Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Ano 8 • nº1388 Janeiro/2014
Falando de conquistas Na opinião do agricultor Jorgiel, da comunidade Bom Jesus em Tianguá «antes de existir esse projeto de agroecologia em rede a gente tinha dificuldade com questão de assistência técnica, com o projeto veio fortalecer essa assistência e também ajudar a produção, a questão também da comercialização ajudou um pouco, a expandir também o nosso produto, ficar mais visado, porque teve toda uma articulação entre os dois sindicatos, pra tá ajudando, pra tá consolidando isso que a gente já tinha e ajudou bastante». Desse modo, houve a realização de duas grandes feiras uma em Viçosa e outra em Tianguá, onde as famílias tiveram a possibilidade de expor e comercializar aquilo que produziam para a população. Teve também, em Março de 2011 o lançamento de uma cartilha com onze dicas de receitas de defensivos naturais, que reuniam saberes técnicos e também populares das/os próprias/os agricultoras/es. Entre essas e outras conquistas obtidas, pode se considerar como mais relevante a Escola Família Agrícola Chico Antonio Bié que está se tornando realidade na Serra da Ibiapaba. Embora já fosse idealizada antes mesmo do Projeto Agroecologia em Rede, só se tornou possível através dele quando, no momento em que se fazia o diagnóstico, as famílias demandaram uma educação adequada a vida no campo e coerente com a realidade. Como Chico esclarece, «logo no primeiro ano do projeto notou-se claramente a insatisfação de algumas famílias com a educação recebida pelos filhos na escola convencional. Aí rumamos para outra dimensão que foi lutar pela fundação de uma Escola Família Agrícola na Região da Ibiapaba. Em dois anos de luta conseguimos formar a Associação Escola Família Agrícola da Região da Ibiapaba - AEFARI, com esse público vindo do projeto agroecologia em rede». Assim, o projeto que começou com o objetivo de fortalecer a produção agroecológica, ousou ir mais longe e criar uma escola alternativa para que as/os filhas/os tenham a oportunidade de aprender todas as disciplinas do ensino convencional inter-relacionada com sua vivência, cuidando da terra, plantas e animais de forma sustentável, reafirmando sua identidade camponesa e valorizando o trabalho agrícola. A previsão para início das aulas é dia 10 de março de 2014.
Realização
Patrocínio
Tianguá
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Projeto Agroecologia em Rede tecendo fios de uma agricultura e educação no e para o campo «Cultura e produção, Sujeitos da cultura, A nossa agricultura, Pro bem da população...» Gilvan Santos É com o objetivo de valorizar a importância da agricultura, que nos municípios de Tianguá e Viçosa do Ceará, um projeto denominado Agroecologia em Rede vem tecendo saberes entre famílias rurais na realização de capacitações voltadas para a produção agroecológica sustentável, organização coletiva e comercialização, por meio de estudos teóricos e atividades práticas. Essa iniciativa surgiu no ano final do ano de 2009, quando os Sindicatos de Trabalhadoras/es Rurais – STTR's desses dois municípios discutiam a situação das famílias que recebem tecnologias sociais de convivência com o Semiárido, e, o que acontece a partir do momento que as instituições e governos fazem a entrega encerrando sua responsabilidade. Fizeram um levantamento e avaliaram que em muitos casos o uso não estava sendo adequado, talvez por falta de conhecimentos, pois, mesmo tendo passado por cursos de formação durante o processo de recebimento da tecnologia, o tempo é insuficiente para que haja uma aprendizagem satisfatória. Nesse sentido, o projeto foi criado para desenvolver um processo formativo e de assistência, desempenhando o importante papel de dar continuidade às discussões, ampliar conhecimentos e estimular a aplicação dos saberes na prática, «uma coisa é você participar de um encontro e ver um vídeo e aí você perceber
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alguma coisa, e outra coisa é você ter um acompanhamento, você vai tirando as dúvidas, e você vai percebendo a mudança», destaca o agricultor João Jovem da comunidade Areia Branca em Tianguá. Assim, ele ficava disponível quinze dias por mês, sendo uma semana em Tianguá e outra em Viçosa, mas nos momentos de formação e aulas de campo, as famílias dos dois municípios eram reunidas no mesmo espaço, «nossa metodologia de trabalho era em visitas coletivas na dinâmica teórica e prática. As experiências acompanhadas eram os quintais produtivos das cisternas-calçadão do p1+2, sistemas agroflorestais e mandalas», explica Chico. As ações eram planejadas no início do ano, e, tendo em vista que demandavam altas despesas, os sindicatos procuraram apoio em instituições parceiras como a EMATER-CE (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Ceará), a ESPAF (Escola de Formação Política e Cidadania) e o Instituto Agropolos. Esse último contribuiu com as capacitações fornecendo material didático e disponibilizando facilitadores/as, «nós tivemos capacitação em cooperativismo, associativismo, comercialização, defensivos orgânicos...», lembra Manoel Vicente, diretor do STTR de Tianguá. Os sindicatos, por sua vez, articulavam o local para acontecer as formações e a alimentação que era fornecida pelas/os p r ó p r i a s / o s a gr i c u l t o r a s / e s participantes. As outras atividades eram as aulas de campo e os intercâmbios intermunicipais onde as famílias de Tianguá e de Viçosa conheciam as experiências umas das outras, obedecendo a um roteiro e calendário preparados anteriormente. Nessas trocas de conhecimentos, algumas descobriram que já exerciam práticas agroecológicas, mas não sabiam do que se tratava realmente, como diz João Jovem, «a gente já tinha mais ou menos uma noção de trabalhar, no sentido de não queimar, no sentido de florescer perto da casa que era muito quente [...] quando a gente começou participar das reuniões, começou a perceber que estava no caminho certo e que aquilo que a gente tava comprando para se alimentar, poderia estar fazendo em casa: o cheiro verde, o plantio de macaxeira [...]». Vale citar que as atividades eram direcionadas às famílias, mas também mobilizava as comunidades em mutirões, tornando o projeto conhecido e sensibilizando outras pessoas a se interessar pelos saberes ali partilhados. Contudo, uma dificuldade que se apresentou foi o fato de que muitas quiseram e não puderam participar por não ter terra própria e autonomia para produzir. Preparando para a continuidade O projeto iniciou com 16 famílias em Tianguá, 35 em Viçosa do Ceará e com o tempo algumas desistiram e outras foram aderindo. Nesse contexto, as capacitações visavam preparálas para um novo modelo de produção agrícola, mas também, para dar continuidade multiplican-
Articulação Semiárido Brasileiro – Ceará
do os conhecimentos e capacitando outras. João Jovem afirma que, «na maioria das coisas, na questão de poda, na questão de adubação, daqueles defensivos orgânicos, eu acho que a gente tá super preparado para enfrentar o trabalho e preparar mais pessoas». Manoel do Vale, do Assentamento Nova Esperança enfatiza, «eu já faço isso e a mulher hoje conversa com as companheiras dela e as companheiras já estão mudando». Entretanto, no aspecto produtivo o projeto tem sofrido uma paralisação em conseqüência da estiagem dos dois últimos anos em que a produção foi mínima ou inexistente e poucas famílias se mantiveram produzindo, pelo menos para o próprio consumo, é o caso de Manoel do Vale que diz, «com todo fracasso a gente às vezes tira um cachinho de banana, tira umas laranjinha, limão a goiaba também tem uns pés que a gente sempre tira e faz o suco da goiaba, tem a manga também, tem dois pés de acerola que dá muita acerola também». Isso em muito se deve à influência positiva do projeto nas estratégias de aproveitamento da água e cobertura do solo, «se não tivesse orientação, a gente não tinha a consciência e talvez não tinha conseguido manter um pouco de produção», confirma Antonio Feitosa do Assentamento Nova Esperança. Assim, é aguardando a chegada da estação chuvosa que as «famílias continuam participando das ações do sindicato e a gente continua sabendo como está a situação da área», ressalta Manoel Vicente. E, a articulação em rede permanece e se organiza também na luta por uma escola e uma educação que discuta, valorize o meio rural e a realidade agrícola, para que os saberes agroecológicos sejam ensinados às/aos filhas/os dessas e de outras famílias rurais.