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Ilustrações: Reprodução

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A história do estelionatário que se tornou pioneiro do cinema brasileiro

Jornal daUnicamp www.unicamp.br/ju

Campinas, 29 de agosto a 11 de setembro de 2016 - ANO XXX - Nº 667 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

MALA DIRETA POSTAL BÁSICA 9912297446/12-DR/SPI UNICAMP-DGA

CORREIOS

FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT Fotos: Antoninho Perri

Segunda pele Materiais desenvolvidos no Biofabris, instalado na Faculdade de Engenharia Química da Unicamp: produção em escala maior

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Estudo associa dor crônica à depressão Por um novo código de gestão das águas Tese avalia riscos de bactéria em transfusão O poder antioxidante do óleo e da semente de chia

A pesquisadora Ana Flávia Pattaro sintetizou, caracterizou e processou polímeros biorreabsorvíveis para obtenção de materiais que podem ser implantados em vítimas de acidentes, seja como “segunda pele” ou como prótese. A pesquisa foi orientada pelo professor Rubens Maciel Filho.

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Nuvem recebe R$ 8,4 mi da Finep Recursos permitirão aquisição de equipamentos, mais que dobrando capacidade instalada no CCUEC

Fotos: Antoninho Perri

LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

projeto “Nuvem Computacional da Unicamp”, que vem sendo elaborado há três anos, já tem o seu embrião implantado no Centro de Computação (CCUEC) desde 23 de junho. Agora, com a aprovação pela Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) de recursos da ordem de R$ 8,4 milhões, serão adquiridos mais equipamentos para fazer com que este embrião cresça rapidamente em pelo menos quatro vezes, alcançando mais que o dobro da capacidade hoje instalada no CCUEC. O projeto teve aprovação unânime da Comissão de Planejamento Estratégico Institucional (Copei), onde estão representadas todas as unidades da Universidade, tanto de ensino e pesquisa como administrativas. O professor Alvaro Crósta, coordenador geral da Unicamp, explica que a nuvem é um conceito mais moderno da computação e uma tendência mundial à qual a Universidade está se alinhando. “Passamos por várias etapas na história da instituição: a primeira foi da computação totalmente centralizada, através dos antigos mainframes; depois veio um momento de descentralização, com servidores espalhados por toda a Universidade; e agora voltamos ao caminho da centralização, mas de uma maneira virtual, em que não haverá necessidade das unidades terem seu datacenters para fazer tudo o que fazem – e muito mais.” Segundo Crósta, a tendência moderna é de uma infraestrutura centralizada que os usuários possam acessar de qualquer lugar ou dispositivo, via internet. “É o grande salto que pretendemos dar com este projeto. Hoje temos datacenters espalhados pelos campi, cada um deles exigindo equipamentos, pessoal treinado e infraestrutura de energia elétrica e refrigeração, bem como de backup contínuo dos dados. No futuro vamos colocar na nuvem todos os aplicativos que as pessoas têm instaladas em suas mesas, reduzindo ou eliminado a necessidade de infraestrutura local. Isso permite um ganho fenomenal de escala e em termos de custos.” O professor José Raimundo de Oliveira, coordenador da Coordenadoria de Tecnologia da Informação e Comunicação (CTIC), destaca a participação da comunidade de cientistas da Unicamp, que abraçaram prontamente este projeto para estabelecimento de uma nuvem computacional essencialmente para uso em pesquisa. “Tivemos pesquisadores de praticamente todas as áreas discutindo a proposição. Foi definido um grupo técnico de trabalho formado por professores da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação, do Instituto de Computação e do Instituto de Física, e por técnicos do CCUEC e do Cenapad [Centro Nacional de Processamento de Alto Desempenho]. Esta equipe técnica definiu a arquitetura e a opção de tecnologia a ser utilizada na nuvem.”

O professor Alvaro Crósta, coordenador geral da Unicamp: “No futuro vamos colocar na nuvem todos os aplicativos que as pessoas têm instaladas em suas mesas”

O professor José Raimundo de Oliveira, coordenador da CTIC: “Tivemos pesquisadores de praticamente todas as áreas discutindo a proposição”

Paulo Sérgio de Moraes, diretor de Produção e Suporte do CCUEC: “A ideia de futuro é interligar as nuvens das três universidades paulistas”

Oliveira afirma que o primeiro passo do projeto foi a implantação de um pequeno conjunto de sistemas, o chamado embrião da nuvem, que já está em uso. “Dizemos ‘pequeno’, mas equivale a cerca de metade de tudo o que já tínhamos no Centro de Computação – e dizemos ‘embrião’ porque é pequeno comparado a até onde podemos chegar. Como segundo passo, viabilizado pelos recursos da Finep, estamos com edital pronto para aquisição de equipamentos visando ampliar o embrião, chegando a mais que o dobro da capacidade de todo o nosso parque.” O coordenador da CTIC destaca conceitos marcantes como da elasticidade, visto que, alocado um sistema virtual dentro da nuvem, ele pode crescer criando-se máquinas conforme a necessidade. “Outro conceito dos mais importantes é de compartilhamento: um servidor básico custa em torno de 20 mil reais e talvez dure três anos, mas o pesquisador que adquiri-lo para seu laboratório vai desligá-lo no final da tarde; ou seja, perde um ano de vida do seu equipamento. Com o compartilhamento, o servidor, quando não está sendo usado por este pesquisador, pode servir a outro. Pensando na universidade como um todo, isso significa otimização de recursos.” Paulo Sérgio de Moraes, diretor de Produção e Suporte do CCUEC, adianta que o projeto prevê que a estrutura seja replicada, utilizando os recursos de outras unidades da Unicamp, agregando-os à nuvem. “As unidades também possuem equipamentos subutilizados, que podem ser compartilhados com toda a Universidade. Outro ponto interessante é a autonomia: o administrador ou pesquisador de uma unidade pode entrar na nuvem, criar sua máquina virtual para pesquisa ou atividade administrativa e ele mesmo fazer a gestão disso, com autonomia total.” Moraes observa ainda que a proposta de software deste projeto da Unicamp segue a mesma linha da USP, que já tem uma estrutura implantada há mais de três anos, e da Unesp, que também já fez investimentos em nuvem. “A ideia de futuro é interligar as nuvens das três universidades paulistas, possibilitando que os pesquisadores dessas instituições façam o uso cruzado: se a Unicamp não possui determinada estrutura, poderá usar a da Unesp, e vice-versa – e usar remotamente, como se estivesse na própria universidade.”

INVESTIMENTO Conforme Álvaro Crósta, o investimento no projeto Nuvem Computacional da Unicamp será de aproximadamente R$ 17,4 milhões. “A primeira etapa foi com recursos próprios da ordem de 6 milhões de reais, acumulados por vários anos, que agrupamos e destinamos ao projeto; também recebemos cerca de 3 milhões da Fapesp e, agora, 8,4 milhões da Finep. Comparando com o projeto de nuvem da USP, o nosso vai sair muito mais barato e com uma tecnologia distinta e mais atualizada. O avanço tecnológico acabou nos beneficiando.” José Raimundo de Oliveira conta que desde a inauguração do embrião, várias unidades já vêm realizando testes e algumas já se comprometeram a transferir recursos para a nuvem. A expectativa é de que pelo menos parte dos equipamentos listados nos editais de compra chegue até o final do ano. Com a infraestrutura de rede já adquirida e toda a equipe técnica sendo capacitada, a nuvem deve estar no ar entre o final de agosto e início de setembro. “Já temos um backbone a 10 gigabits, restando ampliar as interfaces com algumas unidades para que possam usufruir de toda a velocidade que a rede vai ter. O embrião está aqui e vai crescer, é uma questão de plugar.”

UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas Reitor José Tadeu Jorge Coordenador-Geral Alvaro Penteado Crósta Pró-reitora de Desenvolvimento Universitário Teresa Dib Zambon Atvars Pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários João Frederico da Costa Azevedo Meyer Pró-reitora de Pesquisa Gláucia Maria Pastore Pró-reitora de Pós-Graduação Rachel Meneguello Pró-reitor de Graduação Luís Alberto Magna Chefe de Gabinete Paulo Cesar Montagner

Elaborado pela Assessoria de Imprensa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Periodicidade semanal. Correspondência e sugestões Cidade Universitária “Zeferino Vaz”, CEP 13081-970, Campinas-SP. Telefones (019) 3521-5108, 3521-5109, 3521-5111. Site http://www.unicamp.br/ju e-mail leitorju@reitoria.unicamp.br. Twitter http://twitter.com/jornaldaunicamp Assessor Chefe Clayton Levy Editor Álvaro Kassab Chefia de reportagem Raquel do Carmo Santos Reportagem Carlos Orsi, Carmo Gallo Netto, Isabel Gardenal, Luiz Sugimoto, Manuel Alves Filho, Patrícia Lauretti e Silvio Anunciação Fotos Antoninho Perri e Antonio Scarpinetti Editor de Arte Luis Paulo Silva Editoração André da Silva Vieira Vida Acadêmica Hélio Costa Júnior Atendimento à imprensa Ronei Thezolin, Gabriela Villen, Valerio Freire Paiva e Eliane Fonseca Serviços técnicos Dulcinéa Bordignon Assine o jornal on line: www.unicamp.br/assineju


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Em escala maior

Fotos: Antoninho Perri

Pesquisadora sintetiza, caracteriza e processa polímeros biorreabsorvíveis implantados em vítimas de acidentes LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

ese de doutorado apresentada na Unicamp promete ser um primeiro passo para suprir a limitação do Brasil na produção de alguns biomateriais, que ainda precisam ser importados visando aplicações como para corrigir e regenerar lesões de tecidos e ossos em vítimas de acidentes traumáticos. A pesquisa de Ana Flávia Pattaro resultou na síntese, caracterização e processamento de polímeros biorreabsorvíveis para obtenção de materiais com características específicas para cada área de aplicação em engenharia de tecidos. A tese foi orientada pelo professor Rubens Maciel Filho, coorientada pela doutora Maria Ingrid Rocha Barbosa Schiavon e desenvolvida no âmbito do Biofabris – Instituto de Biofabricação, instalado na Faculdade de Engenharia Química (FEQ). Ana Flávia Pattaro afirma que a obtenção de polímeros puros, copolímeros e nanocompósitos são fundamentais para que os biomateriais alcancem diferentes propriedades e desempenhos, sendo muito versáteis na aplicação em engenharia de tecidos. “Trabalhei com dois polímeros já conhecidos no meio científico, PGA (Poli (Glicolídeo)) e PLLA (Poli (L-Lactídeo)). A grande vantagem foi sair da ampola em laboratório para produzir polímeros em escala maior, principalmente aqui no Brasil, onde há pouca síntese deste material – ele é normalmente importado, vindo já sintetizado para produção de próteses.” A inovação neste estudo, segundo a pesquisadora, está na síntese do PLLA juntamente com argila bentonítica para produzir um nanocompósito esfoliado. “Atestamos que a argila não interfere no crescimento celular, sendo que esta parte do trabalho se encontra inclusive em processo de patente. A tese pode gerar muitas outras pesquisas, envolvendo desde a copolimerização, que ainda precisa de ajustes, até o processamento do nanocompósito por eletrofiação [técnica de produção de fibras com diâmetros em escala nanométrica], o que em minha opinião representa grande potencial para a sua utilização em pele, curativos e outras aplicações.” A autora da tese explica que os polímeros biorreabsorvíveis podem ser utilizados como scaffolds (estruturas para implantes), fios de sutura, pinos e na liberação controlada de drogas, entre outras aplicações. “Esses materiais importados são muito caros, havendo grande necessidade de realizar esta produção no Brasil. Para cada tipo de aplicação é necessário que tenham características bem definidas de síntese. A maior vantagem da utilização de biopolímeros em próteses é que sua absorção pelo organismo ocorre simultaneamente ao crescimento do tecido danificado, não havendo necessidade de remoção da prótese nem problemas de rejeição.” De acordo com o professor Rubens Maciel Filho, os compostos presentes nestes biopolímeros auxiliam no crescimento celular, permitindo sua utilização, por exemplo, como bandagens para úlceras causadas por diabetes e outras feridas que demoram a cicatrizar. “O material potencializa o crescimento da pele diminuindo o risco de infecções. Dependendo da técnica de fabricação é possível ob-

ter filmes suficientemente flexíveis para aplicação como segunda pele em queimaduras e outras lesões maiores; ou para aplicações que exijam maior resistência mecânica, como parafusos em reconstruções ósseas.” O professor considera importante destacar que a técnica para sintetizar um biomaterial com nanocompósito esfoliado foi desenvolvido dentro do Biofabris, com um campo de aplicações que vai muito além do imaginado pelo grupo, sobretudo na área médica e outras correlatas. “Não se trata de um produto de prateleira, disponível em farmácias ou mesmo em lojas especializadas. Há uma série de aplicações que ficarão mais claras no andamento das pesquisas, devido às características que este material já apresenta e pode apresentar. Isso se deve não apenas à presença da argila, mas à forma esfoliada como estão estruturados. É um polímero obtido simultaneamente com a colocação dos nanomateriais e, por isso, com propriedades mais eficientes para certas aplicações.” Para André Luiz Jardini, pesquisador sênior do Biofabris, o impacto deste trabalho está na produção de um material final que pode ser utilizado em diversas áreas, como em cirurgia plástica, quando a pessoa sofre um acidente e há deformação de parte do assoalho da órbita onde o globo ocular é sustentado. “Com este material é possível produzir implantes para reconstruir o assoalho e, sendo biorreabsorvível, o organismo vai absorvêlo conforme ocorre o crescimento ósseo no local. É uma área delicada não só em termos de cirurgia plástica quanto de implantação de parafusos de titânio para fixação de placas.” A bióloga Ana Amélia Rodrigues ficou responsável pelos testes em cultura de células, observando como os biopolímeros interagiam com células como de regeneração de cartilagem (fibroblastos). “Pelo menos nos testes em laboratório feitos até o momento, esses materiais não interferiram na proliferação das células. Esses testes são os recomendados para a produção de biomateriais, o que já permite avançar para ensaios in vivo dando prosseguimento ao trabalho.” Rubens Maciel Filho lembra que é preciso considerar o valor agregado ao biomaterial, não por ele em si, mas pela dificuldade de produção, funcionalidade e importância da aplicação. “Implantado no ser humano, este material vai dar a resposta desejada pelo médico, permitindo que um osso cresça e se regenere, sem a necessidade de uma segunda cirurgia para sua retirada. Estamos partindo de materiais relativamente baratos para valorizá-los ao preço do ouro. Possuímos um dado de que, produzindo o lactídeo e o polímero através do açúcar como matéria-prima, estaremos multiplicando em mais de 100 mil vezes o valor de exportação desta commodity. Outros produtos podem ainda ser produzidos agregando valores a matérias-primas nacionais”.

Material desenvolvido pela pesquisadora: diferentes propriedades e desempenhos

O BIOFABRIS

Ana Flávia Pattaro, autora da tese: “Atestamos que a argila não interfere no crescimento celular, sendo que esta parte do trabalho se encontra inclusive em processo de patente”

Ana Flávia Pattaro esclarece que, para sua tese, os polímeros biorreabsorvíveis foram sintetizados a partir do dímero (lactídeo e glicolídeo), que é importado a um custo aproximado de R$ 15 mil o quilo. “Nosso desafio agora é desenvolver o lactídeo a partir do ácido láctico, uma fonte que pode vir da fermentação da cana-de-açúcar, tornando toda a cadeia muito mais acessível financeiramente. Desde a sua criação, o Biofabris sempre teve este objetivo: a biofabricação para desenvolver produtos que cheguem à sociedade.”

Publicação Tese: “Síntese, caracterização e processamento de polímeros biorreabsorvíveis para uso na engenharia de tecidos (Tissue Engineering)” Autora: Ana Flávia Pattaro Orientador: Rubens Maciel Filho Coorientadora: Maria Ingrid Rocha Barbosa Schiavon Unidade: Faculdade de Engenharia Química (FEQ) Financiamento: Fapesp, CNPq e BunTech

O professor Rubens Maciel Filho, orientador da pesquisa e coordenador do Biofabris: “O material potencializa o crescimento da pele diminuindo o risco de infecções”

O Biofabris é financiado pelo Governo Federal e pela Fundação de Auxílio à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), tendo o professor Rubens Maciel Filho na coordenação. O laboratório conta também com a participação de docentes da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM), Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW) e da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, e com pesquisadores do Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), entre outras instituições. Sobre esta missão do Biofabris, Maciel Filho aponta a necessidade de dominar áreas fundamentais para o desenvolvimento de aplicações destinadas à população que não tem condições de pagar os valores convencionais. “Queremos mostrar que a pesquisa acrescenta valor aos produtos, dentro de um conceito diferente que é a bioeconomia, trazendo riqueza real para o país e garantindo acessibilidade a todos. É um trabalho em equipe, com várias etapas de produção e conhecimentos específicos que o valorizam demais. É bom lembrar que o Brasil vive quase uma guerra do Vietnã por ano em acidentes de moto nas grandes cidades, vitimando uma maioria de jovens que custam para o Estado, para a família e principalmente para eles próprios, que interrompem seus projetos de vida por nem todos terem acesso a próteses e tratamento especializado.” André Jardini também destaca a multidisciplinaridade da equipe, que no caso desta pesquisa reuniu químico, engenheiro químico, engenheiro mecânico, engenheiro de materiais e biólogo. “É assim desde a criação do Biofabris em 2009. Um pesquisador, isoladamente, dificilmente chega a um material como este, capaz de gerar impacto na sociedade. Os estudos com esses biopolímeros prosseguem, agora na parte de aplicação, com a criação de um projeto para aprovação no comitê de ética e início dos testes pré-clínicos, a fim de identificar as áreas de interesse como de dermatologia, cardiologia (stents) e cirurgia plástica (parafusos e placas). E há a questão prévia, que é a síntese do material precursor, ou seja, como produzir o lactídeo a partir de fontes renováveis, no caso, melaço da cana-de-açúcar.” Ana Flávia Pattaro, que teve apoio da Fapesp, do CNPq e da BunTech (empresa do grupo BUN – Bentonit União Nordeste) para desenvolver a tese de doutorado, lembra que ainda há muito trabalho pela frente para ajustar as propriedades do material. “É apenas o início de muita pesquisa. Precisamos, por exemplo, ajustar as propriedades do nanocompósito para cada tipo de aplicação, incluindo próteses e, também, aperfeiçoar o processo de organofilização (transformação da argila para que tenha afinidade com o polímero), pois qualquer resíduo pode interferir no crescimento celular. Não recorremos a qualquer tipo de purificação para este polímero, o que também representa um grande progresso: quanto menos processos envolvendo solventes, melhor o resultado final, com produtos que não causem toxidade.”


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Estudo associa dor crônica à depressão e ao estresse social Fotos: Antonio Scarpinetti

Pesquisa identificou mecanismos neurofisiológicos comuns em experimentos feitos com animais

O biólogo Marco Oreste Finocchio Pagliusi, autor da dissertação: “Nossos dados sugerem que a dor crônica e os transtornos depressivos podem compartilhar semelhantes mecanismos de neuroplasticidade induzida pelo estresse”

SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br

ma pesquisa desenvolvida no Instituto de Biologia (IB) da Unicamp revelou, em experimentos com animais, que o estresse social pode ser uma das causas tanto dos quadros depressivos como de dores crônicas. O estudo apontou ainda que não somente o estresse, mas a depressão está fortemente relacionada a dores crônicas, como a fibromialgia, por exemplo. A pesquisa se utilizou de uma adaptação inédita de um modelo de estresse por subjugação social (Social Defeat Stress, na sigla em inglês). Nos experimentos, camundongos intrusos foram submetidos a uma espécie de bullyng por camundongos residentes, de uma linhagem mais robusta e agressiva. Uma parte do grupo subjugado apresentou características comportamentais e fisiológicas do tipo depressivas. Além disso, o mesmo grupo apresentou maior sensibilidade à dor por um longo período de tempo, embora os animais subjugados não tivessem qualquer tipo de lesão física. A partir dos experimentos e de análises moleculares em fragmentos cerebrais dos animais, os pesquisadores concluíram que o estresse causou mudanças plásticas nos cérebros dos roedores. O principal apontamento revela a existência de mecanismos neurofisiológicos comuns, tanto à dor como à depressão. O modelo de estresse por subjugação social se aproxima bastante do que acontece com humanos em suas relações sociais, relatam os pesquisadores envolvidos. Os experimentos integraram parte da dissertação de mestrado do biólogo Marco Oreste Finocchio Pagliusi Junior. O trabalho foi defendido recentemente junto ao programa de Pós-Graduação em Biologia Funcional e Molecular do IB. Os professores Carlos Amílcar Parada e Cesar Renato Sartori, ambos do Departamento de Biologia Estrutural e Funcional da Unidade, orientaram e coorientaram a pesquisa, respectivamente. “Nossos dados sugerem que a dor crônica e os transtornos depressivos podem compartilhar semelhantes mecanismos de neuroplasticidade induzida pelo estresse. Tal plasticidade estaria associada às áreas encefálicas relacionadas aos mecanismos neurais de recompensa, como o Núcleo Accumbens e a Área Tegmentar Ventral”, explica o pesquisador Marco Oreste Júnior. Ainda de acordo com o autor do estudo, os resultados intensificam o debate da literatura científica que questiona se a dor crônica e a depressão são duas condições distintas com alta comorbidade ou se são sintomas diferentes de uma mesma condição. “Além disso, avançamos na compreensão destes fenômenos apontando novos alvos tanto para o estudo quanto para o tratamento de dor crônica e da depressão.” A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) financiou o estudo na forma de bolsa concedida ao pesquisador da Unicamp, que é graduado em Ciências Biológicas pelo IB. O estudo insere-se no âmbito de trabalhos sobre a neurobiologia da dor que vêm sendo desenvolvidos no Laboratório de Estudos da Dor, coordenado pelo professor Carlos Amilcar Parada. Os resultados parciais da pesquisa de mestrado foram apresentados no congresso internacional Neuroscience 2014, promovido em novembro daquele ano em Washington, distrito de Colúmbia (D.C), nos Estados Unidos, pela Society for Neuroscience.

O orientador do trabalho, professor Carlos Amílcar Parada, explica que a dor crônica se caracteriza, principalmente, por ser do tipo no qual não há uma lesão traumática, situação muito comum em pacientes com lombalgia e fibromialgia. Amílcar Parada coordena, na Unicamp, linha de pesquisa sobre o mecanismo molecular da dor. “Nós acreditamos que este tipo de condição de estresse social, que é um estresse muito comum na rotina das pessoas, tem uma relação com a fibromialgia. O trabalho do Marco mostra que esse estresse social e, consequentemente, a depressão oriunda dele, pode estar associado a uma alteração nos neurônios responsáveis por uma maior sensibilidade à dor. Portanto, nos pacientes com dor crônica, muitas vezes, não é o músculo que está com problema, mas o sistema nervoso central”, relaciona o docente. O autor da pesquisa, Marco Oreste Junior, informa ainda que um estudo de doutorado já aprovado junto ao IB deverá aprofundar os apontamentos do mestrado. O doutorado busca associar a prática regular de exercício físico como uma ação potencialmente terapêutica, tanto para os quadros de dor crônica, como de depressão. A pesquisa em andamento está sendo orientada pelo professor Cesar Renato Sartori, que também atua no Laboratório de Estudos da Dor do IB. “A compreensão melhor dos mecanismos neurofiológicos comuns à dor e à depressão tem um potencial, no futuro, de identificar moléculas para desenvolver novos medicamentos, por exemplo. Mas o nosso enfoque no laboratório e nessa pesquisa é trabalhar com a hipótese de que os mecanismos que estão por traz disso dependem de uma alteração de estilo de vida, muito mais do que de um medicamento que viria resolver o problema”, situa o orientador do doutorado.

O docente Cesar Renato Sartori, que atua na área da neurofisiologia, acrescenta que os estudos subsequentes vão investigar o exercício físico em dois eixos: primeiro como prevenção e segundo como intervenção. Cesar Sartori investigou no seu doutorado na Unicamp o efeito potencialmente antidepressivo e cognitivo da atividade física. “Queremos investigar o exercício físico como intervenção, como ação capaz de impedir que o indivíduo desenvolva essas doenças e sintomas. E segundo, como uma proposta terapêutica, nos casos em que já ocorreram a depressão e a dor crônica. A hipótese é que essa proposta de alteração de estilo de vida e comportamental volte a regular o sistema de maneira natural e fisiológica, revertendo aquilo que induz ao desenvolvimento da dor e da depressão.”

EXPERIMENTOS

Marco Oreste explica que a partir dos experimentos com os roedores foram identificados dois grupos de animais: suscetíveis e resilientes. “Nossos resultados mostraram que aqueles animais mais resilientes ao comportamento depressivo são também um pouco mais resistentes a terem dor crônica. Isso nos dá indicativo de que os mecanismos neurais que suportam os dois fenômenos, a depressão e a dor crônica, são comuns ou parcialmente comuns.” O autor da pesquisa esclarece ainda que os camundongos submetidos aos experimentos passaram por sessões diárias de estresse por subjugação social por dez dias consecutivos. Após esse período, os animais foram submetidos a testes para a avaliação do comportamento do tipo depressivo e de resposta a estímulos aversivos, como aqueles que geram a dor.

O professor Carlos Amílcar Parada, orientador: “Nós acreditamos que este tipo de condição de estresse social, que é um estresse muito comum na rotina das pessoas, tem uma relação com a fibromialgia”

“Encerrada a avaliação comportamental, todos os camundongos foram eutanasiados e seus encéfalos retirados para posterior microdissecção do Núcleo Accumbens e Área Tegmentar Ventral para análises moleculares”, especifica. Em relação ao modelo de subjugação social por estresse, o autor da dissertação afirma que se trata de uma adaptação bastante fiel ao modelo de comportamento depressivo do ser humano. “Esse modelo foi estabelecido em 2006 por um grupo americano e adaptado para este tipo de pesquisa que nós desenvolvemos aqui. Em modelos antigos de indução de depressão usava-se muito a restrição física, como frio, choque elétrico, etc. Mas isso não simula muito bem as condições em seres humanos. Na subjugação social os animais são submetidos a confronto social, como se fosse um bullyng mesmo.”

Publicação Dissertação: “Estudo do efeito do estresse por subjugação social sobre o comportamento nociceptivo de camundongos e mecanismos neurobiológicos associados” Autor: Marco Oreste Finocchio Pagliusi Junior Orientador: Carlos Amilcar Parada Coorientador: Cesar Renato Sartori Unidade: Instituto de Biologia (IB) Financiamento: Fapesp

O professor Cesar Renato Sartori, coorientador: “Queremos investigar o exercício físico como intervenção, como ação capaz de impedir que o indivíduo desenvolva essas doenças e seus sintomas”


5 Campinas, 29 de agosto a 11 de setembro de 2016 Fotos: Antonio Scarpinetti

Tese propõe mudanças

na classificação de águas

Depósito de água mineral em Campinas: produto é considerado minério pela legislação

Economista analisou o arranjo institucional que rege o aproveitamento comercial do produto ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br

partir do Código de Minas, de 1934, e do Código de Águas Minerais, de 1945, as águas minerais, termais, gasosas e potáveis de mesa no Brasil passaram a ser consideradas como minério, não mais como recurso hídrico. O Código de Mineração de 1967 manteve essa classificação e, atualmente, o projeto de lei que prevê um novo código não trata das mudanças na institucionalidade das águas minerais, mantendo a classificação de minério. Um estudo de doutorado do Instituto de Economia (IE), de autoria do economista Pedro dos Santos Portugal Júnior, analisou o arranjo institucional que rege o aproveitamento comercial das águas minerais no país e concluiu que ele provoca desarticulação normativa e conflitos que culminam com a exploração insustentável desses recursos. “Por isso é preciso mudar essa institucionalidade, considerando as águas minerais como recursos hídricos, e fortalecer os órgãos gestores e reguladores desse segmento”, afirmou. Segundo o pesquisador, a sua tese faz uma proposta diferenciada de integração das águas minerais na gestão dos recursos hídricos dentro da Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH). “Nesse âmbito, deverá prevalecer uma boa estrutura técnica e liberdade de ação e fiscalização dos órgãos.” Na literatura, Pedro buscou informações sobre a gestão da água mineral nos Estados Unidos, Portugal, Espanha, França, Alemanha, Argentina e Colômbia. Desses, informou ele, somente Portugal e Espanha consideram institucionalmente as águas minerais como minério. Todos os demais a consideram como recurso hídrico e alimento, inclusive a França, que possui uma das melhores legislações sobre gestão de águas no mundo. Na Espanha, há um debate no momento, assim como no Brasil, para a mudança dessa institucionalidade e para que as águas minerais passem a integrar finalmente a gestão de recursos hídricos.

Agora no doutorado, orientado pelo professor do IE Bastiaan Philip Reydon, o autor continuou a observar que muitos problemas na exploração e uso desse recurso ocorriam pela confusão institucional que existe e pela falta de articulação entre as leis que regem esse mesmo recurso: a água. Foi por essa razão que resolveu propor uma mudança na institucionalidade das águas minerais no Brasil. A ideia foi integrála com a Política Nacional de Recursos Hídricos e com ampla participação social, via Comitês de Bacia Hidrográfica. Para verificar a receptividade de sua proposta, Pedro fez uma pesquisa em 2015 com estudiosos e pessoas que trabalham com esse tema. Usou um método denominado painel de especialistas. A partir dessa consulta, ficou claro que a maioria deles era contrária à manutenção da atual institucionalidade que considera as águas como minério. Essas pessoas indicaram alterações relevantes no documento, enfatizando a necessidade de um papel central das secretarias estaduais de recursos hídricos (que fazem a gestão das águas subterrâneas conforme a PNRH) e uma mais forte integração com os Comitês de Bacia Hidrográfica. Ele sugeriu que as águas minerais, termais, gasosas e potáveis de mesa passem a ser reputadas como alimento no Brasil e que, no que se refere à sua classificação como recurso hídrico, ela siga a Política Nacional de Recursos Hídricos. Quanto à sua classificação como alimento, deverá seguir os parâmetros da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), como já acontece atualmente.

Outro ponto saliente na proposta é a imediata reclassificação das águas, determinando como minerais apenas aquelas que apresentem ação medicamentosa, e elas deverão ter um tratamento diferenciado na PNRH. Já as águas potáveis de mesa (comercializadas por meio de garrafas, garrafões e copos) deverão ser enquadradas como águas para consumo comum e seguir os padrões de gestão e fiscalização já instituídos pela Política Nacional de Recursos Hídricos. Pedro propôs ainda políticas públicas como a instituição de instrumentos econômicos por meio da cobrança pelo uso da água, no lugar da Contribuição Financeira sobre a Exploração Mineral (CFEM). “Assim, as arrecadações por meio de cobrança pelo uso da água devem ser aplicadas na região da bacia hidrográfica onde se explorou o recurso, com vistas a melhorias e preservação do meio ambiente e das águas.” O economista abordou a aplicação efetiva da gestão de resíduos sólidos nas empresas de águas minerais no Brasil, por conta da grande quantidade de embalagens plásticas usadas. Isso está em pauta no Grupo de Coalização Empresarial, Setor de Embalagens. “Mas agora precisa ser ampliado”, opinou o estudioso, que é mestre em desenvolvimento econômico e professor e pesquisador do Centro Universitário do Sul de Minas, em Varginha.

PRODUÇÃO O país é o quarto maior produtor mundial de águas minerais, empatado com a In-

PROPOSTA Desde o mestrado, o pesquisador se interessou pelo tema das águas minerais e discutiu a gestão ambiental em empresas que exploram esse recurso. Viu o grave problema que há nesse segmento pois, no Brasil, a água subterrânea pode ser classificada de duas formas pelas suas características. Se for tida como recurso hídrico, segue a Política Nacional de Recursos Hídricos, e seu domínio e gestão ficam a cargo dos Estados. Se classificada como água mineral, segue os códigos de mineração e águas minerais, e seu domínio e gestão ficam a cargo da União, especialmente do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

donésia e atrás da China, Estados Unidos e México. O total produzido no Brasil em 2013 foi de 11 bilhões de litros. Isso incluiu água engarrafada, uso como insumo para produção de sucos prontos, cervejas, refrigerantes e chás prontos, e consumo direto em balneários e parques. A produção de água engarrafada sozinha totalizou 7,1 bilhões de litros, ou seja, 65% da produção nacional. O crescimento da produção total no Brasil entre 2008 e 2013 foi de 93,74%, muito acima da média de crescimento mundial – que foi de 32,60% no mesmo período. “Nesse sentido, os principais gargalos são o aumento vertiginoso do consumo de água mineral engarrafada e a superexploração desse recurso, que pode provocar sérios danos ambientais, como rebaixamento do terreno no entorno da fonte e falta de água para abastecimento urbano, caso a fonte de água subterrânea seja um tributário dos mananciais de abastecimento”, contextualizou o economista. A poluição causada pela produção e pelas embalagens empregadas na comercialização também é outro gargalo, juntamente com o enfraquecimento do ecoturismo, a favor apenas da exploração industrial e comercial. Isso tudo ainda vem somado à confusão institucional, que provoca problemas e conflitos, e à falta de fiscalização, que faz com que muitas empresas explorem a água acima do máximo permitido. Mas, de acordo com Pedro, os problemas não terminam por aí. Tem o aumento da exploração desse recurso por grandes empresas nacionais e multinacionais, o que pode levar a uma oligopolização desse mercado e ao domínio das fontes desse recurso nas mãos de poucas empresas, advertiu. “É necessário fazer melhorias na Política Nacional de Recursos Hídricos, que ainda possui alguns pontos passíveis de alteração, e o fortalecimento dos órgãos gestores e reguladores, diminuindo a ingerência política e primando pela liberdade de atuação.”

Publicação

Pedro dos Santos Portugal Júnior, autor da pesquisa: “É preciso mudar essa institucionalidade, considerando as águas minerais como recursos hídricos, e fortalecer os órgãos gestores e reguladores desse segmento”

Tese: “A controvérsia sobre as águas: uma proposta de integração institucional e de políticas públicas para o segmento de águas minerais no âmbito da gestão de recursos hídricos” Autor: Pedro dos Santos Portugal Júnior Orientador: Bastiaan Philip Reydon Unidade: Instituto de Economia (IE)


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Campinas, 29 de agost

Um mitômano nos primór

Pesquisa revela a trajetória de Eugênio Maria Piglione Rossiglione de Farnet, c CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br

cidade de São Paulo chegava à década de 1920 passando por diversas modificações urbanas e mudanças no modo de vida das elites. Tinha um teatro municipal, viadutos uniam partes da cidade antes separadas por vales, várzeas eram dominadas, casarões construídos pelos barões do café ocupavam aquela que veria a ser a Avenida Paulista. Desenvolvia-se uma cidade cosmopolita, de pretensões europeias que já se espelhava em cidades americanas, com uma população de aproximadamente 580 mil habitantes, com grande contingente de imigrantes italianos, mas também de portugueses, espanhóis, alemães e franceses. No decorrer e depois da Primeira Grande Guerra começara a se desenvolver o parque industrial paulistano e em consequência cresciam e adensavam-se na cidade os bairros operários, marginalizados pela elite paulistana. Era uma São Paulo que se desenvolvia economicamente e ansiava por progresso e modernidade, impulsionada pelos valores burgueses. É a esta cidade, marcada pela cultura europeia, influenciada pelos valores propagados através do cinema silencioso proveniente dos EUA e fascinada pelo fantasioso, que chega, em meados de 1921, Eugênio Maria Piglione Rossiglione de Farnet, dizendo-se proveniente de Gênova. Apresenta-se como nobre, cujas proezas ao redor do mundo são registradas pela imprensa paulista como fait divers, proveniente de um hipotético diário pessoal, próximo do folhetim rocambolesco. A partir de 1923, ao se mudar para Campinas, interior de São Paulo, Eugênio abandona o sobrenome Pignone e se denomina E. C. Kerrigan, pretenso diretor ítalo-americano com experiências nos estúdios da Vitagraph e da Paramount. Dizia-se filho de um conde e de uma multimilionária americana. Mitômano, sempre elegantemente trajado, utilizava a lábia e o charme para exercer sua tendência mórbida para a mentira com o fim de atingir seus objetivos, aproveitando-se do clima provinciano da cidade. É recebido e hospedado por uma família de um mecânico italiano e em pouco tempo os engabela com suas histórias mirabolantes, surrupiando-lhes as economias acumuladas em anos de trabalho. Naturalmente tudo seria devolvido em poucos meses quando seus pais viriam morar em um palácio em São Paulo. O que naturalmente nunca aconteceu. Casa-se com uma das moças da família paulistana que o acolhera e, logo depois, o sogro, desconfiado, vai a Gênova para verificar a veracidade das histórias que tanto fascinara a família. Descobre que eram todas mentirosas e que seu genro não passava de um estelionatário internacional. Telegrafa à família relatando a descoberta. Desesperada, uma das cunhadas lhe dá um tiro. Pignone vai para as páginas policiais, inicialmente como vítima, mas logo as investigações mostram que ele usara todos os recursos imaginários para ludibriar a família. Mesmo assim, logo depois consegue espaço no Fanfulla, jornal da colônia italiana, para contar histórias de sua vida fantasiosa e ganha espaço nos noticiários de O Estado de S. Paulo e do Correio Paulistano pela peculiaridade dos entrechos. Na verdade estabelece-se um pacto em que a imprensa abdica da veracidade para ter alimentados seus desejos por histórias fabulosas, fantásticas, que ele é capaz de oferecer. A propósito, ao publicar suas narrativas na forma de folhetim, o Fanfulla, que só perdia em tiragem para o conceituado órgão paulista, esclarece que não se responsabiliza pela veracidade dos fatos, mas o faz atendendo ao interesse público.

Nesse folhetim, Pignone narra duas de suas aventuras. Na Itália ele teria conquistado uma filha de japoneses e o pai, supondo-a desonrada, quer que ele cometa haraquiri. Ele conta então como escapou dessa aventura, refugiando-se em Paris. Lá teria se dedicado a explorar a vida noturna da cidade, os bordeis e a ação de criminosos violentos, os apaches, como eram denominados. Ao sofrer uma tentativa de assalto, descobre a existência de um bando de criminosos e resolve desarticulá-lo. O espírito que revela nessas narrativas aventureiras, fantasiosas ou não, permeiam toda a vida de Pignone e suas posteriores pretensões cinematográficas, conforme ele já revelara na época a outro jornal italiano de São Paulo, o humorístico Il Pasquino Coloniale.

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CINEMA

Kerrigan se envolve em um movimento que, incentivado por revistas como Selecta, Para Todos e Cinearte, começava a tomar força e levaria, na medida do possível, ao projeto por elas vislumbrado: a criação de grandes estúdios cinematográficos, a exemplo de Hollywood, e a produção de filmes de ficção com personagens de um país idealizado e progressista. Nesse contexto, ele alimenta o desejo de uma cinematografia em formação, fomentada por essas revistas, adquirindo de pronto certa respeitabilidade e admiração ao se fazer passar por diretor que trabalhara em estúdios americanos. Alguém com experiência no tão admirado cinema hollywoodiano e com modos refinados, característica que lhe é recorrentemente conferida, desperta o interesse de críticos que desejavam ver no país o desenvolvimento da indústria de filmes. Com sua capacidade insinuante, Kerrigan agita a produção de ficções, se relaciona com diversos personagens que se destacam na atividade crítica, no poder financeiro, no trabalho cinematográfico e mantém forte sintonia com diversos produtores ainda ativos durante os anos 1920, mesmo em um meio dominado pelas produções estrangeiras. Esse personagem mítico e contraditório tem interessado dispersamente pesquisadores desde o final da década de 1960. Em 1974, a revista Cinearte menciona um aventureiro, que se dizia chamar E. C. Kerrigan, que se constituíra figura de relevo pelo menos nas cidades de Campinas, Guaranésia, São Paulo e Porto Alegre. Ele também é citado em outras obras que abordam o cinema nacional, caso da História do Cinema Brasileiro, coletânea publicada em 1999. Trabalho desenvolvido pela jornalista Ingrind Hannah Salame da Silva junto ao Instituto de Artes (IA) da Unicamp, orientado pela professora Miriam Viviana Gárate, reúne informações coletadas por esses estudiosos do cinema nacional e avança, sobretudo no período que antecede a incursão do italiano no meio cinematográfico brasileiro, o que permite esclarecer a postura desse personagem como diretor e roteirista e caracterizar o conteúdo dos filmes que realizaria. O estudo, que mostra a trajetória de Pignone, abundante em peripécias, revela invenções fantasiosas, rumores, denúncias policiais, versões e contraversões, trazendo à tona um mitômano compulsivo. Seus relatos descrevem proezas ao redor do mundo, semelhantes aos famosos heróis folhetinescos do século 19. Identificado como embusteiro sem posses ou antecedentes aristocráticos, ocupa o noticiário policial de jornais paulistanos. Em posterior entrevista ao Fanfulla, declara que seus relatos inverossímeis destinavam-se à elaboração de filmes, revelando suas ambições cinematográficas.

Kerrigan (centro, de branco) dirige cena de “Amor que redime”, produção de 1928

Kerrigan em cena de “Corações em suplício”: produtora de Guaranésia, Minas Gerais, foi à falência depois do filme


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to a 11 de setembro de 2016

rdios do cinema brasileiro

cujo nome artístico era E.C. Kerrigan, estelionatário realizador de filmes mudos dirige Amor que redime (Ita Filme, 1928) e Revelação (Uni Filme, 1929) e pelo menos quatro cinejornais (Ita-Jornal) e dois naturais, Glória à Virgem do Rosário e Campeonato estadual de futebol (Ita Filme,1927). Apenas quatro dessas obras resistiram ao tempo: Ita-Jornal 3 e 5 e Campeonato estadual de futebol. Depois, em 1930, viaja para Curitiba em mais uma tentativa de trabalhar em cinema, abrindo a Academia Cinematográfica Paranaense, de onde teve que sair por não conseguir apresentar prova de idoneidade moral, uma exigência local, e retorna a Porto Alegre. Mais tarde reaparece apresentando-se como hindu capaz de ler bolas de cristais. Aos 75 anos é condenado por estelionato, vindo a morrer em 1956, em Porto Alegre.

Fotos: Divulgação

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Ficha policial e matérias com a reprodução da foto do “falso conde” em jornais paulistanos: golpes em série

A dissertação busca resgatar a trajetória cinematográfica de E. C. Kerrigan. Mostra que, para realizar filmes de ficção, ele recorre a duas estratégias, comumente utilizadas no período do silencioso brasileiro: ou criando escolas de cinema, que possibilitavam a reunião de técnicos, artistas e produtores, ou realizando documentários com evocações elogiosas a instâncias do poder. Nos dois casos, utilizava um recurso recorrente: a imagem da persona do diretor com experiência em Hollywood, farsa convenientemente aceita ou rejeitada pelo público, pela imprensa e pelos críticos conforme sua produção oferecesse ou não características do cinema estrangeiro. Sua carreira, como a de tantos outros cineastas, não resiste ao advento do cinema falado no Brasil, em 1929, que encarece e torna mais complexa a produção, distribuição e exibição de filmes.

TRAJETÓRIA CINEMATOGRÁFICA E. C. Kerrigan dirige cinco filmes de ficção, pelo menos quatro cinejornais e dois naturais, como eram denominados os documentários na época. Em Campinas, interior de São Paulo, cria a Escola Cinematográfica Campineira e funda a Apa Filme, em que dirige Sofrer para gozar (1923), mas logo é demitido da produtora por exigir salário mais alto e ser desmascarado por não saber inglês. Defenestrado em Campinas, recebe convite para dirigir em São Paulo, em 1925, em média metragem, Quando elas querem (Visual Filme), fracasso financeiro. Desempregado muda-se para a cidade mineira de Guaranésia, e convence os irmãos Masotti, ligados ao cinema, a fazerem Corações em suplício, ainda em 1925 (Masotti Filme), atuando como o vilão da história sob o pseudônimo de William Gouthier. A fita também não tem retorno financeiro e leva a produtora à falência. Muda-se, então, para Porto Alegre, onde

DISSERTAÇÃO

No primeiro capítulo, a autora detémse nas primeiras histórias de Kerrigan, que julga essenciais para a compreensão de sua trajetória no cinema por revelarem sua natureza mitômana e por permitirem identificar elementos comuns ao folhetim e ao melodrama. Suas narrativas, quando identificado como Eugênio Pignone, envolvem viagens ao redor do mundo, aventuras de caça a panteras, cobras, pumas da Índia, na Serra do Mar e aventuras no Chile e na Bolívia. O Fanfulla publica um diário de Centenaro caracterizando-o como herói em busca de fortes emoções, acompanhado de armas, automóveis, aviões, motocicletas. As figuras femininas revelam-se companheiras de poucas horas, motivo para disputas em duelos e inspiração romântica. Do mesmo modo, todos os enredos das ficções dirigidas por Kerrigan mostram situações inesperadas, eminência de perigo, embates físicos, personagens bem definidos como mocinha, vilão, galã, sempre movidos por sentimentos de arrependimento, vingança, perdão, abnegação, altruísmo e que vivem em meio aos conflitos de uma sociedade em processo de modernização. O segundo capítulo da pesquisa revela o envolvimento e a participação de Kerrigan em suas três primeiras películas, ora como figura agregadora, ora como impulsionadora, ora como responsável pela falta de planejamento que causa rombos financeiros, e mostra a confluência dos ideais da revista Cinearte com a proposta da Visual Filme. O terceiro capítulo trata dos filmes desenvolvidos por Kerrigan no Rio Grande do Sul. Identifica a Ita Filme como uma iniciativa de grandes investimentos financeiros que não escapam às observações da imprensa gaúcha. Ressalta que seus telejornais concentram-se nos acontecimentos da região, proporcionando ao espectador um olhar diferenciado da cidade de Porto Alegre. Destaca o caráter regionalista da ficção ali produzida, diferentemente dos que defendem uma produção que deveria ter motivações e abordagens nacionais.

CONTRIBUIÇÕES Ingrind entende que o seu estudo contribui para a compreensão do desenvolvimento das primeiras atividades cinematográficas no Brasil, e como estas foram influenciadas pelas produções hollywoodianas. Em vista das películas ficcionais de Kerrigan não terem sobrevivido, ela centrou suas análises em três documentários sobre a época e principalmente nas revistas Cinearte, Selecta e Para Todos. Com isso resgata, de certa forma, as preocupações da crítica daquele período em defesa de um cinema nacional, espelhado no modelo americano, que mostrava o progresso e o moderno e escondia tudo que fosse socialmente negativo.

Caricaturas de Kerrigan em “Il Pasquino” (1921) e em “A Onda” (1923): notoriedade

Foto: Antoninho Perri

Ingrid Hannah Salame da Silva, autora da pesquisa: dissertação contribui para a compreensão do desenvolvimento das primeiras atividades cinematográficas no país

Para a pesquisadora, o trabalho traz à tona a importância de Kerrigan no cinema brasileiro da década de 1920 e recupera, através das manifestações que suscitou na crítica da época, as ideias e as perspectivas que orientavam o cinema nacional. Ela destaca, ainda, que Kerrigan teve uma produção extraordinária para a época, em que todos os seus filmes foram lançados comercialmente, quando era comum que as produções não se completavam ou por falta de recursos ou por falta de mercado. Considera, também, que suas produções evidenciam através dos seus escritos e fil-

mes como o cinema bebe de variadas fontes, que caracterizam uma variedade de referências, em que se destacam os folhetins e o cinema norte-americano. Ingrand completa: “No meu entendimento, o maior valor do trabalho está no resgate das primeiras histórias de Kerrigan ao chegar ao país, porque os trabalhos que existiam até então as mencionam muito brevemente. Resgatar o seu protagonismo na imprensa formadora de opinião da metrópole que se consolidava é muito relevante porque essa circunstância vai delinear o seu percurso como cineasta”.

Publicação Dissertação: “Entre fatos e boatos: as aventuras de E.C. Kerrigan no cinema silencioso brasileiro” Autora: Ingrid Hannah Salame da Silva Orientadora: Miriam Viviana Gárate Unidade: Instituto de Artes (IA)


8 Campinas, 29 de agosto a 11 de setembro de 2016

Por um diagnóstico mais seguro Fotos: Antoninho Perri

Pesquisa avalia se bactéria pode causar doenças a partir da transfusão de sangue infectado CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br

artonelas são bactérias de ocorrência mundial e que, embora negligenciadas, podem causar doenças fatais, a exemplo das endocardites. São as únicas que infectam o interior de eritrócitos humanos. A espécie mais associada à infecção humana, a Bartonella henselae, pode estar presente em animais de estimação, particularmente gatos, e já foi isolada do sangue de doadores do Hemocentro da Unicamp em que a infecção se mostrou assintomática. Com o objetivo de avaliar se essa espécie pode causar infecção a partir da transfusão de sangue infectado, a enfermeira Marilene Neves da Silva, doutoranda do programa de Clínica Médica, realizou pesquisas com camundongos, orientada pelo dermatologista e infectologista Paulo Eduardo Neves Ferreira Velho, docente do Departamento de Clínica Médica, na disciplina de dermatologia, da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp. Do trabalho, que envolveu estágio de alguns meses no laboratório de hematologia da University of Minnesota (EUA) e coorientado pela professora Amanda Roberta de Almeida, resultou o “Estudo translacional sobre a infecção por Bartonella henselae e sua transmissão transfunsional”, que avaliou esse tipo de transmissão e sua infecção aguda e tardia no sangue, baço, fígado e pele dos camundongos. A pesquisa translacional tem como escopo estabelecer uma ponte entre o que ocorre nas bancadas dos laboratórios e pacientes e comunidades, visando oferecer novas possibilidades de prevenção, diagnóstico e tratamento de doenças e a formulação de políticas públicas de saúde condizentes com as necessidades das populações. Ao adotar o modelo translacional, a pesquisadora seguiu duas vertentes. Na primeira avaliou a possibilidade da transmissão de Bartonella henselae por via transfusional, do que resultou publicação no prestigiado periódico Transfusion. Na segunda abordagem ela avaliou a infecção aguda e tardia por essa bactéria no sangue, no baço, no fígado e na pele em modelo animal, trabalho que rendeu novo artigo, já submetido à outra revista. A ideia central era a de verificar se essa bactéria presente de forma assintomática em doadores de sangue poderia causar infecção em receptores.

ESTUDOS No primeiro estudo, apresentado em um dos capítulos da tese, sangue de camundongos previamente infectados foi transfundido para exemplares desses mesmos animais não infectados. O interessante é que, mesmo quando os exames de sangue realizados nos animais previamente infectados, não revelavam a presença das bartonelas, elas foram identificadas em determinados tecidos como baço e fígado dos receptores, embora em quantidades muito pequenas. Confirmou-se assim que a transmissão por transfusão é possível em camundongos, como já havia sido demonstrado anteriormente entre gatos, que constituem o hospedeiro natural dessas bactérias. “Demos um passo além e concluímos que a transmissão por Bartonella henselae por transfusão sanguínea é possível, mesmo quando os camundongos doadores apresentam infecção não identificável no sangue”, diz Marilene. No segundo braço do trabalho, mostrado em outro capítulo da tese, em que a autora se concentrou nas infecções agudas e tardias, as amostras foram avaliadas depois de quatro e 21 dias após a infecção experimental. Na fase aguda não se detectou a bactéria no sangue dos camundongos embora ela se

A enfermeira Marilene Neves da Silva, autora da tese: “Realizamos um passo muito grande mostrando a contaminação da bactéria por transfusão sanguínea de um animal para o outro de mesma linhagem”

manifeste em determinados tecidos. Mas depois de 21 dias a infecção no sangue, estava presente em todos os animais estudados. Neste caso, a infecção acontece, embora nem sempre a bactéria esteja no sangue ou esteja nele em quantidades não suficientemente altas e no tempo necessário para gerar doenças. Paulo Velho lembra que não há consenso sobre onde a bactéria se “esconde”, nem mesmo se sabe por que sua ação pode ocorrer em períodos recorrentes ou mesmo não se manifestar, revelando-se no caso assintomática por toda a vida do indivíduo. Além da pequena quantidade de bactéria no sangue, a manifestação tardia da infecção na corrente sanguínea pode constituir outro desafio para o diagnóstico precoce. Estes resultados levam os pesquisadores a considerar que novos estudos são necessários em humanos para reavaliar os riscos e o impacto da transmissão destas bactérias por via transfusional. Para o docente, a relevância da bartonela tem sido subestimada até porque seu diagnóstico é muito difícil, pois exige uma cultura que não é de rotina e as técnicas moleculares utilizadas podem dar resultados falsos-negativos, como confirma o trabalho da aluna. Como se trata de uma bactéria negligenciada, muitos médicos não consideram o diagnóstico em casos de endocardite, hepatite, linfonodos aumentados, ou febre de origem desconhecida, por exemplo. Para Paulo, o ideal seria chegar a testes que permitissem um diagnóstico passível de ser aplicado em um banco de sangue e, portanto, barato, acessível e rápido. Na ausência dessa metodologia, não existe segurança sobre a detecção da transferência dessa bactéria para o indivíduo que recebe o sangue, mesmo porque pode ser que ela precise de um parasita para se multiplicar. Ele enfatiza: “Existem questionamentos que precisam ser respondidos. O nosso trabalho alerta para a necessidade de desenvolver diagnósticos seguros, pois ocorrem doenças de causas desconhecidas e que poderiam estar associadas à infecção por bartonela”. Marilene acrescenta que, ao trabalhar com o modelo animal, teve a preocupação centrada em como o estudo pode ser transferido para o humano. “Realizamos um passo muito grande mostrando a contaminação da bactéria por transfusão sanguínea de um animal para o outro de mesma linhagem, constatando que ela permanece em determinados tecidos e não no sangue ou pode estar nele em quantidades tão pequenas que as técnicas vigentes não permitem detectar”. Com efeito, o isolamento desse microrga-

O professor Paulo Eduardo Neves Ferreira Velho, orientador: “O nosso trabalho alerta para a necessidade de desenvolver diagnósticos seguros, pois ocorrem doenças de causas desconhecidas e que poderiam estar associadas à infecção por bartonela”

nismo por cultura se torna difícil por requerer um período de incubação prolongado e condições especiais de crescimento. Para a pesquisadora, o modelo animal mostra que a bartonela pode ser transmitida pela transfusão sanguínea; que só depois de 21 dias da infecção experimental ela foi encontrada no sangue; e ainda não é possível ter segurança do seu nicho primário. Mostra também a baixa sensibilidade dos métodos de análise, em face de ocorrência dos falsos negativos. Considera muito importante tornar público e fomentar a curiosidade sobre esse tipo de bactéria tão pouco valorizada, que vive próxima do ser humano em animais de estimação e potencialmente fatal. Paulo Velho considera um privilégio discorrer sobre uma linha de pesquisa a que vem se dedicando há anos e mostrar que se trata de um campo de investigação em que existem muitas perguntas e questionamentos a serem respondidos. “Estamos trabalhando com um organismo vivo no limite do conhecimento, pouco estudado, pouco considerado, mostrando que esses estudos revelam-se mais importantes do que se julgava antes”. Embora o espetro clínico das manifestações associadas às bartonela tenha crescido rapidamente nas duas últimas décadas, os médicos normalmente não consideram a infecção por bartonela como diagnósticos diferenciais, embora elas devessem ser mais conhecidas pelos profissionais de saúde, considera o orientador do trabalho.

ANTECEDENTES Já em 1994, Paulo Velho se deparou com o caso de um paciente com angiomatose bacilar, doença que provoca lesões na pele e decorrente da infecção por bartonela. Foi quando começou a estudar doenças causadas por estas bactérias, que são raras, embora quatro delas fossem bem conhecidas: a angiomatose bacilar, que acomete mais pacientes com Aids; a febre das trincheiras, observada na época de guerras; a doença de Carrión, própria da região dos Andes peruanos; e a mais conhecida, a doença da arranhadura do gato. Ele tentou então reproduzir em um modelo animal o que observara no paciente por ocasião do seu doutorado, pois notara que essas doenças mencionadas tinham alguns elementos em comum. Ao terminá-lo, em 2001, listou dez prioridades de pesquisa. A primeira delas referia-se ao fato das bartonelas serem bactérias que sabidamente se hospedam nas hemácias, que pode ser fatal, e preocupava-se em saber se elas poderiam ser transmitidas de um indivíduo para outro

em decorrência de transfusão de sangue. Ele ainda se perguntava se essa bactéria poderia causar infecção assintomática, levando o indivíduo a comportar-se como um doador de sangue com a infecção. Em 2006 teve a ideia de infectar com bartonelas uma bolsa de sangue para verificar se elas resistiam à estocagem, constatando que depois de 35 dias elas se mostravam viáveis. Então, no caso de um doador assintomático, o sangue infectado poderia ser transfundido. Daí surgiu a questão: nessas situações não se estaria transfundindo bactérias que podem não causar danos imediatos à transfusão mas causá-los depois? Em 2009, com recursos originários do Center for Global Health, do Johns Hopkins Hospital, ele pôde dar início a pesquisas com vistas a estas indagações. Foi quando em 500 amostras de sangue encontrou seis das quais foram isoladas as bactérias, o que corresponde a 1,2% das amostras. Utilizando técnica molecular, as amostras positivas elevaram-se para 16, levando a 3,2% das contaminações, valor que considera alto e preocupante para um agente do qual pouco se conhece. O docente enfatiza que, como os testes disponíveis são pouco sensíveis, nos trabalhos convencionais não são identificadas todas as contaminações. Por isso, diz ele, “nosso foco é o de colaborar para melhorar o diagnóstico de bartonelas, chamando a atenção para a importância dessa infecção para a saúde coletiva. A questão da transfusão serve para mostrar que se está correndo risco desconhecido. Aliás, a revista Transfusion, mencionado no editorial o trabalho da Marilene na edição que o publicou, afirma que existe um risco potencial que precisa ser mais bem avaliado para se ter noção mais exata da relevância dos achados do estudo”.

Publicação Tese: “Estudo translacional sobre a infecção por Bartonela henselae e sua transmissão transfusional” Autora: Marilene Neves da Silva Orientador: Paulo Eduardo Neves Ferreira Velho Coorientadora: Amanda Roberta de Almeida Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM) Financiamento: Fapesp e CNPq


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Tese atesta poder antioxidante do óleo e da semente de chia

Fotos: Antonio Scarpinetti

Pesquisadora conclui que alimento pode contribuir na prevenção e no controle de desordens metabólicas PATRÍCIA LAURETTI patricia.lauretti@reitoria.unicamp.br

consumo da semente ou do óleo de chia pode não favorecer o emagrecimento como muitos acreditam, mas, ainda assim, faz muito bem à saúde. A conclusão é de uma tese de doutorado desenvolvida na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp pela pesquisadora Rafaela da Silva Marineli Campos, com orientação do professor Mário Maróstica Junior. Os estudos foram desenvolvidos em animais que tiverem a chia acrescida na dieta. Além de verificar os efeitos benéficos no organismo dos animais, a tese também fez a caracterização química da semente e do óleo de chia e identificou a capacidade antioxidante das matérias-primas. Embora a semente já tenha se tornado popular entre aqueles que buscam uma dieta mais saudável, ainda não havia nenhum estudo sobre o óleo de chia, conforme Rafaela apurou, e inclusive as investigações sobre a semente ainda precisavam ser aprofundadas em aspectos que o trabalho focou. Os animais usados na pesquisa foram divididos em 6 grupos: controle magro, controle obeso, animais alimentados com dieta adicionada de semente de chia em período longo de 12 semanas e curto de 6 semanas; e animais alimentados com dieta adicionada de óleo de chia em período longo e curto. “Trabalhamos dois grupos em duas frentes, com o óleo e a semente, além dos grupos de controle”, resume Rafaela. Com o objetivo de aferir se apenas o consumo do alimento ajudaria a emagrecer, as dietas continuaram oferecendo gorduras e açúcares. “Deixamos todas as dietas com o mesmo teor de energia e substituímos a quantidade de óleo comum de soja, pelo óleo de chia ou semente de chia. A quantidade de fibra ficou igual para todos os animais e, da mesma forma, o teor lipídico e energético ficou semelhante”. As diferenças no tempo de introdução da semente e do óleo durante seis ou doze semanas teve como objetivo simular a prevenção e o tratamento das comorbidades, ou implicações da obesidade, a partir da ingestão do alimento na dieta. “Dois grupos receberam a chia o tempo todo concomitantemente à dieta obesogênica para ver se a semente ou o óleo preveniam complicações relacionadas à obesidade, e outros foram ‘engordados’ primeiramente com uma dieta obesogênica sem chia para depois receber a semente ou óleo com o objetivo de tratamento”. Foram avaliados vários parâmetros nos animais, como ingestão alimentar, ganho de peso, peso de tecidos adiposos e órgãos, perfil lipídico e hormonal séricos, perfil de ácidos graxos plasmático, marcadores inflamatórios séricos, conteúdo de lipídeo hepático e fecal, resistência à insulina, tolerância à glicose, estresse oxidativo, peroxidação lipídica, capacidade antioxidante plasmática e hepática. A obesidade gera uma inflamação. Trata-se de uma doença crônica não transmissível e alguns alimentos têm o poder de diminuir essa inflamação. A pesquisa comprovou que a chia é um deles. A inflamação decorrente da obesidade foi reduzida bem como os marcadores anti-inflamatórios foram aumentados. Em relação ao estresse oxidativo, responsável pelo envelhecimento, o efeito é semelhante: houve redução da peroxidação lipídica, que é a acumulação de lipídios em alguns órgãos, e aumento da capacidade do sistema de defesa antioxidante. Outros resultados positivos referem-se à resistência à insulina, tolerância à glicose e aos níveis de colesterol, problemas que também podem estar relacionados com a obesidade. “A dieta ‘obesogênica’ fez com que os animais desenvolvessem dislipidemia, que é o aumento do colesterol ‘ruim’, redução do colesterol ‘bom’ e aumento do colesterol total. Esse desequilíbrio está relacionado às doenças cardiovasculares e a chia reverteu isso”, comemora a pesquisadora. As análises apontaram aumento da concentração de ácidos graxos ômega-3 no sangue dos animais, sobretudo aqueles relacionados à redução do risco de doenças cardiovasculares”. Os resultados entre os grupos que receberam a semente ou o óleo entre seis ou doze semanas foram os mesmos, ou seja, o estudo mostrou que seis semanas já são suficientes para que as alterações nos marcadores aconteçam.

Óleo e sementes de chia usados nos experimentos

O professor Mário Roberto Maróstica Junior, orientador: “Você pode ter muitas hipóteses, conhecimento popular, mas é necessárioque haja uma evidência científica”

INTERESSE O interesse pela chia para esta pesquisa de doutorado deve-se a muitos fatores. “A semente tem várias frações que são de interesse. Dos alimentos de origem vegetal é, por exemplo, o que mais tem ômega 3, em concentração de até 68% em sua composição. Além disso, tem alta concentração de fibra, principalmente insolúvel, e também de proteínas. Da mesma forma, a concentração de aminoácidos é alta em relação a outros alimentos como trigo, milho, etc...”, salienta o orientador. A pesquisa também identificou compostos fenólicos antioxidantes na semente e no óleo de chia. De acordo com Maróstica, a escolha da chia também foi motivada pelo crescimento da busca por alimentos funcionais que se deu na última década. “Percebemos que o consumo de chia começou a aumentar e muito se falava sobre a qualidade da chia baseada em sua composição e menos em estudos de atividade funcional fisiológica. Daí a necessidade da prova de conceito, que é mostrar que esse conceito de ‘fazer bem’ é comprovado por estudos científicos. Você pode ter muitas hipóteses, conhecimento popular, mas é necessário que haja uma evidência científica, e isso vai de encontro a nossa linha de pesquisa”. O grupo ao qual o trabalho está relaciona-

Rafaela da Silva Marineli Campos, autora da tese: “As análises apontaram aumento da concentração de ácidos graxos ômega-3 no sangue dos animais”

do vincula doenças à ação de alimentos. “Nós estudamos muito a ação de alimentos na melhora da obesidade”, acrescenta Maróstica. A conclusão do trabalho sugere que há “subsídios à introdução destes compostos na dieta habitual da população, podendo atuar como coadjuvante na prevenção e no controle de desordens metabólicas crônicas”. Porém recomenda precaução antes de extrapolar os resultados para humanos ou estipular quantidades de ingestão.

Publicação Tese: “Avaliação do potencial da semente e do óleo de chia (salvia hispanica l.) na prevenção e no tratamento da obesidade e comorbidades induzidas por dieta hiperlipídica e hiperglicídica in vivo” Autora: Rafaela da Silva Marineli Campos Orientador: Mário Roberto Maróstica Junior Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)


10 Campinas, 29 de agosto a 11 de setembro de 2016

Painel da semana 

Painel da semana  Fórum: Rede de Economia Solidária - Com transmissão ao vivo pela TV Unicamp e com o tema “Rede de Economia Solidária de Campinas: trajetórias, desafios e perspectivas”, no dia 29 de agosto, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp, acontece mais uma edição do Fórum Permanente de Sociedade e Desenvolvimento. O evento tem como público-alvo alunos, docentes e interessados no assunto. Programação e outras informações no site http://www.foruns.unicamp.br/foruns/projetocotuca/forum/ htmls_descricoes_eventos/soc_e_desenv14.html  Curso do CPQBA - O Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA), por meio de sua Divisão de Química de Produtos Naturais, organiza, de 29 de agosto a 2 de setembro, o curso “Aplicação de tecnologia verde de separação verde líquido-líquido na pesquisa de produtos naturais como uma ferramenta para o desenvolvimento de medicamentos”. Ele será ministrado pela professora Svetlana Ignatova (Reino Unido). O curso é apoiado pela Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP) e pela ViceReitoria Executiva de Relações Internacionais (VRERI). Mais detalhes, no site www.cpqba.unicamp.br  Fórum: Conservadorismos, fascismos e fundamentalismos - No dia 30 de agosto, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp, acontece o Fórum Conservadorismos, Fascismos e Fundamentalismos. O evento é uma realização do Fórum Pensamento Estratégico (Penses), com o apoio do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp. O Penses é um espaço acadêmico, vinculado ao Gabinete do Reitor, responsável por promover discussões que contribuam para a formulação de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento da sociedade em todos seus aspectos. Mais informações sobre o Fórum podem ser obtidas no site www.gr.unicamp.br/ penses/forum-conservadorismo  Oficina de pintura - O Grupo GPECIS do CIS-

Guanabara e a Coordenadoria de Desenvolvimento Cultural (CDC) da Unicamp oferecem a oficina de pintura “Introdução à mistura e composição de cores” com o artista Jerci Maccari. Será no dia 30 de agosto, das 14 às 16 horas, à rua Mário Siqueira 829, no bairro do Botafogo, em Campinas-SP. O público-alvo são adultos, jovens e crianças. O artista tem como temática o homem do campo, geralmente do sudoeste do Paraná. Com cores muito vivas e bem definidas, procura registrar o ambiente sócio-cultural do meio rural e suas consequências, além da simplicidade do lavrador como simbologia de vida. Em sua trajetória como artista plástico já participou de exposições individuais, coletivas e internacionais recebendo premiações e chamando a atenção de especialistas, que publicaram artigos sobre seus trabalhos. Mais detalhes pelo telefone 19-3231-6369.  A Dança da amizade - O lançamento do documen-

tário “A Dança da Amizade. Histórias de Urucungos, Puítas e Quijengues”, de José Alexandre Sobrinho (IA-Unicamp), acontece no dia 30 de agosto, às 20 horas, no Museu da Imagem e do Som (MIS), em Campinas-SP. Após o lançamento haverá bate-papo com o diretor e Alceu José Estevam. O MIS fica à rua Regente Feijó 859, no Centro, em Campinas - SP.  Genealogias possíveis: arquivo, exibição e circulação - O Museu de Artes Visuais da Unicamp (MAV) e o Grupo de Pesquisa MODOS organizam no dia 1 de setembro, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp, o evento “Genealogias possíveis: arquivo, exibição e circulação”. Tanto a produção artística quanto a produção crítica e historiográfica serão observadas por esses três eixos, organizadores e interiores à própria produção de artes visuais. O objetivo é refletir sobre a possibilidade de constituir novas filiações, estabelecer afinidades antes impensadas e nem sempre legitimadas pela história da arte. O encontro tem como público-alvo alunos e professores de artes, história da arte e museologia. Mais informações no link https://genealogiaspossiveis.wordpress.com, e-mail mfmcouto@iar.unicamp.br ou telefone 19-3521-7194.  Biogas & Anaerobic Digestion - O Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe) organiza nos dias 2, 5 e 6 de setembro, para alunos de Pós-graduação da FEA, FEQ, IB, e Feagri, principalmente, o curso treinamento “Biogas & Anaerobic Digestion”. O objetivo é fornecer aos participantes conceitos abrangentes e compreensíveis de tecnologias de produção de biogás e controles de processos Tópicos sobre operação comercial com abordagem em co-digestão de resíduos urbanos, e os desafios na integração de biomassa local subutilizado em unidades de biogás no Brasil também estão no programa. O curso será ministrado em inglês na Sala de Videoconferência da unidade. Inscrições e outras informações no link http://www.nipe. unicamp.br/2013/eventos-detalhe.php?id=129  Domingo no Lago - O Espaço Cultural Casa do Lago organiza no dia 4 de setembro, mais uma edição do Domingo no Lago. A primeira atração do mês da primavera ocorre na Sala de Cinema, às 10h30, local em que o grupo Já de Teatro apresenta a peça “A Pequena Catadora de Latinhas”. No mesmo horário, na Sala Multiuso, a atração será o espetáculo “O Pequeno Senhor do Tempo” com a Companhia Trilhas da Arte Pesquisas Cênicas. O Domingo no Lago será encerrado com o “Concerto de Primavera”. Ele será executado pela Orquestra de Flautas da Unicamp, às 11h30, também na Multiuso. Leia mais: http://www.unicamp. br/unicamp/eventos/2016/08/10/em-setembro-domingo-nolago-tera-pecas-teatrais-e-concerto-de-primavera  Redação científica - O Espaço da Escrita ofer-

ece aos docentes, pesquisadores de carreira, aos alunos de graduação e aos de pós-graduação da Unicamp, o curso básico “Método Lógico para Redação Científica”. Será no dia 6 de setembro, às 8h30 horas, no Auditório III do Centro de Convenções da Unicamp. As inscrições podem ser feitas no link https://docs.google.com/ forms/d/e/1FAIpQLSca7lBYlr66q-MWsHPugUdOSPE9a9b-

Teses da semana 

0fJaqRlcF4U_Z3C60fw/viewform?c=0&w=1. O curso terá 8 horas/aula e será ministrado pelo professor Gilson Luiz Volpato (Unesp/Botucatu). Ele foi organizado para todos que queiram aprender do zero ou aperfeiçoar a escrita de textos acadêmicos desde a perspectiva da ciência empírica.  Oficina de desenho - Com as artistas Isabelle Cedotti e Larissa dos Anjos, evento ocorre nos dias 6, 20 e 27 de setembro, e nos dias 4, 18 e 25 de outubro, das 14 às 16h30, no Centro Cultural de Inclusão e Integração Social (CIS-Guanabara) da Unicamp. A proposta é trabalhar o desenho de observação com a finalidade de entrar em contato com as particularidades da técnica. O CIS-Guanabara fica na Rua Mário Siqueira 829, no bairro do Botafogo, em Campinas-SP. Os encontros serão guiados por alunas do curso de graduação em Artes Visuais da Unicamp. Inscrições e outras informações: telefone 19-3231-6369.  Jornada de Estudos Saussurianos - Por ocasião do centenário da publicação do Curso de Linguística Geral (1916), livro atribuído a Ferdinand de Saussure, considerado o fundador da linguística moderna, no dia 8 de setembro, às 8 horas, no Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), acontece a III Jornada de Estudos Saussurianos. O objetivo do evento, que prossegue até o dia 9, é promover o debate sobre o sistema conceitual saussuriano, sobre os desdobramentos de suas elaborações e sobre o alcance da teoria em domínio diversos de indagação sobre a linguagem. A palestra de abertura, às 9h30, será proferida pela presidente do Cercle Ferdinand de Saussure, Daniele Gambarara, da Universitá della Calabria. O público-alvo são pesquisadores nacionais e estrangeiros, professores e alunos de pós-graduação. Mais detalhes no site https://jesaussurianos.wordpress.com, telefone 3521-1549 ou e-mail mail saussureunicamp@gmail.com  Artigos para a Conceição/Conception - Publicação do Programa de Pós-Graduação em Artes da Cena do Instituto de Artes (IA) recebe, até 10 de setembro, artigos e resenhas para a sua próxima edição com o tema Singularidades e Coletividades. Artistas, pesquisadores e professores de Artes da Cena ou áreas afins podem enviar as suas reflexões no formato de artigos, resenhas, ensaios. A revista também aceita artigos e resenhas em fluxo contínuo com temas livres. Conceição/Conception é um periódico semestral, online, bilíngue, que abrange as áreas de conhecimento teatro, da dança e da performance. Mais informações no link http://www.publionline.iar.unicamp.br/index. php/ppgac/announcement  UPA 2016 - As inscrições gratuitas para participação no evento Unicamp de Portas Abertas podem ser feitas no site http://www.upa.unicamp.br/. Este ano a UPA ocorre no dia 10 de setembro, um sábado. Conheça a programação no link http://www.upa.unicamp.br/programacao  Mostra Unicamp 50 anos - Como parte das comem-

orações pelo seu cinquentenário, a Unicamp promoverá no período de 11 a 19 de setembro a Mostra Unicamp 50 anos – Ciência, Arte, Tecnologia e Inovação. O objetivo da iniciativa é apresentar à comunidade interna e à sociedade em geral a evolução do conhecimento gerado pela Universidade e a sua incorporação ao cotidiano da população. “Além de expormos as contribuições já dadas, nós também faremos uma reflexão sobre o futuro das atividades da Unicamp ao longo dos próximos 50 anos”, adianta o professor Fernando Coelho, coordenador da Comissão Executiva da Mostra e assessor da Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP). Leia mais: http://www.unicamp.br/unicamp/noticias/2016/03/21/mostratrara-contribuicoes-da-unicamp-sociedade

Teses da semana  Artes: “A representação da mulher em Iracema - Uma

Transa Amazônica” (mestrado). Candidata: Lívia Perez de Paula. Orientador: professor Fernão Pessoa Ramos. Dia 29 de agosto de 2016, às 14h30, na sala 3 da Pós-graduação do IA. “Documentário Inflexivo: o personagem apropriado em cena” (doutorado). Candidato: Carlos Antonio dos Santos Segundo. Orientador: professor Francisco Elinaldo Teixeira. Dia 30 de agosto de 2016, às 10 horas, na sala da coordenação da Pós-graduação do Multimeios do IA. “Água e vinho: canção e música instrumental em Egberto Gismonti - (1969-1977)” (doutorado). Candidata: Maria Beatriz Cyrino Moreira. Orientador: professor Rafael dos Santos. Dia 30 de agosto de 2016, às 13h30, na sala 3 da Pós-graduação do IA. “O cinema de Trinh T.Minh-ha: intervalos entre antropologia, cinema e artes visuais” (doutorado). Candidato: Gustavo Soranz. Orientador: professor Marcius César Soares Freire. Dia 31 de agosto de 2016, às 9 horas, no IA. “Ensaios sobre a cidade no cinema argentino contemporâneo” (doutorado). Candidata: Natalia Christofoletti Barrenha. Orientadora: professora Miriam Viviana Gárate. Dia 31 de agosto de 2016, às 13 horas, na sala 3 do prédio da Pós-graduação do IA. “(Nem) tudo puta e viado: Uma análise dos estereótipos presentes nas pornochanchadas (1969-1982)” (mestrado). Candidata: Lívia Maria Pinto da Rocha Amaral Cruz. Orientador: professor Pedro Maciel Guimarães. Dia 31 de agosto de 2016, às 13h30, na sala FF08 da FEF.  Ciências Médicas: “Resposta anti-inflamatória na aterosclerose: Identificação e caracterização do efeito das citocinas IL-27 e IL-37” (mestrado). Candidata: Liana Maria Villarejos. Orientadora: professora Maria Heloísa Souza Lima Blotta. Dia 29 de agosto de 2016, às 9 horas, no anfiteatro do departamento de pediatria da FCM.  Computação: “Uma solução de implantação autoadaptativa para plataformas Android” (mestrado). Candidato: Junior Cupe Casquina. Orientadora: professora Cecí-

Eventos futuros 

lia Mary Fischer Rubira. Dia 2 de setembro de 2016, às 10 horas, no auditório do IC2 do IC. “Uma solução baseada no reconhecimento de íris para proteção de dados em dispositivos móveis” (mestrado). Candidato: Frances Albert Santos. Orientador: professor Leandro Aparecido Villas. Dia 9 de setembro de 2016, às 10 horas, no auditório do IC2 do IC.  Economia: “O papel do setor externo no crescimento da economia chinesa (1978-2008)” (mestrado). Candidato: Eduardo Roberto Zana. Orientador: professor Antonio Carlos Macedo e Silva. Dia 30 de agosto de 2016, às 14 horas, na sala 17 do IE.

“Capitalistas em Campinas: 1873-1886” (mestrado). Candidata: Fernanda Sabarim. Orientador: professor José Ricardo Barbosa Gonçalves. Dia 31 de agosto de 2016, às 14h30, na sala 17 do pavilhão da Pós-graduação do IE.  Educação Física: “Relação entre o hemisfério cerebral acometido pelo AVC. Habilidade motora, sintomas depressivos e função cognitiva: Aplicações para a educação física” (mestrado). Candidato: Hélio Mamoru Yoshida. Orientadora: professora Paula Teixeira Fernandes. Dia 30 de agosto de 2016, às 14 horas, no auditório da FEF.  Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo:

“Estruturas dinâmicas articuladas pantográficas - aplicações em arquitetura mediadas por simulações paramétricas” (mestrado). Candidato: Mauricio Guimarães de Oliveira. Orientadora: professora Ana Lúcia Nogueira de Camargo Harris. Dia 29 de agosto de 2016, às 9 horas, na sala de defesa de teses 2 da FEC. “Avaliação alternativa da garantia física em usinas hidroelétricas por meio de modelos de otimização para o planejamento da operação” (mestrado). Candidata: Violeta Fonseca Lino Milochi. Orientador: professor Alberto Luiz Francato. Dia 30 de agosto de 2016, às 10 horas, na sala de defesa de teses 3 do prédio de aulas da FEC.

“Trepadeira como envelope da edificação e seu desempenho como estratégia bioclimática” (doutorado). Candidata: Denise Damas de Oliveira Morelli. Orientadora: professora Lucila Chebel Labaki. Dia 30 de agosto de 2016, às 14 horas, na sala de defesa de teses 3 da FEC.  Engenharia de Alimentos: “Farmacocinética, farmacodinâmica e depleção de resíduos de nova formulação de enrofloxacina para frangos de corte (gallus gallus domesticus)” (doutorado). Candidata: Karina Parra Duarte Bonassa. Orientador: professor Felix Guilhermo Reyes Reyes. Dia 29 de agosto de 2016, às 14 horas, no salão nobre da FEA. “Extração sequencial de compostos bioativos de subprodutos industriais de maracujá amarelo (passiflora edulis sp.) utilizando fluidos pressurizados” (doutorado). Candidata: Juliane Viganó. Orientador: professor Julian Martínez. Dia 31 de agosto de 2016, às 9h30, na sala 2 da Extensão da FEA. “Modelagem e simulação da destilação com correntes paralelas aplicadas à produção de Bioetanol” (mestrado). Candidata: Lilian Caroline Kramer Biasi. Orientador: professor Antonio José de Almeida Meirelles. Dia 5 de setembro de 2016, às 10 horas, na sala 31 do DEA da FEA. “Aproveitamento de resíduos da indústria sucroalcooleira (vinhaça e palha de cana) através da co-digestão anaeróbia termofílica assistida com ultrassom” (mestrado). Candidato: Fernan David Martinez Jimenez. Orientadora: professora Tânia Forster Carneiro. Dia 5 de setembro de 2016, às 14 horas, na sala 2 da extensão da FEA. “Seleção e melhoramento de leveduras capazes de fermentar pentoses através de engenharia evolutiva” (mestrado). Candidata: Carla Ferreira dos Santos Vieira. Orientador: professor Francisco Maugeri Filho. Dia 6 de setembro de 2016, às 9 horas, na sala l da Extensão da FEA.  Engenharia Elétrica e de Computação: “Coclusterização em comitês de filtros colaborativos e em análise de atividade cerebral” (mestrado). Candidata: Thalita Firmo Drumond. Orientador: professor Fernando José Von Zuben. Dia 29 de agosto de 2016, às 13h30, na sala PE11 da FEEC. “Avaliação da acurácia do modelo de simulação a usinas individualizadas baseada no pós operativo” (mestrado). Candidata: Xiomara Beatriz De La Cruz Molina. Orientador: professor Secundino Soares Filho. Dia 30 de agosto de 2016, às 10 horas, na sala PE12 do prédio da CPG da FEEC.  Engenharia Química: “Caracterização de um compósito polimérico biodegradável utilizando poli (ε-caprolactona) e borra de café” (doutorado). Candidata: Natália Raquel Brisolla Oliveira. Orientadora: professora Lucia Helena Innocentini Mei. Dia 31 de agosto de 2016, às 10 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ.  Física: ”Mecanismos e consequências da geração de

massa dinâmica para o gluon” (mestrado). Candidata: Clara Teixeira Figueiredo. Orientadora: professora Arlene Cristina Aguilar. Dia 2 de setembro de 2016, às 14 horas, no auditório da Pós-graduação do IFGW. “Investigando a influência do setor leptônico em mecanismos de bariogênese” (mestrado). Candidato: Eduardo Akio Sato. Orientador: professor Pedro Cunha de Holanda. Dia 9 de setembro de 2016, às 10 horas, no auditório da Pósgraduação do prédio D do IFGW.

 Geociências: “A discrepância entre os índices sobre

a região metropolitana de Campinas e a realidade habitacional de Campinas” (doutorado). Candidata: Rafaela Fabiana Ribeiro Delcol. Orientadora: professora Arlete Moysés Rodrigues. Dia 29 de agosto de 2016, às 9 horas, no auditório do IG. “Políticas de regulação e inovação: reciclagem de resíduos eletroeletrônicos” (doutorado). Candidata: Luciara Cid Gigante. Orientadora: professora Leda Maria Caira Gitay. Dia 29 de agosto de 2016, às 14 horas, no auditório do IG. “Mapeamento de áreas favoráveis ao processo de recarga de água em uma sub-bacia às margens do rio Mogi Guaçu” (mestrado). Candidato: Gustavo Klinke Neto. Orientadora: professora Sueli Yoshinaga Pereira. Dia 30 de agosto de 2016, às 14 horas, na sala A do DGRN do IG.

Destaque do Portal 

“Análise da proposta de sustentabilidade em cidades inteligentes: o caso do centro de operações do Rio de Janeiro” (mestrado). Candidata: Gorete Bernardelli. Orientadora: professora Flávia Luciane Consoni de Mello. Dia 31 de agosto de 2016, às 14 horas, no auditório do IG. “Controvérsias sobre a sustentabilidade do etanol combustível no Brasil: panorama e investigação socioinformática dos jornais online de amplo alcance” (doutorado). Candidata: Flavia Gouveia de Campos Gomes. Orientador: professor André Tosi Furtado. Dia 31 de agosto de 2016, às 14 horas, na sala A do DGRH. “Metamorfismo, geoquímica e geocronologia das sequências metassedimentares do domínio interno do orógeno Riacho do Pontal, Província Borborema, NE-Brasil” (mestrado). Candidato: Felipe Holanda dos Santos. Orientador: professor Wager da Silva Amaral. Dia 9 de setembro de 2016, às 14 horas, na sala A do DGRN do IG.  Linguagem: “O uso de estratégias comunicativas em inglês pelo controle de tráfico aéreo brasileiro” (mestrado). Candidata: Natália de Castro Guerreiro. Orientadora: professora Matilde Virginia Ricardi Scaramucci. Dia 29 de agosto de 2016, às 9 horas, no anfiteatro do IEL.

“Sobre norma e preposições: um estudo das completivas finitas (des)preposicionadas em português” (doutorado). Candidata: Kelly Cristina Tannihão. Orientador: professor Emilio Gozze Pagotto. Dia 29 de agosto de 2016, às 14 horas, na sala de defesa de teses do IEL. “Fala, leitura, escrita e computadores: práticas digitais de linguagem” (mestrado). Candidata: Alline Mayumi Ribeiro Kobayashi. Orientadora: professora Maria Irma Hadler Coudry. Dia 29 de agosto de 2016, às 14h30, no anfiteatro do IEL. “A identidade referencial na progressão entre textos” (mestrado). Candidata: Karina Menegaldo Dias. Orientadora: professora Anna Christina Bentes da Silva. Dia 29 de agosto de 2016, às 15h30, na sala dos colegiados do IEL. ““I account this world a tedious theatre”: a tragédia do ‘teatro do mundo’ em John Webster” (doutorado). Candidato: Renato Gonçalves Lopes. Orientador: professor Eric Mitchell Sabinson. Dia 30 de agosto de 2016, às 8 horas, no anfiteatro do IEL. “Fonoaudiologia no contexto da equoterapia: um estudo neurolinguístico no atendimento de crianças com Transtorno do Espectro Autista” (doutorado). Candidata: Paloma Rocha Navarro. Orientadora: professora Maria Irma Hadler Coudry. Dia 30 de agosto de 2016, às 9 horas, na sala de defesa de teses do IEL. “Concepções de letramento em dois currículos oficiais prescritos (DF e MT): uma análise crítica” (mestrado). Candidata:Camila Dalla Pozza Pereira. Orientadora: professora Márcia Rodrigues de Souza Mendonça. Dia 31 de agosto de 2016, às 9 horas, na sala dos colegiados do IEL. “Os preceitos ovidianos: um estudo intertextual de Remedia amoris” (doutorado). Candidata: Gabriela Strafacci Orosco. Orientadora: professora Patrícia Prata. Dia 31 de agosto de 2016, às 9 horas, na sala de defesa de teses do IEL. “Que preto, que branco, que índio o quê? - A designação da população do Brasil no Correio Braziliense” (mestrado). Candidato: Carlos Raphael dos Santos Gomes. Orientador: professor Eduardo Roberto Junqueira Guimarães. Dia 31 de agosto de 2016, às 14 horas, na sala de defesa de teses do IEL.  Odontologia: “Detecção de instrumentos endodônticos fraturados em canais radiculares: comparação entre diferentes sistemas radiográficos digitais e tomografia computadorizada de feixe cônico” (doutorado). Candidata: Ana Caroline Ramos de Brito. Orientador: professor Christiano de Oliveira Santos. Dia 29 de agosto de 2016, às 9 horas, na sala da Congregação da FOP.

“Avaliação comparativa da influência de dois regimes farmacológicos após exodontia de terceiros molares” (mestrado). Candidato: Renato da Costa Ribeiro. Orientadora: professora Luciana Asprino. Dia 1 de setembro de 2016, às 14 horas, na sala da Coongregação da FOP. “Radiolucência justa-apical: Avalição em imagens de radiografia panorâmica e tomografia computadorizada de feixe cônico” (mestrado). Candidata: Eduarda Helena Leandro do Nascimento. Orientadora: professora Deborah Queiroz de Freitas França. Dia 5 de setembro de 2016, às 9 horas, na sala da Congregação da FOP. “Avaliação pré-cirúrgica do terceiro molar inferior em imagens de tomografia computadorizada de feixe cônico: influência dos parâmetros de aquisição” (mestrado). Candidata: Larissa Pereira Lagos de Melo. Orientadora: professora Deborah Queiroz de Freitas França. Dia 5 de setembro de 2016, às 14 horas, na sala da Congregação da FOP.  Química: “Aplicações de pseudopotenciais em métodos compostos para cálculos de alto nível de propriedades eletrônicas e termoquímicas” (mestrado). Candidato: Cleuton de Souza Silva. Orientador: professor Rogério Custódio. Dia 30 de agosto de 2016, às 14 horas, no miniauditório do IQ.

“Nova abordagem para a síntese total do espilantol e estudo de atividades biológicas” (mestrado). Candidata: Isabella Gonçalves Alonso. Orientador: professor Júlio Cesar Pastre. Dia 1 de setembro de 2016, às 14 horas, no miniauditório do IQ. “Clonagem, expressão, purificação e caracterização da proteína SGT1 da cana-de-açúcar, uma co-chaperona do sistema Hsp90” (mestrado). Candidata: Izabella Venturini Cagliari. Orientador: professor Carlos Henrique Inácio Ramos. Dia 5 de setembro de 2016, às 9 horas, no miniauditório do IQ. “Bioacessibilidade e biodisponibilidade de nutrientes e elementos tóxicos em alface (Lactuca sativa)” (doutorado). Candidata: Emanueli do Nascimento da Silva. Orientadora: professora Solange Cadore. Dia 6 de setembro de 2016, às 14 horas, no miniauditório do IQ.


11 Campinas, 29 de agosto a 11 de setembro de 2016

A alternativa biocêntrica é discutida por especialistas do Brasil e exterior Mesas-redondas reúnem intelectuais no âmbito série Perspectivas Unicamp 50 Anos Fotos: Antoninho Perri

Especialistas debatem na primeira mesa-redonda: sustentabilidade em pauta

LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

esquisadores do Brasil, Áustria, França e Inglaterra apresentaram dia 24 seus estudos sobre “Alternativa Biocêntrica”, dentro da série Perspectivas Unicamp 50 Anos, no auditório da Adunicamp. Os especialistas em antropologia social, ciências sociais, estudos de gênero, produção cultural e meio ambiente foram reunidos em duas mesas-redondas: “Crises Ambientais e Decrescimento”, discutindo os debates vigentes nas ciências humanas quanto à alternativa biocêntrica face ao colapso ambiental, com ênfase para o decrescimento e a simetria política entre as espécies; e “Cidadania Ampliada”, analisando um novo pacto entre as espécies sob o enfoque da alternativa biocêntrica. A mesa da manhã foi coordenada pelo professor Mauro William Barbosa de Almeida, do Departamento de Antropologia da Unicamp, que atua em pesquisas sobre a Amazônia, reservas extrativistas, diversidade social e teoria antropológica. “Vamos discutir o conceito de decrescimento como alternativa para a crise ambiental”, adiantou. É uma ideia que tomou corpo por volta dos anos 1970, quando começaram a aparecer trabalhos de biólogos e

economistas principalmente, e de outros estudiosos, apontando para o esgotamento próximo dos recursos naturais associado ao crescimento industrial e da população – e com isso uma perda da qualidade de vida na Terra.” Mauro Almeida explica que a alternativa biocêntrica se baseia em conceitos vindos de ciências como ecologia, agronomia, física e economia, gerando um debate sobre o que fazer diante desta percepção de uma crise de recursos naturais e perda das espécies de vida. “Uma das alternativas vem dos que dizem que a tecnologia vai resolver tudo, incluindo problemas como de suprimento de energia, com abundância e progresso técnico. É o pensamento otimista de que o mundo deve continuar na mesma rota. A outra corrente aponta para a necessidade de uma contenção da expansão, sendo menos difundida no Brasil, por ser um país que ainda está nessa rota, querendo crescer.” Segundo o professor do IFCH, a corrente pela contenção é mais forte na Europa, onde certos países estão em fase de estabilidade e até de declínio da população. “Há uma preocupação de reorientar as atividades humanas para a qualidade de vida, com uma estabilidade e não com uma expansão infinita. Esta corrente não é forte em nosso país, mas está presente,

O professor Marc Brightman, diretor do Centro de Antropologia e Sustentabilidade da University College London (UCL): intelectual inglês abordou a alternativa biocêntrica a partir de aspectos da crise ecológica mundial

por exemplo, na construção de megausinas como a de Belo Monte: temos aqueles que acham que há alternativas menos impactantes e de pequena escala para abastecimento energético futuro, e outra visão antecipando uma demanda muito ampliada de energia para fins industriais, mineração, etc. A alternativa biocêntrica é um movimento que vai crescer neste século em escala mundial.” O convidado internacional da primeira mesa foi o professor Marc Brightman, diretor do Centro de Antropologia e Sustentabilidade da University College London (UCL), que tem várias publicações sobre governança global da floresta, conservação e cosmopolíticas. “Abordo, dentre várias coisas, da pesquisa que faço com os estudantes sobre o tema da sustentabilidade e, a partir dela, sobre o que podemos entender como alternativa biocêntrica, a começar por alguns aspectos da crise ecológica mundial. Uma pergunta é se as medidas adotadas por organizações internacionais para proteger populações tradicionais e os lugares onde moram, são elas mesmas sustentáveis, preservando não só a natureza, mas também a convivência com outras espécies.” A coordenação da mesa da tarde coube à professora Nádia Farage, do Departamento de História da Unicamp e autora

A professora Nádia Farage, do Departamento de História da Unicamp: “Se é para haver uma mudança de fato em nossa maneira de estar na vida, ela começa na maneira como nos relacionamos com as outras espécies”

de diversos artigos sobre naturismo, animalidade e biopolítica no Brasil moderno. “Vamos tratar, basicamente, sobre a contribuição das ciências humanas e da filosofia, bem como da crítica literária, para repensar a condição animal. É um tema que se articula com o da manhã, pois não há como pensar o crescimento sem repensar a carnificina sobre a qual a produção capitalista se baseia. Se é para haver uma mudança de fato em nossa maneira de estar na vida, ela começa na maneira como nos relacionamos com as outras espécies.” A mesa da manhã também contou com a presença do professor Luiz Cesar Marques Filho, do Departamento de História da Unicamp e autor de “Capitalismo e Colapso Ambiental”. Do debate da tarde também participaram: Claudia Leitner, da Universität Wien (Áustria), cujas áreas de interesse são literatura, estudos da mídia, de gênero, pesquisa histórica sobre as mulheres, literatura, bioética e ciências da vida, bem como estudos em animais; Fahim Amir, da Kunstuniversitaet (Áustria), autor de artigos sobre produção industrial de animais, trabalho animal e zoopolíticas; e Hicham-Stéphane Afeissa, da Université de Franche-Comté (França), que depois de vários anos estudando a fenomenologia de Husserl e a filosofia Kantiana, voltou seu interesse para a filosofia ambiental.

O professor Mauro William Barbosa de Almeida, do Departamento de Antropologia da Unicamp: “Há uma preocupação de reorientar as atividades humanas para a qualidade de vida, com uma estabilidade e não com uma expansão infinita”


12 Campinas, 29 de agosto a 11 de setembro de 2016 Foto: Reprodução

ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br

rotação externa de quadril utilizada pelas bailarinas do balé clássico, e chamada de en dehors, pode influenciar negativamente o desempenho da altura dos saltos verticais. Foi o que revelou estudo de mestrado de Mariana Diehl, apresentado à Faculdade de Educação Física (FEF) e orientado pelo professor Sérgio Cunha, docente desta faculdade. A mestranda, que obteve financiamento da Capes e do CNPq, capturou em vídeo imagens de bailarinas durante performance e, a partir delas, calculou os ângulos articulares do quadril, joelho e tornozelo. Para o quadril, onde foram vistas as maiores diferenças, ela notou que as bailarinas tiveram um menor ângulo de flexão de quadril no salto sauté, o primeiro ensinado no balé clássico. No salto que não tinha rotação, as bailarinas tiveram um maior ângulo de flexão do quadril. Esse maior ângulo de flexão pode ter levado as bailarinas a atingirem uma maior altura. Entretanto, pontuou a estudiosa, não se pode afirmar que a diferença encontrada na altura dos saltos é apenas decorrente da rotação externa do quadril, pois não houve um estudo eletromiográfico que comprovasse como os músculos estão sendo ativados. Por outro lado, Mariana reconheceu que não há como a bailarina saltar sem o uso da rotação externa do quadril. “Por isso são fundamentais novos estudos para entender algumas questões: ‘se não existe a opção da bailarina trabalhar sem essa rotação, então como melhorar seus parâmetros?’” A mestranda coletou alguns dados para os cálculos dos torques articulares a fim de compreender o que acontece em termos de força. “Temos que conhecer cada vez mais esses movimentos e pensar como adaptá-los dentro da dança para melhorar o desempenho das bailarinas”, sublinhou. A altura do salto é muito importante para a dança, conforme a pesquisadora. Acontece que nem sempre esse é o primeiro aspecto que uma bailarina leva em conta. Normalmente, pensa mais na parte estética. “Só que, se tiver condições de saltar mais alto, também poderá melhorar a estética da dança. Então vejo que a parte artística é sempre bem-trabalhada. Já a parte física deixa a dever. Portanto, é preciso investir no treinamento e aprimorar os desempenhos artístico e físico.” Mariana destacou que o seu estudo vem bem a calhar porque mostra a mecânica da movimentação da dança. Hoje em dia, o treinamento convencional consiste nas aulas de dança e raramente incluem treinos complementares como pilates, sessões de alongamentos e musculação. “O treinamento de força ainda não é muito aceito para as bailarinas por vários motivos, entre eles a hipertrofia. A bailarina não pode apresentar um físico musculoso. Tem que ser magra e longilínea”, enfatizou. “Dessa forma, é preciso descobrir mais sobre a rotação externa, principal característica do balé clássico que gera a movimentação da bailarina.”

Bailarinas e o salto “sauté”: pesquisadora filmou sequências para fundamentar trabalho

completamente as articulações do quadril, joelho e tornozelo. Tem que manter as pernas um pouco mais próximas uma da outra, fazer ponta de pé, saltar com o corpo ereto e ainda pensar na altura do salto, explicou. Nesse estudo, foi encontrada uma média de altura do salto de 27 cm.

PLIOMETRIA

Do quadril

ao salto também compartilhada por grande parte das bailarinas. “Desenvolvemos um treinamento pliométrico (técnica específica de treinamento esportivo para melhora da potência muscular) para observar se haveria melhora na altura dos saltos”, contou. Mariana esclareceu que, na dança, os saltos são divididos em grandes e pequenos. Nos grandes, as bailarinas não relatam excessiva dificuldade. Mas os maiores obstáculos estão nos pequenos, que em geral são realizados em sequência. Não se faz nas aulas apenas um salto e sim séries de 8, 16, 32. Para isso, a bailarina necessita de potência muscular.

Tem outra particularidade: o salto sauté dificilmente aparece nas exibições, pelo fato de ser um passo mais usado para as aulas de dança. Nas coreografias, entram saltos mais complexos e, como o sauté é básico, é como se fosse um fundamento para aprender a saltar. “Mas outros saltos derivam dele, tal a sua importância”, salientou. “Esse é o salto mais simples com a rotação externa. Quando a bailarina salta na vertical, realiza um pequeno plié, que é uma flexão de joelhos. E, na queda, volta para o plié e finaliza o salto.” O sauté não tem muitos passos ao longo da sua execução, embora sendo rico em detalhes. A bailarina tem que estender

Na iniciação científica, Mariana foi à literatura com vistas a dar a sua contribuição. Optou por aplicar um treinamento pliométrico de oito semanas a bailarinas que eram alunas do primeiro e do segundo ano do curso de Dança. Esse tipo de treinamento é empregado com frequência em modalidades esportivas como o vôlei, o basquete e o futebol. A pesquisadora descreveu que as sessões tinham duração de até uma hora e meia de saltos pliométricos. Observou-se uma melhora individual no salto após o treinamento, porém eram saltos específicos da pliometria. Há poucos relatos desse treinamento para bailarinas, e as meninas avaliadas nunca tinham participado dele. Os achados foram de que as bailarinas que fizeram o treinamento pliométrico tiveram uma melhora individual de 27% e, as que não fizeram treinamento, uma melhora de 18%. O salto sauté foi analisado somente no pós-treinamento. Essa ideia surgiu numa segunda iniciação científica de Mariana. No entanto, não foi vista melhora na altura do salto das bailarinas que participaram do treinamento. “A principal descoberta foi que o nível técnico das que saltaram mais era muito diferente, e isso não foi controlado. As que fizeram o treinamento eram do primeiro e do segundo ano do curso, e as que foram do grupo-controle eram do último ano”, descreveu. Para o salto pliométrico, a diferença se explica pela técnica mesmo. As que fizeram o treinamento saltaram mais alto, visto que esse treinamento aumenta a potência muscular, que eleva a altura do salto, revelou Mariana. Ela concluiu, na segunda iniciação científica, que o treinamento pliométrico melhora a altura dos saltos em atletas, contudo pode não ser tão eficaz para bailarinas, porque esse treinamento é aplicado com os membros inferiores em alinhamento neutro (uma perna paralela à outra) e, quando a bailarina vai saltar na técnica do balé clássico, ela realiza rotação. Nesse estudo, Mariana não pôde afirmar se a pliometria era boa ou ruim. “O que verifiquei é que, como o salto do balé é muito específico, pode ser que o ganho do treinamento pliométrico não seja transferido para o salto do balé, mas tem bons resultados para o ganho de potência muscular”, afirmou ela, que no doutorado pretende continuar as análises para ir além nas áreas de biomecânica e de treinamento em dança. Foto: Divulgação

COMPLEXIDADE A pesquisa de Mariana começou há alguns anos com uma iniciação científica. A então aluna de graduação procurou Sérgio Cunha com algumas inquietações. Ela, bailarina, fazia o bacharelado em Dança na Unicamp e percebia muita dificuldade na execução dos saltos, situação

Publicação Dissertação: “Análise da influência da rotação externa de quadril em saltos verticais de bailarinas de balé clássico” Autora: Mariana Diehl Orientador: Sérgio Cunha Unidade: Faculdade de Educação Física (FEF) Financiamento: Capes e CNPq Mariana Diehl, autora do estudo: “É preciso descobrir mais sobre a rotação externa, principal característica do balé clássico que gera a movimentação da bailarina”


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