Apropriação do conceito de Educomunicação no âmbito da Sociedade Civil: Terceiro Setor e Mídia

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ANTONIA ALVES PEREIRA

PROJETO DE PESQUISA

APROPRIAÇÃO DO CONCEITO DE EDUCOMUNICAÇÃO NO ÂMBITO DA SOCIEDADE CIVIL: TERCEIRO SETOR E MÍDIA

Pesquisa documental sobre as atividades educomunicativas desenvolvidas por organizações ligadas à Rede CEP em parceria com as redes de ensino federal, estadual e municipal, entre os anos de 2000 a 2010, e sua repercussão na mídia.

Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação Área de concentração: Interfaces Sociais da Comunicação Linha de pesquisa: Comunicação e Educação Nível: Mestrado


APROPRIAÇÃO DO CONCEITO DE EDUCOMUNICAÇÃO NO ÂMBITO DA SOCIEDADE CIVIL: TERCEIRO SETOR E MÍDIA Pesquisa documental sobre as atividades educomunicativas desenvolvidas por organizações ligadas à Rede CEP em parceria com as redes de ensino federal, estadual e municipal, entre os anos de 2000 a 2010, e sua repercussão na mídia.

RESUMO

A pesquisa pretende pontuar as experiências bem sucedidas das organizações do Terceiro Setor que compõem a Rede CEP em parceria com a educação básica, em nível nacional, estadual e municipal, bem como sua repercussão na sociedade para verificar a apropriação do conceito de educomunicação, entre os anos de 2000 a 2010. Partirá de tese doutoral defendida em 2004 sobre a metodologia dessas organizações.


1. Introdução Desde o Relatório Jacques Delors, “Educação, um tesouro a descobrir”, (1996) com seus célebres eixos básicos de competências – a prender a ser, aprender a conviver, aprender a fazer e aprender a conhecer – muito se caminhou no sentido de ampliar o leque do trabalho com competências e habilidades. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB (Lei 9.394/96) apresentou avanços significativos na educação brasileira, ganhando força com os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs (2000) que apresentaram questões pontuais com documentos para o Ensino Fundamental (EF) e Ensino Médio (EM), este último sendo organizado em três áreas curriculares: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias; Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias; e Ciências Humanas e suas Tecnologias. Em 2007 surgiu o Programa Mais Educação (Portaria Interministerial nº 17/2007) apresentando a proposta de educação integral. Desde então, o EF e EM vem sendo revisto pelo MEC a fim de garantir educação de qualidade por meio de reformulação curricular. O programa está sendo desenvolvido prioritariamente nas escolas que apresentaram baixo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), situadas em capitais e regiões metropolitanas, mas deverá atingir a todas as redes federal, estaduais e municipais. Em 2008, as atividades atenderam 1.380 escolas em 55 municípios, nos 27 estados, beneficiando 386 mil estudantes. No ano seguinte, foi ampliado para cinco mil escolas de 126 municípios, de todos os estados e no Distrito Federal para atender a 1,5 milhão de estudantes. Em 2010, o programa já atendia dez mil escolas, beneficiando a três milhões de estudantes. Com Mais Educação, a educomunicação adentra no universo das redes de ensino como política pública, sendo dessa forma legitimada pelo Ministério da Educação (MEC) através das oficinas utilizando a linguagem midiática como prática educativa. O conceito de educomunicação entra como oitavo entre os dez “macrocampos1” de atividades a serem desenvolvidas na escola enquanto espaço de educação integral. Esse macrocampo é assessorado pelo NCE/USP e desenvolve atividades envolvendo as seguintes mídias: Jornal escolar, Rádio escolar, História em quadrinhos, Fotografia e Vídeo. Em 2010, foi a vez do EF2 se organizar em áreas do conhecimento: linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e ensino religioso. Essa reformulação 1

Os macrocampos do Programa Mais Educação: 1) acompanhamento pedagógico; 2) meio ambiente; 3) esporte e lazer; 4) direitos humanos; 5) cultura e artes; 6) cultura digital; 7) prevenção e promoção da saúde; 8) educomunicação; 9) educação científica e 10) educação econômica. 2 Resolução de 14 de janeiro de 2010 Resolução Nº 1, DE 14 DE JANEIRO DE 2010 - Define Diretrizes Operacionais para a implantação do Ensino Fundamental de 9(nove) anos. Disponível em:


aponta para mudanças significativas nas séries iniciais e finais do Ensino Fundamental, abrindo-se para possibilidades de parcerias com a sociedade civil. Quando nos referimos à educomunicação, vamos além dos aparatos tecnológicos – que não é o foco dessa pesquisa – para adentrar no âmago da questão das tecnologias sendo incorporadas como perspectiva pedagógica na perspectiva de ampliar o coeficiente comunicativo das relações no interior do ecossistema comunicativo na escola pública, que trabalha com a educação integral e em parceria com organizações do terceiro que trabalham com educomunicação. Silva Filho (2004, p. 240) afirma que “as instituições de educomunicação são efetivamente

um

espaço

de

desenvolvimento

de

competências

e

habilidades

comunicacionais”. Os jovens e crianças “participam ativamente dos processos, muitas vezes, são eles mesmos a determinarem o que e como se deve fazer” (p. 245).

2. Objeto A presente pesquisa se volta para a prática da educação integral nas escolas públicas em parceria com os organismos do Terceiro Setor que compõem a Rede de Experiências em Comunicação, Educação e Participação (Rede CEP)3 que têm seus trabalhos fundamentados na educomunicação – e com o Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São Paulo (NCE/USP) que vem atuando em assessoria de políticas públicas e na recém-criada Licenciatura em Educomunicação na Escola de Comunicações e Artes (ECA/USP). Esta pesquisa não pretende investigar como está acontecendo esse processo nas escolas beneficiadas pelo Programa, tema de outra pesquisa a iniciar-se na Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da ECA/USP, sob a responsabilidade de uma orientanda recémingressada no programa. Meu interesse específico, ao invés, é pontuar experiências bem sucedidas que estejam acontecendo por meio de parcerias com as organizações do Terceiro Setor vinculadas à Rede CEP. Trata-se de uma organização que se formou tendo sua metodologia passada pelo crivo da tese doutoral de Genésio Zeferino da Silva Filho intitulada “Educomunicação e sua metodologia: um estudo a partir de práticas de ONGs do Brasil”, trabalho orientado pelo Professor Dr. Ismar de Oliveira Soares. <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=2465&Itemid=>. Acesso em: 18/01/2011. 3 A Rede de Comunicação, Educação e Participação - Rede CEP foi constituída em setembro de 2004 e hoje reúne dez organizações, um centro de pesquisa e dois colaboradores com vasta experiência nas áreas de Comunicação, Educação e Participação, entendida por esta organização como educomunicação.


A tese de SILVA FILHO verificou que as instituições do Terceiro Setor que trabalham com a inter-relação comunicação/educação, ou simplesmente educomunicação, se organizam em torno de práticas que garantem o verdadeiro exercício da cidadania pelos estudantes, uma vez que as atividades acontecem mediante uma gestão participativa e suas ações se dão por projetos, levando-as à constituição de um sistema metodológico peculiar em seu jeito de atuar. Seu estudo respaldou-se nas pesquisas do NCE/USP que vem sistematizando experiências, projetos e estudos na inter-relação comunicação/educação/ tecnologia na América Latina desde os anos 1998. A tese de doutorado “Educomunicação e sua metodologia: um estudo a partir de práticas de ONGs do Brasil”, defendida em 2004, é nosso ponto de partida por demonstrar que o sistema metodológico das oito organizações investigadas, que trabalham com o conceito de educomunicação como intervenção social, apresenta possibilidades significativas de transformação para a educação. O autor verificou que as práticas educomunicativas delas têm na interdiscursividade e na multirreferencialidade seu eixo estruturador; no incentivo e no exercício do protagonismo juvenil, da gestão participativa e da ação por projetos o seu modus operandi, ou seja, suas faculdades operacionais. Essas práticas constituem-se em espaço de aceitação e de elaboração de valores, bem como de desenvolvimento de competências e habilidades comunicacionais. (SILVA FILHO, 2004, p. 251)

Seis dessas organizações fazem parte da Rede CEP que se orgulha em ter o NCE/USP4 como um centro de pesquisa fazendo parte de sua constituição, devido a suas contribuições no âmbito de pesquisas, na assessoria e consultoria em projetos e programas na inter-relação comunicação/educação. Também desenvolve projetos e programas no âmbito das políticas públicas junto aos governos federal, estadual e municipal. Essas organizações têm forte relação com o incremento de políticas públicas para a tríade comunicação, educação e participação, como foi demonstrada em pesquisa para a Unicef realizada por Rosetti (2005) evidenciando também suas práticas. Por este motivo, a presente pesquisa pretende focar nas relações estabelecidas com as redes de ensino para averiguar de que forma elas podem contribuir com as instâncias federal, estadual e municipal para a qualidade da educação pública.

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Reconhecido como centro de pesquisa pela Rede CEP, O Núcleo de Comunicação e Educação – NCE/USP nasceu em 1996, no espaço da Universidade de São Paulo, reunindo um grupo de professores de várias universidades brasileiras interessadas na inter-relação entre Comunicação e Educação. Seu primeiro grande trabalho foi uma pesquisa junto a especialistas de 12 países da América Latina e países da Península Ibérica para saber o que pensavam os coordenadores de projetos na área e qual o perfil dos profissionais que trabalham nesta inter-relação.


Segundo Silva Filho (2004), as práticas educomunicativas dessas organizações proporcionam uma situação ideal de gestão dentro da escola no âmbito da comunicação. Isso porque estamos imersos em entornos que se dão pelas tecnologias da comunicação e da informação (TIC), mas que são, muitas vezes, carentes de habilidades de convivência. Com certeza, todas as escolas gostariam que seus alunos se expressem criticamente diante da mídia, da sociedade e dos conteúdos trabalhados em sala de aula. Condição de quem é “tem vez e voz” num ambiente em que o forte é gestão participativa e democrática. Esse idealismo é prérequisito nos trabalhos das organizações de educomunicação. Se a educomunicação já se encontra legitimada pelo MEC desde 2007, o caminho para parcerias com organizações educomunicativas encontra-se efetivado para a realização de tantas outras atividades em programas governamentais como o “Mais Educação”. É o que se percebe nos documentos “Passo a Passo – Mais Educação” (2007) e no relatório resultado de pesquisa quantitativa em 2007, para a implantação do programa, iniciou-se uma apresentando-se seu resultado em 2009 por meio do relatório5 que teve por objetivo “investigar as experiências de ampliação da jornada escolar no ensino fundamental em curso no Brasil, identificando as principais práticas em vigor e as concepções a elas subjacentes”. (MEC, 2009, p.5). São mais de cinco mil municípios no território nacional. Dos 2.112 municípios que responderam ao questionário, 500 tem experiências de ampliação da jornada de atividades no Ensino Fundamental, alguns mais de uma experiência como atestam as 800 apresentadas. Os dados mostram foram implantadas recentemente: há um ano (39%), dois anos (54,8%) e três anos (67%). No entanto, as regiões Sul e Sudeste vêm desenvolvendo experiências de jornada escolar ampliada há mais de dez ou até mesmo há mais de 20 anos. Quase a metade (45,5%) delas apresentam oito horas diárias de atividades e 55,5%, associam a uma carga horária maior ou igual a sete horas, o que é considerado “tempo integral” pela legislação6 que admite e valoriza a realização de experiências extraescolares porque “na contemporaneidade, a educação busca ultrapassar os muros da escola para interagir com o território que a envolve” (MEC, 2009, p. 27).

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O relatório “Educação integral/educação integrada e(m) tempo integral: concepções e práticas na educação brasileira – Mapeamento das experiências de jornada escolar ampliada no Brasil” apresenta as atividades/experiências realizadas em nível nacional, regional e estadual por representantes das universidades: UFPR, UNB, UNIRIO, UFRJ, UERJ, UFMG e ULBRA. 6 Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB 9.394/1996.


Das 800 experiências, 299 são desenvolvidas durante cinco dias da semana, com oito ou mais horas diárias. A maioria acontece em turno contrário (641) ao período letivo, sendo que 76,4% estão integradas ao Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola. Relendo o relatório à luz do “macrocampo educomunicação”, evidenciamos que foram desenvolvidas 75 atividades relacionadas a rádio/jornal e 365 a informática, sendo que 214 delas foram realizadas em sala de multimeios. Quando realizadas fora da escola, o local “ONG” – organização do terceiro setor – apareceu 27 vezes. Funcionários de ONG aparecem 25 vezes mencionados como responsáveis e apenas cinco vezes como coordenadores. No entanto, no item “outros” aparecem a secretaria de educação estabelecendo parcerias com outras instâncias como direção da escola, outras secretarias ou ONG. Os dados permitiram aos relatores afirmar que mesmo com um número significativo de experiências em nível nacional, ainda não atendem a todos os alunos dos municípios, o que “aponta para a necessidade de, no país, independentemente da região, aumentar o número de estudantes do ensino fundamental com jornada escolar ampliada, mesmo naqueles municípios que já vêm desenvolvendo esse tipo de experiência” (p. 20). Em suas considerações finais, o relatório afirma que é preciso buscar respostas para a formulação de políticas que “enfrentem o desafio de aumentar o número de alunos nas experiências em jornada escolar ampliada diminuindo as diferenças regionais em relação a esse aspecto e contemplando” (MEC, 2009, p.126). Apesar de evidenciar a pequena participação das universidades, fundações e ONGs como parceiras nos projetos, aponta para “a existência de uma proporção significativa de parcerias com a comunidade que sinaliza um enraizamento da escola no entorno e pode revelar um maior envolvimento dos sujeitos (pais, moradores e outros) com as experiências” (MEC, 2009, p. 133). Esse panorama delineado pela pesquisa evidencia a necessidade de políticas e ações que “subsidiem os projetos em andamento e estimulem novas experiências, contribuindo para reduzir as desigualdades e para qualificar as ações, tendo em vista a garantia do direito à educação numa perspectiva integral”. (MEC, 2009, p.134). Os dados conclusivos do relatório abrem caminho para a presente investigação que almeja levantar as experiências bem sucedidas realizadas na escola em parceria com as organizações do Terceiro Setor (Rede CEP) a fim de verificar como se deu a apropriação do conceito de educomunicação pelos estudantes e professores. Se os jovens que participam das


organizações são beneficiados com essa prática metodológica como atesta Silva Filho (2004), é possível que aconteça aos estudantes das escolas que utilizam a educação integral como ampliação de seu currículo escolar. Se essas experiências existem e são significativas, certamente, são noticiadas e reverberadas pelas comunidades locais, por este motivo, a pesquisa ainda pretende sondar como se deu sua repercussão. Para isso serão analisadas as notícias e informações divulgadas pela mídia convencional (jornal, revistas, rádio e televisão) e de Internet (redes sociais, blogs, sites, etc) a respeito dessas experiências em seu entorno social e cultural onde acontecem essas experiências, entre os anos de 2000 a 2010. Parto da hipótese de que a parceria entre as organizações fundamentadas no conceito de educomunicação com as escolas de educação básica podem agregar valor significativo aos estudantes por sua metodologia baseada em três eixos fundamentais: protagonismo juvenil, gestão participativa e ação por projetos. Isso porque a comunicação no interior delas é participativa, democrática e descentralizada, de maneira a favorecer a co-participação, a integração de todos os participantes, em seus diversos níveis, em torno de determinados objetivos e metas comuns. Comprovando-se essa hipótese, parte-se para uma hipótese complementar que evidencia que as atividades desenvolvidas sob a ótica da educomunicação se dão num ecossistema comunicativo que propicia o desenvolvimento de competências e habilidades para o exercício da comunicação. Sendo assim, supõe-se que as crianças, adolescentes e jovens que participam de atividades sob a gestão dessas organizações, têm potencializadas suas competências e habilidades comunicativas, seu protagonismo juvenil e sua melhora na aprendizagem de conteúdos curriculares. Portanto, a relevância da pesquisa encontra-se na pontuação das experiências bem sucedidas realizadas pelas organizações educomunicativas em parcerias com escolas da Educação Básica em diversas regiões brasileiras no momento em que o Ministério da Educação (MEC) rever suas políticas públicas para o Ensino Fundamental e Ensino Médio e se abre a parcerias com a sociedade civil. Os levantamentos da tese de Silva Filho (2004) e do livro de Rosetti (2005) são precursores nesse momento histórico. Sua originalidade refere-se ao fato de ser a primeira pesquisa que pontuará essas experiências unindo terceiro setor e educação pública, podendo tornar-se uma referência para as instituições educacionais, para as associações do terceiro setor e para o curso de licenciatura em Educomunicação.


3. Quadro Teórico de Referência Nossa revisão literária parte dos estudos de Soares (2002, 2003, 2008, 2010), consciente de carregar neles pensadores como Paulo Freire que propõe a pedagogia do diálogo desnudando a concepção de educação bancária; Mário Kaplún que é pioneiro nos estudos de comunicação ligados aos processos educativos; Jesus Martín-Barbero que vem trabalhando na relação comunicação e cultura e suas relações tecnológicas; ainda serão considerados pesquisadores do Núcleo de Comunicação e Educação (NCE/USP) e da área de concentração Interfaces Sociais da Comunicação do PPGCOM, bem como estudos de doutorado e mestrado que vem investigando projetos e programas que estão utilizando a educomunicação como campo de intervenção social na educação formal e não-formal. A tese de Silva Filho (2004) sobre a metodologia das instituições que trabalham com educomunicação é uma das referências primordiais, não só pelo fato de investigar as práticas das instituições, mas por referenciar o conceito de ecossistema comunicativo a partir de Pierre Babin, Martín-Barbero e Soares. Aprofundando os estudos acerca de ecossistema comunicativo7, pretende-se alargar esse horizonte em pesquisas recentes dos pesquisadores Javier Echeverría (1999) sobre terceiro entorno e Umberto Galimberti (2006) sobre a teoria da ação a partir da perspectiva da educomunicação seguindo os estudos de Soares (2008, 2010). Também é fonte de pesquisa, o livro de Rosetti (2005) sobre “Mídia e Escola – perspectivas para políticas públicas”, resultado de pesquisa do Unicef. Além de toda de toda publicação do Ministério da Educação em questão de leis, decretos, portarias e documentos orientativos que façam referência à educação integral. Apesar de heterogêneas, essas organizações “têm como proposta central inserir práticas comunicativas no ensino. (…) Elas trabalham com diferentes mediações tecnológicas “em projetos que de tal envergadura que, se ainda não são, estão em vias de se tornar políticas públicas”. (ROSETTI, 2005, p. 8). É justamente esse recorte que pretendemos realizar em nossa pesquisa a respeito de sua atuação no ensino formal em parceria com a rede pública de educação nacional e/ou em suas regiões de atuação. A história do livro é entrelaçada à Rede CEP por ser fruto da pesquisa realizada a partir da convocatória do Unicef, em 2002, para que fossem apresentados projetos que

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Fruto das pesquisas de Barbero, esse ecossistema pode ser considerado sinônimo de “terceiro entorno” (Javier Echeverría) ou “bios midiático” (Muniz Sodré).


“apontassem caminhos para a construção de políticas públicas de Comunicação, Educação e Participação, a partir dos conhecimentos e experiências acumulados em projetos que vinha apoiando no Brasil” (ROSETTI, 2005, p.8). Para a pesquisa foram escolhidas nove instituições que apresentavam afinidade na tríade “comunicação-educação-participação”. Distribuído a 3.500 secretários de educação municipais e estaduais, disponibiliza as metodologias e os aprendizados construídos por essas organizações, estimulando sua adoção por políticas e redes públicas de ensino. Ainda indica as dificuldades e as soluções encontradas pelas organizações pesquisadas para inserir suas práticas no sistema público de ensino e acaba por traçar um diagnóstico até então inexistente no Brasil, que se somou a estudos acadêmicos sobre o tema, realizados no âmbito de algumas universidades do país. A publicação tem um significado importante para a Rede CEP por se constituir em seu primeiro produto e apresentar suas propostas de articulação com a rede formal de educação.

Segundo Rossetti (2005, p.9) o principal objetivo da Rede CEP é “construir em três anos uma proposta abrangente de política pública envolvendo mídia e escola”. Isso porque as novas mídias põem em xeque os modelos tradicionais de ensino e subvertem poderes estabelecidos. O problema da educação hoje não é tanto dar acesso à informação, papel tradicional das escolas, mas dar sentido ao “mar de informações” em que estamos todos mergulhados. Para lidar com tanta informação, é preciso repensar os modelos de Comunicação, Educação e Participação predominantes no século XX. (ROSETTI, 2005, p. 10).

Tanto Silva Filho (2004) quanto Rossetti (2005) revelam inúmeras possibilidades de experiências realizadas pelas organizações junto à educação básica. Ao falar das mudanças observadas entre as crianças e jovens participantes desses programas, Rosetti (2005, p.32), afirma que elas mostram o potencial das abordagens educativas da tríade Comunicação, Educação e Participação, pois percebe-se que elas ampliam o vocabulário e repertório cultural; aumentam as habilidades de comunicação; desenvolvem competências de trabalho em grupo, negociação de conflitos e planejamento de projetos; e melhoram o desempenho escolar, entre outros ganhos. Para Silva Filho (2004) isso acontece devido ao ecossistema comunicativo que se constitui no interior das organizações apontado por ele como “espaço de interdiscursividade e multireferencialidade” em que a experiência educomunicativa “acontece exata e necessariamente na integração ressignificada de diferentes referências, relações, fontes, discursos e experiências vividas no dia a dia das práticas educomunicativas”. (p. 158). O processo de ressignificação se dá a partir do conteúdo/material/entorno que vão tomando contato mediante a multirreferencialidade, bem como pelas experiências que vão sendo vivenciadas e pelos processos metodológicos que se constituem “o eixo estruturador


das práticas educomunicativas dessas instituições. As práticas se dão e se constituem na interdiscursividade e na multirreferencialidade”. (SILVA FILHO, 2005, p.161). Identificou três grandes ações metodológicas: o protagonismo juvenil, a gestão participativa dos processos comunicacionais e a ação por projetos. Ao falar dos valores que são trabalhados nas propostas educativas, enfatiza o trabalho em equipe como base metodológica das instituições de educomunicação e afirma que elas “são espaço de aceitação e de elaboração de valores”, pois nos projetos de educomunicação, os adolescentes e jovens têm a oportunidade não apenas de elaborar e assumir determinados valores, mas também de desenvolver competências e habilidades comunicacionais, tanto para a comunicação pessoal, quanto interpessoal, ou na interação com o entorno social. Essas competências e habilidades os tornam aptos, também, para o uso de tecnologias e o domínio de suas linguagens. (SILVA FILHO, 2004, p. 221).

Suas práticas de gestão comunicativa “buscam convergências de ações, esforços e recursos, sincronizados em torno de um grande objetivo: ampliar o coeficiente comunicativo das ações humanas”. Silva Filho (2004) detectou que a comunicação nelas é participativa, democrática e descentralizada porque há uma maneira de “gerir os processos comunicacionais que possibilita a co-participação, a integração de todos os participantes, em seus diversos níveis, em torno de determinados objetivos e metas comuns”. (p. 247). Em sua pesquisa, fala do ecossistema comunicativo como um espaço que envolve “todas as ações, as pessoas, as metodologias, os conteúdos que fazem parte do processo educomunicativo” (p. 249). Percebeu ainda que esse espaço é propício ao desenvolvimento de competências (conhecimentos ou saberes) e habilidades (capacidades operacionais) para o exercício da comunicação. As competências e habilidades comunicacionais mais evidenciadas nas instituições foram: competência e habilidade para expressão de pontos de vista e interesses; competência para o diálogo e para compreensão das outras pessoas; competência e habilidade para recepção crítica dos meios e mensagens de comunicação social; competência e habilidades para o uso da linguagem de meios de comunicação. (SILVA FILHO, 2004, p. 252).

Ecossistema comunicativo visto como terceiro entorno8? Os entornos a partir da classificação de Echeverría são considerados por Soares (2010, p. 61) como uma cartografia para definição de estratégias de ação. O terceiro entorno é “formado pelo conjunto dos instrumentos de informação e dos meios de comunicação que permitem ao homem deslocarse dos dois primeiros entornos”. (SOARES, 2010, p. 61).

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Os entornos do ser humano classificados por Echeverría refere-se ao âmbito natural (verde ou ecológico, primeiro entorno) e ao entorno urbano (instituições sociais e políticas ligadas à cidade, segundo entorno).


Se a sociedade atual se estabelece no terceiro entorno e se o progresso da técnica e da tecnologia se dá pela intervenção do agir humano, é porque “o sentido da tecnicidade emerge do lugar que a cultura passou a ocupar na sociedade da informação” (SOARES, 2010, p. 62) de acordo com Martín-Barbero. A Teoria da Ação de Galimbert afirma que é “pela ação que podemos posicionar-nos na face da terra, sendo-nos permitido ensaiar esta ação, educar para esta ação, comunicar esta ação. Este é o campo da educação, ou melhor, da educomunicação”. (SOARES, 2010, p. 60). Esses entornos à luz de Galimbert e Echeverría não se deram de forma natural, mas surgiram “em resposta às nossas necessidades de sobrevivência coletiva. São frutos do agir humano, numa dialética cada vez mais veloz entre vida material e vida espiritual, entre a realidade e a esperança”. (SOARES, 2010, p. 61). Abrir as portas da escola para receber o computador e seus periféricos e imergir no universo online por meio da Internet não é necessariamente uma postura de inovação nem de melhoria na educação. As técnicas e tecnologias sempre estiveram aí. Fazer uso delas para garantir o exercício da cidadania e do fluxo de comunicação nos ambientes educativos requer mais que isso, pois uma aproximação essencial ao mundo das novidades tecnológicas, no âmbito da escola, deveria ir além do simples empoderamento pragmático (alfabetização digital), devendo chegar ao nível da produção de conhecimentos sobre o sentido da própria tecnologia nos ambientes dados. (SOARES, 2010, p. 63).

Esse posicionamento do coordenador do NCE/USP aponta para uma reinvenção das tecnologias garantindo “o retorno à capacidade de análise, de previsão e de antecipação da realidade, pelo uso das inteligências e da racionalidade”. (SOARES, 2010, p.63). Dessa forma, o universo escolar tem muito a ganhar com a presença de educomunicadores capazes de minimizar a visão simplificadora que cerca o marketing em torno às tecnologias, pois sua eficácia está na dependência das políticas e nas metodologias e não nos aparatos em si. Além de garantir ao uso da técnica o caráter de ação pedagógica integradora, mediante o exercício democrático do uso dos recursos da informação, esse profissional também será capaz de identificar nos espaços das ciências humanas os referenciais que possam ajudar a entender o fenômeno representado pelas tecnologias. Soares (2010, p. 65) defende o não aprisionamento do conhecimento condicionado à exploração econômica, ou seja, práticas da lógica competitiva levando setores da sociedade a caminhar em direção oposta à lógica colaborativa que a sociedade vem conquistando


mediante a difusão do software livre. Nesse cenário, a autonomia tecnológica por parte dos professores e estudantes é prioridade na disputa entre modelos competitivos e colaborativos. As ideias de Galimberti podem ser vistas como uma reviravolta no estudo das relações com as tecnologias porque defendem uma dependência estreita do homem com as tecnologias, pois foram estas que possibilitaram sua sobrevivência sobre a terra. Para este autor a diferença entre os humanos e os animais não é devido à razão e à inteligência dos primeiros, “mas ao fato de que não dispõe de instintos que o orientem, de forma direcionada, plena e absoluta, na solução de suas necessidades” (SOARES, 2008, p. 50). Por não encontrar respaldo em seus instintos, os homens intervieram no mundo através da sua ação, mediante acertos e erros, criando procedimentos ou técnicas para solucionar suas necessidades imediatas. A grande problematização é que as tecnologias acabaram ganhando autonomia e sufocando o homem por meio de ideologias, tornando plausíveis, indispensáveis ou mesmo obrigatórios certos procedimentos, firmando “a incapacidade de análise, de previsão e de antecipação da realidade” (SOARES, 2008, p. 51). Sendo assim, o homem é convidado a refazer a estrada “tomando consciência – mediante a ação – de exercitar o controle sobre a educação e o trabalho”. A aproximação do mundo das tecnologias ao espaço escolar “vai além do simples apoderamento pragmático, chegando ao nível da produção do conhecimento”. É preciso discutir as tecnologias “como condição civilizatória, caso reconheçamos que seja indispensável que nossos alunos delas se apropriem para não serem por elas dominados”. (SOARES, 2008, p. 52). Considerando o pensamento de Galimberti, pode-se admitir que a educação é um construto humano, uma técnica com seus fundamentos teóricos e procedimentos práticos destinados a formar o homem para uma ação em sociedade. Essa técnica, portanto, produziu suas tecnologias com recursos de linguagens para os processos de ensino e de aprendizagem. Por este motivo, o que Soares (2008, p. 53) propõe é “saber como as tecnologias devem ser assumidas pela ampla comunidade educativa (a escola e seu entorno, somada à família, à mídia e à própria cidade educadora)”. O NCE/USP propõe que as tecnologias sejam introduzidas na escola como uma “mediação na construção de ecossistemas comunicativos abertos e democráticos, unindo a comunidade educativa em torno de projetos de cidadania participativa”. (p. 54). Isso porque é uma proposta baseada em Paulo Freire que reconhece e rejeita o caráter centralizador que acompanha o uso das tecnologias do ensino – a imitar a forma como as mesmas são usadas no mercado e na mídia – considerando que apenas a escola, como agente social presente em todo o território


nacional, teria condições de fazer frente ao modelo centralizador com que as tecnologias são implantadas. (...) Para o NCE/USP, os benefícios que hoje chegam a 30 ou talvez 50 mil jovens atendidos, em todo o Brasil, propiciados pelo trabalho de ONGs de excelente qualidade, permitindo a este grupo o acesso criativo e democrático às tecnologias, deveriam também chegar aos 42 milhões de adolescentes que frequentam o ensino básico. E por que a insistência nos adjetivos “criativo” e “democrático”? Justamente porque o sistema prima em estabelecer a performance individual como “padrão de produção”. No caso, não bastaria aprender a manusear os recursos da informação. Seria preciso saber “por que”, “como” e “com quem”. (p. 54)

O NCE/USP ao invés de incentivar o projeto “Um Computador por Aluno”, sugere um “Laboratório de Multimeios por Escola” porque acredita que se agregaria a habilidade do uso individual de uma tecnologia digital à “habilidade de gerenciamento de projetos multimidiáticos, na forma de consórcios colaborativos, unindo adultos e jovens”. (p.54). Por trás dessa proposta coletiva, figura a prática democrática e criativa de professores e estudantes que daria vida a um ecossistema comunicativo à maneira de Silva Filho (2005) em que estariam integradas “todas as ações, as pessoas, as metodologias, os conteúdos que fazem parte do processo educomunicativo”. Um lugar em que seja possível desenvolver competências (conhecimentos ou saberes) e habilidades (capacidades operacionais) comunicacionais em todos os atores do ambiente educativo. Para Martín-Barbero (1999) o desafio é inserir as tecnologias na escola de maneira a ser uma experiência cultural num entorno informacional e espaço educacional difuso e descentralizado, fazendo desse cenário um processo de aprendizagem que conserve seu encanto. Nessa dimensão, Soares (apud Silva Filho, 2004, 186) conceitua ecossistema comunicacional como algo que “designa a organização do ambiente, a disponibilização dos recursos, o modus faciendi dos sujeitos envolvidos e o conjunto das ações que caracterizam determinado tipo de ação comunicacional”. Em 1997, Soares (apud Silva Filho, 2004, p. 189) já considerava o processo educativo como um ecossistema comunicativo e apresentava quatro razões para isso: A educação - como estrutura formal de ensino – apresenta-se à sociedade como organização completa, onde movem-se pessoas que desempenham funções, emitem, recebem e reelaboram símbolos, relacionam-se institucionalmente bem ou mal com o público externo e, muitas vezes, com os meios de comunicação. A educação trabalha a informação, sistematizando-a e divulgando-a; trabalha o lúdico, mobilizando sentimentos, emoções; cultiva e difunde valores; manipula, se assim podemos dizer, o substrato mesmo da inteligibilidade de toda interação humana. A escola, por definição ou vocação, em não poucos casos, representa um espaço comunicacional único capaz de dar à criança, ao adolescente ou, até mesmo, ao jovem universitário, condições ímpares para expressar-se, desenvolvendo sua capacidade de ter e usar a palavra, uma palavra que, com freqüência, lhe será negada pelo sistema massivo dos meios de comunicação.


A educação é, finalmente, um espaço onde a leitura e a crítica da comunicação – da própria comunicação e da comunicação massiva – podem ser feitas, a partir dos paradigmas oferecidos pelas ciências sociais e pelas ciências do comportamento, sempre que o sistema formal ou não formal de ensino tenha como meta a preparação de cidadãos autônomos frente às reais possibilidades de manipulação exercidas pelos sistemas de meios.

Silva Filho (2004, p. 188) considera que o “ecossistema comunicativo refere-se a relações, a ação comunicativa, a apropriação e manejo de linguagens de comunicação, a finalidades e objetivos das práticas comunicativas”. Para isso é necessário, portanto, que sejam efetivados nas instituições canais de conversação e de entendimento entre todos os atores sociais, revendo formas de entender, conceber e atuar. Ainda, no levantamento bibliográfico serão evidenciadas as pesquisas e documentação sobre a legislação brasileira para a educação, seus programas e projetos que visam uma melhoria na qualidade da educação, de maneira especial, no que tange à educação integral – objeto de nossa pesquisa. Os “Primeiros Passos” do Programa Mais Educação evidencia que a estratégia interministerial envolvendo dez ministérios, promove a ampliação de tempos, espaços, oportunidades educativas e o compartilhamento da tarefa de educar entre os profissionais da educação e de outras áreas, as famílias e diferentes atores sociais, sob a coordenação da escola e dos professores. Isso porque a Educação Integral, associada ao processo de escolarização, pressupõe a aprendizagem conectada à vida e ao universo de interesse e de possibilidades das crianças, adolescentes e jovens. (PRIMEIROS PASSOS, 2007, p. 7).

Esse espaço se configura com abertura a estabelecer uma rede de aprendizagem em torno da educação integral para o “trabalho dos profissionais da educação, dos educadores populares, estudantes e agentes culturais” (p. 14). As experiências precisam “oferecer às crianças, adolescentes e jovens diferentes linguagens, e valorizar suas vivências, modificando o próprio ambiente escolar e a produção do conhecimento” (p. 20). Essa rede transcende à escola, pois a comunidade e a escola “apresentam diferentes possibilidades educacionais e de construção de conhecimento por meio da observação, da experimentação, da interação e, principalmente, da vivência” (p. 30). Em alguns trechos especificamente como no “macrocampo: educomunicação” e nas entrelinhas de sua proposta, o Mais Educação evoca o surgimento de experiências pautadas na educomunicação. Isso nos leva a contextualizá-la em nossa pesquisa como algo que foi se sistematizando e se legitimando na sociedade, de maneira democrática e participativa. Ao falar em educomunicação, trazemos à torna as pesquisas de Soares (2003) a partir do NCE/USP que pontuaram esse novo campo de intervenção social, resgatando os movimentos populares de educação e comunicação dos anos 70. Nos anos noventa suas


pesquisas9 em torno da inter-relação comunicação/educação/tecnologia evidenciaram práticas e reflexões, eventos e publicações realizadas na América Latina (Venezuela, Colômbia e Brasil) e uma experiência envolvendo um grupo de escolas da América do Norte, Central e do Sul, gerenciado pelas Salesianas/FMA10 em torno dessa temática definida mais especificamente no Encontro de Cumbayá, Equador. Esses eventos apontam que a “educação para a comunicação, o uso das tecnologias na educação e a gestão comunicativa transformam-se em objeto de políticas educacionais, sob a denominação comum de educomunicação”. (SOARES, 2003). No Fórum sobre Mídia e Educação11 promovido pelo MEC, os pesquisadores constataram que o desenvolvimento tecnológico cria novos campos de educação e espaços de convergência de saberes, fazendo-os reconhecer uma inter-relação entre comunicação e educação. Hoje estão presentes nas escolas, tecnologias antigas (vídeo-cassete, rádio, projetor de slides, etc) e novíssimas ferramentas (computador, projetor multimídia, lousa digital, Internet, redes sociais, etc.). Mas a escola e seus educadores sabem o que fazer com essas ferramentas? Como lidam com a aprendizagem e a informação? Para Moran (2009) a matéria prima da aprendizagem é a informação organizada/significativa, ou seja, a informação transformada em conhecimento. Para o especialista, “a escola pesquisa a informação pronta, já consolidada e a informação em movimento, em transformação, que vai surgindo da interação, de novos fatos, experiências, práticas, contextos”. (MORAN, 2009). Para trabalhar esse conhecimento que surge da interação, são necessárias novas habilidades das escolas e de seus educadores. Nesse sentido, as pesquisas realizadas no âmbito da educomunicação surgem como aliada nesse processo. 9

Na Venezuela o Congresso Nacional aprovou o Estatuto da Criança e do Adolescente, “com artigos que garantem o direito da jovem geração à expressão e a uma pedagogia da educação para a recepção crítica dos meios de comunicação” (SOARES, 2003, p.35). No Brasil, a Secretaria de Educação do Município de São Paulo iniciou o projeto “Educomunicação pelas ondas do rádio” que pretendia capacitar em quatro anos os membros das comunidades escolares de suas 450 escolas [o projeto deu tão certo que se tornou política pública com a Lei Educom]. Em 1999 aconteceram ainda dois eventos. Em Bogotá, Colômbia, o I Seminário Internacional sobre Comunicação e Educação que resultou no livro “Comunicación-Educación - coordinades, abordajes y travessías”, coordenador por Carlos Eduardo Valderrama (2002) na America Latina. 10 As irmãs Salesianas ou Filhas de Maria Auxiliadora (FMA)são religiosas da Igreja Católica presentes em 89 nações nos cinco continentes. Uma de suas áreas de atuação é a educação e o fazem aproximando a comunicação a sua prática pedagógica, conhecida como Sistema Preventivo de Dom Bosco. Esse primeiro encontro foi avaliado em 2007, com o livro “A Família Salesiana e a nova escola no continente americano: Cumbayá 1 a Cumbayá 2”, publicado origionalmente pela Editora Salesiana e disponível no endereço: <http://www.salesianos.com.br/downloads/Cumbaya1.pdf>. Acesso em: 12/07/2010. Vale a pena dizer nesse momento que a autora desse projeto de pesquisa pertenceu a esse grupo, mais especificamente à Inspetoria Nossa Senhora da Paz – uma das nove províncias no Brasil – com sede em Mato Grosso, entre os anos de 1991 a 2003, portanto, participou ativamente desse processo. 11 MEC, Mídia e Educação: perspectivas para a qualidade da informação, recomendações. 2000, p. 24... Disponível em: <http://www.unicef.org/brazil/pt/midiaedu.pdf>. Acesso em: 25/6/2010.


Esse novo campo de intervenção social, constato pelo NCE/USP em pesquisas realizadas entre 1997-1999 com 172 especialistas de doze países na América Latina, é comprovado por Soares (2003) em 1999/2000, quando realizou pesquisa na Marquette University, Califórnia, EUA, identificando duas áreas de intervenção social: as mediações tecnológicas (informationliteracy) nos espaços educativos e educação frente aos meios de comunicação (media literacy). Mais adiante, enxerga na América Latina mais uma, a gestão da comunicação em espaços educativos, chamada por Martin-Barbero por “ecossistemas comunicativos”. Constatando que a educomunicação trabalha a partir do conceito de gestão comunicativa, define-a Como o conjunto das ações inerentes ao planejamento, implementação e avaliação de processos, programas e produtos destinados a criar e a fortalecer ecossistemas comunicativos em espaços educativos presenciais ou virtuais, assim como a melhorar o coeficiente comunicativo das ações educativas, incluindo as relacionadas ao uso dos recursos de informação no processo de aprendizagem. (SOARES, 2003, p.43).

E para ampliar esse coeficiente comunicativo supõe uma teoria da ação comunicativa que privilegie o conceito de comunicação dialógica; uma ética da responsabilidade social para os produtores culturais; uma recepção ativa e criativa por parte das audiências; uma política de uso dos recursos da informação de acordo com os interesses dos polos envolvidos no processo de comunicação, o que culmina com a ampliação dos espaços de expressão.(SOARES, 2003, p. 43).

4. Objetivos Objetivo Geral: realizar um estudo documental das atividades e práticas desenvolvidas no âmbito da educação integral em escolas públicas assessoradas por organizações que fazem parte da Rede CEP e pelo NCE/USP para averiguar os ganhos para os estudantes em termos de aprendizagem, exercício da cidadania, gestão participativa e competências e habilidades comunicacionais, bem como sua repercussão na sociedade civil mediante pesquisa informacional na mídia. Objetivos Específicos: identificar as atividades e práticas que organizações do Terceiro Setor ligadas à Rede CEP e o próprio NCE/USP realizaram em escolas públicas ligadas ou não ao Programa Mais Educação, no contexto de educação integral, para averiguar como se deu a apropriação do conceito de educomunicação pelos educadores, educandos e escolas; colher depoimentos de estudantes para saber se cresceram em competências e habilidades comunicativas, em gestão participativa, em exercício da cidadania e se sua aprendizagem


melhorou; identificar na postura do educomunicador que será formado pela Licenciatura de Educomunicação da ECA/USP as características elencadas pelo Programa Mais Educação, bem como nas novas diretrizes para o Ensino Fundamental e Ensino Médio, e sua contribuição para a educação brasileira enquanto gestor de processos comunicativos no ecossistema educativo numa perspectiva transformadora; Objetivos teóricos: reler os conceitos de ecossistema, protagonismo juvenil, ação por projetos, competências e habilidades comunicacionais e exercício da cidadania à luz da educomunicação. Objetivos práticos: fazer levantamento das notícias publicadas na mídia convencional (impressa, eletrônica e digital) e na Internet (blogs, sites, redes sociais – em geral e das organizações pesquisadas;), entre os anos 2000 e 2010, a respeito das organizações e escolas envolvidas nas atividades dessa pesquisa, para realizar um diagnóstico-avaliativo acerca da apropriação do conceito de educomunicação e do discurso praticado nas notícias (hegemônico, discursivo ou informativo); definir parâmetros de tratamento das notícias de acordo com a temática, seção, jornalista, enfoque, fontes, teor do discurso (hegemônico, polifônico ou informativo), periodicidade, envolvidos, abrangência, dentre outros; gêneros jornalísticos, quantificação (centímetros de texto por coluna), origem da notícia, levantamento das notícias, tendo por base também a seção “NCE na Mídia”.

5. Procedimentos Metodológicos Para colher informações entre os anos 2000 a 2010 das experiências realizadas pelas organizações da Rede CEP serão realizadas consultas a seu arquivo documental (impresso, vídeo, áudio). Para complementá-las serão feitos questionários e entrevistas com os organizadores, coordenadores e participantes dos projetos. Quanto aos participantes, imaginase que as escolas, professores e estudantes – ainda podem ser possíveis contatá-los, pois eles ainda podem estar na comunidade. Serão estudados também os sites das instituições envolvidas – organizações do terceiro setor, escolas e secretarias de educação – para colher informações que respaldem o material coletado, bem como para ter um posicionamento oficial sobre os projetos e/ou programas. Quanto à repercussão das experiências na mídia, a pesquisa será realizada nas organizações, por meio do clipping que elas porventura tenham realizado, bem como aos


veículos de comunicação das regiões pesquisadas. Será realizado um construído um instrumento para classificar as notícias e informações, quanto ao assunto, fontes, discurso, etc.

6. Considerações Finais A educomunicação encontra-se legitimada pelo MEC desde 2007 como macrocampo no programa Mais Educação. No entanto, práticas educomunicativas vêm sendo realizadas de maneiras pontuais em diversas escolas no território brasileiro em parceria com organizações do Terceiro Setor. Através do programa acima citado, percebe-se que é interesse do poder público fazer acontecer experiências bem sucedidas nas escolas, alargando o tempo em que o estudante fica na escola pública, constituindo-se no que vem chamando de educação integral. Esse é um momento propício para alargar as experiências, apesar de poucas como constatadas no relatório que pesquisou esse item em todos os municípios brasileiros. Essas experiências ainda não atendem a todos os alunos dos municípios, o que “aponta para a necessidade de, no país, independentemente da região, aumentar o número de estudantes do ensino fundamental com jornada escolar ampliada, mesmo naqueles municípios que já vêm desenvolvendo esse tipo de experiência” (MEC, 2009, p. 20). Se as organizações do Terceiro Setor que trabalham com educomunicação puderem ser parceiras das redes de ensino do País, uma grande contribuição será dada à educação de qualidade em nível nacional, estadual e municipal, devido sua prática metodológica. Isso porque as escolas ainda conservam, em sua maioria, práticas de transmissividade de informação elencadas na educação bancária criticada por Paulo Freire desde a década de 60. Sabe-se que as tecnologias precisam ser assumidas pela comunidade educativa como “mediação na construção de ecossistemas comunicativos abertos e democráticos, unindo a comunidade educativa em torno de projetos de cidadania participativa”. (SOARES, 2008, p. 54). Então, porquê com este autor que para o NCE/USP (...) os benefícios que hoje chegam a 30 ou talvez 50 mil jovens atendidos, em todo o Brasil, propiciados pelo trabalho de ONGs de excelente qualidade, permitindo a este grupo o acesso criativo e democrático às tecnologias, deveriam também chegar aos 42 milhões de adolescentes que frequentam o ensino básico.

Para Soares (2008) quando se fala em criativo e democrático, embute-se a necessidade de ir além de saber os processos de produção, é preciso saber “por que, como e com quem”. Portanto, experiências educomunicativas realizadas em escolas públicas podem apontar transformações significativas na educação a curto, médio e longo prazo.


7. Sumário para a pesquisa Introdução PARTE I – EDUCOMUNICAÇÃO, CAMPO EM MOVIMENTO 1. Educomunicação, campo legitimado 2. Terceiro Setor, articulação e mobilização 3. Educação integral, escolas em busca de qualidade 3. Mídia, repercussão de experiências educativas PARTE II – TERCEIRO SETOR E ESCOLAS, PARCERIA DE SUCESSO 4. Experiências educomunicativas, parcerias bem-sucedidas 5. Protagonistas Cidadãos, resultado de práticas transformadoras 6. Aprendizagem em alta, melhora no desempenho dos estudantes

8. Referências Bibliográficas ANDRÉ, Marli E. D. A. de. Etnografia da prática escolar. Campinas: Papirus, 1995. ALVES, Patrícia Horta. Educomunicação: a experiência do núcleo de comunicação e educação. 2002. 123 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Comunicação) – Escola de Comunicação e Artes, Núcleo de Comunicação e Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002.

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9. Cronograma das Atividades de Pesquisa Itens Realização de disciplinas Contato com as organizações Levantamento das notícias Revisão bibliográfica Pesquisa práticas/parcerias Monitoramento, aferição e tratamento dos dados Escrita preliminar Questionários/entrevistas Qualificação Escrita da dissertação

2010

Jan-Fev

Mar-Abr

Mai-Jul

Ago

Set

Out

Nov

Dez


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