Estranhamente quieto. Nenhum inseto correndo sobre a areia, nenhum escorpião estalando nas rochas, nem asas de morcego batendo pesadamente durante a noite. Ele inclinou a cabeça para trás e farejou o ar. Pessoas. Três homens, dois aparentemente banhados em colônias rivais e enjoativas, outro cheirando a uma refeição recente cheia de alho. Pelo fedor, o cara deve ter apreciado uma grande pizza de alho com crosta de alho, seguida de molho de alho. Vozes soaram à distância, formas volumosas movendo-se contra as silhuetas negras das árvores ressequidas e da vegetação pontiaguda. O trio de ofensores olfativos estava empurrando outra pessoa à frente deles no escuro. O som de algo duro e metálico conectando-se com a carne macia e o osso
craniano foi pontuado por um grito agudo de dor e o arrastar abrupto de pés tropeçando e um corpo caindo na areia. — Levante-se! — O comando latido foi baixo, mas chegou aos ouvidos de Asher como um tiro. Outra voz respondeu, essa várias oitavas mais alta e falando rápido, as palavras indiscerníveis até mesmo para sua audição aumentada. Mas não precisava ouvir o que estava sendo dito. A ansiedade pulsando no ar da noite era inconfundível. Como era a ameaça dos três homens que não tinham ideia de que não eram os únicos assassinos na área imediata. — Você o ouviu. Fique de pé e continue andando, — ordenou o segundo homem, seu hálito de alho flutuando na brisa leve junto com sua risada sádica. — A menos que queira que deixemos sua bunda magra aqui mesmo. O patrão não se importa com isso, só que você nunca volte. O grito suave veio novamente, seguido por um pedido de misericórdia que fez o queixo de Asher apertar. Porra. Memórias antigas rugiam sobre ele como uma onda negra, muito rápida e poderosa para ele segurar. Um coro de gritos de misericórdia semelhantes encheu seus ouvidos, seus sentidos subjugados pelo vívido e impiedoso ataque de todos os pecados que testemunhou em seu passado. E aqueles que ele perpetrou. Lembretes indesejados de que ele já foi ruim o suficiente, mas junto com sua habilidade única de sentir as memórias dolorosas de qualquer pessoa em detalhes sensoriais completos e a lembrança total com o toque mais breve, fez da preferência de Asher pela solidão uma necessidade tanto quanto uma forma de vida. O que não precisava era se envolver com o que estava acontecendo entre Bafo de Alho e seus parceiros pesadamente perfumados e o adolescente magricela que evidentemente irritou alguém o suficiente para ordenar que esses homens arrastassem o garoto até a morte certa. Mas isso não impediu os pés de Asher de se moverem embaixo dele, indo direto para o problema. — Problema, senhores?
— Que porra é essa! — Um dos irmãos Colônia Barata girou em torno de seus sapatos polidos, o paletó escuro se abrindo para revelar o coldre vazio amarrado em seu peito. A arma que estava segurando tinha sangue vermelho brilhante de quando evidentemente, açoitou o garoto de cabelos escuros com o capuz enorme e jeans largos. Agora o bandido não parecia tão duro. Sua arma balançou em sua mão enquanto levantava o olhar, depois levantou um pouco mais, para encontrar o olhar estreito de Asher. — De onde diabos você veio... A fala morreu na parte de trás de sua boca quando olhou para Asher – realmente olhou para ele – tomando nota do brilho sobrenatural de suas íris e as pontas afiadas de suas presas, que irromperam de suas gengivas em resposta à fúria agora correndo em suas veias. — Oh, merda. — O tonto cambaleou atrás em seus calcanhares, soltando sua arma com um grito abafado. Saiu correndo às cegas para o deserto enquanto seu companheiro encharcado de patchouli dava uma volta rápida para o veículo. Asher mal olhou acima para seguir a fuga humana. A trilha de vapor que deixavam em seu rastro era como uma corda invisível que o levaria a ambos os homens, não importando o quão rápido ou longe tentassem fugir. Bafo de Alho não foi tão inteligente quanto seus companheiros. — Maldito sanguessuga, — ele rosnou. Ele tinha uma mão no ombro pequeno do garoto, possivelmente a única coisa que mantinha o jovem vacilante e espancado em pé. A cabeça do garoto estava baixa, um rosto com delicadas feições asiáticas quase ocultas por longos cabelos emaranhados de sangue. Bafo de Alho empurrou seu silencioso cativo para o chão com uma mão, sua atenção – e sua arma – fixa em Asher agora. A pistola semiautomática agarrada em seu punho do tamanho de um presunto não tremeu nem um pouco. — Coma chumbo, seu idiota Raça! Num rugido ele puxou o gatilho em fogo rápido, três tiros de curto alcance apontados para o peito de Asher. Todos, exceto o primeiro, erraram. E enquanto aquele único golpe à direita do esterno de Asher não o atrasaria, muito menos o mataria, isso o irritou.
Antes que Bafo de Alho pudesse pegar o resto de sua munição, Asher estendeu a mão e esmagou o cano da arma como se fosse feito de papel alumínio. — Estava dizendo? Olhos chocados se arregalaram, olhando para o rosto sombrio de Asher. O valentão não podia responder mesmo se tentasse. Asher tinha a garganta do homem em seu punho. Ele esmagou a frágil traqueia com uma flexão ociosa de seus dedos. Num gorgolejo ensopado de alho, o humano expirou pela última vez antes que seu corpo flácido caísse no chão do deserto como o lixo que era. Asher olhou atentamente para o jovem caído e estranhamente imóvel no arbusto próximo. Resistiu ao impulso de estender a mão e sentir a batida do coração, em vez de ouvir as respirações calmas e superficiais e observar a espinha e a caixa torácica se moverem quase imperceptivelmente sob o moletom folgado. O garoto estava vivo. Pelo menos isso contava como algo. Enquanto isso, ele tinha dois outros problemas para enfrentar. Calmamente, sem uma pontinha de sentimento, ele pegou a pistola ensanguentada da areia, onde o Colônia Número Um a derrubou e disparou um único tiro no deserto escuro. O tiro ecoou, então o covarde fugitivo caiu no chão a vários metros de distância, mortinho da silva. Asher se virou para encontrar o último dos três homens no acostamento da estrada, lutando para entrar no sedã preto. Outra bala poderia facilmente detê-lo também, mas a antiga linha de trabalho de Asher recusava-se a métodos tão rudes. Ele disse a si mesmo que era aquela parte fria dele que o impulsionou, e não o chute em seus intestinos que sentiu quando ouviu o garoto maltratado e indefeso implorando por misericórdia que nunca viria. — Onde pensa que vai? A voz profunda e imperturbável de Asher fez com que o último dos covardes saltasse com tanta força que poderia ser confundido com uma convulsão epiléptica. Preso entre a porta do motorista aberta e a presença
maciça
de
Asher
agora,
o
Colônia
Barata
Número
Dois
girou
desajeitadamente, mãos paradas na frente dele. — Oh Deus! Espere um segundo, tudo bem? Espere! — O homem falou com pressa, os olhos se movendo enquanto se aproximava do carro, como se uma parte instintiva dele que não podia aceitar sua morte iminente tivesse esperanças de chegar ao volante antes que Asher terminasse com ele. Fofo. O bandido lambeu seus lábios carnudos, o suor escorria de sua testa oleosa enquanto ele parecia considerar suas poucas e diminutas opções. — Olha, não quero nenhum problema com você, uh... Senhor. Só quero voltar a Vegas e sair do seu caminho. — Ele tentou sorrir, mas seus lábios não pareciam estar se comunicando com seu cérebro. Sua boca tremia e seus grandes dentes começaram a bater. — Por favor... tem que me deixar ir. Juro que nunca mais me verá depois desta noite. Asher não tinha dúvidas sobre isso. Brevemente, ele considerou deixar o covarde continuar a barganhar e implorar. Não para seu próprio prazer, mas para que pudesse descobrir para quem esses três idiotas trabalhavam. Mas essa era uma ladeira escorregadia, uma que não queria deslizar. Não importa para quem esses homens mortos trabalhavam, ou o que o garoto poderia ter feito para justificar uma morte tão cruel. Não, uma vez que lidasse com o último lixo, descobriria onde o garoto pertencia e garantiria que chegasse lá em segurança. Depois disso, caberia ao garoto cuidar do próprio pescoço. Asher voltaria ao rancho com seu trabalho e os animais e teria uma consciência limpa. Limpa sendo um termo relativo. Independentemente disso, não havia necessidade de se aprofundar mais ou se insinuar mais nessa situação do que já fez. Mas Colônia Barata continuou falando. — Está bem, está bem... Acho que entendi agora. Este é seu território e estamos invadindo. Certo, cara grande? Então, como posso consertar isso? Quer dinheiro? Posso te dar dinheiro. — Não quero seu dinheiro. A resposta rosnada fez o rosto do humano empalidecer. Sua mão subiu perto de sua garganta, onde o pomo de Adão balançava em seu duro gole.
— Também não quero seu sangue. Alívio escapou do humano numa respiração forte. Ele olhou por cima do ombro, de volta ao deserto iluminado pela lua, então disse algo realmente estúpido. — Quer a menina? Asher fez uma careta, só agora percebendo o óbvio. — O garoto é uma mulher? Ele assentiu. — Ela é sua, se a quer. Não vou contar a uma alma. Apenas me deixe ir, e pode fazer o que quiser com a cadela. — Uma nota de confiança invadiu o rosto do humano. Até conseguiu sorrir. — Leve-a. Então você e eu podemos apenas... esquecer isso. Asher grunhiu, longe de se divertir. — Eu nunca esqueço. Com a velocidade da luz, estendeu as mãos e torceu a cabeça do homem até que a coluna vertebral se partisse em duas. Com o cadáver desmoronado no asfalto, Asher caminhou até a parte de trás do sedã e fez um balanço do seu entorno. Três cadáveres e uma jovem inconsciente necessitando de cuidados médicos. Apenas fodidamente perfeito. E Pensar que um pneu furado foi sua maior dor de cabeça quando partiu mais cedo hoje à noite. Ele esteve na área por cerca de quinze anos e conseguiu se manter discreto. Embora, se por acaso o aparato judiciário-legal decidisse atravessar essa parte do deserto antes que os coiotes e abutres chegassem aos três homens mortos, sabia que estariam lhe fazendo uma visita. Só porque ninguém o incomodava, não significava que as pessoas não sabiam de sua presença. O rancho de Ned era um dos poucos domicílios entre Cima e Kelso, e embora houvesse muitos Raças vivendo em Las Vegas, ele seria o primeiro na lista de suspeitos devido à proximidade. Ele não temia nenhum homem, mas o pensamento de ser enjaulado ou do colar, ou ter que matar aqueles que juraram proteger e servir, não se sentava bem com ele. Especialmente, quando fez um favor a eles, eliminando alguns da ralé.
Com um último olhar para a pequena forma ainda deitada na areia, onde ela desmaiou há pouco tempo, Asher abriu o porta-malas com um comando mental e xingou quando suas suspeitas foram confirmadas. Ali, ao lado do estepe e do macaco, haviam duas pás enferrujadas, uma lona e uma fita isolante. Implacável, ele agarrou uma das pás e voltou para a areia e espinheiros, imaginando que verificaria a garota mais uma vez antes de se ocupar em cavar um túmulo para seus possíveis assassinos. Quando chegou ao local onde a garota havia caído, Asher parou e soltou uma maldição baixa. — Que diabos? Ela se foi.
Capítulo 2 Naomi mais tropeçou do que correu, seus pés se movendo tão lentamente que ela se perguntou se alguém amarrou os cadarços de seus tênis Van juntos quando não estava olhando. Mas os sapatos dela não a atrasavam. Era sua cabeça. Porra, isso doía. Ela passou a maior parte da noite sendo maltratada por aqueles gângsteres de Vegas. Seu crânio já estava doendo pelo que ela tinha certeza que era uma concussão após o golpe inicial que sofreu quando a colocaram no porta-malas no Cassino Moda. Agora, sua têmpora esquerda estava latejando como um tambor, seus sentidos enevoados após a pancada da pistola, que foi de uma situação já porcaria para de merda. No início, quando os capangas de Leo Slater a confrontaram no elevador do cassino, ela ficou chateada por ser pega, mas nunca lhe ocorreu que não sobreviveria à noite. Era chocante a rapidez com que as coisas aconteceram. Mesmo quando a levaram direto para o porão e saíram pela entrada subterrânea secreta da garagem, ela estava confiante de que iria se
safar de alguma forma. Mas então Gordo, o cara grande com mau-hálito, enfiou o punho na sua testa e estava apagada. Acordou quando a puxaram para fora do porta-malas no meio do deserto sob um céu negro. Não era bom. Mas, mesmo assim, não desistiu de si mesma. Era hábil em sair de espaços apertados e situações perigosas. Inferno, ela sobreviveu tanto em seus vinte e seis anos que nove vidas não seriam suficientes. Ela tinha certeza de que nasceu com mais de uma dúzia. Foi a visão da arma dos bandidos e o silêncio de milhas de Mojave que a preocuparam que sua infinita sorte aparentemente acabasse. Ela sempre estava preparada para a luta ao longo do voo, mas entendeu rapidamente que sua única esperança de fuga era fingir mansidão e acalmar os três idiotas num sentido de complacência, enquanto a levavam para a areia. Tudo que tinha a fazer era representar seu papel e esperar até ter chance de fugir. Era um bom plano – seu único plano, na verdade – até que o amigo de Gordo ficou impaciente e esmagou a ponta de sua Beretta contra sua bochecha. A última coisa que se lembrava era de cair no chão e implorar para que a poupassem. Parte disso fazia parte de seu jogo, mas quando sua visão começou a se encher de estrelas e seu crânio ficou espesso com algodão, ela percebeu um momento de verdadeiro medo. As probabilidades eram muito boas de que ela estava prestes a morrer. Então ele apareceu. Não algum cavaleiro branco cavalgando para salvá-la, mas um macho Raça. Grande. Impiedoso. Letal. Possivelmente, a única coisa pior que iludir a morte certa nas mãos dos capangas de Slater era o fato de que foi poupada por uma ameaça ainda maior à sua existência. Ela não tinha certeza do porque o imenso vampiro veio em seu socorro, mas não ia ficar por perto e descobrir. Quaisquer que fossem suas razões, ela não estava interessada em oferecer sua carótida em pagamento. Sem mencionar mais alguma coisa que o imortal rosnando podia ter em mente.
Então, voltou ao Plano A. Correr e se esconder, depois descobrir uma maneira de voltar a Las Vegas inteira. Se apenas suas pernas estivessem a bordo desse plano. Cada passo sobre a areia dura e desigual parecia exigir esforço hercúleo, como se arrastar pelo melaço. A noite estava tão escura quanto breu, mas ela foi retardada ainda mais pelo embaçamento de sua visão e pela batida incessante dentro de seu crânio surrado. Náusea rolou sobre ela, fazendo-a cambalear. — Supere, Botão de Ouro, — ela se repreendeu em voz baixa. — Passou por situação pior que essa. Apenas continue andando. Continue empurrando. Encorajada pelo discurso de motivação autodirigida, elaabaixou a cabeça e deu mais alguns passos... só para bater numa parede maciça que pareceu se materializar no ar fresco da noite. Exceto que esta parede estava quente. Quente mesmo. E construído por carne musculosa e força sólida e imóvel. E esta parede cheirava bem também. Temperos escuros misturados com sabão limpo e algo menos fácil de definir. Ela respirou o cheiro e gemeu em reflexo pela grande melhoria sobre qualquer outra coisa que estava inalando a noite toda. — Não há necessidade de fugir. — A voz profunda sacudiu sua mente de volta à realidade fria. Puta merda! Ela deu um pulo para trás, depois girou e disparou na direção oposta com tudo que tinha. Mas lá estava ele na frente dela novamente, bloqueando qualquer esperança de fuga. Ela parou, bufando e cedendo, prestes a desmaiar. — Eu disse para parar de correr, garota. — Foda-se você! Ela tentou se esquivar dele, mas seu corpo grande era mais rápido. Apenas sobrenatural. — Percebe que está apenas perdendo a pouca energia que tem, não é? Ele estava zombando dela, ou apenas declarando fatos tristes? De qualquer maneira, ela não gostou.
Ela olhou acima, forçada a inclinar a cabeça, a fim de ver seu rosto carrancudo, o capuz de seu moletom caiu de sua cabeça. Imediatamente, desejou não ter olhado. Não era que fosse feio, tanto quanto queria fingir que ele era. Não era bonito, mas surpreendentemente masculino. Impressionante em um nível primitivo que fez até mesmo seus sentidos contundidos responderem com apreciação indesejada. Seu rosto era áspero e sombreado, sob as ondas marrons e desgrenhadas de seu cabelo longo, como se o escultor de Heaven tomasse um bloco de pedra e esculpisse até que estivesse quase pronto e depois parado. Planos rígidos, ângulos agudos, queixo quadrado. Ela não podia dizer a cor dos olhos que a examinavam debaixo dos cortes castanhos de suas sobrancelhas. Brasas iluminavam suas íris, seu brilho aquecido não deixando dúvidas de que era algo diferente. Como se as pontas brancas afiadas e peroladas de suas presas não fossem suficientes para lembrá-la do que estava lidando aqui. Um assassino frio e sem emoção. Ela o viu em ação enquanto ela bancava a desmaiada e assistia sob seus cílios abaixados enquanto ele despachava Gordo e os outros dois bandidos. Ele foi implacável. Seus métodos rápidos e brutais, sem hesitação. Ela fez questão de ficar o mais longe possível de sua espécie, mas todas as espécies desde a criação da Terra tinham sérias ameaças como ele. O tipo de cara que ninguém queria encontrar num beco escuro, porque sabia que apenas uma pessoa ia sair e que as chances eram de que não seria você. E agora, ali estava ela, indefesa e sozinha com aquele enorme macho Raça no meio do Mojave, o cemitério sem marcas de incontáveis prostitutas, fugitivos e fraudadores de cartas. Nenhum lugar para correr e ninguém para ouvi-la gritar, mesmo que pudesse reunir forças para tentar qualquer um deles. Ela olhou para ele novamente, tentando julgar suas intenções. O rosto rude que a encarava era ilegível, mas havia conflito em seus olhos. Como se ficar ali com ela fosse o último lugar que ele queria estar também. — Você está sangrando, — ela apontou, olhando para o peito dele. — Gordo atirou em você.
Ele encolheu os ombros. — Não é nada. Sou Raça. Vai curar em poucas horas. — Eu sei o que você é. Ela não queria que soasse como uma acusação, mas era tarde demais para voltar atrás. Para ser justa, não conheceu nenhum homem de qualquer tipo, mortal ou não, em quem pudesse confiar em todos os seus vinte e seis anos. Bem, exceto Michael. E ele dificilmente contava porque era mais como um irmão para ela desde que ambos eram crianças órfãs correndo soltas nas ruas. Merda. Michael. Ele devia estar preocupado com ela. A essa altura, o telefone dela provavelmente estava explodindo com ligações e mensagens de seu melhor amigo pedindo notícias. Não que ela pudesse responder, mesmo que quisesse. O telefone dela estava enterrado numa lixeira na Moda, jogado ali junto com a identidade falsa de estudante que Leo Slater tirou dela momentos antes de colocá-la no porta-malas do sedã. — Qual seu nome, garota? — Zoe, — ela respondeu, deixando a mentira sair de sua língua tão facilmente como quando o trio de capangas veio para levá-la para longe do cassino. Ela tinha dezenas de apelidos, muitas vezes era difícil lembrar seu verdadeiro nome. O que a mãe dela, Aiko, lhe dera no dia em que ela nasceu. O que não ouvia desde os oito anos de idade. Seu improvável salvador grunhiu, estudando-a em silêncio inquietante por um longo momento. — Não parece uma criança estúpida, Zoe, — ele comentou. — Então, que tipo de problema teve com homens como esses três e seu chefe? Ela engoliu em seco, tentando decidir o que seria melhor para ela com esse homem perigoso que parecia ter engolido o disfarce de adolescente tão prontamente quanto seus captores originais. Mas esse macho Raça não era um idiota como Gordo e companhia. Seu olhar astuto e cintilante fixou-se sem piscar nela, e ela sentiu com uma certeza fria em sua medula que ele saberia se tentasse alimentá-lo com mais mentiras. — Tentei roubar algo deles hoje à noite. De um cassino.
Ele grunhiu. — Dinheiro? Ela assentiu, estremecendo com a dor resultante causada por pequenos movimentos. — Sim, peguei um pouco de dinheiro de uma máquina caça-níqueis que deu defeito. Pegaram-me antes que eu pudesse sair pela porta com isso. O queixo quadrado ergueu-se, depois sacudiu ligeiramente a cabeça. — Talvez você seja estúpida. Ganância e más escolhas são duas das principais razões pelas quais as pessoas acabam aqui no meio da noite. Ela não tinha dúvidas de que ele estava certo. E embora estivesse dando a ele uma pequena porção de honestidade, não via razão para explicar que o “pouco de dinheiro” que tentou roubar esta noite estava na casa de dois mil, nem que o fato dela ter chegado perto daquela quantia considerável de dinheiro era porque tinha conseguido enganar uma das máquinas de um modo que só ela podia, então subornou outro jogador com cem dólares para coletar seus ganhos para ela e entregá-los. Em vez da velha senhora grisalha do Kansas a encontrar no elevador com seu pagamento, conforme combinado, Naomi foi interceptada pela segurança do Moda. Ela se recusava a chamar sua motivação de ganância, mas supôs que tinha que lidar com o fato de que foi uma má decisão correr um risco tão grande. De agora em diante, não confiaria em intermediários quando se tratasse de coletar seus ganhos no cassino de Slater. Ela teria que começar a ser mais criativa. Ela esfregou distraidamente os pulsos enquanto tentava pensar com clareza. Tudo doía. Foi um longo dia e uma noite ainda mais longa. Seu cérebro estava embaralhado e ela só queria ir para casa, subir em sua cama e deitar por uma hora ou dez. Mesmo que alguma lógica fraca lembrasse a ela que um longo sono era apenas a pior coisa que poderia fazer com uma concussão, estava tão exausta que mal podia permanecer em pé. Se não saísse desse deserto em breve e voltasse à estrada para Vegas, poderia desmaiar exatamente onde estava.
Com o cérebro embaçado e as pernas ficando mais fracas debaixo dela a cada segundo, sua capacidade de planos inteligentes e movimentos ousados estavam desaparecendo rapidamente. Junto com suas opções. Tinha que descartar seu plano original de correr e procurar abrigo até que pudesse despistá-lo ou pegar o caminho de volta para a interestadual. Em sua condição atual, ela nunca iria a qualquer lugar a pé. O que significava que não estava apenas em dívida com este macho Raça hoje à noite, mas também à sua mercê. Uma vez que tanto a luta quanto a fuga estavam fora da mesa, desde que ele se aproximou dela, tudo que tinha para trabalhar eram suas habilidades de negociação. E ousadia. Ela podia muito bem agarrar os dois e jogar os dados. Deus, ela gostava muito mais quando esses dados eram carregados a seu favor primeiro. — Olha, senhor, ah... como disse que era seu nome? — Não o fiz. — Aqueles olhos brilhantes da Raça pareciam ver através dela. — Sou chamado de Asher. Nome incomum e maneira estranha de colocá-lo também. Mas então nada sobre esta noite era normal, muito menos esta conversa com ele. — Ok, Asher. — Ela assentiu, lembrada pelo doloroso movimento de seu cérebro dentro de seu crânio, que mesmo pequenos movimentos não eram uma boa ideia agora. Sua carranca escureceu quando ela cambaleou sob a onda de outra rodada de náusea. — Como estava dizendo, Asher, realmente aprecio o que fez por mim aqui. E mesmo que não esteja preocupado com esse buraco no seu peito, lamento que tenha levado um tiro tentando salvar meu traseiro. Agora, só quero ir para casa, tomar um banho quente e depois dormir por uma semana. Tenho certeza que você deve ter coisas que preferiria estar fazendo hoje à noite também. Enquanto ela falava, seu olhar percorreu seu rosto em escrutínio avaliativo. Se o descontentamento em sua expressão fosse qualquer coisa, ele não parecia gostar do que via. — Você fala demais. E ele quase não falava nada, não que isso importasse. Ela não podia ler seu rosto de pedra e olhar sobrenatural mais que podia avaliar suas palavras curtas, medidas e rosnados sem tom. Tudo que sabia era que ele
parecia tão ansioso para se desfazer dela, como ela estava para colocar toda a noite em seu espelho retrovisor. — Ok, — ela anunciou, sentindo-se quase alegre. — Então, acho que vou embora agora. Vendo como Gordo e seus amigos não precisarão mais do carro deles, vou encontrar as chaves e pegar a estrada. Ela forçou um sorriso apertado apesar da dor florescente em sua mandíbula, mas ele não sorriu de volta. — Nem parece ter idade para dirigir. Ela zombou. — Tenho vinte e seis anos. — O diabo que tem. — Aqueles olhos ardentes vagaram sobre ela novamente, da cabeça aos pés dessa vez. Foi uma viagem curta, considerando que ela tinha apenas um metro e sessenta. Também estava enterrada em camadas de roupas soltas que poderiam encaixar três dela dentro. — Não sou uma menina, — ela murmurou, indignação madura em sua voz. — Aqueles capangas só pensaram que eu era uma criança por causa de como estou vestida e porque disse a eles que era menor de idade. Achei que seria o suficiente para me soltarem, mas achei errado. Ele não parecia satisfeito em ouvir isso. — Não é uma criança? — Posso ser quarenta centímetros mais baixa do que você e ter cerca de quarenta e cinco quilos a menos, mas sou uma mulher adulta. Provavelmente não era a coisa mais inteligente a dizer para um predador como o que agora estreitava seu olhar e inclinava a cabeça para estudá-la mais de perto, mas culpou sua concussão pela imprudência. Além disso, se esse macho quisesse atacá-la, seu estado de adulta provavelmente não importaria e já teve tempo e oportunidade suficientes para fazer o pior. Pelo menos, essa era a racionalização a que se agarrava enquanto rezava por sua única saída viável para essa bagunça. Garras de dor se fecharam sobre seu crânio latejante, apertando ainda mais. Ela gemeu antes que pudesse impedir que o som patético escapasse dela. — Está ferida. Esse caroço na sua cabeça precisa de atenção médica. — Eu sei, — disse ela, tanto quanto custava admitir. Deus, ela odiava se sentir fraca e impotente mais que qualquer outra coisa no mundo. Ela
passou grande parte de sua infância dessa forma e lutou todos os dias para ter certeza de que nunca mais se sentiria assim. Ouviu sua profunda exalação e a maldição que a rodeava. — O hospital mais próximo fica em Henderson. Não está em condições de dirigir, muito menos chegar tão longe. Ele provavelmente estava certo. Não, ele estava definitivamente certo. Uma súbita onda de exaustão fluiu sobre ela e ela gemeu, mais cansada que se lembrava de estar em muito tempo. Sua cabeça estava começando a girar, sua visão nublando. Droga, ela estava desaparecendo rapidamente. Pegar o volante agora provavelmente faria o que os bandidos de Leo Slater pretendiam fazer com ela. Ainda assim, que outra escolha tinha? — Vamos, — ele afirmou categoricamente. — Vamos? — Ela piscou para ele, observando aquele queixo quadrado descendo com seu breve aceno de cabeça. — Ao hospital. Eu te levo lá. Ah, merda. Ele estava falando sério? Entrar num veículo com ele? Acreditava que ele realmente faria o que disse e não desviaria para outro lugar, ou talvez decidisse cobrar sua dívida com uma ou duas gotas de seu sangue? — Não. — Sua resposta disparou para fora dela, uma façanha nada fácil quando sua língua estava engrossando dentro da secura de algodão de sua boca. Ela deu um passo atrás e sua visão nadou. — Vou ficar bem, — ela murmurou, suas palavras sussurradas enquanto falava. — Só... preciso de um minuto... para... descansar e... pegar meu... Esteve consciente tempo suficiente para sentir os joelhos começarem a se dobrar sob ela. Mas se bateu na areia dura e nos espinhos do deserto um instante depois, não tinha ideia. Pela
segunda
vez
inevitavelmente, ficou escuro.
esta
noite,
o
mundo
dela
subitamente,
Capítulo 3 Asher segurou a mulher inconsciente em seus braços e deixou sua maldição murmurada voar na brisa da noite. Ela pesava quase nada, mesmo vestida em metros de tecido disforme e jeans. Por mais descontente que tenha ficado ao saber que ela não apenas era mulher, mas uma mulher adulta, além disso, pelo menos uma pequena coisa estava a favor dele hoje à noite. A roupa poupava os dedos de tocar sua pele nua. Se fizesse essa conexão tátil, sua mente estaria agora inundada com todas as piores de suas memórias agonizantes. Ele olhou para a cabeça caída e cabelos negros sedosos na altura dos ombros, percebendo apenas agora quão bonita ela realmente era. Chamar suas feições de delicadas mal fazia justiça a ela. Além das roupas largas e simples que usava, ela parecia uma perfeita boneca de porcelana, um pequeno anjo de cabelo cor de ébano dormindo em seus braços grandes. Seus olhos amendoados tinham um tom impressionante de marromdourado antes de se fecharem. Agora suas pálpebras fechavam seu olhar inteligente e inclinado, grossas franjas de cílios negros flutuando contra a suavidade leitosa de seu rosto. A boca em forma de arco que ele duvidava que descansasse muito enquanto ela estava acordada agora estava relaxada,
respirações suaves que sopravam pelos lábios entreabertos muito sensuais para sua paz de espírito. — Zoe, — ele disse, esperando que o som do nome dela pudesse acordá-la. Ela não se mexeu. E pelo que não foi a primeira vez, ele se perguntou se era mesmo o nome dela. A mulher era uma guerreira e uma lutadora, isso ele podia adivinhar. Para não mencionar ladra, por sua própria admissão. Mas também era tola se achava que podia correr tão longe de um chefe de cassino obviamente poderoso que mandou matá-la, e então voltar a Vegas como se nada tivesse acontecido. Então, novamente, não era o maldito problema dele. No entanto, ali estava ele, não mais longe de toda essa situação desagradável do que no momento que parou o caminhão de Ned ao lado da estrada para dar uma olhada. Não, estava ainda mais profundo agora – pelo menos até que limpasse os corpos e deixasse sua bagagem indesejada na sala de emergência do hospital mais próximo. Seja qual fosse o problema que ela teria depois disso, não era da sua conta. Asher levou-a para a área onde Gordo e seus companheiros estavam, cuidadosamente colocando-a num pedaço de areia enquanto ia trabalhar para terminar seu trabalho de limpeza. Uma vez que o grande buraco foi cavado e depois preenchido com seus três ocupantes permanentes, dirigiu o sedan o suficiente para o fundo do deserto que não seria visto da estrada tão cedo. Então voltou para lidar com a fêmea. Ele meio que esperava que ela tivesse ido embora quando voltasse. Ou talvez esperasse que ela estivesse lá. Mas ela ainda estava onde a deixou, ainda enredada no sono não natural que faria mais mal do que bem se sua concussão fosse tão grave quanto ele suspeitava que era. Ele se agachou ao lado dela, tentando não se fixar em quão suave e inocente ela parecia. Ou como era tão bonita que quase doía olhar para ela. Quanto tempo se passou desde que teve uma mulher?
Um mês, ele adivinhou. Inferno, talvez dois. Muito tempo, tempo demais, com base na agitação primitiva que sentiu quando seu perfume doce e quente invadiu seus sentidos, acendendo uma necessidade possessiva nele que não queria reconhecer. O desejo de tocá-la era quase demais para resistir. O sangue vermelho-escuro atualmente secando num riacho fino em sua têmpora também não estava ajudando. Suas presas já estavam estendidas por sua raiva na batalha anterior. Agora pulsavam em suas gengivas por uma razão completamente diferente. — Zoe. Acorde. — Ela ficou imóvel, perturbadoramente imóvel. Ele sacudiu o ombro dela, quase incapaz de sentir a carne e osso diminutos sob o moletom grosso. — Zoe? — Uhhnn... — Suas pálpebras tremeram, mas seus olhos não abriram. E embora seus músculos se contorcessem sob seu aperto enquanto continuava a acordá-la, ela mal estava respondendo. — Cansada... Ele franziu a testa, tendo pouca experiência com doentes ou feridos. Esteve com Ned até o fim de sua vida mortal, mas o velho tinha facilitado morrendo em seu sono. A julgar pela incapacidade da mulher de permanecer acordada ou em pé, tinha a sensação de que, se não fizesse algo para deixá-la consciente logo, ela talvez nunca mais acordasse. — Sei que está cansada, mas tem que se levantar agora. Ela gemeu em protesto, enterrando o rosto mais fundo em seu enorme capuz. Sua voz era baixa e sonolenta, sua fala arrastada. — Vá em frente, Michael. Me deixe dormir. Michael? Ouvi-la murmurar o nome de outro homem cravou mais que curiosidade nele. Algo mais profundo que irritação também. Se estava acostumada a esse outro homem a acordando – esse Michael – então onde diabos ele estava agora? Não deveria sua vida ou morte ser a preocupação desse homem mais que a de Asher? — Vamos lá, Zoe, — disse ele, mais rude do que pretendia. — Em pé agora.
Quando ela continuou deitada lá, ele passou os dedos pelo cabelo molhado de suor e expeliu uma maldição. Então se abaixou e tomou-a sob os braços, levantando seu corpo sonolento em pé. Se não a segurasse, ela teria caído no chão no instante que ele a soltasse. Podia ver que isso não estava indo a nenhum lugar produtivo, então com um braço segurando-a atrás dos joelhos, a trouxe de volta para o berço de seus braços e começou a se dirigir para o velho caminhão. Como se a primeira vez que a segurou contra ele desse jeito não fosse tormento suficiente, agora sentia cada curva de seu pequeno corpo, cada batida constante de seu coração. Ela não era dele, mas ele teria dado a vida por ela hoje à noite. Ele sabia disso com uma certeza que martelava como um tambor de guerra em suas veias. Felizmente, havia poucas situações em que sua genética e treinamento podiam falhar, mas a verdade do que estava disposto a fazer por essa mulher que não conhecia e que não deveria dar a mínima o surpreendeu enquanto a carregava para o caminhão. Se não perdesse mais tempo, poderia tê-la no hospital em Henderson dentro de uma hora. Bastante tempo para deixá-la na porta e voltar ao rancho bem antes do nascer do sol, o que era fundamental para sua própria boa saúde. Se tivesse sorte, talvez a lesão na cabeça de Zoe apagasse todas as lembranças do que aconteceu aqui hoje à noite – incluindo sua intervenção. Deus sabia que desejava poder esquecer, mas duvidava muito que pudesse limpar da memória seu lindo rosto e os olhos cor de xerez de seus pensamentos. Para não falar de seu quase desaparecimento brutal. Deslocando seu peso leve em seus braços, abriu a porta do passageiro e gentilmente a colocou dentro. Ela começou a cair de lado, mas ele a endireitou, forçado a segurar o meio dela para que pudesse alcançar o cinto de segurança e firmá-la no lugar para o passeio à frente. Não foi até aquele momento que viu algo mais sobre ela que não tinha notado antes e com certeza nunca iria esquecer. — Filha da puta.
Sob a curva teimosa de seu queixo, quase obscurecida por várias contusões, arranhões e fuligem, havia uma pequena marca de nascença vermelha, que ele não confundiria com outra coisa. Uma maldição explodiu dele, baixa e madura, enquanto olhava para aquele singularmente significativo símbolo de lua crescente e lágrima. Esta fêmea era uma Companheira de Raça. Asher olhou para ela, a fúria crescendo nele. Essa pequena marca mudava tudo. Porque agora que a viu, essa mulher não era mais um problema que podia simplesmente despejar na sala de emergência mais próxima antes de sair correndo para retomar sua vida sem olhar atrás. Mulheres com essa marca eram raras. Preciosas. Amadas por sua espécie. Protegidas a todo custo e com até o último pedaço de honra que um macho Raça possuía. Até mesmo um assassino frio como ele respeitava esse protocolo não escrito. Mas isso não significava que tinha que gostar. — Foda-se. — Asher deixou-a no banco do passageiro e andou num círculo apertado na alça empoeirada da estreita faixa de duas pistas, enquanto tentava decidir o que fazer sobre ela agora. Nenhuma escolha, exceto a óbvia. Tinha que levá-la de volta ao rancho com ele. E então tinha algumas ligações a fazer. Favores a pedir aos únicos membros Raça realmente equipados para lidar com uma Companheira de Raça do lado errado de um inimigo poderoso que já deixou claro que a queria morta. Contornando o caminhão com passos determinados, subiu atrás do volante e ligou o motor. Ressoou à vida, vibrando como um terremoto de baixo nível, como sempre fazia nos primeiros minutos em que acelerava. Nem mesmo isso foi suficiente para acordar a Companheira de Raça ferida ao lado dele no banco largo. Asher soltou outra maldição e engatou a caminhonete, rugindo no trecho desértico do asfalto. Dirigiu o mais rápido que o velho Chevy podia aguentar, não diminuindo a velocidade até que saísse da estrada principal e
atingisse a pista de terra que acabaria levando-os para frente da fazenda isolada de Ned. Quando parou na frente do lugar, os faróis amarelos do caminhão iluminaram a velha casa e sua coleção de piquetes e dependências, e não pôde deixar de tentar vê-lo através dos olhos de um estranho – os olhos dela. E definitivamente não era muito para se olhar. Não que ele não tivesse cuidado disso enquanto estava lá. Gostava do jeito que Ned fez as coisas. O que significava que o encanamento funcionava muito bem, a fundação e a construção eram sólidas como pedras, e o local era bem isolado contra o frio que agarrava o deserto em longas noites de inverno. Asher instalou boas janelas e portas ao longo dos anos e, por insistência de Ned, acrescentou meia dúzia de painéis solares no telhado para aproveitar um pouco da energia do implacável sol do deserto que Asher evitava. Ele franziu a testa ao notar a tinta branca lascada na varanda e a falta de qualquer paisagismo ou jardim de verdade. O galinheiro estava em bom estado e não estava cedendo. E o par de cavalos velhos e esqueléticos – Trixie e Jubileu, em homenagem a duas irmãs de Ned que lhe passaram varíola quando ele era criança – tinham um piquete que Asher cuidava toda noite, certificando-se de que o celeiro estava cheio de feno fresco e água abundante... Mas quanto ao charme? A velha casa e os arredores estavam decididamente em falta. Não que ele ou Ned já tivessem precisado de charme. E no que diz respeito à convidada inesperada de Asher, ela não ficaria tempo suficiente para sofrer por falta do luxo que poderia estar acostumada em Las Vegas. Era um lugar seguro para se esconder até que pudesse tomar as providências necessárias para sua mudança. Porque Companheira de Raça ou não, quando aqueles capangas que foram enviados para se certificar de que ela ficasse no deserto não aparecessem para o trabalho amanhã, o seu empregador iria querer respostas. E Asher só podia imaginar que haveria um inferno a pagar uma vez que o chefe do cassino descobrisse que perdeu seus homens e o pequeno ladrão que planejava eliminar.
Ele saltou do caminhão, guardando as chaves enquanto o cascalho rangia até o outro lado. Ela se encolheu quando ele soltou o cinto de segurança e a pegou em seus braços. Sua cabeça caiu contra seu ombro, sua voz um sussurro. — Ainda estamos em casa, Michael? Asher apertou seus molares com a lembrança do homem que ela aparentemente dependia de conforto, apesar do fato de que seu Michael evidentemente a deixou para lutar com Gordo e seus amigos sozinha. — Você está segura agora, — ele disse a ela com força, quando girou a porta fechada atrás dele. Um uivo triste do outro lado da porta de tela o cumprimentou quando entrou na varanda. Sam, o cão amarelo idoso de Ned, olhou para ele de dentro da casa com grandes olhos castanhos patéticos. Asher balançou a cabeça lentamente, confuso pelo animal. O maldito cachorro rondava dia e noite e geralmente não lhe dava atenção a menos que ele tivesse comida em suas mãos, mas no segundo que deixava o rancho para fazer uma rápida missão, você pensaria que deixou o pobre vira-lata por um ano. Com o cotovelo, Asher empurrou a porta, ele nunca se dava ao trabalho de trancar, e entrou na casa escura. O rosto de Sam, já bastante triste, graças à Mãe Natureza, era ainda mais patético, pois considerava Asher e sua nova visita com algo próximo ao desdém. — Sim, eu sei. Estou atrasado e isso não parece com seu saco de ração. Sentia-se como um idiota falando com a besta como se fosse seu companheiro de quarto, mas depois que Ned faleceu, o lugar parecia muito malditamente silencioso sem um pouco de conversa de vez em quando. Mesmo se fosse unilateral a maior parte do tempo. Sam bocejou, então balançou a cabeça num movimento que fez as orelhas caírem e as bochechas soltas balançarem, então correu para trás quando Asher deixou cair as chaves do caminhão na mesa da cozinha e levou a Companheira de Raça para dentro. As opções para mantê-la naquela noite eram tão poucas quanto as acomodações eram escassas. Havia o sofá na sala de estar, mas a relíquia era feita de um tecido velho e rechonchudo embelezado por dois longos pedaços de fita isolante que percorriam toda a extensão da almofada desgastada. Sabia
por experiência que a coisa estava longe de ser confortável, e além disso, metade do tempo Sam o requisitava para sua cama. Os quartos de hóspedes, embora grandes entre os dois no final do corredor e o par de alojamentos longos e espaçosos numa ala conectada nos fundos, estavam vazios, exceto por alguns projetos de móveis semiconcluídos que Ned desistiu anos antes de perder a visão e lixo variado que o velho se apegava e Asher ainda não tinha conseguido limpar. O que significava que o único lugar viável a oferecer era o quarto principal, seu quarto desde que Ned se fora. Não havia necessidade de ligar o interruptor da lâmpada. Sua visão era ainda mais acentada no escuro, e uma rajada de luz incandescente só poderia causar mais dor à mulher com lesões cerebrais sob seus cuidados. Ele a colocou em cima do cobertor fino, certificando-se de que a cabeça dela caísse suavemente no travesseiro. Seu suspiro contente quando se acomodou na cama acordou algo enferrujado e sem uso dentro dele. Empatia e compaixão nunca foram seu forte, dado seu passado. Passar alguns anos em torno de Ned e dos animais do rancho o afrouxou um pouco, mas ainda era uma péssima escolha quando se tratava de cuidar de alguém. Muito ruim para essa mulher, porque por enquanto – até que fizesse arranjos para sua segurança e proteção em outro lugar – ele era tudo que ela tinha. Seu olhar desviou-se para a marca de Companheira de Raça sob o queixo dela. Não era de admirar que tivesse perdido isso antes. O machucado em forma de punho que escurecia a linha de sua mandíbula quase ocultava a pequena marca de nascença agora. Ele tinha sido mortífero o suficiente quando viu os três grandes homens batendo numa vítima indefesa. Entender agora que a vítima era uma Companheira de Raça? A raiva de Asher disparou através dele tão fresca como sempre, e consumiu tudo. Por mais que quisesse se assegurar de que nada do que aconteceu naquela noite o preocupava, havia uma parte dele que se contorcia com o desejo de encontrar o bastardo que pediu sua morte e entregar a justiça do jeito que apenas alguém como ele podia. Foi fácil com os três gangsters.
Quando encontrasse seu chefe, arrancaria a porra de sua cabeça e a transformaria num enfeite de capô para o velho Chevy de Ned. Tinha a sensação de que realmente sentiria prazer nesse assassinato. E faria isso com as mãos nuas, pele-a-pele, porque tinha certeza de que o terror e a agonia do homem seriam uma lembrança que ele adoraria reviver mais e mais. A respiração pesada atrás dele indicou que Sam estava parado dentro do quarto. Ele se virou para o cachorro e encontrou a cabeça grande de Sam inclinada em curiosidade para a mulher na cama de Asher. Seus olhos castanhos pareciam ter uma nota de surpresa, tanto quanto pareciam questionador. A boca de Asher se curvou num sorriso relutante. — Se isso significa um comentário sobre quanto tempo passou desde que tivemos companhia feminina em casa, estou bem ciente da resposta. Nunca. Sam gemeu em resposta, estridente e suplicante. Asher grunhiu. — Sim, ela é bonita, mas não se apegue. Ela não vai ficar. Se estava falando com o cão ou para si mesmo, ele não tinha certeza. De qualquer maneira, depois de ver que ela estava confortável e bem o suficiente para passar a noite, sua primeira prioridade seria pegar o telefone para arranjar um novo e melhor lugar para ela se recuperar. De preferência tão longe de Vegas e dele quanto possível. Contornando o cachorro, os dois saíram do quarto. Depois de deixar Sam ir ao quintal fazer seu negócio, Asher abriu o velho armário de remédios de Ned no banheiro do corredor e folheou o conteúdo. Uma caixa de analgésicos vendidos sem receita não aberta desde a morte de Ned. Expiraram há um mês, mas eram melhores que nada. Armado com as pílulas, um copo de água e uma compressa cheia de gelo da cozinha, ele voltou ao quarto. Como suspeitava, ela ainda estava desmaiada. Seu rosto estava pálido em torno de suas bochechas e boca. Tão pálida que por um momento ele se perguntou se subestimou a gravidade de seus ferimentos. Ele só testemunhou o final de sua provação nas mãos de seus agressores. O grande galo em sua
cabeça era uma grande preocupação, mas ela podia estar sofrendo de ossos quebrados ou pior, por tudo que ele sabia. Franzindo a testa, colocou o copo e outros itens na mesa de cabeceira, em seguida, sentou-se na beira do colchão para dar uma olhada mais de perto nela. Ela tinha tantos arranhões e contusões que era difícil decidir por onde começar. Ele resistiu ao impulso de sentir sua testa nua e verificar a febre, e concentrou-se em sua respiração. Era suave e lenta, mas não difícil. Tão gentilmente quanto possível, colocou a compressa fria contra a bochecha e a testa machucada, usando um travesseiro de reserva para mantê-la no lugar enquanto deixava seu olhar percorrer o comprimento de seu corpo vestido. A única maneira de saber se tinha feridas que não estava vendo era tocando-a. Estava bastante certo, baseado em quão determinada ela correu antes, que seu corpo estava em grande parte ileso, mas a adrenalina era uma coisa complicada. Ele viu dor em seus olhos em vários pontos esta noite e queria ter certeza de que a pequena e dura guerreira não estava em pior forma do que já temia. Começando em seus tornozelos, ele deslizou as mãos suavemente sobre as pernas cobertas de jeans, movendo-se lentamente para cima e concentrando-se nas linhas dos ossos enquanto ia. Ela era pequena, mas magra e atlética. Esperava que ela fosse magra com base em sua pequena estrutura, mas enquanto suas mãos e dedos se moviam sobre seus quadris e outras curvas escondidas sob sua roupa, foi atormentado por uma enxurrada de imagens mentais de como ela poderia realmente parecer sem as roupas grandes que pretendiam disfarçar a mulher lá dentro. Má ideia deixar sua mente se dirigir por essa estrada. Mas já estava imaginando-a em sua cabeça. Já se perguntando o quão macia sua pele impossivelmente perfeita pareceria sob as pontas dos seus dedos, debaixo da sua boca... sob seu corpo nu e empurrando. Porra. Ele rangeu os dentes e forçou a fantasia para fora de sua mente. Melhor renunciar ao resto de seu exame dela. Se ela tivesse quebrado ossos
ou outros problemas, teria que esperar até que ela estivesse consciente e pudesse dizer a ele o que estava errado. Agora, tudo que precisava era que ela abrisse aqueles olhos quentes de xerez e se sentasse para tomar o analgésico que ele trouxe para ela. — Zoe, pode me ouvir? — Ela gemeu baixinho em resposta, franzindo as sobrancelhas. — Abra seus olhos para mim. É hora de acordar. Quando sua cabeça começou a se debater no travesseiro, ele alcançou a compressa desalojada. No mesmo instante, o rosto dela voltou-se para ele, pousando a bochecha contra a palma da mão aberta. A conexão pele-com-pele atravessou-o como um relâmpago. Suas pálpebras se abriram como se ela pudesse ter sentido o poder disso também. Por um instante – um instante que pareceu durar uma eternidade – seus olhares se prenderam e seguraram. Ela murmurou algo em sua voz rouca e espessa, mas Asher estava além de ouvir isso. Arrancado de seu lugar na beira da cama com ela, foi arremessado em outro lugar e hora, sua mente agarrou-se a uma lembrança dolorosa. Memória dela. Mergulhado na visão, sons e emoções do momento, estava vivendo tudo através de seus sentidos. Através de uma das mais cruas experiências de sua jovem vida. E ela estava chorando. Sufocando-se em lágrimas de garotinha, sentada no meio de um esquálido apartamento de um quarto, segurando um ursinho de pelúcia cor-de-rosa no peito. — Mamãe, por favor, não vá! Por que não pode ficar em casa comigo esta noite? Uma elegante jovem japonesa vestida com um vestido de seda vermelho e sandálias altas e finas saiu do banheiro aberto e se agachou até ficarem olho no olho. Ela era linda, seu delicado rosto oval emoldurado por uma longa cortina de cabelo preto brilhante. Olhos marrom-escuros esfumaçados dominavam suas feições, e esta noite seus lábios estavam destacados com uma cor escarlate tão brilhante que parecia vidro.
— Agora, Narumi, não prometeu à mamãe nenhuma lágrima hoje à noite? — Ela sorriu, mas não alcançou seu olhar. — Sabe o quanto eu trabalho. Mamãe não merece sair e se divertir com outros adultos de vez em quando? Um suspiro e um aceno hesitante. — Acho que sim. Mas não gosto do seu novo amigo. Ele machucou seu rosto da última vez. O lindo sorriso vacilou. Uma mão esbelta veio até o fantasma de uma contusão que permanecia sob o olho esquerdo, não exatamente apagada pela maquiagem que a cobria. Mamãe usava um novo anel no dedo desde que aconteceu. A profunda pedra preciosa vermelha brilhou quando ela tocou ternamente sua bochecha. — Não se preocupe com a mamãe, ok? Sou uma menina grande, eu sei o que estou fazendo. Posso cuidar de mim mesma, tudo bem? E você também pode, docinho. Agora, seja boa para mim e se vista para a cama. Prometo que vou estar em casa antes de você acordar de manhã. — Não, você não vai. — Uma recriminação suave, proferida numa garganta dolorida e crua. Um suspiro foi sua única resposta. Ela se inclinou e seus lábios vermelhos pareciam frios e pegajosos contra a testa da filha. Então ela se levantou e alisou o vestido, parando para dar uma última olhada no espelho antes de caminhar para a porta lascada e envelhecida. — Eu te amo, querida. Ela saiu, o som de seus saltos altos clicando na escadaria de aço do prédio, enquanto sua filha pequena aterrorizada se movia para a janela e espiava através das cortinas rasgadas para a grande limusine preta que estava abaixo, rezando para que o homem mau dentro não machucasse sua mãe novamente. A maldição de Asher pontuou o silêncio do quarto. A versão adulta daquela criança chorosa e assustada, desde então, voltava para seu sono. Ele estava feliz por isso agora, aliviado por se libertar de seu olhar quando afastou a mão do rosto dela e se levantou. Seu coração martelava tão dolorosamente quanto o dela. A tristeza e a raiva entupiam sua garganta, junto com o medo e a solidão com que a criança aparentemente viveu regularmente.
Era quase demais para ele suportar. Como ela conseguiu lidar com a força daquelas emoções poderosas em sua tenra idade, ele não tinha ideia. Ele se afastou da cama, observando-a dormir. Voltaria para acordá-la e dar-lhe os analgésicos e a água. Agora, precisava de ar. Precisava de espaço para respirar por alguns minutos, pelo menos até que a explosão esmagadora das emoções de Zoe – ou melhor, de Narumi – tivesse chance de diminuir.
Capítulo 4 Naomi acordou com alguém ao lado da cama repetidamente lavando a mão estendida com um pano quente e úmido. Um que fazia cócegas e cheirava fortemente a Alpo1. Forçando uma pálpebra aberta, ela esperou que as batidas em seu crânio aumentassem novamente, como aconteceu a noite toda, mas não havia dor latejante. Nenhum sentimento abafado de cabeça de algodão ou onda vertiginosa de náusea. Isso era um alívio. O pior da tempestade em seu crânio depois dos golpes sofridos pelos capangas de Slater finalmente passou. Sua visão estava clara agora. E de repente se encheu com a boca ofegante e grandes olhos castanhos inquisitivos de um gigante cão amarelo que farejava seu rosto ao lado da cama. — Bem, olá. — Ela franziu a testa, engolindo com uma boca seca. — Quem é você, o animal de conforto do hospital? A cauda grossa começou a bater entusiasticamente em resposta, um gemido suave se formando enquanto a fera tentava se aproximar dela, praticamente se arrastando para cima da cama.
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Marca de ração de cachorro.
— Esse é Sam, — uma voz profunda respondeu, desencarnada graças ao enorme cão bloqueando sua visão de qualquer outra coisa no quarto. Mas ela conhecia esse rosnado baixo. Ouviu isso em seus sonhos a maior parte da noite, importunando-a para abrir os olhos pelo menos meia dúzia de vezes, ordenando como um sargento quando tudo que ela queria fazer era dormir por dias. Asher. Ela se lembrou de seu nome incomum. Contra sua vontade, se lembrou de seu rosto rudemente bonito também, as bochechas esculpidas e mandíbula forte que fazia seu pulso acelerar um pouco mais rápido em suas veias. O que diabos ele estava fazendo no hospital com ela? E então isso a atingiu – não estava em uma cama de emergência do hospital. Estava em um quarto de uma pequena casa. Um que evidentemente pertencia ao letal Raça que transformou Gordo e seus dois camaradas em isca de urubu. Ela estava dormindo na cama do grande vampiro. — Oh, meu Deus. — Ela caiu de volta contra a cabeceira da cama, puxando os joelhos até o peito. Os movimentos bruscos combinados com o crescente alarme fizeram as têmporas latejarem, mas ela tinha problemas maiores no momento do que uma pancada na cabeça. Ela olhou para ele sobre o rosto sorridente e babento do cão infernal que agora conseguiu colocar as quatro patas na cama. — O que fez comigo? — Freneticamente, ela sentiu o pescoço para se certificar de que ainda estava intacto. Estava. E agora, tanto ele quanto o cachorro grande estavam olhando para ela como se tivesse perdido a cabeça. — Disse que ia me levar ao hospital na noite passada. Ele entrou mais no quarto, segurando uma caneca fumegante nas mãos. — Sim, eu disse. — Mentiu para mim. — Isso realmente a surpreendia? Sabia que não devia confiar em nenhum homem, então o que fez? Colocou sua fé – e sua vida – nas mãos de um assassino comprovado. Um maldito vampiro, pelo amor de Deus. — Estou saindo daqui.
Ela jogou as pernas para o outro lado da cama e se levantou. Não foi bom. O zumbido estava de volta, não tão horrível quanto no deserto, antes que ela aparentemente tivesse desmaiado durante a noite, mas o suficiente para jogá-la de costas no colchão. — Você não vai a lugar nenhum, — ele afirmou calmamente. — E eu não fiz nada para você, exceto ter certeza de que estava confortável e que sua lesão na cabeça não piorou da noite para o dia. — Aposto. — Ela zombou, muito indignada para se preocupar em fazêlo com raiva. — É isso que diz a todas as mulheres infelizes que captura e arrasta para seu covil? — Meu covil? — Sobrancelhas castanhas se curvaram, ele olhou ao redor do quarto escassamente mobiliado com sua cama de dossel feita à mão e mesas de cabeceira grossas. Adjacente ao pé da cama king-size havia uma cômoda coberta com um velho aparelho de televisão que seria antiquado há uma década. Não era exatamente uma casa gótica de horrores, mas o que ela sabia sobre os Raça? A maioria das pessoas razoáveis desistiu da visão antiquada dos vampiros nas duas décadas que seu tipo vivia em campo aberto entre os humanos. E sua experiência com os membros Raça não era muito. Puramente por escolha. Preferia continuar assim, especialmente depois de testemunhar as habilidades mortais de Asher na noite passada. Agora, a única coisa que precisava fazer era encontrar a saída mais próxima. Tentou levantar de novo, mas o enorme cão tinha a barriga rastejando ao lado dela e jogou a grande cabeça no seu colo. Ela suspirou, achando difícil resistir aos olhos suplicantes que a encaravam, implorando por seu toque. A contragosto, coçou-o atrás das orelhas e sob o queixo gordo. Sentiu os olhos de Asher do outro lado da sala. — Gosta de cães? — Claro que sim. Que tipo de monstro não gosta de cachorros? — Ela olhou por cima do ombro para ele e o encontrou carrancudo. — Ele pertence a você?
Ele deu uma leve sacudida de cabeça. — Ele é o cachorro do Ned. — Quem é Ned? — Um amigo. Morreu no ano passado e me deixou este rancho. Naomi inclinou a cabeça para ele. — Então odeio te dizer isso, Asher, mas Sam é seu cachorro agora. Azul cobalto. Essa era a cor dos olhos de Asher. Ela não tinha certeza na noite passada no deserto. Estava muito escuro, e seu olhar muito quente, iluminado como brasas de âmbar desde o momento em que chegou à cena para cuidar dos homens que a machucaram. Ele observou enquanto ela continuava a acariciar e dar tapinhas no cachorro. Aqueles profundos olhos azuis chegaram dentro dela de alguma forma, parecendo estranhamente familiares depois de tudo que aconteceu na noite passada. Seu olhar parecia intenso, muito íntimo. — Acho que você acabou de fazer um amigo para a vida, — disse ele, o canto de sua boca larga puxando num sorriso irônico. E foi um belo sorriso também. Transformou os ângulos duros e as linhas severas de um jeito que fez seu estômago revirar como num passeio de parque de diversões. Ela imediatamente parou a mão, cruzando os braços na frente do capuz amarrotado. Droga, não queria se aquecer com esse macho – esse estranho perigoso. Nem com o cachorro dele, aliás. — Tem um telefone que eu possa pedir emprestado? O sorriso de Asher desapareceu. — Pra quê? — Preciso ligar para alguém e dar o fora daqui. Você mesmo disse ontem à noite que preciso de um médico. Ele balançou sua cabeça. — Você vai ficar bem. A concussão poderia ter sido pior. O que precisa agora é descanso e nutrição. Ele segurou a caneca para ela. O caldo amarelo aguado com macarrão pálido e pequenas manchas de cenoura e carne branca anêmica em cubos nadavam quase até a borda. — O que é isso? — Café da manhã. Sei de viver com Ned que os humanos têm o hábito de comer pela manhã. Infelizmente, tudo que resta nos armários são alguns
dos seus antigos enlatados. Encontrei uma lata de sopa que não vai expirar por mais algumas semanas. Espero que isso não te dê botulismo. Caramba, depois de uma crítica como essa, como podia recusar? Mas sua oferta inexpressiva de macarrão de frango enlatado no café da manhã foi séria. Na verdade, ele cozinhou alguma coisa por consideração por ela, como se se importasse, caso sua expressão solene fosse qualquer indicação. Ainda assim, ela tinha lugares a ir. Pessoas para garantir que não estava deitada no meio do Mojave com uma bala na cabeça. O pobre Michael provavelmente estava louco de preocupação agora que era de manhã e ela ainda não tinha voltado para casa ou ligado para avisá-lo que estava bem. Deus não permita que ele fique tão preocupado que possa chamar o departamento de pessoas desaparecidas. A última coisa que qualquer um deles precisava era convidar a polícia a começar a farejar. Esse pensamento só renovou sua necessidade de sair de lá e voltar para Las Vegas o mais rápido possível. Suavemente afastando a caneca de sopa oferecida por Asher, ela balançou a cabeça. — Obrigada pela lembrança, mas realmente não estou com fome. Ela desalojou a massa resmungona de Sam do colo e se forçou a ficar em pé. Não foi tão ruim desta vez. Só tinha que levar as coisas mais devagar. — Então, sobre esse telefone, — disse ela para Asher. — Tenho alguém esperando notícias minhas e realmente deveria ir antes que ele envie uma equipe de busca. Ele tende a se preocupar quando estou fora de contato por uma hora, quanto mais a noite toda. O rosto de Asher escureceu quanto mais ela divagava. — Sente-se. Deveria descansar um pouco mais. Ainda é cedo para ficar de pé. — Não, não é. — Ela abriu os braços como se para mostrar a ele o quanto melhor se sentia, até mesmo fez um pouco de brincadeira, apesar da sensação de tontura que se seguiu. — Vê? Noventa e nove por cento de volta ao normal. — Eu disse sente-se, Narumi.
Ela ficou imóvel, cada músculo em seu corpo tenso, cada célula ressoando de choque ao som daquele nome em sua língua. Seu nome mais antigo. O que se recusava a usar desde a morte da mãe quando Naomi tinha oito anos de idade. — Do que acabou de me chamar? Ele colocou a caneca de sopa na mesa de cabeceira. — Esse é seu nome, não é? Não Zoe. Narumi. — Não. — Sua cabeça balançou de um lado para o outro. — Não, esse não é meu nome. Mas está certo, não é Zoe também. Meu nome é Naomi. Não uso esse outro há muito tempo. Não gosto de ouvi-lo. Na verdade, apenas uma pessoa, além da minha mãe, sabe desse nome, e com certeza não deveria ser você. — Está falando de Michael? Como se o primeiro choque não fosse surpreendente o suficiente, agora isso? — Como sabe tanto sobre mim? Que diabos está acontecendo aqui? — Você fala em seu sono, para começar, — ele respondeu calmamente. — O que não é surpreendente, considerando o quanto fala quando está acordada. — Em sua pequena carranca, ele continuou. — Mencionou o nome do seu homem várias vezes enquanto eu cuidava de você durante a noite. E em seu torpor antes de perder a consciência no deserto. Parte dela sentiu-se compelida a corrigi-lo sobre Michael ser “seu homem”, mas isso era apenas mais um fato sobre sua vida que não era da sua conta. Era o outro conhecimento que ele parecia ter que a incomodava mais. — Como sabe meu nome? Você... conheceu minha mãe? — Não. — Conhece Leo Slater? Sua testa se enrugou ainda mais. — Não. Também não o conheço, mas estou familiarizado com o nome dele. — Todo mundo num raio de 300 quilômetros de Las Vegas sabe o nome dele, — ela devolveu friamente. — Sim, — ele concordou, prendendo-a num olhar desconfiado e estreito. — Ele é o chefe do cassino que você tentou roubar ontem à noite?
Ele deve ter tomado seu silêncio pela confirmação que era. Uma maldição sibilou para fora dele e passou a mão sobre o seu bigode cinza escuro. — O que Leo Slater tem a ver com sua mãe? — Nada. Esqueça que citei qualquer um deles. Sua risada em resposta foi sombria. — Pede muito, Naomi. Ela levantou o queixo. — Diga-me como sabe meu outro nome. Acho que me deve isso, não é? Por um momento, não tinha certeza se ele responderia. Ele parecia perdido em seus próprios pensamentos, andando de um lado para o outro d quarto enquanto Sam dormia como os mortos entre eles. — Cada Raça nasce com uma capacidade extra-sensorial ou outra habilidade sobrenatural única, — explicou ele. Ela assentiu com a cabeça, não totalmente ignorante de alguns dos princípios básicos de sua espécie, até mais do que gostaria. — Meu dom, embora use o termo vagamente, é a capacidade de sentir uma memória sensorial completa das memórias de outra pessoa quando toco alguém. Apenas as mais dolorosas. Os traumas. Os momentos de maior medo ou agonia. As memórias nunca desaparecem. Quando as sinto, nunca mais me abandonam. — Sinto muito, Asher. Eu não... só posso adivinhar o que isso deve ser para você. — Naomi olhou para ele, perdendo um pouco da raiva e indignação que sentia há pouco. Ela não conseguia imaginar nada tão horrível. Ser amaldiçoado a suportar as piores experiências de alguém e nunca conseguir escapar delas. O que significava que ele agora conhecia um pouco da dor dela também. — Você me tocou na noite passada? — Não intencionalmente. Sou cuidadoso. — Seus lábios pressionaram juntos, então ele exalou outra dura maldição. — Ontem à noite, quando cheguei para lhe dar água e analgésicos, você ficou agitada. Estava jogando sua cabeça no travesseiro e eu... fui alcançado por você. Por um momento, toquei seu rosto.
Ela piscou para ele, lembrando-se como num sonho todas as vezes que ele entrou para checá-la, para acordá-la e ter certeza de que ela estava bem e não em qualquer desconforto. — O que viu? — Deus, odiava o quão baixa sua voz soava, quão fraca e assustada. — Você era jovem, acho que quatro ou cinco anos. Sua mãe estava com você num estúdio. Ela estava usando um vestido de seda vermelha, se preparando para sair num encontro com alguém esperando numa limusine do lado de fora. A respiração de Naomi vazou dela num suspiro agudo. — Lembro daquela noite. Não foi a primeira nem a última. Mas lembro do vestido vermelho. — Você implorou para ela não ir — continuou Asher, sua voz profunda e baixa, sóbria. — Não gostava de seu novo namorado, porque ele estava abusando dela. Mesmo em tenra idade, reconheceu isso. E estava chorando. Você estava com medo por ela e com medo de ficar sozinha. Naomi sentiu essas emoções se acumulando no fundo de sua garganta agora. Se lembrou de tudo sobre aquele momento. Lembrou-se de pensar que uma noite sua mãe nunca mais voltaria. E então uma noite, finalmente, ela não o fez. Ela inalou, empurrando a memória abaixo antes que se sentisse mais fraca por não ter conseguido proteger sua linda mãe. A única pessoa que já se importou com ela, a amava. Pelo menos até que Michael apareceu e lhe fosse o irmão que ela nunca teve. Durante seu tempo compartilhado nas ruas como órfãos acotovelando turistas e tentando sobreviver, conseguiram montar uma pequena família pouco convencional de desajustados. E nenhuma das pessoas que ela amava precisaria trombar ou lutar, contanto que Naomi tivesse algo a dizer sobre isso. O que significava que realmente precisava voltar para Vegas, e logo. Alisando suas roupas e cabelos amarrotados, deu a volta ao lado da cama, se aproximando da porta aberta. Não ia se enganar tentando superar Asher, mas esperava mostrar a ele que estando firme em seus pés, ele poderia estar inclinado a conceder-lhe o telefonema.
Ela limpou a garganta. — Acho que esta é a parte em que digo muito obrigada ou desculpe pelas memórias, e então vou embora. Infelizmente, Gordo destruiu meu celular junto com minha identificação no cassino, então você tem uma linha aqui, ou talvez um telefone via satélite? Ela deu um passo mais perto do limiar e, de repente, a porta do quarto se fechou sozinha. — Puta merda. Ela girou para encontrar Asher ainda de pé a vários metros atrás dela, seu rosto ilegível. Mas aquelas piscinas azuis profundas estavam sóbrias e determinadas. — Precisamos conversar, Naomi. — Pensei que fosse isso que acabamos de fazer. — Ela engoliu, mas manteve sua fachada de confiança impertinente firmemente no lugar. — Isso foi divertido, Asher, mas tenho pessoas esperando que eu volte para casa, então vou agradecer a você por me deixar ir agora. Ele não se mexeu. — Você tem uma marca sob o queixo, Naomi. — Tenho marcas em cima de mim toda, graças a Gordo e seus amigos imbecis, — ela zombou, fingindo que não entendia, apesar do alarme que estava crescendo dentro dela. Mas Asher não estava entrando no jogo dela. Não, o macho Raça estava mais sério do que o tinha visto até agora. — Estou falando sobre o símbolo. A lua em forma de lágrima e crescente. Estou falando sobre o fato de você ser uma Companheira de Raça. Ela balançou a cabeça como se pudesse refutar tanto a marca de nascença quanto o que significava. — Você é uma Companheira de Raça, — ele insistiu. — Uma de um pequeno número de mulheres neste planeta que são algo mais que mortal. Algo mais que simplesmente humanas. Naomi engoliu em seco. Ela tinha doze anos antes de saber que a incomum marca de nascença vermelha que carregava a separava de outras meninas. Ela simplesmente contara com a sorte por nunca ter ficado doente – nem mesmo uma fungada – e por ter nascido naturalmente forte e atlética. Não foi até que estava num orfanato pela terceira ou quarta vez que conheceu outra garota que tinha o mesmo símbolo em algum lugar em seu corpo. A marca de Jessamine estava em sua barriga, escondendo-se num
campo de sardas que salpicava a maior parte da pele clara da bela garota ruiva. Jessie sabia de coisas que Naomi não sabia. Coisas que a mãe dela sussurrou sobre os Raça e o que as mulheres com a marca de Companheira de Raça significavam para eles. Como só as Companheiras de Raça podiam gerar descendentes de vampiros, e somente depois de uma ligação mútua de sangue com um macho Raça, uma conexão que ligaria o casal em ambos os corpos, coração e emoções pelo tempo que vivessem. Que, como um par acasalado, significava algo próximo da eternidade. E, como os Raças, as companheiras de Raça tinham talentos e habilidades únicas também. Jessie podia conjurar tempestades e outros climas à sua vontade. O talento de Naomi não era tão inspirador, mas provou ser útil para ela ao longo do tempo. Mais recentemente, ontem à noite no cassino de Leo Slater. Mas isso não ia ajudá-la a lidar com o formidável homem Raça estudando-a intensamente a um braço de distância. —Você é uma Companheira de Raça, Naomi. E como um macho Raça, isso significa que estou obrigado pela honra a protegê-la. Pelo menos até você estar em algum lugar seguro com pessoas que irão ajudá-la a permanecer assim. — Obrigado pela honra a me proteger? — Ela latiu uma risada inquieta. — Bem, se isso é tudo, então não se preocupe. Libero você dessa obrigação. Então, terminamos aqui. — Não é tão simples assim. — Sim, Asher. É. — Enquanto ela expelia seus argumentos na esperança de persuadi-lo a deixá-la ir, o resto do que ele disse começou a afundar. — Espere um segundo. O que quer dizer, até que eu esteja em algum lugar com pessoas que possam me ajudar a ficar em segurança? Quais pessoas? — A Ordem. — O quê? — Ela ficou boquiaberta, dividida entre indignação e descrença. — A Ordem, significando aquele grupo de guerreiros que são os
machos Raça mais letais e perigosos que se conhece andando por esta boa Terra desde então... Bem, acho que desde que você pisou nele? Um sorriso sombrio puxou o canto de sua boca. — Eles estavam aqui primeiro, na verdade. Centenas de anos antes de eu ser criado. E a Raça como espécie tem andado neste planeta por muito mais tempo que isso. Milhares de anos. — Seja como for, — ela atirou de volta, irritada e nem um pouco nervosa. — Não preciso de uma aula de história. O que preciso é que me deixe ir, Asher. Agora. Mesmo. Com sua voz crescente, Sam se sentou na cama e inclinou a cabeça para ela. Ela fez uma careta para o cachorro e seu proprietário obstinado. — É tarde demais, — Asher informou uniformemente. — Já alertei a Ordem da situação através de um velho amigo meu que está em contato com eles. Alguém entrará em contato comigo em breve para tomar mais providências para seu transporte para uma casa segura num Darkhaven. Puta merda, ele estava falando sério. Ele tinha toda a intenção de esmagá-la em sua noção distorcida de proteção, não importando o que ela dissesse ou quisesse. — Não. Isso é loucura. Você é louco se acha que pode me trancar neste quarto e me manter cativa até o quê? Até você ou seus amigos da Ordem me enviarem para algum lugar que não conheço e que não quero estar? — Ela cruzou os braços, furiosa agora. — Temos uma palavra para isso, sabe. É chamado de sequestro. Ele deu um passo em direção a ela, depois outro, até que menos de um pé os separava no pequeno quarto que parecia estar encolhendo diante de seus olhos, enquanto Asher se aproximava dela. Seu corpo grande irradiava calor e aquele aroma picante e delicioso que se agarrava ao cobertor e lençol na cama e a deixou louca na maior parte da noite. — Tenho uma vida própria, Asher. Tenho pessoas que me importam esperando em Vegas. Quero voltar para eles. Quero ir agora mesmo. Ele balançou a cabeça lentamente, os primeiros sinais de remorso se transformando em seu olhar azul determinado. — Sinto muito, Naomi. O que quer não é possível agora. Não quando você e eu sabemos que há um homem
poderoso naquela cidade que quer que você morra. Não posso mandar você de volta para lá para ser morta. — Eu me viro sozinha. — Isso pode ser verdade, — ele disse, quase suavemente agora. — Mas você é preciosa demais para correr esse risco. Ele quis dizer muito preciosa para a Raça, ou alguma outra coisa? O jeito que estava olhando para ela, ela não podia ter certeza. Sua voz baixa e suave fez suas veias correrem quentes, soltando algo dentro dela. Algo suave e ansioso. Ela se afastou dele, precisando de espaço para respirar. — Quero falar com Michael. Eu preciso ver ele, Asher. Você não pode me manter longe da única família que tenho! Raiva e frustração cresceram dentro dela, trazendo uma dor por trás de seus olhos. Lágrimas brotaram, mas ela se recusou a deixá-las cair, nem mesmo numa tentativa de influenciar sua simpatia. Assumindo que o monstruoso vampiro tinha alguma. Em vez disso, ela olhou para ele com rebeldia. A visão de suas emoções crescentes só pareceu endurecer seu belo rosto. Ele exalou um suspiro pesado. — Pode entrar em contato com seu Michael ou com qualquer outra pessoa que goste... uma vez que esteja nas mãos da Ordem e fora das minhas. Então será problema deles para lidar. Sem outra palavra, ele deu a volta e foi até a porta do quarto. — Sam, — ele rosnou, com o dedo apontado um comando para o cão sair do quarto com ele. Naomi olhou para ele, incrédula, chocada que isso estivesse realmente acontecendo. — Onde vai? Ele não lhe deu resposta. — Espero que a Ordem estre em contato a qualquer momento. Com alguma sorte, você sairá daqui à noite. Ele saiu, fechando a porta atrás dele. Naomi ouviu o barulho metálico da tranca quando ele a fechou. Ela mordeu o lábio, esperançosa quando seus longos passos e as patas de Sam se retiraram pelo corredor.
Então limpou impacientemente as lágrimas que caíam por suas bochechas agora que estava sozinha. E sorriu, sentindo uma pequena faísca de esperança se acender no peito. Fora daqui ao anoitecer? Sem chance. Estaria fora daqui em uma hora ou morreria tentando.
Capítulo 5 — Pare de me olhar assim. Sam estava deitado no chão da oficina de móveis de Ned, com o queixo apoiado nas patas dianteiras estendidas, enquanto seus tristes olhos castanhos olhavam para Asher num julgamento silencioso. Nos últimos vinte minutos desde que deixou Naomi trancada dentro do quarto do outro lado da casa, Asher estava enfrentando a desaprovação de Sam – e seu próprio desgosto autodirigido. Numa maldição murmurada, ele pegou um formão de detalhes para refinar alguns dos arabescos na mobília que estava tentando aperfeiçoar por quase um ano. A cabeceira artesanal, uma vez terminada, substituiria a antiga no quarto principal. Não que não apreciasse a habilidade de Ned. Inferno, antes que o velho ficasse cego há alguns anos e não pudesse mais desfrutar de sua forma de arte favorita, ensinou a Asher tudo que sabia sobre conseguir beleza e função até mesmo das mais comuns tábuas de madeira. Os móveis de Ned eram robustos e confortáveis, muito parecidos com o homem, e, embora Asher apreciasse o trabalho de seu amigo, o quarto não se parecia com ele, desde que os pertences de Ned dominavam o espaço.
Asher não estava com muita pressa para fazer a transição, mas gostava de ter algo produtivo para fazer com as mãos, especialmente durante os longos períodos de luz do dia no deserto. E agora, quando era tudo que podia fazer para não pensar na mulher sendo mantida contra seus desejos e sua vontade na outra parte da casa. — Realmente acha que queria prendê-la como uma maldita prisioneira? — Ele perguntou a Sam, lascando cuidadosamente um dos floreios complicados que estava esculpindo na cabeceira da cama. — Acha que não sei que é uma violação de merda, tirar a liberdade de alguém? Ele sabia melhor que a maioria. Durante quase a primeira metade de sua vida, foi escravizado num lugar que não queria estar, sua vida pertencente à outra pessoa. O programa de assassinos de Dragos, o programa Hunter, foi uma existência brutal e fria. Uma que Asher suportou desde o nascimento até a idade adulta, junto com vários outros machos Raça que tiveram a infelicidade de serem criados no laboratório do homem sádico. Asher e outros como ele – todos meios-irmãos de sangue e irmãos eternos pelo inferno compartilhado de sua experiência – foram mantidos escravizados por um grilhão que nem o mais forte macho da primeira geração podia quebrar. Havia momentos que Asher ainda podia sentir o polímero frio de seu colar ultravioleta preso em volta do pescoço. Havia momentos que ainda acordava banhado em suor gélido depois dos pesadelos – memórias vívidas e sensoriais – do que aqueles colares UV podiam fazer ao explodir com clareza brutal em sua mente. A escravização dos Hunters era tão completa que nenhum deles sequer tinha nomes. Todos os meninos, adolescentes e homens do programa eram referidos simplesmente como o que eram – um Hunter. Apenas uma das muitas maneiras que Dragos garantiu que nenhum deles se sentisse inteiro. Eram propriedade. Ferramentas e instrumentos, não algo vivo. Não eram nada mais que armas letais a serem chamadas – ou destruídas – ao capricho de seu mestre. Os nomes que usavam vieram depois, depois que os sobreviventes escaparam do laboratório e tiveram que aprender a fazer seu próprio caminho no mundo além de seus colares e gaiolas.
Asher soltou um suspiro severo, sacudindo as garras de seu passado antes que pudessem arrastá-lo mais fundo. Sam ainda estava olhando para ele com expectativa, como se medisse o caráter de Asher por quanto tempo iria levar antes que ele se levantasse e deixasse sua bela refém livre. Ou talvez o julgamento viesse da própria consciência de Asher. Pelo menos o cativeiro de Naomi seria temporário. Não podia demorar mais que algumas horas até que a Ordem interviesse para controlar melhor a situação. Então ela teria sua liberdade novamente, embora não voltasse a Las Vegas por um tempo. Não até – e a menos – que os guerreiros considerassem que era seguro para ela retornar, o que provavelmente significava depois que Leo Slater e quaisquer outros inimigos que ela fez tivessem tempo suficiente para esquecê-la. Asher desejou que fosse apenas uma questão de tempo antes que ele fosse capaz de esquecer a fêmea. Tirar Naomi de sua mente foi impossível antes mesmo que a tocasse e absorvesse a memória dolorosa de sua infância. Não podia negar sua atração por ela. Com sua beleza sombria e delicada, era a mulher mais adorável que já viu. Mas combinada com sua personalidade ardente, tenaz e intelecto rápido, sem mencionar seu núcleo de força interior incansável, ele ficaria perdido se tivesse que passar mais que um punhado de horas em sua companhia. Nada disso fez com que se sentisse menos um bastardo pela forma grosseira com que lidou com as coisas com ela hoje. Ele olhou para Sam e balançou a cabeça. — Vá em frente e diga. Sou um idiota. O cachorro bocejou e caiu de lado para tirar uma soneca, aparentemente tendo desistido do senso de honra de Asher. Asher grunhiu. — Acho que isso nos faz dois. Provavelmente três, contando Naomi. Dada sua tenacidade e óbvia coragem, ele esperava ouvir alguns protestos ou outros sons de rebelião vindo do quarto do outro lado da casa. Mas ela estava completamente quieta lá atrás, quase resignada a tudo que ele
disse a ela. Ele não esperava por sua aflição, mas odiava pensar que a luta se foi tão facilmente. E havia uma parte dele que se perguntava se sua aparente rendição não era nada... Seu telefone tocou na bancada ao lado dele. A tela não mostrava nenhum número, mas quando falou com Scythe na Itália algumas horas atrás, o homem disse-lhe para esperar uma ligação de um dos líderes da Ordem na área. — Asher, aqui é Kade, — disse a voz profunda do outro lado da linha. — Dirijo-me ao centro de comando da Ordem em Lake Tahoe. Entendo que tem uma situação em suas mãos. — Poderia dizer isso. — Ele deu ao comandante da Ordem uma descrição de tudo que aconteceu no deserto na noite passada, culminando com a descoberta de Asher da marca de Companheira de Naomi e sua decisão de trazê-la para sua casa. — Fez a coisa certa, — Kade assegurou. — Se esta fêmea se colocar na mira de um filho da puta como Leo Slater, pode não haver lugar suficiente para ela fugir. Slater não é alguém para foder. Se os rumores são verdadeiros, não há quase uma milha quadrada de deserto ao redor de Las Vegas que não contenha pelo menos uma dúzia de túmulos cheios de alguém que tenha atrapalhado seu temperamento ou seus lucros. As veias de Asher se apertaram ao ouvir o guerreiro da Ordem confirmar o que já temia. — Naomi teve dois ataques contra ela depois de tentar roubar seu cassino ontem à noite. — Por que ela fez isso? Ela tinha que saber se falhasse, Slater viria atrás dela com as armas em chamas. Quanto dinheiro vale esse tipo de risco? — Não sei, — respondeu Asher. — Mas não acho que esta é a primeira vez que ela tentou algo assim. — Como assim? — Ela estava usando um disfarce, um malditamente bom também. Parecia um adolescente quando a vi pela primeira vez. Nunca teria imaginado que era uma mulher, muito menos uma mulher adulta. Se conseguisse fugir com o que tentou roubar do cassino de Slater, tudo que teria que fazer era
abandonar o disfarce e fugir. Estariam procurando punks em idade escolar, não uma mulher bonita com o rosto de um anjo. — Rosto de um anjo, hein? — Kade respondeu, uma sugestão de diversão em sua voz profunda. Asher se amaldiçoou pelo escorregão. Sua opinião sobre a beleza de Naomi não tinha relevância na conversa. E se já não soubesse que Kade estava ligado por sangue com sua própria mulher bonita, sua Companheira de Raça Alexandra, Asher poderia encontrar ainda menos humor na resposta intrigada do guerreiro. — Naomi sabe que é uma Companheira de Raça? Ele considerou sua reação não-tão-entusiasmada, e sua falta de surpresa quando tentou explicar o que sua marca de nascença significava. — Ela sabe. Kade fez um barulho de aprovação. — Foi informada de que a está trazendo a Ordem para fornecer proteção e uma casa segura para ela? — Sim. — Como isso aconteceu? Asher grunhiu, uma resposta que, sem dúvida, expressava mais que palavras. — Há um homem, — disse ele ao guerreiro. — Um humano, estou supondo. Ele está em Las Vegas. Ele é... importante para ela. — Um amante? Os molares de Asher se apertaram involuntariamente. — Não sei. Possivelmente. — Ok. Vamos resolver tudo com ela assim que tivermos Naomi na mão, — disse Kade. — Ainda estamos a seis horas do pôr-do-sol, mas enviarei uma equipe para sua casa o mais rápido possível. Enquanto isso, mantenha-a calma e confortável... O comandante da área de Tahoe ainda estava falando, mas as orelhas de Asher subitamente foram sintonizadas em outro som. Sam também ouviu. Com as orelhas caídas, ergueu a cabeça e olhou para Asher em dúvida enquanto o inconfundível ruído do velho Chevy de Ned rugia para a vida lá fora. — Santo inferno.
— Algo errado? — Kade perguntou. Os pés de Asher já estavam se movendo, o telefone ainda preso ao ouvido. Num flash de movimento, estava de pé na sala principal da casa. A porta do quarto principal estava entreaberta. O mesmo com a porta que dava para a varanda. — O plano de retirada vai ter que esperar, — ele murmurou para o outro macho Raça. — Tenho um problema por aqui. — Alguma coisa aconteceu com a mulher? — A voz de Kade continha um tom grave. — Naomi está bem? Asher zombou em voz baixa. — Sim, ela está bem. Está roubando meu maldito caminhão. Entrarei em contato. Ele terminou a ligação, a luz do dia saindo no jardim. O sol do meiodia do deserto chamuscou seus olhos, e aquela luz ultravioleta implacável o levou de volta apesar da fúria que praticamente o estimulou a atacar e arrastar a mulher tola de volta para dentro. Mas estava muito atrasado para alcançála. Com um braço erguido para proteger o rosto, olhou para o quintal e para a garagem. O caminhão de Ned já estava a meio caminho da estrada deserta, pulando sobre buracos e levantando nuvens de poeira amarela, enquando Naomi escapava sob a cobertura da luz do dia.
Capítulo 6 — Puta merda, Nay, o que diabos aconteceu com você? Explodi seu telefone nas últimas doze horas. Michael rolou a cadeira de rodas para dar espaço para ela entrar no pequeno bangalô dos anos 50, localizado num bairro residencial a nordeste da Strip. Quando ela entrou, ele olhou ao redor dela, franzindo a testa quando viu a caminhonete estranha na pequena entrada de automóveis. — Onde pegou o calhambequê? Ou eu ainda quero saber? — Provavelmente não. — Ela fechou a porta atrás dela e abriu o zíper do casaco enquanto passava por ele, tirando a maior parte de suas roupas mal ajustadas até que tudo que usava era uma blusa preta e jeans largos. A casa ficou quieta por onze horas, especialmente considerando que havia cinco crianças morando na última contagem. — Todo mundo ainda está dormindo? — Sim. — Michael deu a ela seu típico olhar de mãe-galinha. — Todos tivemos uma longa noite, principalmente porque eu estava tagarelando até às quatro horas. Sabe que eles podem sentir quando algo está errado ou qualquer um de nós está chateado. Ela se inclinou e soltou um beijo casto no topo de seu cabelo loiro e arenoso. — Eu sei. Me desculpe por ter te preocupado.
A pequena casa de Michael era uma casa segura não oficial para crianças de rua desde que a comprou cinco anos atrás, usando a maior parte do acordo de seguro que recebeu dois anos depois de ser atropelado por um motorista bêbado na Flamingo Road. A depressão que sofreu por sua incapacidade de andar de novo o levou a alguns lugares sombrios. Não ajudou o fato de seu namorado de longa data decidir abruptamente que a hospitalização de Michael durante meses era um bom momento para “fazer uma pausa e ver outras pessoas”. O amigo de Naomi perdeu tanto de repente, mas foi seu sonho de ajudar outras crianças como ele – crianças como Naomi e os dois – que lidavam com mãos de merda na loteria da vida e não tinham uma família própria, que atraiu Michael, e deu-lhe novo propósito. Também lhe dera propósito. Ao vê-lo durante o ano de intensas terapias, todos os altos e baixos que se seguiram ao acidente e o longo caminho até a recuperação, galvanizaram sua amizade e seu compromisso com as crianças que queriam ajudar. Eram companheiros de quarto desde então. Além do quarto com duas camas de solteiro que ela e Michael dividiam como irmão e irmã, dois outros quartos foram equipados com beliches e espaço para seis crianças cada, oito caso ficassem a curto prazo. Um quarto era reservado para meninos e o outro para meninas. A casa não era um palácio de forma alguma, mas era confortável e era um lar. E quando os abrigos da cidade estavam cheios, isso significava um lugar seguro para qualquer criança com menos de 18 anos deitar a cabeça e obter três refeições sem medo de julgamento ou retorno. Qualquer coisa era melhor que acabar numa ala do estado. Naomi sabia disso em primeira mão. Um sistema que esperava que crianças que já tiveram sua confiança arrastada milhares de vezes pelo vidro quebrado depositassem essa mesma confiança num bando de burocratas que não os conheciam, e não davam a mínima para eles, além de checar seus pequenos formulários e passar o dinheiro para a próxima pessoa na fila? Não era de admirar que a maioria das crianças escorregasse pelas brechas ou se sentisse tão desesperada por uma sensação de normalidade que aceitasse até mesmo
a mais dúbia oferta de bondade de qualquer um que lhes desse uma segunda olhada. Se ela e Michael tivessem algo a dizer sobre isso, nenhum garoto jamais sentiria que não tinha para onde ir ou ninguém em quem confiar. Este sonho deles, por mais humilde que fosse, significava tudo para ela. Mais que isso, era a única coisa boa que ela fez em sua vida que sabia que teria deixado sua mãe orgulhosa. Mas não havia dúvida de que pressionou os limites na noite passada e isso quase custou sua vida. Teria, se não fosse por Asher. Deus. Asher. Vamos falar sobre ofertas duvidosas de gentileza. Também vinha com amarras, evidentemente. Ou melhor, uma gaiola trancada. Ela desabou na sala e soltou um gemido, segurando o crânio. — Bom senhor, olhe para você. — Michael estacionou sua cadeira de rodas na frente dela. Embora seu rosto redondo estivesse comprimido de preocupação, até de raiva, manteve a voz quase num sussurro. — Está coberta de hematomas. Que porra aconteceu ontem à noite depois que mandou uma mensagem dizendo que estava a salvo e a caminho de casa? — Tudo meio que foi para o inferno naquele momento, — ela admitiu, em seguida, retransmitiu os destaques de como foi interceptada pela segurança do Cassino Moda e ganhou uma carona pela I-15 até o meio do Mojave. — Me arrastaram para fora do carro e me levaram para a areia sob a mira de uma arma. Michael respirou fundo. — Doce Jesus, José e Maria. — Batendo a mão no peito, fechou os olhos por um longo momento, depois exalou devagar. Quando olhou para ela novamente, seu olhar castanho estava preenchido com uma mistura de horror e alívio. — Ok. Está obviamente viva, então acredito na sua incrível habilidade de pousar em seus pés, não importando o problema. Mas caramba, Naomi. Essa merda está ficando séria. Sabe que Leo Slater não brinca por aí.
— Eu sei. — Sabia disso melhor que a maioria das pessoas. E ontem à noite recebeu um lembrete bastante robusto. — Mas como você disse, estou obviamente viva. Ele franziu a testa. — Certo. E como exatamente conseguiu isso? — Tive algum... socorro. — A menos que me diga que uma unidade de soldados das Forças Especiais caiu do céu para salvá-la de três capangas de Slater – três capangas fortemente armados – então não consigo nem imaginar que tipo de ajuda foi necessária para tirar você desse apuro. E isso não faz nada para explicar o monte enferrujado que está estacionado na entrada da garagem. Ela sorriu apesar da gravidade do que aconteceu com ela – tanto na noite passada no deserto como nesta manhã na casa de Asher. Michael sempre teve a capacidade de difundir até mesmo a pior situação e fazê-la sentir que tudo ficaria bem. — Não foi uma unidade das Forças Especiais, e ninguém caiu do céu para me salvar. — Ela olhou para ele, sabendo que ele ia achar a verdade real ainda mais difícil de engolir. — Foi um grande macho Raça. Chegou naquela caminhonete velha e calmamente acabou com todos os três capangas de Slater em cerca de um minuto. — Um macho Raça? — Michael ficou boquiaberto. — Por favor, não me diga que acabou sendo o lanche da meia-noite de um vampiro em cima de todo o resto da noite passada. Ela balançou a cabeça, depois estremeceu com o pulsar das têmporas. — Asher não me mordeu. Disse que ia me levar ao hospital, mas ao invés disso, depois que desmaiei por uma concussão, me levou para casa com ele e cuidou de mim a noite toda. Não foi até esta manhã quando acordei que as coisas realmente ficaram estranhas, acabando comigo trancada em seu quarto. Michael engasgou com o suspiro. — Foi aí que as coisas começaram a ficar estranhas? Vá em frente. Sou todo ouvidos. — Ele viu minha marca de nascença. — Quer dizer sua marca de Companheira de Raça, — seu amigo corrigiu solícito.
Ela franziu o cenho. — Não chame assim. É apenas uma marca de nascença, a menos que eu acorde um dia e decida que quero ter pequenos bebês vampiros ou algo assim. O que não vou fazer, e não farei. Michael encolheu os ombros. — Essa marca é também a única razão pela qual conseguiu escapar de dentro de uma sala trancada, estou certo? Esse pequeno talento de Companheira de Raça para manipular engrenagens de metal e magnetismo. Esse mesmo que você tem usado para enganar jackpots de slots de cassino e roleta durante o tempo que te conheço. — Ele riu. — Foi assim que sequestrou o caminhão do seu bom samaritano também? — Não fiz o truque no caminhão, — ela murmurou. — Não precisei, porque encontrei as chaves na mesa da cozinha. O que não justificava o fato dela ter roubado o caminhão de Asher. Roubar dinheiro de Leo Slater era uma coisa por que nunca pediria desculpas, mas não podia negar a pontada de culpa que carregava, sabendo que tirou algo de Asher, quando tudo que ele fez foi ajudá-la. — Quanto a ser um bom samaritano, — ela acrescentou, — não iria tão longe, Michael. Os bons samaritanos devolvem carteiras perdidas sem receber nada do dinheiro. Os bons samaritanos andam com senhoras idosas pelas ruas movimentadas e são voluntários em bancos de alimentos. Não matam três gângsteres a sangue frio por causa de uma mulher que nem conhecem. Não insistem que estão ligados à honra de proteger alguém apenas por causa de alguma marca boba de nascença, então providenciam o envio da dita pessoa para um esconderijo de vampiros. Deus sabe onde serei uma peça de mobília ou uma vaca premiada. — Ele fez tudo isso? Ela assentiu com força. — Contou à Ordem sobre mim, pelo amor de Deus. Se não tivesse fugido, mais tarde hoje estaria lidando não apenas com Asher, mas com qualquer número de guerreiros da Ordem que tentassem proteger minha vida por causa de algum código moral antiquado. — Seu herói Raça durão conhece a Ordem? Naomi lhe lançou um olhar fixo. — Não tem que agir tão impressionado com ele, sabe.
— Ele salvou sua vida, querida. Claro, estou impressionado. E sou muito grato a ele. Naomi sorriu para seu amigo, aquecida por sua afeição. E supôs que se ela se acalmasse e desse um minuto para sua indignação esfriar, havia uma parte dela que não podia deixar de estar mais que um pouco intrigada com Asher também. Ela tinha tantas perguntas sobre ele. Tanto que queria saber, como conheceu seu amigo Ned e o que estava fazendo com sua vida antes daquela época. Ela viu assombro em seus profundos olhos azuis. Uma dor que ela não sabia nomear. Talvez tudo que viu eram as feridas de seu dom único – sua maldição ao experimentar toda a angústia e aflição de quem tocasse. Como devia ser assim para ele, dia após dia? Como ele lidava com uma vida inteira cheia dessas lembranças? Ela queria saber, queria perguntar todas essas coisas e muito mais. Também por que, se estava tão disposto a proteger sua vida, ele já não tinha uma Companheira de Raça? Michael se aproximou e deu a mão dela um aperto suave. — Se algum dia eu ver este seu Asher, quero agradecer a ele por salvar minha melhor amiga. — Asher não é meu nada, — ela resmungou, levantando-se do sofá. — E se eu tiver sorte, nunca vou ter que vê-lo novamente. As sobrancelhas de Michael se levantaram. — Oh, doce irmã postiça. Ele é gostoso, não é? Ela queria rir, mas estava ocupada demais lutando contra uma súbita onda de calor. Podia literalmente sentir o sangue correndo para suas bochechas enquanto uma imagem indesejada do corpo musculoso de Asher e seu rosto robusto e bonito tomavam forma em sua mente. Era mais que gostoso. Era sobrenaturalmente masculino e facilmente o homem mais excitante que já viu. Raça, ela se corrigiu. Ela não estava totalmente preparada para pensar nele como simplesmente um homem, muito menos um que podia estar atraída. Especialmente depois que fez essa rotina de homem das cavernas nesta manhã. Independentemente de quão nobres suas intenções possam ter sido.
— Acho que a palavra que está procurando é psicótico, — disse ela, e se dirigiu para a cozinha, desesperada por um pouco de água – ou talvez uma bebida forte. — E, de qualquer forma, não importa o que penso sobre Asher. Tenho coisas maiores para pensar, ou seja, meu próximo passo com Leo Slater. Michael entrou no quarto atrás dela. Todo seu humor e provocação desapareceram com a menção de Slater. — Do que está falando, seu próximo passo? Naomi, desviar algum lucro do Cassino Moda pode ter parecido uma piada e meia quando começou este seu jogo, mas a merda ficou séria na noite passada. Você quase foi morta. Ela encheu um copo de água da torneira e bebeu, depois encolheu os ombros. — Eu caí de pé. — Por pouco. Já se viu? Está cheia de arranhões e hematomas. — Ele assobiou uma maldição tranquila, balançando a cabeça. — Se não fosse pela misericórdia de um estranho... um homem Raça que, segundo sua própria descrição, poderia ter se voltado tão facilmente contra você na noite passada, provavelmente estaria deitada debaixo de uma pilha de terra em algum lugar no Mojave agora. — Não é sobre mim. É sobre justiça, Michael. É sobre garantir que nenhuma criança que entre pela nossa casa tenha que ser afastada porque estamos sem camas ou sem comida. É sobre pegar algo de um idiota poderoso e corrupto como Leo Slater e dar para alguém que realmente precisa. Alguém que merece isso. Michael soltou um suspiro lento. — Não, Naomi. É sobre sua mãe. É sobre o que Slater fez com ela. Sei que quer fazer o certo para essas crianças, mas isso é sobre vingança para você. E se não for cuidadosa, vai acabar como sua mãe. Desaparecida e presumivelmente morta nas mãos de Slater. Doeu ouvi-lo dizer isso. Não porque estava errado, mas porque a conhecia melhor que qualquer um. Por mais que quisesse sustentar as crianças que cresciam nas ruas abandonadas e aterrorizadas, depois do desaparecimento de sua mãe, também estava em busca de sangue. Sangue de Leo Slater.
Seu plano sempre foi o de secá-lo através de uma série de roubos cada vez mais humilhantes e sem solução. Já tinha uma dúzia de vitórias, não importa o erro da noite anterior. E agora estava de olho num prêmio ainda maior – um jackpot combinado que vinha se acumulando há meses no Moda. Naomi queria sair com tudo isso. Queria que Slater fosse feito de bobo na frente de seus investidores e clientela de alto nível por sua falta de segurança. Eventualmente, queria destruí-lo. Então, um dia, uma vez que estivesse reduzido a miséria e vergonha, todo seu poder tirado dele por causa dela, queria enfrentá-lo cara a cara e dizer-lhe que foi ela quem tirou tudo que ele tinha – assim como ele fez com ela. Só então, depois que ele soubesse o que ela fez, queria ser a única a enfiar uma faca em seu coração. — Não precisa se preocupar comigo, — ela insistiu para Michael. — Sei o que estou fazendo. E tenho cuidado. — Não, querida. Você não tem. — Ele balançou a cabeça sóbria. — Não mais, você não tem. Essa vingança que tem contra ele está deixando você imprudente. Você precisa sair. Quero dizer agora. — Não posso fazer isso, Michael. Não até eu completar este último resultado. Ele estava prestes a protestar mais, mas o som de pés arrastando no linóleo do corredor interrompeu abruptamente a conversa. Garotos gêmeos, de cabelos escuros e pele café com leite, com corpos esguios e rostos de querubins arredondados que diziam que mal estavam na adolescência, entraram cautelosamente na cozinha. Naomi nunca os viu antes, e viu a incerteza deles quando a viram também. — Oi, — disse ela, oferecendo um sorriso amigável. Michael girou a cadeira de rodas para encará-los. — Ei, pessoal. Dormiram bem? Sua irritação com ela desapareceu instantaneamente, agora que as crianças estavam na cozinha. Os garotos se inclinaram cautelosamente, mas continuaram olhando para Naomi. O mais alto colocou um braço protetor ao redor de seu irmão. Seus olhos escuros e penetrantes captaram sua
aparência, demorando-se nos hematomas que sombreavam seu rosto e queixo. — Quem é ela? Não perguntaram sobre seus ferimentos. A maioria das crianças de rua tinha feridas e cicatrizes próprias, e parecia haver um código não escrito que proibia perguntas desconfortáveis. — Sou Naomi, — disse ela. — Nossa conversa estava muito alta aqui e te acordamos? As crianças deram vagas sacudidas de cabeça. Michael tocou o ombro dela e sorriu para os gêmeos. — Naomi mora aqui também. É como uma irmã para mim. Às vezes, isso significa que brigamos como irmãos. — Isso provocou um sorriso no mais baixo dos dois garotos. Michael olhou para ela. — Nay, esse é Max e Billy. Estou esperando que fiquem por aqui para tomar café da manhã? — Ele levantou uma sobrancelha questionadora em direção a Max, o mais alto, que era claramente o chefe. O ligeiro peso do menino mudou de um pé para o outro quando seu irmão olhou para ele esperançoso. — Sim, — Max murmurou. — Acho que poderíamos comer. Acha que poderíamos tomar banho também? Já faz alguns dias e... Ele parou, olhando para seus tênis surrados, a vergonha rolando dele em ondas. Naomi não queria nada mais que arrastá-lo para os braços e dizerlhe que ele importava. Prometer que nem sempre seria assim. Mas esteve naqueles mesmos sapatos esfarrapados e com a confiança trôpega o suficiente para saber que nada o faria correr mais rápido que um abraço ou uma palestra bem-intencionada. Ela cruzou as mãos na frente dela e deu às crianças um sorriso caloroso e casual. — Pode usar o chuveiro no banheiro principal, — disse ela. — Fim do corredor. Toalhas de linho estão no armário, segunda porta abaixo à sua direita. Fiquem à vontade, então, quando terminarem, certifiquem-se de esfregar o azulejo e pendurar as toalhas molhadas para secar no gancho atrás da porta, certo?
Por mais estranho que parecesse, enquanto a maioria dos adolescentes de classe média se rebelava contra as regras da casa e a orientação dos pais, as crianças que apareciam em seu abrigo improvisado pareciam gostar de receber algumas responsabilidades. Talvez sentir que estavam contribuindo para algo tirasse um pouco do constrangimento de precisar – e aceitar – a ajuda de alguém. Também os lembrava, ainda que sutilmente, da importância de mostrar respeito e ter autodisciplina. Não tinham muitas regras aqui. As crianças vinham e iam por vontade própria. E a promessa de não forçar ou contatar a polícia, os pais ou serviços sociais ajudava que mais deles voltassem – até, em alguns casos, permaneciam até que pudessem se levantar. Em troca, ela e Michael tinham uma regra estrita de “não violência, sem drogas”, e esperava-se que cada criança se limpasse. Hospedavam de seis a dez crianças alguns dias, o que significava que em algumas noites havia um garoto preso no sofá também. Se tivessem mais espaço, poderiam não apenas oferecer acomodações de longo prazo, mas também aumentar o número de crianças que poderiam ajudar. O que trouxe seus pensamentos de volta ao enorme jackpot maduro para colheita no Moda. 1.3 milhões de dólares e algumas mudanças que não apenas significariam terras e um abrigo adequado para as crianças, mas também garantiriam que a operação permanecesse viável por muitos anos. Além disso, havia muita justiça poética na ideia de usar o dinheiro de Leo Slater para financiar uma instituição de caridade para crianças órfãs e negligenciadas. Viu Max e Billy saírem da cozinha para voltarem pelo corredor em busca de toalhas. — Mata-me a cada vez, — ela murmurou baixinho para Michael, seu coração doendo de uma forma que não podia descrever para alguém que nunca sentiu isso. — Te contaram alguma coisa? Ele balançou a cabeça e passou a mão pelo cabelo curto. — Não. Estou supondo que o pai é o problema. Billy tem um conjunto de impressões digitais no braço que tentou esconder abaixando as mangas. Mão grande, enrolada por toda a volta e depois outra. E quando atendi a porta, os dois pareciam
aliviados por eu estar numa cadeira de rodas. Provavelmente imaginaram que poderiam me superar se tivessem que sair. A parte mais triste de tudo isso não era que provavelmente se sentissem assim. Era o fato de que sua sobrevivência dependia deles mantendo esse medo perto de seus corações e nunca esquecendo-o. Frequentemente, as pessoas oferecendo ajuda eram as que tinham o potencial de machucá-las ainda mais que as pessoas das quais estavam fugindo. Essa era a realidade de viver nas ruas. Dois garotos jovens e bonitos, com rostos bonitos, podiam fazer muito dinheiro para um cafetão. Uma vez que estavam viciados em drogas, suas vidas acabavam e imploravam para ficar. Naomi empurrou o peso de seus pensamentos sentimentais e se concentrou em Michael com um sorriso irônico. — Se achavam que poderiam superar você, não viram você derrubando o Strip nessa cadeira como se tivesse um foguete sob sua bunda magricela. Ele riu. — Bunda magricela? Deveria se olhar. Ela riu, feliz por voltar ao modo normal aqui em casa. Sua provocação era parte integrante do dia a dia. Tinha que ser. Se não conseguissem encontrar uma maneira de compartimentar e aliviar a carga pesada de ver essas crianças lutando, enlouqueceriam. Ela o apertou levemente no ombro. — Vou fazer ovos e bacon. Você está no dever das torradas. — Sim, chefe. — Ele foi até a geladeira e tirou dois pães enquanto Naomi se ocupava nos armários, pegando as panelas e os temperos necessários. — Não ache que vou esquecer onde paramos antes dos meninos aparecerem, Nay. Minhas pernas podem não funcionar mais, mas meu cérebro está em forma. E tenho um plano. Ela girou um olhar estreitado para ele. — Que tipo de plano? Com as crianças bem fora do alcance da voz, ele baixou a voz para um sussurro conspiratório. — Quer atingir o cassino de Slater novamente pelo grande placar? Bem. Fazemos do meu jeito. E fazemos isso hoje à noite.
— O quê? Depois da noite passada, está louco? — Ela balançou a cabeça. — Tenho que me calar por um tempo primeiro. Dar a Slater a chance de se sentir confortável novamente. — Nuh-uh, — Michael disse, aquele brilho familiar de astúcia iluminando seus olhos cor de avelã. — Pense nisso, Nay. No momento, ele provavelmente nem sabe que seus caras estão desaparecidos ainda. Provavelmente está sentado à beira da piscina, bebendo um Bloody Mary e sendo espancado por sua massagista, pensando que tudo está bem e elegante. Logo, no entanto, provavelmente depois que tiver um almoço de cinco pratos e outro trabalho de mão, começará a fazer ligações para seus homens e perceberá que não receberá ligações. Ele vai ficar aborrecido, mas com certeza não vai pensar que uma mulher pequena poderia ter enfrentado três de seus capangas armados, então vai dar um tempinho. No final da tarde, vai começar a se perguntar. Vai começar a fazer ligações para outros capangas maiores para encontrá-los. — Está certo. Merda, está absolutamente certo. Uma vez que o sedan preto fosse encontrado onde Asher deve tê-lo abandonado, as suspeitas aumentariam. Inicialmente, ela não passava de outra vigarista num de seus muitos cassinos, um mosquito que precisava ser acertado. Ele entregou a tarefa de lidar com ela aos seus bandidos, e em sua mente, isso era o fim de tudo. Mas perceber que ela fugiu? Slater não gostaria disso nem um pouco. Isso iria comê-lo, fazê-lo sentir-se fraco. Especialmente por ser enganado por uma mulher. Puxaria as fitas de segurança daquela noite e estaria procurando por ela. Estaria virando a cidade do avesso até que a encontrasse. — Sabe o último lugar que vai estar procurando por você? — Michael perguntou. Ela assentiu. — Sim. Bem debaixo do nariz dele. Mas como vou fazer isso? — Nós, — Michael corrigiu. — O quê? Não seja ridículo.
— Não sou. Além de sua magia quando se trata de máquinas e magnetismo, ensinei praticamente tudo que sabe sobre o trabalho. Cartões, dados, o nome dele. Inferno, até mostrei a você como montar um disfarce decente e onde obter as melhores identidades falsas deste lado do Mississippi. — Não, Michael. — Ela recuou, balançando a cabeça para ele. — De jeito nenhum. Esse show é muito importante. É muito grande. Não quero você em nenhum lugar perto disso. — Porque, porque estou nessa cadeira? Ela recuou, sentindo como se ele tivesse lhe dado um tapa. — Isso é um golpe baixo. E nem perto da verdade. Sabe disso, certo? Quando ele não disse nada, ela se aproximou e colocou os braços ao redor dos ombros dele. — Você é toda a família que tenho, Michael. Morreria antes de deixar qualquer coisa acontecer com você. — O sentimento é mútuo, Nay. Então, não pense que vou mudar de ideia. — Olhou para ela com um olhar duro e determinado. — Não vai voltar ao cassino de Slater sem mim. Cada instinto que ela tinha dizia que isso era muito perigoso, muito arriscado. Especialmente agora que ele queria se adicionar à equação. Se alguma coisa acontecesse com seu amigo... — Não sei, Michael. Tenho um mau pressentimento sobre isso. Talvez seja cedo demais. Quero dizer, e se eu for descoberta? E se Slater tiver sua segurança procurando alguém de acordo com minha altura e tamanho? Nunca me deixarão chegar perto das máquinas, muito menos sair com a bolsa cheia. Michael não parecia convencido, nem um pouco. Por mais que ela estivesse motivada pela vingança de Leo Slater, ele era viciado na emoção da perseguição, o brilho de ganhos ilícitos. Ele sempre foi, pelo menos antes do acidente. Ela não conseguia se lembrar da última vez que o viu tão enérgico. Parte dela adorava ver seu amigo se excitar – realmente animar – com alguma coisa novamente. Mas outra parte estava apavorada pela possibilidade de cometer um enorme erro.
— Vou me preocupar com o como, — ele disse a ela. — Você se preocupa com o café da manhã, então vai descansar um pouco antes de começarmos a montar nosso plano para o grande resultado de hoje à noite.
Capítulo 7 A única coisa que Asher odiava mais que a Vegas Strip era a Vegas Strip numa noite de sábado. Era um oceano de pessoas, movendo-se como um cardume de peixes contendo espécies de todos os tamanhos, cores e formas existentes. Havia as meninas bem vestidas e muito maquiadas usando faixas ou tiaras cintilantes que as proclamavam “futuras noivas” ou “finalmente legais”, que mal conseguiam andar nos saltos altos, depois de cinco drinques. Os caras não eram exceção, festejando em bandos para celebrar seu último show na véspera de seu casamento, cercados pelos outros solteiros determinados a colocá-los em apuros. Os turistas com seus chapéus e camisas de Vegas estampados com o lembrete onipresente do que acontecia em Vegas... Toda essa massa estridente e despreocupada de pessoas que entupia a Strip passeava cegamente pelos muitos homens, mulheres e crianças semteto que enchiam as calçadas e alcovas no caminho entre um cassino brilhante e outro. Asher alongou seu passo e saiu da multidão, para o Cassino Moda com um suspiro de alívio. Claro, era de propriedade de um mafioso assassino, mas pelo menos era um pouco menos frenético que a rua.
O espaço era cavernoso, com paredes altas e ofuscantemente brancas, e um teto que devia estar a trinta metros de altura. O piso de mármore de bom gosto brilhava sob a luz de um enorme lustre de cristal com intricadas formas de vidro que brilhavam e cintilavam como diamantes. Se Leo Slater queria que seu carro-chefe parecesse ao mesmo tempo exclusivo e um pouco intimidador, ele conseguiu. A maioria dos clientes que vinha para entregar seu dinheiro aos cofres de Slater eram pessoas da classe trabalhadora atraídas para dentro pela fantasia de riquezas instantâneas e fáceis de serem adquiridas do outro lado das portas giratórias de latão polido. Outros, os poucos brilhantes, estavam vestidos ricamente em roupas de grife e roupas que transmitiam um ar de excesso e a despreocupação casual daqueles que esperavam por um bom tempo e dispostos a queimar maços de dinheiro em troca de algumas horas de emoção em qualquer uma ds mesas chamativas do Moda ou máquinas caça-níqueis reluzentes. Asher entrou com uma jaqueta de couro preta sobre uma camiseta preta e calça jeans preta. Acenando para uma garçonete que o observou com olhos ansiosos e um colete de renda três vezes menor que os seios de plástico, ele se moveu para a multidão, tirando fotos mentais de tudo ao seu redor. O som infinito de musicais de caça-níqueis estalando. A localização das mesas em relação ao balcão de segurança, a colocação das câmeras. Os rostos dos empregados e jogadores. Tudo isso. E enquanto catalogava seus arredores, ele procurava em todos os rostos por olhos amendoados cor de xerez e uma boca de arco de cupido que tinha certeza encontraria em qualquer lugar agora. É claro que, se Naomi estivesse no cassino, como Asher suspeitava, as chances eram de que tivesse pouca semelhança com a linda mulher que sabia que ela era. A vestimenta andrógina que a escondia na noite passada era apenas um dos seus muitos disfarces. Asher fez uma careta, entrando mais fundo na multidão. Depois de colocar a Ordem de prontidão após a fuga de Naomi, ele teve o dia todo para se irritar e se repreender por deixá-la escapar. Ele não tinha
certeza de como ela conseguiu abrir a fechadura de dentro do quarto, mas na última hora que esteve na cidade, de tudo que descobriu sobre Naomi Fallon, vulga Naomi Pierce, vulga Naomi Sato, vulga vários outros pseudônimos, tinha a sensação que abrir uma simples fechadura era apenas um dos truques em seu repertório. Bem, ele tinha alguns truques próprios. Como um Hunter, não era apenas hábil em assassinatos frios, mas também era um rastreador especialista. Ainda não tinha encontrado uma presa que não fosse capaz de perseguir. Isso era bom quando provavelmente era a única coisa entre a vida de Naomi e outro encontro no deserto com um pouco do músculo contratado de Leo Slater. Se colocassem as mãos sobre ela novamente, Asher não tinha dúvidas que seria por ordens não só para acabar com ela, mas também fazer dela um exemplo. Foi esse pensamento que o atormentou até que o sol finalmente rastejou abaixo do horizonte, liberando-o para sair atrás dela. Estava chateado como o inferno que ela roubou o caminhão velho de Ned, mas também foi seu erro. Ele não teve coragem de trocar o carro decrépito por algo novo após a morte de Ned. O Chevy o levava onde precisava ir na maior parte do tempo, e já que era o único veículo que tinha, Asher não queria perdê-lo. A verdade era que tinha se tornado um pouco sentimental com a relíquia enferrujada – bem como sobre o velho Ned também. Então, alguns meses atrás, depois que um par de babacas na fronteira do estado o roubou para pegar uma nota de vinte dólares que deixou descuidadamente enfiada no porta-copos, Asher instalou um rastreador GPS sob o capô. Que foi o que usou para rastrear o caminhão até a entrada de uma pequena casa a alguns quilômetros da Strip. Fez uma visita a esse endereço antes de vir para o Moda, mas o lugar estava vazio. Vazio de pessoas, quer dizer. Encontrou muitas outras coisas interessantes lá dentro. Havia quartos de beliche em ambos os cômodos vazios, as camas todas arrumadas, mas mostrando sinais de ocupação recente. Mochilas surradas e sacos de lixo
pretos cheios de roupas infantis ocupavam espaço em ambos os quartos, como se as crianças que estavam ali acabassem de chegar ou logo estivessem saindo. E havia outros itens de interesse para ele também. Particularmente no último quarto do final do corredor – o que estava com o cheiro inebriante de Naomi e o cheiro de sabão de um homem humano. Dentro daquela sala havia duas camas de solteiro e uma clara delimitação entre um lado do espaço e outro. O que significava que Naomi e Michael não estavam vivendo juntos como amantes, mas platonicamente. Se não estava enganado, Michael estava numa cadeira de rodas a muito tempo. Havia rampas do lado de fora e o banheiro principal estava equipado com trilhos e um assento portátil no chuveiro. Por todas as indicações, eram simplesmente companheiros de quarto. Por que essa compreensão lhe deu um profundo alívio, Asher ainda não queria saber. Pensou nos outros itens que descobriu. A caixa de sapatos aberta num escritório na sala de Naomi estava cheia de passaportes, carteiras de motorista, carteiras de estudante – tudo com alguma variação de sua foto neles, todos, sem dúvida, falsos. Havia numerosos IDs pertencentes a um Michael Carson na parte inferior da caixa também. Entre os dois, deviam ter mais de uma dúzia de pseudônimos diferentes. E no lado da sala de Naomi encontrou uma mesa de maquiagem repleta de tubos, kits, potes de sombra para olhos, lápis labiais e inúmeros outros itens. Em seu armário estofado havia alguns pares de jeans e algumas camisetas, além de trajes, perucas e disfarces suficientes para equipar uma trupe de teatro inteira. Asher não se sentiu culpado por suas táticas ou seu reconhecimento. Tinha um trabalho agora, e era proteger Naomi, não apenas de Leo Slater e seus lacaios, mas também de si mesma. O palpite de Asher de que seu roubo do cassino na noite passada não foi a primeira vez se intensificou a cada pista que descobria sobre ela.
E como estava no meio do Casino Moda, todo instinto predatório lhe dizia que ela estava lá, em algum lugar no meio do enxame de patronos bêbados e barulhentos. Só precisava saber onde procurar. Mesmo que Slater já soubesse do fato que ela fugiu e escapou da morte que ele planejou para ela, o arrogante bastardo certamente não estaria procurando por ela sob seu próprio teto novamente. Apenas um maldito idiota viria e atingiria o mesmo cassino que foi pego tentando roubar na noite anterior. Um tolo ou um gênio descarado, Asher pensou, examinando o grande espaço por qualquer um que pudesse remotamente passar pela Companheira de Raça. Durante a hora seguinte, deu uma volta pelo cassino, parando no caixa para comprar algumas fichas para ajudá-lo a se misturar à multidão. Jogou algo na mesa de poker Caribenho, olhando distraidamente suas cartas antes de dar outra olhada ao redor da sala. As máquinas caça-níqueis. Desde que foi onde ela mencionou estar ontem à noite antes de tudo ir ao inferno com os capangas de Slater, era um lugar tão bom quanto qualquer outro para começar a procurar por ela agora. Por duas vezes, nas máquinas caça-níqueis, viu mulheres jovens que poderiam passar por Naomi por trás. Brilhantes cabelos negros e corpos pequenos, mas quando se viravam, a semelhança terminava. Tinha que tirar o rosto dela da cabeça – uma tarefa quase impossível, já que pensava nela um pouco mais a cada hora que ficou preso esperando o anoitecer. Além disso, ela era claramente uma profissional quando se tratava de se disfarçar e misturar. Ela não se pareceria nada com si mesma hoje à noite. Tinha que pensar no excepcional. Pensar como Naomi. Mais meia hora se passou sem um sinal dela em qualquer lugar perto das máquinas caça-níqueis. Para continuar sua busca secreta no andar do cassino, seguiu para a mesa espanhola de 21 mais próxima do poço das roletas. Deslizando uma pilha de fichas para o círculo de apostas, deixou seu olhar percorrer as mesas e os jogadores reunidos ao redor deles.
Não foi até que avistou uma velhinha do outro lado dele, com as costas e ombros curvados como se nos últimos estágios da osteoporose, que parou frio e ficou olhando. De cabelos grisalhos e movimentos lentos, usava uma longa saia escura e uma túnica igualmente sem graça florida que pendia de seu corpo. Não podia ver o rosto dela. Nenhuma parte dela, enquanto ela se afastava dele em direção ao banheiro feminino, junto com um bando de mulheres de meiaidade conversando com bonés de beisebol cor-de-rosa e jaquetas de equipe enfeitadas com dados bordados nas costas. Asher olhou tão intensamente que mais de uma das garotas cor-derosa gargalhou, olhando desconfortavelmente por cima dos ombros, seus instintos mais primitivos sentindo o predador escondido e observando a multidão. Não a velhinha, no entanto. Ela continuou andando, de cabeça baixa e ombros encurvados. Asher sentiu um grunhido crescer dentro dele. Nunca iria confundir o cheiro dela. Pegou entre os outros perfumes mais pesados, licor derramado, fumaça de cigarro e incontáveis odores que permeavam o ar do cassino lotado. Apenas o rastro de sua pele quente por baixo de toda a roupa e artifício fazia todos os pistões disparar dentro dele ao mesmo tempo. Imagens incidentais e carnais de Naomi e dele juntos explodiram numa corrida. Os dois em sua cama, ele ajoelhado entre suas coxas, a cabeça jogada atrás em êxtase quando entrasse nela. Suas presas pulsaram em suas gengivas e ele selou seus lábios juntos numa carranca sombria para escondê-las. Não era bom. Lutou para empurrar abaixo tanto os pensamentos inapropriados quanto o súbito e persistente inchaço de seu pênis. A pequena velha desapareceu ao virar a esquina para os banheiros e ele engoliu em seco após a súbita secura em sua garganta, finalmente capaz de pensar direito novamente. Disse ao jogador para colocar um marcador em seu lugar e abandonou suas cartas para se aproximar dela, até que estava a dez metros de distância da entrada do banheiro. Se afastou para o lado e esperou, ele pensou em
entrar atrás dela. Mas a última coisa que precisava – a última coisa que qualquer um deles precisava – era criar uma cena. E havia uma mínima chance que a velha realmente não fosse Naomi. Uma chance infinitesimal na melhor das hipóteses. Se não fosse ela, ele seria amaldiçoado. Inferno, provavelmente estava de qualquer jeito. Havia se alimentado apenas alguns dias atrás, mas apenas a visão da fêmea o deixou louco com a necessidade de tê-la sob sua boca. Fechar os dentes e presas sobre o pescoço magro e sedoso e... — Com licença, — uma voz masculina tímida murmurou atrás dele depois de ter ficado ali por vários minutos. Ele se virou para encontrar um humano de cabelos ruivos em seus vinte e poucos anos esperando desajeitadamente, um sorriso nervoso preso em seu rosto. Asher olhou para ele em silêncio, irritado por ser interrompido. — Você é, hum... está em frente ao caixa eletrônico, — o outro homem murmurou, sua voz subindo uma oitava enquanto olhava para Asher, parecendo perto de se mijar. Asher rosnou e saiu do caminho. Ele se virou para o banheiro enquanto as damas cor-de-rosa e algumas outras mulheres que também estavam no banheiro voltaram para o cassino. Nenhum sinal de Naomi, no entanto. Impaciente, se afastou o suficiente atrás de uma grande coluna decorativa que a maioria de sua massa estava fora de vista. Na melhor das hipóteses, seria capaz de interceptá-la sem ela fugir ou derrubar toda a casa com um grito ou uma luta, uma vez que ela o visse lá. Mas ele a levaria de qualquer maneira. Não ia sair de Vegas sem ela seguramente na mão. Enquanto esperava, mais alguns minutos se passaram. Seguido por mais alguns. O tráfego de pessoas dentro e fora do banheiro feminino continuava num fluxo constante, mas Naomi não estava em lugar nenhum. Filha da puta. Ela sumiu. Não tinha certeza se foi pura sorte que tivesse saído do banheiro naqueles segundos em que esteve conversando com o outro homem, ou se de
alguma forma o sentiu em seus calcanhares e com sucesso o evitou... Tudo que sabia em seu intestino era que Naomi não estava mais aquele banheiro. Ele engoliu uma série de maldições, por muito pouco. Ela não podia correr muito. Não dessa vez. A encontrou uma vez – ou pelo menos achou que tinha – e a encontraria novamente. Ela era cautelosa e inteligente, mas ele era implacável. E se tivesse que rasgar o lugar inteiro esta noite, a fim de salvá-la de si mesma, maldição se não o faria. Porque se Naomi percebesse ou não, ela era dele. Para proteger, se lembrou severamente. Até mesmo essa possessividade, contrária a tudo que já sentiu, estimulou seu corpo a se movimentar pelo andar do cassino.
Capítulo 8 — Obrigada por me deixar usar sua jaqueta, — Naomi disse a uma das cinco mulheres que encontrou no banheiro feminino. Ela entrou atrás delas, sentindo-se desconfortável e nervosa, como se o olho de Moda no céu estivesse seguindo cada movimento dela dentro do cassino. Ou pior, como se alguém parado em algum lugar do andar a tivesse fixa em sua mira. Naomi não conseguiu entrar num dos banheiros rápido o suficiente. Coração disparado, palmas das mãos úmidas de ansiedade, tirou a peruca cinza e máscara dentro do box e jogou tudo na lata de lixo antes de sair com jeans e camiseta que usava embaixo. Ninguém lhe deu atenção quando ela discretamente se aproximou de uma pia vazia para espalhar sabão e água em seu rosto para tirar a maquiagem da velhice. O “Diamond Divas Dice Club” estava na frente dos espelhos, refrescando seu perfume e se preparando enquanto conversavam sobre qual restaurante do cassino servia o melhor jantar para os madrugadores. Depois de secar o rosto com toalhas de papel, Naomi ofereceu sua opinião para quebrar o gelo e depois começou a negociar com uma das senhoras a compra de sua jaqueta como um amuleto de boa sorte.
Vestindo a jaqueta com aroma de cigarro e ópio bordado com o nome “Gladys” na frente, Naomi manteve a cabeça baixa enquanto saía do banheiro com as mulheres, um minuto ou dois depois, como se fosse parte de seu corpo apertado, convenientemente se escondendo, em bando. — Realmente aprecio isso, — disse ela à jogadora gordinha de cabelos escuros enquanto as Divas faziam uma pausa com ela no meio do caminho do cassino. — Acho que isso vai me trazer muita sorte. — Espero que sim, querida. — Gladys sorriu quando ela acariciou sua mochila rosa reluzente. — A melhor sorte que tive até agora foi vendê-la para você por uns bons cem dólares. Naomi sorriu. — Aproveitem seu jantar, senhoras. Uma vez que o grupo se dirigiu para o bufê de frutos do mar que ela recomendou, ela virou o casaco de dentro para fora e deslizou de volta para dentro dele. Agora que estava no andar novamente, não queria atrair atenção indevida com um cartaz rosa neon nas suas costas. Ela olhou para seu telefone para verificar a hora. Merda. Estava com dois minutos de folga. Michael ficaria nervoso por causa disso, mas tiveram seus sinais todos funcionando horas antes de chegarem separadamente no Moda hoje à noite. Não haveria comunicação entre eles sobre o trabalho até que ambos voltassem para casa. Ser visto falando ao telefone ou passando qualquer tipo de sinais de mão no andar para o outro não só colocaria o plano da noite em risco, mas suas vidas. Naomi olhou ao redor com cautela, ainda sentindo uma pontada de desconforto, embora não conseguisse encontrar nenhuma evidência para sustentá-la. Provavelmente era apenas paranoia por causa do que aconteceu ontem à noite. Além disso, ainda havia tempo para abortar se qualquer um deles sentisse que deveria. Um rápido olhar através da multidão mostrou Michael parado assistindo as mesas de roleta. Ele estava batendo palmas junto com os espectadores reunidos, seu sinal pré-arranjado apenas um estremecimento de suas extremidades. Naomi se endireitou e atravessou as fileiras de máquinas caça-níqueis, indo direto ao bar para pedir uma bebida, conforme combinado. Martini com
três azeitonas se estivesse pronta para rolar; Bloody Mary, se sentisse que deveria cancelar e sair o mais rápido possível. Com o Martini na mão, voltou para os caça-níqueis e começou a alimentar uma máquina vazia a quatro assentos do corredor. Ela não escolheu essa seção em particular por acaso. À frente de sua fileira, situada de modo que o alto sinal luminoso do jackpot enfrentava a multidão no meio do caminho e brilhava para que todos os olhos pudessem ver, estava a máquina que pagava o maior valor do Moda. Aquele com o prêmio de 1,3 milhão de dólares esperando para ser recebido. Naomi casualmente mudou de uma máquina para
a outra,
progredindo para o caça-níquel de um dólar, sentado ao lado do elegante e imponente Monte Carlo Fortune Bonanza, que estava sendo monopolizado por uma entediada loira-platina que estava esperando seu papai encerrar na mesa de blackjack do outro lado. Naomi colocou uma nota de vinte dólares em sua máquina e puxou a alavanca. Como a maioria das pessoas ao seu redor, ela gritava de excitação quando pegava qualquer quantia de dinheiro e esfregava o vidro como se quisesse que os símbolos mais cobiçados aparecessem. A única diferença entre ela e todos os outros pobres tolos ao redor dela, perdendo seus salários, era que ela realmente podia enganar a máquina para obedecer suas ordens. Quando perdeu cerca de metade do seu dinheiro, olhou e viu Michael lentamente indo até ela. Era hora. A loira colocou mais cem na máquina de Monte Carlo e puxou a alça. A ansiedade de Naomi aumentava a cada segundo que a mulher permanecia no assento. Quando estava prestes a enfiar sua terceira grande nota, Naomi se inclinou para ela. — Quer uma dica para aumentar suas chances com as grandes máquinas de dinheiro? — Com o aceno intrigado da vizinha, ela disse: — Não puxe a alavanca para girar a roda. Use o botão em vez disso.
Enquanto ela confidenciava o conselho absurdo, Naomi estendeu a mão e tocou o botão vermelho. Não para empurrá-lo, mas apenas para deixar a ponta do dedo pousar levemente na máquina. Foi o suficiente. A mulher sentou-se e apertou o botão. Perdeu a rodada. Encolhendo os ombros, tentou novamente, então novamente. — Obrigada pela sua dica, — ela murmurou, soltando um bufo. Missão cumprida. Michael rolou apenas alguns segundos depois. Não falavam um com o outro, mal reconheciam a presença do outro. Naomi voltou para sua máquina enquanto Michael se situava ao lado dela. —
Como
estão
os
Martinis
neste
lixão?
—
Ele
perguntou
despreocupadamente, do jeito que qualquer jogador faria, a fim de iniciar uma conversa com uma colega atraente. — Estão meio fortes, — disse ela com uma risadinha ensaiada. Um movimento descuidado de sua mão enviou seu copo para o chão acarpetado. Ela abaixou para pegá-lo, aproveitando a oportunidade para passar a mão pela lateral do elegante estojo de metal do Monte Carlo Fortune Bonanza. Ela encolheu os ombros para Michael. — Acho que isso significa que estou fora agora. Ele riu, perfeitamente casual, sorrindo enquanto ela andava ao redor dele com seu copo vazio. Seu pulso estava martelando, mas ela manteve sua expressão suave fixa em seu rosto. — Tome cuidado, — ela disse a ele, já se afastando da área. — Obrigado. — Ele colocou uma nota de cem dólares na máquina e apertou o botão de aposta máxima. — Você também. Ela virou as costas para ele, as mãos em punho frouxamente em seus lados quando começou a andar. E então orou como o inferno que não estivessem cometendo um erro colossal.
Capítulo 9 O grito de uma mulher soou em algum lugar no cassino. Asher congelou onde estava. Quase completou sua busca nas mesas de roleta e em vários caça-níqueis na enorme área de jogo sem nenhum sinal de Naomi. Aquele grito estridente enviou uma onda de adrenalina – e medo frio – correndo em suas veias. Foda-se. Não deixe ser ela. Mas então outro grito se elevou, seguido por dezenas de outros e a repentina cacofonia de vozes, sinos, sirenes e aplausos. Em outra seção dos caça-níqueis perto do caminho principal do cassino, uma máquina ridiculamente alta com um sinal digital exibindo um nome igualmente ridículo, evidentemente acabou de pagar um mega-prêmio, totalizando mais de um milhão de dólares. Quase todos no local pararam para olhar a área onde uma multidão se reunia rapidamente em torno do vencedor. Asher se dirigiu a esse caminho também, se esticando para ver quem estava no centro da multidão animada. Esperava que fosse Naomi – ou sua aparência disfarçada – enquanto se aproximava da periferia dos espectadores.
Mas não era ela sentada na frente da máquina. Enquanto os agentes de segurança e gerentes do Moda entravam para saudar o grande vencedor da noite, Asher percebeu que era um homem. Cabelos arenosos e um rosto amistoso e redondo que se iluminou de surpresa e gaguejante euforia enquanto girava em torno de sua cadeira de rodas para aceitar os parabéns de todos. — Não posso acreditar! — Ele exclamou, parecendo para todos o novo milionário chocado e radiante. — Isto é incrível! Eu venci! Filho da puta. Michael Carson. O amigo de Naomi não teve sorte para receber o maior prêmio acumulado no local. Teve ajuda. O tipo de ajuda que Naomi poderia fornecer. O que significava que ela tinha que estar perto. Num único instantâneo mental, Asher absorveu tudo isso. Michael parecia à beira das lágrimas reais em sua cadeira de rodas. O sinal do grande prêmio de 1.3 milhões de dólares piscando. O funcionário do cassino avançou com um largo sorriso e uma pilha de papéis para o vencedor assinar. E lá, na periferia da multidão em expansão, o rosto de um anjo estava coroado por cabelos negros e brilhantes. Não mais vestida como uma velha, Naomi tirou todo seu disfarce e agora observava o caos com um sorriso confuso no rosto, enquanto recuava para abrir espaço para mais pessoas que a empurravam. E continuou recuando, lentamente se afastando, como uma sombra. Não tão rápido, Asher pensou, olhando diretamente para ela. Ela o vislumbrou naquele mesmo momento, seu olhar cor de xerez colidindo com sua furiosa mancha âmbar. Sua boca se abriu em repentino e silencioso pavor. Então ela girou e escapou de vista, seu pequeno tamanho a escondendo entre a multidão de clientes do cassino. Asher mergulhou na multidão, cortando com um propósito decidido. Ao longe, a viu virando a esquina perto do poço de vidro do elevador privado central. Por um instante, a perdeu de vista. — Porra, — ele rosnou baixinho.
Usando toda a velocidade genética dos Raça, atravessou o salão do cassino, nada além de ar frio passando pelo aglomerado de frequentadores do cassino que se moviam lentamente, na maior parte inebriados, a caminho do elevador. Nenhum dos sentidos humanos era suficientemente agudo para rastreá-lo, mas havia um par de olhos que o encontraram e trancaram com intensidade de laser. Um homem Raça grande usando um terno escuro, um fone de ouvido sem fio e um distintivo de segurança Moda no quadril saiu do elevador no mesmo momento que Asher corria atrás de Naomi numa velocidade sobrenatural. Olhos prateados gelados se estreitaram sob as grossas sobrancelhas masculinas. Asher o conhecia – ou melhor, costumava conhecê-lo. Quando ambos eram garotos sem nome, unidos e capturados sob o brutal programa Hunter de Dragos. Não havia parentesco entre eles, então ou agora. Asher não saiu do laboratório com muitos amigos. Ou qualquer um, nesse assunto. Nas duas décadas desde que ele e esse macho escaparam do programa, seus caminhos não se cruzaram até o momento. Ver um colega ex-assassino agora, aqui e obviamente empregado por ninguém menos que Leo Slater, deixou o assassino em Asher tenso por uma briga. Por morte, se necessário. Se enfrentaram em desafio silencioso, Asher calculando uma dúzia de maneiras letais de abrir seu ataque enquanto a carranca do outro homem se aprofundava em suspeita. — O que está fazendo aqui, Asher? — Ele falou pesadamente o apelido, desprezo em cada sílaba. — Não teria adivinhado ser do tipo que joga. — Poderia te perguntar a mesma coisa. — Ele olhou para a crachá bronze brilhante preso à lapela do casaco do Hunter. Cain, é isso? O macho grunhiu, aqueles olhos astutos brilhando como a borda afiada de uma lâmina polida. Nessa altura, quatro outros membros da equipe de segurança do Moda se juntaram a Cain do lado de fora do elevador. Os homens, todos humanos, olhavam para ele e Asher em dúvida. — Tudo bem, senhor? — Perguntou um deles a Cain.
Ele deu um aceno conciso. — Se espalhem no andar. Certifique-se de que estamos seguros. Estarei bem atrás de vocês. Enquanto a unidade se espalhava para fazer o que ele queria, o olhar de Cain varreu a área imediata – incluindo o caminho que Naomi tomou apenas alguns instantes atrás – antes que sua atenção voltasse para Asher. — Problema, irmão? A boca de Cain se apertou com um rosnado. — É melhor esperar que não haja. Ou estarei bem atrás de você também, irmão. Asher deu um sorriso frio, então colidiu contra o ombro do segurança de Slater quando passou por ele sem outra palavra. Tudo que era animal dentro dele fervia com a ameaça que esse assassino representava – não tanto para ele, mas para Naomi. E agora, até mesmo para seu amigo Michael. Asher saiu do cassino, inalando o ar da noite enquanto se dirigia para as luzes brilhantes da Strip. Ela não era difícil de rastrear agora. Dois quarteirões pela calçada, ela estava correndo para o meio-fio com o braço para fora, tentando chamar um táxi. Ela gritou quando ele enganchou um braço em volta de sua barriga e a puxou para longe da rua. — Continue andando e não se afaste de mim ou vire a menos que queira chamar mais atenção para nós dois. — Com a mão na parte de baixo de suas costas, a conduziu ao lado dele e começou a andar rapidamente em direção à garagem onde ele anteriormente estacionou o caminhão. Demasiado esperta para fazer uma cena na rua, ela deu um passo ao lado dele, instruída, seu corpo tremendo sob a palma da mão. — Como diabos me achou? E o que acha que está fazendo? — Salvando seu belo pescoço pela segunda vez, — ele murmurou. — Vamos. Embora ele dificilmente a chamasse de cooperativa, ela ficou quieta o resto da caminhada até a caminhonete. Ele a colocou no lado do passageiro, depois deu a volta e subiu ao volante.
Ela lhe lançou um olhar irritado quando ele ligou o caminhão. — Desde que vejo que você não teve problemas para recuperar essa lata velha de onde a deixei esta manhã, acho que isso significa que sabe onde me deixar. — Não vou te deixar em nenhum lugar. — Você certamente vai. — Ela recuou, girando para enfrentá-lo. —— Me leve para casa, Asher. Agora mesmo. — Eu vou. Pro meu lar. — O quê? Não! Droga, deixe-me sair deste caminhão agora mesmo. — Fora de questão. — Quando ela pulou para a maçaneta ao lado dela, ele estendeu a mão pelo assento e fechou os dedos sobre a mão dela. — Se eu deixar você ir, você vai acabar morta. — Já não tivemos essa conversa? Eu te disse que não quero sua proteção. Só quero que me deixe em paz. — Não posso fazer isso, Naomi. Especialmente depois do golpe que você e Michael acabaram de dar. Seu rosto empalideceu, mas seu queixo teimoso subiu um pouco. — Não tenho ideia do que está falando. Ele zombou. — Mesmo? Estou apostando que você tem cerca de um 1.3 milhões de ideias do que estou falando. Ela ficou em silêncio por um longo momento. — Michael ganhou esse prêmio, não eu. Não há razão para alguém no cassino suspeitar de algo. — Não, a menos que tenham um motivo para estudar o vídeo de segurança do cassino e notem que uma mulher idosa entrou mancando no banheiro feminino alguns minutos antes da grande vitória, mas nunca saiu. Naomi engoliu em seco. — Senti como se estivesse sendo observada. Era só você? — É melhor esperar que fosse só eu. — Ele mordeu uma maldição, enfurecido por sua audácia – por sua imprudência que parecia se aproximar do suicídio. — Pelo amor de Deus, Naomi. Tem que saber o que significa cruzar com um homem como Leo Slater. Está deliberadamente tentando se matar? — Não. — Então por que, droga? Que porra está tentando fazer? — Você não entenderia.
— Tente, — ele rosnou, segurando seus ombros delgados. Estava vibrando com a força de sua raiva e sua preocupação por ela. Ele sentia seus olhos queimando com faíscas enquanto olhava para ela dentro dos limites da cabine do caminhão. Deus o ajude, queria sacudi-la. Queria dirigir seu punho através do painel e sacudi-la por quão perto ela estava do perigo. Perigo que ela nem podia começar a entender, agora que sabia que Slater tinha um ex-Hunter em sua folha de pagamento. — Diga-me porque está tão obcecada com esse cassino. Por este homem. — Ele me deve. Vamos apenas deixar por isso. — Não. Não vamos deixar assim. — Ele a segurou com mais força. — Você não é uma fêmea estúpida, Naomi. Na verdade, provou ser inteligente como o inferno. Exceto quando se trata de Slater. Um arrepio percorreu-o quando reviveu a angústia, o medo e o desamparo de uma criança inocente que testemunhou a brutalidade da vida, a fealdade daquilo, muito jovem. Havia uma parte dele – uma parte que mantinha enterrada lá no fundo – que entendia um pouco disso também. Asher procurou seu olhar aflito, suas mãos ainda a segurando. A conexão renovou a memória que leu antes, mas ele não a soltou, incapaz – ou talvez sem vontade – de liberá-la. — Foi Slater quem machucou sua mãe, não foi? — Machucou? — Ela falou numa voz firme, mas baixa. — Ele a matou, Asher. Não posso provar, mas sei que o fez. A polícia chamou o caso de sem solução. Apenas outra mulher que desapareceu da face da Terra depois que Leo Slater se cansou de espancá-la e usá-la. — Ela desapareceu? — Quando eu tinha oito anos de idade. Ela me deixou sozinha para o fim de semana e... nunca voltou. — Naomi engoliu em seco, seus olhos se encheram de lágrimas. — Continuei esperando. Fiquei esperando, mesmo depois que o serviço de proteção das crianças chegou ao nosso apartamento e me levou com eles alguns meses depois. Asher exalou uma maldição que brotou das profundezas de sua alma. Sua raiva era uma coisa viva. Poderia ter passado por isso e ficar bem. No
pouco tempo que a conhecia, raiva e combatividade eram as emoções que ela mais usava. Junto com a determinação teimosa e incansável. Não, essas eram as emoções que ela mantinha na frente para todos verem. Foi a única lágrima rolando por sua bochecha que fez seu coração doer. E a próxima e próxima depois disso. Sua tristeza pela mãe o rasgou ao meio. Ele não tinha habilidade quando se tratava de dar conforto ou dizer as coisas certas. Ele foi criado para negar qualquer suavidade, qualquer emoção que pudesse torná-lo um instrumento mais fraco quando se tratava de lidar com a morte. Nem mesmo seu tempo cuidando de Ned alisou todas as suas arestas. Mas queria dar conforto à Naomi. Queria que ela soubesse que sua dor era dele agora. Que não apenas a protegeria, mas faria o que fosse necessário para garantir que Leo Slater nunca tivesse chance de machucá-la ou a qualquer outra pessoa novamente. Sem palavras, moveu as mãos dos ombros para os lados de seu belo rosto, embalando-a gentilmente nas palmas das mãos. Ela não resistiu a ele. Seu olhar permaneceu preso no dele enquanto ele alisava os polegares sobre as lágrimas que agora percorriam seu rosto em correntes firmes. E quando a puxou para ele, seus lábios se abriram numa exalação silenciosa, um som que estava longe de ser um soluço. Asher roçou sua boca sobre a dela, chocado com a corrente que rugia através dele naquele primeiro contato tenro. Não estava preparado para o quão agudamente a desejava. Não estava preparado para o quão profundamente esta mulher estava impactando sua vida. Não tinha espaço para o problema que ela estava trazendo para seu mundo solitário. E com certeza não estava preparado para lidar com todos os sentimentos que ela estava alimentando dentro dele desde o momento que seus olhos se encontraram pela primeira vez. Ele se afastou dela com um gemido baixo e um pedido de desculpas murmurado que realmente não queria dizer. — Prepare-se, — ele ordenou rispidamente. — Não é seguro para você nesta cidade. E já perdemos muito tempo.
Ela afundou contra o assento em silêncio e puxou o cinto de segurança através de seu corpo. Quando estava segura, Asher colocou o caminhão em marcha e saiu correndo da garagem com determinação renovada. Protegeria Naomi com seu braço e sua vida. Tão escassa quanto sua honra era, não podia viver com ele mesmo se permitisse que algo acontecesse com ela. E agora, além dessa obrigação, pagaria a dívida que Leo Slater lhe devia mesmo se fosse a última coisa que fizesse. Assim que garantisse que Naomi estava fora do alcance de Slater, aquele filho da puta iria afundar.
Capítulo 10 Ele não disse duas palavras para ela durante a viagem de Vegas. Ela disse a si mesma que estava aliviada por seu silêncio pensativo ao lado dela, especialmente desde que seus lábios ainda estavam queimando pelo calor de seu beijo. Foi tão inesperado, sua ternura chegando logo depois de sua óbvia frustração com ela. Ele a beijou por desejo? Deus sabia que estava entretendo alguns pensamentos e impulsos puramente sexuais e espontâneos a respeito de Asher. Por mais zangada que quisesse estar, e estava, com o macho dominador Raça, mal podia negar sua consciência dele, nem a resposta ansiosa de seu corpo. Qualquer mulher com olhos em sua cabeça e sangue vermelho quente em suas veias acharia impossível descrever Asher como algo menos que derrete-calcinhas. Mas isso não significava que a atração fosse mútua. No instante que ele cobriu sua boca com a dele, parecia tão bravo que ela quase esperou que socasse alguma coisa – possivelmente ela. Isto, até que seus olhos começaram a lacrimejar e aqueles soluços pateticamente fortes começaram a sair de sua boca antes que ela pudesse segurá-los.
A humilhação inflamava suas bochechas, aumentando o fogo já estabelecido na sequência do seu beijo. Quão profundamente embaraçoso ter desmoronado na frente dele daquele jeito. Lágrimas, pelo amor de Deus. Nunca chorou por sua mãe, muito menos na presença de outra pessoa. Nem mesmo Michael sabia o quão profundamente a perda realmente a feriu. Agora, foi e chorou na frente de Asher como a menina de oito anos abandonada e de coração partido que foi todo aquele tempo atrás. Por tudo que sabia, ele poderia ter feito isso simplesmente para calála. Ou, pior ainda, por pena. Mas seu beijo ardente não tinha gosto desses impulsos. Não que ela estivesse em condições de julgar. No momento que suas mãos fortes se fecharam ao redor de seus ombros, em seguida, embalou seu rosto, ela estava longe demais para questionar qualquer coisa, exceto a intensidade de sua necessidade de afundar contra ele em rendição. No momento, tudo que ela queria era ficar o mais longe possível dele e tentar esquecer toda a ideia perturbadora. Quando Asher saiu da estrada deserta e iluminada pelas estrelas para a estrada de terra que levava ao antigo rancho, Naomi ficou suspensa entre a emoção de tirar de Leo Slater um dos seus milhões e a preocupação por Michael nas próximas horas cruciais. Após sua grande “vitória” no cassino. Por agora, toda a documentação do cassino devia estar assinada, o cheque emitido e em suas mãos, pronto para ser depositado em sua conta bancária. Mas e se algo deu errado? E se tudo foi ao inferno depois que ela fugiu do Moda com Asher em seus calcanhares? Naomi enfiou a mão no bolso da calça jeans e pegou o novo telefone para verificar as mensagens de Michael. Nenhuma palavra ainda. Droga. Embora tivessem concordado que ele enviaria um texto assim que estivesse limpo e sentisse que era seguro fazer contato, seus dedos coçavam com a necessidade de checar com ele. Mal tocou na tela com a primeira letra quando o dispositivo de repente pulou de seus dedos e direto na mão de Asher.
— Que diabos? — Ela ficou boquiaberta, lembrando de quão pouco entendia sobre ele ou sua espécie. — O que pensa que está fazendo? — Você tem seus pequenos talentos; eu tenho o meu. — Ele deixou cair o telefone entre as coxas separadas enquanto manobrava o caminhão sobre os buracos e vales da entrada de carros. Quando estavam estacionados na frente da casa, desligou o motor e deu a ela um olhar sombrio. — Se você se preocupa com seu amigo, a melhor coisa que pode fazer por ele é manter distância por um tempo. Sabia que ele estava certo, mas era contra a vontade dela deixar qualquer homem – particularmente esse – dar ordens a ela e dizer o que podia ou não fazer. — Tudo bem, marcou seu ponto. Vou pegar meu telefone de volta agora. Ela estendeu a mão, mas ele a ignorou. Pegando as chaves e o celular numa das mãos, saiu do caminhão e se aproximou para abrir a porta antes que ela tivesse chance. — Vamos entrar. Não é boa ideia ficar aqui mais tempo do que precisamos. Seu tom era sombrio e soava longe de entusiasmado pela ideia de têla em seu lugar pela segunda vez. Ela quase lembrou a ele que a única razão pela qual estava lá foi por causa de sua insistência de que estaria morta sem ele. A contragosto, saiu do caminhão e caminhou com ele até a varanda onde a boca ofegante de Sam e os choramingos ansiosos os cumprimentaram do outro lado da porta de tela. Apesar de tudo o mais que estava perturbando e fora de controle em sua vida, a visão do cão que dançava e pulava de um lado para o outro, abriu um sorriso no seu rosto. Pelo menos alguém estava satisfeito com esse arranjo indesejado. — Ei, você, — disse ela, caindo sobre as coxas e dando uma boa massagem no traseiro e nos ombros grossos de Sam, assim que entrou na casa mal iluminada. Ela riu quando o cachorro grande virou círculos animados na frente dela e cobriu o seu queixo com lambidas molhadas. — Oh, sim, um menino tão bom! Seu cachorro é maluco, Asher. Quero dizer, olhe para ele. Todo seu corpo sacode quando eu o toco.
Asher estava olhando, mas não para Sam. Quando ela olhou para cima de seu agachamento na frente dele, ainda acariciando e coçando o cão delirantemente feliz, encontrou os olhos de Asher fixos nela. Aquelas piscinas azuis escuras ardiam, minúsculas fagulhas crepitavam em suas profundezas. Presa na intensidade de seu olhar sem piscar dela, todo o calor que sentiu durante e depois do beijo de Asher a inundou novamente. Ele fez um som estranho no fundo da garganta. Não exatamente um grunhido, mas uma vibração profunda que parecia chamar algo selvagem dentro de suas veias. Sua pulsação chutou, pulsando ao lado de seu pescoço e mais abaixo, um pulsar pesado que fez suas pernas ficarem um pouco fracas sob ela. Quando ele finalmente falou, viu as pontas brilhantes de suas presas. — Vou ligar mais algumas luzes para você. Ele desapareceu na escuridão da casa, movendo-se silenciosamente, com a discrição de um fantasma. Ou algo muito mais perigoso que isso. Assim que Sam o ouviu na cozinha, suas orelhas frouxas se animaram e correu na frente de Naomi. Ela seguiu, sentindo-se subitamente desajeitada e desconfortável na casa de Asher. Não era como se pertencesse a ela. E tinha certeza de que Asher também estava arrependido da presença dela. — Sabe, se for apenas questão de ficar por um tempo, tenho outros lugares que posso ir. Posso conseguir uma nova identidade falsa e mudar minha aparência novamente. Ele acendeu a luz sobre a mesa da cozinha e enviou uma carranca na direção dela. — Do que está falando? — Não acho que você realmente me quer aqui mais do que eu quero estar aqui. — Que diferença isso faz? Ela deu de ombros como se nada disso fosse grande coisa para ela. — Estou dizendo que tenho outras opções. Sei que muitas outras pessoas podem ajudar se eu... — Ninguém mais pode ajudá-la, Naomi. Apenas eu agora.
Ele parecia tão certo, tão gravemente sério, que até ela estava tentada a acreditar nisso. Ela cruzou os braços sobre o peito para abafar o arrepio que tomou conta dela. — Nem mesmo a Ordem? Sua mandíbula ficou tensa enquanto a estudava. — Posso falar com eles agora, se preferir. Há um centro de comando perto de Tahoe. Provavelmente podem ter alguém aqui para te recuperar em algumas horas. — Não. — Ela balançou a cabeça, amaldiçoando-se por até mesmo mencionar sua ameaça anterior de empacotá-la e despachá-la para a Ordem sem seu consentimento. — Vou ficar. Pelo menos por enquanto. Disse a si mesma que era um plano bastante razoável, pelo menos até que estivesse totalmente limpa com Michael. Quanto mais se afastassem por enquanto, mais seguro seria para os dois. Uma vez que o cheque do grande prêmio do Cassino Moda estivesse em sua conta bancária, suas vidas poderiam ser retomadas. Ela poderia lidar com um dia ou mais aqui no rancho com Sam e seu dominador vampiro companheiro de casa. Foi o pensamento de passar a noite que lhe deu mais que uma pequena pausa. — Vai ficar no quarto principal, — Asher a informou de forma sucinta. — Não preciso da cama. Além disso, vou estar vigiando vinte e quatro por sete agora. Ela zombou, inclinando o quadril contra o balcão enquanto ele acendia mais luzes. — De olho para ter certeza de que não abra a fechadura e escape de novo? Ele a alfinetou com um olhar sóbrio. — Posso garantir que fique aqui dentro, mas estou mais preocupado em impedir que mais alguém entre. A gravidade de sua voz a surpreendeu. Estava mais do que preocupado. Estava sombrio com uma certeza que a sacudiu. — Quem acha que vai estar procurando por mim? Slater? — Ela levantou o ombro, considerando. — Ele não sabe que tenho repetidamente roubado seus cassinos no ano passado. Tomo cuidado de sempre parecer diferente, nunca como eu mesma. E ontem à noite foi a primeira vez que fui pega.
O rosto de Asher parecia trovejante com descrença e fúria. — Quantas vezes o roubou? — Não sei. Dez ou doze, suponho. — Cristo. — Sua boca ficou plana. — Usando seu dom de Companheira de Raça... como o chama, engodo? Ela assentiu. — Com um toque, posso manipular metais e magnetismo. Engrenagens simples, maquinaria. Fechaduras. Ele grunhiu. — E máquinas caça-níqueis de cassino. — Às vezes também engano nas mesas de roleta. Para variar. Tudo que tenho que fazer é pousar minhas mãos no estojo para fazer a conexão com as partes móveis e dobrá-las à minha vontade. — Por quanto, Naomi? — Suas sobrancelhas franziram ainda mais, seu corpo grande irradiando um calor que ela podia sentir até do outro lado da cozinha. — Santo inferno. Quanto já tirou dele? — Antes de hoje à noite? — Ela lambeu os lábios, sua boca ficou seca sob a força ardente do olhar de Asher. — Um par grande de cem. É como Michael e eu mantemos o abrigo aberto em sua casa. Sem o dinheiro, aquelas crianças... — Droga, mulher. Sua interrupção rosnada a cortou bruscamente. Ele correu até ela, seu rosto uma máscara de raiva. E outra coisa também. Era isso... medo? Parecia que queria segurá-la e sacudi-la até que seus dentes tremessem. Ou isso ou beijá-la novamente, embora se ele fizesse isso, sabia que não haveria ternura agora. Seria punitivo, brutal de uma forma que não deveria fazer seu coração disparar como agora. Mas ele não se apoderou dela. Passou a mão pelo cabelo, depois olhou para as janelas e os paineis deslizantes que davam para a propriedade do lado de fora. Nada além de escuridão sem fim do outro lado do vidro, mas quando o olhar de Asher se voltou para ela, estava sombrio de pavor. De repente, sua declaração enigmática de que ninguém além dele podia ajudá-la agora – nem mesmo os poderosos guerreiros da Ordem – voltou correndo para ela como um vento gelado.
— O que foi? — Ela perguntou a ele. — Algo aconteceu esta noite no cassino. Sabe de alguma coisa, não sabe? Asher, o que não está me dizendo? — Encontrei o chefe de segurança de Slater logo depois que você fugiu. Seu nome é Cain. Ele é Raça, Naomi. Pior que isso. É um assassino treinado. — Oh, merda. — Sua cabeça estava leve, como se todo o sangue tivesse se esvaindo. — Um assassino. Está... você tem certeza? Ele não disse nada, apenas ofereceu um aceno sombrio. Claro, tinha certeza. Não era de admirar que estivesse agindo como se ela estivesse a um passo de seu túmulo a noite toda. Ela provavelmente estava. — Ele não sabe que você está comigo, — Asher disse a ela. — Até onde sei, ele não sabe nada sobre você. Se soubesse, nunca teria saído do cassino hoje à noite. Está segura por enquanto. Comigo. Sua tranquilidade ajudou a aliviar o medo dela – um pouco. Ela não tinha razão para duvidar de qualquer coisa que Asher disse a ela, nem mesmo isso. Mas ele não podia protegê-la para sempre. Nem estava oferecendo isso. — Oh, Deus, — ela murmurou. — Tenho que avisar Michael. — Não, Naomi. — Asher balançou a cabeça. — A maneira mais certa de ajudar seu amigo é manter a distância agora. Existe alguma razão para Slater pensar que vocês dois estavam juntos nisso? — Não. Nunca fizemos um trabalho juntos e não há nada para nos unir dentro ou fora do cassino. — A casa que você compartilha... — Está apenas no nome de Michael. Nem uso o endereço em nenhuma das minhas identidades. — Com o aceno de cabeça, ela continuou. — Chegamos ao cassino separadamente esta noite, ele cerca de quarenta minutos antes de eu chegar lá. Uma vez que estávamos dentro, não falamos nem sinalizamos que nos conhecíamos. — Mas você tocou a máquina para garantir que ele recebesse o prêmio? Ela assentiu. — Tínhamos tudo ensaiado. A única mudança foi meu disfarce. Antes de hoje à noite, nunca estive dentro do cassino sem me disfarçar. E só larguei minha velha senhora depois que pensei que estava sendo observada de alguma forma.
Asher amaldiçoou baixo em voz baixa. — Tirou seu disfarce por minha causa. Porque eu estava te seguindo. Me desculpe, Naomi. — Não é sua culpa. — Ela mal resistiu ao impulso de estender a mão e tocar o punho cerrado que agora descansava no balcão perto dela. — Todos os erros que cometi foram meus. Só espero que os que cometi hoje à noite não acabem machucando Michael. Não vou poder relaxar até ouvir que ele está bem. Asher deu-lhe um aceno vago. — Você teve um longo dia. E só vai ficar maior. Volte e se estabeleça enquanto ponho comida para os animais. Ela não percebeu o quão exausta estava até que ele mencionou isso. Seu pescoço estava rígido de estresse, seu corpo dolorido e tenso. Seus olhos ardiam dos restos de sua maquiagem apressadamente lavada e adesivos protéticos faciais. — Tudo bem se eu usar seu chuveiro? Ele gesticulou por cima do ombro dela, em direção ao corredor que levava ao seu quarto. — Na metade do corredor à esquerda. — Obrigada, — ela murmurou. Começou a andar assim, então parou para olhá-lo por cima do ombro. — De verdade, Asher. Obrigada. Por tudo que está fazendo por mim. Ele apenas olhou para ela, em silêncio enquanto a observava sair.
Capítulo 11 Asher pegou um grande saco de comida de cachorro de um dos armários e colocou-o no balcão, tentando ignorar o som da água correndo pelos canos velhos da casa. Não foi fácil. O encanamento sacudiu e gemeu, o que normalmente era apenas um leve aborrecimento em qualquer outro dia. Combinado com o conhecimento de que Naomi estava nua sob o jato quente a uma curta caminhada pelo corredor, o barulho do chuveiro parecia durar para sempre. E com essa consciência vieram muitas imagens vívidas que não conseguia banir de sua mente. Imagens de seu cabelo preto liso e molhado contra seu pescoço e ombros leitosos, seu pequeno corpo ensaboado com espuma e escorregadio sob as mãos que se moviam. Praticamente podia sentir sua pele macia sob suas próprias mãos, e como se imaginava abrindo suas coxas magras e musculosas para mergulhar entre elas, primeiro com seus dedos, então com todo o comprimento de seu pênis, então estremeceu com a onda de necessidade que rolou sobre ele. — Cristo. — Passou a mão sobre o queixo cerrado, suas presas doendo e estendendo-se, enchendo sua boca.
Beijá-la foi a pior coisa que poderia ter feito – por ela e por ele mesmo. Porque agora sabia o gosto de sua doce boca exuberante e isso só o deixava faminto por mais. Com fome de saber o quão doce o resto dela seria sob seus lábios e língua. Ou sob a pressão afiada de suas presas. Se fosse apenas desejo, poderia ser capaz de lidar com isso. Não fodia há um tempo, mas sabia de muitos lugares que poderia ir entre aqui e Las Vegas para acabar com esse tipo de coceira. Duvidava que o corpo de outra mulher fosse suficiente para despertar o que sentia por Naomi. Ela provocou mais que curiosidade física ou necessidade nele. Provocou mais que simples fome de sangue também. Ela despertou seu interesse de maneiras que nenhuma outra mulher fez antes. Mais que apenas sexy e inteligente, ela também era resistente e forte. Resistente e tenaz como o inferno, apesar de seu tamanho diminuto. Ele respeitava isso mais do que queria admitir. Mas junto com a coluna de aço que ela obviamente possuía, vinha a teimosia que ele só via no espelho. Sem dúvida, a mulher seria um problema para ele. Já era, desde que sua ameaça de a entregar para a Ordem era vazia agora. Não, depois desta noite, ela era sua para proteger. Se Slater, Cain ou qualquer outra pessoa tivesse ideias sobre prejudicá-la, teriam que passar por ele primeiro. Sentiu um baque contra a parte de trás de sua perna e olhou para o expectante Sam abanando a cauda impaciente. Asher grunhiu. — Claro, agora você é meu amigo, né, meu velho? Contanto que nossa linda visitante não esteja na sala ou que eu tenha sua comida em minhas mãos. Sam conduziu-o avidamente para a tigela vazia, empurrando a cabeça grande para baixo para começar a comer, mesmo antes de Asher terminar de servir a ração. Enquanto o cão mastigava entusiasticamente, Asher acariciou seu curto pelo dourado e o cabelo mais grosso na nuca do cachorro. Invisível, uma lembrança passou por ele – uma própria – por volta da época que chegou pela primeira vez ao lugar de Ned depois de vagar sem rumo pelos Estados Unidos após sua libertação do controle de Dragos.
Estavam sentados nesta mesma cozinha, Ned comendo uma tigela de ensopado de carne na pequena mesa que ainda estava na frente da janela com vista para a parte de trás da propriedade. Estava escuro e Sam precisava de uma corrida. — Eu vou levá-lo, — Asher ofereceu. — Você senta e termina sua refeição. Ned lhe dera um sinal de agradecimento e continuou comendo. — Ponha a coleira e a guia nele antes de deixá-lo sair. Aquele maldito coiote está rondando de novo e não quero Sam pensando que deve ir atrás dele e tentar expulsá-lo. Esse filhote tem mais atitude que bom senso às vezes. Tipo como algumas outras pessoas por aqui. Asher lembrou de sorrir para o gracejo quando se virou para pegar a coleira do cachorro com suas etiquetas barulhetas. Assim que seus dedos se fecharam ao redor do material frio e inquebrável, todo seu corpo ficou frio. Como se estivesse enraizado no gelo, não conseguia se mexer. Não conseguia pensar. Não podia ouvir nada além da corrida de seu próprio sangue batendo em sua cabeça. Foi incapaz de respirar, sentindo o fantasma de outra coleira apertada em torno de seu próprio pescoço. Foi a sensação da mão marrom de Ned em seu braço que sacudiu Asher de seu estupor. Aterrou-o, puxou-o de volta de uma borda escura. Mas naquele momento, Asher viu apenas insanidade no horizonte. Tão perto que quase podia tocá-la. — Sem coleira, — ele se sobressaiu, sua voz era dura e distante. Ned apertou o braço suavemente e assentiu. — Tudo bem, filho. Sem guia, então. Nunca mais falaram sobre isso, e enquanto Ned conhecia o básico do passado de Asher – uma consideração que achava que devia ao velho em troca de sua vontade de compartilhar sua casa com alguém tão diferente dele – Ned não sabia sobre as origens de Asher. Como um Hunter. Não conhecia nenhuma das coisas hediondas que Asher fez enquanto seu pescoço estava cercado com a coleira que nunca sonhou escapar. Ned nunca bisbilhotou, nunca julgou. Em vez disso, tentou convencer Asher – sem sucesso – que, mais cedo ou mais tarde, precisaria deixar o
rancho e encontrar uma família própria. Não percebeu que a liberdade de Asher só se estendia até onde suas pernas podiam carregá-lo. Nunca estaria livre de suas memórias. Nem dos seus pecados. Um som suave o sacudiu de volta ao aqui e agora. Naomi limpou a garganta atrás dele, trazendo com ela o aroma fresco de pele quente e limpa e cabelo úmido e lavado. Suas bochechas rosadas e cabelo preto brilhante enviaram uma dor através dele que mal pode conter. Mas não mais que a longa camiseta branca que ela usava. A camiseta dele. Ele franziu o cenho, tudo que pôde fazer para reprimir a súbita onda de suas presas e o calor que arrepiou sua pele da cabeça aos pés. Sua ereção foi instantânea, e sabia como devia parecer estar encarando com mais agonia do que excitação. — Eu, hum, espero que não se importe. Minhas roupas cheiravam a fumaça do cassino e não conseguia mais colocá-las quando estava limpa. Encontrei esta camiseta em cima da cômoda com outra roupa dobrada. Seu sangue correu para fora de sua cabeça e foi para o sul quando percebeu que estava praticamente nua embaixo dela. Seus seios eram pequenos e altos, com pouca necessidade de sutiã, não que ela parecesse estar usando um. O algodão não tinha forma real em seu pequeno corpo, mas era tão fino que podia apenas distinguir os picos escuros de seus mamilos e a sugestão de sua calcinha cor de lavanda embaixo dela. Porra. — Tudo bem, — ele rosnou, girando apenas para impedi-la de ver o carvão quente de seus olhos. Seus glifos estavam se contorcendo em cores escuras, tudo em resposta ao desejo que sentia por essa fêmea. Quando falou de novo, sua voz era como cascalho grosso por causa da presença de suas presas. — Podemos sair amanhã à noite para pegar algumas roupas para você. Também vamos precisar de mantimentos. Espero que não esteja com fome, já que qualquer coisa que tenho aqui sobrou de quando Ned estava vivo. O que significa que é algo entre não comestível e radioativo. Ela riu. — Não estou com fome, mas se eu chegar lá, tenho certeza que posso descobrir alguma coisa.
— Terá que fazer, porque também não cozinho. — Oh, não diria isso. Pelo que me lembro, faz uma lata de macarrão de galinha mais ou menos. Ele sentiu o calor dela atrás de si quando ela entrou na cozinha e foi até o animal de estimação Sam, que estava lambendo sua tigela recémesvaziada. Seus pés estavam descalços, e ele se viu encarando, fixando-se no esmalte pêssego e na delicada faixa prateada que circulava um dos dedinhos perfeitos. — Michael me mandou uma mensagem enquanto eu estava no chuveiro, — disse ela, soando mais que aliviada. — Diz que tudo ocorreu sem problemas. Está em casa e recebeu o cheque. Vai levá-lo para o banco na segunda de manhã. Deve ficar limpo em alguns dias, e parece que Slater não tem ideia do que o atingiu. Asher esperava que ela estivesse certa sobre isso, mas seu instinto dizia que ela e Michael estavam longe de estar limpos com Slater. Podiam nunca estar seguros novamente. Não se algum dia descobrisse o esquema deles. O temor sobre aquela eventualidade esfriou um pouco do calor que sentia pela Companheira Raça que não apenas derrubou sua existência solitária como também a incendiou. Ele a queria, sem dúvida, mas o que mais queria era sua segurança. — O que disse a Michael? Não mencionou que estava aqui comigo, não é? — Não. — Ela se aproximou dele, encostada no balcão. — Só disse a ele que estava em algum lugar seguro e que achei melhor ficar longe por um tempo. Não quero que tenha informações que Slater ou qualquer outra pessoa possa usar contra ele se as coisas ficarem complicadas. A negação é mais plausível nesses próximos dias, especialmente, ele estará mais seguro. Asher assentiu, estudando sua expressão preocupada. — Você e Michael são muito próximos, entendo. — Ele é como um irmão para mim. Somos família um do outro há dezoito anos, desde que nós dois tínhamos oito anos de idade.
Oito anos de idade. Asher exalou um suspiro. — Desde que você perdeu sua mãe. — Michael e eu nos conhecemos mais tarde naquele mesmo ano. Minha mãe estava desaparecida há alguns meses quando os serviços de proteção às crianças chegaram ao apartamento e me abrigaram como protegida do estado. Saltei através de algumas casas do grupo e situações adotivas naquele ano, mas nada funcionou. Acho que me certifiquei disso. Continuei fugindo, me rebelando ainda mais toda vez que tentavam me disciplinar. Eu era, como quase todos diziam, difícil. Asher sentiu o canto de sua boca puxar num sorriso irônico. Não foi muito difícil imaginar uma versão mais jovem de Naomi, teimosa, irritada e independente, recusando as menores tentativas de quebrá-la ou contê-la. Lá estava ela, metade do seu tamanho até mesmo adulta, mas teve mais coragem quando criança do que ele quando era adolescente e jovem. — Onde finalmente acabou? — Na rua, — ela respondeu categoricamente, encolhendo os ombros. — Era melhor que qualquer coisa que o estado tivesse em mente para mim. Pelo menos os predadores eram mais fáceis de detectar. Prefiro me arriscar com os viciados e desprezíveis que moram na rua do que os monstros que vivem em casas bonitas e sorriem para você enquanto te convidam para entrar, mas não mostram suas garras até que você finalmente tenha decidido confiar neles. — Foi isso que aconteceu com você? — Algumas vezes. Mas confio no meu instito mais que em qualquer outro, então sempre consegui sair de lá antes que o pior acontecesse. — Ela olhou para ele então, seus suaves olhos xerez sombrios. — Michael esteve muito pior que eu. Teve uma família adequada uma vez, pais amorosos, casa grande e um cachorro, toda a utopia de cerca branca. Mas então em seu oitavo aniversário, cometeu o erro de confiar em sua mãe e dizer que achava que era gay. Ela disse ao pai de Michael e em vez de ter bolo e sorvete, seu pai o surrou quase até a morte. Foi tão ruim que Michael teve que fechar sua mandíbula com fios.
— Cristo, — Asher murmurou. Seu intestino agitava como sempre acontecia quando ouvia falar de crianças sendo maltratadas, e lutava para encontrar palavras de conforto. Naomi engoliu audivelmente, emoção em sua voz. — Seus pais disseram aos médicos e ao assistente social que veio ao hospital que ele teve uma briga na escola. Michael não negou isso. Nunca contou a verdade a ninguém. Assim que foi mandado para casa para se recuperar, fugiu e nunca olhou atrás. Nós nos encontramos mais tarde naquele ano. Eu o vi tentando roubar a carteira de um turista fora de um fast food. Ele foi pego e o grito do cara o fez fugir. Vi onde Michael correu, então depois que surrupiei vinte dólares de um caixa eletrônico, comprei um par de hambúrgueres e bebidas e levei para ele. Nós comemos juntos dentro de um tubo de drenagem perto da rodovia, e dificilmente nos separamos desde então. Asher a estudou, maravilhado com sua fortaleza. Ele até mesmo admirava seus pequenos furtos, considerando que os usava como meio de sobrevivência e bondade, e não para seu próprio benefício. Mesmo seus sucessos nos cassinos de Slater pareciam ser um meio de prover os outros mais que ela mesma. O problema era sua motivação. Ela não seria a primeira pessoa a perder a vida por causa de uma vingança insaciável. — Como Michael se sente sobre você se arriscar tanto quando se trata de Leo Slater? — Ele não gosta, — ela admitiu. — Está me implorando para deixá-lo há muito tempo. — Homem inteligente. Já gosto dele. Ela lhe lançou um olhar sarcástico. — De qualquer forma, prometi a ele que este seria o último trabalho para mim. Sem mais roubar de Slater. Temos o que precisamos para manter o abrigo por um tempo, então estou farta disso agora. Asher estreitou seu escrutínio dela, sentindo que havia coisas que ela não estava dizendo. Coisas que não prometeu a Michael. — Parou de pegar dinheiro de Slater, mas ainda não terminou com ele. Não era uma pergunta, mas uma afirmação plana.
— Eu te disse, Asher. Tenho uma dívida para cobrar dele. Pela minha mãe, pelo que fez com ela e acredita que se safou todo esse tempo. Todos os espancamentos e outros abusos que ela sofreu. E, finalmente, a morte dela. — Como pode ter certeza de que ele a matou? As pessoas desaparecem, Naomi. Até as mães às vezes se afastam e deixam tudo para trás. — Não ela. — Ela balançou a cabeça, resoluta. — A única coisa que tínhamos era uma à outra. Isto é, até que Slater apareceu. Ele a deslumbrou com carros e roupas extravagantes, com promessas de uma vida melhor – para nós duas. Mas tudo que fez foi usá-la. A destruiu, primeiro com surras, depois com drogas. Quando ela desapareceu, era apenas uma casca da mulher que minha mãe foi antes de conhecê-lo. — E você quer vingança. — Isso mesmo, — ela sussurrou, assentindo. — Quero fazê-lo sofrer. Quero arruiná-lo e depois me certificar de que entende que fui eu o tempo todo. Quero fazê-lo pagar por todas as coisas que fez, coisas que não podem ser desculpadas ou ignoradas apenas por molhar a mão de alguém ou por qualquer uma das ameaças dele. Asher grunhiu. — É compreensível, Naomi. Não posso dizer que não iria querer as mesmas coisas se fosse você. Mas tem que perceber, mesmo se você se vingar de Slater, as chances de ir embora com sua vida são pequenas. Mínimas. Ela balançou a cabeça, silenciosamente desdenhosa. — Não me importo com o que acontecer comigo. — É aí que você e eu diferimos, então. Eu me importo com o que acontece com você. Enquanto olhava para ela, a expressão de Naomi se suavizou com essas palavras. Isso durou apenas um instante. Ela exalou e deu a ele um rolar irreverente de seus olhos. — Certo. Porque tenho uma marca debaixo do meu queixo? — Sim, — ele respondeu solenemente. — Porque você é uma Companheira de Raça. Mas havia algo mais que estava sentindo também. Algo que não estava preparado para reconhecer, muito menos expressar. Quando pensava em
manter Naomi a salvo, tudo letal e violento nele parecia ter um significado mais profundo. Ele se sentia protetor. Possessivo. Essas emoções estranhas o inundavam, junto com o desejo que mal conseguia conter desde o beijo imprudente na cidade. Não conseguia manter seu olhar longe de vagar sobre ela novamente agora, seu cheiro e a vibração de seu pulso tão perto o deixando louco de necessidade. Ela deve ter percebido isso – o pulsar baixo que parecia carregar o ar entre eles. A cozinha parecia muito apertada, quente demais. Elétrica com todas as coisas que Naomi despertava nele. Ela engoliu em seco, mas não se moveu um centímetro. — De qualquer forma, — ela disse, — as únicas coisas que importam para mim agora são Michael e as crianças que estamos tentando ajudar. Eles são minha família agora. Faria qualquer coisa por eles. — Eles têm sorte de ter você. — E você, Asher? — No começo, ele não teve certeza do que ela estava perguntando. Suas sobrancelhas se uniram em dúvida e ela inclinou a cabeça para ele. — Você tem família? Um bando de irmãos carrancudos e arrogantes como você em algum lugar lá fora? — Não tenho família, — ele respondeu sem emoção. Isso era verdade, pelo menos. — E o Ned? Vendo que deixou seu rancho e seu cachorro, você e ele devem ter sido próximos. Asher não sabia como responder isso. Nunca se considerou próximo de ninguém. Não como foi criado. Muito pelo contrário, na verdade. Mas sentia gratidão pelo velho viúvo que abriu seu lar a um estranho, um vagabundo que tinha todos os motivos para temer. Mas Ned não teve medo. Tratou Asher como uma pessoa, não como um monstro. O tratou como um igual, não um empregado ou uma ferramenta. Deu a Asher seu respeito. Mais que isso, lhe deu sua confiança.
— Fomos... amigos. — A palavra pareceu estranha em sua língua porque nunca a usou para descrever alguém antes. — Parece estranho aqui sem ele às vezes. Naomi sorriu gentilmente, estendendo a mão para colocar a mão sobre a dele. — Sinto muito que tenha perdido seu amigo, Asher. O terno sentimento deixou uma pontada dentro dele que pareceu tão inquietante para ele quanto sua admissão que sentia falta do velho. Evidentemente, estar perto de Naomi era um campo minado de revelações. Inclusive o quanto queria segurá-la e sentir seu corpo contra o dele. Queria beijá-la novamente, e se ela continuasse a tocá-lo e falar suavemente sobre sentimentos, iria enlouquecer. Ele se afastou dela e se aproximou para colocar a ração de Sam de volta no armário. Atrás dele, ela soltou um suspiro. — Se importa se eu pegar um copo de água? — Fique à vontade. Não vai me achar um grande anfitrião. Ela fez um barulho de reconhecimento, foi até os armários e procurou um copo. Encheu-o na pia, depois parou em frente à geladeira para estudar a coleção de fotografias amareladas que estavam permanentemente presas à superfície de metal com ímãs e fita velha muito antes de Asher chegar ao local. — É ele? — Perguntou ela. — O homem afro-americano em várias dessas fotos? — Sim, esse é Ned. — Asher guardou a comida do cachorro e olhou para o conjunto de imagens desbotadas. — A mulher que está sentada ao lado da varanda nesta foto era sua esposa, Ruth. Naomi olhou mais de perto e virou um sorriso caloroso para ele. — Ela é linda. Também a conhecia? — Não. Ela morreu seis anos antes de eu vir para cá. Na foto, havia um Ned sorridente de cinquenta e poucos anos, tirada antes que seus cachos curtos e negros ficassem brancos e seus profundos olhos castanhos ficassem turvos e sem ver. Ele e sua esposa de pele morena e olhos castanhos estavam sentados lado a lado em cadeiras de balanço de madeira. Asher nunca viu tal satisfação num par de rostos antes em sua vida. Nunca soube que esse amor existia.
— Ned fez essas cadeiras ele mesmo, — disse quando o silêncio se estendeu entre eles. — Me disse que depois que Ruth morreu, as colocou no celeiro lá atrás e não aguentou olhar para elas novamente porque o lembravam dela e de tudo que perdeu. — Que triste. — Naomi olhou para algumas das outras fotos antes de virar um olhar curioso para ele. — Como vocês dois se conheceram, afinal? — Uma noite, cerca de quinze anos atrás, acabei saindo de Vegas. Não era muito de deixar qualquer grama crescer sob meus pés, e não tinha ideia de onde queria ir em seguida. Tudo que sabia naquele momento era que tinha passado muito tempo sem me alimentar. Mais de uma semana, o que é mais do que qualquer um da minha espécie deveria forçar. Corri mais de cinquenta milhas antes de finalmente ver sinais de civilização. E apenas um posto de gasolina e loja de conveniência. Ninguém ao redor exceto uma velha picape sucateada parada numa das bombas. — A Chevy de Ned, — Naomi disse com um sorriso. Asher assentiu. — Este velho negro saiu do lugar e foi bombear sua gasolina. Sabia o que eu queria no instante que me viu. Cristo, eu devia ser uma visão. Minha visão estava turva de fome, e minhas presas pareciam estar em chamas na minha boca. Rosnei algo para ele. Nem sei o que disse. Esperava que ele corresse – ou tentasse. Não estava lá para matá-lo, mas do jeito que minha sede estava me atrapalhando, ele tinha que saber que era uma possibilidade. — O que Ned fez? Asher soltou uma exalação confusa. — Fez a coisa mais maldita. Estendeu o braço para mim. Me deixou alimentar, bem ali onde estávamos. Foi a coisa mais generosa que alguém já fez por mim. Quando peguei o que eu precisava, ele me deu um tapinha na cabeça e me disse para entrar no caminhão com ele. Disse que eu parecia precisar de um chuveiro e um lugar para esperar a chegada da luz do dia. Naomi olhou para ele, silenciosa e claramente emocionada. — Parece que Ned era uma pessoa muito especial. — Sim, — disse Asher. — O melhor que já conheci.
— Você disse que nunca ficava muito tempo em nenhum lugar. Onde estava antes daquela noite? Ele encolheu os ombros. — Por aí. — Bem, acho que foi muita sorte para você ter encontrado Ned. Então, novamente, tenho a sensação de que ele diria que foi o sortudo. Parece que vocês dois precisavam um do outro mais do que você percebeu. — Talvez, — ele concordou, perdido nas memórias antigas, as partes de sua vida que nunca compartilhou com ninguém antes. E nunca quis compartilhar até agora. Naomi sorriu. — Acho que talvez você tenha aparecido na hora certa para mim também, Asher. Se não fosse por você parar ontem à noite no deserto, eu não estaria aqui. — Ela sorriu, seus belos lábios trêmulos. — Acho que o que estou tentando dizer é, eu te devo minha vida. Não sei como vou pagar isso. Contra todas a disciplina que foi gravada nele desde que era um menino, Asher estendeu a mão, o desejo de tocá-la forte demais para negar. Ele segurou seu rosto frágil em sua palma larga. Acariciou o polegar sobre a pele que era tão macia e cremosa quanto o cetim. Ele rosnou uma maldição, uma advertência sem palavras para si mesmo, para não permitir que o que quer que estivesse se formando entre eles escapasse de seu controle. — Você fica viva, Naomi. Esse é todo o retorno que preciso. Esperava que ela se afastasse de seu toque, mas ela não o fez. Ficou parada, tão congelada no lugar quanto ele parecia estar. Ela virou o rosto ainda mais na mão dele, seu olhar escurecendo para a cor rica e quente do uísque. Sem dúvida, era um convite. Um que não sabia como teria força para recusar. — Está ficando tarde, — ele proferiu, sua voz profunda e áspera. Ele retirou a mão, empurrando-a no bolso da frente da calça jeans. — Como eu disse, o quarto é seu. Tenho animais do lado de fora que precisam ser cuidados, mas estará segura aqui por alguns minutos até eu voltar. Vou te ver de manhã.
Ele não esperou para ouvir sua resposta. Não podia. Sua sanidade dependia de estabelecer uma distância imediata entre a boca e o corpo tentador e sua vontade tosca de resistir a ela. Ele saiu pela porta da cozinha com uma maldição sibilada, sua respiração fumegando na noite fria do deserto.
Capítulo 12 Cain olhou para fora da grande janela bloqueada dos UV de sua suíte de cobertura no Casino Moda, observando o nascer do sol sobre a cordilheira de cobre à distância. Uma tempestade estava chegando, trazendo nuvens escuras e quentes e gotículas de chuva que corriam pelo vidro esfumaçado com uma intensidade cada vez maior. Era raro esse tipo de chuva torrencial, especialmente durante o dia, mas quando chegava, ele aproveitava. A mudança no ar. O céu cinzento e metálico sobrevoava as montanhas ao longe, enquanto raios estalavam e trovão explodia. O poder disso enviava vibrações até os ossos dele. Num mundo onde sempre se sentiu tão grande e indomável, supunha que tempestades como essa lhe davam alguma perspectiva de que havia algumas coisas na Terra que não podia controlar. Não que quisesse esse lembrete no momento atual. Descalço no carpete cinza pálido e vestido com calças de cordão soltas que pendiam em seu físico musculoso, se afastou do vidro e se virou para a mesa em seu escritório para olhar a tela do laptop aberta novamente.
O rosto que olhava para ele o incomodou nas últimas doze horas. Olhou para as imagens de longe, deu um zoom a ponto de poder distinguir cada linha do rosto dela, mas droga. Ainda não estava certo. Com um grunhido de frustração, caiu na cadeira de couro e começou a rolar mais uma vez pelos vídeos que havia compilado. Começou há alguns meses num dos pequenos cassinos de Leo Slater no centro da cidade. O Mina de Ouro era um dos cassinos mais antigos de Vegas
e
assim
parecia.
Os
veteranos
que
frequentavam
o
velho
estabelecimento não o fariam de outra maneira. Cain supôs que houvesse conforto naqueles corredores cobertos de papel de parede e no tapete vermelho, uma familiaridade que fazia seus clientes se sentirem em casa de uma maneira que o lustro elegante e marmorizado do Moda nunca poderia. Nunca perdendo a chance de fechar o punho em torno de um dinheirinho, não importa de quem era proveniente, Slater acomodou os velhinhos, oferecendo jogos nostálgicos servidos por jogadores uniformizados e antiquados e apregoando especiais para madrugadores como bolo de carne com purê de batatas ou assados com todas as guarnições noite após noite. O Mina de Ouro seria mais apropriadamente chamado de mina de bronze quando se tratava de lucros, e nunca competiria verdadeiramente com o Moda em termos de renda. Por outro lado, também não era suscetível aos caprichos do jet-set, que sem dúvida acabaria abandonando o Moda e coroando um novo ponto, deixando todo esse cromado e verniz para manchar e secar. Altos e baixos era um estilo de vida na Strip, mas parte do trabalho de Cain como chefe de segurança das Empresas Slater era garantir que os interesses financeiros do chefe permanecessem alinhados o máximo de tempo possível. O Mina de Ouro era a apólice de seguro de Leo Slater contra os incontroláveis ventos da fortuna. Assim, quando o lugar mostrou lucros menores nos caça-níqueis e roleta nos dois últimos trimestres do ano passado, Cain notou. À primeira vista, não parecia tão estranho. Mas à medida que explorava o fluxo de caixa com seus analistas, via um padrão sutil, porém estranho, de
escores médio a grande, desproporcionais em relação ao resto do ano. Quando revisou os livros anteriores do ano e encontrou um padrão similar, menor de perdas nas máquinas, só ficou mais desconfiado. Tudo isso o levou a fazer vigilância por vídeo nos dias em que pagamentos extraordinariamente altos ocorreram. Havia dúzias, e levou dias para examiná-los, mesmo com seu olho aguçado e percepção aguçada. Eventualmente, sentiu um padrão que ainda não podia ser confirmado, mas que sentia em seu intestino. A mesma pessoa era responsável por pelo menos meia dúzia das vitórias. Talvez mais. Certo, ela parecia totalmente diferente a cada vez. Às vezes era mais alta, às vezes mais baixa. Um dia estava gorda, duas semanas depois, tão magra quanto uma ginasta. Jovem, velha, grisalha e loira platina. Até suspeitava que veio uma ou duas vezes disfarçada de homem. A única coisa que nunca mudava era o fato de que era pelo menos parte asiática. Havia literalmente milhões de pessoas asiáticas que passavam através do Mina de Ouro todos os anos, então antes de expressar sua teoria para Slater ou ao resto de sua equipe e fazer papel de bobo, Cain queria ter certeza. Ninguém conseguia se disfarçar tão bem sem cirurgia plástica. Ou anos de prática e execução. Mas Caim persistiu, ordenando às equipes de segurança de cada cassino que enviassem vídeos diretamente para ele, se houvesse alguma pontuação incomum. Até mesmo conferiu tranquilamente com os associados que trabalhavam para alguns dos concorrentes de Slater na Strip. Ninguém mais estava vendo os sucessos repetidos e aparentemente direcionados em suas casas. O que significava que essa mulher misteriosa tinha um problema com o chefe ou não tinha bom senso para perceber o tipo de problema que estava cortejando. E a partir da aparência dela – da precisão quase cirúrgica com que se disfarçava e da discrição com a qual conseguia facilmente algumas centenas
de milhares de dólares ao longo do tempo – ela não estava em falta no departamento de inteligência. Nem bolas. Então, isso o levou de volta ao único motivo plausível. Por algum motivo, ela mirava em Leo Slater. E isso significava, inteligente ou não, que provavelmente não ficaria muito neste mundo. Se Slater tivesse sucesso na noite anterior, a mulher já estaria morta. Ela quase não foi detectada, vestida com um moletom solto, parecendo qualquer um dos muitos skatistas e outros punks que andavam pela Strip com as calças na metade das costas e o cabelo despenteado pendurado em seus rostos. Mas então conseguiu um número vencedor nos caça-níqueis – quase como se não pudesse evitar tentar outra pontuação. Ela evidentemente aliciou outro jogador para coletar seus ganhos para ela, mas já era tarde demais. Um dos chefes do caixa a apontou para alguns dos idiotas de Slater no chão e a palavra veio do escritório executivo para ensinar uma pequena lição ao trapaceiro. Cain ficou chateado como o inferno ao saber que o chefe entregou a garota para Gordo e seus dois companheiros sem chamar Cain para a decisão. Se Slater soubesse sobre a trilha de migalhas de pão que Cain estava perseguindo, sem dúvida ele seria a primeira pessoa a ser chamada para lidar com a situação. Afinal, a principal qualificação no currículo de Cain eram os dezesseis anos que passou como assassino no infame programa Hunter. Esperava que sua investigação secreta do ladrão misterioso terminasse abruptamente na outra noite, mas tudo que tinha eram mais perguntas. Especialmente após o veículo de Gordo ser recuperado a cinco quilômetros da estrada deserta sem nenhum sinal da garota ou de qualquer um dos três homens enviados para matá-la a sangue frio. E então, lá estava ela novamente na noite passada. De volta ao Moda, vestindo outro disfarce inteligente. Pelo menos por um tempo.
Caim reproduziu o vídeo de vigilância aérea do cassino, avançando rapidamente até o ponto em que a velha com os ombros curvados foi direto ao banheiro feminino e nunca mais saiu. Sabia que isso não estava certo. Ela saiu, mas abandonou sua prótese e fantasia e, aparentemente, decidiu se esconder à vista de todos. Cain não precisou procurar muito para encontrá-la. Correu o filme capturado perto da máquina Monte Carlo Fortune Bonanza, e lá estava ela. Porra, era um nocaute também. Pequena, cabelos negros na altura dos ombros e um rosto lindo que parecia tão inocente quanto sedutor. Ele sabia que ela não era inocente, certamente não a respeito do Moda, mas não tinha feito nada de errado na noite passada também. Assistiu o vídeo várias vezes na noite passada e esta manhã, não encontrando nenhuma razão para suspeitar dela por algo mais questionável que chegar ao cassino com maquiagem de palco e um disfarce. Quanto ao grande prêmio, aquele milhão e alguma coisa foi para casa com o homem sentado ao lado dela, um paraplégico de vinte e poucos anos que chorou lágrimas de alegria por quase vinte minutos, quando a gerência do cassino o conduziu para a papelada e formulários fiscais que precederam a apresentação de seu grande cheque. E ainda assim, Caim não conseguia desviar o olhar da tela. Não ajudou que continuasse circulando de volta para o fato de que o Moda teve outro convidado incomum na noite passada. Ninguém além de um ex-companheiro Hunter. Asher. Ele fez uma pausa e folheou o restante do filme da noite até pousar no que capturava o outro lado do cassino, perto da entrada. Não havia como disfarçar aquele enorme bastardo. Ele se moveu pela multidão com passos determinados. Um homem numa missão. Não. Correção: Um Hunter em busca de sua presa. Que diabos aquele filho da puta estava fazendo aqui? O que estava procurando?
Cain deixou o vídeo rodar, mantendo o foco fixo no macho Raça e quase incapaz de sufocar seu rosnado. Não era o único Hunter sem amor por Asher. Inferno, o macho ganhou cada gota de desprezo que vinha em sua direção. Enquanto a filmagem de vigilância continuava, viu o momento em que Asher fixou seu alvo. Aqueles olhos azuis escuros se estreitaram com foco laser, Asher cortou a multidão no chão do cassino, seus longos passos o levando na direção do... banheiro das senhoras. Puta merda. Era a mulher. Era quem estava procurando. Assistiu ao filme por alguns minutos, suas veias batendo com a certeza quando Asher assumiu uma posição do lado de fora dos banheiros e esperou. Estavam trabalhando juntos? E se não, o que diabos queria com a ladra persistente de Leo Slater? Cain fechou seu laptop com uma maldição incrédula. Não sabia o que Asher estava fazendo, mas ia logo descobrir.
Capítulo 13 A chuva começou um pouco antes do amanhecer. Naomi sabia porque esteve acordada na maior parte da noite. Tinha muitos motivos para rolar e virar até o amanhecer. Tensão após o grande sucesso no Moda. Preocupação por Michael e o bem-estar das crianças que ficaram na casa. Temor pelo fato de que, se Slater soubesse dela, poderia retaliar não só por meio de sua equipe de segurança composta de capangas humanos homicidas, mas também com um macho Raça. Um assassino treinado, de acordo com Asher. E então havia ele. Asher. De todos os pensamentos que continuavam atormentando sua mente, estar sob o mesmo teto que Asher, era o que tornava o sono quase impossível. Não ajudava que a roupa de cama e camiseta que usava para dormir cheirassem como ele. Toda vez que fechava os olhos, sua cabeça se enchia de imagens dele. Seu rosto anguloso e robusto e olhos cobalto profundos. Sua mandíbula quadrada e boca grande e luxuriante. Agora que sabia como essa boca era na dela, estava achando difícil pensar em outra coisa quando estava perto dele. Por mais confortável que foi conversar com ele na cozinha na noite
passada, toda vez que ele encontrava seu olhar, tinha certeza de que sabia o quanto ela queria beijá-lo novamente. Sim, tinha certeza que ele percebeu isso. Quando ela estendeu a mão para tocar a dele e dizer-lhe que sentia muito pela morte de Ned, ele não conseguiu fugir dela rápido o suficiente. E embora ele tivesse tomado o rosto dela em suas mãos depois que se atirou para ele com aquela oferta quase inocente de pagar de volta por tudo o que estava fazendo por ela, ele evidentemente pensou em beijá-la uma segunda vez. Pelo jeito como praticamente fugiu da casa, era uma maravilha que não tivesse derrubado a porta de tela enquanto saía. Naomi soltou um suspiro e saiu da cama. Não sabia onde ele estava, ou onde esteve durante a noite. A casa estava em silêncio, exceto por Sam, que estava parado do lado de fora da porta do quarto, dormindo enrolado no chão desbotado do corredor. Ele ergueu a cabeça quando ela saiu, cobrindo a pata estendida com lambidas e fungadas. — Bom dia para você também, — ela murmurou, caminhando calmamente para o banheiro. No armário havia uma escova de dentes embalada e um tubo de pasta de dente, evidentemente colocado ali para ela em algum momento entre o banho na noite passada e o amanhecer. Depois de se limpar um pouco e passar os dedos úmidos pelos cabelos, voltou para o corredor. Sam a levou para a cozinha vazia e para a tigela igualmente vazia. — Está tentando me encrencar, ou realmente precisa de um café da manhã? Ele inclinou a cabeça para ela, os olhos suplicantes e basicamente irresistíveis. — Tudo bem, então. Café da manhã. — Ela pegou a comida dele e colocou um pouco na tigela, depois trocou a água dele também. Não pôde deixar de pensar em como as coisas estavam em casa, imaginando o caos feliz das crianças arrumando a mesa e ajudando com ovos e panquecas – uma das especialidades de Michael. O desejo de ligar e checar era quase esmagador. Mas já arriscaram o suficiente com suas mensagens de texto ontem à noite. Uma vez que o cheque do cassino estivesse no banco, poderia pensar em retomar sua vida em Vegas.
O que significaria deixar Asher para retomar a sua sem ela. Por que esse pensamento lhe dava uma pontada de arrependimento, ela certamente não queria saber. Ela afastou o sentimento e voltou seu foco para ideias mais produtivas. Depois de procurar alimentos sem sucesso, por café ou um meio para fazer algo, ela se contentou com o chá que encontrou num dos armários. Com uma caneca fumegante em suas mãos, atravessou a casa, lentamente absorvendo tudo – a mobília estofada e a TV de outra era, as fotografias emolduradas e bugigangas extravagantes. O antigo sistema de som e a coleção de CDs de música, o clássico R & B compartilhando espaço na prateleira com álbuns country de todos os tipos das últimas décadas. Havia grossas capas de livros de romances em brochura, com cantos dobrados, páginas amareladas. E no chão perto de uma cadeira reclinada uma cesta de palavras cruzadas e Sudoku, a maioria deles resolvida com lápis no rabisco de uma mão envelhecida. Ela via instantâneos da vida de Ned e Ruth nesta casa em todos os lugares que olhava. O que não viu foi evidência de Asher. Quinze anos vivendo com o velho que lhe deu abrigo em sua casa; quase mais de um ano vivendo aqui sem Ned. No entanto, Asher ainda não se estabeleceu. Poderia sair amanhã e não haveria sinais de que esteve aqui. Naomi tomou um gole de chá e foi para a ala traseira da casa. Essa parte era um acréscimo, e no final do corredor haviam dois quartos de hóspedes – ambos sem mobília, como se planos para uma família em crescimento ou visitas de amigos e parentes de Ned e Ruth nunca se materializassem. Mais abaixo, no mesmo corredor, ouviu um som abafado vindo do quarto no final. O ritmo do movimento era fluido, completamente focado. Ela parou na porta aberta do que parecia ser uma loja de carpintaria e simplesmente observou Asher trabalhar por um momento. Sua cabeça estava curvada, aquelas ondas castanho-chocolate de seda pendendo sobre a testa enquanto ele lixava meticulosamente a borda de uma
cabeceira de madeira elaboradamente esculpida. Ele estava descalço e de peito nu, vestindo apenas um par de jeans soltos e desbotados. Ela ficou de pé e olhou fixamente, hipnotizada pelo emaranhado de dermaglifos que cobria todo seu peito e torso, e abaixo em seus braços musculosos. As marcas da pele Raça eram apenas um pouco mais escuras que o resto dele agora, mas sabia que eram um barômetro de suas emoções. No pouco tempo que o conheceu, as viu mudar de cor várias vezes, geralmente em fúria. Finalmente, ele olhou para cima. Franziu o cenho, o que parecia ser sua expressão usual sempre que ela estava por perto. — Tem alguma coisa errada? — Não. — Ela encolheu os ombros, levantando sua caneca. — Espero que não se importe por que fiz um pouco de chá. — Claro, não me importo. — Ele parou como se esperasse que ela fosse embora. Ou apenas esperando. Naomi entrou no quarto, olhando para a coleção de peças armazenadas lá. Cadeiras artesanais. Mesas laterais bonitas. Um par de estantes. Até um armário alto. Muitas coisas bonitas para equipar a maior parte da casa. E tudo isso foi habilmente feito, nada menos que uma obra de arte. Não pôde resistir a andar para ver mais de perto. — Estas são algumas peças incríveis. Por que Ned manteve todas aqui? — Algumas são dele, — Asher respondeu, seu tom ilegível. — O resto é meu. Ela lançou um olhar incrédulo para ele. — Seu, como você as fez? Ele deu um aceno vago. — Ned me ensinou o ofício antes de perder a visão e o uso de suas mãos. No começo, só o ajudava a terminar as coisas que ele tinha que abandonar. Depois de um tempo, achei que trabalhar com as mãos era uma boa maneira de ocupar minha mente, especialmente quando estou confinado durante o dia. Ela olhou para a cabeceira com seus floreios e redemoinhos entrelaçados de madeira incrustada. Um padrão que ecoava a pele de Asher. — Você é muito bom nisso. Deve mover algumas dessas peças para os outros cômodos da casa. As mesas laterais funcionariam muito bem na sala de estar,
em vez das antigas, lá agora. Se quiser, posso te mostrar como eu iria organizá-las. Ele estava olhando para ela como se ela acabasse de se oferecer para raspar a cabeça dele. — Não gasto muito tempo na sala de estar e não tenho nenhuma utilidade para nenhuma dessas coisas aqui. Sou só eu e Sam em casa, e não precisamos de muito. — Já pensou em vender o que faz, então? — Ela colocou sua caneca numa bancada para que pudesse passar a mão sobre a curva acetinada de uma das cadeiras. — Parece uma pena deixar que coisas bonitas acumulem poeira quando alguém pode apreciá-las. — Não tenho interesse em vendê-las, também. — Ele colocou o bloco de lixamento abaixo, sério e seco agora. Seu olhar varreu-a da cabeça aos pés, desprazer em sua expressão tensa. — Ainda está vestindo minha camisa. Há uma pequena lavanderia na cozinha, se quiser lavar suas roupas. Ela ofereceu um sorriso que não foi devolvido. — Obrigada, farei isso. Nunca consegui suportar o cheiro de fumaça. Minha mãe costumava levá-lo para casa com ela todas as noites que estava no cassino com Slater. Asher grunhiu. — Assim que o sol se por, vamos até a divisa do estado pegar alimentos e suprimentos. Pode pegar algumas roupas extras também. Enquanto isso, por que não encontra algo para fazer? Leia um dos livros de Ruth ou termine uma das palavras cruzadas de Ned. — Está falando sério? — Ela cruzou os braços, franzindo a testa enquanto ele voltava a trabalhar na cabeceira da cama como se ela já tivesse ido embora. Seu tom áspero e atitude desdenhosa a irritou desde a primeira vez que se encontrou nesta casa, mas estar na ponta receptora agora – especialmente depois do beijo deles – a picou mais profundamente do que estava preparada. — Está tentando se livrar de mim? Ele olhou para ela. — Não posso fazer isso até ter certeza de que Slater foi cuidado. E mais que provável, Cain também. Sua boca se apertou com força, mas apenas num esforço para evitar a dor em sua voz. — Se não estivesse preocupada em colocar Michael ou as crianças que contam com a gente em risco indo para casa agora, já teria ido embora.
Ela girou para sair, mas a dois passos dele parou. Não podia suportar a confusão emocional, nem a tolice que sentia por ter se permitido sentir algo por esse homem – esse homem Raça frio – que claramente não podia esperar para tirá-la da vida dele. Ela se virou furiosa tanto consigo mesma como com ele. — Por que me beijou no caminhão ontem à noite, Asher? Seu rosto endureceu. — Isso importa? Isso foi um erro. Não vou deixar acontecer de novo. Suas palavras fizeram o ar em seus pulmões se evaporar, fez seu estômago parecer como uma rocha dentro dela. Ele voltou a lixar como se não tivesse mais a dizer. Como se fosse fácil para ele dispensá-la, não só da sala, mas de seus pensamentos. — Um erro, — ela disse, assentindo, sabendo que deveria se sentir da mesma maneira sobre isso, mas não podia. — Fez isso porque eu estava chorando? Porque sentiu pena de mim? — Ela respirou fundo, encarando a cabeça baixa e os músculos volumosos dos ombros dele enquanto raspava o bloco de lixa sobre a borda já alisada da cabeceira da cama. — Fez isso por piedade, Asher? Sua mão parou abruptamente. Num grunhido baixo, soltou o bloco de lixamento e empurrou a cabeceira para longe dele, levantando-se. Naomi recuou, questionando instantaneamente sua própria sanidade por provocá-lo. Era difícil para ela lembrar às vezes o que ele era, o que esse perigoso macho Raça poderia fazer com ela. No momento, porém, ele era simplesmente Asher, o homem que estava virando sua vida de cabeça para baixo com um desejo que ela não queria sentir. Um desejo que se centrava totalmente nele, naquele homem perigoso e solitário que queria contra tudo que era sensato e razoável que conhecia. Ela permaneceu firme enquanto ele andava até ela, embora com um leve tremor em seus membros. Seu olhar a incinerou, seus olhos brilhando e queimando com luz âmbar. Os glifos no peito largo e braços poderosos rodopiavam e fervilhavam com uma profusão de cores escuras – índigo, vinho e ouro. Sua mandíbula
estava rígida, mas quando ele puxou uma respiração através de seus lábios apertados, ela vislumbrou as pontas de suas presas. — Sim, Naomi, — disse ele, sua voz profunda tão áspera quanto cascalho. — Quando te beijei, foi porque você estava chorando. Ela inalou bruscamente, odiando que soasse como uma pegada em sua garganta. Quando ela olhou para longe de seu olhar ardente, ele estendeu a mão. A mão grande dele se curvou ao redor da parte de trás do pescoço dela, deixando-a sem escolha a não ser olhar para ele. — Beijei você porque suas lágrimas também doem em mim, — ele murmurou. Ele balançou a cabeça, perfurando-a com aqueles olhos sobrenaturais que pareciam conter ainda mais tormento que o que ela sentia se agitando dentro dela. — E porque, mesmo sabendo que seria um erro provar seus lábios, nem isso foi suficiente para me fazer querer menos você. Antes que ela pudesse dizer uma palavra, ele baixou a cabeça para a dela e tomou sua boca novamente. Não o terno roçar de seus lábios contra os dela como no caminhão na outra noite, mas profundo e faminto e cru. Sua língua invadiu, queimando-a por dentro a cada lambida e impulso febril. Ele a beijou como se quisesse comê-la viva. Como se estivesse faminto para saboreá-la novamente e agora nada o impediria de reivindicar tudo dela. O desejo que estava queimando entre eles desde que ela acordou pela primeira vez em sua cama, viva apenas por causa dele, agora explodiu num calor que nenhum deles parecia capaz de conter. Onde seu primeiro beijo foi hesitante e incerto, este não deixou dúvidas sobre o que ambos queriam – precisavam – um do outro. Asher colocou a mão sob a longa bainha da camiseta que ela usava. Ele gemeu contra sua boca, seus dedos acariciando o tecido fino de sua calcinha. — Ver você nisso na noite passada foi uma tortura. Agora não posso usá-la novamente sem imaginar você assim. — Ele segurou seu sexo, massageando a dor crescente que floresceu lá. — E então, sabendo que estava no meu banheiro, nua e molhada... Porra.
Sua carícia ficou mais intensa, sua grande mão abrindo mais suas pernas, concedendo-lhe melhor acesso à junção encharcada entre suas coxas. Ela arqueou em seu toque, segurando seus ombros enquanto sua cabeça girava com prazer. Seus dedos estavam quentes quando ele afastou a calcinha, em seguida, mergulhou em sua fenda lisa. Sensação disparou através dela a cada carícia, cada mergulho rítmico de seus dedos em seu corpo trêmulo. — Isso é o que eu queria fazer, — ele proferiu entre beijos quentes, arrastando a boca abaixo em sua garganta enquanto a levava à beira da loucura com a mão. — Custou tudo que eu não tinha para andar pelo corredor e me juntar a você lá. Naomi gemeu, movendo-se impotente contra a palma da mão e os dedos dele. — Asher. — Isso mesmo, — ele rosnou. — Agora, talvez entenda por que beijei você. E ontem à noite, enquanto você tomava banho no quarto ao lado, o que eu mais queria era sentir você escorregadia e molhada sob meus dedos, e então queria te foder, Naomi. Queria te empurrar contra os azulejos e entrar em você até que não sentisse mais essa maldita necessidade de estar dentro de você. — Oh, Deus. — Ela estava ofegando com seu toque perverso, à beira do clímax era exatamente onde estava. — Não teria parado de pensar em você, Asher. Também tive todos esses mesmos pensamentos. Queria todas as mesmas coisas. É o que imaginei quando me toquei lá. Imaginando que você estava me tocando, me acariciando do jeito que está agora. Ele ronronou baixo em sua garganta e olhou para ela com necessidade ardente. — Ficou sob o jato quente e gozou pensando em mim, doce pequena Narumi? O som de seu nome – seu nome verdadeiro – deveria parecer errado, dissonante até. Ninguém a chamava assim agora. Ela não permitia. Mas ouvir o nome dela nos lábios de Asher, especialmente quando estava olhando para ela como se pertencesse a ele e apenas a ele, soltou algo dentro dela. Ela se sentiu livre.
Se sentiu vista. E se sentia segura, verdadeiramente segura, talvez pela primeira vez em sua vida. — Sim, — ela suspirou contra seus lábios quando ele voltou para outro beijo. — Gozei pensando em você. Então passei o resto da noite sozinha em sua cama, imaginando se entraria e se juntaria a mim. Desejando que o fizesse. Ele soltou uma maldição áspera, o som pontuado pelo rasgo de sua calcinha sendo arrancada. Asher puxou a camiseta acima da cabeça, depois passou as mãos ao longo de cada centímetro de sua nudez. Seus músculos se apertaram e flexionaram, seus glifos pulsaram e vivraram com cor e movimento – como arte viva dançando em sua pele dourada. Ela não suportava a impaciência de sentir tudo dele também. Deslizando as mãos pelas laterais do torso, ela estremeceu com a força pura dele. Não havia dúvida de que era mais que mortal, não havia dúvida de que era o homem mais letal e poderoso de quem já esteve perto. Mas também era carne e osso, tudo pulsando e formidável e quente sob seus dedos questionadores. Ele gemeu baixo em sua garganta quando ela alcançou o cós solto de sua calça jeans e segurou seu pênis. Sua respiração parou por um momento quando ela percebeu o tamanho dele. Mas qualquer hesitação que sentia foi queimada no instante seguinte, quando ele empurrou em seu alcance, sibilando quando ela o agarrou com mais força e começou a acariciar seu comprimento. — Quero ver você, — ela sussurrou. — Preciso sentir tudo de você. Quando ela se atrapalhou um pouco, ele assumiu, soltando o botão e o zíper e empurrando o jeans abaixo. Naomi olhou fixamente, maravilhada com os belos glifos que rastreavam ao redor de seus quadris magros e sobre sua virilha, desaparecendo na palha escura da raiz de seu pênis. Ela o pegou de novo, admirando-o agora com os olhos e o toque. Sua resposta foi um rugido profundo e desenfreado. — Sou o primeiro Raça com quem esteve?
— O único. — Ela não perdeu a forma como os olhos dele brilharam com essa admissão. — E homens humanos? Ela encolheu os ombros. — Um par, eu acho. Mas já faz tanto tempo que poderia ser para sempre. — Ela sustentou seu olhar ardente, ainda o acariciando e tentando não deixar os joelhos cederem sob ela enquanto ele explorava seu corpo também. Ela estava tão molhada para ele, tão faminta por senti-lo dentro dela que mal podia suportar o desejo. — Nunca quis ninguém do jeito que quero você, Asher. Sua boca se curvou num sorriso pecaminoso. — Bom. Ele afundou na frente dela de joelhos, uma mão segurando seu quadril para apoiá-la enquanto a abria para ele com a outra e aninhava seu rosto contra seu sexo. Sua boca a envolveu, sua língua pressionando úmida e quente entre suas dobras, então circulando seu clitóris com traços impiedosos que a fez ver estrelas atrás de suas pálpebras fechadas. Ele fez barulhentos e eróticos grunhidos enquanto lambia sua carne tenra e a fodia com sua língua. Ele era uma força imparável, uma tempestade que ela se lançou com total abandono. — Oh, Deus, — ela engasgou, tremendo quando a levou em direção à crista de uma liberação intensa. Ela gozou contra sua boca, estremecendo e ofegando, suas veias parecendo tão incandescentes e elétricas quanto raios de luz. — Asher! Ela ainda estava girando naquele esquecimento e acabada com o poder de seu clímax quando ele se afastou dela com um grunhido baixo e levantoua de seus pés. — Envolva suas pernas em volta de mim, — ele ordenou a ela, sua voz um grito de outro mundo. Com os tornozelos presos atrás das costas, ele a segurou no alto, suas mãos fortes posicionadas sob as coxas, enquanto a guiava lentamente, centímetro por centímetro impossível, sobre o comprimento de seu eixo. A plenitude ia além do prazer e da dor, uma dor doce e deliciosa enquanto seu pequeno canal se esticava para acomodar a medida completa
dele. Foi tão bom que ela quase gozou pela sensação esmagadora de conclusão. Então ele começou a se mover. Segurando todo seu peso em suas mãos como se ela fosse uma pena, a deslizou acima e abaixo, empurrando impossivelmente mais profundo a cada golpe controlado. Ela balançou contra ele, precisando de mais. Precisando de tudo que ele tinha para lhe dar. Ele gemeu quando ela o persuadiu num ritmo mais duro. — Você é tão pequena, Naomi. Não quero te machucar. — Sou mais forte do que pareço, vampiro. Ele sorriu, um flash diabólico de enormes presas. — Sim, você é. — Então, não pare, Asher. — Ela o beijou com força, dando um leve beliscão em seu lábio. — E não seja gentil. — Ah, foda-se. — Seu olhar era um inferno agora, sua íris âmbar devorando as fendas estreitas de suas pupilas. Num rosnado grosso, ele aumentou seu aperto sobre ela e se dirigiu duro – uma vez, duas vezes, de novo e de novo. Naomi gemeu, um tremor se transformando rapidamente numa liberação que não podia diminuir nem conter. Seu prazer explodiu dela num grito. E ainda Asher continuou, sem gentileza e selvagem, dando-lhe exatamente o que ela exigia dele. Ele gozou com um rugido que deveria ter arrancado o telhado da casa, liberando um jato escaldante e sem fim que só tornava seus golpes mais ardentes e febris. O atrito era demais, o corpo dela estava muito sensível. Outro orgasmo correu sobre ela, deixando-a estremecendo e desossada em seu rastro. — Oh, Deus. — Ela ofegou contra seu ombro enquanto lutava para recuperar o fôlego. — Isso foi... incrível. Sua risada respondendo estava sombria com promessa. — Sim, foi. Mas não acho que terminei com você ainda. Temos horas de luz do dia e, agora que sei o que gosta, pretendo aproveitar ao máximo.
Capítulo 14 Asher nunca passou tanto tempo na cama em todos os quinze anos que viveu no rancho combinado. Embora, para ser exato, ele e Naomi não se contivessem estritamente na cama. Usaram o tapete do quarto, a cadeira e até a cômoda. E encontraram muitas maneiras criativas de aproveitar outras áreas da casa também. Deveria estar satisfeito, mas tudo que conseguia pensar depois de voltar de sua viagem de compras à noite na divisa do estado era a rapidez com que poderia ser capaz de deixá-la nua e debaixo dele novamente. Não ajudou sua ereção quase permanente que, quando entrou na casa depois de cuidar dos cavalos e galinhas, Naomi estava curvada na cozinha, sua bunda empinada parecendo madura para a colheita em seus jeans apertados enquanto vasculhava os armários e tirava uma frigideira. Música suave saia do sistema de som da sala de estar. Não um dos álbuns country favoritos de Ned, mas um de jazz comovente que o velho costumava ouvir nos dias que Ruth parecia estar em sua mente mais que o habitual. Enquanto Asher observava Naomi balançar e cantarolar a música sensual, não imaginava que seria capaz de ouvir de novo sem pensar nela.
Ela olhou para ele enquanto ele deixava a porta de tela se fechar silenciosamente. Seu lento sorriso quando seus olhos se conectaram fez seu pênis se contorcer atrás de seu zíper. — Estou fazendo um peito de frango para colocar na salada, — disse ela, colocando a panela no fogão. — Isso soa bem para você? — Faça o que quiser. A cozinha é sua. — Ok. — Ela caminhou até a geladeira e tirou alguns dos produtos frescos que compraram, colocando-os no balcão ao lado da pia onde ele estava agora lavando e secando as mãos. — Como é não poder comer comida de verdade? Ele encolheu os ombros, encostando-se no balcão enquanto ela lavava a alface e sacudia a água. — Sua definição de comida e a minha são diferentes, isso é tudo. — Então, nunca provou frutas frescas ou um bife perfeitamente passado? Ou chocolate realmente bom? — Não. Poderia provar comida humana se quisesse, mas apenas uma mordida ou duas. Os sistemas digestivos dos Raças não são equipados para uma alimentação crua como essa. Seu olhar desviou para sua boca. — Só sangue? — Sim. E só sangue fresco, tirado de uma veia viva. Ela engoliu em seco, e quando sua garganta delicada funcionou, ele ficou subitamente muito consciente do fato de que passaram alguns dias desde a última vez que se alimentou – muitos, especialmente para um Um Gen como ele. Gerações posteriores podiam empurrar seus corpos para mais de uma semana, mas não o mais puro da Raça. No entanto, por mais sedento que estivesse, a ideia de pegar uma carótida básica do Homo sapiens era ainda menos atraente que o habitual. Não quando Naomi estava em pé na frente dele. — Por que não tentou tomar da minha veia, Asher? Ele rangeu os dentes por sua inocente pergunta. Ela estava fora dos limites por uma série de razões, principalmente pelo fato dela ser uma Companheira de Raça. Ele estendeu a mão e tocou a pequena marca de nascença abaixo do queixo. — Por causa disso.
Um gole de seu sangue iria alimentá-lo da maneira que o sangue humano nunca poderia, mas também o ligaria a ela como uma corrente inquebrável. Enquanto vivessem, ele a sentiria em suas próprias veias, em seus sentidos. E se ela bebesse dele, não haveria outro macho para ela também. O vínculo de sangue não era apenas sagrado entre um homem Raça e sua mulher, mas eterno. Ela merecia alguém melhor. Alguém digno dela. Então, por que sentia um desejo tão profundo de perfurar sua pele sensível, apesar de tudo isso? Ele limpou a garganta, a boca subitamente tão ressecada quanto o deserto Mojave do lado de fora. — É melhor cozinhar, — ele murmurou. — Se Sam acordar no outro quarto e sentir o cheiro de frango no fogão, pode ter que lutar com ele pelo seu jantar. Ela riu baixinho. — Ok. Sem jantar para você, mas tem certeza que não quer nada? — Eu não disse isso. — Ele rondou na direção dela, incapaz de resistir à necessidade de estar perto. — Definitivamente vejo algo que eu quero. Seus braços a rodearam por trás e ele se aproximou, gemendo ao sentila pressionada contra a frente de seu corpo. Tão pequena quanto era comparada ao seu tamanho imenso, nunca sentiu nada mais perfeito que o calor suave de seu corpo inclinado em sua dureza. Ele moveu seus quadris contra o traseiro dela, sua excitação à beira da agonia só para estar perto dela. Ela inclinou a cabeça atrás e suspirou, balançando lentamente para a música dentro da gaiola de seus braços. — Sempre amei essa música antiga. Ele grunhiu. — Nunca a apreciei mais do que agora. Sua boca se curvou enquanto ela olhava para ele sob as grossas pestanas de seus cílios. — Dance comigo. — Ela se virou dentro do círculo de seu abraço solto, até que estavam de frente um para o outro sem espaço entre eles. Ela se moveu com fluidez, girando os quadris enquanto passava os braços ao redor do pescoço dele e segurava seu olhar aquecido. — Você está muito tenso, Asher. — Não sou muito bom dançarino.
— Não foi isso que quis dizer. — Levantando-se na ponta dos pés, ela puxou sua cabeça para baixo e inclinou a boca sobre a dele. Seu beijo explodiu em seus sentidos como gasolina jogada num fogo furioso. Ele alisou suas mãos para baixo sobre ela, apertando-a e fundindo-a contra sua excitação. Queria estar dentro dela, fundido com ela. Estaria, se não fosse pelas barreiras condenáveis de suas roupas. — De quem foi a ideia brilhante de deixar você se vestir? — Ele rosnou através de beijos febris. — A partir de agora, só quero ver você com minha camiseta ou nada. Ela sorriu para ele. — Soa como um plano para mim. Ele a beijou novamente. — Se gosta disso, espere até ouvir meus outros planos. — Talvez devesse pegar algumas bebidas energéticas, — disse ela, suspirando quando ele enfiou as mãos sob a blusa e tirou os ganchos do sutiã. — Sua resistência Raça vai me matar. — Está reclamando? — Nem mesmo perto disso. — Ela gritou de surpresa quando ele a levantou do chão e a colocou no topo do balcão. Suas mãos acariciaram suas costas, depois se emaranharam em seus cabelos enquanto ele espalmava seus joelhos e abria suas pernas. Ele se moveu para o V das coxas dela e a pegou possessivamente ao redor da nuca, esmagando a boca dela numa contusão aquecida, contundente dos lábios dele/dela e línguas. Não sabia quanto tempo estavam se beijando antes que seus sentidos se arrepiassem com um desconforto. Ouviu um som lá fora – tão fraco que poderia ter imaginado. Mas não tinha; era real. Sua audição Raça era muito aguda para ser confundida. Alguém estava do lado de fora da casa, em algum lugar no escuro. — O que foi? — Naomi perguntou quando ele parou para ouvir mais de perto, sua mão ainda curvada em torno de sua nuca. — Asher? Ele colocou o dedo indicador contra os lábios molhados e entreabertos. Seus olhos amendoados se arregalaram ansiosos. Puxando-a abaixo do
balcão, a colocou de pé e sussurrou em seu ouvido. — Vá para o quarto e tranque a porta. Leve Sam com você. — Asher, o que é... — Faça isso, Naomi. — Um dos cavalos relinchou no curral, um som nervoso que chamou sua atenção para a escuridão do outro lado da porta dos fundos. Asher gentilmente pegou seu queixo e trouxe seu olhar de volta para ele. — Provavelmente não é nada. Os animais ficam assustados o tempo todo. Mas preciso ter certeza, então faça o que peço. Por favor. Ela deu um leve aceno de cabeça e saiu da cozinha. Somente depois que ele ouviu a porta do quarto fechar, Asher se moveu. Saiu da casa com as mãos vazias, sabendo que se tivessem um intruso – especialmente o que ele suspeitava – sua melhor arma era ele mesmo. Ao se aproximar do piquete dos cavalos, uma forma escura se afastou das sombras. — Esta certamente é uma pequena fazenda que tem aqui, Asher. — A voz de Cain era desprovida de emoção, impossível de ler. — Nunca pensei que iria encontrar você brincando aqui fora em algum lugar. Especialmente não com aquela pequena fêmea ladra lá dentro. — Ele riu baixinho. — Aparentemente, está cheio de surpresas ultimamente. — Se tem algum desejo de continuar respirando, Cain, deveria sair da minha terra. O ex-Hunter avançou, seus passos sem pressa. — Não vim aqui para lutar com você, Asher. Não desta vez, de qualquer maneira. Afinal de contas, nós dois nos conhecemos bem o suficiente para perceber que, se fosse isso, nenhum de nós teria – ou receberia – um pingo de misericórdia do outro. Asher não estava prestes a negar isso. — Então por que está aqui? — Curiosidade, — ele respondeu. — Não tanto sobre você, mas sobre ela. — Ela não é da sua conta. — Um grunhido subiu pela garganta de Asher antes que pudesse segurá-lo. — Se você tocar nela, não se engane, Cain. Vou te matar.
O assassino de cabelos escuros sorriu e balançou a cabeça, os olhos prateados brilhando. — Não tenho que tocá-la. Ela já é uma mulher morta, considerando que está tão determinada em foder com Leo Slater. Asher saltou para ele, suas presas saindo de suas gengivas quando agarrou Cain pela garganta. — Ele mandou você? Aquele filho da puta assassino já enviou três de seus capangas atrás dela e lidei com eles. Me diga o que sabe, ou você é o próximo. Cain sorriu, mas havia uma nota de incerteza em seus olhos astutos. E a ficha caiu. — Você se importa com ela. — Ele riu então. — Não me diga que está ligado à pequena ladra. Posso entender por que tinha suas mãos em cima dela agora, mas isso é algo mais. Asher apertou com mais força, depois soltou seu ex-camarada com uma maldição aguda. Cain esfregou a garganta distraidamente. — Que tipo de jogo vocês dois estão jogando aqui? O que um filho da puta como você quer com o dinheiro que ela está roubando dos cofres de Slater há mais de um ano? Duzentos mil não são simplesmente varridos para debaixo do tapete e perdoados. Particularmente por um homem como Slater. Santo inferno. A cifra elevada o chocou, mas manteve sua expressão educada. E não perdeu o fato de que Cain não estava dizendo nada sobre a vitória de Michael na outra noite. — Slater não tem espaço para guardar ressentimentos, — respondeu ele. — Se leva alguns golpes em seus cofres, é mais do que merecido. Cain sacudiu a cabeça. — Qual o problema, não esteve no submundo o suficiente antes de escaparmos do programa, agora é um ladrão comum também? Ele não negou isso. Enquanto Naomi estivesse na mira de Cain, Asher não ia tirar o alvo de si mesmo. Nem mesmo para dar ao outro macho a verdade. — Você é um juiz, considerando com quem trabalha. Está pegando o dinheiro de Slater. A única diferença é que está fazendo isso com sangue nas mãos.
Agora, o rosto de Cain endureceu. — Nós dois temos sangue em nossas mãos, Asher, e isso nunca vai se lavar. Mas pelo menos eu nunca matei meus próprios irmãos. — Nós matamos quem Dragos ordenou que matássemos. Cain sacudiu a cabeça. — Sabe muito bem que há uma diferença entre você e eu. — Então prove isso. Vá embora e não volte. — Não posso fazer isso. Slater me paga para cuidar de seus interesses. E nada lhe interessa mais que seu dinheiro. Ele vai querer de volta, — acrescentou Cain. — Se ele descobrir que ela está repetidamente o golpeando, não vai impedi-lo. E ele não mandará um bando de palhaços atrás dela como fez na outra noite. A notícia que Cain deixou escapar deixou Asher surpreso. Slater não sabia que era Naomi o golpeando? Todos os seus disfarces, seus ataques pacientes
se
espalharam
ao
longo
do
tempo,
enquanto
separava
metodicamente Slater de algumas centenas de milhares de dólares. Para não falar do mais de um milhão que Michael levou embora ontem à noite com a ajuda dela. E Slater não sabia. Mas Cain sim, e isso era igualmente perigoso – se não mais. — Por que ela fez isso? — Perguntou o Hunter. — Revisei horas de filmagem de vigilância. A vi operar. Eu sei que ela é inteligente e corajosa como o inferno. Então, por que continuar provocando Slater? Diga-me apenas isso. Por mais que Asher precisasse de um aliado, não ia se enganar que encontraria um em Cain. Nem em nenhum de seus outros companheiros Hunters. Todos foram gerados pela mesma linhagem antiga no laboratório de Dragos, mas poucos dos antigos Hunters emergiram de sua escravidão com qualquer ligação de lealdade aos seus meios-irmãos de sangue. Pelo menos, Asher. Não podia apostar a vida de Naomi na esperança de que Cain lhe desse consideração. Mas que outra escolha tinha? — Slater matou sua mãe. Cain quase não piscou. — Ele matou muitas pessoas.
— Bem, desta vez alguém veio cobrar a dívida. — Ela levou essa merda longe demais. Tudo que está fazendo é cavar seu próprio túmulo. Em algum momento, Slater vai descobrir, e vai me dizer para pegá-la. — No rosnado baixo de Asher, o outro Hunter olhou para ele por um longo momento, considerando-o em silêncio. — Slater vai me dizer para acabar com ela, e vou fazer isso porque é meu trabalho. Tenho certeza de que pode se relacionar com isso, certo? O golpe não deveria ter doído, mas Asher passou a maior parte de sua vida se arrependendo de tudo que fez ao comando de Dragos. Reviveu a profundidade e a amplitude de seus pecados várias vezes, graças à maldição de seu dom único. Os olhos prateados de Cain se estreitaram. — A vitória na noite passada no Moda - o grande dos caça-níqueis. Estava lá com a mulher. Ela não tem nada a ver com isso, não é? Asher fingiu confusão e balançou a cabeça. — Pelo que me lembro, o vencedor foi um cara numa cadeira de rodas. Então, a menos que ela seja mágica, não sei como você surgiu com essa ideia. Cain olhou para ele, a ameaça nos ossos afiados de seu rosto. — Se acontecer de estar trabalhando com esse cara, Michael Carson, não vai acabar bem para nenhum de vocês. — Isso é uma ameaça? — Não, — ele zombou. — Considere isso um aviso, embora não saiba por que você mereça um. — Eu não, — admitiu Asher. — Mas ela sim. Ela é uma Companheira de Raça, Cain. Um olhar de puro choque varreu o imenso macho. Essa revelação era a única coisa poderosa o suficiente para parar até mesmo um assassino gelado como ele. Todos os machos Raça, até mesmo os Hunters, sabiam que toda sua raça devia sua existência – e seu futuro – às mulheres que carregavam a marca da lua em forma de lágrima e lua crescente. Sem Companheiras de Raça, não haveria mais Raça. Só isso fazia Naomi e as outras como ela serem mais preciosas que as riquezas de qualquer homem.
Ainda assim, Cain soltou uma maldição, parecendo mais desconfiado do que nunca. — Esta Companheira de Raça. Ela é sua então? Asher não tinha certeza de como responder isso, então resolveu dizer a verdade. — Não em sangue, — disse ele. — Mas não se engane, ela é minha. E enquanto eu respirar, ela está sob minha proteção. — Sob sua proteção? Um bastardo sem alma como você? — Cain ergueu as sobrancelhas escuras numa risada profunda. — Então, Deus, ajude-a se você é tudo que ela tem para contar. Cain o deixou parado lá no escuro, o assassino furtivo desaparecendo na noite da mesma maneira que apareceu. Demorou vários minutos para Asher voltar para a casa. Naomi o encontrou com um suspiro aliviado quando ele abriu a porta do quarto e disse que tudo estava bem. — O que aconteceu? — Ela perguntou, procurando o abrigo de seus braços. — Tinha... alguém estava lá fora? — Não foi nada. — Ele pressionou um beijo no topo de seu cabelo preto liso, odiando-se pela facilidade com que a mentira escorregou de sua língua. — Provavelmente apenas um coiote cheirando onde não devia. Não se preocupe. Se voltar, vou lidar com isso.
Capítulo 15 Ele insistiu que tudo estava bem, mas pelo resto da noite Asher parecia distante, sua atenção distante. Naomi não conseguia penetrar nas sombras que cobriam seu rosto bonito e perturbado. Nem ele permitiu que ela o fizesse. Ele desviou de todas as suas perguntas e acalmou seus medos com garantias de que não deixaria nada - e ninguém - chegar perto o suficiente para lhe fazer mal. Ele não precisava dizer as palavras para ela saber que Slater e os homens perigosos que o serviam estavam acima de tudo em sua mente. A preocupação de Asher foi transmitida em seu silêncio sombrio e pela maneira de um soldado que percorria a casa, um ar de prontidão rolava em ondas. Foi só quando a levou para a cama algumas horas depois que ela o sentiu voltar para ela completamente. Nua embaixo dele quando ele trouxe os dois para uma liberação surpreendente, viu seus olhos azuis escuros queimarem com desejo por ela e seus glifos dançarem com cor em sua pele brilhante. Sentindo-o se mover dentro dela, seus golpes poderosos obliterando tudo, exceto o prazer, não havia lugar para dúvidas ou preocupações sobre Slater e o que quer que pudesse esperar por ela fora do abrigo dos braços de Asher.
Ele a acordou de maneira semelhante na manhã seguinte. Com o sono ainda agarrado a ela e seu corpo frouxo de uma exaustão feliz, Naomi gemeu quando sentiu a boca de Asher beijando um caminho quente sobre sua barriga e depois abaixo em seu quadril. Sua respiração se alastrou quente contra seu sexo quando ele beliscou e provocou seu monte. Quando sua língua apertou em sua costura e encontrou seu clitóris, ela se arqueou num suspiro de sensação. Ela abriu as pálpebras preguiçosas, pegando o lábio inferior com os dentes enquanto ele começava a beijá-la e sugá-la a sério. — Asher, — ela sussurrou, já ofegante, derretendo por ele mais uma vez. — Espere. Deixe-me limpar antes de você... — Deite-se. — Seu olhar ardia enquanto ele olhava para ela. Com uma grande mão espalmada em seu estômago, ele usou a outra para segurá-la no lugar debaixo de sua boca. — Quero você apenas assim. Gosto de me saborear em você e saber que isso é tudo meu para desfrutar. Ele baixou a cabeça enquanto falava, lambendo-a com uma descarada carnalidade enquanto mantinha seu olhar. Ele pegou o broto apertado de seu clitóris entre os dentes e passou a língua sobre ele, vertiginosos redemoinhos a fazendo praticamente arranhar os lençóis. — Oh, Deus, — ela sussurrou, estremecendo em resposta a cada golpe cruel. — Tão bom. Ele gemeu um baixo estrondo de aprovação, recompensando-a com outra longa e desavergonhada lambida na fenda de seu corpo. Chamas dançaram ao longo de sua pele quando ela se arqueou para ele. Ela já se sentiu tão devassa antes? Sabia a resposta, porque nunca quis nenhum homem do jeito que queimava por ele. Seus pensamentos se espalharam enquanto ele continuava a atormentá-la com a língua. — Está me deixando louca, Asher. Sua risada baixa vibrou contra sua carne tenra, mas ele não mostrou nenhuma piedade. Seu orgasmo brilhou nas bordas de sua consciência, fora de alcance. E ele sabia disso, caramba. Ele sabia exatamente como jogar com seu corpo e estava provando ser um mestre de controle.
— Oh, foda-se... deixe-me gozar, — ela rosnou para ele, não se importando com o quão voraz soou. Era tarde demais para fingir que ela era algo menor. Quando estavam juntos assim, ela não tinha defesas. Ela simplesmente o queria. Precisava do prazer que só ele era capaz de dar a ela. Seus dedos se fecharam sobre suas coxas e as abriram mais amplamente, suas mãos tão ásperas quanto sua língua era gentil. Ela estremeceu quando ele se afastou e seu hálito quente tomou conta dela. — Você é tão bonita aqui, — ele murmurou, sua voz em um tom sobrenatural. — Suave e sedosa. Doce e quente. Quem precisa de comida quando tenho você para comer? Longe foi a tentadora provocação agora, em seu lugar pura fome enquanto ele a comia viva, lambendo e sugando, enviando ondas pulsantes de calor das pontas de seus dedos até os dedos dos pés. Ela moveu seus quadris contra sua boca com abandono, a dor em sua barriga se espalhando e crescendo, aprofundando-se numa necessidade que ela não podia conter. — Por favor, Asher, — ela implorou, pegando seu cabelo castanho espesso em seus punhos enquanto tremores ondulavam através de seu núcleo. Ela queria fazer isso durar, mas o prazer era tão afiado como uma faca agora, e estava equilibrada precariamente no limite. — Quer gozar, baby? — Sua voz baixa provocou seus sentidos, sua boca ainda se movendo implacavelmente sobre sua carne inflamada. Sua língua mergulhou dentro dela e ela gemeu. — Goze para mim, Naomi. Dê para mim, agora. Ela não podia segurar sua libertação nem se tentasse. Suas
costas
se
curvaram
quando
ele
empurrou
dois
dedos
profundamente em seu corpo. A invasão súbita combinada com o êxtase de sua língua esperta enquanto ele trabalhava seu clitóris em círculos mágicos era mais do que ela podia suportar. Seu clímax cresceu e inchou, até que tudo que pôde fazer foi gritar seu nome ao cair do precipício. — Asher.
O sangue correu para sua cabeça e a luz explodiu atrás de suas pálpebras
fechadas,
quando
os
tremores
a
sacudiram
numa
onda
interminável de liberação. Seus ossos eram líquidos, seus membros sem peso. Suas terminações nervosas ficaram eletrificadas, seus sentidos brilhando como minúsculos diamantes atrás de suas pálpebras fechadas enquanto ela o segurava apertado contra ela com uma mão, cavalgando na crista de seu orgasmo até o final. Isso deveria ter acabado com ela, a intensidade de quão duro e com que frequência ele a fez gozar desde a primeira vez que ficaram nus juntos. Mas estar com Asher fazia algo selvagem nela. Isso desencadeou um desejo que só parecia aprofundar cada momento que ela estava com ele. Ela queria atribuir isso ao fato de ter passado tanto tempo sem intimidade ou desejo físico. Ou talvez fosse a novidade de estar com um homem tão atraente e poderosamente sexual quanto Asher. Por tudo que sabia, esse desejo insaciável poderia ser uma resposta elementar da parte dela que não era completamente mortal, finalmente entrando em contato com a parte dele que era Raça. Mas Naomi sentiu uma conexão mais profunda do que qualquer uma dessas coisas. Estava começando a se importar com ele. Impossível. Mal se conheciam. Isso tudo era quente, emocionante e esmagador por causa das circunstâncias. Vida e morte. Perigo nos seus calcanhares. E o fato de ele ter entrado em ação para salvá-la de tudo como um cavaleiro das trevas que ela nunca sonhou que poderia realmente existir. Isso era o que fazia estar com ele ser tão excitante. Essa era a razão pela qual se sentia tão completamente, visceralmente selvagem por ele, mesmo depois de ter arranhado aquela coceira inicial. Exceto que nenhuma dessas coisas parecia explicar a dor crua que se abria dentro dela desde que conheceu Asher. Uma dor que só estava ficando mais profunda e mais difícil de ignorar toda vez que ele a tocava ou roçava sua pele com as pontas afiadas de suas presas. Por mais que tentasse, não podia ignorar o desejo que sentia por algo que estava tão certa pela vida toda que nunca desejaria.
O tipo de ligação que agora sabia que só poderia compartilhar com Asher. Deus a ajudasse, ficou surpresa ao reconhecer a possibilidade real de estar se apaixonando por ele. — Ei, — ele disse, seu grunhido profundo um grosso estrondo quando subiu pelo comprimento de seu corpo. Ele gentilmente bateu na têmpora dela. — Tudo bem por aqui? Você está bem? Ela piscou, ainda se recuperando dos tremores de felicidade e sua própria descoberta surpreendente. — Sim, — ela murmurou, olhando para os olhos derretidos e o rosto rudemente bonito que nunca deixava de roubar seu fôlego. Ela estendeu a mão para acariciar sua bochecha. — Estou mais do que bem, Asher. Isso a aterrorizava, como tudo podia parecer certo quando ela estava com ele. Porque mais cedo ou mais tarde teriam que sair de sua cama e encarar a realidade. Mas ainda não. Agora não. Ela o beijou, subitamente desesperada por ele de novo. Ele gemeu contra o duro aperto de sua boca na dele, em seguida, soltou um silvo quando ela deslizou a mão abaixo e envolveu os dedos em torno de seu comprimento rígido. — De costas, vampiro. É minha vez de te torturar. *** Ele fez o que ela exigiu, apesar de que estava mais duro que nunca e desesperado pela necessidade de estar dentro dela. Ele jurou para si mesmo quando escapou da coleira de Dragos que nunca se renderia ao capricho de ninguém novamente. Mas isso foi antes de conhecer Naomi. Esta mulher era dona dele e não podia negar isso. Especialmente quando estava olhando para ele com olhos vidrados e ainda com fome.
Suas veias latejavam, não só pela necessidade de transar com ela, mas com outro desejo violento também. Quando se deitou na cama e observou-a montá-lo, ele reprimiu um grunhido. O sangue correu para seu pênis e uma dor começou a pulsar em suas gengivas enquanto suas presas se estendiam ainda mais. Os pontos afiados pareciam adagas contra sua língua. Ele alcançou seus quadris, pronto para encaixá-la em seu pênis ereto, mas ela afastou as mãos dele. Seu sorriso era sensual, mas determinado. — Paciência agora. Eu nem comecei. Ele soltou uma respiração áspera. — Não tenho paciência quando você está nua e ao meu alcance. Ela inclinou a cabeça, uma das sobrancelhas negras arqueadas sobre os olhos amendoados. — Está sugerindo que eu amarre você, então? Porra. Mesmo que não existissem restrições que pudessem prendê-lo, a ideia de se entregar ao prazer de Naomi fez com que a lava penetrasse em todas as células de seu corpo. Mesmo que fosse um tormento e um teste de seu controle, manteve as mãos na cama e simplesmente assistiu enquanto ela espalhava pequenos beijos em seu peito e abdômen. Sua língua rosa saiu para lamber os redemoinhos e arcos de seus dermaglifos. — Amo ver suas cores, — ela murmurou, explorando-o lentamente com a boca. Correu os lábios entreabertos sobre os glifos que circulavam seus peitorais, em seguida, seus pequenos e contundentes dentes se uniram sobre um de seus mamilos e ele quase pulou do colchão. — Cristo, mulher. Tenha cuidado, a menos que queira que eu te morda de volta. Foi um erro fazer a ameaça. Não só porque era vazia – algo que nunca faria. Mas também porque sua mente lógica estava se apoiando na fome – e na sede – que o atormentava com garras fincadas, quanto mais tempo Naomi brincava com ele. Agora que disse as palavras, a imagem saltou vívida em sua cabeça. Naomi se abrindo embaixo dele, sua garganta esbelta arreganhada e arqueada para ele como uma oferenda. Sua boca baixando para ela, suas presas perfurando sua veia.
Ele quase podia sentir a doçura de seu sangue em sua mente. Seria delicado como o cheiro dela, e ousado como a própria mulher. Ele apertou os olhos e a mandíbula, lutando contra a dor que indicava sua necessidade de se alimentar. Agora mais que nunca, estava quase desesperado por isso. Esse ataque animalesco. O gosto quente e escuro de sangue – o sangue de Naomi – inundando sua boca. A sensação de bater profundamente dentro dela enquanto ele bebia, seu canal apertando-o quando ela gozasse. Ele rosnou e fechou os olhos, tentando em vão barrar as imagens – e a sede – de seus pensamentos. A necessidade de encontrar um doador de sangue ficava mais urgente quanto mais tempo estivesse na presença de Naomi. Pelo menos se sua fome física fosse saciada, poderia ter a força para aguentar suas necessidades quando ela se aproximasse dele. Fodidamente não provável, mas estaria amaldiçoado se tirasse algo mais dela do que ele já tirou. O lembrete de Cain na noite passada do que Asher foi – e tudo que nunca poderia ser – foi oportuno. Asher estava ficando muito confortável com Naomi. Achou muito fácil imaginar como seria a vida dele com alguém com quem compartilhar. Alguém como Naomi. Não. Não como ela. Somente ela. Disse a si mesmo que observar Cain era apenas acalmar seus medos sobre Slater se aproximando dela ou de Michael. Mas os motivos de Asher também eram egoístas. Naomi não sabia sobre seu passado. Não sabia quantas vidas ele tirou, incluindo muitos inocentes. Sua mentira queimava, mas cada minuto que se passava desde seu confronto com o outro Hunter só tornava mais difícil encontrar as palavras que precisava dizer para ela. Ela continuou a beijar e lamber e beliscar seu caminho pelo seu torso. Ele levantou a cabeça para observar enquanto ela descia, e o olhar em seus olhos enviou um aríete de luxúria batendo nele. Seu pênis já inchado pulsou e saltou, líquido claro chorando em seu estômago em antecipação do que ela pretendia para ele.
— Você é lindo, — ela murmurou, seus olhos acariciando-o tão admiravelmente quanto suas mãos. — Nunca poderia me cansar de olhar para cada centímetro seu, Asher. Ele queria responder. Dizer a ela que não era nada comparado a ela. Queria regá-la com todas as palavras que não poderiam fazer justiça, mas tudo que conseguiu foi um gemido estrangulado, perdido em seu aperto quente quando colocou os dedos em torno de seu eixo. Então ela começou a deslizar a mão para cima e para baixo em seu comprimento. Seus longos golpes sem pressa faziam sua pélvis balançar quando ele se esticou na direção dela, ao seu alcance. — Está me matando, anjo. Deus, faria qualquer coisa desde que continue me tocando assim. — Qualquer coisa? — Ela riu suavemente. — Melhor não fazer promessas que pode não querer manter. Ela estava brincando, inconsciente de quão apto era seu aviso. Ele tinha cem promessas que queria dar a ela, mas não tinha o direito de falar uma única. E então ele não tinha palavras, uma vez que sentiu o calor de sua respiração quente e úmida na cabeça de seu pênis. — Naomi — Seu nome era pouco mais que um grunhido quebrado quando ela fechou os lábios sobre ele e puxou-o profundamente em sua boca. — Ah, Deus. Ele resistiu, reflexivamente enfiando os dedos em seu cabelo escuro. Sua língua era fogo puro e ela estava queimando-o vivo enquanto acariciava, puxava e chupava. Ela não conseguia encaixar o tamanho total dele em sua boca, mas isso não a impediu de tentar. Ele quase derreteu enquanto ela o afagava profundamente, os músculos tensos agarrando-o como um punho quente e úmido. Todo o tempo, ela fazia pequenos sons sensuais, gemidos e zumbidos em torno de sua circunferência que lhe dizia mais que qualquer palavra que ela estava tão consumida de prazer quanto ele. Se não pudesse prová-la agora, precisava entrar dentro dela no mínimo. Ele estremeceu com o esforço de deixá-la continuar, sentindo sua língua como um mártir, sofrendo esta sublime tortura em silêncio.
Mas então ela começou a chupar para valer, puxando atrás até quase tê-lo expelido antes de sugar duro e profundo, trabalhando a base de seu pênis com os dedos, encorajando-o a empurrar com a mão ao redor de seus quadris. O ritmo era como um batimento cardíaco agora, implacável, impossível de controlar. Ele apertou ainda mais o cabelo dela. — Jesus, — ele disse, sua visão borrada numa névoa de vermelho, suas presas se estendendo ainda mais quando seu clímax o atingiu como um trem de carga. — Tem que parar antes que eu... ah foda-se... Naomi... Ele parou quando percebeu que seu aviso tinha exatamente o efeito oposto. Ela apenas aumentou o aperto e se moveu mais rápido, gemendo agora, sons desesperados e necessitados que provocaram um curto-circuito em seu cérebro. — Porra! Ele berrou seu nome quando todas as terminações nervosas dispararam de uma vez, enviando ondas de choque através de seu corpo. Ele gozou mais duro que nunca, jatos quentes escaldando-o por dentro enquanto ela o sugava impiedosamente. Uma sensação que nunca sentiu antes envolveu-se ao redor dele, apertando seu peito enquanto acariciava o cabelo de Naomi e se rendia ao calor de sua boca. O que sentia por ela ia muito além da luxúria. Era algo profundo e elementar, algo primitivo e inegável. Algo possessivo e permanente. Minha, ele pensou, enquanto a puxava para se deitar ao lado dele. Ele acariciou seu rosto bonito e os lábios brilhantes que acabaram de lhe dar um prazer tão intenso. Minha, ele disse a si mesmo, mesmo sabendo que não tinha o direito de desejar. Abaixou a cabeça e beijou-a profundamente, até que ambos estavam desesperados por ar. Então deixou seus dedos descerem pela suave bochecha dela e ao longo de sua graciosa linha da mandíbula, até que parou no pequeno símbolo escarlate que passava logo acima da pulsação que martelava em sua garganta. — Minha, — disse ele, suas presas arreganhadas e doloridas.
Mas antes que cedesse ao Ăşnico erro que nunca poderia desfazer, jogou Naomi sobre os joelhos, abriu bem suas pernas, depois se enterrou atĂŠ o punho dentro dela, deixando-a saber que ela era dele da Ăşnica maneira que poderia ser...
Capítulo 16 — Bem, o que você acha? — Naomi estava na sala de estar e gesticulou para o par de mesas laterais que Asher fez. — Não te disse que ficariam ótimas aqui? Ele deu de ombros sem compromisso, mas como se ela não estivesse certa sobre a mudança ser boa. — Vão ficar, eu acho. — Você acha? — Ela olhou boquiaberta para ele, um largo sorriso rompendo seu lindo rosto. — Isso parece mil vezes melhor e sabe disso. Para ele, a maior melhoria da sala foi o pequeno foguetinho em pé no meio dela. Ela tinha o cabelo preto e lustroso preso num rabo de cavalo, que só acentuava a beleza de sua pele e olhos incomuns. Jeans escuros e uma camiseta branca deveriam ser mundanos, mas em Naomi eram tão atraentes quanto lingerie. Ou talvez fosse apenas a libido insaciável de Asher – pelo menos no que dizia respeito a ela. Ele finalmente a deixou sair da cama por volta do meio-dia, principalmente porque os dois precisavam tomar banho e ela precisava comer. Ele optou por manter distância, o melhor que podia, apenas para evitar a
tentação de seu delicioso corpo... e a noção igualmente tentadora de sua carótida. Depois que ela almoçou, ela adormeceu com Sam no sofá enquanto Asher se enfiava na oficina, sozinho com sua culpa e indecisão. O confronto com Cain ainda pesava em sua mente. O outro Hunter estava certo sobre uma coisa. Se Slater soubesse sobre Naomi e ligasse a sequência de vitórias suspeitas a ela, ele estaria atirando nela com os dois cartuchos carregados. E se o bastardo tivesse a certeza de que ela teve algo a ver com a grande vitória de Michael na outra noite? Asher nem queria pensar nisso. Não se preocupou que não pudesse lidar com Slater ou um caminhão de seus capangas humanos. Inferno, até cuidaria de Cain se chegasse a isso, ou levaria o macho abaixo com ele. Mas, cada vez mais, a possibilidade real de que Naomi se machucasse no processo – física ou não – estava se tornando um risco que não queria. E sabia o porquê também. Aquela dor profunda e insaciável atrás do esterno era a culpada. Ele se importava com ela. Não do jeito que fez no começo, como uma obrigação de proteger uma fêmea que poderia um dia ter a prole de outro macho Raça, mas como a mulher que desejava acima de qualquer outra. Como companheiro, ele nunca seria digno, mesmo que suas mãos não fossem manchadas com incontáveis vidas perdidas. E se preocupar significava que estava sujeito a cometer erros. Para realmente mantê-la segura, precisaria de todas as armas à sua disposição, entre elas a capacidade de pensar, agir e reagir com a lógica sem emoção de sua vida anterior. Permitir que Naomi passasse por aquelas paredes mudou tudo. Ela o mudou. — Vamos lá, — disse ela, agarrando a mão dele. — Vamos pegar o armário para o quarto. Vai me agradecer depois. Ela deu-lhe um pequeno puxão, apenas para parar quando o celular tocou no bolso de trás. — É o Michael.
Asher ficou tenso quando ela bateu na tela e leu por um segundo. — Os fundos do cassino não poderiam ser liberados tão cedo, poderiam? — Não, — disse ela, mas quando ela olhou para ele, seu rosto estava iluminado com emoção. — Não é pelo dinheiro. São notícias melhores ainda. Penny está de volta. — Penny? — Asher balançou a cabeça, confuso. — Ela é uma das crianças da casa, uma menina de dez anos que teve uma vida realmente ruim até agora. Esteve desaparecida por quase duas semanas desta vez, a mais longa desde que apareceu pela primeira vez. Mas agora está de volta. Asher grunhiu. — Posso ver que está aliviada. — Está brincando comigo? Estou exultante. Estava tão preocupada com ela. — Naomi abaixou a cabeça e começou a mandar mensagens de texto para Michael. — Tenho que ir vê-la. Mesmo que seja apenas por alguns minutos... — Fora de questão. — Se importa se eu pegar emprestado o... — Ela olhou para cima, franzindo a testa. — Desculpe? Ele deu uma breve sacudida de cabeça. — Não acho que seja uma boa ideia. É muito cedo. Slater pode ter olhos na casa... inferno, isso é praticamente um presente. Os olhos de Cain, no mínimo, embora não até o anoitecer. Asher estava bastante certo que o ex-Hunter não machucaria Naomi agora que sabia que era uma Companheira de Raça, mas ainda era seu trabalho cuidar do dinheiro de Slater. Havia muitas maneiras criativas de tirar alguém do caminho sem machucá-la. O pensamento de um assassino como Caim chegando perto dela era suficiente para deixar o sangue de Asher gelado. E a ideia de deixá-la sair durante o dia, quando Asher não podia protegê-la dos bandidos humanos de Slater, era uma opção que se recusava a considerar. — Não vai, Naomi. E definitivamente não sozinha. Seu queixo subiu. — E você não pode me manter aqui.
— Sim. Eu posso. — Ele deu um passo na direção dela. — Mas não quero fazer isso. — Quero ver Michael e Penny e o resto das crianças. — É muito cedo. Se Slater... Ela balançou a cabeça. — Se Slater tivesse alguma suspeita sobre aquela vitória na outra noite, nunca teria deixado Michael sair do cassino com o cheque em primeiro lugar. Estamos nos divertindo juntos aqui, Asher, mas não sou sua propriedade. Você não tem o direito de me manter longe da minha casa. Sua casa. De alguma forma, realmente começou a esquecer esse fato. Irônico, considerando tudo o mais que foi amaldiçoado a lembrar em sua vida. Naomi pertencia a outro lugar. Seu amigo e as crianças problemáticas que estavam tentando ajudar significavam mais para ela que qualquer coisa. Certamente mais que ele. Ele viu sua devoção a eles na linha determinada de sua boca, e nos rebeldes olhos xerez que detinham o poder de virá-lo do avesso com um único olhar. Parecido com o que colocava sobre ele agora. Depois da intimidade que compartilharam nos últimos dias e noites, ouvi-la descartá-lo como se nada mais que um bom momento foi mais doloroso do que ele imaginava ser possível. Hora de recalibrar seu pensamento. Para não mencionar seus desejos imprudentes a respeito desta fêmea. — Você está certa, — ele disse uniformemente. — Não pertence a mim. Se quer ir para casa, então não vou te manter longe disso. Mas vou levar você até lá. — Tudo bem, — ela disse baixinho, sua expressão suavizando um pouco. — Obrigada. Ele se afastou dela sem reconhecer sua gratidão. — Diga ao seu Michael que irei com você. Vamos sair assim que a noite cair. ###
A porta se abriu antes que ele tivesse chance de bater, e Michael Carson olhou para ele de sua cadeira de rodas. — Puta merda, ela não estava brincando. Você é enorme. — O jovem deu à Asher um largo sorriso quando rolou atrás e abriu espaço para ele entrar na casa atrás de Naomi. — Sou Michael. Ele estendeu a mão para Asher e Naomi empalideceu. — Oh, Michael, espere. Asher não gosta... — Está tudo bem, — disse Asher, apertando a mão do homem apesar do custo. Ele resistiu ao repentino choque de lembranças feias que o atingiram no contato, com o cuidado de manter sua expressão neutra, apesar da fealdade – e da agonia – do sofrimento passado de Michael. O incidente que Naomi lhe contou, aquele que terminou com o queixo de um menino de oito anos sendo esmagado sob o punho de seu pai, rolou sobre Asher em detalhes brutais. Ele balançou a cabeça, sentindo nada além de respeito pelo jovem que sofreu tanto, mas que sobreviveu para fazer uma vida melhor, não apenas para si mesmo, mas para as crianças que recebia em sua casa. — Estou honrado em conhecê-lo, Michael. — Da mesma forma. Agora vejo por que Nay estava tentando manter você só para ela mesma. — Seus olhos quentes e sorridentes varreram Asher de novo da cabeça aos pés, antes de inclinar um olhar arregalado para Naomi. — Bem, entrem vocês dois. Não queremos sentar aqui com a porta aberta a noite toda, não é? — Como estão as coisas? — Naomi perguntou, código que Michael percebeu instantaneamente. — Quieto até agora. — Ele baixou a voz para quase um sussurro. — Mal posso acreditar como foi suave. Amanhã, desta vez, devemos ser de ouro. Um suspiro saiu dela. — Graças a Deus. — O som das vozes das crianças foi transportado de outras áreas da casa e ela esticou o pescoço para espiar o corredor. — Muitas crianças vêm para a noite? — É cedo ainda, então apenas quatro, mas o resto chegará mais tarde.
— E Penny, — Naomi solicitou, entusiasmo e alívio em sua voz. — Estou muito feliz em saber que ela voltou. Michael assentiu. — Eu também. Aparentemente, a mãe dela está de volta à cidade de Reno. Trouxe outro namorado perdedor com ela. Penny queria dar a ela uma chance, mas as coisas ficaram ruins novamente. O rosto de Naomi apertou em simpatia. — Drogas? — Sim, o habitual. — Pobre garota. — Pais de merda, — disse Michael. — Mas Penny tem uma boa cabeça em seus ombros. E sabe que sempre terá um lugar para ficar conosco. — Ele rolou em direção à cozinha adjacente. — Vocês dois vão ficar aqui por um tempo? Ela olhou para Asher. — Sim, por um tempo, eu acho. — Ótimo, — disse Michael. — Todos acabamos de jantar e aluguei aquele novo filme de super-herói na TV a cabo, então todo mundo está se limpando antes de nos acomodarmos. Enquanto isso, estou no dever de pipoca. Agora que você está aqui, pode ajudar. Asher observou sua comunicação fácil, uma pontada amarga de ciúmes surgindo dentro dele. Ele sabia que Naomi e Michael eram apenas amigos, mas a afeição óbvia deles um pelo outro fazia com que se sentisse um estranho, como o intruso que era. Houve um tempo, não muito tempo atrás, que seu desconforto não teria sequer sido registrado. Nem agora, se a mulher em questão fosse alguém além dessa. Enquanto os amigos discutiam sobre algumas das outras crianças e especulavam sobre quem ainda teria que aparecer esta noite, ele olhou em volta para a casa confortável, embora modesta. A grande área tinha visto dias melhores, mas estava limpa e arrumada, como o resto da aconchegante sala de estar. Uma TV de tela plana era o ponto focal óbvio do espaço, mas também havia estantes cheias de centenas de romances e livros de não-ficção, além de uma pequena mesa de estudos com um computador.
Tudo no lugar tinha uma sensação de lar e família – coisas que Asher não seria capaz de reconhecer ou apreciar se não conhecesse Ned Freeman tantos anos atrás. Coisas que as crianças que vinham para ficar com Naomi e Michael provavelmente não experimentariam se não fosse pela generosidade de ambos. E o amor. Asher o sentia enquanto ouvia o par falar. E então viu aquele cuidado em ação um momento depois, quando o som de pés levemente espalhados surgiu do corredor. — Penny! — O rosto de Naomi se iluminou com alegria quando a garota loira e esbelta vestida com uma longa camisola correu para os braços abertos. Penny abraçou Naomi perto. — Michael disse que você estava fora por um tempo e não tinha certeza de quando estaria aqui. — A menina olhou para Asher e ficou quieta, uma curiosidade cautelosa roubando seu olhar azulceleste. — Quem é você? Naomi deu-lhe um olhar estranho. — Asher é... um amigo meu. — Oi, — disse a menina, os braços ainda em volta de Naomi. Asher assentiu brevemente, e no mesmo momento várias outras crianças chegaram pelo corredor. Quatro meninos, dois deles gêmeos idênticos de olhos escuros, os outros um garoto baixinho e gorducho com uma coroa de cabelo ruivo brilhante e um garoto latino de rosto redondo e rabugento. As crianças pararam e olharam boquiabertas para Asher. — Quem deixou o gigante entrar? — Isso foi de um dos gêmeos. Michael sorriu. — Pessoal, este é Asher. — Ele lançou um olhar irônico para Asher. — Permita-me apresentar o resto do comitê de boas-vindas esta noite. Nós já ouvimos falar de Max, e esse é seu irmão mais bonito, Billy. — Uma piada, considerando que não havia praticamente nenhuma diferença entre eles, mas o outro garoto riu enquanto Max brincava de socar seu ombro. — O forte e silencioso aqui é Juan, e esse outro pequeno patife é Tyler. — Essas tatuagens estão em seus braços? — Tyler deixou escapar, apontando para Asher. O porta-voz dos gêmeos, Max, deu uma olhada ao garoto. — Ele é Raça, gênio. Esses são dermaglifos. Um monte deles.
Asher acenou para o menino. — Sou Gen One. É por isso que tenho tantos glifos. Juan se animou, uma curiosidade cautelosa no olhar que encontrou o olhar de Asher. — Então, você é como um vampiro de verdade? Asher sorriu. — Mais ou menos. — Legal! — Tyler piou, sua voz jovem alta e estridente. — Podemos ver suas presas? — Quando está com fome, as pessoas parecem comida para você? — Billy entrou na conversa. — Gente. — Michael acenou com as mãos para o grupo de crianças um gesto de saída. — Temos um filme para assistir, lembra? Talvez Asher permita que os hooligans o interroguem depois. — Ah, cara! — Os protestos vieram principalmente de Billy e Tyler enquanto Michael os enxotava para a sala. — Desculpe por isso, — Naomi disse, dando um olhar suave para Asher. — Duvido que já tenham visto alguém como você antes. — Está tudo bem. — Ei, Nay, — Michael chamou do lado do sofá, com o controle remoto na mão. — Se importa de lidar com a pipoca enquanto faço as coisas para o filme? — Claro. — Ela olhou para Asher. — Quer ajudar? Ele sabia tanto sobre fazer pipoca quanto qualquer outra coisa quando se tratava de uma cozinha, mas assentiu e a seguiu para fora da sala. Por mais que quisesse fingir que podia manter distância dela, ela o atraía como um imã. E se a atração dela era tão forte sem uma ligação de sangue, quão ruim seria para essa fêmea se ela realmente fosse dele? Ele não permitiu que o pensamento se prolongasse. Era inútil imaginar, de qualquer maneira. Este era o lugar onde ela pertencia. Se não tivesse visto antes, o fez agora. Ele se afastou, observando-a abrir os armários coloridos enquanto pegava uma grande caixa de pipocas, guardanapos e várias tigelas grandes. — Está feliz por estar em casa.
— Estou. — O sorriso que ela se virou para ele estava desprotegido, cheio de puro contentamento. — Vê o quão especiais eles são? E esses cinco são apenas alguns dos que provavelmente virão para ficar esta noite. Ele assentiu. — Todos parecem boas crianças. — Eles são incríveis, — disse Naomi. — Todos têm muito potencial, sabe? Tudo que precisam é de uma pessoa para dar um tempo. Apenas uma fodida pessoa para mostrar a eles que são importantes, que são amados. Ele se aproximou, mal conseguindo resistir a tocá-la. — Então aquelas crianças lá estão com mais sorte que a maioria. Eles têm duas pessoas oferecendo-lhes uma chance. Duas pessoas que se importam. Ela balançou a cabeça com força, segurando o olhar dele. — Michael e eu não podemos salvar todos. Não podemos salvar todos e, quando penso nisso, isso me mata por dentro. — Está fazendo o que pode, Naomi. Isso é mais do que muitas outras pessoas fariam. Incluindo os pais dessas crianças. — Eu sei. Essa é a parte realmente horrível, não é? Pais que não se endireitam, nem podem se endireitar, mesmo por seus próprios filhos. Por mais que ame minha mãe, o fato de ela ter escolhido alguém como Leo Slater sobre mim, de vez em quando, dói, às vezes, pior do que perdê-la para a morte. Ela se virou, ocupando-se com um pacote de pipoca. Asher se aproximou e estendeu a mão para acariciar o lado do rosto dela. — Sua mãe não era tão forte como você. Você era mais forte, mais valente que ela, mesmo quando era aquela menina de oito anos implorando para que ela ficasse. Naomi virou a cabeça para ele, assombro em seus olhos dourados escuros. — Odeio que me viu assim. — Ela engoliu em seco, em seguida, exalou uma maldição suave. — Odeio que saiba quão assustada e magoada eu estava. Passei toda minha vida empurrando essa dor para baixo, tentando negar que no fundo ainda sou aquela criança aterrorizada e irritada. E agora você... você é a única pessoa da qual eu nunca posso me esconder, Asher. Nunca posso ser forte perto de você porque me viu no meu ponto mais fraco. — Não. — Ele curvou os dedos em torno de sua nuca, seu rabo de cavalo preto acetinado roçando as costas de sua mão. — Não precisa se
esconder ou fingir ser nada. Pode ser fraca ou forte e isso não vai fazer diferença para mim. Sempre será a mulher mais extraordinária que já conheci. Ela respirou fundo. — Asher, o que eu disse a você hoje, antes de virmos aqui... — Você estava certa, — disse ele, cortando-a no ato. — Não pertence a mim. Pertence aqui, com essas crianças. Eles precisam de você, Naomi. Michael também o faz. Por um longo momento, ela apenas olhou para ele, seu olhar procurando. — E você? Me diga o que você precisa. — Preciso saber que está segura. Que está feliz. — Ele puxou a mão para longe dela antes que cedesse à vontade de segurar mais apertado por algo que não merecia. — Preciso saber que Slater e aqueles que o servem nunca podem machucá-la. — Isso é tudo? — É o suficiente. — Ele se afastou dela, colocando-a fora de seu alcance. — Prometi protegê-la até que tenhamos certeza que Slater não pode machucá-la. É o que pretendo fazer. Então pode retomar sua vida aqui e voltarei para a minha. Ela ficou completamente imóvel, em silêncio. Deus o ajudasse, seu olhar parecia tão sombrio que se sentiu envergonhado como se tivesse acabado de atingi-la. Por um período interminável, nenhum deles falou ou se mexeu ou respirou. Pés descalços bateram no linóleo atrás deles. Então a voz estridente de Tyler exigiu: — Onde está a pipoca, pessoal? O filme está prestes a começar! — Está indo, — disse Naomi, cumprimentando o menino com um sorriso feliz que não chegou a alcançar seus olhos. — Por que não me dá uma mão agora que está aqui? Pode abrir os pacotes para mim e colocar nas tigelas. Ela virou de costas para Asher e apressadamente começou a trabalhar com Tyler ao seu lado. Asher caminhou de volta para o outro cõmodo sem que ela notasse. Quando o milho foi estourado e trazido da cozinha, Michael começou o filme para o grupo ansioso de crianças. Estavam todos empilhados na sala de estar, cada um gravitando num determinado lugar. Max pegou a poltrona
reclinável, com Naomi numa das extremidades da sala onde Michael estacionou a cadeira. Penny estava aninhada perto do outro lado de Naomi. — Asher vai dormir aqui esta noite? — Billy perguntou do seu lugar no outro lado do sofá. Michael riu. — Não esta noite, amigo. Asher tem seu próprio lugar. Agora Penny virou um olhar curioso para Naomi. — Isso é o que você tem feito? Ela assentiu. — Vou ficar com Asher por um tempo, mas voltarei em breve. — Oh. — A menina encolheu os ombros. — Vai assistir com a gente ou o quê? Levou um segundo para Asher perceber que estava falando com ele. — Sim, claro. Ela deu um tapinha no espaço ao lado dela e ofereceu-lhe um sorriso hesitante que ele tinha certeza que tinha tudo a ver com sua confiança em Naomi e seu gosto em amigos e nada a ver com ele pessoalmente. Ele se aproximou e sentou, com cuidado para não invadir o espaço pessoal da garota. Ainda assim, ela endureceu involuntariamente de uma forma que o fez se sentir enjoado enquanto tentava não pensar em todas as razões pelas quais poderia temê-lo, muito menos pelo fato que era Raça. Os primeiros minutos enquanto os créditos rolavam foram gastos num silêncio constrangedor, toda sua atenção centrada no rosto firme e impassível de Naomi enquanto ela olhava para a tela grande. Logo, todos se perderam no filme. Asher nunca assistiu TV ou filmes, mas havia algo de reconfortante no silêncio compartilhado dentro da sala, nada além de rostos extasiados e o ruído rítmico de pipoca sendo jogada em punhados nas pequenas bocas. Em algum momento, Penny relaxou, caindo contra o ombro dele. Seus roncos suaves vibravam através de seu braço enquanto ela se aninhava contra ele tão inocentemente quanto um gatinho. Ele a observou por um momento, e quando olhou para cima, seu olhar colidiu com a terna consideração de Naomi. — Você deveria pegá-la, — ele murmurou. Antes que percebesse o que estava fazendo, estendeu a mão para aproximar a criança de Naomi. Assim
que seus dedos tocaram o braço nu de Penny, foi golpeado com a imensa força de sua memória – transportado de seu assento na sala para um chão empoeirado sob uma pequena cama enquanto ele espiava através de uma saia rosa rasgada. O terror o agarrou, sugando toda a respiração de seus pulmões. Não, não seus pulmões. Os de Penny. Seu terror penetrou através dele como ácido. Num instante, sua memória se imprimiu nele antes que pudesse se afastar. Ele estava aqui. Ela podia ouvi-lo, respirar pela boca. Podia sentir o cheiro de uísque e suor azedo saindo dele. A única questão era se estava bêbado demais para pensar em olhar embaixo da cama ou se... O medo se fechou ao redor de seu coração como um punho gelado quando sapatos escuros entraram em seu quarto. A saia da cama tremulou e um par de olhos cinzentos e aguados perscrutou a escuridão. — Aí está você, garota da Penny. Quallll o proooblema? Saia e dê um beijo de boa noite em seu padrasto. Asher ficou de pé, alimentado por uma raiva pura e inalterada. Penny se mexeu, piscando para ele sonolenta. De alguma forma, quando ele olhou nos olhos daquela menina, conseguiu manter a voz uniforme. — Desculpe. Não estou realmente no clima do filme. Preciso de um pouco de ar. Ele saiu da casa para a varanda e sugou grandes tragos de ar quente de Nevada. Quando a porta se abriu alguns minutos depois, esperava ver Naomi. Ele tinha seu pedido de desculpas alinhado, mas parou quando percebeu que era Michael. — Você está bem? — Sim, — respondeu Asher bruscamente. — Tudo bem. Michael assentiu com a cabeça, seu olhar preocupado firme. — É difícil processar algumas vezes, mesmo para mim, e isso tem sido meu normal desde antes do meu acidente. Algumas noites, quando uma criança nova aparece, deito na cama tão cheio de raiva e dor pelo que eles suportaram. Nem precisam dizer as palavras na maior parte do tempo. Quando você conhece a dor, sabe
como ver isso neles. — Michael olhou para a noite, suas mãos descansando levemente nas rodas de sua cadeira. — Nay é muito melhor nisso tudo que eu. Ela nunca deixa que eles vejam sua raiva pelo que passaram – a raiva que acompanha esse trabalho. Eu, por outro lado... — Ele olhou para Asher com um olhar irônico. — Digamos que há muitas vezes quando fica tão pesado que preciso sair para respirar também. Ou rolar, conforme o caso. Asher riu. — Você está bem, pelo que vi hoje à noite. Michael deu um aceno de desdém. — De qualquer forma, essa não foi a razão pela qual vim para cá. Só queria te agradecer. Por ajudar Naomi. Ela é a pessoa mais leal e altruísta que conheço. Impulsiva e impetuosa também, mas provavelmente não preciso te dizer isso. Asher sentiu um sorriso na boca. — Apenas algumas de suas melhores qualidades. Michael assentiu. — Minha amiga é independente como o inferno, mas isso não significa que não precise de alguém para se apoiar de vez em quando. — Ela tem você, — Asher apontou. — Não do que estou falando. Acho que o que estou perguntando é, ela tem você agora também? Ele não sabia como responder isso. Parte dele queria tranquilizar o homem que amava Naomi como um irmão que nada jamais aconteceria com ela enquanto Asher estivesse respirando. Mas não sabia como poderia fazer essa promessa quando não tinha o direito de se sentir tão protetor com ela, tão possessivo. — Vou mantê-la segura, — ele jurou solenemente. Mesmo que isso significasse mantê-la longe de si mesmo.
Capítulo 17 Eles dirigiram por quase uma hora em um desconfortável e tenso silêncio antes de Asher finalmente falar. — Vamos precisar abastecer antes de voltarmos para o rancho. Ele gesticulou para um posto de gasolina pouco iluminado com uma loja de conveniência, o único sinal de civilização que viram por incontáveis quilômetros nesse trecho da rodovia I-15. Quando saíram da estrada deserta e entraram na estação decadente no meio do nada, Naomi pensou em algo que Asher havia lhe dito. — Foi aqui que você conheceu Ned? Ele deu um breve aceno de cabeça e desligou o motor. Um pouco do seu entusiasmo por estar sentada no mesmo local que Asher estivera há quinze anos, foi ofuscado pelo modo como ele mal a respondeu. Na verdade, ele parecia vagamente irritado com a ideia dela saber algo sobre seu passado. Como
se
depois de
tudo
que
compartilharam,
agora
ela
estivesse
ultrapassando um limite. Ele estava se afastando dela emocionalmente, voltando para o ser solitário estoico que conhecera naquela primeira noite no deserto. Achava que não tinha quem culpar a não ser a si mesma pela mudança abrupta nele.
Afinal, foi ela quem tentou fingir que não havia nada entre eles quando pareceu que ele tinha pretendido impedi-la de ver Michael e as crianças. Ela se sentiu encurralada e seus pelos eriçaram. Agora, não sabia ao certo como retirar o que disse. Se é que ele se importava. — Asher... — Não vai demorar muito, — disse ele, saindo do carro. Ela se recostou no velho assento de couro e esperou enquanto ele abastecia. Alguns minutos depois, a tampa do reservatório e ele bateu na janela do lado do motorista. — Eu vou pagar lá dentro, — disse ele através do vidro. — Volto logo. Ela assentiu e observou-o caminhar em direção à estação. A jovem de pé atrás do balcão também o observava. Alta e cheia de curvas em sua blusa decotada e camadas de maquiagem pesada à la showgirl de Vegas, a loira platinada mal escondia seu interesse no macho musculoso andando com uma graça sobrenatural pelo estacionamento vazio. Ela abriu um grande sorriso de flerte quando Asher entrou e se aproximou da caixa registradora. Eles falaram por alguns segundos enquanto ele tirava um dinheiro do bolso de trás e entregava a ela. Naomi não gostou da pontada de possessividade que sentiu ao ver Asher conversando com outra mulher quando ele mal pronunciara uma dúzia de palavras para ela desde que tinham saído da casa de Michael. Frustrada, ela virou a chave na ignição e começou a procurar alguma música no rádio. Não havia muito para escolher, apenas uma antiga estação de country que parecia estar sendo transmitida de dentro de uma lata. — Dane-se — disse ela, desligando o rádio e voltando a olhar para a frente da picape. Asher tinha sumido. E, também, a bela atendente do caixa. O estômago de Naomi afundou, frio e pesado como uma rocha. Onde eles estavam? Ela não queria pensar no motivo dos dois terem desaparecido tão repentinamente, nem queria reconhecer a mágoa e a suspeita que estabeleciam residência em seu peito.
Alguns momentos depois, ela viu a cabeça e os ombros de Asher se acima do topo de uma das bombas. Enquanto ele saía do lugar e se dirigia para a picape, a caixa voltou para trás do balcão ajustando a alça do top. Asher entrou no carro sem dar uma palavra de explicação. Naomi observou-o colocar a picape em marcha e voltar para a estrada. — Tudo bem? Ele assentiu. — Tudo em ordem. Devemos estar de volta ao rancho em menos de vinte minutos. Por mais que doesse ceder ao seu ciúme, Naomi não conseguiria conter suas emoções por muito tempo. Eles só tinham percorrido uns oito quilômetros quando ela olhou para o rosto iluminado pelo painel dele. — Ela era bonita. A garota do posto de gasolina. Ele encolheu os ombros. — Sim. Eu acho que sim. — Foi por isso que você entrou? — Ela tentou parecer casual, despreocupada, mas para seus ouvidos sua voz soava vazia. Ele olhou para ela em questionamento. — Eu te disse, entrei lá para pagar. — Eu sei o que você me disse, Asher. — Ok. — Havia uma pontada de irritação em seu tom. — Então, o que você está perguntando? — Nada. Esquece. Ela olhou pela janela por um bom tempo, sabendo que de fato não tinha o direito de perguntar mais nada. Ele não lhe devia respostas ou explicações. Deus sabia que não lhe devia desculpas. Afinal, ela foi voluntariamente para a cama dele e ele não tinha prometido nada em troca. Ainda assim, doía pensar nele se sentindo atraído por outra mulher. Era mais do que doloroso pensar que ele poderia ter levado aquela atração ainda mais longe – principalmente enquanto ela esperava no carro, do lado de fora. Mas caramba, ela precisava saber. Quando eles finalmente se voltaram para a pista de terra esburacada que levava ao rancho, ela não conseguiu impedir que as palavras saíssem. — Você transou com ela?
Ele a olhou com reprovação. — O quê? Jesus. É isso que você acha? — Transou? — Não. — Ele estacionou a picape e tirou a chave, a mandíbula apertada. Os tendões em seu pescoço eram grossos e firmes como cabos, os ossos angulares de suas bochechas pareceram de alguma forma mais pronunciados, de modo sobrenatural. Mesmo com a pouca luz dentro da cabine, ela pôde ver que os glifos em seus braços e pescoço estavam escuros e pulsantes. — Eu não queria sexo com aquela mulher, Naomi. Eu queria o sangue dela. Talvez devesse ter se sentido aliviada. Ela sabia o que ele era. Entendia que ele tinha que se alimentar. Mas até essas palavras a entalhavam por dentro. — Essa é a verdadeira razão pela qual você entrou... para beber dela? — Sim. — Uma única palavra. Nenhuma entonação em sua voz fria e letal. Ela assentiu com força, e então praticamente se jogou na maçaneta da porta. Não conseguia sair do veículo rápido o bastante, não conseguia se afastar dele o bastante. Caiu no chão poeirento e correu, sem parar até chegar ao cercado onde os cavalos estavam. Asher estava bem atrás dela. — O que está fazendo? — Vá embora, por favor. — Porque está tão chateada? Ela girou na direção oposta dele e avançou mais alguns metros. Ele pareceu se materializar bem à sua frente. — Me diga, Naomi. Por que a ideia de me alimentar de outra mulher te irrita? Ela zombou fragilmente. — Porque aparentemente eu sou uma idiota. Ele balançou a cabeça. — Você sabe que eu sou Raça. Sabe que é da minha natureza... é uma droga de necessidade... que eu tome de hospedeiro de sangue. — Sim, eu sei de tudo isso, — ela retrucou, olhando para o rosto cuidadosamente educado. — Eu sei o que você é e do que precisa.
Os olhos dele brilharam com pequenas faíscas de âmbar. — Então por que está tão decidida a me condenar por isso agora? — Porque eu te amo. — Asher estava bem atrás dela. A confissão saiu em disparada dela. Uma vez liberta, ela sentiu um pouco do peso em seu peito aliviar. Mas nada da dor diminuiu, contudo. — Eu amo você, Asher. E pensar em você com outra mulher... bebendo de alguém... me rasga por dentro. Ele fez uma careta, um rosnado baixo se formando. — Não deveria dizer essas coisas. — Por que não? Porque você não quer ouvir? — Estava fervendo agora, com todas as cartas na mesa diante dele. Nunca se sentiu tão vulnerável em toda a sua vida. — Eu me apaixonei por você, Asher, e isso me mata de medo. As faíscas que iluminavam o olhar dele tinham se liquefeito enquanto ela falava, suas pupilas engolidas pela luz. Quando ele estendeu a mão para tocar em seu rosto, ela viu seus glifos se agitarem em cores vivas. — Vamos entrar agora. Este não é o lugar para o que precisa ser dito. E não é seguro aqui fora para você, principalmente no escuro. Ela balançou a cabeça devagar. — Também não é seguro para mim lá dentro. Porque cada minuto que passamos juntos me faz querer fingir que o resto do mundo – o mundo real – não existe. — Ela se afastou do toque dele, embora fosse difícil negar a si mesma o conforto oferecido. — Estou com tanto medo, Asher. Eu já sei o que é dor, mas nunca dei a ninguém o poder de me machucar como a você. Eu não percebi o que isso significava até esta noite. — A última coisa que eu quero fazer é te machucar. — Ele tocou seu rosto com as mãos e gentilmente a puxou para um beijo. Tenro, sem pressa, de perder o fôlego. — E a única veia que eu quero é a sua. Ela franziu a testa. — Mas você e aquela mulher... — Eu fui até o posto com toda a intenção de me alimentar dela, mas não me alimentei. Não consegui colocar a minha boca em alguém que não era você. — Asher... — Não, — ele disse, balançando a cabeça. — Não olhe para mim com esse tipo de alívio. Porque você está certa. Estar comigo também não é seguro
para você. Porque se eu tomar seu sangue como eu quero, não há como voltar atrás. Eu ficarei ligado a você para sempre, Naomi. Sempre irei te querer, te desejar... sentir fome de você. — Ele respirou fundo e soltou o ar em um palavrão forte e estrangulado. — Inferno, eu vou sentir tudo isso quer eu tenha o seu sangue em mim ou não. Ela engoliu com dificuldade, a garganta seca. — Então tome, Asher. A cara dele fechou ainda mais. — Você não devia dizer isso. Não sabe realmente que tipo de homem eu sou. Eu não tenho a honra que é preciso para lhe recusar. — Então não recuse. — Ela estendeu a mão, acariciando seu rosto bonito. Agora conseguia ver o seu tormento muito claramente. Ele a queria, mas também estava morrendo de fome. Conseguia ver aquela angústia escrita em pelo seu rosto. — Quanto à honra, eu nunca conheci um homem melhor. Um leve sorriso puxou o canto de seus lábios. — Você conhece pelo menos um. Michael. — Não é isso que eu quero dizer. Eu nunca conheci um homem que eu quisesse do jeito que quero você. Ela inclinou a cabeça para o lado e tirou o elástico que segurava cabelo em um rabo de cavalo. Espalhando os fios soltos por cima de um ombro, ela se exibiu ao olhar febril dele. Para as presas afiadas que pareciam se alongar ainda mais quando seu olhar se fixou na artéria pulsante dela. — Ah, porra, — ele murmurou. A respiração dele saía e entrava fazendo ruído quando ele abaixou o rosto para o seu pescoço. A língua estava quente e úmida quando passou por cima de sua carótida. — Eu consigo sentir o seu coração batendo. Juro que sinto nas minhas próprias veias sempre que estou perto de você. Ele
a
lambeu
novamente,
mais
deliberadamente
agora,
uma
provocação, testando o toque da língua sobre seu pulso acelerado. O coração de Naomi socava seu peito, martelando em antecipação à sua mordida. Asher rosnou, um som animal que a fez vibrar do ouvido até a medula. Então ele pressionou a boca aberta na lateral do pescoço dela e afundou as presas profundamente.
— Oh, Deus. — Ela não estava preparada – nem pelo solavanco de dor, nem pela onda de calor que veio inundando em seu rastro. Era tão bom, tão primitivo. Tão poderoso. A excitação floresceu em seu centro, tão repentina quanto um flash e profunda como um vulcão. Ela se arqueou para aumentar o contato, devassa e selvagem. O corpo dele estava firme, a ereção apertando-a em uma forte exigência. Em um suspiro, ela inclinou a cabeça para trás e observou o mar de estrelas acima virar um borrão de um campo de diamantes enquanto se perdia para o prazer de seu calor e sua sede elementar. Cada puxão forte dos lábios e da língua de Asher em sua veia ecoavam em uma pressão sensual e crescente no centro dela. Estava molhada e ofegante, desesperada para senti-lo dentro de si. — Asher, eu não aguento... o prazer é demais. Por favor... Ele grunhiu agudamente contra sua garganta, a língua varrendo as perfurações. Uma sensação de formigamento seguiu quando suas feridas se curaram. Ele estremeceu, e quando seu olhar se elevou para o dela, brilhava com uma devoção que a surpreendeu. — Agora, eu vou te levar para dentro, — ele murmurou, as presas enormes e brilhando à luz das estrelas. Pegou-a nos braços. — Minha doce e deliciosa Narumi. O seu lugar é na minha cama.
Capítulo 18 Ele deveria tê-la deixado ela ir esta noite. Deveria ter ido embora da casa de Michael sozinho e a deixado lá ou a levado para a Ordem no Lago Tahoe ele mesmo para que pudesse cuidar de Slater e Caim e de qualquer outra pessoa que pudesse representar uma ameaça ao bem-estar de Naomi. Qualquer coisa teria sido melhor para ela do que o que tinha acabado de fazer. Mas era tarde demais para críticas ou arrependimentos. O sabor inebriante do sangue de Naomi ainda era o fogo mais doce em sua língua – alimentando cada célula de seu corpo – e não havia como voltar atrás. Bastardo que ele era, não queria levá-la de volta. Asher levou-a para casa, passando por um Sam confuso e seguindo o corredor até o quarto. Ele fechou a porta com um chute e a colocou na cama. — Não vou te dividir com ninguém hoje. Você é minha. Ela sorriu para ele, o rosto preguiçoso de desejo. — Gostei da ideia. Esta noite ela gostava. Nesta noite ele ainda era um homem que ela achava que conhecia, em que acreditava poder confiar. Ele preferiria morrer a matar sua fé nele, mas já
havia feito isso, escondendo a verdade sobre de onde ele veio... e de todos os pecados que cometeu. O medo que Naomi sentia por um assassino como Cain seria dez vezes maior do que sentiria por Asher se ela soubesse. E ela saberia, se ele fosse descuidado o bastante para deixá-la beber seu sangue. Ela veria tudo e saberia que estava se unindo a um monstro. Mas por enquanto, ela o amava. Com seu sangue rugindo nas veias e o vínculo entrelaçado de sua alma à dela, ele sentia sua essência viva e brilhando dentro de si. Ele sabia da bondade e da empatia que era Naomi. Seu prazer, sua dor... agora era tudo dele também. Seu afeto envolveu-o como um abraço caloroso, acendendo seu sangue enquanto despertava um desejo insuportável em seu coração. — Você é tão linda, — murmurou enquanto a despia lentamente, beijando cada centímetro de pele exposta quando tirou sua camisa e abriu o fecho do sutiã rendado. Tirou seu jeans e a calcinha, parando para apreciar a doçura de seu sexo. Estava faminto por ela, e o poder de seu sangue dentro dele intensificava sua fome e necessidade de lhe dar prazer. — Por favor, Asher, — ela sussurrou acaloradamente enquanto ele se despia. — Não me faça esperar. Ele queria se demorar, saborear o presente de seu corpo, embora ela já tivesse lhe dado mais do que o suficiente. Mas pelo vínculo ele sentiu seu desejo roendo tanto quanto o dele e foi demais de suportar até para ele. Quando ele voltou para a cama, ela passou os dedos pelo seu ombro e desceu pelo braço para pegar sua mão. Ela a colocou entre as pernas e se moveu, sem inibições em seus movimentos ou no olhar febril que fixou nele enquanto ele a acariciava e sondava seu canal apertado com os dedos. Ela suspirou e gemeu, seu corpinho magro torcendo em uma agonia prazerosa. Ele a olhou com uma fome crua. Pensar que era sua – mesmo quando sabia no fundo da sua alma que ele nunca seria digno dela – o fez se sentir
como um rei. Como um deus, principalmente quando seus olhos estavam presos nos dele com um desejo que o surpreendia. — Tão linda, — ele proferiu, a garganta apertada pela profundidade de seus sentimentos. Os mamilos apertados e castanhos fizeram sua boca salivar e ele não conseguiu resistir a descer a cabeça e fechar os dentes em um deles, suas presas marcando a pele atrás de mais um gosto de sangue. Ela ofegou seu nome, a espinha curvando-se em seu abraço. — Você tem gosto de paraíso, — ele murmurou no mamilo enquanto lambia a pequena corrente que fluía sobre a língua, o cheiro de sua pele e o cheiro ainda mais doce de seu sangue de Companheira de Raça levando-o à uma necessidade que beirava a loucura. — Asher... Sua expressão ia além do prazer, além do desejo, enquanto ele acariciava seu sexo e puxava seu seio com os dentes e a língua. A excitação dele também era um carretel apertado. O vínculo lhe daria todas as suas emoções mais intensas – suas mais profundas alegrias e êxtases, seus medos mais terríveis e suas dores mais agudas. Tão espantoso como era sentir o desejo dela por ele, e sua resposta desinibida ao seu corpo e seu toque, o pensamento de experimentar a angústia ou desconforto de Naomi era uma tortura por si só. Se dependesse dele, ela nunca conheceria nada que não fosse felicidade. E se isso significava mantêla em sua cama pelo resto de seus dias e noites, não conseguia pensar em nada que fosse gostar mais. Um rosnado saiu dele nos calcanhares daquela promessa silenciosa. Selando o pequeno fluxo de sangue que escorria em sua língua, ele se colocou sobre ela e se posicionou entre as coxas separadas. Ela estava molhada e pronta para ele, seu quadril subindo para se encontrar com o dele. Ambos gemeram com a intensidade de sua união. Asher ao se movimentar nela, cada célula em seu corpo em chamas com a necessidade de reivindicá-la, de ficar com ela... amá-la para sempre como sua companheira. Quando estava se movendo dentro dela, era fácil negar todas as outras coisas que estava sentindo. O medo de perdê-la para alguém como Slater ou
seus homens. A incerteza de seu futuro, mesmo que ele fosse neutralizar essa ameaça, e a dor que seria forçado a suportar se Naomi descobrisse que se entregou a um monstro. Nunca tinha se achado um covarde até o momento. Mas quando persuadiu o corpo dela a uma liberação que a deixou arranhando seus ombros e gritando seu nome em êxtase, ele entendeu o quão fraco realmente era. Porque aquela mulher o possuía com cada respiração ávida e suspiro de prazer, com cada batida poderosa de seu coração. Asher a observou lhe entregar tudo. Sentiu em sua medula, através do vínculo que ele não tinha o direito de formar com ela. Que Deus o ajudasse, mas era fácil fingir que era um homem melhor quando Naomi se contorcia e desmoronava em seus braços. Era fácil negar sua profunda desonra por ter cedido às suas próprias necessidades e desejos egoístas com ela... e a culpa de não conseguir se arrepender.
Capítulo 19 Naomi saiu do chuveiro na manhã seguinte, sentindo-se diferente de muitas maneiras – mais forte, mais descansada, cada fibra de seu ser vibrando com a lembrança da incrível paixão de Asher na noite passada. E sua mordida. Ela gemeu só de pensar em como era bom ter sua boca nela assim, as presas perfurando a carne flexível de seu pescoço. Agora que ela sabia o que era se entregar à fome dele, um desejo mais profundo começava a tomar forma dentro dela também. Ela queria prová-lo. Queria beber de sua veia e sentir o mesmo tipo de vínculo que ele havia descrito depois de se satisfazer com ela. Ela queria sentir seu vínculo. Ficou apavorada com o quanto queria isso, mesmo sabendo que não haveria volta. Um futuro com Asher. Como sua companheira de sangue. Sua companheira Raça. Embrulhando uma toalha em volta de si, ela ficou na frente do espelho do banheiro e olhou para o seu reflexo. Inclinou a cabeça e, pela primeira vez em sua vida, estudou o pequeno e vermelho símbolo debaixo do queixo com
algo diferente de aborrecimento ou ressentimento. Passou vinte e seis anos tentando fingir que o selo de lágrima e lua crescente em sua pele não era nada mais do que uma marca de nascença, algo a ser ignorado. Agora, não conseguia vê-lo sem pensar em Asher e no mundo incrível e apaixonado que se abria para ela desde que ele entrou em sua vida. Ela alisou os dedos sobre a veia que pulsava logo abaixo da orelha, incapaz de conter o largo sorriso que se espalhou por seu rosto. Ela o amava. Ele não disse as mesmas palavras com exatidão, mas disse outras coisas. Coisas tenras. Coisas possessivas. E durante todo o tempo seu olhar derretido a tinha queimado com sua intensidade e sua crua honestidade. Deus, ela estava perdida. Mais e mais desde que conhecera Asher, ela se permitia imaginar lugares luminosos em seu futuro, lugares que teriam muito espaço para as crianças e Michael, mas sempre com Asher no centro. Surpreendeu-a perceber o quanto ansiava profundamente por essas coisas, e que a outra força propulsora de sua vida—vingar-se de Leo Slater—tinha começado a ficar em segundo plano em relação a esta outra. Esperança. — Você é uma idiota apaixonada, — disse ao seu reflexo exultante, mas nem isso diminuiu o olhar feliz em seu rosto. Ela balançou a cabeça e terminou de se secar, depois correu para se vestir para poder encontrar Asher e talvez persuadi-lo a ajudá-la a tirar a roupa depois que fizesse chá e encontrasse algo para comer. Estava penteando os cabelos úmidos quando seu telefone tocou. Pegou-o de cima da escrivaninha e franziu a testa para o número privado mostrado no visor. Não havia muita gente que soubesse seu número; Michael e as crianças, basicamente. Instantaneamente, seus pensamentos se inclinaram em direção a Slater, mas ela não conseguia imaginar como ele saberia como chegar até ela. Ainda assim, seu dedo hesitou por um segundo sobre a tela antes de decidir atender. — Alô?
— Oi, — uma voz feminina respondeu. — Naomi, aqui é Sheila, do escritório do Dr. Davis. — Ah. Claro, é claro. — Naomi soltou a respiração reprimida quando percebeu que era apenas a assistente do médico da clínica de baixo custo onde eles levavam as crianças. — Está tudo bem? — Sim, tudo bem. Nós, ah, tivemos uma consulta com Tyler hoje para fazer o check-up da asma. — Ok. — Naomi se lembrava vagamente do compromisso, mas geralmente era Michael quem acompanhava essas coisas e fazia com que todos chegassem onde deveriam. — Poso ajudar em alguma coisa? — Bem, eu estava só me perguntando... Tyler está esperando que alguém venha buscá-lo há mais de uma hora, então eu não sabia se você... — Só um segundo, — Naomi falou. — Michael não o levou para a consulta? — Sim, ele o trouxe. Mas Tyler me disse que Michael o deixou porque tinha que ir ao banco e fazer outras coisas antes de voltar para buscá-lo. Como eu disse, já faz um bom tempo desde que terminamos com Tyler e o pobre rapazinho está ficando um pouco ansioso para que alguém venha buscá-lo. — Eu posso imaginar, — Naomi murmurou, uma sensação de desconforto rastejando sobre ela. — Você já tentou ligar para Michael? — Sim. Já ligamos para ele várias vezes, mas o telefone dele vai direto para o correio de voz. Naomi apertou a base do nariz. — Ok, eu também vou tentar. Não estou na cidade agora, mas posso chegar em cerca de uma hora. Tyler pode esperar aí mais tempo? — Ele é bem-vindo para ficar o tempo que for necessário, — disse a assistente. — Tenho certeza de que ele ficará aliviado ao saber que conseguimos encontrar alguém. — Claro. Por favor, diga a ele para não se preocupar. Quando ela terminou a ligação, Asher apareceu na porta aberta do quarto. — Qual o problema? — Não tenho certeza. Talvez nada. Ele balançou a cabeça. — Não parece ser nada para mim.
Ela sabia a que ele estava se referindo – o vínculo de sangue que evidentemente o alertara para a preocupação que já formava uma bola gelada em seu estômago. — Um dos meninos, Tyler, está esperando Michael buscálo na clínica médica da cidade. Está sentado lá há mais de uma hora. Asher franziu a testa. — Não me parece do feitio de Michael largar uma criança assim. — Não. Não é. Ele disse a Tyler que tinha que ir ao banco e fazer outras coisas. — Ela digitou o número de Michael no telefone e balançou a cabeça quando a ligação foi diretamente para a caixa postal. — Asher, eu preciso da picape. Um olhar sombrio apareceu em seus traços. — Não é uma boa ideia, Naomi. Não quando eu não posso ir com você. Não estou gostando disso. Ela foi até ele e pressionou a palma da mão na lateral da mandíbula tensa. — Eu sei que não, mas eu não posso deixar o garotinho esperando sozinho. Ele já foi abandonado pelas pessoas em que confiava na vida curta que teve. Eu não vou ser uma delas. Ela não precisava do benefício de uma ligação de sangue para saber que Asher estava a dois segundos de recusar. Não que ele tivesse muita escolha. A picape era dele, mas ela sabia que ele não poderia negar o uso dela quando se tratava de uma das crianças. — Não há com o que se preocupar, — ela prometeu. — Michael se distrai às vezes. Ele provavelmente está tentando fazer dez coisas ao mesmo tempo e acabe chegando à clínica na mesma hora que eu. De qualquer forma, não é como se fosse o meio da noite... — Não, — Asher murmurou. — É o meio da manhã, quando não posso passar mais de dez minutos fora dessas quatro paredes sem incinerar. — Eu vou ficar bem. — Ela ficou na ponta dos pés e beijou-o, fixando em seu olhar duvidoso. — Ligo para você no caminho, e assim que tiver notícias de Michael e ter certeza de que Tyler está seguro, voltarei para casa. A luz em seus olhos mudou quando ela disse essa palavra, casa. Seu rosto severo se suavizou, embora apenas marginalmente. Ele enfiou os dedos em seus cabelos e a trouxe de volta para outro beijo, sem pressa e de língua. — Você liga assim que chegar à cidade.
— Ligo sim. Ela pegou o telefone e as chaves do velho Chevy e saiu correndo pela porta. Várias vezes durante a viagem de uma hora até Las Vegas, ela ligou para o celular de Michael, mas só caía no correio de voz. Cada ligação não atendida fazia sua preocupação se tornar cada vez mais gélida, chegando à uma preocupação real de que alguma coisa estava errada com o pagamento de Moda. Ou, pior, que Michael estivesse com problemas. Não havia sinal da van dele no estacionamento da clínica quando ela chegou. Assim que entrou na clínica, ela foi recebida por um Tyler aflito, jogado em uma das cadeiras da sala de espera com lágrimas escorrendo pelas bochechas sardentas. — Ei, amigo, — disse ela, correndo para ele e se agachando à sua frente dele para bagunçar seu cabelo ruivo. — Sinto muito que você teve que esperar tanto tempo. Tudo bem com você? Seu rostinho doce estava contraído, o nariz inchado de tanto chorar. — Cadê o Michael? — Ele provavelmente ficou preso em algum lugar que foi. Não tenho certeza, mas vamos encontrá-lo. Tyler franziu a testa. — Eu pensei que vocês tinham se esquecido de mim. — Nunca, — ela o assegurou com sinceridade, sacudindo a cabeça. — Jamais. Está me ouvindo? Ele assentiu rigidamente e ela pegou sua mão quando ele ficou de pé. Com um aceno para Sheila atrás da janela de vidro da recepção, ela pegou sua carga fungando e o levou para o estacionamento quase vazio. — Essa não é a caminhonete do Asher? — Tyler perguntou enquanto ela o ajudava a subir no lado do passageiro. — Sim. — Onde ele está? — Ele voltou para o rancho, querido. Ele queria vir te pegar comigo, mas precisou ficar lá.
— Porque ele é Raça, certo? Ela assentiu, impressionada com a facilidade com que o menino havia aceitado Asher como parte de sua tribo improvisada. Ver todos eles juntos na casa de Michael havia lhe dado um vislumbre do que era uma verdadeira família. Sua família, não aquela em que nasceu, mas a que queria desesperadamente ter pelo resto de sua vida. Ela passou a mão pela cabeça do menino. — Cinto de segurança, ok? Vamos para casa agora. Tão discretamente quanto podia, tentou o número de Michael novamente quando se acomodou ao volante. Sem sorte. Droga, onde ele estava? Ela levou outro segundo para falar com Asher, tomando cuidado para manter a preocupação longe da voz para que Tyler não detectasse o pânico que estava começando a deslizar pelas suas veias. Mas Asher sabia. Sua voz foi gentil e tranquilizadora, dizendo que ele havia checado as notícias em busca de relatos de acidentes e problemas de trânsito, mas que não tinha encontrado motivo para preocupação. — Obrigada, — ela murmurou. — Eu te ligo quando chegar em casa. Durante o trajeto até o outro lado da cidade, ela manteve Tyler ocupado com perguntas sobre a escola e o dever de casa e sobre o que ele iria querer para o jantar. Eles caíram em uma conversa familiar e fácil até dobrarem a esquina da rua que levava à casa de Michael. E então o coração de Naomi se apertou atrás do esterno. A van de Michael estava estacionada na entrada da garagem. O que em qualquer outro dia poderia parecer normal, mas naquele momento pareceu muito, muito errado. — Mas que diabos? — Tyler deixou escapar, enviando-lhe um olhar confuso. — Você quis dizer que ele estava em casa esse tempo todo? — Eu não sei, querido. — Naomi estacionou ao lado do veículo, incapaz de abalar o frio profundo que se espalhava por ela. — Por que você não fica aqui e me deixa falar com ele primeiro, ok? Para seu alívio, o menino não discutiu. Naomi saiu da picape e deixou a porta enferrujada se fechar com um rangido.
Quando entrou pela porta da frente destrancada, lembrou vagamente que havia prometido ligar para Asher quando chegasse. Mas seus pés se moviam por conta própria, levando-a para dentro da casa silenciosa. Deus, estava quieto demais. — Olá? Michael? Alguém em casa? Não era incomum as crianças se dispersarem e fazerem as suas próprias coisas durante o dia. Havia escola para alguns, enquanto outros eram ou muito jovens ou muito rebeldes para comparecer com o tipo de regularidade que precisavam. Parte do acordo com as crianças que entravam e saíam de casa era que só ficassem porque queriam. Para a maioria, isso significava ter um lugar para ir quando a noite caísse ou quando o deserto ficava muito frio, ou muito quente, para se sobreviver por muito tempo do lado de fora. Deixá-los ter sua liberdade fazia parte da equação, não importava o quanto fosse difícil para Michael e ela aderirem ao acordo às vezes. Agora, Naomi não conseguia pensar em nada que quisesse mais do que ouvir um bando de jovens adolescentes e outras crianças correrem pela casa, de preferência com Michael logo atrás deles, ou convocando todos para a cozinha para uma refeição. Qualquer coisa, menos o silêncio de sepultura que a rodeava enquanto ela adentrava mais. — Michael? Ela se dirigiu para o quarto no final do corredor. A porta estava parcialmente aberta – aberta o suficiente para que visse a cadeira de rodas vazia do lado de dentro. — Michael... Seus passos desaceleraram quando se aproximou, sua mente relutante em processar o que todo instinto em seu corpo tentava lhe dizer. Algo ruim aconteceu. Algo horrível. Ela entrou no quarto e olhou para o chão ao lado da cama. As pernas dele estavam em um ângulo estranho, como se ele tivesse caído de sua cadeira de rodas para dentro do guarda-roupa aberto. Então ela viu seu rosto azul e sem vida... e o cinto de couro apertado firmemente ao redor do pescoço dele. Seu coração despencou.
Não. Oh Deus, não. Tropeçou um passo para trás. E gritou.
Capítulo 20 A ociosidade de esperar e pensar estava enlouquecendo ele, então, em um impulso de atividade, Asher montou a nova cabeceira do quarto principal. Nunca ficaria do seu gosto, e já que precisava de algo para fazer com as mãos, decidiu impulsivamente dar uma utilidade à maldita coisa. Tinha acabado de se afastar para olhar a peça esculpida à mão quando uma lâmina invisível mergulhou em seu peito. Ele cambaleou para trás nos calcanhares, perplexo por um momento, incerto de onde o ataque tinha vindo. E então ele soube. Com uma certeza cortante, percebeu que a dor que estava sentindo era dela. De Naomi — Não. — Um grito irregular subiu para estrangulá-lo. — Não! O choque e a tristeza que ela vivenciava o rasgaram como aço serrilhado, tão agonizante que quase o derrubou de joelhos. Mas ela estava viva. Graças a Deus por isso, ela ainda estava viva e respirando. Ele podia sentir sua energia em suas veias, dizendo-lhe que sua conexão não tinha sido cortada por algo tão impensável quanto a morte dela.
Mas ela estava sofrendo profundamente. Não por causa de ferimentos físicos, mas por uma perda que mal podia suportar. Ela já deveria ter ligado. Já deveria estar na casa de Michael há alguns minutos pela estimativa de Asher. Com o corpo ainda preso por sua angústia, ele procurou o telefone e ligou para ela. — Asher. — Sua voz saiu forçada, quase um sussurro. Um soluço saiu dela. — Meu Deus... Asher, ele está morto. Michael está morto. — Ah, Cristo. — Ele engoliu em seco, odiando não estar lá com ela. — Você está bem? Diga-me o que aconteceu. Ela explicou como o encontrou alguns minutos atrás, morto de um aparente suicídio. Ela disse que estava do lado de fora da casa esperando pela polícia, com quem ela tinha acabado de falar um segundo antes dele ligar. — Ele não se matou, Asher. Slater está por trás disso. — Sim. — Ele olhou para a hora em seu telefone e sentiu vontade de rugir sua fúria. Levaria várias horas até o pôr do sol. A mulher que adorava estava a oitenta quilômetros de distância e ele não podia fazer nada para ajudá-la. Nada para salvá-la, se o perigo que encontrou Michael fosse focar nela em seguida. Pelo menos poderia ter certeza de que não foi Cain quem matou o amigo dela. Aquele bastardo letal seria tão afetado quanto Asher pela luz ultravioleta. Mas sem Asher para nivelar as probabilidades, até um humano vindo atrás de Naomi era um risco que ele não podia correr. — Você tem que sair daí, querida. Agora mesmo. Venha para casa, Naomi. — Eu-eu vou assim que conseguir, — disse ela, sua voz quase abafada pelo crescente ruído de sirenes. — Eu contei a Tyler o que aconteceu e ele está com medo de que a polícia leve ele e as outras crianças para um orfanato. — Jesus, — Asher assobiou. — Diga para ele nunca vamos deixar isso acontecer.
Ele ouviu o vacilo curto em sua voz. — Eu vou. Eu vou dizer isso a ele, Asher. Ok, é a polícia chegando agora. Eles estão indo até a entrada da garagem, e Tyler está esperando no... — Sua voz foi interrompida por um suspiro. — Ah não. Tyler acabou de ver a polícia e fugiu. Tyler! — Naomi, me diga o que está acontecendo aí. Ele ouviu sua respiração mudar quando ela começou a andar rapidamente para se encontrar com a polícia. — Eu tenho que ir. Eu te ligo assim que puder. Escutou o barulho de portas de carros se fechando e oficiais falando com ela no segundo antes dela terminar a ligação. Tirou o telefone da orelha e olhou para ele com os olhos ardentes. O medo agarrou-o, mas desta vez a emoção não era de Naomi... era a sua. Nunca se sentiu tão impotente, ele, o assassino incontrolável que não temia nada, não perdia nada – não amava nada – durante todo o começo de sua brutal existência. Agora não podia fazer nada além de esperar. E se preocupar. E rezar para que a mulher que amava não tivesse sido arrancada dele antes que tivesse a chance de dizer o quanto ela significava para ele. Segurou seu telefone em um aperto esmagador, mas sabia que não poderia cortar a única linha de comunicação que ele tinha com Naomi. Então, em um berro que sacudiu as quatro paredes de sua prisão diurna, Asher puxou o braço e atirou o punho no centro da cabeceira que tinha feito, estilhaçando a madeira em mil cacos irregulares. ### Naomi se escorou na picape de Asher e respondeu a todas as perguntas que a polícia e os socorristas fizeram a ela. Não, ela não estava em casa quando o falecido tirou a vida. Não, ela não tinha conhecimento de abuso de drogas, problemas financeiros ou qualquer outra causa que pudesse ter levado seu melhor amigo
e colega de quarto a apertar um cinto no pescoço e se estrangular lentamente com ele. Não, ela não sabia de nenhum outro membro da família que deveria ser contatado sobre a morte de Michael. Só havia ela. E o grupo de crianças órfãs que se sentiriam tão destruídas quanto ela, ao saber que uma das pessoas mais gentis e mais compassivas da Terra estava subitamente, inconcebivelmente perdida. — Quantas crianças iam e vinham da casa do Sr. Carson regularmente, Sra. Fallon, e qual seria a faixa etária delas? — Como é? A funcionária da JUSTIS, o departamento de aplicação da lei composto de oficiais humanos e Raça, deu-lhe um olhar de desculpas. — Eu sei que algumas dessas perguntas são difíceis, mas estou apenas tentando estabelecer o possível estado mental do Sr. Carson em suas últimas horas. Ele poderia estar guardando algum segredo ou possível culpa com relação a qualquer uma das crianças que ele convidou para ficar em sua casa? — Você não pode estar falando sério. — Naomi ficou boquiaberta, fumegando. — Não. Claro que não. Michael foi a única coisa boa que aconteceu nas vidas de merda que essas crianças levavam. A oficial levantou o ombro. — Só estou tentando cobrir todas as possibilidades. — Bem, considere todas as possibilidades cobertas, — Naomi estalou. — Terminamos por aqui. Seu olhar foi para o meio-fio, onde o saco preto com zíper com o corpo do seu amigo estava sendo carregado de uma maca para uma ambulância que aguardava. — Aqui está o meu número, — disse a oficial JUSTIS, entregando-lhe um cartão com seu nome. — Se pensar em mais algo que devamos saber, me ligue. Naomi enfiou o cartão da oficial Rachel Reynolds no bolso sem olhar para ele. Nunca iria usá-lo.
Não disse a policial que já sabia o que aconteceu com seu amigo. Que Slater ou seus capangas tinham ido atrás de Michael e encenado seu assassinato para parecer um suicídio. Não sabia como, mas sabia o porquê. Se alguém estava abrigando uma insuportável culpa ou segredos, esse alguém era ela. E agora, por sua causa, seu melhor amigo estava morto. Por que tinha deixado Michael convencê-la a deixá-lo fazer parte do último trabalho? Ele tinha sido tão inflexível, mas ela poderia ter recusado. Droga, era o que deveria ter feito. Quanto a compartilhar o que sabia sobre sua morte com a força policial, embora pudesse desencadear uma investigação sobre as atividades criminosas de Slater, ela não acreditava que ele seria obrigado a pagar pelo que fizera com Michael. Assim como nunca pagou pelo que fez com a mãe dela. Homens como Slater eram intocáveis. Por que ela não tinha aceitado esse fato antes que custasse a vida de Michael seria um fardo que nunca seria capaz de se tirar das costas. Naomi entrou na picape e ligou o motor. Quando saiu da garagem e entrou na rua, a dor a inundou. Era profunda demais para lágrimas, o choque envolvendo-a em um casulo que parecia entorpecê-la de dentro para fora. Tudo o que queria fazer era se deitar em posição fetal e chorar por uma semana, mas tinha coisas que precisava fazer. A prioridade número um seria localizar Tyler e as outras crianças antes que elas se dispersassem aos quatro ventos por medo de serem levadas a algum lugar por estranhos. E depois precisava voltar para o rancho. De volta para casa com Asher. Ele saberia o que fazer. Ele seria capaz de ajudá-la a encontrar as crianças. Eles poderiam voltar para a cidade hoje à noite assim que escurecesse e começar a procurar até encontrarem todos. Ela não dirigiu nem dois blocos quando seu telefone tocou com um toque familiar. O toque de Michael.
Por um instante, enquanto se apressava para retirar o aparelho do bolso de trás e ver o número dele na tela, pensou ter imaginado todo aquele dia horrível. Mas a realidade gelada se instalou com a mesma rapidez quando ela levou o telefone ao ouvido e ouviu uma voz ameaçadora e abafada do outro lado da linha. Uma que ela só ouvia em seus pesadelos desde os oito anos de idade. — Olá, Naomi. Ou eu deveria dizer Narumi? — Ela sentiu o sangue sair de seu rosto com o jeito que ele falou seu nome, cheio de um divertimento sinistro. — Que pena o que aconteceu com seu amigo. Suicídio é uma coisa tão feia. — Você fez isso. — Não havia necessidade de fingir que ela não estava ciente da maldade de Leo Slater. — Seu bastardo sádico, você o matou. Uma risada baixa enviou um arrepio pelos seus ossos. — Não, minha querida. Foi você. Ela dificilmente poderia negar a parte que lhe cabia em tudo. A culpa tomou conta dela em uma maré negra, e ela fez de tudo para evitar que seu soluço a sufocasse. — Continue falando, Slater. Vou levar tudo o que sei sobre você diretamente para a polícia. Incluindo o que você fez com a minha mãe. — Não, Narumi, você não vai. — Ele parecia tão confiante, que ela sentiu vontade de gritar. — Você não vai, porque se pretendesse fazer isso, ainda estaria falando com os policiais estacionados na garagem do seu amigo aleijado. Ela sorveu o ar. Ele estava perto o suficiente para vê-la? Ainda estaria espreitando em algum lugar da estrada? Seu olhar disparou para o retrovisor e espelhos laterais, tomando nota dos vários veículos que a rodeavam. Ele poderia estar em qualquer lugar, seguindo-a sozinho ou acompanhado por qualquer um de seus lacaios. — O que você quer? — Perguntou, sabendo que não havia nada que ele pudesse tirar dela agora que significasse mais do que já tinha perdido. — Tenho certeza que você sabe o que eu quero. Meu dinheiro. Tudo. Ela engoliu em seco, sacudindo a cabeça enquanto olhava para a estrada iluminada pelo sol e para as placas espalhafatosas que flanqueavam
a Strip. — Se era isso que queria, então não deveria ter matado Michael. O dinheiro está na conta bancária dele. Eu não posso tirá-lo. — Ache um jeito, Narumi. E eu também quero o resto. Pela minha contabilidade, você me deve mais duzentos e trinta e sete mil dólares a mais do que você e seu amigo me roubaram na outra noite. Ela zombou, mas seu coração estava acelerado de medo. — Eu não faço ideia do que você está falando. Ele exalou, um som forte e impaciente. — Você pode ter me enganado bem debaixo da porra do meu nariz, mas não me tome por um tolo. Eu chequei o vídeo dos meus cassinos nos últimos meses. Não sei como você fez e não me importo. Eu quero meu dinheiro de volta. Cada. Porra. De. Centavo. Ele estava pedindo o impossível – mais do que o impossível– e ela nem por um minuto achou que ele não sabia disso. Ela gastou mais da metade do dinheiro dele nas crianças e ajudando Michael a administrar o abrigo. Esse dinheiro foi para comida, roupas, inúmeras outras necessidades. Quanto ao pouco que ela fazia servindo mesas aqui e ali ou fazendo qualquer outro bico, não faria a menor diferença no que lhe devia e, além disso, o que recebia de extra praticamente acabava antes mesmo que entrasse em casa. — Eu não tenho todo o seu dinheiro para lhe devolver. — Então encontre um modo de conseguir. Tudo, — ele disse novamente, a ameaça na calma da sua voz de víbora. — Ou vai me forçar a lhe tirar outra coisa caso falhe. A linha morreu. O fôlego de Naomi a deixou, parte em alívio, parte em pavor paralisado. Ela pouco se importava com o que Slater pudesse fazer com ela em si, mas não queria imaginar até onde ele iria para ferir qualquer outra pessoa que ela amava. Suas mãos tremiam tanto que ela teve que encostar. Ela ficou parada em uma zona de carregamento por vários minutos, até que um caminhão tocou sua buzina e quase a matou de susto. Deus, o que foi que ela fez? Nos últimos dezoito anos de sua vida, ela viveu com o único propósito de se vingar de Leo Slater. Fazendo-o pagar por ferir sua mãe, por levá-la embora e destruir tudo o que Naomi tinha.
Há quase dois anos, ela vinha roubando o monstro de seu passado. Cortando-o onde lhe doeria, no único lugar que um homem como Slater era capaz de sangrar. Mas mesmo quando tomava o dinheiro dele, cada uma daquelas pequenas vitórias parecia vazia. É por isso que ela tinha continuado roubando mais e mais e mais. Agora, a única que tinha perdido era ela. E mesmo que tivesse a chance de tirar o último centavo das fortunas de Slater – mesmo que tivesse a certeza de que um dia poderia destruí-lo completamente antes de apunhalar seu coração negro – ela sabia que aquilo também seria um triunfo vazio. Simplificando, Leo Slater não importava. O custo de sua vingança já foi alto demais. Ela só queria que acabasse. Se pudesse, entregaria todo o seu maldito dinheiro agora, exatamente como ele exigiu. Mas não tinha acesso à conta bancária pessoal de Michael, nem tinha os mais de duzentos mil que tirou dos cassinos de Slater ao longo do tempo. Mas tinha alguns. E nunca poderia gastá-lo de qualquer maneira, sabendo que cada centavo que tirava de Slater agora estava manchado com o sangue de Michael. Entorpecida e estremecida de lágrimas que ela se recusava a deixar vazar, ela olhou para o telefone e digitou um dos números armazenados no aparelho. Uma voz alegre respondeu. — Anytime Private Vaults, posso ajudar? — Sim, — disse Naomi. — Eu preciso esvaziar meu cofre.
Capítulo 21 Menos de uma hora depois, Naomi entrou no Casino Moda carregando uma sacola de lembranças de Las Vegas cheia de dinheiro com oitenta e sete mil dólares em notas grandes. Tudo o que havia sobrado de todos os seus repetidos sucessos nos cassinos de Leo Slater. Asher ligou para ela várias vezes desde que tinha saído da casa de Michael, mas ainda não podia falar com ele. Ela se sentia horrível por silenciar o telefone, mas sabia o que ele diria se dissesse que estava indo entregar a Slater o que ele pedia. Ou, em parte, pelo menos. Esperava que o dinheiro que tinha para lhe dar o apaziguasse o suficiente para que recuasse e não machucasse mais ninguém próximo a ela. Se tivesse que trabalhar o resto dos seus dias para ganhar de volta o restante do que lhe devia, estava totalmente preparada para fazê-lo. Só queria que ele saísse de sua vida agora e para sempre. Só queria ser capaz de chorar por Michael e levar Tyler, Penny e o resto das crianças para casa e nunca deixá-los partir. Esses planos a fortificaram enquanto marchava pelo cassino em direção ao elevador central de vidro que a levaria aos escritórios executivos no
último andar. Seu dedo só tremeu um pouco quando apertou o botão no painel e esperou o elevador. Alguém estava descendo. Quando o elevador parou suavemente no nível do saguão, ela se viu encarando o rosto de um homem que nunca tinha visto antes. Um homem de cabelos escuros com olhos prateados que nunca confundiria com um ser humano. O maciço macho Raça que saiu do elevador era tão alto quanto Asher, e constituído da mesma solidez debaixo da camisa branca de abotoar e da calça social que se esticavam sobre seu físico musculoso. No V aberto do colarinho da camisa, um elaborado emaranhado de dermaglifos enrolava-se e contorcia no pescoço. Todos os instintos em seu corpo lhe diziam que aquele não era apenas um macho Raça, mas o assassino treinado que Asher havia lhe advertido estava na folha de pagamento de Slater. Cain. Aqueles olhos prateados perspicazes de predador olharam para a sacola em suas mãos e voltaram para ela em suspeita. — Onde diabos pensa que vai? — Preciso ver Slater. — Ela tentou contorná-lo, mas ele era muito grande. Seu corpo bloqueava as portas do elevador, que se fecharam em um sussurro atrás dele. — Uma droga que vai. O que tem na sacola? Ela sabia que a única coisa que deveria estar sentindo sob o olhar daquele macho ameaçador era medo por sua vida, mas ainda estava muito entorpecida e em choque com a morte de Michael para sentir qualquer coisa que não fosse fúria agora que estava olhando para um dos homens provavelmente responsável por tirar a vida de Michael. — Tenho certeza que sabe por que estou aqui. Para entregar ao seu chefe o que ele exigiu. Seu dinheiro de sangue. Cain balançou a cabeça, a carranca aumentando. — Não posso deixar que faça isso.
— O que vai fazer? — Ela zombou. — Me matar aqui mesmo no saguão do cassino? Ou me levar para algum lugar e me amarrar para fazer parecer que eu me matei do jeito que você e os outros bandidos que trabalham para Slater fizeram com o meu amigo? Os lábios do vampiro se apertaram em um grunhido baixo. — Eu não tive nada a ver com isso. Na verdade, acabei de ficar sabendo por alguns dos homens da equipe de segurança. Ela olhou para ele, amargura em sua voz. — Como se eu fosse acreditar em você? Tenho certeza de que Slater e o resto de vocês, bandidos, estão lá em cima se parabenizando por matar um homem que tinha poucas chances de se defender. Um tendão saltou na bochecha tensa e sinistra de Caim. — Você não poderia estar mais errada, ao menos no que me diz respeito. E nas ocasiões em que matei alguém, nunca precisei de uma desculpa ou motivo para fazer com que parecesse outra coisa. Ela engoliu em seco, vendo um vislumbre da frieza que vivia dentro dele. — Tenho certeza que deve dormir como um bebê sabendo que tem padrões tão elevados. Agora saia do meu caminho e me deixe passar. — Naomi. — Ele fechou a mão em volta do seu pulso como um pedaço de ferro. Seu rosto escureceu, mesmo enquanto sua íris se iluminava com manchas âmbar de irritação. — Se você for até lá, Slater nunca vai te deixar sair. Ao menos, não enquanto ainda estiver respirando. Ela tentou se soltar, mas não havia como. Pela expressão dele, esse tipo de força veio facilmente, sem sequer pensar. — Arrume o que sobrou e saia da cidade o mais rápido possível, — ele disse a ela. — Há muitos lugares para onde pode ir. Como Companheira de Raça, você encontrará um abrigo seguro em qualquer uma das comunidades de Castas deste país ou de qualquer outro. Vá para uma. Fique longe de Las Vegas. Estranho como esse conselho parecia diferente vindo de alguém que não era Asher. No começo, ele insistiu em nada menos do que ela dar o fora da cidade e ficar longe. Por mais que tenha recusado a sugestão, a ideia de
ser afastada de sua cidade e de sua vida aqui era algo que nunca consideraria agora. Principalmente se Cain estivesse sugerindo que também devesse deixar Asher para trás. Ela olhou para baixo, percebendo apenas agora que Cain tinha uma mochila de couro preto a seus pés. — Onde você vai? Ele grunhiu. — Eu não sei. Qualquer lugar que não seja aqui. Passei muito tempo trabalhando para um imundo como Slater. Para mim já deu. Ela franziu a testa, chocada e não muito certa de que pudesse acreditar nele. Mas enquanto ele segurava seu olhar, ela viu sombras profundas em seus frios olhos prateados. Viu o mesmo abismo sombrio e assombrado que ainda vislumbrava nos profundos olhos azuis de Asher às vezes. — Eu vou ajudá-la a chegar a algum lugar seguro, — disse ele, seu tom solene demais para ser uma mentira, mesmo para um assassino como ele. — Você pode vir comigo agora, Naomi. Eu prometo que pode confiar em mim quanto a isso. Talvez ela pudesse, mas não queria o que Cain estava lhe oferecendo. Sua vida estava aqui, e se precisava de um refúgio seguro, tinha Asher. Ela balançou a cabeça e ficou de pé. — Eu não vou a lugar algum. Já estou exatamente onde devo. Cain a estudou, depois exalou uma respiração lenta. — Você está cometendo um erro. — Eu não corro de ninguém, nem mesmo de Slater. Especialmente dele. — Não, — disse ele. — Não estou falando de Slater. Estou falando de Asher. Isso a surpreendeu. Desconfiada do assassino agora, ela levantou o queixo. — Veio me alertar sobre ele? Isso não vale muito vindo de alguém como você. — Como eu? — Aqueles olhos afiados se estreitaram em questão. — Eu sei o que você é. Asher me contou. Você é um assassino de sangue frio. Um assassino treinado.
Cain não disse nada por um bom tempo. — Eu sou todas essas coisas, Naomi. Eu nasci um Hunter. Mas ele também. — O quê? — Agora um frisson de incerteza se arrastou pela sua espinha. Ela conhecia o termo Hunter, mesmo que em sentido amplo. Houve um louco entre os Raça vinte anos atrás que criou um exército de assassinos em seus laboratórios escondido por décadas. Todos garotos, todos do mesmo pai monstruoso usando dúzias de companheiras de raça encarceradas. Os bebês nascidos dentro do laboratório foram escravizados desde o momento em que respiraram pela primeira vez e criados para serem máquinas de matar por Dragos até ele finalmente ser destruído pela Ordem. Cain estava dizendo que ele e Asher faziam parte daquele programa horrível? Se sim, por que Asher não mencionou isso? — Você não sabia. — Ele riu, mas era um som empático, um que dizia que podia até ter pena dela. — Não estou surpreso, considerando o fato dele realmente parecer se importar com você. Nunca pensaria que um bastardo como Asher fosse capaz dessa emoção. A bolsa de dinheiro em seus braços já estava pesada antes, mas agora estava começando a parecer um chumbo. — Me diga o que você sabe. Ele deu uma sacudida áspera de cabeça e começou a passar por ela. — Esqueça. Não cabe a mim. — Agora cabe, — disse ela, segurando a manga da sua camisa. — Droga, me conte o que você sabe sobre Asher. — Você já sabe o pior apenas por falar o nome dele. — Do que está falando? — Uma das doutrinas do programa Hunter era a obediência ao nosso mestre, Dragos. Mas sempre havia alguns que resistiam, garotos obstinados, adolescentes arrogantes... machos adultos que se recusavam a serem dobrados. Dragos acreditava em disciplina. Ele acreditava em dar exemplos para os outros seguirem ou aprenderem. E para ajudá-lo a manter seu controle, ele tinha escravos de mente para nos monitorar, mas também tinha oficiais – outros Hunter que se destacavam em seu treinamento e que podiam ser chamados para aplicar a justiça que julgasse adequada. — O que isso tem a ver com Asher?
Depois da dor que já passou, ela ficou surpresa por ainda ter a capacidade de sentir mais medo ou pavor. Mas ela sentiu. Eles estavam abrindo um abismo nela enquanto esperava que Cain lhe contasse o resto do que sabia. — Todos nós no programa Hunter usávamos coleiras ultravioletas que detonariam se tentássemos fugir ou se resistíssemos ao nosso treinamento. Ou no caso de darmos a Dragos qualquer motivo para nos querer fora. Havia um executor em quem ele mais confiava. Um Hunter dentro do programa que não tinha escrúpulos em pressionar o detonador que inflamaria o anel de luz ultravioleta ao redor do pescoço de um Hunter – o pescoço de um irmão – e o reduziria a pó. Naomi fechou os olhos quando uma onda de compreensão a inundou. — Asher. Cain rosnou. — Havia rumores de que ele gostava tanto de seu papel que tocaria o condenado nos segundos antes de matá-lo. Apenas para saborear sua dor. Para sentir o terror deles enquanto alguns imploravam por misericórdia nos segundos antes que ele os liberasse. Naomi se sentiu enjoada pensando no dom de Asher para recordar – reviver – o pior das memórias de alguém com seu toque. Deus, se isso fosse verdade, isso o tornaria um animal. Pior que um animal, um monstro sádico. Não queria pensar nisso. Parte dela se recusava. Só conhecia Asher há alguns dias, mas não conseguia associar o homem que amava com o assassino frio que Cain estava descrevendo. — Nem posso acreditar que ele esteja usando esse nome depois de todo esse tempo. Ele poderia ter escolhido outro nome assim que foi libertado – todos nós tivemos essa escolha. — Ele deu de ombros. — Inferno, talvez seja um distintivo de orgulho para ele. — Pare. — Naomi balançou a cabeça, sobrecarregada com tudo o que tinha ouvido. Ela queria saber, mas não aguentaria mais. Não agora. Não depois de hoje. — Ele não contou nada disso. — Não era uma pergunta, porque o olhar de choque em seu rosto deve ter sido suficiente para remover qualquer dúvida
de Cain. Daí ele pareceu se tocar de algo. — Ah, Jesus. Você está apaixonada por ele? Parte sua queria negar, mas ela não conseguia forçar as palavras da boca seca. Nem mesmo quando o olhar de aço de Cain a examinava como se ela fosse a maior idiota da Terra. — Vá embora, Naomi. Para longe de Slater. De Asher. De toda essa merda. Faça isso por você mesma... antes que acabe mais arrependida do que eu acho que já está.
Capítulo 22 Mais de uma dúzia de chamadas e o dobro de mensagens de texto e ela ainda não respondia. Asher andava pela casa como um animal em uma jaula, seus glifos se contorcendo por toda sua pele e seus olhos queimando como brasas no crânio. Com as presas enchendo a boca, ele rosnou e amaldiçoou enquanto passava trajando suas vestes de combate no tapete da sala ao mesmo tempo em que Sam o olhava ansiosamente de sua posição próxima. Asher não estava com raiva de Naomi. Todo seu ódio próprio raiva fútil eram direcionados apenas para si mesmo. Nunca deveria ter deixado que ela saísse sozinha. Eles poderiam ter encontrado outra solução para o garoto deixado no consultório – qualquer coisa, menos a que levasse Naomi de volta a Las Vegas sem ele. Mas, mesmo ao pensar nisso, sabia que ela nunca admitiria se esquivar de sua responsabilidade para com uma criança que contava com ela. Inferno, nem mesmo Asher teria sugerido isso. E nada disso teria mudado o fato de que Michael Carson estava morto. Assassinado a sangue frio.
Ele mal conseguia acreditar que o jovem sorridente e bondoso estava morto agora. Asher também se culpou por isso. Deveria saber que Slater não deixaria passar uma perda tão grande em seu cassino. Ele estaria focado em Michael, farejando qualquer motivo que pudesse encontrar para voltar atrás no pagamento ou recuperá-lo antes que estivesse completamente fora de alcance. Matar o vencedor certamente não seria a maneira mais inteligente de fazer isso, mas se Slater pensasse que ele teria outra maneira de colocar as mãos no dinheiro... Porra. Onde diabos ela estava? Ele pegou o telefone novamente e começou a ligar quando ouviu o som de cascalho ao longe. Finalmente. Era pouco depois de meio-dia com o sol brilhando no alto, mas ele não dava a mínima. Quando a velha picape de Ned tocou a estreita faixa de terra à frente, Asher praticamente arrancou a trava da tela na pressa de encontrar Naomi enquanto ela parava em frente de casa. A luz queimou sua visão e a nuvem crescente de poeira amarela se acumulou em sua garganta como cinzas enquanto ele corria para o lado do motorista do veículo e abria a porta. — Graças a Deus você está bem. Estava ficando louco aqui. Ela não respondeu. Ela mal olhou para ele quando desceu do carro e caiu no chão. Ele a trouxe para junto de si, ignorando as agudas picadas dos raios mortais do sol em sua pele exposta. O alívio disparou dentro dele ao segurá-la novamente e em ver por si mesmo que ela ainda estava inteira e sem machucados. — Naomi. — Ele não queria soltá-la, mas ela estava como um pedaço de madeira em seus braços. Sua respiração era superficial, sua expressão em branco. — Baby, você está bem? Ele podia sentir que ela estava – sua ligação com o sangue dela lhe dizia que não foi ferida. Mas ela estava inundada com uma quietude chocada que o destruía por dentro. Ele conhecia aquele olhar. Já havia visto aquele
tipo de dormência antes, em outros Hunter, quando era menino. Sentiu isso depois de completar o primeiro pedido feito por Dragos para que matasse. Um choque e um horror tão profundo que te esvaziavam. Tocá-la agora deu-lhe um solavanco quando uma memória nova e terrível fluiu dela para criar raízes em sua mente e sentidos. A dor e o horror de Naomi quando ela descobriu que seu amigo estava caído em seu quarto, seu rosto quase irreconhecível pela cor horrível e inchaço que o garrote de couro em torno de seu pescoço havia causado. Ele passou as mãos pelo rosto dela, tirando os cabelos lisos de ébano de seus olhos. — O que aconteceu depois que você deixou Michael? Eu tenho ligado e mandado mensagens esse tempo todo. Por que não respondeu? Estava procurando Tyler ou as outras crianças? Ela engoliu em seco e sacudiu a cabeça, o olhar ainda vazio. Como ela conseguiu chegar em casa em estado de choque, ele não tinha ideia e nem queria considerar. Ele olhou para ela e viu algo estranho no chão da cabine da picape. Uma sacola de estilo turístico estampada com um slogan brilhante de Las Vegas. A bolsa estava cheia de dinheiro. Muito dinheiro. Que porra era essa? Ele vasculhou o rosto dela, com o medo subindo pela sua nuca. — Naomi, não. Me diga que você não foi ver Slater... Mas não, ele racionalizou. Se ela tivesse feito isso, não estaria viva e em pé na sua frente agora. Ela piscou aturdida, e franziu a testa. — Você está queimando, Asher. Não pode ficar aqui. Ele sequer sentiu a dor das manchas vermelhas irritadas chiando em seus antebraços e rosto expostos. Todo o seu foco, toda a sua preocupação, estava nela. — Vamos entrar. Agarrando a sacola com uma mão e ela na outra, ele fechou a porta da caminhonete e trouxe Naomi para dentro da casa. Sam imediatamente correu, enchendo-a de um afeto que ela mal parecia notar. — Vamos, — disse Asher, levando-a para a sala e sentando-a no sofá.
Ele colocou a sacola no chão e sentou ao seu lado. Quando seus olhos encontraram os dele novamente, ele sentiu uma retraída que não tinha nada a ver com Michael ou com a provação que passou hoje. Algo mais estava errado ali. Se seus olhos feridos não lhe disseram isso, a pontada de angústia que o perfurou pelo vínculo não deixou dúvidas. — Fale comigo, Naomi. Me fale onde você esteve. — Ele olhou de volta para a sacola cheia de notas de grande valor e praguejou em voz baixa. Tinha que haver dezenas de milhares de dólares dentro daquela sacola. — O que está fazendo com todo esse dinheiro? — Estava saindo da casa de Michael depois de falar com a polícia, — ela murmurou, sua voz soando enferrujada e sem uso. — Eu recebi uma ligação. O número de Michael. Só que não era Michael. — Slater. — Asher praticamente cuspiu o nome. — Ele me disse que quer todo o dinheiro de volta. Não apenas o que Michael e eu tomamos na outra noite. Tudo. Tudo que eu já roubei dele. Asher lembrou da quantia que Cain tinha mencionado. — Você não tem todo esse dinheiro nessa bolsa, — ele disse, com o medo se enrolando dentro de si quando percebeu aonde esta conversa estava indo. — Me diga que não planejou fazer o que Slater pediu. Não está planejando levar esse dinheiro para ele, está? — Não estou planejando, — ela murmurou. — Foi o que eu fiz. Quer dizer, tentei. Ele pulou em pé com uma maldição selvagem. — Puta merda. O que quer dizer com tentou? Ela olhou para ele, uma desolação em sua expressão. — Encontrei alguém que você conhece. Estava para encontrar Slater no Moda e Cain estavam saindo. Se demitindo e deixando a cidade, de acordo com ele. Asher consideraria essa notícia surpreendente depois. No momento, o único detalhe importante era o fato de Naomi evidentemente ter ficado cara a cara com o ex-hunter. — O que mais ele tinha a dizer? — Muitas coisas, Asher. Basicamente o que ele disse foi que eu precisava ter cuidado com você. — Ela olhou para ele, seus olhos macios cor
de xerez deixando-o sem lugar para se esconder. — Ele me contou sobre o seu passado. Sobre o fato de você fazer parte do programa Hunter, tudo. Me alertou que eu deveria sair de Las Vegas e deixar você sem nunca olhar para trás. Seu peito parecia estar sendo aberto por dentro. Ele não precisava saber os detalhes de qualquer outra coisa que Cain tivesse dito a ela. Os detalhes não importavam. Tudo entre eles havia mudado por causa de sua conversa com o outro Hunter. — Por que não me contou? Por que tive que saber por outra pessoa, Asher? Ele deu um passo para longe dela, incapaz de segurar sua expressão acusadora. — Eu não queria que você soubesse. Ela exalou bruscamente. — Acho que é compreensível. Difícil me convencer do fato de que só você pode me proteger de um homem como Slater, ou até mesmo Cain, quando você é mais perigoso do que qualquer um deles. É isso? Você não acha que eu merecia saber? — No começo, não vi razão para contar. E depois... Não demorou muito até que eu tivesse esperança de que você nunca descobrisse. Ela se levantou com as pernas ligeiramente trêmulas, depois se virou para sair do quarto. Asher disse a si mesmo que deveria deixá-la ir. Ela estava certa. Ele era pior que Slater e Cain juntos. As coisas que fez. As mortes que causou sob o comando de Dragos. Dezenas delas, cada uma gravada em sua memória em detalhes totais e vívidos. Se Naomi fosse embora depois de ficar sabendo de tudo isso, não poderia culpar ninguém além de si mesmo. Mas ele não estava pronto para deixá-la partir. Deus, nunca estaria pronto para isso. Movendo-se mais rápido do que seus olhos poderiam rastreá-lo, ele bloqueou seu caminho. — Você merece saber. Por mais que eu desejasse que você nunca tivesse descoberto todas as coisas que eu fiz, eu te devo a verdade. Mesmo que isso te faça me deixar e nunca olhar para trás. — É verdade? Você não foi só parte daquele programa horrível, mas também foi seu executor? Realmente matou garotinhos e homens – seus
irmãos – para Dragos? — Suas perguntas vieram rapidamente, disparadas, uma enxurrada de verdades feias. — Asher, meu Deus. — Sua respiração ficou abrupta quando seu olhar severo o estudou. — Você realmente gostou tanto que usou o seu dom para se deleitar com a dor deles? Então, Cain não tinha poupado sequer um detalhe do seu passado. Não era surpresa. Seus irmãos Hunter tinham muitos motivos para desprezálo, mas Cain estava errado sobre uma coisa. — Não. Eu não gostava do meu dever. Eu odiava cada segundo. Mas fiz porque queria sobreviver... e porque se eu não executasse os pedidos de Dragos, alguém o faria. Ou ele mesmo faria, e eu não desejaria isso a ninguém, muito menos aos meus irmãos. Ele a viu lutando para aceitar o que estava ouvindo dele. Ele a sentiu recuar emocionalmente através de seu vínculo. Mas ela não se afastou dele. Não estava tentando partir e nunca olhar para trás. Ainda não, de qualquer maneira. — Cain disse que você fez questão de tocar os que você... — Ela se interrompeu, fechando os olhos brevemente. — Ele disse que antes de você executar outro Hunter, você usava sua habilidade de Raça para sentir o medo deles enquanto eles imploravam por suas vidas. Ele disse que você queria sentir a agonia deles antes de matá-los. Asher assentiu lentamente. — Isso é verdade, sim. — Oh, meu Deus. — Repulsão vazou através de sua conexão, oleosa e amarga. — Ah Merda. Eu não quis acreditar nele... Ela se sentiu repelida por sua confissão, ele pôde ver na expressão ferida tanto quanto sentir em seu sangue. Ela recuou, mas Asher a pegou pela nuca. — É verdade que coloquei minha mão em todos os Hunters que tive que executar. Eu queria sentir o terror e a angústia deles. — Ele falou acima do seu gemido estrangulado, forçando-a a manter o olhar enquanto ele mostrava as partes mais negras de sua alma. — Eu fiz isso, Naomi, porque nunca queria esquecê-las. Eu queria lembrar de cada rosto, cada par de olhos temerosos ou desafiadores que me fixaram como a última coisa que viram. Eu
nunca quis me esquecer dos irmãos que matei para poder continuar vivendo. Essa foi a minha penitência, nunca esquecer. Ela relaxou em seu aperto frouxo, apenas um pouquinho. Seu corpo caiu com o peso de sua exalação pesada. Quando ela falou, sua voz era quase suave demais para ser ouvida, seus olhos se tornando tenros, quase sentindo pena. — Quantos, Asher? Ele balançou sua cabeça. — Muitos. Eu fui egoísta, mesmo assim. E sem honra. Se eu não tivesse cumprido as ordens de Dragos, eu seria o único a morrer. Me assegurei que quando eu entregasse a morte ela fosse rápida, mesmo quando Dragos pedia sofrimento. — Nem posso imaginar o quanto sua vida foi terrível, — ela murmurou. — As vidas de todos os Hunter. Não, ela não podia. Ele desejava que ninguém fosse capaz de imaginar esse tipo de existência brutal e sombria. Mas ele e Cain não eram os únicos Hunter que andavam pela Terra com memórias daqueles anos e pecados a serem reconciliados. Havia outros. Scythe na Itália agora, junto com Trygg, outro ex-hunter servindo a Ordem por lá. Inúmeros mais espalhados em cada canto do globo nas duas décadas desde que o programa e Dragos foram destruídos. Asher alisou com a ponta do polegar os lábios frouxos de Naomi. — Por mais horrível que fosse a minha vida naquela época, eu não queria morrer. Por muito tempo, eu não sabia por que era importante para eu continuar, continuar vivendo. — Ele acariciou sua bochecha. — Agora eu sei o que estava esperando. Ela chorou baixinho, mas manteve os braços ao lado do corpo, recusando-se a tocá-lo. — Foi injusto da minha parte beber de você antes que soubesse quem eu fui... o que eu fiz. Eu não mereço o seu vínculo e sei que nunca vou ser digno dele. Nunca serei digno do seu amor, se é que ainda não o perdi. — Ele segurou o rosto dela carinhosamente nas mãos e procurou seus olhos desolado, com o olhar sentido. — Eu te amo, Naomi. Tudo o que eu quero é
um futuro com você ao meu lado, mas eu não sei se você vai ser capaz de me olhar do mesmo modo de antes. — Não, eu não vou poder, — ela admitiu suavemente. — Mas também não posso culpá-lo. Eu não te culpo por fazer o que você nasceu e foi treinado para fazer, Asher. O que dói mais é você não ter me dado a oportunidade. Você não confiou em mim o suficiente para ser honesto sobre o seu passado e o quanto ele o envergonhava. Em vez disso, tive que saber por outra pessoa. Nunca me senti tão idiota. — Eu sei, — ele murmurou, sua auto aversão como ácido na garganta. — Me desculpe por isso. Me desculpe por tudo que aconteceu com você. Ela se afastou dele, a voz apertada. — Agora não importa. Michael está morto, Asher. Por minha causa, meu melhor amigo está morto. E Tyler e as outras crianças poderiam estar em qualquer lugar da cidade agora sem nenhum lugar para ir. — Nós vamos resolver isso, — ele jurou. — E assim que o sol se pôr, eu cuidarei de Leo Slater. — Não. — Ela balançou a cabeça, mais cansada do que jamais a viu. — Ele pegou tomou tudo o que podia de mim agora. Parei de lutar com ele. Ele ganhou. Ele não importa mais, apenas aquelas crianças importam. Ela se afastou dele, abraçando o próprio corpo. Então ela se virou e seguiu pelo corredor até o quarto principal e fechou a porta, silenciosamente se afastando de Asher. Ele ficou lá, sabendo que ela não queria que a seguisse. Não daquela vez. Sentiu o pesar dela em suas veias quando ela desmoronou em privado atrás da porta fechada e lamentou pelo seu amigo sozinha.
Capítulo 23 Uma batida silenciosa soou na porta. Naomi em algum momento cochilou na cama, exaustão e dor, finalmente, arrastando-a para um sono profundo. Agora ela acordou, sentindo-se descansada e totalmente esgotada. — Entre. Irônico em conceder permissão para Asher entrar quando era seu quarto, sua casa – sua vida – que ela havia invadido com todos os seus problemas. Ela sentou-se na cama quando a porta se abriu e ele entrou, acompanhado por Sam, cujo corpo inteiro se agitou de excitação ao ir até ela, parecendo que não a via há uma semana. — Ei, doce garoto, — disse ela, incapaz de resistir a acariciar seu pescoço e suas orelhas frouxas. Com a língua para baixo, ele dançou e choramingou na frente dela, sua feliz ignorância acerca dos muitos traumas do dia de alguma forma era reconfortante para ela agora. — Como você está? — Perguntou Asher, observando-a acariciar e coçar o feliz cão. — Espero não ter te acordado. — Não. — Ela balançou a cabeça. — Eu estava acordada quando você bateu. Que horas são?
— Pouco depois das cinco. Ela piscou, atordoada. — Me deixou dormir a tarde toda? O sorriso de Asher foi hesitante. — Você precisava do descanso. Ela precisava, nem que fosse para escapar da dor que ainda a consumia por ter perdido Michael. Mas o sono foi apenas um alívio temporário. Mais cedo ou mais tarde, ela teria que acordar. Assim como mais cedo ou mais tarde teria que lidar com todos os arranjos e ajustes que agora precisariam ser considerados não apenas para o seu amigo, mas para as crianças que perderam o único porto seguro em uma tempestade. E depois havia Asher e ela. Eventualmente, eles também teriam que decidir como as coisas ficariam para os dois a partir de hoje. Se significaria ficarem juntos ou cada um por conta própria, ela não estava pronta para contemplar. Sua testa estava franzida quando ele a olhou de onde ele estava, quase que não dentro do quarto. — Eu pensei que pudesse estar com fome, então fiz algo para você comer. Ela não sabia se estava com fome ou não, mas o fato dele ter pensado em cuidar dela a aqueceu quando tudo o que sentiu até agora era frio. — Obrigada. Agora ela não podia olhar para ele da mesma forma que antes. A revelação de Cain e depois a confissão de Asher o tinham lançado sob uma luz diferente. Como homem, Asher era agora menos misterioso do que quando o conheceu, mas ainda mais complicado do que jamais poderia ter imaginado. Seus sentimentos por ele também eram complicados. Seu amor não diminuiu, nem mesmo depois de Cain ter lhe dado motivos mais do que suficientes para duvidar de Asher. Até para desprezá-lo. Mas ela não conseguia parar de amá-lo, nem mesmo antes de conhecer a verdade completa da versão do próprio Asher. Asher, ela pensou, seu coração doendo por tudo que ele suportou. Quanto ao seu nome, o epíteto que ele manteve por todo esse tempo, ela entendia agora que não era um emblema de orgulho como Cain havia presumido. Asher manteve seu nome pejorativo pela mesma razão que
guardou as memórias de todos os Hunter que foi forçado a executar – como mais um lembrete de seu remorso, sua penitência. Cain o entendeu mal. Como Naomi, até hoje. Ela olhou para a pilha de madeira quebrada que estava no chão do quarto. — O que aconteceu com a sua linda cabeceira? Ele encolheu os ombros, a boca apertada formando uma linha reta. — Depois que você encontrou Michael... sentir sua dor e medo através do seu sangue... sabendo que eu estava a quilômetros de distância e que não poderia fazer nada para ajudá-la caso precisasse de mim? — Ele parou abruptamente de falar e soltou uma maldição em voz baixa. — Me rasgou por dentro, não ser capaz de estar lá com você. — Oh, Asher. A peça esculpida à mão na qual ela tinha-lhe visto trabalhar durante dias obviamente era que ele vinha aperfeiçoando há muito mais tempo e foi completamente destruído. O centro parecia ter sido esmagado com uma marreta. Ou com o punho de um macho Raça. — É só uma placa de madeira, disse ele. — Talvez eu faça outra algum dia. Naomi saiu da cama e caminhou até ele, colocando a palma da mão na sua bochecha. Aquilo a surpreendeu, o quanto aquele homem significava para ela depois de apenas alguns dias e noites juntos. O quanto ela afundaria se eles tivessem a eternidade? Subiu na ponta dos pés e deu um beijo nos lábios dele. Pretendia que fosse apenas um beijinho, mas ela não percebeu o quanto sentia falta do contato com ele até que os braços fortes dele a envolveram, abraçando-a junto. Eles se beijaram por um longo momento, ternamente, pedindo desculpas. Quando Asher finalmente a soltou, suas írises estavam brilhando com manchas de luz ambarina. Ele a queria, mas estava mantendo essa necessidade sob controle, ainda que mal. Naomi também sentia o mesmo, o anseio de se perder em algo bom depois de todo o mal que passaram hoje. Mas não podia satisfazer suas próprias necessidades ou desejos.
Não quando ainda havia coisas para fazer na cidade. — Vamos lá, — disse ele, pegando sua mão. — Depois de colocar alguma coisa no estômago já estará escuro. Podemos ir até Vegas começar a procurar Tyler, Penny e o resto das crianças. — Obrigada. — Ela entrelaçou os dedos com os dele enquanto andavam, grata além de palavras pelo fato dele entendê-la sem que precisasse falar. — O que você preparou? O cheiro é delicioso. Ela olhou surpresa – e achando graça – para o banquete que ele preparou. Esperando por ela na mesa estava uma tigela grande de sopa de galinha enlatada, peito de frango cozido em um prato de salada, uma tigela de cereal e uma xícara de frutas frescas, além do pão de fôrma que eles trouxeram do supermercado na outra noite. — Eu não sabia o nível da sua fome, — ele murmurou. — Então fiz tudo que eu sei que você gosta. Ela riu apesar da angústia que a dominara o dia todo. — Está perfeito. Acho que sei para quem ligar da próxima vez que precisar alimentar um exército de crianças famintas. Ela sentou-se e comeu, maravilhada ao descobrir que tinha apetite depois de tudo. Depois que se fartou, ela e Asher saíram do rancho e entraram em Las Vegas para começar a procurar pelas crianças. Começaram com os parques e abrigos em volta da Strip. Encontraram muitas crianças e jovens adolescentes por perto, mas nenhum deles pertencia ao grupo que queriam localizar. Tinham até mesmo passado por algumas das áreas obscuras da cidade, no meio de lotes industriais e depósitos de carga, alguns dos lugares que garotos desesperados tendiam a procurar abrigo quando não tinham melhores opções. Enquanto a noite avançava, Naomi não conseguia esconder sua frustração. Ou seu medo. — Odeio saber que eles estão em algum lugar achando que não estou procurando por eles. E se eles fugiram, Asher? E se nunca os encontrarmos?
— Vamos encontrá-los, — ele lhe assegurou, sua voz grossa determinada. — Vamos procurar por todo o estado e mais, se for necessário. Ela assentiu e sentou-se, olhando pela janela da picape para as luzes do cassino e dos hotéis altos. O Cassino Moda se destacava como uma torre feita de diamantes, até as luzes que piscavam do heliporto no telhado. Elegante e convidativo. Nenhuma pista do monstro que morava lá dentro. Asher limpou a garganta. — Talvez devêssemos passar na casa de Michael. Ela deliberadamente evitou pedir que fossem até lá, nem um pouco pronta para revisitar o lugar que sempre seria a fonte de seus piores pesadelos. Mas Asher estava certo. Eles tinham que tentar tudo. Quando ela assentiu, ele virou na rua que os levaria para a área residencial da Strip. Ela pegou sua mão quando eles chegaram à rua de Michael. Não percebeu que estava prendendo a respiração até a picape se aproximar da casa escura e da van de Michael ainda estacionada na entrada da garagem. O ar em seus pulmões a deixou em um soluço irregular. — Dói tanto, Asher. — Eu sei, querida. — Ele trouxe seus dedos até os lábios e os beijou. — Não posso mais voltar mais para cá. Nenhuma das crianças que moram aqui podem. Ele assentiu, com um olhar solene. — Você não precisa. Nenhum de vocês. Há espaço de sobra para todos no rancho. — Está falando sério? — Sim. Vamos achar uma maneira. Seu coração pulou dentro da caixa torácica. Ela tentou lhe dar um abraço, mas o cinto de segurança a conteve. — Merda. — Rindo, apesar de suas lágrimas, abriu a fivela e jogou os braços ao redor dele, salpicando seu rosto com beijos de agradecimento. Ele inclinou a cabeça para a dela, um sorriso brincando nas bordas de sua boca sensual. — Talvez eu devesse parar o carro para você fazer isso. Ela estava tão envolvida no momento que o toque repentino de seu celular no bolso de trás levou um segundo para se registrar.
O toque de Michael novamente, só que desta vez ele atingiu os seus sentidos como um martelo no vidro. — Oh, meu Deus. O rosto de Asher escureceu mesmo quando seus olhos se iluminaram com fogo. Ele encostou no meio-fio e parou a picape. — Se for Slater, deixe que eu lido com isso. Mas ela já tinha o telefone no ouvido. — Alô. — Você me desaponta, Narumi. — A voz de Slater a cortou. — Eu achava que minha mensagem tinha sido clara o suficiente. E você ainda não trouxe meu dinheiro. — Eu te disse, eu não tenho o dinheiro. Eu tenho um pouco, mas... — Tudo, — ele cortou bruscamente. — Essa foi a minha exigência. Os olhos de Asher brilharam enquanto ele ouvia, ao lado de Naomi. Se Slater estivesse ao seu alcance, Naomi não tinha dúvida de que Asher já teria rasgado a garganta do homem com as próprias mãos. — Por que você insiste em me fazer te machucar, Narumi? Lembra do que eu disse? Se você não me devolver o dinheiro, eu serei forçado a tomar outra coisa de que você ama. Ela nem queria adivinhar o que poderia ser. Ele já arrancara seu coração hoje. O que mais poderia fazer? — Eu posso te dar o que tenho. Oitenta e sete mil dólares. O resto... — Cada. Porra. De centavo, — disse Slater. Então ele começou a rir. Um som maníaco que gelou suas veias. — Cada centavo meu em troca do seu, Narumi. Sua respiração prendeu. — O quê? Ao fundo, ela ouviu uma comoção seguida por uma jovem chorando histericamente. — Traga ela aqui, — ordenou Slater. Os gritos ficaram mais altos à medida que a garota se aproximava do telefone. Ela fungou e engasgou com as lágrimas. — N-Naomi? — Oh, meu Deus. — Penny soluçou, soluços cheios de medo que a rasgaram. — Penny, não se preocupe. Não vamos deixar que nada aconte...
O som de uma mão batendo em uma bochecha macia cortou o ar do outro lado da linha. Penny gritou, então começou a berrar, implorando a Naomi para ajudá-la. — Traga o dinheiro. Todo. — Rosnou Slater. — Ou a doce pequena Penny aqui também vai sofrer um terrível acidente. A não ser que eu decida arrancar o que me deve da carne dela.
Capítulo 24 — Puta merda! Acabei de ganhar mil dólares! — Caixa acumulada! Meu Deus! — Duzentos e cinquenta dólares! Não posso acreditar! Asher ia a cerca de 20 passos atrás de Naomi, enquanto ela atravessava o grande buraco de caça-níqueis do Casino Moda. Enquanto caminhava, casualmente passava os dedos por todas as máquinas pelas quais passava, demorando-se apenas o tempo suficiente para refinar o mecanismo interno a atingir um pagamento a cada rodada. O barulho de vozes excitadas no cassino foi crescendo como um tsunami em seu rastro, junto com os sons quase ensurdecedores das máquinas ao vomitarem milhares e milhares dos lucros de Leo Slater. Não demorou muito para que os gritos e aplausos dos vinte, trinta, cinquenta ou mais vencedores incitassem um tumulto de novos jogadores tentando passar e ter uma chance de ganhar o dinheiro que parecia fluir sem parar das máquinas. Pessoas na rua começaram a entrar no Moda também, quando se espalhou a notícia de que algo incomum estava acontecendo lá dentro.
— Dinheiro jorrando! — Alguém gritou. — Dinheiro jorrando pelos slots! Asher não pôde deixar de se maravilhar com a determinação de aço de Naomi ao provocar um pandemônio bem debaixo do nariz de Slater. O plano de ir para o ataque tinha sido dela. Em vez de sentir uma desesperança paralisante diante da ameaça que ele fez há alguns minutos, a notícia de que ele estava com Penny como refém reanimou Naomi. — Nenhuma quantidade de dinheiro vai satisfazê-lo, — ela disse a Asher na picape enquanto consideravam suas poucas opções. — Mesmo se eu tivesse os um milhão e os duzentos mil que devo, ele não vai me deixar sair com vida. Agora, também não deixará que Penny saia. Isso não vai acabar a menos que eu termine com isso. Ela estava certa, Asher não tinha dúvidas. Então, ela retornou ao domínio de Slater como uma guerreira em marcha. Totalmente corajosa, armada com sua espinha de ferro e o poder de seu dom único de Companheira de Raça. E com ele. Asher ficou fora da linha de visão dos vários olhos do cassino no alto. O melhor meio de ajudá-la no momento era ser um elemento surpresa. Por enquanto, aquele show era dela, e ele nunca se sentiu mais orgulhoso de alguém em toda a vida. À medida que o alvoroço aumentava, todos os chefes das mesas se reuniram no meio do cassino, cinco caras de coletes pretos e camisas brancas parados com os paus nas mãos e dando de ombros em uma inútil demonstração de confusão. Quando o caos atingiu o ponto de ebulição, Naomi olhou para Asher. Ele deu um aceno de cabeça e se aproximou o suficiente para ouvir quando ela pegou o telefone e discou o número de Michael. Slater demorou um momento para responder, e quando o fez, foi no meio de uma distração apoplética. — E diga a Thompson para arrastar a bunda até aqui com algumas respostas que eu quero agora! Para que eu pago vocês? Narumi, — ele rosnou.
— É melhor que tenha me ligado para dizer que já tem a porra do meu dinheiro. — Sim, eu tenho seu dinheiro. Eu tenho as mãos até no último centavo do seu cassino, Slater. E a menos que você solte Penny nos próximos dois segundos, eu vou drenar todas as máquinas caça-níqueis e roletas do lugar. — Do que diabos está falando? — Disso. — Ela segurou o telefone por um momento e o deixou ouvir o frenesi em curso no térreo do cassino. — Solte Penny, ou isso vai ser apenas o começo. — Eu mato a cadela primeiro, — ele sussurrou. — E depois vou atrás de você. — Resposta errada. — A voz de Naomi era firme, um controle frio. Asher sorriu enquanto observava sua mulher incrível passear ao longo de outra fileira de máquinas, tocando cada uma delas, acionando sinos e sirenes enquanto Slater ouvia. A multidão de pessoas lutando para chegar até o dinheiro se concentrava como uma colmeia de abelhas, em cima das máquinas gritando com uma excitação gananciosa. Naomi olhou para Asher, nada além de aço no olhar. — Eu quero Penny, — ela exigiu de Slater. — Mande ela aqui para baixo. Agora mesmo. — Vai pagar por isso, sua putinha. — Você primeiro, — disse ela, esvaziando mais meia dúzia de máquinas do outro lado enquanto falava. — Solte Penny. — Alguém vá pegar aquela maldita criança! — Ele gritou, a voz estridente ao fone. Quando Slater voltou a falar com Naomi, estava ofegante de raiva. — Ninguém me ameaça. Ninguém me rouba. Entendeu? Você já está morta, cadela. Está morta! Naomi mal piscou com a ameaça. Ela desligou na cara dele e se virou para Asher. — Acha que vai funcionar? Ele estendeu a mão e tocou sua bochecha. — Você acabou de fazer a parte mais difícil. Você é incrível, sabe disso? Ela deu-lhe um olhar ansioso, a primeira vez em que a viu vacilar naquela noite. — Eu só quero Penny em segurança.
— Não vamos embora sem ela. — Ele olhou para cima, a cabeça e os ombros se elevando acima da maioria da multidão agitada. — Temos companhia por vir. O grupo de guardas de segurança finalmente conseguiram ter uma pista sobre a origem da ruptura. Alguns deles tocaram os fones de ouvido sem fio e ficaram parados, sem dúvida recebendo as instruções de Slate. Todos os cinco começaram a correr na direção deles. — Vá, — ele disse a Naomi. — Continue abaixada. Eu lido com esses idiotas. Os homens se separaram, três correndo em direção a Asher, enquanto os outros dois se espalharam para cobrir o perímetro do aglomerado de gritos, berros e empurrões que eram os clientes do cassino. Naomi desapareceu na multidão, sua pequena estatura e agilidade ajudando-a a se esconder à vista de todos. Asher girou a cabeça na direção dos gerentes que se aproximavam. Um simples flash de suas presas convenceu um dos homens a pôr o rabo entre as pernas e correr na direção oposta, mas o outro par continuou correndo para ele. Ele também os atacou, agarrando suas cabeças com as mãos e esmagando seus crânios até ficarem inconscientes. Ele tinha mais problemas a caminho. Agora, a unidade de segurança de Slater tinha decidido se juntar à festa. Meia dúzia de homens saíram de outras partes do cassino para procurá-lo. Um cowboy já estava com a pistola na mão, brandindo-a enquanto corria até Asher. Péssima jogada. Asher já estava em movimento antes que o humano soubesse o que tinha lhe atingido, jogando o guarda no meio do chão. Outro segurança doido para apertar o gatilho disparou por cima do enxame de clientes do cassino e, de repente, os gritos de alegria se transformaram em um surto de pânico. Quando a multidão gritou e mergulhou para se proteger, os outros seguranças abriram fogo. Tiros soaram de várias direções, alguns deles atingindo o alvo. Asher não sentiu a pancada das várias balas que bateram nele. Sua atenção estava inteiramente focada em outra coisa.
Do outro lado do grande cassino, o elevador de vidro descia até o saguão. Do lado de dentro, Slater, baixo e atarracado, com cabelos escuros grisalhos e uma cara com papada comprimida de raiva no momento. Suas mãos seguravam os ombros delgados de Penny à sua frente, como se estivesse preparado para usar a garota magrinha como um escudo. Ao redor do par estava a equipe de segurança fortemente armada de Slater. Porra. Onde estava Naomi? Asher examinou a área procurando-a enquanto os seguranças do térreo se aproximavam dele atirando. Ele se esquivou do fogo e do fluxo implacável de civis aterrorizados saindo de todas as direções para as saídas. — Naomi! Outro tiro o atingiu, de cheio no peito. A fúria de Asher agora estava em total ebulição. Berrando, ele acabou com a equipe de humanos, suas mãos um borrão ao esmagarem e torcerem colunas, trabalhando na intenção de abrir caminho até Slater e a criança. Quando as portas do elevador se abriram, a nova equipe de homens se espalhou. E então ele viu Naomi. Slater tirou as mãos de Penny quando saiu do elevador e ficou boquiaberto com o caos que acontecia dentro de seu valioso cassino. A desatenção momentânea foi aparentemente toda a oportunidade da qual Naomi precisava. Ela correu, dando uma investida desesperada para o elevador. — Não, — Asher rosnou. — Naomi, não! Longe demais para avisá-la e atacado com uma nova rajada de tiros, ele não conseguiu alcançá-la antes que Slater percebesse que ela estava lá. Asher rugiu. — Naomi! Ela estava dentro do elevador aberto e tinha a menina chorando debaixo do braço quando Slater girou ao redor e as viu. Sem hesitar, ele esmurrou a mandíbula de Naomi. Ela caiu como uma pedra, colidindo com a parede do fundo do compartimento de vidro. Asher avançou em um salto e um grito trovejante de guerra.
Chegou atrasado só por um segundo. Seu corpo ensanguentado colidiu com as portas fechadas quando o carro começou a subir rapidamente com Slater pairando sobre o corpo imóvel de Naomi e Penny caída no canto se dissolvendo em gritos de terror.
Capítulo 25 Naomi abriu os olhos com um gemido. Seu rosto estava pressionado no chão frio de mármore do elevador enquanto ele subia rapidamente pelo centro do Casino Moda. Os braços finos de Penny estavam em volta dos ombros de Naomi, a garota soluçando sobre seu corpo caído. O queixo de Naomi doía como o inferno, mas ela estava viva. Penny estava viva. Oh, Deus. Asher. Ela o viu sob o fogo pesado da segurança do cassino e dos guardacostas pessoais de Slater. Ele era Raça, então ela sabia que seria preciso muito para derrubá-lo, mas isso não aliviava o terror que caía que nem gelo dentro do seu estômago. — Barnes, vá para o heliporto e ligue o helicóptero. — Slater estava falando com alguém ao telefone a alguns metros de onde Naomi havia caído depois que bateu nela. — Só eu. Já estou a caminho. Naomi se levantou com as mãos, sua visão borrada. Um pé pesado chutou o centro de sua coluna, tirando o ar de seus pulmões enquanto ela era mais uma vez presa ao piso de mármore. — Deixe ela em paz! — Penny gemeu. — Pare de bater nela, seu idiota!
Como uma víbora, Slater atacou com força e sem aviso. O golpe selvagem fez a menina voar para trás na parede do carro do elevador. Assim que sua cabeça loira bateu no corrimão cromado afiado, ela desabou inconsciente, deixando um rastro de sangue no vidro. — Seu filho da puta! — Naomi saltou em pé, adrenalina e fúria correndo pela sua corrente sanguínea. Ela teria pulado em Slater no ataque, mas quando se virou para encará-lo, viu-se olhando para o cano de uma grande pistola preta. A expressão ficou sombria com ameaça. — Vamos, Narumi. O elevador parou e as portas se abriram silenciosamente para um andar privado do prédio. Naomi olhou furtivamente para Penny e ficou aliviada – mesmo que apenas parcialmente – ao ver seu peito subindo e descendo, embora ela não se mexesse. — Comece a andar. — Slater fechou a mão no cabelo da parte de trás da cabeça de Naomi e marchou com a arma apontada para ela em direção a uma porta de aço onde havia escrito Acesso ao Telhado – Apenas Pessoas Autorizadas. — Você sempre foi uma pedra no meu sapato, — ele reclamou. — Você e a sua mãe. Mais problemas do que já valeram. Não me surpreende que tenha ficado tão arrogante quanto ela. Naomi não perdeu a referência passada que ele usou. — É por isso que você a matou? Ele riu. — Eu não a queria morta, mas que escolha ela me deixou? Naquela última noite ela veio para minha casa com uma porra de ultimato – que eu procurasse ajuda e tratasse os meus surtos de raiva ou ela daria queixa? A cadela estúpida tinha uma câmera cheia de fotos, com todas as contusões que eu dei a ela, os ossos quebrados. Quer dizer, quem diabos ela pensou que era? A bile subiu à boca de Naomi ao ouvir aqueles fatos. Depois de anos querendo respostas, achando que sua mãe não tinha sido forte o suficiente para se afastar de um relacionamento mortal, a verdade doeu ainda mais. — Então, ela se impôs e você mandou algum dos seus bandidos se livrar dela? Ou fez Cain colocar em prática suas habilidades especiais para você?
— Cain. — Slater zombou. — Aquele bastardo Raça acabou sendo um maldito traidor. Eu pagava um milhão por ano ao idiota para cuidar dos meus interesses – dentro e fora dos cassinos – e o que ele fez? Me apunhalou pelas costas. Ele já devia saber há meses dos seus roubos, mas eu tive que ficar sabendo por um dos engravatados da contabilidade do Golden Mine. Naomi respirou fundo, mais do que surpresa com aquela informação. Mas Slater ainda não tinha respondido totalmente à pergunta sobre sua mãe. — O que aconteceu com a minha mãe? Não importa se você me disser. Tenho certeza de que não tem intenção de me deixar viver. E tão aterrorizada como estava com a ideia, ela tomou pouco conforto no fato de Penny ainda estar viva no elevador, e se Asher fosse capaz de chegar até ela, ele garantiria que a garota ficasse a salvo. Não queria considerar todos os tiros que os homens de Slater deram em Asher. Ela o viu em ação. Ele era imbatível. Mas não era imortal; até mesmo um Raça poderia ser morto se os ferimentos fossem catastróficos o bastante. Recusou-se a deixar o pensamento criar raiz. Não podia se deixar imaginar que ele poderia estar sofrendo... ou pior. — Me diga, seu pedaço de merda covarde, — pressionou Naomi. — Você mandou seus homens matarem a minha mãe? Ele puxou o cabelo dela, jogando sua cabeça para trás até ela estar olhando para seus olhos frios de réptil. — Não, Narumi, não mandei ninguém matá-la. Guardei esse prazer só para mim. Levei-a para o meio do Mojave e esmaguei a cabeça dela com uma chave de roda. Depois eu a deixei para que os abutres e outros comedores de lixo brigassem por ela. Naomi quase vomitou. Mesmo que o tempo todo tivesse suspeitado de algo próximo a isso, ouvi-lo dizer – ouvir a satisfação em sua voz enquanto descrevia como tinha brutalizado uma mulher que tinha lhe amado verdadeiramente, tolamente – fez a bile subir pela sua garganta. — Seu doente fodido. Seu monstro! — Foi ótimo relembrar, Narumi, mas eu tenho que voar. — O punho que estava agarrando o seu cabelo puxou com ainda mais força agora.
E aquela pistola fria e dura apertou contra a têmpora dela. Ele a cutucou uma vez que estavam em frente à porta de acesso ao telhado. — Abra. Ela fez o que ele pediu, desejando ter a chance de alcançar a arma que estava armada e carregada em sua cabeça. Nunca tinha tentado arrancar uma arma, mas caramba, se houvesse alguma esperança, ela tentaria. Uma brisa morna soprou neles no topo do cassino de cinquenta e dois andares. No alto, o céu estava escuro, as estrelas ofuscadas pelas luzes da Strip. A lua lançava um brilho leitoso na superfície de concreto do teto e cintilava o helicóptero preto que estava no grande alvo pintado no heliporto. Os rotores estavam imóveis, sem sinal de alguém no cockpit. Às suas costas, Slater soltou um palavrão. — Onde diabos está o meu piloto? Barnes! — Ele gritou. — Por que diabos esse pássaro não está pronto para voar? — Barnes teve outro compromisso. A voz profunda de Asher foi um grunhido sobrenatural vindo de algum lugar atrás deles. Com a mão ainda segurando o cabelo de Naomi, Slater se virou, colocando-a em sua frente como um escudo. — Que porra é essa? De pé em cima de um grande aparelho de ar condicionado, Asher parecia algo saído de um filme de terror. Imenso, fervendo de ódio, de outro mundo com seus glifos agitados visíveis por todo seu corpo. Seus olhos eram carvões derretidos, emitindo calor como uma fornalha. Seus lábios estavam repuxados para trás em um rosnado assassino, mostrando os dentes e suas presas enormes e afiadas. Ele nunca pareceu mais formidável do que naquele momento, mas Naomi viu como seu peito se esforçava para dar cada respiração. E ele estava pingando sangue de mais ferimentos à bala do que ela conseguia contar. — O seu namorado Raça? — Slater deu uma gargalhada seca. — Eu devia ter adivinhado que o seu gosto em homens seria tão questionável quanto o seu gosto em colegas de quarto.
Que Deus a ajudasse, ela queria ver Slater sofrer. Ele merecia nada menos que uma morte lenta e prolongada – coisas que ela só poderia sonhar em fazer com ele. Se o olhar estreito de Asher significasse alguma coisa, ele também desejava o sofrimento de Slater. Ele saltou no ar, um rápido arco de movimento que o levou acima de Naomi e Slater em menos de um segundo. Slater olhou para cima, ofegando enquanto observava Asher desaparecer na escuridão. — Puta merda! Para onde ele foi? O aperto no cabelo de Naomi afrouxou enquanto Slater girava descontroladamente com a arma apontada. E então Asher estava bem na sua cara, agarrando-o pela garganta. Slater berrou como um homem possesso, apertando o gatilho várias vezes. Cliques contundentes que não liberaram uma única bala. — Q-que porra é essa? — Ele gaguejou, descrença em seus olhos loucos. — O que você fez com a minha arma? Asher ergueu uma sobrancelha para Naomi em uma pergunta. Ela encolheu os ombros e sorriu. O aperto de Slater na arma foi afrouxado quando Asher o ergueu até que ficasse nas pontas dos seus mocassins polidos só com a força de um braço. Então ele andou com Slater pelo telhado, sem parar até estarem muito perto da beira de uma queda de mais de seiscentos metros. Slater agarrou o braço de Asher, mas não adiantou. — P-por favor, — ele balbuciou. — Me solte. Ai, porra. Ai, Merda! Asher o empurrou para ainda mais perto da borda, levantando-o até que seus pés mal deslizassem pelo concreto do telhado. O rosto de Slater era uma máscara de horror, branqueada e sem vida. Seus olhos cruéis rolavam em seu crânio, como se seu cérebro estivesse dividido entre olhar para a Strip a toda aquela distância abaixo dele ou para o rosto sem emoção do macho Raça que literalmente tinha o seu destino nas mãos. — Não pode fazer isso, — Slater ofegou. — O que você quer? Eu te dou qualquer coisa!
— Implore, — disse Asher, avançando mais. Os calcanhares de Slater pendiam do prédio agora, com os dedos dançando na beirada. — Implore pela sua vida e talvez eu te deixe viver. — Por favor! — Slater choramingou. — Sim, eu imploro! Estou te implorando, por favor! Não faça isso comigo! Asher sacudiu a cabeça. — Não implore a mim. Implore a ela. Slater engoliu em seco, um grunhido estrangulado sob a pressão dos dedos de Asher apertados ao redor de sua traqueia. — P-por favor... Narumi, estou te implorando! Me perdoe. Eu amei a sua mãe, eu juro. Eu nunca quis machucá-la. Se eu pudesse voltar atrás, eu... Eu faria tudo diferente, você tem que acreditar em mim. — Não. Eu não tenho que acreditar em você. Ele engasgou com um soluço de choro. — Então me deixe fazer as pazes com você. Fique com o dinheiro... com tudo. Você pode ficar com ele... Eu vou te dar mais, se é o que você quer. — Não é o que eu quero, — ela respondeu sem emoção, sentindo nada pelo o homem. Nem mesmo ódio. Ele não era nada para ela. Menos que nada. — Eu pensei que queria me vingar lentamente de você depois do que fez com a minha mãe. Mas depois do que você fez com Michael... — Eu vou confessar tudo, — ele falou às pressas, o desespero aumentando enquanto Asher continuava a segurá-lo sobre as luzes e o ruído da Vegas Strip. Ele começou a soluçar a sério agora, seu orgulho completamente o abandonando. — Por favor! Pelo amor de Deus, me diga o que você quer de mim! — Nada. Ela balançou a cabeça e se aproximou dele, para que ele pudesse ver seu rosto na escuridão – um rosto que parecia tanto com o de sua mãe – e que soubesse que Aiko Sato viveria nela, Narumi, muito depois de Leo Slater e seu império virarem pó. — Eu não quero nada de você, — ela disse a ele. — E você também não receberá nada de mim. Muito menos meu perdão. Um gemido baixo começou a crescer dentro dele enquanto ele olhava para ela, fúria se transformando em um fervor forte. Saliva voava de seus
lábios frouxos enquanto ele se dirigia a ela. — Sua puta! Sua ladra maldita! Eu deveria ter esmagado seu crânio na mesma noite em que matei a puta da sua mãe. Porra, me larga! Asher não olhou para ela para pedir permissão. Seu julgamento de Slater já tinha sido feito; agora tudo o que restava era a execução da sentença. Ele o apertou mais e fechou os olhos por um longo momento. Naomi percebeu o que era aquele momento de hesitação. Ele estava saboreando os últimos momentos de pavor de Slater, absorvendo todas as facetas de seu terror e desespero para que se lembrasse daquilo para sempre. Slater lutou freneticamente, vomitando ameaças e maldições. — Seu sanguessuga maldito. Me larga! Asher exalou calmamente e abriu os olhos. — Ok. Então ele largou Leo Slater sobre a borda. — Asher. — Naomi correu para ele, enterrando-se em seus braços. O cheiro do sangue dele a subjugou. Em todo lugar que tocava seus dedos ficavam molhados e pegajosos. — Meu Deus. O que fizeram com você? Ele depositou um beijo no topo de sua cabeça. — Estou bem. Vou viver. Vamos pegar Penny e sair daqui. Penny estava vindo no elevador quando eles voltaram do telhado. Ela se jogou nos braços de Naomi, tremendo incontrolavelmente e chorando de alívio pelo término da provação. Parecia que uma bomba explodira no saguão do Moda. O lugar estava totalmente vazio, a não ser por alguns retardatários e vários seguranças mortos que jaziam em poças de sangue onde Asher os tinha derrubado. Dinheiro e objetos pessoais estavam espalhados pelo chão, derrubados pelas centenas de pessoas que fugiram quando o tiroteio começou. E dentro do quase vazio cassino em ruínas, o som musical e a barulheira das máquinas caça-níqueis competiam com o som das sirenes dos veículos JUSTIS que chegavam do lado de fora. Com Penny agarrada a ela, Naomi tomou conforto do calor do braço de Asher sobre seus ombros enquanto os três saíam do cassino.
— Com licença senhor. Senhora. — Uma oficial se aproximou assim que eles saíram. Era a mesma mulher que esteve na casa de Michael naquele dia, a oficial Reynolds. Naomi se irritou ao ver a mulher, mesmo que não pudesse culpá-la por fazer seu trabalho. — Oh, olá. Fallon, não é isso? Com o aceno de Naomi, a policial a estudou com mais do que curiosidade, depois ela voltou seu olhar desconfiado para Asher. Com suas presas estendidas e seus olhos acesos como brasas, não havia como confundilo com outra coisa senão Raça, mas a oficial da lei nem sequer recuou. — Algum de vocês pode me dizer o que aconteceu aí hoje? Pelo que entendemos, as máquinas falharam e parece que o gerenciamento do cassino foi um pouco... excessivo em resposta à situação. Asher grunhiu. — Mais ou menos isso. A oficial olhou-o de cima a baixo. — Você não parece muito bem. Temos uma ambulância aqui, se precisar de atenção médica. Ou de um doador de sangue de emergência. Ele balançou sua cabeça. — Não preciso de nenhuma dessas coisas. — E você, Srta. Fallon? Naomi abraçou mais Asher. — Só preciso ir para casa. Eles começaram a se afastar e a oficial da JUSTIS limpou a garganta. — Só mais uma coisa, por favor. — Quando eles pararam, ela apontou para a rua a vários metros da entrada do cassino. — Vocês sabem algo sobre o corpo que caiu na calçada há alguns minutos atrás? É difícil dizer com certeza, mas achamos que é o dono do Moda, Leo Slater. Asher olhou para Naomi antes de encontrar o olhar estreito do oficial. — Depois da quantidade de dinheiro que ele perdeu hoje à noite, as chances são boas. Slater provavelmente pulou. A fêmea zombou. — Suicídio, então? — Coisas estranhas aconteceram, — respondeu Asher. A oficial assentiu. — Tudo bem então. A JUSTIS vai dar uma olhada em tudo isso... mas talvez não muito de perto, — acrescentou ela, baixinho.
E quando ela os dispensou, Naomi vislumbrou uma marca peculiar no pulso da oficial. O mesmo símbolo de lua crescente e lágrima que ela tinha sob o queixo. — Se cuidem, — a oficial falou detrás deles.
C
Capítulo 26 Naomi grudou como cola ao seu lado no caminho inteiro de volta ao rancho. Asher sabia que suas feridas eram tão severas quanto numerosas, mas seriam muito piores se não tivesse um pouco do sangue de sua Companheira de Raça dentro dele. Tão ruim quanto sua condição era, esse pensamento o manteve de pé enquanto empurrava o velho caminhão de Ned até o limite para levar Naomi e Penny para casa e em segurança o mais rápido que pudesse. Suas próprias necessidades poderiam esperar. Depois da noite que acabaram de ter – e tendo chegado perto demais de perder qualquer uma delas – ele não ia se arriscar. — Ele vai ficar bem? — Penny sussurrou para Naomi quando chegaram à casa. — Vampiros podem morrer? — Asher não vai morrer. — Naomi segurou o rosto preocupado da garota, mas virou um olhar solene para ele na luz fraca do painel. — Não enquanto eu tiver algo a dizer sobre isso. Eles se dirigiram para a casa, Naomi se aconchegando debaixo do braço dele. Ele não confundiu a preocupação em seus passos cuidadosos, nem no ritmo constante de seu batimento cardíaco. Seu amor por ele o animava,
tanto quanto seu pequeno corpo encravado firmemente contra ele o apoiava enquanto mancava para a varanda. — Você tem um cachorro? — Os olhos de Penny se iluminaram no instante que espiou Sam esperando para cumprimentá-los. Ela tinha um galo de tamanho decente na nuca pelo ataque de Slater no elevador, mas todos os traumas do dia pareciam fugazes para a garota em face da recepção ansiosa do velho cão de caça. Ela correu para a porta de tela à frente de Asher e Naomi. — Olhe para ele, é tão fofo! Até mesmo Asher teve que admitir, a contragosto, que o cachorro era uma visão bem-vinda depois das últimas horas infernais. Eles entraram, Asher apoiado pesadamente em Naomi. Seu sangue escorria em múltiplas poças no chão, fazendo Sam gemer e inclinar a cabeça grande para ele em cautelosa curiosidade. Naomi gentilmente segurou a cabeça da menina com a mão livre. — Penny, me faz um favor? Leve Sam para a cozinha e veja se ele precisa de comida ou água enquanto ajudo Asher a se limpar. — Certo. Vamos lá, Sam! — Ela foi embora, liderada pelo cão entusiasmado por conhecer um estranho. Asher grunhiu. — Ela é resiliente. — A maioria das crianças é, — disse Naomi. — Essa é a única maneira que podem sobreviver na maior parte do tempo. Neste momento, estou mais preocupada com você. Ela o conduziu ao banheiro e sentou-o no vaso fechado. — Fique quieto — ordenou, virando-se para vasculhar o armário em busca de um pano limpo, toalhas e uma tesoura, que usou para cortar sua camiseta encharcada de sangue e manchada de sujeira. Ele deixou que ela trabalhasse, dizendo a si mesmo que era simplesmente pelo prazer de vê-la cuidar dele, mas a verdade era que levou muitos golpes. As feridas de bala não o matariam, mas com certeza o teriam desacelerado ou o derrubado se não fosse pelo sangue dela, alimentando o corpo dele como nenhuma quantidade de sangue humano jamais poderia. — Você me salvou, Naomi. Ela lançou-lhe um olhar e sacudiu a cabeça. — Ainda não, não o fiz.
— Sim, fez. Quando parei naquela estrada deserta algumas noites atrás, pensei que estava te salvando. Mas estava errado. Foi você quem me salvou. Ele não resistiu em esticar a mão para acariciar seus cabelos negros, prendendo algumas das mechas de ébano atrás da orelha para que ele pudesse ver seu rosto e observar aqueles olhos macios e amáveis olhando para ele com uma atenção tão concentrada. E amor. O humilhou ver aquela emoção dirigida a ele, a sentir pulsante e viva dentro de seu vínculo com ela. — Precisa de sangue, Asher. — Sim, — ele admitiu. — Mas mais do que isso, só preciso de você. Ele curvou os dedos em volta da nuca dela e puxou-a para perto de seu beijo. Poderia ter continuado por horas sem deixá-la ir, mas o pior de seus ferimentos ainda estava sangrando e a excitação fazendo seu coração bater ainda mais forte não estava ajudando. — Beba de mim, — ela insistiu, recuando e tirando o cabelo do pescoço. — Tome tudo que precisar. Deus o ajudasse, não tinha vontade de recusar. Afundou suas presas na coluna macia de sua garganta e bebeu, depois bebeu um pouco mais. Seu sangue o rejuvenesceu instantaneamente, consertando carne e músculo rasgados, consertando ossos quebrados pelas balas. As balas presas nele foram empurradas uma a uma. Bateram contra os azulejos do banheiro enquanto caíam. Num suspiro trêmulo, Naomi acariciou seus dedos em seus cabelos e o segurou perto enquanto se entregava ao poder de sua cura, intoxicando as células vermelhas. Enquanto seu corpo se unia, o desejo rugia através dele. A queria, mas não aqui. Assim não. Quando fizesse amor com ela em seguida, queria fazer isso devagar, com reverência. Queria fazer amor com ela como sua companheira. Ele gemeu e varreu a língua sobre as perfurações gêmeas, fechandoas.
— Preciso de você, — ele sussurrou contra sua pele, sua voz rouca de emoção. — Não apenas no meu sangue, Naomi. Mas na minha vida para sempre. Ele recuou e tomou o rosto dela em suas palmas, seus olhos transformados banhando sua pele leitosa num brilho âmbar quente. — Eu te amo muito. Por alguns minutos hoje à noite, não sabia se algum dia conseguiria te contar isso de novo. Quando vi Slater te levar até o elevador e não consegui falar com você a tempo... Porra. Estava com tanto medo de perder você. Ela balançou a cabeça, inclinando-se para beijá-lo. — Eu também te amo, Asher. Nunca quero que nada nos separe. — Nada vai, — ele assegurou-lhe, em seguida, soltou um suspiro. — Fiquei tão orgulhoso por você esta noite. Mesmo que tenha me assustado por ver Slater no caminho que fez, fiquei impressionado com você, o fato de não fugir de nenhum desafio. Não importa o quanto eu queira que você faça. Ela riu baixinho, pressionando a testa na dele. — Acho que sou muito parecida com minha mãe. É estranho o quanto percebo isso agora. Pensei que ela era fraca, mas a confissão de Slater provou o contrário. Ela se voltou contra ele. No final, ela também o enfrentou. E ele a matou por isso. Asher amaldiçoou, fúria queimando em seu intestino. — Queria fazêlo sofrer em seus momentos finais. — Eu sei, — ela sussurrou. — Vi o que fez... com seu dom. Ele não podia negar isso. — Essa foi a primeira vez que saboreei uma morte. Agora, toda vez que pensar no que ele fez com você e com Michael, até mesmo com sua mãe, vou lembrar de seu horror. Vou lembrar de sua falta de esperança e vou gostar. — Asher. — Ela acariciou sua bochecha, seu olhar macio. Então inclinou a cabeça e começou a beijar as partes do peito e torso dele que não estavam crivados de remendos de feridas. — Você me curou, Naomi. Em lugares que não pode ver também. Mas também me arruinou. Nunca quero saber como é viver um dia sem você na minha vida.
Ela olhou para ele. — Não estou indo a lugar nenhum. Este é um lar. Bem aqui, — ela disse, levantando a cabeça para beijar sua boca. — E aqui mesmo. — Ela beijou a base de sua garganta, depois outra no centro do peito, onde seu coração batia fortemente atrás do esterno. — E bem aqui. Asher sorriu. — Continue. Sou todo seu. Ela riu e se levantou, pegando a mão dele enquanto entrava no chuveiro e ligava a água. — Vamos trabalhar com o resto de você primeiro. Mas definitivamente quero voltar a essa ideia.
Capítulo 27 Naomi saiu do quarto principal usando a camiseta de Asher, o cabelo ainda úmido do chuveiro. Por mais que quisesse se perder no conforto e na paixão de seus braços, seus pensamentos também estavam na garotinha dentro da casa com eles. Ela subiu pelo corredor e sorriu ao encontrar Penny dormindo no sofá, o grande corpo de Sam encolhido contra ela nas almofadas finas. A criança dormia como se não tivesse tido um bom descanso por semanas, e talvez não teve. O mais silenciosamente que pôde, Naomi se aproximou e pegou uma manta de crochê e colocou-a sobre o cachorro roncando e a garota. Ela deu um passo atrás, simplesmente olhando para a cena pacífica, com o coração apertado de satisfação. — Ei. — O sussurro baixo de Asher acariciou seus sentidos quando veio para ficar ao lado dela em nada além de uma calça larga de ginástica. Suas feridas estavam quase desaparecidas agora, as piores nada além de marcas rosadas em sua pele dourada. — Sam está em sua glória. Naomi assentiu. — Não consigo parar de pensar sobre o resto deles. As outras crianças na cidade.
Ele deu um beijo suave no ombro dela. — Voltaremos amanhã à noite, assim que o sol se puser. — E se não encontrarmos todos eles, Asher? — Então, vamos voltar de novo na noite seguinte e depois disso. Até os trazermos todos para casa. — Casa, — ela murmurou, voltando-se para olhar para ele. — Gosto do som disso. — Eu também. — Ele ergueu o queixo e roçou os lábios nos dela. — Venha comigo, Naomi. A garota vai dormir até de manhã. Ele a trouxe de volta ao quarto e fechou a porta silenciosamente atrás deles. Seus beijos eram apaixonados, mas ternos. Reverentes. Veneráveis. Por mais cansada que estivesse do sofrimento, a boca dele na dela despertou um desejo febril. Ela o queria. Cada toque a deixou em chamas. Cada beijo a deixou desesperada por mais. E ele também a queria. Naomi deslizou a mão por baixo da cintura frouxa da calça e segurou o comprimento dele. Era aço puro enquanto o acariciava, ainda aveludado e quente contra a palma da mão. Quando ele alcançou sob sua camiseta para acariciar seus seios, ela caiu contra ele. Então ele moveu sua mão para a junção encharcada e dolorida de suas coxas e ela estava perdida, choramingando suavemente com saudade. Não houve hesitação quando a levou para a cama. Entrou nela com um longo e lento golpe que quase a fez gozar na hora. Fizeram amor em silêncio, perseguindo uma liberação rápida e compartilhada que deixou os dois estremecendo com a intensidade de sua necessidade um pelo outro. Demorou algum tempo até que algum deles se movesse ou falasse. Naomi nunca sentiu mais alegria em toda sua vida. Nem mais satisfação. Mas seus pensamentos continuavam voltando para Slater e o preço imperdoável que Michael pagou por participar de sua inútil busca por vingança. A sacola cheia de dinheiro de Slater estava no canto do quarto. Ela olhou para ela, odiando a visão disso agora.
— Não posso ficar com o dinheiro dele, — ela murmurou. — Falei sério quando disse que não queria nada de Slater, nem mesmo o dinheiro. Asher se levantou em seu cotovelo e deu um aceno sóbrio. — Não precisamos disso. — Nós não, certo? Vamos descobrir tudo. Posso conseguir trabalho em algum lugar. — Ela sorriu para ele. — Trabalho que não requer perucas ou uma dúzia de identidades falsas. Vou ser totalmente legal a partir deste ponto. Ele sorriu. — Não precisa se preocupar com isso. — Sim, preciso. Cuidar de meia dúzia de crianças não sai barato, Asher. — Sei disso, — ele admitiu. — E corrija-me se estiver errado, mas não vamos abrir espaço para mais do que isso? Estava pensando que temos espaço aqui no rancho para pelo menos oito para começar. Mais, uma vez que eu arrume os quartos de hóspedes com alguns dos móveis de Ned e faça mais alguns beliches. Em algum momento, poderíamos acrescentar uma extensão à casa. — Está falando sério? — Naomi olhou para ele. — Amo essa ideia. Mas, Asher, a menos que tenha descoberto ouro aqui ou tenha algum direito sobre o petróleo, não acho que conseguiremos fazer nada disso. — Não tenho nenhuma dessas coisas. — Então o quê? — Quando Ned morreu, me deixou esta casa e a terra que veio com ela. Me deixou aquela caminhonete e aquele velho cachorro amarelo lá fora também. Mas também me deixou outra coisa. Ele saiu do colchão e caminhou gloriosamente nu até a cômoda e tirou algo da gaveta de cima. Em sua mão havia um envelope com o endereço do remetente de um banco em Las Vegas. Ele entregou a Naomi. — Abra. Ela o abriu e puxou a folha de papel dobrada dentro. — É um extrato bancário do mês passado com seu nome. — Seu olhar se desviou para o total da conta. — Puta merda. Isso é um monte de dígitos. Ele riu. — Nós vamos sobreviver. Vamos mais que sobreviver. Mas onde...
— Uma das paixões de Ned era fazer móveis. Outra jogar na loteria toda semana sem falhar. Dois anos depois da morte de Ruth, acertou um grande prêmio. Um milhão e meio, mais correção. — Oh, meu Deus. — Naomi sentou-se contra os travesseiros, seus dedos tremendo enquanto olhava para o total novamente, o que combinado com os juros oscilava perto do dobro dessa quantia. — Ele não gastou um centavo, — disse Asher. — Me disse que sem Ruth para curtir com ele, o que precisava? Não acho que qualquer coisa agradaria ao velho mais que saber que o dinheiro que ganhou ajudaria a dar a um bando de crianças um novo começo na vida. Ela não podia acreditar no que estava vendo, no que estava ouvindo. — Asher, não sei o que dizer. Ele sentou-se na beira da cama, seu olhar intenso. — Diga que me deixa compartilhar com você e com essas crianças. — Mas só se você quiser. Uma imagem passou por seus pensamentos – através de seu coração e alma. Viu Asher e ela alguns anos no futuro, uma casa cheia de crianças tagarelas, selvagens e um rancho cheio de animais. Ela se viu segurando um bebê pequeno em seus braços, um com lindos glifos como seu pai e seu próprio cabelo preto e olhos amendoados. Asher assentiu. — Eu quero também. Quero a coisa toda... com você, minha incrível Narumi... como minha mulher e parceira, a única amiga que vou precisar. Como minha Companheiro de Sangue. Sua garganta entupiu de alegria. — Não consigo pensar em nada que queira mais. Um gemido baixo vibrou no peito de Asher quando ele se aproximou dela e levou o pulso até a boca. Com os olhos brilhantes e quentes, suas pupilas finas como navalhas, afundou suas presas nos músculos e tendões e abriu a veia para ela. — Beba, — ele disse ternamente. — Seja minha para sempre. — Asher, — ela sussurrou, abaixando a cabeça para aceitar seu presente e seu vínculo. — Tenho sido sua todo o tempo.
Ele jogou a cabeça atrás numa maldição sibilada quando ela tomou o primeiro gole. Seu sangue correu quente e formigando em sua língua. Cada gole era uma revelação, enviando calor e poder rugindo dentro dela com a força de um maremoto. Ela gemeu e tomou um pouco mais, sua sede se desenrolando, despertando algo dentro dela que nem sabia que existia. Era ele... Asher. Ela sentiu-o em seus sentidos, em sua medula, em cada partícula desfraldada de seu ser. Ela sentiu o amor dele trançando junto com o dela quando o vínculo se firmou. Asher a colocou de volta na cama embaixo dele e entrou nela enquanto ela se alimentava, sua boca faminta ainda agarrada ao pulso dele. Ela não conseguia o suficiente dele, desse incrível macho Raça. O homem dela. O amor dela. Seu companheiro eterno.
Epílogo Quatro semanas depois Asher bateu o último prego no lugar e se afastou com um grunhido de satisfação. — O que acham, pessoal? Cinco jovens garotos estavam num semicírculo na loja de madeira, avaliando o recém-terminado beliche em que todos trabalharam juntos. Max, o mais velho dos gêmeos de cabelos escuros, espelhava a postura de Asher, com as mãos apoiadas nos quadris e o martelo pendurado no laço do cinto. — Parece bom e forte para mim. Seu irmão Billy assentiu com entusiasmo. — Gosto disso. Outro aceno de cabeça de Juan, que estava entre Tyler e o mais novo garoto a se mudar para o rancho, um tímido de doze anos chamado Kevin. Asher encontrou o olhar incerto da criança. — Acha que isso vai funcionar para você, Kev? — Sim, — ele murmurou, tentando esconder seu sorriso. Em vez de administrar o rancho como um abrigo, ele e Naomi decidiram torná-lo um verdadeiro lar. Documentos de tutela estavam em
andamento com o Estado para Penny e os quatro garotos, e se Kevin decidisse ficar por perto, logo o acrescentariam à lista oficial da família também. Embora normalmente demorasse meses, se não anos, para que os casos de adoção terminassem nos tribunais, Asher e Naomi tiveram uma pequena ajuda do lado deles na forma de uma certa oficial da JUSTIS que se tornou uma amiga. Rachel Reynolds não só varreu a investigação da morte de Slater para debaixo do tapete, mas também se assegurou que nenhuma das cenas de vigilância tomadas no Moda naquela noite sobrevivesse. Quanto ao dinheiro de Slater, Naomi doou para um abrigo familiar na cidade – incluindo o prêmio de mais de um milhão do cassino que ela herdou de Michael como única beneficiária listado em seu testamento. Sua casa foi demolida e o lote logo seria reaproveitado para um parque no bairro. Asher sorriu para os meninos e bateu no ombro de Max. — Acho que devemos ir buscar Naomi e Penny para que elas possam verificar o nosso trabalho? — Claro, — disse Max. — Então vai me mostrar como esculpir o trabalho de detalhe como está fazendo com essa peça por lá? Asher assentiu, olhando para o novo projeto em que estava trabalhando sozinho pelas últimas duas semanas. Estava coberto com um lençol para impedir que Naomi fosse intrometida sobre o presente que estava fazendo para ela, mas ele já compartilhou o segredo com os meninos. — Sim, amigo. Terei todo o prazer em ensinar o que sei. Max deu-lhe um sorriso raro. — Impressionante. Com o novo beliche acabado e outros três nos quartos de hóspedes, tinham um amplo espaço para todos – além de mais alguns. Asher tinha a sensação de que não demoraria muito para preencher essas novas camas e o espaço extra da casa. Se conseguisse, dentro de um ano, ele e Naomi também estariam enchendo o berço que planejava surpreendê-la assim que terminasse. — Vamos, pessoal. Ele levou o grupo de meninos para a varanda, onde Naomi estava com Penny e Sam mais cedo para assistir o pôr do sol. Mas devem ter se aventurado na propriedade em algum momento entre então e agora. Asher não se
preocupou; podia sentir sua Companheira de Raça em cada batida de seu coração contente. O crepúsculo se instalou no deserto, lançando tudo num tom azul frio que não era nem dia nem noite. Sua hora favorita. Sorriu ao ver as garotas e o cachorro chegando de um pequeno trecho de terra no lado oeste da propriedade, onde Naomi passara a última semana transplantando cactos floridos e suculentas. Ontem à noite, Asher ajudou-a a colocar duas pequenas lápides ao lado do par castigado pelo sol que ficou ali por mais anos. Agora a mãe de Naomi e Michael tinham um lugar com eles também, junto com Ned e Ruth, que seriam considerados familiares enquanto Asher vivesse. O sorriso de Naomi quando se aproximou enviou calor para cada célula e osso em seu corpo. Bem como alguns outros lugares. — É uma noite tão linda, — disse ela, cumprimentando-o com um breve beijo. — Penny e eu decidimos dar um passeio e pegar algumas flores silvestres para minha mãe e Ruth. Como está a fabricação de móveis? Billy foi o primeiro a responder. — Terminamos o beliche e parece incrível! Naomi recompensou todos os cinco garotos com um sorriso brilhante. — Essas são ótimas notícias. Não posso esperar para ver isso. Típico de crianças, já estavam distraídos com Sam, que encontrou um pedaço de pau e agora estava implorando para alguém brincar com ele. Em poucos instantes, o grupo foi junto com Penny, revezando-se para jogar o novo brinquedo favorito de Sam no jardim da frente. Asher olhou para Naomi, observando-a deliciar-se ao observar o bando de crianças barulhentas e risonhas. — Olha como estão felizes, Asher. Ele grunhiu e puxou-a para perto. — Gosto de ver como você está feliz. — Eu estou, — disse ela, olhando para ele. — Nunca imaginei que pudesse ser tão feliz. Nunca percebi como é bom se sentir finalmente em casa. Ele a beijou, ignorando os gemidos e gritos de “Eca, nojento!” de Tyler e Billy no quintal.
— Eu te amo, — ele disse à sua Companheira. — A casa que me deixa mais feliz é aquela que vejo nos seus olhos. O olhar de Naomi manteve o dele na calma da escuridão crescente. — Venha sentar comigo por um tempo, — disse ela. Então pegou a mão dele e o levou de volta para a casa deles, onde as duas cadeiras de balanço esculpidas à mão por Ned esperavam por eles na varanda.
Fim.