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Interface
Wi-Fi 6 e tecnologias para redes sem fio mais sofisticadas devem levar a uma redução ou extinção das redes cabeadas ou à convivência de ambas? Como obter um bom desempenho em redes sem fio? Parte 2
Na edição anterior de Interface, apresentei as características do padrão Wi-Fi 6 (IEEE 802.11ax) e seu princípio de operação. Nesta edição, continuo a discussão apresentando o conceito de spatial streaming, fundamental para todas as análises de operação e desempenho da tecnologia Wi-Fi 6 e o mecanismo de OBSS –Overlapping Basic Service Set, ou interferência entre canais. Wi-Fi 6 e interferência entre canais
Conforme discutido anteriormente, clientes Wi-Fi 6 suportam MU-MIMO - Multi-user, Multiple-input, Multiple-output no downlink, ou seja, do PA – Ponto de Acesso Wi-Fi para o usuário (cliente). Com o uso dessa nova tecnologia secundária de acesso multiusuário, um novo conceito precisa ser introduzido, que é o spatial streaming. Por falta de um termo mais adequado em português, vou manter o original em inglês ao longo do artigo.
O spatial streaming em tecnologia Wi-Fi é uma técnica de transmissão utilizada em comunicação sem fio que emprega MIMO para transmitir sinais codificados (stream de dados) de várias antenas. Isso leva ao reúso do espaço para maior capacidade de transmissão. O AP Wi-Fi 6 pode supervisionar a transmissão no downlink e uplink de vários rádios (clientes), enquanto controla o acesso ao meio físico (PHY). A figura 1 mostra o formato padrão da configuração MU-MIMO.
Como exemplo, se um PA Wi-Fi que emprega MU-MIMO utilizar a configuração 4x4:4, quatro spatial streams serão transmitidos a quatro clientes (figura 2).
Na figura 2, cada stream de dados é único. Da mesma forma, também é possível transmitir quatro spatial streams a dois clientes, por exemplo, em uma configuração 2(2x2:2). Nessa configuração, cada cliente é capaz de operar em 2x2:2 e receber dois spatial streams únicos e duas antenas de transmissão e duas de recepção serão utilizadas tanto no PA quanto em cada cliente. O downlink MU-MIMO foi introduzido na segunda geração de rádios IEEE 801.11ac (Wi-Fi 5), o IEEE 802.11ac Wave 2, habilitando quatro conexões de downlink simultâneos em vez de um único MIMO, entretanto, mantendo a configuração 1x1:1 no uplink. A principal diferença entre o Wi-Fi 5 e o Wi-Fi 6 é a quantidade de clientes que podem ser tratados pelo PA simultaneamente. O Wi-Fi 6 é projetado Fig. 1 – Formato padrão de rádios MIMO para suportar 8x8:8 MU-MIMO tanto no downlink quanto no uplink, ou seja, até oito clientes podem ser atendidos ao mesmo tempo, o que aumenta de forma importante o throughput da rede.
Esta seção se propõe a analisar tópicos de cabeamento estruturado, incluindo normas, produtos, aspectos de projeto e execução. Os leitores podem enviar suas dúvidas para Redação de RTI, e-mail: inforti@arandanet.com.br.
Fig. 2 – Transmissão MU-MIMO na configuração 4x4:4
Tecnicamente, o Wi-Fi 6 traz uma taxa de transmissão monousuário 37% maior que a oferecida pelo IEEE 802.11ac. No entanto, o mais significativo é que essa melhoria resulta em um throughput quatro vezes maior por cliente em ambientes com altas densidades de usuários, assim como uma melhor eficiência no uso de energia elétrica e consequente longevidade aumentada das baterias dos dispositivos.
Uma consequência do emprego do Wi-Fi 6, que suporta downlink MUMIMO, é a necessidade de distanciamento físico crítico entre os
clientes e pontos de acesso. Isso é feito para garantir desempenho ótimo e minimizar o OBSS, que pode ser entendido como interferência entre canais que discutirei em mais detalhes a seguir. A figura 3 mostra um exemplo da disposição dos clientes em uma rede de alta densidade.
As distâncias apresentadas na figura 3 são fictícias, apenas com o objetivo de esclarecer que as distâncias entre clientes e, entre clientes e pontos de acesso em redes Wi-Fi 6, devem ser determinadas com critérios bastante específicos e não aleatoriamente. Portanto, o bom desempenho da rede dependerá de um bom projeto e instalação adequada.
Como sabemos, a tecnologia Wi-Fi é um sistema de comunicação em radiofrequência, portanto, que opera em modo half-duplex. Nesse modo de comunicação, apenas um rádio pode transmitir por um mesmo canal em um determinado ciclo de transmissão, ou seja, não há transmissão simultânea em qualquer sentido. O protocolo CSMA/CA - Carrier Sense With Multiple Access Collision Avoidance, empregado em redes Wi-Fi, assegura esse método de transmissão por detectar o canal durante um tempo
predeterminado pelo padrão, evitando, então, que mais de um cliente ou PA utilize o mesmo canal simultaneamente.
Ao passo em que o protocolo de camada física (CSMA/CA) efetivamente evita as colisões na rede Wi-Fi, ele consome um tempo significativo de utilização do canal e leva ao OBSS, ou interferência entre canais, quando diversos pontos de acesso e/ou clientes Wi-Fi tentam estabelecer uma conexão no mesmo canal de forma simultânea. O efeito disso é mostrado na figura 4.
No exemplo da figura 4, temos dois pontos de acesso (PA-A e PA-B) operando no mesmo canal (11).
Fig. 3 – Tecnologia MU-MIMO e disposição dos dispositivos em redes Wi-Fi 6 de alta densidade
Se o PA-A detectar o sinal de transmissão do PA-B em suas proximidades, ele adiará sua transmissão e não poderá transmitir naquele ciclo. Da mesma forma, seus clientes adiarão a transmissão se detectarem o sinal de transmissão do PA-B.
Esse mecanismo é referido como BSS Basic Service Set e é o pilar da tecnologia Wi-Fi. Quando ocorre a sobreposição de BSS, temos uma interferência por sobreposição de canais, ou OBSS, destacado pelas linhas vermelhas na figura 4. Outros pontos de acesso operando em outros canais não são afetados pelo OBSS entre os pontos de acesso PA-A e PA-B.
Embora representada aqui a interferência entre dois pontos de acesso Wi-Fi, os clientes da rede sem fio também podem causar OBSS e isso é bastante comum, especialmente os dispositivos que se movem dentro dos limites da cobertura da rede. Novamente, um bom projeto é fundamental para o desempenho ótimo.
O leitor pode estar se perguntando o quanto o desempenho da rede é realmente melhorado com o Wi-Fi 6 (em relação às gerações anteriores) uma vez que um determinado canal somente pode ser utilizado por um único cliente (ou PA) em um determinado momento devido ao OBSS.
Uma técnica bastante interessante, conhecida como BSS coloring, para a reutilização do canal foi desenvolvida para lidar com esse problema. Se vários pontos de acesso operam em um mesmo canal, eles podem transmitir com um identificador (color) único na rede, que permite que mais de um PA utilize o meio físico ao mesmo tempo
Fig. 4 – Exemplo de OBSS entre dois pontos de acesso usando o mesmo canal
Fig. 5 – Exemplo de reúso do canal por meio da técnica de BSS coloring (à esquerda sem esquema BSS Coloring e à direita com esquema BSS Coloring) sem precisar esperar o canal estar livre, pois seu identificador diferencia os dados transmitidos por ele em relação a outros dispositivos. A figura 5 exemplifica o uso dessa técnica.
Na figura 5a o esquema de BSS coloring não é empregado e, portanto, todos os pontos de acesso que operam no canal 11 estão sujeitos à sobreposição de canais (OBSS). Na figura 5b vemos o esquema de BSS coloring aplicado. Nesse caso, diferentes pontos de acesso que operam no mesmo canal (canal 11), porém com identificadores (cores) diferentes não estão sujeitos à sobreposição de canais, apenas aqueles que operam com o mesmo indentificador (cor azul na figura) sofrem o efeito do OBSS. Embora simples do ponto de vista esquemático, a implementação do reúso do canal com o emprego da técnica de BSS coloring é bastante complexa e a taxa de transmissão resultante (throughput) dependerá do esquema de modulação empregado (QAM-16, QAM-64, etc.), quantidade de spatial streams, largura de banda de cada canal, banda de guarda, etc. Quanto mais pontos de acesso operando no mesmo canal com identificadores diferentes, maiores intervalos de guarda precisarão ser utilizados e o desempenho do canal será reduzido em cada ciclo de transmissão. De qualquer forma, o desempenho global é o que importa, uma vez que mais transações na rede serão possíveis devido ao reúso do canal.
Na próxima edição de Interface continuaremos nesse tema, revisando os mecanismos de modulação empregados em Wi-Fi e suas relações com o desempenho da rede e taxa de transmissão efetiva por cliente, entre outros.
Paulo Marin é engenheiro eletricista, mestre em propagação de sinais e doutor em interferência eletromagnética aplicada à infraestrutura de TI. Marin trabalha como consultor independente, é palestrante internacional e ministra treinamentos técnicos e acadêmicos. Autor de vários livros técnicos e coordenador de grupos de normalização no Brasil e EUA. Site: www.paulomarin.com.