Neuropsicologia e subjetividade Fundamentos do MĂŠtodo Ramain
Maria Clara Nassif
DIRETOR GERAL Wilon Mazalla Jr. COORDENAÇÃO EDITORIAL Marídia R. Lima REVISÃO DE TEXTOS Regina Stocklen EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Fabio Diego da Silva Patrícia Lagoeiro Tatiane de Lima ILUSTRAÇÕES Bruno Algarve CAPA Leonardo Paiva Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Nassif, Maria Clara Neuropsicologia e subjetividade : fundamentos do método Ramain / Maria Clara Nassif. -1. ed. -- Campinas, SP : Editora Alínea, 2014. 1. Método Ramain-Thiers 2. Neuropsicologia 3. Neuropsicologia - Metodologia 4. Subjetividade Psicologia social I. Título. 14-12276
CDD-612.801
Índices para catálogo sistemático: 1. Neuropsicologia 612.801 ISBN 978-85-7516-728-1 Todos os direitos reservados ao
Grupo Átomo e Alínea Rua Tiradentes, 1053 - Guanabara - Campinas-SP CEP 13023-191 - PABX: (19) 3232.9340 e 3232.0047 www.atomoealinea.com.br Impresso no Brasil
Quando a criança era criança, andava balançando os braços. Desejava que o riacho fosse rio, que o rio fosse torrente e essa poça, o mar. Quando a criança era criança, não sabia que era uma criança. Tudo era cheio de vida e a vida era uma só. Quando a criança era criança, não tinha opinião, não tinha hábitos. Sentava-se de pernas cruzadas, saía correndo, tinha um redemoinho no cabelo, e não fazia pose para as fotos. Extraído de Asas do desejo, filme de Wim Wenders, 1987
Para Letícia, Clara, Júlia, Isabela, João, Carolina e Sofia Meus amados netos
Obrigada, Prof. Germain Fajardo, por seu incessante apoio a esta e outras tantas construções criadas com sua fundamental colaboração. Obrigada, Dr. Wanderley Manoel Domingues, por sua constante contribuição ao nosso trabalho clínico, por seu espírito de abertura ao novo que tanto nos ajudou a implantar o Método Ramain no Brasil, e outros tantos projetos que vimos construindo juntos. Obrigada a todas as companheiras de equipe da Cari Psicologia e Educação, pela permanente criação de nosso campo de trabalho, pelo nosso espaço de reflexão conjunta: Ana Paula Stefani, Ceni Rabello Marchesan, Camilla Tereza Mazetto, Maria Rita Marchi e às tantas outras colegas que participaram de nosso percurso. Obrigada a todos os pacientes com os quais vivemos tantas e tantas horas de Ramain, em nosso percurso clínico de mais de quarenta anos e que contribuíram para a construção das reflexões aqui expressas. Obrigada, em especial, aos dois pacientes cujo percurso aqui relato, que autorizaram a apresentação de sua evolução, nomeados de forma a preservar sua identidade. Obrigada à Thais Vizona, que colaborou na revisão bibliográfica, ao Licurgo de Carvalho, Valéria Soares e Tereza Bettinardi que com tanta dedicação elaboraram a diagramação final.
Sumário
Prefácio..........................................................................................11 Introdução.....................................................................................15 Meu percurso.........................................................................15 O campo da arte.....................................................................17 Plano de trabalho..................................................................21 O Método Ramain .................................................................23 A situação...............................................................................29 O processo psicoterápico Ramain.........................................36 1. Um Projeto de Vida....................................................................39 Retrospectiva de Bianca.........................................................41 Qual é o seu lugar?.................................................................42 A busca de um caminho........................................................44 O grupo-lugar de seu e de outros caminhares......................46 A evolução de Bianca em um grupo Ramain.........................47 Linha do tempo caso Bianca.................................................52 Como Bianca se encontra hoje em dia..................................54 2. A Luta de Poderes......................................................................61 Aprender a pensar.................................................................63 A busca de um caminho........................................................65 O grupo-lugar de seu e de outros caminhares......................72 A evolução de Vítor em um grupo Ramain............................76
Linha do tempo caso Vítor....................................................87 Como Vítor se encontra hoje em dia.....................................91 15 anos depois…....................................................................95 3. A Relação com o Real.................................................................97 As representações mentais.................................................. 101 Hábito e representação........................................................ 103 Neuropsicologia e flexibilidade mental.............................. 108 4. A Subjetividade........................................................................125 Atenção e subjetividade....................................................... 131 O sujeito existencial............................................................. 136 5. O Lugar do Eu..........................................................................141 O corpo-lugar....................................................................... 144 O grupo-lugar....................................................................... 148 Intersubjetividade, autonomia e alteridade........................ 153 6. Compreendendo os Eixos do Ramain.....................................157 Uma possível leitura do processo psicoterápico de Bianca..... 158 Uma possível leitura do processo psicoterápico de Vítor....... 165 Síntese.................................................................................. 168 7. O Psicoterapeuta Ramain........................................................181 8. O Processo Criativo de Simonne Ramain...............................197 In memoriam....................................................................... 198 Uma Palavra Final.......................................................................201 Uma contribuição do Grupo de Estudos Teóricos da Association Simonne Ramain Internationale..................... 201 Fondaments anthopologiques qui sous-tendent la Méthode Ramain................................................................. 202 Ramain en tant que «Pédagogie du sujet»........................... 203 Referências Bibliográficas..........................................................205
Prefácio
Um breve capítulo do manuscrito confiado pela autora – apenas mais de três páginas – intitula-se “A gratidão”. Se bem que em francês a palavra gratitude existe, a expressão mais usual é reconnaissance, como em português, reconhecimento. Para escrever esse livro, Maria Clara Nassif precisou conhecer o Método Ramain, descobri-lo agindo na evolução de pacientes por mais de quarenta anos – crianças, adolescentes, adultos impedidos até então de viver uma vida plena – para reconhecer seu valor psicoterápico e tentar explicar ao leitor em que consiste, como age, que fins norteiam o processo que ele instaura e alimenta. Para escrever este livro, a autora precisou estudar, pesquisar, ler em livros e em rostos, escutar, perceber; e também levantar hipóteses, consultar, engajar-se e constatar. Em uma palavra, viver o Método Ramain além de sua formação como psicoterapeuta. E, à medida que Maria Clara se aprofundava no Ramain, como é normal, ela foi criando sua própria vida pessoal e profissional; aprimorando instituições relacionadas à psicologia e à educação; abrindo seu leque de interesses para outras ciências, a filosofia e a arte. Assim, Maria Clara conheceu-se e conheceu artistas, escritores, pensadores, pesquisadores… e um dia, à maneira de Arthur Rimbaud que escreveu “je me suis reconnu poète”1, ela se reconhe1. In Lettre a Georges Izambard, de 13/05/1871: “Me reconheci poeta”.
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Prefácio
ceu em condições de se engajar na formação de psicoterapeutas Ramain e foi aceita no seio da Association Simonne Ramain Internationale, da qual é membro titular desde 1981. Este livro é sua criação mais recente. Outras seguirão. Ele é uma testemunha, como já dissemos, de mais de quarenta anos de trabalho na instituição que ela dirige com a colaboração de uma equipe de psicoterapeutas – CARI – Psicologia e Educação – e mais outras, brasileiras ou francesas, com as quais Maria Clara colabora assiduamente. Testemunha – dizíamos – de um engajamento; consigo, com os pacientes em psicoterapia Ramain ou de base psicanalítica, com várias equipes de terapeutas e pesquisadores, com o Método Ramain que ela tem praticado e pratica com os grupos mais diversos; conosco, seus parceiros mais próximos, igualmente engajados na procura da verdade científica com suas repercussões sociais e humanas. Porém, mais que uma testemunha, esse livro é um reconhecimento: de Simonne Ramain, mulher, pessoa porque engajada, criadora; e também de Bergson, Popper, Bion; de Aníbal Silveira, Edgar Morin, Mauro Maldonato e tantos outros que, por caminhos diversos, têm chegado a interpretações do real condizentes com as asseverações e procederes do Método Ramain. Paul Ricoeur escreveu2: “N’est-ce pas dans mon identité authentique que je demande à être reconnu? Et si, par bonheur, il m’arrive de l’être, ma gratitude ne va-t-elle pas à ceux qui, d’une manière ou d’une autre, ont reconnu mon identite en me reconnaissant?” e Maria Clara cita uma intervenção nossa de 2003: “Somente a autonomia traz o reconhecimento da alteridade: enquanto eu não cheguei a essa autonomia, o outro não é esse outro, diferente de mim e igual a mim. Alteridade significa o reconhecimento do outro como ser autônomo, mas, para isso, é preciso que eu seja autônomo”3.
2. In Parcours de la Reconnaisance…, p. 11: “Não é na minha identidade autêntica que eu solicito ser reconhecido? E se, por felicidade, isso chega a me acontecer, minha gratidão não vai aos que, de uma maneira ou de outra, têm reconhecido minha identidade ao me reconhecer?” 3. Neste livro, p. 156.
Neuropsicologia e Subjetividade
Obrigado, Maria Clara, por sua autonomia que lhe permite reconhecer. O Ramain “tem a ver” com isso. Deixe-me citar mais uma vez Paul Ricoeur4: “Dans la reconnaissance mutuelle s’achève le parcours. de la reconnaissance de soi-même”. Germain Fajardo
4. In Parcours de la Reconnaisance…, p. 274: “No reconhecimento mútuo finda-se o percurso do reconhecimento de si mesmo”.
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