nº 47 - outubro/2014
Bons de briga Os bancários acabam de encerrar mais uma greve vitoriosa. A categoria, aliás, coleciona greves, há décadas, que garantiram muitas conquistas para a classe trabalhadora. Conheça essa história de resistência e luta
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Revista dos Bancários Publicação do Sindicato dos Bancários de Pernambuco
Redação Av. Manoel Borba, 564 - Boa Vista, Recife/PE - CEP 50070-00 Fone 3316.4233 / 3316.4221 Site www.bancariospe.org.br Presidenta Jaqueline Mello Secretária de Comunicação Anabele Silva Jornalista responsável Fábio Jammal Makhoul Conselho editorial Jaqueline Mello, Anabele Silva, Geraldo Times e João Rufino Redação Camila Lima e Fabiana Coelho Projeto gráfico e diagramação Bruno Lombardi - Studio Fundação Crédito da capa Arquivo Seec PE Impressão NGE Gráfica Tiragem 12.000 exemplares
Sindicato filiado a
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Revista dos Bancários
Editorial
Um país dividido A presidenta Dilma Rousseff (PT) e o senador Aécio Neves (PSDB) venceram o primeiro turno das eleições presidenciais e agora disputam a preferência do eleitor, que volta às urnas no dia 26 de outubro. O resultado do primeiro turno mostra um país divido: os estados mais ricos preferiram o candidato tucano e os mais pobres votaram em peso na petista. Isso se reflete também no eleitorado em geral, que reedita uma luta de classes, tão comum e forte em tempos passados. A votação mostra que o eleitor tem consciência de que há dois projetos antagônicos em jogo: um conservador, que visa manter os privilégios das elites que dominam o país há mais de 500 anos; e outro, democrático e popular, que busca garantir conquistas e direitos para todos e incluir aqueles que sempre estiveram à margem da sociedade, tornando a economia mais dinâmica. Aécio Neves já nomeou seu ministro da Fazenda, caso seja eleito. Trata-se do mesmo homem forte que comandou a economia no governo FHC: Armínio Fraga. Em recente entrevista para o jornal O Estado de São Paulo, Armínio Fraga foi enfático: “O salário mínimo cresceu muito ao longo dos anos. É uma questão de fazer conta. Não apenas o salário mínimo, mas o salário em geral... Esse é outro tema que precisa ser discutido, sob pena de engessar o mercado de trabalho”. Armínio Fraga, e o próprio Aécio, têm defendido em conversas privadas com o empresariado a adoção de medidas impopulares no ano que vem. Na entrevista do Estadão, Fraga disse: “O custo de tomar as medidas impopulares é muito menor do que o de não tomar. As pessoas têm de cair na real”. Os tucanos também defendem a terceirização de todas as áreas, inclusive nas atividades-fim, com vários projetos no Congresso que praticamente acabam com a CLT e com a carteira de trabalho. O fator previdenciário é outro mal criado pelos tucanos, que acabou com a aposentadoria de muita gente. Já com Lula e Dilma, houve uma valorização histórica no salário e proteção aos direitos. Para os bancários dos bancos públicos que viveram a era tucana e a era petista, visualizar essas diferenças é muito fácil. Qualquer trabalhador com carteira assinada, por mais que tenha um alto salário, é um operário e como tal deve ter consciência de classe. Por isso, no segundo turno, pense que projeto para o país você quer nos próximos quatro anos: o que defende os interesses do trabalhador ou aquele que só é bom para a elite financeira.
Índice Campanha Nacional 2014
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Greve forte arranca novas conquistas para os bancários Bancários colecionam greves que mudaram a história da categoria Página 6
Homenagem à Abelardo da Hora Página 13
Saloá tem turismo para todos os gostos Página 16
Confira nossas dicas de cultura Página 14
Conheça Inácio Dantas, bancário da Caixa e tenor
Marcio Pochmann analisa a economia e a política do Brasil
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Página 10 Outubro de 2014
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Campanha Nacional 2014
Uma greve, muitas conquistas Bancários acabam de encerrar mais uma Campanha Nacional vitoriosa, depois de sete dias de greve
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s b a nc á r i o s ac a bam de conquistar um dos maiores aumentos reais de salário dos últimos vinte anos. A categoria também garantiu a valorização do piso, com repercussão em toda curva salarial nos bancos públicos, e um reajuste histórico no vale-refeição. Além da parte econômica, os bancários avançaram no combate às metas abusivas e ao assédio moral e em questões relativas à saúde e condições de trabalho. Mas tudo isso não caiu de graça do céu, por bondade dos bancos. Para arrancar essas conquistas, os bancários tiveram de encarar uma semana de greve nacional, iniciada no dia 30 de setembro e encerrada em 7 de outubro. A força da greve, que em Pernambuco parou mais de 80% dos bancos, garantiu aos bancários mais uma Campanha Nacional vitoriosa. A presidenta do Sindicato, Jaqueline Mello, destaca que, na última década, os bancários têm conquistado avanços importantes em todas as campanhas. “Estamos vivendo, sem dúvida
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Em Pernambuco, a greve deste ano paralisou mais de 80% dos bancos
alguma, o período de maiores conquistas para os bancários. Na década de 1990, fazíamos greve para não perder direitos e evitar que os salários fossem arrochados todos os anos. Já de 2003 para cá, temos ampliado as conquistas da categoria em todas as campanhas, garantindo aumento real de salários e mais direitos”, avalia Jaqueline. Os números confirmam a avaliação da presidenta do Sindicato. De 2004 para 2014, os bancários tiveram reajustes salariais acima da inflação em todos os anos, acumulando 20,7% de ganho real. No piso, a valorização é ainda maior: 42,1% de aumento acima da inflação. “Isso é resultado direto da nossa luta, mas também da estratégia que adotamos assim que o presidente Lula foi eleito. No período de Fernando Henrique, a campanha salarial não era unificada, com funcionários dos bancos públicos negociando em separado com cada empresa. O governo do PT aceitou a reivindicação histórica dos sindicatos e passou a negociar junto com a Fenaban numa mesa única, mantendo negociações paralelas para as questões específicas. Com essa unidade, todos os bancários se uniram em torno de uma mesma luta, aumentando o nosso poder de pressão e garantindo
Confira todas as conquistas da Campanha Nacional dos Bancários 2014 em www.bancariospe.org.br.
todas essas conquistas da última década”, diz. No governo de Fernando Henrique, os bancários dos bancos públicos amargaram oito anos de reajuste zero e ainda perderam muitos direitos conquistados a duras penas. Nos bancos privados, os bancários ainda garantiram algum reajuste, mas sempre abaixo da inflação. Já sob o governo Lula e Dilma, os aumentos salariais sempre foram acima da inflação, os funcionários dos bancos públicos recuperaram a grande maioria dos direitos retirados pelos tucanos e ampliaram suas conquistas, entre elas, o projeto-piloto que garantiu mais segurança nas agências de Recife, Olinda e Jaboatão, PLR muito mais alta,
13ª cesta alimentação e ampliação da licença-maternidade para 180 dias. “Agora, neste segundo turno das eleições presidenciais, temos dois projetos para o futuro do país. Um deles, encampado por Aécio Neves, traz de volta o modelo do governo FHC, que é péssimo para os trabalhadores. Os tucanos arrocharam o salário mínimo, criaram o fator previdenciário, retiraram direitos dos trabalhadores e só não acabaram com a CLT e legalizaram a terceirização ilegal e indiscriminada porque não deu tempo, embora esses dois projetos ainda tramitem no Congresso Nacional. O outro projeto de país é encampado pela presidenta Dilma, que garantiu uma
valorização histórica no salário mínimo, ampliou os direitos dos trabalhadores e protegeu os mais pobres, levando milhares de pessoas a ascender para a classe média. O resultado do primeiro turno mostra mesmo um país dividido. Os estados e pessoas mais ricos votaram no PSDB. Os estados mais pobres e os trabalhadores votaram no PT. Resta a cada eleitor aqui de Pernambuco saber o que queremos do próximo presidente: que cuide dos mais pobres e dos trabalhadores ou que governe para os mais ricos”, finaliza Jaqueline. Confira todas as conquistas da Campanha Nacional dos Bancários 2014 em www.bancariospe. org.br. Outubro de 2014
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Greve
A epopeia dos bancários Uma das categorias mais organizadas do Brasil, os bancários colecionam greves que mudaram a história, mas que também se modificaram através do tempo
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mês de outubro começou com mais uma greve dos bancários. A cada ano, a arma dos trabalhadores na luta entre patrões e empregados ganha diferentes perfis. A greve de hoje não é a mesma de dez anos atrás, que não é a mesma dos anos oitenta, que é bem diferente da década de 50. “Quando eu entrei no banco, em 1986, a gente vivia o fim da ditadura e havia uma ânsia de luta muito grande. A gente queria mudar a sociedade. A greve era muito mais fácil porque havia uma consciência de classe que se sobrepunha ao medo”,
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lembra a secretária de Finanças do Sindicato, Suzineide Rodrigues. No entanto, se houve períodos de mobilização mais intensa e organização mais forte, também houve tempo em que as greves não ocorriam ou eram curtas. Houve tempo em que sequer se podia falar em greve, sob risco de prisão, tortura e morte. Houve tempo em que se acreditou que patrões e empregados eram amigos. Mas foi sempre ela, a greve, que arrancou dos banqueiros as maiores conquistas para os bancários.
Nos tempos de Getúlio Irineu Nascimento, falecido em março deste ano, foi um dos sócios-fundadores do Sindicato, que completa 83 anos no próximo dia 14 de outubro. Sua história como sindicalista coincide com o período do Estado Novo, quando a organização dos trabalhadores estava sob a tutela estatal. Neste contexto, ele declarou em vídeo gravado para a comemoração dos 70 anos da entidade: “No meu tempo não havia greve. Não havia litígio com o empregador. Os empregadores eram nossos amigos e nós éramos amigos deles”. Houve poucas conquistas neste período. Mas nos anos anteriores ao re-
Jaqueline Mello
Paralisação dos bancários do BNB nos anos 90
gime do Estado Novo, o Sindicato participou da campanha que garantiu a jornada de seis horas para a categoria, em 1933. Participou também de uma luta mais ampla, pela regulamentação do salário-mínimo, em 1936. Os avanços nos direitos da categoria coincidem quase sempre com os períodos de maior organização.
Anos dourados Em Pernambuco, foi somente na década de 1950 que ocorreu a primeira greve dos bancários. Segundo a pesquisadora Zirlana Teixeira, autora do estudo “A ação do Sindicato dos Bancários de Pernambuco contra a privatização dos bancos públicos”, o movimento foi deflagrado à revelia da direção do Sindicato e durou 40 dias. Um dos participantes, Milton Percivo, se tornaria o presidente da entidade. Entre a década de 1950 e o início dos anos sessenta, a categoria foi reforçando, a cada ano, sua capacidade de mobilização. Em depoimento gravado em vídeo, Gilberto Azevedo, que presidiu a entidade entre os anos de 1959 e 1961, lembra o grau de organização da categoria: “Tínhamos uma comissão sindical em todos os bancos. Chegamos a realizar assembleias com mais de 2 mil bancários. Era
quase metade de todos os bancários que existiam na época”. Darcy Leite, falecido em 2010, foi presidente do Sindicato até a intervenção militar. Segundo ele, os bancários eram tão organizados que, durante as greves, um simples telefonema era suficiente para fechar uma agência. Foi entre o final dos anos 1950 e início da década de 1960 que os bancários de Pernambuco conseguiram, por exemplo, o fim do trabalho aos sábados e que o pessoal de portaria tivesse direito à jornada de seis horas. Para os trabalhadores brasileiros, o ano de 1961 marcou a conquista do 13º salário.
Renascimento da organização Então veio o golpe e, durante mais de dez anos, o Sindicato ficou nas mãos dos interventores militares e seus herdeiros. Epaminondas Neto, secretário
de Administração do Sindicato, entrou no Bandepe em 1981. Mas só alguns anos depois, com o retorno de Miguel Arraes ao governo, a organização dos trabalhadores, reprimida pela ditadura, deu sinais de recuperação. “O Bandepe sempre foi um banco muito político. Então já existia um sentimento de solidariedade entre os concursados e de revolta contra as injustiças que vinham dos apadrinhamentos políticos. Com a volta de Arraes, este sentimento aflorou”, lembra Epaminondas. Foi quando os bancários retomaram a Associação Atlética do Bandepe e começaram a se reunir. “O Sindicato ainda estava nas mãos dos herdeiros da intervenção militar. Então a gente se reunia no Sindicato dos Metalúrgicos. Tinha muita gente do antigo PCB, outros sem filiação partidária... mas cada agência tinha, no mínimo, um representante Outubro de 2014
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Greve Suzineide Rodrigues
Os protestos dos bancários sempre tiveram como marca o bom-humor
na comissão de funcionários”, conta o diretor. Com esta capacidade de organização, eles conquistaram o direito a delegados sindicais em todas as agências, inclusive no interior, e estavam na linha de frente na batalha contra os banqueiros. Suzineide Rodrigues, secretária de Finanças do Sindicato, entrou no Bradesco neste período, em 1986. E lembra do papel de liderança exercido pelo pessoal do Bandepe e do Banco do Brasil. “Mas havia uma adesão geral, inclusive nos bancos privados. Havia comandos de greve por área, formados pelo pessoal da base, militantes. Eu, por exemplo, ainda não fazia parte da direção do Sindicato. Mas chegava às sete horas
Fabiano Félix
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da manhã para fazer piquete em frente à agência”, lembra. Na Caixa Econômica Federal, a briga era para que os empregados fossem enquadrados como bancários. Considerados economiários, eles não tinham os direitos da categoria, como a jornada de seis horas, nem podiam se filiar ao Sindicato dos Bancários. Foi preciso muita luta pra que, finalmente, eles passassem a fazer parte da categoria em 1985, após uma forte greve nacional que entrou para a história dos bancários. Outra greve marcante aconteceu em 1989, quando houve adesão em massa dos bancos privados. “Claro que existia a pressão, a repressão. Depois desta greve, por exemplo, algumas lideranças foram demitidas; outras foram promovidas como forma de cooptação. Mas, apesar do medo, havia uma cultura da união, um espírito coletivo”, conta Suzi.
Bancos diferentes, greves diferentes Era outra a realidade dos bancos na década de 1980, a começar pela
quantidade. Só entre os estaduais, havia o Banorte, Banco Industrial, Mercantil de Pernambuco e Bandepe. Havia ainda os bancos federais e os privados. O número de agências era, portanto, muito maior. Segundo Suzineide, somente entre a Rua Nova, Guararapes, Concórdia e Rua da Palma, eram 22 unidades. Com o tempo, os bancos foram se fundindo, vários foram vendidos, outros privatizados e o sistema financeiro foi se tornando mais concentrado e enxuto. A tecnologia também não era a mesma de hoje. Com tudo isso, o número de trabalhadores era muito superior. “Tudo era feito nas agências, na compensação, na boca do caixa. Então tinha muito mais gente. E a maioria era escriturário e caixa. Hoje, boa parte tem alguma função comissionada. Isso enfraquece a greve porque se criou uma cultura de que chefe não faz greve. Além disso, o peso das comissões se tornou tão grande que acabou escravizando as pessoas e tornando-as reféns do medo do descomissionamento”, explica Suzi. Os relatos dos dirigentes sobre os anos 80 mostram grevistas ousados e destemidos. “Éramos jovens. Fazíamos greves ao som dos Titãs... À noite, íamos na Avenida Rio Branco
fechar a compensação. Já levei muita carreira da Polícia. Colegas apanhavam, outros iam presos... o Sindicato já tinha uma equipe de advogados de plantão para liberar o pessoal”, conta Epaminondas. Como a maior parte dos serviços era efetuado nas agências, o prejuízo causado pelas greves era muito maior. “Hoje, o prejuízo é na imagem do banco. Eles têm horror quando a gente fala que a culpa é dos banqueiros, e coloca a sociedade contra eles”, opina Suzi. Apesar do individualismo ser o maior adversário dos tempos modernos, a mobilização e organização dos trabalhadores têm crescido nos últimos dez anos em relação aos anos 90 e a estratégia das negociações e campanha unificada ajuda a fortalecer a luta.
Tempos difíceis A presidenta do Sindicato, Jaqueline Mello, entrou na Caixa Econômica Federal em 1989 e, um ano depois, enfrentava uma das greves que marcou sua vida. “Quando Collor assumiu, ele mandou anular a contratação de todos os concursados que tinham sido chamados entre fevereiro e março daquele ano. Fizemos greve e a repressão foi dura: muita gente foi demitida por causa disso”, lembra Jaqueline.
Houve outras greves fortes no período Collor, entre as quais a de 1991, que durou 21 dias. Em todas elas, as medidas de punição eram duras, com desconto dos dias parados por exemplo. “Mas na era Collor, ainda havia um movimento de resistência. Com FHC, foram várias medidas que, aos poucos foram minando a organização dos trabalhadores”, conta a dirigente. Direitos retirados, transferências compulsórias, demissões, reajuste zero, ampliação da terceirização, privatizações e fusões. As greves, quando existiam, eram curtas, se restringiam aos bancos privados e garantiam, no máximo, a reposição da inflação ou um abono. No BB, BNB e Caixa, apenas retirada de direitos e zero de reajuste. Mesmo assim, os bancários garantiram conquistas importantes nesse período, dentre as quais a Convenção Coletiva Nacional, que unificou a luta da categoria em 1992, e a PLR (Participação nos Lucros e Resultados), em 1995, que foi sendo aperfeiçoada ano a ano.
A última década Nos últimos anos, os bancários têm feito greves fortes todos os anos e conquistado aumento real em todas elas, entre outros avanços. Mas há problemas graves que permanecem sem resposta: a rotatividade, as metas abusivas, a falta de pessoal, as péssimas condições de trabalho. “É uma forma de organização de trabalho que desumaniza as pessoas. O bancário é cobrado todo tempo sobre as metas. Ele dorme pensando nisso, almoça pensando nisso... e isso vai se solidificando de tal forma que não há mais espaço para outros pensamentos: o pensamento coletivo, por exemplo”, avalia secretário-geral do Sindicato, Fabiano Félix. Mesmo assim, há muita gente nova que vem agindo na contramão desta cultura do individualismo criada pelos bancos e dão exemplo de resistência. Cada uma destas pessoas tem uma missão: ganhar corações e mentes para a luta coletiva.
Na última década, os bancários têm ampliado suas conquistas todos os anos, com fortes greves
Epaminondas Neto
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Entrevista
A economia segundo Marcio Pochmann
Qual a sua opinião em relação à proposta de independência do Banco Central (BC), defendida por alguns candidatos à Presidência da República? Na hipótese de passar a ser independente, o BC se deslocaria do Poder Executivo e se tornaria, praticamente, um outro poder, cujos interesses estariam diretamente ligados ao sistema bancário financeiro – diferentemente, do
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Antonio Cruz/ABr
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esse período eleitoral, surgem muitas dúvidas em relação às propostas e críticas dos candidatos à Presidência da República, principalmente na pauta econômica. A Revista dos Bancários conversou com o economista Marcio Pochmann sobre a situação do Brasil e do mundo e as perspectivas para o país, no novo mandato presidencial, que se inicia em 2015. Pochmann é doutor em economia pela Universidade Estadual de Campinas, onde leciona, atualmente. Foi presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), supervisor do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Econômicos (Dieese) e professor da Universidade Católica de Brasília. Publicou dezenas de livros e artigos acadêmicos.
Pochmann é doutor em economia pela Unicamp, foi presidente do Ipea e tem dezenas de livros publicados
que temos hoje. Atualmente, o BC tem autonomia no exercício das funções que a Constituição Federal estabelece. No entanto, a definição dos seus dirigentes integra as opções feitas pelo povo, a cada quatro anos, em relação ao plano de governo. E o BC tem uma atribuição enorme, não apenas na fiscalização do sistema bancário, mas, também, na política monetária, que permite termos um tipo de programa econômico ou outro. Retirar o poder executivo daqueles que foram eleitos pode comprometer a democracia, que já é, no Brasil, relativamente recente e limitada. Então, é um equívoco a independência do BC, pois isso significaria terceirizar a política monetária e a própria fiscalização dos bancos a uma instituição que teria total independência em relação ao Executivo e àqueles que foram eleitos para implementar as políticas econômicas e sociais. O programa de governo do candidato Aécio Neves evidencia apoio à terceirização de atividade-fim. Qual a sua opinião sobre esse tema? O Brasil, até o presente momento, caracteriza-se por não ter tido uma reforma trabalhista liberalizante. Nós tivemos algumas medidas nesse sentido, na década de 90, mas nunca uma reforma trabalhista. O avanço
A grande imprensa brasileira tem feito muitas críticas ao governo Dilma em relação à economia. Até que ponto essas críticas são coerentes ou distorcidas? A imprensa brasileira, de maneira geral, aceitou os parâmetros do mercado financeiro para analisar a economia. Se formos olhar numa perspectiva mais ampla, o que percebemos é que estamos diante da mais grave crise econômica do capitalismo dos últimos 70 anos. Os Estados Unidos, a própria União Europeia, têm observado por diversos indicadores o aumento da pobreza, da desigualdade de renda, do desemprego e dos baixos salários. Nesse período, nós percebemos que o ônus dessa crise tem sido repassado à classe trabalhadora. Segundo a OIT [Or-
ganização Internacional do Trabalho], o mundo teria perdido 72 milhões de emprego, entre 2008 e 2013. Então, vamos analisar a situação do Brasil e perceber que o sentido é muito diferente. Nesse mesmo período, o Brasil viveu a geração de 11 milhões de empregos formais, a queda da pobreza e da desigualdade. É um país onde, de certa maneira, os trabalhadores estão protegidos, pelo menos até agora, dos efeitos nefastos da crise internacional. É, portanto, uma referência importante para ser considerada. Em outros períodos em que tivemos crise, os trabalhadores pagaram por ela, com perda de emprego e redução de salários. E, nesse sentido, instituições internacionais destacam a experiência brasileira de hoje como exitosa. Então, é coerente o argumento da presidenta Dilma de que um dos principais obstáculos ao governo dela, na economia, foram justamente as consequências da crise econômica de 2008? De 2008 para cá, o ritmo de expansão dos chamados BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) é quase a metade do ritmo em que estavam crescendo até 2008. A China crescia a 10% ou 11%, ao ano, e está crescendo 6% ou 7%. A África do Sul e Rússia, também, diminuíram os seus ritmos de expansão. Isso tem a ver com a crise. Nós estaríamos crescendo a 2 ou 3%, no entanto esse é um ano em que há dúvidas, especialmente dos empresários, em relação ao que vai ocorrer com a economia
Elza Fiúza/ABr
da terceirização das atividades-meio não deixou de enunciar a possibilidade de reduzir os custos de contratação e flexibilizar os contratos. Mas isso não seria consolidado, pois estamos acompanhando a pressão dos trabalhadores com o objetivo de regular a terceirização. Agora, se tivermos a vitória de um candidato que permita não só a terceirização de atividade-meio, mas, também, a de atividades-fim; nós estaremos diante de uma reforma trabalhista, que se consolidaria a redução do custo da contratação e a flexibilização dos contratos. A flexibilização, de maneira geral, tem como consequência salários menores e menos direitos para os trabalhadores terceirizados e enorme rotatividade de mão de obra.
“O Brasil é um país onde os trabalhadores estão protegidos. Em outros períodos de crise, os trabalhadores pagaram por ela” Marcio Pochmann Outubro de 2014
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nacional no próximo ano. Principalmente, porque há economistas de determinados candidatos que estão, por exemplo, prevendo uma recessão, ao dizerem que o Brasil precisa passar por um “tarifaço”, fazer um ajuste nas contas públicas e aumentar o superávit fiscal de 1,9% para 3% ou 3,5%. Tudo isso tem um impacto na economia. E, num quadro de incertezas, é natural que os empresários cancelem investimentos, e isso se reflete no que estamos vivendo: mais fragilidade para a expansão. Mas eu entendo que, superado período eleitoral e mantida a presidenta Dilma, 2015 será um ano de recuperação da economia, com uma situação muito melhor. Qual à sua opinião sobre as críticas ao governo Dilma pelo aumento da inflação? Ao longo dos últimos 12 anos, não houve nenhuma convivência com a inflação acima de uma meta acordada previamente. A meta de inflação não foi aumentada, ela continua sendo 4,5%, com a possibilidade de mudança, para cima ou para baixo, de dois pontos percentuais. E a inflação tem ficado dentro desse parâmetro. Não há nenhum descontrole inflacionário. Pelo contrário. O que temos, de fato, é um aumento sobre determinados níveis de preço, que decorrem da própria desvalorização cambial, da elevação de preços alimentícios em função da seca ocorrida. E, obviamente, isso termina fazendo com que a inflação esteja acima do centro da meta, mas ela está sob controle.
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Pochmann: a imprensa brasileira aceitou os parâmetros do mercado financeiro para analisar a economia
Então, é acertado o caminho escolhido pelo atual governo para o combate da inflação? Exatamente, é o caminho possível. Há uma exploração da oposição e dos meios de comunicação, ao apresentar uma realidade muito mais grave do que ela se apresenta. Porque se a gente pergunta ao cidadão comum como ele vê a sua situação, de maneira geral, ele responde: “estou com emprego, minha renda melhorou, fiz compras, melhorei a situação da minha casa, estou satisfeito”. Mas, se a gente perguntar como ele vê o Brasil, ele vai responder: “o Brasil está péssimo”. E como é possível a situação individual estar boa e situação do Brasil estar tão ruim? É porque o cidadão comum não tem condições de avaliar a situação do Brasil, e os meios de comunicação apontam os dados de forma muito que pior do que, na realidade, eles se apresentam. Qual a sua avaliação geral do governo Dilma na área econômica?
O governo Dilma se assenta em uma experiência inédita para a democracia brasileira: 12 anos de uma unidade programática. Apenas durante o período militar e o Estado Novo tivemos uma unidade programática por muito tempo. Estamos em uma trajetória de opções que foram feitas, e os resultados são bastante satisfatórios. Mas é claro que o Brasil é um país com heranças históricas acumuladas e vive problemas que devem ser enfrentados de forma mais significativa. O segundo governo da presidenta Dilma, se houver aprovação da maior parte da população, deve representar não apenas o aprofundamento do que se viu nos últimos 12 anos, mas, também, a introdução de reformas: como é o caso da reforma eleitoral, a reforma tributária, a reforma urbana – da qual tem se falado tanto, principalmente, em relação à mobilidade. Esse segundo governo Dilma afirmaria medidas tomadas anteriormente, mas aprofundando a realização de reformas.
Elza Fiúza/ABr
Entrevista
Homenagem
Abelardo da Hora e a beleza do ser humano
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Thomas Baccaro
scultor, desenhista, gravurista e ceramista pernambucano, Abelardo da Hora completou 90 anos em julho e faleceu no último dia 23 de setembro. O artista deixa uma vasta obra de grande beleza nas ruas do Recife e em seu ateliê, localizado no centro da cidade. Além de sensibilidade e talento, suas obras evidenciam suas fontes de inspiração e aflição: a beleza do ser humano, as expressões da cultura popular e o sofrimentos daqueles que viviam na miséria. Abelardo da Hora foi preso 70
vezes, em virtude de sua atuação política. Nas gestões de Miguel Arraes e Pelópidas Silveira, na prefeitura do Recife, assumiu cargos públicos. Na década de 1960, foi um dos criadores do Movimento de Cultura Popular, cuja sede funcionava no Sítio da Trindade, que se tornou um espaço dedicado à cultura, na cidade. Além disso, foi um dos responsáveis pela criação da lei que tornou obrigatória a colocação de obras de arte em áreas construídas de mais de 1000 metros quadrados, no Recife. Pouco tempo antes de ser internado no hospital em que faleceu, Abelardo continuava produzindo intensamente. Em entrevista concedida ao Diário de Pernambuco, em julho deste ano, enumerou cinco dos seus desejos: levar a exposição “Amor e Solidariedade”, que circulou pelo Brasil, para a Europa; reconstruir duas obras destruídas pelos militares, durante o golpe de 64 (um monumento em homenagem às ligas camponesas e uma torre de iluminação metálica que se movia com vento); inaugurar o Instituto Abelardo da Hora; construir um monumento nos arrecifes; e acabar com miséria no Brasil – o que, segundo o próprio artista, era o seu maior sonho. Prefeitura Municipal de João Pessoa Outubro de 2014
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Divulgação
Agenda cultural
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Janela Internacional de Cinema entra em cartaz
ALICE UNDERGROUND
Divulgação
Nos sábados 4, 11 e 18 de outubro, está em cartaz o espetáculo Alice Underground, da Companhia Incantare. A peça é inspirada nas obras de Lewis Carrol, mas acrescenta outros personagens e tramas. A peça está no Teatro Eva Hertz, Shopping Rio Mar, às 19h30.
A partir do dia 27, entra em cena a 7a edição da Janela Internacional de Cinema. Nos cinemas São Luiz e da Fundação, serão exibidas centenas de filmes, entre curtas e longas. Haverá mostras competitivas e também a exibição de grandes clássicos do cinema, entre os quais Juventude transviada (1955), O massacre da serra elétrica (1974), A filha de Ryan (1970) e Il dolci inganni (1960).
Na mostra competitiva, 150 produções serão exibidas, entre elas, os filmes pernambucanos História natural, do jornalista Júlio Cavani; Loja de répteis, do cineasta Pedro Severien; e os inéditos João Heleno dos Brito - de Neco Tabosa – e Noites traiçoeiras, com direção de João Lucas Melo Medeiros. A programação completa será divulgada no dia 14 em www.janeladecinema. com.br/2014
Campeonato de Futebol dos Bancários em ritmo quente
MAGIA DE MIRÓ Na Caixa Cultural, vale conferir a exposição A Magia de Miró. São 69 gravuras e 23 fotografias do artista catalão Joan Miró. Visitação de terça a sábado, de 8h às 20h. A Caixa Cultural fica em frente ao Marco Zero, no Recife Antigo.
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Depois de uma pausa no final de semana das eleições, o Campeonato de Futebol dos Bancários volta a movimentar o Clube de Campo do Sindicato, em Aldeia. Nos dias 11 e 12, jogam Itaú X Bradesco Olinda; Bradesco X Santander; Bradesco Regional X Apcef Master e Bradesco Cabo X Banco do Brasil. E nos dias 18 e 19, os jogos são entre Bradesco e Apcef-PE; Bradesco Olinda e Apcef Master; Bradesco Regional e Banco do Brasil; Itaú e Santander. A disputa está acirrada.
Até o fechamento desta edição, Apcef e Bradesco empatavam em número de pontos na liderança da tabela, com o Bradesco à frente no saldo de gols.
Outros talentos
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De repente, música
Bancário da Caixa, Inácio Dantas tem um grupo musical que faz intervenções inusitadas e pega muita gente de surpresa
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paixonado por música, o bancário Inácio Dantas concilia o dia a dia de ensaios e apresentações com seu grupo, Cena Vocal, com o trabalho na Caixa Cultural Recife. “Minha grande paixão é o teatro musical. E o meu sonho é ter uma companhia e produzir espetáculos”, afirma Inácio. A formação dele evidencia que esse sonho é antigo e que, há anos, trilha o caminho para alcançá-lo. É formado em Comunicação Social e Artes Cênicas, pela Universidade Federal de Pernambuco, e em canto erudito, pelo Conservatório Pernambucano de Música – onde é aluno do curso de canto popular. O Cena Vocal é formado por Inácio (tenor), Anastácia Rodriguez (mezzosoprano), Bianca Vieira (soprano), David Mitchel (baixo)
e Sueudo Fernandes (barítono). Antes de formarem o grupo, os cinco músicos foram garçons-cantores, em um restaurante localizado na zona sul do Recife. O próprio grupo intitula o trabalho que desenvolve de “intervenção musical”. “Ela tem inspiração nos flash mobs, que ficaram conhecidos pela dança. São grupos de pessoas que começam a dançar em espaços públicos, sem que as pessoas ao redor estejam esperando. No nosso caso, também fazemos performances repentinas em lugares inusitados, mas cantando”, conta Inácio. O Cena Vocal costuma fazer as intervenções nos espaços públicos, pelo menos uma vez por mês. O grupo tem, também, um trabalho mais comercial: apresentações em festas de formatura, 15 anos e outros eventos sociais. “Mantemos o formato da intervenção musical, nas festas. Nos vestimos como se fôssemos convidados e cantamos misturados a eles. Essa proximidade com o público nos dá mais prazer, nos sentimos mais vivos”, afirma Inácio. Quanto aos seus 10 anos de trabalho na Caixa, Inácio conta que teve a sorte de, sempre, trabalhar em áreas que tinham a ver com a sua formação. “Estou realizado profissionalmente, mas admito que, se pudesse trabalhar apenas com teatro musical, o faria”, afirma. Quem quiser conhecer melhor o trabalho do Cena Musical ou contratá-lo, pode entrar em contato com grupo por e-mail (grupocenavocal@gmail. com) ou pelo facebook (facebook.com/cenavocal). Outubro de 2014
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Saloá
Sombra e água fresca
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metros, a contar do seu trecho superior, onde inicia-se a primeira queda até o poço, em seu trecho inferior. São três quedas d’água, a última com mais de 10 metros de altura. Os mirantes na serra são outro passeio imperdível, entre os quais o da Serra da Prata, o da Igreja de Antônio Ricardo e o dos Cristais. A Serra da Prata tem cerca de 990 metros de altitude e 250 metros de altura em relação à cidade de Saloá. Há, também, as construções arquitetônicas: Casas de Farinha, como a do Sítio Caldeirão; antigas casas grande, como a do Bebedouro; tranquilos povoados, como São Serafim e Serrinha da Prata; Igrejas como a de São Vicente de Paulo, padroeiro da cidade. A festa do padroeiro acontece este mês, entre os dias 11 e 19 de outubro, com uma programação religiosa, que inclui procissões, missas e novenas e também a festa profana, com apresentações culturais, brincadeiras e quermesses. Saloá fica a 267 quilômetros do Recife, próximo a Garanhuns. Quem for, também não deve deixar de provar os deliciosos licores de rosas e erva-doce, de fabricação caseira.
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aloá, no Agreste pernambucano, está inserida no circuito do turismo rural de Pernambuco. Com atividades campestres, cachoeiras e belas paisagens, tem entre os principais atrativos a Fazenda Brejo. Trata-se de um Hotel Fazenda, que oferece aos seus visitantes banhos em fonte de água mineral e cachoeira, passeios a cavalo ou em carro de boi, caminhadas por trilhas ecológicas, pescaria e outras atividades. Na Fazenda Brejo, o valor das diárias varia entre R$ 150 e R$ 200. O local dispõe de uma reserva ambiental com 52 hectares de mata atlântica e brejo de altitude. Mais informações no site www.fazendabrejo.com.br. Mas Saloá tem opções também para quem não quiser gastar tanto: cachoeiras, mirantes, serras e antigas construções. A cachoeira do Coema fica entre um grande paredão rochoso em forma de concha e apresenta uma queda de aproximadamente 30 metros de altura. A do Cu do Bicho tem uma altura aproximada de 80