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arq|a a75 76 ARQUITECTURA E ARTE

GERAÇÃO Z #1

arq|a

Ano X – Novembro|Dezembro 2009 €11,00 (continente) – €16,00 Espanha

GERAÇÃO Z #1

Edição Dupla

MOOV Arquitectos Anónimos® Kaputt! AUZprojekt Pedro Gadanho Carlos Sant’Ana Hans Ibelings Silvia Forlati Ariadna Cantis Luís Tavares Pereira João Pedro Serôdio José Mateus Ana Vaz Milheiro João Afonso Nadir Bonaccorso Nuno Brandão Costa Bernardo Rodrigues Bruno Baldaia Pedro Jordão TOSCA.lab João Maria Gusmão e Pedro Paiva Catarina Botelho Habitar Portugal 2006/2008 Dossier: Evento 2009

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Nov|Dez 2009 | €11,00

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ISSN: 1647- 077X


ENTREVISTA

arquitectura

Perspectivas Internacionais

Hans Ibelings (A10), Silvia Forlati (Wonderland), Ariadna Cantis (Freshmadrid)

LUÍS SANTIAGO BAPTISTA MARGARIDA VENTOSA

Hans Ibelings

Director Revista A10 new European architecture Statement A10 - Hans Ibelings Em vez de expor os últimos trabalhos dos, já muito familiares, grandes nomes que enchem as manchetes dos manuais de arquitectura, a revista A10 alarga a sua rede de forma mais abrangente, de modo a abarcar outras coisas muito interessantes que se estão a passar no velho continente, dedicando igual atenção à produção arquitectónica da Europa do leste, oeste e central. A A10 apresenta em reportagens claras e informativas, novos projectos e edifícios das “estrelas” de amanhã, de mestres esquecidos e de talentos desconhecidos. A A10 é composta e publicada pelo crítico de arquitectura Hans Ibelings e pelo designer gráfico Arjan Groot. Tem uma rede de mais de 70 correspondentes pela Europa, desde a Irlanda à Turquia e de Portugal à Rússia. Graças a esta rede pan-europeia, a A10 é, muitas vezes, a primeira a dar conta de um novo projecto ou edifício. Desenvolvimentos recentes, como a expansão da União Europeia, levam não só a uma reconsideração das fronteiras geográficas da Europa mas, também, fazem surgir a questão de haver, ou poder haver, algo como uma cultura europeia e, mais especificamente, uma cultura arquitectónica europeia. A Europa tem estado dividida ao longo da sua história e ainda o é hoje em dia – economicamente, politicamente e culturalmente. Contudo, este continente encontra-se, simultaneamente e mais do que nunca, no caminho de se tornar uma entidade, especialmente no que se refere à área cultural. No mundo da arquitectura existe uma intensa troca entre pessoas, projectos e ideias. Torna-se normal estudar, trabalhar e construir noutros países da Europa e conjuntamente com parceiros europeus. A A10 tem como objectivo contribuir para esta troca com uma publicação que monitoriza e promove as múltiplas facetas desta vibrante cultura arquitectónica. arq|a: No contexto da revista A10, tem divulgado e debatido a nova arquitectura europeia, mostrando a melhor produção arquitectónica de uma nova geração de arquitectos. Poderíamos dizer que a revista A10 procura marcar uma diferença geracional na arquitectura europeia? Hans Ibelings: Não creio, para mim a A10 não trata de mostrar o trabalho das novas gerações, apesar de isso acontecer em muitos casos. Quanto mais velho fico, menos acredito nesta ideia de diferenças geracionais. Tencionamos explorar os últimos desenvolvimentos na Europa e, em particular, em regiões que normalmente não são cobertas por outras publicações internacionais, como a Europa central que estranhamente é, por vezes, denominada como ex Europa do Leste (nunca falamos incidentalmente da ex Europa Ocidental) e zonas que foram, durante muito tempo, consideradas periféricas, como os Açores ou a Noruega. Por isso não estamos a tentar mostrar uma geração mais nova, mas sim apresentar uma parte diferente da produção

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arquitectónica e ficaria satisfeito se pudesse mostrar mais trabalho dos velhos mestres, de tendências antiquadas, e movimentos inesperados. E isto remonta à origem da A10, pois o nosso ponto de partida foi o facto de não querermos publicar o que se pode encontrar em qualquer outra revista. arq|a: Por outro lado, as condições de exercício da profissão alteraram-se profundamente com a globalização económica e comunicacional e os tremendos avanços dos meios tecnológicos. Como se reflectem na arquitectura actual essas mudanças nas condições técnicas e produtivas? HI: Podemos ver, claramente, que devido ao que denomina de globalização da comunicação houve uma grande aceleração da troca de informação e, hoje em dia, todos têm acesso à mesma informação, ao mesmo tempo. Este facto promoveu, sem dúvida, uma homogeneização da arquitectura actual. E criou também a impressão


– erroneamente, creio – de que o mesmo tipo de arquitectura pode aparecer em qualquer lado, que a arquitectura é criada sob condições idênticas, quando acredito que ainda são as circunstâncias locais que influenciam a produção de edifícios. Nesse sentido, penso que a diferença entre edifício e arquitectura é importante. A arquitectura pode ser internacional; os edifícios dificilmente o serão. arq|a: A actividade dos arquitectos tem-se pluralizado e diversificado substancialmente, compreendendo hoje a prática profissional, a experimentação projectual, a investigação técnica, a actividade política, a acção social, a função política, o ensino, a investigação teórica, a prática editorial, a curadoria, a intervenção artística, etc. Perante este espectro alargado, o que define hoje a especificidade da actividade do arquitecto? HI: Os arquitectos dizem muitas vezes que ser generalista é a sua especialidade. Penso que podemos facilmente comprová-lo. Creio que a divisão do trabalho, que levou a inúmeras formas de especialização, está invertida de alguma maneira e, por exemplo, se olhar para o meu próprio trabalho já não existe uma clara distinção entre ser autor, crítico ou editor. Penso que algo semelhante está também a acontecer a nível da arquitectura. Ser arquitecto não é sinónimo de projectar edifícios. Também pode ser outras coisas. E até afirmaria que olhando para a situação económica actual combinada com a tendência demográfica de decrescimento populacional na Europa e com o impacto ambiental da construção em geral, é óbvio que os arquitectos não podem sobreviver só a projectar edifícios.

Silvia Forlati

Presidente Wonderland - Platform for Architecture Statement Wonderland - Astrid Piber, Anne Isopp, Silvia Forlati A plataforma Wonderland desenvolve um projecto bottom up, conectando jovens arquitectos. Entre 2004 e 2006, transformou-se numa rede europeia de 99 ateliers de 9 países diferentes. A nova fase – iniciou-se em Bratislava, em Julho de 2008 – centra-se no crescimento da rede em termos de alcance geográfico e de capacidade. O objectivo específico para esta fase é potenciar um projecto de trabalho de colaboração transnacional, para lá das existentes fronteiras profissionais e culturais. arq|a: No âmbito da plataforma Wonderland, têm analisado estruturalmente as alterações nas formas de entender a profissão por parte da emergente geração de arquitectos europeus. Podemos dizer que a Wonderland procura marcar uma ruptura geracional na arquitectura europeia? Sílvia Forlati: Wonderland é essencialmente um projecto bottom-up, uma rede desenvolvida não com base num determinado plano, mas com origem em eventos que tiveram lugar devido ao juntar esforços de um grupo. Isto quer dizer que a resposta que podemos dar à vossa questão (se estamos a tentar uma ruptura geracional, etc.) se baseia no que observámos e não de um ponto de vista top-down. O trabalho que fazemos é a partir de dentro e não somos observadores neutros. Qual

Edições Wonderland/Platform for Architecture: #1; #2 e #3

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FRESHFORWARD, diagrama, Madrid, 2007

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é o denominador comum? O modo como as fronteiras nacionais são percepcionadas mudou; existe um sentimento de que o que estamos a fazer na Europa como arquitectos é semelhante – travar a mesma batalha pela sobrevivência profissional, mesmo que haja algumas diferenças nas particularidades das condições com que nos deparamos. As fronteiras nacionais tornaram-se muito mais fluidas, mesmo para pequenos ateliers, e é possível aplicar conhecimentos de diferentes contextos. Esta percepção alargou o campo de acção, tanto em termos de cruzamento de tradições educacionais dos vários países, como em termos de localização dos ateliers e dos projectos a seleccionar. Exemplo disso são os dados que recolhemos sobre cerca de 100 concursos de sucesso em que, no mínimo, um terço é produzido por ateliers estrangeiros. E para 62% dos ateliers na base desta selecção não era requerida experiência prévia nesses países. É nesta dissolução de fronteiras que se encontra a maior diferença geracional em relação à geração anterior.

arq|a: A actividade dos arquitectos tem-se pluralizado e diversificado substancialmente, compreendendo hoje a prática profissional, a experimentação projectual, a investigação técnica, a actividade política, a acção social, a função política, o ensino, a investigação teórica, a prática editorial, a curadoria, a intervenção artística, etc. Perante este espectro alargado, o que define hoje a especificidade da actividade do arquitecto? SF: Para responder à vossa pergunta acerca da especificidade da actividade do arquitecto, seria necessário definir onde acaba o espectro, onde é que se torna não-arquitectura, mas não tenho a certeza de que isto seja relevante. Enquanto a auto definição de ser arquitecto se aplicar, aceito o trabalho feito como sendo arquitectura.

arq|a: Por outro lado, as condições de exercício da profissão alteraram-se profundamente com a globalização económica e comunicacional e os tremendos avanços dos meios tecnológicos. Como se reflectem na arquitectura actual essas mudanças nas condições técnicas e produtivas? SF: Em relação à questão da globalização da comunicação, referida na vossa pergunta, os avanços tecnológicos contribuíram seguramente para a mudança de mentalidades quando se fala de distâncias e de fronteiras, no entanto não considero que seja a razão mais forte mas sim um dos aspectos, entre outros, que levaram ao processo de mudança na profissão. Não vejo um único modo de fazer arquitectura, mas sim um conjunto de possibilidades partilhado além fronteiras alargando, por exemplo, o seu campo de acção para outras áreas e tentando também uma abordagem pró-activa ao trabalho, como começar projectos próprios e inventar os próprios clientes, afastando-se assim da tradicional relação cliente-arquitecto. É a diversidade que é definidora e não um posicionamento específico. No entanto, esta diversidade não é fácil de percepcionar – experimentamos isso por exemplo com os inquéritos Wonderland, tentando identificar as posições extremas e analisar o que acontece no espectro entre elas. No nosso primeiro estudo tentámos definir o campo de acção, acabando por definir-se três categorias: os puristas, que exercem de acordo com o perfil tradicional, os all-rounders, que enquanto arquitectos circulam noutras áreas de actividade, e os cross-breeders, que juntando-se a profissionais de outras áreas criam actividades híbridas. Para mais de metade dos ateliers incluídos no estudo uma parte substancial do trabalho (acima de um terço) está ligada a áreas exteriores à arquitectura tradicional. Se comparar este estado de coisas com o que acontecia antes, tenho a impressão que não só a diversidade é maior como o seu ponto de equilíbrio se deslocou para posições mais diferenciadas. Por exemplo, esta abertura do campo de actividade deixou de ter um estatuto de excepção e passou a ser prática comum. (O inquérito também revela que a actividade num campo mais abrangente pode ser uma ajuda para gerar novos trabalhos, não trazendo mais margem de lucro do que a arquitectura por si só).

Statement Freshmadrid - Ariadna Cantis A exposição Freshmadrid utiliza a linguagem da web baseada na utilização de estratégias interactivas. Esta exposição estimula a criação e apoia a produção de novos trabalhos e projectos, uma iniciativa que selecciona, simultaneamente, a difusão de trabalhos e projectos, com o objectivo de providenciar uma percepção clara das mutações e evolução desta disciplina, uma plataforma de observação do vasto trabalho dos novos arquitectos, garantindo um lugar de protagonismo à criação. A ideia surge após se ter detectado uma nova atitude, um novo posicionamento perante um projecto de arquitectura, a sua problemática e os limites do discurso disciplinar dos profissionais formados pela Escola Superior Técnica de Arquitectura de Madrid, entre os últimos anos da década de 90 e os primeiros anos de 2000, e que não tem em conta os preconceitos temáticos, culturais ou geográficos. A selecção do equipamento FreshMadrid não corresponde à de uma competição, ou prémio ou bolsa, baseia-se, isso sim, na observação de um comportamento perigoso e propositivo da parte destes jovens. A inovação da situação deste grupo pode identificar-se claramente na inclusão, no seu reportório, de ferramentas de projecto que têm origem na sociologia, política, antropologia, biologia, economia, ecologia que alarga e reforça o conceito multidisciplinar de uma nova maneira, providenciando espaço àqueles que se movem entre o universo híbrido da arquitectura e arte contemporânea, livre de preconceitos ideológicos e formais. O “arquitecto estrela” dá lugar ao “arquitecto da rua”, perto do seu cliente, mas próximo da sociedade, experimental e investigador. É essencial compreender o conceito Freshmadrid como algo novo, sem contaminação das definições preexistentes de como devem ser uma exposição ou publicação de arquitectura. É por esse motivo que utilizamos a linguagem da web e estratégias interactivas, com o objectivo de estimular a criação conjunta e apoiar a produção de novos trabalhos e projectos através de novos formatos relacionais. Freshmadrid é, também, uma posição ideológica e instrumental, é uma aposta num novo modelo documental. (www.freshmadrid.com)

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Ariadna Cantis

Comissária Freshmadrid


FRESHFORWARD, diagrama, Madrid, 2007

arq|a: No contexto do projecto FreshMadrid, tem trabalhado com uma nova geração de arquitectos que exploram novas estratégias e formas de entender a prática arquitectónica. Poderíamos dizer que o FreshMadrid procura marcar uma diferença geracional da arquitectura europeia? Ariadna Cantis: Freshmadrid é a quarta geração da arquitectura espanhola recente; se F. J. Saenz de Oiza, Jose Antonio Corrales e Molézun são a primeira, Juan Navarro e Rafael Moneo a segunda, Abalos&Herreros ou Tuñon&Mansilla assinalam a terceira, a seguinte é a geração Freshmadrid, arquitectos emergentes que foram alunos dos acima referidos. Freshmadrid marca uma nova geração local, as diferenças mais importantes são a incorporação no seu reportório de ferramentas projectivas de outras disciplinas: economia, ecologia, história, sociologia, etc. Os arquitectos desta geração trabalham com orçamentos baixos, com necessidades básicas, têm em comum preocupações políticas e sociais, mobilidade, temporalidade e subversão conceptual, transitando entre interiores efémeros a projectos de pequena escala, desde a instalação à execução, fazem emergir uma nova forma de encarar a prática profissional, actuando na fronteira disciplinar entre a arquitectura e a arte contemporânea. arq|a: Por outro lado, as condições de exercício da profissão alteraramse profundamente com a globalização económica e comunicacional e

os tremendos avanços dos meios tecnológicos. Como se reflectem na arquitectura actual essas mudanças nas condições técnicas e produtivas? AC: Os arquitectos emergentes ampliam e reforçam o conceito da multidisciplinaridade na profissão de forma nova, providenciando um espaço para aqueles que se interessam pelo universo híbrido entre a arquitectura e a arte contemporânea, livre de preconceitos ideológicos ou formais, utilizando, para tal, novas tecnologias ou rede sociais como condições produtivas da prática arquitectónica. arq|a: A actividade dos arquitectos tem-se pluralizado e diversificado substancialmente, compreendendo hoje a prática profissional, a experimentação projectual, a investigação técnica, a actividade política, a acção social, a função política, o ensino, a investigação teórica, a prática editorial, a curadoria, a intervenção artística, etc. Perante este espectro alargado, o que define hoje a especificidade da actividade do arquitecto? AC: Não existe uma definição única para a actividade dos arquitectos de hoje, trata-se de um espectro alargado de actividades que vão desde a prática arquitectónica à arte contemporânea, performance, investigação, acção ou guerrilha urbana, arte pública, etc. 

RE-FRESH diagrama/mapa, Madrid, 2008

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