Coordenação Editorial Pedro Faria dos Santos Filho – UNICAMP Robson Fernandes de Farias – UFRR Wilon Mazalla Jr – Editora Átomo Conselho Editorial Adriana Vitorino Rossi – UNICAMP Gláucia Maria da Silva – USP|RP Marcelo Carneiro Leão – UFRPE Mário Sérgio Galhiane – UNESP Osvaldo Antonio Serra – FFCLRP-USP Ótom Anselmo de Oliveira – UFRN Ricardo Ferreira – UFPE Sérgio Melo – UFC Yassuko Iamamoto – USP
Revista Brasileira de Ensino de Química (ReBEQ) é uma publicação semestral da Editora Átomo e colaboradores. Dentro do espírito maior da editora, que é a difusão do conhecimento por meio da democratização das valiosas pesquisas e avanços científico-educacionais, quase sempre em latência nas boas universidades, e pelo intercâmbio de idéias e experiências daqueles que participam do processo ensino/aprendizagem, a ReBEQ inaugura novo espaço, abrindo suas páginas para pesquisadores, docentes (ensino médio e superior), alunos de graduação e pós-graduação, com a visão de que o conhecimento deve ser construído e compartilhado coletivamente. O conhecimento contemporâneo deve ser apresentado de forma inter/transdisciplinar trazendo preocupações como a ética, o meio ambiente e a humanização dos processos e serviços. Centrada nas questões ensino/aprendizagem, visa contribuir para a atualização e otimização do Ensino de Química.
Conselho Ad hoc Marlon Herbert F. B. Soares – UFG Nidia Franca Roque – UFBA Viviani Alves de Lima – UFU
Revista Brasileira de Ensino de Química rebeq@atomoealinea.com.br
Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas e Informação PUC-Campinas
Revista Brasileira de Ensino de Química Campinas, SP: Editora Átomo, 2006 v. 1, n. 1, jun./jun. 2006
www.atomoealinea.com.br/rebeq
Semestral Publicação científica-educacional
Revisão
1. Química – Periódicos. 2. Ciências exatas – Periódicos.
Helena Moysés
CDD 540
Capa e Editoração Eletrônica Fabio Diego da Silva
Índice para Catálogo Sistemático 1. Química
540
Pede-se permuta. - Pide-se cange. A division of the American Chemical Society
We ask for exchange. - On demande l’echange. Si sollecita intercambio. Wir bitten un aurstausch un publikationen.
SUMÁRIO
Editorial
Artigos Caracterizando Fenóis com um Reagente Preparado com Esponja de Lã de Aço para Limpeza e Ácido Muriático Sebastião F. Fonseca, Karina S. Souza e Maria Cristina Santos
A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves
Panorama da Pesquisa em Ensino de Química no Brasil Wilsilene dos Santos Oliveira, José Machado Moita Neto e Nilson Fonseca Miranda
Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos Claudio Galeno Caldeira e Ana Maria Faccioli de Camargo
Como Fazer? Uma Retrospectiva do Programa do MEC, suas Perspectivas e Algumas Contribuições José Carlos de Azambuja Bianchi e Pedro Faria dos Santos Filho
Relatos de Experiência Uma Proposta para Ensinar Estequiometria de Reações Químicas em Sala de Aula Sabrina Gardoni Peixoto Guimarães, Camila de Lourdes Sousa e Elenice Aparecida Carlos
História da Química Edward Frankland e as Técnicas de Laboratório APC
William Crookes e o espiritismo RFF
Polanyi e o ensino de Química RFF
Memória Fotográfica da Química no Brasil História da Química na Região Norte
Resenhas
Normas Editoriais
CONTENTS
Editorial
Articles Characterizing phenols with a reagent prepared with steel wool sponge for cleaning and muriatic acid Sebastião F. Fonseca, Karina S. Souza and Maria Cristina Santos
The viscosity revisited and didactic examples of viscous fluids Jacqueline A. Marques and Débora Gonçalves
Overview of research in chemistry education in Brazil Wilsilene dos Santos Oliveira, José Machado Moita Neto and Nilson Fonseca Miranda
From chemistry teachers to alchemist teachers Claudio Galeno Caldeira and Ana Maria Faccioli de Camargo
How to do? A retrospective program of MEC, its prospects and some contributions José Carlos de Azambuja Bianchi and Pedro Faria dos Santos Filho
Experiences Account A proposal to teach stoichiometry of chemistry reactions in the classroom Sabrina Gardoni Peixoto Guimar達es, Camila de Lourdes Sousa and Elenice Aparecida Carlos
Chemistry History Edward Frankland and laboratory techniques APC
William Crookes and spiritualism RFF
Polanyi and chemistry educaion RFF
Photographic Memory of Chemistry in Brazil Chemistry history in the Northern Region
Reviews
Editorial Standard
EDITORIAL
Em continuidade dos propósitos, apresentamos o terceiro volume da Revista Brasileira de Ensino de Química, reiterando que, mesmo com todo o desenvolvimento alcançado pelo homem nos tempos modernos, o ensino de Química ainda apresenta muitas das dificuldades já encontradas no passado e, somente com muita união, troca de experiências e divulgação de nossos esforços e resultados, poderemos avançar. Assim, a ReBEQ se faz presente na divulgação de todas as formas de conhecimento e desenvolvimento alcançados, que possam, efetivamente, contribuir para a melhoria da qualidade do ensino de Química em todas as regiões do país, independente do seu nível de aplicação e abrangência. Ao mesmo tempo, ela abre as portas para divulgar nossas idéias e experiências, desde que adequadas aos propósitos da revista. Acreditamos que o Ensino de Química, objeto de estudo de alguns especialistas, deve, também, ser área de interesse para todos aqueles que lidam com esta ciência, professores dos diferentes níveis de ensino, alunos de graduação e pós-graduação. Com esse espírito, a ReBEQ apresenta artigos com temas variados, passando por relatos de sala de aula e assuntos que despertam curiosidades histórica e contemporânea. A ReBEQ, a cada passo, consolida sua atuação como veículo e contributo para os necessários avanços científico-educacionais. Coordenação Editorial
CARACTERIZANDO FENÓIS COM UM REAGENTE PREPARADO COM ESPONJA DE LÃ DE AÇO PARA LIMPEZA E ÁCIDO MURIÁTICO Sebastião F. Fonseca Karina S. Souza Maria Cristina Santos Instituto de Química – UNICAMP E-mail: sfonseca@iqm.unicamp.br
Os autores agradecem o apoio e o incentivo dos Grupos de Ensino de Química do Instituto de Química da UNICAMP.
RESUMO O artigo trata da preparação de um reagente, usando esponja de lã de aço para limpeza e ácido muriático (ácido clorídrico comercial), e sua reação com cinco substâncias fenólicas com a formação de complexos coloridos. O experimento descrito pode ser executado em um período normal de aula com materiais comercialmente acessíveis. Palavras-chave. Fenóis; esponja de lã de aço; ácido muriático. ABSTRACT
CHARACTERIZING PHENOLS WITH A REAGENT PREPARED WITH STEEL WOOL SPONGE FOR CLEANING AND MURIATIC ACID The article reports the preparation of a reagent, by the use of steel wool sponge for cleaning and muriatic acid (commercial hydrochloric acid), and its reaction with five phenolic substances with the formation of coloed complexes. The described experiment can be executed in an usual class period with commercially accessible materials. Key-words. Phenols; steel wool sponge; commercial hydrochloric acid.
}
INTRODUÇÃO
comercial) e esponja de lã de aço para limpeza. As substâncias a serem testadas são acessíveis
A caracterização de grupos funcionais
comercialmente e o experimento pode ser reali-
empregando reações típicas é um dos aspectos
zado em um período normal de aula.
importantes da Química Orgânica, especifica-
As substâncias contendo grupo hidroxila
mente no que se refere à Análise Orgânica. Essas
fenólico utilizadas no experimento foram ácido
reações, geralmente, são pouco executadas em
salicílico (1, preparado por hidrólise básica do
laboratórios do ensino médio pela não disponibi-
ácido acetilsalicílico, 1a), eugenol (2, óleo de
lidade de reagentes. No entanto, materiais acessíveis e baratos podem oferecer alternativas
cravo), vanilina (3, aromatizante de alimentos),
interessantes[1-3]. Um reagente que produz com-
salicilato de metila (4, medicamento) e parace-
plexos coloridos com fenóis pode ser preparado
tamol (5, medicamento).
facilmente, a partir do ácido muriático (HCl O
O
OH
C
OH
CH3O
CH3O HO
C
H
HO 3
2
1 O CH3 C
O
O C
OH OH
H
O C
N
OCH3
4
CH3
O
HO 1a
C
5
Figura 1. Estruturas das substâncias fenólicas 1-5. (1) ácido salicílico, preparado por hidrólise básica do ácido acetilsalicílico (1a); (2) eugenol (óleo de cravo); (3) vanilina (aromatizante de medicamentos); (4) salicilato de metila (medicamento); (5) paracetamol (medicamento).
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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Caracterizando Fenóis com um Reagente Preparado com Esponja de Lã de Aço para Limpeza e Ácido Muriático
}
PARTE EXPERIMENTAL
}
RESULTADOS E DISCUSSÃO Ferro metálico em presença de HCl é trans-
Preparação do reagente (FeCl2/FeCl3)
2+
formado em íons Fe com liberação de hidrogê-
Colocar em um béquer de 50 mL metade de uma esponja de lã aço para limpeza (BombrilÒ,
2+
nio (Esquema 1). Os íons Fe 3+
2+
[3]
são oxidados a 3+
Fe pelo oxigênio do ar . Fe e Fe formam
ou similar) e adicionar cuidadosamente 10 mL
complexos coloridos com moléculas que pos-
de uma solução de HCl comercial/água (1:1).
suem grupos substituintes “doadores” de elétrons
Deixar a reação se processar durante 15 minutos
ou com ânions com essa característica (ligantes).
(agitar ocasionalmente a mistura, com cuidado,
Os fenóis estão entre as substâncias que produ-
com um pequeno bastão de vidro) e depois ver-
zem esses complexos[4-5].
ter a solução obtida para outro recipiente. Diluir a solução resultante com 20 mL de água destilada, neutralizar com solução aquosa de bicarbonato de sódio (10%) e filtrar usando um chumaço de algodão. Utilizar essa solução para os testes com fenóis.
Reações dos fenóis com solução de FeCl2/FeCl3 3+
Preparar em cinco tubos de ensaio, ou em
Esquema 1. Formação dos íons Fe2+/Fe e do complexo colorido.
frascos de penicilina, soluções das substâncias fenólicas - (1) ácido acetilsalicílico (Aspirinaâ, â
â
O reagente para detecção de fenóis foi pre-
Melhoral ou AAS ), (2) ácido salicílico (pre-
parado com metade de uma esponja de lã de aço e
parado pela hidrólise do ácido acetilsalicílico),
20 mL de uma solução aquosa 1:1 de ácido
(3) salicilato de metila (Gelolâ ou similar), (4)
muriático (HCl comercial), em bequer ou outro
eugenol (óleo de cravo) e (5) paracetamol – dis-
recipiente compatível. A reação se processou
solvidas em 1 mL de etanol comercial ou em 1
durante 15 minutos (Figura 2), sob agitação cui-
mL de solução de acetona-etanol (1:1): cerca de
dadosa com um bastão de vidro. A solução foi
4-5 gotas de cada substância líquida (1-4) e a
vertida para outro recipiente, diluída com 10 mL
metade de um comprimido triturado de 5. Adi-
de água, neutralizada com solução saturada de
cionar à cada solução de substância fenólica de
NaHCO3 e filtrada sobre um chumaço de algodão. A solução resultante contendo FeCl2/FeCl3)
FeCl2/FeCl3, agitar, observar a mudança de
foi utilizada nos testes para substâncias fenólicas
coloração e comparar os resultados obtidos.
(Figura 3). A detecção de fenóis foi realizada com
algumas
gotas
da
solução
aquosa
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
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Sebastião F. Fonseca, Karina S. Souza e Maria Cristina Santos
soluções (cerca de 1 mL) das substâncias 1, 2, 3, 4 e 5 (4-5 gotas ou meio comprimido), dissolvidas em etanol ou etanol-acetona (1:1) comerciais, e adição de 1-3 gotas da solução aquosa de FeCl2/FeCl3. A coloração azul-violeta característica de complexos de íons FeI2+/Fe3+ com fenóis (Figura 4) foi bem visualizada para o ácido salicílico (1), o eugenol (2) e a vanilina (3), mas não foi
Figura 2. Reação da esponja de lã de aço com HCl.
tão evidente para o salicilato de metila (4) e não houve mudança significativa com o paracetamol (5). É provável que a presença de grupos substituintes como –COOCH3 e –NHCOCH3 interfira na complexação do grupo hidroxila fenólico com os íons de ferro.
}
CONSIDERAÇÕES FINAIS O reagente FeCl2/FeCl3 foi preparado facilmente pela reação da esponja de lã de aço para lim-
Figura 3. Filtração da solução de FeCl2/FeCl3.
peza com ácido muriático (HCl comercial), com posterior neutralização da solução resultante. As substâncias testadas que apresentaram resultados mais evidentes foram ácido salicílico (1), eugenol (2) e vanilina (3). Os outros grupos funcionais presentes no salicilato de metila (4) e no paracetamol (5) parecem interferir na complexação do grupo hidroxila fenólico com os íons de ferro. Além da caracterização de substâncias que apresentam grupo hidroxila fenólico, o experimento permite abordagens sobre reações de metais com ácidos
Figura 4. Resultados das reações dos fenóis com a solução de FeCl2/FeCl3.
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minerais e conceitos relacionados, e pode ser realizado em um período normal de aula.
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Caracterizando Fenóis com um Reagente Preparado com Esponja de Lã de Aço para Limpeza e Ácido Muriático
} REFERÊNCIAS [1] FONSECA, S. F.; GONÇALVES, C. C. S. Revista Brasileira de Ensino de Química, v. 1, n. 1, p. 9-12, 2006. [2] FONSECA, S. F.; GONÇALVES, C. C. S. Química Nova na Escola, n. 20, p. 55-58, 2004.
[5] MANO, E. B.; SEABRA A. Práticas de Química Orgânica, 3. ed., Edgard Blucher Ltda., São Paulo, 1987, p. 101-102. [6] VOGEL, A. I. Química Orgânica – análise orgânica qualitativa, Edgard Blucher Ltda., São Paulo, 1971, v. 3, 1128-1129.
[3] HESS, S.; Experimentos de Química com materiais domésticos, Editora Moderna, São Paulo, 1997. [4] MAHAN, B. H. Química - um curso universitário, Edgard Blucher Ltda., São Paulo, 1970, p. 522-526.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Recebido em: 17 dez. 2008 Aceito em: 20 fev. 2009
13
A VISCOSIDADE REVISITADA E EXEMPLOS DIDÁTICOS DE FLUIDOS VISCOSOS Jacqueline A. Marques Universidade Estadual de Ponta Grossa, Departamento de Química Débora Gonçalves Universidade de São Paulo, Instituto de Física de São Carlos E-mail: gdebora@if.sc.usp.br
Aos Prof. G.F. Leal Ferreira (IFSC-USP) e Prof. J. Procópio (ICB-USP) pelas sugestões e leitura atenta do manuscrito em uma das suas primeiras versões.
RESUMO O tema viscosidade, por sua relevância em diferentes áreas do conhecimento, é estudado em disciplinas básicas de graduação em Ciências Exatas e Biológicas. No tratamento do assunto, os livros didáticos de Química Geral pecam pela superficialidade, e a viscosidade só é apresentada com mais detalhes em livros de Físico-Química, usualmente em capítulos sobre macromoléculas em solução. Os de Física Básica, por sua vez, abordam o tema com certo detalhamento teórico, porém, não incluem exemplos de fluidos viscosos que possam despertar o interesse dos alunos. Todo o detalhamento necessário é encontrado em livros de Mecânica e Dinâmica dos Fluidos, no entanto, dentro de disciplinas básicas (e em somente algumas aulas), é clara a dificuldade de se ter uma visão mais geral sobre a viscosidade. Além disso, os livros didáticos trazem poucos exemplos de fluidos viscosos e não descrevem como funcionam os principais equipamentos de medição de viscosidade. Assim, neste artigo, propomos revisar os princípios teóricos sobre o tema viscosidade e a sua medição, discutir exemplos de fluidos viscosos para, desta forma, auxiliar os professores de Físico-Química, Física Básica e disciplinas afins a enriquecerem suas aulas. Palavras-chave. Viscosidade; fluidos Newtonianos; fluidos viscosos. ABSTRACT THE VISCOSITY REVISITED AND DIDACTIC EXAMPLES OF
VISCOUS FLUIDS The viscosity theme, for its relevancy in different knowledge areas, is studied in graduate discipline in Exact and Biological Sciences. In the subject’s treatment, General Chemistry textbooks err at superficiality, and viscosity is introduced in detail in books about Physics-Chemistry, usually in chapters about macromolecules in solution. Basic Physics books approach the subject with a detailed theoretical; however they do not include examples of viscous fluids that may arouse the student’s
interest. All the needed details are found in books about mechanics and dynamics of fluids, however, essentially in basic disciplines (and only in a few classes), it is evident the difficult of obtaining a general overview about viscosity. Moreover, the textbooks give a few examples of viscous fluid and do not describe how the main equipments for the measurement of viscosity really work. Therefore, in this article, we suggest to review the theoretical principles about viscosity theme and its measurement, to discuss examples of viscous fluid to help teachers of Physics-Chemistry, Basic Physics and related disciplines to enrich their classes Key-words. Viscosity; Newtonian fluid; viscous fluid.
}
A VISCOSIDADE
Para um fluido em escoamento, a tensão de
Na representação tradicional o fluido, está
cisalhamento, s, está relacionada à taxa de
posicionado entre duas placas planas paralelas de
variação da velocidade do fluido (velocidade
áreas (A) iguais e a uma distância y[1]. Na Figura
de cisalhamento) (ou deformação), g&, pelo
1a, observa-se uma força tangencial constante, F,
coeficiente de viscosidade, h[3]:
aplicada sobre a placa superior (a) e que promove o movimento uniforme da camada do fluido,
dv F = s = h = x = hg& A dy
(1)
aderida à placa, a uma velocidade inicial de escoamento, v0. Devido ao atrito interno entre as
A equação acima é a Lei de Newton para o
camadas adjacentes do fluido, a sua velocidade
escoamento viscoso4 e h é a viscosidade dinâ-
de escoamento diminui gradualmente até ser zero
mica (absoluta) do fluido, dada em N s m-2 (Pa s),
(velocidade nula) na placa inferior (b), mantida fixa. A força aplicada à placa superior por unidade de área, s = F/A, é proporcional ao ângulo de cisalhamento, g = Dx/y, definido na Figura 1a. Essa força provoca os deslocamentos das camadas do fluido na direção x em um tempo dt
16
ou em Poise e, usualmente, centiPoise (cP) (1 cP = 10-3 Pa s). Na prática, a viscosidade cinemática (n) é a grandeza mais utilizada, estando ela relacionada à viscosidade absoluta e à densidade do fluido5 por n = h/r, dada em Stokes (St) e, usualmente, centiStokes (cSt) (1 St = 1 cm2 s-1). A vis-
e que se refletem na variação transversal da
cosidade específica, hsp, é definida para soluções
velocidade, ou seja, na formação de um perfil
estando relacionada à viscosidade absoluta
de velocidade. Em outras palavras, a tensão de
(intrínseca) e à viscosidade do solvente puro: ho,
cisalhamento, s, é diretamente proporcional à
hsp = (h-ho)/ho. A viscosidade relativa, hr, é a
velocidade adquirida e inversamente propor-
razão entre a viscosidade intrínseca e a viscosi-
cional à distância entre as placas[2].
dade do solvente, hr = h/ho.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos
a) x
a
F
que se diferencia do escoamento turbulento pelo número de Reynolds6, NR, que está relacionado ao raio do capilar, velocidade média, densidade (r) e viscosidade média do fluido
y
(NR = 2Rrv/h). Partindo de um regime turbu-
y x
lento, os experimentos de Reynolds mostraram que o escoamento se tornava laminar quando
b t=t+dt
t
NR < 2000.
b)
Na Figura 1b, observa-se um cilindro de raio A R
L r
B
R, seções transversais A e B e pressões de entrada P1 e de saída P2 (P1 > P2). A força aplicada sobre o
n
P1
P2 dx
fluido no cilindro de raio r é pr2(P1-P2) que, pela Lei de Conservação de Massa, é compensada pela tensão de cisalhamento devido ao gradiente de
Representação de um fluido viscoso: a) entre duas placas planas paralelas; b) escoando em um cilindro de raio R. Figura 1.
velocidade em cada seção: pr2(P1-P2) = s2prL, onde L é o comprimento do cilindro entre A e B. Seguindo o que foi apresentado na Equação 1, s = hdv/dr, podemos reescrever esta equação
}
ESCOAMENTO VISCOSO Se a deformação de um fluido for homogê-
como: ( P - P2 ) dn s = =- 1 r dr h 2Lh
(2)
nea, conforme descrito na Figura 1a, o perfil de velocidades é observado da placa superior,
Ou seja, dv = - f(s) dr com sinal negativo, já que v
móvel, até a placa inferior, fixa. Em se tratando
decresce para r crescente. O perfil de velocidade
de um fluido escoando em um tubo cilíndrico,
pode ser obtido após a integração de r a R:
ou um capilar, a velocidade de escoamento irá variar com a distância das paredes, atingirá um
n=
( P1 - P2 ) 2 (R - r 2 ) 4Lh
(3)
valor máximo na região central e será praticamente zero nas paredes do tubo, onde o fluido está em contato (Figura 1b).
Assim, tendo a velocidade de escoamento do fluido no capilar, podemos obter a vazão do
Para haver escoamento do fluido neste
fluido, Q, em cada seção, sem que seja neces-
tubo, deve ser exercida uma força na direção do
sário assumir a natureza do fluido laminar
escoamento, o que provoca a formação de um
(Newtoniano ou não-Newtoniano, que defini-
gradiente de pressão, dP, então necessário para
remos a posteriori). Como Q = Au e A = 2prdr,
vencer o atrito interno das camadas adjacentes
é possível se obter a contribuição dQ e, poste-
do fluido. Este tipo de escoamento é laminar,
riormente, Q, integrando entre r = 0 e r = R:
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
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Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves
Q=
pR 4 ( P1 - P2 ) 8hL
(4)
que apresentam vantagens e desvantagens de acordo com o tipo de fluido em análise. Os métodos de medidas de viscosidade são os mais
A Equação 4 é chamada Hagen-Poiseuille, não é válida para fluidos turbulentos e que pode também ser expressa pela diferença de pressão de entrada e saída no fluido no capilar, P1 – P2, DP:
variados e, hoje, há um número considerável de viscosímetros comerciais com preços acessíveis. Um dos viscosímetros capilares mais conhecidos e simples é o denominado de Ostwald. Outros viscosímetros também se baseiam no
DP =
8hLQ pR 4
(5)
princípio de escoamento laminar de um fluido em um capilar, tais como os de Cannon-Fenske e de Ubberlohde[7-8], conforme Figura 2. Esses visco-
Conforme se verifica na Equação 5, a queda de pressão de um fluido em um capilar é diretamente proporcional à viscosidade e inversamente proporcional à quarta potência do raio do capilar. Nesse caso, o regime de escoamento é laminar e escoa na parte central do capilar,
símetros contêm, basicamente, duas partes, A e B; a parte A, mais estreita, apresenta um ou dois bulbos com traços de referência, a e b, e se comunica com um capilar, c. De acordo com a viscosidade do fluido, podem ser utilizados tubos e capilares com diferentes diâmetros.
independentemente da velocidade do fluido. Como veremos adiante, esta equação é muito importante, por exemplo, na explicação do mecanismo de bombeamento de sangue pelo coração e na determinação da viscosidade em viscosímetros capilares.
}
ALGUNS TIPOS DE EQUIPAMENTOS As medidas de viscosidade podem ser realizadas basicamente por meio de três tipos de viscosímetro: i) capilar: permite a medida da
Figura 2. Exemplos de viscosímetros capilares.
resistência ao fluxo de um fluido em um capilar; ii) rotacional: baseia-se na rotação de uma parte
18
(ou duas) (tais como de cilindros concêntricos ou
Nos viscosímetros capilares, o fluxo é pro-
palhetas) imersa em um fluido viscoso; iii) de
duzido por uma diferença de pressão, sendo
esfera: permite calcular o tempo de retenção de
medido o tempo, t, necessário para certo
uma esfera em um fluido viscoso.
volume de um fluido, entre a e b, escoar através
Aqui, serão apresentados alguns desses
de um capilar de comprimento L e raio R. De
equipamentos, que não são, obviamente, únicos e
acordo com a equação apresentada anteriorREVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos
mente, (4), e reescrita usando V/t = QV, temos a
onde r = densidade da solução, ro = densidade do
vazão volumétrica do fluido no capilar:
solvente puro, t = tempo medido usando a solução
QV =
e t0 = tempo medido usando o solvente puro. Para
V pR 4 DP = t 8hL
(6)
soluções diluídas, podemos assumir r = ro , o que origina hr = t/t0 Neste caso, a relação entre a visco-
A diferença de pressão nas extremidades do capilar pode ser obtida pela diferença nas alturas
sidade específica, hsp, e a viscosidade relativa, hr será dada por[7]:
dos níveis, h, conforme Figura 3, já que o escoamento sofre a influência da aceleração da gra-
hsp = hr - 1 =
vidade e, portanto, depende da densidade do
(t - t0 ) t0
(7)
fluido, r. Como a equação de Hagen-Poisseuille
O viscosímetro de Ostwald funciona bem
é válida somente para um escoamento laminar, a
para fluidos Newtonianos sob um mesmo
viscosidade cinemática (em Stokes) do fluido,
volume do fluido, desde que não haja um desni-
h, será proporcional à densidade do fluido, r, e
velamento considerável do viscosímetro entre
ao tempo de escoamento do fluido, t.
uma medida e outra. O problema do desnivelamento é superado ao se utilizar o viscosímetro
plástico (Casson)
de Cannon-Fanske, já que, neste caso, o centro
plástico (Bingham)
das duas partes fica em uma mesma posição,
reo-fluidificante (pseudoplástico) Newtoniano
mesmo sob uma leve inclinação do viscosímetro. Porém, de forma similar ao viscosímetro de Ostwald, há a necessidade de um volume constante de fluido. Essa limitação é sanada pelo uso do viscosímetro de Ubberlohde, já que ele apre-
reo-espessante (dilatante)
senta um terceiro braço, permitindo a sua operação independentemente do volume de fluido adicionando ao viscosímetro. Assim, para este
Figura 3. Variação da tensão de cisalhamento com a deformação de cisalhamento para diferentes tipos de fluidos.
último equipamento, é possível fazer diluições da solução dentro do próprio viscosímetro. O viscosímetro de queda de esfera (Hoppler)
Para se determinar a viscosidade de uma solu-
se baseia em medidas do tempo de retenção de
ção diluída com um viscosímetro capilar, devem
uma esfera imersa em um fluido viscoso[4,6].
ser feitas medidas dos tempos de escoamento da
Após considerar as forças que atuam sobre esta
solução e do solvente puro. Conforme apresenta-
esfera em escoamento (gravitacional, de arraste, e
mos anteriormente, a viscosidade relativa é dada
de impulsão), obtém-se, em um intervalo de
pela razão entre a viscosidade intrínseca e a visco-
tempo Dt, a relação:
sidade do solvente, hr = h/ho, ou seja, hr = r.t/ro.to, REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
h = k ( r 1 - r 2 ) Dt
(8),
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Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves
sendo k = uma constante que depende do equipamento, e r2 e r1, as densidades da esfera e do
Para um cilindro de comprimento L, o torque aplicado ao rotor, M, dado em N m, será:
fluido, respectivamente.
M = 2pR 2 Ls( r )
(10)
Um outro tipo de viscosímetro muito utilizado para a análise de fluidos Newtonianos e
Combinando essas duas equações, temos:
[9]
não-Newtonianos é o rotacional . Neste caso, M = 2pR 3 Lh
uma parte do viscosímetro gira em relação à outra
dW dR
(11)
e provoca o cisalhamento no fluido. A viscosidade é medida em função do torque fornecido à
Após a integração da Equação 11, obtemos
parte móvel para se atingir determinada veloci-
a velo ci dade angu lar, W, para W = 0 quando
dade angular do fluido. Diferenças nas taxas de
R = Ri e W = We quando R = Re:
cisalhamento caracterizam diferentes tipos existentes de viscosímetros rotacionais, tais como os
We =
de cilindros concêntricos, placas, cone e placa, ou ainda, discos paralelos.
M Re 3 R dr 2pLh òRi
(12),
ou em termos da viscosidade:
Podemos considerar o princípio de funcionamento do viscosímetro de Couette[4,6,10], que
h=
consiste em dois cilindros concêntricos; o cilin-
M æ 1 1 ö ç 2 - 2÷ ç 4pLW e è R i R e ÷ø
(13)
dro externo gira a uma velocidade angular do rotor, W, dada em rpm ou rad s-1. A rotação
O uso da Equação 13 permite que seja obtida
desse cilindro provoca o escoamento laminar
a viscosidade a partir dos parâmetros torque, velo-
do fluido posicionado entre o cilindro externo
cidade angular e dos valores do comprimento e
de raio Re e o cilindro interno, fixo, de raio Ri.
raios dos cilindros interno e externo. Em outras
Um gradiente de velocidade angular é, então,
palavras, a viscosidade pode ser reescrita em ter-
observado nas camadas cilíndricas do fluido de
mos de uma constante, relacionada às característi-
raio R, dW/dR, já que a camada adjacente ao
cas do equipamento de medida:
cilindro interior está estacionária e a camada do
h= k
fluido adjacente ao cilindro exterior gira a uma
M We
(14),
velocidade angular, We. Em se tratando de um fluido Newtoniano
A tensão de cisalhamento, s, e a velocidade
preenchendo o espaço entre os cilindros, é
de cisalhamento, g&, estão também relacionadas a
válida a Lei de Newton, apresentada previamente (equação 1), onde s = hg&, sendo a tensão
duas outras constantes: g& = k ' W e s = k '' M . No
de cisalhamento, s, a uma distância radial R,
cisalhamento, s, deve ser analisada por métodos
expressa como:
matemáticos, já que a relação entre tensão de s( R ) = hR
20
dW dR
(9)
caso de fluidos não-Newtonianos, a tensão de
cisalhamento e a velocidade de cisalhamento não é linear[6]. REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos
}
TIPOS DE FLUIDOS Viscoelásticos Os sólidos também podem apresentar atrito interno, que se manifesta por meio de movimentos lentos, resultantes das tensões internas. Em se tratando de um sólido com características fluidas, e sujeito a uma tensão de cisalhamento, o ângulo de cisalhamento irá aumentar lentamente em um comportamento similar ao de um fluido (líquido) viscoso. A deformação será instantânea em um sólido, e progressiva em um fluido. Os fluidos denominados viscoelásticos apresentam propriedades viscosas (de líquidos) e elásticas (de sólidos); nestes, a deformação é uma função do tempo e
Newtonianos Os fluidos Newtonianos apresentam uma única viscosidade a uma dada temperatura, independentemente da tensão de cisalhamento. Porém, a maioria dos fluidos apresenta um comportamento reológico mais complexo, dependente do tempo e ou da elasticidade, e a determinação da viscosidade para estes materiais não é, portanto, trivial[4-6]. Um fluido Newtoniano, ideal, pode não apresentar uma característica elástica inerente ou uma estrutura de gel, como também não possuir uma viscosidade considerada alta[1], caso da água ou do óleo, que ao serem submetidos a uma tensão constante escoam enquanto uma tensão for aplicada.
apresenta duas contribuições, a viscosa e a elástica[3]. A relação entre estas duas contribuições,
Não-Newtonianos
a dada temperatura, depende da força aplicada
A grande maioria dos fluidos tem um com-
e do tempo da deformação. Aqui, o fluido será
portamento não-Newtoniano, com valores de vis-
tratado como viscoso quando ele fluir (como o
cosidade não constantes com a velocidade de
óleo lubrificante) e viscoelástico, quando a sua
cisalhamento e que dependem, ou não, do tempo.
textura sólida predominar (como a gelatina).
Os fluidos não-Newtonianos independentes do
Um exemplo clássico de um fluido viscoe-
tempo[7-9] são classificados como reo-fluidifican-
lástico é o piche: durante o seu escoamento, a
tes (pseudoplásticos), reo-espessantes (dilatantes)
sua viscosidade aumenta, porém, devido às suas
e plásticos (Birgham e Casson)2. Na Figura 3 é
características de sólido, pode-se provocar a sua
apresentada como varia a tensão de cisalhamento,
ruptura com um bastão de vidro. Em alguns
s, em função da velocidade de cisalhamento, g&,
materiais de cadeias longas, observa-se um efeito denominado recolhimento elástico – uma parte rompida se move para cima e a outra, para baixo[3]. O Número de Deborah, adimensional, De, dado por De = l/t, sendo l = tempo de relaxação característico do material e t = tempo de fluxo (velocidade de deformação) é quem diferencia um material fluido (baixos valores de De) de um sólido (altos valores de De). REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
para estes diferentes tipos de fluidos. Os principais modelos que representam os fluidos plásticos são os denominados Bingham e Casson, para os quais a tensão de cisalhamento varia com a deformação de cisalhamento a partir de uma tensão inicial de escoamento, s0, também chamada de tensão de inércia (ver Figura 3). Nesses fluidos, o escoamento ocorre
21
Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves
desde que seja atingido certo valor de s0, e a
Tabela 1. Classificação de alguns fluidos viscosos. Fluido
viscosidade é denominada plástica (s - s0 = h0 1/2
g&, Bingham, s
- s0
1/2
= h0
1/2
1/2
g& , Casson).
A viscosidade dos fluidos pseudoplásticos e dilatantes obedece à Lei de Potência (modelo de escoamento de Ostwald-de Waele), sendo k, o índice de consistência; n, o índice de escoamento e h, a viscosidade absoluta: s = kg&
n
s h = kg& n -1 g&
(15)
Classificação
Água, leite, ar, hidrogênio, mercúrio, óleo lubrificante.
Newtoniano.
Amido de milho em água, argila, ingredientes de bala, lama.
Dilatante.
Chocolate, papel, tinta à base de água.
Pseudoplástico.
Ketchup, vidros.
Plástico.
Leite condensado, mel, tinta a óleo.
Tixotrópico.
Maionese, margarina.
Pseudoplástico/tixotrópico.
Clara de ovo batida, dispersão de polímeros, géis, gelatina, manteiga batida, musse, nata, pasta de dentes, pasta de amendoim.
Viscoelástico.
Os valores de k e n dependem da natureza do fluido; enquanto maiores valores de k indicam menor fluidez, o parâmetro n indica quão distante está o fluido não-Newtoniano do Newtoniano (n = 1 para fluido Newtoniano). No caso de fluidos pseudoplásticos, n < 1, e
EXEMPLOS COTIDIANOS DE FLUIDOS VISCOSOS
dilatantes, n > 1, e ambos os fluidos podem ser
Em nossa vida cotidiana, há um número
representados por um gráfico linear log s vs log
variado de fluidos viscosos; podemos considerar
g& quando se obtém log k e n, sendo log k = log s
inicialmente três exemplos: quando se pretende
para log g&= 0, e n = coeficiente angular.
obter efeitos texturizados em paredes, as tintas
No caso dos fluidos dilatantes, a viscosi-
devem ter uma alta viscosidade; para uma aplica-
dade aumenta proporcionalmente com a velo-
ção mais usual, uma baixa viscosidade, já que só
cidade de cisalhamento, independente do
assim a pintura se torna viável por meio de equi-
tempo, sendo este tipo de comportamento
pamentos apropriados. Enquanto a maioria dos
[12]
.
solventes comuns tem uma viscosidade despre-
É comum em materiais com altos níveis de
zível, as resinas possuem uma elevada vis-
desfloculantes, tais como argilas, lama, amido
cosidade. Nas indústrias, é crucial se ter um
de milho em água, ingrediente de balas etc.
conhecimento a respeito da viscosidade de maté-
mais raro do que o da pseudoplasticidade
Os fluidos não-Newtonianos dependentes
rias-primas e produtos, determinar a funcionali-
do tempo são classificados como tixotrópicos
dade de ingredientes no desenvolvimento de um
(fluidificantes) e reopéticos (espessantes), nos
produto, avaliar a qualidade, textura etc., de pro-
quais a viscosidade aparente decresce ou aumenta
dutos finais e intermediários, e controlar a quali-
linearmente com o tempo, respectivamente.
dade e a vida útil de um produto na prateleira.
Na Tabela 1, observa-se a classificação de alguns fluidos em função da viscosidade.
22
}
Em sala de aula, podem enumerados exemplos interessantes de fluidos viscosos: REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos
Alimentos
mento, s0, percebida ao se forçar o
• Leite – o leite fresco, como uma emul-
ketchup a sair de um frasco[6].
são de gordura em água, é um exemplo
• Chocolate – exemplo de fluido pseudo-
clássico de fluido Newtoniano. A visco-
plástico, com escoamento complexo e
sidade do leite depende do seu processa-
comportamento reológico variável; sob
mento industrial; ela diminui quando
a aplicação de uma tensão inicial de
comparados os leites integral e desna-
escoamento, s0, comporta-se como um
tado devido às diferenças nas quantida-
plástico de Bingham. Contudo, com o
[13]
des de proteínas e lipídeos
passar do tempo, torna-se mais fluido,
.
• Omega 3 – os ácidos graxos poliinsa-
perdendo esta classificação. Para a des-
turados Ômega-3, encontrados em peixes,
crição das propriedades reológicas do
têm sido adicionados ao leite e a outros
chocolate, a indústria utiliza uma versão
alimentos como um ingrediente fun-
do modelo de Casson antes das etapas
cional. Dentre os seus vários efeitos
finais de processamento por ser este o
positivos, um deles é o de diminuir a
que melhor representa a continuidade
viscosidade do sangue e a agregação de
do escoamento[15]. O mesmo modelo é
plaquetas[14].
utilizado em purês de tomate, com os
• Margarina e maionese – exemplos de
quais se verifica se a consistência dos
fluidos não-Newtonianos pseudoplás-
purês difere de acordo com os métodos
ticos e tixotrópicos, com alta consistên-
de produção e a variedade e maturidade
cia,
dos tomates[16].
rico
conteúdo
em
óleos
e
viscosidade que diminui com o aumento
• Natas, claras de ovos batidas, manteiga
da força externa aplicada, levando ao
batida, musses e gelatina em água fria
alinhamento das moléculas e à diminui-
– exemplos comuns de fluidos viscoe-
ção do atrito viscoso. Na ausência da
lásticos.
força externa, que pode provir de uma
• Na indústria de alimentos, o desenvolvi-
faca, a viscosidade volta ao valor origi-
mento de novos produtos requer a utili-
nal. O mel e o leite condensado, devido
zação de ingredientes funcionais, sendo
à presença de proteínas, têm a mesma
a análise da viscoelasticidade quem
natureza tixotrópica.
definirá a função dos espessantes, gelei-
• Ketchup – exemplo de fluido plástico
ficantes, emulsificantes, ou ainda, o
Bingham, cujo escoamento é rápido
controle da sinerese (exsudação espon-
após superada a tensão inicial de escoa-
tânea)[17].
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
23
Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves
Lubrificantes A presença de um óleo lubrificante em
A formulação de um medicamento, entre
peças mecânicas se justifica em parte pela
outros fatores, determina a sua via de admi-
necessidade de reduzir o atrito entre as partes
nistração injetável. Medicamentos mais vis-
móveis. Para manter uma peça lubrificada, o
cosos (como as soluções oleosas) devem ser
óleo, na forma de um filme, deve suportar o
injetados no organismo principalmente por
peso das peças móveis de tal forma a haver,
via intramuscular, sendo estas injeções dolo-
após a expulsão do excesso de óleo para as late-
rosas[19]. Para tanto, de acordo com a viscosi-
rais, uma distância suficiente entre as partes[17].
dade e a concentração do medicamento,
Esta característica deve-se à própria pressão
devem ser usadas agu lhas e seringas com
interna no fluido e depende da viscosidade,
calibres e comprimentos adequados. Intuiti-
densidade do fluido e velocidade das partes
vamente sabemos que a pressão a ser exercida
[18]
móveis
24
Medicamentos e sangue
. Obviamente, a viscosidade depende
no êmbolo de uma seringa depende também
da temperatura – peças mecânicas lubrificadas
da viscosidade do medicamento, assim como
e aquecidas se movem com mais facilidade
a velocidade de absorção e a tolerância medi-
exatamente devido à menor viscosidade do
camentosa também estão relacionadas à flui-
lubrificante.
dez medicamentosa.
A dependência entre a viscosidade de
Um outro tema de interesse (e complexo) é
óleos lubrificantes e a temperatura é reduzida
a dinâmica do sangue em sistemas cardiovascu-
com o uso de aditivos. Os testes de ponto de
lares (artérias, capilares e veias). O sangue é
mínima fluidez indicam os menores valores de
uma suspensão contendo cerca de 55% de parte
temperatura nos quais ainda ocorre o escoa-
líquida, o plasma (91,5% de água, 7% de prote-
mento dos óleos lubrificantes. Estes experi-
ínas e o restante de outros solutos) e 45% de
mentos possibilitam a classificação dos óleos
parte sólida (glóbulos vermelhos e brancos, e
em grau inverno ou verão, sendo os primeiros
plaquetas)[20,21]. A viscosidade do sangue é
utilizados em baixas temperaturas sem haver
maior do que a da água (cerca de 3,5 vezes) e
congelamento.
depende de particularidades do próprio sangue,
Especificamente para as graxas, que são
geometria e diâmetro dos tubos por onde ele
lubrificantes pastosos (emulsões de óleos e
escoa. Também amplia a complexidade da
espessantes), há a necessidade de uma tensão
questão, o fato de os vasos sanguíneos não
inicial de escoamento, s0, já que diante de bai-
apresentarem formas geométricas cilíndricas
xas tensões de cisalhamento, elas se portam
ideais. Além disto, o regime de escoamento
como sólidos e não escoam. Assim, as graxas se
sanguíneo deixa de ser laminar para ser turbu-
assemelham aos óleos lubrificantes sob altos
lento em caso de obstruções ou variações de
valores de tensão de cisalhamento.
fluxo em vasos com superfícies rugosas.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
A Viscosidade Revisitada e Exemplos Didáticos de Fluidos Viscosos
A viscosidade do sangue depende da vis-
mínimo do capilar no qual ocorre a diminuição
cosidade do plasma (que é cerca de duas vezes
da viscosidade aparente do sangue é de cerca 7
a da água pela presença de proteínas), grau de
mm, conforme resultados in vitro e in vivo, res-
agregação e sedimentação das células, grau de
pectivamente[24]. Vale também mencionar que a
deformidade dos leucócitos, porcentagem de
obtenção da viscosidade do sangue in vivo é
hemácias, e geometria e diâmetros dos tubos e
extremamente difícil. Um dos métodos usados
[22]
capilares
. Em particular, ela aumenta com o
para tal é medir a queda de pressão em um seg-
aumento da porcentagem de glóbulos verme-
mento do tubo, o volume de sangue que por ali
lhos no sangue; e a este aumento está relacio-
estiver escoando, ocomprimento e diâmetro
nado o maior atrito interno que as camadas
interno deste tubo, para, em seguida, calcular a
laminares do sangue, com um maior número de
resistência ao escoamento[24].
células, experimentam, e a uma maior pressão,
A equação de Hagen-Poiseiuille é aplicada
então necessária para permitir o escoamento
ao mecanismo de bombeamento do sangue pelo
sanguíneo. Um exemplo deste efeito é o
coração em sistemas cardiovasculares. O fluxo
aumento da viscosidade do sangue em lugares a
sanguíneo depende da pressão sanguínea
altas altitudes[23]. Nestes locais, a quantidade de
(diferença de pressão, DP) e da resistência ao
glóbulos vermelhos no sangue aumenta para
escoamento que, por sua vez, dependem da vis-
compensar a diminuição da pressão atmosfé-
cosidade do sangue, geometria e morfologia
rica e, portanto, a menor quantidade de oxigê-
dos tubos e capilares. O escoamento turbulento
nio no sangue. Um outro exemplo é a anemia,
aumenta no caso de haver estreitamento dos
que está associada à deficiência de glóbulos
vasos, como em capilares, ou pela presença de
vermelhos no sangue, levando, portanto, a uma
placas ateroscleróticas nas paredes; esta ten-
diminuição da viscosidade sanguínea.
dência à turbulência é prevista pelo número de
Na área de Biofísica, um efeito conhecido como Fahraeus-Lindqvist, e originalmente des-
Reynolds, que como mostrado anteriormente, é inversamente proporcional à viscosidade.
crito em 1931, descreve a dependência entre a
O som do escoamento turbulento, ou da
viscosidade e o diâmetro dos tubos e capilares
vibração provocada por ele, é aquele ouvido por
sanguíneos. A viscosidade do sangue diminui a
um estetoscópio, seja no caso da compressão das
partir de determinado valor crítico de diâmetro
artérias pela placa do estetoscópio, que provoca o
do capilar já que o alinhamento dos glóbulos
aumento da velocidade do sangue e, portanto, da
vermelhos em dutos estreitos provoca a diminui-
turbulência, seja nos chamados sopros san-
ção do atrito interno, ou seja, da viscosidade do
guíneos, quando a turbulência do sangue está
sangue, então denominada “aparente” para dife-
associada ao estreitamento nas válvulas com
renciá-la da viscosidade do plasma. O diâmetro
patologias cardíacas.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
25
Jacqueline A. Marques e Débora Gonçalves
}
CONSIDERAÇÕES FINAIS O tema viscosidade pode ser abordado em sala de aula com uma maior profundidade do que a normalmente encontrada em livros didáticos de Química e Física, além de poder ser exemplificado com muitos dos fluidos viscosos encontrados em nossa vida cotidiana. De alguma forma, os exemplos aqui apresentados tem uma complexidade de comportamento reo-
[7] COLLINS, E. A.; BAREŠ, J.; BILLMEYER JR., F. W. Experiments in Polymer Science, John Wiley & Sons, 1973. [8] BRAUN, D.; CHERDRON, H.; KERN, W. Practical Macromolecular Organic Chemistry, Harwood Academic Pub., 1984. [9] HARADA, M. Rotating viscosimeter, US Patent, 4, 878, 378, nov. 7, 1989. [10] OGSTON, A. G.; STAINER, J. E., Biochem. J. 1953, 53, 4. [11] TANNER, R. I. Engineering Rheology. 2. ed. Oxford Engineerign Science Series, 2000.
dos na bibliografia selecionada e em literatura
[12] LEWIS, M. J. Physical Properties of Dairy Products, Robinson, R. K. Modern Dairy Technology, Cap. 5, Vol. 2, 1994.
específica. Para medidas didáticas em laborató-
[13] SILVA, P. H. F. Química Nova na Escola, 1997, 6, 2.
rio, podem ser utilizados óleos lubrificantes,
[14] UAUY, R.; VALENZUELA, A. Nutrition, 2000, 16, 680.
óleos de cozinha (antes e após frituras), leite e
[15] BECKETT, S. T. The Science of Chocolate, Royal Society Chemistry, 2000.
lógico. Maiores detalhes podem ser encontra-
soluções poliméricas, já que para estes, há relativamente vasta bibliografia com valores tabelados de viscosidade.
[16] RAO, M. A. J. Texture Studies, 1977, 8, 135. [17] BOBBIO, P. A.; BOBBIO, F. O. Química do Processamento de Alimentos. 3. ed., Livraria Varela, 2001. [18] STANLEY, R. C. Phys. Education, 1972, 7, 193.
}
REREFÊNCIAS [1] NUSSENZVEIG, H. M. Curso de Física Básica – Fluidos, oscilações e ondas, calor. 3. ed. Ed. Edgard Blücher, 1983. [2] STREETER, V. L.; WYLIE, E. B. Mecânica dos Fluidos. 7. ed. McGraw-Hill, 1982.
[19] FLORENCE, A. T.; ATTWOOD, D. Princípios Físico-Químicos em Farmácia, EDUSP, 2003. [20] SOLOMON, E. P. et al. Biology, Sauders College Pub., 1993. [21] BRUM, G.; MCKANE, L.; KARP, G. Biology: exploring life, John Wiley, 1993. [22] REINHART, W. H. Biorheology, 2001, 38, 203.
[3] VIEIRA, R. C. C. Atlas de Mecânica dos Fluidos, Ed. Edgard Blücher, 1971.
[23] KAMETAS, N. A. et al. BJOG: An International Journal of Obstetrics & Gynaecology, 2002, 109, 930.
[4] FOX, R. W.; MCDONALD, A. T. Introdução à Mecânica dos Fluidos. 5. ed. LTC Editora, 2001.
[24] PRIES, A. R.; SECOMB, T. W.; GAEHTGENS, P. Cardiovascular Research, 1996, 32, 654.
[5] PAO, R. H. F. Fluid Dynamics, Charles E. Merrill Books, Inc., Columbus Ohio, 1967. [6] MACOSKO, C. W. Rheology – Principles, measurements, and applications, VCH, 1994.
26
Recebido em: 23 abr. 2008 Aceito em: 26 fev. 2009
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
PANORAMA DA PESQUISA EM ENSINO DE QUÍMICA NO BRASIL Wilsilene dos Santos Oliveira José Machado Moita Neto Nilson Fonseca Miranda Universidade Federal do Piauí – UFPI
RESUMO O Ensino de Química no Brasil aparece, hoje, como uma área de pesquisa que tem despertado grande interesse de pesquisadores que buscam compreendê-la como área interconexa com as demais áreas tradicionais da Química, porém, com identidade própria. Os cursos de licenciatura em Química, ao modificarem seu projeto, que visa preparar os profissionais em educação química, propiciam uma reflexão mais ampla sobre o processo ensino-aprendizagem, com o consequente aumento de pesquisas na área. Neste trabalho, apresentaremos um panorama sobre a Pesquisa em Ensino de Química no Brasil. Palavras-chave. Ensino de química; pesquisa em ensino; grupos de pesquisa; licenciatura em química. ABSTRACT
OVERVIEW OF RESEARCH IN CHEMISTRY EDUCATION IN BRAZIL. In our days the chemistry education in Brazil appears as a research area that has attracted great interest of researchers seeking to understand it as an interrelated area with other traditional areas of chemistry, but with its own identity. The Chemistry Graduate Courses modifying their projects to prepare the education professionals, provide a broader reflection on the teaching-learning process, with the consequent increase in the research on this area. This paper presents an overview on the Research in chemistry education in Brazil. Key-words. Chemistry education; research in education; research groups; Chemistry graduate courses.
}
INTRODUÇÃO A área de concentração, ou a linha de pes-
Lutfi[2]. Ressaltam-se também as atribuições
quisa “Ensino de Química” tem sido objeto de
relativas às tecnologias digitais que colaboram
reflexão e crítica de pesquisadores que expres-
com a diversificação didática no ensino de
sam, em seus trabalhos, um novo olhar acerca
Química no Brasil.
da prática pedagógica em Química. Estudos
Segundo as Orientações Curriculares do
significativos e publicações crescentes ocorre-
MEC[3], a área de Educação Química traz
ram, na área, a partir da década de 1980. Pode-
importantes contribuições para a melhoria do
mos constatar essa afirmação nos anais das
ensino por meio de encontros regionais e nacio-
reuniões da Sociedade Brasileira de Química
nais onde são realizados minicursos, palestras,
(SBQ), que tem registrado um aumento signifi-
mesas-redondas e apresentação de trabalhos
cativo do número de trabalhos apresentados na
voltados para o ensino da disciplina. Enfa-
seção de Educação. Em 2008, foram apresenta-
tiza-se também o surgimento de livros didáti-
dos 139 trabalhos.1
cos com base em pesquisas realizadas e
Trabalhos envolvendo os diversos conteú-
projetos apresentados. Neste trabalho eviden-
dos químicos, inovações metodológicas, recur-
cia-se o esforço da comunidade de educadores
sos
à
químicos para mudanças do ensino no país,
formação inicial e continuada do químico, revi-
apontando-se publicações como a revista
sões educacionais, são muito encontrados na
Química Nova na Escola, que possui muitos
literatura, evidenciando a preocupação dos pro-
anos de circulação, e que é voltada para profes-
fissionais da Química com o ensino da disci-
sores e estudantes de Química. Em um dos arti-
plina. Diversos trabalhos têm destacado o
gos publicados neste periódico Schnetzler
Ensino de Química numa perspectiva de prepa-
mostra a importância da pesquisa em ensino de
ração do aluno para o exercício da cidadania,
Química[4]. Neste trabalho a autora menciona
1.
28
como, por exemplo, Santos e Schnetzler[1] e
didáticos,
aspectos
relacionados
Os dados foram extraídos da revista SBQ/2008. Acesso: www.sbq.org.br REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Panorama da Pesquisa em Ensino de Química no Brasil
que apenas o domínio do conteúdo não é sufici-
As modificações sofridas nos cursos de
ente, e se faz preciso recorrer à aplicação de
licenciatura na área de Química, visando uma
contribuições teóricas para a educação quí-
boa qualificação do profissional de ensino,
mica, o que ressalta a valorização desta área.
induziram muitos trabalhos de pesquisa
Em tempo, não podemos deixar de mencionar a
tomando a Química como ponto de referência,
ReBEQ, este novo e importante espaço para a
mas dando ênfase à questão do ensino propria-
discussão das questões de ensino e aprendiza-
mente dito. Uma importante contribuição para
gem. Assim, pretendemos neste trabalho, traçar
a área de Ensino de química é o trabalho de
um quadro diagnóstico da pesquisa em Ensino
Oliveira e Queiroz[6], que traz um levantamento
de Química no Brasil.
do quadro geral em que a pesquisa em Ensino de Química é atuante no Brasil, identificando programas de pós-graduação, grupos de pes-
}
OS CURSOS DE LICENCIATURA EM QUÍMICA
quisa, encontros científicos e periódicos especializados que têm o ensino de Química como área de pesquisa.
Os cursos de Licenciatura em Química no Brasil, há algum tempo, não estavam adequados à formação de professores, visto que a pró-
}
pria grade curricular era dotada de disciplinas focadas apenas no aspecto químico do conheci-
ENCONTROS NA ÁREA DE ENSINO DE QUÍMICA
mento, com pouca formação específica em
Informações sobre os encontros realizados
magistério. Modificações em legislação pos-
no Brasil foram adquiridas nos sites da Socie-
sibilitaram a inserção de disciplinas que muda-
dade Brasileira de Química (SBQ) e Associa-
ram a ênfase da licenciatura. Segundo o Parecer
ção Brasileira de Química (ABQ) bem como
[5]
CNE/CES 1303 do Ministério da Educação ,
em nota na revista Química Nova na escola[7-9].
as Instituições de Ensino Superior (IES) devem
Um dos principais encontros na área de
estabelecer currículos que enquadrem o perfil
ensino de Química no Brasil é o Encontro Nacio-
do profissional químico; no caso da Licencia-
nal de Ensino de Química, ENEQ, que ocorre
tura, materiais didático-pedagógicos que propi-
bianualmente, desde 1982, sendo um evento
ciem ao aluno aprendizagens que suscitem
específico da área. O último encontro realizado,
formação para o magistério. Dentre as verten-
XIV ENEQ, aconteceu na cidade de Curitiba –
tes trabalhadas estão as Diretrizes Curriculares
PR de 21 a 24 de julho de 2008, foi organizado
Nacionais e as Diretrizes Nacionais para a Edu-
em parceria com várias universidades e sediado
cação Básica, além de conteúdos essenciais
pela Universidade Federal do Paraná. Nesta oca-
para a construção humana, como filosofia, his-
sião, foram inscritas 1440 pessoas, dentre estu-
tória e instruções em língua portuguesa e
dantes e pesquisadores, e foram aceitos para
estrangeira.
apresentação cerca de 470 trabalhos.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
29
Wilsilene dos Santos Oliveira, José Machado Moita Neto e Nilson Fonseca Miranda
Outro evento importante é o Encontro de
A primeira não é específica da área de ensino,
Debates sobre o Ensino de Química que ocorre
porém possui seção destinada a trabalhos que
no Rio Grande do Sul. O último (28º EDEQ)
envolvem a Educação Química nos vários níveis
ocorreu, em outubro de 2008, na Universidade
de ensino. O número de trabalhos publicados
Luterana do Brasil (ULBRA) em Canoas – RS.
por esta revista aumentou muito nos últimos
Há, também, outros encontros regionais como
anos e hoje, em cada volume, tem-se um número
ECODEQ (região Centro-Oeste), EMEQ (Minas
aproximado de 200 páginas sendo que na década
Gerais), EDUQUI (Bahia), EPPEC, SIMPEQ e
de 80 esse número era de 50 páginas, como des-
EVEQ (São Paulo) e outros. É interessante tam-
crito no trabalho de Oliveira e Queiroz[10]. Sua
bém lembrar os Simpósios Brasileiros de Educa-
edição é bimestral e, ao longo dos dois últimos
ção Química, o 6º Simpósio ocorreu, em 2008,
anos, 2007 e 2008, o número de artigos publica-
em Fortaleza-CE.
dos na seção de Educação foi de 59.
A Reunião Anual da Sociedade Brasileira
A revista Química Nova na Escola trata de
de Química é o maior evento de Química na
assuntos voltados exclusivamente para a Edu-
América Latina e possui uma seção específica
cação Química. Sua publicação desde 2008 é
para trabalhos de Educação Química (ED). Nas
trimestral e conta ainda com cadernos temáti-
Reuniões Anuais participam cerca de 2500 pes-
cos que abordam assuntos da atualidade em
quisadores e o número de comunicações chega
Química. Suas subdivisões facilitam a leitura e
a 2200, que são distribuídas entre as diversas
proporcionam maior esclarecimento sobre os
áreas da Química, inclusive a área de Ensino de
diversos aspectos de ensino da disciplina. Em
Química. A 31ª Reunião aconteceu em Águas
2007 e 2008 foram publicados 63 artigos pela
de Lindóia – SP, em maio de 2008, e contou
revista em foco. Esses dados podem ser encon-
com a apresentação de 139 trabalhos na área de
trados no site da SBQ.
educação. Sua produção foi menor que a de
As revistas Química Nova e Química Nova
2007 (164 trabalhos) devido, provavelmente, à
na Escola constituem-se veículos de comunica-
realização do XIV Encontro Nacional de
ção científica da Sociedade Brasileira de
Ensino de Química no mesmo ano.
Química e melhor espelham a preocupação com o ensino de Química no país.
}
30
PERIÓDICOS ESPECIALIZADOS
Em 2006, na 29ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química, foi apresentada à
No contexto mundial ainda existem poucos
comunidade científica a Revista Brasileira de
periódicos relacionados especificamente à área
Ensino de Química (ReBEQ), uma publicação
de Ensino de Química, destacando-se o Journal
semestral da Editora Átomo e colaboradores, que,
of Chemical Education e o Education in Che-
então, inaugurou um novo espaço, abrindo novas
mistry. Aqui no Brasil, encontram-se as revistas
páginas – para pesquisadores, docentes (ensino
Química Nova e Química Nova na Escola,
médio e superior), alunos de graduação e pós-gra-
muito conhecidas entre os educadores químicos.
duação – comprometidas não apenas com a REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Panorama da Pesquisa em Ensino de Química no Brasil
divulgação científica, mas, também, com a for-
No Brasil, muitas instituições com curso
mação e atualização dos pesquisadores, professo-
superior em Química têm aderido às linhas de
res e estudantes da área do ensino, por meio de
pesquisa voltadas para o ensino de Química e,
intercâmbio de idéias e experiências que enrique-
com isso, formado muitos mestres e doutores
çam o processo ensino/aprendizagem.
na área. Surgiram também muitos grupos de
A área de Pesquisa em Ensino de Química
pesquisa no país e, assim como nas outras subá-
tem se desenvolvido e amadurecido no Brasil
reas da Química, foram organizados encontros
com trabalhos abordando temas atuais publica-
específicos.
dos nestes periódicos especializados. Muitos de
Hoje, as instituições de ensino superior em
seus resultados podem ser aplicados de forma
Química do Brasil veem a questão e se interes-
acessível à compreensão do educando, propici-
sam pela formação de docentes não somente
ando a construção do processo ensino-aprendi-
dominadores de conteúdo, mas principalmente
zagem dentro e fora de sala de aula. A formação
atenciosos em relação ao ensino. O número de
do professor é essencial neste processo, pois
universidades brasileiras que proporcionam
pode se pronunciar sobre o tema adequando-se
uma maior ênfase na formação de professores
mediante a realidade pedagógica que o circunda.
ainda é pequeno. Segundo a Capes,[11] as instituições com programas de pós-graduação com
}
PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO E GRUPOS DE PESQUISA Foi realizada uma busca de programas de
mestrado e doutorado que possuem linha de pesquisa em Ensino de Química são: UnB, UFRN, UFRGS, UFSCar, USP- SP, USP- São Carlos, UNICAMP.
pós-graduação com mestrado e doutorado que
Muitos grupos de pesquisa com linha em
possuem linha de pesquisa em Ensino de Química.
Ensino de Química podem ser encontrados no
Esta pesquisa foi feita no site da Coordenação de
país. De acordo com análise feita dos grupos
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
encontrados no Diretório de grupos no site do
(Capes) na página de cursos recomendados. A
Cnpq, sua quantidade é relativamente grande e
Capes avalia os programas de pós-graduação bra-
estão localizados em vários estados do territó-
sileiros com base em critérios como: atividades de
rio nacional. A maior parte destes grupos se
pesquisa e ensino, corpo docente e discente, teses e
concentra na região Sudeste do país, com desta-
6
dissertações e produção intelectual. O perfil dos
que para a Universidade de São Paulo-USP.
grupos de pesquisa foi adaptado a partir do diretó-
Por outro lado, são encontrados, no Diretório,
rio de grupos de pesquisa do Conselho Nacional
quatro grupos pertencentes ao estado do Piauí,
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
sendo este um dos estados de destaque na
(CNPq). Os grupos foram categorizados de acordo
região Nordeste, juntamente com Pernambuco.
com: nome, líderes, área predominante, linhas de
Em relação à área predominante, a maioria
pesquisa, instituição, endereço.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
dos grupos tem suas pesquisas voltadas às ciên-
31
Wilsilene dos Santos Oliveira, José Machado Moita Neto e Nilson Fonseca Miranda
cias exatas propriamente ditas (Química e
Sem dúvida, as tecnologias digitais modi-
outras); entretanto, uma quantidade considerá-
ficaram a face da pesquisa em Química no Bra-
vel de grupos trabalha, prioritariamente, em
sil; contudo, ainda não tiveram semelhante
Educação (22 grupos). Dentre as linhas de pes-
efeito no ensino de graduação e muito menos
quisa, é possível verificar várias alternativas
no ensino médio. Os licenciados em Química,
como: uso de informática, formação de profes-
mesmo nas universidades mais equipadas do
sores, elaboração de materiais didáticos, aspec-
país, ainda não estão suficientemente treinados
[12]
tos ambientais dentre outros.
para o uso das tecnologias digitais em sala de aula no ensino médio.
}
UMA LINHA RECENTE: TECNOLOGIAS DIGITAIS NA QUÍMICA
ção, adquire a competência técnica para indicar à escola e para seus alunos, o livro didático que
As tecnologias digitais modificaram o ensino
melhor se enquadra ao seu modo de conduzir o
e pesquisa em Química e estão presentes no cotidi-
processo ensino-aprendizagem. A questão que
ano de toda a sociedade. É esperado, portanto, que
surge é a seguinte: o licenciado está preparado para
comecem a aparecer cada vez mais trabalhos cien-
indicar à escola softwares de química que o auxi-
tíficos em Ensino de Química que olhem, especifi-
liem no magistério? Temos software com quali-
camente, o papel destas tecnologias.
dade didática para ser utilizado no ensino médio?
Antigamente, o tempo do pesquisador era
A busca em banco de dados de alta quali-
dividido entre biblioteca, atividades burocráti-
dade, como os disponibilizados pelo portal de
cas de pesquisa (confecção de projetos, artigos,
periódicos da Capes, tem chegado aos alunos
pareceres etc.), atividades de ensino, participa-
de graduação em Química, que, assim, podem
ção em eventos científicos e, principalmente,
conhecer a produção científica recente. Con-
laboratório de pesquisa ou trabalho de campo.
tudo, dois problemas imediatos ocorrem
As tarefas do cientista de hoje não muda-
quando se pensa em acrescentar um frescor
ram substancialmente, contudo, o tempo dedi-
científico ao ensino médio pelo uso de artigos
cado às mesmas e o volume de trabalho
científicos recentes: 1) o melhor da Química
mudaram drasticamente. As tarefas se multipli-
está escrito em inglês e 2) o portal de periódico
caram exatamente pela possibilidade de se
da Capes só é disponível para instituições que
fazer mais rapidamente tudo e com mais quali-
tem pós-graduação reconhecida pela Capes. A
dade por conta do computador, da internet e de
base de dados Scielo pode contornar estas difi-
uma infinidade de softwares que minimizaram
culdades, contudo, estará o professor de Quí-
tempos de cálculo, de análise de dados e de
mica preparado para trabalhar um artigo
busca de informação. Alguns destes recursos
científico recente em sala de aula?
[13]
podem ser obtidos no site LAPEQ grupos de pesquisa da USP.
32
O licenciado em Química, durante a gradua-
de um dos
Há uma grande quantidade de sites disponíveis na internet sobre a maioria de assuntos
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Panorama da Pesquisa em Ensino de Química no Brasil
de Química. Usando um buscador como o
crescimento intelectual como é o caso da revista
Google acadêmico é possível, inclusive, encon-
Química Nova na Escola que, até o ano de 2007,
trar material científico de qualidade. Também
tinha sua publicação semestral e hoje, é trimes-
há uma diversidade de sites didáticos de
tral. Este crescimento também ocasionou a orga-
Química no Brasil. Mas estará o licenciado
nização de muitos encontros regionais em
preparado para fazer um uso didático deste
educação química. Uma quantidade considerá-
material de fácil acesso para os alunos? O
vel de grupos de pesquisa em ensino de Química
acesso é mesmo fácil para todos os alunos?
no Brasil trabalha esse campo como área predo-
Sem dúvida, o otimismo nos leva a uma
minante, sendo que o maior número de contribu-
resposta positiva às perguntas anteriores, pois
ições é proveniente da região sudeste do país.
as tecnologias digitais devem estar a serviço
Pelo menos sete instituições de ensino superior
da Química e também do ensino desta disci-
possuem programas de mestrado e doutorado
plina. Vários trabalhos de pesquisa em educa-
em Educação química, o que mostra uma quali-
ção vêm trazendo à tona estas questões e
ficação específica em que novas pesquisas pas-
muitas dissertações de mestrado e teses de
sam a ser desenvolvidas no âmbito educacional.
doutorado sobre este assunto têm sido defen-
Sem dúvida, os estudos nas grandes áreas da
didas em universidades das mais diferentes
Química ainda predominam, mas percebe-se as
regiões do país, dentre as quais podem-se citar
proporções que a pesquisa em ensino tem
UFC, UFPI, UNB e USP.
tomado, no panorama nacional, dentro da ciên-
A responsabilidade de formar docentes
cia Química.
para o magistério do ensino médio em Química está nas mãos das universidades e centros de ensino. O licenciado deve ser preparado para
}
atuar em um mundo que usa cada vez mais as Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), também na educação.
}
CONSIDERAÇÕES FINAIS Com as mudanças educacionais referentes ao currículo dos cursos de licenciatura em Química, um aumento de pesquisas relacionadas ao ensino foi induzido. Devido ao amadurecimento do ensino e da pesquisa em Química e à grande quantidade de artigos, os periódicos nacionais também sofreram modificações para abrigar tal REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
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33
Wilsilene dos Santos Oliveira, José Machado Moita Neto e Nilson Fonseca Miranda
[7] http://www.sbq.org.br. Acesso em: jan. 2009. [8] http://www.abq.org.br/simpequi/. Acesso em: jan. 2009. [9] Nota em Química nova na escola, n. 29, agosto de 2008, p. 45. [10] OLIVEIRA, J. R. S. de; QUEIROZ, S. L. Comunicação e linguagem científica: guia para estudantes de Química. Campinas: Editora átomo, 2007, 112 p.
[15] SCHNETZLER, R. P. A pesquisa em ensino de química no Brasil: conquistas e perspectivas. Quím. Nova, São Paulo, v. 25, supl. 1, p.14-24, 2002. [16] http://qnesc.sbq.org.br. Acesso em: jan. 2009. [17] http://www.quimicanova.sbq.org.br. Acesso em: jan. 2009. [18] http://wwwjchemed.chem.wisc.edu. Acesso em: jan. 2009. [19] www.rsc.org/Education/Eic. Acesso em: jan. 2009.
[11] http://www.capes.gov.br. Acesso em: dez. 2008. [12] http://www.cnpq.br/gpesq/apresentacao.htm. Acesso em: jan. 2009. [13] http://www.lapeq.fe.usp.br. Acesso em: jan. 2009. [14] FRANCISCO, C. A.; QUEIROZ, S. L. A produção do conhecimento sobre o ensino de Química nas Reuniões Anuais da Sociedade Brasileira de Química: uma revisão. Quím. Nova, São Paulo, v.31, n. 8, p. 2100-2110, 2008.
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Recebido em: 17 abr. 2009 Acesso em: 28 abr. 2009
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
DOS PROFESSORES DE QUÍMICA AOS PROFESSORES ALQUÍMICOS Claudio Galeno Caldeira Centro de Ensino Superior de Uberaba – CESUBE E-mail: csarreta@terra.com.br Ana Maria Faccioli de Camargo Universidade de Uberaba – UNIUBE E-mail: camargo@uniube.br
RESUMO É comum encontrarmos estudantes com aversão à Química, talvez porque ela envolve conceitos abstratos e distantes da realidade cotidiana. Avaliamos a Química e seu ensino, e, objetivando mudanças, propiciamos aos professores uma nova ferramenta, o professor alquímico. Os professores alquímicos contextualizam, no tempo e no momento socioeconômico a Química, para proporcionar aos alunos sua compreensão. Acreditamos que os professores alquímicos têm condições de serem um diferencial para os atuais e futuros professores de química. É necessário, porém uma mudança na concepção dos professores, deixando a formação tecnicista e adotando uma postura alquímica, sem que isso implique no retorno à visão mágico-vitalista dos alquimistas. Palavras-chave. Educação; formação de professores; professores alquímicos; química. ABSTRACT
FROM CHEMISTRY TEACHERS TO ALCHEMIST TEACHERS. It’s common to find students with aversion to chemistry, perhaps because it´s abstract concepts and distance of the daily reality. We evaluate chemistry and its education and, objectifying changes, we propitiate to the chemistry teachers a new tool, the alchemist teachers. The alchemist teachers contextualize chemistry in the time and the social-economic moment, to allow the pupils to understand the subject. We believe that the alchemist teachers have conditions to be a differential for the current and future chemistry teachers. It is necessary, however, a change in the conception of teaching, leaving the technicist formation and adopting an alchemist position, without returning to the magician-vitalist vision of the alchemists. Key-words. Education; trainig of teachers; alchemist teachers; chemistry.
}
INTRODUÇÃO Um dos motivos que nos levaram à pesquisa
e possibilidades, sanar as falhas que outrora
que resultou neste artigo foi a busca de uma expli-
havíamos identificado nos vários professores
cação para uma grande inquietação que sempre
com os quais tivemos contato. Percebemos que
nos incomodou, desde os primeiros contatos com
simplesmente vontade, interesse e desejo de
o universo da Química, mas que não conseguía-
fazer algo diferente pouco representavam
mos achar uma explicação – a dificuldade que
diante de um sistema já enraizado e engessado
muitos estudantes tinham com o seu aprendizado.
num método tido como correto e, portanto,
Achávamos que a causa seria o fato de as escolas
reprodutível sem alterações ou questionamen-
secundaristas não disporem de um ambiente ade-
tos. Método e sistema, aliás, em que havíamos
quado para a realização de aulas de Química, ou
sido formados e agora tentávamos sair. O maior
seja, não dispunham de um laboratório. Sendo a
desafio a ser enfrentado não seria mudar o sis-
Química uma ciência essencialmente experimen-
tema, mas mudar a nós mesmos. Tínhamos o
tal, pensávamos que se fossem utilizados os
desejo, talvez utópico, de sermos para nossos
materiais e o ambiente adequado, certamente os
alunos aquilo que nossos professores não
conceitos vistos na aula teórica seriam muito
tinham conseguido ser.
mais facilmente assimilados pelos estudantes.
A prática docente nos fez perceber que na
Percebemos que as dificuldades continuavam
mão de um professor despreparado, pouco adian-
também na graduação já que, estando no ambi-
tam laboratórios, multimídias, novas e modernas
ente universitário e dispondo de diversos labora-
metodologias. O velho quadro-negro e um
tórios, as mesmas dificuldades de aprendizado
pedaço de giz poderiam surtir muito mais efeito
apareciam em vários estudantes.
em mãos habilidosas e idéias inventivas que uma
Regressamos anos mais tarde à sala de
36
diferente e tentarmos, por meio de novas idéias
sala 3D de última geração.
aula, mas, agora, como professores e passamos
Imbuídos no desejo de mudança e de trans-
a nos ver com o poder de, finalmente, fazermos
formação que esperamos que este nosso trabaREVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos
lho possa contribuir para que realizemos nossa
que realmente alguns estudantes não se dedi-
própria transformação, além de proporcionar-
cam o quanto deveriam, mas também estamos
mos, aos colegas docentes, um momento para
cientes de que este tipo representa uma pequena
repensarem suas atividades.
porcentagem do total de uma escola e/ou faculdade. Assim, o problema frequentemente recai
}
O ENSINO DE QUÍMICA
sobre os professores de Química. Se assim ocorre, cabe perguntar: será que os
Enquanto conhecimento empírico, a quí-
profissionais que têm a função de iniciar, de
mica vem acompanhando a espécie humana
desencadear, de controlar o processo de aprendi-
desde o domínio do fogo (Chassot, 1995).
zagem, de levar “luz” aos seus alunos não esta-
Enquanto ciência, foi criada, no século XVII,
rão sabendo fazê-lo? Considerando que sim, que
com os trabalhos do inglês Boyle, ou, como
realmente há uma falha, nos questionamos: por
preferem alguns, no século seguinte com o
que os professores de química não estão sabendo
francês Lavoisier. Mesmo tendo acompanhado
ensinar? Novas idéias vão surgindo, mas, após
a espécie humana desde os primórdios tempos,
análise, elas podem ser condensadas novamente
ainda hoje é possível encontrarmos, na maioria
em duas possibilidades. A primeira aponta para
dos estudantes, dificuldades no aprendizado da
uma falha, que, em nosso entendimento, seria a
Química. Novas abordagens dos temas e meto-
mais grave – a falta de conhecimento do conte-
dologias para seu ensino foram desenvolvidas,
údo ministrado. A segunda possibilidade está na
mas, mesmo assim, podemos notar, por parte
dificuldade que os professores de Química
dos estudantes, a falta de conexão entre os
enfrentam na transmissão dos saberes. Quere-
assuntos abordados na sala de aula e o seu coti-
mos crer que a quantidade de profissionais que
diano, acarretando numa compreensão equivo-
se enquadraria na primeira possibilidade seja
cada da Química.
pequena, a ponto de serem desprezados estatisti-
O questionamento inicial era descobrir o
camente, pois, caso contrário, constataríamos
porquê das dificuldades percebidas na maioria
estarem nossos estudantes diante de profissio-
dos alunos no aprendizado da Química, e che-
nais despreparados e desqualificados para a fun-
gamos a duas possibilidades. A primeira inci-
ção que exercem.
dia os estudantes e sobre eles recaem todas as
Concentramo-nos então na segunda possi-
culpas pelo não aprendizado, ou seja, eles não
bilidade, a de que os professores de Química
aprendem porque não se esforçam para tal, não
não sabem transmitir seus conhecimentos. A
se dedicam, não estudam e, portanto, não
pergunta que fazemos agora é: por que eles não
aprendem. A segunda possibilidade está vol-
estão sabendo transmitir? Quando utilizamos o
tada aos professores de Química e a explicação
verbo ‘transmitir’ o fazemos com o propósito
é simples, eles não sabem ensinar. Sabemos
de sermos mais facilmente compreendidos,
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
37
Claudio Galeno Caldeira e Ana Maria Faccioli de Camargo
mas entendendo que a prática docente e o papel
iniciante. A falta de um laboratório poderia ser
dos professores vão muito além da simples
resolvida com experimentos mais simples, fei-
transmissão de conhecimentos.
tos na própria sala de aula e com a utilização de
Observamos que a partir de um primeiro
38
materiais disponíveis no dia-a-dia dos alunos.
questionamento, outras perguntas são formula-
Mas encontramos nos professores de
das, que vão gerando outras mais, pois as respos-
Química uma “falha” mais difícil de ser corri-
tas, normalmente, geram mais perguntas, mais
gida – a sua formação inicial. Os professores de
dúvidas, mais questionamentos. Para tentarmos
Química, licenciados ou não, que atuam nas
responder a esta última questão levantaremos
milhares de salas de aula brasileiras tiveram, e
algumas possíveis respostas. A primeira delas
ainda têm, sua formação estabelecida nos mol-
refere-se ao fato de muitos professores de Quí-
des de uma ciência que preza o conteudismo, o
mica não terem formação na área pedagógica. É
mecanicismo e o positivismo. É essa formação
comum vermos profissionais formados em áreas
engessante, rígida, que vem tolhendo os profes-
correlatas à Química, como engenharia química,
sores de Química, a liberdade para tentar fazer
farmácia ou química industrial, serem “jogados”
algo diferente que consiga aproximar seus estu-
dentro de uma sala de aula de uma escola. O
dantes da Química, não de uma ciência distante
resultado é normalmente desastroso porque estes
e incompreensível dos centros de pesquisa, mas
profissionais, mesmo tendo uma grande bagagem
principalmente da Química nossa de cada dia.
de saberes químicos, não tiveram nenhuma pre-
É possível mudar a atual situação do ensino
paração pedagógica. Não houve na sua formação
de Química no Brasil? Como mudar os professo-
inicial, nenhuma disciplina que lhes preparassem
res já formados, moldados, enraizados numa
para o desempenho da atividade docente. O que
outra concepção do que é ser professor?
fazer agora? Muitos buscam sanar suas deficiên-
Acreditamos que sim, visto que, no século
cias didáticas frequentando um curso de licencia-
XX, ocorreram significativas mudanças na
tura em Química. Outros simplesmente desistem.
concepção do que é ser professor. Definições
Alguns permanecem insistentemente na sala-
tais como detentor do saber, mestre, sábio,
de-aula aprendendo a “dar aula” na base da tenta-
foram trocadas por professor reflexivo, profes-
tiva e erro, o que pode gerar nos estudantes um
sor crítico, professor autônomo, professor pes-
afastamento ainda maior da Química.
quisador para citar apenas algumas. Estas
Percebemos então que realmente a dificul-
mudanças surgiram quase que naturalmente,
dade do não-aprendizado dos estudantes viria
como consequência de um século que foi, por
dos professores de Química, pois, para alguns
um lado de grande avanço tecnológico e cientí-
dos problemas apresentados havia soluções
fico, mas por outro foi o de fixação do capita-
simples e fáceis. A falta de formação pedagó-
lismo como ideologia hegemônica, influen-c
gica era facilmente resolvida num curso de
iando diversas outras áreas entre as quais está a
licenciatura. Os anos e a vivência numa sala de
educação. Aliás, a escola é uma instituição
aula trariam a experiência necessária ao então
importante para o capitalismo, pois é por ela REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos
que se pode propagar, discreta e impercep-
micos, embora estes tragam outras abordagens
tivelmente sua ideologia.
de conteúdo e dinâmica para as aulas. A pro-
Tentar mudar a concepção, o paradigma do
posta de educador alquímico surgiu como uma
ser professor é opor-se ao sistema e à ideologia
resposta às dificuldades encontradas pelos
vigente, mas acreditamos que seja uma forma
docentes de Química, carentes de formação
ou pelo menos uma tentativa de mudarmos o
pedagógica, com o aprendizado de seus alunos.
quadro atual. Tentaremos, neste trabalho mos-
Lexen et. al. (2007) sugeriram diferenças entre
trar que são necessárias mudanças na concep-
os perfis dos docentes de química e aquele dos
ção do ser professor de Química, deixando a
educadores químicos.
formação tecnicista e adotando uma postura alquímica.
Salientamos que por trás do eufemismo de educador químico podemos encontrar as con-
Atualmente, a maioria dos professores de
cepções de professor reflexivo e professor pes-
Química tem dificuldades com seus aprendizes
quisador. Estas concepções surgiram nas
pelo fato de eles, em sua maioria, não consegui-
décadas de 1980 e 90 e, rapidamente, se espa-
rem conectar ou relacionar o saber da sala de
lharam entre os profissionais de educação, mas
aula com o seu cotidiano, além de acharem que
da forma como foram assimiladas estas con-
Química seja apenas decorar várias fórmulas
cepções tiveram uma conotação de um dilema
ou nomes. Isso faz com que estes estudantes se
shakespeareano “ser ou não ser”. Ou seja, ou o
desinteressem pelas aulas, por mais que os
professor assumia determinada concepção e
professores se esforcem.
resolveria todos os problemas de ensino-apren-
A rejeição que muitos estudantes têm em
dizagem, ou, não assumindo esta ou aquela
relação à Química pode ser devido à formação
concepção, seria responsável por todos os fra-
tecnicista, conteudista e positivista de seus pro-
cassos de seus alunos, bem como o seu próprio,
fessores. Essa formação rígida inibe a liberdade
pois poderia ser visto como antiquado e ultra-
do pensar e do agir a partir do momento em que
passado. Ser reflexivo é estar na moda
foca um determinado objeto, todos os olhares,
(Alarcão, 2002).
atitudes e saberes, desconsiderando o entorno.
Ao longo de nossa caminhada, não só
Tais professores reproduzem, fielmente, em
como estudantes, mas também como docentes,
sala de aula, a formação que tiveram e ainda se
sempre pudemos observar as dificuldades e
justificam alegando que foram formados de tal
rejeições que muitos estudantes tinham/têm
forma e que não há porque agirem diferente
com a Química. Percebemos também que, por
(Maldaner, 1999).
meio das relações de poder1 vivenciadas na
Acreditamos que as dificuldades também
sala-de-aula entre professores e estudantes,
são vivenciadas por parte dos educadores quí-
seria possível tentar mudar esse quadro ou, pelo
1.
Segundo Foucault, não se exerce um poder, mas pratica-se relações de poder quer seja entre governante e governados, quer seja entre professores e alunos.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
39
Claudio Galeno Caldeira e Ana Maria Faccioli de Camargo
menos, minimizá-lo. Foi quando surgiu a idéia dos professores alquímicos.
Tentando fugir desse processo, propomos uma transmutação do docente de química, passando de professores de química para professores
}
O PROFESSOR ALQUÍMICO
mesma conotação usada pelos alquimistas sécu-
Diversas concepções de professores emer-
los atrás. Eles acreditavam que seria possível
giram no século XX, principalmente na
modificar, transmutar qualquer metal em ouro,
segunda metade, tais como professor pesquisa-
porque isso não alteraria a essência da matéria,
dor, professor reflexivo e educador químico.
modificaria apenas a constituição, as proprieda-
Ao invés de uma ação libertadora, estas con-
des. É essa a idéia que pretendemos demonstrar
cepções tiveram um efeito inverso, isto é, inci-
quando utilizamos o termo ‘transmutação’, a de
diram sobre os próprios professores na forma
que não é necessário mexer intimamente na cons-
de um peso extra, de uma cobrança no sentido
tituição da formação do docente de Química,
de se adequarem aos novos conceitos, sob
mas, sim, entender e modificar algumas caracte-
pena, caso não se adequassem, de serem res-
rísticas educacionais.
ponsabilizados por qualquer falha detectada na educação dos estudantes (Pereira, 2006).
40
alquímicos. A idéia de transmutação terá a
A escolha dos professores alquímicos como objeto de estudo se deu por acreditarmos que com
Assumir tais concepções é querer “estar na
este perfil os futuros estudantes de química pode-
moda” ou “ser moderno” quando, na verdade,
rão ter a chance de melhor compreenderem a
os professores estão sendo, sem perceberem,
Química e quiçá, por meio dela, tornarem-se
agentes de um processo sutil que está em curso
homens e mulheres mais conscientes e críticos do
– a disciplinarização dos docentes. Acredita-
mundo em que vivem, e que o ensino da Química,
mos que a concepção de educador químico
no ensino médio, possa não mais ser visto como e
também possa ter tido, em muitos docentes de
considerado inútil (Chassot, 1995).
Química, essa imposição, pois Lexen et. al.
Optamos por uma pesquisa bibliográfica,
(2007, p. 7), ao referirem-se aos alunos de
pois a figura dos educadores químicos é nova
licenciatura em Química e, consequentemente,
dentro do próprio universo da Química e,
a futuros professores de Química, dizem que “é
segundo Chassot (1995), a concepção de edu-
entendimento do grupo de professores da
cador em Química surgiu há cerca de trinta
necessidade do estudante enxergar-se como um
anos no exterior e, no Brasil, é ainda mais
futuro educador desde o início do curso”.
recente. Segundo este autor, embora possamos
Estes modelos são colocados de tal forma
observar um aumento do número de disserta-
que os professores, não só de química, mas
ções de mestrado ou teses de doutorado que
também das demais disciplinas, sintam-se inca-
abordam o ensino de Química, o número é
pacitados, despreparados, caso não assumam
ainda pequeno em consequência dos valores
esta ou aquela determinada postura.
com que o tema é visto, talvez por desconheci-
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos
mento de boa parte dos professores de química,
mos a criatividade, não só na utilização de dife-
e que se verifica até mesmo nos cursos de licen-
rentes recursos metodológicos (aulas expositivas,
ciatura em Química (Chassot, 1995).
práticas etc.), mas, também, de diferentes recur-
Portanto, se partíssemos para uma pesquisa
sos tecnológicos (quadro e giz, internet, vídeo
de campo, buscando nela subsídios que nos aju-
etc.). Para melhor esclarecer a nossa proposta de
dassem na construção do novo perfil do professor
professor alquímico, relatamos uma aula dada
de química talvez não o encontrássemos.
por um professor alquímico.
A mudança começa pelo próprio nome, que
Embora já tenham decorrido dez anos desde o
promove um resgate à importância dos professo-
primeiro dia que entramos numa sala de aula, não
res. Quando utilizamos o substantivo ‘professor’
como aluno, mas como professor, e tentássemos
no lugar de ‘educador’ pretendemos dizer que, no
diversificar as aulas, alguns conteúdos acabavam
nosso modo de percepção, o termo ‘educador’
sempre caindo na mesmice de sempre. É o caso do
teria uma conotação de ser algo além do ser pro-
estudo da radiatividade e de suas aplicações.
fessor, ou seja, um estágio superior e almejado
Mesmo utilizando vídeos ou documentários mos-
pelos professores. Acreditamos que os professo-
trando o funcionamento da bomba atômica e o dia
res têm sim uma atividade multifacetada agindo
06 de agosto de 1945, quando ela foi lançada sobre
como professor, educador, orientador, coordena-
Hiroshima, sentíamos que não havia uma boa assi-
dor, colaborador e tantas outras que lhe queiram
milação pelos estudantes, principalmente das tur-
imputar, mas sem que necessite de rótulos para
mas do ensino médio. Questionávamos como
diferenciar este daquele. Discretamente, os rótu-
poderíamos mudar a aula, a metodologia, os recur-
los irão disciplinar os docentes impondo-lhes,
sos ou qualquer outra coisa que pudesse fazer com
mais uma vez, ser ou não ser, ou se é educador ou
que os estudantes percebessem a importância desta
não, ou se é professor ou não e assim por diante.
data, não só pelo fim da II Guerra e pelo número de
Acreditando que os professores, não só os
vítimas, mas, do ponto de vista químico, o que
de Química, desempenham simultâneos papéis
representou este dia.
perante não só seus alunos, mas também
Tentamos, então, uma abordagem dife-
perante a sociedade é que propomos que o pro-
rente, justamente porque teríamos a oportuni-
fessor alquímico não se restrinja a um modelo
dade de ministrar essa aula para uma turma de
ou padrão de comportamento, visto que é poli-
curso superior em que, espera-se, o grau de
valente, consciente de seu papel como profes-
compreensão e assimilação sejam maiores que
sor na formação de seus alunos e ciente de seu
os de estudantes do ensino médio. Ao invés de
papel de cidadão que tem sob sua responsabili-
ir direto ao assunto, optamos por uma aborda-
dade a formação de novos cidadãos.
gem histórica que teve duas frentes, uma abor-
Como professores, sempre tentamos mini-
dando a estrutura da matéria e o conceito de
mizar os temores encontrados pelos estudantes a
átomo e a outra abordando os fatos que levaram
respeito da Química. Como ferramenta, usáva-
à II Guerra, seu desenrolar e seu término com a
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
41
Claudio Galeno Caldeira e Ana Maria Faccioli de Camargo
rendição dos japoneses após os massacres
educador, e nem necessitam trilhar um único
atômicos de Hiroshima e Nagazaki.
caminho.
Durante a aula, ilustrada por apresentação
Aparentemente, estamos também rotu-
de multimídia, descrevemos a evolução dos
lando e criando mais um novo tipo de profes-
modelos atômicos associando-os ao momento
sor. Se optamos por adjetivar o professor foi
histórico-social vivido não só por aquele deter-
com o único propósito de se fazer notar, pois se
minado cientista, mas pela ciência e pela socie-
utilizássemos apenas o substantivo, o que não
dade como um todo. Ao final da apresentação,
seria errado e nem fugiria de nossa proposta,
que necessitou de mais duas aulas além do pla-
não despertaríamos a atenção dos demais
nejado, para nossa surpresa, a empolgação dos
docentes, quer sejam da Química, quer sejam
alunos – que queriam saber mais, questiona-
da Matemática, Biologia, enfim de qualquer
vam, opinavam e sugeriam revistas ou sites –
área do saber humano.
mostrava seu envolvimento com a aula. O que representou ser um professor alquí-
resgatar um período em que a maioria dos quí-
mico nesta aula? Representou a diferença entre o
micos contemporâneos negava a relação com a
2
42
E por que escolhemos alquímicos? Por que
3
saber esotérico e o saber exotérico , a partir do
química e com a ciência moderna? A resposta a
momento que não se restringiu aos meros concei-
estas duas perguntas pode ser dada com uma
tos químicos, mas ao seu contexto histórico, con-
única palavra – transmutação.
seguindo ampliar a visão e a compreensão de um
Situada entre os extremos, a conquista do
importante acontecimento histórico e científico -
fogo e o início da Química, está um período
a bomba atômica.
desconsiderado por muitos químicos modernos
Esta característica do que é ser alquímico
e contemporâneos – a alquimia. Acreditamos
deixa claro que a passagem dos professores de
que esta desconsideração se deva ao fato de
Química ou educadores em Química para os pro-
que, no surgimento das ciências modernas, os
fessores alquímicos envolve mudanças, e mudar,
novos saberes, para imporem-se como “verda-
geralmente, não é facilmente aceito. Os professo-
des”, as ciências renegaram e menosprezaram
res já têm muito com o que se preocuparem,
os antigos saberes.
pedagogicamente falando, no antes, durante e
Segundo Chassot (1995, p. 21), é possível
depois de suas aulas para se preocuparem com
fazermos três leituras da alquimia, sendo a prime-
normas, regras e modelos que orientem sua ativi-
ira a “que apresenta a alquimia como uma prática
dade profissional. Os professores não necessitam
eivada de charlatanismo e destituída de qualquer
de rótulos, quer seja reflexivo, pesquisador ou
significado científico”, a segunda “contextuali-
2.
Esotérico. Adj. 1.Filos. Diz-se do ensinamento que, em escolas filosóficas da Antiguidade grega, era reservado aos discípulos completamente instruídos. 2. P.ext. Todo ensinamento ministrado a círculo restrito e fechado de ouvintes. [...] compreensível apenas por poucos, obscuro, hermético (Ferreira, 1994, p. 267).
3.
Exotérico. Adj. 1.Filos. Diz-se de ensinamento que, em escolas da Antiguidade grega, era transmitido ao público sem restrição, dado o interesse generalizado que suscitava e a forma acessível em que podia ser exposto, por se tratar de ensinamento dialético, provável, verossímil (Ferreira, 1994, p. 285). REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos
zando a alquimia e os alquimistas” na época
Não tentando vê-la ofuscados pela ciência
medieval e a terceira “que admite um certo rea-
moderna, mas no contexto histórico vivido pelos
lismo-fantástico, [...] que tem muito de incrível
alquimistas, podemos perceber que eles acredita-
ou ainda inexplicável”. Acreditamos que, embora
vam ser possível a transmutação dos metais em
possa ter havido aproveitadores, como em toda
ouro porque acreditavam que a matéria, além de
atividade humana, a alquimia não pode ser rotu-
ser constituída por quatro elementos – água, fogo,
lada como uma atividade cujo único propósito era
terra e ar, tinha a característica da busca pela evo-
o de lograr os cidadãos e cidadãs em benefício
lução e pelo aprimoramento. Ou seja, a matéria,
próprio. Acreditamos, sim, que a alquimia teve
em sua essência, era a mesma, diferenciando ape-
seu lugar como atividade que buscou, a seu
nas em algumas proporções. Se fossem feitos
modo, compreender o microcosmos (interior
alguns ajustes, poderia-se, sim, transmutar um
humano) observando o macrocosmos (universo)
metal em outro.
(Goldfarb, 2001).
Com a concepção de que os metais “evo-
Nessa busca pela compreensão e aprimora-
luíam naturalmente” a partir de uma semente,
mento do indivíduo, muitos métodos, técnicas
de um embrião, iniciava-se a idéia da transmu-
e substâncias foram inventados, descobertos ou
tação, sintetizadas por Eliade (apud Goldfarb,
criados, sendo alguns deles inclusive, assimila-
2001), mas ressaltando que tais concepções
dos posteriormente pela química. Outra carac-
eram compartilhadas apenas pelos primeiros
terística importante da alquimia é o fato de ela
alquimistas, excluindo-se aqui, aqueles que
ser o resultado do conhecimento de vários
eram puramente metalurgistas.
povos em épocas e locais diferentes, com seu
Com os professores acontece algo seme-
início no antigo Egito e tendo os árabes como
lhante, visto que, em essência, são todos bem
agentes fundamentais, fundindo e reformu-
semelhantes, bastando apenas algumas altera-
lando os saberes gregos, orientais e os seus pró-
ções, daí a idéia da transmutação para torna-
prios, além de serem os responsáveis pela
rem-se alquímicos.
entrada destes saberes na Europa Medieval. Aos olhos da Química, a alquimia pode ser vista como atividade desprovida de qualquer
}
característica científica, mas acreditamos que
CONSIDERAÇÕES FINAIS
sem a lente da modernidade, tentamos
As formas de ensino bem como as ciências
enxergá-la com os olhos dos antigos alquimis-
passaram por várias mudanças ao longo dos
tas, situados naquele contexto político, social e
séculos. Os estudantes de hoje não são expecta-
científico, a veremos bem diferente, sendo pos-
dores passivos do discurso proferido pelos pro-
sível percebemos atividades de pesquisa cujos
fessores de qualquer área do saber humano.
saberes foram precursores nos moldes da
Também não são mais ou menos indisciplina-
ciência moderna, ou seja, a química.
dos ou rebeldes em comparação aos estudantes
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
43
Claudio Galeno Caldeira e Ana Maria Faccioli de Camargo
do passado, embora a sala de aula já tenha ser-
mais um modelo de como “ser professor”.
vido de cenário para severas punições e formas
Nossa intenção é que os atuais e futuros profes-
de castigos que se assemelhavam mais às tortu-
sores de Química tornem-se alquímicos no sen-
ras. Diríamos sim, que os estudantes de hoje
tido de questionarem os saberes, transmitidos
são mais informados que seus antecessores,
em sala de aula, da Química enquanto ciência
porque hoje a informação é processada e
criada numa matriz mecanicista e sob a égide
transmitida mais rapidamente.
de uma ideologia cada vez mais hegemônica, a
Se o mundo está em constante mudança,
partir do século XVI. Que os professores alquí-
sendo a química quem estuda as transforma-
micos considerem não só as descobertas, mas
ções, nada mais coerente que nós, professores
também o contexto histórico-social no qual elas
de química, acompanhemos estas mudanças e
ocorreram.
as levemos para a sala de aula. A escola, como
Questionar é a palavra de ordem dos profes-
um espelho da sociedade, não poderia ficar
sores alquímicos. Mas questionar o que e como?
alheia às mudanças. No século XVI, a reforma
Questionar consigo mesmo e com seus alunos, os
religiosa luterana levou, por meio do próprio
conhecimentos vistos em sala de aula, lembrando
Lutero e de Comenius, à reforma na educação
que consideramos sala de aula, não somente o
trazendo mudanças definitivas para a sala de
espaço físico tradicional, mas qualquer lugar uti-
aula. Estando, agora, no século XXI, acredita-
lizável para a realização de uma aula de Química.
mos que novas mudanças se fazem necessárias.
Para realizarem este questionamento, é necessá-
Foi também nesse período que a ciência viu
rio que os professores alquímicos lembrem-se
nascer uma nova corrente de pensamento – a
sempre que muitos itens colocados no currículo
positivista, que em sua visão, considerava o
do conteúdo de química estão ali, não por sua
mundo como uma grande máquina, fragmentá-
importância científica, mas por representarem,
vel, mensurável e analisável (qualitativa e quanti-
num determinado momento histórico-social, a
tativamente). Nesta mesma direção, mudou
supremacia de um determinado país.
também a forma de se fazer ciência.
44
Muitos destes itens, embora desconexos
O novo olhar do mundo fez com que não
com a realidade atual, continuam sendo vistos e
houvesse lugar para a alquimia e sua visão
estudados, porque muitos professores brasilei-
“mágico-vitalista” (Goldfarb, 2001) na ciência
ros talvez não ousem romper com o atual sis-
moderna, cedendo, então, a alquimia lugar à
tema de ensino. Percorrer novos caminhos é
química.
sempre uma tarefa que gera insegurança e rece-
Ao sugerir a figura do professor alquímico
ios e, mudar uma estrutura que já está montada,
não pretendemos negar a química moderna e
pode levar a uma série de inseguranças, temo-
todos os seus saberes, nem sugerir que os atuais
res, dúvidas e receios, fazendo com que os atu-
professores saiam transmutando metais em
ais professores de Química optem por não
ouro e, muito menos, é nosso interesse criarmos
fazê-lo.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Dos Professores de Química aos Professores Alquímicos
Cabe ressaltar também que a transmutação
}
dos professores de química para os professores alquímicos representa muito mais que uma metodologia de ensino. Em nenhum momento nos preocupamos em dizer que os professores alquímicos deverão usar este ou aquele recurso e nem esta ou aquela mídia, porque ser alquímico não está no fato de ser capaz de ministrar uma aula-show. Ser alquímico é ser capaz de, utilizando quaisquer recursos materiais, físicos e tecnológicos disponíveis, levar seus estudantes à compreensão da química. Ao utilizarmos, ao longo do trabalho, as expressões ‘estudantes de química’ ou ‘alunos’, o fazíamos num sentido amplo com intuito de referirmos não só aos estudantes de Química do ensino médio, mas também aos alunos-professores, ou seja, aos estudantes do curso de licenciatura de Química. Tais alunos mereceriam uma atenção especial visto que serão eles os responsáveis, brevemente, por estarem numa sala de aula, como professores químicos ou alquímicos, levando aos seus alunos, as modificações da
REFERÊNCIAS [1] ALARCÃO, Isabel. Refletir na prática. Revista Nova Escola, São Paulo, n. 154, ago., 2002. Disponível em: <http://novaescola.abril.com.br/ index.htm?ed/154_ago02>. Acesso em: 27 jul. 2007. [2] CHASSOT, Attico. Pra que(m) é útil o ensino? Alternativas para um estudo (de química) mais crítico. Canoas: ULBRA, 1995. [3] FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. 5. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1985. [4] GOLDFARB, Ana Maria Alfonso. Da alquimia à química. São Paulo: Landy, 2001. [5] LEXEN, Ademar Antônio, et. al. A formação inicial em química no contexto de uma universidade comunitária. Reunião anual Sociedade Brasileira de Química, 30., 2007, Águas de Lindóia, Anais... Águas de Lindóia: SBQ, 2007. Disponível em: <http://www.sbq.org.br/30ra/Workshop%20UPF.pdf>. Acesso em: 12 abr 2008. [6] MALDANER, Otávio Aluísio. A pesquisa como perspectiva de formação continuada de professor de química. Revista Química Nova, São Paulo, n. 2, mar./abr., 1999. Disponível em: <http://www.scielo.br/>.Acesso em: 25 out. 2006. [7] PEREIRA, Marcos Villela. Políticas públicas em educação e o alastramento da má consciência. In: Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino Educação, Questões Pedagógicas e Processos Formativos: Compromisso Com A Inclusão Social, 13., 2006, Recife, Anais... Recife: ENDIPE, 2006.
matéria estudada na Química. A mudança de professores de química para professores alquímicos não exige formação específica, porém exige esforços individuais, particulares, para quebrarem o “gesso do meca-
Recebido em: 17 abr. 2009 Aceito em: 28 abr. 2009
nicismo” com o qual eles estiveram presos todos estes anos.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
45
COMO FAZER? UMA RETROSPECTIVA DO PROGRAMA DO MEC, SUAS PERSPECTIVAS E ALGUMAS CONTRIBUIÇÕES José Carlos de Azambuja Bianchi Instituto de Química – UNICAMP E-mail: jcabianchi@hotmail.com Pedro Faria dos Santos Filho Instituto de Química – UNICAMP E-mail: pfaria@iqm.unicamp.br
RESUMO Em 1996, o MEC criou a Secretaria de Educação a Distância, sinalizando sua intenção de investir em recursos pedagógicos direcionados para o ensino nos níveis fundamental e médio. A partir desta iniciativa, posteriormente, o MEC passou a transmitir, via satélite, um programa chamado Como Fazer? destinado aos professores de ensino médio. Este trabalho apresenta um relato de como é montado cada episódio desse programa, desde a aquisição dos vídeos, até a gravação final com a equipe de professores convidados para orientar a sua utilização. Além de discutir as dificuldades associadas à utilização deste tipo de recurso, apresentamos, como contribuição a este projeto, uma disciplina de pós-graduação ancorada nestes vídeos, bem como uma dissertação de mestrado desenvolvida em nosso instituto, focalizando a produção de material de apoio para os vídeos do programa Como Fazer?. Palavras-chave. TV escola; ensino a distância; vídeos para aulas de química. ABSTRACT
HOW TO DO? A RETROSPECTIVE PROGRAM OF MEC, ITS PROSPECTS AND SOME CONTRIBUTIONS. In 1996, the Brazilian Education and Culture Ministry, MEC, created the Distance Education Secretary, SEED, showing his intention to develop pedagogical instruments towards fundamental and medium school levels. After that, MEC started the transmission of a TV program called Como Fazer? directed to teachers of those levels. This work presents an account of how that TV program is created since the videos acquisition to the final recording with the invited teachers. We discuss the difficulties associated with this program and present some contributions to it as a post graduation discipline and a master thesis focused on the production of texts directed to the Como Fazer? TV program. Key-words. TV Escola; distance learning; videos for Chemistry classes.
}
INTRODUÇÃO Nos tempos modernos, o ensino a distância vem ganhando cada vez mais espaço na carga horária dos cursos de formação, nos mais variados níveis. Basicamente, ele está associado a um sistema de educação que substitui, parcialmente, o professor por recursos tecnológicos desenvolvidos para esse método de ensino. Se em regiões mais providas de material humano qualificado este recurso ainda não é essencial,
48
Nesse ambiente de preocupação com as novas tecnologias voltadas para o ensino, em 1996, o Ministério da Educação e Cultura, MEC, criou a Secretaria de Educação a Distância, SEED. Esta postura sinalizava, claramente, a intenção de investir em projetos pedagógicos por meio de recursos técnicos disponibilizados para a rede pública dos ensinos médio e fundamental. A partir dessa iniciativa, o MEC passaria a transmitir um programa chamado TV Escola,
em outras regiões, caracterizadas pela escassez
destinado aos professores de ensino médio, utili-
de recursos, ele representa uma boa alternativa
zando um canal de satélite. Para tornar este pro-
para diminuir a distância e o isolamento dos
grama acessível aos professores de qualquer
profissionais que ali atuam.
região, o MEC distribuiu para as escolas públi-
Já no final do século passado, o governo ace-
cas de todo o país, um kit tecnológico, que
nava para esta alternativa nas suas Leis de Diretri-
incluía um televisor, um aparelho de videocas-
zes e Bases, publicadas em 1980, onde se dava
sete, uma antena parabólica e um receptor de
atenção especial para o ensino a distância, como
satélite. A idéia era de que o programa TV
um processo educacional capaz de desenvolver e
Escola alcançasse cerca de 58000 escolas da
veicular programas em todos os níveis e modali-
rede pública, 1,1 milhão de professores e 30
dades de ensino.[1] Isso permitiria que profissio-
milhões de alunos.[2]
nais da área de ensino pudessem resgatar aspectos
A programação, distribuída via satélite,
de sua formação, tomando contato com informa-
seria destinada às escolas públicas brasileiras,
ções gerais ou conteúdos específicos na sua pró-
com o objetivo de propor e manter a formação
pria região de atuação.
continuada dos professores em exercício, REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Como Fazer? Uma Retrospectiva do Programa do MEC, suas Perspectivas e Algumas Contribuições
particularmente aqueles distantes dos grandes
uma das áreas envolvidas gravá-los, com o
centros. A idéia era de que isto contribuísse
auxílio do equipamento que fora anteriormente
para o aperfeiçoamento do trabalho do profes-
doado às escolas. Para viabilizar esta sistemá-
sor, tanto na sala de aula, quanto no âmbito da
tica, o MEC divulgava toda a programação das
escola e da comunidade.
exibições em uma revista que também se cha-
Com essa perspectiva, em outubro de 1999,
mava TV Escola. Além dessa programação, a
iniciou-se a transmissão do projeto TV Escola,
SEED também distribuía para todas as escolas
voltado para o ensino médio, que envolvia três
da rede pública, um guia anual de programas,
tipos de programas, com estruturas muito distin-
na tentativa de facilitar a organização do pro-
tas. O primeiro deles, denominado O Acervo,
fessor na escolha dos programas ao longo de
apresentava diversos vídeo-documentários, com
todo o ano.
tempo de duração superior a 1 hora. Estes vídeos
Neste trabalho, focalizaremos nossa aten-
eram acompanhados de propostas dirigidas aos
ção no programa Como Fazer? devido ao nosso
professores, que visavam o melhor aproveita-
maior interesse nos projetos direcionados ao
mento dos mesmos em sala de aula. Já o pro-
ensino médio e, também, porque o acervo deste
grama Ensino Legal, focalizava questões
programa é, majoritariamente, direcionado aos
relacionadas aos currículos, projetos educacio-
professores e alunos do nível médio.
nais, metodologias de trabalho e sistemas de ava-
Assim sendo, pretendemos fazer uma des-
liação dirigidos aos professores do ensino médio.
crição dos diversos passos envolvidos, desde a
O terceiro programa do projeto TV
idéia inicial até a produção e edição dos vídeos
Escola era intitulado Como Fazer?; ele se
que serão transmitidos, via satélite, para todo o
baseava na exibição de vídeos com duração
país. Acreditamos que estas informações sejam
aproximada de 20 minutos, que eram acom-
importantes para todos os usuários dos vídeos,
panhados de textos breves, dirigidos tanto
ao mesmo tempo em que poderão esclarecer
aos professores quanto aos alunos. Acredi-
eventuais
tava-se que este formato deveria beneficiar
direcionamento deles.
dúvidas
quanto
à
escolha
e
tanto os professores quanto os alunos, uma vez que estavam sendo oferecidas imagens para ilustrar alguns conceitos, bem como tex-
}
tos que auxiliavam no entendimento dos mes-
TV ESCOLA – COMO FAZER? O PERCURSO DO VÍDEO FINAL
mos. Ressalte-se que o que se esperava era
Estabelecidas as perspectivas do alcance e
que o professor pudesse atuar como mediador
dimensão do programa Como Fazer?, o prime-
entre as imagens e o entendimento dos alunos
iro passo, e talvez um dos mais importantes,
acerca das mesmas.
reside na escolha adequada do vídeo que será
Todos esses programas eram transmitidos
tratado no programa. Neste caso, são pesquisa-
via satélite e caberia aos professores de cada
das as alternativas existentes tanto no mercado
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
49
José Carlos de Azambuja Bianchi e Pedro Faria dos Santos Filho
50
interno quanto no externo; para tal, a SEED
ensino médio, sendo um de cada área que
designa alguns funcionários, de formações
explorará o vídeo. Estes professores são convo-
diversas, que pesquisam junto às produtoras
cados para uma reunião na cidade de São Paulo,
brasileiras como TV Cultura e outras redes,
onde o vídeo lhes é apresentado. É importante
bem como em outras de países como Inglaterra,
salientar aqui que estes professores nunca
Canadá, França e Estados Unidos. Uma outra
assistiram aos vídeos e tampouco conhecem o
parcela de vídeos acaba sendo produzida pelo
conteúdo ou a pertinência dos mesmos, particu-
próprio MEC. Independentemente da origem
larmente para a área de Química. Os vídeos são
destes vídeos, não temos notícia dos critérios
entregues aos professores, que são, novamente,
adotados na seleção dos mesmos. Aparente-
convocados para uma próxima reunião que
mente, os Parâmetros Curriculares Nacionais
ocorrerá em cerca de 20 dias, quando será reali-
do Ensino Médio constituem uma sugestão de
zado o próximo passo.
abordagem dos saberes relativos ao ensino
Neste intervalo, os professores convidados
médio, em nome de competências a serem
assistem, insistentemente, aos vídeos, procu-
alcançadas, sem perder de vista o olhar
rando, nas imagens, a melhor maneira de apro-
específico de cada disciplina.
veitar o vídeo para ilustrar aulas dirigidas aos
Independentemente dos critérios adotados e
alunos do ensino médio. Merece comentário
de sua origem, o fato é que o acervo do MEC de
aqui o fato de que, uma vez rotulado pela
vídeos direcionados para o Ensino Médio está
SEMTEC como adequado para determinada
próximo de 500 unidades. Destes, aproxima-
área, não cabe ao professor questionar a perti-
damente 60 vídeos são indicados para a área de
nência, ou não, do vídeo para a sua área de atua-
Química. Ressalte-se, novamente, que estas indi-
ção. Concordando ou não, cabe a ele imaginar e
cações são feitas por funcionários designados
encontrar argumentos adequados para o melhor
pela SEED.
aproveitamento do vídeo.
O passo seguinte é identificar as áreas que
No próximo passo, os professores compare-
poderiam se beneficiar, de alguma maneira, de
cem à gravadora designada para gravar as ima-
cada um desses vídeos. Para isso, a parceria
gens que acompanham o vídeo. Nesta parte, cada
entre a Secretaria de Ensino a Distância e a
professor convidado dispõe de um tempo de
Secretaria de Educação Média e Tecnológica,
quatro minutos, ininterruptos, sem qualquer
SEMTEC, determina três áreas cujos domínios
censura ou filtro, onde ele expõe seu olhar e emite
contemplam argumentos e linguagem que
sua opinião dirigida aos professores do ensino
podem explorar, adequadamente, as imagens
médio. Nesta opinião, ele expressa sua visão de
apresentadas no vídeo.
como os professores deveriam explorar aquele
Uma vez identificadas as áreas que explo-
vídeo em aulas dirigidas aos alunos do ensino
rarão um determinado vídeo, a SEMTEC, de
médio. Aqui, ele também sugere atividades para a
acordo com seus critérios, designa uma equipe
sala de aula, propõe trabalhos interdisciplinares e,
composta por três professores que atuam no
na medida do possível, de acordo com o conteúdo REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Como Fazer? Uma Retrospectiva do Programa do MEC, suas Perspectivas e Algumas Contribuições
do vídeo, apresenta uma rápida demonstração
}
experimental, que pode ser reproduzida por pro-
COMO FAZER? O MATERIAL IMPRESSO QUE ACOMPANHA OS VÍDEOS
fessores que atuam junto ao ensino médio. Como
Uma outra tarefa, que é destinada aos pro-
a demonstração experimental é acompanhada
fessores que comentam os vídeos, é a produção
pelas câmeras de TV, todo e qualquer detalhe
de textos ou fichas de apoio, que acompanham
experimental pode ser ressaltado. Este procedi-
os vídeos e servem de apoio para os professores
mento é repetido para cada um dos três profes-
que utilizarão os vídeos. Até 2004, elas apre-
sores convidados, sendo que a mediação dos
sentavam os conceitos mais explícitos no
diálogos é feita por um apresentador do pro-
vídeo, e mesmo aqueles menos evidentes, mas
grama, que participa de todas as gravações.
que são pertinentes às imagens contidas no
Após a gravação da fala isolada de cada
mesmo. Além disso, neste material também se
um dos professores, a equipe composta pelos
ressaltava a interface da química e das outras
três dispõe de, aproximadamente, 12 minutos
áreas exploradas entre si, bem como se indi-
para propor um trabalho interdisciplinar; neste
cava as competências que seriam alcançadas
trabalho, a condição imposta aos professores é
utilizando aquele vídeo. Finalmente, este mate-
que ele envolva grande parte da comunidade
rial impresso deveria conter, ainda, a proposi-
escolar e que, obviamente, esteja atrelado ao
ção de atividades a serem desenvolvidas em
tema do vídeo. Até onde sabemos, esta pro-
sala de aula, que poderiam incluir questões para
posta surge de uma conversa preliminar entre
discussão, exercícios e alguma demonstração
os professores que compõem a equipe, e que
experimental.
dura apenas alguns minutos.
A partir de 2004, o programa, então inti-
Terminada esta fase, o conjunto de ima-
tulado Sala do Professor, passou a ser acom-
gens que comporão o vídeo, que será transmi-
panhado de fichas um pouco mais bem
tido via satélite, está completo e é finalizado
elaboradas, e que incluíam os seguintes pon-
pela produtora do vídeo. Na verdade, ele é
tos: um título especial, diferente do original,
composto por cerca de 20 minutos com as ima-
e que apresentasse algum apelo motivador
gens originais, importadas ou não, por 12
para os usuários; uma seleção de conteúdos,
minutos dos comentários individuais dos três
cuidadosamente escolhidos, em função do
professores, e por mais 12 minutos da proposta
tema do filme e do ano do ensino médio para
elabora pelo grupo de professores. Esta última
que se destina; estratégias para o trabalho
parte, composta pelos 24 minutos finais, até
interdisciplinar e para a exibição do filme em
2004, era denominada Sala do Professor.
sala de aula, incluindo as pau sas no filme e as
Atualmente, todo o conjunto de imagens recebe
reflexões que devem ser inseridas nestas
esta denominação.
pausas.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
51
José Carlos de Azambuja Bianchi e Pedro Faria dos Santos Filho
Em qualquer um dos casos, após a inclusão
inabilidade para mudar de conduta em sala de
de todos estes aspectos, as fichas são enviadas à
aula em função do novo recurso didático, bem
SEMTEC para revisão de texto e adequação ao
como a conduta inadequada dos alunos durante
espaço disponível para publicação, mas nunca
a apresentação dos vídeos.
para revisão do conteúdo! Terminada a edição
Há que se considerar, ainda, as longas jor-
feita pela SEMTEC, o fichário completo é
nadas de trabalho da maioria dos professores
enviado a todas as escolas da rede pública e fica
que atuam no ensino médio, em particular
à disposição dos usuários. Ele também pode ser
daqueles que atuam junto às escolas públicas.
encontrado na homepage do programa TV
Isso acaba limitando a capacidade do professor
[3]
Escola Como Fazer?, no site do MEC.
em se instrumentalizar para o bom exercício de sua atividade, bem como restringe o tempo que
}
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROGRAMA COMO FAZER? Acreditamos que seja inquestionável a necessidade de se oferecer subsídios aos pro-
lhada e cuidadosa do material disponibilizado pelo programa TV Escola. E é óbvio que o material requer esta análise por parte do professor para ser bem aproveitado!
fessores que atuam em regiões mais distantes,
Além disso, apesar de todo o esforço da
que se encontram isolados e carentes de novas
equipe de professores que comentam o vídeo, na
metodologias para o ensino, particularmente o
produção do material impresso que os acompa-
de Química. O programa TV Escola Como
nha, este acaba ficando aquém das necessidades
Fazer? representa uma tentativa importante,
dos professores que os utilizariam, para uma
que vai ao encontro das expectativas deste
exploração mais completa dos mesmos. É muito
público mas que, de certo modo, apresenta
provável que o professor, pelas mais diversas
ainda alguns pontos a serem considerados. O
razões, não se sinta à vontade para trabalhar os
mais importante é no tocante aos resultados de
conteúdos, bem como as atividades sugeridas na
uma análise feita pelo Núcleo de Estudos de
fichas impressas que acompanham os vídeos.
Políticas Públicas, da UNICAMP, sobre a
Infelizmente, apesar de todo o esforço empe-
implementação do projeto TV Escola no
nhado na implantação e execução do programa,
[4]
Em um grupo de 4141
estes são os indicadores da avaliação efetuada
professores que atuam no ensino médio, na
pelo núcleo de estudos da UNICAMP. Uma das
região Sudeste do país, 27% garantiram que
razões para tal, talvez, seja a não abrangência da
não estão treinados para utilizar este novo
ficha para a demanda do professor em uma explo-
recurso, enquanto que outros 17% asseguraram
ração mais completa do vídeo. Para aqueles pro-
que preferem utilizar o livro didático em vez
fessores de regiões mais remotas, acaba sendo
destes novos recursos. Os argumentos para tal
mais seguro e mais fácil, a simples exibição do
são os mais diversos, destacando-se a maior
vídeo, como uma atividade extra-classe, sem
quantidade de trabalho para o docente, a sua
explorá-lo da forma como é sugerido.
período 1997-2001.
52
ele poderia dedicar a uma análise mais deta-
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Como Fazer? Uma Retrospectiva do Programa do MEC, suas Perspectivas e Algumas Contribuições
}
UMA CONTRIBUIÇÃO PARA O PROGRAMA COMO FAZER?
alunos não soubessem o conteúdo, mas a verdade é que a espontaneidade foi perdida e todas
Considerando todas as dificuldades encon-
as dificuldades, inerentes a uma nova postura,
tradas pelos professores que atuam no ensino
vieram à tona. Resumidamente, podemos dizer
médio, decidimos avaliar a exeqüibilidade da
que, mesmo tendo a contribuição de todos os
proposta do programa TV Escola Como Fazer?
alunos, as aulas só começaram a tomar um for-
junto a um grupo de alunos de Pós-graduação do
mato adequado no final do semestre. Conside-
Instituto de Química da UNICAMP. A proposta
rando agora a situação de isolamento de muitos
foi testada em uma disciplina, em nível de
professores, podemos dizer que o objetivo deles
Pós-graduação, oferecida para 20 alunos; estes
atenderem às expectativas do projeto TV Escola
alunos foram devidamente esclarecidos quanto à
é, praticamente, inatingível. A menos que eles
metodologia e os procedimentos do programa
fossem treinados para tal, como foram os alunos
TV Escola Como Fazer? e o objetivo maior da
nesta disciplina.
disciplina era tentar atender a todas as expectati-
Um outro ponto que merece ser comentado
vas do projeto TV Escola. Para isso, foram sele-
foi que, ao longo do semestre, percebemos nos
cionados, previamente, 12 vídeos do acervo do
alunos certa dependência de algum material
MEC, que já haviam sido destinados às aulas de
que pudesse servir como ponto de partida para
Química. Em cada uma das aulas, com quatro
o preparo das aulas. Imaginamos, então, que
horas de duração, havia a exibição de um vídeo
poderíamos produzir um material de apoio,
original, sem os comentários dos professores, e
completo e detalhado, que acompanhasse os
todo o grupo de alunos discutia tudo o que pode-
vídeos do programa TV Escola. Este material
ria, eventualmente, ser abordado a partir daque-
deveria contemplar tanto a formação do profes-
las imagens. Ao final da discussão, uma dupla de
sor quanto a transposição para os alunos do
alunos era selecionada para ministrar uma aula,
ensino médio.
em nível de ensino médio, ancorada nas imagens
Considerando a complexidade desta pro-
do vídeo. Esta aula deveria ser ministrada na
posta, este tema foi desenvolvido em uma dis-
semana seguinte e deveria vir acompanhada de
sertação de mestrado apresentada no Instituto
um material impresso que desse o suporte
de Química da UNICAMP em 2005.[5] Este
adequado ao conteúdo de Química que seria
material se destina àqueles que pretendem utili-
abordado.
zar os vídeos ali explorados, e traz uma aborda-
A impressão que tivemos foi que, apesar de
gem muito completa e diferenciada de todo o
trabalharmos com um grupo de alunos, privile-
conteúdo químico que pode ser explorado a
giado e experiente, em um primeiro momento,
partir das imagens mostradas.
não estávamos preparados para uma aula de bom
Acreditamos que esta seja uma boa alter-
nível, ancorada em imagens e observações tira-
nativa para o melhor aproveitamento dos
das a partir de diálogos e situações. Não que os
vídeos disponíveis no acervo do MEC. Se
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
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José Carlos de Azambuja Bianchi e Pedro Faria dos Santos Filho
fôssemos capazes de produzir um texto ade-
TV Escola Como Fazer? do MEC, aliado à
quado para cada um dos vídeos, muito prova-
nossa experiência utilizando parte destes
velmente este acervo poderia ser utilizado com
vídeos em uma disciplina de Pós-graduação, e
muito mais eficiência e sua aplicação poderia,
ao desenvolvimento de um projeto de mestrado
também, ser muito mais prazerosa tanto para
baseado no mesmo acervo, nos permite afirmar
alunos quanto para professores.
que o direcionamento do programa é muito adequado e pertinente, mas que ainda requer
}
muito investimento na produção de material
CONSIDERAÇÕES FINAIS
complementar aos vídeos e no treinamento dos professores que o utilizarão.
No desenvolvimento deste trabalho observamos que a atualização dos saberes específicos da disciplina é da maior importância para o trabalho docente, pois assegura maior autonomia no direcionamento da disciplina e garante mais possibilidades de escolha de materiais e recursos didáticos. Além disso, alguns filmes considerados pela comissão da SEED como adequados para serem explorados em aulas de Química, estão muito distantes de qualquer abordagem interessante para os alunos desta disciplina. Isto sinaliza para o fato de que os meios de comunicação, enquanto recursos de apoio, não podem, ou não devem, ser empregados pelo professor no formato que lhe chega às
}
REFERÊNCIAS [1] SOUZA, P. N. P.; SILVA, E. B. Como entender e aplicar a nova LDB. São Paulo: Editora Pioneira Thomson Learning, 1997. [2] FIORENTINI, L. M. R. TV na escola e os desafios de hoje: curso de extensão para professores do ensino fundamental e médio da rede pública - UniRede e SEED/MEC. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 2000, V1. [3] http://www.mec.gov.br [4] NEPP, Pesquisa. Implementação da TV Escola no Brasil (1997-2001). Núcleo de Estudos de Políticas Públicas, UNICAMP. Campinas, 2002. [5] BIANCHI, J. C. A. Dois textos de química para dois vídeos do programa TV Escola Como Fazer? MEC, dissertação de mestrado, UNICAMP, 2005.
mãos. Por outro lado, parte considerável do acervo é adequada para a finalidade à qual se destina. O histórico apresentado sobre a concepção e utilização dos vídeos do acervo do programa
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Recebido em: 23 out. 2008 Aceito em: 25 mar. 2009
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
UMA PROPOSTA PARA ENSINAR ESTEQUIOMETRIA DE REAÇÕES QUÍMICAS EM SALA DE AULA Sabrina Gardoni Peixoto Guimarães Licenciada em Química pelo Centro Universitário de Caratinga – UNEC E-mail: sabrinagardoni@hotmail.com Camila de Lourdes Sousa Licenciada em Química pelo Centro Universitário de Caratinga – UNEC Elenice Aparecida Carlos Bacharel e licenciada em Química pela Universidade Federal de Viçosa – UFV
RESUMO Nesses últimos tempos tem sido difícil para o aluno estudar Química e, principalmente, entender estequiometria. A falta de interesse dos estudantes pode estar relacionada a diversos fatores, dos quais se destaca a abordagem tradicional do processo educativo. Neste trabalho, apresentamos um jogo como proposta de ferramenta didática para auxiliar no ensino do tema estequiometria. Utilizando apenas materiais de baixo custo, observamos que aquela atmosfera tediosa inicial foi substituída por uma maneira dinâmica e interativa de se obter o conhecimento desejado. Palavras-chave. Jogos didáticos; ensino de Química; estequiometria. ABSTRACT A PROPOSAL TO TEACH STOICHIOMETRY OF CHEMISTRY REACTIONS IN THE CLASSROOM. The stoichiometry is an essential tool to teach chemistry to students of medium level. As it has been difficult to make students interested in this subject, in this work we present a motivated and interactive proposal to broach this content in classrooms. By using only cheap materials, changes from a tedious atmosphere of classroom to a dynamic way of getting knowledge were observed. Key-words. Educational game; Chemistry teaching; stoichiometry.
}
INTRODUÇÃO Uma das tarefas mais importantes da Quí-
deve apontar as dificuldades presentes na compre-
mica no seu dia-a-dia é calcular as quantidades de
ensão, mas também o professor no ensino, pois
reagentes que serão consumidas numa determi-
mesmo buscando a melhor maneira de transmitir e
nada reação química e dos produtos obtidos por
fazer com que o aluno compreenda o significado
meio dessa reação. Todos esses cálculos são rela-
matemático do coeficiente estequiométrico, ele
tados no ensino médio com o nome de estequio-
pode não conseguir provocar a aprendizagem.
metria, um tema da química que tem dado muita
Portanto, é necessário buscar ferramentas que
dor de cabeça para os estudantes.
auxiliem o processo ensino-aprendizagem, por
Por trabalhar com relações de proporcionalidade entre os elementos que formam as diferentes substâncias e com balanceamento de equações, envolvendo apenas cálculos no processo, o tema não tem chamado atenção dos alunos. A falta de interesse dos estudantes pode estar relacionada a diversos fatores, sendo os
56
Ao trabalhar este tema, não somente o aluno
exemplo, os jogos didáticos. O jogo pedagógico ou didático é aquele fabricado com o objetivo de proporcionar determinadas aprendizagens, diferenciando-se do material pedagógico, por conter o aspecto lúdico2, é utilizado para atingir determinados
principais a abordagem tradicional do processo
objetivos pedagógicos, sendo uma alternativa
educativo como a transmissão-recepção de
para melhorar o desempenho dos estudantes em
informações, a falta de contextualização e a atu-
alguns conteúdos de difícil aprendizagem[3].
ante memorização[1]. Assim, assuntos que cons-
A importância do jogo na educação tem
tituem a base de uma determinada área do
oscilado ao longo dos tempos, mas, principal-
conhecimento, como é o caso da estequiometria
mente, nos momentos de crítica e reformulação
no ensino de Química, podem não ser bem assi-
da educação, são lembrados como alternativas
milados, comprometendo os próximos conteú-
interessantes para a solução dos problemas da
dos a serem abordados.
prática pedagógica[4].
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Uma Proposta para Ensinar Estequiometria de Reações Químicas em Sala de Aula
Nessa perspectiva, o jogo é o eixo que con-
O jogo foi montado em um papelão, cujo
duz a um conteúdo didático específico, resul-
tamanho pode variar. Sobre o papelão foram
tando em um empréstimo da ação lúdica para a
colocadas duas colunas: a primeira com as equa-
[5]
aquisição de informações .
ções químicas não balanceadas e a segunda com
Vendo o jogo como uma alternativa estimu-
os coeficientes estequiométricos. O objetivo do
lante da aprendizagem, é apresentado, neste tra-
jogo é fazer com que o aluno faça as associações
balho, um jogo como proposta de ferramenta
da primeira coluna com a segunda, com o mate-
didática para auxiliar no ensino do tema estequi-
rial metálico e do aparato montado para testar a
ometria, em aulas de Química do ensino médio.
condutividade elétrica.
Esta atividade lúdica visa proporcionar ao aluno uma maneira mais descontraída de adquirir o conhecimento, com o objetivo de despertar seu interesse e, conseqüentemente, uma participação efetiva durante a aula, a fim de alcançar uma aprendizagem mais significativa.
}
MATERIAIS • pedaço de papelão (30 x 40 cm); • papel sulfite; • tesoura; • prendedores de papel (de latão); • clipes; • fios elétricos; • aparato para testar a eletricidade; • fita adesiva; • cola.
}
MÉTODOS Figura 1. Montagem do jogo (a) frente e (b) verso.
Elaboração do jogo Esta atividade surgiu de modelo de jogo já existente, utilizado para trabalhar as expressões [6]
No verso do papelão as associações deve-
numéricas da Matemática . Para trabalhar com o
rão ser feitas corretamente, pelas conexões
tema estequiometria foram feitas algumas adap-
feitas entre os fios, percevejos e clipes
tações.
(material metálico), como mostra a Figura 1. O
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
57
Sabrina Gardoni Peixoto Guimarães, Camila de Lourdes Sousa e Elenice Aparecida Carlos
aparato para testar a corrente elétrica pode ser
cionaram a primeira coluna com a segunda e a
montado utilizando fios elétricos, lâmpada,
cada acerto, a lâmpada acendia. A equipe que
soquete e uma fonte de energia. As extremida-
conseguiu acender a lâmpada mais vezes e em
des livres dos fios do aparato deverão ser colo-
menor tempo, foi decretada vencedora.
cadas em contato com as pontas dos
A fim de verificar a contribuição desta ati-
percevejos, que perfuram o papelão, relacio-
vidade lúdica no processo de aprendizagem, foi
nando a primeira coluna com a segunda.
aplicada uma segunda lista de exercícios, com
O aluno deverá fazer as relações entre a pri-
o mesmo nível de dificuldade da lista anterior.
meira e a segunda coluna, de modo que a equa-
Em seguida, foi quantificado o número de acer-
ção fique corretamente balanceada fazendo com
tos de cada aluno na primeira e na segunda lista.
que a lâmpada do aparato acenda. }
RESULTADOS E DISCUSSÃO O jogo causou forte impacto nos estudantes. Inicialmente, os alunos não compreenderam a proposta apresentada pela professora, e pensaram que era apenas um pretexto para ela não dar aula. Perguntas do tipo “Professora, a senhora não vai dar aula?”, eram freqüentes. Acostumados a uma abordagem tradicional, os alunos entendem que as aulas devem ser apenas
Figura 2. Lâmpada do jogo acessa indicando que as colunas foram relacionadas corretamente.
com o professor transmitindo o conteúdo e os estudantes recebendo as informações de maneira passiva. No entanto, no decorrer da ativi-
Aplicação do jogo
dade os alunos perceberam que o jogo era também uma forma de ensinar/aprender Quí-
O tema balanceamento de equações quími-
mica, e a participação efetiva dos mesmos faci-
cas foi abordado antes da aplicação do jogo, de
litou o aprendizado e gerou um clima de
forma totalmente teórica, para uma turma de 1º
satisfação ao final da aula.
ano da Escola Estadual Engenheiro Caldas. Após
Este impacto positivo do jogo, na aprendi-
essa aula, foi aplicada uma lista de exercícios para
zagem dos alunos, pode ser percebido também
ser resolvida pelos alunos com o objetivo de veri-
pelos resultados das listas de exercícios, pois o
ficar o grau de assimilação dos mesmos.
rendimento dos alunos na lista 2, aplicada após
Num outro momento, o jogo didático foi aplicado na mesma turma, dividindo-se a sala
o jogo, foi melhor do que na lista 1, conforme apresentado na Quadro 3.
em três equipes. Os alunos de cada equipe rela-
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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
Uma Proposta para Ensinar Estequiometria de Reações Químicas em Sala de Aula
5 Primeira lista de exercícios
Segunda lista de exercícios
Número de acertos
4
3
2
1
0 1 2
3 4
5 6
7 8
9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 Aluno
Quadro 1. Rendimento obtido pelos alunos nas listas de exercícios.
}
CONSIDERAÇÕES FINAIS
}
A aceitabilidade dos alunos a esta nova proposta promoveu uma participação mais efetiva dos mesmos durante a aula, levando a uma melhora no desempenho dos alunos na resolução de exercícios de balanceamento de equações após a realização da atividade lúdica. Os resultados qualitativos e quantitativos indicam a eficiência da atividade proposta. Essa eficiência é resultado da dinâmica do processo que é proporcionada pelo jogo.
REFERÊNCIAS [1] http://www.unesp.br/prograd/PDFNE2002/ aproducaodejogos.pdf#search=%22jogos%20di d%C3%A1ticos%22, Acessada em Agosto 2006. [2] CUNHA, N. Brinquedo, desafio e descoberta. Rio de Janeiro: FAE. 1988. [3] GOMES, R. R.; FRIEDRICH, M. A Contribuição dos jogos didáticos na aprendizagem de conteúdos de Ciências e Biologia. EREBIO, 1, Rio de Janeiro, 2001, Anais, p. 389-92. [4] http://www.crmariocovas.sp.gov.br/dea_a.php?t=019, Acessada em Agosto 2006. [5] KISHIMOTO, T. M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. Cortez, São Paulo, 1996. [6] PASSOS, M. M. De Olho no Futuro. São Paulo: Quinteto Editorial, 1996.
Recebido em: 03 mai. 2008 Aceito em: 10 dez. 2008
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
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EDWARD FRANKLAND E AS TÉCNICAS DE LABORATÓRIO APC
Edward Frankland foi um dos mais notáveis químicos do século XIX. Nasceu em Churchtown (Lancaster), Inglaterra, em 1825. Iniciou-se com aprendiz de farmácia, estudou em Londres com Lyon Playfair e na Alemanha com Bunsen e Liebig. Ao retornar à Inglaterra foi professor de Química em diversas instituições e em 1897 recebeu o título de Sir. Faleceu em 1899. Fez importantes contribuições teóricas, dentre elas os conceitos de valência e ligação química, a constatação do grupo carboxila (-COOH) como característico dos ácidos orgânicos, preparou os primeiros compostos organometálicos e introduziu as primeiras fórmulas gráficas. Não menos importantes foram suas contribuições técnicas, muitas vezes ignoradas: o condensador de refluxo, a destilação em atmosfera inerte, a técnica do tubo selado, até hoje utilizadas; aparelhos para análise de água e para estudo de combustão, um coletor de gases, estes muito importantes em seu tempo. Os historiadores apontam que foram fundamentais para o desenvolvimento de seu trabalho, além de sua habilidade experimental, um ambiente adequado, disponibilidade de materiais (muitos ele trouxe da Alemanha, por não serem disponíveis ainda na Inglaterra) e sua grande capacidade de transferir tecnologia de uma área para outra.
}
BIBLIOGRAFIA [1] A dictionary of Scientists, Oxford University Press, Oxford. [2] RUSSEL, C. Chemical techniques in a preeletronic age: the remarkable apparatus of Edward Frankland, in Instruments and experimentation in The History of Chemistry. F. C. Holmes and T. H Levere (eds.), The Mit Press, Cambridge (MA), 2000.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
61
WILLIAM CROOKES E O ESPIRITISMO RFF
O inglês William Crookes (1832-1919) foi um químico de destaque, contando, dentre suas contribuições, a descoberta do tálio (Tl) e determinação de seu peso atômico, em 1861. Tornar-se-ia conhecido ainda, em Física, por seus estudos sobre descargas elétricas em gases rarefeitos (tendo produzido os famosos “tubos de Crookes” ou tubos de raios catódicos), que levariam à descoberta do elétron. Foi muito produtivo como pesquisador, publicando mais de 250 trabalhos, além de mais de uma dezena de livros. Por suas inúmeras contribuições científicas1, seria-lhe concedido, em 1897, o título de Sir. Contudo, Crookes dedicar-se-ia ainda ao estudo das manifestações espíritas (no que não agiu diferentemente de outras figuras célebres de seu tempo como Alfred Russel Wallace – co-propositor, com Charles Darwin, da teoria da evolução das espécies por meio da seleção natura - e Michael Faraday)2.
William Crookes
1.
Vela a pena destacar que durante toda a sua vida científica, Crookes jamais esteve vinculado à Universidades ou Centros de pesquisa. Tudo o que produziu cientificamente o fez no laboratório que montou em sua casa, sustentando-se com o lucro advindos de seus inventos e de suas publicações. Era, efetivamente, um pesquisador independente.
2.
A famosa Society for Psychical Research (S.P.R.) fundada em 1882, contava, entre seus membros, com diversos cientistas, como Lord Kelvin.
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63
História da Química
Vela a pena destacar que Crookes procurou aplicar, às suas investigações dos fenômenos espíritas, o mesmo rigor empregado em investigações científicas convencionais (embora haja dúvidas sobre até que ponto a objetividade de Crookes não foi afetada).
Um “tubo de Crookes”
Consta que o interesse de Crookes pelos fenômenos espíritas teria se intensificado (há indícios de que seu contato com o espiritismo já iniciar-se alguns anos antes) após a morte de seu irmão Philip (vítima da febre amarela, em Cuba, onde trabalhava como engenheiro elétrico). Estendendo sua experiência no campo das ciências para a investigação dos fenômenos espíritas, Crookes publicaria uma série de trabalhos com seus resultados. Dentre os “médiuns” estudados por Crookes, Florence Cook foi uma das que mais o impressionou. Muito embora tenha mais tarde abandonado as investigações espíritas, ao que tudo indica, Crookes permaneceria crendo na realidade física desses fenômenos e na possibilidade de sua explicação científica, bem como na realidade de uma vida após a que conhecemos.
64
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
POLANYI E O ENSINO DE QUÍMICA1 RFF
Diferentemente de Gastón Bachelar[1], cuja proposta epistemológica tornou-se muito difundida no Brasil, sendo, inclusive, no tocante ao ensino de química, tema de livro[2], a obra do Húngaro Michael Polanyi (Polányi Mihály, Budapeste – 1891-1976), é ainda muito pouco conhecida no Brasil, possivelmente em função da inexistência (até onde sabemos) de traduções de suas obras, cujos originais podem ser encontrados em inglês, por exemplo (ver bibliografia). Este pequeno artigo visa, justamente, trazer, no sentido de divulgar, por primeira vez quem sabe, para alguns colegas, um pouco da proposta epistemológica de Polanyi. No tocante aos que se dedicam ao ensino de química, em particular, vale a pena salientar que Polanyi era físico-químico, tendo dado importantes contribuições à essa área da química. Posteriormente em sua carreira, Polanyi dedicar-se à economia e à filosofia, com sua proposta epistemológica sendo a contribuição que aqui nos interessa.
Michael Polanyi
1.
O presente trabalho é parte integrante do livro “Polanyi e o ensino das ciências”, com publicação prevista para o final de 2009.
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65
História da Química
A partir dos anos 1930, Polanyi iniciou uma articulação de suas opiniões contra a prevalência do positivismo na ciência, argumentando que ele falha em reconhecer a contribuição que o compromisso/engajamento pessoal e do conhecimento tácito exercem na ciência. Em seu livro Personal knowledge Polanyi lança as principais idéias que compõem sua proposta epistemológica. Segundo Polanyi, sabemos muito mais do que podemos relatar, sendo o que podemos descrever (o chamado conhecimento explícito) apenas uma fração ínfima do todo (em relação ao que não pode ser descrito: o conhecimento tácito, do qual fazem parte as percepções e história de vida do indivíduo). Logo, para os que se dedicam ao ensino das ciências, torna-se evidente que a epistemologia de Polanyi “cai como uma luva” como referencial teórico interpretativo e como elemento norteador de práticas de ensino inovadoras. No tocante ao ensino da química, ciência por excelência dedicada ao estudo das transformações da matéria que são, desde cedo, vivenciadas em nosso cotidiano, o chamado conhecimento tácito tem um importante, realçando, uma vez mais, a adequação da emistemologia de Polanyi. Polanyi propõe que a dimensão tácita do conhecimento (de fundamental importância), não é devidamente considerada e valorizada pela escola tradicional. No tocante ao ensino de química, em particular, nossa experiência, quer como ex-alunos de cursos do ensino médio ou de nível superior, quer como professores, nos faz perceber a veracidade dessa assertiva.
}
REFERÊNCIAS [1] G. Bachelard, A formação do espírito científico, Contraponto, Rio de Janeiro, 1999. [2] L.T.S. Parente, Bachelar e a química, EUFC, Fortaleza, 1990.
Bibliografia M. Polanyi, Personal knowledge, The University of Chicago Press, Chicago, 1974. M. Polanyi, Science faith and society, The University of Chicago Press, Chicago, 1964. M. Polanyi, H. Prosch, Meaning, The University of Chicago Press, Chicago, 1977. M.T. Mitchell, Michael Polanyi, ISI Books, Wilmington, 2006. H.Prosch, Michael Polanyi – a critical exposition, State University of New York Press, Albany, 1986. W.T. Scott, M.X. Moleski, Micheal Polanyi – scientist and philosopher, Oxfor University Press, Oxford, 2005.
66
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
A criação de uma instituição de ensino de Química em Belém remonta a 1920 e foi resultante da ação de parlamentares paraenses na Câmara Federal, que aproveitaram a decisão do Congresso Nacional de criar diversos cursos de Química no país. Foram, assim, implantados cursos de Química nos institutos técnico-científicos já existentes nas cidades do Rio de Janeiro (então, a capital federal), São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte, Salvador e Recife. Como em Belém ainda não houvesse uma escola politécnica, foi necessário criar uma instituição própria. Com a ajuda a Associação Comercial do Pará, que possuía um MUSEU COMERCIAL, em prédio próprio, onde eram exibidas matérias-primas regionais e alguns processamentos e implementos físicos para obtenção de produtos acabados e semiacabados. Ali, foi montada a ESCOLA DE CHIMICA INDUSTRIAL, cujo prédio, de linhas neoclássicas, ainda se mantém edificado, servindo a outras atividades, e situado em local privilegiado, na praça da República.
Foi o primeiro diretor da escola o célebre cientista francês, já radicado em Belém, Paul Le Cointe, autor de vários trabalhos entre os quais a notável coletânea A AMAZÔNIA BRASILEIRA..., obra muito consultada por pesquisados químicos, botânicos, bioquímicos, médicos, farmacêuticos. A instituição de ensino recém-criada contava com a participação de professores pesquisadores franceses, convidados por Le Cointe, para integrarem o corpo docente da escola. Vieram da França, Charles Paris, Raymond Joannis e, posteriormente, René Rougier, Georges Bret, Camille Henriet e André Callier.
Posteriormente, em 1930, foram as atividades da Escola interrompidas em consequência do corte de verba de manutenção, encerrando-se, assim, um breve ciclo de atividades envolvendo ensino, pesquisa, extensão e prestação de serviços. Somente em 1956 proceder-se-ia a reabertura da Escola, graças ao trabalho e empenho pessoal de Clara Martins Pandolfo, que intercedeu junto à administração da Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA), no sentido de arcar com os custos de manutenção do curso de química industrial juntamente com a Associação Comercial do Pará.
Atualmente, depois de várias estruturações dentro da Universidade, dois departamentos concentram as atividades dos profissionais da química: o Departamento de Química (setor básico) e o Departamento de Engenharia Química e de Alimentos (tecnológico). Por sua vez, além do curso de química industrial preexistente, procedeu-se, já dentro da Universidade, a implantação de outros cursos de graduação em Química (licenciatura e bacharelado, no setor básico, e Engenharia Química e Engenharia de Alimentos, no setor tecnológico) e pós-graduação em Química (mestrado e doutorado, no setor básico) e Engenharia Química (mestrado, no setor tecnológico).
RESENHAS
}
CROMATOGRAFIA LÍQUIDA MODERNA: HPLC/CLAE LANÇAS, F. M. Cromatografia líquida moderna: HPLC/CLAE. Campinas, SP: Átomo, 2009.
A Cromatografia é uma técnica de separação que está presente em praticamente todas as áreas do conhecimento científico e tecnológico modernos: da petroquímica ao controle de qualidade de fármacos; do estudo da composição química da atmosfera de outros planetas à avaliação de resíduos de contaminantes em alimentos; do doping em esportes à contaminação ambiental; da proteômica ao “teste do pezinho” em recém-nascidos, além de muitas outras. Sua consolidação como técnica científica é atribuída ao botânico Tswett que, no início do século passado (1903-1906), divulgou resultados de suas pesquisas sistemáticas sobre o assunto. Essa modalidade de separação, atualmente denominada Cromatografia Líquida Moderna ou HPLC (High Performance Liquid Chromatography), sofreu uma revolução nos últimos 30 anos, o que permitiu um avanço espetacular em várias áreas do conhecimento científico, em especial, na análise de substâncias químicas de interesse para o bem-estar do homem, uma contribuição jamais alcançada por uma técnica analítica. Pode-se, ainda, antever que sua contribuição deverá ser ampliada nas próximas décadas (em especial, pela miniaturização da instrumentação, e novos desenvolvimentos nas colunas) consolidando-se como a mais importante técnica de análise instrumental do século XXI. Neste trabalho, o autor descreve as bases teóricas da técnica - a instrumentação e consumíveis necessários (com ênfase nas colunas), seus modos de operação, sua otimização e validação –, os métodos atuais de preparo da amostra e, a análise qualitativa e quantitativa. O enfoque principal é sempre a clareza e precisão dos conceitos, atualidade do assunto e a generalização sempre que possível. Tópicos particulares, de interesse para alguns poucos grupos de pesquisadores, não foram abordados em detrimento de um maior detalhamento dos assuntos de interesse da maioria dos usuários da técnica. WMJ
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química – vol. 3 – núm. 1
71
Resenha
}
ESTUDO DE CASOS NO ENSINO DE QUÍMICA SÁ, L. P.; QUEIROZ, S. L. Estudo de casos no ensino de química. Campinas, SP: Átomo, 2009.
O método de Estudo de Casos, uma variante do método Aprendizado Baseado em Problemas, também conhecido como Problem Based Learning (PBL), foi desenvolvido com o intuito de colocar os alunos em contato com problemas reais, de estimular o desenvolvimento do pensamento crítico, a habilidade de resolução de problemas e a aprendizagem de conceitos da área em questão. Ele possui a característica de enfatizar o aprendizado autodirigido, centrado no estudante. Pesquisas têm mostrado a sua potencialidade na promoção de um ensino que vise o desenvolvimento de conteúdos não apenas informativos, mas também formativos em cursos de Ciências. O primeiro capítulo do livro versa sobre as origens e a popularização do método no ensino de Ciências, enquanto o segundo capítulo apresenta considerações importantes a respeito do processo de produção dos casos e de estratégias para sua aplicação. No capítulo seguinte, discutem-se os principais objetivos e resultados alcançados com o emprego do método no ensino de Química. No quarto capítulo, é apresentada uma experiência sobre o uso do método de Estudo de Casos em um curso de Bacharelado em Química. Depois, discute-se em que medida as propostas de ensino pautadas no método de Estudo de Casos podem estimular a elaboração de argumentos por parte dos alunos. O sexto capítulo apresenta uma bibliografia comentada, composta de vinte e nove trabalhos, que tratam do método de Estudo de Casos aplicado à área de Química, localizados a partir de levantamento bibliográfico realizado em revistas da área de Educação em Química. Cada trabalho que integra esta bibliografia é acompanhado de um pequeno resumo, no qual são apresentados aspectos relevantes discutidos em cada obra. WMJ
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NORMAS EDITORIAIS
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Átomo que aceita colaborações em forma de arti-
Ao encaminhar os trabalhos para análise
gos, resenhas, relatos de experiência, notícias e
do Comitê Científico, os autores deverão
memória fotográfica da Química no Brasil. Os
observar as seguintes orientações: 1. Originalidade e ineditismo dos textos: o autor deve enviar, junto com o trabalho, uma declaração na qual se compromete a não apresentá-lo, simultaneamente, em outro periódico, durante o prazo estipulado para avaliação, e autoriza a sua publicação nesta revista. 2. As colaborações devem ser redigidas em português ou espanhol. Em casos excepcionais, cuja pertinência será analisada pelo Comitê, serão aceitos textos em inglês e francês, que deverão ser traduzidos para a língua portuguesa. 3. Em folha à parte, devem ser informados os dados de autoria: título do trabalho, nome completo, vinculação institucional, formação acadêmica e endereço residencial ou institucional do autor (incluindo telefone e e-mail) para o encaminhamento de correspondência pela Secretaria de Redação. 4. No caso de artigos, os originais não poderão exceder o limite máximo de 40.000 caracteres (com espaço), incluindo todos os elementos gráficos disponíveis no arquivo. Para resenhas,
textos poderão ser publicados em português e espanhol. Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo, necessariamente, a opinião ou pensamento da coordenação e conselho editoriais. Os originais submetidos a análise do Comitê Científico serão encaminhados a, no mínimo, dois conselheiros do seu corpo editorial, os quais avaliarão de forma específica e decidirão sobre a pertinência dos textos à linha editorial da revista. Em caso de necessidade de revisões de conteúdo ou adequações às normas editoriais, o autor receberá os pareceres dos conselheiros, ficando, assim, responsável pela reapresentação do trabalho reformulado no prazo de 45 dias, contados a partir da data de recebimento da comunicação. O anonimato entre autores e conselheiros, durante o processo de arbitragem dos textos, é garantido pelo Comitê. O prazo médio estipulado para a apresentação do resultado final é de até 60 dias, a contar da data de recebimento do texto. Os trabalhos não aprovados pelos conselheiros, ou não devolvidos no prazo estipulado para reformulação, serão arquivados e os autores informados.
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notas críticas e outros, observar o limite de 10.000 caracteres (com espaço). 5. Quanto à estrutura do texto, devem ser observadas as seguintes orientações: na primeira página, apresentar o título e subtítulo do trabalho, o resumo e as palavras-chave (até 05, evitando-se combinações extensas que não correspondam ao conteúdo do texto). Todos esses elementos devem ser apresentados em português ou espanhol e inglês. 6. Os textos devem ser digitados no programa Word for Windows, em fonte Times New Roman, tamanho 12, com espaço duplo, e enviados por correio eletrônico para o seguinte endereço: rebeq@atomoealinea.com.br
por asterisco (*,**,***) no rodapé da página a que se refere. As citações autorais deverão ser feitas em seqüência numérica e apresentadas ao final do artigo
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SOBRE A UTILIZAÇÃO DE IMAGENS As tabelas, quadros e figuras (ilustrações, fotografias, gráficos, entre outros) devem ser apresentados com o máximo de resolução (300dpis em diante), em preto e branco, em arquivo à parte e, de preferência, finalizados para sua inserção direta no texto. Para a produção das tabelas, recomenda-se seguir as orientações do IBGE (www.ibge.gov.br) publicadas em suas normas de apresentação tabular. Todos esses elementos gráficos devem estar indicados
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SOBRE REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E NOTAS
e numerados, consecutivamente, ao longo do texto, de acordo com a ordem em que aparecem.
O autor do trabalho é responsável pela exatidão, organização e utilização correta das referências e citações constantes no texto, bem como na listagem bibliográfica a ser apresentada no final
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SOBRE A NATUREZA DA COLABORAÇÃO E RECEBIMENTO DE EXEMPLARES
dos artigos. A Associação Brasileira de Normas
Fica aqui expresso que a participação dos
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autores neste periódico é de caráter espontâneo,
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portanto, não-remunerado. O autor principal
ções necessárias para a organização das referên-
receberá, gratuitamente, dois (02) exemplares da
cias bibliográficas. No caso de notas, esse recurso
edição em que seu artigo foi publicado, mais
tem seu uso limitado ao caráter explicativo-infor-
separata eletrônica deste; os co-autores receberão
mativo, neste periódico, evitando-se a utilização
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de notas bibliográficas. As notas, quando utiliza-
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das, devem aparecer em seqüência representada
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