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Património
APRUPP, A ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA SELECIONADA PELA UNESCO PARA O WHV 2020 - 2021
por Alice Tavares, Presidente APRUPP
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A APRUPP – Associação Portuguesa para a Reabilitação Urbana e Proteção do Património é uma associação sem fins lucrativos, com sede no Porto, criada em 2012, cuja atividade se centra na sensibilização para as boas práticas de reabilitação de edifícios e reabilitação urbana que integrem a preservação do Património edificado e preocupações sociais. Os sócios da APRUPP são sobretudo arquitetos, engenheiros, investigadores, professores universitários, conservadores restauradores, empresários ligados à construção entre outros profissionais e interessados na Reabilitação e no Património. O trabalho multifacetado que a APRUPP (https://aprupp.org/) tem vindo a desenvolver foi agora reconhecido pela UNESCO, como sendo convergente com os objetivos do programa internacional WHV – World Heritage Volunteers Initiative, já que alia a sensibilização com a formação técnica nas mais variadas áreas ligadas à reabilitação do Património. Os resultados mundiais do WHV – World Heritage Volunteers Initiative 2020-2021. Fostering Youth Commitment towards World Heritage foram conhecidos este mês de dezembro de 2020, tendo sido selecionadas 55 candidaturas no contexto mundial, em que 13 candidaturas são para o conjunto Europa e América do Norte, de entre as quais a candidatura da APRUPP foi selecionada e é a única para Portugal. As restantes candidaturas são para a Alemanha (2), Finlândia (1), Itália (1), Croácia (1), Espanha (2), Turquia (1), Rússia (4). Destas 13 candidaturas selecionadas apenas duas são promovidas por associações não governamentais, entre elas a APRUPP. As 55 candidaturas irão desenvolver campanhas de trabalho e sensibilização exclusivamente em locais de Património Mundial, em 32 países e dinamizadas por 49 organizações. O WHV 2020-2021 tem como objetivo capacitar e dar oportunidades enriquecedoras a jovens de irem para além das suas fronteiras, participar em atividades práticas de conservação e contribuir para a preservação do Património Cultural de relevo mundial, em regime de voluntariado. A Initiative WHV foi criada em 2008 e pretende dotar os jovens de capacidades e competências para terem um papel ativo na proteção, preservação e promoção do Património Mundial. É com este objetivo geral que a APRUPP apresentou a sua candidatura intitulada WHV – Porto in the Path of Cultural Heritage Sustainability dirigida à área classificada “Centro Histórico do Porto, Ponte Luiz I e Mosteiro da Serra do Pilar”. Durante 10 dias, entre 14 e 25 de maio de 2021 irão ocorrer Workshops sobre técnicas de conservação de elementos identitários do edificado antigo do Porto, como caixilharias, paredes de tabique, clarabóias, para além de visitas de levantamento/identificação de edifícios com elementos originais desse edificado e de forma intercalar debates com os principais intervenientes e responsáveis pela preservação deste Património de valor mundial. A APRUPP abrirá no início de janeiro uma Call para os 20 voluntários participantes (15 estrangeiros e 5 nacionais), bem como uma Call de Boas Práticas de reabilitação dirigida a técnicos projetistas, empresas e investidores. Esta
iniciativa irá promover um Património Nacional relevante no contexto mundial, dando-lhe visibilidade e será uma oportunidade de promoção de um debate alargado sobre práticas de reabilitação, que no contexto nacional apresentam desvios preocupantes com o recurso sistemático a demolições do interior dos edifícios, mantendo a fachada, numa destruição sem precedentes do Património edificado corrente nacional. Em 2012 a maior preocupação da APRUPP era a de que se fomentassem programas de apoio à reabilitação urbana para que o Património edificado dos centros históricos, centros urbanos e áreas rurais não se perdesse por abandono e degradação decorrente dos efeitos da anterior lei do arrendamento e da crise económica. No presente, a grande preocupação recai sobre a delapidação do Património em curso pelo menos desde 2015, por falta de regras claras de proteção do Património edificado corrente a nível municipal, por falta de regras claras das operações de reabilitação que façam obrigatoriamente uma prévia avaliação dos valores culturais e patrimoniais presentes, com a consequente definição de níveis de preservação e, uma excessiva permissividade, impotência e por vezes promoção dos municípios de ações de demolição sem fundamentos credíveis. A perda de autenticidade do Património edificado está em curso de forma acelerada, incluindo das fachadas e, se em 2011 os edifícios anteriores a 1919 representavam menos de 6% do global, em 2021, lamentavelmente estaremos perto da extinção deste edificado caracterizador de muitos lugares. Com consequências graves do ponto de vista cultural e contrariamente ao que tem sido divulgado, também terá consequências negativas ao nível do turismo cultural, a menos que estejamos a promover um turismo sustentado em forte iliteracia e recuerdos made in China, com forte pressão para monofuncionalidade do espaço urbano lesiva da permanência das populações residentes. Outros riscos para o Património estão identificados e inexplicavelmente estão alicerçados em argumentos com forte marketing, como: a promoção da eficiência energética, a promoção do conforto, a diminuição de produção de CO2 e de resíduos, necessidades de áreas de compartimentação maiores para os estilos de vida atuais. De forma sumária estamos desde 2015 a aumentar a produção de resíduos (expectável considerando a generalização das demolições nas intervenções). Estamos a promover uma eficiência energética alicerçada na instalação de equipamentos e infraestruturas para aquecimento e arrefecimento quando sabemos que a tranche de maior consumo energético nas habitações está ao nível dos equipamentos de cozinha e quando sabemos ainda que as Famílias Portuguesas não aquecem as suas casas de forma contínua. Ora isso inviabiliza retornos aceitáveis do investimento e também a demonstração da eficácia das soluções de reabilitação baseadas na promoção de substituição de caixilharias, por exemplo. Para além de não se equacionar a durabilidade dos equipamentos instalados, com uma indústria que muito rapidamente descontinua equipamentos e altera ligações entre componentes exatamente para que estes tenham uma deadline de permanência no mercado, onerando a montante a manutenção desses equipamentos ou impondo a sua substituição ainda antes do retorno financeiro do investimento inicial. Facilmente se verifica que muitas das intervenções no edificado antigo de Lisboa e Porto, com todas estas prerrogativas de conforto
não são destinadas ao mercado nacional ou são apenas para uma classe média-alta. Quando a especulação está a transformar o edificado antigo em apartamentos em muito casos com áreas igualmente reduzidas ou espaços com partilha de funções (proliferando os Estúdios, os T0, os T1), que não respondem às necessidades das Famílias Portuguesas nem à capacidade financeira destas para o alojamento de estudantes universitários ou recém-licenciados. Efetivamente, estes são aspetos a acompanhar e sobretudo a ter uma visão crítica capaz de avaliar as consequências das medidas, não só da sua eficácia e gasto de financiamento da União Europeia, como também das consequências para o Património. Para este efeito a APRUPP procura acompanhar os dados de caracterização desta realidade, quer através da comunidade técnica, quer da comunidade científica, numa polivalência de abordagem que já vem enunciada desde 2019 pelo ICCROM a ser incentivada através de canais de trabalho colaborativo entre indústria e universidades, entre universidades e entidades ligadas ao Património e Cultura e entre estas e a indústria. Daí que a candidatura que apresentou à WHV 2020-2021 teve parceiros como o Centro da Terra (através da Arqª Ana Antunes), a Escola Superior Gallaecia (através da Arqª Mariana Correia), a Universidade de Aveiro (através do Prof Aníbal Costa e a autora). Para que a polivalência de pontos de vista enriqueça as ações a desenvolver, neste caso no Porto. O Porto apresenta um património azulejar de reconhecido valor, não apenas no seu edificado antigo, num tempo em que as indústrias cerâmicas procuraram responder à necessidade de proteção das fachadas com uma solução estética, mas também mais tarde em alguns exemplares do Movimento Moderno da Arquitetura como por exemplo o Edifício Parnaso e mais recentemente o edifício do Terminal de Cruzeiros do Porto de Leixões. Em vários momentos da história da Arquitetura Portuguesa observamos o papel crucial de inovação em cada época das indústrias da cerâmica. No presente alguns desafios potenciam essa ligação: a proteção do Património azulejar como um marco da história da Arquitetura/Indústria/Construção; os materiais e tecnologias de conservação dos elementos cerâmicos das várias épocas, incluindo a presente projetada para o futuro, a sua ligação compatível ao suporte e durabilidade do conjunto; os avanços tecnológicos para responder a funções cada vez mais exigentes e a soluções de arquitetura cada vez mais diversas. A proteção das fachadas azulejares e nomeadamente uma ponderação sobre a aplicação da Lei 79/2017 de 18 de agosto já foi abordada em 2019 em debate promovido pela APRUPP, como também o apoio à formação técnica de conservação através de Workshops em Lisboa e Porto. A recente promoção do Prémio APRUPP 2020 de teses de doutoramento e de mestrado permitiu verificar que os elementos cerâmicos integram as preocupações académicas no âmbito do conhecimento das correntes da Arquitetura mas também da conservação dos elementos cerâmicos em edifícios do século XX. O Património do século XX que é já identificado como o Património do futuro. Uma convergência de posições que está a levar entidades internacionais como a UNESCO, o ICCROM, o ICOMOS, o DOCOMOMO e o Getty Foundation a sensibilizar a comunidade internacional. Uma chamada a toda a sociedade e à qual a APRUPP procurará dentro da sua ação promover e na qual as indústrias da cerâmica terão também um papel importante a desenvolver.