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Questão Estratégica
MATÉRIAS-PRIMAS MINERAIS EM PORTUGAL: UMA OPORTUNIDADE QUE NÃO DEVEMOS PERDER
por Luís Martins, Geólogo
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A história do aproveitamento dos recursos minerais é quase tão antiga como a história do próprio homem. A sua utilização foi de tal modo marcante e determinante para a evolução da humanidade que os grandes períodos da pré-história têm designações baseadas em recursos minerais.
Por outro lado, a história da Terra é constituída por várias alterações climáticas, períodos de aquecimento e arrefecimento, muitos milhões de anos antes do aparecimento do Homem. No entanto, hoje em dia é quase consensual junto à opinião pública que as alterações climáticas a que assistimos são devidas à actividade humana, principalmente às emissões de CO2 por ela produzidas, embora só existam registos climáticos das últimas centenas de anos, ínfimos quando comparados com os milhões de anos de vida do Planeta. No entanto, não se coloca em causa que a redução das referidas emissões só pode ser benéfica, se ela for abordada à escala global, já que só assim faz sentido. É neste contexto que surge hoje um novo objectivo económico-energético, de transição para um cenário de baixo carbono. E é nele que, uma vez mais, os recursos minerais terão um papel determinante, assumindo particular importância metais como o lítio. Assim, vários países europeus, como a Suécia e a Alemanha, têm desenvolvido políticas fundamentais no sentido de aproveitar os normalmente designados minerais estratégicos para a implementação deste cenário. Sem esquecer um apoio político e financeiro muito relevante da própria Comissão Europeia, interessada em que o Velho Continente não fique, desta vez, ainda mais dependente do exterior. Assim, foi publicada em 3 de Setembro de 2020 uma nova Comunicação da Comissão Europeia (COM(2020) 474), actualizando a lista de matérias-primas críticas e introduzindo o lítio como uma das 4 novas substâncias, reafirmando os princípios da
Geólogo Luis Maertins -
Iniciativa Matérias-Primas de 2008 e estabelecendo um Plano de Acção, com 10 pontos, que garanta um abastecimento sustentável e seguro destes recursos à Europa. O primeiro destes pontos, a formação de uma Aliança Europeia para as Matérias-Primas (https://erma.eu/), foi já lançada em 29 de Setembro de 2020.
Portugal possui importantes recursos de lítio e ainda um potencial enorme por explorar, ao contrário da maioria de outros países europeus. Várias empresas produtoras de matérias-primas cerâmicas têm sido as responsáveis pelo facto de Portugal ser hoje o 1º produtor europeu de lítio. As propriedades deste metal devem continuar a ser potenciadas com este objectivo mas urge que ele seja também utilizado para outros fins. A promoção da construção de uma completa cadeia de valor deste metal no País, desde a sua pesquisa, exploração, processamento, manufactura de produtos finais e re-
ciclagem, não se limitando aos primeiros passos dessa cadeia e indo assim capturar todo o respectivo valor acrescentado, deve ser uma prioridade. O País tem instituições de investigação e académicas com excelente conhecimento nestas matérias. Tem empresas que têm vindo a apostar e a investir no País, com capacidade tecnológica suficiente para desenvolver a referida cadeia de valor de forma ambientalmente correcta e em benefício das comunidades locais, dos municípios, das regiões, do País.
Papel importante terá ainda a clusterização na construção de cadeias de valor de recursos minerais, tendo em conta que elas são muitas vezes complexas e demoram tempo a consolidar, mas são a chave para a sustentabilidade. Isto tendo em conta também que a economia de recursos é resiliente a longo prazo e só é possível construir com planos estratégicos de longo prazo. Assim, a materialização do “triângulo do conhecimento” em Clusters que promovam a colaboração entre empresas, instituições governamentais e instituições académicas e de investigação é essencial em qualquer sector (Fig. 2) e em particular no dos recursos minerais. Em 2017 o Governo Português reconheceu oficialmente o Cluster Portugal Mineral Resources, entre 20 clusters temáticos. Esta associação tem hoje cerca de 70 membros, a maioria deles pequenas e médias empresas, mas também as melhores instituições de ensino superior e de investigação na área dos recursos minerais. Este Cluster deverá ser peça fundamental para aumentar a capacidade de investigação das nossas instituições e de inovação das nossas empresas.
Será que, com tudo isto, vamos perder esta oportunidade? Esperemos que não. É que não há vida, pelo menos à que hoje nos habituámos, sem minas. A menos que queiramos mudar por completo de estilo de vida e regressarmos à Idade da Pedra. Mesmo assim haveria que continuar a explorar a pedra, um dos mais importantes recursos minerais de Portugal. Esperemos que o lítio também o seja.
Para isso será determinante uma aposta estratégica do Governo no sector dos recursos minerais, ainda para mais num contexto económico e de saúde pública tão difícil como o que vivemos hoje, e que pode e deve ser estratégico e estruturante. Mais do que nunca: