ReBEQ v.3 n.1 - Revista Brasileira de Ensino de Química

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Coordenação Editorial Pedro Faria dos Santos Filho – UNICAMP Robson Fernandes de Farias – UFRR Wilon Mazalla Jr – Editora Átomo Conselho Editorial Adriana Vitorino Rossi – UNICAMP Gláucia Maria da Silva – USP|RP Marcelo Carneiro Leão – UFRPE Mário Sérgio Galhiane – UNESP Osvaldo Antonio Serra – FFCLRP-USP Ótom Anselmo de Oliveira – UFRN Ricardo Ferreira – UFPE Sérgio Melo – UFC Yassuko Iamamoto – USP

Revista Brasileira de Ensino de Química (ReBEQ) é uma publicação semestral da Editora Átomo e colaboradores. Dentro do espírito maior da editora, que é a difusão do conhecimento por meio da democratização das valiosas pesquisas e avanços científico-educacionais, quase sempre em latência nas boas universidades, e pelo intercâmbio de idéias e experiências daqueles que participam do processo ensino/aprendizagem, a ReBEQ inaugura novo espaço, abrindo suas páginas para pesquisadores, docentes (ensino médio e superior), alunos de graduação e pós-graduação, com a visão de que o conhecimento deve ser construído e compartilhado coletivamente. O conhecimento contemporâneo deve ser apresentado de forma inter/transdisciplinar trazendo preocupações como a ética, o meio ambiente e a humanização dos processos e serviços. Centrada nas questões ensino/aprendizagem, visa contribuir para a atualização e otimização do Ensino de Química.

Conselho Ad hoc Marlon Herbert F. B. Soares – UFG Nidia Franca Roque – UFBA Viviani Alves de Lima – UFU

Revista Brasileira de Ensino de Química rebeq@atomoealinea.com.br

Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas e Informação PUC-Campinas

Revista Brasileira de Ensino de Química Campinas, SP: Editora Átomo, 2006 v. 1, n. 1, jun./jun. 2006

www.atomoealinea.com.br/rebeq

Semestral Publicação científica-educacional

Revisão

1. Química – Periódicos. 2. Ciências exatas – Periódicos.

Helena Moysés

CDD 540

Capa e Editoração Eletrônica Fabio Diego da Silva

Índice para Catálogo Sistemático 1. Química

540

Pede-se permuta. - Pide-se cange. A division of the American Chemical Society

We ask for exchange. - On demande l’echange. Si sollecita intercambio. Wir bitten un aurstausch un publikationen.


SUMÁRIO

Editorial

Artigos Caracterizando Fenóis com um Reagente Preparado com Esponja de Lã de Aço para Limpeza e Ácido Muriático Sebastião F. Fonseca, Karina S. Souza e Maria Cristina Santos

A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves

Panorama da Pesquisa em Ensino de Química no Brasil Wilsilene dos Santos Oliveira, José Machado Moita Neto e Nilson Fonseca Miranda

Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos Claudio Galeno Caldeira e Ana Maria Faccioli de Camargo

Como Fazer? Uma Retrospectiva do Programa do MEC, suas Perspectivas e Algumas Contribuições José Carlos de Azambuja Bianchi e Pedro Faria dos Santos Filho


Relatos de Experiência Uma Proposta para Ensinar Estequiometria de Reações Químicas em Sala de Aula Sabrina Gardoni Peixoto Guimarães, Camila de Lourdes Sousa e Elenice Aparecida Carlos

História da Química Edward Frankland e as Técnicas de Laboratório APC

William Crookes e o espiritismo RFF

Polanyi e o ensino de Química RFF

Memória Fotográfica da Química no Brasil História da Química na Região Norte

Resenhas

Normas Editoriais


CONTENTS

Editorial

Articles Characterizing phenols with a reagent prepared with steel wool sponge for cleaning and muriatic acid Sebastião F. Fonseca, Karina S. Souza and Maria Cristina Santos

The viscosity revisited and didactic examples of viscous fluids Jacqueline A. Marques and Débora Gonçalves

Overview of research in chemistry education in Brazil Wilsilene dos Santos Oliveira, José Machado Moita Neto and Nilson Fonseca Miranda

From chemistry teachers to alchemist teachers Claudio Galeno Caldeira and Ana Maria Faccioli de Camargo

How to do? A retrospective program of MEC, its prospects and some contributions José Carlos de Azambuja Bianchi and Pedro Faria dos Santos Filho


Experiences Account A proposal to teach stoichiometry of chemistry reactions in the classroom Sabrina Gardoni Peixoto Guimar達es, Camila de Lourdes Sousa and Elenice Aparecida Carlos

Chemistry History Edward Frankland and laboratory techniques APC

William Crookes and spiritualism RFF

Polanyi and chemistry educaion RFF

Photographic Memory of Chemistry in Brazil Chemistry history in the Northern Region

Reviews

Editorial Standard


EDITORIAL

Em continuidade dos propósitos, apresentamos o terceiro volume da Revista Brasileira de Ensino de Química, reiterando que, mesmo com todo o desenvolvimento alcançado pelo homem nos tempos modernos, o ensino de Química ainda apresenta muitas das dificuldades já encontradas no passado e, somente com muita união, troca de experiências e divulgação de nossos esforços e resultados, poderemos avançar. Assim, a ReBEQ se faz presente na divulgação de todas as formas de conhecimento e desenvolvimento alcançados, que possam, efetivamente, contribuir para a melhoria da qualidade do ensino de Química em todas as regiões do país, independente do seu nível de aplicação e abrangência. Ao mesmo tempo, ela abre as portas para divulgar nossas idéias e experiências, desde que adequadas aos propósitos da revista. Acreditamos que o Ensino de Química, objeto de estudo de alguns especialistas, deve, também, ser área de interesse para todos aqueles que lidam com esta ciência, professores dos diferentes níveis de ensino, alunos de graduação e pós-graduação. Com esse espírito, a ReBEQ apresenta artigos com temas variados, passando por relatos de sala de aula e assuntos que despertam curiosidades histórica e contemporânea. A ReBEQ, a cada passo, consolida sua atuação como veículo e contributo para os necessários avanços científico-educacionais. Coordenação Editorial



CARACTERIZANDO FENÓIS COM UM REAGENTE PREPARADO COM ESPONJA DE LÃ DE AÇO PARA LIMPEZA E ÁCIDO MURIÁTICO Sebastião F. Fonseca Karina S. Souza Maria Cristina Santos Instituto de Química – UNICAMP E-mail: sfonseca@iqm.unicamp.br

Os autores agradecem o apoio e o incentivo dos Grupos de Ensino de Química do Instituto de Química da UNICAMP.

RESUMO O artigo trata da preparação de um reagente, usando esponja de lã de aço para limpeza e ácido muriático (ácido clorídrico comercial), e sua reação com cinco substâncias fenólicas com a formação de complexos coloridos. O experimento descrito pode ser executado em um período normal de aula com materiais comercialmente acessíveis. Palavras-chave. Fenóis; esponja de lã de aço; ácido muriático. ABSTRACT

CHARACTERIZING PHENOLS WITH A REAGENT PREPARED WITH STEEL WOOL SPONGE FOR CLEANING AND MURIATIC ACID The article reports the preparation of a reagent, by the use of steel wool sponge for cleaning and muriatic acid (commercial hydrochloric acid), and its reaction with five phenolic substances with the formation of coloed complexes. The described experiment can be executed in an usual class period with commercially accessible materials. Key-words. Phenols; steel wool sponge; commercial hydrochloric acid.


}

INTRODUÇÃO

comercial) e esponja de lã de aço para limpeza. As substâncias a serem testadas são acessíveis

A caracterização de grupos funcionais

comercialmente e o experimento pode ser reali-

empregando reações típicas é um dos aspectos

zado em um período normal de aula.

importantes da Química Orgânica, especifica-

As substâncias contendo grupo hidroxila

mente no que se refere à Análise Orgânica. Essas

fenólico utilizadas no experimento foram ácido

reações, geralmente, são pouco executadas em

salicílico (1, preparado por hidrólise básica do

laboratórios do ensino médio pela não disponibi-

ácido acetilsalicílico, 1a), eugenol (2, óleo de

lidade de reagentes. No entanto, materiais acessíveis e baratos podem oferecer alternativas

cravo), vanilina (3, aromatizante de alimentos),

interessantes[1-3]. Um reagente que produz com-

salicilato de metila (4, medicamento) e parace-

plexos coloridos com fenóis pode ser preparado

tamol (5, medicamento).

facilmente, a partir do ácido muriático (HCl O

O

OH

C

OH

CH3O

CH3O HO

C

H

HO 3

2

1 O CH3 C

O

O C

OH OH

H

O C

N

OCH3

4

CH3

O

HO 1a

C

5

Figura 1. Estruturas das substâncias fenólicas 1-5. (1) ácido salicílico, preparado por hidrólise básica do ácido acetilsalicílico (1a); (2) eugenol (óleo de cravo); (3) vanilina (aromatizante de medicamentos); (4) salicilato de metila (medicamento); (5) paracetamol (medicamento).

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Caracterizando Fenóis com um Reagente Preparado com Esponja de Lã de Aço para Limpeza e Ácido Muriático

}

PARTE EXPERIMENTAL

}

RESULTADOS E DISCUSSÃO Ferro metálico em presença de HCl é trans-

Preparação do reagente (FeCl2/FeCl3)

2+

formado em íons Fe com liberação de hidrogê-

Colocar em um béquer de 50 mL metade de uma esponja de lã aço para limpeza (BombrilÒ,

2+

nio (Esquema 1). Os íons Fe 3+

2+

[3]

são oxidados a 3+

Fe pelo oxigênio do ar . Fe e Fe formam

ou similar) e adicionar cuidadosamente 10 mL

complexos coloridos com moléculas que pos-

de uma solução de HCl comercial/água (1:1).

suem grupos substituintes “doadores” de elétrons

Deixar a reação se processar durante 15 minutos

ou com ânions com essa característica (ligantes).

(agitar ocasionalmente a mistura, com cuidado,

Os fenóis estão entre as substâncias que produ-

com um pequeno bastão de vidro) e depois ver-

zem esses complexos[4-5].

ter a solução obtida para outro recipiente. Diluir a solução resultante com 20 mL de água destilada, neutralizar com solução aquosa de bicarbonato de sódio (10%) e filtrar usando um chumaço de algodão. Utilizar essa solução para os testes com fenóis.

Reações dos fenóis com solução de FeCl2/FeCl3 3+

Preparar em cinco tubos de ensaio, ou em

Esquema 1. Formação dos íons Fe2+/Fe e do complexo colorido.

frascos de penicilina, soluções das substâncias fenólicas - (1) ácido acetilsalicílico (Aspirinaâ, â

â

O reagente para detecção de fenóis foi pre-

Melhoral ou AAS ), (2) ácido salicílico (pre-

parado com metade de uma esponja de lã de aço e

parado pela hidrólise do ácido acetilsalicílico),

20 mL de uma solução aquosa 1:1 de ácido

(3) salicilato de metila (Gelolâ ou similar), (4)

muriático (HCl comercial), em bequer ou outro

eugenol (óleo de cravo) e (5) paracetamol – dis-

recipiente compatível. A reação se processou

solvidas em 1 mL de etanol comercial ou em 1

durante 15 minutos (Figura 2), sob agitação cui-

mL de solução de acetona-etanol (1:1): cerca de

dadosa com um bastão de vidro. A solução foi

4-5 gotas de cada substância líquida (1-4) e a

vertida para outro recipiente, diluída com 10 mL

metade de um comprimido triturado de 5. Adi-

de água, neutralizada com solução saturada de

cionar à cada solução de substância fenólica de

NaHCO3 e filtrada sobre um chumaço de algodão. A solução resultante contendo FeCl2/FeCl3)

FeCl2/FeCl3, agitar, observar a mudança de

foi utilizada nos testes para substâncias fenólicas

coloração e comparar os resultados obtidos.

(Figura 3). A detecção de fenóis foi realizada com

algumas

gotas

da

solução

aquosa

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Sebastião F. Fonseca, Karina S. Souza e Maria Cristina Santos

soluções (cerca de 1 mL) das substâncias 1, 2, 3, 4 e 5 (4-5 gotas ou meio comprimido), dissolvidas em etanol ou etanol-acetona (1:1) comerciais, e adição de 1-3 gotas da solução aquosa de FeCl2/FeCl3. A coloração azul-violeta característica de complexos de íons FeI2+/Fe3+ com fenóis (Figura 4) foi bem visualizada para o ácido salicílico (1), o eugenol (2) e a vanilina (3), mas não foi

Figura 2. Reação da esponja de lã de aço com HCl.

tão evidente para o salicilato de metila (4) e não houve mudança significativa com o paracetamol (5). É provável que a presença de grupos substituintes como –COOCH3 e –NHCOCH3 interfira na complexação do grupo hidroxila fenólico com os íons de ferro.

}

CONSIDERAÇÕES FINAIS O reagente FeCl2/FeCl3 foi preparado facilmente pela reação da esponja de lã de aço para lim-

Figura 3. Filtração da solução de FeCl2/FeCl3.

peza com ácido muriático (HCl comercial), com posterior neutralização da solução resultante. As substâncias testadas que apresentaram resultados mais evidentes foram ácido salicílico (1), eugenol (2) e vanilina (3). Os outros grupos funcionais presentes no salicilato de metila (4) e no paracetamol (5) parecem interferir na complexação do grupo hidroxila fenólico com os íons de ferro. Além da caracterização de substâncias que apresentam grupo hidroxila fenólico, o experimento permite abordagens sobre reações de metais com ácidos

Figura 4. Resultados das reações dos fenóis com a solução de FeCl2/FeCl3.

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minerais e conceitos relacionados, e pode ser realizado em um período normal de aula.

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Caracterizando Fenóis com um Reagente Preparado com Esponja de Lã de Aço para Limpeza e Ácido Muriático

} REFERÊNCIAS [1] FONSECA, S. F.; GONÇALVES, C. C. S. Revista Brasileira de Ensino de Química, v. 1, n. 1, p. 9-12, 2006. [2] FONSECA, S. F.; GONÇALVES, C. C. S. Química Nova na Escola, n. 20, p. 55-58, 2004.

[5] MANO, E. B.; SEABRA A. Práticas de Química Orgânica, 3. ed., Edgard Blucher Ltda., São Paulo, 1987, p. 101-102. [6] VOGEL, A. I. Química Orgânica – análise orgânica qualitativa, Edgard Blucher Ltda., São Paulo, 1971, v. 3, 1128-1129.

[3] HESS, S.; Experimentos de Química com materiais domésticos, Editora Moderna, São Paulo, 1997. [4] MAHAN, B. H. Química - um curso universitário, Edgard Blucher Ltda., São Paulo, 1970, p. 522-526.

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Recebido em: 17 dez. 2008 Aceito em: 20 fev. 2009

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A VISCOSIDADE REVISITADA E EXEMPLOS DIDÁTICOS DE FLUIDOS VISCOSOS Jacqueline A. Marques Universidade Estadual de Ponta Grossa, Departamento de Química Débora Gonçalves Universidade de São Paulo, Instituto de Física de São Carlos E-mail: gdebora@if.sc.usp.br

Aos Prof. G.F. Leal Ferreira (IFSC-USP) e Prof. J. Procópio (ICB-USP) pelas sugestões e leitura atenta do manuscrito em uma das suas primeiras versões.

RESUMO O tema viscosidade, por sua relevância em diferentes áreas do conhecimento, é estudado em disciplinas básicas de graduação em Ciências Exatas e Biológicas. No tratamento do assunto, os livros didáticos de Química Geral pecam pela superficialidade, e a viscosidade só é apresentada com mais detalhes em livros de Físico-Química, usualmente em capítulos sobre macromoléculas em solução. Os de Física Básica, por sua vez, abordam o tema com certo detalhamento teórico, porém, não incluem exemplos de fluidos viscosos que possam despertar o interesse dos alunos. Todo o detalhamento necessário é encontrado em livros de Mecânica e Dinâmica dos Fluidos, no entanto, dentro de disciplinas básicas (e em somente algumas aulas), é clara a dificuldade de se ter uma visão mais geral sobre a viscosidade. Além disso, os livros didáticos trazem poucos exemplos de fluidos viscosos e não descrevem como funcionam os principais equipamentos de medição de viscosidade. Assim, neste artigo, propomos revisar os princípios teóricos sobre o tema viscosidade e a sua medição, discutir exemplos de fluidos viscosos para, desta forma, auxiliar os professores de Físico-Química, Física Básica e disciplinas afins a enriquecerem suas aulas. Palavras-chave. Viscosidade; fluidos Newtonianos; fluidos viscosos. ABSTRACT THE VISCOSITY REVISITED AND DIDACTIC EXAMPLES OF

VISCOUS FLUIDS The viscosity theme, for its relevancy in different knowledge areas, is studied in graduate discipline in Exact and Biological Sciences. In the subject’s treatment, General Chemistry textbooks err at superficiality, and viscosity is introduced in detail in books about Physics-Chemistry, usually in chapters about macromolecules in solution. Basic Physics books approach the subject with a detailed theoretical; however they do not include examples of viscous fluids that may arouse the student’s


interest. All the needed details are found in books about mechanics and dynamics of fluids, however, essentially in basic disciplines (and only in a few classes), it is evident the difficult of obtaining a general overview about viscosity. Moreover, the textbooks give a few examples of viscous fluid and do not describe how the main equipments for the measurement of viscosity really work. Therefore, in this article, we suggest to review the theoretical principles about viscosity theme and its measurement, to discuss examples of viscous fluid to help teachers of Physics-Chemistry, Basic Physics and related disciplines to enrich their classes Key-words. Viscosity; Newtonian fluid; viscous fluid.

}

A VISCOSIDADE

Para um fluido em escoamento, a tensão de

Na representação tradicional o fluido, está

cisalhamento, s, está relacionada à taxa de

posicionado entre duas placas planas paralelas de

variação da velocidade do fluido (velocidade

áreas (A) iguais e a uma distância y[1]. Na Figura

de cisalhamento) (ou deformação), g&, pelo

1a, observa-se uma força tangencial constante, F,

coeficiente de viscosidade, h[3]:

aplicada sobre a placa superior (a) e que promove o movimento uniforme da camada do fluido,

dv F = s = h = x = hg& A dy

(1)

aderida à placa, a uma velocidade inicial de escoamento, v0. Devido ao atrito interno entre as

A equação acima é a Lei de Newton para o

camadas adjacentes do fluido, a sua velocidade

escoamento viscoso4 e h é a viscosidade dinâ-

de escoamento diminui gradualmente até ser zero

mica (absoluta) do fluido, dada em N s m-2 (Pa s),

(velocidade nula) na placa inferior (b), mantida fixa. A força aplicada à placa superior por unidade de área, s = F/A, é proporcional ao ângulo de cisalhamento, g = Dx/y, definido na Figura 1a. Essa força provoca os deslocamentos das camadas do fluido na direção x em um tempo dt

16

ou em Poise e, usualmente, centiPoise (cP) (1 cP = 10-3 Pa s). Na prática, a viscosidade cinemática (n) é a grandeza mais utilizada, estando ela relacionada à viscosidade absoluta e à densidade do fluido5 por n = h/r, dada em Stokes (St) e, usualmente, centiStokes (cSt) (1 St = 1 cm2 s-1). A vis-

e que se refletem na variação transversal da

cosidade específica, hsp, é definida para soluções

velocidade, ou seja, na formação de um perfil

estando relacionada à viscosidade absoluta

de velocidade. Em outras palavras, a tensão de

(intrínseca) e à viscosidade do solvente puro: ho,

cisalhamento, s, é diretamente proporcional à

hsp = (h-ho)/ho. A viscosidade relativa, hr, é a

velocidade adquirida e inversamente propor-

razão entre a viscosidade intrínseca e a viscosi-

cional à distância entre as placas[2].

dade do solvente, hr = h/ho.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos

a) x

a

F

que se diferencia do escoamento turbulento pelo número de Reynolds6, NR, que está relacionado ao raio do capilar, velocidade média, densidade (r) e viscosidade média do fluido

y

(NR = 2Rrv/h). Partindo de um regime turbu-

y x

lento, os experimentos de Reynolds mostraram que o escoamento se tornava laminar quando

b t=t+dt

t

NR < 2000.

b)

Na Figura 1b, observa-se um cilindro de raio A R

L r

B

R, seções transversais A e B e pressões de entrada P1 e de saída P2 (P1 > P2). A força aplicada sobre o

n

P1

P2 dx

fluido no cilindro de raio r é pr2(P1-P2) que, pela Lei de Conservação de Massa, é compensada pela tensão de cisalhamento devido ao gradiente de

Representação de um fluido viscoso: a) entre duas placas planas paralelas; b) escoando em um cilindro de raio R. Figura 1.

velocidade em cada seção: pr2(P1-P2) = s2prL, onde L é o comprimento do cilindro entre A e B. Seguindo o que foi apresentado na Equação 1, s = hdv/dr, podemos reescrever esta equação

}

ESCOAMENTO VISCOSO Se a deformação de um fluido for homogê-

como: ( P - P2 ) dn s = =- 1 r dr h 2Lh

(2)

nea, conforme descrito na Figura 1a, o perfil de velocidades é observado da placa superior,

Ou seja, dv = - f(s) dr com sinal negativo, já que v

móvel, até a placa inferior, fixa. Em se tratando

decresce para r crescente. O perfil de velocidade

de um fluido escoando em um tubo cilíndrico,

pode ser obtido após a integração de r a R:

ou um capilar, a velocidade de escoamento irá variar com a distância das paredes, atingirá um

n=

( P1 - P2 ) 2 (R - r 2 ) 4Lh

(3)

valor máximo na região central e será praticamente zero nas paredes do tubo, onde o fluido está em contato (Figura 1b).

Assim, tendo a velocidade de escoamento do fluido no capilar, podemos obter a vazão do

Para haver escoamento do fluido neste

fluido, Q, em cada seção, sem que seja neces-

tubo, deve ser exercida uma força na direção do

sário assumir a natureza do fluido laminar

escoamento, o que provoca a formação de um

(Newtoniano ou não-Newtoniano, que defini-

gradiente de pressão, dP, então necessário para

remos a posteriori). Como Q = Au e A = 2prdr,

vencer o atrito interno das camadas adjacentes

é possível se obter a contribuição dQ e, poste-

do fluido. Este tipo de escoamento é laminar,

riormente, Q, integrando entre r = 0 e r = R:

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

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Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves

Q=

pR 4 ( P1 - P2 ) 8hL

(4)

que apresentam vantagens e desvantagens de acordo com o tipo de fluido em análise. Os métodos de medidas de viscosidade são os mais

A Equação 4 é chamada Hagen-Poiseuille, não é válida para fluidos turbulentos e que pode também ser expressa pela diferença de pressão de entrada e saída no fluido no capilar, P1 – P2, DP:

variados e, hoje, há um número considerável de viscosímetros comerciais com preços acessíveis. Um dos viscosímetros capilares mais conhecidos e simples é o denominado de Ostwald. Outros viscosímetros também se baseiam no

DP =

8hLQ pR 4

(5)

princípio de escoamento laminar de um fluido em um capilar, tais como os de Cannon-Fenske e de Ubberlohde[7-8], conforme Figura 2. Esses visco-

Conforme se verifica na Equação 5, a queda de pressão de um fluido em um capilar é diretamente proporcional à viscosidade e inversamente proporcional à quarta potência do raio do capilar. Nesse caso, o regime de escoamento é laminar e escoa na parte central do capilar,

símetros contêm, basicamente, duas partes, A e B; a parte A, mais estreita, apresenta um ou dois bulbos com traços de referência, a e b, e se comunica com um capilar, c. De acordo com a viscosidade do fluido, podem ser utilizados tubos e capilares com diferentes diâmetros.

independentemente da velocidade do fluido. Como veremos adiante, esta equação é muito importante, por exemplo, na explicação do mecanismo de bombeamento de sangue pelo coração e na determinação da viscosidade em viscosímetros capilares.

}

ALGUNS TIPOS DE EQUIPAMENTOS As medidas de viscosidade podem ser realizadas basicamente por meio de três tipos de viscosímetro: i) capilar: permite a medida da

Figura 2. Exemplos de viscosímetros capilares.

resistência ao fluxo de um fluido em um capilar; ii) rotacional: baseia-se na rotação de uma parte

18

(ou duas) (tais como de cilindros concêntricos ou

Nos viscosímetros capilares, o fluxo é pro-

palhetas) imersa em um fluido viscoso; iii) de

duzido por uma diferença de pressão, sendo

esfera: permite calcular o tempo de retenção de

medido o tempo, t, necessário para certo

uma esfera em um fluido viscoso.

volume de um fluido, entre a e b, escoar através

Aqui, serão apresentados alguns desses

de um capilar de comprimento L e raio R. De

equipamentos, que não são, obviamente, únicos e

acordo com a equação apresentada anteriorREVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos

mente, (4), e reescrita usando V/t = QV, temos a

onde r = densidade da solução, ro = densidade do

vazão volumétrica do fluido no capilar:

solvente puro, t = tempo medido usando a solução

QV =

e t0 = tempo medido usando o solvente puro. Para

V pR 4 DP = t 8hL

(6)

soluções diluídas, podemos assumir r = ro , o que origina hr = t/t0 Neste caso, a relação entre a visco-

A diferença de pressão nas extremidades do capilar pode ser obtida pela diferença nas alturas

sidade específica, hsp, e a viscosidade relativa, hr será dada por[7]:

dos níveis, h, conforme Figura 3, já que o escoamento sofre a influência da aceleração da gra-

hsp = hr - 1 =

vidade e, portanto, depende da densidade do

(t - t0 ) t0

(7)

fluido, r. Como a equação de Hagen-Poisseuille

O viscosímetro de Ostwald funciona bem

é válida somente para um escoamento laminar, a

para fluidos Newtonianos sob um mesmo

viscosidade cinemática (em Stokes) do fluido,

volume do fluido, desde que não haja um desni-

h, será proporcional à densidade do fluido, r, e

velamento considerável do viscosímetro entre

ao tempo de escoamento do fluido, t.

uma medida e outra. O problema do desnivelamento é superado ao se utilizar o viscosímetro

plástico (Casson)

de Cannon-Fanske, já que, neste caso, o centro

plástico (Bingham)

das duas partes fica em uma mesma posição,

reo-fluidificante (pseudoplástico) Newtoniano

mesmo sob uma leve inclinação do viscosímetro. Porém, de forma similar ao viscosímetro de Ostwald, há a necessidade de um volume constante de fluido. Essa limitação é sanada pelo uso do viscosímetro de Ubberlohde, já que ele apre-

reo-espessante (dilatante)

senta um terceiro braço, permitindo a sua operação independentemente do volume de fluido adicionando ao viscosímetro. Assim, para este

Figura 3. Variação da tensão de cisalhamento com a deformação de cisalhamento para diferentes tipos de fluidos.

último equipamento, é possível fazer diluições da solução dentro do próprio viscosímetro. O viscosímetro de queda de esfera (Hoppler)

Para se determinar a viscosidade de uma solu-

se baseia em medidas do tempo de retenção de

ção diluída com um viscosímetro capilar, devem

uma esfera imersa em um fluido viscoso[4,6].

ser feitas medidas dos tempos de escoamento da

Após considerar as forças que atuam sobre esta

solução e do solvente puro. Conforme apresenta-

esfera em escoamento (gravitacional, de arraste, e

mos anteriormente, a viscosidade relativa é dada

de impulsão), obtém-se, em um intervalo de

pela razão entre a viscosidade intrínseca e a visco-

tempo Dt, a relação:

sidade do solvente, hr = h/ho, ou seja, hr = r.t/ro.to, REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

h = k ( r 1 - r 2 ) Dt

(8),

19


Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves

sendo k = uma constante que depende do equipamento, e r2 e r1, as densidades da esfera e do

Para um cilindro de comprimento L, o torque aplicado ao rotor, M, dado em N m, será:

fluido, respectivamente.

M = 2pR 2 Ls( r )

(10)

Um outro tipo de viscosímetro muito utilizado para a análise de fluidos Newtonianos e

Combinando essas duas equações, temos:

[9]

não-Newtonianos é o rotacional . Neste caso, M = 2pR 3 Lh

uma parte do viscosímetro gira em relação à outra

dW dR

(11)

e provoca o cisalhamento no fluido. A viscosidade é medida em função do torque fornecido à

Após a integração da Equação 11, obtemos

parte móvel para se atingir determinada veloci-

a velo ci dade angu lar, W, para W = 0 quando

dade angular do fluido. Diferenças nas taxas de

R = Ri e W = We quando R = Re:

cisalhamento caracterizam diferentes tipos existentes de viscosímetros rotacionais, tais como os

We =

de cilindros concêntricos, placas, cone e placa, ou ainda, discos paralelos.

M Re 3 R dr 2pLh òRi

(12),

ou em termos da viscosidade:

Podemos considerar o princípio de funcionamento do viscosímetro de Couette[4,6,10], que

h=

consiste em dois cilindros concêntricos; o cilin-

M æ 1 1 ö ç 2 - 2÷ ç 4pLW e è R i R e ÷ø

(13)

dro externo gira a uma velocidade angular do rotor, W, dada em rpm ou rad s-1. A rotação

O uso da Equação 13 permite que seja obtida

desse cilindro provoca o escoamento laminar

a viscosidade a partir dos parâmetros torque, velo-

do fluido posicionado entre o cilindro externo

cidade angular e dos valores do comprimento e

de raio Re e o cilindro interno, fixo, de raio Ri.

raios dos cilindros interno e externo. Em outras

Um gradiente de velocidade angular é, então,

palavras, a viscosidade pode ser reescrita em ter-

observado nas camadas cilíndricas do fluido de

mos de uma constante, relacionada às característi-

raio R, dW/dR, já que a camada adjacente ao

cas do equipamento de medida:

cilindro interior está estacionária e a camada do

h= k

fluido adjacente ao cilindro exterior gira a uma

M We

(14),

velocidade angular, We. Em se tratando de um fluido Newtoniano

A tensão de cisalhamento, s, e a velocidade

preenchendo o espaço entre os cilindros, é

de cisalhamento, g&, estão também relacionadas a

válida a Lei de Newton, apresentada previamente (equação 1), onde s = hg&, sendo a tensão

duas outras constantes: g& = k ' W e s = k '' M . No

de cisalhamento, s, a uma distância radial R,

cisalhamento, s, deve ser analisada por métodos

expressa como:

matemáticos, já que a relação entre tensão de s( R ) = hR

20

dW dR

(9)

caso de fluidos não-Newtonianos, a tensão de

cisalhamento e a velocidade de cisalhamento não é linear[6]. REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos

}

TIPOS DE FLUIDOS Viscoelásticos Os sólidos também podem apresentar atrito interno, que se manifesta por meio de movimentos lentos, resultantes das tensões internas. Em se tratando de um sólido com características fluidas, e sujeito a uma tensão de cisalhamento, o ângulo de cisalhamento irá aumentar lentamente em um comportamento similar ao de um fluido (líquido) viscoso. A deformação será instantânea em um sólido, e progressiva em um fluido. Os fluidos denominados viscoelásticos apresentam propriedades viscosas (de líquidos) e elásticas (de sólidos); nestes, a deformação é uma função do tempo e

Newtonianos Os fluidos Newtonianos apresentam uma única viscosidade a uma dada temperatura, independentemente da tensão de cisalhamento. Porém, a maioria dos fluidos apresenta um comportamento reológico mais complexo, dependente do tempo e ou da elasticidade, e a determinação da viscosidade para estes materiais não é, portanto, trivial[4-6]. Um fluido Newtoniano, ideal, pode não apresentar uma característica elástica inerente ou uma estrutura de gel, como também não possuir uma viscosidade considerada alta[1], caso da água ou do óleo, que ao serem submetidos a uma tensão constante escoam enquanto uma tensão for aplicada.

apresenta duas contribuições, a viscosa e a elástica[3]. A relação entre estas duas contribuições,

Não-Newtonianos

a dada temperatura, depende da força aplicada

A grande maioria dos fluidos tem um com-

e do tempo da deformação. Aqui, o fluido será

portamento não-Newtoniano, com valores de vis-

tratado como viscoso quando ele fluir (como o

cosidade não constantes com a velocidade de

óleo lubrificante) e viscoelástico, quando a sua

cisalhamento e que dependem, ou não, do tempo.

textura sólida predominar (como a gelatina).

Os fluidos não-Newtonianos independentes do

Um exemplo clássico de um fluido viscoe-

tempo[7-9] são classificados como reo-fluidifican-

lástico é o piche: durante o seu escoamento, a

tes (pseudoplásticos), reo-espessantes (dilatantes)

sua viscosidade aumenta, porém, devido às suas

e plásticos (Birgham e Casson)2. Na Figura 3 é

características de sólido, pode-se provocar a sua

apresentada como varia a tensão de cisalhamento,

ruptura com um bastão de vidro. Em alguns

s, em função da velocidade de cisalhamento, g&,

materiais de cadeias longas, observa-se um efeito denominado recolhimento elástico – uma parte rompida se move para cima e a outra, para baixo[3]. O Número de Deborah, adimensional, De, dado por De = l/t, sendo l = tempo de relaxação característico do material e t = tempo de fluxo (velocidade de deformação) é quem diferencia um material fluido (baixos valores de De) de um sólido (altos valores de De). REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

para estes diferentes tipos de fluidos. Os principais modelos que representam os fluidos plásticos são os denominados Bingham e Casson, para os quais a tensão de cisalhamento varia com a deformação de cisalhamento a partir de uma tensão inicial de escoamento, s0, também chamada de tensão de inércia (ver Figura 3). Nesses fluidos, o escoamento ocorre

21


Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves

desde que seja atingido certo valor de s0, e a

Tabela 1. Classificação de alguns fluidos viscosos. Fluido

viscosidade é denominada plástica (s - s0 = h0 1/2

g&, Bingham, s

- s0

1/2

= h0

1/2

1/2

g& , Casson).

A viscosidade dos fluidos pseudoplásticos e dilatantes obedece à Lei de Potência (modelo de escoamento de Ostwald-de Waele), sendo k, o índice de consistência; n, o índice de escoamento e h, a viscosidade absoluta: s = kg&

n

s h = kg& n -1 g&

(15)

Classificação

Água, leite, ar, hidrogênio, mercúrio, óleo lubrificante.

Newtoniano.

Amido de milho em água, argila, ingredientes de bala, lama.

Dilatante.

Chocolate, papel, tinta à base de água.

Pseudoplástico.

Ketchup, vidros.

Plástico.

Leite condensado, mel, tinta a óleo.

Tixotrópico.

Maionese, margarina.

Pseudoplástico/tixotrópico.

Clara de ovo batida, dispersão de polímeros, géis, gelatina, manteiga batida, musse, nata, pasta de dentes, pasta de amendoim.

Viscoelástico.

Os valores de k e n dependem da natureza do fluido; enquanto maiores valores de k indicam menor fluidez, o parâmetro n indica quão distante está o fluido não-Newtoniano do Newtoniano (n = 1 para fluido Newtoniano). No caso de fluidos pseudoplásticos, n < 1, e

EXEMPLOS COTIDIANOS DE FLUIDOS VISCOSOS

dilatantes, n > 1, e ambos os fluidos podem ser

Em nossa vida cotidiana, há um número

representados por um gráfico linear log s vs log

variado de fluidos viscosos; podemos considerar

g& quando se obtém log k e n, sendo log k = log s

inicialmente três exemplos: quando se pretende

para log g&= 0, e n = coeficiente angular.

obter efeitos texturizados em paredes, as tintas

No caso dos fluidos dilatantes, a viscosi-

devem ter uma alta viscosidade; para uma aplica-

dade aumenta proporcionalmente com a velo-

ção mais usual, uma baixa viscosidade, já que só

cidade de cisalhamento, independente do

assim a pintura se torna viável por meio de equi-

tempo, sendo este tipo de comportamento

pamentos apropriados. Enquanto a maioria dos

[12]

.

solventes comuns tem uma viscosidade despre-

É comum em materiais com altos níveis de

zível, as resinas possuem uma elevada vis-

desfloculantes, tais como argilas, lama, amido

cosidade. Nas indústrias, é crucial se ter um

de milho em água, ingrediente de balas etc.

conhecimento a respeito da viscosidade de maté-

mais raro do que o da pseudoplasticidade

Os fluidos não-Newtonianos dependentes

rias-primas e produtos, determinar a funcionali-

do tempo são classificados como tixotrópicos

dade de ingredientes no desenvolvimento de um

(fluidificantes) e reopéticos (espessantes), nos

produto, avaliar a qualidade, textura etc., de pro-

quais a viscosidade aparente decresce ou aumenta

dutos finais e intermediários, e controlar a quali-

linearmente com o tempo, respectivamente.

dade e a vida útil de um produto na prateleira.

Na Tabela 1, observa-se a classificação de alguns fluidos em função da viscosidade.

22

}

Em sala de aula, podem enumerados exemplos interessantes de fluidos viscosos: REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos

Alimentos

mento, s0, percebida ao se forçar o

• Leite – o leite fresco, como uma emul-

ketchup a sair de um frasco[6].

são de gordura em água, é um exemplo

• Chocolate – exemplo de fluido pseudo-

clássico de fluido Newtoniano. A visco-

plástico, com escoamento complexo e

sidade do leite depende do seu processa-

comportamento reológico variável; sob

mento industrial; ela diminui quando

a aplicação de uma tensão inicial de

comparados os leites integral e desna-

escoamento, s0, comporta-se como um

tado devido às diferenças nas quantida-

plástico de Bingham. Contudo, com o

[13]

des de proteínas e lipídeos

passar do tempo, torna-se mais fluido,

.

• Omega 3 – os ácidos graxos poliinsa-

perdendo esta classificação. Para a des-

turados Ômega-3, encontrados em peixes,

crição das propriedades reológicas do

têm sido adicionados ao leite e a outros

chocolate, a indústria utiliza uma versão

alimentos como um ingrediente fun-

do modelo de Casson antes das etapas

cional. Dentre os seus vários efeitos

finais de processamento por ser este o

positivos, um deles é o de diminuir a

que melhor representa a continuidade

viscosidade do sangue e a agregação de

do escoamento[15]. O mesmo modelo é

plaquetas[14].

utilizado em purês de tomate, com os

• Margarina e maionese – exemplos de

quais se verifica se a consistência dos

fluidos não-Newtonianos pseudoplás-

purês difere de acordo com os métodos

ticos e tixotrópicos, com alta consistên-

de produção e a variedade e maturidade

cia,

dos tomates[16].

rico

conteúdo

em

óleos

e

viscosidade que diminui com o aumento

• Natas, claras de ovos batidas, manteiga

da força externa aplicada, levando ao

batida, musses e gelatina em água fria

alinhamento das moléculas e à diminui-

– exemplos comuns de fluidos viscoe-

ção do atrito viscoso. Na ausência da

lásticos.

força externa, que pode provir de uma

• Na indústria de alimentos, o desenvolvi-

faca, a viscosidade volta ao valor origi-

mento de novos produtos requer a utili-

nal. O mel e o leite condensado, devido

zação de ingredientes funcionais, sendo

à presença de proteínas, têm a mesma

a análise da viscoelasticidade quem

natureza tixotrópica.

definirá a função dos espessantes, gelei-

• Ketchup – exemplo de fluido plástico

ficantes, emulsificantes, ou ainda, o

Bingham, cujo escoamento é rápido

controle da sinerese (exsudação espon-

após superada a tensão inicial de escoa-

tânea)[17].

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

23


Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves

Lubrificantes A presença de um óleo lubrificante em

A formulação de um medicamento, entre

peças mecânicas se justifica em parte pela

outros fatores, determina a sua via de admi-

necessidade de reduzir o atrito entre as partes

nistração injetável. Medicamentos mais vis-

móveis. Para manter uma peça lubrificada, o

cosos (como as soluções oleosas) devem ser

óleo, na forma de um filme, deve suportar o

injetados no organismo principalmente por

peso das peças móveis de tal forma a haver,

via intramuscular, sendo estas injeções dolo-

após a expulsão do excesso de óleo para as late-

rosas[19]. Para tanto, de acordo com a viscosi-

rais, uma distância suficiente entre as partes[17].

dade e a concentração do medicamento,

Esta característica deve-se à própria pressão

devem ser usadas agu lhas e seringas com

interna no fluido e depende da viscosidade,

calibres e comprimentos adequados. Intuiti-

densidade do fluido e velocidade das partes

vamente sabemos que a pressão a ser exercida

[18]

móveis

24

Medicamentos e sangue

. Obviamente, a viscosidade depende

no êmbolo de uma seringa depende também

da temperatura – peças mecânicas lubrificadas

da viscosidade do medicamento, assim como

e aquecidas se movem com mais facilidade

a velocidade de absorção e a tolerância medi-

exatamente devido à menor viscosidade do

camentosa também estão relacionadas à flui-

lubrificante.

dez medicamentosa.

A dependência entre a viscosidade de

Um outro tema de interesse (e complexo) é

óleos lubrificantes e a temperatura é reduzida

a dinâmica do sangue em sistemas cardiovascu-

com o uso de aditivos. Os testes de ponto de

lares (artérias, capilares e veias). O sangue é

mínima fluidez indicam os menores valores de

uma suspensão contendo cerca de 55% de parte

temperatura nos quais ainda ocorre o escoa-

líquida, o plasma (91,5% de água, 7% de prote-

mento dos óleos lubrificantes. Estes experi-

ínas e o restante de outros solutos) e 45% de

mentos possibilitam a classificação dos óleos

parte sólida (glóbulos vermelhos e brancos, e

em grau inverno ou verão, sendo os primeiros

plaquetas)[20,21]. A viscosidade do sangue é

utilizados em baixas temperaturas sem haver

maior do que a da água (cerca de 3,5 vezes) e

congelamento.

depende de particularidades do próprio sangue,

Especificamente para as graxas, que são

geometria e diâmetro dos tubos por onde ele

lubrificantes pastosos (emulsões de óleos e

escoa. Também amplia a complexidade da

espessantes), há a necessidade de uma tensão

questão, o fato de os vasos sanguíneos não

inicial de escoamento, s0, já que diante de bai-

apresentarem formas geométricas cilíndricas

xas tensões de cisalhamento, elas se portam

ideais. Além disto, o regime de escoamento

como sólidos e não escoam. Assim, as graxas se

sanguíneo deixa de ser laminar para ser turbu-

assemelham aos óleos lubrificantes sob altos

lento em caso de obstruções ou variações de

valores de tensão de cisalhamento.

fluxo em vasos com superfícies rugosas.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos

A viscosidade do sangue depende da vis-

mínimo do capilar no qual ocorre a diminuição

cosidade do plasma (que é cerca de duas vezes

da viscosidade aparente do sangue é de cerca 7

a da água pela presença de proteínas), grau de

mm, conforme resultados in vitro e in vivo, res-

agregação e sedimentação das células, grau de

pectivamente[24]. Vale também mencionar que a

deformidade dos leucócitos, porcentagem de

obtenção da viscosidade do sangue in vivo é

hemácias, e geometria e diâmetros dos tubos e

extremamente difícil. Um dos métodos usados

[22]

capilares

. Em particular, ela aumenta com o

para tal é medir a queda de pressão em um seg-

aumento da porcentagem de glóbulos verme-

mento do tubo, o volume de sangue que por ali

lhos no sangue; e a este aumento está relacio-

estiver escoando, ocomprimento e diâmetro

nado o maior atrito interno que as camadas

interno deste tubo, para, em seguida, calcular a

laminares do sangue, com um maior número de

resistência ao escoamento[24].

células, experimentam, e a uma maior pressão,

A equação de Hagen-Poiseiuille é aplicada

então necessária para permitir o escoamento

ao mecanismo de bombeamento do sangue pelo

sanguíneo. Um exemplo deste efeito é o

coração em sistemas cardiovasculares. O fluxo

aumento da viscosidade do sangue em lugares a

sanguíneo depende da pressão sanguínea

altas altitudes[23]. Nestes locais, a quantidade de

(diferença de pressão, DP) e da resistência ao

glóbulos vermelhos no sangue aumenta para

escoamento que, por sua vez, dependem da vis-

compensar a diminuição da pressão atmosfé-

cosidade do sangue, geometria e morfologia

rica e, portanto, a menor quantidade de oxigê-

dos tubos e capilares. O escoamento turbulento

nio no sangue. Um outro exemplo é a anemia,

aumenta no caso de haver estreitamento dos

que está associada à deficiência de glóbulos

vasos, como em capilares, ou pela presença de

vermelhos no sangue, levando, portanto, a uma

placas ateroscleróticas nas paredes; esta ten-

diminuição da viscosidade sanguínea.

dência à turbulência é prevista pelo número de

Na área de Biofísica, um efeito conhecido como Fahraeus-Lindqvist, e originalmente des-

Reynolds, que como mostrado anteriormente, é inversamente proporcional à viscosidade.

crito em 1931, descreve a dependência entre a

O som do escoamento turbulento, ou da

viscosidade e o diâmetro dos tubos e capilares

vibração provocada por ele, é aquele ouvido por

sanguíneos. A viscosidade do sangue diminui a

um estetoscópio, seja no caso da compressão das

partir de determinado valor crítico de diâmetro

artérias pela placa do estetoscópio, que provoca o

do capilar já que o alinhamento dos glóbulos

aumento da velocidade do sangue e, portanto, da

vermelhos em dutos estreitos provoca a diminui-

turbulência, seja nos chamados sopros san-

ção do atrito interno, ou seja, da viscosidade do

guíneos, quando a turbulência do sangue está

sangue, então denominada “aparente” para dife-

associada ao estreitamento nas válvulas com

renciá-la da viscosidade do plasma. O diâmetro

patologias cardíacas.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

25


Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves

}

CONSIDERAÇÕES FINAIS O tema viscosidade pode ser abordado em sala de aula com uma maior profundidade do que a normalmente encontrada em livros didáticos de Química e Física, além de poder ser exemplificado com muitos dos fluidos viscosos encontrados em nossa vida cotidiana. De alguma forma, os exemplos aqui apresentados tem uma complexidade de comportamento reo-

[7] COLLINS, E. A.; BAREŠ, J.; BILLMEYER JR., F. W. Experiments in Polymer Science, John Wiley & Sons, 1973. [8] BRAUN, D.; CHERDRON, H.; KERN, W. Practical Macromolecular Organic Chemistry, Harwood Academic Pub., 1984. [9] HARADA, M. Rotating viscosimeter, US Patent, 4, 878, 378, nov. 7, 1989. [10] OGSTON, A. G.; STAINER, J. E., Biochem. J. 1953, 53, 4. [11] TANNER, R. I. Engineering Rheology. 2. ed. Oxford Engineerign Science Series, 2000.

dos na bibliografia selecionada e em literatura

[12] LEWIS, M. J. Physical Properties of Dairy Products, Robinson, R. K. Modern Dairy Technology, Cap. 5, Vol. 2, 1994.

específica. Para medidas didáticas em laborató-

[13] SILVA, P. H. F. Química Nova na Escola, 1997, 6, 2.

rio, podem ser utilizados óleos lubrificantes,

[14] UAUY, R.; VALENZUELA, A. Nutrition, 2000, 16, 680.

óleos de cozinha (antes e após frituras), leite e

[15] BECKETT, S. T. The Science of Chocolate, Royal Society Chemistry, 2000.

lógico. Maiores detalhes podem ser encontra-

soluções poliméricas, já que para estes, há relativamente vasta bibliografia com valores tabelados de viscosidade.

[16] RAO, M. A. J. Texture Studies, 1977, 8, 135. [17] BOBBIO, P. A.; BOBBIO, F. O. Química do Processamento de Alimentos. 3. ed., Livraria Varela, 2001. [18] STANLEY, R. C. Phys. Education, 1972, 7, 193.

}

REREFÊNCIAS [1] NUSSENZVEIG, H. M. Curso de Física Básica – Fluidos, oscilações e ondas, calor. 3. ed. Ed. Edgard Blücher, 1983. [2] STREETER, V. L.; WYLIE, E. B. Mecânica dos Fluidos. 7. ed. McGraw-Hill, 1982.

[19] FLORENCE, A. T.; ATTWOOD, D. Princípios Físico-Químicos em Farmácia, EDUSP, 2003. [20] SOLOMON, E. P. et al. Biology, Sauders College Pub., 1993. [21] BRUM, G.; MCKANE, L.; KARP, G. Biology: exploring life, John Wiley, 1993. [22] REINHART, W. H. Biorheology, 2001, 38, 203.

[3] VIEIRA, R. C. C. Atlas de Mecânica dos Fluidos, Ed. Edgard Blücher, 1971.

[23] KAMETAS, N. A. et al. BJOG: An International Journal of Obstetrics & Gynaecology, 2002, 109, 930.

[4] FOX, R. W.; MCDONALD, A. T. Introdução à Mecânica dos Fluidos. 5. ed. LTC Editora, 2001.

[24] PRIES, A. R.; SECOMB, T. W.; GAEHTGENS, P. Cardiovascular Research, 1996, 32, 654.

[5] PAO, R. H. F. Fluid Dynamics, Charles E. Merrill Books, Inc., Columbus Ohio, 1967. [6] MACOSKO, C. W. Rheology – Principles, measurements, and applications, VCH, 1994.

26

Recebido em: 23 abr. 2008 Aceito em: 26 fev. 2009

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


PANORAMA DA PESQUISA EM ENSINO DE QUÍMICA NO BRASIL Wilsilene dos Santos Oliveira José Machado Moita Neto Nilson Fonseca Miranda Universidade Federal do Piauí – UFPI

RESUMO O Ensino de Química no Brasil aparece, hoje, como uma área de pesquisa que tem despertado grande interesse de pesquisadores que buscam compreendê-la como área interconexa com as demais áreas tradicionais da Química, porém, com identidade própria. Os cursos de licenciatura em Química, ao modificarem seu projeto, que visa preparar os profissionais em educação química, propiciam uma reflexão mais ampla sobre o processo ensino-aprendizagem, com o consequente aumento de pesquisas na área. Neste trabalho, apresentaremos um panorama sobre a Pesquisa em Ensino de Química no Brasil. Palavras-chave. Ensino de química; pesquisa em ensino; grupos de pesquisa; licenciatura em química. ABSTRACT

OVERVIEW OF RESEARCH IN CHEMISTRY EDUCATION IN BRAZIL. In our days the chemistry education in Brazil appears as a research area that has attracted great interest of researchers seeking to understand it as an interrelated area with other traditional areas of chemistry, but with its own identity. The Chemistry Graduate Courses modifying their projects to prepare the education professionals, provide a broader reflection on the teaching-learning process, with the consequent increase in the research on this area. This paper presents an overview on the Research in chemistry education in Brazil. Key-words. Chemistry education; research in education; research groups; Chemistry graduate courses.


}

INTRODUÇÃO A área de concentração, ou a linha de pes-

Lutfi[2]. Ressaltam-se também as atribuições

quisa “Ensino de Química” tem sido objeto de

relativas às tecnologias digitais que colaboram

reflexão e crítica de pesquisadores que expres-

com a diversificação didática no ensino de

sam, em seus trabalhos, um novo olhar acerca

Química no Brasil.

da prática pedagógica em Química. Estudos

Segundo as Orientações Curriculares do

significativos e publicações crescentes ocorre-

MEC[3], a área de Educação Química traz

ram, na área, a partir da década de 1980. Pode-

importantes contribuições para a melhoria do

mos constatar essa afirmação nos anais das

ensino por meio de encontros regionais e nacio-

reuniões da Sociedade Brasileira de Química

nais onde são realizados minicursos, palestras,

(SBQ), que tem registrado um aumento signifi-

mesas-redondas e apresentação de trabalhos

cativo do número de trabalhos apresentados na

voltados para o ensino da disciplina. Enfa-

seção de Educação. Em 2008, foram apresenta-

tiza-se também o surgimento de livros didáti-

dos 139 trabalhos.1

cos com base em pesquisas realizadas e

Trabalhos envolvendo os diversos conteú-

projetos apresentados. Neste trabalho eviden-

dos químicos, inovações metodológicas, recur-

cia-se o esforço da comunidade de educadores

sos

à

químicos para mudanças do ensino no país,

formação inicial e continuada do químico, revi-

apontando-se publicações como a revista

sões educacionais, são muito encontrados na

Química Nova na Escola, que possui muitos

literatura, evidenciando a preocupação dos pro-

anos de circulação, e que é voltada para profes-

fissionais da Química com o ensino da disci-

sores e estudantes de Química. Em um dos arti-

plina. Diversos trabalhos têm destacado o

gos publicados neste periódico Schnetzler

Ensino de Química numa perspectiva de prepa-

mostra a importância da pesquisa em ensino de

ração do aluno para o exercício da cidadania,

Química[4]. Neste trabalho a autora menciona

1.

28

como, por exemplo, Santos e Schnetzler[1] e

didáticos,

aspectos

relacionados

Os dados foram extraídos da revista SBQ/2008. Acesso: www.sbq.org.br REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Panorama da Pesquisa em Ensino de Química no Brasil

que apenas o domínio do conteúdo não é sufici-

As modificações sofridas nos cursos de

ente, e se faz preciso recorrer à aplicação de

licenciatura na área de Química, visando uma

contribuições teóricas para a educação quí-

boa qualificação do profissional de ensino,

mica, o que ressalta a valorização desta área.

induziram muitos trabalhos de pesquisa

Em tempo, não podemos deixar de mencionar a

tomando a Química como ponto de referência,

ReBEQ, este novo e importante espaço para a

mas dando ênfase à questão do ensino propria-

discussão das questões de ensino e aprendiza-

mente dito. Uma importante contribuição para

gem. Assim, pretendemos neste trabalho, traçar

a área de Ensino de química é o trabalho de

um quadro diagnóstico da pesquisa em Ensino

Oliveira e Queiroz[6], que traz um levantamento

de Química no Brasil.

do quadro geral em que a pesquisa em Ensino de Química é atuante no Brasil, identificando programas de pós-graduação, grupos de pes-

}

OS CURSOS DE LICENCIATURA EM QUÍMICA

quisa, encontros científicos e periódicos especializados que têm o ensino de Química como área de pesquisa.

Os cursos de Licenciatura em Química no Brasil, há algum tempo, não estavam adequados à formação de professores, visto que a pró-

}

pria grade curricular era dotada de disciplinas focadas apenas no aspecto químico do conheci-

ENCONTROS NA ÁREA DE ENSINO DE QUÍMICA

mento, com pouca formação específica em

Informações sobre os encontros realizados

magistério. Modificações em legislação pos-

no Brasil foram adquiridas nos sites da Socie-

sibilitaram a inserção de disciplinas que muda-

dade Brasileira de Química (SBQ) e Associa-

ram a ênfase da licenciatura. Segundo o Parecer

ção Brasileira de Química (ABQ) bem como

[5]

CNE/CES 1303 do Ministério da Educação ,

em nota na revista Química Nova na escola[7-9].

as Instituições de Ensino Superior (IES) devem

Um dos principais encontros na área de

estabelecer currículos que enquadrem o perfil

ensino de Química no Brasil é o Encontro Nacio-

do profissional químico; no caso da Licencia-

nal de Ensino de Química, ENEQ, que ocorre

tura, materiais didático-pedagógicos que propi-

bianualmente, desde 1982, sendo um evento

ciem ao aluno aprendizagens que suscitem

específico da área. O último encontro realizado,

formação para o magistério. Dentre as verten-

XIV ENEQ, aconteceu na cidade de Curitiba –

tes trabalhadas estão as Diretrizes Curriculares

PR de 21 a 24 de julho de 2008, foi organizado

Nacionais e as Diretrizes Nacionais para a Edu-

em parceria com várias universidades e sediado

cação Básica, além de conteúdos essenciais

pela Universidade Federal do Paraná. Nesta oca-

para a construção humana, como filosofia, his-

sião, foram inscritas 1440 pessoas, dentre estu-

tória e instruções em língua portuguesa e

dantes e pesquisadores, e foram aceitos para

estrangeira.

apresentação cerca de 470 trabalhos.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

29


Wilsilene dos Santos Oliveira, José Machado Moita Neto e Nilson Fonseca Miranda

Outro evento importante é o Encontro de

A primeira não é específica da área de ensino,

Debates sobre o Ensino de Química que ocorre

porém possui seção destinada a trabalhos que

no Rio Grande do Sul. O último (28º EDEQ)

envolvem a Educação Química nos vários níveis

ocorreu, em outubro de 2008, na Universidade

de ensino. O número de trabalhos publicados

Luterana do Brasil (ULBRA) em Canoas – RS.

por esta revista aumentou muito nos últimos

Há, também, outros encontros regionais como

anos e hoje, em cada volume, tem-se um número

ECODEQ (região Centro-Oeste), EMEQ (Minas

aproximado de 200 páginas sendo que na década

Gerais), EDUQUI (Bahia), EPPEC, SIMPEQ e

de 80 esse número era de 50 páginas, como des-

EVEQ (São Paulo) e outros. É interessante tam-

crito no trabalho de Oliveira e Queiroz[10]. Sua

bém lembrar os Simpósios Brasileiros de Educa-

edição é bimestral e, ao longo dos dois últimos

ção Química, o 6º Simpósio ocorreu, em 2008,

anos, 2007 e 2008, o número de artigos publica-

em Fortaleza-CE.

dos na seção de Educação foi de 59.

A Reunião Anual da Sociedade Brasileira

A revista Química Nova na Escola trata de

de Química é o maior evento de Química na

assuntos voltados exclusivamente para a Edu-

América Latina e possui uma seção específica

cação Química. Sua publicação desde 2008 é

para trabalhos de Educação Química (ED). Nas

trimestral e conta ainda com cadernos temáti-

Reuniões Anuais participam cerca de 2500 pes-

cos que abordam assuntos da atualidade em

quisadores e o número de comunicações chega

Química. Suas subdivisões facilitam a leitura e

a 2200, que são distribuídas entre as diversas

proporcionam maior esclarecimento sobre os

áreas da Química, inclusive a área de Ensino de

diversos aspectos de ensino da disciplina. Em

Química. A 31ª Reunião aconteceu em Águas

2007 e 2008 foram publicados 63 artigos pela

de Lindóia – SP, em maio de 2008, e contou

revista em foco. Esses dados podem ser encon-

com a apresentação de 139 trabalhos na área de

trados no site da SBQ.

educação. Sua produção foi menor que a de

As revistas Química Nova e Química Nova

2007 (164 trabalhos) devido, provavelmente, à

na Escola constituem-se veículos de comunica-

realização do XIV Encontro Nacional de

ção científica da Sociedade Brasileira de

Ensino de Química no mesmo ano.

Química e melhor espelham a preocupação com o ensino de Química no país.

}

30

PERIÓDICOS ESPECIALIZADOS

Em 2006, na 29ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química, foi apresentada à

No contexto mundial ainda existem poucos

comunidade científica a Revista Brasileira de

periódicos relacionados especificamente à área

Ensino de Química (ReBEQ), uma publicação

de Ensino de Química, destacando-se o Journal

semestral da Editora Átomo e colaboradores, que,

of Chemical Education e o Education in Che-

então, inaugurou um novo espaço, abrindo novas

mistry. Aqui no Brasil, encontram-se as revistas

páginas – para pesquisadores, docentes (ensino

Química Nova e Química Nova na Escola,

médio e superior), alunos de graduação e pós-gra-

muito conhecidas entre os educadores químicos.

duação – comprometidas não apenas com a REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Panorama da Pesquisa em Ensino de Química no Brasil

divulgação científica, mas, também, com a for-

No Brasil, muitas instituições com curso

mação e atualização dos pesquisadores, professo-

superior em Química têm aderido às linhas de

res e estudantes da área do ensino, por meio de

pesquisa voltadas para o ensino de Química e,

intercâmbio de idéias e experiências que enrique-

com isso, formado muitos mestres e doutores

çam o processo ensino/aprendizagem.

na área. Surgiram também muitos grupos de

A área de Pesquisa em Ensino de Química

pesquisa no país e, assim como nas outras subá-

tem se desenvolvido e amadurecido no Brasil

reas da Química, foram organizados encontros

com trabalhos abordando temas atuais publica-

específicos.

dos nestes periódicos especializados. Muitos de

Hoje, as instituições de ensino superior em

seus resultados podem ser aplicados de forma

Química do Brasil veem a questão e se interes-

acessível à compreensão do educando, propici-

sam pela formação de docentes não somente

ando a construção do processo ensino-aprendi-

dominadores de conteúdo, mas principalmente

zagem dentro e fora de sala de aula. A formação

atenciosos em relação ao ensino. O número de

do professor é essencial neste processo, pois

universidades brasileiras que proporcionam

pode se pronunciar sobre o tema adequando-se

uma maior ênfase na formação de professores

mediante a realidade pedagógica que o circunda.

ainda é pequeno. Segundo a Capes,[11] as instituições com programas de pós-graduação com

}

PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO E GRUPOS DE PESQUISA Foi realizada uma busca de programas de

mestrado e doutorado que possuem linha de pesquisa em Ensino de Química são: UnB, UFRN, UFRGS, UFSCar, USP- SP, USP- São Carlos, UNICAMP.

pós-graduação com mestrado e doutorado que

Muitos grupos de pesquisa com linha em

possuem linha de pesquisa em Ensino de Química.

Ensino de Química podem ser encontrados no

Esta pesquisa foi feita no site da Coordenação de

país. De acordo com análise feita dos grupos

Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

encontrados no Diretório de grupos no site do

(Capes) na página de cursos recomendados. A

Cnpq, sua quantidade é relativamente grande e

Capes avalia os programas de pós-graduação bra-

estão localizados em vários estados do territó-

sileiros com base em critérios como: atividades de

rio nacional. A maior parte destes grupos se

pesquisa e ensino, corpo docente e discente, teses e

concentra na região Sudeste do país, com desta-

6

dissertações e produção intelectual. O perfil dos

que para a Universidade de São Paulo-USP.

grupos de pesquisa foi adaptado a partir do diretó-

Por outro lado, são encontrados, no Diretório,

rio de grupos de pesquisa do Conselho Nacional

quatro grupos pertencentes ao estado do Piauí,

de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

sendo este um dos estados de destaque na

(CNPq). Os grupos foram categorizados de acordo

região Nordeste, juntamente com Pernambuco.

com: nome, líderes, área predominante, linhas de

Em relação à área predominante, a maioria

pesquisa, instituição, endereço.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

dos grupos tem suas pesquisas voltadas às ciên-

31


Wilsilene dos Santos Oliveira, José Machado Moita Neto e Nilson Fonseca Miranda

cias exatas propriamente ditas (Química e

Sem dúvida, as tecnologias digitais modi-

outras); entretanto, uma quantidade considerá-

ficaram a face da pesquisa em Química no Bra-

vel de grupos trabalha, prioritariamente, em

sil; contudo, ainda não tiveram semelhante

Educação (22 grupos). Dentre as linhas de pes-

efeito no ensino de graduação e muito menos

quisa, é possível verificar várias alternativas

no ensino médio. Os licenciados em Química,

como: uso de informática, formação de profes-

mesmo nas universidades mais equipadas do

sores, elaboração de materiais didáticos, aspec-

país, ainda não estão suficientemente treinados

[12]

tos ambientais dentre outros.

para o uso das tecnologias digitais em sala de aula no ensino médio.

}

UMA LINHA RECENTE: TECNOLOGIAS DIGITAIS NA QUÍMICA

ção, adquire a competência técnica para indicar à escola e para seus alunos, o livro didático que

As tecnologias digitais modificaram o ensino

melhor se enquadra ao seu modo de conduzir o

e pesquisa em Química e estão presentes no cotidi-

processo ensino-aprendizagem. A questão que

ano de toda a sociedade. É esperado, portanto, que

surge é a seguinte: o licenciado está preparado para

comecem a aparecer cada vez mais trabalhos cien-

indicar à escola softwares de química que o auxi-

tíficos em Ensino de Química que olhem, especifi-

liem no magistério? Temos software com quali-

camente, o papel destas tecnologias.

dade didática para ser utilizado no ensino médio?

Antigamente, o tempo do pesquisador era

A busca em banco de dados de alta quali-

dividido entre biblioteca, atividades burocráti-

dade, como os disponibilizados pelo portal de

cas de pesquisa (confecção de projetos, artigos,

periódicos da Capes, tem chegado aos alunos

pareceres etc.), atividades de ensino, participa-

de graduação em Química, que, assim, podem

ção em eventos científicos e, principalmente,

conhecer a produção científica recente. Con-

laboratório de pesquisa ou trabalho de campo.

tudo, dois problemas imediatos ocorrem

As tarefas do cientista de hoje não muda-

quando se pensa em acrescentar um frescor

ram substancialmente, contudo, o tempo dedi-

científico ao ensino médio pelo uso de artigos

cado às mesmas e o volume de trabalho

científicos recentes: 1) o melhor da Química

mudaram drasticamente. As tarefas se multipli-

está escrito em inglês e 2) o portal de periódico

caram exatamente pela possibilidade de se

da Capes só é disponível para instituições que

fazer mais rapidamente tudo e com mais quali-

tem pós-graduação reconhecida pela Capes. A

dade por conta do computador, da internet e de

base de dados Scielo pode contornar estas difi-

uma infinidade de softwares que minimizaram

culdades, contudo, estará o professor de Quí-

tempos de cálculo, de análise de dados e de

mica preparado para trabalhar um artigo

busca de informação. Alguns destes recursos

científico recente em sala de aula?

[13]

podem ser obtidos no site LAPEQ grupos de pesquisa da USP.

32

O licenciado em Química, durante a gradua-

de um dos

Há uma grande quantidade de sites disponíveis na internet sobre a maioria de assuntos

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Panorama da Pesquisa em Ensino de Química no Brasil

de Química. Usando um buscador como o

crescimento intelectual como é o caso da revista

Google acadêmico é possível, inclusive, encon-

Química Nova na Escola que, até o ano de 2007,

trar material científico de qualidade. Também

tinha sua publicação semestral e hoje, é trimes-

há uma diversidade de sites didáticos de

tral. Este crescimento também ocasionou a orga-

Química no Brasil. Mas estará o licenciado

nização de muitos encontros regionais em

preparado para fazer um uso didático deste

educação química. Uma quantidade considerá-

material de fácil acesso para os alunos? O

vel de grupos de pesquisa em ensino de Química

acesso é mesmo fácil para todos os alunos?

no Brasil trabalha esse campo como área predo-

Sem dúvida, o otimismo nos leva a uma

minante, sendo que o maior número de contribu-

resposta positiva às perguntas anteriores, pois

ições é proveniente da região sudeste do país.

as tecnologias digitais devem estar a serviço

Pelo menos sete instituições de ensino superior

da Química e também do ensino desta disci-

possuem programas de mestrado e doutorado

plina. Vários trabalhos de pesquisa em educa-

em Educação química, o que mostra uma quali-

ção vêm trazendo à tona estas questões e

ficação específica em que novas pesquisas pas-

muitas dissertações de mestrado e teses de

sam a ser desenvolvidas no âmbito educacional.

doutorado sobre este assunto têm sido defen-

Sem dúvida, os estudos nas grandes áreas da

didas em universidades das mais diferentes

Química ainda predominam, mas percebe-se as

regiões do país, dentre as quais podem-se citar

proporções que a pesquisa em ensino tem

UFC, UFPI, UNB e USP.

tomado, no panorama nacional, dentro da ciên-

A responsabilidade de formar docentes

cia Química.

para o magistério do ensino médio em Química está nas mãos das universidades e centros de ensino. O licenciado deve ser preparado para

}

atuar em um mundo que usa cada vez mais as Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), também na educação.

}

CONSIDERAÇÕES FINAIS Com as mudanças educacionais referentes ao currículo dos cursos de licenciatura em Química, um aumento de pesquisas relacionadas ao ensino foi induzido. Devido ao amadurecimento do ensino e da pesquisa em Química e à grande quantidade de artigos, os periódicos nacionais também sofreram modificações para abrigar tal REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

REFERÊNCIAS [1] SANTOS, W. L. P. dos; SCHNETZLER, R. P. Educação em Química: compromisso com a cidadania. 2. ed. Ijuí: Editora Unijuí, 2000. [2] LUTFI, M. Cotidiano e Educação em Química. Ijuí: Livraria Unijuí editora, 1988. [3] BRASIL. Ministério da educação (MEC), Secretaria da Educação Básica (SEB), Departamento de Políticas de Ensino Médio. Orientações Curriculares de Ensino Médio. Brasília: MEC/SEB, 2004. [4] SCHNETZLER, R. P. A pesquisa no ensino de Química e a importância da Química Nova na Escola. Quím. Nova na Escola, São Paulo, n. 20, p. 49-54, 2004. [5] http://portal.mec.gov.br/index.php. Acesso em: jan. 2009. [6] OLIVEIRA, J. R. S de; QUEIROZ, S. L. Considerações sobre o papel da comunicação científica na educação em química. Quím. Nova, São Paulo, v. 31, n. 5, p. 1263-1270, 2008.

33


Wilsilene dos Santos Oliveira, José Machado Moita Neto e Nilson Fonseca Miranda

[7] http://www.sbq.org.br. Acesso em: jan. 2009. [8] http://www.abq.org.br/simpequi/. Acesso em: jan. 2009. [9] Nota em Química nova na escola, n. 29, agosto de 2008, p. 45. [10] OLIVEIRA, J. R. S. de; QUEIROZ, S. L. Comunicação e linguagem científica: guia para estudantes de Química. Campinas: Editora átomo, 2007, 112 p.

[15] SCHNETZLER, R. P. A pesquisa em ensino de química no Brasil: conquistas e perspectivas. Quím. Nova, São Paulo, v. 25, supl. 1, p.14-24, 2002. [16] http://qnesc.sbq.org.br. Acesso em: jan. 2009. [17] http://www.quimicanova.sbq.org.br. Acesso em: jan. 2009. [18] http://wwwjchemed.chem.wisc.edu. Acesso em: jan. 2009. [19] www.rsc.org/Education/Eic. Acesso em: jan. 2009.

[11] http://www.capes.gov.br. Acesso em: dez. 2008. [12] http://www.cnpq.br/gpesq/apresentacao.htm. Acesso em: jan. 2009. [13] http://www.lapeq.fe.usp.br. Acesso em: jan. 2009. [14] FRANCISCO, C. A.; QUEIROZ, S. L. A produção do conhecimento sobre o ensino de Química nas Reuniões Anuais da Sociedade Brasileira de Química: uma revisão. Quím. Nova, São Paulo, v.31, n. 8, p. 2100-2110, 2008.

34

Recebido em: 17 abr. 2009 Acesso em: 28 abr. 2009

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


DOS PROFESSORES DE QUÍMICA AOS PROFESSORES ALQUÍMICOS Claudio Galeno Caldeira Centro de Ensino Superior de Uberaba – CESUBE E-mail: csarreta@terra.com.br Ana Maria Faccioli de Camargo Universidade de Uberaba – UNIUBE E-mail: camargo@uniube.br

RESUMO É comum encontrarmos estudantes com aversão à Química, talvez porque ela envolve conceitos abstratos e distantes da realidade cotidiana. Avaliamos a Química e seu ensino, e, objetivando mudanças, propiciamos aos professores uma nova ferramenta, o professor alquímico. Os professores alquímicos contextualizam, no tempo e no momento socioeconômico a Química, para proporcionar aos alunos sua compreensão. Acreditamos que os professores alquímicos têm condições de serem um diferencial para os atuais e futuros professores de química. É necessário, porém uma mudança na concepção dos professores, deixando a formação tecnicista e adotando uma postura alquímica, sem que isso implique no retorno à visão mágico-vitalista dos alquimistas. Palavras-chave. Educação; formação de professores; professores alquímicos; química. ABSTRACT

FROM CHEMISTRY TEACHERS TO ALCHEMIST TEACHERS. It’s common to find students with aversion to chemistry, perhaps because it´s abstract concepts and distance of the daily reality. We evaluate chemistry and its education and, objectifying changes, we propitiate to the chemistry teachers a new tool, the alchemist teachers. The alchemist teachers contextualize chemistry in the time and the social-economic moment, to allow the pupils to understand the subject. We believe that the alchemist teachers have conditions to be a differential for the current and future chemistry teachers. It is necessary, however, a change in the conception of teaching, leaving the technicist formation and adopting an alchemist position, without returning to the magician-vitalist vision of the alchemists. Key-words. Education; trainig of teachers; alchemist teachers; chemistry.


}

INTRODUÇÃO Um dos motivos que nos levaram à pesquisa

e possibilidades, sanar as falhas que outrora

que resultou neste artigo foi a busca de uma expli-

havíamos identificado nos vários professores

cação para uma grande inquietação que sempre

com os quais tivemos contato. Percebemos que

nos incomodou, desde os primeiros contatos com

simplesmente vontade, interesse e desejo de

o universo da Química, mas que não conseguía-

fazer algo diferente pouco representavam

mos achar uma explicação – a dificuldade que

diante de um sistema já enraizado e engessado

muitos estudantes tinham com o seu aprendizado.

num método tido como correto e, portanto,

Achávamos que a causa seria o fato de as escolas

reprodutível sem alterações ou questionamen-

secundaristas não disporem de um ambiente ade-

tos. Método e sistema, aliás, em que havíamos

quado para a realização de aulas de Química, ou

sido formados e agora tentávamos sair. O maior

seja, não dispunham de um laboratório. Sendo a

desafio a ser enfrentado não seria mudar o sis-

Química uma ciência essencialmente experimen-

tema, mas mudar a nós mesmos. Tínhamos o

tal, pensávamos que se fossem utilizados os

desejo, talvez utópico, de sermos para nossos

materiais e o ambiente adequado, certamente os

alunos aquilo que nossos professores não

conceitos vistos na aula teórica seriam muito

tinham conseguido ser.

mais facilmente assimilados pelos estudantes.

A prática docente nos fez perceber que na

Percebemos que as dificuldades continuavam

mão de um professor despreparado, pouco adian-

também na graduação já que, estando no ambi-

tam laboratórios, multimídias, novas e modernas

ente universitário e dispondo de diversos labora-

metodologias. O velho quadro-negro e um

tórios, as mesmas dificuldades de aprendizado

pedaço de giz poderiam surtir muito mais efeito

apareciam em vários estudantes.

em mãos habilidosas e idéias inventivas que uma

Regressamos anos mais tarde à sala de

36

diferente e tentarmos, por meio de novas idéias

sala 3D de última geração.

aula, mas, agora, como professores e passamos

Imbuídos no desejo de mudança e de trans-

a nos ver com o poder de, finalmente, fazermos

formação que esperamos que este nosso trabaREVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos

lho possa contribuir para que realizemos nossa

que realmente alguns estudantes não se dedi-

própria transformação, além de proporcionar-

cam o quanto deveriam, mas também estamos

mos, aos colegas docentes, um momento para

cientes de que este tipo representa uma pequena

repensarem suas atividades.

porcentagem do total de uma escola e/ou faculdade. Assim, o problema frequentemente recai

}

O ENSINO DE QUÍMICA

sobre os professores de Química. Se assim ocorre, cabe perguntar: será que os

Enquanto conhecimento empírico, a quí-

profissionais que têm a função de iniciar, de

mica vem acompanhando a espécie humana

desencadear, de controlar o processo de aprendi-

desde o domínio do fogo (Chassot, 1995).

zagem, de levar “luz” aos seus alunos não esta-

Enquanto ciência, foi criada, no século XVII,

rão sabendo fazê-lo? Considerando que sim, que

com os trabalhos do inglês Boyle, ou, como

realmente há uma falha, nos questionamos: por

preferem alguns, no século seguinte com o

que os professores de química não estão sabendo

francês Lavoisier. Mesmo tendo acompanhado

ensinar? Novas idéias vão surgindo, mas, após

a espécie humana desde os primórdios tempos,

análise, elas podem ser condensadas novamente

ainda hoje é possível encontrarmos, na maioria

em duas possibilidades. A primeira aponta para

dos estudantes, dificuldades no aprendizado da

uma falha, que, em nosso entendimento, seria a

Química. Novas abordagens dos temas e meto-

mais grave – a falta de conhecimento do conte-

dologias para seu ensino foram desenvolvidas,

údo ministrado. A segunda possibilidade está na

mas, mesmo assim, podemos notar, por parte

dificuldade que os professores de Química

dos estudantes, a falta de conexão entre os

enfrentam na transmissão dos saberes. Quere-

assuntos abordados na sala de aula e o seu coti-

mos crer que a quantidade de profissionais que

diano, acarretando numa compreensão equivo-

se enquadraria na primeira possibilidade seja

cada da Química.

pequena, a ponto de serem desprezados estatisti-

O questionamento inicial era descobrir o

camente, pois, caso contrário, constataríamos

porquê das dificuldades percebidas na maioria

estarem nossos estudantes diante de profissio-

dos alunos no aprendizado da Química, e che-

nais despreparados e desqualificados para a fun-

gamos a duas possibilidades. A primeira inci-

ção que exercem.

dia os estudantes e sobre eles recaem todas as

Concentramo-nos então na segunda possi-

culpas pelo não aprendizado, ou seja, eles não

bilidade, a de que os professores de Química

aprendem porque não se esforçam para tal, não

não sabem transmitir seus conhecimentos. A

se dedicam, não estudam e, portanto, não

pergunta que fazemos agora é: por que eles não

aprendem. A segunda possibilidade está vol-

estão sabendo transmitir? Quando utilizamos o

tada aos professores de Química e a explicação

verbo ‘transmitir’ o fazemos com o propósito

é simples, eles não sabem ensinar. Sabemos

de sermos mais facilmente compreendidos,

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

37


Claudio Galeno Caldeira e Ana Maria Faccioli de Camargo

mas entendendo que a prática docente e o papel

iniciante. A falta de um laboratório poderia ser

dos professores vão muito além da simples

resolvida com experimentos mais simples, fei-

transmissão de conhecimentos.

tos na própria sala de aula e com a utilização de

Observamos que a partir de um primeiro

38

materiais disponíveis no dia-a-dia dos alunos.

questionamento, outras perguntas são formula-

Mas encontramos nos professores de

das, que vão gerando outras mais, pois as respos-

Química uma “falha” mais difícil de ser corri-

tas, normalmente, geram mais perguntas, mais

gida – a sua formação inicial. Os professores de

dúvidas, mais questionamentos. Para tentarmos

Química, licenciados ou não, que atuam nas

responder a esta última questão levantaremos

milhares de salas de aula brasileiras tiveram, e

algumas possíveis respostas. A primeira delas

ainda têm, sua formação estabelecida nos mol-

refere-se ao fato de muitos professores de Quí-

des de uma ciência que preza o conteudismo, o

mica não terem formação na área pedagógica. É

mecanicismo e o positivismo. É essa formação

comum vermos profissionais formados em áreas

engessante, rígida, que vem tolhendo os profes-

correlatas à Química, como engenharia química,

sores de Química, a liberdade para tentar fazer

farmácia ou química industrial, serem “jogados”

algo diferente que consiga aproximar seus estu-

dentro de uma sala de aula de uma escola. O

dantes da Química, não de uma ciência distante

resultado é normalmente desastroso porque estes

e incompreensível dos centros de pesquisa, mas

profissionais, mesmo tendo uma grande bagagem

principalmente da Química nossa de cada dia.

de saberes químicos, não tiveram nenhuma pre-

É possível mudar a atual situação do ensino

paração pedagógica. Não houve na sua formação

de Química no Brasil? Como mudar os professo-

inicial, nenhuma disciplina que lhes preparassem

res já formados, moldados, enraizados numa

para o desempenho da atividade docente. O que

outra concepção do que é ser professor?

fazer agora? Muitos buscam sanar suas deficiên-

Acreditamos que sim, visto que, no século

cias didáticas frequentando um curso de licencia-

XX, ocorreram significativas mudanças na

tura em Química. Outros simplesmente desistem.

concepção do que é ser professor. Definições

Alguns permanecem insistentemente na sala-

tais como detentor do saber, mestre, sábio,

de-aula aprendendo a “dar aula” na base da tenta-

foram trocadas por professor reflexivo, profes-

tiva e erro, o que pode gerar nos estudantes um

sor crítico, professor autônomo, professor pes-

afastamento ainda maior da Química.

quisador para citar apenas algumas. Estas

Percebemos então que realmente a dificul-

mudanças surgiram quase que naturalmente,

dade do não-aprendizado dos estudantes viria

como consequência de um século que foi, por

dos professores de Química, pois, para alguns

um lado de grande avanço tecnológico e cientí-

dos problemas apresentados havia soluções

fico, mas por outro foi o de fixação do capita-

simples e fáceis. A falta de formação pedagó-

lismo como ideologia hegemônica, influen-c

gica era facilmente resolvida num curso de

iando diversas outras áreas entre as quais está a

licenciatura. Os anos e a vivência numa sala de

educação. Aliás, a escola é uma instituição

aula trariam a experiência necessária ao então

importante para o capitalismo, pois é por ela REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos

que se pode propagar, discreta e impercep-

micos, embora estes tragam outras abordagens

tivelmente sua ideologia.

de conteúdo e dinâmica para as aulas. A pro-

Tentar mudar a concepção, o paradigma do

posta de educador alquímico surgiu como uma

ser professor é opor-se ao sistema e à ideologia

resposta às dificuldades encontradas pelos

vigente, mas acreditamos que seja uma forma

docentes de Química, carentes de formação

ou pelo menos uma tentativa de mudarmos o

pedagógica, com o aprendizado de seus alunos.

quadro atual. Tentaremos, neste trabalho mos-

Lexen et. al. (2007) sugeriram diferenças entre

trar que são necessárias mudanças na concep-

os perfis dos docentes de química e aquele dos

ção do ser professor de Química, deixando a

educadores químicos.

formação tecnicista e adotando uma postura alquímica.

Salientamos que por trás do eufemismo de educador químico podemos encontrar as con-

Atualmente, a maioria dos professores de

cepções de professor reflexivo e professor pes-

Química tem dificuldades com seus aprendizes

quisador. Estas concepções surgiram nas

pelo fato de eles, em sua maioria, não consegui-

décadas de 1980 e 90 e, rapidamente, se espa-

rem conectar ou relacionar o saber da sala de

lharam entre os profissionais de educação, mas

aula com o seu cotidiano, além de acharem que

da forma como foram assimiladas estas con-

Química seja apenas decorar várias fórmulas

cepções tiveram uma conotação de um dilema

ou nomes. Isso faz com que estes estudantes se

shakespeareano “ser ou não ser”. Ou seja, ou o

desinteressem pelas aulas, por mais que os

professor assumia determinada concepção e

professores se esforcem.

resolveria todos os problemas de ensino-apren-

A rejeição que muitos estudantes têm em

dizagem, ou, não assumindo esta ou aquela

relação à Química pode ser devido à formação

concepção, seria responsável por todos os fra-

tecnicista, conteudista e positivista de seus pro-

cassos de seus alunos, bem como o seu próprio,

fessores. Essa formação rígida inibe a liberdade

pois poderia ser visto como antiquado e ultra-

do pensar e do agir a partir do momento em que

passado. Ser reflexivo é estar na moda

foca um determinado objeto, todos os olhares,

(Alarcão, 2002).

atitudes e saberes, desconsiderando o entorno.

Ao longo de nossa caminhada, não só

Tais professores reproduzem, fielmente, em

como estudantes, mas também como docentes,

sala de aula, a formação que tiveram e ainda se

sempre pudemos observar as dificuldades e

justificam alegando que foram formados de tal

rejeições que muitos estudantes tinham/têm

forma e que não há porque agirem diferente

com a Química. Percebemos também que, por

(Maldaner, 1999).

meio das relações de poder1 vivenciadas na

Acreditamos que as dificuldades também

sala-de-aula entre professores e estudantes,

são vivenciadas por parte dos educadores quí-

seria possível tentar mudar esse quadro ou, pelo

1.

Segundo Foucault, não se exerce um poder, mas pratica-se relações de poder quer seja entre governante e governados, quer seja entre professores e alunos.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

39


Claudio Galeno Caldeira e Ana Maria Faccioli de Camargo

menos, minimizá-lo. Foi quando surgiu a idéia dos professores alquímicos.

Tentando fugir desse processo, propomos uma transmutação do docente de química, passando de professores de química para professores

}

O PROFESSOR ALQUÍMICO

mesma conotação usada pelos alquimistas sécu-

Diversas concepções de professores emer-

los atrás. Eles acreditavam que seria possível

giram no século XX, principalmente na

modificar, transmutar qualquer metal em ouro,

segunda metade, tais como professor pesquisa-

porque isso não alteraria a essência da matéria,

dor, professor reflexivo e educador químico.

modificaria apenas a constituição, as proprieda-

Ao invés de uma ação libertadora, estas con-

des. É essa a idéia que pretendemos demonstrar

cepções tiveram um efeito inverso, isto é, inci-

quando utilizamos o termo ‘transmutação’, a de

diram sobre os próprios professores na forma

que não é necessário mexer intimamente na cons-

de um peso extra, de uma cobrança no sentido

tituição da formação do docente de Química,

de se adequarem aos novos conceitos, sob

mas, sim, entender e modificar algumas caracte-

pena, caso não se adequassem, de serem res-

rísticas educacionais.

ponsabilizados por qualquer falha detectada na educação dos estudantes (Pereira, 2006).

40

alquímicos. A idéia de transmutação terá a

A escolha dos professores alquímicos como objeto de estudo se deu por acreditarmos que com

Assumir tais concepções é querer “estar na

este perfil os futuros estudantes de química pode-

moda” ou “ser moderno” quando, na verdade,

rão ter a chance de melhor compreenderem a

os professores estão sendo, sem perceberem,

Química e quiçá, por meio dela, tornarem-se

agentes de um processo sutil que está em curso

homens e mulheres mais conscientes e críticos do

– a disciplinarização dos docentes. Acredita-

mundo em que vivem, e que o ensino da Química,

mos que a concepção de educador químico

no ensino médio, possa não mais ser visto como e

também possa ter tido, em muitos docentes de

considerado inútil (Chassot, 1995).

Química, essa imposição, pois Lexen et. al.

Optamos por uma pesquisa bibliográfica,

(2007, p. 7), ao referirem-se aos alunos de

pois a figura dos educadores químicos é nova

licenciatura em Química e, consequentemente,

dentro do próprio universo da Química e,

a futuros professores de Química, dizem que “é

segundo Chassot (1995), a concepção de edu-

entendimento do grupo de professores da

cador em Química surgiu há cerca de trinta

necessidade do estudante enxergar-se como um

anos no exterior e, no Brasil, é ainda mais

futuro educador desde o início do curso”.

recente. Segundo este autor, embora possamos

Estes modelos são colocados de tal forma

observar um aumento do número de disserta-

que os professores, não só de química, mas

ções de mestrado ou teses de doutorado que

também das demais disciplinas, sintam-se inca-

abordam o ensino de Química, o número é

pacitados, despreparados, caso não assumam

ainda pequeno em consequência dos valores

esta ou aquela determinada postura.

com que o tema é visto, talvez por desconheci-

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos

mento de boa parte dos professores de química,

mos a criatividade, não só na utilização de dife-

e que se verifica até mesmo nos cursos de licen-

rentes recursos metodológicos (aulas expositivas,

ciatura em Química (Chassot, 1995).

práticas etc.), mas, também, de diferentes recur-

Portanto, se partíssemos para uma pesquisa

sos tecnológicos (quadro e giz, internet, vídeo

de campo, buscando nela subsídios que nos aju-

etc.). Para melhor esclarecer a nossa proposta de

dassem na construção do novo perfil do professor

professor alquímico, relatamos uma aula dada

de química talvez não o encontrássemos.

por um professor alquímico.

A mudança começa pelo próprio nome, que

Embora já tenham decorrido dez anos desde o

promove um resgate à importância dos professo-

primeiro dia que entramos numa sala de aula, não

res. Quando utilizamos o substantivo ‘professor’

como aluno, mas como professor, e tentássemos

no lugar de ‘educador’ pretendemos dizer que, no

diversificar as aulas, alguns conteúdos acabavam

nosso modo de percepção, o termo ‘educador’

sempre caindo na mesmice de sempre. É o caso do

teria uma conotação de ser algo além do ser pro-

estudo da radiatividade e de suas aplicações.

fessor, ou seja, um estágio superior e almejado

Mesmo utilizando vídeos ou documentários mos-

pelos professores. Acreditamos que os professo-

trando o funcionamento da bomba atômica e o dia

res têm sim uma atividade multifacetada agindo

06 de agosto de 1945, quando ela foi lançada sobre

como professor, educador, orientador, coordena-

Hiroshima, sentíamos que não havia uma boa assi-

dor, colaborador e tantas outras que lhe queiram

milação pelos estudantes, principalmente das tur-

imputar, mas sem que necessite de rótulos para

mas do ensino médio. Questionávamos como

diferenciar este daquele. Discretamente, os rótu-

poderíamos mudar a aula, a metodologia, os recur-

los irão disciplinar os docentes impondo-lhes,

sos ou qualquer outra coisa que pudesse fazer com

mais uma vez, ser ou não ser, ou se é educador ou

que os estudantes percebessem a importância desta

não, ou se é professor ou não e assim por diante.

data, não só pelo fim da II Guerra e pelo número de

Acreditando que os professores, não só os

vítimas, mas, do ponto de vista químico, o que

de Química, desempenham simultâneos papéis

representou este dia.

perante não só seus alunos, mas também

Tentamos, então, uma abordagem dife-

perante a sociedade é que propomos que o pro-

rente, justamente porque teríamos a oportuni-

fessor alquímico não se restrinja a um modelo

dade de ministrar essa aula para uma turma de

ou padrão de comportamento, visto que é poli-

curso superior em que, espera-se, o grau de

valente, consciente de seu papel como profes-

compreensão e assimilação sejam maiores que

sor na formação de seus alunos e ciente de seu

os de estudantes do ensino médio. Ao invés de

papel de cidadão que tem sob sua responsabili-

ir direto ao assunto, optamos por uma aborda-

dade a formação de novos cidadãos.

gem histórica que teve duas frentes, uma abor-

Como professores, sempre tentamos mini-

dando a estrutura da matéria e o conceito de

mizar os temores encontrados pelos estudantes a

átomo e a outra abordando os fatos que levaram

respeito da Química. Como ferramenta, usáva-

à II Guerra, seu desenrolar e seu término com a

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

41


Claudio Galeno Caldeira e Ana Maria Faccioli de Camargo

rendição dos japoneses após os massacres

educador, e nem necessitam trilhar um único

atômicos de Hiroshima e Nagazaki.

caminho.

Durante a aula, ilustrada por apresentação

Aparentemente, estamos também rotu-

de multimídia, descrevemos a evolução dos

lando e criando mais um novo tipo de profes-

modelos atômicos associando-os ao momento

sor. Se optamos por adjetivar o professor foi

histórico-social vivido não só por aquele deter-

com o único propósito de se fazer notar, pois se

minado cientista, mas pela ciência e pela socie-

utilizássemos apenas o substantivo, o que não

dade como um todo. Ao final da apresentação,

seria errado e nem fugiria de nossa proposta,

que necessitou de mais duas aulas além do pla-

não despertaríamos a atenção dos demais

nejado, para nossa surpresa, a empolgação dos

docentes, quer sejam da Química, quer sejam

alunos – que queriam saber mais, questiona-

da Matemática, Biologia, enfim de qualquer

vam, opinavam e sugeriam revistas ou sites –

área do saber humano.

mostrava seu envolvimento com a aula. O que representou ser um professor alquí-

resgatar um período em que a maioria dos quí-

mico nesta aula? Representou a diferença entre o

micos contemporâneos negava a relação com a

2

42

E por que escolhemos alquímicos? Por que

3

saber esotérico e o saber exotérico , a partir do

química e com a ciência moderna? A resposta a

momento que não se restringiu aos meros concei-

estas duas perguntas pode ser dada com uma

tos químicos, mas ao seu contexto histórico, con-

única palavra – transmutação.

seguindo ampliar a visão e a compreensão de um

Situada entre os extremos, a conquista do

importante acontecimento histórico e científico -

fogo e o início da Química, está um período

a bomba atômica.

desconsiderado por muitos químicos modernos

Esta característica do que é ser alquímico

e contemporâneos – a alquimia. Acreditamos

deixa claro que a passagem dos professores de

que esta desconsideração se deva ao fato de

Química ou educadores em Química para os pro-

que, no surgimento das ciências modernas, os

fessores alquímicos envolve mudanças, e mudar,

novos saberes, para imporem-se como “verda-

geralmente, não é facilmente aceito. Os professo-

des”, as ciências renegaram e menosprezaram

res já têm muito com o que se preocuparem,

os antigos saberes.

pedagogicamente falando, no antes, durante e

Segundo Chassot (1995, p. 21), é possível

depois de suas aulas para se preocuparem com

fazermos três leituras da alquimia, sendo a prime-

normas, regras e modelos que orientem sua ativi-

ira a “que apresenta a alquimia como uma prática

dade profissional. Os professores não necessitam

eivada de charlatanismo e destituída de qualquer

de rótulos, quer seja reflexivo, pesquisador ou

significado científico”, a segunda “contextuali-

2.

Esotérico. Adj. 1.Filos. Diz-se do ensinamento que, em escolas filosóficas da Antiguidade grega, era reservado aos discípulos completamente instruídos. 2. P.ext. Todo ensinamento ministrado a círculo restrito e fechado de ouvintes. [...] compreensível apenas por poucos, obscuro, hermético (Ferreira, 1994, p. 267).

3.

Exotérico. Adj. 1.Filos. Diz-se de ensinamento que, em escolas da Antiguidade grega, era transmitido ao público sem restrição, dado o interesse generalizado que suscitava e a forma acessível em que podia ser exposto, por se tratar de ensinamento dialético, provável, verossímil (Ferreira, 1994, p. 285). REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos

zando a alquimia e os alquimistas” na época

Não tentando vê-la ofuscados pela ciência

medieval e a terceira “que admite um certo rea-

moderna, mas no contexto histórico vivido pelos

lismo-fantástico, [...] que tem muito de incrível

alquimistas, podemos perceber que eles acredita-

ou ainda inexplicável”. Acreditamos que, embora

vam ser possível a transmutação dos metais em

possa ter havido aproveitadores, como em toda

ouro porque acreditavam que a matéria, além de

atividade humana, a alquimia não pode ser rotu-

ser constituída por quatro elementos – água, fogo,

lada como uma atividade cujo único propósito era

terra e ar, tinha a característica da busca pela evo-

o de lograr os cidadãos e cidadãs em benefício

lução e pelo aprimoramento. Ou seja, a matéria,

próprio. Acreditamos, sim, que a alquimia teve

em sua essência, era a mesma, diferenciando ape-

seu lugar como atividade que buscou, a seu

nas em algumas proporções. Se fossem feitos

modo, compreender o microcosmos (interior

alguns ajustes, poderia-se, sim, transmutar um

humano) observando o macrocosmos (universo)

metal em outro.

(Goldfarb, 2001).

Com a concepção de que os metais “evo-

Nessa busca pela compreensão e aprimora-

luíam naturalmente” a partir de uma semente,

mento do indivíduo, muitos métodos, técnicas

de um embrião, iniciava-se a idéia da transmu-

e substâncias foram inventados, descobertos ou

tação, sintetizadas por Eliade (apud Goldfarb,

criados, sendo alguns deles inclusive, assimila-

2001), mas ressaltando que tais concepções

dos posteriormente pela química. Outra carac-

eram compartilhadas apenas pelos primeiros

terística importante da alquimia é o fato de ela

alquimistas, excluindo-se aqui, aqueles que

ser o resultado do conhecimento de vários

eram puramente metalurgistas.

povos em épocas e locais diferentes, com seu

Com os professores acontece algo seme-

início no antigo Egito e tendo os árabes como

lhante, visto que, em essência, são todos bem

agentes fundamentais, fundindo e reformu-

semelhantes, bastando apenas algumas altera-

lando os saberes gregos, orientais e os seus pró-

ções, daí a idéia da transmutação para torna-

prios, além de serem os responsáveis pela

rem-se alquímicos.

entrada destes saberes na Europa Medieval. Aos olhos da Química, a alquimia pode ser vista como atividade desprovida de qualquer

}

característica científica, mas acreditamos que

CONSIDERAÇÕES FINAIS

sem a lente da modernidade, tentamos

As formas de ensino bem como as ciências

enxergá-la com os olhos dos antigos alquimis-

passaram por várias mudanças ao longo dos

tas, situados naquele contexto político, social e

séculos. Os estudantes de hoje não são expecta-

científico, a veremos bem diferente, sendo pos-

dores passivos do discurso proferido pelos pro-

sível percebemos atividades de pesquisa cujos

fessores de qualquer área do saber humano.

saberes foram precursores nos moldes da

Também não são mais ou menos indisciplina-

ciência moderna, ou seja, a química.

dos ou rebeldes em comparação aos estudantes

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

43


Claudio Galeno Caldeira e Ana Maria Faccioli de Camargo

do passado, embora a sala de aula já tenha ser-

mais um modelo de como “ser professor”.

vido de cenário para severas punições e formas

Nossa intenção é que os atuais e futuros profes-

de castigos que se assemelhavam mais às tortu-

sores de Química tornem-se alquímicos no sen-

ras. Diríamos sim, que os estudantes de hoje

tido de questionarem os saberes, transmitidos

são mais informados que seus antecessores,

em sala de aula, da Química enquanto ciência

porque hoje a informação é processada e

criada numa matriz mecanicista e sob a égide

transmitida mais rapidamente.

de uma ideologia cada vez mais hegemônica, a

Se o mundo está em constante mudança,

partir do século XVI. Que os professores alquí-

sendo a química quem estuda as transforma-

micos considerem não só as descobertas, mas

ções, nada mais coerente que nós, professores

também o contexto histórico-social no qual elas

de química, acompanhemos estas mudanças e

ocorreram.

as levemos para a sala de aula. A escola, como

Questionar é a palavra de ordem dos profes-

um espelho da sociedade, não poderia ficar

sores alquímicos. Mas questionar o que e como?

alheia às mudanças. No século XVI, a reforma

Questionar consigo mesmo e com seus alunos, os

religiosa luterana levou, por meio do próprio

conhecimentos vistos em sala de aula, lembrando

Lutero e de Comenius, à reforma na educação

que consideramos sala de aula, não somente o

trazendo mudanças definitivas para a sala de

espaço físico tradicional, mas qualquer lugar uti-

aula. Estando, agora, no século XXI, acredita-

lizável para a realização de uma aula de Química.

mos que novas mudanças se fazem necessárias.

Para realizarem este questionamento, é necessá-

Foi também nesse período que a ciência viu

rio que os professores alquímicos lembrem-se

nascer uma nova corrente de pensamento – a

sempre que muitos itens colocados no currículo

positivista, que em sua visão, considerava o

do conteúdo de química estão ali, não por sua

mundo como uma grande máquina, fragmentá-

importância científica, mas por representarem,

vel, mensurável e analisável (qualitativa e quanti-

num determinado momento histórico-social, a

tativamente). Nesta mesma direção, mudou

supremacia de um determinado país.

também a forma de se fazer ciência.

44

Muitos destes itens, embora desconexos

O novo olhar do mundo fez com que não

com a realidade atual, continuam sendo vistos e

houvesse lugar para a alquimia e sua visão

estudados, porque muitos professores brasilei-

“mágico-vitalista” (Goldfarb, 2001) na ciência

ros talvez não ousem romper com o atual sis-

moderna, cedendo, então, a alquimia lugar à

tema de ensino. Percorrer novos caminhos é

química.

sempre uma tarefa que gera insegurança e rece-

Ao sugerir a figura do professor alquímico

ios e, mudar uma estrutura que já está montada,

não pretendemos negar a química moderna e

pode levar a uma série de inseguranças, temo-

todos os seus saberes, nem sugerir que os atuais

res, dúvidas e receios, fazendo com que os atu-

professores saiam transmutando metais em

ais professores de Química optem por não

ouro e, muito menos, é nosso interesse criarmos

fazê-lo.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos

Cabe ressaltar também que a transmutação

}

dos professores de química para os professores alquímicos representa muito mais que uma metodologia de ensino. Em nenhum momento nos preocupamos em dizer que os professores alquímicos deverão usar este ou aquele recurso e nem esta ou aquela mídia, porque ser alquímico não está no fato de ser capaz de ministrar uma aula-show. Ser alquímico é ser capaz de, utilizando quaisquer recursos materiais, físicos e tecnológicos disponíveis, levar seus estudantes à compreensão da química. Ao utilizarmos, ao longo do trabalho, as expressões ‘estudantes de química’ ou ‘alunos’, o fazíamos num sentido amplo com intuito de referirmos não só aos estudantes de Química do ensino médio, mas também aos alunos-professores, ou seja, aos estudantes do curso de licenciatura de Química. Tais alunos mereceriam uma atenção especial visto que serão eles os responsáveis, brevemente, por estarem numa sala de aula, como professores químicos ou alquímicos, levando aos seus alunos, as modificações da

REFERÊNCIAS [1] ALARCÃO, Isabel. Refletir na prática. Revista Nova Escola, São Paulo, n. 154, ago., 2002. Disponível em: <http://novaescola.abril.com.br/ index.htm?ed/154_ago02>. Acesso em: 27 jul. 2007. [2] CHASSOT, Attico. Pra que(m) é útil o ensino? Alternativas para um estudo (de química) mais crítico. Canoas: ULBRA, 1995. [3] FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. 5. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1985. [4] GOLDFARB, Ana Maria Alfonso. Da alquimia à química. São Paulo: Landy, 2001. [5] LEXEN, Ademar Antônio, et. al. A formação inicial em química no contexto de uma universidade comunitária. Reunião anual Sociedade Brasileira de Química, 30., 2007, Águas de Lindóia, Anais... Águas de Lindóia: SBQ, 2007. Disponível em: <http://www.sbq.org.br/30ra/Workshop%20UPF.pdf>. Acesso em: 12 abr 2008. [6] MALDANER, Otávio Aluísio. A pesquisa como perspectiva de formação continuada de professor de química. Revista Química Nova, São Paulo, n. 2, mar./abr., 1999. Disponível em: <http://www.scielo.br/>.Acesso em: 25 out. 2006. [7] PEREIRA, Marcos Villela. Políticas públicas em educação e o alastramento da má consciência. In: Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino Educação, Questões Pedagógicas e Processos Formativos: Compromisso Com A Inclusão Social, 13., 2006, Recife, Anais... Recife: ENDIPE, 2006.

matéria estudada na Química. A mudança de professores de química para professores alquímicos não exige formação específica, porém exige esforços individuais, particulares, para quebrarem o “gesso do meca-

Recebido em: 17 abr. 2009 Aceito em: 28 abr. 2009

nicismo” com o qual eles estiveram presos todos estes anos.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

45



COMO FAZER? UMA RETROSPECTIVA DO PROGRAMA DO MEC, SUAS PERSPECTIVAS E ALGUMAS CONTRIBUIÇÕES José Carlos de Azambuja Bianchi Instituto de Química – UNICAMP E-mail: jcabianchi@hotmail.com Pedro Faria dos Santos Filho Instituto de Química – UNICAMP E-mail: pfaria@iqm.unicamp.br

RESUMO Em 1996, o MEC criou a Secretaria de Educação a Distância, sinalizando sua intenção de investir em recursos pedagógicos direcionados para o ensino nos níveis fundamental e médio. A partir desta iniciativa, posteriormente, o MEC passou a transmitir, via satélite, um programa chamado Como Fazer? destinado aos professores de ensino médio. Este trabalho apresenta um relato de como é montado cada episódio desse programa, desde a aquisição dos vídeos, até a gravação final com a equipe de professores convidados para orientar a sua utilização. Além de discutir as dificuldades associadas à utilização deste tipo de recurso, apresentamos, como contribuição a este projeto, uma disciplina de pós-graduação ancorada nestes vídeos, bem como uma dissertação de mestrado desenvolvida em nosso instituto, focalizando a produção de material de apoio para os vídeos do programa Como Fazer?. Palavras-chave. TV escola; ensino a distância; vídeos para aulas de química. ABSTRACT

HOW TO DO? A RETROSPECTIVE PROGRAM OF MEC, ITS PROSPECTS AND SOME CONTRIBUTIONS. In 1996, the Brazilian Education and Culture Ministry, MEC, created the Distance Education Secretary, SEED, showing his intention to develop pedagogical instruments towards fundamental and medium school levels. After that, MEC started the transmission of a TV program called Como Fazer? directed to teachers of those levels. This work presents an account of how that TV program is created since the videos acquisition to the final recording with the invited teachers. We discuss the difficulties associated with this program and present some contributions to it as a post graduation discipline and a master thesis focused on the production of texts directed to the Como Fazer? TV program. Key-words. TV Escola; distance learning; videos for Chemistry classes.


}

INTRODUÇÃO Nos tempos modernos, o ensino a distância vem ganhando cada vez mais espaço na carga horária dos cursos de formação, nos mais variados níveis. Basicamente, ele está associado a um sistema de educação que substitui, parcialmente, o professor por recursos tecnológicos desenvolvidos para esse método de ensino. Se em regiões mais providas de material humano qualificado este recurso ainda não é essencial,

48

Nesse ambiente de preocupação com as novas tecnologias voltadas para o ensino, em 1996, o Ministério da Educação e Cultura, MEC, criou a Secretaria de Educação a Distância, SEED. Esta postura sinalizava, claramente, a intenção de investir em projetos pedagógicos por meio de recursos técnicos disponibilizados para a rede pública dos ensinos médio e fundamental. A partir dessa iniciativa, o MEC passaria a transmitir um programa chamado TV Escola,

em outras regiões, caracterizadas pela escassez

destinado aos professores de ensino médio, utili-

de recursos, ele representa uma boa alternativa

zando um canal de satélite. Para tornar este pro-

para diminuir a distância e o isolamento dos

grama acessível aos professores de qualquer

profissionais que ali atuam.

região, o MEC distribuiu para as escolas públi-

Já no final do século passado, o governo ace-

cas de todo o país, um kit tecnológico, que

nava para esta alternativa nas suas Leis de Diretri-

incluía um televisor, um aparelho de videocas-

zes e Bases, publicadas em 1980, onde se dava

sete, uma antena parabólica e um receptor de

atenção especial para o ensino a distância, como

satélite. A idéia era de que o programa TV

um processo educacional capaz de desenvolver e

Escola alcançasse cerca de 58000 escolas da

veicular programas em todos os níveis e modali-

rede pública, 1,1 milhão de professores e 30

dades de ensino.[1] Isso permitiria que profissio-

milhões de alunos.[2]

nais da área de ensino pudessem resgatar aspectos

A programação, distribuída via satélite,

de sua formação, tomando contato com informa-

seria destinada às escolas públicas brasileiras,

ções gerais ou conteúdos específicos na sua pró-

com o objetivo de propor e manter a formação

pria região de atuação.

continuada dos professores em exercício, REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Como Fazer? Uma Retrospectiva do Programa do MEC, suas Perspectivas e Algumas Contribuições

particularmente aqueles distantes dos grandes

uma das áreas envolvidas gravá-los, com o

centros. A idéia era de que isto contribuísse

auxílio do equipamento que fora anteriormente

para o aperfeiçoamento do trabalho do profes-

doado às escolas. Para viabilizar esta sistemá-

sor, tanto na sala de aula, quanto no âmbito da

tica, o MEC divulgava toda a programação das

escola e da comunidade.

exibições em uma revista que também se cha-

Com essa perspectiva, em outubro de 1999,

mava TV Escola. Além dessa programação, a

iniciou-se a transmissão do projeto TV Escola,

SEED também distribuía para todas as escolas

voltado para o ensino médio, que envolvia três

da rede pública, um guia anual de programas,

tipos de programas, com estruturas muito distin-

na tentativa de facilitar a organização do pro-

tas. O primeiro deles, denominado O Acervo,

fessor na escolha dos programas ao longo de

apresentava diversos vídeo-documentários, com

todo o ano.

tempo de duração superior a 1 hora. Estes vídeos

Neste trabalho, focalizaremos nossa aten-

eram acompanhados de propostas dirigidas aos

ção no programa Como Fazer? devido ao nosso

professores, que visavam o melhor aproveita-

maior interesse nos projetos direcionados ao

mento dos mesmos em sala de aula. Já o pro-

ensino médio e, também, porque o acervo deste

grama Ensino Legal, focalizava questões

programa é, majoritariamente, direcionado aos

relacionadas aos currículos, projetos educacio-

professores e alunos do nível médio.

nais, metodologias de trabalho e sistemas de ava-

Assim sendo, pretendemos fazer uma des-

liação dirigidos aos professores do ensino médio.

crição dos diversos passos envolvidos, desde a

O terceiro programa do projeto TV

idéia inicial até a produção e edição dos vídeos

Escola era intitulado Como Fazer?; ele se

que serão transmitidos, via satélite, para todo o

baseava na exibição de vídeos com duração

país. Acreditamos que estas informações sejam

aproximada de 20 minutos, que eram acom-

importantes para todos os usuários dos vídeos,

panhados de textos breves, dirigidos tanto

ao mesmo tempo em que poderão esclarecer

aos professores quanto aos alunos. Acredi-

eventuais

tava-se que este formato deveria beneficiar

direcionamento deles.

dúvidas

quanto

à

escolha

e

tanto os professores quanto os alunos, uma vez que estavam sendo oferecidas imagens para ilustrar alguns conceitos, bem como tex-

}

tos que auxiliavam no entendimento dos mes-

TV ESCOLA – COMO FAZER? O PERCURSO DO VÍDEO FINAL

mos. Ressalte-se que o que se esperava era

Estabelecidas as perspectivas do alcance e

que o professor pudesse atuar como mediador

dimensão do programa Como Fazer?, o prime-

entre as imagens e o entendimento dos alunos

iro passo, e talvez um dos mais importantes,

acerca das mesmas.

reside na escolha adequada do vídeo que será

Todos esses programas eram transmitidos

tratado no programa. Neste caso, são pesquisa-

via satélite e caberia aos professores de cada

das as alternativas existentes tanto no mercado

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

49


José Carlos de Azambuja Bianchi e Pedro Faria dos Santos Filho

50

interno quanto no externo; para tal, a SEED

ensino médio, sendo um de cada área que

designa alguns funcionários, de formações

explorará o vídeo. Estes professores são convo-

diversas, que pesquisam junto às produtoras

cados para uma reunião na cidade de São Paulo,

brasileiras como TV Cultura e outras redes,

onde o vídeo lhes é apresentado. É importante

bem como em outras de países como Inglaterra,

salientar aqui que estes professores nunca

Canadá, França e Estados Unidos. Uma outra

assistiram aos vídeos e tampouco conhecem o

parcela de vídeos acaba sendo produzida pelo

conteúdo ou a pertinência dos mesmos, particu-

próprio MEC. Independentemente da origem

larmente para a área de Química. Os vídeos são

destes vídeos, não temos notícia dos critérios

entregues aos professores, que são, novamente,

adotados na seleção dos mesmos. Aparente-

convocados para uma próxima reunião que

mente, os Parâmetros Curriculares Nacionais

ocorrerá em cerca de 20 dias, quando será reali-

do Ensino Médio constituem uma sugestão de

zado o próximo passo.

abordagem dos saberes relativos ao ensino

Neste intervalo, os professores convidados

médio, em nome de competências a serem

assistem, insistentemente, aos vídeos, procu-

alcançadas, sem perder de vista o olhar

rando, nas imagens, a melhor maneira de apro-

específico de cada disciplina.

veitar o vídeo para ilustrar aulas dirigidas aos

Independentemente dos critérios adotados e

alunos do ensino médio. Merece comentário

de sua origem, o fato é que o acervo do MEC de

aqui o fato de que, uma vez rotulado pela

vídeos direcionados para o Ensino Médio está

SEMTEC como adequado para determinada

próximo de 500 unidades. Destes, aproxima-

área, não cabe ao professor questionar a perti-

damente 60 vídeos são indicados para a área de

nência, ou não, do vídeo para a sua área de atua-

Química. Ressalte-se, novamente, que estas indi-

ção. Concordando ou não, cabe a ele imaginar e

cações são feitas por funcionários designados

encontrar argumentos adequados para o melhor

pela SEED.

aproveitamento do vídeo.

O passo seguinte é identificar as áreas que

No próximo passo, os professores compare-

poderiam se beneficiar, de alguma maneira, de

cem à gravadora designada para gravar as ima-

cada um desses vídeos. Para isso, a parceria

gens que acompanham o vídeo. Nesta parte, cada

entre a Secretaria de Ensino a Distância e a

professor convidado dispõe de um tempo de

Secretaria de Educação Média e Tecnológica,

quatro minutos, ininterruptos, sem qualquer

SEMTEC, determina três áreas cujos domínios

censura ou filtro, onde ele expõe seu olhar e emite

contemplam argumentos e linguagem que

sua opinião dirigida aos professores do ensino

podem explorar, adequadamente, as imagens

médio. Nesta opinião, ele expressa sua visão de

apresentadas no vídeo.

como os professores deveriam explorar aquele

Uma vez identificadas as áreas que explo-

vídeo em aulas dirigidas aos alunos do ensino

rarão um determinado vídeo, a SEMTEC, de

médio. Aqui, ele também sugere atividades para a

acordo com seus critérios, designa uma equipe

sala de aula, propõe trabalhos interdisciplinares e,

composta por três professores que atuam no

na medida do possível, de acordo com o conteúdo REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Como Fazer? Uma Retrospectiva do Programa do MEC, suas Perspectivas e Algumas Contribuições

do vídeo, apresenta uma rápida demonstração

}

experimental, que pode ser reproduzida por pro-

COMO FAZER? O MATERIAL IMPRESSO QUE ACOMPANHA OS VÍDEOS

fessores que atuam junto ao ensino médio. Como

Uma outra tarefa, que é destinada aos pro-

a demonstração experimental é acompanhada

fessores que comentam os vídeos, é a produção

pelas câmeras de TV, todo e qualquer detalhe

de textos ou fichas de apoio, que acompanham

experimental pode ser ressaltado. Este procedi-

os vídeos e servem de apoio para os professores

mento é repetido para cada um dos três profes-

que utilizarão os vídeos. Até 2004, elas apre-

sores convidados, sendo que a mediação dos

sentavam os conceitos mais explícitos no

diálogos é feita por um apresentador do pro-

vídeo, e mesmo aqueles menos evidentes, mas

grama, que participa de todas as gravações.

que são pertinentes às imagens contidas no

Após a gravação da fala isolada de cada

mesmo. Além disso, neste material também se

um dos professores, a equipe composta pelos

ressaltava a interface da química e das outras

três dispõe de, aproximadamente, 12 minutos

áreas exploradas entre si, bem como se indi-

para propor um trabalho interdisciplinar; neste

cava as competências que seriam alcançadas

trabalho, a condição imposta aos professores é

utilizando aquele vídeo. Finalmente, este mate-

que ele envolva grande parte da comunidade

rial impresso deveria conter, ainda, a proposi-

escolar e que, obviamente, esteja atrelado ao

ção de atividades a serem desenvolvidas em

tema do vídeo. Até onde sabemos, esta pro-

sala de aula, que poderiam incluir questões para

posta surge de uma conversa preliminar entre

discussão, exercícios e alguma demonstração

os professores que compõem a equipe, e que

experimental.

dura apenas alguns minutos.

A partir de 2004, o programa, então inti-

Terminada esta fase, o conjunto de ima-

tulado Sala do Professor, passou a ser acom-

gens que comporão o vídeo, que será transmi-

panhado de fichas um pouco mais bem

tido via satélite, está completo e é finalizado

elaboradas, e que incluíam os seguintes pon-

pela produtora do vídeo. Na verdade, ele é

tos: um título especial, diferente do original,

composto por cerca de 20 minutos com as ima-

e que apresentasse algum apelo motivador

gens originais, importadas ou não, por 12

para os usuários; uma seleção de conteúdos,

minutos dos comentários individuais dos três

cuidadosamente escolhidos, em função do

professores, e por mais 12 minutos da proposta

tema do filme e do ano do ensino médio para

elabora pelo grupo de professores. Esta última

que se destina; estratégias para o trabalho

parte, composta pelos 24 minutos finais, até

interdisciplinar e para a exibição do filme em

2004, era denominada Sala do Professor.

sala de aula, incluindo as pau sas no filme e as

Atualmente, todo o conjunto de imagens recebe

reflexões que devem ser inseridas nestas

esta denominação.

pausas.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

51


José Carlos de Azambuja Bianchi e Pedro Faria dos Santos Filho

Em qualquer um dos casos, após a inclusão

inabilidade para mudar de conduta em sala de

de todos estes aspectos, as fichas são enviadas à

aula em função do novo recurso didático, bem

SEMTEC para revisão de texto e adequação ao

como a conduta inadequada dos alunos durante

espaço disponível para publicação, mas nunca

a apresentação dos vídeos.

para revisão do conteúdo! Terminada a edição

Há que se considerar, ainda, as longas jor-

feita pela SEMTEC, o fichário completo é

nadas de trabalho da maioria dos professores

enviado a todas as escolas da rede pública e fica

que atuam no ensino médio, em particular

à disposição dos usuários. Ele também pode ser

daqueles que atuam junto às escolas públicas.

encontrado na homepage do programa TV

Isso acaba limitando a capacidade do professor

[3]

Escola Como Fazer?, no site do MEC.

em se instrumentalizar para o bom exercício de sua atividade, bem como restringe o tempo que

}

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROGRAMA COMO FAZER? Acreditamos que seja inquestionável a necessidade de se oferecer subsídios aos pro-

lhada e cuidadosa do material disponibilizado pelo programa TV Escola. E é óbvio que o material requer esta análise por parte do professor para ser bem aproveitado!

fessores que atuam em regiões mais distantes,

Além disso, apesar de todo o esforço da

que se encontram isolados e carentes de novas

equipe de professores que comentam o vídeo, na

metodologias para o ensino, particularmente o

produção do material impresso que os acompa-

de Química. O programa TV Escola Como

nha, este acaba ficando aquém das necessidades

Fazer? representa uma tentativa importante,

dos professores que os utilizariam, para uma

que vai ao encontro das expectativas deste

exploração mais completa dos mesmos. É muito

público mas que, de certo modo, apresenta

provável que o professor, pelas mais diversas

ainda alguns pontos a serem considerados. O

razões, não se sinta à vontade para trabalhar os

mais importante é no tocante aos resultados de

conteúdos, bem como as atividades sugeridas na

uma análise feita pelo Núcleo de Estudos de

fichas impressas que acompanham os vídeos.

Políticas Públicas, da UNICAMP, sobre a

Infelizmente, apesar de todo o esforço empe-

implementação do projeto TV Escola no

nhado na implantação e execução do programa,

[4]

Em um grupo de 4141

estes são os indicadores da avaliação efetuada

professores que atuam no ensino médio, na

pelo núcleo de estudos da UNICAMP. Uma das

região Sudeste do país, 27% garantiram que

razões para tal, talvez, seja a não abrangência da

não estão treinados para utilizar este novo

ficha para a demanda do professor em uma explo-

recurso, enquanto que outros 17% asseguraram

ração mais completa do vídeo. Para aqueles pro-

que preferem utilizar o livro didático em vez

fessores de regiões mais remotas, acaba sendo

destes novos recursos. Os argumentos para tal

mais seguro e mais fácil, a simples exibição do

são os mais diversos, destacando-se a maior

vídeo, como uma atividade extra-classe, sem

quantidade de trabalho para o docente, a sua

explorá-lo da forma como é sugerido.

período 1997-2001.

52

ele poderia dedicar a uma análise mais deta-

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Como Fazer? Uma Retrospectiva do Programa do MEC, suas Perspectivas e Algumas Contribuições

}

UMA CONTRIBUIÇÃO PARA O PROGRAMA COMO FAZER?

alunos não soubessem o conteúdo, mas a verdade é que a espontaneidade foi perdida e todas

Considerando todas as dificuldades encon-

as dificuldades, inerentes a uma nova postura,

tradas pelos professores que atuam no ensino

vieram à tona. Resumidamente, podemos dizer

médio, decidimos avaliar a exeqüibilidade da

que, mesmo tendo a contribuição de todos os

proposta do programa TV Escola Como Fazer?

alunos, as aulas só começaram a tomar um for-

junto a um grupo de alunos de Pós-graduação do

mato adequado no final do semestre. Conside-

Instituto de Química da UNICAMP. A proposta

rando agora a situação de isolamento de muitos

foi testada em uma disciplina, em nível de

professores, podemos dizer que o objetivo deles

Pós-graduação, oferecida para 20 alunos; estes

atenderem às expectativas do projeto TV Escola

alunos foram devidamente esclarecidos quanto à

é, praticamente, inatingível. A menos que eles

metodologia e os procedimentos do programa

fossem treinados para tal, como foram os alunos

TV Escola Como Fazer? e o objetivo maior da

nesta disciplina.

disciplina era tentar atender a todas as expectati-

Um outro ponto que merece ser comentado

vas do projeto TV Escola. Para isso, foram sele-

foi que, ao longo do semestre, percebemos nos

cionados, previamente, 12 vídeos do acervo do

alunos certa dependência de algum material

MEC, que já haviam sido destinados às aulas de

que pudesse servir como ponto de partida para

Química. Em cada uma das aulas, com quatro

o preparo das aulas. Imaginamos, então, que

horas de duração, havia a exibição de um vídeo

poderíamos produzir um material de apoio,

original, sem os comentários dos professores, e

completo e detalhado, que acompanhasse os

todo o grupo de alunos discutia tudo o que pode-

vídeos do programa TV Escola. Este material

ria, eventualmente, ser abordado a partir daque-

deveria contemplar tanto a formação do profes-

las imagens. Ao final da discussão, uma dupla de

sor quanto a transposição para os alunos do

alunos era selecionada para ministrar uma aula,

ensino médio.

em nível de ensino médio, ancorada nas imagens

Considerando a complexidade desta pro-

do vídeo. Esta aula deveria ser ministrada na

posta, este tema foi desenvolvido em uma dis-

semana seguinte e deveria vir acompanhada de

sertação de mestrado apresentada no Instituto

um material impresso que desse o suporte

de Química da UNICAMP em 2005.[5] Este

adequado ao conteúdo de Química que seria

material se destina àqueles que pretendem utili-

abordado.

zar os vídeos ali explorados, e traz uma aborda-

A impressão que tivemos foi que, apesar de

gem muito completa e diferenciada de todo o

trabalharmos com um grupo de alunos, privile-

conteúdo químico que pode ser explorado a

giado e experiente, em um primeiro momento,

partir das imagens mostradas.

não estávamos preparados para uma aula de bom

Acreditamos que esta seja uma boa alter-

nível, ancorada em imagens e observações tira-

nativa para o melhor aproveitamento dos

das a partir de diálogos e situações. Não que os

vídeos disponíveis no acervo do MEC. Se

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

53


José Carlos de Azambuja Bianchi e Pedro Faria dos Santos Filho

fôssemos capazes de produzir um texto ade-

TV Escola Como Fazer? do MEC, aliado à

quado para cada um dos vídeos, muito prova-

nossa experiência utilizando parte destes

velmente este acervo poderia ser utilizado com

vídeos em uma disciplina de Pós-graduação, e

muito mais eficiência e sua aplicação poderia,

ao desenvolvimento de um projeto de mestrado

também, ser muito mais prazerosa tanto para

baseado no mesmo acervo, nos permite afirmar

alunos quanto para professores.

que o direcionamento do programa é muito adequado e pertinente, mas que ainda requer

}

muito investimento na produção de material

CONSIDERAÇÕES FINAIS

complementar aos vídeos e no treinamento dos professores que o utilizarão.

No desenvolvimento deste trabalho observamos que a atualização dos saberes específicos da disciplina é da maior importância para o trabalho docente, pois assegura maior autonomia no direcionamento da disciplina e garante mais possibilidades de escolha de materiais e recursos didáticos. Além disso, alguns filmes considerados pela comissão da SEED como adequados para serem explorados em aulas de Química, estão muito distantes de qualquer abordagem interessante para os alunos desta disciplina. Isto sinaliza para o fato de que os meios de comunicação, enquanto recursos de apoio, não podem, ou não devem, ser empregados pelo professor no formato que lhe chega às

}

REFERÊNCIAS [1] SOUZA, P. N. P.; SILVA, E. B. Como entender e aplicar a nova LDB. São Paulo: Editora Pioneira Thomson Learning, 1997. [2] FIORENTINI, L. M. R. TV na escola e os desafios de hoje: curso de extensão para professores do ensino fundamental e médio da rede pública - UniRede e SEED/MEC. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 2000, V1. [3] http://www.mec.gov.br [4] NEPP, Pesquisa. Implementação da TV Escola no Brasil (1997-2001). Núcleo de Estudos de Políticas Públicas, UNICAMP. Campinas, 2002. [5] BIANCHI, J. C. A. Dois textos de química para dois vídeos do programa TV Escola Como Fazer? MEC, dissertação de mestrado, UNICAMP, 2005.

mãos. Por outro lado, parte considerável do acervo é adequada para a finalidade à qual se destina. O histórico apresentado sobre a concepção e utilização dos vídeos do acervo do programa

54

Recebido em: 23 out. 2008 Aceito em: 25 mar. 2009

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UMA PROPOSTA PARA ENSINAR ESTEQUIOMETRIA DE REAÇÕES QUÍMICAS EM SALA DE AULA Sabrina Gardoni Peixoto Guimarães Licenciada em Química pelo Centro Universitário de Caratinga – UNEC E-mail: sabrinagardoni@hotmail.com Camila de Lourdes Sousa Licenciada em Química pelo Centro Universitário de Caratinga – UNEC Elenice Aparecida Carlos Bacharel e licenciada em Química pela Universidade Federal de Viçosa – UFV

RESUMO Nesses últimos tempos tem sido difícil para o aluno estudar Química e, principalmente, entender estequiometria. A falta de interesse dos estudantes pode estar relacionada a diversos fatores, dos quais se destaca a abordagem tradicional do processo educativo. Neste trabalho, apresentamos um jogo como proposta de ferramenta didática para auxiliar no ensino do tema estequiometria. Utilizando apenas materiais de baixo custo, observamos que aquela atmosfera tediosa inicial foi substituída por uma maneira dinâmica e interativa de se obter o conhecimento desejado. Palavras-chave. Jogos didáticos; ensino de Química; estequiometria. ABSTRACT A PROPOSAL TO TEACH STOICHIOMETRY OF CHEMISTRY REACTIONS IN THE CLASSROOM. The stoichiometry is an essential tool to teach chemistry to students of medium level. As it has been difficult to make students interested in this subject, in this work we present a motivated and interactive proposal to broach this content in classrooms. By using only cheap materials, changes from a tedious atmosphere of classroom to a dynamic way of getting knowledge were observed. Key-words. Educational game; Chemistry teaching; stoichiometry.


}

INTRODUÇÃO Uma das tarefas mais importantes da Quí-

deve apontar as dificuldades presentes na compre-

mica no seu dia-a-dia é calcular as quantidades de

ensão, mas também o professor no ensino, pois

reagentes que serão consumidas numa determi-

mesmo buscando a melhor maneira de transmitir e

nada reação química e dos produtos obtidos por

fazer com que o aluno compreenda o significado

meio dessa reação. Todos esses cálculos são rela-

matemático do coeficiente estequiométrico, ele

tados no ensino médio com o nome de estequio-

pode não conseguir provocar a aprendizagem.

metria, um tema da química que tem dado muita

Portanto, é necessário buscar ferramentas que

dor de cabeça para os estudantes.

auxiliem o processo ensino-aprendizagem, por

Por trabalhar com relações de proporcionalidade entre os elementos que formam as diferentes substâncias e com balanceamento de equações, envolvendo apenas cálculos no processo, o tema não tem chamado atenção dos alunos. A falta de interesse dos estudantes pode estar relacionada a diversos fatores, sendo os

56

Ao trabalhar este tema, não somente o aluno

exemplo, os jogos didáticos. O jogo pedagógico ou didático é aquele fabricado com o objetivo de proporcionar determinadas aprendizagens, diferenciando-se do material pedagógico, por conter o aspecto lúdico2, é utilizado para atingir determinados

principais a abordagem tradicional do processo

objetivos pedagógicos, sendo uma alternativa

educativo como a transmissão-recepção de

para melhorar o desempenho dos estudantes em

informações, a falta de contextualização e a atu-

alguns conteúdos de difícil aprendizagem[3].

ante memorização[1]. Assim, assuntos que cons-

A importância do jogo na educação tem

tituem a base de uma determinada área do

oscilado ao longo dos tempos, mas, principal-

conhecimento, como é o caso da estequiometria

mente, nos momentos de crítica e reformulação

no ensino de Química, podem não ser bem assi-

da educação, são lembrados como alternativas

milados, comprometendo os próximos conteú-

interessantes para a solução dos problemas da

dos a serem abordados.

prática pedagógica[4].

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Uma Proposta para Ensinar Estequiometria de Reações Químicas em Sala de Aula

Nessa perspectiva, o jogo é o eixo que con-

O jogo foi montado em um papelão, cujo

duz a um conteúdo didático específico, resul-

tamanho pode variar. Sobre o papelão foram

tando em um empréstimo da ação lúdica para a

colocadas duas colunas: a primeira com as equa-

[5]

aquisição de informações .

ções químicas não balanceadas e a segunda com

Vendo o jogo como uma alternativa estimu-

os coeficientes estequiométricos. O objetivo do

lante da aprendizagem, é apresentado, neste tra-

jogo é fazer com que o aluno faça as associações

balho, um jogo como proposta de ferramenta

da primeira coluna com a segunda, com o mate-

didática para auxiliar no ensino do tema estequi-

rial metálico e do aparato montado para testar a

ometria, em aulas de Química do ensino médio.

condutividade elétrica.

Esta atividade lúdica visa proporcionar ao aluno uma maneira mais descontraída de adquirir o conhecimento, com o objetivo de despertar seu interesse e, conseqüentemente, uma participação efetiva durante a aula, a fim de alcançar uma aprendizagem mais significativa.

}

MATERIAIS • pedaço de papelão (30 x 40 cm); • papel sulfite; • tesoura; • prendedores de papel (de latão); • clipes; • fios elétricos; • aparato para testar a eletricidade; • fita adesiva; • cola.

}

MÉTODOS Figura 1. Montagem do jogo (a) frente e (b) verso.

Elaboração do jogo Esta atividade surgiu de modelo de jogo já existente, utilizado para trabalhar as expressões [6]

No verso do papelão as associações deve-

numéricas da Matemática . Para trabalhar com o

rão ser feitas corretamente, pelas conexões

tema estequiometria foram feitas algumas adap-

feitas entre os fios, percevejos e clipes

tações.

(material metálico), como mostra a Figura 1. O

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

57


Sabrina Gardoni Peixoto Guimarães, Camila de Lourdes Sousa e Elenice Aparecida Carlos

aparato para testar a corrente elétrica pode ser

cionaram a primeira coluna com a segunda e a

montado utilizando fios elétricos, lâmpada,

cada acerto, a lâmpada acendia. A equipe que

soquete e uma fonte de energia. As extremida-

conseguiu acender a lâmpada mais vezes e em

des livres dos fios do aparato deverão ser colo-

menor tempo, foi decretada vencedora.

cadas em contato com as pontas dos

A fim de verificar a contribuição desta ati-

percevejos, que perfuram o papelão, relacio-

vidade lúdica no processo de aprendizagem, foi

nando a primeira coluna com a segunda.

aplicada uma segunda lista de exercícios, com

O aluno deverá fazer as relações entre a pri-

o mesmo nível de dificuldade da lista anterior.

meira e a segunda coluna, de modo que a equa-

Em seguida, foi quantificado o número de acer-

ção fique corretamente balanceada fazendo com

tos de cada aluno na primeira e na segunda lista.

que a lâmpada do aparato acenda. }

RESULTADOS E DISCUSSÃO O jogo causou forte impacto nos estudantes. Inicialmente, os alunos não compreenderam a proposta apresentada pela professora, e pensaram que era apenas um pretexto para ela não dar aula. Perguntas do tipo “Professora, a senhora não vai dar aula?”, eram freqüentes. Acostumados a uma abordagem tradicional, os alunos entendem que as aulas devem ser apenas

Figura 2. Lâmpada do jogo acessa indicando que as colunas foram relacionadas corretamente.

com o professor transmitindo o conteúdo e os estudantes recebendo as informações de maneira passiva. No entanto, no decorrer da ativi-

Aplicação do jogo

dade os alunos perceberam que o jogo era também uma forma de ensinar/aprender Quí-

O tema balanceamento de equações quími-

mica, e a participação efetiva dos mesmos faci-

cas foi abordado antes da aplicação do jogo, de

litou o aprendizado e gerou um clima de

forma totalmente teórica, para uma turma de 1º

satisfação ao final da aula.

ano da Escola Estadual Engenheiro Caldas. Após

Este impacto positivo do jogo, na aprendi-

essa aula, foi aplicada uma lista de exercícios para

zagem dos alunos, pode ser percebido também

ser resolvida pelos alunos com o objetivo de veri-

pelos resultados das listas de exercícios, pois o

ficar o grau de assimilação dos mesmos.

rendimento dos alunos na lista 2, aplicada após

Num outro momento, o jogo didático foi aplicado na mesma turma, dividindo-se a sala

o jogo, foi melhor do que na lista 1, conforme apresentado na Quadro 3.

em três equipes. Os alunos de cada equipe rela-

58

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


Uma Proposta para Ensinar Estequiometria de Reações Químicas em Sala de Aula

5 Primeira lista de exercícios

Segunda lista de exercícios

Número de acertos

4

3

2

1

0 1 2

3 4

5 6

7 8

9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 Aluno

Quadro 1. Rendimento obtido pelos alunos nas listas de exercícios.

}

CONSIDERAÇÕES FINAIS

}

A aceitabilidade dos alunos a esta nova proposta promoveu uma participação mais efetiva dos mesmos durante a aula, levando a uma melhora no desempenho dos alunos na resolução de exercícios de balanceamento de equações após a realização da atividade lúdica. Os resultados qualitativos e quantitativos indicam a eficiência da atividade proposta. Essa eficiência é resultado da dinâmica do processo que é proporcionada pelo jogo.

REFERÊNCIAS [1] http://www.unesp.br/prograd/PDFNE2002/ aproducaodejogos.pdf#search=%22jogos%20di d%C3%A1ticos%22, Acessada em Agosto 2006. [2] CUNHA, N. Brinquedo, desafio e descoberta. Rio de Janeiro: FAE. 1988. [3] GOMES, R. R.; FRIEDRICH, M. A Contribuição dos jogos didáticos na aprendizagem de conteúdos de Ciências e Biologia. EREBIO, 1, Rio de Janeiro, 2001, Anais, p. 389-92. [4] http://www.crmariocovas.sp.gov.br/dea_a.php?t=019, Acessada em Agosto 2006. [5] KISHIMOTO, T. M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. Cortez, São Paulo, 1996. [6] PASSOS, M. M. De Olho no Futuro. São Paulo: Quinteto Editorial, 1996.

Recebido em: 03 mai. 2008 Aceito em: 10 dez. 2008

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

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EDWARD FRANKLAND E AS TÉCNICAS DE LABORATÓRIO APC

Edward Frankland foi um dos mais notáveis químicos do século XIX. Nasceu em Churchtown (Lancaster), Inglaterra, em 1825. Iniciou-se com aprendiz de farmácia, estudou em Londres com Lyon Playfair e na Alemanha com Bunsen e Liebig. Ao retornar à Inglaterra foi professor de Química em diversas instituições e em 1897 recebeu o título de Sir. Faleceu em 1899. Fez importantes contribuições teóricas, dentre elas os conceitos de valência e ligação química, a constatação do grupo carboxila (-COOH) como característico dos ácidos orgânicos, preparou os primeiros compostos organometálicos e introduziu as primeiras fórmulas gráficas. Não menos importantes foram suas contribuições técnicas, muitas vezes ignoradas: o condensador de refluxo, a destilação em atmosfera inerte, a técnica do tubo selado, até hoje utilizadas; aparelhos para análise de água e para estudo de combustão, um coletor de gases, estes muito importantes em seu tempo. Os historiadores apontam que foram fundamentais para o desenvolvimento de seu trabalho, além de sua habilidade experimental, um ambiente adequado, disponibilidade de materiais (muitos ele trouxe da Alemanha, por não serem disponíveis ainda na Inglaterra) e sua grande capacidade de transferir tecnologia de uma área para outra.

}

BIBLIOGRAFIA [1] A dictionary of Scientists, Oxford University Press, Oxford. [2] RUSSEL, C. Chemical techniques in a preeletronic age: the remarkable apparatus of Edward Frankland, in Instruments and experimentation in The History of Chemistry. F. C. Holmes and T. H Levere (eds.), The Mit Press, Cambridge (MA), 2000.

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61



WILLIAM CROOKES E O ESPIRITISMO RFF

O inglês William Crookes (1832-1919) foi um químico de destaque, contando, dentre suas contribuições, a descoberta do tálio (Tl) e determinação de seu peso atômico, em 1861. Tornar-se-ia conhecido ainda, em Física, por seus estudos sobre descargas elétricas em gases rarefeitos (tendo produzido os famosos “tubos de Crookes” ou tubos de raios catódicos), que levariam à descoberta do elétron. Foi muito produtivo como pesquisador, publicando mais de 250 trabalhos, além de mais de uma dezena de livros. Por suas inúmeras contribuições científicas1, seria-lhe concedido, em 1897, o título de Sir. Contudo, Crookes dedicar-se-ia ainda ao estudo das manifestações espíritas (no que não agiu diferentemente de outras figuras célebres de seu tempo como Alfred Russel Wallace – co-propositor, com Charles Darwin, da teoria da evolução das espécies por meio da seleção natura - e Michael Faraday)2.

William Crookes

1.

Vela a pena destacar que durante toda a sua vida científica, Crookes jamais esteve vinculado à Universidades ou Centros de pesquisa. Tudo o que produziu cientificamente o fez no laboratório que montou em sua casa, sustentando-se com o lucro advindos de seus inventos e de suas publicações. Era, efetivamente, um pesquisador independente.

2.

A famosa Society for Psychical Research (S.P.R.) fundada em 1882, contava, entre seus membros, com diversos cientistas, como Lord Kelvin.

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História da Química

Vela a pena destacar que Crookes procurou aplicar, às suas investigações dos fenômenos espíritas, o mesmo rigor empregado em investigações científicas convencionais (embora haja dúvidas sobre até que ponto a objetividade de Crookes não foi afetada).

Um “tubo de Crookes”

Consta que o interesse de Crookes pelos fenômenos espíritas teria se intensificado (há indícios de que seu contato com o espiritismo já iniciar-se alguns anos antes) após a morte de seu irmão Philip (vítima da febre amarela, em Cuba, onde trabalhava como engenheiro elétrico). Estendendo sua experiência no campo das ciências para a investigação dos fenômenos espíritas, Crookes publicaria uma série de trabalhos com seus resultados. Dentre os “médiuns” estudados por Crookes, Florence Cook foi uma das que mais o impressionou. Muito embora tenha mais tarde abandonado as investigações espíritas, ao que tudo indica, Crookes permaneceria crendo na realidade física desses fenômenos e na possibilidade de sua explicação científica, bem como na realidade de uma vida após a que conhecemos.

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POLANYI E O ENSINO DE QUÍMICA1 RFF

Diferentemente de Gastón Bachelar[1], cuja proposta epistemológica tornou-se muito difundida no Brasil, sendo, inclusive, no tocante ao ensino de química, tema de livro[2], a obra do Húngaro Michael Polanyi (Polányi Mihály, Budapeste – 1891-1976), é ainda muito pouco conhecida no Brasil, possivelmente em função da inexistência (até onde sabemos) de traduções de suas obras, cujos originais podem ser encontrados em inglês, por exemplo (ver bibliografia). Este pequeno artigo visa, justamente, trazer, no sentido de divulgar, por primeira vez quem sabe, para alguns colegas, um pouco da proposta epistemológica de Polanyi. No tocante aos que se dedicam ao ensino de química, em particular, vale a pena salientar que Polanyi era físico-químico, tendo dado importantes contribuições à essa área da química. Posteriormente em sua carreira, Polanyi dedicar-se à economia e à filosofia, com sua proposta epistemológica sendo a contribuição que aqui nos interessa.

Michael Polanyi

1.

O presente trabalho é parte integrante do livro “Polanyi e o ensino das ciências”, com publicação prevista para o final de 2009.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

65


História da Química

A partir dos anos 1930, Polanyi iniciou uma articulação de suas opiniões contra a prevalência do positivismo na ciência, argumentando que ele falha em reconhecer a contribuição que o compromisso/engajamento pessoal e do conhecimento tácito exercem na ciência. Em seu livro Personal knowledge Polanyi lança as principais idéias que compõem sua proposta epistemológica. Segundo Polanyi, sabemos muito mais do que podemos relatar, sendo o que podemos descrever (o chamado conhecimento explícito) apenas uma fração ínfima do todo (em relação ao que não pode ser descrito: o conhecimento tácito, do qual fazem parte as percepções e história de vida do indivíduo). Logo, para os que se dedicam ao ensino das ciências, torna-se evidente que a epistemologia de Polanyi “cai como uma luva” como referencial teórico interpretativo e como elemento norteador de práticas de ensino inovadoras. No tocante ao ensino da química, ciência por excelência dedicada ao estudo das transformações da matéria que são, desde cedo, vivenciadas em nosso cotidiano, o chamado conhecimento tácito tem um importante, realçando, uma vez mais, a adequação da emistemologia de Polanyi. Polanyi propõe que a dimensão tácita do conhecimento (de fundamental importância), não é devidamente considerada e valorizada pela escola tradicional. No tocante ao ensino de química, em particular, nossa experiência, quer como ex-alunos de cursos do ensino médio ou de nível superior, quer como professores, nos faz perceber a veracidade dessa assertiva.

}

REFERÊNCIAS [1] G. Bachelard, A formação do espírito científico, Contraponto, Rio de Janeiro, 1999. [2] L.T.S. Parente, Bachelar e a química, EUFC, Fortaleza, 1990.

Bibliografia M. Polanyi, Personal knowledge, The University of Chicago Press, Chicago, 1974. M. Polanyi, Science faith and society, The University of Chicago Press, Chicago, 1964. M. Polanyi, H. Prosch, Meaning, The University of Chicago Press, Chicago, 1977. M.T. Mitchell, Michael Polanyi, ISI Books, Wilmington, 2006. H.Prosch, Michael Polanyi – a critical exposition, State University of New York Press, Albany, 1986. W.T. Scott, M.X. Moleski, Micheal Polanyi – scientist and philosopher, Oxfor University Press, Oxford, 2005.

66

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1


A criação de uma instituição de ensino de Química em Belém remonta a 1920 e foi resultante da ação de parlamentares paraenses na Câmara Federal, que aproveitaram a decisão do Congresso Nacional de criar diversos cursos de Química no país. Foram, assim, implantados cursos de Química nos institutos técnico-científicos já existentes nas cidades do Rio de Janeiro (então, a capital federal), São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte, Salvador e Recife. Como em Belém ainda não houvesse uma escola politécnica, foi necessário criar uma instituição própria. Com a ajuda a Associação Comercial do Pará, que possuía um MUSEU COMERCIAL, em prédio próprio, onde eram exibidas matérias-primas regionais e alguns processamentos e implementos físicos para obtenção de produtos acabados e semiacabados. Ali, foi montada a ESCOLA DE CHIMICA INDUSTRIAL, cujo prédio, de linhas neoclássicas, ainda se mantém edificado, servindo a outras atividades, e situado em local privilegiado, na praça da República.


Foi o primeiro diretor da escola o célebre cientista francês, já radicado em Belém, Paul Le Cointe, autor de vários trabalhos entre os quais a notável coletânea A AMAZÔNIA BRASILEIRA..., obra muito consultada por pesquisados químicos, botânicos, bioquímicos, médicos, farmacêuticos. A instituição de ensino recém-criada contava com a participação de professores pesquisadores franceses, convidados por Le Cointe, para integrarem o corpo docente da escola. Vieram da França, Charles Paris, Raymond Joannis e, posteriormente, René Rougier, Georges Bret, Camille Henriet e André Callier.

Posteriormente, em 1930, foram as atividades da Escola interrompidas em consequência do corte de verba de manutenção, encerrando-se, assim, um breve ciclo de atividades envolvendo ensino, pesquisa, extensão e prestação de serviços. Somente em 1956 proceder-se-ia a reabertura da Escola, graças ao trabalho e empenho pessoal de Clara Martins Pandolfo, que intercedeu junto à administração da Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA), no sentido de arcar com os custos de manutenção do curso de química industrial juntamente com a Associação Comercial do Pará.


Atualmente, depois de várias estruturações dentro da Universidade, dois departamentos concentram as atividades dos profissionais da química: o Departamento de Química (setor básico) e o Departamento de Engenharia Química e de Alimentos (tecnológico). Por sua vez, além do curso de química industrial preexistente, procedeu-se, já dentro da Universidade, a implantação de outros cursos de graduação em Química (licenciatura e bacharelado, no setor básico, e Engenharia Química e Engenharia de Alimentos, no setor tecnológico) e pós-graduação em Química (mestrado e doutorado, no setor básico) e Engenharia Química (mestrado, no setor tecnológico).



RESENHAS

}

CROMATOGRAFIA LÍQUIDA MODERNA: HPLC/CLAE LANÇAS, F. M. Cromatografia líquida moderna: HPLC/CLAE. Campinas, SP: Átomo, 2009.

A Cromatografia é uma técnica de separação que está presente em praticamente todas as áreas do conhecimento científico e tecnológico modernos: da petroquímica ao controle de qualidade de fármacos; do estudo da composição química da atmosfera de outros planetas à avaliação de resíduos de contaminantes em alimentos; do doping em esportes à contaminação ambiental; da proteômica ao “teste do pezinho” em recém-nascidos, além de muitas outras. Sua consolidação como técnica científica é atribuída ao botânico Tswett que, no início do século passado (1903-1906), divulgou resultados de suas pesquisas sistemáticas sobre o assunto. Essa modalidade de separação, atualmente denominada Cromatografia Líquida Moderna ou HPLC (High Performance Liquid Chromatography), sofreu uma revolução nos últimos 30 anos, o que permitiu um avanço espetacular em várias áreas do conhecimento científico, em especial, na análise de substâncias químicas de interesse para o bem-estar do homem, uma contribuição jamais alcançada por uma técnica analítica. Pode-se, ainda, antever que sua contribuição deverá ser ampliada nas próximas décadas (em especial, pela miniaturização da instrumentação, e novos desenvolvimentos nas colunas) consolidando-se como a mais importante técnica de análise instrumental do século XXI. Neste trabalho, o autor descreve as bases teóricas da técnica - a instrumentação e consumíveis necessários (com ênfase nas colunas), seus modos de operação, sua otimização e validação –, os métodos atuais de preparo da amostra e, a análise qualitativa e quantitativa. O enfoque principal é sempre a clareza e precisão dos conceitos, atualidade do assunto e a generalização sempre que possível. Tópicos particulares, de interesse para alguns poucos grupos de pesquisadores, não foram abordados em detrimento de um maior detalhamento dos assuntos de interesse da maioria dos usuários da técnica. WMJ

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1

71


Resenha

}

ESTUDO DE CASOS NO ENSINO DE QUÍMICA SÁ, L. P.; QUEIROZ, S. L. Estudo de casos no ensino de química. Campinas, SP: Átomo, 2009.

O método de Estudo de Casos, uma variante do método Aprendizado Baseado em Problemas, também conhecido como Problem Based Learning (PBL), foi desenvolvido com o intuito de colocar os alunos em contato com problemas reais, de estimular o desenvolvimento do pensamento crítico, a habilidade de resolução de problemas e a aprendizagem de conceitos da área em questão. Ele possui a característica de enfatizar o aprendizado autodirigido, centrado no estudante. Pesquisas têm mostrado a sua potencialidade na promoção de um ensino que vise o desenvolvimento de conteúdos não apenas informativos, mas também formativos em cursos de Ciências. O primeiro capítulo do livro versa sobre as origens e a popularização do método no ensino de Ciências, enquanto o segundo capítulo apresenta considerações importantes a respeito do processo de produção dos casos e de estratégias para sua aplicação. No capítulo seguinte, discutem-se os principais objetivos e resultados alcançados com o emprego do método no ensino de Química. No quarto capítulo, é apresentada uma experiência sobre o uso do método de Estudo de Casos em um curso de Bacharelado em Química. Depois, discute-se em que medida as propostas de ensino pautadas no método de Estudo de Casos podem estimular a elaboração de argumentos por parte dos alunos. O sexto capítulo apresenta uma bibliografia comentada, composta de vinte e nove trabalhos, que tratam do método de Estudo de Casos aplicado à área de Química, localizados a partir de levantamento bibliográfico realizado em revistas da área de Educação em Química. Cada trabalho que integra esta bibliografia é acompanhado de um pequeno resumo, no qual são apresentados aspectos relevantes discutidos em cada obra. WMJ

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NORMAS EDITORIAIS

Revista Brasileira de Ensino de Química

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(ReBEQ) é uma publicação semestral da Editora

SOBRE A APRESENTAÇÃO DE ORIGINAIS PARA AVALIAÇÃO

Átomo que aceita colaborações em forma de arti-

Ao encaminhar os trabalhos para análise

gos, resenhas, relatos de experiência, notícias e

do Comitê Científico, os autores deverão

memória fotográfica da Química no Brasil. Os

observar as seguintes orientações: 1. Originalidade e ineditismo dos textos: o autor deve enviar, junto com o trabalho, uma declaração na qual se compromete a não apresentá-lo, simultaneamente, em outro periódico, durante o prazo estipulado para avaliação, e autoriza a sua publicação nesta revista. 2. As colaborações devem ser redigidas em português ou espanhol. Em casos excepcionais, cuja pertinência será analisada pelo Comitê, serão aceitos textos em inglês e francês, que deverão ser traduzidos para a língua portuguesa. 3. Em folha à parte, devem ser informados os dados de autoria: título do trabalho, nome completo, vinculação institucional, formação acadêmica e endereço residencial ou institucional do autor (incluindo telefone e e-mail) para o encaminhamento de correspondência pela Secretaria de Redação. 4. No caso de artigos, os originais não poderão exceder o limite máximo de 40.000 caracteres (com espaço), incluindo todos os elementos gráficos disponíveis no arquivo. Para resenhas,

textos poderão ser publicados em português e espanhol. Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo, necessariamente, a opinião ou pensamento da coordenação e conselho editoriais. Os originais submetidos a análise do Comitê Científico serão encaminhados a, no mínimo, dois conselheiros do seu corpo editorial, os quais avaliarão de forma específica e decidirão sobre a pertinência dos textos à linha editorial da revista. Em caso de necessidade de revisões de conteúdo ou adequações às normas editoriais, o autor receberá os pareceres dos conselheiros, ficando, assim, responsável pela reapresentação do trabalho reformulado no prazo de 45 dias, contados a partir da data de recebimento da comunicação. O anonimato entre autores e conselheiros, durante o processo de arbitragem dos textos, é garantido pelo Comitê. O prazo médio estipulado para a apresentação do resultado final é de até 60 dias, a contar da data de recebimento do texto. Os trabalhos não aprovados pelos conselheiros, ou não devolvidos no prazo estipulado para reformulação, serão arquivados e os autores informados.

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notas críticas e outros, observar o limite de 10.000 caracteres (com espaço). 5. Quanto à estrutura do texto, devem ser observadas as seguintes orientações: na primeira página, apresentar o título e subtítulo do trabalho, o resumo e as palavras-chave (até 05, evitando-se combinações extensas que não correspondam ao conteúdo do texto). Todos esses elementos devem ser apresentados em português ou espanhol e inglês. 6. Os textos devem ser digitados no programa Word for Windows, em fonte Times New Roman, tamanho 12, com espaço duplo, e enviados por correio eletrônico para o seguinte endereço: rebeq@atomoealinea.com.br

por asterisco (*,**,***) no rodapé da página a que se refere. As citações autorais deverão ser feitas em seqüência numérica e apresentadas ao final do artigo

}

SOBRE A UTILIZAÇÃO DE IMAGENS As tabelas, quadros e figuras (ilustrações, fotografias, gráficos, entre outros) devem ser apresentados com o máximo de resolução (300dpis em diante), em preto e branco, em arquivo à parte e, de preferência, finalizados para sua inserção direta no texto. Para a produção das tabelas, recomenda-se seguir as orientações do IBGE (www.ibge.gov.br) publicadas em suas normas de apresentação tabular. Todos esses elementos gráficos devem estar indicados

}

SOBRE REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E NOTAS

e numerados, consecutivamente, ao longo do texto, de acordo com a ordem em que aparecem.

O autor do trabalho é responsável pela exatidão, organização e utilização correta das referências e citações constantes no texto, bem como na listagem bibliográfica a ser apresentada no final

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}

SOBRE A NATUREZA DA COLABORAÇÃO E RECEBIMENTO DE EXEMPLARES

dos artigos. A Associação Brasileira de Normas

Fica aqui expresso que a participação dos

Técnicas (ABNT – www.abnt.org.br) fornece,

autores neste periódico é de caráter espontâneo,

por meio da NBR 6023 (agosto/2002), as orienta-

portanto, não-remunerado. O autor principal

ções necessárias para a organização das referên-

receberá, gratuitamente, dois (02) exemplares da

cias bibliográficas. No caso de notas, esse recurso

edição em que seu artigo foi publicado, mais

tem seu uso limitado ao caráter explicativo-infor-

separata eletrônica deste; os co-autores receberão

mativo, neste periódico, evitando-se a utilização

um (01) exemplar e separata eletrônica do texto.

de notas bibliográficas. As notas, quando utiliza-

No caso de resenhas, cada autor terá direito a um

das, devem aparecer em seqüência representada

(01) exemplar e separata eletrônica.

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