Ano 8 • nº 1656 Novembro/2014
Umarizal Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Dona Fátima: empreendedorismo e agricultura familiar Moradora do Sítio Campos, município de Umarizal, no Oeste Potiguar, Fátima Pereira é um exemplo de agricultora familiar que encontrou na agroecologia oportunidades e possibilidades de conviver com o semiárido e gerar renda para a família. Há mais de 8 anos ela trabalha com hortaliças, produzindo verduras e legumes de forma orgânica. Casada com o também agricultor João Batista, 59 anos, foi através da terra que eles conseguiram criar com dignidade seus filhos, três de sangue e um de coração, como ela costuma dizer quando se refere ao adolescente de 10 anos, Eriverton Fernandes, que mora com o casal desde os dois anos. O casal cultiva cheiro verde, couve, alface, cebolinha, pimenta e tomate cereja. Em tempo de inverno bom, eles conseguem colher batata, feijão, milho, macaxeira, jerimum. Além disso, no cercado ainda tem as fruteiras que garantem a família uma alimentação mais saudável como bananeira, mamoeiro, cajueiro, mangueira, laranjeira. Ao redor da casa, Dona Fátima garante que de tudo tem um pouco. “Aqui em casa, eu tenho pé de pau que eu não sei nem o nome”. O pedaço de terra não é muito grande, mas com muito trabalho eles vem construindo um pequeno oásis em meio a vegetação seca que se espalha pelo semiárido em tempo de estiagem. Apesar da pouca água, em cerca de uma hectare, a família mantém um quintal produtivo vivo e resistente às mudanças climáticas. “Todo ano quando falta chuva, a gente ainda consegue manter por um bom tempo nossas hortas tudo verde com a água do cacimbão. Mas tem ano que falta água e a gente perde tudo, mas mesmo assim a gente não desanima, levanta a cabeça e consegue recomeçar do zero. Quando a gente menos espera já está tudo verde de novo”. O único segredo de acordo com o Seu João é o trabalho. O suor aduba a terra e o amor pela agricultura faz com que eles não desistam e continuem resistindo e também buscando alternativas para se conviver com as adversidades do semiárido. “A gente se criou na agricultura, mas agora a gente passou a ter mais cuidado com a terra, com as plantas, e também a se preocupar com o meio ambiente, com a nossa saúde e alimentação”. O casal hoje atua como multiplicadores do conhecimento agroecológico que adquiriram nos últimos anos a partir do acompanhamento técnico da Diaconia.
Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Articulação Semiárido Brasileiro – Rio Grande do Norte
Dona Fátima se orgulha por ser uma das agricultoras que utiliza métodos agroecológicos para produzir alimentos no município. “Tem pessoas que não se preocupam com a qualidade da verdura, mas a maioria dos meus clientes só compram a mim porque sabem que eu não uso veneno. Além disso, eles sempre dizem que meu coentro demora mais tempo para estragar.” Dessa forma, sem utilizar agrotóxico, a família busca solucionar os problemas que surgem com as hortas a partir do que eles têm na propriedade. Para pulverizar as plantas, ela conta que utiliza as folhas do nim para fazer o composto. “Dentro de uma gamela, eu coloco as folhas, misturo com esterco e urina de gado. Boto até pimenta malagueta”, explica. No sábado, ela sai de casa às 5 da manhã. Com verdura e legumes na garupa da moto, a agricultora vai de porta em porta no centro da cidade para vender os produtos e fazer a entrega das encomendas. “Só volto para casa quando consigo vender tudo. Tem dia que eu preciso fazer duas viagens porque a verdura não dar para quem quer”. Ela também vende no sítio para amigos e vizinhos. Além disso, para complementar a renda, o casal ainda produz leite e mel. Por dia, eles conseguem produzir cerca de dezessete (17) litros de leite, que são para o próprio consumo e também comercializados na comunidade. Já o mel, dependendo do ano, eles calculam que conseguem produzir uma média de quatrocentos (400) litros. . Quando tem banana, não dá tempo nem tirar do pé, dona Fátima vende toda a carga por telefone. “na hora que eu vejo que as bananas já estão de vez, eu ligo para as minhas clientes só para elas virem buscar”, conta. Empreendedora, a agricultora também aproveita as frutas que tem no cercado para fazer ‘dindin’, picolé caseiro feito com suco de frutas vendido em saco plástico. A unidade custa 25 centavos e os sabores mais procurados são de coco e de goiaba. Estocadas em garrafas de plástico dentro de um caixão de madeira ou penduradas na meia parede da casa, Dona Fátima guarda o tesouro maior que qualquer agricultor pode ter, as sementes. Algumas delas, o casal planta, desde que veio morar no Sítio Campos, há aproximadamente 14 anos. São sementes de milho, feijão, gergelim, feijão, alface, melancia que garantem a soberania alimentar da família. “Eu tenho a liberdade de plantar o que eu quero comer. Não preciso esperar pela semente do governo. Caiu a primeira chuva, a gente já está preparando a terra para plantar”, destaca Dona Fátima. A esperança de um bom inverno, de uma boa colheita, de dias melhores e de uma boa vida brilha nos olhos da agricultora e estende-se pelo sorriso que nunca desanima, às vezes tímido, mas tão resistente quanto a caatinga que sobrevive à falta de água e aos processos de desertificação. E assim, com um olho na terra e o outro no céu, Dona Fátima, Seu João e o menino Eriverton, assim como todos os outros homens e mulheres do semiárido que vivem da terra, seguem resistindo dia a dia, de verão a verão, semeando com muita perseverança e trabalho um horizonte de coisas belas e verdes.
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