Revista dos Bancários 46 - set. 2014

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nº 46 - setembro/2014

POR QUE OS BANCÁRIOS PRECISAM ENTRAR EM GREVE TODOS OS ANOS? Entenda como agem os bancos nas negociações e porque a greve é necessária

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Revista dos Bancários Publicação do Sindicato dos Bancários de Pernambuco

Redação Av. Manoel Borba, 564 - Boa Vista, Recife/PE - CEP 50070-00 Fone 3316.4233 / 3316.4221 Site www.bancariospe.org.br Presidenta Jaqueline Mello Secretária de Comunicação Anabele Silva Jornalista responsável Fábio Jammal Makhoul Conselho editorial Jaqueline Mello, Anabele Silva, Geraldo Times e João Rufino Redação Camila Lima e Fabiana Coelho Projeto gráfico e diagramação Bruno Lombardi - Studio Fundação Crédito da capa Lumen Fotos Impressão NGE Gráfica Tiragem 12.000 exemplares

Sindicato filiado a

Editorial

Hora da decisão Setembro sempre é um mês de decisão para a Campanha Nacional dos Bancários. Nesta época do ano, as negociações com os bancos entram na reta final e, geralmente, há poucos avanços nas discussões. Na última década, os bancários tiveram de encarar fortes greves todos os anos para garantir que a pauta de reivindicações seja atendida. E este ano a história não deve ter um final diferente. As negociações realizadas até o final de agosto já mostraram que os bancos não estão dispostos a construir uma proposta de acordo através do diálogo. Com este cenário, o Sindicato já está esquentando a mobilização dos bancários e preparando a categoria para mais uma possível greve. Nesta edição da Revista dos Bancários, a reportagem de capa mostra como tem sido o comportamento dos bancos na mesa de negociações. Mais do que isso, a matéria destaca a importância da greve para os bancários e como as paralisações têm tido sucesso nos últimos anos. Como forma de ampliar a mobilização, uma série de atos já foi realizada pelo Sindicato nas agências e departamentos dos bancos, na capital e no interior. Como sempre, os protestos têm como marca o bom-humor. E um dos principais responsáveis por este bom-humor é o grupo de teatro que acompanha o Sindicato nas manifestações. Conheça quem são os atores e o que eles pensam na entrevista do mês. A revista de setembro também traz a história de um bancário do Bradesco, que viveu um verdadeiro inferno em seu trabalho. O banco acabou destruindo a sua saúde mental e, depois, demitiu o bancário mesmo com doença ocupacional comprovada. O Sindicato reagiu, garantiu a reintegração do trabalhador e ainda uma indenização de R$ 100 mil na Justiça. São histórias como esta que mostram a importância dos bancários lutarem por mais saúde e condições de trabalho, pautas que estão entre as principais reivindicações da Campanha Nacional deste ano.

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Campanha Nacional 2014

Bancos empurram bancários para mais uma greve

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ENTREVISTA Conheça os atores que ajudam o Sindicato a protestar com bom-humor Página 8 Confira nossas dicas para cultura e lazer Página 14

Bancário muda de vida através do esporte Página 15

Bordadeiras de Passira e a luta pela valorização Página 16

Sindicato garante indenização para bancário que teve a saúde afetada pelo Bradesco Página 12 Setembro de 2014

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Campanha Nacional dos Bancários Campanha do ano passado terminou após 23 dias de greve

A greve nossa de cada ano

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m todos os anos da última década, entre agosto e outubro, a história se repete na Campanha Nacional dos Bancários. Um ciclo de negociações infrutíferas, propostas rebaixadas, pressão e chantagens, greve. Somente aí, o enredo muda de rumo e a corda do cabo de guerra, que antes pendia para o lado dos bancos, começa a se equilibrar. “A maior arma que o trabalhador dispõe para enfrentar os

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Entenda como agem os bancos e porque é tão importante a construção coletiva da greve

interesses do capital é deixar de vender sua força de trabalho”, afirma a presidenta do Sindicato, Jaqueline Mello. Para ela, em um processo de negociação, os dois lados precisam estar dispostos ao diálogo e ambos precisam ceder em algumas coisas. O que faz diferença é a força, a energia e o espírito coletivo com que os lados puxam a corda. “Quanto mais o trabalhador percebe que esta é uma luta de todos, quanto mais a categoria está integrada em um sentimento coletivo, mais força ele ganha e maiores os avanços”, explica Jaqueline. Este processo, entretanto, não é simples. As armas dos banqueiros são muito poderosas. Envolvem um processo cotidiano de fazer do ambiente de trabalho o espaço do individualismo, da disputa, da desumanização. O sistema de metas, os programas de remuneração variável, os comissionamentos, tudo caminha para este mesmo fim: destruir o sentimento coletivo e impedir a organização.


Greve no banco Rural, em 1999

“Muitos bancários se tornam reféns de uma comissão e, portanto, alvos fáceis das pressões dos bancos. Na agonia de cumprir metas diariamente, as pessoas não refletem sobre o sentido do que fazem e deixam de lutar por seus direitos para garantir resultados ao patrão”, afirma a responsável pela Secretaria da Mulher do Sindicato, Sandra Trajano. No entanto, todos os anos, os bancários mostram que continuam fortes, apesar das estratégias dos banqueiros. “A gente sabe

que, se não fizer greve, não conquista nada. Aqui, em meu setor, a adesão ao movimento é sempre grande”, diz Daniel Lins, funcionário da Gifug (Gerência de Filial do FGTS) da Caixa Econômica Federal.

A força dos bancários Daniel trabalha há oito anos na Caixa. Sempre fez greve. Sempre participou das assembleias e atividades de Campanha. Durante os dias de movimento, ele não tira férias: vai para frente da agência,

conversa com outros colegas, ajuda a construir a greve em outras unidades. “Se todos os trabalhadores fizessem isso, a gente fortaleceria muito o movimento e as conquistas seriam mais fáceis”, diz Daniel. Embora nem todos o façam, há vários trabalhadores que, como Daniel, não se dobram à pressão, à manipulação e às estratégias do banco para minguar o espírito coletivo. Pelo contrário. No ano passado, por exemplo, não faltaram trabalhadores de bancos públicos que, com a agência fechada, ajudaram os colegas de bancos privados. Quanto mais forte a greve, maior o incômodo para os banqueiros. “Hoje em dia, o impacto financeiro das greves já não é o mesmo, por conta das várias tecnologias que garantem que as operações sejam efetuadas. Mas há um outro tipo de incômodo, que é aquele que afeta a imagem do banco. Cada vez mais, estamos conseguindo ter a população ao nosso lado”, opina o secretário de Bancos Privados do Sindicato, Geraldo Times. Para Geraldo, o que os bancários precisam ter claro é que a greve não é contra a população, mas contra os banqueiros. “A gente não pode admitir que os trabalhadores deixem de atender os clientes e continuem trabalhando dentro da agência para favorecer o patrão”, ressalta ele. A categoria dos bancários é reconhecida no mundo sindical pela sua capacidade de organização. É uma das poucas que Setembro de 2014

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Campanha Nacional dos Bancários garantiu Convenção Coletiva Nacional, além da negociação e mobilização conjunta de trabalhadores de todos os bancos. O processo de organização não se resume nem se encerra na greve. Dura o ano inteiro, com mesas permanentes de negociação em todas as empresas. Durante a preparação da Campanha, encontros e discussões acontecem em todo o país, culminando na realização da Conferência Nacional, quando é definida a pauta de reivindicações. “Todo o processo de organização é construído de dentro pra fora. Envolve desde a sindicalização até a participação nos atos, assembleias, encontros. A greve é parte deste processo”, explica a secretária de Finanças do Sindicato, Suzineide Rodrigues.

O passo a passo da Campanha Ano após ano, muitas coisas se repetem em cada Campanha. Os banqueiros usam a mesma fórmula: as rodadas iniciais não avançam, servem para que eles desqualifiquem a pauta de reivindicações dos trabalhadores e exponham seus interesses: terceirização, ampliação de jornada, perda de direitos. “Eu me sinto na faixa de Gaza. Só que eles são Israel e a gente, os palestinos”, desabafou o diretor do Sindicato, Fernando Batata, depois de uma rodada sem avanços com o BNB. Neste momento, a pressão dos bancários ainda não entrou em cena, o que justifica a sensação de desequilíbrio de forças evo-

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As passeatas dos bancários chamam a atenção para a Campanha e garantem apoio da população

cada por Batata. “O Capital não tem limites e os banqueiros são a representação maior disso. Eles sempre querem ganhar mais, o que significa retirar direitos. Ao mesmo tempo, mesmo algumas reivindicações que não teriam impacto financeiro são negadas, como se aceitá-las fosse uma forma de reconhecer o poder de organização da categoria”, explica Jaqueline. Entre os direitos que os banqueiros sempre tentam atacar está a jornada de seis horas. E entre os principais desejos dos bancos está a terceirização que, para eles, significaria resultados maiores à custa da precarização do trabalho e, simultaneamente, fragilização da organização dos trabalhadores. “Eles querem fomentar a divisão, a desorganização. Colocam bancários contra bancários, agências contra agências... Não é à toa que desejam tanto a terceirização”, acrescenta a presidenta do Sindicato. Nas primeiras rodadas de ne-

gociação, a corda do cabo de guerra ainda parece pesar para o lado dos banqueiros. “Eles manipulam as estatísticas e os dados, camuflam informações, dizem que os processos de gestão – como as metas e programas de desempenho – não podem fazer parte da negociação, repassam a responsabilidade pela segurança das agências para o Estado, fazem de tudo para desqualificar as reivindicações dos trabalhadores”, conta a secretária de Bancos Públicos do Sindicato, Daniella Almeida. E, neste processo, são todos iguais: bancos públicos e bancos privados. São todos patrões e a postura não difere. Terminadas estas primeiras rodadas de negociação, o processo entra em outra etapa. É quando os bancos vão se organizar, internamente, para elaborar sua proposta. “E há polêmicas também entre eles. Às vezes um banco é favorável a ceder em alguma coisa. Outros empacam”, revela Jaqueline.


Enquanto isso, nas agências, eles apostam na desmobilização: pressionam, enviam mensagens subliminares, fazem circular boatos, tentam cooptar trabalhadores, fazem ameaças. Também investem na mídia, para tentar pôr a população ao seu favor, e tentam articular o Poder Judiciário. As primeiras propostas são, quase sempre, inaceitáveis, rejeitadas na própria mesa de negociação. Enquanto isso, os bancários reforçam as atividades de mobilização e se preparam para uma possível greve. Somente quando existe uma proposta um pouco mais elaborada, que inclua outras cláusulas além da reposição salarial, as assembleias são chamadas para decidir. “A gente faz questão de cumprir todos os trâmites legais para que a greve não seja considerada ilegal”, explica o secretário de

Assuntos Jurídicos do Sindicato, Justiniano Júnior.

Tempos difíceis Se a batalha não é fácil hoje, um dia já foi pior. Na década de 90, sequer havia negociação com os bancos públicos. O diálogo se restringia aos bancos privados e os avanços eram tímidos, embora maiores que nas empresas estatais. Nas agências, o medo e a perseguição dificultavam a mobilização. Apesar disso, as paralisações, atos e greves não deixaram de acontecer, embora com menor impacto. Não é à toa que bancários e banqueiros estão de lados opostos também na Campanha Eleitoral. Em Conferência Nacional, os bancários de todo o país aprovaram o apoio à candidatura de Dilma Rousseff que, para eles, apesar de ter muito a avançar, garantiu

mais democracia, negociações e conquistas para os bancários e para o povo brasileiro. Sempre com pressão e luta. Os banqueiros, por sua vez, apoiam outras candidaturas, que defendem, por exemplo, a independência do Banco Central e a terceirização. “Hoje, quando existe uma regulação, o Banco Central já age como representante dos bancos, imagine se fosse independente... O que a gente defende, ao contrário, é a regulamentação do sistema financeiro. E que os bancos tenham mais responsabilidade social”, diz Jaqueline. Acompanhe o dia-a-dia da Campanha Nacional em www. bancariospe.org.br. E não deixe de participar das atividades do Sindicato. “O sucesso da nossa Campanha depende de cada bancária e de cada bancário”, conclui Jaqueline. Bancários em greve, em 1990

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Entrevista

Protesto com bom-humor As manifestações organizadas pelo Sindicato sempre trataram os assuntos espinhosos de forma bem-humorada. Para isso, o auxílio de um grupo de teatro é fundamental. Conheça, nesta entrevista, quem são e o que pensam os atores do Sindicato

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s manifestações e protestos que os bancários de Pernambuco realizam durante

o ano inteiro têm como marca registrada o bom-humor. E uma das ferramentas para tratar de assuntos espinhosos de forma leve é o teatro. Há décadas, o Sindicato utiliza esquetes teatrais para sensibilizar empregados e clientes dos bancos sobre questões importantes para a

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categoria. Nesta Campanha Nacional, o grupo de teatro é formado pelos atores Beto Filho, Itacy Henriques, Nady Oliveira, Raul Elvis e Reinaldo Patrício. O esquete é dirigido e produzido por Normando Roberto Santos. A apresentação teatral da Campanha mostra um cabo de guerra entre um banqueiro e um grupo formado por bancário, aposentado e cliente. Juntos, eles conseguem vencer o banqueiro. A Revista dos Bancários conversou com Beto, Itacy e Normando sobre a trajetória deles no teatro e a experiência de fazer esquetes para o Sindicato. Há 15 anos, Beto trabalha como ator. Também é produtor e aluno do curso de serviço social. Itacy fez o seu primeiro curso de teatro em 1992. No ano seguinte, começou a apresentar esquetes para o Sindicato. Desde o início, sua vocação


para a comédia ficou evidente. Sua voz marcante a torna inesquecível para muitos espectadores. Normando trabalha com teatro há 35 anos: escreve, dirige, produz e atua. Já participou de mais de 40 espetáculos teatrais, além de filmes curtas e longas-metragens. Desde a década de 1980, Normando presta serviço para o Sindicato. Confira os principais pontos da entrevista.

História no Sindicato Itacy - Em 1993, comecei a fazer esquete aqui, na época da TV Sindical, a convite de Pitóia, que era o produtor. Há uns quatro anos, Normando me chamou para fazer novos esquetes. Nós trabalhamos

mais para o Sindicato durante a Campanha Nacional, mas já fizemos trabalhos em outros períodos. Para mim, o esquete da Campanha deste ano é o melhor que já fizemos.

uma mulher me xinga... Na rua, temos muito feedback e precisamos saber usá-los. Para ficar divertido e não invasivo, tem de saber brincar.

Comédia Teatro de rua Beto – A rua é muito diferente do palco. Na rua, o público não tem uma faixa etária, é muito diverso. Nós não ficamos tão presos às marcas como no palco. Brincamos mais, improvisamos mais. E ficamos rodeados pelo público, numa espécie de círculo. Então, temos de ser resilientes. Adoro fazer teatro de rua, improvisar. Comento sobre um cara que está comendo uma pipoca,

Itacy – Fiz um curso de teatro no Valdemar de Oliveira. E depois fiz um teste para participar do Teatro de Amadores de Pernambuco (TAP) e passei. Fiquei em cartaz com dois espetáculos, um adulto e um infantil. Então, perceberam que eu tinha um perfil para Catirina, que é uma personagem de comédia. É difícil de fazer, mas eu tenho essa veia cômica. Quando eu faço drama, todo mundo ri. Fazia um espetáculo infantil, “O O grupo teatral arrancou risadas e aplausos dos bancários do Bradesco de Prazeres, em ato da Campanha, no final de agosto

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Entrevista O cabo de guerra, símbolo da Campanha deste ano, ganhou cenas bem-humoradas nos esquetes

casamento da Dona Baratinha”, e ela chorava em cena. Era uma cena triste, mas todo mundo ria.

Esquetes dos bancários Itacy – É o teatro que introduz as intervenções do Sindicato nos bancos, durante as campanhas, para que as pessoas entendam sobre o que o dirigentes irão falar. Gosto muito de fazer esses esquetes, ainda mais pela parceria com Beto, que também faz bem comédia. Somos uma dupla que encaixa perfeitamente. Como o grupo tem experiência de palco e de rua, ele tem a dinâmica para interagir com o público. E é difícil fazer o público interagir nos bancos, pois o que ele quer é ser atendido. Nós educamos os clientes, lembrando que eles devem ser gentis com os

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bancários, que não são os culpados pela demora no atendimento. O esquete é direcionado à categoria bancária e, também, aos clientes. Lembro de um espetáculo cujo mote era “O que queremos?” e, até hoje, tem gente no Sindicato que me chama de “O que queremos?”.

lação conheça as reivindicações da categoria; entenda que a luta do Sindicato não interessa só aos bancários, pois também beneficia os clientes dos bancos. A luta não é apenas por melhores salários para o bancários, mas também por melhor atendimento.

Normando – Os esquetes funcionam para suscitar discussões entre os clientes e a própria categoria bancária. Eles incitam os bancários a participar das ações promovidas pelo Sindicato. O teatro é uma linguagem poderosa. É real, é ao vivo.

Aprendizado com os bancários

Beto – Costumo dizer que uma das categorias mais organizadas do Brasil é a bancária. A intenção do esquete teatral é que a popu-

Normando - Fico muito triste em pensar nas condições de trabalho dos artistas, em Pernambuco. Diferente do bancário, que está amparado por muitas leis, trabalhamos, hoje, e não sabemos quando trabalharemos de novo. Então, é interessante observar uma categoria que luta pelos seus direitos, de forma organizada. Nós não temos essa força. Penso que


nosso sindicato também poderia ser assim. Poderia fiscalizar a situação dos teatros, verificar se existem contratos de trabalho. Fico triste, mas eu sou o bufão, o histriônico. Ajudamos outra categoria a garantir os seus direitos e lembramos que a nossa é muito fragilizada.

Viver de teatro em Pernambuco Normando – Pernambuco teve um momento profissional de ouro, quando as televisões tinham o teleteatro. Era a época de Lúcio Mauro e Arlete Sales. Isso, eu acho, era na década de 60. Hoje, nós, atores, temos um sindicato, mas não temos um profissionalismo vingado, um profissionalismo dos contratos, do profissional que vive, exclusivamente, do seu ofício. Existem, no estado, muitos atores que vivem no semi-profissionalismo, sabendo que, a qualquer momento, podem ficar sem trabalho. Houve um embrião de profissionalismo no estado, com um advogado chamado Bóris Trindade. Ele assinava as carteiras dos artistas e trazia atores do eixo Rio-São Paulo. Ele montou um espetáculo com Ítala Nandi, Luiz Mendonça e Paulo César Pereio. Eles vieram fazer temporada, no teatro Santa Isabel, com um produtor daqui. Fora outros espetáculos que Bóris produziu. Beto – Não conheço, no Recife, um grupo de teatro que crie um vínculo empregatício com o ator e pague um salário digno, de forma que ele trabalhe só nisso.

É possível viver só de teatro por um tempo, mas tem uma hora que não dá mais. O ator tem que ser muito articulado, não pode ser só bom, porque existe muita gente boa. E precisa produzir também. Como produtor consigo ganhar muito melhor do que como ator. Um dos caminhos para se viver, hoje, é por meio da aprovação de projetos culturais.

celino já foi ator aqui no Recife e, hoje, os textos dele são dirigidos por Newton Moreno. Ou seja, isso aqui é uma escola. Nós temos bons atores, bons diretores. Temos a licenciatura na Universidade Federal de Pernambuco, mas o mestrado você só consegue fazer na Bahia. Agora, esse caldeirão dá naquilo que eu já falei: o profissional mesmo não existe.

Itacy - É difícil, mas eu vivo de teatro. Tenho casa, carro. Quando você tem um potencial bom, sabe fazer, todo mundo chama você para trabalhar. Desde 1992, quando comecei a fazer teatro, nunca parei. Tenho a carteira assinada pelo Consórcio Novo Recife e educo as pessoas nas paradas de ônibus. Também fiz as “Noites de Terror do Playcenter”. São sempre trabalhos artísticos.

Fortalecimento do teatro pernambucano

Reconhecimento nacional do teatro pernambucano Normando – Uma Companhia que já foi muito reconhecida no estado foi o TAP, que está completamente parado. Que outra companhia tem, realmente, visibilidade? Algumas companhias daqui participam dos grandes festivais – de Curitiba, de Porto Alegre, de São José do Rio Preto. São esses festivais que dão visibilidade aos grupos e atores. O teatro de Pernambuco tem qualidade. Não deixam a desejar, o Magiluth; O Poste Soluções Luminosas de Samuel Santos, que também já fez esquetes aqui no Sindicato; o Coletivo Angu, que monta os textos de Marcelino Freire. Mar-

Normando – O artista pernambucano não senta para discutir questões políticas. Esse é o maior problema: somos uma categoria dividida, cheia de guetos. Isso nos afasta do profissionalismo. Assim, outras categorias avançam nas suas reivindicações, e nós nem temos reivindicação. Nós queremos reabrir o Teatro do Parque, mas é preciso mais mobilização. As casas de espetáculo precisam de manutenção constante, pois elas abrem e fecham, novamente, para outra reforma. É preciso construirmos um discurso mais afinado, e isso passa pelas entidades que nos representam. Nós temos a Apacepe [Associação dos Produtores de Artes Cênicas de Pernambuco], o Sated [Sindicato dos Artistas e Técnicos de Espetáculos de Diversão no Estado de Pernambuco], a Artepe [Associação dos Realizadores de Teatro em Pernambuco] e a Federação de Teatro de Pernambuco. Ou seja, o que falta é união das entidades e dos seus associados, para que a atividade artística, no estado, torne-se, de fato, profissional. Setembro de 2014

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Saúde e condições de trabalho

Quando o banco rouba a alma Conheça a história de um bancário do Bradesco que teve a saúde psíquica destruída pelo trabalho

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ebastião Alcionann Barbosa completou, em agosto, 30 anos como empregado do Bradesco. Ao longo dos anos, sobretudo na última década, ele não percebeu como o banco ia corroendo sua saúde. Quando percebeu, já era tarde. Hoje, Sebastião já não frequenta ambientes sociais. Não anda sozinho na rua, com medo de alguma convulsão decorrente da Síndrome de Pânico, como já lhe aconteceu outras vezes. Também não pode dirigir com os efeitos dos tantos remédios que é obrigado a tomar. Sebastião sabe que sua vida nunca mais será a mesma. Ele estará sempre preso a uma rotina de medicamentos, psiquiatras, psicólogos, crises, internações. “Eu rezo todos os dias para voltar ao normal, mas sei que não tem volta. Espero que minha história sirva de alerta para que outras pessoas, nas agências, não deixem sua vida chegar ao ponto que eu deixei”, ressalta. O Sindicato garantiu na Justiça uma indenização de R$ 100 mil para o bancário do Bradesco. Em decisão unânime, a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho

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da 6ª Região também mandou o banco devolver o emprego do funcionário, que fora demitido de forma ilegal.

Via Crúcis

O Sindicato garantiu na Justiça uma indenização de R$ 100 mil para o bancário

Os problemas de Sebastião começaram há alguns anos, depois que o bancário passou por três assaltos: dois na agência Piedade e um na Recife Centro. Quando ele assumiu a gerência-geral no município de Afogados da Ingazeira, os problemas aumentaram. “Havia 17 bancos postais ligados à unidade de lá. E não havia carro-forte. Tínhamos, eu e o gerente administrativo, de abastecer nós mesmos todos estes locais. Tudo isso antes da agência abrir. Ou seja, eu tinha que sair de casa cinco horas da manhã para fazer todo este percurso”, lembra Sebastião. Em Serra Talhada, assumiu a gerência sob circunstâncias nada agradáveis: o colega que antes assumira a função tinha sido baleado enquanto fazia o transporte de valores para abastecer cidades vizinhas. Ele acredita que foi por volta de 2006 que se deu conta de que havia algo errado com sua saúde. “Eu já vinha há algum tempo sem conseguir dormir do domingo para a segunda, mas não levava muito a sério. Mas o quadro foi se agravando. Quando chegava na frente da agência, eu começava a suar, as mãos, o pescoço... vinha uma sensação de que o ar ia faltar, de que eu ia desmaiar”, descreve o trabalhador. Foi quando ele decidiu procurar acompanhamento médico-psicológico, que diagnosticou a Síndrome do Pânico associada à depressão. Sebastião passou a se tratar com remédios, mas não se afastou do banco. E toda manhã, ao abrir a agência, passava pelo mesmo sofrimento. Em 2010, quando o Bradesco assumiu a folha de pagamento do


Descaso Todos no banco estavam a par da doença de Sebastião. O próprio médico do banco constatara. Por duas vezes chegou a apresentar o atestado para tentar o afastamento. Não conseguiu. Sequer conseguiu tirar férias entre 2010 e 2011. “Em maio de 2011, eu conversei com o gerente regional e expliquei que o médico havia aconselhado uma licença. Ele disse que eu descansasse e voltasse na segunda. Na terça-

-feira, eu fui demitido”, lembra o trabalhador. Para ele, o grande apoio veio do Sindicato. “Sou sindicalizado desde que entrei no banco, em 84. E mesmo antes de eu ser demitido, o pessoal sempre me apoiou, me ouviu, me orientou. Sou muito grato a todo o pessoal do Sindicato por tudo o que fizeram e fazem por mim”, ressalta. Obviamente, o Sindicato não homologou a demissão. Encaminhou o bancário ao INSS e o perito atestou a doença e o considerou inapto. Os descasos do banco continuaram após a demissão: Sebastião estava com o exame periódico vencido e não fez o exame demissional. A advogada Márcia Santos, do escritório Galindo, Falcão e Gomes Advogados, que presta serviços ao Sindicato, entrou com ação judicial requerendo, além da reintegração, indenização por danos morais.

Decisão judicial No último mês de julho, por unanimidade, a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região manteve a decisão da 20ª Vara do Trabalho que, além de determinar a reintegração, condenava o banco a indenização por danos morais. A indenização que o banco foi condenado a pagar, de R$ 100 mil, é quase nada diante do que foi tirado do trabalhador. E, apesar da reintegração, Sebastião continua doente. Mas a terapia que vem desenvolvendo recomenda o contato progressivo com o foco desencadeador da doença. Em seu caso, o banco. “Queremos alertar as outras pessoas para que não deixem jamais a situação chegar neste ponto. O Sindicato está de portas abertas. Procurem-nos”, ressalta o secretário de Saúde do Sindicato, Wellington Trindade. Os telefones do Sindicato são: (81) 3316-4215 e 3316-4244.

Charlie Balch/FreeImages

Estado, a situação piorou. Além de dar conta da demanda da agência, que aumentara, ele teve que assumir outros PAAs (Postos de Atendimento Avançado). “Eu tinha que fazer tudo: alugar prédio, acompanhar reformas... Não tinha sábado, domingo, nada. Trabalhava mais de dez horas por dia e continuava transportando valores, sem escolta, sem carro-forte”, lembra Sebastião.

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Campeonato de Futebol dos Bancários de Pernambuco

TERRA Terra, premiado solo de dança da bailarina e coreógrafa Maria Paula Costa Rêgo, do Grupo Grial de Dança, está em cartaz no Sítio da Trindade, em Casa Amarela, aos sábados e domingos, 19h30, com entrada gratuita. O núcleo do espetáculo é a pesquisa sobre o índio brasileiro. Em cena, Maria Paula contracena com 450 quilos de areia.

Nove equipes disputam o 16º Campeonato de Futebol dos Bancários de Pernambuco. A primeira fase começou no último dia 6 e segue até o dia 16 de novembro. Nos primeiros jogos, saíram na frente os times do Itaú, Bradesco, Apcef e Santander, justamente

os semifinalistas do ano passado. Os jogos são realizados no Clube de Campo dos Bancários durante os fins de semana e são uma ótima oportunidade para confraternização. Saiba mais sobre o Campeonato em www. bancariospe.org.br.

Palhaças do mundo inteiro ocupam os palcos do Recife

MUNGANGA A dupla Mateus e Catirina, há 25 anos interpretada pelos atores Ivan Leite e José Brito, celebram este tempo de relacionamento levando ao palco do Teatro Arraial (Rua da Aurora) seus momentos mais memoráveis. A dupla faz parte, inclusive, da história de lutas dos bancários. A montagem fica em cartaz às sextas e sábados, às 20h.

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Entre 13 e 20 deste mês, a segunda edição do Festival PalhaçAria traz para os palcos recifenses palhaças do Brasil e de outras partes do mundo. Comediantes da Áustria, Japão, França, Espanha e Argentina, além de profissionais locais, fazem graça nos Teatros Hermilo Borba Filho, Apolo e Santa Isabel. A maioria das

peças tem restrição de idade, mas há algumas para o público infantojuvenil. Também haverá um fórum sobre o ofício do palhaço e duas oficinas que, no entanto, já estão com vagas esgotadas. Acesse a programação em www.circonteudo.com.br/ stories/documentos/article/3792/ Palhaçaria_Programação.pdf


Outros talentos

João Cunha de Azevedo

Vida nova Bancário da Caixa, João fumava duas carteiras de cigarro por dia e não tinha fôlego nem para jogar pelada com os amigos. Hoje, descobriu a corrida, ganhou saúde e se orgulha por ser um bom exemplo para o filho

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orrer é uma atividade recente na vida do bancário João Cunha de Azevedo. Até março de 2012, ele não praticava atividades físicas. Em “peladas” com os amigos, sentia dificuldade para respirar e mal conseguia correr. Nessa época, surgiu o convite para participar do Circuito das Estações, uma corrida promovida pela Caixa Econômica Federal, banco para o qual trabalha. Ele aceitou o desafio. “Fiz apenas dois treinamentos antes da corrida, sem os tênis adequados. E fumava duas carteiras de cigarro por dia. Consegui terminar os cinco quilômetros em 25 minutos e 26 segundos”, conta João. Desde então, a corrida passou a fazer parte do cotidiano dele. Durante um ano, pesquisou sobre corrida, comprou os equipa-

mentos adequados e buscou, sozinho, aprimorar seus treinamentos. Há alguns meses, João conta com a assessoria do treinador virtual Anderson Bassi (andersonbassi.com.br). João treina, no mínimo, três vezes por semana. Próximo às competições, os treinamentos se intensificam: corrida, natação e musculação, durante seis dias por semana. Os resultados evidenciam a evolução do atleta. Em agosto deste ano, ganhou medalha de ouro na prova de cinco quilômetros dos Jogos Nacionais da Caixa, realizados em Goiânia (GO), com o tempo de de 17 minutos e 51 segundos. “Sou um atleta amador, que treina em ritmo avançado e que tem uma meta de atleta profissional: realizar a prova de cinco quilômetros em menos de 16 minutos”, afirma. João, que era atleta na infância e juventude, enumera os benefícios de ter retomado os esportes. “Me sinto mais forte e saudável, parei de fumar e represento uma nova referência para o meu filho, que também quer ser atleta. Além disso, a corrida é uma válvula de escape para o estresse do trabalho”, explica. Embora a Caixa ressalte, nas propagandas, o seu apoio à prática esportiva, João conta que o trabalho no banco é um obstáculo aos treinamentos. “Sou forçado a fazer horas extras e já tive dificuldades para ser liberado para participar das competições. Não recebo nenhum tipo de incentivo da Caixa por ser atleta. Pelo contrário”, afirma.Apesar das dificuldades, João segue motivado a enfrentar novos desafios. Em outubro, participará de uma prova de biatlo: 200 metros de natação e três quilômetros de corrida. Setembro de 2014

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Conheça Pernambuco Passira

A terra do bordado manual

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m Pernambuco, a terra do bordado manual é Passira. São 5 mil bordadeiras numa cidade de 30 mil habitantes. A tradição do bordado na região é mais antiga que o próprio município, criado em 1963, quando tornou-se independente de Limoeiro. Passira está localizada na Zona da Mata Norte, a cerca de cem quilômetros do Recife. Mesmo com trabalhos de qualidade e beleza reconhecidas, as bordadeiras temem não conseguir manter a tradição. Em geral, os bordados manuais de Passira são vendidos por preços muito abaixo do mercado, e as bordadeiras são muito mal remuneradas. “É preciso um mês de trabalho intenso para bordar um lençol e duas fronhas. E ganho R$ 60 por isso”, conta Maria do Carmo Felício. “Nem conseguimos vender os bordados por um preço justo, nem pagar às bordadeiras um valor justo”, lamenta Maria das Dores Chalegre, bordadeira e proprietária de uma loja referência em bordados para recém-nascidos. As bordadeiras contam que, em outras cidades, as peças produzidas por elas são vendidas por preços

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Revista dos Bancários

Bordadeiras têm seu talento reconhecido, mas ainda são mal remuneradas

até cinco vezes superiores. “Temos o sonho de que as bordadeiras de Passira trabalhem de forma integrada e que possamos criar um selo único que ateste a qualidade dos nossos bordados e valorize os preços das nossas peças”, afirma Maria Lúcia Firmino, integrante da Associação das Mulheres Artesãs de Passira. Segundo diretor de Cultura da Prefeitura de Passira, Rogério Santana, “é preciso que o Estado dê mais apoio à tradição do bordado manual”. Nos dias 21, 22 e 23 de novembro, haverá a Feira do Bordado Manual e do Artesanato, em Passira.

Coco de roda Além do bordado, a cidade possui outras manifestações culturais. A comunidade quilombola Chã dos Negros, localizada na zona rural de Passira, mantém a tradição do coco de roda. “Aqui, nós dançamos o coco em pares”, afirma Maria Gorete Martins, que faz parte da Comunidade. Fundada no final do século XIX e reconhecida, em 2004, pela Fundação Cultural Palmares, a Chã dos Negros luta pelo direito à terra (um território de 320 hectares), à saúde e à educação diferenciadas para quilombolas. Para obter mais informações sobre Passira, acesse o site www.portalpassira.com.br.


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