ReBEQ v.5 n.1 e 2 - Revista Brasileira de Ensino de Química

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ISSN 1809-6158

VOLUME 05 | NÚMERO 1/2 | JAN./DEZ. 2010


VOLUME 05 | NÚMERO 1/2 | JAN./DEZ. 2010

Coordenação Editorial Pedro Faria dos Santos Filho – UNICAMP Robson Fernandes de Farias – UFRN Wilon Mazalla Jr – Editora Átomo Conselho Editorial Adriana Vitorino Rossi – UNICAMP Gláucia Maria da Silva – USP|RP Marcelo Carneiro Leão – UFRPE Mário Sérgio Galhiane – UNESP Osvaldo Antonio Serra – FFCLRP-USP Ótom Anselmo de Oliveira – UFRN Ricardo Ferreira – UFPE Sérgio Melo – UFC Yassuko Iamamoto – USP Conselho Ad hoc Marlon Herbert F. B. Soares – UFG Nidia Franca Roque – UFBA Viviani Alves de Lima – UFU Revista Brasileira de Ensino de Química rebeq@atomoealinea.com.br www.atomoealinea.com.br/rebeq Revisão Bruna Oliveira Gonçalves Capa Fabio Diego da Silva Editoração Eletrônica

Revista Brasileira de Ensino de Química (ReBEQ) é uma publicação semestral da Editora Átomo e colaboradores. Dentro do espírito maior da editora, que é a difusão do conhecimento por meio da democratização das valiosas pesquisas e avanços científico-educacionais, quase sempre em latência nas boas universidades, e pelo intercâmbio de ideias e experiências daqueles que participam do processo ensino/aprendizagem, a ReBEQ inaugura novo espaço, abrindo suas páginas para pesquisadores, docentes (ensino médio e superior), alunos de graduação e pós-graduação, com a visão de que o conhecimento deve ser construído e compartilhado coletivamente. O conhe­ cimento contemporâneo deve ser apresentado de forma inter/ transdisciplinar trazendo preocupações como a ética, o meio ambiente e a humanização dos processos e serviços. Centrada nas questões ensino/aprendizagem, visa contribuir para a atuali­ zação e otimização do Ensino de Química.

Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas e Informação PUC-Campinas Revista Brasileira de Ensino de Química Campinas, SP: Editora Átomo, 2006 v. 1, n. 1, jan./jun. 2006 Semestral Publicação científica-educacional 1. Química – Periódicos. 2. Ciências exatas – Periódicos.

Patrícia Lagoeiro Indexada

CDD 540 Índice para Catálogo Sistemático 1. Química

540

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Rua Tiradentes, 1053 - Guanabara - Campinas-SP CEP 13023-191 - PABX: (19) 3232.9340 e 3232.0047 www.atomoealinea.com.br


VOLUME 05 | NÚMERO 1/2 | JAN./DEZ. 2010

Sumário

7 Editorial Artigos

9 17 29

Ligação Hidrogênio: uma contribuição para o Ensino de Química Adriano de Souza Reis e Pedro Faria dos Santos Filho

Animações 3D para o Ensino de Química Silvio Henrique Fiscarelli, Maria Helena S. S. Bizelli, Luiz Antonio Andrade de Oliveira e Patrícia Eliane Fiscarelli

Recursos Computacionais no Ensino de Química Orgânica Jeanny Gomes Caixeta, Gérson Carlos Rezende, Paulo Sérgio Gonçalves Nunes e Claudemir Batalini

Estudo sobre as Interações Intermoleculares com Auxílio de uma Simulação 37 Um Computacional Agnaldo Arroio e Claudia Ayres

47

Aplicação de Recursos Multimídias para o Ensino de Modelos Atômicos em Química: impressões e receptividade dos alunos do curso de engenharia Vinícius Garcia Freaza

Relatos de Experiência

57

A Aprendizagem dos Fundamentos da Química Orgânica com o Emprego de Modelos Moleculares Ricardo Barroso Gomes

63

A Utilização de Jornais e Revistas como Instrumento para o Aprendizado em Química: uma proposta construtivista Mauricio Ferreira da Rosa, Viviane da Silva Lobo e Iara Lucia Lazzarin


71

A Acidez Estomacal e Sua Função na Digestão: um experimento para despertar a curiosidade e aumentar o interesse de alunos do Ensino para Jovens e Adultos Lílian Carvalho e Weverson Ferreira

77

Atividades Criativas em Grupo Aplicadas a Aulas Experimentais de Química para Ensino Médio e Graduação Marcia C. Delpech

83

Ensinar Química Geral nos Cursos de Graduação: é possível tornar o conhecimento significativo? Ana Luiza de Quadros, Dayse Carvalho da Silva, Flávia dos Santos Coelho e Marcos Vinicius Ribeiro

e Descaminhos da Prática do Professor de Química no Contexto da 95 Caminhos Transposição Didática Rafael de Jesus Santana

107

Experimentos Integrados para a Melhoria das Aulas Práticas: proposta metodológica, análises e resultados Hélvio Silvester A. de Sousa, Ethanielda de Lima Medeiros e Alcineia Conceição Oliveira

Instrumentos e Criatividade

123

Construindo um Calorímetro de Água para a Contextualização do Ensino de Química Utilizando a Temática “Alimentos” Mara Elisa Fortes Braibante, Hugo Tubal Schmitz Braibante, Maurícius Selvero Pazinato e Marcele Cantarelli Trevisan

História da Química

133

RFF e JMF

135

RFF

Schrödinger Não Acreditava em Sua Equação

Um Pouco da História da Guerra Química

139 Resenhas

141

Normas para Publicação


Contents

7 Editorial Articles

9 17 29

Hydrogen Bond: a contribution for the Chemistry Teaching Adriano de Souza Reis e Pedro Faria dos Santos Filho

3D Animations for the Chemistry Teaching Silvio Henrique Fiscarelli, Maria Helena S. S. Bizelli, Luiz Antonio Andrade de Oliveira e Patrícia Eliane Fiscarelli

Computational Resources for Organic Chemistry Teaching Jeanny Gomes Caixeta, Gérson Carlos Rezende, Paulo Sérgio Gonçalves Nunes e Claudemir Batalini

37

Agnaldo Arroio e Claudia Ayres

47

Multimedia Resources Application for the Teaching of Atomic Models in Chemistry: receptivity and impressions from students of Engineering

A Study on Intermolecular Forces with Computer Simulation Assistance

Vinícius Garcia Freaza

Experiences Account

57

The Learning of Organic Chemistry’s Basis through the Use of Molecular Models Ricardo Barroso Gomes

Use of Newspapers and Magazines as a Tool for Learning in Chemistry: a 63 The constructivist approach Mauricio Ferreira da Rosa, Viviane da Silva Lobo e Iara Lucia Lazzarin

71

Stomach Acidity and its Role on Digestion: an experiment to increase the curiosity and interest of students in adult and young teaching Lílian Carvalho e Weverson Ferreira

77

Group Creative Activities Applied in Experimental Chemistry Classes to College and University Students Marcia C. Delpech


Chemistry Teaching in Undergraduate Courses: is it possible to make 83 General meaningful knowledge? Ana Luiza de Quadros, Dayse Carvalho da Silva, Flávia dos Santos Coelho e Marcos Vinicius Ribeiro

95

Ways and Problems in the Practice of the Chemistry’s Teacher in the Context of Didatics Transposition Rafael de Jesus Santana

Experiments to the Improvement of Practical Classes: methodological 107 Integrated evaluation, analyses and results Hélvio Silvester A. de Sousa, Ethanielda de Lima Medeiros e Alcineia Conceição Oliveira

Tools and Creativity

123

Building a Water Calorimeter for the Contextualization of Chemistry Teaching Using Food as the Theme Mara Elisa Fortes Braibante, Hugo Tubal Schmitz Braibante, Maurícius Selvero Pazinato e Marcele Cantarelli Trevisan

Chemistry History

133 135

Schrödinger Didn´t Believe in His Equation RFF e JMF

A Few Comments About the Chemistry War History RFF

139 Reviews

141

Editorial Standards


Editorial

Com o desenvolvimento de novas tecnologias, os professores de todas as disciplinas se veem diante de um verdadeiro arsenal de recursos que poderiam, em princípio, serem aplicados ao ensino. Apesar de os professores poderem se beneficiar destes novos recursos, é razoável imaginar que aqueles que têm que contar com a capacidade de abstração do aluno deveriam, em princípio, ser mais beneficiados que os demais. Isto se justifica pelo fato de que estes novos recursos permitem que se criem imagens, que podem auxiliar os alunos na compreensão de muitos conceitos que têm se mostrado, ao longo do tempo, de difícil entendimento. A química, particularmente, é uma área em que a inserção destes novos recursos, aplicados ao ensino, tem se mostrado essencial na elucidação fenomenológica. A ReBEQ, com sua missão de estimular a produção do conhecimento e divulgar os novos recursos aplicados ao ensino, inicia, aqui, uma viagem através do desenvolvimento e aplicações destas novas tecnologias, numa tentativa de instrumentalizar os docentes de todas as regiões do país e estimulá-los a utilizar recursos já disponíveis para toda a comunidade, bem como divulgar os resultados de sua aplicação nos vários níveis de ensino. Este volume 5, nos números 1 e 2, apresenta um conjunto de trabalhos que incluem animações, simulações, recursos multimídia e computacionais, bem como a utilização de modelos moleculares no ensino de diversos tópicos de química. Sua aplicação é uma tendência irreversível no ensino e que deve ser estimulada, cada vez mais, entre os professores de química. Alie-se a isto a exigência marcante da comunidade estudantil para a inserção destes recursos no ensino. Convidamos, mais uma vez, professores e alunos a divulgarem suas experiências no desenvolvimento e nas aplicações de novos recursos no ensino de química, numa tentativa de desenvolver esta área, ainda embrionária, em nosso país. Se conseguirmos difundir esta ideia no meio acadêmico, estaremos dando um grande auxílio àqueles que se encontram distantes dos grandes centros em que a aplicação de uma gama de recursos visuais já vem sendo realizada.

Coordenação Editorial



Artigo 01 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 9-16

Ligação Hidrogênio: uma contribuição para o Ensino de Química Hydrogen Bond: a contribution for the Chemistry Teaching Adriano de Souza Reis e Pedro Faria dos Santos Filho1

RESumo

As forças intermoleculares são muito importantes para o entendimento das propriedades físicas e reatividade das moléculas. Dentre estas forças a ligação hidrogênio destaca-se como uma das mais interessantes e particulares. Ela se restringe à existência de um átomo de hidrogênio ligado a outro átomo muito eletronegativo e tem a particularidade de apresentar um caráter direcional que a diferencia de uma interação dipolo-dipolo convencional. Neste trabalho comparamos os valores dos pontos de ebulição dos compostos formados a partir de todas as combinações do átomo de hidrogênio com os átomos dos elementos das famílias 14 a 17; discutimos as características das interações dipolo-dipolo, destacando a importância do caráter direcional que torna a ligação hidrogênio tão particular, e que ajuda a entender os valores observados dos pontos de ebulição destes compostos. Palavras-chave: Ligação hidrogênio. Interação dipolo-dipolo. Forças intermoleculares. ABSTRACT

The intermolecular forces are very important in the understanding of physical properties and reactivity of molecules. Among these forces the hydrogen bond is one of the most interesting and particular. It restrings itself to the existence of a 1

Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Química.


hydrogen atom bound to a very electronegative atom and presents a distinctive directional character which distinguishes it from the conventional dipole-dipole interactions. In this work we analyze the boiling points of the compounds formed by the combinations of hydrogen and all the atoms of the 14-17 groups of the periodic table; we also discuss the particularities of the dipole-dipole interactions giving emphasis to the directional character which become the hydrogen bond so particular, giving an explanation for the observed boiling points. Key-words: Hydrogen bond. Dipole-dipole interaction. Intermolecular forces.

1. Introdução

químicos são primordiais. Aliado a eles encon-

Na construção do conhecimento, a passagem das moléculas para as substâncias não é muito simples. Nas moléculas isoladas, ainda que difíceis de serem imaginadas, é fundamental o entendimento das ligações químicas que mantêm os átomos constituintes unidos. O passo seguinte é tentar entender como estas moléculas se organizam ou se agregam umas às outras. Afirmar se existe ou não ligações químicas entre elas é uma questão a ser discutida e depende da maneira que pensamos. Normalmente, os livros didáticos (Shriever, 2003; Huheey, 1993) e os professores de química tratam das substâncias moleculares como um conjunto de moléculas unidas através do que eles chamam de “forças intermoleculares”. Estas forças intermoleculares são classificadas em diversas categorias, mas têm, essencialmente, a mesma natureza eletrostática, independentemente da denominação que recebem. Na verdade, quando moléculas se aproximam umas das outras, elas se perturbam mutuamente, atraindo-se e repelindo-se de acordo com sua natureza. A grande dúvida que surge, agora, é com relação ao tipo de interação que se estabelece entre as moléculas. Existiria, aqui, a formação de novas ligações químicas? Qual o critério para se

tramos os modelos.

diferenciar uma interação entre moléculas de uma

As forças intermoleculares, aliadas à estrutura atômica e às ligações químicas, representam os grandes pilares da Química. A grande maioria das interpretações microscópicas dos fenômenos acaba recaindo sobre estes fundamentos; isto os torna imprescindíveis para os profissionais da Química e justifica sua abordagem em todos os níveis. A maneira que esta abordagem é feita e a carga horária a ela destinada depende do nível, da instituição e do interesse de professores e alunos. A verdade é que, no desempenho de suas funções, os químicos, tanto da academia quanto do setor produtivo, se deparam, a todo o momento, com estes fundamentos. Se, na formação de um químico, o esforço para se entender estrutura atômica e ligação química já é enorme, ele cresce ainda mais para se entender as forças intermoleculares. A vantagem é que, ao discutir este assunto, os alunos já têm certa familiaridade com a utilização de modelos e, particularmente, quanto ao seu significado. O caminho a ser traçado agora é muito semelhante ao já percorrido no estudo de estrutura atômica e ligação química. Novamente, as observações dos fenômenos que nos cercam e o olhar atento dos

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Ligação Hidrogênio

ligação química entre elas? A dúvida é se a única

diferentes. Neste caso, tanto a ligação quanto

interação entre as moléculas é essencialmente

a molécula são polares. Se imaginarmos agora

eletrostática e multidirecional (física), ou se,

um conjunto destas moléculas, fica evidente que

a partir de determinado ponto, passa a existir

a polaridade desta ligação induz a uma forma

“sobreposição” de orbitais e um caráter direcional

preferida de orientação quando as moléculas se

na interação (química). Estas duas situações podem

aproximam umas das outras. Nesta orientação

ocorrer isoladamente ou elas se complementam?

preferencial, a parte deficiente de elétrons de

Como veremos adiante, as respostas a estas

uma molécula tende a se aproximar da região

questões não são muito simples (Reis, 2008).

onde existe maior densidade eletrônica da

Aparentemente, é possível diferenciar as

outra molécula, estabelecendo-se, assim, uma

interações entre as moléculas como físicas ou

interação dipolo-dipolo. O conjunto de todas estas

químicas. As interações físicas seriam aquelas

interações dipolo-dipolo, que se estabelecem entre

de natureza essencialmente eletrostática, que

todas as moléculas, acaba sendo responsável pelas

agem a distâncias maiores que as de uma ligação

propriedades físicas da substância.

covalente, e que se estabelecem entre moléculas

Seria de se esperar que, quanto mais

polares ou entre moléculas apolares; seriam

acentuada

interações de longo alcance. Por outro lado, as

negatividade, maior seria a interação dipolo-

interações

seriam

-dipolo que mantém as moléculas agregadas umas

de curto alcance, de caráter direcional e com

às outras. Isto deveria resultar em maiores pontos

superposição de orbitais; envolveriam a formação,

de fusão e ebulição. Entretanto, nas moléculas

ainda que parcial, de ligações covalentes.

diatômicas heteronucleares, onde um dos átomos

químicas

intermoleculares

fosse

esta

diferença

de

eletro-

Dentre as forças intermoleculares, destaca-

é o hidrogênio, a situação parece ser um pouco

-se a ligação hidrogênio, característica em certas

mais complicada. Os dados mostrados na Tabela 1

moléculas e responsável por muitas propriedades e

relacionam os valores dos pontos de ebulição dos

características particulares de muitas substâncias.

compostos formados a partir das combinações do

Dentre elas, a água, uma das espécies de mais

hidrogênio com os elementos das famílias 14 a 17.

difícil interpretação para os químicos e, talvez,

Os dados da Tabela 1 apontam para algumas

um dos maiores desafios para o entendimento

características bastante interessantes. Chama a

científico humano.

atenção o fato de que, dentre estas 16 espécies formadas a partir de combinações envolvendo o átomo de hidrogênio, apenas a água apresenta-se

2. A

interação dipolo-dipolo

no estado líquido à temperatura ambiente. As outras 15 substâncias, mesmo aquelas com uma diferença

Em um composto molecular, onde os

de eletronegatividade bastante acentuada, como é

átomos que participam da molécula apresentam

o caso da molécula de HF (1,82), apresentam-se no

eletronegatividades diferentes, as ligações cova-

estado gasoso à temperatura ambiente. Isso mostra

lentes acabam apresentando polaridade. Isso

que, apesar das moléculas serem polares, e poder

não significa que a molécula deva ser polar, mas

existir uma forte interação intermolecular do tipo

apenas a ligação isolada. Em uma situação bem

dipolo-dipolo, ela não é suficiente para manter

simples, vamos imaginar uma molécula diatômica

as moléculas agregadas. Em outras palavras, em

onde os dois átomos sejam de elementos químicos

moléculas pequenas, constituídas por um número

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Adriano de Souza Reis e Pedro Faria dos Santos Filho

Tabela 1. Comparação entre os valores dos pontos de ebulição [CRC Handbook (2010)] para espécies que apresentam o mesmo arranjo estrutural. P.E (oC)

P.E (oC)

P.E (oC)

CH4

-161

NH3

-33

H2O

100

HF

20

SiH4

-111

PH3

-87

H2S

-59

HCl

-85

GeH4

-88

AsH3

-62

H2Se

-41

HBr

-66

InH4

-51

SbH3

-17

H2Te

-2

HI

-35

reduzido de átomos, nem mesmo uma forte

mais polares, diminui a interação entre elas; à

interação dipolo-dipolo é suficiente para mantê­

primeira vista, parece que a interação dipolo­

‑las unidas à temperatura ambiente. Por isso, nesta

‑dipolo não é tão importante em moléculas di,

condição, elas se apresentam no estado gasoso.

tri e tetra-atômicas, em que um dos constituintes

Por outro lado, comparando-se, agora, os

das moléculas é o hidrogênio. Além disso, parece

valores da Tabela 1 entre si, notamos algumas

também que a massa atômica do outro átomo tem

características que merecem uma análise bem

um efeito maior no ponto de ebulição, sendo que

cuidadosa. Entretanto, antes de iniciar esta análise,

quanto maior a sua massa atômica, maior o ponto

vale a pena enfatizar que devemos tomar certo

de ebulição.

cuidado nas comparações a serem feitas, pois

Considerando agora os primeiros compos­

não podemos fazer comparações onde mais de

tos de cada coluna, ou seja, NH3, H2O e HF,

um efeito varie. Não podemos, por exemplo,

12

P.E (oC)

eles são os que apresentam a maior diferença de

comparar as propriedades dos compostos H2Se

eletronegatividade dentre todos os compostos

e CH4, que apresentam a mesma diferença de

de sua coluna. Contrariamente a tudo o que foi

eletronegatividade entre os átomos envolvidos,

afirmado no parágrafo anterior, eles são os mais

mas que apresentam arranjos estruturais distintos

polares e, ao mesmo tempo, os que apresentam

além de uma molécula ser polar e a outra apolar!

os maiores pontos de ebulição. Aparentemente,

Vamos considerar, inicialmente, apenas os

deve existir algum efeito adicional, ou alguma

casos em que o hidrogênio está ligado a elementos

característica, nestes três compostos, que os

mais eletronegativos que ele. Para isso, vamos

tornam tão diferentes dos demais. No caso

excluir desta discussão os compostos formados a

específico da água, esta diferença é tão marcante

partir dos elementos da família do carbono. Além

que, mesmo à temperatura ambiente, ela é a única

disso, apenas por conveniência, os primeiros

espécie, dentre todas as dezesseis, que se apresenta

compostos de cada coluna da Tabela 1 (NH3,

no estado líquido. Quem sabe um olhar mais atento

discussão preliminar.

para explicar estas, aparentes, anomalias!

H2O e HF) também serão deixados de lado nesta

ao átomo de hidrogênio não indique um caminho

Para o restante da tabela, o que se observa é

O hidrogênio é um dos elementos químicos

que, contrariamente ao esperado, em uma mesma

mais interessantes para se estudar devido à sua

família, à medida que se aumenta a diferença de

versatilidade. Ele pode gerar cátion ou ânion,

eletronegatividade entre o hidrogênio e o outro

interagir com grande parte dos elementos químicos

átomo, o ponto de ebulição diminui. Em outras

conhecidos, além de compartilhar elétrons tanto

palavras, à medida que as moléculas se tornam

com elementos mais eletronegativos quanto

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Ligação Hidrogênio

menos eletronegativos que ele. Talvez seja pelo fato de apresentar apenas um elétron ao redor do seu núcleo, que este elemento apresente tamanha variedade de comportamentos. Em meio a toda esta variedade de compostos que ele participa, destaque deve ser dado àqueles em que ele se encontra ligado a elementos muito eletronegativos, como flúor, oxigênio e nitrogênio. À primeira vista, não seria de se esperar nada de diferente em relação às outras interações nas quais os dois átomos têm eletronegatividades muito diferentes. O que acontece agora é que, como o hidrogênio apresenta apenas um elétron ao redor do seu núcleo, nestas interações este elétron passará a ser atraído muito mais fortemente pelo núcleo do outro átomo, deixando uma região ao redor do seu núcleo, praticamente, sem elétrons a maior parte do tempo. Utilizando apenas a teoria da ligação de valência, vamos examinar mais detalhadamente esta interação. Como a diferença de eletronegatividade entre o átomo de hidrogênio e o outro átomo é muito acentuada, isto faz com que

3. A

ligação hidrogênio Como estamos utilizando a teoria da

ligação de valência, o raciocínio, ainda que mais superficial, é mais simples, basta apenas pensarmos em termos de atrações entre núcleos e elétrons. A interação dipolo-dipolo, tratada do ponto de vista essencialmente eletrostático, não deixa de ter uma componente repulsiva, uma vez que os dipolos são nuvens eletrônicas que apresentam algum desvio em relação a alguma situação ideal (maior ou menor densidade eletrônica). De qualquer forma, os dipolos são nuvens eletrônicas que se repelem a partir de certa aproximação. E quanto menor a densidade eletrônica no dipolo, maior será a aproximação entre eles. Ao redor de um determinado dipolo, os outros dipolos poderão se organizar de duas maneiras, ou seja, alinhados com o dipolo ou paralelos ao dipolo, como mostrado na representação a seguir: Aδ+- Bδ- Aδ+- BδBδ-- Aδ+

os elétrons envolvidos na ligação covalente se

No caso de um dos átomos que participam

concentrem a maior parte do tempo na região entre

do dipolo ser o hidrogênio, todas as considerações

os dois núcleos, só que muito mais próximos do

que fizemos anteriormente passam a ser impor-

núcleo do outro átomo. Apesar de existir um par de

tantes. Em primeiro lugar, a aproximação com

elétrons que é atraído simultaneamente pelos dois

os dipolos em paralelo não deve ser tão efetiva,

núcleos, eles se concentram muito mais próximos

como indicam os valores dos pontos de ebulição

do átomo mais eletronegativo. Se imaginarmos a

mostrados na Tabela 1. É provável que a repulsão

linha de união entre os dois núcleos, poderíamos

que se estabelece a partir de certa aproximação

dizer que, no átomo de hidrogênio, do lado oposto

impeça uma interação mais efetiva entre os dipo-

ao átomo ligado a ele, “praticamente”, não existem

los. Não queremos dizer que a interação dipolo-

elétrons. Quanto mais eletronegativo for o átomo

-dipolo não existe; apenas que ela não é capaz de

que se liga ao átomo de hidrogênio, mais drástica

manter os dipolos unidos a ponto de a substância

é esta situação e menor a densidade eletrônica

apresentar-se no estado líquido. Por outro lado,

naquela região do átomo de hidrogênio. Nesta

o que podemos afirmar sobre a aproximação dos

situação, podemos imaginar o núcleo do átomo

dipolos, agora alinhados na linha de união entre

de hidrogênio ou, em outras palavras, o próton,

os núcleos?

completamente desprotegido, ou seja, naquela região não existe nada ao seu redor.

Temos, agora, pelo menos três situações distintas: nenhum dos dois átomos é o de

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Adriano de Souza Reis e Pedro Faria dos Santos Filho

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hidrogênio; um dos átomos é de hidrogênio e o

átomos de nitrogênio, oxigênio e flúor, além da

outro átomo é ou mais ou menos eletronegativo

interação dipolo-dipolo, deve existir algum outro

que o hidrogênio, mas não muito; um átomo é o de

efeito que justifique estes dados. Aparentemente,

hidrogênio e outro átomo é muito eletronegativo

este efeito deve estar relacionado à aproximação

(F, O, N).

entre dois dipolos, segundo a linha de união dos

No primeiro caso, onde não existe átomo de

dois átomos, onde não existe mais repulsão elétron­

hidrogênio, podemos dizer que, em qualquer uma

‑elétron. Em uma primeira aproximação, podemos

das interações, tanto a alinhada quanto a paralela,

dizer que a ausência de repulsão nesta interação está

haverá um somatório de atrações e repulsões,

limitada à participação do átomo de hidrogênio,

sendo que a repulsão se manifesta em qualquer

desde que ele esteja ligado a um destes três átomos.

uma das interações. No segundo caso, onde um

Este caso, e apenas nele, onde a aproximação

dos átomos é o de hidrogênio, podemos dizer a

segundo a linha de união entre os núcleos tem um

repulsão na região deste átomo deve ser menor

aspecto diferencial em relação a todos os outros

em função da diminuída densidade eletrônica ao

casos, limitando-se, exclusivamente ao átomo de

redor deste átomo; entretanto, ao considerarmos os

hidrogênio, chamaremos “ligação hidrogênio”.

dipolos alinhados, a repulsão entre o hidrogênio,

Esta ligação hidrogênio é tão mais forte quanto

polarizado positivamente, e o outro átomo, polari­

mais próximos da linearidade estiverem os quatro

zado negativamente, deverá ser bem menor do que

átomos que compõem os dois dipolos, pois neste

no caso anterior, apesar de ainda existir.

caso não haverá repulsão elétron-elétron.

Finalmente, na última situação, onde o

Resumindo, podemos afirmar que a ligação

hidrogênio se encontra ligado a um elemento

hidrogênio é um caso especial de interação dipolo­

muito mais eletronegativo, podemos dizer que,

‑dipolo, com um aspecto direcional preferencial,

na aproximação com os dipolos alinhados,

que se limita à presença do átomo de hidrogênio

o hidrogênio deverá apresentar o seu próton

ligado a um elemento muito eletronegativo. Para

totalmente desprotegido, com uma densidade

que ela seja muito efetiva, é necessário que os

eletrônica absurdamente baixa ao seu redor. Nesta

quatro átomos que compõem os dois dipolos

situação, com a aproximação lateral do átomo do

estejam perfeitamente alinhados, inibindo, assim,

outro elemento, polarizado negativamente, não

a repulsão elétron-elétron e permitindo uma

haverá repulsão e, além disso, passará a haver

aproximação mais efetiva entre os dipolos.

atração entre o núcleo do hidrogênio e os elétrons

Limitando, então, a discussão às espécies

mais externos do outro átomo. Com esta orientação,

H3N, H2O e HF, onde a ligação hidrogênio é mais

a atração é a mais forte que pode se estabelecer e, até

efetiva, algumas observações merecem atenção

aqui, a consideramos essencialmente eletrostática.

especial. Em primeiro lugar, a comparação

Com esta contribuição adicional, é possível que as

entre estas espécies é um tanto difícil porque

moléculas sejam muito mais agregadas e seu ponto

as espécies são muito diferentes para poderem

de ebulição seja mais alto que nas situações onde

ser comparadas adequadamente. O número de

não exista esta contribuição.

dipolos é diferente em cada uma delas, o arranjo

Podemos afirmar que a relação entre os

espacial também é diferente e, por fim, a diferença

valores de ponto de ebulição e os dipolos das

de eletronegatividade entre os átomos varia de

interações do átomo de hidrogênio com todos os

molécula para molécula. Desta maneira, o que

átomos dos grupos 14-17 indica que, nos casos dos

podemos fazer é tentar relacionar os valores de

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Ligação Hidrogênio

ponto de ebulição destas três espécies entre si, e

hidrogênio, representa a melhor situação, ou o

tentar relacioná-los a alguma destas características

melhor compromisso, para uma interação mais

das moléculas.

efetiva entre as moléculas de água. Tudo isto resulta

Na molécula de amônia, existem três

no maior ponto de ebulição observado entre todos

dipolos N-H; na molécula de água, dois dipolos

os compostos de hidrogênio com os elementos dos

O-H e na molécula de H-F, apenas um dipolo.

grupos 14-17.

Entretanto, a comparação entre os valores dos

Através de todas estas comparações entre

pontos de ebulição destas três espécies indica

os valores dos pontos de ebulição, verificamos

que aquela em que existe o maior número de

que as interações intermoleculares variam muito,

dipolos e, por conseguinte, aquela que participa

de acordo com os dipolos envolvidos. Se, por um

do maior número de interações dipolo-dipolo, é

lado, as interações dipolo-dipolo não contribuem

onde se verifica o menor ponto de ebulição. Isto

muito para a interação intermolecular entre

corrobora a afirmação, já feita anteriormente, de

moléculas de baixo peso molecular, a ligação

que nestas moléculas de baixo peso molecular, a

hidrogênio parece ter um papel marcante. Contudo,

polaridade ou a interação dipolo-dipolo não é o

da mesma forma que as interações dipolo­

efeito determinante no ponto de ebulição. É muito

‑dipolo, as ligações hidrogênio também variam

importante ressaltar aqui, que os pares de moléculas

de intensidade, dependendo do átomo ligado ao

que interagem via dipolo-dipolo, quando estes se

átomo de hidrogênio. Quanto mais eletronegativo

alinham paralelamente, não interagem através de

for o átomo ligado ao átomo de hidrogênio, mais

ligação hidrogênio. Muito pelo contrário, a ligação

deficiente de elétrons, ou desprotegido, estará o

hidrogênio só é efetiva quando os quatro átomos

núcleo deste átomo; isto faz com que a atração

que compõem os dois dipolos estão alinhados.

deste núcleo pelos elétrons mais externos do outro

Por outro lado, a molécula de HF é aquela que apresenta a maior diferença de eletrone­

átomo seja mais forte, estabelecendo-se assim a interação entre estas duas moléculas.

gatividade; contudo, isto não faz dela a que

Até que ponto esta interação é essen­

apresenta o maior ponto de ebulição. Indiretamente,

cialmente eletrostática, ou se existe qualquer outra

isto pode significar que a maior diferença de

contribuição além desta, é um ponto que merece

eletronegatividade também não deve ser o efeito

discussão. De qualquer forma, independentemente

majoritário que determina o ponto de ebulição.

das contribuições presentes nesta interação, que

Finalmente, temos a molécula de água,

passamos a chamar ligação hidrogênio, conven­

que não apresenta a maior diferença de eletrone­

cionou-se que uma maneira adequada de se

gatividade entre os átomos e muito menos o maior

representá-la é através de um conjunto de pontos,

número de dipolos entre as três espécies que estamos

ou uma linha tracejada, entre o átomo de hidrogênio

comparando. Contudo, ela é a que apresenta o maior

e o outro átomo, como mostrado a seguir.

ponto de ebulição! Aparentemente, deve existir um compromisso entre a diferença de eletronegatividade

A – H ......A – H

e o número de dipolos existentes na molécula. É

Apesar de ser uma maneira bastante simples

possível que a diferença de eletronegatividade

de se representar esta interação intermolecular, não

entre os átomos de oxigênio e hidrogênio, aliada à

podemos perder de vista todo o conhecimento que

possibilidade de poder participar, simultaneamente,

ela representa. Como este tipo de interação é muito

de duas interações dipolo-dipolo, e quatro ligações

importante na água, ela acaba merecendo uma

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

15


Adriano de Souza Reis e Pedro Faria dos Santos Filho

posição de destaque nas forças intermoleculares,

o fato de que, enquanto a maioria dos líquidos se

em todas as situações em que temos a presença

contrai, ao passar do estado líquido para o sólido,

de água. Como a água está intimamente ligada ao

com a água ocorre justamente o contrário. E o que

cotidiano das pessoas, além de ser o constituinte

dizer da reprodução do DNA, que segue o mesmo

majoritário de nosso organismo e o veículo para

padrão ao longo de toda a nossa vida? E os ácidos

uma infinidade de processos físicos, químicos

de Bronsted-Lowry, que se dissociam apenas

e bioquímicos, não há como dissociar a ligação

parcialmente, a despeito de todas as moléculas

hidrogênio da água. Ao falarmos de um, estamos,

serem idênticas? Estes, além de muitos outros

implicitamente, falando do outro. Isto deveria fazer

exemplos, representam situações cuja interpretação

com que esta interação merecesse uma posição

requer um conhecimento mais aprofundado desta

de destaque na grade curricular dos cursos de

interação, conhecimento este que vai muito além

graduação em Química, Farmácia e Bioquímica.

dos pontinhos difundidos por todo o mundo.

4. Considerações

finais

Pelas mais diversas razões, a discussão sobre a ligação hidrogênio não tem o destaque que comentamos e acaba se restringindo aos pontinhos entre o átomo de hidrogênio e o outro átomo mais eletronegativo. O quanto dela deve ser representado pela covalência, bem como a importância do caráter direcional nesta interação acabam nem sequer sendo discutidos. Dentre algumas das situações em que o conhecimento mais profundo dos aspectos da ligação hidrogênio é importante, podemos citar

16

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

REFERÊNCIAS CRC Handbook of Chemistry and Physics, 91. ed. EUA, CRC Press, 2010. HUHEEY, J. E.; KEITER, E. A.; KEITER, R. L. Inorganic Chemistry: Principles of Structure and Reactivity. 4. ed. New York: HarperCollins College Publishers, 1993. REIS, A. S. Ligações hidrogênio no cotidiano - uma contribuição para o ensino de química. Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Química, Campinas, São Paulo, 2008. SHRIEVER, D. F.; ATKINS, P. W. Química inorgânica. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2003.


Artigo 02 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 17-28

Animações 3D para o Ensino de Química 3D Animations for the Chemistry Teaching Silvio Henrique Fiscarelli1, Maria Helena S. S. Bizelli2, Luiz Antonio Andrade de Oliveira2 e Patrícia Eliane Fiscarelli3

RESumo

Este trabalho descreve uma proposta de desenvolvimento e validação de um modelo de animação multimídia para apoio à aula presencial da disciplina de Química Geral em um curso de graduação de Química. Tem como objetivo apresentar alguns resultados relacionados aos aspectos teórico-metodológicos adotados, ao formato das animações desenvolvidas e alguns resultados da utilização pelos alunos. O modelo 3D adotado busca aumentar o apelo visual e sensorial durante a apresentação da informação e expandir as relações entre teoria e prática, oferecendo uma nova alternativa para os alunos ao sistematizar os conhecimentos. Os resultados demonstram o grau de aceitação por parte dos alunos e as possíveis contribuições desse recurso para a aprendizagem. Palavras-chave: Animações. Objetos de aprendizagem. Conteúdos complementares. ABSTRACT

This work describes the proposal, development and validation of a multimedia animation model to support learning in the chemistry course classroom at universities. The aim of this model is to enhance the visual and sensorial appeal during the information presentation, and to expand the relations between theory and practice, offering a new alternative for students to systematize the given 1

Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara – UNESP. E-mail: silvio@fclar.unesp.br

2

Instituto de Química de Araraquara – UNESP.

3

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo – IFSP.


knowledge. This project will present: the theoretical-methodological fundaments adopted in the model; the level of the student’s information apprehension, possible contributions of this resource to learning; as well as the results related to the student’s acceptance and adequacy of the model. Key-words: Animations. Learning objects. Learning support.

1. Introdução

Na última década, os avanços da Informática permitiram incorporar ao ambiente web recursos como animações, simulações e vídeos que, até então, estavam restritos às mídias físicas como HDs (Discos Rígidos), CD-ROMs e DVDs. A informação digital na Internet circula mais rapidamente, podendo ser facilmente reproduzida e apresentada em diferentes interfaces e mídias. Do ponto de vista educacional, essa evolução, além de facilitar a disponibilização de conteúdos, possibilita a personalização e adequação para uso em diversas situações de ensino e aprendizagem. Dessa forma, cada vez mais temos observado que a educação presencial se junta com segmentos à distância, por meio do uso da Internet e ferramentas de e-learning. Nesse contexto, a utilização de recursos de animação permite diversas formas de interação e representação do mundo real ou imaginário por parte do aluno. As animações têm se mostrado uma

18

do aluno. As animações, no campo da educação, podem ser compreendidas como a combinação de representações pictóricas, escritas, sonoras e gráficas, que têm como principal objetivo facilitar a aprendizagem, adequando e diversificando a apresentação das informações. Contextualizando o ensino de Química, Kozma e Russel (2005) consideram que as animações e simulações podem ajudar os estudantes a entender conceitos abstratos e complexos, tais como: a evolução da teoria atômica, a formação de moléculas e compostos e os processos envolvidos nas reações químicas. A animação é a simulação de movimentos criados a partir da apresentação de um conjunto de imagens exibidas em rápida sucessão, suficientes para que o olho humano não consiga diferenciá-las e tenha a ilusão de movimento. Até o início da década de 1990 predominava o modo clássico de produção de animação em 2D. Assim, eram criados milhares de desenhos, os quais eram fotocopiados

ferramenta promissora, no processo de ensino e

para uma película de filme ou escaneados para o

aprendizagem, por ser um recurso capaz de facilitar

computador, que participava do processo apenas

a demonstração de processos, a visualização

no final da produção. Com a evolução do hardware

temporal de um dado evento, a exposição de

e software computacional, a produção de uma

fenômenos raros, complexos ou perigosos e,

animação passou a ser totalmente realizada no

também, para melhorar a capacidade de abstração

computador. O surgimento de softwares que

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Animações 3D para o Ensino de Química

possibilitam desenhar, colorir e compor sequências

processo de ensino e aprendizagem. Rieber e

de imagens abriu o caminho para a elaboração de

Boyce (1990), em uma pesquisa sobre as leis de

animações inteiramente produzidas no computador.

Newton, não encontraram diferenças significativas

Com isso, os computadores tornaram o processo

na aprendizagem do tema, mas verificaram que os

de criação de animações relativamente fácil, uma

alunos que utilizaram animações foram capazes

vez que se pode controlar facilmente o que aparece

de recuperar as informações mais rapidamente.

na tela. Paralelamente, surgiram os softwares de

Rieber (1991) verificou resultados positivos sobre

modelagem 3D que permitem construir objetos

a aprendizagem incidental e, em outro trabalho de

virtuais com precisão e fidelidade muito próximas

1995, verificou que a animação seria muito mais

aos objetos reais.

eficiente do que imagens, para a aprendizagem

Comparativamente, a animação digital 3D

de procedimentos. Hays (1996) também sugere

demanda maior trabalho durante a sua elaboração

resultados positivos das animações para alunos

inicial, a chamada fase de modelagem; no entanto,

com pouca habilidade espacial.

pode reduzir consideravelmente o tempo total

No âmbito da psicologia cognitiva, grande

de desenvolvimento de uma animação, pois uma

parte dos trabalhos sobre o uso de animações

vez criado o objeto 3D é possível manipulá-lo

fundamenta-se na Teoria da Codificação Dual de

facilmente, criando-se movimentos, mudando-

Paivio (1986), que sugere a existência de dois

-se ângulos de visão, dimensões, cores etc. Desse

sistemas cognitivos: um canal especializado na

modo, as animações 3D estão cada vez mais

representação e processamento da linguagem

ganhando espaço, tornando-se mais frequentes não

não verbal, tal como objetos, eventos e imagens;

apenas no cinema e na televisão, mas também nos

e outro, especializado na representação e pro-

sistemas multimídia e Internet.

cessamento da linguagem verbal. A partir dessa

Considerando a possibilidade do uso de

premissa, Clark e Craig (1992) complementam

animações 3D como ferramenta de auxílio ao ensino

que o uso de duas formas de mídias simultâneas,

e aprendizagem, esta pesquisa propõe investigar

quando usadas adequadamente, contribuem para a

o processo, concepção e desenvolvimento de

melhor retenção da informação do que se utilizadas

animações educacionais para apoio às aulas

isoladamente.

presenciais de disciplinas de um curso de Química.

A partir de uma série de estudos empíricos,

Assim, em conjunto com o professor da disciplina

Mayer (2001) propõe três pressupostos que devem

de Química Geral, foram levantadas as demandas,

ser considerados na multimídia como elementos

as dificuldades na transmissão dos conteúdos e

educacionais:

os tópicos mais significativos, para que fossem

1. O pressuposto da codificação dual,

criadas animações adequadas às necessidades da

seguindo os mesmos parâmetros de

disciplina.

Paivio, no qual os seres humanos possuem canais de processamento da informação separados para representar

2. Referencial

teórico

materiais visuais e materiais auditivos; 2. O pressuposto da capacidade limitada,

A literatura, na área de animações

ou seja, cada canal (visual e auditivo) tem

educacionais, relata vários trabalhos que buscam

uma capacidade limitada de processar

evidenciar os benefícios das animações ao

informações simultaneamente, por isso,

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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Silvio Henrique Fiscarelli et al.

para que haja a efetiva aprendizagem, é

Para tratar a questão da quantidade de

preciso saber balancear a apresentação

informações, Sweller (2003) introduziu o conceito

das informações em cada canal;

de Carga Cognitiva. Para o autor, a memória de traba­

3. O pressuposto do processamento ativo,

lho, que está ligada à capacidade de mani­pularmos

no qual é necessário que o educan­ do

símbolos durante o processo de aprendizagem, é

esteja envolvido ativamente na apren­

limitada e se apoia na impossibilidade natural do

dizagem, o que inclui estar motivado

ser humano em processar muitas informações na

e atento para assimilar e organizar as

memória a cada momento.

novas informações e integrá-las ao conhecimento pré-existente. Como resultado dos estudos realizados e dos pressupostos enunciados, Mayer (2001) propõe que os alunos aprendem melhor com animações multimídia quando: • combina-se narração e imagens; • legendas e imagens correspondentes estão próximas; • narração e imagens são apresentadas simultaneamente em vez de sucessivamente; • legendas, imagens ou sons não relevantes para o assunto são excluídos; • utiliza-se animação e narração em vez de animação e legenda; • utiliza-se animação e narração em vez de animação, narração e legenda; • a multimídia é apresentada a sujeitos que têm poucos conhecimentos sobre o assunto; • a multimídia é apresentada a sujeitos com boa orientação espacial. Outro aspecto a ser considerado na apren­ dizagem e, consequentemente, na elaboração de materiais multimídia, é a quantidade de infor­ mações apresentadas aos alunos. De acordo com Sweller (2003), a aprendizagem ocorre de maneira mais eficaz quando o volume de informações oferecidas ao aluno for compatível com sua capacidade de compreensão (Sweller, 2003).

20

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

Essa limitação afeta diretamente o apren­ dizado, pois todo processamento de informação exige algum esforço, algum dispêndio de energia mental em nível de atenção, memória e raciocínio. Assim, quanto maior a carga cognitiva envolvida no processo de ensino, maior a dificuldade do aluno em reter eficientemente a informação. Segundo Mayer (2001), na elaboração de con­teúdos para materiais de ensino, deve-se levar em consideração os três principais tipos de carga cognitiva: 1. A carga cognitiva intrínseca: imposta pela complexidade do conteúdo do material de ensino, ou seja, a manipulação simbólica envolvida na aquisição do novo conhecimento; 2. A carga cognitiva natural: imposta pelas atividades de ensino, compreendendo a retenção de informações relevantes e o raciocínio necessário para entender o conteúdo. Esse tipo de carga é necessária e benéfica ao processo de ensino e aprendizagem; 3. A carga cognitiva externa: não relacionada diretamente ao conteúdo, geralmente irrelevante e, consequentemente, desperdiça recursos mentais limitados que poderiam ser usados para auxiliar a carga natural. Considerando os três tipos de cargas cogni­ tivas, ao desenvolvermos um material para ensino,


Animações 3D para o Ensino de Química

devemos dosar e otimizar as duas primeiras e, preferencialmente, eliminarmos a carga cognitiva externa. Mas como podemos otimizar as cargas cognitivas intrínseca e natural? Quanto à primeira, a solução mais prática é dividir o conteúdo de forma a não introduzir muitas informações simultaneamente, mas sim, progressivamente. Quanto à carga cognitiva natural, a escolha de recursos adequados para a apresentação do conteúdo pode ser uma opção viável para sua redução. Aprofundando-se um pouco mais no contexto da produção de animações, verificamos que outro aspecto a ser considerado é a comunicação. Afinal, as animações multimídia educacionais caracterizam-se como uma forma de comunicação, pois contam com um emissor (animação),

um

código

(imagens,

textos,

sons, narrações) e um receptor (o aluno). Assim, parece-nos pertinente considerar as contribuições do Princípio da Relevância de Sperber e Wilson (1995), elaborada durante uma pesquisa que buscava compreender como os receptores de uma mensagem reconheciam e interpretavam um enunciado. Segundo a teoria desses autores, ao interpretarmos uma mensagem, nossa atenção volta-se sempre para o que nos parece mais relevante e confiável; ou seja, um ouvinte infere no significado do emissor com base nas evidências fornecidas. Ainda,

3. A

proposta para desenvolvimento de animações O fluxo básico de trabalho para a produção

das animações é constituído pelas seguintes etapas: a) Cada animação, que tem origem em um tema/tópico definido pelo docente, passa por revisão bibliográfica onde são verificadas as abordagens existentes sobre o tema. Nessa etapa são consultados livros, artigos e materiais disponíveis na internet; b) Síntese e especifícação: a partir do material coletado é feito um resumo, sintetizando as principais ideias do tema; c) A partir do texto-resumo é criada a narração e o storyboard da animação; d) Aprovação pelo docente responsável pela disciplina: a proposta de animação é analisada pelo docente, verificando sua adequação geral; e) Desenvolvimento: a equipe define as ferramentas a serem utilizadas e desenvolve a animação; f) Revisão final: a animação, já em seu estado final, é enviada ao docente para possíveis correções e/ou alterações; g) O conteúdo é publicado no web site. A Figura 1 apresenta, sinteticamente, o fluxograma de trabalho.

segundo esses autores, isso ocorre porque a

Considerando-se os aspectos teórico-meto-

busca pela relevância é uma característica básica

dológicos adotados, o grupo de pesquisadores/

da cognição humana.

professores envolvidos nesta pesquisa optou por

Assim, quanto mais relevante for o input

desenvolver animações com narração, conforme

ou estímulo recebido pelo aprendiz, isto é, quanto

sugerido por Mayer (2001), e não somente

mais efeitos contextuais produzirem os enunciados

imagens em movimento que são mais comumente

e menor for o esforço para processá-los, mais

encontradas na Internet. Cada animação desen-

facilmente ocorrerá a compreensão e maior será a

volvida explora um único assunto ou tópico

probabilidade de aprendizagem.

da matéria, buscando priorizar as informações

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Silvio Henrique Fiscarelli et al.

relevantes para o tópico em questão e reduzir a

confiabilidade quanto à fidelidade da animação

carga cognitiva.

à situação real. Além disso, conforme destacam

Buscando contemplar o Princípio da Rele-

Lidwell, Holden e Butler (2003), os aspectos

vância, optamos por criar as animações que partem

estéticos e a aparência atrativa são importantes

de um contexto concreto, como por exemplo, um

elementos para criar confiabilidade nos usuários.

experimento ou uma situação problema real e

Normalmente, as animações que encon-

contextualizá-la em um cenário tridimensional o mais

tramos na Internet e em CD-ROMs são extrema-

realístico possível. O desenvolvimento das animações

mente curtas, utilizadas como complementos de

em 3D possibilita mostrar vários ângulos de um

um texto; ou seja, para a compreensão do assun-

experimento, aplicar zoom em detalhes importantes,

to o texto é mais importante do que a animação.

observar com maior precisão a disposição espacial

Pensando em oferecer materiais mais dinâmicos,

dos objetos, entre outras vantagens.

buscamos reverter essa lógica e elaboramos animações com um formato de “microdocumentários”, com duração entre 4 e 7 minutos, nas quais a

Revisão bibliográfica

Tópico/assunto

narração permite entender o assunto tratado, sendo o texto externo um complemento das animações. NÃO

Diante da proposta de desenvolvimento das Especificação da animação

animações, foram estabelecidas algumas questões que a investigação deveria responder. Dentre as quais, podemos destacar: a) Os alunos estão preparados para usar

Aprovação pelo docente

esse tipo de recurso? b) As animações são consideradas, pelos

SIM

alunos, como um instrumento legítimo de apoio à aprendizagem? c) O modelo proposto, com imagens

Desenvolvimento da animação NÃO

tridimensionais, narração e duração

Publicação na internet

SIM

Revisão pelo docente

mais longa, é considerado adequado pelos alunos? d) Em que medida podemos verificar as contribuições das animações para a aprendizagem dos alunos?

Figura 1. Fluxo de desenvolvimento de um conteúdo digital.

O cenário e a qualidade semirrealística das animações buscam, de um lado, reduzir a carga cognitiva, uma vez que, devido a sua semelhança

22

4. Resultados 4.1. Quanto

ao perfil dos alunos

com a situação real, exigem menor esforço de

O primeiro aspecto, considerado na pro-

processamento para o seu reconhecimento e

posta de elaboração dos conteúdos digitais, foi

interpretação e, de outro, criar no aluno uma

conhecer os usuários, suas necessidades, hábitos,

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Animações 3D para o Ensino de Química

comportamentos e experiências. Essas informações

informações sobre os conteúdos estudados em

podem ser consideradas fundamentais para a plena

sala de aula. Com relação à preferência do tipo de

execução da proposta, pois entendemos que os

conteúdo digital, 61% dos alunos consideram as

alunos não devem ser obrigados ou coagidos a

animações e vídeos como os recursos que melhor

acessar os conteúdos complementares, mas sim,

ajudam a entender os conteúdos abordados em sala

optar pelo uso desse material, entendendo que o

de aula. Em seguida, temos as simulações com

mesmo pode ser um recurso útil para melhorar ou

21%, e, finalmente, os hipertextos com 18%.

facilitar seu aprendizado. Com o objetivo de traçar o perfil dos alunos do 1º ano do Curso de Química, público-alvo da

4.2. Quanto

à validação do modelo de animação proposto

pesquisa, aplicamos um questionário, composto

O professor da disciplina de Química Geral,

por questões com alternativas de múltipla escolha.

baseando-se na ementa da disciplina, sugeriu que

A finalidade desse questionário foi caracterizar

fossem elaboradas animações que facilitassem o

os hábitos dos alunos quanto ao uso da Internet

entendimento da evolução histórica dos modelos

como fonte de pesquisa, seus conhecimentos sobre

atômicos, demonstrando de que maneira os

os diversos tipos de mídia e suas preferências

experimentos e as descobertas de cientistas do

quanto ao uso dos recursos digitais. Consideramos

início do século XX levaram à elaboração e a

esses aspectos importantes, pois os alunos, ao

evolução da Teoria Atômica. Como proposta

realizarem a interação com os conteúdos digitais

inicial para o desenvolvimento das animações,

propostos, provavelmente utilizam conhecimentos

foram estabelecidos como temas os experimentos

e adotam comportamentos adquiridos na interação

listados no Quadro 1:

com outras páginas web e com outros softwares utilizados em outras situações do cotidiano. A análise deste primeiro instrumento

Quadro 1. Relação de animações e implicações para o modelo atômico.

apontou que, a busca na Internet de informações

Animação

complementares às aulas presenciais, é uma prática

(1) Experimentos de Crookes e Thomson (descarga em gases e tubos de raios catódicos) Duração: 04:20 min.

ou hábito comum entre a maioria dos alunos (76%). Foi possível constatar ainda que os alunos já possuem experiência com o uso de recursos multimídia, conhecem e distinguem os vários tipos de mídias e conteúdos digitais educacionais disponíveis (animações, vídeos e simulações) e têm condições de utilizá-los com o propósito de ampliar seus conhecimentos.

Implicações para o modelo atômico Descoberta e comprovação da existência dos elétrons como partículas negativas e divisibilidade do átomo.

(2) Experimento de Rutherford Proposta de um modelo nuDuração: 4:08 min clear de átomo. (3) Experimento de Millikan Duração: 05:32 min.

Determinação da carga do elétron.

(4) Linhas espectrais (Átomo de hidrogênio) Duração: 07:47 min.

Níveis de energias propostos no modelo de Bohr.

Ainda, considerando os hábitos dos alunos relacionados à busca de conteúdos complementares

O processo de pesquisa sobre os temas,

às aulas, verificamos que a frequência ideal de

a coleta de material, a elaboração dos textos

atualização ou inserção de novos conteúdos no

narrativos e a produção das animações sele­

site é a semanal, pois é com essa frequência que

cionadas levou, aproximadamente, quatro meses

a maioria dos estudantes realiza consultas em

para ser concluído. Durante a coleta de infor­

web sites e mecanismos de busca, a procura de

mações para a elaboração das animações, foi

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23


Silvio Henrique Fiscarelli et al.

considerado essencial encontrar fotos, esquemas,

sobre as mesmas. O questionário foi divido em

gráficos e descrições que permitissem modelar

duas sessões. Na primeira sessão, composta

os objetos 3D com precisão e fidelidade aos

basicamente por questões com resposta de múltipla

objetos, equipamentos ou aparatos utilizados

escolha, os alunos avaliaram aspectos ligados à

pelos cientistas em sua época. Buscando, quando

adequação do formato da mídia (animação) como

possível, a recriação dos objetos em 3D basearam­

possível instrumento de apoio à aprendizagem.

‑se nas descrições e figuras presentes nos artigos

Nessa sessão, os alunos foram indagados sobre

originais dos cientistas. As animações descritas

aspectos relativos ao uso da técnica de animação

podem ser encontradas no endereço <http://

3D, da narração como veículo de comunicação, da

www.e-quimica.iq.unesp.br>4 na seção “Química

qualidade das imagens e da dinâmica da animação

Geral”. A Figura 2 apresenta algumas imagens

como um todo.

retiradas das animações.

A avaliação dos alunos com relação à proposta de formato para as animações, foi positiva, uma vez que 97% deles consideraram que o uso da técnica tridimensional facilitou a visualização e a compreensão dos experimentos tratados nas animações. A mesma porcentagem de alunos considerou que a qualidade das explicações foi boa ou ótima e a maioria (74%) preferiram o uso da narração ao uso da legenda. Com relação à trilha sonora de fundo, 85% consideraram que a música de fundo não atrapalha a narração e, consequentemente, não influencia negativamente no entendimento da animação. A resposta dos alunos à questão sobre a trilha sonora de fundo recebeu um interesse especial na investigação, pois esse artifício poderia ser considerado um elemento de dispersão da atenção ou de aumento da carga cognitiva. No entanto,

Figura 2. Imagens das Animações: (a) Experimento de Crookes, (b) Experimento de Rutherford, (c) Experi­ mento de Millikan.

constatamos que as respostas dos alunos que não foram favoráveis a esse elemento, argumentaram sobre a intensidade ou o ritmo da música, mas não sobre sua presença.

Para validar o uso das animações, enquanto

Com relação às sugestões para o aprimo­

recursos didático-pedagógicos, 43 alunos do

ramento das animações, 52% dos alunos fizeram

1º ano, matriculados na disciplina “Química Geral”,

algum tipo de sugestão. As mais significativas

assistiram as quatro animações desenvolvidas e,

foram: “aprofundar os detalhes técnicos” (19%)

logo em seguida, responderam a um questionário

e “deixar as animações um pouco mais lentas”

4

24

Endereço direto para as animações: http://www.e-quimica. iq.unesp.br/index.php?option=com_content&view=categor y&id=36&Itemid=55

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

(18%). As demais sugestões tiveram amplitude especifica e muito diversificada para serem consideradas relevantes.


Animações 3D para o Ensino de Química

Na sessão seguinte do questionário, foi

a) Denominar o Anodo, como polo nega­

perguntado ao aluno, propositalmente de maneira

tivo e Catodo como polo positivo;

não diretiva, o que ele entendeu sobre cada uma

b) Não considerar a força da gravidade

das animações. A resposta deveria ser dissertativa

sobre as gotículas, no experimento de

e espontânea, com o objetivo de verificar a apreensão das informações, conceitos e fenômenos

Millikan; c) Confusão na mudança de nível de

apresentados nas animações.

energia dos elétrons;

As questões abertas, contendo as percep­

d) Não atribuir as forças exercidas pelo

ções e entendimento dos alunos sobre as anima­

núcleo ao desvio das partículas alfa no

ções, foram analisadas segundo a técnica de

experimento de Rutherford.

Análise de Conteúdo, que permite categorizar segmentos das respostas dissertativas em grupos com significações semelhantes. De acordo com Bardin (1997), o ato de codificar ou caracterizar

Quadro 2. Frequência das categorias de respostas obser­ vadas. Animação

um segmento de texto é colocá-lo em uma das classes de equivalências, definidas a partir de suas significações e construindo as categorias conforme os temas que emergem do texto. Para classificar os elementos em categorias é preciso

Experimento de Crookes e Thonson

identificar o que eles têm em comum, permitindo então seu agrupamento e interpretação. Baseando-se nas respostas dos alunos, foram criadas categorias de respostas que expres­ savam o entendimento de conceitos ou fenômenos

Experimento de Rutherford

tratados em cada uma das animações e, em seguida, essas categorias foram contabilizadas conforme a ocorrência nas respostas dos alunos. As porcentagens de ocorrência podem ser observadas no Quadro 2. Tratando-se de respostas espontâneas,

Experimento de Millikan

consideramos que os resultados, em termos de aquisição do conhecimento, foram positivos, uma vez que os alunos foram capazes de citar, com suas próprias palavras, uma boa parte das informações veiculadas nas animações. Entre os erros mais comuns, cometidos pelos alunos e observados nas respostas às questões propostas, podemos destacar:

Linhas Espectrais

Categorias de respostas

Ocorrência de citação

Os elétrons possuem carga negativa

90%

Os elétrons deslocam-se do catodo em direção ao anodo

75%

Os Raios Catódicos são feixes de elétrons em movimento

85%

O núcleo do átomo é positivo

95%

O núcleo é extremamente pequeno em relação ao átomo

80%

O desvio das partículas alfa é resultado da interação com o núcleo

80%

Objetivo era determinar a carga do elétron

100%

As gotículas eram carregadas negativamente

95%

As placas exerciam forças de atração e repulsão sobre a gotícula

70%

Os elétrons localizam-se em níveis de energia

85%

Os elétrons podem mudar de nível de energia

70%

A absorção e emissão de fótons pelo elétron são responsáveis pela mudança de nível de energia

70%

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Silvio Henrique Fiscarelli et al.

5. Conclusões

A análise dos dados coletados durante a pesquisa permite-nos concluir que: • Os alunos demonstram já possuírem o hábito de utilizar conteúdos da Internet como complemento ao ensino presencial; • Os conteúdos mais dinâmicos e interativos, como animações e simulações, têm a preferência dos alunos; • Os alunos avaliados não expressaram ter dificuldades para utilizar e manipular os diferentes formatos de mídia presentes na Web; • Para os alunos que participaram da pesquisa, a animação 3D facilita a visualização e a compreensão dos conteúdos abordados; • O formato de “microdocumentários”, adotado na produção das animações, contendo imagens em 3D, narração e trilha sonora de fundo, foi considerado, pelos alunos, um modelo adequado para a apresentação de conteúdos didáticos. Os alunos foram capazes de organizar e sistematizar autonomamente as informações apresentadas nas animações, habilidades que, isoladamente, não implicam necessariamente na aquisição de conhecimento, mas que podem ser consideradas pré-requisitos para que a aprendizagem ocorra. De maneira geral, os resultados obtidos na pesquisa sinalizam positivamente o uso de animações 3D e no formato de microdocumentario, como instrumento de apoio e aquisição autônoma de conhecimentos. As animações foram amplamente aceitas pelos alunos e se mostraram adequadas para a demonstração de processos temporais, a visualização espacial mais realística, a explicação dos detalhes de um fenômeno e a demonstração de equipamentos e experimentos.

26

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

Embora a validação da proposta de animação tenha sido realizada em sala de aula com os alunos de uma única disciplina, espera-se que esses resultados possam servir como evidências para o uso desse tipo de recurso, como instrumento de apoio à aula presencial. Nas aulas presenciais, por questões de tempo hábil para tratar os conteúdos e cumprir o cronograma da disciplina, o professor, geralmente, se detém a explorar e enfatizar os aspectos declarativos do conhecimento; ou seja, apresenta aos alunos conceitos, leis, regras e equações que permitem analisar e interpretar um determinado fenômeno químico ou físico. No entanto, para que o conhecimento não seja mecânico e baseado na pura e simples memorização de fórmulas e métodos, é preciso oferecer ao aluno referências que contextualizem os fenômenos estudados dentro de um cenário maior da Química, a qual tem uma história enquanto Ciência e que passou por diversos paradigmas ao longo de sua formação. Esse conhecimento contextual implica saber “por que”, “como”, “quando” e “onde” determinado conhecimento químico foi gerado. Nesse sentido, as animações descritas nesta pesquisa oferecem uma alternativa viável para contextualizar e ampliar o acesso à informações e, consequentemente, a melhorar as condições de ensino e aprendizagem.

REFERÊNCIAS BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1997. CLARK, R.; CRAIG, T. Research and Theory on multimedia: learning effects. Springer-Verlag: Berlin, 1992. HAYS, J. Journal of Educational Computing Research. 1996, 14. KOZMA, R.; RUSSELL, J. In: R. Mayer. (ed.). Cambridge handbook of multimedia learning. Cambridge University Press: New York, 2005.


Animações 3D para o Ensino de Química

LIDWELL, W.; HOLDEN, K; BUTLER, J. Universal principles of design. Rockport Publishers: New York, 2003. MAYER, R. Multimedia Learning. University Press: New York, 2001.

Cambridge

PAIVIO, A. Mental representations: a dual coding approach. Oxford University Press: England, 1986.

RIEBER, L. P. Journal of Educational Psychology, v. 83, n. 3, 1991. ______.; BOYCE, M. J.; ASSAD, C. Journal of Computer-based Instruction, v. 17, n. 2, 1990. SPERBER, D.; WILSON, D. Relevance: communication and cognition. Blackwell: Oxford, 1995. SWELLER, J. The psychology of learning and motivation. Academic Press:San Diego, 2003.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

27



Artigo 03 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 29-36

Recursos Computacionais no Ensino de Química Orgânica Computational Resources for Organic Chemistry Teaching Jeanny Gomes Caixeta, Gérson Carlos Rezende, Paulo Sérgio Gonçalves Nunes e Claudemir Batalini1

RESumo

Nesse cenário atual, globalizado e de intensa tecnologia, o uso do computador em sala de aula pode ser visto como um positivo aliado ao processo de ensino-aprendizagem, desde que correta e devidamente intermediada pelo professor. Relatam-se aqui experiências do uso de recursos e programas computacionais com a intenção de dinamizar o aprendizado de conteúdos relevantes dentro da Química Orgânica, com alunos da 3ª série do Ensino Médio da Escola Estadual Couto Magalhães, em Campinápolis – MT, a maioria sem acesso a computador por morarem em zona rural. Palavras-chave: Aprendizagem significativa. Ensino de Química. Recursos computacionais.

ABSTRACT

In this current globalized and technological world the use of computers in the classroom can be seen as a positive addition to the teaching-learning process, since that it is corrected and properly mediated by the teacher. This article reports experiences with the use of computational resources and programs with the intention of boosting the learning of relevant contents of Organic Chemistry, with 1

UFMT – CUA – Licenciatura Plena em Ciências Naturais e Matemática – Habilitação em Química. E-mail: pirapotimao@msn.com


students of the 3rd grade from Couto Magalhaes High School in Campinapolis – MT, most of them don’t have access to computer since they live in the countryside. Key-words: Significant learning. Chemistry teaching. Computational resources.

1. Introdução

Os conteúdos desenvolvidos no Ensino Médio relacionados a Química Orgânica, principalmente aqueles que requerem visualização tridimensional das estruturas químicas, sempre acarretaram dificuldades de entendimento pelos alunos, quando trabalhados pelo professor apenas utilizando o quadro negro. Modelos mecânicos disponíveis comercialmente e até mesmo modelos que podem ser construídos pelos educandos, utilizando bolas de isopor e varetas de bambu, constituem eficientes alternativas para minimizar o problema. Com a presença atualmente tão marcante do computador em nosso meio, a introdução dessa tecnologia na Educação visando melhorias no processo ensino-aprendizagem constitui estratégia interessante e atrativa para os alunos. Usados de maneira adequada, não como simples instrumentos, mas como ferramentas coestruturantes, os recursos computacionais podem ampliar o conceito de aula,

reconhecido como uma pessoa que já apresenta várias habilidades; a partir do seu saber deve construir novos conhecimentos, de reconstruir e de ampliá-los, se preparando assim para o exercício consciente da cidadania (Freire, 2003; Hodson, 1994; Gonzáles, 1992). Aqui, ele produz e assimila conhecimento de acordo com o meio social em que vive, gerando um espírito crítico que pode facilitar a percepção da Química ao seu redor (Ausubel, 1980). Essa percepção, das Ciências em geral, caminha de maneira a encontrar nas atividades de laboratório um aliado importante (Maldaner, 2000). Com a intenção de estimular o processo de

ensino-aprendizagem

em

conteúdos

de

Química Orgânica do Ensino Médio, os alunos secundaristas envolvidos neste trabalho utilizaram vários recursos computacionais e ainda criaram um programa específico de perguntas e respostas interativo,

abordando

alguns

conteúdos

da

disciplina.

criar novas pontes cognitivas, além de fazer com que o professor e o aluno venham a interagir num ambiente aberto e objetivo (Azevedo, 1997; Brito, 2001; Freitas, 1999). Num processo alicerçado em dar significado ao aprendizado, é vital que o aluno seja

30

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

2. Metodologia

A pesquisa foi desenvolvida com alunos do turno vespertino do ensino médio da Escola Estadual

Couto

Magalhães,

localizada

em


Recursos Computacionais no Ensino de Química Orgânica

Campinápolis – MT. A maioria dos alunos são

e isomeria empregando os dois recursos de

moradores da zona rural, tendo pouco ou nenhum

programas descritos, os alunos investigaram

contato com computadores. A escola possui um

através da rede Internet várias estruturas orgânicas

Plano Político Pedagógico (PPP) desde 1990,

presentes em princípios ativos de medicamentos

que se apresenta bem definido quanto às ações

e de produtos alimentícios, sendo explorados

pretendidas, priorizando atividades práticas como

aqui vários conceitos da disciplina estudados

estratégias úteis para o ensino. Há seis anos, através

anteriormente, além de desenharem estruturas em

do apoio da Secretaria Estadual de Educação do

disposição 3D.

Mato Grosso, a escola foi contemplada com dez

Sob a supervisão da professora, os alunos

computadores, estruturando dessa maneira um

realizaram um levantamento em 30 livros didáticos

laboratório computacional, onde foi desenvolvido

de diferentes autores de Química Orgânica do

este trabalho.

Ensino Médio dos últimos 15 anos, procurando

A turma de 24 estudantes respondeu ini-

investigar a frequência e maneira com que

cialmente algumas perguntas relacionadas à

exploram a visualização bi e tridimensional das

importância e expectativa que tinham em usar

estruturas orgânicas.

recursos computacionais como estratégia de

A última etapa do trabalho foi a da

ensino. Fez-se assim uma coleta de dados,

construção, junto com os alunos, de um tutorial

através de questionários abertos específicos, com

próprio e específico, contendo questões abordando

perguntas claras e objetivas referentes à prática

alguns temas relevantes na área de Química

pedagógica, para reconhecer os principais anseios

Orgânica, de fácil acesso e com perguntas de fácil

em relação ao ensino de Química Orgânica com o

entendimento. O desempenho individual poderia

uso de recursos computacionais.

ser verificado num gabarito virtual também

As duas atividades seguintes foram desen-

construído pela equipe e que se apresentava

volvidas em 12 semanas com 4 horas/aula por

disponível apenas após o término das questões

semana, totalizando 48 horas. Nas aulas iniciais

respondidas.

foram usados métodos tradicionais (quadro-negro) para abordar funções orgânicas, nomenclatura de substâncias orgânicas e isomeria. Em sequência, os alunos foram apresentados ao laboratório virtual para iniciarem as atividades computacionais. A turma foi dividida em grupos de 2 ou 3 para cada

3. Resultados

e discussão

3.1. Levantamento

prévio

computador e realizaram as atividades designadas

Todos os 24 alunos envolvidos no

de Química Orgânica em seus computadores,

trabalho e que responderam ao questionário

inicialmente, sendo apresentados ao programa

inicial

Chemwin, que contempla apenas estruturas

interessante e atraente desenvolver atividades

bidimensionais e, posteriormente, as atividades

de Química Orgânica com o uso de ferramentas

foram exploradas em programa ChemSketch 8.0,

computacionais. Apesar da grande maioria dos

que tem domínio em estruturas bidimensionais e

educandos fixarem moradia em área rural e não

tridimensionais. Esses programas se encontram

disporem de computadores, isso não pareceu

disponíveis na rede Internet. Além das atividades

ser obstáculo e percebeu-se que estavam com

relacionadas às funções orgânicas, nomenclatura

expectativas

consideraram

positivas

que

seria

quanto

à

bastante

estratégia

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

31


Jeanny Gomes Caixeta et al.

metodológica a ser adotada. Diante dos relatos dos alunos percebemos que o ensino de Química num laboratório virtual constitui um dos caminhos para despertar o interesse na disciplina. O conheci­ mento é construído num processo contínuo, com noções fundamentais de conhecimento lógico, de espaço, tempo e casualidade, onde o professor é o mediador e os educandos vão construindo sua aprendizagem a partir do que já sabem de forma significativa. Junte-se a isso o fato do conhecimento novo ser internalizado e estar logicamente relacionado com os conhecimentos

Figura 1. Manipulação de modelo mecânico tipo “Framework” (tubos de plástico e suportes de metal). Fonte: foto de Jeanny Gomes Caixeta.

mais antigos (Ausubel, 1976). 3.2. Aulas

tradicionais e aulas com o uso de recursos mecânicos e computacionais Durante as primeiras quatro semanas, num

total de 16 horas, os conteúdos de Química Orgânica referentes às funções orgânicas, nomenclatura e isomeria foram ministrados de modo tradicional, com o auxílio somente de giz e quadro negro. Os alunos, ao visualizarem as estruturas orgânicas desenhadas no quadro, as entenderam como tendo características de planaridade. Essa exposição em quadro negro das estruturas levantou diversas dificuldades nos alunos quanto ao entendimento

32

Figura 2. Manipulação de modelo mecânico tipo “pau e bola”. Fonte: foto de Jeanny Gomes Caixeta.

de ângulos de ligação nas estruturas orgânicas,

As atividades computacionais iniciaram

hibridização, isômeros espaciais, ou seja, conteúdos

com a instalação dos programas computacionais

que têm forte ligação com a tridimensionalidade

ChemWin

das moléculas.

na

rede

e

ChemSketch

Internet.

8.0,

Utilizando

disponíveis projeção

em

Antes, porém, de iniciar as atividades

datashow, a professora explicou inicialmente o

computacionais, os alunos manipularam dois tipos

funcionamento do programa Chemwin (2D) e os

de modelos de estruturas moleculares disponíveis

alunos ficaram livres para desenhar uma ou mais

comercialmente (Figuras 1 e 2) e ainda puderam

moléculas orgânicas de estrutura simples para

criar modelos manuais a partir de bolas de isopor

ambientalizarem com o recurso. Já nessa etapa

e varetas de bambu, atividades clássicas que

presenciou-se um contagiante entusiasmo dos

auxiliam no entendimento das estruturas químicas.

alunos em explorar recursos diferenciados para o

Observamos que o uso desses recursos, além de

seu aprendizado. O momento foi oportuno para

despertar a curiosidade, facilitou a compreensão

fundamentar nas diferentes estruturas orgânicas

de vários conteúdos que não tinham sido bem

criadas pelos alunos as regras de nomenclatura da

esclarecidos em aulas tradicionais anteriores.

IUPAC estudadas nas aulas teóricas (Figura 3).

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Recursos Computacionais no Ensino de Química Orgânica

Figura 3. Moléculas orgânicas desenhadas inicialmente por um dos grupos de alunos usando o programa Chemwin (visualização em 2D). Fonte: foto de Jeanny Gomes Caixeta.

Com o programa ChemSketch 8.0, proce­ deu-se a apresentação nos mesmos moldes do Chemwin. O referido programa possui ambiente inicial semelhante ao Chemwin, em que as estruturas são construídas bidimensionalmente (Figura 4) e depois podem ser projetadas tridimen­ sionalmente (Figura 5), fornecendo uma série de recursos para o usuário.

Figura 5. Molécula orgânica desenhada por um dos grupos de alunos e projetado no programa ChemSketch 8.0 (visualização em 3D). Fonte: foto de Jeanny Gomes Caixeta.

Nessa etapa, os alunos puderam usar de várias ferramentas que o programa ChemSketch 8.0 fornece para aprimorar os conteúdos trabalhados teoricamente. Após otimizar a estrutura desenhada, ele percebe rapidamente que a grande maioria das moléculas orgânicas não são planares. Foi possível nesse ensaio uma comparação com as estruturas aromáticas, principalmente as derivadas do benzeno, que têm características planares. Os alunos, explorando as diferentes funções do programa, visualizaram as diferentes formas de representação das estruturas, ângulos formados entre diferentes tipos de ligação, distância entre átomos iguais e diferentes, volume e tamanho molecular, mudança de centro quiral para moléculas estereoisômeras, só para citar alguns. Fundamentando-se na possibilidade 3D desse programa, principalmente os conteúdos envolvendo estereoisomeria (isômeros espaciais cis/trans, E/Z,

Figura 4. Molécula orgânica desenhada por um dos grupos de alunos usando o programa ChemSketch 8.0 (visualização em 2D). Fonte: foto de Jeanny Gomes Caixeta.

R/S), cuja complexidade é significativa, parecem ter sido bem mais facilmente sedimentados pelos alunos; essa complexidade pode ser uma das razões pelas quais esses conteúdos geralmente não

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

33


Jeanny Gomes Caixeta et al.

são totalmente explorados nos livros didáticos de

mas apenas uma investigação e constatação da

nível médio. Para consolidação dessas atividades,

pouca atenção que vem sendo dada às estruturas

os alunos pesquisaram diferentes rótulos de

orgânicas na literatura do Ensino Médio.

produtos alimentícios e bulas de medicamentos e exploraram aqueles princípios ativos que constituíam moléculas orgânicas. A partir dos nomes desses princípios ativos, que geralmente são exibidos de modo comercial, não seguindo as regras de nomenclatura da IUPAC, os alunos, usando a rede Internet ou pesquisas em livros, conseguiram

suas

estruturas,

certificaram-se

das diferentes funções orgânicas que muitos dos princípios ativos possuem, definiram seus nomes oficiais e puderam também explorar essas estruturas nos dois programas disponíveis no

3.4. Desenvolvimento

de um tutorial específico

Após as atividades desenvolvidas ante­ riormente descritas com o auxílio do computador, os alunos se mostraram independentes e confiantes para criar um tutorial próprio de perguntas e respostas abordando os conteúdos estudados de Química Orgânica. O tutorial criado apresentou­ ‑se de fácil acesso, com perguntas de fácil entendimento, e a performance individual pôde ser verificada num gabarito virtual, disponível apenas após o término das respostas às questões.

laboratório computacional.

Priorizou-se perguntas envolvendo nomenclatura,

3.3. Levantamento

estereoisomeria.

funções orgânicas, características das cadeias e

bibliográfico

Os alunos foram divididos em grupos

O tutorial compreendendo dez perguntas

para fazer um levantamento nos livros didáticos

foi construído usando uma planilha do Excel

do conteúdo de Química Orgânica de Ensino

e funciona da seguinte maneira: no primeiro

Médio para verificar a frequência com que

acesso, abre-se uma janela onde o aluno clica

apresentam

em cima da questão que pretende responder

estruturas

orgânicas

explorando

aspectos tridimensionais. Foram analisados 30

(Figura 6).

livros nacionais, editados entre 1993 e 2008. Em nenhum dos livros aparecem incentivos para o emprego de recursos computacionais no ensino

Questões Avaliativas de Química

de Química Orgânica. Quanto ao uso de recursos

Questão 1

Questão 2

Questão 3

mecânicos e manuais, apenas em uma literatura

Questão 4

Questão 5

Questão 6

mais recente, aparecem figuras de estruturas com

Questão 7

Questão 8

Questão 9

modelos construídos com bolas de isopor ou montadas com modelos comerciais, entretanto, não há sinalização de incentivo à criação/emprego desses recursos. Todos os livros apresentavam imagens 2D de estruturas orgânicas, no entanto,

Questão 10

Resultado final

Prof. Jeanny obs.: clique em voltar ao Menu para VOLTAR. Atenção! Só marque as alternativas com a letra (X).

Figura 6. Janela inicial das questões a serem escolhidas.

em 70% deles em quantidade consideravelmente

34

baixa. Com relação à presença de imagens 3D

Em seguida, com a questão na tela, ele pode

de moléculas orgânicas, apenas 9 livros (30%)

responder a questão também clicando no quadrado

dos pesquisados exibiam algumas estruturas.

em frente a cada item (Figura 7). Somente ao final

O objetivo desse levantamento não foi o de

das marcações aparece o gabarito mostrando quais

classificar os livros como melhores ou piores,

foram as questões indicadas corretamente e quais

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Recursos Computacionais no Ensino de Química Orgânica

foram as marcadas erradas. Aqui também se tem

problema da falta de interesse nas aulas de Química

acesso a um gabarito que divulga as respostas

dos nossos alunos, além de beneficiar uma via de

corretas.

relacionamento e aprendizagem em mão dupla (professor-aluno).

1) A fumaça liberada na queima de carvão contém muitas substâncias cancerígenas, dentre elas o benzopireno, como por exemplo, a estrutura:

Voltar ao Menu Sua cadeia correspode a um: a) Hidrocarboneto, insaturado, aromático, com núcleos condensados. b) Hoidrocarboneto, alicíclico, insaturado, com três núcleos condensados. c) Heterocíclico, saturado, aromático. d) Ciclo homogêneo, saturado, aromático. e) Alqueno, insaturado, não aromático.

Percebemos com essas atividades desenvolvidas em laboratório virtual um estímulo à capacidade inovadora dos estudantes, catalisando o senso de investigação e criatividade, permitindo uma discussão integrada dos temas estudados em sala de aula, despertando nos estudantes a consciência de sua própria dignidade e sua capacidade do exercício pleno da cidadania, tornando-os figuras ativas de seu próprio progresso e da comunidade em geral.

Figura 7. Questão 1 do tutorial construído pelos alunos.

A habilidade despertada e desenvolvida pelos alunos nas atividades computacionais permitiu que eles criassem um site próprio para uso da turma, onde puderam inserir o tutorial elaborado e também incluir material adicional em relação ao normalmente utilizado em sala de aula; criou-se assim uma ferramenta prática e amigável que serviu de complementação, enriquecimento e facilitação ao entendimento dos conteúdos trabalhados, além de uma associação positiva de ensino e pesquisa (Freire, 1996).

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4. Considerações

finais

O ensino dos conteúdos de Química Orgânica associados à dinâmica computacional tornou as aulas desenvolvidas atraentes e resgatou um aprendizado contextualizado, despertando o interesse do aluno através da correlação teoria/ prática. O trabalho coletivo socializa o conhecimento que cada um possui, pode minimizar o

FREITAS, M. T. A. Psicologia e Educação: um intertexto. São Paulo: Ática, 1999. GONZÁLES, E. M. Qué hay que renovar en los trabajos prácticos? Enseñanza de las Ciencias, v. 10, nº 2, p. 206-211, 1992. HODSON, D. Hacia um enfoque más crítico del trabajo de laboratorio. Enseñanza de las Ciencias, v. 12, p. 299-313, 1994. MALDANER, O. A. A formação inicial e continuada de professor de química: professores pesquisadores. Ijuí: Unijuí, 2000.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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Artigo 04 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 37-46

Um Estudo sobre as Interações Intermoleculares com Auxílio de uma Simulação Computacional A Study on Intermolecular Forces with Computer Simulation Assistance Agnaldo Arroio1 e Claudia Ayres2

RESumo

Este trabalho tem o intuito de investigar a elaboração conceitual dos alunos sobre as interações intermoleculares, no modo macroscópico e, principalmente, no modo microscópico, com a aplicação de um simulador e de alguns videos. Este estudo é de caráter qualitativo. Foi aplicado um questionário durante a atividade no computador, com questões abertas. As respostas obtidas mostraram uma grande dificuldade dos alunos em migrar de um modo de representação para outro. É importante que os alunos tenham atividades em que possam fazer registros escritos sobre suas elaborações conceituais, possibilitando assim um caminho para se investigar melhor esta construção do conhecimento científico. Palavras-chave: Visualização. Simulação computacional. Modos de representação. Interações intermoleculares. ABSTRACT

This work aims to investigate the student’s conceptual construction about intermolecular forces, in macroscopic and especially in microscopic mode, with 1

Bacharel em Química pela USP e em Imagem e Som pela UFSCAR, Mestre e Doutor em FísicoQuímica pela USP, Pós-doutorado em Educação pela USP, Professor Doutor na Faculdade de Educação da USP. E-mail: agnaldoarroio@yahoo.com

2

Graduada em Química pela USP – Bacharel e Licenciatura. Mestranda no Programa de PósGraduação Interunidades no Ensino de Ciências - USP. Email: claudia_ayres@yahoo.com.br


the use of a computer simulation and some videos. The study is qualitative. It was applied an inquiry during the activity using the computer, with discursive questions. The answers had shown a great difficulty of the pupils to move from a representational mode to another one. It is important that the students have activities where they do written registers about their conceptual elaborations, making possible a way to better understand their construction of the scientific knowledge. Key-words: Visualization. Computational simulation. Mode of representation. Intermolecular forces.

1. Introdução

centenas, de animações e simulações, estes últimos também referenciados como applets, a maioria

O dia a dia da sala de aula atual, da maioria das instituições de ensino, tem o computador como um dos elementos presentes, junto com a lousa, o retroprojetor e outros equipamentos aos quais já lidamos com relativa proximidade. No entanto, a presença do computador, como de qualquer outro equipamento, exige de quem irá usá-lo, conhecimento de suas potencialidades para um melhor planejamento de sua ação. O computador concentra funções de outros equipamentos como gravador e reprodutor de áudios e vídeos, agregando outros recursos que são desenvolvidos para ele, como as animações e simulações. Esses últimos, obtidos a partir do uso de alguns programas computacionais, vêm sendo usados em mídias de comunicação como a televisão e a internet, como modelos que exemplificam e/ou demonstram uma situação,

38

elaborados sobre algum conteúdo das disciplinas do currículo escolar, desde o nível fundamental até o nível superior. Trabalhos onde o uso da simulação se fez com o intuito de promover a aprendizagem de conceitos em Química (Santos; Greca, 2005; Raupp et al., 2010; Adadan; Irving; Trundle, 2009; Sanger et al., 2007), relatam o uso desse tipo de recurso e apresentam uma análise dos resultados obtidos. Há trabalhos em que a simulação se aplica como complemento à aula tradicional expositiva, representando práticas laboratoriais no ensino de hidráulica (Guillermo; Tarouco; Endres, 2005), ou discutindo como inserir a simulação no ensino de engenharia (Belhot; Figueiredo; Malavé, 2001). Além destes, há trabalhos que apresentam material didático interativo sobre Física, desenvolvidos para alunos de ensino superior (Alfonso, 2004), entre

uma ação ou um fenômeno de interesse. Com isso,

outros que apresentam e discutem aplicações

o contato dos indivíduos com esses recursos já

da simulação em diversas situações de ensino/

ocorre de uma forma dirigida por interesses nem

aprendizagem (Araujo; Veit; Moreira, 2007;

sempre educacionais.

Machado; Nardi, 2007; García; Ortega, 2007).

No entanto, o papel educacional também

Essa ferramenta pode ser um dos meios

cabe a esses recursos. Uma procura rápida em

que o professor pode utilizar para promover a

qualquer site de busca irá indicar dezenas, senão

compreensão das imagens em química, pois a

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Um Estudo sobre as Interações Intermoleculares com Auxílio de uma Simulação Computacional

construção do conhecimento científico, nessa

2. Objetivos

área da ciência, se baseia na elaboração de conceitos abstratos e incompreensíveis sem o uso de modelos e de representações visuais destes. Através da simulação é possível o aluno usar mais de um tipo de visualização, simultaneamente ou não, interagindo com as imagens apresentadas, o que pode auxiliá-lo em uma maior apropriação dos modelos e de suas representações e contribuir

Este trabalho foi elaborado a partir do uso de uma simulação sobre o conteúdo de interações intermoleculares, onde se tinha como objetivo auxiliar os alunos em uma melhor compreensão das interações que ocorrem entre os materiais, no modo macroscópico e, principalmente, no modo submicroscópico (Johnstone, 2010).

para que o aluno construa um modelo mental com maior semelhança ao modelo cientificamente aceito ou que o aluno reelabore seu modelo

3. Referencial

mental, tornando-o mais completo (Tasker; Dalton, 2006). Dessa forma, é possível trabalhar um obstáculo frequente nas aulas de Química que é a dificuldade que os alunos apresentam em compreender essa área da ciência em seus três modos de representação: o macroscópico, o submicroscópico e o simbólico (Johnstone, 1991, 2010). Mais do que compreenderem, os alunos apresentam grandes dificuldades em transitar de um modo de representação para outro. Identificamos como modo macroscópico a observação de fenômenos, como a mudança de estado físico da matéria. Para os alunos, esse modo de representação é tangível pelos seus sentidos, sendo facilmente aceito e assimilado. No entanto, quando o professor faz uso de explicações no modo submicroscópico, tais como movimento e arranjo das moléculas, para explicar tais fenômenos, o aluno demonstra grandes

dificuldades

de

compreender

teórico

A simulação é um programa baseado em um modelo teórico, elaborado por um especialista em

linguagem

computacional.

Consiste

da

emulação de uma situação real, a partir de um modelo, que por sua vez corresponde a uma representação simplificada da realidade (Belhot; Figueiredo; Malavé, 2001). Com o uso desse recurso, o aluno tem a oportunidade de analisar diferentes situações, processos ou procedimentos acerca de um objeto, sistema ou fenômeno, que muitas vezes, não podem ser executados experimentalmente, seja por escassez de material, seja pelo custo dos mesmos ou pelo risco ao qual o aluno ficará exposto. No trabalho de Guillermo, Tarouco e Endres (2005) o simulador é descrito como um dispositivo que reproduz virtualmente uma situação real (ou que poderia ser real) e dessa forma nos permite “experimentar” os efeitos de

tais

um determinado procedimento sem que a situação

representações, de transitar de uma dimensão

real esteja de fato ocorrendo. Nesse contexto, o

concreta para uma dimensão de maior abstração,

simulador atua como um recurso no qual o aluno

sem conseguir se apropriar do significado do

consegue verificar hipóteses construídas por ele ou

modo submicroscópico e da forma como o mesmo

transmitidas por um professor ou material didático,

é representado, que vem a ser o modo simbólico,

predizer comportamentos de sistemas de interesse

onde se usa símbolos químicos, fórmulas e

assim como aplicar conceitos já estudados em

estruturas para representar átomos, moléculas e

situações de estudo às quais possa não ter tido

seus compostos (Wu; Krajcik; Soloway, 2000).

contato durante a elaboração do conceito.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

39


Agnaldo Arroio e Claudia Ayres

40

O trabalho de Tasker e Dalton (2006)

de longo prazo, para a recuperação dessas

nos reporta sobre as dificuldades dos alunos

informações quando necessário sua utilização em

em conseguir transitar entre os três modos

novas situações. Ao ser exposto a ferramentas de

de representação do conhecimento químico e

visualização, como as animações e simulações,

traz algumas possibilidades acerca do uso das

o aluno passa a ter contato com recursos visuais

animações e simulações para melhorar essa

que trazem características dos sistemas em estudo.

capacidade de transpor as representações. Para

Essas características, quando destacadas para o

subsidiar o uso desses recursos, os autores propõem

aluno, o auxiliam na elaboração de seu modelo

um modelo de processamento da informação

mental, com um grau crescente de sofisticação,

visual, baseado na Teoria da Codificação Dual

de riqueza de características. No entanto, para

de Paivio, que nos apresenta dois sistemas

que a transição entre os modos de representação

cognitivos para o processamento da informação,

se torne acessível para o aluno, é necessário que

sendo um para informações não verbais e outro

o mesmo não só visualize o fenômeno, por meio

para informações verbais. Na Teoria da Carga

de uma prática ou ferramenta de visualização,

Cognitiva de Sweller, que trata sobre como o

mas também tenha oportunidades de descrever

indivíduo gerencia as informações que recebe,

por palavras e desenhos o que ocorreu com o

como são armazenadas e se inter-relacionam com

fenômeno, no modo submicroscópico, com atenção

informações existentes anteriormente na memória.

para as características fundamentais do sistema;

Na Teoria Cognitiva da Aprendizagem Multimídia,

discutir sua representação com colegas, visualizar

de Richard Mayer e seus colaboradores, a qual

uma animação, comparando as semelhanças e

se baseia na teoria de Paivio para estabelecer

diferenças da sua representação e a da animação

pressupostos

de

e relacionando o modo submicroscópico com o

recursos multimídia, assume-se que os indivíduos

sobre

o

desenvolvimento

modo simbólico, através de equações, diagramas

processem as informações visuais e auditivas por

e fórmulas usadas para representar o fenômeno.

canais distintos e limitados em capacidade de

Vale ressaltar que adotamos a expressão modos

processamento. Para uma integração efetiva dos

de representação, pois todas as formas de

canais visual e auditivo, é importante que o aluno

representação são importantes na aprendizagem

participe de forma ativa da atividade, para poder

química, e ao usar a expressão “níveis de

integrar as informações recebidas pelos distintos

representação”, pode-se passar a ideia de uma

canais na memória de trabalho, para que, com

relação hierárquica em que um nível tenha uma

as informações pré­‑existentes em sua memória

posição de maior importância sobre outro.

de longo prazo, e construir esquemas dessas

A simulação pode promover um pen­

informações, os quais podem ser armazenados,

samento crítico no aluno e ilustrar a teoria em

sem sobrecarga do processamento cognitivo. O

diversas escalas, desde a observável, perceptível

modelo de processamento da informação visual

pelo sensorial até o particulado ou, ao menos,

proposto pelos autores, envolve a percepção de

próximo deste. No entanto, suas potencialidades

estímulos visuais e auditivos por partes separadas

não se fazem somente em função do software ou

da memória sensorial; a seleção por um filtro, a

do equipamento no qual o mesmo é usado. Suas

integração e o processamento das informações

potencialidades só são efetivas na construção

visuais e verbais na memória de trabalho e a

do conhecimento se o mesmo for explorado de

armazenagem dessas informações na memória

forma consciente pelo professor, através de um

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Um Estudo sobre as Interações Intermoleculares com Auxílio de uma Simulação Computacional

desenvolvimento coerente de ensino e organizado

das partículas com o comportamento visível do

para que a ferramenta se adéque às necessidades

sistema.

da metodologia de ensino a ser aplicada e não o contrário (Eichler; Del Pino, 2000).

O recurso foi usado com alunos do primeiro ano do Ensino Médio de uma escola privada, na qual há laboratórios de informática atualizados frequentemente, com um número de computadores suficiente para que os alunos trabalhassem em

4. Metodologia

duplas ou individualmente e com acesso à internet

Este trabalho fez uso de um software

banda larga. Essa condição de estrutura física foi

interativo para o estudo de conceitos sobre o

importante neste trabalho, pois o objetivo era que

conteúdo de interações intermoleculares.

O

o aluno interagisse diretamente com a ferramenta

mesmo apresenta uma interface fácil de ser

e não indiretamente, como uma demonstração

manuseada, na qual os recursos disponíveis

do simulador. Além disso, como o recurso está

são facilmente encontrados. Ao interagir com

disponível na web, uma conexão banda larga de

o software, o usuário acessa vídeos de misturas

qualidade, com poucas interferências ou quedas

homogêneas e heterogêneas e, conforme o

de conexão, contribui de forma positiva com o

interesse ou orientação, poderá usar a simulação

ambiente de trabalho a ser desenvolvido.

3

disponível, para observar alguns dos sistemas

Os alunos foram dispostos em duplas e

visualizados através do vídeo, representados no

antes do início da atividade, foi entregue a cada

modo particulado. Não é necessário trabalhar

dupla um roteiro com questões abertas envolvendo

nessa ordem de visualizações, pois os recursos

os sistemas a serem visualizados. A escolha pelas

de vídeo e simulação podem ser acessados de

questões abertas se fez para permitir aos alunos o

forma independente, o que pode ser interessante

registro livre das suas observações, possibilitando

dependendo da proposta e dos objetivos de ensino

assim que observássemos, em uma análise pos-

com o recurso. Além dos vídeos e da simulação,

terior, se havia o uso dos conceitos trabalhados

o software apresenta uma animação onde se

e como se dava esse uso, como as imagens

representa a formação do dipolo induzido.

visualizadas eram interpretadas pelos alunos. O

Nosso intuito era proporcionar ao aluno

modelo do roteiro se encontra no final do trabalho.

a visualização e a interação com sistemas, nos quais os conceitos trabalhados em sala de aula se fazem presentes como variáveis que interferem no comportamento das substâncias que os formam.

5. Resultados

e discussão

A abordagem desses conceitos na sala de aula

Durante toda a atividade a professora

foi teórica expositiva, com uso de representações

interagiu com os alunos, esclarecendo suas

estáticas tanto na lousa quanto no material

dúvidas acerca do recurso, de alguns dos conceitos

didático (apostilas), o que pode dificultar ao aluno

estudados e sobre as imagens que visualizavam.

conseguir relacionar as características dinâmicas

No entanto, tomou-se o cuidado de não induzir na leitura de imagens ou na elaboração dos registros escritos que os mesmos fariam, para

3

Pode ser encontrado no endereço http://nautilus.fis.uc.pt/ molecularium/pt/ligintermol/index.html, com acesso gratuito.

não comprometer a análise das respostas obtidas. A atividade transcorreu com o envolvimento de

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

41


Agnaldo Arroio e Claudia Ayres

todos, professora e alunos, sendo que estes se

“Eles se atraem, pois o pano ficou com a carga

mostravam bastante interessados.

elétrica negativa e o vidro atraiu a carga positiva

Uma das visualizações feitas pelos alunos

do oxigênio” (Sistema água/barra de vidro).

durante a atividade é a tela da simulação onde se

“O pano de lã passa suas cargas negativas para

tem a água e a barra de plástico (Figura 1):

a barra de plástico, que por sua vez é formado por cargas +/- que atrai a água composta por moléculas maiores negativas e menores +” (Sistema água/barra de plástico). “[...] os conjuntos de bolinhas giravam com a aproximação da barra de plástico [...]” (Sistema água/barra de plástico). “[...] os desenhos da acetona não se mexem com a aproximação da barra de ferro [...]” (Sistema

Figura 1. Tela do simulador.

acetona/barra de ferro).

Fica evidente a dificuldade em identificar

42

Nessa tela, o aluno observa as repre­ sentações de todo o processo de eletrização por atrito da barra de plástico quando em contato com um pedaço de lã, podendo acompanhar a visualização da transferência de cargas entre esses materiais e, em seguida, observar a alteração no percurso do filete de água com a aproximação da barra de plástico eletrizada. Nesse ponto da visualização, a simulação demonstra para o aluno o comportamento das moléculas de água com a aproximação da barra eletrizada, evidenciando a rotação destas partículas em função da atração de polos opostos, numa tentativa de indicar a relação desse movimento no modo de representação submicroscópico, com a alteração do percurso do filete de água, que representa o modo macroscópico. Vale ressaltar que o aluno poderia, a qualquer momento, clicar em vídeo para assistir a uma pequena gravação dessa experiência, podendo então visualizar mais informações sensoriais. A análise posterior das respostas dadas pelos alunos mostrou que parte deles interpretou

e diferenciar átomos e moléculas, a polarização

de forma inadequada as imagens da simulação.

Nas respostas dadas sobre os vídeos vistos,

Isso pôde ser inferido em razão de registros como:

há a identificação correta dos sistemas como

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

das moléculas e a identificação dos polos for­ mados, assim como a identificação das imagens da simulação com as respectivas partículas que representam, por exemplo, as bolinhas com suas cores e tamanhos distintos representando os átomos envolvidos e seus conjuntos repre­ sentando as moléculas de cada substância. Isso denota a dificuldade que os alunos apre­ sentam na aprendizagem de representações no modo submicroscópico, devido ao fato de serem representações de uma dimensão inacessível, diretamente, pelos sentidos; um universo de estruturas invisíveis, a olho nu, e conforme sinalizam Ben-Zvi et al. (1986), a aprendizagem de Química, pelos alunos, está intensamente apoiada nas informações obtidas pelos sentidos. Isso implica que, para o aluno, não é fácil identificar as características observáveis de um sistema como decorrência de um comportamento da natureza particulada, tornando-se relevante desenvolver atividades onde se possa propiciar ao aluno situações de estudo envolvendo essas dimensões.


Um Estudo sobre as Interações Intermoleculares com Auxílio de uma Simulação Computacional

misturas homogêneas ou heterogêneas, tendo, em

hidrogênio ficarem mais próximos da barra,

algumas respostas, a preocupação em indicar a

[...]” (Sistema água/barra de plástico).

coloração e o aspecto do sistema obtido: “Ao entrarem em contato, a solução se tornou azul e não dissolveu tudo” (Vídeo água/sulfato

“A lã passa cargas negativas para o plástico, quando se aproxima da água, suas cargas e moléculas se movem e (a água) é atraída”

de cobre).

(Sistema água/barra de plástico).

“A solução ficou amarela” (Vídeo água/

As respostas aqui transcritas indicam a

acetona).

percepção do aluno com relação ao dinamismo das

“Eles não se misturaram, ficando os dois

partículas e ao posicionamento dessas estruturas

separados” (Vídeo água/ciclohexano).

estar relacionado à atração de cargas opostas

Essas respostas demonstram a facilidade de interpretar fenômenos sensoriais, que se efetivam no concreto, tangível aos sentidos. Não houveram indícios de distorções ou equívocos de interpretação nas respostas referentes aos vídeos.

entre as partículas dessas substâncias, devido a polarização. Fica expressa a transição entre o modo submicroscópico (“[...] suas cargas e moléculas se movem [...]”) e o modo macroscópico (“[...] e (a água) é atraída”).

O conjunto de respostas transcritas nesse estudo denota um dos obstáculos que temos no ensino e na aprendizagem de Química que é a

6. Conclusões

transição entre os modos de representação; em

Neste trabalho, o uso da simulação esti-

nosso estudo, especificamente entre os modos

mulou o aluno a pensar sobre as características

macroscópico e submicroscópico, representados

dos sistemas, tanto no modo macroscópico

pelas formas e figuras do simulador e as partículas

quanto no submicroscópico, buscando mostrar

com carga, seus arranjos e movimentos. Há

as relações existentes entre essas dimensões nos

vários estudos feitos sobre essa questão e

sistemas estudados. Os registros escritos, feitos

alguns pesquisadores (Tasker; Dalton, 2006;

pelos alunos, mostram a leitura de imagem feita

Wu; Krajcik; Soloway, 2000; Ardac; Akaygun,

por eles, quais as características dos sistemas

2004) tem se dedicado a essa investigação,

que contribuem, na sua percepção, para o

buscando compreender como essa transição pode

comportamento das substâncias e, a partir dessas

ser favorecida, por meio de registros escritos

informações, torna possível ao professor a

e pictográficos, muitas vezes apoiados nas

condução de uma abordagem de conceitos mais

visualizações através dos recursos multimídias.

efetiva para a construção e elaboração de modelos

Alguns alunos apresentaram interpretações adequadas dos sistemas visualizados, indicando a transição da representação visual para o conceito abstrato:

mentais cada vez mais completos, por parte dos alunos. É fundamental investigar a elaboração de conceitos por parte dos alunos e as dificuldades que os mesmos apresentam para consolidar seu aprendizado,

buscando

minimizar

equívocos

“[...] as moléculas de água se aproximam da

conceituais que possam estar subsidiando as

barra de plástico, de forma aos átomos de

análises dos alunos. Criar oportunidades onde

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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Agnaldo Arroio e Claudia Ayres

o aluno possa expor a sua interpretação sobre

se pretende realizar. O papel do professor como

um fenômeno ou sistema; em que, através de

integrador, motivador e mediador dessa ação é

registros escritos, se possa analisar as elaborações

imprescindível para uma efetiva participação dos

conceituais que o aluno possui, possa ser um meio

alunos, tornando válida a proposta tanto para o aluno

para se encontrar um caminho de construção do

quanto para a abordagem educativa que se pretende.

conhecimento químico no qual as dificuldades de transição entre os modos de representação possam ser superadas, promovendo uma melhora na interpretação de fenômenos e aproximando os alunos da ciência, especificamente, da Química. Logo, a atividade proposta neste estudo se mostrou uma importante ferramenta, pois somente através dela se conseguiu ter acesso às elaborações conceituais dos alunos, às interpretações de imagens que os mesmos validavam como per­ tinentes e adequadas ao conceito em estudo. No entanto, percebemos, pelos registros, que a leitura de imagem por si só, não garante a correta interpretação da mesma. É relevante um terceiro, que pode ser o professor ou outro colega com maior domínio do conteúdo, o qual irá atuar na leitura das imagens, na interpretação das representações visualizadas através da simulação ou de qualquer outro recurso de visualização, na elaboração do registro escrito, favorecendo uma melhor compreensão dos conceitos ali representados e das relações existentes. As simulações se mostraram uma fer­ ramenta efetiva para auxiliar o aluno na construção conceitual. Para isso, as atividades envolvendo esse tipo de ferramenta precisam ser acompanhadas de roteiros de registro da atividade, para possibilitar ao aluno a retomada e discussão de suas respostas e, ao professor, um referencial pelo qual possa atuar na aprendizagem. É preciso que o professor tenha clara a necessidade de direcionar o olhar do aluno para a leitura coerente da imagem, ajudando-o na construção de um modelo mental mais adequado. As potencialidades das ferramentas de ensino estão ligadas às suas funcionalidades e, espe­ cialmente, ao planejamento da ação educativa que

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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Agnaldo Arroio e Claudia Ayres

ROTEIRO SOBRE INTERAÇÕES E SOLUBILIDADE

1. Interações O que ocorre? Complete a tabela a seguir com suas observações. Água

Acetona

Barra de Plástico Barra de Vidro Barra de Ferro

2. Solubilidade Nos vídeos deste link, o que você observou? a) Água com etanol

b) Água com acetona

c) Água com ciclohexano

d) Água com sulfato de cobre (CuSO4)

e) Água com azeite

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

Ciclohexano

Tetracloreto de Carbono


Artigo 05 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 47-56

Aplicação de Recursos Multimídias para o Ensino de Modelos Atômicos em Química: impressões e receptividade dos alunos do curso de engenharia Multimedia Resources Application for the Teaching of Atomic Models in Chemistry: receptivity and impressions from students of Engineering Vinícius Garcia Freaza1

RESumo

A utilização de recursos multimídias na educação tem sido cada vez mais difundida. A internet apresenta inúmeros recursos disponíveis entre animações, vídeos, simuladores e softwares educacionais para as mais diversas áreas do conhecimento, e os professores têm uma vasta gama de opções de tais recursos para serem utilizados em sala de aula. Este trabalho consistiu na escolha de alguns desses recursos disponíveis na World Wide Web, para utilização dos mesmos em uma aula de Química para alunos da primeira série do ciclo básico do curso de Engenharia, e averiguação da opinião e receptividade dos alunos quanto a utilização de tais recursos. A aula foi ministrada na Faculdade Anhanguera de Jundiaí, e o tema desenvolvido foi “Modelos Atômicos”. A averiguação da opinião e receptividade dos alunos para o uso de tais recursos foi realizada com base na aplicação de questionários ao final da aula. Palavras-chave: Recursos multimídia. Animações. Simuladores. Softwares educacionais. Modelos atômicos. Química.

1

Faculdades Anhanguera, Campinas, SP.


ABSTRACT

The use of multimedia in education has been increasingly widespread. The Internet has many resources available among animations, videos, simulators and educational software for many different areas of knowledge, and teachers have a wide range of options to use in the classroom. This work approaches the choice of some of these resources available on the World Wide Web to the use in chemical classes in elementary courses of Engineering. The students opinion and receptivity towards such resources are also related in this article. These classes were ministered in Anhanguera University of Jundiaí, and the theme developed was “Atomic Models.” The investigation and review of students’ receptivity to the use of such resources was based on questionnaires at the end of the class. Key-words: Multimedia. Animations. Simulations. Educational software. Atomic models. Chemistry.

1. Introdução

abordagens, dentre as quais tem se destacado o

Também tem sido possível levar às salas de aula, ou mesmo à casa de qualquer pessoa interessada, ambientes virtuais que simulam os laboratórios de Química. A experimentação no ensino de Química possui um papel fortemente motivador e vinculado aos sentidos dos alunos. Alguns trabalhos expõem depoimentos de professores de Química que relatam um aumento na capacidade de aprendizagem dos alunos quando se faz o uso da experimentação (Giordan, 1999). Entretanto, em muitas escolas não há um laboratório de Química disponível, ou quando há, este não se encontra satisfatoriamente equipado. Mesmo quando há o laboratório disponível e equipado, existem situações em que o experimento que se deseja realizar pode apresentar condições perigosas ou impossíveis de serem realizadas em um laboratório didático. O uso das simulações virtuais nesses casos torna-se uma alternativa interessante. Essas simulações, se não substituem a verdadeira experiência que um aluno teria ao visitar um laboratório real, pelo menos podem aproximar o aluno de tal experiência, tornando o processo de aprendizagem de Química mais experimental. As simulações de ambientes laboratoriais e de

uso de simulações e animações computacionais

experimentos surgem como uma nova opção no

(Ribeiro; Greca, 2003a).

ensino de Química, visando substituir represen-

A revolução tecnológica que as diversas esferas da sociedade têm experimentado nas últimas décadas é inegável. O acesso e a democratização da informação, bem como a rapidez de sua propagação, devem-se, principalmente, à popularização da Internet. O uso da Internet na educação tem possibilitado a consulta, a comunicação e a difusão de ideias e experiências em todo o mundo. Utilizar a Internet no ensino expande consideravelmente a sala de aula pela troca de informações, dados, imagens e programas de computadores que ocorre em âmbito mundial quase que instantaneamente (Ferreira, 1998). No ensino das ciências, e especificamente no ensino da Química, a utilização de computadores e periféricos tem proporcionado, cada vez mais, a possibilidade de representar e simular conceitos científicos

abstratos,

calcados

em

modelos

teóricos. Para explicar e explorar fenômenos, processos e ideias abstratas, bem como para proporcionar aos alunos o desenvolvimento da capacidade de representação em seus diferentes níveis, os pesquisadores têm sugerido várias

48

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Aplicação de Recursos Multimídias para o Ensino de Modelos Atômicos em Química

tações esquemáticas e modelos estáticos por ferramentas que proporcionam a visualização de

2. O

conceito de modelo em Química e os modelos atômicos

modelos dinâmicos (Ribeiro; Greca, 2003b). Muitos recursos como os citados nos parágrafos anteriores podem ser encontrados na internet, para livre utilização. Há uma centena de sites que dispõem de conteúdos educacionais on line ou para download. Entretanto, se visitarmos alguns desses sites, logo perceberemos uma semelhança estética em muitos deles. Alguns até possuem ideias educacionais muito interessantes, porém, deixam a desejar no que diz respeito à apresentação dos conteúdos e à qualidade técnica e de produção. Por outro lado, muitos desses recursos apresentam o aspecto técnico e de produção muito bem desenvolvido, embora a abordagem de conteúdo seja duvidosa. Esse desencontro descrito no parágrafo anterior é atribuído a um amadorismo de funções, pois muitas vezes, programadores que assumem a temporária ou circunstancial função de educador, produzem softwares tecnicamente cuidadosos, mas pedagogicamente duvidosos. Outras

vezes,

educadores

aventuram-se

na

função de programadores e tentam traduzir ideias pedagogicamente interessantes em códigos de programação que pouco conhecem, atingindo resultados não satisfatórios (Lollini, 1991). Percebe-se então que o professor, ao decidir utilizar recursos disponíveis na Web em suas aulas, deve ter o cuidado de selecionar recursos que sejam eficientes e cuidadosos na abordagem dos conteúdos e, que ao mesmo tempo, que consigam promover um diferencial em sua aula, atraindo a atenção e gerando interesse dos alunos. O presente trabalho tem a intenção de averiguar a opinião e a receptividade dos alunos ao assistirem uma aula de Química com a utilização de alguns recursos multimídia disponíveis na Web para o ensino do tópico de modelos atômicos, escolhidos pelo professor.

Uma das bases primordiais para o entendimento da Química é o conceito de átomo. Desde a Grécia antiga até nossos dias, a preocupação em entender a constituição da matéria sempre esteve presente na humanidade. A primeira proposta amparada por evidências experimentais foi feita por John Dalton em 1808, levando-o à elaboração do primeiro modelo atômico. Nestes mais de 200 anos de história, a definição de átomo sofreu diversas reformulações, e em todas elas, sempre houve a necessidade de se imaginar e representar um novo tipo de átomo. O conceito de modelo é bastante utilizado em Química, especialmente no entendimento da estrutura atômica. O termo modelo, cientificamente, pode ser utilizado para expressar um conjunto de ideias que fisicamente não existem, mas existem apenas na imaginação de alguém que as formula. Um modelo passa a adquirir conotação científica quando uma maioria de pessoas utiliza a mesma forma de pensar, sendo adotado como o melhor entendimento, aceito pela comunidade científica, sobre determinado fenômeno ou observação, seja ele qual for (Santos Filho, 2007). Os modelos atômicos que serão ensinados na aula que envolve este trabalho são os modelos de Dalton, Thomson, Rutherford, e Bohr. Embora esses não sejam os únicos modelos atômicos que surgiram na história, são os quatro modelos iniciais que constam no plano de ensino da disciplina Química do curso de Engenharia da Anhanguera Educacional e no livro-texto adotado para a disciplina. 2.1. O

ensino de modelos atômicos e os diferentes recursos multimídia Quando analisamos o contexto em que os

diversos modelos atômicos conhecidos surgiram,

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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Vinícius Garcia Freaza

percebemos que eles foram propostos para explicar

‑los, compará-los e escolhê-los. Nesse momento,

fenômenos e observações experimentais. Porém,

o educador se deparará com diversos tipos de

em sala de aula, esse conteúdo muitas vezes é

recursos sobre um mesmo assunto, porém, com

trabalhado de forma expositiva, e não através

formatos diferentes. Simuladores de experimentos,

de experiências ou demonstrações feitas pelo

animações e vídeos estão entre os recursos mais

professor. Dessa forma, perde-se o sentido original

comumente encontrados sobre o tema “Modelos

da criação de um modelo atômico, que é o de

Atômicos”. Cada um desses recursos constitui­

explicar a ocorrência de determinados fenômenos

‑se em uma modalidade do uso do computador no

e observações.

ensino, e possui peculiaridades na sua utilização,

A forma como se ensina os conceitos de átomo e estrutura atômica, em geral, tem

sala de aula.

mostrado inadequação e apontado a necessidade

Os simuladores de experimentos podem

de se elaborar novas abordagens. Constata-se

contribuir para que os alunos entrem em contato

que em livros didáticos, a natureza da abordagem

com os experimentos que levaram os cientistas

dos conteúdos é essencialmente microscópica e

a proporem seus modelos atômicos, quando

envolve conceitos abstratos, impossíveis de serem

esses

visualizados e exemplificados concretamente,

de serem reproduzidos por serem de alto

tais como núcleo, eletrosfera, prótons e nêutrons

risco, muito caros ou por envolverem aparato

(Eichler; Del Pino, 2000).

experimental complicado. Entre outros fatores,

experimentos

mostram-se

impossíveis

Por outro lado, uma abordagem de ensino

a experimentação permite ao experimentador

baseada na reprodução dos experimentos que

assumir o controle das variáveis inerentes a um

levaram tais cientistas à elaboração de modelos

fenômeno em estudo. Segundo Giordan (1999),

é praticamente impossível, pois o aparato

esse controle subsidia a prática empírica de adotar

experimental e a complexidade para se reproduzir

a precisão da medida da variável como critério

muitos

mais adequado de julgamento do fenômeno. A

dos

experimentos

inviabilizariam

a

ocorrência de uma aula com tal proposta. Surge então, a possibilidade da utilização de recursos multimídia, para compor aulas com

50

bem como na postura do professor e os alunos em

partir daí, a compreensão do empírico possibilita a compreensão do fenômeno, considerando a exis­ tência de medidas instru­mentais precisas.

uma nova abordagem, diferente da expositiva,

A Figura 1 mostra a tela de um simu­

e estruturada apenas no aspecto microscópico.

lador dos resultados do experimento de bombar­

Muitos recursos disponíveis na World Wide

deamento da lâmina de ouro com partí­culas alfa,

Web para utilização on line ou mesmo para

de Rutherford, interpretados sob o entendimento

download,

simulação

da proposta de seu modelo. Esse simulador permite

interativa dos experimentos realizados pelo

ao usuário controlar a energia das partículas alfa

cientistas que propuseram os modelos atômicos,

que serão lançadas contra o núcleo de um átomo,

até a visualização de animações dos modelos

e o número de prótons e nêutrons existentes no

microscópicos elaborados pelos mesmos.

núcleo do átomo que será bombardeado com as

possibilitam

desde

a

Para que essa abordagem seja viável, caberá

partículas alfa. A previsão de novos fenômenos

ao professor a missão de vasculhar a internet em

pode ser realizada com o usuário alterando as

busca de tais recursos além de conhecê-los, testá­

variáveis citadas neste parágrafo.

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Aplicação de Recursos Multimídias para o Ensino de Modelos Atômicos em Química

entre os níveis de energia existentes no átomo de hidrogênio e observar qual é o comprimento de onda da radiação emitida em tal transição. Assim, é possível relacionar a transição escolhida com a coloração correspondente exibida no espectro do hidrogênio, observado na animação descrita no parágrafo anterior.

Figura 1. Tela do simulador de resultados do expe­ rimento de Rutherford.

Nas duas figuras a seguir temos as repre­ sentações das diferentes telas de um mesmo simulador. Nesse simulador são explorados os resultados dos experimentos de espectroscopia de Bohr, interpretados sob o entendimento da proposta de seu modelo. É possível, em um primeiro momento, entender o experimento de espectroscopia utilizado por Bohr para fundamentar o seu modelo, através de uma

Figura 3. Tela de simulador dos resultados do expe­ rimento de Bohr.

animação que simula o espectro obtido quando se aplica uma alta voltagem em uma lâmpada de hidrogênio, e faz-se passar a luz emitida por um prisma. A Figura 2 mostra a tela da animação do espectro de hidrogênio.

Animações são recursos úteis quando se deseja, por exemplo, representar uma situação ou modelo microscópico que para ser compreendido sem o uso desse recioso, exigiria grande carga de abstração por parte dos alunos. No caso específico do assunto de modelos atômicos em Química, as animações podem contribuir para que os alunos adquiram uma visão dinâmica e/ou tridimensional de um modelo microscópico, que é geralmente demonstrado em livros didáticos com imagens estáticas e em duas dimensões.

Figura 2. Tela da animação do experimento do espectro do hidrogênio.

A Figura 4 mostra quatro momentos diferentes de uma mesma animação que representa o experimento de Thomson com o tubo de raios

A Figura 3 representa a tela de um segundo

catódicos. Tal experimento levou-o à descoberta

momento desse simulador, onde é permitido ao

do elétron. Com essas quatro animações é possível

usuário selecionar diferentes transições eletrônicas

observar, dinamicamente, a saída de um feixe

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

51


Vinícius Garcia Freaza

luminoso do cátodo (feixe de elétrons) dirigindo-se para o ânodo, bem como o comportamento do feixe na diferentes situações apresentadas: presença da cruz de malta, presença de cata-vento de mica e presença de campo elétrico. Thomson observou o comportamento do feixe de elétrons sob todas essas condições em seu experimento original.

Figura 5. Cena do vídeo da série “Mundos Invisíveis” a constituição da matéria e o modelo atômico de Dalton.

3. Materiais

e métodos

Para a realização deste trabalho, foram escolhidos cinco recursos multimídia, encontrados para livre utilização na internet para compor uma aula sobre os modelos atômicos de Dalton, Figura 4. Animações sobre o experimento de Thomson.

Thomson, Rutherford e Bohr. Os recursos utilizados foram: •

Capítulo da série “Mundos Invisíveis”,

Um vídeo pode ser utilizado no ensino

que aborda a constituição da matéria e

de Química com diversas finalidades, entre

o desenvolvimento do primeiro modelo

elas: contextualização histórica de determinada

atômico, proposto por Dalton;2

descoberta

ou

desenvolvimento

científico,

reprodução de um experimento perigoso ou

Conjunto de 4 animações e 2 filmes sobre os experimentos de Thomson;3

complicado, reprodução de experimentos demo-

rados com tempo editado, entre outras. Os vídeos

Um simulador dos resultados do experimento de Rutherford;4

combinam estímulos relacionados à visão e

audição aumentando a retenção da mensagem

Um simulador dos resultados dos experimentos de Bohr.5

enviada ao cérebro (Canabrava; Vieira, 2006). A Figura 5 traz a imagem da cena de um

2

Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=fCfLW8 SCmcQ&p=50492300A871CA95&playnext=1&index=90>.

3

Disponíveis em: <http://www.algosobre.com.br/quimica/ descoberta-das-particulas-subatomicas.html>; <http:// www.youtube.com/watch?v=UavibT0fFJw>; <http://www. youtube.com/watch?v=vIf9sTeKUTo>.

4

Disponível em: <http://objetoseducacionais2.mec.gov.br/ handle/mec/3080>.

5

Disponível em: <http://www.mhhe.com/physsci/chemistry/ essentialchemistry/flash/linesp16.swf>.

vídeo da série “Mundos Invisíveis”, que se propõe a abordar historicamente o desenvolvimento do conceito de átomos e subpartículas da matéria. Nesse vídeo, o tema principal é o questionamento do homem sobre a constituição da matéria, desde a Grécia antiga até o desenvolvimento do primeiro modelo atômico por John Dalton em 1808.

52

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Aplicação de Recursos Multimídias para o Ensino de Modelos Atômicos em Química

Todos esses recursos foram utilizados na

a) Tornou a aula mais interessante e

ordem cronológica apresentada pelos tópicos do

contribuiu para o aprendizado do

parágrafo anterior, durante uma aula que teve

conteúdo;

duração total de 180 minutos, intercalados com

b) Não fez diferença. A aula teria o

o discurso expositivo do professor e a utilização

mesmo efeito se fosse dada sem tais

da lousa. Os recursos foram apresentados

recursos;

utilizando um notebook com acesso a internet,

c) A aula foi ruim, e seria melhor se o

um equipamento projetor e uma tela de projeção

professor utilizasse apenas a lousa e

centralizada na lousa.

a exposição oral.

Após o término da aula, foi aplicado

(c) 0%

um questionário para os alunos, com cinco questões de múltipla escolha. As questões foram

(a) 100%

(b) 0%

elaboradas para permitir a análise posterior sobre a aceitação e impressão dos alunos acerca dos recursos multimídia utilizados durante a aula. Os alunos foram orientados a responder o questionário de forma correta e sem qualquer tipo de identificação, para garantir o sigilo quanto a sua opinião pessoal.

Figura 6. Resultados da primeira questão.

2. Entre os recursos utilizados, qual você achou mais interessante? 4. Resultados

e discussões

a) O vídeo sobre Lavoisier e Dalton; b) Os vídeos e animações sobre o tubo

A análise das respostas do questionário

de raios catódicos de Thomson;

aplicado aos alunos permitiu a construção de

c) O simulador dos resultados do expe-

um gráfico para cada questão, que demonstra

rimento de Rutherford;

a distribuição percentual das respostas obtidas

d) O simulador dos experimentos e do

para cada alternativa da questão. No dia da aula

modelo de Bohr.

e da aplicação do questionário, a sala contava com oitenta e dois alunos. Todos responderam ao questionário. As cinco questões aplicadas aos alunos são reproduzidas a seguir, bem como as

(Todas) 12%

(d) 16%

(c) 23%

alternativas propostas para a resposta de cada uma das questões. As alternativas de cada questão são seguidas pelo gráfico com os resultados percentuais obtidos para cada alternativa.

(b) 22% (a e b) 1% (b e c) 1% (Nenhuma) 12%

(a) 24%

1. O que você achou da utilização dos recursos multimídia na aula sobre modelos atômicos?

Figura 7. Resultados da segunda questão.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

53


Vinícius Garcia Freaza

3. Se essa aula fosse dada apenas na lousa,

5. Como você acha que esses recursos deve­

qual seria sua previsão para a compre­

riam ser utilizados pelos pro­fessores?

ensão desse mesmo conteúdo?

a) Em todas as aulas, pois a aula fica mais interessante;

a) Teria mais dificuldade de enten­der

b) Nunca deveriam ser utilizados, pois

os modelos atômicos e os experi­

não contribuem significativamente

mentos que levaram à elaboração

com a aula;

dos mesmos;

c) De vez em quando, pois o professor

b) A compreensão seria muito melhor,

deve intercalar aulas tradicionais

pois esses recursos atrapalharam

com aulas desse tipo.

minha imaginação; c) Minha compreensão dependereria mui­to do desempenho do professor. (c) 37%

(a) 63%

(c) 24%

(a) 76%

(b) 0%

(b) 0%

Figura 10. Resultados da quinta questão.

Figura 8. Resultados da terceira questão.

4. Se após a aula o professor fornecesse o endereço desses recursos na Web o que você faria? a) Não iria acessar; b) Iria acessar por curiosidade, não para estudar; c) Iria acessar para estudar utilizando a internet. (c) 73% (a) 6%

(b) 21%

Figura 9. Resultados da quarta questão.

54

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

É possível discutirmos a aceitação da utilização de recursos multimídia em sala de aula pelos alunos fazendo-se uma análise dos gráficos obtidos para cada uma das questões. No caso específico de uma das questões, é possível analisar a importância dada pelos alunos a esse tipo de recurso quanto ao acesso ou uso fora da sala de aula. A primeira questão trata de forma simples e direta a aceitação da utilização dos recursos multimídias por parte dos alunos. Estes foram unânimes em apontar que a utilização de tais recursos torna a aula mais interessante e julgam que esses recursos contribuem para que o aprendizado seja mais significativo. Nos desperta a atenção o fato de que a totalidade dos alunos teve a mesma opinião, sem exceções. A segunda questão induz o aluno a comparar os recursos utilizados e a optar por um deles, apontando-o como o mais interessante. Durante a aplicação do questionário, foi dada


Aplicação de Recursos Multimídias para o Ensino de Modelos Atômicos em Química

a instrução de que, nessa questão, os alunos poderiam apontar mais de um recurso escolhendo mais de uma alternativa se assim o desejassem, mas que preferencialmente deveriam se lembrar de todos os recursos utilizados na aula e apontar o que mais lhes despertou interesse. Essa ressalva visava evitar com que os alunos apontassem todos

multimídia utilizados, fora da sala de aula, e

os recursos como interessantes, pelo simples

A quinta questão faz um levantamento sobre

fato de serem recursos multimídia, mas que

qual a frequência de uso dos recursos multimídia

refletissem qual foi o tipo de recurso que mais

em aula pelo professor os alunos julgam ser mais

lhe agradou ou chamou atenção, possibilitando

adequada. A maioria dos alunos (76%) aponta que

assim uma diferenciação da aceitação entre

tais recursos deveriam ser utilizados em todas as

os diversos recursos. O vídeo sobre o modelo

aulas pelo simples fato desses recursos tornarem

atômico de Dalton, as animações e vídeos sobre

a aula mais interessante. Um grupo menor de

os experimentos e modelo atômico de Thomson

alunos (24%) julgou que as aulas com utilização

e o simulador dos resultados do experimento

de recursos multimídia devem ser intercaladas

de Rutherford apresentaram praticamente os

com aulas tradicionais expositivas. Nenhum

mesmos índices percentuais (em torno de 23%

aluno apontou que os recursos multimídia nunca

cada um deles) como recurso mais interessante.

deveriam ser utilizados pelo professor.

qual a finalidade de tal acesso se ele ocorrer. A grande maioria dos alunos (73%) apontou que tem interesse em acessar os recursos utilizados para estudar, porém, boa parte dos alunos (21%) julgou que iriam acessar o recurso multimídia apenas para satisfazer a curiosidade e não para estudar.

O simulador dos resultados dos experimentos de Bohr despertou um pouco menos de interesse nos alunos (16%). Uma pequena parcela dos alunos (12%) não conseguiu apontar apenas um como recurso multimídia mais interessante, apontando todos os recursos nessa questão.

5. Considerações

finais

Diante do exposto, percebemos que a utilização de recursos multimídia em sala de

A terceira questão pedia para que os alunos

aula promove um aumento do interesse dos

fizessem uma previsão de como seria seu próprio

alunos em relação ao conteúdo exposto pelo

entendimento desses conteúdos caso a mesma

professor, segundo avaliação dos próprios alunos.

aula fosse dada sem os recursos multimídias.

Esses recursos, quando utilizados em conjunto,

A maioria dos alunos (63%) apontou que teria

intercalados com tecnologias tradicionais como

mais dificuldade de entender o conteúdo sem a

a lousa e associados ao discurso e exposição do

utilização de tais recursos, independentemente do

professor, podem contribuir para a construção de

desempenho do professor na condução dessa aula.

uma aula mais dinâmica e rica em exemplos e

Uma minoria significativa (37%) apontou que a

demonstrações.

compreensão dos conteúdos sem a utilização dos

No caso específico do ensino de modelos

recursos iria depender do desempenho do professor

atômicos em Química, ou mesmo em outras

na explicação do conteúdo. Nenhum aluno apontou

áreas do conhecimento que exigem boa dose de

que os recursos multimídia utilizados atrapalharam

abstração para sua compreensão, o uso dos recursos

a compreensão dos conteúdos envolvidos na aula.

multimídia pode colaborar para que essa abstração

Na quarta questão é possível analisar qual

seja facilitada. Há de se citar também que tais

é o interesse dos alunos em acessar os recursos

recursos permitem a demonstração e simulação de

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

55


Vinícius Garcia Freaza

experimentos importantes para a compreensão de determinado conteúdo e que seriam impossíveis de serem reproduzidos com as condições normais existentes nos ambientes de ensino. Para

que

a

utilização

de

recursos

multimídia em sala de aula seja bem sucedido, cabe ao professor pesquisar, fazer reflexões e testar o material antes de apresentá-lo. Já que, esses recursos, quando utilizados com moderação, enriquecem a aula e aproximam a ciência estudada do aluno, uma vez que a possibilidade de demonstrar experimentos e simular conceitos dinâmicos e abstratos é enorme. Além disso, se esses recursos forem disponibilizados aos alunos após a aula, podem servir de estímulo ao estudo e à pesquisa fora da sala de aula.

Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Didática e Metodologia do Ensino Superior – Programa Permanente de Capacitação Docente. Valinhos, SP: Anhanguera Educacional, 2009. CANABRAVA, T.; VIEIRA, O. F. A. Treinamento e Desenvolvimento para Empresas que Aprendem. Brasília: SENAC, 2006. EICHLER, M.; DEL PINO, J. C. Modelagem e Implementação de Ambientes Virtuais de Aprendizagem em Ciências. IV Congresso RIBIE, Brasília, 1998. Disponível em: <http://www. niee.ufrgs.br/ribie98/trabalhos1.html>. Acesso em: 01 out. 2010. _______.; DEL PINO, J. C. Computadores em educação química: estrutura atômica e tabela periódica. Química Nova, v. 23, n. 6, p. 835-840, 2000. FERREIRA, V.F. As tecnologias interativas no ensino. Química Nova, v. 21, n. 6, p. 780-786, 1998. GIORDAN, M. O papel da experimentação no ensino de ciências. Química Nova na Escola, n. 10, p. 43-49, 1999. LOLLINI, P. Didática e computadores: quando e como a informática na escola. São Paulo: Loyola, 1991.

referências BARBOSA, R. Perspectivas do uso do computador no ensino. Material da 1ª aula da Disciplina Tecnologias Aplicadas ao ensino e aprendizagem, ministrada no

56

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

RIBEIRO, A. A.; GRECA I. M. Simulações computacionais e ferramentas de modelização em educação química: uma revisão de literatura publicada. Química Nova, v. 23, n. 4, p. 542-549, 2003. SANTOS FILHO, P. F. dos. Estrutura atômica e ligação Química, 2. ed. Campinas: Autor Editor, 2007.


Relato 01 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 57-62

A Aprendizagem dos Fundamentos da Química Orgânica com o Emprego de Modelos Moleculares The Learning of Organic Chemistry’s Basis through the Use of Molecular Models Ricardo Barroso Gomes1,2

Resumo

Neste trabalho, propomos a utilização de atividades experimentais de Química, em que utilizamos a Química Computacional, com o emprego do software Avogadro e o uso do kit de montagem de modelos moleculares Atomlig 77 Educação, com o objetivo de propiciar ao aluno uma visão tridimensional de algumas moléculas orgânicas abordadas em sala de aula, dentro do conteúdo programático de Química. Sugerimos que os alunos trabalhem em grupos, viabilizando a interação social entre os estudantes e a discussão dos resultados sob a orientação do professor. Após as dinâmicas realizadas em sala de aula, é promovida uma avaliação discursiva, cujos resultados são expressos graficamente, mostrando sua validade como proposta pedagógica. Essa proposta pode propiciar a aprendizagem dos conceitos envolvidos sobre Química Orgânica, sobretudo a visualização espacial de modelos moleculares, além de contribuir com a formação do aluno como indivíduo crítico e reflexivo. Palavras-chave: Ensino de química. Modelos moleculares. Interação social. Química orgânica.

1

Mestre em Ensino de Ciências da Saúde e do Ambiente – UNIPLI; Especialista em Docência do Ensino Superior; Bacharel em Ciências Farmacêuticas – UNISUAM; Bacharel em Química com atribuições tecnológicas – UNIGRANRIO. E-mail: ricardogomes18@ig.com.br

2

Agradeço ao Colégio Santa Teresa de Jesus, à coordenadora pedagógica Janaina Fedozzi e à Irmã Graça por permitirem a realização do presente trabalho.


ABSTRACT

In this project, we propose the use of experimental activities of Chemistry, by Computational Chemistry means by the use Avogadro software and the assembly of Atomlig 77 Educação molecular models. That was done in order to offer the students a tridimensional view of some organic molecules, which are studied in class, as a content in the Chemistry program. We suggest that the students work in groups, in order to make feasible the social interaction between them and the debate about the results, under the teacher´s guidance. After the experiences carried out in the classroom, a discursive evaluation is promoted from which results can be expressed graphically, showing its validity as a pedagogical proposal. This proposal could make easier for students, the learning of basic Chemistry concepts, above all the space view of the molecular models, and also the student’s education as critical and reflexive individuals. Key-words: Chemistry teaching. Molecular Models. Social interaction. Organic chemistry.

1. Introdução

Os princípios da Química devem ser interpretados como uma parte fundamental da construção do conhecimento e, assim, estar ativamente em contínuo movimento de mudança e em coerência com os postulados de natureza ética (LDB, 1996). Além disso, o aprendizado da Química no ensino médio deve possibilitar ao aluno a compreensão tanto dos processos químicos em si, quanto da construção de um conhecimento científico em estreita relação com as aplicações tecnológicas e suas implicações ambientais, sociais, políticas e econômicas (MEC, 2002). Em vista disso, o presente trabalho visa

-aprendizagem, fazendo-se possível visualizar as moléculas de maneira tridimensional e como estão orientados espacialmente os seus orbitais. Dessa forma, se compreendem muitos fenômenos associados às moléculas de interesse químico, físico e biológico. O programa computacional utilizado para construção de moléculas foi o Avogadro (AVOGADRO), além do kit de montagem de moléculas orgânicas Atomlig 77 Educação, que permitiram aos estudantes aprenderem conceitos abstratos de geometria molecular, polaridade, isomeria plana e espacial além das representações moleculares (fórmula molecular, estrutural plana e espacial).

utilizar, dentre outros recursos, um programa computacional e um kit de montagem de moléculas orgânicas para estimular os alunos do 3° ano do Ensino Médio do Colégio Santa Teresa de Jesus (CSTJ), localizado no bairro Tijuca, na capital do Estado do Rio de Janeiro.

58

2. Metodologia

O trabalho realizado no CSTJ começou ao se fazer uma revisão sobre a geometria das

Levando-se em conta que grande parte

moléculas orgânicas, hidrocarbonetos, funções

dos alunos apresenta dificuldades em relação à

orgânicas e isomeria, sendo realizados diversos

compreensão da Química, utilizamos a Química

exercícios objetivos e discursivos aplicados em

Computacional e o uso de um kit molecular

vestibulares de instituições privadas, públicas e o

voltado para o ensino de Química Orgânica,

ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) além

com o intuito de auxiliá-los no processo ensino-

de uma aula prática no laboratório de Química.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


A Aprendizagem dos Fundamentos da Química Orgânica com o Emprego de Modelos Moleculares

Como recursos didáticos, foram utilizados o

dizagem, colaboram com a adaptação do aluno a

programa computacional Avogadro e o kit de

uma sociedade cada vez mais tecnológica (Raupp

montagem de moléculas orgânicas Atomlig 77

et al., 2008).

Educação. Por fim, aplicou-se um questionário

A prática com o emprego do kit de

para verificar a opinião dos alunos em relação

montagem de moléculas orgânicas despertou

aos recursos didáticos aplicados e uma prova

enorme interesse e interação por parte dos

discursiva.

alunos, que foram divididos em quatro grupos de 5 até 7 alunos (Figura 1), com o objetivo de montar estruturas orgânicas previamente

3. Resultados

relacionadas pelo professor, conhecendo suas

e discussão

Durante o primeiro trimestre das aulas foram feitas revisões sobre as características gerais dos compostos orgânicos, com aplicações de exercícios objetivos e discursivos. Além disso, foi feita uma atividade prática no laboratório de Química sobre normas de segurança e seus

propriedades medicinais, físico-químicas, além de responder questões levantadas pelo educador, com a interação de todos os grupos, quando questionados sobre o que ocorreria com os compostos e o tipo de isomeria montados por cada grupo.

principais materiais utilizados no dia a dia no laboratório, com suas respectivas aplicações, uma vez que o CSTJ dispunha de vasta vidraria e reagentes além de equipamentos como centrífuga, capela, balanças, dentre outros, mostrando a importância da Química, não só na descoberta de novas substâncias na Química Medicinal, mas da Ciência como um todo. O uso do software Avogadro foi bastante importante para o desenvolvimento da capacidade intelectual dos alunos, pois permitiu a visualização

tridimensional

das

moléculas

Figura 1. Grupos utilizando os kits Atomlig 77 Educação.

orgânicas, girando em uma animação, fazendo-se com que os estudantes levantassem questões sobre a sua geometria espacial, dentre outras. O seu uso foi realizado utilizando-se um projetor, conectado ao laptop, e uma tela em frente ao quadro da sala de aula.

O programa Avogadro (Figura 2) e o kit de moléculas Atomlig 77 Educação (Figura 3) foram bastante relevantes no decorrer do trabalho, pois possibilitaram a demonstração de vários tópicos abordados na Química Orgânica, como conceitos

Atualmente, muitos softwares estão dispo-

abstratos de geometria molecular, comprimentos

níveis na Internet para download totalmente livre, e

de ligação, ângulos, hibridização, polaridade,

outros podem ser comprados dos seus fabricantes.

isomeria plana e espacial além das representações

Pode-se salientar que estas ferramentas, quando

moleculares (fórmula molecular, estrutural plana e

devidamente aplicadas, além de motivar a apren-

espacial).

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

59


Ricardo Barroso Gomes

45% Excelente

15% Bom

40% Muito bom

Figura 4. Opinião sobre a visualização da geometria espacial no programa Avogadro. Figura 2. Tela do programa de Química Computacional Avogadro.

Outro tópico questionado aos alunos foi sobre a identificação das funções orgânicas feitas com o software (Figura 5). O resultado obtido foi que: 5% manifestaram haver muita facilidade em identificar as funções orgânicas construídas pelo professor ao usar o software Avogadro; 65% expressaram ter tido facilidade em reconhecê-las, 25% manifesta­ram ter tido pouca facilidade no seu reconhecimento e apenas 5% expressaramter tido dificuldade para visualizar as funções dos compostos orgânicos.

Figura 3. Kit molecular para ensino de Química Orgânica Atomlig 77 Educação.

Após a dinâmica com o uso do programa Avogadro, foi passado um questionário com o intuito de verificar a opinião dos alunos sobre o uso

25% Pouca facilidade 5% Muita facilidade

65% Facilidade

5% Dificuldade

do software na visualização em relação à geometria espacial e à identificação das funções orgânicas. Em relação à geometria espacial (Figura 4) 45% consideraram excelente, 40% acharam muito bom e 15% consideraram bom, não havendo nenhum

Figura 5. Opinião sobre a visualização das funções orgânicas no programa Avogadro.

aluno que classificasse o software como regular ou

60

ruim, o que vem a confirmar a boa identificação

Segundo o regimento interno sobre a ava­

e a boa visualização dos ângulos formados pelos

liação do processo de aprendizagem do CSTJ, são

seus orbitais relacionando-os com a hibridização

atribuídas menções, que são expressas por conceitos,

ocorrida dos átomos de carbono, corroborando com

em cada componente curricular atribuídas pelo

o processo de ensino­‑aprendizagem dos alunos.

professor e ratificadas pelo conselho de classe:

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


A Aprendizagem dos Fundamentos da Química Orgânica com o Emprego de Modelos Moleculares

• •

E (Excelente) – atingiu plenamente os

processo de ensino-aprendizagem dos alunos e

objetivos propostos para o período letivo

contribui para que sejam realizadas novas práticas

nas áreas cognitivas, afetiva e social;

futuras, mostrando a importância da Química e

mB (Muito bom) – atingiu parcial-

tirando a impressão que o aluno tem de ser essa

mente os objetivos propostos;

uma Ciência distante e inatingível.

B (Bom) – atingiu o mínimo dos objetivos propostos;

R (Regular) – não atingiu o mínimo dos objetivos propostos, necessitando de

O

estudos de recuperação; •

4. Conclusão

desenvolvimento

deste

trabalho

I (Insuficiente) – não atingiu os obje-

proporcionou uma evolução bastante significativa

tivos propostos.

para os alunos, pois eles cresceram em sua capacidade de raciocínio, tornando-se mais críticos

21,8% Insuficiente

8,8 % Regular

e compartilhando suas descobertas com os demais alunos e professores.

26% Bom

4,4% Excelente

Desta forma, encorajamos o uso crescente 39% Muito bom

de ferramentas em sala de aula, como softwares destinados à Química Computacional, kits de montagem para moléculas orgânicas e atividades lúdicas, não apenas pelo seu impacto no aprendizado de conceitos e representações químicas, mas pela eficiência da ferramenta

Figura 6. Resultados da avaliação discursiva.

Após as dinâmicas com o uso do software e do kit de montagem, realizou-se a aplicação

como preparação do estudante para um futuro profissional onde a Química Computacional estará cada vez mais presente no cotidiano.

de uma prova discursiva sobre os conteúdos referentes aos princípios de Química Orgânica (hidrocarbonetos, funções oxigenadas, funções

REFERÊNCIAS

nitrogenadas e isomeria plana), em que 4,4%

LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.

conseguiram conceito máximo excelente, 39% obtiveram conceito muito bom, 26% conquistaram conceito bom, 8,8% receberam conceito regular e 21,8% tiveram conceito insuficiente (Figura 6). Analisando o gráfico com atenção, podemos observar que mais da metade, 69,4%, conseguiram conquistar a média do colégio, o que vem a confirmar que o uso de ferramentas alternativas para a prática docente, seja ela com o uso da Química Computacional, kits de montagens ou práticas lúdicas, só vem a corroborar com o

MEC. Secretaria de Educação Média e Tecnológica (Semtec). PCN + Ensino médio: orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais – Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília: MEC/ Semtec, 2002. AVOGADRO – Homepage e Download. Disponível em: <http://avogadro.openmolecules.net/>. RAUPP, D.; SERRANO, A.; MARTINS, T. L. C. A evolução da Química Computacional e sua contribuição para a educação em Química. Revista Liberato, Novo Hamburgo, v. 9, n. 12, p. 13-22, jul./ dez. 2008.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

61



Relato 02 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 63-70

A Utilização de Jornais e Revistas como Instrumento para o Aprendizado em Química: uma proposta construtivista The Use of Newspapers and Magazines as a Tool for Learning in Chemistry: a constructivist approach Mauricio Ferreira da Rosa1, Viviane da Silva Lobo2 e Iara Lucia Lazzarin3

Resumo

O ensino de Química nos dias atuais impõe aos educadores novas formas de ensinar que despertem o interesse do aluno pela disciplina, mostrando que a Química está diretamente relacionada com muitos fatos do seu cotidiano. O emprego de jornais e revistas como um material didático auxiliar no ensino de Química é de grande valia, pois mostra ao aluno que aqueles conteúdos aprendidos em sala de aula estão presentes no seu dia a dia e não somente nas páginas dos livros didáticos. Dessa forma, o aluno pode correlacionar o conteúdo ministrado e a realidade que o cerca, construir o seu próprio conhecimento e ter uma visão mais crítica do mundo. Neste trabalho é relatado o emprego de jornais e revistas numa aula de Química para uma turma de EJA (Ensino de Jovens e Adultos), em que foi abordado o tema radioatividade. Verificou-se in loco que a falta de hábito de leitura e a insegurança dos alunos em expôr suas opiniões e conclusões foram as grandes dificuldades enfrentadas em sala de aula. Palavras-chave: Construtivismo. Ensino de química. Jornais e revistas.

1

Professor Associado do Centro de Engenharias e Ciências Exatas da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste). E-mail: mauriciofrosa@yahoo.com.br

2

Professora Adjunta do curso de Tecnologia em Processos Químicos da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).

3

Técnica em Alimentos da Sanepar.


ABSTRACT

Nowadays, the teaching of Chemistry imposes to teachers, new ways to raise the interest of students for their discipline, showing that Chemistry is directly connected to many facts of life. The use of newspapers and magazines as auxiliary teaching materials in Chemistry classes is of great value, because it shows the student that those contents learned in the classroom are present in his daily life and not only in the pages of textbooks. In this way, the student can correlate the content provided and the reality that surrounds him, build up his own knowledge and have a more critical view of the world. In this work the method of using newspapers and magazines in a Chemistry class of EJA (Young and Adult Education) is reported, where the topic of radioactivity was focused. We found that the lack of reading habits and the insecurity of students presenting their opinions and conclusions in public were the major problems faced in the classroom. Key-words: Constructivism. Education in chemistry. Newspapers and magazines.

1. Introdução

Segundo Chassot (1995), A Química é também uma linguagem. Assim, o ensino de Química

deve ser um facilitador da leitura do mundo. Segundo o mesmo autor, a Química que se ensina deve preparar o cidadão para a vida: para o trabalho e o lazer. Isso é educar através da Química.

Fazer da disciplina de Química um instrumento para formação de pessoas conscientes, com opiniões críticas que possam interagir com o mundo ao seu redor, é uma das funções do educador. Entretanto, seria possível uma educação onde todos pudessem enxergar a Química que existe nas situações reais? A resposta seria sim, se nas escolas se apresentasse a Química que está relacionada ao cotidiano dos alunos. Na verdade, o que geralmente se verifica no ensino de Química é um incentivo à memorização de fórmulas, reações e cálculos

64

mediante informações e estarem conscientes de seu posicionamento? Segundo Santos e Schnetzler (1996), somente incluir temas sociais ou dinâmicas de simulação ou debates em sala de aula não basta, é preciso incluir novos conteúdos, metodologias, organização do processo de ensino-aprendizagem e métodos de avaliação. O educador tem um grande desafio ao entrar na sala de aula: orientar os alunos para que eles sejam os agentes do próprio conhecimento. Dessa forma, a sala de aula deve ter um ambiente de cooperação e construção de conhecimento. Devido a estrutura e organização das escolas, estas acabam tornando-se isoladas da sociedade, cabendo então ao educador estabelecer os vínculos entre a escola e a sociedade. Essa mediação pode ser feita quando o professor passa a utilizar outras fontes de informação, diversa dos livros didáticos, tais como jornais e revistas.

matemáticos em vez da aprendizagem efetiva.

O uso de periódicos na educação tem como

Também observa-se um excessivo enfoque, por

objetivo mostrar aos alunos como selecionar

parte dos professores, no cumprimento da ementa

versões de fatos, organizá-los, analisá-los e

curricular, que, em geral, aborda conteúdos muito

criticá-los, para que, enfim, retirem suas próprias

distantes da realidade dos alunos. Então, como se

mensagens e informações (Faria, 1999). Além

daria a transformação das aulas de Química, em

disso, os alunos são estimulados a pesquisar,

oportunidades que preparassem os alunos para

a argumentar e a correlacionar fatos, passos

tomarem decisões criticamente, ou seja, agirem

fundamentais no processo de aprendizagem. Para o

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


A Utilização de Jornais e Revistas como Instrumento para o Aprendizado em Química

professor, porém, torna-se um desafio, pois deverá

Os teóricos construtivistas preocupam­

encontrar o melhor caminho para utilizar tal meio

‑se em saber como o indivíduo aprende e não

de comunicação em sala de aula, uma vez que ele

estão interessados em descobrir como ensinar.

estará oferecendo um texto que não foi preparado

Pensando dessa maneira, constatam que o aluno

para ser utilizado com fins didáticos.

é o sujeito de sua própria aprendizagem. Sendo

Considerando esses fatores, a utilização

assim, conclui­‑se que nem sempre o que o

de jornais e revistas torna-se um forte vínculo

professor ensina é o que o aluno aprende. Assim,

entre a sociedade e os conteúdos teóricos dos

a busca de muitos educadores por um método

programas escolares, sendo um recurso aplicável

de ensino eficaz passa a ser um investimento

para todos os educadores, independentemente da

estéril. No Construtivismo, a postura adotada

disciplina que ministrem e do nível escolar que

pelo professor é a de convidar seus alunos

atuem.

para trabalharem juntos. Então as questões que Em meio a todas as mudanças que a

permanecem: como ser professor? Como romper

educação brasileira sofreu e vem sofrendo ao longo

a barreira do antigo modelo de professor, que

dos anos, estão os professores que, na maioria

também é tão atual?

das vezes, não recebem condições adequadas de

O aluno é o protagonista na questão

trabalho, nem salários suficientes, o que os obrigam

da aprendizagem, pois é ele quem deve estar

a assumir uma carga horária excessiva, devido à

mobilizado a pensar e a construir seu conhe­

política governamental que privilegia a quantidade

cimento, cabendo ao professor ser o guia do

e não a qualidade educacional (Libaneo; Oliveira;

processo de aprendizagem, definindo os objetivos

Toschi, 2003). É baseado nesses fatos que se vê

e controlando os rumos da ação pedagógica. Em

a necessidade de transformações. Porém, como

resumo, o Construtivismo não oferece modelos.

fazê-las?

Assim, pode-se utilizar os meios de comu­

Tendências pedagógicas, como o Cons­

nicação, jornais e revistas, como uma proposta

trutivismo, contagiam professores com uma

construtivista, a fim de promover o gosto e o hábito

nova mentalidade, representantes de uma visão

de leitura entre os alunos. Com a leitura de textos

progressista, comprometida com a democracia e

informativos, cada aluno absorve as informações

investida de preocupações sociais.

a seu modo e ritmo, fazendo conexões entre o

O Construtivismo provém do movimento

fato ocorrido e suas experiências anteriores.

Iluminista, que defendia a capacidade humana

Ainda com a leitura dessas fontes os alunos

de se guiar pela razão e, através desta, criar e

podem desenvolver a aquisição literária, podendo

recriar o mundo (Grossi; Bordin, 1993; Rosa,

assim transmitir suas mensagens e informações

1994). Traduzido para a linguagem psicológica,

de acordo com a linguagem da comunicação,

o Construtivismo se encaixa no princípio

bem como escrever textos próprios a partir de

interacionista, que admite o conhecimento como

informações retiradas dos meios de comunicação.

resultante das interações do sujeito (com todas as

O efeito mais geral da utilização de jornais

suas características hereditárias) com o meio (com

e revistas na sala de aula é o desenvolvimento

todos os seus condicionantes sociais e culturais).

de operações e processos mentais. O aluno, com

O Interacionismo tem o sujeito como protagonista

isso, aprende a identificar, relacionar, combinar,

na produção do saber.

comparar, selecionar e ordenar informações.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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Mauricio Ferreira da Rosa, Viviane da Silva Lobo e Iara Lucia Lazzarin

Aprende, ainda, a levantar hipóteses e verificá-las, a reproduzir e transcrever informações e também, a criar textos e histórias. Ainda, o educando aprende a conceituar, memorizar e reaplicar conhecimentos. Essa metodologia torna-se particularmente interessante quando aplicada ao Ensino de Jovens e Adultos (EJA). O EJA é resultado de um movimento que começou ainda na década de 1940, quando se discutia a educação conscientizadora de jovens e adultos. Entretanto, com o advento da ditadura, essas discussões foram abortadas e o governo adotou o seu programa oficial de alfabetização, o MOBRAL, que teve o papel de controle e centralização das ações pedagógicas. Com a redemocratização do país e a promulgação da nova Constituição em 1988, o Estado passou a ser o responsável pelo ensino fundamental inclusive para aqueles que não tiveram acesso na idade apropriada, como estabelecia o Art. 208. Entretanto, essa responsabilidade foi suprimida para o ensino de jovens e adultos pela Emenda Constitucional no 14 de 1989. O EJA é uma educação básica, e é fundamentada no ensino para pessoas que possuam certa vivência. Para tanto, essa educação deve aprimorar o exercício da cidadania e ampliar a interação dos estudantes com o mundo ao seu redor. Dessa visão saiu a proposta de instituir o uso de jornais e revistas como ferramenta no ensino de Química, associando os fatos que ocorrem no

2. Metodologia

Este trabalho foi realizado como estágio de regência do curso de Licenciatura em Química Unioeste/Toledo (PR), em uma classe de trinta e cinco alunos, da 4ª etapa “B” do Ensino de Jovens e Adultos (EJA), do Colégio Estadual Luiz Augusto Moraes Rego, localizado no perímetro urbano da cidade de Toledo no oeste do Paraná. O projeto, que abordou o tema radioatividade, foi desenvolvido em seis aulas, sendo duas aulas semanais em sequência, de quarenta e cinco minutos cada. Iniciou-se por um relato oral sobre o acidente radioativo ocorrido em Goiânia, com o objetivo de introduzir o tema a ser abordado nas aulas posteriores. Em seguida, foi ministrada uma aula expositiva introdutória sobre o tema radioatividade, utilizando quadro-negro e giz, com a finalidade de apresentar aos alunos a definição conceitual, o histórico e as leis de desintegração. Também foram resolvidos exercícios e feitos comentários sobre a aplicação da radioatividade e dos elementos radioativos. Finalizou-se a execução do projeto através de uma avaliação com questões objetivas e dissertativas sobre radioatividade. Após a realização da avaliação, os alunos receberam textos jornalísticos e elaboraram um texto relatando sobre as reportagens lidas para que, na sequência, comentassem com os demais alunos da classe sobre seus textos.

cotidiano aos conceitos próprios do conteúdo. O EJA no Paraná destina-se preferencialmente àqueles que possuem idade acima de 18 anos para o Ensino Fundamental e acima de

66

3. Resultados

e discussão

21 anos para o Ensino Médio. Porém, o que foi

A concepção do trabalho deu-se a partir de

verificado na classe onde o projeto foi aplicado

questionamentos iniciais cujas finalidades eram

é que cerca de 48% dos alunos possuíam idade

identificar não só as concepções prévias dos alunos

inferior a vinte e um anos.

sobre o assunto como também conhecer melhor o

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


A Utilização de Jornais e Revistas como Instrumento para o Aprendizado em Química

público. Dentre as questões elaboradas pergun­

ser aproveitado para incitar discussões em sala de

tou­‑se sobre a frequência com que utilizavam a

aula.

biblioteca e a frequência com que liam jornais e

Visando minimizar as carências detectadas

revistas. Em ambos os casos as respostas foram

no questionário decidiu-se pela utilização de

iguais, ou seja, raramente iam à biblioteca e

periódicos em sala de aula, como uma tentativa de

raramente liam jornais.

introduzir recursos pedagógicos que despertassem

Quando indagados sobre o que entendiam

a atenção do aluno, tendo em vista, que nas

por radioatividade, foram obtidas respostas, tais

reportagens dos periódicos estão contidos fatos

como:

que ocorrem no dia a dia. • Luz, claridade, estudos;

O tema radioatividade foi escolhido por ser

• É como um imã, por exemplo;

um tema que, geralmente, não é abordado no EJA

• É usado no tratamento de algumas

e para sugerir aos alunos que descubram o quão

doenças, mas também pode tornar-se

importante é seu papel nos avanços da ciência

perigoso;

atual (Lima; Pimentel; Afonso, 2011).

• São elementos químicos que têm atomi-

Haja vista o diagnóstico de popula­ção que

cidade e suas cargas têm a capacidade

apontava que 97% da classe trabalhava e dispunha

de produzir câncer ou alterações gené-

de pouco tempo para estudos extra classe, planejou­

ticas.

‑se um trabalho para ser realizado em sala de aula. Dessa maneira, pôde­‑se trabalhar otimizando o

Percebe-se claramente que a concepção dos alunos com relação à radioatividade é errônea, pois nenhum conseguiu defini-la e citar as conse­ quências do uso de elementos radioativos.

tempo, pois dispunha­‑se de pouco tempo para a execução do projeto. Iniciou-se o tema com uma apresentação do acidente radioativo acontecido em Goiânia

Quando indagados sobre os benefícios que

no ano de 1987. Contou-se aos alunos sobre esse

a radioatividade poderia ter proporcionado a huma­

caso, como se deu a contaminação de centenas

nidade, obtiveram-se respostas como estas:

de pessoas, a morte e os prejuízos causados às

• Ao mesmo tempo que traz benefícios

vítimas e ao meio ambiente. Durante a explanação

pode causar muito estrago se houver

percebeu-se a curiosidade dos alunos, que em sua

vazamento;

totalidade não conheciam o fato. Foram feitos

• Sim, a energia nuclear e radiografias;

vários questionamentos, gerando uma proveitosa

• Sim, principalmente em uso científico e

discussão. Questionaram sobre o descaso sobre

geração de energia; • Ao mesmo tempo que traz benefícios, traz também doenças; • Saber mais sobre o meio ambiente; • Sim, aprofundamento em defesas.

a cápsula de césio-137 e também sobre as consequências do acidente ao ser humano e ao meio ambiente. Em seguida deu-se uma breve explanação do histórico, enfatizando os seus principais personagens, pois, segundo Cury, é tão impor­

Verificou-se com essas respostas que

tante falar da história da ciência e da história dos

apesar dos alunos não conseguirem conceituar

pensadores quanto do conhecimento que eles

radioatividade, a maioria deles possuía noções da

produziram (Cury, 2003). Esse tipo de abordagem

utilização de elementos radioativos. Esse fato pôde

é fundamental, pois situa o aluno no tempo e

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Mauricio Ferreira da Rosa, Viviane da Silva Lobo e Iara Lucia Lazzarin

ressalta que ciência é construída por pessoas iguais a ele, que também passavam dificuldades. Foram apresentadas as leis radioativas e algumas aplicações benéficas e pacíficas dos elementos radioativos. Na sequência, foram fornecidas aos alunos reportagens de jornais ou revistas, solicitando que relatassem do que as

atingidas por água aquecida à 200ºC, sem contato com a radioatividade. A energia nuclear é controlável, e com responsabilidade é possível usufruir dela sem prejuízo nenhum ao meio ambiente ou a sociedade e reverter em muitos benefícios às pessoas (Acidente, Folha de Londrina, 2004).

reportagens estavam tratando. Os textos utilizados estão citados abaixo, seguidos pelos relatos dos estudantes: Direito à informação O seguinte texto quer nos informar que o césio é mortal, e o governo ou os responsáveis por ele não tem os cuidados devidos, ou melhor nos escondem. Algumas pessoas lutam para que isso seja um assunto seguro e livre, para que não aconteçam acidentes como o que aconteceu em Goiânia (Filho, 1988).

“O texto nos diz que deveríamos saber muito mais sobre as notícias. Saber sobre a radiação, talvez nós sabemos muito pouco e por isso não conseguiríamos evitar nenhum acidente. Se todos fossem mais informados sobre as leis, sobre todas as coisas do mundo poderíamos ajudar muito mais. O nosso país é muito pobre em informações e nós também não procuramos saber nada, ficamos esperando que as respostas venham em nossas mãos. As vezes, por descuido e falta de informação deixamos as coisas passar por nós e não fazemos nada, nem mesmo tentamos ajudar nosso país”. Acidente em usina mata quatro no Japão Acidente em usina nuclear japonesa mata quatro e deixa outras sete vítimas com queimaduras graves; a princípio entende-se que houve um acidente nuclear, na verdade aconteceu uma falha humana e as pessoas foram

68

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

Acidente nuclear mata 4 e fere 7 em usina no Japão No Japão, um acidente nuclear muito grave aconteceu, matando quatro trabalhadores e ferindo outros sete. O vazamento ocorreu no aniversário do lançamento da bomba atômica em 1945 sobre a cidade de Nagazaki, após uma série de lapsos de segurança em reatores. Os temores sobre a segurança das cinqüenta e duas usinas nucleares do Japão começaram em 1999, quando ocorreu um vazamento em uma unidade de tratamento de urânio. O Japão é o terceiro produtor mundial de energia nuclear. O vazamento de ontem foi causado por falta de água fria na turbina do reator. O reator nuclear número 3 foi desligado quando o vapor começou a vazar do buraco. Os outros dois reatores da usina estão trabalhando normalmente (Acidente, Gazeta do Povo, 2004). Dez anos depois, césio-137 ainda mata O acidente com o césio-137 que acabou matando várias pessoas e conta­ minando muitas outras, que sofrem até hoje com os sintomas dessa radiação. Há pessoas que adquiriram câncer depois da radiação. Nós não estamos preparados para enfrentar uma catástrofe radiológica (Dez Anos, ‑Folha de São Paulo, 1997).

Posteriormente, os alunos foram convi­ dados a explanar aos demais, sobre o assunto da reportagem lida, e com isso foi gerado um debate


A Utilização de Jornais e Revistas como Instrumento para o Aprendizado em Química

bastante produtivo, onde os alunos conseguiram

a escrita seria mais fluente. Portanto, essa

captar informações contidas nos artigos e transmiti-

metodologia também é uma oportunidade para

-las ao restante dos alunos.

um trabalho coletivo envolvendo professores de outras disciplinas, tais como Português, Geografia, História etc.

4. Considerações

finais

A postura de um professor construtivista, de convidar seus alunos a trabalharem juntos é a maneira mais adequada para que ocorra o processo ensino-aprendizagem, pois nele o aluno é o agente do próprio conhecimento e o professor é o orientador para que isso ocorra. A utilização de jornais e revistas como uma prática construtivista é um instrumento auxiliar válido, pois se pode tratar os mais variados temas, sempre tentando correlacionar os fatos ao conteúdo abordado em sala de aula. Esse tipo de abordagem sofre algumas limitações, principalmente no que tange à dificuldade que os alunos enfrentam na interpretação das reportagens, como também, na linguagem utilizada nos veículos de comunicação, que é diferente daquela encontrada nos livros didáticos e apostilas, onde se encontram textos com as frases mais importantes em negrito ou em quadrados coloridos. Ao lerem as reportagens os alunos conseguiram tirar suas próprias conclusões a respeito do assunto e transmiti-las aos demais, gerando uma discussão entre professor e alunos em torno do tema. Acredito que a prática da leitura facilitaria a compreensão dos textos e, portanto,

REFERÊNCIAS ACIDENTE em usina mata quatro no Japão, Folha de Londrina, 10 de agosto de 2004. ACIDENTE nuclear mata 4 e fere 7 em usina no Japão, Gazeta do Povo, 10 de agosto de 2004 CHASSOT, A. I. Catalisando transformações na educação. 3. ed. Ijuí: Unijuí,1995. CURY, A. Pais brilhantes & Professores fascinantes. 2ª ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2003. DEZ ANOS depois, césio-137 ainda mata, Folha de São Paulo, 29 de outubro de 1997. FARIA, M. A. Como usar o jornal na sala de aula. 4. ed. São Paulo: Contexto, 1999. FILHO, J. P. C. Direito à informação. Ciência Hoje, v. 7, n. 40, 1988. GROSSI, E. P.; BORDIN, J. Construtivismo Pós – Piagetiano. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 1993. LIBANEO, J. C.; OLIVEIRA, J. F.; TOSCHI, M. S. Educação Escolar. Políticas, Estrutura e Organização. São Paulo: Cortez, 2003. LIMA, R. S.; PIMENTEL, L. C. F.; AFONSO, J. C. O Despertar da Radioatividade ao Alvorecer do Século XX. Quim. Nova Escola, v. 33, n. 2, 2011. ROSA, S. S. Construtivismo e Mudança. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1994. SANTOS, W.; SCHNETZLER, R. Função Social: O que significa ensino de Química para formar o cidadão. Química Nova na Escola, n. 4, 1996.

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Relato 03 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 71-76

A Acidez Estomacal e Sua Função na Digestão: um experimento para despertar a curiosidade e aumentar o interesse de alunos do Ensino para Jovens e Adultos Stomach Acidity and its Role on Digestion: an experiment to increase the curiosity and interest of students in adult and young teaching Lílian Carvalho1 e Weverson Ferreira2 Resumo

Relata-se neste trabalho como a metodologia de projetos foi utilizada para contextualizar conteúdos de Química e promover sua interdisciplinaridade com a Biologia. Os alunos propuseram um experimento sobre a ação do ácido clorídrico na digestão da carne e, após os resultados, ficaram animados em descobrir o que havia ocorrido. Muitas questões interdisciplinares foram geradas durante o desenvolvimento do projeto, principalmente a partir da pesquisa bibliográfica realizada após o experimento. É importante dizer que no início houve certa rejeição pela proposta pedagógica por parte dos alunos. Porém, em aulas posteriores à apresentação do trabalho e discussão dos conteúdos gerados pelo projeto desenvolvido, os alunos relataram que a metodologia utilizada foi muito enriquecedora e os possibilitou entender melhor o que estava ocorrendo. Outra vantagem deste recurso pedagógico é que ele ajuda a despertar o interesse dos 1

Mestranda e Graduada em Química pela Universidade Federal de Minas Gerais. E-mail: lilianamaralcarvalho@yahoo.com.br

2

Graduado em Farmácia Industrial e Bioquímica e mestre em Ciências da Saúde (área de concentração: Controle de Qualidade de Fármacos e Insumos Farmacêuticos) pela Universidade José do Rosário Velano. Doutor em Química Inorgânica, Pós-doutor em Química Analítica e Pós-doutorando em Química Inorgânica pela Universidade Federal de Minas Gerais. E-mail: weversonferreira@yahoo.com


alunos, que ficam bastante empenhados em pesquisar sobre o tema em questão. Assim, eles aprendem como buscar e construir o conhecimento, qualidade indispensável durante sua formação. Palavras-chave: Metodologia de projetos. Interdisciplinaridade. Contextualização de conteúdos. ABSTRACT

This paper reports how this projects methodology was used to contextualize some Chemistry contents and promote its interdisciplinarity with Biology. Students have proposed an experiment about the action of hydrochloric acid in the digestion of meat and, after the results, were excited to find out what had happened. Many interdisciplinary questions were raired during the project’s development, mainly from literature search performed after the experiment. It’s important to say that in the beginning there were some rejection of the proposal by the students. However, after presentation of the work and discussion of the content generated by the developed project, in class the students reported that the methodology was very rewarding and enabled them to better understand what was happening. Another advantage of this educational resource is that it helps to draw the students interest, which stay much focused on researching the topics. Thus, they learn how to fetch and build the knowledge, an essential quality for their educational background. Key-words: Project methodology. Interdisciplinarity. Content contextualization.

1. Introdução

O ensino de Química é, em grande parte, dificultado pelo fato dos alunos não entenderem os motivos que os levam a estudar esta disciplina. Diversos estudantes acham que a Química não faz parte do seu cotidiano e, portanto, não lhe dão a atenção necessária (Cardoso; Colinvaux, 1999). Na Educação de Jovens e Adultos (EJA) esse problema é agravado, pois os alunos são mais velhos e há muitos anos não têm contato com disciplinas ligadas às áreas da ciência. Assim, estes devem ser estimulados através de atividades especiais, para que possam aprender a reconhecer a importância da Química no universo que os cerca, facilitando desta maneira o aprendizado. Segundo Cardoso e Colinvaux (1999), a compreensão da Química ajuda a desenvolver uma visão crítica do mundo que cerca o indivíduo. Ele deve entender as razões e objetivos que motivam e justificam o ensino desta disciplina, e isso será

72

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

alcançado com o abandono das aulas baseadas em memorizações de nomes e fórmulas e à introdução dos conhecimentos e conceitos do dia a dia dos alunos. Isso proporcionará um aprendizado mais eficiente e um conhecimento mais sólido (Miranda, 2009). Uma maneira de despertar o interesse pelos assuntos abordados em Química é com o uso da metodologia de projetos (Silva, 2007; Bicalho et al., 2009; Cavalcanti; Silva, 2006). Segundo Bicalho et al. (2009). O processo investigativo é a principal ferramenta da metodologia de projetos. Nele, o aprendiz, ao conduzir o experimento, vivencia novas situações que exigem: compromisso, melhor relação interpessoal, adaptações, lidar com a casualidade e a agregação de novos valores. Fazer ciência ensina a pensar, ajuda a formular teorias, propicia o desenvolvimento de técnicas para se atingir um objetivo, possibilita escolher os meios de resolver um problema e


A Acidez Estomacal e Sua Função na Digestão

expor com clareza os conceitos com critérios racionais e fundamentados no conceito científico.

aos estudantes acesso à internet e à biblioteca. Para

Um livro publicado por esse autor descreve vários experimentos de fácil realização em sala de aula que podem ajudar professores de ensino médio a abordar conhecimentos de Química e de Biologia (Bicalho et al., 2009) com seus alunos. O Projeto de Ensino Médio de Jovens e Adultos do Colégio Técnico da Universidade Federal

de um pré-projeto contendo: título, introdução,

de Minas Gerais (PEMJA-COLTEC-UFMG) decidiu utilizar uma forma de ensino baseada no uso da metodologia de projetos, da interdisciplinaridade e da experiência de vida dos alunos para abordar os conteúdos, tornando-os mais interessantes e fáceis de aprender. No PEMJA, a Química é lecionada

maior interesse dos alunos pelo experimento, foi solicitada a eles a escolha do tema e a elaboração objetivo, justificativa, materiais e metodologia.

3. Reagentes

e materiais utilizados pelos alunos • •

Ácido clorídrico (1 mol/L); Balança com precisão de 0,1 g;

Luvas de borracha;

Carne suína fresca;

Béqueres;

Faca.

de maneira interdisciplinar com a Biologia, dando origem à área Sócio-Químico-Biológica. Nessa área, os conteúdos são relacionados, mostrando sua utilidade, facilitando o entendimento e aumentando o interesse dos alunos por eles. Neste trabalho um simples experimento proposto pelos alunos, “Uso do ácido clorídrico para simular o pH do estômago e sua função na digestão”, ajudou a aumentar a curiosidade e o interesse dos alunos do PEMJA por conteúdos abordados em Química e Biologia, através da sua contextualização e do uso da interdisciplinaridade.

4. Experimento

e resultados obtidos pelos alunos Foram cortados quatro cubos de carne

com peso aproximado de sete gramas e cada um deles foi colocado em um béquer. Em dois desses béqueres (devidamente identificados) adicionou-se ácido clorídrico suficiente para cobrir os cubos, e nos outros dois béqueres (devidamente identificados)

adicionou-se

água

suficiente

para cobrir os cubos. Após esse procedimento os béqueres foram deixados em repouso por 24

2. Metodologia

horas. Os alunos observaram que, pouco tempo após a adição do ácido, a carne escureceu, porém

Este trabalho foi realizado no Projeto de

ainda estava consistente. Mas, após as 24 horas de

Ensino Médio de Jovens e Adultos do Colégio

imersão, eles observaram que a carne desmanchava

Técnico da Universidade Federal de Minas Gerais

com facilidade. Por outro lado, a carne imersa em

no ano de 2010. Devido à escassez de tempo

água não apresentou alterações significativas.

dos alunos da EJA para realizarem trabalhos

Após essa observação, os alunos ficaram

extraclasse, todo o processo, incluindo a busca

muito empolgados e rapidamente vieram pergun-

bibliográfica e a redação do trabalho, foi realizado

tar por que aquilo havia acontecido. Foi sugerido

durante o período de aulas da disciplina Sócio-

a eles que procurassem informações sobre o que

-Químico-Biológica. Para isso, foi disponibilizado

é pH, o que é um ácido e uma base (segundo

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

73


Lílian Carvalho e Weverson Ferreira

Arrhenius e Bronsted-Lowry), qual a função da acidez do estômago, o que é concentração, quais são as maneiras de se expressá-la (mol/L, g/L, g/Kg etc.) e se o ácido estomacal pode fazer mal ao estômago. Na aula posterior ao experimento os estu­ dantes trouxeram vários textos para responder às indagações. Os alunos conseguiram entender o que é potencial hidrogeniônico (pH) e sua relação com a concentração de íons H+ em solução. Ainda, fizeram relação com a função da acidez no estômago e com os males causados pelo excesso desta. Por outro lado, apresentaram dúvidas sobre as teorias ácidobase e sobre as transformações matemáticas utilizadas para expressar concentração, como por exemplo, como transformar concentração em mol/L em concentração em g/L. Nesse momento, é de extrema importância discutirmos a influ­ ência da Matemática no ensino de Química. Ao longo do semestre, vários professores perceberam que grande parte dos alunos possui dificuldade em Matemática. Em diversas situações, as aulas de Química requerem conhecimentos dessa disciplina e, quase sempre, o professor de Química necessita repassar aprendizados básicos de Matemática para que os alunos consigam entender o conteúdo. Em um outro momento, os alunos também foram orientados a pesquisar sobre as utilidades gerais dos ácidos (do ácido clorídrico, em especial) e sobre os impactos ambientais que podem ser gerados em sua fabricação/ utilização. Dessa maneira, muitas outras questões interdisciplinares foram geradas durante o desenvolvimento do projeto, principalmente a partir da pesquisa bibliográfica realizada após o experimento. Assim, foram estudados temas como: sistema digestório, acidez estomacal e seu tratamento, úlcera gástrica e impactos ambientais causados pelo homem (acidificação de rios e da

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

terra por dejetos industriais, chuva ácida, efeito estufa etc.). Após essas atividades, foi pedido ao grupo que organizasse as informações, as apresentasse e as discutisse com os demais alunos. Durante a apresentação, observou-se que os alunos estavam confiantes e interessados. O grupo explicou aos demais alunos todos os conteúdos levantados pelo experimento científico e discutiu cada um dos textos sobre impactos ambientais. Foi muito interessante o grau de envolvimento dos demais alunos da classe nas discussões, fazendo uma grande “mesa redonda”, principalmente quando se correlacionava a Química com o meio ambiente. Imagina-se que esse comportamento possa estar associado à familiaridade com um tema cotidiano, que todos nós temos vivenciado. Vários alunos relataram que cresceram em áreas rurais ou em pequenas comunidades e tiveram a oportunidade de observar de perto a grande modificação que ocorreu no ambiente durante o crescimento da sua comunidade. É importante dizer que no início, antes da realização do experimento, houve certa rejeição pela proposta por parte dos alunos. Ao conhecerem a metodologia de projetos e saberem que após iniciarem a pesquisa teriam que responder sozinhos às suas dúvidas, os estudantes reclamaram muito e alegaram que o professor é que devia dar as respostas. Essa rejeição inicial também foi relatada por Silva (2007): Além do desvio em relação ao programa e o fato de temer que nossos diálogos fossem objeto de questões em provas e testes, os alunos, pelo menos a grande maioria, estavam confusos pelo fato de ao realizarem um experimento na sala de aula o professor perguntar para eles como é que eles explicariam o respectivo fenômeno, uma vez que, eles de nada sabiam ou ainda não tinham


A Acidez Estomacal e Sua Função na Digestão

estudado aquilo antes. Durante nosso diálogo, um aluno falou: nós queremos que o senhor explique as coisas como elas são, e pronto.

É importante ressaltar que, através de experimentos simples como esse, vários conteúdos de Química e Biologia podem ser contextualizados. Também se verificou que esse tipo de abordagem

Apesar da relutância, foi sugerido aos estudantes que iniciassem a metodologia de projetos e que, após o fim do primeiro trabalho, seria discutido se deveriam continuar com este método de aprendizagem. Nas aulas posteriores à

desperta um maior interesse para o aprendizado,

apresentação e à discussão dos conteúdos gerados

interdisciplinaridade, é que os alunos ficam mais

pelo projeto desenvolvido, os alunos relataram que

interessados e empenhados em pesquisar sobre

a metodologia utilizada foi muito interessante e

o tema em questão e, assim, aprendem como

os possibilitou a entenderem melhor o que estava

buscar e construir o conhecimento, qualidade

ocorrendo, em vez de somente aceitar. Muitos foram

indispensável durante a formação do estudante.

pois os alunos conseguem compreender a utilidade da Química. Outra vantagem de usar a metodologia de projetos, em conjunto com a contextualização e a

os comentários, tais como: “Agora sim, vemos uma utilidade para o aprendizado de química”.

5. Conclusão

O tema do projeto, escolhido pelos alunos, foi muito interessante e permitiu ao professor, além de correlacionar conteúdos de Química e Biologia, aproveitar as vivências pessoais de cada aluno, com intuito de aumentar consideravelmente seu interesse pelos assuntos abordados. O fato dos alunos terem escolhido o tema contribuiu significativamente para o sucesso deste método pedagógico. Foi possível observar grande entusiasmo, interesse e participação dos estudantes ao discutirem o projeto executado utilizando essa nova ferramenta de ensino.

REFERÊNCIAS BICALHO, R. S. et al. Construindo o conhecimento: Ecologia. Belo Horizonte: Editora RHJ, 2009. CARDOSO, S. P.; COLINVAUX, D. Explorando a motivação para estudar química. Química Nova, São Paulo, v. 2, n. 23, 2000, p. 401-404. CAVALCANTI, L. C. D.; SILVA, R. L. G. N. P. ReBEQ 1, 77, 2006. MIRANDA, P. R.; GALUCH, M. T. B. Mediação docente na Educação de Jovens, Adultos e Idosos. Revista da Alfabetização Solidária, São Paulo, v. 8, n. 8, 2009, p. 113-124. SILVA, A. J. P. A Química na EJA: ciência e ideologia. Dissertação de Mestrado em Educação. Santa Maria: Universidade Federal de Santa Maria, 2007.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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Relato 04 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 77-82

Atividades Criativas em Grupo Aplicadas a Aulas Experimentais de Química para Ensino Médio e Graduação Group Creative Activities Applied in Experimental Chemistry Classes to College and University Students Marcia C. Delpech1,2

Resumo

Este trabalho aborda um método que envolve atividades criativas e apresentações em grupo aplicadas a aulas práticas de química, para nível médio e graduação. O objetivo enfoca a orientação e o treinamento do aluno para algumas das formas de avaliação, como as dinâmicas de grupo, às quais ele certamente será submetido em processos seletivos para estágios e, posteriormente, empregos. Nas aulas de laboratório, é lançada uma tarefa-surpresa, a qual os grupos dispõem de um tempo reduzido para resolver, e cujo conteúdo pode, ou não, ser totalmente conhecido pelos alunos. Um bom exemplo de tema a ser desenvolvido envolve a saturação e a supersaturação de soluções aquosas à base de cloreto de sódio. A proposta é fazer com que o grupo interaja, discuta, erre e acerte. Dessa forma, há um incentivo para superar desafios e encontrar soluções de forma rápida. O grupo deve ser instruído a trabalhar com o mínimo de material possível de forma a aprender a não desperdiçar, ter criatividade e aproveitar ao máximo o que houver disponível. A tarefa é finalmente apresentada por cada grupo para a turma e os conceitos são então debatidos com todos e esclarecidos pelo professor. Palavras-chave: Ensino de química. Atividades criativas. Aulas experimentais. Preparo de soluções.

1

Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. E-mail: mcd@uerj.br

2

Agradeço à psicanalista Alícia L. Sterlino pelo auxílio na revisão do texto.


ABSTRACT

In this work, a method involving creative activities and group presentations applied to Chemistry laboratory classes for secondary level and graduation courses is described. The purpose of this method is to inform and prepare the students for some kinds of activities, as group dynamics, which are commonly employed in selective processes for probations and jobs. In class, a surprise-task is proposed and the groups have a short period of time to work on it and to reach a conclusion. A relevant example to be employed involves the saturation and supersaturation of aqueous solutions based on sodium chloride. The theme of the task may not be totally known by the group but the proposal is focused on interaction and discussion among the students in order to present a quick solution for the problem. The material available is in minimum quantities in order to teach them to be creative and to avoid waste. The groups finally present their work and all the concepts about the theme are discussed with the teacher and the rest of the classmates. Key-words: Chemistry education. Creative activities. Experimental classes. Liquid solutions preparation.

1. Introdução

O professor ao propor a tarefa, deve

Atualmente, o acesso ao mercado de trabalho, em qualquer área, tem sido cada vez mais restrito, com exigências curriculares e formas rigorosas de seleção que se estendem também a vagas para estágios. Processos de seleção que comumente envolvem dinâmica, de grupo e apresentações pessoais costumam surpreender grande parte dos candidatos que, por falta de orientação somada a nervosismo, podem ter experiências frustrantes. A grande maioria dos alunos, tanto de nível técnico quanto de graduação, toma contato com essas dificuldades somente no momento em que as tem que enfrentar, pois não é costumeiro que, no decorrer de seus cursos, tenham uma orientação voltada para esses assuntos. Dessa

forma,

este

trabalho

aborda

um método que envolve um treinamento em atividades em grupo e apresentações aplicadas a aulas práticas de Química (Forte; Cruz, 2006; Fritzen, 1997, 1999; Miranda, 2003a, 2003b; Van Oech, 1998). A proposta desse tipo de aula é lançar uma tarefa-surpresa, dentro de um tema

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ressaltar que mesmo que o aluno não esteja seguro de como desenvolvê-la deverá tentar fazê-lo, com o auxílio dos outros membros do grupo. O aluno deverá ser informado pelo professor de que muitas vezes, em sua futura vida profissional, várias tarefas que ele não saberá solucionar de imediato lhe serão apresentadas, bem como outras de difícil execução, algumas às quais terá um tempo reduzido para terminar ou, até mesmo, mesmo outras que ele não conseguirá resolver no tempo estipulado. O professor deverá frisar que o importante não é acertar de imediato a tarefa proposta, e sim desenvolver em grupo o que puder ser feito, nas condições disponíveis e discutindo as possibilidades. O conteúdo teórico relativo à tarefa não deve ser fornecido pelo professor no período de desenvolvimento do trabalho, nem o esclarecimento de dúvidas, deixando que o grupo de alunos discuta e tente resolver o problema de forma independente. Assim, é criado um ambiente semelhante ao que os alunos irão encontrar em processos seletivos envolvendo dinâmica de grupo

simples da Química, que deverá ser desenvolvida

e, principalmente, na vida profissional, quando

em grupo, em um tempo reduzido e com o mínimo

terão realmente que “se virar” para resolver os

de material possível.

problemas.

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Atividades Criativas em Grupo Aplicadas a Aulas Experimentais de Química para Ensino Médio e Graduação

Nessa etapa da prática, o professor somente

pode estimulá-los a propor soluções para lidar

supervisiona a turma para que o trabalho seja

com essas situações. Dessa forma, o grupo deve

conduzido com segurança. Monitores, quando

ser incentivado a relatar as dificuldades que se

disponíveis, também prestam valioso auxílio.

apresentaram e algumas soluções pertinentes.

Os grupos devem ser estimulados a inte-

É importante, também, que o professor vá

ragir entre si, ajudando-se mutuamente, pois não

introduzindo informações úteis e relevantes como,

deve haver a conotação de competição. Convém

por exemplo: forma oportuna de apresentação,

ressaltar que, na inter-relação de grupos, devem

posicionamento e postura adequados e português

ser estimulados os vínculos de parceria e não de

correto. Pontos como incentivar os alunos a

dominação (Pichon-Rivière, 1998).

valorizarem seus trabalhos, por mais simples que

O material fornecido é o mínimo necessário

sejam, devem sempre ser ressaltados.

para que os alunos aprendam a desenvolver a tarefa

Após cada apresentação, o grupo deve

em questão e, consequentemente, qualquer outra,

ser acolhido com uma salva de palmas, a fim de

de forma criativa e com poucos recursos, fato com

que os alunos se sintam recompensados por seu

o qual muitas vezes poderão se deparar em suas

trabalho.

vidas profissionais.

Esse método pode ser aplicado em aulas

Ao final do tempo destinado para a tarefa,

práticas de Química ministradas para segundo

os grupos encerram suas atividades, mesmo que

grau, nível técnico e graduação. A profundidade

não tenham conseguido terminá-la. Cada grupo

do tema variará de acordo com a ementa da

então apresenta seu trabalho, cita as dificuldades

disciplina. Na graduação, aulas para áreas

encontradas e as conclusões, com a completa

distintas à Química devem ser planejadas de

atenção do resto da turma. É importante que

forma a interessar o aluno, muitas vezes avesso

cada membro do grupo dê a sua contribuição.

à disciplina. Convém ressaltar também que esse

Nesse ponto do trabalho, o professor participa

tipo de trabalho é adequado para aulas práticas de

intensamente, conduzindo as apresentações,

curta duração.

fazendo perguntas, incentivando a assistência para tal e, principalmente, corrigindo os conceitos equivocados, que, muitas vezes, surgem das discussões. Ao longo das apresentações, as dúvidas vão sendo sanadas e o professor deve

2. Descrição

do método

incentivar que os próprios alunos que acertaram

O tema deste trabalho tem sido aplicado pela

os conceitos respondam às perguntas feitas pelos

autora no Instituto de Química da Universidade do

colegas.

Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em disciplina

Os alunos devem estar cientes de que,

prática de Química para ciclo básico da Faculdade

muitas vezes, a tarefa (ou parte dela), talvez não

de Engenharia. Temas pertinentes à ementa foram

possa ser desenvolvida no tempo destinado para

transformados em tarefas simples, descritas a

tal e que tanto as condições de trabalho quanto o

seguir.

material fornecido podem também ser escassos.

1. Planejamento das aulas: verificação do

O professor deve ressaltar para os alunos que,

tempo disponível (as práticas devem ser

certamente, eles passarão por situações seme-

simples e planejadas para que o tempo

lhantes dentro e fora do ambiente de trabalho e

seja bem aproveitado).

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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Marcia C. Delpech

Exemplo: Aula prática a ser ministrada

a apresentação de seus resultados constituem um

em período de 1 h 40 min para uma

treinamento valioso.

turma de 20 a 30 alunos, dividida em

A partir da segunda aula, após estarem

5 grupos.

cientes do objetivo e da importância das atividades

a) Chegada e recepção dos alunos,

que serão ministradas no curso, as aulas práticas

informação da tarefa, divisão e loca-

poderão ter início. Conforme citado anteriormente,

ção dos grupos: 10 a 15 minutos;

é importante que as tarefas sejam desenvolvidas

b) Tempo disponível para o desenvolvi-

pelo grupo, em tempo reduzido, sem a ajuda do

mento da tarefa: 20 a 25 minutos;

professor, de forma a estimulá-los a pensar, discutir

c) Apresentações, esclarecimentos das

entre si, encontrar soluções para o problema e

dúvidas: 10 minutos por grupo, em

apresentar o trabalho. 4. Material didático de apoio: ao final

um total de 40 minutos; d) Explicações finais e perguntas para nota: 20 minutos.

da aula, o professor poderá indicar referências bibliográficas disponíveis

2. Material: o material de laboratório deve ser, de preferência, simples e de custo reduzido, com o emprego de reagentes atóxicos e de fácil obtenção. Dessa forma, esse método poderá ser aplicado em qualquer instituição. 3. Instruções para as aulas: na primeira aula, o professor deverá fazer uma preleção, dispondo informações úteis para os alunos em relação às exigências para a vida profissional. Por exemplo, os alunos devem ser alertados de que inglês fluente e prática em informática são itens que devem constar em qualquer currículo.

para os alunos na biblioteca local ou, dependendo no nível da turma, preparar apostilas, nas quais as referências serão citadas. 5. Avaliação: uma sugestão de avaliação, que tem sido empregada, é dividir a média da prática em duas partes: a primeira englobando o desempenho dos alunos no laboratório (pontualidade, comportamento, participação nos experimentos e na discussão), e a segunda constando de uma prova escrita, no final do curso, envolvendo perguntas sobre toda a matéria vista.

O professor deve também se inteirar dos tipos mais comuns de processos seletivos, que são normalmente feitos em empresas, e contá-los para os alunos, principalmente

àqueles

envolvendo

dinâmica de grupo.

80

3. Sugestões

de temas para experimentos simples Os dois exemplos a seguir citam temas

simples, porém ricos em informações e conceitos.

Os alunos devem ser cientificados de que

Ambos envolvem a formação de soluções líquidas.

tanto o trabalho em grupo quanto as apresentações,

Esses temas são bastante adequados tanto para

sejam de relatórios, monografias, dissertações,

aulas de ensino médio quanto para nível técnico

teses, ou trabalhos diversos, serão uma constante

e de graduação, principalmente se escolhidos

em suas futuras vidas profissionais. Portanto, a

para disciplinas ministradas para áreas diversas

execução de tarefas-surpresa de forma rápida, e

à Química (Kotz; Treichel, 2002; Russell, 1994;

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Atividades Criativas em Grupo Aplicadas a Aulas Experimentais de Química para Ensino Médio e Graduação

Usberco; Salvador, 2002), ja que têm sido aplicados por dez anos em aulas experimentais para alunos de graduação em Engenharia. 3.1. Tema

1: Formação de soluções: saturada, insaturada e supersaturada Material para cada grupo: Cloreto

de sódio (NaCl) (20 g de amostra por grupo, condicionados em copinhos plásticos); 3 bécheres de 250 mL; 1 espátula; 1 bastão de vidro; deixar disponíveis, caso os alunos peçam, placas de aquecimento. Tarefa: os alunos não devem ser infor­ mados de qualquer dado relativo à prática, como o coeficiente de solubilidade, por exemplo; apenas que terão disponíveis 20 g de NaCl e água para preparar as soluções. Esse sistema foi escolhido pois todos, com certeza, sabem que existe um limite a partir do qual um excesso de sal se depositará. Dessa forma, o desenvolvimento inicial da tarefa será facilitado. De forma independente, os alunos veri­ ficarão que, com informações mínimas, poderão

à temperatura e à pressão atmosférica); sistemas bifásicos. Sugestão de perguntas para o final da aula: Para despertar ainda mais o interesse e provocar a atenção dos alunos, é conveniente que o professor faça oralmente perguntas valendo nota. A seguir, são citadas duas sugestões, que esclarecem muitas dúvidas (tem sido observado que poucos alunos de graduação do curso de Engenharia, respondem corretamente a pelo menos uma delas): 1. “Qual é a solução mais saturada de NaCl em água, aquela que apresenta 1 g de depósito ou outra que apresenta 1 kg de depósito?” 2. “Sabendo-se que o limite de solu­ bilidade do sistema estudado é de 36 g de NaCl em 100 g de água (a 25o C e 1 atm), responda qual é a solução mais insaturada, aquela à qual foi adicionado somente 1 g de NaCl ou aquela que apresenta 35 g de NaCl?” (Nesse ponto é frisado o conceito de solução diluída e de solução concentrada).

desenvolver dois sistemas: uma solução saturada (com e sem depósito) e uma solução insaturada. Um equívoco que comumente existe, e será corrigido, é o conceito de uma solução supersaturada, na maior parte das vezes, confundida pelos alunos com uma solução saturada com depósito. Os alunos também observarão que não será possível preparar uma solução supersaturada nas condições e no tempo propostos. Principais conceitos abordados: defi­

3.2. Tema

2. Formação de soluções e interações intermoleculares entre soluto e solvente Material por grupo: 5 tubos de ensaio e

estante; líquidos dentro de vidros identificados com respectivas pipetas e peras: água, hexano, etanol, detergente e óleo de cozinha. Tarefa: a tarefa consiste em que o grupo desenvolva um método de teste da solubilidade dos líquidos fornecidos entre si. As estruturas

nições de solução saturada, insaturada e super­

químicas dos líquidos são apresentadas no quadro

saturada (com ênfase para a última, que é

negro. No processo imediato de formação da

maior fonte de dúvidas); exemplos de outros

solução, deve ser observado se há aquecimento

sistemas conhecidos (bebidas gaseificadas como

ou resfriamento do tubo. Pares como água­

soluções supersaturadas, por exemplo); conceito

‑hexano, água-etanol e hexano-etanol devem ser

de coeficiente de solubilidade (nesse ponto é

obrigatoriamente testados, bem como o sistema

importante frisar que esse parâmetro está associado

água-óleo-detergente.

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Marcia C. Delpech

Principais conceitos abordados: formação de solução e de sistemas bifásicos; interações intermoleculares; processos de dissolução endo e exotérmico; diferença entre formação de solução e reação química3; diferenciação entre solução e dispersão coloidal, principais características desses sistemas; emulsão. 3.3. Outras

4. Conclusão

A resposta dos alunos do ciclo básico do curso de graduação em Engenharia (FEN/UERJ) quanto à participação e ao aprendizado nas aulas tem sido bastante satisfatória e estatisticamente constante. De 2001 a 2010, em 20 semestres, 92 turmas, com uma média de 20 alunos cada,

sugestões de temas

totalizando aproximadamente 1.800 alunos, foram

Saindo do tópico de formação de soluções, outros dois temas também aplicados são brevemente sugeridos: 1. Coloides. Os alunos preparam gelatina e mingau de amido, sistemas que, na prática, já conhecem, observando o comportamento das misturas a frio e a quente, com e sem agitação e associando a essa prática os conceitos fundamentais de formação de géis termorreversíveis.

submetidas a esse método nas aulas de laboratório. Em todos os semestres, de 70 a 80% dos alunos apresentaram nas avaliações, média superior a 7,0. A autora tem sido também informada por diversos ex-alunos da utilidade das informações divulgadas e praticadas nas aulas frente às etapas de seleção às quais eles têm sido submetidos. Esse método, portanto, parece estar sendo eficaz e útil, tanto no aprendizado da disciplina quanto na orientação para a futura vida profissional dos alunos.

O conceito de macromoléculas também é introduzido, bem como a diferenciação entre solução e dispersão coloidal. Ao final da aula, jujubas e também um gel, são oferecidas para a turma; 2. Eletroquímica e processos espontâneos (célula galvânica). Para isso, os alunos utilizam

laranjas,

limões,

algodão

embebido em salmoura e pedaços de metal (cobre e zinco) observando, com voltímetro e com lâmpada, a passagem espontânea da corrente elétrica através do meio eletrólito das frutas e da salmoura, em contato com metais de diferentes potenciais. A cobreação espontânea de um prego de ferro em contato com solução aquosa de sulfato cúprico também é verificada e discutida.

3

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É importante corrigir conceitos que surgem, invariavelmente, como a ideia de que durante a formação da solução ocorre uma reação química na qual há uma geração de calor.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

REFERÊNCIAS FORTE, C. M. S.; CRUZ, A. A. A. Utilização de dinâmicas de grupo na facilitação do processo de ensino e aprendizagem em química, SIMPEQ. 4º Simpósio de Educação em Química, Fortaleza, 2006. FRITZEN, S. J. Exercícios práticos de dinâmica de grupo. Vol. 1, 28. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1999. ______. Exercícios práticos de dinâmica de grupo. Vol. 2, 24. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1997. MIRANDA, S. Oficina de dinâmica de grupos para empresas, escolas e grupos comunitários. Vol. 1, 11. ed. Campinas: Papirus Editora, 2003a. ______. Oficina de dinâmica de grupos para empresas, escolas e grupos comunitários. Vol. 2, 5. ed. Campinas: Papirus Editora, 2003b. VAN OECH, R. Um chute na rotina. 5. ed. São Paulo: Cultura Editores Associados, 1998. PICHON-RIVIÈRE, E. Teoria do vínculo. 6. ed. São Paulo: Livraria Martins Fontes Editora Ltda., 1998. KOTZ, J. C.; TREICHEL Jr., P. Química e reações químicas. Vol. 1, 4. ed. Rio de Janeiro: LTC – Livros Técnicos e Científicos Editora S. A., 2002. RUSSELL, J. B. Química geral. Vol. 1, 2. ed. São Paulo: Makron Books, 1994. USBERCO, J.; SALVADOR, E. Química. 5. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2002.


Relato 05 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 83-94

Ensinar Química Geral nos Cursos de Graduação: é possível tornar o conhecimento significativo? General Chemistry Teaching in Undergraduate Courses: is it possible to make meaningful knowledge? Ana Luiza de Quadros1, Dayse Carvalho da Silva2, Flávia dos Santos Coelho3 e Marcos Vinicius Ribeiro4

Resumo

A fim de identificar estratégias utilizadas por professores do Departamento de Química da UFMG que visam tornar os conhecimentos químicos mais significativos para os alunos de outros cursos de graduação, que se utilizam da Química, desenvolvemos este trabalho. Utilizamos a entrevista semiestruturada com quatro professores cujas práticas foram descritas pelos mesmos como vinculadas ao mundo de trabalho dos estudantes. Percebemos algumas tentativas de inserção do conhecimento químico nas práticas comuns aos outros cursos mas, por serem iniciativas isoladas, precisam ser melhoradas e ampliadas. Palavras-chave: Conhecimento químico. Aprendizagem significativa. 1

Prof. Assistente do Departamento de Química – ICEx – UFMG, Belo Horizonte, MG; Doutora em Educação pela Faculdade de Educação (FAE) da UFMG, Belo Horizonte, MG; Mestre em Educação nas Ciências Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, UNIJUI, RS; Especialização em A Produção do Conhecimento e o Ensino de Química. Universidade de Passo Fundo, UPF, RS; Graduação em Licenciatura Plena Em Química. Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, UNIJUI, RS. E-mail: ana.quadros@uol.com.br ou aquadros@ufmg.br

2

Graduada, Mestre e Doutoranda em Química pelo Departamento de Química – ICEx – UFMG. E-mail: daysecsm@yahoo.com.br

3

Fiscal Federal Agropecuário do Laboratório Nacional Agropecuário em Minas Gerais/ LANAGRO/ MG – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Mestre em Química pelo Departamento de Química – ICEx – UFMG, Belo Horizonte, MG; Graduada em Química pelo Departamento de Química – ICEx – UFMG, Belo Horizonte, MG. E-mail: flaviascoelho@yahoo.com.br

4

Mestrando em Engenharia Metalúrgica e de Minas pela Escola de Engenharia – UFMG, Belo Horizonte, MG; Especialização em Engenharia Sanitária e Tecnologia Ambiental pela Escola de Engenharia da UFMG, Belo Horizonte, MG; Graduado em Química pelo Departamento de Química – ICEx – UFMG, Belo Horizonte, MG. E-mail: vinquim@yahoo.com.br


ABSTRACT

This article has as its goal to identify strategies used by teachers, members of the Chemistry Department in UFMG, that have the purpose of making the knowledge on chemistry more meaningful to chemistry students from other undergraduate courses. A semi-structured survey was conducted with 4 teachers whose practices were described by themselves as tied to the students work scenario. It was possible to notice some insertion attempts regarding the chemistry knowledge in practices common to other courses, but due to the fact that they were isolated initiatives, they need to be improved and broaden up. Key-words: Chemical knowledge. Significant learning.

1. Introdução

O desenvolvimento tecnológico de um país, estado ou região depende, sem dúvida, da presença de profissionais com conhecimento suficiente para tal. A tecnologia, apesar de possuir muitos significados e definições, parece ser, sempre, um vínculo direto entre as ciências básicas e os meios de produção. O conhecimento químico, como constituinte das ciências básicas, é uma ferramenta indispensável às áreas mais tecnológicas. A Química é um dos ramos das ciências básicas considerado essencial para a formação de profissionais capazes de desenvolver e analisar novas tecnologias. Como consequência, disciplinas de Química se fazem presentes em cursos de graduação de diversas áreas, dentre as quais podemos destacar as Engenharias e a área da Saúde, para as quais, neste trabalho, dirigimos nosso olhar. Certamente, para estas áreas, pensar quimicamente pode fazer diferença no exercício profissional. No contexto das disciplinas que tratam do conhecimento químico no ensino superior, a Química Geral é a mais presente nos cursos de graduação. Para alguns deles ela representa a única disciplina específica da área de Química. Configura-se, nesses casos, numa oportunidade

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

única para que os conceitos fundamentais desta ciência sejam trabalhados e que alunos destes cursos tenham uma visão mais ampla deste campo do conhecimento e de suas múltiplas interações com as várias profissões. Nos cursos de Química, a importância desta disciplina é mais facilmente percebida pelos alunos, uma vez que ela trabalha conceitos fundamentais que são, na maioria das vezes, retomados em outras disciplinas. Para os outros cursos é que ela se torna um desafio. Trata-se de um período curto ou uma carga horária limitada para conseguir, através dos conteúdos ministrados, mostrar aos alunos que estes conceitos são importantes e relevantes para a sua área de atuação, atraí-los para a aprendizagem desta ciência e possibilitar que eles pensem em diferentes soluções para um problema e que este pensar seja permeado pela Química. Quando Gonzales et al. (1998) desenvolveram um estudo sobre os conteúdos de Química Geral e a aplicação dos mesmos no curso de Engenharia Mecânica, citaram: Sabe-se que uma das vias para motivar os estudantes é conseguir uma vinculação adequada entre os conteúdos que se apresentam e o perfil da especialidade, ressaltando a aplicação destes conteúdos para que os alunos


Ensinar Química Geral nos Cursos de Graduação

se convençam de sua utilidade prática. Isto é muito importante nas disciplinas básicas, pois é uma opinião freqüente dos estudantes que muitos conteúdos desta disciplina serão desnecessários em sua futura vida profissional (Gonzales et al., 1998, p. 347).

Mesmo que a contextualização tenha um maior destaque na educação básica, ela pode ser uma importante estratégia, juntamente com a interdisciplinaridade, a ser utilizada nas práticas usuais em salas de aula do ensino superior. O professor do ensino superior pode assumí-la como uma ferramenta a ser utilizada

O desinteresse dos alunos em relação à

para que o aluno entenda o mundo através do

disciplina de Química Geral ficou evidente em

conhecimento científico. Sem dúvida, desenvolver

pesquisa realizada por Quadros et al. (2005) com

o conhecimento a partir de um contexto social,

alunos dos cursos de Engenharia de Produção

cultural e econômico representa um avanço em

e de Minas da Universidade Federal de Minas

relação ao ensino mais tradicional. É importante

Gerais (UFMG). Nesta pesquisa, a maioria dos

lembrar que o significado de contextualizar

alunos pesquisados declarou ser superficial e

ainda é questionável. Segundo Lopes (2002), a

desinteressante o conteúdo ministrado nesta dis­

contextualização é um conceito limitado. Sobre

ciplina. Com o resultado dessa pesquisa, interes­

este conceito, ela afirma que:

sou-nos conhecer as estratégias que os professores têm usado nas disciplinas ministradas a outros cursos de graduação, especialmente a Química Geral, para que o aluno perceba a importância de tais conhecimentos e como esses conhecimentos se inserem no mundo de trabalho em que ele pretende atuar. Desde

que

as

diretrizes

curriculares

foram reformuladas, como consequência da Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB – Lei nº 9394/96, o que antes era chamado de cotidiano foi sendo substituído pelo conceito de contextualização e, como tal, tem recebido uma atenção especial dos pesquisadores em educação. Contextualizar o conhecimento químico é visto como uma maneira de dar sentido ao que é trabalhado em sala de aula. Ao comentar sobre a reforma curricular e a organização do ensino médio, os Parâmetros Curriculares Nacionais, PCN (Brasil, 1999a) citam que todo conhecimento é socialmente comprometido e não há conhecimento que possa ser aprendido e recriado se não se parte das preocupações que as pessoas detêm (p. 44).

Prevalece a restrição do processo educativo à formação para o trabalho e para a inserção social, desconsiderando sua relação com o processo de for­ mação cultural mais ampla, capaz de conceber o mundo como possível de ser transformado em relação a condições sociais menos excludentes (p. 10).

A contextualização é uma estratégia de ensino-aprendizagem que aborda a ciência em seu contexto social com suas inter-relações ambientais, éticas, políticas e sociais. Partir do contexto social pode significar o desenvolvimento de atitudes e valores nos alunos, num processo de significação mais amplo do conteúdo. O objetivo central desta estratégia é explorar aspectos do mundo de vida ou de trabalho que, de alguma forma, representem preocupação para os alunos e/ ou para a comunidade. Alário e Wartha (2005), ao analisarem a contextualização do ensino de Química em livros didáticos do Ensino Médio afirmam que, Contextualizar é uma postura fren­­ te ao ensino o tempo todo, não é

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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Ana Luiza de Quadros et al.

exemplificar. É assumir que todo conhe­ cimento envolve uma relação entre sujeito e objeto. É construir significados e significados não são neutros, incor­poram valores porque explicitam o cotidiano, constroem compreensão de problemas do entorno social e cul­tural, ou facilitam viver o processo de descoberta (p. 43).

Ainda segundo estes autores, a contex­ tualização leva os alunos a compreenderem a relevância do que é estudado e permite aplicar tais conhecimentos para entender o mundo que os cercam. Chassot (1993) também enfatiza que a

diretamente perceptíveis como átomos, moléculas, íons, elétrons etc. Os conteúdos químicos de natureza simbólica estão agrupados no aspecto representacional que compreende informações inerentes à linguagem química como fórmulas, equações químicas, representações de modelos, gráficos e equações matemáticas e também corresponde

à

linguagem

como

instrumento

mediador entre o fato produzido ou trazido e o aspecto teórico. No caso das disciplinas de Química presentes em outros cursos, entendemos que contextualizar pode não ser o termo mais adequado.

contextualização do ensino não impede que o

Neste caso, trata-se da inserção de conceitos

aluno resolva questões clássicas de Química,

científicos básicos em uma área tecnológica bem

principalmente se elas forem elaboradas buscando

específica. Isto implica em trabalhar um conceito

avaliar a evocação de fatos, fórmulas ou dados,

científico que é, normalmente, considerado

mas a capacidade de trabalhar o conhecimento de

teórico, de forma que ele se torne significativo

forma mais ampla.

para os alunos. Assim sendo, optamos pelo uso

Segundo Mortimer et al. (2000), o conhe­

do termo “dar significado” aos conteúdos, sempre

cimento químico pode ser analisado segundo

que estivermos falando em tornar o conhecimento

três aspectos: fenomenológico, teórico e repre­

químico importante para alunos que estão em

sentacional. O aspecto fenomenológico diz res­

outros cursos que não o de Química.

peito aos fenômenos de interesse da Química,

Gonzáles et al. (1998), ao discutirem a

podendo ser um fato levado à sala de aula ou um

relação entre as ciências técnicas usando, para

fato provocado pela experimentação. Esse fato

isso, a Engenharia Mecânica, e as ciências básicas

pode, também, ter relação com a área de interesse

afirmam que o desinteresse dos alunos por estas

mais direto deste aluno. Neste caso, o fenômeno

não se deve, apenas, ao fato de que muitos de

está materializado na atividade social. Tal aspecto

seus conteúdos não são vistos pelos mesmos

possibilitará ao aluno dar significação para deter­

como necessários em sua vida profissional. Eles

minado conhecimento. As relações sociais que eles

afirmam, também, que alguns professores do ciclo

estabelecem através desta ciência mostram que a

profissional não prestam atenção aos conteúdos

Química está na sociedade, no ambiente etc.

das disciplinas básicas. E isso, segundo os

A abordagem do ponto de vista fenome­

pesquisadores, pode estar reforçando a concepção

nológico também pode contribuir para promover

dos alunos de que as disciplinas básicas são

o desenvolvimento de habilidades específicas tais

superficiais e desinteressantes. Segundo eles,

como controlar variáveis, medir, analisar resultados, elaborar gráficos etc. O aspecto teórico relaciona­ ‑se a informações de natureza atômico-molecular, envolvendo, portanto, explicações baseadas em

86

modelos abstratos e que incluem entidades não

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

É muito provável que, se este vín­ culo não for estabelecido pelo pro­ fessor, o aluno não consiga ver a impor­­tância e a função de determinado


Ensinar Química Geral nos Cursos de Graduação

conhecimento básico para sua futura atividade profissional e só tome conhe­ cimento dessa necessidade anos depois de ter concluído a graduação (p. 347, tradução nossa).

cursos e sobre a expectativa desses alunos em

Considerando os resultados encontrados por

diferenciada para outros cursos.

relação à mesma. Julgando que ela não daria uma visão geral sobre o conhecimento a ser desenvolvido no curso, como acontece no curso de Química, argumenta que ela deveria ser

Gonzáles et al. (1998) para o curso de Engenharia

Segundo Vigotski (1993), os conceitos são

Mecânica, parece-nos que este é um problema que

construções culturais que o indivíduo adquire ao

existe em todos os cursos nos quais a Química

longo de todo o seu processo de desenvolvimento.

Geral representa a única disciplina específica da

Ele afirma existir um sistema dinâmico de

Química.

significados. Pensamos, então, que essa atribuição

Holme (2001), ao pesquisar a aprendizagem

de significado aos conceitos é que pode construir

de alunos da engenharia e da Química, com a

conhecimentos o que, não temos qualquer dúvida,

intenção de compará-las, observou que os alunos

nada tem a ver com repasse de informações.

da Química têm um desempenho melhor, mesmo

Então, mesmo que o aluno não consiga

tendo cursado a mesma disciplina de Química

atribuir o significado esperado aos conceitos fun­

Geral que os outros. O autor atribui este resultado

damentais desenvolvidos nas disciplinas básicas,

ao fato de que a aprendizagem é fundamentalmente

espera-se que, quando esses conceitos sejam

afetada pelo ambiente no qual o aprendiz está inserido

retomados em outra disciplina, ocorra um avanço

(p. 1578). E isto seria um dos motivos que faz o

de significados. E nisso se justifica a necessidade

estudante de engenharia – e pensamos que de

de uma maior integração entre as disciplinas

outros cursos também – se dedicarem às disciplinas

básicas e as específicas. Para que um conceito se

mais específicas, deixando num plano secundário

desenvolva, mesmo que apenas em fase inicial,

aquelas mais básicas como a Química Geral, para a

é preciso vencer a resistência dos alunos às

qual dirigimos nosso olhar, neste trabalho.

disciplinas que trabalham esses conceitos; neste

Silva et al. (2003) fizeram uma análise da percepção dos professores de Química Geral sobre a seleção e a organização conceitual nesta disciplina e, neste trabalho, afirmam que os estudantes de outras áreas, que não a Química, cursam, muitas vezes, a disciplina de Química Geral apenas para satisfazer as exigências de sua graduação, sem perceberem a necessidade daquele conhecimento para a área que escolheram. Essa idéia parece ser aplicável a todos os cursos nos quais a disciplina de Química Geral é a única que se faz presente.

caso, a Química Geral. Luckesi (1993) afirma que às gerações que aí estão não interessa apropriar-se dos resultados dos enten­di­ mentos já estabelecidos pela humanidade, mas adquirir um instru­ mento cognitivo que permita um aprofundamento dos conhecimentos já existentes e construção de novos entendimentos da realidade (p. 84).

Assim sendo, preocupou-nos saber até que ponto as disciplinas da Química, principalmente

Filho (2000), ao analisar a Química Geral

a Química Geral, têm atendido ao preceito de

no curso de Química, faz alguns questionamentos

auxiliar na construção de significados em outros

em relação a esta mesma disciplina para outros

cursos de graduação.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

87


Ana Luiza de Quadros et al.

2. Planejamento

88

do trabalho

3. Análise

das experiências

Em outra pesquisa realizada por Quadros

A resistência que alunos de outras áreas ou

et al. (2006), com os professores do Departamento

cursos têm apresentado sobre as disciplinas das

de Química da UFMG, buscava-se identificar as

ciências básicas, como é o caso da Química, nos fez

concepções de ensino que estes docentes traziam,

dirigir o olhar para algumas tentativas desenvolvidas

através da narrativa de uma aula que estivesse

dentro de Departamento de Química da UFMG, no

presente em suas memórias de forma especial.

sentido de minimizar essa resistência.

Essa pesquisa permitiu evidenciar quatro relatos

As entrevistas feitas com quatro professores

de aulas, nas disciplinas de Química Geral e

que ministram disciplinas nos cursos de Nutrição,

Inorgânica ministradas para outros cursos de

Engenharia Civil, de Minas e Metalúrgica estão

graduação que não o de Química, nas quais há uma

sintetizadas a seguir.

preocupação com a significação do conhecimento.

Já conhecendo a resistência que alunos de

Acreditamos que essa preocupação possa estar

Engenharia Civil normalmente têm à Química e

auxiliando os professores a desenvolverem a

que os engenheiros civis trabalham com materiais,

disciplina de Química Geral com conhecimentos

uma das professoras desenvolveu, com seus alunos

químicos mais vinculados ao mundo de trabalho.

deste curso, um trabalho alternativo dentro da

Nessas narrativas havia uma evidente preocupação

disciplina Química Geral. Segundo ela, essa era

com a inserção das ciências básicas nas outras

uma tentativa de despertar o interesse dos mesmos

áreas de conhecimento.

por esse campo do conhecimento.

Selecionamos os quatro professores cujas

Utilizando a metodologia da Termogra-

narrativas mostravam essa preocupação. Com estas

vimetria (TG) para estudar reações de decom-

narrativas em mãos, elaboramos um instrumento de

posição térmica de sólidos, a disciplina focou o

coleta de dados – uma entrevista semiestruturada e

estudo na cal de construção. Os alunos conheceram

a aplicamos aos quatro professores selecionados. A

o modo de funcionamento do aparelho de TG

entrevista de três deles foi gravada em áudio e outra

e aprenderam a importância e as implicações

foi escrita, a pedido do entrevistado. As questões

do estudo termogravimétrico da cal. Além dos

solicitaram, desses professores, que descrevessem

conhecimentos químicos abordados nesse trabalho,

a experiência com a disciplina de Química nos

como reações e estequiometria, outros assuntos

cursos que a ministravam, as inovações feitas

como cálculos de derivadas (conhecimento

no sentido de dar significado ao conhecimento

matemático) também foram incorporados.

químico (relacionando-o com o mundo de trabalho

Segundo a professora, os alunos, de

futuro do estudante) e os resultados obtidos. A

maneira geral, se integraram muito a esse projeto.

nossa expectativa era obter maior detalhamento

O interesse ocorreu de tal forma que, por conta

sobre os trabalhos desenvolvidos pelos profes-

própria, eles fizeram visitas a indústrias de cal,

sores, tentando verificar quais estratégias esses

obtendo amostras nesses locais. A professora

professores estariam usando para que os conteúdos

ainda ressalta que “mesmo sendo alunos em início

desenvolvidos na disciplina pudessem mostrar-se

de curso, eles mostraram muita maturidade na

mais significativos para os alunos.

execução do trabalho”.

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Ensinar Química Geral nos Cursos de Graduação

A principal preocupação da professora foi

amadurecimento dos alunos nestas semanas em

com a formação dos alunos e sua qualificação

que o trabalho se desenvolve. É nossa percepção

ao sair da universidade e ingressar no ciclo

que os alunos passam, a partir daí, a ver a Química

profissional. De acordo com ela, “[...] considerei

como uma disciplina importante.

uma atividade proveitosa, pois pelo menos estes

O curso de nutrição da UFMG foi projetado

40 alunos sairão da universidade com boas

na forma de módulos integrados. Assim, os alunos

noções de que a Química pode ajudá-los quando

que cursam Química Fundamental I têm disciplinas

estiverem exercendo a sua profissão. E sabendo

no semestre seguinte nas quais aquele conhecimento

responder à pergunta: ‘Para que estudar Química

se faz necessário. Segundo a professora, o desen­

em Engenharia Civil?’.

volvimento do conhecimento químico focado

Uma segunda experiência relata um

em alimentos e nutrição envolve os alunos de tal

trabalho desenvolvido na disciplina de Química

forma que eles chegam às disciplinas seguintes

Fundamental I, cujo conteúdo é similar ao

com um bom preparo básico. A professora afirma

presente na disciplina de Química Geral, no

que os alunos, após o trabalho com as moléculas,

curso de Nutrição. A professora procura trabalhar

apresentam um aproveitamento significativamente

o conhecimento químico focando nos temas

melhor também na avaliação escrita, quando

relevantes para a área dos alunos, ou seja, usando

comparado com a primeira avaliação, feita antes do

alimentos e nutrição como foco.

desenvolvimento do trabalho.

A cada semestre os alunos escolhem um

Na terceira experiência ou tentativa de

tema entre os sugeridos pela professora, para

dar significado ao conhecimento químico, está

desenvolver um trabalho em pequenos grupos,

uma ênfase à sua utilidade/aplicabilidade. O

baseados em moléculas de alguns constituintes

conteúdo é desenvolvido frisando, para os alunos,

dos alimentos, como corantes naturais, corantes

as possibilidades de elaboração de projetos que se

artificiais, aditivos, vitaminas e outras, que são

utilizem daquele conhecimento tendo em vista a

substâncias diretamente ligadas ao contexto do

produção tecnológica. Na entrevista, o professor

curso de Nutrição. Cada grupo fica responsável por

comentou:

uma molécula e, baseada na sua estrutura química, vai estudar as particularidades como: configuração eletrônica de seus átomos isolados, orbitais híbridos de átomos estratégicos na molécula, geometria em pontos estratégicos, isomeria etc. e, com eles, entender as propriedades, funções, cor etc. da molécula em estudo. No decorrer da disciplina eles têm que ser capazes de construir um modelo da molécula e discutir com os colegas os itens acima descritos.

“a dificuldade que o aluno apresenta, em termos de domínio e de interesse no conteúdo não é devido à incapacidade de aprendizagem, mas ele tem sérias dúvidas sobre a significância daquele conteúdo na vida dele. [...] Então, à medida em a gente começa a discutir os projetos ou as possibilidades de projetos, ele vai mostrando interesse e consegue, inclusive, perceber se fez a opção correta de curso, pois tem mais certeza sobre o que vai trabalhar”.

Segundo a professora, é na construção do

Como exemplo, entre os vários usados pelo

modelo que se percebe uma maior empolgação

professor, está o desenvolvimento do conteúdo de

dos alunos, porque os diferentes conhecimentos

estrutura eletrônica. Numa aula em que ressaltava

são vistos numa molécula que é muito conhecida e

a importância deste conhecimento e da estabilidade

útil para a nutrição. A professora afirma notar um

dos íons, o professor citou o caso da cirrose (doença

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89


Ana Luiza de Quadros et al.

que atinge o fígado humano, principalmente de

possa maximizar rendimento ou minimizar custos

pessoas que ingerem bebidas alcoólicas em excesso).

e, também, avaliar o destino dos resíduos gerados.

Essa doença está relacionada à elevação na taxa de

A receptividade dos alunos neste tipo de aula é

eliminação do Zn . Então, nos questionamentos

muito grande. Este professor comenta durante a

de um aluno, as seguintes questões apareceram:

entrevista:

+2

seria viável acrescer Zn+2 à cerveja ou às bebidas alcoólicas? Isso diminuiria o efeito nocivo do álcool sobre o fígado humano? É na perspectiva de uso/ aplicabilidade que o conteúdo pode ganhar sentido, segundo o professor. Na opinião do professor, os alunos que se empolgam com as potencialidades da Química apresentam uma aprendizagem sensivelmente melhor que os demais. Isso reforça a sua tese de que cada um dos conhecimentos trabalhados em sala de aula deve vir acompanhado do uso/ utilidade e potencialidades. Nossa última investigação relata o trabalho de outro professor, ao desenvolver a disciplina de Química Inorgânica para o curso de Engenharia de Minas. Segundo o professor, ter conhecimento da área de atuação do futuro profissional pode auxiliar no desenvolvimento da disciplina. Por isso, no início do curso, enfatiza a necessidade dos conhecimentos trabalhados na disciplina no campo de atuação profissional dos alunos. Esse trabalho é justificado pelo professor em decorrência da percepção de que os alunos de engenharia tendem a resistir às disciplinas básicas, por não entenderem a necessidade das mesmas para a sua formação. Mas, acima disso, o professor considera que as características do mercado, cada vez mais competitivo, exigem uma formação mais ampla. O tópico sobre a Teoria do Campo Cristalino, na Química Inorgânica, é iniciado destacando a atividade de empresas da área de mineração. A extração do ouro e da pirita são exemplos usados. Quando uma amostra é aberta,

90

“[...] alguns deles realmente passam a se interessar mais pela Química, muitas vezes eles até chegam a elaborar questionamentos mais aprofundados, começam a fazer vários tipos de questões que podem estar além do meu conhecimento”.

Nas avaliações, o professor procura lançar questões em que os estudantes precisem pensar um pouco mais em termos de conceitos, de forma a mostrar um entendimento dos processos químicos e não apenas memorização. Somente assim terão condições de interferir em processos químicos de forma correta. Esta é, segundo o professor, a atitude esperada de um profissional da Engenharia. Ele comenta que “A universidade não tem condições de passar para o aluno todos os métodos necessários para que ele possa entrar no mercado pronto para atuar [...]. O que é importante é que o aluno tenha uma boa base conceitual para que ele possa se inserir em qualquer ambiente tecnológico e cientifico de forma mais rápida”.

Sobre a disciplina de Química Geral, pelo fato de ser ministrada em vários cursos, o professor afirma que há a necessidade de trabalhá-la com diferentes enfoques. Segundo ele, talvez, um dos entraves para que isso não esteja acontecendo de forma mais geral, dentro das universidades, devese ao fato de que professores têm receio de mostrar as suas dificuldades em relação ao processo de ensino-aprendizagem. 3.1. Estamos

re-significando o conhecimento?

com o objetivo de ser processada, é necessário que

Nós percebemos, através dos relatos destas

se entenda quimicamente este processo para que se

experiências, que significativos avanços em termos

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Ensinar Química Geral nos Cursos de Graduação

de concepção de ensino-aprendizagem estão

não sua criticidade. O pensar do educador somente

acontecendo. Mesmo que não tenhamos isso como

ganha autenticidade no pensar do educando,

uma prática corriqueira, há uma tentativa de tornar

quando mediatizados ambos pela realidade e,

as aulas e os conteúdos químicos mais significativos.

portanto, na intercomunicação. As experiências

A inserção das ciências básicas nas

aqui discutidas, apesar de não representarem o todo

áreas mais tecnológicas, dentro de um curso

universitário, tentam superar tal visão e promover

de graduação, de forma a ser percebida como

um ensino mais significativo.

importante e necessária pelos alunos, representa

A educação é essencialmente a aquisição de

um avanço. Elas devem ser percebidas como

autonomia pelo indivíduo. Ela deve ter um fim em

possibilitadoras do desenvolvimento tecnológico,

si mesma e, com ela, o indivíduo deve adquirir a

como necessárias num processo de produção/

capacidade de pensar por conta própria e de apontar

produtividade, uso/aplicabilidade, dentre outras.

soluções viáveis para um problema. A educação

Certamente essa nova postura poderá tornar este

científica e tecnológica deve ensinar a pensar,

conhecimento mais significativo.

comunicar-se, pesquisar, ter raciocínio lógico,

Apesar de muitas das disciplinas que

fazer sínteses e elaborações teóricas, organizar o

envolvem conhecimentos das ciências básicas e,

próprio trabalho, ter disciplina, ser independente e

entre elas, a Química, serem consideradas, pelos

autônomo, articular o conhecimento com a prática.

alunos, como “conteudistas” e desnecessárias, foi

Usando conceitos de “domínio” e de

possível observar outras ênfases sendo utilizadas,

“apropriação” provenientes de Wertsch (1998),

o que julgamos ser um indício de mudanças.

poderíamos inferir que muitos dos conhecimentos

Freire (1979) ressalta que a educação deve

das ciências básicas serão de domínio dos alunos,

buscar temas geradores que permitam ao aluno

ou seja, eles dominam o conteúdo e são capazes

buscar uma significação social do conhecimento.

de responder a questões propostas pelo professor,

Ao invés de reproduzir o mundo ele vai transformá­

em sala de aula. Porém, se não forem capazes de

‑lo. Logo,

usar esse conhecimento em outras situações de seu

[...] A narração de que o educador é sujeito, conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado. Só existe saber na invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e com os outros (p. 66).

mundo de vida ou de trabalho, não se apropriaram do conhecimento. O apropriar envolveria uma questão de atitude do sujeito/aluno, que depende de barreiras culturais, que devem ser transpostas. É preciso que o aluno visualize esse conhecimento com simpatia, tenha prazer em aprender, vislumbre possibilidades de uso e, nesse caso, com uma inserção tecnológica.

Ainda, segundo Freire (1979), o ensino

Assim, para que a apropriação do conhe­

tradicional pode ser conceituado como estático e

cimento das ciências básicas ocorra, é preciso

repetitivo e com falta de criatividade, através de

vencer a resistência do aluno. Wertsch (1998),

uma concepção bancária, na qual os alunos são

baseado em outros autores, já propôs que a

vistos como seres adaptáveis ao ajustamento, numa

resistência e a rejeição podem ter grande impacto

postura altamente passiva diante da aprendizagem.

sobre o desenvolvimento das pessoas. Pelo que

Tal visão anula o poder criativo dos alunos,

estamos entendendo, essa resistência à apropriação

estimulando sua ingenuidade diante do mundo e

pode, inclusive, levar a uma resistência do próprio

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

91


Ana Luiza de Quadros et al.

domínio, nesse caso visíveis nos instrumentos

as percepções que têm sobre a aprendizagem dos

usuais de avaliação da própria disciplina, quando os

alunos, as formas de avaliação do conhecimento e

resultados não são satisfatórios. Assim, os relatos

da própria disciplina.

aqui descritos mostram tentativas de superar essa resistência e, já por isso, são significativos.

92

Nos relatos analisados, a avaliação ainda é um ponto obscuro. Um trabalho que fez toda

Uma das professoras pesquisadas comentou

a diferença no curso continua recebendo uma

sobre a necessidade de discutir este trabalho, até

pontuação mínima, seguindo regras a muito

para lhe garantir que está no caminho de produção

estabelecidas. Apesar da coragem e da ousadia em

de conhecimentos significativos; outra, ao des­

mudar a forma de trabalho, nem sempre isso vem

crever uma experiência interessante, relata que

acompanhado de mudanças na forma de avaliar.

não está disposta a repeti-la em função do excesso

Sabemos que a sociedade atual exige novas

de trabalho que ela representou. Infelizmente,

dinâmicas de ensino para que a aprendizagem

em todos os relatos, percebemos trabalhos

aconteça de forma significativa. A educação

isolados, sem uma discussão conjunta prévia e

superior, que está mais próxima tanto da produção

nem avaliativa. Muito já se tem comentado sobre

de conhecimentos quanto de teorias mais modernas

a solidão do trabalho do professor e isso se faz

de ensino e aprendizagem, pode fazer um trabalho

presente no ensino superior.

mais integrado, que possibilite aos alunos uma

Cada um dos envolvidos planeja, desen­

visão mais ampla de ciências, ressaltando sua

volve e avalia suas aulas sem uma partici­pação

importância, necessidade e inserção nas diferentes

de seus pares. Essa solidão não se faz presente

áreas.

na pesquisa e extensão. No ensino, ela parece ser

Essa integração pode se dar em diferentes

uma característica marcante. Sendo a universidade

níveis e nenhum deles tem menos importância

fundamentada nesses três pilares – ensino, pesquisa

que o outro. Nós acreditamos que os objetivos

e extensão – estranha-nos o fato de que apenas o

dos trabalhos desenvolvidos pelos professores

ensino tenha suas atividades desenvolvidas de

entrevistados mereceriam uma atenção especial

forma mais isolada. A pesquisa e a extensão que

dos coordenadores dos cursos de graduação,

são realizadas nas universidades, principalmente,

principalmente em dois tópicos que destacamos:

por grupos consolidados, não sofrem deste dilema.

o primeiro refere-se à articulação necessária entre

Ao pensarmos em promover melhorias no

o conteúdo desenvolvido nas disciplinas básicas

ensino que está sendo feito por nós, temos que

com o mundo de trabalho do futuro profissional

começar a pensar num trabalho mais coletivo, mais

– e nisso vimos ênfase nos relatos a nós feitos; o

discutido e, consequentemente, mais amadurecido.

segundo refere-se à articulação entre as diferentes

É na discussão coletiva que podem surgir ideias

disciplinas de um mesmo currículo.

que valorizem a significação dos conhecimentos e

Se os alunos não estão conseguindo

que melhorem a relação entre o ensino ministrado

perceber a relação do conhecimento das ciências

e a aprendizagem significativa.

básicas com o conhecimento mais específico,

A Química Geral, sendo uma disciplina

o trabalho do professor poderia ser repensado.

ministrada por muitos professores, também está

Acreditamos que a concepção que os professores

isolada em cada um dos cursos dos quais faz parte.

têm de ciência e, em especial, da ciência Química

Mesmo os vários professores que a ministram não

e de como ensiná-la podem levar a práticas que

discutem entre si as experiências que desenvolvem,

dificultam uma aprendizagem mais significativa.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Ensinar Química Geral nos Cursos de Graduação

Essa relação “conhecimento das ciências básicas e conhecimento específico” que é tão próxima e, talvez, tão lógica para o professor, pode estar parecendo muito distante da realidade profissional do estudante de cursos cujas áreas são mais tecnológicas.

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Relato 06 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 95-106

Caminhos e Descaminhos da Prática do Professor de Química no Contexto da Transposição Didática1 Ways and Problems in the Practice of the Chemistry’s Teacher in the Context of Didatics Transposition Rafael de Jesus Santana2

Resumo

O presente artigo tem por finalidade abordar os caminhos e descaminhos da prática de professores de Química de duas escolas da Rede Estadual de Ensino Médio de Sergipe no contexto da transposição didática (TD). Ao longo do estudo, buscamos expor uma discussão entre teóricos no que se refere à prática docente, à trans­ posição didática e aos modelos atômicos. Esta pesquisa utilizou como abordagem a análise qualitativa, combinando estratégias comparativas, por meio de categorias predefinidas através da análise de conteúdo. Utilizamos como instrumento para coleta de dados entrevistas semiestruturadas aplicadas aos professores das escolas pesquisadas. Os dados coletados e organizados em categorias apresentaram indi­ cativos de que a transposição didática dos modelos atômicos, realizada pelos docentes, na prática, foi deficiente, pois ocorreu de forma fragmentada e seguindo uma simples cronologia de ideias. Palavras-chave: Prática docente. Transposição didática. Modelos atômicos.

1

Este estudo constitui parte do trabalho realizado no mestrado com o título ‘Formação e atuação do professor de Química: um estudo sobre a transposição didática dos modelos atômicos’. Trabalho vinculado ao Programa de Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática, da Universidade Federal de Sergipe, 2009-2010.

2

Mestre em Ensino de Ciências e Matemática pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), Especialista em Didática e Metodologia do Ensino Superior (FSLF), Licenciado em Química (UFS), Pesquisador do Grupo Disciplinas Escolares: História, Ensino, Aprendizagem (DEHEA) e Integrante do Grupo de Pesquisa EDAPECI/UFS.


ABSTRACT

This article aims to address the ways and the problems in the practice of chemistry’s teachers of two schools in Sergipe in the context of the didactics transposition (DT). Throughout the study, we seek to expose a discussion among theorists regarding teaching, didactic transposition and atomic models. This research was to approach the qualitative comparative analysis, combining strategies, through pre-defined categories through content analysis. We use as an instrument for data collection, semi-structured interviews applied to teachers of the schools surveyed. The data collected and organized into categories presented indicates that the didactic transposition, atomic models made by teachers, in practice, were deficient because it occurred piecemeal and following a simple chronology of ideas. Key-words: Teaching practice. Didactic transposition. Atomic models.

1. Introdução

A busca pela melhoria do ensino de Química tem se tornado cada vez mais perceptível, principalmente diante de novas propostas curriculares de seleção e de organização dos conteúdos, que visam contribuir para a superação de deficiências como a ausência de experimentos, a falta de relação com o cotidiano, a descontextualização e a fragmentação dos conteúdos. Nessa perspectiva, Maldaner (2006) ressalta que a prática corrente dos professores de Química em nossas escolas de Ensino Médio é seguir uma sequência convencionada de conteúdos de Química, sem preocupação com as inter-relações existentes entre eles e, muito menos, com questões mais amplas da sociedade. Espera-se que no Ensino Médio a Química seja valorizada na qualidade de instrumento cultural essencial na educação humana, dando ao aluno a capacidade de tomar decisões conscientes na sociedade em que vive. A proposta de ensino presente nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM, 2000) contrapõe-se à velha ênfase na memorização de informações, nomes, fórmulas e conhecimentos como fragmentos desligados da realidade dos alunos. Ao contrário disso, pretende-se que o aluno

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

reconheça e compreenda de forma integrada e significativa, as transformações químicas que ocorrem nos processos naturais e tecnológicos em diferentes contextos, encontrados na atmosfera, na hidrosfera, na litosfera, na biosfera, e em suas relações com os sistemas produtivo, industrial e agrícola. Assim, no presente artigo, busca-se abordar os caminhos e descaminhos da prática de professores de Química de duas escolas da Rede Estadual de Ensino Médio de Sergipe no contexto da transposição didática (TD). Diante do universo de temas, metodologias e recursos que envolvem o ensino de Química, fez-se um recorte temático que recaiu sobre os modelos atômicos. Os modelos atômicos foram escolhidos por diversos motivos. Primeiro, porque a Química, enquanto ciência, procura explicar a natureza utilizando modelos (representações teóricas) que constituem sistemas epistêmicos de explicações, não perdendo de vista que a complexidade dos modelos, teorias e conceitos presentes na Química, pode constituir uma barreira adicional para a compreensão dessa Ciência. Outro aspecto é que o ensino dos modelos atômicos, em sala de aula, consiste em um processo de noções abstratas, o que faz Souza, Justi e Ferreira (2006) afirmarem que a


Caminhos e Descaminhos da Prática do Professor de Química no Contexto da Transposição Didática

apropriação do conceito pode adquirir características muito complexas em vista do reconhecimento de que esse conceito é um modelo científico e, como tal, transitório, que contribui para a interpretação da constituição e das propriedades das substâncias (p. 12).

Além disso, os primeiros modelos explicativos da matéria constituem um dos nove temas estruturadores propostos pelas Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCN+), que sugerem novas propostas de escolha e organização de conteúdos para o educador. Considerando que o professor seja agente da TD, a partir do momento em que transforma a aula em saberes ensinados, desenvolve-se esta pesquisa por se acreditar que essas ações são determinadas pela formação e pela experiência do docente, pelos manuais utilizados e pelas situações didáticas criadas por ele que poderão propiciar interações na sala de aula. Não se pretende encerrar a temática por aqui, pois se acredita na importância de (re) pensar as necessidades formativas, os avanços e as perspectivas do professor de Química, que perpassa, também, pela necessidade de mudanças curriculares que atendam às novas finalidades de ensino, capazes de contribuir para uma prática docente em que os saberes possam ser mobilizados em qualquer nível de ensino.

das atividades escolares, visando contribuir para a compreensão das funções sociais dos estudantes. Segundo Leite (2004): Foi para pensar o tempo das práticas escolares que o sociólogo ocupou-se dos saberes que circulam nesse contexto, propondo que estes condicionariam o tempo dos estudantes em dois sentidos: haveria o tempo do conhecimento, regulado pelo próprio objeto de estudo, mas haveria também o tempo da didática, definido em função das condições de “transmissão” desse conhecimento (p. 47).

Posteriormente, em 1980, o matemático Yves Chevallard retomou essa ideia inserindo-a num contexto mais peculiar, criando uma teoria e, com isso, sendo capaz de analisar questões importantes no domínio da didática da matemática. Segundo Chevallard (1991) a TD consiste em: Um conteúdo de saber que tenha sido definido como saber a ensinar sofre, a partir de então, um conjunto de transformações adaptativas que irão torná-lo apto a ocupar um lugar entre os objetos de ensino. O trabalho que faz um objeto de saber a ensinar, um objeto de ensino, é chamado de transposição didática (p. 36).

A origem do conceito em didática da matemática foi formalizada por Y. Chevallard e por M. A. Johsua, quando examinaram as transformações sofridas pela noção matemática de

2. Um

breve discurso sobre a teoria da transposição didática O conceito de TD faz parte de um modelo

teórico proposto para a análise do sistema didático

distância, desde a sua introdução no “saber sábio”, até o momento de sua introdução nos programas da disciplina de geometria da sétima série, momento em que o saber ensinar transformou-se na noção de geometria da reta (Astolfi; Develay, 1990).

formulado originalmente pelo sociólogo francês

Com o passar do tempo, o conceito de TD

Michel Verret, em 1975, que se propôs a fazer

foi assimilado por várias didáticas que fizeram

um estudo sociológico da distribuição de tempo

adaptações em função de suas especificidades, a

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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Rafael de Jesus Santana

exemplo da Química. Esta teoria, na concepção

das relações entre os integrantes desse sistema:

de Chevallard, apresenta três níveis de análise do

o saber (S), quem ensina/professor (P), quem

processo de transformação do saber:

aprende/aluno (A).

1. savoir savant (saber sábio); 2. savoir à enseigner (saber a ensinar) e

S

3. savoir enseigné (saber ensinado). Esses níveis, apesar de denominações diferentes, possuem elementos comuns ligados ao saber e estão interligados entre si. Na concepção de Chagas (2009): a teoria da TD fornece um modelo para analisar a distância existente entre o saber sábio (científico) e o saber ensinado, concebendo o sistema didático enquanto lócus privilegiado da abordagem da epistemologia do saber ensinado (p. 77).

A transformação do saber ocorre nos âmbitos externo e interno da escola. Para Chevallard (1991)

P

A

Figura 1. Sistema didático (Chevallard, 1991, p. 23).

Chevallard (1991) reconhece a complexidade das relações estabelecidas entre os três integrantes do sistema didático, considerando que a discussão da triangulação didática, em uma perspectiva epistemológica, significa pensar as relações que ocorrem a partir dos saberes escolares.

o processo de TD externa é determinado por uma

Diante do exposto, apresentam-se ao longo

instituição denominada noosfera, que influencia

desta pesquisa alguns indicativos das interações do

tanto na seleção dos conteúdos escolares quanto

sistema didático (TDI), já que foi/é muito difícil

nos métodos de ensino, fazendo parte dela

capturar elementos do seu funcionamento sem vê-

cientistas, professores, políticos, autores de livros,

-lo em ação: acompanhar as aulas, observar, filmar

elaboradores de manuais – incluindo ainda os

e/ou gravar a atuação no sistema didático, isso

responsáveis pela formação inicial e continuada.

devido às determinações que marcam a TDI.

Vale destacar que é no sistema didático que ocorre a TD interna, relacionada à singularidade que cada professor dá ao ensinar a partir do texto do saber (livro didático), dos programas e dos

98

3. Metodologia

currículos, o que permite afirmar que o professor

Para a presente pesquisa, optou-se por uma

é agente do sistema didático, devendo exercer

abordagem qualitativa, combinando estratégias

constantemente a vigilância epistemológica a fim

comparativas por meio de categorias predefinidas

de evitar o distanciamento entre o saber ensinado e

através da análise de conteúdo (Bardin, 2010)

o saber científico.

para identificarmos semelhanças e diferenças na

Para Chevallard (1991) sua teoria vem rever

transposição didática dos modelos atômicos, na

um equívoco da reflexão pedagógica: a discussão

atuação de professoras de Química, de duas escolas

dos saberes escolares de forma secundarizada. Para

da Rede Estadual de Ensino Médio de Sergipe.

tanto, insere a representação triangular do sistema

Inicialmente, foi realizada uma pesquisa

didático (Figura 1), demonstrando a complexidade

exploratória com o levantamento do quantitativo

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Caminhos e Descaminhos da Prática do Professor de Química no Contexto da Transposição Didática

de professores de Química que atuam na Rede Estadual de Ensino de Sergipe, junto à Secretaria Estadual de Educação de Sergipe (SEED). Esses dados contribuíram para a seleção uma amostra intencional, baseada nos critérios de escolha das escolas e dos professores.

4. Resultados

e discussão

A teoria atômica, assim como outras, passou por transformações até chegar nos currículos, nos livros didáticos (elementos da TD externa) e nas salas de aula (lócus das interações

Após visitar as escolas estaduais localizadas

do sistema didático, características da TD interna).

em Aracaju-SE, foi feita a escolha de duas delas,

No entanto, pretendemos dar ênfase nas discussões

obedecendo aos seguintes critérios: uma por ser

que tratam do terceiro nível do saber da TD: o

centro de excelência, bem equipada e na qual os

saber ensinado.

alunos estudam em tempo integral, e a outra por

É nesse nível que o papel do professor

apresentar condições inferiores de estrutura e de

tem grande importância, pois ele precisa, além

equipamentos, além dos alunos estudarem em

de dominar o conteúdo, pensar sobre o que, como

apenas um turno. Definidas as escolas, manteve-

e para que ensinar. Nesse processo também é

-se contato com os professores de Química que

necessária a vigilância epistemológica, a fim de

atuavam na 1ª série do Ensino Médio, oportunidade

evitar um grande distanciamento entre aquilo que

em que foi feito um breve relato sobre a pesquisa e solicitou-se a contribuição deles para a realização desta investigação. Duas professoras de cada escola prontificaram-se a participar da pesquisa e passaram à etapa seguinte, agendamento e realização das entrevistas. Essas entrevistas foram realizadas de forma semiestruturada e possibilitaram a participação dos sujeitos da pesquisa, considerando uma sequência temática para que os entrevistados respondessem, não detendo qualquer rigidez e permitindo, assim, que um questionamento desse origem a outros (Triviños, 1987) seguindo um roteiro em que destacava o perfil, a formação e a atuação do professor. Com o intuito de preservar os nomes das escolas e das professoras pesquisadas, a escola centro de excelência foi denominada escola A e as respectivas professoras de professora 1 (P1) e de professora 2 (P2). Já a outra escola foi identificada como escola B e as docentes de professora 3 (P3) e professora 4 (P4).

ensinamos (ou tínhamos a intenção de ensinar) e o saber de referência (saber científico). Diante do exposto, investigamos o que as professoras de Química das duas escolas pesquisadas ensinam sobre modelos atômicos aos seus alunos, conforme o Quadro 1. Diante do que as professoras afirmaram ensinar sobre modelos atômicos, é possível diagnosticar indicativos de um ensino que segue uma simples cronologia, podendo, inclusive, criar uma ideia equivocada de Ciência e de atividade científica, fazendo com que o aluno acredite que a ciência desenvolve-se de forma neutra, objetiva e sem conflitos, graças à descoberta de cientistas. Os professores de Química ao ensinarem os modelos atômicos precisam tomar os devidos cuidados para evitar que ocorram descontextualizações, simplificações e esquematizações. Além disso, precisam pensar em situações didáticas capazes de mobilizar os alunos no processo de ensino-aprendizagem.

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Rafael de Jesus Santana

Quadro 1. Distribuição dos motivos explicitados pelas professoras entrevistadas para responder o que ensinam sobre os modelos atômicos aos alunos. Ensinar

As teorias (P1). A evolução dos modelos (P1). Desde os primórdios: o modelo de Dalton, Thomson, Rutherford e Bhor (P3).

Falar

Do modelo atômico atual (P1). Da relação dele com a questão do espectro (P1). A questão do modelo ser onda ou partícula (P1).

Fazer

Comparações simples como nos livros didáticos (P4).

Trazer

Dentro do contexto da realidade deles (P2). Questões do dia a dia (P2).

Discutir

Através de textos a questão de Lavoisier, como ele introduziu a Química como ciência, como se chegou ao modelo atômico e como se deu a sua evolução (P2).

Fonte: Entrevistas realizadas no período compreendido entre 18/01 a 08/03 de 2010, Aracaju-SE.

A professora 4 (P4), por exemplo, afirma

se os teóricos começaram é porque eles

que ensina os modelos atômicos “fazendo compa­

eram curiosos e isso é muito bom. Isso é

rações simples como nos livros didáticos”. De

bom até para que o aluno também possa

acordo com Melo (2002), a maioria dos professores

aguçar a curiosidade para a ciência [...].

de Química, quando ensinam estruturas atômicas

Agora, entender esse modelo, não só a

e ligações químicas utilizam os livros didáticos,

evolução dele, mas principalmente como

mas tanto a abordagem que os referidos conteúdos

ele hoje é trabalhado, como ele hoje é visto

recebem nas aulas quanto nos livros didáticos,

pela ciência faz ele entender os demais

parece inconveniente.

conteúdos” (P1).

Esse problema é atribuído ao fato da existência de uma linguagem fragmentada, que envolve

muitos

conceitos

inadequa­ damente

cone­ctados. Além disso, o conceito de modelo, fundamental no ensino de Química, pratica­ mente não é abordado. Os modelos atômicos são apresentados na maioria dos livros didáticos por meio de desenvolvimento histórico inade­quado, dando a impressão de que os mesmos foram descobertos e não fonte de criações científicas. O conceito de modelos é um dos pilares metateóricos que se edificam nas ciências naturais (Galagovsky; Adúriz-Bravo, 2001). Assim, é importante identificar no discurso das professoras a importância desse saber para os alunos, conforme descrito a seguir.

100

“Olhe, da forma como ele vem abordado no livro didático, nenhuma. Porque ele é muito abstrato, ele trata de coisas, assim, muito superficiais, mas em se tratando, assim, da forma como você o aborda, pelo lado da modernidade, para que o aluno possa compreender o mundo que o cerca. O que acontece hoje com o nosso aluno? Ele tem muita tecnologia, ele utiliza muito essa tecnologia, mas ele não conhece nada sobre essa tecnologia. E ele tem assim vários tipos de celulares, até melhor que o do professor; ele tem computadores;tem mp3, mp7. E o que faz desse material ser melhor ou pior em relação a um gravador do meu avô, por

“Eu não valorizo muito a importância,

exemplo, um gravador que usava aquela

eu acho que a historicidade do conteúdo

fitinha e tal. Então, qual a diferença disso

é importante para que o aluno possa

aí? Certo? O que faz? Isso tá na constituição

conhecer como tudo começou, até porque

do material. Então, quando você começa a

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Caminhos e Descaminhos da Prática do Professor de Química no Contexto da Transposição Didática

estudar os materiais que o rodeiam, aí você

A P1 reconheceu o papel que a história da

começa a explicar as suas propriedades

evolução do modelo atômico tem para o apren­

químicas e físicas e sua construção, ou seja,

dizado deste saber, como também a dificuldade em

você parte do macro pro micro. Isso começa

trabalhar sua importância, isto é, a utilidade que o

a ficar claro para o aluno que isso tem um sentido, não simplesmente eu chegar lá e dar gráficos de energia e discutir com ele, parecendo que eu até estou falando do sexo dos anjos” (P2).

saber tem para os alunos. Já a P2 disse que lidava com esse saber, fazendo uma análise de como ele se apresenta no livro didático, sendo “muito abstrato”. Porém, considerou o fato de que uma abordagem diferente ajuda “o aluno a compreender

“A importância é porque ele é um assunto que tem pré-requisito. Quando você começa a trabalhar número atômico, distribuição eletrônica, átomos, nêutrons ou íons, você precisa explicar qual é a estrutura atômica daquele átomo. Que aquele átomo não é apenas uma esfera maciça, como dizia Dalton, que ele não é um pudim de passas como dizia Thomson, então você tem que antes, preparar esse aluno, a sua maturidade como é esse modelo atômico, como é o átomo, a estrutura atômica na verdade

o mundo que o cerca”. Além disso, mencionou as tecnologias usadas pelos alunos, demonstrando, assim, ser possível discutir a constituição da matéria, suas propriedades químicas e físicas, partindo do “macro para o micro”, o que, segundo a referida professora, possibilita a realização de um ensino mais concreto, não precisando tratar do “sexo dos anjos”. A P3 entendeu que discutir sobre a importância deste saber deveria ser um pré­ ‑requisito. Em sua prática, a referida professora demonstra os saberes por meio de analogias, como

desse átomo. É importante sim. Então, é

por exemplo, sobre Dalton “esfera maciça” e sobre

apenas uma questão de planejamento, mas

Thomson “pudim de passas” para situar a própria

como se fosse um pré-requisito” (P3).

estrutura do átomo. Verificamos que a P4 afirmou a importância da história como fundamento

“Todos têm sua importância. Modelos

para o aprendizado, justificando apenas que a

atômicos mesmo [...] senão, como eles vão

transposição didática desse saber deve ocorrer

ter a noção do que seria o átomo, de como

sem muita extensão, pois assim a aula se tornaria

foi que surgiu a ideia. Daí, eu acho uma

menos enfadonha.

coisa importante a parte histórica, sem se

Comparando os discursos sobre a impor­

estender muito, senão se torna enfadonho”

tância da história do saber no ensino, constata­

(P4). Diante

‑se que as ideias apresentadas pelas professoras dessas

considerações,

criamos

três categorias para análise: utilidade, história e abstração. Verificamos que a primeira esteve presente no discurso das quatro professoras,

estiveram próximas do senso comum e distantes do saber de referência, não tendo ficado evidente a importância do estudo da natureza e da epis­ temologia da ciência para que se pudesse com­

enquanto a categoria “história” apareceu na fala

preender, por exemplo, a necessidade de usar

das professoras P1 e P4 e a categoria “abstração”

modelos e explicar a sua importância central no

no discurso da P2.

ensino de Química.

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Rafael de Jesus Santana

A transposição didática dos modelos

fazer, tentem visualizar o que foi dito e

atômicos pode levar o aluno a ter dificuldades em

tracem no caderno. A gente vai explicando

estabelecer relações entre os modelos atômicos e o

táticas diferentes e vê onde está o melhor

comportamento da matéria, ou seja,

entendimento. Por exemplo, às vezes, antes

ele não sabe utilizar um modelo micro (conceitual e abstrato) para compreender fenômenos macro (Melo, 2002, p. 4).

O posicionamento apresentado pelas en­ trevistadas, no que se refere aos ensinamentos sobre modelos atômicos e à importância desse saber para os alunos, instigaram a investigação dos recursos utilizados para facilitar o processo de ensino e de aprendizagem, conforme apresentado no Quadro 2. Constata-se que os recursos utilizados pelas docentes para o ensino dos modelos atô­ micos foram os mais variados: modelos de isopor; modelos de papel; desenhos; textos; CD­

de passar aquele desenho, explico e peço a eles que façam um esboço no caderno, depois do assunto que eles copiam. Muitos deles não trazem o livro, o livro tem” (P4). Neste contexto, Maldaner (2006) chama a atenção para o fato de que: Os professores ao saírem dos cursos de licenciatura, sem terem problematizado o conhecimento específico em que vão atuar e nem o ensino desse conhecimento na escola, recorrem, usualmente, aos programas, apostilas, anotações e livros didáticos que os seus professores proporcionaram quando cursavam o Ensino Médio (p. 74).

‑ROM; livros didáticos e apostilas. Já a categoria

Comparando as práticas das professoras

de procedimentos de ensino foi identificada no

das escolas A e B e considerando a disponibilidade

discurso das P1, P2 e P3.

de recursos em ambas, verifica-se que, apesar

Dentre os discursos apresentados, o da

da escola A ser o centro de excelência (e dispor

professora P4 chamou a atenção porque, além de

de muito mais recursos) e a escola B se ressentir

explicitar o recurso utilizado, explicou também, o

da falta de condições para a realização didática,

que fez para mobilizar os alunos. A docente disse

não há diferenças significativas entre as ações

que ensinar por meio de:

desenvolvidas pelas professoras das duas escolas,

“Aula expositiva com desenhos e o livro didático adotado pela escola. Antes de

tomando como categorias fazer/utilizar os recursos didáticos na transposição didática dos modelos atômicos.

Quadro 2. Distribuição dos motivos explicitados pelas professoras entrevistadas para responder sobre quais recursos utilizam para ensinar os modelos atômicos aos alunos.

Utilizar

Apostilas, alguns livros didáticos que apresentam CD-ROM, aí levando o aluno para a sala de multimídia a gente pode apresentar esses modelos. Textos [...] muito bons que servem para unir, aproximar esse conteúdo da vida, do cotidiano do aluno (P1). Filme, modelos de papel, modelos de isopor. Procuro trabalhar com o real, usando desenhos e modelos (P2).

Fazer

Modelos de isopor, máquina fotográfica, quadro e giz, o programa Movie Maker, Power Point e Apostila (P3). Desenho (P4).

Fonte: Entrevistas realizadas no período compreendido entre 18/01 a 08/03 de 2010, Aracaju-SE.

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Caminhos e Descaminhos da Prática do Professor de Química no Contexto da Transposição Didática

Quadro 3. Distribuição dos motivos explicitados pelas professoras entrevistadas para responder sobre a dispo­nibilidade de laboratório de informática, dos recursos tecno­lógicos e de outros tipos de multimídias. Tem sala de vídeo, laboratório de informática e Data Show (P1).

Recursos tecnológicos

Eu posso dizer que a escola A é atípica da Rede Estadual. Ela tem laboratório de química, física e biologia Recursos tecnológicos e dois laboratórios de informática (P2). Ela só me disponibiliza quadro, piloto e sala de informática (P3).

Recursos tecnológicos

Sala de informática (P4).

Recursos tecnológicos

Fonte: Entrevistas realizadas no período compreendido entre 18/01 a 08/03 de 2010, Aracaju - SE.

Nessa direção, considerando a importância

Nessa mesma perspectiva, o trabalho de

das transformações dos meios de informação e de

Gois e Giordan (2006) apresenta uma ferramenta de

comunicação na sociedade, que tem afetado, dentre

construção e visualização de objetos moleculares

as várias esferas, a escola e, consequentemente, o

virtuais e tridimensionais, chamada “Construtor

exercício da profissão docente, é de grande intersse o saber das professoras sobre a disponibilidade de laboratório de informática e recursos tecnológicos nas escolas pesquisadas, conforme o Quadro 3. Para este quadro, foi criada a categoria “recursos tecnológicos”. Nota-se que a escola A dispõe

de

mais

recursos

(tecnológicos

e

manipuláveis) que a escola B, sendo considerada, inclusive, pela professora P2 como “atípica da Rede Estadual”. Apesar das diferenças, ambas possuem laboratório de informática. Quanto ao uso desse espaço, somente a P1 afirmou levar os alunos para a sala de multimídia para apresentar os modelos (Quadro 2). Apesar da maioria das professoras não

de Objetos Moleculares”, que pode ser livremente acessada pela internet3 e possibilita construir objetos moleculares virtuais e tridimensionais de compostos orgânicos de cadeia simples ou ramificada, com até 30 átomos de carbono. Essas pesquisas são exemplos que demons­ tram que a utilização de recursos tecnológicos pode ser feita nas aulas de Química, podendo aguçar a curiosidade dos alunos e criar situações de aprendizagem que os façam desenvolver habili­ dades para a solução de problemas, tornando­‑os partícipes no processo de ensino-aprendizagem. A utilização de recursos digitais, quando bem planejados e utilizados adequadamente, pode facilitar aos usuários o acesso de informações e conduzir a atividade no ritmo peculiar de cada

utilizarem o laboratório de informática nas suas

um. Com a utilização de imagens, experiências

aulas, entendemos que o uso de recursos tecno­

de simulação e de experimentação, a atividade

lógicos pode trazer contribuições significativas

projetada pode extrapolar situações de ensino que

para facilitar o processo de transposição didática

têm se mostrado incapazes de criar outros modelos

dos modelos atômicos. Na revisão de literatura,

afastados daqueles pertinentes à racionalidade

identificamos trabalhos que abordam essa temá­ tica, dos quais destacamos o de Eicheler e Del Pino (2000) ao relatarem a importância do software educativo e sua utilização. Sobre as possibilidades de seu uso entendem que alguns podem ser considerados ferramentas que auxiliam o aluno

técnica. Diante do quadro até então delineado, as professoras demonstraram sentir dificuldades para ensinar os modelos atômicos aos seus alunos do Ensino Médio, conforme apresentado no Quadro 4.

a raciocinar a respeito de certos fenômenos, a exemplo dos que utilizam a simulação.

3

Facilmente encontrado em (http://einstein.fe.usp.br).

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Quadro 4. Distribuição dos motivos explicitados pelas professoras entrevistadas para responder se têm algum tipo de dificuldade para ensinar os modelos atômicos. Tenho. Até porque nós sabemos que é algo que vem avançando muito. A complexidade em si do conteúdo envolvido, no modelo atômico atual. Eu acho que a prova que fundamenta. A dificuldade maior Dificuldade didático­ é em como pegar aquela linguagem [...] é como explicar de forma mais clara e mais simples para o ‑epistemológica aluno, para que ele possa entender (P1). Dificuldade didático­ No início de carreira sim. Mas agora a experiência, a formação vai ajudando, a discussão com outros colegas ‑epistemológica e sufi­ também (P2). ciência pedagógica Não (P3).

Suficiência pedagógica

Até onde vai o meu entendimento não (P4).

Suficiência pedagógica

Fonte: Entrevistas realizadas no período compreendido entre 18/01 a 08/03 de 2010, Aracaju-SE.

Criou-se para o Quadro 4 duas categorias:

os modelos atômicos, por meio de softwares

dificuldade didático-epistemológica e suficiência

educativos e de simulações, por exemplo. Além

pedagógica. Foi observado que a categoria “difi­

disso, diferentes ferramentas computacionais

culdade didático-epistemológica” apareceu no

podem ser utilizadas no ensino de Química,

discurso de duas professoras P1 e P2, tendo havido uma superação, através da experiência e da discussão com colegas na prática da P2. A categoria suficiência pedagógica foi identificada na fala de três professoras P2, P3 e P4. Diante desse cenário, houve a preocupação de saber que a maioria das professoras P2, P3 e P4 acreditam não ter dificuldades didático­ ‑epistemológica para ensinar aos alunos. O interesse maior foi saber se as professoras percebem dificuldades de aprendizagem desse saber (modelos atômicos) nos alunos, conforme especifica o Quadro 5. Identifica-se no discurso de P1 e P2 a categoria “dificuldades de aprendizagem”, enquanto que a categoria “aprendizagem suficiente” foi identificada no discurso de P3 e P4. Foi possível inferir, a partir do discurso da P1, a falta de percepção de utilidade do saber. A referida professora afirmou “não (ser) possível evidenciar o experimento de Rutherford, por

104

inclusive dos modelos atômicos. O professor pode priorizar, se considerar necessário, àqueles que permitam principalmente interatividade, baixa necessidade de recursos e portabilidade, para que se atinja às finalidades de ensino. No discurso da P2, identificamos a falta de hábito em questionar os alunos e dificuldades em fazê-los questionadores. O discurso da P3 evidenciou que os alunos fazem confusão com os nomes dos cientistas e seus respectivos modelos. Diante do contexto até então delineado, considerando as deficiências identificadas na prática docente, acredita-se que a formação conti­nuada pode ser um caminho em busca na melhoria da prática e, consequentemente, do ensino. Essa formação continuada pode ocorrer de diversas maneiras: nos grupos de estudos nas universidades e/ou nas escolas; de pesquisas; de programas de extensão; de encontros locais; de encontros regionais; nacionais e até internacionais

exemplo, no laboratório, apesar dos alunos ficarem

que discutam sobre o ensino de Química;

ansiosos”, no entanto, como vimos anteriormente,

oportunidade para os docentes planejarem suas

a escola dispõe de laboratório de informática,

aulas; compartilharem suas dúvidas e dificuldades,

sendo este um momento adequado para ensinar

entre outras.

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Caminhos e Descaminhos da Prática do Professor de Química no Contexto da Transposição Didática

Quadro 5. Respostas das professoras de Química à questão: Você percebe alguma dificuldade por parte dos alunos na aprendizagem desses conteúdos? Com certeza, e às vezes eles até questionam, aonde eles vão utilizar aquilo na vida? E como aqui a escola disponibiliza laboratório de Química, é uma hora que eles ficam querendo ir para o laboratório. A gente não Dificuldades de pode fazer isso no laboratório, não pode representar o experimento de Rutherford no laboratório e eles ficam aprendizagem querendo, ficam ansiosos e fica aquela aula maçante mesmo porque envolve muitas teorias (P1). Muito. Muito, porque o nosso aluno tem o hábito de decorar, e quando ele é levado a questionar, ele se sente Dificuldades de um pouco incomodado, então você tem que ter muito jogo de cintura para começar a questionar o aluno. aprendizagem Então, até você chegar e fazer dele um aluno questionador, você tem uma série de dificuldades (P2). Dos modelos atômicos não. Eles se atrapalham com os nomes dos cientistas que foram desenvolvendo esses Aprendizagem modelos, mas quanto aos modelos mesmo não (P3). suficiente Aprendizagem suficiente

O entendimento, como eu lhe disse, é muito facilitado (P4). Fonte: Entrevistas realizadas no período compreendido entre 18/01 a 08/03 de 2010, Aracaju-SE.

5. Considerações

finais

No presente artigo, abordaram-se caminhos e descaminhos da prática de professores de Química de duas escolas da Rede Estadual de Ensino Médio de Sergipe no contexto da transposição didática (TD). Em busca de respostas para compreender o que, como e com quais recursos as professoras de Química, formadas na UFS, ensinaram os modelos atômicos aos seus alunos, foi feita uma abordagem sobre a prática docente e perceberam-se aproximações entre as ações das professoras pesquisadas e os seus professores da formação inicial, apesar de haver indicativos de mudanças no que se refere ao uso de recursos utilizados por elas. Foi indentificado que as professoras ensinaram as teorias, a evolução dos modelos e apenas uma disse “falar” do modelo atômico atual. Os dados apontaram para uma transposição didática dos modelos atômicos, nas duas escolas, por meio do método tradicional de ensino (recepção/ transmissão), de forma deficiente, em que os saberes foram apresentados de forma fragmentada e seguindo uma simples cronologia de ideias, podendo ter criado uma concepção de ciência equivocada. O aluno, desta forma, pode acreditar que a ciência desenvolve-se de forma neutra,

objetiva e sem conflitos, graças à descoberta de cientistas e isolada do contexto social. Nas duas escolas pesquisadas, as professoras de Química disseram utilizar os seguintes recursos para o ensino dos modelos atômicos: apostilas; livro didático; desenhos e modelos de isopor, havendo maior predominância no uso dos dois primeiros. Considerando o que as professoras disseram ensinar, chama a atenção, mais uma vez, a necessidade da vigilância epistemológica, a fim de evitar um grande distanciamento entre o saberes ensinados e os saberes de referência (científicos). Esses indicativos apontam para a necessidade de modelar realidades, compreendendo a importância do trabalho com modelos nas Ciências, em particular na Química. Devemos compreender que a construção de modelos tem como finalidade a busca da facilitação de nossas interações com os entes modelados sendo, a partir deles, capazes de fazer inferências e previsões de propriedades. As deficiências identificadas na prática das docentes é mais um revelador da necessidade de (re)pensarmos sobre como estão sendo formados inicialmente os professores de Química no Brasil e sobre a necessidade de uma formação continuada capaz de inserir o professor atuante em sala de aula, formado muitas vezes sob a égide

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de currículos antigos, que não contemplaram questões atuais, num cenário de pesquisa e dis­ seminação de resultados de pesquisas, buscando discutir questões em busca da melhoria do ensino. É necessário inserir os professores quer em formação inicial quer em formação continuada num cenário de discussões e propostas capazes de veicular modelos curriculares que permitam que eles explorem, de forma cada vez mais sistemática, aspectos sociocientíficos de temas dentro do contexto curricular ao qual estão habituados. Por fim, é importante destacar que este trabalho procurou trazer reflexões capazes de ampliar o debate sobre a atuação de professores num cenário em que a teoria da transposição didática, em emergência no campo das didáticas das ciências, articulasse as diferenças ou as seme­ lhanças existentes na atuação de professores de Química através de um dos pilares que sustentam essa ciência: os primeiros modelos explicativos de constituição da matéria.

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Relato 07 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010

p. 107-122

Experimentos Integrados para a Melhoria das Aulas Práticas: proposta metodológica, análises e resultados Integrated Experiments to the Improvement of Practical Classes: methodological evaluation, analyses and results Hélvio Silvester A. de Sousa, Ethanielda de Lima Medeiros e Alcineia Conceição Oliveira1,2

Resumo

Neste trabalho, experimentos para determinação da concentração micelar crítica (CMC) e tensão superficial de surfactantes através da condutometria e tensiometria, respectivamente, foram adaptados com o objetivo de facilitar a assimilação de tais conceitos por estudantes de graduação. Os experimentos foram investigados e parâmetros como tipo de surfactante usado, concentração e temperatura foram avaliados para correlacioná-los àqueles de micelas e de tensão superficial. A metodologia empregada permitiu avaliar o aprendizado através de um questionário aplicado aos estudantes de Química, bem como avaliar a assimilação dos conceitos supracitados. Os resultados mostraram que a metodologia motivou os graduandos e auxiliou na compreensão das dificuldades envolvidas no entendimento do tema leis da termodinâmica, além de aplicar tais conceitos, quando possível. Os experimentos integrados auxiliaram os estudantes a compreender os aspectos teóricos relacionados às práticas de tensiometria e condutometria. Os experimentos passaram por reformulações para contextualizá-los, a fim de serem aplicados na disciplina em F. Q. II, oferecida aos estudantes de Química. Palavras-chave: Concentração micelar crítica. Tensão superficial. Experimentos de físico-quimica. 1

Departamento de Química Analítica e Físico-Química, Universidade Federal do Ceará. E-mail: alcineia@ufc.br

2

Agradecemos à UFC pela bolsa de monitoria concedida a ELM e a FUNCAP pela bolsa de IC concedida a HSAS.


ABSTRACT

In this work, experiments to determinate the critical micelar concentration (CMC) and surface tension of surfactants by condutometry and tensiometry, respectively, were adapted with the goal of facilitating the assimilation of such concepts by chemistry graduating students. The experiments were integrated and parameters such as type of surfactants used, concentration and temperature were evaluated to correlate them to those of micelles and surface tension. The employed methodology allowed evaluating the learning level through an applied questionary to the chemistry`s student as well as the assimilation of the abovementioned themes. Results also showed that the methodology motived graduating students and enabled to solve comprehension difficulties involved in thermodynamics laws and that to apply concepts, as possible. The integrated experiments also enabled students to understand the theoretical aspects related to the tensiometry and the condutometry practices by associating them. The experiments are passing by reformulations with the goal of being applied to F. Q. II discipline to contextualize them to the referred discipline, which is offered to the graduating chemistry students. Key-words: Critical micelar concentration. Surface tension. Physical chemistry experiments

1. Introdução 1.1. As

atividades experimentais nos cursos de química As aulas experimentais são de fundamental

importância para auxiliar na compreensão dos conteúdos teóricos uma vez que, através dessas aulas, podem-se relacionar as observações experimentais sobre determinados temas e possibilitar uma interpretação dos mesmos (Borges, Castilho, 2007; Galiazzi; Gonçalves, 2007). As impressões dos docentes de Química da educação superior acerca do papel da experimentação no ensino têm sido apontadas na literatura, de modo que há um consenso de que se deve elaborar estratégias e metodologias de ensino que visem entender por que os alunos não compreendem determinados assuntos nas disciplinas oferecidas em seus cursos de graduação (Borges; Castilho, 2007; Nitschke; Pastore, 2002). Dessa forma, as atividades experimentais estão asseguradas, pois constituem uma forma de explicitar o conhecimento, de questioná-lo ou de formular novas hipóteses sobre um dado aspecto teórico, facilitando o aprendizado de um tema específico (Nitschke; Pastore, 2002).

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Especificamente, nas disciplinas de físico-química ministradas nos cursos de graduação em Química, existe uma dificuldade, por parte dos estudantes, de assimilar determinados aspectos dos conteúdos teóricos (Pinheiro; Medeiros; Oliveira, 2010; Rodrigues; Oliveira, 2009) em virtude do caráter eminentemente físico-matemático que a disciplina oferece. As aulas experimentais são recursos que tem por objetivo diminuir tal dificuldade. Neste sentido, a metodologia proposta neste trabalho associa técnicas tais como a viscosimetria, a polarimetria e a tensiometria, visando auxiliar no entendimento desses conceitos através da experimentação. As aulas experimentais sobre as respectivas técnicas são ministradas, separadamente, não havendo, na maioria das vezes, concatenação entre elas. Assim, a assimilação dos aspectos teóricos norteadores dos experimentos (leis da termodinâmica, propriedades de transportes, termodinâmica de soluções eletrolíticas e não eletrolíticas, dentre outros) é dificultada, segundo os graduandos. Sabe-se que a realização frequente de aulas práticas nos cursos de Química facilita o


Experimentos Integrados para a Melhoria das Aulas Práticas

aprendizado devido à natureza atrativa e moti­ vadora dessas aulas (Farias, 2011; Galiazzi, Gonçalves, 2007; Rodrigues; Oliveira, 2009; Neto

1.2. Tensão

superficial e conceitos associados: motivação e justificativa para a proposta experimental

simples que abordem diversos assuntos, levando

A contribuição da superfície à energia de um líquido deve-se às atrações intermoleculares (Mortimer, 2008). Admitindo-se que as molé­ culas na superfície de um determinado líquido encontram­‑se em contato direto com as molé­ culas vizinhas mais próximas, do que com

o aluno a ter uma visão mais ampla e crítica dos

aquelas no interior do líquido, existe uma

experimentos.

diferença de energia potencial entre as molé­

et al., 2011). No entanto, existem fatores, como o pouco tempo reservado para as aulas e a falta de equipamentos, que dificultam o entendimento dessas práticas. Uma solução para essas dificul­ dades é compilar diversos conteúdos em práticas

A metodologia proposta neste trabalho

culas do interior e da superfície do líquido

se baseia no desenvolvimento de uma prática

(Mortimer, 2008; Dilmohamud; Seeneevassen;

de laboratório que engloba diversos assuntos

Rughooputh; Ramasam, 2005). Dessa forma,

inter‑relacionados, como propriedades dos sur­

a tensão superficial é definida como o trabalho

factantes, soluções eletrolíticas, fenômenos de

necessário para aumentar a área da superfície,

superfície, bem como os aspectos termodinâmicos

ou a força necessária para cortar a superfície,

aí envolvidos.

usualmente expressa em mN m-1 (Menger; Shi;

As várias propriedades que os surfactantes

Rizvi, 2009; Adamson, 1979). Ressalta-se que essa

adquirem quando em solução podem variar

grandeza é dependente dos fatores que afetam as

segundo o tipo (catiônico, aniônico, não iônico

interações moleculares, dentre os quais destacam­

ou anfótero), o tamanho da cadeia carbônica e

‑se a temperatura, a pressão e a presença de outros

as condições experimentais (força iônica, contra

componentes (Mortimer, 2008).

íons, temperatura etc.) (Castro; Galvez-Borrego;

Os outros componentes supracitados são

Hoces, 1998). É fundamental o conhecimento

denominados de surfactantes ou tensoativos,

sobre essas mudanças de propriedades. Existem

compostos caracterizados pela capacidade de

poucos trabalhos que avaliam esses efeitos

alterar as propriedades superficiais e interfaciais

específicos, principalmente quanto ao tamanho

de um líquido (Maniasso, 2001). Mudanças na

da cadeia carbônica, um dos enfoques deste

temperatura causam também alterações na tensão

trabalho.

interfacial, na viscosidade, na solubilidade relativa

A aplicação da metodologia sugere que os

do surfactante e na agitação térmica das partículas

estudantes de Química adquiram estímulo para

dispersas (Neves, 2002). Além da condutometria,

ter um pensamento interdisciplinar que envolva

outras técnicas tais como potenciometria, res­

situações contendo questões experimentais e

sonância magnética nuclear e espectroscopia

teóricas, em um experimento simples. É de extrema

podem ser utilizadas para a determinação da CMC

importância que os estudantes tenham ideia de que

de um surfactante (Belt et al., 2005; Dilmohamud

o laboratório não é apenas um atrativo visual, mas

et al., 2005; Menger; Shi; Rizvi, 2009; Neves,

sim um ambiente estritamente necessário para o

2002). No entanto, o método condutométrico

conhecimento teórico do assunto abordado.

apresenta-se como o mais utilizado para a referida

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109


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determinação, devido à facilidade de manuseio e

corpo discente sobre o papel da experimentação na

reprodutibilidade dos resultados.

sua formação, como se segue:

A utilização de propostas metodológicas que estimulem a assimilação de conceitos associados à termodinâmica vem se destacando na área de Química (Farias, 2011; Demo, 1997; Chaudhuri; Paria, 2009). No que se refere ao estudo dos surfactantes, apesar de vários trabalhos focarem a influência do tipo de surfactante sobre a tensão superficial, dentre outros parâmetros (Dilmohamud et al., 2005; Maniasso, 2001; Neves, 2002), a dificuldade de assimilação dos conceitos reside no fato de que não há uma correlação com outras técnicas físico-químicas, tais como a picnometria, a viscosimetria e a própria tensão superficial. A proposta deste trabalho é avaliar o efeito das propriedades de soluções de surfactantes sobre a concentração micelar crítica (CMC) e inserir esse conteúdo em aulas práticas da disciplina de Físico-Química II. Os surfactantes utilizados neste trabalho foram: Dodecil sulfato de sódio (SDS), CH3(CH2)11SO4-Na+ (aniônico); Brometo de cetiltrimetil amônio CH3(CH2)15N+(CH3)3Br- (CTAB,

catiônico) e Ácido dodecilbenzeno sulfônico CH3(CH2)11C6H4SO3H (DBA, aniônico). Esses

surfactantes foram utilizados devido ao seu baixo custo e à facilidade de manuseio. Especificamente, buscou-se analisar: 1. A influência da concentração de SDS, CTAB e DBA sobre a tensão superficial, formação de micelas e viscosidade; 2. O efeito da temperatura nas propriedades físico-químicas das soluções contendo os surfactantes supracitados.

2. Metodologia

A presente metodologia constituiu-se de duas etapas: desenvolvimento/adaptação das atividades experimentais e análise da avaliação do

110

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2.1. Metodologia 2.1.1.

experimental

Medida da tensão superficial de surfactantes

Ao tensiômetro (Figura I, Material Suplementar) adicionou-se um volume de água suficiente para encher a pipeta acima da marcação zero (Tavares, 2011). Esse procedimento foi efetuado com o auxílio de uma seringa do seguinte modo: um béquer contendo uma solução de referência foi colocado na base do suporte, de modo que o capilar foi mergulhado na solução (certificou-se de que a válvula estava aberta). Através da seringa conectada a uma mangueira na extremidade superior da pipeta, fez-se uma sucção lenta do líquido até que a solução atingisse um nível superior à marca zero da pipeta (não permitindo que o líquido entrasse na mangueira) (Adamson, 1979). Após encher a pipeta, fechou-se a válvula e, em seguida, controlou-se o tempo de queda de uma gota antes que essa atingisse a marca zero da pipeta, em aproximadamente 4 segundos. A partir do momento em que o volume de água atingiu a marca zero da pipeta, o frasco pesa filtro foi colocado, imediatamente, abaixo do tubo capilar e recolheram-se dez gotas, fechando-o, em seguida. Retirou-se o pesa filtro e determinou-se a massa (m1) na pipeta e o volume (v1) de 10 gotas. Posteriormente, o mesmo procedimento de preparação e de preenchimento do instrumento foi feito com a mesma solução de SDS, na concentração de 5,0 mM. Foram então adicionadas mais 10 gotas no mesmo pesa filtro e obteve-se a massa (m2), perfazendo-se 20 gotas da solução; mediu-se com a pipeta o volume (v2) de 10 gotas. O mesmo procedimento de preparação, preenchimento do instrumento e adição de mais dez gotas da mesma solução foi repetido, sequencialmente. Obteve-se a massa (m3) de 30 gotas acumuladas na pipeta, e o volume (v3) de 10 gotas da solução. Fez-se


Experimentos Integrados para a Melhoria das Aulas Práticas

uma média com os valores de massa e volume. O procedimento foi repetido para as outras soluções de SDS. Nesses experimentos teve-se o cuidado de manter o pesa filtro limpo e seco, externamente, antes de efetuar cada pesagem. As medições foram realizadas à temperatura ambiente. O mesmo procedimento experimental foi utilizado para a obtenção dos valores de volume e de massa para as soluções de CTAB e DBA. 2.1.2.

Influência da temperatura na concentração micelar crítica e na tensão superficial dos surfactantes Construiu-se um sistema contendo uma

bureta com agitador magnético e eletrodo do condutivímetro, similar a um eletrodo de titulação potenciométrica (Figura II, Material Suplementar). Colocou-se, inicialmente, 50 mL de água na célula de condutância medindo-se a condutância elétrica. Com o auxílio de uma bureta, adicionou-se uma solução estoque do surfactante (SDS) com concentração de 5,0 mM, em intervalos regulares de 2,0 mL (volume em que a variação de condutância após cada adição de surfactante fosse constante) sob agitação. A condutância foi lida para cada concentração. Esse procedimento foi realizado para

As técnicas de picnometria e viscosimetria também foram empregadas concomitantemente ao experimento supracitado, de acordo com a proposta apresentada na literatura (Simoni; Balthazar; Simoni, 2011). A influência da temperatura sobre a tensão superficial foi investigada acoplando-se um banho termostático ao sistema mostrado na Figura 1. 2.2. Avaliação

da proposta experimental por parte dos estudantes de graduação Os experimentos integrados foram executados

por estudantes de graduação do curso de Química Licenciatura, Bacharelado e/ou Industrial, inscritos na disciplina de Físico-Química II, no primeiro semestre do ano de 2011, perfazendo um total de 50 alunos matriculados. Posteriormente, aplicou-se um questionário de modo a avaliar a metodologia. Sugere-se que a realização do experimento seja feita através de grupos de trabalho, de modo que cada grupo poderá realizar um experimento (viscosimetria, tensiometria, condutometria), isoladamente. Em seguida, após a construção de gráficos e de tabelas, os resultados podem ser expostos no pós-laboratório, de modo que se permita a discussão coletiva das propriedades termodinâmicas avaliadas.

as outras soluções estoques com concentrações iniciais de 10,0; 20,0; 30,0; 40,0 e 50,0 mM. Os experimentos foram realizados à temperatura ambiente (Maniasso, 2001; Adamson, 1979). O mesmo procedimento experimental foi utilizado para a obtenção dos valores de CMC para o CTAB e DBA nas concentrações investigadas. O procedimento experimental realizado em função da temperatura foi semelhante ao adotado

3. Resultados

e discussão

3.1. Determinação

da concentração micelar critica e tensão superficial de um surfactante A Figura 1 mostra a variação do coeficiente

de viscosidade das soluções de SDS, CTAB e DBA em função da massa específica.

na determinação da concentração micelar crítica

Os resultados de picnometria mostraram que,

dos surfactantes. A única diferença adotada foi o

à medida em que se aumentam as concentrações de

béquer permanecer em um banho termostático, nas

SDS, CTAB e DBA, aumenta-se proporcionalmente

temperaturas: 7 °C, 17 °C, 37 °C, 47 °C e 57 °C.

a massa específica; isso pode ser explicado devido

Foram utilizados os surfactantes SDS, CTAB e

ao aumento de sólidos solúveis no meio. Abaixo

DBA na concentração de 50,0 mM.

de 10 mM (0,9960 g mL-1) as soluções dos

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111


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da força iônica dos surfactantes: as moléculas de

Viscosidade dinâmica (cP)

1,00

surfactantes volumosos como o DBA e o CTAB CTAB SDS

0,95

DBA

0,90

tendem a dissociar-se e a formar micelas mais facilmente em baixas concentrações (Tabela 1) ao passo que, em elevadas concentrações, a viscosidade aumenta, ocorrendo uma diminuição no valor da CMC. Assim, há uma influência do tamanho da

0,85

cadeia carbônica sobre os valores de CMC. Esse 0,80 0,996

0,997

0,998

0,999

1,000

Massa específica (g.ml-¹)

Figura 1. Coeficiente de viscosidade das soluções de SDS, CTAB e DBA em função da massa específica.

comportamento é notório quando se comparam as soluções 50 mM de SDS com CTAB que possuem valores distintos de CMC. O SDS possui 12 átomos de carbono em sua cadeia hidrocarbônica enquanto o CTAB possui 16. Os diferentes tamanhos da cadeia influenciarão no raio da micela. Utilizando­

surfactantes comportam­‑se como soluções diluídas,

‑se o CTAB, necessita-se de uma menor quantidade

sendo o valor da viscosidade próximo do da água,

de monômeros por micela, enquanto o uso do SDS

na temperatura do experimento (Tavares, 2011).

promove o emprego de maiores quantidades. Desse

Observa-se, ainda, que em concentrações superiores

modo, a concentração mínima em que se iniciará a

a 30 mM (0,9975 g mL ) as soluções de surfactantes

formação de micelas é maior para surfactantes com

têm viscosidade aproximada de 0,87 CP, sendo o

menores cadeias.

-1

SDS uma exceção. Portanto, a determinação do

Outro fator a ser considerado é a interação

coeficiente de viscosidade dos líquidos associada

eletrostática nas micelas e suas mobilidades. Como

à picnometria revelou que a viscosidade dinâmica

as soluções de SDS possuem maiores valores de

das soluções variou de forma proporcional à

viscosidade em concentrações superiores a 30 mM

concentração das soluções contendo surfactantes.

(Figura 1), infere-se que as suas micelas possuem

A justificativa para tal comportamento reside no

uma maior quantidade de monômeros, já que o

fato de que o aumento do número de moléculas de

tamanho da parte hidrofóbica é menor. Dessa

surfactante no líquido dificulta o fluxo do fluído,

forma, existem nas atmosferas iônicas micelares

considerando o escoamento laminar (Nitschke;

uma maior interação eletrostática; (Jones, 1933;

Pastore, 2002; Mortimer, 2008; Adamson, 1979;

Tang et al., 2006) isso conduz a um aumento do

Jones; Talley, 1933). Esse resultado comprova que

atrito interno das soluções. Esse aumento do atrito

a relação é dependente de restrições estéricas e

viscoso, denominado de efeito eletroforético,

Tabela 1. Valores de CMC obtidos por condutometria e tensão superficial das soluções de SDS, CTAB e DBA a 26,5oC. Os valores entre parêntesis relacionam-se a tensão superficial em mN m-1.

112

Concentração (mM)

CMC de SDS (mM)

CMC de CTAB (mM)

CMC de DBA (mM)

10,0

8,5 (46,3)

4,4 (44,6)

1,2 (34,5)

20,0

8,4 (39,6)

4,3 (43,2)

1,1 (35,9)

30,0

9,1 (38,3)

4,2 (41,3)

1,2 (35,3)

40,0

9,4 (39,7)

4,0 (38,7)

1,4 (33,4)

50,0

9,5 (39,2)

3,7 (34,0)

1,3 (34,7)

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Experimentos Integrados para a Melhoria das Aulas Práticas

reduz a mobilidade das partículas do líquido.

Por exemplo, na concentração de 30 mM, a

Em contraposição, as soluções surfactantes de

tensão superficial determinada pela extrapolação

CTAB e DBA requerem menores quantidades

gráfica das soluções de SDS, CTAB e DBA

de monômeros por micelas, pois o primeiro tem

foram respectivamente de 39,2 ± 0,62 mN m-1,

maior cadeia hidrofóbica e o segundo sofre,

41,33 ± 0,32 mN m-1, e 35,26 ± 0,51 mN m-1,

provavelmente, influência do efeito estérico,

respectivamente. Esses valores seguem a mesma

devido à presença de um anel aromático em sua

tendência para a CMC e a viscosidade dos

parte hidrofílica, sendo os valores para o DBA

referidos surfactantes à temperatura ambiente

próximos a 1,2 mmol, em concordância com a

(Figura 1 e Tabela 1). Adicionalmente, a região I

literatura (Chaudhuri; Paria, 2009). Esses dois

da Figura 2 relaciona-se a um período de indução,

efeitos conduzem a uma redução das interações

no qual a tensão superficial varia pouco com a

eletrostáticas das atmosferas iônicas micelares,

concentração visto que os monômeros ocupam

facilitando assim a mobilidade micelar e, por

preferencialmente a superfície dos líquidos, devido

consequência, reduzindo a viscosidade dessas

à presença do grupo hidrofóbico; isso diminui a

soluções surfactantes (Galiazzi; Gonçalves, 2007).

força de coesão entre as moléculas do solvente

É importante ressaltar que as justificativas são

e, consequentemente, diminui de modo pouco

baseadas na segunda lei da termodinâmica

significativo a tensão superficial. Por outro lado,

(Adamson, 1979; Neves, 2002).

na região II pode ocorrer adsorção cooperativa

A fim de correlacionar os experimentos

entre as moléculas de surfactante na interface ar/

anteriores com a tensão superficial, utilizando-se o

líquido, fato que promove uma diminuição brusca

método da gota, foi construída a Figura 2:

da tensão superficial; na região III ocorre uma saturação da superfície, de modo que a adição de

Tensão superficial, γ (mN.m-¹)

64 I

60

novas moléculas de surfactante tem efeito menor

SDS CTAB DBA

56

sobre o valor da tensão superficial, principalmente após atingirem a CMC (Lopes et al., 2011; Menger; Shi; Rizvi, 2009).

II

52 48

Para explicar esses fenômenos é preciso

III

observar as circunstâncias envolvidas na dinâmica

44

de equilíbrio da solução ocorrida antes e após a

40

CMC. Em concentrações abaixo da CMC, os

36

monômeros estão em equilíbrio na solução,

32 1,0

0

1

2

3

4

LnC (mM)

Figura 2. Tensão superficial em função da concentração a 26,5 oC para as soluções de SDS, CTAB e DBA.

adsorvidos nas interfaces do líquido e, quanto mais monômeros são adicionados, maior a adsorção e a formação de monocamadas de surfactantes (Nitscheke; Pastore, 2002) Ressalta-se também que, antes da CMC, os monômeros comportam­

Nota-se que as curvas obtidas concordam

‑se como eletrólitos fortes; após a micelização,

com os estudos conduzidos com surfactantes, a

cada monômero adicionado contribui para a

temperatura ambiente, mostrados na literatura

formação de micelas. Entretanto, apenas uma

(Dilmohamud et al., 2005; Menger; Shi; Rizvi,

fração α de íons ficam livres em solução, pois

2009; Jones; Talley, 1933; Abreu; Masetto, 1987).

os aglomerados micelares conduzem uma menor

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113


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quantidade de íons que os respectivos monômeros

adições posteriores dos surfactantes propiciam

individuais (Neves, 2002). Momentos antes da

uma constância em relação aos valores de tensão

CMC, quando a superfície é saturada, a próxima

superficial. Esse comportamento pode ser eluci­

adição de tensoativo formará as primeiras micelas;

dado ao observar que, após a CMC, ao contrário

neste ponto, a última adição de tensoativo possui

dos monômeros, as micelas se dispersam na

diferentes quantidades de monômeros, a depender

solução, não apresentando efeito adicional sobre a

da concentração utilizada. As soluções com menor

tensão superficial (Neves, 2002).

concentração podem possuir o número mínimo

A influência da estrutura do surfactante

necessário para formar as primeiras micelas e as

sobre a tensão superficial também foi estudada.

mais concentradas, um excesso de monômeros. De

Nota-se que o DBA possui uma parte hidrofóbica

maneira simplificada, na interface líquido-ar, há a

volumosa, exercendo um efeito maior no distan­

formação de uma monocamada organizada com

ciamento das moléculas do solvente, tendo,

as caudas hidrofóbicas orientadas para o ar, sendo

portanto, um maior efeito sobre a redução da tensão

que as forças intermoleculares entre as caudas

superficial dos líquidos. O CTAB, por sua vez,

hidrofóbicas são fracas (van der Waals) resultando

possui uma maior cadeia carbônica, comparado

na diminuição da tensão superficial. Se as forças

ao SDS, exercendo uma menor influência sobre

fossem fortes, não haveria redução na tensão

a diminuição da tensão superficial, uma vez que,

superficial. Isso justifica a diferença de CMC entre

devido ao tamanho, uma quantidade menor de

as diferentes concentrações do mesmo surfactante

monômeros se acomoda na superfície do líquido.

(Tabela 1). As soluções mais concentradas estão

Isso conduz a uma menor efetividade na redução

sujeitas a maiores valores de CMC, uma vez que

da tensão superficial dos líquidos. No caso do

podem adicionar, em poucos volumes, um excesso

SDS, que possui uma cadeia hidrocarbônica

de monômeros. As soluções menos concentradas

menor, houve um maior efeito sobre a redução

tendem a ter uma maior exatidão no ponto da CMC,

da tensão superficial, uma vez que existe uma

devido aos seus monômeros serem adicionados em

maior quantidade de monômeros acomodados na

menor número.

superfície dos líquidos, reduzindo de forma mais

Nesse experimento, a adição de SDS até uma concentração próxima a 10 mM proporcionou um decréscimo brusco da tensão superficial da solução. Isso pode se justificar pelo fato de

114

efetiva a tensão superficial. 3.2. Efeito

da temperatura sobre a tensão superficial e viscosidade dos surfactantes

que, ao se iniciar a adição de um surfactante à

A tensão superficial diminuiu com o aumento

água, as moléculas tentam se arranjar de modo a

da temperatura, em concordância com estudos

minimizar a repulsão entre grupos hidrofóbicos e

conduzidos em soluções aquosas (Dilmohamud,

a água: os grupos polares do surfactante ficam na

Seeneevassen, Rughooputh, Ramasam, 2005). Tal

solução aquosa, próximos à superfície; os grupos

efeito foi mais pronunciado para soluções com

apolares ficam na interface àgua-ar, minimizando

mais íons como, por exemplo, a solução de SDS

o contato com a água. Isso gera uma diminuição na

(Figura 3a), seguindo a mesma tendência da CMC

tensão superficial (γ) da água, o que provoca um

(Figura 3b). O aumento de entropia do sistema

desequilíbrio das forças atuantes na sua superfície

é o fator responsável pela diminuição da tensão

(Borges; Castilho, 2007; Jones; Talley, 1933). As

superficial com o aumento da temperatura.

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Tensão superficial, γ (Nm-¹)

Experimentos Integrados para a Melhoria das Aulas Práticas

7,8 7,6

o líquido mais fluído e tendo menores efeitos

Água DBA CTAB SDS

7,2 6,8 6,2

sobre a superfície, conforme observado através da Figura 5a. O principal fator facilitador desse escoamento é o aumento entrópico do meio. Isso significa que existe uma forte dependência da

5,8 5,40

constante de viscosidade e tensão superficial com

5,0 3,0

a temperatura, ou seja, uma pequena mudança de temperatura influenciará no equilíbrio existente

(a) 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 Temperatura (°C)

10

(Lopes et al., 2011). Infere-se, portanto, que soluções pouco viscosas conduzem mais íons em temperaturas

(b)

moderadas (27,5 ºC); por outro lado, em

9

temperaturas menores que 27,5 oC, a mobilidade

SDS CTAB DBA

8 CMC (mM)

entre as micelas e os monômeros em solução

7

dos íons foi reduzida, sobretudo em soluções

6

com maior coeficiente de viscosidade (Figura 1,

5

curva DBA). Isso motivou o estudo do efeito da

3

temperatura sobre a viscosidade das soluções

2

nessas concentrações. O processo envolvendo

4

o DBA apresentou o maior valor de energia de

1 15

20

25

30

35

40

45

50

Temperatura (°C)

Figura 3. (a) Tensão superficial em função da tempe­ ratura. (b) CMC em função da concentração de SDS, CTAB e DBA (50 mM) a diferentes temperaturas.

A influência da temperatura sobre a tensão superficial e a CMC dos líquidos é mostrada através da equação:

ativação (6,7 × 10-3 J.mol-1) devido às restrições estéricas

apresentadas

pela

molécula

deste

surfactante, enquanto o CTAB apresentou o menor valor de energia de ativação (5,29 × 10-3 J.mol-1). Adicionalmente, a Figura 3b mostra que a variação da CMC com a temperatura é mais pronunciada para o SDS que para o CTAB. Essa observação conduz à conclusão de que o sistema contendo CTAB deve possuir menores valores de

ES ~ HS = GS + TSS = γ - T (∂γ/∂T)

energia de ativação visto que o equilíbrio existente

em que: E é a energia superficial; H é a entalpia

pela variação da temperatura para o SDS e o DBA,

superficial; G é a energia de Gibbs superficial; T

os quais possuem um elevado valor de energia

é a temperatura absoluta; g é a tensão superficial

de ativação. As micelas são bastante estáveis e

(Neves, 2002).

possuem uma dinâmica de equilíbrio, entretanto,

s

s

s

entre as micelas e monômeros é menos afetado

Essa expressão mostra que a tensão super­

ao ocorrer uma elevação da temperatura, há um

ficial diminui acentuadamente com a elevação

acréscimo energético no meio micelar; o que

da temperatura, uma vez que o aumento da

causa uma maior dificuldade de aglomeração

proprie­ dade leva a um aumento do número de

de monômeros para a formação de micelas. O

moléculas que podem escapar da força potencial

equilíbrio, então, é direcionado para a forma de

formado pelas moléculas vizinhas, tornando

monômeros no meio, necessitando-se uma maior

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115


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quantidade de monômeros, em temperaturas mais

uma redução da viscosidade dessas soluções, fato

altas, para ocorrer o deslocamento do equilíbrio

concordante com a literatura (Lopes et al., 2011).

para a formação de micelas. Quando há um acréscimo na temperatura do sistema próximo meio, dificultando a formação de aglomerados tão estáveis e tão organizados como as micelas, pois esse acréscimo de energia promove uma movimentação maior dos monômeros em solução desestabilizando e dificultando a formação de micelas (Lopes et al., 2011). Dessa forma, quando há um aumento da temperatura do meio, ocorre um notado crescimento da CMC. Deve-se ressaltar que, nas temperaturas de 7 e 57 °C, a CMC não pôde observar a concentração micelar crítica, uma vez que os extremos de temperatura influenciaram na mobilidade dos monômeros em solução, desestabilizando o meio e dificultando a visualização gráfica da CMC.

116

Condutância (µS)

da CMC, passa a existir uma maior desordem no

1300 1200 1100 1000 900 800 700 600 500 400 300 200 100 0

17 °C 27 °C 37 °C 47 °C

SDS

CTAB

DBA

0

5

10

15

20

25

30

35

40

Concentração (mM)

Figura 4. Condutância de soluções de SDS, DBA e CTAB (50 mM) em função da temperatura.

3.3. Análise

do questionário de avaliação

No que se refere à condutância (Figura 4),

A Figura III (Material Suplementar) apre­

quando há um aumento do número de monômeros

senta os dados obtidos do questionamento sobre a

em solução pode existir uma maior interação

motivação dos alunos para realizarem os experimentos

eletrostática no meio, uma vez que essas solu­

práticos em Físico-Química II, para o aprofundamento

ções são eletrolíticas. A condutância de uma

dos conteúdos abordados em sala de aula.

solução depende da facilidade com que seus íons

Os resultados mostraram que 45 % dos

conseguem movimentar-se através da mesma,

entrevistados afirmaram que se sentem motivados

fato facilitado pelo aumento da temperatura. A

a realizarem as práticas de Físico-Química II,

variação da condutância deixará de ser relevante

enquanto 42 % sentem-se pouco motivados e cerca

a partir da CMC, pois a atmosfera iônica micelar

de 13% acreditam não ter nenhuma motivação.

possui maiores valores de tempo de relaxação

Esse questionamento evidencia a heterogeneidade

que a atmosfera de hidratação formada pelos

de opiniões dos entrevistados acerca das práticas

monômeros livres.

(Tabela 2) que, em relação à justificativa para

Essa interação pode conduzir a um aumento

pouca e/ou nenhuma motivação, engloba as

da Ea. Desse modo, necessita-se de uma maior

questões de: estrutura física do laboratório, falta de

energia para que ocorra o escape das moléculas em

relação das práticas com a indústria, dificuldades

solução. Essa relação entre a energia de ativação

com relação aos assuntos abordados. Em relação

típica da viscosidade é comparável à energia

aos entrevistados que responderam sentirem­

potencial média das interações intermoleculares.

‑se motivados, esses consideram as práticas

Ao compararem-se os valores de viscosidade,

como ferramenta importante ao aprendizado dos

para as concentrações 30 mM de SDS e CTAB,

conteúdos teóricos, um dos fatores determinantes

observa-se que o aumento da temperatura promove

para a busca do conhecimento concreto.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Experimentos Integrados para a Melhoria das Aulas Práticas

Tabela 2. Respostas de alguns entrevistados à Questão 1. Resposta

Justificativa

Sim

Com pressão, todo mundo sente motivação.

Sim

Curiosidade para, realmente, comprovar os conceitos e fórmulas.

Sim

Porque esclarece mais.

Sim

Pois na prática posso conhecer melhor os equipamentos para manuseá-los.

Sim

Pois eu gosto da prática e facilita aprender a teoria.

Mais ou menos

Alguns experimentos são muito repetitivos e ultrapassados

Mais ou menos

Nem todas as práticas estão eficientemente relacionadas a teoria.

Mais ou menos

Depende da prática.

Mais ou menos

Simplesmente não gosto.

Mais ou menos

O laboratório não oferece condições satisfatórias.

Mais ou menos

Porque tenho um pouco de dificuldade.

Não

Demora muito e não dá tempo fazer muita coisa.

Não

Escassez de aparelhagem.

Não

Não há clareza na objetividade das práticas na indústria.

Não

Não vejo relação com a indústria e o professor não relaciona.

Não

Porque a teoria não atrai.

Destaca-se, ainda, que dos 45 % dos estu­ dantes entrevistados que responderam sim à questão anterior, 71 % desses estudantes acham que as aulas práticas de Físico-Química II são importantes para a melhor compreensão dos assuntos abordados em sala de aula; por outro lado, 29% dos entrevistados

(a) 2. Você considera que há certo nível de dificuldade com relação às práticas “Determinação da concentração micelar de crítica (CMC) e medida da tensão superficial de sufactantes?” Mais ou menos - 42%

29% - Sim 29% - Não

acreditam que essa importância se aplica em alguns casos como, por exemplo, nos assuntos que tratam do cotidiano industrial ou, quando o assunto abordado nas práticas condiz com aqueles estudados na teoria. Em termos gerais, no que se refere à justificativa (Tabela 2), os alunos consideraram as práticas essenciais para melhor compreensão e aprofundamento dos assuntos abordados em sala

(b) 3. As práticas abordadas tomam evidente os diversos conceitos relacionados a propriedades dos surfactantes, soluções eletrolíticas, fenômenos de superfície e aspectos termodinâmicos envolvidos no processo?

de aula. Estes resultados indicam que a participação

Mais ou menos - 36%

dos educandos nas classes de laboratório promove

Não - 16%

48% - Sim

a reconstrução do conhecimento abordado em sala de aula. A Figura 5a apresenta os dados obtidos para o questionamento sobre a existência de dificuldade para realizar os experimentos integrados propostos

Figura 5. (a) Dificuldades encontradas nas aulas práticas I. (b) Integracão de conceitos vistos nas aulas práticas.

neste trabalho.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

117


Hélvio Silvester A. de Sousa, Ethanielda de Lima Medeiros e Alcineia Conceição Oliveira

Tabela 3. Respostas de alguns entrevistados à Questão 2. Resposta

Justificativa

Sim

As explicações são dadas muito rapidamente. Os alunos, de modo geral, não se sentem à vontade com os professores do curso, para perguntar.

Sim

Há dificuldade para o controle de formação de bolhas.

Sim

Muitas informações para assimilar

Sim

Falta de material e condições de trabalho no laboratório

Sim

Ainda não tínhamos visto a teoria

Sim

É a primeira vez que vejo isso

Sim

Saber para que serve e onde será usado no dia-a-dia

Mais ou menos

Parte química do experimento bem compreendida, parte matemática insuportável.

Mais ou menos

Em ver as micelas

Mais ou menos

Apesar das explicações dos professores, há dificuldade em encontrar na literatura sobre os assuntos em questão.

Mais ou menos

Você tem que estudar, talvez não consigamos os resultados de acordo com a teoria.

Mais ou menos

Não considero tão difícil assim

Não

118

São práticas fáceis de serem realizadas e entendidas.

Os resultados mostram haver uma grande

conteúdo com o cotidiano social e profissional, o que

divergência de conclusões: 29 % dos alunos

é uma grande contradição, pois o conteúdo abordado

afirmaram não sentir nenhuma dificuldade com

é de grande aplicação industrial. Intui-se que as

relação à prática “Determinação da concentração

abordagens teóricas ensinadas pelos professores

micelar crítica (CMC) e medida da tensão

não deixam claro os objetivos de cada prática, pois

superficial de sufactantes”; 29% afirmaram sentir

de acordo com Abreu e Masetto e colaboradores

dificuldades e 42% que sentiram um pouco de

(1987), é imprescindível que o professor saiba

dificuldade. Apesar de ser um conjunto de práticas

porque transmitir determinado assunto, de modo

muito simples de serem compreendidas e muito

que seja útil para o desenvolvimento do aluno. Por

utilizadas em indústrias, há uma heterogeneidade,

outro lado, segundo as impressões dos docentes

por parte dos entrevistados, com relação à

consultados, os estudantes não demonstraram

justificativa de suas respostas (Tabela 3).

interesse em aprender tais conteúdos. Outras

Uma análise minuciosa das respostas

atribuições à dificuldade das aulas práticas se

positivas dadas à Questão 2, explicitou o motivo

referem à falta de relação com a indústria, o motivo

da dificuldade, com relação às práticas abordadas.

real da prática e também a análise matemática, de

A grande maioria dos entrevistados (55%) afirmou

acordo com 3 % dos entrevistados.

que o motivo que conduz às dificuldades nas aulas

A Figura 5b apresenta os dados obtidos

práticas é a incompreensão dos fenômenos físico­

para o questionamento sobre os diversos conceitos

‑químicos. Esse fato intui que os graduandos não

relacionados com os experimentos abordados no

conseguirem atingir os objetivos propostos na

trabalho. O conhecimento prévio adquirido pelo

prática. Cerca de 36% dos entrevistados sentiram

estudante foi algo determinante para os resultados

dificuldades por não conseguiram associar o

obtidos, de acordo com 48 % dos entrevistados

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Experimentos Integrados para a Melhoria das Aulas Práticas

(Figura 5b) que acreditam haver evidência de

estudados, bem como ferramenta matemática. Por

vários conceitos inseridos nas práticas. Porém, o

fim, observa-se que grande parte dos estudantes

conhecimento prévio pode ser confundido com

aceitou receptivamente a nova metodologia e

o conhecimento científico que o aluno tenha

irá aplicá-la em suas futuras profissões. Além da

adquirido em sala de aula em outras disciplinas e/ou

técnica pedagógica de integração dos experimentos,

em outras situações. Os resultados demonstraram

destaca-se que os resultados experimentais cor-

que 16 % dos entrevistados não aprenderam os

roboraram com os dados da literatura.

diversos conceitos relacionados aos experimentos executados. Entende-se por conhecimento prévio aquele no qual o aluno previamente aprende aquele conteúdo sem o ter estudado cientificamente. Os

4. Considerações

finais

estudantes ainda explicitaram suas impressões

A proposta apresentada sugere integrar

relativas aos experimentos e outras disciplinas

experimentos para atenuar as dificuldades encon-

vistas no curso de graduação. A utilização dos

tradas nas aulas práticas de físico-química, no que

conhecimentos científicos adquiridos em outras

diz respeito à abordagem dos aspectos técnicos e

disciplinas é visível na realização das práticas

pedagógicos dessas aulas.

aqui abordadas, em virtude de que 45% dos entrevistados

acreditaram

nessa

Experimentalmente,

constatou-se

que

informação;

as propriedades de soluções foram modificadas

cerca de 42% intuíram que, de alguma forma,

pela adição de surfactante e, à medida que há um

essa afirmação é verdadeira em contraposição a

aumento da concentração do mesmo à temperatura

13% que revelaram não haver evidência nas aulas

ambiente, ocorre uma elevação proporcional

práticas dos assuntos vistos em outras disciplinas.

da CMC. O aumento da temperatura dificulta

Ressalta-se, ainda, que a associação dos

a formação de micelas, o que é confirmado pela

assuntos vistos na disciplina com os aspectos

necessidade de adição de uma quantidade maior de

utilizados na futura profissão dos estudantes foi

monômeros em solução, à proporção que se eleva a

avaliada e que para 55% dos entrevistados, os

temperatura para que se atinja a CMC. A utilização

temas vistos nas aulas práticas serão utilizados em

de diferentes concentrações de surfactante reduz

sua futura profissão; cerca de 32% têm dúvidas

a tensão superficial de soluções e este efeito foi

sobre essas, enquanto 13% justificam que esses

maior, com o aumento da temperatura.

temas não oferecem os conhecimentos que serão aplicados na futura profissão.

A análise das propriedades de surfactantes em solução pode ser abordada de um modo

A partir dos resultados obtidos, infere-se

amplo quando associada à viscosidade e CMC,

que a metodologia adotada para a integração dos

observando-se haver uma relação direta entre tais

experimentos “Determinação da concentração

propriedades físico-químicas, no comportamento

micelar crítica (CMC) e medida da tensão

termodinâmico de soluções eletrolíticas.

superficial de surfactantes” facilitou a assimilação

Em relação ao objetivo do trabalho, pode-se

de conceitos relativos às propriedades de soluções.

perceber que houve um ganho na assimilação dos

Nota-se que as dificuldades encontradas na

conteúdos das aulas práticas, visando a melhoria da

disciplina Físico-Química II estavam relacionadas

aprendizagem dos conceitos, através da integração

à falta de conhecimento prévio dos temas

de experimentos. Diante da dificuldade de se

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

119


Hélvio Silvester A. de Sousa, Ethanielda de Lima Medeiros e Alcineia Conceição Oliveira

entender os conceitos termodinâmicos aplicados

Este estudo ainda está passando por

como tensão superficial e formação de micelas,

reformulações com vistas às adaptações para

foram também analisadas as limitações dos alunos

outras práticas, não só das disciplinas de Físico­

e, em particular, a motivação para realizar as

‑Química, mas com outras práticas do curso

práticas e o nível de aprendizado, de forma que

de graduação em Química, com o intuito de

a proposta metodológica corroborasse com as

ampliar as possibilidades de relacionar diferentes

hipóteses deste trabalho: facilitar o processo de

experimentos.

ensino-aprendizagem. Verificou-se entrevistados importantes

que

71

consideram para

melhor

%

as

dos

aulas

alunos práticas

compreensão

dos

assuntos abordados em sala de aula, enquanto 45 % dos estudantes estavam motivados a realizar os experimentos práticos de Físico-Química II e, aproximadamente, 80 % deles não encontraram dificuldades na realização dos experimentos abordados neste trabalho. Cerca de 48 % dos entrevistados afirmaram que as aulas práticas

ABREU, M. C.; MASETTO, M. T. O professor universitário em aula. São Paulo: MG Editores, 1987. ADAMSON, A. W. A textbook of physical chemistry. 2. ed. New York: Academic Press, 1979. BARROS, I. C. L.; DOS SANTOS, V. O.; DE OLIVEIRA A. C. S. Revista Brasileira de Ensino de Química, v. 4, p. 163, 2009.

integradas tornaram evidentes os diversos conceitos

BELT, S. T. et al. Chemistry education research and practice, v. 6, p. 166, 2005.

relacionados como propriedades dos surfactantes,

BEHRING, J. L. et al. Quim. Nova, v. 27, p. 429, 2004.

soluções eletrolíticas, fenômenos de superfície e

BIDETTI, B. B. Quim. Nova, p. 1-4, 2011. (No prelo)

aspectos termodinâmicos envolvidos no processo.

BORGES, S. S. S.; CASTILHO, M. G. G. Revista Brasileira de Ensino de Química, v. 2, 2007.

Na opinião de 45 % dos entrevistados, os diversos assuntos estudados em outras disciplinas cursadas por eles, em semestres anteriores, foram associados às aulas práticas e, aproximadamente, 55% dos alunos conseguiram associar os temas vistos nas práticas com os aspectos que serão utilizados na sua futura profissão. No entanto, tiveram dificuldades em associar os temas vistos nas aulas práticas com os diversos assuntos estudados em outras disciplinas cursadas em semestres anteriores. Para 45% dos graduandos, a associação dos temas vistos nas práticas com os aspectos que serão utilizados na sua futura profissão é inexistente. Destaca-se que as análises de um maior nível de abrangência sobre a aprendizagem dos alunos foram mensuradas, através de dados quantitativos e qualitativos, principalmente questionando-os em relação aos motivos das dificuldades, de modo a serem propostas ações para atenuá-las.

120

Referências

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

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Experimentos Integrados para a Melhoria das Aulas Práticas

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

121


Hélvio Silvester A. de Sousa, Ethanielda de Lima Medeiros e Alcineia Conceição Oliveira

MATERIAL SUPLEMENTAR

Figura I. Sistema utilizado para determinar a tensão superficial de um líquido. Fonte: Maniasso (2001).

Figura II. Sistema para medidas utilizando-se o condutivímetro.

1. Você se sente motivado para realizar os experimentos práticos da disciplina Fisico-Química II? Mais ou menos - 42%

45% - Sim 13% - Não

Figura III. Motivação na realização das práticas de Físico-Química II.

122

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Instrumentos e Criatividade 01 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010 | p. 123-132

Construindo um Calorímetro de Água para a Contextualização do Ensino de Química Utilizando a Temática “Alimentos” Building a Water Calorimeter for the Contextualization of Chemistry Teaching Using Food as the Theme Mara Elisa Fortes Braibante1, Hugo Tubal Schmitz Braibante2, Maurícius Selvero Pazinato3 e Marcele Cantarelli Trevisan3

1. Introdução

No ensino de Ciências, específicamente no ensino de Química, há a necessidade de se utilizar agentes facilitadores que promovam a transposição de conceitos científicos, seu formalismo e códigos específicos de representação para a interpretação de situações reais (Tubino et al., 2008). Para atuar de forma significativa no ensino de Química, propusemos neste artigo, como estratégia de

importante ferramenta facilitadora do processo de ensino e aprendizagem. A experimentação pode ser entendida como uma atividade que permite a articulação entre fenômenos e teorias (Silva et al., 2010). Nesse sentido, a utilização de atividades experimentais no ensino de Química é uma necessidade que pode ser desenvolvida para exemplificar a teoria e auxiliar no entendimento dos conceitos.

ensino, a realização de uma atividade experimental,

De acordo com os Parâmetros Curriculares

que busque relacionar os conhecimentos químicos

Nacionais – PCNs (Brasil, 2002), deve-se buscar

com o cotidiano dos alunos.

significado ao conhecimento escolar, mediante a

Desde o século XVIII, a experimentação

contextualização e incentivar o raciocínio e a ca-

no ensino de Ciências é reconhecida como uma

pacidade de aprender. Para isso, os PCNs orientam

1

2

3

Formada em Química Licenciatura pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Doutora em Ciências (Química Orgânica) pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), é professora de Química Analítica do Departamento de Química da UFSM. E-mail: maraefb@gmail.com Formado em Química Industrial pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), é professor de Química Orgânica do Departamento de Química da UFSM. Formado em Química Licenciatura pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), mestrando do Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde pela UFSM. E-mail: mauriciuspazinato@gmail.com


a inserção de temas transversais na educação, dentre

outros (Oliveira, 1996). Uma pesquisa realizada

eles a saúde, que permite uma contextualização e

pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

promove a relação da Química com outras áreas do

(IBGE, 2011) revela que 48,1% dos brasileiros

conhecimento que compõem o currículo básico, a

estão acima do peso e 15% são obesos.

socialização do papel do professor. Dentre as temáticas geradoras do conhecimento químico os “Alimentos” proporcionam ao professor a possibilidade de intervir na realidade

2. Metodologia

dos alunos no sentido de uma melhor formação

Este trabalho foi desenvolvido na forma

cidadã, além de auxiliar na estruturação do ensino

de uma oficina para o 3º ano do Ensino Médio,

e na organização do trabalho escolar. Muitos

utilizando

conteúdos tradicionais do currículo básico das

(Delizoicov; Angotti, 1990), que são relatados a

ciências exatas podem ser abordados utilizando essa

seguir:

temática: na Físico-química pode-se desenvolver o conceito de energia, calcular a energia contida nos alimentos, conversão de unidades e reações endotérmicas e exotérmicas; na Química Orgânica permite-se trabalhar as funções bioquímicas e sua relação com os principais tipos de alimentos (proteínas, carboidratos, lipídeos, vitaminas e sais minerais). A energia necessária para a realização das nossas atividades vitais e diárias provém da nossa alimentação. Os alimentos são o combustível para vida, quando ingeridos são queimados pelo nosso organismo, resultando em energia térmica (calor) e

urbanização, a participação da mulher no mercado

substanciais nos hábitos alimentares da maioria dos brasileiros (Silva, 2000). A consequência desses fatores é uma alimentação baseada em pratos rápidos e práticos como os produtos industrializados e os “fast-food”, os quais muitas vezes não são saudáveis e acabam provocando problemas de saúde, como por exemplo, a obesidade, o colesterol elevado, a gastrite, o diabetes, a hipertensão entre

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

Momentos

Pedagógicos

Segundo Delizoicov e Angotti (1990) são feitas questões problematizadoras, que além de uma simples motivação para introduzir um conteúdo específico, devem fazer um elo desse conteúdo com situações reais que os alunos conhecem ou presenciam, porém não interpretam completamente ou corretamente devido à falta de conhecimentos científicos específicos. As questões problematizadoras feitas foram: •

Para a realização das inúmeras tarefas que temos em nosso dia precisamos de energia para executá-las. Quais são nossas fontes de energia?

Você sabe quanto tempo de atividade física é necessário para gastar a energia

de trabalho, o desenvolvimento da tecnologia e o aumento do comércio, contribuíram para mudanças

Três

Momento Pedagógico: Problematização Inicial

As mudanças históricas observadas nas últimas décadas no Brasil, como o processo de

os

2.1. 1º

energia mecânica (movimentos).

124

desenvolvida

absorvida no consumo de uma maçã? •

Quantas calorias são consumidas quando comemos uma maçã?

Você sabe quais os gastos de calorias nas diferentes atividades do dia a dia?

Os questionamentos tiveram por objetivo fazer um levantamento dos conhecimentos prévios dos alunos sobre o tema, mostrando que as informações deles não eram suficientes para


Construindo um Calorímetro de Água para a Contextualização do Ensino de Química Utilizando a Temática “Alimentos”

esclarecer todas as questões realizadas, sendo necessária a busca de mais conhecimento. Para uma melhor discussão a respeito das perguntas realizadas foi fornecido aos alunos um roteiro da oficina. Além de possuir duas tabelas que informavam a respeito das calorias absorvidas pela ingestão de uma determinada quantidade de alguns alimentos (Tabela 1) bem como os gastos de calorias em diferentes atividades físicas (Tabela 2), esse roteiro ilustrava os Guias Alimentares, que fazem parte de projetos nacionais desenvolvidos por grupos interdisciplinares para a elaboração de programas de educação nutricional (Pacheco, 2006), Roda de Alimentos (Figura 1) e a Pirâmide

da saúde bem como à prevenção de doenças

de Alimentos (Figura 2).

nutricionais importantes como as de variedade,

Alimento

Quantidade

Kilocalorias

Maçã vermelha

1 unid. 100 g

54

Pão francês

1 unid. 100 g

275

Filé mignon

1 unid. 100 g

180

Batata frita

1 porção de 70 g

280

1 unid. 100 g

540

Coca-Cola

1 copo 300 mL

135

Ovo cozido

1 unid. 100 g

178

1 copo 300 mL

100

1 unid. 100 g

361

Cerveja Bolo de chocolate

é um gráfico que ilustra os três grupos alimentares indispensáveis à nutrição dos brasileiros (energéticos, construtores e reguladores) e, no centro da Roda, o estímulo ao consumo de água. A Pirâmide de Alimentos é um instrumento simples, prático e instrutivo, um guia destinado às pessoas saudáveis maiores de dois anos de idade. Foi elaborado em 1999 por um grupo interdisciplinar de pesquisadores ligados a área da saúde, levando em consideração as necessidades alimentares da população brasileira (Pacheco, 2006). Através da visualização da Pirâmide podemos ter noções proporção e moderação. A variedade pode ser

Tabela 1. Calorias dos alimentos.

Chocolate ao leite

relacionadas à alimentação. A Roda de Alimentos

observada entre os diferentes grupos alimentares que compõe a Pirâmide Alimentar, pois nenhum grupo é mais importante que o outro. A proporcionalidade é transmitida pelo tamanho dos grupos e pela indicação do número de porções recomendadas. A moderação pode ser observada pelos integrantes do topo da pirâmide, que devem ser consumidos em quantidades menores.

Fonte: Dorosz (2006).

Tabela 2. Gastos de Calorias em diferentes atividades. Atividade Caminhar

Tempo

Kilocalorias

30 min.

90

Correr rápido

30 min.

510

Pedalar

30 min.

270

Jogar futebol

30 min.

270

Estudar

30 min.

90

Dormir

30 min.

39

Ficar sentado

30 min.

45

Fonte: GIPEC (2006).

Os Guias Alimentares tem o propósito de orientar práticas alimentares que visem à promoção

Figura 1. Roda de alimentos. Fonte: Pacheco (2006).

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

125


Mara Elisa Fortes Braibante et al.

Figura 2. Pirâmide de alimentos. Fonte: Usberco et al. (2006).

O tempo estimado para a realização dessa

os problemas lançados no primeiro momento.

etapa da oficina foi de aproximadamente 20

A realização dessa etapa da oficina teve duração

minutos.

estimada de 40 minutos.

2.2. 2º

2.3. 3º

Momento Pedagógico: Organização do conhecimento De acordo com Delizoicov e Angotti

Consiste em abordar de maneira sistemática

(1990) “os conhecimentos necessários para a

o conhecimento adquirido pelo aluno, permitindo

compreensão do tema central e da problematização

que esse analise e interprete situações iniciais que

inicial serão sistematicamente estudados nesse

determinaram o seu estudo e outras situações que não

momento, sob a orientação do professor”. Os

são as iniciais, mas que são explicadas pelo mesmo

conteúdos abordados foram mudanças de estado

conhecimento (Delizoicov; Angotti, 1990). Nesse

físico, conceito de energia e calor, termoquímica,

instante, o aluno teve a oportunidade de aplicar o que

calorimetria, unidades de energia e funções

aprendeu em aula na prática e em situações reais do

bioquímicas (proteínas, carboidratos, lipídeos).

seu dia a dia, compreendendo que os conhecimentos

Optou-se pela turma de 3º série do Ensino Médio,

científicos têm utilidade na sua vida.

pela possibilidade de também trabalhar conceitos abordados em anos anteriores.

126

Momento Pedagógico: Aplicação do conhecimento

O experimento realizado consiste em estimar a quantidade de energia contida em alguns

A explicação dos conteúdos envolvidos na

alimentos sólidos com alto teor de gordura como,

problematização inicial, bem como a comparação

por exemplo, a noz e a castanha-do-pará. Para

dos conhecimentos prévios dos alunos com os

isso, foi proposto para os estudantes a construção

conhecimentos científicos permitiu que eles

de um aparelho simples que é o calorímetro de

observassem a necessidade de estudar mais sobre

água, que deve ser montado como é indicado na

determinado assunto para que tivessem uma

Figura 3. O principal objetivo desse experimento

melhor compreensão. A partir desse momento os

foi demonstrar na prática os princípios e o funcio-

estudantes puderam interpretar com maior clareza

namento de um calorímetro de água.

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Construindo um Calorímetro de Água para a Contextualização do Ensino de Química Utilizando a Temática “Alimentos”

• O clipe foi fixado no suporte com utilização de fita adesiva; • A amostra de alimento foi prendida no clipe; • O erlenmeyer contendo água foi fixado no suporte, com o auxílio de uma garra; • O termômetro foi prendido em uma garra localizada acima da garra do erlenmeyer para que a leitura fosse realizada; Figura 3. Montagem do calorímetro de água.

• O alimento foi queimado com a utilização de um fósforo ou isqueiro,

Com a utilização de uma quantidade

e, depois de iniciada a combustão, foi

de água conhecida e temperatura previamente

mantida por mais alguns instantes a

medida, provocando uma queima nos alimentos,

chama do fósforo ou do isqueiro perto

a temperatura da água irá aumentar. Através

do alimento para evitar a interrupção da

da medida da variação da temperatura da água

combustão (Figura 4);

podemos determinar quantitativamente a energia desprendida pelos alimentos e transferida para água durante a combustão. Para o desenvolvimento da atividade experimental “Medindo as calorias dos Alimentos”, são necessários os seguintes materiais: • 1 balança; • 1 proveta de 100 mL; • 1 erlenmeyer de 250 mL; • 1 termômetro; • 1 clipe de papel; • Fita adesiva; • 1 lata de compota; • 2 garras; • 1 suporte; • Fósforos ou isqueiro.

Figura 4. Queima do alimento.

São recomendados alimentos que possuam alto teor de gordura, como a noz, para se determinar as calorias.

• Após iniciada a queima do alimento, o erlenmeyer com água foi aproximado

Para a realização dos cálculos que quan­

o mais rápido possível do mesmo, para

tificam a energia desprendida durante a combustão

evitar perdas de calor para o meio; • A lata com fundo removido foi colocada, envolvendo o alimento com a finalidade de proteger os alunos e minimizar as

do alimento utilizado, foi medida a massa do alimento e anotada. Em um erlenmeyer foi medido 100 mL de água da torneira. O calorímetro foi montado como é descrito a seguir:

perdas de calor (Figura 5);

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

127


Mara Elisa Fortes Braibante et al.

Q = m.c. ΔT

(1)

Q = 100 g. 1 cal/gºC. 51 ºC Q = 5100 cal, que equivale a 5,1 Kcal Na equação (1), Q é quantidade de calor, m é a massa da água, c é o calor específico da água e ΔT é a diferença entre a temperatura final e a inicial. Para fazer a conversão das unidades de Figura 5. Proteção do sistema com a lata.

energia de calorias para Joule, utilizamos a se­ guinte relação:

• Quando cessada a chama, estando o ali­­ mento totalmente queimado, foi verifi­

1 cal = 4,18 J

cada a temperatura da água (Figura 6).

Portanto: 1 Kcal _____ 4,18 KJ 5,1 Kcal _____ x x = 21,32 KJ Para determinar os valores energéticos dos alimentos por grama utilizamos a seguinte equação:

Figura 6. Alimento totalmente queimado.

Q=

Quantidade de calorias liberadas Massa do Alimento

Q=

5, 1Kcal = 1, 5Kcal/g 3, 4g Além da realização do experimento com a

Com o intuito de auxiliar na determinação das calorias contidas nos alimentos, anotou-se alguns dados como é mostrado abaixo. As anota­ ções contêm os resultados obtidos experimental­ mente, junto com os alunos, para a noz: • Massa em gramas da noz: 3,4 g; • Massa em gramas da água: 100 g; • Temperatura inicial da água: 27 ºC; • Temperatura final da água: 78 ºC;

128

noz, foi feito o mesmo procedimento para a castanha­ ‑do-pará. O valor calórico calculado juntamente com os alunos para a castanha-do­‑pará foi de 3,5 Kcal/g. Os alunos já haviam sido, previamente, orientados a procurar na literatura os valores calóricos descritos para os alimentos utilizados e, em caso de discordância daqueles determinados no laboratório, sugerir explicações para as mesmas. Os valores obtidos experimentalmente

• Variação de temperatura: 51 ºC.

podem

As quantidades de calorias liberadas na

se deve a erros experimentais como perda de

combustão da noz foram calculadas pela seguinte

calor para o ambiente, diferença da quantidade

relação:

de caloria em um mesmo tipo de alimento,

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

apresentar

algumas

diferenças

dos

valores calóricos indicados pela literatura e isso


Construindo um Calorímetro de Água para a Contextualização do Ensino de Química Utilizando a Temática “Alimentos”

considerando a densidade 1g/cm3 não levando em conta a temperatura, entre outros. Entretanto, a importância da realização desse experimento consiste na demonstração e visualização do

Nº de alunos

ventilação do ambiente, a massa da água utilizada

funcionamento de um Calorímetro de água para

21 18 15 12 9 6 3 0

os alunos. O tempo utilizado para a realização do 3º momento foi de aproximadamente 30 minutos.

15 7 1

0

Muito Pouco Sem Importante Importante Importante Importância

Figura 7. Análise das respostas dos alunos a respeito da importância da temática.

Em relação à visualização dos conteúdos científicos relacionados com a temática, os 3. Resultados

e discussões

Esse trabalho foi desenvolvido com 23 alunos do 3º ano do ensino médio, turno noturno

resultados foram satisfatórios, pois todos os alunos conseguiram ter uma ótima ou boa visualização dos conceitos desenvolvidos em aula.

da cidade de Santa Maria, RS. A oficina com a temática “Alimentos” foi realizada durante os períodos de Química e na própria sala de aula. O

Nº de alunos

da Escola Estadual de Ensino Médio Cilon Rosa

tempo de duração foi de aproximadamente dois períodos (90 minutos). O objetivo experimental era fazer a determinação da quantidade de energia em calorias de um alimento sólido com alto teor de gordura como a noz e a castanha-do-pará. Os

21 18 15 12 9 6 3 0

de calorias, conteúdos científicos e curiosidades sobre o tema. No término da oficina os alunos responderam a um questionário investigativo que

das respostas dos alunos encontra-se ilustrada nos gráficos a seguir. Quando perguntados sobre qual a importância da temática “Alimentos” para a realização da aula de Química, a maioria dos alunos respondeu que o assunto era muito importante. Isso demonstra interesse sobre o tema.

Boa

0 Ruim

Segundo todos os alunos que responderam mentais contribuiu para uma melhor compreensão dos conteúdos.

Nº de alunos

outras duas eram abertas e subjetivas. A análise

Ótima

o questionário, a utilização de atividades experi-

continha sete perguntas, das quais cinco eram objetivas, fechadas e de múltipla escolha e as

11

Figura 8. Análise das respostas dos alunos em relação à visualização dos conteúdos utilizando o tema “Alimentos”.

alunos que participaram da oficina receberam no início um guia da aula com informações, tabelas

12

21 18 15 12 9 6 3 0

21

2 Sim, muito importante

Sim, mas seria dispensável para o entendimento do conteúdo

0 Não

Figura 9. Análise das respostas dos alunos sobre a contribuição de experimentos realizados em aula.

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129


Mara Elisa Fortes Braibante et al.

Quando perguntados se mantinham uma alimentação saudável, grande parte dos alunos

Nº de alunos

respondeu não, como ilustra o gráfico:

21 18 15 12 9 6 3 0

16

7

Sim

Não

Figura 10. Análise das respostas dos alunos quando questionados a respeito de seus hábitos alimentares.

Já em relação à frequência que praticam exercícios físicos durante a semana, a resposta foi dividida. Mas observa-se que a maioria faz exercícios pelo menos uma vez por semana.

Na última pergunta do questionário foi solicitado para os alunos que sugerissem outros temas para as aulas de Química. Algumas das temáticas citadas foram: “cabelos, chás, cosméticos, ação do ácido nos alimentos, gases poluentes, produtos químicos de limpeza, exercícios físicos e academia, bombas de fumaça, bombas de efeito moral e bombas caseiras”.

4. Considerações

finais

Através da realização dessa oficina podemos constatar que a utilização da temática “Alimentos” é uma estratégia eficaz no ensino de Química, pois foi capaz de aproximar os conteúdos científicos da realidade dos alunos. A metodologia adotada, os três momentos pedagógicos, proporcionou uma aula dinâmica e atrativa envolvendo os estudantes

Nº de alunos

em todas as etapas. Dessa forma, a participação 21 18 15 12 9 6 3 0

dos alunos e a interação com o professor durante a oficina permitiu a realização de trocas de 5

8

Não prático 1 a 2 vezes

7

3 3 vezes

mais que 3 vezes

Figura 11. Análise das respostas dos alunos em relação ao número de atividade físicas realizadas por eles durante a semana.

conhecimentos, experiências e ideias favorecendo o processo de aprendizagem. Após a realização do experimento, podemos observar grande entusiasmo e interesse dos alunos sobre o tema. Isso comprova a eficácia de atividades experimentais para o bom desenvolvimento de uma aula de Química. Outro aspecto importante na abordagem dessa temática nas escolas foi discutir

Em relação às perguntas subjetivas, as respostas foram bastante variadas, embora dois alunos não tenham respondido a essas questões. Quando consultados sobre o que mais chamou a atenção na aula com a temática “Alimentos” algumas respostas foram: “o experimento, medir as calorias dos alimentos, as tabelas de calorias, ajuda a ter uma alimentação controlada, os guias alimentares e os problemas de saúde causados pela má alimentação”.

130

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

sobre os hábitos alimentares da população brasileira e dos próprios alunos. Em relação aos estudantes que assistiram à oficina, a maioria revelou não ter uma alimentação equilibrada e saudável. Muitos alunos não sabiam da existência dos Guias Alimentares e não tinham noção das quantidades calóricas de muitos alimentos por eles consumidos diariamente. Assim, esta oficina além de abordar os conteúdos tradicionais de Química explorou os problemas de saúde causados pela má alimentação.


Construindo um Calorímetro de Água para a Contextualização do Ensino de Química Utilizando a Temática “Alimentos”

Referências BRASIL. Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Parâmetros Curriculares Nacionais – Ensino Médio: Orientações Educacionais Complementares aos parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/SEMTEC, 2002. DELIZOICOV, D.; ANGOTTI, J. A. P. Metodologia do ensino de ciências. São Paulo: Editora Cortez, 1990. DOROSZ, P. Tabelas de calorias e regimes de emagrecimento. 4. ed. Barueri: Manole, 2006. GIPEC. Alimentos: produção e consumo. Ijuí: Unijuí, 2006.

PACHECO, M. Tabela de Equivalentes, Medidas Caseiras e Composição Química dos Alimentos. Rio de Janeiro: Livraria e Editora Rubio LTDA, 2006. SILVA, M. V. Consumo de alimentos, programas de suplementação e estado nutricional de escolares. Curso de atualização em alimentação e nutrição para professores da rede pública de ensino. São Paulo: FAPESP, 2000. SILVA, R. R.; MACHADO, P. F. L.; TUNES, E. Ensino de Química em foco: Experimentar sem medo de errar. Ijuí: Unijuí, 2010.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa. Disponível em: <http:// www.ibge.gov.br>. Acesso em: 15 abr. 2011.

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Oliveira, J. E. D.; Cunha, S. F. C.; MARCHINI, J. S. A desnutrição dos pobres e ricos: dados sobre a alimentação no Brasil. São Paulo: Sarvier, 1996.

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

131



História da Química 01 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010 | p. 133-134

Schrödinger Não Acreditava em Sua Equação RFF e JMF

Os modernos modelos explicativos da formação das ligações químicas são modelos baseados na mecânica quântica. Nesses modelos, as funções de onda dos diferentes orbitais tem sua origem na equação de Schrödinger (equação diferencial). Por sua vez, a famosa Equação de Schrödinger, marco inicial da Mecânica Ondulatória, tem seu ponto de partida quando o físico francês, o Príncipe Louis Victor Pierre Raymond de Broglie (1892-1987)1 apresentou nos Comptes Rendus de l´Academie des Sciences de Paris 179, p. 39, em 1924, sua interpretação ondulatória da matéria: o elétron descreve uma “onda-piloto” em sua órbita Bohriana. Tal interpretação, a princípio, causou um certo ceticismo por parte dos físicos. Ao ler esse trabalho de Broglie (que iniciou sua carreira acadêmica como estudante de História Medieval), o físico e químico holandês Petrus Joseph Wilhelm Debye (1884-1966)2 sugeriu ao físico austríaco Erwin Schrödinger (1887-1961) – o qual ganharia o Nobel de Física de 1933 – que este fizesse um seminário sobre as ideias do Príncipe francês. Imediatamente Schrödinger recusou, dizendo: “Eu não quero falar sobre tal ‘nonsense’”. Porém, como Debye era o chefe do grupo de pesquisa, do qual participava Schrödinger, ele enfatizou que esse seminário era importante para a formação do referido grupo. Schrödinger, então, aceitou e prometeu apresentar as ideias de de Broglie em uma forma matemática mais compreensível. E assim o fez, propondo a hoje famosa Equação de Schrödinger: H} (r ) = E} (r ) onde H é o operador Hamiltoniano (soma das energias potencial e cinética), E é a energia do elétron em uma órbita atômica estacionária e } (r ) é a função de onda de Schrödinger.

1

Prêmio Nobel de Física de 1929.

2

Prêmio Nobel de Química de 1936.

Schrödinger


Schrödinger Não Acreditava em Sua Equação

Porém, segundo Debye contou ao físico russo Piotr Leonidovich Kapitza (1894-1984)3 por ocasião da apresentação do seminário de Schrödinger sobre esse assunto, este não estava muito convicto da equação que estava propondo. Foi Debye, presente a esse seminário, quem disse a Schrödinger, ao término de sua “lecture”: “Você fez um trabalho extraordinário”. Debye

3

134

Prêmio Nobel de Física de 1978.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


História da Química 02 | Volume 05 | Número 1/2 | Jan./Dez. 2010 | p. 135-138

Um Pouco da História da Guerra Química RFF

Quando se fala em armas químicas, fica subentendido que se está a falar de substâncias químicas que interajam diretamente com as vítimas, via sistema respiratório, por exemplo, pois, em última análise, a maior parte das armas são químicas, visto que utilizam-se de explosivos ou de elementos químicos radioativos. Dos pontos de vista tático, estratégico e tecnológico, a I Guerra Mundial foi uma espécie de híbrido entre o modo de guerrear dos séculos XIX e XX. Ou antes, tendo-se iniciado, dos pontos de vista tático, estratégico e tecnológico como uma guerra do século XIX, ela logo incorporaria características que marcariam a guerra do século XX, e que permanecem até hoje. Seria na primeira Guerra Mundial que surgiriam, por exemplo, os tanques de guerra (inicialmente pouco mais do que tratores adaptados), dando início ao que se convencionaria chamar “cavalaria mecanizada” (ou motorizada). Uniformes camuflados, o uso extensivo e intensivo da artilharia, a consolidação do capacete como peça obrigatória no campo de batalha e as armas químicas estariam entre as novidades. O gás cloro (fórmula Cl2) à temperatura e pressão ambientes é um gás

amarelo­‑esverdeado. Ao ser inalado, o gás termina por gerar a formação de grande quantidade de fluidos nos pulmões, fazendo com que a vítima “se afogue” nos seus próprios líquidos.

Uma das grandes forças da arma química está, além do seu efeito físico propriamente dito, é claro, na sua força psicológica. Dada a sua própria natureza, a substância gasosa não pode ser tocada, da mesma forma que podemos tocar um fuzil, por exemplo, ou mesmo vista (dependendo de sua natureza, sua concentração na atmosfera etc.). Logo, termina por causar, entre os combatentes, um terror bem maior do que o provocado por bombardeios, por exemplo, contra os quais sempre temos alguma proteção (ou ao menos ilusão de proteção) física. Uma vez verificada a eficácia dos gases como armas de guerra, passou-se do simples uso de uma substância já existente (como o cloro), para o desenvolvimento (sínteses e teste) de outras, como o famigerado “gás mostarda”. O gás mostarda1 é 1

O gás mostarda, C4H8Cl2S (menos conhecido como iperita) além disso, é um bom exemplo de que os alemães não foram absolutamente, os primeiros a produzir gases com fins (ou que poderiam para esse fim ser empregados) bélicos, visto que foi produzido pela primeira vez na Inglaterra, em 1822.


Um Pouco da História da Guerra Química

menos mortal que o cloro, causando a formação de bolhas (vesículas, pústulas) na pele e sendo acondicionado dentro de projéteis. Até o fim da Guerra, gases como bromo, Br2 (do mesmo grupo químico do cloro) e fosgênio (fosfogênio: COCl2),

seriam também empregados.

Unidade americana equipada com máscaras contra gases (I Guerra Mundial)

Os alemães seriam os primeiros a utilizar gases como arma de guerra: primeiramente em 1914, em Neuve-Chapelle, mas as quantidades de gás colocadas no interior dos projéteis foram muito poucas, não surtindo qualquer efeito. Já em 1915, o brometo xílico (gás lacrimejante) foi empregado, em Bulimov (no front Russo), em quantidade suficiente para surtir efeito, mas o frio intenso terminou por congelar o gás, anulando, assim, suas consequências. Ainda em 1915, na segunda batalha de Ypres2, decidiu-se pelo uso do cloro. Ao invés de ser colocado no interior de projéteis, cilindros do gás (como os que podemos encontrar nos laboratórios de química) foram transportados para a linha de frente e abertos quando as condições do vento tornaram-se favoráveis. Enquanto as máscaras contra gases não eram introduzidas, os soldados improvisavam lenços embebidos em urina como proteção (a amônia presente na urina reage com o cloro, formando cloreto de amônio, e, assim, além de constituir­ ‑se numa barreira física, o lenço embebido em urina constituía-se numa barreira química contra o cloro). Tendo-se em vista a eficácia do gás, já em setembro do mesmo ano os britânicos estariam utilizando o cloro (em 25 de setembro, na batalha de Loos). Para infelicidade deles, o vento voltou-se em sua direção, e os danos só não foram 2

136

Houveram três batalhas de Ypres: 1914, 1915 e 1917.

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Um Pouco da História da Guerra Química

maiores por que máscaras contra gases de razoável eficiência já haviam sido desenvolvidas e equipavam o exército britânico.

Máscara contra gases utilizada na I Guerra Mundial.

Do que apresentou-se até aqui depreende-se que Fritz Haber (1868-1934) não foi o primeiro nem o único a implementar o uso de armas químicas, de forma que sua posição de “pai das armas químicas” e, em função disso, sua execração por parte da comunidade científica, deve-se a um daqueles caprichos da história, tão comuns. Muito embora tenha sido dele a proposição do uso do cloro, e ele pessoalmente tenha inspecionado seu emprego e convencido o alto comando alemão da oportunidade tática e estratégica de sua utilização, o rápido emprego subsequente dos gases de guerra feitos pelos aliados apenas atesta que Haber estava certo, do ponto de vista estritamente técnico, e que mais cedo ou mais tarde alguém teria tomado a iniciativa.

Fritz Haber com uniforme do exército alemão (I Guerra Mundial).

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2

137


Um Pouco da História da Guerra Química

Einstein, por exemplo, não recebeu a alcunha de “pai das armas nucleares”, muito embora sua carta ao presidente Roosevelt tenha sido decisiva para a implementação do projeto Manhattan (que culminaria com a produção das bombas que seriam lançadas sobre Hiroshima a Nagazaki) e sua célebre equação E = mc2 ser a base explicativa para o grande poder de destruição daquele tipo de armas. Tendo sido responsáveis por apenas 3% das mortes durante a Primeira Guerra Mundial, os gases como armas de guerra foram oficialmente abolidos em 1925, muito embora usos de armas químicas sejam ocasionalmente reportadas, como no caso mais recente (em 2009) das denúncias do uso dessas armas na ofensiva israelense contra os palestinos na faixa de Gaza.

138

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número1/2


Resenhas

MAIA, Daltamir. Práticas de química para engenharias. Campinas: Átomo, 2008.

Em todas as áreas, é uma crítica comum (e pertinente) que, via de regra, os conteúdos ministrados em boa parte das disciplinas, em um determinado curso, o são fora de contexto, de forma que os estudantes terminam por não entender qual a finalidade do que é ministrado e, pior ainda, mesmo quando aprovados com “boas notas”, não conseguem, posteriormente, aplicar os conhecimentos adquiridos em determinadas disciplinas às necessidades de sua vida profissional. No tocante à Química, a sua presença, e consequente importância, se faz sentir não apenas na Engenharia Química (presença por demais óbvia), mas também, e de forma significativa, nas Engenharias Ambiental, Florestal, de Materiais, do Petróleo, Mecânica e Civil, dentre outras. Elaborar um bom programa para as disciplinas de Química para os semestres iniciais dos cursos de Engenharia significa estabelecer o melhor compromisso possível entre conhecimentos básicos (no sentido de conhecimentos fundamentais para o bom entendimento da química) e conhecimentos que, embora da área de química, sejam necessários (por que se inserem no contexto) para os estudantes das Engenharias. Na elaboração deste livro, foi assumido que o aluno possui conhecimentos básicos de Química, adquiridos no ensino médio. Contudo, sempre que necessário, esses conhecimentos são reapresentados, na medida (extensão e profundidade) e no momento em que se façam oportunos. Nesse sentido, o glossário apresentado ao final do livro e mesmo as notas de rodapé funcionam como oportunidades para aumentar o volume de conhecimentos apresentados. Na busca pela contextualização e interdisciplinaridade, buscou-se introduzir, sempre que possível e oportuno, notícias de jornal ou matérias de revistas especializadas, a fim de que o aluno (futuro engenheiro) adquira, desde cedo, a capacidade de inter relacionar os conhecimentos adquiridos nas disciplinas de Química com o dia a dia da sua profissão.

ZUIN, Vânia Gomes. A inserção da dimensão ambiental na formação de professores de química. Campinas: Átomo, 2010.

A Química – ao lado da Biologia, da Geociência, dentre outras – constitui-se como um campo fundamental para a compreensão da natureza complexa do ambiente natural e artificial. A inserção da dimensão ambiental na formação de professores de Química é uma preciosa iniciativa da professora Vânia Zuin, em que se propõe uma reestruturação curricular na universidade, oferecendo ao estudante conhecimentos, valores e habilidades


Resenhas

que lhe permitirão uma participação responsável na prevenção e solução de problemas ambientais, para além dos muros das escolas e universidades. O livro apresenta uma proposta consistente que, paulatinamente, deverá superar as dificuldades de ordem prática e institucional e, principalmente, contrastar as concepções correntes sobre a formação de professores de Química.

140

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 05 | Número 1/2


Normas para Publicação Revista Brasileira de Ensino de Química (ReBEQ) é uma publicação semestral da Editora Átomo que aceita colaborações em forma de artigos, resenhas, relatos de experiência, notícias e memória fotográfica da Química no Brasil. Os textos poderão ser publicados em português e espanhol. Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo, necessariamente, a opinião ou pensamento da coordenação e conselho editoriais. Os originais submetidos a análise do Comitê Científico serão encaminhados a, no mínimo, dois conselheiros do seu corpo editorial, os quais avaliarão de forma específica e decidirão sobre a pertinência dos textos à linha editorial da revista. Em caso de necessidade de revisões de conteúdo ou adequações às normas editoriais, o autor receberá os pareceres dos conselheiros, ficando, assim, responsável pela reapresentação do trabalho reformulado no prazo de 45 dias, contados a partir da data de recebimento da comunicação. O anonimato entre autores e conselheiros, durante o processo de arbitragem dos textos, é garantido pelo Comitê. O prazo médio estipulado para a apresentação do resultado final é de até 60 dias, a contar da data de recebimento do texto. Os trabalhos não aprovados pelos conselheiros, ou não devolvidos no prazo estipulado para reformulação, serão arquivados e os autores informados.

Sobre a apresentação de originais para avaliação Ao encaminhar os trabalhos para análise do Comitê Científico, os autores deverão observar as seguintes orientações: 1. Originalidade e ineditismo dos textos: o autor deve enviar, junto com o trabalho, uma declaração na qual se compromete a não apresentá-lo, simultaneamente, em outro periódico, durante o prazo estipulado para avaliação, e autoriza a sua publicação nesta revista; 2. As colaborações devem ser redigidas em português ou espanhol. Em casos excepcionais, cuja pertinência será analisada pelo Comitê, serão aceitos textos em inglês e francês, que deverão ser traduzidos para a língua portuguesa; 3. Em folha à parte, devem ser informados os dados de autoria: título do trabalho, nome completo, vinculação institucional, formação acadêmica e endereço residencial ou institucional do autor (incluindo telefone e e-mail) para o encaminhamento de correspondência pela Secretaria de Redação;


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