Revista ArqViva #002

Page 1

CURITIBA_BRASIL

arqviva

®

A R Q U ITE TUR A

_

C ULTUR A

_

ARTE

_

CIDADE

# 002

Copenhague prestes a se tornar carbono zero

Reforma no

teatro guaíra

resgata modernismo paranaense

Shopping center: o outro lado do

“vilão” da vida urbana

Uma nova Linha Verde: Venda de potencial construtivo na Bolsa de Valores promete impulsionar o desenvolvimento da região. Esta ideia vai dar certo?


Há 30 anos, a Baggio constrói confiança com qualidade, responsabilidade e muita segurança. São mais de 1.000.000m² construídas e entregues com atenção em cada detalhe. Tudo para transformar cada cliente, num cliente satisfeito.

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_ EDITORIAL

Um novo olhar para a arquitetura O

arquitetura com profissionais

tem o desafio de recuperar esta

sabor especial para

da área e com todos os que a

importante construção modernista

a Associação Brasileira dos

consomem diariamente, mesmo

sem interferir no projeto original.

Escritórios de Arquitetura do

sem se dar conta.

A revista traz ainda o projeto de

Paraná (AsBEA-PR): completamos

revitalização da avenida Cândido de

em agosto 15 anos de uma

dentro de tudo o que envolve a

Abreu, uma discussão sobre o uso

trajetória que muito nos

venda de potencial construtivo da

de edifícios históricos por shopping

orgulha. Durante esse período

região da Linha Verde. Conversamos

centers e uma agenda completa de

conquistamos respeito e

com diversos especialistas, que

exposições culturais em cartaz.

credibilidade junto à sociedade,

traduziram de forma simples

Boa leitura!

fortalecemos nossa atuação

esta complexa operação que

como arquitetos e participamos

envolve poder público e iniciativa

ativamente de discussões que

privada. Na seção “Viagem” você

interferem no presente e no

descobre o que Copenhague,

futuro de Curitiba.

a capital da Dinamarca, está

fazendo para tornar-se carbono

Em comemoração a esta

Nesta edição você irá ficar por

importante data, lançamos o

zero. O tema sustentabilidade

segundo número da revista

está presente também em uma

ARQ VIVA, uma publicação

reportagem sobre o restauro

que promove a discussão da

do Teatro Guaíra. A intervenção

Foto Gerson Lima

ano de 2012 tem um

Gustavo Pinto (à direita)

Presidente da AsBEA-PR (2008-2010 / 2010-2012) Orlando Ribeiro (à esquerda)

Presidente da AsBEA-PR (2012-2014)

_ EXPEDIENTE

arqviva

®

ArqViva é uma publicação da AsBEA-PR

projeto gráfico E Projeto editorial

(Associação Brasileira de Escritórios de

ID Design e Publique Editorial

Arquitetura) em parceria com a ID Design

Editora-chefe: Luciana Zenti (MTB 4059-PR)

e Publique Editorial. A reprodução parcial

Direção de arte: Iraisi Gehring

deste material é permitida desde que

Colaboraram nesta edição:

Presidente

CONSELHO EDITORIAL

citada a fonte. O conteúdo das matérias

Diogo Cavazotti, Luise Takashina, Fernanda

Gustavo Pinto

Gustavo Pinto, Waldeny Fiuza,

publicadas é de responsabilidade dos autores.

Peruzzo, Patrícia Ribas, Rosa Bittencourt e

Vice-presidentes

Cris Lacerda, Elaine Zanon,

© Todos os direitos reservados.

Rosângela Oliveira (textos). Eduardo Macarios,

Waldeny Fiuza, Elaine Zanon,

Adolfo Sakaguti, Francisco Almeida,

Orlando Ribeiro, Franciso Almeida,

Margareth Menezes, Keiro Yamawaki

Gilson Werneck, Margareth Menezes,

e Orlando Pinto Ribeiro

Clóvis Inácio Bohrer Filho,

Gerson Lima e Fernanda Peruzzo (fotos). Para anunciar entre em contato pelo email:

Natália Richert (diagramação).

anuncie@revistaarqviva.com.br

Simon Ducroquet (infográficos). Revisão: Jairo Henrique Rodrigues e Fausto Tiemann

Cristiane Lacerda

AsBEA-PR • Av. Cândido de Abreu, 427,

Diretores

cj.307-A 80530-903. Curitiba - PR

Adolfo Sakaguti,

Fone/Fax.: (41) 3024 0090

Frederico Carstens, Keiro Yamawaki

www.pr.asbea.org.br / asbea@asbea-pr.org.br

Tratamento de imagens: Cleverson Cassaneli



Foto BIG&Glessner

Foto Leonardo Régnier

ÍNDICE

36 Viagem

Metrópole Verde A ousadia de Copenhague a favor do desenvolvimento sustentável.

Foto Fernando Aguiar

Quem paga mais? Venda de potencial construtivo na Bolsa de Valores promete impulsionar o desenvolvimento da região da Linha Verde. Foto divulgação

24

especial

+ MAIS _

16

Agende-se Exposições e mostras

culturais em Londres, Nova York e São Paulo.

58

NoVIDADES & INOVAÇÕES

Criatividade e soluções

História

Pausa para o intervalo Restauro do Teatro Guaíra resgata a história da arquitetura modernista no Paraná.

48

arquitetônicas inusitadas.



Foto divulgação

Foto Eduardo Macários

ÍNDICE

80

Design & Conceito

Luxo italiano Edifícios condenados ganham vida com reformas ousadas e sustentáveis.

60

Entrevista

Consumo x História: esta relação dá certo? Os arquitetos Yumi Yamawaki e Fábio Duarte debatem a construção de shopping centers em edifícios históricos.

+ MAIS _

82

Recorte da cidade

Foto divulgação PMC

O artista plástico João

A vez é dos pedestres Projeto da nova avenida Cândido de Abreu retoma a vocação da cidade para os calçadões.

72

Perspectiva digital - IPPUC

Urbanismo

Dias retrata uma cena de rua.



AGENDE-SE

Curitiba

Poty Lazzarotto no MON Patrícia Ribas

Foto divulgação

por

E

mais importantes artistas do Paraná. Desenhista,

pinhões estão de volta e a luta diária para

ilustrador, muralista, gravador e professor, o

ficar mais tempo na cama torna-se a cada dia mais

curitibano Napoleon Potyguara Lazzarotto – o

intensa. Mas nada disso deve ser desculpa para

Poty – ganhou notoriedade por seu traço moderno

ficar em casa, especialmente para quem gosta de

e diferenciado. Na mostra há material inédito,

arte e cultura: neste inverno, a capital paranaense

como fotos familiares e correspondências, além

está com uma bela exposição em destaque no

de ilustrações feitas para obras literárias (muitas

Museu Oscar Niemeyer: Poty, de todos nós.

de outro paranaense notório, o vampiro Dalton

A mostra é um presente a todos os

Trevisan), bem como esboços e estudos não tão

paranaenses: no salão principal do museu, o

conhecidos do público, feitos em viagens. Uma

SERVIÇO: Poty, de todos nós

Olho, estão dispostos cerca de 800 itens que

linda homenagem.

Até 30 de setembro

compõem a trajetória de Poty Lazzarotto, um dos

Imagem reprodução

m Curitiba, as temperaturas já caíram, os

Museu Oscar Niemeyer Rua Marechal Hermes, 999, Centro Cívico, Curitiba 41 3350 4400

16/

arqviva



E

stá em exibição no MASP, em São Paulo, a maior exposição já reunida na América

AGENDE-SE

do Sul do gênio italiano Michelangelo Merisi da Caravaggio. Considerado um dos principais

São Paulo

representantes do barroco, criador de uma técnica ímpar de contraste entre luz e sombra – o que traz dramaticidade e veracidade aos quadros

recebe obras do grande mestre da luz e sombra

–, o artista chega aos brasileiros em seis telas, que representam boa parte da produção total conhecida do pintor: há apenas 62 obras tidas como originais de Caravaggio.

A mostra Caravaggio e seus Seguidores, que

é parte da programação do evento Momento Itália-Brasil 2011-2012, reúne as pinturas São

Jerônimo que Escreve, São Francisco em Meditação, São Januário Degolado, Retrato do Cardeal e Medusa Murtola. Estes dois últimos trabalhos, aliás, nunca haviam deixado a Itália. A exposição ainda destaca outras 14 obras de artistas importantes da segunda metade do século 16 e início do século 17 que foram influenciados pela técnica e pelo estilo do artista, chamados “Caravaggescos”.

Segundo os organizadores do evento, a

produção de Caravaggio se fundamenta em três temáticas principais e que estão presentes na exibição: temas bíblicos, mitológicos e do cotidiano. As pinturas expostas retratam vários períodos da vida do artista e foram divididas em blocos: trabalhos consagrados e conhecidos,

Foto Orazio Borgianni

novas descobertas e quadros considerados

arqviva

ainda em estudo e de difícil classificação. Além de integrarem coleções particulares, as pinturas provêm de importantes museus

SERVIÇO: Caravaggio e seus Seguidores

italianos – Galleria Borghese (Roma), Palazzo

Até 23 de setembro

Barberini (Roma) e Galleria degli Uffizi (Florença).

Museu de Arte de São Paulo – MASP

Oportunidade ímpar para apreciar o talento de

Avenida Paulista, 1578, São Paulo

um grande gênio. Depois do Brasil, a mostra

11 3251 5644

18/

“problemas” pela História da Arte – obras

segue para a Argentina.



do que uma instalação arquitetônica: uma verdadeira “máquina despoluente”, com

AGENDE-SE

canhões de água e purificadores de ar. A intenção é remover a emissão de poluentes do equivalente a 260 veículos durante o

Nova Iorque apresenta estrelas da arquitetura

período em que ficar em exibição. Uma vitrine e tanto para novos talentos.

SERVIÇO:

Wendy, por HWKN

Outro programa imperdível é o Museu de

Artes e Design, o “MAD” (The Museum of Arts

11 West 53 Street

and Design). Com uma coleção permanente

Até setembro

incrível e voltado a mostras que valorizam a

Nova York, NY 10019

criatividade e o contemporâneo, este museu

momaps1.org/yap/

cada ano o mundo da arte e da arquitetura volta os olhos

tem como diferencial a visita guiada, que foge

view/15

a Nova York para a divulgação do Young Architects

do conceito tradicional. Em vez de funcionários

Program (YAP), concurso realizado pelo Museu de Arte Moderna

sisudos, os responsáveis pelo tour são voluntários,

Museu de Artes e Design

de Nova York e pelo MoMA PS1. Os ganhadores de 2012, a 13ª

verdadeiros apaixonados por design e arte

- MAD

edição do evento, são os nova-iorquinos Matthias Hollwich e Marc

moderna. Isso faz do passeio uma experiência

2 Columbus Circle

Kushner, que vão apresentar a obra Wendy. Aliando conceitos

rica e interativa. Leva em média 45 minutos e

Nova York, NY 10019

de arquitetura e sustentabilidade, o projeto se propõe a ser mais

já está incluído no preço da entrada.

www.madmuseum.org

Imagem cortesia de HWKN

A

A visita guiada do “MAD” (The Museum of Arts and Design) é um dos destaques do museu.

20/ arqviva



Foto divulgação

AGENDE-SE

Obras do artista plástico Damien Hirst estão em exposição na Tate Modern. Tubarão preservado em formol é uma das atrações.

Londres:

atrações para além das Olimpíadas

O

fog se foi e no verão, com dias mais longos e ensolarados,

Londres ferve de atrações. Dos museus e centros culturais

destaques é a mostra do artista plástico britânico

aos pubs, há muito o que se fazer na capital britânica,

Damien Hirst, um dos mais influentes – e polêmicos

sobretudo neste ano, em que a cidade recebe as Olimpíadas (27

– de sua geração, na galeria Tate Modern. Orçadas

de julho a 12 de agosto) e as Paraolimpíadas (29 de agosto a 9 de

em milhões de reais, as obras deste inglês

setembro). Assim, há muitas novidades para encantar os visitantes.

ganharam a atenção da mídia em todo mundo

Limitar-se ao roteiro básico de Big Ben e Parlamento, com direito a

por um fator inusitado: além de ter a morte como

chá e fish and chips, só para quem não quer se divertir.

tema predominante dos trabalhos, Hirst usa como

De 21 de junho a 9 de setembro, acontece o London 2012

matéria-prima corpos de animais – preservados

Festival, evento que pega carona na febre dos jogos olímpicos e

em formol ou efetivamente apodrecendo em

que mobilizará praticamente todos os espaços culturais londrinos.

público (como na instalação A thousand years, de

São 12 mil atrações diversas, envolvendo arte e design, música,

sua mostra de estreia, em 1990, que traz a cabeça

literatura, cinema, moda e gastronomia, além, é claro, de teatro

de uma vaca, coberta de moscas, em avançado

(afinal, estamos na terra de William Shakespeare). Há apresentações

estado de putrefação). Além dessa obra, estará

em diferentes pontos da cidade, inclusive em parques. E o melhor:

em exibição um dos trabalhos mais conhecidos

muitas delas são gratuitas. É só ficar atento à programação.

do artista: The physical impossibility of death in

22/ arqviva

Dentro das atrações previstas, um dos


preservado em formol, suspenso em um tanque de acrílico. Impactante.

Foto © Sidsel de Jong

the mind of someone living, um imenso tubarão

Mostra revela uma face pouca conhecida do pintor norueguês Edvard Munch.

Também na Tate Modern a imperdível mostra

Edvard Munch: The Modern Eye. Se você acha que conhece tudo sobre o pintor norueguês vai se surpreender. Poucos artistas modernos são tão conhecidos e, ao mesmo tempo, tão pouco compreendidos como Munch (1863-1944). A exposição apresenta a trajetória do trabalho do pintor no século 20, incluindo 60 quadros – muitos deles levados do Munch Museum, em Oslo ( Noruega), para Londres. Podem ser vistas ainda produções raras do artista em filme e fotografia. Munch é tido como um pintor simbolista, mas a exposição revela como ele foi influenciado pela modernidade e a vida fora do estúdio, usando fatos relatados na imprensa e cenas das ruas como inspiração. London Festival mobiliza quase todos os espaços culturais da cidade.

SERVIÇO:

Damien Hirst

Edvard Munch: The Modern Eye

Tate Modern, Londres,

Tate Modern, Londres, Bankside, SE1, 9TG

Bankside, SE1, 9TG

Até 14 de outubro

Até 9 de setembro

www.tate.org.uk

www.tate.org.uk

London 2012 Festival De 21 de junho a 9 de setembro Londres, vários locais

Foto LOCOG

http://festival.london2012.com

arqviva /23


A região onde está a Linha Verde pode sofrer uma completa mudança de perfil nos próximos anos. O impulso será dado por uma operação inédita em Curitiba realizada pela Prefeitura, que irá vender potencial construtivo na Bolsa de Valores para financiar grandes obras no local. A operação, no entanto, envolve riscos e ainda gera muita desconfiança

Quem paga mais?

E

se fosse possível contar com

A operação prevê a realização de diversas

a ajuda da Bolsa de Valores

obras no entorno dos 30 quilômetros da Linha

para fazer dinheiro e financiar

Verde. Entre as melhorias estão áreas de lazer

o desenvolvimento urbano?

e convivência, reurbanização de vias transver-

A ideia, que à primeira vista

sais e implantação de trechos de ciclovia. Os

pode parecer inusitada, já é realidade em

recursos necessários estão sendo obtidos pela

Curitiba. Para alavancar a ocupação plane-

venda de Certificados de Potencial Adicional

jada da cidade, a prefeitura municipal está

de Construção – os Cepacs – na Bolsa de

pedindo uma mãozinha aos investidores.

Valores de São Paulo (Bovespa).

A moeda de troca é o chamado potencial

A ideia não é nova. Surgiu na França na

construtivo, que nada mais é do que a compra

década de 70, ganhou os Estados Unidos

do direito de construir mais do que a Lei de

anos depois e nos últimos tempos vem sendo

Zoneamento permite em determinado local.

usada como instrumento de transformação

O alvo da Prefeitura é certeiro. O governo

urbanística em diversas cidades brasileiras,

municipal está de olho na Linha Verde – não

especialmente em São Paulo (leia quadro na

apenas na via, mas em toda a região próxi-

página 31). O que impressiona no exemplo

ma que faz parte de uma imensidão de 44

curitibano são as dimensões da operação, que

milhões de metros quadrados, algo como 30

estabelece diretrizes para o trecho urbano

vezes a área do Parque Barigui. É a chamada

da antiga BR-116 e da qual fazem parte 22

Operação Urbana Consorciada (OUC) Linha

bairros no eixo norte e sul (veja o mapa na

Verde, nome técnico dado ao instrumento

página 27). Cerca de 82 mil habitantes serão

legal que o poder público tem para tirar do

afetados. Um estudo realizado pela Fundação

papel melhorias urbanas com a ajuda do

Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe),

setor privado e da própria população. Em

a pedido da Prefeitura, aponta que com a

poucas palavras, um complexo consórcio

evolução da operação urbana, em 28 anos,

de regras muito bem definidas.

perto de 135 mil pessoas estarão ocupando a região – sem a operação, seriam 85 mil.

24/ arqviva

Foto Leonardo Règnier

Rosângela Oliveira e Luciana Zenti

por


_especial_urbanismo

Uma área de 44 milhões de metros quadrados faz parte da Operação Consorciada Urbana Linha Verde. O investimento abrange a via e os bairros próximos.

arqviva /25


A operação é audaciosa. Lançada no final de 2011, quando foi aprovada a lei específica, é tida como promessa de uma nova Curitiba dentro de Curitiba. Se tudo correr de acordo com as expectativas otimistas do governo municipal, teremos finalmente a polêmica Linha Verde – a via, propriamente dita – concluída. Isso incluiria as tão reivindicadas trincheiras que podem ajudar a aliviar o pesado tráfego e os constantes congestionamentos locais.

Entre as obras previstas ao longo de 30 quilômetros da Linha Verde estão as “trincheiras verdes”, que devem desafogar o complicado trânsito na região.

Para isso, no entanto, é preciso dinheiro. Pelo projeto, a Prefeitura irá disponibilizar 4,83 milhões de títulos com valor mínimo de R$ 200,00. Toda a operacionalização do processo na Bovespa está sendo feita pelo Banco do Brasil, que já recebeu da administração municipal R$ 550 mil pela realização do serviço por um período de dois anos, e ainda receberá outras comissões que irão variar de 1% a 1,25% pelas vendas dos Cepacs. Já a Caixa Econômica Federal é quem está gerindo os recursos e irá fiscalizar as obras. Quem decide investir leva para casa os títulos. A pergunta é: quem lucra com esses papéis? O investidor, que vende o certificado para construtoras, que precisarão de autoPerspectiva digital - PMC

rização para construir empreendimentos maiores. A Prefeitura, que pode desenvolver a região sem precisar colocar a mão no bolso. E a população, que deve usufruir de uma região melhor planejada e adequada do ponto de vista urbanístico. Quem também Verde é a última grande área para desenvolacompanha com interesse as discussões são vimento imobiliário vertical em Curitiba e a os arquitetos. As grandes dimensões da Linha operação é uma forma fantástica de captar Verde e a compra de potencial construtivo recursos baratos no mercado para investir adicional podem ser o pontapé para que sejam em infraestrutura”, defende o presidente da desenvolvidos projetos inovadores aliando Associação dos Dirigentes de Empresas do modernidade nas construções a amplas Mercado Imobiliário do Paraná (Ademi/PR), áreas verdes e de convívio social. “A Linha Gustavo Selig. “Trata-se de um modelo de

A Prefeitura ainda precisa ter um entendimento melhor das necessidades do mercado imobiliário no local para garantir o sucesso do plano.” Gustavo Pinto, presidente da Asbea-PR 26/ arqviva

gestão do dinheiro público transparente e objetivo”, resume o presidente da Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura do Paraná (Asbea-PR), Gustavo Pinto.


,

_especial_urbanismo

Entenda como funciona

1

a Operação Urbana Consorciada Linha Verde (OUC)

LINHA VERDE

ATUBA

O QUE É A LINHA VERDE Trecho da antiga BR-116 que foi transformado em uma via municipal a partir de 2007, com a conclusão do contorno rodoviário.

BAIRRO ALTO

Polos de desenvolvimento: regiões de maior investimento. A altura das edificações será livre, limitada apenas pelos padrões da Aeronáutica

Jóckey Clube

TARUMÃ

trechos

Vitor Ferreira do Amaral

Trecho Norte

2

Pinheirão

Trecho Sul: já concluído Trecho em construção:

financiado pela Agência Francesa de Desenvolvimento

JARDIM BOTÂNICO CAJURU

Centro Politécnico

Vila olímpica do Tarumã:

projeto prevê a integração das várias estruturas esportivas da região.

res Tor das Av.

LINHA VERDE

PAROLIN

FANNY

Para desenvolver a região da Linha Verde, a prefeitura de Curitiba vende potencial construtivo adicional, que é o direito de construir acima do que permite a Lei do Zoneamento. O número de andares e o total da metragem quadrada variam conforme a localização. As áreas onde poderão ser usados os Cepacs atingem 22 bairros da cidade (No mapa, área dentro do traçado verde)

Andares acima do permitido, que serão negociados via Cepacs

GUABIROTUBA

el

lB

na

Limite de construção permitida

ém

LINDÓIA

Potencial Construtivo

Ca

to eixo no P loria al F ech Mar Av.

30 k m

Centro

PUC

7) 27 á( agu an Par bariti Cu via do Ro

PRADO VELHO

Este é o trecho que deve receber os maiores investimentos. Para isso, a prefeitura de Curitiba pretende captar R$ 48 milhões da iniciativa privada por meio de leilões de potencial construtivo na Bolsa de Valores.

Locais onde a iniciativa privada poderá construir além do limite da Lei de Zoneamento. Para isso, será preciso comprar Certificados de Potencial Construtivo Adicional (Cepacs). Ao todo, R$ 1,2 bilhão serão investidos na área beneficiada pela operação.

BACACHERI

JARDIM SOCIAL

Linha Verde Norte

HAUER

4 CAPÃO RASO

PINHEIRINHO

Contorno Sul:

O dinheiro gerado nos leilões vai para uma conta específica da operação e só poderá ser usado para obras na área de influência da Linha Verde.

3

Bolsa de Valores

Os Cepacs são vendidos na Bovespa. Os principais investidores são empresas ligadas à construção civil.

ALGUMAS OBRAS PREVISTAS NA OPERAÇÃO Arborização Ciclovia

Sinalização Calçadas Novas vias Áreas de lazer

N

Iluminação

Pavimentação

1 km Fonte: Prospecto de Registro da Operação Urbana Consorciada Linha Verde

BR-116

Infográfico Simon Ducroquet

Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)

Gestão dos recursos

Trincheiras

arqviva /27


Nem tudo são flores Para que tudo isso se concretize, ainda no primeiro leilão”, conta a diretora de Mer-

Por enquanto, não há data prevista para

existe um caminho cheio de obstáculos a ser cado de Capitais e Investimentos do Banco novos leilões na Bovespa. De acordo com a percorrido. Depois de um atraso de quase do Brasil, Paolla Gray Caldas. Ao todo, foram secretária de urbanismo, o agendamento vai três meses, a Prefeitura finalizou em junho arrecadados R$ 28,3 milhões. Dos 300 mil depender da avaliação do mercado financeiro os projetos das obras do primeiro lote de títulos ofertados, 141.588 foram negociados. e da demanda por mais potencial construtivo Cepacs encaminhado para a Comissão de “O resultado mostrou o interesse do mercado na Linha Verde. Até lá o governo municipal Valores Mobiliários (CVM) – um investimento imobiliário e da construção civil no planeja- terá que fazer a lição de casa. “A Prefeitura da ordem de R$ 2 bilhões que será arcado mento urbano de Curitiba”, diz asecretária ainda precisa ter um entendimento melhor pela própria operação por meio de verbas municipal de Urbanismo, Suely Hass. orçamentárias e financiamentos. Para que

das necessidades do mercado imobiliário

Um único grupo comprou 70% dos Cepacs no local para garantir o sucesso do plano”,

os papéis fossem lançados na Bovespa, a disponibilizados nesta primeira etapa. São alerta Gustavo Pinto. Por causa da compra de Prefeitura precisou detalhar as obras pre- os investidores do Jockey Plaza Shopping Cepacs, o preço final dos imóveis na região vistas para a região. Isso serve para que Center, do qual fazem parte as empresas da Linha Verde será o mesmo encontrado os investidores tenham real dimensão do Casteval, Paysage e Melton (que pertence em locais como Água Verde e Portão, que potencial do negócio e se interessem pela ao grupo Tacla). “A compra foi fundamental costumam ser mais procurados pelo consucompra dos certificados.

para viabilizar o projeto”, afirma o diretor- midor final. “A concorrência pode inviabilizar

No dia 26 de junho, foi realizado o pri- -proprietário da Casteval, Osvaldir Benato. o interesse na região, gerando um vazio meiro leilão de Cepacs na Bolsa. A operação “Com a possibilidade de aumento do poten- urbano até que se esgotem os terrenos nos foi um sucesso e atraiu 18 investidores. “Em cial construtivo, o empreendimento dobrará bairros mais nobres de Curitiba.” , acrescenta operações similares, como a Faria Lima, em de tamanho.” O grupo espera estar com o o presidente da Asbea-PR.” São Paulo, tivemos apenas um interessado alvará da obra em mãos em breve para dar

Foto Leonardo Règnier

continuidade ao projeto.

Passado inglório. Futuro promissor? Há mais de 20 anos a Linha Verde é protagonista de uma história recheada de polêmicas. Como termina o próximo capítulo, ninguém sabe ainda

O

primeiro lote de obras da Operação Urbana Consorciada deve contemplar projetos para a conclusão da Linha Verde. Essa é a

principal promessa. Desde que a rodovia BR-116 foi transformada em via urbana – com a concessão pelo Governo Federal ao município na década de 90 – nem tudo foi totalmente implementado em função da demora e do alto custo das obras. Em 1999, a proposta era transformar a via em um sistema de transporte de alta capacidade com financiamento do Japan Bank For Internacional Coorperation. Mas dois anos depois o recurso não saiu. O planejamento foi alterado para o Projeto Linha Verde, que recebeu recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Dos quatro trechos previstos, só o Linha Verde Sul foi concluído em 2009. O Linha Verde Sul do Pinheirinho até o Contorno Sul serão executados com recursos do PAC da Copa de 2014 (PAC da Mobilidade). Já o Linha Verde Norte foi dividido em quatro lotes, e somente um teve início em 2011. Os demais lotes fazem parte das intervenções da OUC.

28/ arqviva



Outra condição determinante para a Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc),

A definição das obras com eficiência e

procura pelos certificados que ainda restam Luiz Hayakawa. “A demanda das obras será agilidade é, no entanto, a menor das dificulé o investimento em uma boa estrutura consequência da ocupação e caberá ao dades a serem enfrentadas. Cabe ao governo urbana. “Só assim a região da Linha Verde poder público acompanhar essa dinâmica.” municipal, agora, convencer a opinião pública poderá tornar-se interessante para os nossos

A lei que regulamenta a operação prevê que de que esse é o melhor caminho para fazer

clientes. Hoje, o local ainda é muito carente na região ocorra uma mescla de uso residencial decolar a região da Linha Verde. No início em equipamentos públicos”, diz Gustavo e comercial. Suely Hass ressalta que haverá uma do ano, uma audiência pública reuniu moSelig. A Prefeitura, no entanto, diz que irá exigência para que os empreendimentos sejam radores das regiões afetadas, e outras seis observar os movimentos do mercado para concebidos com menor impacto ambiental reuniões foram feitas com representantes tomar suas decisões. “As obras públicas e seguindo parâmetros diferenciados dos de de entidades ligadas ao setor da construção serão definidas de acordo com o perfil dos outras regiões da cidade. “Será necessária a civil. Mas, depois disso, pouco tem sido feito investimentos que serão lançados na região”, implantação de dispositivos de retenção de para prestar esclarecimentos à população. afirma o administrador regional da Matriz águas pluviais e incentivada a implantação

Ao contrário do que muita gente acredita,

e ex-presidente do Instituto de Pesquisa e de áreas arborizadas e permeáveis”, comenta. os investimentos não estão restritos às áreas Suely diz ainda que para evitar as escavações de frente para a antiga rodovia. Na realidade, e todos os transtornos técnicos e ambientais toda a região próxima – e seus respectivos dessas operações, a nova legislação incentiva moradores – será afetada. Hoje, a maioria e premia a solução arquitetônica de estacio- das ocupações no local é de imóveis de

A Linha Verde é a última

namentos cobertos acima do solo.

grande área para desenvolvimento imobiliário vertical em Curitiba.

baixo e médio padrão. O que muitos temem é que a especulação imobiliária altere esse

A operação é uma forma de captar recursos baratos para infraestrutura.” Gustavo Selig, presidente da Ademi/PR

A grama do vizinho...

A cidade de São Paulo foi uma das pioneiras no Brasil ao lançar as operações urbanas consorciadas. A experiência paulistana ajuda a entender o que vem por aí e evitar a repetição do que não funcionou.

A

Prefeitura de São Paulo utiliza o instrumento de operação

municipal ficou refém do mercado imobiliário, pois as obras

urbana consorciada desde 1990. No início, as contrapartidas

públicas só puderam ser executadas quando houve interesse por

para se construir além do zoneamento da região eram o pagamento

parte das empresas em investir em determinadas operações. Para

com construções de interesse social. A partir de 2011, com a criação

tentar equacionar isso, a Prefeitura vem procurando direcionar o

do Estatuto das Cidades, passaram a operar com a utilização dos

interesse imobiliário para regiões distintas da cidade, “e com isso

Cepacs. Atualmente o município possui quatro operações em

ficamos um pouco menos dependentes”, diz o superintendente.

vigor: Centro, Água Branca, Faria Lima e Água Espraiada; e até o

final do ano deve lançar as operações Lapa – Brás, Mooca – Vila

edificações, pois segundo Bartalini, muitas empresas repetem

Carioca e Vila Verde – Jacu.

a mesma tipologia e investem em novidades que não agregam

quase nada à região onde estão inseridas. “As novidades foram

O arquiteto superintendente de desenvolvimento da São

Outra dificuldade sentida foi em relação à arquitetura das

Paulo Urbanismo – empresa pública vinculada à Secretaria de

espaço gourmet e churrasqueira na varanda. Isso são apenas

Desenvolvimento Urbano –, Vladir Bartalini, comenta que a vantagem

penduricalhos”, critica. Em função disso, estão revendo a operação

dessa modalidade de financiamento de obras via iniciativa privada

para projetos mais direcionados à realidade das comunidades

é ter uma gestão compartilhada com a prefeitura, empresários e

afetadas pelas intervenções. Os prédios altos em bairros

sociedade civil e garantir a continuidade de projetos, independente

horizontais devem ser substituídos por prédios menores com mais

dos ciclos políticos. “Essa é a grande força dos consórcios”, pondera.

habitações, sem áreas verdes e espaços de serviços dentro dos

Mas ao longo desses anos de operação, a Prefeitura de São

condomínios. “Queremos que as pessoas circulem nas áreas verdes

Paulo vem sentindo a necessidade de fazer algumas mudanças

comuns nas ruas do bairro e que os serviços como lavanderia e

nas leis das operações para se adequar à dinâmica do mercado.

cabeleireiro se instalem no comércio junto às calçadas, gerando

Bartalini admite que em determinados momentos a administração

emprego e renda à comunidade”, afirma.

30/ arqviva


_especial_urbanismo

Ideia importada: da França para a Linha Verde

A

s Operações Consorciadas Urbanas surgiram na França, com as chamadas Zones d’Aménagement Concerté (ZACs). De lá, foram levadas para os Estados Unidos. No Brasil, a operação já foi usada por cidades como Rio de Janeiro e Belo Horizonte, mas é em São Paulo que estão os casos mais conhecidos.

Calle 30

(Madri, Espanha)

Foto Tricia Anderson

É a estrada principal em Madrid, em torno do núcleo central da cidade, que sofreu um impacto urbanístico e ambiental. A remodelação da antiga M-30 deu lugar a uma infraestrutura com segurança e modernidade para o tráfego. Um grande parque linear foi criado ligando florestas, parques e jardins históricos, dando à cidade uma conexão diferenciada em meio ao concreto das grandes metrópoles.

Fells Point e Píer 17

(Baltimore, EUA)

A renovação desses bairros portuários é considerada exemplo de sucesso de operações consorciadas públicoprivadas. Nos dois casos as intervenções objetivaram a revitalização de áreas degradadas, valorizando o uso do porto e alavancando oportunidades econômicas voltadas para o turismo e o lazer. Além de espaços públicos centrais bastante dinâmicos, também houve um incentivo para a reocupação com uso residencial.

Foto divulgação prefeitura Madrid

(Nova Iorque, EUA)

Zones d’Aménagement Concerté (ZAC) Foto divulgação

(França)

Nessa iniciativa, áreas degradadas são adquiridas pelo Estado (por direito de preferência ou por simples desapropriação), que decide um novo uso para elas. Depois de receberem intervenções, que vão desde o projeto arquitetônico até construções, as áreas são valorizadas e comercializadas. Sua utilização é tanto por órgãos públicos como pela iniciativa privada.

arqviva /31


padrão e acabe empurrando a população menos favorecida para áreas ainda mais distantes e com menos infraestrutura. “A nova legislação exige para alguns terrenos a compra de até 10 vezes mais potencial do que antigamente. Isso inviabiliza novos empreendimentos para o público de baixa renda”, explica Gustavo Pinto. O arquiteto e urbanista Rivail Vanin de Andrade, professor da Universidade Positivo e membro do Conselho da Cidade de Curitiba (Concitiba), afirma que essa segregação poderá ocorrer, a exemplo do que aconteceu em outras Perspectiva digital - PMC

regiões da cidade, como nas imediações do Parque Tingui. “Houve uma mudança de zoneamento e em dois anos uma grande valorização dos imóveis. Muitas pessoas venderam os terrenos e não aproveitaram as benfeitorias feitas na região”, diz. O estudo realizado pela Fipe mencionado no início desta reportagem também iden-

Os empreendimentos da região terão que atender a critérios de redução de impacto ambiental como coleta de água da chuva e amplas áreas permeáveis.

tificou que existem 15 áreas de habitações irregulares na região de abrangência da operação. Mas Suely garante que o projeto

construção civil estão muito elevados e se

O representante do Sinduscon conta

contemplará programas de relocação dessas

houver um aumento no valor do potencial

que diversas empresas estão desenvolvendo

famílias, e que logo na primeira emissão

para revenda, pode-se frear o desenvolvi-

estudos para obras na Linha Verde, e outras

de Cepacs estão previstos recursos para

mento imobiliário na Linha Verde”, diz. Essa

até já adquiriram terrenos na região antes

a urbanização da Vila Paraná – conhecida

também é uma preocupação do Sindicato

mesmo do primeiro leilão dos Cepacs na

como Vila Papelão –, no bairro Capão Raso.

da Indústria da Construção Civil no Estado

Bovespa, para conseguir a aprovação do

do Paraná (Sinduscon/PR). O vice-presidente

projeto. No mesmo compasso de espera

Aumento de preços

administrativo da entidade, Ubiraitá Antonio

está o diretor da Hafil Inc, Caio Napoli, que

O mercado está apreensivo com uma

Dresch, afirma que o sindicato incentivou

possui dois empreendimentos a serem lan-

possível especulação financeira que as ven-

as empresas interessadas em investir na

çados na Linha Verde: um edifício residencial

das dos títulos poderão gerar. Gustavo Selig

Linha Verde a adquirir os Cepacs logo no

com cerca de 240 unidades no bairro Novo

defende a pulverização das negociações para

primeiro leilão para evitar a especulação

Mundo e outro comercial com 200 salas no

minimizar o problema. “Hoje os custos da

e até mesmo o esgotamento dos títulos.

Capão Raso. A empresa integra o Grupo Hafil,

“Estamos alertando as empresas para se

do qual fazem parte outras duas incorpo-

antecipar, pois para a aprovação do alvará

radoras imobiliárias com forte atuação no

é necessário ter os títulos.”

Sul do Brasil. Napoli está otimista, mas teme a valorização do preço dos Cepacs pelo mercado. “Muitas vezes é preciso antecipar a compra dos títulos mesmo antes de se ter

O resultado do primeiro leilão de Cepacs mostrou o interesse do mercado no planejamento

urbano de Curitiba.” Suely Hass, Secretária Municipal de Urbanismo. 32/ arqviva

uma finalização do projeto, caso contrário ficamos à mercê da oscilação do mercado e dos especuladores”, pondera Napoli, que já participou de uma operação consorciada urbana em São Paulo e conhece bem essa modalidade construtiva.



Ilustração Natalia Richert

Artigo_

por

José Pio Martins *

A lógica do negócio

"

A venda de potencial construtivo é um meio de

trazer mais recursos para a prefeitura, além de valorizar os preços dos imóveis na região.”

34/ arqviva

A Prefeitura de Curitiba

fazê-lo nos termos da lei de

à cidade. Seria lamentável, visto

anunciou a Operação Urbana

zoneamento; quem quiser

que o poder público teria de abrir

Consorciada Linha Verde, por

construir prédios mais altos terá

mão de sua responsabilidade para

meio da qual o poder público

de pagar pelo potencial adicional

com o bem comum apenas para

municipal venderá licenças para

de construção. Trata-se de um

conseguir mais dinheiro. Eis aí

construções a fim de arrecadar

mecanismo capaz de carrear

uma questão para ser examinada.

dinheiro para aplicação em

mais dinheiro para a prefeitura,

obras urbanas.

que pode ser usado para obras

de potencial construtivo é um

O tema não é bem entendido

de melhorias na própria região

meio de trazer mais recursos

pela população, mas pode ser

ou fora dela. A questão principal

para a prefeitura, além de

resumido de maneira simples.

é saber se faz sentido permitir

valorizar os preços dos imóveis

Digamos que uma prefeitura

construções acima de quatro

na região. Surge aí a segunda

faz o planejamento urbano e

andares naquele local. Se fizer

questão: o destino que será dado

o zoneamento de determinada

sentido e não for prejudicial ao

ao dinheiro adicional arrecadado.

região, definindo que as

urbanismo local, a prefeitura

Em geral, esse tipo de “negócio”

construções no local possam

estará apenas sendo “esperta”, no

não faz sentido se o dinheiro

ter, no máximo, quatro andares.

sentido de obter mais dinheiro

não for usado, pelo menos em

Ao mesmo tempo, uma lei é

dos investidores interessados

boa parte, para melhorar o local

aprovada autorizando o poder

em obras mais altas.

que gerou a arrecadação.

municipal a conceder licenças

para construções, digamos,

mostrar que, em tal região, as

com até oito andares, mediante

construções máximas deveriam

pagamento aos cofres públicos.

ser de quatro andares, nesse caso

Quem quiser construir

a prefeitura estaria vendendo

até quatro andares, poderá

licenças adicionais prejudiciais

De qualquer forma, a venda

Se a lógica urbanística

*José Pio Martins é economista e reitor da Universidade Positivo.



Prestes a ser tornar a primeira capital carbono zero no mundo, Copenhague prova que ousadia e criatividade transformam a arquitetura em uma aliada do desenvolvimento sustentável

metrópole

verde por

Fernanda Peruzzo, de Copenhague

DINAMARCA

Suécia COPENHAGUE

Alemanha

Apesar do inverno rigoroso, a integração com o meio externo é a marca da nova arquitetura de Copenhague. O premiado projeto do The Royal Danish Playhouse é um dos cartões-postais da cidade.

36/ arqviva


_ viagem_Dinamarca

Foto Jens Markus Lindhe

H

37/ arqviva

á algo de podre no reino

em 2011. A vocação para a sustentabilidade

da Dinamarca. E eles se

pode ser confirmada antes mesmo de se

orgulham disso. Todos

pisar em solo nórdico. Da janela do avião,

os dias, 40% de todo o

vê-se dezenas de turbinas eólicas fincadas

lixo produzido na capital

mar adentro, a poucos quilômetros da costa.

Copenhague é transformado em biogás e

Esses gigantes brancos são responsáveis por

bioetanol, combustíveis que abastecem a

20% da energia consumida no país.

rede de aquecimento central da cidade e

Toda essa consciência ecológica, claro,

permitem que seus habitantes espantem o

não surgiu à toa. Nos anos 70, a crise do

frio com a consciência limpa. Por ano, mais

petróleo implodiu os sonhos de crescimento

de 800 mil toneladas de material orgânico

da Dinamarca, obrigando essa que é uma

– como sobras de madeira e palha – são

das mais antigas monarquias do mundo

processadas com essa finalidade. Até 2025,

a buscar fontes alternativas de energia

esse número será ainda maior. A construção

e novos modelos de desenvolvimento.

de uma nova usina de biomassa, com

Eficientes e criativos, os dinamarqueses

maior capacidade de produção, é um dos

logo perceberam que a natureza poderia

projetos de sustentabilidade que fazem

ser a sua maior aliada e passaram a adotar

parte do Plano de Ação Climática CPH

políticas de incentivo ao uso da bicicleta

2025, programa lançado recentemente

como meio de transporte, remodelando

pelo governo dinamarquês e que pretende

as ruas e liberando a população do jugo

fazer de Copenhague a primeira capital

dos combustíveis fósseis. Foi nessa época

carbono zero do mundo.

também que um grupo de hippies formou

Condições para isso não faltam. A cidade

a comunidade anarquista de Christiania,

já é considerada a Capital Verde da União

uma área de 34 hectares repleta de casas

Europeia, segundo estudos desenvolvidos

ecoeficientes, hortas orgânicas e ideais de

pela Siemens, em 2009, e pelas Nações Unidas,

subsistência.

arqviva /37


Uma nova Copenhague A partir dos anos 90, projetos de Para os canais que cortam a região eles revitalização urbanística modificaram mais imaginaram um aproveitamento inteligente, uma vez a vida por lá e criaram novos bairros, transformando-os em espaços de lazer e, ao como o Orestad, que é considerado o primeiro mesmo tempo, reservatórios pluviais. marco urbanístico dessa nova Copenhague.

A posição geográfica também deveria

Um concurso público lançado em 1994 reforçar os laços da capital com Malmo, na escolheu um projeto finlandês, do escritório Suécia, finalmente conectadas pela construção Arkki, para planejar o crescimento de uma de uma ponte de 16 quilômetros entre os área de 310 hectares na região sul que estava dois países, a mais longa estrutura desse deserta. A ideia era criar um centro comercial tipo na Europa. e residencial que oferecesse novos conceitos

Em 2000, os primeiros edifícios foram

de estilo de vida e moradia, onde a natureza inaugurados e hoje o distrito concentra pudesse ser inserida num contexto urbano. empresas, corporações, duas universidades A proposta do escritório vencedor foi criar e a rede de comunicação nacional Danish uma região na qual os prédios altos fossem Broadcasting. Pelo menos 7 mil pessoas cercados por áreas verdes e os terrenos vivem ali e outras 10 mil trabalham na região. que ainda estivessem vagos ocupados por Nos próximos vinte anos, estima-se que os equipamentos públicos temporários, como residentes cheguem a 20 mil e a população canchas de esportes, parquinhos ou praças. flutuante entre 60 e 80 mil. Foto BIG&Glessner

Projeto da nova usina de biomassa Amager Slope, do escritório de arquitetura BIG: montanha artificial vai transformar lixo em energia.

38/ arqviva


Foto BIG&Glessner

_ viagem_Dinamarca

Rumo ao carbono zero A proposta do programa CPH 2025 é ousada: reduzir 20% das emissões de dióxido de carbono até 2015 e garantir que até o prazo final toda a energia venha de fontes limpas

D

O telhado da usina de biomassa servirá como área de lazer e pista de patinação. Durante o inverno, a falsa montanha se transformará em estação de esqui.

as 50 ações previstas para zerar a cota de emissão, 44 já estão em andamento. O resultado é que pelos próximos treze anos

a cidade parecerá um grande canteiro de obras. Entre as medidas mais importantes, está a instalação de 100 novas turbinas eólicas, o que aumentará em 50% a contribuição dos ventos para a eficiência energética. O lixo responderá por outra importante fatia das reduções. A nova usina de biomassa Amager Slope, na região de Orestad, terá capacidade 20% maior que a planta atual. Mesmo obtendo a energia de um processo de incineração do material orgânico, ela emitirá entre 50 e 60 mil toneladas de dióxido de carbono a menos na atmosfera, graças a sistemas especiais de filtragem. De suas chaminés, círculos de fumaça limpa serão expelidos em intervalos determinados de tempo. O que mais chama a atenção nesse projeto, porém, é a sua face externa. Concebida pelo escritório dinamarquês Bjarke Ingels Group (BIG) como uma espécie de montanha artificial, 90 metros acima do solo, ela funcionará como um parque

O governo dinamarquês lançou recentemente um plano de ação climática para

reduzir a emissão de CO 2 na capital.

Um dos projetos previstos é a construção de uma

nova usina de biomassa

que transforma o lixo gerado pelos habitantes em combustível.

aberto. Enquanto suas laterais farão o papel de jardins verticais,

o telhado será transformado em uma pista de esqui.

arqviva /39


Capital das bikes V

ista da calçada, a hora do rush em Copenhague é um

Para isso, os 350 quilômetros de ciclofaixas e 40 quilômetros de

espetáculo interessante. Nos horários de pico, nada menos

estradas cicláveis existentes serão expandidos em mais cem, garantindo

que 35 mil ciclistas cruzam as ciclovias centrais em direção a suas

assim a integração com os bairros mais distantes e também com

casas, escola ou trabalho. Ao todo, 55% da população da cidade se

outros municípios num raio de 50 quilômetros da capital. Quatro

locomove assim, sobre duas rodas, percorrendo inacreditáveis 1,2

novas pontes para ciclistas e pedestres serão construídas sobre

milhão de quilômetros todos os dias.

o canal que separa as regiões leste e oeste, facilitando a vida de

Mas quando são considerados os moradores das cidades vizinhas

quem vai do centro histórico para a moderna região das docas em

e da região metropolitana, esse número cai para 37% de usuários. É

Christianshavn. A sinalização exclusiva para ciclistas será melhorada,

por isso que campanhas de incentivo ao uso das magrelas como meio

com a sincronização de semáforos em favor de quem pedala. “Como

de transporte jamais saem da pauta de prioridades da prefeitura: a

eliminar os carros é impossível, nós vamos promover soluções cada

meta é transformar 50% da população da Grande Copenhague em

vez melhores para os ciclistas, criando verdadeiras autopistas”, afirma,

ciclistas ativos na próxima década.

animado, o diretor-executivo do projeto climático, Jorgen Abildgaard.

55%

A bicicleta é o meio de transporte de da população da cidade. milhão de quilômetros é quanto os copenhaguenses pedalam por dia

1,2

40/ arqviva

Com tudo isso, fica fácil entender por que Copenhague foi eleita cinco vezes seguidas como a mais bike friendly do mundo pela União Internacional dos Ciclistas. Recebendo hordas de urbanistas ávidos para estudar seu modelo de transporte, a cidade deu até origem ao verbo copenhagenizer, que em inglês significa estimular e viabilizar o uso de bicicletas.

Foto divulgação

Congestionamento de ciclistas: diariamente mais de 35 mil pessoas cruzam a cidade sobre duas rodas.



Os prédios residenciais exibem a mistura figura escultural uma abertura que assegura a

Do outro lado da cidade, o bairro de

tão desejada e incentivada no Plano Diretor vista, a ventilação e a boa iluminação interna, Nordhavn deve seguir o mesmo caminho. de unir forma e função à arte. Diversos deles apesar da proximidade entre elas. foram premiados e alguns já são considerados

A área industrial e portuária é alvo do maior

Na residência universitária Tietgen Hall, dos projeto de desenvolvimento metropolitano em

referências da arquitetura moderna, como arquitetos Lundgaard & Tranberg, 360 estúdios andamento em toda a Escandinávia. A proposta, a Universidade IT, o residencial 8Tallet e o foram agrupados em cinco andares, num prédio tão visionária quanto a de Orestad, é criar uma VM Mountain.

de forma circular que se integra perfeitamente à espécie de comunidade sustentável do futuro.

O recém-inaugurado Bella Sky Comwell, paisagem verde recortada por canais. Inspirado As casas serão projetadas para emitir o menor projetado pelo escritório 3XN para abrigar o maior nas edificações chinesas tulou, caracterizadas índice de CO² possível. Serão abertos canais e hotel da Escandinávia, por exemplo, reúne 812 pela forma de arena que estimula o senso de píeres, além de passarelas sobre as águas para quartos em duas torres de 23 andares cada, sem coletividade, todas as unidades têm vista para colocar a população em contato com a natureza que nenhuma das janelas tenha vista obstruída. os canais ou para o pátio interno, onde está a e incentivar os passeios a pé e de bicicleta. Como um casal dançando, cada uma das torres área de convívio social e jardim.

Projeto dos arquitetos do escritório Lundgaard & Tranberg oferece vista privilegiada para os canais de Copenhague ou para o jardim cultivado no pátio interno.

Foto Hans Nerstu

se projeta em direções opostas, criando nessa

42/ arqviva


_ viagem_Dinamarca

Foto Fernanda Peruzzo

Anfitriã exemplar M

esmo sem saber, os turistas que visitam Copenhague também colaboram com

as políticas ambientais. Atualmente, 63% de todos os quartos de hotel são verdes. Ou seja, exibem certificados de sustentabilidade indicando que o estabelecimento reaproveita água, usa fontes de energia limpa e servem alimentos sem agrotóxicos. A alimentação orgânica, aliás, é assunto de estado por lá. Pelo menos 68% de todos os alimentos e bebidas servidos nas escolas e instituições públicas têm selo verde. Pelas ruas, essa política também é evidente. Restaurantes, cafés e até mesmo barraquinhas de cachorro-quente exibem orgulhosos seus menus à base de ingredientes frescos e livres de pesticidas. O BioMio é um dos mais aficionados entre eles. Instalado na antiga região dos açougues e abatedouros, Vesterbro, o restaurante garante que é 100% orgânico. Por lá, desde alimentos, bebidas e produtos de limpeza, passando pelo tecido usado na confecção dos uniformes, até a tinta das paredes,

Foto Fernanda Peruzzo

tudo é biodegradável e tem origem certificada.

O restaurante BioMio é um espelho da nova Copenhague: instalado no antigo bairro dos abatedouros (Kødbyen), oferece alimentos orgânicos em um ambiente irretocável.

arqviva /43


Turismo arquitetônico Black Diamond Inaugurada em 1999, essa extensão

Foto Ty Stange

Endereços imperdíveis para quem quer conhecer o melhor da arquitetura local

da Biblioteca Real desenhada pelos arquitetos Schmidt, Hammer e Lassen recebeu esse nome graças à sua fachada de vidro preto que reflete a água do mar e a faz brilhar.

The Royal Danish Playhouse Foto divulgação

Concebido pelos arquitetos Lundgaard e Tranberg, o prédio serve ao teatro e complementa o complexo da Opera House, em frente. Seu projeto foi premiado pela

Outro projeto de Henning Larsen, inaugurado em 2000, é um centro de

Também à beira do canal central, a estrutura imaginada pelo arquiteto Henning Larsen soma 41 mil metros quadrados, parte deles subterrâneos. Sua fachada combina mármore, calcário e vidro e seu interior conta com obras de artistas nórdicos, como Olafur Eliasson.

apoio e pesquisa ao design que reúne

ITU Building

exposições imperdíveis de grandes nomes da história, como Verner

O prédio é um dos símbolos do

Panton, ou novidades, como novos

novo bairro de Orestad. Com 19 mil

materiais e suas aplicações.

metros quadrados e cinco andares, é

44

arqviva

Foto Andy Skovsen

banhado por luz natural graças a sua configuração em H.

Foto Enrik Petit / EKKO

The Danish Design Centre

The Opera House

Foto Henrik Petit

Foto divulgação

RIBA European Award, em 2008.


The VM Houses Esse conjunto residencial, construído em Orestad pelo grupo Bjarke Ingels, realmente parece uma montanha habitada. Seus 10 andares escalonados reúnem 80

Foto Ty Stange

Foto divulgação

unidades, todas com jardins particulares.

Radisson Blu Royal Hotel Desenhado por Arne Jacobsen, em 1960, o hotel é uma espécie de Meca para os amantes do design. Foi para decorar os seus salões, quartos e hall que o arquiteto

Foto divulgação

Foto Ty Stange

criou as poltronas Egg e Swan.

Danish Centre of Architecture Instalado num antigo casarão na região das docas, em Christianshavn, reúne exposições e um acervo de toda a história da arquitetura dinamarquesa.

8Tallet Também em Orestad, esse complexo residencial do escritório BIG foi premiado como melhor projeto de moradia pelo Festival Mundial de Arquitetura, em 2011.

arqviva /45


projetos de revitalização A partir dos anos 90,

urbanística transformaram a cidade e criaram novos bairros, como o Orestad, que é considerado o primeiro marco urbanístico da nova Copenhague. Foto divulgação

Cultura e qualidade de vida A revitalização da cidade trouxe também novas atrações culturais em zonas antes abandonadas. A Biblioteca Real The Black Diamond ganhou um moderno prédio no porto central. O nome faz referência à fachada de vidros pretos. No interior do prédio está a maior coleção de gravuras e fotografias históricas do país, com cerca de 200 mil peças, além de áreas de lazer, cafés e restaurante. A poucos passos de distância, outras duas construções de tirar o fôlego: a Playhouse (casa da Companhia de Teatro Real Dinamarquesa) e a Opera (que abriga as companhias de balé e ópera do país). Até as águas frias do mar Báltico, que banham a capital e correm por seus canais, passaram por um processo de despoluição. Antes contaminado por resíduos das indústrias instaladas às suas margens e por boa parte do antigo esgoto da cidade, o porto foi revitalizado em 2002, quando todo o sistema foi modernizado. Hoje, os 600 mil moradores da região podem se orgulhar de ter uma praia limpa, com vida marinha e própria para banho. Piscinas foram construídas no principal canal, que corta a cidade ao meio e curiosamente é chamado pelos copenhaguenses de porto. Amager, Islands Brygge e Copencabana (um trocadilho com o nome da famosa praia brasileira) reúnem áreas de lazer, areia, cadeiras e toda a estrutura necessária para quem deseja nadar, compondo uma As águas limpas (e geladas) do mar Báltico enchem cinco piscinas na “praia” de Islands Brygge.

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das principais opções de lazer no verão.



Pela primeira vez desde que foi inaugurado, o Teatro Guaíra passará por um grande restauro. Os corredores do centro cultural, projetado por Rubens Meister, guardam curiosidades que ajudam a contar a história da cultura paranaense

Pausa para o intervalo por

Diogo Cavazotti

N

ão faz muito tempo, o ator paulistano Emílio de Mello deu voz às insatisfações do público e dos artistas do Centro Cultural Teatro

Guaíra. Ao final da peça In on It, em 2010, Mello interrompeu os aplausos e reclamou, em alto e bom som, do forte cheiro de mofo que afetava o palco, a plateia e os camarins do Guairinha. O assunto repercutiu na imprensa e trouxe à tona o debate sobre a urgente necessidade de recuperar o espaço. Dois anos depois, começa o segundo ato. Em breve, o som de óperas e sinfônicas será substituído pelo barulho de martelos, furadeiras e marretas. No lugar de atores e dançarinos, Fotos Departamento de Preservação e Memória do Teatro Guaíra

o espetáculo será regido por arquitetos e executado por um elenco de pedreiros. Pela primeira vez desde a sua inauguração, em 1974, o Teatro Guaíra passará por um grande restauro. A previsão é de que até o final do ano seja entregue o projeto executivo que irá definir as obras necessárias para recuperar o teatro. Apenas no projeto, será investido R$ 1,2 milhão. Depois disso, ainda há pela frente pelo menos um ano inteiro de obras. A vista aérea do teatro revela toda a imponência do edifício e a interessante integração com a Praça Santos Andrade.

48/ arqviva


Foto Adriano Bassani

_ história_Teatro Guaíra

Ao longo de quase 40 anos, este importante exemplar da arquitetura modernista do Paraná sofreu com a ação do tempo e hoje tem problemas estruturais e acústicos, além de excesso de umidade.

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Foto Departamento de Preservação e Memória do Teatro Guaíra

O desafio de mexer em uma estrutura como

a do Guaíra é grande.” Rosina Parchen, coordenadora do setor de Patrimônio Cultural da Secretaria de Estado da Cultura

O imenso painel de Poty Lazzarotto vai ganhar ainda mais destaque com uma iluminação especial.

O esforço vale a pena. O mofo, provocado seja completamente revitalizado (leia o quadro pelo Rio Belém, que passa embaixo da Um Novo Espaço, na página 54) construção, não afeta apenas o Guairinha,

A acústica do teatro vai merecer atenção

mas também os outros dois espaços do Centro redobrada na reforma. Afinal, é considerada Cultural Cultural, o Miniauditório Guaíra e o um dos pontos altos do projeto de Rubens Guairão. O cheiro desagradável está longe de Meister, arquiteto que desenhou o Guaíra. ser o único problema. As instalações elétricas Para garantir a melhor qualidade de som estão precárias, há rachaduras por todos os lados do auditório, Meister consultou autoridades e diversos pisos quebrados. Não há conforto mundiais e aprendeu com elas. Caso do arpara a plateia, que é obrigada a usar banheiros quiteto alemão Ben Schlanger, que projetava antigos e ocupar poltronas barulhentas. Com cinemas em Hollywood e inspirou algumas a recuperação, que irá passar por diversos das inúmeras pesquisas de Meister em busca ambientes do Guaíra, a promessa é que o local da acústica perfeita.

50

arqviva


_ história_Teatro Guaíra

ubens Meister fez do Guaíra

mais as qualidades do trabalho dele

sua obra mais emblemática,

são ressaltadas. É um exemplo de boa

mas também deixou em Curitiba

arquitetura, sóbria, sem excessos ou

outros marcos da arquitetura

exageros”, opina Irã Dudeque.

modernista, como o Centro

Em depoimento ao arquiteto

Politécnico da Universidade Federal,

Salvador Gnoato, um dos autores

a Rodoferroviária e o edifício do

do livro “Rubens Meister – Vida e

Sesc da Esquina. Ele foi, também,

Arquitetura”, Meister fez revelações

um dos principais responsáveis pela

sobre o Guaíra: “Ao projetar o

criação do curso de Arquitetura

teatro, parti do princípio de que a

da UFPR na década de 60. Nasceu

acústica deveria ser resolvida com

na cidade de Botucatu, no estado

a arquitetura, e não com o uso

de São Paulo, em 1922. Mas foi em

de equipamentos mecânicos. O

Curitiba que fez sua vida.

auxílio eletrônico poderia ser usado,

“Não dá pra entender a

mas não para corrigir os defeitos

arquitetura curitibana sem Rubens

de acústica”. Meister morreu em

Meister. Quanto mais o tempo passa,

Curitiba, em 2009, aos 87 anos.

Porém, o que era top de linha na década de 1970, hoje está defasado. “Na época em

Foto divulgação

R

O homem por trás da obra

Aos 25 anos, o arquiteto Rubens Meister inovou ao apresentar um projeto em linguagem modernista.

As tradicionais poltronas vermelhas são fundamentais para a qualidade da acústica. Serão reformadas, mas não haverá aumento de lugares disponíveis.

que o edifício foi projetado não se imaginava chegar aos atuais níveis sonoros dos espetáculos”, explica o arquiteto Sérgio Izidoro, funcionário do Guaíra há 20 anos. Para resolver o problema, um projeto específico vai garantir isolamento acústico entre os auditórios. Isso permitirá que os três teatros sejam utilizados simultaneamente sem interferência de som entre as salas. E para garantir a qualidade da acústica, não haverá aumento no número de lugares disponíveis. As 2.167 poltronas do exercem papel importante na acústica do teatro, tanto pela sua composição material quanto pela posição que ocupam no auditório”, diz o arquiteto.

Foto Adriano Bassani

Guairão, garante ele, são fundamentais. “Elas

arqviva /51


Art Déco x

Modernismo

O arquiteto Rubens Meister perdeu o concurso para o projeto do Teatro Guaíra. Mas caiu nas graças do governador Bento Munhoz e entrou para a história como um dos pioneiros da arquitetura modernista em Curitiba.

O primeiro Teatro Guaíra foi inaugurado em 1884 e ficava na Rua Doutor Muricy, ao lado de onde hoje está a Biblioteca Pública do Paraná.

E

ra o ano de 1948 quando o governador do Paraná, autor de proposta que lembrava a Ópera de Paris. Na terceira Moysés Lupion, decidiu ceder aos apelos da elite colocação vinha o jovem Rubens Meister, de 25 anos, que

curitibana, que desejava um espaço adequado para receber apresentou um projeto de linguagem modernista. apresentações de música e de teatro. Lupion anunciou um

Certo de que a escolha do primeiro lugar não era acer-

concurso público para a escolha do projeto de construção tada, um dos julgadores, Fernando de Azevedo, levantou a do maior teatro do Paraná, que seria erguido no meio da bandeira a favor de Meister. Os ruídos chegaram ao sucessor Praça Rui Barbosa. Era o novo Teatro Guaíra.

de Lupion, Bento Munhoz da Rocha Neto, que concordou

Novo, sim. O primeiro Teatro Guaíra de Curitiba funcionava em levar adiante o projeto modernista. O prêmio ao primeiro na Rua Dr. Muricy, no centro da cidade, ao lado de onde colocado do concurso foi pago, mas apenas Meister viu o hoje está a Biblioteca Pública do Paraná. Foi inaugurado próprio projeto sair do papel. Muitos, sobretudo a imprensa da época, não concordavam

de prisão política entre 1893 e 1895 durante a Revolução com o resultado oficial do concurso. Acreditava-se que a Federalista e, depois de uma ampliação, foi reinaugurado construção deveria ser o símbolo de uma nova era, ou seja, em 1900 com o nome de Guayrá – palavra indígena que moderna. A confusão foi parar nas páginas dos jornais. “Era significa “além da fronteira”. Não durou muito. Em 1937, o uma polêmica que existia no Brasil inteiro. O país passava prédio foi demolido, pois corria o risco de desabar.

por um momento de afirmação da arquitetura moderna”,

A perspectiva de ter um novo e grandioso teatro animou explica o historiador e arquiteto Irã Dudeque, membro do a população curitibana. O que ninguém esperava era que Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB). “Havia muitas dúvidas o assunto fosse dar tanto o que falar. O projeto vencedor, sobre o estilo moderno do prédio. Hoje temos a certeza de da Construtora Nacional, contemplava uma construção art que a escolha foi acertada”, opina Dudeque. Por achar que

déco. O segundo lugar foi para o arquiteto Carlo Barontini, praça não era lugar para receber uma construção, e sim para

52

arqviva

Fotos Departamento de Preservação e Memória do Teatro Guaíra

em 1884 com o nome de Theatro São Theodoro, serviu


_ história_Teatro Guaíra

circulação de pessoas, o governador mudou a localização do teatro para a rua ao lado da Praça Santos Andrade.

caixa e as obras do teatro finalmente ganharam fôlego. A promessa era de que em 1970 os paranaenses teriam

Passaram-se mais de duas décadas desde a aprovação do projeto até o final da construção do Teatro Guaíra.

o maior auditório, o Guairão, em funcionamento. Mas no

A construção Os curitibanos, que tanto ansiavam por um teatro de porte, ainda tiveram que esperar muito. Da aprovação do

dia 25 de abril daquele mesmo ano, um incêndio destruiu tudo e a estrutura do Guairão desabou. A real causa do incêndio nunca foi descoberta.

projeto até finalizar a construção, passaram-se mais de duas

Foram mais quatro anos de obras. Finalmente, em

décadas. Em 1952 o Paraná – ainda um estado basicamente

12 de dezembro de 1974, o Guairão abria as cortinas.

agrícola – vivia um bom momento econômico. Três invernos

A primeira noite foi do musical “Paraná, Terra de Todas

sem geadas haviam impulsionado a lavoura de café. Com

as Gentes”, escrito por Paulo Vítola e Adherbal Fortes. O

dinheiro em caixa, o governador Bento Munhoz autorizou

espetáculo fazia um retrato da colonização do Paraná em

o início da obra do Teatro Guaíra. Paralelamente foram

forma de paródia: no palco, mais de 70 atores em cena,

iniciadas as construções do Centro Cívico e da Biblioteca

acompanhados de coral e orquestra sinfônica, represen-

Pública. As obras marcariam as comemorações do cente-

tavam as diversas etnias do estado. O publicitário Paulo

nário de emancipação política do Paraná.

Vítola, atualmente diretor-presidente da e-Paraná (Rádio

Três anos depois, no entanto, um forte inverno assolou

e Televisão Educativa do Paraná), lembra-se da noite em

o campo e o governo ficou sem verba. A construção pas-

que Meister assistiu ao ensaio daquele espetáculo para

sou mais de uma década parada. Governadores entraram

testar a acústica da sala. “Ele se movimentou por todos

e saíram e nada do Teatro Guaíra ficar pronto. No final

os pontos da plateia, apenas ouvindo, sem mover um

da década de 60, o cenário mudou novamente. O Brasil

músculo da face. Quando chegou ao último balcão, para

tornou-se a 9ª economia do mundo, o dinheiro voltou ao

alívio de todos, aprovou o próprio projeto.”

arqviva /53


O edifício foi tombado em 2003, por isso o restauro terá que respeitar a arquitetura original.

Um novo espaço Foto Fernando Aguiar

O restauro do Teatro Guaíra tem o importante desafio de resgatar a

grandiosidade da construção e preservar a memória cultural da cidade

Controle da umidade A obra prevê a recuperação de todo o revestimento do prédio, incluindo a impermeabilização para eliminar infiltrações ocorridas principalmente nas áreas revestidas com mármore travertino, bastante poroso.

Modernização Os sistemas de movimentação de cenário, luminotécnica cênica, sonorização e imagem serão modernizados. O teatro vai ganhar um gerador para atender a luz cênica, pois o equipamento existente funciona apenas para as saídas de emergência e principais circulações. Um sistema de detecção de incêndio, específico para salas de espetáculos, também está previsto.

Comodidade para artistas e público Os camarins serão equipados com mobiliário novo e os banheiros, que estão com sistema

Havia muitas dúvidas sobre o estilo moderno do prédio, inclusive se aquela não seria uma moda passageira. Hoje temos a certeza de que a escolha foi acertada.” Irã Dudeque, historiador e arquiteto O restauro do Guaíra não será tarefa fácil. para as necessidades atuais sem alterar as Tombado como patrimônio cultural do estado características do prédio histórico.” Antes de desde 2003, o projeto de recuperação do edifício aprovado, o projeto deve passar por análise do deve respeitar a arquitetura original da obra. Conselho Estadual do Patrimônio Histórico e “O desafio de mexer em uma estrutura como Artístico do Paraná (Cepha), composto por dez a do Guaíra é grande”, diz a coordenadora do consultores - cada um deles é qualificado em setor de Patrimônio Cultural da Secretaria de áreas específicas de preservação arqueológica, Estado da Cultura, Rosina Parchen. “O mais histórica, artística e natural. importante é adaptar as funções do teatro

54

arqviva

hidráulico defasado, louças antigas e peças quebradas, receberão melhorias. Os assentos das poltronas dos auditórios serão recuperados para ficarem mais silenciosos e evitar que quebrem com facilidade.

Acessibilidade Deve ser finalizada a implantação de acessibilidade aos auditórios, trabalho que teve início em 2008 com a instalação de rampas, espaço para cadeirantes e elevador de acesso.

Fachada Do lado de fora, a beleza do teatro será ressaltada por uma iluminação especial, que irá valorizar o imenso painel do artista paranaense Poty Lazzarotto na entrada principal, em frente à Praça Santos Andrade.



Ilustração Natalia Richert

Artigo_

por

Maria da Graça Rodrigues Santos *

Termos e conceitos

"

É especificamente na

questão da restauração

que reside a preocupação de profissionais voltados para a

preservação do patrimônio cultural.”

56/ arqviva

O exercício da arquitetura nos

junto de intervenções que visam

cias federal, estadual e municipal.

impõe uma infinidade de ações,

ao restabelecimento total ou par-

Complementarmente, é possível

que abrangem desde o sonho de

cial de uma edificação a uma fase

munir-se de informações e docu-

projetar novas edificações até o

anterior.” É especificamente na

mentos, que podem auxiliar na to-

projeto e acompanhamento de

questão da restauração que reside

mada de decisões. Especialistas na

obras de alteração de edificações

a preocupação de profissionais

área da preservação do patrimônio

existentes. Tais ações costuma-

voltados para a preservação do

cultural, em âmbito internacional,

mos designar como reforma, re-

patrimônio cultural, quando se

organizam encontros que dão ori-

cuperação ou restauração, sem,

deparam com ações de interven-

gem a documentos conhecidos

muitas vezes, nos preocuparmos

ção, que muitas vezes entendem

como Cartas Patrimoniais, que

em dar mais precisão a cada um

e utilizam o termo apenas para

são preciosos para orientar-nos

destes termos.

nomear intervenções sobre edifi-

sobre a questão. Diria aqui que

Se consultarmos os dicionários

cações antigas, reconhecidas insti-

a Carta de Veneza e a Carta do

iremos encontrar a definição clara

tucionalmente como patrimônio.

Restauro da Itália são documentos

para cada um deles. Tomando o

Se observarmos a própria

imprescindíveis para quem pretende

Dicionário Aurélio como referência,

definição do Aurélio, veremos

desenvolver projetos e acompanhar

por exemplo, encontraremos que

a preocupação em detalhar o

obras de restauração. A Carta de

reformar diz respeito “a ação de re-

termo, referindo-se à necessidade

Veneza, especificamente, explica

construir, fazer de novo”. Para recu-

de se adotar uma “metodologia

também sobre o próprio conceito

peração, encontramos a definição

crítico-estética” para orientar as

de restauração. Que nos sirvam

de “ato ou efeito de recuperar”.

intervenções e garantir que o que

as cartas como referência, para

Ambos são conceitos amplos, que

o dicionário define como “resta-

garantir que se preserve o nosso

abrangem não apenas o universo

belecimento total ou parcial de

patrimônio, quer seja ele antigo

da arquitetura. Quanto à restau-

uma edificação a uma fase anterior”

ou moderno.

ração, o dicionário, dentre outras

não se faça com base em decisões

definições, trata o termo de modo

arbitrárias e sentimentais.

específico, apresentando-o como:

“...7. Conjunto de intervenções

levar à mutilação de partes im-

técnicas e científicas, de caráter

portantes de edifícios históricos,

intensivo, que visam a garantir,

ou mesmo à sua total descaracte-

no âmbito de uma metodologia

rização, é importante consultar os

crítico-estética, a perenidade dum

órgãos públicos voltados à preser-

patrimônio cultural. 8. Arquit. Con-

vação do patrimônio, nas instân-

Para evitar erros, que podem

*Maria da Graça Rodrigues Santos Doutora em arquitetura e urbanismo pela Universidade de São Paulo. Professora titular da Universidade Positivo.



encaixe especial

NOVIDADES

&

Foto divulgação

Foto divulgação Studio Boot

INOVAÇÕES

O sistema de encaixes IXXI criado pelos holandeses Roel Vaessen, Eric Sloot e Paulien Berendsen é perfeito para quem gosta de decorar com arte. As peças construídas em forma de “I” e “X” são usadas para conectar cartões de 20cm x 20cm que, unidos, formam fotografias ampliadas, murais ou até mesmo reproduções pixeladas de grandes obras de arte. Os cartões são confeccionados em papel especial, com gramatura de 300g, à prova d’água e resistente aos raios UV. Por conta disso, as cores não desbotam e o painel pode ser instalado em qualquer cômodo da casa. Inclusive no meio da sala, como se fosse uma divisória suspensa (para isso há um trilho para fixação no teto). Vendidas pela internet, as peças podem ser produzidas a partir do banco de imagens oferecido pela equipe ou com imagens pessoais: basta fazer o upload do arquivo. Os produtos são entregues na casa dos clientes, em qualquer parte do mundo. www.ixxi.nu

Arena ciclável

Foto divulgação

Nada como uma área de lazer dedicada à bicicleta para incentivar a prática do ciclismo. Pelo menos essa é a justificativa dada pelos arquitetos do escritório We Are You e Erik Hallberg para o projeto Cycling Center, em Gotemburgo, conhecida como a mais chuvosa entre as grandes cidades suecas, e também a com o menor número de usuários de bikes. O velódromo concebido em forma de arena mistura pistas para quem deseja praticar a atividade de maneira intensa e atlética e áreas de passeio. Tudo devidamente coberto por um telhado tensionado.

58/ arqviva

Paisagem futurística

Apesar de parecer um cenário de filme de ficção hollywoodiano, o recém-inaugurado Gardens by the Bay, na baía de Cingapura, é bastante real. Construído sobre uma área de 101 hectares na região

Dentro delas, o ambiente é o de uma estufa tropical onde são cultivadas mais de 200 espécies de plantas, especialmente bromélias. Na copa dessas árvores estão instalados painéis de energia solar, que

da Marina Bay, o projeto dos escritórios britânicos Wilkinson Eyre Architects e Grant Associates reúne modernas estufas, canteiros e 18 árvores gigantes. Com altura entre 25 e 50 metros, essas estruturas feitas em concreto armado e aço funcionam como um jardim vertical, sobre as quais crescem centenas de espécies de orquídeas, samambaias e trepadeiras.

alimentam o seu sistema de iluminação, e conectadas aos seus troncos estendem-se as passarelas que conduzem os visitantes por boa parte do parque e que garantem uma vista espetacular do espaço, 22 metros acima do solo. www.gardensbythebay.com.sg


Depois de Jaime Hayon e Marcel Wanders, a marca italiana Bisazza convocou o Estúdio Nendo, comandado pelo japonês Oki Sato, para criar sua nova linha de móveis, pias, banheiras e acessórios para salas de banho. A coleção Nendo é marcada pela influência nipônica e seu minimalismo. As peças produzidas em madeira natural impermeabilizada e resina laqueada branca têm linhas retas e curvas econômicas, que incorporam funcionalidade e simplicidade ao momento do banho sem deixar de fora a beleza. www.bisazza.com

O português Alexandre Farto – mais conhecido como Vhils – já é apontado como o Michelângelo da street art. Aproveitando a fachada de edifícios como suporte e usando ferramentas dignas de pedreiros e marceneiros, ele descasca, quebra, risca e explode as paredes externas. É dessa forma que consegue criar retratos gigantes em baixo relevo que revelam a estrutura dos imóveis e brincam com jogos de luz e sombra, claro e escuro. A maneira de Vhils transformar a paisagem urbana caiu no gosto da classe artística. Em menos de quatro anos, ele já soma dezenas de exposições pelo mundo, incluindo uma participação na Bienal de São Paulo. Nada mal para quem tem apenas 25 anos. www.magda-gallery.com http://alexandrefarto.com

Foto cortesia Galerie Magda Danysz

Foto divulgação

sala zen

Desconstrução artística

Foto Adria Goula Sarda

Feira livre

O projeto de relocação da Feira Dominical de Santo Antônio, em Barcelona, executado pelo escritório Ravetllat Ribas Arquitectes é a prova de que tudo o que um mercado de rua precisa ter para se tornar ainda mais atraente é um teto. A estrutura de metal erguida 4,5 metros acima do chão cobre as pistas de rolagem da rua Urgell, garantindo aos feirantes e clientes todo o conforto para suas compras, mesmo quando o clima não está amigável. Parte do telhado é retrátil. Aos domingos, quando acontece a feira, é acionado e se estende por cima das calçadas, aumentando o espaço de exposição coberto. Durante os demais dias da semana, o espaço coberto é ocupado pelos carros e seus motoristas.

arqviva /59


_ entrevista_SHOPPING CENTERS

Consumo x História: esta relação dá certo? Curitiba é recordista em número de shoppings entre as cidades de médio porte. Boa parte deles está em prédios históricos. Esta é uma contribuição importante para a cidade? Os arquitetos Yumi Yamawaki e Fábio Duarte, autores de um estudo publicado na Europa, foram atrás da resposta e descobriram que é possível tirar boas lições do exemplo curitibano por

Luise Takashina

fotos

Eduardo Macarios

E

ntre os arquitetos, a crítica é shopping centers na região central. A área quase unânime. A construção construída é quase três vezes maior que desenfreada de shopping a da terceira colocada, Belo Horizonte – centers cria cidades dentro da motivo mais do que suficiente para chamar cidade. Muralhas sem qualquer a atenção dos estudiosos.

comunicação externa, limitam-se a beneficiar

Em 2010, a dupla de arquitetos apresentou

uma parcela de consumidores de alta renda e um artigo científico sobre o assunto no inviabilizam o comércio de rua local. Some-se International Laboratory of Architecture and a isso o impacto ambiental: lixo gerado em Urban Design (Ilaud), encontro itinerante que quantidades extraordinárias, altíssimo consumo reúne estudantes e profissionais de arquitetura energético. Seriam, afinal, os shopping centers de várias partes do mundo, realizado na China os modernos vilões da vida urbana?

com o tema “Regeneração de Áreas Urbanas”.

Os arquitetos Yumi Yamawaki e Fábio O evento deu origem ao livro Where Does The Duarte (ela autora de uma dissertação de New City Come From?, lançado recentemente. mestrado sobre o tema e ele professor Fábio e Yumi figuram como os dois únicos autores do curso de Pós-Graduação em Gestão brasileiros convidados para fazer parte da obra. Urbana da PUC-PR) descobriram que em Eles escreveram um capítulo analisando dois Curitiba essa história tem um ingrediente casos de reconversão de edificações históricas que faz toda a diferença. Por aqui, três em shoppings centers: Estação e Müeller. Em dos quatro shoppings localizados na um longo bate-papo com a reportagem da região central são construções históricas revista ARQ VIVA, os entrevistados defenderam que foram revitalizadas. Romperam o que a transformação de espaços históricos em ciclo degradação-demolição e hoje são centros comerciais em Curitiba foi positiva, importantes referenciais para a população. criticaram o excesso de shoppings na região Entre as principais capitais brasileiras, central e alertaram para o crescente impacto Curitiba é a que tem maior número de ambiental dessas construções.

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Yumi Yamawaki e Fábio Duarte acreditam que o uso de edifícios históricos em Curitiba fez com que o ciclo degradaçãodemolição fosse rompido.

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ARQ VIVA: Por que a construção de um

Fábio Duarte: Além disso, há um problema centro cultural correndo o risco de ninguém

shopping é um tema tão polêmico entre de objeto arquitetônico que está sendo muito frequentar e, por último, transformar o local em arquitetos e urbanistas?

pouco visto no Brasil: o espaço fechado do um espaço privado ocupado por escritórios.

Fábio Duarte: É polêmico porque no shopping precisa ter aquecimento, resfriamento, No caso desses shoppings, as edificações Brasil é permitida a construção de shoppings iluminação. O impacto de consumo energético históricas adquiriram uma nova função e centers muito grandes e fechados dentro da é fabuloso. Em relação à arquitetura, você não foram mantidas como espaços públicos. cidade. Nos Estados Unidos, na Europa e até cobra do shopping que ele gere um percentual em alguns países da América Latina, os grandes X da sua energia. A tarifa que ele paga é a ARQ VIVA: Nesses casos, o impacto negativo centros comerciais fechados só são permitidos mesma que você paga na sua casa e o local é menor? em regiões mais afastadas. E por que isso é um consumidor intensivo de energia. Nessa

Fábio Duarte: Acredito que sim. Curitiba

é melhor? Quando você cria um shopping lógica, temos que pensar em quais os impactos teve um momento de reaproveitamento desses center, você mata o comércio de rua local. que os grandes empreendimentos têm na espaços históricos. O Shopping Estação, por Porque é um lugar seguro, fácil de chegar de cidade e o que a gente tem que fazer para exemplo, é um bom exemplo de como reutilizar carro e de estacionar. Para pessoas de classe que eles compensem ou mitiguem isso. Pensar edificações centrais que são históricas. Criou-se média e alta, é mais cômodo e barato. Só que em um shopping energeticamente eficiente um empreendimento que atrai gente. E uma há impactos grandes, como no trânsito. Por é uma lição de arquitetura a se aprender. parte da área da estação de trem antiga é usada isso é importante ter medidas de controle.

para a memória ferroviária. Você consegue entrar

O [Park Shopping] Barigüi, por exemplo, fez ARQ VIVA: Curitiba impressiona pela no shopping pelo antigo saguão da estação uma via de acesso separada da via de tráfego. quantidade de shoppings. E chama a atenção que antes era fechado. Acho que foi inteligente. Mesmo assim, essas são medidas paliativas. O porque alguns estão em prédios históricos que Vale o mesmo para o Shopping Müeller. Não impacto seria muito menor se os shoppings foram reaproveitados. Esta é uma contribuição teria o que fazer com uma quadra inteira. Ou fossem permitidos apenas em rodovias. importante para a cidade?

Yumi Yamawaki: A questão viária, no

derrubávamos o prédio ou dávamos um uso

Fábio Duarte: A gente não pode cair na para aquele conjunto arquitetônico inteiro.

entanto, é apenas um dos problemas. É preciso dicotomia de que um shopping na cidade é Então a saída foi manter pelo menos a casca. também adotar medidas para que o comércio sempre ruim. Não há dúvidas de que um grande Mais ou menos a mesma coisa que foi feita com de rua não morra. No Shopping Estação, mesmo centro comercial pode ser uma forma de dar um o Shopping Curitiba [que antes era um quartel]. com acesso pela Av. Sete de Setembro, onde há uso público a um prédio histórico. transporte público, não houve uma dinamização

São os únicos três casos em que se justifica ter

Yumi Yamawaki: No caso dos shoppings um shopping dentro da cidade em Curitiba

da área que fica no entorno. O público é quem Müeller, Curitiba e Estação, havia três soluções: do ponto de vista urbanístico e arquitetônico. tem carro e não quem usa ônibus.

derrubar tudo e fazer habitação; projetar um ARQ VIVA: Mesmo que os shoppings fossem deslocados para regiões mais afastadas da

Mais sobre o livro Where Does The New City Come From?

C

omposto por 13 capítulos, o livro tem a colaboração de arquitetos da China, Índia, Itália, Argentina, Japão, Estados Unidos e África do Sul. Para saber onde adquirir, entre em contato com o ILAUD (info@ilaud.eu). Até o fechamento desta edição, o livro estava disponível apenas em versão digital.

cidade, ainda assim seria um desafio valorizar o entorno. Como resolver essa equação? Fábio Duarte: É quase insolúvel. Eu preferiria que um shopping do tamanho do Müeller não estivesse onde está. Mas se não fosse aproveitado, talvez o prédio histórico nem existisse mais. No entanto, é preciso destacar que esse é um caso completamente diferente do que está acontecendo com o bairro Batel. Sem o Shopping Crystal e o Pátio Batel [que está

sendo construído], aquilo seria tudo perfeito. Os projetos desses shoppings são muito diferentes do Shopping Novo Batel, que está na mesma região, e é bem aberto, quase uma galeria.

62/ arqviva


_ entrevista_SHOPPING CENTERS

O ideal é que o espaço funcione como se fosse galeria para que o público passe por dentro. Quando a

construção permite a relação interior/exterior, as pessoas ficam com a sensação de que parece uma rua.” Yumi Yamawaki

Em alguns países os grandes shoppings só são permitidos em regiões afastadas. “Este cuidado preserva o comércio local”, explicam os arquitetos Yumi e Fábio.

arqviva /63


Yumi Yamawaki: É um shopping que tem quase como se fosse uma praça pública em Usam, por exemplo, telhados de vidro. Só que, uma permeabilidade boa, entradas pelos três frente à construção. Assim se torna menos infelizmente, essa tem sido uma iniciativa do lados, lojas voltadas para o exterior. E tem alguns impactante para a cidade e também mais empreendimento e não do poder público, que equipamentos culturais que chamam outro público, convidativo. Deve ser obrigado a se abrir, até poderia exigir esse diferencial para preservar o como teatro para crianças e cinema. Eles fazem até para a segurança do usuário. feirinhas lá. E ele tem uma função local. Quem usa o

espaço urbano. A prefeitura deveria normatizar.

Yumi Yamawaki: O ideal é que funcione O empreendedor quer utilizar o potencial

shopping são as pessoas que moram no entorno. como se fosse galeria para que as pessoas máximo daquele terreno. Ele não vai fazer uma atravessem por dentro. Quando a construção praça na frente e colocar uma fonte porque ARQ VIVA: Não há como negar que os shoppings permite a relação interior/exterior, as pessoas quer aquele espaço como área de venda, de são um sucesso e que se proliferam rapidamente. ficam com a sensação de que parece uma lojas. Mas se for obrigado, ele vai ter que fazer. Projetos como esse, em que há comunicação rua. Percebo que há um pequeno processo Se não normatizar, não tem jeito. com o espaço todo, seriam o caminho do meio? de mudança. Antes os shoppings eram mais Fábio Duarte: O shopping tem que ser fechados. Os shoppings mais novos pensam permeável para a rua e criar um espaço externo, na relação do entorno, do exterior e do interior.

Pensar em um shopping

energeticamente eficiente

é uma lição de arquitetura a se aprender.” Fábio Duarte

Prédios fechados geram alto consumo de energia. Os arquitetos defendem que os projetos incluam soluções para reduzir o impacto ambiental.

64/ arqviva



o futuro

é aqui

N por

fernanda peruzzo a contramão do atual boom da construção civil, arquitetos defendem o caminho inverso para o desenvolvimento. Permitir a prédios velhos um uso novo. Essa é a ideia central por trás do retrofit. Uma técnica que consiste em dar segunda vida ao que parecia condenado.

Nesta equação, todos saem ganhando. A obra ganha valorização no mercado imobiliário, os moradores passam a viver com mais qualidade e uma infinidade de matéria-prima deixa de ser consumida.

São duas as palavras de ordem: tecnologia e sustentabilidade. É por

meio da primeira que se alcançam os resultados da segunda. “Retrofit nada mais é do que uma reforma de altíssima qualidade”, ensina Orlando Pinto Ribeiro, professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Positivo e vice-presidente da AsBEA-PR. “Dizer que a obra é um retrofit é elogiar.” Quem fica com o maior crédito, no entanto, é a própria cidade. “Toda a população sai ganhando com a mudança da paisagem urbana”, destaca Orlando.

66/ arqviva

Perspectiva digital do projeto assinado pelo escritório Bjarke Ingels Group

Telhado verde, transporte público não poluente e reaproveitamento de água e energia são apenas algumas das proposições do escritório BIG para um grandioso centro comercial francês


_pelo mundo

O centro comercial Europa City é um complexo de compras e lazer que será construído na próxima década na cidade de Gonesse, nos arredores de Paris.

arqviva /67


Perspectivas digitais do projeto assinado pelo escritório Bjarke Ingels Group

O

escritório dinamarquês Bjarke Ingels Group (BIG) parece ter elevado o termo sustentabilidade a um novo nível com

seu projeto para o centro comercial Europa City, um complexo de compras e lazer que será construído na próxima década em Gonesse, município que fica a 16 quilômetros da capital francesa e próximo ao Aeroporto Charles de Gaulle, na Grande Paris.

A paisagem natural e a estrutura construída se fundem no projeto. A partir da calçada, será possível ter acesso ao

jardim cultivado no telhado.

68/ arqviva

Instalado em uma área de 80 hectares, o projeto

sugere a criação de um cenário improvável, onde a paisagem natural e a estrutura construída se fundem de um modo tão sutil que será possível ter acesso ao jardim cultivado no telhado a partir da calçada. Simulando o que seria uma área rural montanhosa, a elevação formada pelo edifício não ultrapassará os limites de altura permitidos para a região, que é de três andares (cerca de 15 metros).


_pelo mundo

Do alto dele, porém, será possível avistar os principais

mil pessoas, uma pista de esqui e um parque aquático, mais

monumentos da capital francesa. Nos meses de inverno

áreas para exposições e apresentações culturais devem

o amplo jardim estará coberto por neve, como toda

confirmar a vocação cultural e turística do Europa City.

paisagem europeia, e será transformado em uma área

para a prática de esqui e snowboard.

de uma cidade europeia clássica oferecerá seu maior

Mas é na infraestrutura que essa representação

Embaixo dessa estrutura, entre 500 e 600 lojas serão

espetáculo. Boa parte da energia consumida virá de

distribuídas em seis zonas distintas, cada uma fazendo

fontes renováveis, incluindo energia solar e eólica.

referência a uma zona de comércio famosa no continente,

Para garantir a eficiência energética do espaço foi

da La Rambla espanhola à Champs-Élysées parisiense. O

imaginado um sistema de reaproveitamento do calor

percurso entre elas será constituído por vielas – como nas

residual das centrais de aquecimento e iluminação, que

cidades medievais – e grandes boulevards – idênticos aos

será reconvertido em energia, dessa vez para manter a

encontrados nos centros modernos –, culminando numa

temperatura interna das áreas de lazer, spa e piscina.

grande praça central. Um sistema público de bicicletas

Toda a água utilizada no complexo será reaproveitada

e pequenos ônibus elétricos colocado à disposição dos

na irrigação do parque construído sobre o telhado. O

visitantes permitirá um deslocamento rápido e agradável

lixo será separado e reciclado ali mesmo, minimizando

de um ponto a outro da planta. Pelo menos uma dúzia de

o envio de dejetos para o aterro sanitário local.

Entre 500 e 600 lojas serão distribuídas pelo centro comercial. Um sistema público de bicicletas e pequenos ônibus elétricos permitirá o deslocamento dos visitantes.

hotéis, uma sala de espetáculos com capacidade para duas

arqviva /69


Perspectiva digital do projeto assinado pelo escritório Bjarke Ingels Group

A elevação formada pelo edifício será de no máximo três andares, altura permitida para a região

70/ arqviva


_pelo _pelo mundo mundo

Concurso internacional

O

grupo Immochan, incorporadora responsável

pelo projeto do centro comercial

1)

Europa City, estima atrair entre 25 e 40 milhões de visitantes por ano com essa mistura da cultura norte-americana do shopping center com a preferência

Foto 3 - Perspectiva digital do projeto assinado por Snohetta

Foto 2: Perspectiva digital do projeto assinado por Manuelle Gautrand

Foto 1 - Perspectiva digital do projeto assinado por Valode e Pistre

europeia pelas áreas de convívio social. O investimento total é de 1,7 bilhões de euros. Para escolher o melhor projeto, o grupo está promovendo um concurso.

Além da planta proposta pelos

dinamarqueses do BIG – apresentada nesta reportagem –, outros três escritórios europeus estão na competição. O projeto do francês

2)

Valode & Pistre (foto 1) é baseado na cidade de Paris e até mesmo o Sena é recriado. O também francês Manuelle Gautrand Architecture (foto

2) propõe a integração com o meio externo a partir de elevações e telhados verdes. E os noruegueses do escritório Snohetta (foto 3) pretendem recriar a paisagem agrícola da França usando canteiros que simulam plantações e bosques com árvores típicas.

A previsão é de que até o final de

3)

2012 seja anunciado o vencedor. As obras, no entanto, só terão início em 2020, quando for concluída a construção da linha D do trem metropolitano que integrará a região à capital. Para saber mais acesse www.europacity.com.

arqviva

/71


A proposta de revitalização e reforma da avenida Cândido de Abreu mostra que o uso do espaço público pelos moradores é mais do que uma tendência. É uma necessidade

A vez é dos

pedestres por

Rosa Bittencourt

C

uritiba vai ganhar um novo

tiga metalúrgica dos Irmãos Müeller (hoje o

espaço para os pedestres. Na

Shopping Müeller), além de todos os outros

avenida Cândido de Abreu

prédios residenciais e comerciais da região.

será construída uma rambla

Ao final do percurso pelo calçadão, estarão

– tipo de via pública com

a mais famosa praça do Centro Cívico –

calçadão central e também espaço para o

Nossa Senhora da Salete – e as construções

tráfego de veículos. A obra retoma a voca-

que abrigam os poderes máximos da capi-

ção da cidade para o caminhar. Às margens

tal e do estado. A revitalização está orçada

do calçadão serão mantidas as vias para

em R$ 18 milhões, com recursos da Prefei-

carros, marca registrada do Centro Cívico.

tura Municipal de Curitiba (deste total, R$ 4

“Esta é uma proposta urbanística pouco

milhões são do PAC da Mobilidade Urbana

difundida nas cidades brasileiras e que está

para a Copa 2014).

sendo sugerida como solução de desenho

urbano”, explica o arquiteto e urbanista Or-

para começar em 2013 e ser entregue antes

lando Ribeiro. “Permite que as pessoas que

da Copa do Mundo, não será somente um

passam diariamente por ali, mas que não

ir e vir dos engravatados do Centro Cívico.

usam as calçadas para acessar os edifícios

Pelo projeto, haverá pontos móveis para

comerciais, circulem de uma maneira mais

café, banca de revistas e outros utilitários

agradável (Leia o quadro na página 76 e en-

que priorizem o ficar no local. Nas entreli-

tenda o que são ramblas).”

nhas da obra está um convite para que seus

A visão dos pedestres será de 360 graus.

usuários aproveitem o espaço ao máximo e

Com os pés em cima de um granito e não

iniciem um caminho a pé pela nova Cân-

A obra da Prefeitura de Curitiba, prevista

mais do polêmico petit pavé, os usuários

dido de Abreu. Os pontos de partida são

poderão girar a sua cabeça e de qualquer

muitos, a começar pela Praça Tiradentes e

lugar poderão ver o histórico prédio da an-

o Centro Histórico.

72/ arqviva


Perspectiva digital - IPPUC

_ urbanismo_centro cívico

A obra retoma a vocação da cidade para o caminhar. Às margens do calçadão, serão mantidas as vias para carros, marca registrada do Centro Cívico.

arqviva /73


Outra opção será iniciar o percurso di- paço voltado para o pedestre e propiciar

reto do eixo da revitalização, a Praça 19 de um circuito cultural e histórico a partir do Dezembro. Com os pés no granito, a partir Centro em direção ao Centro Cívico”, exdesse ponto caminham-se exatos 870 me- plica o autor do projeto, Reginaldo Reinert. tros num espaço de 18 metros de largura “Esse trajeto não é só para profissionais ou e chega-se à sede da Prefeitura Municipal. estudantes do eixo entre o Centro e o CenA partir dali, é possível seguir até a Pra- tro Cívico, muito menos voltado só para os ça Nossa Senhora da Salete (onde estão o turistas. Será um convite para que o curitiPalácio Iguaçu e a Assembleia Legislativa). bano saia de sua casa e aproveite este novo Mais alguns passos e tem-se a vista do Mu- espaço de lazer e cultura”, completa o arquiseu Oscar Niemeyer. “A nova via tem como teto, que trabalha na área de planejamento objetivo imediato a valorização de um es- do Instituto de Pesquisa e Planejamento de Curitiba (Ippuc).

Reconhecimento para o

A nova via tem o objetivo de

modernismo

valorizar um espaço voltado para o pedestre.”

No anos 50, Curitiba inovou ao projetar o Centro Cívico, um espaço compartilhado pelos Três Poderes.

Reginaldo Reinert, arquiteto do Ippuc

A Cândido de Abreu da década de 1940 não lembra em nada a movimentada avenida dos dias atuais.

O

Centro Cívico foi o primeiro projeto em linguagem moderna no Brasil. Foi desen-

volvido pelo arquiteto David Xavier de Azambuja e uma equipe de alunos de Lúcio Costa (que ao lado de Oscar Niemeyer projetou Brasília), então professor na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro. O projeto antecipou as concepções adotadas na capital federal uma década depois.

A ideia era construir uma grande praça desti-

nada ao uso exclusivo dos pedestres, com edifícios dispostos nas laterais e avenida monumental de acesso que se vincula com o conjunto ao centro tradicional da cidade.

O desenvolvimento das obras – iniciadas em

1950 – se arrastou ao longo dos anos 60, com grandes alterações. Apesar de não ter sido concluído em totalidade, o Centro Cívico é um marco da comemoração do Centenário da Emancipação Política do Estado do Paraná e da decisão do governador Bento Munhoz da Rocha em patrocinar a arquitetura moderna. O conjunto arquitetônico de Preservação da Prefeitura Municipal de Curitiba no acervo da arquitetura moderna e está em processo de tombamento.

74/ arqviva

Foto divulgação PMC

do Centro Cívico está incluído entre as Unidades


_ urbanismo_centro cívico

Perspectiva digital - IPPUC

A nova cândido de abreu Um investimento de

R$ 18 milhões

está sendo feito para remodelar a avenida e torná-la um espaço adequado para motoristas e pedestres

Ao longo dos 970 metros haverá uma pista tátil

Uma faixa será de

para deficientes visuais.

uso preferencial

Os cruzamentos terão

Toda a fiação

dos ciclistas.

pistas elevadas para

será subterrânea.

garantir a segurança dos pedestres. Nestes pontos, O calçadão central terá 950 metros de extensão, com nova iluminação, paisagismo, espaços de lazer, quiosques de café e outros serviços como

obrigatoriamente, os veículos deverão reduzir

Uma das novas linhas

a velocidade para passar

que passará por ali é

pelo cruzamento.

a do Ligeirão (CentroBoqueirão). As demais serão mantidas.

internet sem fio de graça.

arqviva /75


“Incentivo fantástico” Raphael Hardy Fioravanti, mestre em Antropologia Social pela UFPR e professor do curso de Ciência Política da Facinter, acredita que por mais que o curitibano seja conhecido por manter um perfil fechado e mais recluso em sua casa, há pessoas de todas as partes e regiões que moram em Curitiba e a maioria delas aproveita os espaços públicos da capital nos fins de semana. “No Museu do Olho, milhares de jovens vão para lá, vindos da periferia e das cidades metropolitanas. Qual é o significado do museu para estes Foto Bob Bobsson

jovens? Eles não o veem como um local de acesso à cultura e às artes. É mais um espaço para curtir com os amigos”. O professor cita que espaços de mobilidade, em geral, não são usados para sociabilização. Ele acredita,

Você sabe o que é uma rambla?

agradáveis, seguros e limpos, que estimulam

A palavra tem origem no idioma árabe e significa “leito de rio seco”.

a permanência destes usuários, “será um

Ou seja, nos projetos de rambla o rio é o calçadão e as margens são as vias

incentivo fantástico e a obra redefinirá o

para veículos. O diferencial está justamente nessa maneira de conciliar a

uso do espaço urbano.”

necessidade dos motoristas com um ambiente harmônico, que atenda

Para Fioravanti, a redefinição do uso cul-

às pessoas que estão a pé. O calçadão deixa de ser um prolongamento

tural de um espaço não ocorre do dia para

natural de uma calçada e vai para o centro da via.

noite. “Alguns lugares são feitos apenas para

As ramblas mais conhecidas ficam em Barcelona, na Espanha. Elas têm, ao

passagem, outros propiciam a relação entre

todo, 1,2 quilômetro. Possuem uma espécie de calçadão onde os pedestres

as pessoas”, destaca. “Os equipamentos que

podem caminhar e são margeadas por ruas onde passam os carros. No centro,

serão disponibilizados, sua manutenção e as

a movimentação cultural é intensa. São lojas, cafés, restaurantes, floriculturas

ações promovidas nestes locais é que dirão

e artistas que fazem performances para o público. Na prática, mais qualidade

qual será o perfil da população e que uso

de vida aos moradores graças a uma solução urbanística adequada.

esta dará ao novo calçadão.”

Com o novo calçadão,

haverá um ir e vir do setor histórico para o Centro Cívico

e toda região que ele compreende.” Paulo Chiesa, professor de Arquitetura da UFPR 76/ arqviva

no entanto, que se forem criados ambientes


Com o novo projeto, serão cinco pistas no sentido Praça Tiradentes, sendo uma de uso exclusivo dos ônibus.

_ urbanismo_centro cívico

As obras que vão deixar a Cândido de Abreu com uma nova proposta de uso, segundo o professor do departamento de Arquitetura da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Paulo Chiesa, já passaram da hora. Nos últimos dez anos, a via se configurou como um eixo entre o Centro Cívico e o Centro, com a construção de edifícios residenciais e comerciais. “Muito antes da construção Perspectiva digital - IPPUC

de Brasília, Curitiba ousou com as obras em torno da Praça Nossa Senhora da Salete e ali se estabeleceu a nossa Praça dos Três Poderes. O uso pela população ainda é muito tímido. Com o novo calçadão, haverá um ir e vir do setor histórico para o Centro Cívico e toda região que ele compreende, como, por exemplo, o Museu Oscar Niemeyer”. Chiesa lembra que Curitiba merece essa nova Cândido de Abreu, justamente porque é a capital do estado.

Evaporação do tráfego

Teoria europeia defende que, a longo prazo, as pessoas irão deixar de usar seus carros por falta de espaço nas regiões centrais

A

O arquiteto e professor da PUC-PR Carlos Hardt afirma que um projeto que tenha como prioridade o pedestre é sempre positivo. “A preocupação é com a acessibilidade a este novo espaço”, observa. O risco de uma

explosão da presença de carros, não só em Curitiba, mas no mundo todo,

travessia de uma calçada, passando pela

colabora com um movimento que prioriza o fechamento de ruas para os

rua até o calçadão, que ficará no centro da

veículos e volta seu uso para os pedestres. O fenômeno é conhecido como “evaporação

via, na avaliação do professor, merecerá

do tráfego”. A lógica está em pensar que quanto menos ruas e estacionamentos

sinalização especial para evitar acidentes

disponíveis houver, menos as pessoas irão utilizar seus carros. Assim, aos poucos, os

entre pedestres e veículos nos cruzamentos.

veículos poderiam “evaporar” da cidade.

Hartd faz a seguinte observação sobre o

Em 2004, a Comissão Europeia reconheceu essa teoria oficialmente com a

novo piso de granito no calçadão: é preciso

publicação do relatório Reclaiming city streets for people – Chaos or quality of life?

que o material dê condições de fluxo para

(Recuperando ruas da cidade para as pessoas – Caos ou qualidade de vida?). O estudo

pedestres e cadeirantes ou pessoas com

traz alguns exemplos de sucesso em cidades como Kajaani (Finlândia), Londres

dificuldade de locomoção, como os idosos.

(Inglaterra), Nuremberg (Alemanha) e Strasbourg (França). Nesses locais, os governos encararam de frente o problema do tráfego no centro e investiram em soluções alinhadas ao conceito de “evaporação do tráfego”. O resultado foi a redução do espaço para os carros e a valorização dos ambientes de convívio social.

arqviva /77


Ilustração Natalia Richert

Artigo _

por

Orlando Ribeiro *

Gentileza urbana

"

Gentileza é uma virtude. Não

78

arqviva

Manifesta-se de forma diver-

• As feiras livres (artesanato,

é etiqueta, não são normas de

sificada através de iniciativas de

gastronomia, orgânicos,

civilidade e nem um manual de

valorização do lugar por meio

hortifrutigranjeiros);

boas maneiras. Significa corte-

de intervenções arquitetônicas

• A Rua 24 horas: que oferece

sia, amabilidade, fidalguia, bom

dignas de mérito; ações de re-

serviços e comércio de

tratamento. Tem muito poder,

cuperação da paisagem urbana

conveniência;

relação direta com a inteligência

e de preservação e valorização do

• A recente revitalização da zona

e denota elevação moral. A gen-

patrimônio cultural material e ima-

central da cidade (Marco Zero).

tileza depende do exemplo e do

terial das cidades; ações concretas

hábito. É uma questão racional.

de cidadania, equilíbrio urbano e

organizada, embora reconheça

Quando se pratica a gentileza,

sustentabilidade ambiental.

os esforços e méritos do poder

usa-se a inteligência e a intenção

A cidade de Curitiba ficou

público nessas iniciativas,

em prol do bem-estar.

conhecida internacionalmente

ainda é muito incipiente em

Gentileza urbana é um termo

por conceber e implantar

suas contribuições. Não são

relativamente novo, utilizado

inúmeras estratégias urbanísti-

comuns na cidade intervenções

e difundido por arquitetos e

cas gentis de iniciativa pública.

arquitetônicas e/ou paisagísticas

urbanistas de todo o mundo

Dentre as mais conhecidas e

que possam ser classificadas

com o propósito de enfatizar e

replicadas, destacam-se:

como gentilezas urbanas, mas elas

estimular o hábito voluntário,

• Os parques urbanos: ampla-

existem. E quando isso acontece,

individual ou coletivo, das ações e

mente utilizados pela população,

devem ter o mérito reconhecido

atitudes voltadas para a melhoria

preservam os recursos hídricos e

para incentivar novas ações.

da qualidade da vida urbana. O

simultaneamente recuperam a

resultado é a (re)criação de uma

paisagem urbana de áreas am-

A gentileza urbana é um cidade mais amável, aprazível termo novo difundido e humana, e que incentiva pelos arquitetos. A proposta o exercício da cidadania nos é tornar a cidade âmbitos pessoal e profissional

mais aprazível e humana.”

público e privado.

Por sua vez, a sociedade

bientalmente degradadas; • O calçadão de uso público: um grande street mall no centro da cidade;

*Arquiteto e urbanista, Orlando Ribeiro é a o atual presidente da AsBEA-PR e sócio-proprietário da Contexto Arquitetura. orlando@contexto.arq.br



Criados pelo designer Raffaello Galiotto, os revestimentos de pedra da Lithos Design são esculpidos de forma a refletir a luminosidade do ambiente e criar poesia na decoração

Luxo italiano

"

por

luciana zenti

80/ arqviva

Fotos divulgação

Os revestimentos são feitos à base de uma pedra chamada Pierre Bleu, que ganha efeitos decorativos contemporâneos ao ser esculpida.


_ design e conceito

A

Os detalhes do modelo Luxury 4, da italiana Lithos Design, lembram folhas varridas pelo vento e conferem estilo ao revestimento. Disponível em acabamento dourado.

lta tecnologia, arte e bom gosto dão origem

sensação de que foi arranhada. O resultado

a peças únicas quando combinados na

é um poético jogo de linhas, pontos e curvas

dosagem perfeita. A Lithos Design é prova disso

douradas e prateadas que refletem a luz do

e tem se destacado por fazer com maestria

ambiente e criam um belo efeito decorativo.

essa combinação. A empresa italiana cria e

desenvolve revestimentos de luxo à base de

Raffaello Galiotto. Depois de estudar pintura

pedras naturais, como o mármore. Criada em

na Accademia di Belle Arti (Academia de Belas

2007, a Lithos é hoje reconhecida como uma

Artes) em Veneza, na Itália, ele passou a se

das mais inovadoras do setor no mundo todo.

dedicar ao design industrial. Conquistou diversos

Na linha Luxury Collection, são quatro

prêmios internacionais pelas criações em pedra

modelos que seguem diferentes tendências,

e hoje leciona como professor convidado em

do clássico ao moderno. Os revestimentos são

universidades italianas, além de desenvolver

feitos à base de uma pedra chamada Pierre Bleu,

pesquisas relativas aos diferentes aspectos do

Serviço:

que ganha efeitos decorativos contemporâneos

mármore, como a capacidade de refletir luz e

Lithos Design

ao ser esculpida profundamente, dando a

a sustentabilidade do material.

www.lithosdesign.com

As peças são criações do designer

arqviva /81


_ RECORTE DA CIDADE

Paisagem curitibana

"

A arte é a razão de ser da minha vida.

Dedico-me a ela inteiramente.”

Paulo Dias, artista plástico

82/ arqviva

tela de paulo

dias

Ao retratar uma esquina da Rua Inácio Lustosa, em Curitiba, Paulo Dias brinca com o abstrato e o figurativo. A luz guia formas e texturas, que criam o desenho real dos espaços e objetos retratados no quadro feito em óleo sobre eucatex. Vire a página de ponta cabeça e você verá um quadro abstrato. “A natureza apresenta formas, cores e texturas que são, muitas vezes, mais interessantes do que aquelas que podemos imaginar”, resume o artista autoditada que se dedica à arte contemporânea.




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