A VOZ DE RIO DAS PEDRAS
ENTREVISTA EXCLUSIVA
A advogada Cláudia Corrêa coordena uma pesquisa na comunidade para que o morador tenha endereço certo, com CEP e cidadania PÁGINA 8
I N F O R M A Ç Ã O
ANO I - N0 0 - RIO DE JANEIRO, 1 DE MAIO DE 2013
APRESENTAÇÃO
A NOSSA
VOZ Interessados em melhorar a qualidade de vida desta comunidade, um grupo de comerciantes tomou duas decisões: criar uma associação de classe e editar um jornal que representasse os anseios dos moradores locais. Está criada, assim, inicialmente para circulação mensal e tiragem de 20 mil exemplares, esta “A Voz de Rio das Pedras”. Três experientes jornalistas estão à frente desse projeto, que pretende ser realizado em parceria com os moradores: Aziz Ahmed, colunista do jornal “Povo do Rio” e professor de Jornalismo da Univercidade; Ricardo Gomes, editor do “Jornal do Commercio” e com larga experiência na criação de jornais comunitários; e Laerte Gomes, outro veterano profissional, c uja carreira é farta em desafios desse gênero. E mais: como consultora, a professora de Direito Cláudia Franco Corrêa, personagem de reportagem publicada nesta edição. Mas a essência da nossa equipe são os moradores de Rio das Pedras, aos quais convidamos, neste número zero de apresentação, a participar deste desafio. Como? Apurando informações, bisbilhotando os bastidores da comunidade e clamando ao conhecimento das autoridades as aspira ções, as angústias e os desejos comunitários. Em suma: fazendo parte da nossa equipe. Estamos à disposição no e-mail avozderiodaspedras@gmail.com. Disponham.
80%
E
QUEREMOS PAGAR A LUZ!
Moradores querem ficar livres dos “gatos”
C I D A D A N I A
PÁGINA 6
DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
Queremos virar bairro MAS AUSÊNCIA DE POLÍTICAS PÚBLICAS, OPORTUNISMO ELEITORAL E POUCA
MOBILIZAÇÃO DOS MORADORES DEIXAM NOSSA COMUNIDADE CERCADA DE LIXO,
ESGOTO A CÉU ABERTO, COLOCANDO NOSSAS FAMÍLIAS EM RISCO DE DOENÇAS PÀGINAS 3, 4 e 5
DA NOSSA POPULAÇÃO É COMPOSTA POR NORDESTINOS PÁGINA 3
BARRA
MORADORES VEM FAZER COMPRAS AQUI EM RDP! PÁGINA 7
LAZER
ALÉM DE RUAS LIMPAS, QUEREMOS CULTURA! PÁGINA 7
Quer ser colaborador de A VOZ DE RIO DAS PEDRAS? Faça contato por contato@avozderiodaspedras.com.br
São flagrantes na rotina dos moradores a constatação da falta de adequada retirada de lixo, a inexistência de uma rede de esgotos, o precário fornecimento de energia elétrica...
C O M U N I C A D O
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A VOZ DE RIO DAS PEDRAS
Sua população sempre foi constituída por gente ordeira e trabalhadora, que espera realizar o sonho de comemorar a transformação da favela em bairro
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POR QUE DEVEMOS VIRAR BAIRRO? Av. Engenheiro Souza Filho
Escola Municipal Cláudio Besserman Viana “Bussunda”
Morador de Rio das Pedras
Convidamos todos os comerciantes estabelecidos nesta comunidade a participar da Associação Comercial do Rio das Pedras, na qualidade de sócios fundadores. Contamos com o apoio da Associação Comercial do Rio de Janeiro, junto à qual pretendemos Esgoto a céu aberto
Comerciantes de Rio das Pedras
estabelecer parceria no sentido de obter das autoridades apoio para a implantação de melhorias para os moradores, como energia elétrica
INDEFINIÇÃO DAS AUTORIDADES ATROPELA OS DIREITOS DE MORADORES DA COMUNIDADE
regular, água, esgoto, coleta de lixo,e implantação de um Centro Administrativo do Município, serviços da Defensoria Pública e de
I
um Juizado Especial. Pedimos contactar Tony Fontoura pelo telefone Clínica da Família
Lixo acumulado na Av. Engenheiro Souza Filho
9625-7599 e pelo email: Tony@RiodasPedras.com.br
Rio das Pedras, maio de 2013. Ronald Guimarães Levinsohn Nova Marapendi Empreendimentos Imobiliários S/A
Carlos Fernando Carvalho Carvalho Hosken S/A
Paulo Cesar Meirelles Falta de infraestrutura
Construtora Santa Cecília S/A
Organizadores
Rede elétrica precária
Vazamento de água
Rua do Amparo e seus buracos
Trânsito caótico
Coleta de lixo precária
Comércio da Av. Engenheiro Souza Filho
Expediente
A VOZ DE RIO DAS PEDRAS
www.avozderiodaspedras.com.br
CLASSIFICADOS GRÁTIS! DIRETOR-RESPONSÁVEL
EDITORES
TRATAMENTO DE IMAGENS
Aziz Ahmed
Laerte Gomes
Eduardo Jardim
Publicação mensal Tiragem: 10 mil exemplares
(Reg. 10.863 - MTPS) azizahmed@avozderiodaspedras.com.br
laerte@avozderiodaspedras.com.br
Impresso na Gráfica e Editora Jornal do Commercio
DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
Ricardo Gomes ricardogomes@avozderiodaspedras.com.br
Uma publicação da Livraria e Editora Citibooks Ltda. CNPJ: 05.236.806/0001-5 Rua Jardim Botânico, 710, CEP 22.460-000 para a Associação Comercial do Rio das Pedras (em organização). Rua Nova 105 – Loja, Rio das Pedras
A partir dos próximos números, este jornal vai reservar espaço para que você, morador ou comerciante de Rio das Pedras, possa anunciar bens, serviços ou produtos que esteja disposto a alugar, vender ou, simplesmente, doar. Basta que seja um texto curto e grosso, que vamos publicar de graça. Se quiser "vender seu peixe", encaminhe o anúncio para o setor de classificados para o e-mail contato@avozderiodaspedras.com.br. APROVEITE!
O trânsito caótico da Rua Nova
ncrustada na fronteira da Barra da Tijuca com Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio, Rio das Pedras - segundo dados do IBGE, a terceira maior comunidade do País – convive com uma situação insólita: não é favela, nem bairro. São flagrantes na rotina dos moradores a constatação da falta de adequada retirada de lixo, a inexistência de uma rede de esgotos, o precário fornecimento de energia elétrica, o mínimo de ordenamento urbano e o máximo de abandono pelos poderes públicos. Atribui-se à chamada “polícia mineira” - que desde o início combateu o tráfico de drogas e a presença de maus elementos – o fato de a comunidade registrar um nível de crimes entre os mais baixos das comunidades e bairros da cidade, transformando-a no objeto de desejo para moradia de pessoas carentes e emergentes. No rastro da divulgação da presença das milícias nas favelas do Rio, numa novela da TV Globo, um grupo de políticos aproveitou a oportunidade para aparecer na mídia, criando uma CPI na Assembleia Legislativa. O relatório final do trabalho dos deputados apontou vários delitos. Em consequência, foi ajuizado processo-crime na esteira de uma campanha divulgada nos meios de comunicação denunciando a máfia das milícias que atuavam em favelas perigosas através do controle no fornecimento de botijões de gás, televisão a cabo, energia elétrica e tráfico de drogas. Conclusão: muitos chefes da “polícia mineira” do Rio das Pedras foram condenados, malgrado a inexistência de comércio de drogas na comunidade. Sua população sempre foi constituída por gente ordeira e trabalhadora, que espera realizar o sonho de comemorar a transformação da favela em bairro, projeto do ex-prefeito Cesar Maia, mais tarde abandonado pelo sucessor, o arquiteto Luiz Paulo Conde, um especialista em artdeco. O terreno ocupado pela comunidade de Rio das Pedras pertence ao Estado do Rio de Janeiro, que o desapropriou no governo Brizola, que, na ocasião, incentivou a invasão da área e a ocupação de 1.000 apartamentos, gerando uma ação de indenização por danos e perdas desde 1983.
Areal 1 e seus transtornos diários
Av. Engenheiro Souza Filho e seu comércio intenso
Comércio de Rio das Pedras
Av. Engenheiro Souza Filho, uma das principais Vias da Comunidade
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mil imóveis tem a comunidade, segundo a associação dos moradores
A carência de serviços básicos tornam Rio das Pedras um verdadeiro patrimônio da desumanidade.
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A VOZ DE RIO DAS PEDRAS
Isso aqui hoje é um caos. Já solicitei uma reunião com representantes da COMLURB e da Prefeitura, mas ninguém apareceu. O número de agentes de limpeza é insuficiente.”
120
mil moradores já não aguentam mais tamanha imundície.
Valões de esgoto correm sem nenhum tratamento, agravado pelo despejo de lixo por moradores.
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A VOZ DE RIO DAS PEDRAS
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A VENEZA DO COCÔ
ESGOTO A CÉU ABERTO, CERCADO DE LIXO POR TODOS OS LADOS, ESSE É O CARTÃO POSTAL DE RIO DAS PEDRAS. NOSSA POPULAÇÃO NÃO MERECE!
A
pelidada jocosamente pelos moradores de “Veneza do cocô”, a Rua Xaxá é o cartão postal que retrata o ambiente de imundície e falta de saneamento na comunidade de Rio das Pedras. Enquanto a romântica, charmosa e verdadeira Veneza, no nordeste da Itália, é classificada pela Unesco como patrimônio da humanidade, o acúmulo de sujeira, a ausência de mínima infraestrutura, a insegurança, a desordem urbana e a carência de serviços básicos tornam a tradicional favela da Zona Oeste carioca um verdadeiro patrimônio da desumanidade. Os cerca de 120 mil moradores já não aguentam mais tamanha imundície e desamparo das autoridades. E pedem socorro. Quem chega ao local já se depara com um cartão de visitas que causa péssima impressão: um valão cheio de lixo. O caminho pela Estrada de Jacarepaguá continua exibindo imagens desoladoras: entulhos e mais entulhos espalhados ao longo da via pública e das calçadas – onde há calçadas. Os líderes comunitários estão cansados de procurar as autoridades competentes e não serem atendidos em suas solicitações, Um deles desabafou à reportagem de A VOZ DE RIO DAS PEDRAS: “Isso aqui hoje é um caos. Já solicitei uma reunião com representantes da COMLURB e da Prefeitura, mas ninguém apareceu. O número de agentes de limpeza é insuficiente. Faltam contêineres caçambas e lixeiras. Se o cidadão não tiver onde colocar o lixo e não tem ciência do local de recolhimento fica difícil resolver o problema”. Segundo a associação dos moradores, a comunidade tem 47 mil imóveis. O número de homens da limpeza não dá conta do tamanho de Rio das Pedras. O saneamento básico é outro grave problema.. Valões de esgoto correm pela comunidade sem nenhum tratamento, agravado pelo despejo de lixo por moradores. A Rua Xaxá é a síntese do problema, por isso foi tachada de “Veneza do cocô”. Os flagrantes fotográficos nesta edição valem mais do que as palavras. Retratam com fidelidade um cenário de sujeira, desordem urbana e total desamparo do poder público. Quanto ao mau cheiro, o leitor pode imaginar.
São flagrantes na rotina dos moradores a constatação da falta de adequada retirada de lixo, a inexistência de uma rede de esgotos, o precário fornecimento de energia elétrica.”
Rio das Pedras fede.” Camila Guimarães, de 23 anos, operadora de telemarketing
Pode escrever aí que todos gostaríam de ter o relógio nas suas casas e pagar as contas de luz.”
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Rosa Rodrigues Soares, dona de casa , 65 anos
A VOZ DE RIO DAS PEDRAS
Isso aqui está cheio de ratos. Tenho vergonha disso aí.”
Queremos ser tratados como cidadãos. Queremos cumprir nossos deveres e ter nossos direitos respeitados.”
Luzia Ximenes, doméstica, de 51 anos
Soly Lopes, de 43 anos, Coordenadora de projetos sociais,
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escolas públicas de grande porte
ROSA RODRIGUES
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espaço
de Desenvolvimento Infantil - EDI funcionando e outro em construção, além de mais de 20 creches particulares
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RIO, 1 D E M A IO D E 2 0 13 NEGUINHO DO BAIÃO
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A VOZ DE RIO DAS PEDRAS
SOLY LOPES
COMUNIDADE QUER RELÓGIO NAS CASAS E PAGAR AS CONTAS DE LUZ, MAS TAMBÉM
Diversidade de serviços encontrados na comunidade
CAMILA GUIMARÃES
LUZIA XIMENES
JANAÍNA MELO
RECLAMA DO MAU CHEIRO CAUSADO PELO LIXO EXPOSTO E O CHORUME ACUMULADO
A LIGHT NA CADEIRA ELÉTRICA
ECONOMIA AQUECIDA
O
s moradores de Rio das Pedras colocam a Light numa cadeira elétrica. A reportagem deste jornal ouviu a comunidade e levou um choque. Ninguém ali quer viver na ilegalidade, alimentando os “gatos” de energia. Pelo contrário, querem que a concessionária acabe com eles. Moradora há 22 anos na favela, a coordenadora de projetos sociais Soly Lopes, de 43 anos, diz que gostaria de ter relógio de luz, pagar regularmente as contas para manter uma relação formal com a Light. E explicou: “Nós queremos ser tratados como cidadãos. Queremos cumprir nossos deveres e ter nossos direitos respeitados.” A dona de casa Rosa Rodrigues Soares, de 65 anos e há 30 residente no local, concorda com Soly e dá uma sugestão: “Por que não criam uma tarifa social para o pessoal de baixa renda? Pode escrever aí que todos gostaríam de ter o relógio nas suas casas e pagar as contas de luz.” Se o problema da falta de energia na comunidade mantém a polêmica em voltagem de alta tensão, o comerciante Neguinho do Baião, de 48 anos, há 21 morador do local, chama a atenção para o problema do esgoto, do lixo acumulado e também dos “apagões”. Mas ele salienta um lado positivo: “Aqui é uma comunidade tranquila, muito boa para morar. Falta o poder público olhar mais nossos problemas e fazer um esforço para acabar com eles. Transformar Rio das Pedras em bairro pode ser uma solução”. A dona de casa Rosa, ao dar dicas sobre como resolver o problema do fornecimento legal de energia, mostra ó emaranhado de fios e cabos entrelaçados nos postes e reafirma que é difícil viver dignamente num ambiente de tamanha desordem urbana. Ela lembra que também sofre com a falta dágua, o lixo, o esgoto e “todas as mazelas que você pode imaginar”. Com certa liderança na comunidade, onde ficou popular graças ao sucesso dos projetos sociais que coordena, Soly Lopes defende a transformação de Rio das Pedras em bairro: “Acho que seria excelente. Também gostaria muito de ter o relógio da Light na minha casa, marcando a energia que consumimos e cobrando a conta, para que possamos também cobrar a prestação de um serviço de melhor qualidade’, acrescentou Soly. Espremidos numa calçada estreita, entre uma montanha de lixo e um transformador de energia “instalado” no pé de um poste, na localidade conhecida como Ladeira do Pinheiro, a doméstica Luzia Ximenes, de 51 anos, reclamava da falta de educação dos moradores. Apontando para o lixão, disparou: “Isso aqui está cheio de ratos. Tenho vergonha disso aí.” Igualmente indignada com o comportamento nada civilizado de alguns vizinhos, o operadora de telemarketing Camila Guimarães, de 23 anos, repete a longa lista de problemas enfrentados pela população local e diz que os taxis se recusam a entrar na comunidade e não por causa da segurança. E explica: “Eles não deixam a gente aqui para não quebrar os carros nesses buracos da rua”. Referindo-se à sujeira espalhada por todos os lados e o esgoto correndo a céu aberto, Camila foi enfática; “Rio das Pedras fede.” Por fim, outra cria da comunidade, onde foi morar quando tinha nove anos, a comerciária Janaína Melo, de 20 anos, que trabalha numa loja que vende desde artigos de papelaria, a bolos, doces e artesanato, reclama dos problemas de energia, além de todos os já citados nesta reportagem. Ela lembra que, no período de Natal, grande parte de Rio das Pedras ficou três meses sem luz. “Isso é triste, né?”, lamentou. Em suma, além de serviços essenciais precários e dos “apagões”, como disse a jovem Camila, “Rio das Pedras fede”.
Tudo o que se procura se encontra em Rio das Pedras, de material de construção a bares e restaurantes
UM MERCADO CONSUMIDOR DE RAZOÁVEL PODER AQUISITIVO ATRAI COMÉRCIO, SUPERMERCADOS, BANCOS, CASAS DE ESPETÁCULOS, ESCRITÓRIOS E OS MAIS VARIADOS NEGÓCIOS À COMUNIDADE
Grandes casas de show
Grandes lojas de móveis
Agências de Turismo Restaurantes
A VOZ DE RIO DAS PEDRAS CONTRA-CAPA
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meses foi quanto tempo durou a pesquisa da advogada
A aquisição do direito de propriedade no Brasil perpassa por um sistema legal complexo e contraditório”.
a maior
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comunidade do Brasil, segundo o IBGE e é a única que pode virar bairro
...Estaríamos certos ao afirmar que o Direito é pacificador e se pauta pelo princípio da igualdade.”
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ENTREVISTA Localizado na Rua Nova 105, o Centro de Cidadania, mantido pelo Centro Universitário da Cidade (UniverCidade), além de oferecer atendimento jurídico gratuito a todos os moradores de Rio das Pedras, está realizando o maior Censo já feito em uma favela no Brasil. É um trabalho inovador, com o objetivo de promover melhorias para a comunidade. O Censo busca fazer uma radiografia local, identificando quais as maiores reclamações e sugestões de comerciantes e moradores, visando buscar soluções para que Rio das Pedras se torne um bairro com infraestrutura, saneamento básico, coleta de lixo, escolas de qualidade para as crianças, áreas de lazer e dotada de aparelhamentos urbanos dignos de um bairro de verdade. Todas as moradias e estabelecimentos comerciais serão visitados. Logo, abra as portas de sua residência e de seu comércio para o pesquisador, que é identificado com camisa e crachá da UniverCidade. Todas as informações são sigilosas. A pesquisa busca também estabelecer parcerias com entidades privadas e públicas visando promover as melhorias necessárias em Rio das Pedras. Aliás, já está em andamento uma parceria da Prefeitura com o Centro de Cidadania para dar nomes a todas as ruas da comunidade, para que o morador, em breve, resida numa rua com nome e CEP. Ter um endereço legalizado é o primeiro passo para o reconhecimento da comunidade como bairro. O Centro de Cidadania está presente na comunidade desde 2008 atendendo os moradores sob a coordenação da professora de Direito Cláudia Franco Corrêa que, recentemente, lançou um livro mostrando o caminho para regularizar as propriedades de Rio das Pedras. Nesta entrevista para A Voz de Rio das Pedras, Cláudia esclarece a atuação do referido Núcleo em nossa comunidade.
Núcleo de Cidadania de Rio das Pedras
CLÁUDIA FRANCO CORRÊA, advogada especialista em direito da propriedade
NÚCLEO DE CIDADANIA REALIZA CENSO NA COMUNIDADE PROFESSORA DE DIREITO EXPLICA OS PASSOS PARA TORNAR RIO DAS PEDRAS UM BAIRRO DE VERDADE
A VOZ DE RIO DAS PEDRAS
CLÁUDIA – Tudo começou com a minha vinda para Rio das Pedras no ano de 2008 para realizar pesquisa sobre o “Direito de laje” existente na comunidade para minha tese de doutorado. Como sou professora de Direito da UniverCidade, que há anos está presente na comunidade promovendo a cidadania com acesso à educação, acabei formando, com um grupo de estudantes de Direito, um núcleo de atendimento jurídico e de mediação de conflitos. Naquela época, atendíamos em uma pequena sala na Associação de Moradores. Hoje, possuímos prédio próp rio na Rua Nova, 105. Além do atendimento jurídico gratuito, promovemos mediações de conflitos entre os moradores e diversas pesquisas que visam buscar melhorias para que Rio das Pedras se torne um bairro com infraestrutura digna e funcional.
CLÁUDIA – O atendimento se dá de segunda a sexta, no horário das 10h às 16h. Os serviços oferecidos incluem esclarecimento de dúvidas jurídicas, bem como encaminhamento para postos de serviços públicos. E mais: promovemos também a mediação e conciliação de conflitos entre moradores, especificamente nas questões civis (direito de vizinhança, direito de família, contratos e di-
reito sucessório), elaboração de contratos e ajuizamento de ações, principalmente ação de alimentos, que é a grande demanda da comunidade.
CLÁUDIA - Mais de 1500 atendimentos, sendo que já realizamos quase 200 mediações de conflitos, com um sucesso que impressiona, porque até hoje apenas quatro acordos feitos com nossa participação não foram cumpridos. Nossa estatística é melhor do que a do Judiciário. Isto se dá não apenas pela nossa atuação, mas, sobretudo, pela vontade que o povo de Rio das Pedras demonstra de viver em paz. Realmente, Rio das Pedras é uma favela diferente.
CLÁUDIA – Diferente no sentido de querer viver em paz. Está mais que comprovado que escolher Rio das Pedras para viver se dá por ser um lugar tranquilo, onde as pessoas se conhecem. Quando iniciei minha pesquisa aqui ouvia sempre que Rio das Pedras é o melhor lugar por causa da ausência de violência, presente
Mediadores integrantes do Centro de Cidadania, Irineu Soares, Michelle Telles e Patrícia Toscano
em tantos outros locais do Rio de Janeiro. Minha experiência no convívio com a comunidade só tem ratificado essa informação. Passei não só a gostar do lugar, mas, principalmente, a admirá-lo pelo ambiente de convivência sadia e fraterna entre os moradores.
CLÁUDIA – O objetivo é ouvir todos os moradores e comerciantes. Será o maior Censo feito em uma favela no Brasil. Algo realmente inovador. O intuito é promover melhorias a partir das falas dos principais atores da questão, ou seja, os moradores e comerciantes que tornam Rio das Pedras a terceira maior favela do Brasil e a segunda do Rio de Janeiro. São quase 80 mil moradores, distribuídos em 25 mil moradias aproximadamente, e 5 mil comerciantes, uma realidade social e econômica maior do que a de muitas cidades brasileiras. Ouvi-los é o passo mais importante para viabilizar as melh orias necessárias e urgentes. Com o resultado desse trabalho poderemos efetivar parcerias com setores públicos e privados objetivando transformar Rio das Pedras em um dos melhores bairros para classe menos favorecida viver.
CLÁUDIA – Na realidade ele já está acontecendo. Os pesquisadores são em sua maioria alunos de Direito que trabalham no Núcleo. Estão identificados com crachá e camisa da UniverCidade. Aplicam um questionário que não leva mais do que 10 minutos para ser respondido. Todas as
informações são sigilosas e serão usadas apenas para a pesquisa. Peço que todos os moradores e comerciantes sejam generosos e contribuam com a nossa pesquisa, cedendo um pequeno tempo, recebendo nossos pesquisadores. Esse levantamento, na realidade, será fruto de uma grande parceria entre a UniverCidade, o s moradores e os comerciantes. Somente com a colaboração de todos será possível obter sucesso.
CLÁUDIA – Sim. Além de diversas publicações em congressos nacionais e internacionais, o que atrai pesquisadores de diversos locais do mundo para comunidade, mais recentemente, em decorrência do nosso levantamento territorial de Rio das Pedras, a Prefeitura do Rio de Janeiro concretizou uma parceria conosco e deu inicio a o projeto “endereço legal” de nossa autoria, legalizando as ruas de Rio das Pedras. Isso significa dizer que todos os moradores e comerciantes em breve terão um endereço legal, com nome da rua reconhecido pela Prefeitura e com CEP de verdade. É o primeiro pass o para que a favela se torne um bairro no qual cada morador tenha reconhecida sua cidadania urbana. É uma falta de respeito com o cidadão, o morador não ter um endereço reconhecido pelo Estado.
CLÁUDIA – Está. Eles es-
tão presentes todas as terças e quintas em nosso prédio na Rua Nova, com o projeto “Pouso”. Estamos colaborando para que tudo ocorra de forma mais rápida possível. Certamente, em breve, os moradores serão convidados em suas ruas para uma reunião com a Prefeitura, a fim de dar nomes aos logradouros. Cremos que, a partir dessa etapa, muita coisa boa virá para Rio das Pedras. Chegou a hora de os moradores da comunidade serem vistos e tratados como cidadãos fora da época eleitoral.
CLÁUDIA – O problema do lixo é recorrente, além da questão do esgoto, energia elétrica, falta de estacionamento e o trânsito caótico nas principais vias da comunidade.
CLÁUDIA – De todas as favelas que conheço a única que possui essa condição é Rio das Pedras. Isto se dá por mérito dos moradores, que, a despeito da ausência do poder público, foram criativos e dinâmicos na construção de um bom lugar para viver. Comparando a outras favelas, o que o poder público tem a fazer é bem menor. Na realidade, o poder público não deve mexer naquilo que já dá certo. Ele tem que colaborar naquilo que inexiste ou é deficitário, ou seja, olhar os moradores como cidadãos. Apenas isso.
CLÁUDIA – As portas do Núcleo estão sempre abertas para os moradores e comerciantes locais. É um lugar onde todos são sempre bem-vindos, seja para o atendimento de suas questões jurídicas, seja para dar sugestões. Nosso objetivo é contribuir para que a cidadania seja efetivada através de uma melhor qualidade de vida. Todos têm o direito a uma vida digna. Todos.