ISSN 1809‑6158
VOLUME 08 | NÚMERO 01 | JAN./JUN. 2013
VOLUME 08 | NÚMERO 01 | JAN./JUN. 2013
Coordenação Editorial Pedro Faria dos Santos Filho – UNICAMP Robson Fernandes de Farias – UFRN Wilon Mazalla Jr – Editora Átomo Conselho Editorial Adriana Vitorino Rossi – UNICAMP Gláucia Maria da Silva – USP|RP Marcelo Carneiro Leão – UFRPE Mário Sérgio Galhiane – UNESP Osvaldo Antonio Serra – FFCLRP-USP Ótom Anselmo de Oliveira – UFRN Sérgio Melo – UFC Yassuko Iamamoto – USP
Revista Brasileira de Ensino de Química (ReBEQ) é uma publicação semestral da Editora Átomo e colaboradores. Dentro do espírito maior da editora, que é a difusão do conhecimento por meio da democratização das valiosas pesquisas e avanços científico-educacionais, quase sempre em latência nas boas universidades, e pelo intercâmbio de ideias e experiências daqueles que participam do processo ensino/aprendizagem, a ReBEQ inaugura novo espaço, abrindo suas páginas para pesquisadores, docentes (ensino médio e superior), alunos de graduação e pós-graduação, com a visão de que o conhecimento deve ser construído e compartilhado coletivamente. O conhe cimento contemporâneo deve ser apresentado de forma inter/ transdisciplinar trazendo preocupações como a ética, o meio ambiente e a humanização dos processos e serviços. Centrada nas questões ensino/aprendizagem, visa contribuir para a atuali zação e otimização do Ensino de Química.
Conselho Ad hoc Marlon Herbert F. B. Soares – UFG Nidia Franca Roque – UFBA Viviani Alves de Lima – UFU Revista Brasileira de Ensino de Química rebeq@atomoealinea.com.br www.atomoealinea.com.br/rebeq
Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas e Informação PUC-Campinas Revista Brasileira de Ensino de Química Campinas, SP: Editora Átomo, 2006 v. 1, n. 1, jun./jun. 2006 Semestral Publicação científica-educacional
Revisão Helena Moysés Capa e Editoração Eletrônica
1. Química – Periódicos. 2. Ciências exatas – Periódicos.
Fabio Diego da Silva
CDD 540
Patrícia Lagoeiro Indexada
Índice para Catálogo Sistemático 1. Química
540
A division of the American Chemical Society Pede-se permuta. - Pide-se cange. We ask for exchange. - On demande l’echange. Si sollecita intercambio. Wir bitten un aurstausch un publikationen.
Rua Tiradentes, 1053 - Guanabara - Campinas-SP CEP 13023-191 - PABX: (19) 3232.9340 e 3232.0047 www.atomoealinea.com.br
VOLUME 08 | NÚMERO 01 | JAN./JUN. 2013
Sumário
7 Editorial Artigos
9
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio e formação inicial de professores de química Ivan Araújo Mariano, Daniela Gonçalves de Abreu, Thiago de Souza Cavallini e João Ricardo Sanchez
23
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais Kaio Vinícius da Costa e Silva e Agnaldo Arroio
35
Energia Versus Poluição Atmosférica: uma oficina temática para o Ensino de Química Ediane Machado Wollmann e Mara Elisa Fortes Braibante
Relatos de Experiência
45 53
67
81
A Simbologia na Linguagem Química Emerson Luis Pires
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo Maria Alice Reis Pacheco e Pedro Faria dos Santos Filho
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica Ana Paula Sebastiany, Ivan Francisco Diehl e Michelle Camara Pizzato
O Ensino de Química Durante a Trajetória Escolar de Alunos do Curso Subsequente em Técnico de Alimentos Juliana de Medeiros Franco Lima, Daguia de Medeiros Silva, Ana de Fátima Costa da Silva, Francisca Edileuza da Silva e Emanuele de Araújo Santos
89
99
Aulas de Química: uma busca pela implantação de aulas experimentais Keila Cruz Moreira, Daguia de Medeiros Silva, Jeovane Jefferson Soares de Oliveira e Ana de Fátima Costa da Silva
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública Dirceu Donizetti Dias de Souza, Agnaldo Arroio e Karen Cacilda Weber
História da Química
111
A “Alquimia” de Rutherford e as Descobertas do Próton, do Nêutron, da Radioatividade Artificial e da Fissão Nuclear José Maria F. Bassalo e Robson F. de Farias
115 Resenha
117
Normas para Publicação
Contents
7 Editorial Articles Activities: possibilities for science education for students of secondary 9 Extension education and initial training of chemistry teachers Ivan Araújo Mariano, Daniela Gonçalves de Abreu, Thiago de Souza Cavallini e João Ricardo Sanchez
23
Elements of the Nature of Science: a proposal for integration by audiovisual productions Kaio Vinícius da Costa e Silva e Agnaldo Arroio
35
Energy Versus Air Pollution: a thematic workshop for the Chemistry Teaching Ediane Machado Wollmann e Mara Elisa Fortes Braibante
Experiences Account
45 53
67
81
The Symbology in Chemistry´s Language Emerson Luis Pires
Teaching Stoichiometry Through Video Maria Alice Reis Pacheco e Pedro Faria dos Santos Filho
Analysis of Ideas from Students about Electric Conductivity Ana Paula Sebastiany, Ivan Francisco Diehl e Michelle Camara Pizzato
The Chemistry Teaching During the School Career of Students of the Técnico de Alimentos Course Juliana de Medeiros Franco Lima, Daguia de Medeiros Silva, Ana de Fátima Costa da Silva, Francisca Edileuza da Silva e Emanuele de Araújo Santos
89
99
Chemistry Classes: a quest for the implementation of experimental classes Keila Cruz Moreira, Daguia de Medeiros Silva, Jeovane Jefferson Soares de Oliveira e Ana de Fátima Costa da Silva
The Discussion on Pesticides in View of a Visual Narrative Production Performed by Students of a Public School Dirceu Donizetti Dias de Souza, Agnaldo Arroio e Karen Cacilda Weber
History of Chemistry
111
The “Alchemy” of Rutherford and the Discoveries of the Proton, the Neutron, the Artificial Radioactivity and the Nuclear Fission José Maria F. Bassalo e Robson F. de Farias
115 Review
117
Editorial Standards
Editorial
A geração atual de estudantes foi educada com os recursos da informática. Os alunos aprenderam a serem rápidos e imediatistas e acostumaram-se às imagens geradas pelos computadores; o real e o virtual passaram a ocupar os mesmos espaços. Esta situação foi transferida para as escolas e uma nova geração de professores começou a ser preparada para atender essa juventude que respira os avanços tecnológicos e anseia por novas estratégias de ensino. Há algum tempo a ReBEQ acenou para esta realidade dedicando parte de um número aos trabalhos que abordavam a utilização de recursos de informática no ensino de química. Além disso, a grande maioria dos trabalhos publicados até agora enfatizam novas estratégias, que envolvem a produção de filmes, crônicas, jogos educativos, gincanas e até olimpíadas de química, na tentativa de atender aos alunos atuais. O número de relatos de experiência em sala de aula descritos até agora é surpreendente. Esta mudança de paradigma não está associada apenas aos alunos, mas a toda a comunidade. No passado existia aquele estereótipo do cientista experimentalista, que passava a maior parte do tempo em laboratórios, tentando descobrir algo novo a partir de experimentos minuciosamente planejados; entretanto, a realidade avança. O planejamento teórico, a partir de cálculos computacionais já virou rotina. Os cientistas passam muito mais tempo diante de computadores do que nos laboratórios. As simulações precedem, frequentemente, a prática de laboratório e o que era difícil de ser executado experimentalmente passou a ser calculado. A prova mais recente de tudo isso foi anúncio do Prêmio Nobel de Química 2013; os três pesquisadores laureados desenvolveram extraordinários programas, em que os modelos de computador espelham os processos vitais e a fenomenologia, de maneira geral. Esta prática revolucionou as pesquisas em Química e, hoje, impulsiona a maioria dos avanços da área. Não somente nos laboratórios de pesquisa, mas também nas salas de aula houve uma mudança marcante de postura, tanto por parte dos professores quanto dos alunos. Os professores estão sendo obrigados a se atualizar com as novas ferramentas de ensino e com os novos recursos de informática que lhe permitem mostrar o que antes tinha que ser apenas imaginado. Hoje já se fala em laboratórios virtuais, os experimentos já são filmados e reproduzidos para os alunos nas salas de aula e os materiais digitais, interativos ou não, já estão sendo inseridos nos livros didáticos. Esta é uma tendência irreversível e que marcará a trajetória de alunos e professores. Como no Brasil a inserção destes novos recursos didáticos e o acesso aos recursos de informática ainda é um pouco insipiente, a ReBEQ vem tentando estimular os
seus leitores a divulgarem suas experiências com estes novos recursos, de forma a compartilhar o conhecimento adquirido com toda a comunidade de professores e alunos que se dedicam ao ensino/aprendizagem de química. Somente com a divulgação de nossos erros e acertos é que nossa comunidade evoluirá e acompanhará esta mudança no cenário mundial.
Coordenação Editorial
ARtIGO 01 | VOLUME 08 | NÚMERO 01 | JAN./JUN. 2013
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio e formação inicial de professores de química Extension Activities: possibilities for science education for students of secondary education and initial training of chemistry teachers Ivan Araújo Mariano1 Daniela Gonçalves de Abreu2 thiago de Souza Cavallini3 João Ricardo Sanchez4 RESumO
Tendo em vista que a formação é um processo interativo e complexo e partindo da compreensão que a participação em outras atividades, além daquelas propostas nas disciplinas do currículo do curso, tem muito a contribuir com a formação e o desenvolvimento profissional docente, neste trabalho pretende-se: a) identificar e caracterizar algumas atividades desenvolvidas pelo CEIQ (Centro de Ensino Integrado de Química), dando ênfase para as Olimpíadas Regionais de Química; b) elencar e discutir possíveis contribuições das olimpíadas para o ensino de ciências nas escolas de Ribeirão Preto e região, bem como investigar as ações ocorridas nas escolas de educação básica em decorrência da VI ORQ, Química e Energia: Movendo a Humanidade (2008) e c) analisar a participação de licenciandos em 1
Mestrando pelo Programa de Pós-graduação Multiunidades em Ensino de Ciências e Matemática da Unicamp-PECIM; Instituto de Química, UNICAMP.
2
Professora da área de Ensino de Química do Departamento de Química da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Coordenadora do Centro de Ensino Integrado de Química (CEIQ), desde 2007.
3
Técnico do Departamento de Química da FFCLRP/USP atuante no CEIQ e membro da Comissão Organizadora da Olimpíada Regional de Química.
4
Mestrando do programa de Pós-graduação em Química pelo Departamento de Química da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto/USP-Ribeirão Preto. Ex- estagiário de Centro de Ensino Integrado de Química (CEIQ).
p. 9-22
Química nas diversas atividades de extensão promovidas pelo CEIQ a fim de discutir habilidades agregadas à formação destes. Para obtenção dos resultados, documentos do CEIQ foram analisados e alunos de ensino médio e licenciandos de Química foram entrevistados. Os resultados indicam a maior proximidade dos alunos de ensino médio com a ciência como forma de complementação de sua educação científica, por meio das Olímpiadas. Pode-se dizer também que as atividades de ensino, de maneira geral, contribuem para as ações de ensino do professor em sua formação inicial, propiciando uma formação profissional plural e significativa. Palavras-chave: Formação inicial. Extensão. Olimpíadas. Ensino de ciências. Abstract
Given that education is a complex and iterative process and based on the understanding that participation in activities other than those proposed in the disciplines of the course curriculum has much to contribute to the training and professional development of teachers, this study aims to: a) identify and characterize some activities developed by CEIQ (Center for Integrated teaching of Chemistry), emphasizing the Olympics Regional Chemistry, b) to list and discuss possible contributions of the Olympics for the teaching of science in schools of Ribeirão Preto and region as well as how to investigate the actions occurring in elementary schools due to ORQ VI, “Chemical and Energy: Moving Humanity” (2008) and c) analyze the participation of undergraduate chemistry students in various extension activities promoted by CEIQ to discuss aggregate their training skills. To obtain the results, CEIQ documents were analyzed, and high school students and undergraduate chemistry students were interviewed. The results indicate the proximity of high school students with science as a way to complement their science education through the Olympics. One can also say that the teaching activities in general contribute to the actions of the teacher in their initial teaching providing a vocational and meaningful training. Key-words: Training. extension. Olympics. Science teaching.
1. Introdução
Para Nogueira (2000), a extensão como prática acadêmica visa propiciar a articulação do ensino e da pesquisa com demandas sociais. Em 1996 foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) que afirma no Capítulo IV, art. 43, p. 23, que é finalidade da Educação Superior promover a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição. Em acordo com a LDB, Instituições de Ensino Superior têm promovido atividades de extensão de forma a disponibilizar o conheci-
10
forte influência de Projetos Curriculares desenvolvidos nos Estados Unidos (Fahl, 2003). Segundo Maurício (1992) eram objetivos dos primeiros centros de ciências brasileiros: dar assistência permanente aos professores de ciências exatas e naturais, promover seminários, debates e conferências sobre temas relacionados com o aprimoramento do ensino das ciências exatas e naturais, realizar cursos destinados a aprimorar os conhecimentos dos professores e aperfeiçoar as técnicas de ensino, entre outros. No início da década de 1990, numa época em que o Curso de Química do Departamento de Química da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São
mento produzido em seus espaços para o público
Paulo (FFCLRP-USP) era pouco procurado, foi
em geral. Neste cenário, os museus e centros de
criado o Centro de Ensino Integrado de Química
ciência têm tido papel fundamental.
(CEIQ). Inicialmente, o objetivo principal deste
O surgimento dos Centros de Ciência no
Centro era contribuir com o desenvolvimento de
Brasil se deu nas décadas de 1950 e 1960 e teve
atividades de extensão universitária, especial-
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio...
mente aquelas voltadas à promoção e à divulgação
ciências nas escolas de Ribeirão Preto
da ciência e tecnologia nas escolas da Região.
e região, bem como investigar as ações
A formação é um processo interativo e com-
ocorridas nas escolas de educação básica
plexo, que requer uma sólida organização e prepa-
em decorrência da VI ORQ, Química
ração teórico-metodológica e didático-pedagógica e
e Energia: Movendo a Humanidade
uma trajetória acadêmica dos licenciandos em quí-
(2008) e
mica em diversos âmbitos de formação, experiências
c) analisar a participação de licenciandos
e vivências com relação à profissão. Licenciandos em
em Química nas diversas atividades de
Química, bem como professores da área de ensino e
extensão promovidas pelo CEIQ a fim
de outras áreas da Química e também técnicos têm
de discutir habilidades agregadas à for-
participado das atividades de extensão do CEIQ.
mação destes.
A educação em ciências não se limita mais somente à sala de aula no âmbito da escola; além disso, os centros de ciências são locais que podem promover o aprendizado e gosto pelas ciências,
2. Fundamentação
teórica
contribuindo para popularizar o conhecimento
Para Santos e Schnetzler (2003), conside-
cientifico e tecnológico, já que muitas vezes a
rando que a cidadania se refere à participação dos
escola possui muitos dos recursos tecnológicos
indivíduos na sociedade, torna-se evidente que,
oferecidos por estes centros.
para o cidadão efetivar a sua participação comu-
De acordo com Rossi e Ferreira (2008), a
nitária, é necessário que ele disponha de informa
Quí mica, particularmente, tem grande potencial
ções, que estão diretamente vinculadas aos pro
para o desenvolvimento de atividades de estágio de
blemas sociais que o afetam, os quais exigem um
licenciandos em espaços de educação não-formal e
posicionamento quanto ao encaminhamento das
de divulgação científico-cultural, como os centros
soluções. Para estes autores, a química se enqua-
e museus de ciências. Com relação aos Cursos de
dra em tais condições. E ainda para Chassot (2003,
Licenciatura em Química, as Diretrizes Curricu
p. 49), a cidadania só pode ser exercida plenamente
lares (Parecer CNE/CES 1303/2001) estabelecem
se o cidadão tiver acesso ao conhecimento (e isto não
que o licenciando deva ter tempo e ser estimulado
significa apenas informações).
a buscar o conhecimento por si só, devendo partici-
Podemos dizer que os objetivos das ORQ
par de projetos de pesquisa e desenvolver práticas
são muito próximos daqueles propostos para um
extensionistas, dentre outras coisas. Assim, com o
ensino CTS, ou seja, pretende-se incentivar e
entendimento do CEIQ como espaço profícuo tanto
preparar os alunos para o debate – uma educação
para a educação científica do aluno de ensino médio,
para a discussão – desenvolver a faculdade de jul-
como para a formação do aluno de Licenciatura em
gamento; conscientizar e discutir nossos direitos e
Química, neste trabalho pretende-se:
deveres na sociedade, desenvolvimento de valores
a) identificar e caracterizar algumas ativi-
éticos e também possibilitar que o conhecimento
dades desenvolvidas pelo CEIQ (dando
químico não seja o fim, mas o meio por meio do
ênfase para as Olimpíadas Regionais de
qual, pode-se formar o indivíduo para o exercício
Química);
consciente da cidadania.
b) elencar e discutir possíveis contribui
As atividades desenvolvidas pelos licen-
ções das olimpíadas para o ensino de
ciandos em Química, nesses espaços, se consti-
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
11
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio...
tuem em saberes experienciais importantes para a
textos próprios de sua futura atuação profissional,
formação dos professores, pelo fato de envolverem
podendo aumentar seu repertório de ações, esque-
diferentes saberes em um contexto de educação e
mas e atitudes que possam auxiliá-los na docência.
divulgação científica bastante peculiar. Isto requer que o licenciando pense e atue de modo crítico e ativo em um universo em que as relações entre diversos conhecimentos são tão presentes, exigindo uma visão de mundo ampla e articulada com sua formação científica. Com relação à formação inicial de professores, Morin (2006) afirma que o conhecimento progride, principalmente, pela capacidade de contextualizar e globalizar. O conhecimento, só é conhecimento enquanto organização, relacionado com as informações e inserido no contexto. As atividades de extensão auxiliam na superação da inadequação de um saber fragmentado nas disciplinas e a não-pertinência do conhecimento e do ensino, que separa os objetos de seu meio e as disciplinas umas das outras. Tais relações devem se estabelecer, pois ao enfrentar a diversidade dos alunos, o professor deve, por exemplo, ter a flexibilidade e a compreensão multifacetada, adequada para conceber explicações alternativas dos mesmos conceitos e princípios. Depende do professor, transformar o conhecimento do conteúdo em formas que sejam possíveis e eficazes de adaptação às variações de habilidade e contexto apresentadas pelos alunos. Tardif (2002) descreve que a experiência da prática da profissão em uma carreira, é crucial na aquisição do sentimento de competência e também na implantação das rotinas do trabalho. Este mesmo autor afirma que a vivência da profissão antes da formação permite que o estudante adquira competência suficiente para constituir um alicerce sobre o qual se edificarão os saberes profissionais durante a gestão profissional e desde já estruture
3. Aspectos
O desenvolvimento deste trabalho apoiou-se em metodologias fundamentadas na pesquisa qualitativa (Bogdan; Biklen, 1994). A coleta de dados visando à caracterização das atividades realizadas pelo CEIQ se deu por meio da análise de documentos, como por exemplo, informativos e relatórios apresentados pelo CEIQ, no ano de 2007. Na análise documental, à medida que obtêm as informações, o pesquisador elabora a percepção do fenômeno e se deixa guiar pelas especificidades do material selecionado (Laville; Dione, 1999). Na análise documental busca-se identificar informações factuais nos documentos a partir de questões ou hipóteses de interesse (Franco, 2005). Qualquer material escrito, como por exemplo, leis e regulamentos, normas, pareceres, cartas, memorandos, diários pessoais, autobiografias, jornais, revistas, discursos, roteiros de programas, entre outros, que possa ser usado como fonte de informação, pode ser considerado como documento. Num primeiro momento, realizou-se uma leitura exploratória dos textos com o objetivo de conhecê-los. Várias leituras foram feitas e trechos contendo idéias referentes ao foco da pesquisa foram selecionados. A seguir, foram propostas categorias de análise relacionadas à natureza e objetivos das atividades de extensão investigadas, o público-alvo e a participação dos licenciandos em Química. 3.1. Participação de licenciandos em Química
como sujeitos da pesquisa
sua prática de ensino (Tardif; Raymond, 2000).
12
metodológicos
Acreditamos que ao participar das ativi-
Para conhecer e analisar a contribuição das
dades promovidas pelo CEIQ os licenciandos em
atividades de extensão do CEIQ para a formação
química tem oportunidade de se aproximar de con-
dos licenciandos optou-se por dois caminhos:
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio...
giários cursavam diferentes semestres conforme
3.1.1. Análise de relatórios dos
estagiários do CEIQ
citado anteriormente. Dois estagiários cursavam o
Relatórios quinzenais, redigidos em 1ª pessoa, por nove estagiários do Centro foram entregues durante o primeiro semestre de 2008. Os relatórios continham informações como, por exemplo, os objetivos gerais e específicos dos projetos; descrição das atividades realizadas no período pelo licenciando para alcançar os objetivos; reflexão sobre as dificuldades no desenvolvimento do projeto, bem como as aprendizagens adquiridas no desenvolvimento dos projetos. Dentre os estagiários do CEIQ, quatro cursavam o 3º semestre do Curso de Licenciatura em Química, dois cursavam o 5º, e dois cursavam o 7º semestre. Apenas um estagiário era do 9º semestre. 3.1.2. Realização de entrevistas com estagiários
do CEIQ e outros licenciandos em Química No primeiro semestre de 2008, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas (Laville; Dione, 1999) com 3 estagiários do CEIQ e 17 licenciandos em Química que participaram como voluntários, principalmente nas visitas de escolas de Ensino Médio ao DQ, organizadas pelo CEIQ. As entrevistas se iniciavam com perguntas do tipo: Qual está sendo sua participação na realização das visitas de escolas ao Departamento de Química, organizadas pelo CEIQ? À medida que a entrevista prosseguia, outras questões eram formuladas. Todas as entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas. As transcrições foram interpretadas utilizando-se a análise de conteúdo segundo Bardin (2006). Num primeiro momento, realizou-se uma leitura exploratória das transcrições e, após várias leituras, foram selecionados trechos das transcrições que continham idéias relativas ao foco desta pesquisa. Com relação aos licenciandos voluntários, todos cursavam o primeiro ou terceiro semestre do curso de Licenciatura em Química e os esta-
3º semestre e um cursava o 7º semestre. 3.2. Participação de alunos do
Ensino Médio como sujeitos de pesquisa Com o objetivo de discutir as possíveis contribuições na formação científica de alunos da escola básica através das Olimpíadas Regionais de Química, o trabalho de campo foi organizado por meio da realização de entrevistas semi-estruturadas com alunos participantes da ORQ do ano de 2008, envolvendo assim, estudantes das redes públicas e particulares de Ribeirão Preto e região. As entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas e analisadas. Pelo fato de termos como objetivo a análise das implicações da participação dos alunos nas Olimpíadas Regionais de Química, definimos como procedimento metodológico de pesquisa que faríamos entrevistas com alunos de diferentes escolas. As escolas foram escolhidas pelo fato de representarem o universo de escolas que participam das olimpíadas. A partir do registro gravado das entrevistas, constituímos algumas categorias de análise. Inicialmente, trabalharemos individualmente com os dados da escola campeã de 2008 (Escola A), seguida pelas escolas participantes que representaram instituições municipal, estadual e privada (Escolas B, C e D, respectivamente), que foram analisadas em conjunto. Inicialmente, pretendíamos realizar uma entrevista com um grupo de foco (cerca de 10 alunos) em uma escola municipal de Ensino Médio e Fundamental da cidade de Ribeirão Preto, escola esta que participa das olimpíadas de química desde a sua primeira edição. Por se tratar de uma olimpíada regional, chegamos a um consenso que este primeiro espaço amostral selecionado não seria um recorte que se aproximasse da realidade que pretendemos analisar. Sendo assim, decidimos
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
13
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio...
manter a escola acima citada, porém, reduzir o número de alunos desta a serem entrevistados e adicionar outras unidades de ensino que pudessem vir a representar instituições de caráter variado (privado, estadual, municipal), de Ribeirão Preto e também da região. As entrevistas então foram realizadas num primeiro momento com 2 alunos de cada escola, que estavam cursando o segundo ano do ensino médio em 2008. Os alunos do segundo ano foram escolhidos devido ao fato de, em grande parte dos casos, já terem participado da olimpíada no primeiro ano do Ensino Médio e voltarem a participar também no segundo ano. Os alunos do terceiro ano que participaram da olimpíada em 2008 não foram entrevistados, pelo fato de terem concluído o ensino médio e conseqüentemente estarem fora do espaço escolar. É importante destacar que para este trabalho foram analisados e selecionados apenas alguns trechos das entrevistas tendo em vista os objetivos
das pessoas sobre a Química, como ciência e profissão; a aproximação entre universidade e escola básica e contribuir para a formação científica e cultural dos participantes das atividades. Logo abaixo, está apresentado um maior detalhamento das atividades de extensão realizadas:
apresentados anteriormente.
• Exposição Ciência – prazer em conhe cê-la: foi organizada por licenciandos cursando a disciplina Atividades Científico-Culturais e por estagiários do CEIQ e esteve aberta ao público durante um mês. Temas como tratamento de água, reciclagem de bitucas de cigarro para a produção de papel, biodiesel, a influência das sensações (olfato, tato, paladar) e das drogas na vida das pessoas, Química forense, entre outros, foram discutidos com a população em geral, por meio da exibição de painéis, maquetes, realização de jogos e dinâmicas. • Oficinas e mini-cursos sobre temas relativos à Química: foram ministra-
4. Resultados
e discussão
4.1. Identificação e breve descrição das
atividades de extensão As atividades de extensão promovidas pelo CEIQ em 2007 foram realizadas em espaços universitários e também em outros espaços como, por exemplo, escolas de educação básica e na Casa da Ciência Galileu Galilei, que pertence à Secretaria de Educação do Município de Ribeirão Preto e situa-se no centro da cidade de Ribeirão Preto (SP). Pode-se notar que a maioria das atividades de extensão foi voltada para alunos da escola básica (Ensino Fundamental ou Médio) e têm como principais objetivos: a conscientização dos estudantes da escola básica sobre aspectos ambientais e cidadãos; a divulgação da ciência para o público em geral; a contribuição para ampliar o conhecimento
14
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
dos na Casa da Ciência por estagiários do CEIQ e tiveram curta duração (6h). Tais cursos foram oferecidos para alunos do Ensino Médio, durante um mês. • Visitas de escolas de ensino fundamental e médio ao Departamento de Química: estas visitas acontecem durante o ano inteiro e os alunos de Ensino Médio são recebidos na Universidade e assistem a palestras sobre temas relacionados à Química (Ciência e Profissão) e realizam, com a mediação dos licenciandos, experimentos nos laboratórios didáticos do DQ. Participam desta atividade, estagiários do CEIQ e outros licenciandos em Química que atuam como voluntários. Para os licenciandos interessados em
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio...
participar das visitas são organizadas oficinas preparatórias. • Olimpíadas Regionais de Química (ORQ): em 2007 o tema abordado na V ORQ foi A Química e a Vida na Terra: como eu cuido e como eu degrado. Este evento acontece durante todo o ano e na primeira fase escolas de Ensino Médio visitam o DQ e na segunda fase, os alunos realizam provas teóricas e experimentais. Os estagiários do CEIQ participam desde o planejamento até a realização. Licenciandos em Química participam principalmente da realização, atuando como monitores nas visitas, nas atividades práticas. • Elaboração e apresentação de uma encenação teatral de 15 minutos, intitulada O que as pessoas geralmente pensam sobre a Química, durante o recebimento de escolas visitantes ao DQ.
4.2. Olimpíadas Regionais de Química
A Olimpíada Regional de Química (ORQ – FFCLRP-USP) é realizada de forma diferenciada em relação às olimpíadas tradicionais, desde 2003. Pode-se dizer que se trata de uma olimpíada “às avessas”, pois o objetivo maior não é a competição, mas sim a valorização da mobilização de professores e alunos no ambiente escolar e incentivo às ações colaborativas. Os temas abordados são escolhidos com a intenção de que as discussões nas escolas não se restrinjam apenas à disciplina de química e considerando possibilidade de reflexões sobre as relações entre ciência, tecnologia e sociedade (Ensino CTS). Em outros formatos encontrados no país, geralmente os estudantes fazem provas teóricas e participam de algumas demonstrações de experimentos, a partir das quais devem responder algumas questões ou elaborar relatórios. A ORQ é desenvolvida em duas fases, no período de março a novembro de todos os anos.
Apenas na exposição Ciência: prazer em
A primeira delas é realizada na universidade e
conhecê-la pode-se constatar o envolvimento
cada escola inscreve 40 alunos de ensino médio
com uma disciplina do Curso de Licenciatura em
para visitar o Departamento de Química e fazer
Química: Atividades Científico-culturais, que é
uma redação sobre o tema. O critério para seleção
oferecida no 2º semestre do curso e tem por obje-
dos 40 alunos nas escolas fica a cargo dos pro-
tivo a promoção de possibilidades para que o aluno
fessores e muitos relatam que a redação sobre o
participe ativamente de atividades científico-cul-
tema geralmente é o instrumento utilizado. Cada
turais que possam contribuir para a sua formação
escola é recebida num dia e horário previamente
profissional.
acordados. Durante a visita das escolas são fei-
As atividades de extensão identificadas
tas apresentações interativas sobre os temas das
possibilitaram que os licenciandos pudessem entrar
Olimpíadas, onde os alunos visitantes podem obter
em contato com os professores e alunos da escola
maiores informações sobre o assunto abordado
básica e trocar experiências. A extensão possibi-
naquele ano, tirar suas dúvidas e se prepararem
lita a construção de conhecimento conjunto, utili-
para a segunda fase.
zando os saberes do agente responsável (professor
Ainda nesta primeira fase, após a apre-
como mediador) junto com a comunidade externa.
sentação teórica, os alunos são levados para o
Este conhecimento é assim co-produzido, pois é
laboratório didático do DQ e lá, com a ajuda de
transformado pela própria experiência de trabalho
monitores/orientadores, podem conhecer melhor
coletivo.
os equipamentos de segurança do local, vidrarias
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
15
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio...
e reagentes que serão úteis para a parte experimen-
é premiada com um estágio de 40 horas, oferecido
tal da segunda fase. Esta etapa tem se mostrado
aos seis alunos participantes, no DQ, em labora-
importante e indispensável, principalmente para
tórios de pesquisa. Como resultado final, o CEIQ
alunos provenientes de escolas desprovidas de
tem informações sobre o desempenho dos alunos
laboratório e que muitas vezes nunca realizaram
nas provas realizadas, traduzido em notas de zero
atividade semelhante em tal ambiente.
a dez e, portanto, a classificação geral das escolas.
Na segunda fase, seis alunos do ensino
Durante a segunda fase, enquanto os alu-
médio representando cada escola, sendo dois
nos fazem as provas, oficinas são realizadas com
alunos do 1° ano, dois alunos do 2° e dois do 3°,
os professores. Geralmente estão presentes não
retornam ao DQ e realizam provas teóricas e prá-
só professores de química, mas também de outras
ticas. Eles são divididos em dois grupos de três alunos, cada grupo contendo um aluno de cada ano; enquanto um grupo começa a prova teórica o outro inicia a prova experimental. Posteriormente, os grupos trocam de atividade, fazendo com que os dois grupos possam realizar os dois tipos de provas. As provas de cada grupo são diferentes. Machado e Mortimer (2007) constataram que as discussões estabelecidas pelos alunos organizados em grupos, sem a presença do professor, são fundamentais para que os alunos reconheçam conceitos, aprendam a falar com e sobre eles.
áreas, como português, biologia, história, etc. os quais relatam que também participaram do processo da olimpíada em suas escolas, seja colaborando na redação, seja discutindo o tema da olimpíada sob o ponto de vista de sua área disciplinar. O contato dos professores com o CEIQ/universidade é estreitado. Alguns professores mantêm contato e, posteriormente, buscam colaboração para organizar atividades, como por exemplo, oficinas, feiras e palestras, em suas escolas. 4.2.1. Análise dos dados da Escola A
(Privada‑Campeã) da ORQ de 2008 e que realizaram um estágio no DQ/FFCLRP/USP
Além disso, no grupo, eles têm a oportunidade de confrontar suas opiniões com os colegas. O trabalho em grupo promove o desenvolvimento de habilidades de ouvir, negociar, respeitar a opinião do outro, argumentar e procurar justificativas para suas opiniões. Tanto na prova teórica como na
A escola em questão participou efetivamente de todo o processo das olimpíadas regionais (primeira e segunda fase) e pelo fato de ter ocupado a primeira colocação, recebeu como prêmio
experimental, o conhecimento químico é abordado
um estágio de 40 horas no DQ para os 6 alunos que
conjuntamente com outros aspectos que conside-
fizeram a prova da segunda fase. Com relação à preparação para a ORQ,
ramos importantes para uma formação plena do indivíduo. Os experimentos são planejados e reali-
cidas aulas em períodos adversos para melhor
zados pelos próprios alunos, em equipe. A reso-
preparar os alunos para a prova e que os alunos
lução de situações-problema, para as quais não
consideram a ORQ importante no que diz respeito
temos uma resposta imediata tem sido priorizada,
ao contato com o laboratório, vidrarias, situações
sendo necessário mobilizar diversos tipos de
experimentais, o que nesta, e em grande parte de
conhecimento.
outras escolas, geralmente é ineficiente ou inexis-
Após a realização das provas o CEIQ as
tente, mesmo se tratando de uma escola particular.
analisa e é feita uma classificação de acordo com o
Isso pode ser atestado pelos depoimentos
desempenho obtido pelas escolas. A escola campeã
16
notamos que na escola em questão, eram ofere-
dos alunos.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio...
“Nos anos anteriores a 2008 em que a escola participou, o professor forneceu algumas aulas à tarde para aprofundamento no tema abordado pela olimpíada...” (Aluno A1).
Na maioria das vezes, recebemos o maior número de estudantes possível (na chamada primeira fase), muitas vezes excedendo os 40 alunos pré-acordados. Isto ocorre, porque o nosso maior objetivo é difundir a educação em ciências, por meio das palestras e provas que são oferecidas e não promover a escola e/ou alunos por meio deste veículo. Os alunos ainda foram questionados com relação à visão sobre a ciência química existente antes e pós-olimpíada, e se nesse meio termo alguma mudança foi constatada. Veja a resposta a seguir: “Minha visão de química mudou muito após a ORQ, percebi que a química é muito importante no nosso cotidiano e na nossa vida, que ela está presente em tudo e que o conhecimento dela é importante em todas as áreas” (Aluno A4).
Assim, percebemos a grande influência dos estágios na formação científica e pessoal destes alunos, propiciando um contato com a química do cotidiano e com a pesquisa científica. Isto reforça a importância de se manter esse tipo formação. Os alunos foram questionados se as aulas tradicionais sofrem alguma alteração ou modificação em épocas de olimpíadas e, se sim, por qual ou quais professores. Os alunos da escola D (Privada), responderam que sim e que, inclusive, são oferecidas aulas extras, onde ocorrem resolução de provas de anos anteriores, atividades experimentais e discussões relativas ao tema. Por exemplo: “[...] os outros professores não, mas a ‘Maria’, de química [...], ela veio, falou com a gente, falou pra gente fazer redação e tal, conversou bastante e mandou a gente pesquisar [...], ela trouxe as outras provas do passado [...]” (Aluno D1).
Nas escolas B (Municipal) e C (Estadual), não foram relatadas aulas extras, porém, em ambos
os casos, o professor apresentou o tema em sala de aula, pedindo para os alunos pesquisarem sobre ele. Acreditamos que, desta forma, os alunos também foram estimulados a adquirir conhecimento por outros meios. “[...] a professora avisou sobre a ORQ, mas não é feito nenhum preparo com os alunos antes da gente ir para a primeira fase. Muito pouco, até mesmo pelo tempo escasso, os alunos interessados estudam sozinhos, mas se precisarmos os professores de Química e Português nos ajudam, porém apenas quando a gente pede” (Aluno B1).
As respostas obtidas, em geral, mostraram uma facilidade dos alunos em estabelecer relações entre ciência, tecnologia e sociedade, relembrando inclusive temas de anos anteriores a 2008, mesmo que em algumas delas esta relação não tenha se mostrado muito clara. Por exemplo: “[...] a gente vê mais a parte científica, mais de ficar descobrindo fonte renovável, de outra coisa... agora de tecnologia, é o descobrimento mesmo, é tecnologia mesmo as novas descobertas que eles fazem...e com a sociedade... porque a gente sabe relacionar com o nosso dia-a-dia [...], a gente aprende que tem energia luminosa, que mais pra frente a gente pode utilizar, por que o sol..a gente sempre vê, [...]” (Aluno C1).
Percebemos que foi unânime a importância dada pelos alunos às atividades experimentais, pelo fato de em sua maioria, as escolas não possuírem laboratórios, reagentes, condições para se realizar experimentos. Temos agora, a resposta dos alunos da escola C (Estadual) referente à questão três. Nesta, fica evidente a importância que os professores depositam à olimpíada, exigindo desta forma, um maior esforço dos alunos e a importância que os alunos apresentam ao participar de uma atividade desta, que extrapola os limites da escola. “Trouxe, trouxe sim, porque a gente trabalha antes, então já na química a professora
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
17
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio...
pega mais no nosso pé, principalmente com quem faz olimpíada de química..., pra gente aprender as coisas...tipo balanceamento que teve na outra...pra gente balancear... teve uma questãozinha pra gente fazer isso ai....então pra química também a gente se esforça mais...quando a gente vai participar de coisa assim...pra fora...igual a ORQ, a gente se esforça mais e daí a professora cobra mais, pra chegar no dia a gente dar o nosso melhor...” (Aluno C1). 4.2.2. Extensão e contribuições
para formação inicial dos licenciandos em química (FFCLRP/USP) A partir dos relatórios quinzenais foi possível elencar ações desenvolvidas pelos licenciandos
estagiários em cada um dos eventos/atividades de extensão do CEIQ (Tabela 1). Pelas ações descritas na Tabela 1, pode-se dizer que, entre outras coisas, ao participar das atividades de extensão, os licenciandos têm oportunidade de aprender, por exemplo, a selecionar e organizar informações, sistematizar dados, adequar linguagem, relacionar teoria e prática, contextualizar informações e abordagens feitas ao longo do curso. Na Tabela 2, estão apresentados alguns trechos de relatórios (R) e entrevistas (E) que deram indícios sobre as habilidades agregadas à formação do licenciando em química pela participação nas atividades de extensão.
Tabela 1. Ações dos estagiários necessárias para o desenvolvimento dos eventos/atividades de extensão do CEIQ. Atividades
Ações desenvolvidas pelos licenciandos em química – estagiários
Exposição
• diálogo com especialistas das áreas e professores do Departamento; • visitas a locais que pudessem ajudá-los no trabalho; • estabelecimento de contato com pessoas que podem fornecer detalhes importantes; • seleção de informações; • discussão de formas de se expressar; • reunião e produção de informações para divulgar por meio impresso; • otimização de experimentos.
Mini-cursos e oficinas
• pesquisa do tema abordado; • adequação da linguagem; • interação com os alunos e reflexão sobre como abordar as informações com os alunos da escola básica.
Visitas ao Departamento de Química
• adequação de linguagem; • seleção de informações; • contextualização dos conhecimentos estudados.
Olimpíada Regional de Química
• reserva salas e equipamentos de multimídia; • divulgação do evento para professores e alunos de ensino médio; • busca de patrocínio; • elaboração de palestras; • participação na elaboração e fiscalização de provas teóricas e experimentais; • mais conhecimentos sobre as normas de laboratório; • organização do material experimental; • recepção e orientação dos participantes; • colaboração na organização dos materiais.
Teatro
• conhecimento sobre o desenvolvimento da história da Química; • procurar se colocar no lugar da platéia e discutir qual a concepção que a maioria das pessoas tem sobre a química; • ser criativo para elaborar o roteiro com informações sérias e ao mesmo tempo com humor, • interpretação do contexto e das falas para o teatro.
Fonte: Centro de Ensino Integrado de Química – CEIQ.
18
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio...
Tabela 2. Aprendizagens possibilitadas pelas atividades de extensão do CEIQ. Trechos de relatórios e entrevistas
Contribuição para formação
"Aprendemos que trabalho em equipe e saber ouvir e analisar diferentes opiniões Saber trabalhar em equipe contribui para a melhoria e eficiência do trabalho" (R – LIC 1). "Acho que na aula quando você vai ser professor você vai ter sempre que improvisar você Flexibilidade vai ter sempre que fazer alguma coisa para os alunos gostarem e prestarem atenção em você, que agente sabe que é difícil" (E - LIC 1). "Estou aprendendo a lidar com os alunos porque já passaram 4 escolas e cada escola você percebe que tem um jeito diferente e cada turma tem aspectos diferentes... você tem que aprender a entender para conseguir a trabalhar" (E LIC 8). "Precisei de um melhor diálogo e paciência para alcançar o objetivo" (R - LIC 3). Comunicação "A organização do mini-curso me trouxe uma grande aprendizagem, de como otimizar informações, falar com os alunos, ser claro e saber ‘dominar uma sala" (R - LIC 6). "Quanto à aprendizagem cito a responsabilidade em solicitar alguns serviços em nome Responsabilidade do CEIQ e consequentemente em nome do DQ e da USP, essa questão de formalismo" (R - LIC 5). "Eu acho que você fica mais atento ao que está falando, ao que está fazendo no laboratório, assim também você tem que ter atenção e tudo mais... aqui a responsabilidade dobra, você tem que pensar no que está passando pros alunos, é o nome da USP, é a responsabilidade mesmo nesse sentido" (E - LIC 6). "Preciso usar de um formalismo na linguagem [...] Segue a aprendizagem de organização, Adequação da linguagem utilização de linguagem não verbal através de imagens [...] a necessidade de ser conciso" (R - LIC 5). "Tivemos que nos atentar à forma com que descreveríamos nossas intenções naquela ficha, a questão do discurso a ser utilizado, e quais informações colocaríamos na ficha, pois esta não poderia ficar tão carregada de informações" (R - LIC 7). "Percebo que a oficina possibilitou muitas reflexões a respeito do ensino de Química e Espírito crítico-reflexivo do sistema educacional como um todo, isto é, das mudanças que se fazem necessárias para melhorar a qualidade de ensino [...] Além disso, pude vivenciar as dificuldades que o professor de química encontra para usar o laboratório" (R - LIC 6). "O contato com os alunos, em ambos os eventos, nos permite conhecer um pouco mais desse universo que encontraremos em nossa área de atuação" (R - LIC 7). "Estou aprendendo a lidar com questões burocráticas do DQ; a pensar em atividades que Didática possibilitem uma maior interação entre professor-aluno e aluno-aluno. Além disso estou adquirindo mais habilidade para usar os recursos de informática" (R - LIC 6). "Precisei refletir, pensar na melhor forma de atrair a atenção dos alunos, pensar em modos de eles estarem participando também expondo suas idéias" (R - LIC 4). "Estou aprendendo a selecionar o conteúdo, separar os materiais e dar uma seqüência à oficina, de modo a possibilitar a interação entre eu e os alunos, a levar em consideração os seus conhecimentos prévios e a participação deles durante a oficina (R-LIC 6). Fonte: Centro de Ensino Integrado de Química – CEIQ.
Segundo Perrenoud (2000), trabalhar em
refletir sobre possíveis ações para a melhoria do
equipe é uma questão de competências e pressupõe a
ensino e adquirem, por conseguinte, uma boa
convicção de que a cooperação é um valor profissional
didática e flexibilidade para lecionar à medida que
(p. 81). Os professores precisam saber integrar dife-
se tornam mais responsáveis, construindo assim,
rentes saberes e uma das formas de se obter isso é o
outras competências a partir da prática reflexiva
trabalho coletivo, comungar dos saberes do outro,
(Tardif, 2002; Perrenoud, 2000).
no caso, de um docente que seja de outra área.
As atividades também propiciam que os
Ao vivenciar situações envolvendo pro-
alunos desenvolvam, de certa forma, a didática,
fessores e alunos de escolas básicas, estes podem
que será crucial nas práticas na sala de aula, quando
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
19
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio...
terá que lidar com a imensa complexidade de estar
para que as práticas se efetivassem. Deste modo,
dentro dela. O domínio progressivo do trabalho
cada licenciando teve que fazer uso de seus
provoca uma abertura em relação à construção
conhecimentos, advindos da teoria e da prática,
de suas próprias aprendizagens e de suas próprias
para que concretizassem as ações planejadas.
experiências; tal abertura está ligada a uma maior
Esse trabalho reflete a motivação e a crença
segurança e ao sentimento de estar dominando
de que as atividades desenvolvidas a partir de pro-
bem suas funções (Tardif, 2002).
jetos de extensão, aliadas ao ensino e a pesquisa, podem se constituir em experiências muito significativas para os alunos da educação básica e licen-
5. Considerações
finais
ciandos do ensino superior, além do que articula a aproximação universidade-escola.
A partir dos depoimentos, entendemos que a efetivação maior ou menor da contribuição da participação na ORQ se deve ao maior ou menor envolvimento da escola e professores nas atividades antes da visita e no retorno à sala de aula, dando continuidade aos assuntos abordados. Percebemos o quanto foi interessante para os alunos, discutir a aplicação da ciência em nosso cotidiano, fato este que foi despertado por intermédio de uma prova diferenciada. Segundo os alunos, os conhecimentos adquiridos através da participação na ORQ auxiliam na alfabetização e/ou letramento científico, pois lhes favorecem a aprendizagem da leitura do mundo. Centros e museus de ciências apresentam grandes potenciais para a formação profissional de licenciandos que atuam em suas atividades. Pelo fato desses espaços serem ambientes riquíssimos de interações sociais, de conhecimento científico ‑cultural, se tornam propícios para a atuação e formação de futuros professores. Ambientes como o CEIQ, por exemplo, por desenvolverem diversas atividades, podem contribuir para a formação diversificada e diferenciada dos que colocam em prática tais atividades. Pudemos notar que a participação dos licenciandos em Química, no desenvolvimento e execução dos projetos do CEIQ, privilegiaram um repertório amplo de ações, esquemas, atitudes, ou seja, de saberes que necessitaram serem mobilizados
20
REFERÊNCIAS BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2006. BOGDAN, R; BIKLEN, S. Investigação Qualitativa em Educação. Portugal: Editora do Porto, 1994. CHASSOT, A. Alfabetização Científica: Questões e Desafios para a Educação. Ijuí: Unijuí, 2003. FAHL, D. D. Marcas do Ensino Escolar de Ciências presentes em Museus e Centros de Ciências: um estudo da Estação Ciência e do MDCC. Dissertação (Mestrado). Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, 2003. FRANCO, M. L. P. B. Análise de conteúdo. Brasília: Líber Livro Editora, 2. ed. 2005, 79p. FREIRE, P. Extensão ou Comunicação? Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. LAVILLE, C; DIONE, J. A construção do saber: manual de metodologia da pesquisa em ciências humanas. Porto Alegre: Artmed, 1999. MACHADO, H. A; MORTIMER, F. E. Química para o ensino médio: fundamentos, pressupostos e o fazer cotidiano. In: Fundamentos e propostas de ensino de química para a educação básica no Brasil. Org. ZANON, B. L. MALDANER, A. O. – IJUÍ: Ed. UNIJUÍ, 2007. 2004 p.(coleção educação em química). MAURÍCIO, L.A. Centro de Ciências: origens e desenvolvimento- uma relação sobre seu papel e possibilidade dentro do contexto educacional.1992. Dissertação (Mestrado). Instituto de Física/ Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1992. MORIN, E. A cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Atividades de Extensão: possibilidades para a educação científica de alunos de ensino médio...
NOGUEIRA, M. das D. P. Extensão Universitária: diretrizes conceituais e políticas. Belo Horizonte: PROEX/UFMG; o Fórum, 2000. PERRENOUD, P. 10 Novas Competências para ensinar. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000. ROSSI, A.V.; FERREIRA, L. H. A expansão de espaços para formação de professores de Química: atividades de ensino, pesquisa e extensão a partir da Licenciatura em Química. In: ROSA, M. I. P.; ROSSI, A. V. (Orgs) Educação em Química
no Brasil: memórias, políticas e tendências. Campinas-SP: Editora Átomo, 2008, p. 127-142. SANTOS, W.; SCHNETZLER, R.P. Educação em Química: Compromisso com a cidadania. 3ª ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2003. TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002. TARDIF, M; RAYMOND, D. Saberes, tempo e aprendizagem no magistério. Educação e Sociedade, ano XXI, nº 73, dez. 2000.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
21
ARtIGO 02 | VOLUME 08 | NÚMERO 01 | JAN./JUN. 2013
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais Elements of the Nature of Science: a proposal for integration by audiovisual productions Kaio Vinícius da Costa e Silva1 Agnaldo Arroio2
RESumO
Discussões sobre as representações e veiculações de imagens da ciência em produções audiovisuais para o estudo dos elementos da natureza da ciência, são temas cada vez mais recorrentes na literatura acadêmica, dada a necessidade de novas práticas educativas. Este trabalho procurou analisar e discutir quais são os elementos encontrados na série norte-americana Breaking Bad, para que possamos utilizá-los em sala de aula de química. Trazemos, nessa pesquisa, algumas contribuições sobre discussões acerca de concepções de natureza da ciência que podemos utilizar apoiados pela produção audiovisual destacada. Palavras-chave: Elementos da natureza da ciência. Ensino de ciências/química. Imaginário social. Produções audiovisuais. AbStRACt
Discussions about the placements and representations of science’s images in audiovisual resources for studying the nature of science are increasingly recurring issues in the academic literature, given the need for new educational practices. 1
Licenciado em Química pela UFMT, Mestrando em Ensino de Ciências/Ensino de Química, pela USP. E-mail: kaiovinicius23@gmail.com
2
Bacharel em Química pela USP e em Imagem e Som pela UFSCAR, Mestre e Doutor em Físico-Química pela USP, Pós-doutorado em Educação pela USP, Livre Docente em Metodologia do Ensino pela Faculdade de Educação da USP. Professor Associado na Faculdade de Educação da USP. E-mail: agnaldoarroio@yahoo.com
p. 23-34
This study analyze and discuss the elements found in the north american TV serie Breaking Bad, so we can use it in the chemistry classroom. We bring these research contributions and some discussions about conceptions of nature and science that we can use supported by the audiovisual production highlighted. Key-words: Elements of the nature of science. Science education/chemistry. Social imaginary. Audiovisual productions.
breve discussão sobre a “Natureza da Ciência” (NdC)
Harres (1999), em uma pesquisa faz uma
1. Uma
Para uma educação científica mais adequada, com uma verdadeira construção do conhecimento científico, é necessário rever como ela está sendo praticada na escola. Faz-se cada vez mais necessário o desenvolvimento de procedimentos que permitam ao aluno compreender o mundo, a realidade em que vive e que o habilite como um cidadão da vida moderna ao utilizar estes conhecimentos no seu cotidiano. Assim, não basta apenas a apropriação dos conceitos científicos ou cálculos matemáticos; não que estes não sejam importantes, mas também é necessária uma compreensão da própria natureza da ciência e da construção histórica e social desse conhecimento. O conceito de NdC engloba uma variedade de aspectos sobre o que é a ciência, seu funcio-
revisão de trabalhos acadêmicos sobre concepções da natureza da ciência (CNC), onde ficam latentes quatro focos que concentram essas investigações: concepções dos estudantes, concepções de currículos, concepções de professores e implicações entre as concepções dos professores, sua práxis em sala de aula e as concepções dos estudantes. Apesar da carência da validade e fidedignidade de vários trabalhos, abordando vários aspectos da questão, é significativo que todas estas investigações são consensuais no fato de que estudantes apresentam CNC geralmente inadequadas (Harres, 1999). No mesmo artigo, Harres (1999) ainda destaca os resultados de várias pesquisas que trabalharam com as concepções inadequadas da natureza da ciência mais comuns encontradas nos estudantes sendo estas as seguintes:
namento interno e externo, como se constrói e se desenvolve o conhecimento que produz, os métodos que se usam para validar esse conhecimento,
•
fico como absoluto; •
verdades;
a natureza da comunidade científica, os vínculos •
dade (Vázquez-Alonso et al., 2008).
24
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
lacunas para entender o papel da criatividade na produção do conhecimento;
sistema tecnocientífico e vice-versa, as contribuições desta para a cultura e o progresso da socie-
a ideia de que o principal objetivo dos cientistas é descobrir leis naturais e
os valores envolvidos nas atividades científicas, com a tecnologia, as relações da sociedade com o
a consideração do conhecimento cientí-
•
lacunas para entender o papel das teorias e sua relação com a pesquisa;
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais
• incompreensão da relação entre experiências, modelos e teorias. No entanto, não são apenas os alunos que possuem visões inadequadas da ciência, mas, também, os professores podem apresentar tal problema, ou ainda, como descreve Ledermann (1992), é possível que o professor até tenha uma compreensão satisfatória da natureza da ciência, porém não apresenta uma consciência ou até mesmo não entenda tal temática como importante no ensino.
da população é incapaz de ascender aos conhecimentos científicos, que exigem um alto nível cognitivo”, o que implica, obviamente, reservá-los a uma pequena elite. Isso nos remete para a discussão acerca do papel da natureza da ciência – NdC – na educação científica e, em particular, na tomada de decisões tecnocientíficas com interesse social (Praia; Gil-Perez; Vilches, 2007).
Além disso, o trabalho dos homens e mulheres das ciências – como qualquer outra ati-
As concepções inadequadas da natureza
vidade humana – não acontece à margem da socie-
da ciência se formariam fora dos programas de
dade em que vivem, e é influenciado, logicamente,
formação de professores e, para mudar esta situ-
pelos problemas e circunstâncias do momento his-
ação, ele propõe a inclusão de filosofia da ciência
tórico, da mesma forma que a sua ação tem uma
como parte dos cursos de graduação uma vez que
clara influência sobre o meio físico e social em que
constata que filósofos tinham escores mais altos
se insere. Assinalar isto pode parecer supérfluo;
nesses testes do que os professores de ciências e
no entanto, a ideia de que fazer ciência é pouco
os cientistas.
menos do que uma tarefa de “gênios solitários”
A abordagem das ciências exatas nos cur-
que se fecham numa torre de marfim, desligados
rículos da educação pública, no Brasil, ainda está
da realidade, constitui uma imagem-tipo muito
arraigada a correntes filosóficas que se fortifi-
disseminada e que a escola, lamentavelmente, não
caram, na ciência, a partir do começo do século
ajuda a superar, dado que se limita à transmissão
XX, com sérias consequências até hoje para seu
de conteúdos conceituais e, em suma, de treino de
ensino. Podemos encontrar mais fortemente as
alguma destreza, mas deixa de lado os aspectos
ideologias do positivismo e empirismo, trazendo,
históricos, sociais, éticos, do meio ambiente, que
assim, características que acabam dificultando a
marcam o desenvolvimento científico (Praia; Gil
abordagem de questões que tratem o entendimento
‑Perez; Vilches, 2007).
da natureza da ciência nas aulas, inclusive em programas de formação de professores de ciências em nível superior: É necessário insistir, efetivamente, em que uma educação científica como a praticada até aqui, tanto no ensino secundário como na própria universidade, centrada quase exclusivamente nos aspectos conceituais, é igualmente criticável como preparação para futuros cientistas, e que dificulta, paradoxalmente, a aprendizagem conceitual. O prejuízo tem sido e continua a ser que “a maioria
A Didática das Ciências considera, hoje, que é importante ensinar algo de NdC nas aulas de ciências/química, sendo essa uma das diferentes formas de melhorar a educação para a cidadania, já que há uma forte tentativa, nas condições concretas do sociedade em que vivemos, para a participação interveniente nas decisões tecnocientíficas. A essência da atividade científica encontra-se na mudança de um pensamento e de uma ação baseados nas “evidências” do senso comum, para um pensamento em termos de hipóteses, ao mesmo tempo mais criativo (é necessário ir mais longe
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
25
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais
do que o que parece evidente e imaginar novas
A ponte entre a educação e a linguagem
possibilidades) e mais rigoroso (é necessário
audiovisual se deu de maneira rápida como mos-
fundamentar as hipóteses e depois submetê-las
tra Franco (1992), em seu trabalho que faz um
cuidadosamente à prova, duvidar dos resultados
recorte do Brasil no ano de 1937, que mostra uma
e procurar a coerência global) (Praia; Gil-Perez;
das primeiras iniciativas de aproximação das duas
Vilches, 2007).
temáticas.
A necessidade dessa discussão se faz à luz
A iniciativa mais importante e abrangente para concretizar as relações do cinema com a educação foi a criação – dentro do novo Ministério da Educação e Saúde Pública – do Instituto Nacional de Cinema Educativo – INCE, através da Lei nº 378, de janeiro de 1937.
de um ensino de ciências defasado que acontece nas escolas de educação básica, onde se reproduzem muitos discursos de ciência que não dialogam com a realidade do que se caracteriza como atividade científica. Estamos conscientes das dificuldades que se colocam ao falar de uma “imagem adequada” da atividade científica, que parece sugerir a existência de um suposto método universal, de um modelo único de desenvolvimento científico. É preciso evitar qualquer interpretação deste tipo, mas tal não se consegue renunciando a falar das características da atividade científica; consegue-se com um esforço consciente para evitar simplismos e deformações claramente contrárias ao que pode se entender, em sentido amplo, como aproximação científica ao tratamento de problemas (Praia; Gil-Perez; Vilches, 2007).
Importante ressaltar qual o papel da mídia de massa na sociedade, tanto atualmente como em outros registros audiovisuais, analisados por Kornis (2001). A pesquisadora faz a discussão do papel da Rede Globo durante a ditadura militar, processo político desencadeado no Brasil que provocou uma mudança na ordem social da época. A incursão da Globo com seus produtos ficcionais é de longa data, nos seriados da década de 1970 e as minisséries a partir de 1982, reafirmou a mesma tendência expressa pelas telenovelas, no sentido de estabelecer uma verossimilhança, procurando trazer à tona temas ligados à realidade nacional e
2. A
natureza da ciência nas produções audiovisuais Rever a prática pode levar o educador a
repensá-la para se sentir mais comprometido a assumir o papel de mediador de situações que aliem autopercepção e conhecimento, incitando o aluno ao compromisso de ser o verdadeiro protagonista de sua formação. Os filmes sinalizam a relação entre arte, conhecimento e prazer. Com eles, percebemos
ao cotidiano do público, em linguajar coloquial. Novos temas foram sendo absorvidos, consoantes com as transformações políticas e sociais que se processaram ao longo desses anos, dentre os quais, o fim do regime militar e a mudança nos costumes, além da diminuição da censura que contribuiu para uma maior liberdade no tratamento dos temas, sobretudo aqueles ligados a questões de ordem sexual:
que a experiência estética da arte cinematográfica é essencialmente prazerosa, capaz de produzir conhecimento por meio da experiência advinda dos sentidos, que resulta em mais significativa por nascer do prazer sensível (Pimentel, 2011).
26
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Com uma teledramaturgia voltada para aspectos da realidade brasileira a partir de 1969, a Rede Globo vem se constituindo desde então como um importante agente de construção de uma identidade nacional, não só pela
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais
às intenções do diretor ou a analise do
amplitude de sua rede num país de dimensões continentais, mas também pela diversidade temática contida na programação ficcional desta poderosa empresa da indústria do entretenimento. Entre os diferentes temas tratados nessa linha de programação, destaca ‑se a representação da história brasileira recente que passa a ser representada no formato das minisséries (Kornis, 2001).
conteúdo ou ainda aos elementos da linguagem audiovisual. O filme possui um texto visual e como artefato cultural possui seu próprio contexto sociocultural. A partir desta analise o filme é desconstruído e reconstruído na organização do ensino. Assim, o processo possibilita uma real contextualização, trabalho de leitura crítica do meio, uma
A mídia possui o poder de formar opiniões e de criar um imaginário social. No que tange à divulgação científica nesse meio, existe uma preocupação de como o conhecimento científico é apresentado, pois a divulgação das principais descobertas e avanços tecnológicos veiculados pelos meios de comunicação de massa ampara-se na fundamentação científica. Em seu nome, esses meios (televisão, revistas, jornais) divulgam o conhecimento, instigando o imaginário de que a ela cabe a resolução dos problemas, especialmente, daqueles que envolvem a sobrevivência da humanidade, do planeta e do cosmo. Promovem, ainda, o imaginário de que o conhecimento científico é acessível a todos (Pechula, 2007).
abordagem interdisciplinar e não apenas ilustração em movimento ou redução ao erro conceitual ou ainda confusões entre representação, expressão, realidade e ficção (Santana; Arroio, 2009).
Apoiados pelos exemplos projetados em tela, os estudantes podem perceber, com maior facilidade, os elementos da natureza da ciência, características fundamentais para se entender como funciona a atividade científica e suas relações com a sociedade, questões consideradas importantes na educação científica e que, muitas vezes, não estão inseridas nos materiais didáticos disponíveis. Pesquisas recentes acerca do entendimento e do uso de recursos audiovisuais vincu-
As produções da mídia podem ser uma
lados aos conteúdos de ciências naturais apontam
ferramenta útil no que diz respeito à quebra de
para discussões positivas a respeito do ensino/
estereótipos e outros fatores que distanciam a
aprendizagem de elementos da natureza da ciência
ciência dos estudantes. Com os filmes, seriados e
que são representados em filmes comerciais:
documentários, pode-se alcançar um maior entendimento sobre como funciona a ciência na vida real. Uma estratégia que vem sendo usada para melhorar o entendimento da natureza da ciência
Usando a linguagem audiovisual, é possível juntar ciência, ensino e aprendizagem de uma maneira que a comunicação se torna mais eficiente e de aprendi
é o uso de vídeos, quadrinhos e outras mídias de
zagem mais eficaz, além de aumentar o
massa em geral. Entre essas mídias, o cinema vem
interesse e a motivação dos alunos na ci-
sendo bastante popularmente utilizado como uma
ência. Outro aspecto importante é que
ferramenta educacional para ensinar esse assunto:
os filmes são uma fonte de informação,
Entendemos que a utilização do filme em sala de aula de Ciências é um processo, pois consideramos que a leitura/ análise do filme não se resume apenas
fluenciando diretamente as percepções
como outros meios de comunicação, ine concepções dos alunos. Desta forma os filmes ajudam no processo de aquisição de informações, contribuindo para
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
27
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais
o desenvolvimento dos alunos e do seu senso crítico (Arroio, 2007).
Os filmes nem sempre são produzidos com fins didáticos, mas, em situações de ensino, onde se pretende trabalhar elementos da natureza da ciência como as categorias propostas por Arroio e Farias (2011), as produções apresentam inúmeras possibilidades de argumentar acerca de uma noção geral da complexidade do que venha a ser ciência, considerando os níveis adequados das faixas etárias de alunos envolvidos em atividades de ensino e aprendizagem que relacionem aspectos epistemológicos, sociais, históricos e filosóficos da ciência, podem permear todas as áreas das ciências naturais, como, por exemplo, a discussão de um método científico ou a supervalorização da experimentação dentro de uma proposta estritamente indutivista (Santana; Arroio, 2012). Na tentativa de articular uma análise de como são produzidas essas obras, chama-se a atenção para os componentes histórico, epistemológico, emocional e subjetivo, e como o uso do cinema acontece numa perspectiva sociológica para a compreensão da natureza da ciência, pois pode se tornar um recurso usado de maneira ampla pelo professor.
3. Metodologia
A pesquisa foi realizada com levantamento de episódios escolhidos aleatoriamente ao longo das cinco temporadas da série de televisão norte-americana Breaking Bad (2008). A análise das produções toma como referência a classificação proposta por Arroio e Farias (2011), onde serão apresentadas observações gerais sobre como se pode articular o uso das produções na presença de cada uma das sete categorias referentes aos elementos da natureza da ciência, elencadas segundo a Tabela 1 a seguir:
28
tabela 1. Categorias e atributos para determinar como circula a ciência nas produções audiovisuais propostos por Arroio e Farias (2011). Categoria
Atributos
Mobilização
Instrumentos, Laboratório, Equipamento, Lugares.
Autonomização
Associações, Instituições, Grupos Disciplinares.
Aliança
Recursos, Financiamento, Suporte Científico, Suporte Político, Outros Suportes.
Representação Pública
Relações com a Lei Pública.
Link com a Ciência
Concepções, Teoria, Leis, Hipóteses, Constantes, Fórmulas, Princípios e Modelos.
Não humano
Corpos do mundo material definidos pela prática da ciência e de suas relações com outras áreas de estudo.
Humano
Cientistas, Filósofos, Poetas, Políticos etc.
Arroio e Farias (2011), ao construírem essas categorias e atributos, se pautam em outras discussões e estudos, sobre como a ciência circula segundo proposta de Bruno Latour e de como é representado o conhecimento científico em recursos audiovisuais (Arroio, 2010). Com isso, tenta-se introduzir os elementos da natureza da ciência a partir de como o trabalho científico é apresentado nesses recursos.
4. Resultados
e discussões dos elementos em Breaking Bad Breaking Bad é uma série de televisão,
norte-americana dramática, criada e produzida por Vince Gilligan. A série é exibida nos Estados Unidos e no Canadá pelo canal de televisão por assinatura AMC. Já no Brasil, o seriado é exibido pelo canal pago AXN. A história de Breaking Bad se passa em Albuquerque, Novo México (onde também é produzida), e gira em torno de Walter White, um professor de química do ensino secundá-
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais
rio/médio, pouco apreciado, com um filho adoles-
nagem principal (Químico) questiona a falta de
cente que sofre de paralisia cerebral e uma esposa
seu parceiro no laboratório, afirmando que sem
grávida, Skyler. A história inicial narra o professor
ajuda não daria para continuar com a produção.
White, que é diagnosticado com câncer de pulmão,
A situação toda acontece no seriado pelo fato de
ele sofre um colapso e abraça uma vida totalmente
o Professor White, o Químico, estar trabalhando
diferente, produzindo e vendendo metanfetaminas
sozinho no laboratório, pelas representações, vê-se
com o seu ex-aluno Jesse Pinkman, com o objetivo
que é um espaço que necessita de mais de uma pes-
de assegurar o futuro financeiro de sua família em
soa para desenvolver as funções e a própria trama
caso de sua morte.
em questão mostra a necessidade de outra pessoa
Partindo da classificação proposta por
para tal trabalho, os recortes destacados exempli-
Arroio e Farias (2011), buscaram-se pontuar quais
ficam bem a discussão, com cenas que mostram a
eram os elementos da natureza da ciência que pode-
incapacidade de uma pessoa somente comandar a
riam ser germes de discussão na obra audiovisual
produção de metanfetamina do laboratório.
e que, por sua vez, dialogam com as aulas de quí-
A partir deste exemplo, pode-se abrir
mica da educação básica. Como o seriado possui
espaço para refletir a respeito de algumas visões
cinco temporadas e muitos episódios, procurou‑se
distorcidas, especificamente a visão individualista
identificar os elementos mais recorrentes.
e elitista da ciência, onde os conhecimentos cien
Em relação à Mobilização, podem‑se iden-
tíficos aparecem como obras de gênios isolados,
tificar muitos materiais químicos, como vidra-
ignorando-se o papel do trabalho coletivo e coo-
rias, reagentes que são citados recorrentemente,
perativo, dos intercâmbios entre equipes. Em par-
representação de sistemas químicos para síntese
ticular, faz-se crer que os resultados obtidos por
orgânica em toda a série. Apresentam de maneira
um só cientista ou equipe podem ser suficientes
improvisada, no início da história, posteriormente,
para verificar, confirmando ou refutando, uma
a partir da 3ª temporada, o laboratório é reprodu-
hipótese ou toda uma teoria. Muitas vezes, insiste
zido de maneira verossímil à realidade, com muita
‑se, explicitamente, que o trabalho científico é um
aparelhagem tecnológica em nível profissional,
domínio reservado a minorias especialmente dota
como em fábricas, universidades e centros de pes-
das, transmitindo-se, assim, expectativas negativas
quisa. Sempre são recorrentes as representações
à maioria dos alunos, com claras discussões em
de como funciona a química por trás da fabrica-
relação ao gênero, por exemplo, a ciência é apre-
ção de metanfetamina e consegue-se observar que
sentada muitas vezes como uma atividade eminen-
existe um trabalho de pesquisa por trás da obra. Já
temente “masculina”. Contribui, além do mais,
na abertura do seriado, aparece a fórmula mole-
para esse elitismo, escondendo o significado dos
cular da droga e no início escrita com elementos
conhecimentos por meio de apresentações exclu-
da tabela periódica simbolizando o nome da série
sivamente operativas. Não se faz um esforço para
(Anexo 1).
tornar a ciência acessível, nem para mostrar o seu
Na 4ª temporada (episódio 5, 20:44 min.
caráter de construção humana, em que não faltam
– 22:19 min.; 29:27 min. – 31:48 min.), podem-
hesitações nem erros, situações semelhantes às dos
-se destacar cenas onde surge a oportunidade de
próprios alunos (Gil-Perez et al., 2001).
utilizar o recurso, apoiado por uma discussão ou
A Aliança, ou seja, de onde saem os recur-
dentro de uma sequência didática, das questões
sos financeiros, em Breaking Bad, a química
referentes ao trabalho científico, onde o perso-
está ligada com o tráfico de drogas, associando-
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
29
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais
30
-a a uma maneira realista e mal-vista da química,
uma correlação de forças entre o chamado crime
como fazendo mal para a sociedade, discussão
organizado (com o cartel e o tráfico de drogas) e
que merece ser desconstruída e construída em sala
o DEA, sendo assim, podemos associar quais são
de aula de maneira mais próxima da realidade,
as relações com as leis públicas representado-as
fazendo suas devidas contextualizações. Em aulas
na produção. Já no primeiro episódio (22:40 min.
de Ciências/Química, as complexas relações entre
– 27:03 min. e 43:57min. – 58:08 min.), a produ-
ciência, tecnologia, sociedade (CTS) podem pro-
ção tenta contextualizar na trama como funciona
porcionar uma imagem deformada dos cientistas
a política antidrogas por parte da polícia (DEA).
como seres “acima do bem e do mal”, fechados em
Ao longo das cinco temporadas, existe sempre
torres de marfim e alheios à necessidade de fazer
uma relação para demonstrar forças entre o cartel
opções. Embora, nos últimos anos, os meios de
(tráfico de drogas) e o DEA (narcóticos). A polícia,
comunicação social frequentemente tenham feito
ao longo da trama, se mantém como um elemento
eco de notícias acerca de, por exemplo, problemas
constante, justamente para acentuar a discussão
do meio ambiente provocados por determinados
sobre a ilegalidade da produção e venda de certas
desenvolvimentos científicos, podemos constatar
substâncias. Também no 1º espisódio (43:57 min.
que uma elevada percentagem de professores não
– 58:08 min.), ficam latentes algumas característi-
tem em consideração essa dimensão da atividade
cas de como se realiza uma negociação “por dentro
científica (Gil-Perez et al., 2001).
do tráfico”, que acaba sendo retratada com casos
Na 2ª temporada (episódio 11), podemos
de mortes e outras situações que remetam à utili-
identificar, com várias representações (8:48 min.
zação de violência. Para compreendermos como se
– 12:25 min. e 14:46 min. – 17:13 min.), como vai
constroem e mudam os conhecimentos científicos,
se formando a aliança financeira mais estável ao
torna-se útil começar com uma reflexão sobre as
longo do seriado. Um empresário, dono de uma
possíveis deformações que o ensino de ciências
rede de fast-food, acaba entrando na trama e se
poderia (e pode) estar a transmitir, explícita ou
torna o responsável pela distribuição e produção
implicitamente, acerca de compreensão da natu-
da droga, fazendo uso da rede de comida como
reza do referido trabalho científico (Gil-Perez et
uma forma de transportar e entregar para a venda
al., 2001).
nas ruas. Entretanto, esse mesmo dono mantém
A utilização de substâncias psicoativas é
um bom laboratório, bem equipado com tecnolo-
antiga na história da civilização, as primeiras expe-
gias avançadas e suporte que necessitam de muito
riências humanas ocorreram por meio do consumo
dinheiro para serem adquiridas, neste espaço,
de plantas. A partir do século XIX, o homem isolou
trabalham o professor White e seu ex-aluno, cha-
princípios ativos vegetais como morfina, cocaína
mando a atenção para o caráter clandestino da
e efedrina. Porém, foi no final do século passado,
atividade, pois este laboratório encontra-se escon-
com o surgimento das anfetaminas, que uma subs-
dido embaixo de uma lavanderia industrial.
tância psicoativa foi totalmente sintetizada em
Breaking Bad traz à tona a questão das
laboratório. Com o aparecimento das drogas sin-
drogas e sua proibição. Na série, o professor
téticas, nos anos 80, ocorreu à popularização das
Walter White é cunhando de um agente da DEA
designers drugs, drogas que têm como caracte-
(Drug Enforcement Administration), uma insti-
rística essencial o fato de terem sido modificadas
tuição existente nos Estados Unidos, responsável
em laboratório, com o intuito de potencializar ou
pelo combate ao uso de drogas. Existe sempre
criar efeitos psicoativos ou evitar efeitos indese-
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais
jáveis, além de burlar a legislação vigente. Além
lidar com o seu câncer, qual o papel da família na
disto, a disponibilidade e a diminuição do custo
tomada de decisão de se tratar, ou não (levando em
tecnológico permitem que tais drogas sejam sin-
consideração o efeito colateral da quimioterapia
tetizadas com facilidade em laboratórios clandes-
e outros), e, por último, e mais importante, como
tinos domésticos (Garcia et al., 2012). Logo, esse
pagar pelo tratamento extremamente caro, visto
é um ponto chave para a discussão no que remete
que sua família não possui dinheiro, como mostra
ao link com a ciência, pois em sala de aula de quí-
a cena (episódio 2, 33:22 min. – 37:29 min.) onde
mica a dimensão sociológica do que significa a
o casal principal discute como será o pagamento
síntese orgânica se faz necessária, para que não se
das despesas com a gravidez.
caia no formalismo e nas decorebas de fórmulas e
Se apropriar do seriado em uma aula do
símbolos. Em cenas da 5ª temporada (episódio 3,
3º ano do Ensino médio seria o ideal, pois ao se
28:18 min. – 32:42 min.), bem como em muitos
discutirem outras questões da Química Orgânica é
outros recortes da produção, mostram-se muitos
preciso afastar os estereótipos socialmente aceitos
materiais de laboratórios de química utilizados em
e consolidados, que dificultam o aprofundamento
escala industrial, mostrando o uso de máscaras, por
do conhecimento científico e que causam enormes
exemplo, por conta da fumaça tóxica, como muitos
discrepâncias entre visões de ciência. Essa dis-
outros insumos, tais como (cilindros pressurizados
cussão supõe dizer que devemos nos atentar aos
e mangueiras conectadas a vidrarias diversas.
aspectos culturais, sociais, morais e emotivos para
Walter White é diagnosticado com um
que rompamos com a NdC que apresenta o traba-
câncer terminal de pulmão no terceiro estágio,
lho científico como uma atividade descontextuali-
determinado a gerar uma herança suficiente para
zada, alheia a interesses e conflitos.
sua família, antes de sua morte, ele adentra no
Em aspectos gerais, o seriado apresenta-se
comércio ilegal de drogas, usando de seus conhe-
como um bom suporte para se discutirem elemen-
cimentos de química para produzir metanfetami-
tos da natureza da ciência em aulas de Química,
nas (crystal meth) extremamente potentes, com a
pois possui inúmeros exemplos em suas represen-
ajuda de Jesse Pinkman, seu ex-aluno. A escolha
tações das categorias proposta por Arroio e Farias
do professor pela necessidade de dinheiro nos
(2011). Com esse material, podem-se ter perspec-
diz respeito à última categoria encontrada, o ser
tivas positivas para trabalhar concepções e visões,
humano por trás da representação científica, que,
bem como fomentar discussões sobre aspectos
neste caso, apresenta uma situação peculiar onde
relacionados à ciência, no sentido de melhorar a
um professor de química do ensino médio se trans-
prática de se ensiná-la, levando em consideração
forma em um gangster do crime organizado.
outros fatores que influenciam no fazer “ciência”,
Na 1ª temporada, observa-se, em todos os 7 episódios, a questão pessoal de quem é o cien-
desconstruindo visões distorcidas equivocadas do conhecimento científico.
tista por trás da produção de metanfetamina. No 2º episódio (09:33 min. – 11:35 min.), o personagem aparece dando uma aula de química para uma turma com nenhum interesse e nem um pouco motivada,
5. Considerações
finais
mostrando o quanto isso o frustrava enquanto pro-
As aulas de ciências devem, mais do que
fissional não bem remunerado. Recorrentes cenas
nunca, cumprir um papel emancipador na constru-
que retratam a realidade de como Walter White vai
ção do conhecimento do aluno, discutindo concep-
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
31
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais
ções e visões e trabalhando alguns aspectos que
Arroio e Farias (2011): Mobilização, Aliança,
fujam da lógica conceitual e de cálculos. Nesse con-
Relações com a Lei Pública, Link com a Ciência e
texto, as concepções de natureza da ciência (NdC)
Humano (Cientista). A utilização de vídeos, filmes
são parte indispensável para promover entendi-
e seriados de televisão é uma tendência muito forte
mentos válidos sobre o que é e como funciona a
em sala de aula; esse recurso dá suporte para o
atividade científica e suas relações. Compreender
professor variar e diversificar sua prática docente,
os aspectos sociológicos, históricos e filosóficos
discutindo concepções e perspectivas de diferentes
de construção desse conhecimento é parte funda-
maneiras.
mental da educação científica do estudante, para que possa perceber que o “fazer ciência” é uma das atividades humanas que desenvolvemos. O professor, em sala de aula, como mediador e facilitador na elaboração de conhecimento, pode se apropriar de inúmeras metodologias para melhorar sua prática, pois as produções audiovisuais estão presentes na vida dos estudantes de hoje. A mídia de massa é uma grande formadora de opinião, e não podemos ignorar sua influência. Com o material audiovisual, o docente tem base material na desconstrução de estereótipos e concepções equivocadas do que é ciência ou de qual realmente é o papel de um cientista, com uma construção de concepções que não são descoladas da realidade Essas produções audiovisuais possuem componentes importantes na formação do olhar; com sua linguagem, podem-se ultrapassar algumas limitações diárias que a escola possui em relação à prática docente na construção do conhecimento científico. É importante, também, ressaltar a necessária preparação do docente ao introduzir esses recursos em sua sala, pois, muitas vezes, o material não é produzido especificamente para uma aula, e cabe ao professor o papel de agente interventor, apoiado por sequências de ensino que lhe dêem suporte para a utilização destas produções. O seriado Breaking Bad surge como uma oportunidade de utilização de uma ferramenta que é comum para o aluno, a comunicação audiovisual. Com ela, abre-se uma possibilidade de discussão sobre os elementos da natureza da ciência, classificados em cinco categorias e atributos segundo
32
REFERÊNCIAS ARROIO, A. Context based learning: a role for cinema in science education. Science Education International, v. 21, n. 3, p. 131-143, 2010. _______. The role of cinema into science education. Problems of Education in 21st Century, v. 2, p. 25-30, 2007. _______.; FARIAS, M. D. Possible Contributions of Cinema in Natural Science Education To Understand How Scientists and Science Works. Problems of Education in 21st Century, v. 37, p. 17-28, 2011. FRANCO, M.; COUTO, J. G.; PICCHIARINI, R. A natureza pedagógica das linguagens audiovisuais. In: FALCÃO, A. R.; BRUZZO, C. (Org.). Lições com cinema – coletânea. São Paulo: São Paulo / FDE 1, 1992, p. 11-29. GARCIA, S. C. et al. Designer Drugs: aspectos analíticos e biológicos. Química Nova, v. 35, n. 1, p. 149-158, 2012. GIL-PEREZ, D. et al. Para uma imagem não deformada do trabalho científico. Ciênc. Educ. v. 7, n. 2, p. 125‑153, 2001. HARRES, J. B. S. Uma revisão de pesquisas nas concepções de professores sobre a natureza da ciência e suas implicações para o ensino. Investigações em Ensino de Ciências, v. 4, n. 3, p. 197-211, 1999. KORNIS, M. Uma história do Brasil nas Minisséries da Rede Globo. Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo, ECA, 2003. LEDERMANN, N. G. Student’s and teacher’s conceptions of the nature of science: a review of the research. Journal of Research in Science Teaching, v. 29, n. 4, p. 331-359, 1992. PECHULA, M. R. A ciência nos meios de comunicação de massa: divulgação de conhecimento ou reforço do imaginário social?. Ciênc. educ. v. 13, n. 2, p. 211‑222, 2007.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais
PIMENTEL, L. S. L. Educação e cinema: dialogando para a formação de poetas. São Paulo: Cortez Editora, 2011. PRAIA, J.; GIL-PEREZ, D.; VILCHES, A. O papel da natureza da ciência na educação para a cidadania. Ciênc. educ., v. 13, n. 2, p. 141-156. SANTANA, E. R.; ARROIO, A. A abordagem da natureza da ciência no cinema na formação continuada
de professores. Anais do XVI Encontro Nacional de Ensino de Química, Salvador-BA, 2012. _______.; _______. The History of Science in the Report of the Teachers of Sciences. International Congress of Science Education, Cartagena, Colombia, 2009. VÁZQUEZ-ALONSO, A. et al. Consensos sobre a natu reza da ciência: a ciência e tecnologia na sociedade. Química Nova na Escola, v. 27, p. 34-50, 2008.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
33
Elementos da Natureza da Ciência: uma proposta de inserção através de produções audiovisuais
Anexo 1. Ficha técnica do seriado: Nome:
Breaking Bad
Gênero:
Ação, Teledrama
Duração:
47 minutos/episódios
Criador/diretor:
Vince Gilligan
País de Origem:
Estados Unidos
Idioma Original:
Inglês
Emissora de TV Original:
AMC
Transmissão Oficial:
28/01/2008 – Atual
Número de Temporadas:
5
Número total de Episódios:
54
Fonte: Disponível em: <http://www.imdb.com/title/tt0903747/>. Acesso em: 28 jan. 2013.
Anexo 2. Tabela das cenas do seriado Breaking Bad utilizadas para fundamentar a discussão sobre os elementos da natureza da ciência em produções audiovisuais neste trabalho. Episódio da Série e Minutagem
34
Categorias e atributos dos elementos da natureza da Ciência
4ª Temporada - Episódio 5 20:44 min. -22:19 min. 29:27 min. - 31:48 min.
Mobilização: Instrumentos, Laboratório, Equipamentos, Lugares.
2ª Temporada - Episódio 11 08:48 min. – 12:25 min. 14:46 min. – 17:13 min.
Aliança: Recursos, Financiamento, Suporte Científico, Suporte Politico, Outros suportes.
1ª Temporada - Episódio 1 22:40 min. – 27:03 min. 43:57 min. – 58:08 min.
Representação Pública: Relações com a Lei Pública
5ª Temporada - Episódio 3 09:49 min. – 12:10 min. 28:18 min. – 32:42 min.
Link com a Ciência: Concepções, Teoria, Leis, hipóteses, Constantes, Fórmulas, Princípios e modelos.
1ª Temporada - Episódio 2 09:33 min. – 11:35 min. 33:22 min. – 37:29 min.
Humano: Cientistas, Filósofos, Poetas, Políticos etc.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
ARtIGO 03 | VOLUME 08 | NÚMERO 01 | JAN./JUN. 2013
Energia Versus Poluição Atmosférica: uma oficina temática para o Ensino de Química Energy Versus Air Pollution: a thematic workshop for the Chemistry Teaching Ediane Machado Wollmann1 Mara Elisa Fortes Braibante2
RESumO
Neste estudo apresentamos uma oficina temática intitulada Energia versus poluição atmosférica, que foi desenvolvida através da Metodologia da Problematização, conhecida como Arco de Charles Maguerez, e teve como objetivo explorar uma temática ambiental de forma contextualizada. Esta oficina foi aplicada aos alunos do segundo ano do nível médio, nas aulas de Química, em uma escola da rede pública. Diversas atividades foram desenvolvidas durante a aplicação da oficina, tais como utilização de vídeos, elaboração de textos e elaboração de cartazes. Os resultados obtidos neste estudo evidenciaram que o uso desta proposta metodológica favoreceu o processo de ensino aprendizagem em Química. Palavras-chave: Oficina temática. Poluição atmosférica. Ensino de Química. AbStRACt
In this study we present a thematic workshop entitled Energy versus air pollution, which was developed through the Problem-Solving Methodology, known as the 1
Formada em Química Licenciatura pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Mestre em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde pela UFSM. Atualmente é doutoranda do Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde – UFSM. E-mail: edianewollmann@gmail.com
2
Formada em Química Licenciatura pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Doutora em Ciências (Química Orgânica) pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), é professora do Departamento de Química da UFSM e do Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências: Química da Vida Saúde pela UFSM. E-mail: maraefb@gmail.com
p. 35-44
Arch of Charles Maguerez, and its purpose was to explore an environmental issue in context. This workshop was applied to a sophomore group of students, during the Chemistry classes, in a public high school. Several activities were developed during the implementation of the workshop such as the use of videos, writing and production of posters. The results of this study showed that the use of this methodological proposal helped the process of teaching and learning Chemistry. Key-words: Thematic Workshop. Air Pollution. Chemistry Teaching.
1. Introdução
Já é consenso entre os pesquisadores da área de ensino de Ciências que o processo de ensino e aprendizagem precisa estar evidenciado em um contexto mais amplo, dinâmico e contextualizado. Esta necessidade surge porque os desafios metodológicos não podem estar resumidos apenas ao ensino tecnicista, desconecto com a realidade do aluno. Sendo assim, faz-se necessário desenvolvermos ferramentas que estimulem a vontade do indivíduo em aprender e tornar-se um cidadão mais crítico. Neste contexto, as oficinas temáticas são uma proposta para o ensino de Química, em que um dos seus princípios metodológicos é a contextualização dos conteúdos (Marcondes et al., 2007; 2008). As oficinas constituem uma excelente metodologia para tornar o conhecimento científico mais aplicado e relacionado com a realidade dos estudantes. Esta relação dos conteúdos trabalhados em sala de aula com o cotidiano estimula a observação, a criatividade e a curiosidade pelo aprender
se relacionem com o mesmo. A escolha do tema deve permitir a contextualização do conhecimento científico e a aplicação dos conhecimentos da Ciência no cotidiano dos alunos, podendo levá-los à capacidade de tomar decisões e tornarem-se cidadãos críticos e participativos na sociedade (Marcondes et al., 2007). Sendo assim, acreditamos que a utilização de oficinas temáticas é uma excelente ferramenta para auxiliar na contextualização da temática apresentada neste estudo com a disciplina de Química, bem como, de outras ciências. Para desenvolvermos a oficina temática Energia versus Poluição Atmosférica propomos as etapas da Metodologia da Problematização: Arco de Charlez Maguerez. A Metodologia da Problematização, conhecida como Arco de Charlez Maguerez, teve seus primeiros relatos em 1992, através de um projeto de ensino na área de saúde, na Universidade Estadual de Londrina – UEL (Garcia et al., 2009). A Figura 1 ilustra as cinco etapas propostas por esta metodologia. Pode-se observar que o desenvolvimento
Ciência (Carlos et al., 2011).
36
O primeiro passo que pode ser adotado
do Arco de Maguerez se faz por meio de cinco
quando optamos por desenvolver uma oficina
etapas: Observação à realidade (problematização);
temática é a escolha do tema a ser trabalhado, e
Pontos-chave; Teorização; Hipóteses de solução e
juntamente com este devemos buscar conceitos que
por fim a Aplicação à realidade (prática).
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Energia Versus Poluição Atmosférica: uma oficina temática para o Ensino de Química
é possível fazer para solucionar o problema, e se
Teorização
existe solução. O estudo realizado deverá fornecer elementos para os alunos para que eles criem hipó-
Pontos-Chave
teses de solução para o problema (Berbel, 1998).
Hipóteses de solução
Na “Aplicação à realidade”, os sujeitos envolvidos deverão levar uma resposta de seus Observação da Realidade (Problema)
estudos, das suas compreensões para o problema Aplicação à Realidade
observado. Esta etapa é, sem dúvida, a de maior importância, pois implica em um compromisso dos alunos com o seu meio (Berbel, 1996). Dentro desta perspectiva metodológica foi
REALIDADE
desenvolvida a oficina temática “Energia versus Poluição Atmosférica”, que teve por principal obje-
Figura 1. Etapas da metodologia do Arco.
tivo relacionar o conceito de reações de combustão
Fonte: Adaptado de Garcia et al. (2009).
com a poluição do ar, além de promover a reflexão Na “Observação à realidade”, o aluno deve
a respeito das questões ambientais. Apresentamos
começar a observar a realidade concreta, ou seja,
neste estudo as atividades que foram desenvolvi-
o local onde o tema de trabalho está ocorrendo na
das nas oficinas, bem como a análise qualitativa
vida real. Nesta etapa é importante que o profes-
dos resultados obtidos.
sor oriente seus alunos a olharem atentamente e registrarem o que percebem sobre aquela realidade a ser estudada. Nos “Pontos-chave”, as possíveis causas
2. Procedimentos
metodológicos
do problema deverão ser encontradas. É uma etapa
O estudo apresentado neste trabalho possui
de reflexão, em que os alunos precisam a todo
uma abordagem predominantemente qualitativa,
o tempo se questionar: Por que esse problema
pois o ambiente natural dos sujeitos é a fonte direta
existe? A partir desta análise os alunos são estimu-
de dados, sendo os pesquisadores os principais
lados a uma nova síntese: a delimitação dos pontos
instrumentos. Este estudo envolve a obtenção de
essenciais que deverão ser estudados sobre o pro-
dados descritivos, adquiridos por meio do con-
blema, para que possam compreendê-lo melhor e
tato com a situação em estudo (Bodgan; Biklen,
encontrar formas de interferir na realidade (Berbel,
1982 apud Ludke; André, 1986). Os dados foram
1998).
coletados através de um questionário, elaboração A “Teorização” é a investigação propria-
de textos, elaboração de cartazes, e foram analisa-
mente dita, onde os alunos precisam procurar
dos através da análise textual discursiva (Moraes;
entender o problema. Para isso, se organizam em
Galiazzi, 2006).
busca de respostas, procuram materiais na biblio-
Esta pesquisa foi desenvolvida com trinta
teca, na internet, assistem aulas e palestras, entre
alunos de uma escola estadual da rede pública,
outros. É a etapa do estudo e da compreensão dos
em uma turma de segundo ano, no turno da noite,
conceitos envolvidos no problema.
situada no município de Restinga Seca, RS. Foram
A etapa de “Hipóteses de solução” é aquela
aplicadas diversas atividades durante a realização
em que o aluno deverá se questionar sobre o que
da oficina “Energia versus poluição atmosférica”
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
37
Energia Versus Poluição Atmosférica: uma oficina temática para o Ensino de Química
Figura 2. Algumas das imagens distribuídas aos alunos.
que ocorreu através de cinco etapas, de acordo
dos alunos, sua clareza com relação à linguagem
com a metodologia utilizada, totalizando dez horas
química, bem como sua maneira de se expressar
de aula.
frente a algum problema.
Na primeira etapa foi apresentado aos alunos vídeos que relacionavam a dependência da
As perguntas lançadas através do questionário investigativo foram as seguintes:
poluição atmosférica com os processos de com-
•
Explique com suas palavras o que é
bustão na era moderna e com o desenvolvimento
poluição. Dê exemplos de poluição no
industrial. Após os estudantes assistirem os vídeos,
seu dia a dia.
discussões sobre a relação da Energia com a polui-
•
ção do ar foram feitas.
Comente a afirmação: “Poluição e desenvolvimento: Uma parceria que dá certo!”
Seguindo neste contexto, deu-se início à segunda etapa, momento este que os estudantes
De acordo com Marconi e Lakatos (2010),
foram convidados a responderem um questionário
os questionários apresentam uma grande vantagem
investigativo e produzirem uma redação através de
em relação a outros métodos de pesquisa, que é
recortes de imagens de revistas, jornais e internet
a maior liberdade nas respostas decorrente de seu
disponibilizadas aos mesmos (Figura 2). Os textos
anonimato.
dos estudantes deveriam relatar o que aquelas ima-
Já na terceira etapa da metodologia – teo-
gens representavam para eles; sendo assim, foram
rização – abordamos alguns tópicos, relacionando
elaborados individualmente ou em grupos de dois
estes com conteúdos químicos. Na Tabela 1 apre-
alunos. As produções textuais foram realizadas
sentamos os tópicos e os conteúdos trabalhados
visando analisar, detalhadamente, as opiniões
neste momento da oficina.
tabela 1. Oficina Energia versus poluição atmosférica. Tópicos
Conteúdos
Principais poluentes atmosféricos;
Propriedade dos gases; Óxidos
• Causas da poluição atmosférica. • Reações de combustão. • Consequências no meio ambiente: Chuva ácida, smog foto- • Termoquímica: Reações endotérmicas e Reações exotérmicas. químico, aumento do efeito estufa. • Exercícios relacionados com o conteúdo de Termoquímica. • Consequências na saúde humana: doenças respiratórias, doenças cardiovasculares. • Política sobre o Meio ambiente. • Utilização dos conversores catalíticos.
38
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Energia Versus Poluição Atmosférica: uma oficina temática para o Ensino de Química
Na quarta etapa – Hipóteses de solução –
•
distribuímos aos alunos algumas reportagens de
imagens;
políticas e medidas adotadas pelo governo ou por Organizações Não Governamentais (ONGs), cuja finalidade é minimizar os impactos ambientais. Além de questionar tais ações já existentes, discutiu-se o funcionamento e as vantagens da utilização dos conversores catalíticos nos automóveis, com o objetivo de despertar a atenção dos alunos sobre a contribuição da Química para a sociedade e o ambiente. Na última etapa da metodologia – Aplicação à realidade – formamos quatro grupos na turma e
Produção textual através de recortes de
•
Elaboração de cartazes.
3.1. Concepções dos estudantes sobre poluição
No questionário investigativo, aplicado na segunda etapa da metodologia, foi solicitado aos estudantes que explicassem com suas palavras o que sabiam a respeito do tema poluição. Através da análise das respostas dos estudantes observou-se que a maioria possui conhecimento a respeito do assunto abordado na oficina. A seguir encontram-se transcritos alguns dos relatos dos estudantes.
distribuímos recortes de revistas e da internet,
“Poluição é o que agride o meio ambiente e a nós mesmos. A poluição dos carros, dos lixos jogados por aí, antes e depois de uma chuva etc.” (Estudante 3).
com imagens para estes grupos. Foi solicitado aos estudantes que construíssem cartazes com tais imagens, com o objetivo de conscientizar as pessoas da comunidade escolar com relação
“Poluição é basicamente a ‘sujeira’ que há no mundo, tanto no ar, quanto na água ou na terra” (Estudante 4).
às atitudes que contribuem para minimizar os impactos da poluição atmosférica, assim como as atitudes que aumentam estes problemas.
“Temos vários tipos de poluição, de mares, rios, poluição atmosférica. Todas as poluições ou a maioria são causadas pelo homem, a poluição nos mares pode ser causada pelos óleos e outros produtos depositados pelas indústrias, afetando o meio ambiente” (Estudante 10).
Após a construção dos cartazes pelos estudantes, os mesmos apresentaram o seu trabalho para toda a turma. Para finalizar esta etapa os cartazes foram expostos nos murais da escola com o intuito de atingir toda a comunidade escolar, de acordo com a proposta metodológica.
Alguns estudantes justificaram em seus relatos que a poluição é tudo aquilo que possa vir a prejudicar o nosso meio ambiente e a nossa
3. Resultados
saúde, como pode ser observado através da fala
e discussões
Para uma melhor compreensão, criamos categorias para avaliarmos as concepções dos estudantes, e a contribuição das atividades realizadas através desta proposta metodológica. As categorias criadas foram as seguintes: •
Concepções
dos
estudantes
sobre
poluição; •
Concepções dos estudantes sobre a relação da poluição com o desenvolvimento tecnológico;
do Estudante 3, a qual aproxima-se da definição proposta pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB)3, onde a poluição pode ser conceituada como: “qualquer substância que possa tornar o meio ambiente impróprio, nocivo ou ofensivo à saúde, inconveniente ao bem estar público, danoso aos materiais, à fauna, à flora ou prejudicial a segurança”. Além disso, os alunos foram capazes 3
http://www.cetesb.sp.gov.br. Acesso em: 04 jul. 2012.
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
39
Energia Versus Poluição Atmosférica: uma oficina temática para o Ensino de Química
de argumentar de maneira clara que existem vários
3.3. Produção textual
através de recortes de imagens
tipos de poluição, utilizando para isso alguns
Para a análise das redações elaboradas pelos
exemplos (Estudante 4 e Estudante 10).
alunos na segunda etapa da oficina escolhemos os 3.2. Concepções dos estudantes
sobre a relação da poluição com o desenvolvimento tecnológico
transcritos a seguir, por fornecerem dados de diferentes aspectos sobre a poluição atmosférica.
No questionário investigativo para verificarmos estas concepções, apresentamos aos alunos a afirmação – “Poluição e desenvolvimento tecnológico: uma parceria que dá certo!” – e pedimos para os estudantes responderem se concordavam ou não com esta afirmação, justificando suas respostas. Dos 30 participantes desta pesquisa, 15 alunos responderam que não concordavam com esta afirmação, argumentando em suas respostas que pode haver desenvolvimento, sem que haja tanta poluição. Por outro lado, 13 estudantes responderam que esta afirmação está correta, visto que, para ocorrer o desenvolvimento tecnológico da sociedade é inevitável que ocorra a poluição. Já outros 2 estudantes, envolvidos nesta pesquisa, não souberam se posicionar frente a esta afirmação, conforme podemos acompanhar na Figura 3 Este questionamento foi importante, pois permitiu um momento de discussão e reflexão entre os estudantes da turma. 16 14 Número de alunos
10 8 6 4 2 Não concordam
Concordam
Não responderam
Figura 3. Respostas dos alunos com relação à afirmação “Poluição e desenvolvimento tecnológico: uma parceria que dá certo!”.
40
“[...] Quando esse fenômeno ocorre no ar, acumulam-se gases, como o dióxido de carbono e também o de nitrogênio liberado por algumas indústrias. Essa pode corroer monumentos, prédios e até rodovias, ela é formada devido a liberação de gases poluentes das indústrias, e estes poluentes do ar podem poluir também rios, mares e lagos [...]” (Estudantes 18 e 19).
b) Título: Poluição Industrial “Através desta imagem podemos ver que nossas indústrias formam grandes camadas de fumaças que provocam emissões de gases como óxido de enxofre ou óxido nitrogênio que ao se encontrarem com a água formam o ácido sulfúrico ou ácido nítrico, dando origem a chuva ácida [...] Assim como podemos ver hoje nossas indústrias que são muitas agridem nosso meio ambiente, mas que são indispensáveis porque sem indústrias, fábricas não temos empregos e mesmo sabendo que estas provocam a poluição atmosférica não podemos fazer muita coisa a não ser observar e provocar alguma reação para que o mundo se conscientize com isso [...]” (Estudante 12).
c) Título: O Dióxido de Carbono (CO2)
12
0
a) Título: Chuva ácida
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
“Na cidade de São Paulo há ocorrência de grande tráfego de carros que ao liberar o gás CO2 na atmosfera prejudica a saúde dos seres humanos e dos animais. Na ultima semana, devido a grande liberação de CO2, muitas pessoas procuram postos e hospitais com problemas respiratórios. O governo de São Paulo recomenda aos seus habitantes que usem menos seus carros, e que optem por meio de transportes menos poluentes como bicicletas, carros movidos a gás etc. [...]” (Estudante 27).
Energia Versus Poluição Atmosférica: uma oficina temática para o Ensino de Química
Observamos na redação dos Estudantes
cina, ou seja, no encerramento do Arco de Charlez
18 e 19, que os mesmos expressam as principais
Maguerez, para que assim os alunos pudessem retor-
consequências da Chuva ácida, citando exemplos
nar à realidade com alguma solução para o problema
dos gases que provocam o fenômeno. Já no texto
em estudo; nesse caso, a solução foi a exposição dos
do Estudante 12, intitulado “Poluição Industrial” o
cartazes nos murais da escola, com a intenção de
estudante explica com suas palavras como ocorre
atingir um público maior. Para analisar os cartazes,
esse fenômeno. Em seu relato podemos detec-
separamos o enfoque escolhido por cada grupo.
tar que o estudante refere-se às indústrias como
A turma foi dividida em quatro Grupos
sendo as principais responsáveis pela poluição do
(GP) para a realização desta atividade, sendo que
ar, entretanto sem a existência destas não haveria
cada GP continha sete alunos. Dois GP optaram por
emprego para a população, por isso o estudante
abordar as causas da poluição atmosférica (GP1 e
afirma: “não podemos fazer muita coisa a não ser
GP4 – 14 alunos), responsabilizando as indústrias
observar e provocar alguma reação para que o
e, principalmente, os automóveis por este pro-
mundo se conscientize com isso [...]”. Já na reda-
blema ambiental. O GP2 abordou a consequência
ção do Estudante 27, observou-se que o mesmo fez
da poluição do ar tanto na saúde humana quanto no
uma relação da imagem com a cidade de São Paulo,
meio ambiente, enquanto que o GP3 preferiu falar
abordando o tráfego de carros como um dos princi-
sobre as políticas e ações que existem para dimi-
pais problemas existentes atualmente; o estudante
nuir os impactos ambientais. A Figura 4 ilustra os
faz uma ligação deste problema com os prejuízos à
enfoques e o número de alunos envolvidos.
saúde humana, causados pelos gases oriundos destes veículos e, por fim, traz uma recomendação do
16
governo para que os habitantes optem por meios
14
de transportes menos poluentes. pelos alunos podemos detectar que muitos estu dantes demonstraram ter conhecimento sobre os problemas ambientais, porém muitos desconhecem quais atitudes e ações devem ser postas em prática para que esta realidade mude. Acreditamos que para ocorrer uma mudança de postura perante as questões ambientais deve-se refletir sobre uma série de fatores relacionados à educação formal,
12 Número de alunos
Por meio da produção textual realizada
(GP1 e GP4)
10 (GP2)
8
(GP3)
6 4 2 0
Causas
Consequências
Políticas
Figura 4. Assuntos escolhidos na elaboração dos cartazes e o número de alunos envolvidos.
buscando dessa forma uma interdisciplinaridade entre as diversas áreas do conhecimento e
Os dois grupos que abordaram as causas da
a valorização de novas ideias em termos de edu-
poluição atmosférica (GP1 e GP4) conseguiram
cação ambiental (EA) e meio ambiente (Lucatto;
relacionar o assunto com a disciplina de Química
Talomani, 2007).
ao expor em seus cartazes os principais poluentes atmosféricos, as reações de combustão completas
3.4. Elaboração de cartazes
e as reações de combustão incompletas, explicando
A elaboração de cartazes ocorreu na quarta
para a turma estas definições no dia da apresentação
e quinta etapas da metodologia utilizada nesta ofi-
do trabalho. Além disso, o GP4 utilizou o seu cartaz
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
41
Energia Versus Poluição Atmosférica: uma oficina temática para o Ensino de Química
para um desfile que ocorreu no município, onde a
4. Considerações
finais
escola participou com o tema meio ambiente. O grupo 2 optou por abordar as consequên-
Atualmente, é cada vez mais comum
cias da poluição atmosférica, apresentando um
encontrarmos trabalhos na área de Ensino de
quadro com recortes de imagens que ilustravam
Ciências que discutem a importância da utilização
tais prejuízos tanto na saúde da população quanto
de novas ferramentas para auxiliar a aprendizagem
no meio ambiente. Os integrantes do GP2 fizeram
dos alunos. Sendo assim, procuramos desenvolver
a relação do assunto com a Química através de
um estudo que visasse não apenas o aprendizado
explicações sobre as reações que ocorrem na for-
conceitual, mas também a formação cidadã dos
mação da chuva ácida. Vale destacar, ainda, que os
estudantes.
alunos deste grupo mostraram-se muito seguros e motivados na apresentação para seus colegas.
42
A oficina temática “Energia versus Poluição Atmosférica”, estruturada através de uma metodo-
Já o grupo 3 abordou algumas das políticas
logia problematizadora, teve a finalidade de con-
e ações que existem sobre o meio ambiente; por
tribuir para a compreensão de conceitos químicos,
isso, o grupo foi orientado a pesquisar no labo-
bem como para a elaboração de valores e atitudes
ratório de informática da escola, buscando infor-
por parte dos sujeitos envolvidos.
mações e documentos que pudessem auxiliá-los a
Os resultados obtidos evidenciaram que
entender melhor tais questões, como por exemplo,
os estudantes envolvidos nesta pesquisa possuem
a Política Nacional do Meio Ambiente. Através
concepções a respeito da temática poluição atmos-
de esquemas e fluxogramas, os integrantes do
férica, o que pode ter sido um fator importante
GP3 apresentaram nos cartazes algumas políticas
para a relação do tema com os conceitos quími-
nacionais do meio ambiente. Além disso, estes
cos trabalhados. Além disso, acreditamos que a
alunos proporcionaram uma discussão com toda a
proposta metodológica apresentada neste estudo
turma sobre o cumprimento dessas leis.
e as atividades decorrentes dela contribuíram para
A elaboração dos cartazes despertou um
a contextualização do Ensino de Química, visto
maior interesse na turma, mobilizando-os na
que a mesma propiciou discussões, tomadas de
tomada de decisões, na medida em que escolheram
atitudes e participação direta dos estudantes com a
o enfoque que pretendiam abordar e até mesmo
comunidade escolar.
de atitudes, quando apresentaram para turma e
De uma maneira geral, para que ocorra uma
utilizaram o cartaz no desfile. De acordo com
renovação no ensino é necessário que haja mudan-
Cachapuz et al. (2011), a idéia de uma exposição
ças nas metodologias utilizadas pelos professores.
pública pode introduzir uma forte motivação, pois
Portanto, esperamos que este estudo auxilie pro-
a atividade deixa de ser um simples exercício
fessores da educação básica a inserir estas meto-
escolar, convertendo-se na elaboração do produto,
dologias em suas práticas docentes diárias, criando
destinado ao consumo real de outras pessoas visi-
condições para que os alunos aprendam de maneira
tantes da exposição.
significativa.
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Energia Versus Poluição Atmosférica: uma oficina temática para o Ensino de Química
Referências BERBEL, N. A. N. Metodologia da Problematização no Ensino Superior e sua contribuição para o plano da práxis. Seminário. v.17, n. esp., p.7-17, 1996. ______. A Problematização e a Aprendizagem Baseada em Problemas: diferentes termos ou diferentes caminhos? Revista Interface – Comunicação, saúde, Educação. v. 2. n. 2, 1998. CACHAPUZ, A.; GIL-PEREZ, D.; CARVALHO, A. M. P. de.; PRAIA, J.; VILCHES, A. (Org). A necessária renovação do ensino de Ciências. 2. ed. São Paulo: Editora Cortez, 2011. CARLOS, A. M. M.; SANTOS, C. V.; CALDERAM, A. P.; BRAIBANTE, M. E. F. A Química do papel como tema motivador para a realização de oficinas temáticas. 31º Encontro de Debates sobre o Ensino de Química. Rio Grande, Rio Grande do Sul, 2011. CETESB. Disponível em: <http://www.cetesb.sp.gov. br/ > Acesso em: 04 jul. 2012. GARCIA, M. F. L.; LORENCINI, A. J.; ZÔMPERO, A. de. F. Análise da metodologia da problematização utilizando temas da sexualidade: Tendências e possibilidades. Anais do VII Encontro Nacional de Pesquisadores em Educação em Ciências – ENPEC. Florianópolis, Santa Catarina, 2009.
LUCATTO, L. G.; TALOMANI, J. L. B. A. A construção coletiva interdisciplinar em educação ambiental no ensino médio: a microbacia hidrográfica do ribeirão dos peixes como tema gerador. Revista Ciência & Educação, v. 13, n. 3, p. 389-398, 2007. LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em Educação: Abordagens Qualitativas. São Paulo: Editora EPU, 1986. MARCONI, M. de A; LAKATOS, E. M. Fundamentos de Metodologia Científica. 7.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2010. 297p. MARCONDES, M. E. R. et al.. Oficinas temáticas no Ensino Público: formação continuada de professores. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2007. MARCONDES, M. E. R. Proposições metodológicas para o ensino de Química: oficinas temáticas para a aprendizagem da Ciência e o desenvolvimento da cidadania. Revista Em extensão, Uberlândia, v. 7, p. 67-77, 2008. Disponível em< http://www.seer.ufu. br/index.php/emextensao/article/view/1676/1440>. Acesso em: 18 jun. 2012. MORAES, R.; GALIAZZI, M. C. Análise Textual Discursiva: Processo reconstrutivo de múltiplas faces. Revista Ciência & Educação, São Paulo, vol. 12, n. 1, p. 117-128, 2006.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
43
Relato 01 | Volume 08 | Número 01 | Jan./Jun. 2013
A Simbologia na Linguagem Química The Symbology in Chemistry´s Language Emerson Luis Pires1
Resumo
O domínio e compreensão da linguagem químico simbólica é um dos fundamentos a ser desenvolvido no decorrer do ensino médio. Nessa mesma etapa do ensino também são apresentados os conceitos básicos referentes à estrutura atômica. A adequada interpretação desses conceitos possibilitam ao aluno a capacidade de estabelecer mais facilmente correlações com demais tópicos envolvidos no estudo de Química. Desse modo, fez-se um levantamento com alunos recém-ingressantes no Ensino Superior buscando verificar qual o nível de domínio que estes possuem sobre tais fundamentos. Palavras-chave: Ensino de Química. Linguagem simbólica. Ensino médio. Abstract
The domain and comprehension of chemical symbolic language is a fundamental to be developed throughout the secondary education. During this same period of education the basic concepts related to atomic structure are also presented. The proper interpretations of these concepts give to the student the ability to more easily establish correlations with other topics in the study of Chemistry. Thus, we carried out an inquire with students newly admitted to the Higher Education to verify the domain level on those fundamental topics. Key-words: Chemistry education. Symbolic language. Secondary education.
1
Possui doutorado em Química pela Universidade Estadual de Campinas e foi professor Titular da PUC-PR onde desenvolveu diversos trabalhos e orientações na área de Ensino e Educação (com ênfase em Tecnologia Educacional) e Filosofia e História da Ciência. E-mail: emersonlp@uol.com.br
p. 45-52
1. Linguagem
Assim como a alfabetização é um dos
química simbólica
Diversas áreas do conhecimento fazem uso da linguagem simbólica. Os sinais matemáticos aritméticos estão tão integrados ao nosso dia a dia quanto os símbolos gráficos (letras) de nossa linguagem escrita. Em Química, como em outras áreas, a linguagem simbólica desenvolveu-se até atingir uma característica universal, ou seja, seus signos representam as mesmas idéias sobre um dado fenômeno ou discurso em qualquer idioma. Os primeiros diagramas de uma reação química, ainda sob um estilo alquimista, surgem na obra Tyrocinium Chymicum de 1610 de Johannis Beguini (1550-1620). Um século e meio após esse recurso ter sido apresentado, ele é utilizado nas aulas de Química na Universidade de Edinburgh por William Cullem. Desde então, a diagramação de reações químicas tornou-se prática comum tanto
primeiros elementos a serem desenvolvidos para possibilitar uma adequada comunicação dentro de uma sociedade, a linguagem química simbólica é considerada uma fundamentação primária para um adequado ensino de Química. Pedagogicamente essa etapa está inserida no ensino fundamental (tipicamente no segundo ciclo) estendendo-se até o ensino médio. Sendo assim, é esperado que ao ingressar no ensino superior esse processo de alfabetização já tenha sido concluído. Tal linguagem, do ponto de vista de uma equação química, pode ser subdividida em algumas classes: a simbologia nomenclatória, empregada para o nome de elementos e compostos, a simbologia co-matemática, responsável pelas relações de proporcionalidade, e a simbologia diagramática responsável pela indicação de estados e transformações.
em textos como em salas de aula. A introdução de seta dupla (
) indicando equilíbrio químico
entre duas formas que coexistem, e da seta de
46
2. Modelos
atômicos
duplo sentido (↔), indicativo de ressonância entre
Similar à alfabetização química simbólica,
formas canônicas que não existem, surgiram, res-
a compreensão do modelo atômico é fundamental
pectivamente, somente no final do século XIX com
para um melhor desenvolvimento e entendimento
Jacobus Henricus van’t Hoff e em 1938 por inter-
de diversos tópicos dentro do estudo de Química.
médio de Fritz Arndt (Lakshminarayanan, 2010).
Propriedades físico-químicas, reatividade, geo-
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
A Simbologia na Linguagem Química
metria molecular e outros temas poderão ser
Mais de 2000 anos se passam até que uma
mais facilmente compreendidos e assimilados
teoria reconhecida como científica seja formu-
quando estabelecemos correlações com a estrutura
lada sobre a estrutura da matéria. Em 1808, John
atômica.
Dalton propõe a Teoria Atômica que apresenta
Como é um dos primeiros assuntos a serem abordados no ensino de Química, e por apresentar notadamente um forte conteúdo histórico, o desenvolvimento didático desse tema passa a ser uma ótima oportunidade para a inseminação da metodologia científica e excelente momento para
como pontos destacados: 1. toda matéria é feita de átomos os quais são indestrutíveis e indivisíveis; 2. todos os átomos de um dado elemento são idênticos em massa e propriedades;
apresentar os conteúdos e conceitos científicos
3. compostos são formados por combina-
dentro de um panorama contextualizado histo-
ções de dois ou mais átomos deferentes;
ricamente. Deve-se, no entanto, ter o cuidado de
4. uma reação química é um rearranjo de
não transformar esse quadro em um punhado de fatos e datas isolados e, por vezes, caricata, o que o tornaria entediante e até mesmo antipedagógico. Como não é o nosso objetivo realizar um levantamento historiográfico, colocaremos aqui de forma bastante limitada, algumas pequenas pinceladas do quadro do desenvolvimento da teoria atômica a fim de ilustrar o típico conjunto de informações utilizado por professores e autores. A compreensão da estrutura da matéria ocorre no pensamento humano há muito tempo. Segundo a filosofia Jaina (Índia, século VI a.C.) todas as coisas materiais, em última análise, são produzidas através da combinação das menores partículas indivisíveis da matéria, chamadas de
átomos. Sob uma análise mais direta podemos dizer que, de fato, a concepção de átomo foi pouco ou nada alterada até então. A diferença entre o átomo de Dalton e de Demócrito se estabelece pelo fato de Dalton ter chegado a essas conclusões por meio de evidências empíricas sistemáticas, o que chamamos de método científico. Quase um século mais tarde, Joseph John Thomson faz a descoberta do elétron e em 1904 sugere um novo modelo em que o átomo é tido como uma esfera de matéria positiva na qual os elétrons estão homogeneamente dispostos. Esse modelo ficou conhecido como “pudim de amei-
anu. Os anu são eternos e todos eles têm tato,
xas” e apesar de não ser dada qualquer explicação
paladar, olfato, e cor; a formação de diferentes
sobre o que seria essa porção positiva, o fato dos
substâncias é devida aos diferentes modos geo-
elétrons terem sido identificados como partículas
métricos, esférico ou cúbico, de combinação dos
componentes do átomo trouxe uma nova realidade:
anu, para os diversos modos de seu arranjo interior
o átomo não é mais a menor partícula. Inspirado
e para a existência de diferentes graus de gha-
pelas novas descobertas, Ernest Rutherford des-
napratarabhedena (o que denominamos de espaço
cobre o próton (1911) propondo novo modelo
interatômico) (Mcevilley, 2002). Por outro lado,
atômico no qual há um núcleo atômico onde se
a mais popular concepção primária de átomo é a
encontram as cargas positivas (prótons) e, circun-
atribuida ao filósofo grego Leucipo de Mileto e a
dando esse núcleo em órbitas helicoidais, encon-
seu discípulo Demócrito de Abdera (século V-IV
tram-se os elétrons (cargas negativas), tal qual
a.C.) que teriam cunhado o termo ἀτέμνω ou átomo
um sistema planetário. Uma década mais tarde,
(ἀ-sem, τέμνω- partes).
baseando-se em princípios da física quântica que
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
47
A Simbologia na Linguagem Química
se encontrava em desenvolvimento, Niels Bohr
Na etapa nomenclatória, geralmente é ado-
“aperfeiçoa” o modelo atômico através do enun-
tada uma doutrina de memorização. Os elementos
ciado de postulados.
químicos são apresentados meramente através de
O início do século XX é marcado por uma
seus nomes e vinculados a um símbolo (com uma
série de desenvolvimentos no campo da estrutura
ou duas letras); não há qualquer identidade mais
da matéria. Elétrons, prótons, ondas e partículas;
significativa. Para a simbologia co-matemática
o comportamento no universo atômico segue
a ênfase é quase que exclusivamente dada aos
suas regras e a mecânica newtoniana não é capaz
cálculos matemáticos (estequiometria): o resul-
de representá-las: é a revolução da mecânica
tado numérico obtido é o aspecto mais relevante
Quântica. E diante desse novo modo de interpre-
e sua relação com as características químicas são
tar há a necessidade de um equacionamento, uma
minimizadas ou até mesmo desprezadas. Como
descrição matemática capaz de traduzir essa reali-
resultado dessa sistemática temos que quando uma
dade. Essa tarefa é brilhantemente executada pelo
equação química é apresentada a atenção impressa
físico austríaco Erwin Schrödinger que publica
sobre o aluno é, invariavelmente, a de uma equa-
em 1926 a chamada Equação de Schrödinger. Seis
ção matemática (com alguns elementos ou variá-
anos mais tarde James Chadwick propõe a exis-
veis alternativos) e não de uma equação química.
tência do nêutron e, de uma maneira grosseira,
As transformações que ocorrem na matéria – den-
podemos dizer que estaria construído o átomo
sidade, cor, estado físico etc. – não são vistas e
quântico. Constituído por um núcleo de dimensões
passam a ser irrelevantes; a única atenção é quanto
diminutas (recheado de nêutrons e prótons) e uma
à resposta numérica resultante.
relativamente extensa eletrosfera (onde se encon-
A legislação vigente (Brasil, 2002; Brasil,
tram os elétrons) é, simplificadamente, o modelo
2011) considera o item “estrutura atômica” como
atômico vigente.
tema básico a ser desenvolvido no percurso do ensino médio. Essa mesma legislação enfatiza ainda a importância de promover a contextuali-
3. Programa
e literatura didática
aprendizado significativo e preconiza o uso de
Conforme mencionado, o ensino da lin-
livros paradidáticos e revistas de divulgação cien-
guagem química simbólica é inserido no ensino
tífica como alternativa ao uso de livros didáticos
fundamental estendendo-se até o ensino médio.
tradicionais. Desse modo, a contextualização é
Apesar de constar na literatura didática, devido
colocada como um modo de ensinar conceitos
ao seu caráter bastante intuitivo, o ensino ocorre
científicos ligados à vivência dos alunos, caracte-
quase que na totalidade por meio da interação
rizando-se pelas relações estabelecidas entre o que
direta professor-aluno.
o aluno sabe sobre o contexto a ser estudado e os
O aprendizado é realizado de forma segmentada, isto é, a simbologia nomenclatória é geralmente
48
zação dos conteúdos como modo de atender ao
conteúdos específicos que atuam como explicação desse mesmo contexto.
feita em conjunto com a apresentação e estudo da
O tópico estrutura atômica está presente
Tabela Periódica, enquanto que a simbologia co-
em praticamente todos os livros didáticos desti-
-matemática surge quando do estudo da estequiome-
nados ao ensino médio ou superior enquanto que
tria. Só após essas duas etapas é então introduzida
vagamente surge em outros meios. Em revistas
a simbologia diagramática (equação química).
de divulgação científica de caráter mais popular
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
A Simbologia na Linguagem Química
tais como “Superinteressante” e “Ciência Hoje”,
-ingressos ao sistema de ensino superior possuem
que circulam em edições mensais desde meados
sobre a linguagem química simbólica e também
da década de 1980, são encontrados menos de
sobre a concepção da estrutura do átomo, em seu
dez artigos (entre todas as edições publicadas até
modo mais elementar. Buscou-se ainda estabelecer
o presente) em que figura a temática do modelo
possíveis relações entre formação escolar e áreas
atômico. Dessa pequena quantidade, apenas dois
de interesse com as compreensões dos conceitos
artigos têm como tema central o modelo atômico,
químicos abordados.
não apresentando, contudo, volume de dados muito superior aos encontrados previamente neste presente trabalho. Nos demais artigos desses periódicos, o espaço dado ao tópico é, por vezes, de um a dois parágrafos. Para as publicações didáticas voltadas ao ensino médio é verificado que em sua maioria os autores elaboram um capítulo ou seção destinada à apresentação dos diversos modelos atômicos conhecidos na história. No caso particular dos livros selecionados pelo Programa Nacional do Livro
5. Método
Para o levantamento de dados referentes aos conteúdos químicos, apresentamos duas questões aos alunos. A primeira questão era a seguinte: “O que você compreende por átomo; qual sua constituição?”. Na segunda questão foram apresentadas as seguintes reações químicas:
Didático para o Ensino Médio (PNLEM), como era
2Cr3+ + 3S2- + 6H2O → 2Cr(OH)3↓ + 3H2S↑
de se esperar, todos desenvolvem o tópico. Contudo,
Cr(OH)3↓ + OH–
segundo análise feita por Tavares (Tavares, 2010)
[Cr(OH)4]–
quanto aos critérios de “Construção da Ciência” e
Com relação ao primeiro questionamento,
“Método” todos os livros apresentaram-se bastante
os alunos foram orientados a responder utili-
deficientes. O desenvolvimento científico é apre-
zando qualquer forma de expressão (escrita e/ou
sentado como linear dando-se ênfase apenas ao tra-
diagramática); para o segundo questionamento,
balho individual; não é dada a devida importância a
a orientação foi quanto a dar o significado dos
aspectos como observação ou tentativa e erro. Em
itens assinalados em vermelho em cada uma das
outro critério avaliado pelo mesmo autor, “Modelo/
reações acima. O tempo total para execução foi
Realidade”, conclui que apenas 1/3 dos livros cum-
de uma hora. O teste foi aplicado a alunos ingres-
priram de forma parcial para o esclarecimento da
sos ao ensino superior em universidades privadas
questão; frases soltas e notas laterais, sem desen-
localizadas na cidade de Curitiba, Paraná. A sele-
volver apropriadamente o conteúdo. Em suma,
ção dos alunos participantes do questionário foi
os aspectos humanos que transitam nas diferentes
baseada na condição que tais apresentassem idade
faces da ciência são pouco destacados.
inferior a vinte anos e que pertencessem aos cursos de Química, Engenharia Química, Engenharia de Alimentos ou Farmácia (podendo ser na modalidade de Bacharelado ou Licenciatura). A
4. Objetivo
aplicação do teste ocorreu sempre no primeiro
Esse trabalho tem por objetivo verificar qual o nível de domínio que alunos recém-
mês de acesso ao ensino superior, ou seja, alunos recém-ingressantes.
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
49
A Simbologia na Linguagem Química
Após a aplicação do teste um questionário
essas se destacam as disciplinas de caráter bioló-
de caráter informativo foi aplicado no qual consta-
gico para os cursos de Engenharia de Alimentos e
vam os seguintes itens:
Farmácia e as disciplinas relacionadas à matemá-
1. o curso médio foi realizado em entidade pública ou privada?
tica para os cursos de Engenharia de Alimentos ou Engenharia Química.
2. realizou curso preparatório (cursinho), quanto tempo? 3. qual a motivação para a escolha do curso? O número total de alunos participantes foi de 1146, distribuídos da seguinte forma: Engenharia de Alimentos (182), Engenharia Química (268), Farmácia (322) e Química (374).
Com relação às questões envolvendo conhecimento químico, para a primeira questão (constituição atômica) foi considerado como resposta satisfatória a simples informação desse ser constituído por prótons, nêutrons e elétrons. No entanto, 475 alunos (acima de 40%) responderam ser o átomo um constituinte básico da matéria cuja característica principal é ser indivisível. Outros 108 alunos (9,4%) responderam ser o átomo indivisível, porém constituído de partes
6. Resultados
e discussão
menores, o que em si é um contra-senso. Nenhum desses alunos citou qualquer partícula subatômica.
Para uma análise mais adequada, os resulta-
E ainda, 42 alunos (3,7%) não responderam ou
dos do questionário informativo são apresentados
apresentaram respostas não consistentes, como
inicialmente.
por exemplo: “ainda não se sabe nada a respeito
A restrição em um universo amostral com
do átomo” ou “é algo que está sendo estudado pela
faixa etária inferior a vinte anos teve por objetivo
NASA”. Das respostas consideradas satisfatórias
a eliminação de possíveis alunos que teriam obtido
(45,3%) somente 258, isto é, menos de 25% dos
a formação no nível médio e que por motivos de
alunos foram capazes de informar com certo grau
qualquer ordem não tenham dado continuidade
de clareza a constituição elementar de um átomo,
imediata aos estudos (o que poderia distorcer os
citando suas sub-partículas, núcleo e eletrosfera.
resultados). O perfil do universo amostral obtido
Na Tabela 1 pode-se ver a distribuição das res-
pelo questionário informativo revelou que mais
postas inadequadas com respeito aos cursos e com
de 80 % dos alunos haviam realizado curso pre-
relação aos alunos que se declararam com inte-
paratório com, no mínimo, seis meses de duração,
resse natural ou facilidade de compreensão pelo
e que 65 % haviam realizado o curso médio em
conhecimento específico na área de Química.
instituições privadas. Quanto ao interesse ou motivação pelo curso escolhido, quase 40% dos alunos
tabela 1. Perfil de erro e interesse por curso.
(453) atribuem às mais diversas razões, tais como
Curso
oportunidade de emprego, determinação familiar ou mesmo escolha aleatória. Para os demais alunos a escolha foi feita por afinidade com as disciplinas centrais do curso. Contudo, uma grande parcela dos alunos dessa mesma porção (282 alunos) atribui a outras áreas de conhecimento que não a Química como principal fator motivador; entre
50
Eng. Alimentos
Eng. Química
Farmácia
Química
Resposta inadequada
99 (54,4)*
154 (57,4)
259 (80,4)
113 (30,2)
Interesse ou facilidade por Química
49 (26,9)
117 (43,7)
42 (13,0)
203 (54,3)
* Os valores entre parênteses representam a % do total de alunos referente ao curso.
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
A Simbologia na Linguagem Química
Considerando a segunda questão, 611
superior (cerca de 9% a mais de respostas satisfa-
alunos responderam satisfatoriamente ao menos
tórias) a dos que frequentaram a rede pública. Esse
quatro dos cinco itens marcados para análise; 401
resultado pode ser entendido pelo fato que muitas
entre dois e três itens e 134 apenas um ou nenhum
das instituições privadas adotam os mesmos recur-
item. O perfil de respostas inadequadas para essa
sos (livros) da rede pública ou que quando fazem
questão seguiu a mesma distribuição com respeito
uso de material didático próprio (apostilas), estes
aos cursos que aquela analisada quando da ques-
devem apresentar-se com conteúdo muito próximo
tão anterior. Considerando apenas as respostas
aos livros tradicionais. Tais resultados sugerem
insuficientes (isto é, aquelas que resultaram em
ainda que, independentemente do material ado-
nenhum ou somente um acerto), o maior percen-
tado, a prática didática não apresenta diferenças
tual foi verificado para o curso de Farmácia com
substanciais entre a rede pública e privada. Essas
aproximadamente 32,7% dentre seus alunos. Para
considerações são somente proposições generaliza-
os demais cursos a insuficiência foi menor e mais
das e não podem, de forma alguma, serem tomadas
homogeneamente distribuída, com um percentual
como absolutas. Obviamente, existem instituições
ficando na faixa de 15-20%. Tomando-se a sim-
(públicas ou privadas) que trabalham com material
plicidade da questão, pode-se considerar que um
físico e humano diferenciado, resultando em qua-
conhecimento básico sobre a linguagem química
lidade superior no processo ensino-aprendizagem.
simbólica deveria ser suficiente para resultar no
Também podemos observar que a presença
acerto de ao menos 4 dos itens apresentados; con-
de cursos preparatórios não tem acrescentado
tudo, somente cerca da metade dos alunos (53,3%)
muito no que diz respeito à compreensão de princí-
foi capaz de tal. Apesar do resultado geral para
pios. Aparentemente, o ensino médio está fundado
a segunda questão ter sido mais assertivo que o
no cumprimento de um programa, sem qualquer
obtido para a questão anterior, o padrão de respos-
preocupação com um entendimento adequado
tas obtido demonstrou certa dificuldade por parte
sobre os temas desenvolvidos.
dos alunos em expressar as respostas. A título de exemplo, pode-se citar respostas como “o composto sobe” ou “o composto vai pra baixo”, para o caso das setas ascendentes e descendentes (indi-
7. Conclusão
cativos de formação de composto em fase gasosa
A relação entre interesse ou facilidade pelo
e sólido, respectivamente) ou ainda, para a seta
assunto (conforme informado pelos próprios alu-
dupla (reação em equilíbrio) frases como “a reação
nos) e o acerto é bastante evidente. No entanto,
vai e volta”.
mesmo para os cursos que apresentam um maior
Os resultados obtidos demonstraram que o
número de alunos declarados interessados, o índice
fato do ensino médio ter sido realizado em institui-
de insuficiência foi bastante expressivo. Apesar
ção privada ou pública não causou impacto signi-
dos temas aqui trabalhados estarem inseridos no
ficativo sobre o aprendizado dos tópicos desenvol-
ensino médio e em parte do fundamental, e cons-
vidos nesse trabalho. Analisando-se as respostas
tarem da literatura didática comumente utilizada,
satisfatórias pode-se verificar que aquelas prove-
os alunos têm ingressado no ensino superior com
nientes de alunos que cursaram o ensino médio
grande deficiência em alguns fundamentos quími-
em entidades privadas foram apenas um pouco
cos básicos.
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
51
A Simbologia na Linguagem Química
Os resultados aqui expostos refletem uma grande deficiência no processo ensino-aprendizagem em vários aspectos: material didático deficiente, profissionais mal preparados, progressão inadequada, seleções por exames vestibulares equivocados. Supostamente, o ensino atual está moldado na visão do produto final e não nos princípios geradores. A adoção de uma prática didática contextualizada parece estar distorcida, sendo conduzida utilizando-se de meras exemplificações tomadas a partir de situações cotidianas, porém, sem dar a devida significância dos fatos e nem mesmo a compreensão adequada dos fenômenos envolvidos.
52
Referências BRASIL. LDB: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 6ª Ed., Centro de Documentação e Informação, Edições Câmara, Brasília, 2011. ______. PCN + Ensino Médio: Orientações complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Secretaria de Educação Media e Tecnológica. Brasília: MEC; SEMTEC, 2002. LAKSHMINARAYANAN, A. Arrows in Chemistry. Resonance, v. 15, p. 51-63, 2010. McEVILLEY, T. The Shape of Ancient Thought: Comparative Studies in Greek and Indian. Allworth Press, New York, 2002. TAVARES, L. H.W. A História da Ciência nas Obras de Química do Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio: Uma Análise Através do Conceito de Substância. Dissertação de Mestrado, UNESP, Bauru, 2010.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Relato 02 | Volume 08 | Número 01 | Jan./Jun. 2013
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo Teaching Stoichiometry Through Video Maria Alice Reis Pacheco1 Pedro Faria dos Santos Filho2
Resumo
Este trabalho apresenta uma proposta didática baseada na aplicação de vídeos na disciplina de Química Geral, oferecida aos alunos de Engenharia da Universidade de Caxias do Sul. O conteúdo de Química abordado foi estequiometria e a análise desta aplicação aponta para o potencial desta estratégia em favorecer a aprendizagem dos alunos no assunto estudado. Palavras-chave: Ensino de química. Novas metodologias. Estequiometria. Abstract
This work presents a didactic proposal based on videos application in the general chemistry discipline, offered to engineering students of Caxias do Sul University. The topic stoichiometry was studied and the analysis of this approach points to the potential of this strategy, favoring the learning process in this topic. Key-words: Teaching chemistry. New methodologies. Stoichiometry.
1
Universidade de Caxias do Sul – UCS.
2
UNICAMP, Instituto de Química, Campinas-SP.
p. 53-66
1. Introdução
A aprendizagem pode ser entendida como uma mudança de comportamento das pessoas, que, geralmente, ocorre de forma contínua. Para que ocorra aprendizagem é necessário uma pes-
propicia situações para que o aluno adquira conhecimento, relacionando-o com suas concepções prévias. Cunha e Giordan (2009), a respeito da postura dos alunos quando são convidados a participarem de atividades multimídia, comentam: O desafio é fazer o aluno tornar-se um espectador mais crítico, seletivo e exigente quanto às suas escolhas e, portanto, quanto a sua posição de espectador, formar uma opinião crítica e argumentada a respeito do que a mídia produz como um todo e como elemento específico da sua educação formal.
soa que aprende, um professor e uma situação de aprendizagem. Essa situação de aprendizagem é um processo de construção de conhecimento, que engloba as experiências e saberes prévios do indivíduo, bem como o conhecimento a ser adquirido. De acordo com essa concepção, o construtivismo pode ser entendido como uma das maneiras pelas quais os indivíduos aprendem. Sobre isso, em uma visão construtivista: É importante salientar que, para a construção da aprendizagem em um ambiente construtivista, o professor se conscientize da importância de ser um educador-educando, e que todos os processos de aprendizagem devem estabelecer uma interação muito forte entre o sujeito da aprendizagem e o objeto, aqui simbolizando como objeto, o todo envolvido no processo, ou seja, o professor, [...], os colegas, o assunto (Santos, 2007).
Conforme essa perspectiva, o professor passa a ser um facilitador, um orientador, que
54
Aprender, para Vygotsky, conforme Verzoto (2008), é, então, um processo dialógico, que envolve troca de experiências entre pessoas. Considerando o âmbito escolar, nesse processo de mediação, o professor usa ferramentas culturais, tais como: a linguagem, os jogos e as atividades, por meio das quais o estudante não só assimila e acomoda, mas internaliza, domina e apropria-se de instrumentos culturais, como os conceitos, as ideias, a linguagem adequada e as competências. Assim sendo, o desenvolvimento dos processos cognitivos é o resultado de uma aprendizagem mediada. Essa troca de experiências acontece entre o professor e o aluno, levando em conta as concep-
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
ções prévias deste último sobre o assunto. Reside
No que se refere à animação, esta tem se
aí a importância de se valorizarem os conhecimen-
configurado como uma possibilidade promissora
tos prévios dos educandos, pois serão os suportes
no processo de ensino-aprendizagem, por ser um
para a construção do conhecimento. Segundo os
recurso capaz de facilitar a demonstração de pro-
princípios da teoria construtivista, as práticas edu-
cessos, a visualização temporal de um dado evento,
cativas relacionadas ao ensino de Ciências devem
a exposição de fenômenos raros, complexos ou
ser baseadas na utilização de ideias prévias do estudante, uma vez que o processo de aprendizagem ocorre a partir do que ele já conhece (Verzoto, 2008). Essa nova visão de aprender, centrada no aluno, nas suas concepções prévias, conduziu a novos paradigmas. Condizente com esses novos paradigmas, está a busca por novas metodologias que tornem o ensino de Química mais relacionado com o cotidiano e que estimulem o espírito crítico dos alunos. Desse modo, os conteúdos químicos propiciam a contextualização, desenvolvendo a capacidade de participação e a tomada de decisão, através de debates em sala de aula e da problematização de situações em que o aluno deve propor soluções (Carvalho, 2009). Dentre as novas metodologias, encontra‑se a utilização de recursos audiovisuais tais como softwares, animações e vídeos. No caso dos softwares, a limitação reside no fato de que muitas escolas não têm computadores; mas, por outro lado, nas escolas em que há as ferramentas da informática disponíveis para os educandos, os softwares têm a vantagem de possibilitar as simulações de conteúdos nas situações em que não existam laboratórios de ciências. Essas simulações devem permitir a interação do aluno com o software, fazendo com
perigosos e, também, por conseguir melhorar a capacidade de abstração do aluno (Fiscarelli; Oliveira; Bizelli, 2009). Já o uso do filme, como recurso pedagógico, aparece como uma tentativa de introduzir uma ação ainda pouco comum no cotidiano escolar. Essa prática traz a possibilidade de se utilizarem, não somente palavras, mas também imagens – muitas vezes bem mais atrativas e persuasivas do que a fala do professor – as quais, inclusive, conseguem trazer um impacto muito maior do que o do livro ou de uma aula expositiva (Francisco, 2006). Entretanto, a utilização de filmes nas aulas pode apresentar algumas desvantagens, principalmente quando eles são passados sem um objetivo mais específico. Isso costuma ocorrer quando esse recurso é usado apenas para ilustrar um fenômeno, ou quando não há um questionamento consistente a respeito do conteúdo exibido, uma análise crítica ou uma discussão sobre ele. As
estratégias
citadas
anteriormente
estão presentes – embora pudessem aparecer de forma ainda mais expressiva – tanto no Ensino Fundamental, quanto no Médio e no Superior. Um exemplo, no Ensino Superior, a ser citado é o desenvolvimento de animações, abordando vários tópicos referentes ao concreto armado do projeto “Novas Metodologias para o Ensino de Engenharia
que ele seja um ser ativo no processo. Medeiros
de Estruturas, Utilizando Recursos de Multimídia
ressalta esse aspecto, quando comenta que a uti-
Interativa”, do Departamento de Engenharia de
lização de softwares ou programas multimídias
Estruturas e Fundações da Escola Politécnica da
precisa oferecer estratégias de interação com os
USP. Nesse trabalho, foram desenvolvidas, por
usuários, por exemplo, fazendo com que eles pensem
professores e alunos de iniciação científica, treze
e proponham soluções para algum problema verificado
animações. Esse material está disponibilizado na
(Medeiros, 2008).
internet (Assis; Bittencourt; Noronha, 2006).
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
55
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
nos sobre o assunto abordado e as sugestões para
2. Metodologia
Este
trabalho
foi
desenvolvido
na
Universidade de Caxias do Sul, na cidade de Caxias do Sul (RS), e a escolha dos temas a serem estudados, os roteiros e as filmagens foram direcionadas para as dificuldades encontradas pelos professores dessa instituição. O vídeo produzido tem duração aproximada de vinte e cinco minutos e enfatiza a
a melhoria do recurso aplicado. Dessa maneira, criou-se um questionário pré-atividade, com questões que permitissem avaliar o conhecimento prévio do aluno naquele assunto. Esse questionário precisava ser claro e curto e, de preferência, com questões objetivas. O questionário que foi aplicado aos alunos apresentava-se da seguinte maneira:
importância das quantidades nos alimentos.
Avaliação do vídeo sobre quantidades – Questionário Pré-vídeo
O vídeo se inicia com uma situação do cotidiano, na qual um alimento é preparado através
1. Qual a importância da relação entre quantidades em nossa vida? ( ) 0 (nenhuma) ( ) 1 (pouca) ( ) 2 (regular) ( ) 3 (muito)
de várias receitas. A dependência da qualidade do alimento, de acordo com as quantidades utilizadas, é marcante e surge um diálogo para enfatizar essa ideia. Para confirmar isso, por meio de procedi-
2. Como você avalia que seja o seu entendimento sobre o conceito de estequiometria? ( ) 0 (nenhuma) ( ) 1 (pouca) ( ) 2 (regular) ( ) 3 (muito)
mentos científicos, transfere-se essa situação para um ambiente de laboratório químico. Ali, imagina-se um procedimento experimental em que, através de uma observação visual, é possível comprovar a
3. Você acha que o conceito de estequiometria pode estar inserido em seu cotidiano? ( ) 0 (não) ( ) 1 (pouco) ( ) 2 (talvez) ( ) 3 (sim, muito)
influência das quantidades na natureza do resultado final. Nesse momento, no laboratório, é ressaltada, também, a importância da utilização de EPIs. O procedimento experimental que foi filmado enfa-
4. Você acha que é possível inserir o cotidiano no estudo da estequiometria? ( ) 0 (não) ( ) 1 (pouco) ( ) 2 (talvez) ( ) 3 (sim, muito)
tiza o método das variações contínuas, utilizando soluções de cloreto de bário e dicromato de potássio. Os aspectos importantes desse procedimento foram enfatizados nos diálogos que acompanharam o experimento, conduzido sob a supervisão de
5. Você conhece algum exemplo do seu dia a dia em que o conceito de estequiometria esteja inserido? Cite-o.
um docente da Universidade de Caxias do Sul. O passo seguinte foi a elaboração de um
56
instrumento de avaliação; optamos pela elaboração
Após a exibição do vídeo, os alunos foram
de um questionário, cuja tarefa não foi fácil, uma
questionados novamente. Foram elaborados, então,
vez que não existe uma norma de avaliação e era
dois questionários, sendo um com questões predo-
preciso organizar o instrumento de maneira que ele
minantemente objetivas e outro com questões sub-
fornecesse informações sobre os questionamentos e
jetivas, visando coletar informações e sugestões a
indagações consideradas pertinentes. Assim, tinha
respeito do recurso propriamente dito, bem como
que se conseguir obter dados sobre a validade do
sobre melhorias e adequações no mesmo. Estes
recurso aplicado, o conhecimento prévio dos alu-
questionários são mostrados a seguir:
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
Avaliação do vídeo sobre quantidades – Questionário Pós-vídeo 1. Qual a importância da relação entre quantidades em nossa vida? ( ) 0 (nenhuma) ( ) 1 (pouca) ( ) 2 (regular) ( ) 3 (muito) 2. Como você avalia que seja o seu entendimento sobre o conceito de estequiometria? ( ) 0 (nenhuma) ( ) 1 (pouca) ( ) 2 (regular) ( ) 3 (muito) 3. Você acha que o conceito de estequiometria pode estar inserido em seu cotidiano? ( ) 0 (nenhuma) ( ) 1 (pouca) ( ) 2 (regular) ( ) 3 (muito)
Como na Universidade de Caxias do Sul não existe uma turma específica de Química Geral para qualquer curso, e o número de alunos em cada uma dessas turmas é muito parecido, escolheu-se, aleatoriamente, uma turma para participar desse processo. É importante salientar que houve uma consulta prévia para saber se todos os alunos concordariam em contribuir no processo de avaliação da eficiência do vídeo. A disciplina Química Geral é de início de curso sendo, geralmente, oferecida nos primeiros semestres dos vários cursos de Engenharia, Bacharelado em Química e cursos tecnológicos. A Figura 1 indica a origem dos alunos matriculados nessa turma escolhida de Química
4. Você acha que é possível inserir o cotidiano no estudo da estequiometria? ( ) 0 (não) ( ) 1 (pouco) ( ) 2 (talvez) ( ) 3 (sim, muito)
Geral. Nela, percebe-se a variedade de cursos de
5. Você conhece algum exemplo do seu dia a dia em que o conceito de estequiometria esteja inserido? Cite-o.
que a grande maioria dos alunos ainda se encontra
6. Você acha que o seu entendimento sobre o conceito de estequiometria mudou para melhor após você assistir o vídeo? 7. Você acha que a utilização de vídeos, para ilustrar um conceito de Química, ajuda a consolidar o conceito?
Engenharia nos quais os alunos estão matriculados. Já a Figura 2 mostra a faixa de créditos já cursados pelos alunos; por meio dela, observa-se no início do curso.
5% Eng. Alim. 5% Bach. Quím. Ind. 6% Eng. Elét.
2% Ciênc. Cont. 2% Sist. Inf.
Avaliação do vídeo sobre quantidades – Questões discursivas 1. No vídeo, relacionam-se as quantidades com situações do cotidiano. Você saberia descrever outra situação do cotidiano em que as quantidades são importantes? 2. Quando, no vídeo, é comentado sobre a preparação do bolo, algum fato lhe chamou a atenção, quer seja de uma maneira positiva ou negativa? 3. Com relação à postura dos alunos, quando foram para o laboratório, comente os aspectos positivos e negativos dessa postura. 4. No experimento mostrado no vídeo, enfatizando a reação entre o cloreto de bário e o dicromato de potássio, como você percebeu a relação entre as quantidades?
1% Tec. Polím.
6% Eng. Mec. 8% Eng. Cont. Aut.
20% Eng. Mat.
8% Eng. Quím. 15% Eng. Amb.
13% Eng. Civil
9% Eng. Prod.
Figura 1. Cursos de Engenharia em que os alunos estão matriculados.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
57
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
3% 61-80 2% 81-100
assunto propriamente dito. A questão discursiva
5% 41-60 10% 21-40
0-20 80%
5 tinha por objetivo perceber se houve ou não mudança na percepção sobre o assunto, após a apresentação do vídeo e, ainda, se o aluno conseguiu relacioná-lo com situações do seu dia a dia. As questões discursivas 6 e 7 tinham a intenção de avaliar a percepção do aluno em relação à qualidade do vídeo, sendo que as observações dos
Figura 2. Número de créditos já cursados.
estudantes servem para ajudar na reformulação ou melhoria do vídeo utilizado. Para completar a avaliação dos alunos
Inicialmente, aplicou-se o questionário
sobre o vídeo, um terceiro questionário foi apli-
pré-vídeo, descrito anteriormente. Essa atividade
cado. Esse questionário, totalmente discursivo,
tomou, aproximadamente, 20 minutos da aula, que
tinha o intuito de buscar as opiniões dos alunos.
tem um total de 3 horas. O questionário, como já
É pertinente mencionar que os questioná-
mencionado, era composto de quatro questões de
rios aplicados permitiram buscar as concepções
múltipla escolha e uma questão discursiva. As ques-
prévias dos alunos (questionário do pré-vídeo),
tões 1, 3 e 4 tinham o objetivo de verificar se os
bem como as informações sobre as vantagens de
alunos relacionavam o assunto com o cotidiano. A
se assistir o vídeo, da influência desse vídeo sobre
questão 2 era pontual, no que se refere ao conhe-
o seu conhecimento prévio e de que maneira isso
cimento que o aluno tinha, ou pensava que tinha,
alterou ou não o seu conhecimento sobre o assunto
sobre o assunto focalizado. A questão 5, discursiva,
(questionário pós-vídeo). Todas as respostas aos
solicitava que o aluno descrevesse uma situação
questionários auxiliaram para que se pudesse fazer
do cotidiano em que ele percebia a aplicação do
alterações e mudanças no vídeo, visando adequá-
assunto abordado, no caso, estequiometria.
-lo às necessidades e interesses dos alunos.
Em seguida, o vídeo foi exibido para uma turma de Química Geral, oferecida no período noturno, com 86 alunos. Como as exibições foram na própria sala de aula, não houve nenhum contratempo
58
3. Resultados
e discussão
decorrente de deslocamento dos alunos e tão pouco
Por meio dos dados mostrados nas Figuras
demora na exibição. Mesmo com pouca intensidade
1 e 2, pôde-se perceber que os alunos que participa-
de luz durante a exibição, não houve problema com
ram da pesquisa são de uma variedade muito grande
relação ao comportamento dos alunos.
de cursos de Engenharia e que a grande maioria
Após a exibição do vídeo, sem qualquer
está iniciando o curso. Isso levou à elaboração de
interferência do professor, foi aplicado um segundo
um roteiro que fosse bastante geral e que não prio-
questionário. Esse questionário era composto de 7
rizasse nenhuma das engenharias envolvidas, pois
questões, sendo as quatro primeiras de múltipla
isso criaria um ambiente que priorizaria apenas uma
escolha e as três restantes discursivas. Também,
parte dos alunos. Além disso, visto que a grande
nesse questionário, as questões 1, 3 e 4 buscavam
maioria está iniciando o curso, fez-se uma abor-
obter informações sobre a relação do assunto com
dagem um pouco superficial, mas coerente com o
o cotidiano. A questão 2 era, novamente, sobre o
nível de conhecimento desses alunos ingressantes.
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
20% 1 pouca (11)
2% 0 nenhuma (1)
11% 2 regular (9)
7% 1 pouca (5)
82% 3 muito (72)
29% 2 regular (25)
49% 3 muito (49)
0% 0 nenhuma (0) pré-video
pós-video
Figura 3. Respostas à pergunta sobre a importância das quantidades em nossa vida nos questionários pré e pós‑vídeo.
No primeiro questionário, aplicado antes
avaliavam o seu conhecimento sobre o assunto,
da exibição do vídeo, os alunos foram perguntados
alguns disseram que seu conhecimento era pouco.
sobre “a importância da relação entre quantidades
Diante desse resultado, surgiu a dúvida se eles,
quaisquer na nossa vida”. Depois, após a exibição
de fato, conseguiram perceber a importância da
do vídeo, foi feita a mesma pergunta aos alunos.
quantidade nas suas vidas com tão pouco conhe-
Os resultados estão mostrados na Figura 3.
cimento, ou mesmo, se muitos deles não sabiam
É possível constatar que a grande maioria – no pré e pós-vídeo – da turma manifestou
que a estequiometria se referia ao compromisso entre quantidades.
que “as quantidades são muito importantes na
A questão seguinte esclareceu a dúvida
nossa vida”, sendo que esse resultado ficou mais
levantada no parágrafo anterior pois, nela, os alu-
expressivo depois que assistiram ao vídeo. É
nos deveriam avaliar o seu conhecimento sobre
possível também questionar se eles, realmente,
estequiometria, sem que o professor desse qual-
perceberam essa presença, pois na questão 2,
quer informação sobre o significado desse termo.
quando foram solicitados para responder como
Os resultados estão mostrados na Figura 4.
27% 0 nenhuma (14)
6% 3 muito (7)
4% 0 nenhuma (3)
13% 1 pouca (10) 16% 3 muito (16)
40% 1 pouca (30)
67% 2 regular (57)
27% 2 regular (35)
pré-video
pós-video
Figura 4. Respostas à questão sobre o entendimento prévio dos alunos sobre estequiometria.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
59
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
9% 0 nao (8)
4% 1 pouca (2)
13% 2 talvez (18)
2% 1 pouca (1) 38% 3 sim, muito (31)
49% 2 talvez (45)
85% 3 sim, muito (67)
0% 0 nenhuma (0) pré-video
pós-video
Figura 5. Respostas à questão se os alunos acham possível inserir o conceito de estequiometria no seu cotidiano.
A comparação entre essas análises indicou
Observou-se que grande parte dos que
que a maioria dos alunos que apresentavam pouco
não imaginavam que “o conceito de estequiome-
ou nenhum conhecimento sobre o assunto consi-
tria estivesse tão presente em nosso cotidiano”,
deraram que, depois do vídeo, passaram a apresen-
passaram a afirmar que ele está inserido no coti-
tar um conhecimento regular. Verificou‑se ainda
diano. Dos 86 alunos, apenas 19 permaneceram
que daqueles que já apresentavam conhecimento
com alguma dúvida quanto a isso. Sendo assim,
regular, nove passaram a ter muito conhecimento.
pode-se constatar que, sob esse aspecto, o vídeo
Isso reforça a ideia de que a apresentação do vídeo
foi muito útil. Depois que os alunos manifestaram a opi-
contribuiu para uma melhora nessa percepção dos
nião de que o conceito de estequiometria poderia
alunos. A próxima questão buscava saber se, na
ser inserido no cotidiano, perguntou-se a eles se o
opinião dos alunos, o conceito de estequiometria
cotidiano poderia ser colocado no estudo da este-
poderia ser inserido no cotidiano. Apresentam-se
quiometria. As respostas dos alunos estão exibidas
os resultados na Figura 5.
nos gráficos que aparecem na Figura 6.
27% 2 talvez (12)
9% 0 nao (3) 40% 2 talvez (28)
51% 3 sim, muito (43)
0% 1 pouca (28)
73% 3 sim, muito (70)
pré-video
pós-video
0% 0 nao (0) 0% 1 pouca (0)
Figura 6. Respostas à questão sobre o entendimento dos alunos sobre o conceito de estequiometria estar inserido em seu cotidiano.
60
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
Percebeu-se que, baseados nas suas con vicções de saberem o assunto estequiometria, a
no assunto estequiometria. Esses dados aparecem na Tabela 1.
maioria dos participantes manifestou, no pré‑vídeo,
É preciso registrar que, mesmo dizendo,
que talvez; mas, após assistirem ao vídeo, ficaram
no questionário pré-vídeo, que não tinham muito
ainda mais convictos dessa possibilidade de inserir
conhecimento do assunto estequiometria, os alu-
o cotidiano no estudo da estequiometria. Contudo,
nos conseguiram citar vários exemplos em que o
não se pode esquecer que eles mesmos manifestaram
assunto se apresenta no seu cotidiano. Depois do
que possuíam pouco conhecimento prévio sobre o
vídeo, os percentuais aumentaram e as citações de
assunto e que, somente depois do vídeo, esse conheci-
exemplos se ampliaram. Perceberam-se algumas
mento passou a ser mais expressivo. Então, talvez se
contribuições das vivências dos alunos, pois vários
possa ponderar que, apesar do pouco conhecimento
deles já trabalham e os exemplos citados são de
do assunto, baseado também nas suas vivências, eles
suas atuações profissionais. Os alunos também manifestaram a sua
foram capazes de estabelecer alguma relação entre o
opinião em relação ao seguinte aspecto: o vídeo
cotidiano e a estequiometria. esse
contribuiu para o entendimento do conceito de
conhecimento por parte dos alunos, ao analisar as
estequiometria? Com esses dados foi elaborada a
relações estabelecidas por eles, com o cotidiano,
Tabela 2.
É
possível
entender
melhor
Tabela 1. Respostas em que os alunos citam exemplos do cotidiano nos quais o conceito de estequiometria se apresenta. Pré-vídeo
Pós-Vídeo
Nº
%
Respostas
Nº
%
Respostas
40
46,5
Não (14); mas gostaria de saber (1); não me recordo (10); não responderam (15).
17
19,8
Não (5); não respondeu (10); nesse momento não lembro (2).
26
30,2
Sim (2); fabricação de remédio (5); cozinha (15); fabricação de bebidas (4).
46
53,4
Sim (4); fazer bolos (5); fazer comidas (27); produção de fármacos (8); produção de bebidas (2).
17
19,8
Sim, na mistura para fazer tijolos (3); misturas de concreto (7); preparo de soluções (2); formulação de tintas (2); relação do combustível no cilindro (2).
20
23,3
Sim, na produção de cimento (7); fazer sabonetes e produtos de limpeza (8); fabricação de tijolos (1); ligas metálicas (4).
3
3,5
Em todos os momentos
3
3,5
Sim, no preparo de tintas (1); soluções (2)
Tabela 2. Respostas dos alunos, sobre a mudança do seu entendimento sobre o conceito de estequiometria, após assis tirem ao vídeo. Nº
%
Respostas
17
20
Não (10); Já sabia sobre essa matéria (1); Não respondeu (1); Não se alterou (2); Mais ou menos (1); Continuou o mesmo (2).
42
48,7
Sim (31); Mudou para melhor (7); Observei melhor a importância das quantidades/proporção (4).
20
23,2
Sim, esclareceu dúvidas, pois o assunto ficou mais próximo do cotidiano (12); Acabamos entendendo o que é estequiometria (1); Ficou mais claro devido à visualização (2); Compreendi a importância das quantidades (5).
3
3,5
Sim, mas em virtude da inexperiência dos atores e produção, pode-se melhorar o entendimento, mas foi válido.
2
2,3
Sim, com um conceito amplo ainda melhorou para esclarecer como funciona a estequiometria.
2
2,3
Não consegui ouvir muito bem as explicações.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
61
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
Constatou-se que um número expressivo de
cotidiano, o seu conhecimento sobre o assunto,
alunos afirmaram que o vídeo ajudou a melhorar os
se o vídeo o ajudou a ampliar seu conhecimento
conceitos de estequiometria. Essa fala dos alunos
do assunto e as opiniões dele sobre o vídeo, para
realmente faz sentido quando se retoma a questão 5
ajudar a fazer reformulações, se necessário. Diante
dos questionários pré-vídeo e pós-vídeo, na medida
das respostas apresentadas e já comentadas,
em que se notou que houve um acréscimo nas res-
acredita-se que as expectativas foram superadas,
postas dos alunos, quanto aos exemplos do cotidiano,
pois além dos estudantes participantes manifesta-
fornecidos por eles, em que o assunto está presente.
rem interesse e aceitação do vídeo, como recurso
A seguir, a Tabela 3 apresenta os comentá-
didático, explicitaram conhecimentos por meio de
rios dos alunos, que manifestam se a utilização do
exemplos. Com relação às sugestões dadas pelos
vídeo ajudou ou não a consolidar o conceito.
alunos envolvidos, nas questões 6 e 7, constatou-
Nessa questão, a aceitação do vídeo, como
-se que foram muito claros e fizeram ponderações
um recurso para ajudar na consolidação do con-
bem adequadas e pertinentes, que, inclusive, per-
ceito, foi confirmada pela maioria dos alunos. O que
mitiram a obtenção de excelentes pontos norteado-
se destacou foram as indicações de como esse vídeo
res, os quais vão colaborar, de forma significativa,
deveria ser. Segundo os alunos: deveria ter um bom
para a melhoria do vídeo exibido. Com o intuito de coletar mais informações
áudio, ser objetivo e divertido, além de chamar a atenção dos estudantes.
sobre a influência do vídeo em relação ao enten-
É importante relembrar que os questio-
dimento dos conteúdos e conceitos, por parte dos
nários aplicados, tanto no pré-vídeo quanto no
alunos, foram aplicados questionários discursivos.
pós-vídeo, tinham alguns objetivos específicos,
Esses questionários foram respondidos pós-vídeo,
tais como: perceber a relação do aluno com o
e as respostas estão mostradas na Tabela 4.
Tabela 3. Respostas dos alunos, sobre se a utilização do vídeo ajudou a consolidar o conceito de estequiometria. Nº
62
%
Respostas
9
Não (1); Uma boa explicação basta (1); Indiferente (1); Um pouco (2); Não, uma boa explicação basta, já que é 10,5 um assunto de fácil compreensão (3).
58
Sim (29); Facilita o entendimento (4); Se o vídeo for divertido e objetivo (2); Relaciona com o cotidiano (12); 67,4 Sim pois é uma forma de chamar a atenção dos alunos (2); Sim, pois ilustra e relaciona teoria e prática (7); É um modo diferente de ampliar horizontes (2).
5
5,8
Sim, mas não é suficiente e precisa de aulas para aprofundar o conhecimento.
4
4,7
Talvez, depende do vídeo (2); Pois para algumas coisas dependemos de conceitos (2).
6
7
2
2,3
Com certeza (2); Ajuda muito (4). Sim, se o áudio alcançar até o final da sala.
2
2,3
Sim, para o conceito é viável, mas na parte teórica não influencia muito.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
Tabela 4. Respostas dos alunos, sobre as situações do cotidiano em que as quantidades são importantes. Nº
%
Respostas
14
16,3 Quando se faz comida, por exemplo, um bolo.
10 13
11,6 Todos os produtos que utilizam quantidades para a sua formulação. 15,1 Sim, em diversas situações do cotidiano.
8
9,3
Produção de remédios.
6 6 5 4 4 3 2 1
7,0 7,0 5,8 4,7 4,7 3,5 2,3 1,1
Produção de peças fundidas. Produção de bebidas. No tratamento de água. Para fazer cimento, a medida tem que ser exata para ficar bom. Produtos de limpeza, sabão e sabonete. Produção de agrotóxicos e fertilizantes. Produção de tintas Fabricação de polímeros.
9
10,5 Não (7); Não respondeu a questão (2).
1
1,1
No momento não me lembro de nada.
Verifica-se que, realmente, houve uma trans
expressivos quantitativamente, qualitativamente
posição do conteúdo desenvolvido no vídeo, ou seja,
eles se configuram como um indicativo da relação
da receita do bolo exibida, para outras situações do
que o aluno está fazendo com o seu trabalho. Ele
cotidiano em que quantidades estejam inseridas. O
está interligando teoria e prática para resolver e
que também chamou a atenção foram os exemplos
elucidar problemas. Dessa forma, observa-se que
relacionados com a vivência dos alunos. Isso pôde
atividades como a que foi proposta servem para
ser percebido quando eles citaram bebidas, produ-
esclarecer dúvidas e, consequentemente, facilitar a
ção de tintas, remédios e peças fundidas, pois, como
transposição de conceitos.
esses alunos, na sua grande maioria, já trabalham
Na Tabela 5 aparecem os comentários dos
em indústrias, conclui-se que esses exemplos são do
alunos sobre os aspectos que, para eles, destacaram-
cotidiano deles. Mesmo que esses dados não sejam
-se no vídeo, quando da preparação do bolo.
Tabela 5. Comentários dos alunos, sobre o que lhes chamou a atenção na preparação do bolo. Nº
%
Respostas
8
9,3
Interessante, por ser algo tão simples que está presente no nosso dia a dia.
6
7,0
Positiva, pois mostrou que a falta de ingredientes faz a diferença no final.
14 3
16,3 As proporções das medidas não foram adequadas ou foram alteradas. 3,5 A marca dos produtos que ficava aparecendo.
2
2,3
Sim, que na hora da fabricação todos usaram o mesmo ingrediente e não mediram a quantidade de cada ingrediente.
4
4,7
A ideia a ser trabalhada e o assunto foi muito bom, mas pode ser melhorado, principalmente o áudio.
28
32,6 Não (12); Achei que foi normal (10); Não respondeu a questão (6).
6
7,0
Sim, pois é um fato comum no cotidiano e relaciona teoria com prática.
2
2,3
Quando eles tiveram a ideia de fazer uma festa de aniversário. Seguir atentamente informações pode levar você ao sucesso ou ao fracasso.
2
2,3
10
11,6 As quantidades utilizadas, o fato da mudança de quantidade alterar o resultado do bolo.
1
1,1
Percebi que entendi o conceito, pois no pré-teste também citei o exemplo do bolo.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
63
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
Foi possível perceber que os alunos, em geral, mantiveram-se atentos aos diversos aspectos do vídeo. Alguns alunos se preocuparam em observar a postura dos atores (colaboradores), tanto que notaram que os mesmos estavam nervosos e descuidados. Outros, por sua vez, observaram as cenas como um todo e repararam nos rótulos, enquanto que outros perceberam que os alunos foram descuidados, quando foram fazer as medidas. Alguns ainda constataram que o áudio poderia ser melhor; já outros observaram o conjunto áudio/vídeo e gostaram. Isso mostra que, ao elaborar um vídeo, é preciso estar atento a todas as facetas pois, como já mencionado em questões anteriores, os alunos manifestaram que o vídeo deve ser claro, objetivo e divertido. Depreende‑se de tudo isso que, apesar de ser um vídeo com objetivos educacionais, os alunos estão esperando uma qualidade melhor
nesse recurso e é importante considerar as suas expectativas. O passo seguinte tem o intuito de analisar as observações dos alunos sobre a postura dos atores colaboradores, quando foram para o laboratório. A Tabela 6 apresenta essas respostas. A análise dessas respostas é essencial, pois norteará a postura a ser adotada nos próximos vídeos que serão produzidos. As sugestões e críticas elaboradas pelos alunos serão consideradas e discutidas para que sejam feitas as adequações necessárias, tanto neste vídeo quanto nos próximos que serão elaborados. Outro aspecto a ser analisado refere-se à percepção dos alunos sobre o experimento envolvendo a reação entre o cloreto de bário e o dicromato de potássio. Os resultados das observações dos alunos estão descritos, na Tabela 7.
Tabela 6. Respostas dos alunos, sobre aspectos que lhes chamaram a atenção, no vídeo, quando os atores colaboradores estavam no laboratório. Nº 1
% 1,1
49
57
3 11 6 5 7 1 3
3,5 12,8 7,0 5,8 8,2 1,1 3,5
Respostas Nervosos, não podem fazer o experimento e depois não saber ou gaguejar. Teve somente aspectos positivos, pois demonstraram interesse no assunto e buscaram aprofundar o conhecimento, buscando soluções, tiveram um caráter investigativo e usaram EPIs. Alguns não usaram EPIs e mais dinamismo na biblioteca. Não respondeu a questão (10); não (1). Atingiram o objetivo, algumas falhas ocorreram, mas conseguiram passar a ideia principal do vídeo. O ponto positivo é que eles aprenderam a teoria e aplicavam na prática também. Todos prestaram atenção, mas poderiam questionar mais. O vídeo foi muito enjoativo. Tudo deu certo, eles de fato queriam fazer o bolo certo e depois saber o que deu errado.
Tabela 7. Respostas dos alunos sobre aspectos que lhes chamaram atenção na prática que foi executada.
64
Nº
%
13 20 16 1 5 8 4 3 4 2 2 8
15,1 23,3 18,6 1,1 5,8 9,3 4,7 3,5 4,7 2,3 2,3 9,3
Respostas Não respondeu. Que dependendo das quantidades utilizadas nos reagentes, pode haver diversos resultados no produto. Quando as substâncias forem modificadas, altera-se a coloração dos elementos. Foi útil, mas é útil apenas para quem está estudando. Sim. A explicação da professora foi boa. Olhando a aplicação. Através da precipitação. Conforme a quantidade dos reagentes, fica amarelo ou incolor. Não consegui perceber. Complicada. Quando um diminuía, o outro aumentava.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
Infelizmente, para metade dos alunos que
uma construção e, certamente, as vivências expli-
responderam, não é possível perceber se houve
citadas aqui proporcionaram uma série de aprendi-
entendimento do experimento. Os alunos foram
zagens significativas.
muito vagos nas suas respostas. Falaram de cor e quantidade, mas não da relação entre quantidades. Dá a entender que houve compreensão do conteúdo,
pois
relacionaram
estequiometria
com quantidades, porém, quando chega na parte Química mais conceitual, essa compreensão fica comprometida.
4. Conclusões
A partir das respostas obtidas por meio dos questionários, pode-se afirmar que a aplicação do vídeo teve boa aceitação, sendo que os alunos relataram que houve uma melhora na sua compreensão do assunto enfatizado nas imagens. Observou-se, também, que a escolha do assunto foi oportuna, pois se percebeu que os alunos tinham muitas distorções em relação a esse conceito e que, aparentemente, este foi melhorado, quando comparado com situações observadas em anos anteriores, onde somente o discurso do professor era utilizado para explicar o conceito aqui abordado. Depois da apresentação do vídeo, segundo os dados coletados, houve um avanço na compreensão do tema proposto. Infelizmente, alguns problemas surgiram na elaboração do vídeo, tais como: os atores eram alunos de iniciação científica e não atores profissionais, o que causou certa tensão nos mesmos e, em alguns momentos, esse fato transpareceu no vídeo. Outro problema foi que o vídeo era amador, então, a gravação, a iluminação e o som ficaram comprometidos. No entanto, esses problemas serão corrigidos na elaboração de novos vídeos. Finalmente, cabe mencionar ainda que, como comentado no início deste texto, aprender é
REFERÊNCIAS ASSIS, Wayne Santos de; BITTENCOURT, Túlio Nogueira; NORONHA, Marcos Aurélio M. Desenvolvimento de Recursos Multimídia para o Ensino de Engenharia de Estruturas. Revista do IBRACON - Instituto Brasileiro do Concreto, São Paulo, v. 32, p. 41-51, 2003. Disponível em: <www. lmc.ep.usp.br/pesquisas/TecEdu/artigos/artigo_ Ibracon.pdf>. Acesso em: 13 abr. 2011. CARVALHO, Sérgio Cândido de. Avaliação do uso de filmes-experimento no ensino de Química. Dissertação de Mestrado, Unicamp, Campinas, SP, 2009. Disponível em: <biq.iqm.unicamp.br/arquivos/teses/autorc.htm>. Acesso em: 07 maio 2011. CUNHA, Márcia Borin da; GIORDAN, Marcelo. A imagem da Ciência no Cinema. Química Nova na Escola, v. 31, n. 1, fev. 2009. Disponível em: <qnesc.sbq.org.br/online/qnesc31_1/03-QS-1508. pdf>. Acesso em: 15 abr. 2011. FISCARELLI, Silvio Henrique; OLIVEIRA, Luiz Antônio Andrade de; BIZELLI, Maria H.S.S. Desenvolvimento de animações para o ensino de Química: fundamentos teóricos e desenvolvimento. In: Congresso Estadual Paulista sobre Formação de Educadores, 2009, Águas de Lindóia. Anais X Congresso Estadual Paulista sobre Formação de Educadores, 2009. v. 1, Araraquara, São Paulo, 10 p. Disponível em: <www.calculo.iq.unesp.br>. Acesso em: 04 mar. 2011. FRANCISCO, Manoel Henrique. Vídeos Experimentais para o Ensino de Química. Dissertação de Mestrado, Unicamp, Campinas, SP, 2006. Disponível em: <www.biq.iqm.unicamp.br/arquivos/teses/ ficha74786.htm>. Acesso em: 07 jun. 2011. MEDEIROS, Miguel de Araujo. A informática no ensino de Química: análise de um software para o ensino de Tabela Periódica. In: XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) UFPR, 21. 24 jul. 2008, Curitiba, PR, 11 p. Disponível em: <www.quimica.ufpr.br>. Acesso em: 04 mar. 2011. SANTOS, Fernanda Marsaro dos. Significações de construtivismo na perspectiva de professores “construtivistas” e sua relação com práticas avaliativas. Dissertação de Mestrado. Universidade Católica de Brasília, Brasília, DF, 2007. Disponível
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
65
O Ensino de Estequiometria Através de Vídeo
em: <www.bdtd.ucb.br/tede/tde_busca>. Acesso em: 25 mai. 2011. VERZOTO, José Carlos. Contexto histórico e reflexões didáticas no processo de ensino/aprendizagem
66
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
do conceito de equilíbrio químico. Dissertação de Mestrado, Unicamp, Campinas SP, 2008. Disponível em: <biq.iqm.unicamp.br/arquivos/ teses/000435892.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2011.
Relato 03 | Volume 08 | Número 01 | Jan./Jun. 2013
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica Analysis of Ideas from Students about Electric Conductivity Ana Paula Sebastiany1 Ivan Francisco Diehl2 Michelle Camara Pizzato3
Resumo
Neste trabalho, apresentamos uma análise das ideias de estudantes de Ensino Médio sobre condutibilidade elétrica, separadas por Âmbitos de Complexidade das Concepções (ACC). Os ACC encontrados emergiram da análise do conteúdo das respostas elaboradas pelos alunos durante as aulas ministradas, e que possibilitou a avaliação de como a sequência didática realizada contribuiu para a evolução das ideias dos alunos. Considerando a análise realizada, é possível perceber uma evolução significativa das concepções dos estudantes se entendermos que, após a etapa interventiva, houve uma predominância das explicações em campo microscópico, além de perceber que os materiais possuem funções e utilidades diferentes. Os resultados encontrados apontam a existência de concepções distintas, em termos de sua complexidade, e os obstáculos associados a estas concepções em relação à compreensão do ponto de vista científico dos fenômenos estudados. Palavras-chave: Ideias dos alunos. Ensino de química. Eletroquímica.
1
Licenciada em Ciências Exatas, Mestranda do Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde – UFRGS. E-mail: anapaulaslajeado@yahoo.com.br
2
Licenciando em Ciências da Natureza, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul. E-mail: ivanfranciscodiehl@yahoo.com.br
3
Licenciada em Química e Doutora em Ensino de Ciências. Atuação profissional: Docente, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul. E-mail: michelle.pizzato@poa.ifrs.edu.br
p. 67-80
AbStRACt
In this paper we present an analysis of ideas from High School students about electric conductivity, separated by the Areas of Complexity of Concepts (ACC). The found ACC emerged from the analysis of the subject in the answers made by the students during the classes, which made possible the evaluation of how the teaching sequence done contributed for the evolution of the students ideas. Considering the analysis done, it is possible to realize a significant evolution of the students concepts if we understand that, after the intervening stage, there was a predominance of the explanations in a microscopic field, beyond to perceive that some materials have different functions and uses. The results found show the distinct concepts, in terms of their complexity, and the obstacles connected to these concepts in relation to the comprehension of the scientific point of view of the phenomenon studied. Key-words: Students ideas. Teaching of chemistry. Electrochemistry.
1. Introdução
Na busca de melhores resultados na aprendizagem de química, várias propostas têm sido consideradas. Entre elas, se destaca o uso da experimentação como estratégia central. Segundo os pesquisadores, este tipo de atividade permite uma maior participação do aluno em todo o processo de ensino e aprendizagem (Lima; Marcondes, 2005; Hoernig; Pereira, 2004; Rosito, 2003; Silva; Zanon, 2000; Barbosa; Paulo; Rinaldi, 1999). Nessa abordagem, os alunos têm a oportunidade de participar desde a interpretação do problema até chegar a uma possível solução. Assim, eles
ele se referem e que apresentam as concepções dos alunos no Ensino Médio sobre o mesmo. Nesse sentido, propomos com este trabalho avaliar se a sequência didática – partindo das ideias dos alunos e estruturada através de intervenções práticas e teóricas, seguidas de reflexões sobre tais intervenções – contribui para a evolução das ideias dos alunos sobre Condutibilidade Elétrica ao longo da aplicação de uma sequência didática de caráter investigativo. Ao mesmo tempo, analisamos essa experiência quanto à implementação de ideias, procedimentos e atitudes, baseados em um modelo didático investigativo (Porlán, 1993).
podem discutir, questionar e testar suas hipóteses e ideias, confirmando-as ou reelaborando-as, além de coletar e analisar dados para encontrar possíveis
2. Marco
soluções para o problema.
68
teórico
É consenso entre pesquisadores da área que
Por outro lado, também tem sido apontada
a prática pedagógica dominante em nossas escolas
a necessidade de os professores considerarem as
está baseada no modelo da racionalidade técnica
ideias dos alunos. De fato, resultados de numerosas
(Schön, 1992), no qual se privilegia a memoriza-
investigações realizadas nas últimas décadas sobre
ção de conteúdos, fórmulas e técnicas de resolução
como os alunos constroem seus conhecimentos
de problemas, em detrimento, por exemplo, do
apontam que, antes de iniciar qualquer aprendiza-
entendimento dos conceitos envolvidos nos con-
gem formal em ciências, estes já possuem ideias
teúdos estudados (Porlán; Rivero, 1998; Harres et
sobre os fenômenos que os rodeiam (Treagust;
al., 2005). Os temas são tratados através de aulas
Duit, 2008). No caso específico da condutibilidade
dissertadoras e/ou narradoras, que não despertam
elétrica, são poucos os estudos na literatura que a
a curiosidade científica e, muito menos, a criati-
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
vidade dos alunos. Podemos citar três atividades
(Zembal‑Saul et al., 2002; Silveira; Ostermann,
que preponderam entre aquelas mais praticadas
2002; Lima, 2004).
sob esta perspectiva: aulas expositivas ministradas
Para que a introdução da experimentação
pelo professor para apresentar aspectos da teoria
no ensino das ciências seja uma alternativa que
relativa ao assunto tratado, sessões exaustivas de
favoreça uma aprendizagem mais significativa,
resolução de problemas-padrão e de exercícios
é fundamental que as atividades experimentais
numéricos e, em quantidade extremamente menor,
sejam estruturadas através de um processo de
práticas experimentais rigidamente orientadas e de
investigação, permitindo, dessa forma, promover
cunho verificacionista das leis/princípios/modelos
a formação e o desenvolvimento do pensamento
apresentados.
crítico e autônomo e de atitudes e procedimentos
Este modelo vem sendo fortemente questionado, dentre outros motivos, por não relacionar
frente à temática abordada (Lima; Marcondes, 2005; Barbosa; Paulo; Rinaldi, 1999).
os conteúdos fragmentados “aprendidos” na escola
Além disso, atividades experimentais assim
com as exigências requeridas nas diversas situa-
estruturadas permitem a explicitação e evolução
ções ocorridas no cotidiano. Conforme Camargo
daquelas que são imprescindíveis para o processo
e Nardi (2004), essa fragmentação caracteriza
de ensino e aprendizagem, isto é, as ideias dos alu-
certa cultura do conhecimento que vai produzir,
nos. Para Cubero (1989):
depois de permear todo o ensino escolar, uma série de consequências, entre as quais possivelmente estão o desenvolvimento de certas habilidades em detrimento de outras, e consequentemente acaba interferindo na formação do indivíduo, pois não fornece a habilitação necessária para ter uma visão de mundo polissêmica. Desta forma, os alunos
os alunos adquirem idéias sobre como são os fatos e fenômenos sociais e naturais mediante suas experiências com tudo que os rodeia, o que escutam e discutem com outras pessoas, ou o que conhecem por outros meios de comunicação [...] (p. 12).
passam a considerar os conteúdos estéreis, as dis-
Segundo Treagust e Duit (2008), a pesquisa
ciplinas de ciências difíceis, reforçando ideias do
no ensino de ciências mostrou, nas últimas três
senso comum que delegam a cientistas iluminados,
décadas, que os estudantes já chegam às aulas de
seres extremamente diferenciados dos cidadãos
ciências com ideias sobre os fenômenos e conceitos
comuns, a construção do conhecimento científico
a serem aprendidos, as quais, em geral, não coinci-
e as descobertas e invenções fantásticas.
dem com as visões científicas. Em outras palavras,
De encontro a essas preocupações, as ati-
podemos considerar que já existe um consenso de
vidades experimentais têm sido apontadas como
que os estudantes não podem ser considerados uma
um recurso útil para promover a aprendizagem
tábula rasa. Conforme Von Glaserfeld (1993), o
em ciências, contribuindo significativamente
conhecimento é o resultado de uma ação constru-
para motivar os alunos, despertando interesse e
tiva e não pode, simplesmente, ser “transferido”
curiosidade, e para desenvolver a criatividade e a
a um receptor; em outras palavras, cada aprendiz
imaginação, esta última quando da elaboração de
deve desenvolvê-lo. Assim, cada novo conheci-
hipóteses e modelos explicativos. Além disso, é
mento ou procedimento envolve uma interação
uma forma de levar o aluno a participar de seu
ativa entre as construções prévias do indivíduo e a
processo de aprendizagem, deixando de lado a
nova informação que emerge das situações vividas.
postura passiva do modelo tradicional de ensino
Para Cubero (1989), a aprendizagem significativa
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
69
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
ocorre quando quem aprende constrói sobre sua
-se, aprender a aprender, para ter o prazer de ensi-
experiência e conhecimentos anteriores um novo
nar. Deste modo, buscando o rompimento da pos-
conjunto de ideias, isto é, quando o novo conheci-
tura pedagógica caracterizada pela reprodução dos
mento interage com os esquemas existentes.
saberes e pela fragmentação do conhecimento, este
No entanto, além da interação entre as
trabalho apoia-se nas características do modelo
ideias dos alunos com a nova informação, também
didático investigativo proposto por Porlán (1993).
se faz necessário o intercâmbio de ideias entre os
Nesse sentido, os aspectos fundamentais
alunos e entre estes e o professor. Esses tipos de
da sequência didática adotada foram as atividades
discussões sobre os temas abordados em aula, o
experimentais e a consideração e a utilização das
diálogo e a confrontação de ideias, a atividade de
ideias dos alunos para o planejamento das aulas.
autorreflexão necessária para defender o próprio
Enfim, adotaram-se estas características uma vez
ponto de vista e para responder às perguntas de
que desta forma seria possível favorecer uma
seus companheiros são uma valiosa experiência
aprendizagem mais significativa para os alunos.
para a construção de seus modelos explicativos. Porém, tomar a aprendizagem como um processo construtivo – ou seja, considerar o conhecimento como uma construção progressiva
da pesquisa
– implica admitir que o trabalho que se realiza em
Este trabalho foi desenvolvido na dis-
aula possa resultar que os modelos explicativos
ciplina de Prática de Ensino de Química II, do
dos alunos quase nunca coincidam com aqueles
curso de Licenciatura em Ciências Exatas (Física,
propostos pelo professor. Dessa forma, a avaliação
Química e Matemática, em período integral) do
da evolução das ideias dos alunos ocorre na com-
Centro Universitário UNIVATES. Tal disciplina
paração do que estes pensam após a intervenção
é caracterizada como estágio supervisionado, na
didática com o que pensavam inicialmente, no sen-
qual os futuros professores elaboram uma sequên-
tido de se perceber se houve alteração em termos
cia didática sobre um tópico de química do Ensino
de complexidade, ou seja, se os alunos construí-
Médio e a aplicam em uma escola de sua escolha.
ram um modelo explicativo que satisfaz as suas
O estágio foi desenvolvido em uma turma da 3º
“novas” (ou atuais) necessidades e não se está mais
série do Ensino Médio de uma escola da rede pri-
próximo do modelo científico aceito atualmente.
vada, composta por 16 alunos com idade média
Esta mudança no método de ensino implica,
70
3. Contexto
de 17 anos.
também, em uma mudança no papel do professor
Para o planejamento da sequência didática
em sala de aula. O professor deve passar a atuar
optou-se pelo assunto de Eletroquímica, já que
como problematizador, questionando/propondo/
apresenta uma grande variedade de situações pre-
gerando problemas, a fim de que os alunos perce-
sentes no dia a dia dos alunos e por se tratar de
bam o problema e procurem solucioná-lo. Assim
um tema pouco trabalhado em sala de aula ou que,
sendo, o educador no papel de mediador entre o
quando é trabalhado, não há preocupação com a
educando e o conhecimento, deve ser um profis-
sua abrangência e complexidade. Além disso, este
sional formador, reflexivo, consciente da impor-
tema tem sido frequentemente apontado por pro-
tância do seu papel, integrado no mundo de hoje
fessores e estudantes do ensino médio como um
e responsável pela formação do cidadão. Deve ser
dos assuntos de maior dificuldade no processo de
um eterno aprendente que busca inovar e inovar-
ensino-aprendizagem (Niaz; Chacón, 2003 apud
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
Garnett; Treagust, 1992; Niaz, 2002; Sanger;
construção do conhecimento. Embora o conteúdo
Greenbowe, 1997; Ogude; Bradley, 1996).
estivesse predeterminado, uma vez que o problema
Outro ponto importante considerado antes
não partiu dos alunos, durante a aula, foi propiciado
do planejamento das atividades foi a intenção de
um ambiente de investigação, negociação e dis-
despertar o interesse e o gosto dos alunos pela quí-
cussão de ideias sobre a temática, de forma que a
mica, disciplina que é muitas vezes tomada como
sequência didática utilizada foi elaborada de acordo
difícil, inútil e desinteressante, conscientizando-os
com as ideias dos alunos que surgiam nas aulas, na
da importância desta ciência no mundo moderno.
tentativa de esclarecer e solucionar o problema em
Para isso, a metodologia utilizada pelo
questão e com o objetivo de que os alunos, ao final,
professor tem papel crucial, mas não único, pois
construíssem o seu próprio modelo explicativo
não basta o professor estar comprometido com a
para as transformações que ocorrem dentro de uma
aprendizagem dos seus alunos: eles também pre-
pilha. A estratégia metodológica utilizada foi cons-
cisam desejar aprender. Nesse sentido, os aspectos
truída considerando as características do Modelo
fundamentais da nossa sequência didática foram as
Didático Investigativo (Porlán, 1993).
atividades experimentais e a consideração e utili-
Estruturamos a proposta em 12 atividades
zação das ideias dos alunos para o planejamento
(incluindo uma atividade de autoavaliação e ava-
das aulas, com atividades que visavam a explicita-
liação da disciplina) cujos roteiros de trabalho,
ção, contraste e reelaboração das ideias dos alunos
apresentados no Anexo 1, foram aplicados em
a partir dos questionamentos e dessas atividades
seis encontros de duas horas cada. As atividades
práticas realizadas. Adotamos estas características,
realizadas foram dividas em três momentos, sendo
pois pensamos que desta forma poderíamos favo-
que cada momento foi estruturado em três etapas:
recer uma aprendizagem mais significativa para os
Pré-Intervenção; Intervenção; e Pós-Intervenção.
alunos.
Para esta investigação, nos concentraremos apenas
O enfoque principal das atividades esteve no aluno, cabendo ao professor ser um orientador na
na análise do momento 2. O Quadro 1 apresenta a sequência didática utilizada nesse momento.
Quadro 1. Sequência didática implementada no momento 2. Momento
2
Etapa
Atividades
Pré-intervenção
Levantamento de concepções e formulação de hipóteses, ambas as atividades sobre condutibilidade elétrica.
Intervenção
Atividade prática sobre condutibilidade elétrica. Apontamentos sobre observações realizadas na experimentação. Atividade de reflexão contendo 5 perguntas sobre a experimentação. Socialização oral em grande grupo sobre as conclusões desenvolvidas com as atividades até então realizadas.
Pós-intervenção
Reformulação das respostas dadas à questão sobre condutibilidade, respondida na etapa pré-intervenção.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
71
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
4. Metodologia
da investigação
Esta pesquisa se inscreve na perspectiva de investigação de caráter qualitativo, utilizando análise de conteúdo (Moraes, 1999) como estratégia de análise de dados e tomando como sujeitos de investigação alunos da 3ª série do Ensino Médio de uma escola da Rede Particular (Lajeado – Brasil). As atividades, realizadas de forma coletiva e individual, foram divididas em três momentos, sendo que cada momento foi dividido em três etapas (apresentadas no Quadro 2 juntamente com os objetivos de cada uma), que foram criadas nessa sequência com o intuito de se perceber se ocorreu evolução nas concepções desses estudantes. Quadro 2. Etapas de cada momento e os respectivos objetivos. Fase
Objetivo
Pré-intervenção
Levantamento de ideias: provocar reflexões sobre suas próprias ideias; formulação de hipóteses.
Intervenção prática
Atividade Prática: testar ideias; reflexão sobre a experimentação.
Intervenção teórica
Socialização: discussões em pequeno e grande grupo sobre observações e reflexões da prática; discussões teóricas relacionadas à prática.
Pós-intervenção
Reformulação das respostas.
Para análise, consideramos como dados de antes da intervenção o levantamento de ideias dos alunos sobre condutibilidade dos metais e a formulação de hipóteses sobre a possibilidade de uma lâmpada acender, ou não, através de um teste de condutibilidade com certos materiais. Na etapa interventiva, os dados são provenientes das respostas dadas a um questionário orientador depois de realizada a prática. Para a etapa de pós-intervenção, consideramos as reformulações das ideias iniciais. 5.1. Pré‑intervenção
Para o levantamento das ideias sobre condutibilidade de metais, primeiramente foi solicitado que os alunos respondessem individualmente à seguinte pergunta: “Você já deve ter ouvido falar ou visto que os fios da rede elétrica da nossa casa são de cobre (metal alaranjado). Poderíamos substituir este metal por outro? Comente sua resposta”. Nessa pergunta, os alunos deveriam se posicionar sobre a possibilidade da substituição do metal cobre na fiação da rede elétrica por outro metal e explicar porque pensavam dessa forma. Em um segundo momento, antes da etapa de intervenção – em específico da realização da atividade prática –, os alunos deveriam prever o que iria acontecer. Essa formulação de hipóteses por parte dos alunos foi orientada pelo roteiro apresentado no Quadro 3. 5.2. Intervenção
5. Momento
2
Nosso objetivo, com as etapas no momento 2, era favorecer a discussão em torno da condutibilidade elétrica de alguns materiais que fazem parte do dia a dia dos alunos. Antes da realização da atividade prática, questionamos, oralmente, os alunos utilizando situações do cotidiano, sem dar respostas, para que eles refletissem sobre as propriedades dos materiais que conduzem corrente elétrica e por que isso acontece.
72
Realizou-se uma atividade prática que consistia em observar quais materiais (citados no Quadro 3) conduzem corrente elétrica, ou seja, com quais materiais a lâmpada acenderia e como seria o seu brilho (forte ou fraco). Como foi solicitado que os alunos previssem o que aconteceria com cada material, nesse momento eles testaram as suas ideias e discutiram em pequeno grupo, visando à elaboração de um modelo explicativo para o que observaram segundo a orientação de um questionário com 5 questões, mostrado no Quadro 4.
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
Quadro 3. Roteiro para orientação da prática sobre condutibilidade. Materiais
Hipótese (sim / não)
A Lâmpada Acende? (sim / não)
Brilho da Lâmpada (forte / fraco)
Sal Sal com água (íon) Açúcar Açúcar com água Vinagre (íon) Alumínio (elétron) Ferro (elétron) Plástico Madeira Cobre (elétron) Suco de limão (íon) Borracha Isopor Grafite (elétron) Zinco (elétron) HCl (aq, íon) NaOH (aq, íon) Chumbo (elétron)
Quadro 4. Questionário de orientação para análise da prática sobre condutibilidade. 1. A lâmpada acendeu com todos os materiais? Por que você acha que isso aconteceu? 2. Como você explica o fato de a lâmpada acender com brilhos diferentes? 3. Como você pode observar no experimento, alguns materiais são melhores condutores de corrente elétrica do que outros. Como você explica isso? 4. Quais são as características comuns encontradas nos materiais que conduzem corrente elétrica? E nos que não conduzem? 5. Pensando microscopicamente, como você acha que se dá o processo de condução de corrente elétrica?
Na continuidade, foi realizada uma sociali-
ção dos resultados e das explicações do professor,
zação das ideias que surgiram durante a atividade,
os alunos foram questionados sobre se modifica-
em particular sobre as respostas e opiniões que
riam algo em suas respostas formuladas na etapa
os alunos explicitaram como forma de análise da
pré-intervenção e como seriam as suas opiniões
prática. Tal socialização possibilitou – através da
nesse momento. Foi dado ênfase para que não apa-
discussão e intercâmbio de ideias entre os alunos,
gassem as suas ideias iniciais.
e destes com o professor – identificar quais foram os materiais que conduziram, ou não, corrente elétrica e perceber os materiais que são bons condutores, maus condutores e isolantes, buscando o desenvolvimento de alguns conceitos como íon, elétron e corrente elétrica (carga em movimento).
6. Análise
dos resultados
Para a análise, separamos as ideias dos alunos por Âmbitos de Complexidade das Concepções (ACC). No primeiro dos âmbitos (ACC1), se
5.3. Pós‑intervenção
enquadram as concepções que classificam os
Após a realização do experimento, das dis-
materiais como tendo propriedades iguais, ou
cussões em pequeno e grande grupo, da socializa-
seja, não existem distinções. O segundo (ACC2)
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
73
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
foi dividido em outros dois âmbitos: ACC2.a – no
Percebemos que algumas características do
qual se enquadram concepções que definem os
cobre – já que a pergunta que orienta essa etapa se
materiais como tendo propriedades macroscópi-
refere a este metal – foram citadas, como a malea-
cas diferentes e apresentam um único exemplo de
bilidade, o baixo custo, o baixo poder de oxidação
propriedade; e ACC2.b – no qual também é per-
(ACC2). De uma forma geral, existe uma predomi-
cebida a distinção de propriedades macroscópicas
nância de explicações macroscópicas, na qual os
nos materiais, mas é dado mais do que um único
alunos tendem a explicar uma situação de acordo
exemplo. O ACC3 se distingue do anterior (ACC2)
com o que eles veem. Nessa etapa, os alunos não
por apresentar uma concepção microscópica. Para
tentam ou não conseguem imaginar o que ocorre
aquelas concepções cujo âmbito não foi possível
no interior dos materiais e alguns não percebem
identificar, enquadramos em “outras concepções”.
diferença de propriedades entre materiais distintos
Na etapa de pré-intervenção, a análise das ideias explicitadas pelos alunos permitiu identi-
Na etapa de intervenção, as concepções
ficar duas concepções sobre as propriedades dos
dos alunos podem ser associadas a âmbitos de
metais (ACC1 e ACC2). Na primeira delas, os
maior complexidade se comparado com a etapa
alunos apresentam ideia de que os metais possuem
anterior. Aparecem concepções menos elaboradas
as mesmas propriedades, ou seja, não existem dis-
– descrevendo que nem todos os metais são con-
tinções (ACC1): “[...] outro metal qualquer que
dutores de energia elétrica (ACC2.a): “[...] nem
conduza bem a energia elétrica”.
todos os materiais são condutores”; relacionando o
Na segunda concepção, os alunos apresen-
brilho da lâmpada com a capacidade de condução
tam ideia de que os metais possuem propriedades
(ACC2b): “O que acende forte é um bom condu-
diferentes (ACC2), aparecendo ideias relaciona-
tor de energia e o fraco não tem tanta capacidade
dos ao ACC2a e ACC2b. Quanto ao ACC2a, é
de conduzir energia”; e citando características
informado apenas um exemplo:
comuns entre condutores (c) e não condutores
• “[...] o cobre é o melhor condutor de energia.” • “[...] o melhor condutor é o cobre, mas
(nc): sólidos e alguns líquidos (c), não metais (nc) – (ACC2b): “Metais e alguns líquidos conduzem eletricidade. Não metais não conduzem”.
também pode ser substituído pelo zinco.”
Outros alunos apresentaram concepções
• “[...] ele é revestido e poderia causar
que envolvem um grau de complexidade maior
um circuito, pois os fios tem funções
(ACC3), como a relação da condução elétrica e do
diferentes.”
brilho da lâmpada com a propriedade do material
Porém, outros além de mencionar que os
possuir elétrons livres: “[...] alguns condutores
metais possuem propriedades diferentes, citam
permitem que os elétrons se movimentem mais
mais de um exemplo (ACC2b):
rápido, assim o brilho é maior”; a relação da condu-
• “[...] talvez não tivesse a mesma vanta-
ção elétrica com a propriedade do material possuir
gem, avaliando os pontos de maleabili-
elétrons livres: “Os que conduzem energia elétrica
dade e de condução.”
tem maior quantidade de elétrons livres”; a rela-
• “[...] o cobre é um metal mais barato e
ção da condução com a propriedade do material
um ótimo condutor de energia elétrica.”
possuir mais corrente elétrica e maior frequência:
• “[...] ele é um bom condutor de energia
“Os bons condutores têm mais corrente de energia,
e não enferruja.”
74
(ACC1).
mais frequência…”; a condução através da atração
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
do fio tem elétrons carregados negativos, que se
sequência didática implementada, assim como, a evolução das concepções dos alunos, que condi-
atraem com os prótons positivos dos materiais
zem com o “Momento 2” analisado neste artigo.
entre elétrons (fios) e prótons (material): “Dentro
que utilizamos e acenderam”; e a condução através do choque entre elétrons livres de um polo a outro: “Os elétrons livres saem de um polo e vão se chocando até chegarem até outro polo”, o que também já indica uma visão microscópica para o
Quadro 5. Relação entre âmbitos de complexidade das concepções e etapas. Âmbitos de Complexidade das Concepções (ACC) Etapa ACC1
fenômeno. É interessante ressaltar a concepção expres-
ACC2 ACC2.a
ACC2.b
ACC3
Outras concepções
Pré
sada pelos alunos nessa etapa, de que a conduti-
Interv.
bilidade ocorre devido a choques entre elétrons
Pós
durante a passagem desses de um polo a outro (ACC3). Essa concepção parece evidenciar uma não diferenciação dos alunos entre condutibilidade e resistividade, já que descrevem o movimento dos elétrons – de alguma forma ordenado por coloca-
7. Conclusão
rem que vai de um polo a outro, característica do
A investigação, aqui detalhada, visou per-
conceito de condutibilidade – e o choque desses
ceber em que medida a sequência didática utili-
– característica da resistividade se considerar-
zada contribui para a evolução das ideias dos alu-
mos que esse choque causa uma resistência ao
nos sobre condutibilidade. Cabe destacar que esta
movimento dos elétrons – para explicar o mesmo fenômeno. Na última etapa (pós-intervenção), já é possível perceber uma predominância das concepções associadas ao ACC3, no qual são atribuídos significados microscópicos ao conceito de condutibilidade, tais como, o cobre é bom condutor devido a sua estabilidade e por possuir elétrons livres: “[...] porque ele é estável”, “[...] pois tem bastante elétrons livres”. Além disso, podemos perceber que os alunos começam a identificar distintas propriedades dos materiais (metais, nesse caso), e que estas são determinadas quanto a sua utilização e função nas mais diversas situações do nosso dia a dia (“outras concepções”): “[...] ele [cobre] é revestido e poderia causar um curto circuito por causa que os fios têm funções diferentes”. No Quadro 5, como forma de síntese, pode ser percebida a relação entre os Âmbitos de Complexidade das Concepções e as etapas da
investigação faz parte de uma proposta maior que visa analisar como evoluem as ideias dos alunos sobre eletroquímica, quando envolvidos em um processo didático de caráter investigativo. Considerando a análise realizada, é possível perceber uma evolução significativa das concepções dos estudantes se levarmos em conta que, após a etapa interventiva, houve uma predominância das explicações em campo microscópico, além da percepção de que os materiais possuem funções e utilidades diferentes. Tais concepções se distinguem daquelas apontadas inicialmente, já que muitos não percebiam propriedades diferentes entre os materiais e, aqueles que as percebiam, apenas faziam poucas distinções de âmbito macroscópico. Outro aspecto a ressaltar é a variedade de concepções e o aparecimento dessas em caráter microscópico na etapa de intervenção. Além disso, as explicações são mais elaboradas, no sentido de que buscam contemplar o processo
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
75
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
como um todo – envolvendo elétrons, prótons,
condutibilidade, ou ainda adaptá-lo para outros
polos, dentre outros –, ainda que existam proble-
contextos. Mesmo que as concepções dos alunos
mas conceituais. Apesar de os alunos considerarem uma
não tenham contemplado a relação entre macro
visão microscópica na etapa pós-intervenção, os
e microscópico, as evoluções constatadas nesta
mesmos não fizeram uma relação entre essa e o
investigação nos permitem efetivar a sequência
macroscópico, o que pode indicar um limitante
didática utilizada, em específico a etapa interven-
da sequência utilizada. Os alunos acabam des
tiva. Além disso, os resultados encontrados mos-
considerando características macro como o com
tram a validade da utilização do modelo didático
primento e espessura dos materiais envolvidos,
investigativo, ou seja, de proporcionar ao aluno
mesmo que percebem a importância do tipo de
a liberdade de expressar, testar e reelaborar (caso
material na condução elétrica.
ache necessário) suas ideias, e de considerá-las
Essa relação entre macro e micro nas con-
como legítimas já que Tudo o que vivemos como
cepções dos alunos pode ser considerada mais
válido no momento de vivê-lo (Maturana; Dávila, 2008,
um âmbito da estratégia de análise utilizada nesta
p. 122). Porém, mais do que apontar as concepções
investigação, formando o Âmbito de Complexidade
dos alunos sobre condutibilidade e validar uma
das Concepções 4 (ACC4). Assim, pode ser elabo-
sequência didática baseada no modelo investiga-
rado o Quadro 6, apresentado a seguir, que pode
tivo, esta pesquisa mostrou que é possível traba-
ser utilizado como orientador para futuras pesqui-
lhar de forma coerente com tal modelo ou, mais
sas que desejam analisar as ideias dos alunos sobre
especificamente, com as ideias dos alunos.
Quadro 6. Âmbitos de complexidade das concepções para orientação de análise. Âmbitos de Complexidade das Concepções (ACC) ACC1 os materiais possuem propriedades iguais, ou seja, não existem distinções
ACC2 ACC2.1
ACC2.2
os materiais possuem propriedades macroscópicas diferentes e é citado apenas um exemplo
os materiais possuem propriedades macroscópicas diferentes e é citado mais de um exemplo
Pré Interv. Pós
76
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
ACC3
ACC4
os materiais possuem propriedades microscópicas diferentes
os materiais possuem propriedades macro e microscópicas diferentes
Outras concepções concepções cujo âmbito não é possível identificar
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
Referências BARBOSA, J de O.; PAULO, S. R.; RINALDI, C. Investigação do papel da experimentação na construção de conceitos em eletricidade no ensino médio. Caderno Catarinense de Ensino de Física, v. 16, n. 1, p. 105-122, abr. 1999. CAMARGO, S.; NARDI, R. Formação inicial de professores de física: marcas de referenciais teóricos no discurso de licenciandos. In: IX EPEF Encontro Nacional de Pesquisa em Ensino de Física, Jaboticatubas (MG). 2004. CUBERO, R. Cómo trabajar con las ideas de los alumnos. Díada: Sevilla, 1989. GARNETT, P. J.; TREAGUST, D. F. Conceptual difficulties experienced by senior high school students of electrochemistry: electric circuits and oxidation-redution equations. Journal of Research in Science Teaching, v. 29, n. 2, p. 121-142, 1992. _______.; _______. Conceptual difficulties experienced by senior high school students of electrochemistry: electrochemical (galvanic) and electrolytic cells. Journal of Research in Science Teaching, v. 29, n. 10, p. 1079-1099, 1992. HARRES, J. B. S. et al. Laboratórios de ensino: inovação curricular na formação de professores de ciências. Santo André: ESETec Editores Associados, 1999, p, 2005. HOERNIG, A. M.; PEREIRA, A. B. As aulas de ciências iniciando pela prática: o que pensam os alunos. Revista da Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, v. 4, n. 3, p. 19-28, 2004. LIMA, V. A. Atividades Experimentais no ensino médio: reflexão de um grupo de professores a partir do tema eletroquímica. Dissertação (Mestrado) – USP: São Paulo, 2004. _______.; MARCONDES, M. E. R. Atividades experimentais no Ensino de Química. Reflexões de um grupo de professores a partir do tema Eletroquímica. Enseñanza de las Ciencias, n. Extra, VII Congreso Internacionacional de Enseñanza de las Ciencias, 2005. MATURANA, H.; DÁVILA, X. Habitar humano en seis ensayos de Biología Cultural. Santiago de Chile: J. C. Sáez Editor, 2008.
NIAZ, M. Facilitating conceptual change in students’ understanding of electrochemistry. International Journal of Science Education, v. 24, n. 4, p. 425439, 2002. OGUDE, N. A.; BRADLEY, J. D. Electrode processes and aspects relating to cell EMF. Current, and cell components in operating electrochemical cells. Journal of Chemical Education, v. 73, n. 12, p. 1145-1149, 1996. PORLÁN, R. Constructivismo y escuela: hacia un modelo de enseñanza-aprendizaje basado en la investigación. Sevilla: Díada, 1993. _______.; RIVERO, A. El conocimiento de los professores. El caso del área de ciencias. Sevilha: Díada, 1998. ROSITO, B. A. O ensino de Ciências e a experimentação. In: MORAES, R. Construtivismo e ensino de ciências: reflexões epistemológicas e metodológicas. 2. ed. Porto Alegre: Editora EDIPUCRS, p. 195-208, 2003. SANGER, M. J.; GREENBOWE, T. J. Student misconceptions in electrochemistry: current flow in electrolyte solutions and the salt bridge. Journal of Chemical Education, v. 74, n. 7, p. 819-823, 1997. SANGER, M. J.; GREENBOWE, T. J. Common student misconceptions in electrochemistry: galvanic, electrolytic, and concentration cells. Journal of Research in Science Teaching, v. 34, n. 4, p. 377-398, 1997. SCHÖN, D. A. Formar professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA, A. (Org.). Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992. SILVA, L. H. de A.; ZANON, L. B. A experimentação no ensino de Ciências. In: SCHNETZLER, R. P.; ARAGÃO, R. M. R. Ensino de ciências: fundamentos e abordagens. Piracicaba: CAPES/UNIMEP, 2000. SILVEIRA, F. L.; OSTERMANN, F. A insustentabilidade da proposta indutivista de “descobrir a lei a partir dos resultados experimentais”. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, v. 19, n. Especial, p. 7-27, 2002. TREAGUST, D.; DUIT, R. Conceptual change: a discussion of theoretical, methodological and practical challenges for science education. Cultural Studies of Science Education, n. 3, p. 297-328, 2008.
MORAES, R. Análise de conteúdo. Educação, Porto Alegre, n. 37, p. 7-32, 1999.
VON GLASERSFELD, E. Questions and answers about radical constructivism. In: TOBIN, K. (Org.). The practice of constructivism in science education. Washington, DC: American Association for the Advancement of Science, 1993.
NIAZ, M.; CHACÓN, E. A conceptual change teaching strategy to facilitate high school students’ understanding of eletrochemistry. Journal of Science Education and Technology, v. 12, n. 2, p. 129-134, 2003.
ZEMBAL-SAUL, C. et al. Web-based portfolios: a vehicle for examining prospective elementary teachers’ developing understandings of teaching science. Journal of Science Teacher Education, v. 13, n. 4, p. 283-302, 2002.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
77
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
Tabela 1. Quadro de atividades. Momento 1 Pré-intervenção Levantamento de ideias sobre a reatividade dos metais: 1. Você já deve ter ouvido falar ou visto que os fios da rede elétrica da nossa casa são de cobre (metal alaranjado). Poderíamos substituir este metal por outro? Comente sua resposta. 2. Os portões de ferro costumam enferrujar se não forem pintados. Por que você acha que isto acontece? 3. Você pode citar algum metal que não enferruje? Por que você acha que este material não enferruja? 4. As panelas de alumínio perdem seu brilho rapidamente, mesmo que sejam bem areadas. Por que você acha que isso acontece? 5. Muitas vezes, ao olharmos um objeto de prata, dizemos que a prata está fosca, escurecida. Por que você acha que isto acontece? Intervenção Prática sobre a reatividade dos metais Prática: Os metais reagem com as mesmas substâncias? Material: • Metais: Mg; Fe; Zn; Cu; • Soluções (1mol/L): HCl; ZnCl2; FeCl3; CuSO4; • Outros: 16 tubos de ensaio; 1 estante para tubos; 4 pipetas; 1 caneta de retroprojetor. Procedimentos: 1. Preencha a Tabela 1 descrevendo a aparência dos materiais (cor, estado físico etc.). 2. Coloque um pedaço do metal Mg em quatro tubos de ensaio; 3. Adicione em cada tubo, aproximadamente, 3mL de cada uma das quatro soluções. 4. Espere alguns minutos e observe o que acontece. 5. Anote na tabela qualquer alteração que tenha ocorrido dentro dos tubos. 6. Siga os mesmos procedimentos para os outros três metais e faça suas observações na Tabela 2. Análise dos resultados 1. Todos os metais tiveram suas características alteradas? 2. Com quais reagentes não se observaram modificações? Por que você acha que isso aconteceu? 3. Nos demais casos, nos quais houve modificações, o que aconteceu com o metal e com a solução? Como você explica isso? Socialização de ideias Socialização oral em grande grupo sobre as conclusões desenvolvidas com as atividades até então realizadas. Tabela 1. Descrição dos materiais. Material
Descrição
Mg Fe Zn Cu HCl ZnCl2 FeCl3 CuSO4 Tabela 2. Resultados do experimento. Solução 1 (HCl)
Solução 2 (ZnCl2)
Solução 3 (FeCl3)
Solução 4 (CuSO4)
Mg (alcalino terroso) Fe (metal comum) Zn (metal comum) Cu (metal nobre) Pós-Intervenção Reflexão sobre a primeira atividade (os alunos tiveram a oportunidade de reformular/modificar as suas ideias iniciais).
78
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
Momento 2 A descrição desse momento e das atividades desenvolvidas encontram-se neste artigo e nos quadros 3 e 4. Momento 3 Pré-Intervenção Explicitação das ideias dos alunos sobre pilhas: 1. As pilhas têm um lado + (positivo) e o outro – (negativo). Como você explica isso? 2. Sempre que colocamos uma ou mais pilhas em um equipamento temos que verificar qual o sentido que elas devem ser encaixadas. O que você pensa sobre isso? 3. É hábito popular colocar uma pilha gasta na geladeira para que ela volte a funcionar. O que você acha disso? Explique. 4. Ao utilizarmos uma pilha por um grande período de tempo dizemos que ela está velha. Qual a diferença entre esta pilha e uma pilha nova? 5. Quando um aparelho à pilha para de funcionar, uma das causas pode ser que a pilha tenha acabado. Por que você acha que isso acontece? Prática 1: Como você acha que é uma pilha por dentro? 1. Faça um desenho de como você imagina que é uma pilha por dentro, detalhando os materiais que a compõem, seu nome e função (pra que serve?). Intervenção Prática 1: Como você acha que é uma pilha por dentro? (continuação) 1. Agora você irá abrir uma pilha e fazer um novo desenho, tentando identificar seus componentes. 2. Compare a pilha aberta com a que você desenhou. Há alguma diferença ou semelhança entre os desenhos? Quais? 3. Imagine uma pilha utilizada por um longo período de tempo. Como você acha que é o interior desta pilha? Socialização de ideias Discussão sobre as atividades realizadas anteriormente, e sobre as reações que ocorrem no interior da pilha. Pós-Intervenção Reflexão individual e reformulação das primeiras ideias sobre pilhas. Prática 2: construção de pilhas alternativas (batata e limão). Como você acha que é o funcionamento dessas pilhas? Material: 1. limões, batatas ou outros vegetais volumosos e suculentos; 2. fio de cobre ou jacarés (para conectar os materiais); 3. clipes, placas de zinco e cobre, pregos de ferro; 4. 1 led de 1,5 volt ou menos; 5. 1 calculadora (de pilha comum); 6. pedaços de lixa; 7. alicate; Procedimentos: Primeiro passo: Amassar os limões para romper as divisões internas e liberar o suco. Comece a trabalhar com quatro limões. Em cada limão, enterre uma placa de cobre e uma de zinco tomando o cuidado destas não se tocarem dentro do limão. Também podem utilizar clipes e fio de cobre, ou pregos e fio de cobre, sempre tirando o esmalte das extremidades do fio de cobre com a lixa. Una as placas de cobre às placas de zinco de um outro limão de modo que uma placa de cobre de um limão sempre esteja conectada à uma placa de zinco de um segundo limão, independentemente da quantidade de limões que estejam sendo utilizados. Caso o led ou a calculadora não acenda na primeira tentativa, não desanime: acrescente novos limões à bateria até conseguir seu objetivo. A seguir, repita a montagem com batatas ou outros vegetais e compare os resultados. Questões: 1. Está passando corrente elétrica pela batata e pelos limões? Explique. 2. Como você explicaria o funcionamento dessa “pilha”? 3. Quais as semelhanças e diferenças entre estas e as pilhas comuns abertas e discutidas em aulas anteriores. Socialização de ideias Discussão dos resultados obtidos e explicação Reflexão individual sobre as atividades realizadas na fase “pré-intervenção”, podendo o aluno reformular suas respostas. Além disso, foi solicitado que os alunos elaborassem seu próprio modelo explicativo para o funcionamento da pilha alternativa com base nas idéias construídas ao longo de todos os momentos da sequência didática implementada.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
79
Análise das Ideias dos Alunos sobre Condutibilidade Elétrica
Atividade Final Autoavaliação e avaliação da disciplina Pensando nas nossas aulas de estágio, escreva: 1. O que você mais gostou? 2. O que você menos gostou? 3. Como você acha que foi seu desempenho? Pense no seu interesse, participação nas discussões, realização das atividades, na aprendizagem do conteúdo... 4. Pensando na sua resposta da questão anterior, se dê uma nota e justifique. 5. Escreva uma sugestão, crítica e/ou mensagem para as professoras.
80
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Relato 04 | Volume 08 | Número 01 | Jan./Jun. 2013
O Ensino de Química Durante a Trajetória Escolar de Alunos do Curso Subsequente em Técnico de Alimentos The Chemistry Teaching During the School Career of Students of the Técnico de Alimentos Course Juliana de Medeiros Franco Lima1 Daguia de Medeiros Silva2 Ana de Fátima Costa da Silva2 Francisca Edileuza da Silva2 Emanuele de Araújo Santos2
Resumo
No cenário atual, onde emerge uma nova cultura da aprendizagem, onde o conhecimento é amplamente difundido e os indivíduos necessitam estar continuamente aprendendo, é essencial que os indivíduos aprendam numa perspectiva construtivista, baseada, sobretudo, no aprender a aprender. Os alunos procuram na Química um ensino mais contextualizado e que una conhecimentos teóricos com a prática, de forma que a disciplina não se perca no processo de aprendizagem por memorização. A presente pesquisa, desenvolvida no Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, Campus Currais Novos, foi realizada com os alunos do curso Subsequente em Técnico de Alimentos e teve por objetivo identificar a natureza das metodologias utilizadas no ensino de química durante a trajetória dos alunos no Ensino Médio, estabelecendo relação com o interesse que eles apresentam hoje pela disciplina, suas dificuldades e rendimento escolar. O método para a obtenção das informações foi a aplicação de um questionário objetivo, cujo conteúdo contemplava aspectos qualitativos e utilização de recursos estatísticos. Palavras-chave: Ensino de química. Aprendizagem. Metodologia. Interesse dos alunos. 1
Especialista em Gestão Escolar, Pedagoga do IFRN Campus Currais Novos. E-mail: Juliana.lima@ifrn.edu.br
2
Graduandos de Licenciatura em Química do IFRN Campus Currais Novos.
p. 81-88
AbStRACt
Given the current scenario, in which a new culture of learning emerges, where knowledge is widespread and individuals need to be continually learning, it is essential that individuals learn in a constructivist perspective, based mainly on learning to learn. Students look for a more contextualized Chemistry teaching and uniting theoretical knowledge with practice, so that discipline is not lost in the process of learning by rote. This research developed in Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, Campus Currais Novos, was conducted with students of the course Subsequent Technician Food and aim to identify the nature of the methodologies used in the chemistry teaching in high school, establishing relationship with the interest they have today by discipline, their difficulties and school performance. The method for was the application of an objective questionnaire whose contents contemplated qualitative aspects and resource utilization statistics. Key-words: Chemistry teaching. Learning. Methodology. Student interest.
1. Introdução
Aprender a aprender deve ser meta essencial da educação em todas as áreas e níveis, e, dessa forma, o objetivo da educação dever ser o desenvolvimento de capacidades autônomas (Pozo; Goméz-Crespo, 2009). Assim, pode-se questionar se o ensino de química tem possibilitado o desenvolvimento de capacidades autônomas ou tem insistido no modelo tradicional de aprendizagem
relacioná-la com as dificuldades encontradas no ensino de química e com o interesse despertado nos alunos para com esta disciplina. A partir dos dados coletados, foi possível qualificar como insatisfatórias as metodologias que foram utilizadas pelos professores do Ensino Médio e correlacioná-las com as dificuldades apresentadas pelos alunos e sua falta de interesse pela disciplina de química.
memorística. Partindo-se desse pressuposto, percebe-se que, quando o discente compreende um conteúdo
82
2. Fundamentação
teórica
trabalhado em sala de aula, ele amplia sua reflexão
Inúmeras pesquisas apontam que a maioria
sobre os fenômenos que acontecem à sua volta,
dos alunos não aprende a ciência que lhes é ensi-
podendo gerar discussões durante as aulas, exposi-
nada (Pozo; Goméz-Crespo, 2009). Os professores
ção de suas ideias e construção de conhecimento,
costumam atribuir os resultados insatisfatórios à
ou seja, o aluno torna-se um sujeito ativo no pro-
questão motivacional, ou seja, à falta de interesse
cesso de aprendizagem. Ensinar não é transferir
apresentada pelos estudantes. De fato, a questão
conhecimento, mas criar as possibilidades para a
motivacional é um fator importante. No entanto,
sua própria produção ou a sua construção (Freire,
precisamos compreender que o interesse dos alu-
2002).
nos é diretamente relacionado com a aprendizaBuscando identificar a natureza das meto-
gem, ou seja, se não conseguem aprender, perdem
dologias utilizadas no ensino de química na tra-
o interesse. E por que não conseguem aprender?
jetória escolar de alunos do curso subsequente
Essa é uma pergunta complexa, mas, certamente,
em técnico de alimentos, realizamos um censo.
encontraremos algumas respostas analisando
O objetivo principal foi identificar a metodologia
como o conhecimento científico é abordado pelos
utilizada pelos professores da referida disciplina e
professores.
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Ensino de Química Durante a Trajetória Escolar de Alunos do Curso Subsequente em Técnico de Alimentos
num ensino memorístico, impedem que os alunos
A motivação não é apenas causa, mas também consequência da aprendizagem. Sem aprendizagem também não há motivação. Se apesar de se esforçar, o aluno tem a expectativa de que não vai ser aprovado em determinada disciplina, ou de que não vai aprender o seu conteúdo (dependendo de suas metas), dificilmente vai se esforçar (Pozo; Goméz-Crespo, 2009).
construam seu próprio conhecimento. A metodologia de ensino precisa integrar o máximo possível, as atividades de ver, ouvir, pensar, falar e fazer (atividades perceptivas, motoras e cognitivas) (Ries, 2006). Quanto mais atividades estiverem envolvidas, maior e mais estável é a aprendizagem delas resultante. Desta forma, o professor pode fazer com que o aluno se torne
A Química é uma disciplina que está incluída no programa curricular do ensino fundamental e médio. A aprendizagem da mesma possibilita aos estudantes compreender melhor as transformações químicas que ocorrem em seu dia a dia. A partir daí, o aluno tomará sua decisão e dessa forma, interagirá com o mundo enquanto indivíduo e cidadão (Brasil, 2008). Diante das concepções dos PCN’s, percebe-se a verdadeira missão do professor de química do Ensino Médio: democratizar os saberes científicos e formar um sujeito autônomo. Acredita-se que, através das metodologias utilizadas em sala de aula, seja possível correlacionar teoria e prática, motivando os discentes a compreender a química de uma forma prática e acessível.
participativo em suas aulas, absorvendo melhor os conteúdos trabalhados. Os conteúdos de Química têm a necessidade do envolvimento participativo dos alunos nas aulas, possibilitando aos mesmos, oportunidades para que eles contextualizem os conteúdos ministrados em sala de aula com o mundo que os rodeia. Existem fatores que contribuem para um aprendizado eficiente, tais como recursos didáticos adequados, metodologia aprimorada dos professores, busca pela melhoria do interesse dos alunos, aulas experimentais, dentre outros. Diante deste contexto, requerem-se mudanças nas metodologias utilizadas pelos professores de química, visto que elas são apontadas como o principal motivo do desinteresse e pouco aprendizado dos alunos (Santos et al., 2004).
Trata-se não só de que o aluno conceba a ciência como um processo construtivo, mas de que realmente tente aprendê-la de um modo construtivo, dando um enfoque profundo em vez de superficial, aprendendo na busca do significado e do sentido, e não só repetindo que acredita que é capaz de aprendê-la, que, em resumo, tenha motivação para aprender ciência e não só para ser aprovado na disciplina (Pozo; Goméz-Crespo, 2009).
É sabido que o professor deve atuar como mediador na produção de conhecimento, administrando a aula e promovendo a produção de saberes (Cardoso; Colinvaux, 2000). A presença do professor em sala de aula é de grande importância; quando ele faz o aluno pensar e tirar suas próprias conclusões a respeito da química, o estudante se torna um ser confiante e estimulado a estudar.
São claras as dificuldades no processo de ensino-aprendizagem de Química. Os professores
3. Metodologia
encontram-se condicionados a uma metodologia
Com o intuito de identificar a metodologia
tradicional, fazendo com que a interação com os
aplicada no ensino de química durante o Ensino
alunos seja insuficiente; além disso, mergulhados
Médio, para com os alunos do subsequente do 1°
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
83
O Ensino de Química Durante a Trajetória Escolar de Alunos do Curso Subsequente em Técnico de Alimentos
período de 2011.2, foi aplicado um questionário
Buscou-se com as perguntas iniciais do
contendo seis perguntas objetivas, para um grupo
questionário caracterizar, brevemente, a turma
de trinta e um alunos, durante uma aula. Foi escla-
quanto ao sexo e à sua faixa-etária. Dos alunos
recido qual era o objetivo do questionário e sua não
entrevistados, 39% são do sexo masculino e a
obrigatoriedade em responder ou se identificar.
maioria representando 61% é do sexo feminino. A turma apresenta idades que variam de 18 a 29
Quadro 1. Questionário utilizado para realização da pesquisa. Questionário Informações sobre a disciplina de química obtidas junto aos alunos do subsequente, 1° período, turno vespertino, do IFRN- Campus Currais Novos. 1) Sexo: (
)M (
2) Idade: (
)
)F
anos, embora com predominância das faixas etárias de 18 e 19 anos, ou seja, recém-concluintes do Ensino Médio. A Química influencia a nossa vida, sendo, contudo um assunto difícil de aprender devido aos conceitos de que necessita e ao rápido crescimento do conjunto de conhecimentos que envolvem
3) Você gosta da disciplina de química? ( ) Sim ( ) Não
(Schnetzler, 2004). Uma abordagem metodológica
4) Seu rendimento escolar nesta disciplina é bom? ( ) Sim ( ) Não
mentos, torna notória a existência de uma grande
5) A metodologia aplicada pelos professores de Química em sua vida escolar foi proveitosa? ( ) Sim ( ) Não Se sua resposta for Não, o que faltou? ( ) Precisava mudar a metodologia. ( ) Trabalhar com experimentos. ( ) Relacionar os conteúdos com o cotidiano. ( ) Trabalhar com teoria e prática ao mesmo tempo.
equivocada, aliada à complexidade dos conhecidificuldade no ensino/aprendizagem de Química, resultando numa grande aversão a esta disciplina. Isto pode ser comprovado com as respostas dos alunos quanto ao seu interesse por esta disciplina, mostradas na Figura 1.
6) Com a chegada do curso superior de Licenciatura em química aqui no IFRN despertou em você o interesse de concorrer à seleção do curso?
4. Resultados
32% Sim 68% Não
e discussão
A turma do primeiro período subsequente
Figura 1. Interesse dos alunos pela disciplina.
de alimentos do Instituto Federal de Educação,
84
Ciência e Tecnologia (IFRN) – Campos Currais
Os resultados dos exames de avaliação na
Novos, foi escolhida para a realização da pesquisa.
disciplina de química realizados pelo Ministério
No início do período, a turma era composta por
da Educação demonstram que o desempenho
quarenta alunos, mas, quando o questionário foi
dos estudantes brasileiros está muito abaixo dos
aplicado, apenas trinta e seis estudantes continu-
padrões considerados adequados (Gamboa, 1997).
avam com a matrícula no curso, sendo que des-
Corroborando com esta realidade, a Figura 2 sina-
tes, trinta e um responderam as perguntas pois os
liza que o rendimento dos entrevistados na disci-
outros cinco estavam ausentes neste dia.
plina em questão também não é satisfatório.
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Ensino de Química Durante a Trajetória Escolar de Alunos do Curso Subsequente em Técnico de Alimentos
foi proveitosa, pois está claro que 84% dos indi-
23% Sim
víduos não conseguiram acompanhar o método
77% Não
trabalhado dentro de sala de aula e só 16% responderam que sim.
Figura 2. Respostas ao questionamento se o rendimento escolar dos alunos na disciplina de química é bom.
84% Não
16% Sim
Ao avaliar o rendimento escolar dos estudantes, os resultados foram preocupantes, pois 77% dos discentes têm um rendimento insatisfatório na disciplina de química e só 23% responderam que seu rendimento escolar é satisfatório. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Química para o Ensino Médio esclarecem que as ciências que compõem a área têm em comum a investigação sobre a natureza e o desenvolvimento tecnológico, e é com ela que a escola compartilha e articula linguagens que compõem cada cultura científica, estabelecendo mediações capazes de produzir o conhecimento escolar, na inter-relação dinâmica de conceitos cotidianos e científicos diversificados, incluindo o universo cultural da Ciência Química. No entanto, percebe-se a grande dificul-
Figura 3. Proveito baseado na metodologia aplicada pelo professor ao longo do ensino médio.
Para aqueles alunos que consideraram a metodologia aplicada pelos professores inadequada, os percentuais para as várias sugestões apresentadas aos alunos foram bem variados, como observado na Figura 4. Neste grupo de alunos, 4% responderam que precisava-se mudar a metodologia, 32% afirmaram que precisava-se trabalhar com experimentos, 36% disseram que faltou relacionar os conteúdos com o cotidiano e 28% confirmaram a dificuldade de trabalhar teoria e prática ao mesmo tempo.
dade dos alunos do Ensino Médio em relacionar a teoria com a prática. Na maioria das escolas tem-se dado maior ênfase à transmissão de conteúdos e à memorização de fatos, símbolos, nomes, fórmulas, deixando de lado a construção do conhecimento científico dos alunos e desvinculando o conhecimento químico do cotidiano (Costa, 2007). Essa prática tem influenciado negativamente na apren-
4% Precisava mudar a metodologia 36% Relacionar os conteudos com o cotidiano
32% Trabalhar com experimentos 28% Trabalhar teoria e pratica ao mesmo tempo
dizagem dos alunos, uma vez que não eles conseguem perceber a relação entre aquilo que estudam na sala de aula, a natureza e a sua própria vida. A figura a seguir nos revela que, sob a visão dos estudantes, a metodologia aplicada pelos professores de Química em suas vidas escolares não
Figura 4. Percentuais das respostas dos alunos sobre o que faltou na metodologia adotada pelo professor ao longo do ensino médio.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
85
O Ensino de Química Durante a Trajetória Escolar de Alunos do Curso Subsequente em Técnico de Alimentos
A última pergunta surgiu de uma curiosi-
ram apresentar rendimento insatisfatório em quí-
dade dos professores em saber se os alunos do
mica. Até onde vai a relação entre a metodologia
subsequente de Técnico em Alimentos do primeiro
utilizada pelo professor e o interesse dos alunos e
período têm interesse de concorrer no processo
o seu rendimento, ou mesmo a falta de interesse do
seletivo para o curso de licenciatura em Química.
aluno e o seu rendimento insuficiente, são passí-
As respostas obtidas foram intrigantes, pois, como
veis de discussão.
podemos ver no quadro a seguir, alguns estudantes
De acordo com os dados apresentados,
têm interesse em participar desta seleção, mesmo
podemos associar as dificuldades encontradas
declarando, em sua maioria, o desinteresse pela
pelos alunos à metodologia adotada pelos docen-
disciplina de Química.
tes durante a vida escolar desses estudantes, sendo que a falta de contextualização parece ser um pro-
58% Não
42% Sim
blema reincidente nas abordagens escolares. Os alunos assinalaram como problemas metodológicos a falta de relação teoria-prática, 28%, a escassa relação dos conteúdos com o cotidiano, 36%, e a falta de trabalho com experimentos, 32%. Todos os problemas metodológicos apon-
Figura 5. Interesse dos alunos para ingressar no curso de Licenciatura em Química.
tados voltam-se para a questão da falta de contextualização. A contextualização é o que dá sentido ao conhecimento científico e é um dos
Mesmo com toda a dificuldade que o aluno
aspectos que garantem uma aprendizagem signi-
do subsequente encontra em Química, boa parte
ficativa, entendendo como aprendizagem signifi-
deles, ou seja, 42% responderam que se interes-
cativa, aquele conhecimento que o aluno compre-
sariam em ingressar no curso de Licenciatura em
ende sua utilidade, apresentando, portanto, sentido
Química, enquanto que os outros 58% não têm
em aprendê-lo.
interesse em participar do referido curso. Isto nos
A perda de sentido do conhecimento cien-
leva a crer que, de acordo com as respostas dos
tífico não só limita sua utilidade ou aplicabilidade
alunos, a opção pela formação em nível superior
por parte dos alunos, mas também seu interesse ou
vai além do seu interesse por determinada disci-
relevância (Pozo; Goméz-Crespo, 2009). Trata-se,
plina ou mesmo de sua aptidão por determinada
portanto, de uma relação extremamente dialógica
área.
entre a falta de interesse dos alunos e abordagens metodológicas descontextualizadas, desprovidas de sentido.
5. Conclusão
86
Apesar de alguns poucos alunos acreditarem ser importante o estudo de Química, e de
A partir das respostas dos alunos verificou-
afirmarem que gostam de estudá-la, eles enten-
-se que a maioria deles apresenta idade entre 18 e
dem que, se houvesse o suporte de laboratório de
19 anos, sendo que a maioria declarou não possuir
experimentos, a aprendizagem da disciplina seria
interesse pela disciplina de química, ou seja, 68%
muito mais prazerosa. Pode-se dizer ainda que os
não gostam da disciplina. Acredita-se que essa
professores deveriam realizar conexões entre o
falta de interesse é refletida nos 77% que declara-
conhecimento cotidiano e o científico, apresen-
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Ensino de Química Durante a Trajetória Escolar de Alunos do Curso Subsequente em Técnico de Alimentos
tando a ciência como uma forma aprofundada de
o poder das ideias prévias que os professores tra-
ver o mundo.
zem sobre o ensino e a aprendizagem, no entanto,
Partindo das constatações apontadas faz-se
mudanças curriculares e didático-metodológicas
necessário que o professor de Química adote uma
deverão ser efetivadas nos cursos de formação de
metodologia onde a realização de aulas práticas, a
professores.
contextualização, a utilização de recursos audiovisuais e atividades extras, sejam partes integrantes de suas abordagens didáticas. Tais mudanças metodológicas requerem uma verdadeira transformação no modo de ver e pensar a ciência. Transformação essa que está em trânsito. As teorias científicas não devem ser consideradas saberes absolutos, mas, sim, construções sociais.
O desajuste entre a ciência que é ensinada (em seus formatos, conteúdos e metas, etc.) e os próprios alunos é cada vez maior, refletindo uma autêntica crise na cultura educacional, que requer adotar não apenas novos métodos, mas, sobretudo, novas metas e uma nova cultura educacional (Pozo; Goméz ‑Crespo, 2009).
Ter contato com mudanças de cunho didá-
É necessário levar para os alunos o caráter dinâmico e perecedouro dos saberes científicos, conseguindo que percebam sua transitoriedade e sua natureza his tórica e cultural, que compreendam as relações entre o desenvolvimento da ciência, a produção tecnológica e a or gani zação social, entendendo, portan to, o compromisso da ciência com a sociedade, em vez da neutralidade e objetividade do suposto saber positivo da ciência (Pozo; Goméz‑Crespo, 2009).
tico-metodológico durante a graduação será um passo importante para o professor em formação, levando-o, de maneira menos tortuosa, em direção ao novo, visando atender às novas demandas educacionais.
REFERÊNCIAS
O ensino memorístico, concebido pela pedagogia tradicional, deve dar lugar a um ensino contextualizado onde o aprender a aprender é o mais importante. A ciência deve ser compreendida como dinâmica e não estática. É claro que, para o ensino-aprendizagem, deixar de ser entendido como passivo e se tornar ativo, onde o aluno constrói e reconstrói os saberes, não sendo mais considerado como uma tábula rasa, ainda falta muito, mas acreditamos que práticas metodológicas que busquem a contextualização poderão contribuir. Como transformar o ensino de química nas escolas do Ensino Médio, num ensino contextualizado e significativo, capaz de contribuir para mudanças na sociedade via democratização dos saberes elaborados? Não devemos desconsiderar
BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) – Ensino Médio, 1999. Orientação Curricular para o ensino médio, ciências da natureza, matemática e suas tecnologia. Brasília: Ministério da Educação, secretaria de Educação básica, 2008. CARDOSO, S. P.; COLINVAUX, D. Explorando a motivação para estudar química. Química Nova, v. 23, n. 2, 2000. COSTA, N. S. Professor de química: formação, competências/habilidades e posturas, 2007. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25. ed. São Paulo: Terra e Paz, 2002. GAMBOA, S. S. (Org.). Pesquisa educacional: quantidade-qualidade. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1997. POZO, J. I.; GOMÉZ-CRESPO, M. A. Aprendizagem e ensino de ciências: do conhecimento cotidiano ao científico. Artmed. 2009. RIES, B. Aprendizagem na fase adulta. Ciências e letras, Porto Alegre, n. 40, jul./dez. 2006. Disponível em:
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
87
O Ensino de Química Durante a Trajetória Escolar de Alunos do Curso Subsequente em Técnico de Alimentos
88
<http://www.fapa.com.br/cienciaseletras/publicacao.htm>. Acesso em: 04 jan. 2012.
Cinética Química. 30º Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química, 2004.
SANTOS, D. O.; SANTANA, R. J.; ANDRADE, D.; LIMA, P. Experimentação: contribuições para o processo de ensino aprendizagem do conteúdo de
SCHNETZLER, R. P. Química Nova na Escola, v. 20, n. 49, 2004.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Relato 05 | Volume 08 | Número 01 | Jan./Jun. 2013
Aulas de Química: uma busca pela implantação de aulas experimentais Chemistry Classes: a quest for the implementation of experimental classes Keila Cruz Moreira1 Daguia de Medeiros Silva2 Jeovane Jefferson Soares de Oliveira2 Ana de Fátima Costa da Silva2
Resumo
A disciplina de química é considerada um componente curricular de difícil compreensão entre muitos alunos. Despertar o interesse e a curiosidade em relação à Química requer, do professor, conhecimento, pesquisas e criatividade. Foi a partir dessa observação que surgiu o presente trabalho. Foram investigados, por meio de questionários, cem alunos, buscando perceber como estava sendo ministradas as aulas de química nas escolas estaduais Tristão de Barros e Instituto Vivaldo Pereira do município de Currais Novos/RN. O objetivo desse trabalho foiverificar se as aulas experimentais poderiam ser uma alternativa para aulas mais produtivas no ensino de Química. Com os resultados obtidos, constatou-se que mesmo com 98% dos entrevistados afirmando que as aulas de química estão ocorrendo nas escolas regularmente e 87% dos discentes afirmando que o professor que leciona a disciplina de química é licenciado em química, 63% dos discentes entrevistados, relatam que não tem aulas experimentais de química. Mesmo assim, no desenvolver da pesquisa, foi possível observar que os alunos tem vontade de aprender química, mas as escolas não oferecem condições para que as aulas de químicas ocorram de forma mais adequada pelos professores, fazendo com que os alunos tenham dificuldades de aprender e acabem desmotivados. Palavras-chave: Disciplina de química. Aulas experimentais. Aprendizagem. 1
Doutora em Educação pela UFRN.
2
Graduandos de Licenciatura em Química do IFRN Campus Currais Novos.
p. 89-98
AbStRACt
The chemistry course is considered a curricular component of difficult understanding among many students. Awaken in them an interest and curiosity in relation to chemistry requires, teacher, knowledge, research and creativity. It was from this observation that emerged this work. One hundred students werw investgated, trying to see howI was being taught chemistry classes in the state schools estaduais Tristão de Barros and Instituto Vivaldo Pereira at CurraisNovos/RN. Theaim of this studywas to determine whether the experimental classescould bean alternative to more productive lessons in chemistry teaching.With the results, it was found that even with 98%of respondents stating that the chemistry classesare taking place regularly in schools and 87% of students stating that the professor who teaches the discipline of chemistry are graduated, 63% of students surveyed report that has no experimental classes of chemistry. Even so, developing research we observed that students are willing to learn chemistry, but schools do not offer conditions for chemical classes occur more appropriately by teachers, making the students have learning difficulties and endunmotivated. Key-words: Discipline of chemistry. Experimental classes. Learning.
com omundo enquanto indivíduo e cidadão (PCN,
É de grande relevância a formação continuada do docente, pois quando desenvolve seu potencial e trabalha sua postura diante do desafio de ensinar, estará possibilitando ao estudante tornar-se um ser crítico e reflexivo diante da sociedade, ajudando-o na sua formação cidadã. No ensino de química, as aulas podem ser mais significativas quando não apenas adotam o conhecimento estático, exclusivamente teórico, fazendo uso da aula experimental, como uma boa estratégia de ensino, visto que a atividade experimental ocorre com o manuseio de vidrarias e instrumentos que propiciam o desenvolvimento e a fixação de conceitos teóricos enquanto a teórica se baseia na construção de conceitos através de textos, exercícios e relatos, a respeito de situações práticas onde esses conhecimentos são aplicados. No entanto, os alunos não são convidados a experimentar os conceitos e a desenvolverem novos a partir dos experimentos, impossibilitando, assim, uma melhor relação entre a teoria e a prática. Quando não há essa articulação entre a teoria a prática, os conteúdos não ganham relevância para os estudantes e são facilmente esquecidos. É necessário, portanto, que o processo de aprendizagem seja feito de forma a construir o conheci-
1999).
mento e não apenas apresentar conceitos prontos
1.
Introdução O ensino de forma geral deve oferecer
igualdade de condições de acesso ao conhecimento, bem como valorizar o profissional da educação, em nosso caso o professor. E esse último deve se incumbir, dentre outras funções, zelar pela aprendizagem dos alunos, elaborando e cumprindo um plano de trabalho em consonância com a propostapedagógica da instituição de ensino ao qual está vinculado. As propostas de formação continuada para os docentes têm sido, nestes últimos anos, uma preocupação tanto para o poder público, como para pesquisadores e teóricos da educação (Fróride; Steinle, 2012). Essa preocupação vem se materializando em algumas ações que favoreceo profissional da educação trabalhar com seus discentes de forma que eles tenham condições de aprender os diversos conteúdos que lhes são expostos de uma maneira mais fácil e atrativa, ou seja, trabalhando conteúdosrelacionados com a vivência do aluno, para que estes possam julgar as informações trazidas pela mídia, ofertadas por meioda escola, do seu ciclo de amizades, dentre outros. A partir daí, o aluno tomará sua decisão e, dessa forma, interagirá
90
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Aulas de Química: uma busca pela implantação de aulas experimentais
sem articulação com o cotidiano desses alunos.
tada no aluno a curiosidade, que gera a busca por
Através de experiências realizadas em laboratório,
respostas, que propicia a assimilação de novos
propiciam-se ao estudante aulas com mais signifi-
conhecimentos.
cado em seu cotidiano, bem como pode-se trans-
Muitas vezes, por falta de laboratório ade-
ferir valores que contribuam para a sua formação
quado, ou por falta de tempo, o professor fica
como cidadãos.
limitado à apresentação de aulas práticas, muito embora, em alguns casos, o problema esteja na sua
Independentemente das fases construtivas do processo de aprendizagem, tem sido proposto que as aulas das diversas disciplinas sejam planejadas de modo a aproveitar, complementar, desenvolver e transformar as ideias, teorias e conhecimentos que os alunos trazem, explorando as atividades práticas para a formação do conhecimento de modo mais efetivo (Moreia et al., s/d).
formação inicial.
2. Fundamentação
teórica
O ensino de Química se tornou preocupante nos últimos anos, tendo em vista que, hoje, além das dificuldades em aprender Química, muitos
Ou seja, propiciando aos estudantes aulas
alunos não sabem o motivo pelo qual estudam esta
com mais significado em seu cotidiano, bem como
disciplina, visto que, nem sempre, esse conheci-
a transferência de valores que contribuam para
mento é transmitido de maneira que o aluno possa
a sua formação como cidadãos. Tendo em vista
entender a sua importância.
que a Educação Básica em seu Nível Médio tem
Muitas escolas têm dado maior atenção
entre suas finalidades desenvolver o educando,
à transmissão de conteúdos e à memorização de
assegurar-lhe a formação comum indispensável
fatos, símbolos, nomes, fórmulas, ocultando a
para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios
construção do conhecimento científico dos alunos
para progredir no trabalho e em estudos posterio-
e a desvinculação entre o conhecimento químico
res (Brasil, 1996). É importante, também, que os
e o cotidiano. Essa prática tem influenciado nega-
professores estejam atentos à enorme distância que
tivamente a aprendizagem dos alunos, uma vez
tende a se estabelecer entre o mundo da ciência e
que eles não conseguem perceber a relação entre
o mundo do cotidiano, distância essa, que o aca-
aquilo que estudam na sala de aula, a natureza e a
demicismo exagerado da escola pode tornar ainda
sua própria vida (Miranda; Costa, 2007).
maior. Convenções, enunciados, conceitos, teo-
Para minimizar ou sanar tais aspectos,
rias, modelos e leis podem, à primeira vista, serem
pode-se dizer que uma das soluções a serem
tão incompreensíveis quantas palavras e frases de
providenciadas é a construção de novos recur-
uma língua estrangeira.
sos didáticos, recursos que permitam a concilia-
O professor precisa considerar este pro-
ção entre a teoria e a prática, fazendo com que o
blema e encontrar pontos de contato entre o con-
discente se torne um ser questionador, curioso e
teúdo a ser ministrado e os conhecimentos atuais
que habilidades sejam desenvolvidas para o racio-
do aluno. Tais pontos de contato se localizam,
cínio crítico do mesmo. Porém, para tal fim, é
geralmente, em temáticas do cotidiano e da atua-
preciso que o professor adote uma postura inqui-
lidade. Outro ponto a ser explorado, nesse sentido,
sidora e prime pela pesquisa visando solucionar
são as aulas práticas, pois através delas é desper-
problemas vividos no contexto escolar e, conse-
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
91
Aulas de Química: uma busca pela implantação de aulas experimentais
quentemente, na busca da melhoria de sua prática
Não basta a seleção e a organização lógica dos conteúdos para transmiti ‑los. Antes, os próprios conteúdos devem incluir elementos da vivência prática dos alunos para torná-los mais significativos, mais vivos, mais vitais, de modo que eles possam assimilá-los ativa e conscientemente (Libâneo, 1990).
docente. A construção de recursos didáticos empregados no Ensino de Ciências permite a ligação entre teoria e prática e os experimentos ou atividades práticas devem ser conduzidos visando a dife rentes objetivos, tal como demonstrar um fenômeno, ilustrar um princípio teórico, coletar dados, testar hipóteses, desenvolver habilidades de observação ou medidas, adquirir familiaridade com aparatos, entre outros, permitindo o desenvolvimento do raciocínio crítico e reflexivo do aluno (Ferreira; Hartwig; Oliveira, 2010).
Quando se expõem apenas conhecimentos “prontos” para os estudantes, eles se tornam desinteressantes e, por muitas vezes, cansativos. Possibilitar, por meio de experiências já viven ciadas ou aulas experimentais, a construção do conhecimento torna-se mais proveitoso para os alunos.
Relacionar os conteúdos trabalhados em
A maioria das pessoas aprende melhor de maneira experimental, quando envolve par ticipação pessoal, física, mental e emocional em atividades e oportunidades para a descoberta e realização pessoal. Aprende-se melhor quando são apresentados conceitos em um contexto no qual são envolvidas relações que estão próximas dos alunos (Piconez, 2003).
sala de aula com o cotidiano dos alunos contribui, de forma significativa, pois possibilita uma com preensão mais rápida e fácil, além de favorecer que o aluno construa suas próprias ideias a respeito dos conceitos apresentados.
92
A construção de novas metodologias de ensino para promover a construção de forma ativa pelo aluno do seu próprio conhecimento por meio da investigação e pesquisa é restrita na área da química e explora-se minimamente a formação de um pensamento químico e de um pensamento voltado para visualizarão prática, o que propõe dificuldades dos alunos em construir modelos (Franco Neto; Silva, 2006).
mais os alunos nas aulas, fazendo-os interagir
Vale ressaltar que novas metodologias de
cognitivas) (Ries, 2006). Quanto mais atividades
ensino vêm sendo de grande importância para o
estiverem envolvidas, maior e mais estável é a
aprendizado do aluno, porém, é fundamental que
aprendizagem delas resultante.
É necessário, portanto envolver cada vez entre si e com o mestre, possibilitando debates onde possam expor suas ideias e ouvir as dos colegas. A metodologia de ensino precisa integrar o mais possível, as atividades de ver, ouvir, pensar, falar e fazer (atividades perceptivas, motoras e
novos materiais didáticos para se trabalhar em sala
Tornar o discente, parte integrante da cons-
de aula sejam elaborados junto com os discentes,
trução do conhecimento, aproximar deles os con-
proporcionando um ensino mais dinâmico. Assim,
ceitos trabalhados, amplia as possibilidades para
é importante que os docentes usem da criatividade
abordar as diferentes situações tanto do cotidiano
e flexibilidade para escolher os conteúdos que
como expostas nas aulas. Cria-se assim, a opor-
favoreçam o desenvolvimento do aluno.
tunidade para que os próprios discentes elaborem
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Aulas de Química: uma busca pela implantação de aulas experimentais
suas estratégias de abordagens, quando se depara-
aulas de química e como os alunos
rem com problemas ainda não vistos.Ensinar não é
estão assimilando o conteúdo. Foram
transferir conhecimento, mas criar as possibilida-
consultados onze artigos, sendo que
des para a sua própria produção ou a sua constru-
sete foram selecionados para a análise
ção (Freire, 2002).
dessa pesquisa.
Portanto é de fundamental importância criar
2. No segundo momento, foram visitadas
oportunidades para que o conhecimento seja cons-
duas escolas estaduais do município
truído pelos alunos e uma maneira de se conseguir
de Currais Novos/RN: Escola Estadual
tal fato é trabalhando com aulas práticas, visto que
Tristão de Barros e Escola Estadual
essas além de possibilitarem uma abordagem mais
Instituto Vivaldo Pereira, onde foram
completa dos conteúdos, também desperta neles a
aplicados cem questionários para alu-
motivação para estudar.
nos da 2ª e 3ª séries. O questionário era
Um estudo com alunos do Instituto Federal
composto de oito perguntas objetivas e
de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande
uma discursiva. O intuito de fazer essa
do Norte, Campus Currais Novos, em 2008, mos-
abordagem nas escolas foi perceber
trou que a motivação dos estudantes para estudar
como está sendo trabalhada a disciplina
química cresceu de 2,5% para 68,6% após a intro-
de Química e como as instituições estão
dução de uma abordagem experimental nas aulas
contribuindo para que haja uma boa
(Lima, 2009).
compressão desta disciplina.
Torna-se relevante assim,à investigação
•
A primeira visita foi feita na escola
desse tema nas escolas estaduais no município de
Estadual Tristão de Barros; de iní-
Currais Novos, RN.
cio, foi feita uma pequena reunião com a direção da instituição onde foi solicitada autorização para a aplicação dos questionários aos alunos,
3. Metodologia
além de se explicar como se daria
As escolas Tristão de Barros e Instituto
o procedimento. Após o término da
Vivaldo Pereira foram escolhidas para a realização
reunião, foi visitada uma sala da 2ª
desse estudo, pois, em ambas, os alunos apresen-
série, onde os questionários foram
tavam deficiência no aprendizado, tanto nas aulas
aplicados; logo após, foi a vez de os
teóricas quanto nas práticas.
alunos da 3ª série responderem aos
Esta
pesquisa
foi
dividida
em
questionários.
três •
momentos:
Posteriormente, foi feita uma visita
1. Primeiramente, foi feita uma revisão
à Escola Estadual Instituto Vivado
bibliográfica em artigos que discor-
Pereira, onde ocorreu um proce-
rem sobre a realização de atividades
dimento semelhante ao da escola
experimentais nas aulas de Química
Estadual Tristão de Barros.
e sobre as condições de aprendiza-
3. No terceiro momento, foram analisados
gem dos estudantes do Ensino Médio,
os questionários para se ter uma por-
para podermos ter uma visão crítica
centagem precisa das respostas a cada
de como estão sendo realizadas as
pergunta feita, e, com isso, analisar por
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
93
Aulas de Química: uma busca pela implantação de aulas experimentais
que os alunos têm tantas dificuldades na
na pedagógica. Sem uma formação adequada, o
disciplina.
professor não possui muitos subsídios para inovar o ensino ou incluir elementos que contextualizem os
4. Resultados
conteúdos que desenvolve em sua prática (Milaré;
e discussões
Pinho-Alves, 2010). Ou seja, quando a disciplina
Os dados da pesquisa foram obtidos em um único momento, a ida às escola para a aplicação dos questionários, onde os dados foram colhidos. Apesar de a pesquisa ter sido realizada em duas escolas (Escola Estadual Tristão de Barros e Instituto Vivaldo Pereira), os valores apresentados são a média de todas as respostas sem que haja distinção entre as escolas, buscando-se desta forma obter valores individuais de cada pergunta e expondo os resultados em Tabelas. Os alunos responderam um questionário que era composto por oito perguntas objetivas e uma discursiva, onde expuseram sugestões para melhoria nas aulas de química. Na primeira pergunta, buscou-se saber se as aulas de química estavam acontecendo regularmente; como mostra a tabela a seguir, 98% dos alunos responderam que sim.
é ministrada em sala de aula por um docente que não é da área, ou até mesmo quando o professor não procura ser inovador de ideias e não busca meios para seus alunos aprenderem o que está sendo trabalhado em sala, os conteúdos acabam sendo transmitidos, para o estudante, de modo mecanizado, faltando clareza na abordagem, tornando o aprendizado deficiente. Com a segunda pergunta, buscou-se saber se os alunos tinham conhecimento da formação do seu professor de Química. Foram dispostas as seguintes alternativas: Licenciatura em química, Licenciatura em outra área, Bacharelado, Engenheiro, Tecnólogo, Não tem graduação. Apenas 13% disseram que seu professor já era licenciado em Química e 87% disseram que o mestre estava cursando Licenciatura em química. tabela 2. Média da formação do professor de química. Você sabe qual é a formação do seu professor de química?
tabela 1. Média das respostas sobre as aulas de Química. As aulas de química estão acontecendo regulamente?
Quantidade Porcentagem
Sim, as aulas estão acontecendo regulamente.
98
98%
Não, as aulas não estão acontecendo regulamente.
02
2%
Total
100
100%
Quantidade Porcentagem
Licenciado em Química
13
13%
Licenciando em Química
87
87%
100
100%
Licenciado em outra área Bacharel Engenheiro Tecnólogo Não tem graduação Total
A partir dessa pergunta, foi possível observar que as deficiências encontradas no ensino
94
de Química não se devem a questões externas
Junto com a terceira pergunta foi exposta
à sala de aula como, por exemplo, falta de regula-
uma lista de conteúdos, que entrevistados res-
ridade das aulas, mas, sim, a fatores internos. Entre
ponderam se já haviam sido estudados no ano ante-
esses fatores, a formação inicial dos professores
rior. Os conteúdos listados foram: Matéria e suas
merece destaque, pois a maioria deles apresenta
propriedades, Misturas, Sistemas e Substâncias,
deficiências, tanto na formação específica, quanto
Leis ponderais e Leis volumétricas (Lei de
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Aulas de Química: uma busca pela implantação de aulas experimentais
Lavoisier, Lei de Dalton, Lei de Proust e Lei de
pois mostra que, enquanto este conteúdo foi traba-
Richter-Wenzel-Berzellius), Estrutura do átomo
lhado com os estudantes, o mesmo não aconteceu
(modelos atômicos), Classificação periódica dos
com os demais conteúdos curriculares que estão
elementos (Tabela Periódica), dentre outros. Com
previstos para serem ensinados aos alunos durante
isso, foi possível saber quais foram os conteúdos
o ano letivo. Os dados mostrados na Tabela 3 evi-
trabalhados com os alunos da primeira, segunda e
denciam essa afirmação; como podemos verificar,
terceira série. Através da Tabela 3, pode-se veri-
apenas 7% lembraram das propriedades coliga-
ficar que o conteúdo mais trabalhado, com 81%
tivas das soluções, ensinadas aos estudantes das
das respostas, foi a estrutura do átomo (modelos
escolas Estaduais Tristão de Barros e Instituto
atômicos); esse resultado é de grande importância,
Vivaldo Pereira.
Tabela 3. Média de quais os conteúdos abaixo foi estudada no ano passado. Dos conteúdos de Química citados abaixo, quais você estudou no ano passado?
Quantidade de repostas
Porcentagem de respostas
Matéria e suas propriedades
58
58%
Misturas, Sistemas e Substâncias.
69
69%
Leis ponderais e Leis volumétricas (Lei de Lavoisier, Lei de Dalton, Lei de Proust e Lei de Richter-Wenzel-Berzellius)
29
29%
Estrutura do átomo (modelos atômicos)
81
81%
Classificação periódica dos elementos (Tabela Periódica)
41
41%
Ligações químicas
62
62%
Funções inorgânicas (ácidos, bases, sais e óxidos)
46
46%
Reações químicas
58
58%
Equações químicas
49
49%
Balanceamento de equações químicas
57
57%
Estudo dos gases
35
35%
Estequiometria
09
9%
Estudo das soluções
47
47%
Propriedades coligativas das soluções
07
7%
Termoquímica
10
10%
Cinética Química
13
13%
Equilíbrios Químicos
19
19%
Equilíbrios iônicos
14
14%
Óxido-redução
39
39%
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
95
Aulas de Química: uma busca pela implantação de aulas experimentais
Com relação à quarta pergunta, foi indagado se, na escola, havia laboratório de Química;
Tabela 5. Média para saber se as aulas experimentais acontecem dentro da sala de aula. Você tem aulas experimentais de Química?
49% disseram que não existia laboratório na
Quantidade de respostas
Porcentagem de respostas
Sim
0
0
existência de algum laboratório na escola. Porém,
Não
63
63%
verificou-se a inexistência de laboratórios didáti-
Às vezes
37
37%
Total
100
100%
escola, 31% disseram que tinha laboratório, porém nunca era utilizado e 20% afirmam desconhecer a
cos específicos para cada disciplina nas escolas, havia apenas um laboratório de Ciências, utili-
Para que a pesquisa ficasse mais precisa, foi
zado para dinamizar as disciplinas de Química,
perguntado onde ocorrem as aulas experimentais
Física e Biologia.
e 100 % dos alunos disseram que, quando essas Tabela 4. Média para saber se existe laboratório de química e/ou de ciências na escola. Existe laboratório de Química e/ou de Ciências nesta Escola?
Quantidade de respostas
Porcentagem de respostas
Sim
31
31%
Não
49
49%
Desconheço
20
20%
Total
100
100%
aulas acontecem, elas são realizadas na própria sala de aula. Tabela 6. Média, onde acontecem as aulas experimentais. Em qual ambiente ocorrem as aulas experimentais?
Quantidade de respostas
Porcentagem de respostas
100
100%
No laboratório de Ciências (Multidisciplinar)
0
0
No laboratório de Química
0
0
100
100%
Na própria sala de aula
Buscando descobrir se acontecem aulas
Total
práticas, de modo mais direto, nas escolas pes quisadas, perguntou-se aos alunos se eles traba lhavam de forma experimental na disciplina de
a forma do professor trabalhar os conteúdos de
mentais enquanto 37% responderam que, às vezes,
Química é considerada de fácil compreensão pelos
era trabalhado com experimentos dentro da sala de
discentes; 22% disseram que sim e 78% afirmaram
aula.
que não. Esse número é bastante preocupante, pois Vale ressaltar que, não havendo uma arti
culação entre os dois tipos de saberes, isto é, o
96
Na tabela a seguir, podemos avaliar se
Química; 63% disse que não tinham aulas experi-
mais de 50% dos alunos não estão conseguindo entender o que o docente ensina em sala de aula.
teórico e o prático, o conhecimento poderá ser
Observou-se que, nas escolas pesquisadas,
bem menos relevante à formação do indivíduo.
os professores têm optado por realizar suas aulas
Ainda, os dados obtidos com essa pesquisa permi-
privilegiando a transmissão de conhecimento e
tem constatar que este tipo de ensino de Química
desconsiderando o conhecimento prévio do aluno.
contribui muito pouco para que o aluno o insira em
Essa prática tem influenciado negativamente a
seu dia a dia.
aprendizagem dos alunos, uma vez que não conse-
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Aulas de Química: uma busca pela implantação de aulas experimentais
guem perceber a relação entre aquilo que estudam
que 100% dos entrevistados afirmaram que para ter
na sala de aula, a natureza e a sua própria vida
um maior desempenho na disciplina de Química
(Milaré; Pinho-Alves, 2010).
seria necessário a implantação de um laboratório de Química, possibilitando a realização de aulas
Tabela 7. Os conteúdos estão sendo trabalhado de forma fácil de aprender dentro da sala de aula.
práticas. Outro ponto de destaque é que 50% dos
Os conteúdos de Química Quantidade Porcentagem são trabalhados de forma de respostas de respostas fácil de compreender?
insuficiente, impossibilitando que o professor tra-
alunos consideraram a carga horária da disciplina balhe todo conteúdo de química de maneira que
Sim
22
22%
leve o indivíduo a refletir e construir seus próprios
Não
78
78%
Total
100
100%
conhecimentos em relação à Química com o seu próprio cotidiano. Os outros 50% dos entrevistados mostraram-se desinteressados em aprender o
Na última pergunta objetiva foi questio-
conteúdo de química ministrado pelo professor. É
nado se o professor relaciona os conteúdos vistos
comum que a Química seja considerada uma dis-
em sala de aula com o dia a dia dos alunos; 60%
ciplina pouco interessante pelos alunos do Ensino
dos entrevistados afirmaram que o docente sem-
Médio, entende-se que alguns fatores podem oca-
pre trabalha com temas do cotidiano. Entretanto,
sionar esse desinteresse, tais como, a forma como
no desenvolvimento da pesquisa, observou-se que
é desenvolvida a aula, a postura do professor, o
só trabalhar com conteúdos que envolvam temas
material utilizado ou não, dentre outros. O atual
do dia a dia não é suficiente para a aprendizagem
ensino de Química, na maioria das vezes, prioriza
dos estudantes; é importante que, além de temas
a transmissão de informações, definições e leis
do cotidiano, o conteúdo teórico seja desenvol-
isoladas e memorização de fórmulas matemá-
vido com a prática para uma melhor compreensão
ticas sem qualquer relação com a vida do aluno,
do que está sendo estudado em sala de aula. Em
impossibilitando o entendimento de uma situação-
contrapartida 40% dos alunos entrevistados, res-
-problema (Brasil, 1999).
ponderam que não é sempre que os conteúdos são abordados com temas do cotidiano. Tabela 8. Nas abordagens dos conteúdos, o professor trabalha tema do seu cotidiano. Nas abordagens dos conteúdos, o professor trabalha tema do seu cotidiano? Sim
Quantidade Porcentagem de respostas de respostas 60
Para uma melhor aprendizagem do aluno é necessário que ele se sinta motivado, possibili-
60%
Não
0
0
Às vezes
40
40%
Total
100
100%
tando, assim, uma aprendizagem significativa. As aulas de química ainda são desenvolvidas, em muitas escolas, por meio de atividades nas quais há predominância de um verbalismo teórico/conceitual desvinculado das vivências dos alunos, contribuindo para a formação de ideias/ conceitos em que parece não haver relações entre ambiente, ser humano e tecnologia (Silva, 2003).
Foi feita, também, uma pergunta discur-
Ao avaliar as respostas dos alunos, de
siva em que os alunos puderam dar sugestões para
maneira geral, podemos observar que muitos pos-
melhorar as aulas de Química. Dentre as respostas
suem vontade de aprender, mas que não têm um
obtidas, duas mereceram destaque. A primeira foi
espaço (laboratório) adequado para isso, faltando,
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
97
Aulas de Química: uma busca pela implantação de aulas experimentais
também, tempo (carga horária) suficiente para
bases da educação nacional. Disponível em: <http:// portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/ lein9394.pdf>. Acesso em: 20 ago. 2012.
assimilar e compreender os assuntos apresentados. Além disso, percebemos uma deficiência na formação de pesquisador do próprio professor da disciplina, ou mesmo sua desmotivação para desenvolver tal atitude junto a seus alunos.
5. Considerações
finais
O número de estudantes entrevistados foi representativo e os resultados obtidos apontam que estas duas escolas estaduais do município de Currais Novos não trabalham o elo entre os aspectos teóricos e a prática. Entendemos que isto pode trazer dificuldades no processo de aprendizagem da disciplina de Química. Ao se trabalhar com aulas experimentais, os alunos têm mais facilidade em aprender o que lhes é ensinado, em especial quando é feita uma abordagem que também contemple temas do cotidiano. Assim, eles compreendem melhor os assuntos relacionados à Química. O estudo mostra, também, que os alunos têm vontade de trabalhar com experimentos, porém, eles enfatizam que as escolas não oferecem condições para que as aulas práticas ocorram. Além disso, poderíamos acrescentar que a falta de preparo dos professores, para exercerem as atividades experimentais, também contribui para uma abordagem essencialmente teórica dos conteúdos de química.
REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Educação. PCN’s. MEC/ SEMTEC. Brasília, 1999. _____. Presidência da Republica. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996: Estabelece as diretrizes e
98
FERREIRA, L. H.; HARTWIG, D. R.; OLIVEIRA, R. C. Ensino experimental de química: uma abordagem investigativa contextualizada. Química Nova na Escola, n. 2, p. 101-106, mai. 2010. FRANCO NETO, J. R.; SILVA, R. M. G. Recursos didáticos facilitam o ensino de química. I EQTAP – IV MOQUI – II JOQUI. Urbelândia, MG, ago. 2006. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25. ed. São Paulo: Terra e Paz, 2002. p. 21. FRÓRIDE, M. A.; STEINLE, M. C. B. Formação continuada em serviço: uma ação necessária ao professor contemporâneo. Disponível em: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/2429-6. pdf>. Acesso em: 12 set. 2012. LIBÂNEO, J. C. Didática. Coleção Magistério: 2º Grau. São Paulo: Cortez, 1990. LIMA, C. M. de. Abordagem experimental para o ensino de química no PROEJA: algumas considerações metodológicas. Monografia de Especialização. Currais Novos: IFRN, 2009. MILARÉ, T.; PINHO-ALVES, J. A Química disciplinar em Ciências do 9º ano. Química Nova na Escola, v. 32, n. 1, 2010. MIRANDA, D. G. P.; COSTA, N. S. Professor de Química: Formação, competências/habilidades e posturas. 2007. MOREIA, K. de C. et al. O desenvolvimento de aulas práticas de química por meio da montagem de kits experimentais, s/d. Disponível em: <http://www. unesp.br/prograd/ENNEP/Trabalhos%20em%20 pdf%20-%20Encontro%20de%20Ensino/T3.pdf>. Acesso em: 20 ago. 2012. PARÂMETROS Curriculares Nacionais (PCN) – Ensino Médio; Ministério da Educação,1999. PICONEZ, S. C. B. A aprendizagem do jovem e do adulto e seus desafios fundamentais. 2003. Texto disponibilizado na Webteca do sítio do núcleo de estudos em jovens e adultos e formação permanente. Disponível em: <www.nea.fe.usp.br>. Acesso em: 20 set. 2007. RIES, B. Aprendizagem na fase adulta. Ciências e letras. Porto Alegre, n. 40, jul./dez. 2006. Disponível em: <http://www.fapa.com.br/cienciaseletras/publicacao. htm>. Acesso em: 04 jan. 2009. SILVA, R. M. G. Contextualizando aprendizagens de Química na educação escolar. Química Nova na Escola, n. 18, p. 26-30, 2003.
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Relato 06 | Volume 08 | Número 01 | Jan./Jun. 2013
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública The Discussion on Pesticides in View of a Visual Narrative Production Performed by Students of a Public School Dirceu Donizetti Dias de Souza1 Agnaldo Arroio2 Karen Cacilda Weber3 Resumo
As tecnologias midiáticas sociais são um fenômeno crescente sócial e academicamente. Neste artigo discutimos o potencial uso das narrativas audiovisuais em sala de aula de Química. O conteúdo temático abordado trata dos agrotóxicos e suas relações com aspectos conceituais de Química Orgânica. Metodologicamente, forneceuse aos alunos uma ficha com dados técnicos e solicitou-se a realização de uma narrativa audiovisual. O resultado foi analisado principalmente sobre como os alunos explicitam as relações conceito-tema. O produto audiovisual se constituiu em uma narrativa ambientada interna e externamente à sala de aula. Concepções sobre aulas teóricas e aspectos sobre o trabalho grupal colaborativo são enfaticamente marcadas na produção, enriquecendo substancialmente a integração entre os elementos da narrativa audiovisual, o conteúdo socioconceitual e formas de pensamento. Os resultados contribuem para reconhecer a capacidade de alunos do ensino básico 1
Licenciado em Química pela FCLSBC, mestre em Educação pela FE-USP e Doutor em Educação pela FE-USP. Professor Adjunto do CCEN – Departamento de Química – Universidade Federal da Paraíba. E-mail: baumcima@yahoo.com.br
2
Bacharel em Química pela USP e em Imagem e Som pela UFSCAR, Mestre e Doutor em FísicoQuímica pela USP, Pós-doutorado em Educação pela USP, Livre Docente em Metodologia do Ensino pela Faculdade de Educação da USP. Professor Associado na Faculdade de Educação da USP. E-mail: agnaldoarroio@yahoo.com
3
Licenciada em Química pela UNIOESTE, Mestre e Doutora em Físico-Química pela USP. Profes sora Adjunta do CCEN – Departamento de Química – Universidade Federal da Paraíba. E-mail: karen@quimica.ufpb.br
p. 99-110
como produtores de conteúdo sociocientífico, bem como o potencial uso das narrativas audiovisuais em sala de aula de Química. Palavras-chave: Agrotóxico. Audiovisual. Narrativa. AbStRACt
The social media technologies are a growing social and academic phenomenon. In this article we discuss the potential use of audiovisual narratives in the Chemistry classroom. The thematic content of pesticides and its relationship to conceptual aspects of Organic Chemistry are discussed. Methodologically, the students were provided with a technical data sheet and asked to conduct a visual narrative. The result was analyzed mainly about how students explain the relationship between concept and theme. The product consisted of a visual narrative taking place inside and outside the classroom. Conceptions of classroom and aspects of collaborative group work are strongly marked in the production, substantially enriching the integration between the elements of the audiovisual narrative content and ways of thinking. The results contribute to recognize the ability of elementary school students as producers of social-scientific content as well as the potential use of audiovisual narratives in the Chemistry classroom. Key-words: Audio-visual. Narratives. Pesticides.
1. Introdução
Os avanços atuais nas tecnologias de informação e comunicação, e das novas mídias, possibilitam ao cidadão comum amplo acesso a artefatos culturais que veiculam conteúdo multimodal digital e permitem a comunicação de duas vias (Unesco, 2011). A imediata implicação deste amplo acesso é testemunhada em todos os ambientes sociais, incluindo-se a escola, na qual se observam jovens alunos em aulas de química manipulando diversos aparatos na consumação de registros e nas ações de envio e recepção de imagens estáticas e de audiovisuais. Ao lado e ao mesmo tempo também se notam outros alunos absortos na leitura de livros muitas vezes com conteúdos adversos aos temas que se desenrolam. Estes dois fatos cotidianos são motivos desencadeadores deste trabalho, cujo objetivo é discutir a potencialidade da narrativa audiovisual como instrumento de inserção de alunos de ensino médio de uma escola pública no debate de expressivos temas sociais utilizados como argumento para o ensino de conceitos básicos de química orgânica.
100
A literatura recente disponível, principalmente em periódicos nacionais da área de ensino de Química, revela importantes estudos sobre o tema social agrotóxico, bem como narrativas e audiovisuais, entretanto não são estudos que integram estes três componentes sistemicamente. O tema agrotóxico tem sido explorado como um argumento direto para estabelecer uma temática para o ensino de Química (Cavalcanti et al., 2009; Moraes et al., 2010), incluindo uma revisão de literatura a qual estabelece relação direta com o que se denomina Química Verde (Braibante; Zappe, 2012), mostrando a relevância do tema para a educação científica na escola básica. Esta abordagem contextual é uma proposta educativa mais próxima da vida real, abrangente, e que oferece benefícios amplos para a aprendizagem de toda uma turma de alunos, respeitando a heterogeneidade do espaço social da sala de aula e fomentando o trabalho grupal e colaborativo. Esta proposta ganhou notável reconhecimento com o trabalho de Campbell et al. (1994), na década de 1990, a qual ficou conhecida como a abordagem Salter ou, de maneira mais geral como Context Based Learning (CBL), cujo princípio essencial defende
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública
a participação ativa do sujeito sobre o objeto e em
São muitos os debates sobre os critérios
seu sentido mais amplo, implica respeitar e reco-
para caracterizar a narrativa (Norris et al., 2005;
nhecer sistemicamente o ambiente social e cultural
Hyvärinen, 2006), porém, o discurso narrativo
em que participam o aluno, o professor e a institui-
tem sido entendido como um ato verbal consistindo
ção em que estão situados (Parchmann; Luecken,
de alguém dizer a alguém que alguma coisa aconteceu
2010; Rannikmae; Teppo; Holbrook, 2010; Katrin;
(Smith, 1981; Norris et al., 2005) ou como a narração
Holbrook; Rannikäe, 2012; Arroio, 2010).
de uma sucessão de eventos de ficção (Rimmon; Kenan,
A CBL evidencia questões polêmicas ou
2006) ou ainda a narrativa como um ato da fala,
controversas do mundo real, abordando demandas
sugerindo que a narrativa em si pode ser proveito-
sociais, pelas quais o uso de contextos também é
samente entendida como um ato de retórica, alguém
uma maneira de aumentar a consciência social,
dizendo a alguma outra pessoa em alguma ocasião e
buscando reforço simultâneo entre a expansão da
para alguns propósitos que algo aconteceu (Hyvärinen,
consciência ambiental em um contexto de apren-
2006).
dizagem que atenda a sociedade, bem como vai ao
Norris et al. (2005), desenvolvem intensas
encontro das necessidades dos alunos (Whitelegg;
reflexões sobre a natureza da narrativa em textos
Parry, 1999).
de ciência avaliando a possibilidade de se ter um
As narrativas por sua vez têm recebido
texto híbrido narrativo – explanativo em sala de
atenção especial por parte de autores nacionais
aula, e sugere benefícios ao leitor, tais como incre-
(Ribeiro; Martins, 2007; Arroio, 2011) e estrangei-
mento na facilidade de memorização e compreen-
ros (Galvão, 2005; Norris et al., 2005; Hyvärinen,
são, de organização e apresentação de conteúdos
2006), indicando tendências em sua exploração
e do aumento de interesse pelos alunos por conte-
como recurso didático em salas de aula de Química.
údos da ciência e além disso compilam os vários
Narrativas são geralmente discutidas nos
propósitos da narrativa, tomando-se como contra-
estudos literários abarcando dentre outros o romance,
ponto a alegação tradicional de que se trata apenas
o conto, a crônica, a novela, que são gêneros que
de entretenimento.
carregam consigo os elementos estruturais caracte-
O estatuto científico da narrativa é debatido
rísticos desse modo, como o enredo, o personagem, o
e são apontadas quais passagens narrativas são
narrador, o tempo e o espaço (Garcia, 1980, p. 363).
lidas ou assistidas com maior rapidez, compre-
Narrativas em psicologia cognitiva se des-
endidas melhor e tendem a ser mais bem absor-
dobram em formas de pensamentos pelos quais o
vidas, aumentando a plausibilidade e a persuasão
homem se expressa, se estrutura e se organiza as
das informações apresentadas afetando a memória
quais se explicitam pela linguagem narrativa e pela
positivamente, além do fato de que os leitores
linguagem paradigmática, lógico-científica, ou ainda
aplicam-se mais ao ler a narrativa em comparação
explanativa (Bruner, 1990; Norris et al., 2005).
à prosa expositiva (Norris et al., 2005, p. 552).
Entretanto, isto não significa assumir que
Explicam os autores que as ações e os even-
estas formas de pensamento sejam mutuamente
tos em narrativas são interpretados pelos leitores
exclusivas, mas sim que são interdependentes consti-
de forma mais concreta e mais facilmente orga-
tuindo-se em um continuum que organiza diferentes
nizada pelas relações causais do que as estruturas
formas de inteligência, podendo haver o privilégio
encontradas na prosa explanativa ou argumenta-
cultural de uma sobre a outra em função da esfera
tiva, além de a narrativa é o gênero utilizado para
do conhecimento em que se atua (Sikes; Gale, 2006).
os processos de alfabetização.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
101
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública
Concluindo os autores ressaltam que há uma apelação à visão de que as narrativas são mais
dos a partir de produtos realizados por terceiros e não por alunos do Ensino Básico.
fáceis de compreender porque os elementos mais
A produção do audiovisual permite que
básicos das narrativas são aspectos pertinentes a
o aluno se expresse por meio da oralidade, asso-
toda experiência humana. Nós todos somos agen-
ciando os fenômenos multimodais, ou seja, cons-
tes com propósitos de algum tipo, cujas vidas ine-
trua sua narrativa oral tratando dos conteúdos
vitavelmente consistem em uma série de eventos
temáticos objeto de ensino e aprendizagem e,
situados no tempo (Norris et al., 2005, p. 554).
nesse sentido, entende-se que na realização do
Avraamidou e Osborne (2009, p. 1693)
audiovisual os alunos mobilizam um conjunto de
após extensa pesquisa, incluindo-se a meta-análise
habilidades sociais e competências cognitivas que
sobre narrativa efetuada por Norris et al. (2005),
permitem o cumprimento da tarefa com expressivo
propõem o conjunto de elementos necessários em
sucesso atendendo a proposta do professor. Desta forma, se oportuniza contatos explí-
uma narrativa, apresentados no Quadro 1.
citos do aluno com o conceito e o conteúdo temáQuadro 1. Elementos constituintes de uma narrativa. Elementos da Narrativa Propósito
Eventos
102
Descrição dos elementos Auxiliam-nos a compreender o mundo natural e humano. No caso do mundo natural, as narrativas auxiliam o leitor a inventar novas entidades, conceitos e algumas imagens da visão do cientista do mundo material. Uma cadeia ou sequência de eventos interconectados.
Estrutura
Uma estrutura identificável (começo, meio e fim) onde os eventos são relatados temporalmente.
Tempo
Narrativas dizem respeito ao passado
Agentes
Atores ou entidades que causam os eventos ou experiências.
Narrador
O contador que seja um personagem real ou, alternativamente, a sensação de um narrador.
Audiência
A audiência deve interpretar ou reconhecer a obra como uma narrativa
tico multimodalmente, pois essa é uma questão de ensino e, como tal, se rompe com o caráter memorizador do mesmo, fortalecendo o desenvolvimento das funções representadas pela atenção arbitrária, memória lógica, abstração, comparação e discriminação, fatores que contribuem para o afastamento de simples memorizações. Essa atividade como fruto de um processo social contemporâneo, refletirá na construção do discurso do sujeito e como tal cooperará para o engajamento do mesmo na aprendizagem sobre química. Concomitantemente, os alunos mobilizam competências e habilidades que envolvem rotinas técnicas de operação e manipulação de aparatos culturais tais como câmeras de vídeos e softwares de edição de vídeo e as habilidades retóricas também são contempladas na perspectiva de que os
De maneira análoga, o audiovisual tem sido
alunos deverão saber como visualizar um tema ou
um importante aliado do professor de Química,
como trabalhar certas emoções, assim como serão
(Marcelino-Jr et al., 2004; Arroio; Giordan, 2006;
desafiados a encontrar soluções que atendam às
Arroio, 2011; Dias de Souza; Arroio, 2011; Santos;
necessidades básicas de certas técnicas de filma-
Aquino, 2011; Arroio, 2010; Arroio; Farias, 2011),
gem com o propósito de persuadir a audiência.
pois os conteúdos nesta disciplina muitas vezes
Por último, e de importância fulcral, estará
transitam entre o mundo macroscópico, o mundo
presente a necessidade de enfrentar a negociação de
microscópico e o mundo dos modelos, contudo, na
diferentes ideias no grupo e como colaborar e coor-
maior parte dos casos os audiovisuais são utiliza-
denar o complexo processo da produção audiovisual.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública
A produção audiovisual pode ser usada
para o professor construir sua reflexão e planejar
como uma metodologia pela qual os alunos são
ações de intervenção enriquecendo o processo de
engajados em uma produção ativa, com forte cará-
aprendizagem, corroborando os resultados de pes-
ter motivador em uma autêntica tarefa colaborativa,
quisas efetuadas nesta área (Zahn et al., 2005, p. 2;
onde intencionalmente há o envolvimento dos alu-
Almenara; Cejudo, 2005, p. 15).
nos em atividades criativas (Zahn et al., 2005), permitindo que se estruture os conhecimentos objeto de estudo de forma não-linear, integrando recursos audiovisuais, formas de expressão e textos, o que potencialmente encaminha os atores desse processo ao longo do trabalho grupal, ativo e colaborativo para a incorporação da multimodalidade em suas ações na área de Ciências da Natureza (Arroio; Dias de Souza, 2012; Dias de Souza, 2013). A produção audiovisual, de forma geral, não apenas pode ser considerada valiosa por si mesma, mas também é capaz de mobilizar processos mentais e sociais importantes, que auxiliam a desenvolver tanto as habilidades sociais, cognitivas, interdisciplinares, como também gera uma
Face ao exposto, argumentamos a favor da seguinte questão de pesquisa: como alunos de Ensino Médio abordam o tema agrotóxico e o articulam a conceitos introdutórios da química do carbono tomando-se como ponto de partida a realização de uma produção narrativa audiovisual? Consideramos a relevância desta investigação, pois ela se baseia em uma proposta de caráter sistêmico que desafia os alunos do Ensino Médio a relacionar conceitos científicos, articulados a um tema social (agrotóxico), explicitando-os pela linguagem narrativa do audiovisual, alçando, portanto, estes alunos à categoria de produtores de conteúdo audiovisual de natureza sociocientífica.
profunda elaboração do conteúdo temático em questão (Zahn et al., 2005, p. 2). Paralelamente em um estudo de caso (Dias de Souza; Arroio, 2011), observou-se também que os audiovisuais produzidos por alunos de Ensino Médio na disciplina de Química fornecem valiosas pistas para a compreensão das dificuldades dos alunos na apropriação e domínio de certos conceitos químicos e das relações que permeiam o desenvolvimento de um projeto temático. Nos exemplos abordados no estudo de caso (Dias de Souza; Arroio, 2011) foi possível observar de maneira inequívoca a natureza da interpretação adotada pelos alunos para se referirem ao
2. Metodologia
Com a recente popularização, no Brasil, do acesso aos artefatos culturais que permitem a captura, manipulação e exibição de imagens e áudio encontramos as condições mínimas necessárias para introduzirmos o uso destes artefatos e suas tecnologias nas salas de aula de Química, como estratégia para a produção e realização de narrativas audiovisuais em uma abordagem CBL na perspectiva de reconhecer e permitir nos alunos da Escola Básica elevada capacidade para o exercício
mundo simbólico da química e como foram feitas
da autoria e a prática da produção de conteúdos
essas construções a partir da abordagem sociocul-
sociocientíficos.
tural, considerando o papel do trabalho em grupo
Os sujeitos de nossa investigação são alu-
e colaborativo como uma forte marca impressa na
nos de 3º ano do Ensino Médio de uma escola
produção.
pública estadual localizada na cidade de São
Entende-se que a partir da identificação das
Paulo, que foram convidados a preparar em aulas
dificuldades contidas nas narrativas seja possível
de química orgânica uma narrativa audiovisual
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
103
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública
vinculando conceitos da química do carbono com
físicos, organizaram-se debates com os grupos
o tema social agrotóxico.
sobre o desenvolvimento das propostas para a
A turma de alunos foi subdividida em 4
produção e realização da narrativa audiovisual e
grupos com aproximadamente 9 integrantes de
indicaram-se referências bibliográficas, além da
livre escolha e a execução da tarefa proposta foi
construção de estruturas tridimensionais das várias
orientada por uma ficha de dados na qual se apre-
substâncias alvo dos estudos teórico conceituais.
sentou os agrotóxicos conhecidos pelos nomes
Do total de 30 aulas de 50 minutos cada, 12
Metamidofós e Endosulfan, suas estruturas planas
aulas foram destinadas aos alunos trabalharem com
bidimensionais e algumas de suas características.
seus respectivos grupos na discussão do projeto e
Além disso, cada ficha continha algumas pergun-
suas formas de realização, com acesso livre a todas
tas básicas com a finalidade de orientar os possí-
as dependências da escola, incluindo o laboratório
veis encaminhamentos, as quais são mostradas no
de Ciências, o qual ficou à disposição para qual-
Quadro 2.
quer atividade que se fizesse necessária. Foi oferecido também um guia para a construção do roteiro
Quadro 2. Questões orientadoras para as produções narrativas audiovisuais. Sugestões para orientação das produções narrativas audiovisuais • Quais os principais conceitos que podemos discutir a partir da análise das estruturas dos agrotóxicos acima? • Qual a razão do Brasil ser o maior consumidor de agrotóxicos do mundo e não ser o maior produtor agrícola? • Há alguma relação entre o cidadão e o conhecimento envolvendo agrotóxicos? • Qual a razão de lavarmos frutas, verduras e legumes? • Lavar frutas, verduras e legumes são o suficiente para eliminarmos os agrotóxicos dos alimentos? • Como são obtidos os agrotóxicos Metamidofós e Endosulfan? • Como a sociedade pode interferir nos processos de uso de agrotóxicos? • Orgânicos x Agrotóxicos: O que é melhor? Se há algum melhor, qual a razão de utilizarmos o outro?
Nas aulas que se seguiram os alunos participaram de uma sequência de encontros com o professor em sala de aula com exposições teóricas e interativas, nas quais se discutiram noções básicas sobre a química do carbono utilizando-se módulos de um tutorial de Química Orgânica na versão impressa, produzidos pelo Laboratório de Pesquisa em Ensino de Química e Tecnologias Educativas4. Além disso, ofereceram-se materiais complementares consistindo de peças plásticas (bola e vareta) para a construção dos modelos 4
104
http://quimica.fe.usp.br/
da narrativa audiovisual, além de orientações sobre o enredo, posicionamento de câmera, luz e som. Do ponto de vista da aprendizagem, o que se esperava desta proposta é que os alunos explicitassem conhecimentos básicos sobre a natureza do elemento químico carbono e sua capacidade de formar cadeias constituindo substâncias, aprofundassem e consolidassem os conhecimentos sobre gêneros do discurso, avançassem em relação a cuidados técnicos na produção do audiovisual, no uso de imagens, cores, sons, além de demonstrarem aspectos do trabalho grupal e colaborativo. O resultado será analisado de modo a obter aspectos descritivos de como os alunos explicitam suas concepções sobre o conteúdo temático em uma produção narrativa audiovisual escolar, portanto iremos nos ocupar única e exclusivamente com discussões envolvendo aspectos gerais relacionados à produção e realização da narrativa audiovisual e apresentar e comentar a roteirização, de um único grupo de alunos. Como comentado anteriormente, o projeto em sua forma mais ampla prevê outros resultados, tais como o planejamento e seu desenvolvimento escrito materializado como um diário de bordo, um artigo científico, pôster e arquivos digitais com registros de áudio e audiovisuais sem edição.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública
3. Resultados
O enredo se desenrola em dois ambientes,
e discussão
Os resultados e a discussão que se segue objetivam descrever e comentar a forma de abordagem idealizada, produzida e realizada pelos alunos sujeitos da pesquisa na articulação entre o conceitual e o temático social pela linguagem narrativa audiovisual. O Quadro 3 mostra o roteiro construído pelos alunos cuja sequência de cenas orientou a produção audiovisual.
um caracterizado pelo espaço físico da sala de aula e o segundo por um ambiente externo a sala de aula, e foi organizado em três partes: a Química Orgânica, os agrotóxicos e a conclusão. Os personagens definidos são o professor e seus alunos e um aspecto que chama a atenção é como os “roteiristas” caracterizam as relações sociais da “típica” sala de aula, ou seja, a presença do professor “estressado” que “ensina”, isto é transmite expositivamente conhecimentos con-
Quadro 3. Roteiro escrito pelos alunos para orientar a produção narrativa audiovisual. Roteiro organizado pelos alunos para produção da narrativa audiovisual
ceituais para alunos. Este aspecto merece especial atenção, pois, os alunos no papel de “roteiristas”, deixam clara sua visão sobre o sistema educacional a que estão submetidos, e o reproduzem, com certo grau de criatividade, como bem explicitado
• Nosso curta-metragem é baseado no estudo da Química orgânica, entrelaçando o uso de uma estrutura carbônica que resulta em um Agrotóxico. E o nosso curta-metragem é divido em três partes. • Na primeira parte, a atuação se desenvolve em uma sala de aula típica dos dias atuais, da qual um professor, muitas vezes sem paciência, tenta ensinar Química Orgânica aos seus alunos. Após ensinar o básico de Química Orgânica a seus alunos, o professor leva os alunos ao ar livre introduzindo um pouco sobre agrotóxicos, especificamente a montagem da estrutura carbônica do Metamidofós e esta é a segunda cena do nosso curta-metragem. • Após essas aulas sobre agrotóxicos o professor pede um trabalho sobre o mesmo, como é usado, para que, prevenções e etc., e os alunos começam a montar um vídeo sobre o uso do agrotóxico. • Para finalizar há uma conclusão de todo o nosso trabalho feito ao longo do curta-metragem.
no roteiro. O espaço físico da “típica” sala de aula tem um contraponto pelo “ar livre”. A narrativa audiovisual final apresentada em seu total tem duração aproximada de 40 minutos e foi subdivida em temas, abrindo com o título Aprendendo Química Orgânica com o 3A, seguido pelos subtemas (1) Aprendendo sobre agrotóxicos e compostos e (2) O vídeo. A produção realizada pelos alunos expressou claramente o continuum entre as formas de pensamento explanativa e narrativa, pois o enredo construído para abordar o tema agrotóxico, se inicia com a simulação da aula expositiva sobre
O roteiro como forma escrita de um pro-
conceitos de química orgânica e evolui para o tema
duto visual em sua essência possui uma duração
social ambientado externamente no jardim de uma
efêmera e só se justifica sua existência até sua
residência, nas dependências de uma cozinha e na
plena conversão no referido produto audiovisual.
feira livre.
Seu primeiro desafio é o encontro da ideia
Sequencialmente, o enredo construído uti-
inicial do projeto, que em nosso caso está centrada
liza o recurso da teatralização encenando os cui-
na proposta de sala de aula de debater o assunto
dados necessários para o manuseio da aplicação de
agrotóxico em uma perspectiva sócio-conceitual.
agrotóxico, o ciclo de desenvolvimento de plantas
Os alunos revelam esta proposta e estabelecem o
com e sem agrotóxico, depois se desloca para uma
conflito entre o professor com elevado estresse
cozinha onde são debatidas as formas de manuseio
reconhecido, que objetiva ensinar Química Orgâ-
e higiene de alimentos, finalizando com uma visita
nica a seus alunos caracterizados como chatos.
a uma feira livre onde são apresentadas e discu-
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
105
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública
No primeiro subtema Aprendendo sobre
tidas orientações sobre a compra de alimentos orgânicos. A Figura 1 mostra o frame que constituiu a abertura da produção.
agrotóxicos e compostos a ambientação para os debates se desloca da sala de aula para o jardim de um prédio residencial, local em que o “professor” retoma a aula do dia anterior iniciando com a fala “hoje nós vamos continuar a nossa aula de ontem e como eu disse nós vamos falar um pouco sobre o Petróleo e sobre os Agrotóxicos, não vamos mais falar sobre Química Orgânica, tanto que a gente não está mais em sala de aula”. Esta fala é bastante significativa, pois de certa forma marca com substancial ênfase a concepção dos alunos sobre o ensino e a aprendizagem de conceitos teóricos e sua vinculação com o modelo pedagógico expositivo no espaço social sala de aula na instituição
Figura 1. Frame de abertura da narrativa audiovisual.
A integração entre elementos característicos da atividade social científica explorada na imagem mostrada na Figura 1 imputa uma clara marca sobre as intenções dos alunos, ao decidirem utilizar a composição título, simbologia, objeto de laboratório e modelo de representação estrutural plana para a abertura da narrativa audiovisual, sinalizando que para os próximos frames aspectos conceituais sobre Química Orgânica serão abordados. Esta intenção se materializa, pois na sequ-
106
física escola. O “professor” encena a continuidade da aula conceitual, distribui a ficha de orientação com uma figura que representa a estrutura química dos agrotóxicos e oferece a uma aluna, um invólucro contendo um conjunto com peças plásticas do tipo bola e vareta e solicita a ela que monte o modelo da estrutura tridimensional. No segundo subtema, denominado de O vídeo, em sua introdução outro aluno assume o papel de narrador e inicia a narração com orientações sobre a correta forma de manuseio de agrotóxicos, como explicitado no segmento de fala
ência um aluno integrante do grupo assume o papel
“...como vocês podem perceber, a pessoa que vai
do professor e apresenta o assunto com a seguinte
fazer tem que estar muito bem protegida, porque
fala “...hoje nós vamos falar um pouquinho sobe
ele causa muitos danos à saúde...”, e finaliza este
Química Orgânica, o que é Química Orgânica?”
subtema apresentando A lavagem em uma alusão
O uso de uma tabela periódica mostra a
à necessidade de antes do consumo do alimento o
apropriação do aluno “professor” da ferramenta
mesmo ser submetido ao processo de higiene com
mais amplamente conhecida no mundo da Quí-
água, o que é expresso no segmento de fala “...a
mica, e para além de uma simples simulação, o
lavagem das frutas, pois esta é a parte mais impor-
aluno localiza em sua narrativa verbal a posição
tante, pois através dela nós podemos nos prevenir
e o respectivo nome do grupo no qual o átomo de
de muitas doenças...”.
carbono está posicionado, como se observa na fala
A sequência de frames nos auxilia a esta-
“...o Carbono fica aqui nesta linha 4A, nesta quarta
belecer uma linha de deslocamento temporal, bem
periodização, depois vem o Boro, Nitrogênio...”.
como evidencia a lógica da abordagem narrativa,
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública
revelando aqueles elementos estruturais caracterís-
Em relação ao vocabulário os alunos, ao construírem o texto para o primeiro subtema,
ticos apontados por Garcia (1980, p. 363). Um aspecto notável das narrativas, des
se manifestam em diálogos com termos e ideias
tacado por alguns autores (Bruner, 1990; Norris
específicas do meio científico, exemplificados no
et al., 2005), trata sobre o pouco conhecimento
diálogo entre o “professor” e o “aluno” ambienta-
sobre a produção de textos híbridos no processo
dos em uma sala de aula: “...o carbono é um pouco
de aprendizagem, ou seja, quais os caminhos que os estudantes percorrem na produção daquele texto que admite um continuum entre a forma de pensamento narrativa e a forma de pensamento explanativa (Bruner, 1990; Norris et al., 2005). Isto se deve ao fato de que os textos utilizados em ciências geralmente não apresentam características de narrativas puras, pois também apresentam características explanativas, visto que há neces sidade de promover o raciocínio e conectar os métodos científicos aos dados e às conclusões. Por outro lado, é apontada a dificuldade de definir o que são explanações (Norris et al., 2005, p. 545), entretanto os autores admitem que explanações possam ser atos que tenham a intenção de tornar algo claro, compreensível ou inteligível, ou que para cada caso uma explanação se propõe a resolver um enigma. Dessa forma, as explanações possuem diferentes funções, tais como atribuir, desenvolver ou expandir significados, as quais permitem que se ofereça uma justificativa, que se forneça uma descrição ou um significado causal. Observou-se que a forma de utilização assumida pelos alunos para os vários elementos que caracterizam as narrativas revelam significativo grau de coesão e coerência no discurso proposto para contar a história e, simultaneamente,
diferente, pois ele faz 4 ligações, sendo ligações simples ou saturadas”, o que enseja uma imediata pergunta de um dos alunos que participam da aula com a seguinte fala “...professor, o que são ligações saturadas?”. “Como comprar orgânicos na feira” encerra o subtema O vídeo com os alunos percorrendo uma feira livre, momento no qual exploram a materialidade dos produtos à venda e estabelecem critérios diferenciais entre produtos orgânicos e não orgânicos, com base em características específicas, como no caso dos tomates que se diferenciam por tamanho. Para encerrar a narrativa audiovisual os alunos se reúnem em grupo e tecem seus comentários finais. Nestas considerações finais os alunos apresentam a resposta para o problema inicialmente proposto, construindo a síntese de todos os segmentos anteriores, cuja marca é a essencialidade e a brevidade adotadas no discurso narrativo e exemplificados pelas falas que se seguem, “Apesar de nosso vídeo ter sido uma coisa bem descontraída, por trás dele tem um estudo de verdade, um estudo real, que é o estudo da Química Orgânica junto com o agrotóxico. Bom, como a gente já havia dito no vídeo, a Química Orgânica é o estudo das substâncias que contêm carbono, que contêm as ligações simples que são chamadas
corrobora as afirmações de Norris (2005), sobre a
saturadas, ligações duplas ou triplas que são cha-
hibridização característica aos textos com conteú-
madas insaturadas, têm as formulinhas, tem como
dos científicos.
se faz a estrutura do carbono...”.
Um singular atributo nos textos explanati-
Concluindo, é estabelecida a relação com
vos diz respeito à tendência a uma maior carga no
o tema social pela fala final, “... então por isso
vocabulário, bem como densidade proposicional
quando nós formos ingerir, nós devemos lavá-la
elevada (Norris et al., 2005, p. 553).
direitinho porque ela contém o agrotóxico, por-
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
107
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública
que ele não sai totalmente, mas dá para amenizar
demonstram claramente elevado grau de articula-
a situação”. “É mais ou menos isso, espero que
ção no trabalho grupal colaborativo.
vocês tenham entendido nosso trabalho”.
A abordagem do conteúdo sociocientífico foi produzida e realizada pelos alunos da Escola Básica de maneira que aspectos essenciais
4. Considerações
finais
da Ciência, tais como a definição de Química Orgânica, caracterização do átomo de carbono com
Os avanços científicos e tecnológicos
a utilização da tabela periódica, noção de cadeias
imprimem novas formas de relações sociais e
carbônicas, saturação e insaturação, discussão
desafios contextuais em todas as esferas de con-
sobre a representação estrutural plana e a constru-
vivência e desenvolvimento humanos e a escola
ção de modelos físicos dentre outros ganhassem
não é uma exceção. Por outro lado certas práticas
significado e se articulassem com as questões
consolidadas se mostram potencialmente favorá-
sociais decorrentes do uso de agrotóxico e que se
veis para serem aproveitadas nas demandas que se
iniciaram pelo debate científico conceitual.
avolumam a cada dia. Este é o caso apresentado neste artigo, que buscou de forma sistêmica estabelecer uma possível interrelação entre as narrativas, a produção audiovisual e o debate socioconceitual a partir do tema agrotóxico. Trouxe também a proposta de reconhecer nos alunos de Ensino Básico a capacidade de produtores de conteúdos em duas vias, nas quais a aprendizagem é estimulada e a informação veiculada socialmente. Os alunos, assim como esperado, revelaram suas concepções sobre a escola e ao mesmo tempo exibiram intensa inspiração criativa, integrando os recursos audiovisuais aos elementos característicos das narrativas para contar uma história que se inicia pela argumentação conceitual científica em sala de aula e deságua em uma discussão do cotidiano em uma feira livre. A abordagem para a produção e realização do audiovisual encontrou no uso das legendas,
A implicação mais direta dos resultados obtidos com este trabalho aponta na direção de estimular nos professores de química a possibilidade de expor-se ao risco nas relações vigentes em sala de aula, aliando-se aos recursos que a tecnologia atual nos permite na busca do cumprimento de seu conteúdo programático. Enfim, os resultados deste trabalham indicam que há espaço para ousadia no processo de ensino e aprendizagem em Ciências da Natureza, além de contribuir para reconhecer a capacidade de alunos do ensino básico como produtores de conteúdo sócio-científico de natureza escolar e, naturalmente, o potencial uso das narrativas audiovisuais em sala de aula de Química. À medida que a sociedade avança, novas formas e possibilidades se revelam como cúmplices no desafio de se construir modelos que possam nos encaminhar para um processo eficiente e eficaz de alfabetização científica cidadã.
cores, som, fotos, encenações e ambientes, os elementos necessários para a composição do produto final, imprimindo uma estética particular, a qual revela a visão de certo grupo de alunos da Escola Básica sobre como temas relevantes poderiam ser tratados pela instituição escola, e acima de tudo
108
REFERÊNCIAS ARROIO, A.; GIORDAN, M. O vídeo educativo: aspectos da organização do ensino. Química Nova na Escola, v. 24, n. 1, p. 8-11, 2006.
REVISTA bRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública
_____.; DIAS DE SOUZA, D. D. Multimodality in Science Education. Problems of Education in the Twenty First Century. v.44, p.5-9, 2012.
GARCIA, O.M. Comunicação em prosa moderna. 8 ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1980.
_____. Cinema as Narrative to teach Nature of Science in Science Education. Western Anatolia Journal of Educational Sciences, v. special, p. 87-92, 2011.
KATRIN, V.; HOLBROOK, J.; RANNIKÄE, MIIA. Stimulating students’ intrinsic motivation for learning chemistry through the use of context-based learning modules. Chemistry Education Research and Practice 13.4 (2012): 410-419, 2012.
_____. Context based learning: a role for cinema in science education. Science Education International, 21(3), p. 131-143, 2010. _____.; FARIAS, D. Possible contributions of Cinema in Natural Science Education to understand how scientists and Science works. Problems of Education in the 21st Century, 37, p. 18-28, 2011. BRAIBANTE, M. E. F.; ZAPPE, J.A. A Química dos Agrotóxicos. Química Nova na Escola, v. 34, p. 10-15, 2012. BRUNER, J. Acts of meaning. Cambridge: Harvard University Press, 1990. CAMPBELL, B.; LAZONBY, J.; NICHOLSON, P.; RAMSDEN, J. E WADDINGTON, D. Science: the Salters’ Approach: a case study of the process of large-scale curriculum development. Science Education, 78 (5), 415-447, 1994. CAVALCANTI, J.A.; FREITAS, J.C.R.; MELO, A.C.N. e FREITAS FILHO, J.R. Agrotóxicos: uma temática para o ensino de Química. Química Nova na Escola, v. 32, n. 1, p. 31-36, fev. 2010. DIAS DE SOUZA, D. D.; ARROIO, A. A análise de narrativas orais presentes em vídeos como ferramenta no acompanhamento da aprendizagem de conceitos escolar-científicos. In: VII Encontro Paulista de Pesquisa em Ensino de Química, 2011, São Carlos-SP. Atas do VII Encontro Paulista de Pesquisa em Ensino de Química. São Carlos-SP: CDCC- USP, 2011. _____. Multimodalidade na construção do conhecimento em sala de aula de química: caracterizando a evolução na aprendizagem. 2013. 256 f. Tese (Doutorado em Educação em Ciências e Matemática) Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013.
MARCELINO-Jr., C.A.C.; BARBOSA, R.M.N.; CAMPOS, A.F.; LEÃO, M.B.C.; CUNHA, H.S. e PAVÃO, A.C. Perfumes e essências: a utilização de um vídeo na abordagem das funções orgânicas. Química Nova na Escola, v. 19, n. 1, p. 15-18, 2004. MORAES, P.C.; TRAJANO, S.C.S.; MAFFRA, S.M. e MESSEDER, J.C. Abordando agrotóxico no ensino de química: uma revisão. Revista Ciências&Ideias, v. 3, n. 1, p. 1-15, set. 2010 / abr. 2011. NORRIS, S.P., GUILBERT, S.M., SMITH, M.L., HAKIMELAHI, S.; PHILIPS, L.M.: A Theoretical Framework for Narrative Explanation in Science. Science & Education, v. 4, n. 89, p. 535-563, 2005. PARCHMANN, I.; LUECKEN; M. Context-based Learning for Students and Teachers: Professional development by participating in school innovation projects. Paper presented at the International Seminar, Professional Reflections, National Science Learning Centre, York, February, 2010. Disponível em: https://www.sciencelearningcentres.org.uk/ impact-and-research/research/research-seminars/ NSLC%20UYSEG%20seminar%20parchmann.pdf Acesso em: 01 Jun 2013. RANNIKMAE, M., TEPPO, M., HOLBROOK, J. Popularity and Relevance of Science Education Literacy: Using a based Approach. Science Education International, 21 (2), 116-125, 2010. RIBEIRO, R. M. L.; MARTINS, I. O potencial das narrativas como recurso para o ensino de ciências: uma análise em livros didáticos de Física. Ciências & Educação, Bauru, v. 13, n. 3, p. 293-309 Dec. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ciedu/ v13n3/a02v13n3.pdf>. Acesso em: Outubro, 2011.
HYVÄRINEN, M. Towards a conceptual history of narrative. In: HYVÄRINEN, MATTI, KORHONEN, ANU & MYKKÄNEN, JURI (Ed.). The travelling concept of narrative. p. 20-41, 2006.
RIMMON–KENNAN, S. Concepts of Narrative. In: HYVÄRINEN, M., KORHONEN A., MYKKÄNEN J. (eds.) The Travelling Concept of Narrative. COLLeGIUM, v. 1 Helsinki: Helsinki Collegium for Advanced Studies, Helsinki, p.10-19, 2006.
GALVAO, Cecília. Narrativas em Educação. Ciênc. educ. (Bauru), Bauru, v. 11, n. 2, Agosto, 2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S1516-73132005000200013&lng=en &nrm=iso>. Acesso em: 03 jun. 2013.
SANTOS, P. N.; AQUINO, K. A. S. Utilização do Cinema na Sala de Aula: Aplicação da Química dos Perfumes no Ensino de Funções Orgânicas Oxigenadas e Bioquímica. Química Nova na Escola, v. 33, p. 160-167, 2011.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
109
O Debate sobre Agrotóxicos na Perspectiva de uma Produção Narrativa Audiovisual Realizada por Alunos de uma Escola Pública
SIKES, G.; GALE, K. Narrative approaches to education research. University of Plymouth, 2006. Disponível em: <http://www.edu.plymouth.ac.uk/ resined/narrative/narrativehome.htm> Acesso em: Dezembro, 2012. SMITH, B. H. Narrative versions, narrative theories. In: MITCHELL W. (org.), On narrative. Chicago: Chicago University Press. p. 209-232, 1981. UNESCO Organisation for Economic Co-operation and Development – Alfabetização midiática e informacional – Currículo para formação de professores, 2011. Disponível em: http://unesdoc.unesco.org/
110
images/0022/002204/220418por.pdf Acesso em: mar. 2013. WHITELEGG, E.; PARRY, M. Real-life contexts for learning physics: meanings, issues and practice, Physics Education, vol. 34 (2), 68-72, March 1999. ZAHN, C.; PEA, R.; HESSE, F.W.; MILLS, M.; FINKE, M.; ROSEN, J.J. Advanced Digital Video Technologies to Support Collaborative Learning in School Education and Beyond. In: T. KOSCHMANN; D. SUTHERS; T-W. CHAN (Ed.). Computer Supported Collaborative Learning. p. 737-742. 2005.
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
História da Química 01 | Volume 08 | Número 01 | Jan./Jun. 2013 | p. 111-114
A “Alquimia” de Rutherford e as Descobertas do Próton, do Nêutron, da Radioatividade Artificial e da Fissão Nuclear José Maria F. Bassalo e Robson F. de Farias
Em entrevista à revista Ciência Hoje (vol. 4, jan/fev. 1983), o físico austríaco Guido Beck (1903-1988) conta um fato curioso que aconteceu com Lord Ernest Rutherford (1871-1937; prêmio Nobel de física de 1908): estava o descobridor do núcleo atômico trabalhando, em Manchester, na Inglaterra, por volta de 1918, no grande sonho dos alquimistas, que era a transmutação dos elementos químicos, quando recebeu do Governo Inglês a missão de ir a Paris e discutir com Paul Langevin (1876-1946) sobre seu novo dispositivo de ultrassom para detectar submarinos, já que a Inglaterra e a França haviam se aliado contra a Alemanha por ocasião da Primeira Guerra Mundial (1914-1918).
Ernest Rutherford
Paul Langevin
Rutherford declinou do convite alegando que não tinha tempo para isso. Então, o governo inglês mandou uma ordem de serviço para Rutherford e este respondeu da seguinte maneira: “Agora não posso, vou mais tarde, pois se rompo o átomo isso será mais importante do que a vossa guerra”. Hoje, sabemos que o rompimento (fissão) do átomo só foi possível graças às experiências que Rutherford estava realizando naquela época. Uma transmutação efetiva foi apresentada por ele na Philosophical Magazine (vol. 37, 1919, p. 537; 571; 581), ao descrever uma reação nuclear
História da Química
que realizara, na qual uma partícula α (2He4), ao atravessar um cilindro contendo
gases, principalmente nitrogênio (7N14), havia transmutado esse elemento químico
em oxigênio (8O17) com a emissão de um próton (1H1), segundo a seguinte reação
nuclear (considerada como a descoberta do próton): He4 + 7N14 →
O17 + 1H1
2
8
Como essa reação transmutou o nitrogênio no oxigênio, Rutherford é considerado o primeiro alquimista bem-sucedido. Experiências desse tipo realizadas por Rutherford, isto é, colisão de partículas α com elementos químicos, foram realizadas na década de 1930, na Inglaterra, pelo físico inglês James Chadwick (1891-1974), e na França, pelo casal Joliot-Curie [Iréne (1897-1956) e Frédéric (1900-1958)]. A experiência realizada por Chadwick, em 1932 (Proceedings of the Royal Society of London, vol. A136, p. 696; 735 e Nature, vol. 129, p. 312), em que bombardeou o boro (5B11) com a partícula α e obteve o nitrogênio (7N14), é considerada a descoberta do nêutron (0n1): He4 + 5B11 →
2
James Chadwick
7
N14 + 0n1
Irène Curie e Frédéric Joliot
Por sua vez, a experiência realizada, em 1934 (Comptes Rendus de l´Academie des Sciences de Paris, vol. 198, p. 254; 559 e na Nature, vol. 133, p. 201), pelo casal Joliot-Curie, em que bombardearam o alumínio (13Al27) com a partícula α e obtiveram o primeiro isótopo radioativo, o fósforo (15P30), é
considerada como a da descoberta da radioatividade artificial: He4 + 13Al27 →
2
P30 + 0n1
15
É oportuno registrar que, com os nêutrons obtidos com reações desse tipo, Enrico Fermi (1901-1954) e sua equipe da Universidade Roma, os físicos italianos Franco Rama Dino Rasetti (1901-2001), Edoardo Amaldi (1908-1989), Emílio Gino Segrè (1905-1989) e o químico, também italiano, Oscar D´Agostino (19011975), ainda em 1934 (Nature, vol. 133, p. 898), produziram a primeira fissão nuclear, sem, contudo, entendê-la como tal, ao bombardear o elemento químico
112
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
História da Química
urânio (92U238) com nêutron. Eles, pensavam que haviam obtido um novo elemento
transurânico, o qual Fermi chegou a denominar de urânio-X. Registre-se que Fermi recebeu pressão do governo fascista italiano para denominar esse novo elemento químico de littorio, uma vez que os “littorios” eram oficiais romanos que portavam os fascios (feixes) como insígnia.
Enrico Fermi
Em 1938 (Naturwissenschaften, vol. 26, p. 475), uma nova reação de fissão nuclear, também não entendida dessa maneira, foi realizada pelos químicos alemães Otto Hahn (1879-1968) e Fritz Strassmann (1902-1980), e a física sueco-austríaca Lise Meitner (1878-1968), ao bombardearem o urânio com nêutrons lentos.
Otto Hahn
Fritz Strassmann
Lise Meitner
Além dos resultados já conhecidos, um deles, no entanto, era aparentemente um absurdo, qual seja, o da presença do bário (Ba), em vez do rádio (Ra), como um dos produtos finais da reação. Isso indicava que o nêutron poderia induzir uma partição do átomo de urânio em dois átomos de massas comparáveis. Essa partição foi interpretada por Lise e seu sobrinho, o físico austro-alemão Otto Robert Frisch (1904-1979), em 1939 (Nature, vol. 143, p. 239; 471), como sendo uma fissão nuclear, como, por exemplo, ocorre na seguinte reação (em notação atual): n1 + 92U235 →
0
54
Xe140 + 38Sr94 + 20n1 + γ + 200MeV
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
113
História da Química
onde os elementos de desintegração são o xenônio (54Xe140) e o estrôncio (38Sr94),
além da radiação γ e mais energia liberada de 200MeV. Registre-se que o nome
fissão nuclear foi sugerido, a Frisch, pelo bioquímico norte-americano William A. Arnold, em analogia com o termo utilizado na divisão celular de uma bactéria. Registre-se, também, que a fonte de energia liberada pela fissão nuclear, foi rejeitada por Rutherford, por volta de 1933, quando afirmou: Quem quer que espere obter uma fonte de energia a partir da transmutação de átomos está sonhando. Rutherford, que morreu em 1937, não teve tempo de perceber o erro de sua afirmação, pois, em 02 de dezembro de 1942, Fermi e uma equipe de 42 cientistas da Universidade de Chicago construíram a primeira pilha atômica, por intermédio da fissão nuclear controlada de um isótopo do urânio, o U-235.
Otto Robert Frisch
114
REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 08 | Número 01
Resenha
MATOS, R. M. Noções Básicas de Cálculo Estequiométrico. Campinas: Átomo, 2013.
O livro aborda os principais conteúdos relativos aos cálculos estequiométricos de maneira objetiva, procurando estimular o leitor a construir a rede de conceitos e de orientações necessárias à interpretação de equações químicas e ao entendimento da inter-relação entre as quantidades das substâncias envolvidas nos processos químicos, sejam elas medidas em massa, volume e outras. Como resultado da experiência acumulada na docência do ensino superior, a obra é escrita em uma linguagem técnica, centrada em conceitos e conhecimentos científicos. Entretanto, a estrutura do texto – marcada pela apresentação de diversos exemplos que facilitam o entendimento do assunto em discussão, bem como a proposição dos diversos exercícios organizados em ordem crescente de dificuldade e de complexidade – atua como um importante fator didático que facilita tanto a compreensão quanto a aprendizagem dos conhecimentos em tela. Por fim, ao encerrar em si mesmo a função de livro-texto e de caderno de exercícios, este material assume a característica de livro de consulta rápida de teorias científicas e anotações práticas e de referência a todo estudante de ensino superior cuja área de atuação profissional encontre interfaces com a Química. Prof. Leonardo Maciel Moreira
Normas para Publicação Revista Brasileira de Ensino de Química (ReBEQ) é uma publicação semestral da Editora Átomo que aceita colaborações em forma de artigos, resenhas, relatos de experiência, notícias e memória fotográfica da Química no Brasil. Os textos poderão ser publicados em português e espanhol. Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo, necessariamente, a opinião ou pensamento da coordenação e conselho editoriais. Os originais submetidos a análise do Comitê Científico serão encaminhados a, no mínimo, dois conselheiros do seu corpo editorial, os quais avaliarão de forma específica e decidirão sobre a pertinência dos textos à linha editorial da revista. Em caso de necessidade de revisões de conteúdo ou adequações às normas editoriais, o autor receberá os pareceres dos conselheiros, ficando, assim, responsável pela reapresentação do trabalho reformulado no prazo de 45 dias, contados a partir da data de recebimento da comunicação. O anonimato entre autores e conselheiros, durante o processo de arbitragem dos textos, é garantido pelo Comitê. O prazo médio estipulado para a apresentação do resultado final é de até 60 dias, a contar da data de recebimento do texto. Os trabalhos não aprovados pelos conselheiros, ou não devolvidos no prazo estipulado para reformulação, serão arquivados e os autores informados.
Sobre a apresentação de originais para avaliação Ao encaminhar os trabalhos para análise do Comitê Científico, os autores deverão observar as seguintes orientações: 1. Originalidade e ineditismo dos textos: o autor deve enviar, junto com o trabalho, uma declaração na qual se compromete a não apresentá-lo, simultaneamente, em outro periódico, durante o prazo estipulado para avaliação, e autoriza a sua publicação nesta revista. 2. As colaborações devem ser redigidas em português ou espanhol. Em casos excepcionais, cuja pertinência será analisada pelo Comitê, serão aceitos textos em inglês e francês, que deverão ser traduzidos para a língua portuguesa. 3. Em folha à parte, devem ser informados os dados de autoria: título do trabalho, nome completo, vinculação institucional, formação acadêmica e endereço residencial ou institucional do autor (incluindo telefone e e-mail) para o encaminhamento de correspondência pela Secretaria de Redação.
4. No caso de artigos, os originais não poderão exceder o limite máximo de 40.000 caracteres (com espaço), incluindo todos os elementos gráficos disponíveis no arquivo. Para resenhas, notas críticas e outros, observar o limite de 10.000 caracteres (com espaço). 5. Quanto à estrutura do texto, devem ser observadas as seguintes orientações: na primeira página, apresentar o título e subtítulo do trabalho, o resumo e as palavras ‑chave (até 05, evitando-se combinações extensas que não correspondam ao conteú do do texto). Todos esses elementos devem ser apresentados em português ou espanhol e inglês. 6. Os textos devem ser digitados no programa Word for Windows, em fonte Times New Roman, tamanho 12, com espaço duplo, e enviados por correio eletrônico para o seguinte endereço: rebeq@atomoealinea. com.br
seu uso limitado ao caráter explicativo-informativo, neste periódico, evitando-se a utilização de notas bibliográficas. As notas, quando utilizadas, devem aparecer em sequência representada por asterisco (*,**,***) no rodapé da página a que se refere. As citações autorais deverão ser feitas em sequência numérica e apresentadas ao final do artigo.
Sobre a utilização de imagens As tabelas, quadros e figuras (ilustrações, fotografias, gráficos, entre outros) devem ser apresentados com o máximo de resolução (300dpis em diante), em preto e branco, em arquivo à parte e, de preferência, finalizados para sua inserção direta no texto. Para a produção das tabelas, recomenda-se seguir as orientações do IBGE (www.ibge.gov.br) publicadas em suas normas de apresentação tabular. Todos esses elementos gráficos devem estar indicados e numerados, consecutivamente, ao longo do texto, de acordo com a ordem em que aparecem.
Sobre referências bibliográficas e notas
Sobre a natureza da colaboração e recebimento de exemplares
O autor do trabalho é responsável pela exatidão, organização e utilização correta das referências e citações constantes no texto, bem como na listagem bibliográfica a ser apresentada no final dos artigos. A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT – www.abnt.org.br) fornece, por meio da NBR 6023 (agosto/2002), as orientações necessárias para a organização das referências bibliográficas. No caso de notas, esse recurso tem
Fica aqui expresso que a participação dos autores neste periódico é de caráter espontâneo, por tanto, não remunerado. O autor principal receberá, gratuitamente, um (01) exemplar da edição em que seu artigo foi publicado, mais separata eletrônica deste; os co-autores receberão um (01) exemplar e separata eletrônica do texto. No caso de resenhas, cada autor terá direito a um (01) exemplar e separata eletrônica.
Solicitação de Assinatura: Primeira assinatura / First subscription
Renovação de assinatura / Subscription renovation
Nome / Name: ____________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________ Sexo / Gender: M
F
Data de Nascimento / Date of birth: ______ /______ /___________
Endereço / Address:________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________ CEP / Post Code: |__|__|__|__|__| - |__|__|__|
Bairro / District: ____________________________________
_________________________________________________________________________________________________ Cidade / City: ________________________ DDD / DDI: _____
UF / ST: ______
País / Country: ____________________________
Telefone / Phone #: ________________________
Fax: _______________________________
E-mail:___________________________________________________________________________________________ CPF: |__|__|__|__|__|__|__|__|__| - |__|__|
RG: |__|__|__|__|__|__|__|__|__|__|
/ SSP: |___|___|
CNPJ: |__|__|__|__|__|__|__|__|/|__|__|__|__|-|__|__| Inscr. Estadual: |__|__|__|__|__|__|__|__|__|__|__|__| Obs.: Para alteração de dados cadastrais enviar apenas o formulário preenchido.
Como tomou conhecimento da ReBEQ / How did you know about ReBEQ: Anúncios / Ads
Amigos / Friends
Faculdade / University
Outros / Others: _______________
Preço para Anuidade: R$ 35,00 Assinatura para 2 edições semestrais Opção de Pagamento
Depósito bancário Caixa Econ. Federal / Agência: 3914-4 / Conta Corrente: 180-7 Os valores acima são válidos para venda nacional US$ 30,00 – Venda para o exterior – cheque nominal à Editora Átomo Ltda.
PABX: (19) 3232-9340 ou 3232-0047 Website: www.grupoatomoealinea.com.br/rebeq E-mail: rebeq@atomoealinea.com.br Se precisar de outro impresso, basta fazer cópia (If you need additional forms, simply photocopy the blank form)