ANO VI, Nº 31 // JAN'22 - ABR'22
APDH CELEBRA 20 ANOS
Francisco Matoso relembra percurso da Associação
Prémio de Boas Práticas em Saúde®
Conheça dois dos vencedores
GRANDE ENTREVISTA Constantino Sakellarides:
“O sistema de governação não tem sensores para captar a inquietação profissional no SNS”
Eunice Carrapiço: “O futuro do SNS depende essencialmente das escolhas políticas”
Índice
04 EDITORIAL
L I L L Y
A
I N O V A R
Os 20 anos da APDH e a encruzilhada em que se encontra o SNS servem de mote para o Editorial deste número da revista O Hospital. É também um fenómeno de escolhas sobre os caminhos que queremos percorrer. Foi assim há 20 anos. É assim hoje!
P E L A
CIÊNCIA
06 ATUALIDADE
Francisco Matoso, um dos fundadores da APDH conta-nos a História do nascimento da associação e da sua vocação. Como o próprio diz, não foi um percurso fácil ou facilitado, mas é gratificante o caminho percorrido por um grupo de pessoas que – mesmo não sendo muitos – são fiéis e com grande sentido de responsabilidade.
12 GRANDE ENTREVISTA
Duas visões, o mesmo entusiasmo: defender o SNS e tudo o que ele representa. Na Grande Entrevista desta edição, juntámos um consagrado da Saúde, o professor Constantino Sakellarides, a uma jovem médica de Medicina Geral e Familiar. Ler e entender as duas versões é entender muito do que representa o Serviço Nacional de Saúde.
Vivemos numa era fantástica para a medicina. Na Lilly, utilizamos a inovação na ciência para satisfazer as necessidades médicas nas áreas da diabetes, oncologia, imunologia, doenças neurodegenerativas e da dor. Estamos empenhados em utilizar os avanços mais recentes da ciência para melhorar a vida das pessoas em todo o mundo.
20 DESTAQUE
O serviço de Gastrenterologia e Hepatologia do CHULN é o maior do País. O seu Diretor, Rui Tato Marinho, faz nesta edição o retrato deste serviço e apresenta-nos a melhor forma de tratar da Saúde Digestiva dos portugueses, sem esquecer que é necessário apostar no apoio aos profissionais de saúde que ali trabalham, assim como na investigação e no ensino.
Ouça as histórias de cientistas da Lilly que estão a transformar o mundo com descobertas inovadoras, em lillyforbetter.com.
23 IDEIAS
PP-LILLY-PT-0014/MAR2019
O projeto Ser Raro juntou pessoas e vontades e, durante um ano, debateu os grandes temas relativos às doenças raras em Portugal. O objetivo era apresentar no dia 28 de fevereiro (Dia Mundial das Doenças Raras) as recomendações que devem ser seguidas para que estas pessoas tenham um melhor e mais estruturado acesso à saúde e ao seu tratamento. As recomendações aqui ficam.
Lilly Portugal - Produtos Farmacêuticos, Lda. Torre Ocidente, Rua Galileu Galilei, n.º 2, Piso 7, Fração A/D, 1500-392 Lisboa. Matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Cascais, sob o número único de matrícula e de pessoa coletiva 500165602. Sociedade por quotas com o capital social de €1.650.000,00.
26 ATUALIDADE
Um dos vencedores do Prémio de Boas Práticas em Saúde, da APDH, é apresentado nesta edição. Fala de Teleconsulta de Neurorradiologia de Intervenção e de Encurtar as Distâncias e Potenciar o conhecimento.
36 APDH
A Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Hospitalar (APDH) apresenta as ações e evento que tem vindo a desenvolver e implementar e que provam que estes primeiros 20 anos foram apenas…o começo!
REVISTA DA ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA PARA O DESENVOLVIMENTO HOSPITALAR DIRETORA ANA ESCOVAL COORDENADORA MARINA CALDAS REDAÇÃO MARINA CALDAS, ANTÓNIO SANTOS, ANA TITO LÍVIO EDITORA DE ARTE E PAGINAÇÃO JOANA CÂMARA PESTANA (MYLOGO) FOTOGRAFIA DANIEL PEGO REVISÃO ANA ESCOVAL, ANA TITO LÍVIO, ANTÓNIO SANTOS, SARA ROZMAN, RITA SANTOS IMPRESSÃO UE TIRAGEM 4.000 EXEMPLARES DISTRIBUIÇÃO GRATUITA PERIODICIDADE TRIMESTRAL PROJETO Rua Gomes Freire no9 A r/c 1150-175 Lisboa Tel: 213 530 719 geral@fdc.com.pt PROPRIEDADE ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA PARA O DESENVOLVIMENTO HOSPITALAR (APDH) Gabinete HOPE&IHF Portugal Alameda das Linhas de Torres, 117 1769-001 lisboa Tel. 963 668 745 / 910 069 346 Email: geral@apdh.pt HOPE: hopemail@hope.min-saude.pt IHF: ihf@ihf.min-saude.pt website: www.apdh.pt
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EDITORIAL
SNS: Encruzilhada e Escolhas Europa, sonho futuro! Europa, sonho futuro! Europa, manhã por vir. fronteiras sem cães de guarda. nações com seu riso franco abertas de para em par! Europa sem misérias arrastando seus andrajos. virás um dia? virá o dia em que renasças purificada? Serás um dia o lar comum dos que nasceram do teu solo devastado? (...) Adolfo Casais Monteiro (1944) Europa: Confluência, p. 13-14
A experiência vivida de situações adversas pelas sociedades, à escala regional ou mundial, regista sempre lições para a humanidade aprender com a História de cada uma delas, como se de memória futura se tratasse para em face de sempre inesperados novos eventos utilizar o conhecimento acumulado na resposta ao seu controlo, designadamente na prevenção e mitigação dos impactos negativos. A percepção sobre a capacidade humana de lidar melhor com quadros agudos desfavoráveis não parece evidenciar um significativo acréscimo de literacia basal coletiva no enfrentamento de novos momentos, sobretudo do ponto de vista do comportamento humano e tanto mais pela observação de circunstâncias históricas associadas, mediatamente ante, simultâneo ou póstero. Atente-se nos grandes surtos pandémicos dos séculos XX e XXI, como o Influenza A (1918-19), o Influenza B (1957-58) e SARS-CoV-2 (2020-2022), relacionados em cada momento com crises de guerra ou de mercados. Na era moderna constituíram estes e outros surtos, como a tuberculose, a poliomielite, o VIH/SIDA, enormes desafios para a ciência e tecnologia, identificando os agentes causais, criando princípios ativos para a prevenção e tratamento, próprio ou de complicações, que os sistemas de saúde nacionais logo disponibilizam. Mas subsistem sempre assimetrias regionais no mundo quanto à evolução das epidemias, relacionadas com as desigualdades económicas, sociais e políticas, mais contidos no hemisfério norte e mais persistentes nas populações em largas regiões do sul.
As transições vividas no decurso da atual crise pandémica e na fase de superação, apesar da esperança em melhorias sensíveis, mantêm níveis de incerteza elevados nos tempos do futuro sempre já começados, tanto mais com crises sobrepostas, como os percepcionados na Europa, mesmo na Europa que se sonha como “lar comum” dos que nela nascem ou que a ela aportam... O SNS português está aparentemente numa encruzilhada, com caminhos alternativos à vista ou com melhoria dos caminhos com passos já dados: aproveitando as lições da sua própria história, como as lições da história de eventos adversos com impacto na saúde, passados ou ainda ativos, quiçá este surto epidémico a evoluir para endemia. Juntam-se-lhe os desafios do impacto da crise económica de 2008 persistente e da resolução da mais recente crise de governação do país, como potencialmente favorecendo reformas estruturais da saúde em conjunto com outras, como da solidariedade social, da segurança social, do trabalho, da educação, da ciência e do ensino superior, tendo em vista o melhor bem-estar dos cidadãos, das famílias e das comunidades, naturais ou a viverem em Portugal. A APDH celebra vinte anos de atividade, desde a sua fundação em 4 de abril de 2002, envolvida sempre nos momentos e acontecimentos marcantes da saúde no País, na Europa e no Mundo, representando profissionais e instituições de saúde, hospitais e cuidados de saúde, na sua missão de desenvolvimento da cooperação nacional e internacional entre todos os stakeholders comprometidos com a saúde e bem-estar das pessoas. Um bem haja, aos fundadores e associados da APDH. Um brinde, à saúde em Portugal, a todos os seus profissionais e serviços. A Direção
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ATUALIDADE
De facto, a APDH nasceu e continua a ser uma associação que prossegue fins técnicos científicos do interesse do sector da saúde, público e privado, com total isenção política e alheia à promoção de qualquer interesse comercial.
FRANCISCO MATOSO Vogal da Direção e sócio fundador da APDH
APDH A Multidisciplinaridade como imagem de marca A APDH nasceu há 20 anos no ano de 2002. E nasceu de um sonho associativo inédito em Portugal. O de uma associação de hospitais públicos e privados à imagem de outras associações europeias de hospitais de grande prestígio como a Fédération Hospitalière de France - FHF em França ou a Deutsche Krankenhaus Gesellschaft - DKG na Alemanha. Será porventura interessante recordar que a designação inicialmente escolhida para designar a associação foi Associação Portuguesa dos Hospitais, nomenclatura que não foi autorizada para efeitos registrais devido a antecedentes do sector privado e que desde logo deixava transparecer os objetivos deste projeto. Nasceu assim a Associação Portuguesa para Desenvolvimento Hospitalar sob a sigla APDH.
interesses corporativos, finalidades assumidas por outro tipo de associações. Esta multidisciplinaridade traduz-se desde logo na diversidade profissional da composição dos órgãos sociais eleitos, quer na altura da criação quer atualmente, e constitui um traço distintivo da APDH.
o
Desde a primeira hora que a APDH apostou na multidisciplinaridade como imagem de marca. Não se pretendia que esta organização fosse uma associação com pendor profissionalizante ou de defesa de
Sendo o sector público hospitalar neste período ainda predominante, alguns viam este desígnio associativo como uma possível constituição de um contrapoder. Mas tal propósito nunca foi sequer imaginado.
À vocação nacional logo se juntou, desde o inicio, uma vocação europeia e internacional que decorreu das ligações à Federação Europeia dos hospitais (HOPE) e à Federação Internacional dos Hospitais (IHF). Com efeito, a APDH sempre soube invocar com orgulho a representação nacional nos órgãos sociais daquelas duas organizações internacionais, fruto de um protocolo assinado com o Ministro da Saúde da altura Professor Correia de Campos, representação esta que se mantém na atualidade. Esta representação continua bastante ativa nas atividades presentes da APDH e esperemos que assim continue. Como parte desta resenha é da mais elementar justiça recordar alguns nomes que estiveram e estão inequivocamente ligados à vida desta associação e que de forma desinteressada têm lutado pela sua intervenção ativa na vida nacional. Desde logo o nome do primeiro Presidente da direção, o Professor Ramiro de Ávila, distinto pneumologista e ex-diretor do Hospital Pulido Valente, que com a sua tranquilidade e sentido prático soube liderar os primeiros anos da associação. De seguida o nome da Professora Ana Escoval que, não só sucedeu ao Professor Ramiro de Ávila na direção como foi e é o motor, quando não a transmissão e rodados desta APDH, a quem esta deve ter visto a luz do dia e grande parte da sua existência diária. Finalmente o atual Presidente da direção, Professor Carlos Pereira Alves com a sua experiência, dignidade e sentido de “Estado”, soube conduzir a APDH até aos dias de hoje com renovado impacto.
Está subentendido nestas três menções que outros nomes que têm integrado os órgãos sociais e a estrutura administrativa mereceriam pelo menos igual destaque pela sua contribuição, mais ou menos efetiva, para que a APDH se tenha conseguido estabelecer como parceiro incontornável no sector da saúde no nosso país. E, estamos em crer que o conseguimos ao fim destes muitos anos de atividade, não obstante as muitas dificuldades em fazer passar a nossa mensagem de forma consistente sem sensacionalismos mediáticos e sem (demasiadas) confusões com outros projetos associativos. Através dos seus projetos mais emblemáticos a APDH ganhou um estatuto sólido e consistente e reconhecido no sector que não se confunde com outros intervenientes, desiderato que nos parece essencial para a manutenção da sua existência com um futuro mais tranquilo. Não foi um percurso fácil ou facilitado, de que é exemplo o número de sedes que ao longo destes anos tivemos até à atual, no campus do Hospital Pulido Valente (HPV). Passámos pelas antigas instalações do DEPS do Ministério da Saúde na Avenida Álvares Cabral. Mas também pelas da Direção-Geral da Saúde na Alameda, e depois na Av. Estados Unidos da América, pela Av. Duarte Pacheco até ao edifício D. Carlos do HPV até que em 2021, ainda dentro desta instituição, ás presentes instalações na Alameda das Linhas de Torres. Somos poucos, mas fiéis e com grande sentido de responsabilidade e abnegação com uma experiência profissional acumulada e conhecimento do sector da saúde que nos tem permitido navegar ao longo destes anos com um sucesso tranquilo e reconhecido. Importante será também mencionar alguns dos momentos mais marcantes da vida associativa ao longo destes anos. Os momentos altos da APDH têm sido sem dúvida os seus congressos internacionais dos hospitais (atualmente na sua 9.ª edição) que têm juntado
8 inúmeras entidades e colaboradores constituindo talvez um dos cortes mais transversais da saúde. Prova da capacidade de reinvenção desta associação é a realização, pela primeira vez em 2021, da sua conferência com recurso exclusivo a uma plataforma online, ultrapassando-se assim com êxito assinalável as restrições pandémicas e apontando claramente para um futuro de eventos que será diferente e mais eficiente. As 15 edições do Prémio de Boas Práticas em Saúde® é também uma iniciativa já bem estabelecida e revela bem das possibilidades de parcerias com instituições públicas no desenvolvimento de projetos comuns de alcance nacional. Exemplo também já consolidado da atividade formativa da APDH, com interesse direto para os associados, tem sido a coorganização anual dos cursos de media training que têm permitido a gestores de topo de norte a sul do país de melhorarem as suas competências de comunicação externa e mediática.
9 A vertente internacional da APDH começou pela dinamização do Programa de intercâmbio para profissionais de saúde da Federação Europeia dos hospitais (HOPE) - que permitiu a mais de 250 profissionais de saúde portugueses beneficiarem de uma enriquecedora experiência europeia e a mais de 150 profissionais europeus contactarem com a realidade portuguesa.
modelo de presença física completa para as nossas colaborações libertando assim a própria necessidade de espaço requerendo apena um diferente planeamento do trabalho.
manter-se-ão e, porventura, as parcerias públicas e privadas em que a APDH está envolvida alargar-seão, porque é requisito de qualquer sucesso, a rede de parceiros a que se tem acesso.
Os novos instrumentos de comunicação alteraram-se e tornar-se-ão a regra da comunicação entre os órgãos sociais, mais até com os nossos parceiros atuais e futuros.
Mais recentemente tem sido a Federação Internacional dos Hospitais (IHF) que tem gerado maiores estímulos e mais colaborações, facto que também os novos recursos tecnológicos de comunicação vieram incentivar.
O futuro diretivo da APDH é outro desafio que teremos de equacionar até 2024. Com efeito, até agora, tem havido uma grande continuidade na composição dos órgãos por falta de alternativas, mas a passagem inexorável do tempo está a pressionar cada vez mais para a necessidade de uma renovação de pessoas e grupos etários que permitam dar um novo fôlego à associação e garantir o seu futuro.
É de realçar que a APDH não tem, nem nunca teve dívidas, feito assinalável. Mas a sustentabilidade financeira será sempre uma preocupação e, porque grande parte dessa sustentabilidade é assegurada pelos associados designadamente os institucionais, é essencial que a APDH invista e insista em atividades que criem valor para os mesmos. Em especial aqueles que mais longe se encontram dos grandes centros.
Neste momento em que nos aprestamos a completar 20 anos, contemplamos um futuro sem pandemia que inevitavelmente será marcado por ela e pelas alterações de variada ordem que a mesma provocou no futuro das organizações como a APDH. As novas realidades de trabalho e de espaço laboral vão alterar e já alteraram a forma como a associação trabalha abandonando, pelo menos parcialmente o
Esta busca que não será fácil, sabemo-lo, tem de começar já. Em termos de atividades não pensamos que existam condições para grandes ruturas. Os eventos principais
A APDH está hoje, mais do que nunca, presente, ativa e disponível para colaborar e continuar a apoiar todas as instituições de saúde e os seus profissionais e stakeholders do sector da saúde. Não será demais dizer que sem todos vós, esta associação não existiria e não conseguiria prevalecer. Agradecemos a todos os que connosco sempre colaboraram ao longo destes 20 anos, em especial aos nossos sócios, a quem muito devemos a nossa existência, resiliência e continuidade futura.
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ATUALIDADE
Os autores exercem funções no ACES Pinhal Litoral, respetivamente Estêvão Santos, Filipa Azevedo, Maíra Assis e Tiago Gabriel
Projeto "/delete COVID" ACES Pinhal Litoral MENÇÃO HONROSA NA CATEGORIA DE “MELHOR PROJETO” DA 14.ª EDIÇÃO DO PRÉMIO DE BOAS PRÁTICAS EM SAÚDE®
O primeiro caso de COVID-19 em Portugal foi reportado no dia 2 de março de 2020. No início de dezembro de 2020 contabilizavam-se já 322.474 casos confirmados, 74.456 casos ativos de infeção e 4.963 óbitos em Portugal, com a situação epidemiológica em tendência crescente a nível nacional. Este número crescente de casos representou um enorme desafio para os cuidados de saúde. No ACES Pinhal Litoral existiam, à data, mais de 2.000 Inquéritos Epidemiológicos em atraso, com um tempo médio de resposta, desde a deteção laboratorial, superior a 4 dias, impossibilitando a ação efetiva e atempada de interrupção das cadeias de transmissão. Vários fatores contribuíram para a diminuição da capacidade de resposta: a) escassez de recursos humanos e materiais, com grande sobrecarga dos profissionais envolvidos na resposta COVID e não COVID; b) assimetria na carga de trabalho entre unidades funcionais e entre os profissionais; c) baixa comunicação entre os atores envolvidos na resposta à pandemia (USP e USF/ UCSP); d) dificuldade na comunicação de risco às populações; e) falhas no seguimento dos utentes sem médico; f) perda de seguimento de casos positivos; g) atraso na realização dos inquéritos epidemiológicos; h) divergência interprofissional na abordagem dos casos e contactos; i) duplicação de tarefas. Perante esta situação, foi criado o projeto “/delete COVID“, que centralizou a resposta local à pandemia COVID-19, procurando utilizar de forma mais eficiente os recursos humanos dos CSP segundo um modelo de estrutura organizativa mais flexível com maior produtividade dos agentes envolvidos. A sua filosofia assentou em 3 pilares fundamentais: a) otimização da utilização dos (escassos) recursos existentes; b) redistribuição da carga de trabalho; c) envolvimento da comunidade na resposta. Em termos operacionais, isto traduziu-se na criação de uma equipa multidisciplinar e flexível, a equipa de Vigilância, Ação Local, Orientação e Rastreio da COVID-19 (VALOR19), responsável por todas as atividades envolvidas na resposta pandémica, nomeadamente: a) realização de inquéritos epidemiológicos e rastreio de contactos; b) acompanhamento clínico dos doentes positivos e respetivos contactos; c) identificação de situação de risco acrescido, de surtos e de clusters; d) acompanhamento psicológico e
social dos utentes em isolamento; e) monitorização e vigilância epidemiológica. Isto permitiu retirar a carga de trabalho relacionada com a pandemia das unidades funcionais, podendo estas concentrar-se em reencetar as atividades regulares. Vários fatores foram fundamentais para o sucesso do projeto. A equipa VALOR19 era uma equipa multidisciplinar e flexível. A sua composição e número de elementos eram ajustados conforme as necessidades, tendo em conta a evolução epidemiológica. Foi implementada uma cultura de trabalho baseada na formação contínua, camaradagem e qualidade, com sistemas de monitorização constantes de produtividade e de erro. Foi também criada uma plataforma informática robusta, a PAP COVID, completamente adaptada à realidade e necessidades locais, que potenciou a automatização dos processos já existentes, aumentando a produtividade. Por último, e não menos importante, a colaboração dos parceiros comunitários foi fundamental, não só pelo apoio em termos logísticos mas também pela sua capacidade mobilizadora junto das populações. Este sucesso contabilizou-se em várias vertentes, realçando a redução do número de inquéritos epidemiológicos pendentes, de 2600 para 18 (alcançado em apenas 3 semanas) e a redução da incidência cumulativa de infeção por SARS-CoV-2 nos 14 dias anteriores, de 1555 por 100 mil habitantes para 85 por 100 mil habitantes (de 1 de fevereiro a 31 de março de 2021, respetivamente). Acima de tudo, este projeto demonstrou, no ACES Pinhal Litoral, que a resposta a um problema comum é tão mais robusta e efetiva quanto a participação e colaboração de todos os profissionais de saúde, em colaboração estreita com os parceiros comunitários. Como grupo, aprendemos que a implementação de soluções que exigem uma mudança de paradigma no funcionamento de uma organização é um processo longo, repleto de desafios, visto que é necessário cativar as pessoas para a mudança. O “/delete COVID” deixou-nos extremamente orgulhosos dos resultados alcançados, sentimento amplificado pela atribuição da menção honrosa do Prémio de Boas Práticas em Saúde, e saímos com um sentimento de dever cumprido relativamente à nossa missão de cuidar da saúde das populações.
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GRANDE ENTREVISTA
A APDH comemora os seus 20 anos de existência a 4 de abril. Nesta edição, que é também comemorativa, quisemos juntar a experiência e o conhecimento de quem viveu intensamente o setor da Saúde nestas duas décadas, ao que está ainda por fazer – o futuro e a juventude de quem acredita que há ainda muito por fazer. Quisemos perceber o que pensa quem fez e quem quer ainda fazer, mesmo que vivam realidades e caminhos diferentes e, ao mesmo tempo, refletir sobre a evolução que tem acontecido. Assim, reunimos duas pessoas ligadas à Saúde, mas nascidas em épocas distanciadas e, por isso com percursos e vivências diferentes, para analisar a evolução e o futuro do setor. Falamos do Professor Constantino Sakellarides, uma referência na Saúde, no País e no mundo, com provas dadas em todos os quadrantes por onde passou e com um sentido de objetividade e de juventude difícil de superar e Eunice Carrapiço, uma médica especialista em Medicina Geral e Familiar que apesar de um extenso currículo é ainda muito jovem e com muito futuro por concretizar.
PASSARAM 20 ANOS Que venham mais 20! ENTREVISTA: Marina Caldas
São conversas em que é possível perceber o que se viveu e como se viveu e há traços comuns no caminho que se perspetiva e como deve ser percorrido. A Integração é a palavra mais forte neste contexto. Mas há outras: SNS, Carreiras, Escolhas e Políticas. Começámos por ouvir o Professor.
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GRANDE ENTREVISTA
CONSTANTINO SAKELLARIDES
“O sistema de governação não tem sensores para captar o grau inquietação profissional no SNS”
“O SNS não deve ser uma repartição de um Estado Marreta, mas uma das joias-da-coroa de um Estado Inteligente” Quais os principais desafios da atualidade para o sistema de saúde português e o SNS? Nas últimas décadas a população portuguesa envelheceu consideravelmente e isso tornou-se num extraordinário desafio para o sistema de saúde e para o Serviço Nacional de Saúde (SNS). E também um desafio novo. São muitas pessoas com morbilidades múltiplas e várias formas de dependência e fragilidade que utilizam frequentam os serviços de saúde e que necessitam de uma continuidade de cuidados. As respostas episódicas do passado já não são suficientes. Precisam de cuidados integrados. Esta atenção ao processo de envelhecimento não deve esquecer tudo o resto. Não deve esquecer o desenvolvimento humano e a vida ativa ao logo do percurso de vida. Da criança, ao jovem até às pessoas adultas, passando pela “idade do meio” – aquela idade esquecida, daqueles que têm que, simultaneamente, preocupar-se com os filhos adolescentes e com os pais já com problemas próprios do envelhecimento, com os primeiros sinais de cansaço nos órgãos dos sentidos, e com um emprego onde ou “se sobe ou se sai”. E é preciso recordar também a importância de harmonizar as respostas às necessidades das diferentes gerações. Isso foi agora muito evidente na pandemia em curso. Mas é uma questão mais profunda, esta de evitar tensões indesejáveis entre as várias gerações. A atual diretora da London School of Economics, Minouche Shafik, há quase um ano publicou um livro sobre a necessidade de um novo contrato social, no qual revela um dado especialmente significativo. Se perguntarmos à população de diversos países se pensam que os jovens
atuais vão viver melhor que os seus pais, quase 80% dos chineses acham que sim, enquanto pouco menos de 20% dos britânicos e espanhóis pensam da mesma maneira.
É o SNS viável no atual estado de desenvolvimento da administração pública portuguesa? O SNS não deve ser uma simples repartição de um Estado Marreta, mas antes uma das joias-da-coroa de um Estado Inteligente. E este é um grande desafio, do qual depende, em grande parte, a sobrevivência do SNS. Para o ser, terá que superar a sua tradição de centralização e rigidez hierárquica, para descentralizar e tornar-se muito mais adaptado às diferentes circunstâncias locais. E terá que valorizar lideranças empreendedoras. Não pode ter todos os seus recursos numa primeira linha de ação, dedicada ao imediato, ao curto prazo. Precisamos de uma segunda linha onde se pense o futuro de país. Para não chegarmos tarde e mal preparados a esse futuro. Por outras palavras, são precisos dispositivos identificáveis de análise e planeamento estratégico nos nossos ministérios. E esta é uma agenda urgente do conjunto do governo. O Ministério da Saúde não a pode abordar sozinho. E ela inclui necessariamente uma nova lógica orçamental. Em que os objetivos de bem-estar superam a estreiteza de metas orçamentais centradas essencialmente em indicadores genéricos de produção da riqueza. Vale a pena acrescentar que em alguns países já se começou a trabalhar nesse sentido.
Podemos fazer melhor, no sistema de saúde português, na gestão da informação e do conhecimento, considerando a evolução social e tecnológica do mundo atual?
e muitas vezes colaboram entre si e que precisam de ser enquadradas e direcionadas por diversos instrumentos, muitos deles delicados e suaves, atuando coordenadamente.
Temos que fazer muito melhor e temos todas as condições para que assim seja. O primeiro passo é reconhecer que ainda trabalhamos no pressuposto das inteligências hierárquicas. O que quer dizer: muita em cima, alguma coisa no meio e pouca em baixo. E no entanto, já há muito que vivemos num mundo de inteligências amplamente distribuídas, onde coexistem múltiplas fontes de iniciativa, que interagem
Esta horizontalização de produção, partilha e utilização do conhecimento, permite transformar inteligência distribuída em inteligência colaborativa, sem a qual não é possível promover o desenvolvimento de sistemas complexos como o da saúde. Abordagens sistémicas e não fragmentárias, como aquelas que caracterizam as organizações temáticas verticais que predominam ainda na saúde, são a única forma efetiva de abordar
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GRANDE ENTREVISTA
a riqueza das interações irrecusáveis de um sistema de saúde capaz de cumprir a sua missão. Bom, de facto, do que temos estado a falar é da necessidade de um novo modelo de governação e governança na saúde!
Fala-se hoje muito na centralidade do cidadão nos sistemas de saúde – o que é que isso quer exatamente dizer, na prática? Sim, é muito importante esclarecermos essa noção da centralidade das pessoas. Recordo um colega meu, que reagia muito mal face a esta suposta novidade. E exclamava, irritado: “E até agora estávamos centrados em quê? No gato?!” E, no entanto, esta noção está longe de ser simplesmente banal. Comporta antes múltiplas dimensões significativas. Deixe-me dar-lhe alguns exemplos. Em primeiro lugar a questão de personalização, de precisão diagnóstica e terapêutica. Utilizar toda a vasta informação à nossa disposição para precisar e diferenciar um indivíduo dos outros com situações eventualmente similares. Mas esta é só uma das dimensões. A segunda refere-se à necessidade de gerir o percurso de cada pessoa através dos cuidados de saúde de que necessita. Especialmente aquelas pessoas com múltiplas morbilidades de evolução prolongada. Isso faz-se através de plano de cuidados, propriedade da própria pessoas, partilhada com os seus cuidadores ao longo desse percurso. A pessoa tem que ser necessariamente o primeiro gestor do seu plano de cuidados. Para tal, temos seguramente que investir seriamente na promoção da sua literacia em saúde. E isso ainda por uma outra razão. Ao longo desse percurso de cuidados ser-lhe-ão propostas prescrições e por vezes opções alternativas. Terá que ter sobre isso uma opinião, um ponto de vista, participar na decisão. E que as prescrições propostas não tornem a sua vidade-todos-os-dias, catastrófica, impossível de gerir. E que, alguns desses cuidados, possam ser prestados na sua própria casa. Coordenadamente.
Parece haver uma tendência para uma “fuga” dos profissionais do SNS. O que fazer para os mais novos sejam motivados a ficar?
recursos - financeiros, humanos, físicos, tecnológicos. Não é verdade. Claro que precisa de mais recursos. Mas precisa de acrescentar, transformando.
Aqui chegados, parece-me fazer sentido dizer que um fator crítico na atração e retenção dos profissionais no SNS é a confiança destes no futuro do SNS e, ao mesmo tempo, de o SNS poder proporcionar carreiras profissionais satisfatórias. Daí talvez a relevância do que temos estado a falar.
A segunda, reconhecer que a atitude do público em relação ao privado não pode ser passiva ou simplesmente reativa. Terá que passar a ser proativa. Isso que dizer que deverá ser baseada numa estratégia de cooperação público-privada de curto, médio e longo prazo. Estratégia esta que terá que ser enquadrada por plano de investimento e desenvolvimento do SNS, nos mesmo horizontes temporais. De outra forma aquela estratégia de cooperação poderia facilmente degradar-se para um processo de transferência continuada de capacidades e competências do setor público para o privado.
E não podemos deixar de observar que, nesta matéria, a inércia das autoridades responsáveis não pode deixar de impressionar. A fuga de profissionais diferenciados do SNS é um fenómeno visível há bem mais de uma década. Parece que o sistema de governação não tem sensores para captar o grau de inquietação profissional no interior do SNS, nem aquilo que se passa à sua volta. Um hospital privado está em construção, algures, há 2 anos. Toda a gente sabe. Também se sabe que quando aquele hospital abrir vai buscar os profissionais de que precisa ao SNS daquela região. E, contudo, o hospital acaba por abrir, os profissionais saem como previsto e, no entanto, parece que ficamos todos surpreendidos com a notícia! Precisamos urgentemente de uma política para as profissões de saúde do SNS, que comtemple as várias dimensões do seu exercício. E não uma só como, por exemplo, a ocupação exclusiva ou prolongada. Essa política não pode deixar de contemplar a evolução das expetativas dos próprios profissionais – onde e em quê querem exercer, em tempo completo ou parcial. Sem isso, lugares nos concursos abertos continuarão a ficar por preencher.
Falava-se muito sobre a complementaridade do privado em relação ao serviço público. Ainda podemos manter este conceito ou as coisas mudaram? A alargamento do setor social e privado, com fins lucrativos, no país, principalmente no decurso da última década, é um facto incontestável. Isso, associado à falta das reformas necessárias no SNS. Podemos continuar a dizer, e por quanto tempo, que o SNS se situa no centro do sistema de saúde português. Para que isso continue a ser verdade, parece-me que há que ter em conta as duas condições seguintes. A primeira, superar o discurso político conservador de que o que o SNS precisa é principalmente de mais
É possível falar com propriedade em valores e sentimentos, intangíveis, no sistema de saúde e no SNS? Com certeza que sim. Há particularmente três desses intangíveis que é necessário reconhecer para entender os sistemas de saúde. O primeiro é o da não-acomodação aos contratempos e dificuldades para fazer o que é preciso. Há hoje já demasiadas pessoas que desistiram de entender e influenciar o mundo em que vivemos. Limitam-se a colher os frutos mais à mão e a acreditar em histórias que nunca aconteceram. Isso deve ser contrariado. Nunca li a Divina Comédia, de Dante. Mas quem já leu esta obra, escrita há já cerca de 700 anos, afiança que Dante reservou o pior, o mais quente dos apartamentos do seu inferno, não para os piores pecadores, mas para os indiferentes! O segundo têm a ver com as relações de confiança. Dados publicados pela OCDE, há não muito tempo, mostram que se perguntarmos aos dinamarqueses se têm confiança uns nos outros, cerca de três quartos respondem que sim. À mesma pergunta respondem positivamente um pouco menos de metade dos alemães, mas só 20% dos portugueses. Não importa? Importa sim, e muito. É difícil conseguir os níveis de cooperação necessários, sem promover a confiança de uns nos outros e o apreço pelo trabalho dos outros. Finalmente, o sentido de pertença. Devemos olhar para o SNS como um património identitário, comum e solidário. É propriedade comum, é nosso. Julian Tudor Hart, um inglês famoso, dizia-o, com incomparável eloquência. Dizia que o SNS não é mais que uma extensão da nossa cidadania. Que materializa a nossa genuína preocupação pelos outros. E tinha razão.
CONSTANTINO SAKELLARIDES Licenciatura em Medicina, pela Faculdade de Medicina de Lisboa; Mestrado e Doutoramento em Epidemiologia e Saúde Pública, pela Escola de Saúde Pública da Universidade do Texas, EUA. Agregação em Políticas de Saúde, pela Escola Nacional de Saúde Pública, U. Nova de Lisboa. Foi Professor Catedrático na mesma instituição, atualmente jubilado. Cargos e distinções mais recentes: foi Diretor para as Políticas e Serviços de Saúde OMS/Europa, Copenhaga; Presidente do Conselho de Administração da ARS de Lisboa e Vale do Tejo; Diretor-Geral de Saúde de Portugal; Primeiro coordenador do Observatório Português dos Sistemas de Saúde; Presidente da Associação Europeia de Saúde Pública; Diretor da Escola Nacional de Saúde Pública; Prémio Nacional de Saúde, 2019.
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GRANDE ENTREVISTA
EUNICE CARRAPIÇO
EUNICE CARRAPIÇO
“A implementação do Sistema Local de Saúde pode abrir oportunidades para melhores cuidados de saúde” Qual o atual panorama da Gestão Hospitalar e como o analisa? O meu ponto de vista e modo de ver é o de quem está fora dos hospitais. O meu dia-a-dia profissional decorre na comunidade, nos Cuidados de Saúde Primários. É aí que procuro aplicar os conceitos e uma aproximação metodológica e prática à governação integrada da saúde numa comunidade. O âmbito da minha atuação limita-se à área dos Cuidados de Saúde Primários e, parcialmente, aos Cuidados Continuados no que respeita à ação das Equipas de Cuidados Continuados Integrados (ECCI) junto dos doentes, das suas famílias e dos cuidadores no domicílio. Assim, a minha análise centra-se nos processos de ligação entre os serviços, na integração e na continuidade dos cuidados. Claro que posso dizer que existe uma excelente comunicação e colaboração com a gestão dos hospitais da área do Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) Lisboa Norte. Isto é, com o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN) mas, em geral, este tipo de ligações entre serviços do SNS, sendo cordiais, são bastante pontuais e circunstanciais. Sinto a necessidade de haver consonância, convergência e entrosamento de todos os dispositivos e níveis de gestão no SNS, atualmente desligados entre si. Creio que este é, provavelmente, o maior desafio também para a gestão hospitalar. A possibilidade de, mantendo o foco na prestação de cuidados hospitalares, conseguir a interligação, adaptação, a flexibilidade e o trabalho conjunto com outros serviços para garantir uma verdadeira prestação integrada de cuidados centrados na pessoa. Este desafio pode ainda ser maior com modelos de gestão diferentes. Durante o meu percurso profissional
Licenciada em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.
lidei com diferentes modelos de Gestão Hospitalar e é fácil compreender como deles podem decorrer vantagens e desvantagens no acesso, na qualidade e na satisfação das necessidades de saúde da população, bem como na satisfação dos profissionais de saúde. Na minha opinião, a implementação prática do conceito de sistema local de saúde, enquanto conjunto de elementos simultaneamente autónomos e interdependentes, alinhados pelo mesmo propósito e orientados para objetivos comuns, pode abrir oportunidades de experimentação e de aprendizagem de novos caminhos, para melhores cuidados de saúde e melhor saúde. O essencial é que o foco comum, o centro da atenção, sejam os problemas, as necessidades e os desafios de saúde das pessoas e da população, e não a gestão e/ou as organizações. Trata-se, claramente de um patamar distinto e, quanto a mim, mais avançado e mais adequado, relativamente às atuais unidades locais de saúde (ULS). Conviria analisar com rigor e profundidade os ganhos conseguidos e as limitações das experiências das nove ULS, que já têm em alguns casos mais de duas décadas, para aprender, tirar ilações e perspetivar caminhos futuros.
A dicotomia entre o público e o privado faz sentido neste século, ou não? Em saúde, faz para mim pouco ou nenhum sentido falar em dicotomia entre “público e privado” sem explicitar com rigor do que é que estamos concretamente a falar; quais os propósitos e finalidades explícitos e implícitos de cada um dos “atores”; qual a necessidade e quais as possibilidades e modos de cooperação entre eles; quais os conflitos de interesse em presença; como fica assegurada a prossecução do interesse público e do bem-comum.
Pensa que, no futuro, o SNS vai perder o peso que tem tido face ao aumento de pessoas com seguros de saúde e à fuga de profissionais de saúde para o setor privado?
Médica especialista em Medicina Geral e Familiar (MGF). Exerceu como médica de família na Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados (UCSP) São João do Estoril (ACES de Cascais) e participou ativamente na evolução desta unidade para Unidade de Saúde Familiar (USF), tendo sido cofundadora e dinamizadora do conselho técnico desta USF. Exerceu ainda em tempo parcial na USF Benfica Jardim (ACES Lisboa Norte) até passar a dedicar-se em tempo completo a responsabilidades de âmbito regional na ARSLVT.
Coordenadora da Equipa Regional de Apoio (ERA) ao Desenvolvimento dos Cuidados O futuro do SNS depende essencialmente das escolhas políticas, de Saúde Primários da ARSLVT, da pressão das necessidades e desafios sociais, da tolerância da IP. Coordenadora Regional sociedade para com desigualdades que gerem iniquidade no que dos Programas de Rastreio de à saúde diz Agora,à Consulta é o momento de olhando para estemodo, garantiu-se Deste um menor número de A iniciativa derespeito. Acesso Rápido de Oftalmologia base populacional na ARSLVT– possível cenário, no apostar em Hospitalar estratégias Universitario para robustecercontactos o SNS, hospitalares, bem retinopatia como um diabética menor tempo implementada Centro oncológicos; vincular os profissionais de saúde e criar ainda maior social total de permanência nas instalações hospitalares para Lisboa Norte (CHULN), teve por objetivo diminuir o valor e visual infantil, com aproximação junto escolhas políticas favoráveis ao reforço da cada doente, umentre desígnio que sedos reveste de particular tempoda depopulação. espera dos As doentes até ao primeiro contacto as equipas centros de missão SNS têm necessariamente que se associar a investimentos importância ao ser aplicado no contexto pandémico. médico,dopretendendo também reduzir o número saúde e os serviços hospitalares do concretos, nas áreas acesso, do e de idas aonomeadamente hospital para exames oudo consultas atéatendimento à SNS associados a estes rastreios. do acolhimento, resolutividade, da comunicação, bem como Os dos resultados destes exames complementares primeira decisãoda informada. modelos de integração e da qualidade dos cuidados. Tal implicará foram subsequentemente avaliados em contexto Diretora Executiva do necessariamente transformações na organização na governação não-presencial Agrupamento por um médico especialista, que Desta forma, conseguiu-se aumentar a eficiênciaedos de Centros de do SNS, bem como decisões quanto aos financeiros associados produziu um relatório cada umdesde dos doentes onde cuidados oftalmológicos prestados aosmeios doentes. Saúdepara Lisboa Norte às diversas transformações. constava o estadiamento da doença, terapêutica e 2020. Mantém atividadea como o agendamentoformadora da próxima em função das A consulta virtual foi disponibilizada de forma universal, nasconsulta áreas médica e O empobrecimento a degradação do SNS torna-o, necessidades individuais cadaorientadora doente, dede acordo a todos os doentes eque foram referenciados à sub- obviamente, de gestão de e como pouco atrativo para os profissionais de saúde. Será essa a preferência com o cumprimento guidelines da National -especialidade de Glaucoma, garantindo a realização estágios das de alunos de Mestrado dos cidadãos? Institute for Health and deCare Excellence vários exames complementares de diagnóstico na em Gestão Serviços de Saúde.(NICE), garantindo deste modo a manutenção dos mais mesma vinda ao hospital (“one-stop-shop” model). elevados padrões de qualidade.
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DESTAQUE
RUI TATO MARINHO Gastrenterologista/Director do Serviço de Gastrenterologia do CHULN
Três das doenças no top 10 da mortalidade em Portugal são foro da gastrenterologia: o cancro do cólon e retoCCR, o do estômago, e a doença hepática (cirrose e tumor maligno do fígado). Os chamados Big 5 (cancros do esófago, estômago, pâncreas, fígado, e CCR) são responsáveis por cerca de um terço de todos os cancros. Três dos cancros digestivos são dos que têm pior prognóstico e registam maior aumento na última década - pâncreas, carcinoma hepatocelular e colangiocarcinoma.
Tratar da Saúde Digestiva dos portugueses
Dados que ilustram a importância decisiva que esta especialidade assume no nosso sistema de saúde e que enquadram o destaque que merece no contexto do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte e do país.
Factos e Números O Serviço de Gastrenterologia e Hepatologia do CHULN é o maior do País, englobando várias unidades funcionais: Unidade de Técnicas de Gastrenterologia, onde se realizam cerca de 25.000 exames por ano; Enfermaria de Gastrenterologia, que inclui a Unidade de Hepatologia, com 21 camas, onde se internam perto de 800 doentes por ano; Consulta Externa com 25.000 consultas; Hospital de Dia, que atende mais de 700 doentes por ano. Além destes números, temos a única urgência especializada do Sul do País com presença física 24 horas todos os 365 dias do ano. O Serviço tem como Missão proporcionar os melhores cuidados de saúde no campo do Aparelho Digestivo aos cidadãos que nos procuram nos nossos dois polos, um no Hospital Santa Maria, o outro no Hospital Pulido Valente. O Aparelho Digestivo tem no seu todo 10 metros de comprimento, incluindo 6 órgãos principais - esófago, estômago, intestino delgado, cólon e reto, fígado, pâncreas. Quando falamos em Saúde Digestiva, falamos de prevenção, diagnóstico, tratamento e ajuda no sofrimento e fim de vida. Sabemos que salvamos vidas. Somos reconhecidos pelo European Board of Gastroenterology and Hepatology, temos idoneidade para a formação na especialidade de Gastrenterologia e na subespecialidade de Hepatologia pela Ordem dos Médicos. Também recebemos estagiários da United European of Gastroenterology, como “Clinical Visiting Center”
Mais de uma centena de profissionais Somos 110 profissionais de saúde, dos quais 37 médicos, 37 enfermeiras, 27 assistentes operacionais, 10 assistentes administrativos, um psicólogo, uma assistente social. Os recursos humanos são a principal riqueza do Serviço/Hospital/Sistema de Saúde/Serviço Nacional de Saúde. Temos também nove médicos em formação. Além da preocupação em prestar os melhores cuidados diferenciados aos portugueses que sofrem de doenças do Aparelho Digestivo, umas das minhas maiores preocupações enquanto director do serviço é manter a estabilidade e a psicologia positiva dos
nossos profissionais, procurando que tenham uma vida equilibrada e integrada entre os aspectos profissionais e pessoais. Um profissional de saúde é uma pessoa e não uma máquina. O profissional de saúde é um cuidador valioso de quatro gerações (pais, avôs, filhos, netos). Portugal tem tido um excelente SNS, talvez o principal factor que leva a que a nossa esperança média de vida seja das melhores do Mundo, acimas dos 80 anos. O profissional de saúde é um bem inestimável, é o principal recurso do Sistema de Saúde, havendo falta a nível mundial. A população está muito envelhecida, necessitando de forte investimento nos cuidados de saúde. Somos muito atentos à relação de humanismo, empatia e compaixão. O número de louvores por parte dos nossos doentes tem crescido e é prova disso mesmo.
Investigação e ensino Outros dos dois pilares da nossa tripla Missão. O Serviço de Gastrenterologia e Hepatologia do CHULN tem seis doutorados e três jovens médicos com projecto de doutoramento. Entre os polos de investigação temos áreas tão importantes como as hepatites víricas B e C, o carcinoma hepatocelular, o fígado gordo, as técnicas em gastrenterologia, doença inflamatória intestinal (colite ulcerosa e Doença de Crohn). Destaque ainda para os ensaios clínicos e publicações na revista de Medicina Clínica de maior impacto, o New England Journal of Medicine.
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DESTAQUE
IDEIAS
Uma das nossas mais relevantes actividades é a participação e responsabilidade no Curso de Medicina em vários dos seis anos na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.
implementar algumas delas, como seja a disseção da submucosa, endoscopia para intervenção bariátrica, entre muitas outras. Conseguimos uma patente de uma prótese esofágica.
Queremos reforçar parcerias em curso com a engenharia (Instituto Superior Técnico), a ligação à Europa, aos países africanos, asiáticos, etc
São equipas multidisciplinares, que incluem anestesistas, técnicos de imagiologia, além do grupo da gastrenterologia (médico, enfermagem, assistente operacional, assistente administrativa) que funcionam não raramente em regime de “Equipas de Elevado Desempenho”.
Mr. COVID, em modo de pandemia Sou director do serviço desde 2018, quase todo o tempo em plena pandemia, o que tem trazido muitos desafios, mas ao mesmo tempo uma aprendizagem muito rica em verdadeira medicina de catástrofe. É preciso ter nervos de aço, a mudança é constante, o imprevisível acontece todos os dias. Temos colaborado intensamente com a instituição e outros serviços, que chegou a ter mais de 300 doentes internados por COVID. Não nos podemos esquecer que foram infectados quase 3,5 milhões de portugueses. Os Serviços de Saúde revelaram-se essenciais e vitais, até em termos de segurança nacional e estabilidade de um povo.
A mudança como rotina O Serviço tem tido mudanças, algumas disruptivas: temos tido um forte apoio do Conselho de Administração. Nesse sentido foi possível ter um novo espaço para o Hospital de Dia, reformular a Unidade de Técnicas de Gastrenterologia, ter uma nova e moderna Unidade a curto prazo (ainda em 2022), reativar a Unidade de Técnicas do Hospital Pulido Valente, adquirir modernos endoscópios, entre muitas inovações. Segundo afirma Peter Drucker, o pai da moderna gestão, às vezes mais importante do que inovar é deixar de exercer actividades, que se tornam desadequadas com o passar dos anos. Nesse sentido, deixamos de ter a UCIGE, Unidade de Cuidados Intensivos de Gastrenterologia e Hepatologia que cumpriu o seu papel durante três décadas.
O novo gastrenterologista – Os Big Five Há um novo gastrenterologista cada vez mais diferenciado na execução muito exigente de técnicas endoscópicas. Apesar da pandemia, tem sido possível
Isto implica reformulação do modo de pensar no que diz respeito ao fluxo do material necessário e do modo como os outros nos veem. Eu diria que quase somos cirurgiões minimamente invasivos do interior dos 10 metros do tubo digestivo. Um dos nossos “core business” é a doença oncológica. Criámos uma Unidade Funcional do Doente Oncológico procurando que não falhe nada no circuito e gestão do doente, de máxima prioridade.
O futuro? Ser líder desta equipa de mais de 100 profissionais tem sido um prazer e uma honra. Todos têm aspectos positivos. Fazer melhor e melhor, avançar com acreditação da DGS, criar um centro de responsabilidade integrada, investigar, ensinar, cuidar dos outros e dos profissionais de saúde, preparar para a mudança, antever o futuro, são estas as nossas prioridades.
A ler •
A Arte da Guerra. Sun Tzu.
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Leadership: No More Heroes 3rd ed. 2021 Edição. David Pendleton, Adrian F. Furnham, Jonathan Cowell.
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Equipas de Alto Desempenho. https://www.ordemdospsicologos.pt/ficheiros/documentos/ebook_equipas_de_alto_desempenho.pdf
A máxima
“It is not the strongest of the species that survives, nor the most intelligent that survives. It is the one that is the most adaptable to change.” Charles Darwin.
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RECOMENDAÇÕES PARA AS DOENÇAS RARAS - 2022 O projeto SER RARO nasceu no dia 28 fevereiro de 2021 com o objetivo de juntar conhecimentos, vontades e ideias de peritos nacionais assim como parceiros ligados a esta área da Medicina e da Saúde, ao longo de um ano, com o objetivo de apresentar no dia 28 de fevereiro 2022, as reflexões e as recomendações saídas deste Fórum, capazes de marcar a agenda na redefinição de tudo o que está a ser pensado e elaborado nesta área para a próxima década. Conduzido pela FDC Consulting, consultora dedicada à área da Saúde com particular vocação para as questões de responsabilidade social, com o apoio da Takeda, o projeto Ser Raro foi pensado tendo por base três pilares fundamentais que sustentam o seu nascimento e justificam o fato de ser neste momento. Em primeiro lugar a estratégia nacional para a próxima década. O último Plano Nacional de Gestão para as Doenças Raras data de 2019 e a Estratégia Integrada para as Doenças Raras em Portugal esteve em vigor de 2015-2020. Sabemos que a DGS está agora a começar a desenhar os próximos Plano, Estratégia e Programa para a próxima década, à semelhança do enquadramento Europeu, com os objetivos a serem definidos até 2030. Em segundo lugar, porque a pandemia Covid-19 agravou os problemas existentes e evidenciou outros. Sabemos que já existiam problemas graves e crónicos na área das doenças raras, mas tais problemas foram agravados desde março de 2020 e, a estes, somaram-se outros problemas que importa serem identificados. No mesmo sentido, é de referir que a questão do tratamento domiciliário, que foi tornado uma prioridade pelos doentes europeus e implementado como realidade em muitos países europeus, por cá mantém-se esquecida.
Em terceiro lugar todos sabemos que prioridades destacadas pelo Governo no seu Plano de Recuperação e Resiliência são claras e referem que é importante manter os esforços para continuar a combater problemas estruturais antigos e ainda não resolvidos. Neste sentido, a reforma dos Cuidados de Saúde Primários - que foi lançada há vários anos - vai ter ainda mais investimento para dar resposta a mais problemas dos cidadãos nestes centros de proximidade, em estreita articulação entre os vários níveis de cuidados de saúde, por forma a garantir o melhor acesso, circulação de pessoas e da informação da saúde, através de uma rede territorialmente equilibrada e reforçada de equipamentos, meios complementares de diagnóstico e terapêutica (MCDT), capacidade de rastreio e de intervenção comunitária/domiciliária. Esta reforma pode permitir aproximar os Cuidados de Saúde Primários das Doenças Raras. O Ser Raro nasceu para fazer esta reflexão ao longo de 4 momentos, debatendo temas que culminassem em recomendações que permitissem ajudar a planear as medidas da próxima década para esta área. São eles: •
O impacto e agravamento da pandemia nas Doenças Raras: O que se agravou; que exemplos e soluções nasceram com a pandemia e que podem ser replicados;
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Como melhorar o diagnóstico e tempo de diagnóstico nas Doenças Raras – referenciação, formação, entre outros;
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Como potenciar a investigação nesta área, garantindo mais e melhor acesso à inovação, com financiamento e critérios de avaliação ajustados a esta área;
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IDEIAS
Apoio psicológico, social e económico às pessoas com doenças raras e das suas famílias
Assim, contámos com a presença de várias personalidades, num Comité Executivo que em 4 sessões trouxeram contributos para a discussão destes temas, cujos resultados foram posteriormente apresentados ao Comité Científico, que reunia representantes das três Ordens profissionais (Médicos; Enfermeiros e Farmacêuticos); da APAH – Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (representada pelo Dr. Delfim Rodrigues) e da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna.
período em que a incerteza era muito grande. Neste sentido, a sua continuidade nestes novos tempos deve evoluir e ganhar consistência, mesmo fora do contexto pandémico. Mas não se pode confundir a Teleconsulta com a Telemedicina. Esta última precisa de ser mais trabalhada e ter mais treino para poder ocupar um lugar de futuro nas doenças raras. 2.
O Comité Executivo foi constituído por: •
Luis Brito Avô - Internista; coordenador NEDR e coordenador Ser Raro;
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Paulo Gonçalves - Presidente RD-Portugal;
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Mónica Vasconcellos - Pediatra e Sociedade Portuguesa de Neuropediatria;
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Helder Mota Filipe - Farmacologista; professor Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa; atual bastonário da OF
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João Paulo Oliveira - Diretor serviço Genética do CHUSJ; professor Faculdade de Medicina da Universidade do Porto;
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Júlio Oliveira - Oncologista do IPO Porto;
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Luísa Pereira - Internista; membro do NEDR;
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Manuel Branco - Presidente da SPAIC;
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Isabel Soares posteriormente substituída por Ana
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D’Avó - responsável de comunicação APIFARMA •
Marina Caldas – moderadora/ FDC Consulting
Conclusões e Recomendações Relativamente às recomendações saídas das 4 reuniões realizadas, que contaram sempre com a presença dos membros do Comité Executivo, salientamos as seguintes: 1.
Durante os primeiros dois anos da pandemia por Covid-19, a Teleconsulta foi uma mais-valia muito importante para as pessoas com doenças raras e famílias, tendo um impacto muito positivo no apoio de que estas necessitavam e que ajudou neste
5.
Houve diferentes problemas relacionados com o acesso e o tratamento de pessoas com doenças raras, durante a pandemia, que podem ter tido impactos negativos nas respetivas evoluções e melhorias. Um desses problemas foi a dificuldade de acesso dos doentes aos Cuidados de Saúde Primários (para emissão de receitas médicas e cuidados médicos de rotina, entre outras coisas), outro problema foi a dificuldade de realização, em tempo útil, de exames complementares de diagnóstico que, em alguns casos, chegou a tempos de espera de seis meses algo que, para estes doentes, é inadmissível. Também o número de primeiras consultas diminuiu muito, o que pode ter tido consequências na evolução das respetivas doenças. A experiência do trabalho domiciliário e em Rede nas Doenças Lisossomais e de Sobrecarga, desenvolvida durante a pandemia pelo Hospital de Guimarães, veio provar que o caminho é por aqui e que esta experiência merece ser divulgada, analisada e implementada noutros locais, de forma a que se venha a tornar numa realidade a nível nacional, adaptada às diferentes regiões do país. Diagnosticar mais cedo é essencial e, por isso, é obrigatório investir mais no diagnóstico. Sem esta aposta é difícil ir mais longe e não podemos esquecer que só 25% dos casos mais difíceis de doenças raras chegam a um diagnóstico. Para mudar esta situação é necessário que haja uma aposta no investimento e que este se traduza em mais e melhor equipamento. É também essencial que este equipamento esteja centralizado em serviços dedicados ao diagnóstico. Para que o diagnóstico em doenças raras seja mais efetivo é também essencial que a comunicação entre o Geneticista e o Clínico seja real e, para tal, tem de ser muito trabalhada de forma a dar resultados mais positivos e céleres. Há muito trabalho a fazer neste domínio que, no limite, pode até passar pela mudança da Lei da Genética em Portugal.
demonstrando que fármacos que tinham sido descritos como apresentando resultados positivos nos estudos referidos anteriormente, não viram esses resultados confirmados. Foi o caso da hidroxicloroquina, por exemplo, que não provou ser eficaz na prevenção da mortalidade, na necessidade de suporte ventilatório ou na duração do internamento por COVID-19. A nível europeu foram também iniciados os ensaios clínicos Recovery e Discovery, com princípios e objetivos semelhantes aos do Solidarity. Atualmente, consultando a base de dados clinicaltrials. gov, estão registados quase 7000 estudos, em diferentes estádios de implementação e em diversas fases, com o objetivo de estudar abordagens terapêuticas para a COVID-19. Passado este tempo parece estar claro que abordagens, baseadas no princípio do uso compassivo, que consistiam em testar potenciais terapêuticas fora do contexto dos ensaios clínicos não é aceitável do ponto de vista ético e científico. Atualmente existem alternativas expeditas que permitem incluir essas terapêuticas potenciais num dos diversos ensaios clínicos adaptativos aprovados e ativos. 6.
Para que a investigação científica e clínica seja uma realidade, a existência de dados é fundamental assim como o trabalho realizado em Rede, nacional e internacionalmente. Sem registos, sem epidemiologia, e sem sabermos realmente quantas pessoas com doenças raras existem em Portugal e como estão a ser tratadas não é possível estabelecer um Plano de Intervenção centrado nos problemas essenciais destas pessoas, de forma a potenciar a investigação e para que em Portugal haja uma maior melhor adesão aos ensaios clínicos. Neste domínio, a questão do financiamento é primordial, assim como a existência de Centros de Excelência de proximidade que permitam maior desenvolvimento de investigação clínica.
7.
As instituições oficiais devem assumir a responsabilidade da investigação científica e trabalhar em Rede, sem esquecer de valorizar a questão da literacia das populações no que toca às patologias raras, de forma a que as expetativas estejam de acordo com os avanços da Ciência.
8.
A Burocracia é uma das inimigas das doenças raras e os apoios para ajuda psicológica, social e económica, a pessoas com doenças raras e famílias
e cuidadores existem, de facto, no papel, mas não funcionam como deviam nem estão acessíveis como todos gostariam. Mais grave ainda: há situações em que a obtenção de uns apoios anulam outros, o que também não é admissível. Esta situacão acaba por ser ainda mais complicada quando o que está em causa é a própria definição do que é uma deficiência e que tem conceitos que atrapalha umas situações e complica outras (até pela dificuldade em preencher os respetivos formulários). 9.
A criação de um front-office, que estabeleça a coordenação entre as pessoas com doença e as famílias e os serviços da Administração Pública pode ser uma solução desde que a sua implementação tenha como objetivo a simplificação de todo o processo e a tentativa de acabar com um sistema demasiado burocrático, que funciona inadequadamente e que acaba por ter consequências negativas para as pessoas com doença e respetivas famílias.
10. No processo dos apoios, as crianças estão mais protegidas do que os adultos, tendo sido sugerido que uma das soluções poderia passar pelo acompanhamento do pediatra na fase intermédia
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Teleconsulta na Neurorradiologia de Intervenção a encurtar as distâncias e a potenciar o conhecimento, Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho VENCEDOR NA CATEGORIA DE “MELHOR PROJETO” DA 14.ª EDIÇÃO DO PRÉMIO DE BOAS PRÁTICAS EM SAÚDE® Nos últimos anos, a grande evolução tecnológica na saúde revolucionou a abordagem da patologia cerebrovascular atribuindo à Neurorradiologia de Intervenção (NRI) um papel central no diagnóstico e tratamento destes doentes. A qualidade, a segurança e a eficácia dos procedimentos da NRI dependem da elevada diferenciação, concentração de casuística e experiência, o que limita a dispersão desta atividade, tendo sido criados os Centros de Referência de NRI. Esta concentração de recursos, altamente diferenciados e que exigem equipamentos e dispositivos médicos dispendiosos, evita secundariamente o desperdício de meios por diferentes unidades hospitalares assegurando uma melhor relação custo-efetividade. A desejável centralização de recursos da NRI não deve colocar em risco um dos princípios basilares do SNS - a Equidade de Acesso aos Cuidados de Saúde. Assim, a organização dos cuidados de saúde deve criar as condições necessárias para aumentar a proximidade dos utentes aos Centros de NRI, que passa designadamente pelo desenvolvimento de uma Rede de Teleconsulta de Neurorradiologia de Intervenção (TC_NRI). O Projeto da TC_NRI do CHVNG/E tem
como objetivo a uniformização dos cuidados de saúde na área da NRI, removendo as barreiras geográficas e de recursos humanos e técnicos do quotidiano, promovendo a igualdade e equidade de cuidados de Saúde ao aproximar centros hospitalares com diferentes níveis de diferenciação, resultando na harmonização da prevenção e do tratamento dos utentes com patologia cerebrovascular. O CHVNG/E estabeleceu uma rede de Teleconsulta, sediada no Centro de Referência de NRI, com funcionamento 24 horas/365 dias. Esta organização permitiu a agregação de instituições do SNS, com diferentes níveis de organização, tendo sido definidas relações interinstitucionais próximas, alicerçadas na estreita atividade assistencial e clínica. A TC_NRI aplica-se em dois contextos distintos, no serviço de urgência em patologia cerebrovascular aguda - TC_NRI Urgente - com particular destaque o AVC agudo (Via Verde do AVC) e as hemorragias intracranianas por rotura de aneurisma ou malformação arteriovenosa, e em situações programadas - TC_NRI Programada - em regime de internamento/consulta externa. Na TC urgente releva o AVC agudo, pelo enorme impacto
socioeconómico da doença, sendo a principal causa de morbimortalidade na população portuguesa, e pela forma sensível como se aplica o princípio da equidade, atendendo à enorme repercussão que o tratamento tem no prognóstico, vital e funcional destes doentes. A implementação da TC_NRI reveste-se ainda de maior relevância por ter sido demonstrado, em estudo científico recente (Dias MC et al , Nationwide access to endovascular treatment for acute ischemic stroke in Portugal, Acta Médica Portuguesa), existirem graves disparidades geográficas no acesso ao tratamento do doente com AVC agudo, apesar de Portugal liderar no número de trombectomias por 100 mil habitantes na Europa. As regiões menos próximas dos grandes centros urbanos do litoral têm as populações com menos acesso a cuidados de saúde diferenciados, contribuindo para essa assimetria, sobretudo a “distância” técnico-científica. A distância geográfica propriamente dita é bem menos relevante, sendo mitigada pelas reduzidas dimensões do Pais e pelas suas excelentes redes viárias. Neste domínio o acesso imediato a TC_NRI é primordial, com vista à célere e adequada seleção e orientação dos doentes com
AVC agudo para terapêutica fibrinolítica ou cirúrgica endovascular de revascularização (“Trombectomia”). A implementação do projeto permitiu “transportar” a NRI a todas as unidades hospitalares, possibilitando em conjunto com as especialidades clínicas (Medicina Interna e Neurologia) que laboram à “cabeceira” do doente, a melhoria significativa dos resultados em saúde, englobando todos os indicadores da Via Verde de AVC, independentemente da distância geográfica. No doente eletivo/programado, a TC_NRI gera de igual forma a aproximação e uniformização dos cuidados de NRI, em unidade de saúde com diferentes níveis de diferenciação, inclusive dos cuidados de saúde primários. Permite orientação clínica por uma equipa multidisciplinar, à distância, sem desperdícios de recursos (consultas, MCDT, transporte…), estando garantida a relação de confiança com o médico assistente. Em suma, a finalidade última do projeto passa pela promoção da transformação estrutural e organizacional da NRI, com o estabelecer de uma rede de TC_NRI, umbilicalmente ligada à rede de referenciação da NRI, alicerçada nos Centros de Referência de NRI.
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INOVAÇÃO INOVAÇÃO
É, por fim, a constatação de algo que há muito as companhias de diagnóstico e profissionais de saúde que trabalham na área têm tentado alertar os decisores: a importância do diagnóstico In Vitro (DIV). Não só pelo seu contributo e impacto social (na promoção da saúde, prevenção da doença e na possibilidade de melhorar resultados clínicos para doentes e sociedade), mas também económico (ao gerar importantes poupanças para o sistema de saúde o que hoje, mais do que nunca, importa considerar face aos crescentes desafios de sustentabilidade). Importa referir que os DIV não se esgotam nem se resumem a testes de deteção do SARS-CoV-2. São soluções que estão disponíveis na rotina clínica, estimando-se que são responsáveis por 70 por cento das decisões tomadas pelos profissionais de saúde e que representam apenas 2 por cento do investimento feito nas despesas totais no Orçamento de Estado para a Saúde. Sobre isto, importa referir que quer a população, quer os decisores, não conseguem diferenciar os diagnósticos de outras áreas das tecnologias de saúde (medicamentos e dispositivos médicos) os DIV têm um modelo de acesso particular.
NAZLI SAHAFI Diretora Geral Roche Diagnósticos Portugal Responsável pelo Centro de Gestão da África Lusófona
Diagnóstico In Vitro: uma via verde para a sustentabilidade! Mas, afinal, de que forma é que o diagnóstico In Vitro contribui para a sustentabilidade? E que impacto tem na saúde, na prática clínica, no cidadão, no sistema de saúde? Numa breve reflexão podemos dizer que as companhias de diagnósticos vivem hoje uma nova realidade e que o futuro depende, em muito, da forma como os decisores possam olhar para a importante contribuição deste setor.
A pandemia da COVID-19 permitiu que os diagnósticos fossem percebidos como fulcrais no desenvolvimento de estratégias conjuntas de combate a esta crise de saúde pública, com um significativo aporte assente no valor da inovação e desenvolvimento das diferentes soluções, acessíveis aos cidadãos através de entidades públicas (hospitais) e privadas (laboratórios privados de análises clínicas e farmácias) de prestação de cuidados de saúde.
De facto, uma das principais conclusões do estudo realizado pela NOVA-IMS na análise realizada, em 2021, sobre o “Valor em Saúde: o caso de estudo dos Diagnósticos In Vitro”, leva a aferir que existe um desconhecimento sobre o modus operandis das companhias de diagnósticos o que, por si, leva a que sejam tomadas decisões por vezes descontextualizadas, mas que impactam fortemente estas empresas. Importa, por isso, lembrar que o modelo de acesso a diagnósticos In Vitro assenta essencialmente na resposta a concursos públicos, publicados e concluídos numa base periódica curta. Tal reveste um risco que é assumido pelas companhias de diagnósticos, na realização de investimentos consideráveis, quer através da instalação de equipamentos no valor de centenas de milhares de euros (a qual depende da realização de estudos de implementação de projeto), quer muitas vezes com necessidade de subcontratação de terceiros para a realização de obras e outras adaptações necessárias, nem sempre devidamente consideradas nos encargos do projeto. Além disso, convém sublinhar o apoio contínuo, prestado por equipas especializadas, que assim asseguram o funcionamento 24/7 dos laboratórios
hospitalares, fulcral para o processamento de amostras e entrega de resultados, bem como a colocação adicional de equipamentos laboratoriais em redundância para assegurar sistemas de backup de elevada disponibilidade, com os inerentes custos de investimento e operação. É mais um investimento das companhias de diagnósticos em prol do sistema de saúde e do seu impacto para o cidadão. Por último, e nem sempre devidamente valorizada em sede de concurso público, a formação contínua do pessoal técnico e médico, realizada antes e após a instalação dos equipamentos nos laboratórios, essencial para um melhor desempenho e obtenção de resultados clínicos laboratoriais. A inovação trazida pelas companhias de diagnóstico permitiu o desenvolvimento de dispositivos utilizados em situações críticas (diagnóstico de agentes infeciosos ou afetação multiorgânica na sepsis), no diagnóstico diferencial de condições crónicas (doseamento de péptidos natriuréticos na suspeita de insuficiência cardíaca) ou até na prevenção do cancro (deteção da infeção por HPV no rastreio do cancro do colo do útero). O papel dos DIV na promoção da saúde, prevenção da doença e na melhoria da qualidade de vida das pessoas é indiscutível, aliado a um impacto socioeconómico importantíssimo que contribui, de forma ativa, para a sustentabilidade do SNS. Através de um diagnóstico acertado, é possível iniciar rapidamente o tratamento mais eficaz e, com isso, também salvar vidas, com poupanças significativas para o SNS. Vejamos três exemplos concretos: •
A testagem de HPV para o rastreio do cancro do colo do útero tem um impacto na redução da incidência e mortalidade da doença em 30 e 70 por cento, respetivamente. Estes números traduzem-se numa redução de custos em 24 por cento para o SNS face ao rastreio clássico com base em citologia;
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Se o doseamento do biomarcador NT-proBNP estivesse acessível aos cuidados de saúde primários, seria possível identificar precocemente mais casos de insuficiência cardíaca, a patologia responsável pelo maior número de internamentos hospitalares, uma medida que permitiria uma redução dos custos atuais com a gestão da doença em, pelo menos, um milhão de euros;
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INOVAÇÃO INOVAÇÃO
CONGRESSOS
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A diabetes afeta mais de 1 milhão de portugueses, representando cerca de 13,3 por cento da população entre os 20 e os 79 anos, sendo que dependemos dos DIV para a monitorização da glicose. Atualmente, um diabético controlado despende anualmente, em média, apenas duas horas de cuidados com um profissional de saúde.
São inúmeros os casos que podem ser apresentados e que demonstram o importante contributo dos DIV para o cidadão, para o sistema de saúde e para a sua sustentabilidade. Para o futuro, espera-se que possam finalmente ser percebidos como soluções essenciais para os pilares da promoção da saúde, prevenção da doença e na escolha das melhores opções terapêuticas tendo em vista os melhores resultados para o cidadão e para o sistema. Para que isto seja possível é fundamental que se crie uma “via verde”, para uma correta e rápida avaliação do seu impacto, por forma a acelerar o acesso dos Portugueses aos DIV que demonstrem benefícios clínicos óbvios e de uma forma custo-efetiva. Mas, para isso, importa que os decisores e atores da saúde compreendam os desafios, conheçam a sua cadeia de valor e olhem para os factos, com a consciência de que apenas com o conhecimento podem ser tomadas as decisões mais acertadas para o cidadão e para o País.
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ROSÁRIO ORFÃO Presidente da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia Assistente Graduada Sénior de Anestesiologia Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra
A Sociedade Portuguesa de Anestesiologia em 2022 Nos últimos dois anos, a Sociedade multiplicou-se em recomendações e pareceres para abordagem do doente com Covid 19 em condições de excelência e, com segurança para todos os profissionais. Criou duas linhas telefónicas e grupos de apoio aos colegas anestesiologistas para esclarecimento rápido de dúvidas, nunca interrompeu a publicação da revista, realizou inquéritos sobre internato, condições de segurança dos anestesiologistas, divulgou algoritmos de atuação, manteve contactos com diretores de serviço sobre normas de atuação e organização da resposta à pandemia. Divulgou e escreveu editoriais/mensagens aos anestesiologistas procurando manter a coragem e força moral do nosso imprescindível grupo profissional. Manteve a rede de comunicação com colegas europeus da ESAIC e WFSA e colegas brasileiros da SBA e SAES tendo participado em webinares conjuntos. Com uma enorme preocupação cívica, esteve disponível para as entrevistas necessárias para esclarecimento da população, com vista a informar e tranquilizar em prole da segurança, procurando minorar a angústia desencadeada pela pandemia.
Não descurando o seu objetivo formativo na Anestesiologia, em 2020/2021 organizou 25 Webinares e sete Cursos de Via Aérea. Preocupados com a segurança, em 3 de março 2020 adiamos o Congresso. Em 30 de abril 2021, fomos inovadores organizando o primeiro congresso médico híbrido português. Acreditado pela CME, um novo modelo com vantagens como a de possibilitar que colegas de todo o mundo participem em tempo real e, permitir a todos, assistir online durante um mês. Em outubro 21 retomamos os Encontros Nacionais de Internos de Anestesiologia desta vez em Lisboa, acreditados pela CME e organizado pela secção de internos da SPA. Este ano, 2022, será um ano de mudança. Após um mandato de cinco anos em que procurámos dar resposta ao enorme desafio que a pandemia representou para todos os anestesiologistas, mantendo-nos na liderança da Anestesiologia portuguesa, é tempo de dar lugar a uma nova direção que em continuidade na excelência e qualidade, irá desenvolver novos projetos. Estão em curso eleições para os corpos sociais da SPA e, no fim do Congresso a nova direção tomará posse.
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CONGRESSOS
Congresso 2022 foi elaborado pelas várias secções coordenadas pela Domingas Patuleia presidente da Secção de Anestesia Pediátrica.
Créditos CME Congresso e pré cursos receberão mais uma vez acreditação internacional. O Curso de Via Aérea Difícil, um símbolo de qualidade da Secção de Via Aérea liderada pelo Jorge Matos Órfão, já habitual e imprescindível, decorre nos dias 11 e 12 de março. O Curso de Dor Aguda eTécnicas Locorregionais das secções de Anestesia Locorregional da SPA liderada por Carlos Correia e Secção de Medicina da Dor presidida por Rui Valente, decorre no dia 24 de março.
Realizaram-se ainda dois simpósios patrocinados: Inovação para aumentar os cuidados do doente do MSD e Anestesia Net Zero da Baxter.
O 5º Curso Avançado de Ventilação, numa parceria SPA/SEDAR com apoio da Draguer lecionado pelo presidente da SEDAR, prof Javier Garcia, a oportunidade de frequentar em Portugal um curso de renome.
Participaram colegas Anestesiologistas e de outras especialidades de todo o país, diretores de serviço de Anestesiologia dos vários hospitais, devendo notar-se um predomínio do sexo feminino (70%), tradutor da atual feminização da classe médica e uma forte presença dos internos de Anestesiologia que representam habitualmente 39% das inscrições.
O XI Curso de Introdução à Anestesiologia a cargo da secção de internos presidida pela Inês Vieira, adjuvada pela Mónica Paes Mamede. A Ordem dos Médicos avaliou o Congresso e já conferiu a sua Acreditação.
Lições Magistrais
Congresso da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia 2022 De 24 a 26 março decorreu em Cascais o Congresso Anual de Anestesiologia organizado pela SPA. Numa Sociedade com 67 anos de existência, este acontecimento é já uma tradição que reúne numa das três principais regiões do país, a pletora da Anestesiologia nacional além de convidados internacionais; cerca de 800 médicos que discutem
os principais hot topics da especialidade no âmbito da atualização e formação contínua, proporcionando também partilha de experiências e convívio de gerações. Existindo atualmente na SPA, 18 secções/grupos de trabalho temáticos, o Programa Científico do
Aguda, Evolução do Internato Médico - olhar critico sobre o passado, o presente e o futuro, Striving for motivation: três carreiras inspiradoras e Escolhas criteriosas em saúde, numa apresentação do projeto da Ordem dos Médicos
Decorreram imediatamente antes da Sessão de Abertura, as Lições Magistrais com o nome de dois vultos da Anestesiologia Portuguesa numa forma de os homenagear, Lição Eusébio Lopes Soares - intitulada – The next stage, por Rui Guimarães e Lição Magistral Cristina da Câmara com o título Ciência e Rigor… Arte e História.. Reflexão para o Futuro, por Cristina Pestana. Na sessão de abertura foi entregue o Prémio António Meireles 2021 para a melhor publicação na revista da SPA durante 2021, fomentando a investigação e lembrando o fundador da revista. O Congresso decorrerá em três salas: Carlos Erse Tenreiro, António Silva Araújo e Helena Rodrigues, três nomes que marcaram a Anestesiologia em Coimbra, no Porto e, em Lisboa respetivamente. No programa incluiram-se temas como: Acrescentar valor aos cuidados de saúde, implementar e validar estratégias de qualidade, ERAS para todos Valor e qualidade em via aérea, Marcar qualidade em Dor
Todos os órgãos representativos dos Anestesiologistas portugueses foram convidados. A Direção do Colégio de Anestesiologia da Ordem dos Médicos vai realizar a Assembleia Geral em horário nobre durante o Congresso.
No fim, será efetuado inquérito de satisfação. O último realizado num Congresso presencial, revelou que 86,5% de todos os inscritos considerou o Congresso de nível muito bom ou excelente com 88,7% dos temas a corresponder às necessidades formativas sentidas na prática diária. 97,6% considerou adequado o formato das sessões e respetiva discussão e 96,4% referiu que recomendaria Congresso a outros colegas. A SPA atingiu uma dimensão como Associação de Saúde que orgulha os anestesiologistas portugueses e representa uma grande responsabilidade para a sua direção. Contente com o feedback recebido nos últimos seis Congressos organizados, a direção da SPA e as Comissões Organizadoras e Cientifica estão certas de que o Congresso 2022 que decorreude novo em Cascais no Hotel Miragem sob o título Anestesiologia – Valor da Qualidade e Inovação, foi um sucesso e acima de tudo um regresso à normalidade do reencontro das várias gerações de anestesiologistas oriundos de todo o país, troca de ideias, partilha de experiências e matar
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INOVAÇÃO
Isto leva-nos para um outro ponto: a necessidade de criar sistemas de saúde fortes e sustentáveis a longo prazo. No caso português, se dúvidas ainda houvessem do valor do SNS, todas elas se dissiparam nos últimos dois anos. Nunca foi tão evidente a importância que o SNS tem na vida dos portugueses e no desenvolvimento socioeconómico do país. Mas também nunca foi tão clara a necessidade de um maior investimento para podermos enfrentar os desafios de amanhã. Importa relembrar que o SNS é composto, sobretudo, pelas pessoas que diariamente prestam um serviço louvável a todos aqueles que necessitam de cuidados de saúde. É, por isso, de louvar o trabalho extraordinário dos nossos profissionais de saúde, que lutaram na linha da frente de combate à pandemia de forma incansável e que todos os dias continuam a fazer prova de coragem, determinação e sentido de missão. Foram eles os rostos do combate contra a pandemia, são a alma do SNS e merecem, por isso, toda a nossa admiração e reconhecimento. Mas nunca é demais relembrar que o caminho para a sustentabilidade e para a melhoria dos cuidados não pode fazer-se apenas por via do esforço das instituições de saúde e das suas equipas. É também necessário um maior investimento em Saúde, pois só assim conseguiremos proteger o nosso sistema de saúde e garantir cuidados de qualidade a todos os portugueses no Futuro. Investir mais em Saúde é investir na sustentabilidade a longo prazo.
ANTÓNIO DELLA CROCE Diretor-geral AbbVie
Cinco lições da pandemia de Covid-19 para o Futuro A pandemia de Covid-19 trouxe, sem sombra de dúvida, o maior desafio de saúde pública dos nossos tempos. Veio expor inúmeras fragilidades e pôr à prova a capacidade de resposta dos sistemas de saúde, mas veio também reforçar alguns pontos essenciais: a importância da Saúde, a necessidade de mais investimento no Serviço Nacional de Saúde (SNS), o valor da inovação, o papel da Indústria Farmacêutica e a vantagem das sinergias e parcerias.
Hoje é indiscutível a importância da saúde para o indivíduo, para a sociedade e para a economia. Ficou comprovada a inequívoca interligação entre a saúde das populações e o desenvolvimento económico e social de cada país e do mundo globalizado em que vivemos. Não existe saúde sem economia, da mesma forma que não pode existir economia sem saúde.
E quando falamos em investimento, falamos também em investimento em investigação e desenvolvimento científico, que permitiu e continua a permitir salvar milhões de vidas. A pandemia veio evidenciar o valor da inovação, que se tem traduzido no célere desenvolvimento de meios de diagnóstico, medicamentos e vacinas, chaves essenciais para a resolução desta crise sanitária. Com esta pandemia, fica também evidenciado o papel da indústria farmacêutica e o seu contributo para a sociedade e a economia. Felizmente, hoje podemos vislumbrar o tão aguardado regresso à dita normalidade e isso só é possível graças à inovação disponibilizada pelas empresas farmacêuticas. Sem esquecer também que, ao longo destes últimos dois anos, a indústria lutou para garantir o normal
funcionamento do ciclo do medicamento, para que todos os doentes, independentemente da patologia, continuassem a ter acesso às terapêuticas. Mas como em tudo na vida, nada se faz sozinho… Outra aprendizagem que a pandemia nos trouxe está relacionada com a contínua necessidade de criar sinergias no setor da saúde, através da estreita colaboração entre todos os seus intervenientes, mas não só... A contribuição de outros setores fundamentais, da Academia e da própria sociedade civil foram fulcrais para que o SNS fosse capaz de dar resposta num momento tão crítico como este e de assegurar a saúde e o bem-estar das populações. Temos todos a ganhar se no Futuro continuarmos a alimentar este tipo de interações e parcerias. Em resumo, a pandemia de Covid-19 veio trazer clareza e, se retivermos as devidas lições, poderá agora ajudar-nos a antecipar o futuro a preparar novos desafios. A retoma da economia e da vida em sociedade constitui uma oportunidade única para repensar o setor da Saúde e atribuir-lhe a devida importância. Mais do que nunca, a Saúde deve ser encarada como um investimento na vida e no bemestar das pessoas, como o bem mais precioso de economias e sociedades.
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APDH
Atividades APDH A Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Hospitalar (APDH), como é habitual, tem vindo a realizar as suas iniciativas a nível nacional e internacional. Destas destacam-se, em baixo, as realizadas no primeiro trimestre de 2022.
JANTAR DEBATE "SAÚDE EM PROXIMIDADE"
No dia 22 de março de 2022, realizou-se no Restaurante Altitude em Lisboa, o Jantar Debate subordinado ao tema "Saúde em Proximidade", no qual estiveram presentes 49 profissionais ligados às mais diversas áreas relacionadas com o tema em discussão.
descentralização de competências para as autarquias locais no domínio da saúde (cuidados saúde primários) e o seu impacto na prestação de cuidados de saúde e no acesso dos doentes, bem como as potenciais oportunidades para a comunidade, as organizações e o sistema de saúde português.
Foi um momento de grande qualidade, composto por intervenções de grande pertinência. Como sugestões para debates futuros foi sublinhada a necessidade do desenvolvimento de parcerias para discussão de novas soluções, da criação de um novo modelo de cuidados de saúde, da promoção da inovação e do estímulo à participação de todos os intervenientes neste processo de mudança.
PLANO DE FORMAÇÃO APDH 2019-2022
Este evento resultou de uma parceria com a SINASE e pretendeu promover, à volta da mesa e de um modo informal, o debate sobre a importância do processo de
Venha conhecer no site da APDH (www.apdh.pt) o nosso plano de formação 2019-2022. Estão atualmente em curso 20 ações, que incidem nas mais variadas temáticas, desde a componente jurídica à segurança do doente. Inscreva-se gratuitamente e não perca esta oportunidade para desenvolver as suas competências profissionais.
O que dizem sobre as nossas formações: “As ações de formação promovidas pela APDH têm sido de uma enorme mais valia para o desenvolvimento profissional. Tenho frequentado, desde há vários anos, formações que se têm pautado por uma qualidade técnica e humana excelente.” Artur Carvalhinho, Enfermeiro Diretor, Hospital do Arcebispo João Crisóstomo – Cantanhede "Tive a oportunidade em realizar no ano passado 2 cursos promovidos pela APDH. Os cursos superaram as minhas expectativas iniciais. Os formadores e os conteúdos ministrados foram excelentes e foram uma mais valia para a minha prática profissional. Foi extremamente interessante e proveitosa a partilha de conhecimentos e experiências com os vários formandos. Aconselho vivamente os cursos da APDH pois respondem às nossas necessidades formativas atuais." Pedro Quintas, UCC Pombal do ACeS Pinhal Litoral, Enfermeiro Especialista em EC na área da Enfermagem de Saúde Familiar.
DIÁLOGO ABERTO "O HOSPITAL" – LIVRO VERDE DOS HOSPITAIS DO SNS
Em 2019, resultado de uma parceria entre APDH, a Escola Nacional de Saúde Pública e a FDC Consulting e com o apoio da Takeda, foi iniciada a iniciativa "Diálogo Aberto – O Hospital", que reuniu para o efeito um conjunto de personalidades e peritos ligados ao setor da Saúde e que culminou na publicação - Livro Verde dos Hospitais do SNS. Desafiamo-lo a conhecer esta publicação em detalhe, já disponível numa loja da FNAC perto de si ou online em https: //www.f nac .pt/Dialogo-Aberto-O-HospitalAPDH-Associacao-Portuguesa-para-o-Dese/ a9733051#omnsearchpos=1
LISBOA ACOLHE O 46º CONGRESSO MUNDIAL DOS HOSPITAIS É com muito orgulho que a APDH, enquanto Membro de Pleno Direito da Federação Internacional dos Hospitais (IHF), colabora na organização do 46º Congresso Mundial dos Hospitais (WHC), a decorrer em outubro de 2023, em Lisboa. Este evento da IHF, que junta aproximadamente 1.500 participantes, será coorganizado por um consórcio português, constituído pela APDH, a Associação Portuguesa de Hospitalização Privada (APHP), e a Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH), com o Alto Patrocínio de Sua Excelência O Presidente da República. O WHC é um fórum global único que reúne líderes executivos de hospitais, bem como de serviços e organizações de saúde, para partilharem conhecimentos e boas práticas, trocarem novas ideias e inovações e, fazerem networking com os seus pares da comunidade internacional de Saúde. Os temas e conclusões do WHC são impactantes e, a participação uma experiência significativa e gratificante. O consórcio expressa o seu compromisso com a troca internacional de conhecimentos e, o seu entusiasmo por acolher o 46º WHC:
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APDH
Atividades APDH O consórcio expressa o seu compromisso com a troca internacional de conhecimentos e, o seu entusiasmo por acolher o 46º WHC:
PARTICIPAÇÃO DA APDH NO DUBAI HEALTH FORUM
“É com grande honra e sentido de responsabilidade que aceitamos a distinção de receber em Lisboa o 46.º WHC da IHF. Esperamos trabalhar em conjunto com os profissionais de saúde e especialistas a nível nacional e internacional, visando contribuir para a construção de melhores sistemas de saúde, garantindo e melhorando a saúde das populações, nestes tempos conturbados e desafiantes.”
No âmbito da 4.ª edição do Dubai Health Forum, a IHF organizou, no dia 3 de março de 2022, uma sessão, que contou com a participação ativa de Margarida Eiras, Vogal da Direção da APDH, e Membro do Governing Council e Executive Committee da IHF.
O 1º WHC data de 1929, altura em que decorreu em Atlantic City (EUA), tendo sido realizado inicialmente como um evento bienal. Desde 2015 tem sido realizado anualmente em todo o mundo, em cidades como Barcelona, Espanha (2021) ou Dubai, EAU (2022). O 10º WHC realizou-se em Lisboa em 1957 e, passados mais de 60 anos, este evento regressa uma vez mais a Portugal.
A sessão, intitulada “Healthcare Evolution for the Next 50”, contou com três perspetivas distintas, apresentadas por: •
Ronald Lavater, CEO da IHF, que abordou os modelos de liderança pós-pandemia e de prestação de cuidados de saúde sustentáveis e deu a conhecer o lançamento pela IHF do Geneva Centre of Healthcare Leadership for Sustainability.
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Muna Abdulrazzaq Tahlak, Presidente designada para o próximo mandato da IHF, que falou sobre a importância dos cuidados de saúde centrados na pessoa.
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Margarida Eiras, que apresentou as tendências e desafios do futuro da saúde em Portugal, enquanto exemplo de um país europeu.
A sessão foi moderada por Safya Al Hamadi, Analista de Qualidade Clínica da Autoridade da Saúde do Dubai.