Jornal daUnicamp www.unicamp.br/ju
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012 - ANO XXVI - Nº 547 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
IMPRESSO ESPECIAL
9.91.22.9744-6-DR/SPI Unicamp/DGA
CORREIOS
FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT Foto: Leo Caldas/Folhapress
Foto: Divulgação
Imagem: sxc.hu
4
Droga para regime pode desencadear síndrome
5
7
6
Praga traz à tona crise na citricultura
Foto: Divulgação
Foto: Divulgação
Brasileiros ampliam permanência no Japão
Sistema reúne dados do Programa Biota
Foto: Antonio Scarpinetti
9
Engenheiro desenvolve plataforma para robôs
Foto: Divulgação
12
Os muitos sotaques do rap nacional
Muita fatia,
pouca integração 3
Tese desenvolvida por Cláudia Regina Baddini Curralero, no IE, aponta que falta integração entre as políticas sociais de combate à pobreza.
Casal beneficiado com o Bolsa Família na cidade de Porto das Pedras, Alagoas: sem complementariedade
2
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012
Tese mergulha no universo de
viciados em sexo e amor Estudo desenvolvido no IFCH por antropóloga é constituído por três frentes etnográficas Foto: Antonio Scarpinetti
LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitor.unicamp.br
Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso (Amiti), do Hospital das Clínicas de São Paulo, nasceu focado principalmente no jogo patológico – compulsão para jogos de azar que traz prejuízos emocionais, financeiros e sociais a muitas pessoas. Certo dia, um médico foi procurado pela paciente cuja compulsão era discar o número 145 da Telesp, serviço de linhas cruzadas para bate-papo entre três ou mais participantes; acabava marcando encontros com vários deles e assim seu dinheiro esvaía. “Mas qual é o jogo? Sua história não bate com jogo patológico”, indagou o médico. A resposta: “Como não? Eu jogo o jogo do amor”. Ainda que o diálogo não esteja transcrito fielmente, ilustra o surgimento no país da especialidade voltada à adicção (ou vício) em sexo e amor. Foi no Amiti que a antropóloga Carolina Branco de Castro Ferreira realizou parte do trabalho de campo para a sua tese de doutorado, orientada pela professora Adriana Grácia Piscitelli. Intitulada “Desejos regulados: grupos de ajuda mútua, éticas afetivo-sexuais e produção de saberes”, a tese foi defendida em outubro junto ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp. “O vício em sexo e amor é uma categoria relativamente nova, datada de meados da década de 1960, vindo a ser divulgada em diversas mídias e popularizada com mais intensidade nos últimos 20 ou 30 anos”, explica Carolina. Segundo Carolina Ferreira, seu estudo foi constituído por três frentes etnográficas. A primeira junto a associações anônimas de autoajuda frequentadas por pessoas com compulsão sexual e amorosa. A segunda envolvendo a análise e reflexão sobre a circulação desses sujeitos e de livros e outros materiais de autoajuda, bem como da propagação e visibilidade de noções afetivo-sexuais por meio da mídia, novelas e filmes. E a terceira sobre o surgimento de categorias médicas e conceitos “patologizadores” relacionados ao amor e ao sexo. “Na maioria dos trabalhos em ciências sociais, pensa-se o surgimento de uma categoria médica e como esta categoria influi na vida das pessoas. Eu fiz o contrário, começando o trabalho de campo pelos grupos anônimos, considerados como produtores de saberes, de uma expertise leiga”, informa a antropóloga. “Fui até o Mada – Mulheres que Amam Demais Autônomas – e percebi que as mulheres não frequentavam apenas aquele grupo, mas muitos. Isso porque elas explicam a adicção sexual e amorosa a partir, também, de um endividamento pessoal por causa do uso de medicamentos, álcool ou drogas; havia uma narrativa que conectava vários vícios.” Ao seguir o circuito percorrido por essas pessoas, Carolina constatou que não valia a pena se ocupar de apenas um grupo, mas observar o fluxo dentro de uma rede de variados grupos. “A primeira dessas entidades no Brasil foi dos Alcoólicos Anônimos (AAA), que teve a sua metodologia adaptada para outras categorias, como de neuróticos, introvertidos e narcóticos anônimos. Eles funcionam baseados sobretudo na experiência: se digo que sou alcoólatra ou viciado em sexo, este dizer legitima
mercado do sexo, como por clientes de prostitutas ou viciados em vídeos e revistas de pornografia. Para lidar com uma suposta falta, eles utilizam esta categoria de anorexia, que seria um transtorno físico-moral.”
REGULAÇÃO DOS DESEJOS
A antropóloga Carolina Branco de Castro Ferreira, autora do estudo: abordando o surgimento de categorias médicas e psicológicas
a experiência e por isso posso participar do grupo. Não há mediação de especialistas, embora muitos se relacionem com médicos ou psicólogos.” Mas, afinal, quem é o viciado em sexo e amor? “Segundo eles próprios, é aquele que não fica sem se apaixonar, sem um relacionamento”, diz a pesquisadora. “Existem vários jogos nisso. Quando surge a figura do adicto sexual, a sua cara é de homem. Dez anos depois o problema é associado à mulher, que só aparece como viciada em sexo quando o amor entra em cena. No limite, é para não perder a parceria de determinados homens que a mulher, segundo discursos de especialistas, se submete a fazer sexo na hora que não quer ou com quem não quer. Produzindo a noção de dependência emocional, de amor. Vejo esta forte marca de gênero, tanto por parte de quem frequenta os grupos, como na visão médica.” Carolina Ferreira afirma na tese que o conjunto de informações colhidas revelou que a socialidade produzida nos grupos anô-
nimos opera a partir de ideias e categorias específicas. “Nesta socialidade, o engajamento emocional envolve a produção de teorias nativas da doença e horizontes éticos afetivosexuais criados a partir de práticas pedagógicas no âmbito amoroso-sexual. Há uma espécie de bricolagem entre saberes médicos e psicológicos. Também entram noções de uma religiosidade laicizada: a crença em um poder superior, não de um Deus como o concebido, mas de um deus transcendente, criado na imanência das relações colocadas em jogo nos grupos.” Um exemplo de teoria nativa da doença, de acordo com a autora da pesquisa, é a ideia de uma anorexia social, sexual e emocional, que ela não encontrou no hospital ou nos livros de autoajuda. “A teoria é para um transtorno de outra ordem, não a anorexia como a conhecemos, mas de uma metáfora para tratar de determinadas tensões, principalmente nas relações sociais: a busca de parcerias afetivo-sexuais por parte das mulheres e, no caso dos homens, as relações travadas no
Na tese, Carolina procurou abordar o aparecimento de determinadas categorias médicas e psicológicas que “patologizam” a sexualidade, no intuito de regular alguns comportamentos e desejos. “A adicção em sexo e amor está dentro do conceito de vício, de compulsão. Existe uma diferencial na produção e nas relações de saberes entre os grupos de autoajuda e o campo médico, principalmente diante de toda uma discussão sobre o uso de medicamentos. Embora o Amiti, no caso, priorize bastante os tratamentos terapêuticos em grupos, uma questão que merece atenção no que se refere à regulação da sexualidade é o uso de medicamentos e da relação pejorativa que pode se estabelecer entre identidades e práticas sexuais.” Agora em 2012, lembra a antropóloga, o chamado hypersexual disorder aparece incluído na quinta revisão do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM, na sigla em inglês), publicação da Associação Americana de Psiquiatria que lista diferentes categorias de transtornos mentais e critérios para diagnosticá-los. “Os grupos, produzem as próprias categoria, mas vejo um diferencial na relação de poder quando certas convenções saem do campo leigo e entram para o campo médico-científico. É uma janela de pesquisa que se abre.” Segundo Carolina, as categorias leigas que circulam dentro dos grupos anônimos produzem conhecimentos que acabam bastante difundidos, por exemplo, através dos livros de autoajuda. “Desde a década de 90, houve no Brasil um aumento de 270% desses títulos no mercado editorial. Essas categorias vulgatas servem um pouco como intermediários culturais, tradutores de um saber médico-científico para a linguagem mais popular, mas também acabam produzindo conhecimento.” Outro aspecto interessante ressaltado por Carolina Ferreira é o que os participantes buscam dentro dos grupos. “Há uma busca de éticas afetivo-sexuais em que essas pessoas nem são bonecos normatizados pelo que o grupo diz, tampouco possuem livre arbítrio para fazer escolhas que não estejam reguladas por questões sociais. Os grupos abrem um horizonte de gradientes pelos quais as pessoas vão se movimentando, se aproximando ou se afastando de noções consideradas transgressoras, adquirindo competências emocionais com as quais vão jogar em outros campos sociais, como por exemplo, na busca de parcerias amorosas e de um trabalho melhor, produzindo noções de mobilidade e de ascensão social. No começo da pesquisa, imaginava que os grupos eram frequentados por pessoas de classes alta e média, que vão ao psicanalista. Mas eu sugeriria que vem ocorrendo uma popularização cada vez maior, abrindo o leque para classes média/média e média/baixa.”
Publicação Tese: “Desejos regulados: grupos de ajuda mútua, éticas afetivo-sexuais e produção de saberes” Autora: Carolina Branco de Castro Ferreira Orientadora: Adriana Grácia Piscitelli Unidade: Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH)
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas Reitor Fernando Ferreira Costa Coordenador-Geral Edgar Salvadori De Decca Pró-reitor de Desenvolvimento Universitário Roberto Rodrigues Paes Pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários João Frederico da Costa Azevedo Meyer Pró-reitor de Pesquisa Ronaldo Aloise Pilli Pró-reitor de Pós-Graduação Euclides de Mesquita Neto Pró-reitor de Graduação Marcelo Knobel Chefe de Gabinete José Ranali
Elaborado pela Assessoria de Imprensa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Periodicidade semanal. Correspondência e sugestões Cidade Universitária “Zeferino Vaz”, CEP 13081-970, Campinas-SP. Telefones (019) 3521-5108, 3521-5109, 3521-5111. Site http://www.unicamp.br/ju. E-mail leitorju@reitoria.unicamp.br. Twitter http://twitter.com/jornaldaunicamp Assessor Chefe Clayton Levy Editor Álvaro Kassab (kassab@reitoria.unicamp.br) Chefia de reportagem Raquel do Carmo Santos (kel@unicamp.br) Reportagem Carmo Gallo Neto Isabel Gardenal, Maria Alice da Cruz e Manuel Alves Filho Editor de fotografia Antoninho Perri Fotos Antoninho Perri e Antonio Scarpinetti Coordenador de Arte Luis Paulo Silva Editor de Arte Joaquim Daldin Miguel Vida Acadêmica Hélio Costa Júnior Atendimento à imprensa Ronei Thezolin, Patrícia Lauretti e Jaqueline Lopes. Serviços técnicos Dulcinéa Bordignon Everaldo Silva Impressão Pigma Gráfica e Editora Ltda: (011) 4223-5911 Publicidade JCPR Publicidade e Propaganda: (019) 3327-0894. Assine o jornal on line: www.unicamp.br/assineju
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012
3 Foto: Fernando Canzian/Folhapress
MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br
Brasil conta com políticas sociais de combate à pobreza bem-estruturadas, mas o país ainda não conseguiu fazer com que elas cheguem de forma integrada a todos os necessitados. A constatação faz parte da tese de doutoramento da economista Cláudia Regina Baddini Curralero, defendida recentemente no Instituto de Economia (IE) da Unicamp, sob a orientação do professor Claudio Salvadori Dedecca. De acordo com a autora do trabalho, o problema ocorre porque existe uma fragmentação no interior dessas políticas sociais, que debilita a complementariedade entre elas. “O que ocorre com frequência é que uma política não atua reforçando os resultados da outra ao longo do ciclo de vida das famílias pobres”, afirma. Em sua tese, Cláudia Curralero promoveu uma ampla análise das políticas sociais implementadas no Brasil entre os anos de 2003 e 2010, com especial atenção ao Bolsa Família, programa de transferência direta de renda lançado na administração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Considerada um sucesso pelo governo federal, a iniciativa, que completou nove anos no último dia 20 de outubro, alcança aproximadamente 50 milhões de pessoas com renda familiar per capita inferior a R$ 140,00 mensais, a um custo de 0,46% do Produto Interno Bruto (PIB). Quando o Bolsa Família foi implementado, conforme a pesquisadora, as áreas de saúde e educação no Brasil já estavam bem-estruturadas no país, o que possibilitou que o programa atuasse de forma a reforçar o direito de acesso a esses serviços básicos. “Isso assegurou, além do alívio imediato da pobreza por meio da transferência de renda, o apoio para a superação do ciclo intergeracional de pobreza”, diz Cláudia Curralero. Pelas normas do programa, as famílias beneficiárias assumem o compromisso de acompanhar o cartão de vacinação e o crescimento e desenvolvimento das crianças menores de 7 anos. Já as mulheres na faixa de 14 a 44 anos também se comprometem a fazer acompanhamento médico e, se gestantes ou nutrizes (lactantes), devem realizar o pré-natal e a verificação contínua da sua saúde e a do bebê. Na área da educação, todas as crianças e adolescentes entre 6 e 15 anos devem estar devidamente matriculados e com frequência escolar mensal mínima de 85% da carga horária. Os estudantes entre 16 e 17 anos devem ter frequência de, no mínimo, 75%. “São questões importantes, e que experimentaram avanços nos últimos nove anos. A despeito disso, ainda é possível identificar desigualdades dentro dessas áreas. Ao analisarmos os indicadores, constatamos que os mais pobres continuam apresentando menor nível de escolaridade e maiores dificuldades de acesso à saúde. Ou seja, ainda que sejam universais, essas políticas continuam reproduzindo desigualdades já presentes na sociedade brasileira”, sustenta. Uma das origens do problema, no entender de Cláudia Curralero, está na fragmentação e na falta de articulação entre as políticas sociais. “Um exemplo que costumo citar é o das mães que têm à sua disposição cursos profissionalizantes. Entretanto, elas encontram muitas dificuldades para frequentar as aulas porque não contam com creches, e, portanto, não têm com quem deixar os filhos. Assim, mesmo que conseguissem concluir o curso, elas dificilmente teriam como ingressar no mercado de trabalho, pois continuariam não dispondo de creches. Ou seja, as políticas, por mais positivas que sejam, não se complementam. O resultado da soma dos esforços de cada área, dada a fragmentação e pouca articulação na implementação, é menor do que poderia ser caso fossem contabilizados os ganhos de sinergia de uma atuação mais articulada e integrada. Dessa forma, ainda que o gasto social no Brasil seja considerável, ele pode se tornar mais eficiente para o enfrentamento da pobreza”, considera a autora da tese. A busca por ações mais articuladas e integradas, reconhece Cláudia Curralero, não é uma tarefa trivial de ser cumprida. De acordo com ela, alguns fatores dificultam esse trabalho. Mesmo estando bemestruturadas, as áreas de saúde e educação servem novamente como exemplo dos problemas que ainda esperam por solução. Na primeira, por exemplo, existe a dificuldade de um “diálogo” mais efetivo entre atenção básica e os níveis mais complexos de atendimento à população. No caso da segunda,
Família beneficiada com o programa Bolsa Família, em Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco: superação do ciclo intergeracional de pobreza
Falta sinergia Estudo aponta ausência de complementariedade entre as políticas sociais de combate à pobreza Foto: Divulgação
A economista Cláudia Curralero, autora da tese: “Uma política não atua reforçando os resultados da outra ao longo do ciclo de vida das famílias pobres”
os obstáculos são ainda maiores. “Na educação, o retrato é ainda mais fragmentado, pois não existe um sistema único como na saúde. O ensino fundamental, por exemplo, é de responsabilidade dos municípios. O ensino médio, por sua vez, cabe aos estados. Na realidade, temos milhares de sistemas educacionais no país, o que dificulta a coordenação e monitoramento por parte do governo federal”, diz. Mesmo admitindo toda essa complexidade, Cláudia Curralero pensa ser possível desenhar e integrar as políticas sociais de tal forma que elas cheguem às famílias pobres. A economista destaca que cabe aos agentes públicos [nos níveis federal, estadual e municipal] buscar um diálogo nesse sentido. “Penso que isso é perfeitamente exequível, pois existem instrumentos que podem auxiliar nessa tarefa”, afirma. Uma das ferramentas a que a autora da tese se refere é o Cadastro Único. Ele permite conhecer a realidade socioeconômica das famílias de baixa renda. Entre as informações disponíveis estão as características do domicílio, as formas de acesso a serviços públicos essenciais e dados sobre cada um dos componentes da família. Em suma, o Cadastro Único possibilita observar as diferenças existentes entre
o pobre que vive numa região metropolitana como a de São Paulo e aquele que mora na caatinga nordestina, para ficar em um único exemplo. Cada um deles, obviamente, apresenta carências específicas. “Através das informações contidas no cadastro é possível desenhar políticas públicas de acordo com as necessidades regionais. Dessa forma, além de trabalhar ações mais integradoras, que garantam o acesso a todos os necessitados, é possível articular também um plano de desenvolvimento regional. Nesse caso, os estados teriam um papel importante a cumprir, pois cada um tem uma vocação econômica própria”, pondera a autora da tese. Questionada sobre se essas deficiências poderiam significar que os investimentos feitos pelo país em políticas sociais estariam sendo desperdiçados, Cláudia Curralero responde que o que ocorre é que os investimentos não estão surtindo o máximo de resultado possível, por causa justamente das falhas mencionadas. “Eu me lembro de um caso que chegou ao MDS, sobre uma mãe, beneficiária do Bolsa Família, que estava em depressão. Por causa da doença, a mulher não tinha condições de cuidar dos filhos menores. Assim, a filha mais velha teve que deixar de ir à escola para olhar os irmãos, por falta de creche. Ou seja, a ofer-
ta de vaga existia, mas a adolescente não tinha condições de frequentar a escola. No caso de quem tem dinheiro, esse é um problema superável. Basta pagar uma creche particular ou contratar uma babá. No caso dos pobres, não tem saída. Se a política pública não é abrangente, acentuam-se as vulnerabilidades. É por isso que as ações precisam ser mais integradas e sinérgicas”, reforça a autora da tese. Quanto às críticas que algumas correntes fazem de que programas como o Bolsa Família são meramente assistencialistas e não promovem a autonomia dos beneficiários, a economista observa que as políticas buscam conferir essa independência, mas nem sempre conseguem. Isso se dá, segundo ela, por causa das vulnerabilidades anteriores relacionadas às próprias condições de vida, escolarização, acesso à saúde e condições de moradia, que condicionam a inserção produtiva dos mais pobres. “A pobreza, com todas as suas facetas, dificulta a inserção no mercado de trabalho. Questões como o nível de escolarização, as condições gerais de vida e até mesmo a aparência acabam pesando nas oportunidades que se colocam para os mais pobres. A transferência de renda possibilita que as famílias se mobilizem para buscar trabalho e mais acesso a outras políticas. Por isso, não são assistencialistas, pois complementam a ação das outras políticas sociais”, acrescenta. A pesquisadora adverte, por fim, que o seu estudo não levou em consideração o Plano Brasil Sem Miséria, lançado em junho de 2011. O objetivo da iniciativa é retirar da pobreza extrema cerca de 16 milhões de pessoas que, de tão desamparadas, podem não ter conseguido se inscrever em outros programas sociais, como o Bolsa Família, e ainda tem dificuldades de acessar serviços essenciais como água, luz, educação, saúde e moradia. “Aparentemente, o Brasil Sem Miséria responde a algumas das deficiências que são discutidas na minha tese”, conclui Cláudia Curralero.
Publicação Tese: “O enfrentamento da pobreza como desafio para as políticas sociais no Brasil: uma análise a partir do Programa Bolsa Família” Autora: Cláudia Regina Baddini Curralero Orientador: Claudio Salvadori Dedecca Unidade: Instituto de Economia (IE)
4
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012
Fármaco para emagrecer pode
provocar síndrome, aponta estudo
Dissertação demonstra que medicamento pode alterar perfil de ácidos graxos no organismo Foto: Antoninho Perri
ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br
fármaco orlistate, o mesmo princípio ativo do xenical ou alli, indicado no tratamento da obesidade (que hoje atinge a casa dos 30% na população mundial), provou que pode alterar o perfil de ácidos graxos do organismo humano e que, em longo prazo, pode levar a uma síndrome caracterizada por esta deficiência. Foi o que apontou uma pesquisa de mestrado realizada no Instituto de Química (IQ), de autoria de Thiago Inácio Barros Lopes. O estudo, que envolveu 20 mulheres atendidas no Laboratório de Pesquisa em Metabolismo e Diabetes (Limed) do Gastrocentro, avaliou as mudanças do perfil lipídico das pacientes com sobrepeso tratadas com essa droga. Na pesquisa, orientada pela docente do IQ Anita Jocelyne Marsaioli, o orlistate diminuiu a absorção de ácidos graxos e, durante análise metabólica, promoveu algumas alterações no nível de ácidos graxos essenciais (aqueles que o organismo não consegue produzir) e outros metabólitos como o lactato (produzido após a queima de glicose para o fornecimento de energia, sem a presença de O2), além de uma ligeira redução de cálcio das pacientes investigadas. Essas mulheres estavam na faixa dos 40 anos, num período pré-menopausa, com IMC entre 25 e 30. Conforme Thiago, elas foram escolhidas pelo fato de o sexo feminino ser o gênero que mais faz uso, no momento, de medicamentos para emagrecer. O uso do orlistate, explica o autor, impede a absorção de gordura e também diminui a ocorrência de alguns compostos absorvidos com a gordura. O mestrando constatou então que o medicamento não interfere apenas no perfil lipídico, que envolve uma série de exames para determinar dosagens de colesteral total, HDL LDL E triglicerídios. Os seus efeitos vão para além da perda de peso, como a diminuição das taxas de colesterol. Os ácidos graxos essenciais são blocos construtores de lipídios para todas as células do corpo, pois exercem funções como produção de energia, aumento do metabolismo e crescimento muscular, transporte de oxigênio, crescimento normal celular e regulação hormonal, entre outras. Com sua queda, as pessoas ficam mais sujeitas ao aparecimento de síndromes. Apesar disso, Thiago assinala que esse problema pode ser facilmente resolvido com a suplementação de nutrientes e com medidas para conter a diminuição do nível de cálcio. Ao comparar o seu estudo com outros da literatura, o químico notou que a alteração no perfil lipídico de ácidos graxos, criada pelo orlistate, é similar à que ocorre com a dieta de restrição, onde o nível de gordura diminui. “O seu mecanismo de ação, já que não é absorvido sistemicamente e atua só no trato gastrointestinal como inibidor de lipases gástricas, realmente está correto”, admite Thiago. Essa droga age no sistema digestivo impedindo que a gordura consumida seja absorvida pelo organismo e traga ganho de peso. Ela foi descoberta na década de 1990 e bloqueia a absorção de até 30% das gorduras ingeridas por meio da inibição da enzima lipase, responsável pela digestão das gorduras. Em 2009, recorda o autor, expirou a patente do medicamento, que era de propriedade do laboratório suíço Roche, mas genéricos já podem ser encontrados no mercado de fármacos. Na opinião dele, essa chance é muito oportuna pois, em mais de dez anos de uso, foram raríssimos os relatos de efeitos inesperados, sobretudo diante da sua vasta procura. Além do mais, também o preço, mais competitivo, ajuda a popularizar o produto, permitindo o consumo mais massivo pelas classes menos favorecidas.
SOBREPESO
Por outro lado, o mestrando reconhece que a perda de peso com o orlistate ainda
Thiago Inácio Barros Lopes, autor do estudo: próxima etapa será a avaliação de pacientes que passam por cirurgia bariátrica
é modesta. Em geral, perde-se de três a seis quilos ao ano, quando em conjunto com a dieta, o que é muito menos que a expectativa dos pacientes obesos. Este é um gargalo, acentua ele. Outro gargalo é que os efeitos colaterais, embora não sendo sérios, são no mínimo incômodos, visto que o usuário do medicamento terá que lidar com incontinência e urgência fecais, dificultando a sua ida ao trabalho ou à escola. A despeito dessa droga ser indicada para pessoas com obesidade (IMC acima de 30), o pesquisador partiu para avaliação de pacientes com sobrepeso, cujo perfil lipídico é um pouco distinto. Não havia estudos mais aprofundados sobre os efeitos em nível plasmático do orlistate nessa classe de pacientes, realça Thiago. Ele avaliou vários fatores, como as alterações no perfil de ácidos graxos, uma vez que, por ser um inibidor na absorção de lipídios (gorduras), acaba modificando esse perfil, com impactos no nível de ácidos graxos nos eritrócitos e no metabolismo, verificados mediante uma abordagem metabolômica. Esse tipo de abordagem permite identificar e quantificar o conjunto de metabólicos – o metaboloma – produzido ou modificado por um organismo, avaliando-se os diversos metabólitos presentes no plasma, entre eles níveis de glicose, lactato e até mesmo o nível de cálcio e de magnésio no plasma. Na pesquisa, colaborativa com a Faculdade de Ciências Médicas (FCM), foi administrado o fármaco às pacientes, acompanhada a sua perda de peso e colhidas amostras de seu perfil lipídico. Thiago trabalhou com as amostras já colhidas e cedidas pelo grupo dos endocrinologistas Bruno Geloneze Neto e Sabrina Nagassaki.
PROCESSO
Ainda que o fármaco promova a per-
da de gordura, é desejável que ele venha aliado a uma dieta balanceada e a exercícios físicos porque, quando se faz um tratamento, além de usar o fármaco, sempre existe uma dieta de restrição. Assim, se ingerido o fármaco e ao mesmo tempo gordura, o paciente terá uma maior urgência fecal, com uma presença frequente de óleo nas fezes. Somente este motivo já levaria a pessoa a naturalmente diminuir a ingestão de gorduras, garante ele. Agora, nada impede que o orlistate seja usado continuamente. Há estudos, inclusive, mostrando que, empregado pelo tempo de quatro a cinco anos, o fármaco não causa prejuízos pessoais, dimensiona o pesquisador. De outra via, a despeito de seu estudo ter sido curto, 120 dias, esse tempo foi intencional porque o autor estava sobremodo interessado no efeito do orlistate no perfil de ácidos graxos na membrana de eritrócitos, a qual tem um tempo de vida de 120 dias, tempo necessário para que os eritrócitos sejam reciclados pelo organismo. Os eritrócitos, ensina o mestrando, são os glóbulos vermelhos do sangue, que se expressam no transporte do oxigênio. É importante estudá-los, afirma, porque qualquer alteração no perfil de ácidos graxos, e da membrana de eritrócitos, pode desencadear arteriosclerose e doenças cardiovasculares. Outros estudos têm sugerido que o fármaco produz uma toxicidade no fígado, fato ainda não comprovado. Em oposição, alguns estudos têm demonstrado que o orlistate age contra células tumorais da próstata, inibindo a enzima ácido graxo sintetase e a proliferação de células cancerígenas. A vantagem do orlistate, em relação aos medicamentos que se usam hoje, está em seu modo de atuação, que fica mais restrito ao sistema gastrointestinal, ao contrário, por exemplo, da sibutra-
mina, muito utilizada e que atua diretamente no sistema nervoso central. Thiago conta que o seu estudo procurou ser esclarecedor por avaliar as interações num novo grupo de pacientes – com sobrepeso. Também foi um dos primeiros que fez uma abordagem metabolômica com os pacientes tratados com orlistate em que foram analisados todos os metabólitos (pequenas moléculas) presentes no plasma, e não somente metabólitos selecionados. “Mas trata-se de resultados ainda preliminares”, situa. A professora Anita Marsaioli comenta que o estudo de seu aluno conseguiu estabelecer uma importante cooperação com a Medicina, inserindo a Química como um apoio. “Isso foi muito bom porque os médicos deram-nos um bom retorno, e o meu aluno respondeu às questões com seriedade e trabalho”, relata. “Sem essa colaboração, não iríamos a lugar algum. É preciso olhar ao nosso redor, pois há muita coisa interessante acontecendo e que pode gerar outras perguntas de pesquisa.” No doutorado, Thiago estuda os pacientes que passaram pela cirurgia bariátrica. Serão avaliadas as alterações metabólicas que ocorrem com eles, partindo de análise do plasma para ver as suas consequências.
Publicação Dissertação: “Avaliação do perfil de ácidos graxos em pacientes com sobrepeso tratados com orlistate usando CG-EM e avaliação do perfil metabólico de plasma por RMN de 1H” Autor: Thiago Inácio Barros Lopes Orientadora: Anita Jocelyne Marsaioli Unidade: Instituto de Química (IQ)
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012
5
Um sistema de
informação para o Biota Pesquisadora sistematiza dados, promovendo a integração do conhecimento ecológico Fotos: Divulgação
LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitor.unicamp.br
rande parte do conhecimento científico sobre a biodiversidade e ecossistemas brasileiros encontra-se dispersa, mal documentada e inacessível aos interessados, quando a integração das informações poderia orientar a tomada de decisões para conservação, gestão ambiental e para novas descobertas. A tese de doutorado de Debora Pignatari Drucker vem nesta direção, ao desenvolver um sistema de informação para o Projeto Temático Biota Gradiente Funcional da Fapesp, liderado pela Unicamp. A pesquisa, desenvolvida no Programa de Doutorado Interdisciplinar em Ambiente e Sociedade, sediado no Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam), teve a orientação do professor Carlos Alfredo Joly, do Instituto de Biologia (IB), e coorientação da professora Leila da Costa Ferreira, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH). “Já vinha trabalhando nesta área de gestão da informação sobre biodiversidade no INPA [Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, MCTI], em Manaus, quando conheci o professor Joly”, recorda Debora Drucker. “Como ele foi um dos responsáveis pela criação do Sinbiota [Sistema de Informação Ambiental do Programa Biota], conversamos sobre a possibilidade de uma parceria. O Sinbiota tem enfoque maior nos desafios de se gerenciar dados taxonômicos e identificamos a possibilidade de complementar essa abordagem com um estudo que envolvesse também dados ecológicos”. A pesquisadora explica que os dados ecológicos comumente contemplam atributos quantificáveis de organismos e de ecossistemas, bem como de suas interações, e não necessariamente relacionados com entidades taxonômicas determinadas. “O professor Joly manifestou interesse em um estudo para o Biota Gradiente Funcional – um projeto de grande porte envolvendo estudiosos das mais diferentes temáticas da biodiversidade e de diferentes instituições, o qual revelouse como um estudo de caso interessante para testar novas ferramentas. Para isso, tivemos a parceria de José Augusto Salim, na época aluno Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação, na parte de desenvolvimento de software.” Para dar uma ideia da dimensão do projeto, Carlos Joly informa que o mesmo gerou 33 mestrados e 25 doutorados, reunindo pesquisadores do Departamento Biologia Vegetal da Unicamp, do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Instituto de Botânica (IBt), Instituto de Biociências da Unesp (Rio Claro), principalmente da área de taxonomia; do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena/USP), na área de isótopos de carbono e nitrogênio; do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG/USP), nas trocas de CO2 entre a floresta e a atmosfera; bem como da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), da Universidade de Taubaté (Unitau), do Instituto Florestal e da Fundação Florestal. Joly explica que as pesquisas focaram a mata Atlântica, na vertente entre Ubatuba e São Luís do Paraitinga, onde estão localizados os núcleos Picinguaba e Santa Virgínia do Parque Estadual da Serra do Mar. “Pelo conjunto de pessoas e instituições envolvidas, havia a necessidade de um sistema para organizar toda a informação que foi e ainda está sendo gerada. Isso porque o projeto, embora já tenha terminado enquanto temático, continua sendo desenvolvido com auxílios à pesquisa, por mim e por outros pesquisadores do grupo”.
VISUALIZAÇÃO ESPACIAL
No propósito de contribuir para a criação de uma infraestrutura de informação que sirva como ponte entre a ciência e os processos de tomada de decisão em conservação e gestão ambiental, a autora procurou ferramentas de gerenciamento de dados já existentes, visando promover a integração do conhecimento ecológico. E também desenvolveu
As pesquisas focaram a mata Atlântica, na vertente entre Ubatuba e São Luís do Paraitinga; no detalhe, subparcelas: visualização espacial dos dados
Foto: Antoninho Perri
O professor Carlos Joly, orientador, e Debora Pignatari Drucker, autora da tese: informações integradas
uma ferramenta nova, que permite a visualização espacial dos dados. “Conseguimos visualizar todos os indivíduos arbóreos coletados nas parcelas, sobrepostos a imagens do Google.” Debora catalogou levantamentos de 30 subprojetos de pesquisa do projeto temático, a fim de obter detalhes e dados das pesquisas em andamento e finalizadas. “Apesar de não haver acordos prévios quanto à disponibilização dos dados, muitos se dispuseram a colaborar. Este compartilhamento de informações representa uma nova cultura e o contato com os pesquisadores proporcionou um enorme aprendizado: tanto sobre o amplo universo das pesquisas desenvolvidas, quanto sobre a relação das pessoas com seus objetos de pesquisa e, consequentemente, com os dados por elas levantados.” Em sua tese de doutorado, a pesquisadora conclui que o sistema se mostrou eficiente para gerenciar os dados e metadados fornecidos pelos pesquisadores. “Foi possível recuperar a informação por consultas tanto ao catálogo de metadados, pelo uso de palavraschave, quanto à base de dados, pela seleção de variáveis e de parâmetros temporais e espaciais. A possibilidade de consultar qualquer variável de interesse, independentemente da associação com uma entidade taxonômica, configura um sistema de informação sobre biodiversidade original e inovador”, escreve. Debora Drucker admite que quando iniciou o trabalho, supôs que teria o sistema rodando perfeitamente no final, até perceber a importância de se assegurar um arcabouço
institucional que permita perpetuar a iniciativa no longo prazo. “O sistema ainda está muito artesanal. Atualmente, se algo acontece com o servidor, sou eu que verifico o problema, mesmo não tendo mais vínculos com a Unicamp [hoje é analista da Embrapa]. O sistema deve estar sob um guarda-chuva institucional maior, como do Biota Fapesp ou da Unicamp, que possibilite a manutenção adequada e o amadurecimento e integração de novas funcionalidades.” Uma possibilidade a ser negociada, de acordo com o professor Carlos Joly, deriva da contrapartida oferecida pela Unicamp ao Biota Fapesp, que envolveu um acordo com o Cenapad-SP (Centro Nacional de Processamento de Alto Desempenho, sediado no campus) para armazenamento das bases de dados. “O ideal é que o sistema fique neste arcabouço, com toda a segurança oferecida pelo Cenapad em termos de capacidade técnica, equipamentos e infraestrutura”, afirma o docente.
NA LINHA DE FRENTE
A própria autora da tese, por seu lado, já mantém uma interface com o que está sendo desenvolvido na linha de frente da gestão da informação sobre biodiversidade e ecossistemas, na Universidade da Califórnia (EUA). “Uma equipe do NCEAS (National Center for Ecological Analisys and Synthesis, de Santa Bárbara), em conjunto com outras instituições americanas, desenvolveu algumas das ferramentas que implementamos aqui. Agora, essa equipe faz parte de uma iniciativa de
maior porte, chamada DataONE (Data Observation Network for Earth), que pretende integrar dados de biodiversidade e ecológicos com outros dados relevantes para a compreensão e monitoramento do sistema terrestre, como dados climáticos, socioeconômicos e de agropecuária, inclusive aqueles obtidos por sensoriamento remoto.” Debora esclarece que dentro do universo da informação sobre o sistema terrestre coexistem muitas iniciativas de gestão da informação, mas de forma fragmentada, havendo a necessidade de que se conversem – e ferramentas utilizadas por ela estão sendo aprimoradas pela rede DataONE na busca desta conexão. “Nosso sistema está apto a se conectar com iniciativas pioneiras e de grande porte – daí termos adotado normas mundialmente consagradas. Mas ressalto na tese que uma infraestrutura de informação é composta também por regras e acordos, com ênfase na importância das pessoas em todas as etapas, envolvendo o pessoal de desenvolvimento, curadoria, pesquisadores e usuários.” Segundo Carlos Joly, o trabalho de sua orientada tem contribuído tanto com o PPBio (Programa de Pesquisa em Biodiversidade), do MCTI, e com o PELD (Programa de Pesquisas Ecológicas de Longa Duração), do CNPq, como para a estratégia nacional envolvendo o Sistema de Informação sobre a Biodiversidade Brasileira (SiBBr), que está sendo desenvolvido pelo MCTI e do qual Debora é membro do Comitê Técnico Consultivo. “Temos um conjunto grande de iniciativas bem-sucedidas no país, mas falta interação. O MCTI busca isso, ao trazer profissionais do INPA, Jardim Botânico, RNP, MMA, IBGE, EMBRAPA, do LNCC e da Politécnica da USP, com diferentes experiências, para subsidiar decisões visando formar um conjunto integrado. No cenário internacional, o Brasil tornou-se recentemente participante do Global Biodiversity Information Facility (GBIF), que reúne dados de biodiversidade do mundo inteiro.”
Publicações Tese: “A integração da informação sobre biodiversidade e ecossistemas para embasar políticas de conservação” Autora: Debora Pignatari Drucker Orientador: Carlos Alfredo Joly Coorientadora: Leila da Costa Ferreira Unidades: Instituto de Biologia (IB) e Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH).
6
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012
Os pequenos pagam a conta Tese analisa implicações do combate à bactéria que destrói laranjais em São Paulo Fotos: Antonio Scarpinetti
CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br
m meados deste ano, destacouse no noticiário a crise enfrentada pelos produtores de laranja do interior do Estado de São Paulo. Por falta de compradores, as frutas apodreceram nos pés e parte delas foi distribuída à população. A grande safra e o excesso dos estoques acumulados nas indústrias em decorrência das sanções comerciais impostas pelos EUA à compra do suco brasileiro, devido à utilização do agrotóxico carbendazim, determinaram o não cumprimento dos contratos estabelecidos entre as empresas processadoras de suco e produtores que buscaram apoio governamental. Reunidos em Taquaritinga (SP), produtores vindos das cidades paulistas de Itápolis, Ibitinga, Bebedouro, Matão, Araraquara e Catanduva reivindicaram do governo estadual medidas que estimulassem o consumo do suco e garantissem a venda da fruta. Decididos a partir para outros cultivos, citricultores em protesto derrubaram em plena safra centenas de árvores. A cultura da laranja tem particular importância econômica e social no país, particularmente no Estado de São Paulo, onde está concentrada, pelo volume de gente que emprega na colheita e no processamento industrial. Líder mundial, o Brasil contribuiu com cerca de 25% da produção entre 2011 e 2012, destinando 80% dela à industrialização do suco concentrado e congelado para atender principalmente as demandas dos EUA, da Europa e Ásia, e destinando 20% do restante para o consumo interno in natura. As manifestações dos citricultores trazem à tona apenas alguns dos problemas que afetam a complexa cadeia produtiva global do suco de laranja que envolve diferentes atores nacionais e internacionais. Com o objetivo de apresentar os principais atores da cadeia produtiva do suco de laranja no Brasil e as relações estabelecidas entre eles, Gabriela da Rocha Barbosa, graduada em administração e com mestrado em engenharia de produção, deteve-se no estudo das controvérsias que permeiam a produção de laranja no Estado de São Paulo, a partir do exame das tecnologias de combate ao Huanglongbing ou greening, doença que ataca os laranjais, causada por bactéria e transmutada por inseto. A doença espalhou-se em 2004 e atingiu o ápice em 2009. As soluções até agora adotadas para seu controle se mostram pouco exitosas. Os embates e as negociações em torno das formas de combate à doença constituem o estudo de caso central da tese apresentada no Programa de Pós Graduação em Política Científica e Tecnológica, do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp, orientada pela socióloga e professora Leda Gitahy. A pesquisa buscou entender o processo de transformação na cadeia produtiva no Estado a partir de mudanças tecnológicas introduzidas no setor produtor com vistas ao combate de doenças na lavoura citrícola, ao longo dos anos 2000, analisando as controvérsias e as relações de poder presentes no processo de apropriação dessas tecnologias. A professora Leda lembra que, desde o início do século XX, a atividade de pesquisa, desenvolvimento de tecnologias e de técnicas de produção na citricultura estão voltados para o combate a pragas que atacam os laranjais, configurando um histórico de doenças combatidas e controladas, histórico esse recuperado em um dos capítulos da tese. No caso do greening, não existe consenso entre os vários atores envolvidos na cadeia produtiva da laranja sobre as medidas a serem adotadas no combate à doença, mesmo em nível internacional. O controle envolve inspeção e erradicação de plantas, além da aplicação de inseticidas. No Brasil, o problema se agrava porque os pequenos e médios produtores não conseguem cobrir os custos decorrentes da adoção de tais medidas, o que os leva a abandonar o seu cumprimento, agravando a expansão da doença.
O TRABALHO
O trabalho combinou a utilização de duas abordagens teóricas distintas, o estudo de cadeias globais de mercadorias e a teoria ator-rede e valeu-se da análise de dados empíricos obtidos a partir de pesquisa de campo e entrevistas realizadas com diferentes tipos de produtores rurais de laranja, representantes de sindicatos de produtores e de instituições de pesquisa. A cadeia produtiva estudada é composta por fornecedores de insumos e de bens de capi-
Laranjal no interior de São Paulo: estudo desenvolvido no Instituto de Geociências mostra as transformações da cadeia produtiva
A professora Leda Gitahy, orientadora, e Gabriela da Rocha Barbosa, autora da tese: radiografia dos laranjais
tal; fazendas de produção de laranja; indústrias de suco e de bebidas; trabalhadores; e varejo e consumidor. “Esses componentes interagem com o papel desempenhado pelas tecnologias, o Estado e as estratégias industriais adotadas no setor, sendo que as relações de autoridade e poder (governança) é que determinam como esses elementos são alocados e fluem na cadeia”, esclarece a autora. Gabriela considera que foi possível constatar que as políticas fitossanitárias de combate ao greening, divulgadas pelos órgãos públicos e entidades representativas do setor, não conseguiram conter o avanço da doença, por circunscreverem o controle a questões técnicas, sem considerar os conflitos e as assimetrias de poder existentes. Explica que, apesar das técnicas de controle da doença apresentarem sinais de esgotamento, medidas alternativas de controle esbarram nas exigências competitivas determinadas pela estrutura de governança da cadeia, gerando o avanço do greening e, em consequência, crescente emprego de tecnificação com vistas ao enfrentamento do problema, que inviabiliza cada vez mais a permanência no setor de produtores de menor porte, face ao aumento de custos. Duas questões principais orientaram o trabalho de Gabriela: entender o conjunto de transformações que a partir dos anos 2000 apontam mudanças na configuração da cadeia produtiva e como os problemas fitossanitários se relacionam com elas. Entre essas transformações, ela menciona a progressiva concentração produtiva, crescente tecnificação dos processos, migração geográfica da produção, adoção de novas formas de uso do trabalho rural e de negociações das relações contratuais na cadeia produtiva. Entre as técnicas analisadas, estão os defensivos químicos e biológicos; as técnicas de produção agrícola; as técnicas de produção de mudas resistentes a pragas e doenças. Entre os atores considerou particularmente produtores rurais e de mudas; indústrias processadoras de suco; produtoras de agrotóxicos e fertilizantes;
centros de pesquisa e laboratórios; Secretaria da Agricultura do Estado; engenheiros agrônomos e biólogos. A professora Leda afirma que o trabalho ressalta como novos segmentos vão surgindo na cadeia produtiva, como se delineia nela a mudança na divisão do trabalho e como as controvérsias em torno das tecnologias de combate a doenças modificam as relações entre os atores dessa cadeia produtiva. Considera que isso foi possível analisando toda a cadeia, da produção da muda ao suco que chega ao supermercado, o que leva às relações com países compradores e permite distinguir os papéis exercidos pelos mais diferentes atores. Gabriela enfatiza que o foco do trabalho foi o produtor, pois o objetivo era investigar as transformações nas tecnologias de produção de laranja. Ela destaca que, como a maior parte da produção de laranja é transformada em suco concentrado e congelado destinado à exportação para consumo no varejo, são as empresas que operam nele e os consumidores que acabam determinando a organização da cadeia produtiva no Brasil. A pesquisadora observa ainda que já se verifica o aumento da tendência para o consumo de suco com selo de certificação socioambiental, decorrente da preocupação cada vez maior do consumidor em relação ao processo de produção, seus impactos ambientais e sociais. Essa tendência à certificação do produto também obriga o citricultor a constantes mudanças nos processos de produção. Entre varejistas e produtores, situam-se as poucas indústrias de processamento que detêm mais de 70% da produção do suco e que compram a laranja dos pequenos produtores, gerando desde os anos 90 grandes conflitos em relação ao preço pago pela fruta. Esses grandes compradores determinam o preço da fruta, que segundo os citricultores não cobre o custo da produção e a forma de produzi-la, além do que mantêm pomares que os tornam cada vez mais independentes. Esta situação é agravada pela doença, que aumenta os custos de produção,
seja pela inspeção dos pomares e pulverização constante, seja pela necessidade de erradicação das árvores comprometidas. Alguns pequenos citricultores se negam a adotar essas medidas, o que os leva a usar produtos alternativos para maquiar os sintomas da doença. Preços de mercado insatisfatórios, associados a suspeitas de formação de um cartel denunciado pela associação dos produtores, e custos de produção cada vez maiores, decorrentes das exigências fitossanitárias, inviabilizam os citricultores de pequeno e médio porte, que acabam pagando a conta já que não existe uma política de apoio da Secretaria da Agricultura do Estado para cobertura de parte dos gastos de manejo. Para a professora Leda, “as disputas de governança dessa cadeia produtiva decorrem da indefinição sobre quem paga a conta e da disputa para levar mais, vencida invariavelmente pelos grandes compradores. O aumento constante da tecnificação faz com que cada vez mais produtores passem para outras culturas. Esses conflitos são mostrados na tese”.
DECORRÊNCIAS
Ao final do trabalho, Gabriela conclui que a produção de laranja no Estado de São Paulo está em processo de transformação, impulsionada pela adoção de novas tecnologias e de inovações na organização da produção. Entre as principais mudanças tecnológicas e organizacionais, ela cita as adoções de pomares adensados; de sistemas de irrigação; de poda; mudanças no trato fitossanitário; e inovações no sistema de inspeção de pragas. As soluções técnicas visam minimizar os problemas causados pelo controle de doenças, o que evitaria a perda de plantas decorrentes de constantes erradicações, redução de custos e diminuição de danos ambientais a partir da redução do emprego de fertilizantes e agrotóxicos. A autora defende a reorganização da cadeia produtiva quanto aos processos de produção como o emprego de novas tecnologias para o combate à doença. Considera preocupante a diminuição do número de pequenos produtores e a ausência de alternativas que viabilizem sua permanência no setor. Espera que o trabalho possa contribuir para a formulação de políticas fitossanitárias que cumpram objetivos técnicos, sociais, ecológicos. A professora Leda conclui: “Gabriela conseguiu juntar as relações econômicas e sociais utilizando o enfoque na tecnologia. Ela montou um quadro com base nas cadeias produtivas e conseguiu apresentar os conjuntos de problemas e tendências envolvidos”.
Publicação Tese: “Tecnologias em combate: tradução e controvérsias na produção de laranja no Estado de São Paulo” Autora: Gabriela da Rocha Barbosa Orientadora: Leda Gitahy Unidade: Instituto de Geociências (IG)
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012
7
Tão longe, tão perto Redes sociais contribuem para que imigrantes brasileiros permaneçam no Japão Fotos: Divulgação/Antonio Scarpinetti
ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br
que leva os imigrantes brasileiros descendentes de japoneses a optarem por viver no Japão? Com certeza não são apenas os fatores geográficos ou as raízes que os conduzem até lá. O mercado de trabalho atraente e a segurança são algumas das principais vantagens por quem fixa residência naquele país. Até pouco tempo eles iam para lá fazer dinheiro já numa perspectiva de retornar quando juntassem um certo capital. Hoje isso não está mais ocorrendo. A volta não acontece no prazo previsto, ampliando a “estadia” de famílias num lugar tão longe do seu país de origem. Foi o que mostrou a dissertação de mestrado da socióloga Katiani Tatie Shishito, apresentada ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH). O estudo abrangeu o período entre 2008 e 2010. Por que eles viajavam com a ideia de ficar pouco tempo e ficavam em definitivo? “No início, tratava-se de um fluxo de migração marcadamente temporário que depois sofreu indefinições. Não dá para dizer com certeza que essa trajetória será permanente, mas apresenta uma característica circular muito forte”, opina a autora do estudo. A sua hipótese era de que a convivência no Japão, através das redes sociais entre brasileiros, criava um ambiente mais familiar e, por isso, as pessoas acabavam se acostumando com a vida no Oriente, embora não de forma integrada com aquela sociedade. As redes sociais são formadas por brasileiros, que em geral residem na região central do Japão, no Estado de Aichi, nas cidades de Hamamatsu, Toyohashi, Nagoya e Okazaki e também mais ao norte em Oizumi. Com as redes sociais, a sensação é de familiaridade com as coisas do Brasil. Katiani concorda que o salário no Japão sempre foi um chamariz para os imigrantes mas, no período estudado, o país vivia a crise econômica mundial, em 2009, que emergiu nos Estados Unidos – um grande receptor de carros e produtos japoneses –, provocada pelo mercado imobiliário. A queda nos salários e o desemprego fizeram com que muitos brasileiros retornassem nesse período, mas ao mesmo tempo a constituição de famílias e a diminuição dos salários tornaram inviável a volta. A crise piorou com a chegada de um tsunami na costa nordeste do Japão (um lugar de poucos brasileiros), que afetou a estrutura de mercado e a economia do Japão por inteiro. O estudo de Katiani situou essas crises e começou com a perspectiva de instabilidade de mercado para os imigrantes, em 2010. Ela conta que o Japão agora está se recuperando, contudo já foi alvo de racionamento de água, quando a produção de energia nas usinas nucleares atingiu a produção como um todo. Também a jornada de trabalho foi reduzida até a energia se estabilizar. Os pontos fortes da economia no Japão hoje são as indústrias automobilística e a manufatureira (de produtos eletrônicos). Os brasileiros são absorvidos na produção de chão de fábrica. Há ainda os que têm negócio próprio, vendendo produtos brasileiros e serviços para brasileiros. É um pequeno grupo que não atua no mercado precarizado. Os imigrantes brasileiros ganham razoavelmente bem, comparativamente ao salário oferecido no Brasil, todavia são esses os serviços que os japoneses qualificados não desejam fazer e que ficam relegados aos imigrantes.
PRECARIZAÇÃO
Na década de 1990, houve uma reforma na lei de controle da imigração japonesa, momento em que muitos imigrantes do sudeste asiático entravam no país sem visto de residência de longo prazo ou para trabalho. Entravam como turistas e, expirando os vistos, permaneciam ali fazendo serviços não qualificados, como imigrantes indocumentados. O país teve uma reação: como muitos deles eram considerados “indesejáveis”, pois não se enquadravam nas exigências da política migratória vigente, o governo abriu as portas para os descendentes radicados no exterior.
gressou em Sociologia na Unicamp. Fez o primeiro recorte do projeto dos brasileiros no Japão na iniciação científica. Ampliou o trabalho no mestrado, orientado pela professora Rosana Baeninger, dentro do projeto “Observatório das migrações em São Paulo: Fases e Faces do Fenômeno Migratório”, uma parceria entre Fapesp, CNPq e Nepo da Unicamp.
REDE
Grupo de imigrantes brasileiros em templo na cidade de Kyoto: nova dinâmica migratória
A socióloga Katiani Tatie Shishito: “Trajetória apresenta uma característica circular muito forte”
Essa lei garantiu que até a terceira geração de descendentes de japoneses entrasse no Japão, além dos cônjuges e dependentes. Muitas famílias foram para lá trabalhar, suprindo a necessidade da mão de obra não qualificada. Antagonicamente, essa lei não admitia (e não admite) mão de obra desqualificada. O que havia (e há) são várias modalidades de vistos pedindo qualificação para algum tipo de trabalho – como a diplomacia e o magistério, por exemplo. Alguns estudos japoneses interpretam que essa lei foi uma estratégia para suprir a demanda de mão de obra não qualificada com os descendentes de japoneses que estavam no exterior. A surpresa foi que era de se esperar menos choques culturais por se tratar de descendentes, o que manteria alguns costumes. O que não contavam é que, como eles já estavam há três gerações no Brasil, já tinham costumes brasileiros muito arraigados, um estilo de vida muito diferente do Japão.
METODOLOGIA
A maior dificuldade de Katiani foi entrevistar os brasileiros no Japão. Como não conseguiu fazer a pesquisa de campo presencialmente, devido ao alto custo da viagem, mesmo com sua família morando no Japão, sua estratégia foi apelar para o pai. Ele era então secretário de uma associação brasileira da Prefeitura de Okazaki, onde residia sua família. Ele treinou uma equipe para aplicar um questionário contendo 12 módulos. O plano mostrou-se factível, graças a esse vínculo institucional, não apenas com a Prefeitura e com a associação. Foi obtida ajuda do Consulado Geral do Brasil em Nagoya, que autorizou o uso do seu logotipo institucional, dando maior credibilidade à pesquisa, da qual foram obtidas informações de 195 brasileiros em 78 domicílios.
Esse instrumento indagava sobre a expectativa inicial de permanência: se foi concretizada? Foram explorados ainda os motivos: se eles se acostumaram à vida no Japão?, se juntaram o dinheiro pretendido?, se formaram família? A ideia também era captar informação nas redes: quem ajudou com os recursos para a viagem, com o primeiro emprego e com a primeira hospedagem? Ainda outras questões como se os filhos estudavam em escolas brasileiras ou japonesas, se os brasileiros pagavam aposentadoria no Japão ou no Brasil e se pretendiam fixar moradia lá? A família de Katiani pensava em ficar lá dois anos. Já está há 15 anos. “Fiquei no Japão dos 13 aos 19 anos, quando retornei para fazer a graduação”, relata a mestranda. Ela tinha receio de estudar em escola japonesa, pela falta de fluência no idioma, mas havia poucas escolas brasileiras e muito caras. Sua família (o pai é filho de japoneses) tinha sofrido um golpe de uma empreiteira e, chegando ao Japão, não tinha nada certo. “O nosso passaporte foi confiscado”, lamenta. A jovem começou a trabalhar informalmente aos 14 anos em uma fábrica. Era trabalho pesado de montar peças de registro de gás. No ano seguinte, o governo brasileiro criou um supletivo para brasileiros que estavam no exterior. O projeto piloto foi no Japão, onde ela concluiu o ensino fundamental. Como incentivo, o governo concedeu um prêmio para as três melhores notas. Katiani ficou entre os distinguidos e viajou para o Brasil a fim de receber o diploma do Ministério da Educação (MEC). Isso foi em 2000. Voltou ao Japão e lá ficou mais três anos, completando o supletivo do Ensino Médio. Em 2003, aos 19 anos, estava no Brasil. Levou dois anos para se reorganizar e se readaptar. Fez cursinho e em 2006 in-
No seu estudo, as hipóteses de convivência em redes mostrou que os brasileiros que estão morando há mais tempo no Japão estão fortemente inseridos em redes de relações entre compatriotas. Embora haja também relações com japoneses, as relações entre brasileiros foram mais acentuadas. A presença de alguns elementos do Brasil contribuiu para isso, e alguns estudos do Japão e do Ministério das Relações Exteriores igualmente assinalaram a tendência de maior permanência no destino. A dissertação também sinalizou para a possibilidade de ter contato com a comida brasileira, de ter uma TV brasileira e de estar no cotidiano com brasileiros trocando informações sobre o Brasil. Não notou-se uma imersão na vida japonesa. Até podem morar lá para sempre, porém não integrados àquela cultura. No questionário também foram feitas perguntas abertas avaliando tal permanência. Muitos falaram sobre a segurança como um ponto favorável, isso porque as imagens e as informações veiculadas na mídia sobre o Brasil são negativas e reforçam a violência e as tragédias. As pessoas acabam apagando da memória o cotidiano brasileiro e ficam com medo de voltar para a violência e a instabilidade econômica. E de fato, chegando aqui, voltam sem qualificação e encontram dificuldades de inserção no mercado de trabalho. Muitos não se estabilizam e, como subterfúgio, retornam ao Japão. Nesse sentido, hoje em dia alguns programas fornecem capacitação para imigrantes ao retornarem ao Brasil. O Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), com o projeto Dekassegui Empreendedor, é um deles.
DISTANCIAMENTO
No caso de crianças brasileiras que estudam em escolas japonesas ocorre outra dinâmica: elas entram no ritmo e na cultura daquele país, ganhando fluência na língua. Se os pais não conversam com elas em português, acabam falando somente o japonês. Ocorre que alguns pais vão adultos para o Japão e não sabem falar a língua, muito porque lá existem tradutores nas fábricas e intérpretes. Com isso, não conseguem se comunicar com os próprios filhos, fato que tem fomentado discussões na área de Educação. “Há crianças com vergonha de serem brasileiras. Não querem visitar o Brasil, o que contribui para que os pais optem por morar no Japão”, diz a mestranda. Lá, no momento, estão sendo reformuladas políticas para garantir alguns direitos inclusive no Brasil. Alguns acordos bilaterais envolvendo o MEC já buscam o reconhecimento das escolas brasileiras quando há o retorno dos imigrantes. Outros contemplam a questão previdenciária: os anos contribuídos no Japão passam a valer no Brasil. “Mostrando que os imigrantes estão ficando mais no Japão e que hoje há uma outra dinâmica migratória, é possível que muitas dessas políticas se efetivem. Agora, nem só o Brasil, nem só o Japão dão conta de tudo”, admite Katiani.
Publicações Dissertação: “A expectativa temporal e a permanência de brasileiros no Japão” Autora: Katiani Tatie Shishito Orientadora: Rosana Aparecida Baeninger Unidade: Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) Financiamento: Fapesp e Capes
8
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012 Foto: Antonio Scarpinetti
Francisco de Assis da Silva prepara equipamento fotográfico de monitoramento de animais: registros de pegada de felino gigante
Teiús nas imediações do Biotério: fauna do campus de Barão Geraldo é marcada pela diversidade
O Francisco de Assis da Unicamp Funcionário do Cema protege animais que vivem no campus de Barão Geraldo MARIA ALICE DA CRUZ halice@unicamp.br
utubro foi o mês de São Francisco de Assis para os fiéis da Igreja Católica. Foi também o mês de aniversário do Chico, o Francisco de Assis da Unicamp, funcionário que discretamente ajuda a proteger os bichos do campus. O nome foi escolhido pelo pai para fazer gosto a um amigo, também Francisco de Assis, que no leito de morte pediu ao companheiro que chamasse assim o filho que iria nascer. Chico confessa não ter se sentido obrigado a proteger os animais por carregar este nome, mas faz questão de acentuar as coincidências. “Nasci no mesmo mês de São Francisco, mas o nome não foi escolhido por este motivo. Mas a coincidência está na preocupação que tenho com esses animais.” Há 30 anos na Universidade, foi no Centro de Monitoramento Animal (Cema), coordenado pelo veterinário Paulo de Tarso, que Chico encontrou seu melhor lugar para trabalhar, apesar de valorizar cada momento, cada amigo e uma a uma das oportunidades que a instituição lhe ofereceu. O Cema é um setor de muitos lugares, ou, de preferência, dos lugares onde estão os bichos. E querem saber? Estão nas matas que circundam o campus, nas unidades envolvidas pelo campus e, por que não, no asfalto. Sim porque o mato e o asfalto são vizinhos de cerca, e Chico garante que os bichos estão por aí. Quem nunca deparou com um teiú na porta de sua sala, uma garça no caminho da Editora, com tucanos ao redor do hospital, corujas, morcegos, capivaras, seriemas, gambás, pica-pau e abelhas? Chico também manda notícias de tatus e de certo gato do mato, mas em armadilhas fotográficas, registrou pegadas de felino grande. Como eles chegaram antes dos humanos que habitam esta ex-mata transformada em campus universitário, todo carinho e respeito são bons, pois como adverte o técnico de biotério, “a mata é o lar deles. Nós invadimos”. De fato, eles estão por aí e isso sugere a convivência harmônica entre bicho e gente. O que torna a prazerosa missão de Chico e Tarso não tão simples como parece. Como eles estão mesmo entre os humanos, é preciso de alguém para protegê-los. Então, que seja um Francisco de Assis da Silva. Ao lado de Tarso, Chico vai além das
missões que seriam de um técnico em biotério para garantir uma convivência amistosa. “Procuramos reduzir os riscos à comunidade ao mesmo tempo em que protegemos esses”, reforça Chico. No momento, ele e Tarso esperam ansiosos pelo corredor de fauna, que deverá proteger os animais selvagens em seu próprio habitat. O corredor deverá interligar as áreas de preservação permanentes (APPs) para garantir aos animais um trânsito sem risco de atropelamento. Segundo Chico, há muitas manchas de APPs no campus, e a ideia é fechá-las, interligando-as. Enquanto o corredor não é concluído, o Cema garante a proteção com medidas de segurança, como a sinalização com placas de advertência aos condutores de veículos e outras destinadas a evitar a circulação de pessoas em APPs. Nas principais avenidas, o Cema instalou placas de advertência para os motoristas. O que assusta a comunidade é o número de capivaras, mas Chico alerta para o fato de que a capivara não é o único vetor de carrapato-estrela. “É um grande vetor, mas outros animais selvagens, principalmente aves, podem levar carrapatos para unidades de trabalho e até mesmo para os quintais”, reforça. Nada de fazer cara de cachorro abandonado. Em 2005, já no Cema, Chico viu a Unicamp criar um lar para os cães que ficavam nas praças da Universidade. Perambulavam pelo campus de Barão Geraldo, ora recebendo cuidados de pessoas da comunidade, ora famintos e desprotegidos. Convidado por Fábia Tuma para trabalhar no Cema, foi um parceiro fiel de Tarso, Fábia e a bióloga Lúcia Gabus na luta pela proteção desses animais. “Soltos, acabavam se alimentando do que as pessoas atiravam para eles e nem sempre era o alimento adequado, corriam o risco de atropelamento, maus tratos, agora, com o lar eles têm toda a atenção necessária para uma vida saudável e sem riscos”, acentua. Em sua rotina, Chico une duas paixões: a proteção aos animais e a fotografia. Foi de posse de sua inseparável câmera fotográfica que registrou as pegadas em Áreas de Proteção Permanente (APPs). Quando entrou na Unicamp, em 1982, apesar da paixão por animais, não imaginava que seria levado a seguir os passos de São Francisco. Foi recebido na Universidade pelo Serviço de Controle
de Registros Acadêmicos (Serca), hoje Diretoria Acadêmica (DAC), como patrulheiro mirim. Ao completar 18 anos, assumiu a função de operador de máquinas, mas aguentou três anos, sempre de olho em funções relacionadas à área de química. A transferência para o Biotério, hoje Cemib, foi a realização de um sonho juvenil de trabalhar em laboratório. A primeira experiência foi preparar animais para pesquisa. “Confesso que todos os dias eu ficava triste por ter de manipular os bichos para pesquisa, mas me consolava por saber que era o único jeito de se chegar a resultados que salvassem vidas humanas por meio da descoberta de medicamentos ou até mesmo de dietas adequadas. Aquilo era necessário e tenho orgulho de ter participado de pesquisas que aprimoraram a área de saúde no Brasil, mas sou mais feliz hoje, seguindo os passos de São Francisco”, confessa. Cada vez mais envolvido com a biologia animal, Chico teve seu interesse identificado por alguns docentes que o designaram a fazer controle microbiológico e parasitológico em animais de pesquisa, emprestando laboratórios do Instituto de Biologia, pois o Biotério Central na época não tinha a estrutura de hoje como Cemib. A partir dessa experiência, pôde realizar o sonho de ser um pesquisador de sua área. Em suas folgas e aos finais de semana, começou a realizar controle parasitológico de lobos-guará em bosques e zoológicos do Estado de São Paulo. Dedicou-se a esse trabalho durante dois anos, ao lado de biólogos e veterinários. Neste ínterim, com a autorização de seu então chefe, professor Rovilson Gilioli, e o coordenador na época, professor Humberto Rangel, começou a fazer bacteriologia das fezes dos lobos-guará. Foi uma atividade laboriosa, mas rendeu uma publicação em revista especializada em veterinária. Foram analisados 30 animais, segundo o técnico.
NUTRIÇÃO ANIMAL
A pesquisa suscitou outras oportunidades para o funcionário. Uma delas foi o convite para participar da equipe da bióloga Adriana Batata do bosquezoo em Pedreira, São Paulo, numa pesquisa com lobos-guará enquanto outros biólogos analisavam um grupo de felinos. Paralelamente, começou, ao lado da pesquisadora Débora Tavares e da
funcionária Eliete de Carvalho Leite, da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, a avaliar a nutrição de animais. Cabia a Chico analisar o comportamento de animais em relação às rações produzidas na FEA e no Cemib para animais de pesquisa. “Pesávamos os animais e as rações para ver o quanto ele consumia, o quanto sobrava, o que eles ganhavam de peso e quanto eliminavam”, esclarece. Chico faz o discurso do homem realizado sem hesitar. Admite a importância da Unicamp na construção de boa parte de seu projeto de vida. Que digam Henrique, 17, e Gabriel, 12, filhos dele com a educadora Benedita de Lourdes Motta Silva. Seus primeiros passos na educação foram dados na creche da Universidade. Hoje, estudam em uma escola particular, pois Chico abriu mão da graduação para investir numa educação de qualidade aos meninos. Essa decisão deixa Chico muito tranquilo e feliz, pois a Universidade lhe deu a oportunidade de formar-se técnico em biotério por meio de cursos de especialização. “Sinto-me honrado por ter isso, graças a meu pai, José da Silva (falecido), que me direcionou, por meio do patrulheirismo, à Unicamp. Aqui, pude me formar pela experiência e pela oferta ampla de conhecimento. É uma questão de identificar as oportunidades. Tem de ser observador”, ratifica. A máquina fotográfica não tem funcionalidade apenas para monitorar esses pequenos seres que compõem a fauna e a flora do campus e da mata ao seu redor. Chico é apaixonado pelo hobby desde a época dos rolos de filme, incentivado por um primo fotógrafo, o qual lhe deu a primeira câmera de sua vida. Abre espaço neste que seria seu perfil para destacar os amigos do Núcleo de Fotógrafos Amadores da Unicamp (Nufau), liderado por Beeroth Souza e Zilda Farias. O grupo, formado por funcionários da Universidade, já realizou exposições dentro e fora da Unicamp. Esta prática rendeu alguns prêmios, entre eles uma câmera fotográfica, a participação numa exposição especial da Unicamp e outra em Botucatu-SP, além de matéria no jornal Correio Popular, de Campinas. Por enquanto, explora a diversidade cultural e ambiental brasileira que sorri diante da objetiva de sua câmera. “Gosto muito de fotografar o Estado de São Paulo, ainda faltam muitas cidades, mas meu sonho é fotografar o Amazonas”, declara.
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012
9 Foto: Antoninho Perri
O engenheiro Osvaldo Hugo Bertone: “Módulos permitem diferentes aplicações nas áreas de educação e pesquisa”
Uma plataforma para robôs móveis Engenheiro desenvolve, na FEEC, equipamento que pode ser usado em várias áreas CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br
iferentemente dos robôs fixos, muito utilizados nas linhas de montagem, e que operam a partir de uma base fixa, os robôs móveis podem ser deslocados. Segundo estimativas, os mercados para os robôs móveis de pequeno porte encontram-se em franca expansão. Com o objetivo de desenvolver uma plataforma básica para servir de estrutura para aplicações em robôs móveis, Osvaldo Hugo Bertone, engenheiro com formação nas áreas de mecânica, elétrica e eletrônica, desenvolveu e coordenou projeto para construção de uma plataforma universal com arquitetura aberta que possibilita ao usuário desenvolver ele mesmo as aplicações desejadas para esses tipos de robôs. O trabalho culminou com a construção do Robodeck, um robô móvel de pequeno porte que já esta sendo fabricado e comercializado por empresa sediada em São Carlos, no interior de São Paulo. A plataforma consta de módulos de comunicação para o exterior – Bluetooth, com banda estreita para a transmissão de dados; WiFi, com banda larga para a transmissão de imagens; ZigBee, que permite a comunicação entre vários pontos de uma rede; e de um barramento de comunicação interior que possibilita a inclusão de módulos que controlam sensores e atuadores. São exemplos dos primeiros os sensores que permitem o controle de distâncias, utilizados nos carros mais modernos; o uso das radiações do infravermelho, empregadas em alarmes; de câmaras de vídeo; de GPS e bússola digital; de acelerômetros, como os que acionam air bags quando ocorre desaceleração rápida de um veiculo; a determinação de umidade, temperatura, pressão. Entre os atuadores estão válvulas, servos, que são motores controlados, a exemplo dos que acionam câmaras móveis dos sistemas de segurança. Essa plataforma básica, que utiliza protocolos de comunicação e set de comandos tanto nas comunicações externas como no barramento interno, dispondo de um software de código aberto, permite a usuários como pesquisadores, profissionais, alunos, professores e hobbistas modificarem e desenvolverem quaisquer tipos de aplicações ou de produtos. Em decorrência, a plataforma desse robô móvel é autônoma e pode ser montada nas mais diferentes estruturas como as de um robô tipo aranha que suporta varias câmaras de vídeo; de uma vant, veículo aéreo não tripulado; de um submarino não tripulado, além de permitir o desenvolvimento de software
desktop para comando do robô via internet, celular ou qualquer tipo de telecomunicação futura. Segundo Hugo, o produto do trabalho preenche uma lacuna, viabilizando aplicações nas áreas de educação básica, não só em disciplinas tradicionais como matemática e geografia, mas também em disciplinas transversais, ligadas às áreas técnicas, em que os estudantes podem aprender a programar, por exemplo, rotinas para educação no trânsito, seleção de lixo reciclável, equacionar problemas relacionados à ecologia ou ao reconhecimento de territórios, utilizando sistemas de programação em blocos. No caso de pesquisadores e hobbistas, os produtos podem encontrar utilização no desenvolvimento de novos módulos e aplicações mais sofisticadas em que são empregadas teleoperações. Como a plataforma foi desenvolvida em um único sistema tanto para a educação básica quanto para as pesquisas de alto nível tecnológico, a sua flexibilidade é garantida com a utilização de um software com programação em blocos para o ensino e um software com programação em C para pesquisadores e hobbistas. Ele diz que “o ambiente modular de programação permite que qualquer usuário possa criar novos acessórios (módulos) com diferentes aplicações nas áreas de educação e pesquisa, permitindo inclusive a possibilidade de adaptação da tecnologia gerada para exploração dos crescentes mercados de robôs para as áreas médica (home care) e de segurança”.
PRÁTICA Embora nos trabalhos acadêmicos as abordagens visem em geral os estudos teóricos, o interesse de Hugo pelo desenvolvimento de um produto que atendesse a necessidades reais acabou sendo determinado pela sua larga experiência como engenheiro na área de transformadores de potência, como ex-gerente de projetos e pelas suas atividades ligadas à engenharia eletrônica, que o levaram a ser designado para trabalhar na Inglaterra e Portugal. A ideia de desenvolvimento de uma plataforma móvel, que o acompanhava desde o mestrado realizado na Unicamp, se consolidou quando passou a trabalhar em uma empresa incubadora, em São Carlos, tocada por professores associados, que se dedicava ao desenvolvimento de robôs. Embora sem experiência anterior nessa atividade específica, começou a trabalhar com a equipe no desenvolvimento de um robô que jogava futebol e depois de um robô para uso em educação, o que o levou a aprender robó-
tica. Foi quando teve a ideia de construir uma plataforma de estrutura aberta, apresentando projeto aprovado pela Fapesp, do qual passou a ser coordenador. Foram necessários dois anos para a construção da plataforma e mais um ano para depurar o software. Esse trabalho foi orientado primeiramente pelo professor Alberto Martins Jorge (falecido) e depois pelo professor Marco Antonio Robert Alves, ambos do Departamento de Eletrônica e Microeletrônica (Demic) da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) da Unicamp. O engenheiro, que hoje exerce a docência e é coordenador de cursos de engenharia na região de Campinas, conta que o projeto foi se consolidando e se definindo ao longo do trabalho. “Para movimentar um robô de 17 quilos precisávamos de baterias de potência. A grande sacada foi utilizar as mesmas baterias das populares maquitas, facilmente removíveis e recarregáveis. Seis delas garantem ao robô uma autonomia de mais de cinco horas. O Robodeck, como é denominado, desloca-se sobre quatro rodas devidamente articuladas e foi desenhado para atender às finalidades de um robô móvel destinado às mais diferentes possibilidades de uso”, afirma ele. A ideia foi construir um sistema aberto, semelhante aos PCs dos anos 80 e ao Linux de hoje, de forma a possibilitar a intervenção de todos os seus usuários ao código fonte. Além da parte prática, que se valeu de componentes disponíveis no mercado, o trabalho exigiu o desenvolvimento matemático, de algoritmos de precisão, de desenhos mecânicos e técnicos e envolveu uma equipe por ele coordenada.
FLEXIBILIDADE
A flexibilidade do sistema concebido para utilização tanto na educação básica quanto na pesquisa é garantida com a utilização de um software com programação em blocos, para escolas de ensino fundamental e médio, e de um software com programação em C, para pesquisadores e hobbistas. O engenheiro não sabe da disponibilidade desse tipo de plataforma aberta atualmente no mercado internacional o que o faz acreditar que o produto possa inclusive ser exportado. Varias unidades desse robô já foram compradas por universidades brasileiras para utilização em educação. Ele destaca ainda que, como se trata de uma estrutura aberta, há condições de desenvolver outros produtos a partir dela. “Meu próximo passo será o desenvolvimento de uma vant – veiculo aéreo não tripulado, que certamente terá um impacto muito grande na área de vigilância de territórios e mapeamento de áreas. Atualmente, os militares compram
de Israel equipamento similar para controle de fronteira”. Indagado sobre o diferencial de um produto brasileiro em relação ao importado, Bertone diz que fundamentalmente seria o custo muito menor. O Robodeck é comercializado em torno de 30 mil reais, custo que o faz muito mais acessível que o robô importado. Considera que o produto se ressente ainda de maior divulgação no mercado. Destaca, entretanto, a contribuição do trabalho realizado na formação de quadros técnicos brasileiros, pois muitos engenheiros foram treinados em robótica, o que contribui para a formação de pessoal qualificado para a indústria nacional. Hugo enfatiza que sistemas com esse grau de sofisticação, flexibilidade, abrangência e custo não existem na America Latina. Além do que, a possibilidade de utilizar a internet para teleoperação, ou seja, controlar e programar o robô remotamente via WEB, possibilitará uma gama de subprojetos a serem desenvolvidos em áreas como telerrobótica e telemedicina. Para o engenheiro, as simulações garantem a utilização do projeto desta plataforma em veículos não tripulados terrestres, aquáticos ou aéreos em operações de segurança, de vigilância, mapeamentos de áreas e em quaisquer outras em que haja necessidade da robótica móvel. “A plataforma universal com código fonte aberto permitirá o desenvolvimento de uma quantidade muito grande de aplicações e o aperfeiçoamento constante, a exemplo do que acontece com o Linux, em que profissionais desenvolvem aplicações e as compartilham, criando uma sinergia que traz excelentes resultados”, conclui. No projeto, que contou com financiamentos da Fapesp e bolsas do CNPq, foram gastos em torno de 800 mil reais, com pagamento de pessoal, compra de material e de ferramentas. O trabalho foi desenvolvido em uma empresa incubadora e na fase de fabricação e comercialização passou a ser gerido por outra empresa do mesmo grupo sediado em São Carlos.
Publicação Tese: “Desenvolvimento de uma plataforma universal para aplicações em robôs móveis” Autor: Osvaldo Hugo Bertone Orientador: Marco Antônio Robert Alves Unidade: Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) Financiamento: Fapesp e CNPq
10 Vida Teses da semana Painel da semana Teses da semana Livro da semana Destaques do Portal da Unicamp
aa c dêi ma c
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012
Painel da semana Pic-Jr - Os docentes e pesquisadores da Unicamp interessados em participar da 6ª edição do “Programa de Bolsas de Iniciação Científica Júnior do Estado de São Paulo”, o Pic-Jr, devem submeter projetos de acordo com o Edital PRP—1/2012 (http://www.prp.rei.unicamp.br/picjr/ docs/2013/EditalPibicEM.pdf). O prazo é 30 de novembro. O início das atividades está previsto para 18 de fevereiro de 2013, sendo que, no mês de fevereiro, os bolsistas passarão por um período de adaptação ao ambiente acadêmico recebendo orientações da PRP quanto aos procedimentos necessários para a implementação da bolsa (cadastro no CV Lattes, emissão de CPF, abertura de conta corrente, etc) e aos benefícios concedidos pela Unicamp (emissão de cartão extra-quadro para a utilização do restaurante, transporte fretado, biblioteca, Cecom, etc). Participarão também de atividades de integração e palestras, que serão promovidas no período. As atividades de pesquisa junto aos laboratórios devem ser iniciadas em 1 de março de 2013. Outras informações podem ser obtidas pelos telefones 19-3521-4614, 3521-4758 ou pelo e-mail icjunior@reitoria.unicamp.br Cidade, linguagem e tecnologia - O Laboratório de Estudos Urbanos (Labeurb) promove, de 26 a 28 de novembro, o VII Encontro Internacional Saber Urbano e Linguagem “Cidade, Linguagem e Tecnologia”. O evento, além de comemorar o aniversário de 20 anos do Labeurb, objetiva discutir as relações entre linguagem, tecnologia e o espaço urbano. As inscrições são gratuitas e podem ser feitas no endereço eletrônico http://www.labeurb.unicamp.br/inscricao/. A abertura oficial ocorre no dia 27 de novembro, às 9 horas, no Auditório do Labeurb. Empreendedorismo e inovação - O Fórum Permanente de Empreendedorismo e Inovação “A aplicação da gestão por processos nas diversas áreas da Unicamp” acontece em 26 de novembro, às 9 horas, no Auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM). Inscrições, programação e outras informações no site do evento http://foruns.bc.unicamp.br/foruns/projetocotuca/ forum/htmls_descricoes_eventos/evento44.html Plataformas e tecnologias para as disciplinas de graduação – apresentação dos programas e software à comunidade - Evento organizado pelo Espaço de Apoio ao Ensino e Aprendizagem (EA)² e pelo Grupo Gestor de Tecnologias Educacionais (GGTE) acontece em 26 de novembro, às 14 horas, na sala PB15 (prédio
do Ciclo Básico II). Público-alvo: docentes da universidade. Proposta: compartilhar experiências e conhecer plataformas disponíveis para o ensino de graduação na Unicamp. Outras informações podem ser obtidas no link http://www.ea2.unicamp.br/joomla/index.php/ eventos/proximos/61-plataformas-e-tecnologias-para-asdisciplinas-de-graduacao-apresentacao-de-programas-esoftwares-a-comunidade Gênero e fecundidade – Concebido a partir de um seminário organizado em 2011 pelos Grupos de Trabalho “População e Gênero” e “Fecundidade e Comportamento Sexual e Reprodutivo”, da Associação Brasileira de Estudos Populacionais (Abep), o livro “Diálogos transversais em gênero e fecundidade: articulações contemporâneas” (Editora Librum/ ABEP), foi organizado por Margareth Arilha, André Junqueira Caetano, Moema Guedes e Gláucia dos Santos Marcondes. Reúne artigos que buscam estimular a reflexão em torno das possíveis articulações entre diferentes áreas de conhecimento no campo dos estudos demográficos, especialmente no tratamento dos temas referentes às relações de gênero e de fecundidade. Especialistas de diferentes áreas participam do livro. Entre os autores dos 13 capítulos da obra, estão Sonia Corrêa, José Estáquio Diniz Alves, Suzana Cavenaghi, Lilia Montali, Claudio Dedecca, Mary Castro, Elisabete Dória Bilac, dentre outros. Filmes - Nos dias 27, 28 e 29 de novembro, o Núcleo de Estudos do Gênero (Pagu) exibe vários filmes. As apresentações fazem parte do seminário “Corpo e Linguagem”. A organização é de Karla Bessa (Pagu-Unicamp). Veja a programação no link http://www.unicamp.br/unicamp/ eventos/2012/11/14/pagu-exibe-filmes Vídeos - A mostra de vídeo sobre educação “O ensino básico nos países que compõem a OCDE” acontece no dia 27 de novembro, às 14 horas, na sala PB15 (prédio do Ciclo Básico II). A realização é do Espaço de Apoio ao Ensino e Aprendizagem (EA)² e da Subcomissão Permanente de Formação de Professores (CCG). Público-alvo: docentes e alunos dos cursos de Licenciaturas. Mais detalhes no link http://www.ea2.unicamp.br/joomla/index.php/eventos/ proximos/62-mostra-de-video-sobre-educacao-o-ensinobasico-nos-paises-que-compoem-a-ocde Qualidade de vida no meio ambiente - No dia 27 de novembro, às 14h30, no Auditório da Biblioteca Central Cesar Lattes (BC-CL), o médico Jamiro da Silva Wanderley, da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), profere palestra com o tema “Qualidade de vida no meio ambiente”. O evento integra o Programa de Prevenção contra os Desperdícios nos Restaurantes Universitários da Unicamp. Mais informações podem ser obtidas pelo telefone 19-3521-6434. Obesidade e diabetes - Temas estarão em debate no dia 28 de novembro, no Fórum Permanente de Esporte e Saúde. O evento acontece das 9 às 17 horas, na Faculdade de Ciências Aplicadas de Limeira, sala UL05. A organização é dos professores Dennys Cintra, Eduardo Ropelle, José Rodrigo Pauli, Lício Velloso, Mário Saad. Programação, inscrições e mais informações no link http://foruns.bc.unicamp.br/foruns/projetocotuca/forum/ htmls_descricoes_eventos/saude59.html Música computacional interativa - O Núcleo Interdisciplinar de Comunicação Sonora (Nics) organiza no dia 28 de novembro, às 14 horas, no Auditório II da Agência para a Formação Profissional da Unicamp (AFPU), um concerto de música computacional interativa. No evento, pesquisadores e alunos do NICS apresentam composições, improvisações livres e Instalações sonoras. A organização é do professor José Eduardo Fornari Novo Junior. Mais detalhes pelo telefone 19-3521-7923 ou e-mail beth@nics.unicamp.br
Prêmio Schaeffler - No dia 29 de novembro, às 14 horas, no Auditório ID 02 da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM), acontece a cerimônia de entrega do Prêmio Schaeffler. Um docente e o melhor aluno de Engenharia Mecânica e de Engenharia de Controle e Automação devem receber a honraria. A premiação é oferecida anualmente pelo Grupo Schaeffler da América do Sul, em reconhecimento ao melhor docente e ao melhor aluno do ano. O evento é organizado por Ana Cristina Flosi. Mais detalhes podem ser obtidos no site do evento http://www.fem.unicamp.br/ ou telefone 19-3521-3161. Desafios no ensino das disciplinas básicas de exatas - Discutir as disciplinas básicas das áreas de Exatas e Tecnologia, com ênfase em Física Geral I e Cálculo I. Este é o objetivo do Workshop “Desafios no ensino das disciplinas básicas de exatas”. O evento ocorre no dia 30 de novembro, às 14 horas, no Ciclo Básico II (sala PB15). O público-alvo são docentes dos cursos que oferecem e que possuem em seu currículo disciplinas de física e cálculo básicos. A organização é do Espaço de Apoio ao Ensino e Aprendizagem (EA)², órgão da Próreitoria de Graduação (PRG).
Teses da semana Alimentos - “Efeito da homogeinização à alta pressão na atividade e estabilidade de enzimas” (doutorado). Candidata: Alline Artigiani Lima Tribst. Orientador: professor Marcelo Cristianini. Dia 28 de novembro, às 14 horas, na FEA. - “Néctar de manga (Mangífera índica L.) adoçado com diferentes edulcorantes: perfil sensorial descritivo, tempointensidades e estudos de consumidor” (doutorado). Candidato: Rafael Silva Cadena. Orientadora: professora Helena Maria André Bolini. Dia 28 de novembro, às 14 horas, na FEA. Artes - “O método de cordas duplas de Luis Soler Realp: análise e comparação com publicações afins” (mestrado). Candidato: Paulo Egídio Lückman. Orientador: professor Esdras Rodrigues Silva. Dia 26 de novembro, às 14 horas, na sala 3 da CPG do IA. - “Objetos cotidianos: entre montagens e imaginação” (mestrado). Candidato: Angelo Cappellari. Orientadora: professora Luise Weiss. Dia 29 de novembro, às 10h59, na Galeria de Arte da Unicamp. Computação - “Avaliação da qualidade de cursos superiores à distância” (doutorado). Candidato: Ricardo Luís Lachi. Orientadora: professora Heloisa Vieira da Rocha. Dia 27 de novembro, às 14 horas, no auditório do IC 2, sala 85 do IC. - “Image and video representations based on visual dictionaries” (doutorado). Candidato: Otávio Augusto Bizetto Penatti. Orientador: professor Ricardo da Silva Torres. Dia 29 de novembro, às 14 horas, no auditório do IC 2, Sala 85 do IC. Economia - “Serviços de infraestrutura como opção de investimentos para os fundos de pensão brasileiros” (mestrado). Candidato: Guilherme Nogueira Lopes. Orientador: professor Francisco Luiz Cazeiro Lopreato. Dia 29 de novembro, às 14h30, na sala 23 do Pavilhão da Pósgraduação do IE. Educação - “Os impactos das condições de trabalho sobre a subjetividade do professor de ensino superior privado de Campinas” (doutorado). Candidata: Liliana Aparecida de Lima. Orientadora: professora Elisabete Monteiro de Aguiar Pereira. Dia 28 de novembro, às 9 horas, na FE. Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo - “Avaliação de patologias em conjuntos habitacionais de Bauru e região. Um enfoque às anomalias das fundações e coberturas” (mestrado). Candidato: Érico Cristiano Vidal. Orientador: professor David de Carvalho. Dia 28 de novem-
bro, às 15 horas, na sala CA-22 da CPG/FEC. Engenharia Elétrica e de Computação - “Detecção e otimização da produção bruta de óleo em poços de petróleo com elevação artificial gli” (mestrado). Candidato: Valter Souza Blande. Orientador: professor Takaaki Ohishi. Dia 27 de novembro, às 10 horas, na FEEC. - “Estimulador de nervos automático na realização de bloqueios anestésicos de plexos nervosos” (mestrado). Candidato: Carlos Alexandre Ferri. Orientador: professor Antônio A. F. Quevedo. Dia 27 de novembro, às 14h30, na sala PE12, prédio da CPG/FEEC. - “Malware Behavior” (doutorado). Candidato: André Ricardo Abed Grégio. Orientador: professor Mario Jino. Dia 28 de novembro, às 14 horas, na sala PE12 do prédio da CPG/FEEC.
Livro
da semana
Engenharia Mecânica - “Escala de mensuração dos fatores críticos de sucesso no gerenciamento de projetos” (doutorado). Candidata: Elen Nara Carpim Besteiro. Orientador: professor Olívio Novaski. Dia 29 de novembro, às 9 horas, na FEM. “Variáveis dos atritos complexidade e incerteza em projetos: proposta de criação de escala de mensuração” (doutorado). Candidato: Jefferson de Souza Pinto. Orientador: professor Olivio Novaski. Dia 30 de novembro, às 9 horas, no auditório do DEF/FEM. Engenharia Química - “Determinação experimental de dados de equilíbrio líquido-vapor de misturas binárias de ésteres graxos etílicos e ácidos graxos através da calorimetria exploratória diferencial” (doutorado). Candidato: Rafael Mauricio Matricarde Falleiro. Orientadora: professora Maria Alvina Krähenbühl. Dia 30 de novembro, às 14 horas, na sala de defesa de tese do Bloco D da FEQ. Matemática, Estatística e Computação Científica - “Aplicações de cópulas em modelos de riscos múltiplos dependentes e em modelos de misturas de distribuições” (doutorado). Candidato: Rodrigo Tsai. Orientador: professor Luiz Koodi Hotta. Dia 30 de novembro, às 14 horas, na sala 253 do Imecc. Medicina - “Correlação entre QEQ, IIEF e “RAND 36-Item Health Survey” em homens brasileiros” (mestrado). Candidata: Ana Luiza dos Santos Reis. Orientador: professor Adriano Fregonesi. Dia 27 de novembro, às 10 horas, na Pós-graduação da FCM (sala verde). - “Estado nutricional, adiposidade abdominal e síndrome da fragilidade em idosos da comunidade: dados do Estudo FIBRA - Pólo Unicamp” (mestrado). Candidata: Maria Clara Moretto. Orientadora: professora Maria Elena Guariento. Dia 27 de novembro, às 14 horas, na CPG/FCM. - “Associação da co-infecção por Papilomavírus Humano (HPV) e Chlamydia trachomatis, vaginose bacteriana e resposta inflamatória com a gravidade da neoplasia cervical” (doutorado). Candidata: Juçara Maria de Castro Sobrinho. Orientador: professor Luiz Carlos Zeferino. Dia 28 de novembro, às 14 horas, no Anfiteatro do Caism. - “Desempenho ocupacional e qualidade de vida: interrelações no cotidiano de pessoas com deficiência visual” (mestrado). Candidata: Paula Becker. Orientadora: professora Rita de Cássia Ietto Montilha. Dia 29 de novembro, às 13h30, no Anfiteatro José Martins Filho - Ciped. - “Associação dos polimorfismos A4889G e T6235C do gene CYP1A1 com características clínicas e epidemiológicas do câncer de mama” (doutorado). Candidato: Cassio Cardoso Filho. Orientador: professor Luis Otávio Zanatta Sarian. Dia 29 de novembro, às 14 horas, no Anfiteatro do Caism. Odontologia - “Conduta clínica para a doença cárie: influência da formação odontológica na abordagem conservadora ou curativista” (mestrado profissional). Candidata: Valdinéia Maria Tognetti. Orientadora: professora Maria
Espaços da recordação Formas e transformações da memória cultural Autora: Aleida Assmann Tradução: Paulo Soethe (coord.) Ficha técnica: 1a edição, 2011; 456 páginas; formato 16 x 23 cm; ISBN: 978-85-268-0959-8 Área de interesse: Ciências Humanas Preço: R$ 86,00 Sinopse: Não são apenas os indivíduos que consti¬tuem uma memória para si, a fim de esta¬belecer identidades, conquistar legitimação e fixar metas: o mesmo se dá com as cultu¬ras. Aleida Assmann investiga as diferentes tarefas da recordação cultural, quais os seus meios (como escrita, imagens, memoriais) no processo de transformação histórica e técni¬ca, e as formas de cultivo do saber acumula¬do. Nesse campo, além da política e da ciência, também a arte assume importância cada vez maior. Autora: Aleida Assmann estudou língua e literatura de língua inglesa e egiptologia em Heidelberg. Desde 1993, é professora de cultura inglesa e de teoria literária na Universidade de Konstanz. É autora de importantes publicações sobre história da leitura, história da escrita, antropologia histórica, história da memória alemã, literatura de língua inglesa, teoria da memória e memória cultural. da Luz Rosario de Sousa. Dia 29 de novembro, às 8h30, na Congregação. Química - “Estudo da influência de aditivos naturais nos pontos de entupimento a frio, de turbidez e de fulgor de biodiesel e de misturas diesel-biodiesel” (doutorado). Candidato: Rodrigo Alves de Mattos. Orientador: professor Matthieu Tubino. Dia 30 de novembro, às 14 horas, no miniauditório do IQ.
DESTAQUES do Portal da Unicamp
CPQBA amplia estrutura com inauguração de laboratórios O Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA) da Unicamp inaugurou no último dia 21 os novos laboratórios da sua Divisão de Recursos Microbianos (DRM) e da Coleção Brasileira de Micro-Organismos de Ambiente e Indústria. A cerimônia foi presidida pelo reitor Fernando Ferreira Costa e contou com a presenta dos pró-reitores Marcelo Knobel (Graduação), Ronaldo Aloise Pilli (Pesquisa) e João Frederico da Costa Azevedo Meyer (Extensão). Também participaram da solenidade o diretor do CPQBA, Ivo Milton Raimundo Júnior, o assessor científico-acadêmico da Coordenadoria dos Centros e Núcleos Interdisciplinares (Cocen), Jurandir Zullo, a coordenadora da DRM, Valéria Maia Merzel, e o consultor sênior da Gerência de Geoquímica do Centro de Pesquisas Leopoldo Américo Miguez de Mello (Cenpes) da Petrobras, Eugênio Vaz dos Santos Neto. De acordo com o reitor Fernando Costa, as novas instalações oferecerão melhores condições de trabalho aos pesquisadores do CPQBA, um dos mais importantes órgãos de pesquisa da Unicamp. “O CPQBA é um exemplo importante da evolução que um centro de pesquisa da Universidade pode
Foto: Antonio Scarpinetti
Descerramento da placa de inauguração: novos laboratórios somam cerca de 400 m2 de área
alcançar. Ao longo dos anos, ele tem tido uma significativa produção científica. Além disso, tem contribuído para a formação de recursos humanos altamente qualificados
e estabelecido relevantes parcerias com empresas públicas e privadas do país”, assinalou. O diretor do CPQBA lembrou que a
construção dos novos laboratórios, que somam cerca de 400 m2 de área, é o resultado do esforço tanto da comunidade interna quanto da Administração Central da Unicamp. Segundo ele, com a melhoria da infraestrutura, as responsabilidades do Centro também aumentarão. “Tenho certeza que, com o apoio da comunidade científica e empresarial, a Coleção Brasileira de Micro-Organismos será ampliada, o que nos tornará um centro de referência na área biológica no país”, previu. A coordenadora da DRM também ressaltou que a nova infraestrutura dará melhores condições de trabalho aos pesquisadores, o que deverá refletir na produtividade deles, que já é significativa. Nos últimos dez anos, elencou Valéria Merzel, a Divisão foi responsável pela execução de 39 projetos de pesquisas e pela formação de 16 mestres, 17 doutores e sete pós-doutores. “Além disso, também publicamos 64 artigos em revistas científicas indexadas”, informou. Juntamente com os novos laboratórios, também foram inauguradas na ocasião as reformas do auditório do CPQA. A solenidade foi acompanhada por estudantes, pesquisadores, professores e funcionários. (Manuel Alves Filho)
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012
11 Fotos: Antonio Scarpinetti
Encontro PAD/PED: subsídios para as práticas de formação de graduandos e aperfeiçoamento para estudantes de pós-graduação que vão exercer a docência
Fomentando a reflexão e o debate de ideias PAULO CÉSAR NASCIMENTO pcncom@bol.com.br
o dia 5 de setembro, repetiu-se em uma das salas do Ciclo Básico da Unicamp um evento que, embora voltado a estudantes de graduação e docentes, atrai um significativo número de outros integrantes da comunidade universitária. Naquela data, o professor Paulo Franchetti, do Departamento de Teoria Literária do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), discorreu sobre o tema “Fernando Pessoa e a História de Portugal”, a partir de uma análise de Mensagem (1934), o enigmático livro de poemas publicado pelo escritor lusitano Fernando Pessoa (1888-1935). A exemplo de Franchetti, outros 16 professores da Universidade, convidados do Programa Aulas Magistrais, já puderam compartilhar com a concorrida plateia seus saberes acerca de temas tão ricos quanto diversificados. Iniciativa da Pró-Reitoria de Graduação (PRG) da Unicamp, o programa vem divulgando aulas ministradas por docentes da instituição nas mais variadas áreas de especialização e o valioso acervo didático em Língua Portuguesa é disponibilizado a toda a sociedade por meio de vídeos acessíveis na página da PRG na internet. Criado em 2010, o Programa Aulas Magistrais integra um conjunto de bem-sucedidas ações desenvolvidas pela PRG com o propósito de valorizar o ensino de graduação e de contribuir para incrementar a reflexão e o debate de emergentes questões relacionadas à atividade. As políticas implantadas na atual gestão também colaboram para o aprimoramento do processo didático e das relações entre ensino e aprendizagem no âmbito da Unicamp. “São vários os desafios que a graduação abarca, então cada programa foi estrategicamente concebido para lidar com um setor específico a ser trabalhado, constituído de ação, foco, público, conceito e missão muito bem definidos”, afirma o professor Gilberto Alexandre Sobrinho, assessor da PRG. “Mais do que eventos, são atividades de formação.”
NO CENTRO DAS ‘CONVERSAS’
Emblemático dessa preocupação é o projeto “Conversando sobre a Graduação”, cujo objetivo é promover conversas a respeito de temas que têm importância para o desenvolvimento dos cursos de graduação, tais como avaliação, composição do currículo, vetores, entre outros. As palestras, que ocorrem preferencialmente na última quarta-feira de cada mês, já trouxeram à reflexão assuntos como interdisciplinaridade e interatividade, metodologias ativas de aprendizagem no ensino superior, ensino e pesquisa na graduação, bem como possibilitaram aos participantes conhecer experiências didáticas de outros países, como foi o caso dos encontros que apresentaram aspectos do curso de graduação em Odontologia da
Harvard School of Dental Medicine e acesso e a superar o desafio da escolha da carreira questões de equidade para jovens egressos do a seguir ao término do curso, a PRG conensino médio na África do Sul. O conteúdo, cebeu o Programa Trajetórias, em que peratualmente composto por mais de duas deze- sonalidades de renome compartilham suas nas de “conversas”, também pode ser baixado histórias inspiradoras, procurando motivar na internet. a comunidade por meio de vivências em que O evento recebe especialistas da Unicamp são apresentadas as singularidades dos pere convidados, que abordam temas diretamen- cursos profissionais de cada palestrante. te relacionados ao ensino de graduação. CoA seleta galeria de palestrantes inclui, loca-se no foco a sala de aula e conversa-se a entre outros expoentes, a professora Ada respeito dos vários temas envolvidos no âmbi- Yonath, Prêmio Nobel de Química em 2009; to da graduação, como a relação entre ensino o professor Peter Atkins, titular da Universie aprendizagem, pesquisa, avaliação, relação dade de Oxford, na Grã-Bretanha; o profesFoto: Antoninho Perri sor Alberto Rojo, músico e entre professor e aluno. docente de Física na Univer“Conseguimos estasidade de Oakland; e o cienbelecer, desse modo, um tista social pela Unicamp, espaço institucionalizado Fernando Rossetti, secretápara centralizar o debate rio-geral do GIFE (Grupo de sistemático de questões Institutos, Fundações e Emde interesse da graduação, presas) e chairman da Wings capaz de aglutinar aqueles (Worldwide Initiatives for que estão na linha de frenGrantmakers Support). te na condução desse pro“Trata-se de um projeto cesso, que são os profesque impacta bastante os alusores e os coordenadores nos de graduação, porque há de cursos. Os resultados uma ansiedade natural em têm sido bastante produrelação à carreira e, nos entivos”, salienta Sobrinho, contros, eles têm a oportulembrando que o progranidade de tentar se espelhar ma também está associanas histórias de vida e de do aos serviços de apoio construção de êxito profisdidático e pedagógico sional apresentadas por conoferecidos pelo Espaço de O professor Gilberto Alexandre Sobrinho, vidados de perfil variado”, Apoio ao Ensino e Apren- assessor da PRG. “Mais do que eventos, acrescenta Sobrinho. dizagem (EA)², órgão su- são atividades de formação” bordinado à PRG. A discussão fomenPAD/PED tada pela PRG de temas Concebidos segundo o relativos à graduação espírito de integração que também encontra espacaracteriza as atividades de ço nos Fóruns Permagraduação e de pós-graduanentes, concebidos pela ção na Universidade, os enCoordenadoria Geral contros de aperfeiçoamento da Universidade (CGU) PAD/PED têm por objetivos para propiciar o interintroduzir aos monitores câmbio de experiências e (PAD) noções básicas nas pesquisas feitas por proáreas que fornecem subsífissionais e estudantes dios teóricos para as práticas da Unicamp e profissiode formação de graduandos, nais de outras instituibem como aperfeiçoar para o ções da sociedade. exercício da docência os estudantes de pós-graduação Nessa instância, que da Unicamp. se caracteriza por ser um espaço de integraFrutos de uma parceria ção entre a comunida- Ada Yonath, Nobel de Química, uma das entre a PRG e a Pró-Reitoria de Pós-Graduação (PRPG), de interna da Unicamp atrações do Programa Trajetórias com a comunidade externa à Universidade, a os encontros se realizam em dois momenPRG vem adotando a rotina de desenvolver e tos distintos. No primeiro, a cada início de propor matérias sintonizadas com as grandes semestre letivo, ocorre a apresentação do demandas dos educadores, explica o assessor programa aos novos grupos de monitores e estagiários em uma grande cerimônia no do órgão. Centro de Convenções da Unicamp, inclusive com a presença de alunos dos campi de TRAJETÓRIAS MOTIVADORAS Limeira e Piracicaba. O segundo momento Angústia, ansiedade e insegurança não é composto por desdobramentos dos evenraro convivem com a definição de uma pro- tos iniciais, sob a forma de seis encontros fissão. Para ajudar os alunos de graduação anuais de formação, onde são apresentados
temas previamente selecionados com o intuito de oferecer subsídios para auxiliar o grupo PAD/PED nas suas relações com os demais alunos. “Mesmo que não estejam na linha de frente do ensino, como um docente, os monitores e estagiários realizam uma atividade didática. Então, trazemos para esses encontros de aperfeiçoamento convidados capazes de ajudá-los a se preparar adequadamente para lidar com os desafios que terão pela frente”, observa Sobrinho. “Tratamos de temas mais pontuais, como a questão da avaliação, da afetividade, do uso da voz em sala de aula e da relação comunicativa entre professor e aluno”, exemplifica. Ainda de acordo com ele, poder reunir em torno de um projeto comum alunos de graduação e pós-graduação é extremamente saudável, sobretudo pela riqueza do compartilhamento de experiências com os mais novos por parte daqueles que já vivenciaram a oportunidade de integrar o programa.
NA TELA DA TV Acordo de cooperação técnica firmado entre a Unicamp e a Fundação Padre Anchieta vem permitindo que aulas constituintes de algumas disciplinas ministradas na Universidade sejam gravadas e exibidas com livre acesso pela Univesp TV, canal digital aberto do Programa Universidade Virtual do Estado de São Paulo (Univesp), da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia. No primeiro semestre, foram apresentados os cursos de Física I e Cálculo I, e atualmente já estão disponíveis as aulas de Física II e Cálculo III. A ideia surgiu após o sucesso das Aulas Magistrais na internet. A proposta foi utilizar o mesmo tipo de recurso para disponibilizar aos alunos da Unicamp e de outras instituições as disciplinas que, na Universidade, são aquelas com maior número de matriculados e responsáveis por índices importantes de reprovação, esclarece a professora Dora Kassisse, assessora da PRG. Segundo ela, a receptividade da iniciativa foi extremamente positiva. Disponíveis antes da prova, as gravações dão ao aluno da Unicamp a oportunidade de assistir ou mesmo rever as aulas, o que é de grande valia para dirimir dúvidas e melhorar a preparação. Para a comunidade externa, o material, além de servir igualmente de consulta, colabora para disseminar livremente o conhecimento. De acordo com a assessora, já existe demanda na Universidade para a gravação e exibição de outras matérias. A Univesp TV pode ser sintonizada pelo site http://univesptv.cmais.com.br. O conteúdo das disciplinas também está disponível na página de cursos da Univesp e no canal do Youtube, onde é possível conferir o elevado número de acessos.
12
Campinas, 26 de novembro a 2 de dezembro de 2012
PATRÍCIA LAURETTI patricia.lauretti@reitoria.unicamp.br
a paisagem do sertão nordestino, o céu de um azul exuberante contrasta com o verde pálido dos cactos e a poeira que levanta do solo seco. Um personagem toma conta da cena. É o mestre de cerimônia Rapadura Xique Chico. Chapéu de palha e sandália, ele canta o refrão “vem nortista/agarra essa causa que tu veste/eu digo norte vocês dizem nordeste”. Engajamento em plena caatinga, na cartilha dos gestos e do estilo que se tornou popular a partir das comunidades negras e hispânicas em Nova York nos anos 1970. O rap (e o movimento hip-hop) não ganhou apenas o mundo, mas extrapolou as fronteiras das grandes cidades para se transformar no contato com os mais diferentes climas e sotaques. O clipe do MC cearense Rapadura “Norte, Nordeste – me veste” ultrapassou no Youtube meio milhão de visualizações. Na região amazônica surge o movimento “Hip-Hop da Floresta” e, com ele, o grupo Manoa, de Porto Velho. “De boa, na proa/ no balançar da canoa/ é hip-hop diferente, entende/do Madeirão ao Guaporé”. O bom e velho rap mundial que adiciona o conceito da Indioribeiriferia ou “a junção das culturas dos povos da floresta e das cidades amazônicas, traduzida nas linguagens artísticas do Hip-Hop...”. A explicação está no blog “Comunidade Manoa”. Por linguagens artísticas do hip-hop entenda-se: a música (rap), a dança (break) e as artes plásticas (grafite). Chegamos ao estado de Mato Grosso do Sul, município de Dourados, terra das tribos indígenas Bororó e Jaguapiru. De lá vem o Brô Mc’s, formado por quatro rapazes denunciando as mazelas de suas etnias em duas línguas: português e guarani. “Aldeia unida mostra a cara!” é o brado que foi inclusive atração de programa televisivo global. Ao mesmo tempo, o grupo foi alvo de racismo Foto: Antoninho Perri nas redes sociais. Sim, se o rap já é uma exceção, o rap regional pode ser considerado a exceção da exceção. E tem mais. Contemporâneo de Chico Science, aí está Zé Brown, exrepentista de lata de goiabada em Recife. Na carreira solo ele faz seu “Repente Rap Repente” e o nome do disco diz Renan Lelis tudo. Ele canta “eu Gomes: conhecendo valorizo sim senhor os grupos a minha terra/ prede perto firo a paz e não a guerra/eu valorizo sim os costumes da minha gente/meu chapéu de ouro e meu oxente”. E que tal rap adicionado da milonga e da trova? Trabalho do também veterano Nitro Di, do Rio Grande do Sul, integrante do coletivo “Trovadores RS”. Apresentador de um programa de rádio, além de autor ele virou produtor de grupos que fazem a música do hip-hop baseada no cancioneiro dos pampas. “povo criolo ginetiando a tua ideia/tradição de mão em mão/geração, geração, cuia, erva chimarrão/abre a porteira, boleia/ falo de tudo que nos rodeia/ história, raiz quem disse/ que não ama sua terra me diz?”
Da aldeia à caatinga Fotos: Divulgação
RAP E POLÍTICA
Outra frente do trabalho acadêmico de Renan foi o estudo de como o rap é produzido, gravado e distribuído no Brasil e a análise da relação do hip-hop com a política partidária no país. O pesquisador mapeou a relação entre rap e política e acompanhou a trajetória de alguns candidatos do movimento durante as eleições municipais de 2008. De acordo com Renan, a aproximação com a política começou com o apoio que o grupo Racionais MCs deu para a então candidata à prefeitura de São Paulo Luiza Erundina, em 1990. A partir dos anos 2000, Renan constatou que os apoiadores perceberam que também havia a possibilidade de serem candidatos do hip-hop. “Ao longo desse processo, a associação política que era apartidária passou a ser formalizada e essas pessoas começam a brigar pelo movimento dentro das câmaras municipais”, afirma. O resultado foi o surgimento de leis e editais que, de certa maneira, garantem mais visibilidade a um movimento considerado marginal. “Antes fazíamos eventos com parcos recursos ou apoios que iam embora conforme mudavam os eleitos. Quando existe uma lei como a que instaura em muitas cidades a ‘Semana do hip-hop’, passa a ser obrigação. É uma conquista”. O pesquisador ressalta que a dissertação contribui na leitura do regionalismo como resistência. “O geógrafo Milton Santos foi um norte para o meu trabalho. Ele acredita que haverá um período popular da história, no qual os ‘de baixo’ farão a diferença, utilizando dos recursos tecnológicos que não foram criados para eles. Hip-hop é isso, o uso subversivo dessas ferramentas para fazer a música de protesto que reafirma o papel do lugar do acontecer solidário”. Para Renan, a ideia de lugar é relevo: “Racionais é Capão Redondo, Zona Sul de São Paulo; Rapadura é Nordeste. É um cruzamento bonito entre a arte, a geografia e a cultura”.
EM CADA CANTO
São cinco exemplos, ou cinco situações geográficas, trazendo o assunto para a academia e mais especificamente para a dissertação de mestrado denominada ´Território usado e movimento hip-hop: cada canto um rap, cada rap um canto”, de Renan Lelis Gomes. O trabalho aborda o regionalismo na música rap a partir desses artistas. “O rap brasileiro é isso: cocar e All Star. Em que lugar do mundo se vê algo semelhante?”, indaga o pesquisador. Renan também é Renan Inquérito, rapper do grupo Inquérito, de Campinas, que existe há 14 anos. No princípio ele tinha um pouco de receio de misturar as coisas e trazer sua atividade artística para a pós-graduação no Instituto de Geociências (IG) da Unicamp. Mas o geógrafo e professor da disciplina para o ensino médio e fundamental finalmente gostou do resultado. E teve portas abertas em todo o país por integrar o hip-hop há mais de uma década. O pesquisador conheceu de perto os grupos para verificar as tonalidades regionais de cada um deles. Sobre Rapadura e Zé Brown, ele afirma “que o rap nordestino fala muito da questão do negro, das festas tradicionais, do folclore, de ‘Padim Ciço’, de Lampião, Antônio Conselheiro e Maria Bonita, das revoltas escravistas, e traz o ambiente da embolada, do coco, o duelo da rima que já existia
antes até do hip-hop aqui no Brasil”. As influências passam por Luís Gonzaga e Maria Inês, considerada a rainha do xaxado. No Rio Grande do Sul, a releitura da música gaúcha feita pelos “Trovadores RS” aborda o jeito sulista de ser. “Os grupos produzidos por Nitro Di trazem o chimarrão, as prendas (mulher do peão gaúcho) e guaiacas (parte da vestimenta do peão)”, detalha o pesquisador. Em todos os exemplos, as referências regionais não estão somente nas letras, mas também nos sons. Renan observa na dissertação, referindo-se ao grupo Manoa: “... não é difícil notar os traços específicos daquela região, elementos como o canto dos pássaros, o barulho das águas e da mata, e até mesmo cantos indígenas estão presentes no disco deste grupo, cuja abertura traz um cacique declamando seu canto de guerra sob uma base rap acompanhada de instrumentos indígenas”. O Manoa traz em suas gravações outro instrumento inusitado: uma bacia de alumínio cheia de água que, quando agitada com a mão, produz sonoridade semelhante ao balanço das águas do rio. “No caso, o rio Madeira, tão presente no cotidiano dos habitantes daquele município”, relembra o pesquisador. Para o Brô MCs são os impactos do desenvolvimento do agronegócio que ocupam boa parte dos textos cantados. Os estudos citados por Renan na dissertação tratam de um assunto corrente na mídia: o conflito pela posse da terra no Mato Grosso do Sul. “O grupo Brô MCs representa a etnia Guarani Kaiowá, maior população indígena do Brasil. Suas músicas fazem fortes menções aos saques e barbáries realizados pelo homem branco contra os indígenas, bem como ao processo de destruição física e cultural pelo qual estes povos passam atualmente”, frisa Renan. Mas, embora rico, o universo regional do rap brasileiro não é bem aceito nem mesmo por seus pares. Renan avalia que “o rap regional sofre em razão do ostracismo dentro do próprio rap brasileiro. Não está na mídia e não é o rap que a maioria das pessoas consome”. Para ajudar os grupos estudados, Renan entregou, para cada, um clipe musical que produziu em parceria com o diretor Vras77 e que pretende reunir em um documentário.
Publicação
Na sequência, de cima para baixo, Brô Mc’s, Manoa, Nitro Di, Rapadura e Zé Brown
Dissertação: “Território usado e movimento hip-hop: cada canto um rap, cada rap um canto” Autor: Renan Lelis Gomes Orientador: Marcio Antonio Cataia Unidade: Instituto de Geociências (IG) Financiamento: Fapesp